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Volume 7 - Número 1 - Ano 2011 REVISTA CIENTÍFICA FAESA

Volume 7 - Número 1 - Ano 2011 - faesa.br · Márcia Roxana Cruces Cuevas ... Valéria de Oliveira Fernandes ... THE PREJUDICE AND THE RITUAL OF RELIGION UMBANDA Aline Fadlalah

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Volume 7 - Número 1 - Ano 2011

REVISTA CIENTÍFICA FAESA

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 1-92 | 2011

issn: 1809-7367

v. 7, n. 1, 2011

vitóRia

Volume 7 - Número 1 - Ano 2011

ReVistA CieNtífiCA fAesA

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Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema Faesa de Bibliotecas

R454 Revista Científica Faesa / Sistema Faesa de Educação. - v.1, n.1 (2005). - Vitória : Faesa, 2005

V. 7, n. 1, jan./dez. 2011 Anual issn 1809-7367

1. Generalidades – Periódicos. I. Sistema Faesa de Educação.

CDD 000

eXPeDieNte

Periodicidade: AnualissN: 1809-7367

temática: transversal (multidisciplinar)início da coleção: v. 1, n. 1, 2005

Circulação: Local, nacional e internacionaltiragem de cada número: 1.000

CRÉDitOs tÉCNiCOsRevisão

Alina da Silva Bonella

editoraçãoBios

impressãoGSA Gráfica e Editora

CapaNúcleo de Comunicação e Marketing

Ficha catalográficaSistema Faesa de Bibliotecas

E-mail: [email protected]

endereço

Coordenação de Pesquisa e ExtensãoAssociação Educacional de Vitória - Faesa Campus II

Rod. Serafim Derenzi, 3.115, São PedroVitória, ES – CEP: 29032-060

ACEITA-SE PERMUTA I EXCHANGE IS REQUESTED I SE ACEPTA CAMBIO

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Adriana GonringAlbert SuhettAlessandro Dantas CoutinhoAlexandre Cardoso da Cunha Alexandre Gabriel FranchinAlmerinda da Silva LopesAna Carla Amorim Moura LoureiroAna Maria FurkinAndréa Campos RomanholiAndreia da Silva FerreiraAndrômeda MenezesAnelise Nunes GorzaAthelson Stefanon BittencourtCarine da Silva Cardoso Carlos Eduardo FerraçoCarlos Roberto GuimarãesCelina Rosa dos SantosCláudia Dazzi dos Reis TardinCláudia Maria RussoCláudio Renato Zapalá RabelloCristina Cerqueira BueryDébora Catarina PfeilstickerDenise Franzotti TogneriDomingos de Jesus RodriguesEdson LisboaEduardo Henrique TorreElizabeth Christina Cotta MelloElsimar Rosindo TorresErly Vieira JuniorFabiano MaziniFabio AnhertFlávia Imbroisi Valle ErreraFlavia Mazitelli de OliveiraFelipe Zamborlini SaiterFernanda Julião ReggianiFlavio Rubens LapolliFrederico de Meirelles S. PereiraGilma Corrêa CoutinhoGustavo Peixoto S. MiguelInácia Maria NunesIran PinelIsabel Augusto

Isabele Santos EleotérioIuri Drumond LouroIvani ZechinelliJane C. F. de OliveiraJoão Luiz Vassalo ReisJosé Eduardo SimonJosé RanaliJosé Renato CostaJulia Bellia MargotoJuliana Maria ZucollottoKarina Musso LealKarla CostaLetícia QuesadoLiana FigueiredoLídio de SouzaLígia Arantes SadLiliana A. Pimenta de BarrosLuciana Carrupt Machado Fogame Luiz Henrique BorgesLuzimar S. LucianoMarcelo PassamaniMarcelo SimonelliMárcia Roxana Cruces CuevasMarco Antonio PereiraTeixeiraMargareth PandolfiMaria Auxiliadora Vilela PaivaMaria Cristina JolyMaria Cristina Campelo LavradorMaria Cristina Rodrigues AzevedoMaria da Conceição SoaresMaria Helena AmorimMaria Inês Badaró MoreiraMaria Zanete DadaltoMarielle Ferreira de VasconcellosMarilene Lemos Mattos SallesMaristela Cola SantolinMaura Alves Nunes GongoraMichael Maia SchüsselMirian Cristina Alvarez Pereira Miryam Bonadiu PelosiNagela Valadão CadeOberdan José Pereira

Paulo Neves SotoPaulo SoldateliPriscilla Martins SilvaRafaela RolkeRaquel Machado BorgesRenato de Almeida MorosineRenata MadureiraRicardo MattaRita de Cássia Barcellos BittencourtRober Marconi RosiRoberto Max Lamari e Costa PereiraRobson SarmentoRodolfo Pessotti Messner CampeloRodrigo Dias PereiraRodrigo Lemes MartinsRodrigo PaivaRodrigo RosistolatoRoger Elias Barnabé MachadoRogério Oliveira SilvaRonaldo MarangoniRony Cláudio de. Oliveira FreitasSandra Guedes PachecoSandra Ventorin von ZeidlerSérgio Lucena MendesSilvanaVentorimTânia Mara Alves PratesTânia Maria CrivilinTania Eliete Oliveira TellesTeresinha Cid ConstantinidisTúlio Alberto Martins de FigueiredoValéria de Oliveira FernandesVanessa Maia Barbosa de Paiva RangelVicente Aguilar Nepomuceno de OliveiraVitor Nunes RosaVitor Silva MendonçaWagner dos SantosWanize de Almeida RochaWashington Luiz GonçalvesWellington Rody JúniorWilliam Barbosa Gomes

Conselho editorial

Assessoria Científica

Assessoria editorialEliete Rabbi BortoliniAlessandra Monteiro Pattuzzo Caetano

Elisangella Nunes dos SantosMarcela Caminoti Brunhara

Diretor das faculdades integradas espírito-santenses - fAesACampus Avenida Vitória

Erthélvio Monteiro Nunes Junior

Diretor das faculdades integradas são Pedro – fAesACampus São Pedro

Juliano Silva Campana

Diretor da faculdade espírito-santense – fAesACampus Cariacica

Giovani Borgo Sardi

Adriana GonringAndressa Curto Marques DessauneEliete Rabbi Bortolini

Gilma Corrêa CoutinhoJuliana Morgado Horta Corrêa

Rodrigo Lemes MartinsRodrigo Rossoni

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MissãO DA fAesA

Promover o desenvolvimento socialpor meio do conhecimento.

LiNHA eDitORiAL

A Revista Científica FAESA é uma publicação anual, editada pela faesa.

É multidisciplinar e recebe artigos da comunidade científica e acadêmica local, estadual e nacional. Os artigos são selecionados pelo Conselho Editorial e pela Assessoria Científica.

É propósito da Revista ter no Conselho Editorial e na Assessoria Científica pesquisadores que se destacam nas diversas áreas do conhecimento.

A Revista está indexada nas Bases: Indexação Compartilhada de Artigos de Periódicos (ICAP) e Sumários.org da Fundação de Pes-quisas Científicas de Ribeirão Preto. Todos os artigos publicados têm o código de identificação Digital Object Identifier System (DOI).

Estamos trabalhando para ampliar a distribuição da Revista e indexá-la em outras bases de dados nacionais e internacionais.

Conselho editorial

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suMáRiO

ASPECTOS DA QUALIDADE DA ÁGUA NA LAGOA MARINGÁ, SERRA, ES: POTENCIAIS USOS DO ECOSSISTEMA LACUSTRE ............................................7WATER QUALITY ASPECTS OF THE MARINGÁ LAGOON, SERRA, ESPÍRITO SANTO STATE: POTENTIAL USES OF THE LAKE ECOSYSTEM

Bianca Smiderle-SchadeDiogo nonato santa Clara CóAlessandra Delazari-Barroso

BREVE ANÁLISE SOBRE O SURGIMENTO, O PRECONCEITO E O RITUAL DA RELIGIÃO UMBANDA ...................................................................23SHORT ANALYSIS OF THE EMERGENCE, THE PREJUDICE AND THE RITUAL OF RELIGION UMBANDA

Aline FadlalahHozana FraislebenNatalia Bourguignon

IDENTIFICAÇÃO DE ASPECTOS E IMPACTOS AMBIENTAIS NA LAVANDERIA DE UM HOSPITAL PÚBLICO EM VITÓRIA / ES – BRASIL ........31IDENTIFICATION OF ENVIRONMENTAL ASPECTS AND IMPACTS IN THE LAUNDRY OF A PUBLIC HOSPITAL IN VITÓRIA / ES – BRAZIL

Kajsa Kissely SantórioRonan Nunes Moulin de MoraesAndressa Curto Marques Dessaune

INTERFACE ENTRE SAÚDE MENTAL E A ECONOMIA POPULAR SOLIDÁRIA: POTENCIALIZANDO NOVOS MODOS DE GERIR A VIDA ....................................41INTERFACE BETWEEN MENTAL HEALTH AND POPULAR SOLIDARITY ECONOMY: POTENTIATING NEW WAYS TO MANAGE LIFE

Anelise Nunes GorzaAmanda Cei SantosAndrea Patrocínio Ribeiro

O CANTO DE ANÚNCIO DE SCINAX BELLONI FAIVOVICH, GASPARINI & HADDAD, 2010 (AMPHIBIA: ANURA: HYLIDAE) ............................47THE ADVERTISEMENT CALL OF SCINAX BELLONI FAIVOVICH, GASPARINI & HADDAD, 2010 (AMPHIBIA: ANURA: HYLIDAE)

Juliana PeresJosé Eduardo Simon

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PERFIL DE METILAÇÃO DO GENE P16 EM MUCOSA ORAL DE INDIVÍDUOS COM CARCINOMA EPIDERMOIDE DA CAVIDADE BUCAL ..................................55METHYLATION PROFILE OF P16 GENE IN ORAL MUCOSA OF INDIVIDUALS WITH ORAL SQUAMOUS CELL CARCINOMA

Mariana Vargas CruzEstevão Azevedo MeloAline Gomes SoaresZilda Fagundes Lima OliveiraJosé Roberto Vasconcelos de PodestáSônia Alves GouvêaSandra Ventorin von ZeidlerMelissa de Freitas Cordeiro-Silva

POSSÍVEIS ALTERNATIVAS AO PREDOMÍNIO DA LÓGICA INSTRUMENTAL ........ 65POSSIBLE ALTERNATIVES TO THE PREDOMINANCE OF THE INSTRUMENTAL LOGIC

Julia Bellia MargotoRicardo Roberto Behr

REFLEXÕES SOBRE A APRENDIZAGEM MATEMÁTICA DE ADULTOS ..............73REFLECTIONS ABOUT ADULTS LEARNING MATHEMATICS

Rony C. O. Freitas

NORMAS PARA APRESENTAÇÃO DE ARTIGOS PARA A REVISTA .....................87

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 7-22 | 2011

AsPeCtOs DA QuALiDADe DA áGuA NA LAGOA MARiNGá, seRRA, es: POteNCiAis usOs DO eCOssisteMA LACustRe

WATER QUALITY ASPECTS OF THE MARINGÁ LAGOON, SERRA, ESPÍRITO SANTO STATE: POTENTIAL USES OF THE LAKE ECOSYSTEM

BIANCA SMIDERLE-SCHADE1

DIOGO NONATO SANTA CLARA CÓ1

ALESSANDRA DELAZARI-BARROSO2

issue DOi: 10.5008/1809.7367.039

ResuMO

A avaliação da qualidade da água é necessária, considerando-se os usos do ecossistema. Os níveis de qualidade devem atender às necessidades das comunidades. O objetivo deste trabalho foi caracterizar a qualidade da água da lagoa Maringá, Serra, ES, quanto a alguns parâmetros físico-químicos e o fito-plâncton, utilizando a abordagem dos bioindicadores, ainda com informações escassas no Espírito Santo. Foram realizadas duas amostragens (março e julho de 2010) em dois pontos e traçados perfis verticais de temperatura, pH, condutividade elétrica, oxigênio dissolvido e turbidez. Foram coletadas amostras de água na subsuperfície e no fundo para análise da clorofila e do fitoplâncton. A lagoa Maringá é um ecossistema raso (> 2m) e apresentou estratificação térmica em março e circulação em julho, grande variação de pH (3,3-7,5), condutividade (116-439 μS.cm-1), turbidez (5,6-31,7 UNT), oxigênio dissolvido (1,1-7,9 mg.l-1) e clorofila (13,9-125,5 μg.l-1). Foram encontrados 49 táxons das classes Chlorophyceae, Euglenophyceae, Cyanophyceae e Bacillariophyceae, com predominância qualitativa de euglenofíceas. A ocorrência de florações da cianobactéria Synechocystis aquatilis indica sinais de eutrofização artificial. Os parâmetros analisados permitiram enquadrar a lagoa como classe 2 ou 3 da Resolução Conama nº 357/05. A densidade de cianobactérias se enquadrou na classe especial (até 20.000 cél.ml-1), permi-tindo o uso das águas para abastecimento doméstico, porém, fazendo-se necessário o monitoramento semanal de cianobactérias.

Palavras-chave: Conama. Fitoplâncton. Lagoa costeira. Qualidade da água.

ABstRACt

Water quality evaluation is necessary considering the ecosystems uses and the quality levels must attend the community requirements. The aim of this study was to assess the water quality of the Maringá lagoon, Serra, Espírito Santo State, through some physico-chemical parameters and the phytoplankton, using the bioindicators approach, considering little data available in Espírito Santo State. Two samples were carried out (March and July 2010) at two stations and vertical profiles were taken for temperature, pH, electrical conductivity, dissolved oxygen and turbidity. Water samples were taken at sub-surface and from the bottom to analyze the chlorophyll concentrations and the phytoplankton. The Maringá lagoon is a shallow ecosystem (> 2m depth) and was characterized by thermal stratification on March and

1 Bióloga.2 Bióloga; doutora em Biofísica Ambiental, Faculdades Integradas São (Faesa).

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 7-22 | 2011

overturn on July, large variation in pH values (3.3-7.5), electrical conductivity (116-439 μS.cm-1), turbidity (5.6-31.7 NTU), dissolved oxygen (1.1-7.9 mg.l-1), and chlorophyll (13.9-125.5 μg.l-1). It was found 49 phytoplankton taxa belonging to the Classes Euglenophyceae, Chlorophyceae, Cyanophyceae, and Bacillariophyceae. The qualitative predominance of euglenophytes and the occurrence of cyanobacteria bloom indicate eutrophication. The physico-chemical parameters matching class 2 or 3 requirements from the 357/05 CONAMA Resolution. The cyanobacteria density matching special class requirements (until 20,000 cél.ml-1), allowing the water uses to water supply, however, it is necessary a weekly monitoring of the cyanobacteria.

Keywords: Conama. Phytoplankton. Coastal lagoon. Water quality.

iNtRODuÇãO

Os ecossistemas aquáticos são bens preciosos para a sociedade humana. Avaliar a qualidade da água torna-se fundamental quando se consideram os diversos usos da água. Nesse sentido, as pesquisas têm sido direcionadas à avaliação das características físico-químicas e da estrutura das comunidades biológicas indicadoras das condições ambientais (GLEICK, 1993). Segundo a Resolução Conama nº 357/05, o enquadramento dos corpos d’água deve estar baseado não necessariamente em no seu es-tado atual, mas nos níveis de qualidade que deveriam possuir para atender às possíveis necessidades das comunidades.

No Brasil, as lagoas costeiras estão presentes na maior parte do litoral, dispostas paralelamente à costa, e estão separadas do oceano por uma barreira de areia (SUGUIO et al., 1982). Com ampla ocupação no País, são um dos principais ecossistemas lênticos e de maior produtividade (ESTEVES, 1998). As lagoas costeiras estão entre os ecossistemas mais produtivos da Terra e fornecem uma série de bens e serviços (KNOPPERS, 1994). Dentre eles, estão: suprimentos de água (abastecimento doméstico, industrial, irrigação etc.), controle de inundações, receptor de efluentes domésticos e industriais, suprimento de recursos pesqueiros, invertebrados e aves, extração de fibras vegetais a partir de macrófitas aquáticas, estética da paisagem e ambiente para pesquisa científica e educação ambiental (BARROSO, 2007).

A intensa ocupação urbana na faixa litorânea tem aumentado o impacto sobre as lagoas costeiras, afetando negativamente a biodiversidade, a socioeconomia local e o turismo (ENGELMAN et al., 2008). A eutrofização artificial é um dos impactos mais comuns e mais severos, pois causa mudanças físico--químicas e biológicas nos sistemas aquáticos (SMITH, 1997). O fitoplâncton é o primeiro nível da ca-deia trófica a responder negativamente, resultando em mudanças na composição de espécies, queda na diversidade e florações de uma ou de poucas espécies, comprometendo a qualidade da água para diversos fins.

A comunidade fitoplanctônica tem sido utilizada para avaliar a qualidade da água em ecossistemas continentais (BROOK, 1965; BRANCO; SENNA, 1996). No Espírito Santo, alguns trabalhos foram re-alizados em lagoas abordando fitoplâncton como bioindicador da qualidade ambiental (DIAS JÚNIOR, 1995; DIAS JÚNIOR; BARROSO, 1998; SOUZA; FERNANDES, 2009), porém essas informações ainda são escassas (DELAZARI-BARROSO, et al., 2007).

Nesse contexto, é importante o monitoramento biológico das águas por meio das flutuações das es-pécies no espaço e no tempo, da identificação das condições favoráveis às florações e da detecção de cianobactérias potencialmente tóxicas na água (DELAZARI-BARROSO, 2007). Essas informações poderão subsidiar a tomada de decisões quanto aos usos da água, principalmente quando se considera a aquicultura e o abastecimento público, além da proteção da biodiversidade. Com isso, este trabalho

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objetivou analisar a qualidade da água da lagoa Maringá, Serra, Espírito Santo, com base em alguns parâmetros físico-químicos e na estrutura da comunidade fitoplanctônica, comparando as épocas seca e chuvosa do ano de 2010, e inferir sobre os possíveis usos da água.

MetODOLOGiA

A lagoa Maringá (20°11’ S e 40°12’ O) foi originada pelo represamento do seu vale de drenagem devido à implantação da Rodovia ES-010, no município de Serra, ES. Está inserida na planície de “Tabuleiros”, instalada sobre sedimentos da Formação Barreiras (SUGUIO et al., 1982). A lagoa está distante 1,4km da linha de costa, possui perímetro de 11,9km e área de 0,59km² (Figura 1). Cerca de 85% do espelho d´água é coberto por estandes de macrófitas, principalmente Pistia stratiotes Linnaeus (alface d’água), que crescem em algumas épocas chegando a cobrir todo o espelho d’água da lagoa. A bacia de dre-nagem possui vegetação de restinga em mosaicos e, em algumas porções mais distantes da lagoa, bairros residenciais e algumas ocupações industriais. O clima da região é do tipo Aw, tropical quente e úmido, segundo classificação de Köppen. A temperatura média anual é de 24ºC, e a precipitação anual varia de 900 a 1.200mm.

Figura 1 − Localização da lagoa Maringá, no município da Serra, ES, e dos pontos amostrais (P1 = ponto 1; P2 = ponto 2; área hachurada = porção do espelho d’água coberto com macrófitas)

Os dados de pluviosidade (mm) foram obtidos pelo Sistema de Informações Agrometeorológicas do Incaper (hidrometeorologia.incaper.es.gov.br) na estação meteorológica do município da Serra, ES. A temperatura do ar (º C) foi medida em campo.

Foi realizada uma amostragem na estação chuvosa (março de 2010) e uma na estação seca (julho de 2010), na lagoa Maringá, em dois pontos amostrais (Figura 1): ponto 1, na região pelágica, e ponto 2,

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mais próximo aos bancos de macrófitas, na margem nordeste. Os parâmetros físico-químicos tempera-tura da água, oxigênio dissolvido, condutividade elétrica, turbidez e pH foram medidos em campo, em intervalos de 0,5m na coluna d’água (Tabela 1). A transparência da água (m) foi estimada pela leitura da profundidade do disco de Secchi e o valor encontrado foi multiplicado por 2,7 para estimativa da profun-didade da zona eufótica (Zeu) (COLE, 1994). Foram coletadas amostras de água em duas profundidades: subsuperfície e fundo (0,5m acima do sedimento) para análise da estrutura da comunidade fitoplanctônica por meio da composição florística, estimativa da biomassa (clorofila a), densidade e diversidade. Para a análise das concentrações de clorofila a, as amostras foram filtradas em campo em filtros Wathman GF/C e transportadas ao laboratório em caixa térmica para posterior análise.

Tabela 1 − Parâmetros físico-químicos e biológicos e equipamentos/metodologias correspondentes utilizados(as) no estudo da qualidade da água na lagoa Maringá, Serra, ES

Variável Equipamento/Método/Referência

Temperatura do ar (ºC) Sonda Horiba U-50

Temperatura da água (ºC) Sonda Horiba U-50

Oxigênio dissolvido (mg.l-1) Sonda Horiba U-50

Condutividade elétrica (µS.cm-1) Sonda Horiba U-50

Turbidez (UNT) Sonda Horiba U-50

pH Sonda Horiba U-50

Amostragem qualitativa do fitoplâncton Arrasto superficial com rede de 20 μm

Amostragem quantitativa do fitoplâncton Garrafa de Van Dorn, fixação com lugol acético

Clorofila a (µg.L-1) Filtração em campo e extração com acetona 90% (LORENZEN, 1967)

Taxonomia do fitoplâncton Análise populacional em microscópio NIKON Eclipse E-200

Densidade do fitoplâncton Sedimentação em câmaras (UTERMÖHL, 1958) e contagem em campos aleatórios em microscópio invertido Nikon TS-100F; cálculo da densidade - LUND et al. (1958)

Diversidade do fitoplâncton Índice de SHANNON & WEAVER (1949)

ResuLtADOs e DisCussãO

A lagoa Maringá é um ecossistema lêntico raso, sujeito à ação dos ventos costeiros, predominantes do quadrante nordeste. Apresenta baixa profundidade (> 2m) e, possivelmente, um padrão de funcionamento do tipo “dinâmico” (BOZELLI et al., 1992), cujas características são ausência de estratificação térmica duradoura, produtividade elevada, alta taxa de reciclagem de nutrientes e presença de grandes áreas de macrófitas aquáticas emersas.

Os dados climáticos demonstraram que 2010 foi um ano atípico, sob a influência do El Niño, pois a pluviosidade, nos meses estudados (Figura 2), foi o dobro das médias históricas registradas entre 1948 e 2001 (DELAZARI-BARROSO et al., 2009). Apesar disso, os dados físico-químicos refletiram o padrão das épocas chuvosa e seca, característico das regiões tropicais.

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 7-22 | 2011

Figura 2 − Valores de pluviosidade (barras) do ano de 2010 e temperatura do ar (•) nos dois meses estudados, na lagoa Maringá, serra, es

400

350

300

250

200

150

100

50

0

29

27

25

23

21

19

17

15

Pluv

iosi

dade

(mm

)

Tem

pera

tura

do

ar (º

C)

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

Em março, mês mais chuvoso e mais quente, a lagoa, com 1,8m de profundidade, apresentou estratifi-cação térmica nos dois pontos amostrais, com 3,5 º C de diferença entre superfície e fundo (Figura 3). Como é um sistema raso, provavelmente a estratificação não é duradoura e pode haver circulação da coluna d’água no período noturno, devido à influência dos ventos costeiros, como observado em lagoas costeiras do Rio de Janeiro (ESTEVES et al., 1984) e do Rio Grande do Sul (BECKER, 2002; CARDOSO; MARQUES, 2004). Nessa época, a lagoa apresentou menor transparência da água (Tabela 2), com a zona eufótica alcançando 61% da coluna d’água, pH ácido (Figura 4-a), menor concentração de oxigênio dissolvido (Figura 4-b) e valores mais elevados de turbidez e condutividade, principalmente no fundo da coluna d’água (Figura 4-c e d). Características semelhantes foram encontradas na lagoa Mãe-bá, litoral sul do Espírito Santo, por Souza e Fernandes (2009), também na época chuvosa. Em julho de 2010, a profundidade foi reduzida para 0,8m, houve aumento na transparência (Figura 3), redução na turbidez (Figura 4-c) e a zona eufótica atingiu o fundo. O pH esteve próximo ao neutro, com o máximo de 7,5 (Figura 4-a), e a condutividade elétrica foi mais elevada, com valores acima de 400 μS/cm-1 nos dois pontos amostrais (Figura 4-d).

