O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporâneo

Embed Size (px)

Citation preview

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    1/19

    O TRABALHO ESCRAVO DE IMIGRANTES LATINO-AMERICANOS NO BRASIL CONTEMPORNEO1

    Lucas Andrade de Morais

    Clebianne Vieira Arajo

    Emanuela Cardoso Rocha

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    2/19

    O TRABALHO ESCRAVO DE IMIGRANTES LATINO-AMERICANOS NO BRASIL CONTEMPORNEO1

    Lucas Andrade de Morais

    Graduando em Direito, pelo Centro de Cincias Jurdicas e Sociais CCJSda Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e graduando emAdministrao Pblica pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte(UFRN). http://lattes.cnpq.br/4304836710800316

    Clebianne Vieira Arajo

    Graduanda em Direito, pelo Centro de Cincias Jurdicas e Sociais CCJSda Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).http://lattes.cnpq.br/1180950885750298

    Emanuela Cardoso Rocha

    Graduanda em Direito, pelo Centro de Cincias Jurdicas e Sociais CCJSda Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).http://lattes.cnpq.br/1105903544860752

    RESUMO

    Apesar de existirem diversas leis que probam o trabalho escravo no

    Brasil e no mundo, ainda existem muitos imigrantes que trabalham em

    condies anlogas a escravido. No Brasil os imigrantes ilegais

    provenientes da Amrica Latina, como os bolivianos, paraguaios, peruanose chilenos, vem para o Brasil com o intuito de mudar a situao de vida,

    quando chegam se deparam com uma realidade totalmente diferente.

    Sendo explorados constantemente a condies desumanas. O trfico de

    migrantes latino-americanos para o Brasil tem crescido isto porque este

    pas faz fronteira com os pases de emigrao. A pesquisa em questo tem

    1 Trabalho apresentado no VI Seminrio Internacional de Direitos Humanos (2010), com o tema DireitosHumanos e Integrao Latino-Americana no Centro de Cincias Jurdicas da Universidade Federal da Paraba(UFPB-CCJ) Campus I, Joo Pessoa-PB.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    3/19

    por objetivo analisar as condies de trabalhos de imigrantes latino-

    americanos em condies anlogas escravido e aos trabalhos forados,

    e avaliar as legislaes constitucionais e infraconstitucionais ptrias,

    latino-americana e internacional que ampare esses imigrantes. Para o

    mtodo de pesquisa foram utilizados o estudo comparado e a pesquisa

    exploratria com base em notcias, documentos atinentes ao tema.

    Procurando estabelecer as situaes dos imigrantes e sua importncia no

    processo de integrao econmica, social e cultural na Amrica Latina.

    PALAVRAS-CHAVES: Trabalho Escravo. Imigrao. Amrica Latina.

    Brasil.

    ABSTRACT

    Although there are several laws that prohibit slavery work in Brazil and in

    the world, there are many immigrants working in conditions similar to

    slavery. In Brazil, the illegal immigrants from Latin America, like the

    Bolivians, Paraguayans, Peruvians and Chileans that came to Brazil to

    change their situation of life, when they arrive they are faced with a

    totally different reality, constantly being explored into inhumane

    conditions. The trafficking of Latin American migrants to Brazil has grown

    because this country is bordered by the countries of emigration. The

    research project aims to examine the working conditions of Latin American

    immigrants in conditions similar to slavery and forced labor, and evaluate

    the constitutional laws, Latin American and international that care these

    immigrants. For the research method were used the exploratory research

    and comparative study based on news, documents pertaining to the

    subject. Trying to establish the situations of immigrants and their

    importance in the process of economic, social and cultural integration in

    Latin America.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    4/19

    KEYWORDS: Slavery Work. Immigration. Latin America. Brazil.

    1 Introduo

    Ao mencionar trabalho escravo no Brasil, logo nos remete a

    memria os negros, as senzalas, e os navios negreiros vindo da frica,

    entretanto, essa idia de escravido a existente no perodo colonial do

    Brasil, em que os escravos eram presos s terras dos senhores coloniais,

    e no tinham direitos, alm de viverem em pssimas condies, e era

    parte integrante da propriedade do senhor colonial.

