Upload
jackpilger
View
18
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA BIOQUMICA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM TECNOLOGIA DE
PROCESSOS QUMICOS E BIOQUMICOS
TRATAMENTO MICROBIOLGICO SEQUENCIAL DE
SOLO PROVENIENTE DE UNIDADE DE DESSORO
TRMICA
ULRICH VASCONCELOS DA ROCHA GOMES
Rio de Janeiro, 2011
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA BIOQUMICA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM TECNOLOGIA DE
PROCESSOS QUMICOS E BIOQUMICOS
TRATAMENTO MICROBIOLGICO SEQUENCIAL DE
SOLO PROVENIENTE DE UNIDADE DE DESSORO
TRMICA
TESE APRESENTADA AO PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM TECNOLOGIA DE PROCESSOS QUMICOS E BIOQUMICOS PARA OBTENO DO GRAU DE DOUTOR EM CINCIAS (DSc.)
Orientadores: Francisca Pessa de Frana, D.Sc.
Fernando Jorge Santos de Oliveira, D.Sc.
Rio de Janeiro, 2011
G 633t Gomes, Ulrich Vasconcelos da Rocha.
Tratamento microbiolgico sequencial de solo proveniente de unidade de dessoro trmica/ Ulrich Vasconcelos da Rocha Gomes. 2011.
xvi, 180 f.: il.
Tese (Doutorado em Tecnologia de Processos Qumicos e Bioqumicos) Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola de Qumica, Rio de Janeiro, 2011. Orientadores: Francisca Pessa de Frana e Fernando Jorge Santos de Oliveira
1. Biorremediao. 2. Resduos da Indstria do Petrleo. 3. Hidrocarbonetos
Policclicos Aromticos. 4. Bioestmulo Teses. I. Frana, Francisca Pessa de. (Orient.). II. Oliveira, Fernando Jorge Santos de (Orient.). III. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa em Tecnologia de Processos Qumicos e Bioqumicos, Escola de Qumica. IV. Ttulo.
CDD: 628.55
i
Medicus curat, natura sarat
Hipcrates (460 AC 377 AC)
ii
Este trabalho dedicado memria de meu pai, Jos Rocha Gomes (1945-2008), que partiu to cedo para a espiritualidade e no assiste entre ns realizao desse momento. para voc com todo o meu amor, respeito e considerao.
iii
AGRADECIMENTOS
O final de uma etapa nos apresenta o incio de um novo ciclo de desafios, quando
novas tramas so desenhadas, criando posteriormente vida, de acordo com as nossas aes e
merecimentos. Nesta etapa finalizada, gostaria de expressar meus sinceros agradecimentos:
Aos meus orientadores por acreditarem na minha capacidade, pelo apoio tcnico e
pelo encorajamento, mesmo que em tantas vezes no o tenha percebido nitidamente.
minha amada me, Dulce por toda a fora, apoio e estmulo que precisei durante
todos estes anos. Obrigado por sempre ter estado por perto, protagonizando meu porto seguro
nos momentos de aflio.
Ao meu pai que partiu para a espiritualidade antes da finalizao deste projeto, por me
cobrir de apoio e no deixar perder a garra de enfrentar meus desafios. Nosso ltimo
momento nesta vida, em 21 de setembro de 2008 foi selado com um caloroso abrao.
s minhas irms Uliana e Ulnary pelo apoio, amizade, crdito e por me fazerem
enxergar o verdadeiro sentido de famlia.
Aos meus avs maternos, tambm j na espiritualidade, Evalda e Gasto, pelas cartas
de incentivo, enviadas nos meus tempos de criana, para que estudasse e amasse a arte de
estudar.
Professora Glcia Calazans, grande amiga, mentora e razo de ter vindo ao Rio de
Janeiro. Sua contribuio minha formao acadmica e aos caminhos que desejo percorrer
foi fundamental e sem ela, meu destino teria sido outro.
Ao Professor Carlos Roberto Weber Sobrinho, testemunha de todas as tramas
envolvidas nesta tese, iniciada na postagem dos meus documentos para o Rio. Agradeo por
sua valiosa companhia, conhecimento, palavras de incentivo e participao ativa em
momentos-chave deste trabalho.
Professora Eliana Flvia, por praticar o significado da palavra educador. Obrigado
pela sua pacincia, pela doura de seus gestos e voz, pela chave da porta do Laboratrio, pela
iv
confiana depositada, pelo carinho de amiga, pela preocupao de me, pela orientao
afetiva, por ser o meu porto seguro nos momentos difceis e por ter me ajudado a no desistir.
Pragati Nigam, que sempre ser a referncia acadmica da minha gerao, por
acompanhar esta caminhada h anos, sempre acreditando no meu potencial.
Swati Nigam pela motivao e amizade.
Aos meus grandes companheiros de amizade e trabalho no laboratrio E-109. Mesmo
sob forte presso e dificlimos desafios dirios, entre risos e lgrimas, continuamos mantendo
o humor, a criatividade, o companheirismo e a cumplicidade: Diogo Simas, Aike Costa,
Flvia Padilha, Camila Gonzales, Rafael Bittencourt, Rafael Lima, Leonardo Jordo, Gustavo
SantAnna, Renata Calixto, Carlos Eduardo Felippe, Milton Anterio, Adilza Evangelista e Eni
Silva.
amiga, confidente e cumadi Teresa Cristina do Nascimento pelos bons momentos
juntos.
Um agradecimento especial Jamille Lima, pela fiel amizade e reais palavras
encorajadoras. Tenho voc como a minha terceira irm e o Thor como sobrinho.
Aos meus vizinhos do estratgico laboratrio E-107, meus agradecimentos pelo apoio
e amizade nas horas de trabalho e de lazer, particularmente Diego Cara, Juliana Davies e
Mahdi Gobai.
Kally Souza, pela amizade e companheirismo na repblica e no laboratrio, assim
como pelo auxlio na parte estatstica desse trabalho.
Ao Andr Tavares, pela amizade e diviso do apartamento na Ilha.
Ao Paulo Santana, meu reconhecimento pela fora e dedicao ao trabalho.
s professoras rika Chrisman, Maria Antonieta Couto e Magali Cammarota, cujo
contato durante minha vida de doutorando representou pontos de luz, em momentos decisivos
da tese.
v
Ao Dr. Leon Rabinovich pelas valiosas sugestes e contribuies, principalmente com
respeito aos ensaios microbiolgicos.
Aos funcionrios da EQ, em especial s senhoras Marlene de Souza, Suely Rocha e
Ctia de Assis.
Aos amigos Douglas Guedes, Mariana Galvo do INT e Adriana Nunes da Micoteca
URM/UFPE, pela gentileza na identificao das linhagens bacterianas e das linhagens
fngicas.
Doutora Ana Paula Ahualli e ao Mestre Klaus Reichel dos laboratrios Ipex, pela
gentileza na anlise de dioxinas e furanos.
Ao senhor Luiz Carlos de Oliveira pela realizao das anlises granulomtricas.
Ao Prof. Luiz Guilherme Marques pela amostra de glicerol bruto.
Ao amigo Kenneth R. Vanlerberghe do Kings Cross Doctors Office-Toronto, por
toda reviso e correes gramaticais dos textos em lngua inglesa, relacionados esta tese.
equipe instalada na Bahia, pela sempre amvel receptividade do povo baiano e pelo
suporte durante as visitas tcnicas.
Aos cariocas e fluminenses pelo convvio, ao som do mais musical sotaque do Brasil.
Aos membros da banca por suas apreciaes e sugestes, em sua maioria, acatadas.
Ao Petrleo Brasileiro S/A pelo incentivo financeiro e apoio tcnico.
CAPES, CNPq e FAPERJ pelo financiamento dos projetos que so desenvolvidos
no Laboratrio de Microbiologia do Petrleo (E-109).
E finalmente espiritualidade, que me acompanha em todos os momentos. Agradeo
pelo merecimento da conquista, pela inspirao em momentos-chave, pela proteo e por me
fazerem perceber que crescimento tambm se faz com dor, sem que para isso, a f seja
abalada.
SJT
vi
SUMRIO
Lista de Figuras ix
Lista de Tabelas xii
Lista de abreviaturas xiv
Resumo xv
Abstract xvi
1 Introduo 17
2 Objetivos 23
2.1 Objetivo geral 23
2.2 Objetivos especficos 23
3 Reviso da Literatura 24
3. 1 Resduos da indstria do petrleo 24
3. 2 Hidrocarbonetos Policclicos Aromticos (HPA) 29
3. 3 Vias para tratamento de solos contaminados com leo 34
3. 3. 1 Dessoro trmica 36
3. 3. 2 Biorremediao 44
3. 4 Degradao dos HPA por micro-organismos hidrocarbonoclsticos do solo 48
3. 5 Glicerol: generalidades e uso como cossubstrato 56
3. 6 Ensaios de fitotoxicidade 60
4 Materiais e Mtodos 62
4. 1 A Unidade de Dessoro Trmica (UDT) 62
4. 2 Amostragens e coleta 65
4. 3 Isolamento e identificao de micro-organismos presentes no solo 67
4. 3. 1 Identificao das bactrias 68
4. 3. 2 Identificao dos fungos filamentosos 69
4. 4 Adaptao dos isolados em leo 71
vii
4. 5 Experimentos de biodegradao 72
4. 5. 1 Planejamento experimental 72
4. 5. 2 Experimentos com aplicao dos dados obtidos no planejamento
experimental
76
4. 5. 3 Experimentos utilizando glicerol bruto 76
4. 6 Anlises quantitativas 78
4. 6. 1 Umidade em base seca
4. 6. 2 Capacidade de Reteno de gua (CRA)
78
78
4. 6. 3 pH em gua 79
4. 6. 4 Textura do solo 79
4. 6. 5 Teores de Carbono Orgnico Total, Nitrognio Total e Fsforo Total 80
4. 6. 6 Hidrocarbonetos Totais do Petrleo (TPH) 80
4. 6. 7 Hidrocarbonetos Policclicos Aromticos (HPA) 81
4. 6. 8 Dioxinas e Furanos 81
4. 6. 9 Ensaios microbiolgicos das amostras 82
4. 6. 10 Ensaios de fitotoxicidade 82
5 Resultados e Discusso 86
5. 1 Caractersticas do contaminante do solo 86
5. 2 Caractersticas do solo antes do tratamento por dessoro trmica 88
5. 3 Identificao dos contaminantes remanescentes e propriedades do solo tratado
na UDT
91
5. 4 Microbiota do solo tratado na UDT 98
5. 5 Ensaios de fitotoxicidade do solo contaminado e do solo tratado na UDT 99
5. 6 Ensaios de biorremediao 105
5. 6. 1 Micro-organismos utilizados no bioaumento 105
5. 6. 2 Biorremediao com uso do planejamento experimental 107
viii
5. 6. 3 Monitoramento da biorremediao 119
5. 7 Aplicao dos resultados do planejamento experimental 124
5. 7. 1 Testes de fitotoxicidade nos solos biorremediados 135
5. 8 Biorremediao utilizando glicerol bruto 138
6 Concluses 143
Referncias Bibliogrficas 145
ANEXO A1- Produo bibliogrfica 180
Este documento foi elaborado em conformidade ao Decreto n 6583/08-MRE, que promulga o acordo ortogrfico da lngua portuguesa, assinado em Lisboa em 16 de dezembro de 1990. O estilo antigo foi mantido como originalmente impresso apenas nos ttulos publicados anteriormente publicao do Decreto no D.O.U., em 30/09/2008.
