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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE MEDICINA DEPARTAMENTO DE FISIOLOGIA E FARMACOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FARMACOLOGIA IRI SANDRO PAMPOLHA LIMA ALTERAÇÕES NEUROQUÍMICAS, COMPORTAMENTAIS E HISTOLÓGICAS PROMOVIDAS PELA COCAÍNA ISOLADAMENTE E EM ASSOCIAÇÃO COM IMIPRAMINA, TOPIRAMATO E PENTOXIFILINA EM RATOS FORTALEZA-CE 2009

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE … · Programa de Pós-Graduação em Farmacologia do Departamento de Fisiologia e Farmacologia da Faculdade de ... INTRODUÇÃO 19 1.1

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  • 1

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR

    FACULDADE DE MEDICINA

    DEPARTAMENTO DE FISIOLOGIA E FARMACOLOGIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM FARMACOLOGIA

    IRI SANDRO PAMPOLHA LIMA

    ALTERAES NEUROQUMICAS, COMPORTAMENTAIS E

    HISTOLGICAS PROMOVIDAS PELA COCANA ISOLADAMENTE

    E EM ASSOCIAO COM IMIPRAMINA, TOPIRAMATO E

    PENTOXIFILINA EM RATOS

    FORTALEZA-CE

    2009

  • 2

    IRI SANDRO PAMPOLHA LIMA

    ALTERAES NEUROQUMICAS, COMPORTAMENTAIS E

    HISTOLGICAS PROMOVIDAS PELA COCANA ISOLADAMENTE

    E EM ASSOCIAO COM IMIPRAMINA, TOPIRAMATO E

    PENTOXIFILINA EM RATOS

    IRI SANDRO PAMPOLHA LIMA

    Tese de doutorado submetida

    Coordenao do Programa de Ps-

    Graduao em Farmacologia do

    Departamento de Fisiologia e Farmacologia

    da Faculdade de Medicina da Universidade

    Federal do Cear, como requisito parcial

    para obteno do ttulo de Doutor em

    Farmacologia.

    Orientadora: Profa. Dra. Glauce Socorro

    Barros Vianna

    Fortaleza-CE

    2009

  • 3

    L698a Lima, Iri Sandro Pampolha

    Alteraes neuroqumicas, comportamentais e histolgicas

    promovidas pela cocana isoladamente e em associao com imipramina,

    topiramato e pentoxifilina em ratos / Iri Sandro Pampolha Lima.

    Fortaleza-Ce, 2009.

    162 f. : il.

    Orientadora: Profa. Dra. Glauce Socorro Barros Vianna

    Tese (Doutorado) Universidade Federal do Cear. Faculdade

    de Medicina. Programa de Ps-Graduao em Farmacologia.

    1. Cocana 2. Imipramina 3. Pentoxifilina 4. Memria I. Vianna, Glauce Socorro Barros (Orient.) II. Ttulo.

    CDD: 616.8647

  • 4

    IRI SANDRO PAMPOLHA LIMA

    ALTERAES NEUROQUMICAS, COMPORTAMENTAIS E

    HISTOLGICAS PROMOVIDAS PELA COCANA ISOLADAMENTE E EM

    ASSOCIAO COM IMIPRAMINA, TOPIRAMATO E PENTOXIFILINA

    EM RATOS.

    Tese de doutorado submetida Coordenao do

    Programa de Ps-Graduao em Farmacologia do

    Departamento de Fisiologia e Farmacologia da

    Faculdade de Medicina da Universidade Federal do

    Cear, como requisito parcial para obteno do ttulo

    de Doutor em Farmacologia.

    Aprovada em: 12/02/2009

  • 5

    A Deus por trilhar de maneira to especial a minha vida colocando nela somente pessoas especiais

    Aos meus amados pais, Irimatines e Ftima, incentivadores e amigos de todas as horas.

    Aos meus irmos, Alan e Wallace pela presena e apoio constantes.

    minha esposa rica, pelo apoio e incentivo em todos os momentos

    minha filha Laura, por ser uma

    inesgotvel fonte de inspirao

  • 6

    Agradecimentos

    Profa. Glauce Socorro Barros Viana, pela orientao, pacincia e

    incentivo para a realizao deste trabalho.

    Aos funcionrios e bolsistas da Faculdade de Medicina de Juazeiro

    do Norte FMJ, que em muito contriburam para a realizao deste

    trabalho;

    Ao Amigo Hlio, pelos conselhos e ajuda em todos os momentos.

    Ao amigo da ps-graduao Ccero pelos incentivos e discusses

    constantes.

    Aos amigos da Ps-graduao Marta Fonteles, Cla Sousa, Danielle

    Macedo, Lissiana Magna e todos os demais componentes o

    laboratrio de neurofarmacologia pela colaborao em muitos

    momentos.

    Aos Profs. do curso de ps-graduao em Farmacologia, pelos

    conhecimentos transmitidos e constante disponibilidade.

    Professora Geanne Cunha pela valiosa contribuio e orientao.

    Ao Prof. Newton Silva Santos pela colaborao na realizao de

    procedimentos experimentais.

    Vilani Bastos, pela colaborao em todos os momentos.

    A todos os bolsistas pelo companheirismo e dedicao na execuo

    dos experimentos.

    Aos funcionrios do Departamento de Fisiologia e Farmacologia da

    Universidade Federal do Cear pelo apoio e cooperao.

  • 7

    Polcia Federal de Fortaleza, em especial Dra. Graa, pelo apoio

    incondicional e pela realizao das anlises necessrias.

    Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico

    (CNPq), pelo suporte financeiro.

  • 8

    NDICE

    Lista de Tabelas

    Lista de Figuras

    Lista de Abreviaturas

    Resumo

    Abstract

    1. INTRODUO 19

    1.1 Drogas de Abuso 19

    1.2 Cocana 22

    1.2.1 Histrico 22

    1.2.2 Formas de Cocana 28

    1.2.3 Vias de Exposio 29

    1.2.4 Biotransformao da Cocana 31

    1.3 Cocana e Neurotransmisso 32

    1.3.1 Dopamina 32

    1.3.2 Distribuio dos Neurnios Dopaminrgicos 33

    1.3.3 Papel da Dopamina no Comportamento 34

    1.3.4 O Transportador de Dopamina 35

    1.3.5 Efeito da Cocana no Sistema Dopaminrgico 37

    1.3.6 Circuitos Enceflicos e Drogas de Abuso 39

    1.4 Topiramato 45

    1.4.1 Consideraes Gerais 45

    1.5 Imipramina 47

    1.5.1 Consideraes Gerais 47

    1.6 Pentoxifilina 49

    1.6.1 Consideraes Gerais 49

    2. JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS 53

    2.1 Justificativa 53

    2.2 Objetivos Geral e Especficos 54

  • 9

    3. MATERIAIS E MTODOS 57

    3.1 Animais 57

    3.2 Drogas 58

    3.2.1 Preparo das Drogas 58

    3.2.2 Determinao do Grau de Pureza da Cocana 58

    3.3 Tratamento dos Grupos Experimentais 59

    3.4 Estudos Comportamentais 60

    3.4.1 Teste da Atividade Locomotora 60

    3.4.2 Teste da Esquiva Passiva 61

    3.4.3 Teste de Labirinto Aqutico 62

    3.4.4 Teste de Labirinto em Cruz Elevada 62

    3.4.5 Teste do Nado Forado 63

    3.5 Dissecao das reas Cerebrais 64

    3.6 Determinao de Monoaminas e Metablitos com HPLC 65

    3.7 Culturas de Clulas Mesenceflicas de Rato 68

    3.8 Ensaio de Neurotoxicidade teste do MTT 68

    3.9 Determinao do fluxo sanguneo cerebral atravs de cintilografia 69

    3.10 Dosagem de Nitrito/Nitrato 69

    3.11 Estudo Histopatolgico 70

    3.12 Anlise Estatstica 71

    4. RESULTADOS 73

    4.1 Teste de Atividade Locomotora Espontnea 73

    4.2 Teste da Esquiva Passiva 77

    4.3 Teste de Labirinto Aqutico 82

    4.4 Teste de Labirinto em Cruz Elevada 86

    4.5 Teste do Nado Forado 89

  • 10

    4.6 Efeitos da Administrao repetida de Cocana, Imipramina e a

    Combinao Destes Sobre as Concentraes de DA, DOPAC, 5-HT

    E 5-HIAA em CE de Ratos.

    91

    4.7 Efeitos da Administrao repetida de Cocana, Topiramato e a

    Combinao Destes Sobre as Concentraes de DA, DOPAC e NE

    em CE de Ratos.

    94

    4.8. Efeitos promovidos pela cocana em clulas mesenceflicas de

    ratos expostas 6-OHDA 10M determinados pelo teste do MTT

    98

    4.9. Efeitos da administrao repetida de cocana, topiramato e a

    combinao destes sobre o fluxo sanguneo cerebral em ratos.

    100

    4.10. Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em

    associao com imipramina e topiramato sobre a formao de nitrito

    em crebro de ratos.

    102

    4.11. Anlise histolgica de crebro de animais tratados com cocana,

    imipramina e a associao destas drogas.

    104

    5. DISCUSSO 110

    6. CONCLUSES 130

    7. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 134

  • 11

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com imipramina no teste de esquiva passiva,

    em ratos. 79

    Tabela 2- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com topiramato no teste de esquiva passiva,

    em ratos. 80

    Tabela 3- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com pentoxifilina no teste de esquiva passiva,

    em ratos. 81

    Tabela 4- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com imipramina no teste labirinto aqutico,

    em ratos. 83

    Tabela 5- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com topiramato no teste de labirinto

    aqutico, em ratos. 84

    Tabela 6- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com pentoxifilina no teste de labirinto

    aqutico, em ratos. 85

    Tabela 7- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com imipramina no teste de labirinto

    em cruz elevada, em ratos. 87

    Tabela 8- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com topiramato no teste de labirinto em

    cruz elevada, em ratos. 88

    Tabela 9- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com imipramina sobre os nveis de dopamina

    e seus metablitos (ng/g de tecido) em estriado de ratos. 92

    Tabela 10- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e em associao com imipramina sobre os nveis de

    5-HT e seu metablito (ng/g de tecido) em estriado de ratos. 93

  • 12

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1- Foto das folhas da espcie Erythroxylon coca 22

    Figura 2- Representao da estrutura da cocana 23

    Figura 3- Vias dopaminrgicas em crebro de ratos 34

    Figura 4- Aes da cocana sobre o processo de recaptao de

    dopamina

    37

    Figura 5- Sistema dopaminrgico mesocorticolmbico 39

    Figura 6-

    Figura 7-

    Figura 8-

    Figura 9-

    Estrutura qumica do topiramato

    Estrutura qumica da imipramina

    Estrutura qumica da pentoxifilina

    Cromatografia da cocana em comparao com padro da

    Polcia Federal

    45

    48

    50

    59

    Figura 10- Aparelho de HPLC com deteco de fluorescncia e

    eletroqumica

    66

    Figura 11- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com imipramina sobre a atividade locomotora

    espontnea em ratos.

    74

    Figura 12- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com topiramato sobre a atividade locomotora

    espontnea em ratos.

    75

    Figura 13- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com pentoxifilina sobre a atividade

    locomotora espontnea em ratos.

    76

    Figura 14- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com imipramina sobre o tempo de

    imobilidade no teste de nado forado.

