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Villa da Feira 23

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Villa da Feira 23

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4 Publicidade:

Telef.: 965 310 162 | 256 379 604

Fax: 256 379 607

Tiragem: 500 exemplares

Edição: N.º 23 - Outubro de 2009

Pré-impressão, Impressão e Acabamento:

Empresa Gráfi ca Feirense, S. A.

Apartado 4 - 4524-909 Santa Maria da Feira

Sede Social: Edifício Clube Feirense - Associação Cultural

Vila Boa - 4520-283 Santa Maria da Feira

Email: [email protected]

Depósito Legal: 180748/02

ISSN: 1645-4480

Reg. ICS: 124038

Depositária: Livraria Vício das Letras

Rua Dr. José Correia e Sá, 59

4520-208 Santa Maria da Feira

Apoios: Câmara Municipal Santa Maria da Feira

Irmãos Cavaco S.A.

Zoo Lourosa - Parque Ornitológico

E. Leclerc

Termas das Caldas de S. Jorge

Sociedade de Turismo de Santa Maria da Feira

Patrícios, S.A.

Ficha Técnica

Título: Villa da Feira - Terra de Santa Maria

Propriedade: LAF - Liga dos Amigos da Feira ®

Director: Celestino Portela

Director Adjunto: Fernando Sampaio Maia

Colectivo Editorial - Fundadores LAF:

Alberto Rodrigues Camboa; António Luís Carneiro;

Carlos Gomes Maia; Celestino Augusto Portela; Joaquim Carneiro

Processamento de Texto: Carla Maria Costa Ferreira

Coordenação Científi ca: J. M. Costa e Silva

Supervisão Editorial e Gráfi ca: Anthero Monteiro

Colaboração do TOC, Belmiro da Silva Resende

Periodicidade: Quadrimestral

Assinatura anual: 30 euros

Assinatura auxiliar: 50 euros

Este número: 15 euros

Pagamentos por:

Transferência bancária NIB 007900001127152910124

Cheque à ordem de LAF - Liga dos Amigos da Feira

Capa: Castelo da Feira. Fotografi a de Óscar Maia. Colecção

particular.

Fotografi as: Óscar Maia, J. M. Costa e Silva, Câmara Municipal,

Arquivos particulares, LAF e Fotos Web por José Correia

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Pórtico

Mais uma vez fui convidado para escrever umas linhas no número da “Villa da Feira” e talvez não tenha sido coincidência, que a revista tenha como um dos temas principais os “100 anos da Comissão de Vigilância do Castelo de Santa Maria da Feira”. Os 100 anos que estamos a festejar são um motivo de orgulho para todos nós Feirenses, que mais uma vez demos mostras a todo o Portugal, do que todos podemos fazer para preservar a nossa História e o nosso Património. Mais outra “coincidência” do convite não sei se terá sido o facto de eu ser o mais antigo membro da direcção em funções, em que entrei numa primeira lista convidado pelo Dr. Eduardo Vaz e Sr. Anídio Casals de Azevedo e numa lista posterior pelo Engº. Ludgero Marques e Engº. Cabral Figueiredo pessoas de uma dedicação e interesse pelo Castelo como haverá poucas tão devotadamente entregues à causa. Tenho a certeza que este será mais um exemplar da revista que será referência para todos nós.

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“O OUTONO DA VIDA”

Ilda Maria*

Olho em redor, as árvores do Outono

Já floriram e deram fruto e flor!

Dormem agora um tranquilo sono

De braços nus erguidos ao Senhor.

Não tardará que o vento e a tempestade

E a chuva agreste que virá cair

As faça recordar com mais saudade

A Primavera que não torna a vir!

Assim o bom vive e se devora

Na ânsia inútil de querer viver

Se desespera e busca uma demora

Da Primavera que não torna a ser!

E o Outono virá no declinar

Duma existência calma ou ruidosa, Docemente, fazer desmoronar

Folha por folha a vida caprichosa!

Hosp. Famalicão

*Poeta Faleceu em 20/07/1981

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1º. CENTENÁRIO

1909 – 29 DE OUTUBR0 - 2009

“COMISSÃO DE VIGILÂNCIA PELA GUARDA E CONSERVAÇÃO DO CASTELO DA FEIRA”.

«A hera secular tem desconjuntado e deslocado as pedras, o vendaval tem danifi cado as vedações, o fogo posto fez estalar padieiras e ombreiras, o raio rompeu um dos coruchéus e lascou um dos terrões, o rapazio malfasejo tem destruído e despenhado as ameias; mas o rijo granito dos fundamentos mantém fi rme a verticalidade das linhas severas d’aquele majestoso padrão que os forasteiros contemplam com expressões de admiração pela grandiosidade do velho monumento e dizeres de lástima pela enormidade do desleixo e do vergonhoso abandono a que tem sido votada a veneranda relíquia. Vergonhoso, sim, para o Estado, cuja pertença é, mas ainda mais vergonhoso para nós outros que temos presenciado imperturbàvelmente, quase complacentemente, as injurias do tempo e os insultos e danos da plebe ignara, a um padrão que é honra da nossa terra, de seculares tradições, sem que até hoje tenhamos clamado: Alto lá! Importa terminantemente aos brios, ao pundonor d’esta terra a religiosa conservação do nobre monumento, importa decisivamente aos sagrados interesses d’ela a sua guarda, a sua reparação, o seu restauro».(*)

Presidente

Fortunato Meneres

Secretário Dr. Aguiar Cardoso

Tesoureiro António Coimbra

Vogais Conselheiro Bandeira Dr. Vitorino de Sá Dr. Eduardo Vaz de Oliveira Dr. António Toscano D. Fernando de Tavares e Távora Dr. Gaspar Moreira Dr. João de Magalhães Dr. Vaz Ferreira Visconde do Reboleiro João António de Andrade Benjamim de Pinho Francisco de Lima.

Homenagem de Villa da Feira Terra de Santa Maria 29 de Outubro de 2009

(*) circular “Aos seus conterrâneos, um Feirense” que precedeu a constituição da Comissão.

Fortunato Méneres - 1º Presidente.

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SUMÁRIO

Pórtico Fernando Sampaio Maia 5Poesia Ilda Maria 6Mensagem 1º Centenário 7 Visita do Senhor Presidente da República Francisco Ribeiro da Silva 9Reportagem fotografi ca da Visita do Senhor Presidente da República 13O Projecto de Conservação e Remodelação do Castelo de Santa Maria da Feira Francisco Barata Fernandes 25Visita do Senhor Presidente da República à Comissão de Vigilância do Castelo da Feira Ludgero Marques 27Intervenção do Senhor Presidente da República, Professor Aníbal Cavaco Silva, após a visita ao Castelo de Santa Maria da Feira Professor Aníbal Cavaco Silva 29A visita de D. Manuel II à Feira e ao seu Castelo Francisco de Azevedo Brandão 31Poesia Henrique Veiga de Macedo 36Saudação ao Senhor Presidente da República, General Ramalho Eanes, No Castelo da Feira, P.e Albano de Paiva Alferes 37Poesia Maria Fernanda Calheiros Lobo 40Lançamento do Livro Francisco Ribeiro da Silva 41Castelo de Santa Maria da Feira, 29 de Novembro de 2008 Serafi m Guimarães 45Poesia Conceição Paulino 48Introdução ao Estudo do Povoamento Medieval da Terra de Santa Maria: Actualização Bibliográfi ca J. A. Gonçalves Guimarães 49Poesia Manuela Correia 66Amália Serafi m Guimarães 67Poesia Anthero Monteiro 74O Enclave de Parada (da Freguesia de Louredo) Frei Acaribe 75Dicionário Biográfi co de Personalidades Feirenses Francisco Azevedo Brandão 77Mensagem Escrita João Rodrigues 102Em Prol do Dr. Domingos Caetano de Sousa, Médico Feirense e Cidadão Honrado Manuel de Lima Bastos 103Visitações Domingos Azevedo Moreira 109Poesia Gilberto Pereira 124Aspectos do Corsarismo Durante o Governo Filipino Manuel Leão 125Poesia Edgar Carneiro 130Políticas Culturais e Modos de Vida Urbanos - O contributo da Cultura Popular na Sociedade Contemporânea – algumas notas do caso de Santa Maria da Feira Tiago Santos 131Poesia Manuela Correia 138Direitos das Crianças I Jorge Augusto Pais de Amaral 139As mulheres do Gungunhana Maria da Conceição Vilhena 143Cem palavras sem droga Joaquim Máximo 149O Castelo ao Espelho Óscar Maia 151Postais do Concelho da Feira Ceomar Tranquilo 153Poesia Anthero Monteiro 160

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9 Visita do Senhor Presidente da República

O Castelo da Feira - Monumento Memória Histórica e Pólo de Desenvolvimento

Castelo da Feira – 22.01.2008

Francisco Ribeiro da Silva*

Dirijo-me, especialmente, a V. Ex.ª, Senhor ProfessorAníbal Cavaco Silva, Presidente da República Portuguesa para, na qualidade de responsável científi co do Centro de Documentação e sobretudo na de Associado da Comissão de Vigilância do Castelo da Feira, expor em poucas palavras algumas refl exões de pendor histórico e patrimonial sobre este Monumento, que desejo condizentes com os objectivos que V. Ex.ª tem em mente ao incluir este venerando Castelo no seu roteiro de reconhecimento e valorização patrimonial.

São três as notas que, de forma muito sucinta, apresentarei a V. Ex.ª: 1ª- O Castelo da Feira é um símbolo histórico e memória viva da génese da Nação portuguesa. Embora não esteja incluído nas Dez Maravilhas de Portugal

recentemente proclamadas, o Castelo da Feira tem lugar destacado, por direito próprio, nos monumentos representativos da génese de Portugal como nação independente, bem ao lado do magnífi co Castelo de Guimarães e do desaparecido Castelo de Neiva. Tanto o Castelo de Neiva como este da Feira foram conquistados por D. Afonso Henriques em 1127 e o apoio de ambos foi essencial para as etapas seguintes da fundação de Portugal que culminaram com a batalha de S. Mamede em Junho de 1128 e levaram ao reconhecimento formal de D. Afonso Henriques como Rei de Portugal por Fernando VII de Leão, na presença do legado do Papa, na Conferência de Zamora de 1143. Ao recordar aqui esse primacial valor histórico do Castelo e a viabilização do novo Reino que esta Terra de Santa Maria promoveu ao colocar-se como pólo de ligação entre o território de Portucale e o de Coimbra no apoio às pretensões de D. Afonso Henriques, não quero ressuscitar velhas e renhidas polémicas sobre o lugar do nascimento de Portugal, até porque entendo que o assomar de uma nação provém de várias e diferentes circunstâncias que não são apenas as de um determinado lugar. Mas, se para contextualizar as circunstâncias da independência é preciso referir terras e lugares, este não pode ser ignorado. É-nos grato, pois, sublinhar aqui o reconhecimento do papel histórico deste Castelo e desta Terra de Santa Maria que recentemente foi confi rmado e robustecido pelos estudos

*Professor Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

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de dois insignes autores, um da área de História, o Prof. José Mattoso, outro da área do Direito, o Prof. Eduardo Vera-Cruz Pinto aqui presente, nenhum deles oriundo deste Concelho. Por outro lado, reafi rmando esta nota sobre a relação do Castelo com as origens do nosso país, e não me alargando para outros períodos anteriores e posteriores à fundação de Portugal, pretendo esclarecer que não são apenas os habitantes da antiga Terra de Santa Maria que têm obrigação de prezar e venerar este espaço e estas pedras mas sim todos os portugueses, visto que o Castelo da Feira é uma memória tangível da génese de Portugal como reino independente.

2ª – O Castelo da Feira é um monumento nacional milenário cuja recuperação se deve à iniciativa e empreendedorismo da sociedade civil e que o país precisa de conhecer e aproveitar.

Não vou enfadar V. Ex.ª e os ilustres acompanhantes com os pormenores da história da construção desta fortaleza que foi também residência senhorial. Lembrarei, contudo, que a edifi cação primitiva, de que ainda hoje há vestígios na Alcáçova, remonta aos sécs. X/XI. Curiosamente, nos inícios do séc. XIV, o Castelo foi anexado ao património da Rainha Santa Isabel. Mais tarde, em 1383, D. Fernando e Dona Leonor Teles doaram as terras de Santa Maria da Feira ao Conde de Barcelos, D. João Afonso Telo. Mas, em virtude das contingências da viragem política e dinástica que se seguiu à morte de D. Fernando, o Mestre de Avis, dois anos depois, fez doação dessas terras a Álvaro Pereira, o primeiro da ilustre família que até aos inícios do séc. XVIII presidiu a este território. Mas o Castelo não lhes é entregue senão posteriormente (em 1448), na pessoa de seu neto Fernão Pereira, exigindo em contrapartida a obrigação de o reconstruir. Os novos senhores introduziram algumas alterações no edifício, no sentido de reforçar as capacidades militares de defesa e ataque e também de tornar um pouco mais habitável a antiga fortaleza. Mesmo assim, as condições domiciliárias internas não seriam excelentes. Talvez por isso, no séc. XVII foram construídos, na Praça de Armas, um Paço para morada dos Condes e um celeiro que atravancaram quase todo o espaço da dita Praça de Armas. No mesmo século, foi ainda construída, fora de muralhas, a Capela e casa do capelão. Desabitada a antiga alcáçova e não havendo premência

histórica que exigissem a sua utilização militar, depressa terá começado a degradação do Castelo que apresentaria sinais de decadência já nos fi ns do século XVII, a julgar pelos lamentos do Padre Francisco de Santa Maria que no livro O Céu Aberto na Terra, publicado em Lisboa em 1697, assim se exprime: «fi cando acervo de ruínas o que fora monte de grandezas, e despojo lastimoso dos tempos o que fora emprego agradável dos olhos». A degradação ter-se-á acentuado após a morte do último Conde da Feira, em 1700, que não deixou descendentes legítimos e, por isso, poucos anos depois, a Casa da Feira passou para a posse da Casa do Infantado. Se, a partir daí, o Castelo e anexos não foram totalmente abandonados, também não foram cuidados como mereciam. Nem suas Altezas reais se preocuparam muito com isso. Entrado o séc. XIX e com ele a revolução liberal, as condições do monumento não parece terem melhorado. Pelo contrário. Nem a condenável venda a particulares do Paço e celeiro efectuada em 1839 melhorou as coisas. Mas, fi nalmente em 1905, a sociedade civil da Vila da Feira, desiludida e descrente das promessas de auxílio por parte do Estado e das instituições ofi ciais, mas galvanizada por alguns cidadãos mais conscientes que se congregaram na chamada «Sociedade Castelo da Feira», encontrou meios para evitar a catástrofe total. Uma subscrição pública proporcionou fundos para as obras mais urgentes. De tal modo que em 1908 foi possível receber no Castelo o Rei D. Manuel II que visitava a região para inaugurar o caminho-de-ferro do Vale do Vouga. Parece que a visita régia foi tónico para que esse punhado de feirenses não esmorecesse e se reorganizasse ofi cialmente, constituindo a «Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Feira» de que foi maior impulsionador o Dr. Augusto Aguiar Cardoso. O mérito do trabalho desenvolvido foi reconhecido pelo Governo não só através de louvores públicos mas também pela entrega, em 1939, do Castelo e todas as suas partes, incluindo a Capela e terrenos envolventes à dita Comissão de Vigilância, entrega feita pelo Ministério da Guerra. Em 1982 a Comissão adquiriu personalidade jurídica e passou a chamar-se Comissão de Vigilância do Castelo da Feira. Em 1988 foi dado novo e importante passo traduzido pela assinatura de um protocolo de colaboração em que intervieram as partes interessadas, a saber: o Estado Maior

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do Exército, o Instituto Português do Património Cultural, a Comissão de Vigilância do Castelo e a Câmara Municipal de Santa Maria da Feira. Até 1995, a valorização do monumento seguiu determina--das linhas programáticas que foram esquematicamente as seguintes: 1º- Recuperação física do monumento para o que se recorreu a técnicos especializados em estreita colaboração com os organismos ofi ciais; 2º- Promoção da investigação, publicação e difusão de estudos históricos e de história de arte sobre o Castelo, sua importância estratégica na história militar e política de Portugal, e sobre a própria Terra de Santa Maria. 3º - Edição de colecções de postais ilustrados do Castelo, algumas das quais com difusão nacional. O trabalho desenvolvido foi intenso, dedicado e persistente e o resultado foi a restituição ao Castelo da sua original dignidade. Em 1995 foi empossada nova Direcção da Comissão de Vigilância do Castelo da Feira, presidida pelo Eng.º Ludgero Marques, a qual tem imprimido novo dinamismo às potencialidades do Monumento através da defi nição clara de novos objectivos, da celebração de protocolos e da busca de fi nanciamento nos Programas Europeus. Destacarei os seguintes itens:

1º - Celebração em 1995 de um protocolo entre a Comissão de Vigilância, o IPPAR, a Câmara Municipal de Santa Maria da Feira e o Europarque cujos objectivos foram essencialmente o de valorizar o Monumento e de o tornar útil à Comunidade através da realização no seu espaço de iniciativas culturais compatíveis, promovidas quer pelas entidades signatárias ou por outras;

2º - Promoção e publicação de novos e relevantes estudos sobre o Castelo da Feira e a Terra de Santa Maria.

3º- Continuação faseada (entre 2000 e 2005) das obras de conservação e remodelação do Castelo com a aprovação e apoio do IPPAR, da CCRN e ainda do Programa Operacional da Região Norte. Destas obras falará o principal responsável técnico, Prof. Arquitecto Francisco Barata Fernandes. 4º- Intervenção arqueológica, em 2002, exigida pela

natureza das obras de remodelação a efectuar, intervenção que se revelou extremamente inovadora pelos dados desconhecidos que forneceu e pela abundância e riqueza dos materiais desenterrados. 5º - Criação em 2005 do Centro de Documentação da Terra de Santa Maria. A ideia é não só a de reunir em Arquivo Histórico Digital documentos importantes da História do território mas a de os facultar, através da Internet, aos investigadores e à população que estiver interessada. Uma boa quantidade de documentos que eram de acesso difícil já está disponível na NET.

Para que tal fosse possível e feito com seriedade, a Comissão de Vigilância assegurou a colaboração de qualifi cados Professores da Faculdade de Letras (para a pesquisa documental) e da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (para a parte informática), e ainda de jovens licenciados de mérito provado e do Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, cujo Director aceitou dar o seu precioso contributo pessoal.

Para além de outras marcas de dimensão nacional, o Castelo é, pois, repositório da Memória Histórica da Terra de Santa Maria e das gentes da Feira.

3ª – O Castelo é e há-de ser cada vez mais pólo de desenvolvimento educativo, cultural e turístico.

O Castelo não é evidentemente uma Escola no sentido formal, mas pode ser um poderoso meio de transmissão de conhecimentos históricos à população escolar. Por mim, nunca mais esquecerei a primeira vez que, por volta dos meus 10 anos, visitei este monumento. Não é certamente daí que me vem o gosto pela História. Mas quantas e belas lições práticas de História podem ser aqui ministradas. E não apenas às crianças mas também aos adultos que as acompanham. Aliás, agrada-me saber que, por exemplo, outrora as visitas ao Castelo não demoravam mais que dez minutos. Hoje, com as novas condições de acolhimento, com a projecção do fi lme de animação sobre o Castelo, com o recurso aos meios audiovisuais, com a exposição de alguns materiais arqueológicos as visitas chegam a demorar uma hora. Mesmo sem visita guiada.

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Por outro lado, este espaço há-de continuar a ter utilizações variadas de índole cultural adequadas à dignidade do monumento. Já aqui assisti a concertos, a conferências, a apresentação de livros, a ceias medievais. E no domingo passado, dia de S. Sebastião e da Festa das Fogaceiras aqui foi celebrada a missa solene e abençoadas as Fogaças pelo Bispo do Porto. O Castelo deixou de ser um lugar de fantasmas e de mistérios tenebrosos. A Comissão de Vigilância tem ainda em mente projectos de índole turística e de natureza cultural cuja implementação aumentaria seguramente a atractividade do Castelo. Mas

para os concretizar é essencial conseguir a reintegração da Quinta do Castelo no complexo do mesmo Castelo, como outrora sucedeu. As negociações com o ISSS (Instituto de Solidariedade e Segurança Social) estão bem encaminhadas mas há escolhos que não parece difícil ultrapassar se houver imaginação e boa vontade. Estou seguro de que a visita de V. Ex.ª e da Senhora Ministra da Cultura irão contribuir para a remoção das difi culdades presentes.

Muito obrigado.

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Fotos Óscar Maia

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Cumprimentos de Ludgero Marques, Presidente da Direcção da Comissão do Castelo.

Cumprimentos de Alfredo Henriques, Presidente da Câmara.

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Um carinho especial para as crianças.

Fernando Sampaio Maia presta esclarecimentos sobre a Capela.

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Prof. Arquitecto Francisco Barata Fernandes explica ao Senhor Presidente da República as últimas obras realizadas.

O Arquitecto Francisco Barata Fernandes acompanhou sempre o Senhor Presidente da República durante a visita ao Castelo.

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Ali a Quinta que deve ser do Castelo.

O Senhor Presidente da República durante a sua intervenção.

Esclarecimentos de Alfredo Henriques.

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A Comissão de Vigilância faz a entrega da medalha-troféu, escultura de Irene Vilar.

Entrega de fl ores.

A Câmara Municipal ofereceu uma escultura de Paulo Neves.

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A receber Fogaça entregue por lindas fogaceiras .

A LAF ofereceu ao Senhor Presidente da República a colecção completa da revista Villa da Feira Terra de Santa Maria.

Aspecto do Salão Nobre.

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Gil Cabral de Figueiredo, José Manuel Cardoso da Costa, Alfredo Henriques, Ludgero Marques, Senhor Presidente da República Aníbal Cavaco Silva, Senhora Ministra da Cultura Isabel Pires de Lima, Serafi m Guimarães, Fernando Sampaio Maia, Celestino Portela e Paulo Portela.

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Celestino Portela, Fernando Sampaio Maia, J. M. Cardoso da Costa, Dra. Dona Maria Cavaco Silva, Senhor Presidente da República, Ludgero Marques e Serafi m Guimarães.

No Eirado do Castelo uma dedicatória, única, no seu livro Autobiografi a Política, para Serafi m Guimarães.

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Para a saída do Castelo.

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O PROJECTO DE CONSERVAÇÃO E REMODELAÇÃO DO CASTELO DE SANTA MARIA DA FEIRA

Francisco Barata Fernandes*

*Arquitecto.

Bom dia Senhor Presidente da República, Senhora Ministra da Cultura, Senhor Presidente da Câmara, Senhor Presidente da Comissão de Vigilância, Senhores convidados, minhas Senhoras e meus Senhores,

Serei muito breve nesta apresentação do projecto. O projecto de conservação e remodelação do Castelo de Santa Maria da Feira teve início em 1991. O seu programa e objectivos são ambiciosos, envolvendo todo o conjunto monumental: torre de menagem-alcáçova, praça de armas, tenalha, presbitério, Capela de Nossa Senhora da Encarnação e espaços exteriores envolventes deste monumento, com especial incidência na Quinta do Castelo. Trata-se de um processo longo, algumas vezes interrompido, exigindo uma permanente avaliação da relação investimento/benefício, não só do ponto de vista económico-fi nanceiro, mas também do ponto de vista cultural, social e urbano. O que hoje se pode observar visitando o Castelo é o

resultado de um secular processo de transformação física e funcional. É resultado também de um constante reforço da relação do Castelo com a cidade. De fortifi cação militar que defendeu um burgo e um vasto território de investidas inimigas, esta assume-se hoje como um espaço lúdico e cultural aberto à comunidade. O projecto que se desenvolveu para o Castelo baseia-se na análise do seu processo de transformação, na interpretação do programa acordado entre a Comissão de Vigilância e o IPPAR, actual IGESPAR, e no cumprimento das limitações orçamentais apresentadas. A análise do processo de transformação que o Castelo sofreu ao longo dos séculos foi elaborada com o objectivo de se reconhecerem as constantes arquitectónicas determinantes na preservação da identidade da obra. Desde o princípio que interessou manter esta identidade primigénia, não se pretendendo dar protagonismo ao confronto, por vezes excessivo, entre o novo e o antigo. Da parte da cidade, da parte do território, portanto, da parte relativamente à qual o Castelo sempre afi rmou a sua identidade, todas as características foram preservadas e realçadas. Quando nos aproximamos, quando estamos em condições de nos apercebermos que o Castelo integra novas funções, novos usos e com isso muda todo o seu aparato arquitectónico,

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então, aqui, poder-se-á observar que novos elementos foram introduzidos. Isto é uma visão em certa medida “contra a corrente” dos tempos contemporâneos, que muitas vezes estabelece rupturas e força perdas de identidade entre o património arquitectónico existente e as intervenções actuais. Pensamos que, a intervenção arquitectónica no património, deverá ser precisamente para lhe garantir a conservação da identidade e a capacidade de adaptação ao presente. Verifi cou-se que, numa primeira fase, século XV e XVI, o Castelo respondeu a novos programas através do progressivo alteamento da torre, com a construção de novos pisos e a introdução dos acessos verticais no interior das suas espessas paredes: referimo-nos a uma escada helicoidal que conduz ao eirado e a uma escada de um só lanço, que conduz ao piso térreo. Numa fase posterior, numa segunda fase, século XVII, quando a torre- alcáçova já não correspondia ao aumento de complexidade e signifi cado dos novos programas (programas residenciais – casa nobre), estes ocuparam a praça de armas com novas e afi rmativas construções: o paço dos Condes, que já foi falado. Hoje, a comunidade talvez não aceitasse tal opção. O programa apresentado pela Comissão de Vigilância teve como objectivo implementar uma intensa acção cultural, educativa, social e lúdica, aproveitando as condições únicas que o castelo oferece, quer pela sua componente educativa, quer pela sua particular apetência para funcionar como pólo dinamizador do centro urbano em que se insere. A sua localização proeminente na Quinta do Castelo e no grandioso parque da cidade conferem-lhe potencialidades na dimensão turística nacional. As obras realizadas pretendem dar resposta a tais objectivos, superando os condicionalismos infra-estruturais com que o Castelo se defrontava no desempenho das suas iniciativas. Vivemos hoje um momento em que o Castelo, para continuar a desempenhar o seu papel, a assumir o seu signifi cado, necessita de integrar no seu programa cultural, no seu programa de diálogo com a comunidade, no seu programa de resposta também a anseios da autarquia, necessita de ter um papel decisivo na estruturação da Quinta do Castelo, sua antiga cerca, Quinta do Castelo essa que faz a articulação com a área central da cidade. Nesta fase de desenvolvimento da cidade, poderemos

alcançar uma situação que é rara em Portugal, isto é, poderemos dispor de um parque altamente dinâmico, com grande qualidade paisagística e ecológica, localizado no próprio centro da cidade. A cidade poderá dispor, a muito breve trecho, de um parque com um alcance urbanístico e paisagístico, que ultrapassa os limites da própria cidade. Não se trata de especulação ou perspectiva exagerada. Consideremos a programação cultural e de reabilitação urbana que o Castelo da Feira e a Câmara de Santa Maria da Feira têm apresentado, para se poder verifi car como o melhoramento das acessibilidades, a criação de novos equipamentos, a realização de eventos que atraem visitantes de todo o país, toda esta dinâmica que se pode criar, também, na Quinta do Castelo, vai promovendo a cidade e, simultaneamente, vai contribuindo para que o Castelo, o monumento nacional, seleccione as solicitações a que pretende dar resposta. Deseja-se que esta obra, que pode contar com excelente apoio e articulação com o IPPAR-Norte, venha a constituir uma boa experiência de colaboração equilibrada entre os serviços do Estado e a capacidade de iniciativa e empreendimento de associações locais.

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Visita do Senhor Presidente da República, Professor Doutor Cavaco Silva, à Comissão de Vigilância do Castelo da Feira

Ludgero Marques*

Exmo Senhor Presidente da República, Senhor Professor Aníbal Cavaco Silva Ema. Senhora Dra. Maria Cavaco Silva, Exmo. Senhor Presidente da Câmara de Santa Maria da Feira, Exmo. Senhor Presidente da Assembleia-Geral da Comissão de Vigilância do Castelo, Restantes membros dos órgãos sociais da Comissão,

Minhas Senhoras e meus Senhores,

É para mim e para todos os elementos que se encontram nesta sessão uma honra receber Vossa Excelência, Senhor Presidente e sua Esposa Dr.ª Maria Cavaco Silva.

Esta Centenária Comissão do Castelo da Feira é única em Portugal na função de guardar e cuidar de um Monumento Nacional. Várias foram as acções desenvolvidas no Castelo, desde as de conservação, como também as de restauração, funcionalidade e de pesquisa arqueológicas. O projecto do Professor Doutor Francisco Barata Fernandes garantiu o restauro e a funcionalidade actual deste Castelo. Foi o trabalho dos Arqueólogos que permitiu explorar a história mais profunda do Castelo.

Foi do lançamento do primeiro e segundo Volumes dos Livros “Terra de Santa Maria” do Senhor Professor Doutor Eduardo Vera-Cruz Pinto que foram disponibilizados aos interessados na História de Portugal, elementos valiosos para a compreensão do Castelo da Feira na Independência e Conquista de Portugal. Foi a confi ança do Ministério da Cultura que nos permitiu

*Empresário. Presidente da Comissão de Vigilância do Castelo da Feira. Natural de Rio Meão.

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encontrar as melhores práticas para a realização da nossa obra.

Foi com a cooperação do IPPAR que a Comissão do Castelo da Feira pôde arquitectar toda esta recuperação do Monumento.

Foram os Empresários e os Amigos do Castelo da Feira, que conferiram à Comissão a primeira “tranche” fi nanceira para avançar com as obras. É de uma importância muito grande, para uma comissão da sociedade civil, ter mantido com alguns dos organismos do Governo uma belíssima cooperação que tem permitido esta situação, este estado de conservação do Castelo, pretendendo incentivar o Governo para esta forma de trabalhar em conjunto, que em parceria com o nosso voluntarismo, seja sufi ciente e necessário para podermos valorizar as nossas obras de arte. Este Castelo, localizado já pelos anteriores oradores, numa zona muito especial da Terra de Santa Maria, está ainda numa fase de mostrar aos portugueses, e fundamentalmente aos feirenses, a grande vantagem que poderemos ter em construir nesta zona um verdadeiro farol, onde a confi ança

nas nossas forças e nas nossas acções possa trazer para esta zona a memória medieval de Portugal. Estamos interessados, de facto, em não fi car por aqui, ao apresentar este sinal da capacidade de realização que esta gente da Terra de Santa Maria possui e quer demonstrar. Não é só com voluntarismo que podemos fazer uma obra com dimensão e estruturada. Tiveram a oportunidade de, nas apresentações, verifi car que não é um voluntarismo simples de um ou dois anos, é um trabalho de oito ou nove anos, com gente muito qualifi cada, muito interessada e muito voltada para a Terra de Santa Maria. Portanto, Senhor Presidente da República, muito obrigado por nos ter dado esta possibilidade de sermos mais visíveis, de mostrar aos nossos conterrâneos que estamos a trabalhar em prol do País, em prol dos nossos Monumentos, e espero que esta não seja a última vez que Vossa Excelência aqui vem, porque ainda temos muito trabalho para mostrar – eventualmente com outros e não comigo – para que a valorização do gosto de ser Português continue a acontecer.

Muito obrigado, Senhor Presidente

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29 Intervenção do Senhor Presidente da República, Professor Aníbal Cavaco Silva, após a visita ao Castelo de Santa Maria da Feira

Senhora Ministra da Cultura, Senhor Presidente da Câmara, Senhor Presidente da Assembleia Municipal, Senhor Presidente da Comissão de Vigilância do Castelo da Feira, Senhores Professores e investigadores, Senhores empresários, minhas senhoras e meus senhores,

Encerro aqui, em Santa Maria da Feira, no Castelo da Feira, a segunda Jornada do Património, jornada que incluiu, em Coimbra, o Mosteiro de Santa Cruz, a Sé Velha, a Universidade; na Universidade foi feita a apresentação da candidatura da Alta de Coimbra a Património Mundial da Unesco, e que ontem incluiu também a visita ao Mosteiro do Lorvão. Hoje, estivemos há pouco no Mosteiro de Arouca e, agora, estamos aqui a encerrar esta Jornada do Património, que é a segunda. A primeira, lancei-a no Verão do ano passado, no Baixo Alentejo. E, ao decidir lançar esta jornada do Património, tive em mente vários objectivos: chamar a atenção, sensibilizar

as diferentes entidades, as empresas, os cidadãos, escolas, universidades, para a importância da preservação, da defesa e da valorização do nosso património histórico e cultural; mostrar também como o património, o património histórico, cultural, o rico património de que nós somos possuidores, pode contribuir para o desenvolvimento económico e social das regiões. Também apresentar boas práticas, bons exemplos da recuperação e preservação do nosso património; mostrar casos em que a sociedade civil se organiza para a defesa do património histórico do nosso país; chamar a atenção dos jovens para a responsabilidade que lhes cabe no conhecimento do nosso rico património e na sua preservação e transmissão às gerações futuras. Tive em vista chamar a atenção para a importância do património como factor de singularidade do nosso país, expressão da identidade nacional, aquilo que nos faz diferentes neste tempo de globalização em relação a outros países; chamar a atenção dos portugueses para monumentos emblemáticos que são a expressão visível da nossa memória colectiva. Mas não pretendi fazer apenas a exaltação do passado. Pretendi também mostrar que a preservação e a defesa do património é uma forma de andar para a frente, de ganhar confi ança na construção de um futuro melhor para o nosso país. E penso que o Castelo de Santa Maria da Feira é o lugar

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certo para encerrar esta Jornada, porque aqui encontro de forma muito nítida, muito clara, muitas das razões que me levaram a promover este roteiro para o Património e a lutar contra a decadência de alguns dos nossos monumentos. Desde logo porque, como disse, eu queria mostrar e chamar a atenção, em particular aos mais jovens, para monumentos emblemáticos do nosso país. E este é, sem dúvida, como foi muito bem explicado, pelos oradores anteriores, um monumento emblemático do nosso país, que está na génese da nação portuguesa. O papel que desempenhou na Reconquista e, depois de já terem sido dirimidas todas as querelas entre a Feira e Guimarães, não há dúvida, hoje, que este castelo desempenhou um papel decisivo na fundação de Portugal, depois de evidenciar boas práticas - disse eu - e aqui está uma boa prática, um bom exemplo, um bom exemplo que gostaria de ver replicado noutras partes do país em relação a outros monumentos. Eu tenho dito sempre que nestes roteiros, roteiro para a inclusão, roteiro para a ciência, roteiro para o Património, o que me interessa é mostrar aos portugueses aquilo que de bem nós estamos a fazer, aquilo que de bem nós podemos fazer, mostrar bons exemplos, boas práticas para que elas possam ser replicadas. Mas existe ainda uma outra razão. Eu tenho dito que a defesa, a valorização do património é uma responsabilidade de todos; não é apenas do Governo, não é apenas da Senhora Ministra da Cultura. É uma responsabilidade da sociedade portuguesa. E, por isso, fi co imensamente satisfeito quando tomo conhecimento de instituições da nossa sociedade civil que se organizam para defender o património. Encontrei uma, há pouco, em Arouca – a Irmandade da Rainha Santa Mafalda -, ontem encontrei outra na Sé de Coimbra, uma associação de empresários, de cidadãos, de estudiosos, que estão a organizar-se para defender a Sé velha e estão a fazer um trabalho com um grande entusiasmo que só me cabe aplaudir e incentivar. E agora, aqui, esta Comissão de Vigilância centenária, vai fazer 100 anos no ano 2009, portanto dentro de um ano, que realizou um trabalho notável que está à vista de todos e só merece da minha parte o maior apreço. E o que espero é que esta comissão possa apresentar o seu trabalho noutras partes do país, junto de câmaras municipais onde existam outros monumentos que também requeiram trabalhos de

recuperação e de valorização. Aqui, os responsáveis da cultura podem exibir um sorriso rasgado, a Senhora Ministra da Cultura e os técnicos do Ministério que a acompanham faziam isso e eu juntava-me também, logo à chegada aqui ao castelo. Por isso penso que esta jornada, que escolheu deliberadamente monumentos associados à fundação de Portugal, ligados à nacionalidade, à conquista do território, termina no lugar certo. Resta-me, de facto, manifestar todo o meu reconhecimento, o meu muito obrigado àqueles que, ao longo de 99 anos, trabalharam nesta comissão de vigilância, e também manifestar o meu apreço pela cooperação que tem sido possível desenvolver entre essa comissão, o poder local e o poder central. De facto a recuperação do património é um trabalho que envolve diversas entidades, que requer uma cooperação intensa, por isso Santa Maria da Feira está de parabéns, a Comissão de Vigilância está de parabéns e o Ministério da Cultura está de parabéns, na palavra e dentro da expressão que eu próprio ajudei a consolidar no nosso país: cooperação estratégica. Quero agradecer a presença da Senhora Ministra da Cultura em toda esta Jornada do Património, tal como já tinha acontecido na Primeira Jornada, no Baixo Alentejo.

A todos vós, muito, muito obrigado.

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31 A visita de D. Manuel II à Feira e ao seu Castelo

Francisco de Azevedo Brandão *

A visita de D. Manuel II à Feira e ao seu Castelo deu-se a 23 de Novembro de 1908, quando veio inaugurar o primeiro troço da linha do Vale do Vouga, entre Espinho e Oliveira de Azeméis, aproveitando a sua digressão pelo Norte do país, iniciada a 6 do mesmo mês. Mas, antes de recordar o que foi esse dia glorioso para a Vila da Feira e Terras de Santa Maria, permitam-me evocar aqui a vida deste vetusto e altaneiro castelo que ao longo dos séculos, foi sempre acarinhado pelos reis e príncipes de Portugal. Ignorando-se a sua origem, o Castelo foi erigido numa antigo castro aqui existente, como tantos outros por este país fora, muito antes da nossa nacionalidade. A primeira referência documental sobre o castelo remonta ao tempo de D. Bermudo III, rei de Leão entre 1028 e 1034, ao evocar a batalha de Cesar, onde se diz que o local fi cava situado no território do Castelo de Santa Maria, documento publicado por Alexandre Herculano nos « Portugaliae Monumenta Histórica».

Em 1117 é aqui outorgada a fundação de Albergaria-a-Velha, através de um diploma assinado por D. Teresa, fi lha de D. Afonso VI e viúva do Conde D. Henrique e no qual já se intitulava Rainha de Portugal. Trata-se de um diploma importante para esta terra, pois é o primeiro documento em que aparece a designação FEIRA, que continuaria até aos nossos dias. Foi este castelo, um dos primeiros a declarar-se por D. Afonso Henriques na revolta contra sua mãe, mercê do apoio do Conde Ermígio Moniz, governador das Terras e Castelo de Santa Maria, culminando com a vitória do futuro primeiro rei de Portugal na Batalha de S. Mamede em 1128, razão pela qual se pode dizer ser este monumento o verdadeiro berço da independência de Portugal. D. Sancho I, no seu testamento redigido em 1188, deixou exarado que o Castelo da Feira era um dos cinco castelos que serviria de eventual refúgio da rainha quando viúva e de seus fi lhos. D. Afonso III, no antigo foral que concedeu às Terras de Santa Maria, prescrevia obrigações e serviços dos foreiros e homens dos regalengos a favor do castelo e palácio da Feira. D. Dinis, em 1300, deu de dote a D. Isabel de Aragão, sua mulher, as Terras de Santa Maria e que duas décadas mais tarde seriam disputadas entre o príncipe D. Afonso e seu irmão bastardo Afonso Sanches, com a vitória fi nal a favor do futuro rei D. Afonso IV.

* Licenciado em História pela Universidade do Porto e Bacharel em Filologia Românica pela Universidade de Coimbra. Historiador local, é autor de Anais da História de Espinho, O Associativismo em Espinho, Joaquim Pinto Coelho, um Político de Espinho, O Campo de Aviação de Espinho, O Culto de Nª Sª da Ajuda em Espinho e Manuel Laranjeira, por ele mesmo.

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Em 1372, o rei D. Fernando faz nova doação das Terras de Santa Maria e seu castelo a D. Afonso Telo de Menezes, conde de Barcelos. Este, porém, ao eclodir a crise de 1383-1385, tomando o partido do rei de Castela, foi desalojado do castelo da Feira pelo alcaide do castelo de Penedono, Gonçalo Vasques Coutinho que o entregou ao Mestre de Aviz que, por sua vez, o cedeu a D. Álvaro Pereira, primo do condestável D. Nuno Álvares Pereira. Mais tarde, em 1448, D. Afonso V entregava o Castelo a Fernão Pereira, 3.º Senhor da Feira, com a obrigação de fazer nele as obras necessárias para a sua boa conservação. Seu fi lho, Rui Vaz Pereira seria o 1.º Conde da Feira, e por isso mesmo procedeu a uma remodelação total, adaptando o castelo a residência senhorial. Não é de estranhar que, em 1502, o castelo e residência senhorial, agora sob a alçada do 2.º Conde, D. Diogo Pereira, recebesse como hóspede o rei D. Manuel I e sua comitiva que iam a caminho de Santiago de Compostela. D. Diogo Forjaz Pereira, 4.º Conde da Feira, procedeu a novas reformas no castelo, entre as quais a construção da torre do relógio, destruída mais tarde pelo terramoto de 1755. Em 1580, D. António, Prior do Crato, entrincheirou-se no castelo e utilizando a artilharia que aqui se encontrava, bombardeou a cidade de Aveiro que se tinha recusado a aderir à sua causa. Em 1656, a Condessa D. Joana Forjaz Pereira, fi lha de D. João Forjaz Pereira, vice-rei da Índia, mandou construir a Capela de Nossa Senhora da Encarnação, ainda hoje existente. Meio século mais tarde, em 1700, morre sem descendência legítima o último conde da Feira, D. Fernando Forjaz Pereira, pelo que o rei D. Pedro II evocou a posse da «opulenta Casa da Feira», integrando-a na Casa do Infantado. O que era a casa do Infantado? A Casa do Infantado fora criada por D. João IV, em 1654-55, e consistia num conjunto de bens materiais, propriedades e rendimentos destinados a assegurar o sustento dos fi lhos segundos dos reis, para que vivessem no reino e tivessem suas casas próprias. Segundo o articulado da doação, procurava-se garantir as condições de uma larga descendência para perpetuar e dilatar o mais que pudesse o sangue e a família real portuguesa. A doação abrangia vilas, lugares, castelos, padroados, terras, direitos e tributos de segunda casa, o que garantia

o título de Vila Real para o fi lho primogénito. A Casa do Infantado foi -se enriquecendo ao longo dos tempos por novas doações, como foi o caso do Castelo da Feira, por forma a dar aos infantes uma fonte de rendimento que lhes permitissem conservar o estatuto de príncipes. A título de curiosidade, diremos quem foram os Senhores do Infantado: D. Pedro de Bragança, futuro rei D. Pedro II; D. Francisco de Bragança, duque de Beja (a quem foi entregue o Castelo da Feira); D. Pedro de Bragança, futuro rei D. Pedro III, marido de D. Maria I: D. João de Bragança, futuro rei D. João VI; e por último, D. Miguel de Bragança, futuro rei D. Miguel. Com as lutas liberais e a vitória de D. Pedro IV, os bens de D. Miguel foram postos em hasta pública e vendidos ao desbarato, incluindo, segundo o Dr. Aguiar Cardoso, «toda a cerca do castelo sem se reservar, sequer, uma faixa de terreno em todo o círculo do monumento, para que todas as portas fi cassem praticáveis. E assim foi mesmo vendido, em 1839, o palácio do Conde existente no interior da fortifi cação, com a agravante do arrematante se apossar, ilegalmente, da sacristia da capela e do presbitério». Em 1854, o Castelo é visitado pelos infantes D. Pedro e D. Luís, acompanhados pelo fi lho deste, D. Carlos, que, na altura, faziam uma viagem pelo Norte do país. Curiosamente foram os três reis de Portugal. A partir desta data o Castelo da Feira foi de decadência em decadência até que, em 1877, se procedeu a algumas benefi ciações, mas sem a devida continuidade. Apesar disso, em 1881, o Castelo seria classifi cado como monumento nacional, continuando, porém, a verifi car-se a sua degradação. Entretanto, vários apelos foram feitos por ilustres feirenses, tendentes a impedirem a derrocada fi nal do castelo, apelos que foram ouvidos pelo cidadão Afonso Teixeira do Couto que, em 1905, lançou uma subscrição pública que teve o apoio de muitas fi guras de relevo da terra e que permitiu realizar as reparações mais urgentes. Esta iniciativa levou à criação da «Sociedade dos Amigos do Castelo da Feira» que viria a ser a génese da «Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Vila da Feira», fundada em 1909 e que desde essa data até ao presente, tem feito, à custa de muito sacrifício e esforço fi nanceiro com alguma ajuda ofi cial, obras importantes de benefi ciação e restauro que orgulha o povo feirense.

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A propósito, impõe-se relembrar neste momento o elogio proferido no passado dia 22 de Janeiro pelo Presidente da República, Dr. Cavaco Silva, no encerramento das Segundas Jornadas do Roteiro para o Património, quando, em relação ao trabalho que a Comissão de Vigilância do Castelo da Feira tinha feito nos últimos anos, afi rmou o seguinte: «É um bom exemplo de cooperação estratégica entre a sociedade civil, o poder local e o poder cultural. Trata-se de uma Comissão de Vigilância centenária que tem sido um motor de recuperação física da antiga fortaleza militar, do seu estudo e da projecção que tem alcançado nos últimos anos, com a realização de uma série de eventos artísticos e culturais, em colaboração com o IPPAR, a Câmara e outros actores como o Europarque». Na mesma ocasião, o presidente da República chamou a atenção para a defesa do património histórico, enquanto expressão da singularidade do País neste mundo globalizado e alertou para as circunstâncias de se tratar de um património comum de todos os portugueses que pode contribuir para o desenvolvimento económico do país. Palavras justas e merecedoras para uma Comissão que tem mostrado ao longo de um século o amor e desvelo pelo seu rincão natal, reconhecidos a nível nacional e internacional. Depois desta breve resenha do historial do castelo, vamos então recordar a visita do último rei de Portugal à Feira e ao seu Castelo. Depois de ter sido objecto de saudações, cerimónias e grandes recepções por parte das autoridades e população de Espinho que o recebeu com grande júbilo, D. Manuel II, após o almoço na Assembleia de Espinho, oferecido pela Companhia do Vale do Vouga, dirigiu-se para o comboio especial, constituído por três salões e a carruagem real que o aguardava na estação de Espinho, a fi m de iniciar a viagem inaugural até Oliveira de Azeméis, com paragem obrigatória na Vila da Feira. Temos de frisar que todas as estações e apeadeiros se encontravam «belamente ornamentados com profusão de arbustos, bandeiras, escudos, bandolins de papel, arcos triunfais, merecendo referência especial as estações de S. Paio de Oleiros, Paços de Brandão, S. João de Ver e Vila da Feira, onde se levantaram arcos triunfais, onde a multidão era enorme, havendo bandas de música e um estrondear ensurdecedor de foguetes e morteiros», palavras da reportagem do Primeiro de Janeiro, de 24 de Novembro de 1908.

Na Vila da Feira

O comboio parou no apeadeiro do Cavaco, onde D. Manuel e sua comitiva desembarcaram para tomarem os automóveis e carruagens em direcção à Vila da Feira. O apeadeiro estava engalanado com um arco triunfal e junto dele duas meninas, vestidas de branco, lançavam fl ores sobre o rei. Aguardavam--no ali, além do presidente da Câmara, Dr. João Magalhães, várias individualidades, entre as quais, o conde de S. João de Ver, Visconde de Fijô, Visconde de Reboleira, conde Castelo de Paiva, conde de Águeda, governador civil de Aveiro. D. Fernando de Távora, Dr. Eduardo Vaz, Dr. Vitorino de Sá, conselheiro Manuel Bandeira, Henrique Brandão, Dr. Vaz Ferreira, conde de Albergaria de Souto Redondo, Dr. Gaspar Moreira, etc. Pelo caminho, D. Manuel II foi recebido com entusiásticas aclamações, acompanhadas com girândolas de foguetes e bandas de música. A população tinha sido sensibilizada para assistir e participar na recepção ao rei, não só pela edilidade camarária, mas também pelo jornal Correio da Feira, órgão do Partido Regenerador local, que ao acontecimento dedicou duas edições, uma antes da visita real e outra após a inauguração. Na primeira, o seu director, José Soares de Sá, em editorial, escrevia: «Faz hoje precisamente quinze dias que Sua Majestade, deixando Lisboa, empreendeu a viagem ao norte do país, e desde então as manifestações, que hoje à partida recebeu, tem-se sucedido cada vez com mais brilho e calor, quer na rua ou nos teatros, nos quartéis e estabelecimentos de instrução e caridade, nas fábricas, nos hospitais, por toda a parte, enfi m aonde Sua Majestade se encontra no cumprimento da sua missão ofi cial, no louvável empenho de observar as necessidades e adiantamento dos povos. Esta viagem, realizada sob os melhores auspícios e na observância de um dever constitucional, transformou-se, por um conjunto de circunstâncias, de uma importância única, num verdadeiro passeio triunfal, cujo efeito, refl ectindo-se no país e nas instituições, consolida estas e deve trazer àquela o sossego e tranquilidade de que muito necessita o seu desenvolvimento e progresso... ontem foi a Viana do Castelo, hoje Coimbra, e amanhã cabe a vez às Terras de Santa Maria, onde Sua Majestade vem inaugurar o troço da linha férrea do Vale do Vouga, entre Espinho e Oliveira de Azeméis, melhoramento este que todos os povos ambicionavam

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pela facilidade de comunicação com os grandes centros e importância que lhe dá». E mais adiante, com o subtítulo «Bem-vindo seja El-Rei», José Soares de Sá escrevia: «A visita de Sua Majestade a esta Vila, pelo facto da inauguração do caminho-de-ferro do Vale do Vouga, é para nós uma consideração que muito nos enobrece. Abrilhantado com a sua Régia Presença, tal solenidade vem, por um lado, iniciar uma nova era de progresso para o nosso concelho, de que muito necessita, e, por outro lado, radicando mais o sentimento monárquico, estimula-o a fi m de que nós, ainda atemorizados pela infame tragédia que enlutou a Pátria Portuguesa, concorramos para que o actual reinado seja de ordem e paz, indispensáveis factores de felicidade de um povo! Senhor! Tendes sido até hoje alvo das mais sinceras aclamações em todo o vosso percurso pelas terras do Norte e demonstrações de regozijo; o que o nosso povo vos prepara, em nada desmerecerão daquelas a que tendes assistido, menos pomposas, é certo, mas se não superiores ao menos iguais na sinceridade em cujo característico lhe é tão proverbial e até hoje nunca desmentido. Viva S.M.El-Rei! Viva! Viva a Família Real! Viva a Pátria!». A Câmara Municipal da Feira, por sua vez, afi xou dois editais: um para os moradores da Vila e outro para todos os habitantes do concelho, convidando-os «para assistir à inauguração da linha do Vale do Vouga e associarem-se às homenagens ao chefe do Estado, o rei D. Manuel II».

No apeadeiro do Cavaco, D. Manuel tomou então o automóvel descoberto que lhe estava destinado e iniciou o cortejo em direcção ao Paço (uma casa particular preparada para o efeito), seguido de várias carruagens, onde ia instalada a comitiva real. Durante o trajecto, o cortejo desfi lou por debaixo de um arco elegantemente disposto e nos extremos da curva desta, tomaram assento duas meninas, vestidas de branco, que cobriam de fl ores o jovem monarca. No Largo da Misericórdia, de um arco modelado em cortiça, outras duas crianças deixavam cair pétalas de fl ores à passagem do rei. Alguns grupos de crianças das escolas, acompanhados dos respectivos professores, aguardavam no Largo da Misericórdia a chegada do cortejo, acolhendo S. M. «num coro de vivas».

No Paço

Depois que chegou ao Paço Real, D. Manuel recebeu os membros da Câmara Municipal, autoridades judiciais, administrativas e outras personalidades concelhias. Depois dos cumprimentos, o presidente da Câmara da Feira, Dr. João de Magalhães leu o seguinte discurso: «Senhor! Nascida em remotos tempos, mais de 2100 anos A.C., a velha Lancobriga atravessou e acompanhou o esplendor romano, decaiu, rejuvenesceu sobre a égide de esforçados cavaleiros para ocupar, durante largos séculos, lugar proeminente entre as primeiras terras portuguesas. Orgulhosa dos seus vastos domínios que se estendiam do Douro ao Vouga, ciosa das suas tradições e dos seus fastos, anda hoje tão completa de decadência, rememora todo um brilhante passado e se compraz com amargura, é certo, na recordação desses tempos idos. Aqui nasceram, Senhor, os infanções de Portugal, honrosa distinção com que os reis portugueses galardoavam seus vassalos desta região. Tempo houve em que todos os peões eram cavaleiros, demonstração inequívoca da ligação íntima deste povo com os seus monarcas e prova indiscutível dos esforçados feitos dos nossos ascendentes. Ao conde D. Henrique mereceu a terra de Santa Maria a concessão do seu foral em 1092. Mais tarde, em 1270, D. Afonso III lhe deu novo foral. Mas é, Senhor, a um rei português que tinha o vosso nome e obteve na história o cognome de Venturoso, que a terra de Santa Maria mais deve, pelos especiais cuidados que lhe mereceu. Reedifi cou-lhe o vetusto castelo, constituiu-se-lhe essa ponte que ainda hoje ali se ostenta com as suas armas manuelinas e concedeu-lhe foral, precioso de iluminuras que aqui conservam ainda a demonstrar e a recordar-nos sempre quão grato nos deve ser a memória desse rei feliz, em cujo reinado Portugal foi o grande empório do mundo. Hoje, Senhor, somos um povo decaído, que vive apenas do passado. E dessas gloriosas tradições é padrão único do nosso orgulho esse velho castelo que além se ostenta altivo, recortando com os seus elegantes coruchéus, o céu azul da nossa terra. Alimenta-nos, porém, que a presença de Vossa Majestade nos avigore, dignando-se assistir à inauguração de um caminho de ferro que, bafejando estas terras ubérrimas, nos abra novos horizontes no caminho da civilização e do progresso.

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Memorável fi cará na história da Feira a data de hoje, data feliz em que vemos realizadas velhas aspirações e vem coroá-la com a presença do moço rei, que logo no início do seu reinado se digna associar-se ao que para nós representa um ressurgimento e a estrada aberta a novas e gloriosas empresas. Senhor! Subistes ao trono em bem dolorosas circunstâncias, mas na vossa viagem triunfal ao Norte, tendes tido ocasião de pôr à prova a dedicação e a lealdade do povo português. Com carinhosa solicitude temos acompanhado os vossos triunfos e nos temos regozijado com todas essas tão claras demonstrações de aliança íntima que em Portugal existe entre o rei e o povo. Congratulamo-nos, e não podíamos deixar de o manifestar, nós, que muito amamos a liberdade e o progresso com as vossas afi rmações de serdes um verdadeiro rei constitucional. Senhor! Em nome do município da Feira, que tenho a honra de representar, em nome dessa constituição que tão preciso se torna ressurgir em todo o seu esplendor, vimos apresentar a Vossa Majestade as homenagens do nosso respeito e leal dedicação - E se as galas com que vos recebemos não correspondem ao vosso desejo, nem podem traduzir o nosso entusiasmo e a nossa gratidão pela honra da vossa visita, acreditai, Senhor, que no coração de todos nós vai um intenso júbilo e um carinhoso afecto que tudo vos dedicamos. Dignai-vos, Senhor, como esse outro rei de que usais o nome, ser também um protector desta terra, que muito em vós confi a. Senhor! Os mais ardentes votos para que tenhais um reinado feliz para glória do vosso nome e progresso e prosperidade deste querido Portugal! VIVA O REI!» Em resposta, o rei D. Manuel II agradeceu a recepção festiva que lhe acabavam de fazer e que fi cassem com a certeza de que, como os seus reis antepassados, continuaria sempre, durante o seu reinado, a dispensar a sua protecção e a sua gratidão à Feira e ao seu povo. Finda a recepção, foi servido um lanche que constou de fi letes de ananás, sandes, bolos e champanhe, acompanhado com licor do castelo, fabricado por Afonso Couto, que no fi m ofereceu ao rei uma caixa desse licor, tendo-se-lhe também oferecido a tradicional fogaça. Pela duas horas e um quarto saiu o cortejo em direcção à Igreja Matriz.

