39
UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO EM FISIOTERAPIA KAREN CRISTINE LEITE DE MORAES REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO PULMONAR E FORÇA MUSCULAR RESPIRATÓRIA DE DOADORES VIVOS: ESTUDO LONGITUDINAL SÃO PAULO 2014

REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO PULMONAR …arquivos.cruzeirodosuleducacional.edu.br/.../mestrado_fisioterapia/... · PULMONAR E FORÇA MUSCULAR RESPIRATÓRIA DE DOADORES

  • Upload
    lekiet

  • View
    219

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO

EM FISIOTERAPIA

KAREN CRISTINE LEITE DE MORAES

REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO

PULMONAR E FORÇA MUSCULAR RESPIRATÓRIA DE

DOADORES VIVOS: ESTUDO LONGITUDINAL

SÃO PAULO

2014

KAREN CRISTINE LEITE DE MORAES

REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO

PULMONAR E FORÇA MUSCULAR RESPIRATÓRIA DE

DOADORES VIVOS: ESTUDO LONGITUDINAL

Dissertação apresentada ao Programa de

Mestrado e Doutorado em Fisioterapia

da Universidade Cidade de São Paulo,

como requisito exigido para obtenção do

título de Mestre sob orientação da

Profª.Drª. Luciana Dias Chiavegato.

SÃO PAULO

2014

KAREN CRISTINE LEITE DE MORAES

REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO

PULMONAR E FORÇA MUSCULAR RESPIRATÓRIA DE

DOADORES VIVOS: ESTUDO LONGITUDINAL

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado e Doutorado em

Fisioterapia da Universidade Cidade de São Paulo,como requisito exigido

para obtenção do título de Mestre.

Área de concentração: Avaliação, Intervenção e Prevenção em Fisioterapia

Data da defesa: 31 de Outubro de 2014

Resultado: ____________________________

BANCA EXAMINADORA:

Profª. Dra. Luciana Dias Chiavegato________________________________________

Universidade Cidade de São Paulo

Prof. Dr. Dirceu Costa ___________________________________________________

Programa de Pós graduação de Ciências da Reabilitação da UNINOVE

Prof. Dra.Sandra Cristina Alouche__________________________________________

Universidade Cidade de São Paulo

AGRADECIMENTOS

Acima de tudo agradeço a Deus, por ter me dado o sopro da vida, uma nova história e tua

graça para chegar até aqui.

Aos meus pais Eliseu e Ignez, espelho de minha educação, formação pessoal e construção de

valores e princípios. Por todo o amor, incentivo e doação. Minha eterna gratidão e amor

Ao meu filho Murilo, filho amado, bendito, filho de uma promessa designada por Deus.

Obrigado meu príncipe por toda compreensão e carinho. Eterno amor

A minha orientadora, professora Dra. Luciana Dias Chiavegato, por toda confiança, paciência,

disponibilidade e incentivo. Obrigada por ir além do que seu papel profissional, tão humano e

sensível fazendo a diferença em nossa vida

A todos os professores do programa de mestrado, por todo aprendizado concedido, em

especial ao professor Dr. Leonardo Oliveira Pena Costa pela oportunidade, dedicação e

confiança

A professora Dra. Denise de Moraes Paisani, por toda contribuição, disponibilidade e parceria

Ao professor Dr. Marcelo Fernandes, por toda amizade, oportunidade, confiança, apoio e

troca de experiências em tantos momentos

Aos pacientes, familiares e funcionários que fizeram parte direta e indireta desta pesquisa,

pela confiança e esperança depositada.

A minha amiga, irmã, pastora Lígia Canellas por todo amor, amizade, incentivo, orações

desde o princípio. Obrigada por todos os momentos compartilhados e por ter me conduzido

sempre à Fonte de Água Viva, Cristo Jesus

Ao meu amigo, parceiro, companheiro Alexander Negreiros que tanto me ajudou e colaborou

durante todo esse processo. Obrigada por toda paciência e carinho

As minhas queridas Lis, Elaine, Celi, Vivi, a minha família e a todos que estiveram presentes

direta ou indiretamente na minha vida por todo amor, apoio e força

Meus sinceros agradecimentos

“Aquele que começou a boa obra é Fiel para

aperfeiçoá-la até o fim...” (Fl 1:6)

Toda Honra e Toda Glória a Ti meu Deus, Soberano

sobre todas as coisas...

LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Características gerais dos 110 doadores renais .................................................. 32

Tabela 2. Variáveis da função pulmonar no pré, 1º. 2º. 3º e 5º dias de pós-operatório ..... 33

Tabela 3. Força muscular respiratória dos doadores no pré.1º. 2º. 3º e 5º dias de pós-

operatório ...........................................................................................................

33

Tabela 4. Qualidade de vida no pré e pós-operatório dos 110 doadores renais ................. 34

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

DRC: Doença renal crônica

PO: Pós-operatório

CPP: Complicações Pulmonares Pós-Operatórias

CAA: Cirurgia Abdominal Alta

CRF: Capacidade Residual Funcional

CVF: Capacidade Vital Forçada

VEF1: Volume Expirado Forçado no 1º segundo

PImáx: Pressão inspiratória máxima

PEmáx: Pressão expiratória máxima

SUMÁRIO

PREFÁCIO ............................................................................................................................ 09

RESUMO ............................................................................................................................... 10

ABSTRACT ........................................................................................................................... 11

CAPÍTULO 1

1.CONTEXTUALIZAÇÃO .............................................................................................. 12

1.1 Alterações na função pulmonar e força muscular respiratória no pós-operatório ... 13

1.2 Complicações pulmonares ....................................................................................... 15

1.3 Qualidade de vida .................................................................................................... 16

2. OBJETIVOS ................................................................................................................... 18

3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 19

CAPÍTULO 2

RESUMO ................................................................................................................................ 24

ABSTRACT ............................................................................................................................ 25

INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 26

MÉTODOS .............................................................................................................................. 28

RESULTADOS ....................................................................................................................... 32

DISCUSSÃO ........................................................................................................................... 35

CONCLUSÃO ............................................................................................................... 38

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 39

CAPÍTULO 3

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................. 42

ANEXOS................................................................................................................................ 44

PREFÁCIO

Esta dissertação está apresentada no formato híbrido proposto pelo Programa de

Mestrado em Fisioterapia da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID). No primeiro

capítulo consta uma contextualização que visa fornecer informações a respeito da doença

renal crônica, o transplante renal com doadores vivos e o seu pós-operatório. Compreende

também a justificativa do estudo e seus respectivos objetivos.

Nosso trabalho resultou no artigo “Repercussão da nefrectomia na função pulmonar e

força muscular respiratória: estudo longitudinal”, o qual se encontra no capítulo 2, contendo

introdução, métodos, resultados, discussão e referências bibliográficas. Este artigo foi

submetido para a revista Brazilian Journal of Physical Therapy, portanto, encontra-se escrito

aos moldes propostos pela mesma.

No capítulo 3 constam-se as considerações finais, apontando as principais implicações

dos achados deste estudo, limitações e sugestões para futuras pesquisas. Por fim, encontram-

se como anexos: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que foi assinado pelos

participantes da pesquisa; Ficha de avaliação fisioterapêutica; Questionário de Qualidade

vida SF-36 e a Escala Visual Analógica de Dor utilizada durante a coleta dos dados.

RESUMO

Contextualização: O transplante renal com doador vivo proporciona aumento na chance de

sobrevida e na qualidade de vida dos pacientes transplantados, tornando-se uma prática

comum nas últimas décadas, mas ainda pouco evidenciada quanto à repercussão e evolução

pós-operatória dos doadores renais. Objetivos: avaliar a função pulmonar, força muscular

respiratória, complicações pulmonares pós-operatórias (CPP) e qualidade de vida de doadores

renais no pós-operatório de nefrectomia. Métodos: Trata-se de uma coorte prospectiva, sendo

avaliados 110 doadores renais submetidos à nefrectomia, quanto a função pulmonar (CVF,

VEF1, VEF1/CVF) e força muscular respiratória (PImáx e PEmáx) no 1º, 2º, 3º e 5º dias PO e

qualidade de vida (SF-36) no 30º dia de PO. Todos os doadores receberam orientação e

acompanhamento da fisioterapia. Para a análise estatística utilizou-se a análise de variância de

medidas repetidas ANOVA para um fator (oneway), com análise posthocdeTukey, e nível de

significância de 5% (p<0,05).Resultados: Dos 110 doadores, 72 (65%) eram do sexo

feminino, com idade média de 42,21 ± 9,45 anos. Os doadores submetidos à nefrectomia

apresentaram diminuição de 27% da CVF no 1º PO, 58% da PImáxe 51% da PEmáx

(p<0,001), apresentando no 5º PO valores similares quando comparado aos valores de pré-

operatório (p>0,05). Quanto à qualidade de vida foi observado piora nos domínios da

capacidade funcional, limitação de aspectos físicos, dor, vitalidade e aspectos sociais

(p<0,05), entretanto o estado geral da saúde, aspectos emocionais e saúde mental

permaneceram inalterados (p>0,05). Conclusão: Doadores submetidos à nefrectomia

apresentam redução da função pulmonar e da força muscular respiratória no 1º PO, entretanto,

não apresentam CPP, possivelmente por terem sido submetidos a intervenção fisioterapêutica

durante todo período de internação. Além disso, apresentam redução da qualidade de vida em

relação aos aspectos funcionais no primeiro mês de pós-operatório.

