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1 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ GUSTAVO GASPARINO BECKER RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA PRISÃO PREVENTIVA Biguaçu 2010

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ GUSTAVO GASPARINO …siaibib01.univali.br/pdf/Gustavo Gasparino Becker.pdf · Orientador: Prof. Juliano Keller do Valle Biguaçu ... Umberto Eco

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

GUSTAVO GASPARINO BECKER

RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA PRISÃO PREVENTIVA

Biguaçu 2010

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GUSTAVO GASPARINO BECKER

RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA PRISÃO PREVENTIVA

Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI , como requisito parcial a obtenção do grau em Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Juliano Keller do Valle

Biguaçu 2010

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GUSTAVO GASPARINO BECKER

RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA PRISÃO PREVENTIVA

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e aprovada

pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e

Jurídicas.

Área de Concentração: Direito Processual Penal

Biguaçu, de junho 2010.

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AGRADECIMENTOS

A minha família que sempre esteve do meu lado nos bons e nos melhores

momentos.

Minha namorada Luana Elisa da Silveira que muito colaborou com amor,

paciência e companheirismo.

Aos meus colegas de classe, principalmente Marina Wagner Bruno e Willian

Shinzato, aos finais de semana juntos concluindo esta etapa.

Aos funcionários da 3ª Vara Criminal, Raquel Cristina de Oliveira e Gabriel

Schenkel da Costa e, principalmente, ao Juiz de Direito Titular daquela Vara Leopoldo

Augusto Brüggemann, por todos os ensinamentos nos dois anos em que tive o prazer

de lá estagiar.

Aos funcionários da biblioteca do Tribunal de Justiça de Santa Catarina,

principalmente a Sra. Maria José Maurício, que com muita paciência me ajudou a

encontrar as doutrinas pertinentes.

Ao Professor Orientador Juliano Keller do Valle, pelos conhecimentos

repassados.

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“Tal é a força da verdade que, como o bem, se difunde por si”

Umberto Eco

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda

e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Biguaçu, de junho de 2010.

Gustavo Gasparino Becker

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RESUMO

O presente trabalho de iniciação científica tem como desafio o estudo das situações em

que o Estado pode responsabilizar-se civilmente por danos causados em decorrência

da decretação ou manutenção de prisão preventiva. Diante disto, cabe, inicialmente,

conceituar a responsabilidade puramente dita, bem como, responsabilidade civil e

responsabilidade civil do Estado; analisando a evolução deste instituto no sistema

jurídico brasileiro até os dias de hoje. Verifica-se as duas formas de responsabilização,

subjetiva, que necessita da demonstração do dolo ou da culpa do agente, e objetiva,

onde, baseando-se na teoria do risco administrativo adotada no sistema nacional, basta

a demonstração da ação estatal, o dano e o nexo causal entre os dois anteriores.

Também, estudam-se as causas que ilidem a responsabilidade do Estado por

quebrarem o vínculo causal entre a ação e o dano; como, a culpa exclusiva da vítima, a

culpa de terceiro, o caso fortuito e a força maior. Após, analisa a responsabilidade pelos

atos jurisdicionais, definindo o ato jurisdicional, o ato cometido com dolo, o erro

judiciário e por fim a teoria da irresponsabilidade do poder judiciário. Em seguida,

analisa-se a prisão preventiva, diferenciando-a da prisão pena oriunda de sentença

condenatória definitiva. A prisão preventiva, por se tratar de uma modalidade de prisão

cautelar, deve-se observar os princípios, pressupostos e fundamentos necessários à

sua decretação; assim, pode-se determinar se é cabível a responsabilização do Estado

por eventual dano causado pelo ato decretativo da prisão. E, por fim, analisa-se como a

atividade estatal pode gerar a responsabilização do Estado pela decretação da prisão

preventiva; como aquelas sem fundamento, sem a observância do princípio da

razoabilidade, por prazo razoável, por erro judiciário, bem como, aquela decretada por

autoridade incompetente, sem fundamentação, sem a observância dos requisitos da lei,

prisão preventiva de homônimo, por mandado revogado e ainda, prisão com sentença

absolutória.

Palavra-chave : Responsabilidade Civil do Estado, Prisões Preventiva.

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ABSTRACT

This research have the challenged to study situations where the State may be civilly

liable for damage caused as a result of Preventive detention. Given this it is initially

conceptualize the responsibility purely spoken, as well as civil liability and State’s civil

liability, analyzing the evolution of this institute in the Brazilian legal system until the

present day. There is both forms of accountability, subjective, requiring the

demonstration of a fault the agent, and objective, where, based on the theory of risk,

adopted in the administrative national system, simply a demonstration of state action,

the damage and causal link between this two former. It also aimed to study the causes

that rebut the State's responsibility for breaking the bond causal relationship between

the action and damage; as the exclusive fault of the victim, the guilt from another, the

case force majeure and fortuitous. After it analyzes the jurisdictional responsibility for the

acts, defining the judicial act, the act committed with intent, the judicial error and finally

the theory of irresponsibility of the judiciary. Then analyzes the detention, differentiating

it from the prison sentence come from final sentence. Preventive detention, because it

is a kind of prison precaution, one must observe the principles and assumptions and

fundamentals necessary for its enactment, so you can determine whether it is

appropriate to accountability of the State for any damage caused by the act enacted

from the prison. And finally, we analyze how state activity can generate the

accountability of the state by decree of remand, as those without foundation, without

compliance with the principle of reasonableness, a reasonable period of detention, by

judicial error, as well as one decreed by authority incompetent without reasons, without

observing the requirements of law, custody of the same name, by repealed and still

warrant, arrest with acquittal.

Keyword : State’s civil liability, Preventive detention.

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ROL DE ABREVIATURAS OU SIGLAS

CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

CC/2002 – Código Civil Brasileiro de 2002 (Lei 10.406, de 10 de Janeiro de 2002)

CPC – Código de Processo Civil (Lei 5.869, de 11 de Janeiro de 1973)

CP – Código Penal (Decreto – Lei 2.848, de 7 de Dezembro de 1940)

CPP – Código de Processo Penal (Decreto – Lei 3.689, de 3 de Outubro de 1941)

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

TJMG – Tribunal de Justiça de Minas Gerais

TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina

TJSP – Tribunal de Justiça de São Paulo

TJRJ – Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro

TJRS – Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 13

1 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO .................................................. 15

1.1 CONCEITO ............................................................................................................... 15

1.1.1 Responsabilidade ............................................................................................. 15

1.1.2 Responsabilidade Civil ...................................................................................... 16

1.1.3 Responsabilidade Civil do Estado ..................................................................... 19

1.2 HISTÓRICO DA RSPONSABILIDADE DO ESTADO NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO . 21

1.2.1 Fase da irresponsabilidade .............................................................................. 21

1.2.2 Fase civilista .................................................................................................... 23

1.2.3 Fase publicista ................................................................................................ 25

1.2.4 Responsabilidade do Estado no Direito Brasileiro Atual ....................................26

1.3 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE ............................................................................. 29

1.3.1 Responsabilidade subjetiva ............................................................................. 29

1.3.2 Responsabilidade objetiva ............................................................................... 30

1.3.4 Excludentes de responsabilidade ..................................................................... 32

1.3.4.1 Culpa exclusiva da vítima ................................................................................. 32

1.3.4.2 Força maior e caso fortuito ............................................................................. 33

1.3.4.3 Culpa de terceiro ............................................................................................. 34

1.4 RESPONSABILIDADE NOS ATOS JURISDICIONAIS ...................................................... 34

1.4.1 Atos jurisdicionais ............................................................................................ 34

1.4.2 Atos judiciais dolosos ...................................................................................... 36

1.4.3 Erro judiciário .................................................................................................. 37

1.4.4 Teoria da irresponsabilidade ........................................................................... 38

2 PRISÃO PREVENTIVA ............................................................................. 40

2.1 CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO ................................................................................... 40

2.1.1 Prisão e suas espécies ..................................................................................... 40

2.1.1.1 Prisão pena ..................................................................................................... 42

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2.1.1.2 Prisão cautelar ou processual .......................................................................... 43

2.1.2 Conceito e finalidade da prisão cautelar .................................................... 44

2.1.3 Pressupostos e fundamentos que devem ser respeitados para a decretação

da prisão cautelar .................................................................................................... 46

2.2 PRINCÍPIOS E FUNDAMENTOS ................................................................................. 48

2.2.1 Da dignidade da pessoa humana ........................................................................ 48

2.2.2 Da presunção de inocência ................................................................................. 50

2.2.3 Direito à liberdade ............................................................................................ 52

2.2.4 Ação penal e o jus puniendi ............................................................................... 53

2.3 DA PRISÃO PREVENTIVA .......................................................................................... 55

2.3.1 Conceito e natureza ............................................................................................ 55

2.3.2 Pressupostos e fundamentos .............................................................................. 56

2.3.2.1 Garantia da ordem pública ............................................................................... 58

2.3.2.2 Garantia da ordem econômica ........................................................................ 59

2.3.2.3 Conveniência da instrução criminal ................................................................. 60

2.3.2.4 Assegurar a aplicação da lei penal ..................................................................... 62

3 RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR PRISÃO PREVENTIVA ......... 64

3.1 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR PRISÕES

PREVENTIVAS ......................................................................................................................... 64

3.1.1 Ação/omissão ................................................................................................. 64

3.1.1.1 Abuso de autoridade ....................................................................................... 67

3.1.1.2 Restrição ao direito à liberdade de locomoção ............................................... 68

3.1.1.3 Ofensa ao direito à personalidade ................................................................... 69

3.1.1.4 Inobservância ao princípio da proporcionalidade ......................................... 70

3.1.1.5 Prazo (i)razoável .......................................................................................... 72

3.1.1.6 Erro judiciário .............................................................................................. 74

3.1.2 Dano ............................................................................................................... 77

3.1.3 Nexo de causalidade ....................................................................................... 77

3.2 CAUSAS QUE PODEM ACARRETAR INDENIZAÇÃO .................................................... 79

3.2.1 Prisão decretada por autoridade incompentente ............................................. 79

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3.2.2 Prisao sem fundamento nos requisitos da lei ................................................... 80

3.2.3 Prisao preventiva de homônimo ...................................................................... 84

3.2.4 Prisao motivada por mandado revogado ......................................................... 85

3.2.5 Prisao preventiva e posterior absolvição ......................................................... 86

3.3 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE DO ESTADO NAS PRISÕES PREVENTIVAS ..... 88

3.3.1 Fato/ culpa da vítima ...................................................................................... 88

3.3.2 Fato/ culpa de terceiro .................................................................................... 90

3.3.3 Caso fortuito e força maior ............................................................................. 91

3.3.4 Estado de necessidade/estrito cumprimento do dever legal/legítima defesa ... 92

CONCLUSÃO ................................................................................................... 94

REFERÊNCIAS ................................................................................................ 98

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INTRODUÇÃO

Trata-se de trabalho de iniciação científica (Monografia) para a conclusão do

curso de Direito, sobre a responsabilidade do Estado por prisão preventiva.

O elemento preponderante da pesquisa encontra-se, fundamentalmente, na

sobreposição de princípios fundamentais, sendo dois inerentes ao ser humano,

contemplados na CRFB/88, quais sejam, direito a liberdade e a presunção de inocência

e, do outro lado, o direito de punir do Estado (jus puniendi), igualmente preceito

fundamental do estado democrático de direito.

O cidadão tem o direito à liberdade e da presunção de inocência como preceito

fundamental, e o Estado o dever de punir a conduta antijurídica, neste momento, se

oportuno e necessário à instrução criminal, pode-se decretar a prisão preventiva, no

entanto, devem ser observados alguns pressupostos e requisitos, bem como outros

princípios basilares do Processo Penal.

Portanto, como motivos basilares desta pesquisa estão: 1) as garantias e os

direitos fundamentais da pessoa prescritos na CRFB/88 que devem ser respeitados na

prestação da tutela jurisdicional, principalmente quando da decretação da prisão

preventiva; 2) a conseqüência que a decretação desta modalidade de prisão pode

acarretar na vida da pessoa perante a sociedade, pode mudar a sua vida para sempre.

Logo, o problema tem como foco a análise dos casos em que, causando dano ao

tutelado, pode o Estado ser responsabilizado pela prisão preventiva.

Diante disto, como preceito fundamental, a CRFB/88, no seu art. 5º, inciso LXXV,

prescreve que o Estado será responsabilizado pelo erro judiciário ou prisão alem do

tempo fixado na sentença. No entanto, este dispositivo pode ter uma interpretação

extensiva, configurando ao erro judiciário o dano causado pela prisão preventiva que

não seguiu os preceitos atinentes à espécie, como, a prisão preventiva decretada por

autoridade incompetente, sem fundamentação, não observando os requisitos da lei,

prisão motivada por mandado revogado, prisão de homônimo e ainda, prisão preventiva

com absolvição ao fim da instrução.

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O presente trabalho de iniciação científica possui os objetivos: institucional,

produção de Monografia para obtenção do título de bacharel em direito pela

Universidade do Vale do Itajaí; geral, analisar os casos em que o Estado pode ser

responsabilizado pela prisão preventiva; específico: 1) analisar a responsabilidade do

Estado, bem como sua evolução, as espécies de responsabilidade civil, e os casos que

geram e ilidem a responsabilidade civil do Estado; 2) analisar a prisão preventiva,

diferenciando-a da prisão pena oriunda de sentença condenatória irrecorrível, nos

princípios, pressupostos e fundamentos; 3) por fim, verificar os casos que o Estado

pode ser responsabilizado quando da decretação ou efetivação da prisão preventiva.

Diante de tal, o trabalho foi dividido em três capítulos.

O primeiro capítulo tem como objeto a conceituação do instituto da

responsabilidade civil do Estado, analisando a forma em que o Estado pode ser

responsabilizado por seus atos. Verifica-se a evolução histórica da responsabilidade

civil do Estado no sistema jurídico brasileiro. Para depois, diferenciar as espécies de

responsabilidade, caracterizando aquela adotada no sistema jurídico brasileiro atual e a

sua forma de aplicação nos atos jurisdicionais.

O segundo capítulo estuda a prisão preventiva, diferenciando-a da prisão pena

oriunda de sentença condenatória irrecorrível. Em seguida, verifica-se os princípios,

pressupostos, e fundamentos da prisão preventiva.

O terceiro capítulo estuda as situações em que a prisão preventiva pode

acarretar a responsabilização do Estado. Verificando, também, os casos em que ilidem

a responsabilidade do Estado pela prisão preventiva.

O presente trabalho finaliza com as considerações finais, analisando os

problemas trabalhados, sem esgotar o tema, devendo continuar o seu estudo.

O método de abordagem utilizado no presente trabalho de iniciação científica foi

o dedutivo, partindo dos temas gerais, ou seja, da responsabilidade civil do Estado e da

prisão preventiva, para, por fim, verificar a responsabilidade do Estado por prisão

preventiva.

As técnicas de pesquisa utilizadas foram de documentação indireta, ou seja,

análise de doutrinadores e jurisprudências, pesquisa documental.

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1 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

1.1 CONCEITO

1.1.1 Noção jurídica de responsabilidade

Inicialmente, a definição, bem como a noção jurídica de responsabilidade,

identificando como aplica-se tal preceito quando o Estado figura no pólo passivo da

demanda.

Segundo o Dicionário Técnico Jurídico, o termo responsabilidade é, “Dever

jurídico a todos imposto de responder por ação ou omissão imputável que signifique

lesão ao direito de outrem, protegido por lei.”1

No conceito de Maria Helena Diniz2, toda atividade que provoque prejuízo,

advindo um desequilíbrio na ordem moral ou patrimonial, resulta-se na

responsabilidade.

José de Aguiar Dias, conceituando responsabilidade, afirma que, qualquer

manifestação da atividade humana trás consigo tal problemática.3

Para Silvio de Salvo Venosa4, dando uma breve introduzida ao tema, toda

atividade produzida tanto por pessoa natural quanto jurídica, que venha causar

prejuízo, gera responsabilidade ou o dever de indenizar.

Num conceito mais didático, Arnoldo Wald5, leciona que numa relação jurídica

originária, que porventura haja uma parte lesada, a conseqüência disto é uma

responsabilidade, surgindo daí o dever de indenizar.

1 Dicionário técnico jurídico / organização Deocleciano Torrieri. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Rideel, 2004. p. 469. 2 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro : Responsabilidade Civil. v. 7. 21. ed. rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 03/04 3 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil . 11 ed. revista, atualizada de acordo com o Código Civil de 2002, e aumentada por Rui Berford Dias. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 3. 4 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil : Responsabilidade Civil. 7. Ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 1.

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Na conceituação de Cavalieri Filho6, no que tange à responsabilidade, “[...] é

um dever jurídico sucessivo, conseqüente à violação do primeiro”. Completa ainda

dizendo que, “Designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da

violação de outro dever jurídico.”

Para Miguel Maria de Serpa Lopes, há responsabilidade quando viola-se um

direito gerando tal ao que perpetrou, sendo que este ato pode ser executado ou omitido

em desacordo a uma norma jurídica de preceito de proibição ou de ordem.7

Por seu turno, o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves8, no mesmo

pensamento de Afrânio Lyra, entende que quem pratica um ato, ou por meio de

omissão obtenha o dano como resultado, deve suportar as conseqüências, sendo tal,

regra elementar de equilíbrio social, que por sua vez, em suma, é problema de

responsabilidade civil.

1.1.2 Responsabilidade civil

Fabio Ulhoa Coelho9, conceitua responsabilidade civil como uma obrigação,

onde o sujeito ativo pode exigir, por conseqüência de um prejuízo sofrido, o pagamento

de indenização por parte do passivo.

Para Gagliano Filho10, responsabilidade civil caracteriza-se quando a atividade

danosa viola uma norma preexistente, gerando, conseqüentemente, a obrigação de

reparar:

Conclui-se que a noção jurídica de responsabilidade pressupõe a atividade danosa de alguém que, atuando a priori ilicitamente, viola uma

5 WALD, Arnoldo. Direito Civil : Introdução e Parte Geral. 10 ed. rev. e atual. de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 220. 6 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil . 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 2. 7 LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil . 8 ed. rev. e atualizado pelo Prof. José Serpa Santa Maria. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1996. p. 550. 8 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil . 10 ed., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 3. 9 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil , v. 2, 2. ed., rev. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 252. 10 GAGLIANO FILHO, Pablo Stolze., Rodolfo Palplona. Novo Curso de Direito Civil : responsabilidade civil, p.9

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norma jurídica preexistente (legal ou contratual), subordinando-se, dessa forma, às conseqüências do seu ato. (obrigação de reparar)

Segundo Cavalieri Filho11, “Só se cogita, destarte, de responsabilidade civil

onde houver violação de um dever jurídico e dano. Em outras palavras, responsável é a

pessoa que deve ressarcir o prejuízo decorrente da violação de um precedente dever

jurídico.”, possibilitando, ainda, “[...] dizer que toda conduta humana, que violando um

dever jurídico originário, causa prejuízo a outrem é fonte geradora de responsabilidade

civil.”

A responsabilidade civil traduz-se pela obrigação de reparar um dano

patrimonial, extinguindo-se quando da indenização, explica Hely Lopes Meirelles12.

Arnaldo Rizzardo13, no seu conceito de responsabilidade civil, cria a conexão

entre o ato ilícito gerador do dano, na ordem jurídica do direito alheio, com a obrigação

da reparação deste respectivo dano causado a terceiro:

O ato jurídico submete-se à ordem constituída e respeita o direito alheio, ao passo que o ato ilícito é lesivo ao direito de outrem. Daí que se impõe a obrigatoriedade da reparação àquele que, transgredindo a norma, causa dano a terceiro.

No mesmo sentido, complementa Maria Helena Diniz14, quando diz:

O ato ilícito (CC, art. 186) é praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual. Causa dano a outrem, criando o dever de reparar tal prejuízo (CC, arts. 927 e 944) seja ele moral ou patrimonial (Súmula 37 do STJ). Logo, produz efeito jurídico, só que este não é desejado pelo agente, mas imposto pela lei.

A responsabilidade civil é oriunda de um dano que, por sua vez inspira-se,

antes de mais nada, no equilíbrio e harmonia que orientam o direito, e constitui assim o

seu elemento animador, motivo pelo qual, segundo entende o doutrinador José de

Aguiar Dias15, há tanta dificuldade em definir-se tal assunto numa teoria unitária e

permanente.

11 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil . 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 2. 12 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 35 ed. atualizada por Eurico de Andrade Azevedo e outros. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 655. 13 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil : Lei 10.406, de 10.01.2002. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 29. 14 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro : Responsabilidade Civil. v. 7. 21. ed. rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 03/04 15 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil . 11 ed. revista, atualizada de acordo com o Código Civil de 2002, e aumentada por Rui Berford Dias. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 25.

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“Como fundamento da responsabilidade civil, formulou-se a regra moral de que

todo dano merece ser indenizado, ou seja, qualquer dano causado por ato ilícito deve

ser reparado, o que significa a proibição de causar prejuízos.” é o conceito da

doutrinadora Maria Clara Osuna Diaz Falavigna16. Completa ainda, a mesma autora,

dizendo que, sendo a responsabilidade o instituto que regula a reparação do dano,

deve este ser conhecido, uma vez que sem dano não há responsabilidade.

Ensina Carlos Roberto Gonçalves17, que o instituto da responsabilidade civil é

oriundo do direito obrigacional, uma vez que surge a partir desta a obrigação de reparar

o dano, o que é obrigação de natureza pessoal, além de culminar em perdas e danos.

Completa, ainda, que, segundo a teoria clássica, a responsabilidade civil emerge de

três pressupostos, sendo estes: um dano, a culpa do autor do dano, bem como a

relação de causalidade entre o fato gerador e o dano causado.

Logo, no que tange à responsabilidade civil, conclui-se, seguindo o

entendimento de Venosa18, que tal “[...] resulta de um dano, direto ou indireto, causado

a patrimônio de terceiro, por dolo, culpa, ou simples fato, que deve ser ressarcido.”, o

que aplica-se igualmente ao Estado, que, em decorrência de sua atividade venha

porventura a causar dano a terceiro, responsabiliza-se civilmente, com o dever de

indenizar, conforme ensina Cahali19, bem como Carvalho Filho20 quando diz que o

Estado é civilmente responsável pelos danos causado por seus agente, ficando

obrigado a reparar os prejuízos, pagando as respectivas indenizações.

