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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES Sonu Shamdasani 1 www.rubedo.psc.br | Artigos | © Sonu Shamdasani MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES1 Sonu Shamdasani vive em Londres e é o editor de From India to the Planet Mars, de Théodore Flournoy (Princeton University Press, 1994) e co-editor de Speculations after Freud: Psychoanalysis, Philosophy, Culture (Routledge). Tradução: Marta Chagas "Esse é um livro muito importante e intensamente original - penso que terá um enorme sucesso e tornar-se-á um clássico!" Richard Hull, 19602 Memórias, Sonhos, Reflexões é comumente visto como o trabalho mais importante de Jung, assim como o mais amplamente conhecido e lido. É tido como seu testamento final, pois, como observa Gerhard Adler, "Em nenhum outro lugar o homem Jung revelou-se tão abertamente ou atestou suas crises de decisão e a existência de sua lei interna" 3 . Desde a morte de Jung, ele tem sido a fonte principal sobre sua vida e tem feito brotar uma pletora de literaturas secundárias. Neste estudo, minha primeira omissão será a ampla maioria dessa literatura secundária, por razões que se tornarão mais claras. Espero mostrar que através de um processo que teve implicações perturbadoras para o entendimento de Jung e sua correta localização na história intelectual do século XX, Memórias Sonhos, Reflexões não é, de forma alguma, a autobiografia de Jung. A existência de Memórias, Sonhos, Reflexões retardou significativamente o trabalho erudito sobre Jung. Em seu prefácio para suas memórias biográficas, que foi umas das primeiras a aparecer, Barbara Hannah escreveu que " .... os filhos de Jung eram totalmente contrários a qualquer escrito biográfico sobre seu pai, visto que achavam que tudo o que era necessário foi dito em seu próprio Memórias, Sonhos, Reflexões."4 Quando as biografias de Jung vieram a ser escritas, sem exceção, todas elas basearam- se neste livro, não somente como fonte de informação, mas, também, como a estrutura narrativa fundamental da vida de Jung. Assim, Hannah escreve sobre Memórias que ele

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

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www.rubedo.psc.br | Artigos | © Sonu Shamdasani

MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES1

Sonu Shamdasani vive em Londres e é o editor de From India to the Planet Mars, de

Théodore Flournoy (Princeton University Press, 1994) e co-editor de Speculations after

Freud: Psychoanalysis, Philosophy, Culture (Routledge).

Tradução: Marta Chagas

"Esse é um livro muito importante e intensamente original

- penso que terá um enorme sucesso e tornar-se-á um clássico!"

Richard Hull, 19602

Memórias, Sonhos, Reflexões é comumente visto como o trabalho mais importante de

Jung, assim como o mais amplamente conhecido e lido. É tido como seu testamento final,

pois, como observa Gerhard Adler, "Em nenhum outro lugar o homem Jung revelou-se tão

abertamente ou atestou suas crises de decisão e a existência de sua lei interna"3. Desde

a morte de Jung, ele tem sido a fonte principal sobre sua vida e tem feito brotar uma

pletora de literaturas secundárias. Neste estudo, minha primeira omissão será a ampla

maioria dessa literatura secundária, por razões que se tornarão mais claras. Espero

mostrar que através de um processo que teve implicações perturbadoras para o

entendimento de Jung e sua correta localização na história intelectual do século XX,

Memórias Sonhos, Reflexões não é, de forma alguma, a autobiografia de Jung.

A existência de Memórias, Sonhos, Reflexões retardou significativamente o trabalho

erudito sobre Jung. Em seu prefácio para suas memórias biográficas, que foi umas das

primeiras a aparecer, Barbara Hannah escreveu que " .... os filhos de Jung eram

totalmente contrários a qualquer escrito biográfico sobre seu pai, visto que achavam que

tudo o que era necessário foi dito em seu próprio Memórias, Sonhos, Reflexões."4

Quando as biografias de Jung vieram a ser escritas, sem exceção, todas elas basearam-

se neste livro, não somente como fonte de informação, mas, também, como a estrutura

narrativa fundamental da vida de Jung. Assim, Hannah escreve sobre Memórias que ele

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"...sempre permanecerá o mais profundo e a fonte mais autêntica e profunda sobre

Jung."5 O entendimento de Jung ficou tão fortemente ligado a esse texto que é

improvável que tal compreensão possa modificar-se sem uma releitura radical o mesmo.

De início, a significância de uma autobiografia por Jung era imposta por sua própria da

natureza do empreendimento psicológico. Jung sustentou como um de seus

entendimentos centrais a noção de "equação pessoal". Ele escreve: " ... a crítica filosófica

ajudou-me ver que toda psicologia - a minha inclusive - tinha o caráter de uma confissão

subjetiva."6 Indiferente se alguém concorda com essa noção, ela é crucial para o

entendimento da psicologia de Jung, pois claramente indica como Jung entendeu sua

própria psicologia - e como desejava ser entendido.

À parte de um vislumbre atormentador, num seminário privado em 19257, contudo, Jung

não apresentou publicamente sua história de vida. De seu próprio entendimento da

significância da biografia de um teórico, essa lacuna apresenta, talvez, o maior

impedimento para uma compreensão de seu trabalho. Neste mesmo seminário, ele

francamente provê uma razão para essa lacuna:

Tudo isso é a imagem externa do desenvolvimento de meu

livro sobre os tipos. Eu poderia dizer, perfeitamente bem, que

essa é a maneira como o livro se produziu e colocar um ponto

final nisso. Mas há um outro lado, um avançar cometendo

erros, pensamentos impuros, etc., os quais são sempre muito

difíceis para um homem tornar públicos. Ele gostaria de dar a

vocês o produto acabado desse seu pensamento dirigido, e

fazer vocês entenderem que foi dessa forma que ele surgiu em

sua mente, livre de fraquezas. A atitude de um homem com

função pensamento, em relação a sua vida intelectual, é

bastante comparável a da mulher em relação a sua vida

erótica.

Se você perguntar a uma mulher sobre o homem com quem

ela se casou: "Como isso aconteceu?", ela dirá: "Eu o

encontrei e o amei, e isso é tudo." Ela esconderá, muito

cuidadosamente, todas as pequenas mesquinharias, as

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situações paralelas em que ela pode estar envolvida e ela

apresentará para você, uma situação perfeita impossível de

ser rivalizada. Sobre tudo, ela esconderá os erros eróticos que

cometeu ...