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 3.1 Percentual de resduos perigosos gerados em uma refinaria de
grande porte, calculados a partir de dados de Mariano (2001)
27
Figura 3.2 Estruturas qumicas dos 16 HPA prioritrios da USEPA
(fonte: RAVINDRA; SOKHI e VAN GRIEKEN, 2008)
32
Figura 3.3 Esquema simplificado de uma Unidade de Dessoro Trmica.
1- armazenamento do resduo; 2 preparao e estoque; 3-
admisso; 4 dispositivo transportador; 5 forno; 6- sistema
de tratamento de gases; 7 sistema de tratamento e reciclo dos
efluentes; 8 armazenagem dos slidos; inclinao do
forno (adaptado de SECOND, 2000)
39
Figura 3.4 Corte longitudinal de um forno rotatrio (adaptao de
HEYDENRYCH, GREEFF e HEESINK, 2002)
41
Figura 3.5 Mecanismos de transporte dos HPA por micro-organismos:
difuso simples - HPA de baixa massa molecular (1) e
transporte facilitado - HPA de alta massa molecular (2). O
efluxo dos HPA ocorre com gasto de energia (3) (elaborao
prpria)
52
Figura 3.6 Vias propostas para o metabolismo dos HPA de baixa massa
molecular, naftaleno (A) e de alta massa molecular, pireno (B)
por bactrias aerbias. Fontes: Mrozik, Piotrowska-Seget e
Labuzec (2003); Kanaly e Harayama (2000)
54
Figura 3.7 Principais rotas do metabolismo microbiano do glicerol
(RIVALDI et al. 2009)
57
Figura 4.1 Diagrama de operao da Unidade de Dessoro Trmica 62
x
Figura 4.2 Unidade de Dessoro Trmica 64
Figura 4.3 Aspecto do solo contaminado com resduo de vcuo (A) e
tratado por dessoro trmica (B), retido na rea de quarentena
66
Figura 4.4 Mtodo de isolamento microbiano do solo (adaptado de
BECKER, 1999)
67
Figura 4.5 Confeco do inculo 74
Figura 5.1 Germinao Relativa das Sementes (GRS) 100
Figura 5.2 Elongao Relativa da Raiz (ERR) 102
Figura 5.3 Elongao das razes de Cucumis anguria (maxixe-do-norte)
no extrato do solo contaminado com resduo oleoso de fundo
da cmara de destilao a vcuo, apresentando
desenvolvimento de razes secundrias (destaque, aumento:
4X). Foto: Ulrich Vasconcelos
103
Figura 5.4 ndice de Germinao das sementes (IG) 104
Figura 5.5 Diagrama de Pareto 111
Figura 5.6 Curva de contorno demonstrando o efeito da utilizao do
fertilizante comercial NPK e de glicerol sobre o percentual de
biodegradao dos HPA no solo
112
Figura 5.7 Curva de contorno demonstrando o efeito da utilizao de
fertilizante comercial NPK e da cultura mista sobre o
percentual de biodegradao dos HPA no solo
114
Figura 5.8 Curva de contorno demonstrando o efeito da utilizao do
glicerol e da cultura mista sobre o percentual de biodegradao
dos HPA no solo
118
Figura 5.9 Quantificao das Bactrias Heterotrficas Aerbias do solo
durante 60 dias nos diferentes tratamentos sequenciais:
120
xi
1- fertilizante + cossubstrato + bioaumento; 2- cossubstrato +
bioaumento; 3- fertilizante + cossubstrato; 4- cossubstrato;
5- fertilizante + bioaumento; 6- bioaumento; 7- fertilizante;
8- sem tratamento
Figura 5.10 Quantificao dos Fungos Filamentosos do solo durante 60
dias nos diferentes tratamentos sequenciais: 1- fertilizante +
cossubstrato + bioaumento; 2- cossubstrato + bioaumento; 3-
fertilizante + cossubstrato; 4- cossubstrato; 5- fertilizante +
bioaumento; 6- bioaumento; 7- fertilizante; 8- sem tratamento
123
Figura 5.11 Biodegradao dos HPA durante 60 dias de processo
(concentrao inicial de HPA = 8,43 mg/kg)
125
Figura 5.12 Bactrias Heterotrficas Aerbias no solo 126
Figura 5.13 Fungos Filamentosos no solo 127
Figura 5.14 Variao da temperatura mdia do ambiente e do solo e da
umidade relativa do ar durante o experimento
134
Figura 5.15 Biodegradao dos HPA em presena de glicerol de diferentes
origens durante 60 dias de processo (concentrao inicial de
HPA = 8,43 mg/kg)
139
Figura 5.16 Bactrias Heterotrficas Aerbios no solo 140
Figura 5.17 Fungos Filamentosos no solo 140
xii
LISTA DE TABELAS
Tabela 3.1 Resduos gerados na indstria do petrleo listados por
origem*
25
Tabela 3.2 Caractersticas fsico-qumicas e classificao da atividade
genotxica dos 16 HPA prioritrios listados pela EPA*
31
Tabela 3.3 Exemplos de tratamentos de solos contaminados por leo e
derivados*
35
Tabela 3.4 Principais fatores limitantes na remoo dos HPA no solo 45
Tabela 4.1 Especificaes tcnicas do forno do sistema de dessoro 65
Tabela 4.2 Caracterizao das amostras de glicerol bruto e glicerol PA 77
Tabela 4.3 Caractersticas das sementes do teste de fitotoxicidade 83
Tabela 5.1 Teores de HPA e TPH do resduo oleoso de fundo da coluna
de destilao a vcuo
86
Tabela 5.2 Caractersticas fsico-qumicas e microbiolgicas do solo
contaminado com resduo oleoso de fundo da cmara de
vcuo
89
Tabela 5.3 Concentrao dos Hidrocarbonetos Policclicos Aromticos
(HPA) no solo contaminado com resduo oleoso de fundo da
cmara de destilao a vcuo (p
xiii
destilao a vcuo e do solo tratado na UDT, armazenado na
rea de quarentena
Tabela 5.8 Matriz estendida do planejamento fatorial 23 108
Tabela 5.9 Coeficientes de regresso 109
Tabela 5.10 Tabela ANOVA e de parmetros estimados 110
Tabela 5.11 Percentual de biodegradao dos 16 HPA prioritrios da
USEPA (p
xiv
LISTA DE ABREVIATURAS
ABNT Associao Brasileira de Normas Tcnicas
BHA Bactrias Heterotrficas Aerbias
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CPC Cmara de Ps-Combusto
CRA Capacidade de Reteno de gua
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria
ERR Elongao Relativa da Raiz
FAO Food and Agriculture Organization
FF Fungos Filamentosos
FTB Fotoblastismo
GLP Gs Liquefeito de Petrleo
GRS Germinao Relativa das Sementes
HPA Hidrocarbonetos Policclicos Aromticos
HPA-AMM HPA de Alta Massa Molecular
HPA-BMM HPA de Baixa Massa Molecular
HPA-AMM:HPA-BMM Razo entre HPA de alta e de baixa massa molecular
IG ndice de Germinao
INMET Instituto Nacional de Meteorologia
Kw/o Constante de partio em gua/octanol
PCDD Dibenzo-p-dioxinas Tetra a Octacloradas
PCDF Dibenzofuranos Tetra a Octaclorados
OECD Organization for Economic Co-operation and Development
OMS Organizao Mundial da Sade
OTAN Organizao do Tratado do Atlntico Norte
pb Pares de base
TEF Fatores de Toxicidade Equivalente
TPH Hidrocarbonetos Totais de Petrleo
UDT Unidade de Dessoro Trmica
UFC/g Unidades Formadoras de Colnias por grama de solo
UFC/mL Unidades Formadoras de Colnias por mililitro
USEPA United States Environmental Protection Agency
HPA-AMM:BMM Variao da razo dos HPA de alta e baixa massa molecular
xv
RESUMO
GOMES, Ulrich Vasconcelos da Rocha. Tratamento Microbiolgico Sequencial de Solo
Proveniente de Unidade de Dessoro Trmica. Rio de Janeiro, 2011. Tese (Doutorado em
Tecnologia de Processos Qumicos e Bioqumicos) Escola de Qumica, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, 2011
Os resduos oleosos gerados nas operaes industriais so perigosos e a gesto correta
representa um desafio para o setor industrial. Tratamentos trmicos so amplamente
utilizados na remediao de solos contaminados por petroderivados, porm as temperaturas
empregadas podem permitir a presena de compostos remanescentes ao final do processo. O
presente trabalho teve como objetivo avaliar estratgias de tratamento microbiolgico
sequencial de um solo oriundo de uma Unidade de Dessoro Trmica. No extrato total do
solo foram identificados os 16 HPA prioritrios da USEPA, no sendo detetadas dioxinas e
furanos. Em seguida, foi empregado um planejamento experimental fatorial completo 23,
utilizando como variveis de entrada: adio de fertilizante mineral NPK, adio de glicerol
PA e presena ou ausncia do bioaumento. A biodegradao dos HPA foi escolhida como
varivel de resposta. A anlise estatstica indicou que a adio de glicerol PA em uma
concentrao menor que 0,63 mg/kg, em detrimento do bioaumento e da adio de
fertilizante, foi o fator determinante na biorremediao. A partir desse resultado, foram
testadas as concentraes de 0,32 e 0,16 mg/kg do cossubstrato. A primeira condio
estudada obteve a melhor biodegradao dos HPA, em 60 dias de tratamento, 71,80,2%.
