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Revista jurídica de publicação periódica com artigos da área do Direito.

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  • REVISTADA ESCOLA DA

    MAGISTRATURA REGIONALFEDERAL DA 2 REGIO

    EMARF

    Tribunal Regional Federal da 2 Regio

    Volume 13Maio de 2010

  • Esta revista no pode ser reproduzida total ou parcialmente sem autorizao

    Revista da Escola da Magistratura Regional Federal / Escola

    da Magistratura Regional Federal, Tribunal Regional Federal da 2

    Regio. N. 1 (ago. 1999)

    Rio de Janeiro: EMARF - TRF 2 Regio / RJ 2010 - volume 13, n. 1

    Irregular.

    ISSN 1518-918X

    1. Direito - Peridicos. I. Escola da Magistratura Regional

    Federal.

    CDD: 340.05

  • Diretoria da EMARF

    Diretora-GeralDesembargadora Federal Maria Helena Cisne

    Diretor de PublicaesDesembargador Federal Andr Fontes

    Diretor de EstgioDesembargador Federal Guilherme Couto

    Diretor de Intercmbio e DifusoDesembargadora Federal Luiz Antonio Soares

    Diretor de Cursos e PesquisasDesembargador Federal Guilherme Calmon

    EQUIPE DA EMARFJaderson Correa dos Passos - Assessor Executivo

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  • Tribunal Regional Federal da 2 Regio

    Presidente:Desembargador Federal PAULO ESPIRITO SANTO

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    Desembargador Federal CARREIRA ALVIMDesembargadora Federal MARIA HELENA CISNE

    Desembargador Federal CASTRO AGUIARDesembargador Federal FERNANDO MARQUES

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    Desembargador Federal ANTONIO IVAN ATHIDesembargador Federal POUL ERIK DYRLUND

    Desembargador Federal ANDR FONTESDesembargador Federal REIS FRIEDE

    Desembargador Federal ABEL GOMESDesembargador Federal LUIZ ANTONIO SOARESDesembargador Federal MESSOD AZULAY NETO

    Desembargadora Federal LILIANE RORIZDesembargadora Federal LANA REGUEIRA

    Desembargadora Federal SALETE MACCALZDesembargador Federal GUILHERME COUTO

    Desembargador Federal GUILHERME CALMON

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    SUMRIO

    DEMOCRACIA E REGIME DEMOCRTICO .......................................... 9Reis Friede

    QUESTES RELEVANTES SOBRE O AUXLIO-RECLUSO .................... 17Tatiana Sada Jordo

    ANLISE CRTICA DA ATUAO DO PODER JUDICIRIO EM RELAOAOS BENEFCIOS DA SEGURIDADE SOCIAL ................................ 25Carlos Crtes Vieira Lopes

    CANDIDATO FICHA-SUJA1: O DIREITO ELEITORAL PRO REO........... 39Cesar Caldeira

    CONTROLE ANTITRUSTE DA PROPRIEDADE INTELECTUAL A SERVIODO DESENVOLVIMENTO ............................................................ 73Joo Marcelo de Lima Assafim

    DIREITO DE AUTOR UM ENSAIO HISTRICO ............................. 101Karin Grau-Kuntz

    ALGUNS COMENTRIOS SOBRE A CONVENO N 158 DA OIT.... 145Debora Lacs Sichel

    LICENA COMPULSRIA DE PATENTES .......................................... 151Ricardo Luiz Sichel

    DO ASSISTENTE DE ACUSAO: O (DES)ASSISTIDO PELA CONSTITUIO. 165Bernardo Montalvo Varjo de Azevdo

    PREMISSAS HISTRICAS E TERICAS SOBRE A CONSTITUCIONALIZAODO DIREITO ............................................................................ 205Danilo Nascimento Cruz

  • 8 Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010

    SISTEMA JURDICO NO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL: ESTUDOACERCA DAS AMBIGIDADES NOS PRECATRIOS E EM FACE DAEQUIVOCAO NA DPLICE RENNCIA ANTE O EXCEDENTE QUEULTRAPASSA O LIMITE DE ALADA RELATIVAMENTE PESSOAIDOSA ..................................................................................... 225Adgerson Ribeiro de Carvalho Sousa

    A REPBLICA E A REESTRUTURAO DA JUSTIA ........................ 283Andr R. C. Fontes

  • Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010 9

    DEMOCRACIA E REGIME DEMOCRTICOReis Friede* - Desembargador do Tribunal Regional Federal da 2

    Regio (RJ-ES)

    Recentemente, alguns autores tm manifestado a idia de que ademocracia e o chamado regime democrtico, - em sua traduo material(derivada, por seu turno, da necessria associao entre os Estados delegitimidade e de legalidade) -, constituem-se, na qualidade de conceitoselementares da Cincia Poltica, muito mais em uma resultante estruturaldialtica, relativamente a um processo histrico-factual de uma Sociedade,de ntida feio poltico-ideolgica, do que propriamente em um modeloconcepcional de regime poltico que poderia, em tese, ser implantado,aleatoriamente, conforme desejo formal, de algum modo, manifestado porum povo ou, - o que mais comum -, por uma classe ou grupo governante.

    Assim, a liberdade individual, na qualidade de um dos pilares doregime democrtico, por exemplo, estaria, neste diapaso analtico, muitomais associada ao grau de maturidade scio-poltica (nvel deconscientizao popular) de uma coletividade organizada e, portanto, dopatamar de civilizao obtido por uma sociedade em seu desenvolvimentohistrico-poltico, do que condicionado a simples vontade manifestadapor qualquer meio formal, de ndole poltico-jurdica (v.g. assemblianacional constituinte), de implantao (artificial) de uma democracia.

    Em outras palavras, segundo esta nova orientao doutrinria,simplesmente no seria vivel a implantao (por simples vontademanifesta) do denominado (e almejado) regime democrtico, com todasas suas inerentes conseqncias, em Estados cujos cidados ainda no

    * Reis Friede; Desembargador Federal e ex-Membro do Ministrio Pblico; Mestre e Doutor emDireito; Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Autor, dentre outrasobras, do Curso de Cincia Poltica e Teoria Geral do Estado: Teoria Constitucional e RelaesInternacionais, 4 ed., Ed. Forense Universitria, 2009.

  • Democracia e Regime Democrtico

    10 Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mar.2010

    atingiram as condies mnimas de convivncia tica e moral, at porque,comprovadamente, no possvel ultrapassar, por simples manifestaounilateral de vontade, estgios naturais de desenvolvimento e, igualmente,suprimir pressupostos bsicos de amadurecimento social que,necessariamente, envolvem no somente um processo educacionalcomplexo e verdadeiramente eficiente, mas tambm fatores histricosgenuinamente revolucionrios em sua acepo mais ampla.

    (Neste sentido, TOM DWYER, conhecido socilogo neozelandsradicado no Brasil (Globo, 4 de setembro de 2005, p. 39), salienta,com mrita propriedade, que a pobreza ou mesmo as desigualdadessociais no so, por si s, suficientes para explicar o fenmeno daviolncia e da desordem urbana em situaes de momentneaausncia (ou impotncia) do Estado, citando, exemplificativamente,por um lado, o comportamento exemplar dos cidados norte-americanos residentes em Nova York durante o apago de 1965, oudos pases asiticos atingidos pela tsunami de 2004, em contraposiocrtica, por outro, situao catica no Iraque (supostamentedemocratizado) de 2005, ou o permanente clima de pr-guerra civilexistente no Rio de Janeiro, notadamente nos ltimos dois anos, oumesmo a degradao social observada nos trs estados mais atrasadosdos EUA (Mississipi, Louisiana e Alabama) durante a devastao dofuraco Katrina em 2005, buscando, por fim, demonstrar ondeefetivamente se encontra a parte civilizada da populao mundial.)

    Destarte, foroso concluir, - no estrito contexto desta linha depensamento -, que todos os pases que, hoje, podem ser inequivocamentereputados Estados democrticos de direito, - realizando todos os atributose caractersticas inerentes s democracias materiais (substantivas), bemcomo usufruindo a plenitude do Estado constitucional, associativo dosparadigmas da legitimidade e da legalidade -, passaram, em algummomento histrico, por algum processo poltico estrutural de grandeenvergadura (revolucionrio, em alguma medida) que permitiu, em ltimainstncia, a institucionalizao da verdadeira democracia e docorrespondente regime democrtico material.

    Sob este prisma analtico, a Inglaterra (Reino Unido da Gr-Bretanha eIrlanda do Norte) e a Frana (em funo, respectivamente, da revoluogloriosa (1666/1689) e da revoluo francesa (1789/1799) quetransformaram, em ltima anlise, a concepo estrutural da soberania

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    Reis Friede

    originariamente teocrtica em democrtica) seriam, hoje, democraciasconsolidadas, da mesma forma que os EUA (em decorrncia da guerracivil americana (1861/1865)), a Alemanha e Itlia (em funo do nazismo(1933-1945) e do fascismo (1919/1943)), e a Espanha e Portugal(respectivamente, por conseqncia dos perodos Franquista (1939/1975)e de Salazar (1932/1974)).

    ( oportuno registrar que a plenitude do regime democrtico alemoatual, a exemplo de todos os demais casos citados, no foiimediatamente instaurado, aps o fim do regime nazista em 1945(muito embora tenha sido conseqncia direta do nvel deconscientizao popular auferido atravs do reconhecimento dasbarbries praticadas, direta ou indiretamente, pelo povo alemo).

    Ao contrrio, a democracia foi lentamente conquistada e,especialmente, consolidada, nos anos posteriores ao ps-guerra, atatingir a situao de relativa plenitude nos anos 70.)

    Nos chamados pases perifricos e em todos os demais Estados que,por razes polticas e histricas, no experimentaram processo semelhante(limitando-se apenas a copiar, - por vontade prpria ou por imposioestrangeira -, modelos democrticos estabelecidos), ao reverso, ademocracia e o regime democrtico tm se traduzido, destarte, em umaforma de organizao poltica fundada restritivamente no s em aparentesliberdades (situao em que a normatividade jurdica no possui plenaefetividade), mas, especialmente, em verdadeiros feudos da eracontempornea, em que o populismo assistencial (e o correspondentecontrole indireto das massas) a principal tnica governamental(caracterizando o que se convencionou designar por democraciasformais ou aparentes).