    Quando se falar em trabalho escravo contemporneo, so

    destacados nos meios de comunicaes trabalhadores que so

    aprisionados em grandes fazendas, e vivem em condies desumanas,sem terem a possibilidade de sarem do local por diversos fatores, apesar

    do perodo de escravido ter acabado no Brasil, e juridicamente ela no

    permitida a escravido, em muitos locais do pas pessoas vive em

    situaes anlogas a escravido.

    No s brasileiros so vtimas dessa nova escravido, mas

    tambm os imigrantes latino-americanos, em sua grande maioria

    peruanos, bolivianos e paraguaios, que vivem no Brasil ilegalmente,

    muitos trabalham em fabricas no sul do pas, configurando o chama

    trabalho escravo urbano.

    Assim, o artigo pretende analisar os trabalhos de imigrantes latino-

    americanos em condies anlogas escravido e/ou trabalhos forados,

    e avaliar as legislaes constitucionais e infraconstitucionais ptrias e

    internacional que ampare esses imigrantes.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    5/19

    O trabalho foi dividido em quatro momentos, inicialmente, buscou-

    se uma abordagem conceitual do Trabalho escravos em suas dimenses.

    Num segundo momento, levantou-se a legislao do que versam sobre

    trabalho escravo, tanto no mbito nacional, quanto no internacional. No

    terceiro momento, tenta-se descreve de forma detalhada o trabalho

    escravo de imigrantes latinos no Brasil contemporneo. E por fim,

    demonstram-se as aes e legislaes que visam proteo ao imigrante

    no Brasil. Para tanto, utilizou-se mtodos de pesquisas como estudo

    comparado, visando uma relao entre as legislaes nacionais e

    internacionais, o exegtico-jurdico, e a pesquisa exploratria com base

    em notcias, documentos atinentes ao tema.

    2 O Trabalho Escravo: noes gerais

    A escravido foi abolida em maio 1888, pela Lei urea2, assim as

    prticas desse sistema tambm foram proibidas, a principal delas eratrabalho escravo, forma de trabalho degradante, aliado ao cerceamento

    da liberdade dos trabalhadores. No contexto contemporneo do trabalho

    escravo, essa falta de liberdade se dar por meios de fatores como a

    apreenso de documentos, a presena de guardas armados e gatos com

    comportamentos ameaadores; por dvidas contradas ilegalmente

    impostas aos trabalhadores, ou ento pela localizao geogrfica que

    geralmente impede a fuga.

    Esse tipo de trabalho foi utilizado no perodo colonial brasileiro. Os

    colonizadores portugueses necessitavam de mo-de-obra, o emprego da

    mesma, se dava por meio do trabalho compulsrio, realizado de diversas

    maneiras, a principal dela era o escravismo africano, em que o individuo

    era propriedade do senhor colonial e no possuam direitos, e s

    adquiriram direitos a partir da promulgao da Lei urea.

    2Lei. n 3.353 (Lei urea) declarou extinta a escravido no Brasil.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    6/19

    Passadas dcadas da Lei urea, e com a modernizao das

    sociedades e do sistema jurdico, ainda existem hoje no Brasil o trabalho

    escravo, deixando claro que tal mazela no foi erradicada. As diferenas

    entre o trabalho escravo atual, para o trabalho escravo colonial so

    poucas, tendo em vista que as duas possuem as mesmas violaes aos

    direitos humanos; o escravo atual no tem um padro tnico, como

    tambm o escravo atual no integra mais o patrimnio do senhor. Todavia

    possuem os mesmos intuitos: angariar vantagens econmicas.

    Muitos foram os conceitos adotados para descrever o atual trabalho

    escravo, como trabalho forado, compulsrio, explorao de trabalhador,escravido branca, trabalho anlogo escravido, servido.

    A Organizao Internacional do Trabalho (OIT), em seus publicados

    vm utilizando a expresso trabalho forado para classificar o ato no qual

    algum desrespeita os direitos do trabalhador, atingindo sua integridade

    fsica e moral, sua dignidade e o seu direito liberdade e auto-gesto,

    onde a expresso trabalho forado ou compulsrio significar todo

    trabalho ou servio exigido de um indivduo sob a ameaa de alguma

    punio e para o qual o dito indivduo no se apresentou

    voluntariamente. (OIT, 2003, p. 27,28).

