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PATRÍCIA ANTUNES NUNES DE LIMA MORFEMAS DERIVACIONAIS E COMPOSTOS DO PORTUGUÊS BRASILEIRO NA FALA DE CRIANÇAS DE DOIS A SETE ANOS DE IDADE PORTO ALEGRE 2006

Patricia Antunes Nunes de Lima - ufrgs.br · 3 Agradecimentos À Deus por me dar a oportunidade de cursar uma pós-graduação em uma universidade pública e por ter me iluminado

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PATRÍCIA ANTUNES NUNES DE LIMA

MORFEMAS DERIVACIONAIS E COMPOSTOS DO

PORTUGUÊS BRASILEIRO NA FALA DE CRIANÇAS DE

DOIS A SETE ANOS DE IDADE

PORTO ALEGRE

2006

2

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL INSTITUTO DE LETRAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

Morfemas Derivacionais e Compostos do Português Brasileiro na fala

de crianças de dois a sete anos de idade

por

Patrícia Antunes Nunes de Lima

Dissertação submetida a avaliação como

requisito parcial para a obtenção do grau

de Mestre em Letras

Orientador: Prof. Dr. Luiz Carlos Schwindt

Porto Alegre, julho de 2006

3

Agradecimentos

À Deus por me dar a oportunidade de cursar uma pós-graduação em uma universidade pública

e por ter me iluminado sempre.

Ao professor Dr. Luiz Carlos Schwindt, não apenas pela orientação cuidadosa, mas pelo apoio

que me foi concedido desde o meu primeiro contato com a UFRGS.

À coordenação do Curso de Pós-Graduação em Letras da UFRGS, bem como aos professores

e funcionários desta Instituição, pela atenção e carinho permanentes.

Às professoras Luciene Simões e Ana Zilles e equipe de bolsistas, pela atenção dispensadas.

Ao CNPQ, pela bolsa de estudos concedida, sem a qual a realização deste curso não seria

possível.

À coordenação do Curso de Pós-Graduação em Letras da PUCRS, em especial à professora

Dra. Regina Lamprecht e à orientanda Roberta Azambuja, pela receptividade e apoio dados.

À Coordenação do Curso de Pós-Graduação em Letras da UCPEL, em especial à professora

Dra. Carmen Matzenauer, pela colaboração para realização desta pesquisa.

Aos amigos e colegas do curso de Letras Aline Grodt, André Schneider, Deisi Vidor e Taís

Bopp, pelo apoio e por dividirem comigo esta caminhada.

Aos amigos especiais Adão Júnior, Ana Célia, Eugênia Sawka, Mônica Cabrera, Mathilde

Fernandes, Rute Prestes, Roselena Borges, Luiz Braz e Cecília Melo, por terem me apoiado

durante este período.

Aos meus familiares, em especial à minha tia e madrinha Clari, pelo amor dedicado.

À minha mãe, pelo exemplo de esperança e fé.

Às instituições Rede Adventista de Ensino, Escola de Educação Infantil Meu Cantinho e

Escola Municipal Vinte de Setembro, por terem me despertado o amor pela fonoaudiologia

escolar e pela amizade.

Aos amigos Alex Boscaini, Jussemar da Silva, Luciano da Silva, Maria da Glória Souza, Vera

Fran, Vera Lúcia Oliveira e colegas da Prefeitura de Viamão, pela amizade e por acreditarem

no meu potencial.

Aos meus pacientes e seus respectivos familiares, pela compreensão, reconhecimento do meu

trabalho e, acima de tudo, por dividirem tão solidariamente comigo este período.

4

SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS......................................................................................................... 6 LISTA DE GRÁFICOS....................................................................................................... 7 RESUMO............................................................................................................................. 8 ABSTRACT......................................................................................................................... 9 1 INTRODUÇÃO................................................................................................................ 10 1.1 Justificativa................................................................................................................... 10 1.2 Objetivo geral............................................................................................................... 11 1.3 Objetivos específicos.................................................................................................... 11 1.4 Hipóteses....................................................................................................................... 11 2 REVISÃO TEÓRICA....................................................................................................... 13 2.1 Morfologia ..................................................................................................................... 13 2.1.1 Morfema...................................................................................................................... 13 2.1.2 Base............................................................................................................................. 14 2.1.3 Raiz............................................................................................................................. 16 2.1.4 Radical........................................................................................................................ 16 2.2 Formação de palavras em português brasileiro........................................................ 17 2.2.1 Derivação prefixal....................................................................................................... 18 2.2.1.1 Prefixação com base livre........................................................................................ 19 2.2.1.2 Prefixação com base presa....................................................................................... 20 2.2.1.3 Prefixação: derivação ou composição?.................................................................... 20 2.2.1.4 Prefixação em mudança de classe............................................................................ 21 2.2.1.5 Prefixóides................................................................................................................ 22 2.2.1.6 Prefixos homófonos................................................................................................. 22 2.2.1.7 Prefixos concorrentes............................................................................................... 22 2.2.2 Derivação sufixal........................................................................................................ 23 2.2.2.1 Formações sufixais com base livre.......................................................................... 25 2.2.2.2 Sufixos homófonos................................................................................................... 26 2.2.2.3 Sufixos concorrentes................................................................................................ 26 2.2.2.4 Sufixos categoriais e significativos.......................................................................... 27 2.2.2.5 Formações sufixais com base presa......................................................................... 28 2.2.3 Composição................................................................................................................. 28 2.3 A relação entre morfologia e fonologia...................................................................... 32 2.3.1 Constituintes prosódicos............................................................................................. 32 2.3.2 Sílaba........................................................................................................................... 33 2.3.3 Teoria da sílaba........................................................................................................... 33 2.3.4 Sílabas leves e pesadas................................................................................................ 34 2.3.5 Condições universais de silabação.............................................................................. 35 2.3.6 A seqüência de sonoridade.......................................................................................... 36 2.3.7 A sílaba em português................................................................................................. 36 2.3.8 Os filtros...................................................................................................................... 37 2.3.9 A palavra fonológica................................................................................................... 37 2.4 Aquisição da linguagem............................................................................................... 38 2.4.1 Definição de aquisição da linguagem......................................................................... 38 2.4.2 A visão de Chomsky sobre a aquisição da linguagem................................................ 39 2.4.3 Os primeiros estágios da linguagem........................................................................... 40 2.4.4 Aquisição morfológica................................................................................................ 42 2.4.5 Desenvolvimento lexical e formação de palavras....................................................... 45

5

2.4.6 Convencionalidade e contraste.................................................................................... 45 2.4.7 Acréscimo de palavras ao vocabulário inicial............................................................. 47 3 METODOLOGIA............................................................................................................. 49 3.1 A coleta de dados nos bancos de fala infantil............................................................ 49 3.1.1 Etapas da coleta de dados no CEAAL e DELICRI..................................................... 49 3.2 Coleta de dados dos adultos........................................................................................ 50 3.2.1 A busca no vocabulário dicionarizado do PB............................................................. 50 3.2.2 A busca no VARSUL.................................................................................................. 50 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO...................................................................................... 52 4.1 Freqüência geral dos processos de formação de palavras na fala infantil.............. 52 4.2 Prefixação..................................................................................................................... 54 4.2.1 Prefixo des-................................................................................................................. 55 4.2.2 Prefixo re-................................................................................................................... 56 4.3 Sufixação....................................................................................................................... 57 4.3.1 Sufixo -inho/zinho....................................................................................................... 59 4.3.2 Sufixo -eiro................................................................................................................. 59 4.3.3 Sufixo -ado................................................................................................................. 60 4.3.4 Sufixo -mento............................................................................................................. 60 4.3.5 Sufixo -dor.................................................................................................................. 61 4.3.6 Sufixo -oso.................................................................................................................. 61 4.3.7 Sufixo -ão.................................................................................................................... 62 4.4 Composição................................................................................................................... 63 4.4.1 Composto N + A......................................................................................................... 64 4.4.2 Composto N + p + N................................................................................................... 65 4.4.3 Composto V + N......................................................................................................... 66 4.4.4 Composto N + N......................................................................................................... 66 4.4.5 Composto Num + N.................................................................................................... 67 4.4.6 Composto Num + p + N.............................................................................................. 67 4.4.7 Composto V + V......................................................................................................... 67 4.4.8 Composto A + p + N................................................................................................... 68 4.4.9 Composto N + p + N + A............................................................................................ 69 4.5 A língua-alvo................................................................................................................. 69 4.5.1 Análise no dicionário Aurélio Eletrônico................................................................... 69 4.5.2 A busca no VARSUL.................................................................................................. 71 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................ 75 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................. 77 ANEXOS.............................................................................................................................. 79

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Produção de prefixos, sufixos e compostos........................................................ 53 Tabela 2: Prefixos encontrados na fala infantil.................................................................. 54 Tabela 3: Produção de derivações sufixais......................................................................... 57 Tabela 4: Compostos registrados na fala infantil............................................................... 63

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Processos de formação de palavras encontrados na fala infantil...................... 53 Gráfico 2: Número de ocorrências de prefixos................................................................... 54 Gráfico 3: Distribuição dos sufixos.................................................................................... 58 Gráfico 4: Distribuição dos compostos.............................................................................. 64 Gráfico 5: Formações prefixais na fala infantil e dicionarizadas....................................... 70 Gráfico 6: Formações sufixais na fala infantil e dicionarizadas......................................... 71 Gráfico 7: Formações prefixais encontradas na fala infantil e no VARSUL..................... 72 Gráfico 8: Formações sufixais encontradas na fala infantil e no VARSUL....................... 73

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RESUMO

O objetivo desta pesquisa é contribuir para os estudos sobre aquisição da linguagem,

especificamente sobre aquisição da morfologia. Neste trabalho, assumimos a perspectiva

gerativista, de base chomskiana, no que concerne à concepção de conhecimento internalizado

e de gramática. O que entendemos, aqui, como conhecimento lingüístico, pode ser

formalizado a partir do conceito de gramática. Essa gramática está organizada em

submódulos: fonológico, morfológico, sintático e semântico.

Este trabalho, almejando adequação descritiva, olha para o submódulo morfológico,

com o intuito de investigar a aquisição da morfologia por crianças de 2:0 a 7:0 anos de idade.

Com maior especificidade, investigaremos a ordem de aquisição de morfemas derivacionais e

compostos, a tipologia e produtividade dos mesmos. Após, compararemos a linguagem

infantil com a adulta quanto à proporcionalidade do uso destes processos.

Para tanto, procedemos à descrição de afixos derivacionais e compostos através da

audição das fitas, transcrição, organização e tabulação dos dados. Por fim, procedemos à

análise. Nos debruçamos, para tal objetivo, sobre uma amostra de 60 crianças (30 meninos e

30 meninas), com idades entre 2:0 e 7:0, divididas em intervalos de 2 meses e com

desenvolvimento fonológico normal.

Os dados que fazem parte do presente estudo pertencem aos seguintes bancos:

AQUIFONO, que pertence ao CEAAL (PUCRS e UCPel), DELICRI (UFRGS), Dicionário

Aurélio Eletrônico (versão 3.0) e VARSUL (UFRGS, PUCRS, UFSC e UFPR). Após a

análise dos dados, realizamos a comparação da linguagem infantil com a linguagem adulta,

para averiguar se os afixos e compostos que aparecem na fala infantil são usados por adultos

com a mesma proporcionalidade.

Os resultados obtidos revelaram o que segue.

- O aumento de prefixos, sufixos e compostos foi verificado na passagem da primeira

para a segunda faixa etária. Além disso, os compostos mostraram progressão moderada.

- Os afixos e compostos utilizados pelas crianças respeitam aspectos de uso,

relacionado ao input recebido pelos pais.

- Quanto ao status prosódico, a hipótese de que afixos que são palavras fonológicas

surgem primeiro na linguagem infantil, parece não poder ser confirmada pelos dados.

- No que se refere à produtividade dos afixos e compostos, verificamos que os

prefixos, sufixos e compostos mais usados pelas crianças são também produtivos na língua

portuguesa.

9

ABSTRACT

The goal of this research is to contribute for the studies about Language

Acquisition, specifically about morphology acquisition. On this text, we assume the

Gerativist view, based on Noam Chomsky, related to the conception of internalized

knowledge as well as grammar. What we understand as a linguistic knowledge, it can be

formal according to the concept of grammar. This grammar is organized in submodules:

phonologic, morphological, syntactic and semantic.

This article, earning descriptive adjusting, looks at the morphological submodule, with

the intention of investigating the morphological acquisition in children from 2 to 7 years old.

Particularly, we will investigate the method of derived and composed morphemes, their

typology and productivity. After, we will compare the children to the adult language

concerning to the proportionality of the use of these processes. For such, we proceed to

descriptions of derived and composed affixes through listening of tapes, transcriptions,

organization and data registration. Finally, we start the analysis. We reflect about a sample of

60 children (30 boys and 30 girls), with the age between 2 and 7, divided in terms of 2 months

and with a normal phonological development.

The information which take part of this article belong to: AQUIFONO, which belongs

to CEAAL (PUCRS e UCPel), DELICRI (UFRGS), Aurélio’s Eletronic Dictionary (version

3.0) and VARSUL (UFRGS, PUCRS, UFSC and UFPR). After the data analysis, we will

compare the children to the adult language, to verify if the affixes and composed which

appear in the children speech are used for adults in the same proportionality. The results of

this research show us the following. The increase of prefixes, suffixes and composed was

verified on the passage from the first to the second age line. Furthermore, the composed have

shown us a moderate progression. The affixes and composed used by the children, respect the

aspect of use related to the input received from their parents.

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho está vinculado à linha de pesquisa "Fonologia e Morfologia"

do Programa de Pós-Graduação em Letras da UFRGS.

A presente pesquisa, ao se inserir nessa área, vem ampliar o escopo dos estudos

sobre aquisição da linguagem, especificamente sobre aquisição da morfologia.

Neste trabalho, assumimos a perspectiva gerativista, de base chomskiana, no que

concerne à concepção de conhecimento internalizado e de gramática.

Para Chomsky, a ciência lingüística deve almejar adequação explicativa, ou seja,

deve dizer sobre o conhecimento que o ser humano tem da linguagem. O autor admite,

contudo, que a adequação explicativa está associada à adequação descritiva, pois é preciso

que o objeto em análise seja amplamente mapeado, a fim de possibilitar generalizações mais

seguras.

O que se entende, aqui, como "conhecimento lingüístico", pode ser formalizado a

partir do conceito de "gramática": o conjunto de princípios e parâmetros (ou regras e

restrições) que governam o funcionamento da linguagem humana. Essa "gramática", na

concepção gerativista, está organizada em submódulos: fonológico, morfológico, sintático e

semântico.

Esse conhecimento sobre o funcionamento de uma língua, dominado por falantes

adultos, é gradativamente adquirido pela criança, à medida que ela contrasta o input que

recebe com a Gramática Universal (GU). No processo de aquisição da linguagem, portanto, o

lingüista encontra pistas sobre o que é próprio de línguas particulares e o que corresponde ao

conhecimento lingüístico inato à espécie humana - daí a importância em estudá-lo.

Este trabalho, almejando adequação descritiva, olha para o submódulo

morfológico, com o intuito de mapear a aquisição de morfemas derivacionais e compostos por

crianças de 2:0 a 7:0 anos.

Na seqüência, são apresentados a justificativa, os objetivos e as hipóteses que

norteiam esta pesquisa.

1.1 Justificativa

A partir da década de 70 são intensificados os estudos dentro da área de aquisição

da linguagem. No Brasil, a PUCRS e a UCPel vêm se destacando desde a década de 80 pela

realização de pesquisas, principalmente na área de aquisição da fonologia. O Centro de

11

Estudos sobre Aquisição e Aprendizagem da linguagem – CEAAL (PUCRS) e o Mestrado em

Letras da UCPel contam com três bancos de dados com o objetivo de aprofundar os estudos

sobre aquisição da linguagem normal e com desvios. Entretanto, existem poucos estudos

referentes às outras áreas da linguagem, como a sintaxe e a morfologia. É nessa lacuna que se

insere nossa investigação. Abordando o subsistema morfológico, pretendemos descrever a

aquisição de morfemas derivacionais e compostos e, com isso, contribuir para os estudos de

aquisição, além de oferecer base para estudos em áreas aplicadas da Lingüística.

Nos itens seguintes, descreveremos os principais objetivos que norteiam nossa

pesquisa.

1.2 Objetivo Geral

- Contribuir, a partir da descrição da aquisição de afixos derivacionais e compostos

por crianças de 2:0 a 7:0 anos de idade, para a explicitação do processo de aquisição da

morfologia.

1.3 Objetivos Específicos

- Investigar a ordem de aquisição de afixos derivacionais e compostos, no PB, por

crianças de 2:0 a 7:0 anos de idade.

- Descrever a tipologia de afixos derivacionais e compostos adquiridos nesta fase.

- Refletir sobre a aquisição da palavra fonológica, a partir da tipologia de

morfemas adquiridos nesta fase.

- Averiguar a produtividade dos afixos encontrados na fala infantil.

- Comparar a linguagem infantil com a linguagem adulta, no intuito de verificar se

os afixos e compostos que aparecem na fala infantil são usados por adultos com a mesma

proporcionalidade.

1.4 Hipóteses

- A ordem de aquisição da morfologia derivacional e de compostos é crescente em

termos de freqüência de uso, de acordo com a faixa etária.

- A tipologia de afixos e de compostos que aparecem na fala da criança é

condicionada por aspectos de uso.

12

- Afixos que são palavras fonológicas independentes são adquiridos mais cedo.

- As crianças de 2:0 a 7:0 anos utilizam-se de afixos e de tipos de compostos

considerados produtivos, isto é, afixos e tipos de compostos que contribuem para a formação

de novos vocábulos em PB.

- Os afixos e os compostos que aparecem na fala infantil são usados por adultos

com a mesma proporcionalidade.

Para dar conta dos objetivos e das hipóteses aqui mencionadas, este trabalho, a

partir daqui, organiza-se como segue: no capítulo 2, apresentamos os fundamentos teóricos de

que nos utilizamos em nosso estudo; no capítulo 3, apresentamos a metodologia empregada

na pesquisa; os resultados e a análise estão no capitulo 4; no capítulo 5, por fim, estão nossas

considerações finais.

13

2 REVISÃO TEÓRICA

Neste capítulo são apresentados os principais pressupostos teóricos desta

dissertação. Na seção 2.1, estão as bases da morfologia; em 2.2, descrevemos os principais

processos de formação de palavras em PB; em 2.3, procuramos explorar a relação entre

morfologia e fonologia; por fim, em 2.4, tratamos do processo de aquisição da linguagem pela

criança.