    ( o caso de praticamente todos os pases da Amrica Latina naatualidade, com nfase no emblemtico exemplo da Venezuela deHUGO CHAVEZ. Segundo longa e detalhada anlise realizada porDIOGO SCHELP (Veja, 14 de dezembro de 2005, ps. 156 e segs.),antes da era CHAVEZ, o pas era controlado por dois partidos da elitevenezuelana que por dcadas se restringiram a criar uma estruturaestatal perdulria, ineficiente e, sobretudo, corrupta. Em 1999, eleitoatravs de regras reputadas democrticas, CHAVEZ assumiu apresidncia da Repblica, alterou a Constituio e, com o vertiginosoaumento dos preos internacionais do petrleo, transformou a PDVSA

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    (e os lucros com a venda do petrleo) em uma mquina de comprarapoio poltico interno (retirando US$ 3,7 bilhes / ano para programassociais, por exemplo) e internacional (vendendo a preos subsidiadosleo para diversos pases latino-americanos), alm de estruturar umamilcia armada com aproximadamente 100.000 homens. No obstanteas estatsticas de 2005: a classe mdia encolheu 57%, o nmero depobres aumentou 25%, o desemprego cresceu de 11% para 16%,metade das indstrias fechou, os empregos informais aumentaram45%, a inflao subiu de 11% para 17% ao ano, o investimentoestrangeiro caiu pela metade e a dvida pblica dobrou; CHAVEZ,neste mesmo ano, contava ter o inconteste apoio de metade dosvenezuelanos (a parcela mais pobre, cativada atravs de polticasassistencialistas), alm de ter consolidado o seu poder por meio deplebiscitos em que obteve ampla maioria. Nas eleies legislativasde 2005, obteve vitria esmagadora (graas ao boicote das oposies)e, paradoxalmente, apesar de defender a democracia participativaem detrimento da democracia representativa, no preocupou-se emexplicar a pfia participao de apenas 25% do eleitorado neste pleito.Descobriu-se, tambm, que CHAVEZ, atravs do emprego de mquinasde identificao digital, conseguiu catalogar a orientao poltico-eleitoral de 12 milhes de eleitores durante o referendo de 2004,criando uma listagem batizada de Maisanta com informaes queprivilegiam os aliados em detrimento dos adversrios em todos osnveis (obteno de empregos pblicos, emisso de passaportes, acessoa auxlios sociais, etc.). Alm de tudo isto, h um quase controleabsoluto do Estado venezuelano pelo governo (formalmente)democrtico de CHAVEZ: o Ministrio Pblico encarregado deprocessar os adversrios sob acusao de traio ptria; 80% dosmagistrados tm contratos temporrios (muitos de apenas trs meses)que no so renovados caso julguem de forma contrria aos interessesgovernamentais; os nomes de mais de 20.000 trabalhadores da PDVSA(a estatal petrolfera venezuelana), demitidos depois de uma grevecontra CHAVEZ, esto registrados em uma lista negra, proibidos detrabalhar em qualquer rgo pblico ou na iniciativa privada (sobpena de represlias fiscais do governo); empresrios que se envolvamem atividades polticas de oposio so submetidos a uma devassafiscal; entre outras incontveis e semelhantes iniciativas.

    O uso da pseudodemocracia para destruir a denominada democraciaformal, resta assinalar, neste contexto, no original, como bemsalienta DIOGO SCHELP. ADOLF HITLER era lder de uma bancadaparlamentar eleita com 33% dos votos quando foi democraticamenteescolhido chanceler da Alemanha. Um ano depois, ele acumulou o

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    Reis Friede

    posto de presidente, deixado vago pela morte do marechalHINDENBURG, obtendo para isso a comprovada e incontesteaprovao dos alemes em plebiscito. Nos anos seguintes, fechousindicatos, suprimiu a liberdade de imprensa e gradativamenteeliminou os demais partidos.

    Tanto na Venezuela dos dias atuais, como na Alemanha do passado,tudo isto somente ou foi possvel em funo das frgeis estruturasinstitucionais e do baixo grau de maturidade poltica inerentes chamadademocracia formal ou aparente l existentes. Tanto verdade, que opas mais estvel da Amrica Latina atual, ou seja, o Chile (onde impensvel uma aventura poltica chavista), louva-se, curiosamente, detambm ter experimentado a ditadura mais longa e rgida do continente(ou seja, o governo PINOCHET (ou sua interferncia direta) de 1973 a1997), criando, em alguma medida (ao menos comparativa), parte daspr-condies para o estabelecimento de uma democracia -,relativamente mais substantiva que suas congneres latino-americanas.

    Tambm, cumpre assinalar, em necessria adio conclusiva, que,paradoxalmente, alguns governantes democraticamente eleitos, nombito destes regimes meramente formalistas, foram, durante otranscurso poltico de suas respectivas existncias, afastados pormovimentos populares, durante a plena vigncia de seus mandatoseletivos, sem qualquer respeito normatividade constitucional e aosprocedimentos legais expressamente previstos no mbito de seuscorrespondentes constitucionalismos (v.g. os governos DE LA RUA /Argentina 1999/2001 e GUTIRREZ / Equador 2002/2005 )

    Oportuno acrescentar que, por razes ideolgicas, tambm restaimpossvel (ou, ao menos, improvvel) a instaurao de autnticos Estadosdemocrticos de direito (democracias materiais plenas) em pases cujaconcepo estrutural de soberania no seja de efetiva orientaodemocrtica (todo poder mana do povo e em seu nome exercido) esim teocrtica (todo poder emana de Deus e em seu nome exercido)como o caso tpico dos diversos Estados que abrigam Naes muulmanasdas mais variadas e diferentes orientaes (xiitas, sunitas, etc.).

    (Exatamente por isto a veemente crtica ingnua (e fracassada)tentativa estadunidense de impor ao secular Iraque (curdo, xiita esunita), em um tempo extremamente reduzido e sem qualquer fatorevolucionrio ou de natureza assemelhada, um regime democrtico

  • Democracia e Regime Democrtico

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    fundado em uma concepo estrutural de soberania completamentediversa (e ininteligvel para a cultura milenar iraquiana) da enraizadaideologia teocrtica inerente ao mundo muulmano.

    Alis, lio, lamentavelmente, no aprendida mesmo aps odesastrososo episdio concernente anterior tentativa dedemocratizao do Ir (Prsia) em 1979, realizada atravs da igualmentedesastrosa poltica de direitos humanos, empreendida pelo governoJIMMY CARTER (1976-1980), que acabou por permitir, de formadescontrolada, a derrubada do regime do X REZA PAHLEVI (1953/1979) e sua indesejvel (porm, previsvel poca) substituio pelateocracia totalitria islmica dos Aiatols Khomeini (1979/1989) eKhamenei (a partir de 1989).

    No por outro motivo que, historicamente (especialmente noperodo ps-guerra), a poltica norte-americana para o Sul da sia epara o Oriente Mdio tem se pautado no s pela implantao, mas,sobretudo, pela manuteno (atravs de slido apoio poltico,econmico e militar) de regimes de fora pr-ocidentais que permitamno s evitar os riscos inerentes implantao descontrolada egeneralizada do totalitarismo islmico, mas igualmente manter umrelativo controle sobre uma regio extremamente importante sob oponto de vista geopoltico.

    Ainda assim, fonte de permanente preocupao, por parte dosprincipais estrategistas da comunidade poltico-militar estadunidense,as constantes bravatas declaradas, particularmente pelo governoGEORGE W. BUSH, quanto existncia de projetos (ou, no mnimo,instrues) para a implantao de regimes democrticos em pasesque gozam de relativa estabilidade poltica, como o Egito, a ArbiaSaudita e o Paquisto (este ltimo, inclusive, detentor de armasnucleares).)

    Finalmente, resta consignar, em necessria sntese conclusiva, quepor motivos no propriamente ideolgicos (uma vez que a concepoestrutural de soberania, na hiptese vertente, tambm , a exemplo dosregimes ocidentais, de ndole democrtica somada ao fato tambmrelevante de que os ideais comunistas j foram h muito sepultados),mas, ao reverso, de natureza essencialmente pragmtico-conjuntural, aimplantao (pelo menos a curto e mdio prazos) de genunos Estadosdemocrticos de direito em pases centrais, ex-protagonistas do perodohistrico conhecido por guerra fria, - como a Rssia (antiga URSS) e a

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    Reis Friede

    China -, igualmente se apresenta pouco provvel, sendo muito maisplausvel, em virtual contraposio, que os mesmos venham a desenvolverinexorveis formas peculiares de democracia formal, inteno esta, - valefrisar -, j incisivamente manifesta por VLADIMIR PUTIN quandoexpressamente pontuou, em discurso para a Comunidade Internacional,por ocasio do atentado terrorista em Beslam (2004), que a Rssia nose curvar presso internacional para copiar modelos democrticosestrangeiros (no adaptveis realidade russa), at porque desenvolvesoluo democrtica prpria.

    (Nestes pases, cumpre assinalar, - no obstante o longo perodo detotalitarismo radical experimentado -, o regime anterior no foipropriamente derrubado (de forma diversa do nazismo na Alemanha,do fascismo na Itlia, do franquismo na Espanha, etc.), no permitindoforjar a mesma experincia estruturante e, conseqentemente,conquistar os mesmos resultados viabilizados, em ltima anlise, noque concerne instaurao do (supostamente almejado) regimedemocrtico material.)

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    QUESTES RELEVANTES SOBRE OAUXLIO-RECLUSO

    Tatiana Sada Jordo - Procuradora Federal. Ps-graduanda emDireito Pblico e Direito Privado pela EMERJ/UNESA.

    1.INTRODUO.

    O auxlio-recluso um benefcio previdencirio devido aosdependentes do segurado de baixa renda recolhido priso, por qualquermotivo, sob o regime fechado ou semi-aberto (art. 201 da CR, na redaodada pela EC 20/98). O benefcio somente ser pago se o segurado noestiver recebendo salrio da empresa, auxlio-doena, aposentadoria ouabono de permanncia em servio (benefcio extinto).

    Verifica-se, portanto, que o pressuposto para a concesso domencionado benefcio aos dependentes a cessao da fonte de suasubsistncia. Se o segurado preso permanecer recebendo valores comos quais pode, em princpio, prover o sustento de sua famlia torna-sedesnecessria a proteo previdenciria.

    Na hiptese de priso processual civil, os dependentes do seguradono tm direito ao auxlio-recluso, j que essa modalidade de prisotem carter coercitivo, razo pela qual manter o pagamento do benefciopoderia, em determinadas situaes, servir de incentivo aodescumprimento da obrigao.

    No que concerne ao tempo mnimo de contribuio para que osdependentes do segurado tenham direito ao benefcio de auxlio-recluso,o art. 26 da Lei 8.213/91 no exige carncia para a concesso dessebenefcio previdencirio. A legislao dispensa a carncia, sendo, noentanto, imprescindvel a comprovao da qualidade de segurado do preso.

  • Questes Relevantes sobre o Auxlio-Recluso

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    Para a concesso do auxlio-recluso, os dependentes devem alm decomprovar a qualidade de dependente, apresentar certido do efetivorecolhimento do segurado priso, firmada por autoridade competente,sendo certo que trimestralmente necessrio comprovar que o seguradocontinua preso.

    O auxlio-recluso ser devido a contar da data do efetivo recolhimentodo segurado priso, se requerido at trinta dias desta, ou da data dorequerimento administrativo, se posterior a esse prazo.

    2. AS CLASSES DE DEPENDENTES. CONSIDERAES SOBRE AUNIO ESTVEL HOMOAFETIVA.

    O art. 16 da Lei 8.213/91 elenca trs classes de dependentes. A 1classe composta do cnjuge, do companheiro(a) e do filho noemancipado menor de 21 anos ou invlido de qualquer idade. A 2 classe composta dos pais. A 3 classe, por sua vez, composta do irmo noemancipado menor de 21 anos ou invlido.

    Os enteados e os menores de 21 anos que estejam sob tutela dosegurado possuem os mesmos direitos dos filhos, desde que no possuambens para garantir seu sustento e sua educao, isto , exige-se acomprovao da dependncia econmica (art. 16, 2 , da Lei 8.213/91).

    A distribuio do benefcio de auxlio-recluso segue trs clusulas,seno vejamos.

