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1
PAOLA MAHYRA DE OLIVEIRA CARVALHO
RELAES ENTRE LXICO E AMBIENTE: UM ESTUDO DA
NORMA LEXICAL DO CENTRO-OESTE DO BRASIL
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao
em Estudos de Linguagens da Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul, rea de concentrao Lingustica e
Semitica como requisito parcial para obteno do ttulo
de Mestre.
Orientadora: Profa. Dra. Aparecida Negri Isquerdo .
Campo Grande MS
Agosto, 2015
2
PAOLA MAHYRA DE OLIVEIRA CARVALHO
RELAES ENTRE LXICO E AMBIENTE: UM ESTUDO DA
NORMA LEXICAL DO CENTRO-OESTE DO BRASIL
APROVADA POR:
PROFA. DRA. APARECIDA NEGRI ISQUERDO (UFMS)
PROFA. DRA ELIZABETE APARECIDA MARQUES (UFMS)
PROFA. DRA REGIANE COELHO PEREIRA REIS (UFMS)
Campo Grande, MS, 18 de agosto de 2015.
3
No troco o meu oxente pelo ok de ningum
(Ariano Suassuna).
4
DEDICATRIA
Aos meus pais e irmo
Paulo Neres, Mariza e Paulo Levi
5
AGRADECIMENTOS
A realizao do Mestrado representou para mim a oportunidade de
concretizar um sonho que, muitas vezes, parecia estar distante, pois trilhar novos
caminhos exige cumprir uma jornada longa, por vezes tortuosa, mas gratificante
no final. Portanto, agradeo a todos que estiveram comigo nesta jornada:
Em especial a Deus pelo dom da vida e, por muitas vezes, acalmar meu
corao durante a concretizao deste trabalho.
Aos meus pais, Paulo Neres e Mariza, e ao meu querido irmo Paulo
Levi, que me deram todo o apoio e carinho necessrios. A eles, todo o meu amor
e minha gratido eterna.
Ao meu namorado, Fernando Moura, pela compreenso e pelos abraos
reconfortantes nos momentos de cansao.
minha professora orientadora, Dra Aparecida Negri Isquerdo, pelos
ensinamentos desde a Iniciao Cientfica, que contriburam significativamente
para a realizao deste sonho.
Ao Projeto ALiB, em especial Professora Dra Suzana Alice Marcelino
Cardoso, Presidente do Comit Nacional, por autorizar a utilizao do corpus do
Projeto e assim possibilitar a realizao desta pesquisa.
Capes e FUNDECT pelo incentivo financeiro que possibilitou a
realizao deste estudo.
s queridas amigas Daniela de Souza Silva Costa, Luciene Gomes
Freitas Marins e Priscila do Nascimento Ribeiro por toda a ajuda, conselhos e
palavras de apoio: minha eterna gratido.
6
RESUMO
CARVALHO, Paola Mahyra de Oliveira. Relaes entre lxico e ambiente: um estudo
da norma lexical do Centro-Oeste do Brasil. 2015. 219p. Dissertao (Mestrado em
Estudos de Linguagens), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande-
MS, 2015.
Este estudo teve como objetivo mais amplo a anlise da norma lexical de habitantes da
regio Centro-Oeste do Brasil, com base em dados geolingusticos, extrados do Banco
de dados do Projeto ALiB (Atlas Lingustico do Brasil). Esses dados foram coletados
por meio de inquritos linguisticos realizados com 108 informantes de 24 localidades da
regio Centro-Oeste (trs capitais e 21 cidades do interior), com o seguinte perfil: duas
faixas etrias (18 a 30 e 50 a 65 anos), de ambos os sexos, com dois nveis de
escolaridade: Ensino Fundamental incompleto (interior e capitais) e Curso Superior
(capitais), nascidos e criados nas localidades e filhos de pais nascidos na mesma rea
lingustica. O corpus estudado constituiu-se por designaes fornecidas como respostas
para dez perguntas do QSL Questionrio Semntico-Lexical do Projeto ALiB,
vinculadas a trs reas semnticas: acidentes geogrficos: QSL 001 crrego/riacho;
QSL 002 pinguela; fenmenos atmosfricos: QSL 011
temporal/tempestade/vendaval; QSL 013 tromba-dgua; QSL 014 chuva
forte; QSL 015 chuva de pedra; QSL 017 arco-ris e astros e tempo: QSL 029
estrela matutina; QSL 030 estrela vespertina e QSL 031 estrela cadente. O
estudo teve ainda por objetivo verificar como o ambiente pode influenciar nas escolhas
lexicais dos falantes, no caso, para nomear elementos da natureza, o que permitiu
verificar como o homem urbano concebe a realidade na qual est inserido. Tendo em
vista a natureza do corpus investigado, buscou-se respaldo terico-metodolgico na
Lingustica, em especial, na Lexicologia, na Dialetologia/Geolingustica e na
Semntica, alm de fundamentos em reas afins como a Ecolingustica e a Histria. Os
dados foram examinados nas perspectivas diatpica, diageracional, diassexual,
diastrtica e lxico-semntica e permitiram identificar: a) traos de influncias do
ambiente no repertrio lexical dos falantes naturais dos trs estados da regio Centro-
Oeste; b) influncia de fatores sociais na seleo lexical realizada pelos centroestinos
entrevistados; c) influncias histrico-geogrficas das localidades estudadas no
vocabulrio dos habitantes; d) manifestao de especificidades lingusticas no lxico
dos habitantes da regio Centro-Oeste; f) ndices de marcas de conservadorismos
lingusticos na fala dos informantes idosos. Por fim, o resultado da pesquisa permitiu
identificar a dinamicidade do lxico em uso como tambm a grande variedade de
designaes para os fenmenos selecionados para estudo no universo pesquisado. Em
sntese, o estudo confirmou a estreita relao entre as escolhas lexicais dos falantes e as
influncias socioambientais que os circundam.
Palavras-chave: 1) Lxico; 2) Ambiente; 3) Norma lexical; 4) Projeto ALiB; 5) Regio
Centro-Oeste.
7
ABSTRACT
CARVALHO, Paola Mahyra de. Relations between lexicon and environment: a study of
lexical standard in the Midwest of Brazil. 2015. 217p. Dissertao (Mestrado em
Estudos de Linguagens), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande-
MS, 2015.
Brazil based on geolinguistic data extracted from the Alib Project database (Brazils
Linguistic Atlas). Data were collected through surveys with 108 informants from 24
locations (3 capitals and 21 country cities) in the Midwest region. The informants had
the following profile: two age groups (18-30 and 50-65 years) of both genres, with two
levels of education: Primary Education incomplete (country cities and capitals) and
Higher Education (capitals), born and raised in the localities and children of parents
born in the same language area. The studied corpus is constituted by designations
provided as answers to ten questions of the QSL - Semantic-Lexical Questionnaire from
the Alib Project. Data were linked to three semantic areas: geographical features: QSL
001 - "crrego/riacho" (stream/brook); QSL 002 - "pinguela" (footbridge); atmospheric
phenomena: QSL 011 - "temporal/tempestade/vendaval" (Temporal/Storm / Storm with
winds); QSL 013 - "tromba-dgua" (waterspout); QSL 014 - "chuva forte" (heavy
rain); QSL 015 - "chuva de pedra" (hail); QSL 017 - "arco-ris" (rainbow); and stars and
weather: 029 QSL - "estrela matutina" (morning star); QSL 030 - "estrela vespertina"
(evening star) and QSL 031 - "estrela cadente" (shooting star). The study also aimed
assessing how the environment can influence the lexical choices of speakers, in this
case, to name elements of nature, which has shown how urban man conceives the reality
in which it is inserted. Given the nature of the investigated corpus, we pursued
theoretical and methodological support in Linguistics, in particular the Lexicology in
Dialectology/Geolinguistic and Semantics, as well as foundations in related areas such
as Ecolinguistics and History. Data were examined from the perspectives about the city
or origin, age, genre and lexical-semantic and it has identified: a) environmental
influences the traits of lexical repertoire of the studied speakers born in three states of
Middle West; b) social factors influence the lexicon of speakers; c) historical and
geographical traits influences of the localities studied in the vocabulary of the
inhabitants; d) expression of certain linguistic specificities in the lexicon of the
inhabitants of the Midwest region can be identified; f) linguistic conservatism marks in
the speech of elderly informants were identified. Finally, the result of research has
identified the dynamics of the lexicon in use as well as the wide variety of assignments
for selected phenomena in the investigated area. In summary, the study confirmed the
close relationship between the lexical choices of speakers and the environmental,
historical and geographical influences that surround them.
Keywords: 1) Lexicon; 2) Environment; 3) lexical norm; 4) Alib Project; 5) Midwest
Region.
