Topicos Recurso Direito-processual-civil-II TA 20-07-2015

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  • 7/26/2019 Topicos Recurso Direito-processual-civil-II TA 20-07-2015

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    FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

    PROVA ESCRITA DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL II - TURMA A

    REGENTE: PROF. DOUTOR MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA20-07-2015

    DURAO DA PROVA: 2H00

    Considere a seguinte hiptese:

    Antnio intentou uma ao declarativa sob forma comum contra o Banco ABC alegando:

    ! Que titular de uma conta bancria sediada na Agncia de Lisboa do Banco ABC.! Que celebrou, por escrito particular, dia 1 de janeiro de 2015, com a sociedade R um

    contrato de adeso epigrafado de e-banking, por via do qual lhe era permitido acederaos a servios disponibilizados pela R, atravs da internet, com os cdigos por esta

    fornecidos.! Que a 22 de abril de 2015 a referida conta foi movimentada na quantia de 10.000!atravs

    do servio de e-banking.! Logo que tomou conhecimento da transferncia anmala o Autor contactou,

    telefonicamente, a R para bloquear o acesso informtico conta e apresentou queixa polcia, acerca da transferncia no autorizada que tinha ocorrido na sua conta bancria

    Antnioconclui pedindo a condenao da Ra restituir 10.000!e respetivos juros, contados desdeo levantamento do valor em causa e a ainda a indemnizar o Autorpelos danos no patrimoniais emvalor no inferior a 5.000!. Mais requer, caso o Tribunal tenha a restituio por improcedente, queno deixe de apreciar a sua pretenso indemnizatria.

    Contestando a R, alegou, em suma:

    ! Que no possvel movimentar qualquer conta bancria sediada no banco ABC sem osrespetivos cdigos de acesso, pessoais e intransmissveis.

    ! S a colaborao involuntria, mas censurvel do Autor permitiria que terceiros seapropriassem dos seus cdigos de acesso.

    ! Que todas as informaes e cuidados de segurana haviam sido cabalmente transmitidos aoAutoraquando da sua adeso ao servio.

    ! No tem registo de qualquer chamada telefnica realizada pelo Autor.

    Com estes fundamentos, vem requerer a improcedncia da ao, por no provada, absolvendo-se aRdo pedido.

    Responda de modo fundamentado s seguintes questes:

    1.

    Identifique o objeto desta ao e aprecie a sua admissibilidade. (3 valores)

    2.

    Indique, justificadamente, os temas da prova a enunciar pelo juiz. (2 valores)

    2.1.

    Tendo em conta a sua resposta pergunta precedente, poder o Banco ABC produzirprova quanto existncia da transferncia bancria? (1,5 valores)

    2.2.

    E quanto ao autor da operao? (1,5 valores)

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    3.

    a seguinte a redao do art. 70 do Decreto-Lei n. 317/2009:

    Caso um utilizador de servios de pagamento negue ter autorizado uma operao depagamento executada, ou alegue que a operao no foi correctamente efectuada, incumbeao respectivo prestador do servio de pagamento fornecer prova de que a operao depagamento foi autenticada, devidamente registada e contabilizada e que no foi afectadapor avaria tcnica ou qualquer outra deficincia.

    3.1.

    De que forma este preceito afeta as normas de distribuio do nus da prova? (1,5valores)

    3.2. Est Antnio impedido de produzir prova quanto ao regular funcionamento daplataforma de e-banking? (1,5 valores)

    4. Na pendncia da causa e aps a fase dos articulados, o Banco ABCcontrata os servios doescritrio Lex e Associados Sociedade de Advogados, RL. Revendo o processo, o novo

    mandatrio descobre no existir registo de qualquer movimento de 10.000! na conta deAntnioe est convencido de que tudo no passou de um logro. Pode ainda o Banco ABCalegar este facto? (2 valores)

    5.