    A clusula da excluso (art. 16, 1 , da Lei 8.213/91) estabelece queem havendo dependentes de uma classe, os dependentes das classesseguintes no tm direito ao benefcio. A clusula da concorrncia (art.77, caput, da Lei 8.213/91) determina que na hiptese de haver mais deum dependente da mesma classe, o benefcio ser rateado entre todos,em igualdade de condies, de modo que o auxlio-recluso serdistribudo em cotas iguais. Por fim, a clusula da reverso (art.77, 1 ,da Lei 8.213/91) estipula que ser revertida em favor dos demais a cotaparte daquele cujo direito ao benefcio cessar por algum motivo.

    A dependncia econmica dos dependentes da 1 classe presumida,

  • Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010 19

    Tatiana Sada Jordo

    por expressa disposio legal (art. 16, 4 , da Lei 8.213/91). Os demaisdependentes devem comprovar a dependncia econmica.

    Situao que merece ateno a unio estvel homoafetiva. Cabeindagar se a unio entre pessoas do mesmo sexo pode ser qualificadacomo entidade familiar, a fim de justificar a concesso do auxlio-reclusoao companheiro(a) homossexual do segurado.

    Numa concepo moderna, o conceito de entidade familiar devecomportar interpretao que, de um lado, se coadune com os ditames daConstituio, que outorgou especial proteo famlia, e, do outro lado,acompanhe a evoluo da sociedade. Assim, dentro dessa linha depensamento, a entidade familiar abrange o casamento, a famliamonoparental e a unio estvel, sendo certo que a unio estvel gneroque comporta duas espcies, quais sejam, unio estvel entre homem emulher e unio estvel homoafetiva.

    Dessa forma, quando comprovada a convivncia duradoura, pblica econtnua entre duas pessoas estabelecida com o objetivo de constituiode famlia, independentemente do sexo dos parceiros, o dependenteter direito ao benefcio de auxlio-recluso. No aceitvel oindeferimento do benefcio to-somente em razo da orientao sexual.

    Nesse sentido, apropriada as lies do Des. Federal Joo Batista Pinto Silveira(Revista do TRF/4 Regio, vol. 57/309-348, 310), quando trata do tema:

    (...) 6. A excluso dos benefcios previdencirios, em razo daorientao sexual, alm de discriminatria, retira da proteo estatalpessoas que, por imperativo constitucional, deveriam encontrar-sepor ela abrangidas. 7. Ventilar-se a possibilidade de desrespeito ouprejuzo a algum, em funo de sua orientao sexual, seria dispensartratamento indigno ao ser humano. No se pode, simplesmente, ignorara condio pessoal do indivduo, legitimamente constitutiva de suaidentidade pessoal (na qual, sem sombra de dvida, se inclui aorientao sexual), como se tal aspecto no tivesse relao com adignidade humana. 8. As noes de casamento e amor vm mudandoao longo da histria ocidental, assumindo contornos e formas demanifestao e institucionalizao plurvocos e multifacetados, quenum movimento de transformao permanente colocam homens emulheres em face de distintas possibilidades de materializao dastrocas afetivas e sexuais. 9. A aceitao das unies homossexuais

  • Questes Relevantes sobre o Auxlio-Recluso

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    um fenmeno mundial em alguns pases de forma mais implcita com o alargamento da compreenso do conceito de famlia dentrodas regras j existentes; em outros de maneira explcita, com amodificao do ordenamento jurdico feita de modo a abarcarlegalmente a unio afetiva entre pessoas do mesmo sexo. 10. OPoder Judicirio no pode se fechar s transformaes sociais, que,pela sua prpria dinmica, muitas vezes se antecipam s modificaeslegislativas. 11. Uma vez reconhecida, numa interpretao dosprincpios norteadores da constituio ptria, a unio entrehomossexuais como possvel de ser abarcada dentro do conceito deentidade familiar e afastados quaisquer impedimentos de naturezaatuarial, deve a relao da Previdncia para com os casais de mesmosexo dar-se nos mesmos moldes das unies estveis entreheterossexuais, devendo ser exigido dos primeiros o mesmo que seexige dos segundos para fins de comprovao do vnculo afetivo edependncia econmica presumida entre os casais (...), quando doprocessamento dos pedidos de penso por morte e auxlio-recluso.

    3. PRINCPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM.

    O art. 80 da Lei 8.213/91 preceitua que o auxlio-recluso ser devido,nas mesmas condies da penso por morte, (...).

    A Terceira Seo do Superior Tribunal de Justia (STJ) j firmouentendimento, em homenagem ao princpio tempus regit actum, nosentido de que na concesso de benefcio previdencirio, a lei a serobservada a vigente ao tempo do fato que lhe determinou a incidncia,da qual decorreu a sua juridicizao e conseqente produo do direitosubjetivo percepo do benefcio (RESP n 466646, Rel. Min. HamiltonCarvalhido, DJ 10/03/2003), sendo que o fato gerador para a concessoda penso por morte o bito do segurado (ERESP n 190193, Rel. Min.Jorge Scartezzini, DJ 07/08/2000).

    Nessa ordem de idias, luz do princpio do tempus regit actum, aconcesso do benefcio de auxlio-recluso deve obedecer a legislaoem vigor poca da priso do segurado.

    A propsito, veja-se a esclarecedora ementa do acrdo proferido pelo STJ:

    PREVIDENCIRIO. AUXLIO-RECLUSO. CONCESSO AOSDEPENDENTES DO SEGURADO DE BAIXA RENDA. DETERMINAO

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    Tatiana Sada Jordo

    CONSTITUCIONAL. ARTIGO 80 DA LEI 8.213/91. REQUISITOS DAPENSO POR MORTE. APLICABILIDADE. PRINCPIO TEMPUS REGITACTUM. INCIDNCIA. RECOLHIMENTO PRISO. LEGISLAO VIGENTE POCA. OBEDINCIA. RECURSO PROVIDO.

    I - A EC 20/98 determinou que o benefcio auxlio-recluso seja devidounicamente aos segurados de baixa renda.

    II - Nos termos do artigo 80 da Lei 8.213/91, o auxlio-recluso devido nas mesmas condies da penso por morte aos dependentesdo segurado recolhido priso, desde que no receba remuneraoda empresa nem auxlio-doena, aposentadoria ou abono depermanncia em servio.

    III - A expresso nas mesmas condies da penso por morte quersignificar que se aplicam as regras gerais da penso por morte quanto forma de clculo, beneficirios e cessao dos benefcios. Em outrostermos, as regras da penso por morte so em tudo aplicveis aoauxlio-recluso, desde que haja compatibilidade e no existadisposio em sentido diverso.

    IV - A jurisprudncia da Eg. Terceira Seo entende que a concessoda penso por morte deve observar os requisitos previstos na legislaovigente ao tempo do evento morte, em obedincia ao princpiotempus regit actum.

    V - Quando foi o segurado recolhido priso, no era considerado debaixa renda, no fazendo jus seus dependentes ao benefcio auxlio-recluso, em razo de Portaria posterior mais benfica. Incide, espcie, o princpio tempus regit actum.

    VI - A concesso do benefcio auxlio-recluso deve observar osrequisitos previstos na legislao vigente ao tempo do eventorecolhimento priso, porquanto devem ser seguidas as regras dapenso por morte, consoante os termos do artigo 80 da Lei 8.213/91.

    VII - Recurso conhecido e provido. (REsp 760767/SC, Rel. Min. GilsonDipp, 5 Turma, DJ 24/10/2005)

    4. POSIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). RENDA BRUTADO SEGURADO PRESO.

    Mister se faz ressaltar que, de acordo com o Pretrio Excelso, para aconcesso do auxlio-recluso, a renda a ser considerada a do segurado

  • Questes Relevantes sobre o Auxlio-Recluso

    22 Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010

    preso e no a de seus dependentes. A deciso proferida pelo STFreconheceu a repercusso geral sobre o tema, de modo que deve seraplicada pelas demais instncias do Poder Judicirio e alcana umapopulao carcerria de aproximadamente 450 mil presos.

    O STF deu provimento a dois recursos extraordinrios interpostos peloInstituto Nacional do Seguro Social (INSS) para reformar acrdos proferidospor Turma Recursal da Seo Judiciria do Estado de Santa Catarina, queaplicaram o Enunciado da Smula 5 da Turma Regional de Uniformizaodos Juizados Especiais (para fins de concesso do auxlio-recluso, oconceito de renda bruta mensal se refere renda auferida pelosdependentes e no do segurado recluso) e declarar ainconstitucionalidade do art. 116 do Regulamento da Previdncia Social -Decreto 3.048/99 (Art. 116. O auxlio-recluso ser devido, nas mesmascondies da penso por morte, aos dependentes do segurado recolhido priso que no receber remunerao da empresa nem estiver em gozo deauxlio-doena, aposentadoria ou abono de permanncia em servio, desdeque o seu ltimo salrio-de-contribuio seja inferior ou igual a R$ 360,00(trezentos e sessenta reais)), que regulamentou o art. 80 da Lei 8.213/91.

    O art. 201, inciso IV da CR preceitua que a Previdncia Social conceder(...)auxlio-recluso para os dependentes dos segurados de baixa renda.O STF firmou o entendimento no sentido de que, numa interpretaoliteral desse dispositivo, a Constituio limita a concesso do benefcioprevidencirio de auxlio-recluso s pessoas que estejam presas,possuam dependentes, seja seguradas da Previdncia Social e tenhambaixa renda. O auxlio-recluso surgiu com a edio da EC 20/98, sendocerto que o requisito baixa renda, desde a edio do art. 201 da CR,estava ligado aos segurados e no aos dependentes. De outro lado, numainterpretao teleolgica, foroso reconhecer que se o constituintederivado tivesse pretendido escolher a renda dos dependentes dosegurado para a concesso do benefcio de auxlio-recluso, no teriainserido no texto a expresso baixa renda como adjetivo para qualificaros segurados, mas para caracterizar os dependentes.

    Corroborando com esse entendimento, tem-se na Exposio de Motivosda EC 20/98 que um dos objetivos dessa emenda seria o de restringir oacesso do auxlio-recluso, tendo em vista que, nos termos do art. 194, II

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    Tatiana Sada Jordo

    da CR, o constituinte derivado se pautou no critrio da seletividade paraidentificar aqueles que efetivamente necessitam do mencionadobenefcio previdencirio. Assim, esse objetivo somente poderia seralcanado se o auxlio-recluso tivesse como base de clculo a renda dosegurado. Interpretao em sentido contrrio, que levasse emconsiderao a renda dos dependentes, acarretaria distoresinjustificveis, j que teria de obrigatoriamente incluir no rol dedependentes os menores de 14 anos - impedidos de trabalhar por forado art. 227. 3, I da CR - , sendo certo que qualquer segurado preso quepossusse filhos menores de 14 anos, independentemente de suacondio financeira, geraria auxlio-recluso.

    Por fim, o Tribunal consignou que o art. 13 da EC 20/98 instituiu normatransitria para a concesso do auxlio-recluso e que, para os fins dessedispositivo, a Portaria Interministerial MPS/MF 77/2008 estabeleceu osalrio de contribuio equivalente a R$ 710,08 (a partir de 1 defevereiro de 2009 esse valor passou a ser de R$ 752,12) para efeitode aferir-se a baixa renda do segurado, sendo que esse valor superariabastante o salrio-mnimo hoje em vigor. Dessa forma, esse seria maisum dado a demonstrar no ser razovel admitir como dependenteeconmico do segurado preso aquele que aufere rendimentos at aquelesalrio de contribuio.

