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1 SÃO PAULO ENTRE IDENTIDADES E SIGNOS: O cordel e outras representações em territórios culturais Elis Regina Barbosa Angelo 1 Quando termina a Praça da Sé e começa a Rua Direita com a 15 de Novembro, n as noites de sábado e domingo, sanfonas, pandeiros, bumbo dão suas afinadas finais, para começar um grande forró. Na maioria das vezes são dois ou três grupos a pequenas distâncias e, em volta, começando a chegar, já caindo num envolvimento de bailado, cadência, balançar, são eles e elas, “parecendo que são do Nordeste”, uma aparência de que a semana foi dura, de que a saudade foi pura, de que este forró venha a prolongar esta pureza, que não está lá, porque São Paulo, é grande, é preciso ficar, porque l á há dureza de ganhar o pão, há falta deste, eu duramente tem que ficar nesta grandeza de cidade.” Marcos Magno da Gama escritor Introdução As representações culturais do povo nordestino formam uma alegoria de símbolos e sentidos dados ao longo do tempo por inúmeras questões de “invenção”, como menciona Albuquerque Júnior: “Falar e ver a nação ou a região não é, a rigor, espelhar estas realidades, mas criá-las. 2 Em outros territórios, nos quais as referências caminham com os processos migratórios e novamente se inventam como São Paulo, percebem-se referências e representações da cultura popular e sentidos, significados produzidos sobre esses grupos que ora se diferenciam por meio das peculiaridades por cidade/estado, ora se juntam por meio da “imagem” produzida do nordestino 3 alegoricamente 4 representado em conceitos e preconceitos sobre essa imagem. Nessa formação do conceito pela imagem projetada, pode-se dizer que, os mecanismos de criação e representação do espaço, condensado na idéia de identificação, vão corroborando para o entendimento do que é o território cultural e a noção de 1 Doutora em História. Professora do Departamento de Administração e Turismo- DAT/IM e Professora do Programa de Pós Graduação em Patrimônio Cultura e Sociedade/IM- UFRRJ. Pesquisadora do LEER- Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação USP. Linha 1: Núcleo de estudos populacionais- Linha de Pesquisa Etnicidade e Pesquisadora do grupo NUPAM- Núcleo de Patrimônio, Arquitetura e Memória Fluminense. Linha: e do PPGPACS: Linha 1: Patrimônio Cultural: Identidades e Sociedade. 2 ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. pp. 25 e 26. 3 Na obra de Durval Muniz de Albuquerque Junior, A invenção do Nordeste e outras artes, tem-se uma 4 Nesse caso, a alegoria diz respeito ao que se pretende conceber como representação do lugar imageticamente e conceitualmente, corroborando com a leitura da produção artística e cultural realizada sobre o Nordeste ao longo do século XX, na concepção de Durval Muniz de Albuquerque Junior em A Invenção do “Nordeste”.

SÃO PAULO ENTRE IDENTIDADES E SIGNOS: O cordel e outras … · 2018-07-19 · 3 Na obra de Durval Muniz de Albuquerque Junior, A invenção do Nordeste e outras artes, tem-se uma

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SÃO PAULO ENTRE IDENTIDADES E SIGNOS:

O cordel e outras representações em territórios culturais

Elis Regina Barbosa Angelo1

“Quando termina a Praça da Sé e começa a Rua Direita com a 15 de Novembro, n as noites de sábado e

domingo, sanfonas, pandeiros, bumbo dão suas afinadas finais, para começar um grande forró. Na

maioria das vezes são dois ou três grupos a pequenas distâncias e, em volta, começando a chegar, já

caindo num envolvimento de bailado, cadência, balançar, são eles e elas, “parecendo que são do

Nordeste”, uma aparência de que a semana foi dura, de que a saudade foi pura, de que este forró venha

a prolongar esta pureza, que não está lá, porque São Paulo, é grande, é preciso ficar, porque l á há

dureza de ganhar o pão, há falta deste, eu duramente tem que ficar nesta grandeza de cidade.” Marcos

Magno da Gama – escritor

Introdução

As representações culturais do povo nordestino formam uma alegoria de

símbolos e sentidos dados ao longo do tempo por inúmeras questões de “invenção”,

como menciona Albuquerque Júnior: “Falar e ver a nação ou a região não é, a rigor,

espelhar estas realidades, mas criá-las. 2

Em outros territórios, nos quais as referências caminham com os processos

migratórios e novamente se inventam como São Paulo, percebem-se referências e

representações da cultura popular e sentidos, significados produzidos sobre esses grupos

que ora se diferenciam por meio das peculiaridades por cidade/estado, ora se juntam por

meio da “imagem” produzida do nordestino3alegoricamente4 representado em conceitos

e preconceitos sobre essa imagem.

Nessa formação do conceito pela imagem projetada, pode-se dizer que, os

mecanismos de criação e representação do espaço, condensado na idéia de identificação,

vão corroborando para o entendimento do que é o território cultural e a noção de

1 Doutora em História. Professora do Departamento de Administração e Turismo- DAT/IM e Professora

do Programa de Pós Graduação em Patrimônio Cultura e Sociedade/IM- UFRRJ. Pesquisadora do LEER-

Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação – USP. Linha 1: Núcleo de estudos

populacionais- Linha de Pesquisa Etnicidade e Pesquisadora do grupo NUPAM- Núcleo de Patrimônio,

Arquitetura e Memória Fluminense. Linha: e do PPGPACS: Linha 1: Patrimônio Cultural: Identidades e

Sociedade. 2 ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. pp. 25 e 26. 3 Na obra de Durval Muniz de Albuquerque Junior, A invenção do Nordeste e outras artes, tem-se uma 4 Nesse caso, a alegoria diz respeito ao que se pretende conceber como representação do lugar

imageticamente e conceitualmente, corroborando com a leitura da produção artística e cultural realizada

sobre o Nordeste ao longo do século XX, na concepção de Durval Muniz de Albuquerque Junior em A

Invenção do “Nordeste”.

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concepção de identidade, especialmente permeada pela idéia de região5. Esse território,

comprometendo-se com a imagem coletiva mantenedora de “identidades do povo

nordestino”, onde se recria a comida, por meio da gastronomia, - tipicamente

nordestina-, a zelar pelos sabores, as cores e os sentidos de criação dos pratos, das

lembranças olfativas e dos sentidos da memória.

Nesse compasso, os sujeitos que produzem sentidos corroboram com a imagem

formada de nordestino, onde há diferenças de sonoridades, sensações, cores e sabores,

além das pessoas e suas identificações. Essa é uma das críticas de Albuquerque Junior

em “Invenção do Nordeste” e toda sua colaboração na cristalização de “referências

imagéticas”. Traz também a ideia de lugar, produzindo ou recriando a ambientação do

“ser” e “estar” no nordeste, a fim de criar laços de pertencimento nesse novo lugar, a

cidade, que inclui também a arte popular, o artesanato, a música, a dança, os cheios e

mesmo a moda.