    O Banco ABC pretende salvaguardar a sua imagem pblica pelo que se dispe areembolsar Antnio caso este desista do pedido. Qualifique este hipottico negcioprocessual. (2 valores)

    6.

    Julgada a causa, o Tribunal condena a sociedade Rno pedido. Acontece que o Banco ABCcontratou um seguro contra riscos semelhantes. esta deciso vinculativa para aseguradora? (2,5 valores)

    7.

    Suponha que o juiz da causa tinha sido transferido, j depois do encerramento da audinciafinal, para outra comarca. Atendendo ao contedo desfavorvel da sentena, o Banco ABCpretende saber se existem fundamentos para impugnar a deciso. (2,5 valores)

    FIM

    Responda de modo fundamentado s seguintes questes:

    1.

    Identifique o objeto desta ao e aprecie a sua admissibilidade. (3 valores)

    O objeto do processo constitudo por dois elementos: o pedido (efeito

    jurdico que se pretende obter com a ao) e a causa de pedir (constituda

    pelos factos necessrios individualizao do pedido do autor);0,5

    O autor formula contra o ru trs pedidos: (i) condenao na restituio

    de 10.000!, (ii) condenao no pagamento dos juros de mora contados

    desde a data da operao bancria (pedido genrico) e (iii) a condenao

    no pagamento de uma indemnizao pelos danos no patrimoniais.

    0,25

    O primeiro e o segundo pedidos tm por fundamento a realizao de 0,25

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    uma operao no autorizada sobre a conta bancria do autor

    O autor no apresenta, quanto ao pedido de indemnizao, factos que

    permitam concluir pela sua procedncia. Porm, quem subscreva como

    o Prof. Miguel Teixeira de Sousa a teoria da individualizao

    aperfeioada ver na alegao do contrato e da operao bancria osfactos essenciais que tornam admissvel este objeto (a anlise move-se

    estritamente no plano da admissibilidade) uma vez que permite

    individualizar a situao jurdica alegada por Antnio.

    0,5

    Verifica-se uma cumulao simples art. 555. (o autor formula vrios

    pedidos e pretende a procedncia e a satisfao de todos eles) pelo que

    h que verificar dos seus requisitos de admissibilidade: compatibilidade

    subjetiva e compatibilidade processual (nas suas duas vertentes).

    Apenas aparentemente se verifica uma cumulao subsidiria, este

    pedido, conduzindo a uma condenao parcial dos objetos anteriormentecumulados, no se pode dizer autnomo.

    1,5

    2.

    Indique, justificadamente, os temas da prova a enunciar pelo juiz. (2 valores)

    Dos factos articulados pertinentes, os que devam ser provados so

    includos nos temas de prova, ponto de partida da tarefa de condensao

    do processo (art. 410. e 596./1).

    0,5

    A celebrao do contrato e a realizao da transferncia bancria ficaramadmitidas por acordo (art. 574./2)

    Nota: apenas se exige que os alunos apliquem as normas constantes do

    Cdigo de Processo Civil e do do Cdigo Civil

    0,5

    ... no porm a identidade do ordenante. O Banco ABC apresenta dois

    argumentos paralelos:

    a) impugna a execuo da operao bancria sem autorizao (os cdigos

    de Antnio, pessoais e intransmissveis, tero sido introduzidos);

    b) admite que possa ter sido realizada por terceiros na eventualidade de

    Antnio ter facultado, ainda que inadvertidamente, os seus dados de

    acesso.

    Nota:admite-se que os pontos da contestao permitissem diversas

    interpretaes, conduzindo, em diversos trechos, introduo de factos

    novos. Contudo, essa defesa s constitui exceo se tais factos obstarem

    produo dos efeitos jurdicos pretendidos pelo autor.

    A alegao de que todas todas as informaes exigveis foram prestadas

    confere ao autor direito de resposta (que no ter lugar na rplica); sobre

    estes factos o enunciado omisso.

