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Rainha de Copas - Colleen Oakes

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Nem todo conto de fadas tem um final feliz. Esta é a história de uma princesa que se tornou uma vilã. A traição de um pai. Um Reino com um segredo obscuro. Uma princesa lentamente se desfazendo.Como princesa de um Palácio no País das Maravilhas e futura Rainha de Copas, os dias de Dinah são uma monotonia sem fim de chás, tortas e uma série de humilhações cruéis nas mãos de seu pai, o Rei de Copas. O momento mais aguardado de seus dias é quando é visitada por Wardley, seu melhor amigo de infância, e futuro Cavaleiro de Copas - e o amor de sua vida.Quando um fascinante estranho chega ao Palácio, Dinah observa como tudo o que ela sempre quis ameaça ruir. Conforme a coroação de Dinah se aproxima, uma sequência de eventos suspeitos e sangrentos sugere que há algo errado acontecendo nos extravagantes salões do País das Maravilhas. Cabe a Dinha desvendar os mistérios que se escondem dentro e fora do Palácio antes que ela perca a cabeça para o inimigo sagaz e sem rosto.Metade fantasia épica, metade conto de fadas distorcido, esta deslumbrante saga terá leitores vibrando com a natureza furiosa de Dinah e o devastar de sua ira no País das Maravilhas.Personagens conhecidos como o gato Cheshire, o Coelho Branco e o Chapeleiro Maluco fazem parte da narrativa que encantará os leitores com uma nova perspectiva do País das Maravilhas, criado por Lewis Carroll.

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AlicenoPaísdasMaravilhas

“OqueéquevocêachadaRainha?”,perguntouoGatoemumavozbaixa.“Nadaemespecial”,respondeuAlice,“elaéextremamente…”.Masneste

exatoinstanteelapercebeuqueaRainhaestavabemaoseulado,ouvindo,e completou “…boa nesse jogo e vai ser muito difícil chegar ao final dapartida”.

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“Asabedoriavalemaisqueasmáquinasdeguerra,masumsópecadorpodecausaraperdademuitosbens.”–Eclesiastes9:18

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Um

– Acorde, acorde, você tá atrasada! – Harris pulava de um pé para ooutro, seu rosto rechonchudo pingando suor. Ele tirou os óculos dearmaçãogrossaeoslimpouemseulençoxadrezbranco.–Dinah!Levanta!Estamosatrasados,atrasados,atrasados!Dinah soltou um gemido triste e se enterrou ainda mais embaixo das

grossascobertas,queeramdouradascombelaspenasdepavão.–Aaargh…–respondeu.Elaansiavaporvoltarparaseusonhodomeio

datarde,noqualestavavagandopelaFlorestaRetorcida,perseguindoumaborboleta branca iridescente, cujo esqueleto brilhava através da pele.ExatamentequandoDinahfechouamãoemvoltadeseupequenocorpo,aborboletafoiarrancadaparaocéuporalgoqueDinahnãoviu.Quandoelaolhouparabaixo,ocoraçãopulsantedapequenacriaturaaindaestavaemsuasmãos.Dinahsentounocolchão, agoracompletamenteacordada.Harrisparou

educadamenteaoseuladonacama,esperando.AluzbrilhantedoPaísdasMaravilhasfluíaatravésdajaneladesuasacada.–Harris,ordenoquevocêmedeixedormir.Euestavatirandoumcochilo

muitoagradável. – elao chutoucomapernadescoberta,passandomuitopertodorelógiodebolsoqueeleestavabalançandoporcimadeseucorpo.–Princesa,vocêprecisase levantar.Nóstemosmensagensimportantes

doReideCopas.Seupaidesejavê-la.Dinah forçou-se para fora da cama em um bocejo. Cochilos eram uma

parte essencial da vida no País dasMaravilhas e, algumas vezes, a partefavoritadeseudia.Elaestavanuaepensouemsecobrir,masentãorefletiumelhorsobreisso.Harrisaviusemroupasmilhõesdevezes,considerandoqueeleacriaradesdecedo.Elaestavacertaemnãosepreocuparcomisso,nãocomele.Ovelhorechonchudomallhedeuumasegundaolhada.– Emily! Prepare um banho para a princesa, imediatamente.

Superquente.Dinahprojetouseufortequeixoparafrente:–Eunãoqueroquente.Eugostodebanhosfrios,muitoobrigada.

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Harrisriucomabarriga,osraloscabelosbrancosrestantescaindosobreosóculos:–Princesasnãoescolhemmuitascoisas,Dinah,vocêsabedisso.Elapulouparao ladodabanheira.Emilyestavaenchendo-aapartirde

umlongopescoçodecisnequesaíadotetoe jorravaáguaparaaenormebanheirapreta.Grandesbolhascremosasdotamanhodemelõessaíamdabanheira.Dinahsuspirouinfeliz.–PorqueeutenhoqueirparaoGrandeSalão?Nuncapossodizernada,e

meupainemfalacomigo.–Ouolhaparamim,pensou.Emilyaacariciouintensamentenacabeça:–VocênãodeveriadizeressascoisassobreoReideCopas.Dinah,então,colocouseudedãodopégordinhonabanheira.Ocalorda

águacorreuporsuaperna,fazendo-aestremecer:–Euodeiodiadebanho.–Nóssabemos–EmilyeHarrisresponderam.Harrisolhounovamente

paraseurelógiopratadebolso:–Vamos,vamos!Nósestamosrealmenteatrasados.Dinahdeixouumchoroaltoescaparaoentrarnabanheira.Elagrunhiu

paraEmily,quejogouumgrandebaldedeáguaemsuacabeçaecomeçouaesfregá-lacomduaspequenaspelesdeouriço.–Princesa,suasorelhasestãoimundas!–Emilybradou–Oquevocêfez

hoje?– Nada. – Ouvi através do chão, ela pensou.Montei o Rajado. Subi na

árvore Julla.Lutei comespadascomWardleypertodosestábulos.EspieiasCartas.Dinah gostaria de estar em qualquer lugar que não nessa banheira,

esperandoparaveropai.SeubraçofoilevantadoeEmilyatacouembaixodele, esfregando com um vigor que deixou Dinah se sentindo esfolada,continuouemseutorsoepernas.Comumpesadogrunhido,ajudouDinahasairdabanheiraeacolocounochão.–Seque-se–elaordenou.Sorrindo,Dinahsaiuparaasacada,sentindoosolda tardenoPaísdas

Maravilhas.Paradacomosbraçosabertos,elasentiuasgotículasdeáguaem seu corpo evaporarem e secarem completamente. Da sacada elaconseguiaverquasetodooterrenodoPaísdasMaravilhas,asvilasdoladode fora do palácio que logo seria dela, para governar e controlar. Dinahpermitiu-se respirar profundamente e com prazer enquanto seus olhoscomiamfamintostudoqueestavaàsuavista.Nonorte,camposinfinitosdeflores selvagens se espalhavam e, depois deles estava o Nono Oceano,

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apesardeelanuncatê-lovisto.Alémdele,elaaprendeu,emseusestudos,estavamastemíveisCavernasdaLamentaçãoàbeiradeumenormelago.Olagochamava-seTroden,eeraacasadesereiasemonstrosmarítimosdashistóriasepesadelosdascrianças.Paraoleste,paraalémdasplanícies,elapodia distinguir vagamente o topo das Montanhas Yurkeis, quedescansavam depois da Floresta Retorcida, onde exploradores eaventureiros iamparamorrer nasmãos de ursos brancos das tribos dasMontanhas.Nosul,ficavamasTerrasEscuras,umaregiãoúmida,comoumpântano, que abrigava cartas malfeitas e fantasmas errantes, a casa doPântanodasPenitênciaseoutroslugaresdehorroresimpronunciáveis.Maispróximodela,estavamaspropriedadesdoPaísdasMaravilhas,que

incluía dezenas de pequenas cidades, estradas, moinhos de vento e rios,que iam além das grades de ferro do palácio – esse era o SEU país – ocoraçãodoPaísdasMaravilhas, tão longequanto seusolhospodiamver.Dinahabriuosbraços,comoseabraçassetudoaquilo.AcabeçadeHarrisapareceuatravésdacortinavermelha:–Estamosatrasados,minhacriança!VAMOS!Dinah,estamosmuito,muito

atrasados.VocênãoquerqueoReifiqueaindamaisbravodoquejáestá.Dinah sacudiu o corpo uma última vez e caminhou para dentro,

tristonha.–Sente-se,porfavor,vossaAlteza–Emilyincitou.Dinah sentou-se. Emily empurrou uma escova através de seus cabelos

espessosenegros,Dinahgemeu:–Ah,pare.Suadamadecompanhiapuxouamorosamentesuaorelha:–Elesnãoembaraçariamtantosevocêcuidassedeles.– Não doeria tanto se você não os puxasse – Dinah respondeu. Emily

apertoualíngua.Com os cabelos já escovados, as roupas de baixo, intoleráveis, foram

colocadas e amarradas. Uma camisola e um espartilho branco foramcolocadosemseguida.– Por que eu preciso de tudo isso? – Dinah bufou, enquanto Emily

trabalhavanoslaços–Sótenhoquinzeanos!Emily não respondeu imediatamente e deu umpuxão forte. Os fios do

espartilhoseapertaramemsuacintura:–Porquevocênãoquerque seupaipercebaquevocêandoucomendo

tortasalémdaconta,nãoé?Dinahmordeuolábioeapoiou-senacômoda.Quandoatorturaacabou,

Harrisaguiouatéocentrodoquarto,ondeelaparoucomoumabonecade

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pelúcia – braços e pernas abertos, enquanto as criadas colocavam seuvestido.Umvestidopreto,lisocomumagrandegolabranca,quebrincavaemseurosto.Dinahodiavaessevestido.Dinahodiavatodososvestidos.Elasavestiramemsilêncioefinalizaramcomumbrochedepavão.Emily

pintou de vermelho seus lábios e bochechas, para que ela não parecessedoente, e desenhou um pequeno coração embaixo de seu olho direito.Depoisdoquepareceuumaeternidade,DinahsearrastavapeloCorredorde Pássaros Dourados, sentindo-se como um dos pássaros de bronzeempoleirados nos pedestais de ouro que a cercavam. Seu vestido pretoidiotarepuxavanascosturas.EladisseaEmilyqueeramuitograndeparaaquelevestido,masEmilynãoaouviu.Elaétãoboba,Dinahpensou,bobaeestúpida.Eraumpensamentomaldoso,eelasearrependeu instantaneamente.A

raiva de Dinah podia sair do controle se ela não tomasse cuidado. Seucabelo estava enrolado em um coque insuportavelmente apertado, quedestacava os seus já grandes olhos. Sobre sua cabeça, estava a coroa deprincesa–umafinatiradecoraçõesderubisvermelhos,contornadosporespinhosdeouro.Erapesada,aindaquefossefina.Brilhavanaluzdosol,eera a única coisa queDinah estavausandohoje de que gostava. Em seuspés,brilhavaumparde sapatosda coleçãodaRainha– chinelosbrancosmodelados, incrustados com pequenos diamantes brancos. Antes demorrer,suamãe,aRainhaDavianna,tinhaassumidoohobbyfemininodefazer chinelo. Eles faziam o pé de Dinah doer, e ela odiava como aspequenaspedrascortavamseusdedosecalcanhar.Elatinhaumpéamplo,eossapatospinicavamassolasdeseuspés.Dinah olhou novamente para Harris e Emily. Ele andou rapidamente

atrásdela,parecendoumpoucocomumamorsa.Eraumhomemfofinhoegeneroso,doceemuitointeligente.Elejáhaviasidoumacartaelegante,foioqueDinahouviuporaí,masagoraeleeraotutoreguardião,umpobrehomemcomcabelosbrancos eumadúziade roupas xadrez. Semdúvida,eleamavaDinahprofundamente–algoquefaltavaemoutrasáreasdesuavida.Um pequeno pássaro atravessou seu caminho e Dinah o chutou,

mandando-oaosgritospeloar.– Minha criança – vociferou Harris –, não deixe seu pai ver esse

comportamento,ouentãovocêvaiacabardormindonasTorresNegras.– Eu duvido! – Dinah disse sombriamente – eu queria que isso

acontecesse,aíeupoderiavercomoéládentro.HarrisolhouparaDinahdesapontado.

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–NuncadesejeestardentrodasTorresNegras–eledisse,seriamente–vocênãotemideiadomalqueláSEespreita.Ele começou a falar baixinho comEmily. Dinah se arrependeu de suas

palavras nomesmo instante. Seu pai havia ameaçado jogá-la nas TorresNegras muitas vezes, mas isso nunca aconteceu. Somente os piorescriminosos do País das Maravilhas iam para lá. E, depois que entraram,nunca mais saíram. Corriam rumores de que o Rei jogava nas TorresNegras aqueles que ele precisava silenciar – cartas, mercadores ecobradoresde impostos.AsTorresNegraseramcompostasdeseteconesnegrosconectadosporumapassagemtortuosaeestreita,conhecidacomoTeiadeFerro,quedavanaportadecadatorreecorriaverticalmente,paracimaeparabaixonoseuentorno.Elahaviaouvidoseupaichamá-laumavezde“maravilhaenormeeamaldiçoada”.Da janela de seu quarto, Dinah adorava observar as Cartas do clube

correndo para cima e para baixo nas espirais, como pequenas aranhasvestidas de cinza, segurando seus livros e instrumentos de tortura. APrincesanuncatevepermissãoparaentrarnasTorresNegras,éclaro,masela planejava fazer um tour por elas com o seu melhor amigo,Wardley.Mas,paraisso,elaprovavelmenteteriaqueesperarparasetornarrainha.Dinah,HarriseEmilychegaramaoGrandeSalão.Duasgrandesportasde

marfim assomavam-se assustadoramente diante dela, entalhadas demaneira elaborada com a história do País das Maravilhas. Árvoresamaldiçoadas, tribosYurkeiseconchasdomardançavamdiantedela.Elafechouosolhos.Talvez, ela pensou, talvez se eu desejar muito intensamente, eu poderia

estaremqualqueroutrolugarquenãoaqui.Dinah desejava estar do lado de fora, brincando de pega-pega com os

filhos dos servos, ou espiando pelo buraco do coelho no velho carvalho.Qualquer lugareramelhordoqueoGrandeSalão,sabendoqueseupaiaesperava depois dessas portas impenetráveis. Duas Cartas de Copas,homensbonitos, astutos e firmes, em seusuniformes vermelho-e-branco,abriramasportasparaeles,conformeelesseaproximavam.Dinahsentiusuasmãostremeremecongelou.Ah,não,oh,deuses,agora

não.Ela sentiu a mão de Harris em seu ombro e ficou grata pelo efeito

calmantequeela trazia.Ele abaixoueolhoupara aprincesadiretamenteemseurosto.– Dinah, minha criança, o Rei te chamou aqui por uma razão muito

especial. Tente ser graciosa, educada e amável. Ele é o seupai e governa

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este reino. Tente se lembrar disso. Tudo o que o Rei faz é pelo País dasMaravilhas.OcoraçãodeDinahestavabatendorapidamenteemseupeito.Tinhaalgo

errado,elapodiasentir.Porqueelaforatrazidaaqui?Essanãoerasóumareuniãodeconselhoentediante,naqualelatinhaqueseempoleiraremsuapequena cadeira e parecer interessada, enquanto os homens do País dasMaravilhas discutiam e vangloriavam-se de suas conquistas, ataques aosYurkeisepolítica?Harrislambeuseudedoenrugadoelimpoualgodeseurosto.– Dinah, minha criança, olhe para mim. Tudo vai ficar bem. Vou ficar

esperandoporvocêaquifora.Dinahfoitomadaporumpânicorepentino.Elasepressionounele.–Não.NÃO.Queroquevocêvenhacomigo.–AminhaentradanãoépermitidanoGrandeSalãoparaesse…nodiade

hoje.OReidesejatertodaasuaatenção.HarrisnuncahaviasidodeixadodeforadeumeventonoGrandeSalão.

Como seu guardião e tutor, ele sempre foi bem-vindo para observar oConselhodoRei.Masnãohoje.Algoestavaerrado.–NÃO!–DinaharremessouseusbraçosemvoltadeHarris–por favor,

venha,eunãoseioqueestáacontecendo,porfavor,venhacomigo.HarrissedesvencilhoudeDinah,queagarravasuacinturagorda:–Dinah,nãoseesqueçadequemvocêé,vocêéaPrincesadoPaísdas

Maravilhas,enãodeveagirassimnovamente.QuerenvergonharoRei?Dinahbalançouacabeça.–Não.– Então vá até lá e o cumprimente demaneira respeitosa – ele sorriu

generosamente para ela – vai ficar tudo bem, criança. Confie em mim.Agoradeixe-meversuacaradecoragem.Dinahfezumacareta.– Não, não é assim. Me mostre uma cara de CORAGEM, Dinah. Dinah, a

destemida, a futura Rainha do País das Maravilhas, a futura Rainha deCopas.Dinah respirou profundamente e endureceu seus olhos negros. Ela se

esticou,ficandomaisalta,emurchouabarriga.–Aí,estáumpoucomelhor.–Harrisacariciousuacabeçaalegremente,

masDinah tinha certezade quenotou lágrimas em seus olhos. – Está nahora.Estamosmuito,muitoatrasados.Estareiaquifora.Assim, ele a empurrou gentilmente para dentro do salão. As portas de

marfimfecharamatrásdela,eosomreverberouportodooenormesalão.

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Grandes bandeiras vermelhas ondulavam do chão até o teto, com umcoração negro costurado no centro de cada uma: o brasão do Rei. Oschinelos brancos de Dinah ecoaram no chão de mármore e ela sentiumilharesdeolhosaobservando,julgando.Elamanteveacabeçacoroadaomaisaltoquepôde.Todaacorteobservavaenquantoelacaminhavapelocorredor, lordes e damas de nascimento nobre, suas roupas brilhantesformavam uma mancha colorida no salão de mármore branco-e-preto.Dinah caminhou rapidamente até o trono,mas a frente do Grande Salãoaindapareciaestaraquilômetrosdedistância.AsdiferentesfacçõesdeCartasassentiamcomacabeçaenquantoDinah

passava,algunsdizendo“Princesa”emsuasrespirações.ElaouviuumleverisoeumsussurrodeumaCartadeOuros.“Umacartareenviada”.Elamantevesuacabeçaerguidaefirme,comoHarristinhaditoparaela

fazer.Umdia,esseseráomeuGrandeSalão,disseasimesma.TodasessasCartasirãosecurvardiantedemim,quandoeureinaraoladodemeupai,ecortareiascabeçasdequemrirouatédequemolharparamim.TodasasCartasestavampresenteshoje,umacoisarara.Existiamquatro

divisões dos homens chamados de Cartas, cada uma servindo a umpropósito no reino. Cartas de Copas, homens lindos e habilidosos,uniformizados de vermelho e branco, que protegiam a família real e opalácio. Cartas de Paus, vestidos de cinza, eram encarregados daadministração da justiça: eles puniam os criminosos e assassinos, eorganizavamoDiadaExecução. Sua funçãomais importante era gerir asTorres Negras. As Cartas de Ouros, vestindo capas roxas vibrantes,protegiame administravamo tesouro, e buscavamaumentar os recursosdo Rei. E, então, existiam os Espadas. Espadas eram os guerreiros,encarregadosdelutaresaquear.OsEspadasassustavamDinah;vestidosdepreto,eramhomensduroseobscuros,comumpassadoperigoso.Eleseramvistos como brutais, sanguinários e não eram dignos de confiança. Secriminososserecuperassemejurassemfidelidade,poderiamsejuntaraosEspadas;istoé,seelesnãomorressemnasTorresNegrasprimeiro.Os Espadas eram universalmente abominados e temidos no País das

Maravilhas.Seupai tinhamão firmecomeles,oprimeiroReia terpodersobreosEspadas,comseupunhodeferro.Elehaviaexecutadoseuslíderesmais fortes e subjugado sua selvageria. Os Espadas chiavam em silêncio,comoumabrasaquepoderiainflamareseespalharportodacidade.PorémtodasasCartaseram,nãoimportandooquãoassustadoras,fontedemuitashistóriaselendas.QuandoDinaheracriança,elaamavadeitaremsuacama,ànoite,elistar

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asCartasemsuaordemfavorita:Copasprimeiro, jáqueelesaprotegiam,entãoasdeOuros,depoisasdePause,finalmente,Espadas.–DINAH!–umavozaltarugiudotrono,eDinahsentiuumapequenagota

dexixiescorrerporsuapernaembaixodovestido.Elaestavaperdidaemseuspensamentos,paradanomeiodocorredor.Dinahcurvou-se–Venhaparacá.Agora.Andou rapidamente para o tablado, um alto conjunto de degraus de

pedras.No topo, ficavamduaspesadascadeiras.Elaseramesculpidasemouro no formato de um grande coração. Na parte superior do trono,pequenos corações ascendiam, quanto mais alto alcançavam, menores emaisafiadossetornavam.Omaisaltoinflavaeseabriaemumarajadadecoraçõesesculpidos,comoseestivessemlevantandovoo.ElesfaziamDinahselembrardepássaros.OpardetronosdecoraçãoerapartedahistóriadoPaís das Maravilhas: era sabido que, quando alguém senta no trono, amagiaécanalizadapeloscoraçõesabertosevocêsetornasábio.Observandoseupai,elasabiaqueissonãoeraverdade.Umdos tronosestavavazio,eumaúnica rosavermelhasempreestava

sobre ele. Davianna, sua mãe, morrera quando Dinah tinha dez anos. Osegundotronoeracomandadoporseupai.OReideCopasestavaparadoemsua frente,umhomemgigante, cheiode fúriae sensode justiça,umainsaciável luxúria por comida e mulheres. Enquanto seus olhos azuisfocavamraivosamentenorostodeDinah,elaoviadamesmamaneiraqueseupovo:eleeraotipodereiquepreferiaentrar logonabatalhaemseuHornhoov, do que governar atrás de sua mesa do conselho. Ele era umhomemde ação, brutal e corajoso, cuja fúria era lendária. As pessoas doPaís das Maravilhas respeitavam o Rei, mas somente porque elerepresentava uma força reconhecida… e temida. O que realmenteimportavaparaopovodoreinoeraqueeleomantinhasegurodosYurkeis,eissovaliatudo.Dinahnãoacreditavaqueelefosseumótimorei,masatéelasabiaosuficienteparanuncaproferiressaspalavras.EnquantoolhavaparaofeiçãoduradoRei,lembroudequandohaviaditoissoaHarris,eelehavialhedadoumchacoalhão.–NuncafaleissosobreoReideCopas!–elegritou–Vocêquertersua

cabeçacortada?–Não–elapediuhistericamente–Sóqueroqueelemedêatenção!NaquelediaHarrisaabraçouapertado,afagandoseucabelo,esussurrou:– Ele nunca será o pai que você merece – Sussurrou. Trouxe a torta

favoritadeDinaheelesassistiramaopôrdosoldocampoverde,umraroprazer.

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–SeelenãofosseoRei–Dinahfungou–talvezelemeamasse.–Ah,criança–Harrisrespondeu–,nãoéassimnão,seupaiéumhomem

bruto e inseguro sobre o lugar que ocupa na vida de sua filha, mesmoquandosuamãeaindaeraviva.ARainhaDaviannaeratudooqueeletinha,aúnicacoisaqueeledesejoumaisdoqueaadrenalinadeumabatalhaeocheiro de sangue fresco em sua espada de Copas. Eles tiveram um fimterríveleeutemoque,dealgumamaneira,eleculpevocêporisso.Dinah pensou sobre isso, agora no Grande Salão, enquanto ajoelhava,

semjeito,diantedotrono.OconselheirodoReieochefedoconselho,umaCartadeOuroschamadaCheshire,curvou-seesussurroupalavrassuavesem seu ouvido, sorrindo felinamente. Um frio na barriga pulsou noestômago de Dinah quando o viu. Ela não confiava em Cheshire. O Reirosnou para ele e, então, endireitou-se, suspirou e levantou-se paracumprimentá-la.–Dinah,minha filha,minhaprimogênita.Vejoquevocêestáusandoos

sapatos de sua mãe. – Dinah sentiu um rubor tomar conta de suasbochechas.Elepercebeu!Elapensou.Oreiarranhouagarganta–Olheparacima.Elalevantouacabeçarápidodemais,eacoroaescapouparaoladoecaiu

comumtinidonomármore.Elaviuumolharseveropercorrerseurosto.–Nãosejatãoansiosa–chiou–Vocêpareceridículacomessaexpressão

depidona.Ela sentiu seu lábio inferior tremer. Mordeu-o, fazendo fluir o doce

sanguevermelhoqueelachupouparasuaboca.Eleajoelhou-seepegouacoroa, tão pequena em suasmãos tão grandes. Ele a colocou de volta nacabeçadelacomumsorrisocontido.Acorteriueducadamente,semsedarcontadesuaraivaefervescente.OReipermaneceuparado,suagrandecapavermelhaenquadrandosuafiguracorpulenta,comoumtouro.–Minha filha, conselheiros, lordesedamasdacorte,Cartasecidadãos,

estánahoradeseuReicontarumaverdade importante.–eleolhouparaDinah–Sente-se–disseparaela,esomenteela.Dinahtentousentar-secomoumadama,masacaboucaindonochãocom

umestrondo,quasesemrespirar.Olhoufixoparaele,intimidadadiantedeseutomdevozpoderoso.Olhouaoredor.Nãohaviaumrostosequerquenãoestivessehipnotizadoporsuavozexplosiva.– Há treze anos, nós vivíamos uma guerra devastadora com a tribo

Yurkei. Mundoo e seus guerreiros estavam invadindo as vilas daspropriedades do País das Maravilhas, matando e assassinando pessoasinocentes.ComoRei,eunãopoderiadeixaressemalimperar.Comovocês

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devem lembrar, reuni os melhores Copas e Espadas pela FlorestaRetorcida, e subimos as colinas, onde acabamos com a tribo bárbara emandamosMundoosuplicandodevoltaparaasmontanhasdeondeveio.Foi um grande dia para o País das Maravilhas, um grande dia para asegurançademeupovo!A multidão aplaudiu e assoviou, até que o Rei olhou para baixo,

solenemente,eumsilênciorepentinoseespalhou.Eleconseguiacomandaro salão apenas pelo seu estado de espírito, Dinah observou, algo paralembrarquandosetornasseRainha.–Nós perdemosmuitas Cartas corajosas naquele dia. Eu espero que o

queeuvouconfessarhojetragaalgumahonraaelas.Uma sensação de desconforto estava agitando o estômago de Dinah

enquanto ela sentava no chão do trono. Seu coração estava apertado,batendo tão forte que fez um barulho ao encontrar seu peito. O Rei nãonotou.Elecontinuou:–Aguerraésanguináriaebrutal,algoquepoderasgarocoraçãodeum

homem.Aguerrapodefazerumhomemquestionartudooqueeleacredita,toda verdade a que ele se apega. O País das Maravilhas nunca viu umaguerra, então, permitam-me confessar que a guerra pode tornar umhomem…solitário.Amultidãoassentiucomempatiae,emumcanto,umamulherexplodiu

emlágrimas.Dinahpensouemchacoalhá-laatéqueficasseemsilêncio.ORei os tinha em suas mãos. Seus olhos azul-escuros, profundos como ooceano,brilhavamcomorgulho.– Conforme nossa lei decreta, uma pessoa pode pedir perdão por um

erro cometido durante o período de guerra. Eu estive longe de minhaqueridaesposaDaviannadurantemuito tempo.Osdeusesdescansamemseucoração.Todasaspessoas,incluindoDinah,fizeramumsinaldecoraçãoemseus

peitos.–Ela era o amordaminha vida e, quando eu saí para a guerra, nunca

imaginei que demoraria tanto tempo para voltar. E, para minha eternavergonha…– amultidãoesperava como fôlego contido, enquanto todooGrande Salão estava paralisado – Deuses me perdoem, eu desviei ocaminhodosmeusvotosdecasamento.Houveumainspiraçãoagudaemtodoosalão.Dinahtambémengasgou.– Já era tarde da noite, depois de uma batalha, e eu tinha bebido uma

garrafadevinho.Doladodeforadaminhabarraca,conheciumamulherdeuma vila local, na base das montanhas. Ela era boa e generosa e me

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lembrava tanto Davianna. Meu julgamento estava comprometido e euestavatomadoporlutopelosmeushomensperdidos.Nóspassamosaquelanoite juntos e, já de manhã, eu acordei repentinamente, cego dearrependimento.ComoeupoderiatrairminhaamadaDavianna?Quetipodereieuera?–houveentãoumapausa.–Aquelanoiteeuencontreiumprecipícioeestavaprontoparamejogar

dele.HouvemaisumainspiraçãoagudaemurmúriosirromperamnoGrande

Salão. Duas mulheres desmaiaram e tiveram que ser carregadas pelasCartasdeCopas.OReisorriuastutamenteparaseuconselheiroCheshire,quetinhaumacaparoxaemseusombrosmagros.Cheshiredeuumarápidapiscadelaparaele.SomenteDinahestavapertoosuficienteparaperceberessatroca.–Enquantoestiveparadonapontadoprecipício,observandoasestrelas

setransformandopelaúltimavez,eujuroqueouviumamulhercantandoatravésdabrisa.Algomeencantouemumsonoprofundoesemsonhos.Namanhãseguinte,quandolevantei,eraumhomemdiferente.Meudesejodeviverhaviaretornado.Eunãoconseguiaafastarosentimentodequehaviaconhecidoessamulhercomumedeorigempobreporummotivo.Euvolteiimediatamente para a vila para encontrá-la, mas ela havia desaparecido.Procurei em todosos lugares e teria continuadoaprocurar seMundooeum pequeno exército de cavaleiros não tivessem saqueado nossoacampamentonaquelamesma tarde.Erao caos. Flechas estavamvoandoparatodososlados,masadonzelanãoeraavistadaemlugarnenhum.Nóslutamosevencemos,apesardetermosperdidomuitasCartas.Trezelongosanos se passaram, e não existe um único dia que eu passe sem pensarnaquelamulhereimaginaroquehaveriaacontecidocomela.OReidesceuosdegraus,passandoporDinahsemsequerolhá-la.–Meus fiéis súditos, vou contar-lhes a verdade: há duas semanas, um

pedinte louco e delirante veio até o palácio. Ele veio para vender algoinestimáveleserecusouairemboraantesqueeuconversassecomele.Eratarde,eeuestava furiosopor tersidoacordadotão tarde.Euoencontreinesse mesmo salão, que estava vazio e silencioso como um túmulo.Imagine, se assim desejarem, um rei em seu pijama real se encontrandocomumpedinte carregandoumgrande saco.Ordenei que abrisse o sacoimediatamenteouumaCartadeCopasficariafelizemlhecortaracabeça.Verdadeiramenteaterrorizadoeleabriuosaco…esaiudeláumapequenagarota.Todos engasgaram, inclusive Dinah. Sentia como se seu coração fosse

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explodirdentrodeseupeito.– Ela estava faminta, uma pobre e doce criatura, mas quando ela se

levantouemeolhounosolhos, euvi grandiosidade.Euvi…– elepausounovamente para um efeito dramático – minha filha perdida, a novaDuquesaVittiore.

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Dois

OGrandeSalãoentrouemerupçãocomumacacofoniadesons,apesardeDinahpermanecersentadaatordoadaesemvoz.OssúditosdoReiestavamgritando,suaslágrimaseaplausossedissolvendoemumaondaderuídosfelizes.OReipermaneceuparadoenquantoamultidãobalançavaeoscilavadiantedele.Depoisdealgunsmomentos,elelimpouagarganta:–Não poderia haver nenhumadúvida de que essa garota éminha. Ela

temmeuscabelosdeouro,meusolhosazuiseocomportamentogentildesuamãe,que,infelizmente,encontrouamortenasmãosdastribosYurkeis.DesdequeVittiorechegouaopalácio,eunãofiznadaalémdeobservá-laeestudá-la, para verificar se ela é realmente minha. E, posso dizer, emconfidência, que ela é minha filha perdida. Hoje eu declaro issoabertamente e nenhum homem pode dizer o contrário, pois estariachamandooReidementiroso.OReideCopasdemorouseuolharemDinah,ajoelhadadiantedele,seu

corpoestavapetrificadocomochoque.– A Duquesa Vittiore foi questionada, inspecionada e interrogada.

Emboraeusentisseemmeucoração,eunãomeatreveriaaacreditarqueisso era verdade; até que eu falei comela e vi omeupróprio reflexo emseus olhos. Não há erros: essa é minha segunda filha, que se juntará aPrincesaDinah,comoaDuquesadoPaísdasMaravilhas.EulhesapresentoVittiore.Umapequenagarotaluminosasaiudetrásdotrono.Elaerajovem,mas

já radiante como o sol. Cachos dourados da cor demel desciam até suacintura, seus olhos azuis brilhantes radiavam cheios de alegria ecuriosidade, seu rosto era perfeitamente imaculado, um retrato dainocência.Notopodeseuninhodecachos,descansavaumapequenacoroadepassarinhosdesafiras,semdúvidafeitarecentementepelojoalheirodopalácio.Seuvestidoazulebranco,longo,arrastavapelochão,comoseelafosseumadonzelanodiadoseucasamento.

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– Querida – o Rei disse gentilmente. Ele abaixou e a pegou no colo,segurando-a sobre seu peito para que toda a multidão pudesse vê-la. Opovoengasgoucomtantabeleza,eumaCartadeCopascaiudejoelhoscomaemoção.OReiacolocousentadaaoladodeDinah,queaolhavacomumódioóbvio.Umafúriadeciúmesnasceunela,negraeestranha.Suasmãostremiamenquantoelaagarravafirmementeabordadaescada.Odiscursoexplosivodeseupaicontinuou.–Muitos de vocês devem ter se perguntado o que estão fazendo aqui

hoje. Não há guerras e nenhum assunto importante em nossas mãos. ÉporqueeuqueriaqueoMEUreinosoubessequeoPaísdasMaravilhastemumNOVAduquesa,equecomecemasfestividades!Osalão irrompeuemumaalegriaensurdecedoraeochãoabaixodeles

estremeceu com o pisar dos pés. O som aumentou em uma onda,quebrandoemDinaheaafogando.Ela tentou ficarempé,masseucorpocambaleoupara frentedemaneira tãoviolenta,queacabouescorregandodoisdegrausnaescadademármore;seusjoelhosepeitobateramnadurapedracomumestrondo.Seurostoinflamouemvermelhoenquantotodooreinoaobservava–aprincesasombriaedesajeitada–queagorapareciaum burro corpulento ao lado de Vittiore, uma égua brilhante. O Rei deuumarisadinha,mashaviamalíciaemseusolhos,enquantoagarravaDinahpelosbraços,puxando-aparaficarempé.– E, claro, ela se juntará aos meus dois outros filhos: Princesa Dinah,

minha primogênita e futura Rainha de Copas, e Charles, seu irmãomaisnovo,oorgulhodomeucoração.Mentiras, pensou Dinah, desejando que as lágrimas quentes que

preenchiam seus olhos permanecessem imóveis. Ele está contandomentiras.– Éminha prece e ordem que esse reino acolhaminha filha como sua

nova Duquesa do País das Maravilhas. Se eu ouvir algo próximo dosussurrodapalavra“bastarda”,ohomemoumulheriráperdersuacabeçanaminhaespadadeCopas.Com uma respiração ofegante, Dinah tirou os braços do aperto de seu

pai. Ela podia sentir os olhos damultidão voltados para ela, centenas deolhos famintos observando cadamovimento. Com seus olhosnegros, quefervilhavamcomocarvão,encaravaVittiore.ApequenagarotacomcabelosloirosdeuumpequenoetímidopassoemdireçãoàDinah,queaobservoucuidadosamente,semsaberoquefazer.Elasentiuvontadedegritaroudeatirar alguma coisa nela, mas não ousou fazê-lo. O Rei provavelmentebaterianelaseelaofizesse.Agarotinhaestendeusuapequenamão.

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–Minhairmã–suspirou,comumapitadadesúplica.Amultidãosegurouarespiração.DinahencontrouosolhosazuisdagarotacomumaexpressãofuriosaelevantouacabeçaparaoReideCopas.–Muitoobrigada,pai.Euarecebocommuitaalegriananossa…família.–

ela engasgou nessa última palavra. Agarrou a mão quente da garota emsuasmãos geladas e apertou fortemente. O salão irrompeu emmúsica ealegria,enquantoamultidãosecurvavadiantedasduasgarotaseseupai.OReipercebeuqueomomentoqueeleestavaesperandohaviachegado:– Convido a todos para se juntarem a nós para um banquete de

celebraçãonoSalãodeJantar–eleanunciou.Amultidão começou a sedispersar rapidamente, famintospelas pilhas

detortaecarneassadaque,semdúvida,osesperava.Dinahdeuumpassoparatrásnadireçãodaescada,felizemestarlivreecommedodequeseupaiavissechorando.–Vocênão–grunhiuoRei,puxando-aparatrás,suamãoapertandoseus

braços.Dinah soltou umgemido –O que foi isso? Por que você não estáfelizemconhecersuanovairmã?Dinah girou para encará-lo, as lágrimas que ela estava segurando

escorreramporseunarizebochecha.–Eaminhamãe?Eupensei…eupensei……–elasussurrou.OrostodoReiseiluminouemfúriae,murmurandoraivosamente,elea

arrastoupara longedoolhardaspessoas, atrásdo trono, tãograndequeocultavaosdois.Eleapertouseurostonasmãoseaseguroumaisperto,ocheirodevinhoespalhando-sepor seu rostoapartirdohálitoquentedeseupai.– Eu nuncamais quero que vocêmencione suamãe, não na frente de

Vittiore.OnomedeDiviannanãoserámaisproferidonessessalões.Dinahdeuumgritoagudo.OrostodoReificavacadavezmaisvermelho–PARECOMISSO!PAREDECHORAR!Vocêprecisaestarfelizhoje,suamiserável

ingrata!Vocêtemumairmã.Sejafeliz.Agora ele a balançava violentamente, e ela sentiu seus joelhos

começarem a fraquejar. De repente, umamão longa e magra pousou noombrodoRei.–VossaMajestade,permitaqueeucuidedela.PrincesaDinahcertamente

teve um dia com muitas emoções. Tenho certeza de que foi um grandechoqueparaela.Cheshire, o conselheiro do Rei, deslizou para seu campo de visão. Seu

rostoeralongoeflexível,comoseelenãotivessenenhumossoembaixodapele. Ele tinha um cabelo preto e grosso, olhos negros e lábios pálidos,

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quase da mesma cor de sua pele; mas você nunca os via, pois estavamsempre pequeninos em um sorriso, sustentando seus enormes dentesbrancos. Mesmo quando Cheshire estava amigável e sorrindo, pareciaperigoso.Magroevigoroso,eleseelevousobreorei,radiandomalícia.Hojeeleestavavestidocomosempre,comumcoletedeveludocordeameixaeculotesacimadasbotasdecaça.Umafaixabrancacomosímbolodecadacartacaíadeseuombroesquerdoatéochão,demonstrandosuaautoridadesobretodasasoutrasCartas.NãohavianinguémacimadeCheshire,alémdoRei.DinahergueuosolhosparaCheshire,confusa.Elenuncaforaseualiado;

muito pelo contrário, ele era um homem que estava constantementesussurrando segredos tortuosos no ouvido de seu pai. Rumores de suasatividadesextracurriculares imperavamnocastelo.Algunsdiziamqueelepassava um bom tempo em um laboratório secreto nas Torres Negrascriando novas espécies de pássaros e confeccionando veneno. Algunsdiziamque elepodiamudarde formaeque andavapelo castelodurantetodaanoitedisfarçadodegatodeestimação.Dinahsempretinhadeixadoissopassarcomobobagemdeplebeus,masagora jánãoestava tãocerta.Havia nele uma estranheza atraente, algo que a chamava em suaspromessassedosas.Elaaindaoodiava,semprehaviaodiado.Elaoculpavapeloódiodeseupaiporela.A voz de Cheshire era gentil enquanto ele soltava os dedos do Rei do

ombrodeDinah:–Voulevá-ladevoltaparaseusaposentos.TalvezaPrincesaDinahnão

estejasesentindomuitofestivahoje.ORei se afastoudela semolhá-la novamente e colocou seus braços de

maneiraprotetora emvoltadeVittiore. Ela olhounovamenteparaDinahcomolhostristesevazios.–Sim,Cheshire.Issopareceumaboaideia.Leve-a.Tire-adoalcancedo

meuolhar.OReideCopasemergiudetrásdotronoecomeçouaapresentarVittiore

paraoslordesedamasagrupadosnabasedaescada.Dinahsentiu-sevazia,umatigelaraspada,eelapermitiuqueoduvidosoconselheirodeseupaiaguiasseparaumaportasecretageralmenteusadaparaumasaídaprivativadoRei.Elesandarammetadedocaminho,quandoCheshireparou.Virando-separaelacomumsorrisoperigoso,elepuxouumaelaboradatapeçariadaparede, perto da latrina. Poeira caiu sobre os dois,mas assim que ela sedissipou, revelou uma porta com a mesma cor da pedra ao seu redor.Cheshiresegurouumdedoentreoslábiose,comamãoesticada,empurrou

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a porta que, ao abrir, revelou uma passagem esculpida nas paredes docastelo.Dinah estava entorpecida demais para se impressionar, embora

normalmente ela estaria fascinada. Havia muitas passagens secretas nopaláciodoPaísdasMaravilhas,eelaadoravadescobri-las,umadecadavez.Amaioria de seus dias eram cheios de aulas entorpecentes de Críquete,etiqueta, história e dança, mas, de vez em quando, ela podia escapar doolharobservadordeHarriseexploraropaláciocomWardley.Comumacareta,elaconcedeuaCheshireumsussurroenquantolimpava

umalágrimadeseusolhos:–Paraondeissovai?–elaperguntou.Elenãorespondeu.–Paraondeissovai?–perguntounovamente,irritada.Elesimplesmenteacenouacabeçanadireçãodotúnel.Dinahpassoupor

debaixo da porta, seu coração batendo rapidamente, com medo ecuriosidade ao mesmo tempo. Após algumas rápidas voltas descendoescadas sujasde lama, eles chegaramemumapassagemdepedraúmidailuminada por lanternas cor-de-rosa. As voltas pareciam intermináveis.Cheshirefalavabaixinhoenquantoelesandavam,aaltacadênciadesuavozecoavanasparedes.–Tenhocertezadequeodiadehojefoidifícilparavocê,Alteza.Vocênão

sóganhouumairmãmaisnovaemaisbonitanoseudécimoquintoanodevida,mas ouviu umahistóriamuito clara sobre a infidelidade de seu paiparacomsuaqueridamãe,queDeusatenha.Umagarotainteligentecomovocênãopodesesurpreender.Osdesejosdeseupaiporoutrasmulheressãobemconhecidos.–Cheshireparou,acariciandoseuqueixocomprido–ElenãomereciaDivianna.–Nãofalenaminhamãe,vocênãoaconhecia.Eelanãoéminhairmã!–

Dinahretrucou–Elaéumacriançabastarda!Os dedos magros de Cheshire envolveram seu cotovelo, e ela se

encontrou sendo puxada para trás, cara a cara com ele, seus narizes acentímetros de se tocar. Os lábios dele se curvaram de raiva, revelandoseusdentesbrancosfamintos.–Me escute, Dinah – chiou –, você NUNCA pode deixar o Rei de Copas

ouvi-ladizendoisso.Ascoisasvãomudarparavocê,criança,eémelhorquesejamaisfortedoqueessapirralhachoronaqueéagora.Dinahpuxouseucorpoparalongedodele.– Eu não sei do que você está falando – respondeu, com uma voz

vacilante–eeunãomeimporto.EssagarotaNÃOéminhairmãevocênãoé

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oHarris.Vocênãosabenadasobremim.Ondeeleestá?OndeestáoHarris?–Harrisnãoestáaquieelenãovaiservirpramuitacoisapravocêalém

da tutoriaedeescolherseusvestidosdemanhã.Elenãosabesobreessapassagem,ninguémsabe,sóvocêeeu.Vaichegarummomentoemqueelaserá útil para você, tenho certeza. Há muitas curiosidades no País dasMaravilhas e nas Torres Negras. Mais do que você pode imaginar – elelevantouumasobrancelha–Vocêdeveaprendertudoqueaindanãosabe,Princesa. Até agora você foi uma menina mimada, que passa os diasbrincandonosestábulose sonhandocomaventuras comWardley.OPaísdas Maravilhas é um lugar muito mais sombrio e tortuoso do que vocêimagina.AlgosepartiudentrodeDinah.Elanãoconseguiriamaisaguentarseus

avisos enigmáticos ridículos ou seu sorriso venenoso. Passou por suacabeça que ele provavelmente estava ali em uma missão do Rei, paraassustá-laefazercomqueelaaceitasseVittiore.–Porquevocêestáfalandocomigo?–elarebateu–EUTEODEIO!Nãome

toque!Correndo para longe de Cheshire, ela lançou-se no túnel escuro à sua

frente,semverparaondeestava indo,seuspassosecoandonaescuridão.Elavirouumavez,emaisuma.Indocadavezmaisfundonasprofundezasdo túnel, atéque tudooqueelapodia sentir erao cheirode terra e frio.Cheshire desapareceu no túnel atrás dela, seu chamado por ela sumindosilenciosamente na escuridão. Ela correu debaixo das profundezas dopalácio,tãorápidoquantoasjoiasdeseuspéspoderiamlevá-la.Elavirouàdireita, depois à esquerda e, então, escorregou através de uma fendaverticalnaparede.Chamasdançantescor-de-rosadaslanternasdiminuíamgradualmente,enquantootúnelficavamaisprofundo.Dinahnãoestavapensando–apenascorrendo,omaisrápidoquepodia.

ElacontinuavavendooolharorgulhosodeseupaieaexpressãodevastadadeHarrisenquantoadeixavaentrarnoGrandeSalão.Otúnel ficavamaisestreitoeDinahpodiaver,atravésdesuaslágrimas,asparedesdepedrasefechandonela. Perto da histeria,Dinah ajoelhouno chão frio e deixou aslágrimas saírem, um soluço derramado que era ensurdecedor naqueleespaçopequenino.Chorandoebatendonapedra,elasoltouumgritoaltoderaiva.Como ele ousa? Como ele ousou ser infiel à minhamãe? Como ele ousa

trazê-laparafrentedaspessoasdacorteapenasparahumilharminhamãe?PorqueeleaODEIAtanto?Emsuamente,elaviaVittiore.Vittiore,suanovairmã,abastardadeseu

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pai,aprovadequeelenãoamavasuamãecomoelealegavapublicamente.Vittiore, com seu longo cabelo loiro e seus olhos azuis, como a florescovinha.Dinah remexeu a terra suja. Ela prometeu para simesma quenuncaseriaamigadeVittiore.NUNCA.Elanãoconversariacomelaanãoserque fosse forçada, e ela não veria seu rosto perfeito se pudesse evitar.Nunca aconteceria. Falar com Vittiore seria uma traição à sua mãe. Suamãe…Grandes soluços escaparamde seus lábios, e ela estava gratapor, uma

vez,pelomenos,nãoterservosporperto.Aquieramapenaselaea terra.Ela se acalmou gradualmente, a escuridão era comoum cobertor pesadoemseusombroslargos.Dinahlimpouseusolhoseolhouaoredor.Tudoerasilêncio.Eladecidiuirmaisadiante.Otúnelficavacadavezmaisfrio,oarsoprandoaoseuredoreraumamordidaamarga.Raízespretasegrossas,torcendo-se como cobras, cresceram acima dela. Elas a lembravam dosossosdasbruxase,maisdeumavez,elajurouquepodiavê-lassemexendoe indo em suadireçãoquandoela olhavaparaooutro lado.Esse eraumlugardecoisassombrias.Dinah parou um minuto para recuperar o fôlego. Uma única lanterna

iluminouumapassagememsuafrente,achamabrilhandonaescuridão.Elaandouatravésdaaberturaeemalgunspassoschegouemumlugarcheiodesujeira,enquadradoportrêsarcos.Cadaumlevavaaumtúnele,depé,nocentrodocírculo,Dinahnãoconseguia lembrardequal tinhaacabadodevir.Elespareciamtodosiguais,cadaumiluminadoporumaúnicatocharosa. Haviam símbolos gravados nas abóbodas de cada um: um coração,umaárvoreeumqueelanãoconhecia–umtriângulocomabaseondulada.Ooceano?Elaespiounovamente.Poderiaserumamontanha,elapensou.AsMontanhasYurkeis.Dinahcorreuosdedospor cimados símbolos.Elesestavam levemente

esculpidos na pedra, quase invisíveis a olho nu. Seu coração acelerou nopeito,eopensamentodeseupaidescobrindoseucorpoemdecomposiçãoquandoelanãoconseguisseencontrarocaminhodevoltaaencheudeumaalegriasurpreendente.Elafranziuassobrancelhaseencarouosdesenhos.Apósummomento,elasecurvoueentrounotúnelcomocoração.Sim, ela podia ver suas pegadas na terra. Deixou um suspiro de alívio

escapar.Eraporaliqueelatinhavindo.Issofaziasentido,enfim;elaeraaPrincesa de Copas. Dinah se aventurou no caminho com o símbolo daárvore.Eleeraaindamaistortuosodoqueoqueelatinhavindo,eotúnelcontinuavaadiminuir,atéqueDinahprecisouabaixarparacabernele,suacabeça roçando o teto sujo. Ele ficou ainda menor, e ela percebeu que

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estava rastejando. O túnel continuava em uma curva que parecia eterna.Ummusgobrancocomeçouaseespalharpelasparedes,etodosossonsdavidanopaláciopararam.EntãoDinahsentiuqueelanãopoderiaserastejarmais adiante; abriu-se uma grossa parede de pedra, fixa por trincos tãogrossoscomoseusbraços.Umbecosemsaída.Dinah parou e se envolveu nos próprios braços, atentando para os

tremores de seus ombros. Há quanto tempo ela estava nesses túneis? Otempohaviasetornado,dealgumamaneira,irrelevante.Dias?Horas?Umarfriosopravaaoseuredor,girandodecimaparabaixoemovimentandoaterradebaixodeseuspés.Elalevantouasmãossobreacabeçaesentiuoarfrescobeijarapontadeseusdedos.OsolhosdeDinahseguiramostrincosparacima,atéquedescansaramemumcírculoesboçadolevementesobresuacabeça,apoeiraofaziapoucovisível.Umaporta.Seusolhossearregalaram.Nãoeramtrincos,eraumaescada!