8
LISTRA DE QUADROS
Quadro 01 Localidades da rede de pontos do ALiB na regio Centro-Oeste
distribudas segundo faixas populacionais. 45
Quadro 02 Localidades da rede de pontos do Projeto ALiB no Estado de Mato
Grosso e respectiva populao. 46
Quadro 03 Localidades da rede de pontos do Projeto ALiB no Estado de Gois e
respectiva populao. 52
Quadro 04 Localidades da rede de pontos do Projeto ALiB no Estado de Mato
Grosso do Sul e respectiva populao. 56
Quadro 05 Perfil dos informantes do Projeto ALiB 62
Quadro 06 Registro do nmero de designativos obtidos no Centro-Oeste para as 38
perguntas selecionadas. 63
Quadro 07 Perguntas selecionadas para anlise. 72
Quadro 08 Dicionarizao das designaes para crrego. 87
Quadro 09 Dicionarizao das designaes para pinguela. 102
Quadro 10 Produtividade das respostas para tromba-dgua nas capitais da regio
Centro-Oeste. 117
Quadro 11 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no interior da
regio Centro-Oeste. 118
Quadro 12 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel faixa etria. 120
Quadro 13 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel faixa etria. 121
Quadro 14 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no Estado de Gois,
segundo a varivel faixa etria. 122
Quadro 15 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel sexo. 123
Quadro 16 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel sexo 124
Quadro 17 - Produtividade das designaes para tromba-dagua no Estado de Gois,
segundo a varivel sexo. 125
Quadro 18 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel escolaridade. 126
Quadro 19 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel escolaridade. 127
Quadro 20 - Produtividade das designaes para tromba-dgua no Estado de Gois,
segundo a varivel escolaridade. 127
Quadro 21 - Produtividade das designaes para chuva forte no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel faixa etria. 132
Quadro 22 - Distribuio das designaes para chuva forte no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel sexo. 135
Quadro 23 - Distribuio das designaes para chuva forte no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel escolaridade. 138
Quadro 24 - Dicionarizao das designaes para arco-ris. 168
Quadro 25 - Dicionarizao de arco-ris em obras de cunho mitolgico e folclrico. 170
Quadro 26 - Dicionarizao das designaes para estrela-dalva. 185
Quadro 27 Dicionarizao das designaes para estrela da tarde. 199
Quadro 28 - Designaes documentadas para estrela cadente documentadas na
regio Centro-Oeste. 214
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Diviso regional brasileira. 42
Figura 02 Rede de pontos do Projeto ALiB na regio Centro-Oeste. 62
Figura 03 Armazenamento do corpus analisado. 65
Figura 04 Tela inicial do Banco de Dados Login e senha. 66
Figura 05 Tela ilustrativa do Banco de Dados Cadastro 67
Figura 06 - Tela ilustrativa do Banco de Dados Cidades cadastradas. 67
Figura 07 - Tela ilustrativa do Banco de Dados Informantes cadastrados. 68
Figura 08 - Tela ilustrativa do Banco de Dados Questo cadastrada. 68
Figura 09 - Tela ilustrativa do banco de Dados Relatrios de
questes/respostas.
69
Figura 10 - Tela ilustrativa do Banco de Dados Relatrio de percentuais
gerais.
69
Figura 11 - Tela ilustrativa do Banco de Dados Relatrio de percentuais
detalhados.
70
10
LISTA DE GRFICOS
Grfico 01 Densidade demogrfica, segundo cada grande regio do Brasil. 44
Grfico 02 Produtividade das designaes para crrego/riacho nas capitais da
regio Centro-Oeste.
74
Grfico 03 Produtividade das designaes para crrego/riacho nas localidades do
interior da regio Centro-Oeste.
75
Grfico 04 Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel faixa etria.
77
Grfico 05 Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel faixa etria.
78
Grfico 06 - Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de Gois,
segundo a varivel faixa etria.
79
Grfico 07 - Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel sexo.
80
Grfico 08 - Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel sexo.
81
Grfico 09 Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de Gois,
segundo a varivel sexo.
82
Grfico 10 - Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel escolaridade.
84
Grfico 11 - Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel escolaridade.
85
Grfico 12 - Distribuio das designaes para crrego/riacho no Estado de
Gois, segundo a varivel escolaridade.
86
Grfico 13 - Produtividade das designaes para pinguela nas capitais da regio
Centro-Oeste.
90
Grfico 14 - Produtividade das designaes para pinguela nas localidades do
interior da regio Centro-Oeste.
92
Grfico 15 - Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Mato Grosso
do Sul, segundo a varivel faixa etria.
93
Grfico 16 - Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Mato Grosso,
segundo a varivel faixa etria.
94
Grfico 17 Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Gois,
segundo a varivel faixa etria.
95
Grfico 18 - Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Mato Grosso
do Sul, segundo a varivel sexo
96
Grfico 19 - Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Mato Grosso,
segundo a varivel sexo.
97
11
Grfico 20 - Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Gois,
segundo a varivel sexo.
98
Grfico 21 - Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Mato Grosso
do Sul, segundo a varivel escolaridade.
99
Grfico 22 - Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Mato Grosso,
segundo a varivel escolaridade.
100
Grfico 23 Distribuio das designaes para pinguela no Estado de Gois,
segundo a varivel escolaridade.
101
Grfico 24 - Produtividade das designaes para tempestade nas capitais da regio
Centro-Oeste.
105
Grfico 25 Produtividade das designaes para tempestade no interior da regio
Centro-Oeste.
106
Grfico26- Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
estado de Mato Grosso do Sul, segundo a varivel faixa etria.
108
Grfico 27 Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
Estado de Mato Grosso, segundo a varivel faixa etria.
109
Grfico 28 Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
Estado de Gois, segundo a varivel faixa etria.
110
Grfico 29 Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
Estado de Mato Grosso do Sul, segundo a varivel sexo.
111
Grfico 30 Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
Estado de Mato Grosso, segundo a varivel sexo.
112
Grfico 31 Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
Estado de Gois, segundo a varivel sexo.
113
Grfico 32 Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
Estado de Mato Grosso do Sul, segundo a varivel escolaridade.
114
Grfico 33 Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
Estado de Mato Grosso, segundo a varivel escolaridade.
114
Grfico 34 Distribuio das designaes para temporal/tempestade/vendaval no
Estado de Gois, segundo a varivel escolaridade.
115
Grfico 35 Produtividade das designaes para chuva forte nas capitais da regio
Centro-Oeste.
128
Grfico 36 Produtividade das designaes para chuva forte nas localidades do
interior da regio Centro-Oeste.
130
Grfico 37 Produtividade das designaes para chuva forte no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel faixa etria.
132
Grfico 38 Produtividade das designaes para chuva forte no Estado de Gois,
segundo a varivel faixa etria.
133
Grfico 39 Distribuio das designaes para chuva forte no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel sexo.
134
12
Grfico 40 Distribuio das designaes para chuva forte no Estado de Gois
segundo a varivel sexo.
136
Grfico 41 Distribuio das designaes para chuva forte no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel escolaridade.
137
Grfico 42 Distribuio das designaes para chuva forte no Estado de Gois,
segundo a varivel escolaridade.
138
Grfico 43 Produtividade das designaes para chuva de pedra nas capitais da
regio Centro-Oeste.
140
Grfico 44 Produtividade das designaes para chuva de pedra no interior da
regio Centro-Oeste.
141
Grfico 45 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel faixa etria.
142
Grfico 46 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel faixa etria.
143
Grfico 47 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Gois,
segundo a varivel faixa etria.
145
Grfico 48 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel sexo.
146
Grfico 49 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel sexo.
147
Grfico 50 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Gois,
segundo a varivel sexo.
148
Grfico 51 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel escolaridade.
150
Grfico 52 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel escolaridade.
151
Grfico 53 Distribuio das designaes para chuva de pedra no Estado de Gois,
segundo a varivel escolaridade.
152
Grfico 54 Produtividade das designaes para arco-ris nas capitais da regio
Centro-Oeste.
156
Grfico 55 Produtividade das designaes para arco-ris no interior da regio
Centro-Oeste.
157
Grfico 56 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Mato Grosso
do Sul, segundo a varivel faixa etria.
158
Grfico 57 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Mato Grosso,
segundo a varivel faixa etria.
160
Grfico 58 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Gois,
segundo a varivel faixa etria.
161
Grfico 59 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Mato Grosso
do Sul, segundo a varivel sexo.
162
13
Grfico 60 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Mato Grosso,
segundo a varivel sexo.
163
Grfico 61 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Gois,
segundo a varivel sexo.
164
Grfico 62 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Mato Grosso
do Sul, segundo a varivel escolaridade.
165
Grfico 63 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Mato Grosso,
segundo a varivel escolaridade.
166
Grfico 64 Distribuio das designaes para arco-ris no Estado de Gois,
segundo a varivel escolaridade.
167
Grfico 65 Produtividade das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva nas capitais da regio Centro-Oeste.
172
Grfico 66 Produtividade das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva no interior da regio Centro-Oeste.
174
Grfico 67 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva Estado de Mato Grosso do Sul, segundo a varivel faixa etria.
175
Grfico 68 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva Estado de Mato Grosso, segundo a varivel faixa etria.
176
Grfico 69 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva no Estado de Gois, segundo a varivel faixa etria.
178
Grfico 70 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva no Estado de Mato Grosso do Sul, segundo a varivel sexo.
179
Grfico 71 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva no Estado de Mato Grosso, segundo a varivel sexo.
180
Grfico 72 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva no Estado de Gois, segundo a varivel sexo.
181
Grfico 73 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva no Estado de Mato Grosso do Sul, segundo a varivel
escolaridade.
182
Grfico 74 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva no Estado de Mato Groso, segundo a varivel escolaridade.
182
Grfico 75 Distribuio das designaes para estrela matutina/Vnus/estrela da
manh/ estrela-dalva no Estado de Gois, segundo a varivel escolaridade.
184
Grfico 76 Produtividade das designaes para estrela da tarde nas capitais da
regio Centro-Oeste.
187
Grfico 77 Produtividade das designaes para estrela da tarde no interior da
regio Centro-Oeste.
188
Grfico 78 Distribuio das designaes para estrela da tarde Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel faixa etria.
189
Grfico 79 Distribuio das designaes para estrela da tarde Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel faixa etria.
191
14
Grfico 80 Distribuio percentual das designaes para estrela da tarde Estado de
Gois, segundo a varivel faixa etria.
192
Grfico 81 Distribuio das designaes para estrela da tarde no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel sexo.
193
Grfico 82 Distribuio das designaes para estrela da tarde no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel sexo.
194
Grfico 83 Distribuio das designaes para estrela da tarde no Estado de Gois,
segundo a varivel sexo.
195
Grfico 84 Distribuio das designaes para estrela da tarde no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel escolaridade.
196
Grfico 85 Distribuio das designaes para estrela da tarde no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel escolaridade.
197
Grfico 86 Distribuio das designaes para estrela da tarde no Estado de Gois,
segundo a varivel escolaridade.
198
Grfico 87 Produtividade das designaes para estrela cadente nas capitais da
regio Centro-Oeste.
202
Grfico 88 Produtividade das designaes para estrela cadente no interior da
regio Centro-Oeste.
203
Grfico 89 Distribuio das designaes para estrela cadente Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel faixa etria.
204
Grfico 90 Distribuio das designaes para estrela cadente Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel faixa etria.
205
Grfico 91 Distribuio das designaes para estrela cadente Estado de Gois
segundo a varivel faixa etria.
206
Grfico 92 Distribuio das designaes para estrela cadente no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel sexo.