Posteriormente foi empregado glicerol bruto, proveniente da indstria do biodiesel, em
condies similares, obtendo-se um percentual de biodegradao de 68,00,1%, confirmando
que o composto pode ser empregado como cossubstrato, bem como agregando valor a este
resduo. Os ensaios de ecotoxicidade no solo provaram que a biorremediao eliminou o
efeito fitotxico ainda observado aps o tratamento trmico.
Palavras-chaves: Biorremediao. Bioestmulo. Hidrocarbonetos Policclicos Aromticos. Glicerol. Dessoro
trmica.
xvi
ABSTRACT
GOMES, Ulrich Vasconcelos da Rocha. Sequential Microbiological Treatment of Soil
Obtained from a Thermal Desorption Unit. Rio de Janeiro, 2011. Thesis (Post-Graduation in
Technology of Chemical and Biochemical Processes) Escola de Qumica, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, 2011
Oily wastes generated in industrial operations are hazardous and proper management
represents a challenge to the industrial sector. Thermal treatment is a widely used technique
for oil-contaminated soil remediation however some temperatures may lead to the presence
of residual compounds. The purpose of this investigation was to evaluate the efficacy of
sequential microbiological treatment strategies in a soil obtained from a Thermal Desorption
Unit. The USEPA 16 priority PAHs were found in the soil extracts, but neither dioxins nor
furans were detected. Screening was then performed by using a complete 23 factorial
experimental design with these input factors: addition of mineral NPK fertilizer, addition of
pure glycerol and the presence or absence of bioaugmentation. PAH degradation was chosen
as the response variable. Statistical analysis indicated that the addition of pure glycerol at a
concentration lower than 0.63 mg/kg was the determinant factor in bioremediation. Based on
this result, further experiments were carried out using pure glycerol at 0.32 and 0.16 mg/kg.
The first condition resulted in the best PAH biodegradation at 60 days, 71.80.2%.
Afterwards, raw glycerol obtained as a by-product from the biodiesel manufacturing industry
was used in similar testing and achieved 68.00.1%, confirming that this compound may be
used as a cosubstrate and adding value to this residue. Ecotoxicity assays on soil samples
proved that bioremediation eliminated the phytotoxic effects still observed after the thermal
treatment.
Key words: Bioremediation. Biostimulation. Polycyclic Aromatic Hydrocarbons. Glycerol. Thermal
Desorption.
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
17
CAPTULO 1
INTRODUO
A matriz energtica atual depende de combustveis fsseis e petroderivados. Com a
industrializao, o aumento dessa demanda gerou ao longo das dcadas, impactos positivos na
qualidade de vida da populao mundial, bem como a perturbao ambiental, como um dos
seus maiores efeitos adversos, seja resultado de acidentes e vazamentos de leo, sejam por
atos de guerra (MOHAMED et al. 2006, LEMIEUX; LUTES e SANTOIANNI, 2004).
Independentemente do grau de desenvolvimento tecnolgico e da gesto ambiental,
toda atividade industrial de ampla escala gera grande quantidade de resduos, em
determinados casos, como no setor qumico e petroqumico, o manejo de resduos demanda
elevada ateno, assim como recursos financeiros e humanos especializados (OUYANG et al.
2005).
Por se tratarem de substncias perigosas, a destinao final dos resduos
cuidadosamente planejada, seguindo normas e parmetros previstos por legislaes, manuais
ou estudos tcnicos (RMBKE et al. 2005). Os resduos da indstria do petrleo e gs natural
esto inseridos nesse contexto, por compreenderem uma mistura de hidrocarbonetos alifticos
e aromticos, metais pesados e compostos sulfurados, nitrogenados e oxigenados, de
toxicidade variada (MOHAMED et al. 2006, YUSTE et al. 2000).
Estima-se que 90% da descarga de contaminantes na natureza sejam de origem
antropognica e cerca de 70% de todos os contaminantes ambientais sejam hidrocarbonetos.
Em termos de contaminao por leo, o solo considerado a poro mais afetada. Muitos
poluentes esto no solo h anos, porm o pblico no tem a conscincia adequada da
magnitude e da importncia desse fato (WILCKE, 2007, NIKOLOPOULOU et al. 2006,
ALEXANDER, 2000).
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
18
No caso de descarte de contaminantes em solos, todos os seus constituintes so
impactados, incluindo a microbiota, considerada a chave central para a recuperao da rea.
Tal recuperao caracterizada como um processo lento, quando comparado velocidade da
contaminao, mesmo que ocorra de forma gradual ou por vezes, indireta como nos casos de
microvazamentos e contaminao relacionada pluviosidade (WATANABE e
HAMAMURA, 2003).
A variedade e a concentrao dos contaminantes oriundos dos resduos oleosos podem
influenciar negativamente a fertilidade do solo, principalmente pelas caractersticas de alguns
compostos, que podem ocasionar mutaes e alteraes na composio da macro e da
microbiota nativa. No obstante, o aporte de hidrocarbonetos no solo proporciona ao longo do
tempo, a seleo de micro-organismos degradadores, fundamentais ao processo de
recuperao do sistema impactado (CRAWFORD et al. 2005). importante enfatizar que a
natureza persistente de alguns contaminantes, como os Hidrocarbonetos Policclicos
Aromticos (HPA), pode interromper ou estender o tempo do bioprocesso (HERWIJNEN et
al. 2003).
Os HPA compreendem uma das classes de molculas mais ocorrentes no ambiente. De
carter hidrofbico, estas molculas tendem a se ligar fortemente s partculas do solo,
dificultando o bioacesso e consequentemente sua biodegradao. Alm disso, o potencial
mutagnico e carcinognico dos HPA conhecido e amplamente divulgado na literatura
(GONG et al. 2007, MATER et al. 2006, ENELL et al. 2005, WATANABE, 2001).
Considerando a complexidade inerente aos solos, bem como a diversidade e natureza
dos contaminantes, vrias tecnologias tm sido desenvolvidas e empregadas na remoo de
compostos qumicos poluentes. Dentre esse grupo de processos, destacam-se as operaes
trmicas, como por exemplo, a dessoro trmica, cuja maior vantagem diz respeito
eficincia na remoo de grande quantidade de constituintes em um curto espao de tempo
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
19
(WARD; SINGH e VAN HAMME, 2003, REMMLER e KOPINKE, 1995). A dessoro
trmica uma tcnica baseada no aquecimento do solo, em uma faixa de temperatura
variando de 100 a 350C, na qual promove a transferncia de massa dos contaminantes da
matriz do solo para a fase gasosa, sem que haja destruio desses compostos (MERINO e
BUCAL, 2007, LIGHTY; SILCOX e PERSHING, 1990).
A dessoro trmica no foi uma tcnica desenvolvida para a destruio dos
compostos orgnicos, entretanto, algumas dessas molculas podem ser parcialmente
decompostas, gerando produtos indesejados, como HPA, dioxinas e furanos (KULKARNI;
CRESPO e AFONSO, 2008). Recentemente, em uma extensa reviso sobre produtos
formados a partir de mecanismos envolvendo pirlise e pirossntese, Ravindra, Sokhi e Van
Grieken (2008) enfatizaram a formao de compostos carcinognicos e mutagnicos,
sobretudo HPA. A faixa de temperatura, na qual a maioria destes compostos formada,
atravs de reaes catalisadas pelos minerais presentes no solo, coincide com a faixa de
temperatura empregada na dessoro trmica.
Neste contexto, o grau de eficincia desse processo pode estar sujeito s oscilaes
intrnsecas das condies, em escala industrial, reforma de molculas, ao tipo do solo e ao
teor e natureza dos contaminantes. Tais fatores podem contribuir para a presena de HPA e
outros compostos nos solos j tratados, justificando a necessidade de um tratamento
sequencial, que tenha por objetivo, diminuir ou extinguir o risco que os HPA residuais podem
representar.
Geralmente, os tratamentos sequenciais para a remoo de compostos em solo
envolvem combinaes de metodologias complementares a um tratamento fsico ou qumico
prvio, cuja finalidade ser aumentar a disponibilidade das molculas para uma posterior
remoo por via microbiolgica. A utilizao de micro-organismos na remoo de
hidrocarbonetos de petrleo em solos naturais encontra-se amplamente documentada na
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
20
literatura, sendo considerada ambientalmente correta e com boa aceitao pela opinio
pblica (JACQUES et al. 2007, SUPAPHOL et al. 2006, BONTEN; GROTENHUIS e
RULKENS, 1999).
De uma forma geral, dois tipos de abordagens podem ser aplicados na biorremediao
de solos: bioestmulo e bioaumento. Tais estratgias compreendem um conjunto de tcnicas
consolidadas tanto pelo meio cientfico como pela indstria. As metodologias que empregam
o bioestmulo ou o bioaumento esto atreladas s estratgias metablicas dos micro-
organismos, por exemplo, a produo de biossurfatantes e o cometabolismo, as quais auxiliam
a remoo dos contaminantes do solo por convert-los em biomassa e metablitos. Ressalta-se
que as interaes ecolgicas positivas entre diferentes grupos microbianos potencializam o
bioprocesso como um todo (SENEVIRATNE et al. 2008, CHANEAU et al. 2005,
MULLIGAN, 2004).
Em solos, a biodegradao dos HPA mais lenta quando comparada a outros
hidrocarbonetos. Tais molculas no constituem fontes preferenciais de carbono, fazendo com
que o processo de remoo microbiolgica ocorra por meio de vias cometablicas. Partindo
deste princpio, a adio de cossubstratos, como o glicerol, ao solo contaminado, pode
contribuir para o aumento da velocidade de biodegradao. O glicerol um dos adjuvantes
mais empregados na funo de cossubstrato em diversos bioprocessos industriais e bons
resultados foram reportados na literatura quando da utilizao do composto na biodegradao
de leo cru (ZHANG et al. 2005) e no processo de desnitrificao de guas residurias
(BODK et al. 2009).
O glicerol possui diversas vantagens em relao a outros cossubstratos, tais como, a
propriedade osmorreguladora (NEVOIGT e STAHL, 1997), o fato de poder atuar como fonte
preferencial de carbono na sntese de biossurfatantes (BATISTA et al. 2006) e a grande
disponibilidade no mercado. Neste contexto, o glicerol bruto, um coproduto da indstria do
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
21
biodiesel, passa a ter valor agregado, pelo seu reuso dentro do setor de petrleo e gs, uma
vez que sua produo e oferta vm sendo crescentes ao longo dos ltimos anos, por
conseguinte estimulam pesquisas visando o desenvolvimento de aplicaes funcionais para o
produto (OOI et al. 2004).