    A expresso trabalho forado ou compulsrio foi utilizada pela

    primeira vez na Conveno n. 293da OIT. A mesma instituio reconhece

    ser a expresso trabalho forado e compulsrio um gnero que possui

    vrias espcies, como se observa neste fragmento de um relatrio:

    embora condenado em todo o mundo, o trabalho foradovem revelando novas e inquietantes facetas ao longo dostempos. Formas tradicionais de trabalho forado, como aescravido e a servido por dvida, ainda perduram emalgumas regies, e prticas antigas desse tipo continuamnos perseguindo at hoje. Nas [sic] novas e atuaiscircunstncias econmicas esto surgindo, por toda parte,formas preocupantes como a do trabalho forado em

    3Dispe sobre a eliminao do trabalho forado ou obrigatrio em todas as suas formas. Admitem-se algumasexcees, tais como o servio militar, o trabalho penitencirio adequadamente supervisionado e o trabalhoobrigatrio em situaes de emergncia, como guerras, incndios, terremotos, etc.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    7/19

    conexo com o trficode seres humanos. (OIT, 2002, p.1)

    Por sua vez o trabalho escravo contemporneo :

    Aquele em que o empregador sujeita o empregado acondies de trabalho degradantes, inclusive quanto ao meioambiente em que ir realizar a sua atividade laboral,submetendo-o, em geral, a constrangimento fsico e moral,que vai desde a deformao do seu consentimento aocelebrar o vnculo empregatcio, passando pela proibioimposta ao obreiro de resilir o vnculo quando bem entender,tudo motivado pelo interesse mesquinho de ampliar oslucros custa da explorao do trabalhador. (SENTO-S,

    2001, p. 27)

    No atual trabalho escravo contemporneo no Brasil, pode-se

    destacar que nessa nova escravido relacionada com a escravido antiga

    no que se refere propriedade legal, proibido, uma pessoa ser

    proprietria de outra, ou seja, na atual escravido o patro no mais

    dono do escravo, mais o mantm sobre seu domnio por meios ilegais. J

    o custo de compra do novo escravo baixo, pois esses escravos no socomprados, mas aliciados e, muitas das vezes o patro gasta apenas com

    o transporte do trabalhador at a propriedade. Os lucros so altos, visto

    que o patro no tem gastos com o trabalhador, ou seja, se algo

    acontecer, o trabalhador simplesmente mandado embora, sem nenhum

    direito, o que configura uma mo-de-obra descartvel, pois, existem

    muitas pessoas que esto desempregadas e so os principais alvos dos

    aliciadores (gato).

    Ainda tratando das diferenas entre a antiga e atual escravido no

    Brasil, na antiga escravido, o relacionamento entre o escravo e o senhor

    colnia podia perdurar a vida toda, enquanto na atual qualquer

    divergncia com o patro o escravo mandado embora sem nenhum

    auxlio. Outra caracterstica importante neste contexto que

    diferentemente da escravido colonial o novo escravo no tem uma

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    8/19

    estereotipo tnico padro, ou seja, brancos tambm podem ser escravos,

    diferentemente do antigo sistema escravocrata brasileiro.

    3 Legislaes e o Trabalho Escravo

    Ao tratar do aparatolegal que condena e probe o trabalho escravos

    ou degradantes, em todas as suas formas e em qualquer situao,

    devemos mencionar a conquista de direitos de todas as pessoas, com a

    promulgao da Declarao Universal dos Direitos Humanos de 1948, estacarta tornou-se um instrumento bastante utilizado na defesa dos direitos,

    que foram violados em diferentes momentos da histria da humanidade,

    entre eles o trabalho escravo.

    Nesse sentido, a Declarao de 1948, prezando pelo principio da

    igualdade entre as pessoas e o banimento da escravido em todos os

    pases, preceitua em seus artigos 1 e 4, da DUDH (1948):

    Art. 1 Todas as pessoas nascem livres e iguais emdignidade e direitos. So dotadas de razo e conscincia edevem agir em relao umas s outras com esprito defraternidade.

