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SEXO E TEMPERAMENTO MARGARET MEAD

SEXO E TEMPERAMENTO - · PDF fileSexo e temperamento, porém, vai mais longe na discussão sobre os papéis da biologia e da cultura na definição do comportamento em sociedade

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SEXO E TEMPERAMENTOMARGARET MEAD

• “Sexo e temperamento”, de uma das mais conhecidas antropólogas de todos os tempos, a americana Margaret Mead (1901-1978), sem dúvida é um dos mais bem documentados, dos mais significativos e dos mais importantes trabalhos já publicados sobre a relação entre biologia e sociedade.

• Mead, recém-formada em antropologia no Barnard College, consagrou-se bem jovem, aos 27 anos, com a publicação de um livro sobre a puberdade entre os nativos de Samoa, ilha do Pacífico. O livro argumentava que as complicações da adolescência, tão flagrantes no cotidiano dos Estados Unidos, não existiam entre os samoanos, em cuja sociedade os adultos eram tolerantes com as adolescentes, aceitando que elas desenvolvessem livremente, por exemplo, a sexualidade. O livro teve enorme impacto ao fazer as jovens americanas perceber em que uma sexualidade mais livre era possível e não traria os problemas com que os adultos repressores ameaçavam as adolescentes.

• . “Sexo e temperamento”, porém, vai mais longe na discussão sobre os papéis da biologia e da cultura na definição do comportamento em sociedade. Nele, Mead estuda três tribos da Nova Guiné (outra ilha do Pacífico, bem maior que Samoa): os Arapesh, os Mundugumor e os Tchambuli.

• Na tribo Arapesh, apesar do homem e da mulher realizarem funções diferentes, não existe distinção entre o seu comportamento, pois o objetivo principal é o apoio total no crescimento dos filhos. A menina Arapesh vai ainda criança morar com a família do marido, sendo ele o responsável por alimentá-la e cuidá-la para que cresça bem e saudável. Há um tabu acerca do crescimento da menina, que se for iniciada sexualmente antes pode ficar feia ou não crescer adequadamente. Depois do casamento, a preparação do casal é para o recebimento do filho, a maternidade é uma relação entre pai e mãe. Quando a criança nasce existem regras para os pais seguirem até o seu crescimento, por exemplo, não ter relação sexual entre si até a criança atingir, mais ou menos, os dois anos de idade.

• A segunda tribo é os Mundugumor, onde o comportamento feminino e masculino é violento. Para entender essa relação conflituosa, é preciso compreender a configuração do parentesco na tribo. O pai tem maior proximidade com as filhas, ele deseja ter muitas meninas, porque estas podem ser trocadas por outras esposas. O homem quanto mais esposas possuir é considerado rico, pois são elas responsáveis pela secagem do fumo, objeto de riqueza na sociedade estudada. A esposa, por sua vez, nunca deseja engravidar, porque se nasce uma mulher, a chance é que a casa receba outra matriarca, ao mesmo tempo, o pai não deseja a gravidez da esposa, pois se nasce um menino, este pode usar uma das irmãs como objeto de troca por esposas. Portanto, nesta sociedade os laços familiares e os comportamentos dos gêneros são baseados no confronto e na disputa.

• A última tribo apresentada no livro são os Tchambuli, em que o comportamento feminino e masculino é distinto. A mulher é quem pesca, detém a posição de poder na sociedade, controlando o lucro das relações de comércio, e tem a opção de escolher o parceiro para a união matrimonial. Enquanto os homens se preocupam com as atividades cerimoniais, cuidando dos ornamentos e das atividades artísticas, são os chefes da família, porém quem estipula as regras são as esposas.

• A antropóloga conclui: “Se aquelas atitudes temperamentais que tradicionalmente reputamos femininas – tais como passividade, suscetibilidade e disposição de acalentar crianças – podem tão facilmente ser construídas como padrão masculino numa tribo (no caso, os Tchambuli), e na outra ser prescritas para a maioria das mulheres, assim como para a maioria dos homens (no caso, os Arapesh), não nos resta mais a menor base para considerar tais aspectos de comportamento como ligados ao sexo biológico”.

• O que podemos dizer é que Mead expõe em “Sexo e temperamento” argumentos poderosos para reforçar a tese de que, mais do que a biologia, é a cultura que molda o comportamento das pessoas em sociedade. Mas, mais do que isso, podemos descobrir, na multifacetada sociedade globalizada que temos hoje, grupos e subgrupos em que ora predominam os homens, ora predominam as mulheres, ora mulheres e homens estão em pé de igualdade, ora se fomenta a agressividade, ora se fomenta a docilidade – em suma, temos na sociedade ocidental de hoje, e em muitas não ocidentais, todos os modelos estudados pela antropóloga americana. Ainda mais notável é o fato de que a antropóloga localiza, em cada sociedade que estudou os “inadaptados”, isto é, as pessoas que não se conformam com os papéis que lhes foram reservados, “o indivíduo para quem as ênfases mais importantes de sua sociedade parecem absurdas, irreais, insustentáveis ou completamente erradas”. Esses não tinham lugar em qualquer sociedade estudada por Mead e eram relegados a uma vida difícil, como não tinham lugar em qualquer outra sociedade jamais existente. Mas, cada vez mais, esses inadaptados estão encontrando o seu lugar na sociedade ocidental de hoje, composta, cada vez mais, de conglomerados de diferentes e numerosas tribos.