208
Grfico 93 Distribuio das designaes para estrela cadente no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel sexo.
209
Grfico 94 Distribuio das designaes para estrela cadente no Estado de Gois,
segundo a varivel sexo.
210
Grfico 95 Distribuio das designaes para estrela cadente no Estado de Mato
Grosso do Sul, segundo a varivel escolaridade.
211
Grfico 96 Distribuio das designaes para estrela cadente no Estado de Mato
Grosso, segundo a varivel escolaridade.
212
Grfico 97 Distribuio das designaes para estrela cadente no Estado de Gois,
segundo a varivel escolaridade.
213
15
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ALF Atlas Lingustico da Frana
ALiB Atlas Lingustico do Brasil
CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior
CO Centro-Oeste
GO Gois
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
MS Mato Grosso do Sul
MT Mato Grosso
QFF Questionrio fontico-fonolgico
QSL Questionrio semntico-lexical
UFMS Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
16
SUMRIO
INTRODUO 20
CAPTULO 1 FUNDAMENTOS TERICOS 23
1.1 Norma lingustica: fundamentos 23
1.1.1 Norma lexical regional: contribuies da Dialetologia 26
1.2 Lxico e ambiente: alguns fundamentos 31
1.2.1 Rural e urbano: uma questo complexa 38
CAPTULO 2 BRASIL CENTRAL: CONTEXTUALIZAO
HISTRICO-GEOGRFICA
41
2.1 Estado de Mato Grosso 45
2.2 Estado de Gois 51
2.3 Estado de Mato Grosso do Sul 56
CAPTULO 3 CONSIDERAES METODOLGICAS 61
3.1 Universo pesquisado 61
3.2 Procedimentos metodolgicos adotados na pesquisa 64
3.3 Banco de dados: descrio 65
3.4 Corpus da pesquisa e anlise 70
CAPTULO 4 ANLISE DOS DADOS 72
4.1 rea semntica acidentes geogrficos QSL 001 ...um rio pequeno, de uns
dois metros de largura.
74
4.1.1 Anlise diatpica 74
4.1.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 74
4.1.1.2 Localidades do interior dos trs estados da regio Centro-Oeste 75
4.1.2 Dimenso diageracional 77
4.1.3 Dimenso diassexual 80
4.1.4 Dimenso diastrtica 84
4.1.5 Abordagem lxico-semntica 87
4.2 rea semntica fenmenos atmosfricos QSL 002 ....tronco, pedao de
pau ou tbua que serve para passar por cima de um crrego.
90
17
4.2.1 Anlise diatpica 90
4.2.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 90
4.2.1.2 Localidades do interior dos trs estados da regio Centro-Oeste 91
4.2.2 Dimenso diageracional 92
4.2.3 Dimenso diassexual 95
4.2.4 Dimenso diastrtica 99
4.2.5 Abordagem lxico-semntica 102
4.3 rea semntica fenmenos atmosfricos QSL 11 ....uma chuva com vento
forte e que vem de repente.
105
4.3.1 Anlise diatpica 105
4.3.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 105
4.3.1.2 Localidades do interior dos trs estados da regio Centro-Oeste 106
4.3.2 Dimenso diageracional 108
4.3.3 Dimenso diassexual 111
4.3.4 Dimenso diastrtica 113
4.4 rea semntica fenmenos atmosfricos QSL 13 ....uma chuva de pouca
durao, muito forte e pesada
116
4.4.1 Anlise diatpica 116
4.4.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 116
4.4.1.2 Localidades do interior dos trs estados da regio Centro-Oeste 118
4.4.2 Dimenso diageracional 119
4.4.3 Dimenso diassexual 122
4.4.4 Dimenso diastrtica 125
4.5 rea semntica fenmenos atmosfricos QSL 14 ....uma chuva forte e
contnua
128
4.5.1 Anlise diatpica 128
4.5.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 128
4.5.1.2 Localidades do interior dos trs estados da regio Centro-Oeste 130
4.5.2 Dimenso diageracional 131
4.5.3 Dimenso diassexual 134
4.5.4 Dimenso diastrtica 136
4.6 rea semntica fenmenos atmosfricos QSL 15 Durante uma chuva,
podem cair bolinhas de gelo. Como chamam essa chuva
139
4.6.1 Anlise diatpica 139
18
4.6.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 1139
4.6.1.2 Localidades do interior dos trs estados da regio Centro-Oeste 141
4.6.2 Dimenso diageracional 142
4.6.3 Dimenso diassexual 146
4.6.4 Dimenso diastrtica 150
4.6.5 Abordagem lxico-semntica (perguntas 011-013-014-015) 153
4.7 rea semntica fenmenos atmosfricos QSL 017 Quase sempre, depois
de uma chuva, aparece no cu uma faixa com listras coloridas e curvas. Que
nomes do a essa faixa?
155
4.7.1 Anlise diatpica 155
4.7.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 155
4.7.1.2 Localidades do interior dos trs estados da regio Centro-Oeste 157
4.7.2 Dimenso diageracional 158
4.7.3 Dimenso diassexual 162
4.7.4 Dimenso diastrtica 165
4.7.5 Abordagem lxico-semntica 168
4.8 rea semntica astros e tempo QSL 29 De manh cedo, uma estrela
brilha mais e a ltima a desaparecer. Como chamam esta estrela?
172
4.8.1 Anlise diatpica 172
4.8.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 172
4.8.1.2 Localidades do interior dos trs estados da regio Centro-Oeste 173
4.8.2 Dimenso diageracional 175
4.8.3 Dimenso diassexual 179
4.8.4 Anlise diastrtica 181
4.8.5 Abordagem lxico-semntica 184
4.9 rea semntica astros e tempo QSL 30 De tardezinha, uma estrela
aparece antes das outras, perto do horizonte, e brilha mais. Como chamam esta
estrela?
187
4.9.1 Anlise diatpica 187
4.9.1.1 Capitais da regio Centro-Oeste 187
4.9.1.2 Localidades do interior da regio Centro-Oeste 188
4.9.2 Dimenso diageracional 189
4.9.3 Dimenso diassexual 192
4.9.4 Anlise diastrtica 196
4.9.5 Abordagem lxico-semntica 199
4.10 rea semntica astros e tempo QSL 31 De noite, muitas vezes pode-se 202
19
observar uma estrela que se desloca no cu, assim, e faz um risco de luz. Como
chamam isso?
4.10.1 Anlise diatpica 202
4.10.1.1. Capitais da regio Centro-Oeste 202
4.10.1.2 Localidades do interior da regio Centro-Oeste 203
4.10.2 Dimenso diageracional 204
4.10.3 Dimenso diassexual 207
4.10.4 Anlise diastrtica 211
4.10.5 Abordagem lxico-semntica 214
CONSIDERAES FINAIS 217
REFERNCIAS 220
ANEXO 224
20
INTRODUO
A lngua considerada uma instituio social, o veculo das ideologias, o
instrumento de mediao entre os homens e a natureza, os homens e os outros homens
(FIORIN, 1998, p. 6) possui forte ligao com o ambiente fsico e o contexto social,
cultural e ideolgico dos falantes, podendo, assim, ser concebida como guia para a
realidade social (SAPIR, 1969, p.20). Deste modo, as escolhas lexicais de determinado
grupo podem refletir aspectos de suas crenas e ideologias e do ambiente natural em que
est inserido.
Ao examinar o lxico, possvel reconhecer particularidades referentes norma
lingustica, uma vez que cada grupo possui hbitos particulares que os caracterizam.
Entre os ramos da Lingustica, a Dialetologia estuda predominantemente o fenmeno da
variao espacial das lnguas, tendo como base a modalidade oral, sendo assim, estuda
tambm o lxico e as relaes do repertrio lexical dos falantes com o ambiente fsico e
cultural em que se encontram.
Esta dissertao tem como objeto de estudo a norma lexical dos habitantes da
regio Centro-Oeste, medida que tem como foco central o estudo do lxico
relacionado natureza, reas semnticas dos acidentes geogrficos, fenmenos
atmosfricos e astros e tempo. O estudo analisou dados inditos do Projeto Atlas
Lingustico do Brasil (Projeto ALiB), de carter nacional e interinstitucional que tem
como objetivo principal descrever o portugus do Brasil falado em todo o territrio
brasileiro. Os dados foram coletados pela equipe de pesquisadores do projeto ALiB com
o auxlio de um Questionrio Lingustico, que rene trs questionrios bsicos, o
fontico-fonolgico (QFF), o semntico-lexical (QSL) e o morfossinttico (QMS), alm
das questes de prosdia, de perguntas metalingusticas e de pragmtica, de temas para
discursos semidirigidos e do texto para a leitura. As perguntas selecionadas para este
estudo pertencem ao Questionrio Semntico-Lexical (QSL).
Para a constituio do corpus aqui estudado foram selecionadas as respostas para
38 perguntas do Questionrio Semntico-Lexical (QSL), recolhidas por meio de
entrevistas com 108 falantes naturais de 24 localidades 3 capitais e 21 localidades do
interior dos trs estados da regio Centro-Oeste. Essas perguntas esto assim
distribudas, em termos de reas semnticas: acidentes geogrficos (QSL 01 a QSL O6),
fenmenos atmosfricos (QSL 07 a QSL 21) e astro e tempo (QSL 22 a QSL 38).
21
A escolha dessas reas semnticas se deu em virtude de elas abarcarem
perguntas que buscam designativos relacionados a elementos da natureza, o que permite
verificar como o homem urbano concebe a realidade que o cerca, como tambm
analisar aspectos da influncia do ambiente nas escolhas lexicais de falantes do Centro-
Oeste brasileiro.
Justifica-se a escolha dessa regio brasileira como universo de pesquisa pelas
seguintes razes: possui uma economia centrada em atividades que permitem a
interao do homem com o ambiente (agricultura, pecuria); o cenrio rural presena
marcante e significativa no cotidiano de considervel parcela da populao, inclusive
urbana, ou seja, o contato com referentes relacionados ao meio ambiente fsico e,
consequentemente, com o conhecimento lingustico relativo a esse universo representa
um saber popular e pode evidenciar mudanas em termos de viso de mundo e de
hbitos da populao.