Figura 3 − Perfis térmicos e profundidade do disco de Secchi (m) na coluna d’água nos dois pontos amostrais na lagoa Maringá, serra, es, nos meses de março e julho de 2010

0

0,5

1

1,5

2

Prof

undi

dade

(mm

)

10 20 30 40

Disco de SecchiMarço Disco de Secchi

Julho

Temperatura da água (º C)

P1 Março

P2 Março

P1 Julho

P2 Julho

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 7-22 | 2011

Tabela 2 − Parâmetros físico-químicos e biológicos analisados na lagoa Maringá, Serra, ES, em março e julho de 2010

Parâmetros Março JulhoMín.-Máx. Média DP Mín.-Máx. Média DP n

Profundidade (m) 1,8 - - 0,8 - - 2

Transparência (m) 0,4 - - 0,7 - - 2

Zona eufótica (m) 1,1 - - 0,8 - - 2

Temperatura da água (ºC) 25,6-28,9 27,31 1,10 21,7-23,8 23,1 0,78 8

Turbidez (UNT) 13,4-31,7 27,4 8,4 5,6-9,9 7,9 2,1 8

Oxigênio dissolvido (mg.l-1) 1,1-7,9 4,4 3,2 3,4-4,8 4,3 0,7 8

pH 3,3-4,2 3,4 0,8 7,1-7,5 7,3 0,2 8

Condutividade elétrica (μS.cm-1) 116-143 128,7 12,8 429-439 433,7 5,5 8

Clorofila a (µg.l-1) 13,9-39,1 25,8 10,6 16,7-125,5 50,2 51,6 8

Densidade fitoplanctônica 3.414-29.789 14.742 11.017 2.997-15.671 10.207 6.195 8

Diversidade 0,2-1,4 1,0 0,5 0,6-1,6 1,2 0,5 8

Equitabilidade 0,1-0,3 0,3 0,1 0,1-0,4 0,3 0,1 8Obs.: DP = Desvio Padrão; n = número de amostras nos dois meses estudados.

Figura 4 − Valores da pH (a), oxigênio dissolvido (b), turbidez (c) e condutividade elétrica (d) nos dois pontos amostrais na lagoa Maringá, serra, es, nos meses de março e julho de 2010

0

0,5

1

1,5

2

Prof

undi

dade

(m)

a - pH

b - Oxigênio dissolvido (mg.l-1)

c - Turbidez (UNT)

d - Condutividade elétrica (μS.cm-1)

0 2 4 6 8 10 0 10 20 30 40

0 2 4 6 8 10

P1 Março P2 Março P1 Julho P2 Julho

0

0,5

1

1,5

2Prof

undi

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(mm

)

0

0,5

1

1,5

2

Prof

undi

dade

(m)

0 100 200 300 400 500

0

0,5

1

1,5

2

Prof

undi

dade

(m)

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Análises de parâmetros, como temperatura, oxigênio dissolvido, pH, alcalinidade, condutividade e clorofila a em lagoas costeiras do Rio de Janeiro (ESTEVES et al., 1988) e do Rio Grande do Sul (CARDOSO, 2001; CARDOSO; MARQUES, 2004) mostraram ciclos diários mais pronunciados que as variações sazonais. Variações diárias nos parâmetros físico-químicos são comuns em lagoas costeiras, pois a profundidade reduzida, em geral, torna esses ecossistemas suscetíveis às oscilações climáticas, prin-cipalmente o regime de ventos (KENNISH; PEARL, 2010).

Grandes variações de pH e de condutividade, como observado neste estudo, podem ser comuns em lagoas costeiras, devido à presença de carbonatos e bicarbonatos na água, decorrente da influência marinha (SMITH, 1994). Variações de pH entre 5,2 e 8,2 já foram registradas em lagoas da planície de “Tabuleiros” do baixo rio Doce, no Espírito Santo (BOZELLI et al., 1992) e amplitudes ainda maiores (4,4 – 9,7) foram encontradas por Esteves et al. (1984) em lagoas costeiras do Rio de Janeiro.

A comunidade fitoplanctônica da lagoa Maringá esteve composta por 50 táxons com predomínio florís-tico de clorofíceas (Chlorophyceae – 54 %), euglenofíceas (Euglenophyceae – 28 %) e cianobactérias (Cyanophyceae – 12 %). A contribuição restante contou com a classe Bacillariophyceae (5%) e um fitoflagelado não identificado (2%). A classificação taxonômica está listada a seguir.

DiVisãO CYANOBACteRiA

CLASSE CYANOPHYCEAE

ORDEM CHROOCOCCALES

FAMÍLIA MERISMOPEDIACEAE Aphanocapsa delicatissima West & West Synechocystis aquatilis Sauvageau

FAMÍLIA CHROOCOCCACEAE Chroococcus aphanocapsoides Skuja Chroococcus minimus (Keissler) Lemmermann Chroococcus sp.

ORDEM OSCILLATORIALES

FAMÍLIA PSEUDANABAENACEAE Pseudanabaena sp.

DiVisãO CHLOROPHYtA

CLASSE CHLOROPHYCEAE

ORDEM CHLOROCOCCALES

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FAMÍLIA CHLORELACEAE Monoraphidium arcuatum (Korsikov) Hindak Monoraphidium griffithii (Berkeley) Komárková-Legnerová Monoraphidium minutum (Nägeli) Komárková-Legnerová Monoraphidium sp.

FAMÍLIA CHLOROCOCCACEAE Tetraedron triangulare Korschikov

FAMÍLIA MICRACTINIACEAE Micractinium pusillum Fresenius Golenkinia radiata Chodat

FAMÍLIA OOCYSTACEAE Ankistrodesmus fusiformis Corda Ankistrodesmus gracilis (Reich) Korsikov Chlorella sp. 1 Chlorella sp. 2 Kirchneriella sp. Nephrocytium agardhianum Nägeli Nephrocytium sp.

FAMÍLIA SCENEDESMACEAE Coronastrum cf. anglicum Crucigenia tetrapedia (Kirchner) West & G. S. West Crucigenia sp. Desmodesmus quadricauda (Turpin) Brébisson Didymocystis cf. bicellulares Scenedesmus acuminatus (Lagerheim) Chodat Scenedesmus bicaudatus (Hansgirg) Chodat Scenedesmus ecornis (Ehrenberg) Chodat Scenedesmus javanensis Chodat Scenedesmus sp. 1 Scenedesmus sp. 2

FAMÍLIA RADIOCOCCACEAE Coenochloris sp.

ORDEM VOLVOCALES

FAMÍLIA CHLAMYDOMONADACEAE Chlamydomonas sp.

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DiVisãO euGLeNOPHYtA

CLASSE EUGLENOPHYCEAE

ORDEM EUGLENALES

FAMÍLIA EUGLENACEAE Euglena acus Ehrenberg Lepocinclis ovum Perty Lepocinclis sp. Monomorphina pyrum (Ehrenberg) Mereschkowsky Phacus contortus Bourrely Phacus curvicauda Swirenko Phacus hamatus Pochmann Phacus longicauda (Ehrenberg) Dujardin Phacus cf. polytrophos Phacus sp. Strombomonas sp. Trachelomonas armata (Ehrenberg) Stein Trachelomonas volvocina Ehrenberg Trachelomonas sp.

DiVisãO HeteROKONtOPHYtA

CLASSE BACILLARIOPHYCEAE

ORDEM CENTRALES

FAMÍLIA THALASSIOSIRACEAE Aulacoseira cf. herzogii

ORDEM FRAGILARIALES

FAMÍLIA FRAGILARIACEAE Fragilaria sp.

O predomínio florístico de clorofíceas e cianobactérias já foi registrado em lagoas costeiras no Espírito Santo (HUSZAR et al., 1990; SOUZA; FERNANDES, 2009) e no Brasil (HUSZAR; ESTEVES, 1988; HUSZAR; SILVA, 1992; LAUDARES-SILVA, 1999), porém a riqueza de euglenofíceas nesses ambientes é baixa. Muitas euglenofíceas encontradas na lagoa Maringá, como Lepocinclis, Euglena, Trachelomonas, Strombomonas e Phacus, indicam eutrofia do ambiente (XAVIER, 1988). São indicadoras de ambientes ricos em matéria orgânica proveniente do desenvolvimento excessivo de macrófitas aquáticas e/ou do lançamento de efluentes sem tratamento (TERREL; PERFETTI, 1996). Dentre as clorofíceas, os gêne-ros Ankistrodesmus e Scenedesmus são apontados por Palmer (1977) como bioindicadores de águas

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eutrofizadas que recebem descargas de esgotos, pois são algas oportunistas e desenvolvem-se bem em condições extremas, principalmente em ambientes eutróficos (HAPPEY-WOOD, 1988).

O aporte contínuo de nutrientes, oriundos da decomposição de macrófitas aquáticas e de lançamentos de efluentes não tratados, favorece o crescimento do fitoplâncton, resultando em elevada biomassa, refletida pelas concentrações de clorofila e pela modificação na estrutura da comunidade (SMITH, 1997; REYNOLDS, 2006). Nesse estudo, a concentração de clorofila a foi, em média, 23 vezes maior que as concentrações encontradas nas lagoas de “Tabuleiro” do baixo rio Doce (média de 1,7 µg.L-1 – BOZELLI et al., 1992). Esses autores encontraram maiores concentrações de clorofila a na lagoa do Meio (máximo de 25,8 µg.L-1) e atribuíram à eutrofização artificial.

As concentrações de clorofila foram elevadas nos dois meses estudados (Figura 5). Em março, a Zmix foi maior que a Zeu, possibilitando a manutenção do fitoplâncton na porção iluminada da coluna d’água (REYNOLDS, 2006). Em julho, embora com profundidade menor, a Zeu alcançou o fundo, em função da redução na turbidez. Razões Zeu/Zmix positivas indicam não haver limitação por luz ao fitoplâncton (JENSEN et al., 1994), como observado na lagoa Maringá. Cardoso e Marques (2004) mostraram a ocorrência de um ciclo diurno de clorofila na lagoa do Peri, Santa Catarina, com concentrações mais elevadas no período entre 10 e 14 horas. Esse efeito cíclico foi mais pronunciado na estação chuvosa, e os autores o relacionaram positivamente às variações diárias na temperatura, pH e oxigênio dissolvido.

Figura 5 − Concentrações de clorofila a nos dois pontos amostrais estudados na lagoa Maringá, Serra, ES, nos meses de março e julho de 2010 (Sup. = subsuperfície)

140

120

100

80

60

40

20

0

Ponto 1

Ponto 2140

120

100

80

60

40

20

0

Clo

rofil

a a

(μg.

l-1)

Clo

rofil

a a

(μg .

l-1)

Março-Sup. Fundo Julho-Sup. Fundo

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As cianobactérias apresentaram baixa riqueza de espécies, porém foram dominantes em densidade (Figura 6) em todas as amostras analisadas. As densidades foram mais elevadas em março, com um máximo de 1,9 x 104 ind.ml-1 na superfície do ponto 1, representando 65,9 % do fitoplâncton total. Syne-chocystis aquatilis (76%) foi a espécie dominante em todas as amostras analisadas. Foram detectadas florações dessa cianobactéria (densidade acima de 104 - SMAYDA, 1997), no ponto 1, nas duas amos-tragens, com exceção da superfície, em julho.

Figura 6 − Densidade das classes fitoplanctônicas nos dois pontos amostrais estudados na lagoa Maringá, Serra, ES, nos meses de março e julho de 2010 (Sup. = subsuperfície)

3,E+04

2,E+04

2,E+04

1,E+04

5,E+03

0,E+00

3,E+04

2,E+04

2,E+04

1,E+04

5,E+03

0,E+00

Ponto 1

Ponto 2

Den

sida

de (i

nd.m

l-1)

Den

sida

de (i

nd.m

l-1)

Março-Sup. Fundo Julho-Sup. Fundo

Cyanophyceae Chlorophyceae Euglenophyceae Bacillariophyceae

As concentrações de clorofila a foram maiores nos eventos de floração, refletindo as elevadas densida-des de S. aquatilis. No ponto 2, a floração foi registrada em julho, na superfície, refletindo a biomassa elevada (125,5 µg.L-1 de clorofila a), porém deve-se considerar a influência do estande de macrófitas nesse ponto amostral. Canfield Jr. et al. (1984), analisando dados de 32 lagos na Flórida, EUA, obser-varam que as concentrações de clorofila aumentam quando diminui a percentagem do volume total do lago coberto com macrófitas, e associaram à decomposição das macrófitas que libera clorofila na água.

Ambientes eutrofizados com crescimento excessivo de macrófitas e predominância de poucas espécies em situações com florações fitoplanctônicas apresentam baixa riqueza e diversidade (MARGALEF, 1983; REYNOLDS, 2006), como encontrado na lagoa Maringá (diversidade > 2 bits.ind.-1 – Figura 7). A baixa riqueza encontrada e a dominância de cianobactérias resultaram em baixa diversidade. Huszar e Silva (1992), estudando o fitoplâncton de quatro lagoas costeiras no Rio de Janeiro, encontraram diversidade maior na época de chuvas (3,6-3,8 bits.ind.-1) e menor na época seca (1,2-1,4 bits.ind.-1). Nesse estudo,

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os valores foram baixos nas duas épocas estudadas, porém, na época chuvosa (março), foi observada maior variação vertical na diversidade, refletindo a estratificação térmica e química observada.

Figura 7 − Valores de diversidade do fitoplâncton nos dois pontos amostrais estudados na lagoa Maringá, serra, es, nos meses de março e julho de 2010

Ponto 1

Ponto 22

1,81,61,41,2

10,80,60,40,2

0

21,81,61,41,2

10,80,60,40,2

0

Div

ersi

dade

(bits

.ind.

-1)

Div

ersi

dade

(bits

.ind.

-1)

Março-Sup. Fundo Julho-Sup. Fundo

Os parâmetros físico-químicos analisados na lagoa Maringá (médias entre os pontos amostrais para cada mês estudado) permitiram enquadrá-la como classe 2 ou 3 da Resolução Conama 357/05, depen-dendo do parâmetro de qualidade analisado e do mês amostrado (Quadro 1). Somente a densidade de cianobactérias se enquadrou na classe especial (até 20.000 cél./ml), permitindo o uso das águas da lagoa Maringá para fins mais nobres, como abastecimento doméstico, apenas necessitando de desin-fecção. Porém, nesse caso, faz-se necessário o monitoramento semanal de cianobactérias (Portaria nº 518/04 – MS).

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Quadro 1 − Enquadramento nas classes de uso da água (Resolução CONAMA 357/05), das amostras de água analisadas em março e julho de 2010, na lagoa Maringá, serra, es

Parâmetros Março Julho Classe 2 Classe 3

OD (mg.l-1) 4,4 4,3 Mín. 5,0 Mín. 4,0

pH 3,1 7,3 6,0 a 9,0 6,0 a 9,0

Turbidez (UNT) 22,5 7,9 Até 100 Até 100

Condutividade (µS.cm-1) 128,7 433,7 - -

Clorofila a (µg.l-1) 23,7 45,3 Até 30 Até 60

Cianobactérias (cél.ml-1) 10.347 8.674 Até 50.000 Até 100.000

Os resultados encontrados na lagoa Maringá evidenciam sinais de eutrofização derivados do aporte de matéria orgânica oriundos da decomposição de macrófitas aquáticas e também do lançamento de esgotos não tratados dos bairros adjacentes à lagoa. Para a manutenção da qualidade da água e pre-servação da biodiversidade local, é necessário um controle do crescimento das macrófitas aquáticas, com retirada periódica de parte da biomassa, para que seja minimizada a entrada de nutrientes vindos da decomposição da matéria orgânica autóctone. A ocorrência de florações fitoplanctônicas que com-prometem a qualidade da água e seus usos representa uma resposta à entrada de nutrientes ou de fontes antrópicas, como o derramamento de esgotos não tratados, ou de fontes naturais, como a matéria orgânica resultante da elevada produtividade primária no sistema (WETZEL, 2001).

AGRADeCiMeNtOs

Os autores agradecem à Coordenação de Extensão e Pesquisa da AEV-FAESA pelo apoio financeiro.

Apoio financeiro: COEPE-FAESA

RefeRÊNCiAs

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Enviado em março de 2011Aceito em outubro de 2011

Correspondência para/ Reprint request to:Prof. Dra. Alessandra Delazari-BarrosoNúcleo de Pesquisas Ambientais – FaesaRodovia Serafim Derenzi, 3115, São Pedro, Campus II – FAESA – Vitória – ES CEP: 29032-060

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 23-30 | 2011

BReVe ANáLise sOBRe O suRGiMeNtO, O PReCONCeitO e O RituAL DA ReLiGiãO uMBANDA

SHORT ANALYSIS OF THE EMERGENCE, THE PREJUDICE AND THE RITUAL OF RELIGION UMBANDA

ALINE FADLALAH1

HOZANA FRAISLEBEN1

NATALIA BOURGUIGNON1

issue DOi:10.5008/1809.7367.040

ResuMO

A Umbanda é uma religião relativamente recente. Desde o seu surgimento, foi proibida e até hoje sofre com os rótulos negativos criados pela sociedade. Este artigo procura expor o que é a Umbanda e explicar por que essa religião ainda tão recente sofre tanto preconceito. Foram entrevistados quatro umbandistas e visitados três terreiros localizados em Vila Velha: Tenda Umbandista Estrela dos Obreiros de Oxalá, Grupo Fraternidade Luz do Caminho e Tenda Umbandista Estrela-Guia. Os métodos utilizados para a realização do artigo foram a pesquisa bibliográfica e a observação participante

Palavras-chave: Umbanda. Religião. Preconceito.

ABstRACt

Umbanda is a relatively new religion. It was forbidden since its advent and even today suffers with the negative image created by society. This article seeks to expose what is Umbanda and why, even being a recent religion, it suffers so much prejudice. To do so, four Umbandists were interviewd and we also visited three Terreiros (place where the rithuals taks place), located in Vila Velha: Tenda Umbandista Estrela dos Obreiros de Oxalá, Grupo Fraternidade Luz do Caminho e Tenda Umbandista Estrela Guia. The methods used to make the article were the bibliographic research and participative observation.

Keywords: Umbanda. Religion. Prejudice.

ORiGeM

Muito se fala sobre as verdadeiras raízes da Umbanda. Para o doutor em Antropologia e especialista em Cultura e Religiosidade Afro-Brasileira, Vagner Gonçalves da Silva (2007), ao que tudo indica, ela teve início nas primeiras décadas do século XX, a partir da junção de religiões africanas, indígenas e do es-piritismo. Os primeiros terreiros apareceram na década de 20, fundados por Zélio Fernandino de Morais.

1 Jornalista - Faculdades Integradas Espírito-Santenses (Faesa).

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Zélio nasceu em família de classe média do Rio de Janeiro e começou a sofrer “ataques” repentinos com 17 anos. A família, depois de interná-lo em um hospício e até levá-lo a sessões de exorcismo, procurou ajuda na Federação kardecista de Niterói. Lá, Zélio incorporou um “Caboclo das sete encru-zilhadas”, que o orientou a fundar uma nova igreja com o nome de “Tenda Nossa Senhora da Piedade” (BONATTO, 2008, p.72).

A tenda era frequentada por curiosos e médiuns vindos do Kardecismo, do Candomblé e de diversas outras religiões, que incorporaram à Umbanda alguns dos rituais que já existiam em suas antigas re-ligiões. Muitos desses médiuns, insatisfeitos com os caminhos que a tenda tomava, montaram outras tendas com diferentes rituais (BONATTO, 2008). Segundo Vagner da Silva (2007), é provavelmente por isso que, ainda hoje, não existe um ritual unificado na Umbanda.

Rubem Saraceni dirige um terreiro em São Paulo e é autor de livros sobre a Umbanda e suas entidades. Ele defende que, na Umbanda, não há uma hierarquia uniforme, mas sim muitas hierarquias.

Cada sacerdote que fundou seu terreiro tem referências diferentes sobre espiritualidade, geralmente vindas de outras religiões ou crenças. Para Vagner da Silva (2007), por causa da sua origem banta, que constitui um grupo etnolinguístico que engloba cerca de 400 subgrupos étnicos diferentes, a Umbanda tem a característica de ser uma religião aberta à incorporação de influências locais e de outras crenças.

Hoje todas as culturas são de fronteira. Todas as artes se desenvolvem com relação a outras artes: o artesanato migra do campo para a cidade, os filmes, os vídeos e as canções que narram os acontecimentos de um povo são intercambiados com outros. Assim as culturas perdem a relação exclusiva com seu território, mas ganham em comunicação e conhecimento (CanCLini, 1998, p. 34).

eNtiDADes

Nos centros, os médiuns, intitulados de “cavalos”, incorporam entidades cultuadas como espíritos de mortos e possibilitam que estes venham à Terra para trabalhar nos terreiros.

O transe na umbanda não é considerado nem estritamente individual (como no kardecismo) nem propriamente representação mítica (como no caso do candomblé), mas atualizações de fragmentos de uma história mais recente por meio de personagens tais como foram conservados na memória popular brasileira (BARROS, 2010, p. 8).

A Umbanda é composta de sete linhas de trabalhos espirituias. Rubem Saraceni, em seu terreiro, Pai Benedito de Aruanda, aplica a teoria de que cada uma das sete linhas de irradiação está manifestada em um desses graus: Caboclo, Preto-Velho, Baiano, Marinheiro, Criança (Erê), Exu e Pomba- Gira.

De acordo com Vagner da Silva, cada linha é dirigida por um Orixá principal. Abaixo dos Orixás, esta-riam os Pretos-Velhos e Caboclos e, mais abaixo, os Exus e Pomba-Giras. Eles seguiriam a ordem de elevação espiritual proposta pelo Kardecismo: quanto mais evoluído o espírito, mais luz ele tem e mais distante do plano carnal ele está (SILVA, 2007).

Para definir melhor as principais entidades manifestadas nos terreiros de Umbanda, vamos utilizar os conceitos do antropólogo e pesquisador das religiões afro-brasileiras Vagner da Silva, que descreve as características de algumas das entidades.

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Os Caboclos representam os índios brasileiros, os ‘donos da terra’. Quando baixam nos ter-reiros usam cocar de penas, dançam, fumam charutos e bebem cerveja ou vinho. Geralmente falam em Português antigo ou em uma língua incompreensível que seria sua língua nativa. Uma variação do Caboclo é o Boiadeiro, que também representa a imagem do nativo brasileiro (siLva, 2007, p. 40).

O Preto-Velho, quando incorporado em um médium, mostra-se como espírito de negros escravos idosos. Por essa razão, geralmente andam curvados e com as mãos nas costas. Eles bebem café preto, fumam cigarro de palha e são conhecidos por combater doenças e afastar energias negativas.

Abaixo dessas entidades em elevação espiritual estão os Exus. Eles são considerados guardiões dos terreiros. Por não serem tão iluminados, estão mais “presos à carne”, mais próximos do mundo carnal e, portanto, mais familiarizados com as paixões humanas, como a raiva, a inveja e a luxúria.

O MitO DO eXu

Os Exus foram assim demonizados pelo Cristianismo na época da colonização e isso lhes rendeu um estigma ruim que se revela em sua imagem atual: corpo vermelho, chifres e tridente. Quando ele baixa no terreiro, fala com voz grossa, dá gargalhada e usa expressões de baixo calão. A Pomba-Gira, grosso modo, é a versão feminina do Exu e geralmente se apresenta como prostituta.