Neste contexto de multiplicação da história e memória do “ser nordestino” fora

do seu espaço de criação do lugar, a cidade de São Paulo, exponencialmente uma das

maiores em números de nordestinos fora do nordeste, acaba com a idéia de

pertencimento dos migrantes que saíram de sua terra em busca de novas oportunidades

na cidade.

Pode-se dizer que, como se transformou numa das maiores concentrações de

migrantes, seja na formação de espaços e territórios como o bairro de Santo Amaro na

atualidade, em especial o Lago Treze de Maio, pela concentração de lojas e comércio de

produtos nordestinos, seja por incentivos à cultura, como a formação e fundação cultural

da biblioteca Belmonte, ao buscarem de certa forma, retratar a literatura, os objetos e

saberes do povo, fornecem elementos de análise sobre as representações e a própria

idéia de manutenção das referências como “cordel”, “arte popular”, entre outros.

Em especial as relações do povo nordestino em territórios distintos, seja pelo

apego ao folclore, por ser um elo que intenta integrar o povo dentro do processo de

5 “A região é produto de uma batalha, é uma segmentação surgida no espaço dos litigantes. As regiões são

aproveitamentos estratégicos diferenciados do espaço. Na luta pela posse do espaço ele se fraciona, se

divide em quinhões diferentes para os diversos vencedores e vencidos; assim, a região é o botim de uma

guerra.” ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes, pp. 25 e

26.

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“invenção” regional. No discurso tradicionalista nordestino, o folclore tinha função

disciplinar, com uso dos hábitos e costumes, por meio de códigos sociais. Essa relação

do folclore, percebida em obras relevantes como Gilberto Freyre e de Ariano Suassuna

postulavam essa idéia.

Assim, pode-se dizer que, nessa investigação, concentram-se esforços na leitura

da formação dos territórios nordestinos do cordel, compreendidos na cidade de São

Paulo e reconhecidos pela população paulistana na formação da múltipla e integradora

metrópole. Dessas relações, especialmente focalizando a Biblioteca Belmonte e o

Centro de Tradições Nordestinas, além da idéia de criação de espaços volantes, como a

República do Cordel, que conta com a itinerante relação dos cordelistas na Praça da

República,6 vão somando-se novas formas de interação e afinamento com a literatura de

cordel enquanto instrumento de ação e de reivindicação, com a população nordestina e

seus descendentes que anseiam pela representação de si no território escolhido para

viverem.

Os visitantes desses territórios culturais7, lugares e espaços, entre turistas e

moradores das cidades e regiões, ao entenderem sua aproximação com a memória

efetivada nos recantos criados, possuem de certa forma, uma ligação com a história de

seus antepassados, parentes e amigos, além da sua representação de lugar.

Dessa forma, demonstram apreço e identificação com as referências da memória

nordestina observada nos sabores, imagens, símbolos, sentidos e saberes à relação dos

espaços e, em especial às fronteiras da vida cotidiana, corroborando muitas vezes com o

sentido de pertencer a uma terra, uma gente e uma sintonia que somente os “seus”

poderiam entender.

Essa perspectiva de reconhecimento dos sentidos que os objetos e instrumentos

de memória possuem para a história, fundamenta-se na relação estritamente concebida

pelos objetos de memória, pois, nesse discurso, faz parte da formação dos sujeitos na

história, buscando perceber os sujeitos inscritos nesse novo espaço/território e sua

interação com as questões da memória, do passado, presente e futuro das representações

identitárias.

6 Foi criada a República do Cordel em 2017 com o intuito de agrupar os cordelistas nas praças e devolver

um pouco do glamour de suas histórias e expressões tipicamente nordestinas. 7 Discussão do conceito de territórios culturais do Nordeste fora dele. ANGELO & BARROS (2017).

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No bairro do Limão, em São Paulo, o CTN – Centro de Tradições Nordestinas

similarmente se alinha à formação de território cultural com a apropriação de temas,

cores, sabores e sonoridades que corroboram para a identificação com o Nordeste. A

relação do espaço criado com a finalidade de “pertencer” modela os sujeitos e suas

práticas e criam representações da cultura popular. Assim, recriam-se ambientes e

semelhanças que por meio do entretenimento forjam relações com os lugares de

memória dos nordestinos da cidade grande, seja por meio da musicalidade, das

sonoridades, da ambientação ou do “show”, as representações de alegria e de seleção de

objetos de memória, estão presentes.

Na perspectiva de Pierre Nora, os lugares se formam tanto da intenção em

manter viva a imagem quanto da seleção de uma organização voluntária, intencional e

seletiva. A memória só vive por meio dos objetos que a referencia (NORA, 1993). Os

lugares de memória nascem de um sentido formado a partir do conceito de que não há

memória espontânea, considerando a necessidade que se têm em acumular vestígios,

testemunhos, documentos sobre o passado, entre muitos outros elementos capazes de

formar provas e registros do passado.

Esses lugares de memória, passam a ter a ideia de reivindicação do direito de

“cultivar” suas memórias (RIOS; RAMOS, 2010), e, a necessidade de mostrar aos

“seus”, quem “é” ou quem “são” os símbolos, imagens, pessoas e lugares que

identificam a cultura nordestina. No caso dos outros territórios, as cidades e os

territórios construídos com o intuito cultural, mantém um elo de pertencimento e

identificação com as cidades que fazem parte do universo simbólico nordestino, ou seja,

de onde vieram, pois, “(...) para além dos objetos em si, com vistas a inseri-los no

mundo que os cercam, reconhecendo sua historicidade, suas relações com contextos

sociais específicos” (JULIÃO, 2006, p.95).

Essa escolha dos lugares e territórios de memória e suas contextualizações e

experiências, referem-se de certa forma, ao universo de símbolos agregados ao ser, que

passa pela discriminação, distinção e mesmo orgulho, dependendo da forma com que é

feita a leitura.

Na atual conjuntura, os objetos/pessoas/memórias e lugares passam a ter uma

valorização diferente, passam a ser parte de um movimento de identificação e recriação

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de territórios culturais, pois, a formação do patrimônio vislumbrado na relação de

criação e aceitação, passam a obter o que realmente faz sentido: o sujeito e sua

identificação. Assim, a literatura de cordel e seus territórios vão sendo compreendidas

como identidades populares onde sujeitos, objetos e memórias condensam-se em

patrimônios do povo. Como mencionado por Bourdieu (1998), a simbologia depende de

quem lhe atribui o valor.