Dinahsubiuseistrincosantesqueseuspésseprendessemnovestidoeelacaísseviolentamentenochãodotúnel,arranhandoseusjoelhoseapalmadasmãos.Na próxima tentativa, ela deixou seu vestido para trás. Grunhindo e

suando com o esforço, e vestindo apenas as roupas de baixo, Dinah sepuxouparaotrincosuperioreempurrouaporta.Umapoeiracaiuemcimadela quando a porta rangeu. Usando toda sua força, Dinah inclinou suacabeça e empurrou com seus ombros, rezando para que seus pés nãoescorregarem dos trincos. Uma vez que ela fez isso, a porta se abriufacilmente,lamaegramachovendoemcimadelaedeseuscílios.Comesforçoextenuante,Dinahlevantou-separafora,atravésdoburaco.

Elaespirroualgumasvezes,eolhouemvoltamaravilhada,deitando-senochãoesentindoocontatocomsuascostelas.Acimadela,asestrelasdoPaísdas Maravilhas brilhavam, e se você olhasse de perto, elas se moviamligeiramente. As constelações do País das Maravilhas nunca eramconstantes, eDinahadoravaobservarasmudançasdospadrões,denoiteparanoite–círculos,espirais,linhas,conchas–asestrelasnuncaformavamamesmacoisaduasvezes.Eaquiestavamelas,suasestrelas,tãobrilhantesque sua luz iluminava todo o País dasMaravilhas. Ela estava do lado defora.Nuncatinhaficadotãofelizemsentirabrisafriaemsuapele.Agorapercebiaquetevemedodostúneis.Suaraivaatornoucega.Oarfrescodanoiteacariciouseucorpo,queestavacobertoapenasporsuasfinasroupasdebaixo.Abrisadanoiteenxugouaslágrimaselimpousuamente.Assimquesuarespiraçãovoltouaonormal,elaselevantoueabsorveuo

seu entorno. Ela estava do lado de fora dos portões do palácio, talvez a

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quase um quilometro do círculo das majestosas muralhas de ferroornamentadasquecercavamsuacasa.Asinfamesmuralhaseramfeitasdemilharesdecoraçõesdeferro, juntosemumadançadebelezaedefesa,equeadvertiamosintrusosparaqueficassemlonge.Elaestavaolhandoparao lesteagorae, seapertasseosolhos,poderiaverocontornodaFlorestaRetorcida,muitosemuitosquilômetrosdedistânciadoPaláciodoPaísdasMaravilhas.Ela olhou para os dedos dos pés e mexeu-os nas flores silvestres que

floresciamemtornodeles.Emalgumlugarpróximo,dentrodosportões,agrandeárvoreJullarangiaaoventoedepoisumgemidoagudopercorreuoar,vivoeintenso,tudodeumavez.Pareciaestarrindodela.Dinahestavadiantedocasteloefezumesforçoparanãotemeroqueestavainvisívelnoscamposabertosatrásdela.Elacomeçouacaminharlentamenteparalongedotúnel.NuncahaviasaídodosportõesdocastelodoPaísdasMaravilhase,agora,

ela o contemplava. Erguia-se dos campos de flores vermelhas, como umfaroldeesperançacega.Seuspináculosdouradostorciameperfuravamocéu; as torres e jardins de rosas suspensos adicionavam beleza às suasinúmeras paredes; as pontes brancas conectavam uma torre à próxima.Dinahsabiaque,abaixodastorres,estendendo-separaforadosAposentosReais, estava o Gramado de Críquete, uma imensidão de relva verde,perfeitaparapiqueniques,Críquete,ouequitaçãocomavestruz.ParaleloaoGramado de Críquete, do outro lado do castelo, estava o Jardim Xadrez.EsseeraolugarondeosEspadaseCopassealinhavamparaaformaçãoe,quando os traidores eram executados, o sangue era derramando em umblocodemármorelongoebranco.De onde estava, ela mal conseguia ver, exceto os portões e as alturas

imponentesdosAposentosReais.Espiouavarandadeseuquartoeacenou,pensandoporummomentoque talvezHarris pudesse vê-la.Mas elenãopodia.Ninguémsabiaondeelaestava,eelacertamentenãopoderiadizer-lhes sobre seu túnel secreto para o lado de fora. Talvez, pensou, talvezCheshirenãosoubessesobreotúneldeárvoresquelevavaparaoexterior.Erasódela.Nãohaviaoutraspegadasdentrodesse túnelepoeiranãoseformaduranteanoite.Devehaverumoutro túnel lá embaixo, pensouela,quelevaaosAposentosReais.EraparaláqueCheshireaestavalevando.Com um sorriso, Dinah demorou na visão do palácio um último

momento. Seu castelo era uma beleza, uma fortaleza feroz e formidável,lindo e perigoso aomesmo tempo.Umdia, Dinah pensou, isso tudo seriadela.

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EuvouseraRainhadoPaísdasMaravilhas.EuvouseraRainhaeVittioresóseráaDuquesa.Essepensamentoerasuficiente.Seus joelhos sacudiram quando ela olhou para o castelo, e Dinah

percebeuqueestavaexausta.Seusaposentospareciammuitoatraentes,eogemidoquesubiudaFlorestaRetorcidacausouarrepiosnaespinha.Dinahdeualgunspassosparatrásparaentrarnotúnel,sóque,dessavez,elanãoconseguia encontrar a abertura. Sabia que tinha sido perto de algumasplantasherbáceasedeumgrossoarbustoretorcido,maselesefora.Dinahficoumaisemaisirritadaconformecaminhavapelaárea,brigando

comaterraeasfloressilvestresaolado,atéquepensouemprocurarcomosdedosporbaixodagrama, iluminadaapenaspela luzdasestrelas.Porfim, seus dedos encontraram um sulco anormal na grama, e ela deu umpuxão.Nadaaconteceu.Usando todaa forçaque tinhadentrodela,Dinahlevantou-secomesforço.Aportanãosemexeu.Umtraçodemedobrilhouno cérebro de Dinah. Alguma coisa estava errada. Ela puxou novamente.Suasunhasracharamequebraram,aportaestremeceuebateudevoltanolugar.Elenãosemoveu.Estavatrancada.Dinaholhouparaaporta.Oventoparouapenasporummomento,masfoiosuficiente.Elaouviuumsuspirofracoseguidoporumarespiraçãoirregular.Aluzdeumatochaqueimadaescapouentreaporta.Alguémestavaláembaixo.Alguémahaviatrancadopara fora. Sua respiração ficou presa em seus pulmões. Alguém estavaesperando por ela. A Floresta Retorcida deu outro gemido alto, o somecoandoporcentenasdequilômetros.Dinahseafastoudaportadevagarecorreuomaisrápidoquepôdeemdireçãoaosportõesdopalácio.

Doisanossepassaramdesdeaquelanoite sombria,eRintomeThatch,CartasdeCopasdoserviçodoReicontariam,quandobêbadosdevinho,ahistóriadaquelanoite.AnoiteemqueDinah,aFuturaRainhadeCopas,foiencontradadoladodeforadocasteloapenascomasroupasdebaixo.Elanãolembravadecomotinhaidopararlá,nãohouvenenhumarespostadecomoescaparaatravésdasgradesdocastelosemservista.Elaestavaemestado de choque, tremendo e profundamente amedrontada. Era a noite,eles lembravam, em que o Rei tinha apresentado a doce Vittiore, e elesrefletiam se era uma coincidência ter sido namesma noite que Dinah, aPrincesadoPaísdasMaravilhas,provouserumpoucoestranha–comooseuirmão,oChapeleiroMaluco.

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Tres

OinvernonoPaísdasMaravilhaseraaépoca favoritadeDinah,excetopela jornada anual de seu pai às Montanhas do Oeste. Flocos de neverosados caíam do céu cinza e melancólico, enquanto Dinah, em silêncio,atravessavaopátiocobertopelaneve.Suasbotas feitasdepeledeixavamenormes pegadas no chão, enquanto o vento soprava pequenosredemoinhosdeneverosadaaoredordeseustornozelos.Dinahsoltouumsoprodeargeladoeoviucongelarecairnochão,produzindoumtilintarsuave.Umagarotadedezesseteanosnãodeveriasedivertircomcoisastãosimples, disse a si mesma, mas em seguida repetiu a brincadeira comalegria.DuasCartasdeCopascurvaram-sediantedeDinah,maselapercebeuos

sorrisoszombateirosestampadosemseus rostos.Elanãose importava–nãohoje.Suacapadelãpretaestalavacomoventoconformebalançavaemsuas costas. O odor dos cavalos invadia suas narinas e ela começava acantarolaralegremente.Osestábulos circularesdoPaísdasMaravilhas ficavamentreosmuros

deferroeopalácio,naregiãosudoeste,eabrigavamtodootipodecorcéisimagináveis.Mesmoosestábulossendoimpecavelmentelimpos,davaparasentirocheirodeestercoeaparasdemadeiraquandochegavamaisperto.Partindodeumeixocentraldebaias,amploereforçado,circulavamoutrasbaias com um tipo de passagem entre elas. Cavalos e mais cavalosdormiam, comiam e treinavam nesse complexo labirinto de estábulos,ringues internos para cavalgar e salas cheias de armamentos eequipamentos de montaria. Foi arquitetado para evitar que os cavalosfugissem; e o labirinto assegurava grande dificuldade para aqueles quedesejassemtentarroubaralgumdosseresmimadosquealihabitam.Dinahaspirouoarcongelantemaisumavezenquantopassavapelo labirintodebaias.Homens,fenoecavalos–seuscheirosfavoritos,porquealembravamdele.Nocentrodaestruturadoestábulohouveumamudançapalpávelnoar, à medida que ela chegava ao estábulo central. Essa era uma baiadiferentedetodasasoutras,comportasdemadeiramaciçaqueerguiam-se

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sobreacabeçadeDinah.ElaespioucomumfrionaespinhaquandopassoupelostrêsHornhooves

que a encaravam comaqueles olhos do tamanhodemaçãs, sedentos pormorte. Manteve sua cabeça baixa e continuou andando da forma maissilenciosa que podia. Os Hornhooves a assustavam; assustavam a todos.Eram mais criaturas das profundezas do inferno do que cavalos, emantinham-secomosombrosecabeçaacimadosdemaiscorcéis,naalturadedoiscavalosjuntos,commúsculosnaspernasmaisgrossosqueacabeçadeumhomem.Seuscascosmortaiseramcobertosporcentenasdeossosafiados, inquebráveis: instrumentosparaamortedolorosadequemquerque ficasse no caminho deles. Eram o orgulho e a alegria do Rei,especialmenteMorte.Morte–o ceifadordavida, erao corcel favoritodeseupai.Foi Morte quem encarou Dinah enquanto ela passava pela baia, com

vapor saindo de suas narinas quente o suficiente para queimar a pele.Músculosgenerososdançavamsobseudorsodecorpretocintilante–tãopreto que era quase azul. Ele era maior que os outros dois Hornhoovesbrancos e diziam ser um animal particularmente sedento por sangue –incansável e mais cruel que a maioria de sua espécie. A tribo Yurkeidomavaessa espéciehavia gerações e eramcriadospara seremsoldadossemmedoalgum–osmaiorescavalosdeguerra,quaseimbatíveisemuitoraros.Muitoshomensmorreramsobseuscascos,tantodespedaçadospelosossosafiadose inquebráveis,comoesmagadospeloseugrandepeso.Eleseram tãograndesqueamãodeDinahpoderia ser engolidaporumadasnarinasnegrasecavernosasdeMorte.MorteandavaatéofimdesuabaiaenquantoDinahpassava,seuscascos

pesadosfaziamochãotremer.OsHornhoovesdeixavamDinahnervosa,eelaandoumaisdepressaemdireçãoaosestábulosondeoscavalostoscosefracoserammantidos,úteisparalevarcargaselavraraterra.ElaestaloualínguaeesperouRajadoaparecernaentradadabaia.Quando criança, Dinah o batizou – seu cavalo com manchas pretas e

brancas–deRajado,poiseleafazialembrardosrespingosdechuvasobresuajanela.Eraumcavalodoceegentil.Raramentefaziamaisdoquetrotaralegremente,comercomentusiasmoedarbeijosbabadosnamãodeDinah.Ele deu um relincho de alegria quando ela se aproximou, Dinah, por suavez, sacou uma maçã de dentro da sua capa. Rajado abocanhourapidamente relinchando novamente, seus lábios macios de cavalodançandonamãodeDinah.– Você acha que vim apenas para vê-lo? – ela sussurrou para Rajado,

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enquanto coçava suaorelha –Bomgaroto. –Eladeuum tapinha gentil edirigiu-semais a fundo, em direção ao ringue externo.PobreRajado, elapensou, ele definitivamente não era o motivo pelo qual ela visitava osestábuloshojeeemtodososdias.Umrubordescompensadofoisurgindoemsuasbochechaspálidas.WardleyagorapassavaamaiorpartedeseutempotreinandooscavaloseasCartas;portanto,Dinahtambémestavapassandocadavezmaistempocomoscavalos.WardleyGhaneestava treinandoparaseropróximoValetedeCopas–

umbelotítuloparaocomandantedasCartasdeCopas,mas,paraDinah,eleera muito mais do que isso. Ele era seu melhor amigo… e o rapaz queamava.Alto,comcabeloscastanhos,longosecacheados,quechegavamatéo topo de suas sobrancelhas expressivas, Wardley Ghane era tãodevastadoramentebonitoquantoerahabilidoso.Cavalgavaemsuaseladeébanocomosetivessenascidoemcimadeumcorcelesacavasuaespadadacinturacomgrandefacilidade.Eleeraumguerreirotemível,carregavacomorgulhoobrasãodoReieeraumaCartasagaz,queconseguiatransitarpelas politicagens e armadilhas que inevitavelmente surgiam, mantendosualiderançadiantedasCartasdeCopasmesmosendotãonovo.WardleyestavasendotreinadoporXavierJuflee,oatualValetedeCopas,conhecidoporseromelhorespadachimemtodooPaísdasMaravilhas.WardleyeraofavoritodoReientresuasjovensCartase,quemsabeum

dia,Dinahdesejava,algomaisdoqueisso.ElaqueriafazerdeWardleyseumarido, o que faria dele o Rei de Copas ao seu lado. A linhagem desucessões estabelecia que, quando um rei e uma rainha reinassem,reinariamaté suasmortesouatéquedesistissemdo trono. Seumreiourainha morresse durante o reinado – como aconteceu com Davianna –,então o filho primogênito dessa união, chegando o décimo oitavoaniversário,reinariajuntoaoviúvoouviúva,atéquecasassecomalguém.Então, o rei ou rainhamais velho cederia seu lugar ao trono, e o recém-formado casal real governaria. Contemplando o rosto deWardley, Dinahansiavapelodiaemqueseupairenunciasseedesselugaraoseumarido.EquefosseWardley.ParamuitasurpresadeDinah,nodiaemquecompletoudezesseisanos,elecomeçouafazerseucoraçãocontorcer-sededesejoemcadasorrisosolto,cadaabraçoamigável.UmdiaelaolhouparaWardleyequis mais dele – ela queria tudo. A mudança em seu comportamentogeralmenteodeixavaconfuso,porissotentavamostraromínimodeafetopossível quando estavam juntos; mas, ao cair da noite, deitada em suacama, imaginava seus lábios juntodosdele,opesodocorpopressionadocontraoseu.Seunomeestavasemprenapontada língua,seudesejopor

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ele estavadescontrolado.Elao amavae, de certa forma, sempreo amou.Agora,eleesperavaporela,mastigandoumpunhadodegrãosàssombrasdo palácio, jámontado em seu estonteante corcel branco, quando Dinahsurgiudosestábulos.Eleajeitousuacapaearmaduracomdestrezaejáestavaprontoparaseu

treinamentocomasCartas.Nopeitoraldeseuuniformebranco,haviaumquadrado vermelho com um coração preto em cima, o brasão do Rei.Corning, seu cavalo de umbranco ofuscante, deuum leve pinote quandoviuacapapretadeDinahdançandonoventofrio.– Ôôôaa, calma. –Wardley puxou as rédeas vermelhas antes de sorrir

paraDinah–elevêvocêquasetodososdiaseaindaassimessacapapretasempreo assusta– ele esticouobraçoepassouamãopelopenteadodeDinah–Vocêestábonitahoje!Ela sentiuum calorpassandopor todo seu corpo, esquentando-a até a

pontadosdedosdopé.Wardleysemprefaziaelasesentirassim.–Oquefazaquiforanestamanhãcongelante?Dinahdeudeombros.–Nãoestátãofrio.Vocênuncafoiumapessoadoinverno.Eugosto.Veja,

trouxeumastortasquentesparavocê.Dinah tirou os salgados quentes dos bolsos de sua capa. A geleia de

framboesajáhaviavazadopelacamadadequeijoeseuaromapreencheuopátio.Wardleylambeuoslábios.–Oh,Dinah,vocêétãoboa.Eraexatamentedissoqueprecisava.Vocêé

incrível, sabia? – Pegou a torta de sua mão e enfiou direto na boca emapenasumamordidalambuzada.Oaçúcarsalpicadoemcimaficoutodonoseu lábio superior. Dinah sorriu envergonhada enquanto circulava umcoraçãorosadocomsuabotananeve.VerWardley,àsvezes,eraoúnicomomentofelizdeseudiatodo.–Meupaiveiomeverestamanhã.–Eelefoiterrívelcomvocê,comosempreé?EnquantoWardley falava, farelosde tortavoavamdesuabocaecaiam

emCorning.Dinahretribuiucomumsorrisoanimado.–Vocêsemprecomecomoseestivessefaminto?Elapegouumlençodesuamangaeentregouaele.Elelimpouabocae

sorriu.–Desculpe.E,sequersaber,estousemprefaminto.–Vocêconhecemeupai.Eleteriaquefalarcomigoparaserterrível.Ele

entrou, trocou algumas palavras agressivas com Harris e saiu

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abruptamente,masnãosemantesjogarminhabandejadecomidanochão.Wardleyparoudecomereestreitouseusolhos.–Eentãovocêtrouxeastortasparamim?Dinah sorriu, seus dentes brancos brilhavamem contraste coma neve

rosada.–Não,essassãofrescas,vindasdacozinha.Eujogueiaquelacomidafora;

bem,naverdade,Emilyjogou.Essaeraaversãocurtadahistória.NaverdadeDinahseencolheuemum

canto enquanto seupai gritavaparaHarris sobre todas as coisasque elaestavafazendoerradoeotamanhodesapontamentoquesentiaemrelaçãoaDinah.Elanãoerabonita,eraestúpida,nãoeraumadama,gastavaseutemposonhandoacordadaeexplorandoocastelo,eraterrívelnoCríquete,nãoserviaparareinar…QuandooReigolpeouHarriscomsuagrandemãoaberta,Dinahencolheu-semais aindano chão.AssimqueoRei virouemsuadireção,elacobriuorostoejogou-separaooutrolado.Seupaisaiudoquarto com um ar terrivelmente sarcástico. Parecia que seus ataques deraivaestavamficandomaisemaisfrequentes.Quandoelaeracriança,elesemprehaviasidofrioedistante,maseducado–aindaqueacontragosto.Agora, ele odiava abertamente sua filha na frente dos criados. O Rei deCopas ainda era cordial em público, mas seu desprezo efervescente eracomo uma corrente preta e subterrânea, sugando a alegria de todas asfestas e encontros da Família Real. Dinah o evitava a todo custo, e atéHarris e Emily aprenderam a ficar longe do Rei de Copas e seutemperamentoinflamado.Devolta aos estábulos,Dinah sentou-se emumbaldedeponta-cabeça,

soltandoumsuspiro.–Euoodeio.Eleéterrível.Wardley desceu do cavalo em apenas um movimento suave de suas

pernasepassouobraçolivreaoredordeDinah,enquantoooutroseguravafirmesuaespadadetreinos.–Euseiqueseupainãoéumbompaiotempotodo.–Oununca–retrucouDinahdeformasombria–Elenãoécomoumpai

deveriaser.Elenãoénadaparecidocomoseupai.Wardleysorriucompreensivamente.DiferentedeDinah,eleadoravaseu

gentilpai.–Eusei.MasoReideveteamar.Tenhocertezadequesim…aindaque

seja desse jeito terrível. Reinar o País das Maravilhas não é para os decoração mole, e a coroa pesa, você sabe disso. Você é sua filha, a únicaherdeiraviável,ealgumdiaeleverávocêpela…

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Ele pareceu perder as palavras. Acariciou sua bochecha levemente, eDinahprendeuarespiração.– Pelamulher forte que irá se tornar. A Rainha de Copas. Uma rainha

justaeboa,eumairmãdevota.Euvejovocêficandomaisforteacadadiae,emalgummomento,eleveráisso.–Algumdia–elaresmungou–nãoéhoje.Wardleyficouempéemumpuloedesembainhousuaespada.–Entãovocêdeveriadizerissoaele.Hoje!Euordeno.Dinah levantou e pegou o cabo de vassoura encostado na porta do

estabuloejogouparatrássuacapapreta.ElaficouemposiçãodeataqueeavançoucomocabodevassouranadireçãodeWardley.Eleesquivou-seepulouparaolado.–Eu irei!Eu irei falar, “Pai!Osenhorestá ficandodevagarerabugento

comavelhice.Osenhorjánãoéoguerreiroquefoiumdia.Dêmeureinologo,seuogro!EntãoderrotareiosYurkeisdeumavezportodas!”.Suas espadas soaram em conjunto, madeira e ferro, pelos estábulos e

pelopátioexternotodo.Eraumadançaperfeitaecomplicada,umaquejáfizerammuitasvezesantes.Wardleygiravaedesviava facilmentedeseusgolpes,enquantoDinahoacertavadelevenaalturadeseusquadriscomapartelateraldocabodevassoura.–Uau!Essafoiforte!–eleriu.ElesedistraiumomentaneamenteeDinahavançoucomforçaemdireção

àsuacabeça.Wardleyagachouefacilmentecortouforaumpedaçodocabodevassouracomsuaespada.–Vocêsemprevainacabeça.Semprecomessesgolpesmalplanejados–

ele ensinou – Deixa você vulnerável. Espere pela oportunidade CERTA e,então, tente golpear. Não ataque no minuto que aparecer qualquerabertura. Você é muito impulsiva. Xavier vem trabalhando comigo paraidentificarminhasfraquezas,eessa,minhacara,éasua.Seráaúltimacoisaquefaráemumabatalha.Dinahsorriue tirouumamechadecabelopretoquecaírana frentede

seusolhos.– Eu jamais estarei em uma batalha. Críquete é o mais próximo que

chegareipertodisso,imagino.– Uma rainha deveria saber como se defender – Wardley respondeu,

juntandoospedaçosdocabodevassouradochão.–Mesmoquetudooquevocê faça seja ouvir reclamações e engordar comendo tortas quentes emseutrono.OReideCopaséumguerreiroexperiente.Podenãoserumbompai,maseuoconheçocomocomandante.Eleécomcertezaohomemfirme

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queoshabitantesdoPaísdasMaravilhasafirmamqueé.Nãodeviasertãoduracomele.Vocêdeveriadesejarsercomoelenesseaspecto.–Eusouduracomele?–Dinahjogouseupedaçodecabofora.–Eusou

duracomELE?Eleolhaparamimcomnojoedesprezo.EletrataHarrisdeformaterrível,esóDeussabequetipodeMULHERESelelevaparaoaposentodasamantestodasasnoites…Wardley fincou sua espada no chão e segurou firme o braço deDinah.

Sentiuumtremorintensosobresuapelecalejada.–Dinah,FIQUEQUIETA.–Eledeuumlevechacoalhão.–Vocêpoderiaser

colocadanasTorresNegrasdizendo tais coisas. Eu sei que vocênão temtidoosmelhoresmomentossemsuamãe,masesseódioóbviopeloseupaipodeacabarmatandovocêou,atépior,MEmatando.AideiaparouoargumentoquesubiapelagargantadeDinah.Elajamais

faria algo que ferisse Wardley. Nunca. Wardley foi sempre seucompanheiroeamigodasbrincadeiras,desdequeelamalconseguiaandarcomsuasperninhasroliçaspelocastelo.Quandoerammaisjovens,HarriseEmilyadeixavamcomamãedeWardleyfrequentemente,umasenhoradacorte, e as duas crianças saiam perseguindo pássaros e ouriçosrechonchudosquepercorriamoscamposdopalácio.Wardleyaensinouamanusearumaespada,cavalgarRajado,fazerxixiaoarlivreecomerumatortasemasmãos.Paraumacriança,oPaláciodoPaísdasMaravilhaserarealmenterepletodedeslumbrese,explorarseussegredos juntos, trouxemais alegria para Dinah que qualquer outro momento de sua infância.Wardley era dela e apenas dela, nada que seu pai fizesse poderiamudarisso. Não que importasse muito. O Rei de Copas adorava Wardley eencorajavasuasboashabilidades.Eletoleravaaamizadedosdoisequaseaencorajava, considerando que não sentia tanta raiva de Dinah quandoWardley estava por perto. Um dia ele seria o Valete de Copas, ocomandante das Cartas de Copas. E, talvez, se tudo corresse comoplanejado,eleiriasecasarcomelaeserseuRei.Eleiriaamá-la.Dinah guardou esse último desejo em seu coração e franziu as

sobrancelhasparaele.Elanãogostavaderecebersermõessobreseupai.–Estouindoembora–elaretrucou.–Nãoprecisoouviroquedevofazer

deumgarotocomaçúcarpolvilhadopelorostotodo.Wardleyachougraça.–Dinah,porfavor…–NÃO.Elacobriuseuvestidocinzaclarocomestampasdecoraçõesvermelhos

comsuacapapreta,esualongatrançapretacomocapuz.

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– Essa é a última torta que receberá de mim. Quem é você para darsermão na Princesa do País das Maravilhas? Ninguém, apenas umcavalariçosolitário.Wardley jogou seu cabelo para trás e devolveu um sorriso de

cumplicidade.–Tudobem,maseuaindaestareicomfomeamanhã.–Adeus.–Dinah,espere!Seu coração palpitou em seu peito enquanto virava para ele. Ele se

inclinoucontraalateraldeCorning,seurostopróximoaodela,esussurrou:–Vocênãopodedizernadadotiposobreseupainovamente,anãoser

queestejamosforadoPalácioounonossoespaçonaCapeladeCopas,vocêcompreende?Estoufalandosério.Dinahpercebeuumrarosinaldemedoemseusolhoscordechocolate.

Elasuspirou.–Eunãovou,nãodireinadaquepossaencrencarvocê,prometo.–Bom.–Wardleydeuumapertãoamigávelemseuombro–Eugostode

teraminhacabeça.ElepuxouCorningpelarédeavermelhaemontou.–Vocêvirámeveramanhã,apósotreino?–Talvez.Sesobrartempo,masprovavelmentenão.AmanhãéoJogoReal

deCríquete.–Ahsim,seudiafavoritodoano.Dinahfezumacareta.ElaodiavaoJogoRealdeCríquete.–TalvezencontreumaformadebateremVittiorecommeubastão.– Pegue leve com ela. Eu acho que seu pai a assusta. Ela parece

amedrontadaotempotodo.– Ele deveria assustá-la mesmo. Ela é uma bastarda, indigna de um

minutoquesejadotempodele.Esperoquemorradepneumonia.Wardley mirou seu olhar a distância, focando em algo que Dinah não

conseguiaver.–Vocênãoestáfalandosério.Então,talvez,vocêvenhamevisitarapóso

críquete?Oueuireivê-lanojogo.É claro, é claro, seu coração cantou, irei vê-lo todos os dias! Ela deu de

ombros.– Bom. Antes que eu esqueça, eu tenho algo para Charles. Você pode

entregarissoemmãosparaoChapeleiroMaluco?EleentregouaDinahumpequenocavalo-marinhofeitodemadeira.Ele

mesmo havia talhado; não havia nada que Wardley não conseguissedominar.

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Elavirouoobjetoparasiemsuamão,admirandootrabalhofeito.–Eleiráamar.Wardley direcionou Corning para o outro lado e seguiu pelo vento

gelado.–Atéamanhã!–eledisse.Ela sorriu e acenou enquanto ele se juntava ao batalhão de Cartas de

Copas, que seguia marchando em silêncio na formação em direção aocampo.Seuspassosecoavamemnotasúnicaseduras.XavierJufleebateucomforçanoombrodeWardley,enquantoseguiamgalopandoparaalinhadefrentedopelotão.Dinahfoisaindonaspontasdospésdaáreadoestábulo,voltandopelo

labirinto circular. Enquanto dava voltas pelas curvas infinitas e zigue-zagues das baias, ela permitia um sorriso permanecer em seu rosto. Umanoatrás,sobosolbrilhantedoPaísdasMaravilhas,WardleyhaviadadooprimeirobeijodeDinah,um leve roçardos lábiosno lábio superiordela.Eles estavam embaixo da Árvore Julla, um grande esqueleto de galhosvermelhos com folhas sedosas de amoreira e frutas pretas zumbindo,abrindoefechandoacadahora.Quandocrianças,elessubiramnaÁrvoreJullacentenasdevezesparabrincardeTriboseCartasouespiaroquartode banho das damas. Agora, eles escapavam para o abrigo folhento parateremumminutodetranquilidade juntos–WardleydescansavadosseustreinosintermináveiseDinahdesuasliçõese,àsvezes,deseupai.EraverãonaépocaeDinahestavacomdezesseisanos.Astrombetasda

horadoalmoçohaviamsoado,eDinah,commuitaresistência,haviajogadofora a fruta que estava beliscando e descido da árvore. Ela torceu otornozeloaobaternochãoecaiu,fazendoumcorteemsuapernaporcausadasraízescheiasdeespinhos–comodedosgordosquesaíamdochãoparaprotegeraárvore.Wardley foiatéelae,gentilmente, limpouosanguedapernacomsuaprópriamão.– Você está bem? – ele havia perguntado, segurando a perna com sua

mãogrande.Dinahsorriucorajosamente,apesardetersentidovontadedechorar. Ela não queria queWardley a visse chorando,mesmo que ele játivessevisto inúmerasvezes–comoquandoVittiorerecebeuumbailedefantasiasemsuahomenagem,quandoHarriscomeçouaensinarVittioreaoinvésdeDinahduranteasnoites,ouquandoseupaiesqueceudemandarcháparaelanoDiadeTodososChás.Wardley limpou a mão no tronco felpudo da Árvore Julla, olhou

profundamentenosolhosnegrosdeDinaheabeijou.Seuslábioseramfriosemacios, e suaboca tinhagostode limão.Ela inclinou-se,maselevoltou

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para trás, colocando suas mãos nas bochechas quentes dela, seus olhoscheios de curiosidade enquanto segurava seu rosto em suas mãos. Eletentavaentenderalgo;elapodiavernosolhosdele.Dinahrespirou forte,somente por causa do choque ao sentir um calor repentino subindo porsuasveias,eWardleydeudeombroslevemente.–Apenasqueriasabercomoera.–elependurou-senovamentenaÁrvore

Jullarindo,eDinahseguiuseucaminho,atordoadaeconfusa,atéocastelo.Umanohaviasepassadodesdeentão,eDinahaindaconseguiasentiro

toquedos seus lábiosnosdela enquanto tomava seu rumopara foradosestábulos. Camadas de neve rosada cobriam as lanças douradas eespiraladas do Palácio do País das Maravilhas, e o reino inteiro pareciasegurararespiraçãocomumbrilhoestático.UmgrandegrupodeCartasdeEspadasestavaparadopróximoàsportasdevidrovermelhoquelevavamaté o palácio. Dinah cobriu sua cabeça com a capa, com a esperança decobrir seu rosto,mas seus lábios estremeceramestranhamente àmedidaque foi chegando mais perto deles. Eles estavam com um sossegoexagerado,gargalhadasescapandodesuasbocasenegrecidas.ElaODIAVAosEspadas.–VossaALTE-za.–elescurvaram-selevemente.E,quandoelapassou,ouviuumdelessussurrandoparaoutro:–ÉafilhadoRei,desgraçaparaoreino.Nãoparecenadacomamãe.–Umacartareenviada–sussurrouooutro.O coração deDinah estava batendo forte agora. Umódio incontrolável

começounapontade seusdedosdospése foi subindoaté seupeito.Elatropeçou,eopequenocavalo-marinhodemadeiracaiudesuamão,rolandoatépararcontraabotacompontadeaçodeumdosEspadas.–Opa,oqueéisso?–elesecurvoueapegou,umaminúsculaescultura

perto de suamão grande –Umbrinquedo? Você não émuito velha parabrinquedos,princesa?–Éumcavalo-marinhoeéMEU.Por favor,devolva.–Dinaholhoupara

cimaparaencontraroolhardele,esperandoqueseuslábiostrêmulosnãorevelassemavergonhaquesentia–Porfavor.OEspadaslançouumolharpesadoparaDinah.–Venhapegar,VossaAlteza.Osolhosdeletinhammanchasdouradas,elanotousurpresa.Eraumacor

muitomarcanteemcontrastecomseuuniformepreto-com-preto,ocabeloacinzentadoeosímbolodeespadaspreto tatuadoabaixodoolhodireito.OsoutrosEspadasmantiveram-seimóveis,semicurvados,enquantoDinahdavaumpassotímidoemdireçãoàCarta.Elacomeçouaestendersuamão

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esquerdaemdireçãoaocavalo-marinho,masentãopensoumelhor.Eusoua Princesa do País das Maravilhas, disse a si mesma. Lembre-se do queHarrisdiz.Algumdia,vocêseráRainha.–Não.OsEspadasmovimentaramsuascabeçascomcuriosidade.–EusouaPrincesadoPaísdasMaravilhas,evocêirácolocá-loemminha

mão.OEspadadeolhosdouradosdeuumassobioprofundo.–Certo,defatovocêé,apesardaoutraprincesateraaparênciadeuma.

Se dependesse demim, a linda Dama Vittiore é quem deveria receber acoroa…O ódio acumulado queimava sua espinha. Com ummovimento rápido,

DinahesticouobraçoegolpeouoEspadasemseurostocomforça.Umdeseus anéis de pérola deixou um fino traço de sangue cruzando a faceesquerdadele.Ele,então,precipitou-seemsuadireção,massesegurou,comseupunho

acentímetrosdorostodela.Dinahdeleitou-secomochoquedele.– A Dama Vittiore não é uma princesa, é apenas uma duquesa. Agora,

vocêcolocaráobrinquedoemminhamão.OEspadasabriuumsorrisojocoso.–Semproblema,Princesa–disseestendendoamão.–Não.Minhaoutramão.Com uma careta, ele olhou para o outro braço firmemente guardado

dentrodacapa.Elanãofezomenormovimentoparaestendê-loparafora.Os outros Espadas assistiam chocados enquanto ele tentava, sem sorte,colocarocavalo-marinhoemsuamão,semquefossenecessáriopegaremDinah propriamente, uma atitude punida com morte, com certeza. Aprincesaassistiaàcenaemsilêncio,comoseseubraçoestivesseseparadode seu corpo, e ela fosse apenas uma espectadora diante desse homemmexendo de forma desajeitada em sua capa. Finalmente, o Espadas,envergonhado, pressionou o brinquedo contra a palma da mão e Dinahfechou-aaoredordoobjeto.OEspadasvoltouaobarrilemqueantesestavasentadoeseapoiounele,

encarandoDinah.Umforteinteresseagorasubstituíaoqueanteseraumardezombariaemseurosto.–Entãovocêtemumpoucodosanguequentedoseupai,nãotem?Dinahfranziuassobrancelhas.–FalecomigonovamenteeeumandareivocêparaasTorresNegrasem

umcaixão.Qualéseunome?

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Ohomemficoupálido.–Estavaapenasbrincando,VossaAlteza;porfavor,nãomedelateparao

Rei.–Eudisse,QUALÉOSEUNOME?Esfregousuasmãossujasedisse:–Gorrann.Sr.Gorrann.–Bem, Sr.Gorrann, nãodelatarei você aoRei hoje.Mas seme insultar

novamente algum dia, apenas terei sua cabeça. Não será necessárioenvolveroRei.Com um olhar sisudo, ela passou por eles, sua capa preta esvoaçando

atrás. Assim que as portas de vidro vermelho do palácio fecharam atrásdela, Dinah caiu emum corredor vazio do salão principal. Seus lábios seabriramcomumchorocomedido,maselahaviaselivradodavergonha.Vitoriosa, ela agarrou o cavalo-marinho com uma das mãos suadas e

limpouaslágrimasdeseurostocomaoutra,enquantoseguiaemdireçãoaoChapeleiroMaluco.

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Quatro

Os aposentos de Charles estavam localizados na torre oeste dosAposentos Reais, situados devidamente acima da cozinha do castelo. Seupai tinhadado emmateriais de construçãoo que ele nunca tinhadado aCharlesemvida.OReinãomostrounenhumoutrosinaldeamor,afeiçãoenem mesmo dever para com o filho. O quarto de Charles,consequentemente,eraumdoslugaresmaisestranhosemtodoopalácio.Imensascolunasbrancas incrustadascomcoraçõesvermelhossubiamemespiral até o teto, onde encontravam-se com um imenso afresco queapresentavatodasascriaturasdoPaísdasMaravilhas.Hornhooves,grifos,pássaros de todos os tipos, baleias brancas, ursos de listras brancas edragõesdequatroasasdançavampelotetoemricaspinturas.Seria adorável – uma deslumbrante obra de arte – se chapéus

grosseiramente desenhados não tivessem sido rabiscados em cima dascriaturascomcarvãopreto.Osanimaisagorausavamhorrorosospedaçosde penas, cartolas e chapéus fedora em linhas tortas, bagunçadas, quecorriamdeumparaooutro,semseinterromperem.Oschapéuseramricosemdetalhes,masaslinhasentreeleseramfuriososrabiscos–aartedeumlouco.É triste, Dinah pensou enquanto olhava para o alto, seu capuz caindo

para trásnanuca,que loucura e genialidade tenham sempre semisturadonestequarto.OpróprioquartoeraumtestemunhodaobsessãodeCharles.Prateleiras

em cima de prateleiras de chapéus erguiam-se do chão, torcendo-se ecirculandoemtornodeescadariasvacilantes,construídaspelametade,quelevavamanada,anãoserar.Portastinhamsidocolocadasnasprateleirasdechapéus,abrindo-seefechando-seaoarfrioquesopravadeumaamplajanelaabertanotopodaescadariaprincipal.EssaescadariaeraapreferidadeCharles, cobertaporparafusose tecidos.Pilhasdenevederretendoseacumulavamnoparapeitodajanelaempequenosmontes.Dinahsoltouumsuspiroesubiuemumadasvacilantesescadarias, fechandofirmementeajanelaepassandootrinco.Elaouviuosomdepequeninospésabaixodela.

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–Charles.Vocênãopodedeixarajanelaabertaquandonevaláfora.Estáumfriodecongelaraquidentro,eanevevaiseamontoartodaemcimadosseus novos chapéus. Já conversamos sobre isso. – Ela espanou umimponentechapéufedoracinzacompenaslaranjasdecanário,ornadocomsoleestrelas.–Vocêtemquetomarcuidadocomeles.Aosseuspés,umemaranhadodecabeçadecabelosloirosesujossurgiu

noespaçoentreospisosdosdegraus.–Nevecor-de-rosaemchapéuscor-de-rosafazmorsadançar,eladança

nomar,êê!Charlesdeuumpulo aparecendodebaixoda escada.Dinah soltouuma

exclamação quando ele caiu sobre o piso, dando uma cambalhota aoaterrissaresaltandodepéemumadancinhacomchutes.–Nevenochapéu,nevenochapéu,ogatodeCheshirevaiprobeleléu!EledeuumarisadinhaagudaeDinahriucomele.Charles era apenas dois anos mais novo, mas em sua loucura ele

praticamente não tinha idade. Ele era um gênio, um sábio, um bebêdesamparado e uma criança travessa, tudomisturado num só garotinho.Ele tinha nascido louco – um bebê chorão que nunca dormia; depois, aoengatinhar, batia a cabeça na parede, um menino curioso que uma vezcomeu caco de vidro e não amava nadamais que olhar para as estrelas.Davianna,amãedeDinah,tinhaamadointensamenteseufilholoucoeeraa quemelhor lidava comele.Quandopassava seus braços ao redordele,aninhando-oemseupeitocomoseelapudesseespremeraloucuraatésairdele, ele relaxava e ficava contente, ainda que balbuciasse palavras semsentido.Comocuidadoeamor intensodesuamãe,Charlespareciaestarmelhorando,poucoapouco.Quandoelamorreu,eleficoucompletamentemaníaco,enuncamaisretornou.Frequentemente, ele era encontrado vagando pelo castelo, com um

passarinhomortonumamãoeumpedaçodetortanaoutra.Eracertoqueeletinhadadoumamordidaemumenquantoseguravaooutro.Certavez,elecaiudagaleriadoGrandeSalão,quebrandoasduaspernasnosdegrausdemármoreabaixo.Depoisdisso,seujeitodeandarconsistiadepassinhoscurtoseumsaltotrotado–passosgrotescosdaloucurapermanente.Então,eleparoudecomerporumtempo.NemmesmoDinah,suaamada

irmã, poderia fazê-lo comer. Não mais que uma criança de dez anos deidade, ela tinha implorado a ele enquanto tentava enfiar um pedaço detorta,sopa,ave,qualquercoisadentrodesuaboca.Elesetornoucadavezmaisfraco,retirando-setotalmenteparaseumundomaravilhoso,etodooreino vestiu-se de preto, aguardando a morte do pequeno Príncipe de

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Copas.No que certamente poderia ter sido uma de suas noites finais, Dinah

trouxeumbaúcheioderoupasdafalecidamãedeles.Elaasenfiouemtodaa volta dele, seus vestidos, sapatos e meias, para que ele pudesse serconfortado na sua jornada para outro lugar. Os dedos de Charles tinhamencontradoumdoschapéuscheiosdeadornosdamãe,aquelequeelatinhausadonoDiadeTodososChásnoanopassado–umdeslumbrantechapéucomumalongapluma,imponenteebrilhanteemsuapequeninamão.Umsorriso inesperado surgiu por sua pele translúcida enquanto ele virava ereviravaochapéuemsuasmãos,umaexpressãode fascínionorosto.Eleentãovirou-separaDinahesimplesmentepediuporumbiscoito.–MinhaDinah– ele sussurrou comumsorriso,passando suapequena

mãopeloqueixodela.–Biscoito?Ela viu nos olhos dele naquele dia – ele tinha decidido ficar, simples

assim. Isso foi sete anos atrás. Desde então, Charles nunca deixou seuquarto.Eleobservavaomundoporsuas janelas,deondeocasionalmentelançavaseusextravaganteschapéusparaopovodacidade,queficavaemestadodeadoração.UmchapéucriadoporCharles,ochamadoChapeleiroMaluco, valia mais que qualquer roupa do País das Maravilhas. Suascriações eram obras inspiradas de técnica e insanidade. Descaradamenteextravagantes,ricosdetodacorquepodiaserencontradananaturezae,àsvezes,tambémdasquenãopodiam,eleseramumtestemunhodaloucuradeCharles.Eleraramentedormiaoutomavabanho.Seusdois leaiscriados,Lucye

Quintrell,cuidavamdetodasassuasnecessidades.Elesimpediamqueseusaposentoscaíssemnoabandono,masdavamàsuamentealiberdadeparacriarnaselvagemdemênciaqueaestimulava.Tapeçariaseenormesrolosdetecidocobriamochãoeamaiorpartedasparedes.Estreitaspassagenstinham sido criadas para os criados, mas Charles simplesmente dançavasobreochãocolorido,seuspéstocandoospadrõesdetecidodeametista,abóbora,cinza-acastanhadoegrafite.CharleslevantouoolharparaDinah,aindaparadonaescadaria.Eledeu

umarisadinhaecantou:–Nopescoçodelesumafita,um,dois,corações.Fiteafita!Ela baixou os olhos para a cabeça amarelada e para os olhos que não

combinavam,umazuleoutroverde,queaolhavamdevolta,selvagens.–Vocêselembradomeunomehoje?–Dinahrimacomplantar,feijõesemaisfeijões,crescendoecrescendo,

sobreascolinasatéobrancopálido,comoaçúcarsobreumatorta,morta,

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morta…Dinahabriu-lheumsorrisoorgulhoso.–Issomesmo,Charles,éaDinah.Suairmã.Eutrouxeumacoisapravocê

hoje.Seusolhospiscaramduasvezes.–Umacoisa?Umacoisacomoosol,tododiacadavezmaispróximo.Ele

vaiqueimaragente,aiai,vai,sim.–Nãoébemosol,masumacoisamuitoespecial.Dinah enfiou amão dentro da sua capa e tirou um pequenino cavalo-

marinho de madeira. Os olhos de Charles se arregalaram, e ele pegou opresente em suas pequeninas, femininas mãos.Wardley tinha entalhadoredemoinhosemsuascostasonduladasetingidodepretoseulongonarizcomcarvão.–FoioWardleyquefez.Vocêselembradele?Oquevocêacha?Charles recompensou Dinah com um sorriso enorme, mostrando os

dentesquelhefaltavam.–Cavaloazul,nadandonumenormecampo.Camarõessaborososdentro

desuascostelas,eupossosaborear,possosim!–Ficofelizquetenhagostado.Charles levantouaesculturaparaa luzenquantoelea fazianadarpelo

ar.–Pássarosdomar,escamascintilantes,olhosnegros…Ele disparou para longe dela e começou a fuçar pelos tecidos,

murmurando para si mesmo. Dinah tinha visto isso centenas de outrasvezes. A inspiração para um chapéu tinha se enraizado em seu cérebroembaralhado–uma raiz agressiva e criativa, que espalhava sua alegria eseu veneno por todos e cada um dos caminhos secretos de sua mente.Dinah desceu os degraus da escadaria para falar com os criados, queestavamesperandopacientementepertodaporta.–Comoeleestánessasemana?–perguntouela.Lucy fez uma profunda reverência. Ela era a mulher mais gentil que

Dinah já conhecera, uma avó de três crianças, de bochechas rosadas ecabelosbrancos,quebrilhavamnumazulpálidosobaluzdoduroinverno.Linhasdevidoà idadesurgiamdeseusolhosedesciampeloseupescoço,escondendo-se dentro de um modesto vestido branco. Em sua cabeça,repousavaumaenormebaleiadefeltro,enfeitadacomumredemoinhodefloresrosas.Charlesaamavaprofundamente,àsuaprópriamaneira,eLucyeraasuacriadamaisdevota.Quintrelleraseuassistente–umrapazrobustoquecuidavadotrabalho

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físico envolvido nos cuidados com Charles. Ele lutava para pôr Charlesdentrodabanheiraemformadecisneumavezporsemana,esfregando-ocompeledeouriçoenquantoogarotogritavaesedebatia.EletambémeraoúnicoquepodiaforçarCharlesacomerquandoeleestavaemumdeseusacessosdeinspiraçãofazendoumchapéu.Charlesperiodicamentepassavapor longosperíodosemqueelenãofazianadaalémdetecerecosturar–ataquesselvagens,brilhantemaniaquedurariampordias.DinahnãofaziaideiacomoLucyeQuintrelllidavamcomCharlesumdiaapósooutro,maseles pareciam satisfeitos. Além de Dinah, eles eram os únicos querealmenteoamavam.Apesardeeleserseuirmão,Dinahsentiaqueelaflutuavanumaestranha

bruma emocional com Charles – ela o amava muito, mas seu amor erasempretingidoporconfusão.ElanãopodialidarcomeledamaneiracomoLucy e Quintrell lidavam. Charles a reconhecia na maioria das semanas,mas,quandoissonãoacontecia,Dinahsentia-setraída,aindamaissolitáriaqueonormal.DinahassistiupasmaaLucyenrugandoorosto,aindamaisdo que ele já o era, enquanto separava botões. Ela limpou a garganta,preparando-separaresponderàperguntadeDinah.–Comoeleestá,VossaAlteza?Bem,elecrioudoischapéusnosúltimos

vintedias,maisrápidoqueonormal:aboinafúcsiacomovosdeandorinhaeacartoladegrifo,queseráentregueaoSenhoreàSenhoraClutessanasemana que vem. As duas obras foram inspiradas pelos pássaros quefizeramninhodoladodeforadajanela.Dinah assentiu. Trabalhar com Charles tinha transformado tanto Lucy

quanto Quintrell em chapeleiros também – eles tinham tanta técnica econhecimentocomonenhumoutrochapeleironacidadejamaispoderiater.–Parecemserbonitos.MaseuestavaperguntandosobreoCharles.Ele

andabem?Quintrellagitou-senervosamente.Dinahsorriu.–Bem,contemlogo.–SuaGraça,trêsnoitesatrás,euacordeicomosomdeumarisadaalta

vindadoátrio.–QuintrelllançouumolharnervosoparaLucy.Elapôssuamão enrugada sobre o braço dele e assentiu para que ele continuasse. –Quandoeusaídoquarto,Charlesestavadepésobreumadasescadarias.Ele… – a voz de Quintrell morreu na garganta. Lucy deu um passo parafrente–Charlestinhaumadasagulhasdecosturaenterradanobraço.Eleestavaespremendoosangue,paraquesaísse,edeixando-ogotejarsobreasedadeamora.UmarquejodolorosoescapoudoslábiosdeDinah.

