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Psicologia Social

Ariane Brum de Carvalho e Célia Maria Alcântara Machado Vieira

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Copyright © Sociedade de Educação Tiradentes

C331p Carvalho, Ariane Brum de. Psicologia social. / Ariane Brum de Carvalho, Célia Maria Alcân-tara Machado Vieira. – Aracaju : UNIT, 2011.

176 p.: il. : 22 cm.

Inclui bibliografia

1. Psicologia social. I. Vieira, Célia Maria Alcântara Machado. II. Universidade Tiradentes – Educação à Distância III. Titulo.

CDU : 316.6

Jouberto Uchôa de MendonçaReitor

Amélia Maria Cerqueira Uchôa Vice-Reitora

Jouberto Uchôa de Mendonça JúniorSuperintendente Geral

Ihanmarck Damasceno dos SantosSuperintendente Acadêmico

Eduardo Peixoto RochaDiretor de Graduação

Jane Luci Ornelas FreireGerente de Educação a Distância

Ana Maria Plech de BritoCoordenadora Pedagógica de Projetos Unit EAD

Lucas Cerqueira do ValeCoordenador de Tecnologias Educacionais

Equipe de Produção de Conteúdos Midiáticos:

AssessorRodrigo Sangiovanni Lima CorretoresAncéjo Santana ResendeFabiana dos Santos

DiagramadoresAndira Maltas dos Santos Claudivan da Silva SantanaEdilberto Marcelino da Gama Neto Edivan Santos Guimarães

IlustradoresGeová da Silva Borges JuniorMatheus Oliveira dos Santos Walmir Oliveira Santos Júnior

WebdesignersFábio de Rezende CardosoJosé Airton de Oliveira Rocha JúniorMarina Santana MenezesPedro Antonio Dantas P. Nou

Equipe de Elaboração de Conteúdos Midiáticos: SupervisorAlexandre Meneses Chagas

Assessoras PedagógicasKalyne Andrade Ribeiro Lívia Lima Lessa

Redação:Núcleo de Educação a Distância - NeadAv. Murilo Dantas, 300 - FarolândiaPrédio da Reitoria - Sala 40CEP: 49.032-490 - Aracaju / SETel.: (79) 3218-2186E-mail: [email protected]: www.ead.unit.br

Impressão:Gráfi ca GutembergTelefone: (79) 3218-2154E-mail: grafi [email protected]: www.unit.br

Banco de Imagens:Shutterstock

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Apresentação

Prezado(a) estudante, A modernidade anda cada vez mais atrelada ao

tempo, e a educação não pode ficar para trás. Prova disso são as nossas disciplinas on-line, que possibi-litam a você estudar com o maior conforto e comodi-dade possível, sem perder a qualidade do conteúdo.

Por meio do nosso programa de disciplinas on-

line você pode ter acesso ao conhecimento de forma rápida, prática e eficiente, como deve ser a sua forma de comunicação e interação com o mundo na mo-dernidade. Fóruns on-line, chats, podcasts, livespace, vídeos, MSN, tudo é válido para o seu aprendizado.

Mesmo com tantas opções, a Universidade Tiraden-

tes optou por criar a coleção de livros Série Bibliográfica Unit como mais uma opção de acesso ao conhecimento. Escrita por nossos professores, a obra contém todo o con-teúdo da disciplina que você está cursando na modalida-de EAD e representa, sobretudo, a nossa preocupação em garantir o seu acesso ao conhecimento, onde quer que

você esteja.

Desejo a você bom aprendizado e muito sucesso!

Professor Jouberto Uchôa de Mendonça

Reitor da Universidade Tiradentes

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Sumário

Parte 1: Aspectos Históricos e Temas Centrais da Psicologia Social . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

Tema 1: Surgimento da Psicologia Social . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

1.1 História da Psicologia como Ciência . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

1.2 Caminhando para uma Psicologia Social . . . . . . . . . . . . . 24

1.3 Psicologia Social e Perspectivas teóricas . . . . . . . . . . . . . 33

1.4 Psicologia Social no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

Tema 2: Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade . . . .55

2.1 O Homem como um Ser Social . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56

2.2 Constituição da Subjetividade no Processo de Produção e

Reprodução da Vida Social . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

2.3 Representações Sociais e Outros Temas . . . . . . . . . . . . . 73

2.4 Instituições socializadoras: família, escola, trabalho . . . 82

Parte 2: O Contexto das Práticas em Psicologia Social . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91

Tema 3: Psicologia Social e as relações de grupo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .93

3.1 Grupos, Instituições e Organizações . . . . . . . . . . . . . . . . . 94

3.2 Dinâmica de Grupo: relações interpessoais, intergrupais e

intragrupais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103

3.3 Relações de violência e de altruísmo . . . . . . . . . . . . . . . . 113

3.4 Contexto das Políticas Públicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .123

Tema 4: Psicologia Social e Práticas Interdisciplinares . . . . . . . . . 133

4.1. Preconceito, discriminação e estereótipos sociais . . . . 134

4.2 Campos de atuação em Psicologia Social . . . . . . . . . . . . 143

4.3 Debates atuais em Psicologia Social e Interface com

outras áreas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151

4.4 Interfaces entre a Psicologia Social e o Serviço Social . 159

Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 168

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Ementa

Surgimento da psicologia social: História da Psico-logia como ciência; Caminhando para uma Psicologia So-cial; Psicologia Social e perspectivas teóricas; Psicologia social no Brasil. Debate contemporâneo das relações in-divíduo-sociedade: O homem como ser social; Constitui-ção da subjetividade no processo de produção e repro-dução da vida social; Algumas categorias da Psicologia Social; Instituições de socialização: família, escola e tra-balho. Psicologia social e as relações de grupo: Grupos, Instituições e Organizações; Dinâmica de Grupo: relações interpessoais, intergrupais e intragrupais; Relações gru-pais de reciprocidade; Relações grupais de dominação. Psicologia social e práticas interdisciplinares: Preconcei-to, discriminação e estereótipos sociais; Interface entre o Serviço Social e a Psicologia Social; Campos de atuação em Psicologia Social; Debates atuais em Psicologia So-cial e interface com outras áreas.

Objetivos

Geral

Viabilizar o estudo e a compreensão dos temas relativos à Psicologia Social e suas relações com a reali-dade contemporânea.

Específicos

• Conduzir o estudante ao contexto em que surge e se consolida a psicologia social en-quanto campo específico de produção de conhecimento;

• Oferecer uma visão panorâmica das grandes correntes de pensamento da psicologia so-cial;

Concepção da Disciplina

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• Introduzir os conceitos e categorias de aná-lise fundamentais da psicologia social con-temporânea;

• Proporcionar ao estudante o contato com o campo problemático recente da psicologia social;

• Refletir sobre as relações que a psicologia social estabelece com outros saberes e prá-ticas;

• Discutir o fazer do psicólogo social enquan-to prática em construção contínua;

• Apresentar os campos de atuação mais co-mumente freqüentados pelo psicólogo so-cial;

• Possibilitar ao estudante uma apreensão ini-cial da especificidade da psicologia social, insistindo na dinâmica constante de desen-volvimento deste campo de análise e inter-venção.

Orientação para Estudo

A disciplina propõe orientá-lo em seus procedi-mentos de estudo e na produção de trabalhos cien-tíficos, possibilitando que você desenvolva em seus trabalhos pesquisas, o rigor metodológico e o espírito crítico necessários ao estudo.

Tendo em vista que a experiência de estudar a distância é algo novo, é importante que você observe algumas orientações:

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• Cuide do seu tempo de estudo! Defina um horário regular para acessar todo o conteúdo da sua disciplina disponível neste material impresso e no Ambiente Virtual de Aprendi-zagem (AVA). Organize-se de tal forma para que você possa dedicar tempo suficiente para leitura e reflexão.

• Esforce-se para alcançar os objetivos pro-postos na disciplina.

• Utilize-se dos recursos técnicos e huma-nos que estão ao seu dispor para buscar esclarecimentos e para aprofundar as suas reflexões. Estamos nos referindo ao con-tato permanente com o professor e com os colegas a partir dos fóruns, chats e encontros presenciais. Além dos recursos disponíveis no Ambiente Virtual de Apren-dizagem – AVA.

Para que sua trajetória no curso ocorra de forma tranquila, você deve realizar as atividades propostas e estar sempre em contato com o professor, além de acessar o AVA.

Para se estudar num curso a distância deve-se ter a clareza que a área da Educação a Distância pau-ta-se na autonomia, responsabilidade, cooperação e colaboração por parte dos envolvidos, o que requer uma nova postura do aluno e uma nova forma de con-cepção de educação.

Por isso, você contará com o apoio das equipes pedagógica e técnica envolvidas na operacionalização do curso, além dos recursos tecnológicos que contri-buirão na mediação entre você e o professor.

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ASPECTOS HISTÓRICOS E TEMAS CENTRAIS DA PSICOLOGIA SOCIAL

Parte 1

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1 Surgimento da Psicologia Social

A Psicologia Social é uma área da Psicologia que se ocupa, mais especificamente, dentre outras questões, de discutir a relação indivíduo-sociedade. Existem algumas perspectivas teóricas que se dedicam aos estudos e práticas com ênfase nessa relação de compor-tamentos dos indivíduos com o ambiente social e, do mesmo modo, dos aspectos sociais que compõem a subjetividade dos indivíduos.

Apresentaremos aqui o percurso histórico de surgimento da Psi-cologia como Ciência e em seguida da Psicologia Social, abordando principais correntes, objetos de estudo e dimensão prática dessa área da Psicologia que oferece importante contribuição a outras disciplinas do conhecimento.

Desejamos que você nos acompanhe nesse percurso e se per-mita refletir um pouco sobre essas possíveis relações.

Boa leitura!

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Psicologia Social14

1.1 História da Psicologia como Ciência

“Psicologia” parece-nos um termo bastante amplo e muito presente em nosso cotidiano. Basta anunciarmos em uma conversa informal em uma viagem de ônibus, por exemplo, que somos psicó-logos, para, ligeiramente, nosso companheiro de viagem seguir contando fatos de sua vida, ou cons-tranger-se, aventando que iremos “ler seus pensa-mentos” ou então analisá-lo.

Esse imaginário coletivo muito comum deve-se ao fato de a Psicologia, antes de instituir-se como Ciência, ter surgido junto à filosofia e ao misticismo, o que manteve até os dias atuais um imaginário fan-tástico acerca do saber e do fazer psicológico.

Aqui se coloca como de fundamental impor-tância esclarecer que quando falamos em Psicolo-gia como ciência, estamos distinguindo-a de uma “psicologia” do senso comum, que está presente no cotidiano. Entretanto, as primeiras experiências que enunciam um saber científico nascem da tenta-tiva de explicar fatos do cotidiano.

Vale ressaltar que fazer ciência nada mais é do que refletir, estudar e sistematizar aspectos e aconte-cimentos do dia a dia. Portanto, para tornar científico um conhecimento do senso comum, foi necessário criar uma série de critérios, como por exemplo, isolar o objeto de pesquisa de seu contexto e separá-lo para poder explicá-lo. Foi no sentido de garantir isso que surgiram os laboratórios, pois estes criam um cli-ma de confiabilidade para as investigações científicas.

Vários autores se dedicam a estudar o percur-so traçado pelas diversas formas de conhecimento, até chegarmos à Psicologia dita científica. Os autores Bock, Furtado e Teixeira (2007), foram tomados como referência parta construção deste eixo temático, uma vez que nos trazem importantes contribuições.

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15Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

Destacam esses autores que as investigações científicas na Psicologia iniciam com a busca pelos conhecimentos mais diversos e gerais inerentes a vários aspectos da vida humana. Os conhecimentos foram sendo sistematizados para compreender os fenômenos da natureza e a relação desses fenô-menos com os seres humanos. Nesse sentido, a civilização grega se destacou, tendo sido a mais evoluída na época de 700 a. C. até o início da Era Cristã. Os assuntos que despertavam o interesse dessa civilização eram voltados à estruturação das pólis (cidades), sua arquitetura e até sobre os mo-dos de governá-la (democracia). Ou seja, o interes-se era desenvolver um conhecimento aplicável para resolução de problemas da sociedade. Além desse conhecimento aplicável, os gregos preocuparam-se com a origem e significado da existência humana, fundando o questionamento filosófico.

É ainda dentro da civilização grega que se situam os primórdios da Psicologia. Em verdade, é com Sócrates (469-399 a.C.) que a “psicologia” na Antiguidade ganha consistência, uma vez que este procurava definir o que separa o homem dos animais. Percorrendo tal caminho,este filósofo che-ga à ideia de que a razão, principal característica humana, sobrepõe-se aos instintos.

Ainda outros dois filósofos gregos se desta-cam nesse período: Platão (428/427-348/347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.), que investigaram sobre a interioridade do ser humano. O próprio termo psicologia vem do grego psyché, que significa alma, e de logos, que significa razão. Etimologicamente, portanto, psicologia significa estudo da alma. Pla-tão deu continuidade aos estudos de Sócrates. Para ele, era necessário encontrar um lugar para a alma, situando-a na mente (cabeça), estando, portanto, separada do corpo. Já Aristóteles, que foi discípulo

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Psicologia Social16

de Platão, segue um caminho diferente, ao postular que a alma e o corpo não podem ser dissociados.

Outro momento importante na história da Psicologia é a chegada do Império Romano, que passa a dominar a Grécia, inserindo então na cul-tura grega princípios do Cristianismo a partir da Igreja Católica, que, neste momento, passa também a dominar os conhecimentos até então existentes ligados à área da ciência que hoje chamamos de Psicologia.

Falando em marcos históricos, é imprescindí-vel apontarmos ainda o período do Renascimento. Nele as ciências avançaram, tendo sido um mo-mento histórico de valorização do homem. Galileu (1564-1642) e Copérnico (1473-1543) são alguns ícones que demarcam o início da sistematização do conhecimento científico no período da Renascen-ça. Quem também se destacou neste período foi Descartes (1596-1650), um dos filósofos que mais contribuiu para o avanço da ciência. Ele postulou a separação entre a alma e o corpo, comparando este ao funcionamento de uma máquina. A partir desse momento, o conhecimento científico passou a orientar-se por meio dos postulados de Descar-tes, denominado cartesianismo, que predomina até hoje na ciência. A visão dicotômica “mente-corpo” e outras dissociações dela decorrentes perpassam as ciências naturais e humanas, oriundas do modelo cartesiano de produção de conhecimento.

O filme “O ponto de Mutação”, basea-do na obra de Fritjof Capra, apresenta uma discussão dos efeitos provocados pelo cartesianismo na evolução do co-nhecimento científico. Título original: Mindwalk. Filme de Bernt Capra. Cannes Home Vídeo,1990.

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17Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

Percurso do conhecimento científico

O século XIX1 é marcado pelo crescimento da nova ordem econômica e social – o capitalismo, que incentivou o aumento da produção e estimulou a necessidade de consumo das mercadorias pro-duzidas. O conhecimento científico volta-se a essa nova ordem econômica, no sentido de solucionar problemas gerados pelo próprio sistema. Portan-to, o conhecimento deveria se desvincular da fé e caracterizar-se pela racionalidade.

Enquanto na época feudal a terra era a prin-cipal fonte de produção e a ciência se restringia à criação de um método rigoroso para desvendar as leis da Natureza, nesse novo tempo, a ciência avança tornando-se, sobretudo, um referencial para uma nova visão de mundo. É neste contexto, no qual os pressupostos da ciência se tornam cada vez mais potentes, que surge o Positivismo, tendo como principal teórico Auguste Comte (1798-1857).

Comte é conhecido como o pai da Sociologia e postula o método positivista, estabelecendo-se como um modo de produção da ciência que, segun-do ele, oferece um conhecimento confiável, que se equivale à verdade, ou seja, para Comte, o conhe-cimento científico seria a única forma de se obter um conhecimento verdadeiro. A partir daí surgiu a necessidade de desenvolver maior rigor para a pro-dução desse conhecimento.

Para tal, o Positivismo volta-se para o que chamou de “fatos observáveis”, estabelecendo uma crítica ao Romantismo, fornecendo subsídio à realização de várias pesquisas na física, na bio-logia, na química – chamadas Ciências Naturais. O método positivista reitera o rigor da descrição baseada na observação e experimentação para produção de conhecimento.

1 Este século é conhecido como Período da Modernidade devido ao desenvolvimento do capitalismo e da Revolução Industrial (meados do século XIX). É também o período de ascensão do conhecimento racional sobre o religioso.

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Psicologia científica

Apesar de podermos falar em antecedentes da Psicologia em diversas ideias filosóficas, como apresentadas anteriormente, o reconhecimento da Psicologia como ciência só ocorreu no final do sé-culo XIX, o que mostra que ela é uma ciência rela-tivamente recente.

Seu marco histórico é a criação do primei-ro Laboratório de Experimentos em Psicofisiologia, fundado em 1879 por Wilhem Wundt (1832-1926), em Leipzig, na Alemanha. Esse marco representa o afastamento da Psicologia dos grandes questiona-mentos filosóficos, demarcando sua vinculação às ciências médicas que, nesse século, estruturavam o conhecimento científico com base no método das ciências naturais2. A Psicologia é reconhecida como ciência, portanto, quando se desvincula da filosofia e assume os moldes daquilo que era preconizado pelo modelo positivista, predominante na ciência da época.

É interessante destacar, também, como já ci-tado anteriormente, que a definição de um objeto de estudo é um dos pressupostos para que o co-nhecimento seja considerado científico. A Psicolo-gia, ao longo de sua história, tem tido dificuldade de delimitar um único objeto, uma vez que, ape-sar de ter o homem como centro de seu interesse, apresenta uma diversidade de objetos, como, por exemplo, o próprio homem, o comportamento hu-mano ou ainda o inconsciente, variando de acordo com a corrente teórica. Atualmente, entende-se que devido à complexidade dos fenômenos humanos, o objeto de estudo da Psicologia pode ser definido como sendo a subjetividade. Esta seria, por sua vez, o universo da singularidade que nos identifi-ca como seres individuais com ideias, sentimentos,

2 O método origi-nário das Ciências Naturais parte do princípio de que todo conhecimento humano tem origem na sensação. A experiência propicia a leitura do real que consiste em: observar, descrever, comparar e classi-fi car (AMARANTE, 2003)

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19Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

significados, emoções que representam os modos singulares de sentir, amar, viver, experimentar e se expressar.

Nas pesquisas em Psicologia, o próprio pes-quisador (o homem) faz parte do objeto de pesqui-sa. Logo, percebe-se essa peculiaridade de que o objeto de estudo coincide com o pesquisador, de-mandando, portanto, que sejam criadas diferentes estratégias de separação entre pesquisador e obje-to pesquisado, como apregoa o método científico.

A subjetividade se constrói com o social em uma relação inseparável, pois na medida em que o homem constrói o mundo externo, constrói tam-bém o mundo interno – o modo de pensar e sentir o externo (estas ideias serão mais desenvolvidas com o decorrer da leitura nos próximos temas).

Assim, podemos perceber que algumas pes-quisas em Psicologia são menos vinculadas com os modos positivistas de fazer ciência, tendo em vista a peculiaridade de seu objeto de estudo: o homem e a subjetividade. Todavia, em outros tem-pos, o Positivismo colocou-se como um paradigma absolutamente hegemônico e é por esse motivo que o mesmo norteou as primeiras pesquisas da Psicologia enquanto ciência, como afirmamos an-teriormente.

Contribuições de Wundt à Psicologia Científica

A criação da máquina a vapor produziu no homem uma visão de mundo referendada pela má-quina, a qual denominamos visão mecanicista. Com base nessa visão, Wilhelm Maximilian Wundt (1832-1920) criou modos de estudar a mente ou a cons-ciência, utilizando o método das ciências naturais. Para isso, precisou abandonar as ideias primordiais de Psicologia vinculada à alma, uma vez que esta

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não seria passível de investigação nos moldes científicos da época, que trabalhava somente com

fatos observáveis.Wundt explica o funcionamento

da mente através do paralelismo psico-físico, que consiste na associação ou comparação entre fenômenos mentais e fenômenos orgânicos. Parte do pres-

suposto de que uma estimulação orgâ-nica externa reverbera no cérebro. E, para com-provação dessa teoria, desenvolve o método do introspeccionismo, que busca compreender os efeitos (ou respostas) que um estímulo externo provoca na mente. Por exemplo, a partir de uma

picada com uma agulha sobre a pele, o método consiste em solicitar ao indivíduo pesquisa-do que descreva as sensações despertadas mediante o estímulo externo. Dessa forma, a introspecção leva o próprio sujeito a observar

o processo mental que se situa entre um estímulo e uma resposta.

Introspecção significa observação da própria mente (auto-observação).

Além de Wundt, encontramos também Weber

(1795-1878) e Fechner (1801-1887) que estudaram a relação estímulo-sensação. Outros estudiosos im-portantes desse período inicial da Psicologia cientí-fica foram o americano William James (1842-1910) e o inglês Edward B. Titchener (1867-1927) que, após estudarem em Leipzig, Alemanha, fundaram nos Es-tados Unidos o Funcionalismo e o Estruturalismo, respectivamente, que serão explicados no tópico seguinte. Como todos esses teóricos estudaram em Leipzig, a Alemanha é considerada o berço da Psi-cologia Moderna.

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21Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

Da Alemanha para os Estados Unidos

No século XX a Psicologia norte-americana se destaca, em função do êxodo de muitos pesqui-sadores no período da Segunda Guerra Mundial. Os mesmos saíram da Europa buscando refúgio nos EUA por conta do regime nazista. Além disso, o crescimento econômico do capitalismo nos EUA permitiu o desenvolvimento das primeiras escolas de Psicologia, das quais se originaram algumas te-orias. São elas:

Funcionalismo (William James): Estritamente pragmática, decorrente do modelo social vigente, tem o objetivo de responder sobre as causas e as finalidades das ações humanas, baseada em estu-dos da consciência.

Estruturalismo (Edward Titchener): Estuda a consciência através de seus aspectos estruturais, com base no sistema nervoso central.

Associacionismo (Edward L. Thorndike): For-mula a primeira teoria da aprendizagem da Psico-logia, a qual se dá por um processo de associação de ideias, além da Lei do Efeito, que prenuncia que todo comportamento, se reforçado, tende a se repetir.

Três grandes escolas da Psicologia se desen-volveram a partir dessas teorias:

Behaviorismo (Comportamentalismo) ou Teo-ria Estímulo-Resposta (S-R): fundada por Watson (1878-1958), tem seu maior desenvolvimento nos EUA. As funções psicológicas são definidas a partir do comportamento observável (behavior).

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Psicologia Social22

Gestalt (Psicologia da Forma): Surge na Euro-pa, através de estudos de Max Wertheimer (1880-1943), impondo a necessidade de compreender o homem pela sua totalidade, numa crítica à Psico-logia Moderna3 que, devido à necessidade de com-provação científica, fragmentou o ser humano.

Psicanálise: Surge com Sigmund Freud (1856-

1939), na Áustria. Tem como objeto de estudo o inconsciente. Assim como a Gestalt, esta escola procura trazer outros elementos envolvidos nos fe-nômenos psicológicos, além dos aspectos psicofi-siológicos.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para saber mais sobre essa discussão da Psicologia como Ciência e a diferença do conhecimento e do senso comum, você pode ler os capítulos 1 e 2 do livro “Psicologias” (p. 15 a 45). Os autores discu-tem os antecedentes históricos da Psicologia como ciência e seu processo de consolidação.

Os capítulos 3, 4 e 5 do mesmo livro abordam as correntes teóricas brevemente apresentadas aqui: Behaviorismo, Gestalt e Psicanálise.

BOCK, A; FURTADO, O; TEIXEIRA, M. L. T. Psicolo-gias: uma introdução ao estudo da Psicologia. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

Um outro texto interessante é o capítulo 4 do livro História da Psicologia Moderna, que traz algumas informações sobre os primórdios da Psicologia, na Alemanha.

3 Falamos em Psicologia Moderna aquela que emerge no período da Modernidade.

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23Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

GOODWING, C.J. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cultrix, 2005.

PARA REFLETIR

Nesse item conhecemos o percurso histórico de surgimento da psicologia pré-científica, com os pri-mórdios na civilização grega, e da Psicologia Cien-tífica, demarcada por estudos em laboratórios con-dizentes com o modelo de ciência vigorado pelo surgimento do capitalismo no século XIX e das prin-cipais correntes teóricas do século XX.

Discuta com seus colegas o que caracteriza a Psico-logia científica e quais os aspectos que lhe diferen-ciam de uma “psicologia” que esteve historicamen-te mais vinculada à filosofia.

Reflitam também sobre o duplo lugar do homem no contexto da pesquisa em Psicologia: 1) pesqui-sador e 2) sujeito-objeto da pesquisa, relacionando com a exigência da objetividade científica emergen-te no período da Modernidade.

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1.2 Caminhando para uma Psicologia Social

Para discutirmos essa questão tomaremos como base os autores Álvaro e Garrido (2006), que trazem importantes contribuições para o estudo da Psicologia Social. Antes de adentrarmos ao nosso tema propriamente dito, gostaríamos de retomar uma citação desses próprios autores, quando nos lembram de que “reconstruir origens de qualquer disciplina científica, recorrendo à busca de um mar-co fundador concreto, é sempre uma tarefa comple-xa e, muitas vezes, arbitrária” (Op. cit., p.2).

Diante disso, vale ressaltar que prenúncios de uma Psicologia Social podem ser encontrados ain-da no século XIX, quando são difundidos estudos sobre a linguagem e a comunicação, sistematizan-do os aspectos da relação indivíduo e sociedade.

É importante ainda assinalar como antece-dente, na segunda metade do século XIX, o de-senvolvimento das Ciências Sociais na França. Os trabalhos de sociologia de Émile Durkheim (1858-1917), com o conceito de representações coletivas irá influenciar a temática de representações sociais. Além disso, a Psicologia Social também recebe in-fluência de Gabriel Tarde (1843-1904), com as teo-rias sobre a imitação, e de Gustave Le Bon (1841-1931), com a teoria da psicologia das massas.

Para Durkheim, sociólogo francês, há um evi-dente predomínio do social sobre o individual. A consciência coletiva determina a consciência indi-vidual, ou seja, para ele, a sociedade determina o comportamento do indivíduo. O sociólogo se refere à coerção social como sendo o mecanismo deter-minante das relações entre sociedade e indivíduo.

Já Gabriel Tarde opõe-se às ideias de Durkheim, negando a existência de uma consciência coletiva independente dos indivíduos. Diverge ain-

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25Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

da na consideração de Durkheim sobre a coerção social, afirmando que a conduta social é explicada pela imitação. Em síntese, o comportamento social para ele é resultado de uma influência recíproca entre a sociedade e os indivíduos. Por isso, Tarde foi o precursor do conceito de interação. Para ele, o comportamento social é resultado de influência recíproca e não unidirecional entre as consciências.

Com relação a Gustave Le Bon, este é conhe-cido como precursor da psicologia das massas. O próprio Freud (1856-1939), em 1921, faz referência a este autor em sua obra “Psicologia das massas e análise do eu”. Dentre suas principais afirmações, o autor considera que o fenômeno da multidão pro-move processos psicológicos impossíveis de serem capturados em indivíduos isolados, principalmente podendo levá-los a cometer atos de barbárie por perder a capacidade de raciocínio, tornando-se muito sugestionáveis.

Outro marco importante para consolidação da Psicologia Social encontra-se no início do século XX, mais precisamente em 1908, com a publicação do livro An Introduction to Social Psychology de Mc Dougall (1871-1938). Esse manual corrobora com a tradição evolucionista da psicologia britânica, tra-zendo uma Psicologia Social com forte caráter indi-vidual e biologicista (VALA; MONTEIRO, 2004).