2.1 Morfologia

A Morfologia estuda a estrutura interna das palavras, ou ainda, trata da forma das

mesmas. A estrutura interna das palavras é constituída de elementos associados e uma das

tarefas da morfologia será a de identificá-los. Estes elementos constituem as menores

unidades formais dotadas de significado e, por isso, se denominam morfemas. Todo morfema

se compõe de um ou vários fonemas, e destes difere, fundamentalmente, pelo fato de

apresentarem significado.

Na constituição do termo morfologia, Monteiro (1986) destaca que podemos

identificar os seguintes elementos [morf(o)] e [logia], do gr. Morphe=forma e logía=estudo.

Desta forma, morfologia é a parte da gramática que descreve a forma das palavras.

Segundo o autor, a morfologia tem por objeto de estudo:

- A forma interna das palavras (sua estrutura);

- A relação formal entre palavras;

- Os princípios que regulam a formação de novas palavras.

2.1.1 Morfema

Morfemas caracterizam-se por serem as menores unidades formais dotadas de

significado da língua (Monteiro, 1986). Já que a morfologia estuda a estrutura interna das

palavras e esta estrutura é formada de unidades associadas, uma das tarefas do morfólogo é

identificar estes elementos. O autor cita as seguintes características dos morfemas:

- Os morfemas são os elementos mínimos das emissões lingüísticas que contêm

um significado individual;

- Um morfema é a unidade mínima no sistema de expressão que pode ser

correlacionada diretamente com alguma parte do sistema do conteúdo;

14

- Um morfema pode ser definido como unidade gramatical mínima indistintiva,

uma subunidade da palavra, que não pode ser significativamente subdividida em termos

gramaticais.

Rosa (2005) define morfema da seguinte forma: “Morfema é uma forma

recorrente (com significado) que não pode ser analisada em formas recorrentes (significativas)

menores.”

Segundo Katamba (1993, p. 19-20), o termo morfema é usado para se referir à

menor unidade de significado, às unidades indivisíveis de conteúdo semântico ou funções

gramaticais, que formam as palavras. A afirmação, entretanto, que as palavras têm uma

estrutura causa surpresa, visto que normalmente os falantes vêem as palavras como unidades

indivisíveis de significado. Isto provavelmente deve-se ao fato de que muitas palavras são

morfologicamente simples, como, por exemplo, mar, sol, mesa, bota etc. Estas palavras,

portanto, não podem ser divididas em unidades menores, portadoras de significado.

Zanotto (1986) caracteriza o morfema como unidade mórfica mínima de que se

compõe o vocábulo. O morfema, obrigatoriamente, é portador de alguma significação ou

função gramatical. Nas palavras “mar”, “ sol”, “mesa”, “bota” percebemos que partes destes

vocábulos como “mes-“ e “bot-” não apresentarão nenhuma significação sozinhos. São

apenas fragmentos de palavras que não interessam ao campo da morfologia.

2.1.2 Base

Segundo Rocha (2003), a base caracteriza-se como uma seqüência fônica

recorrente, a partir da qual se forma uma nova palavra. A partir da base, percebemos se um

vocábulo é morfologicamente complexo.

Assim, no processo de derivação, temos a formação de um produto (P), a partir de

uma base (B).

As bases podem ser livres ou presas. As bases presas só funcionam ligadas a

outras, como, por exemplo, pro-, de proscrever, prometer, agr-, de agrário, etc. Prefixos e

sufixos são formas presas. A fim de ilustrarmos melhor o que é base presa, observemos as

seguintes relações paradigmáticas:

Livro livraria livreiro

Pão padaria padeiro

Queijo queijaria queijeiro

Relógio relojoaria relojoeiro

15

Conforme podemos observar nos exemplos acima, identificamos na segunda

coluna um elemento recorrente, que acrescenta à base um significado de “estabelecimento

comercial ou industrial relacionado a X”: trata-se do sufixo –aria. Na terceira coluna, é

também possível reconhecer o sufixo -eiro, formador de agentivos.

No que se refere às bases presas, também observamos o seguinte:

- As bases presas podem apresentar alomorfes: gastr-, gastro; graf-, grafo; agr-,

agri-.

- Às bases presas podem ser anexados sufixos: escot -ismo, gástr -ico, agr- ário,

antrop -óide; outras bases presas gastr-ônomo, geo -logia ou bases livres agri-cultura, bio-

degradável, eco-xiita.

- As bases presas também podem aparecer como segundo elemento da

composição:

BASE PRESA SENTIDO EXEMPLOS

-cida que mata formicida, fungicida

-gam (ia) casamento poligamia, bígamo

-log (ia) tratado, ciência geologia, antropologia

As bases livres, ou seja, bases que constituem palavras da língua, podem funcionar

isoladamente como comunicação eficiente. Geralmente, formam-se novas palavras na língua a

partir de bases livres. Analisemos as palavras a seguir, que ilustram bases livres: teatro,

mexer. A partir delas, podemos formar outras palavras, pelo acréscimo de bases presas,

gerando um produto a partir da base, tais como teatral e imexível, respectivamente.

Os conceitos de base e produto estão relacionados com o que se passa na mente

dos falantes, ou seja, estão ligados com a intuição que o falante tem de palavra primitiva e

derivada. De fato, criam-se novas palavras com base em palavras já existentes na língua e não

pela junção de raízes a prefixos, sufixos, desinências, vogais temáticas, etc como preconizava

a lingüística estrutural.1

1 ‘Base’ não pode ser entendida como um morfema discreto (como raiz, prefixo ou sufixo) porque sua existência está condicionada a um processo específico de formação de palavras.

16

2.1.3 Raiz

Raiz é o morfema comum a várias palavras de um mesmo grupo lexical, portador

da significação básica desse grupo de palavras (Rocha, 2003). Assim, em claro, clarear,

aclarar, esclarecer, esclarecimento e clarividência, a raiz é clar-. Em tom, tonal, tonicidade,

entoar, desentoar, a raiz é tom (com a variante to-). Vejamos, a seguir, exemplos de outros

grupos lexicais e suas raízes:

Raiz: Estud- estudar, estudo, estudante, estudantil, reestudar

Raiz: Quebr- quebrar, quebra, quebradeira, requebrar

O conceito de raiz, como se observa, se dá sob o ponto de vista sincrônico.

Autores como LIMA (1972) e CEGALLA (1979) afirmam que o conceito de raiz só interessa

a gramática histórica.

2.1.4 Radical

Radical constitui a parte da palavra que está presente em todas as formas de uma

mesma palavra. Também é chamada de forma lexical. Para se encontrar o radical de uma

palavra, flexiona-se o nome em gênero e número e o verbo em pessoa, número, tempo, modo

e aspecto. A parte da palavra comum às variações de flexão é o radical.

Cada palavra, portanto, tem o seu radical específico que pode coincidir, ou não,

com a raiz ou radical de outras palavras. Como exemplo em que raiz e radical coincidem,

podemos citar o radical “bel-“ . A distinção entre esses termos só adquire importância quando

consideramos radicais já derivados (secundários, terciários, etc), como “embelezamento”, que

já está constituído de prefixo (em-) e sufixo (-mento). Vejamos a seguir alguns exemplos de

radical.

ITEM LEXICAL RADICAL

Teatro teatro

Menino menin-

Belo bel-

Esclarecer esclarec-

Soltar solt-

17

Apalavrado apalavrad-

2.2 Formação de palavras em português brasileiro

A língua apresenta alguns mecanismos lingüísticos através dos quais é possível

formar novas palavras. Segundo Rocha (2003), este mecanismo lingüístico denomina-se

Processo de Formação de Palavras. No decorrer deste trabalho, nos aprofundaremos em dois

dos principais processos produtivos de formação de palavras no português: a derivação e a

composição. Os vocábulos, no PB, segundo Silva e Koch (1995), apresentam as seguintes

possibilidades estruturais (são compostos de):

1. Apenas um morfema lexical: sol, mar, feliz.

2. Morfema lexical + (vogal temática) + (morfemas flexionais): alun-a-s, part-í-

sse-mos, not-a-ram.

3. Morfema lexical + morfemas derivacionais (+/-) (morfemas flexionais):

3.1. Prefixo (s) + morfema lexical (+/- vogal temática) (+/-) morfemas flexionais):

in-feliz, in-apt-o-s, des-em-palh-a-r.

3.2. Morfema lexical + sufixo (s) (+/- vogal temática) (+/- morfemas flexionais):

mur-alh-a, habitu-al, levanta-ment-o, menin-a-zinh-a-s.

3.3. Prefixo (s) + morfema lexical (+/- elemento de ligação) + sufixo (s) (+/- vogal

temática) (+/- morfemas flexionais): in-feliz-mente, re-prova-ção, des-contenta-ment-o-s.

4. Morfema lexical (+/- vogal temática) (+/- morfemas flexionais) + morfema

lexical (+/- vogal temática) (+/- morfemas flexionais): couve-flor, terç-a-s-feir-a-s, pé-s-de-

molequ-e.

Analisando os modelos de vocábulos acima apresentados, podemos determinar os

processos de formação de vocábulos em português. Os itens 1 e 2 tratam de formas simples e

primitivas. O item 3 constitui-se de vocábulos simples, porém derivados. Finalmente, os

vocábulos do item 4 são vocábulos compostos, já que apresentam mais de um morfema

lexical.

Desta forma, para uma análise sincrônica dos mecanismos usados no processo de

formação de palavras, considerar-se-á a existência de palavras simples e compostas, de acordo

com a existência de um ou mais morfemas lexicais. As palavras simples dividem-se em

primitivas e derivadas. As primitivas constituem-se apenas de núcleos ou semantemas,

seguidos ou não de morfemas flexionais. As derivadas, além do núcleo, possuem morfemas

derivacionais, utilizando-se das primitivas para a sua formação (Monteiro, 1986).

18

Os principais processos de formação de novas palavras da língua portuguesa e que

serão explorados neste trabalho são a derivação e a composição. A derivação se caracteriza

pela formação de palavras, por meio de afixos agregados a um morfema lexical. Já na

composição, a formação de palavras ocorre através da combinação de vocábulos já existentes,

dando origem a um novo conceito.

Vejamos nos itens a seguir alguns conceitos importantes que são pertinentes a

nossa análise.

2.2.1 Derivação prefixal

A derivação prefixal é um processo de criação lexical que consiste na formação de

uma nova palavra através do acréscimo de um prefixo a uma base já existente (Rocha, 2003).

Os prefixos constituem seqüências fônicas recorrentes que se colocam à esquerda de uma

base, com o objetivo de se formar uma nova palavra. Todo prefixo, assim como todo sufixo,

caracteriza-se pelo fato de ser uma forma presa. Os prefixos, no PB, apresentam as seguintes

características:

- Não constituem uma base;

- Afixam-se à esquerda de uma base;

- Participam da formação de novas palavras, ou seja, a presença dos prefixos

caracteriza uma palavra derivada;

- Não mudam a classe gramatical das bases a que se ligam;

- Não mudam o acento da palavra a que se ligam (ainda que possam, contudo, ser

auto-acentuados).

Monteiro (1986) define os prefixos como “elementos que aparecem antes da raiz,

modificando o significado do vocábulo primitivo.”Além das características citadas acima, o

autor coloca alguns aspectos importantes referentes aos prefixos:

- Destacam-se facilmente e, ao destacarem-se, em geral sobra uma palavra única.

Exemplos: des+aparecer; in+feliz, re+mexer.

- A sua presença altera o significado do semantema. Por exemplo, se pegarmos a

palavra validez e lhe antepusermos o elemento [in], a idéia de negação afetará

semanticamente o vocábulo primitivo, já que invalidez será o oposto de validez.

- A presença dos prefixos não serve para indicar a classe gramatical dos vocábulos.

No PB, o gênero e o número não são marcados através de prefixos. Vejamos os exemplos.

19

(Masc.) cantor → *acantor (fem.)

(sing.) altar → *saltar (pl.)

Alguns prefixos, no entanto, podem adquirir status de palavras, ou seja, funcionam

como formas livres, por exemplo, pré-, pós-, extra- etc. Vejamos alguns exemplos de formas

livres:

- Ana Paula vai para o pré à tarde. (escolar);

- Tiago resolveu fazer um pós (pós-graduação);

- Fabiano fará uma aula extra (ordinária).

O fato de existirem formas livres contradiz, de certa forma, a própria característica

do prefixo, que é justamente o fato de ser preso (ligado) a uma raiz.

No que se refere ao status prosódico, Schwindt (2000) discutiu em sua tese de

doutorado o prefixo no português brasileiro (PB), sob a perspectiva de Nespor e Vogel

(1986). O comportamento fonológico ambíguo dos prefixos no PB suscita o seguinte

questionamento: seria ele uma palavra fonológica independente ou não teria outro status de

uma sílaba átona que se afixa à esquerda de uma base? Schwindt propõe uma redistribuição

dos prefixos em composicionais e legítimos, admitindo que os primeiros têm estruturas de

vocábulos fonológicos independentes e que os segundos caracterizam-se como sílabas átonas

afixadas a uma base.

Esta hipótese é sustentada pelos seguintes argumentos: acento e oposição forma

livre/forma presa.

Os Prefixos Composicionais (PC’s), à semelhança de palavras, podem receber o

acento e podem se estabelecer como formas livres. Exemplo: “Fábio encontrou sua ex (ex-

namorada) no supermercado” e “Ana matriculou-se num pós (curso de pós-graduação)”.

Os Prefixos Legítimos (PL’s), à semelhança dos clíticos, não podem receber acento

e não podem existir como formas livres. Como exemplos podemos citar desleal e releitura.

Nos itens a seguir, discutiremos questões relativas à prefixação, embora esta tenha

um caráter menos complexo do que a derivação sufixal.

2.2.1.1 Prefixação com base livre

Prefixação com base livre é aquela que funciona como uma palavra na língua.

Prefixos podem se juntar a bases presas ou livres. Como exemplos de ocorrência de bases

livres, podemos citar:

20

Reinaugurar (inaugurar)

Anti-aéreo (aéreo)

As formações com bases livres são muito produtivas na língua. A transparência

morfológica e semântica da base livre favorece o aparecimento de inúmeros casos de

derivação prefixal.

2.2.1.2 Prefixação com base presa

Inúmeras palavras são formadas em português através do acréscimo de prefixos a

bases presas. Apesar das bases presas não apresentarem autonomia vocabular, podem

combinar com mais de um prefixo, como podemos ver nos exemplos a seguir.

Agredir impelir regresso

Progredir repelir ingresso

Regredir compelir progresso

2.2.1.3 Prefixação: derivação ou composição?

Surge a seguinte questão: a prefixação é um processo de derivação ou composição

de palavras? Formações do tipo reler, pré-eleitoral, decompor e infeliz são consideradas como

derivação, pelo fato de apresentarem a estrutura prefixo mais base. Vejamos, a seguir, mais

detalhadamente estas estruturas.

[re- pref [ler]v]v

[pré- pref[eleitoral]A]A

[com- pref[pôr]V]V

Nos vocábulos sobreviver, conviver e contradizer, observamos a presença de

derivações, uma vez que neles também se constata a existência de prefixo mais base. No

entanto, alguns autores, como Câmara Júnior (1964), afirmam que em casos como este não

deveríamos falar em derivação, mas em composição, já que elementos como sobre, com e

contra são palavras da língua, ou seja, podem funcionar isoladamente.

Dois argumentos são destacados a seguir, que nos levam a considerá-los como

formações derivadas, e não como formações compostas.

21

- Os lexemas compostos caracterizam-se pelo fato de apresentarem mais de uma

raiz. Sobre, com e contra, apesar de serem palavras, não apresentam raiz. São formas

dependentes. Logo, contradizer não é composto, já que apresenta apenas uma raiz.

- Para a apresentação do segundo argumento, consideremos as seguintes sentenças:

a) Ela não pode conviver com os pais.

b) Ela sobrevive andando sobre as águas.

Em (a) com- e con- são entradas lexicais diferentes, do mesmo modo que sobre- e

sobre, em (b). Con- é uma forma presa (prefixo) e com é uma forma dependente. Constituem

itens lexicais distintos, que apresentam funções diferentes. Assim, palavras com funções

distintas são palavras diferentes.

2.2.1.4 Prefixação e mudança de classe

Existem muitos casos em que, em decorrência da necessidade de mudança

categorial, surge um novo vocábulo prefixado na língua. O processo de mudança categorial

torna-se mais rico e complexo na sufixação, se o compararmos com a prefixação.

Geralmente, quando se anexa um prefixo a uma base, não ocorre a mudança de

classe (Bauer, 1983); Calce, (1984). Aliás, são raras as formações cristalizadas do português

em que se dá a transposição de categoria lexical em decorrência da anexação de um prefixo.

Como exemplos, podemos citar prefixo (pre+fixo) e disforme (dis+forma).

Em português, é possível apontar alguns exemplos de formações novas ou recentes

em que se dá a transposição de uma categoria lexical para outra, através da prefixação.

ALVES (1990) cita alguns exemplos:

“Um acontecimento extrapauta concentra as atenções dos bispos...“

“Chegando-se ao cúmulo de divulgar notícias pós-pacto que na realidade não

existiram...”

2.2.1.5 Prefixóides

São “prefixos” que aparecem em uma só palavra. São falsos prefixos, pelo fato de

serem irrecorrentes, já que os prefixos são, por definição, recorrentes.

Exemplos de prefixóides são:

22

Obter contracenar conviver

Supor resguardar contrair

Em contracheque, contrabaixo, contradança, há três prefixóides distintos, pelo

fato de cada um deles ter um sentido especial. Trata-se, na verdade, de prefixóides

homófonos.

Como pudemos observar, os prefixóides acrescentaram às bases um sentido único,

que não pode ser encontrado em outro prefixo da Língua Portuguesa.

Podemos destacar que nem todos os autores compartilham da noção de

‘prefixóide’. Schwindt (2000), por exemplo, não se utiliza dessa categoria, já que entende que

essa noção está coberta pelo conceito de transparência do morfema em questão.

2.2.1.6 Prefixos homófonos

São aqueles que apresentam a mesma identidade fonológica, mas significações

diferentes. São denominados tradicionalmente de prefixos homônimos, por influência de

vocábulos homônimos. Apresentam, portanto, a mesma seqüência fonética, mas sentidos ou

funções diferentes, como in1- negação e in2- movimento para dentro. Vejamos os exemplos a

seguir:

In1- negação

Infeliz, injusto, imaturo

In2- movimento para dentro

Ingerir, imigrar, imergir

2.2.1.7 Prefixos concorrentes

A concorrência ocorre quando os elementos lingüísticos podem ocupar o mesmo

lugar em determinada estrutura da língua. A rigor, não há prefixos concorrentes, mas regras

concorrentes.