    Art. 4. Ningum ser mantido em escravido ouservido, a escravido e o trfico de escravos seroproibidosem todas as suas formas. [Grifo nosso] (BRASIL,2007, p. 14)

    No Art. 1, ressalvado o principio da igualdade entre os

    homens, nesse contexto no existe ningum com mais ou menos direitos

    do que outros, que ningum pode ter seus direitos sobrepostos sobre o de

    outrem, tendo em vista que aqueles direitos so superiores. Tal

    argumento no existe mais. Por esse motivo, visando s violaes sofridas

    pelos escravos no perodo colonial, e as situaes desumanas e

    degradantes sofridas por esses seres humanos, foi preceituado no Art. 4,

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    9/19

    que ningum ser mantido em escravido, ficando proibido o trfico de

    escravos, em todas as suas formas.

    Outro instrumento jurdico importante no combate ao trabalhoescravo e suas formas, so as convenes internacionais da Organizao

    Internacional do Trabalho (OIT), onde em 1930, a OIT apresentou a

    conveno de n 29 sobre o trabalho forado, onde esta trata da

    eliminao dos trabalhos forados ou obrigatrios. Outra conveno

    importante foi a n 1054, publicada em 1957, onde ficou decidida a

    abolio do trabalho forado, alm de proibir o uso de todas as suas

    formas. Alm de outros documentos sobre os princpios e direitosfundamentais no trabalho da OIT (1998)5, nessa declarao promovido

    e aplicado os princpios como a liberdade de associao, eliminao de

    todas as formas de trabalho forado ou obrigatrio, abolio do trabalho

    infantil, dentre outros.

    A Constituio do Brasil de 1988 traz em seu captulo primeiro,

    a garantia da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do

    trabalho humano, preceituando que todos so iguais perante a lei, sem

    distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos

    estrangeiros, residentes no pas a inviolabilidade do direito vida,

    liberdade, igualdade (...) (Art. 5, caput, da CF/88). Portanto,

    estrangeiros e brasileiros so iguais perante a lei, sendo seus direitos

    inviolveis, como o direito a liberdade, justamente este direito que

    desrespeitado no sistema escravista.

    4 Conveno 105 - Abolio do trabalho forado (1957): probe o uso de toda forma de trabalho forado ouobrigatrio como meio de coero ou de educao poltica; como castigo por expresso de opinies polticas ouideolgicas; a mobilizao de mo-de-obra; como medida disciplinar no trabalho, punio por participao emgreves, ou como medida de discriminao.5 Declarao sobre os Princpios e Direitos Fundamentais no Trabalho, em que os pases-membros da OIT

    firmaram um compromisso de respeitar, promover e aplicar os princpios fundamentais e direitos no trabalho,como a liberdade de associao e organizao sindical; o reconhecimento efetivo do direito de negociaocoletiva; a eliminao de todas as formas de trabalho forado ou obrigatrio; e a abolio do trabalho infantil.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    10/19

    Outra norma jurdica brasileira que trata do trabalho escravo o

    Cdigo Penal Brasileiro6, com o intuito de punio a quem pratica a

    escravido, dispe:

    Art. 149. Reduzir algum a condio anloga deescravo, quer submetendo-o a trabalhos forados ou a

    jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condiesdegradantes de trabalho, quer restringindo, porqualquer meio, sua locomoo em razo de dvidacontradacom o empregador ou preposto:

    Pena - recluso, de dois a oito anos, e multa, alm dapena correspondente violncia.

    1o Nas mesmas penas incorre quem:I cerceia o uso de qualquer meio de transporte por

    parte do trabalhador, com o fim de ret-lo no local detrabalho;

    II mantm vigilncia ostensiva no local de trabalho ouse apodera de documentos ou objetos pessoais dotrabalhador, com o fim de ret-lo no local de trabalho.