Na Igreja Matriz

Aqui, ao fundo da escadaria, D. Manuel era aguardado pelo abade, padre Manuel André Boturão, capelão real, párocos do concelho e outros eclesiásticos e professores. Sob o pálio, o rei entrou na igreja onde teve a ocasião de apreciar a rica talha doirada do antigo templo dos Lóios, enquanto o Dr. Aguiar Cardoso executava no órgão o hino nacional. Na sacristia, D. Manuel deixou inscrito o seu nome. Daqui seguiu para uma visita ao Castelo.

No Castelo

No vetusto Castelo da Feira, o rei era aguardado pelo presidente da Câmara, Dr. João Magalhães, pelos doutores Henrique Vaz Ferreira e Eduardo Vaz de Oliveira, conselheiro Bandeira e outras individualidades que lhe prestaram calorosa recepção. À entrada, os meninos Joaquim Vaz de Oliveira e Roberto Vaz de Oliveira, fi lhos do Dr. Eduardo, ofereceram ao rei um delicado ramo de fl ores que este, sensibilizado agradeceu, beijando as duas crianças. D. Manuel II e convidados visitaram todas as dependências do castelo, tecendo o monarca palavras elogiosas para as autoridades municipais pelo seu interesse em recuperar e conservar um monumento que testemunha o glorioso passado das Terras de Santa Maria, prometendo o seu incondicional apoio. Subindo depois ao terraço da torre de menagem, onde tremulava ao vento o pavilhão real com as armas de D. Manuel II, o rei exteriorizou a sua admiração pela deslumbrante paisagem que dali se desfrutava até à linha do oceano que pontifi cava a ocidente. Finda a visita, seguiu o cortejo para a estação da Vila da Feira, onde embarcou novamente com destino a Oliveira de Azeméis, terminus desta viagem inaugural da linha férrea do Vale do Vouga. «E por entre uma ovação geral, troar de foguetes e notas festivas do hino nacional, pôs-se o comboio em marcha, desaparecendo na curva da trincheira do Farinheiro, eram aproximadamente três horas».

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36 A Rua do Crasto

H. Veiga de Macedo*

De plátanos enormes bordejada,A Rua que de frente fita o mar, Num verde e permanente murmurar, Já não dispensa a minha caminhada.

Ainda cedo, em cada madrugada, Eu a oiço, amorosa, a despertar,E sinto no meu peito o seu pulsar, Sentindo que me espera, alvoroçada.

Quando chego ao encontro desejado, A Rua, bem direita em seu traçado, Já toda é das gentes canseirosas.

Há nela coisas belas, luminosas:- O Sol, a cor, a voz da passarada, Sorrindo à minha alma enamorada,

Foz do Douro, 30 de Outubro de 1990.H. Veiga de Macedo

Ao Miguel e à Ana Maria, meus netos e alegres companheiros

nas matutinas andanças pelas ruas da Foz.

* Poeta. Foi Ministro de Portugal.Faleceu em 25-01-2005

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37 Saudação ao Senhor Presidente da República, General Ramalho Eanes, no Castelo da Feira

30 de Novembro de 1983

P.e Albano de Paiva Alferes*

Ex.mo. Senhor Presidente da República Senhor representante do Governador Civil de Aveiro, protector deste Castelo, Senhor Presidente da Câmara, minhas Senhoras, meus Senhores.

Pesa sobre mim, na qualidade de Presidente da Comissão de Vigilância do Castelo da Feira, apresentar ao senhor Presidente da República o nosso melhor saudar, de mistura com votos de boas-vindas. E assim eu saúdo na Pessoa de Vossa Excelência o Presidente da República de espírito esclarecido e coração limpo. O senhor Presidente encontra-se, nestas horas meridianas para a Vila de Feira, dentro dum dos mais belos Castelos Portugueses; verdadeiro ex-líbris das Terras de Santa Maria da Feira. E, apesar de silencioso e triste, está perfeitamente integrado nesta deslumbrante paisagem feirense sendo

mesmo o seu melhor componente. Disse Alguém que: “o Castelo deve ser a Acrópole Sagrada, o lugar eleito das peregrinações patrióticas”... E é, pois, como peregrino da História e da arte militar que o senhor Presidente acaba de transpor os limiares deste Castelo, glorioso padrão evocativo de belas páginas da História Pátria e que a Comissão de Vigilância, desde 1909, tem envidado todos os esforços para o restaurar, conservar e guardar como valioso espécime de arte medieval, carregado de válidas recordações históricas, que urge transmitir às gerações que surgem, mas sem as distorcer, sem as apoucar ou diminuir, lutando, sem tréguas, contra uma nefanda doença desta conturbada época em que vivemos – o neo-vandalismo – que aparece apostado em destruir, mais que as intempéries do tempo, estes gloriosos monumentos que foram sentinelas avançadas e vigilantes desta Terra bendita que constitui a nossa Pátria e, desta forma, fi camos a chorar a perda de ricos exemplares que a ignorância duns e a imbecilidade e espírito de destruição doutros fi zeram desaparecer para sempre. Admiráveis exemplares de arquitectura militar, os nossos Castelos são também testemunhos permanentes e vivos da fundação e consolidação da Nacionalidade Portuguesa, em cujos movimentos o Castelo da Feira tomou, sempre, um lugar de vanguarda, participando nos grandes sucessos da nossa História, alvoraçando-se, alegremente, com as suas horas de triunfo e penando nos seus momentos de infortúnio, sem

*Historiador. Faleceu em 1 de Fevereiro de 1994

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nunca deixar de enaltecer a raça portuguesa com os seus rasgos de bravura e heroísmo. Granito nu e denegrido pelo bafo dos séculos... Pedras velhinhas queimadas e douradas pelo sol que parecem querer falar para vos ler páginas gloriosas da nossa História ou, então, contar-nos perfumadas e belas lendas de sabor mourisco... Testemunho de épocas e escolas várias, não podia deixar o nosso Castelo de refl ectir diversas correntes arquitectónicas.A sua solidez e dignidade exteriores esmagam-nos, enquanto o seu interior, este salão onde nos encontramos, encimado por uma cúpula de manifesta infl uência gótica, seduz pela sua magnifi cência e elegantes proporções de linhas artísticas que, aliadas a certos pormenores romanos, deveras predominantes, nos levam a afi rmar que estamos em presença dum Castelo romano-gótico. Tem sido tarefa árdua e difícil encontrar a certidão de nascimento deste Castelo e, subsequentemente, a sua fi liação... Será oriundo dum velho Castro com que os romanos fortifi cavam as suas estradas ou de outra fortifi cação anterior? É possível... É, porém, certa a estadia dos Romanos neste Castelo, como estão a atestá-lo não só os pormenores arquitectónicos, mas também “aras”, peças de cerâmica e moedas romanas, aqui encontradas. Com a expulsão dos Romanos da Península Ibérica, é de presumir que os Visigodos tenham ocupado e reparado este Castelo, o que se depreende pelas seteiras cruciformes e por outras particularidades de construção. É, no entanto, fruto da arabização a construção daquele Castelo amouriscado, parte do qual foi posto a descoberto com as obras aqui realizadas em 1938, e que, reinando, em Leão, Bermudo III, tio-bisavô de D. Afonso Henriques, foi conquistado aos Mouros por Mem Guterres e Mem Lucílio, condes locais, que, sequiosos de presúrias, se entregavam denodadamente às lutas da Reconquista. Reconstruíram o Castelo e a povoação envolvente, a que deram o nome de “Terra de Santa Maria”, cuja história começou a andar ligada à do Castelo, chegando mesmo a fundir-se uma com a outra, principalmente no século X e nos primórdios da nossa nacionalidade. Crê-se que teria sido no “Castelo de Santa Maria da Feira” onde começou a urdir-se a conjura de bravos e ilustres portugueses, ciosos da liberdade e Independência da sua

Terra, contra o domínio nefasto de Dona Tareja, patrocinando assim a causa de seu fi lho, D. Afonso Henriques. Segundo Herculano, entra agora em cena um dos três ilustres Monizes – o Hermígio – que, sendo senhor da “Terra de Santa Maria da Feira”, teria sido o verdadeiro chefe da insurreição que contribuiu para a vitória de São Mamede, em 1128, que pôs termo à desavença entre mãe e fi lho. E assim o historiador local, Doutor Vaz Ferreira, fi rmado no citado testemunho de Herculano e em descobertas feitas aqui no Castelo, em 1938, apresentando uma tese erudita mas infeliz, proclamava, “alto e bom som”, em 1939, encostado a uma ameia mourisca que acabava de encontrar: “AQUI NASCEU PORTUGAL”. Com a emancipação, o Castelo da Feira entra nos caminhos válidos da História. Em 1448, D. Afonso V cede-o a D.Fernão Pereira, pai do 1º Conde da Feira, D. Rui. Na posse dos Pereiras, o Castelo da Feira sofreu grandiosa reconstrução praticamente como hoje se encontra, com adaptação a armas de fogo, o que o tornou um dos castelos mais característicos dessa modalidade. Este período áureo veio, porém a terminar com a morte do 8º e último Conde da Feira, sem descendência, em 1700. O Castelo passa, então, para a Casa do Infantado e, ao mesmo tempo, entra nos caminhos da ruína e perdição da História, por onde andou perdido e esquecido, cerca de duzentos anos, até que, em 1909, o verdadeiro espírito feirense despertou do letargo a que se tinha abandonado e lançou-se à procura do seu Castelo e foi encontrá-lo coberto de chagas e tombado na rota do esquecimento e desamparo da História, onde tinha tropeçado e caído. Condoídos do seu estado, os feirenses organizados em Comissão, levantam-no da queda, pensam-lhe as feridas, até que, na década de 30, a Direcção dos Monumentos Nacionais renova-o “dos pés à cabeça” e, desta forma, o nosso Castelo, “são e salvo” e teimando viver o nosso tempo, reentra nos trilhos gloriosos da História. Durante este século três Chefes de Estado visitaram este Castelo. Em 1908, o Rei D. Manuel II, a inaugurar o Caminho-de-ferro do Vale do Vouga; em 1970, o Presidente da República, Almirante Américo Tomaz, a assistir à inauguração de várias obras concelhias; e hoje, Vossa Excelência, deu-nos a subida honra de vir até nós, a comungar connosco nos sentimentos

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belos de homenagem ao insigne Poeta Fernando Pessoa. O nosso melhor agradecer. A terminar, não fi caria completa esta mal alinhavada resenha se não me reportasse à Capela do Castelo: uma verdadeira jóia arquitectónica, em granito da região e no estilo maneirista obra seiscentista, hexagonal, que se encontra à ilharga deste Castelo a perpetuar a devoção da sua fundadora, a Condessa da Feira, Dona Joana Pereira, a Nossa Senhora da Encarnação. E assim quando, cá em cima, no Castelo, ecoava o fragor das armas, lá em baixo, na Capela, ciciava o murmúrio da

prece, modalidade da vida da Lusa-Grei. Nesta despretensiosa exposição, esforcei-me por seguir o conhecido adágio latino: “Esto brevis et placebis”. (Sê breve e agradarás). Eu de facto consegui ser breve... mas não agradei, do que peço perdão.

Bem-haja, Senhor Presidente. Bem-haja. Muito Obrigado.

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40 Só

Para

Mim

Maria Fernanda Calheiros Lobo*

Fecho os olhosabro a vidaescrevopara a encontrarensinaste-metudoouquase,nunca deixei de amar.Encostei-meà saudade,como me encostava a ti…vivo(na meia verdade)como se um diana tarde,ainda fosses voltar

*Universidade Sénior - Douro.

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41 LANÇAMENTO DO LIVRO

Serafi m Guimarães, Castelo de Santa Maria da Feira, Comissão de Vigilância do Castelo de Santa Maria da Feira, 2008.

Francisco Ribeiro da Silva*

Castelo de Santa Maria da Feira, 29 de Novembro de 2008

Ex.mo Senhor Prof. Cardoso da Costa, Presidente da Assembleia Municipal de Santa Maria da Feira Ex.mo Senhor Engº Ludgero Marques, Presidente da Comissão de Vigilância do Castelo de Santa Maria da Feira Ex.mo Senhor Prof. Serafi m Guimarães, autor do livro que aqui nos congrega Ex.mo Senhor Dr. Amadeu Albergaria, Vereador da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira Ex.mo Senhor Dr. Celestino Portela, Presidente da Assembleia Geral da Comissão de Vigilância do Castelo de Santa Maria da Feira Ex.mo Senhor Dr. Francisco Azevedo Brandão, ilustre conferencista desta sessão Senhora Dr.ª Fátima Guimarães e demais familiares do Senhor Prof. Serafi m Guimarães

Minhas Senhoras e meus Senhores

1 – Colaborar no lançamento de um Livro novo é sempre uma tarefa agradável, porque é participar num evento festivo de um amigo ou de alguém que nos preza. Para este tipo de incumbências, tal como para uma festa de família, convidam-se os amigos ou, pelo menos, as pessoas que estimámos e prezamos. Mas a tarefa é agradável não apenas porque o autor é um amigo. É agradável também quando se trata de um evento feliz para a comunidade. Pelos motivos que mais abaixo exporei, Santa Maria da Feira e os concelhos vizinhos têm razões para se sentirem um pouco mais enriquecidos. Não é verdade que, quando se inaugura um melhoramento numa terra, toda a gente sente que esse melhoramento lhe diz respeito directamente e lhe traz algo de positivo? Pois bem, a feitura de um Livro, ao mesmo tempo tão belo, tão útil, tão bem escrito e tão acessível sobre o Castelo de Santa Maria da Feira, como é o caso, contribui para que o próprio Castelo, aos olhos de quem lê o livro, se torne ele próprio ainda mais belo, compreensível e menos misterioso. Por isso, antes de mais devo agradecer a honra do convite e o ensejo de participar activamente neste evento festivo e feliz. As minhas saudações, pois, para o Prof. Serafi m Guimarães e para a sua mulher, Dr.ª Fátima Guimarães, cuja cumplicidade nestas tarefas se torna evidente a quem conhece o casal.

*Professor Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

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2- Um novo livro pode ser olhado de diferentes perspectivas, sugeridas pelo frontispício ou pela sua fi cha técnica: aí menciona-se o Autor, o título do livro, a retaguarda de apoio que é o editor e, evidentemente, embora de modo mais subentendido, o leitor, aquilo que se chama, por vezes, o público-alvo. Sobre cada um destes itens, direi uma palavra breve.

2-1 – O Autor

O Autor, antes de mais, é um dos nossos, porque é fi lho da nossa terra. Não nasceu aqui no Castelo, mas a freguesia de Espargo até nem fi ca muito longe. E tal como aconteceu com outros, logo após o exame da 4ª classe, na sede do Concelho, que era a altura de tomar rumo na vida, os seus horizontes alargaram-se para além da fronteira da sua aldeia, e mesmo para além do vasto horizonte que se enxerga do eirado da alcáçova do Castelo. A vida catapultou-o para outros longínquos universos, o da docência universitária que cultivou durante 44 anos e o da pesquisa científi ca a que se devotou, tornando-o conhecido à escala do mundo. A propósito e para comprovar a justa medida das minhas palavras, apraz-me deixar aqui registado que, dos seus mais de 330 trabalhos publicados, 236 foram-no em revistas internacionais. Ou seja, tornando-se num produtivo homem de ciência, o Prof. Serafi m Guimarães, como disse não há muito tempo um seu discípulo, o Prof. Daniel Moura, «é um dos poucos cientistas portugueses cuja obra se tornou um Science Citation Classic». Nenhum farmacologista experimental de qualquer país do mundo, desconhece as experiências conclusivas que Serafi m Guimarães e a sua equipa levaram a cabo na área da farmacologia, porque elas vêm referidas com destaque numa obra de um autor americano, Terry Kenakin, que se tornou numa espécie de Bíblia dos farmacologistas. E só um cientista de eleição consegue por 3 vezes o prémio Pfi zer (um 1º lugar e 2 segundos) e um 1º prémio da «Union Chimique Belge». Mas o que importa aqui enfatizar são duas curiosidades: a primeira é que, não obstante a sua internacionalização, jamais esqueceu ou menosprezou as suas raízes e sempre cultivou, exaltou e difundiu a memória da terra. Aliás, fez questão em receber na sua casa de Espargo alguns renomados cientistas estrangeiros, entre os quais Robert Furchgott, que poucas semanas depois seria o prémio Nobel da Medicina de 1998.

É, de resto, essa dedicação inteligente à terra que nos congrega aqui hoje. A obra que apresentamos brotou seguramente do amor de Serafi m Guimarães a esta comunidade. Bem vistas as coisas todo o amor verdadeiro é criativo e inventivo. Se o não for, não passa de uma quimera quixotesca, oca e estéril. Não basta proclamarmos aos quatro ventos que gostamos muito das nossas origens e da nossa terra se nada fi zermos por ela. A segunda curiosidade nasce da seguinte interrogação: como é que um homem que faz da ciência e do rigor científi co um objectivo de vida, cultiva simultaneamente o gosto pela arte, pela poesia, pela literatura, pela música, pela cultura, pela história que são matérias que embora muito belas, são muito mais porosas? É que não se trata aqui de um mero diletantismo ou de um desejo romântico. O Prof. Serafi m Guimarães tem praticado e produzido obra nestes diversos campos. São, de facto, bem conhecidas de todos a sua competência para a música, a ligação ao Zeca Afonso e ao Orfeão Universitário do Porto, o prazer que extrai do dedilhar de uma guitarra, a predilecção pelo fado e pela balada de Coimbra, a aptidão para cantar que outrora levou o dono de um restaurante da Ribeira do Porto a querer contratá-lo como fadista, com a promessa de lhe pagar o dobro do que ele ganhava como Professor de Medicina. E o jeito para a pintura? Posso testemunhá-lo porque já tive o prazer de contemplar e apreciar na sua casa do Porto a sua capacidade para captar e transmitir para a tela estados de alma dos seus retratados. E quem não teve oportunidade de usufruir da sua propensão para a escrita de crónicas saborosas, para a narração viva de histórias, para a reconstituição de memórias da infância e da juventude? Basta ler as páginas da Revista Villa da Feira - Terra de Santa Maria que heroicamente o Snr. Dr. Celestino Portela vem mantendo, prestando um serviço de alcance incalculável que a geração presente e sobretudo as do futuro não podem deixar de valorizar. Um homem de ciência, como é o caso do nosso Autor, só pode compatibilizar todas essas facetas se for um humanista, não apenas no sentido clássico de cultor das «humaniores litterae» mas sobretudo se for aberto ao sentido da Humanidade, se estiver convencido da dignidade da pessoa humana, pessoa que é corpo mas também é espírito. E Serafi m Guimarães é-o seguramente nos dois sentidos. Creio mesmo que foi o sentido da Humanidade que o levou

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à licenciatura em medicina e depois aos laboratórios das ciências biológicas. Talvez essa seja a razão profunda por que é relativamente frequente encontrar médicos que juntaram primorosamente o exercício da clínica ao cultivo das artes e das letras.

2.2 – O livro intitula-se Castelo de Santa Maria da Feira

Não me debruçarei sobre o conteúdo específi co do livro, não só porque o Autor nos irá elucidar sobre o assunto, mas apontarei razões de carácter geral que me levam a recomendar a sua leitura e o seu estudo.

1º - Trata-se de uma obra sobre um exemplar do Património construído e reconstruído ao longo de séculos pelas mãos possantes dos nossos antepassados, mas não é só património tangível. O Castelo é também Património mental, cultural e alimento permanente do nosso imaginário colectivo. O Castelo da Feira é a unidade mais imponente dos monumentos edifi cados no Concelho de Santa Maria da Feira. Mas também a mais densa, a mais misteriosa, a mais emblemática. À volta dele se foi entretecendo uma história secular de tradições e lendas que povoaram o imaginário e o simbólico de gerações e gerações de feirenses e não só, ao longo dos tempos. Sublinhar essa dupla dimensão do Castelo parece-me ter sido uma preocupação benemérita do Autor que, a meu ver, não está apenas nas entrelinhas mas também nas linhas.

2º - Nesse sentido, é um livro pedagógico, muito actual e até voltado para o futuro. Não só informa e ensina à geração presente tudo quanto os Feirenses devem saber sobre o seu Castelo, nos aspectos histórico, cultural e de psicologia colectiva, mas informa, recorrendo a tudo quanto se escreveu ou investigou nos últimos tempos. Ou seja, partindo de m saber sedimentado e valorizando os trabalhos de pesquisa levados a cabo por juristas, historiadores, arquitectos e arqueólogos do nosso tempo, a síntese que nos é proposta aqui acrescenta algo de novo às sínteses anteriores. Julgo que até se deu ao trabalho de recolher informações junto dos arqueólogos da última fase, antes mesmo de essas informações terem sido publicadas em letra de forma. Aliás, já foram divulgadas em vídeo e em sessão pública promovida pela Comissão de

Vigilância. Mas espera-se pela sua publicação em livro, o que vai acontecer oportunamente.

3º - É um livro muito prático, na medida em que todo o texto é apoiado por fotografi as que elucidam cabalmente o leitor sobre as estruturas físicas do Castelo, a sua evolução secular e até sobre as pessoas que nele habitaram. Diria que o texto, conjugado com a qualidade e a quantidade das imagens, pode oferecer a quem nunca viu o Castelo uma ideia muito próxima daquilo que ele é. E a quem o viu e conhece, proporciona uma excelente revisão da matéria.

4º - Se o Castelo é um ícone que reúne e congrega os Feirenses, nascidos ou moradores no Concelho de Santa Maria da Feira, este livro pode constituir um factor de divulgação e de exponenciação do espírito feirense no mundo que se caracteriza, a meu ver, pelo apego intrínseco à terra, mas também por uma vocação fatal de diáspora. A estrutura física do Castelo signifi ca isso mesmo: alcáçova de paredes grossas e protectoras mas encimada por um eirado amplo, muito elevado, de onde se avistam horizontes marítimos a perder de vista, de atracção porventura irresistível.

5º - Há outro dado que o Autor sublinha que, reportado ao simbólico e às representações mentais, se deve ter em conta: o Castelo não é apenas Património do Concelho de Santa Maria da Feira. Em rigor, ele signifi cou durante séculos a força centrípeta que irradiava, às vezes opressivamente, para todo o Condado da Feira, território esse que abarcava, para além do nosso, parte dos Concelhos de Gaia, de Arouca, de Oliveira de Azeméis e ainda os Concelhos de Ovar, Espinho, S. João da Madeira, Vale de Cambra. Mas não só. O Castelo irradiou também para o conjunto da Terra de Santa Maria que é mais extensa que o Condado. E se atendermos ao papel desempenhado nas circunstâncias e na conjuntura da fundação de Portugal e na sua continuação como reino independente, então o Castelo da Feira adquire importância e valor acrescidos, sendo monumento nacional não apenas porque assim foi classifi cado pelas entidades ofi ciais em 1910, mas porque os senhores que por ele passaram e ele próprio desempenharam papel relevante na História nacional.

6º - Como Historiador gostava de chamar a atenção para o facto de este livro constituir desde já não só uma narração

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histórica mas também uma fonte histórica. Efectivamente ninguém duvida de que as imagens em geral e as fotografi as antigas em especial são documentos históricos de grande valia. A abundância e a qualidade das que conseguiu reunir neste volume acrescenta-lhe uma mais valia que com o tempo se valorizará mais e mais.

7º - Gostaria de sublinhar o interesse e a novidade de um capítulo que nasce das tendências fi loculturais do Autor e do seu gosto pela Arte. É o capítulo sobre o Castelo e os Artistas, com relevância para os trabalhos de António Joaquim e de Júlio Resende e os excertos de alguns testemunhos literários do passado felizmente longínquo, muito curiosos e incisivos, constituindo alguns deles verdadeiro toque a rebate contra a degradação do monumento e em prol da sua recuperação. Que efectivamente se conseguiu.

2.3 – O Editor

O Editor é a Comissão de Vigilância do Castelo, comissão essa que adquiriu essa designação em 1982 mas que é herdeira e continuadora de uma «Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Feira», criada em 29 de Outubro de 1909, após a visita de D. Manuel II. Até 1995 foram objectivos da Comissão não só a prossecução das obras de restauro do monumento mas também a promoção da investigação, a publicação e a difusão de estudos históricos e de história de arte sobre o Castelo, sua importância estratégica na história militar e política de Portugal, e sobre a própria Terra de Santa Maria. A partir de 1995 foi empossada nova Direcção, tendo sido imprimido um renovado dinamismo às potencialidades congregadoras e de atracção que o Castelo potencia, através da defi nição clara de novos objectivos, da celebração de protocolos e da busca de fi nanciamento nos Programas Europeus. De entre o seu programa de acção, já na presidência do Snr. Engº Ludgero Marques, destaca-se a criação, em 2005, do Centro de Documentação da Terra de Santa Maria, um projecto de futuro e de largo alcance e a promoção e publicação de novos estudos sobre o Castelo da Feira e a Terra de Santa Maria. As edições de qualidade têm-se seguido e esta que hoje lançamos insere-se nesse programa. Na minha opinião, a publicação desta obra é um excelente serviço prestado

pela Comissão de Vigilância à causa da conservação e de promoção turística do Castelo visto que se trata de uma obra de divulgação que fazia falta. A partir de agora, com o livro na mão não só qualquer um pode ser guia de si próprio na visita ao Monumento, como colherá nele a informação necessária e sufi ciente para coordenar uma visita de grupo, se para tal houver necessidade. Ao dizer isto, penso sobretudo nos professores que, se aproveitarem o conteúdo do livro, não experimentarão qualquer difi culdade em preparar e proporcionar aos seus alunos excelentes aulas práticas de história. E penso igualmente nos visitantes ocasionais, mesmo estrangeiros, que passam a dispor de um instrumento elucidativo para tirarem o máximo partido de uma eventual visita. Mesmo que não dominem o português, os resumos em língua inglesa e a beleza das fotografi as suprirão essa difi culdade. Por isso, para terminar, felicito em primeiro lugar o Autor pelo êxito do trabalho mas também a Comissão de Vigilância do Castelo que, em boa hora, decidiu iniciar as comemorações do Centenário por esta excelente e bela publicação.

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45 Castelo de Santa Maria da Feira, 29 de Novembro de 2008

Serafi m Guimarães*

Os meus primeiros cumprimentos vão para os ilustres companheiros de mesa e são de uma afectuosa admiração.Desejo saudar, também, com emoção sincera, todos os presentes e agradecer-lhes esta manifestação de interesse e simpatia.

Ao estimado Amigo, Prof. Francisco Ribeiro da Silva, queria agradecer muito a parte substantiva da sua magnífi ca comunicação, própria do ilustre académico que é. Quanto a muitos dos adjectivos, atribuo-os à estima e simpatia que o coração lhe ditou.

Apesar de ter consciência de que ninguém é profeta na sua terra, devo dizer que me sinto confortável neste ambiente caseiro.

Quero dizer, depois, que não tenho experiência directa destas fainas, mas sinto um certo desconforto por ter de falar sobre uma coisa minha!

Se digo bem, o elogio em boca própria é vitupério. Se digo mal, poder-me-á ser perguntado: por que é que o escreveu! É um dilema real que não me deixa à vontade. Contudo, eu estou aqui para isso e já que é assim, quero confessar que o que fi z foi feito com gosto e que gosto do que fi z.

Gosto dele como livro que se vê e que se folheia, isto é, pelo seu todo estético;

Gosto dele como publicação ilustrada que contém informação útil para quem desejar conhecer um dos mais notáveis monumentos portugueses;

Gosto dele como arquivo de dados que se guarda numa biblioteca para consulta ou para avivar recordações.

E digo que gosto sem constrangimentos, porque pouco deste livro é meu. Meu no sentido de ser criação minha, fruto da minha inspiração, da minha pesquisa, do meu esforço intelectual. Para o elaborar, quase que só gastei horas!

É que, excluindo o prefácio e o posfácio eu fui, apenas um escultor que cinzelou a forma, um arrumador de assuntos que, aqui ou ali, deu umas pinceladas para enfeitar o ramalhete.

A consideração minuciosa dos dados objectivos de toda a

* Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

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informação histórica, o esforço interpretativo necessário para uma ligação séria dos factos, a pesada e sempre discutível tarefa de concluir, foram violências a que me subtraí, recorrendo ao trabalho já feito por autores que me ultrapassam no conhecimento documentado e autenticado das matérias aqui envolvidas.

Como digo na Introdução, este livro não consubstancia um estudo, não corresponde a uma dissertação, não procura fundamentar uma teoria nem alimentar uma polémica. Tem como objectivo exclusivo divulgar, com o rigor possível, o passado honrado e que nos honra de um velho castelo português e dar dele uma visão fundamentada daquilo que ele foi representando ao longo dos séculos e daquilo que queremos que ele represente no presente.

Em suma, chamar a atenção para as variadas funções que desempenhou ao longo dos séculos: múltiplas, controversas, muitas vezes seguramente heróicas e decisivas.

Sublinhar a importância do papel único que representou na história e assim recordar o contributo para a nossa identidade como povo. E aqui, não temos que estabelecer comparações nem de pedir desculpa. Os nossos antepassados já tiveram de acertar esas contas.

Lembrar que muito do seu sustento identitário continua mergulhado na sua periferia próxima e é preciso que a arqueologia o desenterre para podermos decifrar, até onde for possível, a intimidade dos seus mistérios e, assim, levar o mais longe possível o grato consolo de encontrar realidades onde tivemos origem e que contribuiram para sermos aquilo que somos.

Dar, ainda, conta das dedicações que, ao longo dos últimos cem anos contribuíram para aquilo que ele é, como hoje o vemos. É, assim, também, uma homenagem muito singela, mas muito profundamente sentida a quantos, nomeados ou anónimos, deram além do seu esforço e do seu dinheiro, a saudável raiva dos seus protestos justos.

E, por fi m, exaltar o alto valor do seu potencial turístico, social, cultural e, por isso, económico!

Dando uma imagem próxima, tanto quanto possível real, sempre entusiasta mas sem paixões, e bem estribada em literatura científi ca sólida;

Creio que ninguém pode ter dúvidas quanto à credibilidade das fontes e à imparcialidade dos intérpretes.

O Castelo de Santa Maria da Feira tem muito que se lhe diga.

Não se esgota em publicações, num livro e, muito menos, neste livro!

De resto ele é, claramente limitado no volume, – 156 páginas e pouco mais do que trinta de texto;

Circunscrito no âmbito – não se especula, não se compara, não se reivindica;

Balizado por limites históricos defi nidos, informa sobre uma parcela relativamente pequena, embora importante, do passado português e dá notícia da centralidade geográfi ca, do relevo económico e da importância política de uma região que foi grande no passado e que tem hoje razões de sobra par ter fé no futuro.

Quanto à estrutura

O livro está dividido em vários capítulos:

No primeiro, procura-se dar de forma corrida, solta, facilmente legível, um apontamento dos momentos mais representativos do seu percurso histórico: pessoas, factos, situações que passaram por ele;

Num segundo capítulo, anotam-se os passos da sua evolução arquitectónica. Embora os aspectos fundamentais dessa evolução estejam solidamente estabelecidos, há pequenas franjas lacunares que, se lhe retiram certezas, lhe dão o encanto de abrir portas à imaginação e à fantasia; é a beleza que entra quando as certezas abrem brechas para deixar entrar a dúvida, quando a história dá lugar à lenda, quando o realismo dá lugar ao romantismo.

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Num terceiro capítulo, dá-se a palavra a quem tem os melhores olhos para o ver e interpretar: dá-se a palavra aos artistas. Com o verbo ou com a tinta aí deixam os seus depoimentos expressos em palavras ou em cores. E a dimensão da beleza não tem limites;

No quarto capítulo, sugere-se o percurso para uma visita e faz-se uma apresentação próxima de cada um dos elementos que o compõem, procurando ser simples e didáctico.

Devo dizer que é com uma emoção, quase infantil, que percorro, ainda hoje, os seus adarves, que penetro nas suas galerias, que subo às suas torres, como o fi z em 1940, de bandeira de papel na mão, sob o olhar atento e carinhoso do prof. José Valente de Pinho Leão.

Finalmente, um registo breve da iniciativa original de que resultou a criação da Comissão de Vigilância, de cujo

centenário iniciamos, hoje, a comemoração. Nada mais bonito e signifi cativo do que integrar o presente na história, através desta celebração que aqui nos reúne, hoje, felizes, orgulhosos e gratos.

O livro termina com a ronda pelos mais marcantes momentos da sua história.

O livro contém, ainda, um resumo em inglês de cada um dos capítulos mais signifi cativos.

Termino manifestando a minha gratidão à Comissão de Vigilância do Castelo, na pessoa do seu Presidente, o Engenheiro Ludgero Marques, pelo convite que me dirigiu e que eu muito gostosamente aceitei, e a todos os que me ajudaram na tarefa da sua elaboração e que eu, por escrito, menciono na primeira página do livro.

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48escrevo na pedra

Conceição Paulino*

com os dedosem garraescrevomeu nome na pedra.

iludidos os sentidosde queassim,encontrarão a realidade deste eu.

de mim.

*Natural de Beja. Escritora. Publicou As Tarefas Transparentes (1993)

-O Luar da Espera (1994) - Falar Mulher (1997) - Salvador o Homem e

Textos Inconsequentes (2007) - O meu País é um sonho sonhado (2009).

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49 Introdução ao Estudo do Povoamento Medieval da Terra de Santa Maria: Actualização Bibliográfi ca **

J. A. Gonçalves Guimarães *

Após a derrocada do reino visigótico em 711 e daquilo que ele conservava da divisão administrativa romana, vários factores irão determinar que os espaços geográfi cos e administrativos da Península se dividam em reinos, províncias, territórios e terras. Para tal contribuíram, para além dos factores de ordem epocal, as fronteiras naturais desses espaços, a sobrevivência dos antigos limites das dioceses visigóticas, das paróquias rurais e as extremas das villae, a organização administrativa muçulmana, que em pouca conta tinha estas antigas divisões, a importância urbana de algumas povoações, o ritmo das presúrias e reconquistas, os fl uxos e refl uxos do povoamento, não necessariamente com esta hierarquização difícil de sistematizar na complexa teia administrativa do mundo mediévico. Até ao séc. XIII, com a proliferação de sub-divisões na sociedade e com a funcionalização da nobreza ao serviço do rei, a repartição administrativa passa ainda por coutos, honras, reguengos, julgados, etc. Para estabelecer o equilíbrio jurisdicional entre os

senhorios laicos, ou religiosos, e a governação real, esta mais presente nos concelhos e nas terras reguengas, são lançadas várias inquirições que, para além do seu importante papel fi scalizador, quantas vezes de acatamento pouco pacífi co pelas classes privilegiadas, terão também um importante papel defi nidor das divisões administrativas. Aparece então a freguesia, e o concelho como cabeça dos julgados criados nas antigas terras ou territórios. A esta transformação, e após aquela data, não é alheia uma nova nobreza que, embora procure títulos e cargos ligados à posse da terra, a origem do seu poder e infl uência social não se esgota neles, até porque minguados em extensão e rendimentos. Por seu lado os concelhos, como cabeças dos julgados, vão ter necessidades de defender as suas liberdades municipais consignadas nas cartas de foral e noutros documentos régios, acolhendo-se à sombra protectora do rei contra diversos senhores locais, eclesiásticos ou laicos. De entre as terras que surgem na documentação dos séculos X a XII, interessa-nos agora estudar particularmente a chamada Terra de Santa Maria, cuja mais antiga referência documentada parece ser uma doação da villa de Azeuedo (Azevedo, S. Vicente de Pereira, Ovar) ao Mosteiro de Lorvão, do ano 978 (PMH-DC 125), a qual tinha como cabeça o castelo perto da civitas sancta maria, este pela primeira vez referenciado na doação ao Mosteiro de S. João de Ver da villa valerii (S. João de Ver, Santa Maria da Feira), datado do ano

*Professor Auxiliar do Instituto de Educação da Universidade do Minho**Primeiras Jornadas de Estudo sobre a Terra de Santa Maria. Organização da Câmara Municipal. Secretariado da Biblioteca Municipal. Apoio da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. 7/9 – Abril – 1988.* *Do Gabinete de História, Arqueologia e Património; director do Solar Condes de Resende.

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anterior (977; PMH-DC 120), e mais tarde chamada Feira na carta de doação do couto de Osseloa por D. Teresa em 1117 (Assilhó-Albergaria-a-Velha), in Terra Sancte Maria ubi uocante Feira, (DMP-DR 49)(1). Os limites desta terra são conhecidos, mas nem sempre fáceis de determinar com precisão, aspecto aliás comum a muitas das divisões administrativas medievais. Só é possível um certo rigor de limites para determinada época, quando os mesmos estão bem expressos num documento que não tenha sido feito para justifi car precisamente a controvérsia desses limites. Infelizmente na maior parte dos casos os documentos ou são vagos ou estão no caso acima referido. A questão agrava-se pelo facto de muitos dos que chegaram até nós serem cópias dos originais, feitas muitos anos após a data que referem e nos quais o copista procurou precisar as referências administrativas, actualizando o texto inicial. Assim sendo, e prometendo estar atentos às diversas variações epocais, podemos considerar que os limites da Terra de Santa Maria chegavam a Norte, ao Rio Douro; a Sul, ao Rio Vouga e aos braços da depois chamada Ria de Aveiro. A Leste, ao Rio Arda, afl uente do Douro, e ao Rio Caima, afl uente do Vouga. As bacias destes dois rios, o primeiro correndo para Norte e o segundo para Sul, são separadas pelo Monte Codal, localizado no actual concelho de Vale de Cambra. A Oeste o limite era o mar. Podemos afi rmar que, no século XI, a tutela da ciuitas Santa Maria se estendia entre o Douro e o Vouga, conforme atesta o Doc. 385 dos PMH-DC, uma doação ao mosteiro de Vacariça datada de 1053 onde se afi rma: et habente ipsas uillas iacentiam inter dorium et vauga subtus ciuitas sancta maria território portugal… Englobava pois o território dos actuais concelhos de Vila Nova de Gaia, Espinho, Santa Maria da Feira, a freguesia de Fermedo (do actual concelho de Arouca), Ovar, S. João da Madeira, Oliveira de Azeméis, Murtosa, Estarreja e Albergaria-a-Velha. Fig. 1

A Terra de Santa Maria nos séculos XII-XIII estava rodeada pelas seguintes: a Norte, na margem direita do Douro, a terra de Amaia onde se situava o couto de S. João da Foz, pertença do Mosteiro de Santo Tirso por doação de D. Mafalda, (fi lha de D. Sancho) desde 1211; a Terra de Bouças, que se estendia até Miragaia; o couto do Mosteiro de Cedofeira, o couto da villa do bispo portucalense; o couto do Mosteiro de Campanhã pertença também do mesmo bispo; o couto do Mosteiro de Rio Tinto e a parte setentrional do couto do Mosteiro de Crestuma; já no território Aquilar (Aguiar), a Terra de Melres, também em ambos os lados do rio, que sucede no século XIII à Terra de Anégia. Na margem esquerda do Douro, a Leste pegava com a terra de Paiva e o território Arauca, o castro Portella,

(1) Citamos documentos dos Portugaliae Monumenta Historica – Diplomata et Chartae. Lisboa, 1867-1873 (PMH-DC, ou só DC); Documentos Medievais Portugueses. Documentos Régios, ed. de Rui de Azevedo, vol. I, tomos I e II. Lisboa: Academia Portuguesa da História, (1958-1961; DMP-DR). Cf. também CARDOSO, Aguiar (1929) – Terra de Santa Maria - Civitas Sanctae Mariae. Coimbra: Imprensa da Universidade.

Fig. 1 - Um dos primeiros mapas contemporâneos com o possível traçado da via romana na Terra de Santa Maria, publicado por PEREIRA 1907.

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os territórios Calambria, Zebrário e Sancta Cruce. A Sudeste, na margem esquerda do Vouga, o território Centum Cortes. A Sul os limites são mais difíceis de determinar: parece que no século XI, a Terra de Santa Maria ultrapassava o Vouga, onde se confrontava com o território de Montemaior (Montemor-o-Velho) (2). Aparecem ainda referências à Terra de Vouga, mas mais tardias. Esta aparente indefi nição poderá ter a ver com as modifi cações do leito do Rio Vouga e a confi guração da Ria, certamente muito diferente da actual (3). Desde que a diocese portucalense fora extinta, ainda no séc. VII, o território da futura Terra de Sancta Maria pertencia integralmente ao bispado de Coimbra, facto esse que é confi rmado, entre vários outros documentos, pela bula Apostolice Sedis, de Pascoal II, datada em Latrão a 24 de Março de 1110 (4), aspecto que já não era novo, pois no século VI, o Parochiale suévico coloca Portucale castrum antiquum na dependência da diocese conimbricence, quando a sede portucalense se situou, temporariamente, a norte do rio Douro no Castro novo (5). Logo que é restaurada no exílio senhorial cristão das Astúrias e passa a ter bispos e condes nomeados, dois outros factos vêm alterar aquela situação: um deles é a reconquista de Portucale em 868 por Vimara Peres, vindo de Coimbra. Este Portucale deve entender-se como o antigo território

subordinado à villa do mesmo nome na margem esquerda do rio Douro, ainda assim denominada, e não o Portucale da margem norte. Com o consequente abandono de Coimbra pelos cristãos, devido à proximidade dos mouros, o repovoamento deve então ter-se fi xado na margem direita do Rio Douro por motivos óbvios de defesa. O território portucalense alarga-se assim de novo para Norte, como já tinha acontecido no séc. VI. A extensão do território meridional, onde subsistira uma Terra de Portugal cuja cabeça era Portucale castrum, vem então a ser substituída pela denominação de Terra de Santa Maria, para não ser confundida com a denominação mais abrangente dada ao território portucalense, agora alargado entre Lima e Mondego. No entanto este problema vai subsistir na reconstituição das dioceses. Este motivo dá-nos o segundo facto: logo que o bispo francês D. Hugo toma posse da diocese portucalense, no início do século XII, vai reivindicar para a sua jurisdição a terra que lhe dera o nome, situada na margem esquerda do rio Douro, o que era perfeitamente lógico, se nos lembrarmos de que aí se localizava a villa de Portugal, na paróquia de Santa Marinha de Portugal, como se lhe refere um documento de 1116, ou ainda de Portu Dorii ou de Portogalla, como passará a ser conhecida pelos motivos já referidos (6). Fig. 2

(2) Para a determinação destas divisões seguimos o mapa «Territórios Portugueses no século XI» de Paulo Merêa e Amorim Girão, publicado em História de Portugal, dir. de José Hermano Saraiva, vol. I. Lisboa: Edições Alfa, 1983, pág. 349, bem assim como outros dados obtidos na bibliografi a indicada nas notas que se seguem, os quais foram, já depois da apresentação pública deste estudo, analisados em MATTOSO, José; KRUS, Luís; ANDRADE, Amélia (1989) – O Castelo e a Feira. A Terra de Santa Maria nos séculos XI a XIII. Lisboa: Editorial Estampa, pp. 32 e segs.; FERNANDES, A. de Almeida (1991) – Faria 1127-1128, e não Feira. Guimarães: Sociedade Martins Sarmento, p. 42 e seg.s, e MATTOSO, José (1993) – A Terra de Santa Maria na Idade Média. Limites Geográfi cos e Identidade Peculiar. Santa Maria da Feira: Comissão de Vigilância do Castelo. Sobre a Terra de Santa Maria como fronteira, ver BARBOSA, Pedro Gomes (2005) - «Guerra de presúria, fossado e algara. A fronteira na reconquista portuguesa (da segunda metade do século IX a inícios do XII). Muçulmanos e Cristãos entre o Tejo e o Douro (secs. VIII a XIII), coordenação de Mário Jorge Barroca e Isabel Cristina F. Fernandes. Palmela: Câmara Municipal/FLUP, 2005, p. 98. 3) Sobre a variação da costa e da Ria de Aveiro ver FREITAS, Conceição; ANDRADE, César (1998) - «Evolução do Litoral Português nos últimos 5000 anos». Al-madan, II.ª série (7), Outubro de 1998, pp. 64-70; BLOT, Maria Luísa B. H. Pinheiro (2003) – Os portos na origem dos centros urbanos. Contributo para a arqueologia das cidades marítimos e fl uvio-marítimas em Portugal. Lisboa: MC/IPA, pp. 197 e segs.(4) Cf. Liber Fidei Sanctae Bracarensis Ecclesiae, tomo I, ed. crítica de Avelino Jesus Costa. Braga: O Distrito de Braga/Assembleia Distrital de Braga, 1965, pp. 8 e 9 (a seguir Liber Fidei).

(5) Cf. Liber Fidei, p. 17 (nota 1) e p. 19; GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (1988) - «De Portucale castrum ao Julgado de Gaia». História de Gaia, fasc. 18. Vila Nova de Gaia: Gabinete de História e Arqueologia, p. 106. A propósito, refi ra-se que a tradução errada da frase latina do foral de Gaia que refere o casale quod fuit sedis Portucalensis quod est in Gaia, não é da nossa responsabilidade, mas sim de outros autores que traduziram que foi sé portucalense em vez do correcto que foi da sé portucalense, talvez na esteira do bispo do Porto D. Rodrigo da Cunha (séc. XVII) que no seu Catálogo dos Bispos do Porto, 2.ª edição, tomo I, Porto, 1742, p. 18 escreveu «…que S. Basílio não foi bispo desta cidade [do Porto], no sítio em que ela hoje está, e a edifi caram os Suevos, porque isto aconteceu quase há 380 anos depois da sua gloriosa morte, se não enquanto esteve dalém Douro, na paragem de Gaia, e com o nome de Cale ou Portucale» (ortografi a actualizada). Ver também FERNANDES, A. de Almeida (1997) – Paróquias suevas e dioceses visigóticas. Arouca: ADCA, pp. 96 a 98 e Nota 292; GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (2002) - «Vestígios arqueológicos paleocristãos de Portucale castrum antiquum (Gaia). I Congresso sobre a Diocese do Porto. Actas, vol. I. Porto: CEDPE/FLUP, UCP-CRP, pp. 543-556.(6) Cf. Livro Preto da Sé de Coimbra, fl . 124 v., e PMH-DC nº 25, documento citado por OLIVEIRA, P.e Miguel de (1967) – Ovar na Idade Média. Ovar: Câmara Municipal, p. 48; para as diversas variantes toponímicas ver ainda GUIMARÃES 1988.

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A questão não vai ser pacífi ca entre este bispo e o de Coimbra, mas no século XIII a Terra de Santa Maria, desde o Rio Douro até ao Arda e seguindo o Rio Antuã até ao braço da Ria em Ovar e daí ao mar, passará defi nitivamente a pertencer à diocese portucalense, o que de facto já acontecia desde cerca de 1135 (7).

A diocese passa assim a incorporar a terra que afi nal lhe dera origem antes das vicissitudes das reconquistas. Como já referimos, a sua existência aparece pela primeira vez documentada numa doação ao Mosteiro de Lorvão do ano 978 (8), sendo presumivelmente uma criação da ocupação novigoda abundantemente documentada na doação que Ordonho II fez em 922 ao Mosteiro de Crestuma: o documento existente é posterior, mas deve refl ectir uma situação verdadeira (9). Porém estamos em crer que a denominação de Santa Maria dada a esta terra poderá ter uma origem alheia aos presores asturianos ou galegos, pois não aparece no extenso e pormenorizado documento n.º 25 dos PMH. Poderá ter sido assim denominada por emigrados moçárabes que se dirigiam para a fronteira do Douro, vindos dos instáveis reinos árabes. A este propósito lembremo-nos que muitas das catedrais do Sul da Península, bem assim como igrejas, capelas e até cidades – Santa Maria de Harum (Faro) por exemplo – são dedicadas a Santa Maria, mesmo durante o domínio árabe, cuja religião respeitava as fi guras principais do cristianismo, considerando-as precursoras de Mahomet. E nunca será demais lembrar estes factos, primeiro porque a infl uência da cultura moçárabe na génese da nacionalidade e da cultura portuguesa têm sido constantemente subalternizadas; segundo, porque ao longo de toda a extrema durii, isto é, da região confi nante com a margem esquerda do Rio Douro, aparecem imensas igrejas e até freguesias sob a invocação de Santa Maria, precisamente em terras onde é notório o povoamento moçárabe. A título de exemplo citemos o caso da terra de Numão (Noomen) no actual concelho de Vila Nova de Foz Côa, onde há inúmeras

Fig. 2 - A descrição da localização da vila de Portugal entre Mafamude e Coimbrões, num documento datado de 922, numa cópia do início do século XII (PMH-DC nº 25).

(7) Cf. SANTOS, Cândido Augusto Dias dos (1973) – O Censual da Mitra do Porto. Subsídios para o estudo da diocese nas vésperas do Concílio de Trento. Porto: Câmara Municipal, p. 21 e seg.s OLIVEIRA, P.e Miguel de (1956) - «Os territórios diocesanos. Como passou para o Porto a Terra de Santa Maria». Lusitânia Sacra, tomo I, Lisboa; MOREIRA, P.e Domingos A. (1973) - «Freguesias da Diocese do Porto. Elementos onomásticos altimedievais, parte I: Introdução Histórica Geral. Boletim Cultural da Câmara Municipal do Porto, vol. XXXIV, fascs. 1 e 2. (8) PMH-DC 125.(9) Cf. OLIVEIRA 1956, pp. 44 segs.; idem 1967, pp. 47/48. Existe uma transcrição recente do documento em Livro Preto. Cartulário da Sé de Coimbra. Edição Crítica. Texto integral; direcção e coordenação editorial de Manuel Augusto Rodrigues e direcção científi ca do Cónego Avelino de Jesus Costa. Coimbra: Arquivo da Universidade, 1999, doc. n.º 81, pp. 129-131.

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invocações de Santa Maria (10). Todos estes factos que vimos a referir destinam-se a enquadrar sumariamente esta terra no contexto geográfi co e político da nacionalidade nascente e procurar determinar a sua real importância e contributo para a consolidação do espírito autonómico portucalense (11). Enorme mancha de terra arável, semeada de villae, aldeias e mosteiros, entrecortada por bosques e prados onde pastavam manadas de cavalos, atravessada por ribeiros, que não chegam a ser obstáculos, mas que irrigam os férteis campos, possuidora de atracadouros no Douro e no Vouga, para os barcos que demandavam a costa, e de marinhas que produziam o sal, tinha efectivamente boas condições

geomorfológicas e climáticas para o desenvolvimento de intenso povoamento. Não possuindo na Idade Média nenhuma cidade importante, terá como cabeça administrativa o castelo da Feira. As suas referências religiosas e culturais, até ao século XII, serão a cidade e a diocese de Coimbra e o Mosteiro de Santa Cruz desta mesma cidade.

II- Geomorfologia

Do ponto de vista geológico, a Terra de Santa Maria é formada por rochas do complexo xisto-grauváquico ante-ordovícico e séries metamórfi cas derivadas, cortada no sentido SE-NO por uma crista de maciços graníticos e granodioríticos, ligados ao maciço central da Beira e que terminam, na plataforma continental, nas praias da margem esquerda da Foz do Douro. Imediatamente a Sul, na freguesia de Arcozelo (Vila Nova de Gaia), começam os terrenos mais modernos, ceno-antropozoicos, que se vão progressivamente alargando para o interior e nos quais se espraia actualmente a Ria de Aveiro, cujo recorte era muito diferente na época que tratamos (12). Sobre estes terrenos encontra-se uma enorme mancha arável (solos Tipo A) com grandes concentrações na zona sul do actual concelho de Vila Nova de Gaia e nas freguesias litorais do concelho de Santa Maria da Feira, prolongando-se para Sul (13). No que diz respeito a elevações, destacam-se a Serra de Negrelos (Canelas/Perosinho), o Monte Grande (Monte da Virgem desde 1905 e o Monte da Meijoeira (Serra do Pilar desde o séc. XVII), este último pertencendo a uma mancha geológica do chamado granito do Porto. Para além destas pequenas elevações situadas no seu extremo norte, a Terra de Santa Maria possui muitos cabeços e montes que dominam a terra chã e que são pontos de referência obrigatória na

(10) O doc. 25 dos PMH refere vários indivíduos de nome arábico, devendo tratar-se de moçárabes como é o caso dos confraties Árias Abderahemen e Mauro; Árias Abrahem, proprietários de moinhos do rio Uíma e Dom Salomão, abade do Mosteiro de Santa Marinha de Antuã. Numa breve análise dos documentos dos séculos IX, X e XI referentes à Terra de Santa Maria, colhem-se muitos outros nomes de origem muçulmana de proprietários, monges e testemunhas dos actos notariais. A este propósito ver LOSA, António (1986) – «Moçárabes em território português nos séculos X e XI: contribuição para o estudo da antroponímia no Liber Testamentorum de Lorvão». Islão e arabismo na Península Ibérica. Actas do XI Congresso da União Europeia de Arabistas e Islamólogos. Évora: Universidade; a este propósito veja-se ainda BARROS, Maria Filomena Lajes de (2005) - «Mouros da Terra e Terra de Mouros». Muçulmanos e Cristãos… 2005: 167-172; refi ra-se ainda que Santa Maria Virgem é um dos oragos do Mosteiro de Crestuma referido precisamente no doc. 25 dos PMH, bem assim como de outros templos religiosos coevos nesta região. A este propósito, e só para o actual concelho de Vila Nova de Gaia, cf. GUIMARÃES 1988 e GUIMARÃES, Susana; GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (2004) - «Cultos femininos no território gaiense e santamariano: continuidades antigas, descontinuidades recentes». Boletim da Associação Cultural Amigos de Gaia (a seguir BACAG), n.º 58, Junho de 2004, pp. 24-31.(11) Cf. SARAIVA, António José (1979) - «A “ideia de Portugal” pode remontar ao século IX». História, n.º 3, Lisboa; MATTOSO, José (1985) – Portugal Medieval. Novas interpretações. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, que refl ectem pontos de vista aparentemente antagónicos, mas que, no nosso entender, são apenas o anverso e o reverso de uma medalha cuja serrilha é o rio Douro, se nos é permitida a metáfora. Tudo isto mostra, portanto, que este rio continuou a ser, durante algum tempo, uma verdadeira fronteira, e que não era assim tão fácil o entendimento das forças políticas do Norte e do Sul, mesmo quando os cristãos dominavam Coimbra, durante o século X. Por alguma razão os romanos tinham feito do Douro a fronteira entre a Galécia e a Lusitânia (MATTOSO, op. cit. p. 91); A. J. Saraiva veio relembrar que na região ao Sul do Douro se conjugaram movimentos de sentido autonomista que partem quer do lado leonês, quer do lado islâmico, e que por vezes se aliam por conta própria ou são aproveitados por forças antagónicas com interesses em cada um dos lados da fronteira; cf. MATTOSO 1985: 88. Sobre a difusão progressiva no território do “conceito” de Portugal ver MATTOSO, José (2001) - «Sobre as origens da nacionalidade portuguesa». Uma vida em História. Estudos em homenagem a António Borges Coelho. Lisboa: Editorial Caminho, 2001, pp. 73-89.

(12) Cf. Carta Geológica de Portugal, Escala 1:1.000.000, Serviços Geológicos de Portugal. Lisboa: Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos, 1968; OLIVEIRA 1967:59 e seg.s; GASPAR, P.e João Gonçalves (1988) - «Formação da Ria e Povoamento da Região de Aveiro. Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 38, Aveiro, 1988, mapa da pág. 56; e FREITAS & ANDRADE 1998.(13) Cf. Carta da Capacidade do Uso do Solo. Portugal: Atlas do Ambiente. Lisboa: Presidência do Conselho de Ministros/Secretaria de Estado do Ambiente, escala 1: 1.000.000, III-3, 1982; Esboço da Carta Geral do Ordenamento Agrário. Lisboa: Serviço de Reconhecimento e de Ordenamento Agrário, escala 1:25.000, 1980. Sobre a evolução da paisagem na área noroeste da Terra de Santa Maria ver GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (2008) - «Para uma arqueologia da paisagem gaiense, os estudos sobre as condições físicas e ambientais do seu território». BACAG nº 66, Junho de 2008, pp. 5-15.