Os prefixos, portanto, só serão considerados concorrentes se as bases pertencerem

às mesmas categorias lexicais. Exemplos:

Negação, sentido contrário: des-/in-(i-)

Desleal, desnecessário,/ infiel, ilegal.

Posição superior: super-/epi-

Super-homem, superposição/epiderme, epígrafe.

23

Movimento para dentro: in-(em)/intro-

Ingerir, importar, embarcar/introduzir, intrometer.

2.2.2 Derivação sufixal

Neste capítulo, abordaremos a derivação sufixal, que é, sem dúvida, o processo de

formação de palavras mais rico e diversificado do PB, sendo assim, o mais acionado pelos

falantes.

Conforme afirma Monteiro (1986), os sufixos são elementos significativos que

aparecem após a raiz de uma palavra. Também se usa o termo para fazer referência ao

elemento lingüístico que, numa dada palavra, antecedendo as desinências gramaticais e/ou

flexionais, tem como função a integração da referida palavra dentro de um campo semântico

particular. O autor coloca as seguintes características referentes aos prefixos:

- Não se destacam sempre com muita facilidade. Por exemplo, em condutor,

haverá dúvidas no destaque do sufixo. Haverá dúvidas entre [tor] e [or]. Para acabar com a

divergência, se desenvolverá uma cadeia de oposições entre formas aparentadas até se

concluir que o sufixo é realmente [or], por causa de condutor..

- Depois do destaque resta somente um pedaço da palavra. Ex.: barb+[udo];

pedr+[eiro] e animal+[Zinho]..

- Não mudam fundamentalmente o significado do semantema. Vejamos o

exemplo.

Livr-o + [aria]

+ [eiro]

+ [inho]

+ [eto]

+ [esco]

O semantema [livr ] guarda em todas as designações o mesmo significado, apenas

especializado pelos diversos sufixos que recebeu.

- Diferentemente dos prefixos, podem indicar as categorias gramaticais dos

vocábulos:

moç + [a] (categoria de gênero)

mãe + [s] (categoria de número)

so + [mos] (categoria de número e pessoa)

fo + [sse] (categoria de modo e tempo)

24

A sufixação pode ser caracterizada como um tipo de derivação que consiste na

anexação de um sufixo a uma base (Rocha, 2003). São, a exemplo dos prefixos, formas

presas. Logo, não faz sentido, em princípio, o uso isolado do sufixo. Morfemas como -udo (de

barbudo), -eiro (de doleiro) e -dor (de animador), por exemplo, são abstrações desnecessárias,

se estudadas isoladamente; -zinho ou –mente, todavia, podem aparecer, raras vezes, em

construções isoladas.

Os sufixos, no PB, apresentam as seguintes características:

- Não constituem uma base;

- Afixam-se à direita de uma base;

- Participam da formação de novas palavras, ou seja, a presença dos sufixos

caracteriza uma palavra derivada;

- Podem mudar a classe gramatical das bases a que se ligam;

- Podem mudar o acento da base a que se ligam, já que, no caso do português, são

alocados na pauta acentual (penúltima sílaba).

No que se refere à função gramatical, há dois tipos de sufixos: os sufixos que

formam novas palavras são denominados derivacionais ou lexicais. Já os que permitem que os

vocábulos variem em gênero e número (nomes) ou em modo, tempo, número e pessoa

(verbos) são chamados flexionais.

Os sufixos derivacionais apresentam as seguintes características:

- Produzem novas palavras, desde que sejam acrescentados os sufixos adequados.

Em outras palavras, podemos criar inúmeras palavras através de formas livres.

- Não se aplicam a todas as palavras existentes na língua (assistemáticos).

Exemplo: barriga – barrigudo, mas seriam estranhas as seguintes formações: *calcanharudo,

*umbigudo, *palpebrudo.

Já os sufixos flexionais se identificam pelas seguintes características:

- Não criam novos vocábulos. Exemplo: belo, bela, belos, belas são quatro formas

do mesmo vocábulo. Conhecerá e conhecemos não constituem verbos distintos de conhecer.

Apenas as noções gramaticais de tempo e pessoa variam;

- São sistemáticos, ou seja, aplicam-se a todas as palavras. O morfema [s] do plural

se aplica a qualquer substantivo ou adjetivo;

- Sujeitam-se a vínculos de concordância (número-pessoal e modo temporal). Ex.:

Se analisarmos a seguinte frase “O mulheres feio pareces bonita quando estariam bem

vestido”, veremos que não se enquadra na gramática portuguesa por causa da inexistência de

25

concordância. Utilizando adequadamente as concordâncias teríamos: “As mulheres feias

parecem bonitas quando estão bem vestidas.”

Resumindo, então, sufixo é uma forma presa recorrente, que se coloca à direita da

base, caracterizando assim uma palavra derivada. O sufixo diferencia-se da base pelo fato de

não apresentar significação e/ou função própria, independente.

Para definirmos se um lexema apresenta sufixo ou não, basta verificar se a

terminação da palavra aparece em outras formações da língua com o mesmo S/F

(significado/função).

A seqüência fônica –oso é um sufixo, pois aparece em várias formações com o

sentido “provido de X”, “que apresenta X em abundância” e com a função de formar

adjetivos, como em gorduroso, oleoso, charmoso, etc.

No vocábulo “rústico”, -ico é um sufixo, porque tal seqüência fônica é recorrente.

Não tem um sentido claro, mas forma adjetivos. Ex.: bíblico, mítico, fálico etc.

2.2.2.1 Formações sufixais com base livre

Para iniciarmos o estudo deste item, conceituaremos base livre (Rocha, 2003).

Base Livre é aquela que se apresenta como palavra da língua. Dessa forma, o sufixo

caracteriza-se como uma forma presa recorrente que se coloca à direita da base,

caracterizando-se assim, uma palavra derivada. O sufixo diferencia-se da base pelo fato de

não apresentar significação S/F independente. A explicação desta relação só será explicitada

se o sufixo estiver anexado a uma base. Portanto, faz sentido falarmos na S/F do produto e

não do sufixo isoladamente. Como exemplos, podemos verificar:

jogador a pessoa que joga

boiada um conjunto de bois

Quando queremos verificar se um lexema apresenta sufixo ou não, devemos

verificar se a terminação da palavra aparece em outras formações da língua com a mesma S/F.

Assim, quando apresentamos as seguintes seqüências fônicas (-eiro, -or, -agem),

verificamos a presença de sufixos. Vejamos os sufixos apresentados anteriormente e seus

respectivos exemplos:

-eiro: leiteiro, roqueiro, carpinteiro, marceneiro – sentido: agente.

-or: jogador (-dor), interruptor (-tor) – sentido: agente ou instrumento da ação.

-agem: folhagem, aprendizagem, ladroagem – sentido: noção coletiva, ato ou

estado.

26

O autor afirma que não existem critérios muito claros para se fazer a distinção

entre sufixo e base presa (como segundo elemento de composição). Em cefaléia, cefalalgia e

encefalite, -algia é considerado pela gramática tradicional como radical (base presa), ao passo

que -éia e -ite são considerados pela mesma como sufixos, apesar de os três elementos serem

equivalentes (dor ou inflamação).

2.2.2.2 Sufixos homófonos

Dois ou mais sufixos distintos que apresentam coincidência sob o ponto de vista

fonético são denominados de sufixos homônimos, por influência da expressão “vocábulos

homônimos”. São sufixos distintos, com duas ou mais entradas lexicais independentes, do

mesmo modo como se dá com os vocábulos homófonos. Estes sufixos, portanto, apresentam a

mesma seqüência fonética, mas sentidos e/ou funções diferentes, como -al1 e -al2, de laranjal

e de semanal.

Sufixos Sentido e/ou função Exemplos

-al

-al1 Plantação laranjal, bananal

-al2 Conjunto, reunião areal, pantanal

-al3 Formador de adjetivos semanal, braçal

-aria

-aria1 Estabelecimento comercial ou

industrial

Livraria, carpintaria

-aria2 Conjunto, reunião Gritaria, pedraria

2.2.2.3 Sufixos concorrentes

Os sufixos concorrentes caracterizam-se como distintos do ponto de vista fonético,

mas apresentando o mesmo sentido e/ou função. Para serem concorrentes, as bases e os

produtos precisam pertencer à mesma classe lexical.

Alguns exemplos de sufixos concorrentes serão apresentados.

27

Sufixos -ista e -eiro: formam substantivos agentivos a partir de substantivos.

Constituem exemplos: florista, frentista, padeiro, lixeiro, farofeiro etc.

Sufixos -dor e -nte:formam substantivos agentivos a partir de verbos: pescador,

namorador, franqueador, militante, estudante etc.

Sufixos -mento e -ção:formam substantivos abstratos a partir de verbos:

fingimento, padecimento, terceirização, mexicanização.

2.2.2.4 Sufixos categoriais e sufixos significativos

Sufixos categoriais são aqueles que mudam a categoria lexical do produto, com

relação à base. Como exemplos, podemos citar:

V - S-dor conquistar conquistador

V - S-mento julgar julgamento

Estes mesmos sufixos podem ser significativos e não-significativos.

Os sufixos categoriais são significativos se acrescentam ao sentido da base uma

informação acessória:

Conquistar Conquistador agente

Seqüestrar seqüestrável possibilidade

Os sufixos categoriais são não-significativos se não podemos apontar neles algum

componente semântico:

Teatro Teatral

Feliz Felicidade

Os sufixos não-categoriais são aqueles que mudam a categoria lexical do produto,

com relação à base. São exemplos de sufixos não-categoriais significativos:

S - S-eiro bicho/bicheiro agente

S - S-ada dente/dentada golpe

28

A - A-íssimo lindo/lindíssimo sufixo superlativo

2.2.2.5 Formações sufixais com base presa

Podemos afirmar, de um modo geral, que palavras novas da língua surgem a partir

de palavras já existentes. É o que podemos constatar nos novos itens lexicais que têm sido

criados em língua portuguesa.São exemplos: aidético, faficheiro, micreiro, seqüestrável etc.

No entanto, devemos observar que novas palavras surgem na língua a partir de bases presas.

Prefixos e Sufixos são formas presas, ou seja, só funcionam ligadas a outras. A fim de

compreendermos melhor o que se entende por base presa observaremos a seguinte relação

paradigmática:

Livro livraria livreiro

Pão padaria padeiro

Queijo queijaria queijeiro

Olaria oleiro

Serralheria serralheiro

Na segunda coluna podemos identificar um elemento recorrente (-aria), que

acrescenta à base significado de “estabelecimento comercial ou industrial relacionado a X.”

Na terceira coluna é possível identificarmos o sufixo –eiro, formador de agentivos. Nos dois

últimos exemplos, embora os sufixos sejam evidentes, as relações paradigmáticas existentes

no léxico do português remetem-nos a bases que não existem como palavras da língua. No

entanto, não podemos duvidar de sua existência. Ol- e Serralh- são consideradas bases presas.

Conforme exposto no livro Estruturas Morfológicas doPortuguês (Rocha, 2003),

uma base presa pode ser identificada se o afixo pode ser interpretado morfo-semanticamente

como afixo, caso em que, por exclusão, poderemos atribuir identidade morfo-semântica à

base.

2.2.3 Composição

Segundo Silva e Koch (1995), a composição pode ser considerada como um

processo de formação de palavras que dá origem a novos vocábulos pela combinação de

outros já existentes, implicando um novo significado. Através desse processo combinam-se

dois morfemas lexicais, operando-se entre eles uma fusão semântica, que pode ser mais ou

menos completa. Assim, em bar-restaurante, o significado de cada elemento permanece com

certa nitidez. Neste composto, estamos nos referindo ao bar que também é restaurante. Já em

29

guarda-chuva este significado praticamente desaparece para dar lugar a outro, ou seja, refere-

se a um único objeto, com significado específico.

A composição, conforme afirmam as autoras acima citadas, pode ocorrer de duas

formas: por justaposição ou por aglutinação.

Na justaposição, os vocábulos mantêm a sua autonomia fonética, ou seja, preserva

o acento e os fonemas que os integram, por exemplo: passatempo, girassol, amor perfeito,

Jesus Cristo. Na aglutinação, os vocábulos adquirem um único acento, também podendo

ocorrer a perda ou a alteração de algum de seus elementos fonéticos (acento tônico, vogais ou

consoantes), conforme podemos ver em planalto, pontiagudo, aguardente etc. A aglutinação

só é levada em conta do ponto de vista sincrônico se, através da análise mórfica, for possível a

depreensão de dois morfemas lexicais. Assim, não se pode falar em composição se o falante

nativo não percebe a existência desses dois lexemas. Isso acontece, por exemplo, em agrícola

(habitante do campo), aqueduto (condutor de água).

Margarida Basílio (1995), que também se dedica ao estudo da morfologia,

apresenta, a partir de um estudo sincrônico e baseado na teoria lexical, uma análise de

fenômenos possivelmente encontrados no léxico do português. Segundo a autora, a

composição caracteriza-se pela união de duas bases (livres ou presas), de acordo com a

necessidade de expressão de combinações particulares. Como o processo composicional não

envolve elementos fixos, não há como pré-estabelecer as funções desses elementos.

A partir da estrutura formada pela junção das bases, determinar-se-á a função

sintático-semântica. A união de dois elementos independentes em apenas um pode tanto

particularizar, quanto dar origem a uma nova interpretação, desvinculada do significado das

partes.

Em seu livro Morfologia Portuguesa, José Lemos Monteiro (1986) define como

composto o vocábulo formado pela união de dois ou mais semantemas. Os componentes

podem estar graficamente ligados (aguardente, passatempo), hifenizados (vira-lata, franco-

suíço) ou soltos (Porto Alegre, Mato Grosso). A partir daí, o autor coloca um problema

básico: distinguir a composição de uma locução.

Como explicação, Monteiro coloca que a composição não permite a permuta entre

seus elementos, como também não possibilita a intercalação de determinantes. Vejamos os

exemplos a seguir.

a) O Mato Grosso ainda crescerá muito.

b) O mato verde e grosso ainda crescerá muito.

30

Na primeira frase (a), não podemos intercalar nenhum elemento, pois se trata de

um elemento composto. Já na segunda frase (b), podemos intercalar, já que se trata de uma

relação de substantivo para adjetivo.

Monteiro (1986) apresenta outros critérios que caracterizam os compostos.

- Os compostos obedecem a uma ordem fixa de elementos, ou seja, não permitem

a troca de posição de seus componentes, visto que, invertendo a ordem dos mesmos, o

significado ficará alterado.

- Os compostos não permitem a supressão dos seus componentes, sem que ocorra

prejuízo no seu significado. Desta forma fica estranho dizermos: “Vou pegar o meu guarda,

pois está chovendo!”

- O composto caracteriza-se por ser um sintagma fixo. Este tipo de formação

transmite um conceito único, uma unidade semântica, tal como se verifica em guarda-chuva,

guarda-roupa, papai Noel, papai do céu (=Deus) ou pista do trem (=trilho). Desta forma,

diferencia-se do sintagma livre, que permite inversão, substituição ou omissão de qualquer

termo sem que fique desfigurado.

Ainda no que se refere à distinção entre locução e composição, Câmara Jr. (1970)

colocou como critério distintivo a possibilidade da locução permitir a supressão de um dos

seus termos, sem prejudicar o que se quer dizer. Na composição, o significado fica

prejudicado. Como exemplos podemos citar o que se segue.

a) * O Mato ainda crescerá muito.

b) O mato ainda crescerá muito.

Podemos citar ainda os exemplos de guarda-chuva e guarda-roupa. Nestes

compostos, não há possibilidade de reduzirmos a um só dos componentes. Se dissermos

somente o guarda, ou somente a chuva ou a roupa, o significado mudará totalmente.

Segundo Rocha (2003), a composição é considerada como um processo autônomo

de formação de palavras em português, diferente da derivação e da onomatopéia. Juntando

duas bases pré-existentes na língua, o falante pode criar um novo vocábulo, dito composto. A

seguir, alguns exemplos de composição:

trem-de-ferro

salário-família

cadeira de balanço

aguardente

café com leite

café da manhã

31

salada de frutas

cor de rosa

verde clarinho

leite condensado

arco-íris

cai-cai

roupa de colégio

Lee (1997) afirma que os compostos são formados pela concatenação de duas ou

mais palavras ou de dois ou mais radicais. O autor coloca, em seu estudo, itens que diferem os

compostos do Português Brasileiro (doravante PB) da palavra comum. Essas diferenças são

expostas a seguir.

- Os compostos podem carregar dois acentos. Já a palavra comum carrega só um.

- Os compostos admitem flexões entre constituintes (ou palavras), enquanto as

palavras comuns não podem, como em garotas propaganda.

- Os compostos, diferentemente dos vocábulos derivados, caracterizam-se somente

como categorias lexicais [+N]: N, A, Adv, *V, *P.

Os compostos apresentam as seguintes peculiaridades:

- Permitem a formação de diminutivo através do acréscimo de sufixo entre

constituintes: guardinha-noturno.

- Podem flexionar mais de uma vez, como podemos ver em homens-rãs.

Em sua análise dos compostos do Português do Brasil, Lee (1997) argumenta que

existem dois tipos de compostos no PB: Compostos Lexicais e Compostos Pós-Lexicais. Os

Compostos Lexicais são formados no léxico e são sintaticamente opacos, ou seja, se

comportam como uma unidade em relação a processos morfo-sintáticos, pois não permitem

flexão, derivação, nem concordância. Os compostos pós-lexicais são formados no

componente pós-lexical e, portanto, sintaticamente transparentes, permitindo flexão,

derivação e concordância.

32

2.3 A relação entre morfologia e fonologia

Nesse capítulo, resumiremos as principais idéias sobre a relação entre morfologia e

fonologia.

2.3.1 Constituintes Prosódicos

Iniciaremos este capítulo retomando um dos conceitos básicos da lingüística, o de

constituinte. Constituinte pode ser caracterizado como uma unidade lingüística complexa,

formada de dois ou mais membros, que estabelecem entre si uma relação

dominante/dominado. Embora cada constituinte pressuponha um cabeça e um ou mais

dominados, os constituintes fonológico e sintático ou morfológico apresentam suas próprias

regras e princípios.

A importância dos constituintes prosódicos pode ser explicada pelo fato de que sua

determinação como domínio de aplicação de regras parece resolver a falta de isomorfismo

entre as estruturas fonológicas por um lado e as estruturas morfológicas ou sintáticas por

outro (cf. Nespor & Vogel, 1986). Conforme afirmam os autores citados acima, as diferenças

básicas provêm do fato de que as regras que constroem a estrutura prosódica não são

recursivas, pois o sistema fonológico é finito. Já as regras sintáticas são recursivas, isto é, o

sistema sintático não é finito.

