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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
A ORGANIZAÇÃO DO ENSINO FRENTE À DIVERSIDADE EM
RELAÇÃO ÀS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM
LIMA, Zenaide A. 1
FURLANETTO, Flávio R. 2
Resumo. Este artigo discute as dificuldades de aprendizagem observadas em alguns alunos, do ensino fundamental anos finais, em sala de aula, a resistência ou até mesmo o desconhecimento de métodos dos professores em intermediar estas questões, a omissão ou distanciamento da família são alguns dos elementos motivadores desta pesquisa. Tendo como referencial teórico a Didática da Pedagogia Histórico- Crítica estruturada por Gasparim (2005). Como problema de pesquisa, opta por responder como a organização do ensino, a intermediação do professor, e o acompanhamento da família podem proporcionar aos alunos com dificuldades de aprendizagem superação e desenvolvimento de potencialidades? Define como objetivo geral de estudo Investigar as possíveis causas das dificuldades de aprendizagens dos alunos do Ensino Fundamental - anos finais, e buscar junto aos docentes e à literatura, meios para encaminhamentos e intervenções pedagógicas. E como objetivos específicos: a) estudar os possíveis distúrbios de aprendizagem e seus impactos na aprendizagem; b) investigar as dificuldades dos docentes ao trabalharem com os distúrbios estudados; c) buscar por meio de estudos coletivos possibilidades de intervenções em sala de aula. Utiliza como método os fundamentos do materialismo histórico dialético, propõe como intervenção um grupo de estudos com professores regentes de classe participantes da pesquisa. Conclui que a correta intervenção, intermediada pela escola, pelo trabalho específico do professor em sala de aula e acompanhamento efetivo da família, todo aluno é capaz de aprender e que a educação deve estar aberta às diferenças, oferecendo ao educando condições para permanência e efetiva aprendizagem.
Palavras-Chave: Dificuldades de aprendizagem. Diversidade. Organização do ensino.
1. Introdução
A base desta pesquisa são as observações dos anos de trabalho como
professora pedagoga da rede Estadual de Ensino no Estado do Paraná, nos quais
analisando casos de alunos que chegam até as nossas salas de aula, arrastando-se
1 Professor PDE; Pós Graduada em Educação Profissional pela Universidade Tecnológica Federal do
Paraná (UTFPR), Cornélio Procópio. Graduada em Pedagogia pela Faculdade Estadual de Filosofia, Ciencias e Letras de Cornélio Procópio, atual Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP). Professora Pedagoga efetiva no Ensino Fundamental e Médio, SEED_PR. E-mail: [email protected] 2 Orientador; Graduado em Licenciatura em Ciências pela Faculdade Estadual de Filosofia Ciências e Letras de Cornélio Procópio, atual Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP). Licenciado em Matemática pelo Centro de Estudos Superiores de Londrina, atual Unifil. Licenciado em Pedagogia pela Universidade Norte do Paraná (UNOPAR). Mestrado em Educação pela Universidade Estadual de Londrina e Doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo. E-mail: [email protected]
em dificuldades básicas de leitura, interpretação e escrita, que não conseguem
progredir em sua aprendizagem, e colocam em “cheque” a formação do professor,
seus anos de experiência em sala de aula. Considerando, ainda, os índices de
reprovação e abandono escolar que são relativamente altos, e as causas pouco
identificadas, vê-se a necessidade de estudo, e investigação do assunto. Os
distúrbios e dificuldades de aprendizagem constituem um dos temas mais relevantes
e significativos da atualidade, não partindo apenas da problemática da criança que
não aprende, mas de todo um conjunto que envolve a família, a escola, profissionais
de diversas áreas de atuação, que buscam respostas à pergunta: por que este aluno
não aprende?
É muito importante que todos os envolvidos, em especial, os professores
conheçam e saibam identificar estas dificuldades tanto em seus alunos como no
próprio processo de ensino, em suas aulas, na metodologia utilizada, no ambiente
educacional e social escolar. Temos como objetivo Investigar as possíveis causas
das dificuldades de aprendizagens dos alunos do Ensino Fundamental - anos finais,
e buscar junto aos docentes e à literatura, meios para encaminhamentos e
intervenções pedagógicas, e ainda:
• estudar os possíveis distúrbios de aprendizagem e seus impactos na
aprendizagem;
• investigar as dificuldades dos docentes ao trabalharem com os distúrbios
estudados;
• buscar por meio de estudos coletivos possibilidades de intervenção em sala
de aula.