O mesmo acontece a um homem a respeito de seus livros. Ele

não quer mencionar as alianças secretas, os faux pas de sua

mente. Isso é o que torna mentirosas a maioria das

autobiografias. Da mesma forma que a sexualidade é, na

mulher, amplamente inconsciente, também é esse lado inferior

de seu pensamento, amplamente inconsciente, no homem. E

da mesma forma que uma mulher estabelece sua força de

poder em sua sexualidade, e não abrirá nenhum de seus

segredos do seu lado fraco, assim um homem centra seu

poder em seu pensamento e propõe mantê-lo como uma

fachada sólida contra o público, particularmente contra outros

homens. Ele acha que dizer a verdade nesse campo é o

equivalente de entregar as chaves da citadela ao inimigo.8

Nessa afirmação surpreendente, o que Jung vê como a quase impossibilidade de

honestidade, o que "torna mentirosas a maioria das autobiografias", prova ser a maior

contra-indicação para se ingressar nesse empreendimento. Claramente, Jung não teve a

menor intenção de 'entregar as chaves de sua citadela' a seus inimigos. Nos anos

seguintes a esse seminário, Jung consistentemente manteve a mesma posição. Em 1953,

Henri Flournoy, o filho do mentor de Jung, o psicólogo suíço Théodore Flournoy,

retransmitiu a Jung a pergunta do Dr. Junod, se ele havia escrito uma autobiografia ou se

pretendia fazê-lo9. Jung replicou:

Eu sempre desconfiei de uma autobiografia porque nunca

ninguém pode contar a verdade. Na medida em que se é

verdadeiro, ou acredita ser verídico, isso é uma ilusão, ou mau

gosto.10

Quando chegou Memórias, teria Jung, tardiamente, sucumbido a uma ilusão, ou a um

severo lapso no gosto? Em uma carta a seu amigo vitalício Gustave Steiner, Jung

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expressou sua contínua resistência a empreender uma autobiografia, a despeito de

pressão contínua:

Durante os últimos anos foi-me sugerido em diversas ocasiões,

fazer algo como uma autobiografia. Não tenho sido capaz de

conceber nada dessa espécie. Conheço muitas autobiografias,

suas auto-decepções e mentiras expedientes; sei muito sobre

a impossibilidade da auto-descrição para entregar-me a uma

tentativa a esse respeito.11

Jung não era menos enfático quanto à possibilidade de uma biografia sobre sua vida. Em

resposta a J. M. Thorburn, quem havia sugerido que Jung poderia encarregar-se de uma

biografia de sua vida, Jung afirma:

... Se eu fosse você, não me importaria com minha biografia.

Eu não quero escrever uma porque, além da falta de

motivação, não saberia como fazê-lo. Muito menos posso ver

como alguém poderia desfazer esse monstruoso nó górdio da

fatalidade, estupidez, aspirações e não sei mais o quê!

Qualquer um que tentasse tal aventura deveria analisar-me

muito mais do que eu me conheço, se quiser fazer um trabalho

verdadeiro sobre isso.12

Como, então, surgiu Memórias? Inicialmente, surgiu da sugestão de um editor

conceituado, Kurt Wolff. Até então, Jung tinha contrato exclusivo com a Routledge &

Kegan Paul e a Bollingen Foudation. Que um outro editor planejasse publicar a

"autobiografia" de Jung era um golpe , embora fosse o que Kurt Wolff se preparasse para

executar. Em um artigo intitulado " Como atrair autores", Wolff escreve:

Cada país no mundo tem estritas leis de tráfico de escravos

brancos. Os autores, por outro lado, são uma espécie

desprotegida e devem cuidar de si próprios. Eles podem ser

comprados e vendidos, como meninas no comércio de

escravas-brancas - só que no casos dos autores, isso não é

ilegal.13

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Para Richard Hull, tradutor de Jung, Kurt Wolff descreveu como:

.... por muitos anos ele tentou persuadir Jung a escrevê-la

[uma autobiografia], como Jung sempre recusou e como,

finalmente, ele [Kurt] chegou a feliz idéia de um "Eckerfrau"

para quem Jung poderia ditar de forma aleatória, a Eckerfrau

sendo Aniela Jaffé.14

Numa carta a Herbert Read, Kurt Wolff escreveu que, em última análise, teria sido Aniela

Jaffé quem persuadiu Jung a realizar essa tarefa15. Devido ao envolvimento com outro

editor, o livro não apareceria nos mesmos canais editoriais como o resto do trabalho de

Jung, o que teria conseqüências significantes para seu resultado.

Em sua introdução para Memórias, Aniela Jaffé escreve:

Nós começamos na primavera de 1957. Foi proposto que esse

livro fosse escrito não como uma "biografia", mas na forma de

uma "autobiografia", com o próprio Jung como narrador. Esse

plano determinou a forma do livro e minha primeira tarefa

consistiu, apenas, em fazer perguntas e anotar as respostas

de Jung.16

Quando o livro foi publicado, sua significância para a compreensão de Jung foi apontada

claramente por Henri Ellenberger. Ele escreve:

Poucas personalidades do mundo psiquiátrico e psicológico

tem sido tão mal compreendidas como Carl Gustav Jung... É

precisamente o interesse nessa sua Autobiografia que nos

permite unificar de modo plausível as imagens disparatadas,

que foram feitas até agora sobre a vida, a personalidade e o

trabalho do fundador da Psicologia Analítica.17

Entretanto, como argumentarei, sua própria plausibilidade não diminuiu as confusões

acerca do trabalho de Jung, mas elevou-as à proporções imprevisíveis.

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De início, muito foi falado sobre as omissões de Jung. Por um lado, Jung foi muito

criticado por não mencionar: seu vitalício caso extra-conjugal, com Toni Wolff; figuras, tais

como Eugen Bleuler e Pierre Janet; e a controvérsia sobre sua alegada colaboração com

os nazistas. Foi questionado que as omissões de Jung, para o psicólogo que fez da

questão da confissão subjetiva a pedra fundamental de sua psicologia, foram sinais de má

fé e desonestidade intelectual. Desastrosamente essa acusação continua a ser feita ao

movimento junguiano.

Por outro lado, essas mesmas omissões não foram apenas defendidas, mas lhes foram

dadas uma razão profunda. Aniela Jaffé escreve:

Nas memórias de Jung as personalia estão quase que

interiamente escassas, para o desapontamento de muitos

leitores ... Essa crítica e a acusação do desinteresse de Jung

para com relacionamentos eram irrelevantes. Seus olhos

estavam sempre voltados para o impessoal, para o arquétipo

oculto; o segundo plano, o qual estava disposto revelar

somente na medida em que dizia respeito a sua própria vida.