Durante a pesquisa e as entrevistas feitas para o artigo, o que percebemos sobre a definição do Exu é uma ideia totalmente contrária à demonização criada pela sociedade. Os Exus e Pomba- Giras estão mais próximos de nós, por estarem mais próximos no mundo carnal e familiarizados com as nossas paixões, por isso alguns umbandistas dizem que eles falam a mesma língua que nós.

Segundo Reginaldo Prandi, é comum as pessoas procurarem os Exus e as Pomba-Giras para solucionar problemas relacionados com fracassos e desejos da vida amorosa e da sexualidade, além de inúmeros outros que envolvem situações de aflição.

Estudar os cultos da Pomba-gira permite-nos entender algo das aspirações e frustrações de largas parcelas da população que estão muito distantes de um código de ética e moralidade embasado em valores da tradição ocidental cristã. Pois para Dona Pomba-gira qualquer desejo pode ser atendido: não há limites para a fantasia humana (PRANDI, 1996, p. 140).

Deusalina Bitencourt, que recebe a entidade-chefe do terreiro Grupo Fraternidade Luz do Caminho, localizado na Barra do Jucu, Vila Velha, considera que Exu é mal interpretado e o vê como o grande guardião da Umbanda: “Acho que os Exus são como a vida. A gente precisa de alguém para limpar o nosso lixo” (BITENCOURT, 2010). A antropóloga e umbandista Ana Cristina Givigi acredita que, quan-do se fala em preconceito contra Exu, fala-se de preconceito com o próprio ser humano, porque “Ele representa aquilo que nós temos dentro de nós muito humano, muito energeticamente negativo, ligado à Terra” (GIVIGI, 2010).

Percebemos, a partir das entrevistas e do contato que tivemos com a religião, que o Exu e a Pomba-Gira nada mais são que entidades como as outras e que exercem um papel de guardiões. Lísias Negrão explica isso. Para ela, os umbandistas não se importam com a forma de agir da entidade ou de onde ela veio, mas sim com a eficácia de seus aconselhamentos.

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Não importa que sejam eles sérios como os caboclos, dóceis como os pretos-velhos, inocentes e bem humorados como as crianças, assustadores como os exus, desbocados e folgazões como os baianos, ébrios como os marinheiros e zés-pilintras ou mesmo sensuais e provocantes como as pomba-giras. O importante é sua eficácia, não a qualidade moral do guia ou de seu aconselhamento (NEGRÃO, 1993, p. 115).

ReLiGiãO BRAsiLeiRA

A forma como a Umbanda se relaciona com seus praticantes diz muito sobre a maneira como o povo brasileiro lida com suas questões espirituais. “Somos fiéis devotos de santos e também cavalos de santo de orixás, e com cada um deles nos entendemos muito bem” (DAMATTA, 1998, p.115). Essas experiências religiosas são complementares entre si e nunca excludentes.

Pedro Oliveira (1977, p. 561) explica que, quando o indivíduo circula livremente entre diferentes agências religiosas, ele supre-se de bens religiosos para suas necessidades cotidianas: “ É o caso de muitas pes-soas que são devotas de Nossa Senhora Aparecida, mas que não perdem a crença de um missionário petencostal e que freqüentam regularmente um terreiro em busca de proteção contra os males da vida”.

Para Prandi, “[...] até hoje o catolicismo é uma máscara usada nas religiões afro-brasileiras, máscara que evidentemente as esconde também dos recenseamentos” (PRANDI, apud TOGNOLLI, 2007, p.1). Segundo Pedro Oliveira (1977) “[...] religião declarada não é a religião praticada e muitos boletins são incorretamente preenchidos ou mesmo os dados são irreais” .

No censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (apud, TOGNOLLI, 2007), no ano 2000, por exemplo, apenas 0,3% da população se declararam seguidores das religiões consideradas tradicionais africanas, nas quais se encaixam na pesquisa o Candomblé e a Umbanda.

Quando entenderem o que a Umbanda faz, entenderão porque não adota a conversão. Quem precisa ser ajudado que venha, depois volte para a sua igreja, não tem problema. A Umbanda, diferente de outras religiões, não faz conversão (SARACENI, 2008, apud, BONATTO, 2008, p. 74).

Terezinha dos Santos (2010), médium que recebe a chefia espiritual do Terreiro Tenda Umbandista Estrela-Guia, localizado em Vila Velha, compara a escolha de se participar de uma religião com a vida, que para ela é um livre arbítrio. “Não falo que você tem que ir pro centro. Não faço a cabeça de ninguém, cada um faz o que tem vontade” (SANTOS, 2010).

A umbandista Ana Cristina Givigi (2010) vê a religião como uma síntese cósmica, ordenada pelo plano astral para receber qualquer espírito. “Seria incoerente se uma religião ordenada pelo plano astral fizes-se evangelismo, a umbanda quer ser reconhecida para ser respeitada, não para encher os terreiros” .

O estranho?

Muitos acham que a Umbanda é uma religião afro-brasileira, assim como o censo do IBGE, que a delimita como uma religião tradicional africana. Porém, ela é genuinamente brasileira com algumas influências de religiões africanas, trazidas para o Brasil pelos escravos e já proibidas desde sua chegada.

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Enquanto os adeptos das religiosidades mais africanizadas buscavam legitimar suas práticas exaltando a pureza das tradições nagô os líderes do ‘movimento umbandista’ fizeram questão de apresentá-la como uma religião brasileira. Acreditamos que o caráter nacionalista atribuído à umbanda fazia parte de um conjunto de estratégias de legitimação que incluíam também a institucionalização da nova religião e a adoção de um discurso evolucionista, no qual a população brasileira era o resultado de um encontro singular entre índios, brancos e negros (OLIVEIRA, 2009, p. 60).

Devido ao preconceito e à proibição, os terreiros apareceram primeiro na periferia urbana, onde os escravos tinham maior liberdade de movimento.

Os Vodus e Orixás foram justapostos com os santos católicos e o interior dos terreiros possuíam numerosos elementos católicos, incluindo estátuas de santos, enquanto os objetos religiosos africanos eram escondidos. As religiões afro-brasileiras eram proibidas, e os terreiros eram freqüentemente visitados pela polícia (JENSEN, 2001, p. 3).

Mesmo com a abolição da escravatura e a separação da Igreja do Estado, a República ainda proibia o espiritismo. A elite branca via os negros como uma desgraça ao caráter nacional. O Kardecismo no Brasil surgiu abraçado pela classe média branca, com a participação de governantes. A religião fundada por Allan Kardec era menos estigmatizada do que as religiões afro-brasileiras.

O governo republicano continuou perseguindo as organizações espíritas por causa da prática ilegal da medicina, mas apesar disso, muitos governadores estavam envolvidos com o movi-mento kardecista que era menos estigmatizado que o Espiritismo Afro-brasileiro. Foi introduzida uma distinção entre baixo espiritismo que era relacionado com as religiões afro-brasileiras e a população negra do setor mais baixo e o alto espiritismo que estava relacionado ao Espiritismo Kardecista e a população branca dos setores mais altos (NEGRÃO, apud JENSEN, 2001, p. 4).

O Código Penal de 1890 não considerava o espiritismo como religião e o tornou caso de polícia. Não interessava se o indivíduo era kardecista ou umbandista, praticar espiritismo era um crime punido com detenção de um a seis meses. O art. 157 também previa multa de até 500 mil réis (ARRIBAS, 2008). Em 1930, na época do Estado Novo no Brasil, havia forte repressão policial contra as religiões afro--brasileiras. Nessa época, vários terreiros foram fechados e seus líderes, punidos. Isso fez com que os frequentadores buscassem lugares mais afastados para estabelecer os terreiros.

Numa tentativa de acabar com o “baixo espiritismo”, o governo Vargas implantou uma lei que estabele-cia que os terreiros espíritas (Kardecistas) deveriam ter um alvará de funcionamento concedido pelas delegacias de polícia. Para conseguir o alvará, os umbandistas se declaravam como espíritas, que eram vistos como do “alto espiritismo” (SAMPAIO, 2007). A necessidade de excluir e isolar o que eles achavam “estranho” é bem exposta por Zygmunt Bauman (1998, p. 28-29):

Aniquilar os estranhos devorando-os e depois metabolicamente, transformando-os num tecido indistinguível do que já havia. Era esta a estratégia da assimilação: tornar a diferença semelhan-te: abafar as distinções culturais ou lingüísticas: proibir todas as tradições e lealdades, exceto as destinadas a alimentar a conformidade com a ordem nova e que tudo abarca: promover e reforçar uma medida e só uma, para a conformidade.

Por todos esses fatores, o preconceito em relação à Umbanda advém de um preconceito histórico, social e cultural. Givigi (2010) acredita que:

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Pela umbanda ser uma religião praticada originalmente por negros, faz com que o preconceito se avolume, por conta do terrível racismo brasileiro, vestido de miscigenação [...]. O preconcei-to em relação à Umbanda é um preconceito social, que é transposto para a religião, e aí vira uma lambança. Que é falta de entendimento, uma perversidade de discriminação transposta para a religião, com incapacidade de compreensão, falta de entendimento, muitas vezes des-conhecimento.

A religião Umbanda não se encaixa nos padrões descritos pelas religiões dominantes na sociedade. Ela é híbrida e, segundo DaMatta (1998), não tem um ritual unificado. Possui uma teologia aberta a muitas variações. Esse seria mais um dos motivos de sua exclusão na sociedade e, consequentemente, na mídia.

Cada terreiro tem um ritual diferente. Alguns possuem imagens, guias, tambores, roupas coloridas ou brancas, utilizam bebidas e fumam. Todas essas características dependem da linha da chefia da casa. Portanto, é impossível estabelecer uma regra para cada um deles. O andamento das giras, por exemplo, acontece de acordo com as necessidades das pessoas que vão aos terreiros em busca de auxílio. Tam-bém não existe um padrão na utilização de pontos cantados e na ordem dos acontecimentos nas giras.

O fato de vivermos em uma sociedade pós-moderna que preza e busca sempre a pureza (BAUMAN, 1998) nos leva a rejeitar o “estranho”, aquilo que não é uma coisa nem outra, que não tem classificação. A Umbanda, por ser uma religião híbrida, encaixa-se nesse perfil.

Os estranhos exalaram incerteza onde a certeza e a clareza deviam ter imperado. Na ordem harmoniosa e racional prestes a ser constituída não havia nenhum espaço – não poderia haver nenhum espaço – para os ‘nem uma coisa nem outra’, para os que se sentam escarranchados, para os cognitivamente ambivalentes (BAUMAN, 1998, p. 28).

Bauman explica esse preconceito como a busca da sociedade em excluir o “diferente”, “preservar a ordem” e a “pureza”. Para ele, a sujeira está ligada à desordem e a luta contra esta emerge como uma característica universal do seres humanos. Ser puro é ter um lugar certo no mundo, estar dentro da ordem.

Uma situação em que cada coisa se acha em seu justo lugar e em nenhum outro [...]. Há, porém, coisas para as quais o ‘lugar certo’ não foi reservado em qualquer fragmento da ordem preparada pelo homem. Elas ficam “fora do lugar” em toda a parte, isto é, em todos os lugares para os quais o modelo da pureza tem sido destinado. O mundo dos que procuram a pureza é simplesmente pequeno demais para acomodá-las. Ele não será suficiente para mudá-las para outro lugar: será preciso livrar-se delas uma vez por todas-queimá-las, envenená-las, despedaçá-las, passá-las a fio de espada (BAUMAN, 1998, p.14).

Nesse desejo de se preservar a “ordem” e a “pureza”, a sociedade pós- moderna tenta banir o “estranho”. “O umbandista quer ter direito ao seu emprego e dizer que é umbandista, quer ter direito a passar na rua e não ter os terreiros queimados [...]. Nós queremos ser respeitados constitucionalmente” (GIVIGI, 2010).

RefeRÊNCiAs

ARRIBAS, Célia da Graça. Afinal, espiritismo é religião? A doutrina espírita na formação da diversi-dade brasileira. 2008. 226 f. Dissertação (Mestrado em Sociologia)- Programa de Pós-Graduação do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8132/tde-05012009-171347/pt-br.php>. Acesso em: 8 jun. 2010.

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BARROS, Sulivan Charles. Sociabilidades míticas na umbanda: identidade étnica e consciência subal-terna. 2010. v. 443, p. 8. (Série Antropologia).

BAUNAM, Zygmunt. O mal-estar na pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

BITENCOURT, Deusalina Mattos. 2010. Entrevista concedida a Natalia Bourguignon. Vila Velha. 24 set. 2010.

BONATTO, Flora. Herdamos dos nossos antepassados africanos uma religião muito familiar. Caros Amigos, edição Os Negros, n. 3, p. 74-76, 2008.

BONATTO, Flora. Zélio incorporava espíritos, a família dizia que ele sofria “ataques”. Caros Amigos, edição Os Negros, n. 3, p. 72-73, 2008.

CANCLINI, Nestor Garcia. Culturas híbridas. 2. ed. São Paulo: Ed. Usp. 1998.

DAMATTA, Roberto. O que faz do Brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

GIVIGI, Ana Cristina. Documentário Umbanda. 2010. Entrevista concedida a Hozana Fraisleben, Vila Velha. 12 ago. 2010.

JENSEN, Tina Gudrun. Discursos sobre as religiões afro-brasileiras: da desafricanização para a reafricani-zação. Revista ReVeR, São Paulo, n. 1, 2001. Disponível em: <www.pucsp.br/rever/rv012001/p_jensen.pdf>. Acesso em: 26 mar. 2010.

NEGÃO, Lísias Nogueira. umbanda: entre a cruz e a encruzilhada. São Paulo: Templo Social, 1993.

OLIVEIRA, José Henrique Motta. Entre a Macumba e o Espiritismo: uma análise do discurso dos inte-lectuais de umbanda durante o Estado Novo. Revista Eletrônica de Ciências Sociais (CAOS), n. 14, 2009. Disponível em: <http://www.cchla.ufpb.br/caos/n14/3Entre%20a%20macumba%20e%20o%20espiritismo.pdf>. Acesso em: 14 ago. 2011.

OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro de. Coexistência das religiões no Brasil. Revista de Cultura Vozes, n. 7, p. 555-562, set. 1977.

PRANDI, Reginaldo. Herdeiras do axé. São Paulo: Hucitec. 1996.

SAMPAIO, Dilaine Soares. De fora do terreiro: o discurso católico e kardecista sobre a umbanda entre 1940 e 1965. 2007. 225 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Religião)- Programa de Pós-Graduação em Ciência e Religião, Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora. Disponível em: <http://www.bdtd.ufjf.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=196>. Acesso em: 9 out. 2010.

SILVA, Vagner Gonçalves. A criação da Umbanda. História Viva, edição Grandes Religiões, n. 6, p. 34-39, 2007.

SILVA, Vagner Gonçalves. Entidades de Luz. História Viva, edição Grandes Religiões, n. 6, p. 40-43, 2007.

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SILVA, Vagner Gonçalves. Arte religiosa afro-brasileira: as múltipas estéticas da devoção brasileira. 2008. Disponível em: <http://www.fflch.usp.br/da/vagner/arteafro.pdf>. Acesso em: 5 out. 2010.

SANTOS, Teresinha Serraz dos. Documentário Umbanda. 2010. Entrevista concedida a Hozana Frais-leben, Vila Velha. 04 set. 2010.

TOGNOLLI, Claudio Julio. A nova cara da Umbanda. Galileu, n. 195, out. 2007. Disponível em: <http://revistagalileu.globo.com/Revista/Galileu/0,,EDG79270-7942-195-1,00-A+NOVA+CARA+DA+UMBANDA.html>. Acesso em: 17 set. 2010.

Recebido em março de 2011Aprovado em outubro de 2011

Correspondência para/ Reprint request to:Aline [email protected]

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iDeNtifiCAÇãO De AsPeCtOs e iMPACtOs AMBieNtAis NA LAVANDeRiA De uM HOsPitAL PÚBLiCO eM VitÓRiA / es – BRAsiL

IDENTIFICATION OF ENVIRONMENTAL ASPECTS AND IMPACTS IN THE LAUNDRY OF A PUBLIC HOSPITAL IN VITÓRIA / ES – BRAZIL

KAJSA KISSELY SANTÓRIO1

RONAN NUNES MOULIN DE MORAES1

ANDRESSA CURTO MARQUES DESSAUNE2

issue DOi: 10.5008/1809.7367.041

ResuMO

Este estudo apresenta um projeto piloto desenvolvido na lavanderia de um hospital público localizado em Vitória/ES, visando à identificação de aspectos e impactos ambientais para a implementação futura de um sistema de gestão ambiental, em conformidade com a NBR ISO 14001:2004. Em agosto de 2010, iniciou-se a identificação das atividades existentes na lavanderia, bem como foram realizadas entrevistas com colaboradores para conhecer as atividades e os processos pertinentes à lavanderia. Foram elaborados fluxogramas de processos e de atividades e também planilhas de locais e de equi-pamentos, assim como se construiu sistemas de entradas e saídas para cada atividade. Os requisitos legais aplicáveis foram identificados a cada aspecto ambiental levantado, considerando-se os requisitos ambientais da NBR ISO 14001:2004.

Palavras-chave: Aspectos e impactos ambientais. Hospital.

ABstRACt

This study presents a pilot project developed in the laundry of a public hospital located in the city of Vitória-ES, aiming at identifying the environmental aspects and impacts for the future implementation of an environmental management system, in accordance with the NBR ISO 14001:2004. In August 2010, the identification of the laundry’s existence activities began, while interviews with the laundry’s staff members were carried out to understand the activities and processes pertaining to the laundry. The flow-charts of the processes and activities as well as spreadsheets of the sites and equipment were developed, while input and output systems for each activity were built. The legal requirements applicable to each environmental aspect raised were identified, considering the environmental requirements of the NBR ISO 14001: 2004.

Keywords: Environmental aspects and impacts. Hospital.

1 Graduando(a) em Engenharia Ambiental (Faesa).2 Graduada em Física; mestre em Engenharia Ambiental (Ufes); MBA Gerência de Projetos; docente do Curso de Engenharia

Ambiental (Faesa).

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iNtRODuÇãO

A partir da segunda metade do século XX, o mundo assistiu ao crescimento do número de organizações (públicas ou privadas) que desenvolviam atividades ou ofereciam produtos e/ou serviços potencialmen-te poluidores. Nesse mesmo período, a humanidade também assistiu às devastadoras e marcantes consequências ambientais provenientes de vários acidentes associados, especialmente, às atividades industriais nos mais variados setores. Esse legado histórico motivou discussões em âmbito mundial, que conduziram as organizações a estabelecer formas de gestão com objetivos explícitos de controle ou redução de seus impactos ambientais negativos associados às suas atividades, produtos e/ou serviços, bem como a repensar o uso dos recursos naturais.

Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), um número crescente de organiza-ções tem implementado seus sistemas de gestão ambiental (SGA) em conformidade com a NBR ISO 14001:2004, visando, notadamente, à obtenção de certificação. As motivações mais comuns para esse esforço são: a manutenção de sua posição competitiva no mercado – especialmente no caso de orga-nizações privadas –, bem como a possibilidade de responsabilização, nas esferas civil, administrativa e penal, daquelas organizações cujas atividades, produtos e/ou serviços causem danos ao meio ambiente e/ou à saúde humana.

Um SGA permite que uma organização empreenda esforços direcionados para controlar seus aspectos ambientais, possibilitando que as relações de causa (aspecto) e efeito (impacto) sejam adequadamente estabelecidas e conduzidas.

Nesse sentido, este trabalho apresenta os aspectos e impactos ambientais identificados na lavandeira de um hospital e sua a avaliação de significância preliminar como a primeira etapa executada na esteira do objetivo de implementação futura de um SGA no local.

MetODOLOGiA

Este estudo utilizou a pesquisa exploratória descritiva como metodologia, de acordo com o trabalho de Henkels (2002), no qual são identificados e avaliados os aspectos e impactos ambientais de uma or-ganização e priorizados aqueles que possam gerar impactos adversos significativos. Para tanto, foram rastreadas e analisadas todas as atividades e processos existentes na lavanderia. A partir dessa análise, foram realizados, nesta ordem: visitas à lavanderia, entrevistas com colaboradores, registro fotográfico, planilhas de locais e de equipamentos, fluxogramas para cada atividade, bem como análise de sistemas de entradas e saídas que nos permitiram obter dados para a formulação de uma matriz de aspectos e impactos ambientais com requisitos legais que refletissem a situação da lavanderia.

Embora o processo de implementação de SGA em conformidade com a NBR ISO 14001:2004 apresente os requisitos para elaboração de uma política ambiental antes mesmo de serem conhecidos os resultados da avaliação de impactos ambientais, optamos por elaborar a matriz de aspectos e impactos ambientais antes do estabelecimento da política ambiental em convergência com o que diz Seiffert (2009), pois, sem conhecer adequadamente os aspectos e impactos ambientais significativos associados às ativida-des, processos ou produtos de uma organização, “[...] corre-se o risco de elaborar políticas ambientais totalmente ‘abstratas’”.

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ResuLtADOs e DisCussãO

Um dos primeiros pontos abordados no método proposto por Henkels (2002), baseado principalmente na NBR ISO 14001:2004, está na seleção dos critérios utilizados pela organização para a identificação e posterior análise de significância de aspectos e impactos ambientais. É a partir do conhecimento dos aspectos e impactos que serão priorizadas ações no sentido de controlar ou reduzir as alterações ad-versas causadas no meio ambiente, que são decorrentes dos aspectos ambientais identificados.

Entre os critérios adotados, temos os técnicos, que são escolhidos de itens clássicos dos métodos de avaliação de risco, e os socioeconômicos (no caso deste estudo, utilizaremos, inicialmente, somente dois critérios: custos de correção e associação).

Critérios Técnicos

• Alcance (escala)

Tamanho da área atingida pelo impacto ambiental, relacionando com sua extensão em referência à organização.

Segundo a metodologia canadense, Programa ISOsoft, a subdivisão se dá em três categorias e es-cala de 1 (baixa) a 10 (alta). Contudo, devido à subjetividade que os intervalos conferem, pontuamos valores de 1 (um) a 3 (três), de acordo com o grau de significância (HENKELS, 2002), nos quais:

1 – restrita à propriedade; 2 – fora da propriedade, local; 3 – regional ou nacional.

• Gravidade (severidade)

Dano que o impacto ambiental causa ao meio ambiente.

Segundo a metodologia canadense, Programa ISOsoft, a subdivisão se dá em três categorias e es-cala de 1 (baixa) a 10 (alta). Contudo, devido à subjetividade que os intervalos conferem, pontuamos valores de 1 (um) a 3 (três), de acordo com o grau de significância (HENKELS, 2002), nos quais:

1 – pequeno dano; 2 – dano moderado; 3 – muito destrutivo ou perigoso.

• Probabilidade de ocorrência e frequência

A quantidade de vezes em que o impacto ocorre ao longo de um período observado é considerada a definição para frequência, que está associada a condições normais e anormais de operação. A pro-babilidade está relacionada com a chance de ocorrência de um evento e está associada a aspectos emergenciais de operação.

A metodologia canadense, Programa ISOsoft, baseia-se em estimar quão provável é a ocorrência de um determinado impacto, e a subdivisão se dá em três categorias e escala de 1 (baixa) a 10 (alta). Contudo, devido à subjetividade que os intervalos conferem, pontuamos valores de 1 (um) a 3 (três), de acordo com o grau de significância (HENKELS, 2002), nos quais:

1 – raro/bastante improvável (ocorrência é anual); 2 – ocasional/possível (que ocorre mensalmente); 3 – frequentemente/provável (que ocorre semanalmente).

• Reversibilidade

Está associada ao tempo de permanência do impacto adverso no meio ambiente, considerando o “tempo-limite” de uma geração para ocorrência do statu quo ante, ratificando o conceito de desen-volvimento sustentável.

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Segundo Quadros (1998, apud HENKELS, 2002), a subdivisão se dá em três categorias, as quais pontuamos valores de 1 (um) a 3 (três), de acordo com o grau de significância (HENKELS, 2002), em que:

1 – completamente reversível; 2 – dificilmente reversível; 3 – irreversível.

