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Congregação para a Educação Católica Pontifícia Obra para as Vocações Sacerdotais Orientações pastorais para a promoção das vocações ao ministério sacerdotal

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Congregação para a Educação Católica

Pontifícia Obra para as Vocações Sacerdotais

Orientações pastorais para a promoção

das vocações ao ministério sacerdotal

INTRODUÇÃO

1. A Assembleia Plenária da Congregação para a Educação

Católica1 solicitou a publicação de orientações pastorais para promover

as vocações ao ministério sacerdotal.

Para responder a tal solicitação, a Pontifícia Obra para as

Vocações Sacerdotais, em colaboração com os seus Consultores, com os

representantes da Congregação para a Evangelização dos Povos, da

Congregação para as Igrejas Orientais e para os Institutos de Vida

Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica e da Congregação para

o Clero, elaborou um Inquérito sobre a pastoral do ministério

sacerdotal com a finalidade de obter um quadro actualizado da pastoral

vocacional nas diferentes regiões do mundo, especialmente no que diz

respeito ao sacerdócio ministerial.

O Inquérito foi enviado no dia 15 de Maio de 2008, por meio das

Representações Pontifícias, a todos os delegados da pastoral vocacional

das Conferências Episcopais e aos directores dos “Centros Nacionais

Vocacionais”, para que pudessem fornecer informações acerca da

situação das vocações e formular propostas de acções pastorais.

Examinadas as respostas das Conferências Episcopais e dos

Centros Nacionais ao Inquérito, surgiu o pedido de orientações para a

pastoral vocacional, com base numa clara e fundamentada teologia da

vocação e da identidade do sacerdócio ministerial.

1 A Assembleia Plenária da Congregação para a Educação Católica tratou o tema nas reuniões de 2005 e de 2008.

2

I. A PASTORAL DA VOCAÇÃO AO MINISTÉRIO

SACERDOTAL NO MUNDO

2. Actualmente a situação das vocações presbiterais é muito

diversificada no mundo. Ela apresenta-se caracterizada por luzes e

sombras. Enquanto no Ocidente se enfrenta o problema da diminuição

das vocações, nos outros continentes, não obstante os poucos meios,

nota-se um crescimento promissor das vocações sacerdotais.

Nos países de antiga tradição cristã a preocupante diminuição

numérica dos sacerdotes, o crescente aumento da sua média de idade e a

necessidade da nova evangelização esboçam a apresentação de uma

nova situação eclesial2.

A diminuição do índice de natalidade também contribui para a

diminuição das vocações de especial consagração. A vida dos fiéis

católicos sofre o contragolpe da procura desenfreada dos bens materiais

e da diminuição da prática religiosa, que desviam das escolhas corajosas

e comprometidas com o Evangelho.

Assim sendo, como escreveu o Santo Padre Bento XVI:

«Precisamente no nosso tempo conhecemos muito bem o “dizer não” de

quantos foram convidados primeiro. De facto, a cristandade ocidental,

isto é, os novos “primeiros convidados”, agora em grande parte se

recusam, não têm tempo para se encontrar com o Senhor»3.

2 «De facto, especialmente nalgumas regiões, precisamente o número demasiado escasso de jovens sacerdotes já constitui hoje um sério problema para a acção pastoral. Juntamente com toda a comunidade cristã, pedimos com confiança e com humilde insistência ao Senhor o dom de novos e santos trabalhadores para a sua messe (Cf. Mt 9, 37-38). Sabemos que algumas vezes o Senhor nos faz esperar, mas sabemos também que quem bate à porta não o faz em vão. E por conseguinte continuemos, com confiança, a rezar ao Senhor para que nos conceda novos e santos “trabalhadores”» (BENTO XVI, Discurso aos Participantes da LVII Assembleia Geral da Conferência Episcopal Italiana, 24 de Maio de 2007, in Insegnamenti III-1 [2007], 917-918).3 BENTO XVI, Homilia durante a Santa Missa com o Episcopado da Suíça (7 de Novembro de 2006), in Insegnamenti II-2 (2006) 573.

3

Por mais que a pastoral vocacional seja estruturada e criativa na

Europa e nas Américas, os resultados obtidos não correspondem ao

empenho amplamente despendido. Todavia, ao lado de situações

difíceis, que devem ser vistas com coragem e verdade, registam-se

alguns indícios de progressos, especialmente onde se formulam claras e

consistentes propostas de vida cristã.

3. A oração da comunidade cristã sempre reforçou, no povo de

Deus, a consciência comum para as vocações, na forma de uma

“solidariedade espiritual”4.

Ali onde amadurece e se fortifica uma pastoral integrada, seja ela

familiar, juvenil ou missionária, juntamente com a pastoral vocacional,

assiste-se a um florescimento de vocações sacerdotais. As Igrejas locais

tornam-se realmente «responsáveis pelo nascimento e pela maturação

das vocações sacerdotais»5. A dimensão vocacional não se propõe assim

como um simples acréscimo de programações e de propostas, mas

torna-se natural expressão de toda a comunidade.

Os dados estatísticos da Igreja Católica e algumas pesquisas

sociológicas mostram que, quando são propostas iniciativas de nova

evangelização nas paróquias, nas associações, nas comunidades

eclesiais e nos movimentos6, os jovens demonstram disponibilidade para

4 «Envolvamo-los, a estes nossos irmãos no Senhor, com a nossa solidariedade espiritual. Rezemos para que sejam fiéis à missão a que hoje o Senhor os chama, e estejam prontos para renovar todos os dias a Deus o seu “sim”, o seu “eis-me”, sem hesitações. E peçamos ao Senhor da messe, neste Dia pelas Vocações, que continue a suscitar muitos e santos presbíteros, totalmente dedicados ao serviço do povo cristão» (BENTO XVI, Homilia na ordenação sacerdotal dos diáconos da Diocese de Roma, 29 de Abril de 2007: AAS 99 [2007] 350).5 JOÃO PAULO II, Exortação Apostólica pós-sinodal Pastores dabo vobis (25 de Março de 1992), n. 41: AAS 84 (1992) 726.6 Cf. Pastores dabo vobis, n. 68: AAS 84 (1992) 775-778.

4

responder ao chamamento de Deus e para oferecer a própria vida ao

serviço da Igreja.

A família permanece a primeira comunidade para a transmissão

da fé cristã. Constata-se, por toda a parte, que muitas vocações

presbiterais nascem nas famílias, nas quais o exemplo de uma vida

cristã coerente e a prática das virtudes evangélicas fazem brotar o desejo

de uma doação total. A solicitude com as vocações pressupõe, de facto,

uma válida pastoral familiar.

É necessário ainda acrescentar que, muitas vezes, a interrogação

sobre a vocação presbiteral nasce nos adolescentes e nos jovens graças

ao alegre testemunho dos presbíteros.