    5. CONCLUSO.

    Diante de tudo o que foi exposto, pode-se concluir que o auxlio-recluso um benefcio previdencirio concedido aos dependentes dosegurado de baixa renda. Esses dependentes esto elencados no art. 16da Lei 8.213/91, sendo certo que numa concepo moderna, a unioestvel homoafetiva deve ser qualificada como entidade familiar a fimde justificar a concesso do auxlio-recluso ao companheiro(a)homossexual do segurado. Na concesso do benefcio de auxlio-recluso, luz do princpio do tempus regit actum, deve ser observada a legislaoem vigor poca da priso do segurado.

    O STF firmou orientao no sentido de que, para a concesso doauxlio-recluso, deve ser considerada a renda do segurado preso, de

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    modo que o benefcio previdencirio somente pode ser concedido aosdependentes do segurado que ganhe at o teto previsto legalmente. Essamatria foi discutida atravs de dois Recursos Extraordinrios (RE 587365e 486413) interpostos pelo INSS. O STF reconheceu a repercusso geral,razo pela qual a deciso obrigatoriamente tem que ser aplicada pelasdemais instncias do Poder Judicirio.

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    ANLISE CRTICA DA ATUAO DOPODER JUDICIRIO EM RELAO AOSBENEFCIOS DA SEGURIDADE SOCIAL

    Carlos Crtes Vieira Lopes - Procurador Federal

    Resumo: Trata-se de trabalho a respeito da atuao do Poder Judicirioem relao ao controle dos atos da Administrao Pblica, onde feita uma anlise crtica das decises que extrapolam este poder decontrole, bem como deixam de aplicar teses favorveis ao INSS que,pelo Direito, seriam inquestionveis. Aborda uma srie de casosconcretos onde se demonstra que a atuao judicial est seequiparando a de um administrador de assistencialismo, o que afrontauma srie de princpios constitucionais e poder gerar a ruptura dosistema previdencirio no futuro.

    Abstract: It is working on the role of the judiciary in relation to thecontrol of acts of government, which is a critical analysis of thedecisions that go beyond the power of control and no longer applytheories that support the INSS, by law, would be unquestionable. Itaddresses a number of cases where it shows that judicial action istreated as a trustee of welfarism, which humiliated a number ofconstitutional principles and could lead to rupture of the pensionsystem in the future.

    1) INTRODUO

    O presente artigo tem por objetivo levar a analise dos intrpretes doDireito uma questo que gera preocupao para quem lida com aPrevidncia Social. Trata-se do numeroso quantitativo de decises do PoderJudicirio que ampliam o espectro da lei, aumentando seus limites, atravsde interpretaes extensivas no que tange aos benefcios previstos naCRFB/88 e nas leis para seguridade social.

  • Anlise crtica da atuao do Poder Judicirio em relao aos benefcios da seguridade social

    26 Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010

    Essas decises so das mais variadas instncias do Poder Judicirio, deJuzes Federais, de Juzes Estaduais, de Turmas Recursais de Juizados EspeciaisFederais, de Tribunais Regionais Federais, do Supremo Tribunal Federal (STF),do Superior Tribunal de Justia (STJ), da Turma Nacional de Uniformizao(TNU), dentre outros. Em razo da grande maioria das aes da seguridadesocial encontrar-se no mbito dos Juizados Especiais Federais, as principaisquestes deste trabalho sero verificadas em relao s decises da TNU.

    Esclareo, ainda, de incio, que o presente estudo no tem por objetivodesqualificar o Poder Judicirio, que a meu ver a instituio mais sriae uma das mais relevantes, assim como a Advocacia Geral da Unio, oMinistrio Pblico e a Defensoria Pblica.

    2) BREVES NOES ACERCA DA SEGURIDADE SOCIAL

    A seguridade social dividi-se em trs mbitos distintos: AssistnciaSocial, Sade e Previdncia Social (art. 194, da CRFB/88). Este ltimo onico mbito em que se exige uma contrapartida do cidado, ou seja,somente fazem jus aos benefcios previdencirios os cidados quecontribuam para o RGPS, adquirindo e mantendo a qualidade de seguradoou seus dependentes. A sade1 um direito de todos e dever do Estado(art. 196, da CRFB/88). E, por fim, mas no menos importante, a assistnciasocial um benefcio concedido aos idosos e portadores de deficinciaque tenham renda familiar per capita inferior a do salrio-mnimo,independente de qualquer tipo de contribuio. O financiamento daseguridade social ser feito por toda sociedade, de forma direta ouindireta, na forma que dispes o art. 195, da CRFB/88.

    A assistncia social benefcio custeado com recursos da Unio Federal,mas com gesto realizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS,autarquia federal responsvel pela sua concesso e pagamento aobeneficirio. Tem como fundamento legal a lei 8.742/93 e o artigos 33/36,da L. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso)

    1 Para maiores detalhes sobre Direito sade, ver artigo de minha autoria, tendo como co-autor oadvogado Marcelo Dealtry Turra. TURRA, Marcelo Dealtry; LOPES, Carlos Crtes Vieira. Direito sade como direito de cidadania. Alguns aspectos prticos. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n.881, 1 dez. 2005. Disponvel em: .

  • Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010 27

    Carlos Crtes Vieira Lopes

    O Regime Geral de Previdncia Social (RGPS) de responsabilidadeintegral do INSS, tendo carter contributivo e filiao obrigatria,observando-se os critrios que preservem o equilbrio financeiro e atuarial(art. 201, da CRFB/1988). Atualmente regula-se pelas leis 8.212/91 e 8.213/91, bem como pelo Dec. 3.048/99.

    O art. 195, 5, da CRFB/1988, por sua vez, deixa claro que ainterpretao acerca dos benefcios concedidos pela Seguridade Socialdever ser estrita, no podendo ser extensiva: Nenhum benefcio ouservio da seguridade social poder ser criado, majorado ou estendidosem a correspondente fonte de custeio total.

    Ocorre que este dispositivo no est sendo observado pelo PoderJudicirio, passando este a atuar como legislador positivo nessa matria, oque vedado pelo ordenamento jurdico, conforme ser analisado a seguir.

    3) A SEPARAO DAS FUNES DE PODER (ART. 2, DA CRFB/1988)

    O artigo 2 da nossa Carta Magna disciplina o princpio da separaodos Poderes2, tendo a seguinte redao: So Poderes da Unio,independentes e harmnicos entre si, o Legislativo, o Executivo e oJudicirio. Atravs dessa separao, cada Poder investido de uma sriede competncias constitucionais determinantes, sendo vedada a utilizaopor outro dessas competncias, a fim de lhes garantir autonomia. A funoprimordial do Poder Judicirio, por exemplo, a de julgar, no de elaborarleis (funo legislativa) ou administrar (funo executiva).

    De acordo com o sistema democrtico, a fim de evitar abusos, aConstituio Federal apesar de declarar que os Poderes so independentese harmnicos, previu a possibilidade de interveno de um Poder sobre

    2 H doutrinadores que entendem equivocada a expresso, por entenderem que o Poder uno, o quese divide so as funes desse poder. Utilizam para fundamentar esta posio dos ensinamentos deMontesquieu, em sua obra O esprito das leis. A meu ver esta posio est equivocada, tendo emvista que o ordenamento ptrio tem por base a sua lei maior, a Constituio da Repblica, promulgadapelo Poder Constituinte Originrio, sendo este iniciador e desvinculado de qualquer doutrina anterior.Ora, no a Constituio que deve se adequar doutrina, mas sim a doutrina que deve fazer umaleitura adequada da Constituio. Trata-se do mesmo erro que incidem diversos penalistas aoafirmarem que a pessoa jurdica no pode responder por crime, querendo se utilizar de teoriastrazidas do exterior que no se adquam Constituio Federal.

  • Anlise crtica da atuao do Poder Judicirio em relao aos benefcios da seguridade social

    28 Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010

    o outro, como forma de controle de freios e contrapesos (Checks andBalances), com a utilizao das funes que no lhes so determinantes.

    No presente trabalho, a forma de controle que interessa to somenteaquela exercida pelo Poder Judicirio sobre o Poder Executivo. Controle,segundo MARAL JUSTEN FILHO, um processo de reduo do poder,entendida essa expresso no sentido da vontade e do interesse de umsujeito sobre outrem3.

    O controle exercido pelo Poder Judicirio sobre AdministraoPblica um mero controle de legalidade, no cabendo ao PoderJudicirio se imiscuir na atividade de deciso de mrito do atoadministrativo, por entender que uma medida seria mais adequada queoutra. Mrito do ato administrativo, segundo o eminente administrativistasupra mencionado:

    ncleo de natureza decisria, produzido por uma escolha devontade pessoal do agente estatal em virtude de uma autorizaolegislativa. A fiscalizao poder examinar os requisitos externos deregularidade da atuao discricionria, o que significa verificar se todosos requisitos legais procedimentais foram respeitados e se a autoridadeadministrativa atuou visando realizao dos direitos fundamentais,com observncia dos valores democrticos.

    No se admite que o Juzo de convenincia e oportunidade, inerente atividade administrativa, seja revisado pelo rgo de fiscalizao.

    (...)

    O Judicirio desempenha atividade de fiscalizao propriamentejurdica, na acepo de que se trata de verificar a compatibilidadedos atos administrativos com as normas jurdicas de hierarquia maiselevada (...). 4

    MARIA SYLVIA ZANELA DI PIETRO, por sua vez, deixa claro os limitesdeste controle:

    O Poder Judicirio pode examinar os atos da Administrao Pblica,de qualquer natureza, sejam gerais ou individuais, unilaterais ou

    3 FILHO, MARAL JUSTEN. Curso de Direito Administrativo. 3 Ed. So Paulo: Editora Saraiva,2008. p. 879.4 FILHO, MARAL JUSTEN. Curso de Direito Administrativo. 3 Ed. So Paulo: Editora Saraiva,2008. p. 894/895.

  • Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010 29

    Carlos Crtes Vieira Lopes

    bilaterais, vinculados ou discricionrios, mas sempre sob o aspecto dalegalidade e, agora, pela Constituio, tambm sob o aspecto damoralidade (art.5, inciso LXXIII, e 37).5

    Por estes ensinamentos, constata-se que o controle exercido pelo PoderJudicirio sobre a Administrao Pblica refere-se apenas ao controle delegalidade, devendo o magistrado se colocar na posio de servidorpblico e nessa posio ter o seguinte pensamento: de acordo com a leio benefcio deveria ser concedido? Essa a razo pela qual o processo emque no haja comprovao de requerimento administrativo deve serextinto sem julgamento do mrito, por falta de interesse de agir, namodalidade necessidade (enunciado 77 do FONAJEF). Se no hilegalidade, no h controle judicial a ser exercido. No bastasse isso,quando o rgo colegiado for afastar a incidncia de uma norma legal,faz-se imprescindvel a reserva de plenrio (art. 97, da CRFB/88), conformedetermina a Smula Vinculante de n 11 do STF.

    Ora, a Administrao Pblica, por forma dos preceitos do caput doart. 37, da CRFB/88, se atm ao princpio da legalidade e, por fora do art.195, 5, do mesmo diploma legal, no pode conceder, majorar ouestender benefcio da seguridade social sem previso da fonte de custeio.Ressalta-se, aqui, que a interpretao extensiva ou a analogia no podemser utilizadas quando a lei traz um silncio eloqente.

