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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CECEN – CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS CURSO DE HISTÓRIA ONDE HÁ FOGO, HÁ MÚSICA: a repressão militar nas décadas de 1960 e 1970 cantada e contada por cantores maranhenses São Luís 2006

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CECEN – · PDF fileA Universidade Estadual do Maranhão e seu magnífico corpo docente do Curso de História, ... Depois estudou violão clássico

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO

CECEN – CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS

CURSO DE HISTÓRIA

ONDE HÁ FOGO, HÁ MÚSICA: a repressão militar nas décadas de 1960 e 1970

cantada e contada por cantores maranhenses

São Luís

2006

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FÁBIO AQUILES MARTINS DE ALENCAR

ONDE HÁ FOGO, HÁ MÚSICA: a repressão militar nas décadas de 1960 e 1970

cantada e contada por cantores maranhenses

Monografia apresentada a Coordenação do Curso de História

da Universidade Estadual do Maranhão, para obtenção do grau

de Licenciatura em História.

Prof° Mestre Marcelo Cheche Galves

São Luís

2006

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FÁBIO AQUILES MARTINS DE ALENCAR

ONDE HÁ FOGO, HÁ MÚSICA:

a repressão militar nas décadas de 1960 e 1970 cantada e contada por cantores maranhenses

Monografia apresentada a Coordenação do

Curso de História da Universidade Estadual do

Maranhão, para obtenção do grau de

Licenciatura em História.

Aprovada em: / /

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________

Prof° Marcelo Cheche (Orientador)

Universidade Estadual do Maranhão

_________________________________________________

1° Examinador

_________________________________________________

2° Examinador

4

A meu avô, José Azevedo Martins

5

“A música é memória e a gente de tanto cantar já faz parte da história”

autor desconhecido

6

AGRADECIMENTOS

A Deus, nosso criador e pai em todas as horas.

A meus avós, José Azevedo Martins (Pichacau) e Terezinha de Jesus, que além de avós foram

pais, irmãos, amigos e criadores até de meus filhos.

A meu padrinho, Edjan de Jesus, que exerceu tantas funções em minha vida, entre elas a de

pai, e que me ensinou a lutar por mim e pelos outros dentro de um mundo tão injusto.

A minha grande incentivadora, a minha amada Roberta, a mais paciente de todas as pessoas

que me cercam, por aguentar meus ataques e bebedeiras, a mulher ideal, o meu amor, meu

grande amor.

Aos meus reis, Artur e Luís, e meu anjo da guarda, Gabriel, pois graças a eles tornei-me uma

pessoa melhor, tomara que um pai mais responsável.

A Universidade Estadual do Maranhão e seu magnífico corpo docente do Curso de História,

em especial os professores Marcelo Cheche, Alan Kardec Pacheco, Helidacy, Henrique

Borralho, Paulo Rios e Elizabeth Abrantes.

A Marcelo, pela imensa paciência e carinho como professor, amigo e orientador.

Ao meu cunhado, Rosenverck Estrela, pela imensa ajuda na produção desse trabalho.

A Dona Roberta, em função dos “pepinos” que resolveu para que eu não fosse jubilado.

A meus pais e irmãos, meu cunhado Ribamar e compadre Mike pelo carinho, pelos risos,

pelas cervejas e churrascos, feijoadas, mocotós, etc...

Aos meus tios, Zequinha e Manolo, como incentivadores de meu crescimento profissional,

A magnitude de César Teixeira e Chico Maranhão.

A Renato Russo, Belchior, Zé Ramalho, Geraldo Azevedo, Alceu Valença, Fagner, Caetano

Veloso, Gilberto Gil, Humberto Gessinger, Zeca Balero, Chico César, Vander Lee, Chico

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Buarque, Geraldo Vandré, Cássia Eller, Zeca Pagodinho, Maria Bethânia, Marisa Monte, Rita

Ribeiro, aos caras do Rappa, do Pearl Jam, e outra vez César Teixeira e Chico Maranhão por

fazerem da música um incentivo às lágrimas, à luta, à embriaguez, ao sonho de ver um mundo

mais justo, um mundo melhor.

A meu tio “Lunga” e João, pois graças a eles quis me tornar professor.

Aos meus grandes amigos de trabalho, de grode e de difíceis momentos no mar e em terra,

Dudu, Dílson, Moraes, Marquinhos, Marcelo, Curió, Netto Goroba, Ronie, Paulo, Alexandre,

Léo, Frazão, Júlio Pavão e Julinho, e meus futuros compadres, Carvalho e o “velho” Ubaldo.

Ao Divina Pastora, por confirmar minha vocação como professor.

Aos meus amigos e compadres, Jackson e Márcio pelas conversas sobre mulheres e músicas.

A Marlon, Josélio, tio Careca pelo fato de desde cedo me colocarem pra escutar coisa boa.

As minhas amadas e amigas de trabalho Celimar, Rizalva, Claudenira, Conceição, Meirinalva,

Josenilde, Zelma, Marília, Vera, Isabel, Sílvia, Ednéia, Flavinha, Dora, Anunciação, Ir.

Heráclia e Ir. Aline, pelos modelos que são e pelo fato de afirmarem cotidianamente o

verdadeiro papel da mulher na sociedade, o de agente de mudança.

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RESUMO

Registro da trajetória de parte da produção musical maranhense nas décadas de 60 e 70.

Enfatiza-se os dois principais cantores maranhenses da época acerca de suas produções e do

ambiente cultural e político que os cercava nas décadas de 60 e 70

Palavras-chave: música – cultura – ditadura - Maranhão

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ABSTRACT

Register of trajectory of part of the maranhense musical production in the decads of 60 and

70. One enphasizes the main maranhenses singers of the time on it’s productions and the

cultural environment polician who surrounded in the decads of 60 and 70.

Keyboards: music – culture – military dictatorship - Maranhão

10

SUMÁRIO

1

INTRODUÇÃO

“Quando a serpente deu o bote”: uma rápida

consideração acerca do golpe de 64 e o governo militar

11 15

2 Estado, cultura e censura 20

3 A música brasileira 25

3.1 “Em caras de presidentes. Em grande beijos de amor.

Em dentes, pernas, bandeiras. Bomba e Brigitte

Bardot”:O Tropicalismo

29

3.2 “Vem vamos embora que esperar não é saber. Quem

sabe faz a hora não espera acontecer”: A música de

protesto

32

4 “Aqui na terra, quem não berra, nada ganha, é mais

um boi de piranha como todo brasileiro”: César

Teixeira e Chico Maranhão cantam e contam a

ditadura em terras do Maranhão

40

CONSIDERAÇÕES FINAIS 48

REFERÊNCIAS 49

11

INTRODUÇÃO

Outro exemplo de resistência é a memória, que

rompe a introversão e recupera o tempo. Recordar

não é voltar atrás, é refazer a história. Lembrar o

passado é sempre também um modo de recorrer ao

amanhã, de construir um projeto.

A memória tende, quando não é um sonho onírico, à

comunicação. É uma recriação coletiva; já não como

biografia pessoal, mas como história compartilhada.

Recusar o esquecimento é, além disso, assumir a dor.

Fazer memória é a tentativa de compreender as

feridas e explicar as cicatrizes; tomar consciência”.

(Ximena Barraza, 1980, pg.167)

A produção musical brasileira durante as décadas de 60 e 70 foi riquíssima,

embora parte dela desobedecesse o status quo dirigido na época por uma ditadura militar.

Ditadura nascida a partir de um regime que se caracterizou pela limitação do direito a livre

expressão, não sendo “proibido proibir”, reforçando também, no plano econômico, o domínio

do capital estrangeiro e a expansão do abismo de posses entre as classes populares e as elites

brasileiras, na desigual distribuição de renda brasileira.

Nesse contexto de controle social, fortalecido pelos constantes atos institucionais

de um Estado sustentado por desejos estrangeiros e conservadores, também cimentado pelas

celas, cassetetes e balas, contra tudo o que desobedecesse a ordem forçada, o medo se

constituiu como parceiro inseparável das diversas camadas sociais brasileiras.

Esse medo ganhava mais proporção à medida que as notícias de prisões,

desaparecimentos e mortes de estudantes, líderes comunitários, trabalhadores e artistas

aumentavam. Um regime instituído através da força, só poderia sustentar-se pela força,

quando o “cala-te boca” não funcionava, o “couro comia”.

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Esse “cala-te boca” não foi obedecido por parte dos artistas brasileiros, que

ganharam visibilidade na luta contra a repressão do regime militar, embora a resistência não

pensada como exclusividade dessa parcela da população.

Músicas como “Pra não dizer que não falei das flores” (Geraldo Vandré, DATA),

“Disparada”(Geraldo Vandré e Theo Barros,1966),“Sabiá”(Tom Jobim e Chico Buarque,

1968), “Apesar de você”(Chico Buarque), “O bêbado e o equilibrista”(Aldir Blanc e João

Bosco, 1978) serão aqui analisadas por fazerem parte de um constante repertório que lembra a

militância de alguns artistas brasileiros contra as mazelas sustentadas pelo governo militar.

É importante também saber que essa produção pautada no desafio da denúncia não

foi exclusividade do eixo Rio-São Paulo, mas que ocorreu em outras partes do território

brasileiro. Através dos trabalhos de uma geração que até hoje compõe o cenário musical

maranhense, Chico Maranhão, César Teixeira, Josias Sobrinho e Sérgio Habibe, a música

produzida no Maranhão inseriu-se nesse contexto.

Nessa direção, o trabalho privilegia a análise de obras dos grandes nomes da

Música Popular Brasileira durante os anos dirigidos pela ditadura militar, ao mesmo tempo

que observou a realidade maranhense dentro dos contextos nacional e internacional, através

de entrevistas com dois dos principais nomes da música maranhense nessa época, Chico

Maranhão e César Teixeira. Além de entrevistas, foi realizada a análise das obras de César

Teixeira nesse referido período, cuja proposta era, e continua sendo, a de revelar ao

espectador a história de sua gente, analisar o presente e projetar o futuro da sociedade

brasileira.

Quem é Chico Maranhão? Francisco Fuzzeti de Viveiros Filho, o Chico Maranhão,

filho de um funcionário público e de uma professora do jardim de infância, deu seus primeiros

passos na música ainda menino, como cantador do boizinho dirigido pela sua mãe. Sai de São

Luís para estudar Arquitetura em São Paulo, e é justamente no Centro-sul que sua música

torna-se conhecida do grande público. Em 1967, participou do Festival da TV Record, com a

belíssima “Gabriela”.

Participa uma outra vez do festival da TV Record com a música “Descampado

Verde”, defendida pelo grupo MPB-4, que, logo em seguida, foi censurada por conter a frase

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“um quarto prás duas”, ou seja, quinze minutos para as duas. Sua censura deveu-se ao fato de

fazer referência ao lesbianismo “um quarto pras duas”. Nesse mesmo ano, participa do

Festival Internacional da Canção, com a música “Dança da Rosa”.

Em 1972, lança seu primeiro LP individual, um ano depois de ter lançado junto

com Renato Teixeira um disco, que foi utilizado como brinde pela agência de propaganda de

Marcus Pereira, o mesmo que anos depois produziria “Bandeira de Aço”, uma coletânea de

músicas maranhenses produzidas ao longo das décadas de 70 e 80 e cantadas por Papete.

Após 1972, Chico Maranhão foi progressivamente abandonando o cenário musical. Porém, na

atualidade, realiza alguns shows e trabalha num projeto, que afirma ser de “grande relevância

para a música maranhense”: o lançamento simultâneo de Cd e Dvd com parte de suas muitas

composições.

Também a partir de duas entrevistas com Chico Maranhão, nos dias 05 e 06 de

janeiro de 2006, foi possível entender o contexto cultural brasileiro entre as décadas de 60 e

70, da mesma forma que foi compreendida a situação da música maranhense dentro desse

período.