Critérios Socioeconômicos

Os critérios socioeconômicos não foram finalizados até o atual momento da pesquisa, considerando que é necessária coleta de dados mais apurados com as partes interessadas. A seguir, estão apresentados aqueles que poderão ser utilizados nesta pesquisa.

• Custos de correção (custo da mudança de tecnologia)

Custos relacionados com a correção do aspecto que está gerando o impacto ambiental, os quais pontuamos, de acordo com o grau de significância, com valores de 1 (um) a 3 (três) (HENKELS, 2002):

1 – não exige liberação de recursos (baixo); 2 – liberação de recursos até o limite da delegação financeira do gerente (médio); 3 – liberação de recurso acima do limite da delegação financeira do gerente (alto).

• Associação

Grau de comprometimento da imagem da organização em relação aos seus aspectos ambientais. Pontuamos, de acordo com o grau de significância com valores de 1 (um) a 3 (três) (HENKELS, 2002):

1 – não existe uma associação (baixo); 2 – pode existir uma associação, porém baixa (médio); 3 – existe uma associação clara, considerada alta (alto).

Além da seleção de critérios ambientais, deve-se também realizar a identificação de aspectos e impactos ambientais por meio da confecção da “matriz de Leopold” e, assim, analisar o grau de significância de cada impacto. Para tanto, seguem outros critérios que devem estar presentes na matriz.

• Condição

Indica a situação em que se encontra o aspecto ambiental no processo, utilizando-se da classificação que segue:

- Condição Normal (N): aquela especificada para que as operações ocorram dentro das condições esperadas de produtividade, qualidade e segurança.

- Condição Anormal (A): aquela resultante de falhas previsíveis ou de paradas e partidas não progra-madas em que consumos, perdas ou poluição novos ou com níveis aceitáveis existam ou possam existir.

- Condição Emergencial (E): aquela proveniente de processo com ocorrência de impacto ambiental adverso, geralmente resultante de falhas não previstas, ou seja, um acidente de operação.

• Temporalidade

Indica o tempo no qual o aspecto é gerado.

- Passado (P): aspectos gerados no passado cujos impactos ainda podem exercer alteração no meio em que atuam.

- Atual (A): aspectos gerados no presente ou que ainda são gerados.

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- Futuro (f): aspectos ainda não gerados e que poderão ser potencialmente gerados no futuro cau-sando impactos.

Além dos critérios ambientais e socioeconômicos, na avaliação de significância dos impactos, são utilizados “filtros” – considerados itens prioritários e limitantes da avaliação –, uma vez que todos os resultados dos demais critérios utilizados na determinação da significância do impacto poderão ser afetados pelos filtros abaixo:

- Requisito Legal (R): o aspecto analisado não atende à legislação aplicável.

- Partes Interessadas (P): manifestação pertinente de parte interessada em relação a determinado aspecto ambiental da organização.

- Ambos (A): o aspecto não atende à legislação aplicável e existe manifestação de parte interessada.

- Não aplicável (N).

As atividades desenvolvidas na lavanderia estão apresentadas na Figura 1. É denominada “área suja” aquela que recebe e concentra as roupas usadas no hospital após serem recolhidas, previamente ensa-cadas, em cada local de geração. Em seguida, as roupas são pesadas e separadas por tipo de “sujeira” nelas contidas. Por esse motivo, existe a classificação “roupa pesada” e “roupa leve”. A primeira refere-se, por exemplo, a roupas contaminadas com sangue ou outros tipos de substâncias ou agentes que podem dar causa à contaminação, enquanto a última reporta-se àquelas roupas que não foram submetidas a contato que pudessem contaminá-las e colocar em risco a saúde humana. Parte da roupa é processada por empresa terceirizada e outra parte é processada no próprio hospital. Aquelas que são processadas no hospital, após a etapa de “lavagem”, são encaminhadas para a “área limpa” – denominação dada ao local que recebe as roupas previamente lavadas, higienizadas, porém ainda levemente úmidas – que são, em seguida, encaminhadas para área de “secagem”, “dobragem/engomagem” (nessa etapa é verificada a necessidade de pequenas costuras nas roupas) e, finalmente, as etapas de “passar”, “ensacolar” e “armazenar” as roupas limpas e higienizadas para serem encaminhadas aos diversos setores do hospital.

Atualmente a lavanderia funciona com a colaboração de aproximadamente 25 empregados diretos e 20 terceirizados.

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figura 1 – Atividades desenvolvidas na lavanderia do hospital

Subárea lavagem2 - Máquina de lavagem

Subárea lavagem1 - Máquina de lavagem

(não funciona)

Empresaterceirizada

Roupa levelimpa úmida

Subáreasecagem

Subáreadobragem /engomagem

SubáreaPassagem /

ensacolamento /armazenamento

Hospital

Subáreacostura

Área limpa

Roupa leve

Triagem /pesagem

Chegada roupasuja ensacolada

Área suja

Roupa pesada

Para a descrição dos aspectos e impactos constantes na “matriz de Leopold”, foram feitos mapeamentos de entradas e saídas de cada processo, que revelaram, a partir das saídas, os aspectos e os possíveis impactos associados a cada etapa do processo. As Figuras 2, 3, 4 e 5 apresentam os fluxos de entrada e de saída dos macroprocessos existentes na lavandeira do hospital, identificados a partir da elaboração do fluxograma da Figura 1.

figura 2 – fluxo de entrada e saída do processo de lavagem

Roupa suja

Água (L)

Água (v)

Energia

Produtos delimpeza Resíduos

Felpas

Efluente

Roupa limpa

Rede - CesanSubárea 2lavagem

Meio ambiente

RSS - Contêiner (Empresa EMEC - gerenciamento interno)

Nota: As letras (L) e (V) se referem, respectivamente, ao estado líquido e ao estado de vapor.

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figura 3 – fluxo de entrada e saída do processo de secagem

Roupa molhada

Água (v)

Energia

Roupas com fita Resíduos (fitas)

Felpas

Roupa seca

Meio ambienteSubárea 3secagem

Destinação final

Nota: A letra (V) se refere ao estado de vapor.

figura 4 – fluxo de entrada e saída do processo de costura

Materiais (linha, pano, agulha, carimbo,tinta para carimbo, remendo térmico)

Resíduos (pedaços de tecido, linha, pedaço de agulha)

Energia (elétrica)

Roupas

Destinação final

Subárea 4costura

Figura 5 – Fluxo de entrada e saída do processo de dobragem/passagem/ensacolamento/armazenagem

Energia

Roupa sem dobragem

Áugua + álcool Resíduos (fitas)

Roupa dobradaSubárea 5dobragem/passagem/

ensacolamento/armazenagem

Destinação final

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Uma vez identificados os aspectos e impactos por meio dos fluxos de entradas e saídas, iniciou-se a construção da matriz para classificar as prioridades em função da significância do impacto.

A Tabela 1 apresenta a matriz de aspectos e impactos ambientais preliminar. Ela foi construída a partir da identificação dos critérios (condição, temporalidade, alcance, probabilidade/frequência, gravidade, reversibilidade). Apresenta o “Sub1” (Subtotal 1), que é a soma dos critérios quantitativos alcance, probabilidade/frequência, gravidade e reversibilidade, e apresenta a coluna “Total” que, no momento, apenas reproduz o que está na coluna Sub 1. A coluna “Prioridade” indica, preliminarmente, e com base apenas nos critérios alcance, probabilidade/frequência e gravidade, a classificação para prioridade de intervenção. Observa-se que, para a coluna Reversibilidade, ainda não há avaliação efetuada e, por esse motivo, não está contabilizada na coluna Sub1.

Tabela 1 – Matriz preliminar de aspectos e impactos ambientais (continua)

Planilha de avaliação ambiental Data: ago./set. 2010

Departamento: Lavanderia Avaliador: KKs

etapa: Levantamento de aspectos e impactos ambientais

Atividade Aspecto/Descrição Destino impacto Requisitos legais

Con

diçã

ote

mpo

ralid

ade

Alc

ance

Prob

abili

dade

/ fre

quên

cia

Gra

vida

deR

ever

sibi

lidad

esu

b. 1

tota

lPr

iorid

ade

Subárea 1 Triagem de roupas

Perfurocortantes Contêiner/Aterro

Contaminação de solo

Constituição Federal de 1988 - art. 225

Política Nacional de Meio Ambiente - Lei n° 6.938/81

Resolução Conama n° 358/2005

Lei Federal n° 12.305/2010

ABNT NBR 12.808/1993

Lei Estadual ES n° 6.407 /00

Instrução Normativa n° 14/08 - Estadual ES / IEMA

NR - Norma Regulamentadora Federal n° 32/05

Lei Federal n° 12.305/10

Resolução Conama n° 316/02

Resolução Anvisa n° 306/04

Resolução Cofen n° 303/05

ABNT NBR 12807/93

ABNT NBR 12808/93

ABNT NBR 12809/93

ABNT NBR 12810/93

ABNT NBR 13413/95

N A 1 1 1 1 3 3 2

Subárea 1 Triagem de roupas

Luvas cirúrgicas Contêiner/Aterro

Contaminação de solo N A 1 1 1 1 3 3 2

Subárea 1 Triagem de roupas

Peças de metal Contêiner/Aterro

Contaminação de solo N A 1 1 1 1 3 3 2

Subárea 1 Triagem de roupas

Ampolas de vidro (quebradas)

Contêiner/Aterro

Contaminação de solo N A 1 1 1 1 3 3 2

Subárea 1 Triagem de roupas

Embalagens de comprimidos (metálicas)

Contêiner/Aterro

Contaminação de solo N A 1 1 1 1 3 3 2

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Tabela 1 – Matriz preliminar de aspectos e impactos ambientais (conclusão)

Planilha de avaliação ambiental Data: ago./set. 2010

Departamento: Lavanderia Avaliador: KKs

etapa: Levantamento de aspectos e impactos ambientais

Atividade Aspecto/Descrição Destino impacto Requisitos legais

Con

diçã

ote

mpo

ralid

ade

Alc

ance

Prob

abili

dade

/ fre

quên

cia

Gra

vida

deR

ever

sibi

lidad

esu

b. 1

tota

lPr

iorid

ade

Subárea 2 Lavagem

Efluente industrial

Fossa/Rede coletora de esgoto

Contaminação de solo/lençol freático e águas superficiais

Resolução Conama n° 357/2005 Resolução Conama n° 397/2008 ABNT NBR 9800/1987

Resolução Conama n° 03/90

Resolução Conama n° 08/90

Resolução Conama n° 05/89

ABNT NBR 10.151/2000

Ministério do Trabalho e Emprego - Norma Regulamentadora nº 17/2005

Conama n° 1/1990

Conama n° 2/1990

Resolução Conama n° 358/2005

Lei Federal n° 12.305/2010

ABNT NBR 12808/1993

Lei Estadual ES n° 6.407/00

Instrução Normativa n° 14/08 - Estadual ES / IEMA

NR - Norma Regulamentadora Federal n° 32/05

Lei Federal n° 12.305/10

Resolução Conama n° 316/02

Resolução Anvisa n° 306/04

Resolução Cofen n° 303/05

N A 2 3 1 1 6 6 1

Subárea 2 Lavagem

Produtos químicos

Fossa/rede coletora de esgoto

Contaminação de solo/ lençol freático e águas superficiais

N A 2 3 1 1 6 6 1

Subárea 3Secagem

Voláteis alcalinos ar Poluição

atmosférica N A 2 3 1 2 6 6 1

Subárea 3Secagem

Sólidos leves (Felpas) ar Poluição

atmosférica N A 2 3 1 2 6 6 1

Subárea 3Secagem Ruídos ar Poluição

sonora N A 2 3 1 2 6 6 1

Subárea 4Costura

Materiais de costura

Contêiner/Aterro

Contaminação de solo N A 1 1 1 1 3 3 2

Subárea 5Ensacolamento/passagem de roupa/armazenamento

- N A 1 1 1 1 3 3 2

A matriz ainda está em construção. É necessário inserir as colunas referentes aos critérios socioeco-nômicos e, de suma importância, os filtros (Requisito Legal e Partes Interessadas), que representam critérios fundamentais para a determinação da significância dos impactos ambientais identificados e posterior classificação de prioridade, para que o hospital possa estabelecer os mecanismos de controle (preventivos ou reativos) aplicáveis aos seus aspectos ambientais.

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CONCLusãO

Como é de grande importância a gestão eficaz dos aspectos ambientais relacionados com as atividades de um hospital, foram feitos levantamentos exploratórios de campo para possibilitar a construção de uma matriz de aspectos e impactos ambientais que permitisse refletir a realidade do hospital. As atividades da lavanderia, fundamentais para o funcionamento de todo o hospital, possuem aspectos ambientais que foram identificados e que serão posteriormente avaliados. Com a identificação dos aspectos e impactos ambientais associados às atividades da lavanderia e avaliação de sua significância, será viabilizada a formulação de uma Política Ambiental e posterior implementação de um SGA, visando à melhoria contínua das atividades da lavanderia, no que concerne às questões ambientais e de saúde humana.

AGRADeCiMeNtOs

À Bernadete Zandomenico, por acreditar no projeto e oportunizar sua realização no hospital.

RefeRÊNCiAs

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR isO 14001: Sistemas de Gestão Ambiental. Rio de Janeiro, 2004.

HENKELS, C. Identificação de aspectos e impactos ambientais: proposta de método de aplicação. 2002. 139 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002.

SEIFFERT, M. E. B. isO 14001 sistemas de gestão ambiental: implantação objetiva e econômica. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

Recebido em março de 2011 Aceito em outubro de 2011

Correspondência para/Reprint request to:Profa. Andressa Curto Marques DessauneFaculdades Integradas Espírito-Santenses (Faesa)Campus I - Unidade de Conhecimento das Engenharias e Ciências Agronômicas Av. Vitória, 2.220 - Monte Belo – Vitória - ES - CEP 29053-360E-mail: [email protected]

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 41-46 | 2011

iNteRfACe eNtRe sAÚDe MeNtAL e A eCONOMiA POPuLAR sOLiDáRiA: POteNCiALizANDO NOVOs MODOs De GeRiR A ViDA

INTERFACE BETWEEN MENTAL HEALTH AND POPULAR SOLIDARITY ECONOMY: POTENTIATING NEW WAYS TO MANAGE LIFE

ANELISE NUNES GORZA1

AMANDA CEI SANTOS2

ANDREA PATROCÍNIO RIBEIRO2

issue DOi: 10.5008/1809.7367.042

ResuMO

A experiência relatada neste trabalho decorre do projeto de extensão Ações Integradas em Saúde Mental: construindo estratégias de intervenção e de interação da rede de saúde mental de Cariacica e no Estágio Básico Supervisionado. O grupo Tramas segue as políticas públicas de saúde mental e os princípios da Política Nacional de Economia Solidária. Tem como objetivo produzir uma forma de trabalho coletiva, equânime e solidária na qual a renda possa promover a sustentabilidade e a autogestão do grupo, tendo como facilitadores assistentes sociais, psicólogos e estudantes de Psicologia. Percebe-se o desenvolvimento social, econômico, cultural e terapêutico dos participantes. O trabalho desenvolvido com cooperação e solidariedade propicia a quebra de estigmas e a produção de novas formas de rela-ção da sociedade com a loucura.

Palavras-chave: Saúde mental. Políticas públicas. Economia solidária.

ABstRACt

The experience reported in this paper takes place through the extension project Integrated Actions in Mental Health: building intervention and interaction strategies in the system of mental health of Cariacica. The group follows the public politics of mental health and the principles of the National Politics of Solidary Economy. It aims at producing a form of collective, equitable and solidarity work in which the income can promote sustainability and self-management of the group, having as facilitators social workers, psychologists and psychology students. It’s possible to perceive the social, economic, cultural and therapeutic development of the members. Work through cooperation and solidarity provides the breakdown of stigma and production of new forms of society acting towards madness.

Keywords: Mental health. Public politics. Solidary economy.

1 Psicóloga; mestre em Subjetividade; professora do Curso de Psicologia (Faesa/AEV).2 Graduanda do Curso de Psicologia (Faesa/AEV).

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 41-46 | 2011

iNtRODuÇãO

Este trabalho constitui-se de um relato de experiência, por meio da qual, durante o ano de 2009, perpassa-mos os espaços das oficinas terapêuticas com os usuários que fazem parte do Grupo Tramas. Do convívio surgiram muitas conversas mantidas com usuários dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS), familiares e equipe técnica. Muitas delas, histórias únicas de superação. Neste contexto, podemos compreender a importância da intervenção terapêutica na vida dos usuários, que se apresenta em forma de acolhimento à experiência do próximo, de caráter cidadão que compreende a dignidade de todos os envolvidos.

O Ministério da Saúde (BRASIL, 2004) propõe que a saúde mental no Sistema Único de Saúde deve ser organizada a partir dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), considerando que estes estejam em contato com outros serviços territorializados da rede, como Unidades Básicas de Saúde, Residências Terapêuticas, Oficinas de Geração de Renda, construindo, assim, em conjunto, novas formas de cuidado e descentralizando o atendimento em saúde.

Os CAPS operam no campo da desinstitucionalização da loucura, advindos da Reforma Psiquiátrica. Surgiram como uma nova proposta aos usuários que antes tinham apenas a opção de internamento psiquiátrico e hoje contam com a articulação de um cuidado clínico e de atenção psicossocial tendo como foco não apenas a doença, mas a complexidade do sujeito.

Criado em 2006, o grupo Tramas nasce a partir da discussão entre profissionais de saúde mental do CAPS e do Programa de Saúde Mental do município de Cariacica, presentes nas Unidades Básicas de Saúde. Estes percebem que alguns usuários dos Serviços de Saúde Mental têm dificuldades de se inserirem no mercado formal de trabalho, e assim surgem estratégias de articulação entre serviços existentes nesse território, como a organização de oficinas de geração de renda.

A prática deste trabalho remete à promoção de encontros entre nós e o sujeito/usuário nos diferentes contextos do saber, onde as oficinas passam a ser coadjuvantes numa história que é construída no dia a dia. Assim, temos como objetivo o acolhimento ao usuário por meio do diálogo e do trabalho em conjunto, reconhecendo suas percepções em relação ao experenciado e compreendendo a dinâmica da oficina de geração de renda.

Com o grupo passamos por ricos momentos de aprendizagem e conhecemos o trabalho de geração de renda, que não se limita a um espaço de sociabilidade, mas é de criação de novas formas de vida. Segundo uma psicóloga do grupo, “Na realidade, a questão terapêutica é muito forte, e a gente perce-be como isso faz bem aos usuários e a quem participa do Programa [de Saúde Mental]. A gente tem condições de ver a evolução dessas pessoas”.

Ao participarmos do grupo, assumimos uma postura outra, já que o nosso olhar não é mais o mesmo diante do vivido/experenciado. Feito isso, estabelecemos outra relação com o mundo e com as pessoas envolvidas, tendo como compromisso a vida e o seu movimento.

MetODOLOGiA

O grupo Tramas trabalha com produção artesanal de tapetes, bordados, pesos de porta, chaveiros, colares, dentre outros produtos de acordo com a disponibilidade de materiais e interesse dos partici-pantes. Os artigos confeccionados são comercializados em eventos, como feiras, fóruns, congressos, seminários e bazares, não havendo um local fixo. A renda arrecadada tem uma parte destinada à compra de materiais e a outra é dividida entre os participantes de acordo com a quantidade de presenças, como determinado em assembleia geral.

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 7 | n. 1 | p. 41-46 | 2011

O grupo trabalha conforme a Economia Solidária (EcoSol), forma de produzir, vender, trocar e comprar seguindo os princípios de cooperação (pensando os interesses em comum e o trabalho coletivo), auto-gestão (os próprios membros do grupo participam da organização e tomadas de decisões) e solidarie-dade (distribuição justa, compromisso, participação com a comunidade, participação e respeito mútuo). Participam grupos e cooperativas formados por pessoas com interesses ou características em comum, como grupos de catadores, de artesãos e de saúde mental.

O grupo é membro do Fórum de Economia Popular Solidária do Espírito Santo, fórum de discussões e definições de propostas em prol da economia solidária no âmbito estadual e nacional. Nos encontros, são reunidos representantes de todos os municípios do Estado do Espírito Santo, empreendedores econômicos solidários, entidades de apoio, órgãos governamentais, usuários, gestores etc. A cada novo encontro, são avaliadas as políticas públicas voltadas à economia solidária.

É no espaço coletivo que o grupo constrói, a partir de novas perspectivas, uma nova forma de fazer uma atividade econômica, voltada para a solidariedade, democracia, autogestão e direitos humanos, em que o trabalho é realizado em conjunto.

Os encontros do grupo, a produção artesanal, a tomada de decisões, as conversas, as trocas e o apren-dizado mútuo possibilitam vivências singulares que fazem emergir questionamentos e problematizações, sem um caminho linear a ser seguido. Assim, percebemos o grupo Tramas como um dispositivo que suscita a criação de possibilidades, de novos acontecimentos e existência da diferença.

Mas o que é um dispositivo? É antes de mais nada uma meada, um conjunto multilinear, com-posto por linhas de natureza diferente. E, no dispositivo, as linhas não delimitam ou envolvem sistemas homogêneos por sua própria conta, como o objecto, o sujeito, a linguagem, etc., mas seguem direções, traçam processos que estão sempre em desequilíbrio, e que ora se aproxi-mam ora se afastam uma das outras (DELEUZE, 1996, p. 1).

O grupo-dispositivo não constitui uma estrutura fixa, mas um processo envolto por pensamentos, sen-timentos, sensações, percepções. Cria-se na tensão, quando falas gestos e encontros se intensificam, provocam deslocamentos, e “[...] é daí que o singular ganha expressão, emergindo do coletivo-multiplici-dade, convidando as identidades ao mergulho na agitação das diferenças” (BENEVIDES, 1997, p. 191).

CONtORNOs DA LOuCuRA

Até o século XVII, os loucos circulam livremente pelos espaços públicos, quando não havia ainda uma separação entre razão e loucura. A criação dos espaços urbanos, os ideais de ordem, cidade limpa e progresso levam à criação do manicômio, espaço para o qual são encaminhados loucos, pobres, deficientes, prostitutas ou qualquer pessoa que constitua “ameaça social”. A loucura passa, então, a ser considerada um perigo visível apenas ao olhar especialista. No século XVIII, o advento da razão científica estabelece a loucura como uma patologia.

A constituição da loucura como doença mental, no fim do século XVIII, atesta um diálogo rom-pido, dá a separação como fato consumado, e enterra no esquecimento todas estas palavras imperfeitas, sem sintaxe fixa, um pouco balbuciantes, na qual se dava a troca da loucura e da razão. A linguagem da psiquiatria, que é o monólogo da razão sobre a loucura, só se pode estabelecer sobre tal silêncio (PEREIRA, apud FOUCAULT, 1998, p. 2).

Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2000), no século XVIII, o médico francês Philipe Pinel propõe uma nova forma de tratamento aos loucos, libertando-os das correntes e levando-os ao tratamento vol-

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tado para a reeducação em relação às normas e ao desencorajamento das condutas inconvenientes. Com o passar do tempo, o tratamento moral vai se modificando e esvazia-se das ideias originais do método, nas quais permanecem apenas as ideias corretivas do comportamento e dos hábitos dos do-entes, como recursos de imposição da ordem e da disciplina. No século XIX, incluem-se ao tratamento medidas físicas, como duchas, banhos frios, chicotadas, máquinas giratórias e sangrias.

Já no século XX, surge, na Itália, a Reforma Psiquiátrica, iniciada principalmente pelo psiquiatra franco Basaglia, como uma crítica ao tratamento destinado às pessoas com transtornos mentais e às institui-ções psiquiátricas. Esse movimento é repercutido em todo o mundo, tendo como proposta a construção de uma rede de serviços e estratégias territoriais e comunitárias em defesa dos direitos humanos e autonomia das pessoas com transtornos mentais.