    Dessa forma, se o controle do Poder Judicirio restrito ao exame delegalidade ou no do ato administrativo, no se pode admitir decisesjudiciais que burlem esta forma de controle, e concedam benefcios daseguridade social quando o INSS observou a lei.

    Em relao definio de princpio da legalidade, trago lio de MARIASYLVIA ZANELLA DI PIETRO:

    Esse princpio, juntamente com o controle da Administrao Pblicapelo Poder Judicirio, nasceu com o Estado de Direito e constitui umadas principais garantias de respeito aos direitos individuais. Isso porquea lei, ao mesmo tempo em que os define, estabelece tambm os

    5 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 Ed. So Paulo: Editora Atlas,2004. p. 640. Ressalto aqui meu entendimento de que o ato imoral aquele que tem desvio definalidade e, assim, seria de plano ilegal, por vcio em um dos seus requisitos de validade, qual sejaa finalidade de interesse pblico.

  • Anlise crtica da atuao do Poder Judicirio em relao aos benefcios da seguridade social

    30 Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010

    limites de atuao administrativa que tenha por objeto a restrio aoexerccio de tais direitos em benefcio da coletividade.

    aqui que melhor se enquadra aquela idia de que, na relaoadministrativa, a vontade da Administrao Pblica a que decorreda lei.

    Segundo o princpio da legalidade, a Administrao Pblica s podefazer o que a lei permite. (...)

    Em decorrncia disso, a Administrao Pblica no pode, porsimples ato administrativo, conceder direitos de qualquerespcie, criar obrigaes ou impor vedaes aos administrados;para tanto, ela depende de lei.6 (MEU GRIFO)

    Complementando esse pensamento, trago lies de ODETE MEDAUAR:

    O sentido do princpio da legalidade no se exaure com o significadode habilitao legal. Este deve ser combinado com o primeirosignificado, com o sentido de ser vedado Administrao editar atosou tomar medidas contrrias s normas do ordenamento. AAdministrao, no desempenho de suas atividades, tem o dever derespeitar todas as normas do ordenamento.7

    Estas decises, no apenas afrontam os dois dispositivos constitucionaisacima, como tambm geram desigualdade na prestao da seguridadesocial e desequilbrio atuarial do sistema, o que gera ao Poder Executivoe a toda sociedade uma sensao de insegurana jurdica.

    A desigualdade gerada em razo da falta de critrios objetivos paraconcesso do benefcio, cada juiz entende de uma forma diferente se anorma previdenciria deve ser estendida ou no. O pior explicar aocidado porque que, em cidade com mais de um Juzo, o benefcioassistencial de seu vizinho que, tendo as mesmas condies econmicase o mesmo numero de familiares, foi concedido por um Juzo e o seu,que teria cado em Juzo diverso, foi indeferido. Trata-se de flagranteAFRONTA AO PRINCPIO DA ISONOMIA art. 5, caput, da CRFB/88.ALEXANDRE DE MORAES aborta o assunto de maneira clarividente:

    6 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 Ed. So Paulo: Editora Atlas,2004. p. 67/68.7 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 12 Ed. So Paulo: Editora Revisa dosTribunais, 2008. p. 124

  • Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010 31

    Carlos Crtes Vieira Lopes

    A igualdade se configura como uma eficcia transcendente, de modoque toda situao de desigualdade persistente entrada em vigor danorma constitucional deve ser considerada no recepcionada, se nodemonstrar compatibilidade com os valores que a Constituio, comonorma suprema, proclama.

    (...)

    Importante, igualmente, apontar a trplice finalidade limitadora doprincpio da igualdade limitao ao legislador, ao intrprete/autoridade pblica e ao particular.

    (...)

    O intrprete/autoridade pblica no poder aplicar as leis e atosnormativos aos casos concretos de forma a criar ou aumentardesigualdades arbitrrias. Ressalte-se que, em especial, o PoderJudicirio no exerccio de sua funo jurisdicional de dizer odireito ao caso concreto, dever utilizar os mecanismosconstitucionais no sentido de dar uma interpretao nica eigualitria s normas jurdicas.8 (MEU GRIFO)

    Em relao ao desequilbrio atuarial do sistema de previdncia social,isto ocorre em razo da aturia ser uma cincia que estuda riscoseconmicos e financeiros, baseado em manipulao de dados estatsticos.Estes dados so formados com base apenas no que consta na lei e na CRFB/88, tomando por base o oramento, o gasto com pagamento de benefciose etc. A questo analisada de forma didtica por Fbio ZAMBITE IBRAHIM:

    A aturia, cincia do seguro, ir cotejar o risco protegido e os recursosdisponveis para sua cobertura, vislumbrando sua viabilidade emdiversos cenrios, especialmente dentro das expectativas futuras emrelao ao envelhecimento da populao e s tendncias da natalidadepopulacional.

    Por meio dessas anlises, possvel aos administradores do regimeprevidencirio a adoo de medidas eficazes, em tempo hbil, paracorreo de desvios, de modo a preservar a segurana e aconfiabilidade do sistema e evitar a sua falncia, o que iria excluir aproteo de milhes de segurados.9

    8 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 20 Ed. So Paulo: Editora Atlas, 2006. p.32.9 IBRAHIM, Fbio Zambitte. Curso de Direito Previdencirio. 9 Ed. Rio de Janeiro: EditoraImpetus, 2007. p.38.

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    Portanto, decises judiciais inesperadas, que trazem interpretaesextensivas, vedadas pelo ordenamento jurdico, alteram um doscoeficientes do clculo atuarial previdencirio, causando prejuzo aoerrio pblico, tanto diretamente, quanto em relao perspectiva deseus clculos futuros. Em razo disso, para manter o sistema previdencirioequilibrado e evitar sua ruptura, o Governo Federal no tem como aumentarde forma significativa o teto mximo dos benefcios do RGPS.

    4) ANLISES DE CASOS CONCRETOS

    Quando verificamos os tipos de decises que vem sendo proferidasem casos concretos, podemos ter certeza de que o controle exercidopelo Poder Judicirio em relao Administrao Pblica extrapola a suafuno, passando a atuao judicial a ser exercida, de formainconstitucional, na posio de legislador positivo, ferindo todos osdispositivos j mencionados, principalmente o princpio da legalidade(art. 37, caput, da CRFB/88) e o princpio da vedao extenso debenefcio previdencirio sem que haja prvia dotao oramentria (art.195, 5, da CRFB/88).

    Na maioria das vezes o rgo julgador afasta a referida norma semafetar a matria a plenrio, ofendendo assim o princpio da reserva deplenrio (art. 97 da CRFB/88) e a Smula Vinculante n. 10, emitida pelo STF.

    Isso ocorre em diversos casos, como nos seguintes, que no chegamnem perto de serem exaustivos:

    - Quando concedem penso por morte, com prova documental precria,dando um valor muito grande prova testemunhal, mesmo quandocontraditria, o que afronta a norma que exige ao menos trs documentoscontemporneos ao bito que comprovem a dependncia econmica (art.22, 3, do Dec. 3.048/99).

    - Quando ultrapassa norma prevista no art. 70 do Dec. 3.048/99, quelimita a converso de tempo de atividade especial em comum apenas ata data de 28 de maio de 1995;

    - Quando ultrapassa a norma prevista no art. 15, 2, da L. 8.213/91, a

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    Carlos Crtes Vieira Lopes

    fim de permitir a comprovao do desemprego por qualquer meio ou, emalguns casos, nem sequer exigir tais provas (Enunciado 25 da Smula da TNU);

    - Quando permite a contagem de tempo pelo trabalhador rural commenos de 14 anos, contrariando norma constitucional que veda o trabalhodos menores de 16 anos, salvo na condio de aprendiz, a partir dos 14anos (Enunciado 5 da Smula da TNU). Vale ressaltar que no existe direitoadquirido a regramento jurdico anterior norma elaborada pelo PoderConstituinte derivado, at mesmo porque as normas que foremmaterialmente contrrias Constituio no so recepcionadas, soconsideradas nulas;

    - Quando estende o conceito de incapacidade para concesso deBenefcio de Prestao Continuada LOAS para menores de 16 anos e noscasos em que se equiparam invalidez exigida para aposentadoria porinvalidez (Enunciado 29 da Smula da TNU). Ora, o BPC-LOAS, em redaodada pelo art. 20, 2, da L. 8.213/91, seria devido para aqueles que tenhamincapacidade para a vida independente e para o trabalho. Se o menor de16 anos no pode trabalhar, no faria jus ao referido benefcio. Em relao incapacidade, esta no deveria se equiparar quela necessria paraconcesso da aposentadoria por invalidez, isso porque para este benefcioexige-se apenas a incapacidade total e permanente PARA O TRABALHO,enquanto para concesso de BPC-LOAS exige-se a incapacidade no apenaspara o trabalho, como tambm para a VIDA INDEPENDENTE;

    - Quando passa a entender que mesmo que o trabalhador utilize deEquipamento de Proteo Individual (EPI) eficaz, o perodo de tempo decontribuio deve ser contado como se fosse de atividade especial(Enunciado 9 da Smula da TNU). preciso ter em mente que o tempoexercido em atividade especial aquele considerado com exposiopermanente e habitual aos agentes nocivos previstos nos regulamentosda Previdncia Social, pois isso poderia causar prejuzos sade e/ouintegridade fsica do segurado. Contudo, a partir do momento em que otrabalhador obrigado pela empresa a utilizar EPI e este eficiente eeficaz cessa a exposio ao agente nocivo, eis que o segurado estdevidamente protegido, no havendo mais qualquer risco sua sade e/ou integridade fsica (art. 57, 4, da L. 8.213/91);

  • Anlise crtica da atuao do Poder Judicirio em relao aos benefcios da seguridade social

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    - Quando permite a aplicao da Tabela de Santa Catarina para revisode benefcios previdencirios pela ORTN/OTN (Enunciado 38 da Smulada TNU). Nesses casos, a reviso refere-se a benefcios concedidos, emregra, h mais de 20 anos e, como se sabe, o INSS tem a obrigao deguarda dos processos administrativos por determinado perodo de tempo,em regra de 5 anos. Ora, aqui, no apresentando o autor a relao dossalrios de contribuio que foram utilizados no clculo da Renda MensalInicial (RMI) de seu benefcio, a ao judicial deveria ser julgadaimprocedente, eis que, pelo art. 333, I, do Cdigo de Processo Civil, onus da prova dos fatos constitutivos de seu direito cabe, exclusivamente,ao autor. No possvel aceitar a utilizao de um ndice, criado combase em coincidncias, SEM PREVISO LEGAL, a fim de garantir umareviso de benefcio que, muitas das vezes, seria de valor inferior ao quefoi concedido judicialmente, causando prejuzo ao errio pblico;

    - E, o mais absurdo de todos os casos, quando aplica de forma extensivao art. 34, pargrafo nico da L. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). Pelo art.34, pargrafo nico, da L. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), o benefciode prestao continuada LOAS concedido a outro idoso que sejamembro da famlia, ser excludo do computo da renda per capita paraconcesso de benefcio da mesma espcie, pelo requerente idoso. Ocontrole do Poder Judicirio sobre o ato do INSS nesse caso acaba nosendo de legalidade, mas sim de ilegalidade. Tratam-se de benefciosdistintos, advindo de recursos diversos (o benefcio assistencial temrecursos advindo do errio da Unio Federal e no paga gratificaonatalina; o benefcio previdencirio advm de errio do INSS e pagagratificao natalina). Como j foi dito, o Controle do Poder Judiciriosobre a Administrao Pblica deve ser apenas de legalidade. Diantedisso surge a seguinte indagao: Se o magistrado fosse funcionrio doINSS e tivesse que indeferir ou deferir o benefcio, nessa hiptese,observando-se o princpio da legalidade, o que ele faria? Certamente aresposta seria pelo indeferimento. O servidor pblico tem que obedecerao que est na lei e esta no estendeu a hiptese do art. 34, pargrafonico, da L. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), para todo e qualquerbenefcio previdencirio de valor equivalente a um salrio mnimo. Trata-se de hiptese que sequer poderia haver interpretao extensiva, eisque no houve omisso do legislador, mas sim silncio eloqente.