16 FALAVIGNA, Maria Clara Osuna Diaz. Teoria e prática da responsabilidade civil : de acordo com a Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 : doutrina, jurisprudência, prática e legislação. São Paulo: Letras Jurídicas, 2004. p. 48. 17 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil . 10 ed., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 2 e 4. 18 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : parte geral. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 239. 19 CAHALI, Yussef Said, Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 13. 20 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo . 22. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 521.

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19

1.1.3 Responsabilidade civil do Estado

De maneira sucinta, Yussef Said Cahali21 introduz a responsabilidade civil do

Estado como a obrigação legal imposta a este de recompor os danos causados por

suas atividades a terceiros.

Para Celso Antônio Bandeira de Mello22, “Como qualquer outro sujeito de

direitos, o Poder Público pode vir a se encontrar na situação de quem causou prejuízo a

alguém, do que lhe resulta obrigação de recompor os agravos patrimoniais da ação ou

abstenção lesiva.”

Portanto, diante de tal, deve-se salientar que sendo o Estado pessoa jurídica,

não pode ter vontade, tão pouco ação própria, o que manifestará mediante pessoas

físicas, agindo na condição de seus agentes, quando devidamente qualificados para

tanto. Portanto, a atividade exercida por seus agentes, reflete a vontade do Estado,

entendendo-se como se este quis ou fez. É o entendimento da doutrinadora Maria

Helena Diniz23.

Neste sentido, completa Cahali24:

Portanto, a Administração Pública só pode realizar as atividades que lhe são próprias através de agentes ou órgãos vivos (funcionários e servidores), de tal modo que a Administração Pública, como ação do Estado, se traduz em atos de seus funcionários.

Carvalho Filho25, reafirma que, por ser o Estado pessoa jurídica, é um ser

intangível. Logo, pode apenas se fazer presente no mundo jurídico mediante a atividade

de seus agentes, pessoas físicas, pois toda atividade exercida é a ele relacionada.

Assim, por si só, não há como o Estado causar dano.

21 CAHALI, Yussef Said, Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 13. 22 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 21 ed rev., atual. até emenda Constitucional 52, de 8.3.2006. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 947. 23 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro : Responsabilidade Civil. v. 7. 22. ed. rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC e com o projeto de Lei n. 276/2007. São Paulo: Saraiva, 2008. p.626. 24 CAHALI, Yussef Said, Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 15. 25 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo . 19. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p.521.

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20

No viés de Hely Lopes Meirelles26, trata-se de responsabilidade civil da

Administração ou do Estado, quando é imposta à Fazenda Pública a obrigação de

compor o dano causado por seus agentes a terceiros no exercício de suas atribuições.

Destaca-se Diniz27 quanto à responsabilidade criminal quando fala-se do

Estado:

“Será preciso salientar que a expressão responsabilidade civil do Estado é

empregada na acepção de responsabilidade não-penal.”

Explica Carvalho Filho28, que trata-se de responsabilidade contratual quando há

a existência de contrato firmado com a Administração, sendo extracontratual quando a

responsabilidade é oriunda das atividades estatais, sem qualquer pacto anterior,

ficando este segundo tipo de responsabilidade como peculiar a este trabalho.

Entende Venosa29 que, se por um ato do agente o prejuízo que resulte de tal é

por descumprimento de contrato entre as partes, estamos diante de responsabilidade

contratual. E, por sua vez, não havendo vínculo contratual entre o prejudicado e o

causador do dano, depara-se com a responsabilidade extracontratual.

Logo, destaca-se o entendimento de Mello30 acerca da responsabilidade

extracontratual do Estado por atos de seus agentes nas esferas do Executivo,

Legislativo ou Judiciário:

Entende-se por responsabilidade patrimonial extracontratual do Estado a obrigação que lhe incumbe de reparar economicamente os danos lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos ou ilícitos, comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos.

Deste norte verifica-se que a responsabilidade das pessoas jurídicas, mesmo

de direito público, caracteriza-se por atos de ação ou omissão que causem prejuízo a

terceiro. Ademais, interessante a este trabalho é a responsabilidade extracontratual do

Estado para com o lesado.

26 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 33 ed. ataul. até a Emenda Constitucional 53, de 19.12.2006, e Lei 11.448, de 15.1.2007 por Eurico de Andrade Azevedo e outros. São Paulo: Malheiros. 2007. p. 649. 27 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro : Responsabilidade Civil. v. 7. 23. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2008. p.639. 28 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo . 22. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p.520. 29 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : parte geral. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 328.

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1.2 HISTÓRICO DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO NO SISTEMA JURÍDICO

BRASILEIRO

A responsabilidade do Estado no sistema jurídico brasileiro evoluiu em três fases

distintas, quais sejam, fase da irresponsabilidade, fase civilista e fase publicista,

1.2.1 Fase da irresponsabilidade

Bandeira de Mello31 destaca que no início do Direito Público imperava o

princípio da irresponsabilidade, qual seja, o poder soberano do Estado faz com que

todos submetam-se a ele, impondo-se sem compensação, tendo como fórmula

norteadora a frase “The King can not do wrong”.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro32 completa acerca de tal quando afirma que “o

Estado dispõe de autoridade incontestável perante o súdito; ele exerce a tutela do

direito, não podendo, por isso, agir contra ele; daí o princípio de que o rei não pode

errar (the King can not do wrong) [...]”.

Meirelles33 no mesmo sentindo: “Sob o domínio dos Governos absolutos negou-

se a responsabilidade do Estado, secularizada na regra inglesa da infalibilidade real –

‘The King can not do wrong’-, extensivas aos seus representantes; [...]”

Tendo em vista a soberania estatal, os funcionários públicos, como parte do

Estado, não podiam errar. Assim havendo lesão à terceiro, respondia ele mesmo por

seu ato danoso, explica Diniz34:

30 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 21 ed rev., atual. até emenda Constitucional 52, de 8.3.2006. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 947. 31 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 21 ed rev., atual. até emenda Constitucional 57, de 18.12.2008. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 991. 32 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo . 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 608. 33 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 35 ed. ataul. por Eurico de Andrade Azevedo e outros. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 656.

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22

A doutrina mais antiga é da irresponsabilidade absoluta, decorrente da idéia absolutista que apresentava o Estado como um ente todo-poderoso, contra o qual não prevaleciam os direitos individuais. Assim sendo, quem contratava com um funcionário público devia saber que este, enquanto preposto do Estado, não podia violar a norma, uma vez que o Estado exercia a tutela do direito. Se o funcionário, no desempenho de sua função, lesasse direitos individuais, ele é que, pessoalmente, deveria reparar o dano e não o Estado.

Segundo Cahali35, a teoria da irresponsabilidade absoluta do Estado encontra-

se dividida em três postulados, sendo o primeiro devido à soberania do Estado que,

diante de sua natureza irredutível, proíbe ou nega-se a igualar-se aos súditos; segundo,

afirma que o Estado, titular do direito, não pode aparecer violando as leis por ele

mesmo criadas; por fim, o terceiro postulado salienta que os atos contrários à lei

praticados pelos funcionários não podem ser considerados atos praticados pelo Estado,

sendo estes atribuídos pessoalmente àqueles.

No Brasil, sob as Constituições de 1824 e 1891 não havia previsão de

responsabilidade do Estado. No entanto, previam que a responsabilidade recaísse

sobre o funcionário por abuso ou omissão praticado por esses no exercício de suas

funções, explica Di Pietro36 que, ainda, completa, “[...] contudo, havia leis ordinárias

prevendo a responsabilidade do Estado, acolhida pela jurisprudência como sendo

solidária com a dos funcionários; era o caso dos danos causados por estrada de ferro,

por colocação de linhas telegráficas, pelos serviços de correio”.

Logo, destaca-se Cahali37 quando afirma que “O princípio da responsabilidade

civil do Estado jamais foi posto em dúvida no direito Civil Brasileiro”.

Diferente é o entendimento de Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias38, eis que

muito embora alguns autores entendam que à época havia a solidariedade do Estado

em relação aos atos dos funcionários público, o texto constitucional claramente ditava a

teoria da irresponsabilidade do Estado, sendo responsáveis pela prática de atos ilícitos

os funcionários que os cometiam. Sendo assim, mais tarde, foram editados textos

34 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro : Responsabilidade Civil. 21. ed. rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7. p. 617. 35 CAHALI, Yussef Said, Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 20 e 21. 36 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo . 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 612 37 CAHALI, Yussef Said, Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 21.

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legislativos relacionados com o assunto; o primeiro foi o Decreto lei n.847, de 11 de

outubro de 1890, publicando o novo Código Penal que instituiu a reabilitação criminal e

atribuindo ao Estado a responsabilidade direta por danos decorrentes de erro judiciário

devidamente reconhecido em sentença; posteriormente, consagrou-se com o Código

Civil de 1916, que prescreveu a responsabilidade do Estado pelos atos cometidos por

seus representantes.

1.2.2 Fase civilista

Nessa fase da evolução histórica do instituto da responsabilidade civil do

Estado, o respaldo, quando fala-se em deduzir uma responsabilidade pecuniária do

Estado, utiliza-se parcialmente dos princípios civilistícos, quais sejam, os princípios da

responsabilidade por fato de terceiro.39

Pablo Stolze Gagliano40 introduz a teoria da culpa civilística como sendo a

primeira teoria subjetiva, que postulava pela responsabilização do Estado por atos de

seus agentes que, na condição de prepostos, causando dano, obriga-o a repará-lo.

Logo, para Dias41, uma vez superada a fase da irresponsabilidade estatal,

admitiu-se a responsabilidade do Estado, em algumas hipóteses, utilizando-se dos

princípios e conceitos do Direito Civil, bem como a idéia de culpa.

Completa, ainda, Márcio Xavier Coelho42, quando diz que na civilista utilizou-se

da doutrina subjetiva, a qual baseia-se na idéia de culpa, portanto, o ilícito é o fato

gerador, cabendo ao prejudicado provar que tal fato deu-se com dolo ou culpa.

38 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Responsabilidade do Estado pela função jurisdiciona l. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 41 39 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 22. 40 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Palplona. Novo Curso de Direito Civil : responsabilidade civil. v. 3, 3. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 210 41 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Responsabilidade do Estado pela função jurisdiciona l. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 25. 42 COELHO, Márcio Xavier. Fundamentos da responsabilidade civil estatal . Brasília: OAB Editora, 2005. p. 39.

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Explica Edmir Neto de Araújo43, que “A responsabilidade, uma vez que o ato

danoso ao administrado é praticado pela pessoa física do funcionário, somente seria

referível ao Estado quando ocorresse culpa”.

Ainda, completa Araújo44, que “[...] só os atos que revelassem a existência de

imprudência, negligência ou imperícia do agente público na sua prática, ocasionando

prejuízos, poderia se considerados para a responsabilização do ente público, pois atos

dolosos seriam imputados diretamente ao funcionário”.

No Brasil, segundo Coelho45, adotou-se a doutrina subjetiva nas Constituições

de 1934 e 1937, bem como o Código Civil de 1916, o que perdurou até o advento da

Constituição de 1946, onde passou a adotar a doutrina objetiva para responsabilizar o

Estado.

Diante da dificuldade encontrada pelo particular em comprovar o elemento

culpa, acredita Gagliano46, seja este o motivo para a extinção desta tese:

Tal teoria acabava por abarcar inúmeras situações de irressarcibilidade, pela evidente dificuldade do particular em comprovar a existência do elemento anímico pelo Estado, sendo esse talvez o maior motivo para o afastamento paulatino dessa tese.

Por fim, entende Meirelles47 que “A doutrina civilística ou da culpa civil comum,

por sua vez, vem perdendo terreno a cada momento, com o predomínio das normas de

Direito Público sobre as regras do Direito Privado na regência das relações entre a

Administração e os administrados”.

43 ARAÚJO, Edmir Neto de, Responsabilidade do Estado por ato jurisdicional . São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 27. 44 ARAÚJO, Edmir Neto de, Responsabilidade do Estado por ato jurisdicional . São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 27 e 28. 45 COELHO, Márcio Xavier. Fundamentos da responsabilidade civil estatal . Brasília: OAB Editora, 2005. p. 39. 46 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Palplona. Novo Curso de Direito Civil : responsabilidade civil. v. 3, 3. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 210 47 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 35 ed. ataul. por Eurico de Andrade Azevedo e outros. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 657.(grifo do autor)

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1.2.3 Fase publicista

Na fase publicista, o instituto da responsabilidade civil do Estado passa a atuar

em terreno próprio, no direito público, procurando se desprender do apoio tomado ao

direito civil da fase antecedente48.

Esta evolução, segundo Araújo49, deu-se a partir de casos concretos dos

tribunais franceses no século XIX:

[...] essa posição doutrinária, que tomou corpo e se firmou a partir da construção pretoriana (casos concretos) dos tribunais franceses desde o século IXI (casos “Rotschild”, 1855; “Pelletier”, 1873, e principalmente, do Tribunal de Conflitos, os casos “Blaco”, 1873 e outros até o caso “Feutry”, em 1908) no sentido da autonomia como ramo da Ciência do Direito, e colocação como ramo autônomo do direito Público, o seu conjunto de normas, princípios, conceitos e institutos foram inicialmente retirados do âmbito do direito comum, privado.

Mello50 explica que, uma vez “Admitida à responsabilidade do Estado [...], sua

tendência foi expandir-se cada vez mais, de tal sorte que evolui de uma

responsabilidade subjetiva, isto é, baseada na culpa, para uma responsabilidade

objetiva, vale dizer, ancorada na simples relação de causa e efeito entre o

comportamento administrativo e o evento danoso”.

Portanto, com a doutrina do Direito Público, conforme o entendimento de

Meirelles51, aparece a proposta de resolver a responsabilidade da administração pública

por princípios objetivos, baseados na teoria da responsabilidade sem culpa, ou numa

culpa especial do serviço público, quando lesivo a terceiros.

No ordenamento jurídico brasileiro, segundo Coelho52, adotou-se a partir da

Constituição de 1946, e mantida até os dias atuais, a teoria do risco administrativo, que

recai na responsabilidade da administração pública a obrigação de reparar o dano

48 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 24. 49 ARAÚJO, Edmir Neto de, Responsabilidade do Estado por ato jurisdicional . São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 29.(grifo do autor) 50 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo . 23 ed rev., atual. até emenda Constitucional 53, de 19.12.2006. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 970.(grifo do autor) 51 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 35 ed. ataul. por Eurico de Andrade Azevedo e outros. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 657.

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causado a terceiro por ação ou omissão desta. Diante de tal, três requisitos básicos são

exigidos para a consumação do dever de indenizar, quais sejam: “1) a ocorrência de

uma conduta comissiva ou omissiva da Administração Pública; 2) efetivamente um

dano; 3) existir nexo de causalidade entre a conduta da Administração e a ocorrência

do dano”.

Finalmente, após este período evolutivo, pode-se dizer que o atual sistema

jurídico brasileiro no que tange a responsabilidade do Estado, do risco administrativo, é

oriundo desta ultima fase.

1.2.4 Responsabilidade do Estado no direito brasile iro atual

Feita uma breve noção temporal quanto à responsabilidade civil do Estado,

apresenta-se o disposto na atual Constituição brasileira, a Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), bem como demais ordenamentos jurídicos

relevantes à matéria.

Inicialmente, nos termos da CRFB/8853, em seu artigo 37, § 6°, assim dispõe

acerca da responsabilidade civil do Estado:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá os princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] § 6º as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável no caso de dolo ou culpa.

Posteriormente, no Código Civil54, promulgado pela Lei 10. 406 de 10.01.2002,

que entrou em vigor 11.01.2003 (CC/2002) transcreve fielmente no seu artigo 43 o

52 COELHO, Márcio Xavier. Fundamentos da responsabilidade civil estatal . Brasília: OAB Editora, 2005. p. 47. 53 BRASIL. Constituição Federal , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010.

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preceito do art. 37, § 6º, da CRFB/88, prescrevendo a responsabilidade das pessoas

jurídicas de direito público, por ato de seus agentes, bem como direito de regresso

contra o responsável no caso de dolo ou culpa.

Carvalho Filho55 entende que o atual Código Civil (CC/2002) disciplina a

matéria em estrita consonância com a prescrita na CRFB/88, de modo a não haver

nenhuma dúvida de que, no ordenamento jurídico pátrio, o Estado se sujeita à teoria da

responsabilidade objetiva.

“Há responsabilidade objetiva quando basta para caracterizá-la a simples

relação causal entre um acontecimento e o efeito que produz.”56

No mesmo sentido afirma Di Pietro57, entendendo que a partir da Constituição

de 1946 ficou consagrada a teoria da responsabilidade objetiva do Estado. Partiu da

idéia de que apenas exigiu a culpa ou dolo para o direito de regresso contra o agente,

eis que não fez a mesma exigência para as pessoas jurídicas, ou seja, há

responsabilidade objetiva do Estado em relação ao particular lesado e responsabilidade

subjetiva do agente público para com o Estado.

Falando em responsabilidade objetiva, há que se falar ao direito de regresso,

Diógenes Gasparini58 explica que, tendo a Administração Pública indenizado a vítima,

pode esta restaurar o seu patrimônio à custa do patrimônio do causador do dano, qual

seja, o seu agente, que por sua vez responde subjetivamente, devendo o Estado

demonstra o dolo ou a culpa do seu representante.

Ademais, no contexto atual de responsabilidade civil do Estado destaca-se

Cahali59:

Tendo a Constituição de 1988 (a exemplo das anteriores) adotado a teoria da responsabilidade objetiva das pessoa jurídicas indicadas em seu art. 37, § 6.°, a que bastaria o nexo de causal idade entre o dano e a ação ou omissão do ente público ou privado prestador de serviço

54 BRASIL. Código Civil , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 55 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo . 22. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p.525 e 526. 56 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 21 ed rev., atual. até emenda Constitucional 57, de 18.12.2008. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 995. 57 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo . 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 613. 58 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo . 14 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1052. 59 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 43.

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público, mostra-se, em princípio, despicienda qualquer averiguação do dolo ou da culpa por parte de seus agentes, por desnecessária sua prova.

Dias60, reafirmando o princípio geral da responsabilidade objetiva do art. 37, §

6°, da CRFB/88, ensina que “[...] a interpretação d esse preceito constitucional, que

impõe a responsabilidade do Estado pelos danos causados aos particulares, leva à

conclusão de que, em primeiro lugar, consagra a responsabilidade objetiva e direta de

todas as pessoas jurídicas de Direito Público, ancorada na atual teoria publicista do

risco criado ou teoria do risco administrativo”.

Quanto à teoria do risco administrativo, explica Gasparini61 que “[...] a obrigação

de o Estado indenizar o dano surge, tão-só, do ato lesivo, de que ele, Estado, foi

causador. Não se exige culpa do agente público, nem culpa do serviço. É suficiente a

prova da lesão e de que foi causada pelo Estado. A culpa é inferida do fato lesivo, ou,

vale dizer, decorrente do risco que a atividade pública gera para os administrados”.

Portanto, conclui-se que, no atual sistema jurídico brasileiro adotou-se a teoria

do risco administrativo, porquanto a responsabilidade civil do Estado é objetiva. Que

segundo o conceito de Mello62 é a relação de causa entre um acontecimento e o efeito

produzido por tal, caracterizando-se pela soma de três fatores, quais sejam, o dano, a

conduta omissiva ou comissiva do Estado, bem como a demonstração de um nexo de

causalidade entres os dois primeiros fatores, assim leciona Coelho63.

No que tange aos atos de omissão, também há que se falar em

responsabilidade objetiva. O mesmo não ocorre quando à responsabilização que recai

ao agente do Estado que é subjetiva.

60 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Responsabilidade do Estado pela função jurisdiciona l. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 44. 61 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo . 14 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1046. 62 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 21 ed rev., atual. até emenda Constitucional 57, de 18.12.2008. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 995. 63 COELHO, Márcio Xavier. Fundamentos da responsabilidade civil estatal . Brasília: OAB Editora, 2005. p. 47.

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1.3 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE

1.3.1 Responsabilidade subjetiva

A responsabilidade subjetiva é subdividida em dois conceitos, nos casos de

omissão do serviço público (falta do serviço) e outra quanto ao agente.

Num conceito genérico, leciona Mello:

“Responsabilidade subjetiva é a obrigação de indenizar que incumbe a alguém

em razão de um procedimento contrário ao Direito – culposo ou doloso – consistente

em causar um dano a outrem, ou em deixar de impedi-lo quando obrigado a isto.”64

Inicialmente, segundo o conceito de Diniz65, responsabilidade subjetiva é

justificada na idéia de culpa ou dolo por ação ou omissão que cause lesão a terceiro,

deste modo, para haver o dever de reparar deve-se provar a culpa do agente.

Neste sentido, para Gasparini66, a obrigação de indenizar está intimamente

ligada na culpa ou dolo do agente, sendo este, o mesmo conceito do Direito Privado,

qual seja, agir com imprudência, negligência ou imperícia.

Aplica-se, segundo Mello67, o princípio da responsabilidade subjetiva, quando o

dano for oriundo de uma omissão do Estado, isto é, o serviço não funcionou, funcionou

tardia mente, ou sem eficiência (falta do serviço).

Seguindo o mesmo entendimento quanto aos atos dos agentes do Estado,

afirma Lúcia Valle Figueiredo68 que, no ordenamento jurídico brasileiro, a

responsabilidade subjetiva está ligada ao dolo ou culpa que recai sobre o funcionário,

cabendo à administração pública indenizar, em ação regressiva, o prejuízo decorrente

da ação de seu agente.

64 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 21 ed rev., atual. até emenda Constitucional 57, de 18.12.2008. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 992. 65 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro : Responsabilidade Civil. v. 7. 23. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009. p.130. 66 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo . 14 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1045. 67 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 21 ed rev., atual. até emenda Constitucional 57, de 18.12.2008. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 980.

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Explica ainda Gasparini69, quanto ao direito de regresso, que uma vez tendo a

Administração Pública indenizado a vítima, pode esta restaurar o seu patrimônio à

custa do patrimônio do causador do dano, qual seja, o seu agente.

Marcelo Alexandrino70 completa que, quando se fala na responsabilidade

subjetiva do Estado, conforme a redação do art. 37, § 6° da CRFB/88, restringe-se

apenas às condutas danosas de seus agentes, oriundas de dolo ou culpa, recaindo

esta modalidade apenas ao causador direto do prejuízo.

