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Sistemas complexos Prof. Jorge H. C. Fernandes ([email protected]) Carga horária:15 horas/aula Brasília Versão 1.2 – Novembro de 2008

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Prof. Jorge H. C. Fernandes ([email protected])

Carga horária:15 horas/aula

Brasília Versão 1.2 – Novembro de 2008

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Sistemas Complexos

1. Conceitos Gerais sobre Sistemas.............................................................................................................................................................6

1.1. O que é um sistema? ..........................................................................................................................................................................6 1.2. Exemplos de sistemas ........................................................................................................................................................................8

2. Esquemas de Classificação e Modelagem...........................................................................................................................................9 2.1. Esquemas de Classificação Universais .........................................................................................................................................9 2.2. Esquemas de Classificação Arbitrários ......................................................................................................................................12 2.3. Abstração e Criação de Modelos .................................................................................................................................................12 2.4. Esquema de Classificação de Ackoff...........................................................................................................................................14

2.5. Exemplos de análises de sistemas.........................................................................................................................................16 3. Teorias e Modelos de Sistemas..............................................................................................................................................................17

3.1. Sistêmica e Sistemas Abertos........................................................................................................................................................17 3.2. Cibernética e Sistemas de Controle............................................................................................................................................18 3.3. Ciência da Computação e Sistemas de Computador Programável ...............................................................................20 3.4. A Engenharia e os Sistemas Tecnológicos, Máquinas e Linguagens.............................................................................26 3.5. Lingüística e Sistemas de Linguagens .......................................................................................................................................30 3.6. Sistemas de Armazenamento e Recuperação da Informação..........................................................................................32 3.7. Comunicação e Sistemas de Comunicação.............................................................................................................................32

3.7.1. Comunicação .............................................................................................................................................................................32 3.7.2. Sistema de Comunicação......................................................................................................................................................33 3.7.3. Um Sistema de Comunicação é organizado em Camadas.......................................................................................34 3.7.2. Protocolos de Comunicação ................................................................................................................................................35 3.7.3. Sistemas de Comunicação de Massa ................................................................................................................................37

3.8. Psicologia e Sistemas Cognitivos.................................................................................................................................................37 3.9. Sistemas de Software .......................................................................................................................................................................38

3.9.1. Um software é uma mensagem..........................................................................................................................................38 3.9.2. Linguagens e hierarquias de software .............................................................................................................................39

3.10. Organizações Humanas e Sistemas de Gestão....................................................................................................................40 3.10.1. Sistemas de Gestão da Qualidade...................................................................................................................................43 3.10.2. Sistemas de Gestão da Tecnologia da Informação...................................................................................................44 3.10.3. Sistemas de Gestão da Informação.................................................................................................................................45 3.10.4. Sistemas de Comando e Controle...................................................................................................................................46

4. Ecossistemas e Sistemas Complexos Adaptativos .........................................................................................................................49 4.1. Ecossistemas Artificiais ....................................................................................................................................................................49

4.1.1. Um Exemplo de Ecossistema Artificial .............................................................................................................................50 4.1.2. Seleção de Estratégias por Agentes ..................................................................................................................................51 4.1.3. Algoritmos Genéticos .............................................................................................................................................................51 4.1.4. Algoritmos Genéticos Aplicados à Solução do Dilema do Prisioneiro Iterado ................................................53

4.2. Sistemas Complexos.........................................................................................................................................................................54 4.2.1. Fenômenos Emergentes........................................................................................................................................................54 4.2.2. Criticalidade Auto-Organizada............................................................................................................................................56 4.2.3. Evolução na Borda Ordem-Caos.........................................................................................................................................57 4.2.4. Paisagens de Aptidão .............................................................................................................................................................58

5. Conclusões.....................................................................................................................................................................................................59

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Resumo

Este texto apresenta uma série de conceitos sobre sistemas, visando compor um arcabouço conceitual sistêmico para a discussão de questões relativas à gestão da segurança da informação e comunicações. São tratados primeiramente os conceitos e as aplicações de sistemas nas mais diversas áreas. São exploradas algumas das principais categorias de sistemas, como as dos sistemas computacionais e de software, dos sistemas organizacionais e de gestão, dos sistemas cognitivos, dos sistemas lingüísticos, dos sistemas biológicos e ecológicos, dos sistemas de comunicação e dos sistemas de comando e controle. Na fundamentação dos conceitos de sistemas destaca-se a abordagem peculiar e recente dos sistemas complexos adaptativos (complex

adaptive systems – CAS). Esta surge como uma proposta unificadora na descrição das propriedades que regem o funcionamento de qualquer sistema formado por agregados de agentes autônomos que interagem por meio de regras simples através das quais emergem comportamentos complexos em um ambiente também dinâmico. As propriedades fundamentais dos sistemas complexos se tornam poderosos instrumentos analíticos e sintéticos para o controle e segurança de sistemas.

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1. Conceitos Gerais sobre Sistemas

1.1. O que é um sistema?

Um sistema pode ser definido como um conjunto de partes inter-relacionadas formando um todo,

que exibe várias propriedades estruturais e processuais (comportamentais) que persistem ao longo de um

tempo. O ambiente de um sistema é tudo com o qual o sistema interage, e também pode ser chamado de

seu universo. A Figura 1 apresenta esquematicamente estes elementos.

Fig. 01: Um sistema interage com seu ambiente.

O sistema forma um “todo” coeso e segregado de seu ambiente subjacente através de um limite ou escopo, conforme ilustra a Figura 2. Isto permite separar o que está dentro do (escopo do) sistema, do que está fora do (escopo do) sistema.

Fig. 02: Limite ou escopo de um sistema.

As propriedades estruturais de um sistema estão associadas às relações espaciais estabelecidas, essencialmente de forma estática, entre as partes ou elementos que formam o sistema. Por exemplo: “um telefone é formado por caixa, fone e dois fios: espiralado e duplo. A caixa é formada por corpo, discador e um gancho. O fone conecta-se à caixa por meio do fio espiralado. O fone descansa junto à caixa por meio do gancho.

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A caixa conecta-se ao sistema telefônico por meio do fio duplo.” Os processos, ou propriedades comportamentais de um sistema estão mais associados às relações temporais, essencialmente dinâmicas, estabelecidas entre as partes ou elementos quando em inter-relação. Por exemplo: “Para que o discador funcione é necessário que o fone esteja fora do gancho” ou “siga os seguintes passos para discar: tirar o fone do gancho, aguardar o tom de discar, discar o número, aguardar o atendimento, iniciar a conversação, finalizar a conversação e colocar o fone no gancho”. É importante perceber que a estrutura de um sistema define os processos ou comportamentos exibidos pelo sistema, enquanto que seus processos definem ou estimulam a construção de estruturas que os suportem. Dizemos então que a estrutura de um sistema define seus processos (comportamentos), e que, por sua vez, os processos ou comportamentos de um sistema definem sua estrutura. Esta noção poderia ser sumarizada pela Figura 3, utilizando-se um símbolo usado na filosofia do Taoísmo.

Fig. 03: Estrutura e processos de um sistema se co-definem.

Em termos simplificados, podemos observar um sistema interagir com seu ambiente em duas situações: (i) para desempenhar uma ou mais funções por meio do estabelecimento de uma relação entre suas

entradas (inputs) e saídas (outputs) realizadas por um usuário nas interfaces do sistema, o que lhes

confere utilidade ao usuário; (ii) para realizar ações sobre o ambiente e perceber correspondentes reações

do ambiente, em um processo cíclico que visa manter sua própria integridade ou existência, e desta forma

atender ao seu próprio interesse ou propósito. No primeiro caso dizemos que o sistema desempenha um ou mais funções, tratando-se de um sistema útil. No segundo caso dizemos que o sistema possui auto-determinação, capacidade de sobrevivência ou propósito, sendo neste caso um sistema autônomo. Vários sistemas se situam no limite entre estas duas situações. Na prática, o ser humano deseja que um sistema seja útil e que também possua capacidade de se manter íntegro ao longo do tempo. A Figura 4 ilustra estas diferenças e conceitos.

Fig. 04: Um sistema desejável é aquele que é simultaneamente útil e autônomo.

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1.2. Exemplos de sistemas

Em termos práticos, o conceito de sistema pode ser aplicado a uma imensa variedade de entidades concretas ou abstratas, como por exemplo: 1. O (sistema de) computador que estou usando para escrever este documento, formado por elementos de

hardware e software em uma estrutura hierárquica, com vários comportamentos previsíveis interna e (ou) externamente observáveis, cujas funções permitem que eu, fazendo parte do ambiente no qual o computador se insere, possa realizar tarefas como edição de texto, envio de e-mails, navegação na web etc;

2. O sistema de injeção eletrônica do meu automóvel, formado por elementos de hardware e software embarcado, cuja função é regular o fluxo de combustível do motor do meu automóvel. O motor do meu automóvel é também um sistema, do qual o próprio sistema de injeção eletrônica faz parte. O automóvel constitui o ambiente do qual a injeção eletrônica faz parte;

3. O Sistema Solar, formado pelo Sol, Terra, outros planetas e corpos celestes, que não desempenha propriamente uma função, mas exibe um conjunto de propriedades estruturais e comportamentais, cujos elementos interagem de forma não intencional. Um conjunto de forças físicas mantém a integridade deste sistema planetário.

4. A Universidade de Brasília1, um sistema formado pelos elementos humanos, físicos e sociais que formam a UNB: seus professores, alunos, técnicos, unidades administrativas como Gabinete do Reitor, decanatos, institutos, faculdades, centros etc, laboratórios de ensino e pesquisa, espaços comunitários etc. Os vários elementos que formam a UnB interagem com um ambiente do qual participam a sociedade brasileira, especialmente do Distrito Federal, visando desempenhar a função de gerir o conhecimento em favor desta sociedade, através de funções de suporte como ensino, pesquisa e extensão universitária.

5. O Sistema Econômico Brasileiro – conjunto de elementos que formam a economia do Brasil, compostos por agentes consumidores, produtores e reguladores, cujos elementos estruturais e comportamentais fazem funcionar o fluxo de recursos que dá vitalidade econômica ao país;

6. O meu “sistema digestório”, formado por minha boca, faringe, esôfago, estômago, intestinos etc cuja função é interagir com outros sistemas de meu organismos visando capturar e transformar alimentos obtidos do meio externo em matéria e energia necessárias à sustentação do próprio organismo, este último também um sistema.

7. A Amazônia, um grande e complexo bioma composto por florestas, rios, populações humanas e outros elementos, que desempenha uma grande variedade de funções, sendo algumas delas: capturar gás carbônico, produzir oxigênio, sustentar parte da biodiversidade do Brasil e América do Sul etc;

8. O SIAFI – Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal2, formado por pessoas, procedimentos, redes de tele-processamento, computadores, software e outros elementos, cuja função é apoiar os processos de administração financeira dos vários órgãos que constituem a União. Os exemplos anteriores representam uma grande variedade de máquinas, organizações ou organismos, de

maior ou menor complexidade e tamanho. Em geral, qualquer “todo organizado” é um sistema, todo ser vivo é um sistema, toda organização ou empresa humana é um sistema e toda máquina criada pelo ser humano é um sistema.

1. Exercícios

1 Cite exemplos de dois sistemas com os quais você interage diariamente. Enumere pelo menos três partes de cada um. Enumere três elementos que não fazem parte destes sistemas.

2 Cite exemplos de estruturas e processos que compõem os sistemas enumerados no exercício 1

3 Descreva as interfaces dos sistemas enumerados no exercício 1

4 Descreva as funções dos sistemas enumerados no exercício 1

5 Cite um exemplo de um sistema que é simultaneamente útil e autônomo

6 Cite um exemplo de um sistema que é útil, mas não autônomo

1 http://www.unb.br 2 http://www.tesouro.fazenda.gov.br/SIAFI/index.asp

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7 Cite um exemplo de um sistema que não é útil, mas é autônomo

2. Esquemas de Classificação e Modelagem

Os sistemas formam um todo que pode ser comparado com outros. O meu sistema digestório pode ser comparado ao sistema digestório de quem está lendo este texto e com os dos demais seres humanos e mesmo outros animais. O meu computador pode ser comparado com outros computadores ou dispositivos. O SIAFI pode ser comparado com o SISCOMEX3, SIAPENet4 ou ReceitaNet5. A Amazônia pode ser comparada com o Cerrado Brasileiro ou com outros biomas. A Universidade de Brasília pode ser comparada com várias outras universidades, instituições de ensino superior, instituições públicas etc.

Assim comparados e percebidos como apresentando estruturas e comportamentos similares, os sistemas são colocados dentro de um ou mais conjuntos ou classes, formando alguns esquemas de classificação. Vários esquemas de classificação existem, e não há um que consiga estar correto.

2.1. Esquemas de Classificação Universais

Alguns esquemas de classificação de sistemas são ditos universais, pois contém conjuntos que enquadram todos os sistemas possíveis. Por exemplo, sistemas podem ser classificados em naturais ou artificiais. Podem ser classificados em orgânicos ou mecânicos. Podem ser analógicos ou digitais. Neste caso, qualquer sistema que se tomar como exemplo poderá ser enquadrado em um dos conjuntos nos esquemas anteriores.

A figura 5 apresenta alguns esquemas de classificação universais.

Fig. 05: Esquemas de classificação universal de sistemas.

Sistemas artificiais são aqueles criados pela ação humana e sistemas naturais são aqueles não criados

pela ação humana.

3 http://pt.wikipedia.org/wiki/Siscomex 4 http://www.siapenet.gov.br/Portal/Servico/Apresentacao.asp 5 http://www.receita.fazenda.gov.br/PessoaFisica/ReceitaNet/default.htm

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Sistemas mecânicos possuem funcionamento descrito por fórmulas matemáticas e da física clássica, enquanto que sistemas orgânicos possuem funcionamento construído ao longo de sua história de existência.

Sistemas analógicos são aqueles que trabalham manipulando grandezas físicas nas quais há uma continuidade de valores como força, aceleração, intensidade de luz, calor e ângulo, enquanto que sistemas digitais trabalham com cadeias de símbolos em quantidades discretas e descontínuas. A figura 6 apresenta exemplos de relógios que são simultaneamente digitais e analógicos. As horas, no modo analógico, são representadas por ângulos, onde existe uma quantidade infinita de ângulos. As horas, no modo digital, são representadas por símbolos, dentro de uma quantidade finita de símbolos (caracteres).

Fig. 06: Um sistema que é simultaneamente digital e analógico.

A figura 7 apresenta as várias partes de um típico sistema analógico de reprodução de áudio comumente usado até a década de 1980. Grandezas físicas magnéticas armazenadas numa Fita K7 são convertidas em grandezas físicas elétricas, amplificadas e enviadas a um dispositivo que as converte para vibrações sonoras (a caixa de som).

Fig. 07: Partes de um sistema analógico de reprodução de áudio.

De forma correspondente, a Figura 8 apresenta um dispositivo computacional digital de uso específico, um scanner. Neste sistema, grandezas físicas armazenadas em uma folha de papel são convertidas para formatos digitais, visando posterior transmissão para um computador de uso geral.

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Fig. 08: Partes de um sistema digital de varredura de imagens.

A figura 9 ilustra as diferenças abstratas entre representações de um sinal sonoro, no modos analógico e digital, e como a conversão entre ambas representações pode ser feita. Na representação analógica há continuidade na representação dos dados. A intensidade do som varia continuamente ao longo do tempo. Os sinais analógicos são contínuos, da mesma forma que ocorre com os elementos que formam o conjunto dos números reais estudados no ensino fundamental. Para que sejam convertidos para representação digital há que se criar uma descontinuidade na representação, pois os sinais digitais são discretos, da mesma forma que são discretos os elementos que formam o conjunto dos números naturais, estudados no ensino fundamental. Neste caso, para a conversão analógico-digital é necessário se fazer uma amostragem do sinal analógico ao longo do tempo, a fim de se construir a representação mais aproximada de uma função contínua (contendo infinitos pontos) em uma representação discreta.

Fig. 09: Representações de um sinal que varia ao longo do tempo, nas formas analógicas e digitais. Adaptado de:

[http://www.soi.wide.ad.jp/class/20050026/slides/04/10.html].

2.1. Exercícios

1 Cite 1 exemplo de sistema que pertencem a cada uma das classes nos esquemas de classificação apresentados.

2 Perceba que estes esquemas não são perfeitos, pois vários sistemas são heterogêneos quando a pertence a um ou outro conjunto. Quais defeitos você encontra nestes esquemas?

3 Cite exemplos de sistemas que até 20 anos atrás eram analógicos e hoje são digitais

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4 Busque encontrar exemplos de sistemas que são atualmente digitais e que, na sua opinião, funcionavam melhor quando eram analógicos.

5 Onde há maior possibilidade de haver descontinuidades ou anomalias no funcionamento, em sistemas analógicos ou em sistemas digitais? Justifique

2.2. Esquemas de Classificação Arbitrários

Vários outros esquemas de classificação de sistemas são possíveis e úteis. Por exemplo, todos os sistemas de informação existentes no mundo formam a classe dos sistemas de informação. Todos os sistemas de computador existentes no mundo pertencem a uma classe chamada de sistemas de computador. Todos os seres humanos pertencem à classe dos seres humanos. Todos os biomas pertencem à classe dos biomas. Qualquer agrupamento ou conjunto de sistemas que comungam de um conjunto de propriedades comuns define uma classe de sistemas. A Figura 10 apresenta algumas classes de sistemas. Note que cada retângulo representa um conjunto, e cada elipse representa um sistema.