Carlos César Teixeira, o César Teixeira, nasceu no Beco das Minas, em São Luís

do Maranhão, no dia 15 de abril de 1953. Filho de um compositor da Madre-Deus, Bibi Silva,

e de uma empregada doméstica vinda de Cajapió, Raimunda Teixeira. Desde muito cedo

interessou-se pela música. Dedicou-se na adolescência às Artes Plásticas, que lhe renderam

dois prêmios (1969 e 1970) em salões de pintura. Mas a música aos poucos tomou conta de

sua vida, graças não só aos programas de rádio que assistia levado pelo pai, como pelo seu

interesse pela rica variedade de ritmos tradicionais maranhenses.

Junto com o poeta Viriato Gaspar, arrebatou o 3º lugar no III Festival de Música

Popular Maranhense com “Salmo 70”, em 1972, ano em que participou da fundação do

Laborarte, movimento artístico existente até hoje. Lá realizou as primeiras experiências com

ritmos regionais. Depois estudou violão clássico com João Pedro Borges (Sinhô), de 1974 a

1976, na Escola de Música do Maranhão.

Em 1978, algumas de suas músicas foram registradas no disco “Bandeira de Aço”

por Marcus Pereira, produtor que na época pesquisava o romanceiro nacional e divulgou

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nomes importantes como Cartola e Canhoto da Paraíba. No ano seguinte, César vence o 1º

Festival Universitário Maranhense de Música Popular com “Sentinela”, em parceria com Zé

Pereira Godão, organizador de brincadeiras populares. Ganhou outros prêmios na MPB, como

o Festival Viva/1985, em São Luís (“Oração Latina”), e o Festival de Marabá-PA/1994

(“Tocaia”). Tem músicas gravadas pelos intérpretes maranhenses Rita Ribeiro, Chico

Maranhão, Gabriel Melônio, Cláudio Pinheiro, Alcione, Célia Maria, Flávia Bittencourt,

Papete e Cláudio Lima, entre outros, como também pelo menestrel mineiro Dércio Marques.

Em 2001 participou do Rumos Itaú Cultural Música, tendo composições suas

(“Parangolé” e “Mutuca”) integrado a coleção de CDs desse programa, e apresentou-se na

Sala Azul do Itaú Cultural-SP, em setembro daquele ano. Foi também premiado como o

Melhor Compositor de 2001 pela Rádio Universidade FM do Maranhão, recebendo troféus de

Melhor Música e Melhor Letra pelo chorinho “Ray-Ban”.

Militando paralelamente na área da Literatura, o artista vence em 1996 o Prêmio

Nacional de Poesia Vinícius de Moraes, promovido pela RIOARTE, da Prefeitura do Rio de

Janeiro, com o “Poema de Amor e Alquimia sobre o Araguaia”.

Em outubro de 2002, recebe Menção Honrosa pelo poema “Patrimônio Cultural

Profano”, no Prêmio Carlos Drummond de Andrade, em Ipatinga-Minais Gerais. Representou

o Maranhão, ao lado de Antônio Vieira, no Projeto “Brasil de Todos os Sambas”,

apresentando-se no Centro Cultural Banco do Brasil – Rio de Janeiro, no período de 29 de

janeiro a 01 de fevereiro de 2004, com a participação especial da cantora carioca Teresa

Cristina e das maranhenses Rita Ribeiro e Célia Maria. Em agosto de 2004, lançou o seu CD

Shopping Brazil, que considera experimental, mostrando uma variedade de ritmos tradicionais

do Maranhão, sem omitir as tendências da música urbana contemporânea. Com esse disco, em

dezembro de 2004, foi novamente premiado pela Rádio Universidade FM, tendo recebido os

troféus de Melhor CD, Melhor Letra (“Shopping Brazil”), Melhor Samba (“Vestindo a

Zebra”), Destaque-Compositor (“Shopping Brazil”) e Destaque-Cantor. De volta à área de

literatura, em novembro de 2005 Cesar Teixeira venceu o 3 º Prêmio Nacional de Poesia–

Cidade de Ipatinga, em Minas Gerais, com a coletânea de poemas Hóstias de Sal e Paixão.

15

Graças as entrevistas feitas com César Teixeira, nos dias 2 de setembro de 2005 e 21 de janeiro de 2006, foi constatado o funcionamento do aparelho repressor militar dentro das terras maranhenses, assim como constatar sua grande produção dentro desse período e como ele denunciava as mazelas ocorridas no Brasil e no Maranhão dentro desse período.

Dessa forma, discutirei a história da produção musical no contexto repressor

instituído pela ditadura, ao mesmo tempo em que realizarei a contextualização, do ponto de

vista político, econômico, social e cultural, no plano internacional e nacional.

No primeiro capítulo, foi mencionado o processo que culminou com o golpe

militar, ao mesmo tempo que foram feitas pequenas considerações acerca do contexto político

brasileiro dentro do Regime Militar. No segundo capítulo foram realizadas considerações

sobre o funcionamento do aparelho repressor estatal dentro de um regime ditatorial. Enquanto

o capítulos três e quatro trazem as produções musicais realizadas em terras brasileiras, no eixo

Rio-São Paulo e Maranhão, analisando-as e mostrando-as como resistência dentro de uma

ordem ditatorial.

Assim, no próximo capítulo, discutirei o contexto histórico brasileiro durante as

décadas de 60 e 70.

1. 1111 “Quando a serpente deu o bote”: uma rápida consideração acerca do golpe de 64 e o

governo militar

Em 31 de março de 1964, João Goulart foi deposto por um golpe militar,

vinculado aos interesses do capital estrangeiro e de setores tradicionais brasileiros. Chegava

ao fim a tentativa de destruir as estruturas arcaicas e modernizar o capitalismo brasileiro,

estendendo os benefícios, também, às classes populares, no que ficou conhecido como

reformas de base.

1 TEIXEIRA, César. Tributo a Manoel da Conceição, 1982.

16

As reformas de base carregavam como bandeiras a reforma agrária, maiores

impostos sobre os ricos brasileiros, além de obrigar as multinacionais a investir a maior parte

de seus lucros, em vez de remeter ao exterior a milhões de dólares conseguidos nessas terras.

Antes da realização do golpe militar, partidos de oposição, como a União Democrática

Nacional (UDN) e o Partido Social Democrático (PSD), acusavam João Goulart de estar

planejando um golpe de esquerda e de ser o responsável pela carestia e pelo desabastecimento

que o Brasil enfrentava.

No dia 13 de março de 1964, João Goulart realiza um grande comício na Central do

Brasil, no Rio de Janeiro, onde defende as Reformas de Base. Neste plano, Jango, como era

conhecido, prometia mudanças radicais na estrutura agrária, econômica e educacional do país.

No início de 1964, o presidente encaminha ao Congresso um projeto de reforma

agrária e é derrotado. Através de mobilizações de massa tenta pressionar o Poder legislativo.

No comício de 13 de março, que reuniu cerca de 150 mil participantes, anuncia decretos

nacionalizando refinarias particulares de petróleo e desapropriando terras com mais de 100

hectares que ladeavam rodovias e ferrovias federais. (DEL PRIORE & VENÂNCIO, 2001, p

351)

Seis dias depois, em 19 de março, os conservadores organizam uma manifestação

contra as intenções de João Goulart. Foi a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que

reuniu milhares de pessoas pelas ruas do centro da cidade de São Paulo. O clima de crise

política e as tensões sociais aumentavam a cada dia. No dia 31 de março de 1964, tropas de

Minas Gerais e São Paulo saem às ruas. Os militares tomam o poder.

Embora o embaixador norte-americano Lincoln Gordon tenha afirmado na época

que o golpe foi genuinamente brasileiro (“made in Brazil”), a participação da CIA (Agência

Central de Inteligência) na desarticulação do governo de João Goulart é uma questão

recorrente na historiografia acerca do assunto (GALEANO, 1970; TOLEDO, 1982; DEL

PRIORE E VENÂNCIO, 2001; PECEQUILO, 2003):

De fato, o golpe de 1964 pode ser acusado de muitas coisas, menos de ter sido uma

mera quartelada. Há muito tal intervenção era discutida em instituições, como a Escola

Superior de Guerra (ESG), criada em 1948, ou o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais

17

(IPES), fundado em 1962, por lideranças empresariais. Outro indício de que o golpe já vinha

sendo tramado há tempos ficou registrado nos documentos da operação “Brother Sam”,

através da qual se previa, caso houvesse resistência, que o governo norte-americano ‘doaria’

110 toneladas de armas e munições ao exército brasileiro (DEL PRIORE & VENÂNCIO,

2001).

Juntamente com Goulart, também foram desarticulados movimentos que se

juntavam às suas propostas, como as Ligas Camponesas, os Sindicatos Operários e a União

nacional dos Estudantes (UNE) e seus CPCs (Centros Populares de Cultura). Atraindo jovens

intelectuais, os CPCs tratavam de desenvolver uma atividade conscientizadora junto às classes

populares. Um novo tipo de artista, "revolucionário e conseqüente", ganhava forma.

Empolgados pelos ventos da efervescência política, os CPCs defendiam a opção pela "arte

revolucionária", definida como instrumento a serviço da revolução social, voltando-se

coletiva e didaticamente ao povo, retirando-lhe da alienação. Trabalhando o contato direto

com as massas, de onde extraíam seu maior interesse e vigor, encenavam peças em portas de

fábricas, favelas e sindicatos; publicavam cadernos de poesia vendidos a preços populares e

iniciavam a realização pioneira de filmes autofinanciados.

Chico Maranhão, em entrevista concedida para a realização dessa pesquisa,

enxerga no Golpe de 64 a participação norte-americana: “Diante do crescimento das

esquerdas brasileiras e da possibilidade da realização de reformas de caráter popular, o

Brasil tornou-se um ‘país perigoso’ para os anseios norte-americanos, que não poderiam

perder um grande mercado consumidor e um país ecologicamente rico” (janeiro de 2006)

Em 9 de abril, é decretado o Ato Institucional Número 1 (AI-1), fortalecendo o

Poder Executivo, dando-lhe a possibilidade de cassar mandatos e exonerar funcionários

públicos. No dia 15 de abril de 1964, o general Castello Branco é eleito, pelo Congresso

Nacional Brasileiro, presidente da República. Durante seu governo, vários parlamentares

federais e estaduais tiveram seus mandatos cassados, cidadãos tiveram seus direitos políticos e

constitucionais cancelados e os sindicatos receberam intervenção do governo militar

.

Ainda em 1964, foi criado o SNI (Serviço Nacional de Informações), órgão

composto por agentes que se infiltravam em universidades, repartições públicas, sindicatos,

escolas, com o objetivo de reprimir a oposição. Assim, não só as oposições dentro do governo

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foram perseguidas, como toda e qualquer idéia que viesse se opor ao governo ou aos

tradicionais costumes.

No dia 27 de outubro foi lançado o AI-2, que aboliu os partidos existentes e

consolidou as eleições indiretas para presidente. Em 1966, foi baixado o AI-3, tornando

indiretas as eleições aos governos estaduais e municipais. Os chefes políticos da direita

conservadora brasileira foram retirados do poder político.

Foi instituído o bipartidarismo. Só estava autorizado o funcionamento de dois

partidos: Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e a Aliança Renovadora Nacional

(ARENA ). Enquanto o primeiro era de oposição, de certa forma controlada, o segundo

representava os militares, ou seja, o partido “Sim, senhor” (ARENA) e do “Acho que

sim”(MDB).

Aprovada neste mesmo ano, a Constituição de 1967 confirma e institucionaliza o

regime militar e suas formas de atuação. Em 1967, assume a presidência o general Arthur da

Costa e Silva, após ser eleito indiretamente pelo Congresso Nacional. Seu governo é marcado

por protestos e manifestações sociais. A oposição ao regime militar cresce no país. A UNE

(União Nacional dos Estudantes) organiza, no Rio de Janeiro, a Passeata dos Cem Mil. Em

Contagem (MG) e Osasco (SP), greves de operários paralisam fábricas em protesto ao regime

militar.