Palavras chave: doador renal vivo, teste de função pulmonar, músculos da respiração,

complicações pós-operatórias, qualidade de vida, fisioterapia (técnicas)

ABSTRACT

Background: The transplant from a living donor provides increased chance of survival and

quality of life of the patients, becoming a common practice in recent decades, but still

somewhat evident as the impact and evolution regarding donors. Objectives: To evaluate

pulmonary function, respiratory muscle strength, the occurrence of pulmonary complications

and quality of life in kidney donors after nephrectomy. Methods: This is a prospective cohort

study that evaluated 110 kidney donors who underwent nephrectomy in relation to lung

function (FVC, FEV1, FEV1/FVC), muscle strength respiratory (MIP and MEP) in 1°, 2°, 3º

and 5° postoperative days and quality of life (SF-36) in the 30° postoperative day. All donors

received physiotherapy. Results: Donor nephrectomy showed 27% decrease in FVC in the 1°

postoperative day, 58% of MIP and MEP 51% (p<0.001), with similar values on the 5th

postoperative day compared to preoperative values (p>0.05). Quality of life was reduced in

the fields of functional capacity, limiting bodily pain, vitality and social aspects (p<0.05),

however the general state of health, emotional aspects and mental health remained unchanged

(p>0.05). Conclusion: Kidney donors exhibit reduction on lung function and respiratory

muscle strength in the 1° PO, however, PPC was not observed. Moreover, quality of life

demonstrates reduction on functional aspects during the first postoperative month.

Key words: kidney living donor, pulmonary function test, respiratory muscles, postoperative

complications, quality of life, physical therapy modalities.

1. CONTEXTUALIZAÇÃO

A doença renal crônica (DRC) é um problema de saúde pública mundial com aumento progressivo de

sua incidência, prevalência e significativa morbidade e mortalidade1-3

. A DRC caracteriza-se pela perda

da capacidade da homeostase dos rins e é definida como alteração da função renal ou filtração glomerular

(clearance de creatinina <60ml/minuto/1.73m2) por três meses ou mais, independente da causa

1,2. Tal

doença é uma condição patológica irreversível que necessita de terapia dialítica, como hemodiálise,

diálise peritoneal e/ou transplante renal2-4

. De acordo com o censo estimado da sociedade Brasileira de

Nefrologia de 2012, 97.586 pacientes fizeram tratamento dialítico5

.

O tratamento preferencial para a DRC em estágio final, independente da causa, é o transplante renal,

estabelecido como um procedimento seguro, que visa aumentar a expectativa e qualidade de vida dos

pacientes3, porém ainda há uma grande diferença entre a necessidade e a disponibilidade de órgãos para

transplante3,6

. A utilização de doadores vivos para os pacientes com DRC aumentou desde que isso se

tornou uma prática comum na década de 1960, e sua utilização vem proporcionando a diminuição no

número de pacientes na fila do transplante quando comparado ao doador falecido7,8

. O transplante com

doador vivo proporciona aumento na chance de sobrevida e na qualidade de vida dos pacientes

transplantados, repercutindo com baixo impacto, tanto físico como mentalmente, ao doador7,9

.

Os riscos de complicações pós-doação e mortalidade entre os doadores são considerados baixos6,7

e,

embora a nefrectomia para doação não promova nenhum benefício direto ao doador, os doadores relatam

satisfação emocional e raramente demonstram arrependimento de sua decisão7,10,11

. Para o

aconselhamento adequado de um potencial doador vivo de rim, diretrizes e consensos norteiam critérios a

serem estabelecidos, incluindo não só os riscos imediatos como também os possíveis efeitos em longo

prazo após a doação, além dos aspectos psicossociais e sócioeconômicos3,12,13

. Os doadores são

submetidos a uma extensa avaliação pré-doação para determinar o grau de histocompatibilidade entre

doador e receptor; realização de exames como angiotomografia computadorizada para avaliação da

qualidade e vasculatura renal; avaliação clínica, com objetivo de se excluir doenças clínicas pré-

existentes, como hipertensão arterial e diabetes mellitus, enfim, tudo o que possa interferir no sucesso do

transplante, assim como avaliação psicossocial e de qualidade de vida de forma contínua3,11,13

.

Visando um menor prejuízo ao doador, diferentes vias podem ser empregadas para a retirada do rim.

Incluem-se entre elas a lombotomia, via incisão subcostal e as realizadas por vias de acesso

laparoscópicas. Estudos mostraram não haver diferença para a evolução pós-operatória do doador ao

serem submetidos à lombotomia ou à incisão subcostal2,14

, embora a nefrectomia por via de acesso

subcostal seja mais indicada pela possibilidade de melhor visualização do campo cirúrgico com menor

incisão10,13,15

. O risco cirúrgico associado com o procedimento de doação e suas complicações demonstra

estar relacionado ao estado cardiopulmonar pré-operatório do paciente, duração da cirurgia (maior que

210 minutos), tempo anestésico16,17

. Fatores clínicos como o tabagismo, doenças respiratórias, obesidade,

hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus também podem influenciar no aumento do risco

cirúrgico e pós-operatório16-18

.

1.1 Alterações na função pulmonar e força muscular respiratória no pós-operatório

A nefrectomia pode ser considerada uma cirurgia abdominal alta (CAA), pelo fato da incisão

cirúrgica ser realizada acima da cicatriz umbilical. Diversos estudos têm mostrado que pacientes

submetidos à CAA, evoluem com alterações na mecânica respiratória e função pulmonar, podendo levar a

ocorrência de complicações pulmonares pós-operatórias (CPP)19,20

. As principais mudanças que

acarretam essas complicações são a diminuição da mobilidade diafragmática; depressão no sistema

nervoso central; diminuição dos volumes e capacidades pulmonares; alteração da relação ventilação-

perfusão e diminuição da eficácia da tosse21-24

.

A diminuição dos volumes pulmonares, respiração superficial, disfunção diafragmática,

comprometimento do transporte mucociliar, dor e repouso prolongado no leito são os primeiros eventos

em cascata que podem levar às complicações pulmonares no período pós-operatório17,25

. A redução dos

volumes pulmonares e da capacidade residual funcional (CRF) pode determinar um padrão restritivo

devido às alterações da mecânica pulmonar e, provavelmente, este seja um dos principais fatores

determinantes das atelectasias seguidas por hipoxemia 16,17,19

.

Após o procedimento cirúrgico, há diminuição dos volumes e capacidade pulmonares de 40 a 50%

em relação aos seus valores pré-operatórios, situação que permanece de 7 a 14 dias após o ato cirúrgico26-

28. Tem sido demonstrado que a redução dos volumes pulmonares, está relacionada a uma disfunção da

mobilidade do músculo diafragma, que teria origem na manipulação de vísceras abdominais,

determinando uma inibição reflexa do nervo frênico, com consequente paresia diafragmática; além da

limitação pela dor29,30,31,32

.

Como em qualquer procedimento cirúrgico, a dor pode ser ponderada como consequência

decorrente no pós-operatório dos pacientes. É considerada como uma desagradável experiência sensorial

e emocional, podendo ser classificada quanto a sua localização, duração, intensidade e qualidade, entre

outras32-34

. Ao contrário do que se pensava, a dor possui uma contribuição parcial e secundária na

diminuição dos volumes pulmonares34

, entretanto, os volumes pulmonares não dependem exclusivamente

da atividade da musculatura respiratória, mas também das propriedades mecânicas dos pulmões. A

diminuição da complacência pulmonar, o aumento da resistência das vias aéreas e a abolição dos suspiros

encontrados após uma CAA, associados à diminuição da mobilidade diafragmática, implicam na

diminuição da CRF, redução da ventilação e expansibilidade das áreas inferiores do pulmão, levando à

ocorrência de atelectasias nas áreas dependentes do pulmão17,19,21

. Essas alterações são máximas nas

primeiras 48 a 72 horas do pós-operatório19,24,26

.