Fig.10: Classes arbitrárias de sistemas.

Cabe à pessoa que está criando o esquema de classificação definir o que há de comum entre os elementos desta classe. Esta operação de enquadramento de alguma coisa dentro de uma classe se chama classificação. A classificação é uma poderosa ferramenta para análise e síntese de sistemas, realizada pelo ser humano desde tempos pré-históricos. Ao enquadrarmos sistemas dentro de classes ou conjuntos podemos criar quadros de referência analítica aplicáveis a vários sistemas, pois é possível fazermos generalizações das propriedades e processos comuns a todos os sistemas que pertencem àquele conjunto.

2.2. Exercícios

1 Crie uma classe arbitrária de sistemas e enumere dois sistemas que pertencem a esta classe e dois que não pertence a esta classe

2 Descreva as características que enquadram um sistema na classe definida no exercício 1

2.3. Abstração e Criação de Modelos

Quando fazemos uma generalização sobre os elementos de algum conjunto criamos um modelo ou representação abstrata de todos os elementos daquele conjunto. Por exemplo, aprendemos durante o ensino

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fundamental que todos os seres humanos possuem cabeça, tronco e membros. Também é usual sabermos que toda pessoa possui um nome, uma data de nascimento, um local de nascimento, uma mãe e um pai biológicos etc. Definido este “modelo” de ser humano, é de se esperar que qualquer ser humano, quando apresentado a você, possua uma cabeça, tronco, membros, nome, data de nascimento, local de nascimento, mãe e pai biológicos. Quando um médico vai realizar um exame no aparelho digestório de um ser humano é de se esperar que ele contenha esôfago, estômago, intestinos etc pois já existe um “modelo” de sistema digestório criado pela própria medicina. Quando um biólogo vai viajar para uma floresta há de se esperar que existam nesta floresta animais silvestres, fontes de água, árvores, insetos etc. Quando se vai usar um computador espera-se que existam dispositivos de entrada de dados, saída de dados e processamento disponíveis para o usuário. Enfim, a existência de modelos torna o mundo a nossa volta mais previsível. A mente humana está constantemente criando modelos abstratos da realidade e enquadrando as entidades com as quais trava contato dentro de tais modelos. Esta criação de modelos é parte essencial dos processos cognitivos, apresentados em seção adiante.

Uma forma comum de criar modelos é baseada no uso de planilhas, que são uma forma de criar modelos de dados. Suponha que você está fazendo um trabalho no qual lhe solicitam produzir um relatório com informações sobre os sistemas de computadores da sua organização XYZ. Para facilitar a apresentação do relatório seria possível criar uma planilha como a apresentada na Tabela 1. Conceitualmente, o usuário criou um esquema de classificação de sistemas de computadores e aplicou uma operação de abstração de sistemas para registrar propriedades relevantes observadas nos sistemas analisados. Para criação do esquema de classificação o usuário julgou que existem três computadores na organização, de números 1, 2 e 3. É possível que existam outros computadores na organização, mas que podem ter passado desapercebidos pelo usuário. Isto demonstra que as operações conceituais são inevitavelmente sujeitas a falhas. Neste caso três elementos foram colocados dentro de um conjunto: o conjunto de todos os “computadores da

organização XYZ”, que vem a ser o sistema de computadores da organização XYZ. A operação de abstração compreendeu julgar que as propriedades relevantes destes computadores são:

número; nome; localização, funções, memória e disco, e que, para cada um dos três computadores foram exibidas as propriedades listadas.

Número Nome Localização Funções Memória Disco

1 Auriga Auditório Apresentação de palestras 500 MB 50 GB2 Aldebaran Sala dos servidores Servidor Web 4 GB 400 GB3 Alfa Centauro Corredor Servidor e-mail 4 GB 400 GB

Tabela 1: Computadores de uma organização XYZ.

Uma vez que modelos são criados, eles podem ser usados para fins de análise e síntese. A análise facilita a compreensão e explicação dos fenômenos que ocorrem à nossa volta. A síntese torna mais fácil manipular os elementos do sistema, visando o alcance de um objetivo ou meta desejada. Por exemplo, com base no modelo acima apresentado, podemos prever que: (i) o computador Auriga tem ou terá problemas de desempenho durante a apresentação de palestras, pois possui pouca memória; (ii) Aldebaran está sujeito a ataques de SQL

injection6, pois provê um serviço na Web e (iii) Alfa Centauro possui maior risco de ataque físico pois está localizada no corredor. Ações corretivas poderão ser efetuadas visando sintetizar uma nova situação para os sistemas de computadores da organização XYZ, onde os riscos acima mencionados sejam minimizados.

Perceba que as organizações, por meio de seus sistemas de informação, manipulam imensas bases de dados que consistem em “modelos” da realidade sobre os mais diversos elementos que fazem parte do ambiente da organização, bem como da estrutura e processos internos da organização. Por exemplo, uma organização bancária possui equipes de analistas de sistemas que são responsáveis por criar modelos de dados sobre seus clientes, contas correntes e outros produtos e serviços bancários. É por meio da manipulação destes modelos que um banco consegue cumprir sua missão.

2.3. Exercícios

1 Use uma planilha eletrônica para criar um modelo de dados para registrar informações sobre elementos de um sistema que você conhece. Insira pelo menos 5 elementos dentro deste modelo.

2 Baseado apenas nas informações contidas no seu modelo criado no exercício 1, faça e registre inferências acerca de propriedades a serem exibidas pelos elementos do sistema, ou pelo sistema como um todo.

6 http://en.wikipedia.org/wiki/SQL_injection

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2.4. Esquema de Classificação de Ackoff

Ackoff [http://www.acasa.upenn.edu/4sys.htm] concebeu um esquema universal para classificação de sistemas, baseado em quatro classes diferentes, conforme a tabela 2. Neste esquema, os sistemas são enquadrados como mecanísticos, animados, sociais e ecológicos conforme a existência ou não de ação intencional para suas partes e seu todo.

Tipo de Modelo de Sistema

Existe ação intencional das

partes?

Existe ação intencional do

todo? Exemplo

Mecanístico Não Não MáquinasAnimado Não Sim PessoasSocial Sim Sim OrganizaçõesEcológico Sim Não Ilhas Galápagos

Tabela 2 – Tipos de Sistemas, segundo Ackoff (Adaptado pelo autor).

Fig. 11: Organização dos tipos de sistemas, segundo Ackoff.

A Figura 11 apresenta uma estrutura de classificação dos sistemas como mecanísticos, animados, sociais e ecológicos.

2.4. Exercícios

1

Preencha a tabela abaixo com informações sobre quatro exemplos de sistema, um para cada um dos tipos indicados por Ackoff na Tabela 2. Para cada exemplo registre: (i) um nome; (ii) uma enumeração das partes ou elementos constituintes do sistema; (iii) uma descrição de quão coeso e segregado é este sistema, isto é, quais são os limites deste sistema; (iv) uma descrição da estrutura do sistema, isto é, como seus elementos internos de organizam ou dispõem espacial e (ou) temporalmente; (v) uma descrição de um ou mais processos ou comportamentos

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internos e (ou) externos do sistema, e que se mantém persistentes com o tempo; (vi) uma descrição do ambiente subjacente típico com o qual este sistema interage e (ou) do sistema de maior escopo (supra-sistema) no qual este sistema se insere; (vii) as funções possivelmente desempenhadas pelo sistema na sua interação com o ambiente externo e (ou) as ações que o sistema realiza na manutenção de sua integridade, autonomia e (ou) sobrevivência. Veja os exemplos na Seção 2.5.

Nome:

Partes:

Coesão e Limites:

Estruturas:

Processos ou Comportamentos:

Ambiente:

Funções e (ou) Ações:

Nome:

Partes:

Coesão e Limites:

Estruturas:

Processos ou Comportamentos:

Ambiente:

Funções e (ou) Ações:

Nome:

Partes:

Coesão e Limites:

Estruturas:

Processos ou Comportamentos:

Ambiente:

Funções e (ou) Ações:

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Nome:

Partes:

Coesão e Limites:

Estruturas:

Processos ou Comportamentos:

Ambiente:

Funções e (ou) Ações:

2.5. Exemplos de análises de sistemas

Nome: Automóvel

Partes: carroceria, motor, suspensão, estofamento etc

Coesão e Limites: Um carro é um objeto discreto, fácil e unicamente identificável através de sua placa. Fisicamente é delimitado principalmente por sua carroceria e pneus. A carroceria possui partes de metal e vidro, que permitem a entrada e saída do condutor, a proteção do motor e a visibilidade de dentro para fora e de fora para dentro.

Estruturas: Um automóvel é formado em sua maior parte por peças rígidas articuladas. Poucas peças são móveis, especialmente as que se encontram no interior do motor, sistema de direcionamento e estofamentos. A suspensão é responsável por suportar o motor e a carroceria. A caixa de mudanças transmite a força rotacional do motor para os pneus, os quais, por sua vez entram em contato com a pista através da qual o carro usualmente de desloca.

Processos ou Comportamentos: Ligar e desligar o motor, abertura e fechamento de portas, aceleração e frenagem, abastecimento de combustível, abrir e fechar janelas laterais, dobrar à direita e à esquerda em variados ângulos, buzinar, mudar marcha, andar à frente, andar de ré, apresentar informações sobre velocidade atual, quantidade de quilômetros deslocados, combustível disponível no motor, rotação do motor, temperatura da água, nível do óleo, carregamento da bateria através do alternador etc

Ambiente: Vias pavimentadas e estradas de terra que compõem os sistemas de trânsito terrestre.

Funções e (ou) Ações: Deslocar condutor, passageiros e bagagens através de vias.

Nome: Sistema imune humano

Partes: Nódulos e vasos linfáticos, amígdalas, adenóides, timo, baço, apêndice, medula óssea, linfócitos, fagócitos e outras células e complexos de substâncias imunes.

Coesão e Limites: O sistema imune coordena suas ações com os outros sistemas de comunicação de fluidos e substâncias do organismo, como o sistema circulatório, os compartimentos corporais e o próprio sistema nervoso. Suas células, embora sejam produzidas originariamente nos tecidos linfáticos, são distribuídas através dos vasos sanguíneos e outros espaços intersticiais do corpo (espaço existentes entre células e entre órgãos). Desta forma, por se tratar de um sistema altamente integrado com o próprio organismo, se torna difícil estabelecer os limites físicos do sistema imunológico.

Estruturas: O sistema imune é uma imensa e complexa rede de comando e controle para defesa contra invasores do organismo. Muitas células imunes e complexos de substâncias imunes se posicionam junto aos

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pontos de entrada do organismo como áreas bucais, nasais e respiratórias, bem como junto a possíveis perfurações na pele, formando a primeira barreira de defesa contra invasores. Os nódulos, vasos e outros tecidos linfáticos se interconectam aos compartimentos internos como abdômen, pulmões e às vias de transporte do organismo, a fim de coletar informações sobre possíveis ataques e distribuir estas células e substâncias no meio interno e nas entradas do organismo. As células e substâncias que ficam nos espaços intersticiais e no sistema circulatório formam uma segunda barreira de defesa.

Processos ou Comportamentos: O sistema imune contém um imenso estoque de várias células e substâncias, que devem produzir uma resposta imune a invasores potenciais. Os anticorpos, da mesma forma que um alicate, adquirem variados formatos para reconhecer e se acoplar a milhões de diferentes substâncias estranhas que estão na superfície de bactérias, vírus, parasitas, fungos e corpos estranhos que penetram no organismo. Estas substâncias são reconhecidas como antígenos. Os anticorpos “marcam” estes corpos e direcionam a ação de várias células imunes que isolam, matam, digerem e secretam estes corpos e outras partes que não são reconhecidas como fazendo parte do organismo.

Ambiente: O organismo humano, do qual o sistema imunológico é um subsistema.

Funções e (ou) Ações: A principal função é chamada de resposta imune e compreende o reconhecimento de antígenos (vírus, bactéria etc), produção e secreção de anticorpos dentro dos fluidos corporais, marcação de antígenos por meio de anticorpos, produção de células T para atacar e destruir células e outros corpos marcados, digestão de microorganismos e substâncias estranhas, coordenação da resposta imune etc.

Nome: Sistema computacional com software armazenado.

Partes: Dispositivos de entrada e saída de dados, armazenamento primário (memória) e secundário (disco etc) e processamento. Dados e softwares armazenados em meio permanente.

Coesão e Limites: Um computador é um sistema delimitado externamente por seus dispositivos de entrada e saída de dados, com os quais estabelece comunicação com o usuário. Estes dispositivos se comunicam as demais partes do computador, especialmente as unidades de processamento e armazenamento.

Estruturas: Dispositivos de entrada e saída de dados enviam e recebem dados de e para a unidade de armazenamento primário. A unidade de processamento também recebe e envia os dados armazenados de e para a memória. Alguns destes dados são instruções que, interpretadas pela unidade de processamento, direcionam o funcionamento do processador à realização de operações de cálculo, lógica e controle de fluxo de dados.

Processos ou Comportamentos: Os dispositivos de entrada de dados convertem impulsos analógicos (cliques de mouse, movimento de mouse, pressionamento de teclas etc) para dados digitais e os armazenam nos dispositivos de armazenamento. Os dispositivos de saída obtém os dados digitais armazenados e os convertem para formas analógicas (pingos de tinta no papel, marcações coloridas na tela do monitor, sons, vibrações etc). Os dispositivos de armazenamento permite a gravação de dados digitais em posições de memória bem conhecidas e a posterior recuperação destes dados. Os dispositivos de processamento realizar a leitura de instruções e dados contidos na memória e a posterior gravação de dados na memória, sendo estes dados obtidos através da transformação de dados de entrada por meio da interpretação das instruções lidas da memória, as quais constituem o software.

Ambiente: O usuário do computador, que usualmente é uma pessoa ou outro dispositivo computacional.

Funções e (ou) Ações: Carga e início da execução de software, entrada de dados, processamento de dados, saída de dados em função do software inicialmente carregado.

3. Teorias e Modelos de Sistemas

Nesta seção serão explorados várias teorias e modelos sobre o funcionamento de sistemas.

3.1. Sistêmica e Sistemas Abertos

À aplicação do conceito de sistemas na compreensão dos mais diversos fenômenos nas várias áreas do conhecimento dá-se o nome de sistêmica, a qual se iniciou com trabalhos pioneiros como o de Bertalanffy, em 1934. A explicação sobre o funcionamento dos seres vivos repousa no conceito de sistema aberto, originalmente

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proposto por Bertalanffy7 em 1950. Quando estudando sistemas biológicos, Bertalanffy notou que sistemas vivos estão necessariamente trocando matéria e energia com o ambiente externo, desenvolvendo uma organização interna complexa e auto-regulatória. Seres biológicos estão sempre buscando se afastar de um estado de equilíbrio químico estático no qual há repouso e morte, alcançando um estado dinâmico de equilíbrio estável, a despeito da contínua tendência da matéria de empurrar o organismo para um estado de máxima entropia (desorganização) e energia mínima (morte). Qualquer sistema apresenta esta característica ele é chamado de sistema aberto. Trabalhos posteriores de físicos como Prigogyne8, com foco em sistemas físico-químicos, classificaram os sistemas abertos como estruturas dissipativas de não equilíbrio, cujo estudo detalhado de suas propriedades representou uma ruptura com o conceito mecanicista, de sistema fechado, que dominava as ciências físicas desde então.

Numa visão mecanicista do mundo os sistemas são estudados como unidades isoladas de seu meio ambiente. Por exemplo, quando estudando um sistema de correias e polias ou sistema de reações físico-químicas, a maioria dos pesquisadores isola ou elimina as influencias oriundas do meio externo. A abordagem de sistema fechado simplifica a análise e síntese de sistemas físico-químicos, os quais tendem a chegar em um estado de equilíbrio auto-organizado, que é descrito na segunda lei da termodinâmica (“a entropia ou desorganização de um sistema isolado que não está em equilíbrio tende a crescer ao longo do tempo, alcançando valor máximo no estado de equilíbrio”). Mas tal abordagem não auxilia na explicação do funcionamento de sistemas que precisam exibir características vitais. Sistemas dissipativos ou abertos, não obedecem localmente à Segunda lei da termodinâmica, pois estão continuamente mantendo ou decrescendo sua entropia interna, isto é, tendem a aumentar seu grau de organização interna, só que às custas de importação de energia livre oriunda do meio ambiente. Um exemplo de estrutura dissipativa simples é um redemoinho, que mantém sua forma graças ao fluxo constante de matéria e energia que a ele chega, e do qual também por ele sai (Figura 12).

Fig. 12: Redemoinho: Uma Estrutura Dissipativa ou Sistema Aberto.

A maioria dos sistemas estudados neste texto é exemplo de sistema aberto.