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documentação medieval: o mons civitas sancta maria (o monte onde se situa o castelo da Feira); o mons petroso ou muratus (Pedroso-Vila Nova de Gaia); mons codal (Vale de Cambra); mons redondo (Vergada-Santa Maria da Feira); mons sexus alvus (Olival-Vila Nova de Gaia); mons penna (Argoncilhe-Santa Maria da Feira); mons castro Portella (Romariz-Santa Maria da Feira); alpe mons sagitella (Monte Murado, Moselos, Santa Maria da Feira), etc. etc. (14).

III- Hidrologia

Neste território existem três redes hidrográfi cas distintas: 1) Os rios e ribeiros que correm para Norte e que desaguam no Douro, de Leste para Oeste: o Arda, o Inha, o Uíma, o Febros, a ribeira de Quebrantões, o ribeiro Martinho (quase todo encanado, corre ao longo da rua Cândido dos Reis, na cidade de Gaia), as ribeiras das Azenhas, também chamada de Santo Antão ou dos Açougues, da Afurada e de S. Paio, além de muitas outras pequenas linhas de água. 2) Os rios e ribeiros que correm para o mar ou para os braços da Ria de Aveiro, e portanto no sentido Leste/Oeste ou Nordeste/Sudoeste e que são, de Norte para Sul; as ribeiras de Canidelo, da Madalena, de Valadares, de Canelas, do Espírito Santo, da Granja, do Juncal, de Silvalde, de Paramos, de Esmoriz, de Ovar, o Rio Antuã, afl uente do Ínsua, que corre primeiro de Norte para Sul, desaguando este último no braço da Ria na Murtosa. 3) O Rio Caima e os seus pequenos afl uentes, que correm de Norte para Sul até desaguarem no Vouga, que parece ter mudado de leito várias vezes em épocas históricas e desaguando ora a Norte ora a Sul de Aveiro (Alauario). Destes rios e ribeiros, os únicos navegáveis são o Douro e o Vouga, para além da própria Ria, em condições muito mais favoráveis na Idade-Média, quando o nível da costa, e portanto da foz dos rios, era mais elevado, o que terá facilitado

a presença de vikings e normandos, documentada para Ovar. (15). Tal permitiu o desenvolvimento de algumas póvoas de pescadores e de homens do mar, que já no século XIII iam pescar até à Galiza, como documenta o foral de Gaia de 1255 (16). Segundo Idrisi, no século XII, entravam no Rio Vouga grandes e pequenas embarcações até 70 milhas da sua foz (17). A Ria de Aveiro não existia pois como hoje a conhecemos: no período romano e medieval era constituída por um grande braço de mar que entrava pela terra dentro até cerca da povoação de Marnel, braço de mar esse que, com a formação de um cordão litoral de areias e o assoreamento produzido pelo próprio Rio Vouga, se foi progressivamente fechando. Existia assim uma enorme baía de terras baixas com início no litoral sul do actual concelho de Gaia e que se estendia até ao Cabo Mondego. Por volta do século X já existia a barrinha de Esmoriz, com o nome de lagona de Auille (D.C. nº 12), bem assim como o porto de Obal (Ovar). Nas bulas de Pascoal II (1110) e de Calisto II (1120), que delimitam os bispados portucalense e conimbricence, o Rio Antuã desagua no mar, bem assim como o próprio Vouga (18). IV- Condições ambientais

Raros são os documentos medievais que nos descrevem a paisagem da Terra de Santa Maria, como aliás de qualquer outra terra. A literatura de viagens era então rara e os pergaminhos dos mosteiros são lacónicos e raramente vão além dos assuntos específi cos a que dizem respeito. Conhecemos no entanto duas descrições feitas por viajantes estrangeiros que são preciosas; comecemos pela do geógrafo árabe Idrisi, que viveu na primeira metade do século

(14) A referência a estas elevações, algumas então com nomes bem diversos dos actuais, encontra-se em quase todos os documentos medievais. Sobre o signifi cado destas referências e a sua utilização simbólico-militar na Idade Média, ver ALMEIDA, Carlos Alverto Ferreira de (1978) – Castelologia medieval de Entre-Douro-e-Minho, desde as origens a 1120. Trabalho complementar para prestação de provas de doutoramento em História da Arte: Porto, 1978 (fotocopiado).

(15) Cf. OLIVEIRA 1967:36. As incursões dos vikings terão começado por volta de 844; os normandos estão referidos num documento de Pedroso de 1026 (PMH-DC 261). Ver, entre outros, AZEVEDO, Rui Pinto de (1974) - «A expedição de Almançor a Santiago de Compostela em 997, e a de piratas normandos à Galiza em 1015-16». In Revista Portuguesa de História, tomo XIV, vol. III, Coimbra, 1974, pp. 74-93 e, para um enquadramento geral da expansão viking, LOGAN, F. Donald (1985) – Los Vikingos en la Historia. México: Fondo de Cultura Económica.(16) Cf. SAMPAIO, Alberto (1979) – Estudos Históricos e Económicos. As póvoas marítimas, vol. II, 2ª edição. Lisboa: Editorial Veja, e GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (1997) – Memória histórica dos antigos comerciantes e industriais de Vila Nova de Gaia. Vila Nova de Gaia: ACIGAIA, p. 23.(17) Cf. IDRISI, Geografi a, citado por PEREIRA, F. Alves (1907) - «Geographia protohistorica da Lusitânia. Situação conjectural de Talabriga». In O Archeólogo Português, Lisboa, vol. XII, pp. 129 a 158. (18) Cf. OLIVEIRA 1967:59-62; GASPAR 1988; BLOT 2003:197 e segs.

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XII, devendo datar-se os seus escritos da época do governo do Condado Portucalense por D. Henrique de Borgonha; na sua Geografi a há um trecho que diz o seguinte: «o caminho por mar de Coimbra a Santiago de Compostela é este: da fortaleza de Montemor à foz do Rio Vouga, 70 milhas. É aqui que começa a terra de Portugal, segundo se diz. Portugal é uma região fl orescente coberta de habitações, praças-fortes, aldeias e muitos campos de cultura. Encontra-se aí muita gente de guerra, a pé e a cavalo, a qual faz razias sobre os vizinhos que não são do mesmo partido…». Noutro passo diz-nos: «…[pelo] caminho de Coimbra à alcaria de Águeda há um dia de viagem e outro ainda dela ao princípio da terra de Portugal, cuja largura o caminho atravessa num dia. Nela fi ca a alcaria nova de Gaia, junto ao Rio Douro, isto é, o rio de Zamora. Este rio passa-se ali em barcos próprios para a travessia» (19). Da primeira metade do século XII possuímos um outro relato que nos dá uma visão da Terra de Santa Maria a partir do mar: trata-se da carta que Ranulfo de Granville, cruzado inglês que participou na tomada de Lisboa aos mouros, escreveu em 1147 a Osberno de Bawdey. Tendo a frota partido do Douro onde esteve ancorada, diz-nos que: «… há ao longo do continente, desde Portugala (20) até esta ilha [de Peniche] rios e castelos. Há o castelo chamado de Santa Maria entre o rio Douro e um bosque a que chamam Mesão Frio, em cujo território repousa S. Donato, discípulo do apóstolo S. Tiago;

depois do bosque encontra-se o Rio Vouga» (21). O bosque que o documento refere situava-se na região de Albergaria-a-Velha (Albergarie Veteris de Meigonfrio) perto da qual se localizava a villa de Osseloa (Assilhó), coutada por D. Teresa a Gonçalo Eriz em 1117. Era pois um dos limites naturais da Terra de Santa Maria (22). A existência de extensas zonas arborizadas junto à foz do Vouga e para o interior é confi rmada pelo Doc. 815 dos PMH-DC, do ano de 1095, que refere um densissiman sillam [por silvam] que ab antiquis temporibus habitaculum erat bestiarum, perto de Ílhavo, por entre a qual deveria passar a antiga estrada romana que atravessava o limite sul da Terra de Santa Maria no Rio Vouga, para o interior dos terrenos pantanosos e alagadiços que rodeavam Alauario (23). Encontramos ainda outras referências à fl ora local na documentação do Mosteiro de Grijó, nomeadamente os castanheiros que forneciam suinere castaneas (CBF 27). A maior parte da documentação deste mosteiro – um dos maiores proprietários da Terra de Santa Maria (24) – fala-nos de árvores de fruto pelo menos desde 1042 (CBF 280), revelando a existência de pomares em várias villae na periferia de Macieira de Cambra, Grijó (CBF 27), Rio Meão (CBF 38), Nogueira 145), Seixo Alvo (CBF 186), etc..

(19) Citado por COELHO, António Borges, organização, prólogo e notas de (1972) – Portugal na Espanha Árabe. Lisboa: Seara Nova, vol. I, p. 72.(20) Alguns autores traduzem apressadamente Portugala (ou Portugale, Portucale ou Portum Dorii ou mesmo Portum) por Porto, ou cidade do Porto, como é o caso de OLIVEIRA, José Augusto de (1935) – Conquista de Lisboa aos Mouros (1147) narrada pelo cruzado Osberno, testemunha presencial; complemento ao volume II da Lisboa Antiga de Júlio de Castilho. Lisboa: Câmara Municipal, quando traduz a impropriamente chamada Carta de Osberno. No mesmo erro, que continua a alimentar grandes confusões, têm igualmente caído autores mais recentes. A este propósito torna-se necessária uma nova leitura atenta, se possível de edições críticas da Crónica Gothorum (1140), da Geografi a de Idrisi e da Crónica de Almançor, bem assim como dos muitos documentos avulsos que referem aqueles topónimos. Sobre os Portucale de ambas as margens veja-se GUIMARÃES 2002:550 e MACIEL, M. Justino (2007) - «Portucale segundo os textos da época suévica». In Revista de Portugal, n.º 4, Vila Nova de Gaia: Confraria Queirosiana/Gailivro, pp. 7-10; sobre o Portucale da margem esquerda ver GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (1995) – Gaia e Vila Nova na Idade Média. Arqueologia de uma área ribeirinha. Porto: Universidade Portucalense, p. 72/73 e 90. (21) Assim como se provou que a célebre carta não era de, mas para Osberno de Bawdey, pois foi escrita por Ranulfo de Granville, ver também a brilhante lição paleográfi ca de OLIVEIRA 1967: 54 e segs., que transformou o falso medica in frigore no documentado meigon frio.

(22) Cf. op. cit., nota anterior, pág. 55.(23) Sobre o traçado da via romana, ver o mapa que publicamos em anexo, retirado de PEREIRA 1907 que, não obstante estar desactualizado em relação à problemática do povoamento romano da região, apresenta um interessante valor documental. Sobre ele, e outros aspectos que também interessam a este estudo, ver o que se diz em LOPES, Luís Seabra (1995) - «Talábriga, situação e limites aproximados». In Portugália, nova série, vol. XVI, 1995, pp. 331-343. Ver ainda CASTRO, Miguel Elísio de (1987) - «Trajecto da Via Militar Romana (desde a Branca a Fiães da Feira)». In Actas das I.as Jornadas de História e Arqueologia do Concelho de Arouca. Arouca: Câmara Municipal/Centro de Arqueologia, pp. 47-52; MANTAS, Vasco Gil (1996) – A rede viária romana da faixa atlântica entre Lisboa e Braga, I. Dissertação de doutoramento policopiada. Coimbra: Universidade; LOPES, Luís Seabra (1997) - «Itinerário da estrada Olissipo-Bracara: contributo para o estudo da Hispânia de Ptolomeu». In O Arqueólogo Português, série IV, 13-15. Lisboa: Museu Nacional de Arqueologia, pp. 313-346. (24) Sobre as propriedades do Mosteiro de Grijó, que abrangem quase toda a Terra de Santa Maria, cf. o mapa publicado em Le Cartulaire Baio-Ferrado du Monastère de Grijó (XIII.e siècles), introduction et notes de Robert Durand. Paris: Fundação Calouste Gulbenkian, 1971; ver também FERNANDES 1991:89 e seguintes.(25) Cf. SOUSA, Arlindo de (1961) – Povoamento medieval de Entre Douro-e-Vouga (fontes toponomásticas). Separata do Boletim Mensal da Sociedade de Língua Portuguesa. Lisboa; e FERNANDES 1991:99, 104 e 161, bem assim como FERNANDES, A. de Almeida; SILVA, Filomeno (1995) – Toponímia Arouquense. Arouca:ADCA.

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Consultando a toponímia de Entre-Douro-e-Vouga (25) encontramos imensos topónimos de origem botânica: Carualhal (de quercalium, de quercus); Cerceto (depois Serzedo, Gaia; de quercetos, carvalhos); Fagiones (Feijões-Feira; de phaseolus); Figairedu (Figueiredo, Feira; de fi caria); Genestosa (Gestosa, Sandim; de genesta); Laurosa (Lourosa-Feira; de laurus); Liuães (Olivais-Feira; de oliva, olivetum); Maçaela (Maceda, Ovar); Macinata (Macinhata da Seixa; Oliveira de Azeméis; Macieira de Sarnes (idem); etc., formas evoluídas de matianata, malus (Macieira); Nesperieira (Palmaz, Oliveira de Azeméis, de nespilus); Nogueira (freguesia de Pessegueiro, Sever do Vouga; de nocaria); Palmaz (Oliveira de Azeméis; de palma); Peraria (S. Vicente de Pereira, Ovar; de pirum); Sautum (Souto, Branca, Albergaria-a-Velha; de saltu); etc., etc.. Damos aqui estes exemplos, simples amostragem de topónimos que se referem à existência de espécies arbóreas, arbustivas e hortícolas conhecidas, de entre as muitas que seria possível encontrar e que nos evidenciam uma paisagem que se encontra já muito transformada pelo homem em tempos tão recuados como os séculos X, XI e XII, onde se misturam espécies da fl ora indígena com árvores exóticas. O pinheiro está ausente da documentação do Mosteiro de Grijó dos séculos X a XIV, o que nos leva a concluir que a sua proliferação na Terra de Santa Maria é posterior aos tempos dionisinos (26). Estamos perante uma terra agrícola, modifi cada desde longa data por acção antrópica na sua fl ora e nas suas condições ambientais. A maior parte da documentação que até nós chegou prova-o à saciedade. Pelas cartas de doação, vendas, testamentos ou outras, perpassam abundantes referências a toda uma extensa paisagem agrária composta por agros, leiras, formais, quintais e quintas, passais, herdades, lavras, casais, almuinhas, pomares, vinhas e linhares. Aqui se cultivava o trigo, a cevada, o centeio, o milho-miúdo; o linho e a vinha, ocupavam um lugar muito especial, com uma presença deveras signifi cativa. No século XIII Gaia e Vila Nova são já entrepostos vinícolas, não só dos vinhos de Ribadouro, mas também do vinho aqui produzido (27). Em 1137 há uma referência no Cartulário Baio-Ferrado do Mosteiro de Grijó ao

cultivo da vinha in ipsa feira civitatis Sancte Marie (CBF, Doc. 38, pág. 49). Perante este panorama é perfeitamente compreensível a escassez de dados sobre a fauna selvagem, apenas existente nas serras que limitavam a oriente a Terra de Santa Maria. Da Serra da Freita poderiam vir peles de raposa, de gato bravo e de outros animais monteses, referidas no Foral de Gaia de 1255, ou as peles de lobo transformadas em manto incluídas num resgate pago aos normandos que assolavam o porto de Ovar por volta de 1026 (DC n.º 261; ver nota 15). A existência de zebros «espécie perdida, ainda abundante e deveras apreciada nos sécs. XIII-XIV e hoje mal identifi cada» (burro selvagem?) teria dado o nome ao Monte Zevreiro, limite Sul da Terra de Cambra e ao monte fronteiro a Crestuma do outro lado do Rio Douro (28). A referência a animais domésticos é, pelo contrário, mais abundante. O Mosteiro de Grijó era um grande produtor de gado cavalar (29), enquanto que o de Arouca mandava as suas manadas de éguas para os pastos de Inverno nas planuras do Antuã, no tempo do abadessado da Infanta D. Mafalda (30). Do enorme acervo documental sobre esta região colhem-se inúmeras referências à existência de bovinos, caprinos, ovinos, suínos, bem assim como a animais de capoeira, (galinhas, frangos, capões e patos) usados no pagamento de muitos foros. Presentes também os muares e asininos, fundamentais para os transportes de pessoas e mercadores, distinguindo-se nos forais medievais as portagens conforme o animal de

(26) A este propósito ver SOUSA, Armindo de (1993) – 1325-1480 (Degradação do coberto vegetal). In História de Portugal, direcção de José Mattoso, segundo volume: A Monarquia Feudal (1096-1480). Lisboa: Circulo de Leitores, pp. 322-327. (27) Sobre o comércio dos vinhos destas vilas medievais veja-se GUIMARÃES, 1997:10 e segs.

(28) Cf. Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol. XXXIII entrada Vale de Cambra, p. 849; alguns dicionaristas dão-lhe o signifi cado antigo de boi ou novilho selvagem, ou seja gado bravo, como é o caso de FIGUEIREDO, Cândido de (1949) – Dicionário da Língua Portuguesa, 14.ª edição. Lisboa: Livraria Bertrand, 2.º volume, p. 1338; porém, sobre este animal, veja-se QUADRADO, José Gomes (2002) - «Haverá zevros na Arte Rupestre». In Côavisão - cultura e ciência, n.º 4. Vila Nova de Foz Côa: Câmara Municipal, pp. 39-41. O doc. 25 dos PMH-DC, refere o monte Zeurario, do outro lado do Douro (em relação a Crestuma), que é o actual lugar de Zebreiros perto da foz do Rio Sousa e que então se situava na Terra de Sausan (Sousa). Viterbo, no Elucidário atribuiu-lhe o signifi cado de monte das vacas; cf. VITERBO, Fr. Joaquim de Santo Rosa de (1984) – Elucidário … edição crítica de Mário Fiúza, vol. segundo B-Z. Porto/Lisboa: Livraria Civilização, p. 648 e também SANTOS, José Dinis dos (1970) – Resenha histórica de Cale, Vila de Portugal e Castelo de Gaia. Separata de Comunidades Portuguesas, n.º 21, Dezembro de 1970, p. 3. (29) Cf. Cartulaire Baio-Ferrado…, 1971: LIII.(30) Cf. MATTOSO, José (1985) – Identifi cação de um país. Ensaio sobre as origens de Portugal 1095 – 1325; vol. II – composição. Lisboa: Editorial Estampo, p. 41.

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carga. Fig. 3 Sobre a fauna marítima e fl uvial possuímos alguns relatos mais pormenorizados, nomeadamente o já aludido Foral de Gaia de 1255, que nos fala de congros, peixotas

(pescadas), ruivos, pargos, evos, eirós e solhos, peixes do mar e do estuário do Douro, onde também eram abundantes as toninhas e golfi nhos e mesmo baleias junto à sua foz (31). Na Idade-Média o peixe deste rio é, por excelência, o sável, contra cuja pesca e venda livre a regatões e recoveiros de longes terras protestam os vereadores do Porto em queixa que enviam ao rei em 12 de Março de 1393. Os visados eram precisamente os pescadores de Avintes e Guimarães (Oliveira do Douro) para além dos da outra margem (32).

Fig. 3 - Ponte medieval em Várzea, Canedo; fotografi a do autor.

(31) Cf. GUIMARÃES, J. A. Gonçalves; AFONSO, José António; PRATA, Raul Solla (1983) – O Foral de Gaia de 1255. Um texto e a sua época. Vila Nova de Gaia: Gabinete de História e Arqueologia, pp. 78-81; ver transcrição actualizada do Foral de Gaia de 1255 em MATTOSO, José; KRUS, Luís; ANDRADE, Amélia (1993) – A Terra de Santa Maria no século XIII. Problemas e Documentos. Santa Maria da Feira: Comissão de Vigilância do Castelo, pp. 137 e segs.. Sobre a existência de baleias junto à Barra do Douro ver Corpvs Codicvm Latinorvm et Portvgalensivm…, vol. II. Porto: Câmara Municipal, 1917, p. 51 e CRUZ, António (1962) - «Os bispos senhores da cidade: II – de D. Pedro Salvadores a D. Vasco Martins». In História da Cidade do Porto, vol. I. Porto/Barcelos: Portucalense Editora, p. 207, Nota 41.

(32) Cf. MORENO, Humberto Baquero (1979) – A acção dos almocreves no desenvolvimento das comunicações inter-regionais portuguesas nos fi ns da Idade Média. Porto: Brasília Editora, p. 45.

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Contra a construção de caneiros de pescaria, que são apontados como responsáveis pela diminuição do número de sáveis e de outros peixes, protestaram nas Cortes de Évora de 1481 os procuradores dos concelhos. A queixa visava em particular os fi dalgos e os mosteiros proprietários de terras ribeirinhas (33). Porém já nas inquirições de 1284 há queixas semelhantes contra as pesqueiras construídas no Rio Vouga. A pesca neste rio com redes combonas está documentada desde 1077; tal como no Douro, aqui se pescavam sáveis e lampreias e os documentos dionisinos referem também a balea, o yerez, o evo, a sibba, ou seja, além daqueles cetáceos, peixes de rio ou de mar (34).

V- Balizas cronológicas

Ao abordar a problemática do povoamento de um dado território é fácil darmo-nos conta de que o mesmo está estreitamente relacionado com as suas condições naturais, mas também com os factores políticos e económicos determinantes no governo dessa mesma região. Por isso pretendemos defi nir as balizas cronológicas do estudo do povoamento da Terra de Santa Maria em períodos mais ou menos longos, compreendidos entre dois factos marcantes para a vida local, ainda que não tenham acontecido exactamente no Entre-Douro-e-Vouga.

1- Período suevo-visigótico (século V a 715)

Destruída a administração romana, perdidas as ligações com a administração provincial e com a cidade capital do império, os hispano-romanos confrontam-se agora com os novos senhores, suevos ou visigodos, conforme os tempos e a sorte das armas. Determinar o momento em que aqui começa a Alta Idade Média é tarefa difícil e até talvez infrutífera. A tradição, ainda que motivada por cortes brutais, ao nível do quotidiano foi lenta nos seus avanços e recuos. Zona periférica, não sabemos que marcas terá deixado no território o efémero reino alano-lusitano do vândalo Ataces, que durou menos de uma década. A destruição de Conimbriga pelos Suevos em 465 e 468 parece representar efectivamente o fi m da

romanidade na região litoral da Lusitânia. Os ecos da vivência das povoações que chegaram até nós são demasiado ténues: no Parochial suévico a referência a três paróquias da diocese de Conimbriga – Portucale, Insula e Antunane (35), demonstra-nos o fraco povoamento do território. Porém a existência de uma necrópole bárbara em chão do Grilo, Esmoriz (36) e de outros achados, dispersos ou ainda mal estudados, poderão dar-nos outras informações mais específi cas sobre este período, para além do recurso cauteloso às Ciências Auxiliares da História, como a Toponímia, a Hagiografi a, a própria Antropologia Cultural e sobretudo a Arqueologia Medieval.

2- Período árabe (715-1064)

Em 715 Conimbriga entrega-se sem combate ao invasor berbere, que progride rapidamente na sua marcha para a Galiza. Inicia-se assim um período em que a futura Terra de Santa Maria é dominada alternadamente pelos mouros, que permanecem por mais tempo em Coimbra (antiga Aeminium) e em Lamego (Lamecum) vigiando a fronteira do wadi-Duwairo, pelos cristãos das Astúrias-Galiza, ou pelos presores dependentes do reino de Leão. Porém o nobile local, guerreiro, lavrador ou monge, está sempre presente nos destinos do território, como o atestam os inúmeros documentos que até nós chegaram. Um sentimento de independência, aliás comum ao de muitos outros territórios peninsulares, poderá ser consubstanciado localmente por episódios como o da morte de Mahamud no séc. IX (37) e, se tomado em devida conta, não estranharemos que mais de um século depois muitos senhores cristãos do Entre-Douro-e-Vouga se tenham integrado nas hostes de Almançor e participado no ataque a S. Tiago de Compostela, quando dobrava o milénio (38). O episódio da presúria de Portucale por Vímara Peres,

(33) Cf. SÉRGIO, António (1941) – Em torno da designação de Monarquia Agrária dada à primeira época da nossa História. Lisboa: Livraria Portugália, p. 55.(34) Cf. OLIVEIRA 1967: 67/68.

(35) Cf. FERNANDES 1997:67, 89/90.(36) Cf. GONÇALVES, António Huet de Bacelar (1984) - «Notas arqueológicas de Rui de Serpa Pinto sobre o litoral Entre Douro - e - Vouga». In Gaya, vol. II, Vila Nova de Gaia, 1984, pp. 75-78.(37) Cf. GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (1989) - «Mahamud: algumas difi culdades na fi xação da biografi a de um guerreiro berbere do Al-Garb al-Andalus». In Actas das 3.as Jornadas de História Medieval do Algarve e Andaluzia. Loulé: Câmara Municipal, p. 107 e seguintes, ou idem (2006) – idem. In Um nome para uma escola: Almeida Garrett. Porto: Universidade Fernando Pessoa, p. 53 e segs..(38) Cf. SARAIVA 1979: 14 a 21.

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que coloca temporariamente esta região na dependência dos reis de Leão, não apagará períodos posteriores de uma certa convivência entre mouros e cristãos, de que fi caram ecos na Lenda de Gaia (39) e na mosteirização de inúmeras propriedades. Efectivamente a presúria de Portucale em 868, a que já aludimos, ou seja, da região entre Vouga e o Douro, feita a partir de Coimbra e por senhores com interesses na região, foi um facto de tão extraordinária importância que bem depressa este topónimo deixa de designar apenas esta primitiva parcela a Sul do Douro, para acompanhar a fi xação desses mesmos senhores no Entre-Lima-e-Douro, aparecendo já no século X a designar também esse território, em oposição ao velho conceito da Galiza romano-suévica estendida até à margem direita do Douro (40). Neste processo autonómico o papel de Coimbra foi fundamental: quem no-lo diz é, entre muitos outros (incluindo Alexandre Herculano), o arqueólogo Goméz-Moreno: «livre da divisão das terras entre os muçulmanos, [Coimbra] manteve provavelmente um governo autónomo, constituindo talvez o foco mais importante de moçarabismo em todo o ocidente» (41). É tido como certo que o domínio mouro no Entre-Douro-e-Vouga terminou em 1052; porém a tomada de Lamego só ocorre em 1057, Viseu no ano seguinte e Coimbra em 1064.

Estava defi nitivamente afastada a presença árabe, da então já chamada Terra de Santa Maria. Fig. 4 Deste período os vestígios materiais arqueológicos conhecidos ainda são escassos e, os que existem, precisam de uma revisão crítica aturada sobre aquilo que sobre eles se escreveu. Outro tanto deverá acontecer com a lição dos documentos, muitos dos quais já foram objecto de atento estudo no que diz respeito à sua cronologia, nomeadamente o célebre documento n.º 25 dos Diplomata et Chartae (42), dado que a confl uência de interesses diversos na posse desta terra motivou a falsifi cação de datas e interpolações abusivas em vários textos ou nas suas cópias tardias, de modo a fazer

(39) Sobre a Lenda de Gaia ver GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (1999) - «Recordações da Lenda de Gaia». In GUIMARÃES, J. A. Gonçalves; COELHO, Sérgio Veludo; MOTA, Deolinda (1999) - Roteiro garrettiano de Vila Nova de Gaia. Vila Nova de Gaia: Solar Condes de Resende, pp. 57-61.(40) Cf. SOARES, Torquato de Sousa (1952) - «Vímara Peres restaurador da cidade de Portucale (Porto) e fundador da Terra Portugalense». In Boletim Cultural da Câmara Municipal do Porto, vol. XV, fasc. 1-2, p. 5 e segs.: conforme este trabalho refere, o Livro de Testamentos do Mosteiro de Lorvão apenas diz o seguinte sobre a presuria ocorrida em 868: Era nonagentesima sexta prenditus est Portucale ad Vimarani Petri. Que se saiba, nesta data é pouco relevante a existência de uma povoação chamada Portugale a Norte do Rio Douro, na sua margem direita; pelo contrário, existe um apreciável número de documentos que coloca uma povoação com este nome na margem esquerda; cf. SOARES, Torquato de Sousa (1957) - «Refl exões sobre a origem e a formação de Portugal». In Revista Portuguesa História, tomo VII, Coimbra, onde os resultados da investigação deste Autor são bem diversos dos daquele seu outro trabalho; sobre este assunto veja-se a bibliografi a referida nas Notas 5 e 20 deste trabalho e aí a lista de documentos que referem a problemática de Portucale. Pensamos que dada a escassez documental só a Arqueologia pode vir a aclarar a real importância dos burgos de ambas as margens. Porém também aqui é preciso ter em conta que, tal como aconteceu com o facto de o Porto ter tido sempre mais historiadores do que Gaia a trabalhar nas suas origens, também desde os anos 80 do século passado que no Porto há muito mais arqueologia do que em Gaia. Ora só se encontra o que se procura e a “quantidade” de resultados não é, por si só, a validação da interpretação desses mesmos resultados. Há que estudá-los e interpretá-los sem preconceitos.(41) Citado por SOARES 1952:8. (42) Cf. OLIVEIRA 1967:48.

Fig. 4 - Porta árabe da muralha de Coimbra; fotografi a do autor.

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pender a sua autoridade para uma das partes. Este problema não é inédito na diplomática medieval peninsular.

3- Período moçárabe ou do condado de Coimbra (1064-1095)

Após a conquista de Coimbra, o governo deste condado, cuja jurisdição se estende desde a zona de infl uência daquela cidade até ao rio Douro, incluindo as terras limítrofes situadas mais a oriente, é entregue ao moçárabe Sesnando Davides. Fig. 5

Em 1080 é restaurado o bispado conimbricence, cujos limites a norte coincidiam com os do condado, ou seja, a Terra de Santa Maria fazia parte integrante desta diocese (43). Em 1092 morre Sesnando e três anos depois D. Henrique de Borgonha assume, em nome de D. Afonso VI de Leão, o governo do Condado Portucalense. Consideramos este período fundamental para a consolidação da vontade autonómica dos barões portucalenses e dos cavaleiros moçárabes conimbricences. Conjugados os

interesses autónomos da diocese de Braga face a Santiago de Compostela com este outro movimento de carácter territorial, temos aqui a situação genesíaca do reino de Portugal.

4- Condado Portucalense (1096-1128)

Entregue o governo do Condado Portucalense àquele príncipe estrangeiro, acentuam-se as contradições internas que, no entanto, permitem uma reorganização do território para fazer face a diversas pressões exteriores. Vejamos alguns factos: ciosos da sua autonomia e prerrogativas municipais, em 1111 revoltam-se os cavaleiros moçárabes de Coimbra, obrigando D. Henrique a conceder-lhes um foral, onde esses mesmos direitos fi cam consignados. Dois anos depois, os arredores daquela cidade são atacados pelos mouros, obrigando D. Teresa a uma precipitada fuga para o norte. Em 1117 a cidade voltará a ser atacada, mas resiste. Era pois necessário continuar a luta na frente sul. Também aqui não poderemos deixar de referir a morte de Soeiro Fromarigues, da família patronal do Mosteiro de Grijó, na batalha de Vatalandi, em 1102, precisamente contra os mouros (44). A frente que oferecia menos perigo era a oriental. Por direito de reconquista, as terras do Vale do Douro pertenciam ao reino leonês, aliás como todo o Condado Portucalense, desde 1073. A recordação dessa dependência está bem patente no conhecido mas lendário episódio da ida a Toledo do Aio de D. Afonso Henriques, a prestar vassalagem ao rei de Leão. Curiosamente em 1121, no Mosteiro de Arouca, alguns documentos já se referem «àquele que governará a terra», o que não é evidentemente uma homenagem a Afonso VII de Leão e Castela (45).

Fig. 5 - Túmulo de Sesnando Davides na Sé Velha de Coimbra; fotografi a do autor.

(43) Cf. OLIVEIRA 1956.

(44) Cf. Cartulaire Baio-Ferrado… 1971:XXIV, onde a data errada referida é 1110, tirada da Cronica Gothorum. Sobre a data correcta ver SÃO PAYO Luiz de Mello Vaz de (1986) - «D. Nuno Soares, o que fez Grijó». «In Armas e Troféus, V.ª série, tomo VI, Janeiro/Dezembro, n.os 1, 2 e 3, Lisboa, 1985/86, p. 5. (45) Cf. DURAND, Robert (1982) – Les Campagnes Portugaises Entre Douro et Tage aux XII.e et XIII.e siècles. Paris: Fundação Calouste Gulbenkian, p. 41. Quando em 1990 A. de Almeida Fernandes equacionou a hipótese de D. Afonso Henriques ter afi nal nascido em Viseu, e não em Guimarães como até então pacifi camente se aceitara, a questão da importância daquela cidade e do condado de Coimbra na formação da nacionalidade ganhou nova importância. Refi ra-se, a propósito, que o episódio da vassalagem do Aio terá sido inventado no século XIII por um trovador seu descendente; cf. MATTOSO 1985:321; GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (1990) – Trovadores medievais de Gaia. Separata de B.A.C.A.G. Vila Nova de Gaia: Amigos de Gaia, pp. 11/12.

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Em 1128 D. Afonso Henriques assume o governo do condado portucalense.

VI- A Terra de Santa Maria na formação da nacionalidade

Sobre a participação de Hermígio Moniz, tenens da Terra de Santa Maria nos acontecimentos de 1128, já muito se escreveu e poderíamos fi car pelo que dele disse a austera interpretação de Alexandre Herculano. É hoje insofi smável o papel relevante dos homens de armas do Entre-Douro-e-Vouga e, em particular, do castelo da Feira na fundação da nacionalidade; no entanto pretendemos trazer a este assunto apenas mais algumas achegas que ainda nos parecem relevantes. No rescaldo da polémica dos anos trinta do século passado entre Vaz Ferreira e Alfredo Pimenta, a que se juntaram os pareceres de Magalhães Basto e de Baptista de Lima, tinha sido posta em causa pelo primeiro a primazia de Guimarães na fundação da nacionalidade, ao que o segundo ripostou. Baptista de Lima defendia que no texto publicado nos Scriptores dos Portugaliae Monumenta Historica fora confundido o castelo de Faria com o da Feira. Pretendia-se puxar para perto de Guimarães toda a acção de D. Afonso Henriques, como é evidente e logo fi cou demonstrado. Ainda hoje para alguns historiadores existem dúvidas, de que se trata efectivamente do castelo da Feira. Porém, além dos documentos citados e do parecer da própria Academia Portuguesa de História, outros textos, como a Crónica de El-Rey D. Afonso Henriques de Duarte Galvão, que se servira de documentos coevos, falam claramente do castelo da Feira. Trata-se pois de uma afi rmação bem antiga. Curiosamente na mesma altura e em artigo publicado n’O Primeiro de Janeiro de 19-1-1940 na série “Falam Velhos Manuscritos” – 422 (46): «Onde Nasceu Portugal?» Magalhães Basto, que não tem dúvidas de que Ermigio Moniz «…teve papel principal na revolta de D. Afonso Henriques», também levanta a dúvida de que o outro castelo que D. Afonso Henriques fi lhou a sua mãe, tenha sido o de Neiva. Apenas levanta a questão, mas

não a persegue: o Códice 79 da Biblioteca Pública Municipal do Porto apresenta em dois passos do texto a palavra nenha e o Livro de Linhagens publicado por Herculano nos Scriptores também diz que foi o castelo de nenha e ainda num outro códice citado por Magalhães Bastos encontra-se a forma muha. Estranha aquele historiador que, a partir daí, se tenha dito que o outro castelo fi lhado tenha sido o de Neiva que, no seu entender, difi cilmente se confunde com o que lá está escrito. Também aqui não vamos responder à questão, que apenas nos ocorre porque num documento de 1347 publicado no Corpvs Codicvm Latinorvm (vol. VI, fasc. II, pág. 32), é referida claramente a existência de uma terra chamada dessam Romaaom de nenha, tal e qual como a palavra grafada naqueles documentos sobre a gesta independentista de D. Afonso Henriques. Não identifi camos ainda esta povoação, que curiosamente coincide no orago com a freguesia de S. Romão do Neiva, o que talvez tenha induzido em erro aqueles historiadores. Só que a nenha deste documento fi ca localizada junto ao Rio Douro, nas terras que pertenceram à família dos de Ribadouro, onde o nosso primeiro rei encontrou sempre apoio. Terá sido este o outro castelo fi lhado? Como vemos, por aqui, o assunto ainda não está encerrado (47). Terminemo-lo por ora com esta transcrição da IIIª Crónica Breve de Santa Cruz de Coimbra, do já citado códice quatrocentista: «E elle [D. Afonso Henriques] quando esto vio forçou dous castellos huum Nenha E outro castello da Feira. E danbos estes castellos fazia elle guerra mortall a seu padrasto…» (48). Uma outra questão é a demasiada importância que se tem pretendido dar à batalha de S. Mamede, em detrimento do estado anterior da revolta dos barões da Terra de Santa Maria, de Ribadouro e de Coimbra, contra o ascendente que Fernão Peres de Trava, ou seja o partido galego, vinha tendo sobre D. Teresa e o condado. E aqui põe-se-nos fi nalmente o problema da terceira frente de luta que os barões portucalenses tinham de enfrentar, a frente galega, a mais perigosa, porque não era apenas militar mas também política e, além do mais, a mais interveniente no território. E também aqui o papel de Portucale, no caso a diocese portucalense,

(46) Recentemente publicado por RIBEIRO, Fernanda; MEIRELES, Maria Adelaide (2000) – Falam Velhos manuscritos… Índice de Assuntos 1930-1960. Porto: Biblioteca Pública Municipal, onde curiosamente não aparece uma entrada «Portugal».

(47) Veja-se a polémica entre FERNANDES 1991 e MATTOSO, KRUS & ANDRADE 1993, a que nos referimos na conclusão.(48) Cf. Anais, Crónicas e Memórias Avulsas de Santa Cruz de Coimbra, organização e introdução de António Cruz. Porto: Biblioteca Pública Municipal, 1968, p. 131.

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vai ser de primordial importância na defi nição de um território que consubstancia, ainda que através de contradições, os anseios da necessária unidade a norte e a sul do Douro para consolidar a independência. Recordemos de novo a questão dos limites entre as dioceses portucalense e conimbricence e o papel que nela desempenhou D. Hugo, homem de mão do arcebispo Gelmires de S. Tiago de Compostela. O território pretendido por ambas as dioceses é exactamente a Terra de Santa Maria, ou seja, o espaço onde confl uem todos os interesses em presença. Poderíamos agora chamar à colação as doações e encoutamentos feitos nesta época no Entre-Douro-e-Vouga por D. Teresa e seu fi lho, o que sempre nos pareceu demasiada coincidência. Voltemos à importância da batalha de S. Mamede: José Mattoso, num seu estudo intitulado «A primeira tarde portuguesa», não deixa de sublinhar que «os documentos referem laconicamente a batalha, para descrever depois outros feitos memoráveis» (49). Já no século XVII Fr. António Brandão, na III.ª parte da Monarquia Lusitana, depois de estudar documentos coevos, «…não dá grande importância a S. Mamede… Só com Alexandre Herculano é que S. Mamede é considerada, pela primeira vez como o dealbar da Pátria» (50). Porém trata-se de uma interpretação, que pretende extrapolar alguns factos controversos: a já referida III.ª Crónica Breve diz que a batalha foi ajustada para Guimarães, «em logar que dizem Sam Rredanhas» (51). Noutro passo da Arenga e Memória Avulsas, se diz apenas que D. Afonso Henriques venceu «em a batalha o conde <de Trestamara> que era casado com sua madre…» (52). A batalha ainda não tinha no século XV o nome pelo qual fi cou depois conhecida. Fig. 6 O que pretendemos aqui salientar é exactamente o quanto está por estudar o papel dos caudilhos locais nesta acção realmente colectiva, que tem vários pontos de partida e envolve «… um grupo humano considerável» (53). «A reacção colectiva dos nobres contra a intromissão de Fernão Peres compreende-se melhor quando se relaciona com a evolução da nobreza portucalense no seu conjunto desde o princípio do século XI. Nessa altura, pouco depois da desorganização provocada pela fraqueza da monarquia asturiana e precipitada

pelas invasões de Almançor, aparecem na região do Porto e de Entre-os-Rios caudilhos de segunda categoria que, um pouco à maneira dos senhores de castelos na França de então, afi rmam o seu poder militar autónomo. Fazem-no em lutas fronteiriças com os Mouros. Nasce daí a riqueza material de famílias como a da Maia e de Riba-Douro, talvez também a de Baião, que estendem os seus domínios respectivamente pela região do Vouga e do Paiva, ainda antes da Conquista de Coimbra pelo rei Fernando Magno» (54).

(49) Cf. MATTOSO 1985: 11.(50) Idem, idem 14 e 15.(51) Cf. Anais, Crónicas e Memórias… 1968:131.(52) Idem, idem, p. 99.(53) Cf. MATTOSO 1985:17.

Fig. 6 - Castelo da Feira; fotografi a do autor.

(54) Idem, idem, p. 23.

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Porém o que por ora nos interessa não é tanto a discussão das primazias interpretativas na fundação da nacionalidade, mas aquilatar, através dos meios documentais e arqueológicos disponíveis, qual a efectiva evolução medieval da região do Entre-Douro-e-Vouga, ou seja, da Terra de Santa Maria. Compreendendo as suas reais potencialidades materiais, institucionais e humanas ao longo dos séculos, desde o fi m da administração romana até 1128, será então mais fácil, perante um quadro minimamente coerente, compreender a participação dos seus próceres e dos seus habitantes na construção da nacionalidade.

VII- Propriedade

Região central de um país nascente, prolongada para Norte pelas veigas do Entre-Douro-e-Minho, para Sul pelas terras baixas do Mondego e para Leste pelos Montes de Arouca e Cambra, com o afastamento das fronteiras, bem depressa a Terra de Santa Maria deixa as lides guerreiras e se entrega ao labor agrícola. Não admira pois que a maior parte do seu território nos séculos XI a XIII seja pertença de inúmeros mosteiros, quer os localizados no território, como S. Pedro de Canedo (fundado no século XI); S. Cristóvão de Sanguedo (séc. X); S. Pedro de Pedroso (século XI); S. Salvador de Grijó (século X); Vila Cova das Donas (Sandim, século XI); Cucujães (século XII), quer os localizados um pouco por todo o Portugal de então, como Paço de Sousa, Cedofeita, Rio Tinto, Santa Cruz de Coimbra, Cete, Bustelo, S. Pedro de Ferreira, Vilar de Frades, Pombeiro, Várzea, Rofoios, Cerzedelo, Carvoeiro, etc. (55). Já para trás tinham fi cado outros mosteiros pré-clunicences, alguns provavelmente de remota regra visigótica, do carácter duplex, alheios às condenações de S. Frutuoso, com carácter familiar ou particular, que acabaram por ser anexados por mosteiros maiores ou transformados em igrejas paroquiais. É o caso dos mosteiros de Anta (Espinho: séc. XI); Azevedo (Ovar; séc. X); César (Oliveira de Azeméis; séc. XI); Crestuma (Vila Nova de Gaia; 927-DC12, século X); Marnel (Águeda; séc. X); Sá (Mosteiró, Santa Maria da Feira; séc. X); Santa Marinha de Portugal ou de Portu Dorii (Vila Nova de Gaia; séc. X); S. João de Ver (Santa Maria da Feira; séc. X); S. Gião (Souto, Santa Maria da Feira; séc. X); Sermonde (Vila Nova de Gaia; séc. XI); Vilar do Febros (Vilar de Andorinho, Vila

Nova de Gaia; séc. XI) e ainda outros mosteiros ou eremitérios dos quais se sabe muito pouco ou quase nada, como o de Santa Marinha in ripa Antunane (Avanca: 922-DC 25); o de S. Martinho (Castelões, Vale de Cambra: 924, DC 92); S. Nicolau (Monte da Meijoeira, actual Serra do Pilar, Vila Nova de Gaia; Censual do Cabido; século XIII) (56). Por aquilo que se sabe da distribuição no território do seu património, verifi ca-se que, a partir do século XII, pouco terá fi cado para a instalação de senhorios laicos, pois teremos ainda de considerar as propriedades das ordens militares, sendo a do Hospital aquela que aqui detém maior número de parcelas de terreno no início do século XIII, seguida dos Templários, aparecendo ainda alguns bens na posse da Ordem de Calatrava e até na dos Espatários (57). Muitas destas propriedades pertenceram, anteriormente, por presúria, aos senhores de Marnel e de Grijó e a outras famílias nobres, a maior parte delas com casa dominial fora deste território, como os da Maia e de Ribadouro. A nobreza local era essencialmente composta por infanções e cavaleiros, como é o caso da família patronal do Mosteiro de Grijó. Juntemos ainda as propriedades de alguns herdadores que habitavam os reguengos dispersos pelo território, mais tarde aforalados em concelhos. Anotemos ainda que o municipalismo começa tarde neste território: Gaia tem foral apenas em 1255 e Vila Nova em 1288; o chamado foral velho da Terra de Santa Maria é na verdade uma súmula das inquirições de D. Afonso III. Nas inquirições dionisinas de 1288 aparecem os julgados de Gaia, da Feira, da Terra de Santa Maria, de Cabanões, de Figueiredo del Rei, de Fermedo e de Cambra, o que não quer dizer que todas estas terras tivessem tido foral, o qual não era exactamente necessário para a constituição dum concelho, como no caso do de Canidelo, de efémera duração, criado em 1363 por carta de D. Pedro (58).

(55) Cf. OLIVEIRA 1967:232.

(56) Idem, idem, idem. Sobre os mosteiros da região ver MATTOSO, José (1968) – Le Monachisme ibérique et Cluny. Les Monastères du Diocese de Porto de l’an mille à 1200. Louvain: Université, tendo-se entretanto publicado nas últimas três décadas alguns trabalhos monográfi cos sobre alguns destes mosteiros, como já assinalamos. (57) Cf. OLIVEIRA 1967: 232.(58) Sobre a documentação aqui referida ver MATTOSO, KRUS & ANDRADE 1989 e idem, idem, idem 1993; sobre o concelho de Canidelo ver MACHADO, J. T. Montalvão (1966) – Amores de D. Pedro e D. Inês em terras da Lourinhã, de Gaia e de Coimbra. Lisboa: Livraria Portugal, e GUIMARÃES, J. A. Gonçalves (1984) – O Concelho de Canidelo de D. Pedro e D. Inês. Separata de Gaya, vol. II, 1984, Vila Nova de Gaia: Gabinete de História e Arqueologia.

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VIII- Conclusão

Defi nida sumariamente a Terra de Santa Maria como uma região natural com características geomorfológicas e ambi--entais próprias que condicionaram o seu passado histórico, estamos perante uma paisagem de há muito intervencionada pelo homem que nela explorou fundamentalmente as enormes potencialidades agrícolas e piscatórias, sem esquecermos a extracção do sal nas muitas marinhas que existiam ao longo da sua costa oceânica. A actividade piscatória gerou ou favoreceu a actividade marítima em geral e a construção naval em particular, que se serviu das madeiras das fl orestas limítrofes. A actividade agrícola gerou, como subsidiária ou complementar, a da criação de gado. Com todas estas características não nos deve surpreender o povoamento intenso que se evidencia no fi nal do século XII. Porém um outro factor jamais poderá ser esquecido na caracterização medieva da terra: é que, como já acontecera em épocas mais remotas, sulcavam-na duas estradas principais: a que fazia as ligações entre o Norte e o Sul do Rio Douro, a estrada mourisca mencionada em tantos documentos do cartório de Grijó e que dependia em absoluto do controlo das barcas de passagem daquele rio; uma outra, vinda de Ovar por Grijó, nela entroncava em Pedroso, e daí partia para leste em direcção a Viseu, servindo as passagens do Douro mais a montante. Esta característica de terra de passagem está presente em toda a sua vida medieva, sobretudo na vida dos seus mosteiros e na actividade das suas povoações ribeirinhas. Fig. 7 Damos por agora concluída esta breve síntese que procurou caracterizar o cenário medieval da Terra de Santa Maria e do seu povoamento até à consolidação da nacionalidade e que mais não pretende ser do que um ponto de partida para um estudo mais exaustivo que concilie a lição documental com o estudo dos edifícios existentes e os vestígios arqueológicos que possam vir a preencher as muitas lacunas que afl oramos e possibilitar-nos assim um melhor conhecimento desta região. Até aqui o essencial deste texto foi lido em 1988 nas jornadas onde igualmente foi apresentada a comunicação «O papel da Terra e do Castelo de Santa Maria na fundação da Nacionalidade – esboço prévio» por José Mattoso (59), que depois daria o livro O Castelo e a Feira. A Terra de Santa Maria nos séculos XI a XIII (60). Tendo enviado o texto e os

mapas da nossa comunicação àquele medievalista, o mesmo fez-nos então alguns reparos à metodologia que seguimos na abordagem do estudo da terra em que ambos estávamos então interessados, embora com perspectivas diferentes, pois a sua era a da História e a nossa a da Arqueologia, ou seja, apenas pretendíamos traçar uma caracterização geral do território onde pudéssemos ir encaixando os vestígios materiais que iam aparecendo, ou que já se conheciam, os quais por sua vez, postos em confronto com a lição documental, quase sempre lacunar e equívoca, contribuiriam assim para a possível reconstituição, interpretação, compreensão e divulgação do passado da região de Entre-Douro-e-Vouga (61). Entretanto, logo no ano seguinte, A. de Almeida Fernandes entra em polémica com José Mattoso, contestando vários aspectos abordados naquele livro, os quais publicou em Faria e não Feira (1127-1128) (62), a que o primeiro respondeu, com A Terra de Santa Maria no século XIII. Problemas e documentos (63) e A Terra de Santa Maria na Idade Média. Limites

Fig. 7 - Mosteiro de Pedroso; fotografi a do autor.

(59) Cf. 1.as Jornadas de Estudo sobre Terras (sic) de Santa Maria, 7 a 9 de Abril de 1988. Santa Maria da Feira: Câmara Municipal. O plural Terras é absurdo e impróprio.(60) MATTOSO, KRUS & ANDRADE 1989.(61) Estávamos nessa época a desenvolver o projecto «O povoamento medieval na margem sul do Rio Douro» homologado pelo Instituto Português do Património Cultural (IPPC) a 2 de Junho de 1986; cf. GUIMARÃES 1995: 7 e seguintes, do qual era signatária a Dr.ª Maria da Graça Peixoto, que não participou na redacção do texto acima apresentado. Trocamos correspondência com José Mattoso sobre o nosso texto entre 02.05.88 e 13.07.88.(62) FERNANDES 1991.(63) MATTOSO, KRUS & ANDRADE 1993.

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Geográfi cos e Identidade Peculiar (64). Para além de aspectos muito particulares da discussão entre aqueles dois grandes medievalistas, que terão mais a ver com os seus caracteres pessoais do que com os assuntos em discussão, e que, na melhor das hipóteses, nos poderiam levar a interrogarmo-nos sobre o percurso biográfi co que a cultura portuguesa ofereceu a cada um deles, infelizmente aquela polémica não teve grandes consequências motivadoras na continuação dos estudos medievais da região, a não ser, talvez, em trabalhos monográfi cos sobre os mosteiros e a sua documentação, de que destacamos, ainda em 1989, O Mosteiro de Vila Cova das Donas (65), a que se seguiram São Salvador de Grijó na segunda metade do século XIV (66), em 1994, e Os Patronos do Mosteiro de Grijó (67), no ano seguinte de 1995, quando é também publicada a nossa tese de mestrado Gaia e Vila Nova na Idade Media. Arqueologia de uma área ribeirinha (68), a qual trata apenas das duas povoações medievais da extremidade norte da Terra de Santa Maria, sendo Gaia a cabeça de um dos seus julgados. Desde então, e afora um ou outro trabalho sobre o monumento medieval por excelência da região (69) e um ou outro artigo sobre alguma escavação arqueológica pontual ou algum pormenor histórico (70), o estudo da Terra de Santa Maria medieval, no seu todo, ou a sua participação na consolidação histórica da nacionalidade portuguesa emergente a partir do século IX, parecem não ter merecido interesse aos investigadores, continuando assim sem resposta ou sem consolidação muitas das questões equacionadas ou debatidas por MATTOSO et all e FERNANDES nos fi nais da

década de oitenta/inícios da de noventa do século passado. Continua pois por fazer uma sólida síntese sobre a Terra de Santa Maria na Idade Média, pois as obras já produzidas, a nosso ver, trataram muito do seu centro e muito pouca da sua extensão. Fig. 8 Por todas estas razões entendemos que poderia ainda ser útil a republicação deste nosso estudo (71), que consideramos válido nas suas linhas gerais, tendo no entanto o cuidado de actualizar a sua bibliografi a com as obras e trabalhos entretanto produzidos sobre alguns dos aspectos aí abordados e, ao mesmo tempo, introduzir algumas correcções e precisões que a nossa própria investigação foi considerando. Só podemos continuar a desejar que o mesmo seja em breve suplantado pelo estudo cuja falta acima lamentamos.

(64) MATTOSO 1993.(65) Cf. SANTOS, José Joaquim de Fontes Dias dos (1989) – O Mosteiro de Vila Cova das Donas. Sua evolução e formação. A exploração dominical. Vila Nova de Gaia: Gabinete de História e Arqueologia.(66) Cf. AMARAL, Luís Carlos (1994) – São Salvador de Grijó na segunda metade do século XIV. Estudo de Gestão Agrária. Lisboa: Edições Cosmos. (67) Cf. PIZARRO, José Augusto P. de Sotto Mayor (1995) – Os Patronos do Mosteiro de Grijó (Evolução e estrutura da família nobre nos séculos XI a XIV). Ponte de Lima: Edições Carvalhos de Basto, Ld.ª. Para o estudo das famílias nobres da região ver idem (1999) – Linhagens medievais portuguesas. Genealogias e estratégias (1279-1325), 3 volumes. Porto: Universidade Moderna.(68) Cf. GUIMARÃES 1995.(69) Cf. BARREIROS, Maria Helena (2001) – O Castelo de Santa Maria da Feira (séculos X a XX). Formas e funções. Santa Maria da Feira: Comissão de Vigilância.(70) Por exemplo GUIMARÃES & GUIMARÃES 2004, op. cit. Nota 10.

(71) Este nosso estudo, sendo portanto anterior ao de MATTOSO, KRUS & ANDRADE 1989, e a quem o facultei logo após a sua apresentação pública em 9 de Abril de 1988, foi inicialmente publicado no Boletim da Associação Cultural Amigos de Gaia, n.º 32, Dezembro de 1991, pp. 30-34 e nº 33, Junho de 1992, pp. 25-33. Aproveito para informar que nessa primeira publicação só são da minha responsabilidade as imagens das páginas 31,32 e 34 (B.A.C.A.G. n.º 32) e 30 (B.A.C.A.G. n.º 33) e não as restantes.

Fig. 8- Porta da alcáçova do Castelo da Feira; fotografi a do autor.

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66 PRESÍDIO

Manuela Correia*

Parto à procura das palavras

mas tenho um nó na garganta

e nas mãos um cadeado

Não ouço choro nem vozes

não sei do meu próprio corpo

neste presídio calado

Todos se foram embora

deste lapso de tempo

rumor de estagnação

Agora quando é que eu fujo

da face do papel branco

do cárcere da solidão

* Nasceu na aldeia de Cabrum, concelho de Vale de Cambra,em 1961. Em Vale de Cambra, durante a frequência do liceu, aprendeu o gosto pela poesia. Iniciou a sua actividade profissional aos 18 anos e aí viveu durante anos. Actualmente exerce a sua actividade profissional no Porto e reside em Santa Maria da Feira, Vila Boa. Tem colaborado em muitas sessões e tertúlias de poesia.Livros publicados: - “As nuvens não são mais de algodão”, de 2000. - “Poemas Tri Angulares”, de 2002. - “Interlúdio d’ Eros”, de 2003. - “Escritos de Areia” de 2005.