    2oA pena aumentada de metade, se o crime cometido:

    I contra criana ou adolescente;II por motivo de preconceito de raa, cor, etnia, religio ouorigem. (Grifo Nosso)

    O dispositivo do Cdigo Penal, em que trata da submisso de

    algum a condies anlogas a escravido, prope-se a tutelar o bem

    jurdico da liberdade individual, um direito fundamental presente na

    Constituio Federal de 1988, assim como preza por manter a integridadefsica e moral, garantindo a dignidade do indivduo. Quando o dispositivo

    legal profere o termo reduzir algum a condies anlogas de escravo,

    remete-se a perca total do bem jurdico da liberdade e da dignidade

    humana, visto que coloca uma pessoa sob o poder de outra, retirando sua

    capacidade e personalidade, o remetendo a condio de coisa, em que h

    a submisso da vitima posse e dominao de outrem.

    6Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de Dezembro de 1940.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    11/19

    Geralmente essas coaes ocorrem por parte do patro

    (dominador), podem ser empregadas diversas formas de coao para

    manter outro sobre seu poder, assim, o trabalhador cria um vinculo de

    dependncia assumindo dvida com este patro, ficando impedido de

    deixar o local, e assim, privando o seu direito de liberdade, o que

    caracteriza como crime segundo do Cdigo Penal Brasileiro:

    Art. 203 - Frustrar, mediante fraude ou violncia, direitoassegurado pela legislao do trabalho:

    Pena - deteno de um ano a dois anos, e multa, alm

    da pena correspondente violncia. 1 Na mesma pena incorre quem:

    I - obriga ou coage algum a usar mercadorias dedeterminado estabelecimento, para impossibilitar odesligamento do servio em virtude de dvida;

    II - impede algum de se desligar de servios dequalquer natureza, mediante coao ou por meio dareteno de seus documentos pessoais ou contratuais.

    2 A pena aumentada de um sexto a um tero se a

    vtima menor de dezoito anos, idosa, gestante, indgena ouportadora de deficincia fsica ou mental.

    No atual sistema escravista, existe a figura dos aliciadores, que

    tambm so conhecidos em algumas regies como gatos, a eles cabem

    o trabalho de recrutar pessoas para trabalharem. O cdigo penal prev

    essa pratica como crime, segundo o art. 207:

    Art. 207- Aliciar trabalhadores, com o fim de lev-los deuma para outra localidade do territrio nacional:

    Pena - deteno de um a trs anos, e multa.

    1 Incorre na mesma pena quem recrutartrabalhadores fora da localidade de execuo do trabalho,dentro do territrio nacional, mediante fraude ou cobranade qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, noassegurar condies do seu retorno ao local de origem.

    2 A pena aumentada de um sexto a um tero se avtima menor de dezoito anos, idosa, gestante, indgena ouportadora de deficincia fsica ou mental.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    12/19

    Portanto, fica evidente que no Brasil, existe um sistema de leis que

    criminalizam as pratica da escravido, como tambm todas as formas que

    auxiliam para a ocorrncia dessa violncia.

    4 O Trabalho Escravo de Imigrantes latinos no Brasil

    contemporneo

    A explorao de imigrantes no Brasil pode ser retratada em diversos

    perodos, ao se tratar dos imigrantes latino-americanos so as maisevidentes no trabalho escravo urbano no Brasil, as vitimas dessa

    escravido so imigrantes em situao ilegal, so bolivianos, paraguaios,

    peruanos e chilenos vivendo em situao lastimvel em algumas cidades

    brasileiras.

    Estes imigrantes latino-americanos chegam ao Brasil atravs da

    rede de trfico, esse trfico pode ser de duas formas, a primeira seria o

    trafico de migrante, e a segunda seria o trfico de pessoas. A

    diferenciao dessas duas formas de trficos tem o consentimento do

    individuo como um ponto importante.

    No trfico de migrantes, a pessoa consente em ser traficada com o

    objetivo de cruzar uma fronteira ilegalmente, est por sua vez sempre

    transnacional, e assim o delito cometido cometido contra as leis de um

    Estado receptor, e o migrante internacional considerado infrator de leisde imigrao do pas em que se encontra. Quanto relao que existe

    entre o traficante e o migrante, ela termina aps a realizao da

    transposio do mesmo a fronteira.