2. Fundamentação teórica
Dificuldades de aprendizagem, temática discutida, questionada, estudada e
que tem provocado grandes inquietações a todos que, direta ou indiretamente, se
ocupam dessa questão, pois falar sobre os problemas existentes na escola, mais
especificamente em sala de aula é um desafio que ultrapassa as fronteiras do
debate teórico e deve conduzir a uma intervenção pedagógica. Diante dessa tarefa
cabe ao educador desempenhar cuidadosamente o seu papel de mediador no
processo ensino aprendizagem. Saviani (1991, p.21), nos lembra
O trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Assim, o objeto da educação diz respeito, de um lado, à identificação dos elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se tornem humanos e, de outro lado e concomitantemente, à descoberta das formas mais adequadas para atingir esse objetivo.
Nessa perspectiva, a escola é apontada como local de onde deve emergir
uma prática pedagógica sistematizada que leve o educando a efetuar experiências
que o conduzam a interagir criticamente na sociedade em que vive em seus vários
contextos.
2.1 Organização do ensino
Acreditamos que a forma como o professor organiza suas atividades de
ensino contribuem muito para o sucesso ou o fracasso da aprendizagem do aluno.
Para ocorrer uma mudança de sentido pessoal nos sujeitos que se encontram em processo de formação, estes devem ser colocados diante da necessidade de organizar a atividade de ensino em contextos de formação que os tenha como sujeitos de uma atividade educativa (FURLANETTO, 2013, p. 21).
Furlanetto (2013), em sua tese de doutorado intitulada ”O movimento de
mudança de sentido pessoal na formação inicial do professor”, utilizando autores
como (FREITAS, 99; OLIVEIRA, 2011; MOURA, 2000; FRIGOTO, 2000), discute a
importância da formação do professor e a qualidade do ensino. Segundo ele, o
Brasil por influência da ordem econômica vigente, tem tido, a partir dos anos 90
reformas pautadas em conformidade com as determinações dos organismos
internacionais. Neste cenário, o autor ainda destaca que uma de suas principais
metas é melhorar as estatísticas educacionais, utilizando-se, por exemplo, de cursos
aligeirados na formação de professores, com o objetivo de tornar o país mais
competitivo em relação aos demais países do mundo. O autor discute ainda, a partir
dos estudos que realizou de Oliveira (2011) que a discussão teórica tem sido
relegada a segundo plano e que as ações de ensino tem assumido um caráter
imediatista, reduzido pelo economicismo, a mero fator de produção. Na sequência, o
autor concluiu suas análises acrescentando que o professor, ao ser responsabilizado
individualmente pela sua formação profissional, isola-se das discussões coletivas,
tornando-se passivo e despolitizado, o que ocasiona alguns problemas até mesmo
conceituais nas práticas de ensino nos dias atuais.
Na mesma direção, ou seja, sobre a despolitização, compartilhamos com
Paulo Freire (2005, p.90) que não é no silêncio que os homens se fazem, mas na
palavra, no trabalho, na ação-reflexão. Acreditamos que a escola deva possibilitar ao
educando seu desenvolvimento intelectual para que seja capaz de interagir como
sujeito do mundo, para que seja capaz de dialogar, de participar conscientemente, e
tenha possibilidades de intervenção, que não aceite pacificamente ser explorado,
que lute por dignidade humana, que seja conhecedor e capaz de buscar seus
direitos sociais. Para que isso ocorra, o ensino necessita ser organizado de forma
dinâmica, as discussões precisam ser coletivas, pois o conhecimento historicamente
acumulado pela humanidade que é transmitido pelos conteúdos escolares,
mediados pelo professor, devem ser muito mais que uma lista de conteúdos, cópias
de livros didáticos, esses conteúdos precisam englobar o mundo e seus
acontecimentos. É necessário que por meio deles o educando compreenda como as
relações sociais estão apresentadas no Brasil, qual a importância da política
nacional e internacional, como se dão as relações de poder numa sociedade
capitalista, qual o papel da mídia nessa relação, o que são organismos econômicos
internacionais e qual seu papel em países em desenvolvimento como o Brasil.
O conhecimento precisa ser significativo para o aluno, ampliando as formas
de pensamento. Essa concepção aproxima-se das contribuições teóricas histórico
culturais, nas quais as práticas culturais são constitutivas do psiquismo humano. O
ensino formal faz parte dessa cultura, portanto, também contribui para a formação
dos sujeitos.