Portanto, a responsabilidade subjetiva está diretamente ligada à culpa, sendo

esta requisito imprescindível para sua caracterização.

1.3.2 Responsabilidade objetiva

Segundo Gonçalves71, na responsabilidade objetiva não há a necessidade de

provar a culpa do agente, sendo que em certos casos há previsão legal e em outros

funda-se no risco dos Serviços Públicos.

Segundo Meirelles72, dá-se em conta da teoria do risco administrativo adotada

no sistema jurídico brasileiro, que responsabiliza a administração pública na obrigação

de indenizar apenas pelo fato lesivo e injusto causado à vítima em virtude da

desigualdade criada pela própria Administração em relação ao administrado.

“A responsabilidade, fundada no risco, consiste, portanto, na obrigação de

indenizar o dano produzido por atividade exercida no interesse do agente e sob seu

controle, sem que haja qualquer indagação sobre o comportamento do lesante, fixando-

68 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo . rev. amp. atual. até a Emenda Constitucional 56/2007. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 289. 69 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo . 14 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1052. 70 ALEXANDRINO, Marcelo. Direito administrativo . 15 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 553. 71 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil . 10 ed., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 21. 72 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 35 ed. ataul. por Eurico de Andrade Azevedo e outros. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 651.

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31

se no elemento objetivo, isto é, na relação de causalidade entre o dano e a conduta do

seu causador.”73

O conceito de responsabilidade objetiva de Mello74 consiste na “[...] obrigação

de indenizar que incumbe a alguém em razão de um procedimento lícito ou ilícito que

produziu uma lesão na esfera juridicamente protegida de outrem. Para configurá-la

basta, pois, a mera relação causal entre o comportamento e o dano”.

Gasparini75, acerca da teoria objetiva:

“Por essa teoria, a obrigação de o Estado indenizar o dano surge, tão-só, do ato

lesivo de que ele, Estado, foi causador.”

Ressalta Alexandrino76, quanto ao § 6°, do art. 37, da CRFB/88, aduzindo que,

“esse dispositivo não estabelece a responsabilidade objetiva para toda a conduta,

comissiva ou omissiva, da Administração. Ao contrário, a responsabilidade objetiva

somente se aplica à hipótese de danos causados pelo Poder Público por meio da ação

de seus agentes.”

Completa Diniz77, que no risco administrativo o principal fundamento da

responsabilidade civil do Estado é ação que causou o prejuízo, sendo apenas exigindo

o nexo causal entre estes dois elementos para a plena comprovação do prejuízo.

Ressalta, ainda, que tal se aplica mesmo o ato sendo regular.

Conforme analisado, o tipo responsabilidade que recai ao Estado, aplicado no

sistema jurídico brasileiro, é o da responsabilidade objetiva baseado na teoria do risco

administrativo, no qual basta a demonstração do dano, da atividade estatal que o

causou, bem como do nexo causal entre os dois anteriores. No entanto, ainda há que

se falar nas causas de excludente de responsabilidade que eximem a administração

pública de ressarcir qualquer prejuízo que a ela não se aplica, pela impossibilidade de

aplicar-se o nexo causal.

73 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil . 21. ed. rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7°. p. 53. 74 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 22. ed. rev., atual. e ampl. até emenda Constitucional 53, de 19.12.2006. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 970. 75 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo . 14 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1047. 76 ALEXANDRINO, Marcelo. Direito administrativo. 15 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 553. 77 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil . 21. ed. rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7°. p. 619.

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1.3.4 Excludentes de responsabilidade

Venosa78 elenca três hipóteses de excludentes de responsabilidade:

“São excludentes de responsabilidade, que impedem que se concretize o nexo

causal, a culpa exclusiva da vítima, o fato de terceiro, o caso fortuito e a força maior

[...]”

As excludentes de responsabilidade são elementos diretamente ligados à

isenção da responsabilização da Administração, portanto, tratar-se-á com mais

abrangência, e voltado aos atos jurisdicionais, no Capítulo III deste trabalho.

1.3.4.1 Culpa exclusiva da vítima

Segundo Gasparini79, trata-se de situação em que a própria vítima do dano deu

causa ao evento, não cabendo ao Estado obrigar-se por tal, eis que falta um dos nexos

de causalidade indispensáveis à responsabilização deste.

Melo80, por sua vez, não entende que a culpa exclusiva da vítima trata-se de

uma excludente, mas sim afasta a responsabilidade do Estado por descaracterizar o

nexo de causalidade.

Carvalho Dias destaca que não há como responsabilizar o Estado por dano

causado pelo próprio comportamento da vítima, faltando, deste modo, o nexo causal,

que seria a atividade estatal.

78 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil : Responsabilidade Civil. 8. Ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 49. 79 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo . 14 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1049. 80 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 22. ed. rev., atual. e ampl. até emenda Constitucional 53, de 19.12.2006. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 988.

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1.3.4.2 Força maior e caso fortuito

Venosa81 distingue estes dois institutos, sendo que o caso fortuito se

caracteriza por imprevisibilidade do fator humano ou da natureza; a força maior também

é revestida de fato humano ou em decorrência da natureza, no entanto, apesar de não

ser possível resistir é possível prevê-la. Conclui afirmando que mesmo com essa

diferença, o efeito jurídico desses dois institutos é sempre o mesmo.

Dias82 explica que a força maior é um evento imprevisível e irresistível

provocado por uma força exterior independente da vontade do ser humano, sendo sua

causa conhecida, no entanto, possui o caráter da irresistibilidade.

O mesmo autor ainda completa:

“Logo, se houver força maior, disto resultando dano ao particular, seu causador,

por óbvio, não foi o Estado, que não poderá ser responsabilizado, pois faltará nexo de

causalidade.”83

Para Cahali84, apenas no caso de força maior exclui-se a responsabilidade da

Administração Pública, uma vez que é oriunda de evento imprevisível da natureza (fator

externo, estranho ao serviço). Estão ressalvados os casos de omissão em que o Estado

responde por esta. No caso fortuito advém de uma interioridade (fator interno), ou seja,

fato interno, decorrente da administração, fulminando no risco e conseqüente

responsabilidade.

Portanto, conclui-se que, em caso de dano por força maior não há que se falar

em responsabilidade da Administração Pública, ressalvados os casos em que o Estado

incorra em omissão, decorrendo na responsabilização deste. No entanto, o caso fortuito

não exclui o Estado da obrigação indenizar ou ressarcir.

81 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil : Responsabilidade Civil. 8. Ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 51. 82 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Responsabilidade do Estado pela função jurisdiciona l. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 39. 83 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Responsabilidade do Estado pela função jurisdiciona l. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 39.

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1.3.4.3 Culpa de terceiro

Na culpa de terceiro ou fato de terceiro, não há responsabilização por parte do

Estado quando a conduta culposa causadora de prejuízo é de terceiro, e não de

agentes públicos.85

Ensina Araújo86, acerca da culpa de terceiro:

A equação dos dados dirigidos à causalidade responsabilizante não chega a se formar, pois não ocorre no caso de culpa devidamente comprovada de terceiro, quer a ação danosa, quer a omissão prejudicial do Estado, mas sim de um terceiro, estranho, naquele exato momento, à relação Estado-administrado.

Di Pietro87 explica que a culpa de terceiro é apontada como excludente de

responsabilidade do Estado, eis que, em regra, a responsabilidade incide naquele que

causou o dano ou prejuízo.

1.4 RESPONSABILIDADE NOS ATOS JURISDICIONAIS

1.4.1 Atos jurisdicionais

Conceituando atos jurisdicionais, Ribeiro explica que, “a prestação jurisdicional

consiste na exteriorização do exercício de um dos poderes do Estado - o Poder

Judiciário -, uma vez que este exerce atividade exclusiva de aplicação da norma jurídica

ao caso concreto, com o escopo de solucionar os conflitos”.88

84 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 50 e 51. 85 BÜHRING, Márcia Andrea. Responsabilidade extracontratual do estado . São Paulo: Thomson-IOB, 2004. p. 164. 86 ARAÚJO, Edmir netto de. Curso de Direito Administrativo . 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 741. 87 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo . 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 617. 88 RIBEIRO, Ana Cecília Rosário. Responsabilidade civil do estado por atos jurisdici onais. São

Paulo: LTr, 2002, p. 48.

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Mello ensina que, o Poder Judiciário pratica tanto atos típicos quanto atípicos. O

primeiro está relacionado aos atos jurisdicionais, quais sejam, os de julgamentos, e o

segundo, aos atos de natureza administrativa e legislativa.89

Reinaldo Moreira Bruno90 explica que os atos jurisdicionais são praticados pelos

Magistrados no exercício pleno da sua função, podendo tais atos ser primários,

primordiais ou atípicos.

Para Araújo91, ato jurisdicional é a atividade fim do Poder Judiciário, resumindo

é a atividade judicial. No entanto, o Poder Judiciário realiza uma série de atividades que

não se enquadram neste conceito, como os atos administrativos ou legislativos.

Alexandrino92 explica que, em se tratando de atos não jurisdicionais praticados

pelo Poder Judiciário, também incide a responsabilidade objetiva do Estado:

[...] em relação aos atos não jurisdicionais praticados pelo juiz e pelos demais órgãos do Poder Judiciário, não há o que se discutir: sobre eles incide normalmente a responsabilidade extracontratual objetiva da Administração, na modalidade do risco administrativo, porque se trata de meros atos administrativos praticados pelo Poder Judiciário.

Finalmente, ressalva Diniz93 que, há uma resistência dos doutrinadores à idéia

da responsabilidade estatal aos atos do Poder Judiciário. Os motivos vão dês da

soberania do Poder Judiciário, passando pela absoluta independência dos juízes, o que

os exime da idéia de serem responsabilizados por seus atos. Ademais, fala-se na

imutabilidade ou autoridade da coisa julgada. Por fim, afirma que esta tese de

irresponsabilidade perde terreno com base no princípio da igualdade dos encargos,

onde afirma que o lesado faz jus a uma indenização quando sofrer um prejuízo, e

ainda, havendo argumento plausível para tanto, surge o dever de indenizar.

89 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 22. ed. rev., atual. e ampl. até emenda Constitucional 53, de 19.12.2006. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 33. 90 BRUNO, Reinaldo Moreira. Direito administrativo , Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 420. 91 ARAÚJO, Edmir netto de. Curso de Direito Administrativo . 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 794. 92 ALEXANDRINO, Marcelo. Direito administrativo . 15 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 562. 93 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil . 23. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 7°. p. 659 e 560

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1.4.2 Atos judiciais dolosos

Segundo Cahali94, o preceito relativo à responsabilização do Estado encontra-

se estabelecido no art. 37, § 6º, da CRFB/88, assim como o direito de regresso em

desfavor de seus agentes. Ainda ressalta a responsabilização pessoal do agente que

cometeu o ato doloso:

Não são estranhos à ordem constitucional pátria os institutos da responsabilidade objetiva do Estado e da responsabilidade regressiva do agente público nas hipóteses de dolo ou culpa (art. 37, § 6.º). A responsabilidade do Estado por erro judiciário encontra-se positivada no art. 5.º, LXXV, da Constituição, enquanto a responsabilidade enquanto a responsabilidade civil da autoridade judiciária nas hipóteses de dolo ou culpa está consagrado no CPC (art. 133.I).

“[...] o ordenamento jurídico brasileiro contem preceitos impondo a

responsabilidade pessoa do juiz, obrigando-lhe ao pagamento das perdas e danos aos

prejudicados, no exercício de suas funções, em duas hipóteses: 1ª) quando proceder

com dolo ou fraude;”95

Meirelles96 explica que “Ficará, entretanto, o juiz individual e civilmente

responsável por dolo, fraude, recusa, omissão ou retardamento injustificado de

providências de ofício, nos expressos termos do art. 133, do CPC, cujo ressarcimento

do que foi pago pelo Poder Público deverá ser cobrado em ação regressiva contra o

magistrado culpado.”

94 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 471. 95 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Responsabilidade do Estado pela função jurisdiciona l. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 174. 96 MEIRELLES, Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 34. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008. p. 667.

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1.4.3 Erro judiciário

A indenização por erro judiciário encontra-se prevista na CRFB/88 no artigo 5º,

LXXV97:

“O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar

preso além do tempo fixado na sentença”.

Nesse sentido, Meirelles98:

O ato judicial típico, que é a sentença ou a decisão, enseja responsabilidade civil da Fazenda pública, nas hipóteses do art. 5º, LXXV, CF/88. Nos demais casos tem prevalecido no STF o entendimento de que ela não se aplica aos atos do Poder Judiciário e de que o erro judiciário não ocorre quando a decisão está suficiente fundamentada e obediente aos pressupostos que a autorizam.

Completa Carvalho Dias99:

“Os erros judiciários têm origem em múltiplas situações apreendidas em razão do que ordinariamente acontece na conturbada atividade forense [...]: a) dolo do agente público julgador (juiz), provocando o erro judiciário de forma consciente, com o objetivo de prejudicar alguém, partes ou terceiros, seja aplicando erroneamente o direito, seja deturpando os fatos, sob valoração inadequada das provas produzidas no processo, tudo de forma deliberada ou premeditada; b) culpa dos agente público julgador, nas situações em que há imperícia [...] ou negligência [...] ou ambas [...]; c) dolo ou culpa dos agentes auxiliares dos órgão jurisdicionais, [...].

Como foco principal desta pesquisa, destaca-se Paulo Magalhães da Costa

Coelho100:

“Em nossa atuação jurisdicional temos entendido que condenar o Estado na

hipótese de prisão preventiva decretada em face de quem não foi o autor do delito, sem

que esse posicionamento implique censura às decisões judiciais.”

Sustenta Canotilho apud Maria Emília Mendes Alcantara101:

97 BRASIL. Constituição Federal , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 98 MEIRELLES, Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 657. 99 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Responsabilidade do Estado pela função jurisdiciona l. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 188.

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Entende-se hoje que o cidadão inocente, após sua reabilitação em processo de revisão, tem verdadeiro direito subjetivo à reparação dos danos. A reparação dos erros judiciários configura-se como responsabilidade por atos lícitos. A inocência, posteriormente demonstrada, virá revelar, sim, um sacrifício individual e grave, absolutamente inexigível sem compensação. A culpa do condenado torna legítimo o exercício do jus puniendi e isentará o Estado do dever de qualquer prestação ressarcitória, a sua inocência não perturba a legitimidade do ato jurisdicional, mas torna obrigatória a atribuição ao lesado ou herdeiros de uma justa indenização.

Enfim, Meireles conclui que os danos causados por erro judiciário, referido no

artigo 5º, LXXV, da CRFB/88 é de responsabilidade do Estado e não do juiz, estando

este responsável quando agir com dolo, fraude, recusa, omissão ou retardamento

injustificado na forma de ação regressiva do art. 133, I, do CPC.

1.4.4 Teoria da irresponsabilidade

Muito embora os doutrinadores entendam que seja cabível responsabilizar o

Estado por danos causado pelos atos jurisdicionais, elencam as justificativas cabíveis

quando há objeção.

“A irresponsabilidade dos danos causados pelos atos judiciais, sem embargo da

concessão feita à reparação dos danos resultantes do erro judiciário, constitui o último

reduto da teoria da irresponsabilidade civil do Estado.”102

Costa Coelho103 afirma que a justificativa da teoria da irresponsabilidade está

na soberania do Poder Judiciário, bem como, “[...] os juízes têm de agir com

independência na interpretação das leis e no exercício da judicatura; o juiz não é

funcionário público, e a indenização por eventual dano decorrente de decisão judicial

vulneraria a regra e a garantia da coisa julgada”.

100 COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manual de direito administrativo . São Paulo: Saraiva, 2004. p. 439. 101 ALCÂNTARA, Maria Emília Mendes, Responsabilidade do Estado por atos legislativos e jurisdicionais . São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 32/33. 102 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado . 3. ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 469. 103 COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manual de direito administrativo . São Paulo: Saraiva, 2004. p. 437.

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Di Pietro104 mostra que existem quatro fundamentos da irresponsabilidade do

Estado por atos jurisdicionais, da soberania do Poder Judiciário, que o magistrado não

é funcionário público, que os juízes dever agir com independência no exercício das

suas funções, sem medo de que suas decisões possam ensejar um responsabilização

por parte do Estado, e, ainda, que a indenização por danos decorrentes de decisões

judiciais infringiria a regra da imutabilidade da coisa julgada, e que tal decisão

reconheceria que a decisão violou o texto da lei.

Frente ao verificado acima, conclui-se que há entendimentos e fundamentos pra

responsabilizar ou não o Estado pelos atos jurisdicionais, diante de tal controvérsia,

segue-se o previsto no art. 5º, LXXV, CF/88, que legitima tal responsabilização.

Posto isso, no capítulo seguinte, tratar-se-á acerca da prisão preventiva, bem

como os pressupostos e fundamentos para sua decretação, que por sua vez, não

sendo observados, podem acarretar na responsabilização do Estado.

104 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo . 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 624.

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2 PRISÃO PREVENTIVA

2.1 CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO DE PRISÃO

2.1.1 Prisão e suas espécies

Muito embora existam diversas espécies de prisão no ordenamento jurídico

brasileiro, estudar-se-á nesse trabalho a prisão processual ou cautelar, da modalidade

preventiva, bem como diferenciar-se-á da prisão pena oriunda de decisão condenatória

irrecorrível. Disto, destaca-se Paulo Alves Franco105 quando afirma que “[...] toda prisão

que anteceda a uma condenação definitiva é preventiva”.

Primeiramente o conceito de prisão por Fernando da Costa Tourinho Filho106:

Em princípio, prisão é a supressão da liberdade individual, mediante clausura. É a privação da liberdade individual de ir e vir; e, tendo em vista a denominada prisão-albergue, podemos definir a prisão como a privação, mais ou menos intensa, da liberdade ambulatória.

Fernando Capez107 conceitua prisão como sendo “[...] a privação da liberdade

de locomoção determinada por ordem escrita da autoridade competente ou em caso de

flagrante delito”.

Segundo Guilherme de Souza Nucci108, prisão “é a privação da liberdade,

tolhendo-se o direito de ir e vir, através do recolhimento da pessoa humana ao cárcere”.

Nestor Távora, por sua vez, afirma que “A prisão é o cerceamento da liberdade

de locomoção, é o encarceramento.”109

105 FRANCO, Paulo Alves. Prisão em flagrante : preventiva e temporária. Campina, SP: Bookseller, 2003. p. 303. 106 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal . Vol. 3. 31 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 407. 107 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 251. 108 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 582. 109 TÁVORA, Nestor e Rosmar Antonni. Curso de direito processual penal . 3 ed.rev. ampl. e ataul. Salvador: Jus Podivm. p. 449.

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Julio Fabbrini Mirabete110 explica que “A prisão, em sentido jurídico, é a

privação da liberdade de locomoção, ou seja, do direito de ir e vir, por motivo ilícito ou

por ordem legal”.

É o conceito de prisão, para Válter Kenji Ishida.111:

“Prisão é a privação da liberdade de locomoção, ou seja, do direito de ir e vir,

por ordem escrita da autoridade competente ou em caso de flagrante delito.”

Tourinho Filho112 destaca duas formas de prisão como sendo: prisão pena

aquela oriunda de uma sentença penal condenatória irrecorrível; e prisão sem pena,

aquela que não deflui de condenação definitiva.

No mesmo sentido, Pedro Henrique Demercian113 destaca as duas formas de

prisão, prisão com pena e a prisão sem pena:

Podemos classificar a prisão em duas espécies: a) a prisão com pena, aplicada AP final do processo criminal, em um sentença condenatória transitada em julgado; b) a prisão sem pena, que não se origina de uma condenação criminal e pode ser administrativa, disciplinar, cautelar processual penal e cautelar constitucional (admitida durante o Estado de Sítio ou de Defesa).

Capez114 explica, no mesmo sentindo, estas duas formas de prisão: a primeira,

prisão pena ou penal, é oriunda de uma decisão judicial final, ou seja, decorrente de

sentença condenatória transitada em julgado que, após o devido processo legal, imputa

ao apenado sanção com a finalidade de satisfazer a pretensão da tutela jurisdicional do

Estado; a segunda, prisão sem pena ou processual, é aquela imposta na decorrência

de processo ou investigação criminal para assegurar o pleno andamento destes e ainda

garantir a execução penal, ou até mesmo coibir a prática de outros crimes.

Ademais, Mirabete115 faz distinção entre outras formas de prisão além das

penais e processuais, ressalta as prisões civis, administrativas e disciplinares, que não

110 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18 ed.rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005. São Paulo: Atlas, 2006. p. 361. 111 ISHIDA, Válter Kenji. Processo penal : de acordo com a reforma processual. São Paulo: Atlas, 2009. p. 158. 112 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal . Vol. 3. 31 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 417. 113 DEMERCIAN, Pedro Henrique e Jorge Assaf Maluly. Curso de processo penal . 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 161. 114 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 251 e 252. 115 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18 ed.rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005. São Paulo: Atlas, 2006. p. 361.

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serão estudadas neste trabalho, eis que a relevante é a prisão processual na

modalidade preventiva, diferenciando-a da prisão pena decorrente de sentença

condenatória transitada em julgado.

2.1.1.1 Prisão pena

Segundo Mirabete116, prisão pena ou penal é aquela “[...] cuja finalidade

manifesta é repressiva, é a que ocorre após o trânsito em julgado da sentença

condenatória em que se impôs pena privativa de liberdade.”

Capez117 leciona acerca da prisão-pena ou prisão penal, que “[...] é aquela

imposta em virtude de sentença condenatória transitada em julgado, ou seja, trata-se

da privação da liberdade determinada com a finalidade de executar decisão judicial,

após o devido processo legal, na qual se determinou o cumprimento de pena privativa

de liberdade. Não tem finalidade acautelatória, nem natureza processual. Trata-se de

medida penal destinada à satisfação da pretensão executória do Estado”.

Eugênio Pacelli de Oliveira118 conceitua a prisão-pena como sendo aquela

decorrente de sentença condenatória transitada em julgado; é conhecida também por

prisão definitiva, muito embora não exista em nosso ordenamento jurídico a figura da

prisão perpétua ou por tempo indeterminado.

Explica Tourinho Filho119 que a prisão pena é aquela imposta como castigo ao

agente do delito ou infração penal, como forma de pagamento ao Estado por sua

conduta penalmente reprovável.