3.1. Exercícios

1 Enumere dois sistemas “vivos” que você conhece sejam eles naturais ou artificiais. Descreva, para cada um deles quais são os fluxos de matéria e energia que por eles passam. Demonstre por argumentação que não é possível que tais sistemas funcionem sem a existência de tais fluxos

2 Enumere dois sistemas “vivos” que você conhece e que trabalham com informação. Descreva, para cada um deles quais são os fluxos de informação que por eles passam. Demonstre por argumentação que não é possível que tais sistemas funcionem sem a existência de tais fluxos

3.2. Cibernética e Sistemas de Controle

O termo “Cibernética” foi cunhado na década de 1940 por Nobert Wiener, um matemático, em seu livro “Cybernetics, or Control and Communication in the Animal and the Machine”. A cibernética, segundo Wiener é a ciência do controle e da comunicação no animal e nas máquinas. A cibernética derivou, de modo mais enfático,

7 http://en.wikipedia.org/wiki/Bertalanffy 8 KAUFFMAN, S. At Home in the Universe: The Search for Laws of Self-Organization Complexity. USA: Oxford University Press. 1996.

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da necessidade prática da criação de sistemas mecanizados ou computacionais que controlam outros sistemas, está desta forma diretamente relacionada à Teoria do Controle. No entanto, há uma grande quantidade de definições distintas para o termo, conforme pode ser visto em [http://www.asc-cybernetics.org/foundations/definitions.htm].

Algumas outras áreas de conhecimento que diretamente influenciaram ou foram influenciadas pela cibernética são: a teoria dos jogos de estratégia, com suas raízes na economia e na ciência política, a qual busca formular esquemas para descrever como agentes inteligentes dentro de um sistema complexo tomam decisões baseadas na racionalidade; e a informática ou ciência da computação, que investigam as propriedades fundamentais e as aplicações dos sistemas computacionais às mais diversas situações.

As teorias de sistemas de controle referem-se, de forma simplificada, ao desenvolvimento de sistemas que controlam outros sistemas tecnológicos. O surgimento da teoria do controle deveu-se principalmente à necessidade prática de controle de máquinas de guerra, como sistemas balísticos, radares e canhões, e teve como visão futurística a robótica. A figura 13 apresenta um esquema de um sistema de controle típico.

Fig.13: Um modelo simplificado de um sistema de posicionamento automático de um lançador de míssil. Fonte:

[Modern Control System Theory and Design, Stanley Shinners. John Wiley. 1992]

Destaca-se nela a existência de um sistema servo-mecânico, como um sensor remoto que envia um sinal ao controle do lançador de míssil, com a função de abater aviões. O sistema de controle precisa ajustar o ângulo correto do míssil, a fim de atingir o avião. Para que isto ocorra de modo efetivo é preciso realizar vários cálculos com grande rapidez, que poderiam envolver a direção, ângulo e velocidade do avião, velocidade do míssil e do vento, a fim de determinar como o ângulo deve variar ao longo do tempo. Embora um operador humano habilidoso, treinado e disponível possa realizar este cálculo mentalmente e controlar a arma, tal combinação é difícil. O controle do ângulo pode então ser feito por um dispositivo eletrônico que representa as grandezas físicas anteriormente mencionadas através de variações de corrente e (ou) tensões elétricas e contém um circuito corretamente modelado que calcula a seqüência de ângulos adequada, representando-as na forma de novas variações de corrente e (ou) tensões correspondentes, que seriam aplicadas ao servo-mecanismo, provocando ajuste do ângulo do míssil e aumentando as chances de atingir o avião.

Perceba que um dos elementos importantes para permitir que o míssil se alinhe com a trajetória do avião é o laço de feedback, apresentado na parte inferior da Figura 13. Feedback (retorno) pode ser definido como um processo através do qual alguma porção do sinal de saída de um sistema de controle é passado como um sinal de entrada para o próprio sistema.

No início da cibernética e ainda em tempos recentes, considerável parte destes circuitos (sistemas de controle) era formada por dispositivos eletrônicos analógicos, formados por transformadores de corrente, capacitores, resistores e transistores. Eram, e ainda são em muitos casos, dispositivos analógicos porque as grandezas físicas (ângulo, aceleração, velocidade, força etc) eram convertidas para impulsos elétricos correspondentes para manipulação no sistema, e na saída as grandezas elétricas eram convertidas para grandezas físicas correspondentes.

Logo no início da cibernética percebeu-se que o uso de conversores analógicos digitais, e o uso de representações algorítmicas das fórmulas matemáticas envolvidas nos cálculos, anteriormente feitos apenas com a análise e modelagem de circuitos eletrônicos, poderia conferir considerável flexibilidade a tais sistemas de controle. As unidades atuais de controle eletrônico de automóveis, por exemplo, coletam informações sobre automóveis por meio de uma rede de sensores, manipulam estas informações por meio de softwares e atuam no controle de várias partes do veículo, como injeção de combustível, controle de portas e cintos de segurança etc. A Figura 14 apresenta partes de uma rede de computadores que existe no interior de vários automóveis atuais.

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.

Fig. 14: Vários aspectos do funcionamento de um automóvel são controlados por computadores digitais

especializados. Fonte: [www.bosch.com].

O surgimento dos computadores digitais programáveis criou uma nova área de conhecimento especialmente dedicada a seu estudo e aprimoramento, chamada de ciência da computação.

3.2. Exercícios

1 Pesquise e enumere dois sistemas de controle que você conhece, sejam eles naturais ou artificiais. Descreva, para cada um deles onde está o fluxo de feedback.

3.3. Ciência da Computação e Sistemas de Computador Programável

A ciência da Computação surgiu como desdobramento da cibernética e das aplicações práticas da teoria do controle, em decorrência da flexibilização das máquinas de controle da cibernética, por meio da adoção de uma arquitetura de computador digital programável de uso geral, à época (1945-46) vulgarmente chamado de “cérebro eletrônico”.

A principal inovação do “cérebro eletrônico” foi introduzir o conceito de programa armazenado em memória associado a um apontador ou contador de instruções em memória. Na arquitetura do cérebro eletrônico, posteriormente chamada de Arquitetura de von Neumann, o computador seria formado por 4 órgãos: (i) de operações aritméticas (cálculo), (ii) de memória (seqüencial e linearmente endereçada), (iii) de controle (interpretação de instruções armazenadas na memória com conseqüente controle do funcionamento dos demais órgãos), e (iv) de conexão com o operador (dispositivos de entrada e saída de dados).

Atualmente a arquitetura de um sistema de computador programável pode ser esquematizada conforme a figura 15.

Fig. 15: Elementos da Arquitetura de Computador de von Neumann.

Um computador é formado por cinco partes: (i) UCP – Unidade Central de Processamento, a qual contém os órgãos de cálculo e de controle da arquitetura do cérebro eletrônico; (ii) Memória RAM (random acess

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memory), que compreende a memória, com células seqüencial e linearmente endereçadas, mas com capacidade de acesso e gravação direta em qualquer endereço; (iii) dispositivos de entrada e saída de dados, que compreende os órgãos de conexão com o operador e (iv) um barramento que interliga todos estes elementos, não apresentado na Figura 15.

São exemplos de dispositivos de entrada de dados o teclado e o mouse. A Figura 16 apresenta o esquema geral de funcionamento de um dispositivo (que é um sistema) de entrada de dados. Estes dispositivos são responsáveis pela conversão das entradas de sinais em forma analógica - por exemplo, o ângulo e velocidade de deslocamento da esfera do mouse e o pressionamento de teclas – para dados em forma digital (cadeias de bits), a fim de que estes dados digitais sejam armazenados em posições específicas da memória RAM.

Fig. 16: Um dispositivo (sistema) de entrada de dados.

São exemplos de dispositivos de saída de dados o monitor de vídeo e a impressora. A figura 17 ilustra o funcionamento de um destes dispositivos (monitor de vídeo). Os dispositivos de saída de dados são responsáveis pela conversão de dados na forma digital (cadeias de bits), armazenados em posições específicas da memória RAM, para sinais na forma analógica – por exemplo, um sinal sonoro na saída de áudio, um sinal luminoso colorido no monitor ou um ponto de tinta preta sobre uma folha de papel, no caso da impressora. Estes sinais analógicos são apresentados e interpretados pelo operador ou usuário.

Fig. 17: Um dispositivo de saída de dados.

A Figura 18 apresenta o esquema geral de um dispositivo de Memória RAM, contendo 1.024 células,

apresentadas com endereços de mem[0] até mem[1.023]. A memória RAM é um sistema cujas interfaces com o ambiente são formadas por um buffer de dado, um buffer de endereço, um linha de read (leitura) e uma linha de write (escrever). Quando a linha write é acionada o dado que está armazenado no buffer de dado é armazenado no endereço indicado no buffer de endereço. Quando a linha read é acionada o dado que está armazenado na posição de memória endereçada pelo buffer de endereço é recuperado da memória e copiado para o buffer de dado.

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Fig. 18: Um sistema de memória RAM.

Note que no modelo computacional de von Neumann parte dos dados armazenados na memória

RAM representam as instruções do software que está sendo executado pelo computador, enquanto que parte dos dados representam informações manipuladas pelo programa. Por exemplo, as posições de memória 0 até 11 podem estar armazenando as instruções do programa, enquanto que as posições de memória 1000 a 1023 podem estar armazenando os valores das variáveis manipuladas pelo programa. As demais posições ou células de memória poderiam estar desocupadas, isto é, os dados que elas contém não possuem qualquer significado para o programa em execução.

A Figura 19 apresenta uma visão esquemática da unidade central de processamento. Como já mencionado anteriormente a UCP é composta fundamentalmente por três partes: Unidade Aritmética e Lógica (UAL), Unidade de Controle (UC) e Registradores.

Fig. 19: Elementos de uma unidade central de processamento.

A UAL é responsável por realizar um conjunto de cálculos matemáticos e comparações lógicas. No exemplo apresentado a UAL recebe dois dados digitais na entrada, vindos das linhas A e B e recebe um sinal que indica qual operação ela deve realizar. No caso específico, a UAL só realiza operação de adição (add) e conjunção lógica e (and). Conforme as entradas recebidas, a UAL produz uma saída na linha C. Por exemplo, se como entrada em A temos o sinal binário que representa o numeral 10, em B temos o sinal binário que representa o numeral 20, e a linha add é acionada, então, depois de algumas frações de segundo, na linha C aparecerá o valor

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30. Note que a UC é responsável pela indicação de quais valores são utilizados pela ALU, de qual operação será realizada, e para onde será transportado o dado disponível na linha C. A UAL é um sistema de cálculo altamente especializado e eficiente, mas não possui poder de decisão (controle) dentro da UCP.

No conjunto de registradores (buffers) destacam-se dois registradores que fazem a principal interface da UCP com o seu ambiente externo. São os registradores de dados e endereço da memória. Juntamente com as linhas write e read, estes registradores são interligados à memória RAM do computador, por meio do barramento central do computador. O registador Acumulador (ACC) é também chamado de registrador de uso geral, e é onde a UCP armazena os resultados intermediários dos cálculos realizados pela ALU, enquanto estes dados não são transportados para a memória RAM. Os dois últimos registradores deste modelo simplificado de computador são o ponteiro de instrução e o registrador de instrução. O ponteiro de instrução é responsável por conter o endereço da memória RAM que contém a próxima instrução a ser interpretada pelo computador. O registrador de instrução contém a instrução que está sendo atualmente executada pela UCP. Todo o fluxo de dados de e para os registradores é também controlado pela UC.

A UC – Unidade de Controle é o elemento central da UCP, e consequentemente de todo o computador. Como já mencionado, ela controla todo o fluxo de dados, endereços entre os elementos do computador, por meio das linhas de controle. Destacam-se como principais linhas de controle do computador as linhas read, write e reset. A linha reset não está sob controle da UC. Ela é usada pelo operador (usuário) do computador para indicar que deve ser iniciada a execução de um novo programa. A UC é a responsável pelo Ciclo de Execução do Programa, um processo descrito no fluxograma da Figura 20.

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Fig. 20: Um fluxograma que descreve o funcionamento genérico de uma UCP.

A UC é capaz de interpretar cada uma das instruções que fazem parte do conjunto de instruções da UCP. A tabela 3 apresenta um exemplo de conjunto básico de instruções que podem ser executadas por um computador como o apresentado nesta seção, que compõem uma linguagem de programação chamada VCML2. Através do uso de VCML2 é possível a construção de qualquer programa de computador, mesmo que seja às custas de muito esforço.

OUTPUT XXX Envia o dado que está na posição RAM[XXX] para o dispositivo de saída de dados

INPUT XXX Recebe o dado que está no dispositivo de entrada de dados e o armazena na posição RAM[XXX]

LOAD XXX Carrega no registrador ACC o dado contido na célula RAM[XXX]

STORE XXX Armazena na célula RAM[XXX] o valor que está no registrador ACC

ADD XXX Soma ao registrador ACC o valor que está armazenado em RAM[XXX]

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SUB XXX Subtrai do registrador ACC o valor que está armazenado em RAM[XXX]

ACC XXX Armazena no registrador ACC o valor XXX

JUMP XXX Desvio incondicional da execução do programa. Isto é, armazena no registrador IP o valor XXX

JNZ XXX Desvio condicional da execução do programa. Isto é, armazena no registrador IP o valor XXX caso o valor contido em ACC seja diferente de 0

STOP Pára a execução do programa

Tabela 3: Linguagem VCML2: Um conjunto básico de instruções para um computador simplificado de uso geral.

A Tabela 4 apresenta um exemplo de um programa de computador que recebe dois números naturais quaisquer e produz na saída o produto entre os dois. A coluna da esquerda representa a posição da instrução na memória, considerando que o programa é carregado a partir da posição de memória 0.

0 INPUT 18 1 INPUT 19 2 ACC 1 3 STORE 20 4 ACC 0 5 STORE 21 6 LOAD 19 7 JNZ 9 8 JMP 16 9 LOAD 21

10 ADD 18 11 STORE 21 12 LOAD 19 13 SUB 20 14 STORE 19 15 JMP 6 16 OUTPUT 21 17 STOP

Tabela 4 : Um pequeno programa em linguagem VCML2, para multiplicação de dois números inteiros positivos, em

um computador que é capaz apenas de somar e subtrair.

São objetos de estudo da ciência da computação o sistema de computador e suas aplicações para a

solução de quaisquer tipos de problemas, que possam ser modelados através da interpretação de instruções em linguagens programáveis. Os programas de computador são capazes de modelar e realizar cálculos de complexidade arbitrária, que em última instância, podem ser estudados como representações concretas de relações matemáticas.

3.2. Exercícios

1 Enumere o conjunto de elementos que fazem parte de um computador simplificado

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2 Dada a figura, julgue a veracidade das seguintes afirmações: 2.1 – A linha B é a linha que controla a UAL – Unidade Aritimética Lógica 2.2 – A linha C é a linha que controla a UAL – Unidade Aritimética Lógica 2.3 – O elemento F é a Unidade de Controle 2.4 – O elemento E é um registrador de dados 2.5 – O sinal D é um sinal que se origina da Unidade de Controle e controla a Unidade Aritimética-Lógica 2.6 – Os elementos H e I estão conectados ao barramento do computador 2.7 – O elemento J é a Unidade Aritimética-Lógica desta UCP

3 Suponha que o programa abaixo está em execução dentro de um computador similar ao apresentado

nesta seção. Neste caso, qual a saída de dados a ser apresentada caso o usuário digite na entrada de dados o valor 0? O que ocorre se a entrada for 10?

Posição de memória

Instrução

0 READ 9 1 LOAD 9 2 JNZ 5 3 ACC 0 4 JUMP 6 5 ACC 1 6 STORE 10 7 OUTPUT 10 8 STOP

4 Quantas instruções contém o programa apresentado no exercício 3?

5 Quantas células de memória (1 célula igual a 1 byte) são ocupadas pelo programa apresentado no exercício 3, durante a sua execução? Quantas destas células são ocupadas com dados? Quantas destas células são ocupadas com instruções?

6 Construa um programa usando a linguagem VCML2 cuja função é imprimir o valor 20 na saída de dados.

7 Julgue a veracidade das seguintes afirmações: 7.1 – Um dispositivo de saída de dados é um conversor de sinais analógicos para sinais digitais

3.4. A Engenharia e os Sistemas Tecnológicos, Máquinas e Linguagens

Tecnologia é um termo de ampla acepção, que significa de modo geral o domínio dos materiais, ferramentas, máquinas e processos, visando o controle das condições ambientais por alguma espécie de organismo, especialmente a humana. O uso de máquinas, antes de ser uma característica determinante da

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espécie humana, também é presente em outras espécies que nos precederam ou que nos acompanham. Mas a evolução da técnica humana é muito mais rápida, e em geral reproduz muitas invenções naturais criadas pelos seres vivos: garras de animais originam facas, os olhos originam os óculos, conchas de moluscos se “transformam” em bacias.

Os sistemas tecnológicos são os objetos de estudo das Engenharias, e compreendem um conjunto de processos para coleta de informações científicas, bem como o desenho e a construção de máquinas que empregam modelos científicos, visando a solução dos problemas práticos da humanidade.

