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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ ANA PAULA COMEL CORSO DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE CURITIBA 2014

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

ANA PAULA COMEL CORSO

DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE

CURITIBA

2014

ANA PAULA COMEL CORSO

DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito, da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel em Direito. Professor Orientador: DálioZippin Filho

CURITIBA

2014

TERMO DE APROVAÇÃO

ANA PAULA COMEL CORSO

DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ___ de _____________ de 2014.

__________________________________________ Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite Coordenador do Núcleo de Monografia da Faculdade de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: _________________________________________ Prof. DálioZippin Filho Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito

Professor: _________________________________________ Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito

Professor: _________________________________________ Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito

DEDICATÓRIA

Ofereço o presente estudo:

Ao meu esposoNeuzire às minhas filhas Layla e Carolina, que ao longo

desses anosdedicaram apoio incondicional para que eu pudesse seguir nesta

jornada, enfrentando obstáculos e lutando comigo,oferecendo palavras de conforto e

incentivo e compreendendo minhas ausências. Sou eternamente agradecida pelo

exemplo de confiança e otimismo depositados em mim.

A você meu Pai, de alma e coração, meu herói, exemplo de vida, garra e

bondade, humilde de coração e discípulo da simplicidade, que iluminou minha vida

com afeto, ternura e dedicação e me educou para viver com dignidade, respeito,

princípios morais e modéstia, que doutrinoua alegria,a dádiva e o amor ao

próximo,que me ensinoua enfrentar as dificuldades com sabedoria e nunca

sucumbir, querenunciou muitos dos seus sonhos para que eu pudesse realizar os

meus e que sem pretender, fez de mim um reflexo seu, mas que hoje está presente

no meu coração em forma de saudade e de luz, aclarando meus pensamentos e

orientando meus passos. À você Pai, o meu muito obrigada.

À minha mãe, mulher admirável, intensa e guerreira, capaz de ouvir o silêncio

e dele retirar os mais profundos ensinamentos. Que nunca esmoreceu diante das

batalhas e dissabores da vida e que é um verdadeiro exemplo de fé e esperança.

Que diante da grandeza da sua doçura me ensinou a persistir e investir nos meus

sonhos sempre recomendando o exercício da paciência, do silêncio e da

observação. Mãe, você é merecedora da minha maior admiração. Obrigada pelo

exemplo de vida e amor cultivado.

AGRADECIMENTOS

Agradeço do fundo do meu coração...

...a Deus que, admirável e evidente na suainfinita bondade, compreendeu as minhas

aspirações e me deu a necessária coragempara alcançar meus objetivos.

... aos professores, mestres e doutores, pela sua capacidade, empenho e dedicação

profissional;

... ao meu orientador, pela atenção, respeito, dedicação e seriedade com que tratou

o trabalho e as minhas dificuldades;

... aos meus colegas e amigos, pelo convívio divertido e harmonioso, em que o

companheirismo se fez soberano a qualquer diferença.

... aos funcionários, pela prontidão, paciência e dedicação manifestadas.

“Talvez eu não tenha conseguido fazer o melhor, mas lutei para que o melhor fosse

feito. Não sou o que deveria ser, mas Graças a Deus, não sou o que era antes”.

(Marthin Luther King)

“A essência dos Direitos Humanos é o direito a ter direitos"

Hannah Arendt

“Se quiser conhecer a situação socioeconômica do país, visite os porões de seus

presídios”.

Nelson Mandela

“Que o perdão seja sagrado, que a fé seja infinita, que o homem seja livre, que a

justiça sobreviva.”

Ivan Lins

RESUMO

Tem por objeto o presente trabalho monográfico uma análise acerca dos Direitos

Humanos, especificamente no tocante às pessoas privadas de liberdade, com

enfoque no Princípio da Dignidade Humana, basilar de todo o ordenamento jurídico.

Muito embora arealidade carcerária brasileira tenha se mostrado incompatível com

estes direitos,em razão das condições a que são submetidos os condenados que

cumprem penanos diversos estabelecimentos prisionais brasileiros, a observância

dosdireitos humanos que lhes são assegurados é de extrema importância. O estudo

surgiu da necessidade de um olhar mais humano sobre os condenados,

considerando que a sociedade busca pela diminuição dos índices de criminalidade,

bem como almeja o resgate da identidade social do preso. Pretende-se demonstrar

que, independentemente de estarem privados de liberdade, os presos não podem

deixar de ser vistos como cidadãos que devem ter asseguradas todas as garantias

constitucionais e serem guarnecidos de dignidade, entendendo-se esta como

qualidade inerente à essência do ser humano, bem jurídico absoluto, portanto,

inalienável, irrenunciável e intangível. Inicia-se o estudo pela evolução histórica dos

Direitos Humanos em âmbito nacional einternacional, passando em seguida ao seu

conceito, para posteriormente abordar os princípios constitucionais essenciais em

sede criminal,seguindo-se com a apresentação do Panorama aproximado do

Sistema Prisional atual, suas violações, eexamede dispositivos legais existentes,

sempre com base nos direitos dos apenados. A abordagem metodológica do

presente estudo é pautada pela pesquisae análise de material bibliográfico e

documental e tende a demonstrar que embora sejam muitos os dispositivos acerca

do tema, o que se verifica éa total ausência de condições dignas nos

estabelecimentos penais, o queconstitui uma verdadeira afronta aos direitos

humanos.

Palavras-Chave: Direitos Humanos. Pessoas Privadas de Liberdade.Dignidade da

Pessoa Humana. Violação.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 9

2 DIREITOS HUMANOS ........................................................................................ 10

2.1 CONCEITO ...................................................................................................... 10

2.2 BREVE HISTÓRICO DOS DIREITOS HUMANOS .......................................... 11

2.3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL ............... 15

2.4 DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS ESSENCIAIS EM SEDE CRIMINAL 18

2.4.1 Princípio da Humanidade .............................................................................. 18

2.4.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana .................................................. 18

3 DOS DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE ..... 19

3.1 PANORAMA BRASILEIRO DO SISTEMA PRISIONAL ................................... 20

3.1.1 Da violação dos direitos humanos nos cárceres brasileiros .......................... 21

4 DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE E SUA

PROTEÇÃO ........................................................................................................... 24

4.1 DIREITOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE E A CONSTITUIÇÃO

FEDERAL DE 1988 ................................................................................................ 24

4.2 CÓDIGO PENAL BRASILEIRO ....................................................................... 25

4.3 PROTEÇÃO INTERNACIONAL ....................................................................... 26

4.4 A LEI Nº 7.210 DE 11 DE JULHO DE 1984 – LEI DE EXECUÇÃO PENAL .... 29

4.5 PACTO DE SAN JOSE DA COSTA RICA ....................................................... 32

4.6 REGRAS MÍNIMAS PARA O TRATAMENTO DE PRESOS NO BRASIL ........ 33

4.7 REGRAS MÍNIMAS PARA O TRATAMENTO DE MULHERES PRESAS ....... 35

4.8 PLANO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA ................. 36

4.9 ESTATUTO PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ ............................. 37

4.10 O NOVO MODELO DE GESTÃO DA EXECUÇÃO PENAL NO ESTADO DO

PARANÁ ................................................................................................................ 38

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 40

REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 41

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1 INTRODUÇÃO

Considerando que muitos são os dispositivosacerca dos Direitos

Humanos,consagrados emTratados aos quais o Brasil é signatário, no presente

estudo será feita uma breve digressão acerca dos direitos e garantias das pessoas

privadas de liberdade, especialmente sob o manto do Princípio da Humanidade e

Dignidade da Pessoa Humana, pilares de todo o ordenamento jurídico e que

preveem boas práticas no tratamento dos reclusos.

Rotineiramente ao ser preso, além de sua liberdade tolhida, tem o cidadão

subtraído seus direitos e garantias fundamentais, sendo então apresentado ao

tratamento desumano e degradante, ocasião em que é vítima de agressões

originárias de agentes carcerários, bem como dos próprios companheiros de cela,

tudo dentro de suas respectivas hierarquias. Partindo deabusos à sua integridade

física e culminando com a violação de sua integridade psicológica, resta-lhe uma

ferida que duramente será cicatrizada.

Independentemente de estarem privados de liberdade, os condenados não

podem deixar de ser vistos como cidadãos que devem ter asseguradas todas as

garantias constitucionais e estar dotados de dignidade, entendendo-se esta como

qualidade inerente à essência do ser humano, bem jurídico absoluto e, portanto,

inalienável, irrenunciável e intangível.

Por se tratarem de direitos comuns a todos os seres humanos, não fazem

distinção deraça, sexo, classe social, religião, etnia, cidadania política ou julgamento

moral, sãoinerentes a qualquer pessoa.

Muito embora a civilização tenha evoluído, cada vez mais aumentam as

condutas penalizadas, exacerbam-se as penas e amplia-se o cenário de desrespeito

aos Direitos Humanos.

Apesar de serem muitos os dispositivos que asseguram os Direitos Humanos,

infelizmente sua aplicabilidade não é o que se verifica, ao contrário,tem sido objeto

de verdadeiro desprezo e afronta por quem deveria zelar seu cumprimento.

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2 DIREITOS HUMANOS

2.1 CONCEITO

Falar em Direitos Humanos importa reconhecer aqueles ligados a liberdade e

a igualdade e que estão positivados no plano internacional. A expressão direitos

fundamentais, por sua vez, seria utilizada para assinalar os direitos humanos

positivados na Constituição Federal de cada Estado. Seriam os direitos

fundamentais eleitos como elementos principais e instituidores do seu ordenamento

jurídico. Assim, o conteúdo dos dois é essencialmente o mesmo, sendo diferenciado

pelo plano em que estão aplicados.