As alterações da mecânica respiratória também têm sido relacionadas à diminuição da força

muscular diafragmática, refletindo numa redução da pressão inspiratória máxima (PImáx) e da pressão

expiratória máxima (PEmáx) no primeiro pós-operatório22,28

. Nos pacientes submetidos à CAA,

evidencia-se diminuição da pressão transdiafragmática e mudança no padrão respiratório, tornando-se

predominantemente costal nas primeiras 48 horas após o procedimento14,22,28,35

.

Embora a literatura mostre as repercussões na função pulmonar no período pós-operatório de

CAA, nosso grupo de pesquisa desconhece estudos que avaliaram tanto a função pulmonar quanto a força

muscular respiratória e sua evolução após nefrectomias em doadores.

1.2 Complicações pulmonares

Conceitualmente, a CPP é definida como uma segunda doença inesperada, que ocorre até 30 dias

depois da intervenção cirúrgica, alterando o quadro clínico e necessitando de intervenção terapêutica,

medicamentosa ou não36

. A diferença da CPP do achado pós-operatório é que o achado não repercute em

alteração do quadro clínico36,37

.

As complicações clínicas mais comuns são atelectasia, hipoxemia e pneumonia, podendo afetar a

maioria dos pacientes, o que pode aumentar o tempo de internação e custos de tratamento, além de

contribuir para o aumento da mortalidade16,17,19, 26

. Também é visto que a ocorrência de CPP está

associada a outros fatores de risco, como tempos cirúrgico e anestésico prolongados, idade avançada do

paciente, história pregressa de tabagismo, presença de doenças respiratórias, obesidade e outras doenças

clínicas associadas19,20,38

.

A CPP é considerada como um dos fatores etiológicos mais importantes para o prolongamento dos

dias de internação hospitalar e mortalidade20,39,40

. Tem sido descrito na literatura que 5 a 10% dos doentes

submetidos a procedimentos operatórios gerais desenvolve CPP, sendo considerada a segunda causa mais

frequente de complicações pós-operatórias19,20,36,38

.

Apesar das complicações cardíacas serem mais reportadas nos estudos envolvendo cirurgias não

torácicas, as CPP são mais comuns, variando de 2 a 19% e seu impacto na morbidade, mortalidade e

custos gerais é superior ao das complicações cardíacas19,24,26,38,39

.

A incidência de CPP varia de 9 a 40% em procedimentos no andar superior do abdome16,38

. Tais

resultados, tão discrepantes, ocorrem porque muitos trabalhos são retrospectivos, mal controlados,

realizados em populações com características muito diferentes e, além disso, não utilizam definições ou

critérios bem definidos para o seu diagnóstico16,19,20,37

.

Embora a CPP seja relatada na literatura como consequência mais frequente das complicações

pós-operatórias no andar superior do abdome, com impacto na morbidade e mortalidade, ainda não há um

consenso sobre sua incidência e critérios.

1.3 Qualidade de vida

A escassez de órgãos e o crescente tempo de espera por um rim de doador falecido tem feito com

que o transplante renal com doador vivo seja cada vez mais procurado7. Com esse crescimento surge a

importância de que os impactos psicossociais e até financeiros devam ser considerados quanto à

informação aos potenciais doadores sobre o processo de doação e de acompanhamento após a

doação9,11,41

.

Lopes et al, 201311

, mostraram que há baixo risco para o doador, além do aumento na autoestima,

altruísmo, documentado como um fator de aumento da sensação de bem-estar e de melhora na qualidade

de vida dos doadores vivos. Os benefícios de se receber um rim de doador vivo incluem maior

comodidade, melhor resultado e melhora da qualidade de vida para o receptor41,42

. Mas é importante

mencionar que possíveis consequências psicossociais nocivas têm sido referenciadas11,41

. Uma pequena

proporção de doadores relata experiências negativas, principalmente quando a doação não é bem

sucedida, como na rejeição do transplante e/ou complicações pós-operatórias43,44

.

Apesar da imagem global da doação ser positiva, para o doador e para o receptor, ainda tem sido

uma questão a ser estudada. Mais estudos são necessários, principalmente os de seguimento em longo

prazo para se conhecer o real impacto da doação na qualidade de vida desta população.

Mediante tais informações, somados ao crescimento dos índices de transplantes renais entre

doadores vivos, torna-se importante conhecer a evolução pós-operatória desses sujeitos considerados

hígidos; quais as possíveis alterações e/ou complicações pulmonares nesses indivíduos e se estas se

comportam como qualquer outro procedimento realizado no abdome superior. E, ainda, o impacto de

todo o processo cirúrgico da doação na qualidade de vida dos doadores, para que dessa forma novas

propostas de manejo clínico possam ser instituídas e melhor indicadas pela equipe multidisciplinar a essa

população.

2. OBJETIVOS

2.1 Primário

Avaliar a função pulmonar e força muscular respiratória de doadores renais no pós-operatório de

nefrectomia para doação.

2.2 Secundário

Avaliar a ocorrência de complicações pulmonares e qualidade de vida no pós-operatório de

doadores renais submetidos à nefrectomia para doação.

3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Vanbelleghem H, Vanholder R, Levin NW, Becker G, Craig JC, Ito S, et al. The Kidney Disease:

improving Global Outcomes website: comparison of guidelines as a tool for harmonization. Kidney

Int. 2007; 71(10): 1054-61.

2. Medina-pestana JO: Organization of a high-volume kidney transplant program – the

“assemblyline” approach. Transplantation. 2006; 81(11): 1510-20.

3. Perlis N, Connelly M, JR DAH, Pace KT, Stewart R. Evaluating potential live-renal donors:

Causes for rejection, deferral and planned procedure type, a single-centre experience. Can Urol

Assoc J. 2013; 7(1-2): 41-5.

4. Levey AS, Eckardt KU, Tsukamoto Y, Levin A, Coresh J, Rossert J, et al. Definition and

classification of chronic kidney disease: a position statement from Kidney Disease: Improving Global

Outcomes (KDIGO). Kidney Int. 2005; 67(6): 2089-100.

5. SBN - Sociedade Brasileira de Nefrologia (2010) http://www.sbn.org.br [Acesso em 15 abril,

2011].

6. Ibrahim HN, Foley R, Tan L, Rogers T, Bailey RF, Guo H, et al. Long-term consequences of

kidney donation. N Engl J Med. 2009; 360(5): 459-69.

7. Buer LC, Hofmann BM. How does kidney transplantation affect the relationship between donor

and recipient? Tidsskr Nor Laegeforen. 2012; 132(1): 41-3.

8. Cosimi A. The donor and donor nephrectomy. In: Kidney Transplantation – Principles and Practice

1994.

9. Virzi A, Signorelli MS, Veroux M, Giammarresi G, Maugeri S, Nicoletti A, et al. Depression and

quality of life in living related renal transplantation. Transplant Proc. 2007; 39(6): 1791-3.

10. Kumar A, Tripathi DM, Srivastava A. Mini incision live donor nephrectomy: an optimal

approach for the developing countries. Clin Transplant. 2003; 17(6): 498-502.

11. Lopes A, Frade IC, Teixeira L, Almeida M, Dias L, Henriques AC. Quality of life assessment in a

living donor kidney transplantation program: evaluation of recipients and donors. Transplant Proc.

2013; 45(3): 1106-9

12. Delmonico F. A Report of the Amsterdam Forum On the Care of the Live Kidney Donor: Data

and Medical Guidelines. Transplantation. 2005; 79(6 Suppl): S53-66.

13. Giessing M. Living donor nephrectomy--quantifying the risk for the donor. Transplant Proc.

2012; 44(6): 1786-9.

14. Chiavegato L, Medina-Pestana J, Tedesco-Silva H, Paisani D, Fiore J, Jr., Faresin S. Surgical

approach does not affect perioperative respiratory morbidity in living donor nephrectomy:

comparison between anterior subcostal incision and flank incision. Transplant Proc. 2010; 42(5):

1472-5.

15. Connor WT, Van Buren CT, Floyd M, Kahan BD. Anterior extraperitoneal donor nephrectomy. J

Urol. 1981; 126(4): 443-7.

16. Scholes RL, Browning L, Sztendur EM, Denehy L. Duration of anaesthesia, type of surgery,

respiratory co-morbidity, predicted VO2max and smoking predict postoperative pulmonary

complications after upper abdominal surgery: an observational study. Aust J Physiother. 2009; 55(3):

191-8.

17. Lawrence VA, Cornell JE, Smetana GW. Strategies to reduce postoperative pulmonary

complications after noncardiothoracic surgery: systematic review for the American College of

Physicians. Ann Intern Med. 2006; 144(8): 596-608.