A pesquisa tem como suporte terico e metodolgico a Dialetologia, a
Etnolingustica, a Lexicologia e a Geolingustica, ramos da Lingustica que
contriburam para que os dados pudessem ser analisados segundo as perspectivas
delineadas. A Ecolingustica tambm foi uma linha terica que contribuiu de maneira
significativa para a compreenso de aspectos da relao entre o homem e o ambiente no
qual est inserido.
Alm disso, considerando a natureza dos dados examinados, tornou-se
necessrio a busca de informaes acerca das caractersticas geogrficas e da histria
social da regio Centro-Oeste, mais especificamente das 24 localidades da rede de
pontos do Projeto ALiB, onde foram coletados os dados. Para tanto, foram buscadas
informaes relacionadas a outras reas do saber como a Histria, a Geografia, dentre
outras.
Desse modo, para relacionar aspectos geogrficos, histricos e culturais ao
repertrio lexical do grupo investigado foi necessria a busca de conhecimentos
lingusticos e scio-histricos acerca da regio brasileira delimitada para a pesquisa que,
por sua vez, teve como foco principal analisar a relao entre lxico e ambiente com
base no vocabulrio relacionado natureza (acidentes geogrficos, fenmenos
atmosfricos e astros e tempo), nas perspectivas diatpica e lxico-semntica, como
tambm verificar aspectos da relao entre as dimenses rural e urbana que se
manifestam na maneira como o homem urbano nomeia aspectos da natureza.
J em termos especficos, a pesquisa estabeleceu os seguintes objetivos: a)
catalogar unidades lexicais relacionadas s reas semnticas selecionadas documentadas
22
no Centro-Oeste brasileiro; b) analisar os itens lexicais catalogados dos pontos de vista
diatpico, histrico e semntico; c) verificar semelhanas e diferenas em termos da
norma lexical entre os habitantes dos trs estados da regio Centro-Oeste para nomear
elementos do ambiente natural; d) identificar a presena de traos rurais nos dados
recolhidos, bem como aspectos da relao entre o conhecimento do referente e a forma
de nome-lo.
Enfim, a pesquisa pretende contribuir para a descrio lexical do portugus
falado na regio selecionada, ampliando os estudos relacionados s reas semnticas
pesquisadas e, consequentemente, incentivar futuras pesquisas acerca dessa temtica.
Em virtude de a proposta estar vinculada a um projeto mais amplo e utilizar como fonte
dados inditos desse projeto, o resultado da pesquisa contribuir com a equipe de
pesquisadores do Projeto ALiB, no que diz respeito exegese de um recorte de dados
lexicais representativos de uma regio brasileira.
Esta dissertao est organizada em quatro captulos. O Captulo 1 trata da
fundamentao terica que embasou a pesquisa, focalizando aspectos tericos
vinculados norma lingustica, com nfase para a norma regional; fundamentos terico-
metodolgicos da Dialetologia, da Ecolingustica, da Etnolingustica e da
Geolingustica; concepes de lngua, de lxico e sua respectiva relao com o ambiente
que circunda o falante tambm so discutidas nesse captulo. Focalizam-se tambm
aspectos da complexidade da relao entre meio rural e meio urbano. O captulo 2, por
sua vez, apresenta uma breve contextualizao histrica e geogrfica dos trs estados
que integram a rea da pesquisa, enquanto o captulo 3 descreve a metodologia adotada
para a realizao da pesquisa. A anlise dos dados foi apresentada no Captulo 4 e
considerou as dimenses diatpica, diageracional, diastrtica, diassexual e, tambm,
aspectos semnticos das unidades lexicais apuradas como respostas para as perguntas
selecionadas. Por fim, so apresentadas as consideraes finais, as referncias que
embasaram a pesquisa e o anexo que contm a Declarao de autorizao de utilizao
do corpus indito do Projeto ALiB.
23
CAPTULO 1 FUNDAMENTOS TERICOS
Este captulo aborda pressupostos tericos relacionados ao conceito de norma
lingustica, particularmente fundamentos relacionados configurao da norma lexical
brasileira e dos regionalismos. Ao abordar os regionalismos, faz-se necessrio discutir
aspectos referentes aos estudos dialetolgicos, como tambm fundamentos tericos das
reas do saber que tm como objeto de estudo o lxico.
Por fim, foi discutida a relao entre lxico e ambiente rural e urbano, noes
tericas que subsidiaram a anlise dos dados.
1.1 Norma lingustica: fundamentos
Ao discutir a questo da norma, primeiramente faz-se necessrio considerar a
questo da variao, j que as particularidades no uso de uma lngua so resqucios dos
contatos intertnicos que se processaram na histria social da populao. No caso do
Brasil, desde o perodo colonial, quando ocorreu o incio da formao da populao
brasileira, houve o contato de basicamente trs bases tnicas: o branco, o negro e o
ndio, o que desencadeou a miscigenao lingustica e cultural to caracterstica do
homem brasileiro. A heterogeneidade foi uma constante no territrio recm-descoberto
e a lngua e a religio foram mecanismos utilizados pelo colonizador como instrumento
de domnio e de opresso. A interao lingustica entre colonizados e colonizadores foi
o grande desafio inicial, tanto que surgiu uma lngua geral que por muito tempo
promoveu a comunicao na colnia:
A lngua que predominou at quase o fim do sculo XVII foi a
denominada lngua geral uma lngua franca desenvolvida entre as
naes indgenas tupinamb ao longo da costa atlntica e adotada
pelos colonizadores, especialmente os jesutas engajados na
cristianizao dos nativos (BORTONI-RICARDO, 2011, p.27).
Na verdade, houve, desde o incio do povoamento do territrio brasileiro, o
convvio entre diversas normas em um mesmo espao geogrfico, j que a ao de
desbravadores das mais variadas nacionalidades foi decisiva para o desenvolvimento
econmico do Brasil colnia, ou seja:
Todos estes contatos etnolingusticos verificados no Brasil-colnia
favoreceram o caldeamento das diferentes etnias e a constituio de
uma sociedade hbrida, multifacetada, com caractersticas diferentes
24
da portuguesa que desenvolveu um podo peculiar de falar com
inmeros vocbulos que passaram a caracterizar o portugus do Brasil
(OLIVEIRA, p. 04, 1999).
Compreende-se, por norma lingustica, o modo de determinado grupo se
comunicar por meio de uma lngua em seus diferentes nveis (fonolgico, sinttico,
morfolgico e lexical) e cujas realizaes podem ser verificadas e estudadas em uma
comunidade especfica, pois se tornam normal naquele espao geogrfico. Partilhando
desse pensamento, Faraco (2008, p.37) pondera que
[...] possvel, conceituar tecnicamente norma como determinado
conjunto de fenmenos lingusticos (fonolgicos, morfolgicos,
sintticos e lexicais) que so correntes, costumeiros, habituais numa
dada comunidade de fala. Normal nesse sentido se identifica com
normalidade, ou seja, com o que corriqueiro, usual, habitual,
recorrente (normal) numa certa comunidade de fala.
.
O conceito de norma1 lingustica foi sistematizado por Coseriu (1979), no
mbito do Estruturalismo, ao propor uma nova leitura para o modelo binrio lngua e
fala de Saussure (2006)2. Para o autor, entre a fala, nvel concreto, e a lngua, nvel
abstrato, h um grau intermedirio, a norma, de carter coletivo, isto , de aceitao de
determinado grupo social, tambm de carter abstrato. Ainda para Coseriu (1979), a
variao e a mudana so fatos inerentes prpria essncia da lngua.
Aps 1950, com a nova viso de norma proposta por Coseriu (1979), ocorre uma
ampliao no conceito de lngua, j que o modelo estruturalista estava centrado na
oposio langue/parole de Saussure, com nfase para o estudo da lngua em detrimento
do estudo da fala. J a tricotomia coseriana sistema/norma/fala abarca os fatos da lngua
e da fala, sendo a norma uma espcie de norma social da linguagem, especfica de uma
comunidade:
[...] a distino entre norma e sistema esclarece melhor o
funcionamento da linguagem, a atividade lingustica, que , ao mesmo
tempo, criao e repetio (re-criao), dentro do padro e segundo as
coordenadas do sistema funcional (isto , do que imprescindvel para
que a linguagem cumpra sua funo); movimento obrigado e
movimento livre, dentro das possibilidades oferecidas pelo sistema.
(COSERIU, 1979, p.79).
O mesmo estudioso confirma a dificuldade de sustentao da oposio entre
lngua e fala, tema esse que foi objeto de estudo de muitos tericos da poca:
A concepo a que chegamos tem antecedentes, em primeiro lugar,
nas dificuldades que se encontram na definio dos conceitos de
1 Louis Hjelmslev (1971, p.80) o responsvel pela 1 formulao da proposta tricotmica:
lingua/norma/fala. 2 A primeira edio da obra pstuma sobre o pensamento de Saussure foi publicada em 1916 (Cours de
Linguistique gnrale). Para este trabalho foi consultada a 27 edio brasileira (2006).
25
lngua e fala, introduzidos na cincia lingustica por Ferdinand de
Saussure e logo aceitos ou reelaborados por toda uma srie de
lingistas, discpulos ou no do mestre genebrino (COSERIU, 1979,
p.18-19).
Cabe ressaltar que, para Saussure, a lngua se configura como acervo lingustico,
instituio social e sistema funcional. No se deve entender lngua e fala como
realidades autnomas, j que a fala vista como realizao da lngua e a lngua como
condio da fala, ou seja, so indissociveis. Coseriu (1979, p. 77) assim complementa
o conceito de lngua:
Em outras palavras, o conceito de lngua no analtico, mas
descritivo e sinttico, constituindo-se como sistema de aspectos
comuns, sistema de isoglossas, sobre a base do que chamamos
material lingustico (soma de atos lingusticos). Por isso dizamos
que mais do que lingustica terica, o conceito de lngua corresponde
lingustica histrica, o produto fundamental desta.