No Brasil, no fim da década de 70, profissionais da saúde mental e familiares de pacientes com transtornos mentais se mobilizam impulsionando o começo da Reforma Psiquiátrica no País. Esse movimento se inscreve no contexto de redemocratização do País e na mobilização político-social que ocorre na época.

Está sendo considerada reforma psiquiátrica o processo histórico de formulação crítica e prática que tem como objetivos e estratégias o questionamento e a elaboração de propostas de transformação do modelo clássico e do paradigma da psiquiatria. No Brasil, a reforma psi-quiátrica é um processo que surge mais concreta e principalmente a partir da conjuntura da redemocratização, em fins da década de 1970, fundado não apenas na crítica conjuntural ao subsistema nacional de saúde mental, mas também, e principalmente, na crítica estrutural ao saber e às instituições psiquiátricas clássicas, no bojo de toda a movimentação político-social que caracteriza esta mesma conjuntura de redemocratização (AMARANTE, 1995, p. 91).

A Reforma Psiquiátrica visa ao fim dos manicômios, não apenas como desospitalização, no sentido do espaço físico, mas das práticas de confinamento, de violência, de direitos negados, de um tratamento fragmentado, da forma de olhar a loucura.

Nasci, sujeito como os outros, a erros e defeitos, mas nunca ao erro de querer compreender só com a inteligência, nunca ao defeito de exigir do Mundo, que fosse qualquer coisa que não fosse o Mundo (PESSOA, 1946, p. 92).

Amarante (1995) fala da desinstitucionalização, que não significa apenas desospitalização, mas des-construção. Isto é, superação de um modelo arcaico centrado no conceito de doença como falta e erro, baseado no tratamento da doença como entidade abstrata. Desinstitucionalização significa tratar o sujeito em sua existência e em relação às suas condições concretas de vida. Isso significa não administrar ape-nas fármacos ou psicoterapias, mas construir possibilidades de trabalho e relacionamentos para a vida.

Em 2001, é aprovada a Lei Federal nº 10.216, que propõe a regulamentação dos direitos e da assistência às pessoas com transtornos mentais e a extinção do modelo manicomial de tratamento.

DesALiNHANDO PRátiCAs

O Fórum Estadual de Saúde Mental é um encontro entre usuários, gestores, técnicos, estudantes e co-munidade em geral. Trata-se de um espaço de troca de experiências e discussão, onde são abordados temas, como o acesso do usuário aos serviços com qualidade, a Reforma Psiquiátrica e a atenção psi-cossocial em rede. Nesse espaço, são expostos trabalhos dos CAPS e grupos terapêuticos e de geração de renda, como o grupo Tramas. Durante o encontro, trabalhamos na venda dos produtos juntamente

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com uma participante do grupo. Nosso momento de descanso acontece numa livraria. Sentamo-nos no chão, ao passo que folheamos livros e contamos umas as outras histórias lidas, histórias de vida, histórias... de nós!

A participante do grupo nos conta de sua vida, dizendo: “[...] quando eu era jovem, morei num internato. Lá a biblioteca ficava trancada o tempo todo [...], as freiras não deixavam a gente ler fora da sala de aula [...], eu entrava escondido à noite para pegar livro. Como tudo era escuro, acabava pegando livros escritos em latim, em inglês e em Francês [...]. Como eu não podia acender a luz do quarto à noite, eu colocava a minha cama perto da janela e lia contando com as luzes dos postes da rua ou a luz da lua.

Segundo Foucault (1987, p. 122), a escola assim como o internato, prisões e hospitais têm, em suas práticas, por meio dos saberes e práticas de controle sobre o corpo, do conhecimento cientifico e vigi-lância, a tentativa de alcançar um adestramento que produz corpos dóceis, que devem:

Aprender a comportar-se, movimentar-se, ser preciso e ter ritmo. Gestos são fabricados, e sentimentos são produzidos. Este adestramento é resultado da aplicação de técnicas positivas de sujeição baseadas em saberes pedagógicos, médicos, sociológicos, físicos etc. O corpo torna-se útil e eficiente, mas ao mesmo tempo torna-se dócil e submisso: o corpo só se torna força útil se é ao mesmo tempo corpo produtivo e corpo submisso (FOUCAULT, 1987, p. 28).

Entretanto, o poder não é entendido como algo centralizado nas mãos de poucos ou do Estado, mas se dá nas relações, em todos os lugares.

Devemos analisar o poder não como uma totalização, estando localizado em um ponto único e centralizado do Estado, e sim como uma rede difusa e plural que se manifesta em práticas cotidianas reais e concretas (CRUZ, apud DELEUZE, 2006, p. 5).

A participante fala do grupo Tramas:

“[...] o grupo é uma extensão da minha casa, porque eu me sinto muito bem, porque são pessoas com problemas menores ou maiores do que o meu, porém somos todos iguais, não perante a sociedade, mas é o que a gente pretende, que a sociedade encare isso como normal, pessoas com problemas mentais mas que têm capacidade pra produzir algo.

Ela, que em sua vida, tem lutas em internatos, hospitais psiquiátricos e na família, mostra que seu diag-nóstico de “doença mental” não é capaz de tirar seu poder. Ela é uma das pessoas que nos permite ampliar o olhar sobre a loucura.

O manicômio existe, muitas vezes sutilmente, no cotidiano, na rua, nas casas, em serviços de saúde. Entendemos que a criação de novas relações com a loucura é o caminho para a desinstitucionalização. Caminho este que não pode ser traçado de forma linear, a priori e fixo. Ele se dá nas relações, nos encontros, na forma de olhar.

Trata-se, de acordo com Amarante e Torre (2001), de abrir mão das interpretações da loucura, segundo erro, incapacidade, inferioridade, doença mental, e potencializá-la como diferença, um modo diferente de relação com o mundo. Enfim, não usar o saber como técnica normativa, mas como possibilidade de criação de subjetividades.

Leituras e trocas, desde os encontros com o grupo Tramas, os eventos da Luta Antimanicomial, as “conver-sas de corredor” pela faculdade nos mostram a infinitude de faces e possibilidades da loucura. Os atores

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do grupo ultrapassam os diagnósticos e demonstram-se capazes de se expressar, produzir, aprender e ensinar. Eles nos levam a enxergar a complexidade e o emaranhado de possibilidades da loucura.

RefeRÊNCiAs

AMARANTE, P. Novos sujeitos, novos direitos: o debate em torno da reforma psiquiátrica. Caderno de saúde Pública, v. 11, n. 3, p. 491-494, jul./set. 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X1995000300024>. Acesso em: 3 nov. 2009.

AMARANTE, P. (Org.). Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: SDE/ENSP, 1995.

AMARANTE, P.; TORRE, E. H. G. Protagonismo e subjetividade: a construção coletiva no campo da saúde mental. Ciênc. Saúde Coletiva [on-line], v. 6, n. 1, p. 73-85, 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232001000100006>. Acesso em: 9 dez. 2009.

BENEVIDES, R. B. Dispositivos em ação: o grupo Saúde Loucura. Revista saúde e Loucura, São Paulo, n. 6, p. 183-191, 1997.

BRASIL. Ministério da Saúde. saúde mental no sus: os centros de atenção psicossocial. Brasília, 2004. Disponível em: <http://www.ccs.saude.gov.br/saude_mental/pdf/SM_Sus.pdf>. Acesso em: 7 jun. 2009.

BRASIL. Ministério da Saúde. Centro Cultural de Saúde. A reforma psiquiátrica brasileira e a política de saúde mental. Rio de Janeiro: 2000. Disponível em: <http://www.ccs.saude.gov.br/VPC/reforma.html>. Acesso em: 31 jul. 2010.

CRUZ, J. (Org.). Gilles Deleuze: sentidos e expressões. Rio de Janeiro: Ciência Moderna, 2006.

DELEUZE, G. O que é um dispositivo? In: DELEUZE, G. O Mistério de Ariana. Lisboa: Vega, 1996.

FOUCAULT, M. Vigiar e punir. Petrópolis: Vozes, 1987.

PEREIRA, A. F. N. Foucault, Derrida e a história da loucura: notas sobre uma polêmica. Cad. saúde Pú-blica, Rio de Janeiro, v. 14, n. 3, Jul. 1998. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102311X1998000300022&lng=ennrm=iso>. Acesso em: 4 dez. 2009.

PESSOA, F. Poemas inconjuntos. 10. ed. Lisboa: Ática, 1946 - 1993.

Recebido em abril de 2010.Aceito em novembro de 2010

Correspondência para / Reprint request to:Analise Nunes GorzaAvenida Hugo Viola, 211, apt. 30/B, Residencial Granville - Jardim da Penha - Vitória – ES CEP 29060-420

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O CANtO De ANÚNCiO De SCINAX BELLONI fAiVOViCH, GASPARINI & HADDAD, 2010 (AMPHIBIA: ANURA: HYLIDAE)

THE ADVERTISEMENT CALL OF SCINAX BELLONI FAIVOVICH, GASPARINI & HADDAD, 2010 (AMPHIBIA: ANURA: HYLIDAE)

JULIANA PERES1

JOSÉ EDUARDO SIMON2

issue DOi: 10.5008/1809.7367.043

ResuMO

Scinax belloni foi recentemente descrita dos arredores do Parque Estadual de Forno Grande, município de Castelo, região serrana do Estado do Espírito Santo, Sudeste do Brasil. O presente estudo descreve o canto de anúncio de S. belloni, a partir de gravações obtidas na localidade-tipo da espécie, entre 6 e 10 de janeiro de 2010. As amostras analisadas corresponderam a trechos da vocalização espontânea de espécimes adultos (n= 3) gravados em bromélias rupícolas (Alcantarea sp.). O canto de anúncio da espécie possui duração média de 0,62 a 0,11s. É constituído de duas a três notas multipulsionadas. O espectro de frequência é de 1.723 a 5.275 Hz, com a frequência dominante emitida em 3.078 Hz. Os parâmetros acústicos diferem dos dados disponíveis para S. perpusillus, S. arduous e S. peixotoi, ressaltando o valor do canto de anúncio como caractere diagnóstico entre as espécies do grupo Scinax perspusillus.

Palavras-chave: Anura. Vocalização. Bromélias.

ABstRACt

Scinax belloni was recently described from the surroundings of the Forno Grande State Park, municipality of Castelo, state of Espírito Santo, southeastern Brazil. The present study describes the advertisement call of Scinax belloni based on recordings obtained in the type locality of the species, between 06th and 10th of January 2010. Three adult specimens were recorded in Rupicolous bromeliads (Alcantarea sp.). The call presents duration from 0,62 to 0,11s, and consists of 2 to 3 multi-pulsed notes. The frequency spectrum varies from 1.723 to 5.275 Hz, with the dominant frequency emitted on 3.078 Hz. The acoustic parameters differ from the data available for S. perpusillus, S. arduous and S. Peixotoi, emphasizing the value of the advertisement calls as diagnostic character among species of the Scinax perspusillus group.

Keywords: Anuran. Vocalization. Bromeliads.

1 Bióloga; pesquisadora associada do Museu de Biologia Prof. Mello Leitão (MBML).2 Ornitólogo; doutor em Ciências Biológicas (Zoologia). Professor das Faculdades Integradas São Pedro (Faesa).

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iNtRODuÇãO

O gênero Scinax, Wagler, 1830, compreende 99 espécies reunidas em dois clados distintos: Scinax ca-tharinae e Scinax ruber (FAIVOVICH et al., 2005). Em particular, o clado Scinax catharinae é composto dos grupos Scinax catharinae e Scinax perpusillus. O grupo S. perpusillus, estabelecido por Peixoto (1987) e aceito por Faivovich et at. (2005), reúne as espécies que desovam em bromélias e que possuem membranas reduzidas ou ausentes entre os dedos II e III do pé. Até recentemente, o grupo S. perpusillus estava representado por dez espécies, distribuídas em áreas costeiras e/ou serranas do Leste do Brasil, entre os Estados de Santa Catarina e Espírito Santo (FAIVOVICH et al., 2005; FROST, 2010). Faivovich et al. (2010) adicionaram uma nova espécie ao grupo S. perpusillus, com a descrição de Scinax belloni dos arredores do Parque Estadual de Forno Grande, município de Castelo, sul do Espírito Santo.

O canto de anúncio emitido pelos machos de anfíbios anuros é distinto entre as espécies, atuando como mecanismo eficiente de isolamento reprodutivo interespecífico, pois tem como função primária a atração de fêmeas para os sítios de reprodução (DUELLMAN; TRUEB, 1986; GERHARDT; DAVIS, 1988; WEL-CH et al., 1998). Por tal razão, o canto tem sido frequentemente empregado como caráter taxonômico, especialmente quando envolve espécies crípticas, para as quais a diagnose morfológica se torna difícil (e.g. LITTLEJOHN; LOFT-HILLS, 1968; WELLS, 1977; DUELLMAN; TRUEB, 1986; MÂNGIA et al., 2010).

O uso dos parâmetros acústicos do canto de Scinax belloni em futuras análises taxonômicas poderá elucidar questões ainda pendentes sobre as relações filogenéticas entre os membros do grupo Scinax perpusillus, para o qual esse caráter se encontra formalmente descrito apenas para S. perpusillus (POM-BAL JUNIOR; BASTOS, 2003), Scinax arduous (POMBAL JÚNIOR; BASTOS, 2003) e Scinax peixotoi (BRASILEIRO et al., 2007). O presente estudo descreve a vocalização topotípica de Scinax belloni, procurando ampliar o conhecimento sobre o espectro vocal das espécies do gênero Scinax.

MAteRiAL e MÉtODO

O canto de anúncio de Scinax belloni foi gravado nos arredores do Parque Estadual de Forno Grande (20º 30’ 20’’ S e 41º 04’ 58’’ O, 1.100m de altitude), durante uma expedição de campo realizada no pe-ríodo de 6 a 10 de janeiro de 2010. A sede do Parque Estadual do Forno Grande situa-se no município de Castelo, região serrana do Espírito Santo, Sudeste do Brasil (Mapa 1). A formação vegetal nativa que predomina nessa região é do tipo Floresta Pluvial Atlântica Montana e Submontana, distribuída sobre relevo acidentado, cujas altitudes variam de 1.050 a 2.039m (PASSAMANI, 2008). O relevo também é marcado pela presença de escarpas íngremes e afloramentos rochosos de litologia pré-cambriana, com trechos recobertos por flora herbáceo-arbustiva incrustada, representada por espécies de Bromeliaceae, Orchidaceae, Asteraceae, etc., conforme José Manuel Lúcio Gomes (Comunicação pessoal, 2010).

De acordo com Ramos et al. (2008), a região possui clima do tipo Cwa, segundo a classificação de Köppen (PEREIRA et al., 2002), apresentando média anual de precipitação em torno de 1.500mm. As chuvas concentram-se nos meses de outubro a abril, com um total de 1.271mm (85%) acumulados no período. A temperatura média anual é de 20,7°C, com a maior média em fevereiro (23,7°C). A menor média ocorre no mês de julho (17,2°C). De acordo com o mapa das unidades naturais do estudo de Feitoza (2006), o Parque Estadual de Forno Grande se insere em uma região de terras frias, acidentadas e chuvosas no Estado do Espírito Santo.

Os parâmetros acústicos do canto de anúncio foram analisados a partir de amostras da vocalização es-pontânea emitida por espécimes adultos (comprimento rostro-cloacal: 19 - 21mm) situados em bromélias rupícolas, em 7 de janeiro de 2010. A vocalização aqui descrita foi gravada na situação em que vários casais foram observados em amplexo, razão pela qual foi interpretada como o canto de anúncio da espécie.

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Mapa 1 – Localização do Parque Estadual de Forno Grande na região sul do estado do espírito santo, sudeste do Brasil

As vocalizações foram gravadas com o uso de gravador analógico Sony TCM 5000 EV e microfone Sen-nheiser Shotgun ME-66, empregando fita cassete EMTEC ferro II. As gravações foram digitalizadas no programa Avisoft SasLab Pro versão 3.0, com frequência de entrada em 16 kHz e 16 bits de resolução. O oscilograma, o sonograma e o espectograma foram elaborados no programa Sound Ruler Acoustic Analysis, versão 9.6, com FFT-length= 256 points, Overlap em FFTs= 0.9 e Window type= Hanning.

Cópias das gravações do canto de anúncio foram depositadas no Arquivo Sonoro Prof. Elias P. Coelho (ASEC), Departamento de Zoologia, Instituto de Biologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. Os valores referentes aos parâmetros acústicos apresentados no texto correspondem à média, ao desvio padrão, aos valores máximos e mínimos e ao tamanho da amostra.

Os dados sobre as condições climáticas (temperatura e umidade relativa do ar) foram obtidos com o uso de termo-higrômetro digital ITHT 2200. As coordenadas e a altitude da localidade em que a vocalização de S. belloni foi gravada foram tomadas com GPS Garmin 12 (datum WGs 89).

Os espécimes-testemunhos foram depositados nas coleções herpetológicas do Museu Nacional (MN), Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, e do Museu de Biologia Prof. Mello Leitão (MBML), Santa Teresa, Espírito Santo, Brasil. Os espécimes coletados foram identificados com base nos caracteres diagnósticos de S. belloni apresentados por Faivovich et al. (2010). A autorização de coleta foi concedida pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente dos Recursos Naturais Renováveis, licença nº. 076/09-NUFAUNA/DIPRAM, Processo nº 02009.001088/2009.

ResuLtADOs

Espécimes adultos de Scinax belloni (Figura 1) foram observados vocalizando no interior de bromélias (Alcantarea sp.) incrustadas em afloramento rochoso de relevo íngreme (Figura 2). As vocalizações

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gravadas entre 18h40min e 19h30min (temperatura do ar: 21 º C; umidade relativa do ar: 87%) pro-cederam de três espécimes coletados (MBML 7280, 7362, 7363). Não choveu na data da gravação, mas havia água acumulada nas bromélias, decorrente de chuvas que ocorreram alguns dias antes do período da expedição.

Figura 1 – Espécime adulto de Scinax belloni (MBML 7280) procedente dos arredores do Parque estadual de forno Grande, município de Castelo, estado do espírito santo

Foto: J. E. Simon.

figura 2 – Ambiente da gravação do canto de anúncio de Scinax belloni (Hylidae): aglomerações de bromélias (Alcantarea sp.) incrustadas em afloramento rochoso nos arredores do Parque Estadual de Forno Grande, município de Castelo, Estado do Espírito Santo

Foto: J. E. Simon.

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A análise sonográfica demonstrou que o canto de anúncio de Scinax belloni é composto por duas ou três notas multipulsionadas (2,5 ± 0,7 notas, n = 22 cantos), as quais são estruturalmente similares entre si (Figura 3a). A duração do canto de duas notas (doravante denominado C-2) é de 0,62 ± 0,03 s (0,59-0,69 s, n = 12 cantos), enquanto a duração do canto de três notas (C-3) é de 0,11 ± 0,007 s (0,10-0,12 s, n = 10 notas). Os cantos são emitidos a intervalos de 1,98 ± 0,66 s (1,41 - 3,96 s, n = 21 intervalos) (Figura 3b). As notas de C-2 possuem duração de 0,019 ± 0,001 s (0,017-0,021 s, n = 21 notas), emitidas a intervalos de 0,032 ± 0,002 s (0,028 - 0,036 s, n = 20 notas). As notas de C-3 possuem duração de 0,019 ± 0,002 s (0,016-0,024 s, n = 21 notas), emitidas a intervalos de 0,031 ± 0,002 s (0,027 - 0,036 s, n = 20 notas). O número de pulsos por nota foi de 31,66 ± 2,22 pulsos (28-35 pulsos, n= 21 notas) em C-2 e de 27,47 ± 1,88 pulsos (24-31 pulsos, n= 21 notas) em C-3. O canto possui espectro de frequência entre 1.723 e 5.275 Hz e frequência dominante emitida em 3.078 Hz (Figura 4c). Em adição, notou-se que a emissão de C-2 e C-3 é aparentemente aleatória na série de cantos emitidos por um macho; porém, o canto de três notas (C-3) foi emitido mais frequentemente (taxa de emissão 1,5 vez maior) do que o canto de duas notas (C-2).

Ao ouvido humano, o canto de Scinax belloni é um trinado de curta duração (0,06 - 0,12 s), lembrando o sinal sonoro emitido por determinados tipos de inseto (por exemplo, ortópteros). É difícil de perceber que é constituído por duas ou três notas isoladas.

Figura 3 – Oscilograma (a), sonograma (b) e espectograma (c) do canto de anúncio de Scinax belloni (topótipo MBML 7280), gravado nos arredores do Parque Estadual de Forno Grande, município de Castelo, Estado do espírito santo

Nota: Temperatura do ar: 21º C; umidade relativa do ar: 87%.

DisCussãO

A descrição do canto de anúncio de S. belloni contribui para o melhor conhecimento sobre o repertório vocal do grupo Scinax perspusillus, para o qual são atualmente admitidas 11 espécies (FAIVOVICH et al., 2005, 2010). Determinados parâmetros acústicos do canto de anúncio de S. belloni (número de notas, duração, frequência dominante etc.) diferem dos dados disponíveis para S. perpusillus (POM-BAL JUNIOR; BASTOS, 2003), Scinax arduous (POMBAL JÚNIOR; BASTOS, 2003) e Scinax peixotoi (BRASILEIRO et al., 2007), ressaltando a importância do canto de anúncio como caractere diagnóstico entre as espécies do grupo Scinax perspusillus. Ao estudarem o comportamento reprodutivo de algu-

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mas espécies desse grupo, Alves-Silva e Silva (2009) registraram vocalizações em contextos sociais de S. perpusillus, S. littoreus e S. v-signatus. Contudo, tais autores não entraram em detalhes sobre os parâmetros acústicos das vocalizações dessas espécies. Não foram encontrados relatos sobre o canto de anúncio das outras cinco espécies do grupo Scinax perspusillus (S. alcatraz, S. atratus, S. melloi, S. faivovichi e Scinax tupinamba).

faivovich et al. (2005) não empregaram a bioacústica ao abordar a filogenia das espécies de Scinax, reconhecendo, por vezes, que as bases moleculares e morfológicas não forneceram informações con-clusivas para os táxons analisados.

Pombal Jr. e Bastos (2003) discutiram e reforçaram a importância da análise do canto de anúncio em abordagens taxonômicas, chamando a atenção para o fato de que o grupo S. perpusillus é perfeitamente diagnosticável, podendo ser considerado um grupo monofilético. Com base em três táxons considerados, tais autores reconheceram características em comum entre suas vocalizações: a) canto de anúncio com pequeno número de notas (3 a 6 notas); b) notas com estrutura multipulsionada/sem harmônicos; e c) intervalo de tempo entre as notas maior do que a duração da nota. Tais características estão presentes em S. belloni e, aparentemente, não são compartilhadas pelas espécies do grupo irmão S. catharinae (POMBAL JÚNIOR et al., 1995), sugerindo que possam constituir-se em sinapomorfias acústicas do grupo S. perpusillus. Sendo assim, abordagens mais amplas e que contextualizem as demais espécies desse grupo poderão implicar em avanços para a taxonomia do gênero Scinax.

Ao descreverem S. belloni, faivovich et al. (2010) a incluíram no grupo S. perpusillus, com base em caracteres morfológicos e na suspeita de que a desova em bromélias também fosse compartilhada por essa espécie. O encontro de girinos em bromélias (SILVA-SOARES et al., 2010) e o uso de bromélias como sítio de vocalização mencionados no presente estudo atestam que S. belloni é de fato uma espécie bromelígena (sensu PEIXOTO, 1995), o que corrobora sua inclusão no grupo S. perpusillus, defendida por faivovich et al. (2010).