Cada emprego da tecnologia dá origem a uma determinada máquina ou sistema, que por sua vez produz uma linguagem através da qual o usuário desta máquina estabelece comunicações visando usá-la ou ensinar outros a usá-la. Uma máquina é um sistema artificial que tem uma utilidade. Uma linguagem, de forma simplificada, pode ser definida como um conjunto de conceitos associados por termos, que formam uma rede que facilita a comunicação entre agentes (outras definições mais formais seguem mais à frente). A Figura 21 apresenta um exemplo de uma máquina criada pelo ser humano e alguns dos elementos que formam uma linguagem para poder usá-la.

Máquina Linguagem

Fig. 21: Máquinas induzem à criação de linguagens e vice-versa.

Em se tratando de máquinas mais complexas, a relação entre máquinas e linguagens também se estabelece. Desta vez, as linguagens são representadas pelos próprios manuais de usuário das máquinas.

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Figura 22 – Máquinas eletrônicas e suas correspondentes linguagens.

A tecnologia, ou os sistemas tecnológicos, devido à sua natureza social, possuem uma característica

notável que é sua constante evolução, em decorrência do erro durante a operação e da subseqüente seleção de novas formas de uso e desuso em função das experiências realizadas por seu uso em meios sociais. Por exemplo, ao operarmos um martelo durante um tempo introduzimos novos conceitos ao nosso acervo de tecnologias e linguagens, como descreve o mapa mental da Figura 23.

Fig. 23: O uso de um martelo leva à criação de novas tecnologias, como a luva.

Os sistemas tecnológicos, de uma organização e da própria sociedade evoluem ao incorporar as

soluções de desenho e produção inventadas pelas gerações anteriores, como por exemplo, os automóveis (Figura 24) e os computadores (Figura 25).

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Fig.24: Evolução das gerações de automóveis Honda. Fonte: [world.honda.com]

Fig. 25: Evolução da relação entre poder computacional e preço dos computadores. Fonte:

[www.3dluvr.com/amigo/junkbin/Evolution%20of%20Computer%20Power%20vs%20Cost.jpg]

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3.4. Exercícios

1 Escolha duas máquinas que você utiliza com freqüência. Descreva, para cada uma delas, pelo menos 4 conceitos que fazem parte da linguagem que você emprega para manipular estas máquinas. Esboce a relação entre estes conceitos por meio de mapas conceituais como os usados nas Figuras 21 e 23.

2 Cite os nomes de duas máquinas com as quais você tem dificuldade de se comunicar. Pesquise e indique onde se encontram as descrições das linguagens que são usadas para que você possa, um dia, eventualmente comunicar-se com elas no caso de uma emergência.

3 Cite o nome de um tipo de máquina que você viu evoluiu bastante nos últimos anos, através de várias gerações. Indique quais foram as principais mudanças na linguagem usada para comunicar-se com as máquinas ao longo de cada uma das suas principais gerações evolutivas.

3.5. Lingüística e Sistemas de Linguagens

A linguagem é um suporte que permite a comunicação entre dois ou mais agentes ou sistemas. Uma linguagem é, por sua vez, definida formalmente como um sistema formado por um conjunto de símbolos que podem ser falados, escritos, gestuais etc (os símbolos formam o alfabeto da linguagem), um conjunto de regras para formação de sentenças ou mensagens (a sintaxe), um conjunto de regras para interpretar o significado destas sentenças (a semântica) e ainda um conjunto de usos práticos que se faz desta linguagem (a pragmática). A natureza e evolução das linguagens humanas é objeto de estudo da lingüística. Como já dito anteriormente as linguagens artificiais são criadas pelos inventores de máquinas, mas de forma geral a criação de linguagens é um fenômeno social, isto é, ocorre sempre devido à necessidade de facilitar a comunicação.

De forma esquemática (Figura 26) poderíamos representam uma linguagem como uma construção coletiva, um sistema de grande valor para uma sociedade, ao qual os agentes desta recorrem sempre que precisam se comunicar com os outros. A preservação da integridade e utilidade de uma linguagem é essencial á manutenção do funcionamento desta sociedade.

Fig. 26: Linguagem é o acervo que permite a comunicação em uma sociedade.

A construção de uma linguagem também é um fenômeno histórico, pois uma linguagem em uso por uma comunidade está em constante evolução, e esta evolução é determinada por fatos que ocorrem nesta sociedade, como a necessidade de dominar ou compreender mais profundamente algum aspecto do ambiente no qual esta sociedade vive. A Figura 27, por exemplo, apresenta um esquema de evolução das linguagens Indo-européias, a partir de uma linguagem raiz comum. Esta evolução reflete a história desta sociedade. A Figura 28 apresenta um esquema da evolução das principais linguagens de programação de computadores.

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Fig. 27: Evolução das linguagens Indo-Européias. Fonte: [http://esa4.rice.edu/~ling215/Ling215Chart1.jpg]

A Figura 28 apresenta um esquema de evolução das linguagens de programação de computadores.

Fig. 28: História evolutiva das linguagens de programação. Fonte: [?]

3.5. Exercícios

1 Descreva pelo menos 4 conceitos que fazem parte da linguagem que você emprega para se comunicar com seus colegas de trabalho. Esboce a relação entre estes conceitos por meio de mapas conceituais como os usados nas Figuras 21 e 23.

2 Descreva pelo menos 4 conceitos que fazem parte da linguagem que você emprega para se comunicar com seus familiares. Esboce a relação entre estes conceitos por meio de mapas conceituais como os usados nas Figuras 21 e 23.

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3 Cite o nome de uma linguagem natural ou artificial que você viu evoluiu bastante nos últimos anos. Indique quais foram as principais mudanças na linguagem ao longo de da sua evolução recente.

3.6. Sistemas de Armazenamento e Recuperação da Informação

Um conjunto notável de tecnologias naturais que foram “descobertas” pela espécie humana é o das tecnologias de armazenamento e recuperação da informação, possíveis através da manipulação mais eficiente de símbolos que compõem um alfabeto e uso de um suporte persistente. A natureza emprega as bases nitrogenadas do DNA para codificar os genes dos seres vivos, bem como emprega um alfabeto de aminoácidos para formar a principal estrutura das proteínas. Em contrapartida, a espécie humana desenvolveu nos últimos 100.000 anos um imenso conjunto de tecnologias para representar informações, especialmente após a invenção das linguagens faladas.

Este “empreendimento” tecnológico, iniciado com a linguagem, seguiu-se através da invenção das pinturas rupestres, da escrita, dos registros em argila, do uso de papiros, papéis e livros, jornais, fotografias, vídeos, áudio e computadores.

Fig. 29: Das pinturas rupestres ao livro: Evolução parcial das tecnologias de armazenamento e recuperação da

informação.

3.6. Exercícios

1 Cite quatro tipos de tecnologias de armazenamento da informação usadas em seu ambiente doméstico, e que não são apoiadas por sistemas computacionais.

2 Cite quatro tipos de tecnologias de armazenamento da informação usadas em seu ambiente de trabalho, e que não são apoiadas por sistemas computacionais.

3 Discorra sobre os prós e contras decorrentes do uso de tecnologias de armazenamento de informação manuais e computacionais, especialmente no que toca à segurança da informação, quanto à confidencialidade, integridade e disponibilidade.

3.7. Comunicação e Sistemas de Comunicação

A linguagem é fundamental para a comunicação, e o desenvolvimento de linguagens e tecnologias de representação da informação implicou no desenvolvimento de vários sistemas de comunicação entre agentes.

3.7.1. Comunicação

Comunicação é um fenômeno através do qual dois ou mais agentes trocam mensagens usando um meio. É de se esperar que a mensagem trocada entre os agentes contenha informações úteis para ambas as partes. Estes agentes podem ser pessoas, animais, órgãos do corpo de um ser vivo, computadores digitais e outros dispositivos e sistemas ativos.

Os elementos que fazem parte do fenômeno da comunicação são: - Uma linguagem comum compreensível aos agentes emissor e receptores, que forma o espaço social da

comunicação; - Uma mensagem com um conteúdo representado na linguagem comum; - Um emissor ou agente que envia a mensagem;

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- Um ou mais receptores ou agentes que recebem a mensagem; - Um canal através do qual a mensagem é transportada; - Um suporte físico ou lógico, chamado de meio, que permite a existência do canal, e no qual há um ruído

que poderá distorcer o conteúdo da mensagem; - Controles acerca do transporte da mensagem, envolvendo inclusive Feedback (retorno) para o emissor e

(ou) receptor. De modo geral, um agente emissor decide que um (ou mais) receptor(es) deve(m) receber determinada

informação ou crê que tal informação seja útil ou provoque algum efeito no(s) agente(s) receptor(es). Para permitir que a mensagem possua valor, o emissor codifica a informação usando uma linguagem conhecida por ambos, prepara uma mensagem que contém esta informação codificada, usa uma extremidade do canal para realizar a transmissão da mensagem e aguarda um feedback. No lado do receptor: (i) a mensagem é recebida através da outra extremidade do canal; (ii) o recebedor identifica qual a linguagem usada para codificação da mensagem; (iii) decodifica ou interpreta a mensagem e (iv) extrai um significado desta mensagem. O recebedor produz alguma informação (atribui significado à mensagem). É possível que o emissor receba alguma mensagem de feedback, o que depende das características de controle da comunicação.

3.7.2. Sistema de Comunicação

Um sistema de comunicação é um sistema que confere um conjunto de características desejáveis e previsíveis ao fenômeno da comunicação. Um sistema de comunicação apresenta uma interface de acesso, através da qual os agentes emissores e receptores enviam e recebem mensagens de forma controlada e segura. Um sistema de comunicação se encarrega de coordenar os elementos intermediários da comunicação, especialmente o canal, visando garantir a entrega, bem como proteger a integridade e eventualmente a confidencialidade da mensagem durante o seu transporte.

São exemplos de sistemas de comunicação: a Internet, imprensa, sistema de correio postal, telégrafo, rádio, televisão, redes de computadores em geral etc. A figura 29b apresenta um esquema abstrato de um sistema de comunicação.

Figura 29b. Elementos de um sistema de comunicação.

Perceba que em um sistema de comunicação os controles são aplicados à mensagem, visando sobretudo protegê-la quanto a distorções devido ao ruído ou falhas oriundas do meio. Em um sistema de correio postal, os agentes emissor e receptor são o remetente e o destinatário. A mensagem que deve ser enviada é a correspondência postal, empacotado na forma de um envelope ou caixa. A linguagem comum empregada entre o emissor e o receptor pode ser composta pela língua portuguesa, pelos conceitos de carta, envelope, pacote, endereço postal, CEP etc. A interface de um sistema postal pode ser uma

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caixa de correio ou o atendente em uma agência. Os controles empregados envolvem a verificação do endereço, a formação de manifestos de carga, a logística de transportes, o eventual retorno ao remetente no caso de não ser possível a entrega. Os ruídos podem ser decorrentes de inundações, greves, dificuldades na entrega, acidentes diversos etc. Em um sistema de televisão, os agentes emissor e receptor são os produtores de programas televisivos e os telespectadores. A mensagem é o próprio conteúdo áudio-visual que usa a linguagem televisiva, de comunicação de massa. A principal interface do sistema de comunicação televisiva é a cadeia televisiva. Mas o sistema é estruturado em níveis, envolvendo os níveis da rede de distribuição de sinal e das antenas de broadcast. O canal empregado no nível de broadcast é aberto é o controle de emissão é centralizado, com o uso de equipamentos para verificar que o sinal possui a qualidade desejada, o que pode ser através da instalação de monitores e receptores geograficamente distribuídos. O controle da recepção no nível de broadcast é distribuído, e feito pelo próprio telespectador. Nos níveis de cadeia televisiva são empregados outros controles, como análise de pesquisas de opinião, monitoramento da audiência através do IBOPE etc.

3.7.3. Um Sistema de Comunicação é organizado em Camadas

Um sistema de comunicação é usualmente formado por vários elementos hierarquizados que compõem o meio através do qual funciona o canal e no qual surgem os ruídos. Enquanto o meio provê ao canal um conjunto de características lógicas e (ou) físicas bem conhecidas, isto é, dentro dos limites de tolerância esperados (inclusive ruído), o próprio meio também pode depender de características lógicas e físicas de outros elementos inferiores. Desta forma, um sistema de comunicações é organizado de forma hierárquica, isto é, em camadas. A figura 29b apresenta um modelo abstrato de organização de sistemas de comunicação em camadas.

Figura 29b. Organização Hierárquica de um Sistema de Comunicação.

A figura 29b descreve que o canal de um sistema de comunicação é a camada superior deste sistema,

chamada de camada de nível n. Para que este canal/camada possa controlar o transporte da mensagem ele utiliza-se das funções providas pela interface (de acesso) ao meio (da camada n). Do ponto de vista da organização hierárquica do sistema de comunicações, o meio de acesso à camada n é a camada/canal de ordem n-1. O controle do canal/camada de ordem n-1 utiliza-se, de forma similar à camada n, das funções e características da interface de acesso ao meio de ordem n-1, o qual vem a ser o canal/camada de ordem n-2. Este processo organiza-se de forma aninhada, até que seja encontrado o meio físico (camada física) do sistema de

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comunicação, cujos controles são definidos apenas pelas propriedades físicas da matéria e energia empregadas para transporte.

3.7.2. Protocolos de Comunicação

Os controles das várias camadas/canais/níveis de um sistema de comunicação necessitam empregar linguagens próprias para coordenar a comunicação, as quais são chamadas de Protocolos de Comunicação. Um protocolo de comunicação é, portanto, uma linguagem de natureza formal usada na coordenação ou controle da comunicação em um determinado camada/canal/nível de um sistema de comunicações.

De modo diferente de um protocolo usado para comunicação entre agentes humanos, um protocolo de comunicação entre dispositivos digitais deve ser mais rígido, pois tais sistemas possuem pouca capacidade de tratamento da ambigüidade exibida por sistemas e protocolos de comunicação não humanos.

Figura 29c. Uma organização da família de protocolos TCP/IP em cinco camadas. Fonte:

[www.wikipedia.org]

Um exemplo de protocolo de comunicação computacional é o Hipertext-Transfer Protocol (http), usado

para permitir a troca de conteúdos multimídia entre servidores e navegadores web. O http é descrito detalhadamente em normas e documentos com na RFC 26169. Faz parte da descrição de um protocolo de comunicação a definição:

• Dos tipos de agentes que participam da comunicação (navegador, servidor, cliente, interlocutor, radialista, audiência, platéia etc), quais os papéis desempenhados por cada tipo (inicia diálogo,

9 Fielding et alli. Hypertext Transfer Protocol -- HTTP/1.1. Disponível http://tools.ietf.org/html/rfc2616. Último acesso em maio de 2008.

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controla fluxo, recebe mensagem, observa evento, envia pedidos, envia resposta etc) e de quais os modos de atuação destes (ativo, passivo, mediador, roteador, cliente, servidor, parceiro, agente autônomo etc);

• do nível/camada ou canal onde o protocolo é utilizado (ex: http é um protocolo de nível de aplicação nos modelos TCP/IP e OSI), e de sua relação com o meio (ex: o http é baseado em sockets TCP, o diálogo é baseado na fala, a ethernet é baseada em um barramento comum, a telefonia analógica é baseada em circuitos comutados etc);

• do propósito ou objetivo do protocolo (ex: http é para uso em sistemas de informação multimídia, colaborativos e distribuídos, o diálogo é usado para troca de informações entre seres humanos fisica ou logicamente próximos etc);

• da terminologia utilizada para descrever o protocolo (ex: http usa e define termos como conexão, mensagem, pedido, resposta, recurso, uri, método de pedido, entidade, cliente, agente do usuário, servidor etc; o diálogo é baseado em frases, pausas etc);

• do funcionamento geral do protocolo, isto é, seus controles (ex: o http é um protocolo de pedido e resposta. O cliente envia um pedido para o servidor com uma estrutura bem definida, baseada em métodos de pedido, URI, versão de protocolo, mensagens MIME-like e um possível conteúdo que forma o corpo do pedido. O servidor responde com uma linha de status, seguida por um conjunto de mensagens MIME-like, e um possível conteúdo que forma o corpo da resposta etc).

• de uma gramática descrevendo precisamente o formato das mensagens do protocolo (ex: a sintaxe de uma URL é como definida no quadro abaixo) http_URL = "http:" "//" host [ ":" port ] [ abs_path [ "?" query ]]

• Vários outros aspectos que descrevem o significado, condições, regras e restrições quanto ao uso adequado do protocolo;

Em sistemas de TIC, especialmente nas redes de computadores e de telecomunicações, existe uma

infinidade de protocolos desenvolvidos, alguns bastante conhecidos, e outros obscuros e usados apenas em sistemas fechados de comunicação.

Muitos protocolos associados formam famílias como a TCP/IP e OSI, as quais são organizadas em camadas. São exemplos de protocolos e famílias de protocolos:

• Família TCP/IP de protocolos de sistemas abertos, composta por protocolos como 802.11, IP, ICMP, UDP, TCP, DNS, FTP, SMTP, POP3, TELNET etc. A família de protocolos TCP/IP é organizada em 4 camadas, conforme a figura 29c.