A proposição de constituintes prosódicos segue a seguinte hierarquia, orientada

pelo trabalho de Nespor & Vogel (1986):

Hierarquia Prosódica

enunciado U

frase entonacional I

frase fonológica φ

grupo clítico C

palavra fonológica ω

pé Σ

sílaba σ

33

Conforme Nespor & Vogel (1986), os princípios que regulam a hierarquia

prosódica são os seguintes:

i) cada unidade da hierarquia prosódica é composta de uma ou mais unidades da

categoria imediatamente mais baixa;

ii) cada unidade está exaustivamente contida na unidade imediatamente superior

de que faz parte;

iii) os constituintes são estruturas n-árias;

iv) a relação de proeminência relativa, que se estabelece entre nós irmãos, é tal que

a um só nó se atribui o valor forte (s) e a todos os demais o valor fraco (w).

Conforme colocam Nespor & Vogel (1986), os constituintes prosódicos estão

sujeitos à seguinte regra:

Xp é um constituinte e Xp-1 é imediatamente inferior na hierarquia.

Considerando que este trabalho está preocupado com a interface

morfologia/fonologia, interessa-nos, particularmente, o constituinte palavra fonológica e, por

conseguinte, o constituinte imediatamente por ela dominado, a sílaba. Vejamos, nas subseções

que seguem, como esses constituintes se definem.

2.3.2 Sílaba

A sílaba é considerada o menor de todos os constituintes da hierarquia prosódica.

O pé é o constituinte que a segue na hierarquia, constituído de uma ou mais sílabas. Como

todo constituinte prosódico, possui uma cabeça que, no PB, é uma vogal. O domínio da sílaba,

mesmo que intermediada pelo pé métrico é a palavra fonológica.

2.3.3 Teoria da sílaba

A noção de sílaba não é recente em fonologia, embora apenas recentemente ela

tenha sido incorporada à fonologia gerativa. Vejamos nos próximos subitens conceitos

básicos que envolvem a sílaba.

Há, basicamente, duas teorias que falam a respeito da estrutura interna da sílaba: a

teoria autossegmental e a teoria métrica da sílaba.

A teoria autossegmental, formulada em Kahn (1976), afirma a existência de

camadas independentes, uma das quais representa as sílabas, às quais estão ligadas

diretamente os segmentos.

34

Sílaba (σ)

p a r

A teoria métrica da sílaba defende que as mesmas são estruturadas como o

exemplo ilustra abaixo, conforme Selkirk (1982).

Sílaba (σ)

A R

Nu Co

As duas teorias apresentam posições diferentes no que se refere ao relacionamento

entre elementos no interior da sílaba. A primeira teoria prevê que o relacionamento entre os

três elementos é igual, ao passo que a segunda teoria prevê um relacionamento muito mais

estreito entre a vogal do núcleo e a consoante do ataque.

Vejamos no subitem a seguir as unidades de duração das sílabas.

2.3.4 Sílabas leves e pesadas

A distinção entre sílabas leves e pesadas estabelecida em muitas línguas, reflete na

atribuição do acento e/ou na atribuição de tom, em línguas tonais (BISOL, 2001).

O latim, por exemplo, recebe o acento sobre a penúltima sílaba, se esta for pesada,

e na antepenúltima, se a penúltima for leve. Nos exemplos abaixo, as sílabas pesadas estão

sublinhadas e (´) indica a posição do acento.

Pa.ra.bél.lum

Pe.pér.ci

In.te.ger

35

O peso silábico é fator decisivo para a constituição de uma sílaba. No entanto, nem

todas as sílabas que tem mais de um elemento caracterizam sílabas pesadas. Na palavra

lacrima, por exemplo, o acento cai na antepenúltima sílaba, mesmo que a penúltima sílaba,

cri, tenha três elementos. Já em pepérci a sílaba per, de três elementos, é pesada. Vejamos as

estruturas internas de ambas:

Sílaba Sílaba

A R A R

Nu Nu Co

C r i p e r

Como podemos analisar na estrutura da palavra lacrima, o ataque da sílaba é

ramificado. Já na estrutura da palavra pepérci, a rima é ramificada. Desta forma, concluímos

que o ataque é irrelevante para o peso silábico; apenas a rima contribui para o peso silábico.

2.3.5 Condições universais de silabação

Existem duas abordagens referentes às condições universais de silabação: a

abordagem de regras e a abordagem de condições. A primeira, utilizada por Harris (1983),

observa que a silabação de uma seqüência de segmentos é feita por meio de regras de criação

de estrutura silábica: regra de formação de núcleo, regra de formação do ataque e regra de

formação da coda. Estas regras são ordenadas entre si: primeiramente cria-se o núcleo, depois

o ataque e, por fim, a coda. A segunda abordagem, adotada por Hooper (1976) e Itô (1986),

considera a silabação um processo automático, que obedece a determinadas condições, não

ordenadas entre si. Estas condições podem ser as mesmas para todas as línguas (universais),

ou condições que prevêem diversas possibilidades, das quais cada língua faz escolhas

(paramétricas).

36

2.3.6 A seqüência de sonoridade

A escala de sonoridade exerce um papel importante na estrutura silábica, pois se

pode correlacionar a sonoridade relativa de um segmento com a posição que ele ocupa no

interior da sílaba. Duas considerações devem ser feitas, a respeito da seqüência de sonoridade:

- O elemento mais sonoro sempre ocupará o núcleo da sílaba; já os elementos

menos sonoros ocuparão as bordas (ataque e rima).

- Quando existem seqüências de elementos dentro do ataque ou da coda, estas

apresentam sonoridade crescente em direção ao núcleo.

Escala de sonoridade

Vogal > Líquida > Nasal > Obstruinte

3 2 1 0

Podemos discutir a seqüência acima através da seqüência nt, de sonoridade

decrescente. Esta seqüência nunca pode constituir o ataque de uma sílaba, mas pode constituir

a coda. Já a seqüência pr pode constituir o ataque de uma sílaba, mas não pode constituir a

coda.Considerando tais observações, apresentaremos a seguir a condição para a boa formação

das sílabas:

Condição de seqüência de sonoridade

Em qualquer sílaba, o elemento mais sonoro constitui o núcleo e é

precedido/seguido por elementos de grau de sonoridade crescente/decrescente.

2.3.7 A sílaba em português

O molde silábico determina a quantidade de segmentos permitidos numa sílaba em

determinada língua. Através de diferentes análises realizadas até então, não se estabeleceu o

número máximo de elementos para o português que uma sílaba possa conter.

Na língua portuguesa, encontramos os seguintes padrões silábicos:

V é

VC ar

VCC instante

CV cá

37

CVC lar

CVCC monstro

CCV tri

CCVC três

CCVCC transporte

VV aula

CVV lei

CCVV grau

CCVVC claustro

Segundo Câmara Jr (1969), a sílaba é formada de um aclive, de um ápice e de um

declive, podendo ser constituída de até seis segmentos:

ápice

aclive declive

No português brasileiro, o ápice constitui-se de uma vogal. O aclive é constituído

por uma ou duas consoantes. O declive pode ser formado pelas consoantes /S/, /r/, /l/ ou pela

semivogal /j, w/. Além destas, existe também a possibilidade de existir uma consoante nasal

no declive, porém as vogais nasais são interpretadas como sendo fonologicamente “vogal

fechada por consoante nasal”.

2.3.8 Os filtros

O molde silábico proposto por Lopez (1979) indica quais são as seqüências de

consoantes permitidas no ataque P (losiva) + L (íquida)> Os grupos /tl/, /dl/ e /vl/, apesar de

permitidos pelo molde, são restritos a nomes próprios de origem estrangeira.

Outro tipo de restrição existente na língua portuguesa é a ausência de /λ / e /η/ em

posição inicial de palavra, com exceção de alguns empréstimos, como lhama e nhoque.

2.3.9 Palavra fonológica

A palavra fonológica pode ser definida como a categoria que domina o pé. Trata-

se de um constituinte n-ário que só tem um elemento proeminente, o que lhe garante apenas

38

um acento primário, ou seja, a palavra prosódica não pode ter mais do que um acento

primário. No entanto, dentro do domínio da palavra fonológica, pode ocorrer reagrupamento

de sílabas e pés, sem compromisso de isomorfia com os constituintes morfológicos.

O domínio da palavra fonológica pode ser igual à palavra terminal de uma árvore

sintática, ou menor que ela. Segundo Nespor e Vogel (1986), como exemplo da primeira

hipótese, podemos citar o latim, uma vez que, nesta língua, um composto constitui uma só

palavra fonológica. Como exemplo da segunda hipótese, citamos o húngaro, em que o

prefixo, menor que a palavra morfológica, pode formar uma palavra independente. Isto revela

que nem sempre o isomorfismo entre palavra fonológica e morfológica existe, como também

exemplificam os compostos do português, os quais formam uma só palavra morfológica, mas

duas fonológicas. Exemplo: [[gwarda]ωωωω[rowpa]ωωωω].

No português brasileiro, existem afixos que constituem palavras fonológicas

independentes, pois apresentam acento primário atribuído. Como sufixos, podem ser citados -

inho, -zinho e -mente. Como prefixos, podemos citar pré- e pós-, prefixos a que Schwindt

(2000) chamou de composicionais, por funcionarem como palavras independentes. O fato de

tais afixos serem acentuados, confere-lhes o status de palavras fonológicas independentes,

ainda que tais afixos não possam constituir, isoladamente, palavras morfológicas.

2.4 Aquisição da linguagem

2.4.1 Definição de aquisição da linguagem

Adquirir uma língua significa apropriar-se de um sistema que é compartilhado

pelos falantes de uma dada comunidade lingüística. Esse processo é muito complexo, pois a

criança adquire vários subsistemas para poder comunicar-se. Os subsistemas podem ser

divididos em fonológico, morfológico, sintático e semântico.

Como este trabalho assumirá a concepção gerativista, partindo da idéia de

gramática universal (GU), assumiremos também sua modularidade e admitiremos que tais

módulos podem se comunicar via interface.

O enfoque deste trabalho será o subsistema morfológico e sua interface com o

fonológico, durante o processo de aquisição da língua por parte da criança.

39

2.4.2 A visão de Chomsky sobre a aquisição da linguagem

Chomsky afirma que a criança, durante o período de aquisição da linguagem, é

exposta a um conjunto de dados lingüísticos primários. Sua tarefa é, a partir deste período,

construir num sistema gramatical que acomode esses dados. O autor propõe, como constructo

teórico, um dispositivo de aquisição da linguagem (DAL), que é alimentado pelos dados

lingüísticos primários e que resulta numa gramática da língua da qual os dados foram

extraídos.

Partindo da idéia de Chomsky, de que o objetivo da criança é construir uma

gramática da linguagem, o autor esboça uma explicação da aquisição da competência

lingüística, ou seja, o crescimento do corpo de conhecimentos sobre a estrutura da linguagem

que está subjacente à capacidade do falante nativo de falar e compreender sua língua. Como

razão para que isto aconteça, enfatiza a importância central da criatividade lingüística, isto é, a

capacidade de o falante nativo produzir e compreender frases da língua que nunca ouviu

anteriormente. O falante é capaz de produzir frases novas que tem caráter gramatical e

distingue-as das que não tem esse caráter. Assim concluímos que o falante tem acesso a mais

do que um acúmulo de enunciados previamente ouvidos.

Chomsky define competência lingüística como o conhecimento que o indivíduo

tem sobre a estrutura de sua língua, que o orienta no uso dela. Já desempenho lingüístico

(performance), é definido como o uso da língua pelo falante nativo num contexto social

específico.

A competência lingüística é que possibilita que toda a criança adquira uma língua

quando pequena e que faz com que qualquer criança possa adquirir qualquer língua, bastando

para tanto que ela esteja exposta a uma dada língua.

Apesar da diversidade de experiências que a criança tem com a língua e com os

adultos que a cercam, todas adquirem a língua a que estão sendo expostas, sem nenhum

esforço aparente. O nossa concepção de aquisição da linguagem postulará que parte do

processo de aquisição seja inato, ou seja possuímos uma dotação genética que nos capacita a

adquirir uma língua e usá-la salvo sérias complicações patológicas.

A teoria desse estágio inicial da criança é a GU, uma previsão daquilo que é

comum a todas as possíveis línguas naturais (princípios), além da variação que pode ser

encontrada entre elas (parâmetros). A associação dos princípios da GU com certos valores

paramétricos gera um sistema gramatical particular, ou seja, uma dada língua.

40

O processo de aquisição da linguagem, então, é tido como a “formatação” da

faculdade da linguagem, através da fixação dos parâmetros previstos na GU. A GU é, nesse

sentido, um quadro de estágio inicial da aquisição (SO) e o seu produto seria o estágio final da

aquisição, isto é, o estágio em que a criança atinge a gramática adulta de sua língua (SS).

Como em termos lingüísticos é complicado falar em estágio final do conhecimento, admite-se

que seja o período em que a criança apresente uma gramática mais próxima à dos adultos ao

seu redor.

Teríamos, então:

Input — GU — uma língua

SO SS

O que ocorre, então, no processo de aquisição é uma filtragem do input através da

GU. Essa “filtragem” serve para “formatá-la” através da marcação de um determinado valor

para cada parâmetro nela previsto. Estando todos os valores paramétricos marcados, tem-se

uma determinada gramática.

Retomando o que foi exposto até aqui, podemos dizer que, segundo Chomsky, o

processo de aquisição da linguagem é inato, guiado pela Faculdade da linguagem, que possui

uma GU (do inglês Universal Grammar-UG), composta de princípios e parâmetros. Como os

princípios se aplicam a todas as línguas naturais, não teriam de ser adquiridos. Os parâmetros,

ainda que em número reduzido, estão igualmente previstos pela GU, porém têm seus valores

abertos a serem marcados de acordo com a língua (ou as línguas) que a criança ouve ao seu

redor. Uma vez filtrados os dados do input e marcados os valores adequados dos parâmetros,

supõe-se que a criança tenha adquirido o sistema gramatical (estável) de sua língua.

2.4.3 Os primeiros estágios da linguagem

B. Barret (1989) estabeleceu estágios durante o período inicial de aquisição da

linguagem. O primeiro estágio apresenta variações entre as crianças, em relação ao momento

que as mesmas o atingem. Estende-se até a época em que a criança apresenta um vocabulário

de até 10 palavras. Nelson (1973) considera esse período entre 13 e 19 meses, com uma média

41

nos 15 meses. As palavras (vocábulos), neste período, possuem uma forte relação com o

contexto e relacionam-se somente a uma pessoa ou objeto específico. As palavras coexistem

com a ação que a criança está praticando e ocorrem paralelamente ao que a criança está

realizando, muito mais do que uma ação independente.

Após este período inicial, a aquisição das palavras é, normalmente, mais rápida.

Esse período seguinte (segundo estágio) é conhecido como explosão do vocabulário (Bates et

al; 1988), sendo caracterizado por uma mudança do padrão de uma a três palavras por mês

para vinte e cinco por mês. As palavras, neste período, tornam-se descontextualizadas e

podem ser generalizadas para diversas situações.

Conforme o vocabulário da criança vai aumentando, as intenções de uso também

vão se modificando. Assim como as intenções primitivas da criança estão relacionadas aos

estágios internos (reações aos objetos) ou direcionadas ao comportamento dos outros

(requisitando objetos, direcionando a atenção), à medida que o vocabulário aumenta, o mesmo

ocorre com as funções às quais ele se aplica. A criança aprende a responder perguntas e a

comentar a cerca do que ela ouve a sua volta. Da mesma forma, é permitido que ela tome

parte em conversas mais extensas.

Segundo Nelson (1973), por volta dos 19 meses as crianças normalmente já

adquiriram um vocabulário de 50 palavras e, dentro de dois meses, normalmente, a maioria já

terá começado a combinar palavras. Tal processo pode ocorrer de duas formas: formas

articuladas, com uma palavra constante, como por exemplo, “todo mundo” ou “mais”, as

quais outras palavras são adicionadas, e formas categóricas, nas quais as palavras são

combinadas, mas sem uma ordem específica.

O próximo período (terceiro estágio) é conhecido como explosão da gramática,

que a criança atinge por volta dos vinte e quatro meses e já adquiriu, na maioria das vezes

uma extensão de habilidades lingüísticas. Nesta fase, segundo Bates et al. (1988), a criança

combina regularmente as palavras e começa a fazer experiências com a forma da língua.

Grande parte dos termos expressivos e compreensivos da língua são adquiridos nesta fase.

No estágio seguinte (quarto estágio), que vai dos dois aos quatro anos, as crianças

adquirem grande parte das formas da linguagem dos adultos. Ao fazê-lo, elas seguem um

padrão de aquisição razoavelmente regular. O vocabulário, nesta fase, aumenta para milhares

de palavras e a criança usa a linguagem para vários fins comunicativos. A criança, a partir de

então, continua a assimilar as regras sintáticas, embora o seu sistema necessite de uma série

de ajustes para aproximar-se do modelo dos adultos.

42

Embora a maioria das regras gramaticais seja assimilada por volta dos cinco anos,

as crianças continuam a desenvolver diferentes construções nos anos escolares. Aliado a este

processo, o “uso” da linguagem desenvolve-se com a capacidade infantil em engajar se em

discursos mais sofisticados com as outras pessoas a sua volta.

2.4.4 Aquisição morfológica

As primeiras sentenças das crianças consistem primeiramente de palavras que

pertencem ao vocabulário adulto como categorias lexicais (nome, verbo e adjetivo). Devido a

este fato, a maior parte dos estudos das primeiras combinações de palavras tem se

concentrado na emergência dessas primeiras palavras lexicais, principalmente enfatizando

seus significados.

Os autores que serão citados a seguir foram marcantes nos achados de aquisição

morfológica na língua inglesa. As pesquisas realizadas dizem respeito à faixa etária que vai

dos 2 aos 6 anos de idade.

Berko (1958) realizou um estudo marcante na era moderna dos estudos de

aquisição. O autor selecionou uma variedade de morfemas gramaticais para o seu estudo

experimental, como a marca de plural (-s), o possessivo, a marca do presente, a marca do

passado (-ed), o progressivo (-ing), e o agente (-er). Como resultados, observou-se que as

crianças adquirem o morfema de plural [s] e [z], mas não suas variantes. Estas últimas são

adquiridas mais tardiamente pelas crianças. O morfema progressivo mostrou ser um dos mais

facilmente adquiridos.