Álvaro e Garrido (2006) também afirmaram que Mc Dougall elaborou a teoria dos instintos, afirmando que grande parte do comportamento humano é de ordem instintiva. Sua teoria teve for-te rejeição devido à influência da teoria empirista que considera o homem como tábula rasa, onde os conteúdos são adquiridos pela experiência, contra-pondo-se à ideia de natureza instintiva. Para ele, o instinto possui três componentes: comportamental, emocional e cognitivo. Rejeitou os métodos de pes-

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Psicologia Social26

quisa subjetivos utilizados pela Psicologia, como a introspecção, e passou a defender a aplicação dos métodos objetivos à Psicologia humana. A teoria dos instintos teve articulação com os movimentos eugenistas, de melhoria da espécie.

Além dele, Strey et. al. (2008) destacam, ain-da, Gordon Allport (1897-1967). Foi ele quem apre-sentou esta disciplina - Psicologia Social - no fim da Segunda Guerra Mundial e é quem associa o interesse pela Psicologia Social ao desenvolvimen-to da corrente positivista de Augusto Comte, além de ter realizado estudos sobre preconceito. Já Kurt Lewin (1890-1947) contribui para a construção de uma Psicologia Social experimental nos EUA, atra-vés de estudos sobre dinâmica de grupos, que ve-remos mais adiante.

É interessante observar que Wundt, enuncia-do anteriormente como fundador dos primeiros ex-perimentos psicofísicos de Psicologia, para torná-la uma disciplina científica, também contribuiu em sua atividade acadêmica para a área da Psicologia So-cial, como salientam Strey et. al. (2008). O grande ícone é sua obra Völkerpsychologie (nome original em alemão) ou Psicologia dos Povos (1900-1920), publicada em 10 volumes, que conclui apenas no seu último ano de vida, em 1920. Para Wundt, o re-sumo desta obra, publicado na terceira edição em 1908, permite uma melhor compreensão do conte-údo teórico da Psicologia dos Povos.

Segundo Bernardes (apud GUARESCHI; CARLOS; FONSECA, 2010), Wundt também queria criar uma Psi-cologia Social e essa foi sua tentativa com a Psicologia dos Povos. Ele constatou que a Psicologia Experimen-tal criada por ele não dava conta de todos os fenôme-nos humanos que a Psicologia procurava explicar, tais como os temas investigados nessa obra: linguagem, religião, pensamento, cultura, costumes, mitos etc. A

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27Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

situação de laboratório e seu método introspectivo servia para investigar apenas os processos sensoriais básicos. O objeto de estudo da Psicologia, contudo, continuaria sendo a mente, mas na Völkerpsychologie o foco era a mente em interlocução com a cultura.

Por ter sido Wundt o pai da Psicologia eEperi-mental e ter sistematizado os estudos em Psicologia científica, teve muitos seguidores. Alguns deles forta-leceram aspectos que se destacavam como mais pro-missores à consolidação do conhecimento científico.

Strey et. al. (2008) destacam Edward Tichener como um dos discípulos de Wundt que, ao mudar--se para os EUA, deu continuidade aos estudos ex-perimentais, privilegiando aspectos da Psicologia Experimental.

Muito embora vários livros de Psicologia Social não associem de antemão os estudos de Lev Vygotsky (1896-1934) a essa área da Psicologia, aproximando-o mais da Psicologia do Desenvolvimento, há que se considerar a relevância desse psicólogo, sobretudo porque hoje vemos muito psicólogos sociais desenvolverem seus trabalhos baseados em sua teoria, como os psicólogos brasileiros da Psicologia Sócio-Histórica. Para ele, qualquer estudo da Psicologia deveria partir do princípio de que a mente é socialmente deter-minada. Seus principais estudos voltaram-se aos processos cognitivos e à relação pensamento e lin-guagem, ambos, socialmente determinados.

A Psicologia Social e sua relação com o período moderno

Veremos, agora, alguns fatos históricos e so-ciais, bem como os principais estudos que impul-

Wundt

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Psicologia Social28

sionaram a criação de trabalhos voltados à Psico-logia Social.

A Psicologia Social no século XX está atrelada a acontecimentos sociais, econômicos e políticos relacionados às guerras mundiais, aos movimen-tos do nazismo e fascismo e à luta do capitalismo contra o socialismo. A estruturação das cidades e a figura do Estado, características da idade moder-na, legitimaram e demandaram um conhecimento voltado à subjetividade e ao comportamento dos homens para que se adaptassem a essas grandes transformações advindas desse período.

Desde a Primeira Guerra Mundial construiu--se uma demanda de trabalho aos cientistas sociais, principalmente aos médicos, para superar as crises que abalaram as estruturas da sociedade no pós--guerra. Para isso, era necessário elaborar estraté-gias de reestruturação social, uma vez que a guerra provocou a devastação de muitas estruturas sociais.

Contudo, foi a Segunda Guerra Mundial, mais precisamente, que forneceu subsídio para a con-solidação da Psicologia Social em sua dimensão prática. Os psicólogos foram convocados a realizar estudos para a adequação dos soldados à guerra e sobre processos grupais, com o objetivo de encon-trar formas de reorganizar as cidades.

Álvaro e Garrido (2006) relatam que nesse período se destacaram estudos sobre liderança, racismo, relações grupais, conflitos de valores, comunicação, propaganda, mudanças de atitudes etc, além de estudos sobre persuasão (motivação militar para a guerra, levantamento da moral dos militares). Como exemplo, pode-se citar o estudo de Norman Triplett, em 1897, sobre desempenho grupal em condições de isolamento.

Uma importante marca da influência da rela-ção do período do pós-guerra com o desenvolvi-

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29Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

mento da Psicologia Social é a Escola de Frankfurt de Ciências Sociais. Esta Escola é representada por teóricos que tiveram que se exilar, a maioria de-les, primeiro em outros países da Europa e depois nos EUA, após Hitler ter fechado os Institutos de Pesquisa dos quais faziam parte na Alemanha. Den-tre os teóricos encontra-se Theodor Adorno (1903-1969), Herbert Marcuse (1898-1979) e Walter Ben-jamin (1892-1940). A Escola de Frankfurt recebeu influência das obras de Karl Marx (1818-1883) e Max Weber (1864-1920). A partir da migração desses te-óricos para os EUA - principalmente Adorno - foram desenvolvidos estudos sobre Personalidade Auto-ritária. Os estudos buscavam analisar as raízes do antissemitismo4.

As pesquisas de Kurt Lewin também tiveram influência do período pós-guerra, tendo sido outro teórico importante no período moderno. Kurt Lewin fundou, em 1945, o Centro de Pesquisas de Dinâ-mica de Grupo para estudantes de pós-graduação em Psicologia Social, onde desenvolveu pesquisas aplicadas a problemas sociais. Conseguiu compro-var em laboratório que a democracia é melhor que a autocracia. É autor da frase: “Não existe nada mais prático que uma boa teoria” (apud FARR, 1996, p.170).

Lewin, por ser judeu, emigrou da Alemanha para os EUA quando Hitler chegou ao poder. Strey et. al. (2008) comentam que, após a morte de Lewin, em 1947, o Centro de Pesquisa em Dinâmica de Grupo foi transferido para a Universidade de Mi-chigan, tornando-se parte do Instituto de Pesquisas Sociais. Considerado um fundador da Psicologia Social como uma ciência experimental e aplicada, Lewin também forneceu contribuições aos estudos sobre grupos. Nos métodos de pesquisa que de-senvolveu deu mais ênfase aos processos que con-

4 O antissemitismo consiste na propa-gação de ideias de que os judeus são perigosos, imorais e não pertencentes às mesmas categorias que não-judeus.

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Psicologia Social30

ferem especificidade aos grupos do que aos aspec-tos que permitiriam uma análise dos indivíduos em grupos. Para ele, a realidade de um indivíduo está atrelada ao que é socialmente aceito.

Podemos dizer que o período moderno exigia que os indivíduos se ajustassem à socie-

dade e à nova ordem social. É como se a estrutura social, devido ao seu avanço e organização, fomentada pelo advento do capitalismo, fosse tida como um fato con-solidado. Nesse sentido, as mudanças de-veriam partir dos indivíduos. Grande parte das intervenções em Psicologia Social, nes-

sa época, foi direcionada aos aspectos individuais, mas isso também não quer dizer que a Psicologia Social que estava sendo formulada nesse período não considerasse a influência das estruturas sociais sobre os comportamentos individuais.

Um exemplo do que estamos tratando refere-se à criação de asilos e hospitais psiquiátricos. Com base no raciocínio de que existem causas internas, por vezes independentes de estruturas sociais, res-ponsáveis pela manifestação da loucura, buscaram-se nos indivíduos explicações para justificar os métodos do tratamento asilar para a loucura. Estes locais eram destinados também àqueles inadaptados ou desajustados ao projeto de ordem social vigorado pelo capitalismo. Suge-rimos a leitura do conto “O Alienista” de Machado de Assis5, para elucidar alguns pressupostos do surgimento do cientifi-cismo, na tentativa em classificar e com-preender a discussão sobre “normalida-de” e “patologia”.

Kurt Lewin

5 ASSIS, Machado de. O Alienista. Porto Alegre: L&PM, 2006.

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31Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

Crise da Psicologia Social

Lane e Codo (2006) salientam que, após o final da Segunda Grande Guerra, criou-se uma in-tensa expectativa de que os estudos produzidos pelo campo da Psicologia pudessem reorganizar e reordenar as estruturas sociais caóticas resul-tantes do pós-guerra. Entretanto, até a década de 1960 não se observava impacto considerável sobre os principais problemas que se apresenta-vam. Deflagrou-se, então, uma crise da Psicolo-gia Social na medida em que esta não conseguia resolver tais problemas sociais. Permaneciam os conflitos, revoltas e greves nas fábricas, além do preconceito e do contexto de pobreza e mise-rabilidade que acompanhava o crescimento dos centros urbanos.

Segundo Lane (2002), foi a partir dessas constatações acerca da ineficácia dos resultados produzidos por seus estudos que se iniciaram as críticas mais contundentes à Psicologia Social nor-te-americana. A França e a Inglaterra foram os prin-cipais países formuladores das críticas que denun-ciam o caráter ideológico dessa vertente em não questionar as estruturas sociais e, portanto, manter e corroborar com situações de desigualdade e in-justiça social.

Na França, na década de 60, segundo Lane e Codo (2006), os questionamentos decorriam da forte influência da Psicanálise, que sinalizava que todo indivíduo tem uma história, a qual é narrada com base no contexto social. Outra forte influência foi o movimento de maio de 68.

O movimento conhecido como maio de 1968 ocorreu na França e foi um aconte-cimento revolucionário que iniciou com

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Psicologia Social32

greves estudantis e envolveu uma multi-plicidade de atores sociais, com adesão direta de trabalhadores de fábricas, re-percutindo na produtividade industrial. Traduzia reivindicações de um país que vivia ainda as marcas da II Guerra Mun-dial e do governo conservador do gene-ral Charles de Gaulle (1890-1970). Foi um movimento que provocou transformações nas relações sociais em todo o mundo.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Sobre os prenúncios de uma Psicologia Social, po-demos encontrar uma abordagem didática no úl-timo capítulo do livro “O que é Psicologia Social” de Silvia Lane. A autora faz um resgate do percurso dessa ciência a partir da Primeira Guerra Mundial, tendo como base a perspectiva da Psicologia Social no Brasil.

LANE, Silvia T. M. O que é Psicologia Social. 22. ed. 4. reimpr. São Paulo: Brasiliense, 2002.

No primeiro capítulo do livro “Psicologia Social: o homem em movimento” é possível acompanhar as principais características da Psicologia norte-ameri-cana e aspectos da crise da Psicologia Social.

LANE, Silvia; CODO, Wanderley (Org.) Psicologia So-cial: o homem em movimento. 13. ed. São Paulo: Brasiliense, 2006.

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33Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

PARA REFLETIR

A partir do que vimos agora, reflita sobre os moti-vos de se abordarem aspectos históricos e sociais para o estudo da Psicologia Social e discuta com seus colegas.

Além disso, considerando o fato de os estudos em Psicologia Social no pós-guerra terem sido direcio-nados à nova ordem social, reflitam sobre a pos-sível relação que você e seus colegas percebem nos dias atuais, entre a ordem econômica vigente, o capitalismo e o desenvolvimento de pesquisas científicas.

1.3 Psicologia Social e Perspectivas teóricas

A Psicologia Social desenvolve-se assumindo aspectos diferentes, os quais estão atrelados ao contexto social e às características dos seus princi-pais autores proponentes. Nesse sentido, podemos destacar três principais perspectivas teóricas: 1) norte-americana, 2) europeia e 3) latino-americana.

Como vimos, a Psicologia Social ganha con-sistência teórico-prática, primeiramente nos EUA, com contribuições tanto de estudiosos norte-ame-ricanos, quanto de psicólogos europeus que migra-ram para este país. A perspectiva norte-americana da Psicologia Social é também conhecida como Psi-cologia Social clássica ou tradicional, com enfoque cognitivista comportamental (Behaviorismo).

Utilizaremos como referência as informações divulgadas pelos autores Vala e Monteiro, em seu livro Psicologia Social, de 2004, para discorrermos sobre as características das perspectivas teóricas

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Psicologia Social34

norte-americana e europeia. A perspectiva latino--americana será apresentada a partir dos autores Lane e Codo (2006).

A perspectiva norte-americana

Para Vala e Monteiro (2004), a Psicologia nos EUA possui uma orientação funcionalista, com William James, e pragmatista, devido aos trabalhos de Dewey. James, por exemplo, estabe-lece algumas oposições a Wundt. Essa Psicolo-gia Social tem um forte viés pragmático, voltada às questões sociais em diversos âmbitos: gestão, engenharia, saúde, política, meio ambiente, eco-nomia, educação etc.

Como é marcada pelo êxodo de diversos estudiosos da Europa para os EUA, alguns prin-cipais teóricos que constroem os elementos que fundamentam a psicologia nos EUA não são norte--americanos. É possível identificar algumas nacio-nalidades, como a inglesa, de Frederic C. Bartlett (1886-1969), turca, de Muzafer Sherif (1906-1988), alemã, de Kurt Lewin(1890-1947), austríaca de Fritz Heider (1896-1988) e polaca, de Salomon Asch (1907-1996).

Os estudos sobre atitudes aparecem como construto central da Psicologia Social norte-ameri-cana e permitem apreender o componente cogniti-vo, afetivo e volitivo do comportamento humano. Traremos mais algumas características da atitude no capítulo sobre “preconceito”.

Vala e Monteiro (1997) ainda comentam o destaque dos estudos sobre papel social. Da mes-ma forma que o preconceito, o papel social con-figura uma predisposição comportamental apren-dida. Tem-se como referência a esses estudos G. Mead (1863-1931) e Dewey (1859-1952), na década

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35Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

de 1920. Já a década de 1940 é caracterizada pelos trabalhos de psicólogos europeus, a exemplo de Kurt Lewin, que já enunciamos.

Outro importante trabalho para a Psicologia Social norte-americana é a obra de Asch, “Social Psychology,” publicada em 1952. No mesmo sen-tido tiveram destaque os manuais de Psicologia denominados “Handbook of Social Psychology” pu-blicados por vários autores: Murchison, em 1935, Lindzey, em 1954, Lindzey e Aronson, em 1968 e 1969. Os manuais, segundo Strey et. al. (2008), de modo geral, reiteram o rigor e a sistematização do método experimental.

Lewin, com interesse sobre uma Psico-logia aplicada, refere-se a uma Psicolo-gia voltada ao cotidiano. Foi soldado na primeira guerra mundial, o que o leva a escrever o livro “A paisagem da guerra”. Além disso, Lewin desenvolveu estudos junto ao governo americano para mu-dar hábitos alimentares após a guerra e participou, em Nova Iorque, de pesquisa sobre o problema da integração de di-versos grupos étnicos. Possuem notória ênfase seus estudos sobre dinâmica dos grupos.

A perspectiva europeia

Instaurada a crise da Psicologia Social norte--americana em não resolver problemas concretos da sociedade naquela época, começam a se inten-sificar algumas críticas a essa forma de Psicologia Social, fazendo emergir outra perspectiva teórica, a Psicologia Social europeia.

De acordo com essa teoria, a identidade dos

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Psicologia Social36

grupos é formada geralmente com base em meca-nismos de diferenciação de outros grupos.

As temáticas que marcaram a Psicologia So-cial europeia foram os estudos sobre influência so-cial e conformidade, de Serge Moscovici, e os pro-cessos intergrupos, de Tajfel (1919-1982). Apesar de se diferenciarem da perspectiva norte-americana, as pesquisas de Moscovici possuem articulação com os estudos de Asch e Scherif. Com o primeiro, no aspecto da conformidade e com o segundo, no fe-nômeno da convergência. Inclusive, no “Handbook of Social Psychology”, de Lindzey e Aronson, consta um capítulo escrito por Moscovici sobre influência social e conformidade.

Assim, Tajfel cria a Teoria das Identidades So-ciais e Moscovici constrói a Teoria das Representa-ções Sociais, que se destacam como as principais contribuições na construção da Psicologia Social na Europa.

Os autores Vala e Monteiro (2004, p.53) si-nalizam uma ambiguidade que caracteriza a Psi-cologia Social europeia na “tendência em conciliar o método experimental com uma psicologia mais social”.

Os questionamentos às condições experi-mentais de laboratório se intensificaram quando Moscovici iniciou os estudos sobre representações sociais (veremos mais detalhadamente esse concei-to no tema 2). Entretanto, cabe assinalar que as re-presentações sociais se articulam a uma Sociologia do conhecimento prático. Com isso, a Psicologia Social europeia aproxima-se mais da Sociologia.

Nesse sentido, destacam-se os trabalhos de Serge Moscovici e Willem Doise6 que buscam inte-grar estudos experimentais e investigação de cam-po. Dentre as contribuições de Moscovici pode-se destacar o estudo das minorias ativas e a influência

6 É professor honorário da Universidade de Genebra, Suíça, tem se dedicado a estudos sobre direitos humanos.

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37Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

social que estas podem exercer sobre as maiorias. Moscovici escreveu um artigo onde considera a ne-cessidade de a Psicologia Social se expandir e se articular com novas teorias, caracterizando a Psi-cologia Social como uma antropologia cultural mo-derna. Além da Sociologia, outra ligação possível a que se refere Moscovici é com o interacionismo simbólico, pois considera o método da observação propício ao estudo das representações sociais.

É importante ressaltar, ainda, que a corrente europeia, devido ao êxodo de pesquisadores aos EUA, perde potência logo após a segunda Guerra Mundial, voltando a se desenvolver na década de 1960.

A perspectiva latino-americana

Essa corrente considera-se diferente das ou-tras duas por partir do pressuposto de que o ho-mem é um ser social, um sujeito sócio-histórico. Com base nesse pressuposto, torna-se fundamental para essa perspectiva estudar com mais afinco o contexto social e as estruturas sociais nas quais os sujeitos estão inseridos, como salientam Lane e Codo (2006).

Esses autores destacam que, devido à pre-dominância dos estudos produzidos nos EUA (corrente tradicional), estes eram também disse-minados em contextos sociais bastante distintos, a exemplo dos países latino-americanos que di-feriam em vários aspectos: cultural, econômico e, sobretudo, quanto aos problemas sociais. Apre-sentou-se, portanto, a necessidade de constru-ção de uma teoria direcionada a essa realidade social específica.

As principais categorias da relação indivíduo- sociedade determinadas pela perspectiva latino-

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Psicologia Social38

-americana, segundo Lane e Codo (2006) são as descritas abaixo e estas devem nortear estudos voltados a contextos particulares:

• Atividade: ações para satisfazer uma ne-cessidade comum.

• Consciência Social: reflexão sobre as ati-vidades e ações realizadas, sobre as con-sequências geradas no meio social.

• Personalidade: o homem se transforma ao transformar o meio, modificando al-gumas características que lhe conferem singularidade.

• Processo Grupal: a consciência social é inerente a todos os membros do grupo.

A partir dessas categorias, presentes nas relações indivíduo-sociedade, a Psicologia Social latino-americana desenvolve outras também funda-mentais, as quais serão abordadas mais detalhada-mente em temas posteriores:

• Linguagem/ pensamento.

• Representações sociais.

• Consciência/alienação.

• Atividade/ consciência.

• Identidade.

A perspectiva latino-americana, com a con-cepção do homem como sujeito histórico e cultural,

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39Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

considera-o ativo, transformador da natureza. Por exemplo, a teoria da aprendizagem desenvolvida pela corrente norte-americana contribui para saber-mos que o reforço, no processo de ensino-apren-dizagem, que pode ocorrer por meio de elogio ou de recompensa, permite a fixação de determinado conteúdo. A corrente latino-americana vai mais além, questionando os critérios que envolvem o processo de aprendizagem. Com isso, questiona os motivos e os fatores (por quê e para quê) que determinam que um conteúdo deva ser aprendido e outro não.

Você verá de forma mais detalhada essa con-cepção do homem como produto e produtor da his-tória e de cultura no tema 2.1 – “O homem como ser social”.

A corrente latino-americana traz o concei-to de ideologia. Ideologia, segundo Jac-ques e Stey (2005), pode dizer respeito apenas a um ideário, ou seja, um conjun-to de ideias, pensamentos. Ou, de outro modo, pode referir-se a um conjunto de ideias com conteúdo de manipulação.

Além disso, o Materialismo Histórico e Dia-lético traz contribuições importantes a esta nova Psicologia Social, pois concebe o indivíduo como uma totalidade histórico-social. É formulado por Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895), com a publicação do Manifesto Comunista em 1848.

Lane e Codo (2006) nos apresentam que o Materialismo Histórico e Dialético é uma corrente de pensamento, uma teoria e uma abordagem me-todológica criada para estudar as sociedades e as relações sociais (relações entre os homens em de-terminado contexto social).

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O Materialismo pode se constituir também como um modo de analisar a história das socieda-des vinculada as suas condições materiais de exis-tência. Parte do pressuposto de que os homens são produtores da sociedade e de suas condições con-cretas, materiais de vida. Por isso, Marx afirma que sempre houve na história conflito de classes (servos oprimidos pelos senhores no feudalismo e no capi-talismo e classe operária oprimida pela burguesia).

A crítica que o materialismo faz ao idealismo7 é de que esta corrente filosófica atribuía as ideias e a realidade a manifestações internas do indivíduo, do espírito. O materialismo, então, postula que as ideias estão alicerçadas em condições sócio-históri-cas e são determinadas pela classe social dominante que constitui a dimensão ideológica (por exemplo, a classe dominante produz ideias e modos de pensar que passam a ser legítimas aos oprimidos).

O materialismo histórico traz à Psicologia So-cial latino-americana a concepção de que os mo-dos de existência dos indivíduos dependem das condições concretas de vida e da forma como a sociedade se organiza. O homem precisa de condi-ções materiais de existência para sobreviver e isso determina a subjetividade.

DIALÉTICA: (Do grego, dois logos) duas opiniões divergentes que podem estar presentes em um mesmo tema. Pressu-põe a ruptura com explicações deter-ministas. Indica a compreensão de um tema na sua complexidade, ou seja, em seu movimento, considerando que há in-terdependência (KONDER, 2003).

A influência marxista contribui para a com-preensão de que as relações sociais são deter-

7 Não pretendemos aqui trazer uma visão pormenoriza-da dessa corrente. Há que se consi-derar uma visão geral no intuito de compreender as raízes desta corrente latino-americana da Psicologia Social.

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41Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

minadas por condições materiais de existência e mediadas pela conjuntura histórica. O método da dialética permite entender o sujeito e suas relações permeadas por contradições. Permite pensar opostos de modo não linear, permite con-siderar que não há relação direta de causa e efei-to. Como exemplo, podemos pensar o fato de o sujeito estar inserido em uma sociedade que pro-duz demandas e necessidades de consumo e, em contrapartida, não oferece condições para que boa parte das pessoas que dela faz parte possa consumir. Os desejos de consumo não são factí-veis e viáveis a todas as pessoas. A publicidade veiculada na mídia é outro exemplo, na medida em que gera uma demanda em termos de ne-cessidades que não são passíveis de satisfação diante das condições concretas de existência das pessoas: desemprego, baixa renda e ausência de outras necessidades básicas de sobrevivência. Ou seja, a contradição se apresenta na própria produção da realidade do homem.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

O texto “Psicologia Social Moderna: um fenômeno caracteristicamente americano” do livro “As Raízes da Psicologia Moderna” relata a prática de psicólo-gos no pós-guerra e a marcante contribuição dos Estados Unidos para constituição de uma certa prá-tica em Psicologia Social.

FARR, R. Raízes da Psicologia Social Moderna. 3.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

Para conhecer um pouco mais do surgimento e das peculiaridades da Psicologia Social Latino-America-

Karl Marx (1818-1883) foi um intelec-tual e revolucionário e um dos maiores expoentes na análi-se do regime social capitalista. E, por isso, oferece contri-buições a diversas áreas que pesqui-sam o tema: econo-mia, administração, psicologia, antropo-logia, serviço social e muitas outras.

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Psicologia Social42

na, sugerimos a leitura do capítulo “O que há de novo na psicologia social latino-americana?”, de Sal-vador Sandoval, publicado no livro “Paradigmas em Psicologia Social: a perspectiva latino-americana”.

CAMPOS, H. F; GUARESCHI, P. Paradigmas em Psi-cologia Social: a perspectiva Latino-Americana. 4. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

PARA REFLETIR

Enumere alguns comportamentos comuns a indi-víduos pertencentes a nossa sociedade brasileira inserida em um contexto capitalista e discuta com seus colegas se esses mesmos comportamentos poderiam ser diferentes se fossem introduzidos em outro contexto social. Reflitam, também, sobre a influência de aspectos sociais nos comportamentos dos indivíduos e faça uma relação com os pressupostos da Psicologia So-cial latino-americana.

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43Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

1.4 Psicologia Social no Brasil

A trajetória da Psicologia Social no Brasil iniciou seu percurso baseando-se em ideias da Psicologia Social norte-americana, apresentando, atualmente, importante influência da perspectiva latino-americana.

Vejamos, agora, com mais detalhes, as espe-cificidades dessa área da Psicologia em território brasileiro.

Um pouco do percurso da Psicologia Social brasileira

Para discussão desse eixo temático, toma-mos como referência a autora Silvia Lane (2002). Para esta autora, mesmo com uma realidade bas-tante distinta - América Latina e América do Norte - a tendência dos psicólogos sociais, pelo fato de terem como referência a corrente norte-americana, era de importar tais teorias aplicando-as à realida-de brasileira. O problema, que levou à sustentação de diversas críticas, era o fato de não haver devida adequação ao contexto social.

Muitos pesquisadores brasileiros iam se aper-feiçoar nos EUA, onde havia diversos centros de estudos. O professor Otto Klineberg (1899-1992), por exemplo, segundo Lane (2002), veio dos EUA a convite da Universidade de São Paulo para introdu-zir a Psicologia Social nesta universidade, ainda na década de 1950.

Devido à inserção desses profissionais, ocorria, por vezes, uma reprodução dos estudos desenvolvidos nos EUA, dos conceitos, técnicas de estudo e intervenção, que tinham como refe-rência o modo de vida típico dos EUA.

Segundo Lane (2002), é possível ver os ves-

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Psicologia Social44

tígios de uma Psicologia Social tradicional até mes-mo em obras publicadas por teóricos latino-ameri-canos. Exemplo disso é o livro Psicologia Social en America Latina publicado no México, que compila em seu conteúdo pesquisas nos vários continentes que usaram questionários, testes e procedimentos de pesquisas realizadas nos EUA e cujos resultados foram analisados tendo como parâmetro tais es-tudos. O que a autora considera problemático e o que impulsionou vários pesquisadores a estabele-cer críticas a esse modelo é a ausência de aspectos que mencionem a especificidade de cada país.