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Amália

Os meus desenhos da Amália

“Quando fi zerem a minha história e eu já não for viva para dizer como foi, então é que se vão fartar de inventar. Mas sei que a minha história vai ser aquela que escolherem, aquela que é a mais interessante, aquela que não é a minha”.

Há dez anos uma falha do coração, de quem tanto o usou, levou-nos a Amália, a deusa absoluta do fado cantado, esse fôlego chorado português e eu, que desde muito pequeno (10, 12 anos de idade?) criei amarras tensas de afecto a essa portuguesa rara, senti o dever necessário de a lembrar, mesmo sem estar à altura do gesto que pretendo.

Há sessenta anos havia intérpretes famosas dessa canção nacional que quase monopolizava a expressão musical do cantar português: a Hermínia Silva, a Maria Teresa de Noronha, a Lucília do Carmo, a Fernanda Baptista, e tantas mais. Mas essa fraternidade espiritual intuída, essa tirania de um encanto cego e defi nitivo, que desde o início me prendeu, só se estabeleceu com a Amália. São assim as coisas da alma, esse produto de uma bioquímica muito particular, que nos dá entendimento e sentimentos. A sua voz, que começou por me chegar vinda do arranhar de discos toscos de 78 rotações por uma agulha ferrugenta, trouxe-me uma presença que, entrada pelos ouvidos, se entranhou nos escaninhos mais íntimos da sensibilidade e da memória e não saiu mais. A poesia – invólucro e miolo do fado – tem estas razões que a razão desconhece. Foi por ela que, neste acontecer tão espontâneo, me tornei um eterno apaixonado da Amália. Diz-se que a Amália era do Mundo, era de todos. Mas, mais do que ser de todos, a Amália era de cada um. Cada um possuía a sua Amália. Havia muito da Amália que foi, sempre, só meu. Quando se ama, quando se estima, quando se admira uma pessoa, há muito dela que só a nós pertence. A sintonia afectiva gera a partilha de uma espécie de electrões espirituais que passam a girar numa órbitra comum e a animar uma

Serafi m Guimarães*

* Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

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intimidade única e intransmissível. Ninguém mais no mundo sentiu ou sente aquilo que eu sentia quando a ouvia e continuo a sentir quando a ouço ou recordo, porque a ternura, o enlevo, a magia que a sua vóz cria gera em mim uma ressonância que é só minha, como é minha e única a saudade profunda que a sua imagem, a sua voz, a sua lembrança, me suscitam. A saudade não é das coisas ou das circunstâncias. Estas ajudam a memória a refazer o que sentimos, o que vivemos, o que fomos nesses momentos. As saudades são sempre de nós própios e refl ectem bens que perdemos. A Amália, como todas as grandes personalidades, foi tão rica que teve muito para dar, mas só deu, a cada um, aquilo que cada um foi capaz de receber. A Amália não foi só aquilo que era fácil de ver ou de entender: um casamento precoce interrompido ou o triunfo no Olympia, ou o fado da Mouraria! Os momentos excessivos, que os palcos mostram, que geram aplausos frenéticos e ecos que chegam longe e que fomentam as notícias de que os jornais se enchem, só traçam limites, só defi nem contornos, são episódios de membrana que não traduzem o que se passa no citoplasma, nem chegam ao núcleo. Para conhecer uma personalidade é indispensável, sem dúvida, ter em conta os factos grandes que até as fracas memórias registam, os episódios que todos assinalam, o relevo dos acidentes, mas isso, não só deixa muito por mostrar, como pode distorcer a natureza do corpo de que só temos o perfi l. As notas mais agudas e sonantes de uma composição contam, mas não constituem a essência de uma melodia. Muito mais do que a exaltação de certos momentos de euforia, conta a vivência serena das horas esquecidas e lúcida dos intervalos, dos momentos de pausa. É dos intervalos da vida que brota o lastro da verdade que a anima e caracteriza. Quem tem a experiência da participação em congressos sabe que, mais do que o espectáculo do palco, interessam as conversas dos corredores. O nervosismo da representação, o medo dos rostos sérios dos anfi teatros, a expectativa dos confrontos, a teia das convenções, geram uma atmosfera postiça, que é desfavorável à revelação da verdade e cria o meio fértil onde se propaga a irrealidade e se fomenta a fantasia! O que, em geral, se conhece da Amália é pouco, às vezes falso, fi ca aquém e deixa, em quem a conheceu melhor, uma

larga margem de desconsolo. Vi o fi lme sobre a Amália recentemente exibido com grande alarido. Como eu entendo tão densa chuva de protestos. Tudo tão longe da minha Amália. A Amália era tão excepcionalmente talentosa que podia ter sido tudo o que tivesse desejado ser. Bela, inteligente, natural, simples, verdadeira, era um poço sem fundo de qualidades humanas. Segui com afecto muitos passos dos seus caminhos, ouvi-a muitas vezes, conheci-a de perto, li os seus versos. O gosto pelo desenho e a preferência para fi xar rostos nasceu comigo e tem-me acompanhado desde tenra idade. Se eu não tivesse a memória da origem e do curso da minha paixão pela Amália bastava-me seguir a marcha dos registos desenhados que dela fi z e possuo para poder traçar, com pormenor, esse percurso. Tinha catorze anos quando fi z o primeiro retrato que guardo da Amália! Era ela uma bela jovem que, no meu “retrato”, aparece um pouco envergonhada e tímida. Não sei se a razão da vergonha era dela ou minha! O primeiro episódio da minha relação pessoal com a Amália é de quatro anos depois e tem história. Numa noite de verão a Amália veio cantar a Espinho. O palco, montado ao lado da Capela da Senhora da Ajuda, ali a um passo do que tinha sido o meu primeiro Colégio de S. Luís, asssociado à expectativa emotiva do momento transformaram aquele recanto feio e triste num espaço largo de luz e encanto. Tudo grandioso e sublime. Estávamos em 1953. Lembro-me que tinha entrado na Faculdade e aproveitei o ensejo para estrear a minha capa e batina. Assim camufl ado e no meio de uma multidão anónima e excitada pedi-lhe um fado e a Amália cantou-o com a sua voz divina e a afeição, que vinha da infância, tornou-se uma paixão adolescente e, no dia seguinte, nasceu o segundo desenho. Uns anos mais tarde, veio ter comigo o portador de um recado da Amália que estava nessa noite no Porto e queria ouvir o nosso grupo de serenatas. O impensável, às vezes acontece. O Fado também é isto! E à noitinha, nervoso, sem ensaios prévios, integrado no grupo de que fazia parte, tinha a Amália à espera na Casa dos Jornalistas e Homens de Letras da Cidade do Porto. Acabara a sessão dessa noite da peça “ O Processo de Jesus” em exibição no Rivoli e era, por isso, grande o número de pessoas de reconhecido mérito e nome sonoro que connosco

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compareceram para a homenagearem. Lembro-me de alguns desses nomes graúdos do teatro português e que eu muito admirava como a Amélia Rey Colaço, o Raúl de Carvalho, o Erico Braga, a Ema Paúl e que tratavam a Amália por tu!

Pois foi, mas a Amália só nos quis a nós, para uma noite rara de arte e emoção, uma noite que foi um expressivo intervalo. A espontaneidade das suas atitudes, a doçura da sua voz, a vivacidade da sua inteligência, o surpreendente

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nível da sua cultura, vinham à tona da circunstância na mais simples das suas frases e no mais subtil movimento dos seus gestos, para dar encanto e raça à sua presença.

Conversámos em três línguas diferentes, relembrámos momentos, falámos do Capas Negras – o fi lme que eu tinha visto seis vezes – e até dançámos!

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Encontrei-a, depois, em dois momentos de exaltação patriótica que foram outros tantos intervalos eloquentes. No avião, de regresso de uma das últimas viagens que a Amália fez ao Brasil, um grande e saudoso Amigo, o Professor Joaquim Polónia, viajou ao seu lado e, na conversa obrigatória que teve com a vizinha de banco, falou-lhe dos meus desenhos e a Amália prometeu vir ao Porto, para os ver. Mas não chegou a vir.

O último episódio de um grande intervalo, vivi-o na Igreja do Carvalhido no funeral do saudoso poeta do “Povo que lavas no rio”. A grande Amália esteve lá, quase sozinha. Foi mais um dos claros momentos reveladores da sua grandeza e o fi lme não mostrou isso!

Outubro de 2009

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74 O. O.

Anthero Monteiro*

olga oliveira

só tem idade p’rá brincadeira

mas tem uma certa mágoa

de não saber

escrever

só sabe assinar na água

no lago deixa cair

duas pedrinhas não mais

produz assim duas ondas

co’as suas iniciais

não há letras mais redondas. *Escritor e poeta natural de S. Paio de Oleiros. É autor de vários livros

de poesia e de ensaio.

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O ENCLAVE DE PARADA (DA FREGUESIA DE LOUREDO)

Frei Acaribe*

De várias entidades ofi ciais e particulares fui várias vezes solicitado a dar (se possível), uma explicação sobre o Enclave de Parada:-se é realmente um enclave; entre que freguesias se encontra situado; qual a sua origem; qual a distância da sede da freguesia; qual a sua área; quantos fogos e habitantes; quais as estruturas de apoio ao seu povo etc. De início limitava-me a informar que era realmente um enclave entre as freguesias de Canedo e Vale, (Santa Maria da Feira) e São Miguel do Mato, (Arouca). Quando, porém, pensei levar a efeito a Monografi a de Louredo, decidi aprofundar o assunto e (como se pode verifi car na referida Monografi a) hoje, creio eu, já não há lugar para qualquer dúvida. As suas actuais confrontações são as seguintes: a Nascente, São Miguel do Mato (Arouca); a Norte, Lomba (Gondomar) e Canedo (Santa Maria da Feira; a Poente e Sul, Vale (Santa Maria da Feira). A sua origem tem a seguinte explicação histórica:- Aquando das lutas pela independência de Portugal, D. Afonso Henriques teve de recorrer a homens que comungassem

nos seus ideais e que possuíssem meios fi nanceiros para fazer face a todas as despesas que tais lutas acarretavam. Um desses homens chamava-se Gonçalo Dias, casado com uma senhora de nome Maria Anaia. Além de tomar parte em algumas batalhas, ainda contribuiu com alguns cavalos, homens, armas e morabitinos (moeda desse tempo). Em compensação, D. Afonso Henriques concedeu-lhes em Couto as terras que hoje são as freguesias de Louredo e Vale (de Santa Maria da Feira) e parte da de São Miguel do Mato (de Arouca). (Vid. Monografi a de Louredo – Breves Apontamentos para a sua História, de A. Freitas, “O Couto de Louredo, págs 31-35) Antes de morrer este Gonçalo Dias faz testamento contemplando vários Conventos e Mosteiros, quer de perto quer de longe, conforme a sua devoção e simpatia. Entre os contemplados contava-se o Mosteiro de Canedo, aqui mesmo ao lado. a quem legou São Vicente e Parada (Vid. Ob. cit. -Testamento de Gonçalo Dias na pág. 42 ). E o que acontece quando um herdeiro recebe um prédio num lugar e outro mais separado, mas os dois perto da sua morada, difi cilmente se desfaz deles. (o que não acontece quando estão situados longe de casa, que quase sempre os alienam). Foi, pois, o que aconteceu com São Vicente e Parada,

* Professor. Historiador.

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que sendo pertença, por herança, do Mosteiro de Canedo, e estando aqui mesmo ao seu lado, os frades nunca permitiram a sua separação. Quando mais tarde se formaram as freguesias, e pela razão anotada, a parcela de Parada permaneceu sempre ligada a São Vicente. A título de curiosidade, e para ser justo com os seus moradores do passado e do presente, devo confessar que este povo, mesmo ao lado da Igreja de São Miguel do Mato, Arouca, (apenas um quilómetro), sempre lutou por viverem ligados a Louredo (São Vicente), de Santa Maria da Feira (donde dista cinco quilómetros bem medidos). Foi freguesia, (mais tarde extinta), com Igreja (Ecclesia) e cemitério.

A norte deste povoado existiu o Mosteiro do Ribeiro, de freiras beneditinas e uma pequena aldeia dizimada pela célebre “peste grande”. Ainda hoje se podem encontrar vestígios de algumas casas. (Vid. ob. cit. págs 27 e 28). Presentemente tem Igreja onde se celebra a Eucaristia todos os sábados à noite; Escola de ensino básico; Campo de Jogos, etc. Segundo o censo actual, consta de 45 fogos, onde habitam 180 moradores de várias condições sociais, verifi cando-se que a maior parte, graças à emigração para o Brasil, França e Suiça, goza de um nível de vida bastante confortável. Outros pormenores sobre este enclave podem ser consultados na obra acima referida.

Igreja de Parada. Cruzeiro.

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77 Dicionário Biográfi co de Personalidades Feirenses

Francisco de Azevedo Brandão *

CASTRO, António Pinto de Almeida e (1809-1880). Nasceu em Fiães em 1908. Foi camarista, e muito interessado pelo progresso da sua terra. Era casado dom D. Marcelina Barbosa de Castro, natural de Sandim, e pai do Dr. Elísio de Castro. Faleceu em 1880.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

CASTRO, Crispim Teixeira Borges de (1871-1962). Nasceu na Quinta da Mámoa, Milheirós de Poiares em 1871. Era formado em medicina pela Universidade de Paris. «Durante muitos anos, no exercício da clínica, nunca levou honorários pelos seus serviços prestados aos habitantes da sua terra que ele amava extraordinariamente, como demonstrou no seu testamento em que legou toda a sua grande fortuna à freguesia de Milheiros de Poiares». Foi presidente da Câmara Municipal da Feira. Era casado com D. Judite Pita de Abreu

Teixeira Borges de Castro. Faleceu na sua Casa da Mámoa em 20 de Outubro de 1962 com 91 anos de idade.

Bibliografi a Francisco Neves, Do Alto da Piedade. Edição da LAF – Liga dos Amigos da Feira, 2003

CASTRO, Elísio Pinto de Almeida e (1869-1956). Nasceu na sua Quinta das Cavacadas, em Fiães, a 6 de Janeiro de 1869. Era fi lho de António Pinto de Almeida e Castro e de D. Marcelina Barbosa de Castro. Foi o organizador e presidente da Iª Comissão Republicana da Feira e o primeiro presidente da Câmara Municipal da Feira após a implantação da República, e nas eleições realizadas em Novembro de 1911 foi eleito presidente do Senado Municipal até 1926. Ainda em 1910, foi nomeado Contador do Tribunal da Comarca do Porto, tendo-se aposentado após o 28 de Maio de 1926. Foi um acérrimo defensor da integridade do concelho da Feira. Em 1920 foi nomeado Governador Civil de Aveiro. Foi ainda chefe de secção do procurador da comarca do Porto. Por sua casa de Fiães passaram alguns vultos de relevo, seus correligionários, como Sampaio Bruno, João Chagas, Germano Martins, coronel Djalma de Azevedo e Alexandre Braga. «Os feirenses jamais poderão esquecer essa nobre fi gura, pelos altos serviços que prestou à nossa terra, mantendo, mercê do seu grande prestígio, a integridade da comarca seriamente ameaçada». Faleceu no Porto a 12 de Novembro de 1956.

* Licenciado em História pela Universidade do Porto e Bacharel em Filologia Românica pela Universidade de Coimbra. Historiador local, é autor de Anais da História de Espinho, O Associativismo em Espinho, Joaquim Pinto Coelho, um Político de Espinho, O Campo de Aviação de Espinho, O Culto de Nª Sª da Ajuda em Espinho e Manuel Laranjeira, por ele mesmo.

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Deixou dois fi lhos: o Dr. Fernando de Castro, advogado, e Elísio Bessa de Castro, chefe de secção da comarca do Porto.

Bibliografi a Correio da Feira, 13.1-1950 e 17.11.1950; 17.11.1956Francisco Neves, Do Alto da Piedade. Edição da LAF – Liga dos Amigos da Feira, 2003Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

CASTRO, Joaquim Correia de (1898- ?). Nasceu no lugar de Chousa de Cima, Fiães, em 17 de Fevereiro de 1898. Matriculou-se no Colégio da Formiga, em Ermesinde em Outubro de 1909. Em 1911 partiu para França a prosseguir os seus estudos, donde regressou a Portugal, onde se ordenou presbítero na cidade de Braga a 5 de Agosto de 1923. Um ano depois foi nomeado professor em Viana do Castelo. Em 1932 foi dirigir a Comunidade em Braga e em 1938 voltou a Viana do Castelo como director superior do Seminário.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira, Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

CASTRO, Manuel António da Silva Coelho e (1887-1952). Nasceu em Fiães em 1887. Em 1910 partiu para Lourenço Marques onde se dedicou à vida comercial. Em 1924 veio a Portugal onde residiu na sua casa de Vilar, em Fiães, tendo voltado pouco depois para Lourenço Marques, prosseguindo a sua actividade comercial. A 22 de Agosto de 1924 fez um testamento, no qual declarava que metade dos seus bens fossem atribuídos a pessoas da família e a outra metade se procedesse à venda e liquidação somente daqueles bens que fossem necessários para aplicar na construção de uma escola industrial e comercial na freguesia de Fiães, concelho da Vila da Feira, tendo confi ado à Junta de Freguesia o encargo da direcção e fi scalização da construção da mesma escola. Depois de vária formalidade jurídica, a portaria do Ministro da Educação Nacional publicada no Diário do Governo de 15 de Fevereiro de 1960, II.ª Série, constitui a Junta Directiva da Fundação Coelho e Castro. Funda-se então a Escola

Preparatória com o nome do benemérito. Coelho e Castro faleceu em Lourenço Marques, em 15 de Janeiro de 1952.

Bibliografi a Domingos da Silva Fontes, Fundação Coelho e Castro. Revista Ulfi lanis Villa, n.º1 – 1978. Edição da Comissão de Defesa do Património e Acção Cultural (cdpac), Fiães

CASTRO, Manuel de Castro. ( ? - ?). Foi pároco de Rio Meão de 16 de Fevereiro de 1719 a 8 de Setembro de 1732. Já em Outubro de 1726 o visitador dizia que Frei Braz de Sousa «se acha mais entrado em anos lhe recomendamos especialmente esta obrigação», mas que isso não o isenta de «qu’insigne a doutrina christam aos menores e instrução nos principais mistérios da nossa santa fee aos seus fregueses…mandamos que os capítulos da visita passada se cumpram e estes se leiam à estação da missa». A última visitação que assinou foi em 21 de Setembro 1732.

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão – a Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001

CASTRO, Manuel Joaquim Varela de ( ? - ?) Foi pároco da freguesia de Pigeiros, apresentado, em 1821, pelos «Rochas», continuadores dos antigos Pereiras da Quinta do Paço de Pigeiros.

Bibliografi a P.e José Inácio da Costa e Silva, Santa Maria de Pigeiros, jornal Tradição, número especial das Comemorações dos Centenários, Setembro, 1940.

CASTRO, Manuel Pinto Almeida e (1777-1837). Nasceu no lugar da Bica, em Fiães. Foi pároco da sua terra desde Julho de 1827 a Agosto de 1834. Foi o último pároco de Fiães de apresentação dos Lóios, de Lamas, cuja congregação foi dissolvida pelo 1.º governo constitucional. Faleceu na sua casa da Bica em 5 de Novembro de 1837, com 60 anos de idade.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

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CASTRO, Manuel Pinto de Almeida e (1815-1883). Nasceu na Casa da Bica, Fiães, em 1815. Era um dos grandes proprietários daquela freguesia. Faleceu a 16 de Janeiro de 1883, com 67 anos de idade.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

CAVACO, António dos Santos (1915-1975). Nasceu na Vila da Feira em 22 de Fevereiro de 1915. Industrial desde os 17 anos com uma empresa a que deu o seu nome, sendo a área da pedra a sua ocupação principal. Com o fi m da guerra inicia um conjunto de obras para um empreiteiro de Espinho, quando simultaneamente construía o Bairro da Misericórdia do Cavaco. Os sobre-custos criados pela infl ação levaram o empreiteiro de Espinho à falência, bem como elevaram o custo de todos os trabalhos contratados, o que afectou negativamente as fi nanças da sua empresa. Assim, decide emigrar para o Brasil durante três anos para se refazer fi nanceiramente. Regressado em 1955, inicia a actividade no seu nome durante algum tempo e faz sociedade com o sobrinho António Leite dos Santos e adopta o nome empresarial de Santos Cavaco & Sobrinho, o que se desenvolve até 1970. Volta ao nome próprio, nessa data, até ao seu falecimento, tendo dado a sua colaboração em várias associações e colectividades na sua terra. Pertenceu aos Bombeiros Voluntários de Santa Maria da Feira; foi membro da Junta de Freguesia, presidente da Casa do Povo; foi eleito regedor da freguesia de Santa Maria da Feira, 15 dias antes do 25 de Abril, não tendo chegado a exercer o cargo; foi fundador e sócio n.º 1 da Sociedade Columbófi la de Santa Maria da Feira; presidente vitalício da mesma Sociedade Columbófi la e director do Clube Desportivo Feirense. Era casado com D. Margarida Marques de Sá de quem teve 7 fi lhos: Manuel, Maria Eugénia, Maria Saudade, António, Eduardo, Maria Margarida e José. Faleceu em 1 de Novembro de 1975.

Bibliografi a Informação de seus fi lhos

CIDES, Nodário ( ? - ?). Vivia em 1137, pois ele e sua mulher venderam a 12 de

Fevereiro desse ano a Paio Trutesendes, seu sobrinho, a sua terra da Villa Palatiolo (Paços de Brandão) por 80 modios.

Bibliografi a Robert Durand, Cartulaire Baio Ferrado du Monastère de Grijó ( XI-XIII Siècles)

COELHO, António Vicente da Silva ( ? – 1966). Residiu no lugar do Outeiro em Travanca e foi ali professor primário durante muitos anos, tendo exercido a sua profi ssão «com raro brilho e competência». Foi um republicano convicto, participando em pugnas políticas do seu tempo e colaborando em vária publicações onde manteve vivas polémicas com «adversários à altura do seu nobre espírito, mas sempre estimado por todos». Era casado com D. Joaquina dos Santos Coelho, da qual teve os seguintes fi lhos: Dr. Arnaldo dos Santos Coelho; Dr. Elísio dos Santos Coelho; Dejamira Santos Coelho Resende; Leonilde Coelho dos Santos.

Bibliografi a Correio da Feira, 10.9.1966

COELHO, David Fernandes (1883 -?). Nasceu no lugar do Ferradal. Fiães em 20 de Fevereiro de 1883. Ordenou-se sacerdote em Junho de 1905. Foi capelão no Colégio de Sanguedo das Irmãs Franciscanas Clarissas, paroquiou as freguesias de Pedroso e Vila Maior. Em 1933 foi nomeado pároco de Válega e Vigário da Vara do distrito eclesiástico de Ovar. Em Agosto de 1939, passou a paroquiar a freguesia de Sanguedo.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira, Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

COELHO, Dionísio ( ? - ?). Vivia em 1733, segundo Provisão de Deputado da Inquisição de Goa que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «da Companhia de Jesus em Goa; natural da freguesia de S. João de Ver, Feira; fi lho de Nicolau Fernandes, natural de S. João de Ver, e de Catarina Coelho, natural de Agueiro, freguesia de Santa Maria de Esmoriz, Ovar, e moradores em S. João de Ver; neto paterno de António

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Fernandes, natural de S. João de Ver, e de uma mulher de alcunha a «Sapeira», parteira, natural de S. Miguel do Souto, Feira, e materna de Domingos Gonçalves, o «Marinho», e de Maria Coelho, de Agueiro. Provisão de Deputado da Inquisição de Goa de 28 de Março de 1733.Dionísio – m. 2, n.º28

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 113, 1963

COELHO, Gaspar Leitão ( ? - ?). Ascendente do Marquês de Pombal, nasceu na Casa das Justas, na Vila da Feira. Teria sido Frei D. Gonçalo Pereira, quando prior de S. Nicolau da Feira, quem atraiu para a Vila da Feira os Coelhos, aparentados com ele pelo casamento de Pêro Coelho com uma sua sobrinha e daí a construção do solar «Casa das Justas» com capela perto do cemitério. Sobre a porta principal da capela está o brasão dos Coelhos: «escudo bojudo, terminado no cimo em ponta, formado por duas curvas reentrantes. É esquartelado, tendo alternadas as armas dos Leitões: as três faixas em relevo, no primeiro e quarto quartéis e nos segundo e terceiro as dos Coelhos». Gaspar Leitão Coelho casou com D. Cecília Pinto, fi lha de Pedro Melo Soares, o do Púcaro, e fi lho de 7.º Senhor de Melo, Martim Afonso de Melo, e de D. Briolanja Pereira. Gaspar Coelho e sua mulher tiveram um fi lho, também de nome Gaspar, que foi desembargador, inquiridor, contador e escrivão da comarca da Feira. Este teve uma fi lha, D. Luiza de Melo que, por sua vez, teve um fi lho, Sebastião Carvalho e Melo, que foi o avô do Marquês de Pombal, Sebastião de Carvalho e Melo. Aquele Sebastião Carvalho e Melo chegou a estar preso por suspeita de ter participado na traição a Francisco Lucena e, por isso, partidário dos espanhóis. A família descendente de António Soares Coelho, irmão de Gaspar Leitão Coelho, voltou para a Casa das Justas». António Soares Coelho casou com D. Brites de Viveiros da Costa, de quem teve Estêvão Soares Coelho que foi casado com D. Inês Godinho de Andrade Freire e tiveram uma fi lha, D. Ana Maria Viveiros Freire, mãe de vários fi lhos bastardos do último conde da Feira, D. Fernando.

Bibliografi a Henrique Vaz Ferreira, Brasão das Justa, D. Inês de Castro e o Calendário Romano. Revista Arquivo do Distrito de Aveiro, Vol. XIII, nº 50, (Abril, Maio e Junho), 1947

COELHO, João Soares ( ? - ? ) Nasceu na Quinta da Fiúza, ou Friura, também chamada de Santo António e Quinta dos Dourados, em Rio Meão. Era fi lho de Teodósio de Matos e de Isabel de Almeida, neto paterno de Salvador de Matos e de Betatriz ou Brites d’Almeida. Em 12 de Agosto de 1654, era prior da freguesia de Roge, concelho de Vale de Cambra, e nesta data faz reconhecimento da sua quinta à Ordem de Malta na pessoa do Comendador em Rio Meão, D. Bernardo de Noronha, quinta que tinha recebido dos seus pais em dote ou em terceira via, já que o pai a tinha recebido em 2.ª via e o avô paterno Salvador de Matos em 1.ª via. Em 18 de Outubro de 1660 fez-se uma escritura de venda da Quinta da Fiúza a Manuel Tavares da Rocha, de Ovar.

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão – A Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão

COELHO, Joaquim Alves Pinto (1895 – 1967). Nasceu em Paços de Brandão em 1895. Foi capitão do Exército e fez parte do Corpo Expedicionário Português, combatendo nos campos de batalha em França, tendo sido prisioneiro dos alemães em 9 de Abril. «Brandoense dedicado à terra, muito se interessava pelo progresso local». Integrado desde novo no ideal republicano, foi um democrata convicto, tendo sido notável a sua correcção e lealdade para com todos, mesmo para com os seus adversários políticos que o admiravam e respeitavam. Faleceu solteiro, em 8 de Agosto de 1967, com72 anos de idade.

Bibliografi a Correio da Feira, 12.4.1967

COELHO, Joaquim Moreira (? -?). Era Reitor de Rio Meão em 1856 e 1857.

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão – A Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão

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COELHO, Joaquim Pinto (1868 - 1917). Nasceu no lugar de Regadas, na freguesia de Mozelos, concelho da Feira, em 27 de Fevereiro de 1868. Era fi lho de José Pinto Coelho e de D. Maria Pinto Coelho. Frequentou a Escola Médico-Cirúrgica do Porto, onde concluiu o respectivo curso em 26 de Julho de 1895, abrindo consultório na sua terra natal no lugar do Murado. Em 1898 transferiu-se para Espinho onde viria a exercer, além do seu múnus de médico, diversos cargos de direcção de várias colectividades e de presidente da Câmara Municipal de Espinho, mais do que uma. No ano da fi xação da sua residência em Espinho, Joaquim Pinto Coelho foi nomeado médico da Associação de Socorros Mútuos local, em substituição do Dr. António Augusto de Castro Soares, que pedira a demissão daquele cargo. Em 6 de Janeiro de 1901 fundou o primeiro jornal de Espinho, a «Gazeta de Espinho», que passou a dirigir até à sua morte. Em 1902, foi eleito presidente da Câmara, de Espinho para o triénio 1902-1905. Em 1905 aderiu ao Partido Republicano Português, em oposição ao governo de João Franco, colocando, a partir dessa data, a «Gazeta de Espinho», ao serviço dos ideais da República. Proclamada esta a 5 de Outubro de 1910, foi nomeado presidente da Comissão Municipal Republicana de Espinho. Em 1911 o Governo Provisório da República, reconhecendo a incompatibilidade das funções de presidente da Câmara com as de Administrador do Concelho, fez com que o Dr. Pinto Coelho entregasse a presidência da Câmara e passasse a exercer apenas o cargo de administrador do concelho de Espinho. A 3 de Abril de 1912 foi eleito novamente presidente da Câmara, por morte do anterior presidente que era o seu amigo e correligionário Dr. Manuel Laranjeira, o malogrado autor do «Comigo» e «Diário Íntimo». Recusou sempre vários cargos políticos de certa projecção como os de governador civil de Aveiro e de Angra do Heroísmo, bem assim como o de director da Penitenciária de Lisboa, por convite de Afonso Costa. Pinto Coelho aceitou apenas o cargo de vogal do Conselho de Administração do Caminho de Ferro de Ambaca, lugar que o não obrigou a sair de Espinho. Espinho fi cou a dever a Joaquim Pinto Coelho grandes e valiosos serviços, entre os quais é justo salientar os seguintes: assinatura do contrato com uma empresa espanhola para o fornecimento da energia eléctrica à vila; municipalização dos serviços de electricidade; construção do mercado municipal; abertura das ruas 16, 18, 23 e 25; expropriação

e urbanização dos terrenos do Largo dos Combatentes; plantação das primeiras palmeiras da Avenida 8; construção do 1º coreto no Largo da Graciosa e instalação de uma fonte luminosa no mesmo local; transferência da feira semanal do terreno onde actualmente se encontra o Parque João de Deus para o terreno onde hoje se encontra: alargamento e alinhamento dos passeios da rua 19; instalação do primeiro colector de esgotos; pavimentação a saibro e macadame de várias ruas, substituição dos nomes de todas as ruas por números; ampliação da planta de Espinho para sul da rua 29; construção da gruta e fonte do Mocho; criação de Escola Nocturna António José de Almeida. O Dr. Joaquim Pinto Coelho faleceu a 24 de Fevereiro de 1917, «em plena luta contra a epidemia do tifo, vítima da sua dedicação pela pobreza enferma».

Bibliografi a Defesa de Espinho Boletim Cultural de Espinho, nº 2, vol .I, 1979, Ed. da Câmara Municipal de Espinho; Francisco Azevedo Brandão, Textos Políticos do Dr. Joaquim Pinto Coelho, Edição Câmara Municipal de Espinho; Gazeta de Espinho

COELHO, José Ferreira ( ? - ?). Era natural da Freguesia de Guisande. Recebeu a ordem de presbítero em 8 de Setembro de 1847 e foi pároco encomendado da mesma freguesia em 1852. Foi ainda pároco encomendado em S. Jorge e Gião, tendo falecido nesta freguesia.

Bibliografi a António Ferreira Pinto, Defendei Vossas Terras – Monografi a de Guisande. Edição da Junta de Freguesia de Guisande, 1999

COELHO, José Ferreira ( ? - ?). Vivia em 1767, segundo Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «homem de negócio. Natural de Pederneira, freguesia de São Nicolau da Feira e morador em Lisboa, na rua Direita da Esperança, defronte do Convento dos Barbadinhos, fi lho de Joaquim Coelho, natural da freguesia de Santiago de Rio

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Meão, e de Domingas Ferreira, natural da dita Pederneira e aí moradores. Neto paterno do Padre D. Teodósio, religioso de Santo Agostinho do Convento de Grijó, e de Micaela da Silva, mulher solteira, natural de Rio Meão, e materna de Manuel Ferreira, natural de Ribeiro, freguesia de São João de Ver, e de Maria Fernandes, natural da dita Pederneira e aí moradores, havendo seu pai sido exposto na roda da Misericórdia do Porto e dado a criar a Maria Francisca, mulher de Domingos Coelho, na freguesia de São Martinho de Mozelos, Feira, e mais tarde a Antónia dos Santos, casada com Manuel Coelho, também de Mozelos, onde fi cara. Era casado com Rosa Caetana Viterbo, fi lha de João Rodrigues, natural de Bucelas, e de Paula da Cruz, da freguesia de Sant’Ana da Carnota, e moradores na Quinta da Bafaria, da mesma freguesia, neta paterna de Manuel Rodrigues e de Ana Francisca, de Bucelas, e materno de Manuel de Avelar e de Maria da Cruz, da Quinta da Bafaria, sendo já viúva de Bento Afonso, comissário da fazenda para o Brasil, natural da freguesia de Santa Maria de Viade, termo de Montalegre, morador em Lisboa, na Cordoaria Velha, freguesia dos Mártires, fi lho de Domingos Afonso e de Domingas João, naturais de Perafi ta, Viade, neto paterno de João Afonso e de Isabel Gonçalves, de Perafi ta, e materno de André João e de Águeda Afonso, de Pendores, freguesia de São Vicente de Chã, termo de Montalegre. Carta de Familiar de 13 de Fevereiro de 1767. A.N.T.T. – José – m.108, n.º2513»

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão, a Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001

COELHO, José Francisco (1874 - ?). Nasceu no lugar dos Valos. Fiães a 7 de Julho de 1874. Ordenou-se presbítero em 1903. Em 1910 colou-se na Igreja de Nogueira da Regedoura, Feira, onde esteve 5 anos. Aposentou-se em 1939.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

COELHO, Manuel Pais (1702-1787). Nasceu em Fiães em 1702. Foi sacerdote, tendo-se interessado pela restauração da Capela da Conceição e foi «o

braço direito» do pároco de Fiães. Faleceu em 6 de Abril de 1787, com 85 anos de idade.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940.

COELHO, Manuel Ribeiro ( ? -1968). Nasceu na Vila da Feira, junto à Igreja da Misericórdia. Foi pároco de Fornos de 25 de Novembro de 1928 a 6 de Dezembro de 1942. Viveu em Fornos com seus pais. Paroquiou depois a freguesia de Serzedo, Gaia até à resignação. Viveu os seus últimos dias na sua casa da Rua Elísio de Castro, onde faleceu a 11 de Janeiro de 1968.

Bibliografi a Padre José Alves de Pinho, Outrora…Fornos. Edição da LAF - Liga dos Amigos da Feira, 2005.

COELHO Manuel da Silva. 1923-2007). Nasceu na freguesia de Fiães em 1923. Ordenado padre, esteve 47 anos à frente da paróquia de Sanguedo. A ele se deve a construção do Centro Social e do Centro Paroquial daquela freguesia. A 17 de Janeiro tinha publicado o livro «Memórias Paroquiais de Sanguedo, editado pela Junta de Freguesia de Sanguedo. Faleceu a 29 de Março de 2007.

Bibliografi a Correio da Feira, 2.4.2007

COELHO, Manuel Vieira ( ? -?). Vivia em 1697, segundo Carta de Familar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «natural de Vila Nova de Gaia e morador no Porto na rua dos Banhos, freguesia de S. Nicolau em casa de seu tio Francisco Rodrigues Forte; fi lho de Diogo Vieira, marítimo, natural de Vila Nova de Gaia, e de Maria Coelha, natural da freguesia de Santa Maria de Lamas, Feira; neto paterno de Diogo Gonçalves e de Maria Vieira, também naturais e moradores em Vila Nova de Gaia, e materno de Domingos André, natural de Lamas. E de Isabel Francisca, natural de Salgueiro, Lamas; ajustado para casar, em 1701, com Antónia Pinta, natural do Porto, fi lha de António Pinto Banhos, tanoeiro, natural de Valadares, e de Domingas Nogueira, natural de Azurar. Moradores no Porto na

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rua dos Banhos, neta paterna de Bartolomeu Domingues e de Maria Francisca, de Vila Chã do Rei, Valadares, e materna de Domingos Francisco e de Ana Francisca de Azurar.Já Familiar em 19 de Novembro de 1697.Manuel –m.43, n.º952»

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 161, 1975

COELHO, Pascoal ( ? - ?). Foi pároco da freguesia de Pigeiros apresentado pelos Pereiras, em 1547.

Bibliografi a P.e José Inácio da Costa e Silva, «Santa Maria de Pigeiros», jornal Tradição, número especial das Comemorações dos Centenários, Setembro, 1940

COELHO, Pedro Ferreira ( ? -?). Vivia em 1617, segundo Informação de poder servir o Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «natural de Azevedo, freguesia de S. Vicente de Pereira, Ovar, morador em Lisboa em casa do inquisidor D. Manuel Pereira; fi lho de António Ribeiro, que por várias vezes fora juiz de fora da Feira, e daí natural, e de Catarina Ferreira, também natural da Feira, morador em Azevedo; neto paterno do Padre Jerónimo Ribeiro, natural de Azevedo, e de Cezília Fernandes, natural da freguesia de S. Martinho de Cucujães, Oliveira de Azeméis, moradores na terra da Feira, e materno de Pedro Ferreira Coelho, ouvidor da Comarca do Condado da Feira, e de Maria de Pinho, fi lha de Tristão Vaz e de Filipa de Pinho, moradores na Vila da Feira.Informação de poder servir o Santo Ofício de 23 de Novembro de 1617Pedro – m. 1, n.º19»

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 166, 1976

COGOMINHO, Fernão Fernandes ( ? - ?). Era casado com Joana Dias Coimbra que, viúva em 1288, possuía propriedades na Terra de Santa Maria, em Válega, Pereira e Gião, propriedades essas adquiridas por compra a cavaleiros locais ou a pequenos proprietários rurais. Joana Dias era senhora da vila de Atouguia e dama do séquito das rainhas D. Beatriz de Castela e Isabel de Aragão, descendendo, pela avó paterna, de uma linhagem de Entre- Douro-e-Minho, a da Maia, tal como a do seu falecido marido, já que os Cogominhos provinham dos Guedões, de Chaves e que tinham o domínio de Panóias.

Bibliografi a José Mattoso, O Castelo e a Feira (A Terra de santa Maria nos séc. XI e XII). Editorial Estampa, 1989

COIMBRA, Alberto (1890-1973). Nasceu na Vila da Feira em 2 de Fevereiro de 1890. Fez os seus estudos no Colégio Aveirense, tendo-se dedicado mais tarde ao comércio e indústria. Republicano e democrata convicto, foi um feirense devotado à sua terra, contribuindo para o seu engrandecimento. Colaborou activamente com José António de Andrade e outros para a fundação da Humanitária Associação dos Bombeiros Voluntários da Feira, fazendo parte dos seus corpos gerentes e para a organização do Clube Recreativo Feirense e Tuna Orfeão Feirense. «Tendo desempenhado com dedicação e escrúpulo que lhe era peculiar diversos cargos em instituições locais, ele foi sempre, em todas as circunstâncias, o homem modesto e despretensioso que a todos impunha respeito e simpatia». Era casado com D. Maria Emília de Melo Toscano Coimbra, da qual teve os seguintes fi lhos: Maria Eduarda Toscano Coimbra Andrade; Maria Helena Toscano Coimbra Vilaça; e António Alberto Toscano Coimbra. Alberto Coimbra faleceu em 24 de Março de 1973 com 83 anos de idade.

Bibliografi a Correio da Feira, 31.3.1973;Francisco Neves, Do Alto da Piedade. Edição da LAF – Liga dos Amigos da Feira, 2003

COIMBRA, Eduardo (1893-1979). Nasceu na Vila da Feira em 6 de Agosto de 1893. Era fi lho de António Bernardo Coimbra, natural de Santa Comba

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Dão, mas com residência na Feira que amava como sua, e de D. Emília Resende Coimbra. Matriculou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, onde concluiu o curso em 30 de Julho de 1915. Em Setembro de 1915, foi nomeado subdelegado do Procurador da República na comarca da Feira. Em Julho de 1917, foi nomeado delegado do Procurador da República na comarca de Mondim de Basto. Em 1920 foi colocado na comarca de Vila Franca de Xira. Em 19 de Abril de 1922 foi transferido para o 1.º Juízo das Transgressões e Execuções da comarca de Lisboa. Em 7 de Abril de 1924, foi nomeado para fazer parte do júri dos concursos para delegados do Ministério Público e em 1926, foi nomeado secretário da Procuradoria da República junto da Relação de Lisboa. A 5 de Março de 1926 foi promovido a Juiz de Direito de 3ª classe e colocado em Mogadouro e em 1930 foi transferido para a comarca de Almada e daqui para o Fundão. Em Dezembro de 1946 foi promovido a Juiz Desembargador e colocado na Relação do Porto e em Dezembro de 1954 foi promovido a Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça. Aposentou-se, por limite de idade, em 1963. «Foi um espírito liberal e democrata, nunca esteve enfeudado a qualquer partido» e foi «um ilustre e dedicado feirense que vivia os anseios da sua terra, dando-lhe a todo o momento, o melhor da sua dedicação e actividade. Faleceu em Lisboa a 31 de Maio de 1979, não se tendo esquecido da sua terra, contemplando no seu testamento a Humanitária Associação dos Bombeiros Voluntários, o Património do Pobres e a Conferência de S. Vicente de Paula. Encontra-se sepultado no cemitério da Vila da Feira. Era tio de D. Maria Helena Toscano Coimbra, de António Alberto Toscano Coimbra e de Rui Nuno Toscano Coimbra.

Bibliografi a Correio da Feira, 8.6.1979; 30.5.1980Francisco Neves, Do Alto da Piedade. Edição da LAF – Liga dos Amigos da Feira, 2002

COIMBRA, Elísio (1892-1966). Nasceu na Vila da Feira em 1892. Era fi lho de António Bernardo Coimbra e de D. Emília de Resende Coimbra. Formou-se na Escola Médico-Cirúrgica do Porto em 1917, onde defendeu a tese «A Diabete Pancreática». Em Paris tirou a especialidade em medicina do estômago, fígado e intestino. Fixou-se no Porto, foi médico na Federação das

Caixas de Previdência e professor na Escola Industrial Infante D. Henrique. A ele se deve também a existência do Orfeão Feirense, que ele fundou em 1911 com Benjamim Gama de Andrade, António Martins, Alberto Coimbra e outros, e a Delegação da Liga dos Combatentes da Grande Guerra de que foi primeiro presidente. Faleceu inesperadamente num hotel, em Paris, no dia 3 de Outubro de 1966, aos 74 anos de idade e no estado de solteiro.

Bibliografi a Correio da Feira, 8.10.1966 e 19.11.1966

COLMIEIRO, Manuel Maria da Rocha (1790 1844). Nasceu na freguesia de Ovar a 1 de Julho de 1790. Era fi lho de Salvador da Rocha Tavares Pereira Corte-Real (ou Salvador de Matos Soares Tavares da Rocha Pereira Pinto Corte-Real) e de D. Angélica Violante de Sousa Colmieiro Coutinho (ou D. Angélica Colmieiro da Rocha), neto paterno de Manuel Alberto da Rocha Tavares Pereira Corte-Real (ou Manuel Alberto Tavares da Rocha Pereira Corte-Real) e de D. Brites Margarida Pacheco Soares, neto materno de Xavier Francisco de Sousa Colmieiro Coutinho 8ou Francisco Xavier Colmieiro da Rocha) e de D. Rosa Margarida Fortunata de Sousa Frazão. Manuel Maria foi baptizado em 12 de Julho pelo vigário João de Sequeira Monterroso e Melo. Casou com D. Maria Emília Leite Pereira de Berredo, fi lha de António Leite Cabral e de D. Josefa Leite Cabral, da casa de Eiriz, Arouca. Intitulava-se morgado de Ovar e Pigeiros. Por ter participado «no nefando crime de rebelião que teve princípio nessa cidade do Porto em o dia 16 de Maio de 1828» foram-lhe confi scados os seus bens, tendo-se homiziado no estrangeiro. Regressando a Portugal resolveu apossar-se abusivamente, em Julho de 1834, dos passais de Santa Maria de Pigeiros do concelho da Feira «por sentir-se prejudicado com o decreto de 5.8.1833 que fazia passar o direito de padroado para o Governo». Tal posse provocou uma demanda da parte do povo e abade Osório (apresentado pelo Governo) e que se prolongou por 13 anos, vindo o fi dalgo a perdê-la nos tribunais da Feira (5.7.1842), Relação (6.3.1844) e Supremo (1846), «pois, se para terem o direito de padroado os seus antepassados doaram das terras que lhes pertenciam, e até por isso não tinha que pagar foros». De 24 para 25 de Setembro de 1846 a igreja de Pigeiros é destruída por um incêndio, «incentivado certamente pelo Colmieiro», para que, acabada a igreja, os

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passais passassem à sua posse. Foi Tenente-coronel de Milícias de Aveiro e foi eleito deputado por Aveiro nas eleições de 12 de Agosto de 1838. Pertencia às nobres famílias dos Morais Colmieiro, de Vinhais, e dos Pereiras da Vila da Feira. Faleceu em Julho de 1844.

Bibliografi a Alberto Sousa Lamy, Monografi a de Ovar, Da Idade Média à República, 1026-1910, 1.º volume. Ovar, 1977

COMENDADORES e Cavaleiros da Ordem de Malta de Rio Meão: Frei Afonso Pires Farinha, nasceu por volta de 1218. Em 1238, já era Comendador de Rio Meão. Tinha entrado na Ordem aos trinta anos “e viveu na fronteira dos Mouros” durante 20 anos. Em 1268, fundou o mosteiro da Ordem de S. João de Malta que foi concluído em 1271.

Frei Domingos Geraldes Alão, em 1300 era abade de Ferronela e Cónego da Sé do Porto. Mandou edifi car a capela de Vera Cruz e Santa Helena, na Sé do Porto, para lhe servir de túmulo.

D. Frei Garcia Martins, foi Grão-comendador da Ordem, nos reinos de Espanha. Faleceu em 1306 e foi sepultado no mosteiro de Leça.

D. Frei Estêvão Vasques Pimentel, foi Balio de Leça e fundador da igreja actual. Foi valido de D. Dinis e D. Afonso IV, tendo sido encarregado de embaixadas extraordinárias junto da Santa Sé. Faleceu em 14 de Maio de 1336.

D. Frei João Coelho, Prior do Crato e Chanceler-mor da Ilha de Rodes. Mandou construir a pia baptismal na igreja daquela ilha «que é peça notável de arte pelas esculturas que a recobrem, entre elas o seu brasão de armas. Faleceu em 26 de Novembro de 1515.

Frei Henrique Telles, referenciado de 1534 a 1558.

Frei Cristóvão de Cernache, Balio de Leça e Grão-chanceler da Ordem de S. João de Jerusalém ou de Malta. Encontrava-se na ilha de Rodes aquando do assédio que lhe pôs o sultão Solimão II, em 1524. Faleceu em 19 de Janeiro de 1569.

Frei Luís Álvares de Távora, aparece como procurador, em 1570, do Comendador Frei Luís Mendes de Vasconcelos, no livro de notas do tabelião da Maia, Cristóvão Velho para o emprazamento do Casal de Gonfufe, São João de Ver, e de Manhouce de Arrifana;

Frei Luíz Mendes de Vasconcelos, referenciado em 1514, 1614 e 1615.

Dom Vasco da Cunha, referenciado de 1557 a 1599.

Frei Duarte de Melo Pereira, Comendador referenciado em 1590, 1592, 1595, 1600, 1602, 1605, 1607, 1608 e 1629; em 1600 a Comenda de Rio Meão andava na dependência dos Condes de Vila Flor, os Vilhenas. Por morte do conde D. Sancho Manuel de Vilhena, as comendas de Rio Meão e Rossas passaram para seu 3.º fi lho, D. António de Vilhena, e a de Frossos para D. Pedro de Vilhena. Mas nas de Frossos e Rossas, foi comendador D. João Manuel de Vilhena.

D. Frei Bernardo Pereira, «rico e poderoso e imperativo, é causa das demandas judiciais entre a Comenda de Rio Meão e Cabido». Em 1629 consegue que seu sobrinho, João Pereira, chantre, cónego e mestre-escola, seja o representante do cabido da Sé do Porto na tombação da Comenda.

Cristóvão Alão de Morais, que nasceu em S. João da Madeira em 13 de Maio de 1632 e foi autor da obra intitulada Pedetura Lusitana.

D. Frei Bernardo de Noronha, cavaleiro professo da Ordem de Malta e Comendador de Rio Meão, em 1651. No Tribunal da Relação do Porto teve contra si o processo que lhe moveu o cabido do Porto por causa dos limites da Comenda e do Cabido entre Ovar e Arada, apelando o Cabido da sentença do Tombo de 1630.

Frei Lopo Pereira Lima, sucedeu na comenda o seu antecessor, Frei Bernardo de Noronha. Faleceu em 31 de Março de 1681 e foi sepultado no mosteiro de Leça do Balio.

Frei Diogo de Melo Pereira, foi no seu tempo que

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se deu a questão de legitimidade de marcos de que deram origem a processos de verifi cação das queixas apresentados pelo Cabido cujas terras nas fronteiras de Ovar e Arada haviam sido invadidas pelos da Comenda de Rio Meão de que ele era Comendador. Faleceu em 1666.

Frei Lopo Pereira de Lima, grão-prior do Crato, Balio de Leça, do conselho de Sua Alteza, comendador das comendas de Rossas, Frossos e Rio Meão, Távora, Santar, Aboim, de 1663 a 1681. Não chegou a receber a investidura de prior-mor do Crato porque «estaria envolvido em conluio com os usurpadores castelhanos». Foi no seu tempo que se deu a sentença de condenação pedida pelo Cabido do Porto devido às alegadas irregularidades de demarcação de fronteiras paroquiais de Ovar, do Caído e Arada, da Comenda vindas do Comendador Frei Bernardo Pereira, em 1628.

Frei Gabriel de Castilho, Comendador de Rossos, Frossos e Rio Meão, cavaleiro da Ordem de Malta, de 1697 a 1701.

Dom Sancho Manuel Vilhena, Administrador da Comenda de Rio Meão, teria falecido depois de Janeiro de 1739, tendo as Comendas de Rio Meão e Rossas passados para seu 3.º fi lho, D. António Manuel de Vilhena, e a de Frossos para seu outro fi lho, D. Pedro Manuel de Vilhena.

Dom Frei António Manuel de Vilhena, nasceu em 28 de Maio de 1663. Era Comendador de Rio Meão em 1745. Faleceu em 12 de Dezembro de 1736.

D. Frei Pedro de Mendonça e Moura, penúltimo Comendador de Rio Meão. Em 24 de Julho de 1816 e 2 de Março de 1820, o rei D.João VI passou-lhe um provisão para tombar as terras anexas à Comenda de Rio Meão, respectivamente Arada e Maceda.

D. Frei Manuel Pedro de Moura e Mendonça, Comendador de Rio Meão de 1816 a 1834. Foi o último Comendador de Rio Meão, porque neste ano de 1834 foram extintas as Ordens Religiosas e Militares. Foi Fidalgo da Casa Real, primeiro-tenente da Armada Real, pelo que residia em Lisboa, sendo seu procurador em Rio Meão o capitão de Milícias e das Ordenanças de Rio Meão, Manuel Pinto de

Almeida, da Casa da Portela, em Paços de Brandão.

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão – A Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001

CONCEIÇÃO, Américo Augusto da ( ? – 1929). Nasceu em Duas Igrejas, Romariz. Foi clérigo de Ordens Menores, bacharel em Teologia, advogado e notário.

Bibliografi a Manuel Francisco de Sá, Breve Monografi a de Duas Igrejas do termo da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1936

CONCEIÇÃO, António Domingues da ( ? – 1906) Nasceu na Freguesia de S. Jorge de Caldelas. Ordenou-se em 21 de Setembro de 1850 e foi colocado, em Guisande, a 21 de Dezembro de 1877. Gravemente doente, retirou-se para S. Jorge em 1904 e faleceu em 19 de Novembro de 1906.

Bibliografi a António Ferreira Pinto, Defendei Vossas Terras – Monografi a de Guisande. Edição da Junta de Freguesia de Guisande, 1999

CONCEIÇÃO, Manuel Coelho da (1680-1761). Nasceu em Soutelo, Fiães por 1680. Foi sacerdote.Faleceu a 20 de Janeiro de 1761 e foi sepultado no Adro Velho.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

CONCEIÇÃO, Manuel Coelho da (1703-1788). Nasceu em Fiães em 1703. Foi sacerdote e faleceu na Chousa a 29 de Fevereiro de 1788.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940

CONCEIÇÃO, Manuel José da ( ? – 1876).

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Natural de Duas Igrejas, Romariz, foi cirurgião «e grande bairrista». Era regedor de Duas Igrejas em 1835. Foi ele que com o juiz da Cruz, Manuel José Ribeiro (bisavô do Padre Manuel Francisco de Sá) e outros requereram ao Bispo do Porto a anexação da freguesia de Duas Igrejas à de Santa Maria de Pigeiros. Em 14 de Abril desse ano. O Bispo atendeu, dando o abade de Pigeiros um sacerdote. Passados três meses, a pedido do pároco de Romariz, o reitor Carneiro, foi a paróquia de Duas Igrejas anexada à de Romariz, por portaria episcopal de 7 de Junho de 1835. Os paroquianos de Duas Igrejas recorreram ao Bispo mas este manteve a anexação. Deve ser pai do Dr. Manuel José da Conceição que pertenceu ao Partido Progressista da Vila da Feira. Faleceu em 1876.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Breve Monografi a de Duas Igrejas do termo da Feira. Casa Nun’Àlvares, Porto, 1936

CONCEIÇÃO, Manuel José da (1839- 1907). Nasceu na Casa da Eira, em Duas Igrejas a 14 de Novembro de 1839. Licenciou-se em medicina na Escola Médico-cirúrgica do Porto, tendo exercido clínica no concelho e arredores. Foi colega de curso de Joaquim Guilherme Gomes Coelho (Júlio Dinis). Para além da sua vida profi ssional, dedicou-se também à política, tendo sido fi gura destacada, a nível concelhio, do Partido Progressista. A sua terra muito lhe deveu, sobretudo na construção da estrada municipal que atravessa aquela localidade, desde a Cruz de Ferro, em Guisande, até à Portela de Romariz. Na altura a Câmara Municipal da Feira não tinha recursos para custear as obras. Foi o Dr. Manuel da Conceição que adiantou um empréstimo ao Município, de «que os seus herdeiros só foram reembolsados muito mais tarde e em moeda desvalorizada». Faleceu em 1907.

Bibliografi a Correio da Feira, 8.12 1989;Padre Manuel Francisco de Sá, Breve Monografi a de Duas Igrejas do termo da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1936.