Brown & Fraser (1963) realizaram um estudo que envolveu seis crianças entre 2 e

3 anos de idade, as quais deveriam imitar um conjunto de 13 sentenças. O objetivo era

verificar se as crianças iriam produzir as sentenças através da imitação, ou do seu próprio

sistema gramatical. Os autores perceberam que as crianças imitaram as sentenças de um modo

sistemático. Especificamente, observaram que as crianças revelaram uma certa tendência a

reter as palavras lexicais, mas deletar as gramaticais. Em segundo lugar, perceberam que a

imitação tende a preservar a ordem das palavras dos modelos originais. Por último,

observaram que as sentenças (imitadas) produzidas pelas crianças eram similares às

produzidas espontaneamente.

43

Cazden (1968) realizou estudos com três crianças, Adam, Eve e Sarah, enfatizando

o seguinte aspecto: o desenvolvimento de morfemas gramaticais, especialmente os flexionais.

Como um dos achados mais importantes do autor, podemos citar:

- O uso de formas irregulares pelas crianças antecedeu o uso de

supergeneralizações. Eve, por exemplo, usou came 11 vezes entre 20 e 22 meses, e depois

usou comed, entre 25 e 27 meses.

O autor observou a existência de três períodos na aquisição de formas irregulares:

- A criança adquire partes das palavras semanticamente relacionadas como

entradas lexicais distintas, por exemplo, came, come e go, goes;

- A criança adquire uma regra geral, ajusta as entradas lexicais para pares regulares

e retêm os irregulares, marcando estes últimos como exceções, por exemplo, come [-regular

past], came [+past]. A supergeneralização pode ocorrer durante o período de reestruturação

lexical;

- A criança adquire as entradas lexicais dos adultos, que pode demorar vários

meses para se completar.

Segundo Aimard (1986), o período de aquisição morfológica pode ser

caracterizado como o período entre dois e três anos, em que a criança tem como atividade

essencial assinalar certas regularidades nas formas que ela ouve. A partir disto, a criança faz

coincidir as modificações de superfície e as relações experimentadas; ela pode também

generalizá-las em outros casos parecidos (por analogia). Obtém-se como resultado uma

intensa atividade de generalização que atinge formas que por vezes existem na linguagem.

Essa imensa atividade produz também um grande número de erros ou faltas morfológicas por

excesso de generalização das regras. Segundo o autor, isso que é produzido caracteriza-se pela

existência de boas faltas e más faltas. As primeiras testemunham uma atividade lingüística

produtiva, ao passo que as segundas resultam de uma combinação de azar ou denunciam uma

simples repetição de uma fórmula congelada.

As boas faltas são originadas de falsas hipóteses ou da aplicação abusiva das

hipóteses. A partir do momento em que assinala regularidades e, posteriormente, tenta

generalizá-las, a criança passa por várias etapas:

- Primeiro – a criança emite uma hipótese de funcionamento;

- Segundo – seu ensaio atualiza a hipótese;

- Terceiro – a atualização da hipótese pode ter dois resultados: atingir uma forma

exata que corresponde a uma forma da linguagem; ou produzir uma forma errônea, mesmo a

44

criança tendo ou não consciência da mesma. A criança, então, vai corrigindo o seu erro, seja

porque o adulto lhe fornece o modelo correto, seja através da continuação de suas tentativas

que, através da observação de outros dados, lhe permitirão estabelecer uma estratégia eficaz.

No estudo realizado por Figueira (1999), a autora focaliza a aquisição de uma

classe de verbos do português, que expressa ações reversas (reversals). A autora coloca que,

mesmo antes dos dois anos de idade, podemos nos deparar com uma considerável quantidade

de material que envolve a expressão de ações reversas. Podemos imaginar quantas vezes, num

só dia, num diálogo ou interação verbal, uma criança é levada a solicitar uma alteração de

estado sobre um objeto que ela porta ou que está no centro de sua atenção. Pode ser uma caixa

que ela quer abrir ou fechar, um balão que quer encher ou esvaziar etc.

As primeiras ocorrências indicando reversos são percebidas muito cedo na fala da

criança. Entretanto, para quem tem como objetivo saber quando a criança passa a dominar os

padrões morfológicos e lexicais aí envolvidos, as primeiras ocorrências devem ser vistas num

quadro mais amplo.

No estudo analisado pela autora, envolvendo dois sujeitos, a observação inicia

quando já se percebe na fala da criança uma certa independência das formas, em relação à fala

do adulto. Em relação ao primeiro sujeito chega a haver entre 2:8 e 3:8, um uso indiferenciado

para ações reversas. Ex.: liga a televisão por desliga a televisão. O que se percebe aqui é uma

forma única cumprindo duas funções, independente se essa relação é morfologicamente

marcada ou não. O uso da marca gramatical corretamente surge a partir da própria experiência

da criança com a linguagem. No primeiro sujeito, os novos verbos prefixados por des- surgem

em torno de 3;11 a 4;10 e, no caso do segundo sujeito, por volta de 3;10 a 5;1. Conforme a

autora, neste período, registramos os criativos desmagrecer (por emagrecer), desabrir (por

fechar), deslimpar (por limpar). Nos dois corpus, registrou-se a ocorrência da reversão

através do prefixo por volta dos 3;10.

No que se refere à produtividade que afeta verbos, observou-se que elas ocorrem

até que certas bases sejam reconhecidas como providas, por si mesmas, da capacidade de

expressar o mesmo significado que o morfema expressa de maneira independente. Isso

envolve o estabelecimento de relações semânticas, e o que é mais importante, o

reconhecimento da coexistência de mecanismos gramaticais diferentes para a expressão da

mesma idéia ou significado.

45

2.4.5 Desenvolvimento lexical e formação de palavras

As palavras constituem o meio lingüístico principal para transmissão de

significado. Elas são indispensáveis e, sem elas, não conseguimos, exemplificar padrões

sintáticos, morfológicos ou sonoros de uma língua.

Desta forma, a aprendizagem das palavras é uma parte crucial da aprendizagem da

linguagem e, está diretamente ligada à aquisição da sintaxe, da morfologia e da fonologia.

Aos 2 anos de idade, as crianças podem produzir algo entre 50 a 500 ou 600

palavras. Elas vão acrescentando novas palavras a este estoque em uma velocidade calculada

em torno de 10 palavras por dia, chegando a um vocabulário de cerca de 1400 palavras por

volta dos seis anos de idade. A partir daí, as crianças aprendem, em média, 3000 novas

palavras por ano até os 17 anos de idade.

Abordaremos nas subseções seguintes, de um modo geral, o desenvolvimento

lexical das crianças a partir dos 2 anos de idade, após terem ocorrido os passos iniciais da

aprendizagem das palavras. Na subseção 2.5.6 veremos alguns princípios que guiam a

aquisição pelas crianças, à medida que relacionamos significados a formas, considerando a

velocidade com que atribuem algum significado a uma palavra desconhecida. Na subseção

2.5.7, veremos a formação de palavras pelas crianças, sua análise das palavras em partes

(radicais e afixos) e sua criação de novas palavras para objetos, ações e propriedades.

2.4.6 Convencionalidade e contraste

Segundo Clark (1993), as crianças ao aprenderem uma língua, devem seguir as

seguintes etapas.

Etapa 1 – isolam palavras para poderem em outras situações de comunicação

identificá-las. Além disso, começam a analisar as partes de palavras identificando, os radicais,

as flexões e, por fim, outros afixos.

Etapa 2 – devem identificar os significados potenciais das palavras.

Etapa 3 – relacionam possíveis significados às formas que identificaram. Os

mapeamentos iniciais podem apresentar uma sobreposição com o mapeamento adulto,

exigindo um ajuste considerável. Estes ajustes, resultam nos padrões do uso inicial das

46

palavras, com super e subextensões, sobreposições parciais e, até mesmo, em certas ocasiões

desencontros totais.

As crianças, ao ligarem significados a formas, seguem dois princípios pragmáticos

fundamentais: a convencionalidade e o contraste.

A convencionalidade oferece um atalho na forma de consistência em relação ao

tempo: “para certos significados, há uma forma que os falantes esperam que seja usada na

língua da comunidade”. É através da convencionalidade que os destinatários sabem o que um

falante quer dizer em determinada situação. Já no contraste, os falantes utilizam todas as

diferenças para marcar uma diferença no significado, ou seja, se os falantes utilizam uma

forma diferente da que se poderia esperar, eles podem querer dizer algo diferente.

Estes dois princípios colocam certas limitações nos usos do léxico pelos falantes.

Assim, as palavras estabelecidas, as que possuem um significado convencional, têm

prioridade. As palavras convencionais, portanto, têm preferência em relação a outras formas

com o mesmo significado que podem ter sido utilizadas em seu lugar, mas que não

convencionais para o significado pretendido. Se duas expressões tiverem exatamente o

mesmo significado, os falantes sempre darão preferência a convencional, em relação a

qualquer outra inovação.

As crianças, por iniciarem a aquisição com um léxico mais limitado que dos

adultos, nem sempre aplicam a convencionalidade e o contraste com os mesmos efeitos que os

falantes adultos (Clark, 1990, 1993). As crianças iniciam tomando como seus alvos as

palavras convencionais que elas ouvem no input em tono dela. À medida que elas passam a

falar cada vez mais sobre o que acontece ao seu redor, passam a ter uma maior probabilidade

de encontrar lacunas em que não possuem as palavras convencionais para o que elas desejam

falar. Podem, então, expandir os recursos disponíveis e estender uma palavra que já

conhecem, ou podem cunhar uma nova palavra, a fim de que aquela ocasião transporte o

significado necessário.

47

2.4.7 Acréscimo de palavras ao vocabulário inicial e preenchimento de lacunas semânticas

Pelo fato das crianças possuírem um vocabulário bem menor que o dos adultos que

os cercam, muitas vezes, diante de lacunas semânticas, elas tentam encontrar algum meio de

preenchê-las.

O primeiro recurso dá-se através do uso de opções lexicais conhecidas. Podemos

ver então o uso de dêiticos (isto, aquilo) para tratar de termos não-rotulados. Também podem

fazer uso de um substantivo de propósito geral como coisa. Quando lhes faltam palavras, em

determinadas situações, podem utilizar verbos de propósito geral como fazer, ir ou colocar.

A partir dos 2 anos de idade somente, é que as crianças formam substantivos

novos quando surge a necessidade do seu uso. As primeiras formações, numa língua como o

inglês, são normalmente compostos de um radical, formados de 2 substantivos, como em

crow-bird (pássaro-corvo) ou táxi-car (carro-táxi). Muitos destes substantivos compostos

identificam substantivos de um tipo já conhecido e rotulado pela criança. Após os 2 anos de

idade, as crianças também começam a usar alguns sufixos derivacionais ao construírem novos

substantivos. O primeiro sufixo nominal utilizado em inglês é normalmente o -er agentivo,

como em hanger (para alguém que pendura quadros). Aos 4 anos, as crianças já criam novos

substantivos agentivos com -er quando se pergunta a elas como elas chamariam alguém que x,

onde x é o termo referente a alguma atividade. Já o uso do sufixo -er para substantivos

instrumentais tende a surgir um pouco mais tarde.

As crianças também cunham novos verbos para falar de ações. Em inglês, elas

utilizam a derivação zero para isto, e transformam, espontaneamente, substantivos em verbos

a partir dos dois anos de idade. Esta maneira de formar novos verbos é particularmente

produtiva em inglês, sendo adquirida muito cedo. O substantivo escolhido designa um dos

participantes do evento, quase sempre o objeto afetado, como em to hair (para escovar o

cabelo), ou o instrumento utilizado, como em to broom, para bater com uma vassoura.

Por último, as crianças também formam novos adjetivos para falar sobre

qualidades e estados. A primeira opção utilizada por elas é o sufixo -y para derivar um

adjetivo de um substantivo ou de um verbo como em growly (que provavelmente vai rugir).

Aproximadamente a partir dos 4 anos de idade, elas também começam a utilizar sufixos como

-al, -ful e -able. No entanto, os novos adjetivos são menos comuns entre as cunhagens das

crianças que os novos substantivos e verbos.

A seguir refletiremos sobre as seguintes questões: como as crianças escolhem que

formas de palavras usar na construção de novas palavras? Por que elas adquirem alguns afixos

48

e padrões de composição antes de outros? À medida que as crianças analisam a estrutura

interna de palavras convencionais, elas aprendem a identificar os radicais e os afixos,

prestando a atenção à forma como estes são combinados. Às vezes, elas tecem comentários

espontâneos sobre suas análises das partes das palavras, com apenas 2 anos de idade. Seus

comentários revelam que a transparência do significado é um aspecto importante em suas

análises.

As crianças também dependem da simplicidade da forma em suas cunhagens, ou

seja, é fácil para ela discernir um radical em uma forma complexa de palavra se seu formato

não sofrer alteração pela afixação ou por qualquer radical adjacente. Na formação de novas

palavras as crianças observam a transparência e a simplicidade. Elas constroem com

elementos já conhecidos (radicais e afixos), quando criam palavras. No processo de formação

de palavras, as crianças também fazem o mínimo de alteração em quaisquer radicais que

estejam sendo utilizados. Elas também são sensíveis à produtividade relativa de cada opção na

linguagem adulta que as cerca. Os primeiros afixos que produzem são os mais produtivos

disponíveis para a expressão do significado pertinente. Por exemplo, as crianças falantes do

inglês, produzem o sufixo agentivo -er em substantivos agentivos novos muito antes dos

sufixos agentivos -ist ou -ness, e elas produzem compostos de radicais formados de 2

substantivos antes de passarem a quaisquer compostos em que os radicais nominais ou verbais

constituintes sejam combinados com afixos. Em sema, quando as crianças cunham novas

palavras, elas prestam atenção não somente a convencionalidade, mas também à

transparência, simplicidade e produtividade. O processo de formação de palavras tanto das

crianças quanto dos adultos depende do que se encontra disponível e do que é produtivo em

cada língua. Por exemplo, a composição não é produtiva em hebraico, e as acrianças

raramente produzem novos compostos antes dos eis ou sete anos de idade. Isto contrasta com

a língua portuguesa, por exemplo, em que a composição é produtiva. Nela, a criança começa a

explorar esta opção, de modo consistente, aproximadamente aos 2 anos de idade.A tipologia

de cada língua e a natureza do input que as crianças são expostas, então, interagem com a

transparência, simplicidade e produtividade, produzindo determinados padrões evolutivos nos

tipos de cunhagem das crianças em diferentes idades.

49

3 METODOLOGIA

Os dados utilizados na presente pesquisa provêm dos seguintes bancos:

AQUIFONO, que pertence ao CEAAL (PUCRS e UCPel), DELICRI (UFRGS), Dicionário

Aurélio Eletrônico (versão 3.0) e VARSUL (UFRGS, PUCRS, UFSC,UFPR).

3.1 A coleta de dados nos bancos de fala infantil

Os dados da fala infantil foram colhidos no banco de dados do CEAAL e

DELICRI. Esses dados referem-se a amostras de fala de sessenta crianças (30 meninos e 30

meninas) com idades entre 2:0 e 7:0, divididas em intervalos de dois meses, todas falantes

monolíngües do português brasileiro, residentes nas cidades de Pelotas e Porto Alegre/RS, e

cujo desenvolvimento fonológico é considerado normal.

Os dados que fazem parte do CEAAL foram coletados com o auxílio do

instrumento proposto por YAVAS, HERNANDORENA & LAMPRECHT (1991) e gravados

em fita cassete. O instrumento é composto por cinco figuras temáticas contendo 125 palavras,

em sua totalidade, familiares à criança, que durante a entrevista, deveria nomeá-las

espontaneamente através de uma “situação” provocada pelo (a) entrevistador (a).

Já os dados do DELICRI foram coletados através de uma situação mais informal

(brincadeiras, desenhos, diálogos) entre o entrevistador (a) e a criança.

3.1.1 Etapas da coleta de dados no CEAAL e DELICRI

A coleta dos dados das crianças foi realizada em quatro etapas.

Etapa 1: audição das fitas e transcrição dos dados ouvidos.

Nesta etapa a pesquisadora ouviu e transcreveu os itens pesquisados, separando os

processos de formações de palavras estudados: prefixos, sufixos e compostos.

Etapa 2: organização dos dados

Depois da transcrição, foram identificadas as ocorrências de prefixos, sufixos e

compostos e posteriormente colocadas em colunas específicas.

Etapa 3: tabulação dos dados

Após a organização dos dados, estes foram registrados em tabelas, separados pela

tipologia e, ao lado, foram registrados os índices de ocorrência.

50

Etapa 4: análise dos dados

Os dados foram analisados de acordo com os objetivos e hipóteses da pesquisa.

3.2. Coleta de dados dos adultos

A fim de comparar os dados da fala das crianças com a linguagem adulta, a

pesquisa estendeu-se a dois outros corpora: o Dicionário Aurélio Eletrônico, versão 3.0 e o

Banco VARSUL e ficou restrita à prefixação e à sufixação.

3.2.1 A busca no vocabulário dicionarizado do PB

O uso do dicionário Aurélio Eletrônico funcionou como meio para testar a

dicionarização das formações: prefixação e sufixação. Após a identificação dos afixos, os

mesmos foram pesquisados no dicionário, não só para verificar a dicionarização, mas para ver

se os afixos mais usados na fala infantil coincidem com os incidentes no dicionário, já que

representam o léxico de uma língua. Assim, o presente trabalho visa a descrever a aquisição

de morfemas derivacionais e compostos do PB, além de comparar a fala infantil com a adulta.

3.2.2 A busca no VARSUL

Apesar da busca no dicionário ser bem utilizada hoje em dia, traz o inconveniente

de que há somente o registro da “incidência” de determinados fenômenos na língua, sem

considerar a sua freqüência. Portanto, é possível que fenômenos não muito incidentes no

dicionário sejam, na fala, freqüentes; por exemplo, nem todos os vocábulos sufixados com

–inho estão dicionarizados, logo -inho é pouco incidente, porém muito freqüente na fala. A

pesquisa nesta fonte teve como objetivo, para compensar este problema, mostrar se o uso que

as crianças fazem dos processos de formação se aproximam (ou não) da fala adulta

estabilizada, ou seja, a freqüência dos prefixos e sufixos mais usados na fala infantil

coincidem com os mais usados na fala adulta? Foram selecionados três informantes do sexo

feminino e 3 informantes do sexo masculino, a fim de identificar as ocorrências

As seções seguintes destinam-se à apresentação e discussão dos resultados

numéricos obtidos através da análise realizada nos bancos de dados do CEAAL e DELICRI.