Esta crise da Psicologia Social, ou seja, esta não consideração do contexto social e políti-co, leva à realização do Congresso Interamericano em Lima, no Peru, em 1979. Os maiores represen-tantes foram psicólogos brasileiros, mexicanos e peruanos, e foram formuladas as principais críticas e propostas de mudanças à Psicologia Social. Isso não significa, porém, que a vertente norte-america-na não tenha se disseminado pelo Brasil.

Lane (2002) destaca que o primeiro livro de Psicologia Social publicado no Bra-sil, em 1959, foi uma tradução da obra de Klineberg. Os principais tópicos da obra eram: Cultura e Personalidade, Di-ferenças Individuais e Grupais, Atitudes e Opiniões, Interação Social e Dinâmica de Grupo, Patologia Social e Política Interna e Internacional.

Surgimento da perspectiva histórico-social

A partir das críticas formuladas à corren-te norte-americana poderíamos levantar alguns questionamentos, também apresentados por Lane (2002):

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45Tema 1 | Surgimento da Psicologia Social

Bem, até aqui, compreendemos como o indivíduo é influenciado pela sociedade. Mas, ele apenas sofre influências? Como o indivíduo pode se tornar autor desta sociedade? Como ele poderá ser respon-sável pelos problemas sociais e pela re-versão dos mesmos?

Com base nessas questões e com vistas à construção de outra perspectiva, foram organiza-dos dois principais encontros que buscavam reunir estudiosos da América Latina que mantinham afini-dade com a construção da Psicologia Social:

• Congresso de Psicologia Interamericana em Miami nos EUA: A crise da Psicologia Social é denunciada em 1976 com críticas mais sistematizadas protagonizadas pelo grupo da Venezuela.

• Congresso de Psicologia Interamericana em Lima no Peru: Realizado em 1979, contou com a participação de brasileiros provenien-tes da ALAPSO (Associação Latino-America-na de Psicologia Social) junto à AVEPSO (Associação Venezuelana de Psicologia Social). O congresso culmina em propos-tas concretas para conduzir mudanças nos rumos da Psicologia Social, mais voltadas à realidade dos países latino-americanos. Foram propostos, ainda, intercâmbios entre os psicólogos sociais dos países.

Este encontro da ALAPSO resultou na cria-ção da Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO).

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Psicologia Social46

De acordo com Lane (2002), no Brasil, a ABRAPSO (Associação Brasileira de Psicologia So-cial) foi resultado das discussões que vinham sen-do realizadas entre os profissionais implicados na construção de uma Psicologia voltada a problemas concretos. Foi criada em 1980 e, até hoje, realiza congressos reunindo profissionais que pesquisam sobre os mais diversos assuntos abordando o tema da Psicologia Social.

Os estudos desenvolvidos no Brasil sob essa perspectiva histórica e social a partir desse momento, década de 80, passaram a assumir um caráter de responsabilidade social voltados aos grupos mais vulneráveis, visando combater fato-res como desigualdade social, com elaboração coletiva de estratégias de enfrentamento a pro-blemas sociais importantes, principalmente mar-ginalidade, excesso de poder e injustiça social. Começa a se desenvolver o que denominamos Psicologia Social em uma perspectiva que tem como base o contexto sócio-histórico em que o homem está inserido.

Psicologia Social e Psicologia Comunitária

Na década de 1980 cresce o trabalho de psi-cólogos sociais brasileiros em comunidades. A Psi-cologia Comunitária nasce vinculada aos trabalhos e discussões formulados pela ABRAPSO. Destaca-ram-se, nesse momento, trabalhos concretos de alfabetização de Adultos, tendo forte influência de Paulo Freire (1921-1997).

Com base no método de Paulo Freire, a Psicologia Comunitária adquire consistência te-órico-prática principalmente no Ceará. O NUCOM (Núcleo de Psicologia Comunitária), vinculado até hoje à Universidade Federal do Ceará pro-

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tagonizou a sistematização de algumas experi-ências práticas que aconteciam junto às comu-nidades, como apresentam Brandão e Bomfim (1999).

É muito importante destacar, de acordo com Gois (2005), que esses debates e práticas iniciam e ganham consistência em território não muito prós-pero. O Brasil ainda vivia sob o contexto do regime político da ditadura (1964-1985) num clima bastan-te repressor, pouco favorável a trabalhos que fo-mentassem a participação social.

Paulo Freire foi educador e filósofo bra-sileiro que trouxe importantes contribui-ções com o método da Educação Popular, com base no diálogo com as comunida-des e articulação com o saber local. Enfa-tiza a relação opressor-oprimido e difun-de a Pedagogia Libertadora em oposição à Educação Bancária.

A Psicologia Comunitária intensifica a ca-tegoria identidade para o fortalecimento de pro-cessos grupais, com base na afetividade. Para a Psicologia Comunitária, não basta apenas ter consciência da necessidade de um processo de transformação para que ele ocorra. É preciso, sobretudo, identificar-se, sentir-se parte e sentir--se sujeito do processo de transformação social (BRANDÃO; BOMFIM, 1999). Um exemplo claro desse tipo de atividade pode ser o tratamento do lixo em uma comunidade, uma vez que não basta fornecer informações sobre doenças transmitidas pelo lixo e locais adequados de armazenamento. É preciso, de outro modo, fortalecer a autoestima das pessoas para se engajarem em um projeto que lhes traga benefícios.

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Outros trabalhos desenvolvidos pela Psico-logia Comunitária é o resgate da convivência en-tre moradores de uma mesma comunidade. Essa é uma atividade que claramente se encontra na contramão da supremacia do capitalismo, que se pauta em valores individualistas, em que a existên-cia humana é circunscrita em valores de consumo. Cria-se o imaginário de que a conquista de valores humanos pode ser obtida através de objetos exter-nos passíveis de consumo, como podia ser obser-vado nas propagandas de cigarro que associavam seu consumo à prática de esportes, à liberdade e ao contato com a natureza.

Entretanto, há muitas necessidades humanas que não podem ser satisfeitas dentro dessa lógi-ca de mercado capitalista vigorada pelo consumo, tampouco em um trabalho remunerado.

A pirâmide de Abraham Maslow (1908-1970), psicólogo americano, propõe uma hierarquia de necessidades que, para ele, devem respeitar um crescente que vai desde a necessidade fisiológica à necessidade de realização pessoal. Inde-pendentemente da condição hierárquica estabelecida por Maslow, seu estudo in-dica alguns aspectos inerentes às neces-sidades humanas que podem ser pensa-das tanto sob efeito de sobrevivência da espécie, quanto de qualidade de vida.

Segundo Lane, (2002), a Psicologia Social e a Comunitária buscaram resgatar, no período de re-democratização do país, a participação do cidadão, que se manteve anulada durante a ditadura militar, com base em uma concepção de homem como su-jeito ativo na construção da estrutura e vida social,

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apesar de, ainda na ditadura militar, terem sido fei-tos trabalhos que enfatizavam a participação so-cial, mesmo com a repressão política.

Enfrenta-se, portanto, o conteúdo ideológico que tenta interromper processos de transformação social que se encontram presentes e se manifes-tam através de instituições como famílias, escolas e trabalho, dificultando a criação de novas formas de relacionamento. Assim, no trabalho comunitário, entra em cena palavras como comunicação, coope-ração, solidariedade e trabalho em equipe. A busca por relações pautadas nesses valores torna-se o objeto de trabalhos comunitários com a perspec-tiva de ampliação de redes sociais. Um dos princí-pios norteadores do trabalho comunitário é a cons-trução de um planejamento coletivo de ações.

Lane (2002) apresenta alguns aspectos fun-damentais que estão entrelaçados ao trabalho so-cial e comunitário:

• Pensamento: processo de reflexão sobre as condições sociais de existência, rela-cionada às condições históricas, às cau-sas de se viver em determinada situação, atividades desenvolvidas etc. Esta prática de refletir sobre a realidade social tem um caráter fortemente educativo.

• Ação, comunicação e cooperação: permite a todos os sujeitos envolvidos no pro-cesso de reflexão social um resgate de histórias de vida, possibilitando a cons-ciência de si e das relações que foram construídas historicamente.

Cada vez mais temos acompanhado exem-plos concretos de trabalhos coletivos, com base

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nesse viés comunitário, tais como os trabalhos realizados em associação de moradores de bair-ro (realização de cursos, eventos, mutirões para resolução de problemas pertinente à vida comu-nitária, como construção de moradia, limpeza do bairro, cuidado com o lixo). Também encontramos experiências de geração de renda com ênfase nos processos de economia solidária, articulado com potencialidades locais, como artesanato, habili-dades profissionais etc. Além disso, destacam-se em algumas comunidades a realização de muti-rões com a construção de estratégias locais de combate à violência, criminalidade e tráfico de drogas.

Nessas experiências, são comuns o desenvol-vimento de maior conhecimento e apropriação dos direitos fundamentais do ser humano e a organiza-ção para a busca de reivindicação. Isso significa o desenvolvimento de classe social.

Nesse sentido, tendo em vista o forte viés ca-pitalista que atravessa de formas diversas as esfe-ras da vida social, o desenvolvimento de estratégias comunitárias, visando um processo de transforma-ção mais amplo, é processual, dinâmico e assume um ritmo próprio em cada local, decorrente de situ-ações favoráveis ou adversas. Entretanto, sabe-se que, de maneira geral, dá-se de forma lenta.

As pressões exercidas pelo sistema social, como um todo, voltadas para a manutenção de soluções individualistas e pautadas no consumo, compõem um contexto fortemente adverso às es-tratégias solidárias e comunitárias. A todo o mo-mento há um processo massivo de informações nesse sentido, ao passo que não é veiculado ou então assumem proporção de inferior relevância experiências consolidadas e exitosas de âmbito social e comunitário.

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Nesse contexto, há um processo importante no trabalho comunitário que é a responsabilização. A participação social convoca a saída da postura confortável do “não tenho nada a ver com isso”. Dessa forma, a principal ferramenta ao trabalho co-munitário é a reflexão, o diálogo histórico e social, compreendendo que tudo que vivemos hoje foi criado em algum momento da história, por pessoas que tinham determinado pensamento e objetivo. Assim, até mesmo aquelas estruturas que parecem imutáveis tornam-se passíveis de mudança.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para compreender um pouco mais sobre a perspec-tiva histórica e social da Psicologia Social, sugeri-mos o texto “O que há de novo na Psicologia Social latino-americana” do livro “Paradigmas em Psicolo-gia Social”. O autor aponta as transformações que foram ocorrendo na Psicologia Social desde suas primeiras intervenções até a composição da pers-pectiva latino-americana.

CAMPOS, H. F.; GUARESCHI, P. Paradigmas em Psi-cologia Social: a perspectiva latino-americana. 4. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

Sobre trabalhos comunitários, sugerimos a leitura do artigo “As bases epistemológicas da Psicolo-gia Comunitária” do livro “Os Jardins da Psicolo-gia Comunitária” de Israel Rocha Brandão e Zulmira Bomfim. No artigo você encontra aspectos histó-ricos e conceituais dessa área, além do sentido contra-hegemônico enfrentado pela perspectiva co-munitária/solidária.

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BRANDÃO, I. R; BOMFIM, Z. Os jardins da Psicologia Comunitária: escritos sobre a trajetória de um mo-delo teórico-vivencial. Fortaleza: ABRAPSO, 1999.

PARA REFLETIR

Pensando na prática do assistente social, tente es-tabelecer, juntamente com seus colegas, possíveis conexões entre ela e os princípios da Psicologia Social em uma perspectiva histórica e social e da Psicologia Comunitária que vimos acima.

RESUMO

Caro aluno, no conteúdo 1.1 estudamos as origens e antecedentes da Psicologia até esta se estruturar como um conhecimento científico.

Já no conteúdo 1.2, conhecemos alguns aconteci-mentos sócio-histórico-políticos que possibilitaram a emergência da Psicologia Social, bem como os principais trabalhos desenvolvidos pelos teóricos nessa perspectiva. No conteúdo 1.3 verificamos que a Psicologia Social emerge com estudos e práti-cas concretas voltadas a reconstruir a sociedade no pós-guerra. Tem como marco a Segunda Guer-ra Mundial e, a partir daí, passa por importantes transformações, sendo alvo de muitas críticas. Abordamos, ainda, as principais perspectivas teóri-

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cas e suas discussões centrais: a norte-americana, a europeia e a latino-americana.

E, por fim, no conteúdo 1.4 vimos como se con-solidaram as experiências brasileiras de Psicologia Social no contexto repressivo da ditadura militar em que também emerge o enfoque da Psicologia Comunitária.

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Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade2

Afirmar que o homem é um ser social não é o mesmo que dizer que ele pertence ou faz parte de uma sociedade. Muitos estudos se dedicaram a discutir essa relação indivíduo e sociedade, de onde se desenvolveram as principais concepções teóricas de ciências, tais como a Psicologia e a Sociologia. Nesse sentido, a Psicologia Social possui uma afinidade peculiar com a Sociologia.

Todos nós sabemos que o homem é um animal que difere em alguns aspectos de outros animais, afinal ele é um animal racional que tem a capacidade de raciocinar, refletir e criar. O que lhe define como um ser social é sua necessidade intrínseca de estabelecer rela-ções sociais.

A partir de agora, buscaremos compreender alguns elementos sociais que nos constituem enquanto sujeitos.

Boa leitura!

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2.1 O Homem como um Ser Social

Distinguir a sociedade e o indivíduo, descre-vendo as características próprias de cada um, tam-bém não é o mesmo que dissociar a sociedade dos indivíduos. Entretanto, considerar o homem como um ser social significa que os elementos sociais estão presentes em todo homem e se apresentam de diferentes modos. Essa discussão instaura a es-pecificidade da Psicologia Social e, como vimos no tema 1, muitos autores protagonizaram teorias e conceitos sobre o assunto.

Para discutir o tema desse tópico, retoma-remos algumas ideias de Álvaro e Garrido (2006), acerca do processo de socialização do ser humano e dos estudos sobre esse tema entre os psicólogos sociais, além de outros autores. A tentativa em sis-tematizar os fenômenos individuais e coletivos da vida social está presente nas formulações do soci-ólogo Émile Durkheim (veremos com mais detalhes no item sobre Representações Sociais).

Outros estudiosos também buscavam com-preender essa relação. O fato de o comportamento do homem se transformar ao entrar em contato com mais pessoas leva ao aparecimento do termo “mas-sa”, cunhado por Freud e Gabriel Tarde. Esse termo remete à existência de um elemento mais primitivo da sociedade e, por isso, pode incorporar movimentos revolucionários contrários ao padrão da ordem esta-belecida, do mesmo modo que “multidão”, como ex-plícito nos trabalhos de Gustave Le Bon (1841-1931).

A análise de pequenos grupos através dos estudos de Kurt Lewin, por sua vez, possibilitou a compreensão de mecanismos de funcionamento das massas (coesão, conflito, ideologia).

Estes estudos mostram que o objeto específi-co de pesquisa da Psicologia Social é compreender

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a relação essencial entre o indivíduo e a sociedade em vários aspectos: compreender como as pessoas se organizam para garantir a sobrevivência, seus costumes, valores e instituições necessárias para a manutenção e continuidade da sociedade. Esta visão social deve ser analisada a partir da pers-pectiva latino-americana, portanto em um contexto historicamente datado e determinado.

Utilizaremos a história de Tarzan (1919), pro-dução cinematográfica popularmente conhecida, para fazer menção a algumas questões que quere-mos discutir. Na história, um bebê é criado por ma-cacos e passa a imitar e introjetar características do grupo com quem convive, durante seu processo de socialização. Dessa forma, passa a andar e “falar” como macaco, aprendendo uma linguagem humana e adquirindo outros hábitos somente quando adul-to, em contato com humanos.

Obviamente esta se trata de uma situação fictícia, entretanto, serve para exemplificar que o homem é dependente desde seu nascimento da presença do outro para simplesmente satisfazer suas necessidades de sobrevivência biológica, as quais dependem, ainda, de afeto e vínculo, como destaca Lane (2002).

As relações sociais

Dizer que o homem é um ser social, como salienta Lane (2002), inevitavelmente, nos remete à ideia de que ele se constitui no cerne das rela-ções sociais e, por isso é, essencialmente, um ser cultural.

Desde que nascemos, como nos lembra Bo-nin (apud STREY et.al., 2008), já estamos inseridos em um sistema social pronto, que passa a ser as-similado, ao longo do desenvolvimento, por meio

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das relações sociais. Podemos afirmar, portanto, que o ser humano é um ser histórico-cultural, que se constitui nas inter-relações sociais. Assim, os conteúdos assimilados vão se materializando como parte do nosso arsenal de comportamentos. Dessa forma, mesmo quando estamos sozinhos, “carre-gamos” a cultura do meio social em que fomos socializados.

É mister tornar claro que não se pretende criar um embate sobre os aspectos biológicos versus as-pectos sociais do homem, como se uma das dimen-sões fosse superior ou mais importante. O que se pretende é correlacionar os aspectos biológicos a uma noção de homem como ser histórico-social. O comportamento de sucção, por exemplo, que viabili-za a amamentação, representa programações bioló-gicas que se agregam aos padrões culturais.

Ao longo de todo o processo de socialização, somos preparados para desempenhar os papéis sociais, modelos de comportamento que caracteri-zam o lugar do indivíduo no grupo ou organização, constituindo, portanto, expectativas sociais em re-lação aos comportamentos de cada um diante de uma situação específica. É interessante observar que os papéis sociais se complementam: o papel social de pai implica na existência do papel social de filho, como o de chefe e empregado etc.

Os estudos de Gabriel Tarde, cujas ideias fo-ram apresentadas no tema 1 e aqui estão sendo retomadas, abordavam a aprendizagem social atra-vés da imitação. Edward Ross (1866-1951), sociólo-go que escreveu um manual de Psicologia Social, reitera a imitação como um conceito fundamental para a análise do comportamento social. A apren-dizagem acontece quando os comportamentos por imitação são reforçados. Os processos cognitivos como atenção e memória são essenciais para estu-

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59Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

dar e compreender o comportamento por imitação. Desse modo, afirmam Álvaro e Garrido (2006) que nos tornamos seres culturais por sermos seres so-ciais. É em contato com outros homens que nos tornamos humanos.

É importante destacar, ainda, como afirma Krüger (1986), que o processo de socialização é contínuo, ocorre durante toda a vida, não se res-tringindo ao período da infância, e universal, ou seja, é intrínseco ao ser humano, independente do local do mundo e/ou época em que viva.

Nesse contexto, alguns autores, como De Beni (2004), apresentam duas fases do processo de socialização:

1. Primária – considerada aquela socializa-ção que ocorre durante a infância, em que os pais representam os principais agentes socializadores, com os quais se estabelece forte identificação e depen-dência. Durante essa primeira fase, ocor-re o processo de significação do mundo social e a interiorização das convenções sociais.

2. Secundária – em um segundo momento, a partir da adolescência, ocorre uma am-pliação dos agentes socializadores, exer-cendo importante influência os grupos de referência, que são aquelas pessoas que passam a servir de modelo, influenciando na formação da identidade pessoal. Nes-se período já se observa um menor en-volvimento emocional e psicológico, além de já se estabelecer uma consciência dos papéis sociais e da existência de vários modos de interpretar e ver o mundo.

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Cultura e linguagem

Considerando o exposto, portanto, pode--se afirmar que as características humanas não se restringem ao geneticamente postulado ou biolo-gicamente programado, mas são forjadas no meio social, através da cultura, das formas de linguagem utilizadas, da história e da política.

Sendo assim, se uma criança pudesse ser criada por macacos e todas as suas relações se resumissem ao formato de relação existente entre estes animais, como no exemplo de Tarzan, poderíamos afirmar que mesmo sendo da espécie humana, ela não seria “hu-mana”, pois não teria sido “humanizada”.

Para facilitar o entendimento do assunto, você pode conceber a cultura de forma muito sim-ples, como sugerem Strey et. al. (2008), com refe-rência a um conjunto de hábitos, a formas de ver o mundo e agir no mesmo, a objetos de arte e suas significações, a valores, crenças, tipos de relações interpessoais, regras sociais e instituições de um determinado grupo.

Esse conjunto de hábitos, valores, relações interpessoais e regras sociais é dinâmico e está em constante mutação. Os valores mudam com o tempo na medida em que as relações também vão se transformando.

A teoria histórico-cultural de Lev Vygotsky, por exemplo, como aponta Gonzalez Rey (2004), salienta que o primata humano, antes de adquirir a fala, é considerado como um ser biológico. De acordo com essa perspectiva teórica, o homem se torna um ser cultural quando domina o uso da lin-guagem, podendo, portanto, processar o conteúdo simbólico presente nas instituições sociais.

Segundo Lane e Codo (2004), admite-se que, historicamente, a linguagem se desenvolve para ga-

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61Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

rantia das condições de sobrevivência da espécie, por meio da transformação da natureza, no senti-do de compartilhar um código comum para criar instrumentos necessários a essa sobrevivência. A linguagem torna-se, portanto, fundamental para transmitir a outros essa prática.

O desenvolvimento da linguagem de acordo com Lane (2002), possibilitou a instauração de um trabalho cooperativo e planejado. Entretanto, muitas vezes a linguagem é compreendida como restrita à fala, quando esta não constitui o único código de comunicação. A linguagem inclui todos os comporta-mentos presentes na interação com o outro: os ritu-ais, a escrita, os sinais, os gestos, os códigos, etc. A linguagem, permitindo o processo de planejamento de ações, essencial para a sobrevivência da espécie, possibilita o desenvolvimento intelectual. Um está estritamente relacionado com o outro. Através do desenvolvimento intelectual é passível a ocorrência de abstrações e generalizações.

Consequentemente, vê-se na linguagem um elemento essencial à interação social. Os estudos de Vygotsky sobre as funções psíquicas superio-res reforçam a constituição social dos homens. Tais funções são a linguagem, a memória, a atenção, a percepção, o pensamento e a abstração. Para ele, nada pode existir em um dado sujeito que não tenha anteriormente existido no contexto das re-lações sociais. Ou seja, a relação entre indivíduo e sociedade, segundo Álvaro e Garrido (2006), é a mesma que se estabelece entre consciência e lin-guagem, sendo um constitutivo do outro.

Lev Vygotsky (1896-1934), psicólogo bielorrusso. É conhecido por seus estu-dos sobre interação humana. É um re-nomado estudioso com contribuições

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Psicologia Social62

principalmente no campo da Educação e Psicologia. Em 1920 funda um labora-tório de psicologia realizando estudos experimentais para descrever processos psíquicos superiores do ser humano, que consiste em usar ferramentas simbólicas para a criação da cultura. O que deve ser aprendido é determinado pela cultura. Este psicólogo, de acordo com Álvaro e Garrido (2006), oferece importante con-tribuição nas teorias da aprendizagem, desenvolvidas através de estudos sobre a linguagem, sobre como se aprende de-terminada língua.

Em um debate mais contemporâneo, tra-zemos as contribuições de Edgar Morin, antro-pólogo, sociólogo e filósofo francês que tem se dedicado a estudos sobre o tema da com-plexidade, trazendo importantes contribuições principalmente para a Educação.

Para Morin (2003), o desenvolvimen-to da linguagem teve valor inestimável no processo de evolução humana. A lin-guagem que o homem dispõe hoje, só se tornou possível devido à confluência de diferentes fatores: mutações genéticas,

crescente complexificação na organização social e relação entre os dois fenômenos citados.

Por conseguinte, Morin (2003) coloca a lin-guagem como uma capacidade superior da espécie humana, que está intimamente associada à condi-ção de ser social, uma vez que viabiliza e fomenta a abstração, a simbolização e a transcendência da experiência imediata, características encontradas somente entre os humanos.

Vygotsky

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63Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para compreender o processo de relação indisso-ciada do homem com a sociedade, leia a primeira parte do livro “O que é Psicologia Social”, mais especificamente o texto “Como nos tornamos so-ciais”.

LANE, Silvia T. M. O que é Psicologia Social. 22. ed. 4. reimpr. São Paulo: Brasiliense, 2002.

Para saber um pouco mais sobre a maneira pela qual a Psicologia Social concebe a linguagem, você pode ler o capítulo “Linguagem” do livro “Psicolo-gia Social Contemporânea”.

STREY, M. N. et. al. Psicologia Social Contemporâ-nea. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

PARA REFLETIR

Neste trecho apresentamos a ideia de que o ho-mem é um ser social e que somente assim pode ser considerado humano. Assista ao filme “Nell” e reflita com seus colegas a questão da linguagem.

Além desse filme, sugerimos também “O Náufra-go” e, a partir dele, reflita, juntamente com seus colegas, se é possível alguém viver absolutamente só. Vejam como o protagonista, mesmo numa ilha deserta, mantém os valores da sua cultura e apro-veitem para se colocar no lugar do mesmo e refletir

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sobre os valores socialmente aceitos e transmitidos como corretos na sociedade atual.

2.2 Constituição da Subjetividade no Processo de Produção e Reprodução da Vida Social

No tópico anterior apresentamos quais ele-mentos definem o homem como ser social. A partir de agora, veremos o homem também como produ-to e produtor de cultura.

Produção e reprodução

Ao dizer que o homem é um produto da cul-tura, queremos reafirmar a ideia de que ao nascer-mos somos inseridos em um meio que tem valores, hábitos, crenças e modos de funcionamento, os quais são adquiridos no decorrer do processo de socialização.

Tal concepção corrobora a tão famosa frase, que diz que o homem é produto do meio, refletindo também o pensamento marxista. Isso nos remete à constatação de que somos sempre semelhantes, ao menos em alguns aspectos, àqueles que nos cercam.

A ideia enunciada até agora objetiva tornar claro que os valores culturais influenciam, sobre-maneira, a aquisição de conhecimentos. De modo que as escolhas e julgamentos não operam num sistema de neutralidade, pois as escolhas morais são atravessadas pelos processos culturais, espe-cialmente pelos valores hegemônicos.

Dessa maneira, os gostos, as coisas nas quais acreditamos, a forma de pensar sobre o mun-do, bem como a forma de agir, estão estreitamente

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65Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

relacionados à cultura da qual se faz parte e aos valores que introjetamos ao longo da vida.

Da mesma forma, as práticas de poder e ex-clusão dependem da sociedade na qual os indiví-duos estão inseridos. Isso remete à noção de que as formas de expressão e as estratégias de confron-to são regidas pela cultura vigente, sendo que agir em não conformidade com o padrão estabelecido pode acarretar exclusão e marginalização.

Considerar essa força de exclusão e a margi-nalização não significa dizer que o ser humano é totalmente passivo na sociedade e que os valores são meramente reproduzidos. Obviamente que, se houvesse mera reprodução e passividade, não seria possível de se justificar as constantes transforma-ções sociais que ocorrem.

Você pode, por exemplo, perceber facilmente que a maneira como as mulheres eram educadas nos anos de 1950 é muito diferente da maneira como as mulheres o são nos dias atuais. Constata-se que a cul-tura é marcada por um dinamismo, o qual só é possí-vel porque não somos passivos diante da mesma.

Por conseguinte, também podemos afirmar que o homem é produtor de cultura. Tal afirmativa visa demarcar a capacidade criadora do homem, marca registrada da sua humanidade.

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Psicologia Social66

Contudo, apesar de considerarmos essa ca-pacidade de produção na sociedade, cabe um questionamento: é possível e fácil de se perceber a si mesmo o tempo todo inovando? Ou melhor, é comum escolher algo diferente do usual?