Como sujeito humano, o professor cria necessidades para garantir sua existência cultural. Em relação à sua atividade profissional, entendemos que o ensino seria sua principal necessidade. Ao realizá-la o professor transforma aquele para quem ensina e transforma-se a si mesmo (FURLANETTO, 2013, p. 45).
O ensino deve estar organizado de forma intencional e propiciar o
desenvolvimento intelectual do educando, dando a ele condições de pleno
desenvolvimento, pois o principal objetivo do trabalho docente deve ser organizar o
trabalho pedagógico para que o aluno aprenda.
No entanto, existem fatores biológicos, emocionais e metodológicos que
podem interferir nos processos de ensino/aprendizagem. Não só no modo como os
alunos aprendem, mas também, no modo como o professor ensina. Nesse sentido,
passaremos no próximo tópico a discutir às dificuldades de aprendizagem e a
explanar a relevância da observação dos fatores que ora mencionamos.
2.2 Dificuldades ou Distúrbios de Aprendizagem
Todos os envolvidos no processo educativo devem estar atentos aos
problemas apresentados na aprendizagem de alguns alunos, pois estas podem advir
desde a fatores orgânicos ou mesmo emocionais, mas também podem estar ligadas
a questões pedagógicas e metodológicas da prática docente. É importante que
sejam diagnosticadas as causas que geram as dificuldades a fim de auxiliar o
desenvolvimento do processo educativo, pois os impactos dessas causas pode
gerar o fracasso da aprendizagem nos alunos. Os problemas na aprendizagem não
podem estar somente focados no aluno, sendo ele o único responsável por seu
fracasso escolar. Estas dificuldades podem também estar relacionadas à prática de
ensino, muitas vezes, destituída de um referencial teórico-prático, e com deficiências
na mediação do professor. Ciasca (2003, p.16) enfatiza que a avaliação dos
problemas de aprendizagem deve ser realizada de forma criteriosa, desvendando
assim “o que é físico, distúrbios de aprendizagem e o que é pedagógico,
caracterizado como Dificuldades na Aprendizagem Escolar”. Afirma que o Distúrbio
de Aprendizagem é uma disfunção intrínseca da criança relacionada aos fatores
neurológicos. Já a dificuldade de aprendizagem é um déficit específico da atividade
acadêmica.
Distúrbio de Aprendizagem segundo a definição do National Joint Committee
of Learning Disabilities – NJCLD (1988)
Distúrbios de aprendizagem (DA) são como um grupo heterogêneo de transtornos que se manifesta por dificuldades significativas na aquisição e uso da escrita, fala, leitura, raciocínio ou habilidade matemática. Estes transtornos são intrínsecos ao indivíduo, supondo-se ocorrerem devido à disfunção do sistema nervoso central, e que podem ocorrer ao longo do ciclo vital. Podem existir junto com as dificuldades de aprendizagem, problemas nas condutas de auto-regulação, percepção e interação social, mas não consistem, por si só um distúrbio na aprendizagem. Podem ocorrer concomitantemente com outras condições incapacitantes ou com influências extrínsecas, porém não são resultados dessa condição (HAMMILL, 1988/1991 apud CIASCA, 2003, p.24).
O Documento da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva (BRASIL, 2008) contempla que os alunos com transtornos
funcionais específicos são aqueles que apresentam: Dislexia, Disortografia,
Disgrafia, Discalculia, Transtorno de Atenção e Hiperatividade, entre outros.
Uma breve descrição, dos distúrbios citados no Documento da Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (Dislexia, Disgrafia,
Discalculia, Disortograifia e o TDAH-Transtorno de Déficit de Atenção e
Hiperatividade ).
-Dislexia: é a dificuldade que aparece na leitura, impedindo o aluno de ser fluente,
pois faz trocas ou omissões de letras, inverte sílabas, apresenta leitura lenta, dá
pulos de linhas ao ler um texto, etc. Estudiosos afirmam que sua causa vem de
fatores genéticos, mas nada foi comprovado pela medicina.
- Disgrafia: normalmente vem associada à dislexia, porque se o aluno faz trocas e
inversões de letras, consequentemente encontra dificuldade na escrita. Além disso,
está associada a letras mal traçadas e ilegíveis, letras muito próximas e
desorganização ao produzir um texto.