No dia 13 de dezembro de 1968, o governo decreta o Ato Institucional Número 5

(AI-5). Este foi o mais duro do governo militar, pois aposentou juízes, cassou mandatos,

acabou com as garantias do habeas-corpus, o habeas-data e aumentou a repressão militar e

policial.

Na realidade, a coesão dos que se beneficiavam com o crescimento da produção

durante o regime militar (burguesia e capital estrangeiro) garantia, social e politicamente, o

endurecimento do regime. O desenvolvimento político estava subordinado à decretação do

AI-5. Dessa forma, havia uma espécie de acordo entre o Estado e a burguesia: ela abriria mão

dos controles políticos tradicionais (fechamento do Congresso, eleições diretas,

pluripartidarismo etc.) e de instrumentos como a liberdade de imprensa (censura em relação

aos meios de comunicação); o Estado, por seu lado, manteria a ordem e o crescimento da

19

produção do país a qualquer custo, assumindo os interesses dos empresários como se fossem

os de toda a nação (BRANDÃO & DUARTE,1990, pg.75)

Dois grupos de esquerda, O MR-8 e a ALN, seqüestram o embaixador dos EUA

Charles Elbrick. Os guerrilheiros exigem a libertação de 15 presos políticos, exigência

conseguida com sucesso. Porém, em 18 de setembro, o governo decreta a Lei de Segurança

Nacional. Esta lei decretava o exílio e a pena de morte em casos de "guerra psicológica

adversa, ou revolucionária, ou subversiva". Em 1969, a Junta Militar escolhe o novo

presidente: o general Emílio Garrastazu Médici. Seu governo é considerado o mais duro e

repressivo do período, conhecido como “anos de chumbo". A repressão à luta armada cresce e

uma severa política de censura é colocada em execução. Jornais, revistas, livros, peças de

teatro, filmes e outras formas de expressão artística são censuradas. (HYPERLINK,

http://www.suapesquisa.com/mpb ).

Muitos professores, políticos, músicos, artistas e escritores são investigados,

presos, torturados ou exilados do país. O DOI-Codi (Destacamento de Operações e

Informações e ao Centro de Operações de Defesa Interna) atua como centro de investigação e

repressão do governo militar. Ganha força no campo a guerrilha rural, principalmente no

Araguaia. A guerrilha do Araguaia é fortemente reprimida pelas forças militares.

No início da década de 70, o Brasil tinha uma população de 99.901.037

habitantes. Conforme revela o Oitavo Recenseamento Geral do Brasil: "5% de brasileiros

mais ricos que absorviam 27,3% da renda nacional em 1960, passam a arrecadar 36,3% em

1970 e os 50% mais pobres vêem reduzida sua participação na renda de 27,8% para 13,1%"

(IBGE, 1985).

Em 1974 assume a presidência o general Ernesto Geisel que começa um lento

processo de transição rumo à democracia. Seu governo coincide com o fim do milagre

econômico e com a insatisfação popular em altas taxas. A crise do petróleo e a recessão

mundial interferem na economia brasileira, no momento em que os créditos e empréstimos

internacionais diminuem. Geisel anuncia a abertura política lenta, gradual e segura. A

oposição política começa a ganhar espaço. Nas eleições de 1974, o MDB conquista 59% dos

votos para o Senado, 48% da Câmara dos Deputados e ganha a prefeitura da maioria das

grandes cidades.

20

Os militares de linha dura, não contentes com os caminhos do governo Geisel,

começam a promover ataques clandestinos aos membros da esquerda. Em 1975, o jornalista

Vladimir Herzog á assassinado nas dependências do DOI-Codi em São Paulo. Em janeiro de

1976, o operário Manuel Fiel Filho aparece morto em situação semelhante. Em 1978, Geisel

acaba com o AI-5, restaura o habeas-corpus e abre caminho para a volta da democracia no

Brasil.

A vitória do MDB nas eleições em 1978 começa a acelerar o processo de

redemocratização. O general João Baptista Figueiredo decreta a Lei da Anistia, concedendo o

direito de retorno ao Brasil para os políticos, artistas e demais brasileiros exilados e

condenados por crimes políticos. Os militares de linha dura continuam com a repressão

clandestina. Cartas-bomba são colocadas em órgãos da imprensa e da OAB (Ordem dos

advogados do Brasil). No dia 30 de Abril de 1981, uma bomba explode durante um show no

centro de convenções do Rio Centro. O atentado fora provavelmente promovido por militares

de linha dura, embora até hoje nada tenha sido provado.

2 Estado, cultura e censura

A ligação entre Estado e cultura não é uma exclusividade do regime militar em

terras brasileiras. Já na década de 30, pode ser vista com grande nitidez, pois com a

instauração do Estado Novo, o aparelho estatal passa a ter um controle mais efetivo sobre as

instituições e manifestações culturais, com a criação do serviço Nacional de Teatro, da

Revista Cultura e Política, ou ainda, com o advento do grande aparelho de censura durante o

governo de Getúlio Vargas, o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda): “No Estado de

Segurança Nacional, não apenas o poder conferido pela cultura não é reprimido, mas é

desenvolvido e plenamente utilizado. A única condição é que esse poder seja submisso ao

Poder Nacional, com vistas à Segurança Nacional.”(COMBLIN, 1980, p..239).

É interessante ressaltar que o Estado Autoritário Brasileiro, nos tempos de Getúlio

ou dos generais, não é um destruidor de manifestações culturais apenas. É, na verdade, um

disseminador, mas de uma cultura catalisada e projetada por ele. No regime militar, por

21

exemplo, nascem os best-sellers, crescem as indústrias de disco, surgem verdadeiros

“impérios” da comunicação em massa, como a TV Globo e a Editora Abril. É nesse momento

também, mais aproximadamente entre os anos de 1975 e 1976, que o Brasil torna-se o quinto

maior produtor de filmes no mercado mundial. O Estado Brasileiro, através da

EMBRAFILME, impõe a ampliação da quota de exibição de filmes brasileiros para 112 dias

ao ano, nos cinemas: “O filme é uma arte, o cinema uma indústria” (INC, 1967).

Com a criação do INC (Instituto Nacional de Cultura), o Estado Militar Brasileiro,

através de órgãos, como a EMBRAFILME, cria um direcionamento dentro dessa indústria

cultural, ou seja, ao invés de simplesmente reprimir, o governo passa a colaborar com a

expansão do entretenimento desvinculado da realidade política. João G. Aragão, Secretário

Geral do MEC, em palestra proferida no ano de 1979 nos dá uma dimensão da política

cultural em vigência: “Acredito que o estabelecimento de uma política cultural conduzirá a

um equilíbrio entre valor econômico e valor social através do eixo cultural. Cultura não é

luxo, logo não pode ser classificada como não utilitária e não rentável”

Podemos observar que enquanto a ditadura era beneficiada pelo crescimento

econômico, chamado de “milagre brasileiro”, pautado na entrada maciça de capital

estrangeiro, os meios de comunicação eram inundados com os slogans como “Brasil, ame-o

ou deixe-o”, “Ninguém segura este país” ou “Este é um país que vai pra frente”. A conquista

do tricampeonato Mundial em 1970 contribuiu em muito para o clima ufanista, expresso nas

canções abaixo citadas:

Pra Frente Brasil (Miguel Gustavo, 1970)

Noventa milhões em ação

Pra frente Brasil do meu coração

Todos juntos vamos

Pra Frente Brasil

Salve a seleção

De repente é aquela corrente ...

Eu te amo, meu Brasil ( Dom e Ravel, 1971)

22

Eu te amo, meu Brasil, eu te amo

Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil

Eu te amo, meu Brasil, eu te amo

Ninguém segura a juventude do Brasil...

Porém, também é importante saber que o regime instituído a partir do golpe de 64

exerceu um controle bem maior, dentro do contexto cultural brasileiro, já que o crescimento

da classe média e a maior concentração das pessoas em centros urbanos criam um espaço

cultural formado por um público muito maior do que os anos anteriores. A censura e a

repressão tentaram conter as manifestações culturais contrárias ao regime instituído pelos

militares. Em relação ao papel exercido pela censura dentro do contexto cultural brasileiro,

Chico Maranhão diz o seguinte: “O que a censura quer é calar o artista, ela tentou calar o

artista, calar tudo o que vinha contrariar o status quo. Me sentei várias vezes diante de

censores em vão, não liberaram minhas músicas” (10 de janeiro de 2006)

O Jornal “O Estado de São Paulo”, em 30 de janeiro de 2005, traz uma interessante

reportagem sobre a censura dentro do contexto ditatorial brasileiro, fazendo uso de entrevista

com uma ex-técnica de censura dos anos 70, a senhora Odette Martins Lanziotti, que na época

tinha como função a leitura de dezenas de letras de músicas todos os dias e decidia pela

aprovação ou não das composições. Criações de Milton Nascimento e Gilberto Gil, entre

muitas outras, passaram por sua avaliação:

Não tem aí uma música chamada Dois homens? Sou louca para encontrar essa música. Era uma letra muito inteligente, bem elaborada, mas eu sentia algo que não podia aprovar. Li de cima para baixo, de baixo para cima e demorei muito a descobrir o que era. Não me lembro dos versos, mas fazia apologia a dois homens juntos. Nunca mais vi esta música.

Em outra passagem, segue narrando sua atuação como censora: Muitas vezes, a gente reprovava a música, mas se sentia como se estivesse se prostituindo, porque não concordava com aquilo. Mas os censores tinham de ter o máximo de cuidado. Recebíamos muitas orientações que deviam ser seguidas. Quem aprovasse uma música que depois fosse reprovada em Brasília tinha de responder a processo interno (Odette Lanziotti, 85 anos, aposentada da Polícia Federal desde 1980) .

Certa vez aprovou uma letra que falava em ‘tempo de murici’. Lembrou-se do dito

popular “em tempo de murici, cada um cuida de si” e não viu problema na composição: “Fui

23

criada ouvindo o ditado, nem sabia que tinha um general Muricy (Antônio Carlos Muricy, um

dos líderes do golpe militar de 1964). Mas respondi a processo e me defendi. Tive colegas

que foram transferidos de cidade porque aprovaram letras que não deveriam ser liberadas.”

(Odete Lanziotti)

A pressão do regime militar contra a resistência cultural intensificou-se não só

sobre a música (embora tivesse mais destaque), também se deu sobre outras manifestações,

exarcebando-se também, a partir de 1965, sobre o teatro, começando com freqüentes cortes

em peças. Já em março a censura proibia pela primeira vez uma peça inteira: O vigário, de

Rolf Hochhuth, montada no Rio. Em julho do mesmo ano ocorreu também a primeira

proibição de um espetáculo antes mesmo da estréia: O berço do herói, de Dias Gomes.

Liberdade, liberdade, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel sofreu 25 cortes em sua estréia

paulistana

Mas, como já falado, o regime militar não fez uso apenas da censura, também fez

uso da repressão. Para se ter uma idéia, o elenco de Roda viva, de Chico Buarque foi agredido

em Porto Alegre, e a censura terminou por interditar o espetáculo. No fim da década, a

repressão cultural, à sombra do AI-5, extremou-se a tal ponto que algumas peças passaram a

ser proibidas em todo o território nacional antes mesmo da estréia. Foi o que ocorreu, por

exemplo, com Abajur lilás, de Plínio Marcos, e Calabar, de Ruy Guerra e Chico Buarque. Ao

mesmo tempo, a repressão deu-se com uma voracidade maior sobre a música, fazendo uso da

violência, das prisões e dos exílios, com intuito de calar as vozes de parte dos cantores

brasileiros. (PROVASEPROVAS.COM.BR, 10 de janeiro de 2006)

O último recurso do poder é a utilização da violência. Não se torna necessário o

uso constante da violência, basta que exista a ameaça de sua utilização, ou seja, há a

possibilidade de seu exercício a qualquer hora, em qualquer lugar. Ao mesmo tempo, o

indivíduo não possui a certeza de não estar praticando “delitos”, ou, se, conseqüentemente,

pode ser detido, ou desaparecido. Assim, a sociedade passa a ter como grande certeza a

existência da violência, fortalecida pelas prisões, desaparecimentos, ou ainda, como fazia a

polícia chilena, dentro de seu regime ditatorial, ao pegar qualquer indivíduo dentro de sua

residência e colocá-lo dentro da viatura para ser mostrado pelas ruas do bairro, e, logo em

seguida, deixá-lo em casa, reforçando assim o caráter de vigilância e a angústia da sociedade

.