Neste momento, cabe chamar a atenção de que, mesmo que não haja passividade permanente ou mera reprodução, há elementos da cultura do-minante que se estabelecem como uma força ins-tituída para guiar os comportamentos e relações sociais. Forças contrárias ou forças instituintes sempre existem e estão presentes.

Por isso, não se pode somente conceber o homem ora como produto, ora como produtor de cultura. Mas deve-se, todavia, percebê-lo como produto e produtor de cultura concomitantemente, como bem destacam Strey et. al. (2008).

Nesse sentido, indivíduos são forjados em sistemas sociais preexistentes. Estes mesmos in-divíduos não se sujeitam diante da ordem vigente, ou seja, não são passivos.

As pessoas fazem interpretações, ponderações e reflexões daquilo que recebem. Tais ações rever-beram de maneira que cada um devolve para a sua cultura, não mais o conteúdo que captou da mesma, mas um novo conteúdo – o fruto da relação entre o conteúdo original e apreciação pessoal do mesmo.

Os sujeitos estão, a todo o momento, aca-tando e construindo criativamente e coletivamente formas de ser e estar no mundo. Isso nem sempre se dá de forma coesa e harmônica. Viver em cole-tividade pressupõe o confronto de ideias e pensa-mentos.

Compreender isso é de fundamental impor-tância para conceber um conceito central da Psi-cologia Social contemporânea, a subjetividade, ou melhor, os processos de subjetivação.

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67Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

A subjetividade, sendo compreendida como oposto de objetividade, foi rechaçada dos vocabu-lários das ciências sociais, por reforçarem a asso-ciação a processos internos aos sujeitos, intrapsí-quicos. Contudo, a categoria “sentido”, introduzida por Vygotsky, resgata e confere novo significado à noção de subjetividade. O sentido refere-se a uma produção individual que acontece através do encontro singular do sujeito com uma experiência social concreta. Possui uma dimensão consciente que o sujeito consegue verbalizar, expressar por palavras, e uma dimensão inconsciente, na qual o sujeito experimenta emoções que não podem ser transpostas em palavras. O sentido, portanto, se-gundo Gonzalez Rey (2004), é o processo através do qual o objetivo se converte em psicológico.

Esse autor afirma, ainda, que a produção de sentidos é inerente a todas as organizações e ativi-dades humanas, sempre indissociada do contexto social. Por isso, em todos os espaços sociais se produz subjetividade e esta é produzida sempre nas relações sociais, portanto em contato com o outro. É sim uma experiência singular, vivida por um sujeito, mas sempre depende de um contexto social para adquirir condições de existência.

A categoria sentido subjetivo consegue inte-grar tanto a diversidade dos aspectos sociais quan-to as dimensões do sujeito. Dessa forma, dizer que o sujeito é constituído subjetivamente significa re-conhecer a dimensão social e pessoal ao mesmo tempo, inclusive os aspectos neurobiológicos.

O sentido subjetivo visa expressar as condi-ções vitais das pessoas. Um alcoólatra expressa os sentidos que conferem singularidade a sua depen-dência. Acredita que é dependente, por exemplo, porque seu pai lhe deu bebida quando era criança e depois que se separou da mulher a dependência

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se acirrou e acredita não conseguir viver sem o ál-cool. Porém, Gonzalez Rey (2004) nos mostra que nessa experiência singular podem ser encontrados elementos coletivos que traduzem um modo com-partilhado de viver a mesma experiência. Essa ex-periência representa o encontro com aspectos mul-tidimensionais. O sentido se produz na dimensão singular em articulação com a dimensão coletiva.

A citação abaixo, de Martin Baró (1989-1998)8, psicólogo mais contemporâneo da perspec-tiva latino-americana, explica melhor a definição do homem e sua relação com a cultura e produção de subjetividade:

O ser humano é uma realida-de objetiva no âmbito de uma sociedade e, portanto, objeto e sujeito nas circunstâncias, pro-duto e produtor de umas con-dições materiais, interlocutor e referente de umas relações sociais. Mas o ser humano também é uma realidade sub-jetiva, gerador de uma pers-pectiva e de uma atividade e, portanto, produtor de uma his-tória pessoal social e produtor de uma vivência (BARÓ apud GONZALEZ REY, 2004, p.142).

Martin Baró pretende resgatar a vivência e as emoções, que são condições fundamentais ao sentido subjetivo. O que confere singularidade aos sujeitos decorre também das confrontações ineren-tes à interação social, do contato com o outro e das marcas das diferenças, fruto desse contato e interação.

A consciência de si ou a identificação de pertencimento a determinados grupos sociais, os quais constituem a subjetividade, permite que se

8 A obra de Martin Baró deve ser vista considerando os problemas sociais enfrentados e pro-tagonizados por ele na América Latina, principalmente em El Salvador. É renomado no campo da Psicologia Comu-nitária (abordada no tema 1). Os temas que lhe mobilizavam eram as condições de opressão sofrida pelas mulheres, machismo, violên-cia, guerra, família e saúde mental. Dedicou sua vida à defesa dos direitos humanos, à justiça social e à igualdade.

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faça questionamento às estruturas sociais que per-passam os grupos. Segundo Lane (2002), na medi-da em que se identificam processos de dominação e relações de desigualdade, o indivíduo começa a se tornar produtor de sua história, da sociedade e de sua subjetividade, tornando-se agente de mu-danças sociais.

Assim, para se entender o que significa sub-jetividade é preciso entender a relação indivíduo--sociedade defendida pela Psicologia Social, a qual afirma que o indivíduo está na sociedade e não tem existência se retirado dela. A sociedade não é apenas um agrupamento de indivíduos, mas é considerada humana. E o homem, como foi ante-riormente citado, só se constitui como humano se há a presença de outro homem, constituindo as relações sociais.

Nesse ínterim, entende-se que a subjetivida-de não está dada geneticamente, mas sim pautada no potencial do qual dispõe o homem, sendo cons-truída em meio à cultura de acordo com as formas de linguagem utilizadas e com o contexto histórico, político e social.

“A cultura é uma produção subjetiva que expressa as condições de vida do ho-mem em cada momento histórico e em cada sociedade concreta, mas que cons-titui uma produção diferenciada que indi-ca precisamente o curso dos processos de subjetivação que orientaram a ação humana em cada época e ambiente em que essa ação foi realizada” (GONZALEZ REY, 2004, p. 125).

Tem-se, por conseguinte, a ideia de que a subjetividade é aberta e ampla, estando em relação

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dialética9 e dialógica10 com a sociedade, influen-ciando todos os movimentos da mesma e, conco-mitantemente, deixando-se influenciar por ela.

Dito isto, pode-se definir a subjetividade, de acordo com Gonzalez Rey (2004), como uma con-densação das características peculiares de cada su-jeito, a qual vai sendo moldada na medida em que se amplia o desenvolvimento e se experimentam as coisas do mundo. Mas, se por um lado a subje-tividade traz a ideia de identidade e singularidade, por outro também denota certa igualdade, posto que os elementos que a compõem se referem ao meio social.

Esse autor também afirma que a subjetivi-dade pode, ainda, ser definida como sendo o uni-verso de ideias, pensamentos, afetos, emoções, percepções e significados construídos a partir das relações sociais e experiências de vida. Dessa for-ma, admite-se que é na subjetividade que se origi-nam as manifestações afetivas e comportamentais de cada um.

Diante do exposto, logo se pode perceber que o mundo externo possibilita a criação do mundo in-terno. A subjetividade não é uma entidade pronta e acabada, mas, ao contrário disso, um processo, sempre inacabado e em constante transformação.

Tais ideias são amplamente defendidas por estudiosos pós-estruturalistas como Michel Fou-cault (1926-1984), Gilles Deleuze (1925-1995) e Félix Guattari (1930-1992), para os quais a produção de subjetividade é imanente à produção do mundo.

Por isso, assim como as subjetividades po-dem ser dominadas por estruturas de poder – que podem conduzir à alienação, massificação, estig-matização da diferença, patologização de caracte-rísticas humanas e formas rígidas de relacionamen-tos consigo e com os outros – podem, também,

9 No sentido aqui de contraposição de ideias.

10 Refere-se ao sentido que se constrói em diálogo com a realidade.

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71Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

disparar processos transformadores que conduzem a outras modalidades de subjetivação.

Tomemos como exemplo um aspecto bem demarcado em estudos sobre produção de subjetivi-dade, condizente ao consumismo produzido pela es-trutura social capitalista. Os autores referidos acima demarcam que esse incentivo ao consumo produz subjetividades e relações pautadas por essa lógica, ou seja, subjetividades consumistas. Todavia, a for-mação do senso crítico e a consciência acerca das características sociais desses fatores de produção podem alavancar um rompimento com essa condi-ção de subjetividade alienada e ou massificada.

Sendo assim, estudos que contemplam direta ou indiretamente o conceito aqui abordado, man-tém um viés político no qual estão incutidas ideias de transformação social, diminuição da opressão e construção de modos de convivência mais igualitá-rios e justos.

Por fim, vale ressaltar que, ao estudar a sub-jetividade, a Psicologia Social se propõe a compre-ender os modos de subjetivação, ou seja, modos de pensar, sentir e agir em uma dada época, enten-dendo, obviamente, que tais modos se referem a uma construção social.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para se aprofundar na forma pela qual se dá o processo de produção e reprodução da vida social, indicamos o texto “Indivíduo, cultura e sociedade” presente na Parte I do livro “Psicologia Social Con-temporânea”.

STREY, M. N. et. el. Psicologia Social Contemporâ-nea. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

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Já para a temática da subjetividade, sugerimos a leitura do texto 3: “A emergência do sujeito e a subjetividade: sua implicação para a Psicologia So-cial” do livro “O social na psicologia e a psicologia social”, de Gonzalez Rey.

GONZALEZ REY, F. L. O social na psicologia e a psi-cologia social. Petropólis: Vozes, 2004.

PARA REFLETIR

Neste último trecho discutimos o processo de pro-dução e reprodução da vida social. Pense sobre a subjetividade na atualidade e discuta com seus colegas o quanto se reproduz nas práticas cotidia-nas uma subjetividade voltada para o capitalismo. Discuta também quão “aprisionante” ou libertadora é tal subjetividade.

Além disso, converse com seus colegas sobre pos-síveis estratégias que podem ser pensadas para estimular uma subjetividade singular que exercite a produção de novos modos de se colocar diante das coisas do mundo.

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73Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

2.3 Representações Sociais e Outros Temas

A teoria das Representações Sociais (RS) foi formulada por Serge Moscovici no período de 1984-1998 e significou um grande avanço para a Psicologia Social europeia, sendo difundida, ainda, entre psicólogos latinos e norte-americanos. Álva-ro e Garrido (2006) salientam que essa teoria foi elaborada por Moscovici como uma alternativa à Psicologia Social cognitiva tradicional para estudar os processos cognitivos a partir de uma perspecti-va psicossocial.

Esses autores demarcam o começo da teoria das RS com a tese de doutorado de Moscovici, na qual investiga sobre a difusão da psicanálise. O objetivo era conhecer como os conceitos da psica-nálise se apresentavam no dia a dia, uma vez que conceitos teóricos como “repressão” e “inconscien-te” eram utilizados normalmente no senso-comum. Ele queria compreender como esta apropriação te-órica dava sentido à realidade.

Moscovici inaugura a teoria das RS com base no conceito de representação coletiva (RC) de Durkheim, que via os fatos sociais como externos à consciência individual.

De acordo com Durkheim (apud ÁLVARO; GAR-RIDO, 2006), fenômenos coletivos não podem ser explicados somente através do indivíduo em seu in-terior. Assim, ele defendia que a religião, por exem-plo, seria um produto de uma comunidade. Seguin-do esse raciocínio, Durkheim entende que as regras que comandam a existência individual referem-se às representações individuais; do mesmo modo que para a Sociologia as regras que comandariam a exis-tência coletiva seriam as representações coletivas.

Por outro lado, para Moscovici, segundo Ál-varo e Garrido (2006), as representações coletivas

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são elementos constitutivos da sociedade (mitos, religião e ciência). Propõe, portanto, a substituição do termo “coletivo” por “social” para referir-se à di-namicidade das RS, já que os conceitos teóricos se transformam ao serem utilizados no senso comum.

De acordo com Strey et. al (2008), as RS po-dem ser compreendidas como “teorias” do senso comum. São explicações coletivamente elaboradas, aceitas e repassadas, que têm a intenção de ajudar as pessoas a dar sentido à realidade.

O conceito originou-se ainda com base na crítica que Moscovici elaborou ao conceito de ati-tude (que abordaremos mais adiante), uma vez que, para ele, neste último predomina um caráter individualista. Moscovici critica ainda as pesqui-sas que tratam as opiniões como representações individuais.

Denise Jodelet (apud Strey et. al., 2008), ou-tra importante estudiosa das RS, define-as como uma forma de conhecimento que possibilita a cons-trução de uma realidade. Assim, as RS podem ser consideradas como conhecimentos práticos orien-tados para a comunicação.

Ainda segundo essa autora, as RS se mani-festam como elementos cognitivos, mas não se re-duzem à cognição, pois são fenômenos eminente-mente sociais. Mesmo que sejam acessadas através da cognição, só podem ser entendidas se conecta-das ao contexto no qual se produziram.

Dito isto, nota-se que as concepções mais aceitas nos remetem à maneira pela qual a Psico-logia Social percebe a relação indivíduo-sociedade. Strey et. al. (2008) afirmam que está contida no conceito de RS a ideia de que o homem é produto e produtor de cultura, ou seja, toma-se, ao mes-mo tempo, as RS como uma expressão do universo intra-individual e uma construção coletiva.

Durkheim

Moscovici

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75Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

O social é elemento constitutivo das RS, por conseguinte, não pode ser visto como algo separado delas. Desse modo, afirma-se que em tal concepção o ho-mem é percebido como essencialmente social, sendo que o social não determina a pessoa, mas é substantivo dela.

Portanto, estudar as RS adquire fundamental importância para as Ciências Sociais e Humanas, de modo que as pesquisas na área se colocam como pesquisas interdisciplinares. As RS situam-se no ramo da Psicologia Social e de ciências afins como uma base teórica sólida e consistente. Dizem respeito a estudos que buscam entender como os grupos pensam sobre determinado assunto, viabi-lizando, não somente a compreensão da subjetivi-dade contemporânea, mas, inclusive, a busca por estratégias de intervenção na sociedade.

Representação Social: “sistema de valores, noções e práticas que proporcionam aos indivíduos os meios para orientar-se no contexto social e material, para dominá--lo... um corpus organizado de conheci-mentos e uma das atividades psíquicas graças às quais os homens se integram em um grupo ou em uma relação cotidiana de intercâmbios, liberam os poderes da imagi-nação” (ÁLVARO; GARRIDO, 2006, p. 286).

Três características são fundamentais a este conceito:

• Sua formação ocorre na interação social. • Representa algo.• Possui caráter simbólico.

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Para compreender melhor esse conceito, va-mos trabalhar a representação social de mãe. Na nossa sociedade a mãe é vista como uma mulher amorosa, carinhosa, acolhedora e que ajuda incon-dicionalmente o filho a se desenvolver. Estas carac-terísticas podem traduzir a imagem mais comum que nos chega quando pensamos no que significa ser mãe.

Obviamente, as mães não são todas iguais, mas os valores da nossa cultura nos levam à predo-minância dessa noção de mãe. Em outras culturas esta representação pode ser totalmente diferente. Ao estudar as RS, busca-se compreender como um grupo constrói seu conjunto de saberes sobre determinados assuntos. Assim, podemos chegar a conhecer com o que esse grupo se identifica, aos seus códigos culturais.

Representação Social e Atitude

Atitude refere-se a um conceito de Psicolo-gia Social amplamente difundido nos EUA. Alguns estudos sobre atitude forneceram subsídios para compreender e explicar o preconceito, como vere-mos no tema 4.

Rodrigues, Assmar e Jablonski (2002) afirmam que a formação de atitude ocorre em decorrência das impressões que formamos ao entrarmos em contato com o ambiente que nos circunda.

Segundo esses autores, ainda, a atitude con-siste em

uma organização duradou-ra de crenças e cognições em geral, dotada de carga afetiva pró ou contra um objeto so-cial defi nido, que predispõe a uma ação coerente com as

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77Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

cognições e afetos relativos a este objeto (RODRIGUES; ASS-MAR; JABLONSKI, 2002, p.98)

A atitude, portanto, não consiste só no as-pecto cognitivo (crenças e cognições), mas envolve componentes afetivos (pró ou contra) e comporta-mentais (predisposição à ação).

A partir dessa concepção, Moscovici (apud Álvaro; Garrido, 2006), através do conceito de re-presentações sociais, mostra que as atitudes estão sempre vinculadas a uma visão de mundo, varian-do de acordo com nossas classificações e nomea-ções que fazemos das pessoas.

No Brasil, foi nos anos de 1970 que o concei-to de RS foi se articulando às pesquisas e produção teóricas na Psicologia Social.

Representação Social e Identidade

A Identidade é outro importante tema debatido e estudado na Psicologia Social. Identificar uma pes-soa significa apresentar as características que lhe si-tuam em determinado contexto social. Nesse sentido, a identidade não é uma coisa que pode ser definida dissociada das relações sociais. Envolve uma multi-plicidade de aspectos, relacionados à inserção social.

Na psicologia social brasileira, os trabalhos de Antônio Ciampa (apud Lane; Codo, 2006) têm se destacado por articular identidade à atividade. De acordo com esse psicólogo, a atividade social de-sempenhada pela pessoa exerce forte influência na construção de sua identidade. Por isso, Ciampa, em algumas de suas obras, assinala que, ao se definir, o sujeito aponta ser aquilo que faz naquele instante, não sendo possível demonstrar a todo o tempo, as suas outras facetas ou suas ações em outros grupos.

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O conceito de identidade não pretende atribuir características imutáveis às pessoas. Pelo contrário, busca mostrar que o homem se transforma de acor-do com o contexto social e com as escolhas que vão sendo feitas, por isso, é construído historicamente.

Ambos os conceitos, identidade e RS, de acordo com Strey et. al. (2008), colocam-se como processos coletivamente construídos e passíveis de transformação, fundamentais para a compreensão de um sujeito/grupo, essencialmente efêmeros.

Representações Sociais e Ideologia

Muitos estudiosos buscam estabelecer rela-ções entre o conteúdo das RS e o conceito de ide-ologia, tais como Strey et. al. (2008), autores em cujos estudos nos baseamos para desenvolver esse tema.

Esses autores apresentam-nos que, para Karl Marx, a ideologia pode ser sintetizada assumindo três dimensões. Uma com ideias puras, autônomas e eficazes, sem nenhuma conexão com a realidade. Outra, como ideias da classe dominante. E, por fim, pode referir-se a um sistema de representações que serve para sustentar relações de dominação. Essas relações se estabelecem quando pessoas ou gru-pos se apoderam das capacidades ou habilidades dos subordinados e interferem nas mesmas, esta-belecendo uma situação de desigualdade.

Para Louis Althusser (1918-1990), filósofo francês citado, a ideologia se materializa nas ins-tituições. Ele criou a teoria dos “aparelhos ideoló-gicos do estado”, como ele denomina instituições como escola, família ou religião, criadas, segundo ele, para organizar a sociedade e, assim, estabe-lecer um controle sobre os comportamentos dos indivíduos e dos grupos.

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79Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

John Thompson, sociólogo contemporâneo, defende que ideologia é o uso de formas simbó-licas para produzir ou reproduzir relações de do-minação. Tal concepção é amplamente aceita no universo acadêmico.

Quando se admite que formas simbólicas que interferem nas relações passam a ser parte crucial do conceito de ideologia, podemos considerar que as RS podem ser ideológicas, pois são também for-mas simbólicas.

O interesse de investigações do campo das RS em articulação com ideologia não é simples-mente elencar distintas visões de mundo na con-temporaneidade, mas sim desvelar como os grupos e pessoas estão sendo prejudicados devido às re-lações desiguais e injustas e compreender a influ-ência das representações sociais para a promoção ou perpetuação dessa desigualdade.

Ancoragem e Objetivação

Ancoragem e objetivação são os processos que possibilitam a formação da RS, como nos apre-sentam Strey et. al. (2008).

A ancoragem é o processo através do qual se busca encontrar um lugar familiar para determinada informação ou situação que, em primeiro momento, é desconhecida. Tudo aquilo que compreendemos como estranho pode ser visto como ameaçador, de modo que é a ancoragem que soluciona o mal-estar causado por essa circunstância.

A ancoragem, portanto, permite que algo desconhecido ou pouco familiar seja comparado e, assim, seja compreendido. Estudos de Jodelet (apud Strey et. al., 2008, p. 109) mostram como as pessoas classificavam doentes mentais em uma pequena cidade francesa. Para estes moradores,

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os doentes mentais até então desconhecidos ao serem vistos foram “julgados por padrões conven-cionais, comparados a idiotas, vagabundos, epilé-ticos”. No estudo, a ideia de idiota foi transferida a doente mental e a isso se denomina ancoragem. Ao ancorarmos, rotulamos o objeto estranho, esta-belecendo conexões entre ele e alguma outra coisa que é familiar.

A objetivação, por sua vez, é o processo mediante o qual conceitos abstratos recebem en-tidade com experiências práticas e concretas. É o mecanismo que procura tornar concreta uma dada realidade. Nesse processo busca-se aliar um concei-to a uma imagem. A associação do conceito a uma imagem foi denominada por Moscovici (apud Strey et. al., 2008) de realidade icônica.

Moscovici também usa a religião para explicar a objetivação, afirmando que, quando chamamos Deus de “pai”, estamos dando ao conceito invisível (Deus), uma imagem (pai) conhecida. Isso faz com que a ideia de Deus seja mais facilmente compre-endida, aceita e repassada pelos sujeitos e grupos.

Teoria das Influências Sociais

Outra importante contribuição das RS, segun-do Álvaro e Garrido (2006), foi o desenvolvimento da teoria da influência minoritária, ou seja, de como uma minoria pode influenciar uma maioria. Nessa concepção, cada indivíduo não somente pode rece-ber influência do grupo, mas também pode influen-ciar o grupo, uma vez que o sistema social é um produto dos indivíduos e de suas ações. Para que isso ocorra, de acordo com essa teoria, é neces-sário que haja um conflito ou confronto de ideias.

De acordo com esses autores, Moscovici re-aliza experimentos para sustentar essa afirmação.

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81Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

Denomina de efeito de conversão a influência das minorias ativas, no sentido de que estas têm o po-der de afetar e converter crenças pessoais. Os estu-dos sobre as minorias ativas acentuavam que estas têm um papel na transformação da ordem social.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para se aprofundar nos conceitos Ideologia e Iden-tidade, você pode fazer a leitura da parte 2 do livro “Psicologia Social: o Homem em Movimento”. No quarto capítulo, ainda da parte 2 do livro citado, encontra-se um texto de Antônio Ciampa que discu-te o conceito de identidade.

LANE, Silvia; CODO, Wanderley (Org.) Psicologia Social: o homem em movimento. 13. ed. São Paulo: Brasiliense, 2006.

Para a leitura sobre o tema das Representações Sociais, indicamos a parte 5 do livro “Psicologia Social: perspectivas psicológicas e sociológicas”, intitulado “A teoria das representações sociais”.

ALVARO, J. L; GARRIDO, A. Psicologia Social: pers-pectivas psicológicas e sociológicas. São Paulo: Mc Graw Hill, 2006.

PARA REFLETIR

Discuta com seus colegas, a partir das ideias for-muladas, como pode ser apresentada a representa-ção social de “aluno” na sua Instituição de Ensino Superior.

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Reflitam ainda sobre os conteúdos ideológicos, à luz da concepção marxista crítica, associados a essa Representação Social que vocês acabaram de elaborar.

2.4 Instituições socializadoras: família, escola, trabalho

Como já discutimos, o homem é um ser so-cial e, portanto, constitui-se enquanto humano por meio das relações interpessoais que estabelece ao longo da vida. Dessa forma, torna-se imprescindí-vel que conheçamos algumas das instituições que contribuem nesse processo, exercendo papéis de agentes socializadores, uma vez que é em seu in-terior que os indivíduos entram em contato com a cultura vigente na sociedade em que vivem.

Entre essas instituições, iremos destacar, aqui, a família, a escola e o trabalho, por exerce-rem importante influência na constituição dos seres humanos em diferentes momentos de sua história. No tema 3, quando trataremos das relações gru-pais, retomaremos a discussão dos processos de institucionalização.

A família

Quantos de nós já não ouvimos falar que a “família é a célula da sociedade”, a base sobre a qual são construídos os alicerces que vão sustentar todo o edifício social? Se não temos bases seguras, a construção fica ameaçada...

Mas essa não é uma unanimidade. Alguns veem a família como uma instituição de controle social, que barra o desenvolvimento, por reproduzir

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83Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

a ideologia dominante, contribuindo, assim, para a formação de cidadãos passivos e dependentes, que não desenvolvem o espírito crítico para questionar aquilo que lhe é passado como sendo natural e próprio do ser humano.

Mas antes que queiramos defender uma ou outra posição, é muito importante que façamos uma análise mais ampla dessa instituição que, in-dubitavelmente, exerce um importante papel de mediadora entre o indivíduo e a sociedade, já que é no seio de uma família que, pela primeira vez, entramos em contato com o outro, que desempe-nhamos nosso primeiro papel social: o de filho.

Para compreendermos a família, precisamos situá-la dentro do contexto social e histórico, para que não a tomemos como algo natural e sim como fruto de toda uma construção que foi sendo dada ao longo do tempo, de acordo com as mudanças sociais que foram se estabelecendo e, a partir des-tas, as necessidades com que se depararam ho-mens e mulheres diante de novas demandas pes-soais e sociais.

O psicólogo José Roberto Tozoni Reis (apud Lane; Codo, 2006), em seu texto “Família, Emoção e Ideologia”, retoma os quatro modelos de família apresentados pelo historiador Mark Poster, para ilus-trar esse caráter histórico da família, concluindo com a família burguesa, que ainda permanece como o modelo ideal de família que assumimos atualmente, apesar de já nos depararmos com variadas consti-tuições familiares, a maioria ainda vista como uma família alternativa que ameaça o padrão tradicional, muitas vezes tido como o único possível.

De fato, a família composta por pai, mãe e filhos vivendo em uma mesma casa, em que a pri-vacidade é um valor largamente defendido, em de-trimento da vida pública, que fica reservada para

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o âmbito do trabalho, é uma composição relati-vamente nova, surgida no século XVIII, diante da emergência de uma nova classe social, a burguesia, que procurou, com isso, atender às necessidades do novo estilo de vida que se estabeleceu após a Revolução Industrial.

Reis (apud Lane; Codo, 2006) continua trazen-do os estudos de Poster, que afirma que a partir desse momento definiu-se nova divisão sexual dos papéis sociais, em que o homem passou a ser o res-ponsável pelo sustento financeiro da família, exer-cendo seu trabalho fora de casa, e a mulher adquiriu o papel de representar a vida emocional, tornando--se dependente do marido e dedicando-se exclusi-vamente ao cuidado dos filhos e da vida doméstica.

Nos dias atuais, podemos observar novos padrões familiares, bem como papéis bem mais diversificados sendo desempenhados tanto pelos homens quanto pelas mulheres. As mulheres conse-guiram conquistar seu espaço também no mercado de trabalho, reduzindo sua dependência em relação à figura do marido, por exemplo, mas não pode-mos negar que a visão que ainda é predominante na nossa sociedade delega à mulher a responsabi-lidade pelas obrigações domésticas e educação dos filhos, mantendo a representação do âmbito emocio-nal familiar. O trabalho, para a maioria dos homens, é o centro de sua autorrealização, haja vista fortes consequências emocionais negativas diante de uma situação de desemprego ou aposentadoria, em geral mais marcantes em homens que em mulheres.