18

Alguns argumentaram que tais omissões eram justificadas porque Memórias inaugurou,

nada menos, que um novo capítulo na história da autobiografia e da auto-compreensão

ocidental - aquele da nova forma "interna" da moderna autobiografia psicológica, e que

Memórias é, historicamente, tão significativo como as Confissões de Santo Agostinho ou

as de Rousseau.19

Essa leitura, que pode ser, convenientemente, chamada de canonização de Jung, foi

ressaltada por Kathleen Raineem em sua recensão, "Um homem enviado", na qual ela

afirma simplesmente:

A vida de Jung, mesmo que fragmentadamente revelada,

convida a comparações não com autobiografias profanas, mas

com as vidas de Plotino e Swedenborg, as vidas de santos e

sábios, entrelaçadas com milagres.20

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Raine não foi a única a fazer comparação com a vida de santos. A mesma analogia foi

feita pelo psicólogo Hans Eysenck, embora com um ponto de vista caracteristicamente

diferente. Em sua recensão, ele escreve:

Acólitos escrevendo hagiografias são raramente afortunados o

bastante para ter a assistência do próprio santo em seus

esforços; Aniella Jaffé teve o privilégio da discussão extensa

com Jung ... Isso pode ser considerado como representando o

tipo de imagem que Jung gostaria de dar de si próprio.21

No prólogo de Memórias, Jung escreve: "Fui agora incubido ... de contar meu mito

pessoal [den Mythus meines Lebens]." Assim, o próprio texto foi tido como um exemplo

paradigmático do que um tal mito poderia ser. Desse modo, não foi somente tomado

como um relato definitivo da vida de Jung, mas, também, como a forma que uma vida

psicologicamente individuada deveria ter. Edward Edinger comenta:

... tal como a descoberta de Jung de sua própria ausência de

mito tinha paralelo com a condição de ausência de mitos da

sociedade moderna, então a descoberta de Jung de seu

próprio mito individual provará ser a primeira emergência de

nosso novo mito coletivo... quase todos os episódios

importantes da vida de Jung podem ser vistos como

paradigmáticos do novo modo de ser, que é a conseqüência

de viver com um novo mito.22

Em sua introdução ao livro, Aniella Jaffé afirma que sua gênese determinou sua forma

eventual. Portanto, algumas palavras são necessárias sobre Aniella Jaffé e sobre seu

relacionamento com Jung. Jaffé encontrou Jung pela primeira vez em 1937 e,

subseqüentemente, começou a fazer análise com ele. Vinte anos depois ela tornou-se

sua secretária. Era um trabalho bem adequado a ela, pois havia trabalhado como

secretária independente dos professores Gideon e von Tsharner.23 Em 1947 ela tornou-

se secretária do Instituto Jung em Zurique.

Em uma entrevista, ela recordou que, depois da morte da esposa, Jung não se sentia

disposto a responder sua correspondência e que ela respondeu muitas cartas em seu

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nome, lendo para ele suas respostas, as quais, às vezes, ele fazia poucas correções.24

Essa afirmação espantosa não deixa claro, precisamente, quantas cartas de Jung,

durante esse período, foram escritas dessa forma. As últimas cartas de Jung, que

compuseram a maioria do segundo volume de suas cartas selecionadas, que Aniella Jaffé

editou com Gerhard Adler, são comumente tidas como possuíndo suas mais sábias e

mais humanas afirmações. Quantas dessas foram, na verdade, trabalho de Aniella Jaffé?

Esse acordo mostra o nível inicial de confiança que Jung demonstrou por Jaffé,

permitindo-lhe "escrever em seu nome". Além do mais, isso nos ajuda a compreender

como Memórias foi composto. De início, Jung confiou em sua habilidade de "assumir seu

'Eu' " e representá-lo para o mundo externo.

Em sua introdução a Memórias, Aniella Jaffé afirma, "Jung leu todo o manuscrito desse

livro e aprovou-o."25 Portanto, é geralmente aceito que Jung foi o derradeiro responsável

por quaisquer omissões no texto. Entretanto, de início, havia rumores de outra ordem de

omissões. Essa pergunta foi feita a Jaffé numa entrevista com Suzanne Wagner, ocorrida

em 1977:

Wagner: Ouvi que existiram partes de sua autobiografia que

não foram permitidas de serem publicadas - idéias sobre

reincarnação, por exemplo.

Jaffé: Não, nós publicamos tudo que julguei que poderia ser

publicado. O que cortei foram partes do capítulo que ele

escreveu sobre a África. Era, simplesmente, muito longo.

Tomaria o livro inteiro. Mas, discuti isso com ele e ele ficou

muito satisfeito.26

A única omissão significante no texto pareceria ser um grande relato das viagens de Jung

à África, o que poderia ser um continente perdido da obra de Jung, que,

conseqüentemente, nunca emergiu. Seja como for, o que é crucial aqui é sua afirmação

de que Jung aprovou as mudanças que foram feitas.

Numa conversa, em 1988, com Michael Fordham, que foi a instigação de minha pesquisa,

ele falou de suas impressões a partir de um esboço inicial de Memórias que ele havia lido.

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Declarou que os capítulos do esboço eram muito diferentes e "mais exasperados" que os

da versão publicada. Eu, subseqüentemente, localizei um editorial datilografado em

Countway Library of Medecine , em Harvard; e não só encontrei capítulos inteiros que não

foram publicados - como um relato das viagens de Jung a Londres e Paris, e um capítulo

sobre William James - mas, também, correções significativas em quase todas as

páginas.27 Contactei, então, Aniella Jaffé sobre meu projeto de pesquisa. Ela informou-

me que nem todo o material, sobre o qual o livro foi baseado, entrou no texto publicado e

que ela planejou usar alguns materiais posteriormente, mas que a permissão foi negada

pelos herdeiros de Jung.28 Ela informou-me que as trasncrições das entrevistas estavam

na Library of Congress, a qual eu consultei subseqüentemente.29

Irei, primeiramente, lidar com traços principais dos textos. Embora o manuscrito de

Countway seja reconhecido como uma versão extensa do texto publicado, o mesmo não

se aplica às transcrições não-publicadas. A própria Jaffé lida com a diferença entre os

textos publicados e as entrevistas reais. Alguns sustentaram que como ela era a

secretária de Jung, sua tarefa na compilação de Memórias, simplesmente, teria sido a de

anotar o relato de Jung. Essa afirmação a enfureceu, levando-a a a revelar seu papel

ativo no trabalho. Em uma carta, Jaffé relatou que seria completamente ridículo afirmar,

como muitos o fizeram, que Jung meramente havia ditado para ela. Ela observou que

Jung falava de maneira semelhante à associação livre freudiana, sendo que tal modo de

falar não poderia ser publicado. Ela disse ter tido um trabalho imenso em desembaraçar

essas associações em uma narrativa coerente. Portanto, a visão de que o texto foi

simplesmente ditado representou um grande elogio a seu trabalho.30

Essa afirmação revela sua parte ativa no texto; sugere que a estrutura narrativa total do

livro que foi tomada, não somente, como a quinta essência da vida de Jung, mas como o

exemplo do novo mito de individuação que este último representou, foi amplamente uma

construção dela. Os próprios textos datilografados dão uma impressão completamente

diferente. Eles, freqüentemente, começam com Jaffé fazendo perguntas específicas e

Jung associando livremente em resposta, não seguindo nenhum padrão cronológico. Em

uma passagem do original datilografado de Countway que foi omitido, Jung disse que as

repetições freqüentes no texto eram um aspecto de seu modo de pensamento circular.