24

Chico Buarque, fazendo uso do pseudônimo “Julinho da Adelaide”, deixa clara a

constante angústia de viver sob um regime ditatorial, ao criar em 1973 a música “Acorda

amor”: “Acorda amor/Eu tive um pesadelo agora/Sonhei que tinha gente lá fora/Batendo no

portão, que aflição/Era a dura, numa muito escura viatura / Minha nossa santa criatura/

Chame, chame, chame lá/Chame, chame o ladrão, chame o ladrão”

Vivendo em uma época que vê o regime ditatorial legitimado por uma

Constituição e pela promulgação de uma Lei de Segurança Nacional que levará civis a

enfrentarem cortes marciais, a repressão toma conta do cotidiano brasileiro, inclusive na hora

do sono. Ao mencionar “eu tive um pesadelo agora”, Chico Buarque torna evidente que os

abusos ditatoriais estão presentes até no subconsciente de cada brasileiro na época: Acorda

amor / Tem gente já no vão de escada / Fazendo confusão, que aflição / São os homens / E eu

aqui parado de pijama / Eu não gosto de passar vexame/ Chame, chame, chame / Chame o

ladrão, chame o ladrão.

Já nessa estrofe, o pesadelo transforma-se em realidade, já que realmente fazia

parte da realidade ditatorial o uso da repressão. Ao mesmo tempo, a partir desse trecho

observamos que a invasão policial não tem justificativa clara, como era muito comum na

época, não existindo, inclusive, a necessidade de mandados judiciais para que prisões fossem

efetivadas. Além disso, a frase “chame o ladrão” dá indício de que um ladrão deveria ser

preso por essa operação policial, e não uma pessoa inocente: “Se eu demorar uns meses /

Convém, às vezes, você sofrer / Mas depois de um ano eu não vindo / Ponha a roupa de

domingo / E pode me esquecer / Acorda amor / Que o bicho é brabo e não sossega / Se você

corre o bicho pega / Se fica não sei não / Atenção / Não demora/ Dia desses chega a sua hora

/ Não discuta à toa não reclame / Clame, chame lá, chame, chame, chame o ladrão, chame o

ladrão, chame o ladrão / (Não esqueça a escova, o sabonete e o violão)”.

Nessas duas últimas estrofes da música podemos verificar a força da repressão,

“Que o bicho é brabo e não sossega” e “Não discuta à toa, não reclame”.Também, os

desaparecimentos, que foram constantes, são denunciados na frase “Mas depois de um ano eu

não vindo / Ponha a roupa de domingo”

Dentro de uma ordem ditatorial, o uso da violência exercida pelo órgão estatal tem

uma representação, tanto para aquele que sofre, quanto para o restante da sociedade, conforme

25

nos explica Ximena Barraza. No fundo, a tortura é a encarnação de legalidade autoritária. A

lei é ditada sob a forma de castigo. Como no relato de Kafka sobre a colônia penitenciária,

publica-se a lei gravada na pele do culpado. Não é necessário comunicar-lhe sua sentença, já

que vai conhecer no próprio corpo. O corpo é o espaço onde se generaliza a norma abstrata. A

tortura dá a conhecer a norma, para que o corpo sirva de memória. O torturado testemunha

com sua vida a perpetuidade da lei. É a testemunha da existência da ordem (BARRAZA,

págs. 148 e 149).

É importante mencionar o exemplo dado por Ximena Barraza de um indivíduo

preso durante o regime ditatorial chileno. Segundo ele, ao ser detido, um dos policiais atirou

contra ele, atingindo seu tórax. Assim mesmo, continuou sendo interrogado e torturado, mas,

diante de sua debilidade, foi conduzido a um hospital. Enquanto recebia tratamento médico,

interrogatórios e torturas continuavam. Seu tratamento médico tinha como principal objetivo

fazer com que sentisse melhor a tortura:

O segredo principal do governo consiste em debilitar o espírito público, até o

ponto de desinteressá-lo por completo das idéias e princípios com que se costuma construir as

revoluções. Em todos os tempos, tanto os povos como os indivíduos, contentam-se com

palavras. Quase invariavelmente, bastam-lhes a aparências; não pedem mais. É possível então

criar instituições fictícias que correspondam a idéias e a uma linguagem igualmente fictícia.

(BARRAZA, 1980, p. 142 e 143).

3. A Música Brasileira

A expansão da música popular brasileira se deve ao processo de urbanização de

nossa população, e conseqüentemente, ao crescimento do prestígio do carnaval, festa popular

e urbana. Porém, é com o aparecimento do rádio que o consumo da música brasileira chega a

uma grande parcela da população, pois a colocou a disposição de todos aqueles que não

possuíam o aparelho para rodar o disco.

O disco teve o objetivo de criar as bases do mercado para a produção musical,

sendo mais consumido do que o livro desde os seus primeiros anos, mas é o rádio que dá à

música dimensões gigantescas. Esse mercado musical tem suas dimensões ampliadas também

pela televisão, que inaugurada por Assis Chateaubriand, em 1950, torna-se bastante popular

26

na década de 60, juntando-se ao rádio nesse processo de difusão: “(...) cedo ficou constatado

que música, além de arte é mercadoria, precisava receber determinado tratamento, adequado à

sua colocação no mercado; não é de surpreender que o teor artístico tenha cedido lugar ao teor

mercantil” (SODRÉ, 1983).

Os festivais da canção, produzidos pelas principais emissoras de TV na segunda

metade dos anos 60, com grande “teor mercantil”, têm como saldo uma nova geração de

artistas e uma reestruturação da música popular. Por conta do agravamento da repressão

política e da censura, o final da década é acompanhado pelo nascimento em terras brasileiras

da canção de protesto.“E festival com vaia é o que mais faz vender”, observou Ismael Correia

(apud SODRÉ, 1983) , empresário de alguns músicos brasileiros nas décadas de 60 e 70.

Os festivais começam a ser vistos como elemento representativo da escolha

popular. Às medidas proibitivas de participação em debates públicos, agremiações e eleições,

a juventude respondia cantando e consagrando seus eleitos, investidos da consciência dos

valores comuns e das aspirações coletivas.

Chico Maranhão explica a marcante presença estudantil nos festivais e,

conseqüentemente, nos embates políticos dentro do regime ao falar:

Dentro do processo de evolução do capitalismo, o desejo pela revolução sai da cabeça dos operários e chega à classe estudantil, à classe média, como muito bem fala Marcuse, filósofo que influenciou profundamente a universidade brasileira dentro desse período, sendo, inclusive, sua leitura proibida dentro do regime ditatorial. (JANEIRO, 2006).

Em 1968, a juventude do mundo se rebela em vários cantos e continentes. Em

Praga os jovens se rebelam contra um governo autoritário de esquerda, nos EUA contra a

Guerra do Vietnã, na França contra o presidente De Gaulle, nem o governo moderado alemão

escapa a ira dos estudantes. No Brasil, o movimento estudantil tem como alvo a ditadura

militar:

As leituras de Marcuse influenciaram muitas cabeças pensantes do Brasil, principalmente nessa região de São Paulo e Rio de Janeiro. Há um encontro, uma adequação muito grande da idéia de Marcuse com a América Latina nesse momento, quando ele... a idéia dele era essa... era mostrar que estava vindo uma mudança do capital, da maneira de encarar o capital... de que o núcleo da revolução, ou da evolução (É bem melhor assim!) sai do âmbito do operário e passa pro universitário, passa prá dentro da universidade. Isso é uma mudança filosófica muito importante no meu tempo, e o Marcuse quando escreve isso, quando tomamos consciência disso, isso transforma muito a vida universitária

27

brasileira. Dentro da Europa isso parece bastante claro diante das manifestações estudantis. O que acontece na França, por exemplo, as revoltas estudantis. Tudo isso, de certa forma, influencia os estudantes brasileiros (Chico Maranhão, janeiro de 2006)

Herbert Marcuse , autor de Eros e Civilização, foi um dos integrantes da Escola de

Frankfurt. herdeiro de uma tradição marxista, proclama sua descrença num processo

revolucionário organizado por operários, dando aos estudantes o papel de organizadores da

dialética histórica. Viriato Gaspar, poeta maranhense, também nos dá noção das

transformações ocorridas no mundo nessa época ao criar “Salmo 70”.

SALMO 70

Música: Cesar Teixeira

Letra: Viriato Gaspar

Salve a bomba explodindo na porta!/ Salve os carros que esmagam meu pranto/ contra o

asfalto molhado da lua./ Salve o negro que o branco elimina/ pra chegar mais depressa no

espaço/ e o seu sangue escorrendo na rua./ Salve o laboratório onde eu compro/ o bebê que

você não gerou!/ Salve a guerra de 30 e a pílula./ Ave, você, gratia plena, amor,/ miserere

nobis, aleluia,/ dominus tecum, aleluia!/ Salve a hora de vida que resta/ Para Cristo correndo

na praça/ Num foguete de mil megatons./ Salve o pão de suor e desgosto/ e o Vietnã

explodindo em meu rosto,/ e esse jato que chupa meu sangue!/ Ave, você, gratia plena, amor,

miserere nobis, aleluia,/ dominus tecum, aleluia!/ Salve o hoje que eu tenho em meus dedos

pra encher de futuro e de amor/ e fazer o amanhã que virá./ Salve o lindo pendão do teu

corpo

desfraldado de noite em meus braços,/ e esse amor que me rói como um câncer!/ Ave, você,

gratia plena, amor,/ miserere nobis, aleluia,/ dominus tecum, aleluia!

Parte das transformações ocorridas no mundo entre as décadas de 60 e 70 são

claramente observadas nessa letra. Os trechos “Salve o laboratório /onde eu compro o bebê

que você não gerou!” e “Salve a guerra de 30 e a pílula” dizem respeito aos bebês de proveta

e a pílula anticoncepcional. Ou ainda, “Num foguete de mil megatons” nos remete às viagens

espaciais humanas realizadas nesse período, daí o nome “Salmo 70”, em relação à década de

70.

28

A relação música e história atinge sua maior intensidade nos anos 60 e 70, quando

boa parte do mundo vive um período de agitações sociais e políticas, em particular no Brasil,

um país regido por uma ditadura militar desde 1964. Segundo Caetano Veloso, em seu livro

“Verdade Tropical”, a grande efervescência cultural dentro das terras brasileiras está

associada ao fato de que, “naquele momento, os artistas brasileiros possuírem um inimigo

comum: o regime militar”.(VELOSO, 1997, p. 178)

Porém, o cantor e compositor maranhense Chico Maranhão acaba expandindo essa

explicação ao se referir ao momento que o mundo passava, não dando à situação interna

vivenciada no Brasil como única explicação.