É importante que seja feita essa contextuali-zação, pois a constituição assumida pela família em determinado momento histórico vai contribuir com a forma como a própria sociedade vai se configurar, além de ela também ser reflexo dos valores e ex-pectativas que regem as relações sociais da época.

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85Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

Sendo assim, torna-se claro que, enquanto a primeira instituição social em que a maioria dos indivíduos se encontra no início de seu processo de socialização, a família representa, para a Psico-logia Social, um importante tema de estudo, por possibilitar a compreensão de parte do processo de estruturação de um indivíduo como ser social.

Voltando para as concepções apresentadas no início deste tópico, é importante que se tenha em vista que a família pode sim funcionar como mantenedora da ordem social vigente, quando re-produz os valores sociais existentes, sem questio-namentos, incutindo em seus membros uma visão naturalizada e, portanto, ideológica, das possibili-dades de relações a serem estabelecidas de acordo com as expectativas de comportamento existentes diante de cada papel social desempenhado.

A escola

A escola é o local onde a criança e o adoles-cente passam a maior parte de seu dia e estabele-cem a maioria dos relacionamentos sociais fora da família. Dessa forma, constitui também um impor-tante meio de socialização, merecendo atenção de todos aqueles interessados nesse processo.

Segundo Miranda (apud Lane; Codo, 2006), é importante que se tenha uma visão contextualiza-da da escola e suas características socializadoras, para que não se formem concepções equivocadas, tomando a escolarização como um processo neutro que tem a função de integrar uma criança abstrata em uma sociedade supostamente harmônica.

Como qualquer outra instituição social, sabe--se que a escola também exerce o papel de transmi-tir os valores que regem a sociedade na qual está inserida. Portanto, como em todas as questões so-

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ciais, ao nos debruçarmos sobre sua característica socializadora, nossa compreensão será mais fide-digna se discorrermos sobre os envolvidos nesse processo, ou seja, a escola, a criança e a sociedade de uma forma abrangente e não reducionista.

A própria concepção da infância, juntamente com a história da instituição familiar, foi sofrendo mudanças ao longo do tempo. Falar de natureza in-fantil é uma forma de cristalizar uma única concepção de criança que não leva em conta as peculiaridades de cada uma, levando a uma proposta educacional segregacionista, em que aqueles que não se adap-tem a ela sejam considerados inaptos, inferiores. Essa postura, muitas vezes, contribui para que o processo de socialização destes e a constituição de sua identidade sejam marcados pela construção de uma imagem negativa, que, quando interiorizada, vai influenciar de maneira importante na autoesti-ma da criança, prejudicando seus relacionamentos interpessoais e, consequentemente, seu desenvolvi-mento cognitivo e emocional, o que pode ser visto, inclusive, como uma “confirmação” da imagem que, na verdade, foi construída e reforçada.

Na verdade, a escola deve estar atenta para auxiliar a criança a tornar-se sujeito de seu proces-so de socialização, para que não assuma simples-mente uma posição passiva de aceitação da cultura que lhe é passada, muitas vezes totalmente distan-te daquela que realmente vivencia no seu dia a dia.

O trabalho

É difícil a gente imaginar alguma ação hu-mana que não envolva, de certa forma, o traba-lho, seja próprio ou realizado por outras pessoas, como bem destaca Codo (apud Lane; Codo, 2006). O trabalho, portanto, está presente na vida do ser

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87Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

humano e intervém na forma como ele se relaciona consigo e com o mundo.

Ao longo da evolução da humanidade, a ma-neira pela qual era desempenhado o trabalho in-fluenciou de forma decisiva na relação do homem entre si e com a natureza. Segundo Lane (apud Lane; Codo, 2006), o trabalho cooperativo, por exemplo, exigiu que houvesse uma organização diferente, com planejamento e divisão de tarefas, levando ao desenvolvimento da linguagem, que possibilitou a atividade do homem com menos li-mitação em termos de espaço de tempo.

As relações estabelecidas por meio do tra-balho influenciam em vários aspectos a vida do homem, tal como seu comportamento, linguagem, forma de se vestir, locais que vai frequentar, tipos de lazer, planos para o futuro e, sobretudo, suas relações sociais, tornando-se, portanto, uma das instituições essenciais na formação do ser social.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Recomendamos a leitura de três capítulos apresen-tados na Parte 3 do livro “Psicologia Social: o Ho-mem em Movimento”, para aprofundar os temas discutidos nesse capítulo.

Para conhecer um pouco mais sobre as mudanças pelas quais passou a instituição familiar ao longo do tempo, você pode ler o capítulo “Família, Emoção e Ideologia”, de José Roberto Tozoni Reis, em que ele apresenta quatro modelos de família do historiador Mark Poster, que comentamos anteriormente.

Ainda nesse livro, você pode encontrar um texto so-bre “O processo de socialização na escola”, de Marília

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Gouvea de Miranda e sobre as “Relações de trabalho e transformação social”, de Wanderley Codo, em que o autor traz discussões em relação à posição ocupada pelo trabalho na nossa sociedade capitalista.

LANE, Silvia; CODO, Wanderley (Org.) Psicologia So-cial: o homem em movimento. 13. ed. São Paulo: Brasiliense, 2006.

Recomenda-se, ainda, a leitura do artigo “A Famí-lia e a Escola como contextos de desenvolvimento humano”, de Dessen e Polonia (2007), em que é apresentada uma reflexão sobre as contribuições dessas duas instituições no processo de desenvol-vimento humano, incluindo a discussão sobre sua função socializadora.

DESSEN, M. A.; POLONIA, A. da C. A família e a es-cola como contextos de desenvolvimento humano. Paideia, 17(36), abr. 2007 . Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/ paideia/v17n36/v17n36a03.pdf>. Acesso em: 15 de julho de 2011.

PARA REFLETIR

A partir de todas essas discussões feitas ante-riormente, acerca do homem enquanto ser social, percebemos a grande importância que a cultura e a sociedade têm na constituição do indivíduo en-quanto humano. Reflita junto a seus colegas sobre a importância de serem discutidas essas questões para a prática do Assistente Social.

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89Tema 2 | Debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade

RESUMO

Vimos no conteúdo 2.1 que para adentrar na dis-cussão do debate contemporâneo das relações indivíduo-sociedade primeiramente foi necessário compreender por que o homem é um ser social, quais os elementos que caracterizam a necessidade de viver o tempo todo em relação com o outro.

Já no conteúdo 2.2, vimos como se dá o proces-so de constituição da subjetividade, demarcando como o indivíduo é, ao mesmo tempo, produzido pela sociedade em que vive (produto) e agente transformador dessa realidade, dos valores e nor-mas sociais (produtor).

Mais adiante abordamos no conteúdo 2.3 o con-ceito de representação social e sua relação com atitude, identidade e ideologia, presente nos es-tudos em psicologia social. Ao final, no conteúdo 2.4, apresentamos algumas instituições responsá-veis pelo processo de socialização, a família, a es-cola e o trabalho, que exercem importante papel na constituição do indivíduo como um ser social, uma vez que, por meio das relações estabelecidas em seu interior vão se constituindo as subjetivi-dades e identidades de seus membros, além de se formarem as representações sociais, podendo simplesmente reproduzir a ideologia dominante ou contribuir para a formação de pessoas ativas na transformação da sociedade.

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O CONTEXTO DAS PRÁTICAS EM PSICOLOGIA SOCIAL

Parte 2

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Psicologia Social e as relações de grupo3

Você deve estar se perguntando a esta altura de nosso estudo o que faz um psicólogo social ou se existe essa prática como uma especialidade na Psicologia. De modo geral, podemos dizer que a Psicologia Social é um campo de estudos, pesquisas e práticas que se relaciona e transversaliza outras áreas na Psicologia, tal como o Serviço Social, fornecendo subsídios para uma prática mais conecta-da com a realidade social do contexto em que vivemos.

Vamos agora nos direcionar para uma discussão da Psicologia Social enfatizando as relações interpessoais no interior dos grupos, bem com as relações intergrupais, uma vez que, compreendendo es-sas relações, nós também podemos ampliar nosso olhar em direção a cada pessoa em particular.

Boa leitura!

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3.1 Grupos, Instituições e Organizações

Partimos da constatação de que é impossível para o ser humano estar isolado em uma estrutura social e, mesmo quando vive sozinho, acaba por reproduzir alguns mecanismos sociais, tais como os grupos, instituições e organizações. Iremos dialo-gar, daqui por diante, justamente sobre esses me-canismos que possibilitam a constituição de uma certa estrutura no sistema social, permitindo sua manutenção.

Para tanto, sistematizamos algumas seme-lhanças e diferenças entre esses três aspectos da vida social, bem como a relação entre eles e sua interdependência.

Grupos, grupalidade e processo grupal

No processo de identidade social que permite nos situarmos espaço-temporalmente em uma so-ciedade, somos levados a mencionar os grupos aos quais pertencemos. Na simples pergunta “quem é você?”, emergem alguns grupos.

Vimos na primeira parte deste livro (Tema 1) que os primeiros estudos sistematizados sobre Psi-cologia Social, a partir da Segunda Guerra Mundial, foram os estudos de Kurt Lewin sobre pequenos grupos. Lewin buscava compreender a dinâmica que ocorre enquanto fenômeno social, quando as pessoas se agrupam.

Após abordagem mais ampla nesse tema, mais adiante, no próximo capítulo, discutiremos especificamente sobre “dinâmica de grupos”.

Segundo Lane (apud Lane; Codo, 2006), que servirá de referência para a construção das ideias apresentadas neste capítulo, podemos pensar o grupo pela sua funcionalidade:

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95Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

Funções do grupo:1. Definir papéis sociais;2. Definir identidade social dos indivíduos;3. Garantir a produtividade social.

O que é um Grupo?

Lane (apud Lane; Codo, 2006) traz a defi-nição de Enrique Pichón Riviére (1907-1977), psi-cólogo e psicanalista argentino, que define grupo como um conjunto de pessoas com uma finalidade em comum, ligadas por constantes de espaço e tempo, além de assumirem papéis e atribuições específicos.

Esse autor elaborou muitos estudos sobre grupos desde 1930 e contribuiu para o desenvol-vimento da Psicoterapia de Grupos, com a técnica dos Grupos Operativos, trazendo importantes resul-tados na recuperação de pacientes. Elaborou estu-dos sobre a relação entre esquizofrenia e situação/dinâmica familiar. A técnica dos grupos operativos nos casos com familiares de pacientes esquizofrê-nicos era utilizada para superar o medo das trans-formações que deveriam ocorrer pelas necessárias mudanças de atitude nos indivíduos esquizofrêni-cos pertencentes a uma estrutura familiar.

Outros autores, como Calderón e Govia, tam-bém referenciados por Silvia Lane (apud Lane; Codo, 2006), definem alguns estágios pelos quais passam os grupos, uma vez que estes, na busca de diferentes formas de satisfazer suas necessidades, estão em constante transformação. São eles:

1. Grupo aglutinado: os membros do grupo es-peram do líder, que propõe ações conjuntas, soluções para os problemas, possuindo, por esse motivo, baixa produtividade;

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2. Grupo possessivo: o líder é coordenador das ações, que devem ter a participação de todos os membros, ocorrendo, portan-to, maior interação;

3. Grupo coesivo: o líder continua coor-denando as ações e ocorre uma maior aceitação dos membros entre si. Há um cuidado para se manter a segurança, ten-dendo a se fechar em relação à entrada de novos membros;

4. Grupo independente: neste estágio, o grupo tende para a auto-gestão, uma vez que a liderança já é distribuída devido ao acúmulo de experiências, minimizando-se as relações de dominação.

Apesar dessa classificação em termos didá-ticos, não é possível compreender esses estágios como processos estanques, uma vez que operam sempre de modo dialético. Para conhecer os grupos ou compreender os motivos de certa ação grupal, é preciso analisar as determinações históricas, so-ciais, econômicas, institucionais e ideológicas que os perpassam.

Ademais, em uma análise dialética dos gru-pos, podemos afirmar que um grupo deve ser com-preendido em relação com as determinações so-ciais, do mesmo modo que o grupo é condição para compreender tais determinações. Por isso, a ação transformadora, como vimos no tema 1, em relação à Psicologia Comunitária, acontece efetiva-mente quando os indivíduos se agrupam. A defini-ção de grupos não se restringe apenas na demarca-ção: indivíduo sozinho versus indivíduo em grupo.

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97Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

Devido a essa multiplicidade de aspectos que envolvem os grupos e pela sua di-namicidade e transformações constantes às quais se submete, destaca Lane (apud LANE; CODO, 2006, p.82) que é mais adequado falar em “processo grupal” e não em grupo.

Relação do grupo com as instituições

Segundo Lane (2002, p.85), “todo grupo ou agrupamento existe dentro de instituições, que vão desde a família, a fábrica, a universidade e até o próprio estado”.

A partir dessa afirmativa, vemos que é fun-damental para compreender um grupo analisar a sua relação com as instituições.

Mas o que são instituições?

Geralmente quando falamos em instituição pensamos logo em um local onde se realiza uma determinada atividade social, que pode ser do go-verno (estatal), privada ou não governamental.

Mas o conceito de instituição não é apenas restrito a um lugar, estabelecimento ou espaço físi-co. Esse conceito assume uma dimensão mais abs-trata que se atualiza também no modo como as pessoas se relacionam. Uma escola, como vimos anteriormente, por exemplo, é uma instituição e nos referimos aqui primeiramente a suas condições estruturais. Possui uma equipe de professores, co-ordenadores, administração, alunos e define nor-mas e valores do que é permitido ou não no âmbi-to institucional. Esse sistema normativo constitui o que denominamos de dimensão mais abstrata de instituição.

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Por isso, podemos falar em escola e, por outro lado, em instituição escolar. Nesse segundo item, incluímos a concepção de educação que en-volve essa escola, o método de ensino, a relação professor-aluno (horizontalidade-verticalidade), o modo de funcionamento, o sistema de avaliação entre outros.

Já vimos no tema 2 que as instituições estão presentes no processo de socialização do indiví-duo de forma marcante. O processo de socialização refere-se à introdução do homem na sociedade e se expressa no processo de constituição da subje-tividade, que, como vimos no tema anterior, revela o modo como se interiorizam determinados con-teúdos institucionais. No modo como pensamos, sentimos, amamos, comemos, dormimos, anda-mos, enfim, em tudo que fazemos e em tudo que pensamos estão presentes as instituições. Elas são criadas para garantir a manutenção das estruturas sociais, mas também podem funcionar como meio de transformação da sociedade.

Processos de institucionalização

As instituições são construídas e projetadas para manutenção de determinadas relações sociais, que em nossa sociedade capitalista, visam manter relações de produção.

Para compreendermos como isso ocorre, bas-ta olharmos para situações do cotidiano que mui-tas vezes passam despercebidas. Sempre que algo se apresenta como uma experiência bem sucedida, tanto no âmbito comercial, empresarial, ou no âm-bito governamental (um plano de governo), como até mesmo em qualquer esfera dos relacionamen-tos interpessoais, verifica-se uma tendência a que-rer repetir e perpetuar tal experiência. Essa tendên-

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99Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

cia à repetição carrega as marcas do processo de institucionalização. Afinal, para instituir algo como certo e seu oposto como errado, é fundamental a repetição.

As instituições estão presentes desde o mo-mento em que nascemos e por esse motivo elas nos atravessam sem muitas vezes percebermos. Precisamos que o outro nos acompanhe para nos ensinar a viver. Isso já pressupõe uma aprendiza-gem que está presente não somente nas escolas, mas ainda nas relações informais. É comum ver nas relações de pais e filhos comportamentos que eram repudiados por esses mesmos pais, quando ocupa-vam a posição de filhos.

Examinemos o poema abaixo e pense-mos sobre esses aspectos invisíveis dos processos de institucionalização:

“Desconfiai do mais trivial,na aparência, singelo. E examinai, sobretudo, o que parece ha-bitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coi-sa natural, pois em tempo de desordem sangrenta,de confusão organizada, de arbitrarieda-de consciente,de humanidade desumanizada,nada deve parecer natural nada deve pa-recer impossível de mudar” (Bertold Brecht).

Por que tendemos a repetir além das experi-ências exitosas, também aquilo que não gostamos ou que mais repudiamos? Agora, sabemos que isso

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acontece devido à força dos conteúdos instituídos e aos mecanismos sociais de institucionalização. É possível entender a institucionalização naquilo que, a primeira vista, parece ser natural, ou seja, que acompanha a história a longo período, o corri-queiro “sempre foi assim”.

A esses processos que buscam a manuten-ção, impossibilitando ou dificultando as transfor-mações necessárias, denomina-se institucionaliza-ção ou cristalização.

Temos visto neste livro – e contamos que você já esteja incorporando essas noções – que as construções que parecem naturais, não o são, uma vez que possuem certa historicidade, ou seja, foram construídas em um dado momento histórico.

René Lourau (1933-2000) e George Lapassa-de (1924-2008) são importantes teóricos e formu-ladores da Análise Institucional, corrente teórica e prática que tem fornecido subsídios e fomentado questionamentos às cristalizações das instituições, provocando desestabilização e rupturas de algu-mas formas instituídas (BAREMBLITT, 1996).

A noção de instituição nos primeiros traba-lhos de Psicoterapia Institucional, no trabalho com pacientes e funcionários em uma instituição hos-pitalar, se confundiu com a noção de organização, como estabelecimento. Veremos a diferença entre esses dois termos a seguir.

Relação entre Organizações e Instituições

Se, como vimos, as instituições compõem cer-ta dimensão abstrata pertinente a valores e regras que perpassam as relações, as organizações, por outro lado, compõem a dimensão concreta. As or-ganizações representam os estabelecimentos. Apon-

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101Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

taremos aqui algumas ideias acerca dessa relação a partir dos autores Bock, Furtado e Teixeira (2009).

Afirmamos que as instituições são criadas para reproduzir certos valores e manter determi-nada estrutura social; as organizações, por assim dizer, representam o local onde ocorrerá essa re-produção.

1. Instituições: campo de valores e re-gras

2. Organização: forma de materialização de valores e regras

3. Grupos: sujeitos ativos que reprodu-zem as regras e promovem valores

Os estudos sobre organização tradicional-mente se concentraram nas relações vinculadas ao trabalho, relacionadas principalmente a empresas. Sendo o trabalho a mola propulsora de uma so-ciedade capitalista, as organizações empresariais assumem importante função na reprodução dos va-lores dessa sociedade, quer seja na compra, venda, consumo, mercadoria e/ou no lucro.

Esses autores salientam que os estudos e pesquisas desenvolvidas nessa área se destaca-ram por analisar como o homem se motiva para o trabalho, desenvolvendo técnicas para aumentar a produtividade. Um estudo conhecido é o aplicado na fábrica Hawthorne que visava estudar a fadiga dos trabalhadores expostos sob várias condições experimentais. Nessa pesquisa, constatou-se que além das condições físicas e condições de traba-lho a que estão expostos os trabalhadores, outro componente importante encontra-se no âmbito das relações interpessoais.

Nesse campo, identificou-se a inserção de muitos psicólogos, constituindo o campo da Psico-

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Psicologia Social102

logia Organizacional e do Trabalho, que atualmente vem assumindo e incorporando novas atribuições em uma análise mais ampla dos processos de tra-balho, tendo grande contribuição dos estudos rea-lizados no âmbito da Psicologia Social.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Sugerimos para uma apreensão dessa discussão acer-ca de instituições, organizações e processo grupal a leitura do capítulo 15 do livro “Psicologias”, intitulado “Psicologia institucional e processo grupal”. Os auto-res fazem a distinção dos três conceitos, bem como a relação entre eles, com exemplos práticos.

BOCK, A; FURTADO, O; TEIXEIRA, M. L. T. Psicolo-gias: uma introdução ao estudo da Psicologia. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

Outra leitura importante é o capítulo 1 da parte 3 do livro “Psicologia Social: o homem em movimen-to”, em que Sílvia Lane retoma a discussão sobre o Processo Grupal.

LANE, Silvia; CODO, Wanderley (Org.) Psicologia So-cial: o homem em movimento. 13. ed. São Paulo: Brasiliense, 2006.

PARA REFLETIR

A partir do que estudamos agora, discuta com seus colegas sobre alguns valores, atitudes e pensamen-

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103Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

tos instituídos na sociedade, que caracterizam ex-pressões do tipo “sempre foi assim, não vai mudar” e façam uma rápida pesquisa sobre o momento histórico em que foi construído, pensando sobre modos diferentes de ser.

Elenque ainda alguns grupos a que você pertence e escreva sobre seu funcionamento, associando com o que apresentamos na discussão sobre grupos. Em seguida, coloque em comum com seus colegas e discutam sobre possíveis diferenças e semelhan-ças entre os grupos dos quais vocês fazem parte.

3.2 Dinâmica de Grupo: relações interpessoais, intergrupais e intragrupais

Anteriormente vimos a definição de grupo, comentamos sobre processo grupal, apontamos di-ferentes tipos de grupo e algumas principais teo-rias que se ocupam dos estudos sobre esse tema.

Neste momento vamos falar mais especifica-mente da Dinâmica de Grupo e de como ela pode ser uma ferramenta, na atualidade, tanto para com-preender a dinâmica dos grupos quanto para a con-figuração de uma prática de intervenção.

Dinâmica de Grupo

Sabemos, conforme exposto em momentos an-teriores, que desde a civilização grega são feitas in-vestigações a respeito dos grupos e da coletividade.

A “República” de Platão e a “Política” de Aristóteles já trazem análises dos fenô-menos coletivos. São remotos os interes-

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ses em estudos de grupo e há muito se busca a compreensão das dinâmicas das relações interpessoais.

Entretanto, a expressão Dinâmica de Grupo

(DG) passou a ser conhecida somente no século XX, tendo aparecido pela primeira vez em 1944, em um artigo de Kurt Lewin (apud Strey et. al., 2008). Nos dias atuais, a expressão possui distintas inter-pretações. Apresentaremos três possíveis, segundo Minicucci (2002):

1. Dinâmica de Grupo pode ser referida como um termo utilizado pela ideologia política11 para demarcar a necessidade de processos participativos nas tomadas de decisão.

Seguindo tal lógica, a DG estuda a maneira pela qual os grupos tomam suas decisões, discu-tem as estratégias de liderança, avaliam o grau de desempenho e eficácia dos dirigentes. Debruça-se, também, sobre temas como a persuasão, influência eleitoral nos grupos, dentre outras questões simi-lares. Enfim, Dinâmica de Grupo, neste contexto, elucida a participação e co-gestão como estratégia essencial em uma sociedade democrática.

2. Outro sentido dado à DG alude a um campo de pesquisa. Portanto, dinâmica de grupo se estabelece como um saber que visa à obtenção de conhecimento so-bre o funcionamento dos grupos.

Para isso, as relações interpessoais são es-tudadas. Inúmeros aspectos que envolvem forças psicológicas e sociais são considerados pela DG na

11 O termo aqui empregado se refere às ideias que vigo-ram em um certo grupo que ocupa o poder, que governa uma coletividade, por exemplo.

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105Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

elaboração de teorias explicativas. Alguns deles po-dem ser: coesão, coerção, pressão social, atração, rejeição, resistência, interdependência e equilíbrio. Também dentro desta interpretação, situam-se as pesquisas sobre a natureza dos grupos e suas leis.

De modo geral, podemos dizer que a DG, como campo de pesquisa, abrange desde as pes-quisa de Lewin, que marcaram as primeiras experi-ências com grupos em Psicologia Social, passando à Sociometria, até a Análise Institucional (comenta-da no capítulo anterior). Esta última tem sido consi-derada como uma corrente contemporânea em DG.

3. DG também é usada para fazer referência a um conjunto de técnicas de intervenção nos grupos, que vão desde simulações – envolvendo treinos ou desempenho de papéis – até as chamadas vivências.

Esse uso da DG tem se configurado como uma área bastante difundida nos dias atuais, especial-mente porque cada vez mais têm sido buscadas for-mas criativas para lidar e intervir com situações que envolvem as pessoas. As técnicas aqui apontadas são utilizadas em inúmeras instituições como esco-las, empresas, espaços terapêuticos, mas também nos esportes e muitas outras (MINICUCCI, 2002).

É de fundamental importância sinalizar que as três interpretações comumente associadas à DG não se colocam como mutuamente exclusivas. Ou seja, quando se refere a uma ideologia política, a DG pode também se estabelecer como campo de pesquisa. Da mesma forma que como técnica de intervenção quase sempre é, ao mesmo tempo, um campo de pesquisa que investiga sobre processo grupal, além de ser uma aplicação prática das pró-prias teorias em DG.

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Relações interpessoais, intergrupais e intragrupais

De modo geral, quando trazemos o tema das relações interpessoais estamos nos referindo a relações entre as pessoas. Ao longo do debate de todos os temas tratados aqui, estamos enfati-zando a relevância das relações interpessoais para a sociedade e para os indivíduos que dela fazem parte e que a constroem a todo instante. É devido às relações interpessoais que são criadas normas, contratos formais e informais, pactuações que são introjetadas, repassadas e, às vezes, questionadas e, em algumas situações, transformadas.

Se o âmbito das relações interpessoais trata das relações entre as pessoas, logo, as relações intergrupais referem-se às relações entre grupos distintos.

Um fenômeno importante no que concerne às relações intergrupais é o que se denomina hostili-dade, que se refere à distância ideológica, normati-va ou social de um grupo em relação a outro, o que acarreta desarmonia entre eles.

Por isso, grupos isolados demonstram ten-dência a reforçar sua coesão interna. Assim, ten-dem também a ser mais rígidos em relação aos de-mais, apresentando menos tolerância para com as características grupais das quais não compartilham.

As pesquisas sobre relações intergrupais reve-lam que para vencer obstáculos e atingir metas mui-to difíceis, os grupos se aliam e mesmo os grupos antagônicos, trabalham em regime de cooperação em prol do objetivo. Deixam de lado, por sua vez, os atritos intergrupais e os estereótipos desfavoráveis. Acompanhamos com frequência essas relações em partidos políticos divergentes, por exemplo, que em período eleitoral fazem as denominadas coligações para atingir o objetivo principal.

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107Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

As relações intragrupais referem-se a relações entre as pessoas que compõem um mesmo grupo. Quando estudamos as relações que se processam dentro de uma família, por exemplo, estamos falan-do de relações intragrupais.

Na temática das relações intragrupais o con-flito se estabelece como um aspecto de suma im-portância. Os conflitos podem se estabelecer como relações que dificultam ou até mesmo impedem o alcance de metas e objetivos. Ao mesmo tempo, podem ser muito potentes para proporcionar as transformações necessárias, para reorganizar ou re-verter valores e ressignificar as relações.

Todavia, os conflitos podem diminuir a coesão grupal e tendem a ser mais frequentes nos grupos formais do que nos grupos informais. Eles podem ocorrer por vários motivos. Por exemplo, porque membros do grupo desobedecem ou burlam as nor-mas, porque alguns privilegiam as necessidades in-dividuais em detrimento das do grupo, ou porque o grupo está passando por um processo de transição, devido aos chamados membros difíceis, etc.

Os grupos formais são aqueles que con-tam com uma aprovação oficial. Por isso, são formalmente organizados e possuem regras e hierarquias explícitas. Já os gru-pos informais surgem de forma espontâ-nea e as relações intragrupais são marca-das pela afetividade. Um exemplo de um grupo formal é o grupo de funcionários do setor de uma empresa e de grupo informal pode ser um grupo de amigos. Vale destacar que ambos não são exclu-dentes, uma vez que dentro de um grupo formal, pode haver um grupo informal.