O glicerol bruto considerado um resduo industrial em funo da concentrao de
metais alcalinos, sabes e outras impurezas, oriundas do processo de produo de biodiesel e
mesmo na forma bruta, o composto pode ser assimilado como fonte de carbono para obteno
de energia e produo de biomassa, apresentando resultados similares aos obtidos quando
empregado o glicerol PA (LIU et al. 2009).
Por tratar-se como uma matria recente, na literatura pesquisada no foram
encontrados estudos que investigaram a aplicao do composto como cossubstrato durante a
biorremediao de solos contaminados com HPA. Outro ponto importante refere-se
ausncia de investigaes sobre as estratgias de tratamento sequencial, microbiolgicos ou
de outra natureza, na remoo dos HPA residuais em solos tratados por dessoro trmica.
A nica explicao para a deficincia deste tipo de abordagem pode estar na prpria
bibliografia relacionada ao tema dessoro trmica como um mtodo propriamente dito.
At hoje, a literatura especializada se preocupou apenas em esclarecer as dvidas relacionadas
aos possveis pontos crticos do processo, bem como demonstrar e discutir a sua eficcia, sob
o ponto de vista das anlises fsico-qumicas, negligenciando o grau de risco que uma possvel
presena de compostos residuais, pode representar, como nos casos da fitotoxicidade, do
bioacmulo e da biomagnificao, mesmo quando as concentraes de compostos
remanescentes so baixas. Neste cenrio, torna-se clara a necessidade de estudos que visam
investigar como a integrao de metodologias pode garantir a real eficcia da interveno.
Por razes j mencionadas, um questionamento sobre a presena dos HPA residuais no
solo pode vir luz, tornando possvel a percepo da existncia de lacunas no que diz respeito
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
22
ao risco sade humana e ambiental, representado por tais compostos. Estas lacunas podem
tambm se estender aos eventos que se seguem ao tratamento de solos por dessoro trmica,
diretamente relacionados microbiota, dinmica dos nutrientes no solo e recuperao do
equilbrio do ecossistema (DAZY; FRARD e MASFARAUD, 2009).
As informaes presentes neste documento dissertam sobre o ineditismo do tema e
descrevem estratgias de tratamento microbiolgico sequencial, em escala de laboratrio, de
um solo previamente tratado em uma Unidade de Dessoro Trmica, em escala industrial,
contendo ao final deste processo, baixos teores de HPA residuais, implicados na toxicidade de
grau moderado alto, nos vegetais testados.
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
23
CAPTULO 2
OBJETIVOS
2. 1 Objetivo geral
Avaliar o tratamento microbiolgico sequencial de um solo tratado por dessoro
trmica, utilizando a degradao dos 16 Hidrocarbonetos Policclicos Aromticos
listados pela United States Environmental Protection Agency, como varivel de
resposta.
2. 2 Objetivos especficos
Caracterizar o resduo oleoso de fundo de coluna da cmara de destilao a vcuo,
contaminante do solo.
Avaliar a eficincia do tratamento trmico atravs da caracterizao das amostras de
solo antes e depois do processo.
Identificar os contaminantes residuais no solo aps tratamento trmico.
Investigar a biodegradao dos hidrocarbonetos residuais identificados, empregando
tcnicas de bioestmulo e bioaumento, com uso de ferramentas estatsticas e de
planejamento experimental.
Utilizar o glicerol bruto, resduo da fabricao do biodiesel, como cossubstrato do
processo de biodegradao dos hidrocarbonetos policclicos aromticos residuais.
Avaliar a fitotoxicidade dos solos pr e ps-dessoro trmica, bem como aps a
biorremediao.
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
24
CAPTULO 3
REVISO DA LITERATURA
3. 1 Resduos da indstria do petrleo
H pouco mais de 150 anos, desde a primeira explorao comercial do petrleo nos
Estados Unidos, o ouro negro, como ficou conhecido, firmou-se como um dos mais
importantes pilares da atividade humana em toda a histria, assumindo uma posio
privilegiada em nossa sociedade e decidindo os progressos, comodidades, benefcios
oferecidos e a organizao de como a conhecemos (CHEREMISINOFF e ROSENFELD,
2009).
O leo cru necessita de vrios tratamentos, sendo o refino, a operao, pela qual so
obtidos os derivados, com maior valor comercial, ao menor custo operacional. O processo do
refino do petrleo consiste em etapas de separao, converso, tratamento de derivados e
formulao. Na etapa de separao ocorre o desmembramento das fraes bsicas do leo
empregando operaes primrias, como a destilao atmosfrica e operaes secundrias, por
exemplo, a destilao a vcuo (CUNHA, 2009, SZKLO, 2005).
Aps a separao das fraes, os resduos depositados no fundo das cmaras de
destilao a vcuo so principalmente constitudos por resinas e asfaltenos. Nas operaes de
converso, ocorre a transformao das fraes separadas e tambm do resduo de fundo das
cmaras de separao, atravs de reaes de quebra, de reagrupamento ou de reestruturao
molecular, tais como, tcnicas de craqueamento, alquilao e condensao de anis,
respectivamente. Na fase de tratamento de derivados so eliminadas ou modificadas algumas
propriedades indesejadas, associadas presena de diversos contaminantes do leo, como o
enxofre, por exemplo. Na etapa de formulao, os derivados do petrleo sofrem um
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
25
polimento, alcanando diferentes especificaes de presso de vapor, peso especfico,
contedo de enxofre, viscosidade, entre outras (CUNHA, 2009, SZKLO, 2005).
Apesar do planejamento e gerenciamento adequados nas refinarias, visando minimizar
possveis perturbaes ambientais, importantes impactos ainda podem ocorrer. Alguns
exemplos desses impactos so o consumo excessivo de gua e energia, a produo de grandes
quantidades de efluentes lquidos, a emisso de gases txicos e o efeito estufa, bem como a
gerao de resduos slidos, de difcil tratamento e disposio (BAIRD, 2008).
De acordo com a Associao Brasileira de Normas Tcnicas, ABNT (2004), os
resduos so definidos como um material resultante da atividade humana de origem industrial,
domstica, hospitalar, agrcola, de servios e de varrio. Em funo de suas caractersticas
fsico-qumicas, podem representar risco para a sade pblica e ambiental, dado os diferentes
graus de toxicidade, podendo ser teratognicos, quando afetam a vida embrionria;
mutagnicos, quando aumentam as taxas de alteraes genticas espontneas e
carcinognicos, quando aumentam a probabilidade do desenvolvimento de cncer.
Os resduos oleosos da indstria do petrleo compreendem uma mistura de substncias
hidrofbicas, de graus de recalcitrncia distintos e por vezes, carcinognicas, podendo ser de
natureza orgnica e inorgnica. Os resduos slidos, semisslidos e lquidos so formados em
muitas etapas do processo do refino e tratamento de efluentes, bem como durante o transporte
e estocagem da matria-prima ou do produto pronto (DEUEL Jr. e HOLLIDAY, 1997). A
Tabela 3.1 apresenta alguns dos principais resduos gerados na indstria do petrleo.
Tabela 3.1 Resduos gerados na indstria do petrleo listados por origem*
Tipo de operao Exemplos
Refino
lama do dessalinizador; resduo de fundo de tanque de
refino; resduo de coque; borras oleosas; catalisadores
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
26
Refino (continuao) exauridos; finos do catalisador exaurido; finos depositados
nos tratamentos trmicos; lamas dos processos de
converso de produtos de fundo de cmaras de destilao a
vcuo; guas cidas; argilas de converso; argilas de
filtrao de leo lubrificante; slidos emulsionados em
leos; sedimento de filtrao; lamas cidas; lamas de
enxofre; produtos fora da especificao.
Tratamento lamas do tratamento de efluentes; lodo de separao leo-
gua; sobrenadante de separadores; lodo biolgico; lama
de limpeza dos trocadores de calor e torres de refrigerao;
argilas de absoro.
Limpeza lodo de limpeza de tubos; lodo de limpeza de separadores;
lodo de poeiras do sistema de emisso de gases; efluentes
oleosos em condensadores.
Transporte e estocagem sedimento de fundo do tanque de armazenamento; borras
oleosas; slidos emulsionados no leo; ferrugem; crostas;
solo contaminado por derramamentos.
* dados reunidos a partir de diversas fontes
Os resduos gerados na indstria do petrleo e gs natural podem ser classificados
como resduos perigosos e no perigosos. Os resduos perigosos ou classe I apresentam
propriedades que lhes conferem graus de periculosidade, ou seja, inflamabilidade,
corrosividade, reatividade, toxicidade e patogenicidade. Ressalta-se que um resduo classe I
no necessariamente tem que apresentar todas essas propriedades (ABNT, 2004). As borras
oleosas, resduos de fundo de tanques e das cmaras de destilao, lodos de tratamento de
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
27
Slidos emulsionados no leo (67,2%) Catalisadores exauridos (25,0%)Borra oleosa (4,5%) Sedimentos depositados (2,4%)Lodo biolgico (0,6%) Lamas (0,4%)Argilas de absoro (0,2%) Resduo de fundo de cmara de destilao (0,1%)
efluentes e de limpeza, amnia e catalisadores exauridos, isto , saturados por metais pesados
e hidrocarbonetos, so exemplos de resduos gerados na indstria do petrleo, pertencentes
esta classe.
Os resduos no perigosos ou classe II compreendem os compostos que no se
enquadram na definio para os resduos perigosos. Os resduos classe II se subdividem em
dois grupos: classe IIA ou no inertes, os quais podem apresentar caractersticas como
biodegradabilidade, combustibilidade e solubilidade em gua; e classe IIB ou inertes,
caracterizados desta forma quando todos os seus constituintes solubilizados apresentam
valores inferiores aos padres de potabilidade da gua, excetuando aspecto, cor, turbidez,
dureza e sabor (ABNT, 2004).
A Figura 3.1 apresenta o percentual de resduos perigosos gerados em uma refinaria de
grande porte.
Figura 3.1 Percentual de resduos perigosos gerados em uma refinaria de grande porte,
calculados a partir de dados de Mariano (2001)
Os resduos perigosos da indstria de petroderivados so constitudos principalmente
por hidrocarbonetos aromticos monocclicos, policclicos e heterocclicos, de alta e baixa
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
28
massa molecular, alm de gua e partculas minerais, incluindo metais pesados. No ponto de
sua gerao, podem conter, em mdia, os seguintes teores: 40-60% de leo, 30-90% de gua e
5-40% de slidos totais. Desta forma, qualquer resduo gerado em operaes industriais
representa risco para o ambiente e um problema para o setor, determinando que o correto
gerenciamento dos resduos seja empregado, prtica existente mesmo antes do atual
movimento ecolgico (DAS e MUKHERJEE, 2007, LAZAR et al. 1999, DEAN, 2005). A
literatura sugere que antes da destinao de tais resduos, se faz necessrio o emprego de
operaes de manejo e de tratamento, como por exemplo, o acondicionamento seguro, a
estabilizao e a disposio em aterros (MACHN-RAMIREZ et al. 2008, MARIANO, 2001).