    90

    Figura 15- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com topiramato sobre os nveis de dopamina

    em corpo estriado de rato.

    95

    Figura 16- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com topiramato sobre os nveis de DOPAC

    em corpo estriado de rato

    96

  • 13

    Figura 17- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com topiramato sobre os nveis de

    noradrenalina em corpo estriado de rato

    97

    Figura 18- Efeito da cocana em clulas mesenceflicas de ratos

    expostas 6-OHDA.

    99

    Figura 19- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com topiramato sobre o fluxo sanguineo

    cerebral em ratos

    101

    Figura 20- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com imipramina e topiramato sobre a

    formao de nitrito em crebro de ratos.

    103

    Figura 21- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com imipramina sobre a viabilidade celular

    105

    Figura 22- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com imipramina sobre a viabilidade celular

    106

    Figura 23- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com imipramina sobre a viabilidade celular

    107

    Figura 24- Efeitos da administrao repetida de cocana isoladamente e

    em associao com imipramina sobre a viabilidade celular

    108

  • 14

    LISTA DE ABREVIATURAS

    l Microlitro

    5-HIAA cido-5-hidroxiindolactico

    5-HT Serotonina

    6-OHDA 6-hidroxidopamina

    ALE Atividade locomotora espontnea

    ANOVA Anlise de varincia

    ATV rea tegmentar ventral

    CE Corpo estriado

    Coc Cocana

    DA Dopamina

    DOPA Diidroxifenilalanina

    DAT Dopamine transporter - Protena transportadora de

    dopamina

    DOPAC cido diidroxifenilactico

    EDTA cido etilenodiaminotetractico

    EPM Erro padro da mdia

    HPLC Cromatografia lquida de alta performance

    HVA cido homovanlico

    Imi Imipramina

    mg miligrama

    mL mililitro

    MTT 3[4,5-dimetiltiazol-2-il]-2,5-difeniltetrazolium brometo

    NAc Ncleo acumbente

    NA Noradrenalina

    NEBA Nmero de entradas nos braos abertos

    NEBF Nmero de entradas nos braos fechados

    NC Nmero de cruzamentos

  • 15

    NMDA N-metil-D-aspartato

    NO xido Ntrico

    NOS NO sintase

    Pent Pentoxifilina

    SNC Sistema nervoso central

    TP Tempo de permanncia

    TPBA Tempo de permanncia nos braos abertos

    TPBF Tempo de permanncia nos braos fechados

    TPM Topiramato

    i.p. Intraperitoneal

    v.o. Via oral

  • 16

    RESUMO

    A cocana reconhecida por produzir marcantes alteraes sobre o humor e comportamento

    humanos. Este trabalho teve como objetivo estudar as alteraes neuroqumicas,

    comportamentais e histopatolgicas promovidos pela administrao repetida (7 dias) de

    cocana isoladamente ou em associao com imipramina, um antidepressivo tricclico,

    topiramato, um antiepilptico, e pentoxifilina, um vasodilatador, em ratos. Ratos Wistar

    machos (200-250 g) foram tratados diariamente com cocana isoladamente (Coc, 10 e 20

    mg/kg, i.p.) ou em associao com imipramina (Imi, 12.5 ou 25 mg/kg, v.o.), topiramato

    (TPM, 50mg/kg, v.o.), pentoxifilina (Pent, 50mg/kg, i.p.) durante 7 dias. Cocana causou um

    aumento significativo da atividade locomotora, e sua combinao com Imipramina,

    topiramato e pentoxifilina bloqueou os efeitos promovidos pela cocana. No teste de esquiva

    passiva, a cocana reduziu a memria de curto e de longo prazo enquanto que a imipramina

    reverteu parcialmente os efeitos da cocana. Pentoxifilina bloqueou completamente os efeitos

    da cocana. No labirinto aqutico, a cocana aumentou o tempo para encontrar a plataforma,

    efeito revertido totalmente pela imipramina e pentoxifilina e parcialmente pelo topiramato.

    No teste de labirinto em cruz elevada, cocana e imipramina diminuram o numero de

    entradas e o tempo de permanncia nos braos abertos. A combinao das duas drogas

    reverteu parcialmente estes efeitos. No teste de nado forado, cocana e imipramina

    diminuram significativamente o tempo de imobilidade do animal. Cocana promoveu

    aumento dos nveis de dopamina (DA) e diminuio de HVA em corpo estriado, efeitos estes

    bloqueados por imipramina e topiramato. Cocana tambm aumentou Noradrenalina (NA),

    efeito bloqueado pelo topiramato. Contudo, cocana no alterou os nveis de serotonina (5-

    HT). Imipramina aumentou os nveis de 5-HT. A exposio de cultura primria de clulas

    mesenceflicas de ratos a cocana reduziu a morte celular causada pela 6-OHDA (10M).

    Cocana diminuiu o fluxo sanguneo cerebral e este efeito foi completamente revertido pelo

    topiramato. Cocana aumentou os nveis de nitrito no crebro dos animais e este efeito foi

    bloqueado pela imipramina e topiramato. Nos estudos histolgicos, cocana promoveu um

    dano significativo no crtex e giro denteado do hipocampo, efeito revertido pela imipramina.

    Estes resultados so de grande importncia, especialmente em relao a atenuao do

    prejuzo cognitivo, a reduo do fluxo sanguneo cerebral, a formao de nitrito e a morte

    celular induzidos pela cocana.

    Palavras-chave: Cocana, imipramina, pentoxifilina, memria.

    http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/?term=pentoxifylline&

  • 17

    ABSTRACT

    Cocaine is known to produce marked alterations in behavior and mood in humans. This work

    was designed to study the interference of the combination of imipramine, a tricyclic

    antidepressant, topiramate, a antiepileptic drug, and pentoxifylline, a drug with

    hemorheologic properties with cocaine on behavioral, neurochemical and histological

    alterations. Male Wistar rats (200 g) were treated daily with cocaine alone (Coc, 10 and 20

    mg/kg, i.p.) or in association with imipramine (Imi, 12.5 or 25 mg/kg, p.o.), topiramate

    (TPM, 50mg/kg, p.o.), pentoxifylline (Pent, 50mg/kg, i.p.) for 7 days. Cocaine caused

    increases in rats locomotor activity, and its combination with Imipramine, topiramate and

    pentoxifylline completely blocked cacaine effects. In the passive avoidance test, cocaine

    impaired short-term and long-term memory and imipramine partly reversed this effect.

    Topiramate didn't promote alterations and pentoxifylline completely blocked cocaine effects.

    In the water maze test, cocaine increased the time to find the platform and this effect was

    completely reversed by imipramine and pentoxifylline. Topiramate partly reversed the

    cocaine effect in the spatial memory. In the elevated plus maze test, cocaine and imipramine

    decreased the number of entrances in the open arms and the time spent in the open arms. The

    combination of the two drugs partially reversed these effects. In the forced swimming test,

    both cocaine and imipramine decreased the animals immobility time. Cocaine also

    increasing dopamine (DA) and decreasing HVA levels in CE, effects blocked by imipramine

    and topiramate. Cocaine also increasing Noradrenaline (NA) levels, effect blocked by

    topiramate. Imipramine alone increasing 5-HT levels. Ours results show that the exposition to

    cocaine in primary rat mesencephalic cell culture before 6-OHDA reduce significantly the

    cell death caused by a 6-OHDA (10M). Cocaine significantly decreased cerebral blood flow

    and this effect was completely reversed by topiramate. Cocaine significantly increased the

    nitrite levels in the brains rat and this effect was completely reversed by imipramine and

    topiramate. In the histological studies, cocaine significantly damaged the cortex and DG

    region of the hippocampus, reducing neuronal cell counts and this effect was completely

    reversed by imipramine. Its results is an important point, especially those related to the

    attenuation of cocaine-induced cognitive impairments, cerebral blood flow, nitrite formation

    and cell death.

    Keywords: Cocaine, imipramine, pentoxifylline, memory.

    http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/?term=pentoxifylline&http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/?term=pentoxifylline&http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/?term=pentoxifylline&http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/?term=pentoxifylline&http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/?term=pentoxifylline&

  • 18

  • 18

    1. INTRODUO

    _________________________________________________________________

  • 19

    1. INTRODUO

    1.1. Drogas de Abuso

    O termo droga teve origem na palavra droog (holands antigo) que

    significa folha seca. Atualmente a medicina define droga como sendo qualquer

    substncia que capaz de modificar funes dos organismos vivos, resultando

    em mudanas fisiolgicas ou de comportamento (Leite et al., 1999).

    Dependendo da ao que as drogas apresentam no SNC, podem ser

    divididas em trs grupos. Um grupo formado por aquelas drogas que diminuem

    a atividade cerebral, ou seja, deprimem o seu funcionamento, o que significa

    dizer que a pessoa que faz uso desse tipo de droga fica "desligada", "devagar",

    desinteressada pelas coisas. Em um segundo grupo esto aquelas que atuam

    aumentando a atividade do crebro, ou seja, estimulam o seu funcionamento

    fazendo com que, a pessoa que se utiliza dessas drogas, fique "ligada", "eltrica",

    sem sono. H um terceiro grupo, constitudo por aquelas drogas que agem

    modificando mais qualitativamente que quantitativamente a atividade do crebro.

    O crebro passa a funcionar de forma anormal e a sua atividade fica perturbada

    (Beedle et al., 1997).

    As drogas de abuso representam um problema significativo nos Estados

    Unidos, com uma estimativa de 22,5 milhes de pessoas com idade superior a 12

    anos (9,4% da populao) classificadas como j tendo usado estas drogas

    (Substance Abuse and Mental Health Services Administration (SAMHSA).

    National survey on drug use and health, 2004).

    O uso continuo de substancias ilcitas continua sendo um problema a ser

    resolvido na sociedade. Em muitos casos, o uso casual de substancias gera uma

    desordem no uso destas, como por exemplo, o abuso (o uso desregrado com

    conseqente prejuzo para o usurio) e a dependncia (vcio, o uso compulsivo de

    uma substancia a despeito de problemas significativos decorrentes de seu uso)

  • 20

    [American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental

    Disorders, Fourth Edition, (DSM-IV). In:Washington, DC, 1994].

    Importantes pesquisas tm sido desenvolvidas na tentativa de padronizar

    tratamentos medicamentosos para a dependncia e abuso a drogas ilcitas.

    Aproximaes farmacoterapeuticas efetivas para manter a abstinncia em adictos

    esto disponveis, particularmente para reduzir o desejo e a busca pela droga em

    usurios de nicotina, lcool e herona. Contudo, cerca de 60% dos dependentes

    em lcool, opiides e cocana que receberam tratamento para dependncia

    tiveram recada em at um ano. Assim, mais pesquisas so essenciais para

    aumentar a eficcia destes tratamentos e oferecer novas opes para estes

    pacientes. O desenvolvimento de novos agentes farmacolgicos para o

    tratamento da dependncia aumentaria bastante as opes atualmente

    disponveis, principalmente no caso de medicamentos que reduzam a abstinncia

    e o desejo e previnam as possveis recadas (Bubar et al., 2006).

    O principal componente lesivo destas drogas o estado de dependncia

    que estas promovem nos usurios. Em estudos cientficos, a dependncia fsica

    definida como um estado adaptativo que se manifesta por intensos distrbios

    fisiolgicos quando a administrao da droga suspensa, enquanto que a

    dependncia psquica caracterizada como uma condio na qual a droga produz

    uma sensao de satisfao que leva a uma necessidade peridica ou contnua de

    administrao da droga para produzir prazer (Dupont et al., 1997).