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–Masporque,porqueeleFARIAisso?Lucyrecusou-seaencontrarseuolhar.– Ele disse que o tingimento não era do tom certo de vermelho. Ele

estavaconsertando. Nós tentamos tirar a agulha dele, mas ele estava nabeiradaescada,então…–Então vocêsdeixaramque ele continuasse, nãoqueriamarriscar que

elecaísse.Osdoisassentiram.Dinah ficou tentadaa seenfurecer comeles, assim

como tinha se enfurecido com o Espadas, mas de nada adiantaria. Elaconhecia Charles, e sabia que ele não podia ser controlado, preso ouensinado. Suamente trabalhavademaneiradiferente – breves flashes debrilhantismo seguidos por mergulhos sombrios em seu macabro mundoimaginário.–Vocêtiroutodasasagulhasdele?–Sim,VossaAlteza.Agorasóodeixamosusarasagulhaspequenas,que,

aliás,levaramàproduçãodealgunstrabalhosmuitoelaborados,cheiosdedetalhes.Dinah olhou Charles mais ao longe, feliz, rasgando um tecido tafetá

verde-maçãemfinasfitascomsuaslongasunhas.Elafoiatéeleeobeijouna lateral da cabeça. Seu cabelo sujo, sempre bagunçado e selvagem,semprecheiravaumpoucocomosuamãe.–Tenhoqueiragora,masvoltodaquiaalgunsdias–disseaele.Charlesmoveudepressaa cabeçaparaolharparaosanimaisno tetoe

começouacantar:–Diasenoites,oreicanta.Presasealmíscarefogoadançar.Elecanta

comumalínguapreta,fogoemseuspulmões,seuspulmões.–Paraondeocavalo-marinhofoi?–perguntouDinah.Charles abriu a boca e pôs a língua para fora, dando batidinhas

lentamente.–Desceu,desceu,desceupratocadocoelho!–gabou-seele.Dinahfechouosolhos.– Não se preocupe, Vossa Alteza; nós iremos encontrá-lo – prometeu

Lucy,antesdevoltarasepararbotões.CharlesaindaestavacantandoquandoDinahsaiudoátrio, seucoração

apertando-se a cada passo, conforme a canção, tão adorável e insana, aacompanhava pelos degraus de mármore enquanto ela seguia caminhoparaseusaposentos.Diantedasuaportaseencontravaumconviteelaborado–convocando-a

para o Jogo Real de Críquete. Já tinha sido aberto, o selo do rei estava

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rompido. Comum suspiro, ela desamarrou as setes fitas cor-de-rosa queprendiamocartãoaoseulugar.Algumacoisaestavavazandodoenvelope–tinta?Dinahtirouocartãoe

inclinouaelaboradacaligrafiaparaaluz.SuapresençaparaoJogoRealdeCríqueteérequisitada.APrincesajogará

ojogofinal,seusoponentesserãoaDuquesaeoReideCopas.Dinahsentiufaltar-lheoarnospulmões.Elanuncatinhajogadocontra

seu pai antes, nunca. Ela era sempre colocada para jogar contra algumadamadacorte–alguémqueelapodiafacilmentevencer,eoReierasemprecolocadocontraXavierJuflee,oValetedeCopas.O líquido negro escorreu mais uma vez, dessa vez caindo sobre seu

sapato.Dinahvirouoenvelopedecabeçaparabaixocomumchacoalhão.Acabeçadeumratobranco,cortadanopescoço,caiudoenvelopeequicouno chão. Dinah saltou para trás com um grito. Tremendo, ela revirou oconvite de trás para frente, mas não havia nada nele. Ajoelhando-se, elatocou a cabeça do rato com a ponta de um dedo trêmulo. Um novosentimentoseapossoudela,esentiu-semuitodespertaenquantoolhavaospequeninos lábiosdorato,repuxadosnumsorrisomacabro.Dinahestavafascinadaecommedoaomesmo tempo,devastadaporhaveraindamaismotivosparaapreensãonodiaseguinte.

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Cinco

Comumacolher,DinahespalhoupudimdeameixasobreseusbiscoitosdefigoenquantoHarrispulavaparafrenteeparatrásdiantedela,ovinhoderramando-sedeseugrandecálice.–Vocêvaiseatrasar,seatrasar,seatrasarparaoJogoRealdeCríquete.

Nãopodemosnosatrasar,VossaAlteza.Harris arrastava-se em torno da mesa, seu longo roupão xadrez

agitando-seatrásdele.–EuprefeririaserperseguidaporHornhoovesdoquejogarcríquetecom

Vittiorehoje– resmungouDinah,bebendoumcopodesuco.Acabeçadoratoestavapresaemsuamente,eelanãoconseguiaafastaraimagemdelaquicandopelochãodepedra.– Pode ser que sim, Princesa, mas, mesmo assim, você ainda precisa

comparecer.ÉojogoantesdoDiadoChá,eespera-sequeafamíliarealnãosó compareça, como também jogue depois que todo o povo da cidadeterminarseusjogos.Essatradiçãodatadecentenasecentenasdeanos…DinahsoltouumgemidoeinterrompeuadivagaçãodeHarris.–ComeçandocomoSétimoReideEspadas,Doylan,oGrande,oJogoReal

deCríqueteestabeleceuasregraseaetiquetadojogo.FezdaFamíliaRealdeCopassinônimodecríquete,parasemprefazendopartedesuasgrandestradições e de tudo que lhes diz respeito – disse Dinah e sorriutimidamente. – Você me faz o mesmo discurso todo ano. Eu lembro.Contrariamenteaoquevocêacredita,euescuto.Agora,porfavor,seráqueeupossolerempaz?Umde seus textosmais longos de histórias,O grande grou, repousava

abertodiantedela, umgrande livrodeprata compáginas gastas.Eraumlivroraro,eumahistóriaficcionalfascinantesobreareligiãoYurkei.Harrisabriuamplamenteasportasquedavamparaopátio,deixandoumaespiraldenevecor-de-rosaentrarnoquarto.–Porfavor,fecheisso,estoucongelando–resmungouDinah.Ovelhoaignorou.

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– Críquete! – exclamou ele – O próprio nome invoca uma visão daexcelência,aristocraciaegraçadoPaísdasMaravilhas.Dinah deixou escapar um suspiro e gentilmente fechou seu livro,

apoiandoorostonaspalmasdasmãos.–OJogoRealdeCríqueteestabeleceparaoanoquevematendênciada

moda, das maneiras, dos chás e de estilo. É uma oportunidade para aFamíliaRealdeCopasmostrarsuaunidade,seusdotesatléticos…Dinah lançoua cabeçapara tráscomumarisada,umpedaçodepudim

presoaoseulábioinferior.–Dotesatléticos?Harris,estamosbatendobolascomgravetos.Unidade?

MeupaimeODEIA,eVittiore…–Éumagarotaadoráveleinocente–completouHarris.Dinahdisparouumolharderepulsaparaele.–…éumacobravenenosaetraiçoeira–respondeuela–Sódeolharpara

elaeuficoenjoada.Elapodeatéserminhairmãpelosangueinfieldomeupai, mas ela NÃO é uma irmã de verdade. Só Charles é meu irmão deverdade.Que,sóparalembrarvocê,nuncafoiconvidadoaumJogoRealdeCríquete!Harrisajeitouseusóculos.–Dinah,vocêsabemuitobemporqueCharlesnuncaéconvidado.–Porqueeleéumconstrangimentoparameupai?– Porque ele não pode ser controlado, e a Linhagemde Copas deve se

mostrar forteesã.Ahistóriado JogoRealdeCríqueteécheiade intrigaspolíticas e grandezas gloriosas, não é lugar para alguém que perdeu acabeça.Dinahdesceuafacapelosbiscoitossobreamesa.–Elepodeserlouco,masémeuIRMÃO.EéofilhodoRei.Seelenãofosse

louco, seria o herdeiro de direito do País dasMaravilhas e cada Carta securvariadiantedele.HarrisseaproximouelimpouolábiodeDinahcomseulençobranco,um

pequeninocoraçãobordadonocanto.–Issocertamenteéverdade,Princesa.Ninguémlamentamaisaperdada

razãodopríncipedoqueeu.Euestava láquandoelenasceu,assimcomoestava com você. Eu segurei seu corpinho vermelho debatendo-se emminhas mãos, envolvi-o com tecido de pele e o abençoei em nome dosdeusesdoPaísdasMaravilhas.EuamoCharles,masatémesmoeuseiqueelenãopodeserincluídoemeventosreais.Elefazacoroaparecerfraca,eissochamaatençãoparafalhasemsuafamília.Dinahesfaqueouseuprato,furiosa.

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– Quando eu for rainha, Charles não será escondido em um átrio,lançando chapéus pelas janelas. Ele vai estar comigo para onde eu for,loucoounão.Harris puxou a cadeira onde ela estava sentada e Dinah pulou para o

chão.– Esse é meu maior desejo, Princesa. Agora, é hora de se vestir! Nós

estamos atrasados, atrasados, atrasados! Emily, traga para ela a veste decríquete!Haviapoucascoisastãohorríveis,Dinahrefletiu,quantoestarpresanum

espartilho como se ela estivesse sendo amarrada às próprias costas. Elaficou parada, braços esticados, enquanto Emily a vestia. Emily gemiaenquanto as costelas fortes e o quadril quadrado de Dinah encolhiam-senumaformacurvilíneadedonzela,aperfeiçoadaporgrossasfitas.Conformeapressãolentamenteaumentava,Dinahestudavaasimesma

numlongoespelhoemformadecoração.Cabelospretosebrilhantescaíamlisosde suas têmporaspara seusombros.Os cabelos eram incrivelmentegrossosepesados,umfardoque,emalgunsdias,Dinahmalpoderiatolerar.Seurostotinhacorclaradecreme,tornadoaindamaispálidoemcontrastecom seus lábios de um profundo vermelho. Eles formavam um biquinhoperfeito – um pequenino coração num rosto forte. Seus olhos marrom-escuro eram enormes e deles pendiam longos cílios – sem dúvida seumelhor atrativo.Sim, forte, ela pensou, girando o corpo.Forte, comomeupai,eescuro,comominhamãe.DinaheraumpoucomaismagraqueamédiadasmulheresdoPaísdas

Maravilhas.Elatinhaombrosfirmesequadrados,comoosdeumhomem.Nametadedoseucorpo,elaerasólida,suaspernasmagrasemusculosas.Nãotinhanenhumacurvadobustoàcintura–elaeraumsólidoquadrado,comumpeitoamplo,melõesmaispequenosqueosfigosmadurosdescritosnos romances espalhafatosos que Emily lia. Seu gosto por tortas deu umpoucodeflacidezaoseuqueixo,comaidade,masDinahaindaeraatraente,ou,aomenos,eraoqueeladiziaasimesma.NãobonitaedelicadacomoVittiore,mastalvezbonitona.UmaCartacertavezachamoudebonitona,eDinahchoroupordias,mas

agora ela percebia. Suamãe tinha sido largamas voluptuosa e, por essemotivo, sua silhueta de ampulheta ainda agraciavamuitas pinturas. Seuslongoscabelosnegrostinhamalcançadoochão,eelacarregavasuacoroacomnaturalidadeebeleza.Daviannatinhasidomuitoeleganteemvestidose coroas, considerando que Dinah sempre se sentiu mais como um dospássaros ridículos que Charles tão frequentemente empoleirava em seus

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chapéus.– Não acabou AINDA? – ela virou-se para Emily – Para deixar minha

cinturamenorqueisso,sómematando.Emily encostou-se às costas de Dinah para abraçá-la e dar um puxão

final.OossodacosteladeDinahpareceuestalareelaofegoucomdor.– Pronto – disse Emily, com um sorriso de autossatisfação. – Agora

acabei,VossaMajestade.Ela foi pegar o vestido de Dinah e o passou cuidadosamente pela sua

cabeça.O tecidogrossode lã cinza caiu ao redordela comoumacortina,apoiando-sepesadamenteemcadacentímetro.Ovestidoeraadorávelmassério,comcentenasdepequeninascosturasmisturando-senumelaboradopadrão.Umgrandecoraçãodebruçava-sesobreseusombrosedesciapelapartedetrásdovestido,suasduasextremidadessuperioresencontrando-senassuasclavículas.Fitasbrancaspercorriamocoraçãodecimaabaixo,emdelicadasondulações.Brilhantesframboesaspontilhavamsuabarra.Emily abotoou o vestido na parte de cima das costas e começou a

trabalharnocabelodeDinah.Elaotiroudorostodaprincesa,torcendoetorcendo, até que um coque volumoso decorasse a parte de trás de suacabeça. Grampos longos e prateados foram afixados no coque, que foi,então,cobertocomumaredeparacabelosvermelhaecheiadejoias.Harrisseaproximou,carregandoumacaixadecristal.–Não–disseDinah–Não,não,não.Harris a ignorou e abriu a caixa, tirando um comprido pincel púrpura.

Comumsorriso,elecomeçouapassarumfinopóbrancoporseurostocomas longascerdasdopincel.Dinahespirrou,eeles foramenvolvidosnumanuvemdepó.–UmaprincesaNÃOdeviaresistirtantoassim–reprimiuHarris.–Você

deveria estar encantada em fazer parte dessa honorável tradição. Quepresentedeviaser jogarnaCorteReal.–eledeuumpassopara tráscomumsuspiroechamouEmilyparaperto–Tragaacoroa.Emily lentamenteajeitoua fina coroadeDinahemsua cabeça.A linha

ininterrupta de rubis vermelhos em forma de coração tremeluziu comofogo sobre seus cabelos negros e pele branca maquiada. Harris fez umaprofundareverência,eDinahviusuaspernastremeremcomoesforço.Eleestavaficandocadavezmaisvelho,eissoaentristecia.–MinhafuturaRainha.Vocêétãolinda.Sintotantoorgulhoemvervocê

mulher.Dinahsegurousuamãoeolevantou,tomandoentreaspalmasseugentil

rostoredondo.

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–Meuqueridoamigo.UmdiaeusereiRainhaevocêjamaisteráquesecurvardenovo.Vocêvaipassarseudiacomendotortaserepousandoemtravesseiros, enquanto outros criados irão providenciar o que vocêprecisar.Harrissorriutimidamente.–Seureinadovaisermaravilhoso,estoucertodisso,masesperariaque

VossaAltezapudesseencontrarmelhoresutilidadesparamimdoqueficardescansandoemtravesseiros.Talvezumaposiçãonoconselho.–Talvez.Dinah ouviu o clangor metálico do trompete, do lado de fora da sua

sacada.AFamíliaReal estava sendo invocadaparao jogo.OGramadodeCríquetelocalizava-sebemnocentrodojardimdopalácio–umquadradobemdelineadoeverdebrilhante,cercadoportorresimpassíveisdoPaláciodo País das Maravilhas. Pilhas de neve cor-de-rosa foram varridas emmontanhas gigantes, que contornavam as laterais do verde, e o própriocampoparecia tãoexuberantecomose fosseumdiaquentedeverão,emvezdefimdeinverno.Firmesdegrausdemadeiraemtrêsladosdocampoforneciamamploassentoparaascentenasdesenhorasesenhoresdacorte.Nos degraus mais baixos, milhares de pessoas da cidade assistiam aosjogadores. Dali, eles podiam admirar, fofocar e dar o próprio julgamentosobretodomundo–opassatempofavoritoduranteoJogoRealdeCríquete.Dinahesperounumladodocampo,ladeadaporHarrisedozeCartasde

Copasparadasprontasparadar-lhequalquertipodeassistência.OMestredos Jogos curvou-se diante de Dinah e, então, chamou-a adiante. Dinahrespirou fundo e murmurou uma oração silenciosa para que tudo issoacabasse logo. Músicos, apinhados um em cima do outro em uma caixadecorada de modo elaborado, erguiam seus compridos trompetes eemitiramtrêsnotasemsaudação.Dinahlevantouseufortequeixoeentrouno campo.Uma educada ondade aplausos soou enquanto ela caminhavapeloverde,seuvestidocinzaroçandoaslâminasafiadasdegrama.Quandoelachegouaomeiodocampo,olhousurpresaaoredor.Sefosse

jogarcomVittiore,ela já tinhaqueestaresperando,naordemcorretadehierarquia. Dinah sentiu um raio de felicidade invadindo-a; talvez issosignificassequeVittiorenãoiriasejuntaraeles!SeriaapenasDinaheseupai, jogando sozinhos. Seu coração deu um pulinho de esperança. Talvezseupaivissequeelaerauma filhadevalor, sua forteherdeira.Dariaseumelhornojogo,Dinahdisseasimesma,semchoramingarousegabar.ElaseriaoretratoeavisãoperfeitadafuturaRainha.O Mestre dos Jogos aproximou-se solene e entregou a Dinah um

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compridobastãodemadeiranoformatodeumflamingo,opássarooficialdopalácio.Dinahgostavadesentiropesadobastãonapalmadamão.Essesbastões eram talhados das árvores da Floresta Retorcida. Cristalizadas eantigas, levavam-se meses para cortar essas árvores e, por causa disso,somenteumapodiaserderrubadaporano.Suamadeiraeravendidaaaltospreços no País das Maravilhas, valendo cem vezes mais que madeiranormal. Soldados a desejavam para o cabo de suas espadas, fazendeirosparaseusarados,mulheresparasuascolheresdecozinha.AúnicapartedaárvorequenãoeravendidaerausadaparaosbastõesdecríqueteparaaFamíliaReal.Dinahesperou,batendoimpacientementeobastãocontrasuaperna,até

ouvir os trompetes rugirem pela segunda vez. Mordendo o lábio, Dinahcurvou-senumaelaboradareverênciaemantecipaçãoaoseupai.Enquantoseusolhosestavamvoltadosparaochão,elaouviuamultidãoprenderoar.Seus olhos negros ergueram-se, esperando ver seu pai em toda suagrandeza,mas,emvezdisso,elateveavisãodabelacobravenenosa.Umaonda de desapontamento a tomou. Vittiore vinha flutuando pelo campo.Seu longovestidoera feitodecentenasdecamadasde fitas tremeluzindoem tons pastéis: pêssego, rosa e limão misturadas de maneiraadoravelmentepeculiar.Seucabelodouradotinhasidocacheadoemváriospequeninhos anéis, que desciam em cascata por suas costas. Sobre suacabeça,umpequenochapéuadornadocompenasbrancasdepavão, feitopeloChapeleiroMaluco. Elas estavamafixadas comumagrande gemadotamanhoedacordeumpêssego.Araivaferveudentrodela,eobastãodeDinahcaiudesuasmãos.Erao

broche da mãe dela. Desde criança, Dinah amava aquele broche,frequentemente fazendo de conta que era um pêssego de verdade,enquantodavaseusprimeirospassosnoquartodamãe.Vittiore fezumareverênciaeducadaparaDinahesussurrou-lhepalavrascorteses.–VossaAlteza.Vocêestáencantadoradecinza.DinahdeuumpassoameaçadornadireçãodeVittiore.–Éumapiada?–perguntouela,comosdentescerrados.Vittiorepareceudesconcertada.–Não?Com um só passo certeiro, Dinah pensou, eu poderia enterrar meus

sapatosderubinoseurostinhobonito.–Ah,vejoqueaPrincesaestáansiosaparacomeçarojogo.Cheshire,vestidoemfascinantepúrpura,veiodeslizandoaoredordelae

deVittiore,colocando-seentreasduas.

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–O JogoRealdeCríquete,VossasAltezas,devesempreser jogadocomgraça e dignidade. Devo lembrar as duas de que o reino todo estáassistindo.Enquanto ele as repreendia severa e calmamente, seus olhos negros

demoraram-sesomenteemDinah,quemordeuoprópriolábio,atéqueelasentiuumagotinhadesanguenalíngua.Elasorriufervorosamenteparaele.– Claro, Sir Cheshire. Jamais alguémdeve se portar comnada alémde

honestidade e caridade. Um homem virtuoso como você nos faz lembrardisso.Cheshireaencarou,seusolhosescurecendo-sederaiva,seulargosorriso

norosto impassível.Dinahsentiuumapunhaladademedo.VittioredeuaDinahumsorrisodepêsamesesegurouseubastão.– Lembraremos disso, Sir Cheshire. Pormuito tempo ansiei jogar com

minhairmã.Elaergueuseusbraçosesguiosepálidoseacenouparaamultidão,que

rugiu selvagem em aprovação, seguida por propostas indecentes decasamento. Era o tipo de recepção queDinah nunca tinha recebido, nemumavezsequer.Cheshire pôs sua mão fina sobre o ombro de Dinah, apertando-o, e

sussurrouemseuouvido:–Conforte-secomofatodequeelaprovavelmenteestásentindomuito

frionaquelevestidinhofino.Antesdeserbela,umarainhadevesersábia.Entãoelepartiu,voltando-seàsuaposição juntoàsCartasdeCopasde

seupai,osbraçosatrásdascostas,umaexpressãosábianorosto.ApesardeaindaodiarCheshireedeselembrardequandoeleatrancouparaforadopalácio,Dinahpermitiu-sesentirconfortadapelosarrepiospercorrendoosbraçoseopeitodeVittiore.Ela,defato,estavaconfortávelnocalordoseuvestido de lã cinza, ainda que parecesse uma mulher de meia-idadecomparadaàradianteduquesa.Elavirou-separaamultidãoe identificouWardley,paradoemseuuniformedeCopasnaextremidadedocampo.Eleergueuamãonumasaudaçãosilenciosa,massuaexpressãoestavatorcidaporumfranzirdecenhoenquantoobservavaVittiore.Dinahestavaaliviadapornãoseraúnicaanotaressedesgostopúblico.Elepareciaincrivelmentedescontente para o próprio bem de Dinah, como se alguma comida otivessedesagradado.Finalmente, após muitas explosões de trompetes, seu pai pisou no

campo, seus passos de ferro ricocheteando para fora do caminho demármore.Seucabeloloiroeonduladofoiafastadodeseurostoparatrásde

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suapesadacoroadourada,esuasbochechasestavamvermelhas,coradas,comosetivessebebido.SeupaiodiavaoJogoRealdeCríquetetantoquantoela.Elepreferiaesportesdecaça–matarveadosoucavalosselvagensforadosmuros do castelo, ou perseguir os rastros dos grandes gatos domarque perambulavam pelo Desfiladeiro Oeste. Ele amava a caça, aquelemomentointensoemqueosanimaislutavamporsuasvidas,tudoemvão,poiselesestavam fadadosa sero jantardoRei.ORei limpouagarganta,pigarreando.–Dê-memeubastão!–berrouele.SeuolharrepousouemDinahenquantoeleesperava.Elamanteveseus

olhosnegrosgrudadosnochão,maselapodiasentirocalorquequeimavadoseuolhar.Ostrêsjogadoressealinharamecadaumrecebeuumabolsade veludo que continha suas bolas de madeira, entalhadas na forma deouriços. As de Dinah eram vermelhas, as do Rei, pretas, e as de Vittiore,brancas. O Mestre dos Jogos caminhou solene até o centro do campo eexplicou as regras. Batidas de tambores soaram enquanto os jogadorescaminhavampelocampo.SeupaigentilmentetomouobraçodeVittioreeafezficaraoseulado.UmciúmeagudoatingiuopeitodeDinah.Elalançouum olhar pesaroso na direção de Harris. Ele lhe deu um sorriso gentil eesfregou nervosamente as lentes dos seus óculos em seu lenço. Elalevantouo olharparaobservar asnuvensque rapidamentepassavamnocéu,parafingirqueestavaemqualqueroutrolugar,excetoali.Quandoosjogadores tomaram suas posições, uma única corneta explodiu um somtriunfante, e a multidão aplaudiu ruidosamente. Lanternas brancasesvoaçantesforamacesas,contornandoocampo,eoJogoRealdeCríquetecomeçou.Vittiorefoiaprimeiraabater.Suaprimeirajogadacomobastãofezsua

bola branca chocar-se com as duas primeiras metas, mas seus lancesseguintes não a deixaram próxima de sua meta seguinte. Dinah era apróxima. Ela nunca tinha sido habilidosa em críquete, apesar das liçõessemanais que ela desprezava. Sua bola vermelha passou pela primeiraportinhola,masficoupresanasegundameta.Seusegundolancedeixousuabolanocaminhodeseupai.OReideCopasassumiuajogadaseguinte.Suabola abriu caminho pelas portinholas na primeira tentativa, golpeando aboladeDinahforadoslimitesdecursoaserpercorrido.Vittioresoltouumarisadinhatriunfante.–Excelentelance,papai!Eletomouseuslancesextrasparamandarsuaesferapretadiretoparaa

terceirameta. Vittiore assumiu seu segundo turno, o toque gentil de seu

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bastãofazendosuabolabrancapassarpeloobstáculo.Dinahconseguiuquesua bola vermelha voltasse para a direção certa, mas ela não teve aoportunidadedeassumirumoutroturnoantesqueasbolaspretasdeseupaiestivessemmirandoassuasvermelhas.Dinahreconheceuaestratégiadele imediatamente. Isolar o oponente. Atacar com incansável fúria.Dominar.Eliminar.Ao observar seu pai sorrindo encorajadoramente paraVittiore quando

elamandouumadesuasbolasbrancasparaumarbusto,Dinahsentiusuavergonhanesseeventorapidamentesetransformaremraiva.Afúrianegraestavacrescendodentrodela,fazendoapontadeseusdedoscomicharem.Doispodiamjogaressejogo,elapensou–nãosepermitiriaserhumilhadapor esse afeto inapropriado. Quando sua vez chegou novamente, elagolpeoucomforçacomobastão,nadacomoumadama.Suabolavermelhavooupassandopelamarcae,comumchoque,lançouaboladeVittioreparaforadocursocomoumperfeito foguete.Amultidãosoltouummurmúriodedesaprovação.PobreVittiore.Dinahnãoseimportou.Outra corneta explodiu e o jogo ganhou complexidade assim que os

pássarosforamsoltos.Umadúziadepássaroscorreramàsoltapelocurso–flamingos, dodôs, cisnes de um branco pálido e patos. Eles entravam nocaminhodasbolas,bloqueavamasestacas,oubicavamoscalcanharesdosjogadores.Eraocaos.UmdodôenterrouobiconadelicadapanturrilhadeVittiore,eelasoltouumgrito,oquefezocoraçãodeDinahdarumpulodealegria.Aindaassim,mesmocomoscaprichosdospássarosecomohumorlevedamultidão,tantoDinahquantoseupaipareciamsentirumamudançano propósito do jogo, enquanto atacavam impiedosamente um ao outro.Bolas vermelhas e pretas chocavam-se umas contra as outrasininterruptamente, enquanto seus bastões agitavam-se, erguendo-se cadavezmaisalto.Vittiorefoiquaseesquecida,masquandoelaseaproximoudadécimaprimeiramarca,Dinahenviouumabolavermelhaemseucaminho,eelafoiempurradaparatrás.O tempo parecia se estender para sempre enquanto os três abriam

caminho,aroapósaro.Amultidãotornou-sesilenciosaetensaaosentirarivalidade entre Dinah e seu pai. Círculos escuros de suor tinham seformado debaixo dos braços do Rei e pela testa de Dinah. Seu pesadovestidodelãestavaencharcadopordentro,eDinahfantasiouarremessá-lona direção damultidão. Sua fina coroa de rubi repousava desconfortávelsobresuacabeça,suaspontasafiadas,puxandoseucabeloparafora,fioporfio,enquantoelasecurvavaerodopiava,semseimportarcomcomodeviaestarparecendo.

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Depoisqueumahorasepassou,Cheshireavançouparaomeiodocampoesinalizouparaospegadoresdospássaros.Ospássarosforamagrupadoseremovidosparaarodadafinal,marcandoofimdojogo.FaltavamtrêsarosparaVittiore,eelanãovenceria.Eladesistiucomumsorrisoconformadoparaamultidãoeumacenodemão.Elesemitiramumagrandesaudaçãoquandoelaseretirou,seuscachosloirosintocadosporquaisqueresforçosfísicos dos quais Dinah e seu pai estavam sofrendo. Cheshire a conduziuparaolimitedocampo,ondeeladesmoronousobreumagrandepoltronaemformadecoração.Elaeratãocharmosacomaquelafalsamodéstia:umajogadadecabelo,umpiscardeseusolhosazuis.IssofaziaDinahsesentirdeprimidaeinvejosaaomesmotempo.Erasuavez.Suasemoçõesmisturavam-seeeladesceuseubastãosobre

sua bola vermelha vingativa, fazendo-a disparar pelo campo com umsonoroCRACKechocar-secomaúltimabolapretadoseupai,quevoouparafora da fronteira, indo aterrissar aos pés de uma mortificada Carta deCopas, quedeuumpassopara trás, sabiamente,poisopróximo somqueDinahouviufoiogritofuriosodeseupai.EledeutrêspassosnadireçãodeDinahe apuxouviolentamenteparaperto.Harris eCheshirepisaramnocampo,prontosparainterferir.OsdedosenormesdoReienterraram-senoombrodeDinah,enquantoumolharcrueltomavacontadasuaexpressão.Para a multidão, parecia um momento engraçado entre pai e filha. MasDinah podia ver a indignação furiosa nos olhos dele e sentir o cheiro dovinhoquandoseuhálitosoprounorostodela.– Princesa, você VAI me deixar vencer esse jogo. Você não vai me

humilhar na frente do meu reino mais do que a sua mera existência jáhumilha.OReideCopasnãovaiperderparasuafilhapatética,ouvocêvaiterqueprocurarumnovomentor,eHarrisvaiseperceberrepentinamenteumEspadas.Lágrimas quentes transbordaram dos olhos de Dinah enquanto ele a

sacudia.Eleeraoseupai,comopodiafazerissocomela?Tentouinvocaramesmaousadiaque tomoucontadelaquandogolpeousuabolapara forado campo, mas não a encontrou. Ela foi substituída por uma fomedevoradorapeloamorde seupai, tãopoderosae realquea fezperderofôlego.–Euvou–sussurrouela–Voufazerqualquercoisaqueosenhorpedir,

papai.Eusintomuito.–Nuncamaisseesqueçadenovodoseulugar.EusouseuReieVittioreé

sua irmã e você vai honrar nós dois. Depois do jogo, você vai se curvardiante dela para que todo o País das Maravilhas possa ver que você a

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aceitoucomosuairmãdesangueeigual.Um soluço de choque escapou dos seus lábios cerrados. Ele sorriu e

gesticulouparaamultidão.–Elalevaojogotãoasério!–anunciouele–Minhadocefilhinha.Ele a soltou. Dinah deu um passo para trás, seus joelhos ameaçando

fraquejar sob ela.OMestredos Jogos caminhouaté o centrodo campoefaloudentrodeumchifredepratafeitodealto-falante.–ApartidafinaldoJogoRealdeCríquetevaicomeçaragora.Porfavor,

fiquemdepéparaoseuRei.A multidão se levantou. O Rei tinha a jogada final. Ele desabotoou os

quatrobrochesemformadecartasqueapertavamsuacapaealançounadireçãodeWardley,queatirourapidamentedocampoealevouconsigoaoseulugaràbordadogramado,masnãoantesdelançarumolharsolidárioemdireçãoaDinah.AboladoReiroloutranquilamenteatravésdaúltimamarca e atingiu a estaca final. Todos os olhares viraram-se para ela,incluindo o de seu pai. Sua expressão era uma mistura distorcida deorgulhoemedo,comoumursonuma jaula.Elepertenciaaumcampodebatalha,nãoaumcampodecríquete.Ouaumtrono.Dinahergueuseubastão.Houveumprenderdefôlegoeelaolhouparaa

multidão,expressõestensasansiandopelavitóriadoseuRei.Elesotemiamsem conhecê-lo, idolatravam-no semprova alguma de sua divindade. Elaentendeude repenteoqueeranecessáriopara serumherói – tinhaqueestardispostoaserumtestadeferro,umamerafigurarepresentativa,semtraço nenhum de intimidade. Tinha que ser a projeção dos medos eesperanças até mesmo dos mal nascidos. Ela entendia. Essa multidãonecessitavadequeseupaivencesse.Ela desceu o bico do seu flamingo com força sobre sua bola que voou

pelo jardim e quicou na beira da estaca. A multidão irrompeu numasaudação gloriosa. Asmulheres estavam chorando e os homens estavamsaudando seu pai – traçando a forma de um coração sobre o própriocoração–edeixandoescaparbravosgritos.OReiergueuseubastãosobreacabeçaemsinaldevitória.Vittiorecorreuparaele, seuvestido flutuandopelagramaverdeebem

cortada.–Papai!Parabéns.Ele a levantou nos braços para um caloroso abraço. Dinah deixou seu

bastão cair e caminhou para fora do campo. Harris seguiu atrás dela, acabeçacaídaemmútuodesapontamento.HámuitotempoHarrisaprendeua ler o humor de Dinah e sabia quando repreender… e quando ficar em

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silêncio. Dinah caminhou rapidamente pelo palácio, seguindo caminhopeloscorredoresretorcidosdepedraatéseuquarto.Elatirouseuvestidode lã cinza, cheirando a suor azedo, e caiu sobre seu colchão. Umamãosuave, enrugada e emagrecida pelo tempo, percorreu por seus cabelos esobresuafronte.ElasentiuHarrissentar-seaoseulado.–Euseiquevocêperdeuaquelelancedepropósito.E,umdia,vocêserá

umagovernantemelhorqueseupaiporcausadisso.Oorgulhodeumlídernuncadevevirantesdobemdoseupovo,algoqueseupainuncapercebeu.Amultidãosomentetorceporeleporqueoteme,nãoporqueoama.Dinahpermaneceuemsilêncio.–Euadeixareidescansaratéobanquetedestanoite–murmurouHarris,

inclinando-se sobreelaparadar-lheumbeijona fronte.Umsono furiosoviolentamentetomoucontadela.

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Seis

Dinah sonhou que estava flutuando em tinta preta, sem peso, sem osconfinamentos do próprio corpo. Pequeninas faíscas de luz brancapulsavamnas lateraisde suavisão.Circulavamedançavamenquantoelaoscilava entre consciência e letargia. Dinah estava consciente de algomalévolo lentamente nadando pela névoa negra em sua direção. Estavafora de seu alcance, mas era temível e tinha fome. Dinah percebeuassustadaqueelaestava,naverdade,penduradadecabeçaparabaixo,seuscabelosondulandonasestrelasbrilhantes.O céu de tinta vibrou e transformou-se num líquido prateado. Dinah

girou no ar, agarrando-se para ficar de pé. Relógios e várias peças demóveispassaramflutuando,boiandonumrioinvisível.Onegrovibrouumasegunda vez, e agora ela estava flutuando num espelho. O perseguidorassassinoestavaperto;elapodiasenti-loagora.Estavaquaseemcimadela.Asunhas friascomogelocravaram-seemseuestômagoeseios.Lutando,Dinahendireitou-se, levantando-sesobreseuspésatéqueapontadoseunarizroçasseoespelhomacio.Elepartiu-secomoágua.Haviaoutroatrásdela.Seusprópriosbraçosagarraram-seemseucorpo.Seusolhosnegrosarregalaram-seenquantoelaolhavaopróprioreflexo.Elaeraaescuridão.Dinahdeuumpulodacamaemsobressalto.Estavaencharcadadesuor,

seusbraçosagitando-senoarfriodanoite.Emilylevantou-sedacadeiradebalançopróximadacama.–Estátudobem,Princesa?–Sim,sim.Obrigada,Emily.Quehorassão?Emilyabaixousuasagulhasdecostura.– Provavelmente deveríamos nos aprontar para o banquete. Algo em

mente,minhaSenhora?DinaholhoupelajanelaparaasestrelasmutáveisdoPaísdasMaravilhas,

acabeçaaindanosonho.–Algoleve.Esemlãnenhuma.Normalmente Dinah não gostava de banquetes. Depois da pompa

infindável e entorpecedora de cérebro que era o ato de sentar-se com

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senhores e senhoras, das Cartas bem nascidas, dos escudeiros econselheiros,afamíliarealfinalmentesesentavaatrásdaMesadoRei,quenãoeraumpedaçocomumdepedra.Asextremidadesdagrossamesadeobsidiana faziam curva nas pontas, com pontas afiadas de navalha queeramacausademaisdoquealgunsbraçosferidos.OReideCopassentava-se em uma elevada plataforma, próxima ao meio da mesa, sua coroadescansando ao lado do seu enorme cálice. Seu bigode loiro já estavamanchadodevinhodecereja,dando-lheaaparênciadeuminsanocanibal.Dinah sentava-se à sua esquerda e Vittiore, à sua direita, parecendoiluminada, como sempre, num vestido justo da cor demirtilosmaduros.Seusolhosazuisebrilhantesradiavamdoseupequeninorosto,encantandoo coração de todo homemdo País dasMaravilhas.NenhumaCarta podiapassarporelasemseencantarporsuapresençaetérea.OReirecostou-seemsuapoltronaesoltouumsonoroarroto.–Maisvinho!–ordenouele.Cheshire inclinou-se sobre o pai da princesa, flutuando no ar como

sempre.EleestavasussurrandonoouvidodoRei,auxiliando,enquantoosolhos do monarca fitavam toda a sala, reconhecendo amigos, inimigos etolos.Osescudeirosderramarammaisvinhoemseuimensocálice,eeleoentornou,sedento,comumadasmãos,aoutrasemprerepousandoemsuaEspadadeCopas.Seupaiviainimigosemmuitoslugares,emcadacasa,emcada linhagem distante e visivelmente absurda que levava ao trono.Assassinos Yurkeis estavam por todos os lados, ele acreditava, cada umdelestentandoroubarsuacoroa.EmilytinhadeixadoescaparparaDinahquehavia inúmerosrumoressobreaparanoiadeseupai.Queeledormiacom sua Espada de Copas. Que seis guardas faziam vigília enquanto eledormia.Queelesomenteconfiava,deverdade,emCheshire.Dinahempurrouooleosopeitodeavestruzpeloprato,cobrindo-ocom

sementesebrotos.Elaestavasemumpingodefomee,pelosseuscálculos,teria que ficar sentada ali por mais quatro horas, um sorriso congeladocolado no rosto. Vittiore soltou uma risada cristalina em resposta a algoque seu pai disse, e Dinah se inclinou sobre a mesa para lançar-lhe umolhardereprovação.Cheshirearecompensoucomumsorrisodeorelhaaorelha, acimada cabeça do seu pai. Dinah lutou contra o desejo de fazervoarseupratonadireçãodele,enquantoabilesubiaporsuagarganta.Seupaisempreaodiou,desdeodiaemquenascera,eDinahestavaconvencidadequea línguavenenosadeCheshire tinhamaisdoqueumpoucoavercomisso.Elapodiaselembrardequandoeramuitonova–antesquesuamãe morresse – e viu Cheshire pela primeira vez. Com cabelos e

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sobrancelhas negras, Cheshire era jovem, mas com a mesma aparênciadesonesta. Sua mão tinha descansado sobre o ombro do Rei, tinha oapertadocomforçaquandoDinahaproximou-sedeles,compassosincertosde suas perninhas. Ela levantou o olhar para o rosto do Rei em alegreantecipaçãoenãoviunadaalémdeumaraivafervente.Eleaassustou;elenão era o seu pai? O homem que amava a sua mãe? Seus olhos azuispercorreram-na,procurando por algo que não encontraram. Sua boca secontorceu primeiro em confusão e, depois, em nojo. Ele a empurrourudementeparatrás.–Tire-adaminhavisão.Nãoqueroquevocêtragamaiselaaqui–disse

eleaHarris,eduasCartasgentilmenteaempurraramparalongedele.Dinahdeuumgritoechutouoprimeirodelesnacanela.AsegundaCarta

foiagarrá-la,maselagirouparalongedeletambém.Chorando,gritouporseupainoarvazio,enquantoHarrispassavaseus

braçosemtornodelaparasegurá-la.–Dada!DADA!DADA!O Rei de Copas passou por ela sem um segundo olhar, sua capa preta

roçando por seu rosto enquanto ele seguia para longe dela, além dela.Cheshire seguiu atrás, a cabeça curvada. Dinah era pequena o suficientepara ver o sorriso de satisfação que se estendeu no seu rosto comprido.Mesmosendoumajovemcriança,elasuspeitavaque,dealgummodo,essepedaço inteligentedehomemtinhaviradoacabeçadeseupaicontraela,sua filha, aquela que ele devia amar, mas nunca amou. Ela sorriu paraCheshire, enquanto prometia, do fundo do seu coração, que a primeiracoisaquefariacomoRainha,depoisqueseupaifalecesseouelasecasasse,seria mandar Cheshire para as Torres Negras para sempre. Claro, ele atinhaajudadonodiaemqueVittiorechegou,mostrandoparaelaostúneis,mas isso porque ele tinha seus propósitos. Com Cheshire, podia-se estarcertodisso.Elenãoeraumhomemparasesubestimar.Ashoraspassavamlentamente,enquantoamultidãotornava-secadavez

mais embriagada pela bebida, e as luzes lentamente diminuíam.Gargalhadasfelizeseocheirodeliciosodetortasabraçavamcomoamantesaqueles sentados, aproveitando o banquete. Dinah estava entediada. Elalançouumolharparaseupai,queriaruidosamentejuntodeXavierJuflee,oValete de Copas e comandante das Cartas de Copas. O Rei de Copas nãonotouDinahobservando,tampouconotouVittioreobservandotristementeadistância, olhandopara algoqueDinahnão conseguia ver. Ela seguiu oolhar de Vittiore até os fundos do salão, mas havia somente sombra,ninguém. Vittiore baixou o olhar, corando. Havia algum movimento na

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periferia de sua visão, eDinah saiu de seu transe e baixouos olhosparamesa.Seu prato tinha sido levado e, em seu lugar, havia uma fatia ainda

soltando fumaça de pão de frutas vermelhas repousando num delicadoprato fino. Ela piscou chocada. Não tinha notado o prato extra sendocolocado em sua frente, e isso era alarmante por si só. Rabiscado emadoráveis letras cursivas, alguém tinha escrito “Coma-me” com geleia deframboesanalateraldoprato.Intrigada,elaolhouaoredor,masnãohavianinguém agindo de modo suspeito, ninguém parecendo malicioso numcantopróximo.Haviaapenascentenasdepessoascomendo,dançandoesegabando excitadas das partidas de críquete que elas mesmas jogaramnaquelatarde.Wardleyabriacaminhoatéooutroladodoquarto,bebendograndes goladas de uma gigante caneca de prata; Harris estavamconversandocomoMestredeMúsica;eCharles jamaisteriasidodeixadoseaproximardobanquetereal.Elavoltouoolharparaamensagememseuprato:“Coma-me”.Seriaum

insulto?Umaameaça?Veneno?Dinahrapidamenteesfregouamensagemcom sua colher de prata. Cada respiração sua cheia de curiosidade, elalevantouo garfo e o espetounopão.Ouviuo cliquedometal na louça, eencontrou um minúsculo frasco de vidro, menor que um carretel decostura. Com as mãos trêmulas, ela pegou o frasco, mantendo as mãosbaixas sobre o prato. A rolha saiu facilmente e um pedacinho de papelescorreuparaseusdedosansiosos.Elaolhouaoredormaisumavez.A festa continuava a se intensificar. Gordos pássaros brancos corriam

acima e abaixo dasmesas, sendo alimentados por divertidos convidados.Como sempre, ninguém se importava com a estranha filha de cabelosnegros do Rei. Suas mãos tremiam enquanto ela desenrolava o papel,perguntando-se de quem ele poderia ter vindo. Cinco palavras, escritasnuma caligrafia cadenciada, agraciavam o pedaço de pergaminho: FainaBaker,asTorresNegras.Rabiscadoaoladodaspalavrasestavaopequenodesenhodeumtriângulocomumaondasobele.Osímboloeravagamentefamiliar,emboraDinahnãoconseguissese lembrardeondeenãotivessetempo de pensar sobre isso nestemomento. Ela virou o papel. Nada. Asbatidasdoseucoraçãoeramtãoaltasqueelatinhacertezadequetodoosalão podia ouvi-las, ainda que ninguém sequer olhasse em sua direção.Dinah fechou os olhos, gravando o nome, o símbolo e as palavras namemória.Então,ela fezcomoseupratoa instruiuecomeuaspalavras,opapelpastosoesemgostonalíngua.