- Discalculia: é a dificuldade para cálculos e números, de um modo geral os
portadores não identificam os sinais das quatro operações e não sabem usá-los, não
entendem enunciados de problemas, não conseguem quantificar ou fazer
comparações, não entendem sequências lógicas.
- Disortografia: é a dificuldade na linguagem escrita e também pode aparecer como
conseqüência da dislexia. Suas principais características são: troca de grafemas,
desmotivação para escrever, aglutinação ou separação indevida das palavras, falta
de percepção e compreensão dos sinais de pontuação e acentuação.
- TDAH: O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade é um problema de
ordem neurológica, que traz consigo sinais evidentes de inquietude, desatenção,
falta de concentração e impulsividade. Hoje em dia é muito comum vermos crianças
e adolescentes sendo rotulados como DDA (Distúrbio de Déficit de Atenção), porque
apresentam alguma agitação, nervosismo e inquietação, fatores que podem advir de
causas emocionais. É importante que esse diagnóstico seja feito por um médico e
outros profissionais capacitados.
Geralmente os professores são os primeiros a identificar que há um problema
na aprendizagem, porém não possuem formação específica para fazer tais
diagnósticos, que devem ser feitos por médicos, psicólogos e psicopedagogos. No
entanto, inerente à profissão do professor deve estar a preocupação em conhecer o
que a literatura apresenta sobre problemas na aprendizagem, além de que
metodologia utilizará para que este educando com dificuldades consiga, mesmo
dentro de suas limitações, fazer parte do processo educativo, de como organizará
seu conteúdo para que atinja o objetivo principal do ensino que é o aprendizado,
pois o aluno não deve por inabilidade, por falta de conhecimento teórico do
professor, ficar à margem do processo de ensino. As dificuldades devem ser
levantadas de forma pontual e os encaminhamentos também, leituras, conversas
com a família para os encaminhamentos médicos, conversa com psicólogos,
encaminhamentos às Salas de Apoio Aprendizagem, Salas de Recursos devem
estar na pauta das atitudes da escola frente aos problemas de aprendizagem
apresentados, tornar as aulas mais motivadas e dinâmicas, não rotular o aluno, e
dar-lhe a oportunidade de descobrir suas potencialidades.
2.3 A importância do Mediador
Um educador forjado na inquietação produzida pela prática socioeducativa e pelo mergulho que faz nas muitas realidades vividas por ele e pelos demais sujeitos dos processos educativos, jamais se dá por pronto. Ele segue a vida desafiando-se a ver-se no não visto, a encontrar-se no não encontrado, pertencer ao não pertencido. Faz dos não-lugares, um lugar para si e para
os outros que compartilham consigo as perspectivas de projetos-mundos e os caminhos da esperança (NOGUEIRA, 2012).
A escola é o laboratório das diferenças, os homens se fazem no confronto
com as diferenças. E o professor é o mediador, é ele que ensina para que o aluno
possa desenvolver seu próprio conhecimento.
É fundamental destacarmos que importante no processo interativo não é a figura do professor ou do aluno, mas é o campo interativo criado. A interação está entre as pessoas e é neste espaço hipotético que acontecem as transformações e se estabelece o que consideramos fundamental neste processo: as ações partilhadas, onde a construção do conhecimento se dá de forma conjunta. O importante é perceber que tanto o papel do professor como o do aluno são olhados não como momentos de ações isoladas, mas como momentos convergentes entre si, e que todo o desencadear de discussões e de trocas colabora para que se alcancem os objetivos traçados nos planejamentos de cada série ou curso (MARTINS,1997, p.11).
De acordo com Gasparin (2007, p.115) a mediação implica, portanto, em
releitura, reinterpretação e ressignificação do conhecimento.
Já Vasconcellos (1997, p.75), nos diz
(...) fica claro que o educador tem uma tarefa muito exigente: estabelecer a dialética entre a continuidade e ruptura em relação às representações do educando. Se fica só na continuidade, não ajuda a crescer; se vai apenas pela ruptura, pode avançar sozinho. Deve partir de onde o educando se encontra (senso comum, visão fragmentada, parcial, sincrética) e através de sua mediação, propiciar análise e síntese do educando, de forma a que chegue ao conhecimento mais elaborado.