É necessário observar a situação mundial para entender a riqueza cultural vivida pelo Brasil numa época conduzida pela ditadura militar. O mundo vê Beatles e Elvis Prersley disseminando liberdade, e o Brasil também, embora esteja vivendo uma ditadura militar. A sensualidade presente na presença de palco de Elvis e os Beatles cantando suas vontades ou debochando da rainha são veículos da liberdade. Há também nesse uma questão muito forte, que é da abertura do sexo. A questão do tóxico também, nessa mesma época, experimentar as coisas proibidas é muito forte.Então, o mundo passa a si abrir dentro desse período, de 50 para 60. Nós somos filhos de um processo mundial, de um processo muito mais amplo. (JANEIRO, 2006)

No cenário interno, Chico Maranhão vê antes mesmo do golpe militar um terreno

extremamente fértil para a evidência cultural brasileira:

É um momento espetacular evidenciado no Brasil dentro desse período. O Brasil vinha de um movimento, de um crescimento, de um progresso muito grande que tem origem ... que tem exemplar situação na fundação de Brasília. O Brasil vivia uma mudança muito grande nesse período, e havia o progresso ‘boiando no ar” com a questão de Brasília, com um presidente... um democrata de posições progressistas. E o Brasil vinha de um movimento muito forte nesse sentido, de 50 prá cá. E isso vem estourando, vem se confirmando exatamente no período de 62, 63 até 70. (Chico Maranhão, janeiro de 2006)

Compositores e intérpretes de todo Brasil chegam a São Paulo e Rio de Janeiro, os

dois maiores centros urbanos brasileiros. A heterogeneidade da música brasileira torna-se

latente nesse período, incorporando uma série de elementos essencialmente regionais. O

reconhecimento por parte do público de cantores e compositores como Djavan, Fafá de

Belém, Belchior e Fagner, acaba confirmando isso. Sobre o papel exercido pelos artistas em

relação ao povo brasileiro, Chico Maranhão fala: “É de suma necessidade salientar que quem

realizava a principal ponte das novas idéias que se expandiam pelo mundo e o povo

29

brasileiro, em especial os estudantes, eram os artistas”.

Como já dito, nesse momento a música brasileira vive um grande momento de

criatividade. A bossa nova (desde a década de 50), a música de protesto, a Jovem Guarda

(Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Vanderléia) e o Tropicalismo de Tom Zé, Caetano Veloso,

Gilberto Gil, Torquato Neto que sintetizava toda essa mudança.

3.1 - 2“Em caras de presidentes. Em grande beijos de amor. Em dentes, pernas,

bandeiras. Bomba e Brigitte Bardot”:O Tropicalismo

“Nós sabíamos que grande parte da MPB reagiria mal ao que estávamos

fazendo. Edu Lobo, Francis Hime, Wanda Sá, Dori, Sérgio Ricardo, e, mais que todos,

Geraldo Vandré, mostravam-se meio irritados, meio decepcionados conosco” (VELOSO,

1997, p.230). Desobedecendo ao embate MPB versus Jovem Guarda (iê-iê-iê), fazendo uso,

inclusive, de elementos presentes nas duas facções, com influências externas declaradas,

nasce o Tropicalismo, que segundo Gilberto Gil, fez uso de “uma música mais comercial com

intuito de veicular idéias revolucionárias”. (VELOSO, 1997, p.172)

Chico Maranhão, em relação às contribuições culturais estrangeiras sobre o meio

artístico brasileiro, afirma que :

Não que esses artistas dos Estados Unidos e da Inglaterra sejam colonizadores, ao contrário, eles vem propor liberdade. E isso é fascinante pra qualquer país, ou pra qualquer grupo social que está reprimido... Liberdade é um sentimento que todos querem , e isso invade o Brasil também. É por aí que entra o Tropicalismo, é nessa linha que o tropicalismo se desenvolve. (Chico Maranhão, janeiro, 2006)

O manifesto tropicalista nasce com o lançamento do disco “Tropicália ou Panis et

circenses”, em 1968, tendo as participações de Nara Leão, Tom Zé, Caetano Veloso, Gil, Gal,

Mutantes e Duprat. Mas, antes disso, o tropicalismo já se anunciava no festival da Record de

1967, quando Caetano cantou “Alegria, alegria”, acompanhado do conjunto argentino os Beat

Boys. Na ocasião, introduziu na sua performance as guitarras, deixando clara a influência do

neo-rock’n roll inglês, o que os nacionalistas da MPB mais odiavam.

2 VELOSO, Caetano. Alegria, Alegria, 1968.

30

O nome “Alegria, alegria” faz referência a um bordão utilizado por Chacrinha e

traz pela primeira vez a palavra “Coca-cola” dentro de uma música brasileira, algo ousado até

para os cantores da Jovem Guarda.

ALEGRIA, ALEGRIA

Caetano Veloso

Caminhando contra o vento / Sem lenço, sem documento / No sol de quase dezembro/Eu vou /

O sol se reparte em crimes / Espaçonaves, guerrilhas / Em Cardinales bonitas/Eu vou /Em

caras de presidentes / Em grande beijos de amor / Em dentes, pernas, bandeiras/Bomba e

Brigitte Bardot / O sol nas bancas de revista / Me enche de alegria e preguiça/Quem já tanta

notícia? / Eu vou / Por entre fotos e nomes / Os olhos cheios de cores/ O peito cheio de

amores / Vãos / Eu vou / Por que não? Por que não?/ Ela pensa em casamento/ E eu nunca

mais fui à escola/ Sem lenço, sem documento/ Eu vou / Eu tomo uma coca-cola / Ela pensa

em casamento/ E uma canção me consola/ Eu vou/ Por entre fotos e nomes/ Sem livros e sem

fuzil/ Sem fome, sem telefone/ No coração do Brasil/ Ela sem sabe – até pensei/ Em cantar na

televisão/ O sol é tão bonito/ Eu vou.

O historiador Enor Paiano, em seu livro “Tropicalismo: bananas ao vento”, levanta

algumas possibilidades acerca da interpretação da música “Tropicália”, de Caetano Veloso:

“Sobre a cabeça os aviões/ Sob os meus pés, os caminhões/ Aponta contra os

chapadões, meu nariz”.

A palavra “chapadões’, presente nessa primeira estrofe, nos remete à região

centro-oeste, mais precisamente Brasília, o centro das decisões políticas brasileiras,

evidenciada mais ainda na segunda estrofe:“Eu organizo o movimento/ Eu oriento o carnaval/

Eu inauguro o monumento/No planalto central do pais”.

Os verbos na primeira pessoa, segundo Enor Paiano, nos remetem ao que se

passava na cabeça de parte dos jovens da época, que se achavam possuidores do poder de

transformar. Porém, logo na segunda frase, nota-se uma característica marcante do

Tropicalismo, o ato de equiparar elementos antagônicos, no caso “movimento” e “carnaval”, o

comprometimento em mudar e a atitude lúdica (descompromissada com a situação). “Viva a

31

bossa, sa, sa, Viva a palhoça, ça, ça, ça, ça”. O antagônico novamente está presente na

continuação da música.

A bossa nova, feita de elementos modernos e consumida pela classe média,

convive dentro da música com “palhoça”, palavra que de imediato nos remete ao

ultrapassado, a camada pobre do interior brasileiro: “O monumento é de papel crepom e

prata. Os olhos verdes da mulata / A cabeleira esconde atrás da verde mata/O luar do

sertão”.

O carnaval continua a ser mencionada na primeira frase, mas, agora, acompanhado

com elementos da nossa literatura romântica, na figura da mulata e de sua cabeleira, além da

verde mata: “O monumento não tem porta/ A entrada é uma rua antiga,/ Estreita e torta/ E

no joelho uma criança sorridente,/ Feia e morta/ Estende a mão”.

O lado lúdico, referente ao carnaval, e a natureza são abandonados para a

constatação da miséria.

“Viva a mata, ta, ta/ Viva a mulata, ta, ta, ta, ta/ No pátio interno há uma piscina

Com água azul de Amaralina/ Coqueiro, brisa e fala nordestina/ E faróis/ Na mão direita tem

uma roseira/ Autenticando eterna primavera/ E no jardim os urubus passeiam/ A tarde inteira

entre os girassóis”. Essa estrofe nos aponta que a realidade sempre é vista como positiva, uma

verdadeira “eterna primavera”, proclamada por aqueles que ocupam o poder, ou seja, a direita

brasileira, evidenciada na frase “na mão direita tem uma roseira”.Além disso, a estrofe faz

referência aos militares, que na época eram chamados de urubus:

“Viva Maria, ia, ia/ Viva a Bahia, ia, ia, ia, ia/ No pulso esquerdo o bang-bang/

Em suas veias corre muito pouco sangue/ Mas seu coração/ Balança a um samba de

tamborim”.A esquerda brasileira, direcionada a guerrilha, daí “bang-bang”, é mencionada

nesse trecho da música, sendo que sua principal preocupação, a defesa do que é nacional, é

enfocada na frase “mas seu coração balança a um samba de tamborim”

“Emite acordes dissonantes / Pelos cinco mil alto-falantes/ Senhoras e senhores

Ele põe os olhos grandes sobre mim”. Assim como poderia estar falando de João Gilberto,

poderia muito bem estar falando do clima de vigilância e medo existente naquele momento.

32

Na contracapa do disco “Tropicália ou Panis et Circenses”, dedicado a João Gilberto, Caetano

escreve: “Os acordes dissonantes já não bastam para cobrir nossas vergonhas, nossa timidez

transatlântica”.

“Viva Iracema, ma, ma/ Viva Ipanema, ma, ma, ma, ma/ Domingo é o fino-da-

bossa/ Segunda-feira está na fossa/ Terça-feira vai à roça/ Porém, o monumento/ bem

moderno/ Não disse nada do modelo/ Do meu terno/ Que tudo mais vá pro inferno, meu bem/

Que tudo mais vá pro inferno, meu bem/Viva a banda, da, da”. Nas últimas estrofes da

música, elementos antagônicos voltam a ser envolvidos. Como exemplo, o “Fino da bossa”,

programa apresentado por Elis Regina, que reunia grandes nomes da MPB, tem como

companhia a célebre frase de Roberto Carlos “que tudo mais vá pro inferno”, ligando dentro

do mesmo espaço as distintas MPB e a Jovem Guarda..

O termo “Tropicália”, segundo Enor Paiano, foi sugerido por um amigo ao ouvir a

canção, já que se identificava com uma obra do artista plástico Hélio Oiticica, que consistia

num labirinto de paredes de madeira, com areia no chão para ser pisada sem sapatos, ladeado

de plantas tropicais, indo dar, ao fim, num aparelho de televisão ligado.

A Tropicália se aproxima de Oswald de Andrade diante da idéia de antropofagia

cultural (canibalismo cultural), que consistia em devorar elementos culturais estrangeiros,

criando a partir disso, objetos associados a cultura brasileira, uma verdadeira neo-

antropofagia. Os tropicalistas estavam mais sintonizados com o que ocorria lá fora, onde os

ativistas buscavam a derrubada de todas as estruturas sob a bandeira de sexo, drogas e rock-

‘n’-roll, com jeans desbotados e pés descalços: era o início do movimento hippie.

3.2 3“Vem vamos embora que esperar não é saber. Quem sabe faz a hora não espera

acontecer”: A música de protesto

A época é marcada por uma série de debates em torno do papel que artistas e

intelectuais poderiam e deveriam exercer enquanto cidadãos que também sofriam os reflexos

das medidas sufocadoras tomadas contra a nação, e não apenas meros denunciadores dessas

3 VANDRÉ, Geraldo. Pra não dizer que não falei das flores, 1968.

33

medidas. E, principalmente, Geraldo Vandré e Chico Buarque destacam-se dentro dessa

proposta da música popular brasileira.

Chico Buarque torna-se o grande nome da música politizada, através de metáforas,

consegue driblar a censura como nas canções “Apesar de você”, “Samba de Orly”, “Meu Caro

Amigo’’ e Cálice. A censura passa a ser implacável com o compositor, este usa o fictício

Julinho da Adelaide, para fugir da censura como ocorre nas músicas “Acorda, amor” e “Jorge

Maravilha”.