18. Davis CL. Evaluation of the living kidney donor: current perspectives. Am J Kidney Dis. 2004;

43(3): 508-30.

19. Smetana GW. Postoperative pulmonary complications: an update on risk assessment and

reduction. Cleve Clin J Med. 2009; 76: 60–5.

20. Paisani DM, Fiore JF, Lunardi AC, Colluci DBB, Santoro IL, Carvalho CRF, et al. Preoperative

six-min walking distance does not predict pulmonary complications in upper abdominal surgery.

Respirology.2012; 17: 1013–1017.

21. Sakai RL, Abrao GM, Ayres JF, Vianna PT, Carvalho LR, Castiglia YM. Prognostic factors for

perioperative pulmonary events among patients undergoing upper abdominal surgery. Sao Paulo Med

J. 2007; 125(6): 315-21.

22. Paisani DM CL, Faresin SM. Volumes, capacidades pulmonares e força muscular respiratória no

pós-operatório de gastroplastia. J Bras Pneumol. 2005; 2(31): 125-32.

23. Chiavegato LD JJ, Faresin SM, Juliano Y. Alterações funcionais respiratórias na colecistectomia

por via laparoscópica. J Pneumol. 2000; 26(2): 69-76.

24. Kanat F, Golcuk A, Teke T, Golcuk M. Risk factors for postoperative pulmonary complications

in upper abdominal surgery. ANZ J Surg. 2007; 77(3): 135-41.

25. Risser NL. Preoperative and postoperative care to prevent pulmonary complications.Heart Lung.

1980; 9(1): 57-67.

26. Arozullah AM, Conde MV, Lawrence VA. Preoperative evaluation for postoperative pulmonary

complications.Med Clin North Am. 2003; 87: 153–73.

27. Chetta A, Tzani P, Marangio E et al. Respiratory effects of surgery and pulmonary function

testing in the preoperative evaluation. Acta Biomed 2006; 77:69-74.

28. Barbalho-Moulim MC, MiguelGP, Forti EM, Campos FA, Costa D. Effects of preoperative

inspiratory muscle training in obese women undergoing open bariatric surgery: respiratory muscle

strength, lung volumes, and diaphragmatic excursion. Clinics 2011; 66 (10): 1721-7.

29. Celli BR. Perioperative respiratory care of the patient undergoing upper abdominal surgery. Clin

Chest Med. 1993; 14(2): 253-61.

30. Dureuil B, Cantineau JP, Desmonts JM. Effects of upper or lower abdominal surgery on

diaphragmatic function. Br J Anaesth. 1987; 59(10): 1230-5.

31. Ford GT, Grant DA, Rideout KS, Davison JS, Whitelaw WA. Inhibition of breathing associated

with gallbladder stimulation in dogs. J Appl Physiol (1985). 1988; 65(1): 72-9.

32. Chapman CR, Casey KL, Dubner R, Foley KM, Gracely RH, Reading AE. Pain measurement: an

overview. Pain. 1985; 22(1): 1-31.

33. Baron R. The long path from mechanism-based treatment. The International Journal of Pain

Medicine and Palliative Care 2001; 1(1): 2-14.

34. Shea RA, Brooks JA, Dayhoff NE, Keck J. Pain intensity and postoperative pulmonary

complications among the elderly after abdominal surgery. Heart Lung. 2002; 31(6): 440-9.

35. Grams ST, Ono LM, Noronha MA, Schivinski CI, Paulin E. Breathing exercises in upper

abdominal surgery: a systematic review and meta-analysis. Rev Bras Fisioter. 2012; 16(5): 345-53.

36. Pereira ED, Fernandes AL, Silva C et al. Prospective assessment of the risk of postoperative

pulmonary complications in patients submitted to upper abdominal surgery. São Paulo Med J 1999;

117(4):151-60.

37. Faresin SM, FilardoFA. Complicações pulmonares no pós-operatório. In: Pneumologia,

Atualização e Reciclagem – Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia. 1997; 42-45.

38. Arozullah AM, Daley J, Henderson WG et al. Multifactorial risk index for predicting

postoperative respiratory failure in men after major non cardiac surgery. The National Veterans

Administration Surgical Quality Improvement Program.Ann Surg. 2000; 232: 242–53.

39. Smetana GW,Lawrence VA, Cornell JE. Preoperative pulmonary risk stratification for non

cardiothoracic surgery: systematic review for the American College of Physicians. Ann Intern Med.

2006; 144(8):581-95.

40. Filardo FA, Faresin SM, Fernandes ALG. Index for a pulmonar postoperative complication after

upper abdominal surgery: a validation study. Rev Assoc Med Bras.2002; 48: 209–16.

41. DeGroot IB, Schipper K, van Dijk S, van der Boog PJ, Stiggelbout AM, Baranski AG, et al.

Decision making around living and deceased donor kidney transplantation: a qualitative study

exploring the importance of expected relationship changes. BMC Nephrol.2012; 13: 103.

42. Lumsdaine JA, Wray A, Power MJ, Jamieson NV, Akyol M, Andrew Bradley J, et al. Higher

quality in living donor kidney transplantation: prospective cohort study. Transplant Int. 2005;

18(8):975-80.

43. Ummel D, Achille M, Mekkelholt J. Donors and recipientes of living kidney donation: a

qualitative metasummary of their experiences. J Transplant. 2011; 1-11.

44. Clemens KK, Thiessen-Philbrook H, Parikh CR, Yang RC, Karley ML, Boudville N, et al.

Psychosocial health of living kidney donos: a systematic review. Am J Transplant. 2006; 6(12):

2965-77.

REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO PULMONAR E FORÇA MUSCULAR

RESPIRATÓRIA: ESTUDO LONGITUDINAL

REPERCUSSÕES PULMONARES DA NEFRECTOMIA PARA DOAÇÃO

KAREN MORAES1, DENISE PAISANI

2, NATHÁLIA COSTA TOLEDO PACHECO

1, LUCIANA

DIAS CHIAVEGATO1,3

1Instituição: Programa de Mestrado e Doutorado em Fisioterapia, Universidade Cidade de São Paulo,

São Paulo, Brasil

2Instituição: Departamento de Fisioterapia, Escola de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo,

Brasil

3Instituição: Departamento de Pneumologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil

RESUMO

O transplante por doador vivo proporciona aumento na sobrevida e na qualidade de vida dos pacientes

transplantados, entretanto, o impacto na função pulmonar e força muscular respiratória no pós-operatório

em doadores de rim permanece desconhecido. Objetivos: Avaliar a função pulmonar, força muscular

respiratória, qualidade de vida e incidência de complicações pulmonares pós-operatórias (CPP) em

doadores renais submetidos à nefrectomia. Métodos: Trata-se de uma coorte prospectiva, que avaliou

consecutivamente 110 doadores submetidos à nefrectomia. Foram avaliados quanto à função pulmonar

(espirometria) e força muscular respiratória (manovacuometria) um dia antes da cirurgia e 1º, 2º, 3º e 5º

dias de pós-operatório. A qualidade de vida (SF-36) foi avaliada no pré e 30º dia de pós-operatório. A

CPP foi avaliada por um pesquisador cego às mensurações. Resultados: Houve queda de 27% da

capacidade vital forçada, 58% da pressão inspiratória máxima (PImáx) e 51% da pressão expiratória

máxima (PEmáx) no 1º dia pós-operatório (p<0,001) com retorno aos valores basais. A qualidade de vida

mostrou comprometimento da capacidade funcional, aspectos físicos, dor, vitalidade e função social

(p>0,05). Nenhum dos pacientes evoluiu com CPP. Conclusão: Doadores renais submetidos à

nefrectomia apresentaram redução da função pulmonar, força muscular respiratória com retorno aos

valores basais no 5º PO e redução qualidade de vida nos primeiros 30 dias de pós-operatório semelhante

à cirurgia abdominal alta.

Palavras chaves: doador renal vivo, teste de função pulmonar, músculos da respiração, complicações

pós-operatórias, qualidade de vida, fisioterapia (técnicas).

IMPACT NEPHRECTOMY IN LUNG FUNCTION AND RESPIRATORY MUSCLE

STRENGTH: LONGITUDINAL STUDY

EFFECTS OF PULMONARY NEPHRECTOMY FOR DONATION

KAREN MORAES1, DENISE PAISANI

2, NATHÁLIA COSTA TOLEDO PACHECO

1, LUCIANA

DIAS CHIAVEGATO1,3

1Instituição: Programa de Mestrado e Doutorado em Fisioterapia, Universidade Cidade de São Paulo,

São Paulo, Brasil

2Instituição: Departamento de Fisioterapia, Escola de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo,

Brasil

3Instituição: Departamento de Pneumologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil

ABSTRACT

Living donor transplant improving survival and quality of life of transplant patients, however, the impact

on postoperative lung function and respiratory muscular strength on kidney donors remains unknown.