O testemunho de sacerdotes unidos a Cristo, felizes do próprio

ministério e fraternalmente unidos entre si, suscita nos jovens um forte

chamamento vocacional. Os Bispos e os sacerdotes oferecem aos jovens

uma elevada e atraente imagem do sacerdócio ordenado. «A própria vida

dos padres, a sua dedicação incondicional ao rebanho de Deus, o seu

testemunho de amoroso serviço ao Senhor e à sua Igreja - testemunho

assinalado pela opção da cruz acolhida na esperança e na alegria pascal -, a

sua concórdia fraterna e o seu zelo pela evangelização do mundo são o

primeiro e mais persuasivo factor de fecundidade vocacional»7.

De facto, os sacerdotes são frequentemente testemunhas de

dedicação à Igreja, capazes de uma alegre generosidade, de uma

humilde adaptação às diversas situações nas quais se encontram e

trabalham. O seu exemplo suscita o desejo de grandes compromissos na

Igreja e a vontade de doar a própria vida ao Senhor e aos irmãos8.

7 Pastores dabo vobis, n. 41: AAS 84 (1992) 727.8 «O serviço de amor é o sentido fundamental de toda a vocação, que encontra uma realização específica na vocação do sacerdote» (Pastores dabo vobis, n. 40: AAS 84 [1992] 725).

5

Exerce uma forte atracção, especialmente nos jovens, o compromisso

dos sacerdotes com as pessoas sedentas de Deus, dos valores religiosos

e que se encontram na condição de grande pobreza espiritual9.

Nota-se também que muitos jovens descobrem o chamamento ao

sacerdócio e à vida consagrada depois de terem vivido uma experiência

de voluntariado, um serviço de caridade para com os que sofrem, os

necessitados e os pobres, ou depois de se terem dedicado por algum

tempo nas missões católicas.

A escola é outro ambiente da vida dos adolescentes e dos jovens,

no qual o encontro com um sacerdote professor ou a participação em

iniciativas de aprofundamento da fé cristã têm proporcionado o início de

um caminho de discernimento vocacional.

4. A difusão da mentalidade secularizada desencoraja a resposta

dos jovens ao convite de seguir o Senhor Jesus, com mais radicalidade e

generosidade.

Ao Inquérito promovido pela Pontifícia Obra para as Vocações

Sacerdotais, as Igrejas locais enviaram muitas respostas que evidenciam

uma série de motivos pelos quais os jovens ignoram a vocação

sacerdotal e a reenviam a um futuro incerto.

Além disso, os pais, com as suas expectativas acerca do futuro

dos filhos, reservam espaços limitados à possibilidade de vocações de

especial consagração.9 «O vosso entusiasmo, a vossa comunhão, a vossa vida de oração e o vosso ministério generoso são indispensáveis. Pode acontecer de experimentar algum cansaço ou medo diante das novas exigências e das novas dificuldades, mas devemos ter confiança de que o Senhor nos dará a força necessária para realizar quanto nos pede. Ele - rezamos e estamos certos disto - não deixará faltar vocações, se lhe implorarmos com a oração e, ao mesmo tempo, nos preocuparmos em procurá-las e conservá-las com uma pastoral juvenil e vocacional de ardor e inventiva, capaz de mostrar a beleza do ministério sacerdotal» (BENTO XVI, Discurso ao Clero, aos Religiosos e às Religiosas durante o encontro na Catedral de São Rufino na Visita Pastoral a Assis, 17 de Junho de 2007, in Insegnamenti III-1 [2007] 1138).

6

Outro aspecto que desfavorece a vocação presbiteral é a gradual

marginalização do sacerdote na vida social, com a consequente perda da

relevância pública. Além disso, em muitos lugares a própria escolha

celibatária é colocada em discussão. Não somente uma mentalidade

secularizada, mas também opiniões erradas no interior da Igreja

conduzem ao desprezo do carisma e da escolha celibatária, mesmo se

não podem ser silenciados os graves efeitos negativos da incoerência e

do escândalo, causados pela infidelidade aos deveres do ministério

sacerdotal entre os quais, por exemplo, os abusos sexuais. Isso cria

confusão nos próprios jovens que, não obstante isso, estariam dispostos

a responder ao chamamento do Senhor.

A própria vida presbiteral, arrastada no turbilhão do activismo

exagerado com a consequente sobrecarga de trabalho pastoral, pode

ofuscar e enfraquecer a luminosidade do testemunho sacerdotal. Em tal

situação, a promoção dos caminhos pessoais e o acompanhamento

espiritual dos jovens tornam-se uma ocasião propícia para a proposta e o

discernimento da vocação, especialmente da vocação presbiteral.

7

II. VOCAÇÃO E IDENTIDADE DO SACERDÓCIO

MINISTERIAL

5. A identidade da vocação ao ministério sacerdotal coloca-se no

íntimo da identidade do cristão enquanto discípulo de Cristo. «A história

de cada vocação sacerdotal, como aliás de qualquer outra vocação cristã, é

a história de um inefável diálogo entre Deus e o homem, entre o amor de

Deus que chama e a liberdade do homem que no amor responde a Deus»10.

Os Evangelhos apresentam a vocação como um maravilhoso

encontro de amor entre Deus e o homem. Este é o mistério do

chamamento, mistério que envolve a vida de cada cristão, mas que se

manifesta com maior evidência naqueles que Cristo convida a deixar

tudo para O seguir mais de perto. Cristo sempre escolheu algumas

pessoas para colaborarem de maneira mais directa com Ele na

realização do desígnio salvífico do Pai.

Jesus, antes de chamar os discípulos a um serviço particular,

convida-os a deixar tudo, para viver em profunda comunhão com Ele,

ou melhor, para “estar” com Ele (Mc 3,14)11.

Também hoje o Senhor Ressuscitado chama os futuros presbíteros

para transformá-los em verdadeiros anunciadores e testemunhas da sua

presença salvífica no mundo.

É no exemplo daquela experiência que nasce a necessidade de ser

companheiro de viagem de Cristo Ressuscitado, de empreender um

percurso de vida que nada dá como certo mas que, com docilidade, se

abre ao Mistério de Deus que chama.

10 Pastores dabo vobis, n. 36: AAS 84 (1992) 715-716.11 Cf. Pastores dabo vobis, n. 34: AAS 84 (1992) 713.

8

6. Cristo Pastor é origem e modelo do ministério sacerdotal12. Ele

mesmo decidiu confiar a alguns dos seus discípulos a autoridade de

oferecer o Sacrifício eucarístico e de perdoar os pecados.