    As drogas de abuso so causadoras de muitos problemas comuns para

    vrias sociedades do mundo. Antigos textos religiosos mostram que, em todas as

    pocas e lugares, os seres humanos deliberadamente usaram substncias capazes

    de modificar o funcionamento do sistema nervoso, induzindo sensaes corporais

    e estados psicolgicos alterados. Essas drogas tm grande poder destrutivo no

    apenas para o indivduo, mas tambm para sua famlia e a sociedade. Dentre as

    drogas de abuso hoje disponveis, temos a cocana e o etanol como os agentes

    mais utilizados, sendo estas drogas alvos de inmeros estudos. Progressos

  • 21

    substanciais tm sido realizados na elucidao das aes moleculares e celulares

    da cocana e do etanol, entretanto, os stios e mecanismos que participam nos

    seus efeitos no esto bem elucidados (Leite et al., 1999).

    A adio gerada pela cocana continua sendo um grande problema de

    sade publica, sendo uma condio clinica crnica onde pode ocorrer

    deteriorao fisiolgica, social e psiquitrica do usurio. O mecanismo de ao

    da cocana envolve a inibio de transportadores neuronais de monoaminas em

    algumas estruturas cerebrais e primariamente no sistema de recaptao de

    dopamina localizado nos neurnios mesolimbicos. A cocana rapidamente

    incrementa a neurotransmisso dopaminrgica e promove alteraes adaptativas

    em circuitos cerebrais envolvidos com reforo, recompensa, sensibilizao e o

    elevado poder viciante desta droga (Maurice et al., 2002).

    A cocana reconhecida por produzir alteraes marcantes no

    comportamento humano, e sua administrao repetida aumenta a probabilidade

    de abuso, levando ao desenvolvimento do vicio. Mudanas na plasticidade

    sinptica nos neurnios dopaminrgicos na rea tegumentar ventral podem

    contribuir para este evento (Liu et al., 2005). Este aumento na plasticidade

    sinptica na rea tegumentar ventral pode ser importante para a formao da

    memria associada droga.

    Embora no existam tratamentos farmacolgicos aprovados para a

    dependncia promovida pela cocana, algumas drogas tm sido testadas com

    alguns resultados promissores (Sofuoglu e Kosten, 2005). A cocana parece

    estimular a neurotransmisso dopaminrgica atravs do bloqueio da recaptao

    de dopamina. Contudo, evidencias sugerem que, em situaes de uso crnico, os

    terminais nervosos podem ter seus estoques de dopamina depletados. A depleo

    de dopamina tem sido associada com a disforia que se desenvolve durante a

    retirada de cocana e o subseqente desejo por mais droga. Assim, alteraes na

    neurotransmisso dopaminrgica podem ser responsveis pelo padro

    compulsivo de uso da droga. Com altas doses e uso regular, outros sistemas de

  • 22

    neurotransmissores tais como serotoninrgico podem provavelmente direta ou

    indiretamente mediar toxicidade no sistema nervoso central (Agarwal, 2005).

    1.2. Cocana

    1.2.1. Histrico

    A cocana uma substncia naturalmente encontrada em dezenas de

    espcies vegetais do gnero Erythroxylum (figura 1), sendo a Erythroxylum coca

    e a Erythroxylum novogranatense as mais utilizadas no cultivo para a produo

    da droga.

    Figura 1 Folhas da planta Erythroxylon coca

    (Fonte: www.cenpre.furg.br/cocaina/fotos.htm)

    O hbito de mascar as folhas de coca pelos indgenas da regio dos Andes

    data de longo tempo. Com a chegada dos conquistadores espanhis, esta forma

    de uso foi estimulada, pois o consumo da droga facilitava a explorao do

    trabalho escravo. Levada para a Europa pelos espanhis, durante os sculos XVI

    e XVII, difundiu-se o uso das folhas de coca na terapia sob as mais diversas

    http://www.cenpre.furg.br/cocaina/fotos.htm

  • 23

    aplicaes: os males do estmago, ulceraes de pele, doenas venreas e dores

    de cabea, musculares e de dente (Gold, 1993, Escohotado, 1993).

    A cocana (figura 2), principal alcalide ativo existente nas folhas da

    Erythroxylum coca, foi isolada em 1860 por Niemann, que constatou seu gosto

    amargo e o efeito peculiar que produzia na lngua, tornando-a dormente e quase

    insensvel. Por volta de 1880, a cocana estava disponvel comercialmente,

    sendo, logo, incorporada a diversas beberagens, entre essas, o famoso Vin

    Mariani, que era conhecido como o vinho dos atletas. Rapidamente relatos

    enfatizavam os poderes miraculosos da droga, bem como sua capacidade de

    eliminar a fadiga (Gold, 1993).

    Figura 2 - Representao da estrutura da cocana

    Fonte: ZARZUELA, J. L. Qumica Legal. In: TOCHETTO, D. Tratado de

    Percias Criminalsticas. Porto Alegre: Ed. Sagra-DC Luzzatto, 1995, cap.8,

    p.164-169.

    Em 1884, Sigmund Freud fez o primeiro estudo pormenorizado dos

    efeitos fisiolgicos da cocana e no livro Ueber Coca sugeriu cinco possveis

    aplicaes da substncia: aumentar a capacidade fsica, em doenas do aparelho

    digestivo, no controle da morfinomania, como estimulante sexual e anestsico

    local. Na mesma poca, Carl Koller introduziu a cocana na anestesia local da

    crnea, e Hall, na odontologia. A anestesia espinhal verdadeira foi obtida por

  • 24

    Augusto Bier, em 1898, ao injetar a substncia em animais, em um assistente e

    nele mesmo (Musto, 1992).

    Nos Estados Unidos, por volta de 1885, a cocana foi adicionada

    juntamente com a cafena em um remdio popular considerado como o

    prottipo da Coca-Cola, com indicaes de uso contra dor de cabea e como

    estimulante. Em 1892, Asa G. Chandler fundou a Coca-Cola Company e colocou

    a bebida no mercado como um tnico para pessoas debilitadas. At meados deste

    sculo (1903-06), esta bebida continha aproximadamente 60mg de cocana em

    230 mL. A partir da sua extrao, a cocana passou a ser empregada em vrios

    produtos. Nesta poca, nos Estados Unidos, extratos de coca eram relatados

    como sendo a cura do alcoolismo e morfinismo, sendo que esses preparados

    pavimentaram o caminho para a cocana em sua forma pura a partir de 1880. A

    cocana foi distribuda na Europa, pelo laboratrio Merck, a especialistas para

    realizarem experimentos com a droga. Nesta poca, Sigmund Freud dedicou-se

    ao estudo da cocana. A euforia social relacionada cocana comeou a se

    dissipar a partir da ltima dcada do sculo passado. Relatos detalhando a

    dependncia cocana, comportamento psictico induzido, convulses e mortes

    causadas pelo consumo, gradativamente se acumularam na literatura. Freud, em

    1887, publicava Fissura e medo da cocana, descrevendo os sintomas paranicos,

    as alucinaes e deteriorao fsica e mental associada ao consumo repetido

    (Musto, 1992).

    Nas dcadas que se seguiram introduo da cocana nos Estados

    Unidos, ela podia ser obtida em dois nveis diferentes: industrializado ou mdico

    e por meio do comrcio da droga pura nas ruas. At a ltima dcada do sculo

    XIX no existia, naquele pas, legislao sobre os atos mdicos ou medicamentos

    em nvel nacional. Mesmo as profisses mdicas estavam se organizando naquela

    poca, de forma que no existia controle sobre a propaganda da cocana ou sobre

    os produtos que continham a substncia. Leis passaram a ser decretadas para

    coibir o acesso fcil substncia acarretando um fortalecimento gradativo do

  • 25

    mercado ilcito de cocana, fazendo com que a droga ilcita ficasse muito mais

    acessvel.

    A partir de 1900, surgiram vrios medicamentos e bebidas base de

    cocana ou de folhas de coca que permaneceram no mercado at 1914, quando foi

    editado o Harrison Narcotic Act, que tornou ilegal o uso e a venda de cocana

    nos Estados Unidos da Amrica. Em 1924, a Associao Americana de Medicina

    realizou um estudo que atribuiu a morte de 26 pacientes utilizao da cocana

    como anestsico, o que restringiu o seu uso na clnica. O pblico, em resposta a

    estas informaes, passava a pressionar as autoridades para tomada de uma

    posio contra a droga. A viso social da cocana transformou-se em 30 anos (a

    partir de 1884); de um tnico anunciado sem efeitos colaterais para a droga com

    restries mais severas da histria atual; porm, no incio do sculo XX, a droga

    continuava a ser permitida para propsitos mdicos. O perodo seguinte foi

    caracterizado pela extino quase total do consumo da droga. Os anos a partir de

    1920 foram caracterizados pelo consumo de derivados opiceos e Cannabis,

    como ocorria no perodo imediatamente anterior cocana. No incio da dcada

    de 30, a cocana deixava de ser um problema social pela diminuio do uso. De

    1914 a 1970, o consumo da droga, devido s suas propriedades eufricas, ficou

    restrito a alguns segmentos da sociedade. A partir dos anos 70, com as restries

    impostas comercializao das anfetaminas, voltou o uso generalizado de

    cocana nos Estados Unidos da Amrica, e no incio da dcada de 80, com a

    introduo do crack, o consumo aumentou de forma alarmante (Gold, 1993).

    muito difcil explicar a o aumento da utilizao de cocana nos Estados

    Unidos a partir do incio da dcada de 70. Esse ressurgimento implicou, tambm,

    no quadro de consumo de cocana que pode ser observado desde a ltima dcada

    no Brasil. Um grande nmero de fatores, porm, convergiram para a mudana no

    hbito de consumo de drogas na populao dos Estados Unidos; o primeiro deles

    refere-se a uma populao que nasceu e cresceu consumindo drogas. O consumo

    de maconha e alucingenos durante a dcada de 60 por um grande nmero de

  • 26

    jovens norte-americanos resultou na ausncia do temor das restries legais, bem

    como das conseqncias mdicas do assim chamado consumo light de drogas

    (Kendall, 1991).

    Infelizmente, a cocana, at o incio da dcada de 80, ressurgiu envolta

    por uma reputao de ser incapaz de promover dependncia, de ser segura em

    relao s conseqncias mdicas e sociais e de ao ultracurta: a droga perfeita

    para interao social. Tornou-se, em princpio, a droga dos ricos e famosos;

    msicos cantavam suas virtudes, filmes mostravam o uso da cocana como

    glamouroso, isento de riscos (Weiss, 1994). No Brasil, considerado o maior

    corredor de trfico da droga do mundo, a cocana trazia uma srie de problemas

    que atingia as mesmas propores nos pases industrializados; o mascar das

    folhas de coca acarreta dependncia semelhante causada pela nicotina, sendo

    associada ao empobrecimento das funes mentais. Alm do bem conhecido

    estado de anarquia e corrupo pblica nos quais os pases produtores se

    encontravam, o imenso crescimento da produo, atividade das mais lucrativas,

    vinha causando consequncias sociais e ambientais incalculveis (Negrete,

    1992). Nenhuma outra plantao conhecida causa nveis similares de eroso,

    principalmente por seu cultivo junto s encostas andinas (Kendall, 1991). Uma

    respeitvel parcela da populao dos pases produtores encontra-se envolvida em

    atividades relacionadas ao trfico (Negrete, 1992).