CONDES da Feira (1452-1827). O primeiro conde foi Rui Vaz Pereira, título dado por D. Afonso V, em 1452. Era fi lho de Fernão Pereira, fi dalgo da casa de D. Afonso V que numa petição ao mesmo monarca, pediu «por quanto a terra da Feira era de seu pai João Álvares

Pereira, a quem como fi lho legítimo maior, esperava suceder, que fi zesse mercê do castelo de juro e herdade, pois que o queria correger, refazer e reparar à sua própria custa, de muros, paredes, casas e todas as outras coisas que fossem necessárias para a sua fortaleza e defensão». O rei outorga-lhe o pedido, e faz-lhe doação, por carta de 19 de Novembro de 1448, do castelo da Feira de juro e herdade, com a condição de fazer as obras necessárias. Assim por morte de Fernão Pereira foi confi rmado o castelo, por carta de 21 de Dezembro de 1467, a seu fi lho Rui Pereira. Casou com D. Leonor de Berredo, que pertencia à casa da Rainha D. Isabel, primeira mulher de D. Afonso V e era fi lha de Gonçalo Pereira, o das Armas, 2º senhor de Cabeceiras de Basto. Faleceu em 1486. Sucedeu-lhe seu fi lho D. Diogo Pereira, 2º conde da Feira. Era também senhor de Besteiros e alcaide-mor do castelo da Vila da Feira. Casou com D. Brites de Castro, irmã do 3º conde de Monsanto. Sucedeu-lhe seu fi lho com o mesmo nome, Diogo Pereira, 3º conde da Feira. Casou com D. Ana de Meneses, fi lha de João da Silva, alcaide-mor de Montemor-o-Velho. Sucedeu-lhe seu neto, D. Diogo Forjaz Pereira, 4º conde porque seu pai morreu em vida do 3º conde. Foi comendador de São Salvador de Baldreu na Ordem de Cristo e casou com D. Iria de Brito. Deste casamento houve um fi lho que morreu em criança. Este 4º conde foi assassinado em Madrid. Em 1595 sucedeu-lhe seu irmão, D. João Forjaz Pereira como 5º conde da Feira, que se notabilizou na vida militar. Foi capitão de Ormuz e de Malaca e general da Armada. Foi nomeado, por carta patente de 11 de Março de 1608, vice-rei da Índia, para onde partiu a 29 de Março desse mesmo ano, comandando uma armada de dezassete navios. Teve também a incumbência de conquistar as minas do Monomotapa, mas faleceu no decurso da viagem. Sucedeu-lhe a sua única fi lha, D. Joana Forjaz Pereira, por mercê de Filipe II de 14 de Março de 1608 e confi rmada como 6ª condessa da Feira por carta de 14 de Outubro de 1620 concedida por Filipe II. Casou com D. Manuel Pimentel ou D. Manuel Forjaz Pereira Pimentel, como é nomeado na carta de 14 de Outubro de 1628 do título de conde da Feira, mestre-de-campo, general da Flandres e governador de Antuérpia. Sucedeu-lhe seu fi lho, D. João Forjaz Pereira, 7º conde da Feira que não deixou descendência. Sucedeu-lhe seu irmão, D. Fernando Forjaz Pereira Pimentel de Meneses e Silva, em 1660, 8º conde da Feira, que casou com D. Vicência Henriques, fi lha de Pedro César de Meneses, comendador da Ordem de Cristo, governador de

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Angola e membro do Conselho de Guerra, e de D. Guiomar Henriques. Este 8º conde não teve fi lhos legítimos, tendo falecido a 15 de Janeiro de 1700, apontando-se-lhe todavia dez fi lhos bastardos, pelo que o condado foi tido como vago e incorporado na Casa do Infantado, em favor do infante D. Francisco, irmão de D. João V, dando o facto origem a uma demanda. Ao bisneto do autor desse processo, D. Miguel Pereira Forjaz Coutinho Barreto de Sá e Resende foi concedido, por carta de 18 de Maio de 1820, o título de 9º Conde da Feira em sua vida. D. Miguel Pereira foi par do Reino e ministro da Guerra e dos Negócios Estrangeiros, no decurso da Regência, enquanto D. João VI permanecia no Brasil. Seguiu a carreira militar, combateu na campanha do Rossilhão e na Catalunha. Em 1880, como coronel, foi escolhido para governador e capitão-general do Pará, mas não chegou a ocupar o cargo. Em 1806 era brigadeiro do exército. Faleceu sem sucessão em 6 de Novembro de 1827, passando a casa a sua irmã, D. Maria Joana Forjaz

Bibliografi a Anselmo Braamcamp Freire, Brasões da Sala de Sintra, Imprensa Nacional, Casa da Moeda, 1996; Correio da Feira Dicionário Enciclopédico da História de Portugal, Publicações Alfa, edição das Selecções do Reader´s Digest, 1990.

CORREIA, Aníbal Alves ( ? - 1966). «Era um convicto democrata e liberal». Iniciou a sua carreira profi ssional como ajudante da Repartição do Registo Civil da Feira, lugar que deixou em 1920 por ter sido nomeado amanuense da administração do concelho, onde se manteve até 1928, data em que foi ocupar o cargo de aspirante da Repartição de Finanças da Feira até à sua aposentação. Foi sócio fundador da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Feira e do Clube Feirense e durante 30 anos ocupou o lugar de tesoureiro da Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Feira. «Era um convicto democrata e liberal, ideais que abraçara ao alvorecer da sua mocidade». Era casado com D. Maria Ângela Carneiro Alves, da qual teve dois fi lhos: Sérgio Aníbal e Gil Carneiro Alves Correia. Faleceu em 5 de Março de 1966.

Bibliografi a Correio da Feira 12.3.1966;Francisco Neves, Do Alto da Piedade. Edição da LAF - Liga dos Amigos da Feira, 2003.

CORREIA, António ( ? – 1961). O capitão António Correia fi xou residência, em 1956, na Quinta das Mestras na freguesia de Sanfi ns, propriedade de seu genro, Eng. Luís Correia de Sá. Foi pioneiro da aviação portuguesa com brevet tirado em Inglaterra, combatente da Primeira Grande Guerra em França. Foi também jornalista, tendo fundado e dirigido em Viseu o semanário «República», de 1928 a 1932. Foi colaborador de vários jornais e revistas, tendo sido secretário da revista «Seara Nova», de Lisboa. Foi autor de vários livros: «Açores, estas Ilhas Desconhecidas», «Palavras sem Eco» e outros trabalhos inéditos no campo económico e social. Por fi delidade aos princípios democráticos, foi-lhe fi xada residência em diversas terras do país, desde o Minho ao Algarve e por fi m demitido do exército e deportado para Cabo Verde, onde permaneceu no Tarrafal durante dois anos. Regressando a Portugal, fi xou residência em Sanfi ns da Feira. Faleceu na Quinta das Mestra, naquela freguesia em 25 de Novembro de 1961.

Bibliografi a Francisco Neves, Do Alto da Piedade. Edição da LAF – Liga dos Amigos da Feira, 2003

CORREIA, Duarte ( ? -?). Era pároco da freguesia de Espargo em 1565.

Bibliografi a Padre Jorge de S. Paulo; O Convento da Feira. Revista Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 63 (Julho, Agosto e Setembro), 1950.

CORREIA, Estêvão Gomes ( ? - ?). Vivia em 1721, segundo Carta de familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «natural da freg. de Arrifana de St.ª Maria, Feira, e morador em St.º André de Prozelhe, Feira (actualmente da freg. de Mosteirô, Feira); fi lho de João Gomes, natural de Carqueijido, freg. de S. João Baptista de S. João da Madeira,

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e de Maria Correia, natural de Arrifana de St.ª Maria , e aí moradores; neto paterno de André António, natural de Arrifana de St.ª Maria e de Maria Fernandes, natural de Lousa, freg. de S. João Baptista de S. João da Madeira, e materno de João Rodrigues, também natural de Arrifana de St.ª Maria, e de Polónia Correia, natural da vila da Feira, e moradores em Arrifana; casado com Isabel Luís, natural da Murtosa, Freg. de St.º André de Prozelhe, Feira, fi lha de António Luís e de Domingas Antónia, naturais e moradores na Murtosa, neto paterno de Gonçalo Luís, também natural da Murtosa, e de Maria Antónia, natural de S. João da Madeira e moradores na Murtosa, e materno de Domingos Jorge, natural da Preza, freg. de Escapães, Feira, e de Francisca Antónia, natural de St.º André de Prozelhe.Carta de Familiar de 20 de Março de 1721. A.N.T.T. – Estêvão – m. 4, n.º50».

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Revista Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 116 Outubro, Novembro e Dezembro), 1963.

CORREIA, Joaquim Pinto (1903-1977). Nasceu na Freguesia de Guisande, concelho da Feira, a 16 de Agosto de 1903. Foi o terceiro fi lho de Manuel Henriques Correia e de Guilhermina Rosa Duarte, pequenos agricultores na referida freguesia. Iniciou os estudos na Escola Primária local. Dadas as qualidades que revelou, foi frequentar, como aluno interno, o Grande Colégio Universal do Porto, onde completou o Curso Liceal. Por motivos económicos ingressou no mundo do trabalho, como Prefeito do Colégio dos Carvalhos. Simultaneamente matriculou-se na Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto, pela qual se veio a licenciar em 12 de Julho de 1930. Mesmo antes de concluir a licenciatura já exercia funções de professor no referido Colégio dos Carvalhos. No ano lectivo de 1931/32 foi destacado pelo Director do mencionado colégio para a sua Sucursal de Espinho, denominada «Colégio de S. Luís», para desempenhar as funções de Director. Ocupou o cargo de Director do Colégio de S. Luís ininterruptamente de 1931 a 1968, data da sua extinção. Em 1948, o Colégio de S. Luís adquiriu autonomia com a constituição da sociedade «Antunes, Correia e Costa, Ld.ª» e com a construção de edifício próprio, localizado no ângulo das Ruas 28 e 29. Além de responsável pela Direcção

Pedagógica, leccionou as disciplinas de Ciências Físico-Químicas e Ciências Biológicas. Casou com D. Maria Aldina Resende Garcia, natural da Freguesia de Arrifana em 17 de Setembro de 1931 de quem teve os seguintes fi lhos: José Alberto, Maria do Rosário e Guilhermina Rosa. Radicado em Espinho desde 1931, além de se ter dedicado ao Colégio de S. Luís foi ainda proprietário da Farmácia Higiene, na Rua 19, desde 9 de Dezembro de 1939, data em que cedeu de trespasse a Agostinho Adriano da Silva Tavares. Faleceu em Espinho em 26 de Dezembro de 1977.

Bibliografi a Curriculum fornecido por seu fi lho, Engenheiro José Alberto Pinto Correia.

CORREIA, Manuel Alves ( ? - ?). Vivia em 1761, segunda Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «natural da freg. de S. Martinho de Escapães, Feira, e morador na freg. de N.ª S.rª da Piedade de Paraúba, comarca de Vila Real do Sabará; fi lho de José Correia, natural de Escapães e de Domingas Dias, natural da freg. de S. Miguel de Milheiros de Poiares, Feira; neto paterno de João Correia, natural de Escapães, e de Isabel Antónia, natural de Sanfi ns de Ferreira, Paços de Ferreira, moradores em Escapães, e materno de João Álvares e de Maria Dias, naturais e moradores em Milheiros de Poiares.Carta de Familiar de 24 de Julho de 1761 A.N.T.T. Manuel – m. 68, n.º 1354»

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Revista Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 153 (Janeiro, Fevereiro e Março), 1973.

CORREIA, Martins ( ? - ?). Foi alcaide do Castelo da Feira. Na crise de 1383-85 levantou voz por Castela, tendo o castelo sido tomado por Gonçalo Coutinho.

Bibliografi a João Corrêa de Sá, Correio da Feira, 22.4.1972.

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CORREIA, Melchior Vaz ( ? -? ). Nasceu na Vila da Feira. Dele apenas se sabe o que o cónego António Ferreira Pinto escreveu sobre «cónegos e benefi ciados da Sé do Porto», na revista «Arquivo do Distrito de Aveiro» nº. 19, 1939 e que se passa a transcrever: «Em 7 de Fevereiro de 1635, tomou posse duma conezia que vagou pela morte do cónego Manuel Pinto. Foi nomeado pelo bispo D. Frei João de Valadares, de quem já era Provisor. D. Frei João morreu logo em Maio seguinte, sendo nomeado Vaz Correia para continuar como Provisor, e nomeado Vigário Geral o licenciado Manuel Aguiar de Sousa. Melchior Vaz Correia continuou no mesmo cargo com o novo bispo D. Gaspar do Rego da Afonseca e governador nas ausências deste. D. Gaspar morreu em 1639 e o cónego Melchior foi eleito novamente para a Sé vaga. Contribuiu muito para a aclamação de D. João IV, no Porto, que se realizou no dia 8 de Dezembro de 1640. Foi notabilíssima a acção de Melchior Vaz Coreia contra a nomeação de D. Francisco de Mora Coutinho Corte-Real para arcediago do Porto e anexo de Meinedo. D. Francisco era fi lho de D. Manuel de Moura Corte-Real, 2º. Marquês de Castelo Rodrigo e neto do célebre D. Cristóvão de Moura, 1º. Marquês do mesmo título, fi dalgo português, mas traidor à sua terra e vendido a Castela, e foi nomeado arcediago tendo apenas cinco anos de idade. Foram estas e outras infl uências que conseguiram do Papa Urbano VIII a nomeação do miúdo ou bebé para arcediago. Desde 1627 a 1635, Vaz Correia sustentou arrojada campanha contra tal nomeação, até que fi nalmente. D. Francisco de Moura, ou alguém por ele, desistiu da dignidade e resignou em favor de Luiz da Gama, cuja posse foi em 9 de Setembro de 1635. O processo encontra-se no Livro nº. 759 do Arquivo do Cabido do Porto, no Arquivo Distrital do Porto. Foi uma luta que notabilizou o Dr. Melchior Vaz Correia e muito contribuiu para a indisposição do Clero contra Castela. Abençoada seja a memória deste ilustre fi lho da Feira».

Bibliografi a Cónego António Ferreira Pinto, Cónegos e Benefi ciados da Sé do Porto. Revista Arquivo do Distrito de Aveiro, nº. 19, 1939

CORTE-REAL, António de Castro Pereira, (1846-1905), 1º visconde e 1º conde de Fijô. O título foi criado pelo rei D. Carlos, por decreto de 28.10.1903 a favor de António

de Castro Pereira Corte-Real, 1.º visconde em duas vidas, Fidalgo de Cota d’Armas (carta de 27.11.1897). Descendem os Condes de Fijô, por legítima varonia de João Cabanas, Cavaleiro da Ordem de Cristo, escudeiro da Casa de Rui Pereira, 1.º Conde da Feira, que morou na sua quinta do Ramalhal de Castelãos e casou com D. Isabel Tavares, fi lha de João Anes Soares, Fidalgo da Casa Real, e de D. Maria Tavares, da Casa dos Senhores de Mira e dela teve Francisco Tavares, Cavaleiro Fidalgo, instituidor, em 1545, do vínculo de Castelãos com capela de N.ª Sr.ª da Graça na igreja da freguesia de Castelãos de Cambra, marido de D. Maria Pereira, da Casa dos Condes da Feira. Deste foi 4.º neto, por legítima varonia, Manuel Tavares da Rocha Pereira, administrador dos vínculos de Castelãos, Pigeiros e Argoncilhe, que casou com D. Margarida Matos Soares da Fonseca, por quem veio a esta casa o apelido de Corte-Real, por ela ser bisneta de João Nunes Cardoso Corte-Real, Senhor de Gafanhão. Um neto destes, o sargento-mor Joaquim da Rocha Tavares Pereira Corte-Real, Cavaleiro professo na Ordem de Cristo, Juiz dos Direitos Reais do Condado da Feira, casou com D. Violante Luís Pereira de Castro, administradora do vínculo de Fijô. António de Castro Pereira Corte-Real nasceu na Vila da Feira em Janeiro de 1846. Era fi lho de António de Castro Corveira Corte-Real, fi dalgo de cotta de armas da Casa da Porta, em Tagilde, Guimarães, comendador da Ordem de Cristo e de D. Emília de Jesus Lobo Caldas. Frequentou o Liceu de Coimbra, cujo curso concluiu em 1863 e, no mesmo ano, matriculou-se em Direito na Universidade, obtendo a sua formatura em 1868, seguindo a magistratura, sendo em 1870, despachado delegado do procurador régio para Valença do Minho, de onde foi mais tarde transferido para a comarca de Estarreja. Depois do seu casamento em 1875 com D.Brízida Varela Falcão Pinto Guedes Sottomaior, fi lha de António da Silva Varela Falcão Sottomaior, da Casa de Paçô, S. João de Ver e de D. Ana Carolina Pinto Guedes da Casa do Fofo, do Porto, pediu a exoneração porque a administração da sua casa não lhe permitia continuar a magistratura. Em 1881 assumiu a direcção do Partido Regenerador da Feira, sendo eleito, nesse ano, presidente da Câmara Municipal da Feira, cargo que exerceu até 1886. De 1881 a 1901 exerceu o cargo de juiz de direito substituto da comarca da Feira. Foi eleito por duas vezes deputado da nação, nas legislaturas de 1881-1886, pelo círculo da Feira e em 1895 pelo Distrito de Aveiro. D.Carlos agraciou-o com o título de 1º

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visconde de Fijô, por Decreto de 31 de Dezembro de 1902, e no ano seguinte elevou-o à grandeza com o título de conde em 28 de Outubro. Como parlamentar vem mencionado no «Dicionário Biográfi co Parlamentar, 1834-1910, vol I (A-C), de Maria Filomena Mónica, no verbete assinado por Zélia Pereira, do qual respigamos o seguinte: «Foi eleito deputado, fazendo parte das listas do Partido Regenerador, para as seguintes legislaturas: 1882-1884, pelo círculo da Vila da Feira (juramento a 20,1,1882), 1884-1887, pelo mesmo círculo (juramento 23.1.1885) e 1896-1897, pelo círculo de Aveiro (juramento de 17.1.1896). Fez apenas parte da Comissão de Legislação Civil, entre 1882 e 1884. Da sua carreira parlamentar contam-se poucas intervenções, não tendo sequer chegado a pedir a palavra na legislatura de 1884-1887. Em 3 de Março de 1882, fez um longo discurso de crítica a Luciano de Castro, e defendeu a actuação do ministro do Reino, com respeito às razões da não confi rmação da nomeação do Conselho do Distrito de Aveiro, assunto sobre o qual aquele deputado progressista interpelara o ministro. Em 13 de Maio do mesmo ano, estando em discussão o incidente que resultara do facto de em Aveiro estarem a funcionar duas juntas gerais de distrito, Corte-Real desferiu novamente críticas à oposição progressista. Em 1896, a maior parte das suas intervenções foram consagradas aos interesses da região de Aveiro, nomeadamente através da defesa de representações dirigidas ao Parlamento: chamou a atenção para a injustiça da cobrança de antigos foros do Convento de Arouca; defendeu o restabelecimento dos arbitradores judiciais da comarca da Feira; e pediu que se tomasse em consideração a situação dos operários chapeleiros de S. João da Madeira, que pediam uma lei de protecção para a indústria chapeleira, entre outros casos» Do seu casamento houve dois fi lhos: João de Castro Falcão Pinto Guedes Corte-Real, casado em Coimbra, com sua prima D. Maria de Assunção Soares de Albergaria Pessoa e D. Emília Maria de Castro Falcão Corte-Real, casada com José Sebastião Cardoso de Menezes Pinheiro de Azevedo e Bourbon.

Bibliografi a Anuário da Nobreza de Portugal, Braga, 1950; Correio da Feira, 7.3.1905; Dicionário Biográfi co Parlamentar, 1834-1910, vol. I (A-

C), coordenação de Maria Filomena Mónica, Assembleia da República, 2004.

CORTE-REAL, João de Castro da Rocha Tavares Pereira ( ? -?). Era Capitão-Mor da Feira em 1811. Nesta data fez-se no seu palheiro, em Espinho, a escritura da Companha de S. José de Ribamar, composta por 102 pescadores de Ovar e assistentes na dita praia de Espinho, onde trabalhaam.

Bibliografi a, Padre Aires de Amorim, Comportamento Grupal das Companhas de Pesca de Arrasto de Espinho a Ovar, até ao Sec. XIX. Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º161, 1975.

CORTE-REAL, José de Castro Falcão Soares de Albergaria (1904-1972). Oriundo da nobre casa de Fijô, da Vila da Feira, nasceu em Coimbra a 10 de Outubro de 1904. Era fi lho do 2.º conde de Fijô, Dr. José Falcão de Castro Pinto Guedes Corte-Real e neto do Dr. António de Castro Pereira Corte-Real, 1.º conde de Fijô, um dos fundadores do «Correio da Feira». O Dr. José de Castro Albergaria, 3.º conde de Fijô, «tinha pela terra dos seus antepassados muito amor e dedicação, concorrendo sempre em todos os momentos para o seu engrandecimento». Casou em Coimbra, em 17 de Dezembro de 1927 com D. Leopoldina de Lemos Teixeira da Silva Lima, da qual teve os seguintes fi lhos: D. Maria José Soares Albergaria Corte-Real, nascida a 12.11.1935; José Luciano de Castro Teixeira de Lima Corte-Real (visconde de Fijô), nascido em Coimbra a 28.3.1929; Dr. Aníbal de Lima Soares Tavares de Castro Corte-Real. O Dr. José de Castro Albergaria foi licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, tendo sido delegado do Ministério Público em Coimbra e Montemor-o-Velho. Foi presidente da Assembleia Geral da Sociedade de Defesa e Propaganda de Coimbra de que foi um dos sócios fundadores, comandante do Terço da Legião Portuguesa e Cavaleiro da Ordem do Santo Sepulcro. Pertenceu ainda aos corpos gerentes da delegação em Coimbra do Círculo de Cultura Musical. Faleceu na sua Quinta das Sete Fontes, em Coimbra, em 22 de Maio de 1972 com 68 anos de idade. José de Castro Falcão Soares de Albergaria Corte Real teve os seguintes irmãos: D. Maria José Soares Albergaria Tavares de Castro Corte Real, nascida em Coimbra a

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8.3.1905. Casou em Coimbra a 30.1.1937 com o Dr. Aurélio Gonçalves, director clínico das Caldas de Felgueira; António de Castro Pereira Tavares Corte-Real, engenheiro, nascido em Coimbra a 14.4.1906. Casou a 19.7.1929 com D. Noémia Cid Monteiro, fi lha de Luís dos Santos Monteiro e de D. Adelina Cid; João de Castro da Rocha Tavares Pereira Pinto Corte-Real, licenciado em Direito, nascido na Vila da Feira a 19.11.1911. Casou em Braga, a 29 9.1945 com D. Maria José de Bulhões Teixeira de Magalhães Mexia Vessadas de Salazar, nascida na Lousã a 9.7.1924, fi lha do Dr. Fernando de Faria Teixeira Vessadas de Salazar e de D. Margarida Bulhões de Proença Magalhães Mexia. Tiveram dois fi lhos: Maria Margarida e Maria de Assunção; Alexandre Lopo Soares de Albergaria de Castro Falcão Corte-Real, nascido na Vila da Feira a 15.3.1913. Casou em Lamego a 11.10.1944 com D. Maria José de Castro de Sousa Girão, nascida em Lamego a 8.3.1920, fi lha de João Baptista de Sousa Magalhães Girão e de D. Maria Cândida de Castro. Tiveram dois fi lhos: João José e Maria Josefi na; Manuel de Castro Pereira Falcão Soares de Albergaria Corte-Real, nascido em Coimbra a 20.3.1915. Casou em Lamego a 20.5.1946, com D. Maria Josefi na Jácome de Sousa e Faria Girão, nascida a 20.6.1926, fi lha de António Pereira Magalhães de Sousa Faria Girão e de D. Maria do Carmo Girão Jácome de Vasconcelos; Vasco de Castro Tavares Pereira Corte-Real, licenciado em Medicina, nascido em Coimbra a 1.2.1916. Casou no Porto a 7.5.1947 com D. Maria Helena Moreira ária de Sousa.

Bibliografi a Anuário da Nobreza, Braga, 1950; Correio da Feira, 27.5.1972 .

COSTA, António de Almada da ( ? - ?). Vivia em 1640, segundo Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «natural de Lisboa e morador na Arrifana de Santa Maria da Feira. Filho de Pedro de Almada, ourives de prata, natural de Almada, e de Leonor da Costa Quaresma, irmã inteira de João da Costa, familiar do Santo Ofício, natural da freguesia de São Nicolau de Lisboa. Era neto paterno de João de Almada, carpinteiro, e de Catarina Rodrigues, moradores na Rua que corre da igreja de Loreto para a de S. Roque. O habilitando era casado com Isabel de Mascarenhas, moradora na dita

freguesia de Arrifana. Esta era fi lha de Francisco Borges e de Ana de Matos; neta paterna de Aleixo Borges e de Francisca Mascarenhas, naturais e moradores na referida Arrifana, e materna de Salvador de Matos e de Isabel Soares, moradores na Quinta da Feúza, Rio Meão. Estas diligências, datadas de 1640 não foram concluídas. Era sobrinha do Padre João Soares de Matos a quem pertenceu a dita Quinta.A.N.T.T. – António – m. 207, n.º3096» Salvador de Matos e sua mulher Isabel Soares também foram pais de Teodósio da Matoa Soares, que, tendo nascido na Quinta de Rio Meão, se casou com D. Brites de Almeida, fi lha de João Nunes Cardoso de Gouveia e de Antónia Soares, senhores do couto de Gafanhão, em Castro Daire e da Quinta do Morgado em S. João da Madeira; avós de Salvador de Matos Soares, natural de Rio Meão, morador no Castelo da Feira, Familiar do Santo Ofício por carta de 28.1.1636 (Maço 1, Dil., n.º 10), e de sua mulher D. Mariana de Pinho Fonseca, natura de S. Cristóvão de Ovar.

Bibliografi a António de Soza Brandão, Moutinhos de S. João da Madeira e Pinhos de Arrifana de Santa Maria. Revista «Armas e Troféus», 1980; David Simões Rodrigues, Rio Meão, a Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001.

COSTA, Baptista Pereira da ( ? - ?). Vivia em1750, segundo Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «homem de negócio; natural da freg. de S. Martinho e Moselos, Feira, moradores na de N.ª Sr.ª de Carijós, Rio das Mortes, Minas Gerais; fi lha de Manuel Pereira, da freg. de S. Cipriano de Paços de Brandão, Feira, e de Cecília Francisca, do lugar de Seitela, freguesia de Moselos; neto paterno de João Pereira e de Maria Antónia, naturais e moradores na freguesia de S. Cipriano, e materno de António Trancoso, natural de Seitela, e de Isabel Jorge, natural da Ponte Nova, freg. de S.tª Maria de Lamas, Feira, moradores em Seitela; ajustado para casar, em 1754, com Vitória Martins, natural da freg. de Candelária da vila da Madalena, Ilha do Pico, fi lha de Manuel de Sousa Vieira e de Domingas do Espírito Santo, neta paterna de Mateus Vieira Leitão e de Maria de Sousa, e materna de João Rodrigues Serpa e de Águeda Rodrigues de

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Mena, todos da Candelária.Carta de Familiar de 18 de Setembro de 1750 A.N.T.T. – Baptista – m. 1, n.º 8»

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Revista Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 101 (Janeiro, Fevereiro e Março), 1960.

COSTA, Belchior Cardoso da (1904-1996). Nasceu em S. Paio de Oleiros a 9 de Fevereiro de 1904. Era fi lho de José Francisco da Costa, antigo vereador do Senado Municipal da Feira (1923-1925) e de D. Maria Cardoso da Costa. Concluiu o ensino secundário, em 1922, no Liceu Rodrigues de Freitas, tendo-se matriculado, nesse ano, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, tendo integrado o Curso Jurídico de 1922-27. Licenciou-se em Direito em 31 de Outubro de 1927, fez estágio de advocacia no escritório do Dr. Vitorino de Sá, abrindo banca de advogado, primeiro na Rua Direita (hoje Rua Dr. Elísio de Castro) e, depois, na sua residência. Casou em 11 de Abril de 1935 com D. Júlia Adelaide Alves Moreira, fi lha do Dr. Gaspar Alves Moreira, «destacada fi gura de advogado e político feirense e Presidente da Câmara Municipal, e de D. Lúcia Adelaide da Silva. Na sua actividade forense de mais de sessenta anos, foi, em mais do que um período, Delegado ou Presidente da Delegação da Ordem dos Advogados na Feira, tendo recebido em 1991 a «Medalha» instituída pela Ordem, no Bastonato da Drª Maria de Jesus Serra Lopes, para galardoar os advogados com cinquenta anos de exercício profi ssional exemplar. Para além da sua profi ssão, o Dr. Belchior Cardoso da Costa dedicou também a sua vida à política local e nacional. Entre 1932 e 1937 exerceu as funções de vogal e, depois, a partir de 1933, de Vice-Presidente da então Comissão Administrativa do Município nos mandatos do Dr. Crispim Borges de Castro, do Dr. Gaspar Alves Moreira e do Dr. Roberto Vaz de Oliveira. Neste último mandato foi eleito pela Câmara para a representar como Procurador à Junta de Província do Douro Litoral, defendendo ali os interesses económicos do concelho. Como parlamentar, foi eleito deputado à Assembleia Nacional para as legislaturas de 1945-1949, 1957-1961 e 1961-1964. Desta actividade transcrevemos da notícia biográfi ca do Dr. Belchior Cardoso da Costa, subscrita por seu

fi lho, o Dr. José Manuel Cardoso da Costa, publicada na revista Villa da Feira – Terra de Santa Maria, ano 2, nº 6, Fevereiro, 2004, o seguinte testemunho: «Proferiu intervenções na Assembleia Nacional em todas as sessões legislativas em que foi deputado, nelas se ocupando, seja da defesa de interesses distritais e locais ou de problemas da mesma natureza (a situação das estradas no distrito, o litoral de Espinho, o perímetro carbonífero do Pejão, o pioneirismo do ensino musical na Vila da Feira, etc.), seja de questões nacionais, designadamente relacionadas com o abastecimento, mas, sobretudo, com a agricultura, e a respectiva economia, fomento e organização, matéria que lhe mereceu particular atenção e empenho. Paralelamente à actividade parlamentar, e ainda no plano estritamente político, foi vice-presidente e, durante longos anos, até 1970, presidente da Comissão Concelhia da União Nacional» (e ainda da «Acção Nacional Popular», que sucedeu à primeira) bem como vogal (até meados dos anos sessenta) da Comissão Distrital de Aveiro da mesma organização, Comissão a que chegou a presidir em 1946. Firme nas suas convicções, a sua acção política pautou-se sempre por um grande sentido de moderação e de equilíbrio, bem como de respeito e tolerância para com os seus opositores – como, de resto, sempre foi timbre e tradição das Terras de Santa Maria (e do distrito de Aveiro). Nessa acção política, por outro lado, constituiu preocupação central e instante, permanente e continuadamente, a defesa dos interesses do concelho e a preservação da sua identidade e integridade, como unidade política e moral e, bem assim, a defesa dos interesses e do prestígio da comarca da Feira. Na sua actividade cívica, foi presidente da Direcção da «Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Feira», esteve na origem da constituição do «Grémio da Lavoura da Feira e S. João da Madeira e da qual foi presidente da sua direcção durante mais de vinte e cinco anos. Em Março de 1974, por proposta do então Governador Civil de Aveiro, Dr. Francisco do Vale Guimarães, foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem de Benemerência pelo Presidente da República, Almirante Américo Tomás. Em 1989 a Câmara Municipal de Santa Maria da Feira atribuiu-lhe a Medalha de Mérito Municipal e anos mais tarde atribuiu o seu nome a uma das principais ruas da cidade. Como deputado, vem mencionado no «Dicionário Biográfi co Parlamentar, 1935-1974, Vol.I, (A – L), da direcção de Manuel Braga da Cruz e António Costa Pinto, com verbete

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assinado por Rita Almeida de Carvalho e que diz o seguinte: «Por indicação de Albino dos Reis, Cardoso da Costa é eleito deputado na IV Legislatura (1945-1949), em representação do círculo eleitoral de Aveiro, integrando novamente o Parlamento nas VII e VIII Legislaturas 81957-1965). Nesta Câmara, o deputado dedica-se sobretudo aos problemas da lavoura: apontando o «excessivo rigor» do tabelamento do milho e afi rma que o combate à insufi ciência deste cereal exige incitamentos, aperfeiçoamento técnico e que «se lance as vistas para a África»; manifesta-se contra a requisição das matas e o corte das vides, os quais não redundam em benefício da colectividade, mas antes servem para enriquecer alguns; apela ao Governo para que acabe com o mercado negro, sendo para tanto necessário atribuir aos produtos um preço compensador para o produtor (22.1.1946, 27.2.1946, 14.2.1946, 24.1.1947, 28.2.1947, 4.2.1948); condena a liberdade contratual do arrendamento rústico, pois o aumento da produção agrícola necessita que se assegure a senhorios e arrendatários «uma posição de mútua estabilidade e confi ança» (4.2.1948); refere a importância da indústria corticeira do Norte e refere a necessidade de reformar a Junta Nacional da Cortiça (17.3.1949); sugere que se aumente a comparticipação do Estado na electrifi cação dos meios rurais (14.12.1957); considerando que a debilidade da lavoura se deve sobretudo ao baixo nível técnico e cultural dos agricultores, apela à intensifi cação e difusão do ensino técnico agrícola (7.2.1958), 30.10.1958, 15.12.1958); refere-se à organização corporativa da lavoura, mais particularmente, à necessidade de ser atribuído aos grémios da lavoura o encargo da distribuição dos produtos próprios ao amanho dos campos, à criação de gado e ao tratamento e defesa das culturas, de ser criado em cada grémio um laboratório experimental, um curso de aprendizagem agrícola e um parque de material agrícola, instituído um seguro de pessoas e de gados, de se dotar os grémios com escolas e livros especializados, os quais deveriam ser isentos de imposto industrial e imposto de licença de estabelecimento comercial e industrial (25.2.1959), 29.4.1960), congratulando-se mais tarde com a adopção desta isenção (11.1.1962); defende, com algumas cautelas, o emparcelamento da propriedade, considerando que este impede o acesso à terra a mais largas camadas populacionais e conduz à libertação de mão-de-obra, o que lembra a oportunidade da reorganização industrial (19.1.1962), 25.1.1962, 19.2.1964); diz que os

grémios da lavoura e suas federações deveriam ter um papel preponderante na comercialização e industrialização dos produtos agrícolas, advoga o desenvolvimento imediato de uma campanha sistemática pela mecanização e motorização da lavoura (19.2.1964); manifesta preocupação quanto à sorte dos Regadios do norte, face à transformação radical de largas áreas alentejanas de sequeiro para regadio prevista pelo Plano Intercalar de Fomento para 1965-1967, e chama a atenção para «o desapego da gente nova pelos campos e pelas coisas da lavoura e pelas actividades da agricultura» (3.12.1964). Ocupa-se ainda das infra-estruturas do seu distrito natal: refere o mau estado das estradas e as fracas dotações para a sua conservação, advogando a construção de maneira a dispensar ou reduzir ao mínimo a sua conservação, isto é, regresso ao sistema da calçada de cubos de granito (14.3.1946, 26.5.1960) e solicita a construção de uma auto-estrada entre o Porto e Aveiro (25.4.1963); alerta para a necessidade de continuar as obras de defesa da Costa de Espinho e solicita a construção de um porto de pesca nesse local (12.3.1947); chama a atenção do ministro das Comunicações para a necessidade de construir um ramal no caminho-de-ferro do Vale do Vouga (15.1.1948); pede que seja removida para outro local a linha de caminho de ferro que se encontra dentro da Vila de Espinho (31.10.1958). Ocupa-se ainda de outros assuntos relativos ao distrito de Aveiro; enaltece a fi gura e obra do professor Guilherme Alves Moreira, a propósito do centenário do seu nascimento (13.12.1961); congratula-se com a aplicação do Decreto-lei n.º 44 161, que autoriza a Academia de Música de Santa Maria da Vila da Feira a ministrar o ensino dos cursos superiores de algumas disciplinas do curso superior de música (Piano, Violino, Violoncelo, Canto e Composição) e solicita ao Governo o auxílio material e as reformas de que o ensino da música necessita (22.3.1962); regozija-se com a ratifi cação pela Santa Sé do patrocínio da princesa Santa Joana de Portugal sobre a cidade e diocese de Aveiro (23.4.1965); aponta ainda o interesse turístico da região e a necessidade de Aveiro dispor de instalações hospitalares adequadas às suas necessidades (3.12.1964). Por fi m, solicita a revisão do art. 314.º do Código Administrativo, que impede as juntas distritais de criar novos estabelecimentos assistenciais e de subsidiar outros que não estejam a seu cargo (27.4.1961 e 16.1-1964). À sua longa carreira parlamentar não será estranha a opinião que Albino dos Reis, então presidente da Assembleia, tinha

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sobre Cardoso da Costa; «um caso a considerar no quadro da política de Aveiro» (IAN/TT, AOS/PC-4C)»: Do seu casamento há quatro fi lhos: José Manuel, Maria Lúcia, Gaspar e Maria Margarida. O Dr. Belchior Cardoso da Costa faleceu na sua Casa da Praça, em 2 de Abril de 1996.

Bibliografi a Correio da Feira;José Manuel Moreira Cardoso da Costa, Dr. Belchior Cardoso da Costa – Notícia biográfi ca Villa da Feira – Terra de Santa Maria, ano II, nº 6, Fevereiro, 2004; Manuel Braga da Cruz e António Costa Pinto, Dicionário Biográfi co Parlamentar, 1935-1974, Vol. I (A – L). Edição do Instituto de Ciências da Universidade de Lisboa e Assembleia da República, 2004.

COSTA, Fernando Francisco Gomes da ( ? – 1969). Nasceu no lugar do Fial, em S. Paio de Oleiros. Era fi lho de José Francisco da Costa e de D. Maria Cardoso da Costa. Formou-se em Medicina e estabeleceu consultório no lugar do Murado, freguesia de Mozelos, Feira. «Dotado de personalidade íntegra, cheio de bondade e de capacidade profi ssional exerceu a sua profi ssão com elevado aprumo, fazendo dela um modelar sacerdócio». Era casado com D. Laura Ferreira Milheiro da Costa, de Mozelos. Faleceu em 11 de Setembro de 1969.

Bibliografi a Correio da Feira, 20.9.1969

COSTA, Germano Marcus da (1897-1977). Nasceu na Vila da Feira em 1897. Proprietário da drogaria «Alfredo Funileiro», foi um «dedicado feirense», tendo sido um dos primeiros elementos do corpo activo da Humanitária Associação dos Bombeiros da Feira, à qual deu toda a sua actividade e dedicação a favor da sua sobrevivência e engrandecimento. Era casado com D. Maria Matos Costa, de quem teve duas fi lhas: Emília e Isaura Matos. Faleceu na sua casa da Lavandeira, em 26 de Julho de 1977.

Bibliografi a Correio da Feira, 5.8.1977

COSTA, João Ferreira da (1910-1975).

Nasceu na freguesia de Nogueira do Cravo em 3 de Junho de 1910, Frequentou os seminários diocesanos e concluiu o curso em Junho de 1935. Foi ordenado sacerdote na Sé Catedral do Porto em 5 de Agosto daquele ano. Em Setembro, foi nomeado coadjutor do pároco de Alvarelhos (Santo Tirso), em Setembro de 1937 foi colocado em Arrifana e em Dezembro de 1945 foi pároco de Paços de Brandão onde se manteve até Setembro de 1956. Nesta freguesia «desenvolveu uma acção preponderante na valorização da capela da Póvoa e no incremento da devoção a Nossa senhora, dado que ocorreu em 1954 o Ano Mariano». Nesse ano enviou para a Exposição, no Porto, algumas imagens, o que muito contribuiu para se ter apurado o valor iconográfi co das mesmas. Em Dezembro de 1956 foi nomeado pároco de Matosinhos, onde se manteve até Outubro de 1967, mês em que foi nomeado para a freguesia de Medas, Gondomar, onde esteve até à sua morte, ocorrida a 24 de Junho de 1975, fi cando sepultado na sua terra natal.

Bibliografi a Padre Antero, Apontamentos sobre Paços de Brandão.

COSTA, José Caetano da ( ? _ ?.) Em 24 de Maio de 1778 era reitor encomendado de Rio Meão. Seria irmão do Reitor de Lourosa João Caetano da Costa.

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão – A Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001.

COSTA, Francisco Álvares da ( ? - ?). Vivia em 1748, segundo Carta de Familiar do Santo ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «Homem de negócios; natural da freg. de S. Pedro de Sanfi ns, Feira, e morador em Pinheiro de Ázere, St.ª Comba Dão; fi lho de Simão Álvares, natural de Sanfi ns, e de Maria da Costa, natural da freg. de S. Miguel de Milheirós de Poiares, Feira, neto paterno de Simão Manuel e de Maria Álvares, naturais de Sanfi ns, e materno de Dionísio da Costa e de Maria de Resende, naturais de Milheirós de Poiares; irmão do Padre Alberto Álvares da Costa, presbítero do Hábito de S. Pedro; ajustado para casar, em 1750, com Rosa Maria de

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Jesus, natural de Pinheiro de Ázere, fi lha de Caetano Zuzarte e de Ana Francisca, neta paterna de Francisco Zuzarte e de Maria Belchior, e materna de João Fernandes, e de Francisca Brito, todos igualmente naturais de Pinheiro de Ázere.Carta de Familiar de 9 de Março de 1748. A.N.T.T. – Francisco – m .69, n.º1282»

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Revista Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º118 (Abril, Maio e Junho), 1964

COSTA, João Caetano da (1712-1778). O Padre Frei João Caetano da Costa foi pároco de Santiago de Rio Meão e foi ele que enviou as informações históricas de Rio Meão para o «Dicionário Geográfi co», do Padre Luís Cardoso, em 1758. Em 31 de Outubro de 1763 foi investido no hábito da Ordem de Malta e vigário colado da igreja de Santiago de Rio Meão. Era natural da freguesia de São Miguel de Silvares, bispado do Porto, onde nasceu em 1712; Neto paterno de João da Costa, da freguesia de São Miguel das Caldas, e de Ana Alviz, do lugar de Rebelo, freguesia de São Miguel de Creixomil, moradores na freguesia de Santo André de Cistelos, bispado do Porto; neto materno de Domingos Gonçalves e de Ana Neta, do lugar de Vila Meão, freguesia de São Miguel de Silvares. Faleceu a 28 de Setembro de 1778 «de idade que dizia ser de 66 anos pouco mais ou menos…»

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão, a Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001.

COSTA, Manuel de Oliveira ( ? - ?). Conhecido por «conselheiro Abade Costa», foi presidente da Câmara Municipal da Feira.

Bibliografi a Jornal Tradição, número especial das Comemorações dos Centenários, 1940.

COSTA, Manuel Pereira da (1917-1961). Nasceu no lugar da Laje, Freguesia de Fornos. Era fi lho de António Gomes da Costa e de D. Rosa Albertina da Costa. Foi ordenado padre na Sé do Porto em 1943 e no dia 17

de Agosto rezou a sua primeira missa na sua terra natal. Foi coadjutor do padre Manuel Barbosa Pereira, abade de Valbom e dali foi para pároco de Mosteirô e mais tarde para S. Roque, Oliveira de Azeméis, onde faleceu a 28 de Maio de 1961.

Bibliografi a Correio da Feira, 15 6.1963

COSTA, Diogo Perdigão da ( ? -?). Vivia em 1652, segundo Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «Capitão; morador em Lamego; fi lho de Manuel Serejo da Costa , Familiar do Santo Ofício, e de Inês Lourenço Perdigoa; casado com D. Clara de Vasconcelos, natural de Arouca, fi lha de António Cardoso de Vasconcelos, natural de Arouca, e de Maria Moreira, natural da vila da Feira, neta paterna de Duarte Mendes de Vasconcelos, também natural de Arouca, e de Isabel Mendes, natural de Santiago de Piães, Cinfães, e materna de Vicente Pinto Lobato e de Antónia Moreira Caldeira, natural da Vila da Feira.Carta de familiar de 26 de Junho de 1652.Diogo – m. 2, n.º87

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Arquivo do Distrito de Aveiro, n. 113, 1963.

COUTINHO, António José Henrique ( ? - ?). Foi nomeado pároco encomendado da Freguesia de Guisande, em 9 de Fevereiro de 1906.

Bibliografi a António Ferreira Pinto, Defendei Vossas Terras – Monografi a de Guisande. Edição da Junta de Freguesia de Guisande, 1999.

COUTINHO, Diogo de Moura ( ? -?). Vivia em 1625, segundo Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «natural de Santa Maria do Zêzere, Baião, e morador na vila da Feira; fi lho de Rodrigo de Moura Coutinho e de Antónia de Castro; neto paterno de Amador da Fonseca

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Pinto e de Francisca Osório, natural de Lamego, e materno de Francisco Fernandes Picanço e de Antónia Delgado, naturais de Gestaçô, todos gente nobre; casado com Leonor de Pinho, natural da vila da Feira, fi lha de Vicente de Pinho e de Antónia Moreira, neta paterna de Duarte Pinho e de Antónia de Pinho, e materna de Marcos Moreira e de Leonor Caldeira, gente nobre da Feira.Carta Familiar de 1625Diogo – m.1, n.º35

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º113, 1963.

COUTO, António dos Santos Ferreira (?– 1975). Nasceu em Milheirós de Poiares a 26 de Junho de 1937. Foi membro destacado da Junta de Freguesia e fez parte de diversos organismos, nomeadamente da Cooperativa dos Lavradores, de que foi fundador. Foi correspondente do «Correio da Feira», e foi ele conjuntamente com seu pai M. Perestrelo, Justino Pinto, Anacleto Mota, Domingos Carvalho e outros que tentaram numa nova fase da vida do grupo de teatro. Colaborou ainda na reconversão do salão paroquial e no parque infantil de Milheirós de Poiares. Era casado com D. Júlia Ramadinho Trindade, da qual teve dois fi lhos: Teresa Maria e Vítor Manuel. Faleceu na sua residência de Milheirós de Poiares em 29 de Novembro de 1975.

Bibliografi a Correio da Feira, 13.12.1975 e 20.6.1975.

COUTO, João Henrique do ( ? - ?). Foi pároco da freguesia de S. Jorge, de 1703 a 1729.

Bibliografi a P.e José Inácio da Costa e Silva, A Freguesia de S. Jorge, jornal Tradição, número especial das Comemorações dos Centenários, Setembro, 1940

COUTO, Joaquim de Sá, (1820-1912). Nasceu em S. Paio de Oleiros em 26 de Março de 1820. Era fi lho de José de Sá Couto, industrial de papel e de Custódia Maria da Costa. Foi um industrial laborioso, tendo-

se dedicado, desde muito novo, ao fabrico de papel que lhe viria a dar diploma e medalhas: foi premiado na Exposição Industrial de 1861, na Exposição Agrícola de Braga de 1863, ma Exposição Internacional Português de 1865, na Exposição Universelle à Paris de 1867, na Weltansntellung, 1870, em Viena e na Exposição Universal de 1878. Participou activamente na política do seu tempo, tendo assumido a chefi a do Partido Progressista da Feira e foi vereador da Câmara Municipal da Feira. Foi agraciado pelo rei D. Luís com a Comenda da Ordem de Nossa Senhora de Vila Viçosa, pelos relevantes serviços prestados à região e ao país. A ele se deve, por força do seu testamento, a construção do Hospital-Asilo Nossa Senhora da Saúde em S. Paio de Oleiros, inaugurado a 6 de Janeiro de 1909. Também Espinho deve ao Comendador Joaquim de Sá Couto muitos benefícios: Foi ele que dirigiu a construção da Capela de Nossa Senhora da Ajuda; que presidiu à Comissão de Auxílio às vítimas do mar; que juntamente com o conselheiro Correia Leal, pugnou pela criação de um apeadeiro do Caminho de Ferro da Linha do Norte, que em 1875 passou a Estação. Por tudo isto, Joaquim de Sá Couto era recordado pelo primeiro historiador de Espinho, o Padre André de Lima, num artigo publicado na revista «Espinho Ilustrado», de Maio de 1931, com as seguintes palavras: Destaco o nome de Joaquim de Sá Couto, para tornar público um pouco do que Espinho deve à sua memória: Vejo o seu nome associado ao de muitos outros que se empenharam ardorosamente para conseguirem melhoramentos e benefícios importantes para Espinho, mas há um gesto seu que basta para se reconhecer quanto Espinho, o Espinho antigo, deveu a esse grande amigo. Foi o seguinte: a partir de 1863 impôs-se a necessidade de substituir os velhos «palheiros» de madeira, de varandas esbeiçadas sobre as ruas e situados em ruelas da povoação, algumas em encruzilhadas sem saídas e disseminadas pelo areal, por casas de pedra e cal. Para isso, porém, era preciso dinheiro. Onde ir buscá-lo? Sá Couto pôs às ordens da nossa gente os seus enormes e bastos capitais por meio de empréstimos e realizou-se o milagre, operando-se essa transformação em bem poucos anos. O mar a partir de 1863 fez em Espinho grandes destroços, lançou por terra muitas casas, reduzindo muita gente à miséria, mas o Comendador Sá Couto foi talvez aquele a quem o mar mais prejuízos causou, a ele e Manuel Alves Moreira, da Idanha de Anta, e que mais tarde fi xou residência em Espinho, a quem podemos e devemos associar

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ao Comendador nesse gesto tão benéfi co para o Espinho de então» Hoje, a Escola do 2º Ciclo do Ensino Básico de Espinho tem o seu nome.O Comendador Joaquim de Sá Couto faleceu a 24 de Janeiro de 1912.

Bibliografi a Álvaro Pereira, Monografi a de Espinho, Espinho, 1970; Defesa de Espinho, 23.6.1973; Espinho Ilustrado, Maio de 1931; Francisco Azevedo Brandão, Anais da História de Espinho, (985-1926), C.M.E., 1991;Francisco Azevedo Brandão, Figuras Ilustres, Comendador Joaquim de Sá Couto, Boletim Cultural de Espinho, nº5/ e 6, 1980; Gazeta de Espinho, 2.2.1902 e 26.1.1912; Terras da Feira, 20.6.2003

CRESCÓNIO, D. ( ? - ?). Possuía grandes terras na região da Feira, sobretudo em Travanca e Souto, nos fi ns do século X, princípios do século XI. Era casado com D. Egas Eres que dela teve D. Gonçalo Viegas que fi cou com os bens do pai e outras propriedades situadas em Travanca.

Bibliografi a Samuel de Bastos, Travanca – A Informação Paroquial de 1758 E Uma retrospectiva do Seu Passado. Revista Villa da Feira- Terra de Santa Maria, ano, IV,n.º 11, Outubro 2005.

CRUZ, António Homem da (1897-1977). Nasceu na Vila da Feira em 1897. Era licenciado em Medicina. Após a sua formatura, exerceu clínica na sua terra. Mais tarde foi nomeado subdelegado de Saúde no concelho do Crato, onde se fi xou e constituiu família. Nesta vila alentejana foi nomeado presidente da Câmara Municipal. Era casado com D. Celeste Tavares Lopes da Cruz Homem de quem teve 4 fi lhos: Américo Manuel, António, Maria da Conceição e Maria Genoveva. Faleceu na sua casa do Crato em Setembro de 1977 com 80 anos de idade.

Bibliografi a Correio da Feira, 30.9.1977

CRUZ, João Ferreira da (? - 1660 ?). Nasceu no lugar de Casais, termo de Maçãs de D. Maria, onde foi baptizado a 25 de Agosto desse ano. Era fi lho Manuel Fernandes ou Manuel Ferreira de Lemos e de D. Isabel Ferreira. Era casado com D. Francisca Luiza Teresa, natural da freguesia de S. Miguel de Alfama, Lisboa, de quem teve os seguintes fi lhos: Luiza Caetano Camelo de Lemos, casada com Francisco António Camelo Falcão Pinto Pereira da Silva, da freguesia da Várzea do Douro, termo de Bem Viver, Comarca do Porto; Micaela Luiza de Aguiar, casada com António José Saraiva de Castelo Branco, natural de Mogofores; Josefa Violante Trindade, freira, e mais duas, professas no Convento da Madre de Deus, em Sá, Aveiro. João Ferreira da Cruz era irmão do Padre Simão Ferreira de Aguiar Franco que tinha comprado a casa e quinta das Ribas, junto ao castelo da Feira, aos herdeiros de José Soares de Albergaria, por escrituras de 24 de Março e 22 de Dezembro de 1707 e as doou, mais tarde a sua sobrinha, Luiza Caetano Camelo de Lemos, fi lha do dito João Ferreira da Cruz, por escritura de 12 de Fevereiro de 1712. Foram, pois os descendentes deste que venderam as citadas propriedades ao Dr. Sebastião Gomes da Costa Pacheco em 1789.

Bibliografi a Roberto Vaz de Oliveira, Quinta das Ribas – Família Vaz de Oliveira. Edição da Comissão das propriedades situadas em Travanca.

CRUZ, Joaquim Gomes da (1899-1959). Nasceu na Vila da Feira. Na sua juventude assentou praça voluntariamente na Marinha de Guerra, tendo feito parte das guarnições das unidades Corveta D. Estefânia, Adamastor e S. Rafael, tendo deixado anos depois a vida militar regressando à sua terra. Aqui foi chefe de secretaria da Câmara Municipal. Espírito liberal e democrata, foi ele que em 6 de Outubro de 1910 organizou uma manifestação de regozijo pelo proclamação da República, à frente da qual seguia com a bandeira verde-rubra, percorrendo as ruas da Vila e vitoriando o novo regime. Quando em Janeiro de 1919 Paiva Couceiro proclama a Monarquia do Norte, Joaquim Cruz que nessa altura era amanuense da administração do concelho, conseguiu atravessar com outros companheiros as linhas monárquicas em Estarreja e juntar-se ao grupo que nas margens do rio Vouga combatia pela República.. Em 1920

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foi nomeado secretário da administração do concelho e pela extinção deste assumiu o cargo de secretário da Câmara Municipal da Feira. Foi um dos fundadores dos Bombeiros Voluntários da Feira e seu 1º. Comandante. Fez parte de associações locais como «Cénico», e «Tuna Orfeão Feirense». Era casado com D. Maria Faria Correia de Sá da Cruz de quem teve os seguintes fi lhos. Joaquim António, Maria Clotilde, Emília Olga, Izulia , Maria Antónia e Maria Joaquina.. Faleceu em 27 de Fevereiro de 1959

Bibliografi a Correio da Feira, 7.3.1959

CRUZ, Manuel Gomes da (? - ?). Vivia em 1728, segundo Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «natural e morador no lugar de Morgado, São Miguel do Souto. Filho de Manuel Gomes Tutor, natural da freguesia de Santiago de Rio Meão, e de Faustina da Cruz, natural do dito lugar do Morgado e aí moradores. Neto paterno de Jerónimo Gomes e de Catarina Fernandes, naturais ambos da dita freguesia de Santiago de Rio Meão. Neto materno o Padre Manuel Correia da Silva, reitor que foi da igreja de São Miguel do Souto, natural do Porto, e de Maria Dias, mulher solteira, natural e moradora no dito lugar de Morgado. Manuel Gomes da Cruz estava ajustado para casar, em 1731, com Luísa de Azevedo, natural de Aldeia, da dita freguesia de São Miguel do Souto, fi lha de Sebastião de Azevedo e de Maria Fernandes, natural do lugar do Cerrado, Souto, e moradores na dita Aldeia. Neta paterna de António Francisco, natural do lugar da Quintã de Santo André de Mosteirô, e de Maria Fernandes, natural de Cabo Monte, e aí moradores. Neta materna de António Fernandes, natural do Amieiro, freguesia de São Mamede de Travanca, e de Maria de Azevedo, natural do Cerrado, e moradores, todos lavradores.Carta de Familiar de 7 de Dezembro de 1728. A.N.T.T. – Manuel – m.95, n.º1783»

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão, a Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001.

CRUZ, Manuel Leandro Cardoso da ( ? - ?).

Foi pároco encomendado de Rio Meão desde 23 de Janeiro de 1868 a 10 de Novembro de 1869. Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão – A Terra e o Povo na História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001

CRUZ, Moisés Figueiredo ( ? - ?). Natural de Mosteiro, descendente dos nobres Camoças, foi chanceler do Consulado de Portugal em Belém do Pará tendo sido transferido em 1927 para o consulado de Manaus. Suportou os efeitos das Revoluções do Amazonas e de S. Paulo em 1930 e 1932, tanto como detentor de um cargo diplomático como homem «dotado de princípios sólidos, coração nobre e alma sã», tendo dado provas humanizadas da sua amizade pelo povo brasileiro, em todas as fases daquela revolução, tentando «suavizar os ânimos que se alteraram pelos prejuízos que sofreram os nacionais, portugueses e estrangeiros». O comendador Moisés Figueiredo Cruz foi membro da Sociedade de Geografi a de Lisboa, do Instituto Geográfi co e Histórico e sócio correspondente de várias instituições nacionais e estrangeiras. Foi conselheiro da Sociedade de S. Vicente de Paulo, onde prestou relevantes serviços em benefício da pobreza, revelando o seu espírito de fi lantropia. Exerceu também as funções de Cônsul em Pernambuco.