«E assim, enviando os Apóstolos tal como Ele tinha sido enviado

pelo Pai, Cristo, através dos mesmos Apóstolos, tornou participantes da

sua consagração e missão os sucessores deles, os Bispos, cujo ofício

ministerial, em grau subordinado, foi confiado aos presbíteros, para que,

constituídos na Ordem do presbiterado, fossem cooperadores da Ordem do

episcopado para o desempenho perfeito da missão apostólica confiada por

Cristo»13.

Por isso, o sacerdote, como afirma claramente a doutrina do

carácter da Ordem sacra, é configurado a Cristo Sacerdote que o

habilita a agir na pessoa de Cristo Cabeça e Pastor14. O ser e o agir do

sacerdote, no ministério, provém da fidelidade de Deus, marcada pelo

dom espiritual que, no sacramento da Ordem, passa a habitar no

sacerdote de maneira permanente e o diferencia dos baptizados

participantes do sacerdócio comum. O sacerdote, de facto, enquanto

unido à Ordem episcopal, participa da autoridade com a qual Cristo

«edifica, santifica e governa o seu corpo»15.

Desta forma, o sacerdócio ministerial diferencia-se

essencialmente do sacerdócio comum e está ao seu serviço16. De facto, o

sacerdote ministerial, «pelo seu poder sagrado, forma e conduz o povo

sacerdotal, realiza o sacrifício eucarístico fazendo as vezes de Cristo e

12 Cf. Pastores dabo vobis, n. 23: AAS 84 (1992) 694.13 CONCÍLIO ECUMÉNICO VATICANO II, Decreto sobre o ministério e a vida dos sacerdotes Presbyterorum ordinis (7 de Dezembro de 1965), n. 2: AAS 58 (1966) 992; Cf. CONCÍLIO ECUMÉNICO VATICANO II, Constituição dogmática sobre a Igreja Lumen gentium (21 de Novembro de 1964), n. 28: AAS 57 (1965) 33-36.14 Cf. Presbyterorum ordinis, n. 2: AAS 58 (1966) 992.15 Ibid.16 Cf. Lumen gentium, n. 10: AAS 57 (1965) 14.

9

oferece-o a Deus em nome de todo o povo; os fiéis, por sua parte,

concorrem para a oblação da Eucaristia em virtude do seu sacerdócio real,

que eles exercem na recepção dos sacramentos, na oração e acção de

graças, no testemunho da santidade de vida, na abnegação e na caridade

operosa»17. Para isto «tende e nisto se consuma o ministério dos

presbíteros»18.

É claro que o dom transmitido pela imposição das mãos deve ser

sempre “reavivado” (cf. 2 Tm 1,6), porque os sacerdotes «quer se

entreguem à oração e à adoração quer preguem a Palavra de Deus, quer

ofereçam o sacrifício eucarístico e administrem os demais sacramentos,

quer exerçam outros ministérios favor dos homens, concorrem não só para

aumentar a glória de Deus mas também para promover a vida divina nos

homens»19.

A primeira dimensão do sacramento da Ordem, de carácter

cristológico, funda a dimensão eclesiológica20. Enquanto é necessário

que a própria Igreja seja convocada pelo Cristo Ressuscitado, os

sacerdotes são habilitados pelo sacramento da Ordem a ser instrumentos

eficazes para a edificação da Igreja, através do anúncio da Palavra, da

celebração dos sacramentos e da orientação do povo de Deus21. Sem

estes dons a Igreja perderia a própria identidade. O sacerdócio

ministerial é assim o ponto nevrálgico e vital para a existência da Igreja,

enquanto sinal eficaz da prioridade da graça com a qual Cristo

Ressuscitado a edifica no Espírito22.

17 Lumen gentium, n. 10: AAS 57 (1965) 14-15.18 Presbyterorum ordinis, n. 2: AAS 58 (1966) 993.19 Ibid.20 Pastores dabo vobis, n.16: AAS 84 (1992) 681.21 Cf. Presbyterorum ordinis, nn. 4-6: AAS 58 (1966) 995-1001.22 Cf. Pastores dabo vobis, n. 15: AAS 84 (1992) 679.

10

Deste modo os sacerdotes, representando Cristo Pastor,

encontram na total dedicação à Igreja o elemento unificante da própria

identidade teológica e da própria vida espiritual. Por isso, «a caridade do

padre se refere primariamente a Jesus Cristo: só se amar e servir a Cristo

Cabeça e Esposo, a caridade se torna fonte, critério, medida, impulso de

amor e de serviço do sacerdote para com a Igreja corpo e esposa de

Cristo»23. Se o sacerdócio ministerial não tem nesse amor a sua origem,

acaba por tornar-se uma tarefa funcional, em vez de propor-se como o

serviço de um pastor que dá a vida pelo rebanho. É, portanto, o amor a

Cristo que constitui a motivação prioritária da vocação ao presbiterado.

7. O ministério presbiteral, conferido com o sacramento da

Ordem, está marcado na sua natureza pela vida trinitária24, vida que é

comunicada por Cristo e pela sua união com o Pai no Espírito Santo.

Esta vida determina essencialmente a identidade presbiteral25.

Cada sacerdote vive na comunhão real e ontológica do Presbitério

unido ao próprio Bispo. De facto: «O ministério ordenado, em virtude da

sua própria natureza, pode ser exercido somente na medida em que o

presbítero estiver unido a Cristo mediante a inserção sacramental na ordem

presbiteral e, por conseguinte, enquanto se encontrar em comunhão

23 Pastores dabo vobis, n. 23: AAS 84 (1992) 691.24 «A identidade sacerdotal - escreveram os Padres Sinodais - como toda e qualquer identidade cristã, encontra na Santíssima Trindade a sua própria fonte [...]. É no interior do mistério da Igreja como comunhão trinitária em tensão missionária, que se revela a identidade cristã de cada um e, portanto, a específica identidade do sacerdote e do seu ministério. O presbítero, de facto, em virtude da consagração que recebe pelo sacramento da Ordem, é enviado pelo Pai, através de Jesus Cristo, ao qual como Cabeça e Pastor do seu povo é configurado de modo especial para viver e actuar, na força do Espírito Santo, ao serviço da Igreja e para a salvação do mundo» (Pastores dabo vobis, n. 12: AAS 84 [1992] 675-676).25 «Assim se pode compreender a conotação essencialmente “relacional” da identidade do presbítero: mediante o sacerdócio, que brota das profundezas do mistério de Deus, ou seja, do amor do Pai, da graça de Jesus Cristo e do dom de unidade do Espírito Santo, o presbítero é inserido sacramentalmente na comunhão com o Bispo e com os outros presbíteros, para servir o Povo de Deus que é a Igreja e atrair todos a Cristo» (Pastores dabo vobis, n. 12: AAS 84 [1992] 676).

11

hierárquica com o próprio Bispo. O ministério ordenado tem uma radical

“forma comunitária” e pode apenas ser assumido como “obra

colectiva”»26.