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Sete

Asestrelasestavamradiantes–brilhavampelonorte,sobreoTodrenetambémpelosul,deondeseviamlinhasverticaissobreasTerrasEscuras.Dinahficousozinhanasacada,embrulhadaemgrossoscobertoresdelã.– SuaGraça, você vai congelar aqui fora! –Emilydissepreocupada, de

dentro de seu quarto. Dinah virou os olhos e a silenciou levantando suamão.–Emily,euestoubem!Estouaquecidaosuficiente,oinvernoestáquase

no fim. – Emily fez uma expressão de consentimento e se retirousilenciosamente.Dinahvoltouseuolhardevoltaparaocéu.–FainaBaker,asTorresNegras.–elamurmurouessaspalavrasparasi

repetidamente.Nãoconseguia imaginaroque significavam,apenasoquesentia–não,elasabia–queeraalgodegrandesignificadoeconsequência.Havia esperado toda sua vida por esse pequeno desenrolar, sem saberdisso. O fiomudo de inquietação que acompanhou cada passo seu nestepaláciotinhaorigens.Eraumpresentenojogodecríquete,nosbanquetes,nos sussurros das Cartas e na corte, especialmente desde que Vittiorechegou. Seráque esteminúsculopapel era talvez sua resposta, algoparacolocá-laàfrentedasituação?QuemeraFainaBaker?Oqueelasabia?E,maisimportante,porqueela

estava nas Torres Negras? Dinah mordeu seus lábios, um hábito denervosismo. Ao contrário do que ela tinha dito a Emily, o ar de fim deinvernoestavaumpoucofrio;afriagementrouporseuscobertores,comoseelesfossemfinoscomolinho.Elasearrepiou.Erahora.Dinahpuxouumlongocachecolborgonha,compequenasfloresbordadasemrosa,desobocobertor.Elachegouatéabeiradasacadaegirouemtornodeumpequenodegraude ferro,nabeiradabalaustrada.O cachecol sedesdobroucomoventocortante,umafaixavermelhaemcontrastecomocéuescuro.Ela entrou, pegou seu chá e tomou banho em silêncio, observando o

vapor subindo pela sala de vestir. Harris e Emily se retiraram para seusquartos de dormir separados, e Dinah ficou andando de um lado para ooutroemfrenteàsuajanela.Paciêncianuncafoisuavirtude,equandoela

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nãoconseguiumaisesperar,saiudasacadaefixouseuolharparaabeiradadela.Elaenvesgouatéver:oescudocomvieiraspratadeWardley, tendoCorningajoelhado,apoiadocontraumcochodeáguaforadoestábulo.ApeledeDinahseagitoudefelicidade–Wardleyestavachegando!Eles

secomunicavamdessamaneiradesdequeelaeraumagarotinha.Wardleysempre estava nos estábulos, enquanto Dinah estava confinada em suaslições, dentro de seu Aposento Real, por isso arrumaram amais simplesformademensagem:umescudoouumcachecolsignificam:“Euprecisotever”.Ooutromontavasuarespostaeamensagemestavacompleta.Dinahvestiuumasimplescamisolacordeameixasobresuafinatúnicaeamarrousua capa sobre ela. Encostando sua orelha contra a porta, ela ouviu asCartasdeCopasdescendoatéofimdaala.Seuspassosdemetalforamsedissipando até desaparecerem completamente.Dinah soubeque eraumaquestãodeminutosatéqueelasvoltassem.Andandosilenciosamente,elasaiudaportaecorreuatéaentrada,omármoregelandoseuspésdescalços.Ela seguiu para baixo, atrás dos passos do servo, no final da ala, ondecomeçou a ventar pelos diferentes corredores, em direção à Capela deCopas.No começo de seu reinado, seu pai ordenou a construção de uma

pequena alcova que tivesse visão para a Capela de Copas. Enquanto amaioria achava desconcertante que ele fizesse qualquer mudança nessasalaantiga,umaque irradiavacom luzearquiteturacaprichosa,oReideCopas pressionou, apesar da construção incluir a demolição de ummagnífico alaúde antigo, que foi selado na parede externa. A alcova foiapelidade“ACaixa”.Seupropósitoera iluminaremudaroscoraçõesdoscamponeses, abençoando-os comopresentede cultuardentroda capela,enquantoosmantinhalongedosmembrosdacorteedaFamíliaReal.OReiacreditava que, concedendo aos camponeses indesejados e órfãosaudiências com a realeza inspiraria, um dia, grandeza nas pessoas declassessociaismaisbaixas.Tododomingo,camponeseseramrodeadospelasCartaselevadosatéA

Caixa. Eles eram forçados a participar da cerimônia na Capela de Copas,recebiam pão e sopa, e eram mandados para seguir caminho. Após apartida, a Capela recebia uma limpeza meticulosa, antes da chegada dopróximogrupodetrabalhadoresdocampo,açougueiros,damasdanoiteepeixeiros.Dinahpensounamais terríveleconvincente ideia–aspessoasdo vilarejo realmente desejavam ser arrancadas de seus trabalhos paraadoraraquelesqueeramtãoprivilegiados?Aindaassim,elaeragrataqueseupaitivesseprovidenciadoumlocalprivadoparaqueelaseencontrasse

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comWardleydentrodocastelo.Comoumaprincesa,Dinahnuncaficavasozinhapormuitotempo,eela

raramente conseguia ir a algum lugar do palácio sem que dezenas depessoasreparassem.Sónasúltimassemanas,cartasdeCopascomeçaramaacompanhá-laa lugaresqueelanormalmente ficavasozinha:abiblioteca,as cozinhas e o átrio. Harris disse que era porque sua coroação estavapróxima e, dessamaneira, seu pai ordenou proteção extra para ela. ParaDinah,eraumachateaçãoterqueaprenderatolerarisso.Comsuarespiraçãopresanagarganta,Dinahabriuasimensasportasda

CapeladeCopas.Elaestavacomsorteessanoite–normalmentehaviaumavigília, mas eles deveriam estar pelos arredores. Ela adentrou a capela.Tinha alguma coisa de horripilante naquele lugar vasto e sombrio, vaziocomo uma tumba e tão frio quanto. Paredes em mosaico brilhavam naescuridão, e ela conseguia distinguir estátuas de pedra com mantosbrigando, abraçando e ordenando: os deuses do País das Maravilhas. Agrandeza da capela a fazia se sentir pequena e exposta. Seus passosquicavam pelo chão como tiros de canhão à medida que ricocheteavampelascolunaseparedesafora.Dinahparoudeprenderarespiraçãoeseviuencarando a parede vermelha, em forma de coração, que decorava osfundosda capela. Finospássarosdourados foramenfileiradosdeponta aponta,atrásdocoração,demodoqueeleosengoliainteiros,fazendosuasasasseremapenasumpontoemsuamassa.Dinahpermaneceusozinhanaescuridão,sentindo-secomoospássaros,

engolidaporcompletoporessasala,pelotrono,porseupaiepelopalácio.Elaansiavaporreinar–sentar-seaoladodeseupaieela,RainhadeCopas,reinariasobreelescomforçaecoragem–maselatemiaoquecustariaparachegarlá.Eraseudireitosentar-senotrono.Quandoelasecasasse,seupainãocederiaotronoparaseumaridocomfacilidade.Seusolhosnegrosseenvesgaram enquanto ela encarava a brilhante janela vermelha, as luzesvermelhas refletiam em seu rosto. O altar parecia pulsar em carmim.Quando eu for rainha, ela dizia a si mesma, todas as minhas dúvidasdesaparecerão,emeupaivaimeabraçarnovamente.Elevaiverqueeunasciparaserrainha,equeeusereiumarainhamelhorqueoreiqueeleera.Dinahouviuo suave ruídodepassos e algumacoisamudounoar.Um

tremularsuavemoveuasbandeiraseatapeçariaqueenvolviaaparede,eDinah, de repente, foi tomada por uma sensação terrível de estar sendovigiada.Elasevirou,mashaviaapenasescuridãoaoseuredor–umburaco,umespaçovazio,eapenasosolhosdosdeusesacimadela.Elafungou.Oarestavacomumcheiroestranho–umamisturainebriantedeterraecarne

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de porco. Atrás dela, uma porta se fechou e ela ouviu passos emmovimento,ecoandopelacapela.Wardley.Elasuspiroucomalívio,viroudecostasrelutanteparaoaltareandouolongocaminhodocorredor,atéqueela estivesse paralela à porta. Com apenas a luz do luar, que era filtradapelajanelavermelha,suasmãosfortesencontraramaescadariademadeiraqueconduziaaotopod’ACaixa.Dinahsoltouumlevegemidoeselevantouaotopodoúltimodegrau.Wardleymostrouseurostodecimadaescadaria.–Depressa!Vocêémaisdevagarqueumalesma.Dinah lançou-lhe um olhar de raiva e continuou a escalar

cuidadosamente,estilhaçosmachucandoseuspésdescalços.Assimqueelaalcançouotopo,foirecebidacomofedordelixo,óleoevegetaispodres–ocheirodapobreza.QuemdeverialimparACaixaapósoúltimoeventonãoofez.Depé,elapassouosdedospelocabeloemaranhadoeajeitousuacapa.Wardley ficouparadona frente dela, vestido em suas roupasde treino –uma larga camisa branca de linho, calças vermelho-escuras e botasvermelhasdemontagem.Suacamisaestavaabertanopeito,eDinahpôdeverobrilhodoluarsobresuapelesuada.Seucoraçãobateutraiçoeironopeito,eelaseforçouaviraroolhar.Wardleydeuumabraçorápido:–Urgh,vocêestácomumcheirohorrível.Dinahsocouseubraço:–ÉACaixa.Parecomisso.–Issopareceumalevebrisaemmeubraço.–eleralhousorrindo.Dinah

sentiuaterratremer–Tentedenovo.Elesoltouseubraço.Dinahdeuumsococomtodasuaforça.Elerecuou.– Ok, tudo bem, doeu de verdade. Continue trabalhando seu braço de

espada.Umdia,seupaitetreinaráparausaraEspadadeCopas.–Duvido,maspareceumbomsentimento.Elessesentaramjuntosnumbancodemadeiraesfarrapadoquefediaa

peixe.– Então, o que você precisa me contar? – Wardley perguntou. – Você

precisade algumacoisa?Está comproblemas?Deveria ter vindoparaosestábulosdentrodealgunsdias.Émuitomais fácilqueficarandandoporaqui sorrateiramente. Notou que agora há Cartas de Copas em todos oslugares por aí? Está ficando ridículo, todos os homens usam uniformeagora. Seu pai não se importa mais se eles são qualificados ou se sãohomensdebem;sóquercorposvestidosemcapas.–Wardleyfezumsomdedesgosto.AconstantequedanosrequisitosparasetornarumaCartadeCopaseraalgoqueelefrequentementelamentava.

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–AomenoselesnãosãodeEspadas.Eleolhou-aporcompletoeviuaseriedadeemseusolhos.Seusorrisose

desmanchou:–Dinah,oquefoi?Dinah aproximou seu rosto do ouvido de Wardley. O simples fato de

estar tão próxima dele fazia com que ela perdesse o fôlego,mas tinhammuitosobreoqueconversar.Paraqualquerobservador,elessepareciamcomdoisjovensamantes,sussurrandopalavrasdeternura.– Ontem alguémme deu um bilhete. Foi durante o banquete, e estava

embaixodomeupãodefrutasvermelhas.Dizia:“mecoma”.Wardley deu um passo para trás, seu rosto tomou uma expressão de

preocupação.Elepegouorostodelaemsuasmãoseseinclinouparaolhá-laclaramente.–Vocênãocomeu,nãoémesmo?Dinah,aquilopoderiaservenenoso.Dinahbalançouacabeça.– Não, não, claro que não. Eu não comi. Mas abri o pão. E tinha isso

dentrodele.–elarelutantementeseafastoudeleetirouumpequenofrascodo bolso de sua capa – Tinha um pedaço de papel dentro dele. Eu li, edepoisocomi.Warldeyarregalouosolhos.Elacontinuou:–Nobilheteestavaescrito,“FainaBaker,AsTorresNegras”.Etinhaum

símbolotriangular.Wardleyolhouparaotelhado,pensativo:–FainaBaker,eununcaouvifalarnessenomeantes.Vocêjá?Dinahbalançouacabeça.–Nunca.Euestivepensandonessenomeportodaatarde,masnão.Eu

tambémnuncaouvifalar.Wardleypegouopequenofrascoecolocou-ocontraaluzdalua.– O que você acha que isso significa? – Dinah apertou suasmãos uma

contraaoutra.– Eu, sinceramente, não sei, mas eu tenho um sentimento de que é

algumacoisaimportante.– Não tem como você saber, Dinah. Pode ser uma armadilha. Alguém

pode estar tramando contra o rei, alguém pode estrar tramando contraVOCÊ.Seupaitemmuitosinimigos.PodeserumassassinoYurkei.– Eu sei disso. Eu sei. – ela se aproximou dele, pressionando sua pele

contra adele, com suaboca contra suaorelha –Eunão consigo explicar,masprecisoencontrá-la.Faina.Essebilhetenãofoientreguesópormalícia,

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euSINTOisso.Warldeypegouamãodelanasuaeummilhãodeestrelasluziramsoba

peledeDinah.–Dinah,euseiquevocêqueracreditarnisso,sónãoseiseéumaideia

sábia.Suacoroaçãoestá ficandocadavezmaispróxima,e talvez issosejaapenasnervosismoseuporestarassumindootrono.Dinahlevantouseusolhosnegroseoencarou.–Vocêconfiaemmim?–Claro.Vocêéminhamelhoramiga.–eleaassegurou,dandoumarisada

nervosa,quefugiudocontroleporsuaintensidade.–Entãomeajudeafazerisso.Wardley,temalgumacoisaerrada.Eusinto

isso. Tem uma emboscada, uma presença, um perigo, alguma coisa RUIMestáacontecendo.Ealguémestátentandonosajudar.EuPRECISO falarcomFainaBakereprecisodesuaajudaparafazeristo.Warldeybalançouacabeça.– Entrar nas Torres Negras será impossível. Você é a Princesa; eles

rastreiam cada movimento seu. E, mesmo que não o fizessem, você nãopode simplesmente entrar nas Torres Negras. Elas estão infestadas dePaus.–elebaixousuavoz–Eosdeusessabemque tipodeperversidadenós encontraremos lá. Você ouviu as histórias. Algumas coisas nuncapodem ser apagadas da memória. As Torres Negras são um lugar deviolência. Tortura. Doença. A depravação do reino se encontra lá, e vocêestá disposta a arriscar tudo isso só por um nome. Um nome que podesignificar nada; nada além de um traidor esperando no escuro, com umpunhalatrásdesi.Vocêrealmenteacreditaqueessamulhertemtodasasrespostas?Querespostasvocêprocura?Eseela realmente tiver,porqueelaestánasTorresNegras?Elessuspiraram- Dinah, me ouça. Criminosos vão para as Torres Negras. Criminosos,

mentirosos, assassinos e pessoas comquem seu pai precisa desaparecer.Nãoéum lugarparaumaprincesa.–elebeijouasmãosdelademaneiracasta–Minhacaraamigaefuturarainha,porfavor,abandoneisso.Dinahsentiusuacabeçagirando.Elanãoconsideroutodasascoisasque

Wardleytinhadito,masnãoimportava.Elasabiadoarrepioquedeslizavasuaespinhaacima,diaadia.–ComoaPrincesadoPaísdasMaravilhaseuordenoquevocêmeajude.Wardleylhedeuumolharexasperado:–Vocênãofariaisso.Alémdisso,eunãotenhoqueteouvir.Vocêainda

nãoéarainha.

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–Maseusereiumdia.–Eeunãotedareiouvidos.Pela fraca luz do luar, Dinah olhou para ele – seu amigo, aquele com

quemelabrincava.Talvezseuamante,algumdia.–Eunãoconsigofazeristosemvocê,Wardley.Nóssempresonhamose

imaginamoscomoseriamasTorresNegras;bem,aíestáanossachance.Wardley se levantou abruptamente, agarrando-a pelo ombro com

ferocidade.–Issonãoéumjogo,Dinah.IssonãoéumabrincadeiranossadeTorres

Negras no Jardim de Rosas, nos agachando atrás dos arbustos. Podemexistirsériasconsequências.Vocêquerperdersuacoroa?Vocêquerqueeupercaacabeça?Dinahdeixousuacabeçacairesussurrou:– Eu sei que estou pedindo demais de você. Mas isso é algo que eu

preciso fazer, com ou sem você. Há algo amais. O símbolo do bilhete, otriângulofeitodeondas?Eujáviisso.Comumdedo,Dinahdesenhouosímbolonochãoempoeirado.Wardley

olhouinexpressivo:–Oqueéisso?–Levouanoitetodaparaqueeumelembrasse,maseuseiondeeujávi

esse símbolo. Está registrado nos túneis debaixo do palácio. Eu lembro,haviamtrêstúneisescondidos.Umlevavaaosalãoprincipal,outroapenaslevavaparaforadosportõesdo lado leste,e tinhamaisummarcadocomesseemblema.–elaoapontou.– Antes eu pensava ser a imagem de uma montanha, as Montanhas

Yurkeis,umsímboloquemarcavaqueo túnel ianaqueladireção.Maseuestavaerrada.ÉosímbolodasTorresNegras.EuachoqueaqueletúnelnoslevariaàsTorresNegras.Wardleycoçouseuqueixo,sentindoabarbacomeçaracrescerdevolta

depoisdebarbeá-lademanhã.–Mascomopodemostercerteza?–Nãopodemos.– E nós não saberíamos em qual torre Faina Banker está, só para

começar.–Estácerto.AgoraWardley andava de um lado para o outro com raiva, suas botas

levantavamuma pequena nuvemde poeira. Dinah conseguiu ver que eleestavalutandoveementementecomsuaprópriacuriosidade.–ComoagentepoderiachegaraoSalãoPrincipal?Eleestáguardadoao

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redordorelógio.Sópordiversão,digamosquenósconseguimosentrareusamosotúnelparachegarlá.Eaí?Nósnãopodemossimplesmenteficarpasseando ao redor das Torres Negras, a princesa e eu, saindo para umpasseio.–Nósconseguimosdarcontadisso.–Dinahrespirou fundo–Eu tenho

umplano.– Digamos apenas que a gente consiga entrar. Nós encontramos Faina

BakeremumadasSETEtorres.Nósconversamoscomela,tomamosumchá,elanoscontaummontedesegredos.Eaí?Nóssó ficamospasseandopordentrodaTeiadeFerro?Tomamosnossocaminhodevoltaparaostúneis?Dinahdeudeombros.–Nóstemosmuitooqueplanejar;nãoestoudizendoqueseráfácil.–Fácil?Éloucura.Éumamissãosuicida.Eparaquê?Dinahselevantoudobancoepegouobraçodelegentilmente.– Para que a futura rainha tenha alguma vantagem antes da sua

coroação. Para não restar dúvidas. “E se?” Para respostas que nuncameforamdadas, e nunca serão. Pelapossibilidadede entenderalgumacoisasobreesselugar.–Eseeuperderacabeça?–perguntouWardley.–Aí,eusentireimuito–eladisse–Éumalindacabeça.Dinah pousou a mão nas bochechas de Wardley. Ela se sentiu tão

próximadele;suapresençafísicaeradevastadora.Sentiuumcalorsubindoem seu rosto, um suor brotando em sua fronte, o cabelo chocolateencaracolado dele casualmente caindo da sua testa. Sem pensar,pressionou seus lábios contra os dele. Luzes brancas explodiram dentrodas pálpebras de Dinah e ela abriu a boca suavemente sob a dele. Seuslábios se mantiveram parados enquanto ele puxou-a para trás surpreso,comsuasmãosnosombrosdela.–Dinah,eu…–Elenãotevetempoparaterminar.Algumacoisasemoveu

naescuridãoabaixo.Elesouviramobarulhodepés,umrepentinosibilonoar.Aescadariadeuumestaloseco.Numrápidomovimento,Wardleytirousua espada e puxou Dinah de forma protetora atrás de si. Sua lâminabrilhavanaluzdalua.–Temalguémaqui–elesussurrou–Nãosemova.Fiqueatrásdemim.OmedooscongelouenquantoumcalafriosubiusobapeledeDinah,um

suspiro preso em sua garganta. Nenhum deles se moveu por váriosminutos,malconseguindorespirar.Daescuridão, sonsde longose fracossuspirossubiramaescadaria.E,então,apenasnomomentoemqueosomdo coração deDinah disparado estava tão alto que ela tinha certeza que

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ressoava por todo o lugar, a presença sumiu. O ar de maledicência foisugado para fora da sala, no entanto, aquela sensação de estarem sendoobservados perdurar. Dinah perguntava a si mesma se essa sensaçãoestiveraláotempointeiro.Wardleyguardousuaespada.–Elesseforam.Elesnãopodemternosescutado,podem?Dinah balançou sua cabeça. De repente, houve um estalo e ambos

pularamumnooutro,enquantoasportasdaCapeladeCopasseabriramabruptamente,etrêsCartasadentraramparaseusturnosdanoite.DinaheWardleyentraramn’ACaixaparaevitarseremvistos.Elasentiuumaondade alívio com a presença das Cartas, apesar de estar deitada no chãoimundoparaevitaroolhardeles.Wardleyolhoupor cimadela comseusolhosarregalados.–Haviaalguémaqui.–elesuspirou–Euouvi.Dinahfezumaceno.Wardleydeuumaolhadadedefesa,seurostoestava

cobertocomumafinacamadadepoeiramarrom.–Tudobem–elesussurrou–EuireiàsTorresNegrascomvocê,masnão

vou gostar disto. Você está certa, tem alguma coisa estranha. Eu ouvisussurrosnosestábulos,eentreasCartas.UmEspadasmedissequeoReitemeporsuavidaeestáreunindotodasassuasCartasaoseuredor.Masporquê?–Entãovocêvemcomigo?Wardleyassentiucomacabeça,suaorelhainclinouparaouvirorelógio.

Dinah estava feliz ao vê-los irem,mas amortificação de beijá-lo devagarvoltou,agoraqueoperigotinhaidoembora.–Wardley,medesculpepelo…Eleacortou.–Nãosepreocupecomisso.Eles ouviram as portas da capela batendo e, de repente, estavam

sozinhosnovamente.WardleypegouamãodelaepuxouDinah.– É hora de partir. Agora. – eles desceram a escadaria rapidamente,

WardleyenvolvendoseusbraçosnacinturadeDinahnoúltimodegraueacolocandonochão.– Vá, vá agora. Volte para os seus aposentos. Use os corredores dos

empregados.Nósfalaremosdistomaistarde.Venhamevernosestábulosamanhã. Nós não vamos nos encontrar aqui novamente. Nunca. Eu nãoacreditoquevoufazerisso.Dinahnãoprecisou ouvir duas vezes,mas ela nãoqueria deixá-lo, não

agora,nãoenquantoeleestavatãoirritado.–Wardley,vocênãotemqueiràsTorresNegras.Euvejoagoraquenão

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deviatertepedido.Masprecisoir.Eunãosoumaiscriançaeprecisosaberoqueestáacontecendocomomeureino.Vocêentende?Wardleydeuumaolhadaparaela,comoseelaestivesselouca.– Se você vai ser a Rainha de Copas – ele disse, inexpressivo –, você

deveriatentardeixardesertãoestúpida.Eunãotenhoescolha.Sevocêfor,eu vou. Você não é tão boa comuma espada comopensa. Alémdisso, sevocêmorrer, seupai cortaminha cabeçadeuma formaoudeoutra.Quesejaentãoporterfeitoalgohonroso.Dinahlhedeuumsorrisorápido.-Honroso?Ouumerrotolo?DinahestavajogandocomWardley–elasabiaqueelenuncaresistiriaa

uma aventura. Wardley deu uma olhada ao redor da sala vazia. Estavaquieto.– Nós faremos um plano mais tarde, mas tiraremos um tempo para

planejarisso.Agora,VÃ.Elaquisbeijá-lonovamente,beijá-lotodososdias,parasempre.Masnão

aconteceunestanoite,entãoelapegousuasaiaecorreuomaisrápidoquepôde para seu dormitório. Até ela se deitar em sua cama naquela noite,repensandonobeijoeemsuaestranhabeleza,comabrisafriadoPaísdasMaravilhasdançandosobsuapele,elanãohaviapercebidoqueelestinhamdeixado o frasco n’A Caixa, junto do desenho do triângulo de ondas napoeira.Estavalá,sozinhonoescuro,querendoserencontrado.

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Oito

Exatamenteummêsdesdeaquelaconversasussurradan’ACaixa,Dinahesfregouosolhos,espantandoosono,enquantoespiavaotic-tacdorelógioemsuaestante.Hojeéodia,pensouseapoiandonoscotovelos,hojeeuvereias Torres Negras e descobrirei quem é Faina Baker. Sentou-se na cama,tocando suas bochechas quentes com as palmas das mãos geladas e sepermitindo respirarprofundamente.Eupreciso estar calmaou issonuncadarácerto,pensou.Temqueparecer serumdia comumpara todomundo,excetoparaWardleyeeu. SoltouumbocejoexageradoenquantoEmily seaproximavademaneiraespalhafatosacomsuastoalhasdebanhofelpudas.–Comovocêestá,SuaGraça?–Estoubem,obrigada.Amanhãsearrastoucomodecostume:umbanhoelaborado,vestir-see

conversar ociosamente com Harris e Emily. Enquanto Emily amarrava olaçodapartedetrásdeseuvestido,Dinahlimpouagarganta:– Fui convidada para tomar chá com a Vittiore hoje, acho que vou

comparecernapartedatarde.Emilyparou:–ComVittiore?Mas…?–EmilysabiabemdoódioprofundodeDinahem

relaçãoaVittiore.–Podenãoserumaideiaterrívelconhecê-lamelhor.LogosereiaRainha

eeudeveriafazeraspazescomela.Nãopossorenegá-laparasempre.Elaéminhasúdita.Dinahsentiusuavoztremerquandoamentirapareceutãoazedaemsua

língua.Harrisaencaravadooutroladodoquarto,emchoque.–MecertificareidedispensarPalmaeNanda.–Emilymordeuoslábios

comraiva.Elaodiavaasduasdamasde companhia estúpidas ebobasdeVittiore,PalmaeNanda;algoquefaziaDinahamá-laaindamais.Elasnuncatrocaram uma palavra sequer, nem nos arredores do palácio juntandolençóis, vestidos e roupas de cama. Dinah não compreendia o ódioprofundoqueasmulherestinhamumaspelasoutras,mas,nodiadehoje,pelomenos, eramaravilhoso que elas não iriamnem se olhar nos olhos.

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Harrispuloualegrementedooutroquarto.–EuouviquevocêvaitomarchácomVittiorehoje?Dinah,essaideiaé

magnífica, que maravilha! Está mais do que na hora de vocês duascolocaremsuasdiferençasdelado.Vocêpodeatéperceberqueelaéairmãquevocêsemprequis.LaçosseapertaramaoredordascostelasdeDinah.– Um poucomais fraco Emily, não quero parecer tensa no chá hoje à

tarde.Emilyfranziuassobrancelhas.–Eunãohaviapensadonisso,SuaGraça;minhasdesculpas.–houveum

segundo de silêncio e, em seguida, a tensão foi dissolvida – Por que nãodeixamosoespartilhodeladohoje,especialmentesevocêvaificarsentadaporumbomtempo?Masentãovamosusarumvestidobrilhante,algoquelembre à Duquesa que você é a futura Rainha. – abriu o guarda-roupabrancoepuxouumvestidodesedamagentacheiodeflorõesecamadas.–Issofaráseuscabelospretosficaremradiantes.Dinahfezumacarafeia,sefizessediferentenãoseriaelamesma.–Nãosezangue,Princesa,sócoloque-o.Assimqueovestidoescorregouporsuacabeça,Dinahlimpouagarganta:–Estareinabibliotecatodaamanhã,estudandocoisasparticularescom

oMonsenhorWol-vore.Wol-voreerao seuprofessorde línguas.Dinahpassavamuitosdiasda

semana com ele, aprendendo a mimetizar a língua das tribos dasMontanhas Yurkeis e a cantarolar os estranhos sons cadentes dasMontanhasOcidentais.ParaDinah,issoeraterrivelmenteinútil,entedianteementalmenteconfuso.Nessedia,emparticular,porém,MonsenhorWol-voreiriavisitarsuaamante,umadocedamadacortequeviviapertinhodopalácio.Wardley estava descobrindo que ouro e pedras compravamumaboaquantidadedeinformaçõessobreosvíciossombriosdacorte.–IssopareceótimoDinah,simplesmenteótimo,estouorgulhosodevocê.

– Harris parecia tão feliz, todo corado e emplumado. Uma punhalada deculpa atravessou-a. Dinah encarou-se no espelho. Olhos negros, e muitasmentiras,elapensou.Limpouagargantanovamente.–Euoficialmenteliberovocêsdoisporhoje.Emily,vocêdeveriairvisitar

suafamíliae,Harris,quemomentoseriamelhordoqueesteparapassarnoJardim de Rosas, ou jogar críquete? Ouvi que nossas rosas brancas devendelaestãocomeçandoaflorescer.OsolhosdeHarrisseiluminaram:–Euachoquedeveriasim.Umpoucodenaturezaécomoumtônicopara

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aalma.Essafoifácil,elapensou.EmilyterminoudevestirDinah,quecomeuseu

cafédamanhãrapidamente,certificando-sedeterporçõesduplasdeovosepão doce de pêssego. Ela precisaria. Enquanto caminhava para a porta,Dinahpegouumapequeninabolsadetecido.–Meuslivros–murmurou.EmilyeHarrisnemolharamparacima.Dinahpodiapercebercomoeles

estavamanimadoscomaideiadeumdiasemresponsabilidades,oqueerararoparaservoseguardiões.Doisjáforam,DinahpensouenquantodecidiuandaremseupróprioritmoatéoGrandeSalão,cumprimentandoasCartas,enquanto passava, e qualquer membro da corte que estivessevagabundeando no corredor sem propósito. Hoje, ela seria vista usandoessevestidoridículoesendoestranhamenteamigável.DinahpasseoupeloGrandeSalãoenotouastrêsCartasdeCopasqueestavamparadasnaportada frente.Fellen,RoxseTatcher,exatamentecomoelaeWardleyhaviamcalculado.Dinahossaudougentilmenteenquantopassava.SerguardiãodoGrandeSalãoeraumaposiçãobaixaentreasCartasde

Copas.OsmaishabilidososeleaisprotegiamoRei,depoisCheshire,entãoDinah e seguindo abaixo na linhagemdaCorte. Aqueles que eramCartasnovas ou que tinham um histórico de serviço questionável protegiam asmuitasportasequartosdocastelo.NadaacontecianoGrandeSalãoamaiorpartedoanonoPaísdasMaravilhas,portantoasCartasdeCopasenviadaspara proteger suas portas eram impiedosamente ridicularizadas. QuandoDinah passou por eles, eles a cumprimentaram preguiçosamente. Elaremoveuumapequenabolsade suamochila, e tropeçou, fazendoabolsavoarnasuafrente.Umvalordemoedasdeouro–maisdoqueosuficienteparaalimentarafamíliadasCartasporumano–esparramou-senafrentedeles.Abolsadepanocontinuavaimóvelemseusombros.Elaviuosolhosde Roxs brilharem. Claro que brilhariam: ele não tinha apenas uma,masduas famílias para alimentar; ele se abaixou para ajudá-la a pegar asmoedas e Dinah viu-o colocando maliciosamente algumas em seu bolso.Perfeito,elapensou.–Medesculpe,soutãodesastrada.–Nenhumproblema,Senhora.Dinahpegouasmoedasrestantesrapidamente,certificando-sedequeos

homensconseguiramvertodasasmoedasdentrodabolsa.Opreçodeumcolar,pensousesentindoculpada,sóumadasmuitasjoiasqueficamociosasnaminhagaveta,maisdoqueo suficienteparaalimentaruma família. Elageralmentesesentiaenvergonhadacomessascoisas.Acenoucomacabeça

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paraRoxse,então,paraasoutrasCartas.–Muitoobrigada.Umbomdia. – abaixandoosolhos, estava inquietae

sem fôlegona frentedeles.Hesitouporumsegundoe, então, inclinou-se,deixandoocabelobalançaremfrenteaoseurosto,suavozbaixandoparaumtomsussurranteurgente–Vocêpoderiame informarondeficaasaladoscasacos?Roxsrespondeu:– Não estou certo por que você precisaria dela, Alteza; você nem está

usandoumcasaco.Dinahcolocouasmãosnosquadris.–Issonãoédasuaconta,eaperguntaestáacimadasuaposição.OsolhosdeRoxsseestreitaram.NenhumaCartadeCopasgostavadeser

repreendidaporalguémdaFamíliaReal;eraumavergonhaabsolutaparaaquelesquejuraramosproteger.–Perdoe-me,Alteza.Euteacompanhoatélá.–Não.Apenasmedigaocaminho.Eupossoirsozinha.Otempoémuito

importante.Dinahpodiaveraconfusãoemsuasexpressões.Porqueelaestariacom

pressaparachegaràsaladoscasacos?– Siga esse corredor, passe pelo oratório e vire na esquina. É uma

pequenaportaàdireita,emfrenteàsaladosempregados.Háumajaneladevidroeferronafrentedaporta.Dinah agarrou, com força, sua bolsa perto do peito e permitiu que um

ruborsubisseporsuabochecha.– Muito obrigada. – apressou-se ao passar pelas Cartas. A sala dos

casacosera fácilde seencontrar;Dinahesteve lámuitasvezesduranteainfância, buscandoumacapade invernopara ela eCharles.Erauma salacomprida,cheiadecasacosdeinverno,dochãoaoteto,etodosostiposdecores,todosparaaFamíliaRealeseusdistintosconvidados.Umvaporsaíadeumafontenomeiodasala,umabaleiadeporcelanaexpeliaumanévoaperiodicamente,garantindoqueoscasacosestivessemsemprequentinhosemacios, independentedaestaçãodoano.Dinah rapidamenteencontrouumcasacosimplesmarromecomcapuz.Colocou sua bolsa de pano no chão, abrindo-a. Dentro dela havia um

vestido de algodão cinza com um pequeno coração costurado namanga.Eraotipodevestidoqueumacriadaouservausariaemseudiadefolga.Dinah o havia roubado de Emily há um tempo. Rapidamente, ela tirou aroupamagenta superelaborada, os babados nadando ao seu redor comonuvens fofas. Cuidadosamente a dobrou e a colocou dentro da bolsa. A

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portadasaladoscasacosseabriueelasearrepiou,poisestavadepécomapenasumafinaroupadebaixobranca.–Soueu–Wardleysussurrou.Dinahvirou-sedecostasecomeçouacolocarovestidocinzapelacabeça.

Wardleyatravessouasala.–Não,espera,nãocoloca.Elasentiucomoseseucoraçãomergulhasseemumaáguacongelante.–Elesestarãoaquiaqualquermomento.Euviaexpressãonorostodeles

quandopergunteisobreasaladoscasacos.Elebalançouacabeçaecomeçouaresmungar.–OReinãodevia terhomensassimaseuserviço.Emsua tentativade

construir um conjunto forte de Cartas, ele aceitou até os piores homens.Seusparâmetroscadavezmenoresestãoenfraquecendooreino.–Shhhh.–Dinahouviupegadaspesadaseotilintardemetaldoladode

fora da porta. Rapidamente Wardley envolveu suas mãos na cintura deDinah e a puxou contra ele. Seus lábios descendo em seu pescoço e suarespiraçãoestavaquenteaopassarporsuapelemacia.Elafechouosolhoseseentregou,conscientedecomocadacurvadeseucorpoestavaàmostraatravésdofinotecido,tãopróximadele,tãopróximodeserapenassuapelepressionadacontraadele.Wardleytomoutodoseucabelonegroegrossoemsuasmãos:–Nãoexagere–elemurmurou.Aportaabriuderepente.AstrêsCartasestavamparadasnafrentedeles,

rindocomoimbecis.Roxsdeuumpassoadiante.–Muitobem,Princesa;parecequevocêadquiriuumgostopelogarotodo

estábulo.–Saia!–grunhiuWardley–NãoseaproximedaPrincesa.–Vocêdeveriaterseguidoesseconselho.Parecequevocêtemasmãos

cheiasporaí.Elanãofazmuitoomeutipo,gostomaisdotipodasenhoritaVittiore e seus cachos loiros,mas com certeza tem um certo apelo. Ouvidizerqueelaéesquentadacomoopaieloucacomooirmão.Elatemfogoemseusangue.Roxs circulou ao redor deDinah, seus olhos lascivos absorvendo-a um

poucodemais:–EntãovocêestádepenandoaPrincesa.Esseencontrosecretodevocês,

oqueelevale?Dinahengoliuemseco.–Oquevocêquerdizer?– Quero dizer, quanto ouro havia naquela sua bolsa? Duzentos?

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Trezentos? Com isso eu compraria uma terra, garota, e comida para asminhasfamílias.Wardleycolocouasmãosemsuaespada.– Não chantageie a Princesa. O Rei irá cortar a sua cabeça no Dia da

Execuçãoporcausadisso.–Bom,entãovamoscontaraele,sim?–Roxssedirecionouàporta,seus

doiscapangasgrunhindocomoidiotasatrásdele.–Espere–Dinahdisse,quasesilenciosamente–Quantovocêquer?–Tudoqueestánessabolsa,senhorita,enadamenoscompraráonosso

silêncio.–Issoéumafortuna–Dinahbufouraivosamente.–Eéissoqueestoupedindo.Dinahalcançouabolsa.Wardleydeuumpassoadiante.–Deixe-mediscutirissocomadamae,então,conversaremos.–Equedama– rosnouFellen,mas asCartas saíram, fechandoaporta

atrásdelas.Elapodiaouvirarisadagananciosadostrêsdoladodeforadasala.–Fomosmuitobem–sussurrouWardley.ElepuxouDinahparapertoe

pressionouseuslábiosnosdela.AsCartasinvadiramasalanovamente,semconseguiremesperar.–Não conseguem ficar com asmãos longe um do outro, hein!? Eume

lembrodequandoerajovemecheiodeluxúria,vocênãoconseguesegurarsuamasculinidade.AsCartasseacotovelavamcomalegria.Wardleylevantouasmãoseeles

ficaram em silêncio. Mesmo quando eles presumiam que ele era só umgarotodoestábulo,eledemandavaatenção:–Anossapropostaéaseguinte:aPrincesaeeununcatemostempopara,

digamos, sermos nós mesmos. Nós lhes daremos todo o ouro da bolsajunto…Dinah tirou um grande anel de ametista. Os olhos das Cartas se

iluminaram.– …disso, se vocês permitirem que fiquemos nessa sala o tempo que

quisermosesecertificaremdequeninguém,ninguém,entre.E issoincluivocês.SealguémperguntarondeestáaPrincesahoje,vocêsirãodizerqueela está tomando chá coma senhoritaVittiore e estudandonabiblioteca.Vocês nunca nos viram. Entenderam?Nós lhe daremos asmoedas agora,masoanelsódepoisquenós…terminarmos.–Wardleydeixouumsorrisomarotoescaparemseurosto–Eprecisaremosdodiatodo.

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Roxsdeuumpassoadiante.–Eporqueeufariaissoporvocê?– Em quem será que o Rei acreditaria, uma Carta bêbada acusada de

roubaroourodaPrincesaouemsuafilha?Roxsrefletiuporummomento.–Combinado.Wardleyentregouabolsaparaele.–Lembre:ninguémentraousai.Nósqueremosficarjuntospelomenos

atéopôrdosol.Quandosairmos,vocêsterãooanel.Fellenfungou.–Vocêachaqueconseguedurartanto,filho?Wardleyseigualoucomumolhar.–Semdúvida.AstrêsCartastrocaramumolharinvejosoeseafastaram.–Nósprecisamos ficardeolhonoGrandeSalão,masnósouviremosse

vocêstentaremescapar.Nãotrapaceie,garoto!–Estábem–Dinah respondeu–Mantenhamapromessadevocêsque

manteremosanossaeeuNÃOireicortarsuascabeçaspeloseusilêncio.AsCartassaíram.WardleyolhouparaDinahcomumsorrisoconfuso.– Sempre podemos confiar em homens de caráter questionável em

situaçõesqueenvolvemouro.Dinahnãotinhatempoparabrincadeiras.–Vocêtrouxeoescudo?Eouniforme?–Sim.Wardleytambémtinhaumabolsa.Dela,eletirouumescudobrancocom

osímbolo cinzadePaus cravado.Eledeslizoua armadura sobrea túnicacinzaeabotoouacapapretacomumpequeninobrochebrilhantedePausemseuombrodireito.–Comoestou?–elesussurrou.–ComoumaCartadePaus–Dinahrespondeu–Eeu?–Comoumaserva,sóquemaislimpinha.Dinah escovou o cabelo rapidamente, e então começou a empurrar os

casacosparaocantodasala.Elesmoveramoscasacos,umporum,atéqueencontraram:umapequenaportademadeira,camufladaestrategicamentenamadeiraàsuavolta.–Euaindanãoconsigoacreditarque issoestáaqui–Dinahsussurrou,

passandosuasmãossobreaspequeninasfrestas.Wardleyconcordou.–FoiassimqueseutataravôescapoudoGrandeSalãoparaencontrarsua

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amanteYurkei,umaservadoRei.OstúneisdocastelosãobemconhecidosentreasCartasdeCopas.–Excetoentreasminhas–Dinahdissesuavemente.–Excetoassuas–Wardleyrespirouprofundamenteeempurrouaporta

–Solteumgemido.–Oquê?–Solteumgemido,bemalto.Dinahfezcomoelepediu.–Issoirásatisfazê-losporumtempo.–Wardleyriu–Vamos.Eelesentraramdebaixodaporta.Apassagem,umtipodecorredorentrefrestasdasparedesdemadeira,

oslevavadiretamenteatéapedraquedarianoGrandeSalão.Checandoseoenormesalãoestavavazio,elespassaramrapidamentepelosdegrausatéotrono.DinahguiouWardleyparaoestreitoespaçonalatrinadeseupai.–Éesseocaminhoparaostúneis?Atravésdalatrina?Dinahnãorespondeu.Elaestavaocupadademaisvirandoatapeçaria.A

última,umtrabalhodearteelaboradorepresentandoavitóriadeseupaisobreMundoo,ochefedosYurkeis,osencheudesujeiraearanhasmortas,quandoDinaharecolocounolugar.Ali,aliestavaaporta,aquelaqueelaselembrava daquele dia terrível quando Vittiore chegou e seu pai aapresentoucomorgulho,comosefosseumprêmio.OdiaemqueCheshiremostrouaelaotúneleelaacidentalmentemudouseucaminhoparaalémdasgradesdopalácio.A porta se abriu com um barulho alto. Eles escorregaram por ela,

certificando-sedequeelaestariadestrancada.DinahguiouWardleyparaostúneisúmidosdepedraquecorriamparalelosaoGrandeSalãoe,então,com uma queda repentina, para baixo dele. Os túneis estavam escuros egelados, muito mais desagradáveis do que da última vez em que Dinahhaviaestadolá.AnevedoinvernodoPaísdasMaravilhastransformouostúneis em longas e úmidas placas de pedra e lama congelada. Dinahobservou sua respiração congelar e cair no chão, na frente deles,provocandoumaltotilintar.Wardleyagarrouumatochadaparedeeaacendeucomseuisqueirode

pedra.Umachamarosadançoudiantedele.–Nósprecisamosnosapressar.Vocêpoderiacairnosonoaquiembaixo

enuncamaisacordar.Essefrioéosuficiente…–suavozfoisumindo,seuslábiosficandoazuis.Elescorreram.Otúnelseaprofundavaeficavacadavezmaisfrio,quanto

mais longeeles iamna terracongelada.Emváriosmomentos,Dinah teve

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que voltar, tentando se lembrar de todas as voltas e reviravoltas que elahavia dado como uma garota histérica de quinze anos. Isso era quaseimpossível;elaestavatãoprofundamentemagoadanaqueledia,correndocegamentepelascatacumbasondulantes.Elavirouaqui,noestranhogatoentalhado na parede? Ou foi ali, quando o túnel se separava em quatrocorredoresedepoisvoltavaparaomesmolugar?Elaestavatodaarrepiadadentrodacapa.– Nós deveríamos ter pegado mais camadas de roupa – Wardley

sussurrou.Elesestavamláembaixonostúneisháquaseumahora,deacordocomo

relógiodebolsodeDinah,surrupiadodeHarrisfacilmentenodiaanterior.–Jáestamoschegando?Talvezdevêssemosvoltar.Pareciaestarmaisescurodoqueantese,derepente,umaondadepânico

envolveuDinah.–Nãotenhocerteza.Estátãoescuroaquiembaixo.–Efrio–Wardleyacrescentou–,nãoseesqueçadofrio.Dinahmordeuoslábiosenquantoobservavatudoaoseuredor.– Está assim tãomais escuro porque estamosmais fundo embaixo da

terra;amesmarazãodeestarficandomaisfrio.Segureatochamaispertodoteto.Elaolhouparacimaetracejouseusdedosnasujeira.Wardleyseguroua

tocha acima dela. A luz tremeluzia e pulava contra as raízes pretasbrilhantes que corriam pelo comprimento do túnel. Vez ou outra, elaspulsavamdiscretamente, como se estivessemvivas, e pareciam semovercadavezmaisperto.Dinahsorriunaescuridão.–Raízes! Issoaconteceunaprimeiravez: eume lembrodepensarque

elassepareciamcomossosnegros.Estamosquaselá!–Rezoparaqueestejacerta–Wardleymurmurou,seusdentesbatiam–

Ouentãovamosvoltarevoupassaro restodomeudiaaquecendomeusdedosdospésemumafogueira,enquantovocêmealimentacomtortas.Asparedesdepedracomeçaramaseestreitar;DinaheWardleyficaram

deladoenquantoseespremiamatravésdela,seusrostosmergulhadosemsuor.Viraramumaesquina,eentãooutra,um labirintodeparedee terrapraticamenteinvisíveis.Haviaumdeclivee,derepente,elesestavamlá.Ocírculodeterra.Acolisãodastrêspassagens.Wardley deixou um longo suspiro escapar e passou a tocha pelos

desenhos.–Incrível.Issoéantigo,Dinah.Muitoantigo.Ancestral.

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Dinahpassouosdedospelotriânguloondulado.–Quandoeuestavaaquiembaixodaúltimavez,eupenseiqueesseera

umsímbolodasMontanhasYurkeis,masestábemclaroagoraquesãoasTorresNegras.Wardley envolveu suasmãos ao redor dos dedos dela com um aperto

amigável.–Vocêqueria escapardoque seupai tinha feito. Faz sentidoquevocê

quisessequefossedasMontanhasYurkeis,eraqualquerlugaremqueelenãoestivesse.OsolhosnegrosdeDinahbrilharamnaescuridão.–Vocêestácomascorrentes?Wardleysacudiusuabolsa.Dinahouviuoruídodometalcontraometal.–Vamos,Princesa.–Vocênãopodemaismechamarassim–Dinahrespondeuenquantose

agachavasobresuasmãosejoelhos,ecomeçavaarastejaratravésdotúnel–Assimqueentrarmosvocêpodemechamardequalquercoisaalémdisso.Sejaomais cruelpossível. – ela fezumapausapara recuperaro fôlego–RezeparaqueessesejaocaminhodasTorresNegras.Wardleyresmungouatrásdela:–Estourezandoparaquenãoseja.Otúnelinclinouparacimamuitoíngreme,oarsetornavaestranhamente

sufocante,quaseúmido.AterraquentepareciagostosadebaixodaspalmasdasmãoscongeladasdeDinah,quandoelescomeçaramasubir.

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Nove

Os joelhos de Dinah doeram quando ela se levantou novamente; subirumaencostaíngremefoimuitomaisdifícildoqueelahaviaimaginado.Lána frente, uma luz vinha de um buraco estreito, no fim do túnel. Dinahcolocouacabeçaparaforaedeuumsuspirodealívio.Omenorraiodeluzde sol vazava de uma única janela velha, que parecia estar quilômetrosacima dela. Eles haviam chegado a algum tipo de cilindro de pedra, e otúnel acabava ali. Ela olhou para baixo. O eixo quase vertical acabavaabruptamente,comumaquedaacentuadaemumagrandepiscinadegelo.Wardleyempurrou-aportrás.–Pare,pare!Nóspodemos cair! –Dinah sussurrou freneticamente.Ela

deu uma olhada ao seu redor e encontrou o que estava procurando.Escadas irregulares levavam para cima e para longe da queda: dentesdeformadosqueseespiralavamatéoaltodaparede,emumanelcôncavo.Wardleylimpouseurosto–Aquiestámaisquente.Dinaholhouparaogelo:–Nãoosuficiente;nósdevemosestaremumburaconochão.Hámuitos

delesnoentornodasTorres.Wardleyfoiprimeiro,escalandoporcimadeDinaheseempurrandopor

sobreaparede.–Fiquepertodaparede.Parteporparte.Euvejoumaportaláemcima.–

elefezumgestoparacimacomorosto.Dinahengoliuseco.Umaquedanãoomataria,mascomcertezaodeixariabemmachucado.– Não olhe para baixo – ele instruiu Dinah. Ela olhou, seus olhos

seguiram uma rachadura no gelo. Estava lá, enterrado até a cintura,congeladoparasempre,umesqueleto.Seusdedosossudoscavandoogelo,asmarcasdagarraemcentímetrosdeprofundidade.Ogritoemsua faceestava marcado ali para todo o sempre, a mandíbula penduradagrotescamentedeseucrânio.Dinahsearrepioutoda.–Oquefoi…?

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Wardleypressionouseucorpocontraaparede:– Feito de propósito? Sim. Eu te disse que as Torres Negras eram um

lugar brutal. As Cartas de Paus encontram muitas maneiras de obterinformações,eamaioriadelaspormeiodatortura.–Então,essehomem…–Então,essehomemprovavelmentefoicolocadoaquiembaixo,naágua,

antesdanevechegarefoiforçadoaobservarenquantotudocongelavaaoseu redor. Eu posso adivinhar que ele está acorrentado lá em baixo, noscalcanhares.Dinah o encarou, deixando a repulsa passar pelo seu corpo. Ela

estremeceu.–Comopodeserquesejaúmidoefrioaomesmotempoaqui?–SãoasTorresNegras.Dinah encarouo esqueleto.Wardley, sempremuito cuidadoso, colocou

osdedosnorostodeDinahevirousuacabeça.–Olheparaooutrolado.Aexcitaçãodeteremencontradoocaminhoatravésdostúneisdiminuía

comcadapassopensativoemdireçãoàporta,sempreconscientesdochãocongelado. Dinah ouviu o barulho dos enormes morcegos do País dasMaravilhas,conhecidosporatacaroscavalosalgumasvezes.Nãoolheparacima, eladissepara simesma,pressionando-semais fortemente contra aparede.Não olhe para cima e não olhe para baixo, só fique parada. Elessubiramemsilêncio,atéquealcançaramumaportaescurecidaeemruínas,corroídapormofoefezesdemorcego.Wardley virou-se para Dinah, a chama rosa colorindo sua aparência

sombria.–Éisso.Nóspodemosvoltaragora,mas,assimquepassarmosporessa

porta,teremosqueterminaroquecomeçamos.Dinaholhouparaaportacomumolharférreo,seuestômagoespumando

demedo.Oarrependimentocomeçavaatrilharumcaminhoemsuamente.Mas, então, ela viu o bilhete, desenrolado em seu pequeno frasco, e selembrou do sentimento que tomou conta dela quando o leu, que aconspiraçãoqueseembrenhavanopaláciodoPaísdasMaravilhaschegariaaté ela em algum momento, independentemente do que fosse e se elaqueriaissoounão.ElaolhouparaWardley,quetinhaumamechadecabelocastanhosoltaemseurostosuado.–FainaBaker,asTorresNegras.Éparaláqueestamosindo.O rosto dele mostrou-se desconcertado quando ele compreendeu que

elesnãovoltariam.