CRUZ, Vicente Alves da ( ? - ?). Era natural de S. Paio de Oleiros, Feira. Tomou posse de Benefi ciado da Sé do Porto em 6 de Junho de 1853.

Bibliografi a Padre António Ferreira Pinto, Cónegos e Benefi ciados da Sé do Porto, naturais do Distrito de Aveiro. Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º19, 1939.

CUNHA, Bernardo António Soares Barbosa da ( ?-?). Nasceu na freguesia de Santa Maria de Arrifana. Era fi lho do bacharel Fernando Marque Soares. Segundo «uns autos de justifi cação arquivados no cartório do 3º. Ofício da comarca da Feira, prova-se que o autor da emboscada e da morte do ofi cial francês Lameth foi Bernardo António Soares Barbosa da Cunha, natural de Arrifana». Aquando da 2ª. Invasão francesa, em 1908, comandada pelo general Soult e este depois de ter invadido a cidade do Porto, retirara-se para

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as serras e constando a Bernardo António que pela estrada real passavam vários destacamentos de tropas francesas para as margens do rio Vouga, preparou-lhes uma cilada, ajudado por outros camaradas. Numa dessas emboscadas, no lugar de Santiago, passou o sobrinho do general Soult, de nome Lameth que, tendo resistido ao assalto, foi morto com um tiro de espingarda por Bernardo António, tendo os restantes companheiros ferido e dispersado muitos soldados franceses. Por este motivo Bernardo António foi perseguido e procurado, vendo-se obrigado a atravessar as margens do Vouga e reunir-se às tropas anglo-lusas, comandadas pelo general Trant, que estavam aquarteladas em Águeda. Daqui acompanhou as tropas e participou nas acções militares de Souto Redondo, Grijó e Porto. Foram seus companheiros na referida emboscada os seguintes cidadãos: João Ribeiro Leite, alferes de granadeiros do Regimento de Milícias de Oliveira de Azeméis e morador na rua da freguesia de Arrifana, com a idade de 31 anos; João Gomes de Resende, fi lho de Manuel Gomes de Resende, da mesma freguesia e lugar, com 31 anos; Atanásio Ribeiro Leite, músico, da mesma freguesia e lugar, de 30 anos e José Ribeiro Leite, cirurgião, do mesmo lugar e freguesia, de 32 anos. Por esta acção, o general Soult ordenou ao general Thomiers e seus soldados que matassem os habitantes de Arrifana que fossem encontrados em qualquer parte da freguesia, tendo ocorrido a 17 de Abril de 1809 o chamado «Morticínio da Buciqueira», onde dezenas de arrifanenses foram mortos a tiro e à baioneta, alguns esquartejados e os seus membros suspensos na árvores para servirem de exemplo. Alguns cadáveres foram arrastados até ao lugar de Santiago, onde tinha sido montada a emboscada, e ali erguidos em postes para exemplo. Para fi nalizar este massacre, as tropas francesas lançaram fogo à maior parte das habitações e no adro da igreja foram abertas «fundas valas», onde os cadáveres foram lançados aos «montões».

Bibliografi a Povo Feirense, 7.5.1939;Saul Ribeiro Valente, Notícia e Memória da Freguesia de Arrifana de Santa Maria. Coimbra, 1937

CUNHA, António Soares Barbosa da ( ? - ?). Natural da freguesia de Arrifana. Era fi lho de José Soares Barbosa da Cunha, Administrador do concelho da Feira de 1847 a 1853. O Dr. António Barbosa foi também

Administrador do concelho vária vezes: de Fevereiro de 1868 a Maio de 1871; de Janeiro de 1872 a Fevereiro de 1879; de Março de 1878 a Julho de 1879; de Abril de 1882 a Junho de 1885 e fi nalmente de Março de 1886 a Novembro de 1888, Num dos intervalos foi Administrador do concelho de Oliveira de Azeméis.

Bibliografi a Henrique Vaz Ferreira, Ferro Velho, Correio da Feira, 27.6.1942.

CUNHA, Fernão ( ? -?) Era abade colado da igreja de Canedo, confi rmado em 13 de Dezembro de 1505, pelo bispo do Porto D. Diogo da Costa, por intermédio do Vigário geral e Abade Comendatário do Mosteiro de Bustelo, Pedro Gonçalves.

Bibliografi a Catálogo dos Bispos do Porto;Cónego A. Ferreira Pinto, Cónegos e Benefi ciados da Sé do Porto. Arquivo do Distrito de Aveiro, n.º 19, 1938.

CUNHA, Inácio António da ( ? - ?). Foi pároco da freguesia de S. Jorge, de 1792 a 1825. Coube a ele «a glória de descobrir e de promover o aproveitamento das Caldas.

Bibliografi a P.e José Inácio da Costa e Silva, A Freguesia de S. Jorge, jornal Tradição, número especial das Comemorações dos Centenários, Setembro, 1940.

CUNHA, João da Fonseca da ( ? - ?) Vivia em 1749, segundo Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «natural de Arrifana de St.ª Maria, Feira, e morador em Formilhão, freg. anexa a S. Miguel do Outeiro, Viseu; fi lho de João da Fonseca da Cunha, cavaleiro do hábito de Santiago, natural de Vagos, e de D. Francisca da Costa, natural de Arrifana de St.ª Maria, e aí moradores; neto paterno de Diogo de Pinho Teixeira, natural de Ovar, e de Isabel da Fonseca da Cunha, natural de Vagos, e aí moradores, e materno de Aleixo Borges da Costa, natural de Arrifana de St.ª Maria, e

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de Joana Borges de Miranda, natural da vila Sambre, Codal, moradores em Arrifana; casado primeira vez com D. Tomásia da Fonseca de Pinho, natural de Vagos, e segunda vez com D. Joana do Amaral, natural de Viseu, fi lha de João do Amaral de Almeida, natural de Viseu, e de Maria de Aguiar Rebela, também natural de Viseu, moradores em Formilhão, neto paterno de Fernando Vaz do Amaral e de Salvadora de Almeida de Andrade, naturais e moradores em Viseu, e materno de António Francisco de Aguiar, natural de Formilhão, e de Isabel Francisca, a «Santa», igualmente natural de Viseu, e aí moradores. O habilitando teve três fi lhos naturais, Maria, natural de Vagos, de Maria João Marmela, natural de Mira, que mais tarde casara com João Gonçalves, fi lho de Manuel Gonçalves e de Maria João, e António e Mariana, naturais e moradores em Formilhão, de Maria Fernandes, também de Formilhão, fi lha de Domingos Fernandes, de Gavinho, Canas de Senhorim, também moradores em Formilhão.Carta de Familiar de 1797. A.N.T.T. – João – m. 23, n.º 560»

Bibliografi a Jorge Hugo Pires de Lima, O Distrito de Aveiro nas Habilitações do Santo Ofício. Revista Arquivo do Distrito de Aveiro, n.130 (Abril, Maio e Junho), 1967.

CUNHA, João de Santa Francisca e ( ? - ?). Vivia em 1773, segundo Carta de Familiar do Santo Ofício que lhe foi concedida nessa data e que a seguir se transcreve: «presbítero secular, morador na sua Quinta das Laranjeiras, freguesia de Santa Maria de Loures. Era natural de Melres, concelho de Gondomar, fi lho de António da Cunha e de Maria Vieira, naturais da dita de Melres, onde são moradores. Era neto paterno de Nicolau da Cunha, natural da freguesia de Santa Eulália de Pedorido, Castelo de Paiva, e de Maria Gonçalves, natural da Freguesia de Santiago de Rio Meão, Feira; e materno de Manuel Vieira Gago e de Ana Alves, naturais da dita de Melres e aí moradores. Recebeu provisão de Notário para que requereu habilitação em 5 de Outubro de 1773. A.N.T.T. – João – m.156, n.º2256»

Bibliografi a David Simões Rodrigues, Rio Meão, a Terra e o Povo na

História. Edição da Junta de Freguesia de Rio Meão, 2001. CUNHA, João Soares da ( ? - ?). Era natural de Fiães. Foi pároco da sua terra durante 30 anos (1769-1799) e benzeu e abriu ao culto a Capela de Macieira, de invocação do Senhor Crucifi cado, S, João e Santo António. Foi durante o seu múnus sacerdotal que se procedeu à partilha do «Monte Maninho», de Fiães, com autorização da Rainha D. Maria II ou do Príncipe Regente, em 1794.

Bibliografi a Padre Manuel Francisco de Sá, Santa Maria de Fiães da Terra da Feira. Casa Nun’Álvares, Porto, 1940.

CUNHA, José Soares Barbosa da ( ? - ?). Natural da freguesia de Arrifana. Exerceu o cargo de Administrador do concelho da Feira desde Março de 1847 até Julho de 1852, voltando a exercê-lo logo em Novembro de 1853. Era Tenente-Coronel do Regimento de Milícias de Oliveira de Azeméis em 20.09.1801.

Bibliografi a Henrique Vaz Ferreira, Ferro Velho, Correio da Feira, 27.6.1942; Nuno Gonçalo Pereira Borrego, As Ordenanças e as Milícias em Portugal, Subsídios para o seu estudo, vol. I. Edição Guarda-Mor, Edição de Publicações Multimédia, Lisboa, 2006.

CUNHA, Manuel Pereira da ( ? - ?). Foi pároco da freguesia de Pigeiros, apresentado, em 1666, pelos «Rochas», continuadores dos antigos Pereiras da Quinta do Paço de Pigeiros.

Bibliografi a P.e José Inácio da Costa e Silva, «Santa Maria de Pigeiros», jornal Tradição, número especial das Comemorações dos Centenários, Setembro, 1940; Samuel de Bastos Oliveira, Travanca – a informação paroquial de 1758 e uma retrospectiva do seu passado. Revista Villa da Feira – Terra de Santa Maria, ano IV, n. 11, Outubro 2005.

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103 EM PROL DO DR. DOMINGOS CAETANO DE SOUSA, MÉDICO FEIRENSE E CIDADÃO HONRADO

Manuel de Lima Bastos*

Dou comigo a pensar porque razão resolvi escrever umas quantas linhas sobre o Dr. Domingos Caetano de Sousa quando não só mal o conheci mas porque, sendo um homem da situação política na época da ditadura, eu militava por razões de família e de opção pessoal no campo contrário da oposição ao regime salazarista vigente. Mas a verdade é que tenho algumas ligações ao homem e ao médico e duas ou três histórias, nas quais é protagonista, para contar. E, sobretudo, porque penso que merece sobejamente que o recorde, homenageie e por breves instantes o retire do limbo do esquecimento. No meu tempo de menino da escola, aí por fi nais dos anos quarenta do século passado, na Vila da Feira e na zona nascente do concelho, os médicos de que conservo memória eram o meu homenageado na sede do concelho, o meu pai na freguesia de Fiães e mais conhecido pelo doutor das Levadas – uns anos mais tarde apareceu outro nesta freguesia, o Dr. Ferreira da Silva, dito o doutor pequenino por ser de baixa

estatura – o Dr. Ferreira Pinto em Sanguedo, o mais velho de todos e médico de minha casa por o meu pai entender que a sua família mais chegada, mulher e fi lhos, não devia ser assistida por ele próprio, o Dr. Carlos Ribeiro nas Caldas de S. Jorge, conhecido por o Dr. Carlos de S. Jorge e justamente lembrado e homenageado há breves dias na sua terra e, por fi m, o Dr. Pais Moreira na freguesia de Canedo. São estes o que a minha memória recorda e suponho que me não atraiçoa tantos anos passados. Lembro-me também que todos entretinham entre si relações de cordialidade e que se requisitavam mutuamente para conferências médicas em casos que lhes apareciam de natureza mais bicuda. É que isto de se socorrerem de meios auxiliares de diagnóstico, como hoje acontece por tudo e por nada, praticamente não existia e ir ao Porto fazer uma simples radiografi a ao cadáver, quase sempre no consultório do Dr. Adolfo Pinto Leite, colega de curso de meu pai, só em casos extremos e quando o paciente tinha recursos para arcar com a despesa, o que era luxo de poucos. Em geral, o médico contava apenas com a sua perícia e ouvido afi nado ao manusear o estetoscópio, os seus conhecimentos e a experiência que a prática clínica trazia ao longo dos anos de exercício da profi ssão.

Durante alguns anos o Dr. Domingos Caetano de Sousa exerceu o cargo de Presidente da Câmara da Feira por

*Advogado. Devoto Aquiliniano

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autárquicos era coisa que não existia. Tenho na lembrança de que foi acusado de não ter feito obra e ter pautado a sua administração pelos mesmos princípios com que se rege o dono prudente duma mercearia: há, gasta-se; não há, não se gasta. Ora eu entendo, mesmo nos tempos actuais, que este princípio deve orientar o bom chefe de família na sua vida, as empresas, as autarquias e as próprias nações. Quero dizer isto para que fi que claro: o endividamento justifi ca-se quando se destina a investimento reprodutivo, isto é, quando tem em vista propiciar a sua própria amortização através do benefício que vai criar mesmo que de natureza apenas social. É o caso do que pede emprestado para comprar o terreno onde pensa edifi car a sua casa, ou esta própria, é o caso da autarquia que se endivida para rasgar a estrada ou outro equipamento social que permitirá à comunidade circular com menos delongas ou viver melhor. Provavelmente o Dr. Domingos Caetano de Sousa era avesso a qualquer forma de endividamento. Se havia cem, gastavam-se noventa e deixavam-se dez ao canto da gaveta para uma precisão imprevista. É importante não esquecer que o homem é ele próprio e a sua circunstância histórica. E a circunstância histórica da época dimanava da visão ultramontana e retrógrada do chefe político do regime para quem o éden na terra era um país rural, contente com a aurea mediocritas de duas telhas por cima da cabeça para que a chuva lhe não caísse no bestunto e um pedaço de pão ao canto do açafate. Melhor ainda se cada português tivesse dois palmos de terra para mourejar, adubar com o suor do seu rosto e obter o sustento de cada dia. O resto resumia-se a cumprir o preceito da missinha aos domingos e dias santos de guarda e a desobriga pela Páscoa da Ressurreição. Por acréscimo, logo viria um lugarzinho modesto à mão direita de Deus Padre para cada português quando chegasse a hora de prestar contas. Neste contexto não admira que o Dr. Domingos Caetano de Sousa se não sentisse estimulado a meter-se em grandes cavalarias pois, sendo homem de indesmentida integridade e parcimonioso no uso do que era seu, muito mais o seria na aplicação dos dinheiros públicos. Com estas características e supondo eu que não teria particular aptidão psicológica para as demonstrações que hoje genericamente se exigem a quem se propõe ocupar qualquer lugar electivo, tais como beijocar criancinhas de

tenra idade, de preferência ao colo das progenitoras, de chamar aos peitos os parranas que saem à rua para vitoriar o candidato, de prometer este mundo e o outro começando pela número ganhador do sorteio da lotaria a seguir às eleições ou de espalhar a sua vera efígie em cartazes por quanto poste de iluminação exista nas redondezas – tudo de preferência sob o olhar atento de uma câmara de televisão - os analistas, politólogos e outros conhecedores da arte de endrominar o próximo não teriam dúvidas em afi rmar que, hoje, o Dr. Domingos Caetano de Sousa não dispunha de perfi l adequado para o cargo.

Contudo, antes e durante o seu consulado à frente dos destinos camarários, o concelho da Vila da Feira foi um oásis de tolerância política e de convivência pacífi ca entre os que pensavam de modo diferente. Para tal contribuiu não só o Dr. Domingos Caetano de Sousa mas sobretudo o Dr. Belchior Cardoso da Costa que foi advogado sabedor e competente e líder do partido único salazarista, chegando a deputado na Assembleia Nacional. Mas ambos eram pessoas cujo carácter e consciência de homens de bem não lhes permitia a delação e muito menos a perseguição política de quem pensava de maneira diversa. Ao contrário, muitos destes – dentre os quais destaco o Dr. Alcides Strecht Monteiro, meu padrinho de casamento, de quem tive a honra de ser sócio no seu escritório de advocacia, crónico cabeça de lista da oposição no distrito de Aveiro nas farsas eleitorais do regime – não poucas vezes se benefi ciaram do aviso e da intervenção protectora de ambos nas frequentes investidas dos Argos da polícia política do regime. Para quebrar este saudável ambiente de cordialidade e respeito mútuo que se vivia no concelho da Vila da Feira foi preciso que viesse encabeçar o lugar de presidente da câmara uma fi gura tenebrosa de defensor fundamentalista das ideias e princípios mais retrógrados do regime. O homem está morto e enterrado mas este facto apenas exige, a quem hoje se debruça sobre as ilegalidades e até as malvadezas que cometeu, que não saia das baias estritas da lisura e da verdade. E é isso e apenas isso que me proponho fazer para estabelecer a diferença entre o passado de concórdia que relatei e de cujos principais fautores apontei os nomes e a época seguinte na qual se banalizou a denúncia, a perseguição política e até a intromissão ilegal na vida íntima dos cidadãos e das famílias.

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concelho uma ampla rede de escutadores que lhe transmitiam o que sabiam, o que supunham saber e o que inventavam por interesse pessoal, político ou até simplesmente para agradar e mostrar serviço ao chefe. Já durante o tempo que passou no escritório do Dr. Alcides Strecht Monteiro, onde estagiou como candidato à advocacia que nunca exerceu, era frequente ser convidado por aquele seu patrono para almoçar na casa deste uma vez que residia em Fiães. Ora contou-me o Dr. Alcides – e soube-o também por outras fontes – que nos períodos eleitorais ia de noite, com outros prosélitos da boa doutrina salazarista, rasgar os cartazes e demais propaganda de quem o recebera no seu escritório de advogado e lhe matava a fome sentando-o à sua mesa. Já nesta altura fi cou defi nido o seu quilate moral e o que, no domínio da perseguição política e por mera animadversão pessoal, o seu carácter lhe iria permitir fazer nos anos vindouros. O meu pai, médico e proprietário em Fiães, praticamente vizinho do indivíduo em causa, nunca teve direito de voto por sistematicamente eliminarem o seu nome dos cadernos eleitorais como perigoso elemento subversivo. Que nunca foi pois jamais desenvolveu qualquer actividade contra o regime apesar de lhe ser desafecto. Deu-se até a circunstância ridícula de ser, desde há muitos anos, facultativo da família do fulano em questão e este ter proibido terminantemente que lhe solicitassem os serviços clínicos. Ora o pai de tão prometedor autarca, pessoa já de idade e achacado de males graves, persistia em querer que fosse o meu pai que o assistisse. De modo que a família esperava que a Presidencial fi gura saísse para a Vila da Feira para exercer as suas funções e ia, em grande segredo, pedir ao meu pai que viesse examinar o velho. Suponho que meu pai anuía condoído por o homem se encontrar no fi m da vida e não ter culpa dos dislates do fi lho. O rancor insensato contra o meu pai, que nunca lhe fez qualquer agravo, foi até ao ponto de impedir a sua efectivação como médico estomatologista no Posto Médico de Santa Maria de Lamas onde trabalhou mais de vinte anos. Abertos vários concursos para preenchimento da vaga, o meu pai metia a papelada para concorrer ao lugar. Jamais saíram os resultados de quase uma dúzia de concursos a que se propôs. De tal forma o caso era extraordinário que o chefe administrativo desse posto – um tal Sr. Luz – que, sendo

afecto ao regime, era homem correcto chegando a estabelecer relações de amizade com meu pai ao fi m duma convivência de mais de duas décadas, tirou-se dos seus cuidados e indagou nos Serviços Médico-Sociais da Previdência em Coimbra da razão de tão anómalo sucesso. Informaram-no, por debaixo da capucha, que apensa à fi cha profi ssional do candidato estava uma carta do dito presidente da câmara – cujo nome jamais referirei – alertando para o grave inconveniente de se nomear um perigoso adversário do regime como médico efectivo. Por esta razão trabalhou meu pai mais de vinte anos em regime de precariedade nunca tendo tido direito a subsídio de doença e a reforma quando adoeceu duma grave insufi ciência renal que o vitimou com sessenta e seis anos de idade. A mim também não me poupou no seu rancor por quem não tinha jeito para a subserviência, isto é, para lamber as botas ao ditador municipal. Nessa época tinha eu negócios com empresas estrangeiras e necessitava de passaporte. Pois meia dúzia de vezes mo recusaram no Governo Civil de Aveiro e não se escondiam de me dizer que resolvesse primeiro o problema da informação fornecida pela Câmara da Vila da Feira pois, sem isso, nada feito. Quando casei em 1964 e passei a residir em Arcozelo, Vila Nova de Gaia, na Junta de Freguesia passaram-me o atestado de residência e fui ao Governo Civil do Porto requerer o almejado passaporte. Só me perguntaram se o queria normal ou urgente. Como optei por este último pagando a taxa devida pela urgência, meia hora mais tarde saía para a rua com o documento no bolso. Mas o pior aconteceu-me uns três anos depois, continuando eu embrenhado no mundo dos negócios e já com a responsabilidade de dois fi lhos pequenos. Certa vez recebi um postal da Pide convocando-me para as suas instalações no Porto às nove horas de determinado dia. Lá me apresentei e, após horas de espera, acabei por ser atendido por um inspector da benemérita instituição, pilar essencial da preservação e consolidação da fé e do império.O homem, ao contrário do que eu receava, foi de inexcedível urbanidade. Em resumo, digamos que era denunciado como autor de dois graves crimes: ter andado a distribuir, uns anos antes, propaganda subversiva contra o regime na inauguração da Ponte da Arrábida a qual seria insultuosa para o venerando chefe do estado, almirante Américo de Deus Rodrigues Thomás (olaré!, com “h”) que honrara a cerimónia com a sua augusta presença.

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O outro denunciado crime que eu teria cometido piava mais fi no: nem mais nem menos que o de fazer reuniões semanais com lavradores de Fiães e das freguesias vizinhas para os doutrinar nos ensinamentos marxistas-leninistas!!! É claro que neguei pela excelente razão de que não era verdade. Poderia agora luzir os meus galões anti-fascistas mas o seu a seu dono. É verdade que sempre me considerei opositor ao regime detestável por toda a minha família paterna lhe ser desafecta, ter sido criado e educado por um pai que tinha como ponto de fé acreditar nos valores mais nobres da democracia e da república e pelo motivo básico de estar do lado oposto da barricada dos que coarctam as liberdades essenciais de um ser humano mais que não seja como resistente passivo. Transformarem-me em denodado activista contra o regime era uma rematada invenção. Disse então e repito-o agora já que não pretendo louros indevidos. Na altura a minha vida e a minha pequena empresa davam-me muito que fazer e em que pensar e até me debatia com um problema que poderia denominar de fracturante, se este palavrão já tivesse sido inventado: gastava mais do que ganhava e ainda não existia a engenharia fi nanceira que permite convencer os labregos endinheirados a investir no capital de empresas que estão sujeitas a dar a alma ao Criador a qualquer momento, como era a minha na altura. O inspector disse-me que estava tudo muito bem e que não punha em dúvida ter à sua frente um inocente chapado. Mas que quem fi zera a denúncia era pessoa conhecida pela sua devoção ao Estado Novo e ao seu fuhrer. Disse-me que aguardasse que ia mastigar qualquer coisa à cantina e que continuaríamos de seguida a sabatina. E deixou-me, escarrapachada na minha frente, a carta que continha a denúncia. É claro que, mal virou costas, a primeira coisa que fi z foi lê-la de fi o a pavio. Como esperava, era da Câmara Municipal da Vila da Feira e estava assinada pelo seu presidente com todas as letras. Estava praticamente em jejum e com a boca seca de fumar um cigarro atrás de outro desde as nove horas da manhã. Regressou seriam quase quatro da tarde e estirou-se bovinamente – pois era bicho corpulento – no cadeirão almofadado e acabou por me dizer: verdade ou mentira, hoje vai-se embora na fresca da ribeira mas, se voltar a haver nova denúncia, vamos poupar-lhe a maçada de arranjar transporte para cá. Seremos nós que o iremos buscar num dos volkswagens que viu lá fora. Pode ir à sua vida e muito

cuidadinho que está metido com fraca rês. Saí do gabinete do inspector nas caves da instituição seria já perto das seis horas. O certo é que me perdi no meandro dos corredores e não atinava com a porta da rua. Passados uns largos minutos volto a encontrar o dito inspector que me pergunta que é que andava ainda ali a fazer. Respondo-lhe que não encontrava a saída e o homem conduziu-me até à rua. E foi-me dizendo com ar escarninho: está a ver...?, dizem que fazemos aqui coisas terríveis às pessoas! Mas o senhor andou por aí o tempo que quis, meteu o nariz onde lhe apeteceu e que é que viu? Nada de nada, até podia testemunhar que aqui se respeita a lei...! Mandei-o in pecto a certa parte e pus-me a andar para casa onde me esperavam numa afl ição. Mas aqui fi ca estampada a diferença incomensurável para a vida e o sossego das pessoas se comparamos a fi gura sem grandeza nem inteligência deste insignifi cante mas mal intencionado Torquemada de terceira ordem com a gente de carácter e de consciência como o Dr. Domingos Caetano de Sousa ou o Dr. Belchior Cardoso da Costa que, defendendo com toda a legitimidade o seu ideário, sabiam respeitar os que dele, também legitimamente, dissentiam. No tempo em que comecei a exercer o ofício de advogado ainda nos era preciso, vez por outra, justifi car alguma falta em tribunal com atestado médico. A primeira vez que me socorri do Dr. Domingos Caetano de Sousa mandei a minha funcionária – que “herdei” do Dr. Alcides Strecht Monteiro e ainda hoje está ao meu serviço – ao consultório do Dr. Sousa para tal fi m. O homem não cobrou nada pelo serviço apesar da insistência em pagar e eu passei a recorrer, sempre que possível, a outros médicos por não me sentir à vontade com os favores indevidos. Estou em supor que o obséquio se devia a eu ser fi lho de um antigo colega com quem tivera boas relações profi ssionais e pessoais embora sem qualquer intimidade. Ora um dia, aí por fi ns dos anos setenta e da parte da manhã, não me senti lá muito bem e, preocupado, lembrei-me de bater à porta do seu consultório voltado para a Igreja e Convento dos Lóios – onde funcionou durante décadas e décadas o velho tribunal da comarca – e pedi-lhe que me examinasse. Depois dos preliminares da praxe mediu-me a tensão arterial e, com o seu velho estetoscópio de cromado já baço

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Com a cabeça ligeiramente inclinada e um leve sorriso na boca, como era de seu timbre, gravemente e com toda a concentração voltou a repetir a manobra. Eu esperava o veredicto com o credo na boca. Acabou por me dizer que não lhe parecia que houvesse nada de preocupante mas que notara uma ligeira dilatação do ventrículo esquerdo. Voltou a não me cobrar os honorários da consulta, eu fui tratar da minha vida embora pensando no íntimo com algum cepticismo como raio é que, com um estetoscópio talvez do tempo da primeira guerra mundial, conseguira detectar a dilatação do meu ventrículo esquerdo. A coisa fi cou por aqui e nunca mais me lembrei do caso. Uns largos anos mais tarde, aí por 1986, fui convidado por um cliente e amigo para ir a Inglaterra ver o jogo de futebol das meias fi nais da Taça UEFA que opunha o Futebol Clube do Porto – de que sou apenas simpatizante moderado e que não frequenta os estádios – ao Aberdeen escocês. Na época estava de moda fazer no estrangeiro um exame médico completo a que chamavam check up e, como tínhamos de fi car um dia em Londres, os três expedicionários submeteram-se a essa prova no Masonic Hospital ( que devia ter sido fundado por alguma instituição maçónica) instalado numa esplêndida mansão nos arredores da capital inglesa. Quando o táxi nos deixou no sopé da imponente escadaria tínhamos à nossa espera uma simpática velhinha, seguramente octogenária, toda perliquitetes e muito bem pintada e arranjada que nos recebeu explicando-nos que era voluntária no hospital e, como falava espanhol, tinha sido destacada para nos guiar até aos diversos serviços onde faríamos vários testes e exames. Começou por nos conduzir a um vestiário, fi cando pudicamente no corredor, onde nos deveríamos despir totalmente, guardar as nossas coisas num cacifo que fecharíamos à chave, envergar um sumptuoso roupão vermelho carmesim e sapatos de quarto da mesma cor que nos forneceram e acompanhá-la ao laboratório de análises clínicas. Percorremos corredores imensos, entramos e saímos de elevadores e não se via vivalma em lado nenhum. Mas pelos vidros das portas de salões, salas e gabinetes podíamos divisar o pessoal médico e auxiliar rodeando pacientes numa azáfama de colmeia ordenada e silenciosa. Nem cheirava a hospital! Depois da colheita de sangue e urina a nossa macróbia

acompanhante, como estávamos em jejum, levou-nos ao refeitório onde nos serviram um esplêndido pequeno almoço à inglesa. Seguiram-se mais não sei quantos exames sofi sticados, electrocardiogramas, electroencefalogramas, provas de esforço, ecografi as, tacs a isto e àquilo e o diabo a quatro. Com tudo isto, sem esperas nem atropelos, demos conta que era quase meio-dia e a velhota informou-nos que iríamos então a uma consulta com um médico que, de posse do resultado de todos os exames, nos explicaria por miúdos o estado do cadáver de cada um. Como eu era o único que entendia e me fazia entender razoavelmente em inglês, a dama acompanhou os outros dois amigos para servir de tradutora e eu vi-me no consultório dum calmeirão de mais de dois metros de altura, de cabelo cor de cenoura, que me informou ser médico e escocês. Disse-me que a papelada de todos os exames realizados e o seu relatório iriam ser-me enviados por correio para Portugal e que os deveria apresentar ao meu médico que saberia o que prescrever-me. Acrescentou, para meu sossego, que não havia nada de particularmente preocupante embora tivesse detectado uma ligeira dilatação do meu ventrículo esquerdo!!! Pensei com os meus botões: e vim eu de tão longe gastar o rico baguinho para este toutiço de cenoura, com recurso a sofi sticados meios de diagnóstico, me dizer a mesmíssima coisa que, uns bons oito anos antes, o Dr. Domingos Caetano de Sousa, com o seu olho clínico e empunhando o antediluviano estetoscópio – embora manejado por mão hábil e ouvido atento e sabedor – já me tinha dito num exame de dez minutos! Perto do hospital havia um restaurante mexicano onde almoçamos feijões com chili picantíssimos e bebemos umas tequillas à saúde de todos os maçons falecidos, vivos e por nascer e à tarde seguimos de avião para as terras altas da Escócia onde o Porto ganhou por 1-0 e foi à fi nal da Taça UEFA que acabou por perder. E tudo está bem quando acaba em bem. Mas devo penitenciar-me e bater com a mão no peito onde ainda pulsa o coração com o ventrículo esquerdo dilatado por ter duvidado da palavra e do saber do Dr. Domingos Caetano de Sousa.

Não tivemos contactos durante largos anos mas

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pasta na mão e envergando o sobretudo bege pelo de camelo com ar friorento, a subir a passo pausado a rua da Vila da Feira que conduzia à sua residência. Falei com ele pela última vez poucos meses antes de falecer. Estava a jantar com minha mulher no balcão da Confeitaria Cunha à Rua Sá da Bandeira no Porto. Era sábado e junto à porta de entrada aglomerava-se grande número de pessoas aguardando uma vaga pois essa parte de restaurante comportava só os lugares no balcão que à época não eram muitos. Divisei, no meio das pessoas que esperavam no passeio, o Dr. Domingos Caetano de Sousa e a esposa, uma senhora que recordo sobre o miúdo mas de aspecto fi no e muito composto. Como estávamos no fi m do jantar, disse a minha mulher que ia praticar a boa acção do dia. Vim cá fora e levei-os quase empurrados para junto dos nossos lugares ao balcão. Fiz sentar a senhora no meu lugar vago e a minha mulher, que nem sequer a conhecia mas industriada por mim, iniciou uma cavaqueira como se fossem amigas de longa data. Ainda ouvi, nas minhas costas, uns zunzuns de protesto mas fi z de conta que não era nada comigo. O Dr. Sousa devia estar vendido, ele que era a discrição e a delicadeza em pessoa. Ainda quis estrebuchar pelo atropelo ao direito de prioridade das pessoas que estavam à sua frente mas, passados que foram uns momentos, deixei pousar a poeira e fi -lo sentar no lugar de minha mulher. Conversamos mais uns segundos para disfarçar e viemo-nos embora. Teriam na altura mais de oitenta anos e a consciência não me censura pelo que fi z. Ao Dr. Domingos Caetano de Sousa é que já não estou seguro disso. Era tão escrupuloso e correcto que provavelmente nem a comida lhe soube bem nem lhe assentou no estômago.

Passado pouco tempo soube que tinha falecido. Recordo a sua fi gura simples, os modos delicados que revelavam discrição e afabilidade, a cabeça sempre um pouco inclinada com duas ou três repas de cabelo a disfarçar a calva, o sorriso de uma brandura amável e a postura educada e atenta de quem pedia desculpa por existir e não querer incomodar. E posso perfeitamente imaginar que, quando chegou lá acima, bateu ao portão com os nós dos dedos com tal ligeireza que ninguém o ouviu. Provavelmente a imensa legião de santas e santos, mais que fartos de carregar o aborrecimento sem

fi m da bem-aventurança eterna, estariam por lá entretidos a ver alguma telenovela que certamente seria brasileira porque no paraíso só se gasta do melhor que há. Mas a S. Pedro, com a sua experiência de dois mil anos como director da portaria celestial e é naturalmente poliglota, não lhe passou desapercebido que alguém batia levemente à porta. E veio abrir dizendo em português abrasileirado porque a clientela tropical é, na proporção demográfi ca, muito mais numerosa que a lusitana:- Vá entrando, seu Domingos, e tome assento. Faça cerimónia não. A casa é sua.

Miramar, Setembro de 2009

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109 Domingos Azevedo Moreira *

VISITAÇÕES

DE

PIGEIROS (FEIRA)

Vol. I (1769 – 1849)

Vol. II (1850 – 1873)

PIGEIROS 1990

*Pároco de Pigeiros

Na publicação do livro I e II de Visitações desta freguesia de Pigeiros, concelho de Santa Maria da Feira, houve a preocupação prioritária de apresentar o texto, tendo-se deixado para outra altura (e até para quem o quiser fazer) o estudo (de grande valor) sobre os aspectos da vida civil e religiosa da época, refl ectidos nestes livros. Tendo em conta também esta mesma fi nalidade, acrescentamos em apêndice uma série de outros textos que afIoram directa ou indirectamente a mesma temática destes dois livros de visitações (indicando no decurso a correspondência entre as duas séries de textos), até pelo interesse da variada e rica documentação do abade Osório.

Quanto à leitura, procurou-se reduzir ao mínimo os riscos de erro através ainda do confronto com os livros de visitações das freguesias de Romariz, Guisan de , Caldas de S. Jorge, etc. , confronto este que não foi sufi ciente para o nosso fi m, pois nos livros dessas freguesias há falta de transcrição de alguns textos (sobretudo da época de 1821 e 1838 ). Assim, nalguns casos, as dúvidas fi caram expressas por um sinal de interrogação entre parêntese curvo, isto é (?) , bem como através de pontos entre parêntese curvo, ou seja (...), para os casos em que se não conseguiu ou será muito difícil a leitura. Também entre parêntese curvo colocamos palavras, sílabas ou letras que reconstituímos por não fi gurarem no texto, quer seja por lapso do escriba, quer para dar sentido ao

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leitor. Outras vezes o parêntese consta do próprio texto, o que anotamos sempre em nota. Substituímos pela forma moderna de aspas, isto é “ “, os correspondentes sinais antigos do texto = =. Em notas abordamos em pormenor alguns casos destes problemas. O início das folhas do original vai assinalado por um traço ao alto, isto é , seguido do número da folha e com uma seta a indicar que se segue o texto dessa folha. Palavras latinas vão entre aspas. Procurou-se respeitar totalmente a ortografi a do texto (colocando apenas alguns acentos e sinais de pontuação para facilitar a compreensão), anotando casos irregulares mas de fácil observação pela palavra sic entre parêntese curvo, ou seja (sic). Não se desdobraram as abreviaturas, mas fez-se um elenco de interpretação das mesmas, o que pode ajudar as pessoas que queiram manusear livros semelhantes. Também registamos algumas breves observações de carácter ortográfi co e gramatical, pois este trabalho não esquece a fi nalidade pedagógico-didáctica. Fizeram-se alguns parágrafos que não constam no original, a fi m de facilitar a compreensão e de não tornar o texto transcrito demasiado pesado. Os textos originais vão sempre transcritos entre aspas, para se distinguir o texto daquilo que é da nossa própria autoria (numeração, etc.). Em suma, os livros de Visitações, também chamados livros de Visita ou dos Capítulos (cfr. n.º 31), além de visitações, são um repositório de assuntos de reconhecido interesse e registo. No fi m, em vez de um índice ideal, optou-se por um mais prático sobre alguns temas de reconhecida importância, pois, como costuma dizer-se, o bom é inimigo do óptimo e que, por ser óptimo, não chega na prática tantas vezes a realizar-se, inconveniente que importava evitar, acima de tudo, nesta publicação. Sobre a vida civil e religiosa, refl ectida nos livros de visitações, é modelar o estudo de António Henriques Tavares, Subsídios para a História da Freguesia de São Martinho de Pessegueiro do Vouga (1682 – 1855), tese inédita em História, em 1972, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.

OBSERVAÇÕES ORTOGRÁFICAS E GRAMATICAIS

A linguagem mais ou menos popularizada usada nestes livros de visitações apresenta algumas características que

a diferenciam da linguagem actual. Iremos referir as mais notórias (os números a seguir a cada citação signifi cam a numeração feita por nós do texto original). Assim, temos, por exemplo:

1) a / e: “Metriz” 9 / Matriz.

2) e / i: “infi cionando” 34 / infecionando, “admetido” 1 / admitido.

3) o (u) / e: “feturos” 6 / futuros, “deloroza” 16 / dolorosa.

4) o / u: “uração” 20 n.º 6 / oração, “grades de pao” 1 / grades de pau, “subórbios” 9 / subúrbios.

5) ai / au: “caizal” 20 / causal.

6) aom / ão : “Christaons” 2 / Cristãos.

7) oins / oens / ões: “instrohiçoens” 2 / instruções, “oraçoins” 59 / orações.

8) am / ã: ”pagám” 159/ pagã.

9) terminação –ão paroxítona (daí o pormos acento por motivo de compreensão): “séjão reformadas” 1 / sejam reformadas, “póssão” 4 / possam.

10) – põem / -põe: “O Ministerio [...] nos impõem” 58/ O Ministério [...] nos impõe, “a S. ta Igr.ª propõem” 34/ a Santa Igreja propõe, “dispõem a Const. am Diocezana” 23 n.º 3 / dispõe a Constituição Diocesana.

11) qua / ca e guo / go: “comarqua” 8 / comarca, “diguo” 4 / digo.

12) s / ss: “asim” / assim.

13) s(z) / ç: “fasso saber” 1 / faço saber, “ousa de Confi ção” 1 / ouça de Confi ssão, “obceruem” 3 / observem, “sençuras” 9 / censuras.

14) s / z: “ezcreverem” 1 / escreverem; “monstruozo”

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167 / monstruoso. 15) s / x: “estripassão” 19 / extirpação, “espostos” 1 / expostos.

16) ch / x: “Edital q. será fi chado” 1 / Edital que será fi xado.

17) m / n: “emrequecendo” 20 n.º 6 / enriquecendo.

18) r antes ou depois da vogal: “percizão” 1 / precisão, “preneciosas” 5 / perneciosas.

19) troca de sons ou formas fonéticas quase iguais: “vene(rá)vais” 20 / veneráveis, “indefectivamente” 108/ indefectivelmente.

20) troca de palavras parecidas: “obtiuessem” 15 / abstivessem, “proceda” 20 n.º 6 / preceda, “privid. as” / providências, “repetidas” 40/ respectivas. O mesmo com sons parecidos: “rezistei” 181 / registei, “ezacto” 145 / exacto.

21) consoante simples / geminada: “esmollas” 34 e “esmolas” 37.

22) falta de letras: “batizar” 20 / baptizar; “ “ sílabas: “venevais” 20 / veneráveis; “ “ palavras: “seja o R.do Paro.o a faze-los logo” 20 n.º 4 / seja o Reverendo Pároco obrigado a fazê-los logo; repetição a indicar plural: “R. R. P. Par.os” 30 (n.º9) / Reverendos Párocos. 23) repetição de sílabas: “Constantantino” 20/ Constantino; repetição de palavras: “A a chave” 30 n.º 8 / A chave, “sob sob” 41 / sob.

24) sintaxe descuidada: “Nenhum Confessor Secular ou Regular oução” 20 n.º 9 / Nenhum Confessor Secular ou Regular ouça, “determinamos q. [...] estarem obrigados” 23 n.º 3 / determinamos que [...] estão obrigados.

25) formas populares: “líuoro” 19 / livro,

“induligencia” 4 / indulgência, “poderemos” 4 / [= podêremos] / podermos. Forma latina: “era ut supra” (era como acima).

26) uso de maiúsculas para acentuar a importância do que se afi rma: “Confi rmo os Capítulos da Visitação passada” 45, “Mandamos” 42, etc.

27) falta de h como em “oras” 18 / horas, etc. e uso de h para desfazer ditongo, etc. com “construhidos” 71 / construídos, “ ahinda” 93 / ainda, etc.

28) ditongos em –u grafados em –o, como em “graos” 78 / graus, “incumbio” 35 / incumbiu, “remeteo” 33 / remeteu, etc.

29) outros casos: “dem” 50 e 57 / dêem, “tem” 81 / têm, “lhe” 18 / lhes, “boma educação” 1 / boa educação, “comprio” 19 / cumpriu, “se não poderem”

31 / se não puderem, “outo” 33 / oito, “noute” 160 / noite.

30) -am oxítono por –ão, -ã, como “pagám” 159 / pagã, “sam” 184 / sã; -ão paroxítono por –am, como “merecêrão” 37 / mereceram, etc.

31) u por v, como “hauendo” 24 / havendo. 32) m de palavras simples mantido em compostos: “emquanto” 136, “comtudo” 138. 33) Variantes gráfi cas perto umas das outras: “orçamento” e “orsamento” 168.

ELENCO DAS ABREVIATURAS

Colocamos entre parêntese o seu desdobramento

A

A. (anno, annos)

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112

A. o (amigo)a. s (annos)Ab. e, Abb. e (abade)abz. te (abzente = ausente)A. C. (Antonio Caetano)A . C. O. (G.) (Antonio Caetano Ozorio (Gondim))acabam. to (acabamento)Admin. ao (administração)Adm. or, Ad. or (Administrador)Adm. vos (Administrativos)Ag. o (Agosto)Al. (Alteza)alim. to (alimento)Alm. da (Almeida)alm. e, alm. s (almude, almudes)alq. e (alqueire)Alz. (Alves)An. o, An. to (António)Ap. o (Apóstolo)App. ca/co (Appostólico, Appostólica)Arrif. a (Arrifana)art. o (artigo)attest. am (attestaçám)att. o, v. or (attento, venerador)auz. e (auzente)Av. M. a (Ave Maria)

B

B. (Bem-aventurada)B. o (Bispo)B. M. (Bem-aventurada Maria)bas. te (bastante)Ben., Ben. do (Benedito = Bento)Ben. do (Benefi ciado)Benef. o (Benefício)Benif. a (Benifi cencia)Bispd. o, Bisp. do, Bisp. o (Bispado)

C

c. (coração)C. (Concílio, Concelho)

C. a (Carta)

C. ta (Costa)cab. o (cabido)Cadr. a (Cadeira)Caet. o (Caetano)cam. as (câmaras)can. (Cânones, canónico)Cap. al (Capital)Cap(p). ar (Cappitular, Capitular)Capp. am (Cappitám)Cap. o, Cap. to (Capítulo)cap. s (capítulos)Card. o (Cardoso)carid. e (caridade)Caru. o, Carv. o (Carvalho)cazam. to (cazamento)Cert. am (Certidám)charid. e (charidade)Chr. (Christo)Ch(r). mo (Christianismo)Cir. aes (Circulares)claram. te (claramente)clarid. e (claridade)Com. ca (Comarca)

Comm.ão Com(m)issão Com(m)unhão

Comp. a (Companhia)

Comp.e Compadre Competente Compet. e (Competente)Con. co (Concelho, Conselho)Conc. (Concílio)Concorr. a (concorrência)concorr. es (concorrentes)confer. as (conferências)

confr.a confraria conferência

Page 111: Villa da Feira 23

113

Confr. e(s) (conforme (s) )Cong. am (Congregaçám, Congregazám)Congreg. am (Congregaçám)Cons. o (Conselho)Const., Const. tam, Const. ção (Constituição)Conste. ção (Constituição)Contr. o (Contrário)Conv. al (Conventual)Corr. a (Correia)Corr. e Corr. te (Corrente)Corr. o (Correio)Cr. da, Cruz. da (Cruzada)Cuid. o (Cuidado)

D

DioceseD. Domingo Dom

d. e (deve)

d. o/a dito / dita domingo / dominga

D. o (Distrito)

D r, D. or/ora Doutor, Doutora Distrito (n.º 139)

D. s DeusDaq. la (Daquela)def. to (defeito)delig. ça (deligência)delig. te (deligente)denh. os (dinheiros)desp. a (despesa)Desp. o ( Despacho)Dez. o (Dezejo)dezbr. o (dezembro)dezemp. o (dezempenho)Dic., Dioc., Diocez. (Diocezano)dir. to (direito)disp. a (dispensa)

disp. ão (disposição)distr. o (distri(c)to) div. o (divino)Dom. (domingo, dominga)dr. o (dinheiro)Dr. Distrito (n.º 139) DoutorDum. o (domingo)Notar: exemplos de formas em –d. e (-ade, -dade):Cid. e (Cidade)id. e (idade)Pi. de (Piedade)felicid. e (felicidade)carid. e (caridade)pied. e (piedade)etc.

E

E. (Era)E. R. M. (Espero Resposta Merçê)ecl., Eclez. o, Ecles. a, Ecclesi. as, eclese. o, ecleseas. os (Ecclesiástico(s), eclesiástica)Ef. to, Eff. to (effeito)El. to (eleito)Emin. mo, Em. na (Eminentíssimo, Eminentíssima)Emin. te (Eminente)Encom. do (Encomendado)Ep. al (Episcopal)Esc. am, Escr. am (Escrivám)Escriptr. a (Escriptura)Esp. a (Espera)Esp. al (Espiritual)

Esp. o Espaço Espírito

Esp. to (Espírito)Est.o (Estilo)Etc. a (Et Cetera)Eug. o, Evg. o, Evang. o (Evangelho)Ex. ca/cia (Excelência)Ex. cam, Exec. am (Execuçám)

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114

Ex. mo/ma (Excelentíssimo, Excelentíssima)Exactam. te (Exactamente) F

F. Filho Fidelíssimo

f. o(s) / a(s) (fi lho(s), fi lha(s) )F. r (Frei)F., F. a, Fid., F. ma (Fidelíssima)faculd. e (faculdade)Feur. o, Fevr. o, Fever. o (Fevereiro)Fed., Fidel. ma (Fidelíssima)Fm. a (Fidelíssima)Fon. ca (Fonseca)Fr. (Frei)

Fr. a feira forma (cfr. n.º 80)

Fr. ca (Francisca)Fran. co (Francisco)freg. a, frg. a (freguesia)freg. es, frg. es (fregueses)Frr. a (Ferreira)

G

G. al (Geral)

G. e, G. de(S) Grande(s) Guarde

G. rs (Gratis)gloriossim.o (gloriosíssimo)Glz. (Gonçalvez)gn. de(s) (grande(s) )G. or, Gou. or (Governador)Gov. o (Governo)Gov. or (Governador)Gr. de(s), Grd. e(s) (Grande(s) )grs. (grátis)Guim. es (Guimarães)

Guizam. tos (Guizamentos)

H

H. es (Henriques)Henr(r)iq. es (Henriques)Henr. e (Henrique)

I

Id. e (Idade)Ig. a, Igr. a (Igreja)Ill.mo/ma (Illustríssimo, Illustríssima)Ill. tre (Illustre)Imediatam. te (Imediatamente)Imp. e, Import. e (Importante)Indiff. tes (Indifferentes)Indulg. a/ca (Indulgência)Inim. os (Inimigos)Iniquid. e (Iniquidade)Inst. (Instituição)Intelig. ca (Inteligência)

Intr. o Inteiro Interino

Inventr. o (Inventário)

J

J. Jesus Jerónimo

J. C. (Jesus Cristo)J. C. N. S. (Jesus Cristo Nosso Senhor)J. e (José)Janr. o (Janeiro)Jer. o (Jerónimo)Joaq. m (Joaquim)

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115

Just. a (Justiça)

L

L. (Lourenço)

l.ça Lembrança (n.º16) licença

L. do (Licenciado)l., l. o(s) (livro(s) )L. te (Leite)Lx. a (Lixboa)leg. to (legítimo)liv. (livro(s) )Lour. o (Loureiro)Lour. co (Lourenço)

M

M. Muito Memoria Magestade

M. a (Maria)m. a (minha)M., Mag. e, Mag. de (Magestade)M. ce (Mercê)M. ço (Março)M. dar, M. dou (Mandar, Mandou)M. e (Mestre)M. el (Manuel)M. er(es) (Mulher(es) )M. mo/ma (Mesmo, Mesma)M. or (Maior, Melhor)M. R. (Muito Reverendo)

M. res Mulheres Menores

M. s Mais Mesmos (cfr. n.º 97)

M. to (Muito)mandam. to (mandamento)Men. o (Menistro)Menistr. o (Menistério)Merecim. to (merecimento)Min. o (Ministro)Mistr. o (Mistério)Mor. a (Moreira)Mostr. o (Mosteiro)movim. to (movimento)

N

n., N. (nosso, Nosso)N. B. (Note Bem)N. D. (Nossa Diocese)n. e (nome)N. Eccl. (Negócios Ecclesiásticos)N. F. (Nossa Fidelíssima)N. R. (Nosso Reverendo)N. S. J. C. (Nosso Senhor Jesus Cristo)n.º (número)naq. les (naqueles)Nativid. e (Natividade)necessr.º (necessario)necessid.e (necessidade)neg.º (negócio)nobr.º (nobembro, novembro)Nog. ra, Nogr. a (Nogueira)not. ª (notícia)nr. os/as (necessarios, necessarias)Notar: números nos meses:7br. º (Setembro)8br. º (outubro)9br. º (novembro)e ainda: 3. as (terceiras)

O

Obd. ª (Obediencia)Obed. a/ça (obediência)Obrig. am (Obrigaçám)Ofend. º (Ofendido)

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116

Off. º (Offício)Offr. er (offerecer)Ol. ª, Oliv. ra (Oliveira)Ordr. º, Ordinar. º (Ordinário)

P

PadreP., p. Papa, Pontífi ce pede(m) passado

p. ª (para)p. al (parochial)P. co (Pároco)p. co/ca (público, pública)

P. e Padre Presidente

p. f. (próximo futuro)pg. (pago)p. lo(s)/la(s) (pelo(s), pelas(s) )p. p. (próximo passado)p. r (por)p. r tanto (portanto)P. S. (Post Scriptum)p. te, pt. e (parte)

P. to Pinto Porto

Pa. co(s) (Pároco(s) )Par. º, Parr. º, (Pároco, Párroco)param. to (paramento)pat. e (patente)pavim. to (pavimento)penit. (penitência)Per. ª (Pereira)Pi. e, Pied. e (Piedade)Pigr. os (Pigeiros)plenip. mo (plenipotentíssimo)

Pont. (Pontífi ce)port. ª (portaria)PP. (Papa)

primeiro(s), primeira(s)pr. o(s)/a(s) pároco(s) próximo(s), próxima(s)

Prec. tos (Preceitos)prez. ca (prezença)

Prez. e (Prezente) Prez. e, Prezid. te (Presidente)

Prez. te prezente, presente prezidente, presidente

primr. ª (primeira)pro. s (próximos)Prouis. or (Provisor)public. ão (publicação)prud. ª (prudência)

Q

Q. (Quezito) (n.º 167)q. e, q. (que)qd. º, q. do (quando)q. l, q. al (qual)q. m, q. em (quem)Q. ma (Quaresma)q. r (quer)q. s (quais)q. tia (quantia)

quintaQ. ta quanta quantia, quotas

q. to (quanto)qualq. r (qualquer)etc.

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117

R

R. (Real)R., R. do (Reverendo)R. M. (Resposta Mercê)R. ma (Reverendíssima)R. R. (Reverendos)R. or (Reitor)R. os (Ritos)Realid. e (realidade)Rd. º (Reverendo)Recom. da (Recomenda)Ref. º (Referido)Reg. e (Regente)Req. r (Requer)Req. to (requerimento)Resp. to (Respeito)Respect. º (Respectivo)Responsabilid.e (Responsabilidade)Rev. do (Reverendo)Rezid. ª, Rez. ª (Rezidencia)rs. (réis)Notar: formas em – r. o/a (-ura, -eiro, -ário, -eira, etc.)por exemplo:Ordinr. º (Ordinário)mostr. º (mosteiro)escriptr. ª (escriptura)cadr. ª (cadeira)Nogr. ª (Nogueira)Teix. ra (Teixeira)etc.

S

Santo, SantidadeS. Sua, Sagrado (n.º 20) Senhor, Senhoria Salutar (n.º 16)

S. ª (Silva)s. ª (sua)S. A(l). R. (Sua Alteza Real)S. es (Soares)

S. J. C. (Senhor Jesus Cristo)S. M. (Sua Magestade)S. M. F. (Sua Magestade Fidelíssima)S. mo (Santíssimo, Sumo)S. N. P(x). (Serviço Nacional e Postal, cfr. 60 e 160)S. º (São)S. or/r (Senhor)S. S. (Sumos)S. to/ta (Santo, Santa)sacram. to (sacramento)sacrif. º (sacrifício)sacros. (sacrosanto)sag. do/da (sagrado, sagrada)Santid. e (Santidade)Santis. º (Santíssimo)satizff. to (satizffeito)Seb. am (Sebastiám)secr.º (secretário)secret.ª (secretaria)secret.º (secretário)seg.º, segd.º (segundo)seg. te (seguinte)

sem. tes Sementes semelhantes

Senh. ª (Senhora)sensibilid. e (sensibilidade)Seq. ra (Sequeira)Serv. º (Serviço)Sinod. (Sinodal)Sm. mo (Santíssimo)Sn(n). ça (Sentença) Snr. (a) (Senhor, Senhora)Sobr. o(s)/a(s) (Sobrinho(s), Sobrinha(s) )Sobred. o/a (Sobredito, Sobredita)socied. e (sociedade)soltr. ª (solteira)som. te (somente)SS. mo (Santíssimo)subst. os (substitutos)suff. te (suffi ciente)sum(m). os (sum(m)ários)supp. e, supp. te (supplicante)Sz. ª (Souza)

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118

T

Tercr. º (Terceiro)Test. as, Testem. as (Testemunhas)Thezr. º (Thezoureiro)tp. º (Tempo)tr. º (termo)trab. º, trau. º (trabalho)Trid., Trident. (Tridentino)tt. (título)tt. ª (testemunha)tt. º (título)Notar: formas em -. te (-ente) e formas em -. to (-ento) por exemplo: som. te (somente) vestim. ta (vestimenta) docum. tos (documentos)

u

Utilid. e (Utilidade)

V

v. gr. (verbi gratia)

VaraV. ª Vossa Viúva Vila

v. º vinho versículo, verso

V. M., V. M. ce (Vossa Mercê)v. or (venerador)V. S. ª (Vossa Senhoria)V. da V. ª (Vigário da Vara)VV. SS. (Vossas Senhorias)V. S. d. ex. ca(m) (Vossa Senhoria dê execuçám, cfr. n.º 21, 22 e 24)

Vas. cos (Vasconcelos)verd. es (verdades)verdadr. º (verdadeiro)Verg. º (Vergalho = Vigário)vez. am (vezitaçám)vez. º (vezinho)vez. ta (vezita)Vig. º, Vigr. º (Vigário)Vir. e(s) (Virtude(s) )vont. e (vontade)

X

X. er (Xavier)X. to (Christo)

PALAVRAS HUMORÍSTICAS

Burra 117, 139 (Bula)Páçaro 117, 118, 120 (Paço)Potaria 144 (Portaria)Putaria 144, 145, 165 (Portaria)(re)borrendos 114 (reverendos)(re)berrendos 134 (reverendos)vergalho 115, 118, 120, 194 e 195, 114 (vigário)

INFLUÊNCIA LATINA

Dada a familiaridade com o latim, sobretudo nos autores de Pastorais, circulares, etc., notam-se vários refl exos directos ou indirectos do latim, não apenas no vocabulário e até sintaxe, mas principalmente na ordem das palavras: “não ignora o R. do Par. º o q. to cooperar deue” 20 n.º 3º/ não ignora o reverendo pároco o quanto deve cooperar, “todos sabem ser D. s nas vulgares romarias mais ofend. º do q. seus S.tos mais glorifi cado” 20 n.º 8 / todos sabem que Deus é nas vulgares romarias mais ofendido do que os seus santos são glorifi cados.