AGRADeCiMeNtOs

A Julian Faivovich e José Perez Pombal Júnior, pelo exame e confirmação taxonômica dos espécimes--testemunhos de Scinax belloni; a André Luiz Campos Tebaldi pela autorização de hospedagem na sede do Parque Estadual de Forno Grande (PEFG); a Neiva Mattos P. Pinheiros, Esther A. Kill, Mabel de Queiroz Lattufe, Luiz Son e José Francisco Targa pelo apoio logístico à nossa expedição ao município de Castelo, no sul do Espírito Santo; a Ednaldo Escotá, Eduardo Buloto, Fabiano Lanschi e Fernando M. Flores pelo auxílio nos trabalhos de campo. Somos gratos a José Perez Pombal Júnior e aos dois revisores anônimos que apresentaram importantes sugestões ao manuscrito. A autorização de coleta foi concedida pelo Ibama, Licença nº 076/09-NUFAUNA/DIPRAM, Processo nº 02009.001088/2009.

RefeRÊNCiAs

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Recebido em marco de 2011 Aceito em agosto de 2011

Correspondência para / Reprint request to:Bióloga Juliana [email protected]

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PeRfiL De MetiLAÇãO DO GeNe P16 eM MuCOsA ORAL De iNDiVíDuOs COM CARCiNOMA ePiDeRMOiDe DA CAViDADe BuCAL

METHYLATION PROFILE OF P16 GENE IN ORAL MUCOSA OF INDIVIDUALS WITH ORAL SQUAMOUS CELL CARCINOMA

MARIANA VARGAS CRUZ1

ESTEVÃO AZEVEDO MELO2

ALINE GOMES SOARES2

ZILDA FAGUNDES LIMA OLIVEIRA3

JOSÉ ROBERTO VASCONCELOS DE PODESTÁ4

SÔNIA ALVES GOUVÊA5

SANDRA VENTORIN VON ZEIDLER6

MELISSA DE FREITAS CORDEIRO-SILVA3

issue DOi: 10.5008/1809.7367.044

ResuMO

O câncer de boca é o sétimo tipo mais incidente na população brasileira. Alterações genéticas em genes supressores tumorais aumentam o risco de desenvolvimento de neoplasia por estarem associadas ao controle do ciclo celular. Alterações epigenéticas envolvendo genes que regulam o ciclo celular estão relacionadas com o início e a progressão de diversos tumores. A hipermetilação do gene supressor tumoral p16 é encontrada em vários tipos de cânceres e está associada ao silenciamento gênico. O objetivo deste estudo foi determinar o perfil de metilação da região promotora do gene p16 em amostras de mucosa bucal normal de indivíduos com carcinoma epidermoide. A técnica Methylation-Specific Polymerase Chain Reaction (MS-PCR) foi utilizada e possibilitou a distinção entre alelos metilados e não metilados na região promotora do gene p16. Foram analisadas 23 amostras, sendo 17,4% positivas para a metilação e 50% destas eram de usuários crônicos de tabaco e 25% de álcool. O envelhecimento pode estar associado à metilação do p16, uma vez que a média de idade dos pacientes positivos foi de 72 anos, maior que a dos pacientes negativos de 56 anos. Os resultados sugerem que a análise da hipermetilação do gene p16 pode tornar-se importante marcador molecular para o carcinoma epidermoide bucal.

Palavras-chave: Carcinoma epidermoide bucal. Mucosa bucal normal. Metilação de DNA. Gene p16.

1 Graduação em Ciências Biológicas – Faesa.2 Graduação em Odontologia – Faesa.3 Doutora e professora da Faesa.4 Médico Cirurgião de Cabeça e Pescoço, Hospital Santa Rita de Cássia – Vitória – Sesa/ES.5 Doutora professora do Departamento de Ciências Fisiológicas – Centro de Ciências da Saúde – Universidade Federal do

Espírito Santo (Ufes).6 Doutora professora do Departamento de Patologia – Centro de Ciências da Saúde – Universidade Federal do Espírito Santo

(Ufes).

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ABstRACt

Oral cancer is the seventh most frequent type in our population and approximately 90% of these malignancies are squamous cell carcinoma. Genetic alterations in tumor suppressor genes increase the risk of tumor development, since these genes are associated with cycle cell control. Epigenetic changes involving cell cycle regulatory genes are related to the initiation and progression of various tumors. The hyper methylation of tumor suppressor gene p16 is found in many types of cancers and is associated with gene silencing. The aim of this study was to determine the methylation of the promoter region p16 in samples of normal oral mucosa from patients with oral squamous cell carcinoma. The technique of MS-PCR (Methylation-Specific Polymerase Chain Reaction), which allowed the distinction between methylated and non-methylated alleles in the promoter region p16, was used. This study analyzed 23 samples, and 17.4% tested positive for methylation. Among these, 50% were chronic users of tobacco and 25% alcohol. Aging may be associated with methylation of p16, since the average age of positive patients was 72 years and negative patients was 56 years. The results suggest that hyper methylation of the p16 can become important molecular marker for oral squamous cell carcinoma.

Keywords: Oral squamous cell carcinoma. Normal oral mucosa. DNA methylation. p16 gene.

iNtRODuÇãO

O câncer bucal representa 3% das neoplasias que afetam a população brasileira, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA, 2009). O Ministério da Saúde estimou 489.270 novos casos de câncer em todo o País para o ano de 2010. Destes, 14.120 acometeriam a cavidade bucal, colocando o câncer bucal como o sétimo mais prevalente no gênero feminino, com 3.790 casos, e o quinto no gênero masculino, com 10.330 casos (INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER, 2009).

O carcinoma epidermoide, originado de células do epitélio de revestimento da mucosa bucal expostas a agentes genotóxicos, corresponde a cerca de 90% das neoplasias orais malignas (SILVERMAN, 2001). Estudos têm demonstrado a associação entre a ocorrência de câncer bucal e o uso do tabaco. O risco de desenvolver a doença aumenta de cinco a nove vezes entre indivíduos fumantes em relação a não fumantes (WÜNSCH-FILHO, 2002). O consumo de álcool também tem sido relacionado com o risco de desenvolvimento do câncer bucal, principalmente quando associado ao uso do tabaco (LAMBERT et al., 2011; SZYMAŃSKA et al., 2011; LEE et al., 2011).

A carcinogênese é um processo de múltiplas etapas caracterizadas por alterações genéticas que di-recionam a transformação do tecido normal em tumoral (LOEB; HARRIS, 2008). Alterações genéticas e epigenéticas podem acarretar perda do controle da proliferação celular, aumentando o risco para o desenvolvimento de neoplasia. Alterações epigenéticas são mudanças herdáveis na expressão de um gene, sem alteração na sequência de DNA, podendo ocorrer hipermetilação, hipometilação, perda de imprinting gênico e modificação de cromatina (VERMA; SRIVASTAVA, 2002).

A citosina metilada (5-metilcitosina) ocorre no DNA de mamíferos por adição covalente do grupo metil (CH3) ao carbono 5’ de uma citosina. Essa modificação ocorre, em geral, em uma citosina adjacente a uma guanina (5’ CG 3’), portanto em dinucleotídeos CpG (BIRD, 2002). Em células normais os dinucle-otídeos CpGs, presentes em ilhas CpG, não estão metilados e, quando essa metilação ocorre, atinge os dinucleotídeos presentes em DNA não codificante (SINGAL; GINDER, 1999). No câncer, entretanto, se a metilação do DNA ocorre em ilhas CpG da região promotora ou no primeiro éxon dos genes, possui efeitos importantes na expressão gênica, sendo vinculada ao silenciamento gênico (BAYLIN; HERMAN, 2000). Quando as ilhas CpG dessa região estão metiladas, os fatores de transcrição são impedidos de

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se ligarem aos sítios de reconhecimento da fita de DNA, presentes na região regulatória de seus genes (SINGAL; GINDER, 1999).

A proteína p16 promove a interrupção da fase G1 do ciclo celular, por meio de inibição do complexo proteico ciclina D-CDK4/6. Essa inibição compromete a fosforilação da proteína do retinoblastoma (pRb), impedindo a liberação do fator de transcrição E2F, e a consequente progressão do ciclo celular para a fase S (HERMAN et al., 1996). Portanto, o silenciamento do gene p16 desregula o ciclo celular, podendo induzir à carcinogênese.

Este estudo teve como objetivo analisar o perfil de metilação da região promotora do gene p16 em células de mucosa oral normal de indivíduos com carcinoma epidermoide da cavidade bucal.

MAteRiAL e MÉtODOs

Casuística

Foram analisadas amostras de DNA de células da mucosa bucal normal de indivíduos com carcinoma epidermoide atendidos no Programa de Prevenção e Detecção Precoce do Câncer de Boca, no Hospital Santa Rita de Cássia, Vitória, da Secretaria de Saúde do Espírito Santo (Sesa / ES).

Foi utilizado o método de raspagem de células provenientes da mucosa bucal, utilizando-se escova citológica estéril (Kolplast, SP, Brasil). O raspado, realizado em local distante da lesão bucal, foi obtido por fricção da escova contra a superfície durante 30 segundos, acondicionado em 200μl de tampão de lise de DNA (10mM Tris-HCl, pH 7,6; 1mM EDTA e 0,6% de dodecil sulfato de sódio (SDS) e mantido à temperatura de 5ºC.

As variáveis idade, gênero e história sobre o consumo de álcool e uso de tabaco foram avaliadas por meio de questionário. O exame físico dos indivíduos com câncer bucal permitiu avaliar o estadiamento do tumor. Essas informações foram classificadas de acordo com o American Joint Committee on Cancer (AJCC) Staging System (2002).

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (120/2006) e o consentimento informado foi obtido de acordo com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 196, de 10 de outubro de 1996.

extração do DNA

Ao raspado de células epiteliais foram acrescentados 10μl de proteinase K, e as amostras foram incu-badas a 37°C, durante 12 horas. Após esse período, adicionou-se fenol saturado com 0,1M de Tris-HCl com pH 7,0 – 8,0 e clorofórmio- álcool isoamílico, na proporção de 24:1 (v/v). O material foi centrifugado a uma velocidade de 10.000 rpm por 20 minutos. O sobrenadante foi transferido para um novo tubo contendo acetato de sódio (0,3M pH 5,2) e 1,0ml de etanol absoluto. Os tubos foram armazenados à temperatura de -20°C, overnight e a precipitação realizada em séries decrescentes de etanol. A pureza das amostras foi verificada por espectrofotometria.

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Modificação do DNA e Amplificação por MS-PCR

Foi utilizado o kit de conversão por bissulfito (Methylcode Bissulfite Conversion Kit- Invitrogen). As ci-tosinas não metiladas presentes em ilhas CpG foram convertidas em uracilas, de modo a possibilitar a distinção do DNA metilado e não metilado. O DNA modificado foi amplificado pela técnica de MS-PCR, com uso de dois pares de primers para regiões metiladas e não metiladas, conforme disposto na Tabela 1 (HERMAN et al., 1996).

tabela 1 – Primers utilizados nas reações em cadeia da polimerase específica para metilação (MS-PCR)

Primer P16 Metilado P16 Não metilado

Sequência primer sense, 5'→3' tta tta GaG GGt GGG GCG Gat CGC

tta tta GaG GGt GGG GtG Gat tGt

Sequência primer antisense, 5'→3'

GaC CCC Gaa CCG CGa CCG taa

Caa CCC Caa aCC aCa aCC ata a

Tamanho (pb) 150 151

Temperatura de anelamento (°C) 63 58

Posição genômica +167 +167

A amplificação foi realizada em um termociclador GeneAmp PCR System 9700 (Applied Biosystems). A reação de PCR iniciou-se com o aquecimento a 95°C por 5min, seguida de 35 ciclos (95°C por 30seg / 30seg à temperatura de anelamento específica para cada primer, conforme indicado na Tabela 1 / 72°C por 30seg) e 4min de extensão final a 72°C. O DNA de células de linhagem T24 de bexiga com hipermetilação da região promotora do gene p16 (American Cell Type Culture Collection) foi uttilizado como controle positivo. Os produtos da PCR foram submetidos à eletroforese vertical em gel de polia-crilamida não desnaturante à concentração de 7%. Para visualização das bandas, o gel foi corado em solução de nitrato de prata 0,1%.

Análise estatística

Os dados são representados como média ± desvio padrão, e a análise foi feita em percentual da amostra com resultado positivo para metilação da região promotora do gene p16.

ResuLtADOs

Foram analisadas 23 amostras de indivíduos com carcinoma epidermoide da cavidade bucal, de ambos os gêneros, com idade entre 24 e 87 anos, resultando em uma idade média de 59±16 anos. Resultado positivo para metilação da região promotora do gene p16 foi observado em 17,4% (4/23) dos casos analisados, conforme mostrado na fotografia do gel de poliacrilamida 7% (Figura 1).

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figura 1 – Gel de poliacrilamida 7% corado com nitrato de prata mostrando alguns resultados da análise de metilação específica da região promotora do gene p16 em amostras de mucosa de indivíduos com carcinoma epidermoide, utilizando MS-PCR

Nota: As colunas unmet e met correspondem a reações específicas para DNA não metilado e metilado, respectivamente, 119, 155: amostras metiladas / C+: controle positivo (células de carcinoma urotelial, linhagem T24) / C- : controle negativo (água ultrapura).

A história do consumo de álcool e tabaco está descrita na Tabela 2. Os indivíduos com resultado negativo para metilação apresentaram tempo médio de duração de uso do tabaco de 34±19 anos e consumo do álcool de 31±14 anos. Enquanto os indivíduos com resultado positivo para metilação apresentaram tempo médio de duração de uso do tabaco de 42±17 anos, considerando apenas os usuários, a história de consumo do álcool foi relatada em 55 anos por apenas um indivíduo consumista.

Tabela 2 – Características tumorais e fatores de riscos em casos positivos para metilação da região promotora de gene p16

Amostras sexo idade estadiantamento tumoral tabagismo etilista

119 f 56 ii Não Não

148 M 82 iv Não Não

155 M 87 iii Sim Sim

158 f 63 iv Sim NãoNota: M: masculino / F: feminino

Um dos casos positivos foi classificado em estádio II, segundo a classificação TNM de tumores malig-nos, apresentando tumor de tamanho entre 2 e 4cm (T2), sem ocorrência de metástases em linfonodos regionais (N0) ou metástases a distância do tumor primário (M0). Os outros três casos positivos para metilação foram classificados em estádios avançados. Um deles apresentou estádio III, com tumor maior que 4cm (T3) e sem metástases (N0, M0). Os outros dois foram classificados em estádio IV, apresentando tumor maior que 4cm (T3), sem metástases a distância (M0), sendo um com metástase em linfonodo, com mais de 6cm (N3) e o outro com metástase em um único linfonodo homolateral, com tamanho entre 3 e 6cm (N2). Os dados das amostras positivas para metilação do gene p16 encontram-se na Tabela 2.

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A média de idade dos pacientes positivos para metilação foi de 72±14 anos, e os pacientes negativos apresentaram uma média de 56±15 anos.

DisCussãO

O carcinoma epidermoide é o tumor mais prevalente na região da cabeça e do pescoço. Estudos têm demonstrado aumento de sua incidência em indivíduos com idade superior a 55 anos, especialmente entre indivíduos do sexo masculino (SEOANE et al., 2006; LAWOYIN et al., 2005). O processo de tumorigênese resulta do acúmulo de mutações em proto e genes supressores de tumor. Nos últimos anos, diversos trabalhos têm mostrado que mutações epigenéticas nesses genes têm papel essencial na carcinogênese (FEINBERG; TYCKO, 2004; BAYLIN; HERMAN, 2000; HERMAN et al., 1996). A hiper-metilação da região promotora de genes supressores tumorais tem sido apontada como importante fator associado à inativação da expressão gênica e à progressão tumoral (JONES; BAYLIN, 2002; HERMAN et al., 1996; BAYLIN et al., 1998).

Estudos têm demonstrado elavada frequência de metilação da região promotora do gene p16 em células tumorais de carcinoma epidermoide, variando entre 23 e 50,9% dos casos (KAZUHIRO et al., 2002; VISWANATHAN et al., 2003; KATO et al., 2006; ROSAS et al., 2001). Sailasree et al. (2008) demonstra-ram que a ocorrência de metilação do gene p16 está associada a pior prognóstico. A metilação do gene p16 está relacionada com o aumento do risco relativo de recorrência tumoral após tratamento, enquanto 84% dos casos com ausência de metilação demonstraram resposta positiva no início do tratamento, sem células tumorais residuais.

Este estudo mostrou que a frequência de metilação da região promotora do gene p16 foi de 17,4% (4/23), resultados estes similares aos encontrados por Kato et al. (2006), que observaram uma frequência de 27,27% (6/22) de metilação. Von Zeidler et al. (2004) encontraram 17,5% de casos positivos para meti-lação da região promotora do p16 (45/258), em epitélio de cavidade bucal de indivíduos tabagistas sem evidências clínicas de câncer bucal. No presente estudo, 50% dos pacientes com carcinoma epidermoide positivo para metilação de DNA de células normais eram fumantes crônicos, com mais de 30 anos de uso, podendo o tabagismo estar associado a mudanças epigenéticas em células normais. Vários estudos têm mostrado que o tabagismo e o etilismo têm uma relação direta com a metilação de DNA e que a idade avançada contribui para essas alterações (SPITZ, 1994; MORSE et al., 1996). Diversos estudos apontaram que o uso crônico de álcool pode influenciar na carcinogênese dos tumores da cavidade bucal (WÜNSCH-FILHO, 2002; ANDRE, 1995; LEE et al., 2011). Dentre os quatro pacientes com metilação do gene p16 analisados neste trabalho, apenas um (25%) afirmou fazer uso de álcool diariamente, por 55 anos. Esses hábitos podem ter influenciado o estado hipermetilado do gene p16, no entanto os casos positivos não expostos a esses fatores de risco sugerem que modificações epigenéticas podem estar associadas a outros fatores, como hábitos alimentares, infecções virais (HPV) e idade.

A proporção de homens e mulheres com metilação do p16 encontrada neste trabalho foi de 1:1. Zöchbauer--Müller et al.(2001) identificaram maior frequência em homens, em um estudo realizado com amostras de câncer de pulmão, entretanto essa relação não está esclarecida. A média de idade entre os indivíduos que apresentaram metilação do gene p16 foi de 72 anos, idade superior para a média verificada nos negativos (56 anos). O envelhecimento torna as células mais suscetíveis às alterações na expressão de genes envolvidos com a proliferação celular, diferenciação e apoptose. Diversos estudos demonstraram que a metilação das ilhas CpG aumenta com o avanço da idade (AHUJA et al., 1998; ISSA et al., 1994).

Os resultados deste estudo mostraram que 75% dos casos metilados se apresentavam em estádios avançados da doença, no entanto relatos sugerem que a metilação do gene p16 está relacionada com o início do desenvolvimento de tumores de cabeça e pescoço (EL-NAGAR et al., 1997; KRESTY et al.,

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2002), o que aponta a necessidade de estudos que agrupem maior número de indivíduos em estádios iniciais.

De acordo com os resultados deste estudo, conclui-se que o envelhecimento pode estar associado à metilação do gene p16, enquanto o estádio de desenvolvimento tumoral parece não apresentar essa relação. No entanto, são necessários mais estudos, incluindo um maior número de casos, que confirmem o papel da metilação do gene p16 e sua aplicação como possível marcador molecular de diagnóstico precoce e prognóstico do carcinoma epidermoide de cavidade bucal.

Agradecimentos: À Dra. Eliete Rabbi Bortolini pelo apoio dado aos projetos de iniciação científica realizados pelos alunos da Faesa. Ao Hospital Santa Rita de Cassia onde este estudo foi desenvolvido.

Apoio financeiro: Fundo de Apoio à Ciência e Tecnologia do município de Vitória (Facitec – PMV) / ES, Brasil.

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Recebido em março de 2011Aceito em outubro de 2011

Correspondência para/ Reprint request to:Dra. Sonia Alves Gouvêa Dept. Ciências Fisiológicas, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Espírito Santo Avenida Marechal Campos, 1468 - Vitória, ES, BrasilCEP: 29042-755Telefone: 55-27-33357333 - Fax: 55-27-33357330E-mail: [email protected]; [email protected]

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POssíVeis ALteRNAtiVAs AO PReDOMíNiO DA LÓGiCA iNstRuMeNtAL

POSSIBLE ALTERNATIVES TO THE PREDOMINANCE OF THE INSTRUMENTAL LOGIC

JULIA BELLIA MARGOTO1

RICARDO ROBERTO BEHR2

issue DOi: 10.5008/1809.7367.045

ResuMO

Este ensaio objetiva contribuir para a discussão acerca das possibilidades de construção de alternativas à lógica instrumental burocrática, essência do modelo de sociedade centrada no mercado, conforme aponta Guerreiro Ramos (1989). Para tal intento, procurou-se realizar um resgate conceitual sobre o modelo burocrático, partindo de um enfoque crítico e evidenciando sua tentativa permanente de ma-nutenção e ocultação de uma ideologia de dominação que se perpetua historicamente, baseada do trinômio poder, controle e alienação, de acordo com o que sustenta Motta (1997). A partir desta análise, traçam-se considerações sobre a dualidade entre as racionalidades instrumental e substantiva, esta como representativa de uma alternativa à primeira. Dando continuidade, apresenta-se o que Guerreiro Ramos (1989) denominou paradigma paraeconômico, que cria diferentes categorias de enclaves alternativos e que abrem espaço para atuações sociais inovadoras, distantes, em diversos aspectos, da predominante lógica de mercado. Por fim, a necessidade de emergência de uma racionalidade diferenciada e oposta ao extremo vínculo entre meios e fins torna-se evidente a partir das análises aqui realizadas, podendo até mesmo ser percebida, mesmo ainda de maneira tímida, na sociedade atual.

Palavras-chave: Modernidade. Racionalidade. Identidade.

ABstRACt

This essay contributes for the quarrel concerning the possibilities of construction of alternatives to the instrumental bureaucratic logic, essence of the model of society centered in the market, as Guerreiro Ramos points (1989). For such intention, a conceptual rescue on the bureaucratic model was made, under a critical approach and evidencing its permanent attempt of maintenance and occultation of an ideology of domination that historically perpetuates based on the triad power, control and alienation, in accordance with what supports Motta (1997). From this analysis, considerations are traded on the duality between the instrumental and substantive rationalities, this as representative of an alternative to the first one. In the sequence, it is presented what Guerreiro Ramos (1989) called par economic paradigm, which creates different categories of alternative enclaves that open space for innovative social performances, distant, in diverse aspects, of the predominant market logic. Finally, the need for the emergence of a distinctive rationality and opposed to the extreme link between means and purposes, it is clear from the analysis presented here and may even be perceived, though still very tentatively, in today’s society.

Keywords: Modernity. Rationality. Identity.

1 Mestre em Administração pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Professora Assistente do Departamento de Administração da Ufes.

2 Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina e pós-doutor em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor Associado do Departamento de Administração da Ufes.

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iNtRODuÇãO

Este ensaio pretende lançar luz a uma discussão extremamente antiga, porém distante ainda de se tornar obsoleta. Não é recente a busca de alternativas à lógica da sociedade em que vivemos, baseada em princípios essencialmente burocráticos, centrada no mercado e, consequentemente, regida pela chama-da racionalidade instrumental. Entretanto, nunca se fez tão presente a preocupação com determinadas consequências dessa racionalidade predominante, relacionada com a exploração e a alienação huma-nas, com o desgaste ético, a extinção de recursos disponíveis no planeta, o consumismo exacerbado, a desigualdade social, dentre tantas outras.

A sociedade civil passa a se organizar cada vez mais em associações, Organizações Não Governamen-tais (ONGs) e outros tipos de organizações do chamado terceiro setor, objetivando a busca de soluções para anos de descaso diante de questões como a preservação dos recursos naturais e a construção de uma sociedade mais igualitária e justa, citando apenas os temas mais recorrentes, embora muitos outros pontos essenciais façam parte dessa agenda. Considerando tal quadro, fazem-se necessárias reflexões mais profundas, capazes de suportar as mudanças em andamento na sociedade atual. Assim, a partir da revisitação a algumas das principais elaborações teóricas de autores, como Alberto Guerreiro Ramos, Maurício Tragtenberg e Fernando Prestes Motta, expoentes da produção científica nacional, dentre outros, pretende-se resgatar e analisar algumas possibilidades de surgimento de uma nova for-ma de racionalidade, baseada em valores e pressupostos um tanto distantes do que se conhece como sociedade centrada no mercado.

