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Homem a mungir uma vaca, Krishna Mandapa, Mamallapuram, séc. VII. Uma imagem encantadora de uma vaca a ser mungida enquanto lambe a sua cria com carinho. Tais imagens asseguram a vivacidade das cenas na caverna de Krishna Mandapa. Fotografia: Benoy K Behl. Editor Navdeep Suri Sub-Editora Neelu Rohra A Índia Perspectivas é publicada em árabe, língua indonésia, língua bengali, inglês, francês, alemão, hindi, italiano, língua pachto, persa, português, russo, cingalês, espanhol, língua tâmil e urdu. As ideias exprimidas nos artigos pertencem aos contribuidores e não necessáriamente à Índia Perspectivas. Todos os artigos originais e re-impressões podem ser livremente reproduzidos com reconhecimentos. As contribuições editoriais e cartas devem ser enviadas para o Editor da Índia Perspectivas, 140 ‘A’ Wing, Shastri Bhawan, New Delhi-110001. Telefones: +91-11-2338 9471, 2338 8873, Fax: +91-11-2338 5549 E-mail: [email protected], Sítio: http://www.meaindia.nic.in Para obter um exemplar de Índia Perspectivas por favor entre em contacto com a embaixada indiana no seu país. Este número foi publicado para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, Nova Deli, por Navdeep Suri, Secretário-Adjunto, Departamento de Diplomacia Pública. Desenho e impressão por Ajanta Offset & Packagings Ltd., Delhi-110052. Vol. 24 nº 1/2010 ISSN 0970 5074 VOL. 24 Nº 1/2010 índia Perspectivas

Revista India Perspectivas Portugues 02/2010

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Page 1: Revista India Perspectivas Portugues 02/2010

Homem a mungir uma vaca, Krishna Mandapa, Mamallapuram, séc. VII.Uma imagem encantadora de uma vaca a ser mungida enquanto lambe

a sua cria com carinho. Tais imagens asseguram a vivacidade das cenas na caverna de Krishna Mandapa.

Fotografi a: Benoy K Behl.

EditorNavdeep Suri

Sub-EditoraNeelu Rohra

A Índia Perspectivas é publicada em árabe, língua indonésia, língua bengali, inglês, francês, alemão, hindi, italiano, língua pachto, persa, português, russo, cingalês, espanhol, língua tâmil e urdu. As ideias exprimidas nos artigos pertencem

aos contribuidores e não necessáriamente à Índia Perspectivas. Todos os artigos originais e re-impressões podem ser livremente reproduzidos com reconhecimentos.

As contribuições editoriais e cartas devem ser enviadas para o Editor da Índia Perspectivas, 140 ‘A’ Wing, Shastri Bhawan, New Delhi-110001.

Telefones: +91-11-2338 9471, 2338 8873, Fax: +91-11-2338 5549E-mail: [email protected], Sítio: http://www.meaindia.nic.in

Para obter um exemplar de Índia Perspectivas por favor entre em contacto com a embaixada indiana no seu país.

Este número foi publicado para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, Nova Deli, por Navdeep Suri, Secretário-Adjunto, Departamento de Diplomacia Pública.

Desenho e impressão por Ajanta Offset & Packagings Ltd., Delhi-110052.

Vol. 24 nº 1/2010 ISSN 0970 5074

VOL. 24 Nº 1/2010

índiaPerspectivas

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Neste número da Índia Perspectivas, o primeiro de 2010, oferecemos aos nossos leitores uma combinação pouco usual de artigos que refl ectem não apenas o magnífi co património cultural da Índia mas também a cada vez maior sofi sticação tecnológica do país.

O ensaio de Benoy Behl sobre a perícia dos artesãos que criaram os templos do século VII em Mamallapuram encaixa perfeitamente com o artigo de Shubhra Mazumdar sobre a estética e a simetria dos jardins mogores. Leela Venkatraman traça a relação dramática que Protima Bedi teve com o estilo de dança clássica de odissi e o estabelecimento de Nrityagram, uma aldeia cultural, enquanto Madhushree Chatterjee realça a cada vez maior popularidade global das diversas formas de música indiana. Também há um artigo a explicar o artesanato de dhokra e um outro sobre os encantos da comida que se encontra enquanto se percorre as ruas da cidade de Lucknow. Os artigos sobre a tradição de jogar pólo em Manipur e sobre as plantas sagradas da Índia, o tributo a Leela Naidu e a reportagem sobre o festival literário de Jaipur continuam a tradição desta revista de ter um leque variado de textos e oferecer um vislumbre da nossa cultura milenar aos nossos leitores.

O Instituto Indiano de Ciência, que acabou de completar cem anos da sua existência, é uma ponte entre o moderno e o antigo, entre o universo cultural e o universo tecnológico. Faz parte da nossa série sobre as melhores instituições académicas na Índia e é o primeiro de cinco artigos sobre a ciência e a tecnologia. Há dois artigos sobre a medicina remota e as células germinais, que exploram o tema da tecnologia de ponta para assegurar cuidados de saúde de alta qualidade e custos acessíveis, enquanto os artigos sobre os automóveis e a nova ponte que liga Bandra e Worli em Bombaim testemunham ao talento nacional na área de desenho e engenharia.

A reportagem sobre a importante visita da primeira-ministra do Bangladesh e os acordos que foram assinados durante a sua estadia conferem um toque político a esta edição.

O nosso próximo número vai ser uma edição especial dedicado ao poeta Rabindranath Tagore.

No entretanto, boas leituras. Como sempre, agradecemos saber as vossas opiniões e reacções.

Navdeep Suri

ecemos saber

Navdeep Suri

A beleza estética dosjardins mogoresSHUBHRA MAZUMDAR 2

As rochas vivas de MamallapuramBENOY K BEHL 12

Nrityagram e a paixão pela dançaLEELA VENKATARAMAN 22

Ligações através das melodias: A música indiana engloba o mundoMADHUSREE CHATTERJEE 32

Tributo

Leela Naidu:O Enigma continua...SMM AUSAJA 75

Dhokra: Uma arte eterna REKHA SHANKAR 38

A cidade de Lucknow e a sua comida popularANIL MEHROTRA 44

Uma nova época nas relações entrea Índia e o BangladeshMANISH CHAND 50

A ponte entre Bandra e Worli em Bombaim: Uma maravilha de engenhariaQUAID NAJMI 54

Os automóveis

Desenhados para ganhar ANNAMMA OOMMEN 58

O centenário doInstituto Indiano de Ciência P. BALARAM 66

Uma única experiênciana medicina remota 70

As células germinais para um futuro sem doençasRICHA SHARMA 72

Os desportos tradicionais

Hóquei em cavalos:A tradição de jogar pólo no estado de ManipurDEBABRATA BANERJEE 78

As plantas sagradas na tradição indianaPRAN NEVILE 82

O encanto doFestival Literário de JaipurAMRIT DHILLON 86

Recensão literária

Os Himalaias:As montanhas vistas das nuvensSUDHIR SAHI 94

Capa: Bijayini Satpathy e Surupa Sen numa postura da dança clássica odissi.

Fotografi a: Deepak Mudgal.

Editorial

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SHUBHRA MAZUMDAR

Pela sua defi nição um jardim é uma representação estilizada das paisagens naturais, especialmente se o jardim for um dos numerosos jardins mogores na Índia, desenhados para transmitir a ideia de um vislumbre de paraíso na terra, através das suas regras formais e da sua fi losofi a de organização.

Para o próprio imperador, o espaço do jardim era uma imagem exterior

representando a majestade do poder imperial, enquanto para os místicos e religiosos as suas serenas paisagens refl ectiam o conceito do charbagh (quatro jardins) ou o ainda mais antigo conceito, descrito no livro do Génesis, de um rio que saia do jardim de Éden e depois dividiu-se em quatro caudais.

Paradoxalmente, essa sublime ligação temática com a ideologia desaparece completamente quando se está dentro de um jardim mogor. Aquilo que nos impressiona nessa altura é a maneira em

O jardim de Nishat em Srinagar (Caxemira)Am

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A beleza estética dos

jardins mogores

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que o espaço foi organizado tanto para a utilidade como para a ornamentação. As proezas da engenharia ao construir os canais de água para regar os jardins moldam a sua personalidade. Pelo outro lado, as árvores frutíferas e as espécies vegetais exóticas são luxuriantes e transmitem uma dualidade de forma e liberdade.

Actualmente, esses jardins talvez já não tenham importância como pomares frutíferos ou amostras de espécies botânicas mas a sua ligação íntima com as tradições agrícolas continua viva, porque esses espaços são

óptimos exemplos da utilização de água. A sua organização rectangular é a técnica mais económica de regar terras. Em vez de distribuir os canais aleatoriamente a paixão dos mogores pela estética explorou esse elemento essencial e transformou-o no foco da sua arte paisagística nos jardins.

Usando proezas da engenharia, o apelo visual e acentos, a água desceu para o jardim de uma altura, simulando o efeito de uma cascata. Ao contrário de replicar a natureza selvagem, esses canais eram contidos dentro de uma cascata de

pedra, com lados esculpidos, onde a água percorria por cima dessas esculturas. À luz do luar, quando não se viam as esculturas, o brilho das águas sugeria uma força viva, acariciada pelos elementos ao seu redor.

Quem foram os construtores desses jardins então? Para além dos próprios imperadores, foram as princesas da casa real que deixaram a sua marca na construção de jardins durante a época mogor. A primeira mulher importante nessa área foi a Hamida Banu Begum, a principal viúva do Imperador

Os jardins de Chasma Shahi e Shalimar Bagh, Srinagar (à direita e em baixo) e Charbagh, Agra (página de frente).

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um bosque denso, criando um oásis de paz longe das intrigas da corte imperial. Ao mesmo tempo, uma das mulheres do imperador Akbarabadi, construiu um jardim no actual bairro de Shalimar Bagh em Deli. Foi uma reprodução do jardim do mesmo nome em Caxemira.

Os jardins mogores não eram apenas zonas de lazer para a realeza mas também simbolizavam a posse territorial. O imperador vivia nesse

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Humayun, que mandou criar um jardim ao redor do túmulo do seu falecido esposo. Foi o primeiro túmulo jardim na Índia, com os seus 30 acres de espaço à margem do rio Yamuna. Enquanto incorporava o estilo de desenho do charbagh dos tempos do Imperador Babur, o seu esquema quadrado foi dividido com os canais de água. Uma muralha construída de

escombros rodeia esse pedaço de paraíso. Algumas décadas mais tarde, outras princesas da casa real, especialmente as fi lhas do Imperador Shah Jahan, aperfeiçoaram a arte. A princesa Jahanara levou a tradição até a vila de Ambala, situada na linha divisória das águas entre as bacias dos rios Ganges e Indo.

A sua irmã, Roshanara, deixou pela posteridade em Deli o jardim conhecido como Roshanara Bagh, antigamente

espaço arranjado e cada planta e árvore crescia lá devido às suas ordens e por sua vontade. Naturalmente, importantes ocasiões cerimoniais realizavam-se de preferência nos jardins. Isso explica porque é que Aurangzeb escolheu ser coroado em Shalimar Bagh, em vez de na mais imponente Fortaleza Vermelha, construída pelo seu pai.

Tanto na vida como na morte, os jardins dos mogores serviam

os imperadores. Por isso, as plantas para esses jardins foram escolhidas para promover a ideia da eternidade. O cipreste escuro simbolizava o desconhecido, ou a morte. Invariavelmente se encontrava ligado com rosas em fl or ou plantas fl oridas, simbolizando a vida. O ciclo da vida e a continuação da eternidade até se esculpiram na pedra, como se pode ver nos trabalhos embutidos que adornam o Taj Mahal.

O jardim ao redor do túmulo do imperador Humayun em Nova Deli.

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Os cenários para esses singulares espaços verdes eram um outro aspecto notável dos jardins indianos dos mogores. Situavam-se às margens de rios, ao pé de colinas ou com vistas para os vales. O melhor exemplo desse último tipo é o jardim que foi construído em Caxemira, entre as colinas que rodeiam o vale e ao lado do maior lago natural desse estado, o Lago Dal. O fl uxo da água na medida em que cai das alturas transmite uma sensação de vida a correr através das veias das plantas. As águas plácidas do lago e a progressão das árvores magnífi cas do chinar simulam a chegada do imperador.

Sem as colinas, o jardim recebe a sua força das margens dos rios. O rio que corre ao pé do Taj Mahal protegia o mausoléu como um útero enquanto as muralhas demarcavam-no da confusão dos mercados e das planícies poeirentas no horizonte. Do mesmo modo, os jardins nas fortalezas e nos palácios ofereciam um panorama da paisagem. Foi uma vista sem interrupções das conquistas imperiais olhando às vilas ao redor das cidadelas.

Gradualmente, desde os cenários para cerimónias magnífi cas, fontes de prazer e os mausoléus das fi guras importantes o jardim transformou-se num lugar para interpretar a presença colonial.

Uma vista aérea do jardim mogor no palácio presidencial em Nova Deli.A

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Quando Deli se transformou na capital da Índia, o arquitecto Lutyens desenhou um jardim ao estilo dos mogores no palácio presidencial - Rashtrapati Bhavan. Na sua localização arquitectónica esse jardim do século XX interpreta as técnicas tradicionais dos jardins mogores ao fechar um espaço dentro de um recinto amuralhado. Canais de água correndo do norte ao sul e do este ao oeste dividem o terreno com linhas rectas em quatro partes, enquanto as fi las de plantas anuais nas orlas evocam um jardim inglês. Em vez de ser uma amálgama sem razão, o elemento mogor na estrutura desse jardim funciona como uma fórmula holística.

É essa habilidade de mudar com os tempos que assegura a resiliência dos jardins mogores. Embora começaram como um preferido passatempo imperial, os jardins mogores hoje em dia servem como um modelo para os jardins formais. Devido à sua fl exibilidade e às suas raízes históricas esses jardins são um elemento fundamental da nossa cultura. ◆A autora é uma conhecida escritora na área das artes.

Uma outra vista do jardim mogor no palácio presidencial em Nova Deli.P

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As rochas vivas de Mamallapuram

Texto e fotografi as: BENOY K BEHL

O templo do litoral, Mamallapuram, séc. VIII. O equilíbrio e as proporções das duas delgadas torres do templo do litoral fazem com que seja um dos melhores

exemplos dos templos estruturais na Índia. Os pormenores esculpidos estão em harmonia com o conceito global.

Os nandis ao longo da parede exterior saúdam as pessoas e convidam-nos a entrar no espaço sagrado além.

Os templos magnífi cos de Mamallapuram refl ectem os estilos desenvolvidos dos templos

do sul da Índia

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No litoral do estado indiano de Tamil Nadu, na costa oriental da península indiana, há uma magnífi ca cidade de templos esculpidos da rocha. Mamallapuram era um dos mais conhecidos portos marítimos da antiguidade

e tinha uma grande cultura cosmopolita. Nos seus mercados pessoas da Ásia do Sueste cruzavam-se com romanos. As moedas que foram encontradas aqui corroboram o vasto comércio com Roma e outros sítios desde pelo menos o século I. Também se sabe que houve colónias de romanos em Tamil Nadu nessa época.

Essa cidade portuária se chamava Mamalai, ou «grande colina», Narasimhavarman Pallava, conhecido como Mamalla ou o «Grande Guerreiro» expandiu a infra-estrutura do porto durante o século VII. Os navios sulcavam os mares daí até o Ceilão e a Ásia do Sueste. Narasimhavarman mudou o nome do porto a Mamallapuram ou ‘cidade de Mamalla’.

Aqui, ao longo de cem anos talvez, desde cerca de 630 a 728 d.C., esculpiram-se maravilhosos monumentos do granito duro e cinzento. Os rochedos eram transformados num universo de animais e pessoas. As rochas eram esculpidas para criar requintados templos. A pedra foi talhada para recriar as formas de animais.

Descida do rio Ganges, Mamallapuram, séc. VII. Um dos aspectos mais maravilhosos da arte de Mamallapuram é a representação sensível e naturalista dos animais. O elefante parece quase vivo e a tenra imagem das suas

crias comove os corações.

A caverna de Mahishasurmardini, Mamallapuram, séc. VII. Mesmo enquanto os grandes temas estavam a ser esculpidos nas rochas em Mamallapuram, as cavernas estavam a ser escavadas das colinas, continuando a tradição vista na Índia ocidental. No silêncio e nas profundezas do interior, os fi éis viam as histórias das

divindades, que personifi cavam grandes conceitos e as qualidades que temos dentro de nós.

Os magnífi cos templos de Mamallapuram refl ectem perfeitamente os estilos desenvolvidos dos templos do sul da Índia. Obviamente, templos semelhantes deviam ter sido construídos desde há muito tempo antes desse período. É provável que os exemplos mais antigos foram feitos de matérias efémeras e não sobreviveram.

Em frente do antigo porto e não muito longe da cidade encontra-se uma das maravilhas da arte escultural da Índia. O vasto rochedo de granito, medindo quase 34 metros por 17 metros, foi transformado num universo de seres divinos e terrestres. Acredita-se que esse relevo gigante remonta ao início ou aos meados do século VII.

Essa cena representa o momento auspicioso quando o rio Ganges descende à terra para conferir as suas bênções e oferecer o tesouro da fertilidade ao mundo. Alguns estudiosos interpretaram essa cena como a penitência de Arjuna, o herói da epopeia da Mahabharata. Aproveitou-se uma profunda clivagem no rochedo para representar o grande rio na medida em que ela descende à terra. Aliás até há um tanque para armazenar água em cima. É provável que nas ocasiões cerimoniais

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Gajalakshmi, caverna de Varaha, Mamallapuram, séc. VII. É o tema da divindade Lakshmi a ser banhada pelos elefantes. Desde a arte budista do séc. II a.C., Gajalakshmi foi um tema perene na arte índica. Aliás, nessa época as imagens eram predominantemente de yakshas e yakshis e ela era a primeira deusa formal a

ser vista. Como as yakshis ela também representa a abundância da natureza.