Quando se dispem borras oleosas ou qualquer outro tipo de resduos em aterros, esse
processo deve ser conduzido de forma a garantir a estabilidade hidrolgica e mecnica, no
intuito de evitar lixiviao e contaminao por infiltraes. Do contrrio, o tratamento e a
disposio final imprprios desses materiais podem causar impactos relevantes e adversos,
principalmente ao solo e aos corpos hdricos subterrneos (RITTER et al. 2006, MISHRA et
al. 2001, VASUDEVAN e RAJARAM, 2001).
Ao se optar em dispor resduos oleosos diretamente no solo, a execuo equivocada ou
insegura dessa operao pode causar graves danos ao ambiente. No entanto,
independentemente do cuidado e da tecnologia empregada na disposio de resduos
diretamente no solo, a transferncia de massa dos contaminantes atravs de suas camadas
pode ocorrer e dessa forma, o transporte da matria orgnica pode seguir trs vias: parte se
dissolve na fase lquida do solo, outra fica retida nos poros e uma terceira, compe a fase
gasosa. Alm disso, observa-se que a rea onde ocorre a adsoro dos contaminantes nos
agregados maior do que toda a rea encontrada na superfcie do solo (NADIM et al. 2000).
Uma vez em contato, os resduos do petrleo podem afetar propriedades importantes
do solo, tais como, permeabilidade, porosidade, densidade, resistncia, estabilidade, umidade,
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
29
entre outras. Em alguns casos, a ao do tempo pode potencializar o impacto negativo no
bioacesso e na biodisponibilidade de certas molculas, tornando os Hidrocarbonetos
Policclicos Aromticos uma das principais classes de compostos reconhecidamente
persistentes (SEMPLE et al. 2007, DUA et al. 2002, VISVANATHAN, 1996).
3. 2 Hidrocarbonetos Policclicos Aromticos (HPA)
Os Hidrocarbonetos Policclicos Aromticos (HPA) compem uma importante e
complexa classe de compostos ubquos, dotados de dois ou mais anis aromticos e
ciclopentanos, condensados e arranjados na forma linear, angular ou em grupos. Os HPA so
geralmente formados a partir de hidrocarbonetos saturados, sob condies deficientes de
oxignio, utilizando vias de pirossntese ou de pirlise, catalisadas por certos constituintes
presentes no meio (MUCKIAN et al. 2007, VO-DINH; FETZER e CAMPIGLIA, 1998).
Os HPA se originam a partir de trs fontes: 1 vegetal, pela razo de muitos dos
constituintes das plantas serem formados por molculas aromticas, tais como, carotenoides,
lignina, alcaloides e terpenoides; 2- geoqumica, quando a matria orgnica exposta altas
temperaturas, permitindo a formao desses compostos; 3- antropognica, mais comum e
muito acima do padro natural de formao (MUELLER; CERNIGLIA e PRITCHARD,
2005).
A maior preocupao com relao aos HPA diz respeito ao seu elevado potencial
mutagnico e carcinognico, amplamente divulgados na literatura (MATER et al. 2006,
ENELL et al. 2005, WATANABE, 2001, entre outros). Dada a natureza hidrofbica, os HPA
so bem absorvidos pelos mamferos, atravs de trs rotas de exposio: ingesto, inalao e
drmica, resultando em mutaes e perturbao nos gametas, alm do acmulo na cadeia
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
30
trfica (FARHADIAN et al. 2011, CEBULSKA-WASILEWSKA et al. 2007, CHEN e LIAO,
2006).
Como xenobiticos, os HPA so considerados os principais contaminantes orgnicos
na natureza, tendo o solo como principal receptor. Essas molculas podem sofrer
transformaes por de diversas vias: oxidao, fotlise, volatilizao e biodegradao. Os
principais fatores determinantes da rota de remoo dos HPA esto principalmente
relacionados ao ambiente e s propriedades qumicas dessas molculas, por exemplo, tamanho
e o nmero e a configurao dos anis (HAMDI et al. 2007, ZHANG et al. 2006, GONG et al.
2005, KANALY e HARAYAMA, 2000).
Os HPA so classificados em dois grupos de acordo com o nmero de anis em HPA
de baixa massa molecular, com dois ou trs e HPA de alta massa molecular, com quatro ou
mais anis (DAUGULIS e McCRACKEN, 2003). A Tabela 3.2 apresenta as principais
caractersticas dos dezesseis HPA prioritrios listados pelo rgo americano de proteo
ambiental, USEPA (United States Environmental Protection Agency).
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
31
Tabela 3.2 Caractersticas fsico-qumicas e classificao da atividade genotxica dos 16 HPA prioritrios listados pela USEPA*
HPA
n de anis
Massa
molecular (g)
Genotoxicidade
(classes)
Frmula
Solubilidade
(mg/L)
Presso de vapor (mmHg)
logKw/o
Ponto de fuso
(C)
Ponto de
ebulio (C)
d (g/L)
Naftaleno 2 128,17 2B C10H8 31,0 8,89x10-2 3,4 80 218 1,14 Acenafteno 3 154,21 3 C12H10 3,8 3,75x10-3 3,9 94 280 1,02 Acenaftileno 3 152,20 -- C12H8 16,1 2,90x10-2 4,1 91 280 1,01 Fluoreno 3 166,22 3 C13H10 1,9 3,24x10-3 4,2 116 295 1,20 Fenantreno 3 178,23 3 C14H10 1,1 6,80x10-4 4,6 101 339 1,25 Antraceno 3 178,23 3 C14H10 0,045 2,55x10-5 4,5 218 340 1,25 Fluoranteno 4 202,26 3 C16H10 0,26 8,13x10-6 5,2 111 375 1,25 Pireno 4 202,26 3 C16H10 0,132 4,25x10-6 5,2 146 404 1,27 Benzo[a]antraceno 4 228,29 2B C18H12 0,011 1,54x10-7 5,6 162 435 1,27 Criseno 4 228,29 2B C18H12 0,0015 7,80x10-9 5,9 254 448 1,27 Benzo[b]fluoranteno 5 252,32 2B C20H12 0,0015 8,06x10-8 6,1 168 481 1,24 Benzo[k]fluoranteno 5 252,32 2B C20H12 0,0008 9,59x10-11 6,8 217 480 1,24 Benzo[a]pireno 5 252,32 1 C20H12 0,0038 4,89x10-9 6,5 179 495 1,24 Dibenzo[a,h]antraceno 5 276,34 3 C22H12 0,005 2,10x10-11 6,5 267 324 1,28 Benzo[g,h,i]perileno 6 278,35 3 C22H14 0,00026 1,00x10-10 6,6 278 550 1,30 Indeno[1,2,3-c,d]pireno 6 278,35 2B C22H14 0,062 1,40x10-10 7,1 164 536 1,30
fontes: IARC (2010); Bojes e Pope (2007), Cai et al. (2007), Eom et al. (2007), Zhang et al. (2006), Daugulis e McCracken (2003) e Pope, Peters e Howard (2000) * United States Environmental Protection Agency classes: 1- carcinognico para humanos; 2B- possivelmente carcinognico para humanos; 3 no classificado como carcinognico para humanos constante de partio gua/octanol densidade (g/L)
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
32
Os dezesseis HPA prioritrios listados pela USEPA representam um modelo de
unidade geral para um grande grupo de molculas e foram escolhidos utilizando critrios
baseados nos seguintes fatos: 1- h bastante informao disponvel; 2- so compostos
representativos da classe, em termos de toxicidade e 3- se encontram em concentraes
superiores aos demais HPA, consequentemente, aumentando o risco, pela maior exposio
(RAVINDRA; SOKHI e VAN GRIEKEN, 2008, THOMAS e WORNAT, 2008)
A Figura 3.2 apresenta as estruturas qumicas dos 16 HPA prioritrios da USEPA.
Figura 3.2 Estruturas qumicas dos 16 HPA prioritrios da USEPA (fonte:
RAVINDRA; SOKHI e VAN GRIEKEN, 2008)
As molculas dos HPA so bastante hidrofbicas, em razo de fenmenos de
ressonncia eletrnica e outras propriedades qumicas, ligando-se fortemente s partculas do
solo, dificultando o bioacesso e aumentando a resistncia biodegradao (GONG et al.
2007, ENELL et al. 2005). Diversas razes podem ser identificadas para explicar o carter
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
33
persistente desses compostos: baixa solubilidade em gua (JACQUES et al. 2008,
HARAYAMA, 1997), baixa biodisponibilidade (SAMANTA; SINGH e JAIN, 2002),
estabilidade molecular (KANALY e HARAYAMA, 2000, YUSTE et al. 2000), alto
coeficiente de adsoro no solo (MOHAMED et al. 2006, VAN HAMME; SINGH e WARD,
2003), altos pontos de fuso e ebulio (GONG et al. 2007), atividade inibitria da microbiota
(TOLEDO et al. 2006) e participao de reaes de condensao de anis e de formao de
radicais livres, catalisadas por metais do solo (RISOUL et al. 2005, LEDESMA et al. 2000,
KARIMI-LOFTABAD; PICKARD e GRAY, 1996).
O Ministrio da Habitao, Planejamento e Meio Ambiente da Holanda considera a
soma da concentrao de 10 HPA padres (naftaleno, antraceno, fenantreno, fluoranteno,
benzo[a]antraceno, criseno, benzo[a]pireno, benzo[g,h,i]perileno, benzo[k]fluoranteno e
indeno[1,2,3-c,d]pireno), cujos valores so distintos para duas categorias denominadas valor
de referncia, 1 mg/kg e valor de interveno, 40 mg/kg. O valor de referncia indica o padro
natural desses HPA no solo, no representando risco para a sade do ambiente e do homem.
Por outro lado, o valor de interveno refere-se ao caso de contaminao do solo, cuja
implantao imediata de estratgias de remediao da rea necessria (NEDERLAND,
2006).