Ele descreveu seu método como um novo modo de peripatética.31 Isso sugere que em

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termos da estrutura narrativa, pelo menos, algo de importância central para o auto-

conhecimento de Jung caíram no vazio.

Na versão publicada, a escassez de qualquer menção sobre as figuras da vida de Jung é

tomada, por alguns, como a marca de sua individuação ou auto-realização e, por outros,

como um sintoma de seu afastamento quase-autístico do mundo, ou de um grau extremo

de narcisismo. Entretanto, nas páginas datilografas das entrevistas, há muitas passagens

de figuras, as mais variadas possíveis, como Adolf Hitler, Billy Graham, Eugen Bleuler e

Sabina Spielrein, para não mencionar uma longa passagem sobre a misteriosa e

sugestiva semelhança entre as irmãs de Jung e a de Goethe. Primeiramente, tomarei uma

dessas omissões como um exemplo.

Muitos esperaram, com a respiração suspensa, sobre o caso extra-conjugal vitalício de

Jung com Toni Wolff; sim, as transcrições continham material sobre esse caso. Laurens

van der Post justifica sua omissão dessa forma:

Ela [Toni Wolff] não é mencionada em Memórias de Jung e

compreende-se a omissão, em grande parte, porque o livro é

um registro somente da quinta-essência. As relações pessoais

de Jung não são, deliberadamente, parte disso.32

Van der Post provê o seguinte relato do papel de Toni Wolff em sua vida:

Ela era a única pessoa capaz de entender, a partir de sua

própria experiência e transfiguração, o que Jung estava

tomando sobre si. Nesse mundo do inconsciente, o qual ele

penetrou como homem, ela sempre suportou como mulher.

Graças à direção de Jung, ela re-emergiu, como uma

personalidade ampliada e reintegrada.33

Nesse sentido, ela desempenhou o papel de Beatriz na Vita Nuova de Dante, que era o

mito de Jung. Nas transcrições das entrevistas de Jaffé com Jung, ele disse que no

começo de sua [Wolff] análise, Toni Wolff tinha fantasias incrivelmente selvagens e

cósmicas, mas, porque ele estava tão preocupado com suas próprias fantasias, era

incapaz de cuidar delas.

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Jung disse que encarou o problema do que fazer com Toni Wolff, somente após o término

de sua [Wolff] análise, apesar de se sentir envolvido com ela. Um ano mais tarde, ele

sonhou que estavam juntos nos Alpes, num vale de rochas, onde ele ouviu elfos cantando

numa montanha, na qual ela desapareceu, o que o deixou temeroso. Depois disso, ele

entrou em contato com ela novamente, pois sabia que seria inevitável e porque se sentia

em perigo de vida. Em uma ocasião posterior, enquanto nadava, ele sentiu cãibra;

prometeu, então, que se isso cedesse e ele sobrevivesse, sucumbiria ao relacionamento -

no qual, somente então, ele embarcou. Ele disse que infectou-a com sua experiência, que

era medonha e terrível; ela foi tragada pela mesma e permaneceu igualmente impotente.

Ele disse que tornou-se seu centro e através de sua compreensão interna, ela encontrou

seu centro (dela). Contudo, ela necessitava muito que ele desempenhasse esse papel, o

que significou que ele não poderia ser ele mesmo e, então, ela se perdeu. Ele se sentiu

como se estivesse sendo rasgado e freqüentemente tinha que se esforçar muito para

manter-se coeso.

Nesse exemplo, pode-se, talvez, entender a omissão por razões de decoro, mas isso não

diz respeito, de forma alguma, às omissões seguintes. Para contextualizá-las, colocarei

algumas diferenças críticas entre a versão publicada e o manuscrito de Countway. Em

Memórias, a única seção que foi nomeada individualmente foi sobre Freud, deixando a

impressão de que as duas figuras mais importantes da vida de Jung foram Freud e Deus,

o que deixou comentadores disputando qual das duas vinha primeiro. Essa impressão é

reforçada nas edições americanas e inglesas, onde os apêndices sobre Théodore

Flournoy e Heinrich Zimmer, que apareciam na edição alemã, estão ausentes.34 Isso

reforça a leitura freudocêntrica sobre Jung, que até hoje tem sido a principal maneira

como Jung e o desenvolvimento da Psicologia Analítica foram compreendidos.

O manuscrito de Countway apresenta uma organização radicalmente diferente. Essa

versão mostra vários arranjos de capítulos que alteram consideravelmente a estrutura da

narrativa. A seção seguinte ao capítulo sobre Freud chama-se "Memórias. Flournoy -

James - Keyserling - Crichton Miller - Zimmer." Esse título está, então, riscado à mão e

mudado para "Théodore Flournoy e William James."35 Somente essas variações no

arranjo já mostram a contingência do arranjo em Memórias. Além disso, nesse arranjo, os

tributos a Flournoy e James se seguem diretamente à seção sobre Freud.

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No capítulo sobre Freud em Memórias, Jung diagnostica Freud como sofrendo de uma

neurose séria e afirma que seus seguidores não compreenderam o significado da neurose

de seu fundador. Para Jung, as afirmações universais feitas pela psicologia de Freud são

inválidas devido a sua neurose. O capítulo que imediatamente se segue, apresenta o

heróico "Confronto com o inconsciente" de Jung e suas descobertas dos arquétipos e,

através da descoberta de seu próprio mito, um meio para "o homem moderno encontrar

sua alma". Memórias, promove o mito da descida heróica e da auto-geração de Jung,

depois dele ter se libertado dos grilhões da psicologia freudiana (fundando uma psicologia

enjeitada, sem antecedentes, sem um modelo primeiro a ser seguido, somente "anti-

exemplos").