1 São Paulo e seus territórios: Da “Nordestinidade” às expressões do povo no

Centro de Tradições Nordestinas, nas ruas e na Biblioteca Belmonte

“Os migrantes eram colocados na boléia dos caminhões onde se

sentavam em bancos de madeira. Para se apoiar, seguravam-se em

tábuas (como se fossem barras) colocadas à frente de cada banco. Daí

utilizar-se o termo “pau-de-arara” em analogia à maneira como essa

ave se apoia para dormir. Durante o dia, sob sol ou sob chuva, à

noite, cobertos por uma lona, os nordestinos viajavam durante muitos

dias para chegar à cidade grande e “ganhar a vida”8

A chegada do nordestino na cidade de São Paulo não necessariamente foi

articulada num lugar específico, como a maior concentração em São Cristóvão no Rio

de Janeiro. Os motivos maiores de atração e repulsão são tidos como formas de trazer

novos sujeitos que comporão os diversos espaços e formarão territórios de grupos e de

sentidos.

O Nordeste do país tem um histórico de repulsão9 calçado pela pobreza, seca e

outras motivações que o transformou num dos pólos de maior repulsão do país, haja

vista seus inúmeros quantitativos de saídas. Na contrapartida, os maiores pólos de

atração diziam respeito às maiores cidades na décadas de 1930 a 1980, período em que

as indústrias e o crescimento eram algo importantes para a economia do Brasil. São

Paulo tinha um slogan”a cidade que mais cresce no mundo”, isso favorecia os

8 ANDRIGUETTI, Nordeste: Mito ou Realidade, pg. 111. 9 “Sobrando mão-de-obra no Nordeste e faltando em outras regiões onde as necessidades do capital

determinam a demanda de mão-de-obra, o nordestino partia, não por uma opção livre e consciente e nem

por uma escolha deliberada, mas sim, para sobreviver. Porém, foram “dirigidos” e orientados, por força

de arranjos institucionais. A força de atração constituía em traição, isto é, já partiam traídos como mão-

de-obra barata nas ardiduras do capitalismo.”GALHARDO, Soledad. Os conterrâneos nordestinos na

metrópole de São Paulo: seus símbolos, sua memória e seus mitos. Anais do Trabalho apresentado no

III ENECULT – Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura, realizado entre os dias 23 a 25

de maio de 2007, na Faculdade de Comunicação/UFBa, Salvador-Bahia-Brasil. p.03.

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deslocamentos oriundos da necessidade de mão de obra, tanto nacional quanto

internacional, movimento que atraia migrantes e imigrantes à cidade.

A organização espacial teve êxito em Santo Amaro, especialmente pelo

comércio de produtos nordestinos no Largo Treze de maio, onde, nas proximidades do

terminal rodoviário, conservou uma organização com característicos do Nordeste em

São Paulo.10

Todavia, não elegeram um bairro para viver como outros grupos de migrantes e

imigrantes, estão pela cidade toda, onde tiveram êxito pessoal e particular no âmbito da

grande metrópole. Numerosos foram os contingentes migratórios para a metrópole e

para cidades do Estado entre os nos de 1930 a 1980, com continuidades posteriores e

também com retornos atualmente percebidos nos deslocamentos pelo país.

Atualmente se percebe um numeroso quantitativo de nordestinos e seus

descendente na cidade, localizados em sua diversidade espacial, com territórios

específicos como o Centro de Tradições Nordestinas, considerado um dos pontos de

encontro do entretenimento e do lazer na cidade e o Largo Treze de maio em Santo

Amaro, um dos pontos de vendas de produtos nordestinos.

Imagem 1: Distribuição percentual da população de 30 a 60 anos de idade, residente

na Região Metropolitana de São Paulo, por naturalidade

Fonte: PNAD 2009/IBGE (Elaboração Ipea)

10 “Santo Amaro chegou a ser o maior polo industrial de São Paulo, hoje é o segundo, até não ter mais

para onde crescer. Com isso, toda a região e seu entorno viraram um grande atrativo para o mercado de

trabalho, constituído principalmente de migrantes nordestinos a partir da década de 50, que também

intensificaram o comércio no bairro. Atualmente é o mais importante centro da região sul e abriga um dos

maiores pontos de comércio popular, o Largo 13 de Maio.” ESTADÃO, Santo Amaro, a cidade que

virou bairro industrial de São Paulo. O Estado de S. Paulo. 11 Dezembro 2014. 10h19. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/geral,santo-amaro-a-cidade-que-virou-bairro-industrial-de-sao-

paulo,1603903 >. Acesso em 10/02/2017.

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Pelas pesquisas desenvolvidas pelo IPEA em 201111, cerca de 45% da população

paulistana se compõe de nordestinos e seus descendentes. Em Santo Amaro, o comércio

popularizado merece atenção, pois, traz elementos que demandam um território do

nordestino, seja nas cores, nos sabores e nos sentidos dados a esses objetos. No entorno

do terminal Santo Amaro se concentram lojas em diversidade de produtos oriundos dos

nove estados, tendo o Ceará como um dos mais procurados pelo gosto do consumidor

local. Além dessas lojas estão os restaurantes na região, procurados pelo sentido que

tem com os estados nordestinos.

Além desse reconhecido território, encontram-se movimentos culturais

populares, que se atem à cultura popular nordestina:

Em 2003 foi inaugurado o Núcleo de Cultura Popular e Repente de

Viola, na Biblioteca Belmonte. Este núcleo foi organizado pela

comunidade formada por artistas da cultura popular nordestina,

poetas cordelistas, repentistas, compositores, apreciadores da cultura

popular, além da importantíssima participação da coordenadora da

biblioteca que incentivou a criação do núcleo, cedendo espaço e

organizando recursos humanos e estrutura para o projeto.12

As atividades como biblioteca temática em cultura popular realizam diversas

atividades que abraçam os âmbitos entre o popular, a tradição a devoção e a diversão, a

comida, a feira e muitos outros atrativos que demandam não somente os signos do

nordestino, mas as representações do povo.

O acervo possui uma diversidade de objetos, cordéis, quadros, livros, periódicos,

jornais, arte popular em cerâmica, artesanato popular, entre muitas representações

populares dos nove estados que compõe o Nordeste brasileiro.