Além disso, será apresentada a comparação com os índices de ocorrência dos processos de

51

formação com a fala adulta. Primeiramente será feita a apresentação da freqüência geral de

aplicação dos processos.

52

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

As seções seguintes destinam-se à apresentação e discussão dos dados levantados a

partir dos bancos CEAAL e DELICRI. Os dados serão expostos em tabelas e gráficos e

posteriormente comentados com base nos pressupostos teóricos deste trabalho. Além disso,

será apresentada a comparação com os índices de ocorrência dos processos de formação na

fala adulta, a partir de levantamento realizado nos dados do Dicionário Aurélio Eletrônico e

do Projeto VARSUL.

Primeiramente, na seção 4.1, tentando discutir nossa primeira hipótese, será feita a

apresentação da freqüência geral de aplicação dos processos estudados: prefixação, sufixação

e composição, com os respectivos exemplos de cada categoria. Nas seções 4.2 a 4.4,

apreciaremos os resultados quantitativos, respectivamente, para prefixação, sufixação e

composição, os quais serão discutidos de acordo com nossas três hipóteses seguintes, a saber,

a tipologia encontrada, a relação com a palavra prosódica e a produtividade morfológica.

Encerrando a seção de apresentação dos resultados, apreciaremos, nas seções 4.5 e 4.6, os

resultados referentes à comparação entre fala infantil, já analisada, e linguagem adulta, através

de levantamento realizado no Dicionário Aurélio Eletrônico e através da análise dos dados do

VARSUL, o que dá conta de nossa última hipótese.

4.1. Freqüência geral dos processos de formação de palavras na fala infantil

Na presente seção, serão apresentados dados gerais encontrados em nossa pesquisa

de acordo com os processos de formação de palavras selecionados para a análise: prefixação,

sufixação e composição, nesta ordem.

Apreciaremos, num primeiro momento, o quadro geral, que apresenta as

freqüências dos processos de formação de palavras na fala infantil.

53

Tabela 1: Produção de prefixos, sufixos e compostos de acordo com a faixa etária.

Gráfico 1: Processos de formação de palavras encontrados na fala infantil (2:0 a 7:0).

0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Número de Ocorrências

2 - 3a 3 - 4a 4 - 5a 5 - 6a 6 - 7a

Faixas Etárias

Gráfico com os três tipos de processos estudados

Prefixos

Sufixos

Compostos

Os dados da Tabela 1 e do Gráfico 1 permitem observar que os processos

estudados têm uso moderado pelas crianças, totalizando apenas 788 dados em

aproximadamente 20 horas de gravação. Entre os processos estudados, as crianças utilizam-se

preferencialmente da sufixação, seguida pela composição e pela prefixação.

FAIXA

ETÁRIA

PREFIXOS SUFIXOS COMPOSTOS TOTAIS

2 – 3 anos 3 120 18 141

3 – 4 anos 4 177 27 208

4 – 5 anos 1 137 32 170

5 – 6 anos 1 125 34 160

6 – 7 anos 0 70 39 109

TOTAIS 9 629 150 788

54

A análise dos dados permite confirmar parcialmente nossa primeira hipótese, já

que há um aumento de processos na passagem da primeira para a segunda faixa etária, mas o

mesmo não pode ser afirmado em relação às demais faixas etárias, considerando que os

números são bastante variáveis.

Nas seções subseqüentes, será avaliado em pormenor cada tipo de formação.

4.2 Prefixação

Conforme vimos no item 2.2.1, a prefixação é um processo de criação lexical que

consiste na formação de uma nova palavra através do acréscimo de um prefixo a uma base já

existente (Rocha, 2003). Veremos na Tabela 2 os prefixos registrados na fala infantil e,

também, a ocorrência encontrada nas diferentes faixas etárias analisadas.

Tabela 2: Prefixos encontrados na fala infantil nas diferentes faixas etárias.

FAIXA ETÁRIA OCORRÊNCIAS VOCÁBULOS ENCONTRADOS

2 a 3 anos 3 Desligar

3 a 4 anos 4 Remexer

4 a 5 anos 1 Desligar

5 a 6 anos 1 Desligar

6 a 7 anos 0 -

Gráfico 2: Número de ocorrências de prefixos por faixa etária.

55

Através da análise da Tabela 2, podemos observar que os prefixos já podem ser

registrados na fala infantil a partir dos dois anos. Observamos também, que em relação à

primeira hipótese, como já havíamos dito na seção 4.1, os prefixos aumentam na passagem da

primeira para a segunda faixa etária. O mesmo aumento não pode ser observado nas demais

faixas etárias.

Os únicos prefixos encontrados na fala das crianças entre 2:0 e 7:0 anos de idade

foram des- e re-.

Na faixa etária de 2 a 3 anos, somente foi registrado o prefixo des-, totalizando

três ocorrências. Nestas ocorrências, o prefixo ligou-se a uma base verbal, com o significado

de "retorno a uma situação anterior" (desligar). Na faixa etária de 3 a 4 anos, registramos um

total de quatro ocorrências somente do prefixo re-, no vocábulo remexer. Na faixa etária de 4

a 6 anos, registramos, assim como na faixa etária dos 2 a 3 anos, somente o prefixo des-. Em

cada uma destas, houve apenas uma ocorrência, no vocábulo desligar. Na faixa etária de 6 a 7

anos, não foram registrados vocábulos prefixados.

Vejamos, a seguir, a tipologia dos prefixos encontrados, sua caracterização, sua

ocorrência e a produtividade dos mesmos na fala infantil.

4.2.1 Prefixo des-

O prefixo des- pode apresentar os seguintes significados: separação, afastamento,

privação ou negação. Cabe salientar que o prefixo des- aplica-se a bases verbais que

expressam atos de encobrir, atar superfícies, como em descobrir, destampar, desenlaçar,

assim como pode ser usado para negar simplesmente o significado da base verbal a que se

junta. Exemplos: “O governo descumpre a constituição” e “A criança desobedeceu aos

pais”.

Nos dados da fala infantil, o afixo des- aparece no verbo desligar, portanto,

observamos que se junta a uma base verbal, com o objetivo de expressar uma ação que afeta

um objeto, significando, a partir disto, “mudança apara condição anterior”. Exemplo:

“Desligar a tevê!”. Na faixa etária de 2 a 3 anos podemos constatar apenas 3 ocorrências. Na

faixa etária dos 4 aos 6 anos, registramos apenas este prefixo, com 1 ocorrência em cada faixa

etária. Nas três faixas etárias em que se percebeu a ocorrência do prefixo des-, este só foi

registrado no verbo desligar.

Segundo Sandmann (1989), o prefixo des- caracteriza-se por ser muito produtivo.

De acordo com o autor, este prefixo se alinha entre aqueles que têm uma significação

56

negativa. Diante dos adjetivos, geralmente significa negação da base a qual se une. Diante de

verbos e substantivos, significa “afastamento, separação ou volta a uma situação.” Vimos,

portanto, que o uso do prefixo na fala infantil, corrobora a sua alta produtividade na língua.

4.2.2 Prefixo re-

O prefixo re- geralmente une-se a uma base indicando repetição, ainda que possa

ter outros significados como reforço e retrogradação.

Nos dados da fala infantil, re- foi o segundo prefixo mais encontrado, com 4

ocorrências, na faixa entre 3 a 4 anos, significando “de novo”, em remexer. Nas demais faixas

etárias não percebemos a ocorrência do prefixo re-. Assim, nossa primeira hipótese não foi

confirmada, visto que não há acréscimo do uso deste prefixo, tampouco sua presença nas

demais faixas etárias.

Segundo Sandmann (1989), este prefixo é produtivo. O autor acrescenta que o

prefixo re-, em formações novas, pode significar “de outra maneira”, como em releitura=

uma segunda leitura + nova maneira de ler, nova interpretação. Desta forma, os dados da

fala infantil corroboram a literatura sobre o PB, no que se refere à produtividade do prefixo.

No que se refere à prefixação, podemos tirar algumas conclusões com base nos

dados da fala infantil coletados para este estudo, como segue.

- Quanto à ordem de aquisição dos prefixos, as crianças adquirem primeiro os

prefixos legítimos, os quais não podem existir isoladamente, ou seja, afixam-se à esquerda de

uma base, como sílabas átonas. Ainda sobre a ordem de aquisição, podemos dizer que é

crescente, em termos de uso, apenas na passagem da faixa etária de 2:0 a 4:0. Nas demais

faixas etárias, não foi registrado acréscimo no que se refere ao seu uso.

- Quanto ao seu status prosódico, os prefixos registrados, des- e re-, não

apresentam comportamentos de palavras fonológicas independentes nos vocábulos analisados.

Desta forma, observamos que, na fala infantil, os primeiros prefixos a aparecer são os prefixos

legítimos (cf. Schwindt, 2000,2001), que não constituem palavras fonológicas independentes.

- Quanto à produtividade, os prefixos adquiridos na faixa etária de 2:0 a 7:0

caracterizam-se por serem produtivos na língua portuguesa.

57

4.3 Sufixação

Analisaremos, agora, a derivação sufixal. A tabela a seguir ilustrará os sufixos

registrados na fala infantil, por faixa etária, e os exemplos de acordo com a tipologia.

Tabela 3: Produção de derivações sufixais por faixa etária.

FAIXA ETÁRIA SUFIXOS PERCENTAGEM OCORRÊNCIA EXEMPLOS

2 – 3 anos

3 – 4 anos

4 – 5 anos

5 – 6 anos

6 – 7 anos

-inho/zinho

-eiro

-ado

-mento

-dor

-oso

-ão

-inho/zinho

-eiro

-ado

-dor

-oso

-ão

-inho/zinho

-eiro

-dor

-ão

-ado

-inho/zinho

-eiro

-ado

-dor

-ão

-oso

-agem

inho/zinho

-eiro

-ado

-dor

-ão

-oso

78,3%

14,1%

3,3%

1,6%

0,8%

0,8%

0,8%

84,1%

8%

4%

2,2%

1,1%

0,5%

78,8%

14,5%

3%

2,1%

1,4%

66,4%

15,2%

11,2%

3,2%

2,4%

0,8%

0,8%

54,2%

28,5%

5,9%

4,2%

4,2%

3%

94/120

17/120

4/120

2/120

1/120

1/120

1/120

149/177

14/177

7/177

4/177

2/177

1/177

108/137

20/137

4/137

3/137

2/137

83/125

19/125

14/125

4/125

3/125

1/125

1/125

38/70

20/70

4/70

3/70

3/70

2/70

Frutinha

Geladeira

Quebrado

Casamento

Escorregador

Corajosa

Minhocão

Cavalinho

Geladeira

Pelado

Abridor

Delicioso

Rabão

Plantinha

Banheiro

Abridor

Grandão

Gripada

Velinha

Banheiro

gelado

Gravador

Casarão

Gostoso

Folhagem

Pedrinha

Cafeteira

Gelado

Abridor

Rodão

Perigoso

58

Gráfico 3: Distribuição dos sufixos por faixa etária.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

Per

cent

agem

2 - 3a 3 - 4a 4 - 5a 5 - 6a 6 - 7a

Faixa etária

Distribuição dos sufixos por faixa etária

inho/zinho eiro ado mento dor oso ão agem

Através da análise da Tabela e do Gráfico 3, verificamos que os sufixos com maior

índice de ocorrência são os formadores de grau –inho/zinho (frutinha, cavalinho), com

ocorrências entre 78% e 84% aproximadamente. A partir dos 5:0 anos ocorre uma diminuição

em seu número de ocorrências. Em segundo lugar, encontra-se o sufixo -eiro (geladeira,

cafeteira) com maior incidência na faixa de 6:0 a 7:0 anos, com aproximadamente 28,5% de

ocorrências, denotando formação de ofício, ocupação, objeto, lugar ou profissão. Em terceiro

lugar, aparece o sufixo -ado, assumindo o valor de “provido de, cheio de“. Este sufixo atinge

sua maior incidência na fala infantil na faixa etária de 5:0 a 6:0 anos, com 11,2%. Como

menos recorrentes na fala infantil, podemos citar os seguintes sufixos: -dor, -oso, -ão, -mento

e -agem. A partir do que foi observado, percebemos que os sufixos -inho e -zinho, na maioria

das suas ocorrências, são formadores de grau. Apesar de a maioria dos autores conceber grau

como derivação, há muita sistematicidade neste processo. Esta pode ser a razão para a sua

produtividade, isto é, eles, neste quesito, se equiparam aos afixos flexionais.

59

A partir da análise do Gráfico 3, verificamos que aos 2 anos já se pode registrar a

ocorrência da sufixação na fala infantil. Na faixa etária de 2:0 a 7:0, o sufixo mais recorrente é

-inho. No que se refere ao aspecto quantitativo, ocorre um aumento na faixa dos 2:0 aos 3:0

anos. Em todas as faixas etárias, os sufixos com maior índice de ocorrência são os formadores

de grau -inho, seguidos do sufixo -eiro.

A seguir veremos as características de cada sufixo encontrado na fala infantil.

4.3.1 Sufixo -inho/zinho

Caracteriza-se como um sufixo que se une a uma base significando a partir daí um

valor diminutivo.

Nos dados da fala infantil, encontramos o sufixo -inho com os seguintes

significados: com valor diminutivo (palhacinho), com valor afetivo (florzinha, chinelinho) e

de forma pejorativa (coisinha).

No que se refere a nossa primeira hipótese, apresentada no item, é corroborada

apenas na passagem de 3:0 aos 4:0 anos. Nas demais faixas etárias, não percebemos um

aumento em termos de freqüência de uso.

Segundo Sandmann (1989), estes afixos são bem produtivos, participando de

formações novas e assumindo conteúdos diversos. Além dos significados citados acima, estes

afixos, como diminutivos, podem expressar simpatia por um objeto, suavizar uma situação

desagradável (corridinha) ou diminuir algo (um tempinho, um momentinho). Assim, os dados

encontrados na fala infantil confirmam o caráter produtivo destes sufixos na língua

portuguesa.

Quanto ao seu status prosódico, estes sufixos caracterizam-se por serem palavras

fonológicas independentes.

4.3.2 Sufixo -eiro

O sufixo -eiro liga-se a bases podendo significar ocupação, ofício, profissão, lugar

onde se guarda algo ou ter significado de agente.

Nos dados da fala infantil, encontramos o sufixo -eiro, denotando lugar onde se

guarda algo (geladeira, mamadeira).

Com relação à nossa primeira hipótese, a mesma confirma-se dos 3:0 aos 7:0, já

que percebemos o seu aumento de acordo com a faixa etária.

60

De acordo com Sandmann (1989), os substantivos em -eiro de base substantiva

são em geral substantivos que designam um agente: baloeiro ‘fabricante, vendedor de balões’;

canavieiro “trabalhador de canavial”. Além disso, o autor encontrou –eiro com sentido

locativo, como no exemplo, atoladeiro, derivado do verbo (atolar), significando “lugar onde

se atola”. Assim, a produtividade encontrada na fala adulta é corroborada através da análise

da fala infantil.

4.3.3 Sufixo -ado/a

O sufixo -ado liga-se a bases significando “provido de”, “cheio de”, “que revela o

caráter de algo”. Já a sua variante -ada caracteriza ações breves ou passageiras (olhada),

produto alimentício (bananada) etc.

O aumento no número de ocorrências deste sufixo, é percebido na passagem da

primeira para a segunda faixa etária e da terceira para a quarta. Assim, não podemos

confirmar nossa primeira hipótese, de que este sufixo aumente de acordo com a mudança de

faixa etária.

Segundo Sandmann (1989), os substantivos designativos de ação terminados em

-ada são muitas vezes empregados no português em sintagmas com o verbo dar: “dar uma

olhada, dar uma esnobada”. Expressa, então, uma ação breve ou passageira. De acordo com a

análise dos dados da fala infantil, estes sufixos assumem o mesmo caráter produtivo que

possuem na fala adulta.Nos dados de 2:0 a 7:0 anos de idade, podemos citar como exemplos

os seguintes vocábulos: quebrado, gelado, limonada, rasgada.

4.3.4 Sufixo -mento

No que diz respeito às regras de formação de palavras, é importante observar

formas duplas uma em -ção e outra em -mento. No Aurélio, por exemplo, já estão registradas

as formas debilitação, desfiguração e também debilitamento e desfiguramento. As derivações

deverbais em -ção e -mento não parecem estar sujeitas ao Efeito de Bloqueio (Aronoff, 1976),

pois aparecem, supostamente lado a lado, na língua, como substantivos sinônimos.2 A análise

2 Segundo Aronoff |(1976), estas formas estariam sujeitas ao Bloqueio, já que veiculam o mesmo significado. Se essa hipótese for verdadeira, ou as formas de fato não compartilham exatamente o mesmo significado, ou não são produzidas, as duas, pelo mesmo falante.

61

do corpus de Sandmann (1989) registrou 28 formações novas com o sufixo -ção e 26 com

-mento.

Na fala infantil, só houve registro do vocábulo casamento, em que consideramos

uma palavra derivada de um verbo (casar). De qualquer forma, este dado está incluído no

elenco das formas sufixais produtivas em PB.

4.3.5 Sufixo -dor

O sufixo -dor forma substantivos designativos de agente ou de instrumento de

ação.

Nos dados da fala infantil, encontramos formações como: escorregador, abridor,

batedor etc, que confirmam os significados possíveis do sufixo.

O aumento de ocorrências deste sufixo pode ser percebido com o aumento da faixa

etária. Desta forma, nossa primeira hipótese é confirmada, embora o acréscimo no número de

ocorrências não seja tão significativo.

De acordo com Sandmann (1989), este sufixo é bastante produtivo, com

significado de agente ou instrumento (misturador, secadora) e, ainda, do ponto de vista

morfossintático, pode muitas vezes ser empregado adjetivamente: ao lado de secadora, por

exemplo, poderíamos ter máquina secadora, e, ao lado de loteador, firma loteadora.

4.3.6 Sufixo -oso/a

O sufixo -oso liga-se a uma base dando o significado de “estar provido de”, “estar

cheio de”.

Na análise da fala infantil, o sufixo confirma os significados acima apresentados

(orgulhoso, delicioso, gostoso).

Quanto ao seu aumento de acordo com a mudança de faixa etária não podemos

fazer uma generalização, já que os números de ocorrências são variáveis.

Como afirma Sandmann (1989), este sufixo foi bastante produtivo no latim e nas

línguas românicas, embora não o seja mais tanto hoje. Esta afirmação é, em certa medida,

confirmada por nossos dados, em que registramos um pequeno índice de ocorrência dos

mesmos (aproximadamente 3%).

62

4.3.7 Sufixo -ão

Este sufixo assume o caráter aumentativo nas bases a que se liga. Também pode

significar proveniência, origem.