As ORiGeNs HistÓRiCAs e As CARACteRístiCAs DO feNÔMeNO BuROCRátiCO

Segundo Weber (1982), a burocracia é um tipo de poder. É igual à organização. Nela, a divisão do trabalho é feita de forma racional, objetivando fins específicos. Assim, a burocracia possui uma ação racional, que é a relação coerente entre os meios e os fins visados. O formalismo, a existência de normas escritas, estrutura hierárquica, divisão horizontal e vertical do trabalho e impessoalidade no recrutamento dos cargos são características predominantes nas organizações burocráticas, que têm, na especialização, na fidelidade impessoal ao cargo e na remuneração em dinheiro, alguns de seus fatores predominantes.

O pensamento de Motta (1997) apresenta uma linha de análise do fenômeno burocrático que o caracteriza a partir de um trinômio sobre o qual se sustenta ao longo da história: poder, controle e alienação. Assim, a burocracia se realiza sobre uma base de três elementos interdependentes e inter-relacionados, sendo ela própria o principal alicerce de um sistema antagônico por natureza, o capitalismo. Tal antagonismo reside no fato de que a posse dos meios de produção é de uns, enquanto outros estão completamente excluídos dessa possibilidade de propriedade. Assim, onde existe antagonismo, existe burocracia.

Ao discorrer sobre o trinômio acima apontado, Motta (1997), assim como Tragtenberg (1980), remon-tam historicamente ao modo de produção asiático como representativo do surgimento da burocracia nas sociedades. Tal forma de organização da produção é característica das civilizações antigas, como o Egito, a China, a Mesopotâmia, o México e o Peru, quando uma minoria de indivíduos passou a se apropriar do excedente econômico, recrutando e empregando mão de obra abundante que era utiliza-da na construção de grandes obras. Como exemplo, as pirâmides no Egito e as obras de irrigação na China. Tal modo de produção passou a exigir um maior planejamento de atividades e o emprego de funcionários intelectualizados que seriam responsáveis pela supervisão e controle do grande contingente de empregados. Inicia-se aí o delineamento de traços marcantes de autoridade e de uma hierarquia rígida que passou a controlar também as informações, já que a burocracia possui e sempre possuiu o segredo como uma de suas armas fundamentais.

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Em função de tais constatações, é que se afirma que a própria administração se confunde com a buro-cracia, ao se consolidar como instrumento e fonte de dominação ao longo da história.

ANALisANDO O tRiNÔMiO BuROCRátiCO: O PODeR, O CONtROLe e A ALieNAÇãO

A dominação racional-legal, de acordo com Weber (1982), é aquela que se sustenta sobre a crença das leis, normas e regulamentos, como capazes de determinar a legitimidade das relações de dominação. O poder é exercido dentro de limites fixados por um sistema de regras que funciona com requisitos de lei. A burocracia é, portanto, o aparato administrativo que se configura a partir desse tipo de dominação, na qual regras estabelecidas independem das pessoas. A empresa moderna consolida-se, assim, ao longo do tempo, como a organização que melhor reflete a burocratização.

Historicamente, os mecanismos de poder e controle sobre os processos e as relações de trabalho vêm se tornando cada vez mais sofisticados, objetivando, sempre, a manutenção e a ocultação das relações de dominação. Tal controle capitalista pode constituir-se na prática, de maneira direta ou indireta, buscando sempre o adestramento do corpo e das emoções do trabalhador, na perspectiva de que é necessário controlar para produzir. De acordo com Faria (2004), o controle direto configura-se no exercício da vigi-lância estreita e permanente; já o controle indireto assume contornos mais sutis, como os trabalhos em equipe, os grupos de controle de qualidade, os famosos grupos semiautônomos, dentre outros.

Como não se pode deixar de considerar a interdependência entre os elementos do trinômio poder, controle e alienação, entende-se que a instituição dessa última, no contexto organizacional burocrático, dá-se, em grande parte, pela instauração e perpetuação das outras duas bases elementares. Assim, a alienação pode ser entendida normalmente, constituída e constituinte de outros elementos essenciais da burocracia.

A hierarquia rígida, ao delimitar de maneira muito precisa e estreita a esfera de competências, direitos e deveres dos integrantes da estrutura burocrática, também limita a liberdade de ação dos indivíduos na esfera organizacional. Da mesma maneira, a divisão e a especialização de tarefas leva o trabalhador a uma atitude de estranhamento com o produto de seu próprio trabalho, com o qual não se identifica mais. Apoiando-se na conhecida definição proposta por Karl Marx, Motta (1997), apresenta a alienação como um processo de empobrecimento do homem, na medida em que se produz mais riqueza, sendo a valorização do mundo das coisas inversamente proporcional à valorização do mundo dos homens.

Assume-se, assim, que o modo de pensar burocrático levaria à tendência a se deixar de lado todos os valores que não sejam absolutamente práticos, isto é, o predomínio da racionalidade instrumental sobre qualquer outra, conduzindo o homem ao vazio e à luta por pequenas posições na hierarquia social de prestígio ou de consumo.

As DifeReNtes fORMAs De RACiONALiDADe

A racionalidade instrumental é o que alimenta o que Touraine (2002) denomina de “modernidade dividi-da”. Ramos (1989), apoiando-se em Weber (1968), apresenta a racionalidade instrumental ou funcional como aquela que se contrapõe à racionalidade noética ou substantiva, representando a preocupação com a coordenação entre meios e fins, com a busca da eficiência operacional, com uma expectativa de resultados a partir da qual os critérios para ordenação das associações humanas são sempre dados socialmente. Tal é a racionalidade preponderante, portanto, na essência burocrática, na empresa capi-talista e na sociedade centrada no mercado.

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À luz da racionalidade substantiva, ao contrário, os critérios seriam dados de maneira racional, sendo evi-dentes por si mesmos ao senso comum individual, de maneira dissociada de qualquer processo particular de socialização. Essa racionalidade substantiva não pode ser percebida como pertencente a qualquer organização, mas sim aos indivíduos como seres racionais, já que não está diretamente relacionada com as questões de eficiência, com expectativas de sucesso ou com a coordenação entre meios e fins. A racionalidade noética ou substantiva é entendida, então, como uma faculdade específica do homem e que afasta da ideia de razão a obediência cega às premissas e padrões de eficiência, enfocando, por outro lado, a ética e os valores. Sendo assim, a partir da utilização da racionalidade noética ou substan-tiva, o homem percebe que existem alternativas à submissão e ao engajamento cego a determinações e valores externos a ele, a partir da utilização de sua capacidade de julgamento e de crítica.

Assim, para a retomada da unidade na “modernidade dividida”, objetivando o alcance de uma nova modernidade, Touraine (2002) propõe a união entre a razão e o sujeito, o vínculo e a tensão entre racionalização e subjetivação, ou seja, uma concepção bipolar da realidade. O que melhor definiria a modernidade seria a exigência de liberdade e sua defesa contra tudo que transforma o ser humano em instrumento, em objeto ou em um absoluto estranho. Nesse sentido, o indivíduo só se torna sujeito opondo-se à lógica de dominação social, utilizando uma lógica de liberdade, de livre produção de si.

Realizando um paralelo entre as ideias de Touraine e Ramos, poder-se-ia considerar que a razão de Touraine corresponderia ao conceito de racionalidade instrumental, enquanto a ideia de subjetivação poderia estar relacionada com o conceito de racionalidade noética ou substantiva, com o retorno das suas possibilidades de liberdade e de atendimento à ética e com os valores pessoais na construção das decisões cotidianas dos sujeitos.

Para Ramos (2001), os empregos não podem e não se constituem mais na única maneira de permitir às pessoas o engajamento em produções sociais significativas, em que se possa reconhecer o valor dos indivíduos. Assim, a organização econômica formal, característica da lógica de mercado, não pode mais estar no centro da existência humana. Precisa, sim, ser delimitada a um contexto específico apenas, deixando lugar para a emergência de múltiplos tipos de organizações sociais alternativas que permitam relacionamentos interpessoais livres das pressões projetadas e organizadas.

O HOMeM eM susPeNsO

Se a teoria administrativa convencional está baseada na racionalidade instrumental, o mesmo ocorre com a própria natureza humana que passa a sofrer do que Ramos (apud FRANCA-FILHO, 2010) denomina síndrome comportamentalista. Tal síndrome se configura a partir do ponto em que o ser humano passa a confundir normas e regras de operação que são características de sistemas sociais episódicos, com as suas regras e normas de conduta como um todo, típico sintoma das sociedades industriais contem-porâneas, nas quais a ordem social está modelada a partir de critérios de economicidade.

Entretanto, Ramos (2001) sustenta, em suas análises, a emergência de um novo modelo de homem, configurado na noção de homem parentético. O autor fundamenta-se na ideia de uma atmosfera de crise que os indivíduos enfrentam nas organizações contemporâneas, seja no campo profissional, seja no acadêmico, com influência nas teorias formuladas sobre o campo administrativo. Tal crise seria consequência de uma profunda ambiguidade e confusão presentes nos ambientes interno e externo às organizações. Existiria, portanto, o provável surgimento de um tipo diferenciado de personalidade que possui dificuldades de ajustar-se passivamente a uma estrutura prefixada de valores institucionais e organizacionais. Assim, a contemporaneidade confusa e em crise faz emergir um novo modelo de homem na teoria administrativa, como resposta à necessidade de criar um referencial, um ponto de apoio para fornecer direcionamentos adequados a um novo contexto.

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A racionalidade noética ou substantiva é apontada como a mola propulsora do homem parentético. A noção de parentético é uma derivação das ideias de Husserl, nas quais o autor se apoia para criar sua nova visão de homem. É justamente a ideia do estar “em suspenso” entre “parênteses”. É a capacidade de excluir-se tanto de seu ambiente interno quanto de seu ambiente externo e examiná-los a partir de uma visão crítica.

Dessa forma, o homem parentético configura-se como um reflexo das novas circunstâncias sociais das sociedades industriais avançadas, requerendo a emergência de um nível diferenciado de consciência. Na sociedade contemporânea, o desenvolvimento e a renovação organizacional só fazem sentido se forem capazes de proporcionar às pessoas uma verdadeira participação social. Por isso, segundo ele, não se pode pensar a partir de uma ótica restrita de gerenciamento apenas das organizações, mas sim a partir de um intuito muito mais amplo e audacioso de dirigir a sociedade como um todo.

Ao mesmo tempo, na medida em que o emprego, em sua lógica formal e instrumental, típica da sociedade centrada no mercado, conforme argumenta Ramos (2001), pode deixar de ser a única opção compre-endida como suficiente para conferir valor e identidade ao ser humano, passa-se a admitir a inclusão dos indivíduos em ocupações alternativas, como as associações, o trabalho autônomo, o artesanato, dentre outras, ampliando ainda mais as opções e possibilidades de autorrealização.

eM fOCO uM NOVO PARADiGMA

Ramos (1989) chega a propor uma teoria substantiva da vida humana associada, uma de suas cons-truções mais importantes, segundo a qual o debate racional, no sentido substantivo, é que constituiria a essência da forma política de vida, sendo, ao mesmo tempo, o suporte indispensável para qualquer vida humana associada que pretendesse ser bem regulada em seu conjunto. O modelo de análise unidimensional das ciências sociais, assim determinado pela evidenciação da predominância da lógica instrumental de mercado sobre qualquer outra em questão, é confrontado a partir da teoria da delimitação dos sistemas sociais. Nela se evidencia a proposta de instituição de uma “nova ciência das organizações”. O paradigma paraeconômico é o elemento central dessa teoria e prevê uma sociedade constituída de vários enclaves, na qual o mercado estaria limitado a ser apenas um deles. Ao se constituir em nada mais do que apenas um dos enclaves de uma sociedade, que passa, então, a ser multicêntrica, o mercado deixa de ser o exclusivo determinante das relações sociais e das possibilidades de realização humana. Nesse contexto, somente de maneira incidental, o indivíduo é um maximizador de utilidades, e a sua existência é conduzida dentro de suas próprias necessidades de atualização pessoal.

Os enclaves do paradigma paraeconômico são definidos no sentido de tipo ideal weberiano, ou seja, não se espera que sejam encontrados de maneira pura em nenhuma situação existente na vida social. O que determina a diferenciação entre tais enclaves é uma maior ou menor prescrição normativa e uma orientação mais comunitária ou mais individual. Suas denominações são as seguintes: economia, isono-mia, motim, isolado, fenonomia e anomia. Para os objetivos propostos neste ensaio, torna-se suficiente a discussão apenas acerca da economia, da isonomia e da fenonomia.

A economia é o enclave típico do mercado. Configura-se a partir do ordenamento sistemático de um contexto organizacional que tenha sido estabelecido para a produção de bens e/ou para a prestação de serviços. Na sociedade centrada no mercado, as economias acabam por moldar a mente de seus membros e também orientar a vida de seus cidadãos, como se o critério de desempenho eficiente resu-misse completamente a natureza humana. A economia é entendida como locus da razão instrumental em qualquer tipo de organização, sejam privadas, com ou sem fins lucrativos, sejam estatais (BOEIRA; MUDREY, 2010).

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Por outro lado, as isonomias referem-se à ideia de associações sociais formadas por iguais, nas quais o objetivo de quem nelas se insere é conseguir a sua atualização, sem a preocupação com a obediência a normas escritas ou a critérios de desempenho. As pessoas não procuram as isonomias para ganhar suas vidas, mas para participar de um relacionamento pessoal gratificante, no qual dão e recebem. A atividade, nas isonomias, configura-se muito mais sob o apelo da vocação do que do emprego e pela busca da realização de motivações intrínsecas e não de interesses de utilidade. Já são muitas as ten-tativas de relacionamento social a partir da lógica desse enclave como as associações, as empresas de propriedade dos trabalhadores, grupos de cidadãos organizados, dentre outros.

As fenonomias permitem aos indivíduos que delas fazem parte grandes possibilidades de opções pes-soais e uma reduzidíssima subordinação a normas e prescrições. Tal enclave tem caráter esporádico ou mais ou menos estável, iniciando-se na ação de um único indivíduo ou de poucos indivíduos que utilizam plena autonomia para liberação de sua criatividade em obras automotivadas. Sendo assim, os critérios econômicos nas fenonomias podem ser considerados incidentais, se comparados com a questão da motivação dos indivíduos. Importante é ressaltar que os indivíduos integrantes das fenonomias, ao mesmo tempo em que se voltam para suas próprias singularidades, não deixam de ter uma preocupação consciente com o social. São os casos típicos de artistas, jornalistas, escritores, artesãos, inventores e outros tipos de trabalhadores autônomos.

Boeira e Mudrey (2010), referindo-se às ideias de Ramos, sustentam que as sociedades centradas no mercado têm tomado critérios, como status, riqueza, raça e sexo, como parâmetros para alocação de autoridade e poder, o que não deveria ocorrer. Entretanto, desde o século XVII, tais critérios têm sido utilizados pelas sociedades centradas no mercado, justamente porque nelas a economia é uma dimensão ou sistema dominante sobre as fenonomias e isonomias.

CONsiDeRAÇÕes fiNAis

Finalmente, a partir do exposto, percebe-se a congruência de alguns autores para o fato de que a pre-dominância da lógica instrumental burocrática e a perpetuação de uma sociedade centrada no mercado têm imposto ao ser humano uma pressão extremamente constante e forte, no sentido da submissão e da colocação em um segundo plano, ou mesmo da anulação, de suas reais motivações e necessidades de autorrealização. A necessidade de emergência de uma racionalidade diferenciada e oposta ao extremo vínculo entre meios e fins torna-se evidente a partir das análises aqui realizadas. Alternativas teóricas, há algum tempo delineadas, parecem começar a se tornar um fato social concreto. Embora ainda de forma incidental, alguns movimentos, no sentido da instituição de alternativas diferenciadas de atuação pessoal e social, que se afastam da prescrição, da hierarquia e da burocratização, podem ser observados.

Estaria, então, configurada a possibilidade de ascensão de uma lógica substantiva de ação caracterizada no homem parentético? Estaria emergindo uma lógica diferenciada em indivíduos capazes de ação crí-tica e noética, fiéis a seus valores e à sua ética e com capacidade transformadora suficiente a ponto de romperem com as amarras da realidade imposta, da submissão, do controle e da dominação inerentes ao ambiente organizacional formal, tornando-se catalisadores de alternativas à centralidade do mercado?

Tais questões realmente só poderão começar a ser respondidas, em definitivo, a partir de estudos empíricos aprofundados. O que se pretendeu aqui, modestamente, foi apenas conferir ao debate um referencial teórico e um quadro analítico capazes de auxiliar no suporte a tal tarefa.

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RefeRÊNCiAs

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Recebido em março de 2011Aceito em outubro de 2011

Correspondência para/ Reprint request to:Julia Bellia MargotoUniversidade Federal do Espírito Santo Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas Departamento de AdministraçãoAvenida Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras.Vitória/ES – BrasilCEP: 29075-910

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RefLeXÕes sOBRe A APReNDizAGeM MAteMátiCA De ADuLtOs

REFLECTIONS ABOUT ADULTS LEARNING MATHEMATICS

RONY C. O. FREITAS1

issue DOi: 10.5008/1809.7367.046

ResuMO

Este artigo apresenta uma reflexão sobre aprendizagem matemática de adultos trabalhadores, oriunda de pesquisa de doutorado. A temática tem permeado discussões, produções e pesquisas sobre o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação Jovens e Adultos (Proeja) no Instituto Federal do Espírito Santo. Tem focado as discussões apenas sobre aspectos pedagógicos, tendo em vista a dificuldade em enveredar por teorias psicológicas para entender as construções cognitivas elaboradas por adultos. Alguns aspectos têm se mostrado mais relevantes com referência à aprendizagem matemática de adultos, entre eles, as interações em grupo, a busca pela liberdade, as construções pedagógicas, os materiais didáticos, o currículo e a prática do professor, a partir das experiências e do diálogo. Este texto focaliza os dois últimos, dada a sua relevância, além da influência que exerce sobre os demais. Utiliza, como aporte teórico, influências das pesquisas em Educação de Jovens e Adultos (EJA), em educação profissional e traz a Educação Matemática Crítica para subsidiar as ações no contexto da Matemática.

Palavras-chave: Proeja. Educação Matemática. Aprendizagem de adultos.

ABstRACt

This paper presents a reflection about adult workers learning Mathematics, arising from doctoral research. The theme has permeated discussions, productions and research on the Proeja at the Instituto Federal do Espírito Santo. We have focused the discussions only on pedagogical aspects in view of the difficulty to engage in psychological theories to understand the cognitive constructions produced by adults. Some aspects have been more relevant when referring to the adults learning mathematics, from the group interaction, the quest for freedom, educational buildings, instructional materials, curriculum, teacher practice, from own experiences and dialogue. In this paper we deepen the last two, given the importance that we have observed, and the influence we have seen over the others. We use as the theoretical influences of research in Adult Education, Professional Education and bring the Critical Mathematics Education to support our vision and our actions in the context of Mathematics.

Keywords: Proeja. Mathematics Education. Adults learning.

1 Doutor em Educação – Ufes.

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iNtRODuÇãO

As reflexões feitas neste texto são frutos de pesquisa realizada no âmbito do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a educação básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja). Esse programa abrange ações relacionadas com pesquisa, formação de professores e cursos que possam proporcionar a estudantes jovens e adultos formação profissional integrada à educação básica. As experiências relatadas aqui têm sido feitas nos cursos Proeja em andamento no Campus Vitória do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) que, neste caso específico, abrange educação profissional técnica de nível médio integrada com o ensino médio, destinada a quem já concluiu o ensino fundamental e ainda não possui o ensino médio e pretende ter uma formação técnica. A base legal do programa é o Decreto nº 5.840, de 13 de julho de 2006. Outros atos normativos que fundamentam o Proeja são: a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996; o Decreto nº 5.154, de 23 de julho de 2004; os Pareceres CNE/CEB nº 16/99, nº 11/2000 e nº 39/2004; e as Resoluções CNE/CEB nº 04/99 e nº 01/2005.

No desenvolvimento das ações descritas no parágrafo anterior, cada vez mais temos sentido necessidade de refletir acerca da aprendizagem de adultos, sobretudo quando pensamos em ações relacionadas com a educação de jovens e adultos trabalhadores. Entendemos que a aprendizagem de jovens, já há muito tempo, tem sido valorizada em pesquisas sobre processos cognitivos e metodologias educa-cionais, mas o adulto continua fora da maioria das discussões a esse respeito. Esse pensamento tem permeado nossas reflexões, ações e pesquisas associadas à Educação Matemática no Proeja, dentro do Instituto Federal do Espírito Santo.

Dessa forma, resolvemos trazer esta discussão à tona, mas, desde o início, deparamos-nos com um dilema. Poderíamos caminhar por duas vertentes: a primeira seria tentar formular ideias sobre as estru-turas cognitivas do adulto e, a partir daí, tentar compreender como novos conhecimentos se agregam a conhecimentos já assimilados; a segunda vertente seria elaborar ou organizar os fatores motivadores da aprendizagem de adultos, considerando aspectos emocionais, pedagógicos e sociais. Neste caso, estaríamos mais interessado em saber o que motiva ou desmotiva o adulto a aprender e como poderí-amos nos voltar para ações que pudessem contribuir para o processo de aprendizagem.

A opção foi a segunda vertente, primeiramente por considerarmos a dificuldade que seria enveredar por teorias psicológicas para entender as construções cognitivas elaboradas por adultos, mesmo porque há limitações nesse campo, já que “[...] as teorias do desenvolvimento referem-se, historicamente, de modo predominante à criança e ao adolescente, não tendo estabelecido, na verdade, uma boa psicologia do adulto” (OLIVEIRA, 1999, p. 60). Depois, por considerarmos que a forma como devem ser organizadas as questões sobre ensino e aprendizagem tem papel fundamental para a aprendizagem de adultos. Ou seja, as questões externas são preponderantes no processo e podem contribuir positiva ou negativamente para que a aprendizagem possa ser significativa para o estudante adulto. Essas questões externas, caracterizadas por Oliveira (1999), seriam: “[...] a condição de ‘não-crianças’, a condição de excluídos da escola e a condição de membros de determinados grupos culturais”.

Utilizamos, como ponto de partida, a afirmação de Merriam (2004, p.199-200) de que não há uma teoria única ou modelo para aprendizagem de adultos. Fazemos duas afirmações importantes que precisam ser consideradas como base de sustentação para toda a discussão: a) o estudante adulto traz consigo experiências de vida que devem ser valorizadas e experiências escolares que muitas vezes foram sig-nificativas para que ele fosse “expulso” da escola em algum momento de sua vida; b) há necessidade de se experimentar novos métodos educacionais que possam respeitar individualidades e trabalhar a diversidade, que não sejam baseados exclusivamente em mecanizações, formalizações e processos.

Também é importante, inicialmente, sabermos que a preocupação com aprendizagem de adultos não é recente. Eduard Lindeman, em 1926, já afirmava que era necessário pensar em um novo tipo de educa-

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ção que assumisse a afirmação de que educação é a vida – e não uma mera preparação para um tipo desconhecido de vida futura, pensando apenas em uma educação relegada ao processo de aprendiza-gem para o período de juventude. Para o autor, a vida inteira é aprendizagem, educação, portanto, não poderia ter fim. Esse novo empreendimento é o que Lindeman denominou educação de adultos não porque se limitava a esse público, mas porque a maturidade do adulto é o que delimitaria seus limites.

No entanto, o autor não nos dá muitos caminhos para explorar os limites aos quais ele se refere e, tampouco, identificar quais são os processos que poderiam contribuir para a tarefa de educar adultos, seja para uma continuidade nos estudos, seja para o resgate de uma educação abandonada em algum momento da vida. Mas Lindeman, de certa forma, aponta para uma educação real que considere o momento presente e que parece cobrar uma mudança de postura do educador, reconhecendo que o adulto tem um saber que a escola deve conhecer e valorizar.