    No Brasil, a cocana era livremente comercializada j no incio do

    sculo, integrante de remdios ou em sua forma pura. Esta situao permaneceu

    at 1921, quando as leis comearam a restringir o seu consumo. Em 1962, no

    primeiro levantamento brasileiro sobre internaes motivadas por consumo de

    drogas, observou-se que apenas quatro casos eram motivados pelo consumo da

    cocana, enquanto neste mesmo ano 8.462 internaes foram motivadas por

    lcool. Com o crescimento do consumo observado na ltima dcada, em 1992

    houve 866 internaes em hospitais psiquitricos por intoxicao aguda ou

    dependncia da droga. Em populaes especificas, como as crianas de rua de

  • 27

    grandes cidades, a cocana proporcionalmente muito mais consumida (relatos

    em 46,5% destas crianas na cidade de So Paulo). Com o surgimento do crack

    no estado de So Paulo durante esta dcada, porm, o consumo e as

    conseqncias tm crescido vertiginosamente (Leite et al., 1999).

    A cocana apresenta um elevado potencial para abuso e continua sendo

    um importante problema de sade publica, com 2,3 milhes de usurios apenas

    nos Estados Unidos (United States Substance Abuse and Mental Health Services

    Administration. Office of Applied Studies. 2001). Apesar dos esforos contnuos,

    ainda no temos a disponibilidade de tratamentos farmacolgicos eficientes para

    a dependncia a cocana (Sofuoglu et al, 2006). Muitos estudos, contudo, tem

    mostrado uma relao entre os resultados dos tratamentos e uma variedade de

    variveis demogrficas e relacionadas ao uso da droga (Sofuoglu et al, 2006).

    O uso de substancias de abuso como a cocana apresenta um elevado

    custo dentro das desordens neuropsiquitricas. Na ltima dcada, muito

    progresso foi feito em relao ao entendimento dos efeitos das drogas de abuso

    sobre o crebro. O vcio a drogas de abuso agora considerado uma doena do

    sistema nervosa central, pois o abuso de drogas afeta varias funes cerebrais.

    Prejuzos neurolgicos observados em usurios de drogas podem refletir

    disfunes neurolgicas e neurotoxicidade induzidas pela droga de abuso (Cunha

    et al., 2008).

    Os efeitos da cocana sobre o processo cognitivo tm sido estudados em

    vrios trabalhos recentes. Muitos estudos na literatura demonstram que a

    exposio repetida cocana ou anfetamina promove funo deficiente do crtex

    prefrontal, crtex orbital e amgdala (Roesch et al. 2007; Schoenbaum et al.

    2004). Alem disso, a administrao repetida de psicoestimulantes tem promovido

    dficits de ateno e reduo na capacidade de aprendizado (Dalley et al. 2005;

    Jentsch et al. 2002), processos estes que dependem de um crtex prefrontal

    intacto e funcional. No obstante, poucos estudos tem relacionado a exposio a

  • 28

    psicoestimulantes com o aprendizado e a memria relacionados com o

    hipocampo.

    1.2.2. Formas de cocana

    A cocana o nico anestsico local que ocorre naturalmente, estando

    presente nas folhas da Erythroxylum coca na proporo de 0,5 a 1,0%. um ster

    do cido benzico e da ecgonina (derivado da tropina) (Musto, 1992).

    A Erythroxylum coca a mais antiga das cocas cultivadas, sendo

    encontrada ainda em um estado semi-selvagem nos Andes peruanos e bolivianos.

    Sua cultura data de vrios milnios e responsvel pela maior parte do

    suprimento mundial de cocana. O processo de extrao da cocana para consumo

    ilcito iniciado colocando-se as folhas e solventes orgnicos (querosene,

    gasolina) em recipientes (tanques); aps um perodo de macerao, o extrato

    orgnico separado das folhas e evaporado. O resduo obtido, denominado pasta

    de coca, contm cocana juntamente com outros alcalides e leos essenciais. A

    droga pode ser obtida, tambm, por meio da secagem das folhas, digesto com

    cido sulfrico e posterior extrao, aps precipitao com bicarbonato de sdio.

    Este produto pode conter sulfato de cocana (40-85%), alm da cocana na forma

    de base.

    A pasta de coca ento tratada com cido clordrico (HCl) para

    formao de cloridrato de cocana, que corresponde a forma usual de trfico.

    raro, contudo, encontr-la na forma pura, sendo normalmente diluda com a

    adio de produtos que procuram mimetizar sua ao farmacolgica, cor ou

    sabor. So utilizados para esta finalidade outros anestsicos locais (lidocana),

    cafena, efedrina, feniciclina, quinina, estricnina, manitol, sacarose, herona, talco

    e outros.

    O cloridrato de cocana apresenta-se na forma de p ou grnulos brancos,

    insolveis em ter e solveis em gua, etanol e clorofrmio, apresentando ponto

  • 29

    de fuso a 196C. A partir do cloridrato possvel obter cocana na forma de

    base, que voltil e quimicamente mais estvel. Essa transformao pode ser

    obtida pela adio de solues alcalinas (bicarbonato) ao cloridrato, extrao

    com ter dietlico e posterior evaporao do solvente orgnico pelo aquecimento.

    O produto obtido dessa maneira a cocana na forma de base livre, mas o

    aquecimento propicia a ocorrncia de exploses devido s caractersticas do ter

    (Musto, 1992).

    1.2.3. Vias de exposio

    A cocana pode ser utilizada por aplicao direta nas mucosas ou atravs

    das vias oral, respiratria (aspirada ou fumada) ou intravenosa. As vias de

    exposio mais utilizadas ocorrem por meio do sistema respiratrio pela

    aspirao e absoro intranasal do cloridrato de cocana ou pela inalao e

    absoro pulmonar da fumaa proveniente do ato de fumar a cocana na forma

    Crack. A cocana pode ser consumida por vrias vias e em uma grande variedade

    de doses (Jones, 1987). O uso intravaginal j foi reportado (Collins et al., 1994).

    A droga tambm pode ser aplicada por via retal (Schrank 1993). A cocana

    apresenta ao equipotente quando fumada ou administrada endovenosamente

    em termos de pico plasmtico (Fischman, 1988). Alm disso, a cocana fumada

    (incluindo o crack) no apresenta os riscos de infeco nem carrega o estigma

    (Johanson e Fischman, 1989).

    A cintica de absoro intranasal de extrema importncia clnica, pelo

    fato da droga ser muito utilizada por esta via. Aps utilizao pela via intranasal,

    o pico mximo de concentrao plasmtica observado entre 30 a 120 minutos

    aps o uso. Essa variao ocorre pelo fato de a cocana produzir diferentes graus

    de vasoconstrio, ocorrncia de biotransformao no prprio local de

    administrao (mucosa nasal), diferenas interindividuais de velocidade de

  • 30

    hidrlise ou diferenas na prtica da tcnica de aspirao que leva deglutio

    parcial da droga.

    Quando a cocana utilizada na forma fumada (pasta, crack ou merla), sua

    velocidade de absoro pode ser comparada a da via endovenosa, levando alguns

    minutos para a droga atingir a circulao sistmica e o crebro. A absoro nesta

    via ocorre nos alvolos pulmonares, sendo facilitada pela extensa superfcie

    pulmonar e pelo tamanho das partculas produzidas na volatilizao do crack. O

    aparecimento dos efeitos desejados depende da quantidade da droga liberada na

    corrente sangnea, a qual est diretamente relacionada com a eficincia do ato

    de fumar. O pico mximo de concentrao plasmtica obtido com 6 a 8 minutos

    aps a tragada (Musto, 1992).

    A injeo de cocana utilizada mais comumente por dependentes em

    relao aos usurios ocasionais. Quando administrada na forma injetvel, at um

    grama da droga adicionado, em cada ocasio, em uma colher. Adiciona-se

    ento gua, sendo a mistura resultante colocada em uma seringa e injetada. A

    euforia acontece imediatamente. O uso intravenoso de cocana produz o pico de

    high (aumento da fora, energia e sensao de autoconfiana) 10 a 15 minutos

    aps a injeo, com durao de cerca de 30 a 45 minutos. Efeitos intensos podem

    ocorrer com doses muito menores do que aquelas administradas oralmente

    (Rowbotham e Lowenstein, 1990). A morte sbita pode ocorrer rapidamente

    como resultado de um colapso cardiorrespiratrio.

    A administrao intranasal uma via comum de utilizao da droga. A

    cocana quando preparada para inalao colocada em uma superfcie

    translcida, como um espelho, onde ela finamente cortada com uma lmina de

    barbear e organizada em filas. Uma fila de cocana consiste em aproximadamente

    20 a 30 mg (Commissaris, 1989; Cox et al., 1983). Seguindo a inalao, h uma

    rpida passagem da cocana para corrente sangunea atravs da mucosa nasal rica

    em capilares, e os nveis sanguneos aumentam rapidamente (em 30 segundos a 2

    minutos), com pico de 15 minutos a 1 hora aps a inalao. (Higgins et al., 1990;

  • 31

    Weiss et al., 1994). Efeitos no humor so evidentes em 15 a 30 minutos aps a

    administrao intranasal, e os efeitos cardiovasculares, incluindo elevao da

    presso arterial, aparecem em 15 a 20 minutos. Estes efeitos geralmente

    desaparecem em 45 a 60 minutos, embora os metablitos da cocana ainda

    estejam presentes na circulao por 4 a 6 horas aps a administrao (Weiss et

    al., 1994).

    A cocana pode ser fumada tanto na forma de pasta de coca como de

    crack, forma mais freqentemente usada. O contedo de cocana na fumaa

    inalada rapidamente absorvido e a concentrao sangunea aumenta

    rapidamente. Efeitos subjetivos como euforia e bem-estar geral ocorrem logo no

    incio do uso. Com o uso prolongado, porm, ocorre uma menor sensao de

    euforia, acompanhada de ansiedade, hostilidade e extrema depresso. No caso do

    crack, h uma intensa euforia inicial acompanhada por severa depresso, agitao

    e desejo por cocana, 10 minutos aps o uso (Leite et al., 1999).

    O cloridrato de cocana pode ser aplicado topicamente (nica via lcita de

    administrao) como anestsico. Por causa de sua insuficiente absoro cutnea,

    no ocorrem efeitos psicotrpicos nesta via de administrao (Brown, 1989;

    Ritchie e Greene, 1990).

    1.2.4. BIOTRANSFORMAO DA COCANA

    A cocana convertida extensamente a produtos de biotransformao no

    organismo por meio de processos enzimticos e qumicos, sendo pouco excretada

    na urina na sua forma inalterada. Os principais produtos de biotransformao so

    a benzoilecgonina e, em menor proporo, a ecgonina, a norcocana e a

    benzoilnorcocana (Leite, 1999).