Objective: Evaluate pulmonary function, respiratory muscle strength, quality of lifeand incidence of

postoperative pulmonary complications (PPC) in kidney donors undergoing nephrectomy. Methods: This

prospective cohort enrolled 110 consecutive kidney donors undergoing nephrectomy. Subjects performed

pulmonary function (Spirometry) and respiratory muscular strength (Manovacuometry) assessment in the

day prior to surgery, 1º, 2º, 3º and 5º postoperative days.Quality of life (SF-36) were evaluated in pre and

30 postoperative days. PPC were assessed daily by a blinded researcher. Results: There was a decrease of

27 % of forced vital capacity, 58 % of maximal inspiratory pressure (MIP) and 51 % of maximal

expiratory pressure (MEP) on the 1st postoperative day (p<0,001), returning to baseline values. The

quality of life was impaired functional capacity, bodily pain, vitality and social function (p>0,05). None

of the patients progressed to CPP. Conclusion: Kidney donor nephrectomy decreased lung function,

respiratory muscle strength with return to baseline at 5º PO and reduced quality of life in the first 30 days

after surgery similar to upper abdominal surgery.

Keywords: kidney living donor, pulmonary function test, respiratory muscles, postoperative

complications, quality of life, physical therapy modalities.

INTRODUÇÃO

O tratamento preferencial para a doença renal crônica (DRC) em estágio final é o transplante renal

considerado um procedimento seguro e viável1,2

. O transplante renal com doador vivo proporciona

redução da mortalidade e melhora da qualidade de vida dos receptores com baixo impacto, tanto físico

como mentalmente, ao doador1-4

. O risco do doador desenvolver complicações pós-operatórias é inerente

ao procedimento cirúrgico e, algumas vezes associado à comorbidades prévias5,6

.

A nefrectomia realizada para doação é considerada uma cirurgia abdominal alta (CAA) e diversos

estudos têm mostrado que pacientes submetidos a este tipo de cirurgia, evoluem com alterações na

mecânica respiratória e função pulmonar, podendo levar a ocorrência de complicações pulmonares7,8

.

Estudos que avaliaram a evolução tanto da função pulmonar quanto da força muscular respiratória após

CAA, mostram reduções em torno de 40 a 50% em valores da capacidade vital forçada (CVF), volume

expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) e força muscular respiratória9,10-12

. Todavia, nas

nefrectomias para doação, encontram-se lacunas destas informações devido à escassez de estudos nessa

população.

A complicação pulmonar pós-operatória (CPP) é considerada como um dos fatores etiológicos mais

importantes para o prolongamento dos dias de internação hospitalar e mortalidade e sua incidência varia

de 9 a 40% em CAA, dependendo do critério utilizado para o diagnóstico7,13

. Chiavegato et al5, em 2010,

mostrou baixa incidência de CPP ao avaliar dois tipos de incisão em nefrectomia, entretanto o período de

seguimento dos pacientes não foi suficiente para avaliar sua repercussão clínica.

Apesar do ato de doação ser positivo, para o doador e para o receptor, ainda tem sido uma questão a

ser estudada para se conhecer o real impacto da doação na força muscular respiratória e função pulmonar,

bem como na qualidade de vida dos doadores. A partir dessas informações, novas propostas de manejo

clínico podem ser instituídas e melhor indicadas pela equipe multidisciplinar destinados à esta população.

Portanto, o objetivo desse estudo foi avaliar a função pulmonar e a força muscular respiratória de

doadores renais no pós-operatório de nefrectomia, bem como a ocorrência de complicações pulmonares e

qualidade de vida no pós-operatório de doadores de rim submetidos à nefrectomia.

MÉTODOS

Participantes: Trata-se de uma coorte prospectiva, em que foram recrutados consecutivamente 124

doadores renais submetidos à nefrectomia para doação, independente da via de acesso (lombotomia ou via

subcostal), internados no Hospital do Rim e Hipertensão – Fundação Oswaldo Ramos. Oestudo foi

aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa desta instituição (1127/01) e todos os voluntários deram

consentimento livre e informado.

Critérios de inclusão e exclusão

Como critérios de inclusão foram considerados sujeitos com idade superior a 18 anos e ambos os

sexos; capacidade para realizar os testes propostos.

Os critérios de exclusão foram: indivíduos com presença de doença pulmonar prévia, comorbidades

como hipertensão arterial sistêmica; diabetes mellitus e cardiopatias não controladas clinicamente. Caso

houvesse pacientes com necessidade de ventilação mecânica por tempo superior a 24 horas no pós-

operatório; óbito nas primeiras 12 horas de pós-operatório; necessidade de intervenção em outro órgão

que não somente o rim e reintervenção cirúrgica, esses seriam reportados e analisados separadamente.

Procedimento

Habitualmente todos os doadores são avaliados por uma equipe multiprofissional: assistentes sociais,

psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, enfermeiros e médicos. Para este estudo os doadores foram

avaliados pela Fisioterapia um dia antes do procedimento cirúrgico, no 1º, 2º, 3º e 5º dias de pós-

operatório. As avaliações incluíram dados antropométricos, exame físico, função pulmonar

(espirometria), força muscular respiratória (manovacuometria) e qualidade de vida (SF-36). O radiograma

torácico foi realizado no pré e no 2º dia de pós-operatório. Todos os doadores receberam orientações pré-

operatórias sobre o procedimento cirúrgico; conscientização da importância da tosse, da deambulação e

da fisioterapia respiratória. No período pós-operatório foram submetidos à fisioterapia, que incluiu 15

repetições de exercícios de respiração diafragmática e outras 15 repetições associadas à mobilização ativa

de membros superiores além da deambulação sob a supervisão do mesmo fisioterapeuta, em todos os dias

de internação, até o momento da alta hospitalar. Os atendimentos foram realizados uma vez ao dia com

um tempo médio de 15 minutos cada sessão. Antes da execução dos exercícios, a dor foi avaliada pela

escala visual analógica (EVA)14

e, caso a intensidade da dor fosse igual ou superior a cinco, os doadores

eram medicados de acordo com protocolo da instituição. Conforme protocolo institucional e na ausência

de intercorrências clínicas, os pacientes recebiam alta hospitalar no 3º PO e retornavam

ambulatorialmente para avaliação das últimas medidas no 5º PO. Vale ressaltar que todos os pacientes

desse estudo tiveram alta hospitalar conforme o protocolo. Após 30 dias de pós-operatório, os doadores

retornavam ambulatoriamente, sendo avaliada a presença de CPP pela averiguação em prontuário e

realizavam avaliação do questionário de qualidade de vida (questionário SF-36), aplicado pelo

pesquisador.

Métodos de avaliação

Função pulmonar: A espirometria (Spirobank®, Italy) foi realizada utilizando os critérios técnicos

propostos pelas diretrizes para testes de função pulmonar da American Thoracic Society15

.

Força muscular respiratória: Foi avaliada pela pressão inspiratória máxima (PImáx) e pressão expiratória

máxima (PEmáx), as quais foram obtidas com a utilização de um manovacuômetro (MTR). Foram

realizadas três medidas com o paciente na posição sentada, intervalo de 60 segundos entre elas, adotando-

se a maior. Ambas as medidas foram realizadas a partir da CRF16

. A PImáx foi obtida solicitando-se ao

paciente respirar tranquilamente e a seguir inspirar com a máxima força possível. Simultaneamente, a

parte inspiratória da válvula unidirecional foi ocluída. O registro da PEmáx foi feito solicitando-se ao

paciente respirar tranquilamente e a seguir expirar com a máxima força possível. Nesse momento,

efetuou-se a oclusão da válvula unidirecional. Os bocais utilizados para os registros da força muscular

respiratória continham um mínimo orifício (± 2mm) com o intuito de excluir a força dos músculos bucais

e tornar as medidas mais fidedignas16

. Estes resultados foram comparados aos valores previstos

utilizando as equações de Neder et al17

.

Complicações pulmonares pós-operatórias: Foram caracterizadas pelo radiograma torácico por um

pneumologista da instituição, realizado no 2º dia de pós-operatório, associado aos critérios para

diagnóstico de CPP de acordo com Pereira et al18

, como se segue:

- Pneumonia: Rx de tórax com infiltrado pulmonar associado a dois dos seguintes sinais: expectoração

purulenta; hipertermia superior a 38,3˚C; aumento superior a 25% no número de leucócitos basais.

- Traqueobronquite: Rx de tórax normal associado ao aumento da quantidade ou modificação do

aspecto da secreção.

