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Responsabilidade civil do estado – aplicação do artigo 37

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Responsabilidade civil do Estado – Aplicação do artigo 37, parágrafo 6.º, da Constituição Federal – Responsabilidade objetiva – Omissão estatal – Estado que possui o dever de zelar pela integridade física e moral do preso – CF, art. 5.º, XLIX – Presença dos elementos configuradores do dever de indenizar – Morte que se deu pela inobservância do dever de cuidado evigilância com a vítima em ambiente carcerário

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APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO N.° 809691-3, DA COMARCA DE CURITIBA – 3.ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA RELATOR : DESEMBARGADOR Francisco Pinto RABELLO FILHO REMETENTE : JUIZ DE DIREITO APELANTES 1 : MARIA CLÁUDIA PEGO MACHADO E OUTRA APELANTE 2 : ESTADO DO PARANÁ APELADOS : OS MESMOS

Ação de indenização por danos material e moral. Presidiário vítima de homicídio praticado por outros detentos, no interior da Penitenciária onde cumpria pena, durante rebelião.

1. Legitimidade ativa – Conjunto probatório que revela a presença dos requisitos caracterizadores da união estável existente entre a primeira autora e o falecido – Paternidade em relação à segunda autora também demonstrada.

2. Responsabilidade civil do Estado – Aplicação do artigo 37, parágrafo 6.º, da Constituição Federal – Responsabilidade objetiva – Omissão estatal – Estado que possui o dever de zelar pela integridade física e moral do preso – CF, art. 5.º, XLIX –Presença dos elementos configuradores do dever de indenizar – Morte que se deu pela inobservância do dever de cuidado e vigilância com a vítima em ambiente carcerário – Dever do Estado de disponibilizar instalações seguras, adequadas e apropriadas, além de vigilância segura e contínua.

3. Valor fixado a título de indenização por dano moral – Majoração – Montante indenizatório que não pode ser irrisório nem pode ensejar enriquecimento sem causa – Observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

4. Pretensão de condenação do réu ao pagamento de pensão mensal alimentícia à companheira da vítima – Impossibilidade – Ausência de prova de que a companheira dependia economicamente da vítima – Companheira que conheceu a vítima quando ela já se encontrava presa – Pensionamento descabido.

5. Filha da vítima – Pensão alimentícia mensal devida desde a data do evento danoso até a data em que ela completar 25 anos – Orientação consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça.

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5.1. Pensão mensal fixada em um salário mínimo – Necessidade de redução para o equivalente a 2/3 do salário mínimo – Imprescindibilidade de abatimento do montante que seria utilizado para benefício da própria vítima – Precedentes do STJ e desta Corte.

6. Juros de mora – Fixação – Responsabilidade extracontratual – Data do evento danoso – STJ, súmula 54.

7. Atualização do débito na forma do artigo 1.º-F da Lei n.º 9.494/1997, com redação dada pela Lei n.º 11.960/2009 – Índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança – Índice que, em regra, somente pode ser utilizado após a entrada em vigor da Lei n.º 11.960/2009 – Tempus regit actum – Sentença que determina a atualização dos valores na forma desse dispositivo legal, atingindo período anterior à vigência daquela lei – Benefício à Fazenda Pública – Manutenção desse índice, sob pena de reformatio in peius.

8. Honorários advocatícios – Valor fixado que se mostra excessivo – Redução.

9. Recursos parcialmente providos e sentença parcialmente reformada em sede de reexame necessário.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível e reexame

necessário n.º 809691-3, de Curitiba, 3.ª Vara da Fazenda Pública, em que é

remetente Juiz de Direito, apelantes 1 Maria Cláudia Pego Machado e Sara

Heloisa Pego Machado dos Santos, apelante 2 Estado do Paraná e apelados, os

mesmos.

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Exposição

1. Maria Cláudia Pego Machado e Sara Heloisa Pego Machado dos

Santos ajuizaram ação de reparação de danos material e moral em face de

Estado do Paraná, perante a 3.ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba.

1.1. Petição inicial (fs. 2-28) e documentos (fs. 29-97): i) em 28/11/2003, por volta das 10h30, Saneo Aparecido dos Santos, companheiro

da primeira autora, Maria Cláudia Pego Machado, e pai da segunda, Sara Heloisa Pego

Machado dos Santos, foi assassinado por golpes de marreta e pá na Penitenciária Estadual

de Piraquara, onde cumpria pena, no momento em que ocorria uma rebelião;

i.i) a segunda autora sequer havia nascido quando do falecimento de seu pai;

ii) o óbito da vítima, que já havia cumprido quase a totalidade da pena que lhe foi

imposta, só ocorreu em razão da negligência e descaso do réu com o seu sistema carcerário;

iii) o Estado deve assegurar ao preso as mínimas condições de sobrevivência e

segurança, sendo responsável por ele a partir do momento em que o segrega;

iv) a vítima estava sofrendo constantes ameaças, pois estava colaborando com o

Poder Judiciário, e o réu, mesmo tendo conhecimento dessas ameaças, nada fez para

assegurar sua integridade;

v) a morte de seu companheiro e pai lhes causou enorme abalo moral, além de

significativos prejuízos materiais, os quais devem ser indenizados;

vi) aplica-se ao caso a teoria da responsabilidade civil objetiva;

vii) estão presentes os requisitos caracterizadores do dever de indenizar;

viii) fazem jus a pensão mensal, devendo ser vitalícia a da primeira autora

(companheira) e observada, em relação à segunda autora, a estimativa de vida da vítima em

70 anos, integrado em ambos os casos o 13.º salário e o valor correspondente às férias;

ix) o valor da pensão deverá observar o disposto no artigo 948, inciso II, do Código

Civil;

x) requerem antecipação de tutela, para imediata prestação de alimentos;

xi) necessidade de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.

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1.2. Foram concedidos os benefícios da assistência judiciária gratuita

e indeferido o pedido de antecipação de tutela (fs. 100-101).

1.3. Contestação (fs. 108-123): i) é parte ilegítima para figurar no polo passivo da presente demanda, já que Saneo

Aparecido dos Santos foi assassinado por outros presos que cumpriam pena na

Penitenciária Estadual de Piraquara, durante uma rebelião iniciada no momento da retirada

de outro presidiário, não lhe podendo ser atribuída qualquer responsabilização;

ii) os agentes penitenciários não colaboraram para o assassinato de Saneo e

tampouco tinham condições de evitar o evento, que aconteceu repentinamente;

iii) inexiste prova da legitimidade das autoras para figurarem no polo ativo da

relação jurídica processual;

iv) consta na certidão de óbito de Saneo que ele era solteiro e faleceu sem deixar

filhos;

v) a vítima estava presa desde 1995, o que revela que a primeira autora não

mantinha com ele união estável;

vi) não há demonstração dos elementos configuradores da união estável, que a

primeira autora aduz que mantinha com o falecido;

vii) a segunda autora somente nasceu após o falecimento de Saneo, de modo que não

teve ele oportunidade de impugnar a paternidade;

viii) o registro de nascimento da segunda autora foi realizado tão-somente com base

na declaração da primeira autora e não foi precedido das formalidades legais;

ix) a responsabilidade do Poder Público por ato omissivo é subjetiva, ou seja,

pressupõe dolo ou culpa;

x) não há qualquer demonstração de que tenha agido com dolo ou culpa, ônus que

incumbia à parte autora;

xi) não há falar em pensionamento, já que a vítima não exercia nenhuma atividade

remunerada, e por conseguinte, não contribuía para o sustento de sua família;

xii) alternativamente, o valor da pensão mensal não poderá ultrapassar 2/3 de um

salário mínimo, a ser dividido entre as duas autoras, sendo considerada devida apenas a

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partir de quando findaria a pena da vítima;

xii.i) o pagamento da pensão deve findar em relação à primeira autora quando ela

vier a conviver maritalmente com outra pessoa ou até a data em que Saneo completaria 65

anos de idade, e em relação à segunda autora, até que ela atinja a maioridade civil;

xiii) inexiste demonstração do alegado abalo moral, de modo que não pode ser

compelido ao pagamento de indenização a esse título;

xiv) caso se entenda devida a indenização pelo dano moral, o valor deverá ser fixado

moderadamente, sob pena de ensejar o enriquecimento ilícito das autoras.

1.4. Após a réplica (fs. 127-134), instadas (f. 135), as autoras

requereram a produção de prova oral, consistente no depoimento pessoal do

representante do réu e oitiva de testemunhas (f. 139) e o réu, requereu o

julgamento antecipado do mérito (f. 140).

1.5. Afastada a alegação de ilegitimidade passiva aventada pela parte

ré (fs. 143-144), o digno juiz da causa fixou os pontos controvertidos e deferiu a

produção de prova oral (f. 152).