Ao visualizarmos nossas salas de aula, e pensarmos em tantas diferenças, e
de que o professor precisa lidar com todas elas, em primeira mão pode parecer
impossível, no entanto, a psicologia vem afirmar que ai está um importante caminho
para se promover uma troca de experiência.
Podemos abordar,ainda, a teoria de Vygotsky que desenvolveu o conceito de
zona de desenvolvimento proximal para discutir e explicar a relação existente entre
desenvolvimento e aprendizagem. Para ele, as situações de aprendizagem vividas
pelo sujeito e mediadas por sujeitos mais experientes geram mudanças qualitativas
e impulsionam o processo de desenvolvimento do indivíduo. A zona de
desenvolvimento proximal é a distância entre o nível de desenvolvimento real,
constituído por funções já consolidadas pelo sujeito, que lhe permitem realizar
tarefas com autonomia, e o nível de desenvolvimento potencial, caracterizado pelas
funções que, segundo Vygotsky, estariam em estágio embrionário e não
amadurecidas (Vygotsky, 1989, p.97). Mas para que esta mediação realmente
aconteça, é necessário saber para ensinar. É função do professor mediador
provocar em seus alunos avanços que não ocorreriam espontaneamente, é uma
interferência na zona de desenvolvimento proximal. A mediação do professor nesta
perspectiva não é a simples relação de um indivíduo com o outro, mas é o processo
da formação de um sujeito que se constituirá na interação social, onde o aluno será
então, concebido como um ser construído sócio-históricamente.
De acordo com Rego (1999, p.104)
As atividades desenvolvidas e os conceitos aprendidos na escola (que Vygotsky chama de científicos) introduzem novos modos de operação intelectual: abstrações e generalizações mais amplas acerca da realidade (que por sua vez transformam os modos de utilização da linguagem). Como consequência, na medida em que a criança expande seus conhecimentos, modifica sua relação cognitiva com o mundo.
Caberá ao professor organizar seu ensino de modo que haja interação entre o
sujeito e o mundo para que o aluno possa desenvolver e ampliar sua capacidade,
aumentando cada vez mais sua capacidade intelectual.
Vygotsky afirma
Aquilo que é zona de desenvolvimento proximal hoje será o nível de desenvolvimento real amanhã, ou seja, aquilo que uma criança pode fazer com assistência hoje, ela será capaz de fazer sozinha amanhã. (REGO, 1999, p. 74).
3. Encaminhamentos Metodológicos
O trabalho foi desenvolvido com um grupo de professores regentes de classe
do ensino regular e também regente das Salas de Apoio à Aprendizagem e Sala de
Recursos do Colégio Estadual Jerônimo Farias Martins, localizado no município de
Santa Cecília do Pavão - PR, pertencente ao Núcleo Regional de Cornélio Procópio.
O trabalho aconteceu no decorrer do primeiro semestre do ano de 2014.
A proposta com os professores teve inicio com um questionário onde foram
levantadas todas as dificuldades de aprendizagens observadas por eles em salas de
aula, a que atribuem estas dificuldades, e qual a fundamentação teórica para estas
atribuições. Na seqüência todas estas dificuldades foram levadas para a discussão
coletiva do grupo de estudo que foi feito em encontros presenciais aos sábados. As
discussões foram mediadas pela fundamentação teórica desta pesquisa, por leituras
e discussões de artigos, textos, projeções de filmes sobre o tema e pelo
conhecimento teórico do grupo. Intencionalmente pretendeu-se que o grupo
aprofundasse seu conhecimento teórico sobre o assunto e juntos pudéssemos
apontar meios para que fossem feitas intervenções pedagógicas adequadas.
A metodologia de desenvolvimento do estudo com os professores seguiu os
cinco passos que formam a Didática da Pedagogia Histórico- Crítica estruturados
por Gasparim (2005).