- Atelectasia: Rx de tórax anormal associado a sintomas respiratórios agudos.

- Insuficiência Respiratória Aguda: Troca gasosa agudamente deficiente e necessidade de suporte

ventilatório invasivo ou não.

- Broncoespasmo: Sibilos à ausculta pulmonar associados a sintomoas respiratórios e necessidade de

medicamentos.

No 30º dia de pós-operatório a presença de CPP foi constatada mediante averiguação dos registros

médicos.

Qualidade de vida: Foi avaliada pelo questionário SF-36, aplicado pelo pesquisador responsável no

período pré-operatório e no 30º dia de pós-operatório. Esse questionário já validado19

, que pontua um

total de 100 pontos, inclui a investigação de oito domínios com 11 questões relacionadas à capacidade

funcional, limitações de aspectos físicos, dor, estado geral da saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos

emocionais e saúde mental. Quanto maior a pontuação total melhor a qualidade de vida.

Análise estatística: A amostra foi selecionada por conveniência. A análise descritiva foi apresentada em

média, desvio padrão para as variáveis numéricas; e em frequência e porcentagem para as variáveis

categóricas. Após constatada distribuição normal dos dados, foram considerados todos os dias de pós-

operatório, porém utilizou-se a análise de variância de medidas repetidas ANOVA para um fator

(ONEWAY) para comparação das médias apenas entre o pré-operatório e os demais dias de pós-operatório

(1º e 5º PO), com análise posthoc de Tukey quando encontrada a diferença. Para todas as comparações foi

utilizado nível de significância de 5%. Os dados foram analisados usando o Sigma Stat 3.2 (San Jose,

EUA).

RESULTADOS

Foram avaliados 124 doadores, 110 (88%) foram incluídos no estudo e 14 (12%) não realizaram a

cirurgia por motivos relacionados ao receptor. As características gerais dos pacientes incluídos

encontram-se na Tabela 1.

Dos 110 doadores incluídos, 72 (65%) do sexo feminino, 25 (22,7%) eram fumantes; 22 (20%) já

tinham fumado, e oito (7,3%) eram etilistas. Entre os doadores, um (0,9%) apresentava insuficiência

coronariana tratada, um (0,9%) diabetes mellitus e nove (8,2%) hipertensão arterial. Todos se

apresentavam estáveis e controlados clinicamente (Tabela1).

Tabela 1. Características gerais dos 110 doadores renais

Média ± DP

Idade (anos) 42,21 ± 9,45

Peso (kg) 68,6 ± 13,60

Altura (cm) 161 ± 0,08

IMC (kg/m2) 26,23 ± 4,46

Tempo cirúrgico (min) 105,04 ± 21,24

Legenda: kg = quilogramas; cm = centímetros; kg/m2

= quilograma por metro quadrado; IMC = Índice de Massa Corpórea;

min = minutos.

Função Pulmonar

Na avaliação da função pulmonar, foi observado diminuição de 27% da CVF no 1º PO (p<0,001),

com recuperação progressiva, apresentando no 5º PO diminuição de aproximadamente 9% quando

comparada com os valores do pré-operatório (p>0,05; Tabela 2).

Quando avaliado o VEF1 observou-se diminuição de 31% e 12% no 1º PO e 5º PO (p<0,001),

respectivamente, sendo observado retorno progressivo aos valores de pré-operatório sem diferença

estatisticamente significante (Tabela 2).

A análise da relação VEF1/CVF, também apresentou diminuição de 6% no 1º PO (p<0,001),

retornando a valores muito próximos do pré-operatório no 5ºPO (p>0,05; Tabela 2).

Tabela 2. Variáveis da Função Pulmonar no pré, 1º, 2º, 3º e 5º dias de pós-operatório

PRÉ 1º PO 2º PO 3º PO 5º PO

CVF (L) 3,57 ± 0,81 2,64 ± 0,74* 2,90 ± 0,76 3,11 ± 0,81 3,24 ± 0,80

% previsto 103,19 ± 12,62 76,33 ± 15,93* 83,72 ± 4,43 89,71 ± 14,04 93,76 ± 15,57

VEF1 (L) 2,96 ± 0,83 2,04 ± 0,6*

2,27 ± 0,63 2,48 ± 0,69 2,60 ± 0,68$

% previsto 99,32 ± 12,97 69,76 ± 15,82* 76,25 ± 17,67 84,91± 15,23 89,17 ± 4,84

$

VEF1/CVF (L) 81,47 ± 7,47 77,17 ± 9,29*

78,59 ± 9,39 80,02 ± 8,96 80,68 ± 7,82

% previsto 100,03 ± 9,53 94,68 ± 11,72* 95,47 ± 14,89 98,37 ± 11,21 98,92 ± 9,94

Legenda: PRÉ = Pré-Operatório; PO = Pós-Operatório; CVF = Capacidade Vital Forçada; L = litros; VEF1 =

Volume Expiratório Forçado no 1º segundo; *p<0.05 comparação Pré vs 1º PO; $ p<0.05 comparação Pré vs 5º PO.

Força muscular respiratória

Na avaliação da força muscular respiratória foi observada queda média da PImáx de 58% no 1º PO

(p<0,001; Tabela 3) com recuperação progressiva, apresentando no 5º PO valores similares quando

comparado aos valores de pré-operatório (p>0,05; Tabela 3).

Ao avaliar a PEmáx, também foi observada diminuição de 51% e 81% no 1º e 5º PO,

respectivamente (p<0,001; Tabela 3).

Tabela 3. Força muscular respiratória dos doadores no pré, 1º, 2º, 3º e 5º dias de pós-operatório

PRÉ 1º PO 2º PO 3ºPO 5ºPO

PImáx (cm H20) 61,78 ± 18,95 36,15 ± 9,97* 41,60 ± 11,69 50,82 ± 16,99 59,62 ± 18,82

% do previsto 61,52 ± 16,93 36,15 ± 9,14* 41,56 ± 10,67 50,37 ± 14.64 59,04 ± 15,77

PEmáx (cm H20) 71,05 ± 20,73 36,59 ± 12,54*

43,65 ± 15,44 49,74 ± 15,25 58,00 ± 18,62$

% do previsto 68,73 ± 17,55 35,53 ± 10,66* 42,35 ± 13,20 48,38 ± 13,01 56,26 ± 15,41$

Legenda: PRÉ = Pré-Operatório; PO = Pós-Operatório; PImáx = Pressão Inspiratória máxima;

PEmáx = Pressão Expiratória Máxima; cm H2O = centímetros de água;

*p<0.05 comparação Pré vs 1º PO; $p<0.05 comparação Pré vs 5º PO.

Complicações pulmonares e dor

Analisando o radiograma torácico, observou-se que 35 (32%) pacientes apresentaram atelectasia

laminar basal, porém sem alteração clínica, não sendo considerado como complicações pulmonares.

Todos os pacientes, no pré-operatório, relataram não sentir qualquer dor, escore0 na escala visual

analógica (EVA). No 1º PO a dor foi em média de 4,88 ± 2,12 (p<0,001) com diminuição progressiva da

dor ao longo dos dias de pós-operatório, ficando no 5º PO com média de 2,55 ± 1,46 (p<0,001).

Qualidade de vida

Ao analisar os 110 doadores, foi observado diferença na maioria dos domínios do questionário

aplicado o SF-36, quando comparado os períodos pré e pós-operatório. Foi observado piora nos domínios

da capacidade funcional, limitação de aspectos físicos, dor, vitalidade e aspectos sociais (p<0,05; Tabela

4). Os domínios estado geral da saúde, aspectos emocionais e saúde mental foram similares aos valores

observados no período de pré-operatório (p>0,05; Tabela 4).

Tabela 4. Qualidade de vida no pré e pós-operatório dos 110 doadores renais

DOMÍNIOS PRÉ-

OPERATÓRIO

PÓS-

OPERATÓRIO

p

Capacidade Funcional 91,09 ± 10,03 77,32 ± 20,53 0.001*

Aspectos Físicos 92,07 ± 19,72 46.22 ± 43,57 0.001*

Dor 81,02 ± 17,54 64,29 ± 22,63 0.001*

Estado geral de Saúde 87,71 ± 14,21 90,27 ± 10,87 0.26

Vitalidade 74,63 ± 20,32 54,51 ± 12,69 0.003*

Aspectos Sociais 93,90 ± 11,20 77,74 ± 22,45 0.001*

Aspectos Emocionais 95,94 ± 13,32 89,53 ± 20,05 0.09

Saúde Mental 85,46 ± 11,69 80,29 ± 19,13 0.75

* p<0,05

DISCUSSÃO

O presente estudo mostrou que os pacientes submetidos à nefrectomia apresentam redução da função

pulmonar e da força muscular respiratória no 1º PO, comparado ao período pré-operatório com retorno

gradativo no 5º PO, e não apresentam complicações pulmonares. Quanto à qualidade de vida, não foi

observado diferença significativa em relação ao estado geral da saúde, aspectos emocionais e saúde

mental, entretanto houve piora da capacidade funcional, limitação de aspectos físicos, dor, vitalidade e

aspectos sociais.