1.6. Em audiência (f. 166), foi colhido o depoimento pessoal da autora

Maria Cláudia Pego Machado (f. 167), assim como inquiridas duas testemunhas

arroladas pela parte autora (fs. 168-169) e uma informante também arrolada pela

parte autora (f. 170).

1.7. Após a apresentação de memoriais (fs. 177-182 e 183-192), tendo

em vista a alegação formulada pelo réu de conexão entre a presente demanda e a

ação autuada sob n.º 25.514, em que a mãe do falecido Saneo Aparecido dos

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Santos também postula indenização em razão do mesmo evento danoso, foi

determinada a intimação das autoras (f. 197), que se manifestaram às fs. 199-200.

1.8. Determinado o apensamento destes autos com os autos n.º 25.514

(f. 204), não foram eles apensados, porque naquela demanda já foi prolatada

sentença (f. 205).

1.9. Colhida a manifestação do Ministério Público (fs. 207-210), foi

proferida sentença1, que (fs. 217-229): i) julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial;

ii) condenou o réu ao pagamente de R$ 50.000,00 a título de indenização por dano

moral, divididos igualitariamente entre as autoras, acrescidos de correção monetária, na

forma que especificou, desde a data do arbitramento;

iii) impôs ao réu o pagamento de pensão mensal à autora Sara Heloísa Pego

Machado dos Santos, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data do trânsito em

julgado da sentença, até que atinja a maioridade civil;

iv) condenou o réu ao pagamento de 75% das custas processuais e honorários

advocatícios, fixados em R$ 8.000,00, e a primeira autora ao pagamento dos 25% restantes,

bem como ao pagamento dos honorários advocatícios ao procurador do réu, fixados em R$

1.000,00;

v) suspendeu a exigibilidade dos ônus de sucumbência relativamente à parte autora,

nos termos do disposto no artigo 11, parágrafo 2.º, e 12 da Lei n.º 1.060/1950;

vi) submeteu a sentença a reexame necessário.

1.10. Apelação da parte autora (fs. 231-238): i) ao contrário do que entendeu o digno juiz da causa, a primeira autora,

companheira do falecido, também faz jus ao pagamento de pensão mensal;

ii) apenas não havia relação de dependência econômica entre a primeira autora e o

1 Juiz Roger Vinicius Pires de Camargo Oliveira.

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falecido no momento do evento danoso porque ele estava preso;

iii) tal situação estava na iminência de se alterar, uma vez que o falecido estava

próximo de sua liberdade;

iv) a dependência econômica no caso é presumida;

v) deve o réu ser condenado ao pagamento de pensão mensal também à primeira

autora, até que venha, ao menos, a constituir nova família;

vi) a pensão mensal a que faz jus a segunda autora deve ser paga desde a data do

falecimento de seu pai, até a data em que ele completaria 70 anos de idade, ou

alternativamente, desde a data do seu nascimento até a data em que ela complete 25 anos de

idade;

vii) o valor arbitrado a título de pensão mensal é insuficiente para atender às suas

necessidades básicas, devendo ser majorado;

viii) o valor da indenização por dano moral também é irrisório, de modo que deve

ser elevado.

1.11. Apelação da parte ré (fs. 239-254): i) não estão presentes os requisitos configuradores do dever de indenizar;

ii) não pode ser responsabilizado pelo falecimento de Saneo Aparecido dos Santos,

pois ele foi assassinado por outros presos que cumpriam pena na Penitenciária Estadual de

Piraquara, durante uma rebelião iniciada no momento da retirada de outro presidiário;

iii) os agentes penitenciários não colaboraram para o assassinato de Saneo e

tampouco tinham condições de evitar o evento, que aconteceu repentinamente;

iv) inexiste nexo de causalidade entre sua suposta conduta omissiva e os danos

suportados pelas autoras em decorrência da morte de Saneo;

v) o ato ilícito foi praticado exclusivamente por terceiro;

vi) a produção probatória revelou que não agiu com omissão na guarda e vigilância

dos presos;

vi) os juros moratórios apenas podem fluir a partir do final do exercício seguinte à

inscrição do precatório requisitório que será expedido, no orçamento estadual, conforme

estabelece o artigo 100, parágrafo 5.º, da Constituição Federal, com redação dada pela

Emenda Constitucional n.º 62/2009;

vii) o valor fixado a título de honorários advocatícios é excessivo, devendo ser

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reduzido.

1.12. Com as respostas (fs. 258-269 e 270-276), subiram os autos a

esta egrégia Corte de Justiça, onde foi colhida a opinião do Ministério Público,

emitida pelo digno procurador de justiça Francisco Gmyrterco, que veio no

sentido de ser desprovido o recurso do réu, dado parcial provimento ao recurso

da parte autora, para que a pensão mensal fixada a favor da primeira autora seja

paga desde o seu nascimento até a data em que completar 25 anos, a partir de

quando deverá ser reduzida à metade do patamar estabelecido inicialmente e

paga até a data em que o falecido completaria 70 anos, mantendo-se a sentença,

quanto ao mais, em sede de reexame necessário (fs. 286-307).

Voto

2. Os pressupostos de admissibilidade recursal

2.1. Os recursos merecem conhecimento, na medida em que estão

presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, assim os intrínsecos

(cabimento, legitimação e interesse em recorrer), como os extrínsecos

(tempestividade, regularidade formal, inexistência de fato impeditivo ou

extintivo do poder de recorrer e preparo dispensado).

2.2. Esclareço que a apreciação da sentença em reexame necessário

será feita simultaneamente à análise das apelações, tendo em vista que os

recursos abordam toda a matéria discutida nos autos, com exceção da alegação de

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ausência de comprovação da legitimidade das autoras para figurarem no polo

ativo da presente demanda, o que se analisará previamente.

3. A legitimidade ativa

3.1. Maria Claudia Pego Machado e Sara Heloísa Pego Machado dos

Santos ajuizaram a presente ação de reparação por danos material e moral em

face do Estado do Paraná, buscando o pagamento de indenização pelos danos

sofridos em decorrência do óbito de Saneo Aparecido dos Santos, companheiro

da primeira autora e pai da segunda, na Penitenciária Estadual de Piraquara, onde

cumpria pena.

3.2. Ao contestar a presente ação de reparação de danos o réu

sustentou a inexistência de comprovação da legitimidade das autoras para

figurarem no polo ativo da relação jurídica processual.

3.2.1. Disse que inexiste comprovação de que a autora Maria Cláudia

Pego Machado mantinha com Saneo Aparecido dos Santos união estável,

tampouco que a autora Sara Heloísa Pego Machado dos Santos de fato é filha do

falecido, uma vez que ela somente nasceu após o falecimento de Saneo.

3.3. Tal preliminar foi afastada pelo digno juiz da causa (fs. 219-223).

3.4. Nesse ponto, absolutamente correta a decisão objeto de revisão.

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3.5. É que a análise dos autos do processo revela que, como bem

reconheceu o digno juiz da causa, a primeira autora comprovou satisfatoriamente

a presença dos requisitos caracterizadores da união estável existente entre ela e o

falecido Saneo Aparecido dos Santos, o que enseja a sua legitimidade para a

propositura da presente demanda (fs. 220 e 222):

[...]

Dos autos emerge claramente que: (1) a autora efetivamente conheceu o de cujus

enquanto este se encontrava recluso à Penitenciária de Piraquara, de sorte que não

coabitaram sob o mesmo teto; (2) o período de convivência foi de aproximadamente dois

anos, segundo o relato da própria autora, confirmado por depoimentos de testemunhas

ouvidas em audiência de instrução; (3) nesse período, a primeira requerente engravidou,

dando a luz à segunda requerente após o falecimento do de cujus e pai; (4) há indícios de

que o de cujus pretendia casar-se civilmente com a primeira requerente quando fosse

liberado do carceramento.

[...]

Neste sentido, caracterizado plenamente o objetivo comum de constituir família, os

depoimento de fls. 166 e seguintes também permitem compreender o caráter extrínseco

necessário à configuração da união estável: a convivência pública e notória entre a autora e

o de cujus como se marido e mulher fossem.

3.6. Quanto à segunda autora, a sua legitimidade também está

evidenciada. É, aliás, o que se extrai do mandado de averbação de f. 137, bem

como da certidão de nascimento de f. 95, onde consta expressamente que ela é

filha de Saneo Aparecido dos Santos.

3.7. Daí porque não merece retoque a sentença nesse ponto.

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4. A responsabilidade civil do Estado

4.1. Sustenta o réu que não lhe pode ser atribuído o dever de

indenizar, na medida em que inexiste nexo de causalidade entre sua suposta

conduta omissiva e os danos suportados pelas autoras em decorrência do

falecimento de Saneo Aparecido dos Santos.