No Brasil, o Conselho Nacional do Meio ambiente, CONAMA, determina valores
orientadores dos HPA para solo, distribudos em trs classes denominadas: referncia,
preveno e interveno. Os valores de interveno ainda esto subdivididos em outras trs
categorias: para reas agrcolas, para reas residenciais e para reas industriais. Diferente na
lista holandesa, os valores orientadores de interveno em reas industriais no correspondem
uma soma de 10 HPA padres e sim, a valores individuais, em mg/kg de solo seco, de 10
HPA, cujas concentraes no podero estar acima dos seguintes valores: antraceno (0,0),
benzo[a]antraceno (65,0), benzo[k]fluoranteno (0,0), benzo[g,h,i]perileno (0,0),
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
34
benzo[a]pireno (3,5), criseno (0,0), dibenzo[a,h]antraceno (1,3), fenantreno (95,0),
indeno[1,2,3-c,d]pireno (130,0) e naftaleno (90,0) (BRASIL, 2009).
3. 3 Vias para tratamento de solos contaminados com leo
Ao longo das ltimas dcadas, o aumento da necessidade da proteo ambiental
proporcionou uma intensa cobrana por parte da opinio pblica, motivada principalmente
por eventos de grande apelo visual e impacto na mdia, tais como, os derramamentos de leo,
a poluio de corpos hdricos, as grandes chamins de fbricas e o desmatamento de florestas.
O momento histrico que deu incio ao que chamamos de conscincia ambiental ocorreu a
partir do impacto causado pelas fotos do planeta Terra, vista no espao, tiradas por
astronautas, entre os anos de 1968-1970. Pela primeira vez na histria, o planeta foi visto por
inteiro e pde-se perceber o quo solitrio e frgil est no espao. Nas dcadas seguintes,
registrou-se o crescimento da preocupao com relao poluio ambiental, proteo de
reas naturais e crescimento populacional, entre outros. Por vezes, assuntos como a guerra fria
e a recesso puseram a necessidade de proteo ambiental em segundo plano, somente
tornando-se prioritrio com a proximidade do incio do sculo XXI (ODUM e BARRETT,
2008, LESCHINE, 2002).
O tratamento do solo contaminado por leo tem como objetivo a reduo do volume
do contaminante e a desintoxicao da rea impactada. Os mtodos e tecnologias aplicados
so limitados pelas condies ambientais e requerem deciso baseada em estudos de caso
(ANDERSON, 2002, NORDVIK, 1999, SAXENA e JOTSHI, 1996). A Tabela 3.3 apresenta
as principais estratgias aplicadas no tratamento de solos impactados com leo e derivados.
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
35
Tabela 3.3 Exemplos de tratamentos de solos contaminados por leo e derivados*
Tratamentos fsicos Tratamentos qumicos Tratamentos biolgicos
Dessoro trmica
Escavao e Aterro
Extrao do vapor do solo
Remoo mecnica
Lavagem
Imobilizao
Queima in situ e ex situ
Injeo de oxidantes
Injeo de emulsificantes
Aplicao de dispersantes
Extrao por solvente
In situ flushing
Estratgias de Bioestmulo
Bioaumento
Biopilha
Fitorremediao
Compostagem
Biorreatores
Biofiltros
Landfarming * dados reunidos a partir de diversas fontes
Dentre as tcnicas mais empregadas e comercialmente disponveis para a remoo de
contaminantes em solos impactados por leo destacam-se os tratamentos trmicos,
reconhecidos por alguns autores, como os mais eficientes. No entanto, as alternativas
biolgicas so consideradas menos invasivas e ambientalmente corretas. De acordo com a
temperatura empregada, os tratamentos trmicos so classificados em dois tipos: 1- tcnicas
de dessoro, operando na faixa de temperatura entre 100 e 350C, as quais promovem o
aquecimento do solo e a separao fsica atravs da transferncia de massa para a fase gasosa
e 2- tcnicas de destruio, operando na faixa de temperatura acima de 350C, promovendo a
modificao qumica dos contaminantes (MERINO e BUCAL, 2007, SAXENA e JOTSHI,
1996).
A complexidade e a concentrao dos poluentes, as propriedades dos solos e a
contaminao residual aps algumas alternativas de tratamento trmico, com nfase nos
compostos menos volteis, sugerem a necessidade de alternativas sequenciais, menos
agressivas e economicamente atrativas. Nesses casos, os tratamentos biolgicos seriam
indicados como uma complementao. Outro fator importante na determinao da estratgia
de tratamento de solos impactados com leo o tempo necessrio para a remediao. Esse
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
36
perodo pode variar de poucos meses a muitos anos e a escolha do processo depende de
alguns fatores, tais como, qualidade e quantidade dos contaminantes presentes, tamanho e
profundidade da rea contaminada, tipo de solo e condies ambientais. Entre esses fatores, o
tipo do contaminante considerado o parmetro determinante (FRIIS et al. 2006, ENELL et
al. 2005, ARARUNA Jr. et al. 2004).
Geralmente, a interao entre os tratamentos fsico-qumicos com os tratamentos
biolgicos ocorre de forma sequencial ou secundria, sendo empregados antes ou depois da
biorremediao. Tais abordagens podem ser exemplificadas pela adio de solventes ao solo
ou pelo emprego do reagente de Fenton ou oznio aps o biotratamento, respectivamente. No
primeiro exemplo, os compostos hidrofbicos so dissolvidos, favorecendo a assimilao
desses compostos pelos micro-organismos, isto , aumentando sua biodisponibilidade. No
segundo exemplo, as estratgias empregadas participam de reaes de oxidao dos
contaminantes residuais e seus metablitos (GAN; LAU e NG, 2009).
Na extensa literatura consultada, a aplicao de qualquer tratamento biolgico
sequencial para a remoo de compostos residuais, em solos tratados por dessoro trmica,
ainda no foi executada, uma vez que os autores enfatizam a eficincia da operao baseados
nas caractersticas fsico-qumicas do solo aps a passagem pelo forno. Contudo, ressalta-se
que as altas temperaturas e certas oscilaes intrnsecas do processo podem promover
determinadas condies, nas quais, um tratamento secundrio se faa necessrio.
3. 3. 1 Dessoro trmica
A dessoro trmica um processo de remoo de molculas no estado lquido ou
gasoso, aderidas superfcie, contidas nos micro e nos mesoporos dos slidos, atravs da
aplicao de energia trmica. O tratamento de solos contaminados utilizando o processo de
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
37
dessoro trmica considerado uma das tcnicas de remediao mais adequadas e versteis,
dentre as existentes na atualidade. Isto se deve ao amplo espectro de contaminantes orgnicos
e de alguns metais que podem ser convertidos s suas formas volteis. Em solos
contaminados com leos, o mtodo est fundamentado no fenmeno de volatilizao dos
constituintes do contaminante, envolvendo equilbrio de fases e transferncia de massa, sendo
a temperatura, um dos principais fatores do processo. Os tipos dos contaminantes, as
caractersticas do solo, incluindo a textura e o tempo de residncia do material nos
equipamentos, tambm so fatores importantes ao sucesso da dessoro trmica
(FALCIGLIA; GIUSTRA e VAGLIASINDI, 2011, DAZY; FRARD e MASFARAUD,
2009, GEORGE et al. 1995, BUCAL et al. 1994).
Vrias tecnologias podem ser empregadas na extrao ou na recuperao de
compostos orgnicos, bem como no tratamento de solos contaminados por leo. No entanto, a
partir da dcada de 1990, a dessoro trmica, apesar de envolver grande investimento,
recebeu destaque pela eficcia, ganho em tempo e menor investimento por tonelada de solo,
correspondendo aproximadamente 50% dos gastos quando comparada biorremediao.
Outras importantes vantagens apresentadas pela tcnica so a possibilidade de remediar
grandes quantidades de solo em menor tempo, a no produo de metablitos por no
envolver atividade biolgica, o potencial de aplicao na recuperao do leo e a
possibilidade de aumentar a biodisponibilidade do contaminante atravs de sua redistribuio
no solo (ROBINSON et al. 2008, WORLD OIL, 2001, BROTEN; GROTENHUIS e
RULKENS, 1999).
Deve-se tambm ressaltar que embora o processo de dessoro trmica no tenha sido
desenvolvido para decompor molculas orgnicas, alguns deles podem o ser, de forma parcial.
As temperaturas empregadas podem promover reaes de isomerizao e ou alongamento de
cadeia, gerando a presena de compostos residuais aps a passagem pelo forno. Em relao a
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
38
este processo, a no destruio total dos constituintes txicos pode se tornar um problema,
caso no haja um planejamento eficaz para descarte de resduos remanescentes. Outros pontos
crticos importantes da operao so a gerao de emisses de gases de efeito estufa e a
formao de produtos e subprodutos da combusto incompleta, tais como, dioxinas, furanos,
xidos de enxofre e nitrognio e os vapores de metais. Para contornar tais inconvenientes, a
Unidade de Dessoro Trmica possui um sistema de controle de poluio de gases, que ser
discutido mais adiante (POPE; PETERS e HOWARD, 2000, McGOWAN; GREER e
LAWLESS, 1996).
Os fenmenos envolvidos na dessoro trmica so divididos em duas etapas:
liberao de compostos orgnicos volteis e gua, seguida pela liberao lenta de leo com o
aumento gradual da temperatura, tendo como consequncia a perda de massa representada
pelas perdas de gua, hidrocarbonetos, material hmico, metais e alguns minerais como
carbonatos. A dessoro trmica pode ser aplicada nos casos de solos contaminados com
misturas de hidrocarbonetos, no entanto, um elevado grau de ateno deve ser tomado quando
o tratamento envolve solos contaminados com leos ou resduos oleosos contendo elementos
metlicos em elevadas concentraes, em especial, arsnio e mercrio, bastante comuns em
alguns leos crus (WORLD OIL, 2001).
A natureza do leo e do solo pode requerer ainda, um elevado gradiente de
temperatura, associado a um aumento do tempo de residncia no equipamento trmico para a
remoo satisfatria dos contaminantes, conferindo o aumento significativo do custo, um dos
limitantes do processo (LEE et al. 1998).
Geralmente, as Unidades de Dessoro Trmica em escala industrial utilizam o
esquema simplificado apresentado na Figura 3.3.