    A benzoilecgonina corresponde a 29-45% da excreo urinria. Para sua

    formao, a cocana sofre hidrlise espontnea (pH dependente) do grupo ster

    carboxlico. O ster metil ecgonina, maior produto de biotransformao depois da

  • 32

    benzoilecgonina, resulta da hidrlise espontnea e degradao enzimtica por

    ao das colinesterases plasmticas e hepticas. A hidrlise enzimtica da

    benzoilecgonina e a espontnea do ster metil ecgonina resultam no

    aparecimento da ecgonina, que pode contribuir com 1 a 8% da excreo urinria

    de cocana. Outro produto de biotransformao a norcocana, que ocorre apenas

    em pequena frao (2 a 6%), mas que farmacologicamente ativa.

    1.3. COCANA E NEUROTRANSMISSO

    1.3.1. DOPAMINA

    - Produo e distribuio no crebro

    O aminocido tirosina o precursor dos neurotransmissores aminrgicos

    que possuem estrutura qumica denominada de catecol. Estes neurotransmissores

    so denominados catecolaminas e compreendem a dopamina, noradrenalina e

    adrenalina. Neurnios catecolaminrgicos esto relacionados com a regulao do

    movimento, humor, ateno e das funes vicerais. Os neurnios dopaminrgicos

    (produtores de dopamina) apresentam a enzima tirosina hidroxilase (TH), um

    catalizador da converso de tirosina em DOPA (Diidroxifenilalanina). O DOPA

    convertido ento no neurotransmissor dopamina pela dopa descarboxilase.

    Quando gerado um potencial de ao (despolarizao da membrana), ocorre a

    exocitose do neurotransmissor dopamina para a fenda sinptica. A dopamina atua

    ento em receptores pr e ps-sinpticos para promoo de seus efeitos, sendo

    recaptada para o neurnio para o trmino do processo sinalizador (Bear, 2001;

    Connors 2001).

  • 33

    1.3.2 DISTRIBUIO DOS NEURNIOS DOPAMINRGICOS

    Os neurnios dopaminrgicos tm origem em trs grupos celulares

    localizados no crebro. Estes so classificados em A8, A9 e A10 (Dahlstrom &

    Fuxe, 1964, Bjorklund & Lindvall, 1984), correspondendo s regies cerebrais

    denominadas campo retrorubral (A8), substncia negra pars compacta (A9) e

    rea tegumentar ventral (A10) (Figura 3). Os axnios dos neurnios

    dopaminrgicos provenientes destes grupos celulares se estendem para regies do

    mesencfalo, formando trs sistemas neuronais:

    Sistema nigroestriatal que compreende os neurnios dopaminrgicos

    originados no grupo de clulas A9 e que termina na regio denominada

    corpo estriado dorsal. Esta regio contem o ncleo caudado e o putamen e

    esta envolvida com o aprendizado de movimentos complexos executados

    automaticamente sob comando voluntrio.

    O segundo circuito, o sistema mesolmbico, originado no grupo A10 e

    parte do grupo A9. Estes neurnios terminam no estriado ventral, o qual

    inclui o ncleo accumbens e tubrculo olfatrio, o septo, a amgdala central

    e o ncleo profundo da formao reticular (Ungerstedt, 1971). O estriado

    ventral tem papel no aprendizado e no desempenho de certos

    comportamentos de motivao.

    O terceiro grupo de neurnios dopaminrgicos se origina nos grupos A9 e

    A10 e termina em vrias regies do crtex cerebral que so envolvidas na

    ateno e memria curta, formando o sistema mesocortical (Thierry et al.,

    1973).

  • 34

    Figura 3 Vias dopaminrgicas em crebro de ratos

    1.3.3. PAPEL DA DOPAMINA NO COMPORTAMENTO

    Inmeras evidncias indicam que a dopamina exerce um importante papel

    na motivao e no reforo (Wise 1982; Robbins et al., 1989; Di Chiara 1995). A

    ao da dopamina no comportamento depende de trs fatores principais: (1) o

    tipo de estmulo que ativa os neurnios dopaminrgicos, (2) a(s) rea(s) cerebral

    (is) afetada(s) pela dopamina e (3) o modo de neurotransmisso dopaminrgica

    (se fsico-sinptico ou tnico-no-sinptico).

    Os neurnios dopaminrgicos so ativados por estmulos encorajadores

    para os animais interpretarem ou repetirem certo comportamento (estmulo

    motivacional). Estes estmulos convergem dos grupos celulares dopaminrgicos

    A8, A9 e A10 para vrias reas cerebrais onde ficam as terminaes dos

    neurnios dopaminrgicos. Assim, atravs da ativao destes neurnios, o

  • 35

    estmulo motivacional pode influenciar a atividade de vrias partes do crebro

    que podem determinar diferentes funes comportamentais. Este mecanismo

    pode ser uma das razes do extenso papel da dopamina no comportamento.

    1.3.4. O TRANSPORTADOR DE DOPAMINA

    A cocana bloqueia a captao de dopamina, 5-hidroxitriptamina (5-HT) e

    norepinefrina (NE) no SNC (Figura 4), promovendo um acmulo destes

    neurotransmissores na fenda sinptica. Existe uma correlao positiva

    significativa entre as potncias da cocana e alguns compostos relacionados, que

    bloqueiam a captao de dopamina e suas habilidades como reforadores em

    situaes de auto-administrao em macacos rhesus (Ritz et al., 1987), sendo que

    correlaes significativas entre os efeitos de reforo e o bloqueio da captao de

    NE e 5-HT no foram encontradas. Estes dados sugerem que o bloqueio da

    captao de dopamina um passo essencial na mediao dos efeitos de reforo

    da cocana. Outro suporte desta hiptese dopaminrgica provm da evidncia de

    que o receptor da cocana e o transportador de dopamina so protenas idnticas.

    Particularmente, fortes evidncias provm dos experimentos de clonagem.

    Outros estudos mostram que vrios inibidores da captao de dopamina, como os

    anlogos da cocana de alta afinidade, mazindol e vrios anlogos do GBR12909,

    se ligam a um stio comum e interagem competitivamente, o que leva

    concluso de que eles se ligam ao transportador de dopamina (Carroll et al.,

    1992; Reith et al., 1992). Alm do mais, Grilli et al., (1991), mostraram que a

    expresso de stios de ligao da cocana e stios de captao de dopamina

    ocorrem ao mesmo tempo durante o desenvolvimento celular in vitro.

    Uma outra indicao de que os stios de ligao da cocana e o

    transportador de dopamina esto intimamente relacionados o fato de que os

  • 36

    stios de ligao da cocana so distribudos no SNC em reas que apresentam

    altas concentraes de dopamina em terminais nervosos. Enquanto estes dados

    indicam um papel proeminente da dopamina, alguns trabalhos indicam que

    interaes significativas entre diferentes sistemas mediadores neuroqumicos,

    como o serotonrgico, gabargico e adrenrgico, podem estar envolvidos na

    modulao das aes de reforo da cocana e compostos relacionados.

    Grandes progressos tambm foram alcanados na elucidao das

    caractersticas da estrutura da cocana, que so significativas na ligao ao

    transportador de dopamina. As caractersticas estruturais importantes incluem a

    configurao levorotatria, um substituinte beta-orientado em C-2 e C-3, e o anel

    benznico no carbono C-3 (Ritchie et al., 1990).

    Alm das caractersticas estruturais relevantes na ligao da cocana,

    vrios laboratrios esto envolvidos na caracterizao da protena transportadora

    de dopamina propriamente dita. Estes estudos levaram ao desenvolvimento de

    tcnicas que eventualmente resultaram na clonagem e expresso do DNAc do

    transportador de dopamina cocana-sensvel (Kilty et al., 1991; Shimada et al.,

    1991). Este achado d a oportunidade de elucidar a seqencia molecular que

    resulta na captao de dopamina e determinar como este processo perturbado

    pela cocana. Finalmente, este conhecimento pode ser til no desenvolvimento de

    medicamentos para o tratamento da dependncia pela cocana. Pela alterao do

    transportador de dopamina atravs de mutaes stio-direcionadas, possvel

    determinar se as mudanas diferentemente alteram a ligao de cocana e

    dopamina. O achado de que um resduo de cido asprtico encontrado em uma

    regio particular parece ser crucial para ambos, transporte de dopamina e ligao

    da cocana, enquanto outras reas so importantes apenas para o transporte de

    dopamina, d suporte possibilidade da capacidade do desenvolvimento de

    antagonistas da cocana que no interfiram com o transporte normal de dopamina

    (Kitayama et al., 1992).

  • 37

    Figura 4 Aes da cocana sobre o processo de recaptao de dopamina.

    1.3.5. EFEITO DA COCANA NO SISTEMA DOPAMINRGICO

    A cocana produz muitos efeitos neuroqumicos, mas seu principal

    mecanismo de ao envolve a monoamina dopamina. A cocana produz um

    bloqueio na recaptao de dopamina, permitindo que esta fique na fenda

    sinptica por um perodo prolongado de tempo. O aumento deste

    neurotransmissor em certas reas do crebro, como por exemplo, no ncleo

    accumbens, responsvel pelos efeitos de reforo da cocana (figura 4).

    A ativao do sistema nervoso simptico tambm ocorre, explicando os

    efeitos simpaticomimticos da cocana, os quais incluem: taquicardia, aumento

    Vesculas com DA Neurnio pr-

    ganglionar

    Cocana bloqueia

    recaptao de DA

    DA

    Neurnio ps-

    ganglionar Receptores ps-sinpticos

  • 38

    da presso arterial sistlica, midrase e outros efeitos simpticos (Ritchie e

    Greene, 1990). Mais especificamente, os receptores D1, D2 e D3 podem estar

    envolvidos no efeito de reforo no sistema dopaminrgico mesolmbico. A

    atividade do receptor D1 foi demonstrada predominantemente em partes

    perifricas do Ncleo accumbens, o qual est relacionado com aspectos

    motivacionais do vcio promovido pela cocana (Koob et al., 1997). Leshner

    (1996), tambm sugeriu que os receptores D1 podem estar envolvidos na

    saciedade pela cocana, visto que agonistas D1 suprimem a auto-administrao

    em ratos. Os receptores D2 tm tambm importncia nos efeitos de reforo da

    cocana. De acordo com Leshner 1996, estes receptores tm um possvel papel

    nos comportamentos motores envolvidos no vcio por cocana, considerando que

    agonistas D2 induzem um comportamento de procura pela droga. Koob et al.,

    1997, sugeriram que isto devido a um aumento na quantidade de receptores D2

    no corpo estriado, o qual est envolvido nos comportamentos motores. Os

    receptores D3 tambm tm efeitos sobre a habilidade da cocana em produzir

    reforo, mas o mecanismo de ao destes receptores ainda precisa ser elucidado

    (Koob et al., 1997). Semelhante aos receptores D1, os receptores D3 foram

    encontrados no shell do ncleo accumbens, mas no na parte central. (Koob et

    al., 1997). Em suma, os receptores D1, D2 e D3 exercem um papel na habilidade

    da cocana produzir reforo.

    O bloqueio da recaptao de dopamina pode estar relacionado a um

    aumento na atividade locomotora com os dias de administrao. Feldman et al.,

    (1997) demonstraram que microinjees de cocana no ncleo accumbens

    resultavam em aumento na atividade locomotora. Porm, estes pesquisadores

    explicaram que o mecanismo pelo qual a cocana produz seus efeitos

    comportamentais pode envolver mais do que um simples bloqueio na recaptao

    de dopamina.

  • 39

    Figura 5 Sistema dopaminrgico mesocorticolmbico

    Fonte: Neurocincias Desvendando o sistema nervoso - Bear, Mark F. 2002.