4.2. Pois bem. Como estamos diante de situação de conduta omissiva,

é necessário verificar se a responsabilidade civil atribuída ao Estado do Paraná,

no caso presente, é objetiva ou subjetiva.

4.3. Analisando o tema, expõe Marçal Justen Filho2:

[...] Tradicionalmente, afirma-se que a responsabilidade civil do Estado por ato

comissivo tem cunho objetivo, enquanto a responsabilidade por ato omissivo apresenta

natureza subjetiva.

Essa tese é logicamente insustentável, e se afigura muito mais razoável afirmar que,

em todos os casos, há um elemento subjetivo, mas subordinado a regime especial.

Na atuação comissiva, o dever de diligência especial impõe ao agente a adoção de

cautelas muito severas, visando precisamente a evitar a produção de lesão a terceiros.

Portanto, quando a atuação comissiva do agente estatal produz o dano a terceiro, presume-

se a presença de um elemento subjetivo defeituoso. O agente produziu o dano porque houve

defeito na formação de sua vontade.

Já na atuação omissiva, a situação é diversa e mais complexa.

[...]

As hipóteses de dano derivado de omissão podem ser diferenciadas em dois grandes

grupos. Existem os casos em que uma norma prevê o dever de atuação e a omissão

2 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 1.254-1.255.

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corresponde à infração direta ao dever jurídico (ilícito omissivo próprio). E há os casos em

que a norma proscreve certo resultado danoso, o qual vem a se consumar em virtude da

ausência da adoção das cautelas necessária a tanto (ilícito omissivo impróprio).

4.3.1. Prossegue esse autor3:

Os casos de ilícito omissivo próprio são equiparáveis aos atos comissivos, para

efeito de responsabilidade civil do Estado. Assim, se uma norma estabelecer que é

obrigatório o agente público praticar certa ação, a omissão configura atuação ilícita e gera

a presunção de formação defeituosa da vontade. O agente omitiu a conduta obrigatória ou

por atuar intencionalmente ou por formar defeituosamente sua própria vontade – a não se

que a omissão tenha sido o resultado intencional da vontade orientada a produzir uma

solução conforme ao direito e por ele autorizada.

O grande problema são as hipóteses de ilícito omissivo impróprio, em que o sujeito

não está obrigado a agir de modo determinado e específico. Nesses casos, a omissão do

sujeito não gera presunção de infração ao dever de diligência. É imperioso, então, verificar

concretamente se houve ou não infração ao dever de diligência especial que recai sobre os

exercentes de função estatal. Se existiam elementos fáticos indicativos do risco de

consumação de um dano, se a adoção de providências necessárias e suficientes para impedir

esse dano era da competência do agente, se o atendimento ao dever de diligência teria

conduzido ao impedimento da adoção das condutas aptas a gerar o dano – então, estão

presentes os pressupostos da responsabilização civil.

Essa concepção conduz à responsabilização civil do Estado em questões de

fiscalização institucional e permanente, sempre que o exercício ordinário das competências

de acompanhamento dos fatos permitisse inferir a probabilidade de resultado danoso a

terceiro.

4.3.2. Mais adiante, conclui4:

3 JUSTEN FILHO, Marçal. Obra citada, pp. 1.255-1.256. 4 JUSTEN FILHO, Marçal. Obra citada, pp. 1.257-1.258.

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Portanto, o tratamento jurídico dos atos omissivos e comissivos é único e

equivalente. A responsabilização civil dependerá da infração de um dever jurídico de

diligência. Essa infração se presumirá reprovável, uma vez que o dever jurídico de

diligência, imposto ao estado, importa a objetivação do elemento subjetivo da conduta. O

agente tem o dever funcional de conhecer seus deveres, de prever as consequências da

infração a eles e de arcar com as consequências. A infração a esse dever importa elemento

subjetivo reprovável.

4.4. Não há falar, portanto, em responsabilidade subjetiva do réu,

razão pela qual eventual dever de indenizar, no caso presente, prescinde da

configuração do elemento culpa.

4.5. O excurso que ora faço tem, então, esta finalidade: resumir que

para configuração do dever de indenizar devem estar presentes três elementos: (i)

ocorrência de dano, moral ou material, sofrido por alguém; (ii) conduta

antijurídica; (iii) nexo de causalidade entre a conduta e o dano5.

5. A análise do caso revela que estão presentes os elementos

configuradores do dever de indenizar. Explico:

5.1. É incontestável a ocorrência dos danos suportado pelas autoras

diante da morte trágica de seu companheiro/pai.

5 Por todos, q. cfr. JUSTEN FILHO, Marçal. Obra citada, p. 1.247.

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5.1.1. Note-se que nem mesmo é possível cogitar-se que o

passamento de um companheiro e pai não tenha o condão de abalar moral,

profunda, imensa e duradouramente sua convivente e filha.

6. Além disso, também está presente a conduta antijurídica que enseja

o dever de indenizar.

6.1. Denota-se do conjunto probatório que Saneo Aparecido da Silva,

companheiro/pai das autoras foi assassinado em 28/11/2003, dentro da

Penitenciária Estadual de Piraquara, onde cumpria pena.

6.2. Conforme se observa do ofício encaminhado pelo diretor da

Penitenciária Estadual de Piraquara ao Ministério Público (fs. 85-86), no dia do

evento, os agentes de disciplina procediam à retirada do detento Marcelo

Amorim Cardozo para conduzi-lo a uma audiência.

6.2.1. Em determinado momento, o mencionado detento acabou

rendendo os agentes de disciplina com “[...] uma pistola feita da tampa de um

isopor de marmitex, e aparentemente com um também pequeno estoque [...]” (f.

85), e libertando os demais presos alojados na galeria 23, dando ensejo a uma

rebelião, durante a qual os próprios presidiários acabaram assassinando dois

outros detentos, dentre eles Saneo Aparecido dos Santos.

6.2.2. A certidão de óbito de Saneo Aparecido dos Santos aponta

como “[...] causa da morte: a) Lesões craneoencefálicas; b) Ação contundente”

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(f. 90), o que corrobora a afirmação da parte autora, no sentido de que a vítima

foi morta mediante golpes de marreta e pá.

6.3. Não se pode olvidar, até mesmo em virtude do que estabelece o

artigo 5.º, inciso XLIX, da Constituição Federal6, que o Estado tem obrigação de

zelar pela integridade física e moral dos presos.

6.4. Toca-lhe, por conseguinte, o dever de vigilância e proteção

daqueles que se encontram sob sua custódia, garantindo-lhes condições básicas

de sobrevivência, de modo que qualquer falha no cumprimento de seu dever

implica em sua responsabilização pelos danos que venham a ocorrer, seja por

ação ou omissão de seus agentes (do Estado), como anteriormente demonstrei.

6.5. No presente caso, houve evidente omissão estatal no

cumprimento de seu dever de cuidado e vigilância em relação à vítima, uma vez

que a morte somente ocorreu em virtude da ausência de zelo pelas pessoas que

estavam sob a custódia do Estado.

6.6. Não pode ser aceitável que o fato tenha ocorrido no interior de

um estabelecimento prisional, à mais completa revelia dos agentes estatais, cujo

dever, no que aqui importa imediatamente, é velar pela integridade física e moral

dos presos.

6 Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; [...].

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6.7. Para atendimento do mencionado direito fundamental dos presos

(CF, art. 5.°, inc. XLIX), o Estado tem o dever (fundamental) de disponibilizar

instalações devidamente seguras, com vigilância contínua, além de espaço

adequado e apropriado para a segregação dos detentos.

6.8. Dessa forma, a displicência estatal para com os presos resultou na

morte da vítima, restando plenamente demonstrada a conduta antijurídica por

parte do Estado, que tinha o dever objetivo de cuidado.

6.9. Note-se que a rebelião somente ocorreu por falha atribuível ao

próprio Estado; afinal, a ele incumbe o dever de manter a disciplina, ordem e

segurança nas penitenciárias. Por aí, ao contrário do que tenta fazer crer o réu,

evidente que o fato de a vítima ter sido assassinada no momento de uma rebelião,

ainda que por outros presos, não tem o condão de afastar o ato ilícito por ele

praticado.

6.9.1. Ademais, não se pode deslembrar que os outros presidiários

que atentaram contra a vida do falecido também estavam sob a custódia do

Estado, de modo que a ele incumbia o dever de vigilância do ambiente

carcerário.

6.9.2. Por outro giro verbal e como bem ponderou o digno juiz da

causa, “[...] o Poder Público, não pode simplesmente alegar a sublevação de um

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grupo de presos como fator invencível, mormente quando os presos

encontravam-se sob guarda e proteção carcerária” (f. 223).