Em nosso estudo, observamos menor comprometimento da função respiratória em doadores hígidos

submetidos à nefrectomia comparado à outras cirurgias abertas do abdome superior5,7,13,20

. Nossos

achados mostram que a CVF e VEF1 diminuem em torno de 30% no primeiro dia de pós-operatório,

dados estes que diferem dos encontrados em outras cirurgias do abdome superior, as quais estas variáveis

são geralmente reduzidas em aproximadamente 50%20,21

. Além disso, a CVF retornou aos valores pré-

operatórios no quinto dia de pós-operatório, o que normalmente ocorre em sete ou mais dias de após o ato

cirúrgico7,22

. Apesar da nefrectomia ter sido realizada por via convencional, nossos resultados são

similares aos encontrados em pacientes submetidos à procedimentos por via laparoscópica23,24

.

Corroborando estes dados, Lunardi et al25

, em 2013 observaram redução de 24% na capacidade

inspiratória máxima em pacientes submetidos à CAA por via laparoscópica.

Em relação à força muscular respiratória, verificamos diminuição de 58% PImáx e da 51% PEmáx no

1º PO de pós-operatório com tendência progressiva aos valores basais nos dias subsequentes de pós-

operatório, o que são dados similares aos previamente descritos na literatura12,21,26

.Várias possibilidades

têm sido sugeridas na literatura para justificar as alterações da função e força muscular respiratória no

período pós-operatório tais como dor, local da incisão operatória, tempos de anestesia e cirurgia, mas

principalmente a disfunção da mobilidade do diafragma devido a inibição reflexa do nervo frênico6,7,9

,

entretanto, o contínuo avanço e aprimoramento das técnicas cirúrgicas, além da presença de equipe

multidisciplinar voltada para o atendimento do paciente cirúrgico parecem contribuir para justificar a

menor repercussão pulmonar encontrada no presente estudo.

Curiosamente, em nosso estudo, não ocorreram CPP, entretanto, 35% dos pacientes apresentaram

achados radiológicos que poderiam desencadear tais complicações. Apesar da incidência de complicações

pulmonares nas CAA variar entre 9 a 40%, acreditamos que esta variabilidade ocorra pela divergência na

definição de critérios diagnósticos utilizados para definir CPP7,9

. No presente estudo foram utilizados

rigorosos critérios para definição de CPP, fato este que pode justificar nossos achados quando

comparados ao de estudos prévios7,10

. Interessantemente, estudos realizados na mesma instituição,

utilizando os mesmos critérios diagnósticos mostraram incidência entre 7 a 24%8,27

. Uma possível

hipótese para este achado é o fato da nossa amostra populacional ser constituída de sujeitos hígidos e

jovens associado aos avanços e melhorias nos cuidados perioperatórios ao longo dos anos, incluindo a

fisioterapia.

Embora nossa amostra tenha sido submetida à nefrectomia aberta, pudemos observar que nossos

resultados foram semelhantes aos encontrados em sujeitos submetidos à nefrectomia via laparoscópica23

.

Diversos estudos mostram que estes procedimentos estão associados à analgesia reduzida, menor tempo

de internação hospitalar e apresentam retorno precoce às condições pré-operatórias23,24,28

. Porém, recente

revisão sistemática23

mostrou que ao comparar cirurgias por vídeo e aberta, a incidência de complicações

gerais tais como, reoperação, perda precoce do enxerto e função retardada do enxerto, são similares em

ambos os procedimentos. Ferrario e colaboradores24

avaliaram 46 doadores submetidos à nefrectomia via

laparoscópica e, assim como em nosso estudo, não foram relatadas complicações pós-operatórias durante

o período hospitalar; entretanto, ao compararmos nossos achados aos dele, observamos que embora nossa

amostra populacional tenha sido submetida à nefrectomia aberta, apresentou menores tempos cirúrgico

(105,04 ± 21 vs 170 ± 45 minutos) e de internação hospitalar (3 vs 5 ± 1dias).

Ao avaliar a qualidade de vida, observamos diferenças na capacidade funcional, na limitação por

aspectos físicos, na dor, vitalidade e aspectos sociais após o ato operatório, corroborando com achados

prévios de outros autores29,30

. Entretanto, no presente estudo, não foram observadas alterações no estado

geral de saúde, aspectos emocionais e saúde mental, fato este pode significar que a satisfação pessoal e

emocional pelo ato de doação está realmente presente29.

Embora apresentem alterações na dor, na

capacidade física e funcional, estudos evidenciam que os doadores retornam aos níveis de suas atividades

de vida diária pré-doação em pouco tempo29,30

, porém, ainda não há consenso sobre o período exato em

que isso ocorre. Apesar de nosso estudo ter avaliado a qualidade de vida 30 dias após a doação, observa-

se que alterações em certos domínios podem ser decorrentes do efeito do ato cirúrgico similar a qualquer

outro procedimento desta magnitude.

Um importante diferencial do nosso estudo foi o fato de que todos os pacientes foram submetidos à

fisioterapia respiratória nos períodos pré e pós-operatório, realizada uma vez ao dia. No pré-operatório,

foram dadas orientações quanto à incisão cirúrgica, importância da tosse, deambulação precoce e

exercícios fisioterapêuticos e no pós-operatório foram realizados exercícios respiratórios sob supervisão.

Por se tratar de um hospital universitário, com crescentes dificuldades assistenciais e com cuidados pré e

pós-operatórios deficitários, poderíamos esperar encontrar maiores repercussões na função e muscular

respiratória associados a complicações pós-operatórias. Entretanto, diferentemente de outros pacientes

cirúrgicos12,20,21

, nossa amostra era constituída por sujeitos hígidos e associado a isto, a possível

conscientização prévia da importância da fisioterapia e sua realização com supervisão, possam justificar

nossos achados.

O presente estudo apresenta algumas limitações. Primeiro, não comparamos a repercussão na função

pulmonar e força muscular respiratória em nefrectomias por vídeo e aberta, entretanto não era o objetivo

deste estudo. Segundo, a qualidade de vida foi acompanhada por 30 dias devido às rotinas da instituição,

porém acreditamos que maior tempo possa ser necessário para observação da sua evolução.

CONCLUSÃO

Nossos resultados sugerem que doadores submetidos à nefrectomia apresentam redução da função

pulmonar e da força muscular respiratória no 1º PO, como qualquer outro procedimento cirúrgico, com

retorno gradativo aos valores de pré-operatório já no 5º PO e não apresentam complicações pulmonares,

possivelmente pelo fato de terem sidos acompanhados pela Fisioterapia durante toda internação

hospitalar. Após 30 dias, a qualidade de vida, o estado geral da saúde, aspectos emocionais e saúde

mental permanecem inalterados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Vanbelleghem H, Vanholder R, Levin NW, Becker G, Craig JC, Ito S, et al. The Kidney Disease:

improving Global Outcomes website: comparison of guidelines as a tool for harmonization. Kidney Int.

2007; 71(10): 1054-61.

2. Medina-pestana JO: Organization of a high-volume kidney transplant program – the “assemblyline”

approach. Transplantation. 2006; 81(11): 1510-20.

3. Perlis N, Connelly M, JR DAH, Pace KT, Stewart R. Evaluating potential live-renal donors: Causes for

rejection, deferral and planned procedure type, a single-centre experience. Can UrolAssoc J. 2013; 7(1-2):

41-5.

4.Ibrahim HN, Foley R, Tan L, Rogers T, Bailey RF, Guo H, et al. Long-term consequences of kidney

donation. N Engl J Med. 2009; 360(5): 459-69.

5. Chiavegato L, Medina-Pestana J, Tedesco-Silva H, Paisani D, Fiore J, Jr., Faresin S. Surgical approach

does not affect perioperative respiratory morbidity in living donor nephrectomy: comparison between

anterior subcostal incision and flank incision. Transplant Proc. 2010; 42(5): 1472-5.

6. Lawrence VA, Cornell JE, Smetana GW. Strategies to reduce postoperative pulmonary complications

after non cardiothoracic surgery: systematic review for the American College of Physicians. Ann Intern

Med. 2006; 144(8): 596-608.

7.Smetana GW. Postoperative pulmonary complications: an up date on risk assessment and reduction.

Cleve Clin J Med. 2009; 76: 60–5.