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–ComovossaAltezadesejar.Fiqueatrásdemime,independentementedoque faça,peloamordosdeusesdoPaísdasMaravilhas,NÃO FALE. Vocêpodedisfarçarseurostoesuasvestes,masvocêfalacomoarealeza,eissonãopodeserdesfeito.Wardley vasculhou sua mochila e prendeu as algemas de ferro nos

pulsosdeDinah.Elaserammaispesadasdoqueelaimaginara.–Você está comaparênciapéssima. – ele a informou.Dinah tinha sido

propositadamente descuidada enquanto caminhava e se arrastava pelostúneis.Seuvestidoestavacheiodelama.Elatinhafuligemdatochaemseurostoedeixaraseucabelo limposearrastarpelasparedesdostúneis.Elaparecia uma plebeia, mais que uma plebeia, uma criminosa. Eles nãoestavamsozinhosnostúneis,Wardleyidentificoufezesderatoemangusto,emaisalgumascoisasqueelenãoconhecia.Dinahtremeucomoarfrioeúmido.–Estoupronta.Wardley pousou os olhos em seu rosto e Dinah viu o medo que era

compatívelcomodela.–Nóspermaneceremosjuntos,nãoimportaoqueaconteça.Vocêtrouxe

suacoroa?Dinahconcordouetocousuabolsa.– Só para o caso de as coisas darem errado. – ela envolveu suasmãos

congelantesnasdele.Ascorrentesderamumalevebalançada.– Aqui vamos nós – disse Wardley. Ele deu um pesado grunhido, e a

corrente em seu pulso quebrou o antigo cadeado da porta. Caiu no chãocomumsompesadoeestridente.Juntos,elesrespiraramfundoeentraram.Amudançadetemperaturafoiimediataesevera.Seanteselesestavam

congelando,agoraDinahestavacobertadesuor.Oareragrosso,úmidoesujo.Pilaresdefumaçanegrasubiamdochãoabaixodeles.Elespareciamestaremumgrandecasulo,umatorrenegraespiralada,maislarganabaseeseestreitandodeformaconsistenteatéotopo.Elesolhavamparaforaeviamum largo abismo, cheio de correntes pesadas, que balançavam e seenrolavam a partir do cone. Dos dois lados, celas infinitas se esticavam,embutidas na circunferência da torre, uma depois da outra, cada vezmenores conforme iam mais alto. O cheiro não era humano, e Dinaharrotoubemalto,nãoconseguindocontrolar-se,eoutroseguiu-se,eoutro.Urina,suor,dejetoshumanosesangue,tudomisturadonoargrosso.Wardleyseinclinou.–Vocêvaificarbem?– Eu sou sua prisioneira! – Dinah o lembrou silenciosamente entre os

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dentes.Wardleyseendireitou.– Certo! Então vamos! – ele deu umpuxão em sua corrente e Dinah o

seguiu, enquanto eles circulavam o caminho cada vez para mais alto natorre.Gritosaltosdedorecoavamdebaixo,eDinahlutoucontraoanseiodetaparasorelhascomasmãos.Wardleypuxousuacorrenteparaqueelaandassemaispertodele.–Elestorturamosprisioneirosnochãodatorre,masascelasmenores

estãonotopo.Ospiorescriminosos ficamnascelasdotopo,paraque,nofimdesuassessõesdetortura,elestenhamquesearrastarnasespiraisatéque possam descansar. – ele balançou a cabeça – A subida já é, sozinha,umaformadetortura.OsolhosdeDinahpousaramcompenaemumhomemvelhoemumacela

pelaqualpassaram, sentadono chãoemsuaprópria sujeira, lambendoaparedepretaepegajosa.Elesevirouquandoelespassaram.Dinahdeuumsorrisotristeparaeleporbaixodocapuz.E,semaviso,ohomempulouemsuadireçãodedentrodacela,conseguindoagarrarapontadesuacapa.Eleapuxouviolentamente contraasbarrasdagrade,balançandosuacabeçaparafrenteeparatrás,enquantoaalcançavaparaapalpá-la.–Copas,Copas,euamominhasCopas!Dinah sentiu seu bafo apodrecido tomar seu rosto e lutou contra uma

nova onda de náusea que subia. Wardley empunhou sua espada e alevantousobreamãoretorcidadohomem.–Vocêadeixaráirouperderáummembrohoje.OprisioneiroriunacaradeDinah:–Perderummembro,perderummembro, todos iremosperdernossos

membroseacabeçahoje…–Quizzer,solteesseprisioneiro!–umavozbemaltaexplodiuatrásdeles.

OhomemsoltouDinahcomumaúltimasacudidadecabeçaemergulhoudevoltaemsuacaverna,sussurrando:–Euaestareiobservando,minhaRainhadeolhosnegros,euestarei!Dinah de um passo para trás, em choque. Eles viraram. Um homem

gordo, maior do que seu pai, apareceu na frente deles. Seu uniforme dePaus,umatúnicapequenaebrancasobrepostaporumescudocinzaeumacapadelã,mantidanolugarporumfechodepausesticadoparacabersuaenormecircunferência.OsímbolodePaus,emcimadeseuescudo,estavarodeadoporumacaveiramuitomaior.Elahaviavistoessesímboloemumlivroumavezouduas;essehomemeraumtorturador.Dinaholhouparaochão. Ela sentiu um pequeno espasmo de medo passar pela mão de

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Wardleyeatravésdesuascorrentes.–Muitoobrigadopelaajuda.Eutenhoquelevaressaprostitutaimunda

paraaTorredasMulheres,masachoquenóspegamosocaminhoerrado.Peçodesculpas.O grito arrepiante de um homem subiu circulando, seguido de uma

súplica chorona.Uma lágrima caiudoolhodeDinah, traçandouma linhalimpa através da poeira em seu rosto. Sem nenhum aviso, o homem aalcançoueacertouseurostocomforça.OsocotirouoardeDinaheelacaiunochão.Wardleypareciaestarrecido,semsaberoquefazer.– Quem é você para ter compaixão pelo homem? Ele não é mais um

homem.AssimquevocêentranasTorresNegras,setornapartedelas.VocêpertenceàtorreeàsCartasdePaus.Vocêéaterraembaixodosnossospés,a sujeira emnossa privada, um escravo daárvore. Não chore por aquelehomem,poiselemereceoquetem.SeusgritosdizemqueeleégratopelajustiçadoRei,gratoporpagarsuadívidacomoPaísdasMaravilhas.Logoosseusgritosdirãoamesmacoisa.Dinahencarouochão.–Aondevocêdissequeaestavalevando,garoto?–ParaaTorredasMulheres,sounovoaqui,acabeidesertransferidodas

CartasdeCopas.Ohomemdeuumafungadacheiaecuspiunochão.–VocêpareceumaCartadeCopascomumrostobonito.Fico felizque

tenhasaído.Elessãoumbandodebastardosfracoseignorantesqueamamse vangloriar por protegerem o Rei. E, em vez disso, passam suas vidasprotegendocorredoresdecâmarasvaziaseobservandoafamíliadacortecontandosuasjoias.No chão, Dinah limpou o sangue de sua boca e pensou sobre o anel

escondidonobolsodeseucasaco.Contando,defato.–Bem,pelomenosvocêsejuntouaumconjuntorealdeCartasaqui.–ele

deuumtapanascostas–Vocêéjovemeforte.Vaisedarbemaqui,sevocêaprender a digerir o cheiro e os gritos. Eu souYoous, o torturador-chefedessatorre.Umsombaixo,depuraagonia, flutuoudochãoparacima.Oguardade

Pausseinclinouparatrásefechouosolhos:– Ah, eume delicio com os gritos. Esse som significa que a justiça foi

aceita e que o País dasMaravilhas está de volta em seu caminho, para oequilíbrioeaharmonia.Aprendaaamarosgritos,garoto.Wardley concordou com seu rosto pálido. Dinah manteve a cabeça

voltadaparaochão.Oprisioneiroqueatinhaassustadotantoaencarava

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dedentrodesuacela,lambendooslábios.–MinhaRainha…–Então,paraondeeulevoessaaqui…esseprejuízoparaasociedade?–

Wardleypuxousuascorrentescomforça.OPausdeuumagargalhada:–Vocêdevesernovo.Erinstentemandou?Wardleylevantouoslábioscomumardezombaria:–EoErinstenláfazalgumacoisa?Ohomemriueacariciouseulongobigode.– Issoémesmoverdade.Elenão faz.Bem,eledevia ter teavisadoque

não há uma Torre das Mulheres. Todos os prisioneiros são presos deacordocomocrimecometido,enãoogênero.Essaéaaladosassassinos.–oPauscomeçouaandaraoredordeDinah–Vocêéumaassassina,minhapequenatortadeamora?Quemvocêmatou?Seuamante?Seusfilhos?–eleempurrouocapuzdeDinahparatrásepassouamãoporsuagrossatrançanegra – Cabelo brilhante para uma plebeia. Será que você era umaprostituta?UmadasprostitutasdoRei?Wardleypressionouodedoemsuatestaeesfregou,comoseestivessese

lembrandodealgo.–Erinstendissequeeladeve ficaralojada comFeenaBoker, sim,acho

queéesseonomedela.OuFina?OhomemseafastoudeDinahcomcuidado.–FainaBaker?Wardleyestralouosdedos.–Ah,sim,éisso,Faina.– Faina Baker está aqui pelo crime de alta traição. Ela está na cela do

topo da Sétima Torre. – ele espiou Dinah – Isso a torna pior do quequalquerhomemnessacela.Eumemantereidistante.–einclinou-separafrenteepassouosdedospeloqueixodeDinah–Oqueelesfazemnaquelatorreépiordoqueamorte,piordoquequalquertorturaquepraticamosaqui.Eutenhopenadevocê,minhalinda.WardleydeuumpuxãoemDinaheelescomeçaramafazerocaminhode

voltaparabaixonaespiral.–Eunãoiriaporaísefossevocê.Nósacabamosdeesfaquearumhomem

láembaixoevocênãoquerficarcomasbotascheiasdesangue.PeguemaTeiadeFerro.Émelhorvocêseacostumarcomisso.Paususamateia,ouentãonósnuncaveríamososol.Yoous pegou em seus dentes com os grandes dedos pretos. Wardley

deixouescaparumgrunhidoecomeçouaandarnovamenteparacimana

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espiral,arrastandoDinah.–Vocêsestãoindopelocaminhoerrado.Oh,deuses.Aqui;entreporessa

porta.Eleandouporentreasduascelas,eumcorredorpequenoeestreitose

abriudiantedeles.Levavaparaumafinaportademetal.–Nãohácadeado?–Wardleyperguntoudesacreditando.Yoousriu.– Você acha que um prisioneiro tentaria escapar das Torres Negras?

Sabendo que há aindamais tortura se ele for pego? Não, ninguém tentaescapar.Alémdisso,elesescapariamsomenteparaaTeiadeFerro,ondehásempre dúzias de Cartas passando ao longo do dia. Isso ou caem para amorte. Eles não têm o sonho de escapar. Suas mentes se esgotam pelasprópriastorres.–elepassouasmãospelaparede,pretaegrossa,cobertacom uma seiva grudenta – Você conhece a lenda das Torres Negras,menino?Wardleyconhecia,eDinahtambém,maseleapenasbalançouacabeça.Yooussentou-senobancodecrépito,suaspernasabertasnadireçãode

Dinah,eladesviouoolhar.–Elesdizemqueas torresestavamaquiantesdequalquerumdenós,

antes da propriedade do País das Maravilhas, antes mesmo das tribosYurkeis chegarem. Elas sempre estiveram aqui, grandes raízes negras,torcidas em espiral, exatamente sete delas. Quando os Yurkeis chegaramnessaterra,elesadoravamastorreseconstruíramcasasaoredordelas.Otempo passou e as torres ficaram cada vez mais grossas até que setornaramuma corpulenta árvore negra,mais forte do que aço, imune aofogo e amachadadas. Nós esculpimos as portas onde haviam frestas nasraízes.OsYurkeis a chamavamdeMeis’Yur , que significa “AVelhaRaiz”.Eles a adoravam, mas, quando os primeiros habitantes do País dasMaravilhas chegaram, eles viram a verdade, as Torres Negras erammalignas. Havia uma presença sinistra nelas, que os deixava doente, osenlouquecia,osdeixavaloucosparatocarsuaseiva…Vocêsabeoresto.Eventualmente,oshabitantesdoPaísdasMaravilhas

empurraramosYurkeis de volta àsmontanhas, onde era o lugardeles, econstruíramopaláciodoPaísdasMaravilhaseseusmunicípios.AsTorresNegrassãocomoumavisoparatodososhabitantesdaqui:quebreasleis,entrenasTorres.SéculossepassarameoprimeiroconjuntodeCartasdePausconstruiuaTeiadeFerro.–Masseamadeiranãopodeserpenetrada…–Wardleycomeçou.– Sim, ela não pode ser. Os corredores de ferro são completamente

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autossuspensos. Eles foram feitos pelo Jackrey, omelhor arquiteto que oPaís das Maravilhas já viu. Todos os corredores estão conectados, masnenhumdelestocaastorres.ÉcomoosPauschegamdeumatorreàoutra,decimaabaixo.Amenosqueestejamosdentro,nessecaso,nósestaremoslá por outros… – ele olhou para Dinah. Elamanteve os olhos no chão. –Propósitos.–Evocêsnãosepreocupamsealguémescapar?Yoouslevantoueseesticou.–Vocêsesentebemdesdequeestáaquigaroto?Wardleyseencolheu,derrotado:–Euachoquenão, eume sinto…–Dinahpodiavê-loprocurandopela

palavra.Elelimpouagarganta–Desconfortável.– São as torres. Está dentro de suas raízes; algum tipo de droga que

esfumaçaossentidoseconfundeamente.Amaioriadosprisioneirosaquiélouca,maselesnãochegaramassim.Asraízesgarantemqueissoaconteça.–eleaumentouo tom–Eunãodevomais falar.Oprisioneiroprecisaserlembradodoquesãoboasmaneiras.ElecomeçouadestrancaraceladeQuizzer.Opequenohomemdeuum

uivoeseafundounofundodesuacela,seusdedoscavavamaparedepreta.Elapingavaumamisturaescura.–Dê-meaárvoreparaaRainha,dê-aparamim!–eleuivava.Yoousoestapeoueelecaiunochãocompoucoesforço.–Eu achoqueumdedooudois vão te lembrardenão tocar emoutro

prisioneiro.Dinah estremeceu e, sempensar, virou-separaos ombrosdeWardley.

Eleeramaisespertoeaempurrouparalonge.–Nãoencosteemmim–elevociferou.YoousapontouparaDinah.–Nãosintapenadele.Emumasemanavocêoestaráinvejando.Ascasas

da Torre de Alta Traição são as piores. Perder alguns dedos não vai sernadacomparadocomoqueestáguardadoparavocê.Agoravá.Euprecisoderrubá-lo.–eleempurrouQuizzerparaseuspés–ANDNDE!–elegritou.Wardley não precisou que ele falasse duas vezes. Puxou a corrente de

Dinahnadireçãodaporta:– Ééé, muito obrigado! – ele disse, sem conseguir esconder suas boas

maneiras.–tudoqueeleouviuemrespostafoiumgritosanguinário.SairdasTorresNegrasfoiacoisamaispróximadoparaísoqueDinahjá

haviaexperimentado.Oarestavasecoegeladoemseurosto,eelapodiarespirar sem ter medo de vomitar. Havia uma fresta de sessenta

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centímetrosentreaportaeapassareladeferro.Wardleyaajudouapassarpeloespaço.Issoerabom,Dinahpensou, jáquesecaísseelamorreriaemseusbraços fortes.AndarpelaTeiadeFerroera tão incríveleassustadorquanto ela havia imaginado da varanda de seu quarto todos esses anos.Pedaçosdeferrosecurvando,pulandoesetorcendoparadiversasportasdiferentes em cada torre. Os corredores iam para cima e para baixo, emespirais gentis, que, de repente, atiravam-se a céu aberto, antes deretornaremparaochão.Elasnãootocavampropriamente,massubiame,entreastorres,umcorredor iaparaocéu.Dinahlembravavagamentedesuas lições da infância sobre a Teia de Ferro – ela era feita de umúnicopedaçosólidodeferro,perfeitamenteequilibradoaoredordastorres.Se Dinah mantivesse os olhos semicerrados, ela poderia ver todo o

caminho para a primeira torre. Daqui, ela podia ver que a Teia de FerroestavacobertapelosPausemseusuniformescinza-e-branco,cuidandodesuas vidas. Eles pareciam insetos, verificando o chão e tudo ao redor,movendo-se sem medo a muitos quilômetros de altura no ar. Algunscarregavam uma papelada; outros, pilhas quentes de comida nem umpouco apetitosas ou penicos. Todos tinham omesmo olhar depressivo efocadoemsuasfaces.DinaheWardleyobservavamfascinadosafacilidadequeelesnavegavamnoquepareciamlabirintosdateia.– Vamos, nós estamos parados aqui há muito tempo. Vamos acabar

chamando a atenção das pessoas. – Wardley começou a guiá-lacuidadosamente para baixo, na direção da porta da torre – Rápido – eledissefirmemente.Andando o mais rápido que podiam, amarrados pela corrente, eles

saíramemumfinocorredordeferro,arqueadoentreasduastorres.Ochãoficavacadavezmais longeconformeelesseguiamocaminho tortuosonocéuabertoentreasgrandestorresnegras,cantarolandocomourticárianosol inabalável de inverno. Eles escalaram em silêncio, vários Pauslançavam-lhesolharesestranhosquandoelespassavam.Wardleypingavadesuor,detãonervosoqueestava.Estar do lado de fora das torres deu a Dinah a oportunidade de

realmente conseguir olhá-las. A casca preta era brilhante na superfície;brilhavanaluzdosol.Pequenasestriasmarcavamcadafaixaqueascendiaparaocéueocontornodasraízesgrossasentrelaçadaserapraticamenteinvisível. Posso imaginar porque os Yurkeis adoravam essas torres, elapensou,elasrealmentesãoumamaravilhacolossaleterrível.Tambémhaviaumavista fantásticadocorredordoCastelodoPaísdasMaravilhaseelespararamparaolharparaseusaposentos.

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–Nósestamosquaselá–Wardleysussurrou,trazendo-adevoltaparaarealidade – Vamos encontrar Faina Baker, conseguir as respostas de queprecisamose,então,SAIR.Estoucomeçandoamesentirmalcomisso.Dinahtentouesboçarumsorriso:–Vocêsempresesentiumalcomisso.–Nãosorria.–eledisseenfaticamente–Euvouacabarficandoaquipor

causadessesorrisonessasuacaraboba.Elescontinuaramocaminhopeloferroretorcido,atéchegaremàSétima

Torre.Osdoispararamdo ladode foradaporta:umenormeburaconasraízesquealguémtinhapreenchidocomferro.–Respireoarpuropelaúltimavez–Dinahsussurrou.ElesrespiraramfundoeWardleyempurrouaporta.ASétimaTorrenão

tinhaumcheirotãofortequantoodaTorredosAssassinos,eDinahestavagrataporisso.Porémhaviaumasensaçãocompletamentediferentenessaespiral negra – era sinistra, como se eles tivessem entrado nasprofundidades do mal. A outra torre estava cheia de gritos e sangue,enquantoessa estavaemumsilêncioprofundo.Haviaumamalícianoar,umadesesperançaquepermeavacadarespiração.Eleshaviamentradonatorremaispertodochãodessaveze,assimqueseusolhosseacostumaramcom a luz, Dinah percebeu a enorme sombra parada atrás deles. Ela seencolheuatrásdeWardleyquandoasombradeuumpassoadiante.–OquevocêsestãofazendoaquinaTorredaTraição?–eleperguntou,

sem nenhum pingo de humor ou cordialidade. De repente Dinah sentiufaltadeYoous.WardleyempurrouDinahparafrente.–NósfomosenviadosparacáporYoous,daTorredosAssassinos.Temos

negóciosa tratarcoma traidoraFainaBaker.Minhaprisioneiraestáaquiparaextrairinformaçõesdela.A Carta deu umpasso adiante, na luz. Seu uniforme cinza-e-branco de

Pausestava intocadoe limpo,muitodiferentedasroupasemãosescurasde Yoous. Esse guarda usava o capacete pontudo de Paus, suas pontasnegraspairandocomoespinhossobresuasbochechas.Haviaumaespadamonstruosapresaemsuascostas.Wardley,esguioemusculoso,derepentepareciaumacriançamagriceladiantedaquelaenormesombra.OPausconcordou:– Vocês não são os primeiros a tentarem extrair informações da Sra.

Baker.Umaoutrapessoaesteveaquinocomeçodasemana,rapazmagrelo.Wardleylimpouagarganta:–Sim,issofoiesclarecidocomErinstenpreviamente.

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Ohomemsoltouumgrunhidoecomeçouacaminharemdireçãoaomeiodaespiral.Elegirou.– Vocês não vêm? Eu não tenho o dia todo para andar por aí com

traidoreseCartasamadorasquenãoconhecemcomoascoisasfuncionam.Wardley e Dinah o seguiram silenciosamente. Suspensa no meio da

espiralmaisaltaestavaumaplataforma,feitadomesmoferroenroladoquea Teia de Ferro. Não havia nenhum anexo nos lados, por isso eracompletamente plana, exceto por algumas engrenagens e uma alavancapulandopara fora, nomeio.Wardley segurou rapidamentenas correntesde Dinah enquanto eles pulavam para a plataforma. Ela balançou a céuaberto e Dinah agarrou o ombro deWardley, para evitar ser lançada novazio.–Vocêparecepróximodessaprisioneira–reparouoguarda–Vocêestá

seaproveitandodesselado?Nãohánadadeerradocomisso.HáalgumasgarotasnaTorredosLadrõesqueeuvisitosemanalmente.Nocomeçoelasreclamavam,masagoraelasgostam.Tiraamentedelasdatortura,nãoqueelasejamuitoterrívelnaquelatorre.Somenteumdedodamãooudopé,devezemquando.Maselasnãoprecisamdededosparaabriremaspernas,nãoé?Dinahpodia ver a raiva inundandoo rosto deWardley. Ele se distraiu

encarandoochãodatorre.Estavadescoberto.–Aquivocêsnãotorturam?Oguardaosencarouirritado.– O quanto familiarizado você está com essas torres? – seu olhar se

estreitou–Eununcaouvifalardevocê.Wardleylhedeuumolharexasperado.– Eu também nunca ouvi falar de você. Mas tenho certeza de que

Erinsten ficaria feliz de saber dos seus prazeres saidinhos na Torre dosLadrões.Dinah podia ver uma incredulidade crescente nos olhos do guarda

enquanto ele olhava para ela e para Wardley. Algo havia mudado. Elamoldouumafeiçãoinsanaemseurostoe,sempensar,selançouparacimadoguarda.Aplataformatremeuviolentamente.Elaconseguiuenvolverosdoisbraçosaoredordeseupescoçoantesqueeleaempurrassecomumaforça tremenda.Ela vooupelo ar epousouno ferro, rolandoparao lado,evitandosimplesmentecairnaescuridão.Aplataformaoscilouebalançou.Dinah se esgueirou nela e soltou um grunhido feroz baixinho, deixandosaliva rolar em seus lábios vermelhos. Ela voou no guarda novamente.Wardley agarrou as correntes em sua cintura e a afundou no chão com

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força.SanguejorroudoscotovelosdeDinah,umborrifovermelhobrilhantecontraoferronegro.ElasecontorciaaoredordospésdeWardley,–Controle-a!–aCartadePausgritou–Elaé louca!Elavaiderrubara

plataforma!WardleypuxouDinahpara cima. Seusolhos castanhosencontraramos

dela e Dinah viu um espanto desconcertado dançar através de seu lindorosto. O homem olhou para o outro lado enquanto seguia na direção docentro da plataforma, murmurando consigo mesmo sobre Cartas eprostitutas.– Louca, comoFainaBaker. Comalguma sorte elas vão sematar enós

não teremos que aturar esse constante fluxo de visitantes. – ele grunhiuparaWardley enquanto pegava uma corrente demetalmuito grossa queestavapenduradanocentrodaplataforma–Segureemalgosólido.Dinahenvolveuseusdedosaoredordasespiraisdeferrodaplataforma.

Wardleymanteveumadesuasmãossegurandofirmementeacorrentedelaeaoutraaoredordopunhodesuaespada.Ohomemsoltouumgrunhidoaltoepuxouaalavancaenferrujadaparabaixo,elaeramaisgrossaqueobraço de Dinah. A plataforma estremeceu e, de repente, eles estavamgirandoparaotopodatorre,ascorrenteschacoalhavamacimadeles.Dinahviu flashes de luz e os corredores de dezenas de celas enquanto elessubiam, asparedes se estreitando cada vezmais conformeeles iammaisalto.Rodasdeferrogemiamcontraascorrentesdemetalenquantoelesseaproximavamdoalto.Oguardausouseuspésparaempurrarumaalavancaqueestavaparada

contraochão,eaplataformaparoucomumsaltoviolento.AnáuseasubiudoestômagodeDinaheelaengasgoucomoamargodabile.–AceladeFainaéanúmero10/6.–eleolhouparaDinahnovamente.Ela

mordiscouseusdedoseoolhoucomcautela–Sejabreve.AssimqueCrayasoltardesuaraiz,hásomenteumcurtoperíododetempoduranteoqualelapoderáfalarantesque…– Antes que…? – Wardley deu um bom pulo para fora da plataforma

arrastandoDinahcomele.Aplataformabalançounoarvazio.– Você verá, eu não quero estragar a surpresa. Cray! Faina tem mais

visitas.Umgarotomagrelosaiucorrendodeumtúnelestreito,seuspésestavam

pretos e descalços. Um antigo broche de Carta estava abotoado em suaantiga túnica de Carta. O tecido estava tão gasto queDinah podia ver ascostelas do garoto enquanto ele respirava. Ele lhes deu um sorrisodesdentado,antesdeseinclinarnafrentedeDinah.

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Primeiroelapensouqueeleestavacurvando-se,eumaondadepânicoaparalisou,masentãoelecomeçouatocarsuasbotas:–Quebelasbotasnós temosaqui.Euacreditoquevou colocarminhas

mãosnelasmaiscedooumaistarde,seelasnãoforemroubadas.Eladeuumaolhadaemseuvestidoeemsuasbotasmarrons.Elaseram

deumaclassebaixaparaosseusparâmetros,masagoraelapercebeu,emumaondadevergonha,queasroupasqueelahaviaescolhidoparaparecerpobre ainda eram mais ricas do que qualquer coisa que aquele garotojamaistinhavisto.Eleficouparadoeaencaroucomcuriosidade.–Siga-me,moça.Nãoandemmuitopertodascelas.–eledeuumarisada

– Claro, você conhecerá essas celas de perto o bastante, entãoprovavelmentenão importaseseuscompanheirosdetorreaconheceremumpoucomelhor.Wardleyolhouparaeleseveramente.–Leve-nosatéFaina,Cray.Aespiralqueoslevavaparacimaficavacadavezmaisapertada,aponto

de Dinah sentir que ela estava girando em círculos. Olhar para baixo adeixavatonta,masolharparacimaeraaindapior.Conformeotetopontudoda torre parecia estar cada vez mais perto, a madeira negra e brilhanteroçavaotopodocapuzdeDinah.Quandopareciaqueelesnãopoderiamirmaisalto,Craypareceudarumpassoàdireitanaparede.–Vocês,mendigos,nãovêm?Dinah percebeu que estava sendo guiada porWardley através de uma

pequena abertura namadeira. Raízes enroladas sobre suas cabeças, essaparte da torre parecia ter a estruturamenos sólida de todas. De vez emquando,umpequenoflocodeneveencontravaoseucaminho,atravésdasrachadurasnamadeira.Étãobonito,Dinahpensou,observando-odissolvercontrao chãopreto.Umabeleza tão delicada emum lugar tão terrível. Ocheironãoeratãoforteaquiemcima,umaproezaauxiliadapelaslâminasfinasdeluzofuscantequepassavamsorrateiramentepelagrossamadeirapreta.Craypuxouumenormemolhodechavesdaparede.–Elaestáaquiemcima,eusótenhoquepuxá-laparaforadaárvore.Diferentemente das celas mais baixas, essa, em particular, tinha uma

grossaportadeferro,entrelaçadacomraízesnegrasoleosas.Alguémtinhapressionadotãoforteedurantetantotempo,queaimagempermaneceu.Oestômago deDinah deu umpulo violento e as correntes que a prendiamsacudiramesaltaram.Crayencarousuasmãosporummomentoe,então,voltou-separaaporta.

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–Fiquemdentrodessaporta.Levaráapenasalgunssegundosparalivrá-ladaraiz.

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Dez

Erabemdifícildefinirexatamenteoqueelesestavamvendonaquelaluzsombria.A celadeFainaeraescura,masassimqueosolhosdeDinah seacostumaram,elapodiaverumapedraplanaparadormir,umpenico,eumtapetesurradonochão.Dali,osolhosdeDinahviajaramdaparedeparaorostodeFaina,enquantoelalutavacontraohorrorquecresciadentrodela.Fainaestavapressionadacontraaparede,firmementeseguraporfaixas

decouroquepassavamporseuabdômenepeito.Elagiroucontraeles,seuspés escorregavam em um fluido negro que pingava de cima. PequeninosramosderaízesnegrasseesgueiravamparaforadaparedeeparadentrodabocaabertadeFaina,seunarizeorelhas.Sobretodoseucorpo,asraízesnegrascirculavameseenrolavam,movendo-selentamente,deixandoumafinacamadanegraenquantoserpenteavamportodaparte.DinahagarrouosbraçosdeWardleyquandoosramosescorregarampelorostodeFaina.Seusolhosestavamabertos,congeladosdepânico,umpequenogemido

saiudesuabocacheiaderaízesnegras.Craycaminhoudevagaratéelaesoltouas faixasdecourodeseucorpo,evitando,porpouco,asraízesqueprocuravamcuidadosamentesuamão.AbocadeWardleysecontorceuderaiva.–Oquevocêestáfazendocomela?Comovocêpodepermitirisso?Oque

é…?–eledeuumpassoadiante,esquecendo-sedesimesmo.Dinahpodiaverqueeleestava transtornado,comasmãosemsuaespada.Esquecerocavalheirismoeahonranãoeraumacoisafácil.Dinahpulouparatrásemsuacorrente,eeleselembroudeondeestavam.Cray desacorrentou Faina e ela despencou para frente. As raízes se

afastaramdeseucorpo, saindodeseunariz,bocaeorelhascomumsomúmidonojento.Finalmente,asraízessesoltaram,eFainaBakerroloucomoumabonecavelhaemumchãosujo.–Vocêsaamarramnatorre!Essaéatorturaparaaltatraição?Craydeuumsorrisosujoesemdentes.–Ei!Oquepoderiaserpiordoqueestarconectadonafontedeveneno

quecorrompeastorres?Asraízessejuntamàpelee,comovocêpôdever,

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elasadoramumaabertura.Chegaumahoraqueovenenocaidiretamentenocérebro.Eleprovocaalucinações,febree,algunsdizem,ahabilidadedeveralémdastorres.Ofuturoeopassado,etudoqueestánomeiodisso.Asraízes fazem você se esquecer de quem é, e o fazem esquecer que éhumano.Oquepoderíamos fazercomessescriminososqueseriapiordoqueseesqueceremdequemsão?EleriueDinahseimaginousilenciando-ocomapalmadesuamão.Havia

um leve contorno na parede onde Faina estava presa, uma raiz secontorcendodevoltaparaseulugar.Umanévoaoleosacondensadanaáreaemqueestavaacabeça.–Sejamrápidos–Craydisse.Dinah deu um passo adiante. Faina Baker estava acabada. Seus braços

estavam finos como palitos, e veias grossas e cinzas corriam por seucomprimento. As raízes deixaram uma sujeira preta por onde estavampassandoemseurostoecorpo,comoseelativessesidoqueimada.Oqueanteseramolhosazuiseamáveis,agoraestavammergulhadosemburacosobscurosnumafaceencovada.–Meusdeuses–WardleymurmurouparaCray–, comovocê consegue

viverconsigomesmo?FainaBakereraumesqueletoandante.Seucabelo,umdiaamarelocomo

o mel, agora estava tomado de branco, e seus lábios estavam pretos desangueemarcasdemordidas.FainaBakerestavanochão,olhouparacimaeviuDinah,umfiodesalivaescapavadesuabocaepingavanochão.Elacomeçouacantarcomumavozincrivelmentebela,agudaeadorável,suaslágrimasmisturavam-secomovibrardesuacantoria.–Vocêstêmpoucosminutosesó.–Crayandouemdireçãoàporta.Wardley deu uma cutucada que empurrou Dinah para frente, quando

Cray bateu a porta da cela atrás deles. Eu poderia ficar presa aqui parasempre,pensouDinah,emumaondadepânico.Eununcadeveriatervindoatéaqui.Elaseajoelhouna lamanafrentedeFaina.Amulhercontinuavaimóvel no chão, traçando corações partidos na terra com os dedos dasmãos.–Olá,Faina,meunomeéDinah.Euachoqueaindanãonosconhecemos,

mas, de alguma maneira, eu acredito que você tenha informações paramim.FainaestendeuamãoeroçouosdedosescurecidospelorostodeDinah,

deixandoduastrilhas.Seusolhosvagosolharamatravésdela.– Eu te conheço – ela sussurrou – a Rainha, a Rainha. Você não é a

Rainha,aindanão.Nãopercaacabeça.

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–Soueu,eurecebiumbilheteparaviraquieencontrá-la,vimconversarcomVOCÊ.Quemévocê?Faina piscou algumas vezes e olhou diretamente para Dinah. Um

momento de claridade acendeu seus olhos e as marcas negras deixadaspelas raízesdesapareceramdesuapele.EstendeuosbraçoseagarrouosdedosdeDinahfortemente.– Ela não é quem você pensa, ela é uma boa garota, seja piedosa, por

favor…aquelaquevocêchamadeDuquesa…Vittiore?O coraçãodeDinahparouporummomento. Isso tudo tinhaa

vercomVittiore?–VocêestáfalandodeVittiore?–Eleveioduranteanoite,comocavalododiaboemuitoshomens.Ele

estavaprocurandoalgumacoisa,procurandopeloamareloepeloazul,poralgoqueelenunca terianovamente, algoqueele teveapenasumavez. –suavozseelevouemumacanção:–Elaeraloira,loiracomoosolnacostadapraia– seusolhos searregalaram–, a coroaerradaesperaporela.Ascorrentesirãoseapertaremvoltadeseusbraçoseelairádançar,ah,elairádançar por sua cabeça, correntes ao redor de seus pulsos, como raízes.Cachosemsangue,cachosemsangue…Amulhernãofazianenhumsentido.Dinahlembrou-sedetodasasvezes

quetevedeconversarcomCharles.ElapegouasmãosdeFainanassuas.–Porfavortentenãofalaremenigmas,euprecisoquevocêlembreoque

sabe.Fainapiscou:–Vocêviuomeubebê?Elaesteveaquiumdia,dentrodemim.Agoranão

hánadaalémdeescuridão,asraízes;elasmemostramascoisas.Euseidecoisas.ElaencontraráamorteembaixodasCopas,esmagadaembaixodocavalododiabo,assimcomoeu.Opaláciodahistóriadeleiráquebrá-la.–Elaestálouca–Wardleysussurrou.Faina levantouacabeçaparaolharparaWardleye lambeuospróprios

lábios.–Vocêdeveterenlouquecido–eladisse–,ouvocênãoteriavindoaté

aqui.DinahpuxouFaina,colocou-adepéea fezdescansarnaplataformade

pedraqueserviacomosuacama.–Oquevocêsabe?Euprecisoquemediga.Pense.Comovocêchegouaté

aqui?O lábio inferiordeFaina tremeue lágrimasnegras,quepareciamtinta,

começaramarolarpeloseurosto.

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–Nós não fizemos nada além de servir o País dasMaravilhas, a nossavidatoda.PegandomariscoseostrasparaamesaeoprazerdoRei.EuviabelezadeumpôrdosolimpetuosonoMarOcidentalnasconchasnasmãosdemeubebê.Eentãotudosefoi,emumflashdeumalâminadeprata.Tudoporcausadevocê.AcamafriadaRainhafoiemvão,maselairá,ahsim,elairá levantar como o sol, meu próprio solzinho… ela possuirá tudo o quevocêdeseja.ElaseinclinoucontraDinah,quesegurouarespiraçãoporcontadaonda

de náusea que a atravessava. Faina tinha o cheiro de algo que ela nuncaconseguiriadescrever,ocheirodaprópriatorre,ummalancestral,sujeiraemorte.–Porfavor,Alteza!Nãodeixequeelesmeamarremnaárvore.Asraízes

me mostram coisas, coisas horríveis, coisas maravilhosas… – começou amurmurarincoerentemente.–IssoéYurkei–Wardleysussurrou–ElaestáfalandoemYurkei!Dinah ouviu commuita atenção,mas todas suas aulas de língua foram

inúteis. O Yurkei que Faina estava falando era uma estranhamistura desons e palavras aleatórias. O corpo de Faina deu um solavanco, e depoisoutro. Dinah segurou gentilmente a cabeça de Faina com suas mãos,enquantoelasedebatianaescuridão.– Eu sei – murmurou –, eu sei que dói. Eu sei que é horrível não ter

controle.ElaselembroudeCharles,comoasuamenteeraumacoisaselvageme

desconhecida, sempre vendo, mas nunca compartilhando, tentando, masnunca conseguindo fazer uma conexão humana. Com um grito alto, ochoquedeFainapassoueeladeitouacabeçanocolodeDinah.Seusolhosazuisbrilhantes comumanovaclaridade, suavozestava firme, a loucuratinharecuado:–Vocêtemque ir–sussurrou–Equilibreomal.E,quandoomomento

chegar, não abra a portamarcada. Por favor! – ela agarrou os braços deDinah, as longas unhas rasgando sua pele pálida – Por favor!Não presteatençãonosanguedossegredos.–Oquevocêquerdizer?–Dinahouviuumsomfracodemarchavindode

baixo.OsPausestavammudandodeturno.– É hora de sair, agora, nós temos que ir! – Wardley insistiu – Não

teremostantasortecomosPausqueestãochegando.Dinahpulou.– Nós não podemos deixá-la aqui assim, eles irão amarrá-la na torre

novamente.

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–Oquevocêachouqueaconteciaaquinastorres?Cháetortas?Essanãoéumaescolhanossa!ElaéumaprisioneiraaquievocêéaPrincesa.Nósprecisamossair,nãoconseguiremosmaisnenhumainformaçãocomela.Eleestavacerto.Fainaestavacaminhandoparaofundodacela.Wardley

enfiou a mão em seu cinturão e puxou uma pequena adaga, quase dalarguradeumdedo.Eleacolocounochãoechutou-anadireçãodamãoescurecidadeFaina.–Oquevocêestáfazendo?–Dinahquestionou.–Umaboaação–Wardleyretrucou.ElepuxouDinahpelospés.ElaseafastoudeleeajoelhouaoladodeFaina,cobrindo-acomumacapa.–Euvoltareiporvocê–elainsistiu.Fainafechouosolhos.–Nãodessa vez.Haveráum fim sanguinárioparaFaina, nenhumbebê

emseuseio.–elaolhouparacimaparaDinaheumcontentamentopacíficopassou por suas feições – Oh, minha pobre Rainha. Seu coração vaiinfluenciarsuasdecisões.–CRAY!–Wardleygritou,batendosuaespadanafechadura–Abraessa

celadeumavezportodas.Cray trotou, surgindo da escuridão e destrancando a porta com um

sorriso.– Conseguiram o que estavam querendo? Ela era bem bonita quando

chegouaqui,nãoémuitomaisagoraqueaárvoreapegou…Wardleydeuumtapaemseurostocomamãobemaberta.–Umhomemdeverdadenuncaprecisausaraforçaparaconseguirisso.CrayencarouWardleycomassombroenquantopassava.–Vouteamarrarnovamente,vamos,Faina.–Vocênãopodedeixá-lasozinha?–Dinahdisparou.–Não.EstamosseguindoordensdopróprioReiparadeixá-laamarrada

do nascer ao pôr do sol. – Ele escorou Faina na parede com facilidade ecolocouasfaixasdecourosobreseupeito.Asraízescomeçaramaseagitarepulsarnaparede.– Até eu acho que é cruel. Omáximo de tempo que vi um prisioneiro

amarradonatorrefoiumahorapordia.EissofoiparaGrayVira-Casaca.GrayVira-Casaca eraumassassinomandadopelosYurkeis. Ele chegou

muitopertodematarorei,massuafalhamortalfoisubestimarCheshire.Depoisdesuatentativa frustradadeenvenená-lo,elepassouummêsnastorres,antesdetersuacabeçacortada,quefoimandada,acavalo,devoltaparaosYurkeis.CrayapertouabochechamagradeFainaentreseusdedosgrudentos:

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– Essa aqui deve ter feito algo além de horrível, mas faz sentido porcausadoqueelaestavafalandoquandochegou.DinahdeuumpassoparaseaproximarmaisumpoucodeCray.–Eoqueera?–perguntou,comavozbaixa.–Dependedoquevocêpodemeoferecer,VossaAlteza.Dinahrecuoucomosetivesselevadoumsoconopeito.–EupossotersidocriadonasTorres,maseunãosoubobo–elepassou

umbraçoaoredordoombrodeDinah–ouvidizerqueaprincesaerasemgraça, mas você não é nem um pouco sem graça. Eu te acho bemimpressionante.Olheparaessequeixoforteeessesolhosperigosos.Dinah ouviu o barulhometálico deWardley sacando sua espada. Cray

sorriueapontouodedoparaWardleyatrásdeDinah.– Vocês nunca vão sair destas torres semmim – ele riu – E tempo é

essencial. O turno da noite está chegando e aqueles Paus são duas vezesmaisbrutaisedesconfiados.Elesvãosacarvocêsemsegundos.Dinahagarrouoaneldeametistanobolsodeseuvestido.Apedraerado

tamanhodeumovodecodorna,elaoretiroudevagar.–EulheofereçoissosevocêmedisseroqueFainadiziaquandochegou

aqui.E senos tirardaquivivos.Ele tambémcompraráo seu silêncio.Elevalecercadedezanosdoseusalárioouosuficienteparacomprarumchalénavila.Os olhos de Cray se iluminaram, o reflexo da pedra brilhava em suas

pupilasgananciosas.–Sim,sim,eulhedireievocêssairãodatorreinteiros,comcerteza.Mas

nóstemosquesairagora.–eleleuospensamentosdeDinahantesqueelapudesseabriraboca–Nósnãopodemos levá-la.Nãoháesperançasparaela,asraízesenvenenaramsuamenteeseucorpo,eelaémaisárvoredoque elamesmanessemundo.Alémdisso, todos osprisioneirosmerecemsuapunição.AntesqueDinahpudesseseopor,Wardleyapegoupeloscotovelosea

arrastou em direção à porta. Cray bateu a porta da cela depois que elessaíram e a trancou. Dinah olhava triste para a cela enquantoWardley aarrastavaparaocorredor.Fainaolhouemseusolhose,porummomento,ela viuoolharpacíficode exaustãoquepassavaemseu rosto.Então, elasoltouumgemidodedoreseentregouparaasraízesenroladasatravésdeseurosto.Umarisadamalignaescapoudesuabocaeosseguiuconformeeles corriam. Lágrimas quentes caíam pelo rosto de Dinah enquanto elacaminhavaconfusaatrásdeWardley.Ascorrentescontinuavampresasemseus pulsos e ela tentava duramente manter o equilíbrio enquanto eles

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seguiamCrayporumcorredorescuroatrásdooutro.–QualéocaminhomaisrápidoparaaTeiadeFerro?Crayapontouparadoisníveisabaixo:–Vêaqueleatiçadordeferropenduradoali?Entreasduascelasháuma

portaparaateia.OspésdeDinahvoavamconformeeladesciaasplataformas,espiralando

cadavezmaisparabaixo.Osprisioneirosgritavamdesuascelas,esticandosuas mãos negras para agarrar Dinah. Cray apontou para uma cordaesfarrapadanochãoentreduascelas:–SigamacordaatésaíremnaTeiadeFerro,de lávocêspodemseguir

sozinhos.EutenhoquevoltarparaaceladeFainaantesquepercebamqueeuestivefora.Como cantodoolho,DinahviuWardley girar, sua capadePauspreta

girando atrás dele. E, em um segundo, ele estava atrás de Cray com suaespadanopescoçopálidodele.– Você nos dirá o que Faina disse, ou morrerá aqui, e eu posso lhe

garantirqueninguémiráinvestigarcomoumcovardefracoperdeutodooseusangue.Craysoltouumguincho:–Elanãodissemuita coisa, amaioria era loucura.Quandoela chegou,

estavaamordaçada,sim,estava!Quandotiramoselasóchoravaedizia:“Elausaráacoroaparamantersuacabeça!Elausaráacoroaparamantersuacabeça!”.Cray começou a choramingar em um tom alto. Alto demais. Wardley

bateuopunhodesuaespadanatêmporadele,eelecaiunochãocomoumsacovazio.– Coloque o anel no bolso dele. É mais seguro. Ele nunca irá dizer a

ninguémque foi tão facilmentevencidoemsuaprópriaprisãoouque foichantageado. Covarde. –Wardley cuspiu em seu rosto e pegou o fim dacorda.FelizmenteCrayestavadizendoaverdadeeacordaosguiouatéaportadisforme,queseabriaparaocéubrilhantedoPaísdasMaravilhas.Movendo-se o mais rápido que podiam sem atrair atenção, Dinah eWardley navegaram no caminho de volta à Torre dos Assassinos. Voltarpelo caminho que vieramdemandava bastante escalada e recuos;muitasvezes, eles acabaram em um corredor de ferro que levava a uma torrediferenteouparaocéuaberto.– Uma armadilha para fujões – Wardley murmurou enquanto eles se

afastavamdeumaenormequedaqueacabavaemumafloramentorochosodentrodasgradesdocastelo.

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–Não,vamosporalinovamente.Levouumahora,maselesfinalmenteconseguiramencontrarocaminho

corretonolabirintoeseguiramparaumaportabaixa,queseabriaparaaTorre dos Assassinos. O cheiro dominou os sentidos de Dinahmais umavez.Maselanãotevetempoparavomitar.Elesestavamcorrendoparacimanaespiral,paraondeaportaesquecidaoslevariaatéapiscinadegelo.ElespodiamouviuosPauscaminhandoparacimanaespiral, logoatrás

deles. O próximo turno de Paus estava chegando e, se eles não seapressassem, teriam que se explicar para um conjunto inteiro de Cartas.Dinahpensounacoroaemsuabolsa.Elaausariaseprecisasse.–Ali,aliestáaporta!–Wardleygritou,enquantoelespassavamvoando

pelascelasepenicosrançosos.AmãodeumprisioneiroagarrouovestidodeDinahatravésdasgrades

da cela e ela foi puxada e caiu. Caiu no chão, e o prisioneiro a puxou nadireçãodacela.Dinahdeuumchutebemforteemsuasmãosmachucadascomosaltodesuabota.Ela libertou o vestido, e o prisioneiro começou a gritar. Eles estavam

praticamentenaporta,quandoWardleyparoubruscamenteepulouparaoladoemumapequena frestanaparede,puxandoDinah comele.Nãoerauma porta, na verdade era um depósito impossivelmente estreito paracorrentesegrampos.OsdoisquasenãocambiamalieDinahseencontroupressionadacontraaparede,comWardleyaenvolvendo.–Yoous–WardleysussurrounoouvidodeDinah–elenãopodenosver,

ouestamosperdidos.Nemsequerrespire.Não importava o alerta, Dinah não conseguia respirar de qualquer

maneira.Umaúnicaraiznegra,percebendoumapresençaaberta,estavaseenrolandonadireçãodo troncodeDinah, seus seiose seu rosto.Algonaárvoreaparalisoueelapodiaapenasobservarcomhorrorcomoodelicadotentáculo alcançava sua boca e arranhava seu caminho para dentro dela,sufocando-a.Umasegundaraizbrotouecomeçouaentraremsuasnarinas.ElaqueriagritarparaWardleymasnãoconseguia.Dinahagoraeraparteda árvore e seria assim para sempre. Visões passaram por sua mente:cabeças decapitadas, crânios brancos, uma fumaça azul, florestasqueimando, cogumelos pulsantes e sangue vermelho-vivo. E, então, elaestavacaindo,caindoparafrente,caindoemumaescuridãoqueeraquentee reconfortante.O braço forte deWardley a agarrouquando ela caía prafrente.–Dinah,Dinah?Ela abriu os olhos, ainda estava nas torres, ainda no espaço entre as

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celas.Wardley tinha uma raiz partida em uma dasmãos e a espada emoutra. Eles a observaram enquanto ela se enrolava e contorcia antes dedesapareceremcinzas.Wardleylimpousuasmãosnatúnicacomnojo.–Aárvore…–elamurmurou.–Vocêseescorounela–Wardleyrepreendeu–,vocêadeixoutocarsua

pele,oqueestavapensando?Dinahbalançouacabeça.Asvisõestinhamidoembora,recuandoemsua

mente,jáesquecidas.–Yoous?–elaperguntouenquantoWardleyaobservava.–Elepassou,nósestamossomenteumnívelabaixodeondeprecisamos

estar.Vocêconsegueandar?Dinahesticouumpéparafrente.–Estoubem.–odesejodeescapardessastorresdamorteerademais.–

Nósnuncadeveríamostervindoatéaqui,Wardley,eusintomuito.– Você deve mesmo sentir. – Wardley respondeu. Eles seguiram o

caminho até a porta semmais problemas, e Dinah ficoumaravilhada emcomo ela estava escondida mesmo estando tão à vista, virtualmenteindistinguível das raízes ao seu redor. A saída de emergência os esperoucalmamente, a porta torta derramava um ar congelante na umidade dastorres.Dinahnuncativeraumavisãotãobem-vinda.Elescaminharamatéapedra,seusolhostreinadosnoesqueletosentinela,parasemprecongeladonogelo,parasempreobservandoastorresqueoseguravam.Dinahdeixouseus olhos brincarem nos buracos brancos em que um dia estiveram osolhosdele,esobreospedaçosdepelecinzapresosnogelo.Elapodiasentira terrível visão sendo filtrada em suamemória, gravando seu olhar cegoparasempre.Opensamentoaencheudehorrorenquantoelessemoviamnadireção

do castelo pelos túneis embaixo da terra, escorregando através do túnelinclinadopeloqualhaviamsubidohorasantes.Elamalselembravadofrioe da escuridão, Wardley guiava o caminho com a tocha rosa brilhante,curvadepois de curva. Eles correram silenciosamentepeloGrande Salão,encontrandoocaminhodevoltaparaa saladoscasacos, semtrocarumapalavra. Foi só quando Wardley começou a tirar seu vestido que Dinahpiscouepercebeuondeelesestavam…equeelesestavamseguros.Oslábiosdelatremeram.–Wardley,sintomuitíssimo,eunãosabia…– Não sabia – Wardley retrucou –, mas eu tentei te dizer. Ninguém

conseguetedizernada,Dinah,nunca,porquevocêéaPrincesaevocêfazoquequer.Vocênãoédiferentedeseupainessesentido.