Varaha Avatara, caverna de Varaha, Mamallapuram, meados do séc. VII. Para lutar contra a confusão e a maldade da ignorância, o deus Vixnu é representado aqui a descer à terra na sua poderosa encarnação de

Varaha Avatara, na forma de um javali. Salva a deusa da terra Bhu-devi de se afogar, representando o grande poder dentro de nós, que nos pode salvar do oceano da ignorância. Essa representação tem uma grande graça

e sofi sticação, comum na arte que desenvolveu sob o patrocínio real durante o período da dinastia Pallava.

deixavam a água a cair de cima pela clivagem, dando um toque de autenticidade à cena sagrada.

Criou-se um mundo cheio de vida no meio da fl oresta ao redor da cena do rio. Há cerca de cem fi guras de animais, homens, mulheres e seres divinos e todos se viram para prestar homenagem ao rio que dá vida à terra. Todas as fi guras são de dimensões verdadeiras e são esculpidas com grande sensibilidade e naturalidade.

Os numerosos seres que habitam nesse universo que foi criado ao redor do rio foram esculpidos de uma maneira muito vivaz. Refl ectem um sentido de liberdade e a alegria que os artistas sentiam ao criar essas fi guras.

Os elefantes têm um extraordinário realismo e suavidade. Os pormenores das crias dos elefantes revelam a preocupação dos artistas para com todos os seres do mundo. Um outro pormenor de um veado a coçar o seu nariz mostra uma grande sensibilidade e bons poderes de observar o mundo natural.

Perto disso há um outro relevo que representa o mesmo tema. Todavia, não foi concluído. Um bocado à esquerda da grande «descida do Rio Ganges» uma cena sobre o deus Crixna foi esculpida nas rochas. O deus Crixna levanta a montanha

de Govardhan para proteger a aldeia da fúria de uma tempestade. É uma cena encantadora. Quando a paz foi restaurada e a tempestade se apaziguou, um pastor de gado toca a fl auta enquanto um outro ordenha uma vaca. É uma das melhores representações da vida rústica na arte indiana.

Na época Pallava, quando esse relevo foi esculpido, não havia nenhuma mandapa pela frente. Por isso, podia-se ver claramente toda a montanha em cima de Crixna na medida em que ele a levantou. Mais tarde, com a introdução de normas mais formalizadas, construiu-se uma mandapa em frente da cena para realçar o estatuto da divindade. É claro que a efi cácia do tema foi parcialmente perdida.

Pode-se ver as suaves esculturas e as formas delicadas do estilo pallava no mandapa de Varaha, que remonta aos meados do século VII. Aqui, podemos também ver os desenvolvimentos da iconografi a e dos estilos arquitectónicos da época pallava. Os leões sentados nas bases das colunas são um elemento característico.

Há quatro principais painéis de esculturas na caverna. Pode-se ver Vixnu na sua encarnação de Varaha, salvando a deusa da terra, Bhu Devi, de ser engolida

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pelos oceanos. Todos os mitos indianos operam a muitos níveis e isso também signifi ca salvar a humanidade do oceano da ignorância. Vixnu é também representada na forma do Trivikrama, o conquistador dos três mundos.

A parede de trás da caverna tem uma imagem da Gajalakshmi. A deusa Lakshmi, que representa a prosperidade, é banhada pelos elefantes aqui. Nessa parede posterior também há um relevo da deusa Durga, que representa a vitória sobre a ignorância.

Na arte pallava, as fi guras são esguias e delicadas. A escala é natural. O relevo adquire uma profundidade pelas fi guras que voltam para dentro e por outras ainda que se vê de costas. Também se vê tais posturas nas pinturas de Ajanta remontando ao século V d.C. e na arte do vale do rio Crixna no estado de Andhra Pradesh.

dos Kushanas, que vieram do sul da China e mandaram fazer os seus retratos nos santuários reais datando do século I, esses são os retratos mais antigos de reis indianos a sobreviver até aos tempos modernos.

Na Índia antiga, o propósito da arte era sempre distrair os nossos pensamentos da realidade efémera da vida ao nosso redor, focando naquilo que era eterno. Por isso, a arte tradicionalmente não representava as fi guras efémeras. A partir dessa época notámos uma mudança e

Uma das mais magnífi cas representações em Mamallapuram é a da Mahishasuramardini, esculpida numa caverna no século VII. É completamente diferente das anteriores representações desse tema. A deusa Durga luta com o búfalo demónio ou Mahisha, que representa o mal da ignorância. É uma cena muito animada e, ao contrário do que no passado, tem uma escala muito realista. Aqui, o demónio tem um corpo humano e a cabeça de um búfalo. As posturas naturais das fi guras, avançando de um lado e recuando no outro, realça o drama e o realismo da cena. Os confi antes ganas do exército de Durga, representando a justiça, são inesquecíveis.

A caverna de Adivaraha é notável pelos seus retratos do rei Narasimhavarman, com as suas rainhas. Também há uma imagem do seu fi lho com as suas mulheres. Depois do período

começa a haver uma ênfase na personalidade do monarca.

Há nove templos monolíticos esculpidos das rochas. Cinco deles formam um grupo. São os mais antigos edifícios desse tipo na Índia esculpidos de rocha tanto no interior como no exterior. São conhecidos popularmente como rathas, ou as quadrigas dos templos. É uma nomenclatura errada porque foram feitos como templos. São uma maravilhosa imagem esculpida na pedra refl ectindo as variadas formas da arquitectura

dos templos do sul da Índia durante essa época.

Os monólitos foram nomeados em honra dos cinco irmãos pandava da epopeia da Mahabharata e da sua esposa comum, a Draupadi. Formam um grupo coerente e provavelmente foram criados em meados do século VII.

Mesmo ao lado das ondas do mar encontra-se uma das maravilhas de Mamallapuram, um templo com duas torres, conhecido como o templo do

Em cima: Vaca sentada, Krishna Mandapa, Mamallapuram, séc. VII. Na visão destes artistas, um homem não vivia a sua vida em isolamento. Vivemos num mundo cheio de tantos seres e a verdade da vida é apresentada aqui sem se esquecer de nenhum pormenor. É esta vaca, e todos os seres deste mundo, que cria a alegria da vida capturada pelos artistas de Mamallapuram.

À direita: Ancião com uma criança, Krishna Mandapa, Mamallapuram, séc. VII. Entre todo o esplendor dos temas divinos, o artista não se esqueceu dos pormenores da vida. Ao lado da cena onde o deus Crixna ergue a Montanha Govardhana, esse encantador pormenor da vida nas aldeias é uma imagem poderosa.

O retrato do rei Narasimhavarman, caverna de Adivaraha, Mamallapuram. Depois do séc. I d.C. e o período dos reis Kushana, que vieram do sul da China, o período da dinastia Pallava oferece-nos os primeiros retratos de reis na Índia. O monarca Narasimhavarman é representado

aqui e, num painel ao lado, há um retrato do seu fi lho também. Esses retratos marcam o início de um novo sentido de importância e esplendor reais, que ia ter um impacto no futuro da arte e da arquitectura índicas.

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As cinco quadrigas, Mamallapuram, meados a fi nais do séc. VII. Esses cinco templos, erroneamente chamados rathas, ou quadrigas, representam as várias formas adoptadas pelas estruturas dos templos no sul da Índia. Foram talhadas de enormes rochas, a imitar os templos estruturais. No passado teria havido muitas estruturas com estas formas feitas de madeira e outras matérias efémeras, que não sobreviveram até aos nossos dias. Os diversos tipos de templos vistos aqui, juntamente com os relevos e as cavernas esculpidos das rochas, conferem um ar de encanto a essa fascinante vila cheia de estruturas divinas.

litoral. As delicadas e esguias torres são entre as mais bonitas estruturas da Índia. O templo provavelmente foi construído pelo rei Narasimhavarman II ou Rajasimha, no início do século VIII. Acredita-se que ele estabeleceu a tradição de construir os templos estruturais de pedra em Tamil Nadu.

Talvez o aspecto mais memorável da arte de Mamallapuram é a representação dos numerosos seres que habitam nesse universo – os veados, as vacas, os elefantes e muitos outros. O homem é representado no meio da natureza, como uma das suas muitas manifestações. O escultor indiano conseguiu transmitir as qualidades vivas e as emoções dos animais com uma rara empatia. É a sua visão do mundo: uma visão que vê a mesma coisa em todos nós, homens e mulheres, nos animais, nas plantas, nas árvores e até no vento que mexe as folhas. Vê uma unidade em toda a criação, que confere uma grande harmonia e compaixão a essa visão.

Publicada pela primeira vez na revista Frontline.◆O autor é um conhecido cinematógrafo, historiador de arte e fotógrafo.

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Nrityagrame

a paixão pela dançaTexto: LEELA VENKATARAMANFotografi as: AVINASH PASRICHA

Nrityagram, uma aldeia cultural dedicada à dança, é um paraíso onde dançarinos, músicos, escritores e actores

amiúde se reúnem para criar uma sinergia das suas energias criativas.

Rodeada pelos bosques verdejantes de Hessargetta, Nrityagram, uma aldeia de dança, trinta milhas longe da cidade de Bangalore, tem um recinto de dez acres e é um paraíso onde dançarinos,

músicos, escritores e actores amiúde se reúnem para criar uma sinergia das suas energias criativas, inspirados pela natureza ao seu redor. Esse projecto foi concebido pela

falecida dançarina Protima Bedi e foi um sonho pouco comum para uma pessoa que foi criada na mais alta sociedade e sob os holofotes do mundo do cinema em Bollywood em Bombaim. A sua vida foi transformada um dia quando ela foi a um auditório para buscar uma amiga e fi cou encantada com a magia do falecido bailarino Guru Kelucharan Mohapatra a dançar odissi. Não se via a imagem de um bailarino calvo com dentes castanhos. Tudo que ela via era a êxtase, a paixão e a graça da dança. Nesse momento ela decidiu que tinha de aprender essa dança, seja como for. Nos bastidores depois do espectáculo, ela abordou o mestre bailarino «Guruji, por favor ensina-me essa dança». Olhando pela moça vestida de calças e com os seus cabelos num rabo-de-cavalo o mestre casualmente estabeleceu

uma condição. «Se, pela hora em que chego na cidade de Cuttack amanhã pelo comboio, vejo uma mulher vestida tradicionalmente à minha espera na porta da minha casa, então vou considerar o seu pedido». Com a certeza que ele tinha conseguido livrar-se dela, Kelucharan Mohapatra esqueceu-se desse encontro até, ao chegar em casa, ele viu uma mulher vestida de sari e blusa com um bindi na sua cabeça à sua espera, sentada «com a paciência de um monumento» nas escadas da sua casa! Achou impossível negar tamanha persistência e pediu Protima a entrar na sua sala de aula e seguir os passos dos outros alunos, ainda convencido que o seu interesse ia desaparecer rapidamente. Mas Protima persistiu e foi só mais tarde, quando Guruji foi a Bombaim ensinar aulas, que ela recebeu a necessária atenção individual para aperfeiçoar a sua dança,

até que ela transformou-se uma bailarina muito conhecida.

A ideia de criar uma aldeia de dança à maneira da Kalakshetra de Rukmini Devi, (por coincidência Rukmini Devi também começou a aprender a dança clássica de bharatanatyam quando ela tinha quase 30 anos), longe dos sons e das distracções das cidades, tornou-se numa obsessão de Protima uns anos mais tarde. Persistiu teimosamente a convencer o então chefe do governo provincial, Ramakrishna Hegde, até conseguiu ter um terreno para uma aldeia dedicada à dança nessa zona, onde uma zona de produção cinematográfi ca tinha sido demarcada. «Acho que o ministro fi cou tão farto de mi ver em todo o lado onde ele ia – no seu escritório, na sua casa, no seu jardim – que decidiu que a melhor maneira de se livrar da minha presença era dar-me o terreno», disse Protima mais tarde, com um grande sorriso. Ela sempre afi rmou que se ele não fosse um ministro liberal e inteligente, a sua visão nunca se teria concretizado. Em seguida houve vários meses de trabalho árduo, trabalhando com o arquitecto Gerard de Cunha para encontrar o fi nanciamento, desenhar e criar pequenas casas para alojamento e um espaço para aulas para os mestres e os alunos. Protima viveu muito tempo no lote numa tenda, onde se encontravam serpentes e escorpiões com frequência. À noite, tinha que usar uma lanterna para ir à casa de banho longínqua. Mas ela não desistiu.

Uma vista de algumas das casas em Nrityagram

A dançarina Kalanidhi Narayanan a ensinar a dança interpretativa

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Finalmente, foi um momento de grande orgulho em 1990, quando Nrityagram foi inaugurado no dia 11 de Maio pelo então primeiro ministro da Índia, V.P. Singh.

Surupa Sen, a principal aluna de Protima, partilhou os seus sonhos e as suas aspirações. Quando a Protima morreu inesperadamente num desmoronamento nas montanhas em 1998 Surupa assumiu o seu lugar à cabeça de Nrityagram. Surupa trabalhou com uma outra aluna de Protima, Bijayini Satpathy, uma bailarina que inicialmente estudou

com Gangadhar Pradhan de Bhubaneswar. A mente criativa de Surupa e os seus conceitos imaginativos de coreografi a, combinado pelo talento incrível de Bijayini e todo o seu grupo, com as suas coreografi as de grupo espectaculares, asseguraram que Nrityagram é uma força muito potente no mundo de odissi.

Os instintos de Protima mesmo em outras áreas nunca falhavam. Lynne Fernandez trabalha com Nrityagram como administradora e gerente desde 1993. Antes

disso trabalhava como actriz e desenhava as luzes para espectáculos, trabalhando no mundo do teatro com pessoas como Barry John, Joy Michael e Lillete Dubey. Protima persuadiu ela a visitar Nrityagram. Depois de uma estadia de dois meses, a familiarizar-se com o sítio e a ajudar Protima como amiga em muitas maneiras, Lynne fi cou muito surpreendida quando Protima disse que ele ia nomeá-la como gerente de Nrityagram. «Mas porque?» perguntou Lynne. «Nunca trabalhei no mundo da dança e não sei nada sobre as

Protima numa postura ao interpretar um verso do Geeta Govinda de Jayadeva (página de frente) e três perfi s de um movimento executado por Protima (em baixo).

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formas clássicas.» «Tenho Surupa para a parte técnica. Não te preocupes. Durante todos estes dias em que estiveste aqui, trabalhaste sem parar sem uma vez pedir alguma coisa para ti própria. Apenas pensaste da instituição. Tenho a certeza que és a pessoa certa para Nrityagram» e desde então Lynne vive em Nrityagram, trabalhando pela instituição dia e noite.

A escola de odissi é cada vez mais conhecida e o grupo de dança de Nrityagram já ganhou os melhores louvores. É espantoso ver o número de horas durante as quais esse grupo treina. Com o ioga, a

meditação, as artes marciais, a sânscrito, a mitologia e a literatura, as oportunidades para a aprendizagem integrada são infi nitas. Com artistas de todas as disciplinas e coreógrafos de todo o mundo a visitar ao longo do ano para ensinar os alunos, criou-se um raro ambiente artístico, realçando a interacção entre as diversas formas de arte. Todos os espectáculos cuidadosamente refl ectem cada aspecto de dança, desde a apresentação, a música, os ritmos, os trajes, as luzes e o espaço. A excelência dos espectáculos do grupo de Nrityagram distingue-o. Os bailarinos também trabalham na quinta e essa sensação de

trabalhar a terra confere uma qualidade muito especial à sua dança. Tanto Protima como o seu mestre inicial Guru Kelucharan Mohapatra (que atribui a sua sensibilidade artística ao facto que na sua infância ele tinha trabalhado numa plantação, cuidando das plantas) acreditavam nessa fi losofi a.

Como a Protima sempre disse «Nrityagram é um estilo de vida».

Durante o festival anual de Vasantahabba, é uma visão inesquecível ver mais que 40.000 espectadores sentados no anfi teatro ao ar aberto a ver os espectáculos de música e dança de diversos tipos ao longo de toda a noite.

Foi em 1996 que o grupo de dança estreou em Nova Iorque, mudando a sua carreira para sempre. Apresentaram os seus espectáculos nos palcos mais conhecidos da cidade – uma proeza que poucos dançarinos indianos conseguiram fazer até hoje. Protima tinha que cuidar de Nrityagram e infelizmente morreu antes de ver os espectáculos do grupo em Nova Iorque. Hoje em dia o grupo de Nrityagram já fez espectáculos em Hawaii, nos EUA, no Médio Oriente, no Extremo Oriente e na Europa, criando o seu próprio nicho no mundo da dança.

Ao lado do estilo clássico de odissi herdado do mestre, Nrityagram já fez muito trabalho inovador, graças ao fi nanciamento que recebeu do Projecto Nacional de Dança da Fundação das Artes da Nova Inglaterra e,

mais recentemente, do Teatro Joyce. Para além da posição da tribhanga (uma postura com três dobras) e chauka (uma postura meia sentada com os joelhos para fora), as principais preocupações estilísticas de odissi, a abordagem que Nrityagram usa incorpora também as extensões das pernas e os altos saltos, que a comunidade ortodoxa dos puristas acha demasiado liberal. Consideram que tamanho sabor físico vai diluir o lirismo que é um dos elementos principais de odissi. A formação rigorosa que os bailarinos de Nrityagram adquirem lhe oferece uma variedade de movimentos e um vigor que talvez seja mais parecido com o estilo de mayurbhanj chhau mas que os

clássicos bailarinos de odisso são incapazes de reproduzir. Deve-se dizer que na dança baseada nos jayadeva ashtapadis, por exemplo, os bailarinos de Nrityagram são muito graciosos.