6.10. Não há, então, como refugir desta verdade: o réu agiu de forma

totalmente negligente, faltando com o dever de cuidado e vigilância que lhe

competia.

7. Do mesmo modo, não há dúvida quanto ao nexo causal, uma vez

que a falta de vigilância, cuidado objetivo e cautela do réu, consistente em não

velar pela integridade física e moral de seus detentos, proporcionaram a morte da

vítima, causando danos de cunho material e moral às autoras.

7.1. Registre-se que o fato de a vítima ter sido assassinada por outros

detentos e não por agentes públicos, não tem o condão de afastar o aludido liame

de causalidade entre os danos suportados pela parte autora e o falecimento da

vítima.

7.1.1. É que a partir do momento em que o Estado segrega

determinada pessoa, colocando-a sob sua custódia, tem o dever de manter sua

integridade física e moral, protegendo-a de eventuais agressões praticadas tanto

por seus agentes públicos, quanto pelas demais pessoas que se encontrem dentro

do estabelecimento prisional, sejam elas funcionários, visitantes ou presidiários.

8. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça vem ao encontro

das considerações que venho fazendo:

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. BOLETIM DE

OCORRÊNCIA. PROVA. DANOS MORAIS. LEGITIMIDADE ATIVA DA IRMÃ.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. MORTE DE PRESO.

RESPONSABILIDADE OBJETIVA.

1. O boletim de ocorrência é um documento público que faz prova da existência das

declarações ali prestadas, mas não se pode afirmar que tais declarações sejam verídicas.

Precedentes.

2. Portanto, o fato de a agente prisional ter informado no boletim de ocorrência o

estado civil da vítima como "convivente" - o que, segundo o recorrente, revelaria a

existência de união estável - não afasta, por si só, a legitimidade ativa da irmã da vítima

para propor a ação indenizatória.

3. Na ausência de ascendente, descente ou cônjuge, a irmã acha-se legitimada para

pleitear indenização por danos morais em razão do falecimento de seu irmão. Precedentes.

4. A responsabilidade civil do Estado nos casos de morte de pessoas custodiadas é

objetiva. Precedentes.

5. Recurso especial não provido. 7

8.1. Este Tribunal de Justiça tem invariavelmente decidido do modo

como venho resumindo:

MORTE DE PRESO NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PRISIONAL –

RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO – ART. 37, § 6º, DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL – MISSÃO DO ESTADO DE ZELAR PELA

INTEGRIDADE FÍSICA DO PRESO – TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO –

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – PREJUÍZO PRESUMÍVEL -

PENSÃO MENSAL CABÍVEL - HIPÓTESE EXCEPCIONAL EM QUE SE PERMITE A

VINCULAÇÃO AO SALÁRIO MÍNIMO – PRECEDENTES – DANOS MORAIS

MINORADOS PARA O “QUANTUM” DE R$ 25.000,00 (VINTE E CINCO MIL) PARA

CADA AUTOR – JUROS DE MORA A PARTIR DO EVENTO DANOSO – SÚMULA

7 STJ, 2.ª Turma, AgRg no REsp 1054443-MT, unânime, rel. min. Castro Meira, j. 4/8/2009 in DJe 31/8/2009.

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54/STJ – CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DA DATA DO ARBITRAMENTO

DOS DANOS MORAIS – SÚMULA 362/STJ - INAPLICABILIDADE DO ART. 1º-F,

DA LEI Nº 9.494/97, PORQUANTO NÃO SE TRATA DE VERBA DEVIDA PELA

FAZENDA A SERVIDOR OU EMPREGADO PÚBLICO – HONORÁRIOS

ADVOCATÍCIOS MINORADOS – APELO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO –

SENTENÇA MODIFICADA EM PARTE EM GRAU DE REEXAME NECESSÁRIO.8

PROCESSO CIVIL. SENTENÇA PROFERIDA CONTRA FAZENDA

PÚBLICA DO ESTADO DO PARANÁ. REEXAME NECESSÁRIO.

CONHECIMENTO DE OFÍCIO.

O Tribunal ao apreciar a apelação, poderá de ofício, reexaminar a sentença,

nos casos do artigo 475, independentemente de remessa pelo Juízo singular.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. MORTE DE DETENTO.

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E DANOS MATERIAIS. CABIMENTO.

LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO. MAJORAÇÃO.

1. É dever do Estado garantir a vida de seus detentos, mantendo, para isso,

vigilância constante e eficiente. Logo, é parte passiva legítima para responder à

demanda indenizatória.

2. Assassinado o detento por colegas de cela quando cumpria prisão provisória,

responde o Estado pelo evento danoso, posto que, se examinada sob o aspecto da

responsabilidade objetiva, assumiu o poder público os riscos inerentes ao sistema

prisional e, se examinada sob o aspecto da responsabilidade subjetiva, não há como

afastar a culpa "in vigilando".

3. O juiz, ao fixar o montante indenizatório, deve considerar os critérios

subjetivos da avaliação do dano moral, não se distanciando, porém, do valor atribuído

em casos análogos pela jurisprudência dominante, já que ausentes no ordenamento

positivo regras jurídicas próprias.

8 TJPR, 3.ª Câmara Cível, ACRN 535519-3, de Congonhinhas, Vara Única, acórdão n.º 33.101, unânime, rel. juiz Fernando Antonio Prazeres, j. 31/3/2009.

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4. Assim, calcado nessa proclamação, majora-se a indenização por danos

morais para trinta mil reais, quantia essa adequada às circunstâncias específicas do

caso concreto.

5. Inexistência de danos materiais da mãe da vítima, porquanto não

comprovada satisfatoriamente a sua dependência econômica.

Agravo Retido desprovido. Apelação 1 provida parcialmente. Apelação 2

desprovida. Sentença reformada parcialmente em sede de Reexame Necessário.9

8.1.1. No mesmo sentido: AC 553537-9, Rezende; AC 555591-5,

Macedo; AC 548157-8, Macedo; AC 545019-1, Amaral; ACRN 502342-1,

Lima; ACRN 476250-3, Calixto; AC 437312-0, Calixto; ACRN 375486-7,

Pereira.

8.2. Passando-se assim, presentes os elementos para a configuração da

responsabilidade civil do Estado do Paraná, conclui-se que está presente o dever

de indenizar, como corretamente reconheceu o digno juiz da causa.

9. O quantum indenizatório pelo dano moral

9.1. As autoras reputam que o valor fixado a título de dano moral é

irrisório, postulando sua majoração.

9.2. No âmbito do valor da indenização por dano moral, é resumir que

o ordenamento jurídico brasileiro adota o sistema aberto, ou seja, não tarifado.

Assim, o arbitramento de indenização por dano moral fica a critério (motivado)

9 TJPR, 5.ª Câmara Cível, AC 443713-4, de Cascavel, 3.ª Vara Cível, acórdão n.º 20.695, unânime, rel. des. Rosene Arão de Cristo Pereira, j. 8/4/2008 – os destaques em negrito são do original.

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do magistrado, que deverá sopesar as circunstâncias e a gravidade do fato, a

situação econômica e financeira das partes, cuidando para não fixar valor

exagerado, de modo a não proporcionar enriquecimento sem causa, nem irrisório,

que nada represente à parte que ocasionou o dano.

9.3. Desse modo, ao se quantificar indenização fundada em dano

moral, é curial atentar-se para o fato de que não se deve, com a condenação, gerar

outra iniquidade além da que lhe deu azo, tampouco enriquecer, com o episódio,

a vítima, já que o escopo aqui não é conceder-lhe um plus, mas sim reparar-lhe

um minus de natureza moral.

9.4. Também não se pode permitir que a gravidade do episódio,

verificada caso a caso, seja subestimada, aplicando-se condenação ínfima a ponto

de não se prestar a punir a conduta da parte ré, e, ao mesmo tempo, apaziguar a

dor moral da parte autora.

9.5. Portanto, diante do ocorrido, considerando o dano provocado, que

acarretou na morte do companheiro/pai das autoras e todos os desdobramentos

daí advindos, levando-se em conta ainda o porte econômico das partes e os

parâmetros da experiência, da razoabilidade e da proporcionalidade, entendo ser

justa a majoração do valor fixado em primeiro grau (R$ 25.000,00 para cada um

das autoras, totalizando R$ 50.000,00), revelando-se razoável o valor de R$

60.000,00 para ambas as autoras (R$ 30.000,00 para cada uma).

10. A pensão alimentícia mensal devida à companheira da vítima

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10.1. Defendem as autoras-apelantes que, ao contrário do que

entendeu o digno juiz da causa, a primeira autora, companheira do falecido,

também faz jus ao pagamento de pensão mensal. Sem razão, contudo.