O sacerdote serve a communio da Igreja em nome de Jesus Cristo.

O Senhor chama o presbítero pessoalmente e associa-o à relação pessoal

consigo, à experiência da fraternidade apostólica e à missão pastoral de

exemplar origem trinitária. O “nós” apostólico, reflexo e participação da

comunhão trinitária, marca a identidade do ministério ordenado27.

É claro que o caminho vocacional e a própria formação deverão

retomar os elementos essenciais dessa mesma vida trinitária28, própria

do ministério ordenado, no qual o chamamento pessoal de Cristo está ao

serviço de uma vida de comunhão-missão, reflexo da vida trinitária.

Uma tarefa importante da pastoral vocacional, portanto, será

aquela de oferecer aos adolescentes e aos jovens uma experiência cristã,

por meio da qual se possa experimentar a realidade própria de Deus na

comunhão com os irmãos e na missão evangelizadora29. Sentindo-se

parte de uma família de filhos e filhas que têm o mesmo Pai, que os ama

imensamente, são chamados a viver como irmãos e irmãs e,

perseverando na unidade, se coloquem ao serviço da nova

evangelização «para proclamar e testemunhar a verdade maravilhosa do

amor salvífico de Deus»30.

26 Pastores dabo vobis, n. 17: AAS 84 (1992) 683.27 Cf. Presbyterorum ordinis, nn. 7-9: AAS 58 (1966) 1001-1006.28 Cf. Pastores dabo vobis, n. 17: AAS 84 (1992) 682-684.29 «Antes de programar iniciativas concretas, é preciso promover uma espiritualidade da comunhão, elevando-a ao nível de princípio educativo em todos os lugares onde se plasma o homem e o cristão, onde se educam os ministros do altar, os consagrados, os agentes pastorais, onde se constroem as famílias e as comunidades» (JOÃO PAULO II, Carta apostólica Novo millennio ineunte, 6 de Janeiro de 2001, n. 43: AAS 93 [2001] 297).30 JOÃO PAULO II, Mensagem para o XLII Dia Mundial de Orações pelas Vocações (17 de Abril de 2005), in Insegnamenti XXVII-2 (2004) 115.

12

A pastoral da vocação ao ministério ordenado tende a gerar

homens de comunhão e missão, capazes de se inspirar no “mandamento

novo” (cf Jo 13,34) fonte da “espiritualidade de comunhão”.

A promoção vocacional e o consequente discernimento levam em

grande consideração essa experiência cristã, fundamento de um caminho

de graça inscrito no sacramento da Ordem e condição para uma

autêntica evangelização.

8. Um prudente e sábio discernimento das condições essenciais para

aderir ao sacerdócio será oportunamente aprofundado para certificar a

idoneidade dos “vocacionados”. A pastoral vocacional está consciente de

que a resposta ao chamamento fundamenta-se na progressiva

harmonização da personalidade nos seus diversos componentes: humano e

cristão, pessoal e comunitário, cultural e pastoral.

«O conhecimento da natureza e da missão do sacerdócio ministerial

– lê-se na Pastores dabo vobis - é o pressuposto irrecusável, e ao mesmo

tempo o guia mais seguro bem como o estímulo mais premente para

desenvolver na Igreja a acção pastoral de promoção e discernimento das

vocações sacerdotais e da formação dos chamados ao ministério

ordenado»31.

Por esta razão a pastoral vocacional tende, em primeiro lugar, ao

desenvolvimento da pessoa na sua totalidade e integralidade, com a

finalidade de preparar os que são chamados ao sacerdócio a serem

conformes a Cristo Pastor, no contexto de uma profunda experiência

comunitária.

Cada “vocacionado” deve ser colocado em condições de viver

uma relação íntima de amor com o Pai que o chama, com o Filho que o

31 Pastores dabo vobis, n. 11: AAS 84 (1992) 674.

13

configura e com o Espírito que o plasma, por meio da educação à

oração, da escuta da Palavra, da participação à Eucaristia, do silêncio

adorador.

A proposta vocacional caminha a par e passo com a assunção

gradual, por parte do “vocacionado”, de tarefas, escolhas e

responsabilidades, também com o objectivo de consentir um

discernimento profundo e amplo da autenticidade da vocação.

A integração e a maturação afectiva são uma meta necessária para

saber acolher a graça do Sacramento. Convém evitar as propostas

vocacionais dirigidas a sujeitos que, mesmo sendo louváveis no seu

caminho de conversão, são marcados por fragilidades humanas

profundas.

É importante que o “vocacionado” perceba com clareza os

compromissos que deverá assumir, particularmente no celibato32.

É oportuno que o chamamento tenha raízes num contexto eclesial

preciso que dê consistência aos motivos da escolha vocacional e que

contribua para sanar os possíveis desvios individualistas dessa mesma

escolha33. Assume uma fundamental importância, neste sentido, a

qualidade da experiência paroquial e diocesana, a frequência e a

participação activa em associações e movimentos eclesiais34.

Normalmente, antes que o adolescente ou o jovem entre no

seminário, é prevista uma experiência de vida comunitária.

32 «Merece uma menção particular a formação ao celibato dos candidatos para o sacerdócio. É importante que estes aprendam a viver e a estimar o celibato como dom precioso de Deus e como sinal eminentemente escatológico, que testemunha um amor indiviso a Deus e ao seu povo e configura o sacerdote a Jesus Cristo, Cabeça e Esposo da Igreja. Tal dom, com efeito, exprime de modo singular “o serviço à Igreja no e com o Senhor” e representa um valor profético para o mundo de hoje» (BENTO XVI, Carta aos Bispos, presbíteros, às pessoas consagradas e aos fiéis leigos da Igreja Católica na República Popular da China, 27 de Maio de 2007, n. 14: AAS 99 [2007] 577).33 Cf. Pastores dabo vobis, n. 9: AAS 84 (1992) 670-671.34 Cf. Pastores dabo vobis, n. 68: AAS 84 (1992) 775-778.

14

9. Um papel decisivo é realizado pelos acompanhadores

vocacionais que, frequentemente, sucedem ao sacerdote que favoreceu e

sustentou os inícios da vocação. Tanto a relação educativa com os

animadores, como o estilo de fraternidade com os outros

“vocacionados”, torna mais autêntico e válido o discernimento da

escolha vocacional.

Sem dúvida, a vida de cada sacerdote e de todo o presbitério

diocesano, capaz de forjar a imagem ideal do sacerdote e as condições

do seu ministério na vida ordinária também através da sua visibilidade,

favorece o caminho de crescimento do chamamento à vocação

presbiteral.

Os exemplos de sacerdotes, venerados como santos, contribuem

muito ao encorajamento e à generosidade dos “vocacionados”.

Sacerdotes totalmente dedicados ao cumprimento do seu ministério

pastoral constituem os modelos referenciais seguros para a consolidação

das razões da escolha da ordem presbiteral.