O manuscrito datilografado de Countway apresenta uma versão muito diferente. Nas

seções sobre Flournoy e James, que sucedem ao capítulo sobre Freud, o problema de

como poder-se-ia fundar uma psicologia não-neurótica, na qual Jung atesta que Freud

sucumbiu, já parece tendo sido respondida afirmativamente antes de Freud, por Flournoy

e James. Além disso, Jung mostra a positividade da relação com mentor, através da qual

nenhuma quebra foi necessária. Jung credita sua significância em sua ajuda a formular

suas críticas a Freud e fornecer pressupostos metodológicos para sua formulação de uma

psicologia pós-freudiana.36

No capítulo sobre James, Jung fornece um relato sobre seu contato e tenta demonstrar

seu débito intelectual para com James. Jung recorda que encontrou James em 1909 e lhe

fêz uma visita no ano seguinte. Disse que James foi uma das mais extraordinárias

pessoas que ele conheceu. Ele o achou aristocrático, a imagem de um cavalheiro,

embora sem ostentação e atrativos. Ele conversou com Jung sem se mostrar superior;

Jung achou que eles travaram uma relação excelente. Ele sentiu que era apenas com

Flournoy e James que poderia falar tão facilmente, que ele reverenciava a memória de

James e que era um modelo para ele. Achou-os ambos receptivos e cuidadosos com

suas dúvidas e dificuldades, o que ele nunca encontrou novamente. Ele prezava a

abertura e visão de James, a qual era, particularmente, marcante em sua pesquisa

psíquica, que discutiram em detalhes, da mesma forma que suas sessões com a médium

Sra. Piper. Ele viu o significado de longo alcance das pesquisas psíquicas como meio de

acesso à psicologia do inconsciente. Jung disse que tinha sido muito influenciado pelo

trabalho de James sobre a psicologia da religião, que também tornou-se para ele um

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modelo, em particular, pelo modo como conseguia aceitar e deixar intacta a religião, sem

forçá-las num preconceito teórico.

Essas duas omissões dizem respeito, em larga escala, à supressões de várias figuras

críticas na vida de Jung. A terceira omissão consiste, simplesmente, em um pequeno

detalhe, ainda que suas implicações para a compreensão da gênese do pensamento de

Jung seja, talvez, não menos significativo. Numa passagem em Memórias que atraiu

muita atenção, Jung descreve sua experiência de ouvir a voz de uma paciente falando

com ele, informando-o que suas atividades eram, de fato, arte e a qual ele batizou,

famosamente, como a voz da anima. Depois da publicação de Uma Secreta Simetria de

Aldo Carotenuto, presume-se, geralmente, que essa paciente não era outra senão Sabina

Spielrein.

O argumento mais extenso sobre isso ocorre em Um Método Muito Perigoso, de John

Kerr, onde forma uma parte crucial da tese de que as mais importantes influências

intelectual e emocional sobre Jung foram Freud e Spielrein. Kerr afirma: "A primeira

menção da 'anima' a ocorrer nos escritos de Jung veio em seu volume Tipos Psicológicos,

de 1920."37 (Entretanto, como notificado anteriormente pelos editores das obras

completas, Jung já tratou da anima em "A Estrutura do Inconsciente"38, de 1916 e Tipos

Psicológicos foi publicado realmente em 1921). Kerr afirma que Jung "imortalizou"

Spielrein sob o nome de anima, argumentando que os dois indícios, dados por Jung,

sobre a identidade da mulher - que ele se correspondia com ela e que rompeu coma

mesma entre 1918-19, apontam a Spielrein. Entretanto nas transcrições, onde ele

realmente chama Spielrein pelo nome, Jung simplesmente insinua que perdeu contato

com ela quando ela foi para a Rússia. Kerr afirma que: "Talvez a maior pista ... seja o

debate sobre ciência versus arte."39 Entretanto, para fazer com que essa última pista

aponte para Spielrein, Kerr afirma, sem nenhum suporte textual, que a voz teria dito

realmente, "Não é ciência. É poesia."40 A suposição de Kerr que a voz era de Spielrein

leva-o a "corrigir" o registro histórico de forma a apoiar sua reivindicação, formando um

argumento circular. Kerr também afirma que a pedra talhada por Jung, em Bollingen, de

um urso rolando uma bola, representa Spielrein e conclui que "a 'anima' de Jung, 'aquela

que deve ser obedecida', acabou sua carreira como uma freudiana"41, daí

substancializando sua leitura freudocêntrica da gênese da psicologia de Jung. Entretanto,

há razões para afirmar que a pedra talhada não representa Spielrein. Roger Payne diz

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

14

que "Franz [Jung] disse que o urso freqüentemente discutido, que 'põe a bola para rolar'

em seu entalhe de Bollingen era realmente Emma [Jung]."42

Nas transcrições, Jung acrescenta um pequeno, mas, decisivo detalhe - que a mulher em

questão era holandesa. A única holandesa no círculo de Jung à essa época era Maria

Moltzer.43 A proximidade de sua relação com Jung foi confirmada por Freud. Em 23 de

dezembro de 1912, em resposta à carta de Jung de 18 de dezembro, na qual afirma ter

sido analisado, e portanto não seria neurótico, diferente de Freud que não o foi,44 Freud

escreveu a Ferenczi: "O mestre quem o analisou somente poderia ser Fräulein Moltzer e

ele está tão tolo quanto orgulhoso, quanto ao trabalho de uma mulher com quem está

tendo um caso."45 A afirmação de Freud é comprovada por Jolande Jacobi, que afirma

em uma entrevista: "Ouvi de outras pessoas que, antes dele encontrar Toni Wolff, ele teve

um caso de amor lá, em Burgholzli, com uma jovem - qual era seu nome? Moltzer."46 Em

uma carta não publicada de 1º de agosto de 1918, Moltzer escreveu a Fanny Bowd itch

Katz, que foi sua paciente,

Sim, eu renunciei ao Clube. Eu não poderia mais viver naquela

atmosfera. Estou feliz por ter feito isso. Acho, que daqui a

algum tempo, quando realmente tornar-se algo, o Clube sentir-

se-á agradecido por eu ter feito isso. Minha renúncia teve

efeitos silenciosos. Silenciosos, pois parece que, isso pertence

ao meu caminho, eu não terei reconhecimento ou apreciação

abertamente pelo que fiz para o desenvolvimento do

movimento analítico como um todo. Eu sempre trabalhei no

escuro e sozinha. Esse é o meu destino e assim deve ser

esperado.47

Jung, em seguida, fez um agradecimento a ela, embutido em uma nota de rodapé, nos

Tipos Psicológicos, onde afirma: "O crédito por ter descoberto a existência desse tipo [o

intuitivo] pertence a Srta. M. Moltzer."48 Dado que Jung via a si próprio como sendo

desse tipo, tal confirmação está dada. Tomadas em conjunto, eu poderia supor que a voz

ter sido de Moltzer é, significativamente, mais forte do que ter sido de Spielrein.

No presente momento, não fica claro quem foi o responsável por essa omissão

específica.49 Entretanto, pode-se contrapor que se Jung aprovou as mudanças, como

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

15

Jaffé nos leva a acreditar, essas questões não seriam de grande importância. Um

esclarecimento crucial da atitude de Jung para com o texto foi emitido num memorandum

não publicado, escrito por Richard Hull, intitulado "Uma lembrança de Eventos

precedentes à Publicação da Autobiografia de Jung, como vistas por R. F. C. Hull". Hull

narra que, em fevereiro de 1960, Jaffé informou-o que Jung desejava vê-lo até o final do

mês. Hull escreve:

O velho homem apareceu ... disse que queria conversar e

falou solidamente por mais de uma hora sobre a autobiografia.