11 IPEA- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Perfil dos migrantes em São Paulo. Comunicado do

IPEA. São Paulo: Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, 06 de outubro de

2011. 12 Texto sobre o projeto da biblioteca e das atividades sobre cultura popular. “Participaram deste

movimento os escritores Jorge Mello,César Obeid, Moreira de Acopiara,os repentistas Adão Fernandes e

João Doto, Luzivam Matias e Sebastião Marinho, o Mestre em bonecos de Mamulengo Valdeck de

Garanhuns,dentre outros. Além de produzirem oficinas de xilogravura, cantoria pé de parede, oficinas de

cordel, desafios de repente, emboladas, os integrantes do Núcleo iniciaram, por meio de doações a

formação do acervo especializado em cordel e cultura popular. Realizaram também o Concurso de

Literatura de Cordel, que contou com participantes de norte a sul do país.” Jomar J. Santos –

Coordenador. Texto enviado em 19/05/2017 por email.

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Imagem 2: Biblioteca Belmonte

Fonte: Acervo da Biblioteca, 2017.

O bairro já faz parte do imaginário dos nordestinos da cidade, reduto de

comercio de Santo Amaro, fazendo parte da história de mobilidade e de transformação

dos espaços pelos migrantes. Dos territórios culturais compostos pelos nordestinos em

São Paulo tanto o CTN quanto a biblioteca Belmonte se sobressaem pela quantidade de

atrações, pelo público alcançado e pela diversidade de elos com a terra natal.

A biblioteca conta com acervo e atividades diversificadas para o público em

geral e foi criada:

(...) com a idéia de disseminar a cultura popular no bairro, este

coletivo criou em 2003, o Núcleo de Cultura Popular da Biblioteca

Belmonte. Participaram deste movimento os escritores Jorge

Mello,César Obeid, Moreira de Acopiara,os repentistas Adão

Fernandes e João Doto, Luzivam Matias e Sebastião Marinho, o

Mestre em bonecos de Mamulengo Valdeck de Garanhuns,dentre

outros. Além de produzirem oficinas de xilogravura, cantoria pé de

parede, oficinas de cordel, desafios de repente, emboladas, os

integrantes do Núcleo iniciaram, por meio de doações a formação do

acervo especializado em cordel e cultura popular. Realizaram

também o Concurso de Literatura de Cordel, que contou com

participantes de norte a sul do país. Em 2005, por conta de um

projeto do Sistema Municipal de Biblioteca de Criação de bibliotecas

temáticas, e respeitando a vocação natural do bairro e o destaque da

Biblioteca Belmonte, haja vista o sucesso do trabalho do Núcleo, a

mesma foi escolhida para ser temática em cultura popular. Em 4 de

agosto de 2007 foi inaugurada a Sala temática de Cultura popular, a

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Biblioteca Belmonte tornara-se a partir daí, a segunda biblioteca

temática da cidade. A primeira biblioteca temática em Cultura

popular do país.13

Na biblioteca além da concepção e organização do acervo, conta com

participantes do entorno, a fim de disseminar e manter a cultura popular como pano de

fundo, promovendo oficinas, concursos, cursos, atividades de sociabilidade e interação

com a comunidade de coparticipantes e de produtores de saberes da cultura nordestina,

como repentistas, cordelistas, mestre de bonecos mamulengos entre outros. Das ruas

comerciais e pontos de encontro dos nordestinos estão:

No largo da Concórdia, na cidade de São Paulo, concentram-se

muitas lojas de discos de músicas nordestinas, ponto de

encontro de produtores de canções e literatura de cordel;

armazéns de comidas e ingredientes vindos de todas as regiões

do Nordeste como carne de sol, manteiga de garrafa,

condimentos, pinga, pimenta, feijão de corda, rapadura, que se

misturam às selas, às sandálias de couro, ao gibão, às ervas, aos

remédios da terra, e outros signos nordestinos, expostos à

poluição da cidade. Nos últimos anos, muitas casas

“nordestinas”, tais como a Patativa, Danado de Bom, Remelexo

e Centro de Tradições Nordestinas, este coligado à Rádio Atual,

foram instaladas em São Paulo, lugares de lazer, e

entretenimento e culinária. 14

Tanto o Largo da Concórdia quanto o largo Treze de Maio encontram-se

símbolos e comércio dos produtos oriundos do Nordeste, acabam sendo transformados

em “lugares” dos sabores, saberes e sentidos na cidade.

Outro símbolo do nordestino na cidade é o CTN- Centro de Tradições

Nordestinas, que vem trazer uma relação singular enquanto território do lazer, cultura e

entretenimento para os nordestinos e seus descendentes além de ser um dos atrativos da

cidade.

O Centro de Tradições Nordestinas

13 Proposta do projeto enviada pelo senhor Jomar . Dados referem-se à concepção e aos espaços criados

na biblioteca. 14 GALHARDO, Soledad. Os conterrâneos nordestinos na metrópole de São Paulo: seus símbolos, sua

memória e seus mitos. Anais do III ENECULT – Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura,

realizado entre os dias 23 a 25 de maio de 2007, na Faculdade de Comunicação/UFBA, Salvador, Bahia.

Salvador, Bahia: UFBA, 2007, pp. 1-16.

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segue em frente,

É um pedaço do Nordeste

Que acolhe muita gente,

Na cidade de São Paulo

Capital tão imponente.15

A história do Centro faz parte da concepção de um empresário paulistano, José

de Abreu, que fundou em 1990 a primeira rádio, a Rádio Atual (AM1370 KHZ), a trazer

música nordestina para a cidade. A ideia era trazer músicas regionais e “ser a voz dos

nordestinos na capital e na grande São Paulo”. ABREU (2016).

Em maio de 1991 foi inaugurado o Centro de Tradições Nordestinas, CTN tendo

como princípio a mesma direção da rádio, ou seja, “reconhecer a cultura nordestina e

homenagear esse povo tão sofrido e discriminado que ajudou a construir São Paulo,

hoje a sétima maior cidade do mundo em população”, segundo Abreu (2006, p.18)

Com o intuito de trazer um pouco do Nordeste à cidade, algumas instituições

foram ao longo dos anos sendo expressões que garantiram elos com o popular e as

expressões vivas do sujeito histórico concebido como partícipe desse âmbito

geograficamente constituído no país. Com a relação de identidade e ao mesmo tempo

com a contrapartida de “inferiorização” apregoada na identificação desses

sujeitos/grupos na cidade, vão desenhando aspectos relevantes de suas marcas e

expressões, a fim de garantir o seu “lugar” na sociedade de acolhimento.

Imagens 3 e 4: Centro de Tradições Nordestinas em São Paulo

15 Um cordel para o CTN. p.10.

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Fonte: Foto de Elis Regina Barbosa Angelo, 2017.