O conceito de Direitos Humanos é muito amplo. Trata-se da própria história

do homem e das suas lutas em busca do reconhecimento em relação às suas

necessidades vitais. Falar em Direitos Humanos é assegurar as garantias basilares

como conteúdo dos valores essenciais, descritos nas Constituições ou Tratados

Internacionais de maneira tácita ou especifica.

Na lição de André de Carvalho Ramos(2013, p.23) aprende-se que os

“direitos humanos consistem em um conjunto de direitos considerado indispensável

para uma vida humana pautada na liberdade, igualdade e dignidade”. Disciplina

João Baptista Herkenhoff (1994, p.30-31) que:

Por direitos humanos ou direitos do homem são, modernamente, entendidos aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de consagrar e garantir.

Pontua Maia Neto(2003, p. 4-5) que“Direitos Humanos são heranças da

comunidade internacional. Trata-se da própria história do homem, de suas lutas

entre séculos e milênios [...]. Independe de reconhecimento legislativo por se tratar

de herança cultural”.

Portanto, Direitos Humanos são a soma de valores, atos e normas que

permitem a todos uma vida digna. Ademais, tanto os direitos humanos como

11

osdireitos fundamentais protegem e promovem a dignidade da pessoa humana,

controlando a atuação excessiva ou omissiva do Estado.

2.2BREVE HISTÓRICO DOS DIREITOS HUMANOS

Na Idade Média, Europa feudal, prevalece a vontade divina e a divisão da

população se faz em três classes, cada qual com as suas responsabilidades. Aos

guerreiros, tidos como nobres, cabia a tarefa de promover a guerra e proteger a

todos dos inimigos. Aos sacerdotes, competia garantir a salvação das almas e

interpretar a intenção da divindade, geralmente em favor dos governantes. Havia,

ainda a classe dos trabalhadores, última e representada pelo povo, em sua maioria

camponeses não livres e comprometidos a sustentar a nobreza, os sacerdotes e a

efetuar o pagamento dos impostos.

Todas estas classes estavam sujeitas a uma espécie de estatuto jurídico,

chamado estamento e que previa direitos e obrigações definidaspelo clero e a

nobreza, que espertamente reservou para si algumas prerrogativas. Conforme

ensina Ricardo Castilho (2013, p.33), “Talvez a Idade Média tenha sido a mais

completa era da desigualdade social oficial. Quem nascia em um estamento

permanecia nele”.

Visível, pois, era a distinção social entre os homens, ocasião em que sendo

diferentes, por óbvio não poderiam ser regidos pelas mesmas leis.

Em 1215, diante das inúmeras violações do rei João Sem-Terra às antigas

leis e aos costumes e, dianteda possibilidade de ser deposto, acatou as

determinações impostas pelos barões editou a Magna Carta Libertatum seu

Concordiaminter regem Johannem et Barones pro concessione libertatumecclesiae

et regniAngliae(Carta Magna das Liberdades, ou Concórdia entre o rei João e os

Barões para outorga das liberdades da igreja e do reino inglês) que ao longo dos

anos sofreu muitas modificações em suas cláusulas e foi confirmada por diversos

soberanos.

Muito embora estabelecesse direitos e garantias individuais, ainda que

restritos a apenas uma parcela da sociedade da época, seu conteúdo limitava o

poder estatal e assegurava direitos fundamentais, prevendo, entre outros direitos o

livre acesso a justiça, o devido processo legal, a proporcionalidade entre o crime e a

pena e o direito de ir e vir em tempos de paz, teor este que séculos mais tarde

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influenciaria Bill ofRights norte-americana e a Declaração Universal dos Direitos

Humanos.Aduz Castilho (2013, p.34) que “eficaz ou não, a Magna Carta de 1215 foi

um marco na história, tornando-se o início da monarquia constitucional inglesa e um

primeiro passo para o constitucionalismo no mundo ocidental”.

Quatro séculos mais tarde, novamente em resposta a uma série de violações

da lei cometidas pelo rei da Inglaterra Carlo I, o Parlamento, em 1628, organizou a

PetitionofRight(Petição de Direitos), baseada em estatutos e cartas anteriores e que

previa entre outros assuntos, a prisão ilegal. Foi elaborada por Edward Coke e tida

como a semente que deflagrou a Revolução inglesa.Nesse sentido, leciona André de

Carvalho Ramos (2014, p.35) que:

A busca pelo poder, já incipiente na Magna Carta, é consagrada na PetittionofRight de 1628, pela qual novamente o baronato inglês, representado pelo Parlamento, estabelece o dever do Rei de não cobrar impostos sem a autorização do Parlamento (no taxationwithoutrepresentation), bem como se reafirma que “nenhum homem livre podia ser detido ou preso ou privado dos seus bens, das suas liberdades e franquias, ou posto fora da lei e exilado ou de qualquer modo molestado, a não ser por virtude de sentença legal dos seus pares ou da lei do país.

Mais tarde, em 1679 durante o reinado de Carlos II, surge o Habeas Corpus

Act, evento importante e consistente em uma lei do Parlamento Inglês que

procuravadeterminar e reforçar o antigo e já existente instituto do habeas corpus,

estabelecido na Magna Carta, como garantia da liberdade individual contra a prisão

ilegal, abusiva ou arbitrária.

Com a Revolução Gloriosa em 1688 o Rei da Inglaterra James II foi deposto

e, em 1689 o Parlamento promulgou a Declaração de Direitos - Bill ofRights, que nas

lições de Ricardo Castilho (2013, p. 53-54) foi a consolidação do Parlamentarismo

inglês, nos moldes em que até hoje é praticado” e determinava, entre outros, os

direitos à liberdade, à vida e à propriedade privada, impedia o Rei de suspender a

aplicação de leis, bem como não lhe autorizava aumentar impostos e recrutar ou

manter exércitos em épocas de paz sem prévia autorização, o que assegurou o

poder do Parlamento na Inglaterra.Nesse sentido, Castilho (2014, p. 54) relata que:

A História mostra que não basta cercear os poderes dos governantes para garantir os direitos humanos. Isso já era verdade na Inglaterra, à época da Declaração dos Direitos: o povo continuou sem o direito de participar desse processo.

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Ainda na Inglaterra, em 1701, pode-se citar como um dos antecedentes

históricos dos direitos humanos o documento intitulado Ato de Estabelecimento -

ActofSettlement – que necessariamentereafirmou o Princípio da Legalidade e

previu, até mesmo a possibilidade do impeachment.

Em 1776, muitas colônias americanas se revoltaram contra o domínio da

Inglaterra sobre os Estados Unidos da América. A primeira delas foi a do povo da

Colônia de Virgínia, que divulgou em 12 de junho um documento intitulado do bom

povo de Virgínia, redigido por Thomas Jefferson, que culminou com a Declaração de

Direitos do Bom Povo de Virgínia e que seria precursor da Declaração de

Independência dos Estados Unidos, aprovada na Filadélfia em 4 de julho de 1776,

de onde “são retirados os primeiros preceitos de maneira a abarcar

significativamente o conteúdo dos direitos humanos” (JUNQUEIRA, 2005, p.41).

Nascia, pois, a Confederação dos Estados Unidos da América.Nesse sentido pontua

Castilho (2014, p. 177-178):

É importante notar que a Declaração de Virgínia, como já mostrado, traz reconhecimento de direitos inatos de toda pessoa humana e também o princípio de que todo poder emana do povo e que em seu nome é exercido. Afirma os princípios da igualdade de todos perante a lei, rejeitando privilégios e a hereditariedade dos cargos públicos.

Treze anos mais tarde, a sociedade francesa ainda era dividida em

estamentos, ou Estado Nacional, sendo que ao Terceiro Estado, compreendia a

burguesia, à qual restava o peso dos impostos e contribuições para o Rei, o clero e

a nobreza.Embravecidos com as atitudes do Rei, proclamou-se em Assembleia

Nacional, que posteriormente transformou-se em Assembleia Constituinte.

Aos 26 de agosto de 1789 a AssembleiaNacional aprova a Declaração dos

Direitos do Homem e do Cidadão, consistentenuma síntese dos ideais da Revolução

Francesa, e que proclamava o direito a liberdade, a igualdade perante a lei e a

inviolabilidade da propriedade, assim comodireito de resistir a opressão. Segundo

Renê Ariel Dotti (1980, p.84),

No pórtico da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, se proclamou que a ignorância, o esquecimento e o desprezo pelos direitos do Homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos. Em consequência de tal fato, os representantes do povo francês, constituídos em Assembleia Geral, decidiram expor solenemente os direitos naturais, inalienáveis e sagrados da criatura humana.

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Em seu artigodezesseis, a Declaração dos Direitos do Homemdo Cidadão

estabeleceu que a adoção de garantias fundamentais era um componente efetivo ao

próprio conceito de constituição. Isso deu aos direitos humanos fundamentais um

caráter constitucional e influenciou as constituições seguintes, que passaram a

trazer sua declaração de forma expressa.Leciona Cândido Furtado Maia Neto (2003,

p. 125) que:

Posteriormente à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, foram proclamadas duas outras Declarações francesas, uma em 1793, que se fundamentava na fraternidade, com um fundo voltado ao aspecto dos direitos sociais, e outra em 1795, que passa a reconhecer e exigir respeito aos deveres dos cidadãos ante ao Estado e às leis vigentes, onde, posteriormente, no século XIX, começa-se a pensar com mais preocupação nos deveres do homem.