    0,5

    O autor alega ter contactado a r para que bloqueasse o acesso 0,5

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    informtico sua conta bancria, facto igualmente impugnado pelo

    Banco. Cabe perguntar pela pertinncia deste facto para composio da

    ao. Se prova do telefonema no contribui para a resoluo da lide no

    deve ser includa nos temas da prova. Este facto todavia relevante para

    o apuramento da responsabilidade da R pelo que deve tambm constar

    deste despacho.

    2.1.

    Tendo em conta a sua resposta pergunta precedente, poder o Banco ABC produzirprova quanto existncia da transferncia bancria? (1,5 valores)

    Toda a defesa deve ser deduzida na contestao (art. 573.). hiptese

    no se aplica nenhuma das excees: defesa antecipada, defesa separada

    ou defesa posterior.

    0,5

    A realizao da transferncia bancria foi alegada pelo autor sem que

    tivesse sido impugnado ou excecionado pela R. admissvel confisso e

    o facto no carece de ser provado por documento escrito. Assim, ficou

    admitido por acordo (574./2).

    0,5

    A aquisio para o processo definitiva; este facto est assente 0,5

    2.2.

    E quanto ao autor da operao? (1,5 valores)

    Ao afirmar que apenas o autor poderia ter realizado a transferncia (assim

    recusando que pudesse ter sido realizada por um terceiro no

    autorizado), a r impugna (por meio de impugnao de facto) os factos

    aduzidos pelo autor.

    0,25

    Esta impugnao torna a autoria da transferncia controvertida e carecida

    de prova.0,25

    Saber quem procedeu operao de pagamento (ie. sua autorizao)

    um facto que interessa ao processo (razo pela qual integra os temas da

    prova, quadro geral dentro do qual se orientar a instruo).

    0,25

    ... constitui assim objeto da prova (art. 410.) 0,25

    ... em conformidade, o banco poder produzir ou requerer os meios de

    prova que permitam que o tribunal forme a sua convico acerca desta

    matria.

    0,5

    3. a seguinte a redao do art. 70 do Decreto-Lei n. 317/2009:

    Caso um utilizador de servios de pagamento negue ter autorizado uma operao depagamento executada, ou alegue que a operao no foi correctamente efectuada, incumbeao respectivo prestador do servio de pagamento fornecer prova de que a operao depagamento foi autenticada, devidamente registada e contabilizada e que no foi afectada

    por avaria tcnica ou qualquer outra deficincia.

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    3.1.

    De que forma este preceito afeta as normas de distribuio do nus da prova? (1,5valores)

    A lei impe a cada parte um nus de provar certo nmero de factos sob

    pena de tomar como base da deciso os factos contrrios.

    A norma fundamental neste mbito a do art. 342. CC a conjugar, no

    caso concreto, com a presuno legal vertida no art. 799. CC

    0,25

    O preceito transcrito (art. 70 do DL 317/2009) onera o prestador de

    servios (a sociedade r) com a prova da autenticao, registo e

    contabilizao da operao de pagamento assim como a prova do correto

    funcionamento tcnico da plataforma de e-banking.

    0,25

    ... no fosse esta norma e a alegao e prova de que foi realizada uma

    operao de pagamento no autorizada competiria a Antnio.0,25

    ... por fora desta disposio, a dvida quanto autenticao, registo,

    contabilizao ou regular funcionamento do sistema de pagamento

    resolve-se contra o Banco ABC (supracitado art. 70., 414. CPC e 346.

    CC in fine).

    0,5

    ... o que implica uma inverso legal do nus da prova (344. e 350. CC);

    aplicao ao caso concreto.0,25

    3.2.

    Est Antnio impedido de produzir prova quanto ao regular funcionamento daplataforma de e-banking? (1,5 valores)

    A distribuio do nus da prova no afeta a produo de prova. Tanto o

    autor como a r podem envidar os esforos probatrios necessrios

    demonstrao da realidade de qualquer facto controvertido.