Távora120 conceitua a prisão pena:

116 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18 ed.rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005. São Paulo: Atlas, 2006. p. 361. 117 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 251 e 252. 118 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo Penal . 11 ed. Atualizada de acordo com a Reforma Processual Penal de 2008 (Leis 11.689 e 11.719) e pela Lei 11.900 (novo interrogatório), de 08.01.09. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 431. 119 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado , vol. 1, 12 ed. atualizado de acordo com as Leis 11.689, 11.690 e 11.719, todas de junho de 2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 747.

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Pode advir de decisão condenatória transitada em julgado, que é a chamada prisão pena , regulada pelo Código Penal, com o respectivo sistema de cumprimento, que é verdadeira prisão satisfativa, em resposta estatal ao delito ocorrido, tendo por título a decisão judicial definitiva.

Para Válter Kenji Ishida121 a prisão pena ou prisão sanção é aquela proveniente

de sentença condenatória transitada em julgado, tendo-a como forma de repressão, eis

que um dos objetivos do Direito Penal. Ainda pode-se dizer que é compatível ao

princípio da presunção de inocência, ou seja, deve-se findar o processo para, ai sim,

iniciar o cumprimento da pena.

2.1.1.2 Prisão cautelar ou processual

Segundo João Alfredo Medeiros Vieira122, a prisão cautelar, também conhecida

como prisão processual, diferentemente da prisão pena, oriunda de uma sentença

condenatória definitiva e irrecorrível, é utilizada pra assegurar condições ao

prosseguimento do processo, com escopo de resultados concretos e exeqüíveis. É mais

conhecida como “coerção processual”.

A doutrina cita como modalidades de prisão cautelar: a prisão em flagrante, a prisão preventiva, a prisão temporária, a prisão decorrente de pronúncia e a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível. Vale dizer que todas essas modalidades de prisão cautelar encontram fundamento no art. 5°, LXVI, da Constituição Federa l.123

Para Paulo Rangel, “A prisão cautelar é uma espécie de medida cautelar, ou

seja, é aquela que recai sobre o indivíduo, privando-o de sua liberdade de locomoção,

mesmo sem sentença definitiva.”124

120 TÁVORA, Nestor e Rosmar Antonni. Curso de direito processual penal . 3 ed.rev. ampl. e ataul. Salvador: Jus Podivm. p. 449. 121 ISHIDA, Válter Kenji. Processo penal : de acordo com a reforma processual. São Paulo: Atlas, 2009. p. 158. 122 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. A prisão cautelar . Santo André, SP: Ledix, 2005. p. 9. 123 BECHARA, Fábio Ramazzini. Prisão Cautelar . São Paulo: Malheiros, 2005. p. 146. 124 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 16 ed. rev. amp. e atual., de acordo com as reformas processuais penais e a Lei 11.900/09: Videoconferência. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 677.

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Entende Oliveira125 que “[...] toda prisão anterior ao trânsito em julgado deve

também ser considerada uma prisão cautelar.

“O procedimento cautelar assegura o proveito prático do processo principal e

garante-lhe eficácia, assegurando o eficaz funcionamento da justiça.”126

Marcellus Polastri Limas127 explica que a prisão processual com natureza

cautelar, pode surgir de flagrante delito ou, neste caso, de ordem judicial, possuindo o

condão de garantir uma melhor persecução penal, sendo sua principal característica a

provisoriedade.

Antônio Alberto Machado128 destaca que às prisões cautelares possuem, além

de caráter de conveniência e efetividade procedimental, as características de serem

provisórias, modificáveis, facultativas e instrumentais.

2.1.2 Conceito e finalidade da prisão cautelar

Segundo Manzini apud Tourinho Filho129, a prisão cautelar é aquela anterior à

condenação, consistindo numa limitação mais ou menos intensa da liberdade física de

uma pessoa por uma finalidade processual penal.

Num conceito mais genérico acerca da cautelaridade da prisão, Francesco

Carnelutti130 ensina que é uma forma de garantir a plena produção das provas:

“[...] sua função consiste precisamente em assegurar os meios ou os resultados do processo, da maneira que os civilistas distinguem entre o processo cautelar final e o processo cautelar instrumental; [...]. Por outro lado, no campo penal, em razão da maior gravidade do perigo

125 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo Penal . 11 ed. Atualizada de acordo com a Reforma Processual Penal de 2008 (Leis 11.689 e 11.719) e pela Lei 11.900 (novo interrogatório), de 08.01.09. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 431. 126 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo penal e constituição , princípios constitucionais do processo penal. 5 ed., rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2009. p. 218. 127 LIMAS, Marcellus Polastri. Manual de processo penal . 2 ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2009. p. 529. 128 MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal . 2 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 462. 129 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal . v. 3., 31 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 420. 130 CARNELUTTI, Francesco. Lições sobre o processo penal . v. 2. Campinas: Bookseller, 2004. ps. 80 e 81.

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concernente à fuga do imputado ou à dispersão das provas, o objetivo cautelar se desenvolve com maior amplitude [...]”.

A finalidade da prisão cautelar baseia-se na privação do indivíduo por urgência

e necessidade para resguardar o processo de conhecimento. É o entendimento de

Bechara131:

A prisão Cautelar tem como escopo resguardar o processo de conhecimento, pois, se não for adotada, privando o indivíduo de sua liberdade, mesmo sem sentença definitiva, quando esta dor dada, já não será possível a aplicação da lei penal. Assim, o caráter de urgência e necessidade informa a prisão cautelar de natureza processual.

Oliveira132 afirma que a cautelaridade da prisão é “[...] no que se refere à sua

função de instrumentalidade, de acautelamento de determinados e específicos

interesses de ordem pública.”

Távora133 explica que durante a persecução penal existe a possibilidade da

decretação da prisão sem pena, quando necessário, e mesmo antes de findo o

processo:

No transcorrer da persecução penal, contudo, é possível que se faça necessário o encarceramento do indiciado ou do réu, mesmo que antes do marco final do processo. Isso se deve a uma necessidade premente devidamente motivada por hipóteses estritamente previstas em lei, traduzidas no risco demonstrado de que a permanência em liberdade do agente é um mal a ser evitado. Surge assim a possibilidade da prisão sem pena , também conhecida por prisão cautelar, provisória ou processual, que milita no âmbito da excepcionalidade [...]”

Por fim, ressalta Franco134 que, as prisões cautelares têm como finalidade a

restrição da liberdade por determinação judicial durante o inquérito policial ou instrução

criminal, podendo ser decretada por medida de segurança processual, para garantir a

execução penal, para preservação da ordem pública, ou por conveniência da instrução

criminal.

131 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 16 ed. rev. amp. e atual., de acordo com as reformas processuais penais e a Lei 11.900/09: Videoconferência. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 677. 132 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo Penal . 11 ed. Atualizada de acordo com a Reforma Processual Penal de 2008 (Leis 11.689 e 11.719) e pela Lei 11.900 (novo interrogatório), de 08.01.09. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 431. 133 TÁVORA, Nestor e Rosmar Antonni. Curso de direito processual penal . 3 ed.rev. ampl. e ataul. Salvador: Jus Podivm. p. 449. 134 FRANCO, Paulo Alves. Prisão em flagrante : preventiva e temporária. Campina, SP: Bookseller, 2003. p. 303.

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2.1.3 Pressupostos e fundamentos que devem ser resp eitados para a decretação

da prisão cautelar

O Fundamento constitucional da prisão encontra-se no art. 5.°, LXI, da

CRFB/88135, que assim dispõe:

“ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e

fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão

militar ou crime propriamente militar, definido em lei.”

Oliveira136 destaca, como pressupostos indispensáveis à decretação de

qualquer medida cautelar, principalmente prisões, a prova da existência do crime e

indícios suficiente de autoria:

Observa-se, primeiro, que os requisitos relativos à prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria constituem o que se poderia chamar de fumus delicti, ou a aparência do delito, equivalente ao fumus boni iuris de todo processo cautelar. A aparência do delito deve estar presente em toda e qualquer prisão provisória (ou cautelar) como verdadeiro pressuposto da decretação da medida cautelatória.

Segundo Rangel137, dois pressupostos devem ser observados quando da

decretação da prisão preventiva, o periculum in mora (periculum libertatis) e o fumus

boni iuris (fumus comissi delicti), sendo o primeiro relativo a demora da decretação bem

como ao prejuízo que tal pode causar à prestação da tutela, ou seja, não a fazendo em

tempo, tanto prejudicará na apuração dos fatos quanto tornar-se-á frustrado o bom

andamento da ação. Quanto ao segundo, trata-se do princípio que rege o prisão

preventiva, devendo haver o binômio da prova da existência do crime e indícios

suficientes de autoria, sem os quais não há possibilidade da decretação desta medida

cautelar.

135 BRASIL. Constituição Federal , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 136 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo Penal . 11 ed. Atualizada de acordo com a Reforma Processual Penal de 2008 (Leis 11.689 e 11.719) e pela Lei 11.900 (novo interrogatório), de 08.01.09. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 450 e 451. 137 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 16 ed. rev. amp. e atual., de acordo com as reformas processuais penais e a Lei 11.900/09: Videoconferência. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 681.

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Ademais, explica Nucci que no Brasil a regra é da prisão ser baseada em

ordem escrita por juiz competente, devidamente motivada e fundamentada, salvo

aquelas oriundas de flagrante delito. Regulam a forma como deve-se proceder a

formalização da prisão os incisos LXII, LXIII, LXIV e LXV do art. 5°, da CRFB/88.

Completa Venosa138 nesse sentido que, “Rigorosamente, no regime de

liberdades individuais que preside o nosso direito, a prisão só deveria ocorrer para o

cumprimento de uma sentença penal condenatória. Entretanto ela ocorre antes do

julgamento ou mesmo na ausência do processo por razões de necessidade ou

oportunidade. Essa prisão assenta na Justiça Legal, que obriga o indivíduo, enquanto

membro da comunidade, a se submeter a perdas e sacrifícios em decorrência da

necessidade de medidas que possibilitam ao Estado prover o bem comum, sua última e

principal finalidade.”

Segundo Antonio Magalhães Gomes Filho139, as regras básicas para prisão

preventiva são:

Primeiro, é preciso que no caso concreto, a existência do direito posto como fundamento da cautela se apresente pelo menos com razoáveis probabilidades (fummus boni iuris). Como segunda condição para a emanação do provimento cautelar, a doutrina processual indica o perigo de insatisfação daquele direito diante da demora na prestação jurisdicional definitiva (periculum in mora).

Os pressupostos da prisão cautelar previstos no art. 312, do CPP, segundo

Mirabete140, referem-se à prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria,

sendo o primeiro quanto à materialidade do crime, ou seja, provas materiais como

laudos, testemunhas, bem como o próprio corpo do crime. Outro pressuposto refere-se

à autoria do delito, devendo-se ter, ao menos, indícios suficientes para imputar ao dito

autor o cometimento de tal fato.

138 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18 ed.rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005. São Paulo: Atlas, 2006. p. 362. 139 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 320. 140 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18 ed.rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005. São Paulo: Atlas, 2006. p. 390.

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2.2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

2.2.1 Da dignidade da pessoa humana

Ressalta Norberto Flach141 que os princípios constitucionais de maior

importância a este estudo são, inicialmente, aqueles que consagram o Estado

democrático de direito (art. 1º, caput), vindo como fundamento, entre outros, aos

princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), o compromisso com a liberdade

(art. 5º, X).

Segundo Ailton Cocurutto142, o princípio fundamental da dignidade da pessoa

humana, que encontra-se consagrado na CRFB/88, no art. 1°, III, é a base de todo o

Estado Democrático de Direito; não havendo este não há que se falar em democracia:

[...] o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana está no plano jurídico constitucional de modo expresso (CF, art. 1°, III), e já pela sua posição geográfica constitucional apresenta-se como núcleo basilar do Estado Democrático de Direito, de tal modo que não haverá Democracia, e tão-pouco Direito, sem sua efetiva concretização em todos os ramos jurídicos da vida social [...]

Afirma Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho143 que o princípio da

dignidade da pessoa humana “[...] é um direito fundamental, mas, além disso, é um dos

fundamentos do Estado Brasileiro”.

O princípio da dignidade da pessoa humana, segundo Alexandre de Moraes144,

tem origem do próprio direito à vida, este protegido constitucionalmente, uma vez que o

direito à vida deve ser assegurado na acepção do direito de continuar vivo e ter uma

vida adequada com a condição humana.

141 FLACH, Norberto. Prisão Processual Penal : Discussão à luz dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da segurança jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p . 36 e 37. 142 COCURUTTO, Ailton. Os princípios da dignidade da pessoa humana e da in clusão social . São Paulo: Malheiros. 2008. p. 47. 143 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo penal e constituição, princípios constitucionais do processo penal. 5 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2009. p. 27. 144 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais : teoria geral, comentários aos arts. 1° a 5° da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 76.

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No Direito Penal o princípio da dignidade da pessoa humana foi fundamental ao

dar origem a outros dois princípios que regem tal matéria, o da culpabilidade e da

legalidade. Afirma Carvalho145.

Célia Rosenthal Zisman146, no que tange à importância da diginidade da pessoa

humana em todos os povos, explica que, “Se há distinção semântica entre direitos

fundamentais o direitos humano, no campo pragmático não se concebe diferença, pois

a proteção é indispensável para a preservação da dignidade e tais direitos são válidos

para todos os povos em todos os tempos”.

Ingo Wolfgang Sarlet147 afirma que os direitos fundamentais, a bem da verdade,

são a concretização do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana:

A idéia de que os direitos fundamentais integram um sistema no âmbito da Constituição foi objeto de recente referência na doutrina pátria, com base no argumento de que os direitos fundamentais são, em verdade, concretizaçãos do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, consagrado expressamente em nossa Lei fundamental.

Carvalho148 introduz acerca do princípio da dignidade da pessoa humana em

relação ao Processo Penal, no que tange ao devido processo penal, à ampla defesa e

ao contraditório:

Em síntese, está assegurado constitucionalmente, pelo princípio da dignidade um Direito Processual que confira ao acusado o direito a ser julgado de forma legal e justa, um direito a provar, contraprovar, alegar e defender-se de forma ampla em processo público, com igualdade de tratamento em relação à outra parte da relação processual, bem como a gestão da prova não seja deferida ao julgador, sob pena de retorno ao sistema inquisitivo.

Por sua vez, Sidney Eloy Dalabrida149 faz a ligação do princípio da dignidade da

pessoa humana ao Processo Penal no que tange à liberdade e à integridade física

relativo à prisão cautelar:

145 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo penal em face da constituição . Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 6. 146 ZISMAN, Célia Rosenthal. Revista de direito constitucional e internacional – Caderno de direito constitucional e ciência política. Ano 17, n. 67. São Paulo: Revista dos tribunaus, abr.-jun./2009. p. 34. 147 SARLET, Ingo Wolfgang, A eficácia dos direitos fundamentais . 8 ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria dos Advogados, 2007. p. 83. 148 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo penal e constituição , princípios constitucionais do processo penal. 5 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2009. p. 30. 149 DALABRIDA, Sidney Eloy. Prisão preventiva : uma análise a luz do garantismo penal. Curitiba: Juruá, 2004. p. 69.

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Ligado diretamente ao campo processual penal e ao foco da investigação, o princípio da dignidade da Pessoa Humana obriga que toda e qualquer intervenção estatal cautelar constritiva da liberdade pessoal somente se concretize quando absolutamente inexistentes alternativas menos danosas e ultrajantes ao indivíduo e, mesmo quando imprescindível, opere-se de modo a preservar a condição do homem como pessoa, livre de atentados à sua integridade física, corporal, à sua imagem e todos os demais efeitos deletérios de uma prisionização prematura.

Moraes150 ainda completa que “a dignidade é um valor espiritual e moral

inerente a pessoa”. O autor acredita que a dignidade da pessoa humana tem uma

apresentação em dupla concepção. Primeiro, a dignidade como um direito individual

protetivo, podendo esta proteção ser contra os abusos do Estado ou ainda uma

proteção com os demais indivíduos da sociedade. E, em segundo plano, pode-se

observar um dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes.

2.2.2 Da presunção de inocência

O princípio da presunção de inocência encontra-se prescrito no inciso LVII, do

artigo 5º, da CRFB/88151: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado

da sentença penal condenatória”.

Paulo Alves Franco152 define presunção de inocência como:

“Todo homem é tido como inocente, enquanto não for declarado culpado, após

legalmente processado. Esse princípio bem consagrado no art. 5°, LVII da CF.”

Completa Luigi Ferrajoli153 quando afirma, “[...] postula a presunção de

inocência do imputado até prova contrária decretada pela sentença definitiva de

150 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais : teoria geral, comentários aos arts. 1° a 5° da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 60. 151 BRASIL. Constituição Federal , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 152 FRANCO, Paulo Alves. Prisão em flagrante – preventiva e temporária. Campinas,SP: Bookseller, 2003. p. 21. 153 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão , teoria do garantismo penal.2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 505 e 506.

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condenação. [...] A culpa, e não a inocência, deve ser demonstrada, e é a prova da

culpa – ao invés da inocência, presumida desde o início – que forma o objeto do juízo.”

Américo Bedê Júnior e Gustavo Senna154 ressaltam que o princípio da

presunção de inocência já encontra-se previsto na Declaração dos Direitos do homem e

do cidadão de 1789, em seu artigo 9°. hoje em dia t rata-se do princípio que sofre maior

violação, uma vez que a regra é o acusado responder ao processo em liberdade,

devendo ser tratado como inocente, não havendo motivo para justificar sua prisão.

Tratando-se a prisão cautelar de exceção, devem estas estar devidamente previstas em

lei e comprovadas à realidade fática.

No mesmo sentido, Carvalho155 lembra que a presunção de inocência já estava

presente nos compêndios da Declaração Universal dos Direitos do homem e do

cidadão, na França, em 1789, bem como já se fazia presente na Constituição da

Virgínia, em 1776, seguindo no mesmo padrão pelos séculos até a Declaração

Universal dos Direitos Humanos, da ONU, em 1948, chegando ao Brasil apenas na

CRFB/88, vigente até os dias de hoje.

Quanto à compreensão do princípio da presunção de inocência no Direito

Processual Penal, bem como nas prisões, Carvalho156 afirma que a CRFB/88 proibiu

que o indiciado ou réu fosse, antes do trânsito em julgado de sentença judicial

condenatória, considerado culpado. No entanto, previu as medidas cautelares de prisão

na forma do flagrante delito e prisão preventiva, por entender que são instrumentos

indispensáveis de proteção do processo.

Com muito cuidado, Oliveira157 trata da presunção de inocência nos casos

extremos de prisões cautelares como sendo a privação da liberdade “[...] de quem deve

ser obrigatoriamente considerado inocente [...]”; portanto, deve ser devidamente

fundamentada por autoridade competente frente à brecha que a legislação abre com

relação a este princípio, o que chama-se de reserva de jurisdição.

154 BEDÊ JÚNIOR, Américo e Gustavo Senna. Princípios do processo penal , Entre o garantismo e a efetividade da sanção. São Paulo: Revista dos Tribunais. p. 65 e 66. 155 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo penal e constituição , princípios constitucionais do processo penal. 5 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2009. p. 161. 156 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo penal e constituição , princípios constitucionais do processo penal. 5 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2009. p. 163.

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2.2.3 Direito à liberdade

A previsão constitucional ao direito à liberdade encontra-se prevista no art. 5º,

caput, CRFB/88158, que garante aos brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil tal

direito, entre outros:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,

garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do

direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...].”

Ademais, tal direito está subdivido em categorias, como liberdade de crença

(inciso VI, artigo 5º, CRFB/88), da atividade profissional (inciso XIII, artigo 5º, CRFB/88),

de pensamento (inciso IV, artigo 5º, CRFB/88), de reunião (inciso XVI, artigo 5º,

CRFB/88), de expressão (inciso IX, artigo 5º, CRFB/88) e, ainda, liberdade de

associação (inciso XVII, artigo 5º, CRFB/88).

Quanto às prisões cautelares, item relevante ao presente trabalho, encontra-se

a liberdade de locomoção, que resta sua previsão no inciso XV, artigo 5º, CRFB/88159:

“é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer

pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”.

Rangel160 aborda o assunto com cautela, por tratar-se de norma que restringe o

direito constitucionalmente previsto da liberdade de locomoção (art. 5º, XV, CRFB/88),

devendo sua interpretação ser restrita, se não for aplicá-lo in bonam partem, não poder-

se-á restringi-lo, tão pouco estender-lhe o alcance, ou até mesmo utilizá-lo por analogia.

Completa ainda o autor, ressaltando que tal princípio deve ser observado para evitar o

excesso dos poderes públicos:

157 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo Penal . 11 ed. Atualizada de acordo com a Reforma Processual Penal de 2008 (Leis 11.689 e 11.719) e pela Lei 11.900 (novo interrogatório), de 08.01.09. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 431. 158 BRASIL. Constituição Federal , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 159 BRASIL. Constituição Federal , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 160 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 16 ed. rev. amp. e atual., de acordo com as reformas processuais penais e a Lei 11.900/09: Videoconferência. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 682.

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Trata-se da adoção, no campo das liberdades públicas, do princípio da proibição do excesso, ou seja, uma limitação preventiva feita aos poderes públicos quando se tratar de medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias fundamentais, embasando, assim, o Estado Democrático de Direito.Em outras palavras, as medidas inerentes ao poder de polícia do Estado são as previstas em lei (devido processo legal), não sendo utilizadas além do estritamente necessário.

No entendimento de Tourinho Filho161, o direito à liberdade não se trata de a

pessoa fazer o que bem quiser, mas sim de fazer o que a lei não proíbe, portando, cabe

aí a previsão de restrição à liberdade, sempre nos limites legais e das necessidades

atinentes, observando garantias para evitar os excessos.

2.2.4 Ação penal e o jus puniendi

Segundo o Dicionário técnico jurídico, o termo jus puniendi é o “direito de punir,

privativo do Estado”162

Tourinho Filho163 explica que "o jus puniendi pertence, pois ao Estado, como

uma das expressões mais características da sua soberania".