8. Paisani DM, Fiore JF, Lunardi AC, Colluci DBB, Santoro IL, Carvalho CRF, et al. Preoperative six-

min walking distance does not predict pulmonary complications in upper abdominal surgery.

Respirology.2012; 17: 1013–1017.

9. Scholes RL, Browning L, Sztendur EM, Denehy L. Duration of anesthesia, type of surgery, respiratory

co-morbidity, predicted VO2max and smoking predict postoperative pulmonary complications after upper

abdominal surgery: an observational study. Aust J Physiother. 2009; 55(3): 191-8.

10. Arozullah AM, Conde MV, Lawrence VA. Preoperative evaluation for postoperative pulmonary

complications. Med Clin North Am. 2003; 87: 153–73.

11. Chetta A, Tzani P, Marangio E et al. Respiratory effects of surgery and pulmonary function testing in

the preoperative evaluation. Acta Biomed 2006; 77:69-74.

12. Barbalho-Moulim MC, MiguelGP, Forti EM, Campos FA, Costa D. Effects of preoperative

inspiratory muscle training in obese women undergoing open bariatric surgery: respiratory muscle

strength, lung volumes, and diaphragmatic excursion. Clinics 2011; 66 (10): 1721-7.

13. Arozullah AM, Daley J, Henderson WG et al. Multifactorialrisk index for predicting postoperative

respiratory failure in men after major non cardiac surgery. The National Veterans Administration Surgical

Quality Improvement Program. Ann Surg. 2000;232: 242–53.

14. Bodian CA, Freedman G, Hossain S, Ensenkraft JB, Beilin Y. The visual analogic scale for pain.

Clinical significance in postoperative patients. Anesthesiology 2001; 95(6):1356-61

15. American Thoracic Society. Standardization of Spirometry, 1994 Update. Am J Respir Crit Care Med

1995; 152:1107-36.

16. Souza R. Pressões respiratórias estáticas máximas. J Pneumol. 2002; 3: S155- S65.

17. Neder JA, Andreoni S, Lerario MC, Nery LE. Reference values for lung function tests II. Maximal

respiratory pressures and voluntary ventilation. Braz J Med Biol Res. 1999; 32(6): 719-27.

18. Pereira ED, Fernandes AL, Silva C et al. Prospective assessment of the risk of postoperative

pulmonary complications in patients submitted to upper abdominal surgery. São Paulo Med J 1999;

117(4):151-60.

19. Ciconelli R FM. Tradução para o português e validação do questionário genérico de avaliação de

qualidade de vida: Medical Outcome Study 36 – Item Short Form Health Survey (SF-36). Ver Bras

Reumat. 1999; 39:143-50.

20. Damiani G, Pinnarelli L, Sammarco A, Sommella L, Francucci M, Ricciardi W. Postoperative

pulmonary function in open versus laparoscopy cholecystectomy: a meta-analysis of the Tiffenau index.

Dig Surg. 2008;25(1):1-7.

21. Paisani DM CL, Faresin SM. Volumes, capacidades pulmonares e força muscular respiratória no pós-

operatório de gastroplastia. J Bras Pneumol. 2005; 2(31): 125-32.

22.Smetana GW, Lawrence VA, Cornell JE.Preoperative pulmonary risk stratification for non

cardiothoracic surgery: systematic review for the American College of Physicians. Ann Intern Med. 2006;

144(8):581-95.

23. Wilson CH, Sanni A, Rix DA, Sommro NA. Laparoscopic versus open nephrectomy for live kidney

donors. Cochrane Data base Syst Rev. 2011;(11):CD006124.

24. Ferrario M, Buckel E, Astorga C, Godoy J, Aguiló J, González G, et al. Results in laparoscopic living

donor nephrectomy: a multicentric experience. Transplant Proc. 2013;45(10):3716-8.

25. Lunardi AC, Paisani DM, Tanaka C, Carvalho CR. Impact of laparoscopic surgery on

thoracoabdominal mechanics and inspiratory muscular activity. Respir Physiol Neurobiol. 2013;

186(1):40-4.

26. Lunardi AC, Miranda CS, Silva KM, Cecconello I, Carvalho CR. Weakness of expiratory muscles

and pulmonar complications in malnourished patients undergoing upper abdominal surgery. Respirology.

2012; 17(1):108-13.

27. Filardo FA, Faresin SM, Fernandes ALG. Index for a pulmonar postoperative complication after

upper abdominal surgery: a validationstudy. Rev Assoc Med Bras.2002; 48: 209–16.

28. Greco F, Hoda MR, Alcaraz A, Bachmann A, Hakenberg OW, Fornara P. Laparoscopic living-donor

nephrectomy: analysis of the existing literature. Eur Urol. 2010;58(4):498-509.

29. Lopes A, Frade IC, Teixeira L, Almeida M, Dias L, Henriques AC. Quality of life assessment in a

living donor kidney transplantation program: evaluation of recipients and donors. Transplant Proc. 2013;

45(3): 1106-9.

30. De Groot IB, Schipper K, van Dijk S, Van der Boog PJ, Stiggelbout AM, Baranski AG, et al.

Decision making around living and deceased donor kidney transplantation: a qualitative study exploring

the importance of expected relationship changes. BMC Nephrol.2012; 13: 103.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O comprometimento da função respiratória observada em doadores hígidos submetidos à

nefrectomia parece ser menos pronunciado no período pós-operatório quando comparado a

outras CAA, porém essa população ainda tem sido pouco estudada. Visto o crescimento dos

índices de transplantes renais com doadores vivos, levantou-se o questionamento de quais

seriam as repercussões pós-operatórias desses pacientes, para que a partir dessas informações

novas propostas de manejo clínico pudessem ser instituídas e melhor indicadas pela equipe

multidisciplinar a essa população.

Nosso estudo foi inovador em nosso meio, uma vez que destinamos um foco específico

para a repercussão da nefrectomia no pós-operatório nos doadores renais hígidos. Além disso,

um importante diferencial do presente estudo foi o fato de que todos os doadores foram

submetidos à fisioterapia respiratória nos períodos pré e pós-operatório, realizada uma vez ao

dia. No pré-operatório, foram dadas orientações quanto à incisão cirúrgica, importância da

tosse, deambulação precoce e exercícios fisioterapêuticos. Dessa forma, todos já estavam

conscientes da importância da fisioterapia, antes mesmo da intervenção operatória, e

esclarecidos acerca dos riscos acentuados que poderiam apresentar no período pós-operatório

para a possível ocorrência de CPP. Por se tratar de um hospital universitário, com crescentes

dificuldades assistenciais e com cuidados pré e pós-operatórios deficitários, esperava-se

encontrar maior repercussão negativa na função pulmonar e força muscular respiratória

associadas à maior incidência de CPP. Entretanto, devemos ressaltar que nossa amostra era

constituída por sujeitos hígidos e, associado a isto, a possível conscientização prévia da

importância da fisioterapia e a atuação da mesma no período pós-operatório possam justificar

nossos achados.

Vale salientar que nosso estudo se preocupou em observar a qualidade de vida dos

voluntários antes e 30 dias após a doação. Não foram observadas alterações no estado geral de

saúde, aspectos emocionais e saúde mental, fato este muito relevante e possivelmente

significa que a satisfação pessoal e emocional pelo ato de doação está realmente presente.

Entretanto, foram observadas diferenças na capacidade funcional, limitação por aspectos

físicos, dor, vitalidade e aspectos sociais. Esses domínios estão naturalmente interligados,

corroborando com outros autores que também observaram limitação nos mesmos aspectos da

qualidade de vida após o ato operatório. Embora apresentem alterações na dor, capacidade

física e funcional, estudos evidenciam que os doadores retornam aos níveis de suas atividades

de vida diária pré-doação em pouco tempo, mas ainda não há consenso sobre o período exato

em que isso ocorre. Apesar de nosso estudo ter reavaliado a qualidade de vida 30 dias após a

doação, as alterações encontradas podem ser decorrentes do próprio ato cirúrgico similar a

qualquer outro procedimento desta magnitude.

Ainda que o objetivo inicial do estudo tenha sido avaliar a repercussão da nefrectomia na

função pulmonar, força respiratória e qualidade de vida, a comparação com um grupo controle

poderia ser benéfica para avaliar o real papel e a importância da fisioterapia nessa população.

Além disso, evidências prévias reforçam que a presença de comorbidades é um significante

fator de risco para o desenvolvimento de CPP e a exclusão desses pacientes em nosso estudo

pode ter influenciado os resultados encontrados. Dessa forma podemos reiterar a importância

de um manejo clínico destinado a essa população, assim como novos estudos para delinear a

repercussão da nefrectomia nos doadores, principalmente em longo prazo.