10.2. De fato, no caso específico dos autos, como bem reconheceu a

sentença, é de todo indevido o pensionamento à companheira da vítima, uma vez

que o conjunto probatório evidencia que ela (vítima) não contribuía econômico-

materialmente para o sustento dessa autora.

10.2.1. Isso porque, consoante se extrai do caderno processual, a

segunda autora apenas conheceu a vítima quando ela já se encontrava presa,

cumprindo pena na Penitenciária Estadual de Piraquara, o que demonstra a

ausência de dependência econômica dessa autora em relação à vítima.

10.2.1.1. A propósito, a própria autora afirmou em Juízo “[...] Que era

amásia de Saneo; Que o conheceu quando ele já estava preso na penitenciária

[...]” (f. 167).

10.2.2. Assim, como o relacionamento amoroso existente entre a

vítima e sua companheira somente se iniciou quando a vítima já estava reclusa na

penitenciária, forçoso reconhecer que a segunda autora não era sustentada pela

vítima e tampouco havia colaboração dela para a assistência familiar.

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10.2.3. Em outras palavras: dada a circunstância fática do caso

presente, não há como se possa presumir a dependência econômica da primeira

autora em relação ao falecido, sendo, portanto, descabido o propósito de ser

pensionada pelo Estado em virtude da morte de seu companheiro.

10.3. Esta Corte tem entendimento nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO 1 – CERCEAMENTO DE

DEFESA – NÃO CONFIGURADO – COMPROVAÇÃO DE FATOS ALEGADOS –

PROVA DOCUMENTAL – AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO ESTADO DO

PARANÁ SOBRE AS PROVAS QUE PRETENDIA PRODUZIR –

RESPONSABILIDADE DO ESTADO – OBJETIVA – DESNECESSIDADE DE

PROVA QUANTO À EXISTÊNCIA DE CULPA LATO SENSU - RECURSO

CONHECIDO E NÃO PROVIDO, MANTENDO A SENTENÇA EM SEDE DE

REEXAME NECESSÁRIO.

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO 2 – VEÍCULO

PERSEGUIDO E BALEADO POR POLICIAIS RODOVIÁRIOS, COM

RESULTADO MORTE – CULPA CONCORRENTE – CARACTERIZADA –

POSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DA VIATURA POLICIAL -

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – MANUTENÇÃO –

LUCROS CESSANTES – UNIÃO ESTÁVEL DECLARADA APÓS A MORTE

DAVÍTIMA - PENSÃO POR MORTE – IMPOSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE

DEMONSTRAÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA – VÍTIMA QUE ERA

ESTUDANTE – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, MANTENDO A

SENTENÇA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO.10

10 TJPR, 3.ª Câmara Cível, ACRN 725507-4, de Curitiba, 2.ª Vara da Fazenda Pública, acórdão n.º 39.737, unânime, rel. des. Dimas Ortêncio de Melo, j. 10/5/2011 – o destaque em negrito é do original.

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APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE

TRÂNSITO. ABALROAMENTO LONGITUDINAL. INVASÃO DA PISTA

CONTRÁRIA. APELAÇÃO CÍVEL. CULPA DO AUTOR EVIDENCIADA.

INFRINGÊNCIA AOS DEVERES PRESCRITOS NO CÓDIGO NACIONAL DE

TRÂNSITO. DANOS MATERIAIS INDEVIDOS. DANOS MORAIS PLEITEADOS

PELO RÉU EM PEDIDO CONTRAPOSTO CARACTERIZADOS. RECURSO

ADESIVO. QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO. PAGAMENTO DO VALOR

DO VEÍCULO. IMPOSSIBILIDADE. CAMIONETA EM NOME DE TERCEIRO.

PENSÃO MENSAL VITACÍLIA. AUSÊNCIA DE PROVA SOBRE A

DEPENDÊNCIA ECONÔMICA.

1. É dever do motorista agir sempre com cautela, tendo o domínio do seu veículo e

andando sempre em sua mão de direção, ressalvadas as situações de emergência. Ao não

agir assim, assume o risco de causar um acidente.

2. Não há que se falar em condenação dos réus pelos prejuízos materiais sofridos

pelos autos quando os danos decorreram da sua própria imprudência.

3. É devida indenização por danos morais pleiteada pelo réu, em pedido

contraposto, quando por ocorrência do acidente o requerido sofre lesões graves e tem

ceifada a vida de sua companheira.

4. O quantum indenizatório deve ser fixado de acordo com a gravidade do dano,

levando em consideração as condições econômicas das partes, obedecendo, ainda, ao

princípio da proporcionalidade e da razoabilidade.

5. Não há que se falar em condenação do autor ao pagamento do valor do veículo,

vez que a propriedade do bem é de terceiro.

6. A fixação de pensão mensal vitalícia só é possível quando comprovada a

dependência econômica do cônjuge sobrevivente.

APELAÇÃO NÃO PROVIDA.

RECURSO ADESIVO NÃO PROVIDO.11

11 TJPR, 10.ª Câmara Cível, AC 631913-7, de Londrina, 2.ª Vara Cível, acórdão n.º 23.026, unânime, rel. des. Arquelau Araújo Ribas, j. 12/8/2010 – os destaques em negrito e itálico são do original.

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RESPONSABILIDADE CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. VALOR DA CAUSA

INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. NÃO CONHECIMENTO. AÇÃO DE

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. MORTE DE DETENTO POR

OUTRO. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA VOLTADA CONTRA ATO DE OMISSÃO

DO ESTADO EM GARANTIR A SEGURANÇA DOS CUSTODIADOS. FALTA DE

VIGILÂNCIA. INADEQUAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE

OBJETIVA DA ADMINISTRAÇÃO. ARTIGO 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DEVIDA. VERBA ARBITRADA

COM OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. PENSÃO MENSAL

INDEFERIDA POR FALTA DE COMPROVAÇÃO DE DEPENDÊNCIA

ECONÔMICA DA FILHA. JUROS DE MORA QUE INCIDEM A PARTIR DO

EVENTO DANOSO. SÚMULA 54 DO STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC.

REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. APELO 1: NÃO PROVIDO.

APELO 2: PROVIDO PARCIALMENTE.

1. É dever do Estado garantir a vida de seus detentos, mantendo, para isso, vigilância

constante e eficiente.

2. Assassinado o detento por outro quando cumpria pena que lhe fora imposta pela

Justiça, responde o Estado pelo evento danoso, posto que, se examinada sob o aspecto da

responsabilidade objetiva, assume o poder público os riscos inerentes ao sistema prisional

e, se examinada sob o aspecto da responsabilidade subjetiva, não há como afastar a culpa

"in vigilando".12

10.4. Daí porque, não merece retoque a sentença nesse ponto.

11. A pensão mensal devida à filha da vítima

11.1. O digno juiz da causa condenou o réu ao pagamento de pensão

mensal à primeira autora (filha da vítima), a partir do trânsito em julgado da

12 TJPR, 3.ª Câmara Cível, ACRN 594783-7, de Curitiba, 1.ª Vara da Fazenda Pública, acórdão n.º 34.757, unânime, rel. des. Paulo Habith, j. 24/11/2009 – é meu, não do original o destaque em negrito.

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sentença até que a menor atinja a maioridade civil, no valor de um salário

mínimo mensal.

11.2. Sustentam as autoras que a pensão mensal a que faz jus a

segunda autora deve ser paga desde a data do falecimento de seu pai, até a data

em que ele completaria 70 anos de idade, ou alternativamente, desde a data do

seu nascimento até a data em que ela complete 25 anos de idade.

11.2.1. Defendem ainda que o valor arbitrado a tal título é insuficiente

para atender às suas necessidades básicas, devendo ser majorado.

11.3. Pois bem. Quanto ao termo inicial da pensão mensal devida a

filha do falecido, merece reforma a sentença.

11.3.1. É que, como consolidado pela jurisprudência, e até mesmo em

razão de sua natureza, a pensão alimentícia é devida desde a data do evento

danoso, e não desde o trânsito em julgado da sentença que a arbitra.

Ilustrativamente:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE FERROVIÁRIO. VÍTIMA

FATAL. CULPA CONCORRENTE. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E

MORAIS.

1. O STJ firmou entendimento no sentido de que há culpa concorrente entre a

concessionária do transporte ferroviário e a vítima, seja pelo atropelamento desta por

composição ferroviária, hipótese em que a primeira tem o dever de cercar e fiscalizar os

limites da linha férrea, mormente em locais de adensamento populacional, seja pela queda

da vítima que, adotando um comportamento de elevado risco, viaja como "pingente". Em

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Apelação cível e reexame necessário n.º 809691-3 (3.ª Câmara Cível) w

ambas as circunstâncias, concomitantemente à conduta imprudente da vítima, está presente

a negligência da concessionária de transporte ferroviário, que não se cerca das práticas de

cuidado necessário para evitar a ocorrência de sinistros.