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    Carlos Crtes Vieira Lopes

    5) TESES NOVAS FAVORVEIS AO INSS E POUCO ACOLHIDAS

    Outro fator de desequilbrio do sistema atuarial decorre de decisesjudiciais que no acolhem teses que so favorveis ao INSS.

    Como exemplo disso, trago baila, a tese da decadncia da reviso debenefcios previdencirios concedidos antes de 28 de junho de 1997, emaes ajuizadas posteriormente a 28 de junho de 2007, sob a alegaoinfundada de que a decadncia no poderia retroagir para prejudicarbenefcios concedidos antes de sua criao legal. Ocorre que, nesse caso,no estamos falando de aplicao retroativa da lei que criou o prazodecadencial, mas sim de aplicao imediata da norma jurdica, conformeensinamentos de Paul Roubier10. Entendimento correto sobre a matria foisumulado pela Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Estadodo Rio de Janeiro, atravs do enunciado n 6311, cuja redao a seguinte:

    Em 01.08.2007 operou-se a decadncia das aes que visem revisode ato concessrio de benefcio previdencirio institudoanteriormente a 28.06.1997, data da edio da MP 1.523-9, que deunova redao ao art. 103 da L. 8.213/91.12

    O Rio de Janeiro , por enquanto, o nico estado em que esta teseteve uma excelente receptividade. Preferindo o Poder Judicirio de outrosestados continuarem a proferir decises que representam uma sangriade dinheiro pblico, criando benefcios em que para o segurado noexistiria prazo decadencial de reviso, mas para a Administrao Pblicasim. Ora, como possvel explicar que a Administrao pode ser compelidaa observar um prazo decadencial, contado a partir da vigncia da lei desua criao, e o segurado no, podendo optar por rever seu benefcio aqualquer tempo?

    Outra questo que merece anlise mais aprofundada diz respeito aplicao das teorias do venire contra factum proprium e da supressio

    10 ROUBIER, Paul. Les Conflits de Lois Dans Le Temps, Paris, 192911 Para maiores detalhes sobre o assunto recomendo a leitura de artigo de minha autoria, denominadoDecadncia do Direito reviso de benefcio previdencirio (uma anlise de DireitoIntertemporal) , publicado na Revista Direito e Poltica, n. 16 (IBAP); Revista de Direito doTrabalho, n. 8 (CONSULEX); Revista da EMERJ, n. 43; Revista da EMARF, n. 1, vol. 11; RevistaVirtual da AGU, n. 77; Revista de Doutrina da 4 Regio, n. 24.12 O Superior Tribunal de Justia tende a adotar este entendimento, reformando a jurisprudnciasedimentada da corte, conforme decises no RESP 110.526 e no RESP 110.836.

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    em favor da Administrao Pblica. Tratam-se de instituto de DireitoPrivado que pode ser facilmente aplicado ao Direito Pblico, eis quereferem-se a dois comportamentos de uma mesma pessoa para comoutrem, com base no princpio da boa-f objetiva, que vedam ocomportamento contraditrio.

    O venire contra factum proprium refere-se a situao em que umadeterminada pessoa, durante determinado lapso temporal, comporta-sede tal maneira que a outra pessoa cria uma legtima expectativa de queseu comportamento no se alterar, quebrando a boa-f objetiva. So,portanto, quatro os seus elementos: comportamento, gerao deexpectativa, investimento na expectativa gerada e comportamentocontraditrio.

    A supressio, por sua vez, consiste em limitao ao exerccio de direitosubjetivo que paralisa a pretenso em razo do princpio da boa-fobjetiva. Para sua configurao, exige-se (I) decurso de prazo semexerccio do direito com indcios objetivos de que o direito no mais serexercido e (II) desequilbrio, pela ao do tempo, entre o benefcio docredor e o prejuzo do devedor. Lio de Menezes Cordeiro (TJRS,Apelao Cvel N 70001911684, Segunda Cmara Cvel, Tribunal de Justiado RS, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Julgado em 04/12/2000).

    Exemplificando, trago um caso concreto onde atuei. O segurado, em1998, requereu e teve concedido benefcio de auxlio-doena por umms, com Data de Cessao de Benefcio (DCB) previamente fixada naCarta de Concesso, tendo este cessado em novembro de 1998. No finalde 2007, o segurado, agora autor, ajuiza ao pretendendo orestabelecimento do referido benefcio, cessado h quase 10 anos atrs,alegando que o INSS agiu de forma ilegal ao cess-lo sem que o mesmotivesse readquirido condies de trabalho. A defesa do INSS em Juzo,nesse tipo de ao, acaba por ser prejudicada eis que, em se tratando deconcesso muito antiga, por vezes a Autarquia Previdenciria no encontrao processo administrativo de concesso, at mesmo porque o seu deverde guarda desses processos, em regra, de 5 anos. Assim, no possvelverificar se o autor pleiteou ou no o restabelecimento do benefcio ouno. Ora, ser que nesse caso justo que o INSS seja obrigado a pagartodo o perodo em que o segurado esteve sem receber benefcio, mesmo

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    Carlos Crtes Vieira Lopes

    sabendo que o grande culpado o prprio autor, que demorou quase 10anos para ajuizar uma ao judicial, sem nem mesmo ter requeridonovamente o benefcio? A soluo para este caso est na aplicao dasteorias do venire contra factum proprium e supressio, teorias que j sobem aceitas em nossa jurisprudncia ptria13, eis que o INSS tinha alegtima expectativa de no esperar que uma pessoa que ficou anos semreceber o benefcio de auxlio-doena e somente havia recebidoprestao eqivalente a um ms de benefcio, venha agora a pleitear quase10 anos de benefcio.

    6) CONCLUSO

    Conforme se verificou no presente trabalho, as decises do PoderJudicirio, por vezes (e muitas vezes), extrapolam o seu poder de Controlesobre a Administrao Pblica, afrontando a diversos princpiosconstitucionais, como o princpio da independncia e harmonias entreos poderes, o princpio atuarial do sistema da Seguridade Social, oprincpio da legalidade, o princpio da vedao estenso de benefciosda seguridade social sem prvia dotao oramentria, princpio da reservade plenrio, dentre outros.

    Assume, assim, as funes similares a de um administrador assistencial,concedendo benefcios e permitindo revises que, por nosso ordenamentojurdico, no seriam admitidos. Frise-se que o Poder Judicirio no apenasest estendendo, de forma exacerbada, as normas da seguridade social,como tem deixado de aplicar teses, com fundamentos incontestveis,que so favorveis Administrao Pblica, como a da decadncia dodireito reviso de benefcio previdencirio, do venire contra factumproprium e da supressio.

    Isso faz com que haja um prejuzo incalculvel ao errio pblico,gerando prejuzo ao clculo atuarial de todo o sistema de SeguridadeSocial e causando insegurana jurdica Administrao no que tange saes de poltica pblica. O assistencialismo que est sendo feito pelo

    13 No Superior Tribunal de Justia (STJ) h diversas decises: AI 1.130.131, AI 1.113.634, AI1.085.209, RESP 207.509, RESP 214.680, AI 921.308.

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    Poder Judicirio agora, nas aes referentes aos benefcios da seguridadesocial, ir gerar prejuzos para as futuras geraes de segurados, inclusivecom a possibilidade de ruptura econmica da Previdncia Social, gerandosua quebra, sua falncia.

    Portanto, faz-se necessria uma reflexo aos operadores do Direito queatuam nessa rea, a fim de questionar qual o pas que esperamos no futuro.

    BIBLIOGRAFIA

    DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 Ed. So Paulo: Editora Atlas,2004.

    FILHO, MARAL JUSTEN. Curso de Direito Administrativo. 3 Ed. So Paulo: Editora Saraiva,2008.

    IBRAHIM, Fbio Zambitte. Curso de Direito Previdencirio. 9 Ed. Rio de Janeiro: EditoraImpetus, 2007.

    MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 12 Ed. So Paulo: Editora Revisa dosTribunais, 2008.

    MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 20 Ed. So Paulo: Editora Atlas, 2006.

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    CANDIDATO FICHA-SUJA1: O DIREITOELEITORAL PRO REO

    Cesar Caldeira2 - Professor Adjunto da Escola de Cincias Jurdicas daUniversidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).

    Para Marcos RamayanaO mais difcil da luta escolher

    o lado em que lutar.Millr Fernandes

    O Direito Eleitoral3 adequado a um Estado Democrtico de Direitoprecisa ser orientado pelos princpios constitucionais da moralidadeeleitoral4 e da lisura das eleies5. A finalidade das normas eprocedimentos eleitorais assegurar o exerccio da cidadania e aconstruo e manuteno de uma sociedade democrtica. O desafiopoltico est em legislar, interpretar e aplicar este direito ex parte populi(do ponto de vista do governado). tambm importante no subestimaras dificuldades que sero encontradas. As regras das disputas pelo podercondicionam os resultados, e por isso, os interesses em manipul-las afavor dos governantes permanente.1 Candidato ficha-suja aquele que responde por processos criminais, eleitorais ou relativos improbidade administrativa.2 Professor Adjunto da Escola de Cincias Jurdicas da Universidade Federal do Estado do Rio deJaneiro (UNIRIO). Mestre em Direito pela Yale Law School. Doutor em Direito pela Universidadedo Estado do Rio de Janeiro (UERJ).3 O Direito Eleitoral, precisamente, dedica-se ao estudo das normas e procedimentos que organizame disciplinam o funcionamento do poder de sufrgio popular, de modo a que se estabelea a precisaequao entre a vontade do povo e a atividade governamental. RIBEIRO, Fvila. Direito Eleitoral,2 ed., Rio de Janeiro, Forense, p. 12.4 Constituio da Repblica Federativa do Brasil (CF) de 1988, art. 14 9.5 A base constitucional deste princpio est presente nos artigos relacionados soberania popular esua expresso poltica: art. 1, pargrafo nico, art. 5, LXXIII, art. 14, art. 27, art. 29, I a IV, art.45, art. 46, art. 60 4, II e art. 612.

  • Candidato ficha-suja: o Direito Eleitoral pro reo

    40 Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010

    A luta por eleies limpas marca as eleies municipais de 2008 no Rio.Em 21 de agosto6 foi feito o pedido oficial para que foras federais venhamgarantir a campanha eleitoral contra a coao de traficantes de drogas emilicianos, que parecem apoiar candidatos fichas-sujas e outros parceiros7.