Em 1804, Napoleão promulga o Código Civil, de caráter autoritário e que

reúne as leis ligadas ao direito civil, penal e processual e que tinha por objetivo

reformar o sistema legal francês, seguindo os princípios daRevolução de 1789.

No ano de 1907 dava-se início à II Conferência da Paz de Haia, que

decidiria pela concepção de uma Corte Permanente para agir na resolução de

conflitos internacionais: a Corte de Haia ou Tribunal Internacional de Justiça.

Em 1945 tem início o tratamento dos direitos humanos no plano

internacional, e não se pode olvidar que o final da Segunda Guerra Mundial, tanto

quanto o advento da Carta das Nações Unidas em 1945 ea proclamação da

Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948,dentre outros pontos

discutidos no processo de sua aprovação,definiu os direitos individuais e coletivos

dos homens como universais,conformeleciona Edmundo Oliveira (2002, p.103),

[...] em torno do processo de aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) proclamada pelas Nações Unidas em 1948,foi ponto de destaque o reconhecimento de que a prisão,sempre constituiu, através dos tempos, a síntese mais emblemática das punições aviltantes, com mentiras, fraudes e conveniências corruptivas, indisfarçável oxigenação do enfraquecimento estatal.

Portanto, simbolizou um limite para uma nova ordem mundial e uma melhora

sem precedentes para os direitos humanos. Como reação às barbáries cometidas

nesse período, surge o sentimento de fraternidade, que teceu uma nova ordem de

15

direitos humanos, voltada à proteção da humanidade como um todo. A respeito

leciona Ricardo Castilho (2014, p.102) que:

Em suma, a Segunda GuerraMundial evidenciou que a tutela dos direitos humanos não poderia ficar restrita ao âmbito nacional. Por, que a soberania, fruto da unificação dos Estados ocorrida na Era Moderna, poderia servir de escudo para a prática de atrocidades inomináveis.

Em 22 de novembro de 1969,a Organização dos Estados Americanos (OEA)

aprova a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, conhecida comoPacto de

San José da Costa Rica, e que em seu art. 5º, nº2, preceitua: “Ninguém deve ser

submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes.

Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à

dignidade inerente ao ser humano”.

Em 1975, surge a Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra

a Tortura e Outras Penas e Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes,

aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas e destaca-se como sendo a

primeira grande Convenção especializada contra um tipo particularizado de violação.

Dez anos mais tarde, em 1985, reafirmando os propósitos da Convenção de

1969, foi assinada a Convenção Americana para Prevenir e Punir a Tortura,

reforçando ainda mais o dever imposto aos Estados de prevenir epunirtanta

aspereza.

Por fim, mas sem a pretensão de esgotar a matéria,em 1988, o conjunto de

Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de

Detenção ou de Prisão, em sua abertura, nas lições de Maia Neto (2003, p. 1008),

previu que “A pessoa sujeita a qualquer forma de detenção ou prisão deve ser

tratada com humanidade e com respeito da dignidade inerente ao ser humano”.

2.3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

A primeira Constituição do Brasil foi outorgada por Dom Pedro I em 1824

e,consagrou a religião católica como oficial do Estado. Dispôs em seu rol os direitos

a serem asseverados pelo Estado, bem como estabeleceuos Quatro Poderes, ao

passo que o Poder Executivo e o Poder Moderadoreram mantidos nas mãos do

Imperador. Dispunha em seu artigo 179 que:“A inviolabilidade dos Direitos Civis, e

Politicos dos Cidadãos Brazileiros (sic), que tem por base a liberdade, a segurança

16

individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império,e seguia-se de

trinta e cinco incisos que apresentavam os direitos fundamentais.

Com a República, a Carta de 1891 manteve o rol de Direitos na Constituição

e, nos ensinamentos de Ricardo Castilho (2013, p.163)

[...] teve espírito liberal. Sua elaboração sofreu bastante influência da Constituição norte-americana e da Constituição argentina, mas vários direitos individuais foram suprimidos por causa de pressões dos grandes latifundiários.

Dentre as principais medidas,a Carta de 1891 estabeleceu o presidencialismo

eliminando o poder moderador e dando maior autonomia aos estados da Federação.

Entre outros dispositivos, instituiu a escolha do Presidente da República e dos

membros do poder Legislativo por meio do sufrágio direto universal aos homens

maiores de 21 anos, o que não se estendeu a todos os indivíduos, pois estavam

impedidos de votar: os analfabetos, menores de 21 anos, mulheres, monges

regulares, praças das Forças Armadas e mendigos. Motivou, ainda, a separação

oficial entre o Estado e a Igreja Católica, transformando o Brasil em um estado laico.

Promulgada durante o governo de Getúlio Vargas, a Constituição de 1934

confiou poderes mais amplos ao governo federal, previu a criação da Justiça do

Trabalho e Justiça Eleitoral, estabeleceu voto obrigatório e secreto a partir dos 18

anos e o direito de voto às mulheres, anteriormente estabelecido no Código Eleitoral

de 1932 e dispôs em seu Título III – Da Declaração de Direitos – segundo

CASTILHO (2013, p.164) “não apenas os direitos e garantias individuais, mas,

também, de modo inovador, os direitos de nacionalidade e os políticos”.

Com a promulgação da Constituição de 1937por Getúlio Vargas, cujo texto

fora inspirado no fascismo, amplia-se os poderes do Presidente da República como

autoridade máxima do Estado. Vigorou durante três anos, passando o Brasil a ser

denominado Estados Unidos do Brasil. Implantou a ditadura no país, instituiu a pena

de morte, permitiu a prisão e o exílio de opositores, a censura prévia à imprensa

com o cerceamento das liberdades individuais e estabelece a eleição indireta para

Presidente da República.

Após o final da ditadura do Estado Novo, a Constituição de 1946

redemocratizou o país, restabelecendo a forma Republicana e o sistema

Presidencialista de governo, fazendo retornar ao texto constitucionalas liberdades

declaradas na Constituição de 1934, eliminadas em 1937. Dentre os principais

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dispositivos regulados, dispôs sobre a igualdade de todos perante a lei, predisse a

garantia de prisão apenas em flagrante delito ou por ordem escrita de autoridade

competente e a garantia ampla de defesa do acusado, reconheceu o direito de

greve, bem como a competência privativa da União para legislar em matéria

processual penal.

Em 1966, Castelo Branco fechou o Congresso Nacional como repressão aos

congressistas para que aprovassem a Constituição de 1967, queestabelecia

oficialmente o regime militar. Esta foi uma das Constituições mais imperiosas da

história e durou 21 anos. Em meio às principais medidas, estabelecia as eleições

indiretas para Presidente da República com mandato de quatro anos. Sofreu reforma

em 1969 através da imposição da Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de

1969, que entre outras medidas, determinou competência para que a Junta Militar

atuasse como poder executivo, legislativo e judiciário, incorporou as decisões e os

dispositivos do Ato Institucional nº 5, que diante de seu terror, teve sua mais grave

incompatibilidade com os Direitos Humanos, consoante leciona João Baptista

Herkenhoff (1994, p.84),

[...] na supressão do habeas-corpus para crimes políticos e outros. Proibindo a apreciação judicial da prisão, o AI-5 nega remédio contra a prisão arbitrária, tornando letra morta o art. 9º da Declaração, redigido nestes termos:“Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado”.

Em 9 de maio de 1972,a Emenda Constitucional nº 2,consoante

ensinamentos de Ricardo Castilho (2013, p. 166) foi “decretada para regular a

eleição de governadores de Estado no pleito de 1974. Mais tarde, na década de

1980, período de abertura política, outras emendas prepararam o restabelecimento

de liberdades e instituições democráticas”.

DenominadaConstituição Cidadã, a Constituição em vigor desde 1988 dá

ênfase às garantias fundamentais e institui o Estado Democrático de Direito com a

previsão expressa dos Direitos Humanos. Trouxe como fundamento, em seu artigo

primeiro, a dignidade da pessoa humana, afora uma grande relação dedireitos.

Como fundamento Independentemente do nível de abstração que tenham, essas

normas são obrigatórias e superiores às demais. Disciplina André de Carvalho

Ramos (2014, p.344):

Parte da doutrina disciplina que as normas constitucionais de direitos humanos possuem hierarquia material singular, uma vez que são: 1)

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cláusulas pétreas (art.60, §4º, IV); 2) são princípios constitucionais sensíveis, ou seja, autorizam a decretação de intervenção federal em caso de violação dos direitos humanos pelos Estados e pelo Distrito Federal (art. 34, VII); 3) são preceitos fundamentais, defendidos pela Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF (art. 102,§1º); 4) são normas de aplicação imediata (art. 5º, §1º).

Diante da ausência de hierarquia entre as normas constitucionais, quando em

argumentação jurídica que abarque o bom emprego desses direitos no caso

concreto, as normas de direitos humanos devem ser priorizadas e interpretadas

conforme os valores previstos na Constituição.

2.4 DOSPRINCÍPIOS CONSTITUCIONAISESSENCIAIS EM SEDE CRIMINAL

2.4.1 Princípio da Humanidade

Nos dizeres de Cezar Roberto Bitencourt (2014, p.70, apud SALDARRIAGA,

1990) o princípio da humanidade “sustenta que o poderpunitivo estatal não pode

aplicar sanções que atinjam a dignidade da pessoa humana ou que lesionem a

constituição físico-psíquica dos condenados”.