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
39
1 2 3
8
4
5
6 7
Resduo
Efluente GasosoTratado
SlidosTratados
Efluente LquidoTratado
Figura 3.3 - Esquema simplificado de uma Unidade de Dessoro Trmica. 1-
armazenamento do resduo; 2 preparao e estoque; 3- admisso; 4 dispositivo
transportador; 5 forno; 6- sistema de tratamento de gases; 7 sistema de tratamento e
reciclo dos efluentes; 8 armazenagem dos slidos; inclinao do forno (adaptado de
SECOND, 2000)
Segundo De Percin (1995), independentemente do tipo do resduo, esse material
necessita passar por unidades de operaes de recepo e armazenamento temporrio visando
dar condies para as anlises no material recebido e o correto acondicionamento, respeitando
a compatibilidade qumica entre os vrios materiais. Nessa etapa, pode ser verificado se os
materiais possuem propriedades radioativas, oxidantes, explosivas, entre outras, e por isso
de fundamental importncia para a segurana do processo e dos trabalhadores, bem como para
o desempenho do processo. Os dados obtidos na recepo e armazenagem dos resduos
permitem escolher as operaes unitrias a serem empregadas na preparao do material que
seguir para o equipamento trmico. Dentre essas operaes, destacam-se a mistura dos
slidos e dos lquidos, moagem e a separao granulomtrica. Assim, pode-se obter uma
mistura de resduos, com poder calorfico adequado, evitando exploses dentro do forno e
reduzindo custos com energia.
Aps a etapa de preparao, tambm conhecida como blendagem, segue a operao de
admisso. Nessa etapa, a massa a ser admitida no equipamento trmico dosada, em geral,
com um equipamento denominado moega. A quantidade de material que sai da moega
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
40
depende das caractersticas da mistura preparada na etapa de blendagem, da temperatura do
forno, das dimenses do equipamento e dos sistemas de controle de emisses acoplados.
Aps a moega, encontra-se a operao de transporte dos resduos para o forno. Esta
etapa determina o fluxo de massa na entrada, de forma a garantir uma homogeneidade do
material, incrementando a eficincia do processo. O transporte de material para o forno pode
ser feito por meio de equipamentos mecnicos, como as correias transportadoras e os
parafusos-sem-fim. As operaes manuais de transporte podem ser realizadas, no entanto, so
menos eficientes, pois apresentam dificuldades para manuteno de velocidade constante e
esto relacionadas aos problemas de sade ocupacional.
Ao serem admitidos no forno, os resduos entram em contato com a energia trmica
presente no equipamento. Esse contato pode ser feito de forma direta ou indireta. Os
equipamentos que possibilitam o contato direto dos resduos com a chama no forno so
denominados Unidades de Dessoro Trmica com chama direta, j os equipamentos que no
possibilitam o contato dos resduos com a chama so denominados de Unidades de Dessoro
Trmica com chama indireta. Nesse caso, o calor transferido uma superfcie que conduz
calor aos materiais nela dispostos. A temperatura de operao dos fornos varia, conforme o
ponto de ebulio dos compostos que se deseja remover dos resduos (DE PERCIN, 1995).
O tempo de residncia dos resduos no forno controlado por duas variveis: a
inclinao e a rotao do forno. Os sistemas rotatrios para dessoro trmica so os mais
comuns e tais sistemas, quando aplicados em chama direta contracorrente, so considerados
mais eficientes para o processo (McGOWAN; GREER e LAWLESS, 1996). A Figura 3.4
apresenta o esquema de um forno rotatrio usado no tratamento de solos contaminados por
leo.
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
41
Figura 3.4 Corte longitudinal de um forno rotatrio (adaptado de HEYDENRYCH;
GREEF e HEESINK, 2002)
medida que ocorre o movimento giratrio, o solo dentro do tambor rotatrio se
distribui em duas regies com caractersticas distintas. Prximo base, forma-se a camada
passiva, que compreende a maior poro, enquanto que na parte superior, forma-se a camada
ativa. A camada ativa possui uma profundidade varivel em funo da velocidade empregada
e das partculas que se movem da superfcie para a parte inferior da face do rotor, ocorrendo
nesta regio a transferncia de massa (HEYDENRYCH; GREEF e HEESINK, 2002).
O tempo de residncia e a velocidade de rotao tambm promovem modificaes da
matriz slida. Essas modificaes so causadas pela quebra das partculas em funo do atrito,
gerando partculas com dimetros menores, principalmente na camada passiva. Alm da
temperatura, a matriz do solo outro fator importante e geralmente areia e cascalho produzem
resultados melhores que solos argilosos (ARARUNA Jr. et al. 2004, McGOWAN; GREER e
LAWLESS, 1996, RINK et al. 1993).
Os vapores e gases emanados no forno so direcionados para o sistema de tratamento
de gases. Esse sistema pode possibilitar a condensao do efluente gasoso atravs da reduo
da temperatura, permitindo, assim, a recuperao de contaminantes de interesse, como por
exemplo, hidrocarbonetos. Em outros casos, o sistema equipado com uma cmara de ps-
Luz do forno
camada ativa
camada passiva
sentido da rotao
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
42
combusto, CPC, na qual ocorre nova adio de calor no sistema, promovendo a oxidao da
fase gasosa. Para esse caso, a temperatura deve estar entre 800 e 1200C (BRASIL, 2002).
Independentemente da presena da CPC ou de sistema de condensao, os efluentes
gasosos emanados desses dispositivos so encaminhados para sistemas de resfriamento,
visando reduzir a formao de outras molculas, destacam-se as dioxinas e os furanos,
compostos altamente carcinognicos. Os efluentes gasosos, em seguida, so encaminhados
para lavadores de gases e para ciclones e/ou filtros visando remoo de gases cidos, xidos
de nitrognio e de enxofre, bem como remoo de material particulado (KULKARNI;
CRESPO e AFONSO, 2008).
A legislao brasileira preconiza que esses sistemas de tratamento de gases devem ser
equipados com sistemas automticos para monitoramento das emisses, possibilitando o
fechamento da entrada do forno para casos de emisses fora dos padres estabelecidos,
ausncia de chama, baixo teor de oxignio, alto teor de monxido de carbono, entre outros
parmetros que possam indicar queima inadequada (BRASIL, 2002). Esse processo de
monitoramento contnuo das emisses, com interligao da resposta analtica automatizada
porta do forno denominado de intertravamento.
Para resfriamento e tratamento dos gases usam-se lquidos e equipamentos diversos.
Os lquidos gerados na unidade so em geral, recirculados no processo com vista reduo
dos custos do processo e os slidos tratados so encaminhados para um local de
armazenamento para anlises. Caso seja considerado adequado, o resduo tratado
encaminhado para destino selecionado, caso seja considerado inadequado, retorna etapa de
preparao, reingressando ao processo.
O tratamento trmico promove modificaes no solo, alterando suas caractersticas
micro e macroscpicas, bem como muitas de suas propriedades fsicas, por exemplo,
resistncia, plasticidade, densidade e capacidade de reteno de gua. A temperatura
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
43
apresenta efeitos significativos principalmente na faixa acima de 100C (ABU-ZREIG; AL-
AKHAS e ATTOM, 2001).
De acordo com McGrath, Sharma e Hajaligol (2001), dentro do forno ocorrem
concomitantemente, vrias reaes mediadas pela temperatura e pelo tempo de residncia, de
modo que HPA podem ser eliminados e outras substncias podem ser transformadas em HPA,
atravs do processo denominado por reforma ou sntese de novo1, isto , quando sob altas
temperaturas, molculas complexas so formadas a partir de precursores simples. Em recente
estudo, o catecol, molcula composta por apenas um anel aromtico, foi utilizado como
modelo para a investigao da formao de produtos de combusto incompleta, sendo
observada a formao de 43 diferentes tipos de HPA, desde naftaleno (C10) ao coroneno (C24)
(THOMAS e WORNAT, 2008).
Os compostos de C1 a C5 constituem as maiores fontes para formao dos HPA. Tais
molculas submetidas temperaturas acima de 300C perdem radicais alquila, gerando a
liberao de hidrognio e de hidrocarbonetos leves, destacando-se o acetileno e o metano.
Neste cenrio tambm possvel a formao de radicais livres, que ao se combinarem com os
hidrocarbonetos leves, promovem reaes de condensao de anis aromticos, bem como
interaes com HPA de baixa massa molecular, produzindo ismeros ou aumentando a massa
molecular por conta do alongamento da cadeia (RAVINDRA; SOKHI e VAN GRIEKEN,
2008, POPE; PETERS e HOWARD, 2000, BUCAL et al. 1996).
Neste contexto, pode existir tambm a converso de HPA no mutagnicos em HPA
mutagnicos como, por exemplo, pireno em benzo[a]pireno. Os HPA mais reativos so o
acenafteno, fluoreno, antraceno, e as formas metiladas de naftaleno, fenantreno e antraceno.
As reaes de isomerizao e aromatizao tambm podem ocorrer e serem catalisadas por
1 Do latim de novo que vem do novo, do incio ou do zero
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
44
minerais e metais presentes no solo (POPE; PETERS e HOWARD, 2000, REMMLER e
KOPINKE, 1995).
3. 3. 2 Biorremediao
A biorremediao um processo que visa a recuperao de solos contaminados por
substncias txicas pela ao de micro-organismos. A biorremediao de solos pode ser
classificada em dois grupos: in situ, isto , na prpria rea contaminada, ou ex situ, quando se
faz necessria remoo fsica (MARGESIN et al. 2007, PALA et al. 2006, POPP;
SCHLMANN e MAU, 2006).
Do ponto de vista do seu planejamento, a biorremediao de solo contaminado por
hidrocarbonetos um processo transdisciplinar, envolvendo interaes entre engenharia,
microbiologia, ecologia, geologia e a qumica (SAMANTA; SINGH e JAIN, 2002). A
biorremediao uma alternativa atraente e de baixo custo, baseada no estmulo da atividade
metablica dos micro-organismos para a converso dos contaminantes em substncias
atxicas e biomassa (CHANEAU et al. 2005, PAZA et al. 2005, RAHMAN et al. 2002,
WATANABE, 2001). Entre as vantagens consideradas mais importantes da biorremediao
de solos contaminados por leo destacam-se: o custo, a possibilidade de aplicao em
conjunto a outros mtodos de remoo e a aceitao pblica. Por outro lado, o acmulo de
metablitos txicos se caracteriza como a principal desvantagem do processo (CHAILLAN et
al. 2004, BOOPATHY, 2000).
A biorremediao de solos contendo HPA requer tempo e apresenta maior
complexidade quando comparada aos processos desenvolvidos para tratamento de ambientes
contaminados com alguns hidrocarbonetos alifticos. A maior dificuldade vem do fato de que
parte significativa dos HPA e de metablitos pode estar incorporado matria hmica,
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
45
tornando a razo soro/dessoro dos HPA, o principal fator governante de sua remoo
(BARRIOS, 2007, WATANABE, 2001, YUSTE et al. 2000).
importante salientar que fatores intrnsecos e extrnsecos incrementam a dificuldade
de biorremediar solos contaminados com HPA e alguns deles esto listados na Tabela 3.4.