Das propostas desse reconhecimento dos nordestinos na cidade, o CTN compôs-

se em princípio como lazer, a fim de trazer um pouco da cultura popular, da música, da

dança, da comida e da religiosidade simbolizada na imagem de padre Cícero Romão

Batista e de Frei Damião, como ícones do povo nordestino. Essas imagens de

religiosidade na imagem do padre Cícero e Frei Damião, fazem parte da relação de fé e

simbolismo religioso popular dos visitantes do centro. Os símbolos e as idéias referentes

ao Nordeste vão compondo os espaços de produção de sentidos que o território

reconstrói para atender às expectativas do público.

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12

O território, nesse caso compõe-se de memórias, de reinvenções de memórias e

mesmo de produção de uma memória imagética, contextualizada num passado

imaginário e de experiências familiares, passadas ou recriadas pelos sujeitos que visitam

e que almejam na visita ter um acolhimento de memórias passadas e de lugares que

contém essa possibilidade. Assim, tanto as imagens religiosas como o padre Cícero

quanto os objetos de memória do passado, como seu carro, documentos e ornamentos

pessoais, vão compondo o que se chama de “lugar de memória”. (NORA, 1993)

O padre Cícero e o Frei Damião formam laços com os conterrâneos, com os

visitantes, curiosos e mesmo com pessoas que tem na fé os santos emocionalmente

constituídos, haja vista ainda estar em processo a canonização de Cícero Romão Batista.

Como os nordestinos já evocaram-no enquanto santo, indiferente da religião católica e

da aprovação da Igreja, o sentido e os sentimentos vão se atrelando à imagem recriadas

nesse território.

Das atividades mais significativas para o âmbito social encontram-se celebrações

de casamentos coletivos; o projeto “Vila Social”, que desde 2013 oferece atividades,

reforço escolar e recreação para mais de 60 crianças entre 4 a 12 anos das comunidades

do entorno do CTN, zona norte de São Paulo; cursos profissionalizantes, CTN cidadão,

uma iniciativa que oferece bimestralmente profissionais para prevenção de doenças

como diabetes, pressão arterial, avaliação oftalmológica e odontológica, além de

serviços que buscam promover o bem estar de moradores das comunidades, como corte

de cabelo, e estética. Também bimestralmente promovem orientação jurídica e emissão

de documentos para cidadãos do entorno. Outras atividades realizadas pelo centro estão

doações de alimentos, leite, promoção de cursos profissionalizantes e demais atividades

de recreação e lazer.

Comemoram no dia 08 de outubro o dia do nordestino, com o intuito de celebrar

as raízes e tradições culturais, além de ser o dia de homenagens centenário do poeta

popular cearense, um dos mais representativos cordelistas, Antônio Gonçalves da Silva,

mais conhecido como Patativa do Assaré, foi um poeta popular, compositor, cantor e

improvisador brasileiro, que ao representar o cordel, dedicou sua vida e obra à produção

de cultura popular, especialmente entoando a história e saga do povo marginalizado e

oprimido do sertão nordestino.

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Das suas produções, da linguagem simples, poética e singular, obteve êxito

como compositor, improvisador e poeta, ao produzir por meio da literatura de cordel,

uma significativa memória literária sobre os nordestinos. Apesar da idéia de migrações

culturais, como abordado por Bhaba (1998, p.241) como forma de circulação de

símbolos e signos acerca de locais e contextos em sistema de valorização específicas,

como esses territórios e símbolos como o cordel, o arcabouço da tradição oral dessa

forma literária acaba por transmutar-se na contemporaneidade para a imagética, na qual

a estética se condensa na televisão e no cinema. (NEMER, 2007)

Comemorando seu aniversário em 08 de março, mês também de atividades

recreativas e homenagens de todo tipo ao cordel, diferenciadas atividades rememoram o

sentido da produção do cordel e a memória dos nordestinos em todo país, além das

demais atividades recreativas que seguem o calendário de eventos da cidade de São

Paulo.

2 Projetos de Interação: A República do Cordel e a “Nordestinidade paulista”

A relação de construção da tradição oral medieval no Brasil tem sua construção

com os primeiros colonizadores portugueses e, e foi introduzida na região do Nordeste

pela similaridade de sua concepção geográfica, assim, a oralidade disseminada pela

literatura de cordel em forma de rima e por meio de poemas passou geracionalmente

pela região sendo uma das mais significativas características populares.

Como rima, poema e informação, o cordel foi sendo uma forma de divulgação

das informações em meios ermos, traduzindo-se em forma de relação social e pessoal,

que tem expoente singular na figura do cordelista cearense Patativa do Assaré,

reconhecidamente musicado por Luiz Gonzaga, na leitura das relações difíceis da

população com o lugar.

Em A triste partida (1966), ao traduzir o sofrimento e a saída do povo em busca

de melhores condições durante a seca do Nordeste, representa os sentidos da migração

ao sudeste e outras relações coma s cidades e territórios onde se instalaram e

produziram novos sentidos sobre os mais variados estados e cidades que compõe essa

região do país.

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Essa representação da cultura oral é uma forma de resguardar a memória popular

nordestina de rimar temas do cotidiano, da história e das mazelas do povo promovidas

por feiras, ruas e lugares populares em forma de folhetos de cordel.16

Imagem 5: A Triste Partida de Patativa de Assaré

Fonte: Acervo da Associação Cultural Patativa de Assaré17

A triste partida

(...) Nós vamos a São Paulo

Que a coisa tá feia

Por terras alheia

Nós vamos vagar

Meu Deus, meu Deus

Se o nosso destino

Não for tão mesquinho

Cá e pro mesmo cantinho

Nós torna a voltar

Ai, ai, ai, ai(...)

16 “A memória do cordel é um importante instrumento da identidade cultural nordestina que eleva a

estima popular como parte da constituição de uma identidade nacional brasileira.” BRASILEIRO,

Osmando Jr. SILVEIRA, Regina da Costa da. Literatura e oralidade no cordel: identidade e Memória

cultural nordestina. Nau Literária: crítica e teoria de literaturas. Dossiê Voz e Interculturalidade Vol.

09, n. 01. jan/jun. de 2013. pp. 3-11. Porto Alegre: PPG-LET-UFRGS, 2013. p.02. 17 ASSOCIAÇÃO CULTURAL PATATIVA DO ASSARÉ. patativadoassare.com. A Triste Partida,

Patativa do Assaré. Disponível em: < http://patativadoassare.com/4884/>. Acesso em: 12/02/2017.

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(...) Chegaro em São Paulo – sem cobre, quebrado.

O pobre, acanhado,

Percura um patrão.