O grupo encontrou um óptimo músico em Raghunath Panigrahi (que não sabia o que fazer depois da morte prematura de sua mulher Sanjuktha Panigrahi e encontrou em Nrityagram a lembrança da paixão de Sanjukta), um compositor ideal. O seu conhecimento musical combinado com os seus estudos de sânscrito e a criatividade de Surupa traduzem-se numa alquimia inesquecível. Os irmãos Ganesh e Kumaresh, que tocam o violino no estilo carnatic, também compuseram música para Nrityagram.

A primeira produção de longa duração de Nrityagram «Sri – À procura da deusa», estreou em Deli em 2001 e nos EUA em 2002-2003, recebendo grandes louvores dos críticos. Ansh foi uma nova maneira de conceber os formatos tradicionais de odissi. A peça «Espaço sagrado» foi inspirada pela arquitectura dos templos como o templo de Chausat Jogini em Orissa e estreou em Madrasta durante o Festival da Academia da Música em Dezembro de 2005. Recebeu o prémio para melhor produção da estação. A peça «Pratima: Refl exões» foi encomendada pela Fundação de Stephen e Cathy do teatro Joyce, onde a relação da dançarina com a dança constrói-se à volta das verdades de criação, contemplação,

Bharati Shivaji demonstrando uma postura no estilo clássico de mohiniattam.Dançarinos num espectáculo no anfi teatro de Nrityagram

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separação e a natureza dual do espírito humano. Estreou em 2008 e Joan Acocella, a crítica da The New Yorker (12/9/2008) listou Vibhakta, uma cena de Pratima, entre os dez melhores espectáculos de dança.

Surupa Sen recebeu o prémio da Fundação Raza para excelência na dança em 2007 e o prémio Yagnaraman do Sri Krishna Gana Sabha em 2008 para melhor direcção artística e coreografi a. Ela continua a trabalhar infatigavelmente em Nrityagram. Os seus espectáculos com Bijayini são os melhores vislumbres do estilo de odissi que se pode ver hoje em dia. Os seus gita govinda

ashtapadis são encantadores e refl ectem perfeitamente o esplendor poético dessas canções. Bijayini também recebeu vários prémios como o Prémio Mahari (2003), o Bismillah Khan Yuva Puraskar do Sangeet Natak Akademi em 2007, o prémio do Yagaraman Krishna Gana Sabha em 2008 e o prémio Sanskriti em 2007 e tem trabalhado sem parar para criar novas técnicas para a formação na arte de odissi. Pavitra Reddy, Rasmi Raj e Manasi Tripathy são as outras bailarinas permanentes do grupo.

A Lynne introduziu novos espaços como o estúdio de dança, o auditório, a sala

Radha e Crixna numa dança do estilo manipuri (página de frente) e um espectáculo de Yakshagana, uma dança folclórica, em Nrityagram (em baixo).

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das exposições e o centro de fi sioterapia em Nrityagram. Trabalhando ao longo do ano, é uma tarefa herculeana manter a instituição, especialmente devido a sua localização, que é tanto uma bênção como uma maldição, porque é sempre difícil convencer músicos e percussionistas a morar lá como músicos residentes. Muitos bailarinos que querem aprender durante o dia sem viver na instituição também acham que a logística dos transportes é difícil. Todavia, Nrityagram também tem um programa onde envia professores para ensinar nas aldeias e nas cidades, benefi ciando muitos alunos.

Para qualquer bailarino, estudar em Nrityagram é realizar um sonho. É um sítio onde a dança e a natureza são amigos íntimos. Esse sonho é mantido graças aos indivíduos que dedicaram as suas vidas à arte e que merecem todo o apoio e encorajamento possível. A dança – e odissi em particular – vai benefi ciar desse patrocínio. ◆A autora é uma crítica de dança.

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Bijayini e Surupa mostram uma abelha atraída a uma fl or de loto – a imagem é uma metáfora para o amor de Radha e Crixna.

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Ligações através das melodiasA MÚSICA INDIANA ENGLOBA O MUNDO

MADHUSREE CHATTERJEE

Enquanto o mundo canta alegremente «Jai Ho», a canção criada pelo compositor A.R. Rahman, que ganhou um Óscar, as duas palavras, que signifi cam ‘seja glorioso’ capturam um momento dourado para a música indiana. A herança musical do país, cujas raízes remontam a mais que mil anos, adquiriu uma

nova visão global e um novo aspecto.

O holofote internacional está focado na música indiana como nunca antes, especialmente peças de fusão que combinam os ragas clássicos tradicionais e ritmos étnicos e folclóricos

com sons ocidentais. O primeiro Óscar ganho pela Índia para uma canção chegou ao mesmo momento em que o instrumentalista indiano Ustad Zakir Hussain, famoso pela sua magia com a tabla, um instrumento de percussão, ganhou um Grammy.

«O mundo está a descobrir a nossa música mais uma vez. Temos tanto para oferecer» diz Hussain, que colaborou com músicos ocidentais no disco que ganhou um prémio Grammy, o «Global Drum Project».

A vocalista Lakshmi Shankar, que ganhou uma nomeação para um Grammy e especializa-se na música clássica do estilo hindustani, do norte do país, descreve esse período como «a segunda renascença da música indiana. No ocidente toda a gente gosta da nossa música e quer ouvir mais».

Todavia, a música indiana já está a superar as fronteiras geográfi cas desde há quase sete décadas, embora sem atingir o êxito dramático como hoje em dia.

Muitos historiadores concordam que a música indiana foi ao estrangeiro pela primeira vez em 1930 com o bailarino e músico Uday Shankar – cujo grupo, baseado em Paris, fez turnês na Europa, na América do Norte e na Ásia do Sueste durante oito anos.

Esse grupo contava com alguns dos maiores nomes na história da música clássica indiana como Baba Allauddin Khan, um lendário

S.E. Nikolai Bulganin, o primeiro-ministro da Rússia, a apresentar fl ores aos artistas da peça «Ramlila» com marionetas de sombra dirigida por Uday Shankar com o seu grupo cultural.

O antigo primeiro-ministro da Índia, Jawaharlal Nehru, também está visível nesta fotografi a. Baba Allauddin Khan

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Ustad Ali Akbar Khan num concerto

músico que tocava o sarod, um instrumento de cordas; o vocalista e músico Vishnu Das Shirali; e o compositor Timir Baran.

Em 1955, o célebre maestro e violinista Yehudi Menuhin apresentou ao ocidente «Música da Índia: Raga da manhã e da tarde», o primeiro disco da música clássica indiana. O álbum tinha Ustad Ali Akbar Khan tocando o sarod, Pandit Chatur Lal tocando a tabla e Shirish Gor na tambura, um instrumento de cordas.

No prefácio, Menuhin apresentou cada instrumento musical e os sons que criava para os ouvidos ocidentais.

Quando o compositor estado-unidense La Monte Young ouviu o som da tambura pela primeira vez na rádio que estava a transmitir esse concerto em 1957, foi até a loja mais perto para comprar o disco. Young depois estudou a música indiana durante 26 anos com o vocalista Pandit Pran Nath.

Menuhin também tocou com Ravi Shankar, o lendário músico indiano conhecido mundialmente pela sua maestria do sitar, um instrumento de cordas, para o álbum «West Meets East» durante a década dos 60.

Mickey Hart, percussionista da banda popular americana The Grateful Dead, achou difícil acreditar que Chatur Lal estava a tocar a tabla apenas com as suas mãos! Hart, um dos melhores percussionistas da música contemporânea ocidental, disse que: «o ritmo indiano

é parecido com o árabe, vê-se a infl uência dos mouros com os pormenores intensos em vários níveis».

Segundo o músico e autor Peter Lavezzoli, um percussionista profi ssional baseado em Miami e St. Louis que passa os seus invernos na Índia ouvindo e escrevendo sobre a música clássica indiana, os desenvolvimentos tecnológicos ajudaram a música indiana a circular no ocidente.

No seu novo livro, «Bhairavi: The Global Impact of Indian Music», Lavezzoli disse que antes da invenção do disco de longa duração, as gravações da música clássica indiana limitavam-se a apenas discos de três minutos de 78 rpm, fabricados exclusivamente para o mercado indiano.

A tecnologia também permitiu o mestre musical Ali Akbar Khan, que tocava sarod, a tocar na televisão nos EUA – o primeiro espectáculo por um músico clássico indiano na televisão americana.

Se 1955 foi o ano em que se semearam as primeiras sementes da música clássica indiana no ocidente, então 1967 foi um ano notável, quando a busca para uma visão alternativa do mundo levou os músicos a percorrer a Ásia, especialmente a Índia, para explorar as suas tradições espirituais e estéticas.

O maestro e violinista Yehudi Menuhin a apresentar a música clássica indiana a um público ocidental

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Maharishi Mahesh Yogi, um asceta indiano que popularizou a antiga ciência da meditação transcendental na Europa e na América, capturou a imaginação dos Beatles – um dos mais célebres grupos britânicos de pop-rock de sempre.

O quarteto de Liverpool passou quase seis semanas no retiro do asceta em Rishikesh e compuseram mais que 30 canções lá. Também foi o início de uma associação vitalícia entre George Harrison, um dos Beatles, e Ravi.

A popularidade de religiões indianas como o culto de Crixna, o budismo e o culto de Chinmaya também ajudou a abrir as portas à música indiana no ocidente.

No seu livro Lavezzoli se lembra do momento em que Ravi Shankar e o falecido mestre de tabla Ustad Alla Rakha fi zeram um espectáculo no festival de pop de Monterey na Califórnia em 1967.

«Os eventos desse fi m-de-semana eram fi lmados... capturando várias fi guras lendários no seu pico – Jimi Hendrix, The Who, Otis Redding e Janis Joplin... quase todos os famosos músicos estavam lá a ver o espectáculo de Ravi Shankar; a maioria nunca tinha visto o músico indiano tocar antes... E a reacção do público foi fantástica,

O mestre do sitar Ravi Shankar com Ustad Zakir Hussain a tocar tabla, um instrumento de percussão, num concerto.

assegurando que Ravi Shankar ia se transformar numa estrela ainda maior».

Em 1994, o músico indiano Pandit Vishwa Mohan Bhatt, que inventou o instrumento de cordas conhecido como a mohan veena, ganhou um Grammy juntamente com Ry Cooder pelo seu álbum «A Meeting By The River».

A maior glória foi o reconhecimento dado à indústria de música dos fi lmes indianos – para os compositores como A.R. Rahman ou um técnico de som como Resool Pookutty, ambos dos quais são nativos do sul da Índia e ganharam Óscares para o fi lme «Quem quer ser milionário» do director britânico Danny Boyle.

Como Vishwa Mohan Bhatt disse: «Se os anos 70 eram sobre os Beatles e Ravi Shankar então 2009 é sobre os músicos indianos que foram ao ocidente para preparar a próxima onda musical. O ocidente é espantado pela nossa disciplina e pelos nossos ritmos, é surpreendido com as emoções da nossa música; já chamamos a atenção de todo o mundo».◆(Fonte: O serviço indo-asiático de notícias - IANS)

O director indiano de música que foi galardoado com um Óscar, A R Rahman a fazer um espectáculo em Nova Deli no dia 11 de Agosto de 2009 para comemorar os 50 anos de

Doordarshan – o canal nacional de televisão.

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O mosaico cultural e criativo do país que se chama a Índia tem uma história de mais que 5.000 anos. Uma das civilizações humanas mais antigas, ao longo dos séculos o povo dessa

antiga terra desenvolveu habilitações e técnicas que são passadas de uma geração à próxima através das tradições orais e as actividades comunitárias e familiares. Os artesãos indianos trabalham com as suas mãos para criar objectos bonitos e úteis, amiúde utilizados para a adoração, com as matérias e as imagens do mundo ao seu redor.

DhokraUMA ARTE ETERNA

REKHA SHANKAR

A «elegância artística» do artesanato dhokra já passou a prova do tempo. Uma das mais antigas técnicas de trabalhar os metais não ferruginosos da civilização humana, dhokra

ainda está a evoluir e a forjar novos caminhos.

Os produtos são requintados ou mais folclóricos conforme a comunidade do artesão. As matérias-primas incluem a argila, metal, madeira e fi os e os artesãos – o tecelão, ferreiro, oleiro ou carpinteiro – são uma parte integral da comunidade local.

A utilização do metal na Índia remonta à época dos vedas. O ferreiro, chamado karmara, gozou de uma alta posição na sociedade. Há uma referência no Yajurveda a Rudra, o deus do relâmpago, homenageando a família do karmara. Como outras actividades artesanais, a arte de trabalhar o metal também é inextrincavelmente ligada à religião. Aliás, antes que um artesão começa a trabalhar reza para orientação ao Tvastram, fi lho de Visvakarma, descrito na grande epopeia hindu, a Mahabharata como, «o lorde das artes, executor de mil formas de artesanato». Os metais têm uma signifi cância religiosa para os indianos e pode-se ver ícones de metal em templos ou em salas de oração em casas em todo o país. Há mais que 2000 anos, os ferreiros indianos fi zeram um grande avanço na metalurgia. Conseguiram produzir latão – uma liga de metais básicos que tinha um aspecto dourado. Alcançaram essa proeza ao fundir zinco e cobre, onde a percentagem de zinco tinha que ser controlada entre 10% e 12%. Uma outra criação notável foi de uma liga metálica chamada panchdhattu feita com cinco metais – cobre,

esses metais têm o aspecto de ouro. Ao longo dos anos o artesanato em metal, como as outras formas de artesanato, benefi ciou do patrocínio real e os artesãos dominaram as técnicas de trabalhar o metal e fazer esculturas.

O artesanato de dhokra é a mais antiga técnica de trabalhar os metais não ferruginosos no mundo. A própria palavra dhokra literalmente quer dizer «mais antigo» e deriva-se do nome das tribos Dhokra Kamar no estado de Bengala Ocidental, que tradicionalmente são ferreiros. São um grupo que se especializa nessa forma artística. Alguns historiadores acreditam que as tribos originalmente vieram da região de Bastar no estado de Chhattisgarh e, sendo nómadas, viajaram nas áreas vizinhas e ao longo do tempo estabeleceram-se nas áreas tribais dos estados de Madhya Pradesh, Chhattisgarh, Orissa, Bengala, Jharkhand e Andhra Pradesh. Embora têm a mesma origem étnica, são identifi cadas por nomes diferentes em cada estado. O seu método de trabalhar o metal é conhecido como a técnica da “cera perdida” e é praticada na Índia desde há mais que 4.000 anos. Provas de semelhantes técnicas de trabalhar ligas à base de cobre foram encontradas na China, no Egipto, na Malásia, na Nigéria e em algumas áreas da América Central.

Um dos mais antigos artefactos esculpidos usando esta técnica é a «mulher dançante» de

zinco, ouro, prata e chumbo, que foi uma liga popular para os ídolos religiosos desde então. O latão e o metal dos sinos, também muito popular, é uma liga de cobre e estanho. Ambos D

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descobriram o metal usaram o novo material com o mesmo tratamento de texturas. Há algumas diferenças nos fornos usados e pequenas variações nas matérias de cada região mas a técnica básica é mais ou menos a mesma. Na Bengala, o forno está em cima do chão enquanto em Chhattisgarh e em outros estados, é subterrâneo. Em Jharkhand, o aparato de aquecimento é atado ao próprio molde. Inicialmente o artesão tem de trabalhar tanto como escultor como um artista. Primeiro, prepara um molde básico de areia, argila e hastes de arroz. Em Bengala, é coberto com um fi o feito de gala, um pasta de óleo de mostarda e a cera das abelhas. Na região de Bastar em Chhattisgarh, os artesãos usam fi os e faixas de

«para o momento, tem toda a confi ança nela mesmo e no mundo. Acho que não há nada como ela em todo o mundo» - uma criação eterna.

A técnica cuidadosa e árdua de trabalhar o metal nessa maneira não mudou desde então e, ao contrário de outras formas de artesanato na Índia, o trabalho de dhokra é feita igualmente por homens e por mulheres. A superfície dos objectos evoca os itens feitos em erva, bambu ou canas. Parece que os artesãos trabalhavam com ervas no passado e quando

Mohenjodaro, uma estátua de bronze de uma altura de 10,8 centímetros. Acredita-se que foi feita em cerca de 2500 a.C. Foi escavada em 1926 de uma casa na antiga cidade de Mohenjodaro, hoje em dia no Paquistão. As pessoas que viram a peça afi rmam que parece falar com o espectador através dos séculos, do seu distante passado até o presente, com uma postura e uma expressão que são tão relevantes hoje como no dia em que foi feita. Ao descrever a escultura, o arqueólogo britânico Mortimer Wheeler disse que a pequena moça de Baluchistão

cera enquanto na área de Sarguja usam uma resina chamada dhuvan. Em Orissa, a cera é misturada com dhuna, a resina da árvore Shorea robusta. Podem-se ver os pormenores do desenho fi nal no padrão que é criado desta maneira com essa cobertura de fi os de cera. Os fi os fi nos, de 1/16o de uma polegada, são atados tão bem que nenhuma parte do molde de areia e argila é visível. Essa camada é depois coberta com argila e deixado para secar ao sol. A camada de argila assume a forma negativa da cera dentro e se transforma num molde para o metal. Deixam-se buracos para que a cera possa derreter e sair quando se aquece o molde. Uma vez que o molde se seque, é aquecido gradualmente e, na medida em que a cera começa D

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de óleo decoradas com pavões são populares e feitas em muitos desenhos diferentes porque são uma prenda tradicional às fi lhas. Os tradicionais pyalae (copos de medição), em vários tamanhos, eram utilizados para medir cereais. Hoje em dia são uma escolha popular para servir nozes ou água para lavar as mãos antes de uma refeição. Em Bastar, é comum ver a imagem de um elefante, que é considerado uma forma da deusa do estado, chamada Dhanteshwari. É curioso que

os artesãos acreditam que não podem ver a deusa então assomem que ela está montada no elefante que fi zeram. Devido à promoção estatal e aos projectos patrocinados pelo governo e por desenhadores, o reportório dos artesãos cresceu para incluir uma variedade de produtos como estátuas, taças, fi guras de animais, criaturas míticas, deuses, deusas e uma gama de acessórios para a casa como lamparinas, maçanetas e cadeias. Alguns dos artesãos até começaram a fazer peças

e talheres para a mesa, que confere um toque exótico à ocasião mais simples. As comunidades sonar, bhat e bhotia fazem joalharia tribal em latão com um impacto espantoso. Usam-se essas peças nos festivais e em ocasiões especiais. Os itens incluem colares, pulseiras para as mãos e os pés, brincos e ganchos para os cabelos.