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A DG defende que os conflitos devem ser ex-plicitados. É fundamental deixar circular a palavra nos grupos, permitindo que os membros expres-sem, inclusive, conteúdos desagradáveis para si e/ou para o coletivo. Isso não para incitar a desor-dem, o desafeto ou o caos, mas sim para que se tornem conhecidos por todos e possam ser solu-cionados. A explicitação do conflito pode até gerar um desgaste emocional no grupo, a depender de sua gravidade, porém, costuma tornar o grupo mais produtivo e mais maduro (MINICUCCI, 2002).

A maturidade de um grupo de que fala Minicucci (2002), não se refere à idade dos seus membros. Não se refere, do mesmo modo, às questões de ordem “biológica”, mas sim, de ordem psico-lógica. Enfim, a maturidade de um gru-po pode ser definida pela motivação do mesmo e sua educação significativa para o desempenho da tarefa, bem como a capacidade de elaborar estratégias pró-prias para lidar com conflitos e relações adversas ou inesperadas.

A manutenção do conflito pode gerar descon-

forto entre os membros, causando insatisfação nos níveis individual e grupal.

Um fenômeno intragrupal muito comum, que costuma sinalizar a existência de conflitos no gru-po, é denominado nas teorias de DG como “Bode Expiatório”.

Pichón Riviere (1907-1977), psiquiatra e psi-canalista, referência em trabalhos com grupos, define “Bode Expiatório” como sendo a situação em que um membro do grupo incorpora o papel de depositário dos aspectos negativos do grupo a

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109Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

que pertence. Tal membro torna-se, então, culpado por tudo que não dá certo ou que fomenta fracas-so. Neste fenômeno, o grupo ataca um de seus membros, ao invés de focar na real questão que emperra o bom funcionamento do grupo. A esse mecanismo se denomina projeção.

De fato, a eclosão do “Bode Expiatório” está associada a certas características do sujeito que fa-cilitam a ocorrência disso. Por isso, psicanalistas como Riviere atribuem o fenômeno a uma dimen-são do desejo tanto do grupo em punir, quanto do indivíduo (que se torna “Bode Expiatório”) em ser punido.

Técnicas em Dinâmica de Grupo

Existem várias técnicas que podem ser usa-das para estudar ou intervir em um grupo.

Uma técnica bastante difundida e utilizada é o role-playing ou desempenho de papéis. Através desta, membros de um grupo, por meio da drama-tização, experimentam desempenhar um papel que normalmente não desempenham.

Semelhante ao role-playing, é a técnica da simulação que se refere a exercícios nos quais os membros dos grupos podem vislumbrar uma ação futura e assim ensaiá-la. Através da simulação, as pessoas desenvolvem novas estratégias comporta-mentais para atingir os objetivos.

Outra técnica que merece destaque é o teste sociométrico. Tal teste foi desenvolvido por Jacob Levy Moreno (1889-1974), criador do Sociodrama e Psicodrama e visa à elaboração do sociograma, um gráfico que elucida a maneira como se distribuem as relações intragrupais. O teste é feito a partir de um questionário no qual cada membro responde quem escolheria para desenvolver determinada atividade.

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No rol das técnicas em DG, destacam-se ainda os jogos para grupos e as vivências em grupo. Os jo-gos são atividades lúdicas especialmente aplicadas no contexto organizacional em treinamentos ou pro-cessos seletivos de grandes empresas. São utiliza-dos para criar um contexto lúdico de aprendizagem e relacionamento interpessoal, até porque estudos revelam que através deles, as pessoas mostram fa-cetas da sua identidade (MINICUCCI, 2002).

Importante: Você encontra muitos jogos e vivências para grupos em livros ou si-tes na internet. Porém, aplicar uma dinâ-mica em um grupo não requer somente o entendimento de como a atividade deve se desenrolar. Mas necessita, sobretudo, um amplo conhecimento dos processos grupais, e das mais variadas formas de intervenção nos grupos.

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111Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

Vale acrescentar também que trabalhar com grupos é, antes de tudo, por mais planejado que possa ter sido, trabalhar com situações de impre-visto e da ordem do inusitado, por se tratarem de pessoas que estão em relação. Vale mencionar que toda relação envolve poder. Inúmeras reações de grupo podem surpreender e desestruturar o facilita-dor que conduz as técnicas de intervenção, fazendo com que o mesmo tenha que desenvolver estraté-gias para lidar, por exemplo, com os fenômenos da resistência.

Assim, o trabalho com grupos exige muito es-tudo, disposição, habilidades interpessoais, capa-cidade comunicativa e capacidade criativa, mesmo porque em se tratando da intervenção em grupos, não existem e não devem existir “receitas” prontas.

Indicação de Leitura ComplementarNo quarto capítulo do livro de Miniccuci “Dinâmica de Grupo: Teorias e Sistemas”, você pode ler so-bre o tema em diferentes instituições como famí-lia, educação, empresa e terapia. Tal capítulo pode ajudar você a compreender temas específicos de diferentes contextos tratados aqui.

MINICUCCI, A. Dinâmica de grupo; teoria e siste-mas. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

Indicamos, também, a leitura do tópico “A dinâmica dos grupos e seus respectivos teóricos” (p. 26-41), da Dissertação de Mestrado de Simone Farias Mou-ra, em que são apresentadas as contribuições teó-ricas de alguns pesquisadores ao desenvolvimento dessa prática.

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MOURA, S.F. A dinâmica de grupos e a gestão or-ganizacional em arranjo produtivo local: estudo de caso. Fortaleza, CE, 2006. 162f. Dissertação (mes-trado em Administração). Universidade de Fortale-za, UNIFOR. Disponível em: <http://www.dominiopu-blico.gov.br/download/texto/cp068486.pdf>. Acesso em: 15 de julho de 2011.

PARA REFLETIR

Você já prestou bastante atenção no seu comporta-mento e no comportamento dos seus amigos quan-do estão jogando? Se possível, permita-se vivenciar novamente uma situação dessas ou então lembre um momento de jogos e discuta com seus colegas as seguintes questões: Como os membros reagem ao fracasso? A interação se mantém a mesma du-rante toda a brincadeira? Existe um bode expiatório?

Procure articular com os conceitos explanados so-bre grupo e DG. Reflita sobre a relação possível que se pode fazer entre um contexto lúdico no cotidia-no e o cenário de uma equipe de trabalho e de que modo a teoria e técnicas de DG podem contribuir para as relações interpessoais. Coloque em comum com seus colegas e discutam sobre as reflexões surgidas nesse exercício.

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113Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

3.3 Relações de violência e de altruísmo

Neste capítulo vamos discutir sobre alguns tipos específicos de relação que podem ser esta-belecidos tanto entre os membros de um grupo (intragrupal) quando entre grupos (intergrupal).

Para Guareschi (1998), o grupo é constitu-ído justamente pela existência de relações en-tre seus membros, sendo estas mais fluidas ou bem intensas, levando a forte coesão do grupo. Diante disso, as mudanças nos grupos ocorrem quando são feitas mudanças nas relações entre seus membros.

Sendo assim, um grupo nunca é estático, es-tando em constante transformação. As relações en-tre os membros são dinâmicas e podem apresentar distintos tipos, que nem sempre são evidentes. Gua-reschi (1998) nos traz duas categorias de relações que ele denomina comunitária e de dominação.

A partir desses dois tipos de relações, que podem ser intra ou intergrupais, também gostaría-mos de iniciar uma discussão sobre alguns compor-tamentos que podem surgir em decorrência do tipo de relação estabelecida entre as pessoas em uma sociedade: comportamentos pró ou anti-sociais, a partir das ideias apresentadas por Rodrigues, As-smar e Jablonski (2002), em seu livro Psicologia Social.

Relações de dominação e violência

Nas relações de dominação, uma das partes se apropria da capacidade de outros, tratando-os de maneira desigual. É uma relação “assimétrica, desigual, injusta” (Guareschi, 1998, p.90).

Parece-nos pertinente pensar que quando fa-lamos em uma relação assimétrica, em que um se

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coloca de forma superior a outro, visando a preju-dicá-lo, estamos também falando de uma forma de violência. Mas o que seria a violência do ponto de vista da Psicologia Social?

A violência é um tema que tem sido muito discutido, diante da alta prevalência de cenas pre-senciadas por muitos de nós, no dia a dia, tornan-do-se cada vez mais banalizada.

Estando relacionada à interação entre as pes-soas, a violência também se torna tema de inte-resse da Psicologia Social, focalizando os aspectos envolvidos na interação entre agressor e vítima. Es-tudiosos da área buscam compreender a violência na tentativa de explicar possíveis fatores relaciona-dos com as causas ou manutenção desse tipo de comportamento ou até encontrar alguns meios de minimizá-lo.

Rodrigues, Assmar e Jablonski (2002) salien-tam que o comportamento violento ou agressivo é aquele que apresenta uma intencionalidade para causar danos em pessoas, animais ou coisas, mes-mo que essa intencionalidade não seja percebida, ou seja, às vezes a própria pessoa que pratica o ato não percebe a intenção de ferir alguém, de for-ma consciente.

Essa agressão, ainda, pode ocorrer como forma de satisfazer impulsos hostis, sendo de-corrente de emoções fortes como a raiva, por exemplo, ou constituir o que se chama de agres-são instrumental, em que prejudicar determinada pessoa serve apenas como um meio para atingir outro objetivo. Percebemos com frequência esse tipo de comportamento em casos de separação conjugal, em que um dos cônjuges agride físi-ca ou psicologicamente os filhos como forma de atingir o marido ou a esposa.

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115Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

Raízes da violência

Não existe um consenso entre os estudiosos da área em relação à origem da agressão entre os seres humanos. Rodrigues, Assmar e Jablonski (2002) apresentam algumas possíveis explicações que são dadas por diferentes pesquisadores.

Alguns autores defendem que a agressão hu-mana é inata, sendo transmitida de forma hereditá-ria. Dessa forma, o comportamento violento seria a forma de expressão encontrada. A Psicologia Social não aceita esta como explicação única, mas admi-te a existência de predisposições biológicas para agressão em algumas pessoas.

Outra hipótese é que a agressão seria uma resposta à frustração, ou seja, condições externas levariam a comportamentos violentos, quando uma pessoa se sentisse impedida ou dificultada por ou-tra de atingir algum objetivo.

Por fim, há aqueles que defendem que a agressão é fruto do processo de socialização e das normas sociais e culturais. Segundo essa aborda-gem, a agressividade pode ser aprendida quando comportamentos violentos são recompensados ao longo da vida ou quando observamos esse tipo de comportamento em pessoas que consideramos modelos.

Sendo assim, é importante salientar que exis-tem vários fatores envolvidos no comportamento agressivo, não podendo haver uma explicação úni-ca e conclusiva a esse respeito. As pesquisas mos-tram que fatores sociais, pessoais e, inclusive, am-bientais parecem estar envolvidos nesse processo.

Se considerarmos o processo de socialização como essencial para a constituição do ser humano e, consequentemente, para a forma como ele vai se comportar em diversas situações, não poderíamos

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deixar de destacar a família como desempenhando papel importante no desenvolvimento da agressivi-dade humana. Existem alguns estudos em diversas regiões que apontam para a violência intrafamiliar como uma das fontes da violência que ocorre na sociedade, ou seja, filhos de pais violentos tendem agir de forma violenta na idade adulta, seja porque seguem os modelos que tiveram ou por aprende-rem que a violência é uma forma eficiente de serem resolvidos os problemas. É importante salientar, no entanto, que não se trata de uma relação determi-nante, podendo haver na sociedade pessoas forte-mente altruístas que tiveram uma história de vida marcada pela violência.

Apesar de haver uma maior ênfase nos fato-res sociais como determinantes da deflagração de comportamentos agressivos, também se aceita que haja influência de características individuais nes-se processo. Baseados em algumas pesquisas na área, Rodrigues, Assmar e Jablonski (2002) apon-tam que pessoas extremamente competitivas, que estão sempre com pressa e são irritadiços e hostis apresentariam uma maior tendência a serem mais agressivas. Entretanto, também se deve levar em conta, como já dito antes, a interpretação que fa-zemos em relação à intencionalidade do comporta-mento do outro na probabilidade de reagirmos com mais ou menos agressividade.

Prevenção e controle da violência

Diante de todos esses aspectos apresentados anteriormente, poderíamos nos perguntar: é possí-vel controlar ou prevenir a violência?

Estudos demonstram que existem sim al-gumas estratégias que podem contribuir para mi-nimizar comportamentos violentos. Mesmo para

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117Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

aqueles que tomam a agressividade como uma ca-racterística inata, haveria uma possibilidade de ate-nuar a manifestação desses comportamentos, por meio da canalização dos impulsos agressivos para atividades aceitáveis socialmente, como esportes, competições, debates, etc.

Mais alternativas encontramos a partir da perspectiva sociopsicológica, que foca suas aten-ções nos fatores sociais como principais instru-mentos no processo de aquisição e manutenção de comportamentos violentos. Assumindo, portanto, que a violência é fruto de aprendizagem, não refor-çar respostas agressivas e possibilitar observação de modelos não agressivos pode contribuir de for-ma importante para seu controle e redução.

Além disso, também contribui a possibili-dade de as pessoas terem respostas alternativas e incompatíveis com a agressão, como pode ser visto em iniciativas de várias ONG’s que oferecem atividades esportivas ou artísticas para crianças e adolescentes moradores de regiões com alto índice de violência.

O estímulo do sentimento de empatia entre as pessoas, possibilitando uma maior humaniza-ção das relações interpessoais, também é muito importante, uma vez que quanto mais percebemos similaridade entre nós, menor a probabilidade de agredirmos uns aos outros.

Além dessas, ainda existe outra estratégia que, infelizmente, é a mais utilizada, apesar de nem sempre atingir seu objetivo, que seria a puni-ção ou ameaça de punição. Deve-se tomar cuidado com seu uso, visto que muitas vezes desencadeia respostas emocionais negativas que, por sua vez, podem justamente ser responsáveis pela manuten-ção de comportamentos agressivos. No uso dessa alternativa, devem-se tomar alguns cuidados para

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que traga os resultados esperados: deve ser previ-sível, seguir imediatamente o comportamento, ser legitimada por normas sociais e, sobretudo, que as pessoas que a administrem não sejam modelos agressivos.

Relações comunitárias e altruísmo

Comunidade é um grupo de pessoas em que há o respeito à singularidade de cada um, ao mes-mo tempo em que ocorre o reconhecimento da in-terdependência recíproca, ou seja, cada um neces-sita do outro para se realizar. Segundo Guareschi (1998), a existência de verdadeiras comunidades é que possibilita a constituição de uma sociedade verdadeiramente democrática.

Relações comunitárias têm como característi-ca serem igualitárias, reconhecerem a singularidade de cada um e repeitarem as diferenças. Além disso, também existe uma dimensão afetiva, em que as pessoas se querem bem. Nesse contexto, é comum encontrarmos outro tema de interesse da Psicolo-gia Social: o comportamento altruísta, que possibi-lita uma maior união entre as pessoas.

Mas o que significaria o altruísmo? Para Ro-drigues, Assmar e Jablonski (2002), autores que nos servirão de base teórica para discutirmos esse tema, o altruísmo poderia ser definido como aque-les atos que têm como objetivo maior beneficiar outra pessoa, sem interesse direto de obter algum ganho para si, podendo, em alguns casos, inclusi-ve, envolver custo pessoal.

É muito difícil, entretanto, conseguirmos sempre identificar a real motivação de um compor-tamento. Sendo assim, para nossa discussão, con-sideraremos como altruísta todo comportamento que tenha como finalidade beneficiar outra pessoa,

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119Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

mesmo que paralelamente acarrete em ganhos para aquele que está ajudando.

Existem muitos fatores que podem estar en-volvidos no desenvolvimento do comportamento altruísta, a maioria deles decorrentes das relações estabelecidas por cada um ao longo de sua vida. Percebe-se que experiências positivas de socializa-ção formam pessoas menos egoístas. Além disso, se ao longo da vida de uma pessoa o altruísmo for recompensado, ou ela conviver com pessoas que sirvam de modelo para comportamentos altruístas, estes vão ter uma maior probabilidade de serem emitidos.

Ademais, percebe-se que em culturas mais “coletivistas” prevalece o bem-estar do grupo e a internalização de padrões sociais altruístas, enquanto nas consideradas “individualistas”, a busca de objetivos pessoas tem maior prevalên-cia que a responsabilidade individual pelo bem coletivo.

Alguns autores defendem que o altruísmo genuíno é aquele em que a necessidade do ou-tro é a única motivação para agir, sem qualquer ganho pessoal. Este seria decorrente da empatia por alguém em necessidade, ou seja, da capacida-de de se colocar no lugar do outro, tomando sua perspectiva.

A partir de um relacionamento empático, per-cebe-se algum vínculo com a pessoa, gerando sen-timentos de compaixão, ternura e generosidade, que, consequentemente, leva a comportamentos altruístas, mesmo que estes acarretem altos custos para quem ajuda.

Contudo, parece que sempre há algum ganho para o autor do comportamento, uma vez que mui-tas vezes se aprende que agir por empatia reduz sentimentos negativos como tristeza e culpa. Torna-

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-se importante destacar é que havendo ou não ga-nhos pessoais, os estudos nessa área servem para comprovar que nem sempre o ser humano age de forma egoísta, como muitas vezes é preconizado.

Podemos concluir, portanto, que como em todo comportamento humano, vários fatores estão envolvidos na origem e manutenção de comporta-mentos altruístas em uma sociedade. Diante de uma determinada situação, portanto, cada pessoa pode agir de formas diferentes, podendo interferir nessa decisão suas características de personalidade, esta-do emocional e, algumas vezes, a própria diferença de gênero, influenciada por questões culturais.

Na sociedade ocidental, por exemplo, perce-be-se que homens são mais altruístas quando na situação se esperam bravura e coragem, enquanto as mulheres tendem a ser mais altruístas quando a situação envolve menos risco e mais necessidade de suporte emocional.

É possível desenvolver o altruísmo?

Assim como para o comportamento agressi-vo, apresentaremos algumas estratégias que podem auxiliar a desenvolver o altruísmo na sociedade, além dos fatores já apresentados anteriormente, como a aprendizagem desse tipo de comportamen-to por meio de reforços ou contato com modelos, que deve ocorrer desde a infância.

Percebe-se, também, que estimular a empa-tia, promovendo a identificação com a pessoa que está precisando de ajuda, aumenta a predisposição para ajudar, o que também ocorre quando quem quer ou precisa ser ajudado deixa mais clara sua necessidade e suas expectativas.

De forma geral, as normas sociais também podem contribuir de forma positiva, quando se

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121Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

valoriza a reciprocidade, responsabilidade social e justiça social, e se promovem reflexões sobre essas questões, contribuindo com a valorização da gene-rosidade como componente do autoconceito. Dessa forma, considerar-se generoso e altruísta levaria a uma maior frequência de comportamentos sociais.

Vimos, portanto, que tanto características ina-tas quanto aprendidas exercem influência na decisão de ajudar alguém. Será que existiriam situações em que umas das duas estariam exercendo essa influên-cia de forma mais marcante? Estudos mostram que, quando a situação envolve baixo custo pessoal, tra-ços pessoais são menos importantes que a situação e mais pessoas se dispõem a ajudar. Por outro lado, quando há alto risco e alto custo pessoal, a perso-nalidade influencia mais. Consequentemente, menos pessoas tendem a ajudar.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para aprofundar os temas discutidos nesse capítu-lo, sugerimos a leitura do texto de Pedrinho Gua-reschi, “Relações Comunitárias, Relações de Domi-nação”, do livro Psicologia Social Comunitária; da solidariedade à autonomia, e os capítulos 6 e 7 do livro Psicologia Social de Aroldo Rodrigues, Eveline Assmar e Bernardo Jablonski, que tratam da Violên-cia e do Altruísmo:

CAMPOS, R. H. de F. (org.) Psicologia Social Comu-nitária; da solidariedade à autonomia. 2.ed. Petró-polis: Vozes, 1998.

RODRIGUES, A. ASSMAR, E.M.L.; JABLONSKI,B. Psi-cologia Social. 21.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

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PARA REFLETIR

Discuta com seus colegas sobre a importância para o assistente social da discussão sobre os diferentes tipos de relações interpessoais e intergrupais.

Tente lembrar com seus colegas de alguns dese-nhos animados que vocês assistiam quando eram crianças. Vocês conseguem identificar comporta-mentos violentos em seus personagens? Alguns estudos têm refletido sobre a influência dos meios de comunicação no comportamento agressivo das pessoas. A partir do que foi apresentado neste ca-pítulo, sobre os diversos fatores envolvidos na gê-nese e manutenção do comportamento agressivo, discuta com seus colegas sobre as possíveis in-fluências desses desenhos animados. Vocês acham que televisão poderia utilizar algum tipo de progra-mação para auxiliar no desenvolvimento de com-portamentos altruístas?

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123Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

3.4 Contexto das Políticas Públicas

O termo “política” pode trazer diferentes cono-tações e, de antemão, ao apenas verbalizá-lo, pode produzir interesse em alguns e talvez rechaço à maio-ria. Bem, e quando associamos ao termo política a noção de público? Talvez, lancemo-nos de imediato à imagem corriqueira de um serviço público, e com ele, a consequente sensação de descrédito, filas, péssimo atendimento, descaso, roubo e impunidade.

Mas, por que será que isso acontece? Como se produz essa imagem? Quais os interesses envol-vidos em manter essa realidade ou em desconstruí--la? O que são as políticas públicas?

Política e relação com a sociedadePrimeiramente, vamos abordar o conceito de

política. O termo política vem do grego polis que é relativo à cidade.

O homem é um animal político (Aristóteles).

Nessa conceituação mais geral, podemos compreender como sendo de interesse político tudo aquilo que diz respeito a essa organização ou administração das cidades.

Um termo aparentemente inocente, mas per-meado de valores, política esteve historicamente associada à ocupação do poder, ou ao exercício de poder de um homem sobre outro homem. É a relação de subordinação, entre governantes e go-vernados, entre soberanos e os súditos.

Psicologia Política

Falamos em Psicologia Política como uma área da Psicologia que se revela como desdobramento da

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Psicologia Social. Essa área não possui ainda tanta expressividade como a Psicologia Social, que já pos-sui um vasto material teórico e prático.

Considerar a existência de uma Psicologia Po-lítica é, sobretudo, não negar e, uma vez mais, rea-firmar que fazer Psicologia é um ato político assim como qualquer atividade humana, quer seja para reproduzir aspectos sociais, quer seja para trans-formá-los. O simples fato de “não se posicionar” ou manter-se neutro é um ato político. Dito isso, vemos que a política não se restringe apenas ao momento de escolha de um candidato para gover-nar as cidades, estados, nações, como costuma ser associado de imediato.

A Psicologia, desde sua instituição como um conhecimento científico, tem voltado seus estudos para a melhoria das organizações e instituições da polis, sendo assim uma ciência comprometida com a polis de modo geral, o que se verifica na medida em que o psicólogo delineia sua atuação profissio-nal para transformação de um cenário de miserabi-lidade e opressão, como vimos anteriormente, ou, de modo oposto, para manutenção dessa situação.

Breve resgate histórico das Políticas Públicas

O período da Modernidade, visto anterior-mente, é representado pelo crescimento do capita-lismo associado à Revolução Industrial e ao conhe-cimento racional em detrimento do conhecimento religioso. A partir desse período, política passa a ser sinônimo de Estado. A Modernidade tinha como principais características, portanto, a industrializa-ção, a urbanização e o surgimento do Estado.

A figura do Estado entra em ascensão para governar as cidades. Na história do Brasil é comum encontrarmos situações semelhantes aos fatos que

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125Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

aconteceram na Europa, pela forte ligação que se tem com os países europeus.

A característica do Estado na Era Moderna da Europa Ocidental é de centralização do poder polí-tico, diferente do que acontecia no regime feudal.

Estado e a noção de Cidadão

Surge assim, o conceito de cidadão, - o indi-víduo pertencente a uma cidade regida pela figura do Estado. Este derrubou o poder que antes era atribuído à Igreja Católica e aos burgueses, ou então à nobreza. Nesse momento, várias práticas sociais e até mesmo profissões têm de se subordinar às leis estatais que regem a sociedade como um todo.

A industrialização causou significativo impac-to em toda a Europa, acelerando a acumulação de riquezas e o consequente aumento das desigualda-des. Nesse contexto, surgiram novos grupos sociais dominantes, os donos das indústrias. A pobreza, que inevitavelmente começou a aumentar em virtu-de da concentração de riquezas nas mãos de uma minoria da população, ameaçava a ordem pública. As pessoas passaram a ocupar as ruas e, com a fal-ta de higiene e de educação, deu-se a proliferação de doenças. Essa questão ameaçava a todos, uma vez que algumas doenças podiam ser transmitidas pelo ar decorrentes das condições de higiene tão precárias naquele momento.

Imagine-se vivendo nessa época e, mesmo pertencendo a uma classe abastada, dotada de bons costumes, educação, moradia, lazer e tudo mais, perceber sua saúde ameaçada por mendigos que ocupavam as ruas. Obviamente, que nesse mo-mento iniciaram os investimentos em estudos para controlar a proliferação de doenças. É assim que inicia a história da saúde pública, por exemplo.

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Esse cenário parece que não mudou muito e ainda se repete. Ao invés de se investir em formas de amenizar as desigualdades sociais e distribuir riquezas, continua-se com ações voltadas à solução de problemas sociais em curto prazo: controle de doenças, combate à violência, controle de natalida-de. E o cerne ou as questões originárias da maioria das mazelas sociais permanecem intactas.

É desse modo que surgem as políticas públi-cas com planejamento e execução de ações volta-das a administrar a vida coletiva, que a partir da Era Moderna passa a ser regulada pelo Estado.

“Dados do Banco Mundial [...] revelam que 10% da população é miserável e que outros 44% são considerados pobres [...]. Na educação, 26,7% são analfabe-tos; quanto à moradia, cerca de um terço dos habitantes não pode contar com a coleta de lixo e esgoto e outros 22,4% não dispõem de serviço de abastecimen-to de água. Estima-se que um quarto da população urbana é favelada” (JACÓ-VI-LELA; MANCEBO, 2004, p. 58).

Política para o Público e Política Pública

Pelo que estamos vendo, as políticas públi-cas são direcionadas a essas classes menos favo-recidas, uma vez que historicamente ameaçam o projeto mais amplo de ordem social. Por isso, as políticas públicas até hoje costumam ser confundi-das ou meramente relacionadas com políticas as-sistencialistas.

Práticas dessa esfera são comuns no Brasil, por exemplo, concessão de benefícios nos diversos

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127Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

âmbitos: saúde, educação, moradia, emprego, ren-da, etc. Entretanto, apesar de essas práticas consti-tuírem realmente a dimensão das políticas públicas, o conceito de público não se restringe a classes me-nos favorecidas ou marginalizadas. Público significa para todos. Na medida em que reconhecemos a cen-tralização do Estado na condução de políticas públi-cas, esse conceito se amplia para todos os cidadãos, todos pertencentes a uma determinada polis.

Qual a diferença entre política de estado, polí-tica pública e política de governo?

Traremos neste tópico alguns conceitos e ideias desenvolvidos por Benevides e Passos (2008) em seu artigo sobre “A humanização como dimensão pública das políticas de saúde”.

De modo geral, dizemos que Política de Es-tado diz respeito ao conjunto de leis e normas que regulam uma nação. No Brasil, a Constituição de 1988 é uma política de Estado, pois estabelece di-retrizes e princípios que regem um estado regula-mentado por um regime democrático de direito.