Para Ishida164, o direito que possui o Estado de aplicar a pena incriminadora em

desfavor daquele que praticou a ação ou omissão de preceito penal, causando um dano

ou lesão jurídica, é conhecido como jus puniendi. Completa ainda, o autor, afirmando

que “O Estado sempre sofre com a infração penal, daí falamos em sujeito passivo geral,

além do sujeito passivo particular existente em qualquer tipo de infração penal. O jus

puniendi pertence ao Estado (representando a sociedade), como uma das expressões

da soberania (exercício exclusivo pelo Estado, poder)”.

161TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 12 ed. atual. até a Lei 11.900 de 8 de janeiro de 2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 629. 162 Dicionário técnico jurídico / organização Deocleciano Torrieri. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Rideel, 2004. p. 375. 163 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 12 ed. atual. até a Lei 11.900 de 8 de janeiro de 2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 629. p. 05 164 ISHIDA, Válter Kenji. Processo penal : de acordo com a reforma processual. São Paulo: Atlas, 2009. p. 01.

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Tourinho Filho165, de forma sintética, leciona acerca da formação do jus

puniendi, bem como tal premissa, acima de tudo, é um dever imposto ao Estado.

[...] o Jus puniendi pode existir in abstrato e in concreto. Com efeito quando o Estado, por meio do Poder Legislativo, elabora as leis penais, cominando sanções àqueles que vierem a transgredir o mandamento proibitivo que se contém na norma penal, surge para eles o jus puniendi num plano abstrato e, para o particular, surge o dever de abster-se de realizar a conduta punível. Todavia, no instante em que alguém realiza a conduta proibida pela norma penal, àquele jus puniendi desce do plano abstrato para o concreto, pois, já agora, o Estado tem o dever de infligir a pena ao autor da conduta proibida. Surge, assim, com a prática da infração penal, "a pretensão punitiva". Desse modo, o Estado pode exigir que o interesse do autor da conduta punível em conservar a sua liberdade se subordine ao seu, que é o de restringir o jus libertatis com a inflição da pena. A pretensão punitiva surge, pois, no momento em que o "jus puniendi" in abstracto se transforma no "jus puniendi" in concreto.

Referindo-se ao jus puniendi e à ação penal, Afrânio da Silva Jardim166, afirma

que "no momento em que o Estado proibiu a vingança privada, assumiu o dever de

prestar jurisdição, monopolizando esta atividade pública".

Explicando o princípio em sua forma pura, Tourinho Filho167 diz que "os órgãos

incumbidos da persecução não podem possuir poderes discricionários para apreciar a

conveniência ou oportunidade da instauração do processo ou do inquérito".

Por fim, José Frederico Marques168 leciona que “Nos estados submetidos à lei e

ao direito, a pena só se aplica ‘processualmente’. A atividade punitiva dos órgãos

estatais encarregados de restaurar a ordem jurídica violada pelo crime submete-se a

um controle jurisdicional a priori, em que o Poder Judiciário aplica a norma penal

objetiva mediante a resolução de uma lide consubstanciada no conflito entre o direito de

punir e o direito de liberdade.”

165 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 12 ed. atual. até a Lei 11.900 de 8 de janeiro de 2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 629. p. 05. 166 JARDIM, Afrânio da Silva. Ação Penal Pública : Princípio da Obrigatoriedade. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 12. 167 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal . 32 ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 40. 168 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal . Volume I. Campinas : Bookseller, 1997. p. 26

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Portanto, o jus puniendi nada mais é do que o dever imposto ao Estado de

prestar a tutela jurisdicional, tendo este a obrigação de aplicar o direito de punir ao fato

delituoso.

2.3 DA PRISÃO PREVENTIVA

2.3.1 Conceito e natureza

Inicialmente, explica Antônio José Azevedo Pinto, “Com efeito, é a prisão

preventiva espécie do gênero prisão provisória, funcionando como medida de natureza

cautelar coercitiva de que se vale o Estado, para restringir a liberdade individual de

quem se ache, ao menos indicado em inquérito pela prática de fato considerado como

penalmente relevante.”169

No mesmo vértice, segue Capez170:

“Prisão cautelar de natureza processual decretada pelo juiz durante o inquérito

policial ou processo criminal, antes do trânsito em julgado, sempre que estiverem

preenchidos os requisitos legais e ocorrerem motivos autorizadores.”

Completa Rangel171 quando afirma que, “A prisão preventiva prevista nos arts.

311 usque 316 do CPP é uma modalidade de prisão cautelar de natureza processual e

deve sempre (e unicamente) ser decretada pelo juiz (característica da

jurisdicionalidade).”

169 PINTO, Antônio José Azevedo. A prisão cautelar no Brasil . Aspectos constitucionais e processuais penais. Rio de Janeiro: Liber Júris. 1987. p. 34. 170 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 277. 171 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 16 ed. rev. amp. e atual., de acordo com as reformas processuais penais e a Lei 11.900/09: Videoconferência. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 710.

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Para Nucci172, o “Conceito de prisão preventiva: é a medida cautelar de

constrição à liberdade do indiciado ou réu, por razões de necessidade, respeitados os

requisitos estabelecidos em lei.”

Por sua vez, Távora173 define que “É a prisão de natureza cautelar mais ampla,

sendo uma eficiente ferramenta de encarceramento durante toda a persecução penal,

leia-se, durante o inquérito policial e na fase processual.”

2.3.2 Pressupostos e fundamentos

Os pressupostos e fundamentos para a decretação da prisão preventiva

encontram-se previstos no art. 312 do CPP174, que assim dispõe:

“A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da

ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a

aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indícios

suficientes de autoria.”

Disso, Sidney Eloy Dalabrida175 ensina, como condição de admissibilidade à

prisão preventiva, aplicável, em regra, aos crimes dolosos punidos com reclusão, tanto

de ação pública quanto privada. Cabe, também, aos punidos por reclusão, quando o

réu for vadio, não possuir precisão de sua identidade e não fornecer elementos

suficientes para obtê-la. Cabe, ainda, quando o réu já tiver sido condenado em crime

doloso, com sentença transitada em julgado. Salienta-se, por fim, não ser cabível aos

crimes culposos, bem como às contravenções penais e, nos casos em que o acusado

se livrar solto.

172 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 622. 173 TÁVORA, Nestor e Rosmar Antonni. Curso de direito processual penal . 3 ed.rev. ampl. e ataul. Salvador: Jus Podivm. p. 477. 174 BRASIL. Código de processo penal . Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/Del3689Compilado.htm. Acesso em 26 de maio de 2010. 175 DALABRIDA, Sidney Eloy. Direito processual penal : v. 6. Florianópolis: OAB/SC, 2006. p. 135.

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“Para a decretação da preventiva é fundamental a demonstração de prova da

existência do crime, revelando a veemência da materialidade, e indícios suficientes de

autoria ou de participação na infração (art. 312, in fine, CPP).”176

Na disposição clara do art. 312 do CPP, a prova da existência material do crime é um dos pressupostos fundamentais para a imposição da prisão preventiva. A dizer que a certeza do crime deve estar cumpridamente demonstrada, no processo ou no inquérito, como condição de admissibilidade daquela medida cautelar. Logo, não bastam meros indícios ou simples presunção sobre a ocorrência do fato delituoso – a lei exige absoluta segurança quanto a essa realidade fática.177

“As finalidades da prisão preventiva, ou seus pressupostos, taxativamente

previstas em lei, são quatro: (a) garantia da ordem pública; (b) conveniência da

instrução criminal; (c) certeza de aplicação da lei penal; (d) garantia da ordem

econômica.”178

Ademais, Antônio Alberto Machado explica que, como requisito básico para a

decretação da prisão preventiva estão a certeza material do crime e os indícios de

autoria, que por sua vez tratam do fumus boni iuris ou, como autores preferem, fumus

commissi delict:

Entre os pressupostos legais da prisão preventiva estão a certeza material do crime e os indícios de autoria. Alguns autores afirmam que esses requisitos configuram autêntico fumus boni iuris para a decretação da prisão cautelar. Mas há quem critique o uso dessa expressão latina, largamente utilizada no processo civil, sob o argumento de que a prova de um crime, que é um fato eticamente negativo, não pode jamais ser identificada com o fato positivo que é a “fumaça do bom direito”. Esses preferem falar, então, num fumus commissi delicti, como requisito para a decretação da prisão preventiva.

Por se tratar de medida excepcional, a decretação da prisão preventiva,

segundo Mirabate179, “[...] não pode se adotada se ausentes os fundamentos legais, ou

seja, quando não estão presentes elementos que indiquem a sua necessidade. Deve

ela apoiar-se em fatos concretos que os embasem e não apenas hipóteses ou

176 TÁVORA, Nestor e Rosmar Antonni. Curso de direito processual penal . 3 ed.rev. ampl. e ataul. Salvador: Jus Podivm. p. 478. 177 MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal . 2 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 469 e 470. 178 MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal . 2 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 469 e 473 e 474. 179 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18 ed.rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005. São Paulo: Atlas, 2006. p. 392.

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conjecturas, ou gravidade do crime. Não se justifica apenas porque o acusado é mau

pagador, ou desonesto, ou desempregado, ou possui maus antecedentes”.

Dalabrida180 afirma que a decisão que decreta a prisão preventiva deve ser

devidamente motivada pelo Magistrado, demonstrando a presença de todos os

requisitos, sendo insuficiente apenas a reprodução literal da previsão legal.

Ressalta Mirabete181 que nos dias de hoje a prisão preventiva é “[...] uma

medida facultativa , devendo ser decretada apenas quando necessária segundo os

requisitos estabelecidos pelo direito objetivo. Embora providência de segurança,

garantia da execução da pena e meio de instrução, o seu emprego é limitado a casos

certos e determinados; não é ato discricionário e só pode ser decretada pelo juiz, órgão

imparcial cuja função é distribuir justiça”.

Portanto, a prova da existência do crime, e indícios suficientes de autoria

taxados no art. 312, do CPP, são os pressupostos da prisão preventiva, e, por sua vez,

os fundamentos são a garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência

da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal.

2.3.2.1 Garantia da ordem pública

Para Oliveira182, o fundamento de garantia da ordem pública não trata de

proteção ao processo, mas sim da própria coletividade:

Percebe-se, de imediato, que a prisão para garantia da ordem pública não se destina a proteger o processo penal, enquanto instrumento de aplicação da lei penal. Dirige-se, ao contrário, à proteção da própria comunidade, coletivamente considerada, no pressuposto de que ela seria duramente atingida pelo não-aprisionamento de autores de crimes que causassem intranqüilidade social.

180 DALABRIDA, Sidney Eloy. Direito processual penal : v. 6. Florianópolis: OAB/SC, 2006. p. 135. 181 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18 ed.rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005. São Paulo: Atlas, 2006. p. 389. 182 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo Penal . 11 ed. Atualizada de acordo com a Reforma Processual Penal de 2008 (Leis 11.689 e 11.719) e pela Lei 11.900 (novo interrogatório), de 08.01.09. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 452.

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Na garantia da ordem pública, a decretação da prisão cautelar, em crimes que

provoquem grande clamor público, visa impedir que o agente estando em liberdade

continue a delinqüir, trazendo acautelamento à sociedade, sedimentando a

credibilidade na justiça.183

“Entende-se pela expressão a necessidade de se manter a ordem na

sociedade, que, em regra, é abalada pela prática de um delito.”184

Entende Mirabete185, que, a decretação da prisão preventiva para garantir a

ordem pública está tanto ligada à gravidade do crime e à repercussão perante a

sociedade quanto à periculosidade do réu, protegendo-o da vítima ou da família desta.

Segundo Rangel186, quando fala-se em prisão em decorrência da ordem

pública, fala-se em paz e tranqüilidade social, sendo este o pressuposto que se parte

quando o indiciado ou acusado após cometer o delito, em liberdade continue a cometer

delitos perturbando a paz e harmonia, haverá assim perturbação da ordem pública.

Tratando-se de medida extrema, deve ser combinada com os demais requisitos legais

para sua eficácia. Ademais, ressalva o autor que não cabe resguardar a integridade

física do autor do delito, quando este for de clamor público, tolhendo-lhe a liberdade, eis

que, além de não ser pressuposto para o cárcere, é dever do Estado resguardar a

segurança e integridade física de todo e qualquer cidadão.

2.3.2.2 Garantia da ordem econômica

A garantia da ordem econômica, segundo a maioria dos doutrinadores, trata-se

de uma espécie do gênero anterior, qual seja, garantia da ordem pública.

183 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 279. 184 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 626. 185 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18 ed.rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005. São Paulo: Atlas, 2006. p. 391. 186 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 16 ed. rev. amp. e atual., de acordo com as reformas processuais penais e a Lei 11.900/09: Videoconferência. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 713.

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Ressalva Capez187, que esta hipótese em que pode ser decretada a prisão

preventiva foi incluída ao CPP pelo art. 86 da Lei 8.884, de 11 de junho de 1994,

denominada Lei Antitruste. Ademais, é uma repetição do requisito “garantia da ordem

pública”.

Conforme Nucci188, “Nesse caso, visa-se, com a decretação da prisão

preventiva, impedir o agente, causador de seríssimo abalo à situação econômico-

financeira de uma instituição financeira ou mesmo de órgão do Estado, permaneça em

liberdade, à sociedade impunidade reinante nessa área”.

Conforme o entendimento de Tourinho Filho189, trata-se de medida para evitar

abusos de ordem econômica, visando evitar a ganância. Ele, no entanto, acredita que a

melhor medida não é a decretação da prisão do agente, mas sim adotar outras sanções

diretas ao fato, como exemplo o fechamento da empresa por tempo determinado ou

bloqueando bens, confiscando lucros, eis que entende que, nesses casos, ao

ganancioso, é mais eficaz mexer no bolso.

2.3.2.3 Conveniência da instrução criminal

Tourinho Filho190 explica que é motivo para a decretação da prisão preventiva,

“[...] se o indiciado ou réu estiver afugentando testemunhas que possam depor contra

ele, se estiver subornando quaisquer pessoas que possam levar ao conhecimento do

Juiz elementos úteis ao esclarecimento do fato, peitando peritos, aliciando testemunhas

falsas, ameaçando vítima ou testemunhas, é evidente que a medida será necessária,

uma vez que, do contrário, o Juiz não poderá colher, com segurança, os elementos de

convicção de que necessitará para o desate do litígio penal”.

187 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 280. 188 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 630. 189 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 12 ed. atual. até a Lei 11.900 de 8 de janeiro de 2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 629. 190 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manuela de processo penal . 12 ed. atual. até a Lei 11.900 de 8 de janeiro de 2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 629.

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A conveniência da instrução criminal consuma-se na prevenção de possível

prejuízo ao andamento do processo. Afirma Oliveira191:

Por conveniência da instrução criminal há de se entender a prisão decretada em razão de perturbação ao regular andamento do processo, o que ocorrerá, por exemplo, quando o acusado, ou qualquer outra pessoa em seu nome, estiver intimidando testemunhas, peritos ou o próprio ofendido, ou ainda provocando qualquer incidente do qual resulte prejuízo manifesto para a instrução criminal.

Nucci192 explica que este pressuposto encontra-se embasado no equilíbrio, na

imparcialidade e lisura em que o processo penal deve estar sedimentado quando da

procura da verdade real, eis que é o maior interesse, tanto da acusação quanto do réu.

Portanto, os transtornos que podem ser causados pelo acusado no decorrer da

instrução criminal, quando este venha a prejudicar a colheita de provas ou até mesmo

intimidando testemunhas, são motivos que podem ensejar a prisão preventiva.

Machado193, por sua vez, afirma que fundamenta-se a preventiva quando o

autor do crime, quando em liberdade, prejudica a produção de provas:

Fala-se em ‘conveniência da instrução’, por exemplo, quando o autor do fato delituoso, em liberdade, possa causar algum embaraço à atividade probatória, seja desaparecendo com os vestígios que compõem o corpus delict, seja ameaçando eventuais testemunhas e peritos ou mesmo destruindo e inviabilizando outras fontes probatórias (documentos, coisas etc.).

Finalmente, para Rangel194, decreta-se a prisão por conveniência da instrução

criminal quando o autor do fato em liberdade venha ameaçar as testemunhas, ou até

mesmo o Juiz ou o Promotor de Justiça responsável pelo caso, quando tentar subornar

qualquer serventuário da justiça ou subtrair documentos necessários ao deslinde da

causa, entre outros. Tal cautelar tem como objetivo principal a garantia de um processo

justo e livre de perturbações por parte do acusado, levando ao magistrado a

possibilidade de formar sua convicção.

191 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo Penal . 11 ed. Atualizada de acordo com a Reforma Processual Penal de 2008 (Leis 11.689 e 11.719) e pela Lei 11.900 (novo interrogatório), de 08.01.09. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 451. 192 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 631. 193 MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal . 2 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 463.

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2.3.2.4 Para assegurar a aplicação da Lei Penal

Como ultimo fundamento da prisão preventiva elencado do art. 312, do CPP, a

segurança para a futura aplicação da lei penal em caso de sentença condenatória não é

o menos importante.

Oliveira traduz195, que “A prisão preventiva para assegurar a aplicação da lei

penal contempla as hipóteses em que haja risco pela de fuga do acusado e, assim,

risco de não aplicação da lei na hipótese de decisão condenatória.”

Para Nucci196, “significa garantir a finalidade útil do processo penal, que é

proporcionar ao Estado o exercício do seu direito de punir, aplicando a sanção devida a

quem é considerado autor da infração penal. [...] Exemplo maior disso é a fuga

deliberada da cidade ou país, demonstrando que não está nem um pouco interessado

em colaborar com a justa aplicação da lei”.

Capez197 explica que havendo a possibilidade do agente do crime evadir-se da

comarca em que responde, ou ainda, este não possuir residência fixa ou trabalho digno

no distrito da culpa, é hipótese para decretação de prisão preventiva:

No caso de iminente fuga do agente do distrito da culpa, inviabilizando a futura execução da pena. Se o acusado ou indiciado não tem residência fixa, ocupação lícita, nada, enfim, que o radique no distrito da culpa, há um sério risco para a eficácia da futura decisão se ele permanecer solto até o final do processo, diante da sua provável evasão.

Para Rangel198, trata-se de prisão a ser decretada ao autor da infração penal,

quando em liberdade e devidamente comprovado, livra-se de seu patrimônio para evitar

o ressarcimento dos eventuais prejuízos causados pelo crime perpetrado por este. Ou

194 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 16 ed. rev. amp. e atual., de acordo com as reformas processuais penais e a Lei 11.900/09: Videoconferência. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 713. 195 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo Penal . 11 ed. Atualizada de acordo com a Reforma Processual Penal de 2008 (Leis 11.689 e 11.719) e pela Lei 11.900 (novo interrogatório), de 08.01.09. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 451. 196 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 632. 197 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 280. 198 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 16 ed. rev. amp. e atual., de acordo com as reformas processuais penais e a Lei 11.900/09: Videoconferência. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 713 e 714.

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ainda, também devidamente comprovado, de que o réu tenta esconder-se ou até

mesmo fugir para não se submeter à eventual pena que lhe poderá ser imposta.

Finalmente, como foco desta pesquisa, a responsabilização do Estado em

decorrência de decretação de prisão preventiva, que em virtude de desconformidade

com a lei, resulte em prejuízo ao administrado, ressalta-se Tourinho Filho199, que

entende apenas como verdadeiras legítimas à decretação da prisão preventiva, a

conveniência da instrução e a necessidade de assegurar a aplicação da lei penal:

“Conveniência da instrução criminal e necessidade de assegurar a aplicação da

lei penal, eis que as verdadeiras legítimas circunstâncias que autorizam a decretação

da prisão preventiva. As demais, não. Atendem, apenas, a propósitos demagógicos.”

Tratou-se neste capítulo acerca da prisão preventiva nos seus pressupostos,

fundamentos, bem como os princípios que norteiam esta peculiar modalidade de prisão

cautelar. Faz-se necessário este entendimento para verificar quando e como uma

prisão preventiva encontra-se em desconformidade com a lei e, em decorrência disto,

resultar na responsabilização do Estado. Logo, demonstrado os elementos necessário

ao objeto da pesquisa, no capítulo seguinte tratar-se-á da responsabilidade do Estado

em decorrência desta modalidade de prisão cautelar.

199 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 12 ed. atual. até a Lei 11.900 de 8 de janeiro de 2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 781.

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3 RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR PRISÃO PREVENTIVA

INDEVIDA

3.1 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR

PRISÃO PREVENTIVA

Neste capítulo tratar-se-á da possibilidade de indenização por parte do Estado

em decorrência de prisão preventiva indevida. Qualquer ação provocada pelo Estado

que porventura cause dano à pessoa, estando esta ação ligada a uma ilegalidade,

omissão ou intransigência do poder público, é responsabilidade deste exaurir tal dano

indenizando o prejudicado.

O mesmo acontece quando o poder judiciário, ainda que, no uso de suas

atribuições, decreta ou mantém prisão preventiva sem observar os preceitos aqui

estudados.

3.1.1 Ação/omissão

Conforme já esclarecido no Capítulo I deste trabalho, a ação do Estado

manifesta-se pelos atos de seus agentes. O mesmo acontece no judiciário; para

decretar-se uma prisão preventiva deve haver manifestação pelo Estado por conta de

um Juiz devidamente competente para tanto, como visto no Capítulo II. Portanto, se em

virtude da ação do Estado causa-se dano a terceiro, deve este responsabilizar-se pelo

prejuízo causado por seus agentes.

“O Estado [...], como pessoa jurídica, desfruta apenas de uma realidade técnica,

somente podendo agir por intermédio de seus representantes, agentes ou prepostos” 200

200 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do estado. 3. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 80.

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Afirma Marcelo Alexandrino201 que o mais importante na caracterização da

responsabilidade Administrativa é o fato de o agente encontrar-se nessa condição

quando do cometimento do dano, eis que desta relação entre o agente e o Estado

estabelece-se quem agiu. Não importando se a ação foi dentro, fora ou além das suas

atribuições, quem responde é o Estado, objetivamente.

Por sua vez, relativamente ao tema, Luiz Antônio Soares Hentz202 entende que

“A responsabilidade pública por prisão indevida, no direito brasileiro, tem seu

fundamento na legislação constitucional (art. 5º, LXXV). A responsabilidade existe ex vi

legis e, por decorrer diretamente da lei, não se depende de sua ocorrência estar ligada

a ato de qualquer agente público. É uma causa objetiva de indenização, promanada

diretamente da Constituição Federal”.