A fala, por sua vez, est intimamente relacionada lngua, uma vez que a
primeira componente indispensvel para que a segunda se efetive, ou seja, uma no
existe sem a outra. O linguista romeno ainda faz distino entre norma e sistema,
concebendo os dois conceitos correspondentes a um estado de lngua, que contribuiu
para a compreenso da mudana lingustica. Desse modo,
[...] vimos que o que se ope ao falante no o sistema (que se lhe
oferece), mas a norma. Pois bem, o falante tem conscincia do
sistema e o utiliza e, por outro lado, conhece ou no conhece, obedece
ou no obedece norma, mesmo mantendo-se dentro das
possibilidades do sistema [...] O indivduo, pois, altera a norma,
ficando dentro dos limites permitidos pelo sistema; mas a norma
reflete o equilbrio do sistema num determinado momento e alterando
a norma, altera esse equilbrio, at pender totalmente para um lado ou
para o outro (COSERIU, 1979, p.80).
Fica evidente que o sistema est em um nvel mais elevado e abstrato do que a
norma, pois rene os elementos disponveis ao falante, enquanto a norma est em um
nvel intermedirio e abstrato, uma vez que se refere maneira como usa a lngua, em
um determinado espao e/ou grupo social. Desse modo, a norma compreende os fatos
lingusticos que ocorrem em uma determinada localidade e/ou regio e o sistema s
possibilidades dos fatos que ainda iro se concretizar, ambos marcados pela abstrao.
Lara (1976), ao discutir a questo da norma, a define como
[...] un modelo, una regla o un conjunto de reglas con cierto grado de
obligatoriedad, impuesto por la comunidad linguistica sobre los
hablantes de una lengua, que actua sobre las modalidades de
actualizacin de su sistema lingustico, seleccionando de entre la
ilimitada variedad de posibles realizaciones en el uso, aquellas que
considera aceptables (LARA, 1976, p.110).
26
Nota-se que o autor reitera que a norma de carter limitado, uma vez que ela
seleciona quais realizaes so aceitveis em um espao especfico, tendo, pois, um
carter mais social. O sistema lingustico e os aspectos sociais seriam os componentes
de normas lingusticas que se concretizam em uma comunidade.
Faraco (2008), por sua vez, relaciona a norma na perspectiva brasileira aos
aspectos diversificados e contrastantes da sociedade, ressaltando a existncia de
diversas normas lingusticas num mesmo territrio, estando cada falante apto a dominar
mais de uma norma, pois [...] numa sociedade diversificada e estratificada como a
brasileira, haver inmeras normas lingusticas, como, por exemplo, normas
caractersticas de comunidades rurais tradicionais, aquelas de comunidades rurais de
determinadas ascendncia tnica, normas caractersticas de grupos juvenis urbanos [...]
(FARACO, 2008, p.42-43).
Biderman (2001) do mesmo modo discute a questo da norma e retoma a
tricotomia sistema-norma-fala de Coseriu (1979). A linguista destaca que o indivduo
no tem liberdade de escolhas, pois a norma norteia as possibilidades do sistema, j que
a norma varia segundo cada comunidade. Diferencia, tambm, norma geral de normas
parciais, a primeira relacionada nao e, a segunda, a pequenos grupos que fazem
parte do convvio geral (BIDERMAN, 2001, p.20).
Deste modo, ao centrar-se na norma lexical dos habitantes da regio Centro-
Oeste e por utilizar dados de natureza geolingustica, este estudo buscou apresentar
traos lingustico-culturais e caractersticas da formao de possveis normas regionais,
contribuindo, assim, para o conhecimento do lxico da rea geogrfica em exame. O
prximo tpico discute a questo dos regionalismos e da contribuio da Dialetologia
para o registro e a classificao da norma lexical regional.
1.1.1 Norma lexical regional: contribuies da Dialetologia
As diferentes vertentes de pesquisas voltadas para os estudos do lxico tm
como base terica a Lexicologia, ramo do saber, cujo objeto de investigao o estudo
cientfico do lxico, por isso examina as relaes entre o repertrio lexical de uma
lngua e o mundo social e cultural que a circunda. A Lexicologia tem, pois, como
principal objeto de estudo a palavra e, por extenso, o lxico e sua estruturao,
medida que se ocupa do repertrio lexical dos falantes, incluindo a questo da
competncia lexical.
27
Em face disso, relaciona-se com outras disciplinas, como assegura Biderman
(2001, p.16): Ademais, a Lexicologia faz fronteira com cincias tais como a
Dialetologia, a Sociolingustica e a Etnolingustica; nessas reas disciplinares fizeram-se
estudos sobre Palavras e Coisas, isto , sobre as relaes entre a lngua e a cultura.
Com relao Sociolingustica, a mesma estudiosa considera os fatores externos como
importante mecanismo de compreenso sobre o funcionamento da lngua, viso
contrria do movimento estruturalista que vigorou por longo perodo. Elia (1987, p.40)
tambm destaca a viso dessa corrente lingustica acerca da lngua:
A Sociolingustica estuda as relaes entre lngua e sociedade. Aqui
lngua deve ser entendida como um sistema de vrios nveis,
integrados num todo historicamente estruturado. A Sociolingustica se
ocupa assim com o estudo da possvel incidncia das foras sociais
sobre os estratos fonolgico, morfolgico, sinttico e semntico das
lnguas.
J a Etnolingustica estuda o conhecimento que os indivduos acumulam ao
pertencerem a uma sociedade especfica e por meio das relaes sociais entre seus
semelhantes, ou seja, foca a anlise na relao entre a linguagem e a cultura que se
estabelece em determinada comunidade de falantes.
Outro ramo da Lingustica com interfaces com a Lexicologia, segundo Biderman
(2001), a Dialetologia que tem por objetivo estudar os acontecimentos lingusticos em
uma dada localidade, considerando sua histria, assim como os demais fatores
socioculturais que influenciam o uso da lngua. Segundo Cardoso (2008, p.24), os
[...] fatores sociais idade, gnero, escolaridade, profisso tm-se
constitudo em aspectos da variao que, de forma diferenciada e com
graus distintos de focalizao, vm ocupando lugar nos estudos
dialetais, especificamente naqueles que se desenvolvem sob a
metodologia geolingustica.
A Dialetologia centra-se, sobretudo, no estudo de aspectos variveis de um
sistema lingustico em relao distribuio geogrfica, medida que prioriza a anlise
diatpica. Para tanto, pauta-se em parmetros metodolgicos bem delimitados:
A Dialetologia busca, prioritariamente, estabelecer relaes entre
modalidades de uso de uma lngua ou de vrias lnguas, seja pela
identificao dos mesmos fatos, seja pelo confronto presena/ausncia de
fenmenos considerados em diferentes reas (CARDOSO, 2008, p.20-21).
Desse modo, o seu foco so os diferentes usos da lngua em uma determinada
regio, ou seja, h para a Dialetologia contempornea duas diretrizes a serem seguidas
no exame do fenmeno lingustico: a perspectiva diatpica e as dimenses sociais
herdadas da Sociolinguistica.
28
As manifestaes lingusticas em determinado espao previamente demarcado,
podem evidenciar tanto a presena quanto a ausncia de determinadas variantes, j que
o vazio geogrfico denunciador de informaes as mais diversas e pertinentes para o
confronto lingustico, do mesmo modo que o registro de usos (CARDOSO, 2010,
p.15). A distribuio das variantes relacionadas a um espao geogrfico em mapas
realizada pela Geografia Lingustica, mtodo da Dialetologia que, segundo
(ISQUERDO, 1998, p. 232), justifica-se, sobretudo, por, alm de registrar a lngua em
uso, possuir um carter documental, na medida em que registra formas lingusticas
utilizadas por falantes de uma poca e de um espao determinados.
Sendo assim ao reunir esses fenmenos, a Geolingustica os demonstra por meio
de cartas lingusticas que esto organizadas nos atlas lingustico, precioso inventrio de
formas, o atlas proporciona uma viso dinmica de cada fato descrito, pela comparao
simultnea com outros nele expostos, ensejando concluses tambm de natureza
histrica (BRANDO, 1993, p.11).
Os atlas lingusticos podem cobrir espaos geogrficos de maneiras distintas, por
isso podem ser classificados segundo sua abrangncia, o seu domnio, em atlas
lingusticos regionais, nacionais, de grupos lingusticos e continentais. O primeiro Atlas
lingustico classificado no grupo dos nacionais foi o Atlas Linguistique de la France
(ALF). A esse respeito, Cardoso (2010, p.74) esclarece que os atlas podem ser
classificados:
[...] pelos espaos geopolticos que recobrem uma regio, no
importando a sua dimenso, um pas ou um continente. Os atlas de
famlia de lnguas, ainda que no possam prescindir do espao
geopoltico para a sua conceituao o homem, portanto o falante de
toda e qualquer lngua, estar sempre situado num espao definido -,
tm como elemento fundamental na sua definio perseguir a
identidade lingustica que extrapolar, obviamente, fronteiras
polticas, ganhando conformao especfica.
Em termos histricos, a Frana o pas que serviu de bero para o incio da
Geolingustica no princpio do sculo XX, com as pesquisas dialetolgicas do francs
Jules Gilliern, com vistas produo do Atlas Lingustico da Frana (ALF), publicado
entre 1902 a 1910. Esse estudo foi uma importante contribuio para o campo de
investigaes sobre a variao diatpica medida que Gilliern foi considerado o
fundador da Geografia Lingustica, rea do saber que se configurou como um novo
mtodo de investigao lingustica, pois, para Cardoso (2010, p.46)
[...] se as diferenas espaciais ganham destaque em relao s demais
porque, na realidade dos fatos, as evidncias de aproximao ou
distanciamento dos fenmenos assumem expresso de maior nitidez e
29
de mais fcil percepo nos espaos fsicos, portanto geogrficos. Tal
viso conduziu a que os estudos geolingusticos aflorassem em todos
os continentes e apresentassem um continuado e crescente
desenvolvimento, o que explica a expanso de projetos que levaram
construo de atlas lingsticos com diferenciadas vises espaciais.
Com relao ao Brasil, a primeira manifestao relacionada aos estudos de
natureza dialetal deve-se a Domingos Borges de Barros, mais conhecido como Visconde
de Pedra Branca, no ano de 1826 que publicou um estudo no livro de Adrien Balbi.