Alguns dos objectos que se vêem hoje parecem não ter mudado ao longo do tempo mas ainda são relevantes enquanto outras peças evoluíram para um outro género sofi sticado e contemporâneo. Cada criação representa a simplicidade primitiva, tanto nos encantadores desenhos folclóricos ou na representação caprichosa de cenas da sua vida quotidiana nas composições, que inclui temas tão diversas como uma mulher tribal a usar um computador; uma mãe a massajar o seu fi lho ou uma vaca a dormir à sombra de uma árvore. Sem nenhuma formação em instituições formais, as habilidades e o sentido estético desses povos resultam da sua própria visão do mundo, ainda imunes às infl uências forasteiras. A Índia é sem dúvida um país privilegiado a ter essa herança eterna e para poder oferecer ao mundo a beleza criativa dos seus artesãos de dhokra.◆A autora trabalha com a Dastkari Haat Samiti e era a directora de India Sponsor Foundation onde encabeçou uma equipa para treinar mulheres desfavorecidas a serem motoristas comerciais pela primeira vez em Deli.

a derreter, o metal líquido é colocado no seu lugar. Neste processo, o nome da técnica deriva-se da perda da cera. O metal líquido substitui a cera no molde interior e endurece entre o núcleo e a cobertura de argila. Assome a mesma forma como a cera. Uma vez arrefecida, quebra-se a camada exterior de argila com uma grande faca e tira-se a escultura de metal. Agora está pronta para o acabamento. Com a excepção das esculturas ocas de três dimensões, o núcleo de argila é deixado dentro da cobertura de metal para aumentar o peso da peça, especialmente se é uma obra votiva e vai ser colocada num altar.

A qualidade do produto fi nal depende não apenas na habilidade do artesão que prepara o molde mas também no que faz os acabamentos. A superfície é lixada para fi car suave e acrescentam-se bolinhas, espirais e motivos entrecruzados para adornar a peça. Um aspecto singular dessa forma de artesanato é que duas peças de dhokra nunca podem ser iguais porque cada peça é feita num novo molde. Não se pode usar o molde uma segunda vez porque é quebrado para extrair a obra. Cada peça é feita com grande amor, cuidado e habilidade e estabelecem-se os preços segundo o seu peso, acabamento e o grau de pormenores na peça.

Tradicionalmente, os artesãos faziam divindades religiosas, recipientes e utensílios para a sua vida quotidiana. Lamparinas D

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Em Lucknow, diferentes gastronomias fundem-se, ao contrário dos outros estados, que têm hábitos culinários muito específi cos. Assim, enquanto Bengala prefere o seu arroz com caril de peixe, a

gastronomia de Guzerate é essencialmente vegetariana. Os estados do sul usam arroz e coco enquanto o estado de Caxemira é famoso pelos seus pratos de carne como gushtaba, nos seus célebres banquetes de wazwan enquanto Jammu, situado ao lado, é famoso pelo seu prato de arroz com feijão. Enquanto os estados orientais comem arroz e carne, os estados de Haryana e Punjab favorecem o trigo e Himachal prefere arroz e milho. Em Lucknow tanto arroz como roti (uma variedade

A cidade de Lucknow e a sua comida popular

ANIL MEHROTRA

Lucknow - a antiga sede dos nabobos de Awadh, o centro de uma cultura requintada, uma cornucópia de artesanato como

chikankari e zardoji, e com uma gastronomia famosa em todo o mundo, é uma combinação de culturas e cozinhas,

artes e artesãos, tradição e modernidade. Aqui a gastronomia transcende os limites da cozinha e é transformada numa

obra de arte.

de pão) são igualmente populares e biryani (um prato de carne e arroz) é tão famoso como o roomali roti (uma variedade de pão fi no como um lençol) e mutton-do-pyaza (carne cozinhada com cebolas e especiarias) é tão venerado como malka masoor (lentilhas cor-de-rosa).

Assim, quando pediram-me escrever sobre a comida popular de Lucknow, fi quei apavorado. Não me considero um conhecedor gastronómico embora eu possa identifi car e apreciar um bom prato. Lucknow tem tamanha variedade gastronómica nas suas ruas que seria uma tarefa difícil mesmo para os peritos. É uma cidade onde a diferença entre a comida quotidiana e a comida festiva é tão grande que até têm nomes diferentes para os estilos de cozinha!

Em termos históricos, os nababos são responsáveis para tornar à gastronomia de Lucknow famosa em todo o mundo – desde o primeiro nababo, Burhan-Ul-Mulk, ao célebre poeta e bailarino o nababo Wajid Ali Shah. Para as pessoas que gostam de estatísticas, pelo menos 19 variedades de kebabs (espetadas), 37 variedades de pão, 35 variedades de zarda (arroz doce), 47 variedades de pulao (pratos de arroz), 37 variedades de doce foram criados apenas durante o reinado do nababo Shuja-Ud-Daula! Lucknow também foi o berço da famosa gastronomia do estilo dum pukht, que nasceu e amadureceu aqui. Desde as suas origens humildes dum pukht já conquistou a imaginação de apaixonados de comida em todo o mundo. Mas vamos falar disso mais tarde.

Os nababos vinham do Irão e patrocinaram as artes em todas as suas formas, desde a dança até a música, o teatro e a gastronomia. Reza a lenda que a água do rio Gomti irritava a frágil constituição dos nababos, que mandaram os médicos reais a encontrar uma solução aos seus problemas gastronómicos! Depois de muitas discussões, os médicos reais sugeriram o uso de receitas com muito açafrão das Índias e resolveram o problema.

Um caril de carne com muitas especiarias Os deliciosos kebabs da loja de Tunde Kebab

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Haji Abdur Rahim, o seu gilafi kulche (pães muito macias) e nihari khaas (pés de vacas ou ovelhas) são maravilhosos. Para encontrar o pão doce de cor laranja conhecido como sheermal (um pão rico feito com açafrão e leite) visitámos aruela de Chawal Wali Gali também

conhecido como a ruela de sheermal. Todavia, o açafrão que originalmente foi utilizado para dar a sua cor laranja, já foi substituído pelas cores sintéticas. Na ruela ao lado, Ban Wali Gali, encontra-se uma loja que foi estabelecida há mais que trezentos anos, a loja de doces

de Ram Asrey, famosa pelas suas lal-pedas (doces redondas de leite).

Também na zona da Gol Darwaza há a loja de Rajá que serve thandai (uma bebida de leite com especiarias). Um copo dessa bebida vai saciar a

garganta mais seca. Se quiser, pode pedir uma infusão de bhang (cannabis) na sua bebida, para ter um efeito maior.

Nenhuma visita à cidade velha é completa sem saborear namish ou malai makhan (uma doce como um souffl é)

em Gol Darwaza. Disponível apenas durante o inverno, a natureza singular desse prato também se deve ao facto que não se encontra em nenhuma outra parte do país. Segundo o nababo Mir Zafar Abdullah, um descendente directo dos nababos e um grande amigo meu, namish foi um prato quotidiano e comia-se com taftan – um pão salgado. A sua transformação para uma doce só aconteceu muito mais tarde. Deixa-se leite batido em baixo do céu à noite e o orvalho dá-lhe um sabor delicado e uma linda cor de amarelo!

Apanhámos um riquexó até Aminabad, um outro mercado antigo onde a comida predomina. Para além de uma fi lial de Tunde Kebabi, as suas ruelas são famosas pelas suas numerosas lojas de chaat (uma merenda salgada). NA encruzilhada entre os mercados de Nazirabad e Aminabad é possível saborear o famoso kulfi (leite adoçado com pistáchios transformado num gelado) na loja de Prakash e há inúmeras lojas a vender merendas salgadas na avenida principal. Durante os invernos, essas lojas vendem rewri, til (sésamo) ladoos e gazak (especialidades usados para aquecer o corpo durante o inverno). Em frente de Tunde Kebabi há uma pequena ruela escura que vai até o restaurante Alamgir, que serve kebabs e roomali roti maravilhosos. O ambiente não é moderno mas os pratos são fora deste mundo. E antes que se

Costeletas suculentas de carne (em cima) e frango assado numa loja na rua.

Wahid biryani – um prato que usa 55 especiarias segredas (em cima) e Tunde Kebab – a herança de um cozinheiro com um braço.

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Uma outra história explica como uma variedade muito macia dos famosos kakori kebabs surgiu. Um velho nababo sem dentes da aldeia de Kakori que não podia resistir os pratos locais deliciosos mandou o seu cozinheiro a desenvolver uma receita que o permitiria saborear o kebab sem a necessidade de mastigar. O prato que o seu cozinheiro produziu é hoje em dia famoso mundialmente como o kakori kebab!

Decidimos começar o nosso passeio gastronómico com os shahi gelawati kebabs da famosa loja de Tunde Kebab na velha cidade de Lucknow. A receita foi desenvolvida por Haji Murad Ali que, reza a lenda, caiu do tecto e perdeu um braço, assim ganhando a alcunha de Tunde (homem de um braço). Embora os fi eis continuam a encher essa loja, a comercialização já começou e hoje em dia se pode encontrar os seus pratos nos centros comerciais e outros sítios na cidade. É necessário dizer-lhe com a encomenda se quer carne do animal grande (isto é, carne de vaca) ou carne do animal pequeno (que seria cabra ou ovelha). A receita é um segredo bem guardado e inclui centenas de especiarias. Também se diz que é bom para a digestão!

Ao lado há a porta Ajmeri, onde a cidade velha se funde com o mercado Nakkhas. Numa pequena ruela encontra-se a loja de Rahim’s que vende a iguaria chamada nihari. Estabelecido em meados do século XIX por

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concorrendo como a família Sharma. Ambos têm os seus adeptos que juram pelas suas respectivas preparações de chaat. Todavia, na minha opinião o vencedor é o King of Chaat ou Shukla, ambos no bairro de Hazratganj. À saída do mercado de Halwasiya, também em Hazratganj, há um homem que vende desde sempre pratos feitos de folhas cheios de uma preparação deliciosa de ervilhas cozidas.

Muito perto à loja de Shukla, em frente do prédio LIC, no centro de Hazratganj, preparam-se as mesas para as pessoas a comer os crocantes batashas (bolinhas de trigo recheados com água cozida com especiarias) com seis variedades de água. A sua clientela consiste de fregueses regulares para quem é obrigatório comer um prato de batasha (gol gappa no Punjab/

Deli e paani poori em Calcutá) depois do seu passeio à noite.

Mais tarde, à noite, as pessoas enchem a praça em frente do restaurante Moti Mahal para os cremosos e deliciosos kulfi s (gelado), os imartis quentes (merendas fritas doces), gajar ka halwa (uma doce de cenoura e leite com frutos secos), gulab jamuns ou centenas de outras variedades de doces.

Ao lado dos correios em Hazratganj e antes de Raj Bhawan (a casa do governador) há o conhecido homem que vende dahi bade (bolas de lentilhas fritas cobertas com iogurte e molhos doces). A loja é pouco mais que um quiosque e abre às 14h todos os dias para além da segunda-feira. Quando a noite chega, já não lhe sobra nenhuma comida. Pode concorrer com qualquer cadeia multinacional! Fora do bairro do

Cantonment, no ubíquo mercado de Sadar Bazaar, encontra-se o Chappan Bhog, que vende maravilhosas doces e chaat.

No bairro de China Gate, ao fi m da Avenida de Mahatma Gandhi, na sombra dos famosos restaurantes «Gemini» e «Clark’s Awadh» encontra-se a comida de Lucknow. Ainda que a comida é quase toda à base de carne é um óptimo lugar para saborear a comida da rua de Lucknow. O aroma de frango com kalimirch (pimenta negra) mistura-se com o perfume de coentros frescos e as sementes de cominhos nas lentilhas. Os aromas de dum pukht biryanis, costeletas, tikkas, mussallam, rogan josh, kebabs, frango marinado e assado até a perfeição, butter chicken e muitas outras especialidades chamam a atenção, juntamente com peixe chatpati, kali dal (lentilhas), paneer kali mirch e

as variações. Esse banquete não é completo até provar a enorme gama de pães como o tandoori roti, roomali, kulche, bhature taftan, phulke, parathas, laccha, varki, pooris e naans... a lista é interminável.

Muskuraiye Ki Aap Lucknow Main Hain (Sorria, agora está em Lucknow!) é o lema da cidade. Para ter o sorriso perfeito é necessário acabar uma refeição com um paan (bétele) é há inúmeras lojas de paan, cada uma a loja preferida de

alguém. Visto que os clientes são fastidiosos na sua escolha de folhas, vários tipos de folhas são trazidas de tão longe como Calcutá, Varanasi, Hamirpur e Mahoba. Preparadas com nafasat (requinte) que é quase uma reverência e temperadas com sabores, condimentos e tabaco (para os que querem), perfumada com água de rosas e gulkand (folhas de rosa marinadas num xarope de açúcar), é oferecida aos clientes com a maior graça. Os habitantes da cidade não dormem sem visitar a sua loja preferida de paan, que às vezes pode ser bem longe da sua casa.

Não me admiro que um poeta uma vez disse:

Aye Shehar-e-Lucknow tujhe mera Salaam hai;Tera hi naam doosra Zannat ka naam hai...

(Ó Lucknow, saúdo-te por ser um outro nome para Paraíso)◆O autor é um conhecido escritor de viagens.

digam que estou a negligenciar os pratos vegetarianos há uma loja que se chama Purani Qabar wali Dukan que oferece divinos pooris e kachauri alu (um pão frito com batatas).

O restaurante Shiv em Kaiserbagh, a uma curta distância de Aminabad serve uma doce e espessa bebida de iogurte, lassi, decorada com frutos secos. Ao lado, na encruzilhada do cinema Novelty encontra-se o restaurante de Sharma Chaat House & Tea Corner, gerido pelos dois irmãos Sharma. Essa loja vende inúmeras chávenas de chá com pães e manteiga desde que me lembro.

À tarde a família Jains monta a sua tenda a vender chaat em frente do cinema Novelty,

As sobremesas deliciosas – zauk-e-shahi (em cima) e makhan malai (em cima à direita). Uma refeição em Lucknow é incompleta sem um paan (à direita).

Kachauri – uma merenda frita (em baixo) e a preparação de uma chávena de chá (à direita).

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No meio do frio do inverno em Deli, a Índia e o Bangladesh inauguraram uma nova primavera nas suas relações bilaterais. Inspirando-se nos temas de unidade nas obras de Rabindranath

Tagore e Kazi Nazrul Islam, os dois poetas icónicos do sub-continente, o primeiro-ministro indiano Manmohan Singh e a líder de Bangladesh Sheikh Hasina Wajed tomaram medidas pioneiras no dia 11 de Janeiro para aproximar os seus dois países na tarefa comum de lutar contra o terrorismo e construir um novo futuro ao redor de comércio, transportes e o trânsito do território nacional.

Na primeira visita de estado à Índia em 2010, o primeiro-ministro indiano, Dr. Manmohan Singh anunciou uma linha de crédito de $1 bilhão para estimular a transformação económica do Bangladesh.

A ajuda podia ser crucial para as cada vez maiores necessidades de Bangladesh de infra-estrutura e ajudar a Sheikh Hasina a realizar o seu projecto intitulado «Visão 2021», que visa transformar o Bangladesh num país com um rendimento médio até 2021.

A Índia também concordou fornecer 250 MW de electricidade através da sua rede central e os dois líderes assinaram um memorando de

Uma nova época nas relações entrea Índia e o Bangladesh

MANISH CHAND

Um vislumbre do passado: a falecida primeira-ministra da Índia Indira Gandhi caminha com o fundador do Bangladesh, Sheikh Mujibur Rahman, num jantar em sua honra em Abril de

1974, um ano antes do que foi assassinado com vários membros da sua família. Trinta e seis anos mais tarde, a sua fi lha, Sheikh Hasina, visitou Nova Deli como primeira-ministra para

fortalecer as relações com a Índia.

entendimento para expandir a cooperação no sector de electricidade, que vai incluir construir ligações entre as duas redes.

Assinalando uma nova cooperação numa área que foi um obstáculo nas suas relações no passado, os dois países assinaram três acordos sobre a assistência legal mútua para assuntos criminais, uma transferência mútua de prisioneiros que já foram julgados e cooperação na luta contra o terrorismo internacional, o crime organizado e o narcotráfi co.