Já a política pública refere-se a ações em di-versos âmbitos que visem direcionar e administrar os problemas cotidianos e os rumos da vida de uma coletividade, de cidadãos pertencentes a um Estado. O princípio da política pública é que deve ser para todos, deve contemplar as diversidades e singularidades dos sujeitos.

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Uma política de governo, por sua vez, é aque-la que alterna de acordo com o tempo do mandato de cada nível de governo: nacional, estadual ou municipal. É um modo de administrar e de colocar em funcionamento ou operar o que está previsto nas leis e constituições e, principalmente, constituir uma prática que respeite e esteja em consonância como o previsto na Constituição brasileira de 1988. Desse modo, as políticas de governo correspon-dem a ações que um grupo específico exerce tendo como base princípios constitucionais e regulamen-tações maiores. Muitas vezes, sem governabilidade de modificá-las.

Como uma política pública pode ser para todos?

Para responder a essa questão, considere-mos o contexto brasileiro em que se tem a compo-sição de um Estado Democrático de Direito. Após transitarmos por vários regimes de poder, inclusive ditatorial, o qual eximiu dos cidadãos o direito a opinar e decidir questões que dizem respeito à vida social, adentra-se no regime democrático. A Cons-tituição de 1988 é um grande marco no sentido de fortalecimento da cidadania, pois nela são regu-lados os direitos e deveres de todos os cidadãos brasileiros. Esse documento jurídico, ao qual temos pouco acesso, nos diz respeito, pois é ele que re-gulamenta todos os aspectos da vida social.

Um princípio importante inerente a uma so-ciedade democrática é o exercício da cidadania que confere liberdade a todos os cidadãos para parti-ciparem das decisões no que diz respeito à vida pública. É dever de um Estado Democrático, por-tanto, compartilhar, descentralizar o poder. É esse caráter de construção coletiva, de decisão coletiva e compartilhada que confere o status de público às

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129Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

políticas do Estado, tornando-se não apenas políti-ca de Estado, mas sim política pública. Um exemplo concreto podem ser as reuniões de orçamento par-ticipativo, onde a comunidade decide sobre como deve ser aplicado o recurso financeiro em determi-nado território.

Atuação em Políticas Públicas

A atuação de qualquer profissional no campo das políticas públicas deve ser a de buscar compor uma prática que esteja em consonância, que leve em consideração e respeite os princípios das políticas públicas, em qualquer das áreas da vida coletiva. O profissional, que pode ser inclusive você, na medi-da em que assume algum cargo em qualquer setor público, torna-se um servidor público. Sendo assim, assume a atribuição como o próprio nome já denota, de SERVIR ao PÚBLICO. Servir às pessoas, às suas necessidades, tanto na esfera de saúde, moradia, educação, alimentação, etc. Deve estar a serviço para proporcionar bem-estar para a população de modo geral. Essa atribuição de servir difere daquela de fazer um favor, pois se trata de um direito con-quistado que cabe a todo e qualquer cidadão.

Essa discussão acerca da atuação em Políticas Públicas é de extrema importância para o assistente social, na medida em que muitas de suas atribuições estão localizadas nesse âmbito, seja na elaboração, execução ou avaliação de políticas sociais, como está preconizado em seu Código de Ética.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Sugerimos a leitura do artigo “E eu com isso? Re-flexões sobre a anomia no Brasil Contemporâneo”,

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primeira parte do livro “Psicologia Social: aborda-gens sócio-históricas e desafios contemporâneos”. Neste texto, é possível perceber determinações so-ciais que produziram ao longo da história do Brasil o desinteresse acompanhado atualmente por ques-tões de cunho político ou que diga respeito à vida pública.

JACÓ-VILELA, A. M; MANCEBO, D (Org). Psicologia Social: Abordagens Sócio-Históricas e Desafios Con-temporâneos. 2. ed. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2004. Outra leitura pode ser o artigo “Psicologia Política”, na parte 2 do livro “Psicologia Social Contemporâ-nea”. No texto, apesar de condizer a um tema espe-cífico à psicologia, fornece alguns elementos para compreensão do conceito de política que pode nor-tear outras disciplinas do conhecimento.

STREY et.al., M. N. Psicologia Social Contemporâ-nea. 9 ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

PARA REFLETIR

Procure discutir com seus colegas, a partir das ex-periências de cada um, como vocês têm vivenciado as práticas políticas nas cidades em que vocês mo-ram e, a partir daí, procure elaborar o seu próprio conceito de “política”.

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131Tema 3 | Psicologia Social e as relações de grupo

RESUMO

Tratamos aqui, no conteúdo 3.1, do contexto das práticas em Psicologia Social em instituições e or-ganizações. Iniciamos abordando as diferenças en-tre grupo, instituições e organizações como uma breve introdução a uma discussão mais prática do campo da Psicologia Social.

Em seguida, no conteúdo 3.2, apresentamos dinâ-mica de grupo e as relações presentes nos pro-cessos grupais: interpessoais, intergrupais e intra-grupais. Apresentamos uma discussão conceitual e algumas técnicas possíveis de serem utilizadas em trabalhos com grupos.

No conteúdo 3.3, focalizamos nossas discussões em dois tipos de comportamentos decorrentes das relações estabelecidas entre os membros de um grupo ou entre grupos: comportamento agressivo e comportamento altruísta.

Por último, no conteúdo 3.4, trouxemos à tona o tema das políticas públicas, abordando o conceito de política e o viés das práticas pertinentes a essa perspectiva.

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Psicologia Social e Práticas Interdisciplinares4

Após termos discorrido um pouco sobre a dinâmica dos grupos na esfera institucional e organizacional, vamos agora conhecer alguns campos de atuação da Psicologia Social, enfatizando os aspectos relacionados com a prática do Serviço Social.

Para isso, iniciaremos discutindo sobre um tema de extrema importância na prática social, o preconceito, do ponto de vista da Psicologia Social que, portanto, enfatiza os aspectos interpessoais envolvidos. Abordaremos, também, uma discussão conceitual sobre um tema bastante contemporâneo, a interdisciplinaridade, que se re-fere à integração de saberes de diferentes disciplinas do conhecimen-to científico para compor um campo comum, reservando um capítulo para tratar da interface entre a Psicologia Social e o Serviço Social.

Boa leitura!

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Psicologia Social134

4.1. Preconceito, discriminação e estereótipos sociais

“Todo brasileiro entende de futebol e sabe sambar”. Essa é a ideia que normalmente se encon-tra no exterior em relação ao Brasil. Será que pode ser considerado um retrato fiel de todos os brasi-leiros? Certamente que não, mas isso representa um exemplo de concepções generalizadas que se formam a partir de determinadas informações que recebemos e que nos levam a tirar conclusões pre-cipitadas e tantas vezes equivocadas. Essa espécie de conclusão pode levar ao que se chama de pre-conceito.

Neste tópico vamos discutir a questão do pre-conceito sob o ponto de vista da Psicologia Social, tomando como base, sobretudo, os fundamentos teóricos apresentados pelos psicólogos brasileiros Rodrigues, Assmar e Jablonski (2002), em seu livro “Psicologia Social”.

Partindo desse pressuposto, portanto, o que seriam os preconceitos?

Preconceitos podem ser entendidos como atitudes ou comportamentos negativos que são direcionados a certas pessoas ou grupos, a partir de um julgamento prévio, que nem sempre correspondem à realidade, e que são mantidos mesmo que fatos concretos o contradigam (RO-DRIGUES; ASSMAR; JABLONSKI, 2002).

Como já comentado anteriormente, para a

Psicologia Social, a atitude é entendida como es-tando relacionada àqueles sentimentos, contra ou a favor, que temos em relação a alguém ou alguma coisa, decorrentes de crenças ou pensamentos, e

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135Tema 4 | Psicologia Social e Práticas Interdisciplinares

que nos predispõem a ação. Dessa forma, pode-mos observar que toda atitude é formada por três componentes: afetivo, cognitivo e comportamental. O preconceito, portanto, enquanto atitude, também apresenta esses três elementos, como será explica-do a seguir:

• Componente afetivo – relaciona-se ao Sentimento negativo que temos em rela-ção a algo ou alguém.

• Componente cognitivo – constitui os Es-tereótipos, que são aqueles pensamen-tos ou crenças que temos em relação às características de alguma pessoa ou grupos.

• Componente comportamental – é o que conhecemos como Discriminação: predis-posição para ação, decorrente tanto dos sentimentos negativos quanto dos este-reótipos. No preconceito, em geral, iden-tificamos tratamentos diferenciados em relação a determinada pessoa ou grupo, como o desprezo, podendo chegar a vio-lência verbal ou física.

Para melhor compreensão, pensemos em uma situação hipotética que envolve o preconceito contra a mulher, em que uma empresa deixa de contratar uma candidata a um cargo de gerência, mesmo esta tendo sido bem sucedida no processo de seleção. O fato de deixar de contratá-la pelo fato de ser mulher constitui o componente compor-tamental (discriminação), que é consequência dos conceitos que se podem ter de que toda mulher não tem capacidade para assumir um cargo de alto

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nível hierárquico em uma empresa (componente cognitivo - estereótipo), o que leva a um sentimen-to de superioridade e talvez até de desprezo por parte dos responsáveis da empresa (componente afetivo).

A partir desse exemplo, fica claro que o pre-conceito é decorrente de ideias pré-concebidas em relação a determinada pessoa, que leva a um sen-timento negativo e, consequentemente, predispõe a uma ação que denominamos comportamento discriminatório. Essa ação, algumas vezes, pode assumir um caráter de extrema violência, como nos campos de concentração, por exemplo, ou ser muito sutil, constituindo um preconceito “mascara-do”, como naquelas pessoas que não admitem ter preconceitos, mas “preferem” que seus filhos não tenham amigos homossexuais.

Percebemos, portanto, que os estereótipos negativos exercem papel relevante na formação do preconceito, despertando o interesse de mui-tos estudiosos em aprofundar a forma como ele se desenvolve e sua consequência nas relações huma-nas. Marques e Páez (apud VALA; MONTEIRO, 2004, p.334) apontam Lippmann (1922) como um dos iniciadores dos estudos em relação à concepção de estereótipo tal qual a conhecemos atualmente, relacionando-a com “representações simplificadas da realidade” que nos leva e reagir ao nosso am-biente. Eles ainda trazem a ideia de Katz e Braly (1935) de que essas crenças que constituem os es-tereótipos são transmitidas ao longo do processo de socialização, levando membros de um mesmo grupo a aceitá-las sem questionamento, nem pre-ocupação de buscar informações da realidade que pudessem confirmar ou refutar essas informações.

Quando falamos de estereótipos, portanto, eles podem ser negativos, positivos ou neutros,

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mas sempre representam uma visão simplificada, que podem até servir para facilitar nossas reações diante do mundo, mas também costumam levar a generalizações equivocadas, encobrindo a individu-alidade de cada pessoa, uma vez que tendemos a exagerar características que tornam semelhantes membros de um mesmo grupo, muitas vezes de forma depreciativa, negligenciando aquelas que são próprias da singularidade de cada um. Muitos de nós, com certeza, já ouvimos falar que “todo índio é preguiçoso”, ideia que foi difundida desde os primeiros anos de descobrimento do Brasil, pelo fato de os índios não se sujeitarem passivamente aos trabalhos impostos pelos portugueses. Na ver-dade, trata-se somente de diferenças culturais em relação ao comportamento dos membros dos dois grupos, que é interpretado de forma reducionista por uma das partes.

Nesse sentido, é interessante salientar que os estereótipos também afetam a percepção que temos do mundo, uma vez que esta sempre é sub-jetiva. Marques e Páez (apud VALA; MONTEIRO, 2004) afirmam, ainda, que eles nos levam a se-lecionar as informações que recebemos do meio, fazendo com que prestemos mais atenção naquelas que condizem com as expectativas que temos em relação a cada estereótipo, além de termos uma tendência a organizar essas informações de forma coerente ao valor atribuído ao estereótipo, preser-vando a diferenciação que estabelecemos entre o grupo que consideramos oposto e aquele com que nos identificamos. Além disso, como salienta Wei-ten (2010), até a nossa memória pode ser tenden-ciosa, favorecendo o preconceito, ou seja, é comum que nos lembremos mais facilmente dos defeitos que das qualidades ou conquistas de pessoas que são membros dos grupos em relação aos quais de-

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senvolvemos certo preconceito, o que nos leva a relacionar a persistência do preconceito justamente com os estereótipos, uma vez que estes facilmente são ativados quando estamos diante de alguém ou de um grupo de quem formamos ou aprendemos um estereótipo negativo.

Formação e minimização de preconceitos

Podemos nos perguntar, também, se existem situações que contribuem para a formação de pre-conceitos ou se ocorre uma predisposição inata, ou seja, será que as pessoas já nascem preconceituo-sas ou desenvolvem essa atitude ao longo da vida, por meio de um processo de aprendizagem?

A partir de tudo o que já foi discutido em relação à formação social do homem, podemos destacar também aqui a influência marcante dos relacionamentos interpessoais na formação dos preconceitos.

É comum que alguns preconceitos sejam transmitidos ao longo de várias gerações, por meio, portanto, da aprendizagem por observação, sendo reforçados pela postura dos membros dos grupos sociais dos quais fazemos parte, ou até por valores veiculados nos meios sociais, na mídia, etc.

No dia a dia, percebemos como é fácil de-senvolvermos preconceitos, como quando já assu-mimos posturas diferentes, a partir de julgamentos positivos ou negativos, diante de novas pessoas a quem somos apresentados, baseados naquilo que ouvimos falar delas anteriormente.

Estudos têm demonstrado que existem algu-mas situações que são mais propensas a gerarem preconceito entre grupos sociais, entre as quais podemos citar ocasiões de competição e conflitos, que ocorrem entre grupos que se encontram dian-

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te de objetivos concorrentes. Ou seja, quando o sucesso de uma parte implica necessariamente no fracasso da outra, formam-se crenças preconceitu-osas e comportamentos depreciativos entre elas. Encontramos um exemplo bem familiar no nosso cotidiano entre torcidas de times de futebol, em que a disputa entre elas chega a deflagrar atos de extrema violência, decorrentes de uma distorção na percepção, em que o torcedor de outro time tem sua imagem, personalidade e características pes-soais reduzidas à filiação a um time rival passando a ser visto, portanto, sempre como uma ameaça pelos integrantes da torcida adversária.

O preconceito também pode ser decorrente do próprio meio social em que vivemos, uma vez que sempre nos deparamos com normas sociais, que estabelecem quais comportamentos são consi-derados corretos e permitidos para cada represen-tante da sociedade. Portanto, as próprias crianças já crescem assimilando essas normas como natu-rais, levando, por uma parte, a comportamentos preconceituosos e por outra parte, ao conformis-mo, ou seja, a assimilação dessas normas e deter-minações pelos grupos alvos do preconceito, que assumem como natural o tipo de comportamento que lhes é dirigido, sendo essa a forma que encon-tram de serem aceitos pela sociedade ou simples-mente porque passam realmente a acreditar nessa concepção.

E em relação à redução desses preconceitos? Segundo Devine (1989), que é retomado por Rodri-gues, Assmar e Jablonski (2002), existem ativações automáticas e controladas dos nossos pensamen-tos, ou seja, diante de certas pessoas ou grupos podem nos vir à mente pensamentos automáticos mas, em um segundo momento, nós podemos rea-valiar essa primeira impressão, de forma conscien-

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te, modificando o pensamento inicial e, portanto, mudando a predisposição ao comportamento.

Existe, ainda, uma hipótese que defende que, aumentando a interação entre os grupos, de forma que exista um status de igualdade e eles estejam diante de objetivos comuns, leva-se a uma situação de interdependência, pela necessi-dade de cooperação mútua para que atinjam os objetivos. Dessa forma, espera-se que haja uma reorganização das percepções, podendo se desfa-zerem os estereótipos.

O fornecimento de informações que possam contribuir para corrigir concepções equivocadas e simplistas também pode ajudar nesse processo, mas quando os estereótipos já estão bem arrai-gados, os aspectos emocionais chegam a distorcer a percepção, como já apresentado anteriormente, e levar-nos a não prestar atenção nas mensagens que vão de encontro a nossas convicções, o que dificulta a redução dos preconceitos.

Preconceito e grupos sociais

Vimos que o preconceito pode estar dirigido a diferentes grupos sociais, independente de ser minoria ou maioria, a partir do momento que as-sociamos nossos julgamentos e crenças a alguma característica específica do outro, seja “raça”, iden-tidade religiosa, gênero, origem social ou geográfi-ca, idade, etc, constituindo o que já denominamos antes de “estereótipos”.

Na nossa sociedade, existem muitos estereó-tipos relacionados ao gênero, por exemplo, em que se esperam socialmente características específicas de mulheres e de homens, causando estranhamen-to, por exemplo, quando nos deparamos com mu-lheres que desempenham a profissão de motorista

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de ônibus ou locutora de futebol, ou homens que trabalham com bordado ou desempenham traba-lhos domésticos. Esse estranhamento é decorrente justamente das crenças que são veiculadas social-mente, definindo papéis sociais específicos para determinados grupos, dificultando uma forma dife-rente de perceber o mundo.

O racismo é um tipo de preconceito muito difundido em nosso meio, em que são atribuídas determinadas características depreciativas às pes-soas que pertencem a “grupos raciais” diferentes dos quais fazemos parte. No Brasil, especificamen-te, encontramos com mais frequência o preconceito racial dirigido aos negros, refletido, inclusive, em expressões usadas no dia a dia, como “negro de alma branca”, “a situação está preta”, exprimindo valores difundidos socialmente, que relacionam a cor branca a virtudes, situações positivas, e a cor negro a defeitos ou situações ruins.

Os atos de discriminação decorrentes deste tipo de preconceito chegaram a um grau tão ele-vado que, em 1989, foi promulgada a lei 7.716, que definiu os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, havendo algumas mudanças poste-riores, culminando na Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010. Nesta, é instituído o Estatuto da Igualdade Racial e estabelecidos os vários direitos que devem ser assegurados à população negra, reforçando as punições prescritas a quem infringi-la.

Esses são alguns exemplos de preconceitos comuns de serem encontrados em nosso cotidiano, contudo o preconceito pode ser direcionado a qual-quer pessoa e nós, como profissionais e cidadãos, devemos sempre refletir e levantar questões sobre possíveis formas de contribuirmos para a minimiza-ção de suas diferentes formas.

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INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para auxiliar na compreensão dos conceitos discuti-dos anteriormente, sugerimos a leitura do capítulo 4 do livro de “Psicologia Social”, de Aroldo Rodri-gues, Eveline Assmar e Bernardo Jablonski, que fala sobre “Preconceito, estereótipos e discriminação”.

RODRIGUES, A. ASSMAR, E.M.L.; JABLONSKI,B. Psi-cologia Social. 21.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

Outra leitura recomendada é o manifesto do Con-selho Federal de Serviço Social em relação ao Dia Nacional da Consciência Negra, em que mostra a atuação dos assistentes sociais em relação ao com-bate do racismo.

CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. CFESS Manifesta; Dia Nacional da Consciência Negra. Bra-sília: CFESS, 2010. Disponível em: <http://www.cfess.org.br/arquivos/2010.11.20_CFESSManifesta_Consciencia-Negra.pdf>. Acesso em: 07 de julho de 2011.

PARA REFLETIR

Assista ao filme “Invictus” com seus colegas e re-flitam sobre as possibilidades de o preconceito ser minimizado a partir de posturas que valorizem o respeito e o verdadeiro interesse pelo outro. Além disso, discutam sobre a importância de que se que-bre o ciclo vicioso em que se colocam os grupos que desenvolvem preconceitos uns contra os outros

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a partir da disseminação de estereótipos que, como vimos, nem sempre condizem com a realidade.

4.2 Campos de atuação em Psicologia Social

A Psicologia Social é uma área transversal, que faz interlocução com várias instituições12 tendo já consolidado um importante campo de atuação, na esfera pública, privada e/ou não governamental. O Conselho Federal de Psicologia, através da reso-lução CFP 005/2003 que regulamenta a profissão, reconhece a Psicologia Social como especialidade em Psicologia.

Bem, para iniciar esse tema, optamos por si-tuar quatro campos importantes de atuação: edu-cação, trabalho, saúde e comunidade.

Como se pode perceber, apesar de se distin-guir quatro principais áreas de inserção profissio-nal, estas não são estanques. É possível integrar conhecimentos e contribuições de campos mais específicos, por exemplo, o educacional e correla-cioná-los ao campo da saúde.

Educação

Muitos estudos na área educacional, que fa-zem parte do currículo acadêmico dos professores, não têm relação com o que ocorre na prática em sala de aula. Isso significa que existe uma lacuna no processo de formação que certamente se reflete na prática.

A atuação profissional da Psicologia nessa área, de acordo com Lane e Codo (2006), carac-terizou-se durante muito tempo como uma prática direcionada a crianças que apresentavam proble-

12 Entendendo esse conceito como normas, valores que compõem a sociedade.

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mas de aprendizagem. Mas, o que efetivamente um psicólogo pode fazer numa escola? Que contribui-ções podem oferecer ao ambiente educacional? Po-demos destacar algumas práticas:

• Auxiliar na reflexão e fornecer subsídios concretos para a metodologia pedagógi-ca utilizada em sala de aula.

• Contribuir na elaboração do currículo e na organização dos conteúdos a serem trabalhados em sala de aula.

• Colocar em análise comportamento dos professores em interação com o aluno.

• Participar das atividades da escola junto à comunidade, principalmente incentivan-do a participação dos pais no acompa-nhamento à educação dos filhos.

Com isso, vemos que o trabalho do psicó-logo no contexto educacional, apesar de ter sido restrito ao aluno com dificuldade de aprendizagem, ampliou-se para as relações pedagógicas. Segun-do Lane e Codo (2006), tais relações de ensino e aprendizagem são mediadas por:

• Condições biológicas.

• Condições sociais.

• Disponibilidade pedagógica.

Muito embora se considere que as relações de aprendizagem envolvem uma multiplicidade de aspectos, as escolas, de modo geral, ainda não

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conseguem contemplar em sua proposta político--pedagógica uma concepção de educação voltada às reais condições sociais dos alunos. Ou, do mes-mo modo, construir um conhecimento voltado à re-solução de problemas concretos.

Tais limitações devem ser pensadas à luz dos componentes ideológicos, com base nas dis-cussões feitas em temas anteriores. Basta lembrar Paulo Freire (1921-1997) um dos expoentes e reno-mados educadores brasileiros, referência na área, que foi preso durante a ditadura militar por criar um método de ensino que partia da realidade das pessoas e despertava nelas uma consciência crítica.

Paulo Freire desenvolveu um método de ensino que buscava fazer essa articulação entre a educação e o cotidiano e experiências de vida das pessoas. Ele alfabetizava adultos, ensinava-os a ler e escrever, valorizando o saber que já possuíam, criando, para isso, o método da educação popular que partia da realidade local para estabelecer um diálogo, ao invés de simplesmente transmitir co-nhecimento.

Considerando que a educação e a família são as primeiras instituições através das quais o indiví-duo é colocado em contato na sociedade, como vi-mos anteriormente, é por meio delas que se apren-dem os valores humanos. Além disso, é através da educação e da escola que são transmitidos conhe-cimentos, tidos como verdadeiros, os quais muitas vezes se recebem sem se questionar.

Atualmente, inúmeros desafios estão postos no campo educacional. Dentre eles, destaca-se o de encontrar certo equilíbrio que permita um diá-logo professor-aluno, com respeito mútuo, criando um ambiente propício para a aprendizagem, a troca de conhecimento e reflexão permanente sobre te-mas importantes que dizem respeito à vida social.

Paulo Freire

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O psicólogo pode contribuir nesse debate, produ-zindo pesquisas que legitimem tais aspectos, assim como construindo projetos de intervenção voltados a um diagnóstico institucional13.

Trabalho

A inserção de psicólogos no campo do traba-lho surgiu no período da modernidade. O aumento crescente das indústrias começa a demandar cada vez mais a mão de obra humana para operar e estabelecer uma relação com as máquinas. Essa era a principal atividade de trabalho que garantia a sobrevivência das pessoas. Entretanto, diferen-te do trabalho artesanal, na indústria geralmente os trabalhadores não tinham acesso à mercadoria produzida, ou seja, o que era produzido não era adquirido por quem os produzia.

Os psicólogos passam a ser chamados para mediar a relação homem-máquina, configurando uma primeira prática de psicologia voltada ao tra-balho, a “psicologia industrial”.

A prática do psicólogo na indústria recebe nos dias atuais inúmeras críticas por ter consolida-do práticas voltadas à sustentabilidade da lógica capitalista em detrimento das necessidades huma-nas. Lane e Codo (2006) destacam que essa prática consistia em algumas atribuições na dinâmica da indústria, a saber:

1. Seleção de pessoas: construção de ha-bilidades para cada tarefa ou setor e identificação de tais habilidades nos can-didatos. A crítica é de que a Psicologia constrói uma prática voltada às máquinas e ao fortalecimento da lógica industrial e não para o homem trabalhador.

13 O diagnóstico institucional é uma prática decorrente do campo da Análi-se Institucional que estudamos no item 2.4. O diagnóstico contextualiza os principais problemas vivenciados, poten-cialidades, atores envolvidos, traba-lhos desenvolvidos etc. É essencial essa análise para construir projetos de intervenção, trabalhando com metas voltadas a problemas da realidade social.

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2. Avaliação de desempenho: a crítica con-sistia na construção de definição de cri-térios mais objetivos sobre promoção, rebaixamento ou demissão de trabalha-dores.

3. Treinamento: esses processos ocorriam de forma mecânica, de modo fragmenta-do de toda a dinâmica industrial. A crítica era de que a elaboração dos treinamen-tos envolvesse todos os trabalhadores para que cada um tivesse compreensão de todo o contexto que perpassasse o processo produtivo e não somente de sua função na empresa.

Saúde

A Psicologia Social tem contribuído cada vez mais tanto com a prática dos próprios psicólogos na área da saúde, quanto com outros profissionais. O psi-cólogo, na área da saúde, pode atuar nos três níveis de atenção: primário, secundário e terciário, envolvendo pesquisa, assistência e formação de recursos humanos.

É possível observar a inserção de profissio-nais psicólogos tanto em hospitais, como em cen-tros de saúde de modo geral, desenvolvendo ati-vidades de apoio terapêutico a pacientes, usuários de serviços de saúde, equipe de trabalhadores e familiares. Além disso, também pode desenvolver trabalhos com enfoque organizacional na área de recursos humanos, gestão de pessoas, enfoque co-munitário ou até mesmo em processos educativos no eixo da educação permanente.

Talvez a maior contribuição da Psicologia Social para a área da saúde seja a concepção do processo saúde/doença “como uma totalidade irredutível que

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compreende os aspectos biológicos e psicossociais do adoecimento” (Spink, 2003, p.61). Essa visão mais ampla possibilita uma mudança de foco na própria atuação dos profissionais de saúde, de uma prática essencialmente médica, focada na doença de forma individual, para uma prática em que as questões da saúde são pensadas sempre levando em conta os fatores individuais e sociais, ou seja, como outros aspectos da vida do ser humano, também o adoe-cimento é tratado como um fenômeno psicossocial, historicamente construído, que envolve, portanto, muitas variáveis e não somente o aspecto orgânico.

Diante dessa perspectiva, Spink (2003, p.27) destaca que a Psicologia Social da Saúde deve ter um “compromisso com os direitos sociais pensados numa ótica coletiva” e exercer sua prática em vários contextos, enfatizando a prevenção da doença e a promoção da saúde.