Completa, ainda o autor, que a fonte primeira da responsabilidade civil do

Estado é o agente público, exteriorizando-se por meio de atos administrativos, de fatos

administrativos e de omissões. Também pode-se dizer que há responsabilidade do

Estado quando a falha é oriunda de equipamento que a Administração Pública utiliza

nas suas atividade, enfim, falha de máquinas, sem culpa ou dolo dos agentes

responsáveis.203

O conceito de agente público, para Edmir Netto de Araújo204, consiste em “[...]

todo aquele que, sob qualquer categoria ou título jurídico desempenha atividade

considerada como pertinente à condição ou prerrogativa de Poder Público, quer em

virtude de relação de trabalho, quer em razão de encargo ou contrato, quer ainda

tendo-se em vista qualquer função de natureza pública, será agente público durante o

período de tempo em que perdure tal situação”.

O mesmo autor, acerca do Magistrado como agente público:

“Assim, o magistrado, ao exercer sua função em geral, estará desempenhando

atividade pertinente à competência privativa do Estado de aplicar contenciosamente a

201 ALEXANDRINO, Marcelo. Direito administrativo . 15 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 478. 202 HENTZ, Luiz Antonio Soares. Indenização da Prisão Indevida : Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Universitária de Direito, 1996. p. 134. 203 HENTZ, Luiz Antonio Soares. Indenização da Prisão Indevida : Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Universitária de Direito, 1996. p. 145. 204 ARAÚJO, Edmir Netto de. Responsabilidade do Estado por ato jurisdicional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 43-44.

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lei a casos particulares, além das atividades administrativas que exerce. É, portanto,

Agente Público.”205

Segundo Di Pietro206, agente é aquele que presta serviço ao Estado, o mesmo

cabendo ao Magistrado que causar dano no exercício da sua função, denominando-se

tal responsabilidade do Estando por ato jurisdicional.

Quanto aos danos provocados no exercício da jurisdição, ressalta Araújo207

que, “[...] não só a decisão como momento processual pode causar dano ou

perecimento de direitos do administrado. A atividade defeituosa do juiz pode também

ocorrer em outros momentos das fases lógicas do processo judicial, causando

igualmente lesões em muitos casos irrecuperáveis aos direitos dos particulares, que

tornarão inócua ou inoperante a decisão que for depois prolatada.”

Ressalta Hentz208 que, havendo prejuízo causado por esta ação do Estado, por

preceito de justiça, deve este reparar tal dano:

“[...] sendo o Estado o agente provocador da lesão de direito, um sentimento de

justiça social lhe impõe a obrigação de indenizar, estando ínsita nessa expressão a

idéia de que a justiça não se realizará se alguma espécie de dano ficar sem reparação.”

Segundo Mello209, determina-se a responsabilidade objetiva do Estado

levantando-se uma relação casual entre o evento danoso e o dano em si.

São algumas ações ou omissões do Poder judiciário que causam dano e geram

a responsabilização do Estado pela prisão preventiva, o abuso de autoridade, o erro

judiciário, a prisão sem respeitado um prazo razoável e a não observância ao princípio

da proporcionalidade.

205 ARAÚJO, Edmir Netto de. Responsabilidade do Estado por ato jurisdicional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 51. 206 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo . 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 624 207 ARAÚJO, Edmir Netto de. Responsabilidade do Estado por ato jurisdicional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 84. 208 HENTZ, Luiz Antonio Soares. Indenização da Prisão Indevida : Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Universitária de Direito, 1996. p. 149.

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3.1.1.1 Abuso de autoridade

Os casos que constituem abuso de autoridade, interessante a este trabalho,

encontram-se previstos nos artigos 3º e 4º da Lei 4.898/1965, sendo o primeiro acerca

à liberdade de locomoção e o segundo quanto às ações que caracterizam o abuso.

A alínea “a” do art. 3º da supracitada lei apresenta, ou estabelece o fundamento

para a responsabilização do Estado pela supressão ao direito à liberdade de

locomoção:

“Art. 3º - Constitui abuso de autoridade qualquer atentado: a) à liberdade de locomoção;”

As alíneas “a”, “c”, “d”, “e”, e, principalmente a aliena “i”, incluída pela Lei nº 7.960, de 21 de dezembro 1989, do art. 4º prescrevem as ações que constituem o abuso de autoridade:

Art. 4º Constitui também abuso de autoridade: a) ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder; [...] c) deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão ou detenção de qualquer pessoa; d) deixar o juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja comunicada; e) levar à prisão e nela deter quem quer se proponha a prestar fiança, permitida em lei; [...] i) prolongar a execução da prisão temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade210

Explica Capez211, acerca da Lei 4.898/1962:

“[...] regula o direito de representação e o processo de responsabilidade

administrativa, civil e penal, nos casos de abuso de autoridade. Por isso, é conhecida

como Lei de Abuso de Autoridade.”

O mesmo autor afirma que abuso de autoridade consiste na prática por órgão

público, no exercício de suas atribuições, de atos que vão além dos limites destas,

209 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo . 22. ed. rev., atual. e ampl. até emenda Constitucional 53, de 19.12.2006. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 970. 210 BRASIL. Lei nº 4.898, de 09 de dezembro de 1695, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4898.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010.

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prejudicando a outrem. São três os pressupostos para a existência de abuso de

autoridade: a) que o ato praticado seja ilícito; b) que seja praticado por funcionário

público no exercício de suas funções; c) que não tenha motivo que o legitime.212

3.1.1.2 Restrição ao direito à liberdade de locomoção

No que tange à liberdade de locomoção a CRFB/88, protege tal princípio,

primeiramente no caput do art. 5º e, no inciso XV, que garante a liberdade de

locomoção no território nacional, no inciso LXI, que prescreve a presunção de

inocência, assegurando que ninguém será preso, exceto em flagrante delito ou por

ordem escrita e fundamentada de autoridade competente; também, por meio de

garantias, o inciso LIV garante o devido processo legal para poder restringir a liberdade,

o inciso LXVII, prevê o habeas corpus e, por fim, o inciso LXV, positiva o relaxamento

de prisão.

A previsão da responsabilização do Estado por ofensa ao direito à liberdade

está no art. 954 do CC/2002213:

Art. 954 - A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá no pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e se este não puder provar prejuízo, tem aplicação o disposto no parágrafo único do artigo antecedente. Parágrafo único. Consideram-se ofensivos da liberdade pessoal: I - o cárcere privado; II - a prisão por queixa ou denúncia falsa e de má-fé; III - a prisão ilegal.

O Estado tem o dever de indenizar qualquer pessoa que sofra restrição à sua

liberdade em decorrência de ato abusivo de autoridade, servindo como forma tanto de

211 CAPEZ, Fernando. Legislação penal especial : lei de imprensa, crimes hediondos, abuso de autoridade, sonegação fiscal, tortura, terrorismo. V. 1. 4. Ed. São Paulo: Damásio de Jesus, 2005. p. 135. 212 CAPEZ, Fernando. Legislação penal especial : lei de imprensa, crimes hediondos, abuso de autoridade, sonegação fiscal, tortura, terrorismo. V. 1. 4. Ed. São Paulo: Damásio de Jesus, 2005. p.143. 213 BRASIL. Código Civil , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010.

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coibir tal prática, como, principalmente, de compor o dano desta advindo, explica

Cahali214:

Em verdade, impõe-se ao Estado de Direito o reforço da garantia dos direitos individuais do cidadão, devendo ser coibida a prática de qualquer restrição injusta à liberdade individual, decorrente de ato abusivo da autoridade judiciária, e fazendo resultar dela a responsabilidade do Estado pelos danos causados.

Conclui-se, daí, que a liberdade de locomoção é garantia Constitucional. A

regra é o indivíduo viver livremente, desfrutando do seu direito de ir e vir, ressalvados

os casos previstos em lei, nos quais a prisão preventiva tem sustentáculo. A não

observância destes limites possibilita a indenização por parte da Administração ao

administrado.

3.1.1.3 Ofensa ao direito à personalidade

O direito à personalidade tem sua previsão no inciso X, do art. 5º, da

CRFB/88215, que assim dispõe:

“X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das

pessoas, assegurado o direito a indenização por dano material ou moral decorrente de

sua violação”.

Assim, afirma Diniz216, que “A fim de satisfazer suas necessidades nas relações

sociais, o homem adquire direitos e assume obrigações, sendo, portanto, sujeito ativo e

passivo de relações jurídico-econômicas. O conjunto dessas situações jurídicas

individuais, suscetíveis de apreciação econômica, designa-se patrimônio, que é sem

dúvida a projeção econômica da personalidade. Porém, a par dos direitos patrimoniais,

a pessoa tem direitos da personalidade”.

214 CAHALI, Yussef Said. Dano Moral . 3. ed. rev. ampl. e atual. conforme o Código Civil de 2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 775. 215 BRASIL. Constituição Federal, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 216 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : responsabilidade civil. V. 7. 23. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 74.

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Vinícius Luiz Albrecht217 ensina que, o “cidadão brasileiro tem assegurado por

força de norma constitucional – cláusula pétrea – o direito à inviolabilidade da imagem,

da vida privada, da honra e de uma gama de direitos que se difundem sobre o conceito

de direitos fundamentais. Em lhe sendo agredido qualquer destes direitos, lhe é

assegurado, pela mesma norma, o direito de ser reparado, não somente pelos prejuízos

materiais, mas também daqueles chamados de extra patrimoniais, que certamente

socorrem ao cidadão mantido injustamente preso.”

Ainda, tal a importância de tal princípio, sua previsão no CC/2002218 deu origem

ao Capítulo II (Dos Direitos da Personalidade), do Título I, do Livro I, abrangendo os

arts. 11, ao 21, destacando-se o art. 12, que assim dispõe:

“Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da

personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas

em lei.”

Logo, a prisão preventiva, se decretada em desconformidade com a lei, viola o

direito à personalidade, legitimando o ofendido a ressarcir-se desta mácula à sua

imagem.

3.1.1.4 Inobservância ao princípio da proporcionalidade

Segundo Norberto Flach219, a importância da adoção do princípio da

proporcionalidade encontra-se no controle tanto da constitucionalidade da leis quanto

nos atos administrativos que restrinjam direitos e garantias fundamentais.

Ressalta Fábio Ramazzini Bechara220 que “O princípio da proporcionalidade,

porquanto se trata de um princípio constitucional e derivado dos valores que norteiam o

regime democrático, tem indiscutivelmente a sua incidência no processo penal. A noção

217 ALBRECHT, Vinicius Luiz. Responsabilidade Civil do Estado : o dever de indenizar a vítima de prisão injusta. Julho, 2004. p. 152. 218 BRASIL. Código Civil , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 219 FLACH, Norberto. Prisão Processual Penal : Discussão à luz dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da segurança jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p . 31.

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do princípio está diretamente associada à garantia constitucional da igualdade,

notadamente a igualdade matéria, na medida em que propicia a eliminação dos

obstáculos e das diferenças que caracterizam as situações de desigualdade, gerando

um tratamento justo e equilibrado”.

Lopes Júnior221 exclama que, “Definido como o princípio dos princípios, a

proporcionalidade é o principal sustentáculo das prisões cautelares”.

O autor Paulo Rangel222, muito embora se utilize da expressão homogeneidade

no lugar de proporcionalidade, entende a necessidade de observar com cautela tal

preceito frente à severidade em que a decretação de prisão preventiva possa causar

em relação ao objeto da sanção:

A medida cautelar a ser adotada deve ser proporcional a eventual resultado favorável ao pedido do autor, não sendo admissível que a restrição à liberdade, durante o curso do processo, seja mais severa que a sanção que será aplicada caso o pedido seja julgado procedente. A homogeneidade da medida é exatamente a proporcionalidade que deve existir entre o que está sendo dado e o que será concedido. Exemplo: admite-se prisão preventiva em um crime de furto simples? A resposta é negativa. Tal crime, primeiro, permite a suspensão condicional do processo. Segundo, se houver condenação, não haverá pena privativa de liberdade face à possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos. Nesse caso, não haveria homogeneidade entre a prisão preventiva a ser decretada e eventual condenação a ser proferida. O mal causado durante o curso do processo é bem maior do que aquele que, possivelmente, poderia ser infligido ao acusado quando de seu término.

A não observância ao princípio da proporcionalidade quando da segregação

preventiva pode violar algumas garantias fundamentais do ofendido, quais sejam, o

direito à personalidade, da dignidade da pessoa humana, e o direito a liberdade de

locomoção.

Ademais, diretamente ligado ao princípio da proporcionalidade está a

razoabilidade do prazo na prisão preventiva.

220 BECHARA, Fábio Ramazzini. Prisão Cautelar . São Paulo: Malheiros, 2005, p. 141. 221 LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal : e sua Conformidade Constitucional. V. 2. 2 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 67.

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3.1.1.5 Prazo (i)razoável

Decorrente da inobservância ao princípio da proporcionalidade, a razoabilidade

do prazo nas prisões cautelares, e por sua vez, nas preventivas é imperativo, vez que

não se pode admitir que esta supressão da liberdade de caráter cautelar extrapole,

primeiramente o limite razoável de duração do processo, e segundo, transforme-se

numa antecipação da aplicação da pena que, porventura, possa ser aplicada ao delito.

O art. 5º, inciso LXXVII, da CRFB/88223, prescreve:

“a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável

duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”

Conforme visto no Capítulo II deste trabalho, a prisão preventiva tem caráter de

provisionalidade, portanto, o fator tempo deve ser considerado. Ou seja, de breve

duração, e, assim não sendo, o que deveria ser provisório acaba sendo uma pena

antecipada.224

No entanto, explica Aury Lopes Júnior que no sistema jurídico brasileiro “Reina

absoluta indeterminação acerca da duração da prisão cautelar, pois em momento

algum foi disciplinada essa questão”. Ademais, completa o mesmo autor que no caso

de prisão preventiva não há qualquer previsão de prazo razoável, podendo o

Magistrado manter a segregação enquanto entender existir o periculum libertatis.225

Por seguinte, o art. 400, do CPP, prescreve que o procedimento comum

ordinário realizará a audiência de instrução e julgamento no prazo máximo de 60

(sessenta dias), e o art. 648, II, do mesmo diploma, considera uma coação ilegal estar

alguém preso por mais tempo do que determina a lei.

222 RANGEL, Paulo. Direito processual penal . 9. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 596. 223 BRASIL. Constituição Federal, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 224 LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal : e sua Conformidade Constitucional. V. 2. 2 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 61. 225 LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal : e sua Conformidade Constitucional. V. 2. 2 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 62.

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O prazo do art. 400 do CPP, segundo Tourinho Filho226, é aquele que o

legislador prescreveu para ser o prazo de conclusão da instrução criminal. No entanto,

diante da grande quantidade de processos nas Varas Criminais, bem como em

decorrência dos pedidos de diligências e cartas precatórias, dificilmente um processo

finda-se em até 120 (cento e vinte) dias, ou seja, o dobro do previsto em lei.

Por sua vez, explica Nucci227, muito embora haja um prazo para concluir-se a

instrução criminal, não há um prazo determinado para a duração dessa modalidade de

prisão cautelar, não devendo perdurar, por lógica, após uma eventual sentença

absolutória. Completa ainda que, estando o investigado ou réu preso, deve ter o

procedimento acelerado para que este não fique detido por mais tempo do que o

razoável.

No mesmo sentido decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF)228 em

jurisprudência, que entende que o excesso de prazo é peculiar a cada caso em

concreto, devendo o magistrado atentar-se à razoável duração do processo:

HC N. 93.786-ES RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO EMENTA: HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO. INSTRUÇÃO CRIMINAL INCONCLUSA. AUDI¬ÇÃO DAS TESTEMUNHAS DA DEFESA. CARTA PRECATÓRIA NÃO-CUMPRIDA. INÉRCIA DO PODER JUDICIÁRIO. ALONGAMENTO PARA O QUAL NÃO CONTRIBUIU A DEFESA. A GRAVIDADE DA IMPUTAÇÃO NÃO OBSTA O DIREITO SUBJETIVO À RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. 1. O Supremo Tribunal Federal entende que a aferição de eventual excesso de prazo é de se dar em cada caso concreto, atento o julgador às peculiaridades do processo em que estiver oficiando. 2. No caso, a prisão preventiva do paciente foi decretada há mais de oito anos, sendo que nem sequer foram ouvidas as testemunhas arroladas pela defesa. Embora a defesa haja insistido na oitiva de testemunhas que residem em comarca diversa do Juízo da causa, nada justifica a falta de realização do ato por mais de cinco anos. A evidenciar que a demora na conclusão da instrução criminal não decorre de “manobras protelatórias defensivas”. 3. A gravidade da imputação não é obstáculo ao direito subjetivo à razoável duração do processo (inciso LXXVIII do art. 5º da CF). 4. Ordem concedida. (STF HC 93.786- ES).

226 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal . 31. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva. 2009. p. 71. 227 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. ps. 1049 e 1050. 228 STF. HC nº 93.786-ES. Rel. Min. Carlos Britto. publ. 31/10/2008, Acesso em: 18 de maio de 2010. Disponível em: https://www.stf.jus.br/arquivo/djEletronico/DJE_20081030_206.pdf.

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Deste norte, já que não há previsão de um prazo razoável para a prisão

preventiva, fica a critério do Magistrado ponderar acerca do tempo que o acusado ficará

preso, bem como, em garantir a celeridade do processo.

3.1.1.6 Erro judiciário

Luiz Antônio de Camargo, “Buscando conceituar o ‘erro judiciário’, não pode ser

outra a definição, senão ‘aquele que decorre de toda atividade judicial danosa,

enquanto exercício da função relativa ao Poder Judiciário’.”229

Stoco230, trata do erro judiciário como uma má subsunção do fato em relação à

lei em vigor ao mesmo período, bem como “erro de perspectiva ou falsa percepção dos

fatos”.

Devemos ainda ressaltar que erro judiciário, diferentemente do entendimento de

muitos, não recai apenas à jurisdição criminal, mas sim a qualquer atividade judicial em

qualquer esfera. É o que leciona Luís Antônio de Camargo231:

É enfim o erro judiciário decorrência, de todo e qualquer erro in procedendo ou in judicando que ocorreu em quaisquer esferas processuais, processos cíveis, criminais, trabalhistas, etc. sendo certo, entretanto, de que seja lá onde se instale o erro em questão, capaz de causar dano ao jurisdicionado, por óbvio ele irá se valer do processo civil como meio instrumental de permitir-lhe a justa reparação, fundada no direito material próprio.

Aguiar Dias apud Cahali232 no mesmo sentido, afirma que comumente o erro

judiciário é ligado à sentença criminal que injustamente condena alguém; no entanto,

num sentido mais amplo, pode-se afirmar que tal definição também é cabível na prisão

preventiva injustificada, não podendo excluir o direito de reparação. Portanto, se há erro

229 CAMARGO, Luiz Antônio de. A responsabilidade civil do estado e o erro judiciá rio. Porto Alegre: Síntese, 1999. p. 71. 230 STOCO, Rui. Responsabilidade do estado por erro judiciário . Revista Brasileira de Ciêcnias Criminais. ano 6, n. 21 (jan/mar 1998). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 90. 231 CAMARGO, Luiz Antônio de. A responsabilidade civil do estado e o erro judiciá rio. Porto Alegre: Síntese, 1999. ps. 70 e 71 232 CAHALI, Yussef Said. Dano Moral . 3. ed. rev. ampl. e atual. conforme o Código Civil de 2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 775.

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judiciário decorrente de sentença condenatória, também há em virtude da prisão

preventiva.

Ressalva Stoco233 que, o erro judiciário pode ser corrigido por outro julgado

superior, através de Revisão Criminal, medida específica e criada para tal fim prevista

no art. 621 do CPP. Saliente ainda, que se deve ter “[...] em mente que corrigir o erro

através da revisão não é o mesmo que reparar o erro, no sentido civilístico da palavra, o

que só se consegue no Juízo Cível, após a declaração dessa circunstância”.

No entendimento de José de Aguiar Dias234, "ordinariamente, considera-se erro

judiciário a sentença criminal de condenação injusta. Em sentido mais amplo, a

definição alcança, também, a prisão preventiva injustificada".

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Rui Stoco235 afirma:

“Nada justifica - hoje - excluir da possibilidade do erro, no sentido genérico a

que se refere a Carta Magna, qualquer tipo de prisão, seja definitiva, decorrente de

sentença; seja ela, ainda, preventiva, cautelar ou provisória".

O erro judiciário é oriundo da atividade judicial danosa que declara direito a um

caso em concreto sob falsa percepção dos fatos, e é, portanto, cabível à decisão que

decreta prisão preventiva, que igualmente, injustificada, não fundamenta ou por culpa

do agente, prejudique o tutelado.236

233 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurispru dencial : doutrina e jurisprudência. 4. ed. rev., atualizada e ampl., 2. tir. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 541. 234 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil . Vol. 1 e 2. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p.327 235 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurispru dencial : doutrina e jurisprudência. 4. ed. rev., atualizada e ampl., 2. tir. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 542. 236 PANTALEÃO, Juliana Fogaça. Indenização por erro judiciário e prisão indevida . Revista IOB de Direito Administrativo. v. 4, n. 44 (ago 2009). São Paulo: IOB, 2009. ps. 39 e 39.

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3.1.2 Dano

O dano segundo Diniz237, “[...] é um dos pressupostos da responsabilidade civil,

contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver ação de indenização sem a

existência de um prejuízo”.

Carlos Alberto Bittar apud Diniz238, ensina que o “[...] dano é prejuízo ressarcível

experimentado pelo lesado, traduzindo-se, se patrimonial, pela diminuição patrimonial

sofrida por alguém em razão de ação deflagrada pelo agente, mas pode atingir

elementos de cunho pecuniário e moral. O dano pode referir-se à pessoa ou aos bens

de terceiro (inclusive direitos), nos dois sentidos enunciados, patrimonial e moral – e em

ambos – mas, especialmente nessa última hipótese, deve ser determinado consoante

critério objetivo, como pondera Barassi, e provado em concreto”.

“Nesses termos, poderíamos conceituar o dano ou prejuízo como sendo a lesão

a um interesse jurídico tutelado – patrimonial ou não -, causado por ação ou omissão do

sujeito infrator.”239

Hentz240, na sua obra acerca do assunto, destaca que “A prisão indevida é

passível de gerar os danos patrimonial e moral, sem dúvida, mas nem só nesses se

encerram os danos passíveis de serem sentidos por aquele que sofre a perda da sua

liberdade física indevidamente. A natureza da liberdade pessoal e a sua importância

para o homem faz gerar um prejuízo especial a sua perda, impondo ao Estado a

responsabilidade de indenizar também o dano pessoal em que se consubstancia tal

perda”.