    Com o objetivo de apresentar um quadro mais amplo e complexo dasmudanas poltico-institucionais e legais ocorridas, trs conjunturas eleitoraissero analisadas. Primeiro, o chamado escndalo da Proconsult a supostatentativa de fraude eleitoral - ocorrida nas eleies de 1982. Depois, oprimeiro turno da eleio anulada de 1994, ocorrida logo antes da OperaoRio. Por fim, a situao pr-eleitoral de 2008, na qual se discutiu a questodos fichas-sujas dentro de uma campanha por eleies limpas.

    Neste perodo, houve uma opo pela progressiva informatizao daseleies. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio vem afirmando, em2008, que o sistema de urna eletrnica seguro e inviolvel. Mas jexistem denncias de que os traficantes e milicianos exigiriam que oseleitores fotografassem as urnas para comprovar seus votos.8 E, por outrolado, h uma sugesto de que o eleitor seja mais esperto que o coator:Afinal, ele pode fotografar o visor e depois, em vez de confirmar o voto,basta apertar o boto de corrigir e refazer o voto.9

    Enquanto anlise crtica realizada ex parte populi, h um foco, primeiro,na ausncia de regulamentao pelo Congresso Nacional do art. 14, 9,

    6 O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Ayres Britto, concluiu o processo derequisio formal de foras federais para o Rio de Janeiro e que assinou o ofcio de requisio queser agora enviado ao presidente da Repblica, Luis Incio Lula da Silva.Ayres Britto reuniu-se com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, a quem caber quantificar ocontingente que atuar na cidade. Do presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro,Roberto Wider, Ayres Britto recebeu o primeiro mapeamento das reas na regio metropolitana doRio de Janeiro que necessitam do reforo de segurana. Inicialmente sero vinte comunidades, ondevive cerca de um milho de habitantes. Ayres Britto lembrou que o governador Srgio Cabral pediuo envio das tropas o quanto antes. Presidente do TSE formaliza requisio de tropas federaispara eleio no Rio. Fonte: TSE, 21 de agosto de 2008. Disponvel em 22/08/2008, ver: http://agencia.tse.gov.br/sadAdmAgencia/noticiaSearch.do?acao=get&id=10884837 Traficantes e milicianos estabeleceram tabelas de pedgio para candidatos s eleies de outubrofazerem campanha nas favelas que controlam. O preo varia de R$ 10 mil (para pequenascomunidades) a R$ 30 mil (locais de mdio porte). GOMIDE, Rafael. Trfico cobra at R$ 30 milde candidatos. Folha de So Paulo, caderno Brasil, 11/09/2008, p. A13.8 Ler: TRE: trfico exige foto para comprovar voto, O Globo, 16/08/2008, p. 1.9 A sugesto do coordenador estadual de fiscalizao da Propaganda Eleitoral, juiz Luiz MrcioPereira. Cf. BORGES, Waleska e BOTTARI, Elenilce. TRE deve vetar celular na urna, O Globo,16/06/2008, p. 3.

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    Cesar Caldeira

    conforme a redao dada pela Emenda de Reviso n 4 de 1994. Depois,a dinmica das relaes entre as associaes dos Magistrados e doMinistrio Pblico e os Tribunais Superiores (Tribunal Superior Eleitoral)e STF (Supremo Tribunal Federal) na campanha para negar registro decandidatura aos fichas-sujas. Entender essa trajetria ajuda a perceber oimpacto da Constituio Federal, que faz 20 anos em outubro de 2008, enovos ativismos em nome do interesse pblico, especialmente demagistrados e membros do Ministrio Pblico10 fluminense. Por ltimo,ficar uma recomendao sobre como prosseguir com a campanha pelaregulamentao legal dessa inelegibilidade.11

    1 O CASO PROCONSULT

    As eleies de 1982 foram gerais e diretas para governadores,senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos e vereadores. Doponto de vista do governo federal era preciso garantir, pelo menos, ocontrole sobre o Senado e as assemblias estaduais para garantir a maiorianas eleies indiretas, via Colgio Eleitoral, que faria o sucessor dopresidente General Figueiredo. Vigorava a fidelidade partidria. O pacoteeleitoral de 1981 proibia coalizo de partidos, estabelecia o chamadovoto vinculado12 e vedava que qualquer candidato renunciasse a suacandidatura, somente podendo faz-lo caso seu partido se retirasse daseleies. Estas regras favoreciam o PDS que tinha mais penetrao nosmunicpios e que seria favorecido com a disperso de votos entre ospartidos de oposio.

    No Rio de Janeiro, o candidato a governador Leonel Brizola fez umacampanha bem sucedida. As possibilidades de fraude eram conhecidas.O voto era dado em cdulas de papel, a apurao se dava nas mesascoletoras de votos. A fraude ocorria atravs de cdulas em branco eram

    10 Esto includos nesta expresso os membros do Ministrio Pblico do Estado do Rio de Janeiro(promotores de justia e procuradores de justia) e da Unio (procuradores da Repblica e procuradorregional federal) que atuam nas eleies.11 Desde logo, preciso reconhecer que as mudanas propostas so controvertidas e que existemprecedentes antigos no TSE que afirmam que a condenao criminal sem trnsito em julgado no apta a ensejar inelegibilidade. Ver: Acrdo. n 18.047, rel. Min. Fernando Neves, de 29.09.2000e Acrdo. n 14.204, rel. Min. Ilmar Galvo, de 20.11.96.12 O eleitor deveria votar somente em candidatos do mesmo partido, caso contrrio o voto seria anulado.

  • Candidato ficha-suja: o Direito Eleitoral pro reo

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    depois preenchidas. Nos boletins que reuniam as totalizaes dessasurnas, havia outra possvel adulterao. A novidade foi a fraude natotalizao da geral dos votos feita por uma empresa (Proconsult)13 criadapara habilitar-se licitao do Tribunal Regional Eleitoral (TRE).14 A suspeitade fraude surgiu devido discrepncia entre os nmeros divulgados porduas empresas jornalsticas a TV Globo e a rdio Jornal do Brasil quefaziam a cobertura dos resultados. Uma reportagem do JB demonstrouque o software da Proconsult tinha um fator Delta, que convertia votosde Brizola em votos brancos, numa proporo pr-determinada.15 Novacontagem de voto realizada pelo TRE comprovou a vitria de Brizola nodia 13 de dezembro de 1982.

    At hoje existem polmicas sobre esta tentativa de fraude eleitoral. Orelato do jornalista Ali Kamel, diretor executivo da TV Globo, indica que:O TRE pediu abertura de inqurito na Polcia Federal. Uma auditoriatcnica do Serpro foi feita na Proconsult. O relatrio do Serpro apontouinmeros erros de procedimento da Proconsult e mostrou que a totalizaode votos tinha sido mal planejada. No dia 16 de dezembro o Serprodivulgou seu relatrio.16

    Ali Kamel resume, em sua carta17, o desfecho das providncias tomadas:

    No mesmo dia, o promotor Celso Fernando de Barros requisitou aoTRE nova percia na Proconsult para determinar por que a Proconsult

    13 Segundo Miro Teixeira, que naquela eleio foi candidato a governador pelo PMDB: Era umasubsidiria da Racimec empresa esta que no regime militar ganhou o monoplio das mquinas dejogos da Caixa Econmica Federal. E hoje essa empresa Gtech, a mesma envolvida no escndaloWaldomiro Diniz. A Racimec, a rigor, j h muitos anos tinha participao societria da Gtech.TEIXEIRA, Miro. A Globo e a Proconsult. Entrevista a Luiz Egypto, em 06/07/2004. Disponvelem 05/08/2008 em:http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=284MEM00114 Ver: Lei 6.996 de 7 de junho de 1982, que dispe sobre a utilizao de processamento eletrnicode dados nos servios eleitorais e d outras providncias.15 Cf. AMORIM, Paulo Henrique. Brizola na Globo, Observatrio da Imprensa, 29/06/2004.Disponvel em 05/08/2008, em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=283ASP00416 de se admitir que, se forem mantidas as condies de trabalho hoje observadas, isso , forassegurado o mesmo grau de confiabilidade dos programas ora verificado, for mantida a integridadedos arquivos e consistncia dos dados, e forem adotadas as recomendaes acima, os servios detotalizao das eleies de 15 de novembro de 1982 no Estado do Rio de Janeiro podero serlevados a bom termo. Este o nosso parecer. Disponvel em 05/08/2008, em http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=283JDB00717 KAMEL, Ali. Globo sobre o caso Proconsult, Observatrio da Imprensa, 29/06/2004. Disponvelem 05/08/2008 em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=283JDB007

  • Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.1-288, mai.2010 43

    Cesar Caldeira

    errara tanto. O tribunal, por unanimidade, recusou o pedido. Naocasio, o desembargador Jalmir Gonalves da Fonte, coordenador dacomisso de apurao, declarou: Nada disso evidencia que os errosforam intencionais. Foram erros humanos atribudos ao aodamentodos servios e exausto das pessoas, a ponto de ser necessrioafastar os tcnicos, no por suspeita, mas por entender que j estavamcansados. Foram todos erros naturais, erros humanos e que j tinhamsido corrigidos quando comeou a auditoria.

    No dia 7 de janeiro de 1983, a Polcia Federal divulgou suas conclusessobre o inqurito da Proconsult. No relatrio, est dito que aProconsult no praticou fraudes na computao dos votos, cometendoapenas pequenas falhas.

    O caso Proconsult deixou um rastro de desconfiana sobre a lisura naapurao de eleies informatizadas em setores do eleitorado fluminense.Ficou ainda a percepo de que a Rede Globo era a principal inimiga doprojeto poltico do brizolismo, e o associava crescente violncia detraficantes de drogas no Rio.18

    2. Eleies anuladas no Rio em 1994

    preciso acreditar no futuro para sair do presente que nos assustae envergonha a todos (1993)

    Betinho (Herbert Jos de Souza)

    Dezesseis anos atrs, em agosto de 1992 se organizava o Movimentopela tica na Poltica (MEP)19 que contribuiu na campanha peloimpeachment do ento presidente Fernando Collor de Mello. Betinho

    18 A Globo nunca o perdoou e preparou-se para dar troco. Durante todo primeiro governo Brizola(1983/86), os noticirios da emissora sistematicamente divulgavam os nmeros da violncia noRio, responsabilizando o governador por um crescente fenmeno social que hoje a maiorpreocupao da sociedade brasileira. Mas no importava, o negcio era responsabilizar o governadordo Estado. Os leitores mais velhos devem lembrar do velho Cid Moreira, com sua poderosa voz,anunciando diariamente em manchete no Jornal Nacional: A violncia no Rio. Sem contar que,muitas vezes editoriais do jornal O Globo contra o governador eram lidos na ntegra na TV. Umverdadeiro massacre que daria frutos em futuras eleies. Cf. ARAUJO, Eliakim. Brizola naGlobo . Observatrio da Imprensa, 29/06/2004. Disponvel em 05/08/2008 em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=283ASP00519 Em 7 de julho de 1992, no Rio de Janeiro, representantes de mais de 200 entidades da sociedadecivil leram, luz de velas, 12 artigos da Constituio que lembram os princpios fundamentais datica na poltica, dos direitos sociais, da democracia e das responsabilidades do presidente daRepblica. Foi o estopim para o Movimento Democrtico pelo Fim da Impunidade, posteriormenterebatizado de Movimento pela tica na Poltica (MEP).