A Constituição Federal de 1988 assegura aos presos em seu artigo 5º, XLIX,

o respeito à integridade física e moral, reafirmado no artigo nº 38, do Código Penal

Brasileiro, e que assim dispõe: “O preso conserva todos os direitos não atingidos

pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua

integridade física e moral”. Nota-se, portanto,a grandeza do Princípio da

Humanidade.

2.4.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

Está consagrada pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo primeiro e

como um dos pilares da República Federativa do Brasil, a Dignidade da Pessoa

Humana.

Nos ensinamentos de Ricardo Castilho (2013, p.223) “afirmar que tal

dignidade é o traço comum de todo ser humano não lhe define, todavia, o conteúdo”.

Por dignidade da pessoa humana pode-se afirmar algo inato a todo ser

humano. [...] é um bem superior aos demais e essencial a todos os direitos

19

fundamentais do Homem, que atrai todos os demais valores constitucionais para si”

(BITENCOURT, 2014, p.69). Daí se pode extrair as características de

irrenunciabilidade e inalienabilidade, as quais não pode o legislador limitar ou

reduzir.

Deste modo, diante de um sistema prisional em que a superlotação, a falta de

condições estruturais, médico-sanitárias adequadas, assim como as imensas

arbitrariedades cometidas em seu interior, e quegeram um cenário de desrespeito

aos Direitos Humanos e o esgotamento da finalidade ressocializadora da pena, que

não intimida e tampouco possibilita que o condenado seja reinserido no meio

social.Visível, pois, está a falta de apreço ao princípio da dignidade da pessoa

humana, sobre a qual pontua Ivan de Carvalho Junqueira (2005, p.63):

Destarte, não obstante a natureza opressiva e brutal de toda e qualquer pena privativa de liberdade, por si só, uma afronta às necessidades inerentes ao Homem, nem por isso deverá a mesma, sob qualquer justificativa, estabelecer limites à recepção intramuros do princípio da dignidade.

Insta salientarque se encontraressalvado na Exposição de Motivos das

Regras Mínimas Para o Tratamento de prisioneiros,adotadas pelo 1º Congresso das

Nações Unidas sobre Prevenção do Crime e Tratamento de Delinquentes, realizado

em Genebra, em 1955, e consoante observa Edmundo Oliveira (2002, p.103), que:

o essencial não é somente descrever a forma detalhada de um sistema penitenciário modelo, mas, acima de tudo, garantir que sua organização seja em cumprimento ao conceito de que toda pessoa, privada da sua liberdade, deve ser tratada com humanidade e com respeito à dignidade inerente a qualquer pessoa, a fim de eu se possa atingir o objetivo principal de reforma e de reabilitação moral dos presos.

Fica observado, portanto, que em âmbito carcerário merece o princípio da

dignidade da pessoa humana, pleno acolhimento.

3 DOS DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE

20

3.1 PANORAMA BRASILEIRO DO SISTEMA PRISIONAL

De acordo com o diagnóstico de pessoas privadas de liberdade realizado pelo

Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema

de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF,divulgado pelo Conselho Nacional

de Justiça,atualmente o sistema prisional brasileiro conta com 715.592 pessoas

privadas de sua liberdade. Desta totalidade, 567.655 cumprem pena no sistema, que

tem por capacidade 357.219 vagas, e outras 148.000 se encontram em Prisão

Domiciliar.

Contadas todas as vagas oferecidas, o déficit encontra-se na casa das 354

mil vagas, e se a esse total somar-se o número de mandados de prisão em aberto,

hoje em torno de 373.991, a população prisional passaria a integralizar 1.089 milhão

de pessoas. Diante de tal índice, o Brasil foi elevado ao terceiro lugar no Ranking

dos dez países com a maior população prisional, ultrapassando a Rússia eficando

atrás, apenas, dos Estados Unidos e China.

Quando o foco são os números entre os estados brasileiros, São Paulo conta

com a maior população carcerária, atualmente 204.946 pessoas, seguido de Minas

Gerais, com 57.498, Rio de Janeiro, 35.611 e em quarto lugar o Paraná, cuja

população carcerária total encontra-se no patamar de 32.438 pessoas.

Por óbvio, diante de um quadro de superlotação, muitos e sérios problemas

haverão de surgir. Evidenteserá a carência no efetivo de servidores, o que propicia a

formação de gangues e o domínio de facções criminosas. Aduz Ricardo Castilho

(2013, p.306), que“a superlotação refletirá, necessária e logicamente, na escassez

de alimentos, suprimentos, material de higiene pessoal, medicamentos, etc. Uma

clara violação dos mais básicos pilares da dignidade de qualquer ser humano”.

Impende destacar que as Regras Mínimas para o Tratamento de Presos no

Brasil - Resolução nº 14 de 11 de Novembro de 1994 do Conselho Nacional de

Politica Criminal e Conselho Penitenciário - atestam que “ao preso será assegurado

o respeito à sua individualidade, integridade física e dignidade pessoal”, e que no

mesmo sentido prevê o artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal de 1988, ao

ordenar o respeito à integridade física e moral, bem como dispõe o artigo nº88

“caput” e parágrafo único da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução

Penal,que ao preso condenado à pena de reclusão caberá unidade celular

individual, com instalação sanitária e área mínima de seis metros quadrados e que

21

vise sua boa saúde,que muito embora sejam perfeitas no papel, na prática não é o

que se constatatampouco se pode aplicar.

3.1.1Da violação dos direitos humanos nos cárceres brasileiros

Considerando que o Direito Penal tem como função básica a defesa social,

pode-se assim afirmar que esta se realiza através da ameaça, bem como pela

efetiva aplicação da pena ao transgressor e por sua execução. Nos dizeres de

Heleno Cláudio Fragoso (2004, p.5),

O sistema de direito penal está hoje em crise. Põe-se em dúvida o efeito preventivo do sistema punitivo, e sabe-se que não é possível emendar o criminoso através da pena. Verifica-se que a prisão necessariamente avilta, deforma a personalidade e corrompe o condenado. (...). Há evidente incongruência entre as aparências do magistério punitivo e suas dramáticas realidades.

Há muito se tem discutido acerca do caos do sistema prisional brasileiro e as

possíveis soluções para essa crise. Entretanto, com o decorrer dos anos o que se

verifica é o aumento absurdo da população carcerária, sempre superior ao número

de vagas ofertadas pelo Poder Público, o que gera um panorama de desrespeito,

bem como o esgotamento da finalidade ressocializadora da pena, que não intimida e

tampouco possibilita que o condenado seja reinserido no meio social.

Retratar o cárcere em nosso país, é apresentar um tratamento dispensado às

pessoas privadas de liberdade extremamente oposto aos Direitos Humanos.Em

meio aos sérios e muitos problemasque podem ser encontrados,Ricardo Castilho

(2013, p.306) enumera:

a superlotação; situação sub-humana das mulheres encarceradas; existência de detentos que já cumpriram pena e continuam presos por não ter advogados; corrupção e a desorganização do sistema; domínio de facções criminosas e de suas lideranças, que controlam presídios e param cidades” [...].

Para César Barros Leal (2009, p.97), as “prisões são convertidas em

zoológicos de animais submissos e ninhos de víboras e outros répteis da fauna

carcerária, apertados em jaulas de pedra”. São lugares onde os presos perdem sua

identidade, são cerceados de todas as suas capacidades e jogados a um cotidiano

que os fragiliza.

22

Supostamente quando estabelecido o Pacto Social, cada parte cederia a

menor parcela de sua liberdade em prol da segurança na vida em sociedade,

partindo-se de um ideal de igualdade.

Com o passar do tempo, embora a civilização tenha evoluído, cada vez mais

aumentam as condutas penalizadas e exacerbam-se as penas.

Fato é que a realidade da prisãoacarretaperturbação. Ela necessariamente

estabelece um sistema de poder conflitivo e arbitrário, que não se ajusta com

facilidade ao esquema de direitos e deveres. Por isso mesmo, enquanto houver

prisões realizando a tarefa que o sistema hoje lhes atribui, haverá sempre rebeliões

e motins, que por seu turno, justificam mais poder arbitrário e repressão.

O verdadeiro problema, portanto, está na própria natureza da prisão e no

papel que lhe é atribuído pelo sistema. São questões que dependem de outras, de

maior âmbito, pois a prisão reflete, em última análise, condições estruturais da

sociedade que a mantém como realidade violenta e totalizante e que dela se serve.

Já em meados do século XVIII CesareBeccaria (2011, p.16) doutrinava,

Quanto maisse estender a esfera dos crimes, serão eles cometidos em maior número, porque sempre se verificará a multiplicação dos delitos à medida que aumentam os motivos do seu cometimento, sobretudo se a maioria das leis se basearam em privilégios, isto é, na prestação de um tributo imposto à massa geral da nação, em favor de poucos senhores.

Na mesma toada, Beccaria(2011, p. 116) ainda argumenta:

Fazei leis simples e claras; e esteja a nação inteira pronta a armar-se para defendê-las, sem que a maioria de que falamos se preocupe constantemente em destruí-las. Não favoreçam elas nenhuma classe particular; protejam igualmente cada membro da sociedade [...]. O temor que as leis inspiram é salutar, o temor que os homens inspiram é uma fonte funesta de crimes.