    J o trfico de pessoas, quanto ao consentimento da vtima, se a

    mesma consentir, ser por meio de coao do aliciador ou por esta iludida

    com as promessas que no se concretizar ao chegar ao destino desejado.

    Esse trfico pode ocorrer dentro de um mesmo territrio, e assim o delito

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    13/19

    cometido contra a pessoa, que considerada vtima. J a relao entre

    a vtima e o traficante continuada aps a vtima atingir seu destino.

    No caso dos imigrantes latino-americanos no Brasil, existemsituaes em que os mesmos buscam algum para facilitar sua travessia

    ao Brasil, o que se configura como trfico de migrantes. E outras vezes

    so persuadidos a migrar com base em falsas propostas feitas por

    aliciadores, configurando assim, o trafico de pessoas. Assim, o trafico de

    migrantes e os de pessoas muitas vezes entrelaam-se, em um s caso.

    No Brasil, mas especificamente em So Paulo, estima-se que

    existam mais de 600 mil7 imigrantes latino-americanos que vivem em

    situao de trabalho escravo, em sua maioria so atrados por

    empresrios para trabalharem em suas fbricas, recebendo salrios

    miserveis, alimentaes pssimas, jornadas de trabalho acima do

    permitido, e os locais de trabalho insalubres e em pssimas condies,

    sem nenhum tipo de segurana e fiscalizao.

    Os trabalhos dos imigrantes latinos acontecem geralmente de forma

    degradantes aliado ao cerceamento da liberdade, esse segundo fator nem

    sempre visvel, uma vez que no mais se utiliza correntes para prender

    o homem a terra, mas sim ameaas fsicas, terror psicolgico, dvidas

    contradas sem justificativas, priso de documentos. E so esses fatores

    que configura o Trabalho escravo contemporneo, e uma das grandes

    vulnerabilidades dos imigrantes no Brasil, a sua situao irregular, pois

    os mesmo acabam virando alvos fceis de coaes e chantagens, isso explicado por que:

    O status imigratrio irregular desses indivduos um fatorde vulnerabilidade que facilita situaes de superexploraolaboral, j que, por medo da deportao, eles tendem a noprocurar autoridades pblicas e a no realizar denncias.(Timteo, 2010, p. 32)

    7Segundo estimativas do Servio Pastoral dos Migrantes, entidade ligada Conferncia Nacional dos Bispos doBrasil (CNBB) - Disponvel em:. Acessoem: 15 de fev. de 2011.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    14/19

    Muitas empresas atraem esses imigrantes pela sua condio de

    mo-de-obra barata e sua situao ilegal e sem documentaes,

    forando-os a trabalharem sob condies desumanas, no caso dosbolivianos que trabalham em fabricas de roupas, os empresrios utilizam

    a mo-de-obra barata desse imigrante para entrar no mercado com

    produtos de baixos custos e produzir produtos a ponto de competir no

    mercado de forma desigual, em busca da obteno de lucro. Tmoteo

    (2010, p. 32), explica que:

    Nas oficinas que empregam imigrantes, jornadas exaustivasso comuns. Geralmente a remunerao calculada combase na produtividade e o trabalhador, por receber apenasalguns centavos por cada pea costurada, busca laborar ato seu limite. Isto contribui para que os trabalhadoresexplorados muitos vezes no acreditem vivenciar umasituao de trabalho anlogo escravido. O indivduo

    justifica sua jornada exaustiva dizendo que encara asituao como transitria, pois tem como objetivoeconomizar, pagar as dvidas com o empregador e

    posteriormente abrir uma oficina de costura prpria.

    As oficinas funcionam em pores ou locais escondidos, pois amaior parte delas ilegal, sem permisso para funcionar. Epara que suspeitas no sejam levantadas pelos vizinhos, queacabariam alertando a polcia, as mquinas funcionam emlugares fechados, onde o ar no circula e a luz do dia noentra. Para camuflar o barulho das mquinas, msicaboliviana toca o tempo todo. (SAKAMOTO, 2006)

    Os cmodos so divididos por paredes de compensado. Essa uma estratgia para que os trabalhadores fiquem viradospara a parede, sem condies de ver e relacionar-se com ocompanheiro que trabalha ao lado o que poderia resultarem mobilizao e reivindicao por melhores condies.(SAKAMOTO, 2006)

    Outro ponto que alimenta a manuteno do sistema a coero

    psicolgica a que so submetidos os bolivianos. Por estar, a grande

    maioria, em situao ilegal no pas, sofrem ameaas por parte dos patres

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    15/19

    de que, se tentarem fugir ou reclamarem daquela situao degradante,

    ser denunciado s autoridades.