Eu concluí que havia controvérsias sobre a "autenticidade" do

texto. (Até esse momento, não o tinha vista ainda) Ele afirmou,

com a maior ênfase, que tinha dito o que queria dizer em sua

própria maneira - um pouco rude e cru algumas vezes - e que

ele não queria que seu trabalho fosse tantifiziert ("titiazado" ou

"velhificado" [N.T.: os termos em inglês são: 'auntified' e

'oldmaidified' que parecem significar uma modificação tal qual

fosse feita por uma tia ou por uma velha dama] na feliz

expressão de Jack). "Você verá o que quero dizer quando

apanhar o texto", ele disse. Falou extensamente sobre a

prática de "ghost-writing" pelo editores americanos. Inferi que o

"Tantifierung" poderia ser feito por Kurt. Em seguida, perguntei

a Jung se poderia ter a autorização de "des-velhificar" o texto

entregue, a mim, por Kurt. "Em todo caso", ele disse, "os

canhões entrarão em ação", apontando-se a si próprio. Achei

tudo isso um tanto complicado, porque Kurt tinha dito

anteriormente que, especialmente nos três primeiros capítulos,

o impacto encontrava-se precisamente no tom altamente

pessoal e falado de maneira não-ortodóxica, que deveria ser

preservado a todo custo.50

Hull, então, leu o texto e começou a rever a tradução. Ele recorda:

Tornou-se claro que as alterações eram todas de um tipo que

abrandavam e "velhificavam" o texto original escrito por Jung.

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

16

Como algumas passagens excluídas pareciam-me

extremamente importantes para uma compreensão adequada

da narrativa subseqüente, restaurei-as da versão de Winston,

junto com um número de referências críticas a família de Jung

e alguns comentários que não poderiam chocar a ninguém,

exceto à burguesia suíça, incluindo um uso altamente

dramático da palavra "merda". Suspeitei que a "tia" foi

encontrada não no Hotel Esplanade em Locarno, mas perto da

casa em Kusnacht, e que era Aniela Jaffé.51

Parece que antes de que Jung, o "canhão", pudesse entrar em ação, ele morreu. Depois

de sua morte, Hull associou-se diretamente a Jaffé. Com referência à exclusão proposta,

ele escreve:

Poderia chamar de exclusão - e escolhi minha palavra

cuidadosamente - censura, uma coisa que Jung teria

desgostado e detestado... Quatro vezes você disse não ser

capaz de ser objetiva. Em um caso de vital importância, cara

sra. Jaffé, é seu dever recuperar sua objetividade: foi em suas

mãos e de ninguém mais que Jung confiou a responsabilidade

pela versão final de seu testemunho de vida... Você imagina

que se a Pantheon fosse obrigada a lançar uma edição

expurgada, toda essa evidência explosiva iria acabar

inutilmente? ... Todos meus argumentos enfraquecem e

diminuem em comparação a um pensamento dominante: por

que o velho homem se deu ao trabalho de vir me ver e falar tão

ardentemente sobre o livro, e por que ele o confiou às suas

mãos? Devo deixá-la encontrar a resposta.52

Entretanto, o próprio Hull foi reticente o quanto ele estaria disposto em "des-tititizar" o

texto. Em uma seção, Jung diagnosticou sua mãe como histérica. Isso foi omitido. Em

uma carta a Gerald Gross, Hull escreve:

Aniela escreveu que a Sra. Niehus insitiria em sua remoção. E

esta era a condição da Sra. N. para a confiança final de Aniela

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

17

... Sentiu que seria um disparate antagonizá-la para lutar pela

palavra "histérica"; para ser franco, não estou disposto a

arriscar minhas relações com ela, em prol de um futuro

trabalho, por sua causa. Sugeri, por isso, a palavra "nervosa"

como um compromisso, e Aniela, gratamente, aceitou-a. Ao

mesmo tempo assinalei, novamente, que essa pequena

censura familiar provavelmente apareceria no final...53

O significado dessas mudanças é que elas dizem respeito ao manuscrito de seções de

Memórias que Jung realmente escreveu - e que foram a base de um caminho sem fim de

psicobiografias.

A questão final é aquela de relacionar o livro como uma autobiografia de Jung. Hull

esclarece o significado dessa questão:

... Há toda diferença do mundo entre um livro chamado "A

Autobiografia de C. G. Jung" e um livro de memórias de Jung,

editado por Aniela Jaffé (de quem poucos ouviram falar). Um é

automaticamente bestseller, o outro não.54

Como poder-se-ia esperar, a editora inglesa de Jung, a Routledge, claramente quis

publicar o livro. Em uma carta de 18 de dezembro de 1959, Cecil Franklin escreveu para

Jung:

Creio que a história desse livro é que ele começou como um

trabalho de Aniela Jaffé, que ela poderia ter escrito com sua

ajuda próxima; mas ele cresceu para além disso e tornou-se,

de fato, sua autobiografia ... Examinamos nosso acordo de

1947 e achamos que se isso é sua autobiografia ... os direitos

de publicação seriam nossos ... Nós aguardamos para quando

possamos publicar sua autobiografia... Iria preocupar-nos

muito e poderia abalar nossa reputação sermos considerados

os editores somente de seus livros estritamente técnicos...55

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

18

Entretanto, Jung nunca viu o livro como sua autobiografia. Em 5 de abril de 1960,

escreveu para Walter Niehus-Jung, seu genro e testamenteiro literário:

Quero agradecê-lo por seus esforços em nome de minha então

chamada "Autobiografia" e confirmar uma vez mais que não

considero esse livro como meu empreendimento, mas

expressamente como um livro que Frau A. Jaffé escreveu... O

livro poderia ser publicado com seu nome e não com o meu,

uma vez que ele não representa uma autobiografia composta

por mim.56

Em 25 de maio de 1960, Herbert Read escreveu a John Barret sobre o livro:

Agora parece que ele terá um título como:

Aniela Jaffé

"Reminiscências, Sonhos, Pensamentos"

Com contribuição de C. G. Jung.57

Seguindo essas negociações, uma resolução da Comitê Editorial das Obras Completas

de Jung foi redigida, permitindo que o livro fosse publicado fora dos contratos exclusivos

com a Bollingen Foundation e a Routledge & Kegan Paul. Ela contém a seguinte

afirmação:

C. G. Jung sempre afirmou que não considerava esse livro

como um empreendimento próprio, mas expressamente como

um livro escrito pela Sra. Jaffé. Os capítulos escritos por Jung

eram para ser considerados como sua contribuição ao trabalho

da sra. Jaffé. O livro seria publicado em nome da sra. Jaffé e

não no nome de C. G. Jung, por que ele não representava uma

autobiografia composta por C. G. Jung (carta de C. G. Jung a

Walter Niehus datada de 5 de abril de 1960).