APESAR DE VOCÊ

Chico Buarque

Hoje você é quem manda/ Falou, tá falado/ Não tem discussão, não/ A minha gente hoje

anda/Falando de lado e olhando pro chão./ Viu?/ Você que inventou esse Estado/ Inventou de

inventar/ Toda escuridão/ Você que inventou o pecado/ Esqueceu-se de inventar o perdão./

Apesar de você/ amanhã há de ser outro dia./ Eu pergunto a você onde vai se esconder/ Da

enorme euforia?/ Como vai proibir/ Quando o galo insistir em cantar?/Agua nova brotando/

E a gente se amando sem parar./ Quando chegar o momento/ Esse meu sofrimento/ Vou

cobrar com juros. Juro!/ Todo esse amor reprimido/Esse grito contido,/ Esse samba no

escuro./ Você que inventou a tristeza/ Ora tenha a fineza/ de “desinventar”./ Você vai pagar,

e é dobrado,/ Cada lágrima rolada/Nesse meu penar./ Apesar de você/ Amanhã há de ser

outro dia./ Ainda pago pra ver/O jardim florescer/ Qual você não queria./ Você vai se

amargar/ Vendo o dia raiar/Sem lhe pedir licença./ E eu vou morrer de rir/ E esse dia há de

vir/ antes do que você pensa/Apesar de você/ Apesar de você/ Amanhã há de ser outro dia./

Você vai ter que ver/ A manhã renascer/ E esbanjar poesia./ Como vai se explicar/ Vendo o

céu clarear, de repente,/ Impunemente?/ Como vai abafar/ Nosso coro a cantar,/ Na sua

frente. Apesar de você/ Apesar de você/ Amanhã há de ser outro dia./ Você vai se dar mal, etc

e tal,/ La, laiá, la laiá, la laiá…….

Nessa letra, Chico Buarque faz uso da descrição de vários fatos, utilizando-se de

uma linguagem puramente metafórica, com uma série de técnicas argumentativas para

despistar os censores e alertar o povo da situação na qual vivia o nosso país. Na letra dessa

música existem diversos mecanismos argumentativos implícitos, mas que se tornam explícitos

no momento em que o auditório toma consciência do conteúdo.

34

A letra intitulada “Apesar de você” demonstra de forma clara a vontade do

compositor, no caso Chico Buarque, expor sua indignação frente a essa “pessoa” que sabemos

ser o regime militar, que naquele momento não permite, entre outras coisas, que as coisas

aconteçam na sua ordem natural como no trecho em que faz uma analogia para ilustrar essa

idéia “Como vai proibir quando o galo insistir em cantar” ou “como vai se amargar vendo o

dia raiar, sem lhe pedir licença”. A analogia se faz presente, pois não é possível que alguém se

zangue porque o galo cantou, e o dia não pedirá licença para nascer, assim como as pessoas

não deixarão de ter suas opiniões somente porque é lei se calar diante dos fatos.

Em toda as estrofes da música aparece o refrão: “Apesar de você amanhã há de ser

outro dia” ou seja, apesar de tudo que a ditadura fez, torturando e matando quem se opusesse

a ela, chegou o momento da democracia. E esse desejo pela democracia não aparece de forma

explícita em meio a letra, porém está inserida na música, fazendo uso de figuras de

linguagem; “Ainda pago pra ver o jardim florescer qual você não queria”, “Você vai ter que

ver o jardim florescer e esbanjar poesia”.

Com relação aos valores, podemos destacar nesse trecho a referência a liberdade

primeiro trecho da letra; “Hoje você é quem manda, falou tá falado, não tem discussão”.

Diante da presença da frase “falou tá falado”, para indicar que o que era dito pelos militares

era lei e não havia a possibilidade de contestação por parte do povo, ou seja, os valores são

invertidos, “a frase falou tá falado” deve apresentar um valor inverso ao que é colocado na

música, o povo deve perceber que não se deve calar diante das ordens da ditadura e mudar o

sentido de “Hoje você é quem manda falou tá falado”.

Em julho de 1966, Geraldo Vandré e Fernando Lona vencem o II Festival

Nacional de MPB, da TV Excelsior, São Paulo, com a música "Porta-estandarte". O

chamamento ao cantar, ("Desce teu rancho cantando/Essa tua esperança sem fim/Deixa que a

tua certeza/ Se faça do povo a canção/ Pra que teu povo cantando/O teu canto ele não seja em

vão"), reflete a crença de que "as dores e tristezas um dia ainda vão findar", sendo essa a

bandeira do poeta, transformado agora em porta-estandarte: o cantar como esperança para o

difícil momento vivido pelo país após a instalação do golpe militar.

PORTA-ESTANDARTE

Geraldo Vandré e Fernando Lona

35

Olha que a vida tão linda se perde em tristezas assim/ Desce o teu rancho cantando essa tua

esperança sem fim/ Deixa que a tua certeza se faça do povo a canção/ Pra que teu povo

cantando teu canto/ Ele não seja em vão/ Eu vou levando a minha / Cantando e canto sim/ E

não cantava se não fosse / Levando pra quem me ouvir/ Certezas e esperanças pra trocar/

Por dores e tristezas que bem sei/ Um dia ainda vão findar/ Um dia que vem vindo/ E que eu

vivo pra cantar/ Na avenida girando, estandarte na mão.

Em outubro do mesmo ano tem início o Festival da MPB da TV Record, de São

Paulo que teve duas músicas vencedoras: "A banda", de Chico Buarque de Hollanda e

"Disparada", de Geraldo Vandré, por exigência do público assistente.

"Porque gado a gente marca/Tange, ferra, engorda e mata/Mas com gente é

diferente", o compositor denuncia injustiças e as grandes diferenças sociais em terras

brasileiras. Ao mesmo tempo, o poeta faz referência a violência utilizada pelo regime militar.

A composição inicia-se com uma espécie de apresentação do cantor, em que ele narra seu

passado, sua terra natal e as vitórias que conseguiu até então, demonstrando dessa forma,

como formou sua atual visão sobre as coisas que o cercam, finalizando com a certeza de que

canta para conduzir a verdade, não cantando "pra enganar(...) nem por mim, nem por

ninguém."

DISPARADA

Geraldo Vandré e Theo de Barros

Prepare o seu coração prás coisas que eu vou contar/ Eu venho lá do sertão, eu venho lá do

sertão/ Eu venho lá do sertão e posso não lhe agradar/ Aprendi a dizer não, ver a morte sem

chorar/ E a morte, o destino, tudo, a morte e o destino, tudo/ Estava fora do lugar, eu vivo

prá consertar/ Na boiada já fui boi, mas um dia me montei/ Não por um motivo meu, ou de

quem comigo houvesse/ Que qualquer querer tivesse, porém por necessidade/ Do dono de

uma boiada cujo vaqueiro morreu/ Boiadeiro muito tempo, laço firme e braço forte/ Muito

gado, muita gente, pela vida segurei/ Seguia como num sonho, e boiadeiro era um rei/ Mas o

mundo foi rodando nas patas do meu cavalo/ E nos sonhos que fui sonhando, as visões se

clareando/ As visões se clareando, até que um dia acordei/ Então não pude seguir valente

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em lugar tenente/ E dono de gado e gente, porque gado a gente marca/ Tange, ferra,

engorda e mata, mas com gente é diferente/ Se você não concordar não posso me desculpar/

Não canto prá enganar, vou pegar minha viola/ Vou deixar você de lado, vou cantar noutro

lugar/ Na boiada já fui boi, boiadeiro já fui rei/ Não por mim nem por ninguém, que junto

comigo houvesse/ Que quisesse ou que pudesse, por qualquer coisa de seu/ Por qualquer

coisa de seu querer ir mais longe do que eu/ Mas o mundo foi rodando nas patas do meu

cavalo/ E já que um dia montei agora sou cavaleiro/ Laço firme e braço forte num reino que

não tem rei.

"Bem-vinda", de Chico Buarque de Hollanda vence em 1968, o IV Festival de

MPB, da TV Record, de São Paulo. O cantar a esperança é retomado nesse poema de Chico

Buarque de Hollanda que, se auto-definindo como "dono do abandono e da tristeza", se

reconhece sozinho e cercado de incertezas: "Pode ser que você venha por mero favor/Ou

venha coberta de amor (...) Pode ser que você tenha um carinho pra dar/Ou venha pra se

consolar", e pede, em nome do luar e dos jardins floridos, do pinho e do samba, da aurora e

da cidade, que a esperança volte e chegue tão linda, que seja capaz de iluminar o quarto

escuro, "entrando como o ar puro todo novo da manhã":

BEM-VINDA

Chico Buarque de Hollanda

Dono do abandono e da tristeza/ Comunico oficialmente/ Que há lugar na minha mesa/Pode

ser que você venha por mero favor/ Ou venha coberta de amor/ Seja lá como for/Venha

sorrindo/ Ah! Bem-vinda, bem-vinda, bem-vinda/ Que o luar está chamando/ Que os jardins

estão florindo/ E eu estou sozinho/ Cheio de anseios e esperança/ Comunico a toda gente/

Que há ;lugar na minha dança/ Pode ser que você venha/ Morar aqui,/ Ou venha pra se

despedir/ Não faz mal/ pode vir até mentindo/Ah! Bem-vinda, bem-vinda, bem-vinda/ Que o

meu pinho está chorando/ Que o meu samba está pedindo/ E eu estou sozinho/ Venha

iluminar meu quarto escuro/ Venha entrando como o ar puro/ Todo novo da manhã/ Venha

minha estrela, madrugada/ Venha minha namorada/Venha amada, venha urgente/ Venha

irmã,/ Bem-vinda, bem-vinda, bem-vinda/ Que essa aurora está custando/ Que a cidade está

dormindo/ E eu estou sozinho/Certo de estar perto da alegria/ Comunico finalmente,/ Que há

37

lugar na poesia/Pode ser que você tenha um carinho pra dar/ Ou venha pra se consolar/

Mesmo assim pode entrar/ Que é tempo ainda/ Ah! Bem-vinda, bem-vinda, bem-vinda/ Ai que

bom que você veio/E você chegou tão linda/ E eu não cantei em vão/ Bem-vinda, bem-vinda,/

Bem-vinda, bem-vinda,/ Bem-vinda no meu coração.

Muitos artistas e intelectuais foram forçados a ir para o exílio, como aconteceu

com os tropicalistas, que foram mandados para Londres. Estava decretado o silêncio. No

mesmo ano, Chico Buarque de Hollanda em parceria com Tom Jobim vence o III FIC nas

fases nacional e internacional, com "Sabiá". Nesse mesmo festival, Geraldo Vandré conquista

o público com "Pra não dizer que não falei de flores" transformado pouco tempo depois, em

uma espécie de hino das frentes de resistência ao regime.

PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE FLORES (Caminhando)

Geraldo Vandré

Caminhando e cantando e seguindo a canção/ Somos todos iguais braços dados ou não/Nas

escolas, nas ruas, campos, construções/ Caminhando e cantando e seguindo a canção/Vem

vamos embora que esperar não é saber/ Quem sabe faz a hora na espera acontecer/Pelos

campos a fome em grandes plantações/ Pelas ruas marchando indecisos cordões/Ainda

fazem da flor seu mais forte refrão/ Acreditam nas flores vencendo canhão/Vem vamos

embora que esperar não é saber/ Quem sabe faz a hora não espera acontecer/Há soldados

armados, amados ou não/ Quase todos perdidos de armas na mão/ Nos quartéis lhes ensinam

uma antiga lição/ De morrer pela pátria e viver sem razão/ Vem vamos embora que esperar

não é saber/ Quem sabe faz a hora não espera acontecer/ Nas escolas, nas ruas, campos,

construções/ Somos todos soldados, amados ou não/ Caminhando e cantando e seguindo a

canção/ Somos todos iguais braços dados ou não/ Vem vamos embora que esperar não é

saber/ Quem sabe faz a hora não espera acontecer/ Os amores na mente, as flores no chão/ A

certeza na frente, a história na mão/ Caminhando e cantando e seguindo a

canção/Aprendendo e ensinando uma nova liça/ Vem vamos embora que esperar não é

saber/Quem sabe faz a hora não espera acontecer

O júri elegeu como campeã a música “Sabiá”, de Tom Jobim e Chico Buarque,

diante das vaias da platéia. Porém, a música “Sabiá” é uma outra música de protesto,

disfarçada pelas metáforas de Chico e Tom. Texto paródico, "Sabiá" opõe uma pátria ideal,

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onde ainda se ouve cantar sabiás, a uma pátria saqueada e depredada, onde não há mais

palmeiras em cuja sombra se possa deitar, ou flores que possam ser colhidas, e noites que não

se queiram, criando uma tensão entre um passado marcado pela nostalgia, e um futuro

marcado pela esperança: "Vou voltar/Sei que ainda vou voltar/Para o meu lugar, foi lá/E é

ainda lá/Que eu hei de ouvir cantar/Uma sabiá".