2. Por não se enquadrar como excludente de responsabilidade, a concorrência de

culpas não é suficiente para afastar o dever da concessionária de transporte ferroviário de

indenizar pelos danos morais e materiais configurados.

3. A fixação do valor da compensação pelos danos morais deve balizar-se entre a

justa composição e a vedação do enriquecimento ilícito, levando-se em consideração o

critério da proporcionalidade, bem como as peculiaridades de cada espécie. Precedentes.

4. A pensão mensal fixada, a título de danos materiais, à luz do disposto no art.

945 do CC/02, é devida a partir da data do evento danoso em se tratando de

responsabilidade extracontratual, até a data em que o beneficiário - filho da vítima -

completar 25 anos, quando se presume ter concluído sua formação. Precedentes.

[...]13

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS –

ATROPELAMENTO DE PEDESTRE – VEÍCULO CONDUZIDO POR

FUNCIONÁRIO DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO – EXCESSO DE

VELOCIDADE – RESPONSABILIDADE CIVIL OBEJETIVA DA SANEPAR PELA

CONDUTA CULPOSA DO SEU PREPOSTO – POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO

DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS – CONDENAÇÃO

INDIVIDUALIZADA – POSSIBILIDADE – SÚMULA 378 DO STJ –

‘QUANTUM’MAJORADOS - TERMO A QUO DOS JUROS DE MORA REFERENTE

A REPARAÇÃO MORAL E DANOS ESTÉTICOS – DATA DO EVENTO DANOSO –

SÚMULA 54 DO STJ – VALOR DA PENSÃO MENSAL ADEQUADO E RAZOÁVEL

AO CASO CONCRETO – REDUÇÃO APENAS PARCIAL DA CAPACIDADE

LABORATIVA – APELANTE QUE CONFIRMA EXERCER ATIVIDADE

REMUNERADA – NATUREZA COMPLEMENTAR DA VERBA ALIMENTAR –

TERMO INICIAL DO PENSIONAMENTO ALTERADO – PENSÃO DEVIDA DESDE

13 STJ, 3.ª Turma, REsp 1139997-RJ, unânime, rel. min. Nancy Andrighi, j. 15/2/2011, in DJe 23/2/2011 – é meu, não do original, o destaque em negrito.

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A DATA DO EVENTO DANOSO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – ‘QUANTUM’

MANTIDO – VERBA FIXADA DENTRO DOS LIMITES DO ART. 20, § 3º DO CPC

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO14

11.4. Nem se diga que o fato de a segunda autora (filha do falecido)

somente ter nascido depois do falecimento de seu pai é suficiente para afastar a

data do evento danoso (óbito da vítima) como termo inicial do pensionamento a

que faz jus.

11.4.1. É que conforme estatui o artigo 2.º do Código Civil, “A

personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a

salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.

11.4.2. Por aí, certo que a segunda autora, nascitura à época do

falecimento de seu pai, faz jus a pensão mensal desde aquela data.

12. Por outro lado, quanto ao termo final, não há como se considerar

justo que a pensão mensal seja paga apenas até quando a beneficiária (filha da

vítima) atinja a maioridade civil.

12.1. Como ressabido é, nos dias atuais, a maioridade civil, por si só,

não afasta o vínculo de dependência econômica existente entre os filhos e seus

pais. Ou como bem ressaltou o digno procurador de justiça Francisco Gmyterco,

“[...] a maioridade civil, em regra, não liberta os filhos da dependência

14 TJPR, 9.ª Câmara Cível, AC 771555-9, de Curitiba, 1.ª Vara da Fazenda Pública, acórdão n.º 28.814, unânime, rel. des. José Aniceto, j. 4/8/2011 – os destaques em negrito e itálico são do original.

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econômica dos pais, haja vista a dificuldade de obtenção do primeiro emprego,

bem como do próprio acesso ao ensino superior” (f. 290).

12.2. Nesse rumo, o estabelecimento de pensão mensal alimentícia

devida aos filhos da vítima deve levar em conta a idade provável em que os

beneficiários constituirão suas próprias famílias, concluirão os estudos e

proverão seu próprio sustento, o que geralmente se dá aos 25 anos de idade,

conforme entendimento consagrado pela jurisprudência.

12.3. Nesse sentido, v.g.:

ACIDENTE DE TRABALHO. RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO.

INEXISTÊNCIA. EMPRESA QUE APRESENTA NOTÓRIA CAPACIDADE

ECONÔMICA. POSSIBILIDADE DE DETERMINAÇÃO DE INCLUSÃO DOS

BENEFICIÁRIOS DE PENSÃO NA FOLHA DE PAGAMENTO. TERMO AD

QUEM DO PENSIONAMENTO. DATA EM QUE OS FILHOS COMPLETAREM 25

ANOS. ACRÉSCIMO À QUOTA-PARTE DA VÍÚVA DO VALOR RECEBIDO A

TÍTULO DE PENSIONAMENTO PELOS FILHOS. POSSIBILIDADE. DESPESAS

DE FUNERAL SEM COMPROVAÇÃO. FIXAÇÃO DE ACORDO COM O VALOR

ESTABELECIDO PELA LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA. POSSIBILIDADE.

1. Não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo Civil. O Tribunal

a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio.

2. O advento da Lei 11.232/2005, que instituiu o atual art. 475-Q, § 2º, do

Código de Processo Civil, ao prescrever ser faculdade do juiz a substituição da

determinação de constituição de capital pela inclusão dos beneficiários na folha de

pagamento de sociedade empresária que apresente notória capacidade econômica,

impõe que a Súmula 313 deste Tribunal seja interpretada de forma consentânea ao

texto legal. Por isso, é possível determinar a inclusão de beneficiários de pensão em

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folha de pagamento de concessionária de distribuição de energia elétrica que,

conforme apurado pelo Tribunal de origem, tem "idoneidade econômica".

3. Consoante iterativa jurisprudência deste Tribunal, o pensionamento deve

cessar apenas na data em que os filhos do falecido genitor completarem 25 anos de

idade.

4. É cabível o acréscimo à quota-parte da víúva do valor recebido a título de

pensionamento pelos filhos, na medida em que houver a cessação da obrigação do

pagamento de pensão a eles. Precedentes.

5. É incontroverso o óbito, portanto as despesas de funeral são presumidas, de

modo que, mesmo não sendo comprovadas, é adequado seu ressarcimento, limitado ao

previsto na legislação previdenciária.

Precedentes.

6. A responsabilidade civil por acidente de trabalho é extracontratual, devendo

os juros de mora fluírem a partir do evento danoso. Incidência da Súmula 54/STJ.

7. Recurso especial parcialmente provido.15

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE FERROVIÁRIO. VÍTIMA

FATAL. CULPA CONCORRENTE. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E

MORAIS.

[...]

4. A pensão mensal fixada, a título de danos materiais, à luz do disposto no art. 945

do CC/02, é devida a partir da data do evento danoso em se tratando de responsabilidade

extracontratual, até a data em que o beneficiário - filho da vítima - completar 25 anos,

quando se presume ter concluído sua formação. Precedentes.

[...].16

15 STJ, 4.ª Turma, REsp 860221-RJ, unânime, rel. min. Luis Felipe Salomão, j. 19/5/2011, in DJe 2/6/2011 – os destaques em negrito e itálico são do original. 16 STJ, 3.ª Turma, REsp 1139997-RJ, unânime, rel. min. Nancy Andrighi, j. 15/2/2011, in DJe 23/2/2011.

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APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ATROPELAMENTO. 1.

INTERESSE RECURSAL. AUSÊNCIA. MATÉRIAS QUE HOUVE PREJUÍZO

PARA A PARTE APELANTE. 2. CULPA DA VÍTIMA. NÃO VERIFICADA. 3.

RESPONSABILIDADE DO PAI. ATO ILÍCITO CAUSADO POR FILHO MENOR.

4. PENSÃO. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. PRESUNÇÃO DE DEPENDÊNCIA.

FILHOS. TERMO FINAL. 25 ANOS.

VALOR. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA RENDA. FIXAÇÃO EM 2/3 DO

SALÁRIO MÍNIMO. PENSÃO PREVIDENCIÁRIA. POSSIBILIDADE DE

CUMULAÇÃO. 5. DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO. [...] 4. Em se tratando de

família de baixo poder aquisitivo a dependência econômica é presumida, sendo

desnecessária a prova de que o de cujus contribuía para com sua família e manutenção

do lar, sendo devida pensão mensal aos filhos até que completem 25 anos e ao cônjuge

sobrevivente no valor equivalente à 2/3 do salário mínimo, eis que não há prova da renda

auferida pela vítima. Ademais, é possível a cumulação da pensão previdenciária e da decorrente de decorrente de ato ilícito, em razão de suas naturezas distintas. [...]17

Ação de indenização por danos material e moral.