1º Passo Prática Social Inicial Nível de desenvolvimento atual do educando:
se expressa pela prática social inicial dos conteúdos. Tem seu ponto de partida no
conhecimento prévio do professor e dos educandos. É o que o professor e alunos já
sabem sobre o conteúdo, no ponto de partida, em níveis diferenciados. Esse passo
desenvolve-se, basicamente, em dois momentos: a) o professor anuncia aos alunos
os conteúdos que serão estudados e seus respectivos objetivos; b) o professor
busca conhecer os educandos através do diálogo, percebendo qual a vivência
próxima e remota cotidiana desse conteúdo antes que lhe seja ensinado em sala de
aula, desafiando-os para que manifestem suas curiosidades, dizendo o que
gostariam de saber a mais sobre esse conteúdo. 2º passo Problematização: consiste
na explicação dos principais problemas postos pela prática social, relacionados ao
conteúdo que será tratado. Este passo desenvolve-se na realização de: a) uma
breve discussão sobre esses problemas em sua relação com o conteúdo científico
do programa, buscando as razões pelas quais o conteúdo escolar deve ou precisa
ser aprendido; b) em seguida, transforma-se esse conhecimento em questões, em
perguntas problematizadoras levando em conta as dimensões científica, conceitual,
cultural, histórica, social, política, ética, econômica, religiosa etc., conforme os
aspectos sobre os quais se deseja abordar o tema, considerando-o sob múltiplos
olhares. Essas dimensões do conteúdo são trabalhadas no próximo passo, o da
instrumentalização. 3º passo Instrumentalização: Essa se expressa no trabalho do
professor e dos educandos para a aprendizagem. Para isso, o professor: a)
apresenta aos alunos através de ações docentes adequadas o conhecimento
científico, formal, abstrato, conforme as dimensões escolhidas na fase anterior; os
educandos, por sua vez, por meio de ações estabelecerão uma comparação mental
com a vivência cotidiana que possuem desse mesmo conhecimento, a fim de se
apropriar do novo conteúdo. b) Neste processo usam-se todos os recursos
necessários e disponíveis para o exercício da mediação pedagógica. 4º passo
Catarse: é a expressão elaborada de uma nova forma para entender a teoria e a
prática social. Ela se realiza: a) por meio da nova síntese mental a que o educando
chegou; manifesta-se através da nova postura mental unindo o cotidiano ao
científico em uma nova totalidade concreta no pensamento. Neste momento o
educando faz um resumo de tudo o que aprendeu, segundo as dimensões do
conteúdo estudadas. É a elaboração mental do novo conceito do conteúdo; b) esta
síntese se expressa através de uma avaliação oral ou escrita, formal ou informal, na
qual o educando traduz tudo o que aprendeu até aquele momento, levando em
consideração as dimensões sob as quais o conteúdo foi tratado. 5º passo Prática
social final - novo nível de desenvolvimento atual do educando, consiste em assumir
uma nova proposta de ação a partir do que foi aprendido. Este passo se manifesta:
a) pela nova postura prática, pelas novas atitudes, novas disposições que se
expressam nas intenções de como o aluno levará à prática, fora da sala de aula, os
novos conhecimentos científicos; b) pelo compromisso e pelas ações que o
educando se dispõe a executar em seu cotidiano pondo em efetivo exercício social o
novo conteúdo cientifico adquirido.
A última etapa consistiu em sistematizar junto ao grupo as ações para as
intervenções pedagógicas adequadas, visando o efetivo aprendizado do educando.
Finalizando com a aplicação de um questionário, aos professores
participantes, com algumas perguntas com objetivo de avaliar o impacto desta
intervenção em sua formação.
4. Análise dos resultados
Ao se tratar de Dificuldades de Aprendizagem no contexto escolar, como já
dissemos anteriormente, não podemos partir apenas da problemática da criança que
não aprende, mas de todo um conjunto que envolve a família, a escola, profissionais
de diversas áreas de atuação, que buscam respostas à mesma pergunta: por que
este aluno não aprende? É muito importante que todos os envolvidos, em especial,
os professores conheçam e saibam identificar estas dificuldades tanto em seus
alunos como no próprio processo de ensino, em suas aulas, na metodologia
utilizada, no ambiente educacional e social escolar. Somos nós, educadores, os
responsáveis pelo processo educativo, parafraseando Pedro Demo “O professor é o
profissional que sabe fazer o aluno aprender", e isso o professor deve ter clareza,
ele é o conhecedor do método, da técnica, da pedagogia que ensina. E se não há
aprendizagem ou se ela está deficiente, é porque há problemas, e é preciso
identificarmos esses problemas. Estes devem ser discutidos com os nossos: direção,
professores, pais, alunos. Juntos podemos aprofundar o estudo, fazer os