Só vê cara estranha, da mais feia gente,

Tudo é diferente

Do caro torrão.(...) 18

A literatura de cordel “disponibiliza o oral e o escrito como modalidades de

apresentação, sendo o romance, o conto, a cantiga, entre outros, como tipicamente orais

e o cordel, escrito”19, e, tendo sua história fundamentada nos meios populares, seja

porque o folheto de cordel era distribuído principalmente por aqueles que não sabiam

ler e escrever, e tendo na oralidade a possibilidade de compreensão, foi sendo um meio

de informação para as camadas mais pobres. Em a Triste Partida, a saga do migrante

arrebatada pelo imaginário de conseguir melhores condições de sobrevivência assola os

discursos produzidos durante o processo.

Na concepção dos signos e símbolos do Nordeste, encontra-se uma fortuita

discussão, do que é “nordestinidade”. Nessa composição de elementos simbólicos do

“nordestino” enquanto sujeito único, está a leitura de composições e recomposições dos

discursos produzidos ao “ser nordestino”, ou seja, ao pobre, ao humilde na saga por uma

vida melhor, representando, portanto a ficção e a cultura inculcada pela relativização

dos sentidos sobre o migrante e o que ele representa. Dessa forma, se percebe ainda que,

a representação do Nordeste é uma referência geograficamente construída de

estereotipadas imagens acerca de nordestinos como afirma Albuquerque Junior (2006).

Muitas críticas e tentativas teóricas de reversão dessa imagem vêm sendo

pensadas em políticas culturais reivindicatórias que possa repensar essa estereotipação

dos sujeitos e o que representam, e dessa forma revisando o conceito que seria essa

“nordestinidade” como menciona Albuquerque Júnior, “reforçando e reafirmando

mitologias em torno do espaço nordestino e de seus habitantes” e, ao mesmo tempo,

18 “A triste partida em cordel, toada de Patativa do Assaré. Gravada por Luiz Gonzaga em 30/11/1964, no

LP homônimo, lançado pela RCA Victor. “A triste partida” tem 19 estrofes, 152 versos e duração de oito

minutos e 53 segundos. Regravação: LP “O Homem da Terra”, RCA, 1980, com participação especial de

Gonzaguinha.“A triste partida” foi lançada originalmente em folheto de cordel com o título “Pau de arara

do Norte”, anos 1950. O folheto grafou na época Assaré como Açaré.” ASSOCIAÇÃO CULTURAL

PATATIVA DO ASSARÉ. patativadoassare.com. A Triste Partida, Patativa do Assaré. Disponível em:

< http://patativadoassare.com/4884/>. Acesso em: 12/02/2017. 19 ALBUQUERQUE, M. E. B. C. de. Literatura popular de cordel: dos ciclos temáticos à classificação

bibliográfica.Tese de Doutorado em Letras pela Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2011.p.23.

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propõe-se repensar essa “repetição regular de determinados enunciados que são tidos

como definidores do caráter da região e de seu povo, que falam de sua verdade mais

interior” (2006, p.24)

Muitos discursos contrários a esse estereótipo negativo têm demonstrado a

preocupação em desmontar o caráter simplificador, homogeneizante, cristalizador e

voraz de determinismos sobre o Nordeste e suas representações.

Apesar dessa relação, outras pesquisas revelam afirmativamente a

nordestinidade enquanto uma forma de identidade do povo enquanto enaltecimento, mas

esse relativizado pelo discurso interno não tem representatividade em todos os

ambientes e sociedades.

Outro autor que trata dessa relativização, em seu trabalho Estado, mídia e

identidade: políticas de cultura no Nordeste contemporâneo, Alexandre Barbalho (2004),

afirma que os signos entoados a essa região que, compartilhados por outro grupo acaba

criando sensação e sentimento de unicidade e declarando-lhe uma identidade.

Tanto para Albuquerque quanto para Barbalho, as relações de pertencimento ao

território e à região do Nordeste, e de sua representação do que é ‘ser’ nordestino, parte de

uma “invenção”, criada em meados de 1910, na qual a polarização de Norte e Sul se

constituída no país nesse momento. A crítica perpassa a concepção da uma narrativa

identitária que foi criada pelas produções culturais e artísticas no cinema, música, poesia,

jornal, televisão e mesmo no teatro que legitima um conceito de “nordestinidade” calcado

num regionalismo, produzindo um discurso que coloca-os num lugar de existência e

separação, intitulando e rotulando como uno. Nessa afirmação concebida de identidade

nordestina, percebe-se uma criação discursiva de unidade que se transforma, se renova, mas

é perpetuada no tempo, ou seja, uma forma de diferenciar os sujeitos e seus lugares.

Albuquerque Júnior (2001) ao produzir a crítica ao conceito e a concepção dessa

referência, reforça que, a concepção ideal de região é a formação da multiplicidade “que se

dá numa luta de forças que domina outros espaços regionais” (2001, p. 26), sendo maleável

e dinâmica.

Nessa esfera, a identidade passa a ser uma construção mental, na qual o território é

imagético e suas representações múltiplas e diversificadas. Os territórios no Nordeste são,

em sua essência, multifacetados, e desenraizados, como “uma condição de nossa época, a

expressão de um outro território” (ORTIZ, 1999, p. 69).

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Na contramão dessa crítica encontra-se uma preocupação latente dos discursos do

patrimônio, de representação e conservação do passado, e de afirmação identitária, que

corrobora com a memória e a ideia de revitalização, muitas vezes polarizada na dimensão

dos usos e abusos da patrimonialização como forma de mercantilizar esse passado.

No entanto, algumas ações e políticas vêm de encontro com essa tentativa de

manutenção cultural pelos discursos de identidade.

No Brasil, a tradição oral se apresenta de várias formas, contudo, a

literatura de cordel é a que mais tem resistido e é a maior detentora de

um cabedal de informações passadas na forma de expressões rimadas,

com características específicas, que instigam os cantadores a

memorizarem seus longos poemas. Essa tradição tem como um dos

seus mais importantes expoentes o cordelista cearense Patativa do

Assaré, autor do conhecido poema musicado por Luiz Gonzaga, A

triste partida (1966), em que conta as agruras do sofrimento causado

por conta da seca nordestina.20

Para compreender o uso e a tradição do cordel faz-se necessário percebe que seu

espaço de atuação é constitutivamente próprio, com seus próprios símbolos, e

concepções temporais, com características próprias, elaborando formas de interação

únicas em que o popular conversa de forma compreensível e acessível, pois, é

compreendida enquanto “a formação de um grande nicho de diversidade, tornando-a

mais complexa, o que não se pode dizer o mesmo da cultura de elite.”21

Na sua história, as praças e os lugares mais simples visitados e utilizados pela

população mais pobre, era circulado o cordel, sempre comercializado em bancas

verticais, onde a escolha do povo era a sua demanda por novos temas, foi ao longo dos

anos repercutindo e se afirmando em outros territórios, mesmo que, de forma incipiente,

mas sobreviveu às mudanças da sociedade contemporânea.