[...]

4. Pensão – Vítima que não exercia atividade laborativa – Irrelevância –

Presunção de mútua assistência entre membros de família de baixa renda – Fixação

no equivalente a 2/3 do salário mínimo – Termo final da obrigação de pensionamento

– Dia em que a vítima, se viva, completasse 65 anos – Média de vida.

4.1. Termo final da obrigação de pensionamento dos filhos da vítima – Pensão

devida até a data em que os beneficiários completarem 25 anos – Orientação

consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça.

4.2. Pensão que deve ser dividida de forma igualitária entre os autores que a ela

fazem jus – Direito de acrescer. [...].18

17 TJPR, 8.ª Câmara Cível, AC 792501-1 de Pato Branco, 2.ª Vara Cível, acórdão n.º 28.561, unânime, rel. des. Jurandyr Reis Junior, j. 25/8/2011 – os destaques em negrito e itálico são do original. 18 TJPR, 3.ª Câmara Cível, AC 785088-2, de Ibiporã, Vara Cível e Anexos, acórdão n.º 40.856, unânime, rel. des. Rabello Filho, j. 23/8/2011 – o destaque em negrito é do original.

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12.4. Desse modo, não há como falar que tal pensionamento se

estenda até a data em que o pai da segunda autora completaria 70 anos de idade,

até mesmo porque a dependência financeira dos descendentes, em regra, não se

estende até a expectativa de vida de seus genitores.

12.5. Daí porque deverá o réu pagar à segunda autora pensão desde a

data do evento danoso, até quando ela (i) completar 25 anos, (ii) contrair núpcias

ou estabelecer união estável ou (iii) vier a falecer, cujo valor deverá ser corrigido

monetariamente, pela média do INPC e IGP-DI, desde o presente arbitramento e

acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a partir de quando cada parcela deveria

ter sido adimplida, até o advento da Lei n.° 11.960, de 30/6/2009, a partir de

quando correrão na forma ali estabelecida.

13. Já quanto à pretensão de majoração do valor arbitrado a título de

pensão mensal, melhor sorte não assiste às autoras. O contrario é que se dá, na

medida em que em sede de reexame necessário tal valor merece redução.

Explico:

13.1. No presente caso, não só inexiste comprovação da renda mensal

da vítima, como se tem certeza de que ela, ao menos quando de seu óbito, não

exercia atividade remunerada, já que, como exaustivamente dito acima, ela

encontrava-se presa.

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13.2. Com isso, o valor da pensão por morte (de vítima que não

exercia atividade remunerada, como é o caso dos autos) deve ser fixado com base

no salário mínimo, descontando-se dele, contudo, o montante que seria utilizado

para benefício próprio.

13.2.1. Nesse rumo, é justo concluir que ao menos 1/3 do valor

recebido seria destinado às despesas pessoais do falecido; logo, a segunda autora

faz jus ao recebimento da parte restante, correspondente a 2/3. É o entendimento

da jurisprudência:

RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE DA ESPOSA. DEPENDÊNCIA

ECONÔMICA DO MARIDO. VALORAÇÃO DA PENA. PRESUNÇÃO LEGAL. CC,

ART. 231-III. PROVA DA DEPENDÊNCIA. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES.

PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE. RISTJ, ART.

257. DEDUÇÃO DE 1/3 (UM TERÇO) DA PENSÃO. GASTOS PRÓPRIOS DA

VÍTIMA. LIMITE DO PENSIONAMENTO: 65(SESSENTA E CINCO) ANOS.

HONORÁRIOS. INAPLICABILIDADE DO ART. 20, § 5º, CPC. ILÍCITO RELATIVO.

CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. POSSIBILIDADE DE INCLUSÃO DO CREDOR NA

FOLHA DE PAGAMENTOS DA DEVEDORA. RECURSO PARCIALMENTE

PROVIDO.

I - É comum nas famílias de baixa renda haver dependência econômica entre os

cônjuges, notadamente em razão de ser sobremaneira difícil a sobrevivência da família com

o salário de apenas um deles, sendo certo, ademais, que a assistência econômica prestada

por um dos cônjuges ao outro goza de presunção legal de existência (art. 231, III, CC).

II - Segundo a boa doutrina, "os danos materiais e morais causados aos parentes

mais próximos não precisam de prova, porque a presunção é no sentido de que sofrem

prejuízos com a morte do parente".

III - Os alimentos a que se refere o art. 1537-II, CC, não se identificam com os

previstos no Direito de Família.

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IV - Afigura-se razoável e justo fixar a indenização em 2/3(dois terços) da renda da

vítima, deduzindo um terço (1/3) correspondente ao que essa, por presunção, despederia

com seu próprio sustento.

V - Para o cálculo indenizatório, tem-se levado em consideração, em casos como o

presente, o período que vai da data do evento até data que a vítima completaria sessenta e

cinco(65) anos.

VI - Na linha dos precedentes deste Tribunal, os honorários advocatícios, em cujo

pagamento for condenada a empresa preponente, devem ser fixados em percentual sobre o

somatório dos valores das prestações vencidas mais um ano das vincendas, mostrando-se

inaplicável o disposto no § 5º do art. 20, CPC.

VII - Tratando-se de empresa concessionária de serviço público, de reconhecida

solvabilidade, é dispensável a constituição de capital, bastando a inclusão do beneficiário

da pensão em sua folha de pagamento.19

13.2.1.1. Assim também o entendimento desta Corte,

exemplificativamente: ACRN 608260-0, Lartes; AC 652183-9, Rabello; AC

653393-9, Patitucci; AC 699821-4, Fachin; AC 713820-1, Vargas; AC 711606-3,

Perfetto.

13.3. Daí porque o valor da pensão mensal deve ser reduzido para o

equivalente a 2/3 do salário mínimo vigente, devendo ser pago à filha da vítima

desde a data do falecimento de Saneo Aparecido dos Santos até a data em que

completar 25 anos.

14. A atualização da condenação relativa ao dano moral

19 STJ, 4.ª Turma, REsp 157912-RJ, unânime, rel. min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 4/8/1998, in DJU 21/9/1998, p. 188.

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14.1. Afirma o réu que o termo inicial dos juros de mora fixado na

sentença está equivocado, pois eles apenas podem fluir a partir do final do

exercício seguinte à inscrição do precatório requisitório no orçamento estadual,

conforme estabelece o artigo 100, parágrafo 5.º, da Constituição Federal, com

redação dada pela Emenda Constitucional n.º 62/2009.

14.2. É preciso notar, contudo, que o digno juiz da causa nada disse a

respeito do termo inicial dos juros de mora, embora tenha determinado a

observância do disposto no artigo 1.º-F da Lei n.º 9.494/1997, com redação dada

pela Lei n.º 11.960/2009.

14.3. Assim, o recurso de apelação nesse ponto sequer merecia ser

conhecido, mas como se está diante de sentença que comporta reexame

necessário, passa-se, então, a sanar tal vício para completa prestação

jurisdicional.

14.4. Inicialmente cumpre registrar que a pretensão do réu de que o

termo para contagem dos juros de mora seja o primeiro dia seguinte àquele em

que o precatório deveria ser pago, não merece prosperar.

14.5. Isso porque se está diante de responsabilidade civil

extracontratual. Com o ilícito nasce, de imediato, a obrigação de ressarcimento

pelo causador do ato. Dessa maneira, desde o evento danoso surge a mora,

correndo os juros respectivos (de mora), por conseguinte, desde então.

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14.5.1. Esse é entendimento já assentado pelo Superior Tribunal de

Justiça com a súmula n.º 54, que tem o seguinte teor:

Súmula 54. Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de

responsabilidade extracontratual.

14.6. Nesse sentido é o entendimento deste Tribunal:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E

MORAIS. APREENSÃO DE MOTOCICLETA. AVARIAS. PRELIMINARES DE

ILEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA AFASTADAS. DANOS MATERIAIS

DEVIDAMENTE COMPROVADOS. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO.