237 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : responsabilidade civil. V. 7. 23. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 61. 238 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : responsabilidade civil. V. 7. 23. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 63. 239 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil . V. 3., 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 36. 240 HENTZ, Luiz Antonio Soares. Indenização da Prisão Indevida : Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Universitária de Direito, 1996. p. 149.

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“O prejuízo sofrido pela pessoa na sua alma, no seu corpo ou nos seus bens

[...] se traduz, no Direito, em prejuízo sofrido pelo sujeito de direitos em conseqüência

da violação destes por fato alheio.”241

O dano decorrente da ação do Estado, conforme visto anteriormente, enseja a

composição deste, ademais, o nexo causalidade é pressuposto necessário a

caracterização desta responsabilidade, vez que é o elo de ligação entre o prejuízo e a

atividade estatal.

3.1.3 Nexo de causalidade

Primeiramente, o conceito prático de nexo causal por Mácia Andrea Bühring242:

A palavra nexo significa ligação, vínculo, união, elo. A palavra causalidade significa relação de causa e efeito. Assim, o nexo de causalidade, ou nexo causal, é a ligação entre a atividade do Estado e o dano sofrido pelo administrado.

Luiz Antônio de Camargo243 explica que “[...] a relação de causalidade, causal

connexion, é o laço ou relação direta de causa e efeito entre o fato gerador da

responsabilidade e o dano, sendo a causalidade o necessário e não a simples

coincidência entre o dano e o procedimento do imputado responsável”.

Completa ainda o mesmo autor que, mesmo tratando-se de responsabilidade

objetiva ou subjetiva, o importante é que não existe responsabilidade civil se não

houver relação de causalidade entre o fato lesivo e o injusto dano.244

Como parte fundamental da responsabilidade civil, seja objetiva ou subjetiva, é

pressuposto da obrigação de reparar o dano, moral ou não, o nexo de causalidade

241 HENTZ, Luiz Antonio Soares. Indenização da Prisão Indevida : Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Universitária de Direito, 1996. p. 149. 242 BÜHRING, Márcia Andrea. Responsabilidade extracontratual do estado . São Paulo: Thomson-IOB, 2004. p. 120. 243 CAMARGO, Luiz Antônio de. A responsabilidade civil do estado e o erro judiciá rio. Porto Alegre: Síntese, 1999. p. 25. 244 CAMARGO, Luiz Antônio de. A responsabilidade civil do estado e o erro judiciá rio. Porto Alegre: Síntese, 1999. p. 25.

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entre a ação ou omissão voluntária e o resultado danoso, estando tal regra prevista no

art. 186, do CC/2002.245

Por se tratar de elemento indispensável à fixação da obrigação de indenizar,

aduz Agostinho Alvin246 que “[...] o dano só pode gerar responsabilidade quando seja

possível estabelecer um nexo causal entre ele e o seu autor, ou como diz Savatier, ‘um

dano só produz responsabilidade, quando ele tem por causa uma falta cometida ou um

risco legalmente sancionado’ (cf. Traité de la Responsabilité Civile em Droit Français,

vol. II, nº 456).”

Não obstante, afirma Venosa247:

O conceito de nexo causal, nexo etiológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável não há como ser ressarcida.

Nexo de causalidade, portanto, é fundamental para a averiguação e a

constatação da responsabilidade estatal, vez que trata-se do elemento básico da

formação do vínculo entre a atividade estatal (jurisdicional) e o dano produzido ao

administrado (prisão indevida).

245 CAHALI, Yussef Said. Dano Moral . 3. ed. rev. ampl. e atual. conforme o Código Civil de 2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 810. 246 ALVIN, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências . 4ª ed. Atual. São Paulo: Saraiva, 1972. p. 340. 247 VENOSA, Silvio da Salvo. Direito civil : responsabilidade civil. v. 4., 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 47 e 48.

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3.2 – CAUSAS QUE PODEM ACARRETAR INDENIZAÇÃO

Tratar-se-á neste item as causas que podem acarretar indenização ao ofendido

pela prisão preventiva, bem como, o entendimento jurisprudencial dos Tribunais

brasileiros acerca dos aspectos que geram e admitem a responsabilização do ente

público.

Dentre muitas outras causas possíveis, destacam-se a prisão preventiva

decretada por autoridade incompetente, prisão preventiva sem a devida

fundamentação, prisão preventiva decretada sem a observância dos requisitos da lei,

prisão preventiva de homônimo, prisão motivada por mandado já revogado e por fim

prisão preventiva e posterior absolvição.

3.2.1 – Prisão preventiva decretada por autoridade incompetente

Inicialmente faz-se necessário conceituar competência. Destaca-se, portanto, o

ensinamento exarado por Capez248:

“Em poucas palavras, competência é a delimitação do poder jurisdicional (fixa

os limites dentro dos quais o juiz pode prestar jurisdição). Aponta quais os casos que

podem ser julgados pelo órgão do Poder Judiciário. É, portanto, uma verdadeira medida

da extensão do poder de julgar.”

Segundo a doutrina tradicional esta competência divide-se em três aspectos

diferente, que coincidem com o supracitado artigo, eis que, no inciso III, caracteriza-se

em razão da natureza do crime praticado (ratione materiae), inciso VII, prescreve a

competência de acordo com a qualidade das pessoas incriminadas (ratione personae),

e incisos I e II, verifica-se de acordo com o local em que foi consumado o crime, bem

como a residência do autor (ratione loci).249

248 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 208. 249 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. ps. 208 e 209.

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Segundo Mirabette, excetuando a hipótese do flagrante delito, a prisão só pode

ser decretada por decisão fundamentada de autoridade judiciária competente. Podendo

ocorrer ilegalidade da prisão pela falta de competência em razão do lugar, em razão da

matéria ou por prerrogativa de função250.

Caracteriza-se constrangimento ilegal quem ordena a constrição à liberdade

sem competência a tanto. É o ensinamento de Nucci251.

O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC)252 em jurisprudência

assim manifestou-se:

Habeas corpus. Prisão preventiva decretada por Juiz incompetente - Nulidade (art. 567, CPP). Por ser ato eminentemente decisório, pois exige fundamentação (art. 315 do CPP), é recorrível, no caso de indeferimento (art. 581, V, CPP)e atinge o status libertatis, manter a prisão seria, ademais, sobrepor-se ao princípio constitucional de que ninguém será preso sem "ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente" (CF, art. 5o., inciso LXI). Ordem concedida.

Portanto, a prisão preventiva decretada por autoridade incompetente é nula,

podendo caracterizar ofensa ao princípio da presunção de inocência e constrangimento

ilegal.

3.2.2 – Prisão preventiva sem fundamento nos requisitos da lei

O artigo 93, inciso IX, da CRFB/88253, prescreve que todas as decisões dos

órgãos do Poder Judiciário serão fundamentadas sob pena de nulidade.

Ainda, ressalta-se que a previsão constitucional encontra respaldo na legislação

Processual Penal, no artigo 315, do CPP254, que assim dispõe:

250 MIRABETTE, Julio Fabbrini. Processo Penal . 18. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2006. p. 752. 251 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 1064. 252 TJSC - Habeas Corpus: nº 1988.046136-4 Rel. Thereza Tang Julgamento: 31/05/1991, Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/3728681/habeas-corpus-hc-461364-sc-1988046136-4-tjsc. Acesso em: 27/05/2010.

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“O despacho que decretar ou denegar a prisão preventiva será sempre

fundamentado”.

Sustenta Meirelles que o ato judicial típico, que é a sentença ou decisão, enseja

responsabilidade civil da Fazenda Pública, nas hipóteses do art. 5º, LXXV, da CFRB/88.

Nos demais casos, tem prevalecido no STF o entendimento de que ela não se aplica

aos atos do Poder Judiciário e de que o erro judiciário não ocorre quando a decisão

judicial está suficientemente fundamentada e obediente aos pressupostos que a

autorizam.255

Quanto a necessidade dos requisitos da lei quando da decretação da prisão

preventiva é a garantia de que não violar-se-á o princípio da presunção de inocência,

nem, tão pouco, torne-se esta uma execução antecipada da pena. É o que explica

Capez256:

Sem preencher os requisitos gerais da tutela cautelar (fumus boni júris e periculum in mora), sem necessidade para o processo, sem caráter instrumental, a prisão provisória, da qual a prisão preventiva é espécie, não seria nada mais que uma execução da pena privativa de liberdade antes da condenação transitada em julgado, e isso, sim, viola o princípio da presunção de inocência.

A fundamentação da prisão preventiva, segundo Nucci257, é exigência

constitucional, e por sua vez, “[...] é indispensável que o magistrado apresente suas

razões para privar alguém de sua liberdade.”

Tanto, que assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ)258:

PRISÃO EM FLAGRANTE (TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS). LIBERDADE PROVISÓRIA (INDEFERIMENTO). FUNDAMENTAÇÃO (GRAVIDADE DOS FATOS E VEDAÇÃO LEGAL). COAÇÃO (EXISTÊNCIA). SENTENÇA CONDENATÓRIA (SUPERVENIÊNCIA). APELAÇÃO EM LIBERDADE (POSSIBILIDADE). 1. Sendo lícito ao juiz,

253 BRASIL. Constituição Federal, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/constituiçao_compilado.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 254 BRASIL. Código de processo penal . Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/Del3689Compilado.htm. Acesso em 26 de maio de 2010. 255 MEIRELLES, Helly Lopes. Direito administrativo brasileiro . 35. ed. atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 665. 256 CAPEZ, Fernando. Processo penal : noções gerais. 17 ed. São Paulo: Ed. Damásio de Jesus, 2007. p. 185. 257 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 635. 258 STJ - HC nº 102973 / SP. 6ª Turma. Rel. NILSON NAVES. publ. 16/06/2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp. Acesso em: 13 de maio de 2010.

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no caso de prisão em flagrante, conceder ao réu liberdade provisória (Cód. de Pr. Penal, art. 310, parágrafo único), o seu ato, seja ele qual for, não prescindirá de fundamentação. 2. Toda e qualquer prisão que tenha caráter de medida cautelar há de vir, sempre e sempre, efetivamente fundamentada. É o sistema – decorre das normas que informam o ordenamento jurídico brasileiro. 3. Se o indeferimento da liberdade provisória está apoiado na gravidade dos fatos, tal aspecto é insuficiente para justificar, a contento, a manutenção de medida de índole excepcional. 4. Também não é suficiente, evidentemente, a reportação, e simples, ao frio texto da lei (por exemplo, ao art. 44 da Lei nº 11.343/06), porque, se assim fosse, a prisão provisória passaria a ter caráter de prisão obrigatória, e não é esse o seu caráter. 5. Admite-se a liberdade provisória, mesmo que se trate de crime inafiançável. 6. Caso no qual o ato judicial que indeferiu a liberdade provisória carece de suficiente motivação; falta-lhe, portanto, validade, decorrendo daí ilegal coação. 7. Do mesmo modo, se à superveniente sentença penal condenatória falta persuasiva motivação, o melhor dos entendimentos é o de que o réu poderá, em liberdade, aguardar o julgamento da apelação. 8. Habeas corpus concedido. (STJ. HC nº 102973 / SP. 6ª Turma. Rel. NILSON NAVES. publ. 16/06/2009)

Destaca-se o Informativo nº 242 do STF259 acerca da necessidade de plena

fundamentação na decretação da prisão preventiva:

Considerando que a gravidade em abstrato do delito e o risco, em tese, de que os pacientes possam evadir-se ou ameaçar testemunhas não bastam, por si sós, para justificar a manutenção da custódia cautelar, a Turma, por falta de fundamentação, deferiu habeas corpus para anular o decreto de prisão expedido contra os pacientes, salientando, ademais, que a prisão preventiva traduz uma medida excepcional de restrição à liberdade, não podendo configurar-se como antecipação da sanção penal. HC 81.180-MG, rel. Min. Ilmar Galvão, 18.9.2001. (HC-81180)

A falta de fundamentação ou mera repetição dos termos da lei são causas de

nulidade bem como trata-se de constrangimento ilegal. Ademais, não pode o

magistrado apenas basear-se em conjectura genérica, a decisão deve consubstanciar-

se em suporte fático que demonstrem a origem do abalo.260

Exige-se que a autoridade judiciária esclareça em seu despacho qual ou quais os fundamentos existente para a decretação da excepcional medida que é a custódia preventiva. Sem a exposição de fundamentos suficientes à determinação, em que se mencionem os mínimos

259 STF. informativo nº 242 . Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo242.htm. Acesso em 27 de maio de 2010. 260 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 636.

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requisitos exigidos pela lei, há constrangimento ilegal à liberdade de locomoção [...].261

A jurisprudência do STJ262 lastreou que a falta de fundamentação é causa de

constrangimento ilegal:

“HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. GRAVIDADE DO DELITO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A falta de demonstração, efetiva e concreta, das causas legais da prisão preventiva, caracteriza constrangimento ilegal manifesto, tal como ocorre quando o Juiz se limita a invocar, sem mais, o temor da comunidade e a probabilidade de repetição do ilícito, sem base em qualquer fato concreto. 2. Ordem concedida”.

O mesmo Tribunal, acerca da responsabilização do Estado por dano oriundo de

prisão quando

CIVIL - AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ESTADO – PRISÃO PREVENTIVA - POSTERIOR ABSOLVIÇÃO PELO TRIBUNAL POPULAR - PRISÃO EFETUADA DENTRO DOS LIMITES LEGAIS - ERRO JUDICIÁRIO NÃO CARACTERIZADO - SENTENÇA CONFIRMADA . O decreto judicial de prisão preventiva, quando suficientemente fundamentado e obediente aos pressupostos que o autorizam, não se confunde com o erro judiciário a que alude o inc. LXXV do art. 5º da Constituição da República, mesmo que o réu ao final do processo venha a ser absolvido ou tenha sua sentença condenatória reformada na instância superior. Interpretação diferente implicaria a total quebra do princípio do livre convencimento do juiz e afetaria irremediavelmente sua segurança para avaliar e valorar as provas, bem assim para adotar a interpretação da lei que entendesse mais adequada ao caso concreto.

A prisão preventiva deve ser amplamente fundamentada, observando os

requisitos e pressupostos da lei e, ainda, as garantias fundamentais, aplicando-os ao

caso concreto. Pois, mesmo que seja imprescindível a prisão do agente, sem a devida

fundamentação, é nula. No entanto, mesmo que os doutrinadores entendam haver

responsabilidade do Estado por prisão preventiva sem a fundamentação, o que em tese

causa constrangimento ilegal, segundo os Tribunais pátrios, não caracterizam a

responsabilização.

261 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal . 18. ed. rev., atual. São Paulo: Atlas. 2006. p. 395. 262 STJ – Habeas Corpus nº 43271/RS. 6ª Turma. Rel. Hamilton Carvalhido. publ. 14/08/2006. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp. Acesso em: 26 de maio de 2010.

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3.2.3 - Prisão preventiva de homônimo

A prisão preventiva de uma pessoa no lugar da outra desrespeita a garantia

constitucional à liberdade prevista no caput do art. 5º da CRFB/88, bem como, trata-se

de constrangimento ilegal, devendo a Administração Pública ressarcir o dano moral

oriundo desta omissão.

É incontroversa a responsabilidade civil do Estado quando prende terceiro

supondo ser o infrator, por erro da autoridade, em razão de homonímia, identificação

falsa, semelhança ou parentesco. Explica Cahali263.

Completa ainda o autor264:

“É igualmente reparável o dano moral, se a pessoa, por engano, permaneceu

presa durante um largo período de tempo, ou foi mantida encarcerada além do tempo

que fora condenada”

O mesmo é o posicionamento jurisprudêncial do TJSC:

CIVIL E CONSTITUCIONAL. PRISÃO PREVENTIVA. ERRO JUDICIÁRIO. RECONHECIMENTO EM PRIMEIRO GRAU. RECURSO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. EQUÍVOCO NO CUMPRIMENTO DO MANDADO POR POLICIAIS CIVIS. PRISÃO DO AUTOR QUE POSSUI O MESMO APELIDO DO CRIMINOSO. PROVA CONTUNDENTE NESSE SENTIDO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. 1."A Constituição da República, em razão da magnitude conferida ao status libertatis (art. 5., XV), inscreveu no rol dos direitos e garantias individuais regra expressa que obriga o Estado a indenizar o condenado por erro judiciário ou quem permanecer preso por tempo superior ao fixado na sentença (art. 5º, LXXV), situações essas equivalentes a de quem foi submetido a prisão processual e posteriormente absolvido" (REsp. n. 61899, rel. Min. Vicente Leal). 265

A pessoa que tem sua liberdade suprimida em decorrência de ter o mesmo

nome, patrocínio ou apelido daquele que deveria estar preso, tem o pleno direito à

263 CAHALI, Yussef Said. Dano Moral . 3. ed. rev. ampl. e atual. conforme o Código Civil de 2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 779. 264 CAHALI, Yussef Said. Dano Moral . 3. ed. rev. ampl. e atual. conforme o Código Civil de 2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 786. 265 TJSC, Apelação Cível n. 2009.051991-5. Rel. Vanderlei Romer, Órgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Público, Data: 19/03/2010. Acesso em 24 de maio de 2010. Disponível em: http://tjsc6.tj.sc.gov.br/cposg/pcpoResultadoConsProcesso2Grau.jsp?CDP=01000ETO70000

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indenização, por se caracterizar constrangimento ilegal e desrespeito a liberdade de

locomoção pela falha do serviço público. Salienta-se que esta falha pode ocorrer,

também, aos mandados já revogados. Onde a pessoa é presa por uma ordem judicial

que não tem mais validade.

3.2.4 - Prisão motivada por mandado revogado

Assim, como à prisão de homônimo, a prisão preventiva motivada por mandado

revogado desrespeita a garantia constitucional à liberdade, disposta no art. 5º, caput, da

CRFB/88 e, configura constrangimento ilegal.

Segue a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

(TJRS) 266, configurando o dano moral em decorrência da omissão do poder público:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. ROCOLHIMENTO DOS MANDADOS. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO. PRISÃO INDEVIDA EM DUAS OPORTUNIDADES. REQUISITOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL PRESENTES. DANOS MORAIS E MATERIAIS CONFIGURADOS. DENUNCIAÇÃO À LIDE.1. Trata-se de indenização por danos materiais e morais contra o Estado do Rio Grande do Sul, sob a alegação de omissão do ente estatal, tendo em vista que não foram recolhidos os mandados de prisão expedidos contra o demandante, mesmo após a decisão que revogou a prisão preventiva inicialmente decretada, o que deu causa a prisão indevida, em duas oportunidades, do ora autor.

Por sua vez, a jurisprudência do TJSC267 configura a prisão por mandando

revogado como constrangimento ilegal:

HABEAS CORPUS. PACIENTE CUJA PRISÃO PREVENTIVA RESTOU REVOGADA, ALÉM DE SE HAVER DECLARADO EXTINTA A SUA PUNIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO ÀS AUTORIDADES COMPETENTES PARA IMPLEMENTAÇÃO DAS PROVIDÊNCIAS

266 TJRS - Apelação Cível Nº 70021094776, Nona Câmara Cível, Rel. Des. Odone Sanguiné, Julgado em 20/02/2008. Acesso em: 18 de maio de 2010.Disponível em: http://br.vlex.com/vid/50250769#ixzz0oJNBE7qi 267 TJSC - Habeas Corpus: 2006.019454-9, Rel. Sérgio Paladino, julgamento: 04/07/2006, Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal. http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5404206/habeas-corpus-hc-194549-sc-2006019454-9-tjsc Disponível em: Acesso em: 27 de maio de 2010.

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RESULTANTES DAS OCORRÊNCIAS, BEM ASSIM DO RECOLHIMENTO DOS MANDADOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. ORDEM CONCEDIDA.

Logo, haverá responsabilização do Estado pela prisão motivada por mandado

de prisão já revogado, frente ao constrangimento ilegal e a inobservância ao princípio

da liberdade.

3.2.5 - Prisão preventiva e posterior absolvição

O acusado pode ser absolvido sumariamente na forma do art. 397 do CPP, ao

final do processo crime em decisão absolutória nos ditames do art. 386 do CPP, ou em

revisão criminal conforme art. 621 do mesmo diploma.

Ensina Eduardo Espíndola Filho268 que:

"Sabido que, em revisão criminal, a absolvição é a reparação de um erro

judiciário, feita pelo Tribunal, cassando uma condenação proferida contra lei expressa,

contra a evidência dos autos, ou baseada em falsa prova ou por novas provas

desamparada, é razoável e é justo sejam indenizados os danos sofridos pelo réu, em

razão de tal condenação".

Por sua vez, entende Cahali269:

“Com efeito, não se compreende que, sendo injusta a prisão no que exceder o

prazo fixado na sentença condenatória, tenha sido menos “injusta” a prisão do réu que

nela é mantida, se ao final a ser julgada improcedente a denúncia pela sentença

absolutória.”

A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ)270:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - PRISÃO PREVENTIVA E ABSOLVIÇÃO CRIMINAL- A prisão preventiva, "in casu", com a duração

268 ESPÍNDOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro , anotado. vol. 6, Bookseller, 2000, p. 497. 269 CAHALI, Yussef Said. Dano moral . 3. ed. rev., ampl., e atual. conforme o Código Civil de 2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 780. 270 TJRJ – Apelação Cível nº 10.182/01-RJ. Rel. Des. Luiz Fux, 10ª Câm. Cível. Acesso em: 18 de maio de 2010.Disponível em: http://brs.aasp.org.br/netacgi/nph-brs.exe?d=AASP&f=G&l=20&p=5&r=96&s1=condenados&s2=&u=/netahtml/aasp/aasp1.asp

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de quase 50 dias, implica sério constrangimento apto a abalar não só a psique do custodiado, como também a sua honorabilidade. Destarte, a prisão provisória nada mais é do que a condenação antecipada, tanto que prevista a detração. Assim, a prisão preventiva reclama prova inequívoca, posto prisão antecipada por conta da verossimilhança da alegação da acusação, indicando uma condenação final. A absolvição revela a inocência "ex tunc" e, "a fortiori", a ilegitimidade da custódia, gerando inafastável dever de indenizar, máxime porque a Carta Federal garante a presunção de inocência e a proteção da dignidade humana. O encarceramento do cidadão deve ser levado a efeito com provas manifestas, posto cláusula pétrea a liberdade de ir e vir. Raciocínio inverso revela indiferença pela dignidade humana e oferece ao Estado carta de alforria para constranger a liberdade humana, postulados dos Estados totalitários- absolutistas, cuja marca é o desrespeito pela dignidade humana, compromisso primeiro de nosso estado de Direito, tal como prometido pela Constituição Federal. Ocorrendo a absolvição, é objetiva a responsabilidade do Estado pela custódia preventiva, cuja ilegitimidade é reconhecida "ex tunc". [...]