• Família OSI de protocolos de sistemas abertos, composta por protocolos como FTAM, X.400, CLNP, X.500 etc;

• FTP – usado para transferência de arquivos na internet • SMTP e POP3 – usados para intercâmbio de emails; • TLS – usado para criar comunicações http seguras através de criptografia. Em sistemas de comunicação empregados para uso por humanos os protocolos são mais flexíveis, visto

a capacidade do ser humano de reconhecer falhas e solucionar ambigüidades, permitindo a recuperação da troca de mensagens. Um exemplo simples é um protocolo para falar ao telefone. Este protocolo:

• O nível de conversação e a linguagem é a humana falada; • Ter por objetivo passar mensagens audíveis entre seres humanos, em qualquer situação de

necessidade; • A terminologia de uso do telefone envolve: aparelho telefônico, gancho, discador, número, código

de área, cumprimento de saudação, diálogo, cumprimento de encerramento da ligação, toque de ocupado, tom de discar;

• O funcionamento geral do protocolo é o seguinte: (i) tirar o fone do gancho; (ii) esperar tom de discagem; (iii) discar número; (iv) aguardar toque até que a chamada seja atendida; (v) iniciar conversação com saudação ao atendente; (vi) conversar; (vii) encerrar conversa; (viii) repor fone no gancho.

• Uma gramática descrevendo precisamente o protocolo poderia ser definida por meio de uma máquina de transição de estados, não apresentada aqui;

• Outras características do uso de um telefone são: (i) não se pode discar se o tom de discar não está ativo; (ii) após receber um sinal de ocupado deve-se repor o fone no gancho etc.

Em suma, protocolos de comunicação fazem parte do dia a dia de uma sociedade, seja ela baseada ou não em computadores.

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3.7.3. Sistemas de Comunicação de Massa

Em alguns sistemas de comunicação uma mensagem é enviada simultaneamente para milhares, milhões ou mesmo bilhões de pessoas, como é o caso dos sistemas de rádio e televisão. Nestes sistemas, chamados de sistemas de broadcast ou de rádio-difusão, é difícil coletar o feedback do receptor.

Dado o impacto potencial que tais sistemas produzem na eventual transmissão de mensagens para um grande conjunto de receptores (aqui chamados de audiência), os sistemas de comunicação de massa são em geral sujeitos a maior controle no seu uso por parte da sociedade.

O desenvolvimento de linguagens a serem empregadas nos sistemas de comunicação de massa é objeto de pesquisas intensas na área de comunicação social, dado o poder que confere aos que a dominam.

3.7. Exercícios

1 Mostre um exemplo de um fenômeno de comunicação que você experimenta frequentemente. Situe os elementos emissor, receptor, linguagem, mensagem, canal, meio, ruído e feedback.

2 Cite pelo menos 10 protocolos de comunicação que você usa freqüentemente.

3 Cite exemplos de um sistema de comunicação que você usa frequentemente. Descreva os elementos estruturais e comportamentais deste sistema.

4 Escolha um protocolo de comunicação bem conhecido por você e descreva-o detalhadamente, quanto a: (i) agentes envolvidos na comunicação; (ii) nível de uso do protocolo utilizado, (iii) relação do protocolo com o meio, (iv) propósito ou objetivo do protocolo, (v) terminologia (vários termos) utilizada para descrever o protocolo, (vi) funcionamento geral do protocolo, (vii) gramática ou maquina de transição de estados descrevendo a elaboração das mensagens do protocolo; (viii) outros aspectos que descrevem o significado, condições, regras e restrições quanto ao uso adequado do protocolo

3.8. Psicologia e Sistemas Cognitivos

Cognição é o processo através do qual um agente interpreta uma mensagem recebida, e tem como resultado a produção de informação. Durante a cognição um agente procura dar significado ao ambiente que o cerca. A cognição é um dos principais objetos de estudo da Psicologia, que investiga quais as estruturas e processos que conduzem um agente à produção da informação ou da compreensão do ambiente que o cerca, sendo a psicologia humana especialmente interessada no funcionamento do cérebro, que compõe, juntamente com o restante do sistema nervoso, o principal sistema cognitivo do corpo humano.

Se tomarmos por base a afirmação de que a cognição é o processo que produz informação, então a informação só existe no interior de sistemas cognitivos. Neste caso, fora dos sistemas cognitivos não existe informação. Apenas dados representados usando cadeias de símbolos em alguma linguagem. Uma forma de melhor ajustar esta afirmação e suas conseqüências aos ambientes tecnológicos de informação com os quais trabalhamos, é dizermos que qualquer dispositivo computacional também é cognitivamente ativo, e que suas limitações decorrem do fato de que a linguagem empregada para comunicação com este dispositivo é muito limitada, bem como a quantidade de informação que o dispositivo pode produzir é bastante reduzida.

Em suma, quanto mais poderosas forem as linguagens compreensíveis por um agente, maior será sua capacidade cognitiva, e consequentemente maior será sua capacidade de extrair informações de uma mensagem.

Uma das teorias mais conhecidas sobre a gênese e funcionamento dos sistemas cognitivos humanos foi estabelecida por Piaget10, através de seu modelo de estágios de desenvolvimento cognitivo humano, conforme sumarizado na Figura 30.

10 http://en.wikipedia.org/wiki/Jean_Piaget

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Fig. 30: Estágios do Desenvolvimento Cognitivo Humano. Fonte:

[http://projects.coe.uga.edu/epltt/index.php?title=Piaget's_Stages]

Segundo o modelo de Piaget, o sistema cognitivo humano é desenvolvido em 4 estágios. O estágio sensório-motor vai do nascimento até os dois anos de idade. Neste estágio o ser humano realiza atividades sensoriais e motoras, mas ainda não emprega linguagem simbólica. Não é possível neste estágio prever as reações a uma determinada ação, e o indivíduo está continuamente aprendendo por tentativa e erro. Não há clara separação entre o eu (self) e o resto do mundo. O estágio pré-operacional vai dos dois aos sete anos. Neste estágio o ser humano aprende a usar as linguagens. A memória e a imaginação se tornam possíveis devido à incorporação de símbolos. Embora possa se situar no passado e futuro, ainda não é capaz de estabelecer claras relações entre causa e efeito. Desenvolve-se uma noção de separação entre o eu (self) e o mundo. O estágio operacional concreto vai dos 7 aos 11 anos. Neste estágio nos tornamos capazes de manipular símbolos de forma lógica e sistemática. Aprende-se a desenvolver relações entre causa e efeito, e as conseqüências dos atos concretos. O último estágio, operacional formal, inicia-se na adolescência. Neste estágio desenvolve-se plenamente a capacidade de abstração. O ser humano torna-se capaz de levantar e provar hipóteses, isto é, prever o que aconteceria se determinados atos fossem realizados.

3.8. Exercícios

1 Há um paralelo entre o estágio cognitivo sensório-motor humano e a capacidade sensório-motora de uma empresa? Exemplifique caso consiga estabelecer algum paralelo. Justifique sua resposta

2 Há um paralelo entre o estágio cognitivo pré-operacional humano e a capacidade pré-operacional de uma empresa? Exemplifique caso consiga estabelecer algum paralelo. Justifique sua resposta

3 Há um paralelo entre o estágio cognitivo operacional-concreto humano e a capacidade operacional-concreta de uma empresa? Exemplifique caso consiga estabelecer algum paralelo. Justifique sua resposta

4 Há um paralelo entre o estágio cognitivo operacional-formal humano e a capacidade operacional-formal de uma empresa? Exemplifique caso consiga estabelecer algum paralelo. Justifique sua resposta

3.9. Sistemas de Software

É possível estabelecer-se como um dos grandes marcos divisores de águas na evolução dos sistemas de tratamento da informação o surgimento do computador digital e seu modelo flexível de tratamento da informação através de software, como discutido anteriormente.

3.9.1. Um software é uma mensagem

O software não é uma máquina, mas sim uma mensagem que contém uma descrição de máquina. Software por si só NÃO é um artefato capaz de realizar trabalho, a menos que exista uma máquina (Sistema de Computação), possuída por um usuário, que carregue e interprete as instruções e informações contidas na mensagem que é o software. Desta interpretação resulta a construção de OUTRO sistema de computação, de outra máquina, de complexidade superior, com o qual interage o usuário.

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Deste modo, na análise de qualquer sistema de computação suportado por software estaremos tratando com duas máquinas: MPU – Máquina Possuída pelo Usuário e MCSW – Máquina Construída por Software. MPU é a máquina possuída pelo usuário antes da interpretação do software. MCSW é o sistema com o qual o usuário interage durante o ‘uso do software’. É uma máquina construída pelo software. A Figura 31 descreve esta relação.

Fig. 31: O software induz o computador à criação de uma nova máquina.

3.9.2. Linguagens e hierarquias de software

Da mesma forma que um motorista segue uma seqüência organizada de passos para guiar um automóvel, existe uma linguagem de conversação entre usuário e um sistema de computador, definida por uma estrutura sintática (forma) e semâtica (significado) usada para construção de sentenças (frases) nesta linguagem. Ao ‘software em interpretação’ é permitido conversar com parte ou todo do sistema de computador, o que permite que tarefas da MPU sejam realizadas sob interferência da MCSW. Esta linguagem é usualmente descrita no manual do usuário do software. Um programador de computador é, portanto, um construtor de linguagens!

Pode-se perceber, que a construção de tais máquinas pode ser organizada sob diversas formas, especialmente através de uma relação hierarquizada, bastando que cada máquina, uma vez construída, ofereça para o usuário a capacidade de carga e interpretação de planos de construção de novas máquinas (o software). Na relação hierárquica de mais baixo nível atinge-se a máquina de ordem 0, construída não mais através de carga e interpretação dinâmica de um software, mas sim através de dispositivos fisicamente imutáveis (o computador de von Neumann). Esta máquina 0 é chamada de hardware. A Figura 32 apresenta esta relação na forma de um exemplo. Suponha a situação na qual um usuário encontra-se usando um editor de texto como o Writer. Para isto ele envia comandos ao writer e recebe a saída produzida por esta “Máquina Writer”. Como esta “Máquina Writer” foi contruída? Através de outra conversação que o usuário teve com a “Máquina Windows”, que ele possuía. Durante esta conversação o usuário enviou para a “Máquina Windows” uma mensagem de carga do software “Writer”. Após da interpretação desta mensagem a “Maquina Windows” foi transformada em uma “Máquina Writer”, que expandiu todas as funções da “Máquina Windows”. Mas como esta “Máquina Windows” veio à existência? Por intermédio de outra conversação mais remota que o usuário teve com seu “Computador PC”, na qual ele solicitou ao “Computador” para interpretar uma mensagem de carga de software, contendo como mensagem o código do sistema operacional Windows. Perceba que para cada máquina diferente desta hierarquia são empregadas distintas linguagens, sendo algumas delas linguagens de programação, como no caso das mensagens de carga de software. O usuário final, no entanto, conversa com um computador por meio de uma linguagem mais restrita, que usualmente está associada às tarefas específicas que ele deve realizar numa organização ou em seu ambiente doméstico.

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Fig. 32: A natureza hierárquica do software, para um usuário do Writer.

3.9. Exercícios

1 Construa uma mensagem para ser interpretada pelo computador descrito na Seção 3.3 que faz com que o computador se transforme numa máquina de multiplicar que recebe dois números inteiros positivos e produz como resultado o produto entre eles, acrescido do valor 5.

2 Analise o conjunto de processos computacionais que estão funcionando em seu computador neste determinado momento. Se estiver usando uma máquina Windows digite CTRL+ALT+DEL para vê-los. Conte quantas máquinas estão simultaneamente em funcionamento neste determinado instante. Destrua uma destas máquinas. Crie duas novas máquinas.

3 Analise o conjunto de processos computacionais que estão funcionando em seu computador neste determinado momento. Descreva pelo menos uma hierarquia de dependências entre máquinas que existe no seu computador neste instante.

3.10. Organizações Humanas e Sistemas de Gestão

Paralelamente ao desenvolvimento da cibernética e da ciência da computação consolidou-se ao longo do Século XX um ramo de aplicação das ciências sociais, denominado Ciências Administrativas, cujo objeto de estudo é a eficiência e eficácia da atuação organizações humanas formais e com propósito específico, como as empresas públicas e privadas. Uma empresa é um sistema complexo que atuam em um ambiente que é a própria sociedade, através da percepção dos fatos que ocorrem no seu ambiente e da realização de ações correspondentes, pictorialmente poderia ser representada como na Figura 33.

Fig. 33: Uma organização humana é um sistema continuamente sujeito às pressões do ambiente.

A fim de que uma organização possa desempenhar adequadamente sua missão e funções ela precisa ser adequadamente controlada, ou em termos mais precisos, gerida ou administrada. A prática das ciências

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administrativas, denominada administração ou gestão de empresas define classicamente um conjunto de cinco funções da administração: (i) planejamento – compreende a definição das metas a serem futuramente alcançadas pela empresa, e a correspondente elaboração de planos de atividades e alocação de recursos para efetivo alcance de tais metas; (ii) organização – a alocação de recursos humanos, físicos, tecnológicos e informacionais capazes de viabilizar a execução os planos; (iii) direção – a motivação, liderança e atuação das pessoas durante a consecução das atividades organizacionais; (iv) controle – o emprego de medições e ações de ajuste que garantem que as ações organizacionais estão executadas de forma eficaz e eficiente e; (v) recursos humanos – a seleção, preparação e desenvolvimento das pessoas que atuam no ambiente organizacional. Estas cinco funções são aquelas idealmente desempenhadas por um subsistema dentro da própria organização que é chamado de sistema de gestão. A Figura 34 apresenta uma visão mais detalhada de como este sistema de gestão se instala dentro da organização.

Figura 34 – Os sistemas de Gestão coordenam a atividade de uma organização.

De modo simplificado, um Sistema de Gestão pode ser visto como um sistema de controle cibernético

implantado dentro de uma organização, como ilustra a Figura 34. Ressalva-se o fato de que uma empresa não é um sistema servo-mecânico, mas sim um corpo complexo, formado por pessoas, procedimentos e outros sistemas como de compra, venda, produção etc, que por sua vez interagem em um ambiente complexo de natureza econômica, cultural, política e social. Desta forma, um Sistema de Gestão assemelha-se mais propriamente ao sistema cognitivo de uma organização. Seus sensores e atuadores se irradiam por todos os níveis e coordenam as principais transações internas e externas da organização. Usualmente a gestão é dividida em três níveis: (i) estratégica – de nível máximo da organização, com visão de médio e longo prazo; (ii) tática – de nível intermediário, focada nas transações de curto prazo, como acompanhamento de produção diária, semanal e mensal e (iii) operacional – de nível inferior, coordena as atividades que são usualmente realizadas várias vezes por dia. Esta divisão representa uma visão idealizada da gestão, em profundos ajustes devido ao avanço da tecnologia da informação.

Nesta visão das ciências administrativas um sistema de gestão de uma empresa é, portanto, um conjunto de elementos de propósito geral na sua origem, mas que, da mesma forma que um computador de von Neumann, foi ajustado às condições específicas e variáveis da organização, por meio das suas próprias funções. Deste modo, se for preciso gerir uma empresa que produz e vende parafusos, por exemplo, será necessário o desempenho das funções de planejamento da produção e venda de parafusos, organização da produção e venda de parafusos, direção da produção e venda de parafusos, controle da produção e venda de parafusos e a gestão de recursos humanos para produção e venda de parafusos.

O elemento estruturador da ação realizada em qualquer dos níveis da organização é a execução planejada e controlada de uma seqüência de atividades visando o cumprimento de uma função. A esta execução dá-se o nome de processo. Sem a existência de processos não é possível a constância da ação organizacional, nem tampouco o planejamento e a organização, que compreendem a essência da gestão. Processos são, portanto, elementos fundamentais para a existência da gestão. Processos organizacionais são usualmente descritos, de forma abstrata, por fluxogramas de atividades, como o da Figura 35, que descreve um fluxo de processo para gestão de requisitos durante o desenvolvimento de software em uma organização.

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No entanto, não se deve confundir o processo organizacional com a descrição do processo por meio de um modelo de processo. O modelo de processo representado na Figura 35 é apenas uma abstração de como deve ser realizado o processo. O que ocorre de fato depende de vários outros aspectos.

Figura 35. Um modelo de processo para a gestão de requisitos de software em uma organização.

A relação entre um modelo de processo organizacional e o processo organizacional efetivamente executado é similar à relação que existe entre um software (seqüência de instruções escritas em uma linguagem de programação que visam o desempenho de uma função) e entre o processo de execução deste software no interior de um sistema de computador. O software é apenas uma descrição, enquanto o processamento de dados conforme um software depende da existência de um sistema que o suporte.

À distância ou desvio que existe entre a forma como um processo organizacional é descrito pela organização e entre a forma como o processo é de fato realizado dá-se o nome de não conformidade. Esta distância é usualmente medida através de processos de auditoria. Enquanto a gestão é responsável pela execução do processo em aderência ao modelo de processo definido, a auditoria avalia se o processo estabelecido está sendo efetivamente realizado conforme o modelo estabelecido, bem como avalia se o próprio modelo de processo, neste caso chamado de controle, atende aos interesses da organização.