Contemporaneamente Ferreira e Cardoso (1994) dividem a histria da
Dialetologia no Brasil em trs fases: a primeira fase o perodo de 1826 a 1920, ano em
que foi publicado o livro O dialeto caipira de Amadeu Amaral (1982) e foi um perodo
com estudos mais voltados para o lxico; a segunda fase de 1920 at 1952 (perodo
marcado pelo desenvolvimento de estudos de carter monogrfico).
A terceira fase foi marcada pelo decreto n 30.643 de 20 de maro de 1952 que
criou a Comisso de Filologia da Casa de Rui Barbosa, cuja finalidade principal era a
elaborao do Atlas Lingustico do Brasil. Todavia, a partir de 1996 comea a se
desenhar uma nova fase na histria da Geolingustica no Brasil com o lanamento
retomada do Projeto Atlas Lingustico do Brasil. Essa data marca o incio da quarta fase
dos estudos de natureza dialetolgica, pois, como afirmam Motta e Cardoso (2006, p.
24), [...] a nova postura metodolgica impressa ao ALiB pelo tratamento
pluridimensional dado aos fatos geolingusticos, vm, por outro lado, confirmar a
escolha do Projeto ALiB como marco divisrio entre as duas fases.
Sendo assim, a Dialetologia apresentou mudanas em seus fundamentos
metodolgicos com o decorrer do tempo, haja vista que, no sculo XIX, era um campo
de estudo voltado para uma populao tipicamente rural e, em sua grande maioria, com
baixa e/ou nenhuma escolaridade. Assim, a chamada dialetologia tradicional era
restrita aos dados recolhidos em zonas rurais. J a viso atual bem distinta, pois
considera que o falante influenciado diretamente pelos meios de comunicao, fator
que garante certa internacionalizao da Lngua Portuguesa em aspectos de vocabulrio.
Alm da varivel diatpica, a Dialetologia considera as variveis sociais na definio do
perfil do informante.
A Dialetologia contempornea abarca tambm estudos em localidades urbanas, o
que possibilita que aspectos dos processos de povoamento das localidades, os fluxos
migratrios presentes no territrio a ser investigado contribuem ainda mais para fins de
anlises dialetais e lingusticas e tambm com influncias da mdia, da escola e das
tecnologias, sendo que cada vez mais tende a incluir entre as localidades a serem
30
investigadas tambm aquelas de povoamento mais recente [...] (ISQUERDO, 2008,
p.112).
Nota-se, portanto, que o desenvolvimento tanto intelectual quanto cientfico da
sociedade contribuiu para que as pesquisas dialetais adquirissem um aspecto
pluridimensional, em virtude da dinamicidade da lngua e a questo diatpica que
deixou de ser o nico aspecto a ser considerado num espao geogrfico delimitado.
Partilhando dessa concepo, Harald Thun (2000) assegura no haver uma
estaticidade dos fenmenos lingusticos descritos que, por sua vez, so influenciados
pela histria, pela cultura. Conforme o mesmo autor, a Dialetologia monodimensional
se diferenciou da pluridimensional pela arealizao complexa, pela desarealizao e
pela quantificao (THUN, 2000, p.78).
Nesse contexto, os fatores extralingusticos, descritos pela Sociolingustica,
tornam-se importantes mecanismos para aperfeioar a metodologia das pesquisas
dialetolgicas. Na atualidade, a Dialetologia, em termos terico-metodolgicos se
aproxima da Sociolingustica, uma vez que para Cardoso (2010, p.25)
[...] a dialetologia no pde deixar passar ao largo a considerao de
fatores extralingsticos, inerentes aos falantes, nem relegar o
reconhecimento de suas implicaes nos atos de fala. Dessa forma,
idade, gnero, escolaridade e caractersticas gerais de cunho
sociocultural dos usurios da lngua consideradas tornam-se elementos
de investigao, convivendo com a busca de identificao de reas
geograficamente definidas do ponto de vista dialetal.
Assim, ao investigar a realidade lingustica de determinado espao fsico
possvel obter marcas lingusticas desse espao, ou seja, ter acesso a traos
lingusticos especficos e, consequentemente, relacionar aos regionalismos.
Sabe-se que ao confrontar povos ou populaes culturalmente distintos tem-se a
possibilidade de determinadas situaes existenciais de um grupo ser aceita ou no pelo
outro, gerando, assim, mudanas na norma lingustica, no caso do Brasil, essa
miscigenao de etnias gerou particularidades que se manifestam de formas distintas,
consoante a regio, nos hbitos lingustico-culturais da populao brasileira.
(ISQUERDO, 2003, 167).
As diferenas lingusticas em determinada localidade/ou regio caracterizam os
regionalismos, Biderman (2001, p.136), pautando-se em Boulanger (1985), define
regionalismo como [...] fato lingustico (palavra, expresso, ou seu sentido) prprio de
uma ou de outra variedade regional do Portugus do Brasil, com exceo da variedade
usada no eixo lingustico Rio/So Paulo, que se considera como o portugus brasileiro
padro.
31
Ao seguir o pensamento de Biderman (2001) que considera como padro a
variedade do eixo Rio/So Paulo, percebe-se uma postura mais ideolgica e poltica do
que lingustica, pois parte da crena de haver um padro lingustico que configura a
norma culta no portugus do Brasil, o que ainda no possvel ser delimitado em
virtude da inexistncia de uma descrio da norma culta em nvel nacional.
Pelo exposto, nota-se que mltiplos falares podem ser influenciados por fatores
como idade, sexo, nvel socioeconmico, ambiente, seja ele urbano ou rural, pois traos
de ruralidade no lxico contribuem com o fenmeno da variao.
A discusso do tema lxico regional exige do pesquisador a recuperao da
histria social, em particular da regio pesquisada. Nesse particular, a discusso das
regies culturais do Brasil feita por Diegues Junior (1960) contribui para a compreenso
de processos de colonizao e de respectiva relao com as atividades econmicas que
serviram como parmetro para a proposta de diviso feita em dez regies culturais
brasileiras: nordeste agrrio do litoral, mediterrneo pastoril, Amaznia, minerao,
centro-oeste, extremo-sul pastoril, colonizao estrangeira, caf, cacau e sal.
Tanto a diversidade de atividades econmicas quanto a riqueza em fauna, flora e
caractersticas geomorfolgicas contriburam para se obter hbitos distintos da
populao em anlise e, consequentemente, formas especficas de nomeao.
1.2 Lxico e ambiente: algumas relaes
A busca pela interao com o ambiente e a preocupao com o fortalecimento da
comunicao com seus semelhantes sempre foi um dos objetivos perseguidos pelo
homem desde tempos remotos. A linguagem em suas vrias modalidades (verbal e no
verbal) tem sido cada vez mais desenvolvida, manifestada e, acima de tudo, valorizada
pelos investigadores da lngua. Nesse sentido, Biderman (2001, p.03) afirma que a
linguagem manifestando-se na fala, ou na escrita, constitui a nossa nica fonte de acesso
realidade imaterial que a lngua.
A lngua, linguagem articulada, vista como elemento de interao entre o
homem e a sociedade, j que utilizada tambm como veculo de comunicao e um
produto social [...] a lngua desempenha um papel preponderante, seja em sua forma
oral, seja atravs de seu cdigo substitutivo escrito. E, atravs dela, o contato com o
mundo que nos cerca permanentemente atualizado (PRETI, 1975, p.02).
Ao veicular crenas e ideologias, a lngua perpetua a viso de mundo de
diferentes grupos em pocas distintas e se adapta s mudanas da sociedade ao longo do
32
tempo, dissemina conhecimentos e tradies de seus usurios. Nessa perspectiva,
Malmberg (1970, p.15) acrescenta que
[...] a lngua , entre outras coisas, todo o mundo conceptual e
ideolgico que expressa a tradio cultural de um povo ou de um
determinado grupo lingstico, e, portanto, no admite ser descrita
com exatido a no ser como parte de um esquema cultural geral.
As modificaes ocorridas na sociedade ao longo do tempo se materializam de
maneira acentuada no nvel lexical, sendo este altamente dinmico, o que permite
investigaes a partir de diferentes perspectivas e variadas nuanas. Biderman (2001,
p.12) o define como [...] um sistema aberto com permanente possibilidade de
ampliao, medida que avana o conhecimento, quer se considere o ngulo coletivo da
comunidade lingustica.
Com relao dinamicidade e heterogeneidade do acervo vocabular partilhado
por uma comunidade de falantes e possibilidade de novas unidades lexicais serem
incorporadas a esse repertrio, Peixoto (2007, p. 22) assegura o seguinte:
[...] o lxico corresponde no apenas a uma mera lista de palavras e
seus significados, onde se tem acesso consulta de sua sinonmia, sua
formao e composio, como um conjunto de catalogaes
cristalizadas, expostas a uma espcie de dissecao, mas muito mais a
um universo lingstico em que palavras j existentes, palavras novas
e aquelas que ainda esto por se criar esto a dispor do falante e ao
mesmo tempo o condicionam.
Em decorrncia desse processo de renovao que decorre de sociais, histricos,
culturais, geogrficos, dentre outros, o repertrio lexical de determinado grupo molda-se
segundo normas sociais impostas pela coletividade, uma vez que
[...] o lxico de uma lngua de cultura atesta o modo de vida e a
imagem de mundo que individualiza um determinado grupo social,
tornando-se assim, em vista disso, uma espcie de documento vivo da
prpria histria desse grupo, assim como de todas as normas sociais
que o regem (ISQUERDO, 2003, p.178).
Essa intrnseca relao entre lxico e sociedade possibilita o processo de
expanso lexical, uma vez que, ao manter contato com novos referentes, os usurios
necessitam ampliar o acervo vocabular disponvel, razo pela qual, a presena de
neologismos constante nas lnguas. Segundo Alves (2007, p.05), ao processo de
criao lexical d-se o nome de neologia. O elemento resultante, a nova palavra,
denominado neologismo.