Em São Paulo, além dos lugares mais comuns onde se vive ainda o cordel, como

o CTN, a Biblioteca Belmonte e bares, restaurantes, lojas e demais espaço de

comercialização de produtos nordestinos como o Largo Treze de maio em Santo Amaro

20 BRASILEIRO, Osmando Jr. SILVEIRA, Regina da Costa da. Literatura e oralidade no cordel:

identidade e Memória cultural nordestina. Nau Literária: crítica e teoria de literaturas. Dossiê Voz e

Interculturalidade Vol. 09, n. 01. jan/jun. de 2013. pp. 3-11. Porto Alegre: PPG-LET-UFRGS, 2013.

p.01. 21 ALBUQUERQUE, M. E. B. C. de. Literatura popular de cordel: dos ciclos temáticos à classificação

bibliográfica. 2011. Tese de Doutorado em Letras pela Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa,

2011.p.19.

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e no próprio centro de São Paulo, a literatura ainda representa a história e a memória

dos nordestinos e sua inserção nessa nova realidade, que, apesar de já cristalizada, ainda

merece atenção, seja sobre a firmação do povo, seja para minimizar os impactos sociais

do preconceito tão rebuscado entre muitos indivíduos na sociedade.

Percebendo essa relação de apego à literatura de cordel e encontrando nesse

grupo a perspectiva de manter a memória viva, algumas entidades, instituições e

sujeitos começaram a pensar sobre os lugares de memória da literatura na cidade.

Nessa perspectiva, foi criado em 2017 um projeto de representação da literatura

de cordel nas praças, a começar pela “República do Cordel”. Sobre esse projeto, que ora

já se tornou realidade, o jornalista Marcelo Fraga, um dos seus protagonistas e

mentores, menciona:

A República do cordel é um movimento que nasceu em São Paulo

com a chegada do Marcelo Fraga (risos) com o cordel em São Paulo

onde a gente viu a necessidade de trazê-los de volta às praças, porque

os paulistas têm uma característica muito, né, de ficar sozinho,

isolado, aquela história, e depois como o cordel saiu de todo Brasil,

praticamente, pelo menos aqui no Sudeste, na época da ditadura das

praças, o que nós fizemos, nós voltamos, nós voltamos às praças,

agora nós já estamos em duas feiras, oficialmente já de artesanato, da

Praça da República e do Ibirapuera, e já com convite até da própria

prefeitura, pra que a gente tome conta das outras praças. Por

exemplo, também, e de outros espaços, como a avenida Paulista aos

domingos, né, onde existe a promoção. Então, são cordelistas, eu, os

cordelistas daqui é que estão fazendo esse movimento. E agora nós

estamos inclusive num grupo, né, fizemos um grupo, a República do

Cordel, e já estamos contatando cordelistas de outros estados pra

criar essa rede. Inclusive tem cordelistas chamando pra que esse

movimento se torne um movimento nacional: República Nacional do

Cordel, que seria o Brasil, entendeu? (FRAGA, 2018)

Essas redes vão sendo formas de interação e de renovação das identificações

com a memória do grupo. “Marcado pela oralidade, o patrimônio poético nordestino

tem suas marcas na escrita reveladas por formas que abrangem tanto a forma do cordel

escrito como suas apresentações orais.”22

Enquanto fonte de trabalho, oferecida pelos cordelistas, traz informações e

cultura, pois, relaciona-se com “(...) protesto, resistência, informação e lazer, são textos

22 Id. Ibid. p. 05

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que conferem vida às feiras nordestinas, seja animando-as com as cantorias dos

cordelistas, seja garantindo-lhes o ganha-pão.23

Imagens 6 e 7: República do Cordel

23 Id. Ibid. p. 07.

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20

Fonte: Foto de Elis Regina Barbosa Angelo, 2017.

Nessa proposta, os cordelistas da cidade tem o intuito de agruparem seus

trabalhos e promover a literatura. Desde a comercialização até o saber-fazer vão sendo

tratados e renovados na proposta de voltar à praça de onde começaram as idéias. Esse

retorno simboliza a rua, o popular e a acessibilidade a todos os grupos da sociedade,

especialmente os desprivilegiados.

O acesso e o reconhecimento da literatura de cordel na praça referenciam uma

retomada da cultura popular, ansiando por novos desafios da comunidade partícipe

desse processo, ou seja, dos próprios cordelistas e suas vozes numa cidade com o São

Paulo. Outros territórios existem no país e corroboram com essa manutenção da

memória, como é o caso da Academia Brasileira de Cordel, 24 presidida pelo Senhor

Gonçalo Ferreira, e mantida na cidade do Rio de Janeiro em Santa Teresa.

24 “Surgida no Nordeste, a literatura brasileira de cordel é repleta de características bem particulares,

que dialogam diretamente com os costumes juninos. Essencialmente popular, o estilo ficou marcado por

narrar histórias do cotidiano do nordestino e muitos autores importantes foram esquecidos pela falta de

registro de suas obras. Alguns deles, no entanto, conseguiram perpetuar suas obras e hoje são

considerados mestre do gênero. Conheça alguns deles: Apolônio Alves dos Santos. Autor do folheto

“Maria Cara de Pau e O Príncipe Gregoriano”, lançado em 1949, foi pedreiro e participou da

construção de Brasília antes de viver de sua poesia. Natural de Guarabira (PB), escreveu cerca de 120

folhetos, incluindo o célebre “Discussão do Carioca com o Pau-de-Arara”. Cego Aderaldo

O poeta popular, nascido em Crato, no Ceará, era inspiradíssimo pela vida no sertão nordestino. Ao

perder a visão em um acidente, descobriu que tinha talento para rimar, tornou-se cantor conhecido na

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No campo da educação, muitas são as ações que corroboram com a permanência

dessa cultura popular, pois, projetos de educação patrimonial e inclusiva, tendem a

trazer à sala de aula conteúdos ludicamente oferecidos pela rima.

As ações que buscam salvaguardar a memória do cordel vãs sendo ações de

garantia da produção, comercialização e história desse povo que encontrou nessa forma

de concepção literária, a sua manutenção cultural.

Na contramão estão as ações depredatórias de mercantilização e

patrimonialização de objetos, histórias e memórias, que, grosso modo vão diluindo as

relações humanas e suas histórias na esfera do consumo, que, ora barbarizadas pela

sociedade de consumo não são criadas pela necessidade de manter a tradição oral, mas a

conduta da diferenciação pelo valor a ela atribuído.

Da concepção de nordestinidade fica a preocupação em manter as identidades de

forma singular, como luta pela essência, pelos saberes e sua importância, não de

diferenciar pela unificação de sujeitos e territórios sobrepujados em discursos da

diferença.