3.10. Exercícios

1 Analise a organização para a qual trabalha. Indique, nesta organização, quais são os cargos das pessoas responsáveis pela: – função de planejamento, no nível estratégico – função de planejamento, no nível tático – função de direção, no nível operacional – função de controle, em qualquer nível

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2 Analise a organização para a qual trabalha. Descreva, nesta organização, pelo menos 3 processos de funcionamento, de qualquer nível. Para cada processo esboce um fluxograma modelando este processo, contendo pelo menos 3 atividades cada um. Apresente pelo menos um ponto de decisão em um dos processos

3 Analise a organização para a qual trabalha. Descreva, nesta organização, pelo menos 3 não conformidades que você já identificou durante sua vida profissional. Julgue qual o risco que estas não conformidades apresentam para o cumprimento da missão da organização.

3.10.1. Sistemas de Gestão da Qualidade

O conceito de Sistemas de Gestão da Qualidade teve sua origem no Japão do Pós-Guerra, e consiste no aprimoramento das funções clássicas e genéricas da administração (planejamento, organização, direção, controle e recursos humanos), visando atender ao segmento das empresas fabris. Um Sistema de Gestão da Qualidade é um Sistema de Gestão, mas com foco nos conceitos de qualidade. A abordagem consistia na melhoria da qualidade dos produtos das indústrias por meio da melhoria da qualidade nos processos produtivos destas indústrias. O principal arcabouço dos sistemas de gestão da qualidade consiste na aplicação do ciclo PDCA: Plan, Do, Check e Act. O PDCA é um processo de melhoria contínua da atuação da organização através da aplicação cíclica dos seguintes sub-processos: Plan (planejamento, conforme as funções clássicas da administração), Do (execução, similar à organização e direção, também conforme as funções clássicas), Check (monitoramento, uma subdivisão da função de controle da administração clássica, na qual são coletados dados sobre a atividade da organização, e os mesmos são submetidos à análise crítica da alta administração) e Act (agir, uma subdivisão da função clássica de controle, onde as ações corretivas e de melhoria são executadas). Perceba que, neste caso, a melhoria é obrigatória, o que caracteriza um dos pilares da gestão pela qualidade.

Trata-se, portanto, de uma visão sistêmica, onde se deixa de olhar apenas o resultado final da atuação de uma empresa: os produtos e serviços ofertados pela organização, para foca-se na organização dos processos ou comportamentos internos desta. Atualmente este conceito está incorporado nas principais normas internacionais para melhoria da gestão de empresas, especialmente às normas das famílias ISO-9000 (qualidade de sistemas de gestão em geral), ISO-14.000 (qualidade em sistemas de gestão ambiental) e ISO-27.000 (qualidade em sistemas de gestão da segurança da informação). A Figura 36 apresenta um modelo de sistema de gestão da qualidade aplicado na gestão da segurança da informação.

Fig. 36: Ciclo PDCA aplicado à gestão da segurança da informação. Fonte: [NBR ISO/IEC 27002:2006].

3.10.1. Exercícios

1 A sua organização emprega o ciclo da qualidade nos seus processos de gestão, mesmo que parcialmente? Justifique sua resposta

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3.10.2. Sistemas de Gestão da Tecnologia da Informação

A identificação, análise e síntese de sistemas de informação organizacionais computadorizados é uma abordagem aplicada de forma especializada por profissionais conhecidos como “analistas de sistemas”. Um analista de sistema (computacional) é um indivíduo, usualmente de formação superior teoricamente apto a identificar, dentro de uma organização humana, quais as necessidades e problemas no tratamento da informação desta organização durante o desempenho de suas transações. De forma objetiva o analista de sistemas também define e orienta a construção de um sistema de computadores apoiados por softwares, capaz de manipular e atender satisfatoriamente estas necessidades de informação.

A Tecnologia da Informação, TI, é um sistema interno à organização, que é responsável por automatizar a manipulação (coleta, cálculo, armazenamento, busca e recuperação etc) das informações de interesse de uma organização humana. A TI também é dita ser uma nova função administrativa, da mesma forma que as cinco funções administrativas anteriormente citadas. A manipulação de informação pelos sistemas providos pela TI atende de forma mais específica aos interesses da gestão da organização. Na visão tecnicista da tecnologia da informação o que é fornecido à gestão da organização são sistemas (ou serviços) de informação.

A TI, por possuir peculiaridades como necessidade de constante atualização e domínio de grandes mudanças tecnológicas, se organiza também na forma de uma organização. A TI é composta por várias partes, como: (i) pessoas desempenhando papéis no suporte ao aparato tecnológico, usuários que usam a interface tecnológica para terem atendidas suas necessidades de informação, clientes que atuam na especificação de suas necessidades de sistemas e gerentes de TI que coordenam o pessoal técnico e de suporte; (ii) processos e procedimentos bem definidos para tratamento de incidentes, solução de problemas, monitoramento de redes de computadores, desenvolvimento de projetos; e por fim, (iii) todo o aparato tecnológico de computadores, softwares, bases de dados e redes de comunicação.

A Figura 37 apresenta uma visão esquematizada de um sistema de tecnologia da informação dentro de uma organização. Perceba que os processos de uma organização de TI podem ser classificados em processos operacionais (aqueles executados rotineiramente) e processos de projeto (aqueles executados periodicamente, e que visam introduzir mudanças na organização).

Fig.37: A Tecnologia da Informação é também uma organização, que provêm à organização hierarquicamente

superior o suporte tecnológico ao funcionamento de um conjunto de sistemas de informação.

Perceba que nas representações indicadas nas Figuras 37 e 34 os sistemas de gestão possuem

similaridade estrutural e funcional com os sistemas de informação. Esta sobreposição é sintomática do conflito que existe entra a gestão das empresas e a Tecnologia da Informação.

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3.10.2. Exercícios

1 Investigue o sistema de TI da sua organização. Enumere pelo menos 2 elementos em cada uma das classes de elementos da TI: tecnologias, processos e pessoas.

2 Descreva um processo operacional do qual você participou numa organização de TI, seja na condição de executor ou de cliente. Use um fluxograma para elaborar esta descrição, formado por pelo menos três atividades.

3 Descreva um processo de projeto no qual você participou numa organização de TI, seja na condição de executor ou de cliente. Use um fluxograma para elaborar esta descrição, formado por pelo menos três atividades.

3.10.3. Sistemas de Gestão da Informação

Uma organização humana formal (empresa) pode ter uma longa existência, realizando ações de forma persistente ao longo de vários anos, a despeito da contínua substituição das pessoas que realizam tais ações. Isto só é possível porque o funcionamento de uma organização não depende da decisão individualizada de seus gestores e colaboradores, mas sim de uma visão coletiva de como procedimentos e processos devem ser desempenhados por qualquer pessoa que nela atue. Esta estabilidade é devida principalmente à gestão da organização. Mas a visão de uma empresa perfeitamente gerenciada é utópica, pois por outro lado, de forma mais ampla, todos os agentes humanos que nela atuam precisam de acesso à informação por meio de sistemas específicos, bem como outros difíceis de delimitar como as redes de relacionamento, que facilmente extrapolam os limites da empresa. Uma empresa é também uma sociedade na qual existem relações de política, poder, cultura, comportamentos e interesses diversos. O comportamento coletivo da organização é influenciado pelo comportamento individualizado de cada um de seus colaboradores, bem como pelas variações nas condições externas. Nesta situação torna-se útil compreender uma abordagem generalista dos sistemas de gestão da informação, que tem suas origens na ciência da informação.

Um sistema de gestão da informação é um sistema que tem por função permitir que o ciclo de vida da informação seja realizado, visando atendimento às necessidades de informação de um grupo. Um ciclo da informação genérico pode ser composto pelas fases apresentadas na Figura 38.

Fig. 38: Um possível ciclo da informação.

Durante a evolução da ciência e técnica humana foram desenvolvidos vários sistemas para suportar

ciclos similares ao apresentado na figura 39, sendo o mais comum deles a Biblioteca. Uma Biblioteca é uma organização especialmente criada para apoiar o ciclo da informação, exceto no que se refere à criação da mesma. Dentro da perspectiva sistêmica uma biblioteca poderia ser modelada conforme a figura 39. Uma biblioteca é uma organização que pode ser genérica ou específica (temática). Uma biblioteca genérica coleta, organiza, armazena, distribui, permite a busca e o acesso de usuários a fontes de informação nas mais diversas áreas, atendendo ao interesse de curto, médio e longo prazo de uma sociedade.

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Fig. 39: Uma biblioteca (sistema) e seu usuário.

3.10.3. Exercícios

1 Descreva a última experiência que você teve utilizando um sistema de biblioteca pública ou interna à sua organização. Enumere os serviços providos por este sistema,

2 Descreva a última experiência que você teve desenvolvendo um sistema de gestão da informação na sua organização. Enumere os processos que são realizados ou apoiados por este sistema.

3.10.4. Sistemas de Comando e Controle

O conceito de comando e controle é aplicado principalmente à gestão de organizações militares. Comando e controle (C2) compreende a aplicação de foco a um conjunto de entidades (pessoas e organizações) e recursos, incluindo informação, visando o alcance de algum objetivo, tarefa ou missão. Formalmente, pode ser definido como “exercício de autoridade e direção por um comandante propriamente designado sobre forças a ele atribuídas e anexadas no cumprimento de uma missão”. As funções desempenhadas pelo C211 são: - Estabelecer a intenção da missão - Determinar papéis, responsabilidades e relacionamentos - Estabelecer regras e restrições - Monitorar e avaliar a situação e o progresso - Inspirar, motivar e internalizar confiança nas forças - Treinar e educar - Prover recursos (provisioning)

A Figura 40 apresenta um modelo conceitual das partes e fatores de qualidade em (um sistema de) comando e controle e como estas relações podem influenciar a efetividade no alcance de uma missão.

11 Undestanding Command and Control. David S. Alberts and Richard E. Hayes. The Command and Control Research Program (CCRP), 2006. Disponível URL: www.dodccrp.org

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Fig. 40: Um Modelo Conceitual de Comando e Controle. Fonte: (Alberts and Hayes 2006).

No modelo apresentado, são funções do comando: (i) o estabelecimento e a comunicação do conjunto inicial de condições, (ii) a contínua avaliação da situação; (iii) e as mudanças de intenção. Os resultados da ação do comando influenciam uma série de fatores como a intenção, a alocação de papéis e responsabilidades, as restrições sobre as ações, a compreensão das possibilidades futuras, a natureza da interação entre os participantes e a alocação de recursos. Destaca-se, conforme o esquema, que a qualidade do comando é fortemente influenciada pela qualidade da informação sobre a situação, bem como pela qualidade com que a missão está sendo executada.

As funções do controle são (i) determinar se os esforços correntes estão na trilha planejada e (ii) realizar ajustes necessários dentro do que foi estabelecido pelo comando. O controle atua sob delegação do comando, produzindo, de forma mais detalhada, ações similares às do comando, mas sem modificar as intenções estabelecidas pelo comando.

Os comportamentos desempenhados e ações executadas pelas pessoas e organizações que fazem parte de um sistema de comando e controle são baseados fundamentalmente no planejamento estabelecido. A administração clássica define as funções de planejamento e direção (execução) como sendo realizadas em tempos distintos, embora a prática demonstre que nenhum plano sobrevive à realidade, embora planejar seja imprescindível12. Desta forma, as ações reais desempenhadas em um sistema de comando e controle são apenas aproximações do planejado. A execução da ação dependerá, sobretudo de um componente de elevado teor cognitivo chamado de “sensemaking”. Trata-se da percepção da situação em tempo real, tanto por parte dos indivíduos envolvidos na ação como aqueles envolvidos com o comando e controle. O senso coletivo da situação influencia diretamente a tomada de decisão e a execução, que por sua vez produz efeitos no ambiente no qual a missão está sendo desempenhada. O resultado desta cadeia de acontecimentos produz um conjunto de informações, que são coletadas, organizadas e acessadas pelo comando, controle, pessoas e organizações envolvidas na missão.

Perceba que o feedback no modelo apresentado é provido fundamentalmente pela informação sobre as condições do ambiente e a qualidade da execução da ação.

Modelos de sistemas de comando e controle, como o esboçado aqui, podem ser usados tanto por organizações militares como por organizações em geral que estão sujeitas a severas restrições de tempo-real durante a execução de sua missão. A importância da compreensão de tais modelos, no caso de organizações militares, se dá pelo fato de que os envolvidos com a ação estão sempre no limiar de uma situação de crise, e sujeitos desta forma a tremendas pressões psicológicas.

12 Nas palavras do General Eisenhower: “durante a preparação para uma batalha eu tenho sempre achado que planos são inúteis, mas o planejamento é indispensável”.

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A Figura 41 apresenta um modelo para a montagem de unidades de decisão em situações de crise, que permitem aprimorar a qualidade do “sensemaking” em sistemas de comando e controle. As setas com sinais positivos e negativos indicam, respectivamente, como as os fatores afetam positiva ou negativamente os processos de tomada de decisão a partir de análise de informações em tempo-real. “Groupthink” é uma patologia de grupo estudada em psicologia, que eventualmente ocorre em grupos decisórios em momentos de crise com pouca preparação. É caracterizada por otimisto exagerado no alcance de resultados, falta de vigilância acerca das condições do ambiente, pensamento “sloganista” acerca das forças e amoralidades do grupo e perda do senso de realidade.

Fig. 41: Um Modelo Conceitual de Processos de Decisão e Implementação durante Crises. Fonte: [Key Readings in

Crisis Management, Dennis Smith and Dominic Elliot. Routeledge, 2006, 430pp].

3.10.3. Exercícios

1 Sistemas de comando e controle são adequados para aplicação na gestão de organizações cujas atividades são realizadas de forma altamente sistematizada e pouco sujeitas a restrições de tempo-real? Justifique sua resposta

2 Sistemas de comando e controle possuem pouca relação com as funções clássicas da administração? Justifique sua resposta

3 Um elevado nível de stress aumenta consideravelmente as habilidades cognitivas de um indivíduo?

4 Uma surpresa reduz o nível de stress de quem é surpreendido?

5 A auditoria de não conformidades é uma atividade tipicamente executada no âmbito de sistemas de comando e controle?

6 A mudança de missão ou intenção de missão em um sistema C2 é atribuição do controle.

7 Uma das atribuições do comando é executar diretamente a ação?

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4. Ecossistemas e Sistemas Complexos Adaptativos

A última parte deste texto apresenta um conjunto de modelos de sistemas mais generalistas, que pela sua natureza distribuída, se constituem em modelos que exibem uma série de propriedades comuns para a compreensão de sistemas complexos em geral.

A investigação dos sistemas complexos adaptativos constitui-se numa abordagem recente do conceito de sistema, com fundamentação na física, biologia, computação e ciências sociais. Esta área investiga quais as propriedades fundamentais que são comuns a qualquer sistema formado por um grande conjunto de elementos autônomos, sejam eles células, agentes econômicos, moléculas, entre outros. O exemplo paradigmático de sistema complexo é o ecossistema. Um ecossistema é uma (Wikipédia, 2008) “unidade natural que composta por vegetais, animais e micro-organismos que convivem em uma área, juntamente com as partes não vivas do sistema”. Algumas das características mais importantes de um ecossistema são as existências de teias alimentares e nichos ecológicos, como ilustra a figura 42.

Figura 42 – Teia alimentar do Pantanal. Fonte: [www.rainhadapaz.g12.br].

Uma teia alimentar apresenta o conjunto das relações de alimentares estabelecidas entre as populações de um ecossistema. Um nicho ecológico descreve como uma população responde à distribuição de recursos e competidores no ecossistema. O estudo de teias alimentares, nichos ecológicos e outros aspectos em ecossistemas permitiu que Charles Darwin formulasse uma das mais importantes teorias que auxiliam na explicação do funcionamento de sistemas ao longo do tempo, que é a Teoria da Seleção Natural. Avanços no uso de computadores permitiram a simulação de vários ecossistemas naturais e artificiais, levando à recentes descobertas de várias outras propriedades bastante importantes na análise e síntese de sistemas complexos.

4. Exercícios

1 Na figura 42, cada elemento do grafo representa uma população ou um subproduto animal ou vegetal.

2 O nicho ecológico de uma população indica o seu papel como presa ou predador, ou ambos, em um ecosistema.

4.1. Ecossistemas Artificiais

Ecossistemas Artificiais são também chamados de sociedades artificiais ou modelos baseados em agentes. Constituem-se normalmente de simulações de ambientes interativos em software, onde uma grande quantidade de agentes autônomos interage durante vários ciclos ou gerações, normalmente compartilhando, combatendo e trocando recursos com os outros agentes. O ecossistema é definido por um conjunto de elementos autônomos (simulados em software) que competem por recursos fluindo em ambiente dinâmico e em relativo isolamento. O

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comportamento individual de cada agente é descrito por um esquema de regras bastante simples, como uma relação do tipo (estado + ação) � (reação). As propriedades analisadas em um ecossistema podem ser eventualmente extrapoladas para contextos mais abrangentes (ou especializados, dependendo do ponto de vista) se considerarmos que qualquer sistema econômico, ou sistemas sociais em um escopo mais amplo, também apresentam as mesmas características básicas de um ecossistema natural: agentes autônomos interagindo (competindo e colaborando) na busca por recursos que fluem constantemente.