O presente é marcado pela negação: "Vou deitar à sombra/De uma palmeira/Que

já não há/Colher a flor que já não dá/E algum amor talvez possa espantar/As noites que eu

não queria/Lhe anunciar um dia", caracterizando o exílio de toda uma geração.

Palavras-chave do texto-base de Gonçalves Dias são recuperadas aqui, como:

sabiá, palmeira, flor, amor (características da terra natal) e o advérbio lá que reforça o sentido

de uma volta decidida ("E é pra ficar") porque lá, é a terra do poeta.

O sentimento da saudade em "Sabiá" tem um sentido social: saudade, de tudo o

que se perdeu, e não meramente espacial, como no poema de Gonçalves Dias.

SABIÁ

Tom Jobim e Chico Buarque

Vou voltar/ Sei que ainda vou voltar/ Para o meu lugar/ Foi lá e é ainda lá/ Que eu hei de

ouvir cantar/ Uma sabiá/ Vou voltar/ Sei que ainda vou voltar/ Vou deitar à sombra/ De um

palmeira/ Que já não há/ Colher a flor/ Que já não dá/ E algum amor Talvez possa

espantar/As noites que eu não queira/ E anunciar o dia/ Vou voltar/ Sei que ainda vou voltar/

Não vai ser em vão/ Que fiz tantos planos/ De me enganar/ Como fiz enganos/ De me

encontrar/Como fiz estradas/ De me perder/ Fiz de tudo e nada/ De te esquecer/ Vou voltar/

Sei que ainda vou voltar/ Para o meu lugar/ Foi lá e é ainda lá/ Que eu hei de ouvir cantar/

Uma sabiá.

Com os maiores compositores da MPB no exílio, os órgãos de comunicação sob

censura, e a onda ufanista imposta ao país pelos serviços de propaganda da ditadura ("Eu te

amo meu Brasil", "Brasil, ame-o ou deixe-o", "Brasil, eu fico"), o grande sucesso musical do

ano é "Pra frente, Brasil" de Miguel Gustavo, composto especialmente para a Copa do Mundo

39

do México, que consagrou o Brasil Tri-Campeão Mundial, e a grande vencedora do V FIC,

"BR-3", de Antonio Adolfo e Tibério Gaspar.

Em referência a volta dos intelectuais, líderes políticos e artistas exilados, Chico Buarque

compôs o “Samba de Orly”.

SAMBA DE ORLY

Chico Buarque

Vai meu irmão/ Pega este avião/ Você tem razão/ De correr assim/ Desse frio/ Mas beija /O

meu Rio de Janeiro/ Antes que um aventureiro/ Lance mão/ Pede perdão/ Pela duração (pela

omissão)/ Dessa temporada (Um tanto forçada)/Mas não diga nada/ Que me viu chorando/ E

pros da pesada/ Diz que eu vou levando/ Vê como é que anda/ Aquela vida à toa/E se puder

me manda/ Uma notícia boa”

Da Venezuela, Geraldo Vandré canta sua "Pátria Amada", espécie de nova

"Canção do Exílio", que encontra no amor, o sentido da permanência. A pátria recompensa

assim o poeta, com a certeza de que será sempre amado por ela, num reconhecimento da

doação do seu cantar.

PÁTRIA AMADA

GeraldoVandré

Se é pra dizer adeus/ Pra não te ver jamais/ Eu que dos filhos teus/ Fui te querer demais/No

verso que hoje chora/ Pra me fazer capaz/ Da dor que me devora/ Quero dizer-te mais/Que

além de adeus agora/ Eu te prometo em paz/ Levar comigo afora/ O amor demais/Amado

meu/ Sempre serás/ Quem me guardou/ No teu cantar/ E me levou/ Além do meu/Além do céu/

E além do mar/ Amado meu/ Que além de mim se deu/ Não se perdeu/ E nem se perderá.

4. 4444“Aqui na terra, quem não berra, nada ganha, é mais um boi de piranha como todo brasileiro”: César Teixeira e Chico Maranhão cantam e contam a ditadura em terras do Maranhão 4 TEIXEIRA, César.Boi de Piranha, 1970.

40

Parte da produção musical feita por maranhenses dentro das décadas de 60 e 70 foi

profundamente influenciada pelos contextos internacional e nacional, ao mesmo tempo que

não afastou-se da análise de questões relacionadas a realidade vivenciada pela grande parcela

da população maranhense, tornando-se parte da resistência implementada por parte da cultura

brasileira ao Governo Militar.

Dessa forma, ao identificar o processo de construção de suas obras, verificamos os

implícitos, os sentidos não ditos, os silenciamentos, agora explicados pelas suas falas, pois

com tais vestígios podemos verificar a riqueza poética e as linguagem metafóricas criadas por

César Teixeira para denunciar as mazelas criadas ou sustentadas pelo Regime Militar dentro

do Maranhão.

Assim, Chico Maranhão fala da chegada de influências sobre a música feita no

Maranhão:

Eu não sei como é que essas idéias chegavam a São Luís. Evidentemente que por algum caminho chegavam... porque os artistas tem uma ‘antena’, uma coisa muito antenada e muito ligada, e um cara como César (César Teixeira) capta, como eu capto, como eu captei, não precisa você ler isso, sabe? (JANEIRO, 2006)

Em entrevista, César Teixeira, cantor e compositor maranhense, explica como tais

influências chegavam:

Através do rádio escutávamos Beatles, Elvis, Geraldo Vandré, Chico Buarque, Caetano e seu tropicalismo. Quando algumas de suas músicas foram proibidas, continuávamos a escutar. Para se ter idéia, através do “mercado negro”, comprávamos até o disco que Caetano fez na Inglaterra. (JANEIRO, 2006)

Por mais que estivesse afastada do eixo Rio-São Paulo, ou seja, o principal centro

de manifestações culturais brasileiras, a cultura maranhense também foi vigiada pelos

aparelhos de censura e repressão, vinculados ao Regime Militar, embora ainda não tivesse

tornado-se comercial, já que não existiam gravadoras nessas terras, e conseqüentemente, sua

maior divulgação através das rádios. A música em especial, disseminava-se a partir da ligação

com o teatro, ou seja, geralmente, assistia-se shows musicais ao mesmo tempo em que as

canções eram interpretadas por atores.

41

César Teixeira nos conta sobre o funcionamento dos aparelhos de censura dentro

das terras maranhenses:

Tanto na música, quanto no teatro, ou a música pra teatro tinha que passar pela censura prévia, aqui na Polícia Federal. A presença desse censor era constante nesse período, tanto nos ensaios gerais e shows de teatro que a gente fazia no Arthur Azevedo, ou em outro local, quanto na possível edição de um disco independente. Um certo dia do ano de 1975, fui chamado, em meio a um ensaio, por um policial e escoltado até a sala do censor por causa da música “Bandeira de aço”. (JANEIRO, 2006)

A música “Bandeira de aço” era uma crítica aos dez anos de Regime Militar. E a

ida de César até a sala do censor justificava-se pelo próprio título da música, que certamente

se referia ao governo dos militares.A justificativa dada ao censor por César foi a seguinte:

Isso aqui é sobre a Festa do Divino, que tem aquela bandeirinha no mastro. Você já viu a Festa do Divino? Aquela bandeirinha é feita de aço... de ferro. E aquela bandeirinha era realmente feita de ferro com um pano na frente. Mas não deu prá convencer o cara, que sugeriu o título ‘Bandeja de aço’.Até hoje tem lá, nos papéis da ditadura ‘Bandeja de aço’. Só que no show eu cantei ‘bandeira de aço, já que, geralmente eles iam no ensaio e raramente apareciam no show (JANEIRO, 2006)

BANDEIRA DE AÇO

César Teixeira

Se ela soubesse da areia que eu como,/ ela nem perguntava./ Se ela soubesse do pó da

sereia/ela nem se zangava./ Vento na cumeeira/ nem dizia palavra, palavra, palavra./

Mamãe, eu tô com uma vontade louca/ de ver o dia sair pela boca/ de ver Maria cair da

janela/ de ver maresia. Ai, maresia!/ Mamãe, eu tô com uma vontade louca/ de ver o dia sair

pela boca/ de ver Maria cair da janela/ de ver besouro. Ai, ai, besouro!/ Ela nem parece com

Nhozinho Chico Soldado/ que na subida da bandeira/ pensou que tava no mundo e era fundo

de quintal. /Bandeira de aço!

Na música, a América Latina e o Brasil são mencionados como um fundo de

quintal norte-americano na frase “Que na subida da bandeira / Pensava que tava no mundo/ e

era fundo de quintal”.

42

Nos trechos “Se ela soubesse da areia que eu como/ ela nem perguntava /se ela

soubesse do pó da sereia ela nem se zangava” tem relação com a própria censura, que não via

nos músicos maranhenses pessoas com problemas, que estavam inseridos na miséria e que

muitas vezes não tinham o que comer. A “areia” liga-se à própria questão da fome nordestina,

em que as crianças tiram da parede barro para comer, não só pela fome, mas também pela

verminose e falta de nutrientes, associadas à miséria.

Enquanto “Bandeira de aço” foi constituída por algumas metáforas para escapar do

crivo da censura, César Teixeira esclarece que isso, às vezes, não era possível:

A gente já fazia música, evitando ser chamado pela censura, ou seja, evitava falar o que comprometesse, mas nem sempre. Tinha coisas que a gente não podia mudar porque acabava com a música. E outras coisas nem se colocava em circulação”. Já temendo a censura e com medo de “Roda gigante” não participar do festival, César substitui “Roda Gigante” por uma outra música. (César Teixeira, janeiro de 2006)

As letras de “Roda gigante” e “Donzela de vidro” não estão completas em virtude de terem

sido esquecidas por César, já que apenas memorizá-las, não escrevendo-as, na época era uma

forma de evitar a repressão.

RODA GIGANTE

César Teixeira

A dança do povo enganado/ Virou um dobrado / Pro seu general/ A dança da roda gigante

Virou uma lágrima do carnaval

A censura não se destinava apenas ao controle sobre a reflexão política e

econômica, mas também, sobre tudo o que pudesse ferir os costumes da direita conservadora

brasileira. Isso não é diferente em terras maranhenses. A música “Donzela de vidro”, de César

Teixeira não chegou a ser divulgada, já que, segundo ele, certamente seria censurada, em

função de tratar-se de uma critica de costumes, uma autêntica crítica ao conservadorismo da

sociedade maranhense, em particular a elite, que fazia de suas filhas verdadeiras “donzelas de

vidro”, tornando-as intocáveis para aqueles que não pertenciam à classe dominante. Ainda

dentro dessa estrofe, existe uma crítica a televisão, chamada por César Teixeira de “vaca

quadrada do Ocidente”, pois alimentava e continua alimentando o sistema. Os desenhos que

43

pudessem parecer mais inocentes disseminavam a idéia de que o herói estava associado ao

Estado.