Algumas Considerações

Os migrantes e a migração fazem parte do olhar sobre as cidades, das cidades

em si, na sua essência e em sua transformação ao longo dos anos. Do início, até o

período abordado, sobre a formação da Feira de São Cristóvão, e do Cento de Tradições

Nordestinas, muitos são as interpretações e os estudos sobre os contextos de formação

do território.

Esse território, formado a partir das relações sociais vividas entremeia os

sentidos e significados do que é “ser nordestino” tanto na cidade de São Paulo quanto

no Rio de Janeiro. Essa relação se estabelece em meio a preconceitos e estereótipos

região e ganhou até um monumento em sua homenagem, localizado em Quixadá, cidade cearense.

Firmino Teixeira do Amaral, Célebre poeta piauense, Amaral foi um dos principais autores da Editora

Guajarina e um dos criadores de um estilo peculiar da literatura de cordel, o trava-língua. Foi autor de

“Peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum”, letra que mais tarde foi gravada por Nara Leão

e João do Vale. João Martins de Athayde, foi o principal editor da literatura brasileira de cordel.

Nascido em 1880, em Cachoeira da Cebola, Paraíba, Athayde foi mascate e pai de 25 filhos e escreveu

suas próprias obras, como “Serrador e Carneiro”.”ADORO PAPEL. Conheça os mestres da literatura

de cordel. Arte e Cultura, Educação. Fonte: ABLC- Academia Brasileira de Literatura de Cordel.

26/06/2013. Disponível em: <http://adoropapel.com.br/2013/06/conheca-os-mestres-da-literatura-de-

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formados pela elitização de lugares, especulação imobiliária, favelização e outros meios

de separação pessoas pela classe, gênero e lugar.

Como ponto de partida, o conceito de cidade de Sodré (2002), amalgamando os

sujeitos e tudo que produzem como sensibilidades e formas de criar identificações,

orientam sobre a definição e conceituação dos territórios como reorganizações da vida

cotidiana com sentidos e sentimentos do passado. A feira e o centro apesar de

formações em estados distintos possuem elos e representações que coexistem nos dois

territórios. Estes, por sinal, muito tem a dizer sobre os seus visitantes, sobre os feirantes

e, especialmente, sobre os nordestinos que vivenciam, freqüentam e apreciam o que

esses representam em suas vidas cotidianas.

As mudanças e as permanências se configuram a partir dos sentidos dados nesse

novo lugar, onde se concentram as relações dinamizadas pela formação deste território,

local onde se mantém de certa forma uma relação mais estreita com a terra natal, com o

Nordeste dos antepassados, configurando uma imagem criada pela mídia, pelas

narrativas do passado ou, ainda, pelos anseios relacionados ao passado.

A referência de “ser nordestino” em cidades metropolitanas como Rio de Janeiro

e São Paulo vão delineando novos sujeitos que divergem e convergem em momentos

distintos para a conformação das identidades, muitas vezes forjadas pela necessidade de

afirmação do passado e negada pelas relações do presente. Apesar de serem distintas as

relações de criação e pertencimento, os territórios mantêm similaridades que definem a

apreciação ao “lugar” criado para si enquanto sujeito social carregados de estigmas e

referências culturais. Esses territórios vão configurando novas relações com as cidades.

O nordestino se (re)configura nesses territórios, muitos são os contrastes, mas as

vozes tentam definir o passado como ponto de partida de si, de seus anseios e de suas

angustias. O que parece certo é a direção de manter viva a memória dos sujeitos que

trouxeram para a cidade e para o bairro esse ar de “diferente” de “singular” e de

“plural”.

Os sujeitos e os lugares transformados em memórias carregam as identificações

da terra natal, do imaginário das pessoas e mesmo dos que vieram em busca de uma

nova vida. Os estereótipos existem, cabe a cada um redesenhar os conceitos de si e do

lugar para que este seja efetivamente um lugar de saudade, de identificação e de relação,

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onde cada indivíduo colabora para a formação e desmistificação da memória, de forma

coletiva.

Nos estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará a literatura

tem seu mais exponencial, onde era vendida em mercados e feiras pelos próprios

autores, mas com as migrações, outros Estados, como Rio de Janeiro, Minas Gerais e

São Paulo foram trazendo elementos populares singulares como referências do modo de

vida e de informação.

Como resultados, pode-se dizer que, além do cordel na perspectiva de

manutenção das identidades, acolhem-se outras expressões que demonstram os lugares

de onde vieram os nordestinos. A literatura de cordel dos estados trazem diferenças

significativas no entrave das discussões sobre os elementos formadores de memórias

acerca das imagens sagradas e consagradas pela perspectiva do patrimônio cultural.

Especialmente como estes lugares se fundamentam na missão de agregar e

manter as identidades, estão às singularidades do povo, que não expressam apenas uma

“nordestinidade”, mas múltiplos nordestes de signos e símbolos diferentes e múltiplos.

São Paulo tem, em projetos como a República do Cordel, a Biblioteca Belmonte

e o próprio CTN, uma (re)invenção, buscando não somente ressignificar o cordel, mas,

trazê-lo para o ambiente das praças e dos sujeitos que buscam manter viva essa

expressão do povo brasileiro.

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Depoentes

DIAS, Francisca Alda Hortência (CHIQUITA). Entrevista concedida a Elis Angelo em

10 de março de 2017, na Feira de São Cristóvão, Rio de Janeiro.

DIAS, Leonel Hortêncio. Entrevista concedida a Elis Ângelo em 10 de março de 2017,

na Feira de São Cristóvão, Rio de Janeiro.

FRAGA, Marcelo. Entrevista concedida a Elis Angelo em 20 de fevereiro de 2018 na

Galeria Olido em São Paulo.

FRAGA, Marcelo. Entrevista concedida a Elis Angelo em 25 de agosto de 2017, na

Praça da República em São Paulo.

MARABÁ da Feira – (Carlos Botelho). Entrevista concedida a Elis Angelo em 10 de

março de 2017, na Feira de São Cristóvão, Rio de Janeiro.

SANTOS, José Diniz dos (VICENTE). Entrevista concedida a Elis Angelo em 23 de

novembro de 2016, na Feira de São Cristóvão, Rio de Janeiro.

SEVERIANO, Maria do Socorro. Entrevista concedida a Elis Angelo em 10 de março

de 2016, na Feira de São Cristóvão, Rio de Janeiro.

SOARES, Antonia Lucinda. Entrevista concedida a Elis Angelo em 10 de março de

2017, na Feira de São Cristóvão, Rio de Janeiro.