Uma descoberta relevante desta linha de investigação é o grande potencial de aplicações do Dilema do Prisioneiro na simulação de diversas propriedades de ecossistemas. O Dilema do Prisioneiro, primeiramente caracterizado em 1965, é um jogo de estratégia simples, baseado na Teoria dos Jogos13. A versão iterada do Dilema do Prisioneiro é capaz de suportar o estudo de diversos modelos de comportamento individual, onde a emergência de cooperação e competição pode ser observada de forma surpreendentemente rica. Através do uso de Algoritmos Genéticos – que simulam aspectos da teoria da seleção natural de Charles Darwin, conjuntamente com o uso do Dilema do Prisioneiro Iterado, torna-se possível detectar a emergência de fenômenos complexos como cooperação entre parentes, estruturas de oligopólios, manutenção de minorias genéticas, comportamento altruísta, etc.

Axelrod14 descreve diversas aplicações de variações do Dilema do Prisioneiro Iterado na modelagem do surgimento de normas e leis, na escolha de parceiros durante uma guerra, na criação e adoção de padrões comerciais, no comportamento de políticos e na disseminação de cultura. Nos parágrafos que se seguem será demonstrado um exemplo simples de experimento com ecossistemas artificiais.

4.1.1. Um Exemplo de Ecossistema Artificial

O exemplo e as figuras que se seguem são baseadas nos trabalhos de Lindgren e Nordhal descritos em [LANGTON, C., ed. Artificial life: an overview. USA: MIT Press, 1995.]. O trabalho analisa a dinâmica de um ecossistema que comporta mil indivíduos - chamados de jogadores, agentes, companheiros ou oponentes - interagindo durante trinta mil ciclos. A cada ciclo de interação cada um dos indivíduos se engaja em negociações com os outros 999 oponentes, aplicando uma estratégia para solução do Dilema do Prisioneiro Iterado. A situação que leva ao Dilema do Prisioneiro é ilustrada pela anedota que se segue.

O Dilema do Prisioneiro Iterado

Dois indivíduos foram presos, acusados de haver praticado juntos um crime. A menos que um deles confesse, não existem provas para manter ambos na cadeia por muito tempo. O promotor oferece uma recompensa para quem confessar o crime (denunciando o outro companheiro), e neste caso o que não confessou receberá uma sentença maior. Se ambos confessam (denunciam o companheiro) eles irão para a cadeia, mas por um período de tempo mais curto. Se nenhum confessa (cooperam entre si) eles serão eventualmente liberados por falta de evidências. A matriz de perdas e ganhos (payoff matrix) deste jogo de soma-não-zero15 é representada na Tabela 5.

Jogador 2

Coopera Denuncia

Coopera (R, R) (S, T) Jogador

1 Denuncia (T, S) (P, P)

Tabela 5: Esquema da matriz de perdas e ganhos usada no Dilema do Prisioneiro.

O Dilema do Prisioneiro se configura quando o ganho T (por ter denunciado o companheiro que cooperou) é maior que o ganho R (recompensa por cooperação mútua), que por sua vez é maior que P (ganho quando há denúncia mútua). O ganho S é o menor de todos e é aplicado ao indivíduo que cooperou, mas foi

13 VON NEUMANN, J.; MORGESTERN, O. The Theory of Games and Economic Behavior. 1949 14 AXELROD, R. The Complexity of Cooperation: agent based models of competition cooperation. USA: Princeton University Press. 1997. 272p. 15 A Teoria dos Jogos (von Neumann, 1949) define duas classes de jogos: de soma-zero e de soma-não-zero. Um exemplo de jogo-de-soma-zero é um bolão entre amigos, onde a soma das perdas (apostas - negativas) e ganhos (prêmios - positivos) de todos os jogadores é igual a zero. Exemplos de jogos de soma-não-zero são as loterias e os bingos, onde a soma das perdas e ganhos de todos os jogadores (apostadores) é diferente de zero.

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denunciado. A condição final para estabelecimento do dilema é que o ganho conjunto quando os dois companheiros cooperam (R + R) seja maior que o ganho conjunto nas situações onde um coopera e o outro denuncia (T + S), ou seja, 2R T + S. Os valores comumente aplicados aos jogos do Dilema do Prisioneiro são: R = 3, T = 5, P = 1 e S = 0, conforme mostra a Tabela 6.

Jogador 2

Coopera Denuncia

Coopera (3, 3) (0, 5) Jogador

1 Denuncia (5, 0) (1, 1)

Tabela 6: Valores comumente utilizados no Dilema do Prisioneiro.

4.1.1. Exercícios

1 O Dilema do Prisioneiro é um jogo de estratégia criado por estudiosos da Teoria dos Sistemas de Controle?

2 O Dilema do Prisioneiro é um jogo de soma não zero?

4.1.2. Seleção de Estratégias por Agentes

Qual estratégia deve um indivíduo adotar quando confrontado com este jogo durante várias iterações? Se sempre denuncia o outro companheiro esta estratégia induzirá o segundo à denúncia mútua, e o ganho global de um sistema onde todos os indivíduos denunciam tende para o valor 1. Por outro lado, se o indivíduo sempre coopera, é possível que ele receba cooperação mútua (ganho global 3), mas neste caso, a estratégia de melhor ganho do oponente será denunciar o companheiro e receber um ganho 5 em detrimento de prejuízo para o primeiro (ganho 0). O ganho global neste último caso tende para 2,5 = (5+0)/2. O Dilema do Prisioneiro pode ser visto como uma representação abstrata de situações de negociação que induzem a comportamentos de cooperação ou competição. Tais situações estão presentes em várias instâncias de sistemas dinâmicos reais como guerras, comercialização de produtos, comportamento grupal, interações em ecossistemas naturais, etc.

Configurado o jogo, o objetivo da simulação é identificar qual(is) é (são) a(s) estratégia(s) de ação mais bem sucedida(s) a ser(em) adotada(s) pelos agentes. Vários fatores dificultam a identificação destas estratégias: Como representar as estratégias? Quão complexas podem ou devem ser as estratégias? Qual a configuração inicial do jogo? Como selecionar as estratégias mais bem sucedidas? Como buscar novas alternativas no espaço possível de soluções?

Tomemos como exemplo o problema da configuração inicial do jogo. Se o sistema no qual um agente é inserido está totalmente habitado por agentes egoístas (que nunca cooperam) a única alternativa de sucesso para este agente é também assumir uma postura egoísta. Por outro lado, se o sistema é inteiramente habitado por agentes que sempre cooperam, a melhor estratégia do agente também é nunca cooperar, já que ele terá um ganho sempre superior ao dos oponentes. A adoção de estratégias se complica à medida que os outros agentes adotam estratégias mistas ou mais complexas, que levam em consideração, por exemplo, a história das interações anteriores com seus oponentes. A adoção da melhor estratégia dependerá, neste caso, da configuração atual do sistema - que afeta a configuração futura, qual a composição dos agentes, quantas interações irão ocorrer, etc. Neste ponto os Algoritmos Genéticos surgem como ferramenta de busca bastante conveniente.

4.1.3. Algoritmos Genéticos

Algoritmos Genéticos16 - Genetic Algorithms-GAs - foram concebidos por John Holland em 1975, e são inspirados nos fenômenos de interação e reprodução diferencial que ocorrem em ecossistemas naturais. Colocam à disposição do simulador de ecossistemas uma poderosa ferramenta de busca em espaços complexos,

16 MITCHELL, M. An Introduction to Genetic Algorithms. USA: MIT Press, 1997. 209pp.

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que permite encontrar estratégias que apresentam desempenho otimizado, enquanto se adaptam dinamicamente às condições atuais do sistema.

Algoritmos genéticos vêem a sobrevivência de um indivíduo como a busca (no sentido computacional) por comportamentos de sucesso (solução) em sistemas (um espaço de soluções). A forma geral de um algoritmo genético é:

1. Gere um conjunto de soluções candidatas, que constituirão sua população inicial. 2. Repita os passos abaixo até que um critério de convergência seja satisfeito:

a. Avalie o sucesso de cada uma das soluções (indivíduos que compõem a população) de acordo com um critério pré-estabelecido.

b. Decida quais candidatos (indivíduos) devem ser eliminados e quais estão aptos à sobrevivência. c. Produza novas variações da população utilizando operações aplicadas sobre os sobreviventes

de reprodução diferencial e alterações no código genético. Reprodução Diferencial - Os indivíduos com maior fitness ganham mais chances de gerar descendentes que serão os agentes da próxima iteração. Alterações no código genético – Existem alterações associadas à geração de um novo descendente. Estas alterações são efetuadas através de operadores genéticos, onde os principais operadores são os de crossover e mutação.

Tomando-se como exemplo o Dilema do Prisioneiro descrito acima, podemos descrever o genoma de

alguns indivíduos e suas estratégias. O genoma de um indivíduo que tem como estratégia nunca cooperar com o oponente poderia ser representado pela cadeia de bits "0". O genoma de um indivíduo que sempre coopera seria representado pela cadeia "1". Estratégias de ação mais complexas poderiam utilizar uma cadeia de dois bits, que consideraria, por exemplo, qual atitude foi tomada pelo oponente na iteração anterior, a fim de decidir o que fazer desta vez. A string "01" representaria, por exemplo, um indivíduo que executa uma dentre duas ações, dependendo do histórico de interações com seus oponentes:

- Primeiro bit - ação a ser tomada caso o oponente não tenha cooperado da vez passada. Como o valor do primeiro bit é "0" o agente não irá cooperar com o oponente desta vez.

- Segundo bit - ação a ser tomada caso o oponente tenha cooperado da vez passada. Como o valor do segundo bit é "1", o agente irá cooperar com o oponente desta vez.

Outras estratégias de ação ou problemas diferentes a solucionar podem usar uma quantidade diferente

de bits: 3, 4, 5, 30, 500, etc. A quantidade de bits depende do tipo tamanho do espaço de busca que se está analisando.

O descendente de um casal herda o código genético de seus pais (a seqüência de bits) onde aproximadamente metade do código genético de cada pai é repassado para o filho. Operadores de crossover recebem o genoma dos dois pais e definem em que ponto cortar o genoma de cada pai para gerar o genoma de um descendente com o mesmo tamanho. Suponha que pais P1 e P2 tem o código genético "0000" e "1111", respectivamente. Se o operador de crossover, por exemplo, despreza o genoma do pai P1 a partir do segundo bit, aproveitando o restante do genoma pai P2, o código do descendente seria "0111". A escolha de o ponto onde realizar o crossover é feita de modo estocástico.

Operadores de mutação alteram estocasticamente os bits do genoma dos novos indivíduos gerados. O operador de mutação mais simples é o point mutation, que inverte o valor de um bit. Por exemplo, se a probabilidade de point mutation (Ppoint mutation) é 1%, então, a cada 100 bits de genoma de descententes produzidos, o valor de um deles é invertido.

São problemas em aberto a escolha adequada das taxas de mutação e de crossover, bem como do tamanho da população. Mitchell17 indica que são em geral adotados os valores de 0,5% a 1% para taxa de mutação, 75-95% de taxa de crossover, e tamanho de população entre 20 e 100. O tamanho e estrutura do genoma da população deve ser adequado ao formato do espaço de soluções que se está explorando. Por exemplo, se o objetivo é encontrar o mínimo de uma função no plano cartesiano em um intervalo bem definido, a quantidade de bits do genoma deve ser capaz de representar, com a precisão necessária, os possíveis pontos no eixo das abcissas sobre o intervalo desejado.

4.1.3. Exercícios

1 Algoritmos genéticos foram criados para simular o fenômeno da seleção natural usando sistemas de computador?

2 O sexo é uma forma de produzir uma nova combinação de códigos genéticos entre dois indivíduos de mesma espécie?

17 MITCHELL, M. An Introduction to Genetic Algorithms. USA: MIT Press, 1997. 209pp.

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3 Mutações genéticas são fenômenos tipicamente simulados em algoritmos genéticos e permitem a exploração de novos espaços de soluções em organismos?

4.1.4. Algoritmos Genéticos Aplicados à Solução do Dilema do Prisioneiro Iterado

Aplicações de algoritmos genéticos ao Dilema do Prisioneiro Iterado são descritas a seguir. Suponha o caso mais simples, onde só existem dois tipos de indivíduos: os que cooperam e os que não cooperam. Neste caso a estratégia de cada indivíduo (o genoma do indivíduo) pode ser codificada através de um único bit, por exemplo: genoma = "0" - nunca coopera, ou seja, sempre denuncia o companheiro - e genoma = "1" - sempre coopera. Em um sistema composto apenas por populações de indivíduos "0" e "1" fica evidente que, quando submetidos à seguidas negociações entre si, os indivíduos "0" - que nunca cooperam - tendem a explorar os indivíduos "1" - que sempre cooperam. Com o passar do tempo, todos os indivíduos sobreviventes serão do tipo "0", e o ganho global deste sistema tende para o valor 1. O uso de um código genético com dois bits permite aos indivíduos o uso de estratégias de jogo mais sofisticadas (2 bits = 4 estratégias), como descrito através dos genomas abaixo:

- genoma "00": o indivíduo não coopera, qualquer que tenha sido a ação do oponente na vez anterior. Esta estratégia é chamada de AllD (always defect - sempre denuncia);

- genoma "01": se oponente não cooperou da vez passada => não coopera desta vez, se oponente cooperou => coopera desta vez. Esta estratégia é chamada de TFT (Tit-For-Tat - Dente-Por-Dente);

- genoma "10": oponente não cooperou => coopera. oponente cooperou => não coopera. Esta estratégia é chamada ATFT (Anti-Tit-For-Tat - Anti-Dente-Por-Dente);

- genoma "11": o indivíduo coopera, qualquer que tenha sido a ação do oponente na vez anterior. Esta estratégia ingênua é chamada AllC (Always Cooperate - sempre coopera).

A Figura 43 mostra a dinâmica populacional de um sistema constituído por 1.000 indivíduos durante 600

iterações (ou gerações). Inicialmente o pool genético da população é distribuído igualmente entre os quatro tipos descritos acima, de modo que o sistema inicia com 250 indivíduos de cada tipo: "00" (AllD), "01" (TFT) , "10" (ATFT) e "11" (AllC). Outros parâmetros da simulação são 0,02% de probabilidade de point mutation, 10% de taxa de crescimento (90% da população se mantém viva para a próxima iteração) e 1% de ruído na comunicação (estocasticamente, em 1% dos casos um indivíduo interpreta erroneamente como cooperação uma ação não-cooperativa de seu oponente, ou vice-versa).

Na dinâmica populacional mostrada na Figura 43 podem ser observados fenômenos de exploração, cooperação e mutações entre os indivíduos, delimitados nos intervalos 1 a 8 (parte superior):

Fig. 43: Dinâmica populacional de um ecossistema artificial durante 600 iterações. Adaptado de Lindgren e Nordahl.

- Intervalo 1 - exploração dos ingênuos - a população de indivíduos AllD ("00"), que nunca cooperam, aumenta rapidamente, pois estes exploram as estratégias ingênuas de AllC ("11") e o non-sense de ATFT ("10"). A população de TFT ("01") é ligeiramente reduzida, mas não sucumbe à exploração de AllD.

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- Intervalo 2 - declínio de populações não cooperantes, retorno das minorias - quando a população de AllD atinge seu auge, praticamente não existem outros indivíduos a quem explorar e o ganho médio da população de AllD decai de 5 para 1. O ganho entre os indivíduos AllD atinge um valor bem menor que o da população mais reduzida de TFT, próximo a 3. Neste caso, o fitness da população de TFTs é maior, e eles ocupam o espaço que anteriormente pertencia à população de AllD;

- Intervalo 3 - antigas populações encontram condições favoráveis e retornam à cena - quando a população de TFTs ocupa quase todo o sistema, sua estratégia cooperativa possibilita o ressurgimento da população AllC ("11"), oriunda de mutantes de TFT ("01");

- Intervalo 4 - exploração - a população ingênua de AllC atinge uma massa crítica e é dizimada pela exploração efetuada pelos ATFT, oriundos de mutantes de TFT;

- Intervalo 5 - exploração de antigos exploradores - indivíduos ATFT são novamente explorados pelos seus mutantes AllD, como ocorreu no intervalo 1;

- Intervalos 6, 7 e 8 - embora com taxas diferentes, ocorrem fenômenos similares ao que ocorreu nos intervalos 2, 3 e 4, respectivamente.

4.1.4. Exercícios

1 Conforme a simulação apresentada, as condições de sobrevivência de uma população de organismos com um determinado comportamento podem ser afetadas pela quantidade e qualidade no comportamento das outras populações?

2 Conforme a simulação apresentada, um indivíduo que sempre coopera com os outros terá altas chances de sobrevivência em um ambiente no qual os demais são todos não cooperantes?

3 Conforme a simulação apresentada, um indivíduo que nunca coopera com os outros terá altas chances de sobrevivência em um ambiente no qual os demais aplicam uma estratégica de olho por olho, dente por dente?