    1.3.6. CIRCUITOS ENCEFLICOS E DROGAS DE ABUSO

    O sistema mesolimbico primariamente regulado pela dopamina e

    parece ser responsvel pelos efeitos agudos de reforo das drogas de abuso

    (Heidbreder et al, 2005; Kreek et al, 2002). Os mediadores neurobiolgicos das

    aes psicoestimulantes centrais da cocana parecem ser as catecolaminas

    centrais, principalmente o neurotransmissor dopamina. Neurnios

    dopaminrgicos da rea tegumentar ventral (ATV) que inervam o crtex lmbico

    e frontal so necessrios para as aes agudas de reforo promovidas pela

    cocana.

  • 40

    As bases celulares para as aes da cocana no sistema dopaminrgico

    comearam a ser elucidadas por meio da administrao de ligantes marcados,

    White e Wang demonstraram que a dopamina deprime normalmente a atividade

    espontnea do ncleo accumbens inervado por neurnios dopaminrgicos da rea

    tegumentar ventral, sendo esta ao trs a dez vezes mais potente nesta em

    relao ao ncleo accumbens. Embora a ao da dopamina no ncleo accumbens

    se d atravs da interao com receptores das famlias D1 e D2, na ATV ocorre

    interao predominante com receptores D2-smile.

    A cocana atua alterando os sistemas de neurotransmissores endgenos.

    Centralmente, a cocana atua na neurotransmisso catecolaminrgica incluindo

    tanto as vias noradrenrgicas como dopaminrgicas. A via noradrenrgica parece

    ser importante na mediao da ativao dos efeitos inespecficos estimulantes,

    incluindo complicaes cardiovasculares e o aparecimento dos sintomas que

    aparecem aps a interrupo do uso dos estimulantes (Gawin e Ellinwood, 1988;

    Kosten, 1990). Os circuitos dopaminrgicos cerebrais parecem ser importantes na

    euforia e nos efeitos de reforo induzidos pelos estimulantes, os quais mantm o

    abuso dos estimulantes (Shepherd, 1988).

    A via serotonrgica tambm tem um papel no abuso da cocana, embora

    isto no tenha sido firmemente estabelecido (Kosten, 1990; Shepherd, 1988). A

    via dopaminrgica mesolmbicamesocortical importante para a auto-

    administrao da cocana (Wise, 1987).

    Os neurnios dopaminrgicos da ATV so clulas que se originam das

    vias dopaminrgicas mesolmbicamesocortical e promovem inervao

    dopaminrgica para o ncleo accumbens (Oades and Halliday, 1987). As

    propriedades de recompensa da cocana podem ser devidas ao bloqueio da

    recaptao de dopamina no ncleo accumbens, o que incrementa e prolonga a

    liberao sinptica de dopamina (Ritz et al., 1987; Koob and Bloom, 1988).

    A cocana incrementa os nveis de dopamina na rea tegmentar ventral

    por bloqueio dos transportadores dopaminrgicos pr-sinpticos, bem como

  • 41

    bloqueia tambm os transportadores pr-sinpticos de serotonina e noradrenalina

    (Kreek et al, 2002; Kalivas et al, 2005). Com a utilizao crnica de cocana,

    ocorre um aumento na expresso de receptores opiides , receptores de

    dinorfinas e receptores glutamatrgicos, como um possvel meio de regular o

    aumento nos nveis de dopamina, enquanto promovem o efeito de reforo da

    droga (Kreek et al, 2002; Kalivas et al, 2005).

    O mecanismo central de ao da cocana e outros estimulantes com alto

    potencial de abuso parece ser a estimulao da via de recompensa dopaminrgica

    no crebro (Gawin e Ellinwood, 1988; Goeders e Smith, 1983; Yokel e Wise,

    1975). De acordo com Kosten 1990, as seguintes aes ocorrem na sinapse

    durante a ao estimulatria: a liberao de catecolaminas dos terminais pr-

    sinpticos; o bloqueio da captao da dopamina, NE e 5-HT (principal

    mecanismo de inativao dos neurotransmissores) e alteraes na sensibilidade

    do receptor com o uso crnico. O uso crnico pode resultar em outros efeitos que

    no s os resultantes da disponibilidade aumentada de catecolaminas e 5-HT.

    Estes incluem sensibilizao (tolerncia reversa) e tolerncia.

    A sensibilizao comportamental pode estar localizada no Ncleo

    accumbens, embora outros sistemas neurais possam mediar os efeitos motores

    agudos da cocana (Kalivas e Duffy, 1990). Foi demonstrado que a sensibilizao

    induzida por cocana pode ser bloqueada pelo haloperidol, um frmaco

    antipsictico antagonista dopaminrgico (Weiss et al., 1989), enquanto a

    administrao de apomorfina, um agonista do receptor dopaminrgico, previne o

    desenvolvimento de uma resposta de sensibilizao anfetamina em

    camundongos (Riffee et al., 1987), mas no previne a sensibilizao induzida

    pela administrao subcrnica de cocana (Riffee et al., 1988); estes resultados

    sugerem que a sensibilizao para estes dois estimulantes pode envolver

    diferentes processos.

    A tolerncia aos efeitos da cocana pode se desenvolver atravs da

    reduo da inibio da recaptao com o uso crnico, diminuindo a liberao dos

  • 42

    neurotransmissores, talvez devido depleo no terminal pr-sinptico (embora

    este mecanismo no tenha sido confirmado) ou alteraes na sensibilidade do

    receptor nos seus stios pr- e ps-sinpticos levando a uma auto inibio

    neuronal (Kosten, 1990).

    A hiptese dopaminrgica procura explicar as propriedades de reforo da

    cocana. Ela prope que a cocana liga-se ao transportador de dopamina e inibe a

    recaptao do neurotransmissor. Como resultado, a neurotransmisso

    dopaminrgica potencializada na via mesolimbocortical, levando ao reforo de

    eventos associados com a ligao da cocana e inibio da entrada de dopamina

    em nvel molecular (Kuhar, 1992). Como outras drogas, tais como nicotina e

    lcool, tambm ativam a via mesolmbica, isto pode servir como via comum final

    para numerosas substncias psicoativas, tanto em seu stio de ao como em

    outros locais no SNC (Kuhar et al., 1991).

    Existem evidncias substanciais da hiptese dopaminrgica em animais,

    mas poucas em humanos. Ritz et al., (1987), reportaram em animais evidncias

    de que a inibio do transportador de dopamina o mecanismo primrio

    responsvel pelos efeitos de reforo da cocana e o stio receptor, ou stio de ao

    onde os eventos resultantes dos efeitos de reforo so iniciados, embora outros

    stios no possam ser excludos. Entre as linhas de evidncia disponveis em

    humanos para esta explicao, Kuhar et al., 1991, listam as seguintes: 1) estudos

    de tomografia emissora de psitrons (TEP), que mostram similaridades no tempo

    de curso entre a ocupao do receptor de cocana (transportador de dopamina) e

    os efeitos da cocana; 2) a presena de parania e psicose em ambos os usurios

    de cocana de forma prolongada ou em altas doses e na esquizofrenia, uma

    desordem que envolve a via dopaminrgica lmbica; 3) a ao de estimulantes

    indiretos do receptor de dopamina, tais como, metilfenidato ou bromocriptina em

    reduzir com sucesso o desejo inicial pela droga, sugerindo que o agente

    dopaminrgico pode influenciar o mesmo processo como a cocana (Dackes et

    al., 1987; Khantzian et al., 1984); 4) a preferncia mostrada por bloqueadores da

  • 43

    captao de dopamina em estudos de escolha feitos com vrias drogas (Chatt et

    al., 1987); 5) e a sugesto de que decanoato de flupentixol, um bloqueador do

    receptor de dopamina, pode diminuir o desejo pela droga (Giannini et al., 1986;

    Gawin et al., 1989). A administrao de drogas bloqueadoras de receptores

    dopaminrgicos, tais como clorpromazina ou haloperidol no reduziram a euforia

    induzida pela cocana ou auto-administrao, mas reduziram os sintomas

    psicticos (Gawin 1986a). O haloperidol tambm falhou na tentativa de atenuar o

    rush (sensao de curta durao que ocorre imediatamente aps a administrao

    da droga e caracterizada por uma sensao de poder e extremo prazer

    comparado a um orgasmo), apenas modestamente influenciando os efeitos

    subjetivos da cocana e atenuando o aumento da presso sistlica e diastlica

    induzido pela cocana (Shere et al., 1989).

    Estes achados sugerem que um bloqueio nos receptores D2 (subtipo de

    receptor dopaminrgico do qual o haloperidol antagonista primrio) no afetou

    fortemente a euforia causada pela cocana, embora o pr-tratamento com

    bloqueadores do receptor dopaminrgico tenham prevenido a euforia pela

    anfetamina. Estes resultados sugerem a possibilidade de que mecanismos

    dopaminrgicos estejam envolvidos no incio do uso da cocana, mas no em

    fenmenos tardios como a dependncia e o desejo. Usando um simples estudo de

    TEP, Pearlson et al., 1993 encontraram que a cocana administrada

    endovenosamente produziu efeitos subjetivos (auto-limitados, como rush e high)

    correspondendo com diminuies regionais no fluxo sanguneo cerebral para

    stios ricos em terminais dopaminrgicos, sugerindo o envolvimento do sistema

    dopaminrgico na produo destes estados subjetivos.

    Enquanto os efeitos da cocana no sistema dopaminrgico neuronal no

    crebro so possivelmente mediados pelo bloqueio de curto perodo na

    recaptao de dopamina, o uso prolongado resulta na depleo de dopamina

    nestes mesmos stios (Volkow et al., 1990). Esta depleo pode resultar na

    interrupo da transmisso dopaminrgico, causando disforia e nsia pela droga.

  • 44

    No estudo de Volkow et al., 1990, porm, foi demonstrada uma recuperao na

    disponibilidade do receptor dopaminrgico ps-sinptico a nveis normais em

    usurios de cocana detoxificados depois de um perodo de um ms livre da

    droga. Outro estudo tambm examinou a possibilidade de que a exposio

    cocana altera o transportador de dopamina e concluiu que a regulao do

    transportador de dopamina altamente sensvel aos regimes de uso e intervalos

    de retirada da droga (Little et al., 1993).

    Vrios aspectos do mecanismo definem as bases das intervenes

    farmacolgicas para o tratamento do abuso da cocana. Por exemplo, quando as

    vias dopaminrgicas so antagonizadas por neurolpticos, os quais atuam como

    bloqueadores dopaminrgicos (Phillips et al., 1983), ou quando estas vias so

    destrudas quimicamente ou retiradas cirurgicamente (Bozarth e Wise, 1986;

    Roberts et al., 1977), os efeitos comportamentais da cocana so eliminados. As

    qualidades eufricas e de reforo da cocana podem tambm ocorrer como um

    resultado do efeito da droga no sistema 5-HT, embora os mecanismos envolvidos

    no sejam ainda conhecidos. A administrao da cocana aumenta a liberao do

    neurotransmissor 5-HT nos stios sinpticos pela inibio da recaptao da 5-HT,

    como j descrito anteriormente, da mesma maneira pela qual afeta a dopamina e

    NE (Hall et al., 1990), resultando na reduo do turnover de 5-HT. Desta forma,

    agentes que modulam a 5-HT tambm influenciam a ao da cocana (Johnson e

    Vocci, 1993).