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19

Em uma conversa realizada em 26 de agosto entre Prof. C. G.

Jung, sr. John Barret, srta. Vaun Gillmor, sr. Herbert Read, sr e

sra. W. Niehus-Jung e sra. Aniela Jaffé, C. G. Jung confirmou

novamente que ele considerava estritamente esse livro como

um empreendimento da sra. A. Jaffé, ao qual ele somente deu

algumas contribuições... O Comitê Editorial decide pelo

presente formalmente que não aprovará qualquer decisão do

Subcomitê Executivo que gostaria de adicionar o livro da sra.

A. Jaffé às Obras Completas.58

Daí, parece que era precondição para a realização contratual do livro que o mesmo

aparecesse como uma biografia de Jung, feita por Aniela Jaffé e não como a autobiografia

de Jung. Em julho de 1960, Kurt Wolff demitiu-se da Pantheon, a qual foi comprada

imediatamente pela Random House. Em 6 de junho de 1961 Jung morreu. No ano

seguinte, extratos de Memórias apareceram em Die Weltwoche e na Atlantic Monthly. O

primeiro extrato em Die Weltwoche era intitulado simplesmente "A autobiografia de C. G.

Jung". O livro mesmo apareceu em 1962, em alemão e inglês. Em outubro desse ano,

Kurt Wolff morreu num acidente de carro. Uma edição francesa apareceu em 1966

intitulada, Minha Vida: Memórias, Sonho e Pensamentos.59

O que era, realmente, uma biografia extraordinária, foi lida, erroneamente, como uma

autobiografia. Desafortunadamente, parece que quando ativeram-se ao significado da

confissão da "equação pessoal" de Jung, seus esforços estavam em parte direcionados

para determinar a forma que ela deveria ter, quais memórias e sonhos omitir - modelando

Jung em seus próprios gostos, fazendo-o o portador de seus "mitos pessoais". Agora

poderia ser o tempo de des-titiazar?

1 Agradeço a Michael Whan por esse título.

2 Richard Hull para John Barret, 4 de maio de 1960, Bollingen Archive, Library of

Congress. A carta de Hull foi citada com a permissão da sra. Birte-Lena Hull.

3Gerhard Adler, "The Memoirs of C. G. Jung", The Listener, 18 de julho de 1963, 85.

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

20

4 Barbara Hannah, Jung: His Life and Work, A Biographical Memoir (London: Michael

Joseph, 1976), 7.

5 Ibid., 8.

6 Jung, "Freud and Jung: Contrasts", CW 4, 336.

7 Jung, Analytical Psychology: Notes of the Seminar gives im 1925, CW volume

suplementar.

8 Ibid., 32-3

9 Henri Flournoy para Jung, 8 de fevereiro de 1953, Jung Archives, E. T. H., Zürich.

10 Jung para Henri Flournoy, C. G. Jung Letters, vol.2: 1951-61, ed. Gerhard Adler e

Aniela Jaffé (London: Routledge & Kegan Paul, 1976), 106, tradução modificada. Em uma

nota dedicada a uma coleção de seus trabalhos não publicados por Jürg Fierz, Jung

simplesmente escreveu: "Eu próprio tenho aversão por autobiografia". 21 de dezembro de

1945, C. G. Jung Letters, vol. 1: 1906-50 (London: Routledge &Kegan Paul, 1973, 404.

11 Jung para Gustave Steiner, 30 de dezembro de 1957, C. G. Jung Letters, vol. 2, 406,

tradução modificada

12 Jung para J. M. Thorburn, 6 de fevereiro de 1952, C. G. Jung Letters, vol. 2: 1951-61,

38-39.

13 Kurt Wolff, "On Luring Away Authors, or How Authors and Publishers Part Company",

Kurt Wolff: A Portrait in Essays and Letters, ed. M. Ermarth (Chicago, University of

Chicago Press, 1991), 21.

14 Richard Hull, "A record of events precending the publication of Jung's auto-biography,

as seen by R. F. C. Hull", 27 de julho de 1960, Bollingen Archive, Library of Congress.

Citado com permissão da sra. Birte-Lena Hull. Em sua introdução para Memórias, Aniela

Jaffé afirma que foi Jolande Jacobi quem sugeriu esse papel para ela. A analogia

Eckermann-Goethe não estava perdida em Jung; em uma carta para Kurt Wolff, ele

escreveu, "Que Deus me ajude, quando li Conversações de Eckermann até Goethe

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pareceu-me um empertigado peru" Jung para Kurt Wolff, 1º de fevereiro de 1958, C. G.

Jung Letters, vol. 2, 453.

15 Kurt Wolff para Herbert Read, 27 de outubro de 1959, Bollingen Archive, Library of

Congress.

16 C. G. Jung, Memories, Dreams, Reflections (London: Flamingo, 1983), 7.

17 Henri Ellenberger, "La Psychologie de Carl Gustav Jung: à propos de son

autobiographie", L'Union Médicale du Canada, vol. 93, agosto de 1964, 993, tradução

minha.

18 Aniela Jaffé, From the Life and Work of C. G. Jung (Einsiedeln: Daimon 1989), 133.

19 O primeiro a fazer essas analogias foi Arthur Calder-Marshall em seu estudo, "Jung:

the Saint of Psychology", Time and Tide, 11-17 de julho de 1963, em que ele afirma: Esse

volume ... está destinado a ser um clássico como Confessions de Rousseau". 24.

20 Kathleen Raine, "A Sent Man", The Listener, 22 de agosto de 1962, 284.

21 Hans Eysenck, "Patriarch of the Psyche", The Spectador, 19 de julho 1963, 86.

22 Edward Edinger, The Creation of Counsciousness: Jung's Myth for Modern Man

(Toronto: Inner City Books, 1984), 12-13.

23 Aniela Jaffé, "Interview with Gene Nameche", Jung Oral History Archive, Countway

Library of Medecine, Harvard Medical Library, Boston, 11.

24 Ibid.

25 Jung, Memories, Dreams, Reflections, 9.

26 Suzanne Wagner, "Remembering Jung: Through the Eyes of Aniela Jaffé",

Psychological Perspectives, vol. 26, 1992, 109.

27 Dr. Richard Wolff, a quem gostaria de agradecer por facilitar minha pesquisa, informou-

me que um dos editores, envolvidos na publicação, vendeu-o a um livreiro. Foi, então,

comprado pelo Dr. James Cheatham e doado a Harvard Medical Library em maio de

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

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1979. Possuía correções feitas por várias mãos, algumas das quais foram identificadas

por Alan Elms: Gerald Gross, Aniela Jaffé (através de Richard Winston), Richard Hull,

Wolfgang Sauerlander, Richard Winston, junto com notas rotuladas "CGJ", mas não pela

caligrafia de Jung.