Portanto, cumpre observar que a prisão cumpre uma função ideológica

importante. Como expressão de castigo, serve também ao controle de uma classe

dominada, formando falsamente a imagem do criminoso.

Desta forma, é precisamente diante da inobservância das normas

asseguradas aos presos no ordenamento jurídico que se exige a atuação do Poder

Judiciário através do real e imediato cumprimento da lei, a fim de que se estabeleça

uma sociedade mais humana e capaz de assegurar aos encarcerados os valores

inerentes aos seres humanos.Segundo Marcos Rolim (2002, p.317),

23

Nos limites das responsabilidades governamentais em umaunidade da federação, é possível revolucionar rapidamente a instituição prisional se tivermos coragem para tanto e, sobretudo, uma política definida. É preciso ver os internos e condenados, primeiramente, como sujeitos portadores de direitos, reconhecendo o fenômeno da cidadania ali onde ele tem sido tradicional e solenemente ignorado.

Expõe Cesar Barros Leal (2010, p.133), que a execução penal é obrigação do

Estado e que cada unidade federativa do sistema dependedo desembaraço dos

governos e do suporte financeiro para que seja mantida, o Ministério da Justiça, via

Departamento Penitenciário Nacional e,como forma de repressão ao cumprimento

das mais básicos normas programáticas, vinculou a liberação dos recursos ao

mínimo cumprimento da legislação relacionada.

Assim sendo, o olhar sobre o sistema prisional deve desobrigar-se da

distância que acompanha a tradição burocrática, do abismo que separa as normas

das pessoas.

24

4 DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE E SUA

PROTEÇÃO

4.1 DIREITOS DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE E A CONSTITUIÇÃO

FEDERAL DE 1988

A Constituição Federal de 1988 é o ordenamento maior do sistema normativo

brasileiro. É na Constituição Federal que se localizam as políticas, os desígnios, os

princípios e as regras que norteiam o Brasil, e também nela está definida a estrutura

organizacional do Brasil.

Em seu artigo 5º, a Magna Carta de 1988 delimita vários direitos e garantias

individuais que são asseguradas a todos os cidadãos. Entretanto, imperioso

ressaltar que da mesma forma com que prevê garantias e direitos, igualmente

enumera limitações para alguns desses direitos, atribuindo, com isso, legitimidade

ao Direito Penal, e é através desse motivo que se pode assinalar a interligação do

Direito Penal com o Direito Constitucional. Nesse sentido, Eugenio RaúlZaffaroni e

José Henrique Pierangeli (2011, p. 125) observam que:

A relação do direito penal com o direito constitucional deve ser sempre muito estreita, pois o estatuto político da Nação – que é a Constituição Federal – constitui a primeira manifestação legal da política penal, dentro de cujo âmbito deve enquadrar-se a legislação penal propriamente dita, em face do princípio da supremacia constitucional.

Dentre os direitos assegurados às pessoas privadas de liberdade, previstos

no art. 5º, da Magna Carta de 1988,cabe destacar que não haverá penas cruéis;será

asseguradotratamento respeitoso, não podendo o encarcerado ser maltratado física

ou moralmente; que ninguém será privado de liberdade ou de seus bens sem o

devido processo legal; que às mulheres encarceradas caberá o direito de ficar com

seus filhos enquanto estiverem amamentando; que o Estado prestará assistência

jurídica, chamada de Defensoria Pública, aos que provarem insuficiência de

recursos, garantindo indenização pelo Estado para toda pessoa condenada por erro

25

judiciário, assim como aquela que permanecer presa além do tempo determinado na

sentença.

4.2CÓDIGO PENAL BRASILEIRO

Consoante liçõesde Cleber Masson (2011, p.67-68),em 1937, durante a

ditadura, Alcântara Machado expôs um Projeto de Código Penal Brasileiro, que foi

instituído pelo Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, e entrou emvigor no

dia 1º de janeiro de 1942. Inspirado no Código Rocco, da Itália, vigora até os dias

atuais, embora tenha sido complementado pela Lei de Contravenções Penais de

1941 e também alterado por Leis contemporâneas, que a exemplopode-se

mencionar a Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984,que reformou suaParte Geral,

humanizando as sanções penais, e adotando penas alternativas à prisão.

Atualmente encontra-se em trâmite o Projeto de Lei do Senado, PLS nº 236,

de 2012, balizado no anteprojeto elaborado por uma Comissão de Juristas criada em

2011 e que instituiu a reforma do Código Penal Brasileiro (CPB). Conforme matéria

publicada pelo Senado Federal, através de meio eletrônico, a entrega do relatório

final pela Comissão Temporária ao Presidente do Senado, Renan Calheiros, se deu

aos 6 de setembro de 2014 e se atentou à evolução dos costumes, das relações

sociais e da tecnologia. Nos dizeres do senador Pedro Taques,relator da Comissão

Temporária, sobre a reforma do CPB, “o novo texto será mais enxuto e moderno ao

tratar das questões penais”.

Cumpre destacar, a título exemplificativo, a redução dos atuais 1.750 tipos

penais para 355; a aplicação de penas maiores para crimes contra a vida;o aumento

o rol de crimes hediondos assim como um maior rigor ao modelo de progressão de

penas, impondo ao condenado por crime mais grave tempo maior sob regime

fechado nos presídios; a supressão do dispositivo que podia descriminalizar o porte

de drogas para uso pessoal e, no que se refere ao aborto, o afastamento da

hipótese de legalização da prática até as 12 primeiras semanas em razão da

incapacidade psicológica da gestante de arcar com a gravidez. Agora segue-se,

portanto, o relatório paraanálise e aperfeiçoamento pela Comissão de Constituição,

Justiça e Cidadania – CCJ e posteriormente no Plenário.

26

4.3PROTEÇÃO INTERNACIONAL

No plano internacional, os direitos humanos das pessoas privadas de

liberdade encontram-se consagrados em diversos tratados,aos quais o Brasil é

signatário e que no presente estudo se dará a partir da Declaração Universal dos

Direitos Humanos (DUDH), proclamada pelas Nações Unidas em 10 de dezembro

de 1948,que visoupromover o respeito aos direitos e liberdades e reconhecendo a

prisão como “a síntese mais emblemática das punições aviltantes, com mentiras,

fraudes e convivências corruptivas, indisfarçável oxigenação do enfraquecimento do

aparato estatal”, segundo relata Edmundo Oliveira (2002, p.103).

Em seu artigo 5º, a DUDH estabeleceu que “Ninguém será submetido à

tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante”.Diante de

tamanha dimensãodo referido artigo como mandamento ético, a Organização das

nações Unidas (ONU)adotou em seu primeiro Congresso sobre Prevenção do Crime

e Tratamento de Delinquentes, realizado em Genebra, no ano de 1955, com

aprovação pelo Conselho Econômico e Social, treze procedimentos para as Regras

Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros, de forma a representar uma nova

versão das regras para o tratamento dos aprisionados, elaboradas pela Comissão

Internacional Penal e Penitenciária em 1929, revistas em 1933 e aprovadas pela

Liga das Nações em 1934.

Mencionadas Regras importam nas condições ínfimas acolhidas pelas

Nações Unidas e conforme Maia Neto (2003, p.978),“estabelecem os princípios da

humanidade e do respeito pela dignidade da pessoa humana, os objetivos sociais e

o desempenho administrativo, formando uma base coerente e efetiva para a

administração dos sistemas penitenciários”. Também tem como objetivo proteger as

pessoas privadas de liberdade dos maus tratos, especialmente no que se refere à

aplicação da disciplina e instrumentos de coação nos estabelecimentos prisionais.

Em sua Exposição de Motivos,especificamente na primeira observação,

dispõeas Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros que:

O objetivo das presentes regras não é descrever detalhadamente um sistema penitenciário modelo, mas apenas – inspirando-se em conceitos geralmente admitidos em nossos tempos e nos elementos essenciais dos sistemas contemporâneos mais adequados – os princípios e as regras de uma boa organização penitenciária e da prática relativa ao tratamento de prisioneiros.

27

Note-se, portanto, que tais garantias que visam reformar o sistema prisional

em termos administrativos, bem como se referem às categorias de prisioneiros

descritos em cada seção, bastando que para isso haja vontade política não somente

do governo, mas também de seus agentes.

Dentre as muitas garantias previstas nas Regras Mínimas para o Tratamento

de Prisioneiros, em sua parte geral, compreendida pelos artigos 6 a 55, é possível

destacaro direito a instalações sanitárias adequadas, limpas e decentes; o

provimento de artigos de higiene necessários à saúde e limpeza; alimentação de

boa qualidade e com valor nutritivo suficiente para a boa sustentação da saúde e

suas forças; a possibilidade de se exercitardurante uma hora ao dia, quando o preso

não trabalhar ao ar livre; serviços médicos; no caso de estabelecimentos prisionais

para mulheres, deve haver instalações adequadas para o tratamento de presas

grávidas, que tenham dado à luz ou sejam convalescentes e a organização de

creches para os momentos em que a criança não estiver sob os cuidados da mãe, a

impossibilidade do uso de força por parte dos agentes e funcionários, salvo quando

em legítima defesa ou tentativa de fuga, resistência física ativa ou passiva a uma

ordem devidamente motivada e posteriormente informado o incidente ao diretos do

estabelecimento prisional dentre outras disposições.