A mesma pesquisadora esclarece que esse fenmeno pode ocorrer por meio de
quatro mecanismos: neologismos fonolgicos, neologismos sintticos (formados por
33
derivao prefixal, sufixal ou composio), neologismos semnticos e neologismos por
emprstimo. Este ltimo ocorre, sobretudo, por emprstimo da lngua inglesa.
Desde a Antiguidade, o homem sempre manteve uma relao intrnseca com o
ambiente onde se insere, j que a relao homem-natureza to antiga quanto a prpria
existncia humana. Desse modo, no h como dissociar as aes ocorridas no meio
natural da histria social do homem.
Na Antiguidade, a dependncia do homem em relao natureza motivou o
surgimento de inmeras crenas em divindades que protegiam as colheitas, os rios, as
chuvas, dentre outros aspectos. Sabe-se que o Egito Antigo se manteve no entorno do
Rio Nilo, o que contribuiu para o desenvolvimento da agricultura e para uma melhor
organizao dos primeiros aglomerados humanos na regio. Para Faber (2014, p.10), o
desenvolvimento da agricultura foi essencial para que as tribos que habitavam a regio
passassem a se organizar de forma mais complexa. Afinal, agora era necessrio
contabilizar a produo agrcola que era produzida de forma coletiva.
Com relao, especificamente, ao Brasil, os rios foram e continuam sendo
utilizados em vrias regies como acesso do homem a determinadas localidades, como
via de circulao e escoamento de produtos, produo de energia eltrica e tambm para
explorao da pesca. Em virtude das diversas bacias hidrogrficas que banham o
territrio brasileiro, h muitos rios de suma importncia para o desenvolvimento
econmico do pas, como por exemplo, os rios Amazonas, Paran, So Francisco, Tiet,
Tocantins e Paraguai, dentre outros.
Com isso, a hidrografia, o clima, a flora, a fauna, a geomorfologia dos lugares
podem influenciar de maneira direta e significativa o lxico dos falantes de uma regio
e, consequentemente, o processo de nomeao da realidade por grupos lingusticos
especficos. Nessa perspectiva, pelo fato de este trabalho ter como um de seus objetivos
examinar aspectos da relao entre o lxico e o ambiente, faz-se necessrio discutir aqui
diversas concepes de meio ambiente.
Houaiss (2001) define o termo ambiente como tudo o que envolve os seres
vivos ou as coisas, ou seja, constitui o meio em que se vive. Ainda na mesma linha,
Ferreira (2004) registra no verbete ambiente a seguinte acepo: aquilo que cerca ou
envolve os seres vivos ou as coisas; meio ambiente. Percebe-se, assim, a viso
generalista de ambiente presente nas definies desse item lexical nessas obras
lexicogrficas de Lngua Portuguesa, pois designa desde os seres vivos at as coisas que
com eles se relacionam.
34
Do ponto de vista da Ecologia, meio ambiente definido como reunio do
ambiente fsico e seus componentes biticos (GRISI, 2007, p.157). O mesmo autor
aponta a existncia de muitas discusses em torno da definio de meio ambiente, haja
vista as amplas dimenses que o envolvem, algumas dessas inerentes ao ambiente
humano. Por a Ecologia ser a cincia que tem por objeto central de estudo as condies
de existncia dos seres vivos e tambm as interaes entre eles e seu meio
compreensvel a dificuldade em se definir com preciso o termo meio ambiente e a
existncia de controvrsias relacionadas a essa temtica.
Para Grisi (2007), a descrio das relaes dos organismos entre si e com o meio
teve incio na histria natural com os gregos, porm, com o passar do tempo, foi
adquirindo novas bases e aperfeioando os estudos relacionados a essa temtica.
Assim como a Ecologia, a Geografia tambm se preocupa com o ambiente, j
que tem como objeto central de anlise o espao que, por sua vez, engloba o social e o
natural. Para tanto, mantm forte relao com as cincias sociais e naturais. Sabe-se
que, mesmo em regies urbanizadas, os fenmenos fsicos por mais afetados que
estejam pela ao do homem, ainda continuam ocorrendo e influenciando o cotidiano
das pessoas.
Deste modo, comum ocorrer nas metrpoles alteraes no relevo, devido
construo de prdios, crregos e rios canalizados para a obteno de maior rea
asfaltada, porm, apesar de todas essas modificaes dos elementos naturais, as chuvas,
dentre outros fenmenos, no deixam de ocorrer.
Percebe-se, pois, que analisar os acontecimentos que ocorrem na natureza e na
sociedade tarefa rdua que exige muita ateno e comprometimento, sendo o trabalho
dos gegrafos de grande importncia para a humanidade, pois, como pondera Sorre
(2003, p.137),
Geografia, no sentido etimolgico, significa descrio da Terra. E,
com um consenso geral da Terra, com tudo o que contm e do que
inseparvel, de tudo o que vive na superfcie e a anima, da
humanidade que a transforma e a enriquece com traos novos. [...]
Enquanto a Geografia Fsica estuda os elementos inertes e a Geografia
Biolgica se ocupa dos seres vivos, a Geografia Humana a parte da
Geografia Geral que trata dos homens e suas obras desde o ponto de
vista de sua distribuio na superfcie terrestre.
H uma diviso disciplinar e histrica a respeito da Cincia Geogrfica, diviso
essa que resultado do trabalho de muitos pesquisadores, cada qual pensando e
moldando o espao geogrfico a sua maneira. A Geografia Fsica estuda o meio fsico
da Terra e denominada Cincia da Terra. Os elementos que estruturam o meio fsico, o
35
relevo, a fauna, a vegetao e o solo so elementos de interesse e de pesquisas para essa
rea do conhecimento.
Os manuais relacionados Geografia Fsica trazem como principais ramos dessa
subrea do conhecimento: a Geomorfologia (parte que estuda o relevo da Terra), a
Climatologia (cincia que estuda o clima e o tempo), a Hidrologia (estuda a distribuio
e propriedades da gua), a Biogeografia (tem por estudo a distribuio dos seres vivos
sobre o planeta Terra) e a Edafologia (estuda a composio da natureza do solo e sua
relao com as plantas).
J a Geografia Humana estuda a relao do homem com o meio ambiente em
que vive e o uso que este faz deste espao. O homem visto como agente transformador
de seu meio, sendo essas mudanas resultados de necessidades sociais. Desse modo,
elementos demogrficos, urbanos, rurais, culturais e polticos so analisados e levados
em considerao por esse ramo da geografia.
J em uma obra especfica da rea de Cincias Humanas e da Terra, o
Dicionrio Geolgico Geomorfolgico, o termo ambiente definido como o mesmo
que meio natural, isto , caracterizado pelos diversos elementos fsicos e biticos. As
formas de relevo, as rochas, os solos, os rios, os climas, a vegetao e a fauna
constituem elementos do meio fsico (GUERRA, 2003). Percebe-se, assim, uma
delimitao do objeto de estudo dessa parcela do conhecimento aqui exemplificado,
especificando que aspectos so relevantes e indispensveis para a constituio do meio
fsico.
Nesse contexto, infere-se que o estudo do lxico da populao de uma rea
geogrfica deve considerar a influncia de fatores culturais, histricos, sociais,
geogrficos, enfim, aspectos extralingusticos que interferem diretamente no uso de uma
lngua, j que a cada situao de fala em que nos inserimos e da qual participamos,
notamos que a lngua falada , a um s tempo, heterognea e diversificada
(TARALLO, 1986, p.06).
Ao investigar a interferncia da realidade fsica e sociocultural no lxico de um
grupo lingustico necessrio considerar a concepo estruturalista-empirista
desenvolvida pela Lingustica na Amrica que postulava que cada lngua deveria ser
tratada como um sistema mais ou menos integrado.
O Estruturalismo norte-americano se destacou na primeira metade do sculo XX
e teve como principais nomes: Franz Boas, Edward Sapir e Benjamin Lee Whorf que
estudaram lnguas indgenas, estudos esses com uma forte relao com a Antropologia.
36
Para Cmara Jnior (1986, p.186), os estudos de Boas influenciaram fortemente
o pensamento da poca acerca da lngua, pois
[...] desenvolveu uma viso geral sobre a linguagem, acentuando seu
carter de padronizao, a inconscincia desse padro, a no-
dependncia da estrutura lingstica da cultura ou da raa e a
possibilidade do emprstimo lingstico em uma escala muito mais
ampla do que a ortodoxia lingstica europia estava inclinada a
admitir. [...] sustentava que os pequenos grupos tribais dos ndios
americanos e a freqncia entre eles, de mulheres de outras tribos e
lnguas, favoreciam o emprstimo lingstico de maneira muito
significativa.
Ainda na linha terica estruturalista, os estudos de Boas influenciaram o
pensamento de Edward Sapir, medida que acreditava que os desenvolvimentos
histricos dependiam da interferncia de fatores culturais, ou seja, estabelecia a
autonomia do fenmeno cultural e, acima de tudo, defendia a influncia do meio
ambiente e de fatores biolgicos na formao das sociedades.
J Sapir postulava que a lngua mantinha relao com a cultura e com a
sociedade, pois para ele a lngua , antes de tudo, um produto cultural, ou social, e
assim deve ser entendida (SAPIR, 1969, p.26). Por extenso, o lxico, para ele,
tambm se relacionava de maneira intrnseca com o ambiente, j que ele refletia o
ambiente fsico e social de seus usurios. Para Sapir (1969, p.44), a definio de
ambiente deveria considerar dois polos, o fsico e o social:
[...] por fatres fsicos se entendem aspectos geogrficos, como a
topografia da regio (costa, vale, plancie, chapada ou montanha),
clima e regime de chuvas, bem como o que se pode chamar a base
econmica da vida humana, expresso em que se incluem a fauna,
flora e os recursos minerais do solo. Por fatores sociais se entendem as
vrias fras da sociedade que modelam a vida e o pensamento de
cada indivduo. Entre as mais importantes dessas fras sociais esto a
religio, os padres ticos, a forma de organizao poltica e a arte.