    0,5

    O material assim adquirido pertence comunidade dos sujeitos

    processuais e no parte que o aduz.0,5

    ... a soluo resulta do princpio da aquisio processual e encontra

    consagrao legal no art. 413..0,5

    4. Na pendncia da causa e aps a fase dos articulados, o Banco ABCcontrata os servios doescritrio Lex e Associados Sociedade de Advogados, RL. Revendo o processo, o novomandatrio descobre no existir registo de qualquer movimento de 10.000! na conta deAntnioe est convencido de que tudo no passou de um logro. Pode ainda o Banco ABCalegar este facto? (2 valores)

    Ainda que o mandatrio tenha tomado conhecimento deste facto aps a

    fase dos articulados tal no permite qualific-lo como subjetivamente

    superveniente. A supervenincia subjetiva s pode ser aferida por

    referncia s partes.

    0,5

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    No possvel afirmar que o Banco ABC desconhecesse, sem culpa, a no

    realizao da transferncia bancria aquando do oferecimento da

    contestao.

    0,5

    Assim sendo, no se verifica nenhuma das excees ao princpio da

    concentrao da defesa (art. 573./1 e 573./2). No admissvel, comeste fundamento, uma defesa posterior.

    0,5

    A omisso deste facto preclude, em definitivo, a possibilidade de

    arguio ulterior (art. 574./2).0,5

    5.

    O Banco ABC pretende salvaguardar a sua imagem pblica pelo que se dispe areembolsar Antnio caso este desista do pedido. Qualifique este hipottico negcioprocessual. (2 valores)

    Haver desistncia do pedido sempre que o autor renuncie ao direito queinvoca em juzo (285.)

    0,5

    Acontece que a desistnciaenunciada , na realidade, a prestao a que

    o autor se obriga num negcio jurdico.0,5

    ... precisamente por esta razo, o negcio processual que as partes se

    propem realizar constitui uma transao (art. 1248./1 CC).0,5

    ... trata-se de um negcio bilateral e oneroso que pe fim ao

    pendente (devendo ser homologada por sentena: art. 290./3 e /4)0,5

    6.

    Julgada a causa, o Tribunal condena a sociedade Rno pedido. Acontece que o Banco ABCcontratou um seguro contra riscos semelhantes. esta deciso vinculativa para aseguradora? (2,5 valores)

    Evidentemente, as partes da causa (Antnio e Banco ABC) ficam

    vinculadas deciso proferida no processo (eficciainter partes)0,25

    ... importa saber se a seguradora, um terceiro perante o processo,

    atingida pelo caso julgado (eficcia ultra partes)0,25

    A circunstncia de um terceiro no ter sido parte numa ao no o colocafora do mbito do caso julgado

    1

    ... contudo, quem tem legitimidade para ser parte numa causa e nela no

    interveio no pode ser abrangido pelo caso julgado da deciso nela

    proferida

    1

    7.

    Suponha que o juiz da causa tinha sido transferido, j depois do encerramento da audinciafinal, para outra comarca. Atendendo ao contedo desfavorvel da sentena, o Banco ABCpretende saber se existem fundamentos para impugnar a deciso. (2,5 valores)

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    Pode questionar-se a existncia de um vcio da sentena 0,25

    ... so vcios de essncia aqueles que atingem a sentena nas suas

    qualidades essenciais, entre eles a falta de poder jurisdicional do

    judicante

    0,25

    ... requer-se contudo uma falta absoluta de poder jurisdicional; o

    proferimento de uma sentena por um juiz que no o do processo no

    d lugar a inexistncia da deciso.

    0,5

    O juiz transferido presidiu audincia final; a sentena que elaborou (sem

    que tenha relevo o seu contedo absolutrio ou condenatrio) no

    padece de qualquer vcio (arts. 605/3 e /4, 615.; assim se evitando a

    inutilizao da audincia).

    1,5