Os dois lados fi zeram passos importantes para melhorar a conectividade, incluindo uma decisão para começar uma ligação ferroviária entre Akhaura

A primeira-ministra da República Popular do Bangladesh, S.E. Drª Sheikh Hasina, a inspeccionar uma guarda de honra durante a recepção cerimonial no palácio presidencial em Nova Deli no dia 11 de Janeiro de 2010.

no Bangladesh e Agartala na Índia. Também decidiram designar Ashuganj no Bangladesh e Silghat na Índia como portos comerciais.

A reciprocar a amizade que recebeu da Índia e os seus esforços para inaugurar uma nova época nas relações bilaterais, Sheikh Hasina disse que o território de Bangladesh não seria usado para actividades contra a Índia pelos rebeldes dos estados do nordeste. Todavia, é claro que há muito trabalho a fazer na área da segurança, embora o primeiro passo já foi feito.

Como sinal da transformação nas relações, a Índia também aprovou uma exigência de Dhaka a permitir trânsitos de transportes ferroviários e rodoviários entre

o Bangladesh, Nepal e o Butão. Sheikh Hasina concordou abrir os portos de Mongla e Chittagong no Bangladesh para mercadorias indo à Índia, ao Nepal e ao Butão.

A amizade foi bem visível no banquete que o primeiro-ministro indiano, Dr. Manmohan Singh organizou para a líder do Bangladesh. Os convidados, especialmente os do estado de Bengala, louvaram o delicioso peixe hilsa pescado no rio Padma no Bangladesh.

Sheikh Hasina falou com emoção sobre os 6 anos que passou no exílio na Índia quando o seu pai, o lendário líder Bangabandhu Sheikh Mujibur Rehman, foi assassinado em 1975.

«A sua visita vai abrir um novo capítulo nas nossas relações»,

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transportes e a partilha das águas dos rios fronteiriços a Índia e o Bangladesh estão a escrever um novo capítulo nas suas relações bilaterais.

Na área de comércio e economia, a abertura dos postos de fronteira de Demagiri-Thegamukh, na fronteira de Mizoram, Sabroom-Ramgarh na fronteira de Tripura Border e feiras fronteiriças nas fronteiras de Meghalaya vão dar um ímpeto económico para os estados do nordeste na Índia.

O Grupo Bharti da Índia já propôs um investimento de $ 300 milhões para construir uma rede de telecomunicações e Meru

A primeira-ministra da República Popular do Bangladesh, S.E. Drª Sheikh Hasina, com o primeiro-ministro indiano, S.E. Dr. Manmohan Singh (à direita) e durante as discussões entre as delegações em Nova Deli no dia 11 de Janeiro de 2010.

disse o Dr. Manmohan Singh, enfatizando uma maior colaboração para lidar com «os desafi os comuns das mudanças climáticas e assegurar comida, água e energia para os nossos povos».

A visita de quatro dias da Sheikh Hasina à Índia tinha um impacto substancial e um ambiente amigável.

As relações bilaterais melhoraram muito desde que Sheikh Hasina e os seus aliados seculares ganharam as eleições em Dezembro de 2008.

Segundo Wahiduddin Mahmud, professor de economia na Universidade de Dhaka, a importância desta vista não se restringe «ao número e aos acordos que foram assinados; muito mais importante é a expressão de uma vontade política para a cooperação».

Hiranmay Karlekar, um perito nos assuntos do Bangladesh e o autor do livro Bangladesh: O Novo Afeganistão?, louvou os resultados da visita de Sheikh Hasina, mas afi rmou que não havia espaço para a complacência se os dois países quisessem que esse processo de ganhos mútuos fosse duradouro.

Ao tomar passos fi rmes para tratar de assuntos como o terrorismo, comércio, trânsito,

Cabs, juntamente com o grupo Tata, está a planear um serviço de transportes com 20.000 táxis em Dhaka.

A imprensa no Bangladesh louvou a visita.

«Os primeiros-ministros Sheikh Hasina e Dr. Manmohan Singh foram inspirados por mais que mera diplomacia ao tratar das relações bilaterais entre o Bangladesh e a Índia», disse o Financial Express.

A cimeira entre os dois países «refl ecte a maturidade para tratar de assuntos sensíveis, que são vitais para os interesses mútuos dos dois vizinhos», disse o Daily Star no seu editorial.

A presidente da Índia, S.E. Drª Pratibha Devisingh Patil, a apresentar o Prémio de Indira Gandhi para a Paz, o Desarmamento e o Desenvolvimento para 2009 à primeira-ministra da República Popular do Bangladesh, S.E. Drª Sheikh Hasina,

em Nova Deli no dia 12 de Janeiro de 2010. O primeiro-ministro indiano, S.E. Dr. Manmohan Singh, e a líder da UPA, Drª Sonia Gandhi, também são visíveis na fotografi a.

Mas os dois arquitectos principais desta transformação descreveram a visita melhor. Sheikh Hasina disse que para além de trabalhar para conseguir criar um «Sonar Bangla» (a «Bengala Dourada» da história, com um país próspero) ia tentar promover uma paz duradoura na Ásia do Sueste.

Acrescentou o Dr. Manmohan Singh: «Esta visita de facto abriu um novo capítulo nas relações entre a Índia e o Bangladesh, refl ectindo uma autêntica união de mentes e corações».◆(Fonte: O serviço indo-asiático de notícias - IANS)

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Ergue-se a partir das águas azuis, com as suas duas torres principais embrulhadas pelas nuvens da monção, e estende-se para 5,6 quilómetros para ligar dois bairros principais da cidade

de Bombaim, o centro comercial da Índia, através das águas do Mar Arábico. A primeira ponte aberta no mar na Índia, o seu nome ofi cial é Rajiv Gandhi Bandra-Worli Sea Link. É uma maravilha de

A ponte entre Bandra e Worli em Bombaim UMA MARAVILHA DE ENGENHARIA

Texto: QUAID NAJMIFotografi as: N.K. SAREEN

engenharia, sustentada por cabos, que marcou uma nova época na Índia da consolidação de infra-estruturas no país.

A sua construção demorou dez anos e essa ponte, que foi inaugurada há pouco, usou quase 40.000 toneladas de aço e 90.000 toneladas de betão e pesa 270.000 toneladas. Foi feito a um custo de $327 milhões. A estrada de alta velocidade tem oito faixas para veículos. A estrada ergue-se nove metros em cima da superfície da água, apoiada em duas torres principais, cada uma equivale a um prédio de 43 andares, com 180 suportes de aço para suster a ponte contra as ondas do mar bravo.

As duas torres principais ligadas aos cabos que apoiam a ponte erguem-se para formar um gigantesco mas perfeito namasté, uma

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S.M. Sabnis, da Direcção das Estradas do Estado de Maharashtra (MSRDC) fi cou emocionado com os louvores que chegaram de todo o país.

«Fizemos o nosso melhor e estamos muito felizes que toda a gente gostou. Aumentou a confi ança de toda a minha equipa», disse Sabnis.

Sabnis disse que essa nova ligação entre a cidade no sul da ilha e os subúrbios ao norte podia durar mais que um século, se for mantido bem.

Também afi rmou que a ponte foi construída para se aguentar mesmo durante intensos terramotos e ventos de mais que 125 quilómetros por hora, o máximo que se encontra nesse litoral.

Mesmo as ondas mais altas alguma vez registadas, de até seis metros, não interrompia o movimento do trânsito na ponte, explicou Sabnis.

Sabnis e a sua equipa agora estão a trabalhar para completar o restante 20% do trabalho, nas restantes quatro faixas da estrada. «Depois disso, o movimento do trânsito vai melhorar ainda mais, com oito faixas a funcionar a plena capacidade», disse. ◆(Fonte: O serviço indo-asiático de notícias - IANS)

saudação tradicional indiana. Também tem duas pontes de cabos, a no lado norte mede 500 metros e a outra, ao sul, mede 350 metros, para permitir que os navios de pesca possam passar por baixo.

A ponte – que foi concebida em 1963 – incorpora alguns dos sistemas mais modernos de segurança, incluindo olhos electrónicos em cima e em baixo.

O projecto envolveu cerca de 3.000 profi ssionais de 11 países, incluindo a China, o Egipto, a Singapura, a Tailândia e até a Sérvia e a Suíça.

Todavia, para além dos números e a perícia técnica, essa ponte facilitou as vidas de milhões de habitantes da cidade de Bombaim, ao reduzir o tempo passado na estrada.

A distância entre Bandra, nos arredores, e Worli, no centro da cidade, é oito quilómetros e precisavam-se de 60-90 minutos para a percorrer durante a hora de ponta. Hoje em dia essa distância é percorrida em 6-8 minutos.

Eliminando 23 semáforos que actualmente existem entre esses dois bairros, é uma nova alternativa à estrada de Mahim, onde o trânsito já ultrapassa os 1,4 milhões de veículos por dia, causando grandes engarrafamentos, especialmente durante as horas de ponta.

As autoridades esperam que cerca de 150.000 veículos vão usar a nova ponte todos os dias,

com uma portagem entre 50 ($1) e 100 rupias ($2), dependendo da dimensão do veículo.

Apesar da portagem, os habitantes da cidade estão muito contentes com essa maravilha de infra-estrutura que sai um quilómetro longe da costa e reduz tanto o tempo passado ao volante.

Os residentes da cidade que passearam pela nova ponte no dia da sua inauguração, com as ondas do Mar Arábico em ambos os lados, voltaram sem palavras.

«Foi uma experiência fantástica, muito melhor do que imaginámos. É muito agradável, é como se a cidade fosse renovada», disse Venkat Iyer, um gestor profi ssional.

«Nasci nesta cidade, vi-a a crescer durante as passadas quatro décadas. A ponte é espantosa, as estradas lindas em ambos lados, a vista desta grande cidade…é impressionante», disse Nigam R. Pandya, um consultor fi nanceiro.

Pratap S. Bohra, um homem de negócios que mora no subúrbio de Juhu, disse que ele tinha deixado de ir ao seu escritório na baixa, em Nariman Point, devido ao tempo que desperdiçava no trânsito.

«Ouvimos tanto sobre esta ponte. Agora que está pronta, estou a pensar seriamente voltar ao meu escritório no sul de Bombaim», diz Bohra.

O engenheiro principal encarregado com o projecto,

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O sector de automóveis na Índia é cada vez maior e está sempre à procura de talento internacional no sector de design, com várias empresas principais a contratar desenhadores e

engenheiros de diferentes partes do mundo em recentes meses.

Ao contrário dos EUA, onde a indústria de automóveis está a enfrentar uma crise, na Índia a indústria dos veículos de quatro e duas rodas está em pleno crescimento com vendas recordes no ano fi nanceiro de 2009-10. Os melhores profi ssionais, incluindo desenhadores, engenheiros e investigadores, que vêem uma grande potencial para crescimento no sector dos automóveis na Índia, estão dispostos a se transferir ao país para trabalhos de média e longa duração.

Um dos gerentes de Maruti Suzuki India Ltd (MSIL), a maior empresa a fabricar carros no país, esteve em Detroit este ano, a encontrar-se com desenhadores e engenheiros em Motown, a

DESENHADOS PARA GANHAR ANNAMMA OOMMEN

A indústria indiana de automóveis está a atrair talento global na área de desenho, na medida em que as principais

empresas estão a contratar desenhadores estrangeiros para lhes ajudar a lançar uma gama de novos modelos

enquanto algumas empresas indianas gigantescas nesse sector já adquiriram empresas internacionais de

desenho de automóveis.

encorajá-los e se transferirem para a Índia.

I V Rao, o director de engenharia de MSIL, teve êxito na sua missão – oito engenheiros de Detroit, especialistas no desenho, modelação e estilo dos automóveis e o desenvolvimento e fabricação dos motores já foram contratados pelo MSIL. Alguns dos engenheiros e desenhadores dos EUA são de origem indiana e estavam contentes aceitar a oferta da Maruti.

Segundo Rao, o talento internacional de design que a empresa contratou vai ajudar a Maruti a lançar novos modelos inovadores e também a ajudar a treinar os seus engenheiros. «Desde muito tempo, tínhamos recursos limitados», realça Rao. «Recebíamos novos desenhos de

Suzuki e fazíamos os testes e o desenvolvimento aqui. Tínhamos poucos desenhadores com experiência e assim foi difícil executar novos projectos».

Os novos desenhadores internacionais iam ajudar a empresa a formar desenhadores dentro da empresa e transferir os conhecimentos, acrescentou Rao.

Outras empresas indianas de automóveis, incluindo Tata Motors, Mahindra & Mahindra, Bajaj Auto e Royal Enfi eld, também estão a falar com desenhadores internacionais na área de veículos na medida em que estão a lançar programas ambiciosos para expandir as suas capacidades de desenho.

Muitos desenhadores internacionais de automóveis

Os automóveis

também visitaram a Índia em recentes meses, trabalhando com os gerentes das empresas principais indianas na área dos automóveis. Esses desenhadores têm a perícia na área de design e da fabricação de modelos no sector dos híbridos, motores e sistemas de transmissão.

Há pouco, Bajaj Auto, a empresa gigante que domina o mercado de veículos de duas rodas, contratou Edgar Heinrich de BMW Motorcycles para chefi ar o seu departamento de design. «O mundo já percebeu que houve uma mudança fundamental na indústria indiana de automóveis, onde os desenhos modernos desempenham um papel vital», afi rma Heinrich. A empresa é baseada em Pune e já lançou uma gama de novos motocicletas

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Sullivan, a nova ênfase no papel do design refl ecte a determinação das empresas indianas de automóveis a penetrar os mercados globais.

A mudança no cenário global de fabricação de automóveis, depois a desaceleração nos EUA e na Europa, também desencadeou um êxodo de cérebros no inverso, com muitos desenhadores a procurar trabalho na Índia e na China. Pininfarina, a lendária empresa italiana de design dos automóveis, estava à procura de um investidor para salvar a empresa durante a recente crise económica. Na altura, havia boatos que uma empresa indiana de automóveis ia adquirir a empresa mas hoje parece pouco interesse no negócio visto que muitos dos melhores desenhadores já se demitiram da empresa.

Os aspectos de design como os protótipos e as maquetas de argila, que habitualmente eram feitos na França, no Reino Unido e na Itália, estão agora feitos por muitas empresas de automóveis na Índia. Tanto as empresas nacionais com as internacionais estão a fazer grandes investimentos na tecnologia e nos recursos humanos, nos centros de design na Índia.

Enquanto a GM e a Chrysler têm centros de I&D em Bangalore, a Renault tem um centro de design em Bombaim. Para além de trabalhar nos projectos indianos das respectivas empresas, essas unidades também fazem trabalhos internacionais para a sua empresa-mãe.

Tata Motors, que surpreendeu a indústria

global de automóveis quando lançou o Nano, entrou na nova lista mais curta de 43 equipas a competir para o Prémio X para Progresso no Sector dos Automóveis.

Havia quase cem equipas na lista original dos concorrentes para o prémio, que vale $10 milhões – incluindo fabricantes famosos e até estudantes de engenharia da Universidade de Cornell – que têm que desenvolver a próxima geração de veículos ecológicos. As equipas entregaram uma lista de mais que 50 veículos.

Tata Motors, que sempre foi na vanguarda da inovação, acredita que é o espírito de «questionar aquilo que nunca foi questionado» que encorajou a empresa a participar no concurso. A empresa pretende desenvolver carros que são mais efi cientes em termos de combustível, mais limpos em termos de emissões e que tenham um impacto mínimo no ambiente,

para além de assegurar óptimos níveis de satisfação da parte dos consumidores.

«Entrámos neste concurso com esta visão, com o modelo Indica Vista EV-X na classe alternativa», diz uma nota da imprensa da empresa.

O concurso visa inspirar uma nova geração de veículos viáveis e efi cientes que oferecem mais alternativas aos consumidores. O prémio de $10 milhões vai ser atribuído às equipas que ganham um concurso para veículos limpos, aptos para serem fabricados, que excedem 100 milhas por galão ou o equivalente energético (MPGe). A ênfase principal está na efi cácia, na segurança, no preço e no ambiente.

«A ideia é desenvolver carros verdadeiros, aptos para serem fabricados, que os consumidores vão querer comprar. Não são projectos científi cos o carros hipotéticos», afi rmam os organizadores do concurso. «Este progresso é necessário

porque o actual consumo de petróleo não é sustentável e porque as emissões dos automóveis contribuem signifi cativamente ao aquecimento global e as mudanças climáticas».

A entidade que está a organizar o concurso, a Fundação do Prémio X, é também conhecida pelo seu Prémio Ansari X, que resultou no primeiro voo particular no espaço num veículo com uma tripulação, há cerca de cinco anos. A fundação também está a patrocinar concursos na área da genómica, dos cuidados de saúde e de uma aterragem na lua.

«As equipas e os veículos representado neste grupo (de 43 concorrentes) são os mais viáveis no nosso concurso e acreditamos que, juntamente, vão ter um grande impacto no mercado dos automóveis», afi rmou Peter Diamandis, CEO e Director da Fundação do Prémio X. O nome da equipa que ganhou o concurso vai ser anunciado em Setembro de 2010.

COM O GRANDE PRÉMIO X NA SUA MIRA

para enfrentar o desafi o das empresas internacionais, incluindo Harley-Davidson, que está prestes a entrar no mercado indiano.