No que tange à aplicação da disciplina e sanção, apontam as Regras Mínimas

para o Tratamento de Prisioneiros,no item nº 31, acercadaproibição de punições por

faltas disciplinares, castigos corporais, penas cruéis, desumanas ou degradantes,

bem como o uso de instrumentos de coação,previsto na regra nº33,que os

permiteapenas em situações de risco de fuga durante uma transferência e também

por razões médicas, porém sempre sob supervisão.

Ao tratar das categorias especiais, disponíveis em sua parte II,

compreendendo os artigos 56 a 95, aos quais se enquadram os presos condenados;

presos dementes e mentalmente enfermos; pessoas detidas ou em prisão

preventiva; condenados por dívidas ou à prisão civil, assim como as pessoas

presas, detidas ou encarceradas sem acusação,também são enumerados Princípios

Mestres, que visam a boa organização penitenciária e também o tratamento das

pessoas quando privadas de sua liberdade.

Verificando-se pois, o artigo nº 61 do documento “Regras Mínimas para a

Vida Prisional”, resta instituído que:

28

O tratamento não deve acentuar a exclusão dos reclusos da sociedade, mas sim fazê-los compreender que eles continuam fazendo parte dela. Para este fim, há que recorrer, na medida do possível, à cooperação de organismos da comunidade destinados a auxiliar o pessoal do estabelecimento na sua função de reabilitação das pessoas. Assistentes sociais colaborando com cada estabelecimento devem ter por missão a manutenção e a melhoria das relações do recluso com a sua família e com os organismos sociais que podem ser-lhe úteis. Devem adaptar-se medidas tendo em vista a salvaguarda, de acordo com a lei e a pena imposta, dos direitos civis, dos direitos em matéria de segurança social e de outros benefícios sociais dos reclusos.

Em sede de análise quanto aos treze procedimentos para a aplicação efetiva

das Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros, cumpre observaro

dispositivo nº5, onde se encontra previsto que de cinco em cinco anos os Estados

deverão informar ao Secretário-Geral das Nações Unidas, por meio do

preenchimento de questionário com perguntas concretas, o grau de cumprimento e

progressos realizados em sua aplicação, bem como a existência, se houver, de

fatores que impeçam seu bom aproveitamento. Já o procedimentonº13predizque,

Nenhuma das disposições previstas nestes procedimentos será interpretada no sentido de excluir a utilização de quaisqueroutros meios ou recursosdisponíveis, de acordo com o direito internacional ou estabelecidos poroutros órgãos eorganismos das Nações Unidas, para a reparação de violações dos direitos humanos, inclusive o procedimento relativo aos quadros persistentes de manifestas violações dos direitos humanos, conforme a Resolução1503 (XLVIII) do Conselho Econômico e Social, de 27 de maio de 1970; o procedimento de comunicação previsto no Protocolo Facultativo do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, e o procedimento de comunicação previsto na Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial.

Na mesma entoação estão os comentários acerca da aludida regra, pois

estas se referem apenas a temas específicos de direitos humanos, não se devendo

excluir nenhumoutro caminho para a reparação de qualquer violação de tais

direitos, de consenso com os critérios e regulamentos internacionais ou regionais

existentes.

Notável,pois, a extrema importância das Regras Mínimas para o Tratamento

de prisioneiros, haja vista a finalidade de preservar a dignidade e os direitos

humanos das pessoas cuja liberdade fora obstada, impedindo que sofram

tratamento degradante e que sejam exacerbadosos tratamentos inerentes à essa

limitação.

29

4.4 A LEI Nº 7.210 DE 11 DE JULHO DE 1984 – LEI DE EXECUÇÃO PENAL

A Exposição de Motivos do Projeto que elaborou a Lei nº 7.210, de 11 de

julho de 1984, Lei de Execução Penal (LEP), cujo texto sofreu muitas alterações

com o passar dos anos, objetivouinserir na execução penal o princípio da legalidade,

garantir a efetiva punição do condenado nas penitenciárias do Brasil e propiciar

meios para sua reintegração à sociedade.Nesse sentido, leciona Renato Marcão

(2013, p.31-32):

A execução penal deve objetivar a reintegração social do condenado ou do internado, já que adota a teoria mista ou eclética, segundo a qual a natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a humanização. Objetiva-se, por meio da execução, punir e humanizar.

Sob o mesmo prisma, invoca aExposição de Motivos da aludida Lei, em seu

dispositivo nº 14:

Sem questionar profundamente a grande temática das finalidades da pena, curva-se o Projeto, na esteira das concepções menos sujeitas à polêmica doutrinária, ao princípio de que as penas e medidas de segurança devem realizar a proteção dos bens jurídicos e a incorporação do autor à comunidade.

No concernente à natureza jurídica da Execução Penal, Renato Marcão

(2013, p. 32,33) entende ser de “natureza jurisdicional, não obstante a intensa

atividade administrativa que a envolve”. Portanto, encontra-se a Execução Penal

subordinada aos princípios e garantias constitucionais incidentes efunda-se em um

processo de conhecimento e somente poderá ser feita pelo Poder Judiciário,

resguardando a integridade do condenado e correlacionando os limites entre a

sanção imposta e seu efetivo cumprimento, evitando também que haja excesso ou

desvio na execução da pena.

Considerando que a execução implica um conjunto de direitos e deveres

envolvendo o Estado e o executado, este último deve adaptar-se aos padrões do

cárcere. Para Renato Marcão (2013, p. 63-64) o sentenciado ao adentrar o sistema

carcerário“longe de estar sendo ressocializado para a vida livre, está, na verdade,

sendo socializado para viver na prisão”.

Nas lições de Maurício Kuehne (2011, p.15), e conforme os termos do art. 3º,

da LEP,às pessoas cuja liberdade fora inibida serão garantidos todos os direitos não

30

atingidos pela sentença ou pela lei. Portanto, o condenadopreserva todos os direitos

compatíveis com o cumprimento da pena, como por exemplo, o direito à vida, a

integridade física, honra, alimentação, saúde, educação, dentre outros. Ainda, em

seu parágrafo único, previsto está o princípio da igualdade, vez que ao condenado

não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.

Acerca dos estabelecimentos prisionais cumpre salientar que maior seria a

penalização do cumprimento da medida restritiva de liberdade em locais que não

atestem o mínimo de condições dignas para o seu cumprimento. Como condições

adequadas tem-se o mínimo estabelecido na Lei de Execuções Penais, consoante

artigo 88, e que assim dispõe:

O condenado será alojadoem cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório. Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular: a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana; b) área mínima de 6,00 m2 (seis metros quadrados).

Essas condições ensejam o mínimo para que cumpra humanamente a

restrição a que foi submetido.Igualmente, não há que se olvidar das questões

atinentes ao psicológico de quem se encontra no claustro. Nesse sentido,traz a LEP

garantias previstas no artigos 12 a 24 e 28 a 37.

Ainda, sob o prisma dos direitos dos apenados, há que se observar a

compatibilidade com as Regras Mínimas de Proteção aos Reclusos, consagradas

pela ONU e que se encontramprevistas na Exposição de Motivos da Lei de

Execução Penal a partir do dispositivo 66 até o 76.

Muito embora a LEP em seu art. 41, estabeleçaos direitos aos apenados,

estes devemobservar o respeito aos limites da lei, pois “tudo o que excede aos

limites, contraria direitos” (MARCÃO, 2013, p. 64). Assim sendo, se lhes cabem

direitos, necessariamente lhes cumpre observar deveres, previstos no artigo39 e que

a exemplo pode-se ressaltar, além das obrigações legais inerentes ao seu estado,

submeter-se às normas de execução da pena, obediência ao servidor e respeito a

qualquer pessoa com quem deva relacionar-se; urbanidade e respeito no trato com

os demais condenados; conduta oposta aos movimentos individuais ou coletivos de

fuga ou de subversão à ordem ou à disciplina, submissão ou à sanção disciplinar

imposta, dentre outros.

31

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, recepcionou a Lei

nº7.210, de 11 de julho de 1984, Lei de Execução Penal, em virtude desta encontrar-

se em acordo com a dignidade e humanização da pena, inclusive por estar em

sintonia com os Tratados deDireitos humanos de que o Brasil é signatário.Nos

termos do artigo 5º, da Constituição Federal de 1988, assegura-se que:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;

Adaptados e proclamados pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua

resolução nº 45/111, de 14 de Dezembro de 1990, estão os Princípios Básicos ao

Tratamento dos Reclusos, todos consistentes na humanização da justiça penal e na

proteção dos direitos do homem, já definidos anteriormente em diversos

documentos, especialmente na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Encontra-se atualmente em trâmite perante o Senado Federal, para análise

da Comissão de Constituição e Justiçae Cidadania, o Projeto de Lei nº 513 de

20131,elaborado por uma comissão de juristas no final de 2013,e que prevê muitas

alterações na Lei nº 7210 de 1984, Lei de Execução Penal.

Um dos principais objetivos é a adoção de medidas que visemreduzir a

superlotação nos presídios, marcada como pilar das rebeliões. As mudanças devem

reduzir a burocracia no sistema prisional e dentre as principais medidas a serem

adotadaspode-se observar a informatização de todo o processo, desde o

recolhimento até a soltura do preso, a criação de centrais informatizadas para

controlar, em tempo real, as vagas e o cumprimento das penas,a emissão de guias

por meio eletrônico, atualmente expedidas por meio físico.