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Dinahrangeuosdentes.–Issonãoéverdade,né?–Sim,obviamente.–eletirouseuescudodeCartasimundoeocolocou

emsuabolsa–Nósdoisestamosimundos,limpeseurostocomasmãos.Ele se afastou dela e Dinah sabia que a conversa tinha terminado. Ela

limpou a sujeira, uma grossa camada, em um casaco vermelho-vivo nofundodasala.OvermelhoalembrouabocamanchadadesanguedeFaina,edesuaspalavrasenigmáticas.Elausaráacoroaparamantersuacabeça.Pena e vergonha correram por ela com tanta força que ela estremeceuenquantocolocavaseucarovestidodesedaeseussapatoscheiosdejoias,completamenteperdidaemseuspensamentos.AstorreseramumamanchanoPaísdasMaravilhas,umamanchadesangue,queseespalhavadesuasterríveisraízesnegras,eduranteséculosaFamíliaRealdeCopasausarapara o mal. Elas não eram uma prisão normal, eram instrumentos detortura,horroremaldições.Enquanto ela levantava suas mãos para colocar a coroa vermelha de

volta em sua cabeça, sentiu a primeira sensação de reconhecimento dedever.SeraRainhasignificavaprotegerseussúditos,mesmoquefossemdepráticasdaprópriaFamíliaReal.AsTorreseramosegredoterríveldoPaísdas Maravilhas, uma monstruosidade para todo o reino ver e nuncacompreender.E,quandoelasetornasseRainha,iriadestruí-las,raizporraiz.Seus pensamentos foram interrompidos por Wardley, seu cabelo

castanho espetado em todas as direções, e um vestígio de terra quepermaneciaemsuabochecha.Dinahabaixouacabeçanafrentedele.–Medesculpeporpedirissoparavocê.Eurealmentenãocompreendiao

queeuestavapedindo.–elalambeuodedoeoesfregoulevementeemseurostoforte,limpandoasujeira.–Eununcavouesqueceroquevihoje.Wardleybalançouacabeça.–AsTorressãoumamonstruosidade.Euouvirumoresehistóriassobre

elas toda a minha vida, mas nenhuma era tão terrível quanto… – elepausou,eDinahviuseusolhosseencheremdelágrimas–Nósdeveríamostê-latrazido…Faina.– Não podíamos – ela respondeu de maneira simples – Não teríamos

conseguidosairatempoeelesficariamsabendoqueestivemoslá.–Estavaaprendendorapidamenteque,oqueeracertoeoqueprecisavaacontecer,nemsempreeramamesmacoisa.Dinahouviuumbarulhobaixinhodoladodeforadaporta,asCartascom

certezaestavamcuriosassobreapaixãosuspeitaqueestavaacontecendo

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dentrodasaladoscasacos.–Estánahora–eladisse.–Nósnãotemosmaisoanel–Wardleydisse.Dinahvirouamaçanetada

portadasaladoscasacosconscientedequeelanuncamaisseriaagarotainocentequehaviaentradoalihorasantes.Seusolhosestavamescurosquandoelavirou.–Eucuidareidisso.Tenhoumbrochedesafiraqueéduasvezesmaior

que o anel, nasminhas coisas. – seu rosto brilhava comdeterminação. ArespiraçãodeWardleyestavaaltaatrásdelaquandoaportaabriu,eelaviuosorrisodeformadoaparecernocantodaboadeRoxs.–Sedivertiram,então?Dinahlimpouagargantaeseusorrisodesapareceurapidamente.

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Onze

Harris ficava insuportável quando encucava com a ideia de que Dinahtinhaqueaprenderalgo.– Não, você está atrasada. Você está atrasada de novo. Você continua

chegandoatrasada.Dinah empurrou seus livros da mesa com raiva. Eles caíram com um

baquenospésdeHarris.– Há coisas mais importantes para fazer do que ficar aqui sentada

repetindo literalmente todas asmaravilhas do País dasMaravilhas. – elacruzou os braços magoada – Esse reino está desmoronando e eu estouolhandoparafotoserecitandorimas,comoumacriança.Harrisempurrouseusóculos.–Oquealevaadizerqueoreinoestádesmoronando,minhaquerida?A

linhagemdeCopasnuncaestevetãoforte.OssúditosdoreinoamamoRei,e…Dinahointerrompeu:–Elesnãooamam,elesotemem.Háumadiferençanisso.–Omedonemsempreéumacoisaruim.QuandovocêforaRainhadeve

buscarosdois.Essassãoascoisassobreasquaisvocêdeveriapensar.LogovocêirásetornarRainha.Dinahajudou,acontragosto,oseuguardiãoaguardaroslivrosdochãoe

observou-o sentandode frente para ela, com suas espessas sobrancelhasbrancasbalançandocomumaalegriaenlouquecedora:–Dinah,possodizerumacoisa?Dinahassentiu:–Sim.– Fazem parte de ser um bom governante a constante educação e o

aprimoramento da mente. O passado deve determinar como você daráformaaoseugoverno.Aprendacomoserrosdeseusantecessores,reúnaconhecimento sobre a história da linhagem Real de Copas e conheça oterrenodesuasterras,ecomoelesetornouoqueéhoje.Agoradiga-me,as

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maravilhasdoPaísdasMaravilhassão…–CortinadoCéu,FlorestaRetorcida,NonoOceano,PaláciodoPaísdas

MaravilhaseasMontanhasYurkeis.–Harrissentou-se,satisfeito–Vocêosconhecemuitobem.Dinah realmente os conhecia bem. Na verdade, ela estava estudando

sobreasuaterratodanoiteaodeitar.NosdoismesespassadosdesdesuaaventuranaprisãodepravadadoPaísdasMaravilhas,Dinahestava lendomaisdoquenunca,enoiteadentro.ElafaziadetudoparamanterafastadosossonhoseasmemóriasdasTorresNegras.Aindaassim,nãoimportavaoquãomentalmenteexaustaelaficava,seusúltimospensamentos,antesdedormir, eram o rosto sombrio de Faina Baker quando a raiz negra seenrolounadireçãodesuaboca.Commaisfrequênciadoquenunca,seussonhoseramsombrioseloucos,

não diferentes da própria torre, e ela acordava ensopada de suor einundadadepânico,mordendosuaprópriaboca.Embora seu estudo e aprendizado tivessem aumentado em dez vezes,

suapaciênciacomasliçõesearotinadiáriadeixoudeexistir.Derepente,elanãoconseguiasuportaraslongasapresentações,aformalidadedacorte,asrotinasridículaseaspráticasqueocupavammaisdametadedodia.Peloamordosdeuses,elapensava,tomandoumgoledechá,eudemoromaisoumenosduashorasparatomarcaféemevestir.Tantacoisapoderiaserfeitanessetempo.E, como se Harris tivesse ouvido seus pensamentos, ele começou a

recolher os livros e colocá-los novamente nas prateleiras alinhadas nasparedesdeDinah.–PerceboqueVossaMajestadenãoestácomhumorparaasliçõeshoje.

Temcertezadequenãotemnadateincomodando?Vocêandarabugentaeevasiva ultimamente, e esse não é um comportamento de princesa,especialmentecomasuacoroaçãochegandonaspróximassemanas.Dinah simplesmente balançou a cabeça. Ela não podia contar para

ninguémsobreoquetinhavisto.EssetipodenotíciacomcertezamatariaHarris,quehaviadiminuídooritmonosúltimosanos.Eaomesmotempoem que confiava em seu tutor, ela o amava também, e nunca poderiaarrastá-loparaalgoobscuro.– Muito obrigada, Harris. Eu só estou cansada. E estou ansiosa para

começaragovernar.– Não deseje isso antecipadamente, Majestade. Uma vez que você

começar,iráansiarpelosseusdiasdecriançanovamente.Eununcatereiissodenovo,pensouDinah,nãoagoraqueeujáseioque

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existealémdopalácio.Dinahse levantoueesfregouapoeirapara foradeseuvestidolistradodemarrom.– Acho que vou visitar o Charles essa manhã. Por favor, peça que os

servospassemessamensagem.Harrisbateupalmas.– Essa parece ser uma ideia brilhante. Por favor, diga para Lucy e

Quintrellqueenviomeuscumprimentos.Dinah assentiu distraidamente enquanto brincava com um pequeno

pássaroemseucabelo.Emilyandouparatrásdelaeprendeu-ofirmementenalateraldesuacabeça.–Pareceadorável,MinhaSenhora.Dinahfezumsomestrondosocomsuagarganta.Nãoimportavaoquanto

ela tentasse, nada poderia fazê-la se importar com a moda do País dasMaravilhas.Elaandavadepressapelopalácio.Emtodolugarqueia,seuritmoagora

era rápido, jáqueela tinhaduasCartasdeCopas seguindo todosos seusmovimentos.É assim que uma Rainha se sente, ela disse para si mesma,então é melhor eu me acostumar. O clique-claque das botas atrás dela alembrava,emcadapasso,queelanuncaestavarealmentesozinha.QuintrellaestavaesperandodoladodeforadaportadeCharles.–MinhaRainha–elecurvou-se.–Aindanão–sorriuDinah–Comoeleestáhoje?–perguntou.– Estranhamente melancólico – ele respondeu, liberando as Cartas e

conduzindo Dinah para dentro – Ele não tem sido ele mesmo na últimasemana. Ele está sempre sentindo-se desesperado, e Lucy o encontra, namaior parte do tempo, choramingando pelos cantos ou gritando com asparedes. Ele parece estar fascinado com escadas e sombras, embora seutrabalhosejafocadosomentenoconceitodesombras,tudoempretoecomtonsde cinza.Édifícilparanósovermosassim.Masestá resultandonoschapéusmaisbonitosqueeujávi.–eledeixouumsuspiroderrotadosair–O Chapeleiro Maluco nunca foi mais excepcional em seu talento, mas onossoCharlesestáestranhamentedesconectado.Dinahdescansousuamãoemseusombros.–Obrigadapormecontar.EusoumuitogrataporCharlesterservostão

amorosos.–Espereatévocêveroqueelefezparaasuacoroação.Ummês,Dinahpensou,sómaisummêsatéqueeugoverneaoladodemeu

pai.OsaposentostortuososdeCharlesestavammaisdesarrumadosdoqueo

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normal. Dinah caminhou por entre os chapéus no chão, chegando até ostornozelos,paraalcançaraescadaemqueCharlessentavaprecariamente.Umapernabalançandononadaeelepareciaintensamentefocadoemumdentequeseguravaemumadasmãos.Dinahestremeceu.–Olá,Charles,essedenteéseu?Charlespiscouváriasvezes,seuolhoverdeencarando-a,enquantooazul

vagavanadireita.Haviasangueemsuaboca.Elalimpougentilmenteseuslábioscomamangadeseuvestidoeelesorriuparaela.–Doisdentes,demaisparamorder.Elabalançouacabeça.EledeuumpuloeDinahsefirmouemumagrade

devimetrançado,queestavaacimadela.Comosolhosbemabertos,eleaencarou:–Vocêsabeoqueasmontanhassussurrantesgritam?Elasclamampor

liberdade! E então é boa noite, boa noite, boa noite, todo o País dasMaravilhas em uma pilha fumegante. – Charles arremessou seu dente edançouescadaabaixonafrentedela.Quandoalcançaramoúltimodegrau,seurostomudoudeencantamentoparahisteria–Odente!Euprecisodele,euprecisodele,maldição,dentepordente.Elecomeçouaprocurá-lofreneticamenteemumapilhadechapéus,que

voavamsobresuascabeças,enquantoelesejogavaembaixodeles.–Estáaqui,Charles.–Dinahhaviavistoodentepousaremumapilhade

penas.Elaopegoueoesfregoucomumtecidodesedadacordonascerdosol.Eleoarrebatoudasmãosdelaeosegurounafrentedaluz.–Marfim.Osso.Texturapretonopretocomdentesdediferentesanimais.

Um chapéu para uma horda. Um chapéu para um… – ele deu uma levecorridinha–Umguerreiro!Umhomemquecarregacabeçasemumabolsa!EleenvolveusuasmãosaoredordeDinah.Issoasurpreendeuumpouco.

Charles a deixava tocá-lo muito relutantemente às vezes, mas ele nuncatomavaainiciativa.Seusolhosperdidosencontraramosdela.–Venhaver.Venhaver.–elesussurrou,repetindoa fraseváriasvezes.

Eleaguiouparabaixodolabirintodasescadasemumpequenoquartodosfundos. Aqui era onde ele geralmente guardava botões de todos ostamanhos e formas,masoquarto tinha sido limpo, e estava vazio.Vazio,excetoporumacoroa.Estava em um banquinho de madeira e uma janela aberta filtrava

exatamente luzsuficienteparaqueelabrilhasseecintilassenosol.Dinahsentiuoardesaparecerdeseuspulmões.Eramagnífico,umapeçadearte

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da mais alta qualidade, diferente de tudo que ela já havia visto. A basegrossa era de prata, escovada com milhares de pequeninos diamantesbrancos encrustados, todos em forma de coração. Ramos de árvoresindividuaisnasciamdos corações, caindoe se enrolandoemumsegundocírculo sólido, que acabava no topo da coroa. Os detalhes ficavam maisincríveis conforme Dinah olhava mais de perto. Os ramos, quandoinvestigados, eram modelados em rostos pequenos, com suas bocasfloridasabertasemumgrito.Estrelas,cintilandonaluz,pendiamdasfinasfaixasdeprataentreosramosrastejantes.OsquatrosímbolosdasCartasligavam as vinhas dos lados da coroa com o topo, onde um coração dediamanteestavaencrustadocomumpássaro levantandovooebrilhandona luz. O coração, ela podia ver, tinha sido cortado no meio e depoisremontado,entãoeleestavaumpoucooblíquo.Elaperdeua fala.Elanãoerasódezvezesmaiorqueasuacoroa,mas

tambémeradezvezesmaiorqueacoroadeseupai.NadaassimhaviasidofeitoantesnoPaísdasMaravilhas,nunca.Eraacoroamaisimpressionantequeelajáhaviavisto,umacombinaçãoverdadeiradearteehabilidade.Elaresplandecianaluzdosol.–Charleseunãopossoaceitar.Issoé…Ela olhou para seu irmão, ele estava parado, por um momento, e

observando-acomumatristezacuriosa.Elalhedeuumbeijonatesta.Elefezumacareta.–Muitoobrigada.Euireiusá-latodososdiasquandoforRainha.Sua própria coroa, um pequeno anel de rubi, parecia patético em

comparaçãocomela.Dinahseesticouparaalcançarocoraçãodediamante.–Não!–Charlesgritou,jogando-senochão,ondecomeçouasedebater.

Seucorposecontraiueumespasmopercorreusuaspernas.Dinahajoelhounochãoaoselado,envolvendoseusbraçosemsuafigurasofrida.–Charles,respire.Charles,seacalme.Eunãoireitocá-la,aindanão.ElachamouLucyeQuintrellvooudocorredor.Seurostodissolvidoem

medopelopequenopríncipe.–Segure-obemapertado.Aqui,coloqueissoemsuaboca.–eledeuum

pequenobastãodemadeiramaciçaaela–Eunãoqueroqueelemordasuapróprialíngua.DinahcolocougentilmenteobastãonabocadeCharleseosegurouaté

queoataquepassasse.–Eucuidodele–eladisseaQuintrell.Eledeuumsorrisogentil.–Oquevocêachoudesuacoroa?

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Dinah olhou para ela novamente. Era muito bonita, mesmo vista debaixo.–Eunãoacreditoqueelefezisso.Eusabiaqueelefaziaalgunstrabalhos

commetalepedrasalgumasvezes,masisso…– Ele está trabalhando nela há anos – Quintrell sussurrou – Nós não

queríamosestragarasurpresa.Odiaemqueestiveremsuacabeçaseráumdiagloriosoparanós,paraCharleseparaoPaísdaMaravilhas.EutenhofédequevocêseráumaótimaRainha.Dinaholhouparabaixoeviuseupequeninoirmão,seucorpotremendo

debaixo de suas mãos. O braço de Dinah era pesado embaixo de suaespinha trêmula.Duas crianças perdidas, ela pensou, esperando por umamãequenuncavaivoltar.ElaolhoudentrodosolhosdeCharleseacariciouseuscabelos.SeucorposeafrouxounocolodeDinah,eelefinalmenteficouparadoequieto.–Acoroadeviairparaacabeçadele–elarespondeu–Seelenãofosse

louco,Charlesseriaoherdeiro,oReideCopas.Quintrellderrubousuaenormemãonoscabelosnegrosdela.–Nãoerapraserassim,Alteza.Possopegá-lo?Dinahbalançouacabeça.–Não,euvouficar.Vocêseimportariademetrazeralgunstravesseiros?A pequena boca de Charles se abriu e fechou, enquanto seus olhos

brilhavamsobaspálpebraspálidas. Sonhandocomchapéus, ele suplicou.Chapéus, árvores e tortas. Ela aconchegou-se ao lado dele, sua cabeçaoleosadescansandoemseuombro.Elesdescansaramjuntos,irmãoeirmã;Charlesfinalmentedormiuprofundamentedepoisqueseuataquepassou,eDinahobservavaacoroa,maravilhada,observandocomoamudançadeluztransformavaasuaaparência.Elaficoucomeleporalgumashoras,atéqueLucyentrou,colocandoseuaventalrendado.–Dinah,Charles temque irparacamaagora.Quintrellpodecarregá-lo

até lá. Após esses ataques, ele geralmente dorme durante dois dias. Équando ele realmente dorme, então nós nos aproveitamos disso, etentamosorganizarelimparseusmateriaiseasala.–elaolhouparaasalapequenaevazia–Pelomenosnãotemosmaisquelimparessequarto.Dinah cuidadosamente tirou Charles de seu colo e deixou Quintrell o

levar.CharleseratãomagroqueQuintrellpodianiná-locomoumacriança.–Euvoltareinofimdessasemana–Dinahdisse,deslizandoosseuspés

noschinelosdejoias.ElaseinclinouparaCharlesedeuumbeijoleveemsuatesta,demorando-seemseucheirodepelenãolavada,soletecido–Evejovocêembreve–elasussurrou.Nocaminhodasaídaelaroubououtra

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rápida olhada na coroa. O sol da tarde estava pesado, e os raios de luzradiante do País das Maravilhas ondulavam sua preciosa superfície. Euvoltareiparavocê,elapensou.Dinah caminhoudepressa pelo corredor de pedra que serpenteava em

torno dosAposentosReais. Umpássaro branco a seguia. Essas pequenascriaturasdebicosperfeitoscorriamdesenfreadaspelocastelo.Elaseviroue o pegou em suasmãos.Opássarodeuum chiado surpreso e, então, seesfregou contra suas costelas. Dinah deixou seus dedos brincaremlevemente em suas penas felpudas e macias enquanto caminhava. Suamentevagavaepulava,relembrandodetudooqueFainaBakerdisseefez.Nãoeradifícil.DinahnãoesqueceriaoqueviraeouviranasTorresNegras,nunca,abelezaencovadadeFaina,asintrigasinfantisdeCray,apreguiçabrutaldeYoous.WardleynãohaviafaladocomDinahdesdeentão,eDinahtinhamedodoqueelepoderiadizer.Comcerteza,eleestavaressentidoporelaoterlevadoatélá,umlugardepesadelos.SuamentecontinuavadandovoltasnaspalavrasdeFaina.“Elairáusara

coroaparamanter suacabeça”.Elaestava,obviamente, falandodeDinah.Masporque elaperderia sua cabeça?Ninguémousariamatar alguémdaFamília Real, a não ser que fosse um assassino Yurkei, ou o próximo aassumirotrononalinhagemdafamília,masseupaitinhaerradicadotodoseles.“Ele veio no cavalo do diabo, procurando por algo que ele nunca teria

novamente.” Isso tambémnão faziasentido.Faina falousobreomar,masseupailutoucomosYurkeisnoleste,noaltodasmontanhas.Foiláqueeleconcebeu Vittiore. E Cheshire, o sussurrador de segredos, ele tambémestava envolvido nisso, não que fosse uma surpresa. Dinah sempre odetestou,eagoramaisdoquenuncaelatinhamaisrazõesparacertificar-sedequeseusprimeirosdiascomoRainhadeCopasfossemosúltimosdiasdelecomoconselheirodoRei.OpássarosoltouumoutrochiadoaltoeserevirounasmãosdeDinah.

Ela olhou ao redor, surpresa. Ela estava caminhando sem destino há umtempo,perdidaemseusprópriospensamentos.AgoraelaestavanapartedoRei do castelo, o lado oeste dosAposentosReais. Dinah raramente seaventuravaporali,pormedodeencontrarseupai.Elaolhouparatrás.SuasCartasdeCopasestavamatrás,parecendoentediadoseirritadosporelaterandadodurantetantotempo.Elacomeçouaandarnovamente.Deixeelesaseguirem, elapensou,éo trabalhodeles.A luzde fimde tardebanhavaocastelocomumadorávelbrilhodourado.Seusolhosseergueramparaumajaneladevidrovermelha,dotamanhodeumaparede,e feitadecentenas

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de pequeninos corações vermelhos. Quando o sol irradiava através dasgrandesnuvens,oscoraçõespareciamestarvivos,umórgãopulsantecommilharesdepartes semovimentando.Ela suspirou.OpaláciodoPaísdasMaravilhaseratão lindo, tãoantigo.Algumasvezeselaesqueciacomoeleeraadorávelecomoelaoamava.–Dinah?Osomeratãosuavequeeladeuumpuloederrubouopassarinho.Ele

deuumabicadinhairritadanacaneladeDinahantesdesairpelocorredor.Vittiore estava parada atrás dela, com um vestido pêssego cheio decamadasemsuafiguramagrela.Seuscachosloirosestavampresosdeumlado comuma rosa rosa-claro.As suasduasdamasde companhia ao seulado,comosempre.Elasusavamvestidoscombinando,listrasvermelhasebrancas e uma cobertura azul, como a cobertura de um bolo. Elas eramgêmeas idênticas, nascidas da Sra. Dee, uma senhoramarcante da corte,quetinhagrandesfavores,grandesdemais,Dinahsuspeitava,comorei.OsolhosdeDinahseestreitaram.–Essarosaeraogrampodaminhamãe.Vittiorelevouasmãosatéacabeça,afobada.–Sintomuito.Eunão…Palma,agêmeamaisquieta,deuumpassoadiante.–OqueaDuquesausanãoédoseuinteresse.–eladeuumrisoboboque

fezDinahrangerosdentes–NãoécomosevocêseimportassecomamodadoPaísdasMaravilhas.Suamãetinhaumanoçãodemodamuitomelhordoquevocêjamaisterá.Nanda,asegundadamadecompanhiaeagêmeamaismaldosadeuuma

risadairônica:–NãoculpeaPrincesa,nãoéculpadela.Emilynãotemnoçãodecomo

vestir as pessoas, ou do que uma dama deveria usar. Ela é baixa denascimento,todossabem.Dinahcerrouosdentes.–NãofaledaEmily,elaéumaservalealeumadamadecompanhiamais

doqueboa.Eudemandomaisdosmeusservosdoquesimplesmentemevestiremcomoumpássarofelpudo.Palmaestreitouosolhos.–Emilynãoétãolealcomovocêpensa.–Quieta,Palma–Nandadissebruscamente.– Vocês duas, quietas agora. Vocês se esquecem dos seus lugares. –

Vittiore ordenou tranquilamente – Voltem para os meus aposentos epreparemumcháparamimeaprincesa.Agora.

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PalmaeNandacurvaram-se irritadase correramparaosaposentosdeVittiore, seus passos em perfeita sincronia. Dinah colocou as mãos nosquadrisdesuasvesteslistradas,sentindo-sederepentebemfranca.–Eunão tenhonenhumavontadede tomar chá.Eu lhedoupermissão

paraapreciá-locomsuasdamasdecompanhiainúteisefofoqueira.Adeus.–elasevirouparairembora.–Não,espere.Sóumaxícara.Dinahbalançouacabeçaeencarousuameia-irmã,aDuquesadoPaísdas

Maravilhas.ElasnuncaestiveramjuntassemoRei,nenhumavezdesdequeVittiore tinha chegado. Dinah a evitava a todo custo, e ela presumiu queVittiore fazia a mesma coisa. Elas nunca tinham as mesmas atividadesagendadas, nem as refeições, nem as lições. Elas se encontravamocasionalmenteembailesreais,jogosdecríqueteemaisassuntostediososdoPaísdasMaravilhas,comoreuniõesdeconselho,massomentealgumasvezes no ano. Nesses momentos, Vittiore parecia tão entediada quantoDinah,mascomumainsinuaçãodemedo.Elasemprefoidelicadaeamável,o que fazia Dinah se sentir muito dura e desajeitada, como um gigantepertodameira-irmã,mesmonoscorredorescavernosos.Vittioregesticulounovamenteatrásdela.–Por favor,Alteza.Somenteumaxícaracomigo.Eupeçodesculpaspor

NandaePalma.Euprometoqueavistadaminhavarandaémuitobela.Quando a rejeição se alinhou em sua língua, Dinah amordeu de volta.

Talvez ela tivesse alguma compreensão de o que Faina Baker estavamurmurandosobreVittiore.Ela,obviamente,tinhasegredosaesconder.AsdivagaçõesdeFainaaindaestavamcheiasdemistérioeloucuraenigmática,elas ainda eramumquebra-cabeças obscuro.Dinah teria que ser criativaparadesvendarseusignificado.–Eutomareiumaxícaradechá.Vittioretropeçounapontadeseuvestidoaosevirar.–Hunf,elessãosempretãocompridos.Eualevareiatélá.–Euseimuitobemondeéoseuaposento–Dinahretrucou–Eraoda

minhamãe.Elas andaram em silêncio, os passos pesados das Cartas de Copas

estavamatrásdelas.– Está um dia adorável lá fora, não émesmo? Fico feliz em ver que a

primaverafinalmentechegou.–Vittioresussurrou.–Euprefirooinverno–Dinahrespondeusecamente–Eusaboreiooar

frescovindodeTroden.OscachosdeVittioreseestremeceramquandoelaabriuaportadeseu

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aposento. O corredor de pedra dava para um lindo quarto iluminado. Asjanelas de Vittiore eram viradas para as Montanhas Ocidentais, que, aolonge, alcançavam o oceano. Diversas cidades pequenas do País dasMaravilhaspodiamservistasdessajanela.DinahsemaravilhouemsilênciocomoquãodiferenteoquartodeVittioreeradodela.OaposentodeDinaheracheiodeestantescom livrosdochãoatéo teto.Era largoedecoradocom tesouros ancestrais, globos e pequenos modelos de navios, mas elanuncaochamariadeadorável.Eletinhasidofeitoparaumhomem,paraoherdeirodeseupai,oqueeleumdiasonhouter.O quarto de Vittiore era a exata definição de adorável. Era arejado e

iluminado, bem diferente da última vez que Dinah o tinha visto, quandoestavatudosombrio,eenvolvidoemtecidopreto,umsinaldolutoporsuamãe. Agora, tecidos de tom pastel envolviam as paredes, movendo-sesuavemente com a brisa. Toda a mobília era pintada de azul-claro, e osestofados eram de espirais brilhantes e cores bonitas. Um pavão brancodesfilava orgulhosamente pelo quarto, bicando o pé de Dinah. Vittiore opegounocolo.– Esse é Gryphon. – ela acariciou o pássaro na cabeça. Ele tremeu de

felicidade–Minhasaladecháéaqui,pertodajanela.Suamesadechárosaerapequenina,Dinahnotou.Elaquasenão tinha

espaço para sentar na frente de Vittiore sem que seus cotovelos setocassem.Ela sempre deve tomar chá sozinha, pensou, que bom que suamesadechátinhaespaçosuficienteparacaberHarriseEmilyaoladodela.Palma e Nanda rodeavam a mesa, observando todos os movimentos deDinah, com suas sobrancelhas meticulosamente desenhadas e rostospintadoscomcoresvivas.Vittiore notou a feição fechada de Dinah quando Palma colocou uma

xícaratransparentedechá.–EueaPrincesatomaremosnossochásozinhas.Saiam.–Mas…Alteza…–Palmainsistiu–Nóssempreficamosparaochá,esea

senhoraprecisardealgumacoisa?–Estátudobem,Palma.–Mas,Alteza, e se a águaacabarouas tortasprecisaremser repostas,

comonósaouviremos?Eurealmenteachoqueémelhorficarmos.Dinah podia perceber pela interação que Vittiore tinha pouco controle

sobresuasdamasdecompanhia,eramaisocontrário.Elapareciatemê-las.Dinahnão estava surpresa. A famíliaDee era feita de escaladores sociaisimplacáveis,sualealdademudavacomovento.Dinahestalouosdedos.

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–Deixe-nos,AGORA.SevocêsnãovãoouviraDuquesa,ouvirãoaMIM,suafuturaRainha.Apressem-se.Palmafezumareverênciaesaiudasalasuspirandoalto.–Medesculpe,elassãomuitosuperprotetoras.–Vittioresedesculpou.–Issonãoédaminhaconta.–Dinahencolheuosombros.Houveunsmomentosdesilêncio.Dinaholhouparasuaxícara.Umavez

que o vapor de água foi derramado sobre a flor roxa espinhosa, uma desuas pétalas laterais desenrolou, enchendo metade do copo com umaestranha pétala brilhante. Um pequeno fluxo de líquido vermelho foiderramadoapartirdo centroda flor,quematizouaxícarae aságuasdeescarlate.–Oqueéisso?Eununcaviessaflordochá.Vittioretrouxeaxícaraparaoslábioseassoprou.– Chama-se cardo sangrento, é um arbusto selvagem que cresce nas

MontanhasOcidentais.–elaapontouacabeçaparaajanela–Torna-seumchámaravilhoso.Dinahlevouaxícaraatéoslábios.Porfavornãosejaveneno,elapensou

ao tomar um golinho tímido. O chá era delicioso, um sabor cítrico fortedançava em sua língua antes de começar um zumbido com um gosto deterra.– É maravilhoso. – Dinah concordou, relutante. Ela levou a xícara aos

lábiosnovamente,comumafacilidadecasual–VocêconheceumamulherchamadaFainaBaker?Vittiore engasgou com seu chá e derrubou sua xícara, que explodiu

contra o prato. O chá vermelho-sangue derramou por seu vestido depêssego,overmelhoespalhando-secamadaacamada.Vittiorebalbuciou:–Ai,eusoutãodesastrada,sintomuito.Minhasmãossempretremem.–

elacomeçoua limparochádamesa.Dinahadicionouumguardanapoaoseuesforço.–Não,não,eununcaouviessenome.Porqueapergunta?Dinahdecidiuseratrevida:–Ésóumnomequeeuouviporaí,semquerer.ApelejápálidadeVittioresetransformouemumtombrancopastel,mas

elapareceurecuperaracompostura.–Éumatristeza,eurezoporaquelesqueestãopresosnasTorresNegras,

especialmenteasmulheres.Dinah arqueou a sobrancelha, ela não havia mencionado as Torres

Negras, ou o fato de Faina ser uma prisioneira de lá. Vittiore estavaclaramente perturbada. Atrás de Dinah, uma porta bateu quando Nandasaiudasala.Elaobviamenteestavaouvindoaconversa.

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Dinahmisturouumpoucodeaçúcarnochá.– Conte-me novamente, onde você cresceu? Acho que nós nunca

conversamos desde que… – ela fez uma pausa – você chegou em nossaporta.Vittiorerespirouprofundamente.Seusolhosmiraramàesquerda.–EunascinaFlorestaRetorcida,nabasedasMontanhasYurkeis.Nasci

no começo de um outono. Nosso pai tinha acampado na vila durante agrande batalha contra os Yurkeis, conheceuminhamãe e eles caíram naluxúria.–Enquantoeleaindaestavacasado.Comaminhamãe.ARainha.Vittiorepiscou.– Sim, eu sintomuito.Euesqueço isso às vezes.Não foi certodaparte

dele ser infiel à sua mãe. Eu acredito que ele estava simplesmenteprocurandoumconfortoemocionalnosbraçosdeminhamãe,nadamais.–Esuamãe?–Dinahperguntou.OsolhosdeVittioreseencheramdelágrimas.– Ela era uma mulher maravilhosa. Seu corpo combinava com sua

natureza,suaveedoce.Quando fui trazidaparacá,aos trezeanos,minhamãetinhamorridohámuitotempo.–avoztravouemsuagarganta.Dinahesperoupacientementequeelaterminasse–Eusoumuitoabençoadaporter umpai tão amável e gracioso, e tambémde ser incluída na linhagemreal deCopas.Mesmoqueminhamãe tenhanascidoplebeia, nossopai éumótimorei.–Comcerteza–Dinahconcordou,suamenteestavamuitoagitada–Você

sentefaltadasMontanhasYurkeis?–Àsvezes.Elaseramtãograndes,umasombrapermanentesobreavila.

Maseuestou felizdeestaraquiagora,nessepalácioadorável. – suamãotremia–Mas,paraserhonesta,podesersolitário.Euvisitooseuirmão,vezououtra.Dinah não conseguiu esconder o choque. Quintrell e Lucy nunca

comentaramnadasobreVittiorevisitá-lo.Elaabaixousuaxícara comumtilintar,opiresembaixotrincou.–Eunãosabiadisso.Quemotivovocêpoderiaterparairvisitaromeu

irmão?–Há uma inocência emCharles queme tranquiliza. Ele émaluco,mas

também é genuíno. – ela olhou pela janela – Ele é tão diferente de todomundo aqui do palácio. Charles não tem motivações ou política. O seumundo é de maravilhas, algo que a corte não concede quando fazemospartedela.

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VocênãoépartedaFamíliaReal,Dinahpensou.Nãodeverdade.–Vocêsentefaltadasuamãe?–Vittioreindagou.Dinahsentiutodooarsersugadodasaladeumavezsó.Ninguémnunca

perguntara sobre suamãe.Depois que elamorreu, foi como seDaviannanunca houvesse existido. Apenas Harris a mencionava de tempos emtempos.Dinahsesentiuimpossibilitadadeproduzirumarespostaodiosa,nãosobreisso.–Eupensoemseusorriso.Eupensoemcomoelasorriaparasimesma

quandofaziachineloscomjoias.Eu lembrodecomoela liahistóriasparanós, com vozes e sotaques diferentes. E em como ela carregava Charles,ferozcomomaisninguém,comoseelefossefeitodevidro.LágrimassereuniramnocantodosolhosdeVittiore.Seufirmeolharazul

airritou,elasentiuumafúriacrescerdentrodela.– Por que você está perguntando sobreminhamãe? Ela não era nada

paravocê,eelanemsoubequevocêexistia.Vocêdeveriaestargrataporela estar morta, ou então você nunca poderia vir até aqui; nem recebernadadomeupai,simplesmenteporcausadenossapena,filhabastarda!Vittiore se recusou a responder ao insulto de Dinah e simplesmente

mudoudeassunto:– Eu posso imaginar como isso deve ser entristecedor para você. É

realmenteinjusto.–elasuspirouelevantoudacadeira,comumaexpressãovaga.Suamentecomcertezaestavaemoutrolugaraoobservaravistadesuavaranda–Você jáesteve foradopalácio?Láháumabelezaquevocênãopoderiaimaginar.– Eu não tenho nenhuma vontade de sair – Dinah respondeu – Essa é

minhacasa,meureino,meupalácio.Euprecisoficaraqui.Vittioreolhouparatodooquarto,ansiosa.Dinahvirousuacabeça.Não

havia ninguém lá, o que ela estava olhando? Dinah virou sua cabeça devoltaeficousurpresaaoencontrarVittioreacentímetrosdeseurosto.Elapuxou Dinah para perto. Seus lábios quase se encostavam, e ela podiasentirohálitofloridodeVittiorecontrasuaboca.–Vocêdeveriairembora.Apenasvá,VÁ,omaisrápidoquepuder,–ela

sussurroucomumaurgênciasemfôlego–Hácoisasacontecendoaquiquevocê jamaispoderia compreender.Eu tambémnãoentendo,masouçoossussurros.–Compreendoquevocêqueraminhacoroa–Dinahsussurrou–nãoé

issoqueestáacontecendo?UmolhardepuraconfusãocruzouafacedeVittiore.–Oquê?

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Asduasgarotaspularamparalongeumadaoutraquandoumaltocrackveiodoladodeforadaporta,quearrebentou-seeoReideCopasentrouapassos largos, com um olhar furioso em seu rosto ruborizado. Ele eraseguidoporseisCartasdeCopas,NandaePalma.– Dinah! – ele trovejou – O que você está fazendo nos aposentos de

Vittiore?– Nós estamos apenas tomando chá. – Dinah balbuciou, de repente se

sentindomuitopequena.–Vocênãodeveriaestartendosuasliçõesagora?Dinah estava parada, tremendo. Suas pernas quase cederam, como

semprefaziamnapresençadeseupai.Sejaforte,eladisseparasimesma,vocêseráaRainhaembreve.– Eu terminei minhas lições mais cedo. Visitei Charles essa manhã.

AparentementeVittiore tambémanda visitandoCharles. Possoperguntarqualfoiaúltimavezqueosenhorviuseufilho?Seupaiatravessouoquartoemumavelocidadealarmante,suaenorme

mãoagarrouosbraçosdeDinah.ElegirousuamãocomforçaeapeledeDinahqueimouembaixodela.– Criança insolente! Não presuma que você tem o direito deme dizer

comolidarcomaminhafamília.EuireivisitarseuirmãoquandooPaísdasMaravilhas tiver um dia perfeito e tranquilo. Que não precise de umgovernante.Dinahtorceuobraçodesuamãoegirouparaencará-lo.– Logo o senhor terá muito mais tempo em suas mãos, quando eu

assumirotronoaoseulado.Euvougarantirquesuastardessejammuitomaistranquilas.Antes que o rei batesse sua mão fechada no rosto de Dinah, ela

vislumbrou orgulho nos olhos dele. Ela era mais feroz do que eleimaginava.Masissofoiapenasporumsegundo,eentãoelaseesparramounochão,comoladoesquerdodeseurostopulsando.–Pai,PARE!–Vittioreimplorou,seusolhosazuisarregalados,emchoque.OReideCopaslançouumolharcomumaenergiaassassinaparaVittiore.–Querida,porfavor,volteparaoseuchá.NandaePalmairãoajudá-la.

Dinah,volteparaosseusaposentos.Nuncamaisvolteaqui.Vocênãotemnadaparafazeraqui,alémdedistrairVittioredeseusestudos.Étípicodevocê servir comoumbloqueio errante para todas as coisas boas. – oReicurvouosdedoseduasCartasdeCopasseaproximaram.EleapontouparaDinaheelasapuxaramrudementepelopé–Leveasduasemboradaqui.Nanda e Palma escoltaram uma Vittiore trêmula para o seu quarto de

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vestir,murmurandogentilmenteemsuaorelha.OReiapontouparaDinah,quehaviaempurradoosguardaseestavadepétremendoemcimadeseusprópriospés.–TenhocertezadequeaPrincesatemmuitoafazerantesdacoroação

nomêsque vem. Por favor, certifique-sede que ela seja colocada soboscuidados de Harris, e lembre-o de que sua tarefa é mantê-la na linha. –Dinahnotouque isso eraumaameaçaenãoumpedido.ORei se curvouparaquepudesseolhardiretamentenosolhosnegrosdeDinah–Euodiariase algo acontecesse com Harris se ele não estivesse fazendo um bomtrabalhoaoeducarafuturaRainha.Talvezumdosmeushomenspessoaisfossemaisadequadoparaatarefa.AbocadeDinahestremeceu.–NÃO. Não, vou ficar longe de Vittiore, sempre fiquei. Eu não tenho a

menorvontadedeestarnapresençadeumabastarda.DinahesperavasentirnovamenteasmãosdoReiemseurosto,mas,em

vezdisso,eledeuumarisadamalvada:–Seufogomeimpressiona,criança.Sempremeimpressionou.Fiquena

sua parte do castelo. Prepare-se para a coroação. Nos vemos no Dia daExecução.OReigirou,esuacapavermelhacirculou logoatrás,umaextravagante

corvivanoquartosuavedeVittiore.Dinahserecompôsedeuumaúltimaolhada para fora das janelas da meia-irmã, enquanto as Cartas aacompanhavamatéaporta.Osolestavasepondoagora,eocéudoPaísdasMaravilhas era uma faixa de tons laranja brilhantes, suas linhas seesticandonohorizonte.Umjardimderosasrosa-choquehaviacomeçadoaflorescernasfloreirasdesuavaranda.E,láfora,osúltimosflocosdenevecor-de-rosa cintilavam na luz minguante. Juntos, eles transformavam omundoemumamisturaestonteantedefogoeluz.DinahsuspirouenquantoaCartadeCopasconduzia-aatéaporta.Eunão

estoumaispróximadaverdadeagoradoquejáestiveantes,elapensou,maspelomenoseunão tenhodúvidasdequeVittiore temalgumaconexãocomFaina. No teto acima dela, estrelas pratas pintadas brilhavam na luzdiminuta.Há tanta paz aqui, pensou,uma cama adorável para uma belamentirosa.

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Doze

Ummês depois, a neve rosa era apenas umamemória, quando Dinahestavadepénochãodelamaesperandoocomeçodasexecuções.ODiadaExecução acontecia duas vezes ao ano no País das Maravilhas. O jardimficava cheio de milhares de moradores da cidade e membros da corte.Cartas passeavam para cima e para baixo, com suas espadas como umasutildicadequeapazseriamantida.DuasfileirasdeEspadasestavamemseusuniformespretos,garantindoadistânciaentrearealezaeaspessoascomuns. Faixas de corações vermelhos floresciam da plataforma,balançandonabrisaquentedeprimavera.ODiadaExecuçãocostumavaserumdeseusferiadosfavoritos,masisso

eraantesdeelacrescerosuficienteparacompreendê-lo.AsleisdoPaísdasMaravilhas determinavam que uma criança não podia assistir ao Dia daExecução até que tivesse dez anos. Até então, era apenas um dia deesbanjar, cheio de presentes e celebrações; um descanso de suas liçõesconstantes.Dinah eWardley fugiam da cozinha com pratos de torta quentes, com

geleiagrudentaemseusdedos,açúcarnonarizesesaciavamatépassaremmal.Quandoelafezdezanos,seupaiordenouqueelafosseàsexecuções,eDinahficouemchoquepordias.Elahaviaperdidosuamãenaqueleanoe,ao ver a morte tão de perto e vividamente, passou muitas noites semdormireteveataquesdechorohistérico.Nãohaviamaistortas,enemmaisfazerdesenhosdeaçúcarnabochechadeWardley.Quanto mais execuções ela presenciava, mais duro seu coração se

tornava. Agora ela nem vacilava quando as cabeças caiam finamente dosombros na tigela de porcelana, algo de que ela realmente se orgulhava.Umarainhadeviaterumestômagoforteparaajustiça,elaraciocinou.Dinahficouperfeitamenteparadaao ladodeHarris, seu rosto livredeemoçõesquandoseuterrívelpaicaminhouparaaplataforma.OsilênciocaiusobreamultidãobarulhentaenquantotodooreinosecurvavadiantedoRei,queestava usando sua armadura impenetrável, que o fazia parecer com umurso, uma força a se reconhecer. Um coração negro marcado em seu

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enorme escudo de prata sobressaía orgulhosamente em seu peito. Suapesadacoroadeourobrilhavanaluzdatarde.ORei subiu as escadas,mas não antes que seu olhar encontrasse o de

Dinah.Haviaumatrocaestranhaentreeles,elelançouumsorrisosatisfeitoparaelaeDinah,confusaeincapazdecontrolarsuaboca,sorriudevolta,oqueacaboudeacontecer?, ela sepreocupou.Elanão lembravade seupaisorrindo para ela, nunca. Ele se arrastou escada acima, suas pisadas deferroecoandopelojardim.Cartas de Copas se agrupavam em uma linha bagunçada na frente do

palco, suas espadas seguras firmemente contra seus peitorais. Seu paicomeçou seu discurso de sempre, declarando os prisioneiros culpados efalando sobre a grande honra que eles proporcionavam ao País dasMaravilhas ao permitirem que o reino cortasse suas cabeças, libertando,portanto,omalqueseescondianoscoraçõessombriosdoReino.Eraumpresentepara todasaspessoasdoPaísdasMaravilhas,dado,deverdade,porele,oRei.OsprisioneiroseramescolhidosespecificamentepelosPaus,deacordocomseuscrimeshediondos,suafaltaderemorsoouonívelgeralde inutilidade para o Reino. A maioria deles era de assassinos, algunsinvasores,outrosladrões,eoutroserammulheresquesevendiamparaoshomensporumpreçoalto.TodoselesmoravamnasTorresNegras.Issojáera punição suficiente, Dinah pensou, pior do que qualquer uma dessaspessoasingênuaspodeimaginar.Eleanunciouqueogrupodehojeeraformadodequatorzeprisioneiros,

novehomensecincomulheres.Alistadosqueseriamdecapitadosdatavade anos atrás, já que havia muitas pessoas no País das Maravilhas quemereciam a lâmina. Dinah estava nervosamente inquieta durante odiscursodeseupai,atéqueelasentiuocotovelodeHarrisprofundamenteemseusquadris.–Ficaquieta,criança.ElafocousuaatençãoemWardley,queestavaparadoemfrenteaopalco,

ao lado de seus companheiros Cartas de Copas. Seu cabelo castanhocacheadohaviasidoraspadorenteàsuacabeça,umamudançaqueDinahlamentavasemprequevia.Elepareciatãodiferente,tãodiferentedaquelegarotoqueelaadorava,tãoparecidocomohomemqueelesetornaria.Atémesmo agora, ele estava parado entre as outras Cartas, seu queixo forteapontando para o lado, seus olhos treinados, no Rei. Ele era confiante etranquilo,otipodehomemquepoderialiderarumexércitoearrebataroscoraçõesdasmulherescomfacilidade.Dinaholhouparasuamãodireitaeviudoisdeseusdedossecruzandoe

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descruzando,umhábitoqueele tinhaquandoestavanervoso.Umsorrisoadorávelsedesenhavanoscantosdabocadela.Algumdia,elaesperava,eleseria o seu rei e governaria ao seu lado. Fortes e apaixonados, elesgovernariam o País dasMaravilhas em uma nova era, começando com adestruiçãodasTorresNegras.Dinah fechouopunho.Raizpor raiz, disseparasimesma,issoseriafeito,Wardleyolhouemsuadireçãoeelalhedeuumpequenosorriso;eleoreconheceucomumapiscada.Seucoraçãodeuumpulodefelicidade.ORei agora finalmente estavanaplataforma,olhandoparaummarde

vermelho.TodosusavamvermelhonoDiadaExecução.Dinahrefletiuqueo sangue não era tão chocante quando todos já estavam cobertos decarmesim.Seupaisentouolargoquadrilnotronodeferro.UmaCartadePausseaproximoudelecomumafolhadepapelenrolada.Oreiarecolheueconcordou,eosdoisficaramparadosesedirigiramà

multidão.Seupaidesenrolouodocumentoe,emsuacadênciaexplosiva,elecomeçoualerosnomesdoscondenados.Cadaprisioneiroeratrazidoparafrente quando seu nome era chamado; eles tomavam o seu lugar,coletivamente, em um longo bloco branco, descansando suas cabeças nomármoremanchado.– Jasper Che-guffe. Robinson Thomas. Abbie Tibbs. Gayleen Skinner.