Royal Enfi eld contratou Venki Padmanabhan este ano como o director para o design e para o desenvolvimento de produtos. Com um doutoramento na engenharia industrial da Universidade de Pittsburgh, Padmanabhan tinha trabalhado com a equipa de engenharia avançada da General Motors nos EUA, com a divisão dos carros da Daimler Chrysler Mercedes e foi o antigo diretor para a Ásia do Sueste para as operações globais de aprovisionamento para a Chrysler antes de ser contratado pela Royal Enfi eld.

«Estamos a examinar a possibilidade de lançar modelos electrónicos de injecção de combustíveis na Índia», diz Padmanabhan. A Royal Enfi eld espera vender cerca de 50.000 motocicletas este ano.

Segundo V G Ramakrishnan, director do sector de automóveis e de transportação de Frost &

«Tínhamos recursos limitados, recebíamos novos desenhos

de Suzuki e fazíamos os testes e o desenvolvimento aqui

»I V Rao,

Director, MSIL

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Maruti Suzuki India Ltd, o maior fabricante de

automóveis na Índia, vai estabelecer uma enorme instalação de I&D de tecnologia de ponta num recinto de 700 acres em Rohtak em Haryana. Essa nova instalação foi planeada como um centro global para a I&D para pequenos veículos e também vai fornecer serviços para o Suzuki Motor Corporation (SMC) no Japão.

Estima-se que o projecto de Rohtak vai custar cerca de $ 325 milhões. Vai ter uma instalação para os testes de acidentes, laboratórios para avaliar as emissões, um túnel de vento e testes de durabilidade, juntamente com a infra-estrutura para avaliar os componentes. O projecto de Rohtak vai aumentar as capacidades de Maruti Suzuki para desenhar e desenvolver veículos completos. A Maruti Suzuki está prestes a desenhar um carro sozinho e lançar um modelo indígena fabricado na Índia até 2012.

«As instalações em Rohtak vão ser um grande avanço para construir a capacidade de I&D da Maruti Suzuki e isso vai permitir-nos oferecer produtos superiores aos nossos clientes no futuro também», afi rma Shinzo Nakanishi, Director e CEO da MSIL. Segundo Nakanishi, o Dr. Osamu Suzuki, diretor da Suzuki, prometeu há seis anos que a MSIL seria o pólo de I&D para toda a Ásia, fora do Japão.

O governo do estado de Haryana recentemente deu a MSIL 700 acres de terra, que é um grande passo para realizar esse projecto. O vasto recinto vai ter um parque dedicado de 100 acres para os fornecedores. Espera-se que as pistas para os testes vão ser prontas durante a primeira fase, até 2012 e todas as instalações de I&D vão ser completadas até 2015.

Segundo Nakanishi, o projecto «vai ser um sonho realizado para os engenheiros e os desenhadores indianos

no sector dos automóveis». O ambicioso orçamento para o projecto de Rohtak realça a cada vez maior importância da Índia para o gigante japonês e o facto que Maruti Suzuki está a revelar-se o principal centro de I&D para pequenos carros fora do Japão, acrescentou.

O projecto de Rohtak também é o primeiro numa série de grandes investimentos por MSIL, que transformou o estado de Haryana num centro global de fabricação. Para o seu mais recente modelo global, o «A-Star», SMC escolheu MSIL como a única base de fabricação para as suas necessidades globais.

A decisão de contratar os desenhadores dos EUA para as suas instalações na Índia refl ecte a confi ança da MSIL no sector de desenhar os carros para os mercados globais.

‘UM SONHO REALIZADO’ PARA OS ENGENHEIROS E DESENHADORES DOS VEÍCULOS

«O objectivo básico de estabelecer um ateliê completo de design na Índia foi de aprender dos desenhadores indianos e do mercado sobre os gostos e as preferências locais», diz Jean-Philippe Salar, o principal desenhador e chefe de Renault Design India. Segundo Salar, o ateliê de design da Renault têm 16 funcionários e opera como um satélite para o ateliê principal em Paris. «Nos últimos 30 meses, este ateliê já completou projectos de design do início ao fi m para o mercado indiano e agora é capaz de trabalhar nos projectos globais da Renault», acrescentou.

Algumas das empresas principais da Índia no sector dos automóveis também começaram a adquirir empresas globais de design. Uma série de parcerias com capital entre fabricantes indianos e empresas globais em recentes meses realçaram a importância deste aspecto da indústria dos automóveis, na medida em que uma onda de

consolidação em todo o mundo signifi ca que uma modelação moderna e de alta tecnologia dos modelos de carros é o principal factor diferenciador.

As empresas indianas de automóveis querem comprar empresas internacionais de design para produzir produtos contemporâneos, melhorar a I&D e ser mais competitivo em termos globais através de uma melhor gestão de custos.

A Mahindra & Mahindra (M&M), uma das maiores empresas indianas no sector dos veículos de utilidade recentemente comprou a empresa G.R. Grafi ca Ricerca Design Srl (GRD), uma empresa italiana baseada em Turim que se especializa no desenho, engenharia, viabilidade e modelação de automóveis. Com essa aquisição, M&M pretende desenvolver um centro global de design para o grupo e para as empresas OEM no sector dos automóveis em todo o mundo.

«As sinergias resultantes dessa aquisição vão ajudar-nos a fortalecer as nossas actuais capacidades de design e também vão ajudar-nos a surgir como um agente dinâmico no sector de design dos automóveis, num contexto global», explica Pawan Goenka, o presidente do sector de automóveis de M&M. «As capacidades complementares entre Mahindra e GRD vão melhorar as suas capacidades de desenvolver os produtos, assegurar uma presença sólida na Europa para a M&M para alavancar as tecnologias e habilitações ao aceder a um grupo de desenhadores e engenheiros com muito talento».

Na medida em que as capacidades dos fabricantes globais no sector dos automóveis se transferem à Ásia, as empresas de design estão a estabelecer escritórios na Índia para focar nas operações nos bastidores, depois da fase das ideias. Muitas empresas globais de design

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À VELOCIDADE MÁXIMA

NA VIA RÁPIDA

Segmento Abril-Set ‘08 Abril-Set ‘09 % variação

Veículos para passageiros 779.217 884.118 13,46

Veículos comerciais 221.685 220.529 -0,52

Veículos de três rodas 184.934 207.809 12,37

Veículos de duas rodas 3.864.443 4.470.464 15,68

Total 5.050.279 5.782.920 14,51

Fonte: Associação dos Fabricantes Indianos de Automóveis (SIAM)

também viram uma queda na procura parcialmente devido ao facto que os fabricantes de automóveis começaram a desenvolver mais desenhos dentro da própria empresa. Cada vez mais empresas de design estão dispostas a vender uma parte da sua capital design na esperança de ressuscitar os seus negócios.

O design vai ser o factor de diferenciação no ambiente globalizado, visto que o desempenho, a qualidade e os custos estão cada vez mais semelhantes. Diz Arun Jaura, director, I&D, Eaton Corporation, um grupo industrial diversifi cado: «Os OEMs indianos estão dedicados a construir as suas capacidades e a aquisição de empresas de design nas economias desenvolvidas parece ser o caminho mais rápido para atingir esse fi m. Com uma escassez de talento no sector

da engenharia, os OEMs e os fornecedores vão estabelecer centros de design na Índia e em outros mercados emergentes».

Acrescenta Dilip Chhabria, director, DC Design: «A actual tendência dos OEMs indianos a adquirir as capacidades de vanguarda é mais como offshoring.”

S D Pradhan, director de Argentum Engineering Design

– que foi estabelecido por B V R Subbu, o antigo director de Hyundai Motors na Índia – afi rma que a empresa se posicionou como uma empresa que fornece serviços de design por contracto aos fabricantes dos protótipos. Argentum estabeleceu uma parceria com Dassault Systemes, uma grande empresa francesa de software, para fornecer soluções a várias empresas na área de formação.

Na medida em que a indústria indiana de automóveis acelera e entra na via rápida, os aspectos de design, investigação e desenvolvimento vão ser uma parte proeminente da sua estratégia global para surgir como um líder mundial. ◆(Fonte: A Fundação Indiana da Brand Equity)

«O mundo já percebeu que

houve uma mudança fundamental na indústria

indiana de automóveis, onde os desenhos modernos

desempenham um papel vital

»Edgar Heinrich,

Director de design, Bajaj Auto

As vendas dos automóveis na Índia dispararam

dramaticamente em meses recentes, na medida em que os consumidores gastam para comprar os novos modelos lançados pelos fabricantes.

Segundo a Associação dos Fabricantes Indianos de Automóveis (SIAM), as vendas de automóveis cresceram 21% em Setembro de 2009 para alcançar 129.000 unidades, em comparação com as 107.000 unidades vendidas em Setembro de 2008. Treze dos 16 fabricantes de automóveis registaram um aumento nas vendas durante o mês.

Os fabricantes principais, incluindo Maruti Suzuki, Tata Motors, Mahindra & Mahindra,

Fiat, BMW e Audi vários novos modelos em recentes meses.

A venda global de veículos – incluindo os carros, os veículos de duas e três rodas e os veículos comerciais – expandiram 10% em Setembro de 2009, para alcançar 1,09 milhões de unidades,

em comparação a 990.000 unidades no mesmo período no ano anterior.

Durante a primeira metade do ano fi scal de 2009-10 (Abril - Setembro), as vendas totais dos veículos cresceram 14,51% para alcançar 5,78 milhões de unidades.

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O centenário do Instituto Indiano de Ciência

depois de chegar no dia 31 de Dezembro de 1898 foi receber uma minuta da proposta da comissão que foi criada para planear o estabelecimento do instituto. O plano passou por várias etapas ao longo de muitos anos difíceis e Burjorji Padshah, um grande amigo de J.N. Tata, foi encarregado com a supervisão do projecto. Infelizmente, J.N. Tata morreu em 1904 sem saber que a sua visão ia se concretizar alguns anos mais tarde. Quando o governo britânico emitiu a ordem decretando a sua fundação em 1909 uma experiência sem precedentes no sector da educação superior e da investigação começou na Índia. O IIsc é sem dúvida o primeiro exemplo de uma parceria pública-particular neste país. A sua evolução ao longo de um século testemunha às suas raízes robustas.

O instituto situa-se em cerca de 400 acres de terreno em

Bangalore, doados pelo rei de Mysore em Março de 1907. Aliás, a contribuição do reino de Mysore foi um elemento vital na decisão sobre a localização do instituto. Num gesto extraordinário, sem precedentes na história da fi lantropia privada na Índia, Tata não quis que o instituto tivesse o seu nome! O seu sonho era criar uma instituição que podia contribuir para o desenvolvimento da Índia. O nome que foi escolhido – o Instituto Indiano de Ciência – refl ecte esse desejo de J.N. Tata. Todavia, pessoas que visitam Bangalore à procura do instituto muitas vezes perguntam aos residentes da cidade onde fi ca o «Instituto Tata», mostrando claramente que o acto de generosidade de Jamsetji Tata continua vivo na memória do povo, apesar da passagem de um século.

O IISc começou com apenas dois departamentos: a química geral e aplicada e as tecnologias

eléctricas. O primeiro director, Morris W Travers, começou a tarefa de organizar o instituto depois de chegar na Índia ao fi m de 1906. Travers começou a construção do edifício principal, que é uma referência em Bangalore hoje em dia. Os departamentos de química orgânica e bioquímica foram entre os primeiros departamentos a serem organizados. O departamento de física foi fundado em 1933, quando C.V. Raman foi o primeiro director indiano do instituto. Neste século da sua história, o IISc cresceu para se transformar no centro principal da Índia para a investigação e a educação superior nas áreas da engenharia e das ciências. Várias novas áreas de investigação foram estabelecidas, muitas delas pela primeira vez na Índia. Os departamentos do IISc abrangem sectores desde a bioquímica até a engenharia aeroespacial e serviram para promover a investigação e

Jamsetji Nusserwanji Tata O rei de Mysore, Krishnaraja Wodeyar IV Morris W Travers

P. BALARAM

O Instituto Indiano de Ciência (IISc) foi concebido em 1896 como um instituto de investigação ou universidade de investigação por Jamsetji Nusserwanji Tata, ao fi m do século

XIX. Um longo período de quase treze anos passou até que o instituto foi inaugurado no dia 27 de Maio de 1909. A história do instituto é um capítulo fascinante na história da educação superior e da investigação científi ca na Índia. As personagens do drama que acabou no estabelecimento do instituto incluem, para além do seu fundador generoso, J.N. Tata, várias fi gures das páginas da história da Índia. Há o Swami Vivekananda, que fi cou um amigo de J.N. Tata na sua famosa viagem aos EUA, o rei de Mysore, Shri Krishnaraja Wodeyar IV e a sua mãe, que reinava no seu lugar, e o Lorde Curzon, o então vice-rei da Índia, cuja primeira tarefa

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em curso, graças a um subsídio concedido pelo governo da Índia em 2006. O instituto recebe centenas de visitas da Índia e do estrangeiro todos os anos e é o palco de diversos eventos académicos nacionais e internacionais.

A face da investigação nas áreas da ciência e da engenharia tem mudado rapidamente em recentes anos. Na medida em que o instituto começa o segundo século da sua história, iniciou muitas novas actividades. As mais notáveis são os programas de doutoramentos interdisciplinares nas ciências matemáticas, a biologia química, as ciências dos sistemas terrestres, a nano ciência e a nano tecnologia e a nano engenharia para os sistemas integrados. Esses programas são desenhados para eliminar as

fronteiras tradicionais entre as disciplinas, assim promovendo a investigação transdisciplinares. O instituto também começou um programa M. Tech nas ciências climáticas e estabeleceu novos centros nas áreas das ciências da terra, as mudanças climáticas e a neurociência. O IISc espera promover vigorosamente a investigação interdisciplinar e colaborativa nos próximos anos e também pretende promover a investigação de pós-doutoramento nas áreas da ciência e da engenharia.

O instituto promove uma interacção com a sociedade e com a indústria através de uma variedade de programas. O Centro para a Consultoria Científi ca e Industrial (CSIC) e a Sociedade para a Inovação e o Desenvolvimento (SID) promovem as colaborações com

a indústria enquanto o Centro para a Educação Contínua (CCE) dá oportunidades aos cientistas e engenheiros a melhorar os seus conhecimentos académicos. O programa de bolsas para jovens cientistas visa atrair jovens alunos ao instituto durante os meses do verão. O instituto também administra o programa de Kishore Vaigyanik Protsahan Yojana (KVPY) do Departamento Nacional da Ciência e da Tecnologia (DST), que visa encorajar os alunos das ciências básicas, da engenharia e da medicina a seguir uma carreira de investigação nessas áreas. A sua dedicação à investigação que é socialmente relevante é bem visível nas actividades do Centro para as Tecnologias Sustentáveis (CST), em colaboração como o Conselho do Estado de Karnataka para a Ciência e a Tecnologia (KSCST), que é situado dentro do recinto do IISc.

A evolução do instituto ao longo dos últimos cem anos acompanhou o desenvolvimento da ciência e da tecnologia na Índia. A sua longa história, a sua longa tradição de investigação académica e um ambiente que favorece as actividades académicas foram elementos importantes em assegurar que o instituto é ainda hoje em dia um centro principal nessa área e atrai os melhores alunos e professores. ◆O autor é o director do IISc em Bangalore.

O laboratório de química estrutural de estados sólidos.

O laboratório de engenharia aeroespacial.

iniciada no IISc. Muitos dos cientistas mais famosos da Índia são associados com o IISc como alunos e professores. Esses nomes incluem G.N. Ramachandran, Harish Chandra, S. Ramaseshan, A. Ramachandran, C.N.R Rao e R. Narasimha. Hoje em dia, os antigos alunos do IISc são os directores de muitas organizações importantes, tanto na Índia como no estrangeiro.

O instituto oferece uma variedade de mestrados na área da engenharia, um programa integrado (pós-B.Sc.) na ciência e doutoramentos numa grande variedade de disciplinas nos sectores da ciência e da engenharia. Os seus laboratórios de investigação têm o equipamento de ponta. Muitos centros nacionais estão albergados no IISc. A sua biblioteca e infra-estrutura de informática são entre as melhores da Índia. Um grande programa para modernizar os laboratórios está actualmente

o desenvolvimento tanto no sector público como no privado. A faculdade e os alunos do instituto estabeleceram e lideraram muitas novas instituições e novos programas em todo o país, representando um grande e genuíno desenvolvimento. Homi Bhabha concebeu a ideia do Instituto Tata de Investigação Fundamental (TIFR) e o Programa de Energia Atómica enquanto trabalhava no IISc no departamento de física. Vikram Sarabhai, o fundador do programa espacial da Índia estudou no IISc também. Depois da sua morte prematura, a Organização Indiana de Investigação Espacial (ISRO) foi criada sob a liderança visionária de Satish Dhawan, que também serviu como o director do IISc. O primeiro Instituto Indiano de Tecnologia (IIT) em Kharagpur foi estabelecido por J.C. Ghosh, que foi o director do IISc no período crucial de 1939-48, quando muita actividade no sector da engenharia foi

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Uma única experiência

na medicina remota

a «retcam») para identifi car esses bebés prematuros e armazenar, tratar e analisar essas imagens. Usando um portal na internet desenvolvido na Índia para tratar ROP remotamente, os técnicos conferiram com peritos em outros lugares, validando um modelo singular que eliminou a necessidade para ter peritos presentes fi sicamente em áreas rurais.

Até agora, 2.100 bebés de mais que 20 centros de saúde para os recém-nascidos, abrangendo uma área de 350 quilómetros foram examinados. Desses, mais que 230 já receberam tratamentos com o laser que salvaram a sua visão sem ter que levar o bebé á cidade. Mais que 80% desses

A diagnóstica remota na área de medicina oftalmológica traz nova esperança para prevenir a cegueira infantil na

Índia rural.