    Esses milhares de imigrantes vm ao Brasil em busca deoportunidades melhores de vida e a chance de enviar recursos para seus

    familiares, em seus pases de origem, aqui no Brasil esse imigrantes

    enfrentas os mesmos casos e problemas que os brasileiros no exterior

    sofrem com preconceitos, horas excessivas de trabalho, dificuldades para

    legalizao e baixos salrios, ao chegar ao Brasil se deparam com uma

    realidade totalmente diferente da imaginada.

    Portanto, nesse novo sistema de escravido so freqentes

    descontos relativos s despesas com alimentao e moradia, e em certos

    casos os trabalhadores tm seus documentos retidos, o que cada vez mais

    aumenta a dependncia entre o patro e o trabalhado, essa dependncia

    chegando ao ponto de acorrent-lo psicologicamente ao trabalho para

    solver uma divida que no acaba, e cada vez mais o torna escravo.

    5 Proteo aos Imigrantes no Brasil?

    No que diz respeito ao sistema de proteo aos imigrantes no Brasil,

    o pas possui o Estatuto do Estrangeiro (Lei n 6.815/80), que decide a

    situao jurdica dos estrangeiros no Brasil, garantindo a todos os direitos

    reconhecidos aos brasileiros, nos termos das constituies e das leisvigentes no pas. Cabendo lembrar que o Estatuto no regula as situaes

    jurdicas dos imigrantes em situao irregular.

    Outro importante instrumento de combate ao quadro de explorao

    laboral de imigrantes, porque busca eliminar um fator de vulnerabilidade

    desta populao: a irregularidade imigratria foi:

    Lei n. 11.961/09 e a prorrogao do Registro Nacional deEstrangeiros (RNE):

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    16/19

    Art.1 Poder requerer residncia provisria o estrangeiroque, tendo ingressado no territrio nacional at 1o defevereiro de 2009, nele permanea em situao migratriairregular.

    Em 2005 o governo brasileiro fechou um acordo bilateral com o

    governo boliviano, permitindo a imigrantes que chegaram at 15 de

    agosto de 2005obter o Registro Nacional de Estrangeiro (RNE) provisrio.

    O RNE um documento de identidades para estrangeiros residentes no

    pas. No ano de 2009, o governo estendeu o acordo, em parte, permitindo

    a prorrogao de RNE provisrio at 2009. Porm exigiu mais documentos

    e dos imigrantes.

    Outra ao no Brasil que visa proteo do imigrante a Pastoral

    do Migrante8, que se trata de um servio eclesial voltado para a acolhida,

    orientao e insero socio-religiosa dos migrantes sob a animao das

    Congregaes dos Missionrios e Missionrias Escalabrinianos, que atuam

    no Brasil em estreito vnculo com o Setor de Mobilidade Humana da

    Comisso Episcopal para o Servio da Caridade, da Justia e da Paz, da

    CNBB e com o Servio Pastoral dos Migrantes.

    A Pastoral do Migrante tem lutado junto ao governo para aprovao

    de trs medidas, uma delas a promulgao de uma nova lei de

    migrao. E as outras a aprovao da Resoluo 45/158 da ONU

    Direitos dos Trabalhadores Migrantes e de seus Familiares, que o Brasil

    ainda no ratificou. Diferentemente de outros pases da America Latina

    como a Argentina que ratificou e reformou nova lei da imigrao (Lei. n25.871/04) e o Uruguai que tambm ratificou e reformou nova lei da

    imigrao (Lei. n 18.250/08).