Pode-se citar como um dos efeitos desse novo processo o fim dos alvarás de

soltura, uma vez que ao final da pena, não será mais preciso esperar a expedição do

documento pelo Juiz da Execução,o que hoje leva pessoas que já deveriam estar

soltas a permanecerem na prisão. Quando o aprisionado estiver próximo do final do

1http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=115665

32

cumprimento da pena, 30 dias de antecedência, o diretor do estabelecimento

prisional informará aojuiz, que não se manifestando sobre a liberação, esta restará

automática, na manhã do dia previsto para sua liberação. O mesmo deverá ocorrer

quando o objeto de análise for a transferência de regime.

4.5 PACTO DE SAN JOSE DA COSTA RICA

Em 25 de setembro de 1992, através do Decreto nº 678, de 6 de novembro de

1992,o Brasil ratificou a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, conhecida

como Pacto de San José da Costa Rica, adotada em 1969 durante a

Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, pelos

integrantes da Organização dos Estados Americanos (OEA),cujo objetivo é

estabelecer os direitos fundamentais da pessoa humana, como o direito à vida, à

liberdade, à dignidade, à integridade pessoal e moral, à educação, entre outros

similares.

Em se tratando de direitos civis e políticos, a Convenção reafirmou direitos

tratados anteriormente na DUDH, aprovados na Lei de Execução Penal e também

nas Regras Mínimas para o tratamento de Prisioneiros, consolidando entre os

países americanos um regime de liberdade pessoal e justiça social, fundado no

respeito aos direitos humanos essenciais, independentemente do país onde a

pessoa viva ou tenha nascido. Especificamente em seu Capítulo II, relativo aos

Direitos Civis e Políticos e, especificamente quanto à integridade pessoal,

constantedo art. 5º, incisos 1 e 2, relativamente às pessoas privadas de liberdade,

resta declarado que:

Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral;Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve

ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano.

De acordo com o art. 41 do Pacto, Ricardo Castilho (2013, p.309) leciona que

“a função principal da Comissão Interamericana de Direitos Humanos é promover a

observância e a defesa dos direitos humanos”.

Entretanto, ao depositar a Carta de Adesão a esse ato internacional,o

Governo brasileiro quando das funções e do processo, declarou interpretativamente

33

que “O Governo do Brasil entende que os artigos 43 e 48, alínea “d”, não incluem o

direito automático de visitas e inspeções in loco da Comissão Interamericana de

Direitos Humanos, as quais dependerão da anuência expressa do Estado", in verbis:

Artigo 43 - Os Estados-partes obrigam-se a proporcionar à Comissão as informações que esta lhes solicitar sobre a maneira pela qual seu direito interno assegura a aplicação efetiva de quaisquer disposições desta Convenção. Artigo 48 - 1. A Comissão, ao receber uma petição ou comunicação na qual se alegue a violação de qualquer dos direitos consagrados nesta Convenção, procederá da seguinte maneira: d) se o expediente não houver sido arquivado, e com o fim de comprovar os fatos, a Comissão procederá, com conhecimento das partes, a um exame do assunto exposto na petição ou comunicação. Se for necessário e conveniente, a Comissão procederá a uma investigação para cuja eficaz realização solicitará, e os Estados interessados lhe proporcionarão, todas as facilidades necessárias;

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, é órgão jurisdicional que

apresenta“competência consultiva e contenciosa” no sistema de proteção aos

direitos humanos das Américas.O Estado brasileiro reconheceu a competência

jurisdicional da Corte por meio do Decreto Legislativo n. 89, de 3 dedezembro de

1998. Até junho de 2012, referida Corte havia emitido 20 opiniões consultivas e no

exercício de sua jurisdição contenciosa e proferido 242 sentenças, conforme lições

de Flávia Piovesan (2013, p. 350, 354).

Sua previsão encontra-se disciplinada nos artigos 52 a 69 do Pacto de San

Jose da Costa Rica, e atítulo exemplificativo, no que se refere ao art. 63, 2, cujo teor

estabelece que “Em casos de extrema gravidade e urgência (...) a Corte, nos

assuntos de que estiver conhecendo, poderá tomar as medidas provisórias que

considerar pertinentes(...).

Nesse sentido, relembra Cesar Barros Leal (2010, p. 134), o caso doPresídio

brasileiro de Urso Branco,denunciado ante a Comissão Interamericana de Direitos

Humanos por suas violações aos direitos humanos, onde a Corte ordenou medidas

provisórias para evitar novasmortes de internos, brutalmente assassinados em

janeiro de 2002.

4.6 REGRAS MÍNIMAS PARA O TRATAMENTO DE PRESOS NO BRASIL

34

Contemplando a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, Lei de Execução Penal,

que em seu artigo nº 61, inciso I, menciona como um dos órgãos da Execução Penal

o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), subordinado ao

Ministério da Justiça, pertinente se faz observar acerca da Resolução nº 14,de 11 de

novembro de 1994, em que o referidoConselho, mediante decisão unânime de seus

membros e ponderando a recomendação aprovada pelo Comitê Permanente de

Prevenção ao Crime e Justiça Penal das Nações Unidas, do qual o Brasil é membro

e, sopesando ainda o disposto na Lei nº 7.210 de 1984 – Lei de Execução Penal

resolveu fixar as Regras Mínimas para o Tratamento de Presos no Brasil, todas em

consonância com os Princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos e

demais documentos internacionais de que o Brasil é signatário, registrado em seu

artigo nº 64, que ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária caberá

adotar as providências essenciaisou complementares para implementar as regras

Mínimas estabelecidas na Resolução, em todas as Unidades Federativas.

São dispositivos regulamentados em 27capítulos e queestabelecem o

respeito a preceitos morais, convicções religiosas,integridade física, dignidade

pessoal e características individuais dos sentenciados.

Ao tratar das regras de aplicação geral, em seu capítulo I, ficam estabelecidos

os princípios fundamentais, cujas normas devem necessariamente obedecer aos

princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos e demais regras

internacionais de que o Brasil é signatário, in verbis:

Art. 1º. As normas que se seguem obedecem aos princípios da Declaração Universal dos Direitos do Homem (...) devendo ser aplicadas sem distinção de natureza racial, social, sexual, política, idiomáticaou de qualquer outra ordem. Art. 2º. Impõe-se o respeito às crenças religiosas, aos cultos e aos preceitos morais do preso. Art. 3º. É assegurado ao preso o respeito à sua individualidade, integridade física e dignidadepessoal.

Os demais capítulos tratam acerca das disposições para a admissão do

condenado ao estabelecimento prisional, da seleção, classificação e separação

dospresos segundo critérios que permitirão, em tese, a individualização da pena,

das características físicas do local dealojamento e demais particularidades sobre os

direitos do condenado.

35

4.7 REGRAS MÍNIMAS PARA O TRATAMENTO DE MULHERES PRESAS

Durante a 65ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em

dezembro de 2010, na Tailândia, foram adotadas as Regras Mínimas para o

Tratamento de Mulheres Presas – Regras de Bangkok, com o intuito de melhorar

principalmente as necessidades das mulheres encarceradas e seus filhos.

Importa salientar que em suas observações preliminares, especificamente no

Regulamento introdutório nº 13, que tais preceitos não substituem sobremaneira as

Regras Mínimas para o Tratamento dos Reclusos e as Regras de Tóquio, que

continuam a ser aplicadas a todos os presos e infratores, sem distinção.

A seção II das Regras de Bangkok contemplapreceitos aplicáveis às

categorias especiais, ou seja, contempla as presas condenadas, mas também são

aproveitadas, na medida em que não se contraponham às normas que as regem e

que sejam em seu benefício, às presas em reclusão preventiva ou que aguardam

julgamento.A título exemplificativo, entre outras, cabe citar a regra nº 48 das Regras

Mínimas para o Tratamento de Mulheres Presas, e que assim prevê:

1. Mulheres grávidas ou lactantes deverão receber orientação sobredieta e saúde dentro de um programa a ser traçado e supervisionado por um profissional da saúde qualificado. Deverá ser fornecida gratuitamente alimentação adequada e pontual para gestantes, bebês, crianças e lactantes em um ambiente saudável e com a possibilidade para exercícios físicos regulares. 2. Mulheres presas não deverão ser desestimuladas a amamentar seusfilhos, salvo se houver razões de saúde específicas para tal. 3. As necessidades médicas e nutricionais das mulheres presas que tenham recentemente dado à luz, mas cujos filhos não se encontram com elasna prisão, deverão ser incluídas em programas de tratamento.

Observa-se, portanto, que seu teor complementa a Norma nº 23 das Regras

Mínimas para o Tratamento dos Reclusos, que agasalha o tratamento dado às

gestantes nas penitenciárias femininas, dispondo que nos presídios deve haver um

lugar para o tratamento das grávidas, parturientes e convalescentes, desde que seja

possível, assim como a instalação de crechespara o período em que a criança não

esteja sob os cuidados da mãe, pois o recém-nascido carece de amamentação e

cuidados.

Outras seções das Regras envolvem questões que contemplam a aplicação

de sanções não privativas de liberdade, pesquisa, planejamento e avaliação dentre

36

outras, todas com o intuito de adotar medidas apropriadas e em conformidade com

as regras e procedimentos das Nações Unidas.