DONZELA DE VIDRO

César Teixeira

Uma moça de vidro / Está desaparecida do lar/ Pois a família e a polícia não querem/Que

ela se case com homem qualquer/ Vou cantar o que sei pra multidão/ E o que não sei na

televisão.

Os movimentos católicos, já presentes no centro-sul, antes mesmo do golpe,

chegam ao Maranhão e espalham-se por um solo fértil graças ao conservadorismo (já

mencionado) de nossa sociedade. Ao mesmo tempo, Rui Frazão, importante liderança

estudantil do Liceu Maranhense, desaparece em Pernambuco e eclode na região do Pindaré

um grave conflito entre fazendeiros e pequenos proprietários, liderados por Manoel da

Conceição.

Como o gado dos fazendeiros invadia as terras dos pequenos proprietários,

comendo suas roças, o líder comunitário, Manoel da Conceição, liderou o movimento do “boi

morto”, a partir do qual os pequenos proprietários passaram a matar e comer o gado que

invadia suas terras. Isso fez eclodir a luta entre fazendeiros e 50 mil pequenos agricultores. As

negociações entre as duas partes foram lideradas pelo Governo do Maranhão, que prometeu

resolver a situação diante do desarmamento dos pequenos proprietários. Porém, numa reunião

entre as lideranças comunitárias (já desarmadas), a polícia invadiu o local já atirando,

atingindo Manoel da Conceição, que dias depois se entregou, sendo levado a um hospital,

onde teve a perna amputada.

Tempos depois, segundo o próprio, Sarney prometeu-lhe uma perna mecânica,

que prontamente não aceitou, segundo César Teixeira, dizendo ainda: “minha perna é minha

classe”. Em homenagem a Manoel da Conceição, César Teixeira canta:

TRIBUTO A MANOEL DA CONCEIÇÃO

Quando a serpente deu o bote,/ ouviu-se um grito de espanto./ O cego tirou da viola um canto

leve como a jaçanã, cotia, sabiá,/ maracajá, pião./ Vem de Pindaré-Mirim/ a sanha bem-te-

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vi/ Manoel da Conceição./ Essa é a nossa terra/ onde a semente é o sol/ que enterra o nosso

coração./ Pedra, espinho e mangue,/ bendito é o fruto do vosso sangue/ que derramou no

chão./ Há quanto tempo anda no vento/ sem nunca se perder/ o derradeiro dos

guerrilheiros/Ninguém vai lhe esquecer/ na hora de lutar, de sofrer/ de amar ou morrer.

José Sarney, ainda como governador, cria a “Lei da Terra” (Lei n° 2.979 de

17/07/1979), consistindo num projeto de colonização da região do Pindaré, em especial Santa

Luzia do Tide, que foi prontamente aceita pelo Congresso.

Os colonos vindos de outros estados eram, na verdade, grileiros, madeireiros, que vieram pra cá. Então, eles tinham todo acesso a incentivo e ficaram espalhados naquela região. O resultado foi que começou um novo processo de violentos conflitos”.Essas coisas aí chapam a nossa cabeça. Isso se reflete em tua música. Depois eu fiz “Aves de rapina”, “Namorada do Cangaço” e “Oração Latina” (César Teixeira, janeiro de 2006)

AVES DE RAPINA

César Teixeira

As aves de rapina/ quando a terra secou,/ levaram a semente/ que um dia eu plantei/ com

todo amor,/ e com saudade dela/ até o mandacaru chorou./ E o chicote queimado/ no roçado

se perdeu/ quando o dedo no gatilho/ do andarilho apareceu/ num filme de bang-bang/ onde

um fio de sangue escorreu/ pela mão de um brasileiro/ que no seu primeiro duelo morreu./E

as ervas daninhas/ cresceram pelo chão/ do terreno baldio/ onde eu enterrei meu coração/ e

na velha cidade/ quase que eu perco a minha razão./ Peguei o trem caipira/ a tiquira, o sal e

o pão/ levando a alma bandida/ escondida no alçapão/ como um passarinho triste/ que come

o alpiste em minha mão,/ depois volta pra gaiola/ e cantando chora aquela canção./ Ai, ai, ai,

ai, adeus./ Se chover, minha saudade/ eu juro que volto/ para os braços teus.

Os acontecimentos ocorridos na região do Pindaré e suas conseqüências para os

trabalhadores rurais são evidenciados dentro de toda essa música, disfarçados pelas metáforas,

típicas de parte da música brasileira dentro desse período.

Na primeira estrofe, a liberdade, entre elas a de expressão, perdida a partir da

instituição do regime ditatorial, é mencionada no trecho “As aves de rapina, quando a terra

secou / levaram a semente que um dia eu plantei”, existindo uma relação com a terra perdida

45

pelos trabalhadores rurais da região do Pindaré. “E o chicote queimado no roçado se perdeu /

com o dedo no gatilho que meu filho esqueceu” faz referência ao desarmamento dos

trabalhadores da região, diante da promessa feita pelo governo estadual. Ainda nesse trecho, a

inocência dos trabalhadores é mencionada na palavra “filho”.

Expulsos, os trabalhadores vieram para a cidade de São Luís, daí “velha cidade”, enquanto

suas antigas terras, dominadas pelos fazendeiros, não mais cultivadas, foram espaço para o

crescimento de “ervas daninhas”.

Como já mencionado, nessa época, na metade da década de 70, César cria

“Namorada do Cangaço”, abordando novamente os conflitos de terra ocorridos no Maranhão

dentro daquele período.

NAMORADA DO CANGAÇO

César Teixeira

Adeus, morena, o meu coração/ é um passarinho solto/ que não se pega com a mão./ Eu

quero mesmo é andar pelo mato/ ouvindo as cantigas de rádio,/ beijar teu retrato/ e voltar

pra casa todo fim de ano/ cantando um bolero de Waldick Soriano./ Saudade um dia sei que

vou sentir,/ sem o coração no peito/ não posso ficar aqui,/ porque a polícia se espalhou no

mundo inteiro/ e até hoje vive atrás de cangaceiro./ Ai, morena, corre, vai buscar/ a minha

metralhadora, que eu vou ter de usar!/ Ai, morena, adeus, vou voltar,/ a música que eu

mesmo toco/ eu tenho que dançar!

Novamente a censura aparece nessa composição, nos trechos “a música que eu

mesmo toco / eu tenho que dançar”, referindo-se às constantes proibições instituídas pelo

Regime Militar. Ao mesmo tempo a guerrilha é mencionada nas frases “Ai morena, corre, vai

buscar / a minha metralhadora, que eu vou ter de usar”. César faz uso, numa estrofe anterior,

para evitar possíveis ligações e, conseqüentemente, a proibição dessa música pela censura,

informando contra quem vai usar a metralhadora no trecho “porque a polícia se espalhou no

mundo inteiro / e até hoje vive atrás de cangaceiro”, sendo o “cangaceiro”, uma espécie de

guerrilheiro nordestino.

46

Numa letra feita no ano de 1972, César Teixeira novamente critica a Ditadura

Militar, ao criar um jogo de palavras bem característico da época, para falar de um boi

chamado “Razão do Povo”.

RAZÃO DO POVO Cesar Teixeira

Na Madre-Deus tem um boi/ que é de toda a Nação/ chamado Razão do Povo,/ fruto da

imaginação./ Vem Catirina, vamos embora/ com a lamparina,/ um boi com a venda nos olhos

não vê quem lhe põe a canga./ Monta na burra, vamos embora,/ Catirina, nas águas do rio

Anil,/ nas águas do rio Bacanga./ Ai, ai, meu Deus, que será/ Razão do Povo amanhã: rabo

do boi na Maioba,/ cabeça do boi no Maracanã.

Nos trechos “Na Madre-Deus tem um boi/ que é de toda a Nação/chamado Razão

do Povo/fruto da imaginação”, César canta a inexistência da participação política ativa de

grande parte da população dentro de um Regime ditatorial, mencionado inclusive, que isso é

um problema de toda nação brasileira na segunda frase, assim como nos trechos “.um boi com

a venda nos olhos/ não vê quem lhe põe a canga”.

Na última estrofe, César nos fala de dois locais tradicionalmente folclóricos dentro

da ilha de São Luís, Maioba e Maracanã, e que eram utilizados como pontos de “desova”

dentro desse período.

Em 1983, César cria “Oração Latina”, numa clara referência a “Pra nã dizer que

não falei das flores”, ao usar a palavra “rosa”, menciona o gradual fim das ditaduras dentro da

América Latina. Aproveita-se da desarticulação do aparelho repressor, desabafando sobre os

horrores da ditadura e proclama a liberdade.

47

ORAÇÃO LATINA

Cesar Teixeira

Essa nova oração/ é uma canção de vida/ pelo sangue da ferida no chão/ que não

cicatrizará/ nem tampouco deixará/ de abrir a rosa em nossos corações/ e diga sim a que nos

quer abraçar/ mas se for pra enganar diga não/ com as bandeiras nas ruas/ ninguém pode

nos calar/ ninguém vai ser torturado/ com vontade de lutar/ e quem nos ajudará a não ser a

própria gente/ pois hoje não se consegue esperar/ somente a rosa e o punhal/ somente o

punhal e a rosa/ poderão fazer a luz do sol brilhar/ e diga sim a quem nos quer acolher/ mas

se for pra nos prender/ diga não/ ninguém vai ser torturado/ com vontade de lutar/ com as

bandeiras nas ruas/ ninguém pode nos calar.

48

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Constatamos através da realização deste trabalho de que forma os acontecimentos

internacionais e a realidade brasileira nas décadas de 60 e 70 influenciaram toda a produção

artística brasileira, sendo que o Maranhão não se absteve de toda essa cadeia de

acontecimentos.

Certamente, é possível mencionar que as produções artísticas, a nível nacional e

internacional, dentro do referido período mergulharam nos problemas políticos, econômicos e

sociais do seu tempo.

Ao mesmo tempo, torna-se necessário admitir que parte significativa de seus

produtores, em especial dentro das terras brasileiras, procurou declarar problemas nacionais,

sem fugir da realidade, declamando o subdesenvolvimento e outras mazelas brasileiras. No

caso do Tropicalismo, observamos com nitidez a preocupação com experimentações estéticas,

fazendo uso de elementos estrangeiros e da própria realidade externa, enveredando por

caminhos alternativos de expressão, que, no caso, não foram utilizados apenas pelos

tropicalistas, já que outros cantores também fizeram uso de metáforas para escapar da

censura.

A poesia e a musicalidade, presentes nas obras de César Teixeira e o momento

cultural caracterizado graças à entrevista de Chico Maranhão, expõem as ideologias, as

vísceras de seus idealizadores, expressam o efetivo diálogo interno dessa produção artística

com os movimentos que a precederam e com os segmentos sociais que viabilizaram sua

gestação.

49

REFERÊNCIAS

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Discografia

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Entrevistas

MARANHÃO Chico. Entrevista sobre sua biografia e música. 06/01/06.

TEIXEIRA César. . Entrevista sobre sua biografia e música. 21/01/06.

Jornais

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FESTIVAL em foco. Jornal do Dia. São Luís. 23/09/1971

FESTIVAL esquenta e Chico poderá vir. Jornal do Dia. São Luís. 16/09/1971

HABIBE vai quebrar. Jornal do Dia. São Luís. 16/09/1971

HOJE a final. Jornal do Dia. São Luís. 26/09/1971

LOUVAÇÃO ganhou o júri popular. Jornal do Dia. São Luís. 03/10/1971

MARANHÃO a música para subsistir e resistir. O Estado do Maranhão. São Luís.

31/12/1977.

MÚSICAS vencedoras vã ser apresentadas no Rio. Jornal do Dia. São Luís. 13/10/1971

SITES

HYPERLINK, http://www.suapesquisa.com/mpb

PROVASEPROVAS, http://www.provaseprovas.com