    Importante mencionar que na Argentina e no Uruguai a qualidade de

    imigrante seja em qualquer situao, no o impedir de utilizar servios

    8Tem por objetivo promover a dignidade da pessoa do migrante, renovando a comunidade para construir umasociedade justa, fraterna e solidria. http://www.pastoraldomigrante.org.br/

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    17/19

    essenciais para a dignidade da pessoa humana, como sade, educao,

    assistncia social, ateno sanitria e a justia.

    Outro sistema de proteo, que poder diminuir a explorao doslatinos a aprovao da Lei de Residncia do MERCOSUL9 (Decretos n.

    6.964/09 e 6.975/09), que permitiria aos imigrantes nascidos em pases

    membros e associados viver em qualquer nao do bloco econmico.

    6 Consideraes FinaisDiante de todo o exposto, fica claro que no Brasil tem um sistema

    de lei que supre em parte as necessidades dos imigrantes em situaes de

    escravido, assim como a prpria escravido em todas as suas formas,

    porm o que falta a luta pela promoo de polticas pblicas voltadas a

    esse segmento populacional, o imigrante.

    Apesar dos avanos, o Brasil ainda no ratificou a Conveno da

    ONU sobre os Direitos dos Trabalhadores Migrantes e de seus Familiares.

    Esse instrumento de suma importncia, pois diz respeito aos direitos e

    protees dos trabalhadores imigrantes, inclusive os ilegais.

    visto que a escravido contempornea no est ligada a cor, raa

    ou etnia do indivduo, mas a uma srie de fatores sociais como a ausncia

    de condies de subsistncia do trabalhador e de sua famlia em sua

    regio de origem. A falta de informaes sobre seus direitos tambmcontribui para que ocorra a explorao.

    Assim, o Brasil deve procura estabelecer as situaes dos imigrantes

    e sua importncia no processo de integrao econmica, social e cultural

    na Amrica Latina, havendo uma integrao dos imigrantes no conceito

    contemporneo de cidadania, tendo por base o respeito mtuo, aos

    9Dispe sobre a implementao do Acordo sobre Residncia para Nacionais dos Estados Partes do MercadoComum do Sul MERCOSUL, bem como sobre as regras comuns para a autorizao de residncia aoscidados dos pases do Mercosul, Bolvia e Chile destinadas a avanar no processo de integrao regional.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    18/19

    direitos humanos desses, e o reconhecimento da riqueza cultural

    transportada.

    Referncias Bibliogrficas

    BRASIL. Direitos Humanos. 3. ed. Braslia: Senado Federal,Subsecretaria de Edies Tcnicas, 2007..

    ____. Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988:

    Comentada pelo STF. Publicado em: 17/08/2005. Disponvel em: . Acesso em16 de setembro de 2009.

    ______. Lei n. 11.961, de 2 de julho de 2009. Disponvel em:. Acesso em: 10 de janeiro de 2011.

    ______.Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Coletniabsica penal. 2.ed. Braslia: Senado Federal, Subsecretaria de EdiesTcnicas, 2007.

    _______.Constituio da Repblica Federativa do Brasil: TextoConstitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alteraesadotadas pelas Emendas Constitucionais n 1/92 a 56/2007 e pelasEmendas Constitucionais de Reviso n 1 a 6/94. Braslia: SenadoFederal, Subsecretaria de Edies Tcnicas, 2008.

    ORGANIZAO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Los convniosfundamentales de laOrganizacion InternacionaldelTrabajo. Genebra: OIT,2003.

    ORGANIZAO INTERNACIONAL DO TRABALHO. No ao trabalhoescravo.

    Relatrio global do seguimento da declarao da OIT relativa a princpiose direitos

    reunio 2001. Braslia: OIT, 2002.

  • 7/24/2019 O Trabalho Escravo de Imigrantes Latinoamericanos no Brasil Contemporneo

    19/19

    SAKAMOTO, Leonardo (coord.). ORGANIZAO INTERNACIONAL DOTRABALHO; Trabalho escravo no Brasil do Sculo XXI.Braslia, OIT,2006.

    SENTO-S, J. L. de A. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. SoPaulo: LTr, 2000.

    TIMTEO, G. L. S. Trabalho de Imigrantes em condies anlogas escravido. In: Revista Jurdica Consulex. Ano XIV. N 312. 15 deJaneiro de 2010.