Hoje em dia, a retinopatia das crianças prematuras (ROP) é uma causa

principal de cegueira nas crianças. Segundo a OMS, países de rendimentos médios como a Índia estão no meio de uma terceira epidemia de ROP.

Os números falam por si. A Índia regista mais que 27 milhões de nascimentos vivos todos os anos e mais que 8,4% são bebés prematuros com pesos de menos que 2 quilos. Até 47% desses bebés prematuros e de baixo peso estão em risco de ter a ROP e fi car cegos. Até 15% deles podiam precisar de tratamento. Com menos que 300 cirurgiões especializando-se na retina e menos que 20 cirurgiões pediátricos especializando-se na retina no país, identifi car e

tratar essas crianças é um desafi o impossível, especialmente nas áreas rurais.

Para ajudar a tratar deste assunto o Instituto Oftalmológico Narayana Nethralaya, um dos centros principais nessa área, situado na cidade de Bangalore, desenvolveu uma experiência singular nos serviços remotos ao longo de dois anos. O projecto chama-se “KIDROP” (Karnataka State Internet Assisted Diagnosis of ROP).

Sob a liderança do Dr. Anand Vinekar, que é o director do departamento pediátrico das doenças da retina, técnicos treinados viajem em 7 distritos do estado de Karnataka com uma máquina fotográfi ca para observar a retina infantil (conhecida como

tratamentos são feitos sem custos ou com custos baixos. Há pouco, a Missão Nacional para a Saúde nas Zonas Rurais (NRHM) apoiou esse projecto, para que possa alcançar mais seis distritos em Karnataka.

Desde 2009, com a ajuda de uma empresa indígena, i2i Tele-Solutions, as imagens adquiridas nas zonas rurais agora estão recebidas numa aplicação de software desenhada especifi camente para o projecto no iPhone da Apple. Agora os especialistas podem dar uma diagnóstica em tempo real e enviar um relatório através da rede GSM, assim reduzindo a dependência nas velocidades dos serviços de internet.

«Estamos num processo de expandir. Alguns outros estados na Índia e alguns países na África e na Ásia do Sueste já querem implementar o nosso modelo», disse o Dr. Anand Vinekar.

Com cada vez maiores taxas de sobrevivência dos recém-nascidos, os bebés que nascem nas zonas rurais e semi-rurais correm o mesmo risco de desenvolver ROP que as crianças urbanas. Neste momento este serviço remoto parece oferecer a melhor opção para cuidar desses pequenos e preciosos cidadãos. ◆Este artigo foi escrito à base das informações fornecidas pelo Instituto Oftalmológico Narayana Nethralaya em Bangalore.

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As células germinais RICHA SHARMA

Visto que as terapias com as células germinais estão a surgir como o tratamento do futuro, a Índia juntou-se a um pequeno grupo de nações que está a promover opções

avançadas de cuidados de saúde.

Como todos os pais, Arvind Tripathi, um professor numa escola na cidade

indiana de Jaipur, quer oferecer o seu fi lho, que está prestes a nascer, um futuro livre de doenças. Enquanto a Índia segue o caminho de desenvolver a tecnologia de ponta nos cuidados de saúde, esse sonho impossível já está quase ao nosso alcance e Tripathi pretende realizar o seu sonho ao preservar as células germinais do seu bebé.

Vai juntar-se a 30.000 outros pais na Índia que conservaram o sangue umbilical das suas crianças para lhe dar uma maneira de lutar contra as doenças genéticas, do sangue e do sistema imunitário para o resto das suas vidas.

Desde 2001, quando o primeiro banco de células germinais na Índia foi lançado na cidade de Madrasta por Reliance Life Sciences, hoje em dia parte do Grupo Reliance liderado por

Mukesh Ambani, os benefícios da tecnologia já chegaram a milhares de pessoas.

Diz-se que as células germinais são uma maneira natural de reparar o corpo humano. As células, que são recolhidas do sangue do cordão umbilical durante o nascimento, são os blocos básicos dos nossos sistemas imunitários e sanguinários e têm o potencial para se transformar em qualquer tipo de células. Formam as células brancas que lutam contra as infecções, as células vermelhas que transportam o oxigénio e as placas que ajudam o corpo a consertar-se.

As células germinais presentes no cordão umbilical e na medula óssea podem gerar novas células durante toda a nossa vida. As células germinais do cordão umbilical foram usadas ao longo dos anos para tratar cada vez mais doenças, incluindo a leucemia, tumores, problemas

de sangue e problemas com as células vermelhas.

Em recentes anos, mais que 10.000 pacientes em mais que 150 países foram tratadas com transplantes das células germinais do sangue do cordão umbilical. Actualmente, os cientistas estão a investigar o uso das células germinais para tratar mais que 85 doenças.

A Índia está a acompanhar esses desenvolvimentos.

Embora não haja nenhuma estimativa das dimensões do negócio, o sector de bancos para conservar as células germinais está a crescer rapidamente com empresas internacionais como Cryo-Save, Cryo-Cell e Cryobank a abrir fi liais em várias partes do país.

«Com uma alta taxa de nascimento (43 milhões de nascimentos por ano), a Índia é um enorme mercado para o sector de bancos que

PARA UM FUTURO SEM DOENÇAS

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preservam essas células. Embora ainda numa fase nascente, os conhecimentos sobre o sistema de conservar as células germinais do cordão umbilical estão cada vez maior», afi rma Mayur Abhaya, o presidente e director executivo de Life Cell International.

«Para aumentar os conhecimentos entre o povo sobre os seus benefícios, a empresa já estabeleceu parcerias com várias associações ginecológicas no país. Também criamos parcerias com hospitais no país para contactas as grávidas e aconselha-las cobre os benefícios de preservar o sangue do cordão umbilical», afi rmou Abhaya.

Estima que o sector está a expandir a 25-30% por ano. Percebendo o enorme potencial para o negócio dos bancos para as células germinais na Índia a empresa europeia Cryo-Save lançou as suas operações na Índia no Dezembro passado com

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as células durante toda a vida do individual», explica V.R. Chandramouli, director de Cryo-Save na Índia.

As famílias que não tenham os fundos necessários na altura do nascimento podem depositar o sangue do cordão num banco público e depois transferi-lo para uso exclusivo. Os bancos públicos das células germinais operam como os bancos de sangue normais. Não custa nada doar as células germinais ao banco público e as células não pertencem mais ao doador. Os utilizadores das células pagam por elas quando encontram células compatíveis.

«Com um banco particular das células germinais o cliente tem o direito de aceder às células para o seu próprio uso ou para os membros da sua família, fazendo um pagamento pontual. Essas células não podem ser vendidas

ou transferidas a terceiros», diz Abhaya. Na medida em que a revolução das células germinais ganha ímpeto na Índia os investigadores também estão a trabalhar numa terapia que tem o potencial de mudar radicalmente os tratamentos para as doenças humanas.

O Centro para a Biologia Celular e Molecular na cidade Sulina de Hyderabad está a colaborar com a faculdade de medicina do Deccan Medical College para investigar a utilização de células germinais para tratar doenças do fígado e com o instituto oftalmológico L.V. Prasad Eye Institute para cultivar as células das córneas.

O Instituto Nacional das Ciências Médicas (AIIMS) em Nova Deli está a desenvolver tratamentos usando as células da medula óssea para tratar as feridas das vértebras, do coração, diabetes, AVCs, doenças vasculares periféricas e certas doenças da superfície ocular.

A faculdade de Medicina das Forças Armadas (AFMC) na cidade de Pune, na Índia ocidental, estabeleceu um dos maiores centros na Ásia para a investigação nesta área. Visto que a terapia das células germinais vai ser o tratamento do futuro, a Índia já juntou-se ao resto do mundo para oferecer as melhores opções de cuidados de saúde disponíveis.◆(Fonte: O serviço indo-asiático de notícias - IANS)

um investimento de cerca de $206,000.

Os kits para as células germinais – que incluem a recolha, tratamento e armazenagem do sangue do cordão umbilical – custam de cerca de $300 até $15,000 dependendo do tipo de facilidades a serem oferecidas. Embora não muito cara em termos relativos, é um preço muito alto para a maioria dos indianos. Para encorajar acesso, as empresas estão a oferecer os seus serviços pagos por empréstimos através de um plano de pagamento.

«Um casal que tem interesse em preservar as células germinais pode contactar a empresa dois meses antes do nascimento. Os nossos conselheiros falam com eles e orientam-nos durante o processo. Depois de 21 anos, vamos cobrar uma taxa mínima anual para preservar

Não há muitas actrizes que fazem um impacto permanente ao fazer apenas poucos fi lmes durante a sua vida. Leela Naidu tinha uma faísca que atraia atenção na indústria cinematográfi ca

– embora nunca esteve uma ‘estrela’ durante os anos 60. A sua carreira foi lançada pelo lendário cinematógrafo Hrishikesh Mukherjee e Leela fez poucos fi lmes. Apesar disso ela ganhou os corações dos seus adeptos em todo o país e ainda hoje, décadas mais tarde, é uma actriz preferida. Nasceu em 1940, fi lha de um cientista nuclear Dr. Ramaiah Naidu (um nativo de Chittor no estado de Andhra Pradesh) e a sua mulher suíça Marthe (uma perita na cultura indiana). Leela adorava

Leela NaiduO ENIGMA CONTINUA...

Texto & fotografi as: SMM AUSAJA

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actuação no papel principal e o fi lme ganhou o prémio nacional para melhor fi lme do ano. A sua música, pelo célebre músico Pandit Ravi Shankar, ainda hoje encanta o público. O seu próximo fi lme – Ummeed – estreou em 1962. Foi uma obra do lendário Nitin Bose. Aliás Bose tinha tido um grande triunfo no ano passado com Gunga Jumna – um fi lme que é considerado a sua melhor obra de sempre. Leela contracenou com Joy Mukherjee e Ashok Kumar em Ummeed, enquanto o compositor Ravi criou a música.

Naidu teve mais um papel memorável em 1963 no fi lme Yeh Raaste Hain Pyaar Ke de Sunil Dutt, pelo cinematógrafo R K Nayyar. Esse fi lme deu-lhe uma oportunidade para se destacar no seu papel de uma esposa infi el. O fi lme, sobre um homicídio, foi inspirado por um processo famoso no tribunal

Leela acabou num divórcio e o seu antigo marido conseguiu ter custódia das suas fi lhas. Depois desse revés ela fi cou fraca e vulnerável e começou a estudar o espiritualismo sob o conhecido fi lósofo J Krishnamurti.

Hrishikesh Mukherjee viu uma fotografi a de Leela por acaso e

Leela Naidu e Sunil Dutt em Yeh Raaste Hain Pyaar Ke, 1963, realizado por R.K. Nayyar (em cima) e a capa da banda sonora de Anuradha (à direita).

‘K M Nanawati contra o Estado de Maharashtra’, que dominou as manchetes em todo o país. Embora as canções compostas por Ravi – ‘Yeh raaste hain pyaar ke...’ e ‘Yeh khamoshiyan...’ foram muito populares, o fi lme não foi um grande êxito de bilheteira. No mesmo ano Leela actuou no fi lme de Merchant-Ivory intitulado The Householder, onde desempenhou o papel de uma esposa liberal com tamanha dedicação que foi um dos seus melhores papéis de sempre, recebendo grandes louvores dos críticos. O fi lme foi bilingue, com diálogos em hindi e em inglês, e

a música e a sua mãe cantava e tocava-lhe melodias em francês, muitas vezes ao piano. Ela ouvia as canções em hindi e em inglês na rádio. Quando tinha cinco anos, apaixonou-se pela música do compositor polaco Frederic François Chopin. Começou a aprender o piano e foi uma das mais jovens alunas da Academia de Música em Genebra. Depois mudou-se pelo universo da dança e começou a aprender ballet à idade de oito anos. Estudou dança no Instituto Euritmico. Foi aí que foi fi lmada pela primeira vez à tenra idade de nove anos durante as fi lmagens para um documentário.

Em 1950 pisou o palco na peça ‘Leela – A alma que quis ser como os deuses’ na sua escola em Genebra. Um dos seus colegas fi cou tão impressionado com o espectáculo que, anos mais tarde, deu-lhe um papel num dos seus fi lmes experimentais ‘O nascimento da alma’. Esse fi lme ganhou louvores no festival de cinema de Cannes. Leela continuou a fazer peças de teatro em inglês e em francês enquanto estudava na Europa, enquanto viagens frequentes à Índia asseguravam que ela fi cou em contacto com as suas raízes indianas. Em 1954, Leela ganhou fama ao ganhar o título da Miss Índia e foi nomeada uma das dez mulheres mais bonitas do mundo na revista Vogue. Dois anos mais tarde, Leela casou-se com Tilak Raj Oberoi, de 33 anos, o fi lho de Mohan Oberoi, dono da cadeia de hotéis Oberoi. Tinham fi lhas gémeas – Maya e Priya Oberoi, mas o casamento de

decidiu dar-lhe o papel principal no seu próximo fi lme Anuradha, onde ela contracenou com Balraj Sahni. Foi assim que começou a sua carreira nos fi lmes de Bollywood, no ano de 1960. Anuradha era uma história sensível que precisava de um toque maduro. Leela surpreendeu os críticos com uma óptima

foi baseado no romance epónimo de Ruth Jhabwala. Os seus diálogos em hindi foram escritos por Prayag Raaj e Satyajit Ray compôs a música.

Leela trabalhou no fi lme Baghi de Ram Dayal em 1964, contracenando com Pradeep Kumar – Vijya Chowdhry e Mumtaz também participaram nesse fi lme. Todavia, não foi um êxito de bilheteira. Depois desse fi lme a sua carreira como actriz começou a minguar. Teve um papel como actriz convidada no fi lme Guru de Merchant-Ivory em 1969, o ano em que ela se casou com o escritor Dom Moraes, o seu amigo de infância. Anos mais tarde Leela Naidu voltou ao cinema com um papel em Trikaal, um fi lme brilhante do cinematógrafo Shyam Benegal, fi lmado em Goa. Mais uma vez Leela teve uma actuação memorável nesse fi lme, que ganhou dois prémios nacionais. O último fi lme que ela fez foi Electric Moon de Pradeep Krishen em 1992. Fez poucos fi lmes durante a sua carreira mas o impacto das suas actuações é tal que ainda é respeitada e admirada como uma actriz formidável. Morreu em Bombaim no dia 28 de Julho de 2009, deixando para trás óptimas memórias dos seus papéis para os seus milhões de fãs. ◆O autor é um historiador da indústria cinematográfi ca.

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O nome na língua de Manipur para este desporto é sagol kangjei que traduz como «hóquei montado em cavalos». O jogo tradicional joga-se com sete jogadores por equipa, montados

Os desportos tradicionais

HÓQUEI EM CAVALOSTexto: DEBABRATA BANERJEEFotografi as: DILIP BANERJEE

em cavalos que geralmente medem por volta de 1,33-1,66 metros em altura. Sete é um número sagrado para o povo de Manipur porque representa os setes clãs ancestrais da população, cada jogador tem um taco de cana com uma pequena cabeça de madeira na extremidade que se usa para bater a bola. A bola tem uma circunferência de 14 polegadas e é feita da raiz de uma planta de bambu. Os jogadores têm que fazer a bola entrar no golo. É um desporto extremamente veloz e excitante. Joga-se em dois estilos – o pana ou o estilo original do estado de Manipur e o estilo internacional, isto é o pólo como se joga no resto do mundo. Os cavalos também são decorados com

A TRADIÇÃO DE JOGAR PÓLO NO ESTADO DE MANIPUR

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placas de metal para proteger os seus olhos, cabeça e ancas, etc. O campo de pólo em Manipur mede 160 sana-lamjei por 80 sana-lamjei, onde um sana-lamjei equivale a 2 metros. A duração do jogo depende de um número de golos estabelecidos antes do jogo, que acaba quando uma das equipas atinge esse número de golos. Se os golos necessários não são alcançados num dia então o jogo continua no dia seguinte! Não há nenhuns postos de golos no jogo tradicional. Toda a linha do fundo é um alvo. Também há poucas regras no formato tradicional. O árbitro, ou huntre hunba, começa o jogo ao atirar a bola no ar. Um jogador pode apanhar a bola no ar, correr com ela e bater nela para fazer um golo. Um jogador pode levar a bola do chão até as suas mãos e depois batê-la com o taco para fazer um golo. Algumas regras foram introduzidas pelo rei Churachand Singh em 1928, proibindo cruzar em frente de outros jogadores e apanhar os tacos dos rivais quando em cima do seu cavalo. Embora o patrocínio real do desporto já acabou, ainda se joga na sua forma tradicional. Hoje em dia há mais que 30 clubes de pólo em Manipur e cada jogo atrai multidões de pessoas, que vem de todos os cantos do estado para ver um jogo no campo imperial de pólo em Imphal, a capital. ◆O autor é um conhecido escritor.

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As plantas sagradas na tradição indiana PRAN NEVILE

A fi gueira indiana (Ficus benghalensis) é a mais sagrada de todas as árvores sagradas na Índia. Tem raízes aéreas que penetram o solo, formando novos troncos. Por isso, é também

chamado bahupada, a árvore de múltiplos pés, e simboliza uma longa vida. Também representa o deus Brahma, o criador divino. Invariavelmente se encontra essa árvore em frente dos templos hindus. Considera-se que os deuses e os espíritos vivem nos seus numerosos ramos. Os ascetas hindus sentam-se em baixo desta árvore para meditar, dar discursos e fazer os rituais sagrados.