4.8 PLANO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA

Em 26 de abril de 2011, o Conselho Nacional de Política Criminal e

Penitenciáriaaprovou o Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária,

sintetizado através de resoluções próprias, bem como de manifestações de

instituições parceiras, cabendo destacar, a título exemplificativo, as manifestações

da Comissão Nacional de Penas e Medidas Alternativas,da Comissão Nacional de

Fomento e Apoio aos Conselhos da Comunidade,do Plano Nacional de Direitos

Humanos e do Conselho Nacional de Justiça.

Consistente em 14 medidas, o Plano adota uma ótica de cidadania e

responsabilização, consistente emreduziras taxas de encarceramento, criar modelos

distintos de prisões para cada segmento, priorizar medidas alternativas à prisão,

combatera corrupção e fortalecer o controle social sobre o sistema penal,mediante

política, método e gestão específica.A título ilustrativo vale destacar algumas

medidas:

Como primeira nota cabe “sistematizar e institucionalizar a Justiça

Restaurativa”, o queimplica um acordo livre e consciente entre a vítima e o causador

do dano. Para que esse objetivo seja alcançado, imperiosoentre outrosrequisitos,

haver uma legislação que a regulamente como uma primeira possibilidade e com

resolutividade válida, o que certamente causará maior sentimento de justiça e de

segurança, visto que permitirá às vítimas participar da construção da solução e ao

infrator compreender em concreto o dano, assumir responsabilidade, pedir

desculpas.

Na medida nº5, ficam estabelecidas “ações específicas para os diferentes

públicos”, tendo em vista que os estabelecimentos prisionais abrigam pessoas com

diferente condição sexual, diversidade de gênero, idade, dentre outras e que devem

ser reverenciadas para que suscitem igualdade de direitos. Tais medidas tem por

objetivo a diminuição dos conflitos e a violência no sistema prisional e encontram-se

em conformidade com a individualização da pena e garantia à dignidade humana.

No concernente a medida nº 8, quando do fortalecimento do controle social,

dispõe seu detalhamento que:

37

O sistema penal, nas suas três instâncias (policial, judicial e penitenciária), por tratar-se de um mecanismo de coerção, tende a fechar-se institucionalmente. As prisões são conhecidas como instituições totais, que, (...) propicia com facilidade o adoecimento psíquico, a infantilização, o abuso de poder e a perda de parâmetros sociais. É fundamental que esses espaços possam ser oxigenados(...) inclusive para que a sociedade se envolva na prevenção da criminalidade e não reforce a ideologia da vingança, criando cada vez mais estereótipos.

Portanto, para que se possa cumprir os fundamentos de um Estado

Democrático de Direito, desmistificar as questões criminais e penitenciárias, é

preciso fortalecer jurídica, social e financeiramente os Conselhos de Comunidade,

os Conselhos Penitenciários e os Patronatos, combater a violência institucional,

especialmente no que se refere a erradicação da tortura e na redução das

letalidades policial e prisional, dentre outros aspectos relevantes.

Para concluir, cita-se a Medida nº 14,que almeja a “construção de uma visão

de justiça criminal e justiça social”, cujo impacto seria uma sociedade melhor

informada, com maiores propostas de prevenção da criminalidade e prioridade às

medidas do Estado Social em detrimento do Estado Penal.Haja vista a

grandiosidade das medidas efetivá-las é o maior problema.

4.9 ESTATUTO PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ

O Estatuto Penitenciário do Estado do Paraná foi aprovado pelo Decreto nº.

1.276 de 31 de outubro de 1995 e é respeitável por sersuplementar a Lei nº 7.210,

de 11 de julho de 1984, Lei de Execução Penal, regras recomendadas pela

Organização das Nações Unidas (ONU) e do Conselho Nacional de Política Criminal

e Penitenciário, vez que normatiza rotinas e procedimentos no trato com os presos.

Dentre os direitos já assegurados às pessoas privadas de liberdadepelos

documentos supracitados,o Estatuto Penitenciário do Paraná prevê que

acasosobrevenha o óbito, padeça de acidente grave, seja acometido de doença ou

em circunstância de transferência de estabelecimento prisional, seu cônjuge,

parente mais próximo ou pessoa por ele indicada quando da sua entrada no cárcere,

será devidamente formado, assim como será o banido da sociedade

prontamenteinformado quando do falecimento ou doença grave do seu cônjuge,

companheiro, ascendente, descendente ou irmão, cabendo-lhe,sob custódia, a

38

faculdade defazer-lhes visitae a eles informar sua transferência para outro

estabelecimento prisional.

Especialmente no pertinente ao ato dedivulgação de informações e

imagem,não será o preso impelido aparticipar ativa ou passivamente da sua

divulgação, cabendo à autoridade responsável por sua custódia o devido sigilo,

principalmente no que se alude àquelas não relacionadas a sua prisão,

anteriormente previsto pelo Decreto nº 465, de 11 de junho de 2011, que observou

acerca da zombaria e humilhação à intimidade dos seres humanos envolvidos em

situações de antissociabilidade, sujeitos ao sensacionalismo jornalístico e das

mídias e geral.

Em relação atransferência de estabelecimento prisional, deve ser o preso

resguardado de insultos e desvelo geral. Ainda, poderá ter o preso suas

correspondências restringidas quando oferecer perigo à ordem ou estabelecimento

em que se encontra encarcerado, resguardados seus direitos, ficando sustada

imediatamente no momento em que restabelecida a normalidade.

4.10 O NOVO MODELO DE GESTÃO DA EXECUÇÃO PENAL NO ESTADO DO

PARANÁ

O Governo do Estado do Paraná, em conjunto com outros poderes, tendente

a implantar um novo modelo de gestão da execução penal, firmou em 27 de abril de

2012, o Pacto Movimento Mãos Amigas Pela Paz, cujo objetivo é operacionalizar

ações conjuntas objetivando o aperfeiçoamento da gestão do Sistema Penal e o

respeito à dignidade humana. Com ele, o Governador sancionou uma série de leis e

documentos que permitem operacionalizar as ações propostas tendo como público

alvo os usuários de álcool e outras drogas, os presos provisórios, os condenados em

regime fechado, semiaberto,aberto e sujeitos a alternativas penais, entre outros.

Dentre as leis sancionadas pelo governador, pode-se mencionar a Lei nº

17.138/2012, que autoriza o Governo do Estado a firmar convênio com as

Associações de Proteção e Assistência aos Condenados – APACse também

aResolução Conjunta nº 003/2012, celebrada entre o Governo, através da Secretaria

de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos - SEJU, Poder Judiciário,

Ministério Público e Defensoria Pública,visando criar a Central de Vagas e fazer

39

obedeceros procedimentos administrativos para a inserção de presos nos

estabelecimentos penais do Estado do Paraná.

Sob a ótica das linhas de ação, além de destacarCriação da Central de Vagas

do Sistema Penal, vale salientar o Sistema Integrado de Informações, onde há

interação entre as informações dos sistemas informatizados do Tribunal de Justiça -

TJ, a Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos – SEJU, e

também da Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná – SESP.

De acordo com esse sistema de informações, é possível saber sob qual

responsabilidade e em que tipo de estabelecimento se encontra recolhido o preso.

Com essas medidas, além de ter a população carcerária reduzida, o Estado

do Paraná foi o primeiro da Federação a compatibilizar dados do Poder Executivo

com o Judiciário.

40

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto é possível concluir que os Direitos Humanos são resultado

de uma longa história e que com o passar do tempo se fortaleceram, resultando nas

garantias atuais, que visam assegurar o valor mais precioso da pessoa humana,

qual seja, a sua Dignidade.

No Brasil, através primeira Constituição, outorgada em 1824 por D. Pedro I, já

encontrava-se prevista a garantia dos direitos fundamentais que, com o passar do

tempo, e através das novas Constituições que surgiram, preocupou-se com os

direitos humanos, lapidando-os e buscandocada vez mais ampliar a sua proteção.

No entanto, pode-se afirmar que com a promulgaçãoda atual Constituição da

República Federativa do Brasil, em 1988, foi admiravelmenteampliado o rol de

garantias fundamentais e deu-se maior ênfase e efetividade aos DireitosHumanos.

Considerando que Direitos Humanos visam assegurar os valores mais

preciososda pessoa humana, e segundo RAMOS (2013, p.23) “consistem emum

conjunto de direitos considerado indispensável para uma vida humana pautada na

liberdade, igualdade e dignidade”, caracterizam-se comodireitos intrínsecos a todo

cidadão.

Todavia, não basta garantir direitos sem que sejam criados meios para

concretizar sua proteção. Ao longo dos anos foram criados instrumentos

fundamentais para a efetivaçãodos Direitos Humanos, dentre os quais pode-se

apontar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, hoje pilar fundamental a nível

mundial, em conjunto com os demais instrumentos da normativa internacional.

De outro lado, encontra-se aabordagem do Sistema Penitenciário brasileiro,

protegido legalmente pela Constituição Federalde 1988 e amparado na Lei nº 7.210

de 1984 - Lei de Execução Penal. No entanto a realidade que se vê encontra-se em

oposição ao preceituado, diante da superlotação dos estabelecimentos prisionais, da

sua estrutura deficiente, ficando mais latente as violaçõesaos direitos humanos dos

presos, que não são colocados em liberdade preparados para serem reinseridos na

sociedade.

Por certo, a posição crítica vivida pelas pessoas privadas de liberdade

somente será resolvida quando o verdadeiro Estado Democrático de Direito deixar

de ser apenas uma previsão constitucional,passandoa efetivar e respeitar o

cumprimento dos princípios para todos os cidadãos.

41

REFERÊNCIAS

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