    Tambm conhecido que agonistas opiides como morfina e metadona

    estimulam a transmisso dopaminrgica no sistema mesolmbico, enquanto

    agonistas opiides reduzem na mesma extenso. Desde que buprenorfina (um

    agonista parcial - ) suprime a auto-administrao de cocana em macacos

    Rhesus na mesma extenso que suprime a auto-administrao dos opiides, pode

    existir uma possvel ligao entre o sistema opiide e os sistemas responsveis

    pela produo dos efeitos de reforo da cocana em primatas (Johnson e Vocci,

    1993).

  • 45

    1.4. TOPIRAMATO

    1.4.1. CONSIDERAES GERAIS

    O topiramato [2,3:4,5-bis-O-(1-metiletilideno)b-Dfrutopiranose

    sulfamato] (Figura 6) um composto com um amplo espectro de atividades

    antiepilpticas, tanto em modelos experimentais como em estudos clnicos

    (Shank e Gardocki, 1994; Wauquier et al, 1996; Bourgeois et al, 1996).

    Este agente foi inicialmente sintetizado como um frmaco antidiabtico, e

    atuaria inibindo a enzima frutose-1,6-bisfosfatase e assim a gliconeogenese.

    Contudo, a inabilidade do topiramato em reduzir os nveis glicmicos em ratos

    determinou a interrupo prematura desta linha de pesquisa. A similaridade

    estrutural do topiramato com a acetazolamida, a qual tem efeitos

    anticonvulsivantes, encorajou pesquisas para testar uma possvel atividade

    anticonvulsivante do topiramato. O topiramato hoje classificado como um

    potente antiepilptico com intensas propriedades neuroprotetoras (Khan et al.,

    2003; Jonhson et al., 2003).

    Figura 6 Estrutura qumica do topiramato

    (Fonte: Johnson, 2005)

  • 46

    Vrias aes farmacolgicas deste composto tm sido identificadas como

    fatores que contribuem para sua ao anticonvulsivante, dentre os quais: (a)

    bloqueio de canais de Na+ voltagem dependentes, o que reduz a durao e a

    freqncia dos potenciais de (Zona e Ciotti, 1997; Delorenzo et al, 2000); (b) um

    efeito modulador sobre os receptores GABAA do cido aminobutirico

    (GABA) com consequente potencializao do GABA (White et al, 2000) e um

    efeito inibidor sobre os receptores ionotrpicos glutamatrgicos NMDA (N-

    metil-D-aspartato) e AMPA (Skradski et al, 2000, Hargreaves e Iain, 2007).

    Adicionalmente, o topiramato inibe algumas isoenzimas da anidrase

    carbnica (Dodgson et al, 2000) e aumenta o metabolismo energtico em ratos

    por mecanismos desconhecidos (Richard et al, 2000). O Topiramato tem

    demonstrado ainda aes neuroprotetoras em modelos animais de isquemia

    cerebral focal (Yang e Li, 2000; Lee et al, 2000). Estas aes oferecem novas

    perspectivas para o uso desta droga, mas os mecanismos que levam a estas aes

    neuroprotetoras permanecem no elucidados.

    Estudos recentes sugerem que mecanismos de reforo similares associados

    com o uso de cocana e lcool resultam no aumento da atividade do sistema

    dopaminrgico mesolimbico (Soderpalm et al, 2000, Hargreaves e Iain, 2007). O

    topiramato uma droga antiepilptica com mltiplos mecanismos de ao, o que

    poderia justificar sua possvel utilidade no tratamento de dependentes

    (Soderpalm et al, 2000; White et al, 2000; Zhang et al, 2000; Johnson et al,

    2005). Tem sido teorizado que estas aes em conjunto podem diminuir a

    facilitao dopaminrgica promovida por drogas de abuso (Johnson et al, 2005).

    Estudos recentes em relao ao vicio tem focado no papel exercido pelo

    glutamato. Enquanto os receptores NMDA tm sido envolvidos com a induo

    do vicio, os receptores AMPA podem mediar o estabelecimento do vicio.

    (Goosens et al, 2004; Zullino et al, 2005).

  • 47

    O topiramato tem sido investigado como um tratamento potencial para

    uma variedade de desordens incluindo diabetes mellitus, obesidade, desordens

    associadas a ansiedade e desordens impulsivas tais como o vicio e a dependncia

    gerados por drogas de abuso (Johnson et al., 2003; Rubio et al., 2004).

    Esta ao seria benfica no tratamento do vicio, pois a cocana e outras

    drogas de abuso facilitam a atividade dopaminrgica mesolimbica (Soderpalm et

    al, 2000). O topiramato poderia assim no s diminuir os efeitos de reforo

    promovidos pela cocana, mas tambm contribuir no tratamento da abstinncia

    pelo decrscimo da sensibilidade neuronal (Johnson et al, 2005, Cornish et al,

    2000).

    1.5. IMIPRAMINA

    1.5.1. CONSIDERAES GERAIS

    Hafliger e Schindler no final da dcada de 1940 sintetizaram uma srie de

    mais de 40 compostos derivados iminodibenzil para possveis usos como

    antihistamnicos, sedativos, analgsicos e antiparkinsonianos. Um destes

    compostos era a imipramina, um composto dibenzazepinico, que diferia

    estruturalmente em relao aos demais agentes antipsicticos. Estudos

    posteriores em animais foram realizados, e poucos compostos, incluindo a

    imipramina, foram selecionados para ensaios teraputicos com base em suas

    propriedades sedativas e hipnticas. Durante os estudos clnicos destes agentes,

    foi observado que a imipramina, diferentemente das fenotiazinas (Kuhn et al,

    1958), foi relativamente ineficaz em reduzir a agitao e inquietude nos pacientes

    psicticos, porm teve uma ao marcante em pacientes depressivos. Desde

    ento, evidencias acumuladas demonstram sua eficcia no tratamento da

    depresso maior (Potter et al., 1998; Thase e Nolen, 2000).

    mk:@MSITStore:C:/Documents%20and%20Settings/User/My%20Documents/livros/GOODMAN%20&%20GILMAN'S%20THE%20PHARMACOLOGICAL%20BASIS%20OF%20THERAPEUTICS%20-%2011th%20Ed.%20(2006)%20by%20kaball.chm::/online.statref.com/document/documentbodycontent.aspxdocid178fxid75sessionid5ac56d~1.htm#a134068mk:@MSITStore:C:/Documents%20and%20Settings/User/My%20Documents/livros/GOODMAN%20&%20GILMAN'S%20THE%20PHARMACOLOGICAL%20BASIS%20OF%20THERAPEUTICS%20-%2011th%20Ed.%20(2006)%20by%20kaball.chm::/online.statref.com/document/documentbodycontent.aspxdocid178fxid75sessionid5ac56d~1.htm#a124420

  • 48

    Antidepressivos tricclicos com uma cadeia lateral terciria (incluindo

    amitriptilina, doxepina, e imipramina) promovem bloqueio da recaptao de

    serotonina e norepinefrina, enquanto que clomipramina relativamente seletiva

    para a recaptao de serotonina. Seguindo estes estudos iniciais, mais inibidores

    seletivos da recaptao de serotonina foram desenvolvidos no inicio da dcada de

    70 (Goodman e Gilman, 2006).

    bem estabelecido que a imipramina (Figura 7) e antidepressivos

    tricclicos relacionados potencializam a ao de aminas biognicas atravs do

    bloqueio de sua inativao fisiolgica, transporte e recaptao, nas terminaes

    nervosas (Horn et al., 1971; Barbaccia et al., 1983). Tambm tem sido

    demonstrado que a imipramina pode atuar em uma variedade de canais inicos:

    canais de clcio tipo-L (Choi et al., 1992), canais de clcio sensveis a potssio,

    canais tipo SK/IK (Gavrilova-Ruch et al., 2002); canais de sdio voltagem-

    dependentes (Ogata & Narahashi, 1989; Nicholson et al.,2002) e canais de

    potssio voltagem-dependentes (Wooltorton e Mathie, 1993; Kuo, 1998;

    Teschemacher et al., 1999; Dreixler et al., 2000). Previamente (Cuellar-Quintero

    et al., 2001), tem sido reportado que a imipramina promove inibio de correntes

    de potssio nos neurnios ganglionares cervicais superiores (SCGs) e que este

    efeito pode contribuir para aes intracelulares da imipramina.

    Figura7 Estrutura qumica da imipramina

    (Fonte: dailymed.nlm.nih.gov/dailymed/fdaDrugl)

    http://dailymed.nlm.nih.gov/dailymed/fdaDrugXsl.cfm?id=3229&type=display

  • 49

    Tem sido proposto ainda que correntes inicas de potssio tem um papel

    relevante na modulao da excitabilidade neuronal (Brown & Adams, 1980;

    Brown & Higashida, 1988; Marrion, 1997). Alem disso, estudos tem suportado

    que a imipramina altera a regulao do fosfatidilinositol 4,5-bifosfato

    (Hilgemann & Ball, 1996; Ford et al., 2003; Loussouarn et al., 2003). Em vrios

    estudos pr-clinicos recentes, os antidepressivos tricclicos tem sido relacionados

    como potenciais novos anestsicos locais, como bloqueadores de canais de sdio,

    similarmente aos anestsicos locais.

    O conhecimento relacionado s propriedades farmacolgicas dos

    antidepressivos permanece incompleto. As aes da imipramina incluem vrios

    mecanismos diferentes e adaptaes secundrias em seus mecanismos de ao

    relacionados com o bloqueio da recaptao de monoaminas.

    Em adio aos seus efeitos inibitrios sobre transportadores

    monoaminergicos, imipramina interage tambm com receptores alfa-

    adrenrgicos. A presena ou ausncia desta interao parece ser critica para o

    aumento da concentrao extracelular de norepinefrina nas em sinapses

    neuronais. Os receptores a2 incluem autoreceptores pr-sinpticos que limitam a

    atividade neurofisiolgica de neurnios noradrenrgicos ascendentes do locus

    ceruleus (Foote e Aston-Jones, 1995).

    Outras alteraes adaptativas tm sido observadas em resposta ao

    tratamento de longo prazo com antidepressivos tricclicos. Estas incluem

    alterao na sensibilidade de receptores muscarnicos da acetilcolina bem como

    de receptores do cido gama-aminobutrico (GABAB) e possivelmente receptores

    glutamatrgicos N-metil-D-aspartato (NMDA) (Kitamura et al., 1991).

    1.6. PENTOXIFILINA

    1.6.1. CONSIDERAES GERAIS

    mk:@MSITStore:C:/Documents%20and%20Settings/User/My%20Documents/livros/GOODMAN%20&%20GILMAN'S%20THE%20PHARMACOLOGICAL%20BASIS%20OF%20THERAPEUTICS%20-%2011th%20Ed.%20(2006)%20by%20kaball.chm::/online.statref.com/document/documentbodycontent.aspxdocid178fxid75sessionid5ac56d~1.htm#a106724mk:@MSITStore:C:/Documents%20and%20Settings/User/My%20Documents/livros/GOODMAN%20&%20GILMAN'S%20THE%20PHARMACOLOGICAL%20BASIS%20OF%20THERAPEUTICS%20-%2011th%20Ed.%20(2006)%20by%20kaball.chm::/online.statref.com/document/documentbodycontent.aspxdocid178fxid75sessionid5ac56d~1.htm#a112426

  • 50

    A pentoxifilina, 3,7-dimetil-1(5-oxo-hexil) (Figura 8) xantina, uma

    droga que apresenta aes hemodinamicas e indicada para o tratamento da

    claudicao intermitente (Ward et al, 1987; Samlaska et al, 1994; Moher et al,

    2000), atuando como inibidor da fosfodiesterase tipo 5. O estudo da

    fosfodiesterase foi iniciado com o trabalho de Henry Hyde Salter em 1886. Um

    asmtico que observou que quando ingeria caf com o estomago vazio, passava a

    apresentar uma respirao mais fcil, sendo este efeito atribudo a uma

    propriedade broncodilatadora da cafena.