Comunidade

Já abordamos sobre o trabalho comunitário em temas anteriores. Entretanto, sistematizaremos algumas experiências. O trabalho na comunidade, como já dissemos, pressupõe a saída de um lugar seguro para a incorporação de uma postura mais ativa do profissional em ir ao local onde as pessoas residem e exercem suas atividades cotidianas. Essa é a grande marca de um trabalho comunitário.

Os trabalhos surgiram de um incômodo de que a Psicologia, com uma forte tradição psicana-lista, acabava por se restringir a atender a apenas uma pequena parcela da população, aqueles que poderiam pagar por um atendimento psicológico. No modo como se exercia a prática clínica que se constituía como hegemônica, a grande maioria da população brasileira, por exemplo, não tinha acesso.

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As principais características de um trabalho com enfoque comunitário, de acordo com as ideias apresentadas por Lane e Codo (2006) e Brandão e Bomfim (1999), são:

• Foco na prevenção, mais que tratamento e reabilitação;

• Principal objetivo: melhorar as condições de vida, mais do que resolver problemas individuais;

• Potencializar trabalhos locais;

• Estimular a participação da comunidade no planejamento e execução de ativida-des e intervenção;

• Os trabalhos em saúde mental devem es-tar articulados com programas sociais.

É importante compreender que o traba-lho em Psicologia Social Comunitária é diferente de um trabalho de caridade ou assistencialismo. E não deve ter vínculo com partido político. Em 1981, o Encontro Nacional da ABRAPSO priorizou a apre-sentação de experiências de trabalhos de psicólogos com ênfase comunitária.

INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Sugerimos a leitura do capítulo 10 do livro “Psi-cologias”, que apresenta a especificidade da profissão de psicólogo, bem como os principais

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campos de atuação e atividades que podem ser desenvolvidas nesse campo.

BOCK, A; FURTADO, O; TEIXEIRA, M. L. T. Psicolo-gias: uma introdução ao estudo da Psicologia. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

Outro texto bastante sistemático onde se encontra uma explanação sobre a práxis do psicólogo é na parte 4 do livro “Psicologia Social: o homem em movimento”.

LANE, Silvia; CODO, Wanderley (Org.) Psicologia So-cial: o homem em movimento. 13. ed. São Paulo: Brasiliense 2006.

PARA REFLETIR

A partir das áreas de atuação da Psicologia que apresentamos acima, discuta com seus colegas sobre quais aspectos dessas áreas da psicologia (educação, trabalho, saúde e comunidade) se ar-ticulam com o que você compreende como sendo uma prática do seu curso.

Discutam também sobre a importância da definição de um Código de Ética para direcionar o exercício de uma profissão. Procure avaliar a relação do arti-go VI do Código de Ética Profissional do Psicólogo com a história da psicologia como ciência trabalha-da no tema 1.

Artigo VI – O psicólogo colaborará na criação de

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condições que visem a eliminar a opressão e a mar-ginalização do ser humano.

4.3 Debates atuais em Psicologia Social e Inter-face com outras áreas

Uma característica importante da consoli-dação das ciências foi a construção de diversas disciplinas do conhecimento. No momento de sur-gimento da ciência, o que garantia esse status “científico”, que buscava se diferenciar do conheci-mento popular ou do senso comum era o isolamen-to do contexto, a classificação e descrição rigorosa. Isso sustentava a crença de que o conhecimento científico poderia fornecer subsídios para controle e previsão de acontecimentos.

O saber geral deveria se tornar cada vez mais específico para corroborar com os critérios científi-cos (descrição rigorosa e comprovação). Ou seja, quanto mais específico, mais científico.

Dessa forma, as produções científicas come-çam a estabelecer relações com outras ciências. Para a compreensão das práticas de uma ciência e sua ligação com as demais é fundamental dissertar sobre o que se conhece como multidisciplinaridade.

A Multidisciplinaridade

Este conceito começa a surgir na medida em que várias disciplinas diferentes devem se reunir para discutir algum assunto em comum, criando estratégias que depende de cada área específica.

A multidisciplinaridade reconhece a existên-cia de uma fronteira bem delimitada no conheci-mento referente a cada disciplina. Assim as diferen-

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tes especialidades podem trabalhar juntas, desde que cada um respeite as limitações da sua área.

Não obstante às relações multidisciplinares que por vezes são estabelecidas entre as mais va-riadas ciências, você provavelmente já deve ter ou-vido falar sobre perspectivas inter ou transdiscipli-nares. Mas, afinal, o que isso significa?

A (Inter) e (Trans) disciplinaridade

Estudiosos, como Edgar Morin (2003), têm se dedicado a discutir a interdisciplinaridade, em di-versas áreas do conhecimento.

Se por um lado a existência dos saberes es-pecíficos e das especialidades contribuíram para aprimorar e lapidar o conhecimento, tornando-o mais científico, por outro, dificultou a apreensão do todo em uma visão integral ao conhecimento científico. Partindo desse pressuposto, são inicia-dos os movimentos do micro (da especialidade) para o macro (para o todo), buscando integrar tais conhecimentos.

Sendo assim, a interdisciplinaridade refere--se a uma perspectiva de construção de conheci-mento que reconhece que as disciplinas científicas necessitam umas das outras, ou seja, os saberes são interdependentes e podem se relacionar. Des-te modo, tanto produções teóricas quanto práticas devem visar essa composição entre disciplinas di-ferentes no sentido de não compartimentalizar os conhecimentos.

Por conseguinte, a interdisciplinaridade ad-voga que o encaminhamento de uma especialidade para a outra não dá conta de uma visão completa de qualquer situação apresentada. Nesse sentido, defende ser necessário construir um conhecimento integrado e articulado, visando superar as divisões

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delimitadas entre as fronteiras disciplinares, tor-nando as produções e práticas científicas mais flui-das, o que permite que um ramo de conhecimento seja perpassado pelo outro.

É nesse sentido que surgem os termos inter--relacionar, interpenetrar uma área na outra, criar campos de interlocução e articular conhecimentos.

Se a interdisciplinaridade é um campo recen-te e ainda em construção, a transdisciplinaridade assume, para muitos, por enquanto, uma dimen-são abstrata e utópica. Pois a transdisciplinaridade constitui a não existência de fronteira entre sabe-res e disciplinas científicas. Isso significa que em uma experiência prática ou em um debate teórico transdisciplinar uma área já se entrelaça com outra, sendo quase impossível identificar onde começa uma, onde termina a outra ou qual a competência específica de cada uma devido à criação de uma zona comum, um diálogo comum.

Psicologia Social em interface com outras áreas

Como já foi dito, paradigmas vigentes de produção científica consideram fundamental a in-terdisciplinaridade. Nesse contexto, a Psicologia Social tem estreitado relações com outros ramos de conhecimento (para relembrar isso você pode retornar ao tema 1).

Nesse sentido, a interlocução da Psicologia com as mais diversas áreas tem construído práticas efetivas visando modificar a realidade. Encontramos psicólogos discutindo questões de meio-ambiente, trânsito, esportes, comunicação social etc. Isso será brevemente sinalizado nas linhas que se seguem.

No campo das organizações, a Psicologia tem sido de suma importância para refletir sobre seu funcionamento. Se primeiramente esta ciência se

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restringia à aplicação de testes psicológicos, atual-mente psicólogos são vistos ao lado de administra-dores e gestores de recursos humanos construindo e executando processos seletivos e de treinamento.

Você já observou que hoje em dia nos processos seletivos das grandes empre-sas o psicólogo sempre está presente? Os processos seletivos, cada vez mais completos, ganharam uma complexida-de claramente visível. Tais processos têm ocorrido em várias etapas e o psicólogo está presente no seu planejamento e, além disso, costuma aplicar testes psi-cológicos, fazer entrevistas com os can-didatos e, ainda, coordenar dinâmicas de grupo que são parte fundamental no processo como um todo.

Como já foi dito em capítulos anteriores, os psicólogos também se envolvem em processos de treinamento. Em verdade, para planejar, executar e avaliar um treinamento, inúmeros saberes traba-lham juntos. No contexto organizacional14 para pro-gramar e realizar um treinamento é preciso desde a participação das pessoas que trabalham em todos os setores organizacionais (finanças, contabilidade, marketing, por exemplo) – para detectar a necessi-dade de treinamento em cada setor – até o envolvi-mento de pedagogos, psicólogos, administradores, gestores de recursos humanos.

Além disso, ao lado de assistentes sociais e médicos do trabalho, os psicólogos nas organi-zações têm desenvolvidos inúmeros trabalhos e práticas organizacionais voltadas à saúde do tra-balhador. Para isso, esses profissionais tem se in-serido cotidianamente nos processos organizacio-

14 Apesar dessa atuação comum entre Psicologia e Administração nas práticas organiza-cionais de seleção e treinamento de profi ssionais, a interdisciplinaridade não deixa de reco-nhecer os saberes e práticas específi cas correspondentes a cada profi ssão.

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nais, uma vez que pensar em saúde do trabalhador implica, necessariamente, no desenvolvimento de projetos de Qualidade de Vida no Trabalho.

Tais ações e interlocuções ocorrem nos mais variados contextos organizacionais. Assim, como já apontado, o psicólogo pode desempenhar suas funções no contexto de uma organização bem es-pecífica, como o hospital, por exemplo.

A Psicologia Hospitalar também desenvolve um trabalho junto a assistentes sociais, por exemplo, no processo de elaboração do luto de familiares de pacientes terminais além de discutir rotineiramente com médicos e demais profissionais da saúde, te-mas relativos à qualidade de vida dos pacientes.

As pessoas da nossa cultura têm muita difi-culdade de lidar com a morte a qual, em um de-terminado momento, é inevitável. Assim, a prática de muitos psicólogos no hospital repousa na ajuda para tratar das questões emocionais que se pre-sentificam nesse momento. O psicólogo, quando necessário, auxilia os pacientes e seus familiares a superar o estágio da negação e a encarar a possibi-lidade da morte iminente de forma menos dolorosa.

Dessa maneira, os psicólogos se colocam como parceiros de demais profissionais da saúde (médicos enfermeiros, técnicos em enfermagem, fi-sioterapeutas, dentre outros) para tratar das ques-tões, para além dos danos físicos, que se colocam no processo de adoecimento. Portanto, diz-se que o psicólogo se insere no processo de humanização das práticas hospitalares.

É mister salientar ainda que a Psicologia So-cial tem inserção nos mais variados movimentos sociais. Aqui estabelece interlocuções com o Servi-ço Social, a Sociologia e as Ciências Políticas, e se vale da Dinâmica de Grupo como ramo de pesquisa para compreender e intervir no processo de forma-

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ção de coletividades. Várias pesquisas e projetos de intervenção, por exemplo, tem se desenvolvido junto ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra), na esfera da Psicologia Social.

Muito associadas às pesquisas com movi-mentos sociais pode-se encontrar pesquisas que se valem da Representação Social como abordagem teórica e metodológica para compreender a iden-tidade dos grupos sociais suas crenças e valores. Nesse sentido, a Psicologia se articula mais uma vez com a Sociologia. Todavia, uma vez compreen-dido como se formam as Representações Sociais que legitimam relações de dominação, a Psicologia Social desenvolve projetos de intervenção junto ao Serviço Social, ao Direito e à Educação.

Os estudos em Psicologia, aliados a ou-tros saberes, fizeram com que alguns grupos vulneráveis como: mulheres, idosos, crianças e adolescentes fossem vistos pela área do Direito sob um novo olhar, garantindo constitucionalmente al-guns direitos como a Lei Maria da Penha, Estatuto do Idoso e Estatuto da Criança e do Adolescente, respectivamente.

Agora que você já tem uma noção de como a Psicologia Social pode constituir uma prática com outras áreas do conhecimento e disciplinas cientí-ficas, cabe sinalizar os atuais debates fomentados pelos psicólogos sociais.

Debates atuais em Psicologia Social

A partir dos Anais de Congressos da Asso-ciação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO, 2011), podemos ter acesso aos temas que vêm sen-

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do debatidos, atualmente, entre os pesquisadores da área, como os que apresentaremos a seguir.

A Psicologia Social tem se debruçado sobre várias questões pertinentes na contemporaneidade como o sistema prisional e os Direitos Humanos, o que nos remete à necessidade de articulação junto à Sociologia, ao Direito e ao Serviço Social.

Também fazem parte dos debates em Psico-logia e, no mesmo sentido, em Psicologia Social te-mas como: uso de drogas na contemporaneidade, loucura e cidadania, cuidados integrativos à saúde e práticas de terapia integrativas (massoterapia, acupuntura, yoga etc), além de estudos da Sín-drome de Down e outras necessidades especiais. Nesse sentido, as produções científicas também se colocam como interdisciplinares, com ênfase na re-lação com outras áreas do saber como a Medicina, a Fisioterapia, a Nutrição e Serviço Social.

Existem ainda inúmeros debates interdiscipli-nares relativos às questões de gênero e sexuali-dade nos quais a Psicologia Social se insere tanto através de pesquisas quanto de intervenções. Tais inserções têm auxiliado na desconstrução de inú-meros estereótipos e preconceitos acerca das mu-lheres, dos homens e dos homossexuais, além de na garantia de direitos sociais.

Por fim, vale apontar talvez a mais nova es-pecialização da Psicologia Social: a Psicologia dos Desastres. Esta surgiu com os desastres provoca-dos pelo furacão Katrina que destruiu Nova Orleans, nos Estados Unidos. Trata-se de uma abordagem que visa a construção de uma política pública de defesa civil que lida com a prevenção de acidentes e, além disso, almeja tratar os prejuízos decorren-tes das perdas humanas que porventura venham a ocorrer em decorrência das tragédias.

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INDICAÇÃO DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para aprofundar o debate sobre as transformações da ciência moderna e, consequentemente, da inter-disciplinaridade, sugerimos a leitura da parte 7 do livro “Ciência com Consciência”, intitulada “A antiga e a nova transdisciplinaridade”. Nesse texto, o autor apresenta algumas limitações do conhecimento cientí-fico instaurado na modernidade e manifesta o desafio da incorporação do saber sem fronteiras disciplinares.

MORIN, E. Ciência com Consciência. 10. ed. Rio de Janeiro: Bertrand, 2007.

Para ilustrar uma temática que vem sendo debatida entre os estudiosos da Psicologia Social, sugerimos a leitura do artigo de Leite e Dimenstein, “Movi-mentos sociais e produção de subjetividade: o MST em perspectiva”.

LEITE, J. F.; DIMENSTEIN, M. Movimentos sociais e produção de subjetividade: o MST em perspectiva. Psicologia e Sociedade. 22 (2), ago. 2010. Dispo-nível em <http://www.scielo.br/pdf/psoc/v22n2/07.pdf>. Acesso em 16 de julho de 2011.

PARA REFLETIR

A partir dos eixos temáticos que envolvem os de-bates atuais em Psicologia Social, discuta com seus colegas quais deles pode-se estabelecer uma rela-ção com o Serviço Social.

Agora, escolha um desses eixos e procure siste-

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matizar essa escolha, apresentando um exemplo prático em que haja composição de uma equipe de assistentes sociais e psicólogos para realizar este trabalho. Para isso, utilize como base as discussões sobre interdisciplinaridade.

4.4 Interfaces entre a Psicologia Social e o Serviço Social

Ao longo desse livro, apresentamos vários âmbitos de estudo e prática da Psicologia Social, sempre com o objetivo de oferecer elementos que possam auxiliar o assistente social tanto do ponto de vista teórico, por meio das reflexões fomenta-das, tanto no aspecto prático da atuação profissio-nal e da pesquisa. Se retomarmos os objetos de estudo e campos de atuação da Psicologia Social e do Serviço Social, podemos encontrar vários pon-tos de intersecção, em que os profissionais que atuam nessas áreas podem se beneficiar da troca de conhecimento, além de poderem contribuir de forma importante para ampliar a abrangência de suas áreas.

Gostaríamos de relembrar, aqui, as ideias de Morin (2007), já apresentadas anteriormente, acer-ca da interdisciplinaridade e da importância de que haja a construção de um conhecimento integrado e articulado entre as diferentes áreas de conhecimen-to. Dessa forma, possibilita-se uma concepção mais ampla do nosso objeto de estudo, ou do usuário a quem prestamos serviço, a partir do momento em que ocorre a transversalização do conhecimento, em que todos os campos são beneficiados, evitan-do uma visão reducionista.

Voltando a questão para as duas áreas de co-nhecimento de que estamos tratando, vimos que a

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Psicologia Social interessa-se em estudar a relação entre o indivíduo e a sociedade, discutindo várias questões que envolvem a constituição do homem enquanto ser social, produto e produtor da socie-dade em que vive.

Por outro lado, alguns autores do Serviço So-cial, como Montaño (2009, p.211), enfatizam que buscar transformar a realidade, mudar a sociedade e interessar-se pela qualidade de vida dos sujeitos devem ser a principal “preocupação e compromisso político e ético-profissional” dos assistentes sociais. Dessa forma, torna-se imprescindível o diálogo com a Psicologia Social, ampliando sua compreensão da constituição desses sujeitos, de modo a contribuir para que assumam um papel ativo no processo de transformação social.

É importante salientar que esse diálogo com outros campos de saber já vem sendo defendido por vários teóricos do Serviço Social. Vasconcelos (2006) traz o tema da interdisciplinaridade como sendo foco de estudo de vários pesquisadores da área, retomando a proposta de Coutinho (1991), quando afirma que toda ciência é aproximativa, não sendo capaz, portanto, de esgotar o real. Daí a importância do pluralismo.

[...] o pluralismo, no entan-to, não signifi ca ecletismo ou relativismo moral, ou seja, a conciliação de pontos de vista teóricos e éticos inconciliáveis. Pluralismo, neste sentido é “sinônimo de abertura para o diferente, de respeito pela po-sição alheia, considerando que essa posição, ao nos advertir para os nossos erros e limites, e ao fornecer sugestões, é ne-cessária ao próprio desenvolvi-mento de nossa posição e, de

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modo geral, da ciência” (COU-TINHO, 1991, p.41, apud VAS-CONCELOS, 2006, p. 37-38).

É justamente nessa abertura para o diferente, de que nos fala Coutinho, no parágrafo anterior, que o Serviço Social e a Psicologia vêm travan-do diálogo em vários campos de atuação, como na saúde, na área jurídica, de assistência social, trazendo resultados enriquecedores para as duas áreas, tal como salientou Coutinho no parágrafo anterior, ao destacar a importância desse pluralis-mo para o desenvolvimento da ciência.

A assistente social Karen Eidelwein (2007), no seu artigo “Psicologia Social e Serviço Social: uma relação interdisciplinar na direção da produção do conhecimento”, faz uma reflexão interessante acerca de um possível diálogo entre essas duas áreas de conhecimento e campos de atuação, de forma a haver uma interdisciplinaridade na constru-ção das práticas e dos saberes.

Essa autora destaca a Psicologia Social como uma área essencialmente interdisciplinar, uma vez que por conta de seu objeto de estudo, a “nature-za social do fenômeno psíquico” (Eidelwein, 2007, p. 300), faz-se necessária a contribuição de outras áreas de conhecimento voltadas à temática do so-cial, sobretudo devido à estruturação histórica da Psicologia em torno de um objeto que sofreu, por um grande período, um processo de descontextu-alização, em que não eram levadas em conta as relações sócio-culturais, políticas e econômicas.

Acreditamos que o Serviço Social consistiria, justamente, em uma dessas áreas de conhecimen-to, uma vez que busca compreender as múltiplas expressões da questão social. Como a Psicologia Social trata justamente das questões envolvidas

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na interação entre sujeito e sociedade, o conheci-mento e a práticas desenvolvidas pelo Serviço So-cial vem contribuindo de forma significativa para ampliar a compreensão desse tema. Não se pode deixar de destacar, contudo, que também os assis-tentes sociais se beneficiam com o conhecimento produzido pelos psicólogos sociais, já que aqueles atuam diretamente com os sujeitos sociais, sendo de fundamental importância que haja o conheci-mento da constituição psíquica desses sujeitos, como salientado anteriormente. Pode-se falar, por-tanto, da necessidade de diálogo, em que ambas contribuem uma com a outra.

Além do aspecto teórico, também a atuação dos assistentes sociais ocorre em diversas áreas envolvidas com as questões sociais, que também são campos de interesses dos psicólogos sociais, tais como:

[...] no campo dos direitos, no universo da família, do trabalho e do “não traba-lho”, da saúde, da educação, dos(as) idosos(as), da crian-ça e dos(as) adolescentes, de grupos étnicos que enfrentam a investida avassaladora do preconceito, da expropriação da terra, das questões ambien-tais resultantes da socialização do ônus do setor produtivo, da discriminação a indivíduos homossexuais, entre outras formas de violação dos direi-tos. (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2007, p. 14).

Os psicólogos, por sua vez, assim com os assistentes sociais, têm cada vez mais se envolvi-do e valorizado práticas que tenham um compro-metimento com a transformação da sociedade, por

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meio de um trabalho ético que vise o desenvol-vimento e a emancipação do ser humano, como bem é salientado no documento que estabelece os “Parâmetros para atuação de assistentes sociais e psicólogos(as) na Política de Assistência Social”, desenvolvido de forma conjunta entre os Conse-lhos Federais e Psicologia e de Serviço Social.

Ainda trazendo a discussão para o aspecto da prática, psicólogos e assistentes sociais têm cada vez mais realizado trabalhos em conjunto, nas diversas áreas de atuação, oferecendo importantes contribuições para que cada ser humano possa ser visto de forma integral, a partir das especificidades do olhar de cada um desses profissionais.

Retomando alguns campos de atuação do psicólogo social, podemos apontar também aí a presença do assistente social, ou pelo menos a sua necessidade, uma vez que ainda não temos, em nossa sociedade, a inserção no mercado de traba-lho desses dois profissionais de forma a atender toda a demanda social existente.

Além da assistência social, já citada nesta nossa discussão, em que o diálogo entre esses profissionais tem se consolidado a cada dia, vale destacar a saúde como um importante campo de interface, em cuja área tem havido trabalhos com diferentes formatos, com um crescimento do cunho interdisciplinar, em que se pode perceber e valori-zar a interdependência das duas áreas de conhe-cimento, na compreensão da saúde por uma ótica cada vez mais coletiva, como propõe Spink (2003).

Simão et. al. (2011) salientam a importância de se compreender o processo de saúde e doença de uma maneira contextualizada, ou seja, levando em conta, além dos fatores biológicos, também os aspectos ambientais, culturais e socioeconômicos. Dessa maneira, o assistente social vem exercendo

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importante contribuição, a partir da especificidade de seu olhar, que visa a compreender a questão social envolvida nesse processo, por meio do es-tabelecimento de diversas atividades, muitas vezes desenvolvidas em conjunto ou paralelamente ao trabalho dos psicólogos sociais.

É evidente que, se temos como foco o ofe-recimento de um atendimento integral à saúde do usuário, torna-se imprescindível o diálogo entre os assistentes sociais, psicólogos e demais profissio-nais que integram a equipe de saúde, de modo que sejam implementadas práticas interdisciplina-res que possibilitem a promoção da qualidade de vida tanto dos usuários e seus familiares quanto dos próprios profissionais.

Ainda no campo da saúde, mas já na inter-face com o mundo do trabalho, podemos citar a atuação em prol da saúde do trabalhador, com um objetivo que é comum às duas áreas de atuação que estamos focalizando neste capítulo: auxiliar o trabalhador a tornar-se sujeito de seu próprio tra-balho, por meio de uma prática crítica que leve em conta suas próprias necessidades e não se restrinja a atender os objetivos da sociedade capitalista.

Nessa vertente, portanto, o Serviço Social e a Psicologia Social podem construir variadas pontes de diálogo, tendo em vista, como discutido ante-riormente, a importância do trabalho no processo de socialização do ser humano, além de a saúde do trabalhador ser um campo intrinsecamente in-terdisciplinar, como destacam Olivar et. al. (2011), possibilitando ao assistente social transitar em va-riadas instituições, exercendo atividades diversifi-cadas, em diálogo constante com diferentes áreas profissionais o que, a nosso modo de ver, enrique-ce sobremaneira a sua prática.

O campo jurídico constitui outra área de

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atuação que vem possibilitando esse trabalho em conjunto, sendo uma prática já bem sistematizada, com produção de pesquisa crescente em ambos os campos de conhecimento.

Diante do exposto, portanto, podemos ob-servar claramente a possibilidade e a relevância do diálogo entre psicólogos sociais e assistentes sociais, propiciando a ambos a formação de uma visão mais ampla da realidade e dos sujeitos so-ciais, não se fechando em perspectivas parciais e, portanto, reducionistas.

INDICAÇÕES DE LEITURA COMPLEMENTAR

Para conhecer possíveis campos de atuação em que já está bem estabelecido o diálogo entre a Psicologia Social e o Serviço Social, sugerimos a leitura da cartilha desenvolvida em conjunto pelo Conselho Federal de Serviço Social e Conselho Fe-deral de Psicologia definindo os “Parâmetros para atuação de assistentes sociais e psicólogos(as) na Política de Assistência Social”.

CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL (CFESS); Conselho Federal de Psicologia (CFP). Parâmetros para atuação de assistentes sociais e psicólogos(as) na Política de Assistência Social. Brasília: CFESS/CFP, 2007. Disponível em <http://www.cfess.org.br/ar-quivos/CartilhaFinalCFESSCFP set2007.pdf>. Acesso em: 20 de maio de 2011.

Outras duas leituras interessantes tratam-se do capítulo “Serviço Social e interdisciplinaridade: o exemplo da saúde mental”, do livro “Saúde Mental e Serviço Social”, de Eduardo Mourão Vasconcelos, que discute a questão da interdisciplinaridade no

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Serviço Social, enfocando sua atuação na Saúde Mental, e o capítulo 2 (“O Serviço Social e a Psico-logia no Brasil e no judiciário paulista”) do livro de Fávero, Melão e Jorge, sobre “O Serviço Social e a Psicologia no judiciário”.

VASCONCELOS, E.M. (org). Saúde mental e Serviço Social; o desafio da subjetividade da interdiscipli-naridade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

FÁVERO, E.T.; MELÃO, M.J.R.; JORGE, M.R.T. O Ser-viço Social e a Psicologia no judiciário; construindo saberes, conquistando direitos. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

PARA REFLETIR

Leia os Princípios Fundamentais do Código de Ética do Assistente Social (CONSELHO FEDERAL DE SERVI-ÇO SOCIAL, 2011) e discuta com seus colegas sobre possíveis contribuições do diálogo entre o Serviço Social e a Psicologia Social para que esses princípios sejam colocados em prática integralmente.

RESUMO

Nesse tema, abordamos a articulação da Psicolo-gia Social com outras áreas do conhecimento con-figurando uma prática interdisciplinar. Elencamos,

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no conteúdo 4.1, os principais campos de atuação da Psicologia Social: na educação, no trabalho, na saúde e na comunidade, contextualizando acerca das principais contribuições teórico-práticas em cada um desses campos.

Discutimos também, no conteúdo 4.2 sobre um tema muito importante no contexto das práticas do assistente social, relacionado aos preconceitos, abordando seus aspectos emocionais, cognitivos e comportamentais, além de discutir sobre algu-mas causas de sua formação e possíveis formas de minimizá-los.

Explanamos, ainda, no conteúdo 4.3, sobre os conceitos de multi, inter e transdisciplinaridade e dedicamos a ampliar o olhar da contribuição da Psicologia a outras áreas do conhecimento e sua inserção em debates contemporâneos.

Por fim, no conteúdo 4.4, fizemos uma reflexão sobre as interfaces entre a Psicologia Social e o Serviço Social, enfatizando a importância de haver um diálogo entre essas áreas de saber, com vistas a contribuir para uma prática e uma produção de conhecimento realmente comprometida com a for-mação de sujeitos críticos e ativos no processo de transformação de sua realidade social.

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