  • Candidato ficha-suja: o Direito Eleitoral pro reo

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    escrevia: O governo Collor ganhou as eleies e comeou a governarpretendendo ser o novo na poltica. Um presidente novo, um partidonovo, um programa novo, um Brasil novo.20 Collor prometia um governoque combateria a corrupo e a superao das desigualdades sociais.

    Em maio de 1992, as acusaes de Pedro Collor, irmo do presidente,de que PC Farias seria o testa de ferro de Fernando em transaes escusas21

    deu oportunidade a mobilizao por uma CPI para verificar a veracidadedesses fatos. Com base no relatrio da CPI foi pedido o impedimento dopresidente. No dia 29 de setembro de 1992, a Cmara votou a favor doafastamento do presidente para que o processo de julgamento no Senadoocorresse. Sob enorme tenso poltica, o processo institucional prosseguiuat a condenao do presidente no Senado. Durante um curto perodode tempo, o legtimo processo institucional prevaleceu.

    A agenda dos movimentos no Rio foi se modificando. Do MEP, quebuscava a restaurao dos princpios ticos na prtica poltica brasileira eo fim da corrupo e da impunidade, avanou-se para a Ao da Cidadaniacontra a Misria pela Vida que visava promover aes de intervenotransformadora sobre uma realidade econmica e poltica que produz ereproduz a fome a misria e a excluso social. Em setembro de 1993surgia uma articulao para promover discusses e oferecer propostaspara o combate violncia: era o Viva Rio.

    A cidade tinha se tornado cenrio de arrastes em praias22 O maisfamoso arrasto de praia ocorreu no dia 18 de outubro de 1992, emIpanema e Copacabana, no incio efetivo do vero e final de umacampanha eleitoral para a Prefeitura do Rio. Ver, Folha de So Paulo,caderno 3, 19/10/94, p. 3. e tneis, chacinas de grande repercussocomo a de Acari, da Candelria e em Vigrio Geral, denncias deenvolvimento de policiais, e outras autoridades com o jogo do bicho e

    20 SOUZA, Herbet Jos. O novo est na rua, o Estado de So Paulo, 29/10/1993. Disponvel em23 de junho de 2008 in: http://www.ibase.br/betinho_especial/com_a_palavra/o_novo_esta_nas_ruas.htm21 Ainda no ms de maio foi apreendido o microcomputador de PC Farias contendo informaessobre o esquema de corrupo e do possvel envolvimento do presidente.22 O mais famoso arrasto de praia ocorreu no dia 18 de outubro de 1992, em Ipanema eCopacabana, no incio efetivo do vero e final de uma campanha eleitoral para a Prefeitura do Rio.Ver, Folha de So Paulo, caderno 3, 19/10/94, p. 3.

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    Cesar Caldeira

    trfico de entorpecentes - o caso da Lista do Castor-23, alm de 64seqestros somente em 199324, para citar apenas eventos que tiveramdivulgao nacional. A revista Veja, de 23 de novembro de 1994, noartigo A centrfuga do medo na cidade 25, elenca uma srie de dadosque evidenciam o quadro de violncia no incio da Operao Rio. Entreoutros fatos merecem destaque:

    * Quatro seqestros por semana no Rio de Janeiro;

    * Procisso de Nossa Senhora da Penha cancelada devido a boatos deinterveno de traficantes;

    * Traficantes negociam 1 300 quilos de cocana por semana em 450favelas do Rio de Janeiro;

    * Dossi revela que 70% da Polcia Civil e 20% da Polcia Militar socorrompidas;

    * Homicdios no Rio aumentam 22,6% em dois anos;

    * 1 080 crianas de zero a 17 anos assassinadas no Rio entre janeirode 1991 e julho de 1993;

    * O Rio tem 65,4 assassinatos por 100 000 habitantes. So Paulo tem 37,9.

    Face a esta situao, demandas sociais por uma efetiva poltica desegurana pblica emergiram durante 1994. Movimentos como o VivaRio demandavam a mobilizao das Foras Armadas no combate

    23 Ver entrevista de Antnio Carlos Biscaia: Polcia no merece confiana, Jornal do Brasil, 3/4/94,p. 15; Bicho tem conexo andina , Jornal do Brasil, 4/4/94, p. 1; Biscaia diz que confia em apenas40 policiais, Jornal do Brasil, 31/8/94, p.16. Ver ainda: Rio recordista em assassinatos no Brasil,Jornal do Brasil, 27/9/94, p.20. Pesquisa do instituto Databrasil revela que, hoje, 55% doscariocas tm medo de morar no Rio, 85% consideram a cidade perigosa e 58% colocam nomesmo saco bandidos e policiais. A populao identifica no governo (72%) e na polcia (47%) osprincipais responsveis pelo crime e aponta a bala perdida como um dos seus mais fortes temores(28%). Mesmo os cariocas ainda no atingidos diretamente pela violncia acostumaram-se a mudarde hbitos: 25% da populao deixaram de sair noite e preferem lazer caseiro. A pesquisa encontraeco em dados oficiais. De acordo com o Instituto Mdico-Legal 20 pessoas morrem em mdia pordia no Rio, vtimas de assaltos ou tiroteios. Ver, Carioca tem medo de morar no Rio, Jornal doBrasil, 30/10/94, p.1.24 Observe-se que o nmero de seqestros, em 1994 aumentou para 90 casos, segundo estatsticas daSecretaria de Polcia Civil do estado do Rio de Janeiro.25 Cf. revista Veja, 23/11/94, p. 80.

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    violncia26, especialmente para aumentar o controle das divisas do estadodo Rio de Janeiro, por onde passam armas e drogas contrabandeadaspelo crime organizado. A Ao da Cidadania contra a Violncia tambmse manifestava organizadamente exigindo segurana j 27.

    O debate poltico eleitoral, principalmente na campanha paragovernador do estado do Rio de Janeiro em 1994, enfatizou a questo docombate criminalidade, sendo que o candidato Gen. Newton Cruz - quechegou em terceiro lugar no primeiro turno 28 da eleio - fez do temauma prioridade. Durante o ms de outubro de 1994, se debateu anecessidade e a oportunidade de uma interveno federal ou dadecretao de um estado de defesa no Rio, tendo havido inclusive umamanifestao, em votao unnime, do Conselho da Seccional da OAB-RJfavorvel ao estado de defesa 29. No dia 4 de novembro um parecer doProcurador Regional da Repblica30 deu encaminhamento ao ProcuradorGeral da Repblica de uma solicitao de decretao de estado de defesa.

    Nem a interveno federal nem o estado de defesa, mecanismosconstitucionalmente previstos ao lado do estado de stio, foramdecretados. Optou-se por um convnio assinado em 31 de outubro de1994 entre o governo federal e do Estado do Rio que deu origem ao queficou conhecida como Operao Rio.

    26 Ver, Plano antiviolncia depende de Itamar, Jornal do Brasil, 10/8/94, p. 17. Nesta matriaencontra-se uma declarao do comandante do 1 Distrito Naval, vice-almirante Waldemar CanellasJr. que ressalta que h restries legais participao militar na represso violncia urbana. importante no criar qualquer precedente perigoso, afirmou o comandante, em uma aluso aosriscos polticos de uma interveno militar na vida pblica do pas. Sobre a atuao do Viva Rio, ler ainda: FERNANDES, Rubens Cesar. Dois minutos pelo Rio,Jornal do Brasil, 11/12/93, p. 11; VELHO, Gilberto , Viva Rio e cidadania, Jornal do Brasil, 16/12/93, p. 11; Rio Bickers faz passeio de branco, Jornal do Brasil, 14/12/93, p. 18. Herbert de Souza, o Betinho, coordenador da Ao da Cidadania contra a Misria e pela Vida outra personalidade notvel que chegou a escrever a favor da atuao das Foras Armadas no Rio.No dia seguinte chacina de Vigrio Geral, portanto, um ano antes da iniciativa do Viva Rio,escreveu que o governador Brizola no tem outro caminho pela frente seno o de apelar para acooperao imediata das Foras Armadas para dissolver a Polcia Militar e comear suareorganizao. Cf. ISTO, n 1249, 8/9/93 p. 35.27 Ver: Manifesto pede segurana j, Jornal do Brasil, 10/8/94, p. 17.28 O ex-candidato a governador do Rio, Gen. Newton Cruz em artigo publicado aps o incio daOperao Rio, a trata como uma Interveno branca, e pronuncia-se desfavoravelmente decretao do estado de defesa. Cf. A interveno branca, O Dia, 20/11/94, p. 4.29 Ler: OAB apoia estado de defesa, O Fluminense, 28/10/94, p. 7; OAB aprova estado de defesa,Jornal do Comrcio, 28/10/94, p. 20; OAB-RJ aprova estado de defesa, O Globo, 28/10/94, p. 9.30 Ler: Procurador pede estado de defesa, O Globo, 8/11/94, p. 15. Ver ainda, Jornal do Brasil, 8/11/94, p. 16.

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    Cesar Caldeira

    nesta conjuntura que ocorre a anulao devido fraude na votaoproporcional das eleies casadas de 3 de outubro do Rio de Janeiro. AJustia Eleitoral chegou concluso que havia cerca de 66 % de votos comindcios de manipulao da vontade do eleitor nas eleies proporcionais.31

    O depoimento do Juiz Paulo Cesar Salomo, corregedor geral do TribunalRegional Eleitoral naquela eleio, destaca a relao entre fraude e impunidade:

    Os rgos de investigao e represso do Estado nos frustraram emmais de um sentido. As primeiras denncias contra a Gregafraudadora j famosa em eleies passadas no Rio de Janeiro, noforam investigadas pela Polcia Federal.32 Como as dennciascontinuassem e se tornassem mais graves, resolvemos apelar para aPM-2. A partir da as investigaes tomaram vulto e estratgiasorganizadas pela prpria Corregedoria foram colocadas em prtica.Finalmente, o quartel general da Grega foi identificado e, emuma batida policial no local, houve a priso em flagrante de 15pessoas (entre elas cerca de cinco polticos). Infelizmente, para minhasurpresa, o delegado responsvel acabou liberando 13 das 15 pessoasque haviam recebido ordem de priso. Essas 13 pessoas foramliberadas sem sequer forneceram seus nomes e endereos parainvestigaes futuras...33

    3. A INELEGIBILIDADE DO PR-CANDIDATO EM RAZO DA VIDAPREGRESSA

    A chamada Comisso Afonso Arinos34 mencionava a vida pregressados candidatos como um aspecto constitucional de importnciafundamental quando disps no seu anteprojeto nos termos seguintes:

    Art. 64. Lei complementar definir os casos e os prazos de inelegibilidade,visando a preservar, considerada a vida pregressa dos candidatos:

    31 SALOMO, Paulo Cesar. Processo eleitoral, fraude e cidadania, Revista Arch Interdisciplinar,n 9, 1994, p.133.32 A rigor, questes eleitorais so de competncia da Polcia Federal, j que a Justia eleitoral umaJustia federal, escreve Paulo Cesar Salomo. Idem. P. 134.33 Idem, p. 134.34 Produziu o Anteprojeto da Comisso Provisria de Estudos Constitucionais, cuja contribuiopositiva para o debate da Constituinte deveria ser mais freqentemente lembrada. Ler: AnteprojetoConstitucional, Revista de Cincia Poltica, vol. 30, Rio de Janeiro: Fundao Getlio Vargas,jan.mar. 1987, p. 9-101.

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