Na fala infantil, indicou “tamanho acima do normal”, como em rabão, ursão,

garrafão e grandão.

O aumento significativo no número de ocorrências deste sufixo só pode ser

verificado na passagem da segunda para a terceira faixa etária. A partir da terceira faixa etária

o número de ocorrências mantém-se praticamente constante.

Segundo Sandmann (1989), o sufixo -ão não é muito produtivo, sendo registradas,

em sua análise, formações como: covardão, atrasadão (adjetivamente).

No que se refere à sufixação podemos concluir o que se segue:

- Quanto à ordem de aquisição dos sufixos as crianças produzem, primeiro, sufixos

formadores de grau diminutivo: -inho/-zinho.

- No que se refere ao aumento da sufixação de acordo com a mudança de faixa

etária, não podemos generalizar, já que este aumento é verificado na passagem da primeira

para a segunda faixa etária e na passagem da terceira para a quarta.

- Quanto à produtividade, os sufixos registrados na fala das crianças analisadas, se

contrastados com a análise de Sandmann (1989), caracterizam-se por serem produtivos.

- Em relação ao status prosódico, o único afixo que constitui palavra fonológica

independente na fala da criança é -inho e sua variante -zinho. Entretanto, não se pode

assegurar que esta aquisição esteja justificada pelo caráter prosódico deste afixo, mas sim por

seu sentido altamente afetivo. Em outras palavras, é seu caráter morfossemântico que faz

aflorar a categoria prosódica “palavra”, incomum na morfologia afixal deste período de

aquisição. Dentro do domínio da palavra fonológica, podem ocorrer reagrupamentos de

sílabas e pés, sem compromisso de isomorfismo com os constituintes morfológicos. Em nossa

análise, percebemos o não-isomorfismo entre palavra fonológica e morfológica. Assim, em

pazinha, velinha e cafezinho, temos o registro de duas palavras fonológicas, mas uma

morfológica.

63

4.4 Composição

Concluindo, então, vejamos agora a composição através da análise da Tabela 4 e

de seu respectivo Gráfico. Ambos foram construídos levando-se em consideração a faixa

etária, a categoria dos elementos que os compõem, e a freqüência na fala das crianças.

Tabela 4: Compostos registrados na fala infantil de acordo com a faixa etária.

FAIXA

ETÁRIA

COMPOSTOS PERCENTAGEM OCORRÊNCIAS EXEMPLOS

2 – 3 anos

3 – 4 anos

4 – 5 anos

5 – 6 anos

6 – 7 anos

N+A

V+N

N+N

N+p+N

N+p+N+A

V+N

N+p+N

N+A

A+p+N

V+V

Num+N

N+N

V+N

N+p+N

N+A

N+N

V+N

N+p+N

N+A

N+N

V+V

Num+p+N

V+N

N+p+N

N+N

N+A

66,8%

11,1%

11,1%

5,5%

5,5%

40,7%

26%

18,5%

3,7%

3,7%

3,7%

3,7%

40,6%

40,6%

15,7%

3,1%

35,2%

32,3%

15%

11,7%

2,9%

2,9%

54%

41%

2,5%

2,5%

12/18

2/18

2/18

1/18

1/18

11/27

7/27

5/27

1/27

1/27

1/27

1/27

13/32

13/32

5/32

1/32

12/34

11/34

5/34

4/34

1/34

1

21/39

16/39

1/39

1/39

Lobo mau

Guarda-chuva

Coca-Cola

Cor de mercúrio

Boi da cara preta

Guarda-chuva

Papai do Céu

Lobo mau

Redondo do tapete

Cai-cai

Quinze de Setembro

Arco-íris

Guarda-chuva

Cor de rosa

Lobo mau

Coca-Cola

Guarda-sol

Capa de disco

Verde clarinho

Fanta uva

Roda-roda

Quinze de setembro

Guarda-chuva

Pista do trem

Lata jóia

Nega maluca

64

Gráfico 4: Distribuição dos compostos por faixa etária.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

Per

cent

agem

2 - 3a 3 - 4a 4 - 5a 5 - 6a 6 - 7a

Faixa etária

Distribuição dos compostos por faixa etária

N+N N+A V+N N+p+N A+p+N

V+V Num+N Num+p+N N+p+N+A

Como podemos verificar, através da análise da Tabela 4 e respectivo Gráfico, já é

possível registrar a ocorrência dos compostos na fala infantil aos 2 anos de idade, embora

aumentem em número e diversidade a partir dos 3 anos.

Os compostos preponderantes na fala infantil são os do tipo: V+N, N+(p)+N, N+A

e N+N, embora possamos registrar a ocorrência de outros tipos. Vejamos, a seguir, a tipologia

dos compostos encontrados, sua ocorrência e produtividade.

4.4.1 Composto N + A

São compostos formados a partir da concatenação de um nome e de um adjetivo.

Resultam numa categoria +N e são compostos pela seqüência determinado + determinante.

Este composto aparece na fala infantil desde os dois anos de idade, por ex. lobo mau (2:0),

leite condensado (4:0), azul forte (6:0), nega maluca (7:0). São os compostos mais freqüentes

na faixa etária de 2 a 3 anos. Atinge sua menor freqüência na faixa de 6 a 7 anos. Portanto,

com relação à nossa primeira hipótese, verificamos que não é confirmada, já que não ocorre

aumento deste tipo de composto com o aumento da faixa etária.

65

No que se refere à produtividade, este tipo de composto não foi observado como

um dos mais produtivos em PB, segundo Sandmann (1989). Este tipo de composto destaca-se,

em sua obra, principalmente, quanto à determinação de sua classificação, ou seja, se seria um

grupo sintático ou um composto. Para Lee, este composto se caracterizaria como pós-lexical,

já que apresenta a seqüência DM (determinado) + DT (determinante).

Como exemplo de ocorrência deste composto podemos referir o seguinte trecho da

fala infantil:

A entrevistadora mostra figuras de estórias infantis para a menina e pergunta quais

são os personagens que ela está vendo nas figuras. A menina (Natália; 2;2) diz o nome dos

personagens e canta:

− Eu sou o lobo mau, lobo mau, lobo mau, eu pego as criancinhas pra fazer

mingau.

A mesma ainda diz:

− Ele botou uma roupa de lobo mau.

4.4.2 Composto N + p + N

São formados pela união de nome, preposição e nome. Resultam numa categoria

lexical +N (adjetivo). Estes compostos estão presentes na fala infantil desde os 2 anos. Em

quase todas as faixas etárias representa o segundo tipo de composto mais usado na fala

infantil.

No que se refere ao aumento deste tipo de composto de acordo com a faixa etária,

podemos dizer que ocorre um aumento na faixa etária de 2:0 a 4:0. Na passagem da faixa

etária de 5:0 para 6:0 ocorre um decréscimo e, na faixa etária seguinte, aumenta sua

ocorrência novamente. Como podemos perceber, não há uma uniformidade quanto a este

quesito.

Segundo Sandmann (1989), este tipo de composto aparece em seu corpus como

um dos mais produtivos. O autor faz apenas uma observação que, muitas vezes, ocorre

incerteza se este tipo seria um composto ou grupo vocabular constante.Em seu corpus foram

registradas as seguintes formações: filhinho-de-papai, meio-de-campo, ponta-de-lança etc.

Como exemplos deste tipo de formação, podemos citar: cor de mercúrio (2:0),

palito de fósforo (3:0), caixa de fósforo (4:0), café com leite (5:0), escova de dente

(6:0).Vejamos a seguir exemplo de ocorrência do composto N + p + N.

66

Em outro momento a entrevistadora questiona:

− E isto aqui (como é o nome)? O que a gente põe fogo!

O menino responde, observando a figura de uma cozinha:

− Caixa de fósforo.

4.4.3 Composto V + N

São compostos formados pela junção de um verbo e um nome, que resultam em

uma categoria lexical + N. Este tipo de composto pode ser verificado desde os 2 anos de

idade. Nas faixas etárias de 3:0 a 4:0 e de 5:0 a 7:0 anos, constitui o composto com maior

índice de ocorrência. Com relação ao aumento deste tipo de composto em relação às faixas

etárias, podemos afirmar que, de um modo geral, este aumento ocorre. Na passagem da faixa

etária de 5:0 para 6:0 anos é que podemos verificar um decréscimo.

Segundo Sandmann (1989), este tipo de composto forma substantivos

determinativos e sua produtividade é grande na língua portuguesa. Formações citadas pelo

autor: mata-burro; fura-bolo e como formação nova cata-mendigo.

São exemplos do corpus da fala infantil: guarda-chuva (2:0), corta-cabelo (3:0),

toca-disco (4:0), guarda-sol (5:0). No parágrafo que segue, vejamos um exemplo deste

composto.

A entrevistadora mostra figuras do instrumento de avaliação fonológica da criança

(Yavas, Hernandorena e Lamprecht) e pede que a menina nomeie os objetos que está vendo

nas ilustrações.

A entrevistadora diz:

− E isto o que é?

A menina responde:

− É um guarda-chuva. (Mariana, 3:10)

4.4.4 Composto N + N

Como todos os compostos resultam numa categoria +N. Seu maior índice de

ocorrência dá-se na faixa etária de 2:0 a 3:0 anos. De acordo com nossa primeira hipótese não

67

podemos afirmar que a aquisição deste tipo de composto seja crescente de acordo com o

aumento da faixa etária, embora sua ocorrência seja constante.

São exemplos desta formação: Coca-Cola (2:0), arco-íris (3:0), Fanta Uva (5:0),

lata-jóia (6:0).

Como exemplo da ocorrência do composto do tipo N + N, podemos citar:

A entrevistadora questiona o nome de um objeto, apontando para uma garrafa:

− O que é isto?

− Serve pra botar Coca-Cola.

4.4.5 Composto Num + N

São formados pela união de um numeral mais um nome, resultando numa

categoria lexical + N. Como exemplo, podemos citar quinta-feira (3:0). Observamos sua

ocorrência apenas numa faixa etária, portanto não podemos afirmar que ocorra um acréscimo

em sua freqüência de uso com o aumento da faixa etária.

Quanto à sua produtividade, Sandmann (1989) afirma que este tipo de compostos

não é muito freqüente em português. No seu corpus foi registrada a ocorrência de sua variante

S + Num, como em sete-barbas; camisa-dez (=centroavante).

4.4.6 Composto Num + p + N

São formados pela concatenação de um numeral, preposição e nome. Observamos

sua ocorrência apenas na faixa etária de 5:0 a 6:0 anos, com um índice de 2,9%. Como

exemplo, podemos citar quinze de setembro.

Sandmann (1989) não trata desse tipo de composto, embora sua produtividade seja

evidente, já que, no mais das vezes, serve à fórmula de uma data.

4.4.7 Composto V + V

São compostos que resultam da união de dois verbos. Sua ocorrência foi

registrada nas seguintes faixas etárias: de 3:0 a 4:0 e de 5:0 a 6:0, com índices

respectivamente de 3,7% e 2,9%. Assim não podemos afirmar que ocorra um aumento no uso

deste tipo de composto, com a passagem das faixas etárias.

68

No que se refere à sua produtividade, não há registros no corpus de Sandmann

(1989). Na fala da criança, contudo, esse tipo de composto parece ser recorrente (ainda que

não necessariamente em nossos dados), já que se estabelece, muitas vezes, por um processo

de reduplicação - fenômeno constante na fala infantil.

4.4.8 Composto A + p + N

São compostos formados por um adjetivo, preposição e nome. Verificamos sua

ocorrência, no nosso corpus, somente na faixa etária de 3:0 a 4:0 anos, no vocábulo redondo

do tapete.

Quanto à sua produtividade, não há registros de sua ocorrência no estudo realizado

por Sandmann (1989).

4.4.9 Composto N + p + N + A

São compostos formados por um nome, preposição, nome e adjetivo. Registramos

sua ocorrência apenas na faixa entre 2:0 e 3:0 anos, no composto boi da cara preta.

Não encontramos comentários com relação à produtividade específica dessa

combinação, na obra de Sandmann (1989).

Com relação às hipóteses apresentadas no presente estudo, podemos afirmar o que

segue.

- A ordem de aquisição da composição em termos de freqüência de uso, de acordo

com a faixa etária é crescente, se analisarmos o processo de um modo geral.

- Os tipos predominantes de compostos encontrados na fala infantil são, em ordem

de preferência: V+N, N+p+N e N+A.

- Quanto ao status prosódico dos compostos, podemos afirmar, seguindo (Lee,

1997) que os compostos predominantes na fala infantil são os chamados "compostos lexicais",

isto é, aqueles que, entre outras características, carregam dois acentos, ou seja, são dois

vocábulos fonológicos e apenas um morfológico.

- As crianças usam, na maioria das vezes, tipos de compostos produtivos da língua

portuguesa, ou seja, que contribuem para formação de vocábulos novos no PB.

69

4.5 A língua-alvo

As seções seguintes destinam-se a estabelecer semelhanças e diferenças entre os

dados da fala infantil e os dados da fala adulta. Para este fim, selecionamos outros dois

corpora: o Dicionário Aurélio, versão 3.0 e o Banco VARSUL.

Nosso intuito foi verificar se os afixos que apareceram na fala das crianças eram,

uns em relação aos outros, utilizados na mesma proporção pelos adultos.

As buscas restringiram-se à afixação, ficando a composição, por questões de

tempo, postergadas para análise futura. Dentre os afixos analisados, circunscrevemos tais

buscas aos prefixos e sufixos usados pelas crianças de nossa pesquisa, a saber: des- e re-;

-inho, -eiro, -ado, -mento, -dor, -oso, -ão e –agem.

4.5.1 Análise no dicionário Aurélio Eletrônico

No intuito de comparar a proporção no uso dos afixos usados pelas crianças com

as formas dicionarizadas, isto é, as formas que consideramos da "língua-alvo”, é que se

procedeu à busca no Dicionário Aurélio Eletrônico. A importância da pesquisa no dicionário

deve-se à referência que representa sobre o léxico de uma língua, ainda que não reflita cem

por cento o léxico mental dos indivíduos. Somado a este fato, com já visto na seção 3.2, nosso

trabalho ao lado da descrição dos afixos, visa a averiguar se a freqüência desses afixos na fala

infantil é similar à fala adulta. Por essa razão, consideramos importante esta comparação,

ainda que não suficiente.

A seguir apreciaremos os gráficos que representam a prefixação e sufixação na

fala infantil e a comparação destes dois processos, separadamente, com os dados registrados

no dicionário eletrônico.

70

Gráfico 5: Formações prefixais encontradas na fala infantil (2:0 a 7:0) & formações prefixais dicionarizadas.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

Per

cent

agem

des- re-

Prefixos

Gráfico comparativo entre prefixação infantil e pre fixação dicionarizada

criança

dicionário

Através da análise do Gráfico 5, observamos que, segundo o levantamento realizado

no dicionário, o prefixo des- é o prefixo com maior número de ocorrências em relação ao

prefixo re-. O prefixo des- apresentou 1926 ocorrências. Quanto ao prefixo re-, foram

registradas 467 ocorrências. Desta forma, o que verificamos através da análise destes dois

prefixos no dicionário eletrônico foi a proporcionalidade de uso destes afixos em relação à

fala infantil.

71

Gráfico 6: Formações sufixais encontradas na fala infantil (2:0 a 7:0) & formações sufixais

dicionarizadas.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

Per

cent

agem

-inho/zinho-eiro -ado -mento -dor -oso -ão -agem

Sufixos

Gráfico comparativo entre sufixação na fala infanti l e palavras sufixadas dicionarizadas

criança dicionário

Conforme podemos observar no Gráfico 6, o sufixo –eiro, por exemplo, constitui o

segundo mais usado pelas crianças. No dicionário eletrônico, dentre os sufixos pesquisados, é

um dos mais recorrentes. A mesma proporção também pode ser observada nos sufixos –ado,

-oso e –agem. No entanto, o mesmo não pode ser dito sobre –inho/zinho. Apesar de ser muito

freqüente na fala infantil, não é muito incidente no dicionário. Não nos detivemos muito sobre

este fato, pois nem todos os diminutivos são dicionarizados e, mesmo assim, sabemos de sua

produtividade tanto na fala infantil como na fala adulta.

4.5.2 A busca no VARSUL

As amostras de fala do VARSUL provêm de diversas cidades, mas como a

presente pesquisa utilizou, no caso dos dados da fala das crianças, bancos de dados de Porto

Alegre e Pelotas, escolhemos a cidade de Porto Alegre, para comparar a fala infantil com a

72

fala adulta. Procedeu-se à análise através da busca pelo Programa Interpretador, com o

objetivo de desfazer qualquer suspeita sobre o léxico dos dicionários, corroborando ou não a

hipótese de que a fala das crianças seria uma representação da fala adulta, em termos de

proporcionalidade de uso dos afixos.

A fim de verificarmos o que os adultos fazem em termos de morfologia afixal e

composição, selecionamos seis informantes (3 do sexo masculino e 3 do sexo feminino) do

município de Porto Alegre, a partir dos quais, estabelecemos as nossas conclusões. A seguir

apreciaremos os quadros das ocorrências, respectivamente, de prefixos e sufixos. Após serão

apresentados os comentários.

Gráfico 7: Formações prefixais encontradas na fala infantil & formações prefixais

encontradas na fala adulta (VARSUL).

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Per

cent

agem

des- re-

Prefixos

Gráfico comparativo entre prefixação infantil e pre fixação na fala adulta (VARSUL)

criança adulto

73

Através da observação do Gráfico 7, verificamos que entre os dois prefixos, des- é o

mais usado tanto na fala infantil como na fala adulta. O prefixo re- também segue a mesma

proporcionalidade, ocupando o segundo lugar em número de ocorrências dentre estes dois

prefixos. De acordo com a busca pelo interpretador, verificamos o uso dos prefixos des- e re-

nos seguintes contextos.

des- : privação, negação ou diminuição de intensidade.

ex. desconfiança, desanimou

re-: repetição

ex. reler

Passaremos à análise do gráfico referente à sufixação na fala adulta e infantil.

Gráfico 8: Gráfico Comparativo entre sufixação na fala infantil e sufixação na fala adulta

(VARSUL).

0%10%20%30%40%50%60%70%80%

Per

cent

agem

-inho/zinho -eiro -oso -ado

Sufixos

Gráfico comparativo entre sufixação na fala infanti l e sufixação na fala adulta (VARSUL)

criança VARSUL

Dentre os sufixos estudados, os únicos registrados na fala adulta foram –

inho/zinho, -eiro, -oso e –ado. Através da análise do Gráfico 8, verificamos que os sufixos

mais usados na fala infantil também foram os mais usados na linguagem adulta, em ordem

diferente. Desses sufixos, o primeiro em número de ocorrências no VARSUL é o sufixo –ado;

o segundo mais usado é –inho/zinho com 39,5%; em terceiro, lugar está o sufixo –eiro (6,2%)

e, por último, –oso (6%).