Basta lembrar São João Maria Vianney, o Santo Cura d’Ars,

indicado pelo Santo Padre Bento XVI a todos os sacerdotes como

modelo luminoso durante o ano sacerdotal de 2010. Com ele se

poderiam recordar muitos outros sacerdotes exemplares que têm

acompanhado, com abnegação, o caminho do povo de Deus nas igrejas

locais durante muito tempo.

Certamente é de grande importância a invocação, confiante e

insistente, dirigida à Virgem Maria, Mãe dos Sacerdotes, para se ser

ajudado a acolher, com disponibilidade, o projecto de Deus na própria

vida e a responder “sim”, com fé e com amor, ao Senhor que chama

sempre novos operários para a difusão do Reino de Deus.

15

10. O crescimento e a maturação de uma vocação presbiteral

requer o amor concreto à própria Igreja particular e a completa

disponibilidade total para qualquer serviço pastoral, experimentando a

liberdade interior ao não sentir-se proprietário da própria vocação.

A participação activa na vida de uma comunidade cristã pode

contribuir para que se evitem novas formas de clericalismo, situações de

centralizações pastorais inoportunas, serviços pastorais em part-time,

escolhas ministeriais ajustadas às necessidades individuais, incapazes

duma visão de conjunto e de unidade da comunidade.

Para edificar uma Igreja em estado permanente de missão, a

vocação do presbítero realiza-se quando este faz crescer uma

comunidade rica em ministérios, na qual existem amplos espaços para a

participação activa e responsável dos fiéis leigos.

Para se tornarem capazes de animar e de sustentar uma

comunidade, é oportuno que os jovens chamados ao sacerdócio

aprendam a colaborar e a confrontar-se com toda a comunidade cristã e

a estimar cada vocação.

A dimensão universal é intrínseca ao ministério sacerdotal35. A

ordenação torna o presbítero idóneo para a missão, que constitui um

aspecto essencial da identidade presbiteral.

Neste sentido, é importante educar o “vocacionado” a preocupar-

se dos que estão próximos e, ao mesmo tempo, ter presente aqueles que

estão distantes.

A disponibilidade para a missão define a verdade do presbítero

em cada uma das suas actividades. Isto significa plasmar uma estrutura

35 Cf. CONGREGAÇÃO PARA O CLERO, Directório para o ministério e a vida dos presbíteros (31 de Janeiro de 1994), nn.14-15.

16

interior e um modo de ser, mais que um modo de fazer, que se

caracteriza pela coragem de sair de toda a forma de particularismo, para

abrir o coração às necessidades da nova evangelização.

17

III. PROPOSTAS PARA A PASTORAL DAS VOCAÇÕES

SACERDOTAIS

11. As vocações sacerdotais são o fruto da acção do Espírito

Santo na Igreja. Nalguns países regista-se um vigoroso e promissor

florescimento das vocações sacerdotais, que encoraja o prosseguimento

no caminho da promoção vocacional.

A Igreja, consciente da necessidade das vocações ao sacerdócio,

reconhece que elas são um dom de Deus e roga, com súplicas

incessantes e confiantes ao Senhor, para que Ele as conceda com

generosidade.

«É o próprio Cristo, o “Senhor da messe”, que escolhe os seus

operários. A sua chamada é sempre imerecida e inesperada. E contudo,

no mistério da aliança de Deus connosco, somos chamados a cooperar

com a Sua Providência e a utilizar o poderoso instrumento que Ele

confiou nas nossas mãos: a oração! Eis quanto o próprio Jesus pediu que

fizéssemos: “Rogai, portanto, ao Senhor da messe que envie

trabalhadores para a Sua messe” (Mt 9, 38)»36.

A oração toca o coração de Deus; torna-se uma grande escola de

vida para os fiéis, ensina a olhar o mundo e as necessidades de cada ser

humano com sabedoria evangélica; e sobretudo une os corações na

mesma caridade e na compaixão de Cristo pela humanidade37.

A experiência de muitas Igrejas locais atesta que um número

considerável de jovens sente o chamamento ao sacerdócio ministerial

36 JOÃO PAULO II, Discurso aos Membros da Associação “Serra Internacional” (7 de Dezembro de 2000), in Insegnamenti XXIII-2 (2000) 1050; Cf. Discurso aos Sócios do movimento para as vocações sacerdotais “Serra Internacional” (29 de Março de 1980), in Insegnamenti III-1 (1980) 759-761.37 Cf. JOÃO PAULO II, Mensagem para o XXXVIII Dia Mundial de Oração pelas Vocações (6 de Maio de 2001): AAS 93 (2001) 98-102.

18

especialmente nas comunidades nas quais a oração constitui uma

dimensão constante e profunda.

12. No Ocidente prevalece uma cultura indiferente à fé cristã e

incapaz de compreender o valor das vocações de especial consagração.

Todavia, a Igreja, chamada a viver no tempo, vê com um olhar

sapiente, dentro da história, a presença de Deus que acompanha,

interpela e chama à aliança, mesmo nos momentos aparentemente

menos fecundos e frutuosos; Ela vê «o mundo com grande simpatia

porque mesmo se o mundo se sentisse estranho ao cristianismo, a Igreja

não pode sentir-se estranha ao mundo, qualquer que seja a atitude do

mundo em relação à Igreja»38.

A Igreja continua, ainda hoje, a anunciar a Palavra de Deus e a

comunicar a boa nova da salvação com a coragem da verdade. De modo

particular, procura propor aos adolescentes e aos jovens a fé que

interpela a vida e responde à sede de felicidade que habita no coração do

homem.

Trata-se de propor a experiência da fé como relação pessoal e

profunda com o Senhor Jesus Cristo, revelador do Mistério de Deus.

Da resposta de fé nasce a descoberta da vocação, especialmente

quando é vivida no interior de comunidades cristãs, que vivem a beleza

do Evangelho, e nos ambientes onde trabalham animadores e

educadores capazes de perceber os sinais da vocação.

Para que se realize uma proposta de fé cristã, que suscite uma

resposta vocacional, é necessário favorecer espaços autênticos de

38 PAULO VI, Discurso na Solenidade da Epifania na gruta santa de Belém (6 de Janeiro de 1964): AAS 56 (1964) 177; L’Osservatore Romano Ano CIV – n. 5 (7-8 de Janeiro de 1964) 2. Original em francês; a tradução do texto em português pertence à redacção.

19

relações humanas39, através da acção de educadores e acompanhadores

adultos na fé e através de ambientes comunitários de vida cristã

atraentes e envolventes.

É positivo propor abertamente a vida sacerdotal aos adolescentes

e aos jovens e, ao mesmo tempo, é necessário convidar as comunidades

cristãs a rezar com mais intensidade “ao Senhor da Messe” (Mt 9,38)

para que suscite novos ministros e novas pessoas consagradas.