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TEXTO DO I LIVRO DE VISITAÇÕES DE PIGEIROS (1769 – 1849)

« | 1

“Livro que há-d(e) servir p. ª se ezcreverem as vizitaçoins nesta Igreja de Santa Maria de Pigeiros que vay rubricado por mim e no fi m seu enserram. to Pigeiros 31 de Mayo de 1769. » | 1v em branco

1

« | 2

O Doutor Joze Nogr. ª da Sylua e Seq. ª, Benefi ciado da Collegiada de S. Pedro de Ferreira, Cónego da S. ta Igr. ª Cathedral do Porto e Vezitador no Espiritual e Temporal nesta Com. ca da Fr. ª pello Ill. mo e Reverendissimo Snr. Niculao Joaq. m Thorel da Cunha M. el, do Con. cº de Sua Mag. de Fedilissima e do Geral do S. Offi cio, G. or do m. mo Bisp. do do Porto, etc. etc. etc. Fasso saber em como vezitando a Parochial Igr. ª de S. M. ª de Pigr. os em prez. ça do Rd. º Par. º e mais pessoas da frg. ª detriminei o seg. te: Primr.ª m.te vezitei o Sacrario, S. mo Sacram. to, Altar Mayor e Colaterais, Imagens, S. tos Óleos, Pia Batismal, Sachristia, e Param. tos e achei tudo decentem. te ornado. Manda Sua Ill. ma, com pena de suspensão, ao Rd. º Párocho desta freg. ª não consinta que Clérigo algu se arroje a celebrar sem vestes talares nem p. ª esse efeito lhe dê ornam. tos nem tambem o admita aos Offi cios Divinos sem ‘(s)tola e sobrepelis. Outrosim manda suscitar as conferencias de Moral na mayor p. te das freguezias do Bisp. do abolidas, e q. se frequentem ao menos hua tarde cada semana às quais prezidirá o Rd. º Pár. º com a cominação de se não passarem as licenças de confessar sem se juntar Certidão | 2 v jurada da frequencia das m. mas e nellas deue tambem entrar todo e qual q. r ordinando o qual não será admetido sem a d. ª Certidão. Determina o mesmo Snr. Que o Rd. º Pár. º não possa instruhir os seus freguezes senão pello Cathessismo de Montpelier, e que recomende a todos os clérigos de Ordens Sacras a cuidadoza aplicação delle porq. serão proguntados nos seus Exames, como tambem os Menoristas p. ª serem admetidos às demais Ordens, com advertencia q. huns e

outros não serão aprouados sem darem bas. te not. ª dele: E o m. mo Rd. º Pár. º admoestará tambem aos Pais de familias q. tiuerem meyos p. ª isso fássão domesticam. te uzar do dito Cathessismo p. ª a boma (sic) educação dellas, e a falta da observancia deste Cap. to se lhe(s) dará em culpa graue. Com pena de suspensão manda o m. mo Snr. q. o Rd. º Pár. º fassa logo executar as Ordens q. vierem do juizo Ecleziásticc, e o m. mo Rd. º Pár. º admoestará aos deuedores de Dízimos, Votos, Laudémios e Remeterá Relação das Pessoas q. deuerem Laudémios ou Luctuozas à Ex. ma Mitra. Com a mesma Pena de suspensão ipso facto Ordena o m. mo Snr. q. nenhum Pár. º ou Confessor Secular ou Regular ous(s)a de Confi ção as molheres senão em Confi cionários fechados mas de tal forma | 3 Forma que pella parte anterior se possa ver destintam. te o Confessor os quais mandarão dentro de tres mezes formalizar, e com Ralos de folha de fl andres, Latão ou outro qualq. r metal nos lados deles, bem advertido q. não deuem ser em forma de grades, mas sim picados em boracos de lemitada ezphera; não se comprehendendo nestra (sic) prohibição aquelas pessoas q. em Rezão de sua Menor ou m. to Cressida Id. e ou das graues e notorias queixas q. padesserem não poderem confessar-se nos ditos Ralos. Debayxo de preceito graue Ordena ao Rd. º Pár. º fassa guardar a costódia da Igr. ª, Vazos Sagrados por pessoas não só de intr. ª confi dência e probidade mas que na comua Reputação séjão tidas e havidas por legítimos Christaons del Rey e com as mesmas qualidades lhe Recomenda admita na sua Igr. ª os Sanchristaons e o m. mo obseruará nas capellas desta freguezia: e, Consentindo o Contr. º, se lhe estranhará grauem. te.

Por queixa que o Prouedor da Real Caza dos espostos da Cid. e do Porto fes a Sua Ill. ma da pouca Carid. e com q. os Párochos se hão com os Espostos da Roda, manda o m. mo Snr. , com pena de suspensão e de se lhe dar em culpa, a todo o Pár. º q. não leue dinheiro pellas Certidoens de que necessitarem as Amas q. vão buscar e Criar os mesmos | 3

v Os mesmos nem ofertas de Missas, Couas ou outro qual q. r emolum. to. Mando que se ponha huma Pedra d’Ara no Sacrário e que este seja forrado por dentro de huma tela ou setim branco; que se Compre Outra Caixa Com três âmbulas ao menos de estanho fi no p. ª os Santos Oleos; que se faça hum torno e gancho de ferro para a Pia baptismal e humas grades de pao ao redor destas com sua porta das mesmas grades com sua

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fechadura e chave; Que as vidraças da Igreja séjão reformadas e que se faça huma de novo para a sacristia; Que igualm. te se faça reformar o pavimento e Taburnos da mesma Igreja com os telhados della e da fábrica. E para todas as referidas obras asigno o termo de seis mezes, suposta a grave percizão que dellas achei com pena de doze mil reis a Cada huma das Pessoas, que a isso forem obrigadas e Com as mais que parecerm justas. O R. Párocho publicará estes na forma do Estilo de que passará Certidão.Pigeiros, 31 de Maio de 1769 E eu o P. Joaquim Joze Mendes de Almeyda Secretario da Vizitação os Escrevi e subescrevi. Joze Nog. ra da Silva e Seq. ra. Na forma q. se me determina publiquei estes Cappítolos à estação da Missa Conventual q. disse a meus freguezes. S. ta M. ª da Pigr. os, de Junho 11 de 1769 O Coadjutor João Leyte de Bastos »

2

| 4 « Nicolao Joaq. m Thorel da Cunha M. el, do Con. co de Sua Mag. de Fidelissima, do geral do S. to Off. co, G. or do Bisp. do do Porto, com toda a jurisdição Ordinaria sem Rezerua alguma. Ao Amabilissimo Clero Secular e Regular e pessoas de hu e doutro sexo deste Bisp. do Saudo e Bênção no Snr. Faço saber q. o Sanctissimo Padre Clemente XIV q. felizm. te previde ��� à Igr. ª Universal pella sua exaltação ao Supremo Appostolado com os Seus Iluminados e Paternais Sentim. tos e com os abundantissimos efeitos da Sua gracioza Liberalid. e se dignou abrir o thezouro da mesma Igr. ª em comum Benefi cio do Mundo Catholico e conceder a Bulla da Indulgencia Plenaria q. acompanha esta Pastoral pella qual Exhorto aos Rd. os Pár. os expliquem as cláuzulas da mesma Bulla com particular distinção e com as mais deuotas expreçoins q. póssão dispor os ânimos dos seus freguezes p. ª dignam. te Receberem o Sanctissimo Sacram. to do Altar, alcançarem o perdão das suas culpas e graça de Deos Todo Poderozo: E tambem os instruham com o mayor disvelo com q. devemos todos interessar-nos no seru. º e ob(e)d. ª, amor e Fidilidade aos Reys Snr. es Augustos e Soberanos como expecialm. te nos aduerte o mesmo Sanctissimo | 4 v Padre na Sua carta

emcýclica q. p. ª este efeito vay junta com a d. ª Bulla p. ª q. todos os pouos com tam emportantíssimas e Religiozíssimas instrohissoens e ocazioens de Sua Santid.e conheçam o q. deuem crer e o q. deuem obrar não só como Christaons obedientes fi lhos da S. ta Madre Igr. ª mas tambem como fi eis Vaçalos de Sua Mag. de Fidelissima e p. ª q. as tenham sempre m. to promptas os mesmos Rd. os Pár. os lançarão de uerbo ad Verbum esta Pastoral no libro, Registarão como também a Referida carta emcýclica em hu Dom. º ou dia S. to de cada mes q. deixo ao seu arbitrio e no fi m da estação Repetirão aquelas instrohiçoens, e da falta da sua execução se lhe fará culpa na uezita p. ª serem castigados como pede hua tao graue omição e p. ª q. haja mais prompta expedição com a mayor cópia de Confessors concedo l. ça p. ª confessarem nas duas semanas deste Jubileu a todos os Rd. os Padres Sacerdotes q. já fôrão approuados e não se acham suspensos e não têm culpas em juizo e p. ª se poderem conseguir nesta Cid. e lhes asigno as Igr. as da S. ta Sé Cathedral, de Nossa Snr. ª do Monte do Carmo, da Mizericordia e de S. Fran. co, e nas freg. as das quatro com. cas Igr. as Parochiais bem advertindo-se comumm. te com atenção a sua aprouação lhes asigno tambem aquelas Capelas com porta p. ca q. lhes fi carem mais proximas às suas Rezidencias e nomear o Rd. º Pár. º lhes aduirto q. antes de nascer o Sol estejam abertas p. ª q. vizitando-as aquellas pessoas q. uivem do seu trau. º póssão nele continuar sem a perda de algum dia E ezta vizitação | 5 Vizitação terá principio no dia 18 do Corr. te mes de Março terceira Dom. ª da quaresma e acabará em o primr. º de Abril proximo seg. te incluziue a Dom. ª da Payxam, dada nesta Cid. e do Porto sob meu signal e sello da Meza Capitolar aos 3 de M. ço de 1770 e eu o P. e Fran. co da Costa escriuão da Câmera Eclesiastica a sobscrevi. Nicolao Joaq. m Thorel da Cunha M. el Gou. or,Pimentel. E não se continha em a d. ª Pastoral q. aqui tresladei fi elm. te como nella se me determina, dia era ut 7 de M. ço de 1770.

O Coadjutor João Leyte de Bastos.Publiquei esta Pastoral na forma que se me determina, S. ta M. ª de Pigr. os, de M. ço 11 de 1770 O Coadjutor João Leyte de Bastos».

(1) por “prezide”.

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3

«Dom Frej Aleixo de Miranda Henriques, da sagrada ordem do(s) pregadores, por m. cê de Deos e da S. ta Sé apostolica Bispo do Porto, do concelho de Sua Magestade Fedilisima, A todos os nossos súbditos asim Eccleziasticos como Seculares fazemos saber q. o S. to P. e Benedito XIV na Sua Constituissão iy que prensepia «Non ambigimos» (sic), querendo extinguir os abuzos que se aviam introduzido pellos maos Cristanos Com grande prazer | 5 v Prazer dos Herejes nos preceitos e forma do jejum, prohibe jii que não se preste dispenssação alguma p. ª Comer carne ou a particulares ou a Communidades sem Cauza urgente a que deue ajuntar-ce o parecer de médico e do Confessor Cujas Consiencias onérã se faltarem ao serio Exame da urgente Cauza q. p. ª o Cummum deue ser urgentisima. 5.º (sic) Ordena que os despenssados «ad Carnes» obceruem a forma do jejum in «Unica Comestione». 4.º (sic) Ordena que os mesmos «despenssados ad esum Carnium” substitúão a penitensia de suas Culpas p. ª Cujo fi m a Igr. ª instituhio o jejum, Com algumas rezas a fauor das almas e, se pusível for, algumas esmollas. No que agraua as Consiencias dos Bispos no Cazo de não o notefi carem asim a seus Rebanhos. Os (sic) mesmo S. mo P. e na segunda Constituição q. prinsipia «in suprema Universali Ecclesia» q. hé 11 Confi rma e declara q. os despenssados «ad esum Carnium» fícão obrigados à obseruancia «Unica Comestionii» ou a despensação, seja dada do Commum ou do particular, o q. o S. m fes p. ª Condanar o parecer de alguns indulgentes | 6 Indulgentes theólogos q. estímão obrigar a Unica Comida só ao Comum e não ao particular. Na 3.ª Constetuição q. hé huma resposta ao Arcebispo de Ualença e prencepia «Cognovimos» (sic) e hé a 55 Confi rma as antecedentes e manda aos Bispos e aos seus delegados q. de nenhuma sorte dispencem em os comeres prohibidos na Comida Unica. Na sua Constitução 90 q. pri(n)sipia «Si fraternitas tua» e hé resposta aos quesitos q. lhe ofereceo o Arcebispo de Compostella. 1.º Declara e Confi rma os dois preceitos de Única Comida de não poderem misturar os Comeres de peixe con os da Carne os dispenssados ad ipsas. 2.º Declara q. na Colação se ha-de uzar só da quantidade e qualidade, do «zibo (sic) e potu», ou do Comer e beber de q. uzão os os (sic) Christaos de recta, ajustada e timorata Consiensia. 3.º Declara q. os dispençados «ad esum Carnium» não podem

«ad Unicam Comessionem» antisipar a hora determinada q. hé ordinariam. te a do meio dia. 4.º Declara q. tambem nos domingos da quaresma fi cam prohibidos os Comeres de peixe aos despenssados «ad Carnes» de tal sorte q. se póção misturar huns com outros manjares nos sobreditos domingos da quaresma não obstante não serem Esses Domingos dias de jejum. 5.º Declara q. os preceitos impostos p. ª os Dias da quaresma obrigam p. ª todos os mais jejuns do anno. | 6v Ultimo: Detremina q. as dúvidas q. sobre essa Suas Constituiçoes e Bulas se originarem pella variedade de argumentos e juizos q. instigados pello inimigo commum a fauor da libardade se movem e se inventam p. ª perdição das almas, logo as dirima e as rezolua o Bispo a Cuja prezença deuem cer trazidas e notefi cadas sem demora. Todas estas Bulas e determinacoes do S.m P. e Benedito XIV confi rmou seu susessor o S. m P. e (Clemente) (2) XIII na Bula q. dirigio a todos os Bispos q. prinsipia «appetente sacro quadragesimali tempore» p. ª q. estes as fi secem notefi car a seus Rebanhos, o q. fazemos ao nosso; ordenamos q. esta dipois de ler-ce na nossa Capital e em todas as mais Igr. as desta Cidade e mosteiros de nossa jurisdissão o nosso Rd. º Menistro a fassa remeter (aos) Arciprestados q. nos pertencem, p. ª q. todos os Párechos da nossa Diacési a fássão saber e praticar aos seus Freguezes e expondo-lhe este nosso eEdital (sic), Dado no Porto sob sello de nossa(s) armas e signal do nosso Rd. º D. r Provizor aos 28 de janr. º de 1772 e Eu o P. e Fr. co da Costa Escriuão da Camara q. o subscrevi, M. el Frr. ª Campos Pimitel (sic).

Publiquei a Pastoral supra em 24 de Feur. º de 1772 à estação da Missa conventual que disse a meus freguezes. Passa na uerd. e, dia era ut supra. O Coadjutor João Leyte de Bastos»

(2) No livro de visitações de Caldas de S. Jorge f. 40 vem expresso “Clemente”.

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4

| 7 Dom Frej João Rafael de Mendonssa, Monge de S. Jerónimo, por mercê de Deos e da Santa Sé Apostolica Bispo do Porto, do Concelho de Sua Magestade todo Fedelisimo q. D. s goarde.A todos os nosso(s) súbditos Ecleziásticos como Ceculares fazemos saber q. o Santisimo Padre Reinante entre outras grassas q. nos Concedeo foi tambem de nomiáremos hum altar preueligiado em em (sic) Cada jgr. ª Parrochial ou Colegiada de nosso Bispado p. ª sufragio das Almas do Progatório con induligensia Plenaria q. durará por tempo de Cete annos reuogados quais quer priuilegios q. ouverem a respeito do mesmo Altar, diguo, a cer a mesma Jgr. ª Parroquial nomiamos o Altar Mor de cada huma das ditas Jgr. a(s) Parroquiais e da mesma sorte nos Concedeo o dito Santisimo Padre podêremos aplicar por nós ou por Cual quer Presbíturo bem morigado (3) Secular ou Regular de Cual quer orde ou instituto eleito a nosso arbítrio huma induligensia Plenaria e remição de todos os pecados aos moribundos q. verdadeiram. te Contritos e ar(r)ependidos e Confessados receberem o Santisimo Sacramento ou, não podendo fazer tendo a dita Contrissão, inuocarem o Santisimo nome de Jezus, se não poderem com a boca, ao menos com o coração, aceitando a morte da mão do Sinhor com pasiensia e alegre ânimo como pena do pecado e lei irrouogável Cujo poder Cometemos aos R.dos Párrechos e seus Cuadejutores desta Cidade e Bispado para q. póssão fazer a dita aplicação da induligensia e bênção guardando a forma | 7 v A forma prescrita neste Cazo pello Papa Benedito XIV q. vem no Retual Romano, em Cuanto a Religiozas nomiamos os seos Confessores ordinarios p. ª lhe fazer a mesma aplicação da dita bênção e jndulg. ª e p. ª q. se fáção notórias estas graças aos R. dos Párrechos as farão publicar em as suas Igr. as com a clareza neseçaria a este respeito fazendo fazer Copiar esta no liuro dos Capítulos q. ce costuma, dado no Porto sob nosso sello e sinal de Nosso R. do

D. r Prouizor aos Cete dias do mes de julho e mil e Cete Centos e cetenta e dois a(nnos) e eu Joze Pedro Lisboa Escriuão da Camara Ecleziastica a sobescreui»

5

«Carta, Nunes Pastoral necessaria p. ª os contrahentes de diversas Paróchias

Doutor Joze Barboza de Albuquerque, Pensionario da Igr. ª de Cidadelhe, Dezembargador e Juiz dos Cazam. tos deste Bisp. do do Porto, pello Excelentissimo e R. mo S. r Dom Frey João Rafael de Mendonça, Monge de S. Jerónimo, por merçê de D. s e da Sancta Sé App. ca Bispo deste Bisp. do do Porto e do Concelho de Sua Mag. de Fidelissima etc. Tendo chegado à Respeitável prezença de Sua Ex. cia R. ma o temerario arrojo de alguns Homens, q. esquecidos da Relegião sem temor de D. s, das justissas e das pennas impostas por direito a semelhantes, se têm Recebido em face de Igreia com humas, deixando emganadas outras, fabricando pera | 8

Pera esse efeito com Reprehensivel desemvoltura ordens de Recebim. to falssas, precepitando-sse attentadamente contra a despozição do Concillio de Trento no horriuel insulto de celebrarem com notoria nulidade o Matrimonio fora da prezença de seus Párochos proprios, não se embaraçando com as detriminaçoens Canónicas, e o que mais hé, tratando com abomináuel desprezo a hum Sacramento da Nossa Santa Ley, porque sendo hum dos seus fi ns o rremedio da comcupicencia se atrevêrão com péssima conduta a fazer delle pretexto das suas inequidades, fi cando asim por estes factos na uerdade dignos de exemplar castigo, constituidos em má fé, e permanecendo no mizeráuel estado de infalíuel condemnação, a que os mesmos Respectiuos Párochos, que ignorantemente e extranhauelm. te executárão as sobreditas Ordens, tinhão obrigação de ocurrer, se bem Refl ecticem no que está a seu cargo e ley Cinodal deste Bisp. do; E querendo o mesmo Senhor tirar do meyo de seu Rebanho estes horrorozos absurdos e extinguir quanto em si hé tam execrandos delitos com as suas preneciosas consequencias, de Ordem sua Mando a todos os Reuerendos Párocos da Com. ca da Feyra que, sendo-lhes aprezentada alguma licenssa ou outros quais quer despachos de Receber por contrahentes que não séjão seus Parochianos, de nenhuma sorte a executem, ainda que nelles va imcorporada dispença de Sua Ex. cia Reverendissima, sem que primeiro as Remetam em carta fechada a este Juizo por pessoa de muita confi dencia e de (3) por “morigerado”. Vide n. º 31.

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conhecido desenteresse das partes pera nelle se averiguar a sua verdade e com Resposta pello mesmo fi el obrarem o que se lhe determinar –ce sendo algum ou ambos seus freguezes examinarão com muita miudeza, primeiramente | 8

v Primeiramente que os Recêbão, a ordem que para esse fi m leuarem e, tendo a mais pequena dúvida nella ou suspeita de falcidade, farám a mesma deligencia, q. nas outras se lhe Recomenda; pena de que, obrando o contrario, fi carem Responssáueis pellos delinquentes leuando-se-lhe em culpa propria e serem por ella asperamente castigados; Esta Ordem correrá com toda a brevidade as Paróchias da sobredita Com. ca pella mesma formalidade da Vezita Copiando-a todos os Reverendos Párochos nos seus liuros das vezitaçoens para a sua impreteríuel observancia asignando nesta de como a Recebêrão e Remetendo-a o último ao Escrivão que a passou pera se fazer serto a Sua Ex. cia R. ma da sua prompta execução. Dada no Porto debayxo da minha asignatura som. te aos 4 de janr. º de 1773. Joze Joaq. m Vidal Escrivão a escreveo, Joze Barboza de Albuquerque etc. ».

Igreja de Pigeiros.

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124 ATLÂNTIDA

Gilberto Pereira*

não mais voltaremos às praias da atlântida

a areia crua jaz sob as águas

e a oração das ondas da manhã

é apenas uma recordação

aqui o calor é voraz

e a sede mata como mil punhais na garganta

aqui o sol abre vales profundos

na nudez da pele

e brilha intensamente branco

como a luz do último suspiro sem manhã

não mais voltaremos às praias da Atlântida

resta-nos recordar o que foi o amanhã

* Gilberto José de Sousa Pereira, natural do Porto (1979), reside desde sempre em Argoncilhe. Frequenta vários encontros poéticos pelo país, sobretudo as tertúlias da Onda Poética, de Espinho, onde mantém uma participação activa desde 1998, lendo preferencialmente Al Berto, Herberto Helder, Mário Contumélias, Eugénio de Andrade e António Gedeão. A sua poesia, com tendência para o soturno e o intimista, sofreu, sobretudo de início, algumas influências dos dois primeiros autores mencionados.Editou o seu primeiro livro de poesia, intitulado Reticências, em Dezembro de 2008.

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125 Aspectos do Corsarismo Durante o Governo Filipino

Manuel Leão*

A guerra nos mares era tão desastrosa como em terra, tendo ainda a agravante da escassa sobrevivência dos vencidos, que, em terra, era menos precária. As batalhas marítimas, ainda no século XVII, eram travadas, geralmente à cata de vantagens ou lucros, tanto mais que havia estados que não só autorizavam a venda de presas, mas também se aproveitavam delas, cobrando impostos pesados sobre a venda. Os grandes fautores da guerra marítima que afectou a nossa história foram de duas origens e motivações diferentes: os piratas e os corsários. Os piratas não só roubavam a carga, mas ainda aprisionavam as vítimas que levavam para as suas cidades portuárias, onde os cativavam e sujeitavam a trabalhos pesados, num regime de cativeiro que era objecto de resgate com valores diferentes de acordo com a categoria dos cativos. O século XVII foi fértil em cativos no solo africano. Os relatos que temos sobre esses acontecimentos distinguem piratas berberescos e turcos, embora a diferença não seja fundamentada: uns e outros eram de religião maometana, tendo por foco irradiador a costa mediter rânica da África.

A partir de 1580, a nossa política externa alterou-se, porque ligados à coroa espanhola, tornamo-nos alvo dos ataques da Grã-Bretanha, fi gadal inimiga dos interesses de Espanha e da rapina holandesa, que queria livrar-se da autoridade espanhola em terras da Flandres. A Holanda, com a criação de companhias marítimas comerciais, de tipo privado, pretendia, acima de tudo, senhorear-se do abastecimento das especiarias tanto na origem abastecedora como nos centros europeus de distribuição. Assim, apareceu a onda de corsários de origem britânica e holandesa. A navegação teve de ser feita com prevenção para re sistir aos ataques, passando, mais tarde, a ser feita em regime de comboio, ou em conjunto alinhando barcos que, mais além, seriam chamados de guerra. Além das eventuais tempestades a que a maioria dos barcos não conseguia resistir sem sofrer graves prejuízos, os navegantes tiveram de se arriscar face aos piratas e aos corsários. A defesa da costa e das áreas fl uviais navegáveis estava organizada através de fachos e vigias, cuja lista já aparece nos documentos da Câmara do Porto, em 1594(1). A cidade tremeu em 1597, na previsão de ataque feito por grossa armada que estaria para entrar em actividade (2). Os corsários eram um pensamento de pesadelo quanto à autarquia portuense, por

* Natural de Milheirós de Poiares, concelho de Santa Maria da Feira, fez os seus estudos no Porto, tendo concluído o curso de Teologia e sido ordenado presbítero, na Sé do Porto, em 1943. Dedicou-se à educação e ensino, dirigindo o Colégio de Gaia, durante décadas. Esteve ligado à Fundação do Instituto Superior Politécnico de Gaia e Escola Profi ssional de Gaia, a cujas direcções pertence. Tem publicado numerosos estudos sobre história cultural do Porto e Vila Nova de Gaia, com incidência nos domínios da arte, da actividade livreira e do teatro portuense antigo. Tem promovido várias iniciativas de carácter social. Criou, em 1996, a Fundação Manuel Leão, com fi ns culturais e sociocaritativos.

(1) Arquivo Histórico Municipal do Porto (AHMP), Ver. 32, 210 v. (2) Volta ao assunto em 1616 (Ver. 41, 41 v).

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exemplo, em 1618 (3). Uma carta régia, recebida no Porto, em 1620 (4), estabelecia orientação tanto sobre corsários como acerca dos cativos em Argel. A defesa entre Aveiro e Viana encontrava-se esquematizada em 1622 (5). Este estudo é quase apenas baseado em documentos notariais. Umas vezes são relatos de testemunhas presenciais com o intuito de defender direitos, transcritos em nota; outras, são cartas tentando acautelar ou justifi car prejuízos sofridos pelos arma dores ou seus clientes. As heranças a receber, por familiares das vítimas, resultantes das viagens, os direitos de família justifi cando mortes ou au sências, entre outras, são as circunstâncias marcantes nos textos encontrados nos cartórios do Porto e Gaia, durante o domínio fi lipino. Em 1601(6), a propósito da concessão dum dote de casamento para Antónia Roiz, fi lha de Manuel Jorge, mareante do Bairro de Miragaia, casar com Manuel de Figueiredo, afi rma-se que foi a mulher quem tomou a iniciativa legal, porque Manuel Jorge estava na Baía onde hora chegara roubado de Ollandezes. Perseguida, tendo por refúgio de emergência o porto de Pontevedra, foi a nau A Gaivota. O fl amengo Gil, Manuel Roiz Vila Real, Gonçalo Lopes, Diogo Henriques e Gonçalo Cardoso da Fonseca fazem procuração para a Galiza, em 1601 (7), porque a nau vinha carregada de Fazenda para estes mercadores, tendo feito escala, em Calais, na França. Ainda no mesmo ano (8), na mesma nau A Gaivota, Jorge Segrey, de Calais, tinha carregado tapeçaria para o portuense Diogo Henriques, mas foi ancorar a Muros, perseguida de emigos acossairos. A procuração traz lista da mercadoria e seus donos. Eram panos, papel, vidros, etc. Tinha sido o mal menor acon tecer este desvio, fugindo aos emigos que ha acossarão. Ainda em 1601 (9), aparece uma procuração de Maria Roiz, a Branca, viúva de Francisco Dias, piloto da carreira do Brasil de Miragaia. Francisco Dias era negreiro, dedicando-

se a vender escravos vindos de Angola, para o Brasil, como se lê: sendo uiuo o dito Francisco Dias seu marido e uindo em hu nauio em que era senhorio em hu coarto delle dAnguola pera O Brisil carreguado de escravos, à vista de Pernambuco tinha sido assaltado pelos Ingleses. Como o marido desapareceu, quer que lhe sejam prestadas contas, não temendo empenhar-se na mira da cobrança do espólio do marido, visto que contrai empréstimo para suportar os custos (10) Em 1606 (11), uma caravela de Matosinhos tinha sido tomada no país de Gales e levada para Londres. Da tripulação fazia parte um marinheiro de Vila Nova de Gaia. Foram tomadas diligências pelos familiares da presa. Em 1612 (12), uma nau de Massarelos, no seu regresso da Baía, foi roubada por corsários. Em 1614 (13), uma procuração colectiva deixa ver as difi culdades dum navio portuense na sua acidentada rota.Um grupo numeroso de mercadores portuenses

Francisco Martins XavierFrancisco de CáceresDiego LopesGonçalo Cardoso da FonsecaManuel CordeiroJoão Lopes Duarte Jerónimo PachecoManuel Luís dos SantosSimão RoizAntónio Fernandes VideiraAfonso CardosoBaltasar Fernandes MendesAntónio Lopes DireitoJoaquim Luís Preto Duarte Luís PretoJoão Roiz PretoJosé PretoJorge MendesJoão Alves

(3) Ibid. 42, 43.(4) Ibid. Ver.43, 134.(5) Ibid. Ver.44, 71/74 v.(6) ADP(Arquivo Distrital do porto), Po 1.º, 3ª s.,118, 96-96 v.(7) Ibid. Lº ll8, 120 v - 122 v.(8) Ibid. Lº ll8, 124/5.(9) Ibid. Po 5, 1ª s., 2, 68 - 69 v.

(10) Ibid. Lº 2, 69v/70.(11) Ibid. Po 2, 25, 72v.(12) Ibid. Lº 36, 70.(13) Ibid. Lº 39, 129 v - 130.

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António da CostaJoão Roiz Vila Real Pedro Fernandes

e outros passam procuração para Sevilha acerqua de hum nauio chamado e nomeado Santa Caterina de que he mestre Saluador Pires, vizinho do lugar de Massa rellos arrabalde desta cidade. A procuração é assinada por representantes dos donos das fazendas que o navio transportava:Manuel Roiz dos SantosSimão Roiz de LimaAfonso CordeiroAntónio da CostaDuarte Roiz PretoRodrigo FernandesLuís PretoJoão CardosoGaspar JorveDomingos Lopes Duarte.

O navio vinha da Baía, último porto onde tocara no Brasil. Na passagem das Ilhas, tinha sido roubado e tomado pelos corsários, mas tinha sido encontrado pela frota real portuguesa que vinha das Índias. Soube-se que o barco teria sido conduzido para um porto espanhol do Mediterrâneo. É para S. Lucar de Barrameda ou outro qualquer porto onde o barco se encontrar, que a procuração é feita. Mas a desgraça não acontecia só aos súbditos de Sua Majestade os Reis Católicos. Em 1615, Luy Vert Arbertsen, framego de nação, em 15 de Junho (14), estando em sua nau Caza Comprida, abaixo da Fortaleza de Viana, foi tomado pelos corsários. Admite que possa ser restituída per nossa armada e tirada do poder dos ditos ladroens. Queria ir para o seu país, por isso passou procuração a Henrique Voes, do Porto. Em 1616 (15), nova situação aconteceu com a nau Santa Catarina, de Massarelos, em cuja carga tinham apostado três mercadores por tuenses: Leonel Mendes Pinto, Francisco de Cáceres e Francisco Ribeiro. O Leonel tinha comprado e pago,

na Baía, 36 caixas de açúcar branco. Fazem procuração para tentar aproveitar alguma mercadoria, porque uindo em viagem para este Reyno a dita nao fora tomada por cossarios e deixarão liure fora da cidade de Seuilla. Tinha havido assalto de sevilhanos que se apoderaram de alguma fazenda. Pouco depois (16), os interessados resolvem entre si aquilo que sobrou desta viagem aventurosa. Em 1617 (17), Pedro Baron era um comerciante do Porto, com pres tígio e dinheiro. Foi o intermediário para o resgate da nau Nossa Senhora da Boa Viagem, de Manuel Vieira da Cunha, a qual foy tomada por cossairos e encontrava-se em porto francês. O crédito de Baron vai permitir o resgate da nau. Baron chegou a ter morada no lugar de Gaia. Perante a frequência de assaltos aos barcos e conse--quentes prejuízos e atrasos na comercialização das fazendas, houve um numeroso grupo de homens de negócio e mercadores que passou procuração para a França com poderes sufi cientes para a rápida solução de casos que envolvam presa de naus, navios, caravelas ou outra qualquer embarcação. Pelo número e pelo peso económico da maioria e ainda porque nos fornece uma lista que representa a força mercantil da cidade, vamos transcrever os nomes dos interessados:

Francisco Nunes XimenezGonçalo Cardoso da FonsecaDiogo Fernandes Pina António da Fonseca PinaDiogo GomesFernão GomesGaspar Marcos Mendes António da Fonseca PretoDiogo Cardoso NunesGaspar Cardoso da Pena Domingos Lopes Vitória António Mendes RibeiroÁlvaro Gomes BravoÁlvaro de AzevedoManuel Roiz Vila RealAntónio da CostaBaltasar Fernandes Mendes

(14) Ibid. Lº 41, 41.(15) Ibid. Lº 43, 36 v-38.

(16) Ibid. Lº 43, 44 v.(17) Ibid. Lº 46, 164. Ibid.

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Afonso CardosoDiogo Henriques PinaDiogo Lopes Pinto António Fernandes EstevesMarcos de Góis de MoraisFrancisco de CáceresPedro Lopes RebeloHenrique BuelJoão Luís HenriquesÁlvaro LopesPaulo LopesFrancisco RibeiroFrancisco de Brito Leão da Cunha Jerónimo Roiz, mestre-salaSimão Fernandes TovarÁlvaro GomesManuel Roiz dos SantosJoão Cardoso NavarroVicente Nunes CoutinhoJoão Roiz Pinheiro.

O procurador era António Mendes, do Porto, certamente ligado aos judeus de origem portuguesa, porque morava em Bordéus.(18)

Em 1624 (19), 0 navio S. Pantaleão, de que era mestre Ma-nuel Magriço de Andrade, “foi tomado sete léguas de Viana” e levado para França. Com o mestre, Francisco Ribeiro faz procuração a Gaspar Caminha Rego, de Viana, para recuperar o navio e receber o que for possível da respectiva carga. Dispõem-se a fornecer todos os documentos necessários para uma efi caz cobrança. Em 1630 (20), Francisco Gonçalves, vizinho da cidade de Lisboa, morador no Outeiro da Boavista, na rua dos Matos, era piloto das suas naus. A descrição da residência do piloto deixa uma ideia do que era Lisboa, nesta época. Havia ramadas com videiras, no espaço que é hoje o Terreiro do Paço. O amanuense do tabelião não era ilustrado para escrever melhor, mas o piloto estava na Porto, de passagem, porqueelle vyera a esta sydade de Imglaterra roubado uymdo de Sam

Tome e os ditos emgrezes lhe deram hu nauyo. Esta evolução do saque feito ao barco representa uma novidade, porque abrange tanto marinheiros como o piloto e outras pessoas surpreendidas no assalto. A procuração de Francisco Gonçalves destinava-se a mover demanda judicial. Ainda antes deste documento, em 1628 (21), o navio A Francesa foi o centro de luta em que se empenhou a navegação costeira. A descrição testemunhal marca o relato feito no documento. Esta nau veo a ella roubada de imgrezes ymdo a Setuual a carregar de sal para com elle yr a Terra Noua ao bacalhao e uymdo segymdo sua uyaje o tombaram os ditos emgrezes depoys de pelejarem com elles e feridos alguns dos companheyros e morte de hu emtraram nesta sidade depoys de lhe tomarem e roubarem as uellas e artilharia e cobres e tudo o mays que tynha o dito nauyo nam lhe deyxando mays que o casquo desbaratado com muytas pelouradas e uerqas e mastros quebrados e cortados dos pelouros e ancoras leuadas de maneyra que com muyto trabalho as barquos desta terra com piloto e gemte foram boscar ao mar com muyto trabalho e despeza e gastos que fi zeram per saluarem as uydas e o casquo do nauyo. Continuando a narrativa, todos se encontravam há bastante tempo no Porto, a curar as feridas, fazendo despesa, mas não tinham outra solução senão vender o navio que estava sem amarras nem ancoras. Em 1630 (22), mareantes e marinheiros de Lisboa estavam no Porto, depois de terem sido roubados por Ingleses, no re-gresso de S. Tomé, receberam um navio para poderem chegar ao fi m da sua viagem com alguma compensação. Em 1632 (23), a nau Rey Dauy tinha entrado na Corunha acossada de enemigos. O mestre era fl amengo e tinha feito carga em Hamburgo, trazendo todos os documentos em ordem, porque não podia ser acusada de contrabando. Vários mercadores portuenses, entre eles Diogo Timão, Pedro Van Jus teren, fl amengos e outros constituem mandatário para desembaraçar o navio. Em 1633 (24), Gonçalo Alvres Franco, morador em Viana da Foz do Lima, faz procuração a Gaspar Fernandes e ao piloto Gaspar Ramos, de Viana, para Pontevedra, para cobrar fretes

(18) Lº 50, 49 v - 51 v.(19) Ibid. Lº 65, 143 v - 144 v.(20) Ibid. Po 1º, 3ª s.,156, 74.

(21) Ibid. Lº 153, 177.(22) Ibid. Lº 156, 17 v - 18 v.(23) Ibid. Lº 156,151 v - 153.(24) Ibid. Po 4, 23, 69 v - 70 v.

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da marinhagem da nau O Bom Jesus, que estava descarregada na Galisa, que tomarão os ollandezes. Pretende que sejam dadas contas das caixas transportadas e da sua soldada e de tudo o que se salluou na dita nao por nome o Bom Jezus. Em 1634 (25), foi o mercador inglês Roberto Presley, morador na rua da Reboleira, quem mandatou João Frazy, de Londres, para reclamar metade do navio Santa Helena, que tinha por mestre Luís da Costa Rosa, vizinho do Porto, que tinha sido tomado por Holandeses e levado a Flossing e Zelanda com a respectiva carga.

(25) Ibid. Po 2, 89, 62.

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130 A FÉ

Edgar Carneiro*

Há quem, sincero, acredite,

ciente de ser absurdo,

que para além desta vida

há-se haver um novo mundo.

Outros há, mais radicais,

ditando com voz segura

que a verdade que buscamos

só está na razão pura.

Muitos nos trazem promessas

ou nos roubam ilusões;

mas após tanto sermão

é só a nós que nos cabe

soltar o nó da questão.

3/11/2007

* Nasceu em Chaves em 1913.Licenciado em Ciências Histórico-Filosóficas pela Universidade de Coimbra.Foi professor dos ensinos técnico-profissional e secundário. De 1967 a 1974, dirigiu a Escola D. Pedro V, a primeira a funcionar em Fiães, neste concelho.Reside há 36 anos em Espinho, foi distinguido pela Câmara local com a Medalha de Mérito.Tem 11 livros de poesia publicados, o último dos quais saiu a lume em 2003 e tem por título «Depois de Amanhã».

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131 Políticas Culturais e Modos de Vida Urbanos**

O contributo da Cultura Popular na Sociedade Contemporânea – algumas notas do caso de Santa Maria da Feira

Tiago Santos*

Cultura Popular no contexto contemporâneo A Cultura, num mundo globalizado, é o que distingue cada um dos povos e cada uma das sociedades. Cada vez mais os mares encurtam e aproximam os continentes fazendo com que exista uma maior uniformização cultural. Os jeans deixaram de ser uma característica americana, as frutas tropicais nascem em países com condições climatéricas rigorosas, o inglês é a língua ofi cial da internet e já é possível assistir nas televisões portuguesas aos canais dos países do leste. Contudo, continuamos a falar português, a não conseguir comer as especialidades que se cozinham nos países asiáticos ou a não ter expressão em desportos como o críquete. Todos estes elementos fazem parte da cultura específi ca de cada povo, de cada sociedade por muito que exista uma globalização e uniformização cultural. Como escreve Kayser as “diferenças fundamentais entre regiões, aldeias, gerações ou grupos

sociais são sobretudo diferenças culturais” (Grácia, 2001, pp. 23). Entre estas características endógenas estão as que fazem parte da Cultura Popular que foi “generada autónomamente por la población no ilustrada y que podemos observar plasmada en la literatura anónima, en los mitos y leyendas, en la arquitectura sin arquitectos, en los refranes, en las canciones y los bailes, en los ofícios tradicionales y en una larga serie de manifestaciones denominadas populares” (López, 1999, pp. 136) e que “emanam de uma comunidade cultural fundadas na tradição, expressas por um grupo ou por indivíduos” (UNESCO 25ª Reunião). Mesmo assim é possível «pertencer» à Cultura Popular sendo técnico especializado. É possível um músico com formação académica tocar ou compor música popular. Aliás, actualmente assiste-se a este fenómeno particular. Com a massifi cação dos produtos e a uniformização do consumo aumenta a procura pelo valor único e pelo que é singular. Ao mesmo nível aumentou a procura pelo turismo rural a que os analistas chamam um «regresso ao passado». “De facto, é no interior rural que se mantém com mais vigor, uma vez que os efeitos da globalização sobre as identidades locais, hábitos, tradições, modos de vida menos se fi zeram sentir (Cavaco, 1999), e onde a oralidade e as relações familiares e de vizinhança constituem alguns dos traços dominantes (Cristovão, 1998), que as formas tradicionais de cultura: a música, o teatro, o folclore, o artesanato, os jogos

* Licenciado em História e pós-graduado em Ensino da História pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto; Curso de Dinamização do Turismo Cultural no EDV pela Agência de Desenvolvimento Regional de Entre Douro e Vouga; mestrando em Cidades e Culturas Urbanas pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.** Orientador do Mestrado: Prof. Doutor Claudino Ferreira.

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populares continuam a desempenhar um papel fundamental e a ser uma referência, nos momentos mais marcantes da vida comunitária” (Neves, 2000, pp.12). José António Neves, na sua tese de mestrado, refere que foi entre 1940 e 1970 que se fi zeram mais recolhas e estudos sobre hábitos e tradições locais “no período em que as comunidades rurais não estavam, ainda, sensibilizadas para o valor do seu património local” (Neves, 2000, pp.23-24). Contudo não podemos esquecer que foi neste período que mais se cultivou o gosto pelo rural e se fomentou o culto dos valores nacionais e locais. Vários exemplos poderiam ser dados mas não compete a este ensaio fazê-lo. Outro exemplo da mistura entre o popular e o global está patente no fenómeno da World Music. As cantigas e instrumentos pertencentes à Cultura Popular integraram bandas que rapidamente se expandiram tornando estes produtos singulares em bens massifi cados. Até que ponto uma Cultura Popular globalizada que deixa de ser específi ca de um determinado contexto continua a ser Popular? Como escreve José Leira López, “la cultura popular no fue nunca exclusivamente tradicional, y quizá la cultura de massas no es únicamente una cultura inducida” (López, 1999, pp. 136). Por isso, “a Cultura Popular é o resultado dinâmico e alterável de um, da intersecção de vários processos de defi nição social de uma categoria, que é, ao mesmo tempo, analítica, ideológica, política, simbólica, social na acepção mais vasta da palavra” (Silva, 1994, pp. 110-111) e “não podemos esquecer que as culturas populares sempre foram fenómenos abertos, e se infl uenciaram, reciprocamente, nas suas relações, através da história” (Neves, 2000, pp.11). Desta forma a linha delimitadora entre as realidades local e global é bastante ténue e o contacto entre a cultura popular e a cultura de massas é inevitável e por vezes confundível. Segundo José Leira López as Culturas Populares são criativas e a Cultura de Massas é o resultado de uma cultura estrangeira introduzida através dos meios de comunicação nos espectadores passivos. “Las culturas popular y clásica nos conducirían a un processo identitario; mientras que la cultura de masas nos llevaría la multiculturalismo. En defi nitiva, las culturas popular y clásica nos conducirían a lo nuestro, a la histórico de lo local; mientras que la cultura de masas nos introduciría – de lleno – en los procesos de globalizacíon” (López, 1999, pp. 139-140). A Cultura Popular garante autenticidade, singularidade e

é “genuina y propia de una región” (Salas, 1999, pp. 116) permitindo criar uma identidade social. O indivíduo vê-se refl ectido nas manifestações culturais locais. Estes princípios circulam de geração em geração através da tradição oral e contêm uma série de traços e características reveladoras de uma sensibilidade que, juntamente com outras manifestações da cultura popular, podem desempenhar um papel determinante no desenvolvimento rural (Neves, 2000, pp. 22). De facto são estas características endógenas que têm de ser valorizadas para que as comunidades mais fechadas, e que no caso português se situam no interior, possam progredir economicamente. Todavia este argumento é extremamente melindroso e perigoso já que o Capitalismo económico actual é inimigo destes valores autênticos. Presentemente vive--se uma conjuntura de globalização da cultura. Os produtos culturais têm obrigatoriamente de ser bens comerciáveis e atravessar os mares e continentes pelos modernos meios tecnológicos e informativos para serem rentáveis. Hoje é possível ouvir e ver um concerto que decorre no Japão, ouvir um cd-livro, visitar o museu do Louvre através de uma viagem virtual a três dimensões ou mesmo assistir a uma conferência internacional que se realize em qualquer parte do mundo através de videoconferência. Em contrapartida, “las culturas tradicionales de las comunidades concretas están ancladas en un espacio y un tiempo determinados, y sus productos se reproducen en interacciones directas” (López, 1999, pp. 144) e “las nuevas tecnologías han cambiado la concepción del espacio y el tiempo “ (Mandianes, 2001, pp. 33) e por isso Cultura Popular não está “exenta de infl uencias” (Salas, 1999, pp. 116). Com a actual globalização cultural existe uma pressão intensa entre o centro e a periferia. Por centro entendem-se a(s) Cultura(s) Ocidental(is) e por periferia os restantes países. Este modelo imposto pelos países ocidentais aos restantes países permite a uniformização do próprio consumo. Actualmente, como refere Slater, a sociedade identifi ca-se com a sua própria cultura através do seu consumo. Mccracken considera que os bens de consumo têm um signifi cado cultural para além do seu carácter utilitário e económico. Se existe uma estandardização no consumo e se as sociedades identifi cam a sua própria cultura através dos consumos tendemos a terminar com a Cultura Popular. Como nos diz Grisa, “ O bem-estar proporcionado pelo consumo garante a instauração de uma cultura em que a ética da felicidade, dos prazeres

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e da fascinação fazem fenecer preceitos morais, proibições e deveres” (GRISA, 2008, p. 67) levando a não existirem razões doutrinais para manter a cultura tradicional e singular de cada sociedade. Mesmo assim, nas últimas décadas, as sociedades/culturas mais desfavorecidas conseguiram impor-se num mundo «consumisticamente» [sic] globalizado. Um exemplo concreto desta situação é referente à “etnocosmética” que surgindo “num nicho de mercado alcançou nos últimos anos uma expressão assinalável nos Estados Unidos. (…) Os grandes produtores e retalhistas atentos ao sucesso de pequenas marcas e lojas de bairro pioneiras no “comércio étnico”, disponibilizam actualmente cosméticos a pensar nas necessidades específi cas das peles negras ou mestiças e nas preferências cromáticas das consumidoras africanas, hispânicas e asiáticas” (Fortuna, 20002, pp.115-116). Neste paradigma económico e bem explícito no modelo de circulação de bens defendido por Grant McCracken a Cultura insere-se perfeitamente já que “es un sistema relativamente integrado, en el que practicamente todo está pautado y estructurado. Es una manera de interpretación de la estructura social (…), es una forma de conducta aprendida (…), es simbólica (…), es compartida de una forma diferencial por la diversidad de grupos y categorías presentes en la realidad social (…) e actúa como un mecanismo de adaptación que responde a los retos planteados por la sociedad y el entorno físico” (López, 1999, pp. 137). Por isso são interessantes as especifi cidades culturais das sociedades mais periféricas que se tornam globalizadas. Um exemplo actual desse fenómeno é a “paixão” exacerbada pela cultura indiana que atingiu o mundo ocidental. As lojas de roupa inspiram as suas colecções nesta cultura, as telenovelas recriam amores e desamores entre ocidentais e indianas e as nossas casas são decoradas com as bijutarias dessa região. Obviamente apenas é possível esta massifi cação com a promoção dos meios de comunicação e informação e com o interesse comercial das grandes marcas internacionais.

A Cultura Popular está quase sempre associada à formação de identidade de uma sociedade ou de uma região mas esta “é, com frequência, uma realidade mal defi nida, que engloba tradições e costumes, restos da cultura material pré-moderna, dizeres e saberes locais” (Portugal, 2001, pp. 45). A identidade é aquilo que nos identifi ca e coloca enquanto seres de uma determinada cultura endógena. Segundo “Berger y

Luckmann es un fenómeno que surge de la dialéctica entre el individuo y la sociedad. Los tipos de identidad no es inteligible sino dentro de un contexto social (López, 1999, pp. 136). É impossível dissociar indivíduo e sociedade quando analisamos a identidade. Obviamente este argumento é um pouco estereotipado já que partimos do pressuposto que todos são “assim” ou têm os mesmos gostos. Estereotipamos que todos os portugueses veneram o Fado, todos os Minhotos dançam o «Vira Minhoto» ou que as mulheres portuguesas são anafadas e têm buço e os homens têm um bigode farfalhudo, gostam de vinho e são abdominosos (1). A identidade é muito mais que um conjunto de estereótipos que condicionam a existência social do individuo. “As identidades são o resultado de um processo histórico lento, sempre em mutação, gerador de mecanismos de apropriação/rejeição pela comunidade no seu todo ou por grupos que a compõem” (Portugal, 2001, pp. 49) capaz de possibilitar a criação de elementos que nos ligam à região e «à nossa terra», para usar uma expressão tão popular. Esses valores com os quais nos identifi camos na nossa cultura fazem parte (também) da nossa Cultura Popular. Aliás, é muitas vezes através da Cultura Popular que se preservam os valores identitários de uma sociedade preservando tradições e rituais que passam de geração em geração. “A identidade baseia-se numa cultura viva das pessoas que habitam um território” (Portugal, 2001, pp. 45) e “todo elllo nos llevará a la valoración de lo autóctono, de lo local, en la realidad heterogenea del mundo de hoy. (López, 1999, pp. 136). A identidade é um processo em constante transformação pelos inputs trazidos pelos indivíduos. Da mesma forma a Cultura Popular está em renovação devido a estes mesmos inputs constantemente trazidos pelos novos veneradores desta cultura. Cultura Popular e Identidade andam lado a lado na evolução local e regional confundindo-se muitas vezes os conceitos ainda para mais no mundo actual globalizado em que os valores de referência locais vão-se desvanecendo. Por isso mesmo “a procura obsessiva da identidade por responsáveis políticos, operadores turísticos, defi nindo-o como aquilo que supostamente nos distingue dos outros e constituindo-a como instrumento de afi rmação de uma determinada comunidade ou território” (Portugal, 2001, pp. 45). De forma a valorizar os territórios, o seu património material e principalmente o

(1) Estereótipos apresentados pelo fi lme britânico “O Amor Acontece”.

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imaterial, o conceito Identidade é «usado e abusado» nas campanhas publicitárias, nos discursos políticos e nos slogans dos documentos estratégicos. “Las tradiciones son seres vivos, dinámicos, como la cultura; nacen, crecen y fenecen. A veces se transforman y se perpetuan a sí mismas” (Mandianes, 2001, pp.43). Não podemos cair em tentação de preservar todas as tradições de cultura popular e não permitir que elas, de alguma forma, se mudem. Só permitindo essa mutação podemos alcançar o progresso já que a civilização apenas evolui com contactos culturais e sociais. Só assim podemos encontrar “compañías de teatro que adaptan a Shakespeare a los valores y símbolos actuales, pudiéndonos encontrar com un Romeo ecologista y barbudo, junto a una Julieta licenciada en Filología y en paro (...) o talvez nos encontremos com un Hamlet que quizá sea un profesor de Sociología que investiga sobre el signifi cado de la cultura” (López, 1999, pp. 146).

Processo histórico da Cultura Popular e Tradicional

Em 1972 a UNESCO teve como tema na sua Convenção a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural. Neste convénio a UNESCO e os seus Estados-Membros identifi caram que deverão reconhecer a obrigatoriedade de assegurar a identifi cação, protecção, conservação, valorização e transmissão às gerações vindouras do património cultural e natural situado no seu território. No departamento para a Educação, Ciência e Cultura foi criado um comité intergovernamental para a protecção do património cultural e natural universal denominado Comité do Património Mundial. Para além disso foi constituído um fundo para a protecção do património cultural e natural de valor universal excepcional denominado Fundo do Património Mundial. Em 1989, a UNESCO na sua conferência geral, colocou em plano de destaque a Cultura Tradicional e Popular. Da reunião saíram uma série de recomendações para serem aplicadas pelos países membros. Os Estados-membros deveriam incrementar pesquisas adequadas com a fi nalidade de elaborar um inventário nacional de instituições interessadas na cultura tradicional e popular; criar sistemas de identifi cação e registo; estimular a criação de uma tipologia normatizada da cultura tradicional e popular (comunidade cultural fundada na tradição, expressas por um grupo ou por indivíduos. De forma a proceder a uma conservação efi caz da

cultura tradicional e popular, a Convenção recomendava o estabelecimento de um arquivo nacional central para gestão normativa; a criação de museus e secções de cultura tradicional e popular nos que já existem; o privilégio das formas de apresentar as culturas tradicionais e populares que realçam os testemunhos vivos ou passados destas culturas; formação adequada aos técnicos da área; fornecimento de meios para preparar cópias de segurança e de trabalho de todos os materiais de cultura tradicional e popular. De forma a preservar e divulgar a cultura popular, a UNESCO recomendava ainda a introdução nos programas de ensino do estudo da cultura popular e tradicional; o direito de acesso das diversas comunidades culturais à sua própria cultura tradicional e popular; o estabelecimento de um conselho nacional de cultura tradicional e popular; a prestação de apoio moral e fi nanceiro aos que estudam e fomentam o estudos desta cultura; o fomento da investigação científi ca sobre a salvaguarda da cultura popular e tradicional. Ainda ao nível da difusão desta Cultura foi recomendado que os Estados-Membros fomentassem a organização de eventos nacionais, regionais e internacionais; estimulassem uma maior difusão desta cultura nos meios de comunicação nacionais e no mundo editorial; estimulassem as regiões, municípios, associações e demais grupos que estão neste sector a criar emprego para técnicos especializados; apoiassem e/ou criassem serviços para a produção de materiais educativos sobre esta cultura; facilitassem a realização de reuniões e intercâmbios dos interessados na cultura tradicional e popular; estimulassem a comunidade científi ca internacional a adoptar um código de ética em relação às culturas tradicionais. Outro dos pontos abordados pelo convénio é o da protecção desta cultura que é fundamental para o desenvolvimento e difusão a larga escala deste património imaterial. Para isso é elementar defi nir e estar atento aos aspectos da protecção intelectual. Para o total sucesso da preservação da cultura tradicional e popular a UNESCO sugeria aos Estados Membros uma cooperação inter-estados (UNESCO 25º Reunião). Em 1999 a UNESCO criou uma distinção internacional denominada “Proclamação das Obras Primas do Património Oral e Imaterial da Humanidade” (2) de forma a destacar os “exemplos mais notáveis de espaços culturais ou formas

(2) Ver em http://portal.unesco.org/culture/en/ev.php-URL ID=34325&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html

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de expressão popular e tradicional tais como as línguas, a literatura oral, a música, a dança, os jogos, a mitologia, rituais, costumes, artesanato, arquitectura e outras artes, bem como formas tradicionais de comunicação e informação. Foram realizadas três edições de Proclamações em 2001, 2003 e 2005” (www.unesco.pt). Em 2003 a UNESCO realizou a Convenção para a Protecção do Património Cultural Imaterial que é em termos práticos um instrumento de protecção do património cultural colocando em prática o manifesto “Convenção para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural de 1972. Como objectivos a Convenção de 2003 tem a “salvaguarda do património imaterial; o respeito pelo património imaterial das comunidades, dos grupos e dos indivíduos em causa; a sensibilização, a nível local, nacional e internacional, para a importância do património cultural imaterial e do seu conhecimento mútuo; a cooperação e o auxílio internacionais,

no quadro de um mundo cada vez mais globalizado, que ameaça uniformizar as culturas do mundo aumentando simultaneamente as desigualdades sociais” (www.unesco.pt). Ainda neste corrente ano o Instituto dos Museus e da Conservação do Patromónio criou o Departamento de Património Imaterial que tem como função “cooperar com centros de investigação, estabelecimentos de ensino superior, autarquias e particulares com vista ao registo e divulgação dos bens materiais, bem como estimular estudos e o desenvolvimento de metodologias de investigação para a salvaguarda efi caz do património cultural imaterial” (www.ipmuseus.pt), dando resposta à convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial da UNESCO de 2003 e que entrou em vigor em Portugal, em Agosto de 2008.