EartheHicket.FainaBaker.AcabeçadeDinahergueu-sederepente.Não,não,não,não…Seu pai continuou lendo os nomes, mas a visão de Dinah focou na

pequenamulher loira que estava sendo arrastada para o bloco. Para suasurpresa, ela pareciamuitomelhor do queDinah a vira nas torres – seucabelo loirosujoaindaestavacheiodeóleoeseusbraçosmagrelosaindatinham machucados, mas a loucura em seus olhos havia recuado, e elaclaramente estivera comendo, pois tinha engordado um pouco. Eles atiraram da árvore, Dinah percebeu, era isso que estava diferente. Eles aengordaram para que ela parecesse uma prisioneira comum na frente damultidão.Faina se endireitou em sua corrente, forçando uma Carta de Paus a

arrastar na direção do bloco. Sua boca estava ferida, e não era umasurpresa, considerando a mordaça de metal que estava envolvendo seurostoeenfiadanomeiodeseuslábiosensanguentados.Elalutavaemvão,tentandodesesperadamentegritar,seusolhosdirecionadosparaaFamíliareal. A Carta que a levava deu um forte puxão na corrente, e Faina foijogadaparafrente,caindodejoelhosnafrentedocompridoblocobranco.Dinahapertavaesoltavasuasmãos.Sentiucomoseseucorpotivessesido

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mergulhado,derepente,emáguascongelantes.ElanãoconseguiatirarosolhosdeFaina.Oqueelapoderiafazer?Fainasoluçouabafadoetentousearrastarparaa frentedaplataforma,

onde as Cartas de Copas esperavam pacientemente por ela com suasespadas.SeusolhosmarejadosestavamfixosemDinahenquantoasCartasa empurravam de volta para o bloco. Uma Carta de Paus a puxou peloscabelos.–Feisty–oReigritou,eamultidãoriucomele.Gritos guturais baixos podiam ser ouvidos através de suamordaça de

metal.Dinahestavatomadaporpânico.Eladeveriatentarcolocarumfimemtudoisso?Querazãoelapoderiadar?ElaolhounadireçãodeWardley,ele estava pálido e abalado, encarando Faina enquanto o guarda aesbofeteavaeaseguravacontraobloco,apoiando-seemsuafacecomtodasuaforça.DinahagarrouocasacodeHarris.–Eugostariadeclamarpiedadeporaquelamulher,apequenina.Harrisolhoudevoltaparaela,alarmado.–Porquê?Vocêconheceessamulher?Dinahbalançouacabeça.– Não, mas olhe para ela, Harris; ela parece uma criminosa? Alguém

capazdecometerumassassinato?Elebalançouacabeça.–Vocênãoouviuasacusações?Aquelamulherassassinouumescudeiro

dePausnastorresnasemanapassada,umjovemgaroto.Oh,deus,afaca!Dinahfalavarápido,frenética:– Mas a lista de espera para o Dia da Execução ainda está nos

prisioneirosdetrêsanosatrás,nãoé?Harrisrapidamenteenvolveuseubraçogordinhoaoredordacinturade

Dinaheaproximousuabocadocabeloescurodagarota.–NãoaborreçaoRei,minhacriança,nãonoDiadaExecução,vocênão

querqueeleachequeestátentandotomarotronoantecipadamente.Nãohánadaquevocêpossafazer.Elaestánoblocoporcausadoassassinatoenãotenhodúvidasdequeseucrime foihorrível,ouentãoelanãoestariaaqui. Somente os piores criminosos são executados, e os Paus têm boasrazõesparaenviá-losparaamorte.ConfienajustiçadoRei.Umdia,quandovocêforaRainha,poderáterpiedadedequemquiser.Elaoempurrouparalonge.–Issonãoéjustiça–elaretrucou.Ela sentiu-se em uma armadilha, um gato em uma jaula, assistindo o

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cabelo sujo de Faina Baker pingar no mármore branco. Faina estavachorando e engasgando em sua mordaça, e ela continuava jogando osbraços para frente, como se estivesse tentando abraçar a multidão. Amultidão,emretorno,murmuravasuaaprovação.Elesadoravamumbomshow,eessamulherloucaedeterminadaanãomorrerestavadandoumaeles. Ela tinha o olhar de uma besta louca, seu desespero era palpável ereal.DinahdeuumpassoemdireçãoaoReiquandoHarrisprendeusuasmãosaoredordesuacintura.–NÃO.Vocêvainoscolocaremrisco.Dinahparou,eleestavacerto.ElanãopodiaarriscarenfureceroReicom

suacoroaçãotãopróxima.SeupaipercebeusuacomoçãocomHarrispelocantodosolhos.Ele levantousuaespadadeCopasnadireçãodeDinahedepoisaapontouparaFaina.Foiummovimentorápidoesutil,masDinahocompreendeunomesmoinstante.Esseeraoseucastigo.Elesabia,ohcéus,elesabia.Elesabiaqueelahavia

estadonasTorresNegras,sabiaqueDinahhaviafaladocomaprisioneira.Fainasevirouegiroucontraascorrentes,seusolhosnuncadeixandoa

primeirafileira.OReipegousuaespadadeCopaseandounadireçãodosprisioneiros,vendocadaumeolhandodentrodeseusolhos.Eleparounafrente de Faina, disse algo baixinho em sua orelha e continuou. Após tercaminhado para cima e para baixo pelo longo bloco branco, ele sedirecionouparaaCartadePaus.Amultidãoestavaagitada.Esseeraomomentopeloqual elesestavam

esperando e não havia dúvidas de que dinheiro havia sido trocadorapidamente depois que os prisioneiros foram apresentados. Apostar namisericórdiadoReieraumapráticacomum.ACartadeuumpassoadianteelimpouagarganta:–OREI, EM TODA SUA GLÓRIA E JUSTIÇA, DECIDIU USAR SUAMISERICÓRDIA NESSE DIA.

ESSES PRISIONEIROS QUE DESCANSAM SUAS CABEÇAS NO BLOCO SÃO ABENÇOADOS,ESCOLHIDOSPARAEXEMPLIFICARA JUSTIÇADOPAÍSDASMARAVILHAS,DASTORRESNEGRAS,DAS CARTAS DE PAUS E DA LINHAGEM REAL DE COPAS. POR CAUSA DE SUA NATUREZAGENEROSA, O REI ESCOLHEUM PRISIONEIROQUE TERÁ SUAMISERICÓRDIA EMTODODIADEEXECUÇÃO.NESTE ANO, AMISERICÓRDIA É DADA A ROBINSON THOMAS, POR SEU CRIME DEROUBO.Umacomemoraçãotempestuosaexplodiudaquelesplebeusquehaviam

apostado em Thomas. Um homem ruivo e bonito, vestido em trapos, foidesacorrentadodafilae levadoparalonge,masnãoantesdecairaospésdoRei,choramingandoetrilhandoabocasobresuasbotas.Dinah sabia o que aconteceria com ele depois que saísse: ele seria

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alimentado, banhado e, então, treinado como um Espadas, para lutar ematar.ObarulhodamultidãocresceraatésetornarensurdecedorquandoRobinsonsaíadaplataforma.– Cortem as cabeças! – bradou uma voz estridente vinda do fundo do

jardim.–Cortemas cabeças! Cortemas cabeças! – amultidão ecoou, cada vez

maisalto,atéqueoprópriochãomurmuravaosom.OReifezumsinalcomsuaespadadeCopaseocarrascodeuumpasso

adiante.Dinahfechouosolhosporumafraçãodesegundos,repetindoparasimesmaoquesempredizianosDiasdeExecução:avidaeraassimmesmo:dadaetirada,eesseseramoscriminososquemereciamasentença.Elanãoseria como as pessoas comuns que apreciavam observar a queda domachado,ojorrodosanguevermelho.Maselatambémnãoseriacomoasmulheresdarealeza,quedesviavamoolharecobriamosrostoscomseuslençoscomumsuspirosoluçante.Elaeraafilhadeseupai,quenãofugiadasconsequênciasdavida.Sangueeraapenassangue.Mas,aoabrirosolhosnovamente,elaviuapenasFaina.Elahaviaparado

desedebatereagoraencaravaamultidão, receptiva.Umacalmapacíficavinhaemseurosto,enquantoaslágrimaspingavamemsuasbochechase,depois,noblocodemarfim.Elahaviaseacertadocomamorte.Osoutrosprisioneirosnãoestavampassandotãobem,elesgritavamourezavam.Dinah sentiu as próprias lágrimas vazarem de seus olhos, e as limpou

rapidamentecomseucasacovermelho.Meupainãoveráminhaslágrimas,pensou,eunãodareiaeleoqueeledesejanodiadehoje.Umafúriatomoucontadeseupeito,quentecomoumachama.Ocarrascolevantousuaespadaduplaeaprimeiracabeçacaiu.Entãoa

segundaeassimpordiantenalinha,atéqueaespadapairousobreFaina.Um sangue escuro pingava da lâmina em seu rosto pálido, uma lágrimanegra,quesemisturavacomasdela.Eununcasabereidaverdade,pensouDinah,nuncasabereiporquerazão

comi um pedaço de papel com o nome dela escrito. Ela não me contou osuficiente:asTorresroubaramminhasrespostas.Faina sorriu para Dinah e, por um momento, Dinah viu o quão

incrivelmente bonita ela deve ter sido um dia. A espada caiu com umalufada, e a cabeça de Faina caiu rapidamente para longe de seu corpo.Agora,umacachoeiraescarlatecobriaoblocoondesuacabeçaestiverahásegundos.Dinahnãotevenemtempodereagirporcontadomovimentoàsuadireita.Vittiorehavia caídode carana lamadooutro ladodeHarris,aterrissandonochãocomumbaqueviolento.

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Dinah observava com um silêncio atordoado até que percebeu o queestavaacontecendoe, então,deualgunspassos emsuadireção, tentandogirá-la. Seu corpo se agitava contra o de Dinah. A multidão engasgou.Mesmo Vittiore sendo leve, o seu peso morto era demais. Com umgrunhido, Dinah a girou, afundando os joelhos profundamente na lama.Vittiore espalhava-se dramaticamente em seu colo, seu vestido brancocontornando Dinah como ondas espirais. Nanda e Palma estavam acirculando como pássaros imbecis, chorando e gritando, mas sem fazernadadeverdade.Dinah olhou para a Duquesa. A raiva passou por seu corpo por ter

Vittiore tãopróxima,umabochecha rosaepálidaemseusbraços, cachosloiroscaíamdebaixodeseusseios,maselaaindaasegurava.AFamíliaRealnão podia parecer desestruturada, mesmo quando suas bases estavamdespedaçadas. A lama tinha, de alguma maneira, coberto exatamentemetadedorostoperfeitodeVittiore,queerabrancocomoporcelana.Dinahlembrou queVittiore nunca esteve presente noDia da Execução, sempreafirmando estar com febre ou com uma dor de cabeça inesperada. Elanunca tinha visto as cabeças rolarem, algo que Dinah havia presenciadomuitasvezes.Ela notou um movimento com o canto dos olhos: Wardley estava

correndoemsuadireçãoparaajudarVittiore,eorestodasCartasdeCopaso estavam seguindo. Espectadores e lordes levantavam suas mãospreocupadoscomaDuquesa,eamultidãoosobservavacomumêxtasedefascinação.Essacenaémacabra,Dinahpensou.ArosabrilhantedoPaísdasMaravilhassendoacolhidapeloespinhoobscuroquesetornariaaRainha.Dinahbateuforte,comsuamãoaberta,norostodeVittiore:–Acorde,bastarda!Osolhosazul-clarosdeVittioreabriramemumarquejo:–Dinah?–eladisse,soandomaispatéticadoqueparecia–Eleprometeu,

eleprometeu…–seusolhosencontraramoolhardeDinahdiretamente–Euusareiacoroaparamanteracabeçadela.E,então,eladesmaioufriamentedenovo.Dinahdeixouqueelacaíssena

lamacomumbaque.Derepente,todosestavamemcimadeles.VittiorefoipuxadadosbraçosdeDinahporWardley,queaninoucomoumacriançaeacarregouparaocastelo,sendoseguidoporPalma,NandaeumadúziadeCartasdeCopas.HarrisajudouDinahaselevantar:–Minhadama,esseatocomcertezafoimuitocorajosoegenerosodasua

parte.

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Harris parecia deliciado com o cuidado inesperado de Dinah comVittiore.Elesempredesejouqueelasfossemamigas,umaideiaqueDinahrejeitavatãoveementementequeelesófalavasobreissoumaveznoano.Dinaholhouparabaixocomnojo.Avestevermelha,quepareciatãoadorávelmomentosatrás,agoraestava

cheiadelamaefiosdecabeloloiro.Elaolhouparacima,encarandoseupai.Ele a encaravadevolta. Seusolhos azuispareciamchamuscar atravésdesuapeleeossos,eelasentiuumódioferventeirradiandodaplataforma.–Vamoscontinuarcomasexecuções–declarou–Sintomuitoporminha

filha, ela é uma flor delicada e gentil, que pensa nos necessitados. Asmulheres,porcausadesuanatureza,têmumcoraçãofracoesensível,masoReinuncadeixarádecumprirajustiça!A torcida feroz da multidão invadiu Dinah, enquanto ela assistia

atordoadaeemsilêncioseupaiordenandoqueasespadascontinuassemotrabalhodenovoedenovonosoutrosprisioneiros,atéquerestasseapenasum balcão cheio de sangue, e um céu azul e limpo acima deles comotestemunha. Ela desejava fechar os olhos, mas os manteve abertos,encarandovagamenteosprocedimentoscomaquelasformassemcabeça.Mais tarde, ela voltaria para o castelo para o banquete e o baile, que

faziampartedoDiadaExecução. Ela comeria aves assadas com todas asespeciarias que se possa imaginar, e dançaria com os solteiros maisinteressantesdoPaísdasMaravilhas,enquantoseupaiaobservava,eelatentaria sorrir e ser graciosa quando os membros da corte tentassemganhar favores futuros com bajulação. Ela falaria da coroação que estáchegando,dajustiçadoRei,dasroupasqueasmulheresdacorteestavamusandonessemês,edosúltimoschapéusdeseuirmão.As conversas eram superficiais, bobas e bem fáceis de fingir, ela havia

aprendidohámuitotempocomoconversarcomtodoosalãosemterquepensar uma vez que fosse. Mas a sua mente nunca deixaria o bloco dedecaptação,suaconsciênciasussurrandoqueelaeraculpadapelamortedeumamulherinocente.Maistarde,naquelanoite,quandoasfestividadesterminaram,etudojá

estava escuro e calmo, Dinah dispensou Harris e Emily e se enterrouembaixo de suas cobertas quentinhas. O choro violento a deixoufisicamenteexaustaeentorpecida,eelacaiunosonorapidamente.Eassimseriam as próximas semanas, Dinah flutuando em uma névoa vazia depensamentosperturbadoresetarefassemsentido.Elatiroumedidasparasuas vestesde rainha, foi instruída comosprocedimentos e tradiçõesdacoroaçãoeouviumurmúriosdeváriasdamaseCartas.AsJoiasReaisforam

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enviadasparaqueelaescolhesseeeladeixouEmilyfazerissoporela.Osolnascia e ia embora, os dias desaparecendo no céu se transformando nanoite,eDinahaindanãoconseguiadespertardeseutorpor.A coroaçãopairavaumpoucoalémdo seualcance, algo comoqueela

sonhou a vida toda,mas, agora, encontrava-se cada vezmais distante detudoedetodos.Dinahestavaperplexacomofatodequeomomentoquedeveria ser omais excitante de sua vida, na verdade a fazia sentir nadaalémdeummedotorturanteeumimensomal-estar.Mesmoque,aoprovarseu vestido da coroação, umamonstruosidade vermelha e branca,Harrisficasse trepidando de alegria ao seu lado, Dinah olhava no espelho e viaFaina a encarando. Seus livros foram empacotados e enviados para aBiblioteca Real, e seus aposentos ficaram prontos para serem de umarainha.Todososminutosdodiaeramocupadosemrodadasdecomidas,dançae

jogos de críquete, mas Dinah nunca estava feliz até que mergulhasseprofundamentenas cobertasànoiteedormisseumsonosemsonhos,noqual ela não veria nem sangue nem torres. Acordar, dormir, nada dissoimportava.Em uma semana ela seria a Rainha, mas tudo o que Dinah conseguia

sentir era a culpa, como uma pedra pesada, pressionando seu coraçãomuitofortemente,eficavamaispesadaacadadia.Elaseentregavaaosono,grata,noiteapósnoite,enquantoasestrelasrodopiavamnocéuacimadela.

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Treze

Dinahsentiuumapenaemseucabelo.Não,nãoeraumapena.Eraumtoque,uminseto?Umamão?A princesa deu um salto em sua cama com um solavanco, respirando

pesadamente.Elaolhouaoseuredornoquarto.Nãohavianada,nadaalémdesuascortinassemexendocomabrisafresca.Fechouosolhos,desejandoqueomedofosseembora.Volteadormir,disseasimesma,nãoénada.Suacolunavibroucomomedo.Elaabriuosolhosnovamente.Edenovo

nada, nada além de uma figura sem rosto com uma capa e capuz pretosparadaaoladodela.Dinahdeixouumgritoaterrorizanteescapareumamãofechousuaboca

violentamente, luvas negras estavam contra os seus lábios. Seu coraçãobatia acelerado em seupeito, e elapodia sentir a força subindopor seusmembros. Dinah lutava ferozmente, suas mãos atacavam, suas unhasarranhavamorostodoestranho,esuaspernasdebatiam-se.Porfim,jogouseu corpo para frente, arrastando a pessoa em suas próprias costasenquantodeitavadebruçosnacama.Eleslutavameoestranhousavatodaasuaforçaparamanterasmãosna

bocadeDinah.Elagritavanasmãosabertasesugouocouropretoemsuaboca.Abocadoestranhoseaproximoudesuatestaeosussurropreencheuseuouvido.–Fiquequietaagora,pare.Nãogrite,nãodênenhumpio.Confiequeeu

nãoestouaquipara temachucar,Princesa.Vocêprecisa confiaremmim,precisamuito;nãohátempoparaexplicações.Eupoderiatercortadosuagargantaumascincovezesatéagora,emesmoassimnãofizisso.Tambémnão te esfaqueei enquanto você dormia. Eu não estou aqui para temachucar.Agora,vocêficaráemsilêncio?Dinah concordou e parou de lutar, o estranho retirou gentilmente as

mãosdesuaboca.Dinahmordeuos lábiosedeuumacotoveladaemseu

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rosto,sentindooossoduroencontraracarne.Ohomemsoltouumrugidoabafado eDinah se atirou para fora da plataforma de sua cama. Ela caiucomforçanochão,eoarsaiudeseuspulmões.Forçando-searespirar,elaseagitoufreneticamenteparapegaralgoqueelasabiaqueestavaembaixodacama,algoquehaviasidocolocadoalihámuitotempo,efinalmentesuamãoencostouemumcaboenferrujado.Comumpuxãorápido,Dinahpuxoudebaixodacamaumadasespadas

antigas que Wardley usava para treinar e apontou para o agressor. Seucoração se contraía tão rapidamente que Dinah ficou com medo deexplodir. Sua boca se abriu e fechou emuma tentativa frustrada de falaralgo.Aspalavrassaíramrapidamente,intercaladascomlufadasdear:– Quem é você? Não se aproxime ou eu tematarei. Diga-me agora, eu

ordeno!Oestranhodepretobalançouacabeça,avozestavaabafadaembaixodo

tecidopreto.Eleclaramenteestavatentandodisfarçaravoztambém.Dinahnãoreconheceuquemfalava.–Eunãoposso lhe contar, nãoestanoite. Chegaráomomentoemque

você terá todas as respostas que está buscando, eu prometo. Mas agoravocêprecisameouvir,escute-mecomovocênuncafezantes.FuieuquetemandeiàFainaBaker.Dinahseguravaaespadaparalisada,apontandoparaopeitodoestranho.

Estrelas negras começaram a se formar em sua visão. Ela precisavarespirar.Afigurasemoveuemumcírculomecânicoaoredordacama.–Nãoseaproxime–Dinahretrucou–Nãometoquenovamente.–Nãotocarei,Alteza.Nãodesejomachucá-la,vocênãotemmuitotempo.Ele parou por tempo suficiente para Dinah sentir sua mão tremer ao

redordopunhodaespada.–Perdoeaminhagrosseria.Queriamuitoquehouvesseoutramaneirade

tecontar,masissoprecisaserfeito.Seuirmãoestámorto,eoReiplanejadizera todoo reinoque foi vocêqueomatou,quevocêomatouporquetemiaqueeleroubasseacoroaquevocêobviamentedeseja.Dinahperdeutodosossentidosdeseucorpo.Elanãotinhaumamente

paraprocessarseuspensamentos,nemumcorpoparacontrolar.Elaestavaentorpecida.Somentesualínguafuncionava:–Vocêestámentindo!VocêestáMENTINDo!–Seugritoecoounoaposento

vazio.–Sintomuito,Majestade,maséumaverdadedevastadora.Realmenteme

machucacontarissodessamaneira.Oseuirmãoestámorto,masvocêvive.Deixe-meelaborarmelhor:façaoqueeudigoevocêpoderácontinuarviva.

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Eutrouxeumabolsacomtudoquevocêpodeprecisar.Pegue-aesaiadocastelo,saiaimediatamente.Dinahnotouumsacodepanonospésdoestranho.Elanãoconseguiaprocessaroqueestavaacontecendo.–Charlesestámorto?Pelasmãosdequem?Oestranhoignorouapergunta.–Não conte para ninguémpara onde está indo.Os seus servos devem

continuar desconhecendo a verdade, para a segurança delesmesmos. Eudeixei os dois inconscientes, estão dormindo profundamente e emsegurançanoquartoaolado.–oestranhocambaleounadireçãodeDinah,estavaficandocadavezmaisagitado–Princesa,vocêestáparadanaminhafrentequandodeveriaestarsemexendo.Vocêpodefugiroumorrer,essaescolhaésua,seupainãovaiesperarpeloDiadaExecuçãoparacortarsuacabeça.Dinaholhouparaele,incrédula.–Meu pai?Meu pai não faria nada paramemachucar, nemmachucar

Charles.–Suaignorânciaéimpressionante,Princesa.Seupaidesejamatá-la.Ele

nãovaidividiracoroacomvocê,oucommaisninguém.–Charles,meuirmão…– Estámorto. O Rei omatou. – a voz respondeu categoricamente. – O

Chapeleiro Maluco não canta mais. Com certeza você sentirá a dor deperdê-lomaistarde,masagoraprecisaagir.NósestamosàfrentedoplanodoReiestanoite,masnãomuito,talvezumahora.MinhaRainha,éhoradeir.O tempo parecia ter parado e Dinah permanecia parada na escuridão.

Abaixou lentamente a espadade suasmãos. Ela sentiu o cheirodocedasárvores Jullas voandoatravésda janela aberta e encarouo xaledeEmilypreguiçosamentedrapeadoemsuacômoda.AluzbrilhantedaluadoPaísdasMaravilhas atravessava as janelasda varanda, delineandoo estranhocomoseelefossefeitodepedra.–Eunãoposso…Eunão…EutenhoqueseraRainha.–E,mesmoassim,senãofugiressanoite,vocêirámorrer.Algo de definitivo na voz do estranho rasgouDinah violentamente e a

trouxeparaopresente.Dinahcorreuparaoarmário,pegandoseucasacode lãmais pesado e os chinelos favoritos de suamãe. O casaco cinza seabotoou facilmente sobre as suas longas vestes de dormir. Ela puxou ocapuz em seu cabelo enrolado e pegou a bolsa do chão. Tudo estavadespedaçando enquanto ela tentava manter a linha; ela não conseguia

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pensardireito.AmarrouaespadaenferrujadadeWardleydemaneiraquecruzasse o seu ombro. O estranho permanecia congelado na frente dajanela.–Otempoestápassando,Princesa.Tic-tac.Vocêprecisair.Elaseagarrounobatentedaportaparamanteroequilíbrioepercebeu

queessaseriaaúltimavezqueveriaessequarto.Suavoztremeuenquantolágrimasbrotavamdeseusolhos.Seuirmão.Morto?Nãopodiaserverdade.– Como posso saber se posso confiar em você? Por que eu deveria

acreditaremqualquercoisaquevocêmedisse?Afigurasevoltouparaavaranda.–Sevocêesperarmuitomaistemponãoprecisaráperguntar.Hámuitas

pessoasnocastelocomtarefasperigosas.Aminhaeravê-lacoroada.Mashojeévê-lasobreviver.Eurezoparaquenosencontremosnovamente.Elegiroueapontouparaaporta.–CORRA, agora! Vá direto para fora do castelo, não pare por nada nem

ninguém.Sealguémtentarteparar,MATE-O.Dinahpulouparaaporta,lágrimascorriamlivrementeporseurosto.Os

largos corredoresdepedra ficavamumbreudurante ànoite, iluminadossomenteporalgumastochasealuzdaluacorrendoatravésdasjanelasdevidro.Dinah correu pelas alcovas e escadas, fazendo de tudo para abafar os

soluços pesados que rasgavam seu peito violentamente. Quaseinstantaneamente, ela pôde perceber que algo estava errado, o palácioestavaestranhamentequieto.GeralmenteCartasdeCopasficavamparadasdo lado de fora de cada apartamento e escada do castelo, mas agora sóhaviamportasabertas…enenhumaCartapodiaseravistada.Enquanto atravessava os corredores sombrios, Dinah pensou que o

estranhoestavadizendoaverdadesobrealgumacoisa.Asprópriasparedesondulavamcomatensão;haviaumdesconfortonoar.OprópriopaláciodoPaísdasMaravilhaspareciaferveremagitação.Dinahcorriaemdisparadanoescuro,nãovianadaetinhaumavagaideiasobreondeestavaindo.Elapodiaverorostodeseuirmão,seusolhosverdeeazulobservando-acompuraadoração.Charles.Charles.Seuspulmõesqueimavamcomoesforçodacorrida,abolsasaltavapara

fora de seus quadris e a espada estava firme em seus ombros. Ela virouumaesquinaederrapouatéconseguirparar,quandodoisEspadasbêbadospasseavamemumcorredoràsua frente.Nãohaviaondeseesconder,elaestava no meio de um corredor largo. Dinah congelou, certa de que osguardas conseguiriam ouvir seu coração batendo forte em seu peito, sua

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respiraçãoaltaeosomdaslágrimasescorrendoemseurosto.Umaeternidade sepassou enquanto elespassavampor ela, seus olhos

concentradosnocaminhoadiante,eobarulhodesuasrisadasbalançandoasparedes.Apartirdali,Dinahseagarrouàsparedes,permanecendonassombrasenquantosemoviapelopalácio,seurostoroçavaemgrossasteiase aranhas apressadas. O aposento de Charles era no canto sudeste docastelo,eDinahestavasemfôlegoaochegaraocorredorquelevavaatéseuátrio. Tremendo, colocou a bolsa no chão e se escondeu atrás de umaestátuadeSternRavier, amelhorCartadePausque já existiu,mortoemumabatalhacontraosYurkeis.Elaespioude trásdosmúsculosdaspernasdaestátua.DuasCartasde

Copas estavam paradas na frente da porta aberta de Charles. O ventosopravapelocorredor,eaportaresistiaaele.Elaseapoiounaestátua,seucoraçãovibrandocomopânico.OqueWardleyfaria?Eledariaumjeitodemandá-losembora,pensou,masseeutentarisso,podeserqueomeusanguesejaderramado. Dinah desamarrou a bolsa. Dentro dela haviam algumaspeças de roupas, fatias de pão e o que parecia uma coleção aleatória dealguns itens. Ela balançou a cabeça. Havia uma estranha engenhoca demetalnofundodabolsa,pareciaumtipodecatracacomrodas,partesquesemoviameumsifão.Issoserviria.Dinahfechouosolhos,fezumaoraçãosilenciosa e arremessou-o para o corredor com toda a sua força. Pousoucomumbarulhoaltodemetal,quericocheteouparacimaeparabaixonasparedes do castelo. As Cartas de Copas, muito bem treinadas, nemhesitaram.Sacaramasespadasecorreramnadireçãoosom.Dinah jogouocasacoporcimadesimesmaeescapousilenciosamente

para dentro do apartamento de Charles. Tudo estava quieto. O quartopareciaumtúmulobizarro,ummonumentodechapéus,escadasemobíliaretorcida. Os animais pintados no teto observavam-na, suas bocas parasempreabertasemumsorrisobizarro.A luzbrancacristalinada luacaíaatravésdasjanelasabertas,iluminandoafitavermelhabrilhantenafrentedospésdeDinah.Ohorrorseespalhouporsuasveiasquandoseusolhosseguiram a fita até o armário aberto em frente da sala. Andandovagarosamente, ela passou pelos chapéus que chegavam à altura dostornozelos e chegou à porta. Ela abriu lentamente e rezou para nãoencontrar o rosto de Charles. E, em vez disso, ela encontrou os olhosabertosesemvidadeLucy,olhandodiretamenteparaDinah,suagargantaera um rio de sangue negro. Quintrell estava caído sobre ela, sua adagadescansavanochãoaoseulado.Seusmúsculostensospareciampedrasnaluzescura,arruinadosapenaspelosfiletesdesanguequecorriamporeles.

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Sua garganta também estava aberta e seu peito havia sido esfaqueado.Dinah levou as duasmãos até a boca enquanto abria a garganta em umgrito silencioso, e se balançou para frente e para trás, lutando paraesconderseussoluçosaltos.E,então,elaseesticoue fechouosolhosdosdoiscomosdedos.Elaouviuavozdoestranhoemsuacabeçanovamente.Otempoestápassando,Princesa.Tic-tac.Vocêprecisair.Ela levantouas

mãos.–Charles?–sussurrou,ousandoteresperanças–Charles?Apenasaescuridãorespondeu,oventouivandodeumajanelaaberta.A

janela… Seu olhar moveu-se até a escada favorita de Charles, onde umajanela aberta batia e rangia com a violência do vento. Por favor, pensouDinah,pelos deuses, não. Ela se apressou até a escada, pela primeira vezsempensaremcomoelaeraperigosa,umaescadaqueaparentementenoslevavaatéocéuesemnenhumcorrimão,confusacomchapéusdetodasascoreseformas.Elaseguiuocaminhoparacimaeparacima,escalandosempensar,seuspésescorregandoprecariamentenasbeiradasdamadeirafina.Quando alcançou o topo, Dinah parou para respirar, apertando sua

barriga. Pisando cuidadosamente, se inclinou no parapeito da janela,rezandoparanãoencontrarnada,antecipandooar frescoemseurostoenadamais.Nãohaviaestrelasnocéuessanoite,elashaviammigradoparaonorte.TalvezdescansassemnasuperfíciedoTroden,iluminandoaquelaságuasdistantes.Elaprecisoudetodaasuaforçadevontadeparaolharparabaixo e, quando finalmente o fez, um gemido escapou de seus lábios.Embaixo da janela, talvez um metro para baixo, havia um precipício depedra,queseprojetavadacozinhadopalácio.Alajedepedragrande,umquadrado perfeito, estava abaixo, e o minúsculo corpo de Charlesespalhava-se sem jeito em cima dela. Suas costas estavam arqueadas emumânguloestranhoesuacabeçaviradaparaocéunoturno,suasfeiçõesseiluminando vagarosamente conforme a madrugada chegava. Seus olhosestavamabertosearregalados,azuleverde,parasempreolhandoenuncavendo.Suabocacurvava-seemumsorrisonadireçãodeDinah,seurostoimaculadopelamanchaescuraqueflorescianapartedetrásdesuacabeça.Chapéus estavam ao seu redor, eles claramente haviam caído com ele.

Algumas de suasmelhores criações estavamespalhadas pelo patamar depedra. Uma cartola de safira, uma boina verde-musgo com juba de leão,chapéusfeitosdetecidodesedacor-de-rosaepenasdepavão.Estaspeçasforam a decoração apropriada para o funeral do ChapeleiroMaluco, poruma vida tão violentamente perdida. Violentamente tomada.Umpássaro

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tremulou acima de sua cabeça no escuro, pousando perto de seu ombro.Charlesnãosemoveuquandoopássarocutucoucuriosamentesuacarne.Dinah virou-se e vomitou na escada, seu estômago se esvaziava entresoluços dolorosos. Ela desabou sobre a borda de um cabide pousadoverticalmenteparaforadaparede.Tudoparou.Eu poderia ficar aqui, ela pensou ao fechar os olhos. Eu poderia

simplesmenteficaraquieesperarqueelesmematem.MejuntariaaCharles,minhamãe,LucyeQuintrell,etodosnósestaríamosjuntos.Eudevoficar.Seu coração se apertou em luto, mas havia algo mais, algo faminto,

escalandoemseuestômago,espalhandooseuvenenoeumadeliciosafúriavermelha se apressando em seus membros. Essa energia a alarmava eseduzia,essaraivaviolenta.Dinahforçou-sease levantar,olhouparaseuirmãomaisumavez,seusolhossedemoraramemseuscabelosloirosquecaíamemsuatesta,nosseusdedosenroladosenacordeseuolhoverde.TraçandoosinaldeCopasemseupeito,elasussurrouumarápidaoraçãoemseucorpoquebrado,rezandoparaqueosdeusesorecebessememseureinodivinocomamoredoçura.– É hora de ir – Dinah sussurrou para seu corpo parado. Um soluço

asfixiantelevantou-seemsuagargantaquandoelapercebeuqueestaseriaaúltimavezqueelaveriaseurosto–Euteamo,esintomuito.Dinah sentiu como se estivesse sendo rasgada no meio ao descer as

escadas, relutante em deixá-lo sozinho na escuridão de uma noite semestrelas.Soluçando, ela desceu as escadas e escorregou silenciosamente pela

parte de trás dos aposentos de Charles, empurrando as prateleiras desuprimentosmilenar.Aportadasaladebotõestinhasidoarrancada,bemcomoumbloqueioquebalançavavagamentedesuadobradiça.Outro soluço saiu de dentro dela com um solavanco. A coroa havia

sumido,amesaestavavazia.Opresentequeelederaparaelaforalevado.Agora não havia nem um pequeno pedaço de Charles com ela, só o seucorpo estatelado em um chão de pedras. A raiva cresceu no seu interiorenquanto ela sentia a luz da luana frentedamesa vazia. Tudohavia idoembora.Elaficoumaisalgunssegundosnaescuridão,forçandoseucorpoaser forte, forçando-se a ser corajosa. Puxandoo capuzda capa sobre suacabeça,Dinahandousilenciosamenteparaaportadosfundos.Elaaabriusemfazernenhumbarulho.AsduasCartasdeCopascontinuavamparadas,aluzdaluacontornavasuassilhuetas,decostasparaDinah.– Você acredita que ela realmente fez isso? – um deles perguntou,

girandoosifãodemetalnaspalmasdasmãos.

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–Nãotenhocerteza–ooutrodisseeriu–Elateriaqueserummonstroparamataropróprioirmão,nãoé?Talvezapressãodacoroaçãotenhasidodemaisparaela.VocêimaginaoquevaiacontecerquandooReiaacordarcomaespadaemsuagarganta?AprimeiraCartasearrepiou.–Elaserádecapitada,ouisso,ouserácolocadanasTorresNegras,sem

dúvida.Contantoqueeu tenha comidanabarriga euma camaquentenofimdodia,eunãodouamínimaseaPrincesaouaDuquesaouChapeleiroMalucoassumamotrono.–OChapeleiroMaluconãoiráfazermaisnadaagora,issoécerteza.Que

pena,nuncapudecomprarumdeseuschapéus.AoutraCartariu:–Oqueestáteimpedindoagora?AsmãosdeDinahtremeramquandopuxouaespadadesuascostas.Ela

escorregou para seu punho sem ruído nenhum. Ela lembrou as aulas deWardley durante as brincadeiras com as espadas. Segure a espada comfirmeza, é uma parte de seu corpo, uma extensão da sua força e não umaferramenta para ser usada. Balance-a com força, deixe suas emoçõesirradiarempelalâminaemvezdeporsuamente.Afúriafamintaqueelasentianaescadarianadouparaseusolhosquando

eladeuumpassoadiantenaescuridão,tãopertoque,porumsegundo,osguardas puderam sentir a respiração dela em seus pescoços. O primeirodesceucomfacilidadedepoisdeumgolpenanuca.Dinahsentiuaespadaencontrar a pele e os ossos, a sentiu escorregar pela carne. Seu sanguerespingounorostodeDinah.Eraquenteesemisturoucomaslágrimas.Trazer sua espada para trás novamente era mais difícil do que ela

imaginara e ela precisou usar as duasmãos. Ela deu um forte puxão e ocorpodelecaiuparafrente,mortoantesmesmodeatingirochão.AsegundaCartaolhavaparaelaemchoque.Dinahbateucomopunhoda

espadaemsuatêmporacomohaviavistoWardleyfazer.Elecaiudejoelhose ela correu a lâmina em seu peito rapidamente. Umamancha vermelhafloresceu,tornando-seumasócomocoraçãoescarlatedesuatúnica.Eusintomuito,elapensouenquantoestavaparadaatrásdoscadáveres.

Eusintomuitoporisso.Dinahrecuperousuabolsa,queestavaembaixodaescada,edeuumaolhadademoradaparaoapartamentovaziodeCharles.As portas de vidro balançavam suavemente no vento, nunca deixandoescaparopesadeloquehaviadentrodelas.Adeus, Charles, pensou,adeus,meuamado.Elaolhouparaoscorposemestadodechoquee,então,correu.Correu mais rápido do que nunca em sua vida, mergulhando pelos

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corredoresdopalácio,umatrásdooutro,virandosempensar.Suaspernasqueimavameseuspulmõessecontraíam,maselanãocedeu,precisavasairdocastelo.Oamanhecerestavacomeçandoasurgir,eumanevoapálidadamanhã começou a entrar através das janelas entalhadas em ferro.Escancarandoumaportalateral,aproximou-sedoquartodosempregadospelacozinha,ondevárioscozinheirospreparavamocafédamanhã.Elesaobservavamcomumaconfusãoselvagem,eelapassouporelesderrubandopratosebandejas.–Alteza?–várioscozinheirosachamaram,maselanãopodiaparar.As

cozinhasdavamparaojardim,eelasearremessounasportasabertas,comumsuspirodealívio,echegouláfora.AmudançanaluzfoitãoextremaqueDinahprecisoupararporumminutoparaseusolhosseacostumarem.Elaestavanos jardinsdetreliçaque ladeavamopátio.Rosasbrancasqueelatinhaplantadoumavidaatráscomsuamãeestavamcomeçandoamostrarseus botões precoces de primavera, despontando de seus cobertores dehera. Dinah ajeitou a bolsa e correu pelo quintal,mantendo-se perto dasparedes,gratapelofatodeatreliçaoferecerabrigodeolharescuriosos.Aoouvirvozesmaisaltas,elaparoueseenfioudebaixodeumarbusto,

cortado na forma de um dodô. Todo seu corpo tremia, ela timidamentelevantouacabeçasobreasfolhasespinhosasecerrouosdentes.Láestavaele,seupai,marchandopelopátiocomCheshireaoseulado,levandooqueparecia ser todo o exército de Copas para o castelo. Seu rosto estavamanchadodevermelho,cheiodeardenteira.–PAREM!Todas as Cartas pararam de se mover e Dinah sentiu sua pulsação

aumentar.Eleatinhavisto?AvozexplosivadoReideCopasecoousobreopavimento demármore quando ele virou para falar com eles. SuasmãossacudiamenquantoelegritavaparaasCartas.–Atençãoparaasminhasordenseencontremminhafilha.Seelatentar

correr ou lutar, usem a força que for necessária para dominá-la. Se paraissoavidadelacorrerrisco,nãoimporta!Elaéculpadadeassassinarmeufilhoinocente,detraiçãoedeplanejarofimdoPaísdasMaravilhas!Elanãoé mais uma princesa; ela é uma traidora da coroa e assassina. Nós aacordaremosdeseusonoefaremosjustiçahojemesmo!Eucortareiasuacabeça com o cair da noite! – Cheshire riu maliciosamente, suas mãosenvoltasemumdospunhaisintrigantes.OreiviroueapontouaEspadadeCopas–Paraosaposentosreais!AsCartasdeCopasmarchavamdeduasemduasparadentrodocastelo.

Dinah começou a tremer incontrolavelmente. Era verdade, era tudo

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verdade. Seu pai era um assassino. Elematara seu irmão,matara Lucy eQuintrell. Você matou dois guardas, uma voz silenciosa a lembrou disso,vocêmesmanãoéinocente.Dinahlimpouosuordeseurosto.Arealidadedasituaçãochegouatéela.Nãohaveriaumaconversasobreisso,nenhumasúplicadefilhaparapai.Nenhumacordo.Estavaacabado.Elanãousariaacoroae,secontinuasseaqui, logonãousariaaprópriacabeça.Oestranhoestavacerto,elaprecisavasairdopalácioagoraenuncamaisvoltar.Corra, sussurrouparasimesma,apesardeseuspulmõessecontraírem

comaideia.Nãodemorariamuito,esuavantagemiriadesaparecernabrisadamanhã. Ela seguiu as paredes do jardim na direção dos estábulos. AstreliçasacabarameDinahesperouatéqueninguémestivesseàespreitanaluz da manhã flagrante, antes de correr em direção aos estábulos.Mantendoacabeçabaixa,Dinahentrounolabirintodoestábuloecomeçouavagarporseucaminho,umrebiteeumabaiadecadavez.Aoredor,aoredoreaoredor,elafoi,circulandocadavezmaisfundonaflorestaescura.Os cavalos bufavam e empinavam enquanto ela passava por eles, seussentidos suaves captando seu pânico e sua desorientação. Quase lá, elapensou, enquanto continuava a caminhar com seus pés escorregando nalama e no estrume. O cercado para cavalos que ela estava procurandoapareceunovamentee,pelaprimeiraveznaquelanoite,Dinahseatreveuaacreditarqueelapoderiasobreviveràqueledia.Tateando,elasoltouatravaeentrounatendadeRajado.Alguémestava

esperando por ela. Um homem estava em frente a ela, a escuridão dosestábulos,escondendosuasfeições,suaespadaempunhada.Dinahpuxouocapuzparatráselevantouasmãosemsinalderendição.–Quemestáai?–Dinah?–umavozsussurrou.–Wardley?Aproximaram-se correndo, sentindo-segratosumnosbraçosdooutro.

Dinah o apertou desesperada. Wardley beijou sua testa, sua cabeça ecolocousuasmãosemsuasbochechas.– Você está machucada? O que está acontecendo? Dinah, o que

aconteceu?Ela deixou os soluços, que estava prendendo desde que tinha visto o

corpocontorcidodeCharles,escapardeseuslábiostrêmulos.– Charles,Wardley, Charles estámorto. Alguém o empurrou da janela.

Oh,deuses.–elaenterrouorostodatúnicadeCopasdeWardley.–Euovi,seu pequeno rosto, pescoço, cabeça, e Lucy e Quintrell, suas gargantasforamcortadasporumaespadadeCopas,tenhocertezadisso.Eeumatei

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duasCartastentandoescapar.Wardleyaempurroueaencarouincrédulo.–Masquem…Oquê?–Meupai.Umassassino?Eunãoseioqueestáacontecendo.–Masporquê?PorqueumpaimatariaopróprioFILHO?Quetipodepai

fariaissocomopróprioFILHO?–OolhardeWardleyecoavaincredulidade.– Eu não sei! O tipo de pai que não quer partilhar o trono. Elematou

Charlesparapodermeculpar.OPaísdasMaravilhasjamaisaceitariaumarainhaquecometeassassinatos.Meupaiqueraminhacoroa,Wardley.Euachoqueelenuncateveaintençãodepassá-laamim.ElabalançavaacabeçaenquantoWardleyaforçavaabeberáguadeuma

algibeiradetecido.Olíquidocaiuemtodoseurosto.Suavozestavaquasehistérica:–Eunãosei!Eunãoentendooqueestáacontecendo.Umestranhoveio

aomeuquarto,meacordouemedisseparairembora,maseunãooouviefuiatéoapartamentodeCharlesparavere…–Dinahsentiuasalagiraraoseuredor–Euoouvi,meupai.Euvi.EleordenouqueasCartasdeCopasmeprendessememematassem,sefossenecessário.Wardleyassentiu.– Eu ouvi. Consegui escapar pela parte de trás da marcha. Fomos

acordados pelo rei, que ordenou a sua prisão e julgamento esta manhã,mandoumatá-laoulevá-lasobcustódia.Dinahdeuumpassoparatrás.–Oquevocêestádizendo?–elaolhouparaaespadadesembainhadade

Wardley–Vocênãoestá…?WardleydeuaDinahumolharexasperado.– Você não pode estar falando sério, Dinah. Dinah… – ele envolveu-a

rapidamente em seusbraçosmagros emurmurou em seu cabelopreto –Você é minha irmã. Minha melhor amiga. Minha Rainha. Você não vaimorrer hoje, não nomeu turno. Mas você deve ir. Uma vez que seu paidescobrir que você tenha ido, este será o primeiro lugar que ele iráprocurar.Elevainosmatar.Dinah,vocêDEVEiragora!Dinahassentiu e, relutando, afastou-sedeWardley.Ela viu as lágrimas

brilhandoemseusolhoscastanhos.Tirouaselademontagemnaparede,comasmãostremendo.–NÃO!–Wardleyagarrouseubraçofortementee,derepente,elaestava

sendopuxadopelo labirintodebaias,cadavezmais fundonoestábulo.Obraçodeleerafirme;elanãopodiaselivrardeseuaperto.–Wardley,oquevocêestáfazendo?PARA!EutenhoqueSAIR!