    Figura 8 Estrutura qumica da pentoxifilina

    (Fonte: dailymed.nlm.nih.gov/dailymed/fdaDrugl)

    Embora o mecanismo de ao ainda fosse desconhecido, estudos

    demonstraram que a cafena era um inibidor no-seletivo e fraco da

    fosfodiesterase. Subsequentemente, anlogos da cafena, incluindo a teofilina,

    foram introduzidos com sucesso no tratamento de doenas respiratrias.

    Trabalhos realizados por Earl Sutherland e Ted Rall e publicados em 1958,

    identificaram inicialmente um nucleotdio estvel ao calor, o monofosfato de

    adenosina cclico (cAMP) em extratos de fgado como um segundo mensageiro e

    sugeriram que este poderia mediar muitos efeitos celulares de neurotransmissores

    e hormnios. A descoberta do cAMP foi seguida de 5 anos at a identificao do

    http://dailymed.nlm.nih.gov/dailymed/fdaDrugXsl.cfm?id=3229&type=display

  • 51

    segundo mensageiro intracelular, a guanosina monofosfato cclica (cGMP), em

    urina de ratos (Ashman et al., 1963).

    No mesmo estudo, inibidores de fosfodiesterase foram identificados e a

    fosfodiesterase foi relacionada com a inativao do cAMP. Foi demonstrado

    tambm que a cafena inibia a atividade desta enzima, provendo um mecanismo

    plausvel para suas diversas atividades (Sutherland, 1958).

    Com o advento da biologia molecular, o numero de isoformas de

    fosfodiesterase identificadas aumentou bastante e somente em 1995 sua

    nomenclatura foi padronizada (Beavo, 1995). Hoje, 11 grupos de isoenzimas

    foram identificadas, incluindo a recentemente caracterizada PDE4A11 (Wallace

    et al., 2005). A atividade da enzima fosfodiesterase tem sido identificada em

    varias clulas no corpo, o que tem levantado muitas possibilidades para o

    aumento de alvos teraputicos seletivos (Lugnier, 2005).

    A pentoxifilina um inibidor da enzima fosfodiesterase, responsvel pela

    destruio de cAMP. considerado um frmaco que promove aumento no

    movimento de espermatozides (Tesarik et al., 1992b; Yovich et al., 1990) e

    inibidor da formao de espcies reativas de oxignio (Gavella et al., 1991;

    Yovich, 1993). tambm indicada para o tratamento da claudicao

    intermitente, embora a eficcia clinica da droga para esta indicao permanea

    controversa. Tem sido sugerido tambm que a pentoxifilina pode ser utilizada em

    doenas que afetam o fluxo sanguneo para a retina, tais como retinopatia

    diabtica (Sonkin et al, 1993; Schmetterer et al, 1996) ou degenerao macular

    (Kruger et al, 1998). O efeito teraputico da pentoxifilina nestas condies pode

    ser relacionada com um aumento do fluxo sanguneo capilar tanto por uma

    alterao na deformilibilidade de eritrcitos e leuccitos bem como por um efeito

    vasodilatador direto. A pentoxifilina tambm tem demonstrado ainda ser benfica

    em desordens imunologicamente mediadas, como por exemplo, dermatite de

    contato, hansenase, artrite reumatoide, cncer e malria (Graninger et al., 1991;

    Huizinga et al., 1996; Sampaio et al., 1998).

    http://www.pubmedcentral.nih.gov/articlerender.fcgi?artid=1575939&tool=pmcentrez#bib38http://www.pubmedcentral.nih.gov/articlerender.fcgi?artid=1575939&tool=pmcentrez#bib40http://www.pubmedcentral.nih.gov/articlerender.fcgi?artid=1575939&tool=pmcentrez#bib63

  • 52

    2. JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS

    _________________________________________________________________

  • 53

    2. JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS

    2.1. JUSTIFICATIVA

    O uso de drogas de abuso representa hoje um problema

    significativo em vrios pases, incluindo o Brasil. Em muitos casos, o uso casual

    destas substancias leva a dependncia fsica e psicolgica, com inmeras

    conseqncias para o usurio, tanto em aspectos scias de convvio como no

    desenvolvimento de alteraes patolgicas.

    Importantes pesquisas tm sido desenvolvidas na tentativa de padronizar

    tratamentos medicamentosos para a dependncia e abuso a drogas ilcitas, mas

    para alguns agentes abusivos os tratamentos disponveis so escassos e pouco

    eficientes. Alguns destes tratamentos reduzem apenas o desejo pela droga, mas

    no diminuem suas toxicidades. Assim, mais pesquisas so essenciais para

    aumentar a eficcia destes tratamentos e oferecer novas opes para estes

    pacientes. No caso especifico de usurios de cocana, no temos ainda um

    tratamento farmacolgico padronizado totalmente eficiente em reverter os

    aspectos ligados ao desejo de consumir a droga e as suas toxicidades.

    A busca por um tratamento eficiente para a dependncia e as toxicidades

    geradas pela cocana nos levou a selecionar trs drogas para o nosso estudo.

    Escolhemos a imipramina por ser um antidepressivo j associado ao tratamento

    de usurios de drogas ilcitas. O topiramato foi selecionado por seus resultados

    promissores no tratamento da dependncia ao lcool e a pentoxifilina por suas

    possveis propriedades neuroprotetoras.

    Deste modo, investigamos os efeitos promovidos pela imipramina,

    topiramato e pentoxifilina sobre as alteraes neuroqumicas, comportamentais e

    histolgicas promovidas pela cocana.

  • 54

    2.2. OBJETIVOS

    GERAL

    Estudar as possveis alteraes neuroqumicas, comportamentais e

    histopatolgicas promovidos pela administrao repetida (7 dias) de cocana

    isoladamente ou em associao com imipramina, topiramato e pentoxifilina em

    ratos.

    ESPECFICOS

    - Determinar possveis alteraes na atividade locomotora espontnea

    promovidas pela cocana isoladamente e em associao com imipramina,

    topiramato e pentoxifilina;

    - Observar as aes promovidas pela cocana isoladamente e em

    associao com imipramina, topiramato e pentoxifilina no teste de labirinto em

    cruz elevada com o intuito de se determinar atividades ansiolticas e ou

    ansiognicas;

    - Avaliar as aes da cocana isoladamente e em associao com

    imipramina no teste de nado forado;

    - Avaliar as aes promovidas pela cocana isoladamente e em

    associao com imipramina, topiramato e pentoxifilina no teste de labirinto

    aqutico objetivando determinar possveis alteraes no processo de aquisio da

    memria espacial;

  • 55

    - Determinar possveis alteraes no teste de esquiva passiva promovidas

    pela cocana isoladamente e em associao com imipramina, topiramato e

    pentoxifilina com o intuito de se determinar possveis alteraes sobre o processo

    de formao e consolidao de memria;

    - Avaliar as aes da cocana isoladamente e em associao com

    imipramina e topiramato sobre os nveis de dopamina (DA), 5- hidroxitriptamina

    (5-HT) e seus metablitos: cido 3, 4 dihidroxifenilactico (DOPAC), cido

    homovanlico (HVA) e cido 5- hidroxiindol- 3 actico (5-HIAA) em corpo

    estriado de ratos aps um perodo de retirada de 24 h usando a tcnica de

    cromatografia lquida de alta performance (HPLC) com deteco eletroqumica;

    - Verificar as aes da cocana isoladamente e em associao com

    imipramina e topiramato sobre os nveis de nitrito em crebro de ratos;

    - Determinar o percentual de clulas dopaminrgicas viveis, em cultura

    primria de clulas mesenceflicas de fetos in vitro de rato na presena e na

    ausncia de 6-OHDA e os efeitos da cocana sobre estes percentuais.

    - Analisar possveis alteraes histopatolgicas promovidas pela cocana

    isoladamente e em associao com imipramina sobre cortes cerebrais de crtex e

    hipocampo de ratos, visando observar possveis leses microscpicas promovidas

    pelo uso destas drogas.

  • 56

    3. MATERIAIS E MTODOS

    _________________________________________________________________

  • 57

    3. MATERIAIS E MTODOS

    3.1. ANIMAIS

    Foram utilizados ratos machos Wistar (200-250g) provenientes do

    biotrio do Departamento de Fisiologia e Farmacologia da Universidade Federal

    do Cear. Os animais foram mantidos em temperaturas controladas de 22 2 oC

    com ciclo claro/escuro de 12 horas e com uma dieta padro e gua ad libitum. Os

    grupos variaram de 12 a 22 animais.

    Durante todos os experimentos, os animais foram mantidos em

    gaiolas com no mximo 6 animais, em condies ambientais semelhantes, com

    ciclos de alternncia claro/escuro de 12 horas, recebendo rao padro tipo

    purina e gua ad libitum. Os experimentos foram realizados de acordo com o

    guia de cuidados e usos de animais de laboratrio do Departamento de sade e

    servios humanos dos Estados Unidos da Amrica (EUA).

  • 58

    3.2. DROGAS

    3.2.1. PREPARO DAS DROGAS

    Cocana (cloridrato de cocana, fornecido pela Polcia Federal do Cear,

    Fortaleza, Brasil) foi dissolvida em gua bidestilada, obtendo-se a concentrao

    de 20 mg/mL para ser administrada na dose 20 mg/kg. Imipramina (obtida do

    laboratrio Cristalia Farma, Brasil) foi dissolvida em gua bidestilada, obtendo-

    se a concentrao de 12,5 e 25 mg/mL para ser administrada na dose 12,5 e 25

    mg/kg. Topiramato (obtido do laboratrio Janssen-Cilag, Brasil) foi dissolvido

    em gua bidestilada, obtendo-se a concentrao de 50 mg/mL para ser

    administrada na dose 50 mg/kg. Pentoxifilina (obtida do laboratrio Aventis

    Pharma, Brasil) ampolas foi utilizada na dose de 50mg/kg.

    3. 2.2. DETERMINAO DO GRAU DE PUREZA DA COCANA

    Para determinao do grau de pureza, foram realizadas anlises fsico-

    qumicas no Laboratrio de Percia da Polcia Federal. Entre os testes realizados,

    foram determinados o ponto de fuso e o comportamento da substncia em

    cromatografia, sempre comparando os resultados com os valores de um padro

    da Polcia Federal.

    Com relao ao ponto de fuso, um parmetro que nos permite estimar o

    grau de pureza da cocana na amostra, o valor encontrado para a amostra

    utilizada nos experimentos assinalados nesta tese foi de 140oC em relao ao

    padro da policia federal que registrou um valor de 180oC. Essa proximidade de

    valores significa que a amostra apresenta um r