Desde a antiguidade certas plantas e árvores na Índia foram atribuídas características divinas. Os hindus adoravam-

nas acreditando que essa adoração podia infl uenciar o seu próprio bem-estar. As árvores perenes eram vistas como um símbolo da vida eterna. Os deuses viviam nas fl orestas…

Templos hindus e a fi gueira indiana em Agouree, às margens do rio Soane, Bihar, por Thomas Daniell, c. 1796 (em baixo) e Uma mulher hindu a fazer uma cerimónia religiosa ao redor de uma planta de tulsi por D.V. Dhurandhar, c. 1890 (página de frente), imagem

gentilmente cedida pelo Museu V&A em Londres.

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as suas reuniões em baixo das suas folhas sagradas. A mais famosa árvore peepul encontra-se em Gaya, onde o Buda atingiu o estado de nirvana ou Iluminação em baixo dessa árvore. Desde então, esta árvore também fi cou conhecida como a árvore bo ou bodhi. Também é um símbolo da fertilidade e as mulheres adoram-na para ter fi lhos.

Outras árvores sagradas incluem a bilva (Aegle marmelos) e a árvore axoca (Saraca indica L), associadas com divindades diferentes. A axoca é sagrada para Kama, o deus de amor, e, segundo as tradições folclóricas, entra em fl or quando o pé de uma donzela bonita toca nas suas raízes. Com as suas três folhas semelhantes ao trixul, ou o tridente indiano, a arma do deus Xiva, a bilva é mencionada na mitologia hindu. A sua fruta purifi ca o sangue.

Para além das árvores sagradas, também há plantas sagradas, a mais famosa das quais é a tulsi, que se encontra em terras arenosas. Uma antiga variedade do manjericão, acredita-se que a planta tulsi é a esposa do deus Vixnu e é adorada pelos hindus. Acredita-se que tocar a planta purifi ca a pessoa e dar um ramo de tulsi a qualquer pessoa signifi ca protegê-las dos perigos e das difi culdades.

A planta também tem muitas propriedades medicinais. As suas folhas têm um perfume agradável e também protegem contra as tosses. As folhas também ajudam a digestão e previnem doenças como constipações. Devido às suas propriedades medicinais os hindus consideraram-na uma planta sagrada. Fanny Parks, uma conhecida escritora, estudiosa e artista, mencionou a adoração desta planta. Descreveu os rituais e a adoração cerimonial da planta e a maneira em que era plantada num vaso em cima de colunas na cidade de Varanasi, onde os devotos circulavam ao redor da planta sagrada, regando-a.

Darbha ou kusha é uma erva sagrada que é essencial para todos os rituais. Essa planta encontra-se nos pântanos. Tem uma superfície enrugada e uma ponta delgada. Segundo às antigas lendas, a planta surgiu quando os deuses e os demónios agitaram o oceano. Diz-se também que enquanto os deuses bebiam amrita ou o néctar da imortalidade, algumas gotas caíram nessa erva e, por isso, transformou-se numa planta sagrada. É mencionada nos antigos textos hindus e nas epopeias e é usada em várias cerimónias religiosas porque se acredita que purifi ca tudo ao seu redor. ◆O autor é um conhecido escritor.

Algumas árvores podem atingir uma altura de mais que 33 metros e podem abranger uma área de mais que 300 metros em circunferência. Por isso, não é estranho ouvir que até dez mil pessoas podem se sentar debaixo de uma única árvore. Muitos viajantes mencionaram esta árvore nas suas descrições da Índia. O bispo Heber (1825) foi tão impressionado por essa árvore que escreveu, «que nobre sítio de adoração». As histórias dos viajantes até inspiraram o grande poeta inglês, Milton, a aludir a essa árvore no seu livro Paraíso Perdido.

Na mitologia hindu, esta árvore é conhecido como a

kalapvriksha, a árvore que realiza os desejos e que traz prosperidade. É também possível ver imagens da adoração desta árvore nos textos budistas. Uma outra grande árvore da Índia é o peepul (Ficus religiosa), que se encontra em todo o país. Uma árvore antiga, é mencionada em muitos textos hindus como uma árvore sagrada, cuja adoração é considerada homenagear a trindade hindu – Brahma, Vixnu e Xiva. Essa árvore também é associada com os antigos rituais dos vedas, onde os fogos sacrifi ciais eram acesos com um ramo desta árvore. Cada aldeia tem a sua árvore especial de peepul e os anciões realizam

Mulheres a adorar uma árvore por William Carpenter, c. 1850, imagem gentilmente cedida pelo Museu V&A em Londres.

A árvore sagrada dos hindus em Gyah, Bihar, por Thomas Daniell, c. 1796

Adoração da planta de tulsi por Fanny Parks c. 1830

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Há poucas mulheres no mundo mais ocupadas que Tina Brown, a célebre editora de Nova Iorque, cuja mais recente iniciativa é um website de notícias que se chama «The Daily Beast»,

que recebe mais que 50 milhões de visitas ao dia. Todavia, para dois anos sucessivos bloqueou uma semana na sua agenda para assistir ao Festival Literário de Jaipur.

«Estou viciada nisso. É uma fantástica reunião dos melhores autores do mundo e dos melhores escritores indianos. É estimulante e divertido», diz ela enquanto bebe uma cidra quente com especiarias no Café Flow, nos jardins do palácio de Diggi, um antigo e encantador palácio transformado num hotel onde esse festival se realiza no mês de Janeiro todos os anos.

O ENCANTO DO

Festival Literário de JaipurTexto: AMRIT DHILLON

Fotografi as: TEAMWORK PRODUCTIONS

Antes de chegar em Jaipur, Tina Brown foi entrevistada através da Twitter pelo Sunday Times na Inglaterra. Quando perguntaram-na o que estava a fazer nesse momento ela respondeu que estava a jantar num restaurante em Nova Iorque e estava ansiosa assistir ao festival.

«Depois de Tatler, Vanity Fair e The New Yorker (todas revistas editadas pela Dra. Brown) não acha que um festival indiano de literatura é pouco importante?» perguntou-lhe o seu interlocutor.

Ela respondeu azedamente: «O que está a dizer? Este festival tem os melhores escritores do mundo. Se isso quer dizer abaixar-se eu faria isso todos os dias». Mais tarde, ao escrever no The Daily Beast, chamou-o «o maior espectáculo literário do mundo».

Para a «Cidade Cor-de-Rosa» o festival foi mais uma vez uma fonte de orgulho visto que Wole Soyinka, Michael Frayn, Amit Chaudhari, Pavan Varma, Louis de Bernieres, Vikram Chandra, Alexander McCall Smith, Hanif Kureishi e quase 200 outros autores principais participaram em cinco dias intensos de actividades literárias.

As origens do festival, que começou há cinco anos, eram humildes. «Li o meu livro numa sala cheia de sofás cobertas de pó com seis pessoas no público. Quando o projector não funcionou três deles saíram mesmo quando lhes implorei fi car», disse o co-fundador, o autor britânico William Dalrymple, que vive na Índia desde há muitos anos.

Wole Soyinka, o autor nigeriano que foi galardoado com o prémio Nobel. Tina Brown com Vir Sanghvi do jornal nacional Hindustan Times

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Dois anos mais tarde, em 2007, Dalrymple e a outra fundadora, Namita Gokhale, conseguiram atrair cerca de oito a dez autores. O ano passado foi o ponto de viragem quando, de repente, o festival fi cou famoso, atraindo 160 autores, 20.000 pessoas e estabelecendo-se como o maior festival literário na Índia e na Ásia.

O evento orgulha-se de ser o festival literário mais democrático do mundo, onde a entrada é grátis e não há tratamento especial para os autores famosos ou as celebridades que visitam. O ano passado a vedeta Julia Roberts visitou (sem ser reconhecida) enquanto Vikram Seth sentou-se no chão nos jardins para comer o seu jantar porque não havia espaço nas mesas.

Não há secções exclusivas. Os autores usam as mesmas casas de banho e comem a mesma comida que o público. Qualquer pessoa, incluindo os 200 alunos de Jaipur e de Deli que são convidados todos os anos para o festival, pode encontrar e conversar com um autor.

Este ano, o autor nigeriano Wole Soyinka, que ganhou o prémio Nobel, jantou com um grupo de alunas encantadas. «Ele disse-nos como viver uma vida boa e como ser uma boa pessoa», disse Asha Gupta, que estuda numa escola em Jaipur.

O escritor britânico Hanif Kureishi foi rodeado por alunos a

Uma vista do público à tarde

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O autor Chetan Bhagat numa sessão com Meenakshi Madhavan, Ira Trivedi e Anjum Hasan (da esquerda à direita).

Um espectáculo pelos músicos folclóricos de Rajastão

aos autores ou pessoas célebres como o actor Rahul Bose (que fez um brilhante trabalho de moderar uma discussão sobre como os livros deviam ser adaptados para os guiões cinematográfi cos) e conversar ou almoçar com eles.

O ambiente festivo realçou o melhor do estado de Rajastão – trajes coloridos e magnífi cos músicos e bailarinos folclóricos, tendas em cores brilhantes e homens com turbantes a servir chá com especiarias em khullars (vasos de barra).

Os concertos à noite são uma parte integral do festival. Depois de um dia de discussões literárias estimulantes as pessoas querem ver um bom espectáculo e este ano não fi caram desiludidas. O público enlouqueceu quando Susheela Raman, a famosa cantora britânica de origem indiana, mostrou a sua voz rica e ousada, que lhe ganhou

uma nomeação em 2001 para o prémio Mercury para o seu álbum de estreia «Salt Rain». O seu parceiro, o guitarrista, Sam Mills, também tocou com ela. Nessa noite de música indiana e britânica, Nathoo Lal Solanki, que toca música clássica no nagara e o músico folclórico Chugge Khan também encantaram os espectadores. Os cantores baul de Bengala, liderados por Paban Das Baul, eram igualmente populares.

A música era ecléctica, desde a música folclórica indiana até à música mística dos sufi s, passando pela música marroquina e músicos populares de fusão como Biddu (que nasceu na Índia, onde começou a sua carreira numa banda de pop infl uenciada pelo reportório clássico dos Beatles e dos Rolling Stones). O grande evento fi nal – o baile dos escritores, com um espectáculo de som e luz

– realizou-se na famosa fortaleza de Amber em Jaipur.

Todavia, voltando às actividades diurnas. Havia discussões sérias sobre a literatura nas tendas, que atraíram públicos entusiastas dispostos a se sentar no chão para ouvir os escritores que amam e respeitam.

Montaram as tendas nos jardins porque não havia maneira em que a grande sala de audiências do palácio, com os seus candeeiros e pinturas nas paredes, podia acomodar todos os indianos e estrangeiros – mais que 26.000 este ano – que inundaram o palácio de Diggi.

Muito do charme do festival deve-se aos jardins lindos do

palácio e ao seu encanto de uma outra época. Enquanto Claire Tomalin explicou a arte de escrever uma boa biografi a numa vasta tenda decorada com riscas verdes, cor-de-rosa, amarelo e magenta, foi interrompida pelos relinchos dos cavalos nas cavalariças reais ao lado.

«O festival ainda tem o ambiente de um grupo de amigos a juntar-se para se divertirem» diz Dalrymple. «A própria cidade é uma atracção. O que pode ser mais simpático no inverno que o sol a brilhar em Jaipur?» William Dalrymple disse que teve a ideia de organizar um festival na Índia depois de assistir festivais em outros países e encontrar célebres

querer o seu autógrafo. «Nunca li os seus romances mas conheço o seu nome», disse Nikhil Rathore, de 15 anos, quando o Kureishi assinou o seu livro depois de mostrar-se relutante a dar autógrafos inicialmente. Depois acrescentou: «Nunca vi tanta gente famosa na minha vida».

Nesse momento o actor Om Puri, que estava a promover a sua biografi a, passou, com um grupo de fotógrafos e repórteres atrás dele e Rathore correu atrás dele para obter o seu autógrafo também.

Nesse festival não importa o quanto uma pessoa seja famosa, têm que fazer tudo sozinho desde encontrar um lugar para se sentar ou encontrar comida, que é servido aos que chegam primeiro. Michael Frayn, o célebre dramaturgo britânico, foi visto procurando uma cadeira para se sentar.

As mesmas regras aplicam-se a toda a gente. O próprio Dalrymple não foi permitido levar o seu café dentro da exposição da livraria Full Circle. Como um estudante bem comportado, obedeceu o guarda da segurança.

Ao contrário dos outros grandes festivais literários que se transformaram em máquinas para fazer dinheiro, com uma hierarquia rígida, no palácio de Diggi o ambiente é relaxado, informal, alegre e quase como um carnaval com grandes multidões a qualquer hora do dia ou da noite. Toda a gente, desde jornalistas até diplomatas e estudantes podem aproximar-se

autores indianos em todo o lado, menos na Índia.

As leituras de poesia e os concertos acabam já depois da meia-noite, com os jardins cheios não apenas com convidados mas também com os habitantes locais, curiosos a ver o evento que transformou a sua cidade num centro literário. «Jaipur é a perfeita cidade para um festival», diz o produtor do festival Sanjoy K. Roy. «Não é apenas sobre os livros, mas é também sobre a música, as cores e a alegria de Rajastão».

Cada sessão ofereceu alguma coisa nova. Alexander McCall Smith, o autor da série popular No. 1 Ladies Detective Agency,

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e um fantástico contador de histórias, contou algumas histórias hilariantes ao seu público.

Numa tenda toda a gente estava tão absorvida em ouvir Omprakash Valmiki a falar sobre a sua juventude que ninguém reparou que a antiga chefe do governo de Rajastão, Vasundhara Raje, tinha entrado e sentou-se silenciosamente.

Num outro dia, realizou-se uma sessão de poesia em honra do poeta de urdu Faiz Ahmed Faiz para comemorar o seu 99º aniversário e a sua fi lha, Salima Hashmi, recitou a sua poesia e falou da sua herança.

Os fãs da actriz Shabana Azmi fi caram encantados quando apresentou o livro da sua mãe, Kaifi e eu, numa conversa com Urvashi Butalia.

Se o festival continua a crescer ao actual ritmo fenomenal vai ser difícil para o palácio de Diggi – que já estava cheio e com o ar de um sítio assediado ao fi m de cada dia – a continuar a ser o anfi trião do evento. Se este fantástico festival for transferido para um outro sítio já não vai ter o mesmo charme. ◆O autor é um jornalista independente.

Susheela Raman e Sam Mills durante um espectáculo no festival.

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Durante muitos anos o célebre fotógrafo Ashok Dilwali capturou as numerosas facetas das montanhas nos Himalaias. Como o Dr. M.S. Gill diz no seu prefácio, “As montanhas

sempre foram uma paixão do Ashok e ele simplesmente quis capturar cada humor, cada aspecto de cada raio do sol, em todas as suas cores – a cair nos picos cobertos de neve...”

O ecossistema frágil dos Himalaias estende-se desde o rio Indo até o rio Brahmaputra. Ao sul e ao norte a cordilheira enfrente hoje em dia ameaças que nunca enfrentou no passado. Essas montanhas têm uma infl uência vital nos sistemas que apoiam a vida humana, com grandes variações climáticas. É a fonte de alguns dos rios mais

Recensão literária

Os HimalaiasAS MONTANHAS VISTAS DAS NUVENS

SUDHIR SAHI

magnífi cos do mundo e abrangem planícies e fl orestas que contém inúmeras formas de vida.

Um acesso mais rápido a sítios longínquos, mais altos níveis de rendimento e aspirações ligadas com o estilo de vida caracterizam os cada vez mais numerosos turistas de lazer hoje em dia. Como em outros sítios dentro da Índia, a cordilheira oferece muitas oportunidades para experiências únicas, incluindo durante o inverno, quando, por exemplo, o rio Zanskar congela para formar um lenço de gelo, conhecido como um chadar e, durante um breve período de tempo, permite acesso invernal ao vale de Zanskar.

Nesse vasto anfi teatro serrano há desfi ladeiros, lagos e vales, às vezes erguendo-se 6.500 metros até os picos das montanhas mais fascinantes do planeta. Por isso, o acesso pela via terrestre é mais viável durante os meses de verão, quando os altos desfi ladeiros estão livres de neve, usualmente entre Maio e Outubro.

Ashok Dilwali já viu tudo. Todavia, nunca se deixa de se espantar com a magia dos Himalaias, que, ainda hoje, revelam os vestígios

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da sua história étnica e cultural. É uma região onde viagens pelas montanhas até lagos distantes reverberam com o chamamento dos patos e dos gansos selvagens, juntamente com muitos outros pássaros. Os sortudos podem ainda ver um vislumbre do leopardo das neves, o mais fugaz e elusivo dos predadores da cordilheira, já à beira de extinção.

Ashok já caminhou por muitos trilhos e caminhos em numerosas direcções. Capturou muitos festivais refl ectindo as culturas locais através da lente da sua máquina fotográfi ca e pela sua paixão.

Há uma mensagem clara nas fotografi as de Ashok. Quando o equilíbrio dos processos naturais é sujeito a pressões pesadas, os resultantes prejuízos podem ter um impacto nos padrões climáticos e nas vidas do povo. Os combustíveis fósseis e o efeito estufa já resultaram num aquecimento global enquanto a utilização de produtos que não são biodegradáveis como os aerossóis danifi cou a camada de ozónio, aumentando a radiação ultravioleta.

Nesse frágil ecossistema dos Himalaias, é uma dimensão crucial. As comunidades locais transformam-se na força atrás das práticas sustentáveis, especialmente na preservação das tradições e dos ambientes locais. Enquanto balança o impacto da pegada ecológica, também cria alguma pressão para que o povo local pode partilhar equitativamente nos benefícios económicos do «desenvolvimento».◆O autor é um conhecido consultor na indústria de viagens.