Para atingir esse objectivo, nas Igrejas locais é oportuno apoiar

uma pastoral geral que trabalhe com impulso evangélico, vocacional e

missionário.

13. Todos os membros da Igreja têm a responsabilidade da

solicitude das vocações sacerdotais. «O Concílio Vaticano II é explícito,

ao afirmar que “o dever de fomentar as vocações sacerdotais pertence a

toda a comunidade cristã, que as deve promover, sobretudo mediante uma

vida plenamente cristã” (Optatam totius, n. 2). Só na base desta

convicção, a pastoral das vocações poderá manifestar o seu rosto

verdadeiramente eclesial, desenvolvendo uma acção concorde, servindo-se

também de organismos específicos e de adequados instrumentos de

comunhão e de corresponsabilidade»40.

A Santa Sé instituiu, há setenta anos, a Pontifícia Obra para as

Vocações Sacerdotais com o objectivo de favorecer a colaboração entre

a Santa Sé e as Igrejas locais para a formação das vocações ao

ministério ordenado.

Esse organismo empenha-se na difusão e no conhecimento da

Mensagem para o Dia Mundial de Oração pelas Vocações, que o Santo

39 Cf. Novo millennio ineunte, n. 45: AAS 93 (2001) 298-299.40 Pastores dabo vobis, n. 41: AAS 84 (1992) 726-727.

20

Padre envia todos os anos à Igreja. Além disso, tem a tarefa de recolher

e de difundir as iniciativas vocacionais mais significativas que

enriquecem as Igrejas locais; organiza Congressos internacionais;

promove e colabora na realização dos Congressos continentais, com o

objectivo de favorecer a sinergia entre todos aqueles que trabalham no

campo da pastoral vocacional.

A experiência das últimas décadas demonstra que a utilização da

Mensagem do Santo Padre ajuda as Igrejas locais a definir, propor e

realizar os programas anuais de pastoral vocacional.

A função do Bispo na promoção das vocações, especialmente

daquelas sacerdotais, é central e fundamental. «A primeira

responsabilidade da pastoral orientada para as vocações sacerdotais é do

Bispo (Christus Dominus, n. 15), que é chamado a vivê-la em primeira

pessoa, ainda que possa e deva suscitar múltiplas colaborações. Ele é pai

e amigo no seu presbitério, e é sua, antes de mais, a solicitude de “dar

continuidade” ao carisma e ao ministério presbiteral, associando-lhe

novos efectivos pela imposição das mãos. Ele cuidará que a dimensão

vocacional esteja sempre presente em todos os âmbitos da pastoral

ordinária, melhor, seja plenamente integrada e como que identificada

com ela. Cabe-lhe a tarefa de promover e coordenar as várias iniciativas

vocacionais»41.

É compromisso do Bispo favorecer para que a pastoral juvenil e

vocacional seja confiada a sacerdotes e a pessoas capazes de transmitir,

com entusiasmo e com o exemplo da própria vida, a alegria de seguir o

Senhor Jesus na escola do Evangelho.

41 Pastores dabo vobis, n. 41: AAS 84 (1992) 727; Cf. CONCÍLIO ECUMÉNICO VATICANO II, Decreto sobre a formação sacerdotal Optatam totius (28 de Outubro de 1965), n. 2: AAS 58 (1966) 714; cf. CODEX IURIS CANONICI, can. 385.

21

A nível diocesano, o Bispo constitui o Centro diocesano para as

vocações, composto por sacerdotes, consagrados e leigos - como um

organismo de comunhão, ao serviço da pastoral vocacional na Igreja

local - com a função de promover as vocações de especial consagração,

no contexto de todas as vocações.

O Centro diocesano para as vocações ocupa-se da formação dos

animadores vocacionais, suscita e difunde no povo de Deus uma cultura

vocacional, participa na elaboração do programa pastoral diocesano,

colabora especialmente com os organismos diocesanos da pastoral

familiar, da catequese e da pastoral juvenil.

Nas dioceses e nas paróquias convém incentivar e sustentar os

grupos vocacionais, que propõem itinerários de educação cristã e de

preliminar discernimento vocacional42.

Os Centros nacionais ou interdiocesanos para as vocações, sob

mandato das Conferências Episcopais e, normalmente, sob a orientação

de um Bispo, coordenam os Centros diocesanos para as vocações.

14. A graça do chamamento encontra um terreno fértil numa

Igreja que, por meio das suas comunidades e de todos os fiéis, cria

condições para respostas vocacionais livres e generosas.

O Beato João Paulo II pediu aos Bispos para «fortificar o tecido

social da comunidade cristã por meio da evangelização da família, para

ajudar os leigos a difundir os valores da coerência, da justiça e da

caridade cristã no mundo juvenil»43.

42 Cf. Pastores dabo vobis, n. 41: AAS 84 (1992) 728.43 JOÃO PAULO II, Mensagem para o XXX Dia Mundial de Oração pelas Vocações (2 de Maio de 1993), in Insegnamenti XV-2 (1992) 135.

22

O testemunho das comunidades cristãs, que saibam testemunhar a

fé, torna-se ainda mais necessário nos dias de hoje para que os cristãos,

comprometidos no seguimento de Cristo, possam transmitir o seu amor.

A comunhão dos crentes em Cristo predispõe a receber o chamamento

do Senhor que convida à consagração e à missão.

A promoção das vocações sacerdotais acontece já nas famílias

cristãs; se animadas pelo espírito de fé, de caridade e de piedade,

constituem como que o “primeiro seminário” (Optatam totius, n. 2) e

continuam «a oferecer as condições favoráveis para o nascimento das

vocações»44.

Ainda que nas famílias cristãs se cultive um sentido de respeito

pela figura do sacerdote, todavia, nessas mesmas famílias,

particularmente no Ocidente, manifesta-se uma certa dificuldade em

acolher a vocação sacerdotal ou de consagração de um filho.

Existe um espaço educativo comum entre a pastoral familiar e a

pastoral vocacional. Tendo presente esse espaço, ocorre tornar mais

conscientes os pais do seu ministério de educadores da fé, enraizado no

sacramento do Matrimónio, para que no coração da família se

desenvolvam as condições humanas e sobrenaturais que tornem possível

a descoberta da vocação sacerdotal.

A paróquia é, por sua vez, o lugar por excelência no qual se

proclama o Evangelho da vocação cristã e, em particular, onde se

apresenta o ideal do sacerdócio ministerial. Ela é o terreno fértil no qual

brotam e amadurecem as vocações, com a condição de que seja «a

família de Deus em fraternidade animada por um mesmo espírito e, por

44 Pastores dabo vobis, n. 41: AAS 84 (1992) 728.

23

Cristo e no Espírito Santo»45 e, portanto, caracterizada pelo estilo de vida

das primeiras comunidades cristãs (cf. At 2, 42; 4, 32).