28 Aniela Jaffé para o autor, carta datada de janeiro de 1991. Todas as afirmações de

suas cartas e dos manuscritos, esboços e transcrições foram dados em paráfrase, pois a

permissão para citá-las não foi concedida pelo testamentário literário de Jaffé.

29 As transcrições, junto a alguma correspondência sobre seu destino, foram restringidas

oficialmente até 1993. Agradeço a William McGuire e a Princenton University Press por

me permitirem consultá-las durante a Páscoa de 1991.

30 Aniela Jaffé para William McGuire, 1981, Bollingen Archive, Library of Congress

31 Countway ms., 1.

32 Laurens van der Post, Jung and the Story of Our Time (London: Penguin, 1976), 172.

33 Ibd., 176.

34 Tributo de Jung a Flournoy foi publicado em inglês em Theodore Flournoy, From India

to the Planet Mars: A Case of Multiple Personality with Imaginary Languages, ed. Sonu

Shamdasani (Princenton: Princenton UP, 1994). O tributo de Jung para Flournoy e

Zimmer também foi publicado na edição francesa de Memórias.

35 Countway ms., 197.

36 Quanto à relação de Jung com William James ver Eugene Taylor, "William James and

Jung", Spring, 1980. Quanto a uma crítica complementar da leitura freudocêntrica de

Jung, ver seu "Jung in His Intellectual Setting: The Swedenborgian Connection", Studia

Swedenborgiana, vol. 7, 1991.

37 John Kerr, A Most Dangerous Method: The Story of Jung, Freud and Sabina Spielrein

(New York: Knopf, 1993), 503. É curioso que Kerr não se deteve na história do caso de

Spielrein, apesar do fato de já ser de domínio público desde 1992 em "Sabina Spielrein:

Jung Patietin am Burghoelzli" de Bernard Minder (dissertação de doutorado, University of

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

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Bern, 1992). Agradeço a Hans Israëls por alertar-me para isso e fornecer-me uma cópia.

Desnecessário dizer que esse material, junto à correspondência entre Bleuler, Jung e a

família de Spielrein, que Minder recuperou, ocasionou uma completa reavaliação do

relacionamento de Jung-Spielrein. O rascunho da carta de referência de Jung para Freud

sobre Spielrein em 1905 que Minder recuperou (Jung an Freud 1905: Ein Bericht über

Sabina Spielrein, Gesnarus, vol. 50, 1993), confirma a recosntrução de Peter Swales em

"What Jung Didn't Say", Harvest: Journal for Junguian Studies, vol. 38.

38 CW 7, 295,n. 21

39 Op. Cit., 506.

40 Cit., 507.

41 Ibid.

42 Roger Payne, "A Visit to 228 Seestrasse", Harvest, vol. 39, 1993, 137

43 William McGuire forneceu as seguintes informações biográficas sobre Moltzer: "Mary

ou Maria Moltzer (1874 - 1944), filha de um destilador holandês, tornou-se enfermeira

como um protesto contra o abuso do álcool. Fez análise didática com Jung e depois de

1913 continuou como psicóloga analítica". The Freud/Jung Letters, ed. William McGuire

(London: Hogarth/Routledge, 1974), 351-2. Para o papel de Moltzer como assistente de

Jung, ver Eugene Taylor, "C. G. Jung and the Boston Psychopathologists, 1902-12",

Voices, vol. 21, 1985.

44 Ibid., 535

45 The Correspondence of Sigmund Freud and Sándor Ferenczi, eds. E. Brabant, E.

Falzeder & P. Giampiere-Deutsch, vol, 1, 1908-14 (Cambridge: Harvard UP, 1993), 446.

46 Jolande Jacobi, entrevista com Gene Nameche, Jung Oral History Archive, box 3, 110,

Countway Library of Medecine, Harvard Medical Library, Boston.

47 Maria Moltzer para Fanny Bowditch Katz, 1º de agosto de 1918, Countway Library of

Medecine, Harvard Medical Library, Boston, citada com permissão

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MEMÓRIAS, SONHOS, OMISSÕES – Sonu Shamdasani

24

48 CW 6, 454.

49 Esse tema foi excelentemente explorado em Alan Elms, "The Auntification of Jung", em

One Life at a Time: Explorations in Psychobiography (forthcoming, Oxford UP), que

complementa a discussão aqui.

50 Hull, "A record of events", 1-2.

51 Ibid., 2.

52 Richard Hull para Aniela Jaffé, 9 de setembro de 1961, Bollingen Archive, Library of

Congress.

53 Richard Hull para Gerald Gross, Bollingen Archive, Library of Congress.

54 Hull, "A record of events", 4.

55 Cecil Franklin para C. G. Jung, 19 de dezembro de 1959, Bollingen Archive, Library of

Congress.

56 Jung para Walther Niehus-Jung, 5 de abril de 1960, C. G. Jung Letters, vol. 2, 550,

tradução modificada.

57 Herbert Read para John Barrett, 25 de maio de 1960, Bollingen Archive, Library of

Congress.

58 "Resolution of Editorial Commitee for 'The Collected Works' of Prof. C. G. Jung",

Bollingen Archive, Library of Congress, assinada por Jung em 29 de novembro de 1960 e

por John Barrett em 13 de dezembro de 1960.

59 "Die Autobiographie von C. G. Jung" Die Weltwoche, 31 de agosto de 1962. O título

alemão difere do inglês: Erinnernungen, Träume, Gedanken von C. G. Jung,

aufgezeichnet und herausgegeben von [recolhida e editada por] Aniela Jaffé (Olten:

Walter Verlag, 1988). Outros ítens na edição alemã que desapareceram nas edições

inglesas foram uma carta de Jung a um "jovem estudante", o posfácio de seu Livro

Vermelho, e "Detalhes sobre a Família de C. G. Jung" por Aniela Jaffé. O último ítem foi

publicado em inglês na Spring 1984. Há muitas discrepâncias entre a edição alemã e a

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inglesa, notadamente numerosas passagens da primeira que desapareceram na edição

inglesa. Algumas, mas não quer dizer todas, foram publicadas em inglês por Shoji

Muramoto, "Completing the Memories: The Passages Omitted or Transposed in The

English and Japanese Versions of Jung's Autobiography", Spring, 1987. Entretanto, uma

vez que o texto foi traduzido para o inglês como foi compilado, não é possível considerar

uma ou outra como a versão original. A edição francesa era Ma vie. Souvenirs, rêves,

pensées, recueilles et publiés par [recolhidos e publicados por] Aniela Jaffé (Paris:

Gallimard, 1966), traduit par [traduzido por] Roland Cahen et Yves Le Lay. Detalhes sobre

Kurt Wolff vieram de William McGuire, Bollingen: An Adventure in Collecting the Past

(Princeton: Princeton UP, 1982), 273-4. Agradeço a Charles Boer por chamar minha

atenção para isso.