Por seu turno, diferentemente decidiu o TJSC271:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MORAL. ERRO JUDICIÁRIO. PRISÃO PREVENTIVA. ABSOLVIÇÃO EM GRAU RECURSAL POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. Não traduz erro judiciário, suscetível de gerar indenização por danos morais, a privação de liberdade emanada de prisão preventiva decretada na presença objetiva dos requisitos reclamados pela lei processual penal. E, do mesmo modo, também não há lugar para qualquer indenização quando a absolvição, em contemplação ao princípio do in dubio pro reo, fundar-se na insuficiência de provas (art. 386, inc. VI, CPP).

Frente o exposto, conclui-se que não há entendimento pacífico que a prisão

preventiva com posterior absolvição pode ou não acarretar a responsabilidade civil do

Estado. No entanto, estando a prisão preventiva devidamente fundamentada nos

requisitos da lei não há que se falar em responsabilização da Administração Pública.

271 TJSC - Apelação Cível nº 2003.000191-3. Rel. Newton Janke, julgamento: 05/10/2004, Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Público. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5367275/apelacao-civel-ac-1913-sc-2003000191-3-tjsc. Acesso em: 27 de maio de 2010.

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3.3 - EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE DO ESTADO NAS PRISÕES

PREVENTIVAS

O vocábulo excludente, segundo Bühring272, tem origem latina, oriundo do

provérbio excludere, que tem por significado excluir ou afastar. Portanto, excludente é a

causa que afasta ou exclui o Estado de sua responsabilidade.

As possibilidades de excludente de responsabilidade são causas que impedem

que o nexo causal se concretize, quais sejam, a culpa exclusiva da vítima, o fato de

terceiro, o caso fortuito e a força maior. Isto no aspecto de rompimento do nexo de

causalidade na relação extracontratual, conforme visto no Capítulo I deste trabalho,

onde o risco da Administração Pública é integral e sua responsabilidade objetiva.

Neste vértice, ressalta Silvio Rodrigues273:

São excludentes da responsabilidade a culpa exclusiva da vítima, o fato de terceiro, o caso fortuito ou de força maior [...]. Conforme foi dito acima, na maioria das hipóteses a presença de uma excludente de responsabilidade atenua ou extingue o dever de ressarcir, justamente por atenuar ou extinguir a relação de causalidade.

“Sendo a existência do nexo de causalidade o fundamento da responsabilidade

civil do Estado, esta deixará de existir ou incidirá de forma atenuada quando o serviço

público não for a causa do dano [...]”274

3.3.1 - Fato/culpa da vítima

Primeiramente, é importante distinguir, vez que a culpa da vítima, também é

chamada de fato da vítima. Assim, se a culpa é exclusiva da vítima, não responde o

272 BÜHRING, Márcia Andrea. Responsabilidade extracontratual do estado . São Paulo: Thomson-IOB, 2004. p. 154. 273 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : responsabilidade civil. 19. ed. v. 4. atualizada de acordo como novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 164. 274 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2008. p. 615.

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Estado pelo dano; se a culpa é concorrente com o Estado, nesse caso atenua-se a

responsabilidade, sendo esta dividida com aquele.275

José de Aguiar Dias276 afirma que “admite-se como causa de isenção de

responsabilidade o que se chama de culpa exclusiva da vítima. Com isso, na realidade,

se alude a ato ou fato exclusivo da vítima, pela qual fica eliminada a causalidade em

relação ao terceiro interveniente no ato danoso. É fácil de ver a vantagem que resulta

de tal concepção, mais ampla que a da simples culpa, mediante um simples exemplo.

Não se responde, decerto, uma empresa de carros urbanos, pela morte do indivíduo

que se atira voluntariamente sob um bonde. Aí, é possível menção à culpa da vítima.

Suponhamos, entretanto, que este indivíduo é louco. Não se pode cogitar de louco.

Mas, por isso, responderá a empresa, quando o fato foi de todo estranho a sua

atividade? Claro que não”.

Discorre, sobre o tema, Oreste Nestor de Souza Laspro277:

Se um determinado indivíduo sofreu um dano oriundo de uma ação ou omissão de um agente do estado, em princípio, estaria formado o liame entre a causa e o prejuízo e, portanto, nasceria o direito ao ressarcimento. Ocorre que, muitas vezes, pode ser que o resultado danoso somente tenha ocorrido em razão da culpa da vítima, ou seja, esta, por ação ou omissão, contribuiu definitivamente para que assumisse a condição de vítima. Nessas situações, em princípio, temos o rompimento do nexo causal com o ato do agente estatal, não existindo direito ao ressarcimento. Com efeito, é indispensável se verificar o fenômeno das concausas. Isso significa que precisamos examinar se a culpa constitui a causa fundamental e exclusiva do dano ou se, por algum modo, ainda subsiste o nexo causal com a ação do agente estatal. Dessa maneira, sempre que o dano não for resultado somente da culpa da vítima, mas também da ação do agente estatal, não temos a exclusão completa do dever de ressarcir, mas sim, uma redução do valor a ser pago, de modo proporcional à responsabilidade de cada um dos envolvidos.

Wald278 explica que “A culpa exclusiva da vítima exclui a responsabilidade e,

havendo concorrência de culpa do agente e do prejudicado, a indenização é reduzida

proporcionalmente”.

275 BÜHRING, Márcia Andrea. Responsabilidade extracontratual do estado . São Paulo: Thomson-IOB, 2004. p. 161. 276 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil . Vol. 1 e 2. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 693 e 694. 277 LASPRO, Orestes Nestor de Souza. A responsabilidade civil do juiz . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 72.

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Por sua vez, Di Pietro279, acompanha o mesmo raciocínio. Havendo culpa da

vítima deve distinguir se a culpa é exclusivamente sua ou concorrente com a do Poder

Público: na primeira hipótese o Estado não responde; já no segundo, tem sua

responsabilidade atenuada, uma vez que reparte-se com a vítima.

Portanto, ao caso específico estudado neste trabalho, esclarece Laspro280 que

“Na hipótese de culpa da vítima, embora aparentemente o dano tenha sido produzido

por uma ação ou omissão no exercício da jurisdição, verifica-se que a vítima contribuiu

para o evento. [...] Não há dúvida que, se a parte deixou de trazer aos autos provas

favoráveis à sua pretensão no momento oportuno, razão pela qual teve prejuízos, sofre

o ônus da omissão, desde que, evidentemente, as provas que deixou de produzir

constituíam a causa da decisão injusta”.

3.3.2 - Fato/culpa de terceiro

Quanto à culpa de terceiro, também conhecida por fato de terceiro, não há

responsabilização por parte do Estado quando a conduta culposa causadora de

prejuízo é de terceiro, e não de agentes públicos.281

Acerca do assunto, leciona Laspro282:

A responsabilidade objetiva do Estado não existe naquelas situações em que o dano foi produzido por um terceiro (não agente), salvo se concorreu para o dano a culpa ou omissão estatal. A justificativa para essa exclusão é a mesma daquela da culpa da vítima, na medida em que, tanto nesta quanto naquela situação, se rompe o nexo de causalidade.

278 WALD, Arnoldo. Direito civil : introdução e parte geral. 11. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 277. 279 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2008. p. 616. 280 LASPRO, Orestes Nestor de Souza. A responsabilidade civil do juiz . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 85. 281 BÜHRING, Márcia Andrea. Responsabilidade extracontratual do estado . São Paulo: Thomson-IOB, 2004. p. 164. 282 LASPRO, Orestes Nestor de Souza. A responsabilidade civil do juiz . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 85.

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Na mesma forma que a culpa da vítima extingue ou atenua a responsabilidade

Estatal, a culpa de terceiro desprende o nexo causal do ato lesivo do ente Público. No

entanto, não exclui da existência de responsabilidade contra o terceiro que provocou o

dano, contra quem é cabível o direito de regresso (art. 930 do CC/2002).283

Logo, Laspro afirma que o conceito de fato, ou culpa de terceiro assemelha-se

com o de força maior, vez que, nos dois casos, a exclusão da responsabilidade, o dever

de ressarcir, não é da Administração pública, em razão de fator externo.284

3.3.3 - Caso fortuito e força maior

A previsão de caso fortuito e força maior está no parágrafo único do art. 393 do

CC/2002285, que dispõe:

“ Art. 393 [...]

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato

necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.”

Muito embora a força maior e o caso fortuito estejam inseridos no mesmo item,

vale salientar que há uma distinção entre os dois termos, vez que o primeiro é oriundo

de uma força inevitável, isentando o Estado de responsabilidade, e o segundo ocorre

de um ato humano ou falha/omissão da Administração.286

“Também se discutiu a distinção entre caso fortuito e força maior,

caracterizando os autores o primeiro pela sua imprevisibilidade e a segunda por sua

inevitabilidade, o primeiro como fato humano e a segunda como fato natural.”287

Afirma Di Pietro288 que, “[...] força maior é acontecimento imprevisível,

inevitável e estranho à vontade das partes, como uma tempestade, um terremoto, um

283 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2008. p. 617 284 LASPRO, Orestes Nestor de Souza. A responsabilidade civil do juiz . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 86. 285 BRASIL. Código Civil , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010. 286 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2008. p. 616 287 WALD, Arnoldo. Direito civil : introdução e parte geral. 11. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 100.

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raio. Não sendo imputável à Administração, não pode incidir a responsabilidade do

Estado; não há nexo de causalidade entre o dano e o comportamento da

Administração”.

Finalmente, destacam-se Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino, concluindo que,

“[...] a nosso ver, o único ponto que se pode identificar como razoavelmente consensual

diz respeito ao reconhecimento de que qualquer evento, não importa como se queira

classificá-lo, que descaracterize o nexo causal entre o dano e uma atuação da

Administração, exclui a responsabilidade desta. [...]. Para os que, como nós, entendem

que só a força maior é evento externo, ao passo que o caso fortuito é circunstância

relacionada à atuação que gera o dano, é mister apontar como excludente somente a

força maior, por afastar o nexo causal entre a atuação do Estado e o dano,

diferentemente do que ocorre nas situações de caso fortuito.”

Portanto, o caso fortuito não constitui causa de excludente da responsabilidade

do Estado, vez que sendo o dano causado por ato humano ou falha da Administração,

pode o ente Público ser responsabilizado.

3.3.4 - Estado de necessidade/estrito cumprimento do dever legal/legítima defesa

O CC/2002289, no seu artigo 188, prevê as ações que não constituem atos

ilícitos, quais sejam:

Art. 188 - Não constituem atos ilícitos: I- os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II- a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.

Parágrafo único. No caso do inc.II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessários, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.

288 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2008. p. 615 e 616. 289 BRASIL. Código Civil , disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 26 de maio de 2010.

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Gonçalves290 explica, acerca do inciso II, bem como do parágrafo único do

artigo 188 do CC/2002, trata-se do estado de necessidade no âmbito civil, por sua vez o

ato revestido dessa característica não é ilícito, no entanto, não necessariamente ilide a

responsabilidade do causador do dano em reparar-lo.

Por sua vez, continua o autor291, aquele que pratica o ato em legítima defesa

contra o agressor, encontra-se amparado pelo exercício regular de um direito e, ou,

estrito cumprimento do dever legal, logo, não é obrigado a reparar o dano causado,

mas mesmo assim, a vítima pode obter ressarcimento do Estado.

Laspro292 afirma, acerca do estado de necessidade, que “O agente estatal

causou prejuízo ao indivíduo, mas por ser esta a única ou a maneira mais eficaz de

evitar um dano maior para a coletividade. Trata-se de um verdadeiro conflito de

interesses, o qual, sem dúvida, é elemento essencial na identificação desta excludente.”

Mais adiante, o mesmo autor, ainda completa:

O estado de necessidade caracteriza-se pela ausência de responsabilidade em razão do bem maior a ser tutelado, como própria finalidade e razão de ser do Estado. É importante verificar que, em todas as outras situações examinadas de exclusão da responsabilidade, o que efetivamente ocorre é o rompimento do nexo de causalidade. Ao contrário, no caso do estado de necessidade, expressamente se afirma que o dano foi causado pela ação do Estado, sendo, entretanto, consideração irresponsável em nome do interesse coletivo. [...] Naturalmente, o prejuízo à vítima de ser o menor possível, razão pela qual, mesmo no estado de necessidade, o Estado responde diante de eventual ação ou omissão culposa.293

Frente à responsabilidade objetiva do Estado e o caráter personalíssimo das

excludentes de ilicitude, a Administração pública não pode se eximir da reparação do

dano causado pelo seu agente, no entanto, fica este protegido em caso de ação

regressiva, vez que seus atos estão revestidos destas excludentes.

290 CONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil . 9. ed. rev. de acordo com novo Código Civil (Lei n. 10406, de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva, 2005. p. 734 e 735. 291 CONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil . 9. ed. rev. de acordo com novo Código Civil (Lei n. 10406, de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva, 2005. p. 736. 292 LASPRO, Orestes Nestor de Souza. A responsabilidade civil do juiz . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 84. 293 LASPRO, Orestes Nestor de Souza. A responsabilidade civil do juiz . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 84.

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CONCLUSÃO

O sistema jurídico brasileiro é contemplado por princípios previstos

constitucionalmente, inclusive, direitos inerentes à liberdade do ser humano, e também

deveres do Estado em detrimento da coletividade. No entanto, quando este dois

princípios colidem como, por exemplo, a decretação de prisão preventiva, o interesse

coletivo se sobrepõe aquele individual, devendo, as regras pré-estabelecidas serem

respeitas, sob pena de ferir princípios e direitos indisponíveis e ensejar reparação.

Portanto, o Estado tem o dever de punir aquele que transgride a norma penal,

mas só fará isso mediante o devido processo legal, tendo como preceito à liberdade e a

presunção de inocência. Tal pessoa só será considerada culpada e passível de punição

quando devidamente processada e condenada por sentença penal condenatória, caso

contrário, não há que se falar em penalidade. No entanto, no curso da instrução

criminal, se necessário, o Estado pode decretar a prisão preventiva do transgressor da

norma penal em benefício do próprio processo, isto é possível apenas quando há prova

de materialidade e indícios suficientes de autoria, para garantir a ordem pública,

econômica, por conveniência da instrução criminal ou, garantir a aplicação da lei penal.

Fora estas hipóteses não pode ser decretada a prisão preventiva.

Quando a prisão preventiva não encontra-se lastreada por esses pressuposto e

requisitos, encontra-se aí uma violação a essa sobreposição de princípios, posto que o

Estado só poderia exercer o seu dever punitivo se respeitadas à condições

preestabelecidas na lei, surgindo daí o dever de compor qualquer dano oriundo desta

atividade.

O primeiro capítulo versou acerca da responsabilidade civil do Estado, sendo

esta uma obrigação que recai ao Estado e decorrência de, em sua atividade, causar

dano ao administrado, tanto como forma de ressarcir a própria lesão, como forma de

sanção. Tal responsabilidade evoluiu até chegar aos dias de hoje, sendo oriunda do

sistema Europeu, no Brasil atravessou três fases distintas, da irresponsabilidade total

até o presente momento onde a responsabilidade do Estado é baseada na teoria do

risco administrativo, na forma objetiva, ou seja, o Estado é obrigado a reparar o dano

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causado por seus agentes, por ação ou omissão, quando no exercício da suas

atividades, devendo ser demonstrado o dano, a atividade que o causou e o nexo causal

entre os dois elementos anteriores. Ainda, há os elementos que excluem o Estado de

responsabilização, desclassificam o nexo causal, quais sejam: a) culpa da vítima, onde

tendo a vítima colaborado totalmente ao dano, não cabe ao Estado responsabilizar-se

vez que a ação não foi sua, mas, sendo a culpa concorrente, o Estado responde na

parte que concorreu; b) culpa de terceiro, na mesma forma da culpa da vítima, sendo

dano causado totalmente por terceiro, a este recai a responsabilização, neste, será

responsabilidade na forma subjetiva, devendo-se comprovar o dolo ou culpa do agente;

c) caso fortuito e força maior, sendo o primeiro causado pelo agente em situação onde

poderia a dano ser evitado, portanto, responsabiliza-se o Estado, no segundo, a dano é

causado por força da natureza revestida de imprevisibilidade, não cabe

responsabilização.

Neste sentido, também importa em atividade do Estado aquela prestada pelo

Poder Judiciário, ou seja, decretando-se a prisão preventiva sem a observância dos

requisitos legais, ou ser a pessoa presa e decorrência de uma omissão na prestação da

tutela jurisdicional, cabe o Estado indenizar eventual lesão.

Logo, tratou-se no capítulo dois acerca da prisão preventiva, modalidade de

prisão cautelar tem como escopo resguardar o próprio processo penal no que tange a

sua eficácia probatória ou da possível pena aplicada, previsto no art. 312 do CPP.

Tratou-se dos pressupostos, que são prova de materialidade e indícios suficientes de

autoria, os quais são imprescindíveis à decretação desta modalidade de prisão. Logo,

verificou-se os requisitos, que são: a) garantia da ordem pública, que trata da gravidade

do crime bem como da repercussão do delito na sociedade, garantindo, acima de tudo,

a integridade física do réu; b) garantia da ordem econômica, muito parecido com o

objeto do requisito anterior, neste o que busca é a garantia de que nos crimes de ordem

financeira esta não será prejudicada com o réu em liberdade; c) conveniência da

instrução criminal, mas plausível dos pressupostos, serve para garantir que o réu,

estando em liberdade, prejudique o andamento do processo; d) para assegurar a

aplicação da lei penal é a garantia que, sendo possível que o réu fuja da aplicação da

lei, submeta-se à futura sentença penal condenatória. Ainda, falou-se dos princípios

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que regem esta modalidade de prisão, que são “violados” em detrimento ao dever de

punir do Estado, e portanto devem ser respeitados, quais sejam, liberdade e presunção

de inocência.

Logo, analisou-se no segundo capítulo, quando e como pode ser decretada a

prisão preventiva, para no terceiro capítulo verificar-se as possibilidades de

responsabilização do Estado em decorrência da prisão preventiva, bem como, causas

que ilidem tal responsabilidade.

Primeiramente, toda atividade do Estado manifesta-se pelos atos de seus

agentes. O mesmo acontece com o Poder Judiciário se, decretando ou mantendo

prisão preventiva causar lesão ao tutelado tem o dever de indenizar, aplicando-se,

portanto, a responsabilidade objetiva, demonstrando a ação do Estado e o dano

causado por este, juntamente com o nexo entre os dois. São ações, ou omissões do

Estado que causam dano e geram a sua responsabilização: a) abuso de autoridade; b)

erro judiciário; c) a inobservância ao princípio da razoabilidade; d) prisão sem observar-

se prazo razoável; e) restrição ao direito à liberdade de locomoção; f) desrespeito ao

direito à personalidade.

Disto, analisou-se as causas que pode gerar indenização, bem como aquelas

que ilidem o Estado de tal sanção, quais sejam: 1) prisão preventiva por autoridade

incompetente, é aquela que a autoridade que a decretou não tinha competência para

aquele ato, é causa de constrangimento ilegal, causando dano dever ser indenizado; 2)

sem fundamentos nos requisitos da lei, neste caso, ocorre, igualmente,

constrangimento ilegal, e na mesma forma, só cabe responsabilização mediante a

comprovação efetiva do dano, posto que não foram observados os requisitos previstos

no art. 312 do CPP, ou seja, violação do princípio da liberdade; 3) prisão de homônimo,

este é um caso concreto de lesão por omissão, o dever do Estado de responsabilizar-se

é latente, não é possível que uma pessoa inocente seja presa no lugar da outra; 4)

prisão preventiva motivada por mandado revogado, igualmente um dano por omissão

do Estado, deve-se indenizar aquele que é preso por ordem judicial que não existe; 5)

prisão preventiva com posterior absolvição, nesta hipótese a demonstração do dano é

imperativa, no entanto, viola direitos fundamentais e deveria ser indenizável com forma,

principalmente, de punição para não ocorrer com tanta incidência. Como forma de

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isenção de responsabilidade, são: 1) culpa da vítima, não incide em responsabilização

se a culpa é exclusiva da vítima, no entanto se esta concorrer com a ação, deve o

estado responsabilizar-se com a parte que deu causa; 2) culpa de terceiro, na mesma

forma da culpa da vítima, responsabiliza-se o Estado com aquilo que deu causa, sendo

esta exclusiva do terceiro, deve a responsabilidade recais a este na forma subjetiva, ou

seja, comprovando-se culpa ou dolo; 3) caso fortuito e força maior, destas duas

modalidades, o primeiro caso esta revestido de uma omissão, posto que o agente

poderia agir mas não o fez, deve o Estado ser responsabilizado por tal, cabendo ação

regressiva para a Administração Pública ressarcir-se do dano, também incide em

responsabilidade subjetiva quanto ao agente, devendo comprovar dolo ou culpa, na

segunda hipótese não cabe responsabilização do Estado posto que o evento danoso

encontra-se revestido de imprevisibilidade, impossível de determinar se causaria o dano

ou não; 4) estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e legítima defesa,

nesses casos, o dano causado deve ser ressarcido ao administrado, cabendo ao

Estado, também, se ressarcir por conta do seu agente da dano por este causa,

incidindo neste a responsabilidade subjetiva.

Por fim, cabe a responsabilização do Estado na prisão preventiva que

efetivamente causar dano ao tutelado em decorrência da atividade jurisdicional que não

observar o requisitos que lei define, cabendo ao magistrado aplicar ao caso concreto a

proporcionalidade devida à aplicação desta modalidade de prisão, bem como ao Juiz

cível à indenização por estes motivos. A prisão preventiva é imprescindível ao processo

penal, posto que cria a segurança no pleno andamento da ação, mas deve ser aplicada

com extrema cautela diante do prejuízo que pode causar ao tutelado, tamanha a sua

força.

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