Na paróquia é evidente a variedade das vocações e é mais

consciente e viva a urgência das vocações sacerdotais, necessárias para

assegurar a celebração da Eucaristia e do sacramento da Reconciliação.

A comunidade paroquial é um seio fecundo, capaz de oferecer a

todos os que se encaminham para o ministério sacerdotal um precioso

contributo de formação humana e espiritual.

Os presbíteros e os consagrados, especialmente aqueles que

trabalham nas comunidades paroquiais, são pessoas decisivas para uma

proposta explícita da vocação sacerdotal às crianças, aos adolescentes e

aos jovens, graças a uma sapiente e convicta acção educativa, capaz de

provocar a questão vocacional.

Também os catequistas e os animadores da pastoral nas

paróquias, oferecendo uma proposta global da mensagem cristã, podem

individuar e oferecer preciosas conexões entre os temas da catequese e a

apresentação das vocações específicas, especialmente da sacerdotal:

«em particular, os catequistas, professores, educadores, animadores da

pastoral juvenil, cada um segundo os recursos e modalidades próprias, têm

uma grande importância na pastoral das vocações sacerdotais: quanto mais

aprofundarem o sentido da sua vocação e missão na Igreja, tanto melhor

poderão reconhecer o valor e carácter insubstituível da vocação e da

missão presbiteral»46.

15. Aos seminaristas deve ser lembrada uma consistente verdade

pastoral: «Ninguém está mais apto do que os jovens para evangelizar os

45 Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965) 34.46 Pastores dabo vobis, n. 41: AAS 84 (1992) 728.

24

jovens. Os jovens estudantes que se preparam para o prebiterado, os

jovens e as jovens que se encontram em formação religiosa e

missionária, tanto pessoalmente como em comunidade, são os primeiros

e imediatos apóstolos da vocação no meio dos outros jovens»47. Além

disso, deve-se ter em consideração os grupos eclesiais organizados, os

movimentos e as associações, enquanto preciosos lugares pedagógicos

de proposta da vocação sacerdotal. Nestes ambientes, o encontro com

Cristo é favorecido por uma concreta atenção às pessoas, por uma

proposta espiritual clara e centrada na oração. Muitas vocações

nasceram a partir destas experiências48.

Na escola, os professores empenhados num serviço que, por sua

natureza, é vocação e missão, podem ampliar a obra educativa da

família no horizonte da cultura e nunca negligenciar a dimensão

vocacional da vida.

O seu serviço pode abrir para uma escolha de vida de total doação

a Deus e aos irmãos, infundindo «no ânimo das crianças e dos jovens o

desejo de cumprir a vontade de Deus no estado de vida mais idóneo para

cada um, sem nunca excluir a vocação ao ministério sacerdotal»49.

O período universitário, em muitas nações, está também a tornar-

se para muitos jovens um tempo fecundo para as próprias escolhas de

vida. Tal facto merece a máxima atenção: os anos da juventude são

47 CONGREGAÇÕES PARA AS IGREJAS ORIENTAIS, PARA OS RELIGIOSOS E OS INSTITUTOS SECULARES, PARA A EVANGELIZAÇÃO DOS POVOS, PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA (organizadores), Desenvolvimentos do cuidado pastoral das vocações nas Igrejas particulares: experiências do passado e programas para a futuro. Documento conclusivo do II Congresso internacional dos bispos e outros responsáveis das vocações eclesiais - Roma, 10-16 de Maio de 1981 (2 de Maio de 1982), n. 41.48 Cf. Pastores dabo vobis, n. 41: AAS 84 (1992) 726-729.49 Pastores dabo vobis, n. 41: AAS 84 (1992) 728. Cf. CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA, Educar juntos na escola católica (8 de Setembro de 2007), n. 19.

25

preciosos e decisivos para a busca do sentido pleno da própria

existência.

Os animadores do tempo livre e do desporto, dentro das

instituições eclesiais, além dos motivos específicos que inspiram a sua

actividade e os valores humanos que permitem realizar, não devem

perder de vista o objectivo maior: a formação integral e harmónica da

pessoa. Tal formação humana, na medida em que se encontra com a

proposta educativa cristã, constitui de facto um terreno fértil para a

proposta da vocação sacerdotal.

A direcção espiritual é uma forma privilegiada de discernimento e

de acompanhamento vocacional. Da parte dos sacerdotes é pedida a

convicta disponibilidade à escuta e ao diálogo, a capacidade de suscitar

e dar respostas às interrogações fundamentais da existência, uma

notável sabedoria no tratar as questões inerentes às escolhas de vida e a

vocação ao ministério presbiteral.

A direcção espiritual e o counselling vocacional requerem uma

preparação específica na formação inicial e permanente dos presbíteros.

16. A promoção da vocação sacerdotal encontra os seus pontos

fortes nas propostas de formação à vida cristã, fundamentadas na escuta

da Palavra de Deus, participação na Eucaristia e no exercício da

caridade.

O anúncio da Palavra passa pela proclamação que inicia e indica

os modos e as formas de actuação do Evangelho na vida de cada fiel e

das comunidades eclesiais. «É precisa uma pregação directa sobre o

26

mistério da vocação na Igreja, sobre o valor do sacerdócio ministerial, e

sobre a sua urgente necessidade para o Povo de Deus»50.

Também a catequese é um caminho ordinário para a promoção

das vocações, quando ajuda os adolescentes e os jovens a considerar a

vida como resposta ao chamamento de Deus e os acompanha para

acolher na fé o dom da vocação pessoal.

A catequese de preparação para o sacramento da Confirmação é

uma ocasião para dar a conhecer aos crismandos os dons do Espírito, os

carismas, os ministérios e os diversos chamamentos que lhes estão

relacionados.

Em qualquer tipo de catequese não deve ser esquecida a

apresentação da vocação sacerdotal. «Uma catequese orgânica e

proporcionada a todas as componentes da Igreja, além de dissipar dúvidas

e refutar ideias unilaterais e distorcidas sobre o ministério sacerdotal, abre

os corações dos crentes à expectativa do dom e cria condições aptas ao

nascimento de novas vocações»51.

A Eucaristia, centro da vida do cristão e da comunidade, favorece

a proposta de um itinerário litúrgico sacramental, que possa alimentar

ordinariamente o caminho de cada vocação.

A frequência constante e periódica ao sacramento da

Reconciliação resulta também decisiva para o discernimento da vocação

sacerdotal.

O Ano Litúrgico constitui a escola permanente de fé da

comunidade cristã, marca os tempos e os momentos da sua vida

ordinária e acompanha o amadurecimento vocacional dos fiéis.