Ainda para o mesmo estudioso, a influncia do ambiente observada em um dos
trs domnios seguintes: no lxico, ou seja, no seu contedo; no sistema fontico,
relacionado ao sistema de sons com que opera para construir palavras e forma
gramatical, ou melhor, nos processos formais e nas classificaes de ordem lgica e/ou
psquica utilizadas quando se fala. Porm, o lxico o domnio que sofre de maneira
acentuada essa influncia. Segundo Sapir (1969), a linguagem cria o mundo virtual
que passa progressivamente ao actual e, com isso, possibilita por meio da cultura uma
maior compreenso das experincias individuais de cada ser humano.
37
Percebe-se, pois, que a relao entre lngua e sociedade e, ainda, entre os
aspectos culturais de determinado grupo desempenham importante influncia no
processo de nomeao de referentes de um espao geogrfico.
A questo do reflexo da viso de mundo do falante na lngua foi amplamente
defendida pela chamada Hiptese de Sapir-Whorf, frequentemente associada tese do
relativismo lingustico, pois, de maneira geral, no postulava a existncia de
propriedades universais nas lnguas humanas, sendo cada lngua nica e tambm a sua
descrio. Schaff (1974, p.96), por sua vez, ponderara que a hiptese de Sapir-Whorf
est, em contrapartida, ligada s pesquisas etnolingusticas da antropologia americana,
que pode tirar partido de toda uma pliade de investigadores sados da escola de F.
Boas.
Na contemporaneidade, outra vertente de estudo se ocupa das relaes entre
lngua e meio ambiente, a Ecolingustica, cujas bases epistemolgicas esto na
Ecologia, trazida para o Brasil pelo pesquisador Hildo Honrio do Couto e, grosso
modo, a rea que pesquisa a relao entre a Ecologia e a Lingustica. O pesquisador
Einar Haugen considerado o pai da Ecolingustica e, a partir da dcada de 1980, no
sculo XX, muitos autores passaram a estudar os fenmenos lingusticos a partir de uma
perspectiva ecolgica, ou, mais especificamente, Ecolingustica.
Alwin Fill, estudioso que se destaca entre os grupos de pesquisadores que se
dedicam a esse ramo de estudos, assim define essa disciplina:
Ecolingustica o ramo das cincias da linguagem que se preocupa
com o aspecto das interaes, sejam elas entre duas lnguas
individuais, entre falantes e grupos de falantes, ou entre lngua e
mundo, e que intervm a favor de uma diversidade das manifestaes
e relaes para a manuteno do pequeno. Segundo Fill (1993, apud
COUTO, 2007, p.41).
A Ecolingustica trabalha com o meio ambiente e suas respectivas divises,
sendo importante observar como se comporta a variedade lingustica em cada um.
Jorgen Door e Jorgen Chr. Bang, entre outros, realizaram uma diviso de meio ambiente
da lngua em social, mental e natural, com termos diferentes para design-los.
O primeiro o que mais tem despertado a ateno dos ecolinguistas, pois centra-
se na diversidade lingustica que contribui para a riqueza cultural dos povos: para o
ecolinguista, quanto mais variedade lingustica houver melhor [...]. Ele evita todo tipo
de linguagem preconceituosa, sem ser censor (COUTO, 2007, p.40-41).
Ainda partilhando do pensamento de Couto (2007), meio ambiente mental so as
relaes entre lngua e pensamento, havendo duas interpretaes para essa relao: h
38
pensamento sem linguagem e o pensamento, propriamente dito, somente o lingustico,
ou seja, aquele que possibilita o fenmeno da variao. A Ecolingustica acolhe as duas
concepes, entendendo que o contexto definir qual ser utilizado em determinado
momento.
E, por fim, ainda para Couto (2007), meio ambiente natural tambm
denominado meio ambiente fsico e, nele, populao, lngua e territrio esto inseridos
como corpos fsicos, ou seja, totalidade formada pelo mundo fsico e a lngua. Essa
corrente de pensamento baseou-se em teses j discutidas, como por exemplo, a tradio
que se iniciou com Boas, passou por Sapir chegou at a Whorf, denominada Hiptese
Hiptese Sapir-Whorf, que influenciou muitos estudos lingusticos.
Em sntese, fica evidente que a lngua deve ser vista como instrumento que
veicula a realidade sociocultural de seus usurios e o nvel que melhor representa essa
relao o lexical. Assim, os valores culturais e as crenas estaro sempre expressos no
ato de nomear os referentes que fazem parte do cotidiano de uma comunidade
lingustica, o que possibilita a riqueza lingustica observada em nosso idioma.
A Ecolingustica tem alguns pontos em comum com a hiptese de Sapir-Whorf,
pois, para Couto (2007, p.59),
[...] essas idias so consideradas precursoras da Ecolingustica no
porque tenham formulado as teses dela tais e quais. s vezes, elas so
importantes por terem formulado justamente o oposto, como o fato de
que nossa lngua determina nossa maneira de ver o mundo, o que
implicaria que a lngua que cria o mundo, idia considerada por
Schaff como mstica e fantstica.
Essa nova disciplina tem uma viso mais ampla do que os percursores da teoria
Sapir-Whorf, pois reconhecem a influncia da lngua sobre o meio ambiente, mas
considera tambm a influncia do meio ambiente sobre a lngua.
Nessa perspectiva, a Ecolingustica contribuiu teoricamente para a pesquisa
cujos resultados esto sendo apresentados nesta Dissertao. A Ecolingustica, ao
considerar a lngua por um vis dinmico e estudar as inter-relaes entre indivduos,
meio ambiente e lngua, contribui para o estudo da relao entre lxico e ambiente,
como tambm das possibilidades de interaes e influncias entre ambos.
1.2.1 Rural e urbano: uma questo complexa
O contato com a natureza e, consequentemente, com o ambiente rural uma
prtica comum dos povos ditos arcaicos, pois, apesar das organizaes sociais j
39
existirem, a grande maioria da populao residia no campo e tinha, como atividade
principal, a agricultura e o cuidado com alguns animais.
Nesse contexto histrico, as cidades serviam como palco para as trocas de
mercadorias, j que elas eram, sobretudo, pontos onde se localizava o(s) santurio (s),
onde se realizava troca de mercadorias e, portanto, centros comerciais e
administrativos (SIQUEIRA; OZRIO, 2001, p.71). Enfim, as relaes entre os
homens foram se intensificando e possibilitando que novos meios de sustentao
passassem a fazer parte daquela realidade ainda em formao.
As novas atividades econmicas desenvolvidas nos centros urbanos, o
surgimento das indstrias e de um maior deslocamento da populao rural para as
cidades decorreram do desenvolvimento do Capitalismo, da Revoluo Industrial e
ainda do uso de mquinas a vapor, j que a maior densidade demogrfica da cidade,
juntamente com seu estilo de vida sedentrio, tornou possvel o aparecimento de uma
cultura urbana, dedicada ao comrcio, manufatura e aos servios (PALEN, 1975,
p.33). Ocorre, portanto, o aumento do grau de urbanizao em algumas reas
especficas.
Ainda para Palen (1975, p.37), a urbanizao tratada como o processo pelo
qual regies rurais se transformam em regies urbanas. Focaliza, assim, a
porcentagem da populao que vive em regies urbanas, mas tambm se refere s
mudanas na organizao social como um todo.
Ao se relacionar esse quadro com o cenrio brasileiro, confirma-se que o
ambiente rural ainda serviu como alicerce para a formao do novo territrio em
desenvolvimento, pois, no Brasil Colnia (sc. XVI, XVII e XVIII), as grandes
propriedades de terra, a lavoura e a pecuria foram os instrumentos que alimentavam
e comandavam a economia brasileira, uma vez que a abundncia de terras frteis e
ainda mal desbravadas fez com que a grande propriedade rural se tornasse, aqui, a
verdadeira unidade de produo (HOLANDA3, 2007, p.48).
O perodo de povoamento e de colonizao do territrio brasileiro teve como
marca principal a explorao de diversas riquezas naturais, tais como o pau-brasil, a
cana-de-acar e o caf, dentre outros. Inicialmente os portugueses no tinham o
objetivo de transformar o Brasil em uma economia governada pela agricultura, pois
desejavam lucros imediatos, naquele perodo, porm, ela era sinnimo de riqueza, poder
e lucros em curto prazo. O ndio e o negro tiveram papel de destaque nesse perodo,
3 A primeira edio desta obra foi publicada em 1936. Para este trabalho foi consultada a 26 edio
brasileira (2007).
40
pois o trabalho desses dois grupos foi de suma importncia para o desenvolvimento dos
latifndios coloniais, tendo significativa participao no desenvolvimento econmico do
Brasil.
E assim, o estabelecimento de um padro industrial ocasionou mudanas na
percepo da cidade e do campo em termos valorativos. O urbano (cidade) passa a ser
compreendido como melhor que o recinto rural (campo) e, desse modo, instaura-se uma
subordinao do espao rural em relao ao urbano (FREITAS, 2012, p.29).
Esse continuum rural/urbano motivado pelo fato de, no ambiente rural, uma
parcela da populao ainda mantm uma vida mais simples, muitas vezes, sem acesso s
tecnologias que esto invadindo o mundo atual, possibilitando, deste modo, maior
contato com elementos vinculados a natureza e ao ambiente natural.
J o ambiente urbano est intimamente interligado aos avanos tecnolgicos, ao
capitalismo e aos meios de comunicao em massa do mundo atual, ou seja, a vida
tranquila e pacata no combina com o ambiente extremamente rpido e voltil da vida
nas cidades, onde tudo muda a todo o instante.
Por fim, ao estudar o lxico de determinada regio lingustica adquiri-se
conhecimento tanto lingustico quanto relacionado histria, cultura, geografia do
local onde esto inseridos os falantes, pois a Lexicologia tem como objeto central de
estudo a palavra e, consequentemente, o repertrio lexical de um grupo. Essa forte
relao com aspectos extralingusticos possibilita a interface com a Etnolingustica e
com a Ecolingustica. O captulo 2, a seguir, aborda aspectos histrico-geogrficos das
localidades investigadas.
41
CAPTULO 2 BRASIL CENTRAL: CONTEXTUALIZAO HISTRICO-
GEOGRFICA
Neste captulo tecemos consideraes histrico-