Tabela 3.4 Principais fatores limitantes na remoo dos HPA no solo
Fatores Exemplos Referncias
Intrnsecos da Microbiota
composio
tamanho e diversidade
versatilidade metablica
aumento da atividade enzimtica
produo de biossurfatantes
viabilidade de aceptores de eltrons
interaes ecolgicas
do Contaminante
natureza
tamanho e estrutura da molcula
biodisponibilidade
toxicidade de metablitos
histrico da contaminao
vres (2000)
Liu et al. (2006)
Marin, Hernandez e Garcia (2005)
Lser et al. (1998)
Singh, Van Hamme e Ward (2007)
Mulligan e Yong (2004)
Tilman (2000)
Atlas (1981)
Bossert, Kachel e Bartha (1984)
Semple et al. (2007)
Boopathy (2000)
Paza et al. (2006)
Extrnsecos
do Ambiente
temperatura
tempo
mudanas sazonais
umidade
matria orgnica
nutrientes essenciais
pH
propriedades do solo
profundidade
Dibble e Bartha (1979)
Rivas (2006)
Marschner e Kalbitz (2003)
Ettema e Wardle (2002)
Amellal, Portal e Berthelin (2001)
ejkov, Mask e Jirk (1997)
Rahman et al. (2002)
Margesin et al. (2007)
Vasudevan e Rajaram (2001)
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
46
Extrnsecos
(continuao)
presena de cossubstrato Romantschuk et al. (2000)
A biorremediao de solos contaminados com HPA um processo controlado que
necessita aplicao de condies muitas vezes no encontradas naturalmente. O revolvimento
do solo uma das condies primordiais, permitindo a homogeneizao, ao mesmo tempo em
que promove aerao, quebra de agregados, eliminao de compostos volteis e o aumento do
contato de micro-organismos com nutrientes e substratos (JONER et al. 2004). O tipo e a
estrutura do solo afetam diretamente a biodisponibilidade do contaminante, bem como a
organizao e a densidade das comunidades degradadoras, consideradas os pontos centrais da
biorremediao (SCHERR et al. 2007).
Os micro-organismos dominam e possuem um papel fundamental na natureza, por
conta da sua biomassa e da atividade metablica, envolvendo na maioria das vezes a atuao
de enzimas indutivas e constitutivas. Geralmente, os consrcios microbianos so o foco dos
processos de biorremediao, sendo a sua importncia atribuda cooperao metablica e ao
cometabolismo (ALDN; DEMOLING e BTH, 2001, JOHNSEN; WICK e HARMS,
2005, SPAIN e VAN VELD, 1983).
A temperatura considerada o principal fator na biodegradao dos HPA quando
presentes no solo. A faixa tima est estabelecida entre 30 e 40C, facilitando a mobilizao
dos HPA e aumentando a solubilidade (PERFUMO et al. 2007, LEAHY e COLWELL, 1990),
como tambm refletindo diretamente na atividade microbiana, promovendo o aumento da
atividade enzimtica (POPP; SCHLMANN e MAU, 2006).
A faixa de pH considerada ideal da biodegradao de hidrocarbonetos do petrleo,
incluindo HPA, se encontra entre 7,4 e 7,8, sendo considerada tima em 7,8 e valores de 8,5
ou superior, no indicados (FRANCO et al. 2004, RAHMAN et al. 2002, ROWLAND et al.
2000).
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
47
O teor de umidade entre 15 e 20% considerado ideal da biodegradao dos HPA.
Nesta faixa, pode ser estabelecido um cenrio propcio competio entre as molculas de
gua pelos mesmos stios minerais de soro dos HPA nos agregados do solo. Dessa forma,
maior quantidade de HPA pode ser encontrada no sorvida matriz e como consequncia, o
bioacesso pode sofrer um aumento (KOTTLER; WHITE e KELSEY, 2001).
A presena de oxignio fundamental para o incio do processo degradativo porque
diversas enzimas envolvidas na quebra das molculas so oxigenases. A aerao artificial
acelera o processo e se caracteriza como fator determinante na velocidade da biorremediao
(LEAHY e COLWELL, 1990).
A concentrao de nutrientes, representados principalmente por nitrognio e fsforo
o fator limitante mais comum da biorremediao de solos. As fontes de nitrognio e fsforo
so essenciais para aumento da biomassa, refletindo diretamente na eficincia da
biodegradao (KIM et al. 2005, SARKAR et al. 2005, VAN HAMME; SINGH e WARD,
2003, ODONNELL et al. 2001).
A melhoria da aerao, a correo do pH e a umidade do ambiente, bem como a
adio de nutrientes compem etapas da tcnica de bioestmulo e visam adequar o ambiente
s melhores condies para a biodegradao (MARGESIN; HMMERLE e TSCHERKO,
2007, BENTO et al. 2005, SARKAR et al. 2005).
Por outro lado, o bioaumento baseia-se na introduo de micro-organismos originados,
na sua grande maioria, do prprio solo a ser tratado (DEJONGHE et al. 2001). A forma usual
da aplicao do bioaumento realizada utilizando consrcios microbianos. Preferidos no
lugar de culturas axnicas, os consrcios microbianos so extremamente prticos, podendo ser
exclusivamente bacterianos (JACQUES et al. 2008, AYOTAMUNO et al. 2007),
exclusivamente fngicos (MEYSAMI e BAHERI, 2003) ou mistos, isto , compostos por
bactrias e fungos (BOONCHAN et al. 2000).
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
48
estabelecido na literatura que a concentrao do inculo esteja entre 107 e 1012
UFC/g para os solos onde a biodisponibilidade um fator limitante, como no caso dos solos
contaminados por HPA. No caso do bioaumento, acredita-se que o inculo deve ser maior ou
igual populao microbiana encontrada no solo a ser tratado. Isto pode promover garantias
contra obstculos importantes a partir da inoculao, tais como, adaptao, predao,
competio, imobilidade e substncias inibidoras como metablitos ou altas concentraes de
cossubstratos e fertilizantes (MACNAUGHTON et al. 1999, VOGEL, 1996, LEAHY e
COLWELL, 1990).
Alguns autores sugerem, no entanto, que a interao das tcnicas de bioaumento e
bioestmulo seria uma alternativa muito interessante, dada as vantagens que este tipo de
associao pode trazer para a biorremediao de solos contaminados por petroderivados
(HAMDI et al. 2007, NIKOLOPOULOU; PASADAKIS e KALOGERAKIS, 2007,
MRQUES-ROCHA et al. 2005). Outros autores comparam as duas tcnicas na tentativa de
eleger qual o tipo ideal de tratamento, isto , se o aumento da populao por injeo de micro-
organismos ou por estratgias de bioestmulo. No entanto, cada histrico de contaminao
nico, no podendo assim ser apontado qual o melhor tratamento antes de uma investigao
prvia. Em algumas situaes o bioaumento foi melhor que o bioestmulo (MANCERA-
LPEZ et al. 2008) e em outras, foi observado o contrrio (BENTO et al. 2005).
3. 4 Degradao dos HPA por micro-organismos hidrocarbonoclsticos do solo
O solo caracteriza-se como um ambiente de alta complexidade biolgica, contendo a
maior poro de biodiversidade, contribuindo dessa forma, para a sustentabilidade de diversos
ecossistemas. Grande parte da atividade humana ocorre em terra, razo pela qual conferida
ao solo, a maior suscetibilidade a possveis impactos, resultados da contaminao por diversas
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
49
fontes, tais como pesticidas, resduos slidos urbanos e hidrocarbonetos do petrleo.
Particularmente o petrleo, produto explorado comercialmente desde 1859, apresenta um
significativo potencial de risco ao ambiente durante qualquer etapa de sua produo,
distribuio e consumo (BARRIOS, 2007, PAUL, 2007, LILLEY et al. 2006, THOMAS,
2001).
A introduo de hidrocarbonetos do petrleo no solo tem origem antropognica em
mais de 90% dos casos. A presena dos hidrocarbonetos no solo responsvel pelo aumento
da razo C:N:P, tornando-a muito mais alta do que em ecossistemas livres desses compostos.
Em muitos casos, ao ser identificada a contaminao, encontra-se no solo uma mistura de
metablitos com leos no biodegradados (NIKOLOPOULOU; PARADAKIS e
KALOGERAKIS, 2006, OLLIVIER e MAGOT, 2005).
As reaes microbianas so a chave para a recuperao de solos contaminados por
leo e o processo de adaptao dos micro-organismos na presena do contaminante, bem
como o estresse causado ao ecossistema promovem uma presso seletiva permitindo que
geraes de indivduos hidrocarbonoclsticos se estabeleam (LEE; OH e KIM, 2008,
HAMAMURA et al. 2006). Ao longo do tempo, tais micro-organismos reduzem o avano da
contaminao atravs da formao de produtos menos txicos ou da sua total mineralizao
(MULLIGAN e YONG, 2004, SMETS e PRITCHARD, 2003). A biodegradao de
hidrocarbonetos do petrleo em solo dividida em duas fases distintas: a primeira, mais
rpida e mediada pela biodisponibilidade do poluente e a segunda fase, mais lenta, controlada
pela relao soro/dessoro dos hidrocarbonetos nos agregados do solo (KAPLAN e
KITTS, 2004, CORNELISSEN et al. 1998).
Em solos no contaminados por leo, estima-se que apenas 0,1% dos organismos
sejam hidrocarbonoclsticos, no entanto, nos casos de solos contaminados por longos
perodos, podem representar 100% dos indivduos. A presena de hidrocarbonetos do petrleo
Tratamento Microbiolgico Sequencial de solo... Vasconcelos, U. (nome para citao)
50
muda a composio da microbiota endgena do solo e esta mudana proporcional
concentrao das substncias xenobiticas (MOON et al. 2006, ATLAS, 1981).
Cada classe de hidrocarbonetos degradada por diferentes maneiras pelos micro-
organismos, utilizando enzimas indutivas e constitutivas. Ao longo do tempo, o fenmeno de
tolerncia ao contaminante estabelecido, tornando o sistema mais resistente a estresses
adicionais, at que os hidrocarbonetos e os metablitos resultantes da biodegradao sejam
totalmente degradados (HAMAMURA et al. 2006, ZOCCA et al. 2004).
Os micro-organismos e as plantas so os maiores agentes de remoo dos HPA do
solo. Dada a sua estrutura qumica