encaminhamentos, apontar caminhos. Um dos grandes problemas da escola é que
ficamos muito isolados, cada um sofre sozinho com seu problema ou joga
responsabilidade para outro, é preciso assumirmos o problema como nosso, só
assim podemos progredir. O grupo de estudos foi a melhor alternativa (leitura de
textos, filmes, discussão em grupos). Concluímos que além de conhecermos os
problemas dos alunos, é preciso identificarmos também os problemas dos
professores, desconhecimento, má formação acadêmica, práticas deficientes, erros
de postura, de "ensinagem", precisamos organizar melhor nosso ensino, diversificar
as estratégias, os métodos. Houve fortalecimento do grupo, crescimento,
amadurecimento intelectual, pois não se trabalha com o que não se conhece, e se o
professor não conhece a dificuldade do seu aluno, como vai intervir. E se não
conhece metodologias diferenciadas como vai trabalhar com a diversidade, uma
mesma forma de trabalhar para pessoas totalmente diferentes, já dizia Paulo Freire
“a pior desigualdade, é tratar desiguais com igualdade". Sabemos que é muito difícil,
dentro do sistema escolar de hoje, trabalhar individualmente, mas talvez em grupos
menores, ou em atividades diferenciadas que possam proporcionar aos quem têm
determinada dificuldade também participar e aprender. E não podemos abrir mão
das Salas de Apoio à Aprendizagem e Salas de Recursos, imprescindíveis diante do
quadro educacional que temos neste momento. Surgiram questionamentos de “por
que todos devem escrever? Por que todos não podem desenhar ou falar o que
entenderam de um determinado assunto, se houver apenas atividades escritas, que
metodologia é essa”?
O apoio de profissionais externos é muito importante, médicos, psicólogos,
assistentes sociais, Conselho Tutelar, Promotoria de Justiça, mas estes são apenas
um apoio, não podemos transferir nossa responsabilidade a outros profissionais, um
laudo não resolve problema de aprendizagem, muitas vezes ele é necessário para
que possamos fazer os encaminhamentos pedagógicos específicos para aquele
caso, mas não pode ser usado para justificar o fracasso daquele aluno ou ainda para
“empurrá-lo” de um ano para outro. Olhar por diversos ângulos para este aluno e
compreender que todos nós somos resultados das diversas experiências que
vivemos que cada um tem o seu jeito próprio de ser, que é preciso entender as
diferença, valorizar e explorar a subjetividade e potencialidade de cada um, só assim
podemos ver com mais clareza as dificuldades de aprendizagem, e não permitir que
essa dificuldade gere o fracasso do aluno, gere problemas emocionais, pois isto
pode interferir diretamente em sua autoestima, podendo refletir também na sua vida
adulta. “A intervenção correta, a paciência, o apoio e o encorajamento prestado pelo
educador serão com certeza os impulsionadores do sucesso escolar do aluno,
abrindo-lhe novas perspectivas para o futuro”.
5. Considerações Finais
As dificuldades de aprendizagem existem isto é fato, mas com a intervenção
adequada os alunos possivelmente podem superar estas dificuldades. O primeiro
problema são elas não serem identificadas, por falta de conhecimento do professor,
pois o diagnóstico precoce pode fazer toda a diferença na vida do educando.
É indispensável à participação a família em todo o processo para que o educando
sinta-se mais seguro e que não está sozinho para superar as dificuldades, e ainda é
esta família que a acompanhará caso necessite de apoios externos à escola.
Quanto ao pedagogo, ele é a ponte entre a família e a escola, será o primeiro
contato para explicar e elucidar possíveis dúvidas em relação às dificuldades que o
educando apresenta,é ele que fará os encaminhamentos para os órgãos externos
quando necessário e também irá auxiliar o professor na metodologia mais correta
para cada educando que apresente dificuldade de aprendizagem, será o facilitador,
e o articulador dos estudos, seja em grupos ou individuamente na hora atividade do
professor.
Acreditamos que quando todos se envolverem e assumirem suas
responsabilidades no processo num conjunto de decisões, quando forem ofertadas a
ele condições para superação das dificuldades de aprendizagem, haverá maiores
possibilidades de superação, esses educandos deixarão de viver às margens do
processo e se tornarão protagonistas da sua aprendizagem e não levarão para o
futuro marcas de uma vida acadêmica pobre e marginalizada.
Podemos considerar que as dificuldades de aprendizagem envolvem diversos
fatores, e que o mais importante é como olhamos para esta dificuldades, como
organizamos nosso ensino, como entendemos as diferenças, como consideramos as
potencialidades e como intervimos de forma correta.
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