50 Pastores dabo vobis, n. 39: AAS 84 (1992) 723.51 Ibid.

27

As várias iniciativas de oração, entre as quais sobressai a

adoração eucarística, preparadas e realizadas de maneira significativa e

com profundo sentido litúrgico, podem colocar em evidência a

importância extraordinária da vocação sacerdotal.

O testemunho da caridade tem na Igreja uma expressão multiforme e

surpreendente. É fundamental que um tal empenho de iniciativas se reforce

através de caminhos formativos concretos, que encorajem à gratuidade e ao

serviço do Reino de Deus e que tendam à configuração pessoal e

comunitária com Cristo.

Cresce a sensibilidade dos jovens para com a condição dos mais

fracos e dos pobres; muitos se mostram prontos a servir, a identificar-se

com o próximo nas alegrias e nas dificuldades da vida.

Alguns escolhem o voluntariado caritativo como forma de serviço

aos que sofrem, aos idosos e aos pobres. Outros empenham-se na

educação das crianças na catequese, nas associações católicas, nas

actividades de tempo livre. A eles se unem todos os que vivem o

testemunho precioso do voluntariado missionário com a sua entusiasta

capacidade de transformar a vida de uma pessoa, abrindo-a às urgentes e

graves necessidades materiais e espirituais, fortemente presentes nos

países em vias de desenvolvimento.

As vocações que florescem no âmbito do testemunho cristão da

caridade resultam sólidas e autênticas, seriamente motivadas ao serviço.

17. Nas comunidades eclesiais ocorre encorajar um verdadeiro

movimento de oração para pedir vocações Senhor. «A oração cristã, de

facto, nutrindo-se da Palavra de Deus, cria o espaço ideal para que cada

um possa descobrir a verdade do ser e a identidade do projecto de vida

28

pessoal e irrepetível que o Pai lhe confia. É necessário, portanto, educar

em particular as crianças e os jovens para que sejam fiéis à oração e à

meditação da Palavra de Deus: no silêncio e na escuta poderão ouvir o

chamamento do Senhor ao sacerdócio e segui-lo com prontidão e

generosidade»52.

Devem ser sustentadas e incrementadas algumas iniciativas que

apresentem uma comunidade concorde na oração pelas vocações.

Desta forma, o Centro diocesano para as vocações poderia propor

e organizar a iniciativa do “mosteiro invisível”, que envolve muitas

pessoas, dia e noite, na oração contínua pelas vocações sacerdotais.

A “quinta-feira vocacional” constitui um momento tradicional de

oração comunitária mensal para os sacerdotes e as vocações sacerdotais,

centralizado na adoração eucarística.

O “Dia Mundial de Oração pelas Vocações” e o “Dia do

Seminário” representam dois momentos de notável relevância para a

oração, a catequese e o anúncio vocacional nas comunidades cristãs.

18. O serviço ao altar é, frequentemente, premissa para outras

formas de serviço na comunidade cristã. Esta experiência, sabiamente

integrada com a educação à oração litúrgica, à escuta da Palavra, à vida

sacramental, pode ser configurada como um verdadeiro itinerário aberto

à vocação sacerdotal.

Por este motivo a pastoral vocacional ao ministério sacerdotal

dedica uma especial atenção aos acólitos. Muitos sacerdotes e

seminaristas, antes de entrar no Seminário, fizeram parte dos grupos dos

acólitos e prestaram serviço ao altar.

52 Pastores dabo vobis, n. 38: AAS 84 (1992) 721.

29

Os retiros e os exercícios espirituais vocacionais, organizados

para os jovens, têm uma grande importância e permite-lhes viver a

experiência do silêncio, da oração contínua e do confronto com a

Palavra de Deus. Tais eventos podem constituir momentos singulares de

reflexão sobre o projecto de vida, como descoberta pessoal do próprio

chamamento vocacional.

As “comunidades vocacionais residenciais” também ajudam os

jovens na orientação e no discernimento vocacional em vista do

seminário. Essas constituem uma espécie de “pré-seminário”, com a

presença estável de sacerdotes preparados, que propõem uma “regra de

vida” marcada por momentos de vida fraterna, de estudo pessoal, de

partilha da Palavra, de oração pessoal e comunitária, de celebração da

Eucaristia, de direcção espiritual.

19. O Seminário menor pode oferecer aos adolescentes e aos

jovens a oportunidade de serem acompanhados, educados e formados no

discernimento do desejo de se tornarem sacerdotes. Além disso, pela

«sua natureza e missão, seria bom que o seminário menor se tornasse na

Diocese um válido ponto de referência da pastoral das vocações, com

adequadas experiências de formação de jovens em busca do sentido das

suas vidas, da vocação, ou que já se decidiram a seguir o caminho do

sacerdócio ministerial, mas que ainda não podem iniciar um verdadeiro

processo de formação»53.

53 CONGREGAÇÃO PARA OS BISPOS, Directório para o ministério pastoral dos Bispos Apostolorum successores (22 de Fevereiro de 2004), n. 86.

30

CONCLUSÃO

20. A solicitude com as vocações sacerdotais é um desafio

permanente para a Igreja.

Por ocasião do LXX aniversário de sua constituição, a Pontifícia

Obra para as Vocações Sacerdotais, para encorajar todas as

comunidades cristãs e nelas todos os que estão particularmente

comprometidos na pastoral vocacional, oferece às Igrejas particulares

este documento, como compêndio para a promoção das vocações ao

sacerdócio ministerial.

O ambiente mais favorável para a vocação ao sacerdócio é a

comunidade cristã que escuta a Palavra de Deus, que reza com a liturgia

e testemunha com a caridade. Em tal contexto, a missão do sacerdote é

compreendida e reconhecida com maior evidência.

O documento deseja apoiar as comunidades eclesiais, as

associações e os movimentos no seu empenho a favor das vocações,

orientando o seu esforço para uma pastoral vocacional capaz de fazer

amadurecer cada escolha do dom de si na vida e de favorecer, em

particular, o acolhimento do chamamento de Deus ao ministério

sacerdotal.

O Santo Padre, durante a audiência concedida ao Prefeito da

Congregação para a Educação Católica, aprovou e autorizou a

publicação deste documento.

Roma, 25 de Março de 2012, Solenidade da Anunciação do

Senhor.

31

ZENON Cardeal GROCHOLEWSKI

Prefeito

+JEAN-LOUIS BRUGUÈS

Secretário

32

ÍNDICE

INTRODUÇÃO

I. A PASTORAL DA VOCAÇÃO AO MINISTÉRIO

SACERDOTAL NO MUNDO

II. VOCAÇÃO E IDENTIDADE DO SACERDÓCIO

MINISTERIAL

III. PROPOSTAS PARA A PASTORAL DAS VOCAÇÕES

SACERDOTAIS

CONCLUSÃO

33