ADOÇÃO DO ORÇAMENTO DE MENOR VALOR. INCIDÊNCIA DOS JUROS DE

MORA A PARTIR DO EVENTO DANOSO. SENTENÇA ESCORREITA. RECURSO

CONHECIDO E DESPROVIDO. Ainda que o apelado não seja o proprietário do veículo,

possui legitimidade para propor a presente ação indenizatória, vez que estava na posse do

veículo (condutor) no momento da ação policial que gerou os danos materiais, podendo ser

responsabilizado pelo proprietário. Não há falar em ilegitimidade passiva, pois os danos

materiais estão diretamente relacionados com a apreensão e remoção do veículo, conduta,

esta, praticada pelos policiais militares. Restou comprovado pelo conjunto probatório, que

as avarias da motocicleta se deram em virtude da ação policial. As despesas com o conserto

do veículo do autor devem ser ressarcidas, adotando-se o valor do menor orçamento

apresentado. Os juros de mora foram corretamente fixados a partir do evento danoso

(Súmula nº 54, do Superior Tribunal de Justiça).20

CONSTITUCIONAL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO

POR DANOS MORAIS. EXAME COM RESULTADO FALSO DE SORO

20 TJPR, 5.ª Câmara Cível, AC 515907-7, de Francisco Beltrão, 1.ª Vara Cível, acórdão n.º 22.534, unânime, rel. des. Luiz Mateus de Lima, j. 21/10/2008 – é meu, não do original, o destaque em itálico.

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POSITIVO. SEGUNDO EXAME QUE CONFIRMA A INEXISTÊNCIA DO VÍRUS

HIV. INCLUSÃO DA DOADORA NA LISTA DE DOADORES INAPTOS.

IMPEDIMENTO DE DOAÇÃO DE SANGUE DEVIDO À AUSÊNCIA DE ZELO

DO LABORATÓRIO. DANO MORAL. ART. 37, § 6º DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. LEGITIMIDADE ATIVA DO

ESTADO DO PARANÁ. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA.

IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA QUE DEVE SER

FEITA EM AUTOS APARTADOS. MAJORAÇÃO DO VALOR FIXADO. JUROS A

PARTIR DO EVENTO DANOSO. SÚMULA N.º 54 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE

JUSTIÇA.

1. O Estado não se desincumbiu do ônus de provar a sua ilegitimidade passiva.

Além disso, ainda que se considerasse como verdadeira a afirmação de que o HEMEPAR

está vinculado a uma autarquia estadual, ainda assim a responsabilidade do Estado do

Paraná permaneceria, pois deixou transcorrer o prazo para chamar o suposto responsável

direto.

2. Não houve cerceamento de defesa, uma vez que a oitiva dos médicos arrolados

pelo Estado não iria alterar o resultado do julgamento, visto que as provas juntadas com a

inicial são suficientes para comprovar o fato causador do dano.

3. A Constituição Federal adotou a teoria da responsabilidade objetiva do Poder

Público sob a modalidade do risco administrativo, nos termos do § 6º do art. 37. A

inclusão imediata do nome da doadora como inapta à doação sanguínea e a não retirada

após o segundo exame que atesta a inexistência do vírus HIV demonstram a falta de zelo

do laboratório, capaz de substanciar o pedido de indenização formulado.

4. A Impugnação à assistência judiciária gratuita - e eventuais pedidos correlatos -

deve ser feita em autos apartados, consoante disposto no § 2º do art. 4º da Lei n.º 1.060/50.

5. Deve ser majorada a condenação por danos morais para R$ 20.000,00 (vinte mil

reais), ante a condição econômica do Estado do Paraná e diante da conduta danosa do

laboratório, que em razão de um primeiro exame positivo para HIV incluiu o nome da

Apelante na lista de doadores inaptos e o manteve mesmo após segundo exame em que se

constatou a inexistência do vírus.

6. Consoante Súmula n.º 54 do Superior Tribunal de Justiça, os juros moratórios

incidem a partir do evento danoso quando a responsabilidade é extracontratual.

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APELO 1 CONHECIDO E DESPROVIDO. APELO 2 CONHECIDO E

PROVIDO.21

14.6.1. No mesmo sentido, v.g.: AC 560786-3, Fontoura; AC 576993-

5, Grandinetti; ACRN 551424-9, Lauro; AC 445814-4, Calixto; AC 536195-7,

Rabello; AC 553595-7, Vilma; AC 350532-8, Fagundes.

14.7. Destarte, os juros de mora devem fluir desde o evento danoso.

14.8. Registre-se que embora a Lei n.º 11.960/2009 (aplicada pelo

digno juiz da causa) só tenha entrado em vigor em 30 de junho de 2009, de modo

que o período anterior a sua vigência não possa, em regra, sofrer sua incidência

(tempus regit actum), ante o princípio da vedação de reformatio in peius, não há

como afastar, para o período anterior a 30/6/2009, a incidência dessa norma ao

caso presente, seja no que diz respeito à correção monetária, seja em relação aos

juros de mora.

14.8.1. É que tal alteração prejudicaria o Estado do Paraná, na

medida em que outros índices de correção, diversos dos “índices oficiais de

remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança” certamente são

mais severos.

15. Honorários advocatícios

21 TJPR, 1.ª Câmara Cível, AC 553795-1, de Curitiba, 2.ª Vara da Fazenda Pública, acórdão n.º 31.921, unânime, rel. des. Vilma Régia Ramos de Rezende, j. 7/7/2009 – os destaques em negrito e itálico são do original.

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Apelação cível e reexame necessário n.º 809691-3 (3.ª Câmara Cível) w

15.1. Estima o réu ser excessiva a fixação dos honorários advocatícios

em R$ 8.000,00 (mil reais). Assiste-lhe razão.

15.2. Nas causas em que é vencida a Fazenda Pública, a verba

honorária é fixada com base no artigo 20, parágrafo 4.º, do Código de Processo

Civil, de modo que não fica adstrita aos limites mínimos e máximos previstos no

parágrafo 3.º do referido dispositivo.

15.3. Para além disso, deve atentar-se para o fato de que não há

complexidade digna de nota permeando a causa; a atividade probatória limitou-se

à produção de prova oral e documental. Sendo assim, o valor de R$ 8.000,00

mostra-se exagerado, de modo que o equivalente a R$ 3.000,00 é imposição

sucumbencial mais adequada ao (bom) trabalho profissional realizado e atende

aos princípios da equidade, da razoabilidade, bem como da justa remuneração

do trabalho profissional.

15.4. Não se pode perder de vista que a verba honorária não pode ser

estabelecida em cifra vultosa, ressabido como também é que não pode ser

estabelecida em cifra aviltante, ofensiva à própria dignidade profissional do

advogado e ao princípio da justa remuneração do trabalho profissional (STJ:

REsp 147346-PR, Asfor; REsp 388542-MS, Direito; REsp 277176-DF,

Franciulli; REsp 671777-PR, Uyeda; REsp 552994-PE, Noronha. TJPR: AC

541495-5, Dimas; AC 535519-3, Prazeres; AC 538166-4, Habith; AC 531316-6,

Vasconcelos; AC 528268-0, Cecconi; AC 465708-7, Rodrigues; AC 318160-2,

Hayton; AC 404999-6, Rabello).

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16. Por fim, importante registrar que o resultado do julgamento não

implica em redistribuição dos ônus de sucumbência fixados na sentença, uma vez

que embora tenha havido ampliação do lapso do pensionamento devido à

segunda autora, houve redução do valor arbitrado a título de pensão mensal,

devendo, por conseguinte, ser mantido a proporção já arbitrada.

17. Conclusão

17.1. Passando-se as coisas dessa maneira, meu voto é no sentido de

que: i) se dê parcial provimento ao recurso da parte autora, para o fim de se:

i.i) majorar o valor da indenização pelo dano moral para R$ 60.000,00, a ser

dividido igualitariamente entre as autoras;

i.ii) determinar que a pensão mensal devida à segunda autora seja paga desde a data

do evento danoso, até quando ela completar 25 anos, contrair núpcias ou estabelecer união

estável ou vier a falecer, cujo valor deverá ser corrigido monetariamente, pela média do

INPC e IGP-DI, desde o presente arbitramento e acrescido de juros de mora de 1% ao mês,

a partir de quando cada parcela deveria ter sido adimplida, até o advento da Lei n.° 11.960,

de 30/6/2009, a partir de quando correrão na forma ali estabelecida;

ii) se dê parcial provimento ao recurso da parte ré, para o fim de reduzir-se o valor

fixado a título de honorários advocatícios, em seu desfavor, para o importe de R$ 3.000,00;

iii) em reexame necessário, seja a sentença parcialmente reformada, para o fim de

reduzir-se o valor do pensionamento para 2/3 do salário mínimo, bem como determinar que

os juros de mora em relação ao pagamento de indenização por dano moral fluam a partir do

evento danoso.

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Decisão

18. À face do exposto, ACORDAM os integrantes da Terceira

Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de

votos, em dar parcial provimento aos recursos e reformar em parte a sentença

em sede de reexame necessário, nos termos do voto do relator.

18.1. Participaram do julgamento, além do signatário (relator), os

Senhores Juiz Espedito Reis do Amaral e Desembargador Dimas Ortêncio de

Melo.

Curitiba, 25 de outubro de 2011 (data do julgamento).

Desembargador Rabello Filho RELATOR