74

Os sufixos na linguagem adulta apresentam os seguintes significados:

-inho/a: aparece com valor diminutivo ou pejorativo.

ex. pequenininho, coisinha, piadinhas, pertinho, vestidinho.

-ado/a: sentido de : “provido de...; cheio de...; que revela o caráter de...”.

ex. engessada, molhada.

-eiro/a: registrado na fala adulta com o sentido de “lugar, profissão, ocupação etc.”

ex. galinheiro, carpinteiro.

-oso/a: revela o sentido de “estar provido de...; estar cheio de...”

ex. estudiosa, maravilhoso.

Em síntese, nossa análise comparativa nos permite dizer que há proporcionalidade

de uso dos afixos estudados na fala das crianças e dos adultos, no que concerne à relação entre

eles.

.

75

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na presente pesquisa, investigou-se a aquisição de morfemas derivacionais e

compostos na linguagem infantil no período dos 2 aos 7 anos de idade, a partir das hipóteses

seguintes.

- A ordem de aquisição da morfologia derivacional e de compostos é crescente em

termos de freqüência de uso, de acordo com a faixa etária.

- A tipologia de afixos e de compostos que aparecem na fala da criança é condicionada

por aspectos de uso.

- Afixos que são palavras fonológicas independentes são adquiridos mais cedo.

- As crianças de 2:0 a 7:0 anos utilizam-se de afixos e de tipos de compostos

considerados produtivos, isto é, afixos e tipos de compostos que contribuem para a formação

de novos vocábulos em PB.

- Os afixos e os compostos que aparecem na fala infantil são usados por adultos com a

mesma proporcionalidade.

Nossa primeira hipótese foi apenas parcialmente confirmada. Constatamos um

aumento geral – incluindo prefixos, sufixos e compostos – da primeira para a segunda faixa

etária. Além disso, compostos mostraram progressão moderada no uso através de todas as

faixas estudadas. Não podemos afirmar o mesmo, contudo, em relação a afixos no que

concerne à passagem da segunda até a quinta faixa etária investigada.

A segunda hipótese parece ter-se confirmado, considerando que os tipos de afixos e

compostos adquiridos pelas crianças respeitam aspectos de uso (semântico-pragmáticos),

relacionados ao input recebido dos pais (e das demais pessoas que convivem com a criança),

sempre condicionados à situação de interlocução. A seguir resumimos a tipologia encontrada.

(i) Os únicos prefixos encontrados na fala infantil foram des- e re-. O primeiro

indicando “retorno a uma situação ou estado anterior ou negação de uma base” e o segundo

significando “reforço ou retrogradação”.

(ii) Os sufixos mais usados na fala infantil foram -inho/-zinho, indicando “grau

diminutivo” e -eiro significando “ lugar onde se guarda algo, objeto etc.”

(iii) Os compostos mais recorrentes na fala infantil foram V+N (guarda-sol), N+p+N

(papai do céu) e N+A (lobo mau).

A nossa terceira hipótese, de que os afixos que são palavras fonológicas surgem

primeiro na fala infantil parece não ser verdadeira, ou, pelo menos, não é confirmada por

nossos dados, já que os prefixos e sufixos empregados, à exceção de -inho/-zinho não podem

76

receber esta classificação. Quanto à -inho/-zinho, parece haver uma motivação de uso

(defendida pela hipótese anterior), que obscurece o real papel da palavra prosódica que

caracterizam.

No que se refere à quarta hipótese, que diz respeito à produtividade dos afixos e

compostos empregados pelas crianças, nossa análise permite confirmá-la, já que os prefixos,

sufixos e compostos mais usados na fala infantil são também produtivos na língua portuguesa,

conforme Sandmann (1989).

Por fim, a quarta hipótese que defendemos também se confirmou, uma vez que os

adultos (Dicionário Aurélio e VARSUL) empregaram os afixos, uns em relação aos outros,

numa proporção bastante semelhante à empregada pelas crianças.

O percurso deste trabalho foi desafiador e enriquecedor, tanto pela temática –

bastante inexplorada ainda em Lingüística – quanto pela metodologia, que nos permitiu

acessar o universo do léxico adulto e infantil.

Entendemos que nossa investigação ainda é preliminar em muitos sentidos, mas

estamos convictos de que ajuda a abrir um caminho importante na pesquisa da aquisição da

morfologia e, por isso, como qualquer começo, saímos com mais perguntas do que chegamos

– não as mesmas, mas muitas outras que o fazer científico descortina.

77

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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78

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79

ANEXOS

Principais Prefixos, segundo Cunha (1983 e 1985) e Almeida (1989).

PREFIXO SIGNIFICADO EXEMPLOS FONTE Ad- a-

aproximação Alinhar, adjunto NMA CC

a-ab-abs- Afastamento, separação procedência

Aversão Abdicar Abstrair

NMA CC

a- an- Negação, privação Átono, analfabeto NMA NMA

Além- Posterioridade local Além-mar NMA Ambi- Movimento circular Ambigüidade NMA Amphi- Movimento circular Anfiteatro NMA Aná- Movimento circular, repetição

contrariedade Aneurisma Anagrama Anáfora

NMA CC CC

Ante- Posição anterior Antebraço CC Anti- Oposição Antiaéreo CC

Apó- Afastamento Apogeu NMA Arqui- arque- Arc- arce-

Superioridade Arquiduque arcebispo

CC CC

Aquém- Anterioridade local Aquém-túmulo NMA Bem- bene- Bom êxito Bem-aventurado

benquerer NMA NMA

Bis- bi- Duas vezes Bisavô, bimensal Catá- Circum-

Movimento de cima p/ baixo Movimento circular

Catadupa cataplasma

CC CC

Cis- Anterioridade local cisplatino NMA Con- com- Co- cor- <cum

Reunião Compor Cooperar corresponder

CC CC NMA

Contra- Oposição, posição fronteira Contra-dizer contrabaixo

NMA NMA CC

De- De cima para baixo, procedência, separação, falta, privação

Decair Deportar decrescer

NMA NMA CC

Des- <de+es

Separação, afastamento, privação, negação,

Desleal Desagradável

NMA NMA

80

Aumento de intensidade desfazer CC Dis- di- Dir-

Separação, distribuição, negação

Dispersar Dilacerar dirimir

NMA CC CC

Dys- Mau êxito Dispepsia disenteria

NMA CC

e- ec- ex- Movimento para fora Eclipse êxodo

NMA NMA

En- Movimento para dentro Embrião encéfalo

NMA CC

Epí- ep- Posição superior Epiderme epônimo

NMA NMA

Eu- ev- Bom êxito Eufonia evangelho

NMA NMA

Extra- Movimento para fora extrajudicial NMA Hemí- Mediação Hemisfério NMA Hypér- Posição superior, excesso Hipertrofia

hipertensão NMA CC

Hypó- Posição inferior, escassez Hipogeu hipodérmico

NMA CC

In- im- i- Ir- em- en- Er-

Movimento para dentro, negação, privação, superposição, repouso, permanência, direção, Tendência, reforço, intensidade, metaplasmo

Imigrar Ingressar Injusto Independência Impor Instruir Insídia Inferir Indício, implorar Irradiar Engarrafar Embainhar Emburrar Erradicar embaralhar

NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA NMA

-inter-entre Posição intermediária Interpor entreabrir

NMA CC

Intra- intro- Movimento para dentro Intramuscular introduzir

NMA CC

Justa- Aproximação justapor NMA Mal- male- Mau êxito Maltratar

malefício NMA NMA

Meio- Mediação Meio-corpo NMA Menos- <ninus

Privação, negação menosprezar NMA

Metá- Posição posterior Metamorfose NMA Ob- o- Oposição, posição fronteira Objetar, opor NMA

81

CC Pará- De lado, defeito, vício, contra,

além de Paráfrase Paraestatal parapsicologia

NMA NMA NMA

Pene- Aproximação Península penumbra

NMA NMA

Per- Movimento através, intensidade, idéia pejorativa

Perfurar Perfazer perverso

CC NMA NMA

Perí- Movimento circular Perífrase perímetro

NMA CC

Post- Posição posterior Postedênico NMA Pos- postônico CC Pre- Posição anterior Predizer NMA Preter- Posterioridade local, excesso Preterir

pretermatural NMA NMA

Pro- Posição anterior prólogo NMA Pros- Movimento para diante Prosélito NMA Re- Repetição, reforço,

retrogradação Reler, reluzir refluxo

NMA NMA NMA

Retro- Reta-

retrogradação Retrospectivo retaguarda

CC NMA

Se- Apartamento, separação Seduzir NMA Sem- Privação Sem-cerimônia NMA Semi- Mediação Semi-círculo NMA Super- Sobre-

Posição superior Superlativo sobracarga

NMA CC

Soto- Posição inferior Sotopor NMA Sub- Sob- So-

Posição inferior Supor Subjugar soterrar

NMA NMA CC

Subter- Posição inferior Subterfúgio NMA Supra- Posição superior Supracitado CC Sus- Movimento para cima Sustentar NMA Sin- sim- Sil- si-

Reunião Síntese Simpatia Sistema sílaba

NMA CC NMA NMA

Trans- tras- Tra- tres-

Posterioridade local, travessia Transcrever Transladar Traduzir trespasse

NMA CC NMA NMA

Tris- tri- Tres- tre-

Triplicação ou reforço Trisavô Trifólio Tresloucar trecentésimo

NMA NMA NMA NMA

Tris- tri- Triplicação Trissílabo tritongo

NMA NMA

82

Ultra- Posterioridade local, excesso Ultramar Ultra-sensível

NMA CC

Vice- vis- vizo

Substituição, em lugar de Vice-reitor Visconde Vizo-rei

CC CC CC

Principais Sufixos, segundo Cunha (1983 e 1985) e Sandmann (1989):

SUFIXO SIGNIFICADO EXEMPLOS ORIGEM -aço -aça -uça

Forma substantivos com força aumentativa ou pejorativa

Ricaço Barulhaço mulheraço

Cunha Sandmann

-agem Forma substantivos que expressam ação, Noção coletiva; estado

Folhagem Panfletagem Farofagem aprendizagem

Cunha Sandmann

-ada Ação breve ou passageira; porção, marca feita por um instrumento; golpe; produto alimentício

Olhada Colherada Dentada Pincelada bananada

Cunha Sandmann

-alha Coletivo pejorativo Canalha, gentalha

Cunha

-ança -ância -ença -ência

Ação ou resultado dela; estado Lembrança Vingança Descrença concorrência

Cunha

-ano Derivação de nomes próprios, pertinência ao substantivo da base; origem;partidário

Malufiano Kwaitiano Romano Luterano

Cunha Sandmann

-ante -ente -inte

Agente Estudante Navegante Ouvinte combatente

Cunha Sandmann

-ão Aumentativos (idiomatismo, apreço, tamanho acima do normal); proveniência, origem

Calçadão Bandejão, bolsão Paredão Alemão

Cunha Sandmann

-ário

Ocupação, ofício, profissão, lugar onde se guarda algo

Operário Secretário Vestiário metroviário

Cunha Sandmann

-ato (-ado)

Classe de...; substantivos abstratos; instituição; titulatura

Bispado Condado Doutorado Campesinato Professorado

Cunha Sandmann

-ário -eiro

Relação, pertinência, posse, origem

Diário Caseiro

Cunha

83

mineiro -ado Provido de...; cheio de...; que

revela o caráter de... Barbado amarelado

Cunha

-ante -ente -inte

Ação, qualidade, estado Semelhante Doente Seguinte

Cunha

-ável; ível Habilidade, capacidade de; digno de... Habilidade, capacidade de; digno de...

Presidenciável perecível

Cunha, Sandmann

-eiro Ocupação, ofício, profissão, lugar onde se guarda algo; árvore; objeto; designa agente

Barbeiro, copeiro Galinheiro Laranjeira Cinzeiro Formigueiro Canavieiro

Cunha Sandmann

-ês -ense -eno

Origem; termos gentílicos; referência; origem

Francês Português Forense Terreno Chileno

Cunha Sandmann

-engo Relação; pertinência; posse Mulherengo Solarengo

Cunha

-ete -eto -ito -ote

Lembrete Poemeto Meninote Serrote

Cunha

-eu Relação, procedência, origem Europeu Hebreu

Cunha

-ez Altivez honradez

Cunha

-eza Beleza Riqueza

Cunha

-ia Abstração (forma substantivos abstratos); Lugar onde se exerce uma atividade; profissão; noção coletiva

Defensoria Controladoria Delegacia Reitoria Advocacia Clerezia

Cunha Sandmann

-io -ivo

Ação, referência, modo de ser Fugidio Tardio Afirmativo

Cunha

-(d) iço -(t)ício

Possibilidade de praticar ou sofrer uma ação

Movediço Quebradiço

Cunha

-íssimo superlativos Aplaudidíssimo Ordeiríssimo Pertíssimo

Sandmann

-ista Seguidor; membro de partido; ocupação; fã de clube esportivo; nomes pátrios e gentílicos

Malufista Federalista Dentista Flamenguista

Cunha Sandmann

84

Nortista Paulista

-ite Inflamação de um órgão indicado pela base, aumento exagerado; proliferação

Apendicite Preguicite Paixonite

Cunha Sandmann

-dade -inho(a) -zinho(a) -ino(a)

Conotação depreciativa Valor diminutivo (formas lexicalizadas, pejorativas ou diminutivas)

Obviedade Crueldade Cantinho Escolinha Corridinha Adeusinho Rapazinho

Cunha Sandmann Cunha Sandmann

-ção -são

Designa ação ou resultado dela Nomeação Agressão Realização Digitação

Cunha Sandmann

-(d)or -(t)or -(s)or

Agente, instrumento da ação Jogador Depilador Misturador Secadora

Cunha Sandmann

-oso Estar provido de...; estar cheio de....

Preconceituoso Orgulhoso

Sandmann

-ção -são

Ação ou resultado dela Nomeação Agressão

Cunha

-douro -tário

Lugar ou instrumento da ação Bebedouro lavatório

-(d)ura -(t)ura -(s)ura

Resultado ou instrumento da ação; noção coletiva

Pintura Atadura Formatura Clausura

Cunha

-mente Advérbios de modo Advérbios de lugar Advérbios de tempo Advérbios de intensidade Advérbios de avaliação ou julgamento

Prudentemente Externamente Antigamente Incrivelmente frio certamente

Sandmann

-udo Provido de...; cheio de.... Pontudo Barbudo

Cunha

-ugem Semelhança, pejorativa Ferrugem Penugem

Cunha

-ume Noção coletiva ou de quantidade

Cardume Ciúme

Cunha

85

Lista de vocábulos encontrados na fala infantil no período dos 2:0 aos 7:0 anos de idade: Prefixos

Des- Desliga Desligado Re- Remexer Sufixos -ada Estragada Gelada Gripada Limonada Pendurada Rasgada -ado Fechado Gelado Gripado Pelado Quebrado Telhado -ão Fortão Garrafão Grandão Rabão Rodão Ursão -dor

86

Abridor Escorregador Gelador Gravador Ventilador -eira Bananeira Bandeira Cafeteira Geladeira Lapiseira Mamadeira Sujeira -eiro Banheiro Bombeiro Chuveiro Cinzeiro Pistoleiro -inha Aguinha Amiguinha Balinha Barriguinha Bolinha Bonequinha Cabaninha Cadeirinha Cadelinha Caixinha Canequinha Canetinha Carninha Casinha Chuvinha Cirandinha Cobrinha Coisinha Coelhinho Coleguinha Comidinha Cordinha Criancinha Escadinha

87

Escolinha Estorinha Estradinha Estrelinha Fadinha Fazendinha Figurinha Filhinha Florzinha Franjinha Frutinha Gordinha Graminha Inteirinha Joaninha Letrinha Massinha Menininha Mesinha Mochilinha Murchinha Orelhinha Ovelhinha Patinha Pecinha Pedrinha Pequenininha Pequenininho Perninha Pitanguinha Plantinha Pracinha Quadradinha Rodinha Sacolinha Sequinha Simoninha Surdinha Tampinha Toalhinha Trancinha Vaquinha Varinha Velinha Xicrinha. -inho Amiguinho Aninho

88

Baixinho Baldinho Banquinho Beijinho Bichinho Biquinho Bolinho Bonitinho Bonequinho Bracinho Branquinho Brinquedinho Buraquinho Burrinho Cabelinho Cabinho Cachorrinho Calminho Carrinho Cascudinho Cavalinho Cheirinho Chinelinho Chiquinho Clarinho Coelhinho Copinho Devagarinho Diabinho Dinheirinho Direitinho Elefantinho Filhinho Fraquinho Furinho Garfinho Gatinho Geladinho Joguinho Lobinho Longinho Macaquinho Menininho Miliquinho Motinho Olhinho Ovinho Palhacinho Palitinho Paninho

89

Parquinho Pedrinho Peixinho Pequeninho Pertinho Pinguinho Pintinho Porquinho Pratinho Pretinho Quadradinho Quadrinho Quentinho Rabinho Radinho Ratinho Redondinho Risquinho Saquinho Sininho Soldadinho Tamainho Teatrinho Trabalhinho Tudinho Ursinho -mento Casamento -osa Perigosa -oso Delicioso Gostoso Perigoso -zinha Colherzinha Florzinha Guriazinha Pazinha Vovozinha -zinho

90

Baldezinho Cafezinho Coraçãozinho Filmezinho Gurizinho Pazinha Tamborzinho Trenzinho Compostos Água de chuva Água doce Água na boca Arco-íris Armário do banheiro Azul forte Bandeira do Brasil Barraca de índio Boi da cara preta Balde de flor Café com leite Café preto Cai-cai Caixa de fósforo Café da manhã Cama de casal Coca-cola Coelhinho da páscoa Cor de azul Cor de mercúrio Corta-cabelo Cor de garrafa Cor de pele Cor de rosa Cor de uva Creme de leite Escova de dente Estrada do trem Faixa de segurança Fanta laranja Fanta uva Guarda-chuva Guarda-sol Lata-jóia Leite condensado Lobo mau Máquina de cortar Meio da rua

91

Nega maluca Palito de fósforo Papai Noel Pasta de dente Pica pau Pista do trem Porta retrato Programa livre Quinta-feira Redondo do tapete Roda de criança Roda-roda Roupa de colégio Salada de frutas Sobremesa Soda limonada Tábua para bater Toca-disco Verde clarinho