Associações, por freguesia, registadas na Federação de Colectividades de Santa Maria da Feira

São Miguel do Souto- Grupo Folclórico “Os Romeiros de Souto”

- AJISCE-Associação Jovem de Intervenção Sócio-Cultural e Ecológica

Espargo - Grupo Cultural e Recreativo “As Andorinhas de Espargo”

Rio Meão

- Rancho Folclórico Recreativo e Cultural “As Florinhas de Rio Meão” - Rancho Folclórico e Etnográfi co das Terras de Santa Maria

- Grupo Cultural e Recreativo “Os Traquinas de Rio Meão”

Paços Brandão - CIRAC-Círculo de Recreio, Arte e Cultura de Paços de Brandão

Nogueira da Regedoura - Rancho Folclórico São Cristóvão de Nogueira da Regedoura

Mozelos - G.D.C.M.-Grupo de Dinamização Cultural de Mozelos

São João de Ver

- Grupo Folclórico “As Lavradeiras de São João de Vêr”

- A.C.D.L.-Associação Cultural e Desportiva da Lavandeira

- Grupo Amizade-Tempos Livres e Educação para a Paz

Santa Maria da Feira

- Centro de Cultura e Recreio do Orfeão da Feira

- Associação de Estudantes do ISVOUGA

- Associação Cultural e Recreativa da Remolha

- Comissão de Vigilância do Castelo de Santa Maria da Feira

- Associação Danças e Cantares Regionais da Feira

- Associação Moto Clube de Santa Maria da Feira “Os Vagabundos do Castelo”

- Federação das Colectividades de Cultura e Recreio do Concelho de Santa Maria da Feira

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Mosteiro - Fórum Ambiente e Cidadania

Arrifana

- Rancho Recreativo Estrelas Brancas de Arrifana- JUAT-Núcleo Desportivo, Recreativo e Cultural de Arrifana

Escapães -Associação Cultural, Recreativa e Desportiva de Escapães

Lourosa

- Grupo Cénico de Lourosa

- GRIC-L-Grupo Recreativo de Intervenção Cultural da Lourocoop

- Grupo Cultural e Recreativo de Lourosa “Os Corticeiros”

- Grupo de Cavaquinhos e Cantares de Lourosa

- Centro de Cultura e Recreio “Os Malmequeres de Lourosa”

- Associação Aliança Família Cadete

Argoncilhe

- Casa da Gaia

- Grupo Musical Estrela de Argoncilhe

- Grupo Recreativo e Benefi cente “A Flôr de Aldriz”

-Rancho Regional de Argoncilhe

Sanguedo– Juventude de Sanguedo

- Rancho Folclórico Santa Eulália de Sanguedo

Caldas de São Jorge- Rancho Folclórico “As Florinhas de Caldas de São Jorge”

- Associação Grupo de Danças e Cantares das Margens do Rio Uima

Pigeiros - Centro de Cultura e Recreio de Pigeiros

Guisande - Associação Cultural de Guisande “O Despertar”

Lobão

- Rancho Regional da Vila de Lobão

- Rancho Folclórico São Tiago de Lobão

Vale

- Grupo Folclórico de Pessegueiro

- Rancho Folclórico “As Lavradeiras de Rebordelo”

O levantamento efectuado das associações foi feito apenas no site da Federação de Colectividades de Santa Maria da Feira, entidade que tem como objecto social: “ representar as colectividades de cultura e recreio do concelho de Santa Maria da Feira defendendo as suas aspirações, lutando pela resolução dos seus problemas e carências; promover o associativismo como instrumento de participação cívica, de formação e desenvolvimento local; propor o aproveitamento de espaços livres e de locais para a prática cultural e recreativa; promover as iniciativas de âmbito cultural e recreativo; promover acções de formação dirigidas ao meio associativo, promover iniciativas de intercâmbio entre as associações” (Federação Colectividades Santa Maria da Feira, 2008, pp. 6). Para além disso, desenvolve actividades que congregam as diversas associações e em muitas delas criam-se sinergias na organização e gestão dos eventos. Neste levantamento apenas constam 43 associações sendo o tecido associativo bem mais extenso. A presença na dinâmica local é bastante

forte “na medida em que cerca de 200 associações do concelho desenvolvem inúmeras actividades de âmbito cultural, algumas de forma mais cuidada, outras de forma mais amadora, espicaçando ou activando as consciências locais. A Câmara da Feira tem um Programa de Apoio ao Associativismo Concelhio (PAAC), que fornece assistência fi nanceira ou logística às associações, quer para o seu funcionamento corrente, quer para a organização de eventos culturais, mas que prevê algumas contrapartidas, nomeadamente no que concerne à formação de públicos” (Melo, 2004, pp.92). No plano prático, as associações para obterem fi nanciamento autárquico precisam de apresentar actividades culturais ao longo do ano e é em conformidade com essas actividades que o subsídio é efectivado. Para além disso outros requisitos são necessários. Se por exemplo alguma das associações pretende participar no evento Viagem Medieval em Terra de Santa Maria através da comercialização de bens perecíveis numa taberna, é necessário apresentar um projecto de exploração para além de que terá de garantir alguma animação para o evento, seja

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por grupos de animação de rua seja pela criação/gestão de alguma área temática. O que é facto é que a candidatura por uma das vagas atinge todos os anos números recordes o que faz com que aumente gradualmente a qualidade das propostas. Nas palavras do presidente da Federação de Colectividades e pertencente à Comissão de Organização do evento, “50% da animação da Viagem Medieval é assegurada por gente do concelho”(3). Numa análise mais profunda, que não é competência deste ensaio, poderíamos verifi car de que forma estas associações se preparam durante o ano para estas iniciativas. Pelas associações acima registadas, e analisando o nome de cada uma delas, podemos adiantar que 18 têm como objecto de intervenção o folclore e a etnografi a. Esta é a área de intervenção mais signifi cativa de todas as associações que fazem parte da Federação de Colectividades. Em toda a região existem muitas associações desta tipologia e como refere Victor Sismeiro “há mais de três dezenas”(Sismeiro, 2009, pp.4) de ranchos folclóricos. De seguida fazem parte da federação de colectividades 14 associações de carácter recreativo e cultural. Ainda fazem parte desta entidade 11 associações com outro género de intervenção.

Bibliografi a

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(3) Informação retirada em http://www.diarioaveiro.pt/main.php?mode=public&template=frontoffi ce&srvacr=pages_13&id_page=4455

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138 ANOS E OCEANOS

Manuela Correia*

De longos rios nascem oceanos

de margens sombrias e solares

De longos meses crescem muitos anos

de dias triviais e alguns ímpares

Do que vai sobrando dos anos e oceanos

há o corpo de terra em que moramos

E será que remamos ou rumamos

a braços ou de bruços com os anos

em gestos ou em gritos com a terra

de costas ou perfil para os oceanos

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139 DIREITOS DAS CRIANÇAS I

Jorge Augusto Pais de Amaral*

O século XX tem sido considerado o século da criança. Foi, na verdade, o século em que se valorizou a sua defesa e protecção e se estabeleceram as devidas regras destinadas a alcançar esse objectivo. Durante muito tempo, o paterfamilias teve sobre os fi lhos (e outros componentes do agregado familiar) o poder de vida e de morte. Na antiga Esparta, desde o nascimento até à morte, o espartano pertencia ao Estado. Os recém-nascidos eram examinados por um conselho de anciãos que ordenavam que fossem eliminados todos os que evidenciassem ser portadores de defi ciência física ou mental ou não fossem sufi cientemente robustos. Constituía uma forma de eugenia. Era curioso como preparavam a criança para a guerra. A partir dos 7 anos de idade, os pais eram afastados da educação dos fi lhos, que fi cava inteiramente entregue à orientação do Estado. A alimentação das crianças era controlada. Se algum sentia muita fome era-lhe permitido e até era estimulado a furtar para conseguir alimentos, pois acreditava-se que essa prática lhe daria uma certa desenvoltura que o auxiliaria na guerra. Seria, porém, castigado se fosse surpreendido a furtar,

não pelo furto, mas porque se deixou apanhar. De uma forma genérica, podemos dizer que até por volta do século XVI, no domínio familiar, a criança encontrava-se na dependência do poder paternal quase sem limites. Com o decurso do tempo, esta situação foi melhorando, embora muitas pessoas ainda possam recordar ter ouvido frases como esta: “o trabalho do menino é pouco, mas quem o perde é louco”. Esta frase evidenciava bem que a criança era considerada como um auxiliar dos progenitores nas tarefas agrícolas e outras. Depois da primeira Guerra Mundial deu-se um passo importante no sentido de proteger a criança da exploração de que era vítima por parte da família. A Organização Internacional do Trabalho aprovou, em 1919, uma Convenção que defi niu o limite de idade para o início da actividade económica dos jovens. Também as ciências como a medicina, a pedagogia, a psicologia e as ciências jurídicas vieram trazer um grande contributo para que a criança passasse a ser olhada de modo diferente. Estabeleceu-se uma nítida separação entre adultos e crianças por forma a que estas fossem encaradas como uma categoria social particularmente vulnerável e necessitada de uma protecção especial. Após os horrores da Segunda Guerra Mundial, generalizou--se a convicção de que as atrocidades cometidas não podiam repetir-se. Tiveram muita força as imagens das crianças que sofreram as consequências do Holocausto, das que foram

*Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça.

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vendidas em África para a escravatura, das que empunhavam uma arma que lhes foi entregue por quem as ensinou e estimulou a usá-la, das que foram vítimas de abusos sexuais, das que sofreram os efeitos da contaminação pela SIDA. Todos estes horrores levaram muitas pessoas a formular a interrogação que o Poeta Augusto Gil sintetiza nos seguintes versos: “Que quem já é pecador sofra tormentos, enfi m! Mas as crianças, Senhor, porque lhes dais tanta dor?! Porque padecem assim”?! Em 1946 foi criado o Fundo das Nações para a Infância – UNICEF – organismo que veio a desempenhar um importante papel na defesa dos direitos da criança, tendo essencialmente por objectivo providenciar pela sua nutrição, saúde, educação e bem estar. Em 1959, cerca de dez anos após a Declaração dos Direitos do Homem, de 1948, (ou dos Direitos Humanos, como algumas pessoas preferem) a Organização das Nações Unidas produziu uma Nova Declaração tendo em vista especialmente a criança. A Declaração Universal dos Direitos da Criança foi adoptada por unanimidade pela Assembleia Geral das Nações Unidas, constituindo um conjunto de princípios a que faltava, porém, força vinculativa. Sentiu-se, portanto, a necessidade de criar uma Convenção que, uma vez aceite pelos diversos Estados, os pudesse comprometer com obrigações muito específi cas. Em 20 de Novembro de 1989 foi aprovada a Convenção Sobre os Direitos da Criança, que entrou em vigor em 1990. Até 1997 foi objecto de ratifi cação por parte de 191 Países que a ela aderiram. A Convenção considera a criança como destinatário de uma protecção especial e como titular de um conjunto de direitos civis e políticos. São evidentes os seus objectivos de salvaguardar a criança de situações de exploração e de violência, ao mesmo tempo que regula o direito à saúde, à segurança social, a um nível de vida socialmente aceitável e ainda o direito à liberdade de expressão, o direito à informação, o direito ao respeito, o direito de brincar, etc. Poder-se-á dizer que a protecção de que a criança carece se veio a transformar em direitos próprios. Deixou de ter sentido a frase atribuída a Montessori sobre a situação da criança: “assemelha-se à de um homem sem direitos cívicos e sem ambiente próprio, um ser à margem da sociedade, que todos podem tratar sem respeito, insultar, espancar e castigar no exercício de um direito conferido pela natureza, o direito do adulto”.

A Convenção dos Direitos da Criança constitui, sem dúvida, um marco de mudança. Já não são apenas os direitos básicos que estão previstos na Convenção, mas também outros direitos que constituem uma verdadeira inovação. A Convenção começa por defi nir a criança como sendo todo o ser humano com menos de 18 anos. Corresponde à menoridade prevista nas leis nacionais. Em Portugal a maioridade civil atinge-se a partir dos 18 anos. Embora todas as pessoas tenham capacidade de (gozo) de direitos, não os poderão exercer por si próprios, mas sim através do seu representante legal, enquanto menores. Ao perfazer 18 anos de idade alcançam a plena capacidade de exercício de direitos e a capacidade judiciária, isto é, a susceptibilidade de estar por si em juízo. O menor é, de pleno direito, emancipado pelo casamento. Porém, o menor que tiver casado sem ter obtido a autorização dos pais ou do tutor, ou o respectivo suprimento judicial, continua a ser considerado menor quanto à administração de bens que leve para o casal ou que posteriormente lhe advenham por título gratuito até à maioridade …– cfr. artºs 122º, 67º, 130º ,132º e 1649º do Código Civil e artº 9º do Código de Processo Civil. A idade núbil que era a partir dos 14 anos para a mulher e a partir dos 16 anos para o homem, passou a ser a partir dos 16 anos para ambos os sexos. Cada Estado, ao ratifi car a Convenção, assumiu o compromisso (previsto no artº 2º) de evitar qualquer descriminação por causa da raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra da criança, de seus pais ou representantes legais, ou da sua origem nacional, étnica ou social, fortuna, incapacidade, nascimento ou de qualquer outra situação. Passaremos a referir alguns direitos da criança.

A) Respeito pela opinião da criança Em conformidade com o artº 12º da Convenção, os Estados devem garantir á criança com capacidade de discernimento o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que são do seu interesse. Os “Dez Mandamentos” determinavam que os fi lhos deviam honrar pai e mãe, sem que fossem mencionados quaisquer deveres dos progenitores para com os fi lhos. O dever de auscultar a opinião dos fi lhos em assuntos do seu interesse estava ainda muito longe de ser concebido. Pode dizer-se que é produto de uma longa evolução.

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A criança deixou de ser vista como um ser em desenvolvimento, cuja protecção cabia exclusivamente aos adultos, para ser tida como verdadeiro titular do direito de emitir opinião sempre que estão em causa as bases da construção da sua própria vida. O nosso Código Civil consagra o direito de respeito pela opinião da criança em várias disposições de onde resulta que se abandonou uma concepção autoritária e se passou a um regime em que se procura dar uma imagem de família solidária. Assim, enquanto anteriormente se dispunha que “os fi lhos devem honrar e respeitar os pais”, hoje concebendo uma posição mais igualitária entre pais e fi lhos, dispõe o artº 1874º que “pais e fi lhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência”. Embora o nº 2 deste preceito determine que “os fi lhos devem obediência aos pais” logo acrescenta que estes devem ter em conta a opinião dos fi lhos nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida. Este dever de auscultar a opinião dos fi lhos depende, como se compreende, do grau de desenvolvimento destes, apenas se tornando obrigatória nos casos em que estejam em condições de emitir um juízo fundamentado acerca dos assuntos em causa. O direito de que ora nos ocupamos encontra-se consagrado em outros preceitos do mesmo Código Civil. Segundo dispõe o artº 1901º, o exercício das respon--sabilidades parentais (exercício do poder paternal, como até há pouco se dizia), na constância do matrimónio, pertence a ambos os pais e deve ser exercido de comum acordo. Quando o acordo faltar, nas questões de particular importância, qualquer deles pode recorrer ao tribunal, que tentará a conciliação. Mostrando-se a mesma impossível, a decisão caberá ao juiz, que terá de ouvir previamente o fi lho, salvo quando circunstâncias ponderosas o desaconselhem. Anteriormente, esta obrigação de ouvir o menor só existia quando este já havia atingido a idade de 14 anos. Actualmente não é fi xada a idade mínima, o que deve ser entendido no sentido de que tal imposição depende do seu grau de maturidade. Casos houve em que o legislador manteve a idade de 14 anos como limiar. É o que se verifi ca nos casos em que os pais não tenham designado tutor e este tenha de ser nomeado pelo tribunal. O juiz ouvirá o menor que tenha completado 14

anos de idade – cfr. artº 1931º. Noutros casos a idade a partir da qual se impõe que seja ouvido o menor foi encurtada para 12 anos. Verifi cou-se tal encurtamento nos casos em que a lei foi objecto de alteração, o que nos leva a concluir que o legislador considerou que a maturidade da criança é agora atingida mais precocemente.Nos casos de adopção plena, o juiz deve ouvir os fi lhos do adoptante maiores de 12 anos. Também o adoptando maior de 12 anos deve expressar o seu consentimento – cfr. artºs 1984º e 1981º. Ainda antes da idade de 18 anos, o Código Civil consente ao menor a possibilidade de ensaiar alguma responsabilidade própria da maioridade que se aproxima. Ao completar a idade de 16 anos, o menor pode administrar os bens que adquiriu pelo seu trabalho – artº 1888º, nº 1, alínea d). Apetece-nos dizer como na canção, que estes jovens estão “a aprender a ser homens”. Por um lado, o preceito estimula a actividade desenvolvida pelos jovens, não entregando o produto da mesma à administração do respectivo representante legal e, por outro lado, concede-lhes a oportunidade de experimentar os primeiros passos em negócios próprios. Aprenderão com os seus erros, se for caso disso. Os bens serão certamente de pouca monta, como facilmente se compreende – cfr. artº 127º. Igualmente, ao atingir a idade de 16 anos, o menor alcança uma situação que se poderá designar por maioridade religiosa. Os pais só podem decidir sobre a educação religiosa dos fi lhos menores de 16 anos – artº 1886º. Até esta idade a sua educação religiosa cabe a ambos os progenitores, que deverão decidir de comum acordo. Na falta deste, deverá o tribunal tentar a conciliação entre os pais e, se o não conseguir, será o tribunal a decidir depois de ouvir o menor. Quando o fi lho atinge os 16 anos, fi nda o poder de decisão dos pais no domínio da educação religiosa. Cabe ao próprio fi lho optar pelo caminho que melhor se lhe afi gure. Os pais deverão limitar-se a aconselhá-lo, nomeadamente se tal lhes for solicitado pelo fi lho. A idade de 16 anos também confere ao menor a capacidade para perfi lhar um fi lho nascido de uma relação extraconjugal – artº 1850º. A perfi lhação é um acto de carácter pessoal. Por um lado, só ele sabe se teve relações sexuais com a mãe do perfi lhado e, por outro, só a ele cabe tomar a decisão de o considerar como membro da sua família. Como se verifi ca, a idade que se exige para contrair casamento é a

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mesma que se exige para que possa perfi lhar, considerando a semelhança que necessariamente se verifi ca nos dois casos. Ainda antes de atingirem a maioridade, cabe aos progenitores, de qualquer idade, prestar o consentimento para que um fi lho seu possa ser adoptado – artº 1981º, nº 1, alínea c). Sendo o consentimento um acto puramente pessoal, deve ser o menor,

independentemente da idade - e não o seu representante legal - a conceder tal consentimento para a adopção de um fi lho por si gerado. Continuará em outro número da Revista.Lisboa, 4 de Setembro de 2009

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143As mulheres do Gungunhana

Maria da Conceição Vilhena*

1. No último quartel do séc. XIX, nas terras do sul de Moçambique, entre os rios Incomati e Zambeze, Gungunhana impunha-se como o maior potentado africano. Era o senhor do reino de Gaza, tinha mais de uma centena de vassalos e possuía uma enorme riqueza, constituída por ouro, marfi m e rebanhos de gado. O seu prestígio político e social vinha-lhe ainda do facto de possuir entre 200 a 300 esposas: 40 viviam junto da corte e as restantes habitavam nas aldeias circunvizinhas. A aquisição de novas esposas fazia-se a um ritmo quase bimensal; e cada casamento era sempre causa de maior engrandecimento, por permitir novas alianças e atrair grande número de presentes. Era uma grande honra ter o régulo de Gaza como genro e protector. Seria demasiado longo falarmos da vida que levavam estas mulheres, em geral; por isso nos limitaremos às sete que acompanharam o marido no exílio.

2. No dia 28 de Dezembro de 1895, após algumas tentativas de negociações e a derrota de Coolela, seguida do incêndio do Manjacaze, a capital de Gaza, Gungunhana foi

feito prisioneiro em Chaimite, por Mousinho de Albuquerque. O ofi cial português deu então ordem ao régulo para que escolhesse sete de entre as suas mulheres, que o acompa-nhariam no seu incerto destino. Foram elas: Namatuco, Patihina, Muzamussi, Machacha, Xesipe e Dabondi. Feitas as suas poucas bagagens, lá seguiram os prisioneiros a pé, durante algumas horas, até chegarem a Zimacaze, na foz do Chengane. Aí embarcam na canhoneira Capelo, que os estava esperando e os transporta até Chai-Chai. A propósito deste embarque, queremos lembrar que, na cultura angune, havia um tabu proibitivo de entrar na água e comer peixe. Os prisioneiros devem, pois, ter sido invadidos pelo horror de viajar de barco, o que irá repetir-se, por várias vezes, até ao fi m da deportação. Com os onze prisioneiros do Manjacaze (Gungunhana, o fi lho Godide, o tio Molungo, o cozinheiro Gó e as sete mulheres), embarcam também o régulo da Zixaxa e três mulheres deste, cuja sorte iria ser igual à dos outros. Em Chai-Chai, na foz do Limpopo, passam então para o navio Neves Ferreira, que os transporta até Lourenço Marques, onde chegam no dia 4 de Janeiro. Aí desembarcam e são mantidos na cadeia homens e mulheres, até serem levados para bordo do África, após o seu reconhecimento ofi cial, feito em público. Neste navio África fariam uma viagem de 60 dias, até Lisboa. As condições a bordo deviam ser péssimas, pois

* Licenciada em Filologia Românica, pela Faculdade de Letras de Lisboa, 1965. Doutoramento de Estado ès-Lettres, pela Sorbonne, Paris, 1975; Professora Catedrática. Leccionou na Universidade de Aix-en-Provence, França; na Universidade dos Açores; na Universidade Aberta de Lisboa e na Universidade da Ásia Oriental, em Macau. Tem publicado perto de cento e cinquenta trabalhos (livros e artigos) sobre literatura, linguística, etnografi a e história. Actualmente é aposentada e Presidente Honorária e Vitalícia da Associação de Solidariedade dos Professores.

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Gungunhana e seus companheiros, num total de 15 pessoas, ocupavam apenas dois compartimentos pequenos, escuros e mal arejados. Por razões de segurança, aí fi cavam fechados à chave, sempre que o barco fazia escala em qualquer porto. E foi o enjoo, a asfi xia, a imobilidade, a juntar à angústia da dúvida sobre o futuro que os esperava. Os jornalistas falam mesmo da tentativa de suicídio por parte de uma das mulheres...

3. Na manhã do dia 13 de Março de 1896, desembarcam em Lisboa e são conduzidos em caleches descobertas, do Arsenal até ao forte de Monsanto. Lisboa em festa, a abarrotar de multidões ruidosas. O público, apinhado pelas ruas, empoleirado em postes, debruçado das janelas, aos magotes, como enxame, ri, grita, vaia, eufórico. Dentro das carruagens, os prisioneiros olham temerosos e embaraçados; eles com ar estupefacto, perplexo; elas apontando, curiosas e

divertidas. Nunca tinham visto casas tão altas, com varandas, ruas calcetadas, praças com fontes e estátuas. E tanta gente alegre, a observá-las, durante todo o percurso. As mulheres africanas parecem bem-dispostas. Do Terreiro do Paço seguiu o cortejo pela rua do Ouro, Avenida da Liberdade, Sebastião da Pedreira, Sete Rios, Benfi ca, rumo a Monsanto. Por todo o lado, em todo o percurso, era aquela mole imensa de gente, às gargalhadas e a insultar. Porém, o desco nhecimento da língua portuguesa dava às prisioneiras a vantagem de não compreenderem o ódio e a ironia da arraia-miúda e assim, na sua inocência, poderem continuar a sorrir. Era o dia 13, uma sexta-feira de céu cinzento. Se os africanos tivessem as mesmas superstições que os brancos, tanto bastaria para que os maus presságios agudizassem ainda mais a angústia que os atormentava.

Gungunhana e as sete esposas que o acompanharam no exílio.

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A tarde aproxima-se do seu fi m, quando chegam ao forte de Monsanto. São seis horas e, em Março, o sol está a esconder-se. As instalações onde são recebidas nada têm de semelhante àquelas casas que, na Baixa, as haviam deslumbrado. Passada a ponte levadiça, entram numa masmorra, onde a escuridão era quase total. As mulheres estão agora assustadas e o terror estampa-se-lhes no rosto. O quarto que lhes havia sido destinado encontrava-se seis metros abaixo da superfície. Espaço escuro, bafi ento, mal cheiroso, húmido e frio. Suspiravam amedrontadas e foi necessário tranquilizá-las; mas continuaram a tremer de frio e talvez também de medo. Assim as encontrou o médico encarregado de examinar o seu estado de saúde. São-lhes mostradas as camas e explicam-lhes como são utilizadas. Até então haviam dormido no chão, sobre esteiras. Convencidas fi nalmente de que não lhes iria acontecer mal, ao entrarem nas camas riram ruidosamente. Nesta fortaleza de Monsanto iriam fi car encerradas durante quatro meses, aproximadamente. Gente habituada a viver ao ar livre, em contacto com a natureza e em constante movimento, vê-se agora privada da largueza dos seus espaços e da quentura do seu clima; imóveis e geladas entre quatro paredes do calabouço, num entorpecimento do corpo e do espírito. Detestam a comida portuguesa e queixam-se constantemente de frio. � Entretanto aprendem a utilizar talheres e passam a usar vestuário europeu.

4. Como passavam o tempo essas mulheres prisioneiras? Grande parte do seu dia era ocupado a pentearem-se, pois usavam um penteado artístico, alto, entre o cónico e o cilíndrico, que constituía um dos distintivos das mulheres grandes do Gungunhana. As mulheres pequenas, ou seja, as rainhas de segunda classe, não tinham o direito de usar esse tipo de penteado. Quanto à favorita, tinha outra ocupação, pois cabia-lhe o dever de manter sempre brilhante a coroa de cera que o marido usava e que era tecida no próprio cabelo.Além disso, dedicavam-se ao artesanato, fazendo pulseiras e colares de missanga, artisticamente trabalhados. Ao princípio, a monotonia dos dias foi quebrada pelas muitas visitas que recebiam. As esposas de ministros, ou de outras altas individualidades, conseguiam a autorização do Ministério

da Guerra e iam até Monsanto, entravam nos calabouços, sorriam, levavam presentes. Ou por curiosidade ou para cumprir o dever de visitar os presos. Não conheciam a língua, mas comunicavam por gestos de simpatia. Ofereciam fruta e doces, objectos variados, pequenos nadas que davam prazer. Um jornalista referiu uma vez a agilidade e delicadeza com que uma dessas mulheres prisioneiras calçou umas luvas que acabava de receber. Com tanta facilidade e perfeição como se a isso estivesse habituada de longa data. E um dia em que uma senhora lhes ofereceu fl ores, com elas adornaram alegremente os seus penteados. As prisioneiras mostravam aos visitantes os seus trabalhos em missangas, com cores variadas e caprichosos desenhos. Estes apreciavam, elogiavam-lhes a arte, sorriam. Mas um dia acabaram-se as visitas, por o ministério as ter proibido. E então foi a solidão total. Tensão, crises de mau humor, cólera, emoções descontroladas, transgredindo assim a contenção imposta pela disciplina militar. O recluso tem de obedecer, mas os nervos começam a dar sinais de fadiga. Há gritos e ameaças, intervenção das forças da ordem. As mulheres choram, os homens são punidos. Era muito difícil para um rei déspota e violento como o Gungunhana, a renúncia calma ao prestígio de que gozara e a aceitação submissa do vencedor português. Cada vez mais angustiado e atormentado pelo receio da condenação à morte, Gungunhana atinge o limiar das suas forças. Adoece gravemente e tem de ser hospitalizado. A sua partida para o hospital impressionou de tal modo as rainhas, que estas quase deixaram de comer. Algumas delas adoeceram mesmo e o médico chegou a propor o seu internamento. No dia em que o marido regressou recuperado, foi grande a alegria das esposas, traduzida em carícias, gargalhadas e gritos de prazer que entoaram pelas celas.

5. De repente a imprensa deixa de se interessar pelos prisioneiros africanos. O encanto da novidade tinha-se extinguido; e agora nada mais saberemos a seu respeito, a não ser que passaram os meses de Abril, Maio e Junho, na mais horrível solidão. Dias a decorrer na penumbra, incertos de futuro, exíguos de espaço, longos de monotonia, húmidos e frios. Até que, no dia 23 de Junho os jornais anunciam a partida do Gungunhana e dos seus três companheiros, na véspera, para os Açores. E as mulheres? Não partem, por enquanto. Apesar das

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visitas simpáticas que haviam recebido, a sociedade lisboeta havia-as rejeitado, escandalizada com a poligamia. Para acabar com o pecado, as autoridades haviam decidido separá-las do marido. Segundo contam os jornalistas, foi muito dolorosa a separação, nesse dia 22 de Junho, pelas 7 da noite. Eles a tremer, de lágrimas nos olhos, convencidos de que iam ser mortos. Elas sem quererem separar-se deles, chorando, gritando, lamentando-se. Esquecidas pela multidão que antes rodeava o forte, abandonadas aparentemente pelas autoridades, a solidão destas mulheres tornou-se insuportável. Tiraram-lhes os seus companheiros; e ali fi cam sozinhas, de 22 de Junho a 6 de Julho. Duas longas semanas de dor, de dúvida, de solidão e de medo. Caídas numa apatia total, nem forças tinham para qualquer

eventual acesso de fúria. Era a segunda desagregação familiar que sofriam. A voz do sangue silenciada por razões de ordem moral e política. Desprevenidas, indefesas, arrancadas a laços e raízes, elas esperam não sabem o quê. Finalmente vem do Ministério a decisão: despachá-las para a ilha de S. Tomé. Pelas 5 h da manhã do dia 6 de Julho recebem então ordem para se vestir e partir. O sofrimento que deixam transparecer é tão grande que os próprios jornalistas se sentem comovidos e revoltados: «pobres expatriadas» que pareciam nem ter forças para se vestir. Ninguém para se despedir delas. À chegada, estavam as ruas cheias de gente, havia movimento e alegria; agora, à partida, é o desconsolador abandono total.

6. Transportam-nas até ao Arsenal e embarcam-nas no paquete S. Tomé. Já no beliche, impressionam por um silêncio

Gungunhana, sentado, o tio e o fi lho, em pé, e as sete esposas sentadas no chão.

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desolador. Umas estendidas, de olhos fechados, como se dormissem; outras, acocoradas e lacrimosas, olhando os circunstantes com pavor; duas recusavam-se a mostrar o rosto. Debilitadas pelo entorpecimento de quatro meses, dilaceradas pelo martírio da dúvida, refugiavam-se num mutismo impregnado de horror, receio e solidão. A separação dos régulos africanos das suas esposas, e o envio destas para S. Tomé, parece ter sido a resposta a uma campanha de moralização, levada a cabo por um grupo de senhoras de bem, revoltadas contra a poligamia dos negros. Era, pois, uma campanha autorizada, promovida e apoiada por pessoas de bons costumes, que consideravam a presença daquelas mulheres como um insulto à moral pública. Além disso, sendo os Açores uma terra de grande religiosidade e pureza (salvaguardada e assegurada pelas casas de prostituição...), o governo não poderia permitir uma tal promiscuidade. A separação foi, pois, uma operação de limpeza, imposta pela moral tradicional. Digamos a propósito termos a notícia de que, nos Açores, os prisioneiros africanos eram levados, regularmente, às casas de prostituição da cidade de Angra do Heroísmo. Referiam alguns jornalistas que se tentou convencer o Gungunhana à monogamia. Como a moral portuguesa só admitia, publicamente, uma mulher, o régulo teria de escolher uma entre as sete e repudiar seis; o que, para estas seria uma humilhação insu-portável. Gungunhana amava-as todas igualmente; e não sabia nem quis escolher uma, pois cometeria para com as outras uma afronta que ele nunca se permitiria. Por isso foi fi rme e enérgico, coerente com os seus princípios. Tendo-se recusado a escolher uma, a separação foi inevitável. Bem pediu o régulo, bem suplicou, mas de nada lhe serviu. Jornais houve que protestaram contra esta decisão, prevendo para o Gungunhana uma lenta agonia, minado de uma saudade e tristeza que lhe encurtaria os dias; o que realmente se deu. Nada, porém, abalou as cúpulas; e as suas ordens foram integralmente cumpridas. E lá partem para S. Tomé, sozinhas, vazias de sonho, sem ninguém que lhes acene com o lenço da amizade; lá seguem pela imensidão de um mar revolto, sem ninguém que lhes estenda a mão da solidariedade, sem ninguém que lhes dirija um gesto de compreensão. Um jornalista comenta:

«Em S. Tomé que sorte desgraçadíssima vão ter? Não seria mais justo, e muitíssimo mais digno, enviá-las para a sua terra natal, de onde nunca deveriam ter saído?!» Era muito grave, aqui no Continente ser-se acusado de “propensões benévolas» para com o Gungunhana. Para se tomar o partido deste era necessário não só muita coragem, como carecia de um preâmbulo fi losófi co, moral e religioso, com apelo à caridade. De contrário, corria-se o risco de ser acusado de traição à pátria. Ou de imoralidade. Ou de atentado aos princípios cristãos. Depois de tomadas todas essas precauções, a Folha do Povo arrisca criticar e condenar ferozmente o comportamento do Ministério da Guerra, que acusa de iníquo e cruelmente bárbaro. Igualmente encontramos críticas violentas no Jornal do Comércio, onde um jornalista, sob o pseudónimo de Fernão Lopes, põe em realce a hipocrisia do governo, escudado no que chama «escrúpulos religiosos» tardios. Fernão Lopes termina o seu artigo relembrando a maneira correcta e hospitaleira como os portugueses foram sempre recebidos por homens e mulheres da corte de Gungunhana.

7. Passados doze dias de náusea e imobilidade, as mulheres chegam a S. Tomé e são entregues ao governador da ilha. Em que vão ocupá-las? Em S. Tomé havia então um mundo confuso de imigrantes, vindos dos mais variados pontos de África, das mais diversas tribos, odiando-se por vezes. Basta olharmos as listas das levas que chegavam ou partiam, para nos darmos conta dessa variedade. Em comum, tinham apenas a cor da pele; e o trágico destino da falta de trabalho. Falavam dialectos diferentes e desconheciam-se entre si. Foi para o meio desta confusão que as rainhas destronadas foram levadas. Que destino lhes foi dado? A Folha do Povo, de 13 de Novembro desse ano de 1896, e respondendo a vários jornais de Lisboa, dá-nos algumas informações. Recordemos que, juntamente com as sete mulheres do Gungunhana, se encontravam mais três, as do régulo Zixaxa, suas companheiras de infortúnio desde o início do exílio. Eram, pois, dez ao todo. Segundo o citado jornal, oito destas mulheres estavam colocadas no hospital civil e militar; e as duas restantes no palácio do Governo. Constava pouco ou quase nada fazerem; e o articulista lamenta que, dado a falta de braços em S.

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Tomé, as não tenham empregado «em qualquer trabalho útil, mediante remuneração condigna». Vem a propósito lembrar que se tratava das mulheres grandes do régulo, isto é, as de mais elevada categoria social na hierarquia feminina, que tinham ao seu serviço as mulheres pequenas, espécie de ecónomas encarregadas de dirigir os bandos de escravos a trabalhar na corte. Eram, portanto, rainhas que nada costumavam fazer e sem hábitos de trabalho. J. F. Marques Pereira, na obra intitulada No tempo de Gungunhana, publicada três anos mais tarde (1899), diz que as mulheres foram para S. Tomé «servir de mancebas, em amiganços baratos, e para acarretar pedras». E António Pedro de Vasconcelos, no fi lme Aqui d’El-Rei, faz dizer a uma das personagens que elas foram levadas para um «bordel do exército». Não encontrámos documentos ofi ciais que nos permitam negar ou confi rmar tais informações. Tratava-se de mulheres que só interessaram enquanto rainhas de um reino cobiçado pelos europeus. Destronado e preso o soberano, perdidas as esposas no meio da massa anónima santomense, o governo, não vendo nelas qualquer perigo, deixava-as cair no esquecimento.

8. Em S. Tomé, as rainhas africanas dos reinos de Gaza e da Zixaxa foram ultrapassadas e absorvidas pela história. Quinze anos de esquecimento; quinze anos de trabalho silencioso, de dor ignorada, de sofrimento mudo que levaria três delas à morte. Num silêncio de deserto, as rainhas tinham sido tornadas escravas submissas, feitas consentimento e conformismo. Enigmas de uma grandeza descaída. Mas em 1910 é implantada a república; e muita coisa vai mudar. Alguém se lembra dessas mulheres exiladas e decide que regressem ao país. Comédia eleitoralista ou desejo de reparação? Gungunhana já havia falecido em 1906. A ordem de repatriamento foi sem dúvida recebida com euforia; era a esperança do regresso a casa que renascia. Só que já não havia casa. Nem país. Gaza tornara-se num distrito da colónia de Moçambique. Os familiares tinham-se espalhado, cada um para seu lado, alguns presos, outros refugiados no estrangeiro. Era a desintegração progressiva dos pequenos estados indígenas e a substituição dos costumes

africanos pelos dos europeus. Desconfi adas, assustadas, sem o elo de união que era o marido, só o medo as irmanava agora; e cada uma vai para seu lado.

9. Eram sete, regressavam quatro. As três mais vulneráveis haviam atingido o limite que desemboca na morte: Muzamusse, Dabondi e Fussi haviam fi cado sepultadas em terra santomense. Patihina volta a casa, mas o medo lavra na família e ela decide fugir para o Transvaal, com o fi lho Tulimahanche. Foram juntar-se aos milhares de emigrados de Gaza, amigos e familiares de Gungunhana, que se haviam fi xado em Speloken. Tulimahanche seria, em 1932, o chefe de um dos dois grupos de exilados angunes que aí existiam então. Namatuco, Chlézipe e Machacha traziam fi lhos arranjados em S. Tomé, nos quinze anos de exílio; fi lhos que, nada tendo com Gungunhana, não corriam o risco de vir a ser presos pelos portugueses. Por isso não recearam em fi xar-se na região onde tinham vivido anteriormente: Chaimite, Chibuto e Chai-Chai, respectivamente. Tinham cumprido plenamente o destino ancestral da mulher: resignar-se e sofrer, numa passividade submissa. Já no seu país, continuarão a cumprir o mesmo destino, como «criadas de servir».

10. E terminamos. Com este trabalho, tivemos a intenção de dar som às vozes silenciosas de mulheres que sofreram cruelmente no todo das suas vidas o que de mais negativo pôde haver no encontro da cultura africana com a cultura europeia. Mulheres esquecidas, relegadas para a periferia da história, quando elas estavam, afi nal, bem no centro dessa história. Elas eram as rainhas do império de Gaza, onde tinham exercido uma importante função política. Elas eram as esposas do então maior potentado da África austral, pelo que pagaram com quinze anos de exílio. Moralmente mutiladas, elas foram as vítimas inocentes de um evoluir da história africana, provocado por decisões e projectos da Europa, os quais levaram a alterações socio-políticas que as afectaram no mais fundo das suas idiossincrasias. Desfeita a sua vida privada, desagregada a sua família, estas mulheres tornaram-se o símbolo de uma África desmoronada e dividida por ideologias levadas da Europa.

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149 CEM PALAVRAS SEM DROGA Joaquim Máximo*

O concurso «Cem Palavras Sem Droga», em que os concorrentes devem limitar os seus textos a cem palavras, além de que não podem utilizar a palavra «droga» ou seus derivados, veio anunciado nos exemplares do Diário de Notícias datado de 20 de Novembro de 1998. Concorri com os dois sonetos que constam a seguir a este texto, em que, no primeiro soneto, a palavra drogado foi substituída pela palavra viciado. Não me parece que venha a ter qualquer das primeiras classifi cações, até porque, se eu pertencesse ao Júri, preferiria o texto de um ex-drogado, em que este desse um testemunho da sua desintoxicação. Concorri com o espirito de alguém que gosta de lançar balões de ensaio. Os dois sonetos que enviei acompanhavam a seguinte carta.

Assunto: Concurso «Cem Palavras Sem Droga»

Exmos Senhores: Venho, por este meio, candidatar-me ao concurso acima referido. Os meus elementos de identifi cação constam na folha azul, que envio em anexo. Candidato-me com dois textos de opinião, em vez de um só, o que me parece que

não contraria o vosso regulamento. Estes textos constam nas folhas cor de laranja, que também envio em anexo. Traduzem duas mensagens:

A primeira para pais e a segunda para fi lhos.

Cumpre-me esclarecer que as duas palavras do pseudónimo com que assino os dois textos não estão incluídas nas cem que constituem cada um deles. Esclareço também que, ao utilizar nos textos as palavras «coca», «heroína» e «toxicodependência», as considero não derivadas da palavra «droga», como é, por exemplo, o caso das palavras «drogar», «drogado», etc. Sem outro assunto, subscreve-se com a maior consideração e estima

* Joaquim Máximo de Melo e Albuquerque de Moura Relvas, nasceu em Coimbra e reside em Vila Nova de Gaia. Tem o curso de Engenharia Electrónica da Universidade do Porto. Exerceu a actividade profi ssional na Administração Geral dos CTT e obteve a especialidade de Instalações Exteriores de Transmissão; União Eléctrica Portuguesa, integrada depois na EDP; Professor da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, como Professor Associado; Colégio de Gaia onde leccionou disciplinas relacionadas com a Electrónica Digital. Faz parte da Direcção da revista Politécnica. É membro da Ordem dos Engenheiros da “American Association for the Advancement of Science”, da “New Iork Academy of Sciences” e da “Planetary Society”.

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Pais de drogado

Pais de drogado, nunca queiram sê-lo; Noites de insónia, com dor para os dois Esperanças de cura perdidas depois, A vida é toda um pesadelo.

Começam as notas a descer na escola, Depois o drogado vai roubar os pais, A isto segue-se o roubo aos demais, E, às vezes, também, vai pedir uma esmola,

Acaba por vir a polícia prendê-lo, Depois os pais vão à prisão vê-lo Mas a culpa pertence a outra gente:

A trafi cantes de coca e de heroína, E estas para esses são mesmo uma mina, Então não será o drogado inocente?

A toxicodependência

A toxicodependência é lenta morte, Que ataca na discoteca ou na escola, E que, sem dores por ela, aí te enrola, Está então traçada a tua má sorte,

De livre passas tu a ser um escravo, Um desgraçado toxicodependente, Devias ter sido muito mais prudente E nunca teres provado, do vício, o travo,

A primeira sensação é a de euforia, Mas precisas muito mais em cada dia, Do vício para a ter bem mantida,

E então tu estás nas mãos do trafi cante, Estás num inferno pior que o de Dante, Que te vai destruir toda a tua vida.

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151 O CASTELO AO ESPELHO

Óscar Maia*

As noites e os dias andavam broncos. Não havia dia – há mais de dois meses – em que não houvesse borrasca da grossa. Os aguaceiros, entremeavam com fortes chuvadas e as gentes, de tanta água que levava no lombo já andava mais que enfastiada e irritadiça. Naquele princípio de tarde, após o almoço, aproveitei uma aberta. Meti-me no carro e rumei ao Porto, disposto a gastar na viagem o exacto tempo de pôr um pé lá e outro cá. E assim foi. Logo que arrumei as coisas do curto rol, abri caminho, com o pé pesado no acelerador. Já na Auto-estrada, desfrutando do calor suave daquele sol que derramava no meu rosto a sua bênção, decidi abrandar, no intuito de colher dele os seus afagos; por mais dilatado tempo... O céu azul, entremeado de nuvens, acorrentara o meu olhar, em ânsias de o reter na minha memória... para sempre. De repente, este idílico quadro, transformou-se em algo ainda mais arrebatador. Um portentoso Arco-íris desenha-se no céu…e aquela

imagem poderosa, me domina e alvoroça. A dez quilómetros do meu destino, imagino que aquele Arco-íris, fantástico, estaria a despejar no Castelo da Feira toda aquela luxúria garrida de cores, como que me apontando o local exacto do “meu tesouro”. Acelerei. Ansioso de chegar ao meu atelier a tempo de sacar da ferramenta ideal que me permitiria fotografar o “meu Castelo” emoldurado enfi m… por este Arco-íris coruscante. E ele, ali estava, aparentemente cada vez mais colorido... à minha espera. Enquanto atravessava a Cidade, fui imaginando os enquadramentos e perspectivas possíveis com cada máquina que possuía. A escolha recaiu para uma das magnífi cas Hasselblad munida de uma super grande-angular. À pressa, recolhi a máquina, um fotómetro e dois rolos e, sem dar explicações, meto-me novamente no carro. Esquadrinho o céu, e arranco em alvoroço. O Arco-íris, ainda lá estava... Enquanto subia a encosta, por entre a folhagem, procuro desesperadamente... O céu azul, salteado de nuvens, ali está, resplandecente, mas despojado da Divina paleta... Saio do carro e olho em redor, mas, do Arco-íris, nem vestígios. Não conseguira chegar a tempo!... Resignado, por mais esta tentativa frustrada, endireitei as costas, espreguicei-me e olhei aquelas pedras, tão

* Fotógrafo de arte.

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familiares… Pensei: “Deste ponto, onde me encontro, já te não fotografo há mais de dez anos…mas é sempre bom ver-te, vigiando este mágico lugar, onde, de quando em quando, se tem que vir... revisitar-te.” Olhei a calçada de cubos de granito…e, porque chovera, um manto irregular de poças de água espelhava o céu, as nuvens, as árvores…e o castelo! Rodeei cada poça, e escolhendo ângulo certo ele ali estava, espelhado… “de cabeça p´ro ar… Apressadamente, recolhi a máquina e introduzi o rolo de fi lme no magasin da Hasselblad, calculei a luz, estabeleci o foco para o “espelho” e daí para o castelo e, comecei a disparar, freneticamente, neste e naquele charco… até esgotar o rolo de fi lme. Introduzi o outro fi lme e apontando de novo para cada charco a distâncias diversas e perspectivas diferentes. A recolha destas 24 imagens durou o escasso momento de 3 ou 4 minutos e, pouco depois, já estava no laboratório a revelar os fi lmes, entusiasmado pela certeza de ter capturado imagens inolvidáveis. Quando o demorado processo de revelação terminou, a decepção foi arrasadora…os fi lmes, patenteavam o vazio, a ausência de qualquer resquício de imagem… com o entusiasmo, esquecera-me de retirar a tampa da lente… Corri para a rua e olhei o céu…era já quase noite…a oportunidade, perdera-se irremediavelmente… A noite foi um pesadelo. Via-me a saltitar de poça em poça como um macaco, empunhando um raquítico cacho de bananas que resvalava das minhas mãos para o fundo tenebroso daquelas poças profundas… com um estranho castelo ao fundo… O dia que amanheceu cinzento, reavivou a esperança…Hora, a hora, esquadrinhava o céu, à espera do momento certo para recuperar com êxito o erro clamoroso da véspera. E quando é chegada a proximidade da hora propícia de fi m de tarde, munido de cuidados e grande apreensão, lanço-me ao caminho carregando todas as cautelas… Ali chegado, esperava-me uma nova e incontornável decepção; as condições climatéricas eram excelentes e semelhantes às do dia anterior, só que, não chovera, e as poças tinham-se eclipsado… O espelho de água, desaparecera…mas a água que faltava, estava pronta a ser usada se a colhesse do chafariz…

Alvoroçado, pedi um balde ali mesmo no bar, à beira da estrada e, como um louco, enchia e despejava para cima do empedrado; o caudal prateado, imprescindível à reposição dos mágicos espelhos que tinham sido derrogados pela estiagem malfazeja das últimas horas. Para minha desgraça, passou gente a pé, de autocarro e noutros veículos e todos me olhavam de soslaio, com infi nita surpresa e comiseração… Os autocarros, acometiam endemoninhados, comprazidos em chapinhar nas “minhas” poças e a arrojar para longe a água … Foi uma peleja ferrenha, entre mim e os monstruosos e escarnecedores passantes que não lobrigavam apurar da fi nalidade daquela inusitada rega dos cubos da calçada. Mas, quando as covas estavam repletas de espelho, arremeti sobre elas o olhar aguçado e vibrante da objectiva da minha Hasselblad, desfechando convicto, com precisão, sobre cada poça – com o convencimento, que provinha da raiva e da frustração do dia anterior; e vertidas nos esgares implacáveis de fotógrafo alienado – que saltitando, se aprazia saqueando daquelas poças espelhadas o assomar assombroso e fantástico de um castelo medieval; que emergia solene, fantasmagórico…e invertido… dos confi ns obscuros e intangíveis dos tempos. Casa de Picalhos, 24 de Junho de 2009

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153 Postais do Concelho da Feira

Ceomar Tranquilo*

A – Postais Ilustrados

Edição da Comissão de Vigilância do Castelo

*Caminheiro por feiras, lojas e mercados.

69 (1) - Villa da Feira “O producto da venda d’esta collecção tem o destino patriótico da Conservação das venerandas relíquias do CASTELO DA FEIRA, a qual está a cargo d’uma benemérita Commissão”

Coloridos, executados na Alemanha.

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69 - A - Reverso do mesmo postal:Circulado para o Porto. Selo de D. Manuel II, 10 R., verde, com sobrecarga República, a vermelho.“Desejo-lhe muita saúde assim como aos meninos e ao Sr. António. Eu continuo melhor qualquer coisa”.

70 (2) - Castelo de Vila da Feira. Com a mesma legenda.

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70 – A – Reverso do mesmo postal.Circulado em 30-3-1911 para Pernambuco – Brasil. Selo de D. Manuel II, 20 R., rosa, com sobrecarga República a preto.“Aqui vai o glorioso e vetusto Castelo da Feira.A sua origem perde-se nas trevas dos tempos e creio ter sido outrora praça forte dos senhores feudais Condes da Feira.Está em completa ruína interiormente e é uma pena se não impedem o seu total desmoronamento.Aquellas pedras já resistiram ao embate de muitos séculos e estão impregnadas de muito sangue das batalhas a que ele muito espectador, tantas vezes assistiu. Os seus muros acolheram muitas vezes os habitantes dalli, espavoridos pelos horrores da guerra.À luz do luar, numa noite melancólica, as ruínas no meio do sombrio arvoredo que as rodeia – devem ter aspectos fantásticos, scismadores…para quem gosta.”

71 (3)-Castelo da Feira. Pormenor interior. Com a mesma legenda. Selo de D. Manuel II, 10 R,. verde, com sobrecarga República, a vermelho, aposto no rosto.

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7l – A – Reverso do mesmo postal.Villa da Feira, 31 de Agosto de 1911. Obliterações de Espinho (31 de Agosto de 1911) e Aveiro (1 de Setembro 1911).“A terra não tem nada de notável a não ser o Castelo; contudo é pitoresca.”

72 (4) – Villa da Feira. Solar dos Condes. Com mesma legenda.

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72 – A – Reverso do mesmo postal.Selo de D. Manuel II, l0 R. verde. Obliteração da Póvoa do Varzim, localidade de destino, em 24. Nov.1910.“Mais um da Villa da Feira até ver. Agora vou atirar-me a um beef também até ver em que param as modas.”

73 (5) – Villa de Feira. Igreja matriz. Com a mesma legenda.

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73 - A - Reverso do mesmo postal. Circulado para Lisboa, 2 selos Ceres, l C. castanho. Obliteração de 20.Fev.20.“Fui Domingo todo o dia passear à Villa da Feira com o Mariano. Não desgostei da Vila mas gostei imenso do histórico do Castelo.A vida de casado quando se tem boa sorte de encontrar um bom marido é bonita”.

Foi feita uma segunda edição com a legenda no verso e que inclui mais um postal, com o nº. 3, fechando a colecção com o nº. 6.

A Comissão editou um postal extra colecção, não numerado, com a legenda no rosto, que representa o Interior da Igreja Matriz, já referenciado no número dez desta revista, a pág. 139.

Foi feita uma segunda tiragem com a mesma legenda.“O producto da venda desta coleccção tem o destino patriotico da Conservação das venerandas relíquias do Castelo da Feira, a qual esta a cargo de uma benemérita Comissão”, colocada no verso, e a adição de um novo postal com a Porta da Barbacã.Este novo postal teve o número 3 fechando a colecção com o número 6, correspondente ao número 5 da primeira tiragem.Não registei qualquer postal com o selo de D. Manuel II, com ou sem sobrecarga República, pelo que admito que a segunda tiragem foi posterior a 1911.

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74 – A – Reverso do mesmo postal. Circulado para o Porto, com selo de 2.C., Ceres, carmim.Obliteração de “Villa da Feira – 30 MAR 08”, – erro de data – e chegada ao Porto em 31-3-18, conforme a obliteração de “Porto Central – 2ª. Secção, 3l-3-18.Como a data era colocada manualmente estes erros aconteciam com frequência, até detectado e corrigido. Estes selos Ceres só entraram em circulação em Maio de 1912.

74 (3) – Porta da Barbacã do Castelo da Feira.

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160 LEITURA

Anthero Monteiro*

tu começaste a abrir com lentidãoum livro de poesia um tanto abstrusae eu comecei a abrir a tua blusasoletrando botão após botão

tu desataste a ler e eu contrafeitomaldizendo as estrofes e o poetapreferia poesia mais concretae pus-me a ler o poema do teu peito

os teus dedos folheavam bem tranquilosnuma calma malévola o volumee os meus dedos queimavam-se no lumeque alastrava do ardor dos teus mamilos

depois interrompeste o que me liasficou no ar pairando o doce aromada tua voz que ameiga e que me domae dava mais poesia às tais poesias

e aqui estamos olhando um para o outroà espera que um se renda neste impasseeu a essa poética sintaxetu à morfologia do meu corpo

*Escritor e poeta natural de S: Paio de Oleiros. É autor de vários livros de

poesia e de ensaio.

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FundaçãoComendador Joaquim de Sá Couto

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Clube FeirenseAssociação Cultural

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LAF - Liga dos Amigos da Feira

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