4.2. Sistemas Complexos

Retomando a discussão acerca dos conceitos de sistemas abertos de Bertalanffy, juntamente com os estudos dos ecossistemas artificiais e naturais, esta seção apresenta a última parte do texto, que consiste em uma introdução às teorias dos sistemas complexos, A fim de obter respostas fundamentais para explicar como as estruturas dissipativas se organizam de forma tão complexa como os seres vivos, nos últimos anos surgiu um novo paradigma de estudo chamado de ciência da complexidade ou dos sistemas complexos adaptativos. As ciências da complexidade dão um passo quântico em direção à unificação da ciência sistêmica, fundamentado na descoberta de novas propriedades dos sistemas interativos complexos. A complexidade examina e provê respostas para a questão de como emergem estruturas ou sistemas coerentes e intencionais, a partir das interações de componentes mais simples e que muitas vezes não possuem comportamento intencional. Em vez de tentar modelar, sintetizar e controlar um sistema altamente complexo usando uma abordagem analítica e de cima para baixo, a complexidade propõe uma nova concepção de síntese de sistemas, baseada em princípios fundamentais como: (i) fenômenos emergentes, (ii) criticalidade auto-organizada, (iii) evolução na borda ordem-caos e (iv) paisagens de aptidão (fitness landscapes).

4.2.1. Fenômenos Emergentes

Os fenômenos emergentes18 são usualmente relacionados com a idéia de sinergia, que diz que “o todo é maior que a soma das partes”. Fenômenos emergentes são comportamentos dinâmicos, analiticamente imprevisíveis mas computacionalmente simuláveis, que são persistentes e reais dentro do todo de um conjunto formado por elementos interativos. Fenômenos emergentes surgem a partir do desempenho de regras muito simples que são obedecidas pelos elementos que formam um sistema complexo. Um exemplo de fenômeno físico emergente é o redemoinho, que sempre surge quando a água escoa em um recipiente com determinadas características. Não há fórmula matemática analítica que consiga provar, a partir do comportamento das moléculas individuais de água, como o redemoinho se forma. Por outro lado, embora o surgimento do redemoinho seja não formulável do ponto de vista analítico-matemático, o redemoinho é robusto e persistente, pois sempre se forma se as mesmas condições forem fornecidas. Apenas construindo-se um experimento real, ou uma simulação computacional, é que se pode demonstrar a existência de fenômenos emergentes. Mas uma vez descoberto, o fenômeno emergente se torna uma propriedade imutável do conjunto ou sistema, a despeito da

18 HOLLAND, J. Emergence: from chaos to order. Reading, Mass: Addison-Wesley. 258pp.

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troca contínua de cada um dos elementos que fazem parte do mesmo, bastando que os novos elementos obedeçam às mesmas regras.

Fenômenos emergentes aparecem em jogos de tabuleiro como o xadrez, que possui um pequeno número de peças que obedecem a regras muito simples mas cuja combinação leva a uma infinidade de configurações possíveis. No xadrez emergem certos padrões de controle de peões, que uma vez descobertos aumentam grandemente a chance de se ganhar o jogo.

Uma compreensão visual de fenômenos emergentes pode ser obtida por meios como ecossistemas artificiais, bem como em autômatos celulares em simulações do Jogo da Vida (Game of Life), criadas por John Conway nos anos 1970. Um jogo da vida é baseado na criação de um espaço reticulado composto por várias células, que podem conter vida ou não. O jogo funciona ao longo de várias iterações, onde a existência ou não de vida em uma célula na próxima iteração dependerá das condições do contorno da célula, conforme as seguintes regras:

a. Caso uma célula esteja povoada:

a. Cada célula com apenas um vizinho, ou sem vizinhos, morrerá na próxima iteração, como se fosse de solidão

b. Cada célula com quatro ou mais vizinhos morrerá na próxima iteração, como se fosse devido a superpopulação;

c. Cada célula com dois ou três vizinhos sobreviverá à próxima iteração b. Caso uma célula não esteja povoada:

a. Se ela tiver três vizinhos estará povoada na próxima iteração b. Caso contrário continuará despovoada.

Através da aplicação das regras acima, usando um programa como o disponível em

[http://www.bitstorm.org/gameoflife/] é possível avaliar o surgimento de vários comportamentos coletivos visualmente interessantes, que se constituem em fenômenos emergentes sempre inesperados, pelo menos na primeira vez em que são observados.

O emprego intencional das propriedades dos fenômenos emergentes para controle de sistemas complexos é muito mais robusto que o emprego de mecanismos de controle concebidos artificialmente. Emergência é um princípio central que pode ser aplicado ao estudo de qualquer sistema coletivo e altamente interativo, tais como agregados moleculares, populações animais e sociedades humanas.

Figura 44 - Uma Simulação Computacional de um Fenômeno Emergente: Autômatos Celulares “Disseminando o

Evangelho” [www.bitstorm.org/gameoflife/].

4.2.1. Exercícios

1 O surgimento de fenômenos emergentes pode ser matematicamente demonstrado através de fórmulas matemáticas analíticas.

2 O surgimento de alguns fenômenos emergentes pode ser simulado através de computadores e software.

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3 Sempre que as condições para surgimento de fenômenos emergentes são estabelecidas eles surgem no seio de um sistema dinâmico.

4 Um fenômeno emergente se torna uma propriedade imutável do conjunto ou sistema, a despeito da troca contínua de cada um dos elementos que fazem parte do mesmo, bastando que os novos elementos obedeçam às mesmas regras.

4.2.2. Criticalidade Auto-Organizada

A criticalidade auto-organizada descreve a existência de ordem na distribuição de eventos catastróficos durante a evolução espaço-temporal de um sistema dinâmico. Em outras palavras, há uma ordem no caos. Um experimento clássico para explicar a criticalidade auto-organizada foi elaborado por per Bak e outros19, e consistiu em medir o tamanho de avalanches que ocorrem à medida que grãos de areia individuais são aleatoriamente despejados em um monte de areia. À medida que a pilha cresce sua inclinação devido à adição de areia seu estado interno energético fica cada vez mais crítico (tende ao estado supra-crítico). Ocorre então uma avalanche, de pequenas ou grandes proporções, que leva à pilha a um estado de menor energia (tende ao estado sub-crítico). Uma plotagem gráfica relacionando o tamanho das avalanches de areia em função da quantidade de vezes que cada avalanche ocorre mostra que há uma distribuição exponencial de eventos, na qual pequenas avalanches ocorrem com menor freqüência enquanto que grandes avalanches são raras, independentemente do tamanho da pilha. Embora seja possível se perceber a regularidade nesta distribuição, é impossível se prever qual será o resultado do despejo de um único grão de areia na pilha.

Fig. 45: Análise Histórica da Atividade Sísmica Global entre 1977 e 1995. Fonte:

[http://www.econ.iastate.edu/classes/econ308/tesfatsion/SandpileCA.Winslow97.htm]

Explorações teóricas e práticas do princípio da criticalidade auto-organizada são aplicadas com sucesso

para explicar fenômenos como o tamanho e distribuição de terremotos, inundações e extinções de organismos biológicos na terra. A figura 45 apresenta uma relação entre a quantidade e tamanhos das avalanches no mundo, entre os anos de 1977 e 1995.

O princípio da criticalidade auto-organizada torna impossível a dedução exata do próximo estado de qualquer sistema dissipativo, mas descreve que existe uma organização interna auto-similar em sua dinâmica, que é mais popularmente conhecida como estrutura fractal. Uma visualização de estruturas fractais por ser obtida por meio da exploração interativa de imagens geradas por programas, como as apresentadas na Figura 46.

19 KAUFFMAN, S. At Home in the Universe: The Search for Laws of Self-Organization Complexity. USA: Oxford University Press. 1996.

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Fig. 46: Explorando uma estrutura Fractal, ou Auto-Similar [www.boutell.com/fracster/].

4.2.2. Exercícios

1 Conforme o princípio da criticalidade auto-organizada, o resultado de uma determinada ação de um agente individual sobre um sistema complexo sempre irá provocar desastres do mesmo tamanho.

2 Conforme o princípio da criticalidade auto-organizada, é impossível que dois desastres de grandes proporções ocorram em seguida.

3 Conforme o princípio da criticalidade auto-organizada, a chance de que dois desastres de grandes proporções ocorram em seguida é menor que a chance de dois desastres de pequenas proporções ocorrerem em seguida.

4.2.3. Evolução na Borda Ordem-Caos

O princípio da Evolução na Borda Ordem-Caos, mais conhecido como Borda do Caos20 estabelece que os sistemas que apresentam maior capacidade de processamento de informação, aproveitamento de oportunidades, e conseqüentemente chances de sobrevivência, são aqueles cujo comportamento se situa na borda de configurações que separa o regime ordenado (sub-crítico e rígido) de um regime desordenado (supra-crítico e imprevisível). A vida na borda do caos justifica o eterno dilema que existe entre rigidez e flexibilidade, entre previsibilidade e inovação, entre otimização e generalização. O fato é que nem sistemas cristalizados nem tampouco sistemas amorfos sobrevivem por muito tempo em um ambiente dinâmico. Sistemas vivos e bem sucedidos se situam na borda do caos, que em termos visuais corresponde a viver na conformação geométrica de um fractal, se adaptando de forma microscópica com grande velocidade, e de forma macroscópica em menor velocidade.

Uma analogia física à borda do caos seria transição da matéria entre os estados cristalinos (rígido) e amorfos (sem forma), à medida que se aquece ou se esfria uma substância. A evolução na borda do caos também apresenta equivalência com a noção de alcance de massa crítica ou transição de fase em um sistema. O alcance da massa crítica provoca o início de uma reação em cadeia, mas precisa ser controlado para que não provoque uma explosão, que teria como conseqüências perda de recursos além do necessário para obtenção do resultado desejado, e em último caso a perda completa do próprio sistema. Por outro lado, caso não haja reação para produção de energia organismo um organismo tende a morrer.

O princípio da evolução na borda ordem-caos é prontamente aplicável em teorias de gestão organizacional contemporâneas. É durante o regime sub-crítico que uma organização otimiza e torna persistente seus sistemas, auferindo recursos em quantidade suficiente para realizar novas experiências que explorar oportunidades. É durante o regime supra-crítico que novas formas de atuação organizacional são desenvolvidas, muitas vezes devido à inevitável ocorrência de catástrofes. O princípio da evolução na borda ordem-caos sugere que, caso tais formas de atuação apresentem vantagens competitivas sobre a condição anteriormente ordenada,

20 KAUFFMAN, S. At Home in the Universe: The Search for Laws of Self-Organization Complexity. USA: Oxford University Press. 1996. KELLY, K. Out of control: the new biology of machines, social systems and the economic Reading, USA: Addison-Wesley, 1994. LANGTON, C., ed. Artificial life: an overview. USA: MIT Press, 1995. HOLLAND, J. Hidden order: how adaptation builds complexity. Reading, Mass: Books, 1995. 185pp.

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estas características sejam incorporadas ao próximo ciclo de regime sub-crítico, conduzindo à evolução do organismo e aumento de sua capacidade competitiva.

Como conseqüência da adoção de uma estrutura dialética na gestão de sistemas, o princípio da evolução na borda do caos justifica que as maiores possibilidades de progresso ocorrem quando a ordem é persistentemente perturbada, mas de forma momentânea e auto-sustentável.

4.2.3. Exercícios

1 Conforme o princípio da evolução na borda ordem-caos, uma organização deve eliminar todos os seus controles de tempos em tempos, a fim de explorar novas possibilidades de atuação na sociedade onde atua.

2 Conforme o princípio da evolução na borda ordem-caos, a auditoria interna ou externa de uma organização deve atuar de forma implacável e punir severamente qualquer menor desvio na utilização dos controles por parte dos gestores, mesmo que estes desvios tenham produzido, de forma clara e inegável, benefícios à eficiência organizacional.

3 Conforme o princípio da evolução na borda ordem-caos, os gestores podem se aproveitar de erros felizes cometidos por seus subordinados, a fim de aumentar a eficiência e competitividade organizacional.

4.2.4. Paisagens de Aptidão

A paisagem de aptidão é um conceito que completa as principais teorias do pensamento complexo. Conforme elucidou Charles Darwin, os organismos vivos que possuem maior aptidão terão maior condição de sobrevivência em um ecossistema, e conseqüentemente sua carga genética terá maiores chances de subsistir evolutivamente. A paisagem de aptidão, na sua interpretação biológica, estabelece uma relação entre a carga genotípica ou fenotípica de organismos (ou agentes) de um sistema e as suas aptidões para sobrevivência no meio. Na Figura 47 é tridimensionalmente representada a paisagem de aptidão de um grupo de organismos, que na prática é um espaço multidimensional. O grau de aptidão possível de ser alcançado por um organismo é representado pelo eixo vertical, enquanto que as variações genotípicas ou fenotípicas que levam ao alcance desta aptidão são apresentadas no plano. Os indivíduos mais aptos encontram-se nos picos, enquanto que os indivíduos menos aptos estão nos vales da paisagem.

Fig. 47: Representação de uma paisagem de aptidão [http://www.talkorigins.org/design/faqs/nfl/].

Suponha que determinado grupo de indivíduos se encontre numa posição chamada de máximo local,

como ocorre no pico que existe no cruzamento das coordenadas (15,15) no plano. Qualquer pequeno deslocamento do grupo, em qualquer das direções, o levará a uma condição de menor aptidão, mesmo que momentânea. Para que estes organismos alcancem uma posição como a existente na coordenadas (30, 30) será necessário atravessar um vale. A menos que empregue técnicas de inteligência competitiva, um organismo em geral não consegue “enxergar” sua paisagem de aptidão. A travessia em direção a uma posição mais adaptada pode ocorrer de forma aleatória, no caso de mutações genéticas ou fenotípicas que ocorrem naturalmente nos organismos vivos, as quais são no entanto capazes de lançar este grupo tanto no pico de maior aptidão como no vale de baixa aptidão, neste último caso podendo levar este grupo à extinção. Outra possibilidade seria o

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emprego intencional de alterações na composição genotípica ou fenotípica do grupo, conduzindo-o a uma evolução artificial.

Exemplos de alterações intencionais são hoje comuns no campo da engenharia genética, que leva à produção de novas variedades vegetais e animais por um processo de mutação sistemático. Exemplos de mutações fenotípicas intencionais realizadas por seres humanos são o desenvolvimento de um novo tipo de ferramenta ou vestimenta, aumentando a capacidade de um animal de viver em um ambiente hostil. O conceito de paisagem de aptidão se completa com a noção de que os caminhos evolutivos dos organismos dependem sobretudo da evolução dos organismos de outras espécies ou grupos que estão presentes no mesmo ecossistema. Em outras palavras, a paisagem de aptidão de um grupo é continuamente deformada pelo desenvolvimento da própria paisagem de aptidão de outros grupos ou espécies de organismos. Os grupos e espécies que compartilham um mesmo espaço com outros estão se deslocando continuamente nas suas paisagens de aptidão, que, no entanto, são também deformadas de forma contínua pelo deslocamento dos outros organismos em suas próprias paisagens de aptidão.

Demonstrações clássicas desta co-evolução são efetuadas pela análise da relação entre presas e predadores em ecossistemas naturais. Suponha que as presas sejam os coelhos e os predadores as raposas. A paisagem de aptidão de uma população de coelhos indica que o desenvolvimento acidental de mais um feixe de neurônios no cérebro do coelho aumentará sensivelmente o olfato, o que permitirá aos coelhos sentirem a presença das raposas com maior precisão. Os coelhos que desenvolvem tal capacidade passam a ter maior aptidão (fitness) e expectativa de vida, relativa aos outros de mesma população que não sofreram mutação. Depois de certo tempo basicamente os coelhos que desenvolveram tal habilidade terão sobrevivido e reproduzido. Há maior disponibilidade de coelhos, o que facilita a caça das raposas. Com mais raposas, a paisagem de aptidão da raposa se deforma mais rapidamente, permitindo, por exemplo que surjam raposas com inovações tecnológicas, como novas glândulas que suprimem o cheiro na raposa. Esta evolução passará a ser um prêmio para maior adaptabilidade destas últimas, o que leva a uma deformação subseqüente da paisagem de aptidão dos coelhos, e este ciclo conduzirá inevitavelmente um sistema a uma evolução, mais precisamente uma co-evolução.

4.2.4. Exercícios

1 Por meio da reflexão acerca do conceito de co-evolução em paisagens de aptidão, estabelece-se como fato que em qualquer sistema complexo jamais haverá dominação completa por parte de alguma espécie de organismo por um período de tempo infinito.

2 Organismos biológicos conseguem alterar intencionalmente seu código genético, visando o alcance de novas posições de sua paisagem de aptidão.

3 Empresas, por meio do uso de técnicas de inteligência competitiva, conseguem alterar intencionalmente seu “código genético”, visando o alcance de novas posições de sua paisagem de aptidão.

4 Quanto um organismo ou população de organismos muda de posição numa paisagem de aptidão, isto deforma automaticamente e imediatamente todas as paisagens de aptidão de todas as outras populações que convivem no mesmo ecossistema.

5 O súbito desaparecimento de uma população de organismos em geral deforma as paisagens de aptidão das outras populações que habitam o mesmo ecossistema.

6 Uma população de predadores que jamais dizima a sua população de presas contribui para a evolução da aptidão de suas presas ao longo do tempo.

7 Aplique o princípio das paisagens de aptidão na análise da co-evolução entre as tecnologias de segurança da informação e os hackers.

5. Conclusões

Este texto apresentou uma ampla gama de modelos de sistemas, que se constituem nos principais modelos de organização da realidade empregados pela humanidade.