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Wardleycontinuouapuxá-laporentreasbaias.–VocênãopodelevarRajado.Paraondevocêvai?–Rajadoéomeucavalo!–VocênãovaisercapazdefugirdosCopascomRajado,nemmesmose

vocêtivessevantagemdeumdia.Rajadomalconseguelidarcomumtrotevespertino.Eleévelho,Dinah!–EntãomedêCorning.Vocêsempredissequeeleéocavalomaisrápido

noPaísdasMaravilhas.–Eleé–murmurouWardley,enquantocorriam,passandobaiaapósbaia

de cavalos acordados abruptamente. Seus relinchos encheram o ar. –Mesmo assim, mesmo com Corning, eu não tenho certeza de que vocêpoderia…Ele foi interrompido pelo clangor de uma centena de chifres soando

pelas muralhas do palácio. O som congelou os dois. O sangue de Dinahgelou,eelaseviuincapazdesemover.–Elesestãovindomepegar–elasussurrou–Acabou.OsolhosdeWardleyestreitaram.–Nãoéhoje,hojequenãoé.Vocênãovaimorrerhoje,Dinah.Vocêvai

morrercomumacoroaemsuacabeça,comossúditossecurvandoaosseuspés.–ElepuxouDinahpelocentrodolabirinto,correndoagora.Umaportade ferro, duas vezes a altura das outras portas de baias, apareceudiantedeles. A corrente que a prendia era grossa como o braço de umhomem,masWardley tinhaaschaves, jáqueele tinhasidoocavalariçopor tantotempo.Dinahsentiutodooseucorpotremer.–NÃO,NÃO!Eunãoposso.Absolutamentenão.–Vocêdeve.–houveumcaráterdefinitivonavozdeWardley,adecisão

foitomada–Vocêdeve.Hornhoovessãomuito,muitomaisrápidosdoqueos cavalos normais. Eles podem facilmente superar um cavalo normal, eelespodemcorrerpordiassemexaustão.–Sim,eelespodemmatarumapessoaporqueelanãoéseumestre,ou

porqueestãodemauhumornaqueledia!DinahtinhapavordosHornhooves.Wardleyabriuocurral,revelandoos

trêsHornhooves–doisbrancoseumaenormebestanegra.Morte,ocorceldeseupai.Eleveiomontadoemumcorceldodiabo.Ascriaturasapoiadasno canto do curral, bufando com raiva, raspando o solo até que elecomeçassearacharequebrarsobopesoenorme.Morteseelevousobreosoutros doisHornhooves, uma figura colossal demúsculo preto brilhante,mais parecido com um dragão do que com um cavalo. Seus cascos eram

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maioresdoqueacabeçadeDinaheeracobertocomcentenasdecravosdeosso–perfeitosparaempalarumacabeça,umjoelhoouumtronco.O conhecimento de Dinah sobre Hornhooves atravessou-lhe a mente;

elesnãoeramapenasfiéiscorcéis,eleseramcriaturassedentasporsangue,guerreirosdesuaprópriaescolha.Elesamavamassassinato,caçaemorte.Em seu frenesi de batalha, um Hornhoov forte poderia matar quarentahomens.HaviaumapinturadeMortenoescritóriodopai,elevando-seanteumguerreiroYurkei,oschefesdeseuscompanheirosde tribodecorandoseus cascos assimque seupai levantava a espadadeCopasmontado emsuascostas.EstefoioanimalqueWardleyqueriaqueelamontasse.–Não–Dinahcomeçouaolharaoredor,beirandoahisteria–Devehaver

umlugarparaeumeesconder,talvezembaixodofenooudessasvigas.Wardley a agarrou fortemente e a levantou do chão, seus braços

envolviamsuacintura.Mortetinhavoltadoparaocantoeestavabufandoraivosamente.Assobiavavaporferventedesuasnarinas,seusolhosnegrosestavam arregalados e confusos. O vapor poderia escaldar a pele dealguém.– Shh… shh, aqui… – Wardley se aproximou de Morte devagar, ainda

segurandoDinah,quesedebatiaemseusbraços.MortetoleravaWardleyporque ele o havia alimentado toda manhã por anos, quando era umescudeirodoestábulo.OsolhosdoanimalestavamcautelosamentefocadosemDinah.Elapodiaouviraagitaçãodoladodeforadoestábulo,asbotasearmadurastilintantes,osgritosdaspessoasdacidade.–Caramba,Dinah!VAIAGORALevanta.Agora.AGORA!Suasmãos tremiam enquantoWardley a levantava até seu peito, suas

mãos em seus ombros. Com um forte empurrão, ele colocou Dinah nascostasdeMorte,comtantaforçaqueelaquasefoipararnochãodooutrolado. Morte bufou e voltou para a porta da sala. Dinah deixou um gritoescapar. Ela estava ajoelhada em suas costas, um oceano de músculos eossospretosbrilhantes.Eleeratãolargo,duasvezesotamanhodeRajado.Suaspernasnãocabiamaoredordele.–Comoeu…?–Monteemseupescoçoenãoemsuascostas.Ela se colocou mais para frente, e as pernas ao redor do pescoço de

Morte, enquanto ele mordiscava com seus dentes brancos e afiados. Eleempinou uma vez, empinou duas, e Dinah agarrou-se desesperadamenteemsuacrina,paramanteroequilíbrio.–Eleéincansável.Seupaiomantevetrancadopormuitosanos.Elevai

correrporvocê.–Wardley jogouabolsaparaela.Dinahcolocouasalças

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sobreseusombros.Obarulho lá foraestavamaisalto.AsCartasestavaminvadindooestábulo,eleschegariamatéelesemminutos.–Venhacomigo!–elagritou.–Nãopossoirembora–elerespondeu,evitandoseusolhos–Aindanão.

Alguémtemqueprotegeroseupovoquandovocêforembora.EoHarris?EaEmily?Dinahsentiuummomentodedúvida.–Nãosei seconsigo fazer issosemvocê.–Morteempinounovamente.

Wardleyesticou-seecolocouasmãosnascanelasdeDinah.Elequasenãoconseguiaalcançá-laporcausadaenormealturadeMorte.–Euteencontrarei,sigaparaaFlorestaRetorcida.Vocêvaiconseguirse

esconder por lá. Eu prometo, Dinah, eu te encontrarei, te dou minhapalavra. –Morte se ergueu e chutou as pernas da frente, por pouco nãoacertando o rosto deWardley comum espinho afiado. Dinah olhou paraWardley.Elenãopareciaestarcommedo.Eleacreditavanela.Issoafezsesentirmaisforte,mesmoqueporumsegundo.–Wardley,eu…–Meacertecomaespada.–OQUÊ?Wardleypassousuaespadaparaela,incrustadacomumpunhoderubi.–Leveessa,deixeaenferrujadaparamim.Agora,enfie-anomeuombro.

– ele acariciou a partemole de seu braço – Rápido, Dinah. Pelos deuses,Dinah,nãopense!FAÇA!Comumgrito,DinahenfiouapontadesuaespadanobraçodeWardley,

sentindo omúsculo separar e rasgar. Carmesim saiu dele, seu sangue, ogarotoqueelaamava,respingandonochão,emsuasmãos.Wardleysoltouumgritodedoragonizante.–Aaaaaaah…Dinah,vocênãoprecisavafazertãobem!–Elecambaleou

para forado curral e começoua abrir asportasdo estábulo, umaapós aoutra,comobraçobom.Mortequasedançava,seuscascosiamparacimaeparabaixo,comaexcitaçãodeverosanguedeWardley.Dinaholhouparaele, abrindo todas as portas do estábulo que conseguia. Ela disse para simesmaparanãoesqueceroscontornosdeseurosto,acordeseucabelo,ascurvasdesuacoluna…maselanãotevetempo.–Elaestáaqui!Aprincesa!Elaestáno…corceldorei…Elenãotevetempodeterminar.Wardleyempurroualâminaenferrujada

em suas costas. O homem caiu com a cara no bebedouro.Wardley olhouparaDinah,seusolhosseencontraram.–Éagora!

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Dinahabriuabocaparaprotestareouviuoshomensgritandoordensdoladodefora.Mortecomeçouapisarnochãocomforça,comseusenormescascos.–Eunãoposso,Wardley…–VÁ!–Wardleygritou.Ele trouxe as costas de sua espada para baixo em todos os membros

posteriores de Morte. Foi o suficiente. Morte ergueu-se e saiu correndopara a frente. Dinah nem teve tempo de perceber o que aconteceu comWardley, porquede repente eles estavampulandopara forado estábulo.Mortecorreudiretamenteparaforadoslabirintosdoestábulo,explodindode porta em porta. Seus joelhos maciços batiam nas portas primeiro, eenormespedaçosdemadeiraquebraramparaforadoscurrais,comMortepisoteado tudo em seu caminho: portas, bebedouros, bancos demadeira,outrosanimais.Dinahfoi inundadaporumachuvadeestilhaços,masnãopodiafazernadamaisdoqueseagarrardesesperadamenteàsuacrina.Suarespiração estava tão alta que fazia o ouvido de Dinah doer quando eleirrompiaatravésdeparedeatrásdeparede,curralatrásdecurral.Ocaosreinava.Madeira explodia para todos os lados, enquanto os cavalos e oshomensgritavam.ElapodiasentirodesesperoselvagemdeMorteparasairdoestábulo,oimpulsodeliberdade.Cartas de Copas tomavamo estábulo agora, umoceano de vermelho e

branco,eelesobservavam,horrorizados,Mortepassarporelescomoumfuracãoviolentodemadeira e feno.Oúltimodegrau eraumcercado. ElapuxouacrinadeMorte,masnadaaconteceu.Eleseguiaemfrente,cadavezmais rápido, excitado com o desafio. Morte saltou o muro facilmente, eDinah quase perdeu o equilíbrio, escorregando em seu pescoço, quandoficoudepécomseuimpulso,nomomentoemqueelebateunochão.Agora estavamdo lado de fora, e o amanhecer brilhante quase cegava

sua visão, que, em determinado momento, focou em uma cena horrível,algodeseuspesadelos.CartasdeCopasestavamfervilhandoaoseuredoreem todaparte,balançandosuasespadasemsuadireção,quandopassavaporeles.UmacorajosaCartadeCopascorreunafrentedeMorte,colocandosuasmãosparacimanaintençãodepará-lo.Dinahodirecionouparaforadocaminho,maselesemantevefirme,comasmãosnafrentedocorpo.– Eia! Eia! – Seus gritos eram inúteis. Morte saltou à frente, e seus

enormescascospisotearamacabeçadohomem,comumapertodoentio.OestômagodeDinahrevirou,maselanãopodiadesviaroolhar.Aprincesaouviuosgritosaterrorizadosatrásdelaeolhou.OsdoisoutrosHornhoovesestavam correndo soltos entre as Cartas de Copas, seus cascos já

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encharcados de sangue. Dinah virou a cabeça, e o corpo deMorte pulouembaixodeseusquadris.Osportõesdeferro,queprotegiamoPaláciodoPaísdasMaravilhasdomundo láde fora, estavam ficando cada vezmaispróximos,eMortenãomostrounenhumsinaldequeestavadiminuindooritmo. Pessoas estavam gritando atrás dela e ao seu redor,mas uma vozestavaaltanomeiodocaos,otomexplosivodeseupai:–MATEM-NA!MATEM-NA!Elasentiuumapertoprofundo.Cartasdetodosostipostentavampará-la

agora. Uma Carta de Paus arremessou uma panela com óleo fervente nadireçãodelesdeumatorredevigia,masMorteestavamovendo-serápidodemais,eelamalrespingounofinzinhodesuacauda.Elesestavamvoandopelomercadoagora,passandodezenasde carrinhosemesas cobertasdefrutasetortas.Umagarotinhasujaparadaaoladodamãe,vendendopão,apontoupara

Dinahenquantoelespassavam,puxandoasaiadesuamãe.–Venhamamãe,aPrincesa–disse,antesdeajoelhar.OcapuzdeDinah já tinhacaídohámuitotempo,eseuscabelosnegros

estavamsoltoseenroladosaoredordeseurosto,elacontinuavaagarradaemMorte.Dinahsentiusuabolsaescorregardeseusombros.Rezandoparaqueconseguissemanteroequilíbrio,elaaalcançoueenrolouasalçasemsuascostas.AespadadeWardleybalançavacontraseusombros.Mortedeuuma bufada profunda de satisfação, um ruído de prazer. As narinas doanimalesuabocaagitavamvapor,eDinah teveasensaçãodequeMorteestava apenas começando. Sua velocidade aumentou e seus cascos quasenão encostavam no chão. Eles se moviam tão rápido que Dinah malconseguiadistinguirorostodaspessoaspelasquaiselapassava.Quando eumorrer hoje, Dinah pensou, enquanto eles se aproximavam

das altas grades de ferro,pelomenos eu saberei como é voar. Os portõesornamentadosdoPaísdasMaravilhasficavamabertostodososdias,paraosviajantesecomerciantesentraremesaíremdopaláciocomoquisessem.Agoratodosemvoltadosportões,DinahpodiaverasCartascorrendoparafecharem as portas. De cada lado, grandes guinchos metálicos eramarrastadospelosEspadas,que lutavamparaconseguirgirarasmanivelasenferrujadas, que não eram giradas há anos. Alguém deu um grito e asenormesgradesdocastelo começarama fechar,umaemdireçãoaoutra,rangendopedacinhoporpedacinho.Do ladoesquerdo,umEspadasaltoedecabelogrisalhoapertavaosolhosnosolenquantoelesseaproximavam.Dinah o reconheceu nomesmo instante, ele era o Espadas que ela haviaencontradoaqueledianocaminhoparaopalácio.Eleaobservavacomum

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olhar fascinado, enquanto os outros Espadas clamavam ao seu redor,gritando e apontando uns para os outros e para ela. Seumovimento erapequeno, tão mínimo que ninguém mais veria, mas Dinah via. Sua mãoparounoguincho,sóporumsegundo.Foiosuficiente.Morte mergulhou através da estreita abertura, seus ombros largos

raspandodosladosdoportãodemetal,quelogodepoisfechoucomtudoláatrás.O cavalo soltouumrelinchodedorquandoosportõeso cortaram,masasuavelocidadenãovacilou.Elehaviavistoocéuabertoeas floresbrancas em sua frente, ele tinha sentido o gosto da liberdadeque lhe foinegada na maior parte dos dias naquele estábulo sombrio. Houve umtremor do movimento embaixo das pernas de Dinah enquanto Morteflexionavaseusmúsculose,então,exatamentequandoelapensouqueelesnão poderiam irmais longe, o ritmo deMorte acelerou e seus passos sealongaram. Ela inclinou-se e Morte, instintivamente, virou para o leste,nunca diminuindo o ritmo. Cada vez mais rápido, sua velocidadeaumentavaconformeseafastavamdocastelo.Dinahouviuosportõesdocastelosendoarrombadosatrásdelaevirou

sua cabeça, desesperada. Um pequeno exército de cavalos apareceu,lideradoporumhomemgrandemontandoumHornhoov.OReideCopas.Sua Espada de Copas estava levantada sobre sua cabeça e ele gritava onomedeMorterepetidamente,comumolharenlouquecidoemseurosto.Dinahestremeceu.Elanuncatinhavistoseupaisermaisautênticodoquenestemomento terrível, e ela sabiaquenuncamaisduvidariadeque eletinha jogado seu irmão pela janela. Ele estava cheio de fúria e ódio,direcionadosparaasuamorte.Nãohaviadúvidas.Ela se virou, seu coração disparando em seu peito, e se agarrou ao

pescoçodomonstro.MortedeuumrelinchofelizeDinahentendeuqueeletinha acabado de perceber que estavam sendo perseguidos. Arrepios deprazer ondulavam em suas costas e seu galope implacável adquiriu umtoquedealegriaenquantovoavamporcamposecórregos,vilasealdeiasdopassado,sobreascolinas,voaratéqueopalácionãofossenadamaisdoqueumpontobrancoevermelhoatrásdeles.Wardleyestavacerto,Mortenãodemonstravasinaisdecansaço,pelocontrário,suavelocidadepareciaaumentar.Paracadapassoqueosperseguidoresdavam,oHornhoovdavaseis.Dinaholhavaparatrás,detemposemtempos,masnãodemoroumuito

tempo para as Cartas perceberem o fracasso de sua perseguição. Elasvoltaramumaaumaconformeos cavalosdesabavam, exaustos comessacorrida eterna. Apenas seu pai os perseguia agora, mas ele nunca

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conseguiriaalcançá-los.Morteeramaisforteemaisrápidoqueasfêmeaseestavabravoporcausadeseuconfinamento.Seuscascospesadospisandoo chão que parecia um tapete de flores selvagens, grama bem cortada eareia rochosa. E continuava,Morte ultrapassava os campos e colinas quelevavamàFlorestaRetorcida.Adistânciaentreelessóaumentava,quandoDinahviuseupairecuar,umpequenopontobrancolálonge.Umalufadadearsaiudeseuspulmõese,derepente,elaousoupensarquesobreviveriaatéopôrdosol.Suaspernasenádegasgritavamcomadordecadagalope,seu corpo batendo ferozmente contra as costas musculosas de Morterepetidamente.Dinah pressionou sua cabeça contra o pescoço doHornhoov, um novo

cansaçoaultrapassando.Elatinhacertezadeque,secaísse,elecontinuariacorrendo. Ele não só não se importava com seu cavaleiro, como sequerlembravaquetinhaum.Sóaqueda jádestruiriaseusossos.Seelacaísse,elecontinuaria,oueleandariaaoseuredoreamataria,comseusenormescascostransformandosuacabeçaempasta.Eeladeixaria.Eles deveriam estar indo na direção leste agora, então ela se inclinou

para a esquerda, torcendo para que ele virasse mais para o norte, naspartesmais profundas da Floresta Retorcida. Seu corpo respondeu, e eleesmagoualamadebaixodeseuscacosaovirarnaqueladireção.VáparaaFloresta Retorcida, Wardley disse. Eu te encontrarei. As árvores ficavamcadavezmaisaltasnohorizonte,seusgalhosalcançavamocéu.Aluzdosoliluminavaládoaltoocéudatarde.Elesestavamcorrendohaviahoras,maspareciamdias.MortevoouporumacolinaeDinahsentousurpresa,esfregandoosolhos.

Elaquasecaiunosonoemseuimensopescoço.–Meusdeuses!Agoraelapodiavê-la–aFlorestaRetorcida.Estavaexatamentenafrente

deles,seuanelexteriordeárvoreseratãoaltoquantoastorresdocastelo.Seus ramos magros tentavam agarrar o céu. As árvores se inclinavam egemiamjuntas,seusgalhossemovendovagarosamente,mesmosemhavernenhumvento.Dinaholhoumaravilhadaparaa floresta,apesardeMortenãodemonstrarnenhumsinaldequeiriaparar.Elacontinuousegurando.O que mais ela poderia fazer? Eles chegavam cada vez mais perto dasárvores.Apesardeasárvoresseremgigantes,aflorestaestavamaislongedoquepareciaeaspernasdeDinahcomeçaramadar cãibra, suas coxasestavam sangrando quando eles chegaram na base das árvores. Suagargantaestavaseca,eaáguapareciaumsonhosedutor.Osolcomeçouasepôrnoleste,conformeelesiamchegandoàbeirada.

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Já tinha sepassadoumdia emetadedeumanoitedesdequeDinah forasacudida e acordada por um estranho. Morte finalmente estavademonstrandosinaisdeexaustão, espasmosviolentos começandoa subirpor seu pescoço, uma espuma de cor violeta escorria de seus lábios. Asárvores,mais altas do que qualquer coisa queDinah já tinha visto, erammaisaltasdoqueasTorresNegras,eficavamexatamenteàsuafrente,osbraços fantasmagóricosbloqueandoamaiorparteda luz,quecontinuavadiminuindo.AlgonasárvoresestremeceueentãoDinahnãoviuocascodeMortepousaremumpequenoburaco,ecairparafrente.O ar os levoudepressa, e os dois foram jogados violentamente emum

riacho lamacento. O corpo de Dinah voou por cima do de Morte, e o deMortepassoucomoumtrovãopordebaixodela.Dinahpousoucomabolsaamortecendosuaqueda.Elaroloucomumbaquecontraumaárvorecaída,sua cabeça batendo em um tronco murcho. Algo em suas mãos estaloucomosefosseumfinogalhodeárvoreeumadorinsuportávelatravessou-lheobraço.Ela tentou levantaracabeçamasera inútil.Elanãoconseguiapensare

nemsemover.Umaáguasuja fluíaparadentrodesuabocaconformeelalutavaparasemanteracordada.SeuúltimopensamentoforamosolhosdeCharles quando ele mostrou a cabeça despenteada de trás da escadaria,azulbrilhanteeverdesuave.–MinhaDinah.Elehaviatocandosuamãogentilmente.Elafechouosolhoseseentregou,nãomaisumarainha.

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Quatorze

Dinahsonhouqueestava seafogando.Elagiravae flutuavamas,dessavez,nolugardasubstânciapegajosadoespelhogrosso,elaestavainalandoágua.Omarestavaflutuandoparadentrodesuabocaepulmões.Peixessecontorciam,seaninhandoemsualíngua,ospeixinhosdavammordidinhasem seus dentes. Uma enguia preta e branca deslizou sobre seu corpo,envolvendo-seemseuabdômen,emseupeito.Algasseagarraramemseustornozelos enquanto ela lutava para se mover e ela sentiu um pânicocrescentealertando-adequenuncaalcançariaasuperfície.Algo sombrio nadava para fora da água negra, algo enorme e

amedrontador.Dinahpiscouosolhos,queagoratinhaumacrostadeareiaecorais.Umpeixebrancobrilhantedeslizouemsuadireção.Suasescamasondularam na luz do sol, cegando-a com sua beleza. Ele abriu a boca eDinahviufileirasemaisfileirasdedentesameaçadoreseafiados.Opeixeusavaumchapéu.Elaabriuabocaparagritaretodaaáguaainvadiu.Dinah abriu os olhos com um susto. Estaria sonhando? Estaria

morrendo? Havia água em sua boca, água de verdade. Ela cuspiu eengasgoumasparao seualívio, essaáguavinhadeumpequenocórrego,um fiapinho de água em cima do chão coberto de lama e plantasmoribundas.Dinah virou a cabeça e cuspiu, engasgando com um pedaço de grama,

queficarapresoemsuabochecha.Comasmãostremendo,elaselevantouesentiuumadorpulsandocorreratravésdeseusdedos.Olhouparabaixoedoisdeseusdedosestavaminchadosedeformados,osdoisapontandoemdireções estranhas. Ela não conseguia mexê-los e ummero toque suavecausavaumadorgritante.Aindacuspindo,elavoltouasentar-seeencarouseusdedos.Respirefundo.Vocêtemquepensar.Depoisdeolharparaelesporalgunsminutos,inclinou-seepuxoufiletes

de grama do leito do rio e fez um curativo em seus dedos. Ela deixouescaparumgritoquandoapertouonó,eramcomoseagulhasestivessemsendo empurradas sob suas unhas. Sem fôlego, deitou-se olhando para ocórrego,ondepodiaverseureflexoimundo.Limpouosanguesecodeseu

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rosto freneticamente,queestavaarranhadoda testaatéoqueixo.Aágualamacentadoriachoaindatinhaumgostosujo,cuspiunovamenteeroloupara o lado, antes de soltar um grito agudo. Cascos pretos cobertos comespinhosdeossosgrossos escavavama terra a centímetrosde seu rosto.Manchasdesanguemarcavamosespinhos,algumasfrescas,quepingavam,eoutrasantigas.Olhandoassimdepertoelapodianotarqueosossoseramirregulares,comosetivessemsidocortadoscomumafaca.Issoostornavaaindamaismortaisdoqueumafacaafiadasendoempurradanacabeçadeumhomem.Dinah ergueu a cabeça devagar, não querendo assustá-lo. Morte

agigantava-se diante dela, era tão grande que bloqueava o sol da tarde.Tudoqueelapodiavererammontesnegrosdemúsculoeossos.Elevaimematar, ela pensou. É o que ele quer. Vapor sibilava para fora de suasnarinas, enquantoelebalançava sua cabeçapara frente epara trás sobreela.Levantouocascoepisoucomforçaparabaixo,acentímetrosdocorpodeDinah,tãofacilmentequebrável,umsacodeossosetecido.Mortebateuo casco novamente. O chão tremeu. Ele abaixou sua enorme cabeça echeirouDinah, o vapor lavou seu rosto, estava tão quente que ela sentiumedodequebolhasnascessememsuapele.Elanãosemoveu,seucorpoestavaparadocomoumapedra, e seusolhos, fechados.Morte finalmentepareceusatisfeitoepuxouolongofocinhodevolta,batendoopédenovo.Dinah abriu os olhos e olhou aterrorizada para seu casco. Um dos

espinhosdeossohaviaquebradoeagoraestavaviradoparaooutrolado,adentrando na pata de Morte. Devia ter quebrado quando ele pisou noburaco,elapensou,e,enquantoelesemexia,furousuapele.EDinahsentiuseuestômagopesar.Oenormecascoveioaochãonovamente,nafrentedeseu rosto, quebrando o chão duro como se fosse feito de vidro. Dinahrespiroufundoeficoudejoelhosvagarosamente,ergueuasmãosnafrentedocorpo,entregando-se.Morterelinchou,aspataspousadasaoredordela.Agarotacontinuouparadaatéqueeleparoudesemovere,então,esticousuas mãos, que tremiam, até que pairassem sobre os espinhos de ossosangrentos.Elerelinchouraivosamente.Eu poderia perderminhasmãos, ela pensou,ouminhasmãos ouminha

cabeça.Esticouasmãos,comomáximodecuidadopossível,eascolocou,aindatremendo,napernadeMorte,passandoporelasvagarosamente,atéquealcançouocasco,comoelatinhavistoWardleyfazercentenasdevezescomcavalosnormais.Wardley.Oqueteriaacontecidocomele?Agorasuasmãosalcançaramapontadosespinhosdeosso.Eladeixouasmãos,comosdedos quebrados, descansarem na perna massivamente musculosa de

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Morteenquanto,comaoutramão,arrancavaoespinhodeossoqueestavaafundado na base de seu casco. As pontas irregulares do espinho sepressionaramcontrasuapeleenquantoelaopuxava.Mortedeuumgritoaterrorizante de dor e pisou forte no chão com seus outros cascos. Oespinhonãosemexeuemnada,eagoraaindaestavaescorregadiocomosanguedamãocortadadeDinah.Morte rangeu os dentes, e Dinah podia sentir sua fúria e ansiedade

crescentes. Ela tinha somente alguns segundos antes que ele perdesse ocontroleeamatasse,elapodiasentirisso.Elaenvolveuasmãosmaisumavezaoredordoespinhoeopuxoucomtodasuaforça,apeledesuasmãosserompendoerasgandocomoseelaestivesseagarrandoapontadeumaespada. Dinah deixou escapar um grito arrepiante quando o espinhoucravou fundoemsuapele,escorregandonosangueúmido.SeusanguesemisturavaaodeMorte,enquantopingava,eseugritosecombinavacomodele,enquantoelebatiarudementeacabeçaparaolado.Dinahsecurvouno chão, coma cabeça embaixodasmãos, umadelas seguravao espinhoensanguentado enquanto Morte trotava em círculos ao seu redor, seuscascospassavamacentímetrosdeseucorpo.–Porfavor–Dinahmurmurou–,porfavor.MortepermaneceuparadoeconsideroutiraravidadeDinahporalguns

minutos, antes de andar para longe para inspecionar seu machucado.QuandoDinahlevantouacabeça,eleestavaaencarandodeumadúziademetros de distância, seus enormes olhos pretos observando cadacentímetro de seu rosto, ele estava pensando, calculando. Depois do quepareceu uma eternidade ele bufou alto e inclinou a cabeça para beber aágua do córrego. Dinah se reencostou e deixou o alívio lavá-la enquantoapertavaomachucadoemsuasmãos.Mortenãoamataria,nãoagora,dequalquermaneira.Ela lavousuamãonocórrego,osanguepintavaaáguade vermelho antes de viajar, seguindo a corrente com um conjunto defolhas roxas.Elaarrancouabarrade sua camisola,queanteserabranca,agora marrom, sangrenta, e coberta com o cabelo preto grosso, e aenvolveuemtornodesuamão.Adordeseusdedosquebradospercorreuseu corpo e ela, lentamente, levantou-se da beira do riacho, temendodesmaiar.Cambaleando,descansoucontraaárvorenaqualhaviabatidoacabeçaemanteveumolhoatentoemMorte,queagoracomiaalegrementetodopedaçodefolhagemàvista.Comida.DerepenteDinahpercebeuovazioqueruíaemseuestômago,

umafometãofortequeelanuncahaviasentido.Suaspernastremiam,elaseempurrousobreospéseandouemdireçãoàsuabolsa.Desamarrouos

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cordões,deixandoabolsacairabertaemsuafrente,suasmãosprocurando,de maneira selvagem, por comida. Não demorou muito para achar umasegundabolsadentrodaprimeira,cheiadecarnedepassarinho,pequenasfatiasdepãoefrutassecas.Dinahcortouospães,ecomeçouamastigareengolirrapidamente.Elaestavaconvencidadeque foratãogostosocomoessepãopuro,edepoiscomeuumpunhadode frutas.Haviaumpequenocantil no interior do saco, que encheu com água do riacho.O líquido eramarrom e lamoso, mas ainda sim fluía em sua garganta como um docenéctar,eDinahbebeuatésentirquepassariamal.Seu estômago estava cheio, mas desconfortável, e Dinah finalmente

sentiu sua mente clarear enquanto encarava Morte, sua crina sedespenteandoaovento.Averdadebrincouemsuamenteemondas.Seupaihaviamatado seu irmão.Umestranhoahavia alertado, empacotadoessabolsaeamandadopara longe.Seelativesseseguidosuas instruções,nãoteriahavidoperseguição. Ela teria escapadona surdinadanoite, indonadireçãoquefossemelhorpraela.MaselatinhaqueteridoverCharles,seucorpodeformado, tinhaque tervistoLucyeQuintrell empilhadosumemcima do outro no armário, como vestidos velhos. Ela tinha que ter vistoWardley.Wardley, seu amor.Wardley a havia salvado e, em troca, ela oapunhalou. O que aconteceria com ele? Seria possível ele a encontrarnovamente?Seupaipoupariasuavidaporcausadeseuafetopelogarotoou ele lhe cortaria a cabeça por causa de sua lealdade à Dinah? Se tudodessecerto,oReiveriaomachucadobemrealqueDinahhaviafeitoneleeestaria convencido, embora ele fosse geralmente desconfiado. O queaconteceriacomHarriseEmily?Umalágrimaroloupeloseurostoquandopensouemseudoceguardiãoacordandoedescobrindoqueelahavia idoembora.Eleacreditariaqueelatinhasidocapazdefazeroquediziam?Queelaodeixarainconscienteetinhamatadoopróprioirmão?Dinahbalançoua cabeça. Nunca. Harris a conhecia de verdade, mas esperava que eletivesseobomsensodeesconderdoReiasualealdadeàDinah.A Floresta Retorcida gemeu alto atrás dela, e as árvores rangiam seus

galhos ao mudarem de posição conscientemente. Toda vez que Dinahpiscava, ela podia ver seu pai, o ódio em seu rosto e a Espada de Copaslevantada sobre sua cabeça, o olhar sangrento em seus olhos. Ele a teriamatado se tivesse conseguido alcançá-la, e a mataria agora se aencontrasse.Dinahficoudepérapidamente,suascoxasardiameestavamemcarneviva,porcausadacavalgadanopescoçodeMorte.OReideCopasvoltaria, com cavalos, Cartas e rastreadores. Muitos Espadas eramtreinadosemrastreamentoeaencontrariamfacilmenteali.

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Dinaholhouaoredorparacompreendertodaasituaçãoemqueestava.Eles estavam na beira da Floresta Retorcida, apenas uns cemmetros decampoantesdasárvores,árvoresgigantesecolossaisquepareciambravase hostis. A clareira era adorável, uma colina suave que escondia umpequeno riacho, o seu solo rochoso coberto de flores silvestres roxas earbustos amarelos. Enquanto Morte mastigava gramas selvagens, a cenaeraquasepitoresca,umafantasiarural,algoqueelapintariaemsuasaulasdearte.AbelezacruadomomentomisturadocomoterrorpersistentedeDinah; ela se agarrou a seu peito. O Rei voltaria; na verdade, eleprovavelmentejáestavaacaminho.Elatinhaquepensar,mover-se.Elanãotinhatempoparasedemorarnaquiloquehaviaacontecido,essenãoeraomomentodo luto.Dinahvasculhouabolsa.Oestranhohaviaempacotadoroupascomalgumas ferramentasecomida:duastúnicasde linhobranco,calças marrons de lã, um cinto, um vestido preto pesado e botas demontariavermelho-escuras,asbotasdasCartasdeCopas,notou.Olhandoemvoltatimidamente,Dinahpuxouacamisolabrancafinasobreacabeçaeestremeceu no ar fresco da primavera, enquanto a brisa acariciava seucorponu.Vestiucalçasmarronseumatúnicabranca,eenfiouospésnasbotas de cavalgar. Elas serviam perfeitamente.Movendo-se rapidamente,ela enrolou a camisola e seu casacode lã, e os empurrouparadentrodabolsa,assuasmãosardiamcomoesforço.Eu tenho que pensar demaneira diferente agora, pensou,eu posso usar

essas coisas depois, eu precisei delas para as minhas mãos. Elacuidadosamentedesembrulhou suamãodo tecido.A feridaera feia:umalinhanegraesangrentagrossacorrianocomprimentodamão.O sol estava parado no alto do céu e o calor em sua pele a deixou

sonolenta. Tenho que ter foco, Dinah pensou quando o vento soprou ocabeloemseurosto.Eutenhoquesermuitoespertaouelesmeencontrarãofacilmente.Eunãopossopensaremcoisascomodormiragora.Elamordeuos lábios. Seupai era corajoso, umhomemcomuma força

física impressionante.Mas ele não era lámuito esperto.Não, ele deixavaessa parte comCheshire. Não era o seu pai que tinha que superar e simCheshire.Oqueele faria?Ele imaginaqueeu iriaparaonorte, pensou.AFlorestaRetorcidaeracheiadeperigosemistérios,masmais importanteaindaeraa terradas tribosYurkeis.AFlorestaRetorcidasó trariamorte,mas no norte havia cidades dispersas, nas quais ela poderia se refugiar,esconder e se transformar em outra pessoa. Ele imaginaria que ela iriaprocurarafamíliadesuamãe,quevivianotopodasMontanhasOcidentais,emIerladia.

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A Floresta Retorcida gemeu novamente atrás dela, as árvores virandosimultaneamenteseusgalhosparaocéudepoisdeumcomandosilencioso.DepoisdaFlorestaRetorcida,ficavamaselevadíssimasMontanhasYurkeis.AqueleeraolugarmenosseguroparaaPrincesadeCopas,poiseraolugardosYurkeisselvagens,curvadospeladestruiçãodosmoradoresdoPaísdasMaravilhas. Era o último lugar emque seupai a procuraria. Talvez fosseporissoqueWardleyosugerira.Elaolhouamedrontadaparaaflorestaquese movia devagar, alarmada pelo sentimento desconfortável de que elaestavasendoobservadapelasárvores.Poucoshomensviveramparacontaros contos da Floresta Retorcida, mas ainda menos homens tinham idocontra seu pai e sobreviveram. A decisão foi tomada. Morte relinchousuavementeaovento,aparentementeapreciandoabrisanofocinho.Dinahnotouochão.Nossorastroestáemtodaparte,pensou.ElaeMorte

tinham derramado sangue ali, deixado pegadas, pedaços deles mesmos.Qualquer rastreador perceberia que eles haviam descansado ali. Dinahchutou um pedaço demadeira petrificado, frustrada. Ele se quebrou emdois pedaços. Então os disperse, pensou, eu tenho que dispersá-los paralongedaqui.Elaolhouparaocéu.Porseumelhorpalpite,seupaiteriameiodiadeviagemdevoltaparaocasteloe,emseguida,meiodiadeviagemdevoltaàquelelocal.Elaficouinconscienteportrêshoras,talvez,ajulgarpelaposição do sol quando ela acordou. Dinah amaldiçoou por não prestaratençãoàsaulasderastreamentodesoldeHarris.Claro,eraumaaposta,masqueeladeveconsiderar.Tinhaqueescapare,paraisso,elateriaquelevá-los para longe do seu rastro, confundi-los. Teria que agir de formadiferentedoqueseriaesperadodela.Poderianãofuncionar,maselatinhaquetentar.Dinahpegousuabolsaecomeçouaandarnadireçãonoroeste.Seuspés

gemiamacadapasso,easduasmãospalpitavamcomfortesdores.Dinahseviusonhandocomvontadededormir,desedeitarnocapimgrosso,queparecia agora tão confortável comoseu colchãodopalácio.Eladeixouospensamentos passarem descontroladamente enquanto cambaleava nocaminho. Quem era o estranho?Havia algo familiar sobre elemas, aindaassim, ela não tinha certeza de que era um homem. A forma como oestranhotinhaenvolvidoumamãoaoredordesuaboca,a formacomoosussurroa emocionara, era tudo tãoabsoluto,poderoso.Quantomais elapensavasobreoquehaviaacontecidomaisfrustradaficava.Anoiteeraumborrãodemedo intenso ede emoções selvagens, e elapercebeuque suamemória da coisa toda era bem borrada e cheia de buracos. Haviamaisalguém no quarto de Charles com ela? Ela nem pensou em olhar. O

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machucadonacabeçadeleaconteceunaquedaoufoifeitoporumaespada?Comoelachegoudeseuquartoatéojardim?OqueaconteceucomWardleydepoisqueelasaiugalopandodoestábulo?Porqueelenãofoicomela?PorqueMortenãoobedeceuseupai?Tomadaportodasessasperguntas,Dinahtropeçouemumapedra,seus

joelhosbateramnochãocomumestrondoalto.Suamenteentrouemumcolapso introspectivo. Era ela a responsável pela morte de Charles? Aslágrimas saíam por causa de seu lindo irmão, Lucy e Quintrell. Todosinocentes, assassinados por seu pai. Era sua culpa que todos estavammortos, sua culpa queCharles saiu voandopor uma janela aberta para aescuridãodeumanoitesemestrelas.Seráqueeletinhaficadocommedo?Ele gritou? Dinah fez uma prece silenciosa para que ele não tivessepercebidooqueestavaacontecendo,paraqueseusúltimosmomentosdevidativessemsidodepazeinocência.LucyeQuintrellforammortosantesdele ou depois? Ela engasgou com um soluço. Será que Charles viu oassassinatoecorreuparacimadasescadasparaescapar?Oh,deuses.Dinahcobriuaboca,commedodevomitar.Elanãopodiaficarparada,ajoelhadanesse campo, mas ela também não conseguia se mover. Ela estavaparalisada em seu próprio luto, chorando. Depois de um tempo, umapequenapedrinhatremeupertodesuamãoedepoissacudiusobreaterra.Cascos.Ela estavaouvindo.O chãovibrou como somde cavalos eDinahabaixouacabeça.O tremerdos cascosdiminuiu conformeeles se aproximavame, então,

pararam. Relutante, Dinah olhou para cima, esperando ver o reflexobrilhante de uma espada de Copas, mas, ao invés disso, Morte estavaparadoaoseulado,suacabeçaabaixadademodoqueDinahpudesseolhardiretamenteemseusolhosnegros.– Vocême seguiu – ela sussurrou, estendendo amãomachucada para

acariciarseufocinho.Morterecuoualarmadoetrouxeumcascoparabaixomuitopertodesuacabeça.Dinahencolheu.Aindanão,pensou,aindanão.Ele podia ter me matado por causa disso. Não esqueça que ele não é umcavalo. Aquela foi uma ideia estúpida. Limpando os olhos, enquanto seucorpo tremia como esforço,Dinah se levantou e continuou andando. Elaolhoupara trás,maravilhadacoma imagemdeMorteaseguindo,mesmoquando ela sutilmentemudava de direção. Sua presençamassiva ainda adeixavanervosa,eelaestavadevidamentecientedequeeleiriaencontraralegriaemmatá-la,masfoibomnãosesentirsozinha.Arrastando-se para continuar,muito lentamente, eles caminharam por

mais algumas horas. Dinah tinha sido engolida por seus pensamentos.

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Morte estava curtindoo sol emseu corponegro.Depoisdeuma reflexãocuidadosa,elajogouumamaçãparaele,queaengoliuinteira,semsequerse importar em mastigá-la. Procurando na bolsa, Dinah encontrou umpedaço de carne de pássaro seca e o mordeu vorazmente enquantofantasiavaumatortadeamoraeumaxícaradecháquentinha.Antesqueela pudesse saboreá-la, a carne já havia acabado. Eu tenho que para decomerassim,pensou,oquefareiquandoacomidaqueestánabolsaacabar?Sóumdiasepassou.ApaisagemaoseuredorestavamudandoeDinahseperguntouoquão

longejáhaviamido.Osolbrilhavabaixoaolesteeanoiteceriaemalgumashoras.BaixasplaníciescobertasdefloressilvestresaindacontinuaramtãolongequantoDinahpodiaver,avistaerainterrompidadevezemquandoporumaárvorecommusgoprateado,mesmoquandonãohavianenhumabrisa. Dinah percebeu que não era a paisagem que havia mudado tanto,massimacor.Asfloresselvagensqueeramdemilharesdecoresdiferentesquandoelesdeixaramoriachotinhamcomeçadoamudarsutilmenteseutom quanto mais longe eles iam. Aglomerados de amores-perfeitosdelicados,narcisos,delfinoscheios,talosaltosdeestrelasardentes,rosasetulipas foram todos começando amudar suas cores ricas para tonsmaisfrios.Delfinosvermelhoscomeçarama tomarumtommaisazulado,maisprofundo;narcisosamarelosbranqueavame,emseguida,transformaram-seemumaluzazule,então,lavanda.Amudançadecorpareciaterorigemnopróprioestame,umredemoinho,apenasumtomdiferente,provocouametamorfose.Seuspésacariciavamas floresquemudavamde tom, campodepoisde

campo. Era tão incrível que Dinah momentaneamente esqueceu comoestava exausta. Foramquilômetros damesma paisagemde tirar o fôlegoantesqueumacolinaenormeselevantassedochão,nasuafrente,cheiadefloresdamontanhaazul.AimagemlembrouDinahdetodasaspinturasqueela havia visto do mar, uma onda quebrando exatamente ao alcançar ocume.Olhandoparacima,Dinahpodiaverqueacormudavanovamente,suavementenotopo.Dealgumamaneira,oápice tinhaumacordiferentedasuabase.Eladeixouabolsacair.Esquecendo-sedetudo,elacorreuatéotopoda

montanha. Seu movimento deixou Morte alerta, que, de um pulo, seuscascos pousaram no chão, com irritação. Quando ela alcançou o topo,deixou-semisturar com a cama de flores, olhando para a paisagemmaisbonitaque já tinhavisto, abeleza sugava todooarde seuspulmões.Eraazul. O azulmais profundo que ela já havia visto,mais profundo que os

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azuisdosolhosdeVittiore,maisvaliosoquejoiasdesafira.Asvestesmaisbonitasdoreinonãopoderiamnuncacapturaresseazul,essascamadasdecores, o azul puro que se estendia até onde os olhos podiam ver. Todacolina,daquiatéohorizontenorte,estavacobertadefloresazuis,emtodosos tons; um azul perfeito e profundo se espalhava emmilhares de tiposdiferentesdeflores.Elaobservavamaravilhadaenquantooventoondulavaatravésdovaleeoazulbrilhavadepontaaponta,rolandoemondaapósonda.Conforme a boca de Dinah se abriu em um susto, uma rajada

particularmente forte varreuo vale, e ela assistiu comespantoque a cormudou para azul pálido, ultrapassando, de imediato, uma flor atrás daoutra, como se as flores estivessem sussurrando entre si. Era tão rápidoque ela não conseguia encontrar a origem, ver a primeira flormudar. Acadarespiração,asfloresmudavamdecor,turquesaparalavanda,lavandaparaazul-escuro,quasepreto.Dinahnuncatinhavistonadatãobonito.Erao Nono Oceano, uma área escurecida no centro do mapa do País dasMaravilhas.Dinahtinhaescritosobreelecentenasdevezesnaslições.Nomapa,eleapareciacomoumpedaçodeágua,masestavaerrado.Nãoeraágua,eraumoceanodeflores,umaextensãoinfinitadeazulcontraoazuldo céu. Dinah percebeu com um estalo que ela não só havia ido longe osuficiente do palácio, mas que havia ido longe demais para o norte. Elahavia perdido a noção do tempo na caminhada, e o anoitecer estavapróximo.As estrelas doPaís dasMaravilhas começarama aparecer no céu, hoje

elas estariam suspensas exatamente acima deles, mas agrupadascentralmente. Elas pareciammais brilhantes aqui do que no castelo. Elaapertou os olhos a leste, a respiração presa de novo como as floresalterando para um surpreendente azul-listrado. Sim, ela tinha ido longedemais; eles passaram alguns metros de distância a partir do final daFlorestaRetorcida.PassadooNonoOceano,haviaumaenormeextensãodenada, que terminou no Troden, exatamente na direção que seu pai a viuseguindoporúltimo,adireçãoqueelaqueriaqueeleseguisse.Erahoradeandarparatrás.EladeuumdemoradoolharnoNonoOceanoondulandoaovento,ascoresmudandodebrisaabrisa,nuncaomesmoazulduasvezes.Eu poderia ficar aqui o dia todo, pensou, só me misturar com o azul edesaparecer.EugostariaqueCharlespudesseverisso.Elapegouuma florque estavapróximade seupépara jogá-lanomar,

maselamurchouemorreunasuamão.Dinah jogouentãoapoeira,eeladançounoventoemdiferentesformas.Elasoltouumsuspirodeexaustãoe

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sevirou.Morteparecia confusoenquantoDinah cuidadosamentevoltava,maslogoelepercebeu,colocandoseuscascosnaspegadasqueelestinhamdeixado algumas horas atrás. Dinah estava perdendo o equilíbrio, aexaustão tornava a dor em suas mãos mortais. Ela estava tão cansada,muitocansada.Eunãovouconseguir,pensou,eunãovouconseguirvoltar.Seu coração parecia bater do lado de fora de seu peito. Ela balançou emseus pés algumas vezes. Cada pegada acabava em seus joelhos. Dinahfinalmentesentou, fechouosolhosparaasestrelasbrilhantesacimadela.Voudescansar,pensou,sóporummomento.Morteficouimpaciente,atéquefinalmente cutucou-a rudemente com seu enorme nariz, o vapor de suasnarinaschamuscandooscabelosemseubraço.Comumesforço,Dinahselevantou, suas pernas obedecendo quando sua mente não podia. Mortelevantouapataetrouxe-acomforçaaochão,repetindoogestonovamente.–Oquevocêquer?–elaperguntoucomraiva–Medeixedormir!Mortecontinuouaencará-laatéqueelapercebeuqueelequeriaqueela

ocavalgasse.Opensamentoadeixoufeliz,maselanãosabiacomosubiremcimadele.ÀsvezeseradifícilparaelasubirnoRajado,eMortetinhasduasvezesoseutamanho.Usarsuacrinaparasubircomcertezaeraocaminhoparaumamortedolorosa,maselanãotinhaasenergiasqueprecisariaparase puxar para cima. Morte levantou a pata novamente e ergueu-a, emseguida,trouxe-aparabaixocomumbaqueretumbante.Oh,seucorpotremiadeexaustão.Dinahdescansousuamãoao ladode

Morte. Ela podia sentir o peso monstruoso de seus quadris, as batidasfortes de seu coração. Ele levantou o casco, ela gentilmente colocou suabota na ponta dos espinhos, equilibrando-se cuidadosamente, sempreconscientedequeosespinhospodiamentraremseupéseopesonãofossedistribuídocorretamente.Comosolhosfechadoselamurmurouumaprecee subiu. Os espinhos pressionaram contra sua bota enquanto Mortelevantavaaperna.DinahvoouparacimaatéqueestivessenaalturacertaparasecolocarnascostasdeMorte,queeramenormeseconfortavelmentequentinhas.Osmúsculosdesuaspernasderamumpulsardolorosoquandoeles retomaram sua posição, estendendo-se no pescoço grosso deMorte,maselanãopoderiaestarmaisgrataempoder sentar.Dinahpreparouavozparacomandá-lo,masdepoispensoumelhor.Elasentouquietinha,atéqueMortesaiuemumtrotarveloznadireçãoemquevieram.Nãoeranoritmo loucoqueos trouxeraaqui,masera trêsvezesmais rápidodoqueDinah conseguiria se estivesse correndo o caminho todo.Omovimento aninava,Dinahfechouosolhos,descansandoocorpoemsuaenormecabeça.Elacaiunosonorapidamente.

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AlualistradadoPaísdasMaravilhasestavaaltanocéuquandoaparadade Morte a acordou. Ela olhou ao redor e soltou um suspiro de alegriaquandoreconheceuocampo,o leitodorioondeeles tinhamcomeçadoajornada hoje. Rapidamente esse lugar pareceu se tornar seguro, essepequeno vale. Ela escorregou para o lado de Morte, incerta de comoconseguiria descer dessa enorme altura. Sua perna raspou em um dosespinhosdeosso,quedeixouumfinoarranhãoemseurosto.MortebebeugrandesgolesdocórregoeDinahencheuseucantilpelasegundavez.Elaencontrousuaespadacaídaemcimadealgumasfolhaseaamarrouemsuabolsa, que estava escondida atrás de um arbusto. Dinah colocou os doissobre seus ombros. Era hora de se movimentar, seu pai provavelmenteestavaseaproximandodeles.Elatinhaandadodemais,eseriaosuficientepara despistar os rastreadores e para enganar Cheshire. Fez uma precesilenciosaparaqueelesmordessemaisca.Dinahsedirigiuparaafloresta,mancando,aliviadaaoouviraspassadas

pesadasdeMorteatrásdela.Váriasdasenormesárvoresqueguardavamabeirada da floresta giravam seus galhos em sua direção, enquanto elapassava.Dinahdeixousuasmãosbrincaremnopunhaldaespada,confianteem sua presença.Eu não terei medo dessa floresta, disse para si mesma,porque minha luta para sobreviver não começa agora. Eu tenho lutadominha vida toda, eu apenas não sabia. Minha luta começou quando nascifilhademeupai,quetinhamedododiaemqueeuassumiriaotrono,eestoumaisseguranessa florestadoque jamaisestivenopalácio.Nãomorrihoje,então não terei medo de morrer amanhã. Esse pensamento a encorajou,apesar de ela duvidar que sua coragem durasse muito. Ela olhou paraMorte, a seguindo de alguns bons metros de distância, suas orelhas tãoplanas em sua cabeça. Até o mortal Hornhoov tinha medo da FlorestaRetorcida.Omedoseagitavaemseuestômago.Dinahpegousuaespadae,assim,aex-PrincesadoPaísdasMaravilhaseseucorcelnegrodemoníacodesapareceramparadentrodaFlorestaRetorcida,deixandonadaparatrásalémdeumafalsatrilhaeodistantesoprodeumacoroa.

FIM