Ranciêre (2007, p. 79) vincula a inteligência muito fortemente à vontade e à necessidade, “[...] ali onde a necessidade cessa, a inteligência repousa, a menos que uma vontade mais forte se faça ouvir e diga: continua”. Também acreditamos que a vontade é um fator determinante para o processo de aprendizagem, mas não podemos nos esquecer de que, no caso do estudante adulto, particularmente, uma carga muito forte de rejeição e derrota é colocada em suas costas. Essa característica também deve ser considerada ao se pensar em processos que possam colaborar para a aprendizagem. Ranciêre (2007) diz que “[...] talvez o fato de vontades desigualmente imperiosas seja suficiente para explicar a desigualdade das performances intelectuais”. Vamos entender essas “desigualdades imperiosas” como certas situações impostas ao estudante da EJA que o fizeram, em algum momento de sua vida, desistir da escola.

Precisamos, ainda, trazer essa discussão para o meio da Educação Matemática. Em que ponto pode-mos ter uma prática educacional matemática que possa colaborar para o processo de aprendizagem de estudantes adultos? Pois bem, precisamos considerar que, para alguns estudantes, a Matemática teve papel fundamental em sua saída da escola ou, ainda, o estudante que volta para escola, mesmo tendo passado por um insucesso em algum momento de sua vida escolar, quer para si exatamente a Matemática de exemplos e repetições que presenciou. Esse é uma situação que precisa ser mudada. A Matemática precisa ser encarada como uma possibilidade de se refletir criticamente.

Quando o ato de encarar o paradoxo da razão e de refletir sobre o que é feito pela matemática se tornam parte da aprendizagem da matemática, então o ensino e a aprendizagem dialógicos se tornam importantes. Consideramos que os processos de aprender e de ensinar podem ser um recurso para reflexões e para a aprendizagem crítica (SKOVSMOSE, 2007, p. 233).

Para Skovsmose (2007, p. 236), é importante que a Educação Matemática crítica “compreenda” os estudantes, querendo dizer com isso que eles sejam vistos como seres humanos (e não apenas como sujeitos epistêmicos). Essa nova concepção crítica da Matemática pode colaborar em vários aspectos relacionados com a educação de adultos, principalmente nessa consideração de estudantes como reais e como agentes no processo de aprendizagem.

O sujeito epistêmico pode ter dificuldade em apreender uma ideia matemática particular. Esse sujeito pode enfrentar alguns obstáculos de aprendizagem e podemos considerar a natureza desses obstáculos. Por exemplo, pode se tornar relevante considerar como uma noção mais geral de proporcionalidade seja obstruída por ideias previamente apreendidas sobre propor-cionalidade. Contudo, considerando estudantes reais, os obstáculos de aprendizagem podem ter uma natureza completamente diferente, um buraco no teto, por exemplo. Estudantes reais têm qualidades que o sujeito epistêmico não tem, por exemplo, estar com fome (SKOVSMOSE, 2007, p. 235).

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Considerar estudantes reais exige uma compreensão de sua experiência passada e de seu horizonte futuro (SKOVSMOSE, 2007). É a partir desse ponto que fazemos um aprofundamento desta discussão, focando-nos em dois aspectos: a importância da valorização das experiências, já abordada por vários autores; e o diálogo como fundamental na aprendizagem de adultos.

APReNDizAGeM A PARtiR DAs PRÓPRiAs eXPeRiÊNCiAs

Se há uma questão que parece ser consenso entre pesquisadores em educação de jovens e adultos é a importância da valorização da experiência que os estudantes trazem para a escola. Bishop (2000) aponta que pesquisas atuais evidenciam que o professor deve considerar que, antes de se apresentar novas ideias aos alunos, é preciso saber o que o estudante já traz, reconhecendo que grande parte dos conhecimentos matemáticos prévios de seus alunos são provenientes de fora da sala de aula e que, às vezes, nem mesmo ele tem consciência de que o possui. É importante os estudantes perceberem que a Matemática não está presa em livros e apenas na escola. Isso nos lembra a fala de um estudante do Proeja, ao fazer uma tarefa de Matemática. A atividade era simples: levantar a quantidade de azulejos necessária para revestir as paredes de um cômodo. O aluno resolveu a questão e se dirigiu ao professor falando:

Professor, eu trabalho em uma loja de materiais de construção e lá eu faço esse tipo de le-vantamento. Hoje mesmo eu fiz uma venda de quase R$8.000,00. Lá eu faço esse cálculo desse jeito: calculo a área total, calculo a área de cada azulejo e divido uma pela outra. Aqui eu também posso fazer assim?

O depoimento do aluno mais uma vez nos fez pensar: por que os estudantes continuam achando que a Matemática que utilizam no trabalho, na vida, não serve para a escola? Por que continuam achando que a Matemática da escola é outra? Bishop (2000) diz que um ponto de partida é preparar tarefas que estejam situadas em contextos que permitam aos alunos utilizarem esquemas e conhecimentos prévios de maneira significativa. O processo de construção do conhecimento do adulto, principalmente, é permeado por suas experiências de vida, cuja lembrança é mobilizada em determinados momentos nas interações de ensino-aprendizagem escolar (FONSECA, 2002). No entanto, precisamos ainda refletir de que forma podemos propiciar esse ambiente, principalmente quando tratamos de Educação Matemática e, mais especificamente, quando tratamos de uma Matemática para ensino médio ou para a formação profissional, tendo, como ponto de partida, que “[...] as ruas também são locais de educação matemática” (SKOVSMOSE, 2007, p. 49).

Lindeman (1989) corrobora o pensamento de Skovsmose e aponta alguns caminhos para essa práti-ca, ao dizer que a abordagem da educação de adultos deverá ser via situações e contextos e não de disciplinas. Para que a aprendizagem possa ter maior chance de êxito, precisa tomar, como ponto de partida, os alunos e não os professores e as disciplinas. O autor norte-americano aponta que, nessa perspectiva, o currículo real deverá ser construído em torno dos interesses e necessidades do aluno, que, por sua vez, teria capacidade de trazer para o processo educacional experiências vividas no trabalho, no lazer, na família, na comunidade etc., fazendo os ajustes necessários a partir das interações vividas.

Somando-se a isso, deve-se considerar que o aluno somente terá uma participação realmente ativa na escola se ela for ligada à vida, se compreender que não se deve considerar o discente como um aluno passivo (GRAMSCI, 1982). Para Lindeman (1989), diferentemente do ensino de crianças, para o qual pode ser necessário antecipar a experiência objetiva pelo uso da imaginação, a experiência do adulto já está lá, esperando para ser apropriada, “A experiência é o livro didático vivo do estudante adulto” (LINDEMAN, 1989, p. 7). Oliveira (1999, p. 60-61) complementa essa assertiva dizendo que

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[...] o adulto está inserido no mundo do trabalho e das relações interpessoais de um modo diferente daquele da criança e do adolescente. Traz consigo uma história mais longa (e pro-vavelmente mais complexa) de experiências, conhecimentos acumulados e reflexões sobre o mundo externo, sobre si mesmo e sobre as outras pessoas. Com relação à inserção em situ-ações de aprendizagem, essas peculiaridades da etapa de vida em que se encontra o adulto fazem com que ele traga consigo diferentes habilidades e dificuldades (em comparação com a criança) e, provavelmente, maior capacidade de reflexão sobre o conhecimento e sobre seus próprios processos de aprendizagem.

Lindeman (1989) aponta que, a partir das experiências trazidas pelos estudantes adultos, o processo de ensino tende a se tornar mais rico, desde que o professor de adultos se conscientize de que ele se torna também um aprendiz e está inserido dentro de uma situação de aprendizagem que se dá em um cenário real. A aprendizagem ocorre a partir de fatos concretos e não de abstrações, “[...] se educação é vida, então vida também é educação” (LINDEMAN, 1989, p. 6) e nada mais vivo para o estudante adulto do que suas relações com o trabalho e, para Gramsci, essa relação se estabelece com a práxis que deveria considerar a fusão absoluta entre o mundo educacional e o da produção (MAYO, 2004).

Para Skovsmose (2007), ocorre muita aprendizagem fora da escola. Esse saber é parte da vida diária e também é produzido em empresas e em locais de trabalho. Porém, aproveitar essa experiência na escola, apesar de primordial na EJA, não é, necessariamente, fácil. Afinal, utilizar o contexto do es-tudante significa reconhecer a realidade vivida por ele e o meio no qual ele está inserido. Outro fator complicador e que por isso não deve ser esquecido é a importância de se valorizar a experiência sem que façamos da escola uma simples reprodutora dessas realidades e, muito menos, uma adaptação às prioridades políticas e econômicas (quaisquer que sejam). A educação deve engajar-se no processo político, incluindo uma preocupação com a democracia. Nesse sentido, a Educação Matemática pode contribuir de forma significativa, desde que se tenha consciência do seu papel na preparação das bases para a sociedade informacional (SKOVSMOSE, 2007).

Por outro lado, devemos lembrar e considerar que o ensino da Matemática formal tem uma parcela de culpa na exclusão do jovem e adulto do ensino regular e, por isso, esse ensino precisa participar do processo e reintegração desse sujeito. É importante aproximar os jovens e adultos da Matemática acadêmica (dos livros), tendo em vista que, assim, se “[...] estabelece um diálogo entre os diferentes tipos de conhecimento matemático, considerando-se as relações de poder implícitas nesse confronto” (KessLeR, 2006, p. 111).

Tenho 24 anos de idade, ensino médio completo e é com muita felicidade e satisfação que eu, depois de várias tentativas para ingressar na Universidade consegui essa grande oportunidade de entrar no Cefetes. É um sonho concretizado de formação técnica profissional qualificada e garantida. Esse primeiro semestre, na disciplina Matemática, não era para eu ‘lembrar’ o que havia há algum tempo aprendido, era aprender de verdade. Na minha pequena trajetória de estudo, sempre tive dificuldades nas matérias de exatas. Sabendo disso sempre me empenhei, me dediquei e me preocupei com essa dificuldade (ESTUDANTE DO PROEJA).

Quando nos referimos à Educação Matemática, tendo por base a valorização do conhecimento prévio e experiências vividas, parece fácil estabelecer uma relação direta entre esses saberes e a Educação Matemática. Afinal,

[...] podemos encontrar matemática em todo lugar. E podemos encontrar muitos tipos diferentes de matemática em todo lugar. Como podemos esperar que exista qualquer característica co-mum? A matemática é desenvolvida por muitos diferentes grupos de pessoas em circunstâncias muito diferentes. Ela se refere a uma pluralidade de atividades (SKOVSMOSE, 2007, p. 211).

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No entanto, há algumas coisas complicadas no processo. Várias questões estão envolvidas numa rela-ção de ensino e aprendizagem, passando pela formação inicial de professores que não discutem esse tipo de prática, até abordagens metodológicas que não conseguem responder aos anseios desse tipo de procedimento. Para Habermas (2004), ainda há outra questão a considerar: a necessidade de as ciências esclarecerem o que ele chama de “ilusões de mundo”, criadas pelo senso comum.

O autor fala da dificuldade de se estabelecer esse elo científico-cotidiano tão importante, especialmente pelo caráter mutante do que é denominado senso comum, que se modifica toda vez que o conhecimento científico se aproxima dele. Habermas nos ajuda a compreender um pouco mais sobre a complexidade que encontramos, quando nos referimos ao Proeja. Afinal, como preencher a grande lacuna existente entre a experiência extraescolar e o conhecimento científico sistematizado? Estamos, nesse caso, pen-sando no ensino de uma Matemática que possa ajudar os estudantes jovens e adultos a compreenderem a linguagem matemática, que, a partir do ensino médio, passa a ser mais rigorosa, e conseguirem, a partir desse conhecimento, estabelecer ligações com novos conhecimentos que encontrarão em outras disciplinas e conhecimento geral, principalmente, disciplinas profissionalizantes. Não queremos, com isso, dizer que a matemática sistematizada seja mais ou menos importante que a Matemática do dia a dia; queremos apenas enfatizar que um conhecimento é tão necessário quanto o outro.

Assim, estabelecer uma ponte entre as experiências de vida e o conhecimento matemático sistematiza-do talvez seja o maior desafio dos educadores matemáticos que atuam no Proeja, pois “[...] a tradição matemática escolar nos impede de ver a matemática operando em situações do cotidiano, apenas porque não há tanta Matemática escolar nessas situações. Nenhuma simples equação é resolvida etc.” (SKOVSMOSE, 2007, p. 213).

Ainda para Skovsmose (2007), o que dificulta essa ligação é o fato de o conhecimento tácito não ser expresso em palavras ou conceitos, mas em ações que o contêm ou expressam. Isso significa que, ao se deparar com um tipo de conhecimento matemático em que a linguagem precisa ser expressa por escrito, o estudante, constantemente, costuma não ver relação alguma entre as duas. A mediação do professor nesse processo, portanto, é fundamental para que o aluno possa vincular esses conhecimen-tos, quando possível, ou utilizar conhecimentos anteriores para compreender essa “nova Matemática” que lhe aparece. O professor pode, com isso, colaborar para que as manifestações em ações, advin-das do conhecimento tácito, possam ser complementadas, não necessariamente transformadas, por manifestações conceituais, sem esquecer que a apropriação do conhecimento pelo estudante ocorre com maior propriedade quando acontece antes, “[...] sem mestre explicador, antes de qualquer mestre explicador” (RANCIÊRE, 2007, p. 22).

As palavras de Ranciêre nos ajudam a refletir um pouco melhor, ampliando nossa visão sobre jovens e adultos, fazendo surgir uma questão: onde ocorre a aprendizagem? Talvez, se pensarmos um pouco, concluiremos que muito do que sabemos e utilizamos em nossa vida aprendemos em diversos momen-tos, inclusive na escola. Se considerarmos que o saber não é produzido somente na escola, mas em um campo mais amplo, no interior das relações sociais, talvez consigamos nos abrir um pouco mais para experiências extraescolares como parte do processo educacional.

Para Kuenzer (2001), o saber é uma produção coletiva dos homens em sua atividade real, enquanto produzem as condições necessárias à sua existência por meio das relações que estabelecem com a natureza, com outros homens e consigo mesmos. A grande questão, talvez, seja não pensar ou discutir mais se é importante ou não valorizar as experiências dos estudantes adultos e, sim, refletir sobre o que e como ensinar de forma contextualizada, aproveitando essas experiências. A dificuldade de atender a esse anseio passa por um tratamento individualizado do sujeito, afinal, experiências de vida são únicas e não coletivas. A mesma autora aponta que o caminho seria começar pela definição das finalidades a atingir e não pelo imediatismo ou pelas necessidades práticas postas por um contexto supostamente

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neutro (KUENZER, 2007). Para ela, essas finalidades dizem respeito a pessoas concretas e a indiví-duos que vivem em situações reais que precisam ser compreendidas em si e em suas articulações com a totalidade da vida social e produtiva com suas múltiplas, complexas e contraditórias relações. Nesse aspecto, é importante considerar os vários fatores que interferem no processo: família, trabalho, distância da escola, entre outros.

Ao longo de minha vida estudantil, tive várias dificuldades, mas sei da necessidade dos estudos e de mais conhecimentos dos quais irei necessitar. Vou fazer o máximo para que eu consiga adquiri-los aqui. No começo do 1º grau, caminhava a pé 3km até a escola. De oito colegas de minha comunidade que concluíram o 1º grau junto comigo, somente eu consegui terminar o segundo grau técnico em Contabilidade. Como morava 4km retirado da cidade, após trabalhar o dia todo na roça eu andava 3km até pegar o ônibus e andar mais 18km até a cidade (colégio) quando retornava às 23h. Depois que me formei, em 2000, fiz dois anos de pré-vestibular, mas não concluí e não fiz a prova, porque tive que trabalhar. Bem, aqui estou tentando de todas as formas, mas vejo as mesmas dificuldades de antes. Tenho uma filha a qual dou pensão e também, como não moro com meus pais, tenho outras diversas dificuldades e problemas (ESTUDANTE DO PROEJA).

Infelizmente, não tenho tempo para estudar em casa, porque trabalho na parte da manhã e à noite no quiosque no meu tio. O único tempo que me resta para estudar é durante o dia, na escola e na parte da madrugada, mas não consigo render muito porque me dá muito sono e acabo dormindo em cima do caderno ou do livro (ESTUDANTE DO PROEJA).

Tinha 25 anos que não estudava. Estou sentindo dificuldades em Matemática e Física. São matérias que precisam de mais tempo de estudo, raciocínio. A dificuldade de conciliar casa, trabalho, filho e estudo mexeu um pouco, mas todos nós passamos por isso quando buscamos algo novo. Não tive boas notas, mas posso dizer que aprendi bastante com os professores e com os colegas (ESTUDANTE DO PROEJA).

É evidente que não podemos atribuir à valorização de experiências anteriores a responsabilidade total pela aprendizagem de estudantes adultos. De nada adiantaria isso se as capacidades de crítica e reflexão não fossem privilegiadas. Lindeman (1989) considera esse fato e afirma que é essencial o estudante saber os porquês do que está acontecendo em todo processo de ensino e aprendizagem. Ao fazer isso, terá dado o primeiro passo em direção ao que o autor denomina comportamento inteligente. Lindeman diz isso para argumentar a favor de um processo de aprendizagem que possa emergir da própria experiência do educando e não a partir das experiências de outras pessoas. Segundo ele, inteli-gência não seria, então, apenas a capacidade de utilizar a experiência e sim utilizar e refletir sobre uma experiência que pode dar significado para o passado, o presente e o futuro. Skovsmose (2008) concorda com Lindeman ao dizer que reflexões podem contra-atacar o desenvolvimento de uma especialidade cega, e nós acrescentamos que também poderão contra-atacar ações mecânicas. Afinal, a construção do conhecimento não está no concreto, mas a partir dele e refletindo sobre ele.

APReNDizAGeM COM O DiáLOGO

O que foi dito até aqui depende totalmente das relações entre os indivíduos envolvidos nos processos que levam à aprendizagem, e não seria demais afirmar que a aprendizagem de adultos ocorre com o diálogo, seja para valorizar o que os adultos trazem de experiências de vida, seja para que possam, a partir da ação verbal, refletir sobre essas experiências. Antes de qualquer coisa, precisamos dizer o que estamos considerando por diálogo. Para isso, pegamos emprestada a conceituação de Skovsmo-se (2007), para o qual diálogo seriam as comunicações que objetivam exemplificar ou esclarecer algo

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ao mesmo tempo em que é indeterminado, um fim aberto, podendo não levar a lugar algum, além de envolver riscos mantendo a equidade. Salientamos ainda, que, para Skovsmose (2002, p.115):

[...] um diálogo pode ocorrer entre dois ou mais participantes. O ponto crucial não é o número de participantes, mas a natureza da conversa e do relacionamento entre os participantes. Diálogos ocorrem de maneira verbal e interações não verbais (tradução nossa).

Podemos, então, perceber, a partir do pensamento do autor, que o diálogo não está relacionado somente com aquilo que se fala, mas também com a forma como se age, o que nos remete à origem etimológica da palavra diálogo, que vem do grego dia, que significa “através”, e logos que pode ser traduzido como “significado”, o que nos levaria a entender diálogo como o processo de facilitar o desenvolvimento do significado com as pessoas envolvidas em sua coconstrução (SKOVSMOSE, 2006). Essa conceituação nos permite a estabelecer uma aproximação com o conceito de ação comunicativa de Habermas (1999) que se refere à interação de sujeitos capazes de linguagem de ação (verbais e não verbais) que se engajam em uma relação interpessoal, negociando as situações suscetíveis de consenso.

A questão principal, ao se valorizar o diálogo, é colaborar para que haja situações que possam transformar a dependência do oprimido em independência. Devemos, no entanto, lembrar que essa conquista não ocorrerá de forma natural, somente porque o professor resolveu promover essa situação, mas também não podemos deixar de considerar o papel fundamental que o docente exerce nessa conquista: “[...] não podemos esquecer que a libertação dos oprimidos é libertação de homens e não de ‘coisas’. Por isto, se não é autolibertação – ninguém se liberta sozinho –, também é libertação de uns feita por outros” (fReiRe, 2005, p. 60).

O diálogo, como algo fundamental para o processo de ensino e aprendizagem, o que Skovsmose chama de aprendizagem dialógica, é comum também nas ideias de Gramsci, para quem uma educação que não fosse baseada no diálogo seria altamente prejudicial para a classe operária (MAYO, 2004), ao que nós complementamos estendendo a afirmativa para a educação de adultos, pois não seria possível valorizar o que o estudante adulto traz de sua experiência de vida com simples transmissão de informações. Essa ação dialógica, bilateral, é responsabilidade de professores e de estudantes. É claro que não podemos negar que os estudantes, aos quais esse direito foi negado por tanto tempo, têm certa dificuldade em compreender e aceitar o próprio conhecimento construído em suas relações com o mundo como um conhecimento válido e significativo:

[...] não é possível o diálogo entre os que querem a pronúncia do mundo e os que não a querem; entre os que negam aos demais o direito de dizer a palavra e os que se acham negados deste direito. É preciso primeiro que, os que assim se encontram negados no direito primordial de dizer a palavra, reconquistem esse direito, proibindo que este assalto desumanizante continue (fReiRe, 2005, p. 91).

Evidentemente, essa reconquista de direito passa por uma abordagem metodológica que possa abrir espaço para que isso ocorra. Desse ponto de vista é importante buscarmos uma educação problema-tizadora que, “[...] respondendo à essência do ser da consciência, que é sua intencionalidade, nega os comunicados e existencia a comunicação” (FREIRE, 2005, p.78). Na perspectiva de uma educação que busca a aprendizagem a partir do diálogo, não cabe mais falarmos de “[...] educando do educador nem o educador do educando e sim o educador-educando e o educando-educador” (p. 78). O autor acrescenta que afinal ninguém mais educa ninguém, “[...] os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo” (p. 79). Essa afirmação é corroborada por Gramsci quando diz que todo professor é aluno e todo aluno é professor num relacionamento recíproco (MAYO, 2004). Assim, o educador aprende com os educandos da mesma maneira que esses aprendem com ele. Os papéis de educador e educando tornam-se quase intercambiáveis.

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Ao se considerar a educação dessa forma, estamos falando de respeito, um respeito que não nasce de um desejo solitário, de uma vontade unilateral, mas que emerge das relações que são desejáveis por todos. Estamos falando de um processo educacional que contribui para a mudança da escola, na mudança das pessoas, na mudança do mundo, um mundo pronunciado que se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes e exige das pessoas mais uma vez que se pronunciem, que não se calem (FREIRE, 2005). Mayo (2004) afirma que, para Gramsci, não há um aprendiz passivo, um recipiente “mecânico” de conhecimento abstrato e por isso devem-se desenvolver processos pelos quais educa-dores e educandos aprendam juntos, coinvestigando o objeto de conhecimento. Nessa perspectiva, a aprendizagem é um caminho de via dupla e:

[...] o educador já não é mais o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os ‘argumentos de autoridade’ já não valem. [...] agora ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo. Mediatizados pelos objetos cognoscíveis que, na prática bancária, são possuídos pelo educador que os descreve ou os deposita nos educandos passivos (FREIRE, 2005, p. 79).

Mas, diferentemente do que propõe Lindeman (1989), que considera que a experiência do estudante adulto não é melhor nem pior que a experiência do professor, apesar de um processo que considera que, ao ensinar, o professor também aprende e, ao aprender, o estudante ensina, Freire não coloca educadores e educandos no mesmo patamar. O educador deve assumir sua autoridade de professor na sala de aula, tomar decisões, conduzir o processo educacional, orientar atividades, não se podendo confundir autoridade com autoritarismo. Se isso acontece, haverá uma geração de abuso de liberdade, ao invés de geração de liberdade e, portanto, não se cumpre a responsabilidade de educar (FREIRE, 2003). Ou seja, o diálogo em sala de aula tem sim um orientador e deve ter uma finalidade, uma inten-cionalidade, evidentemente respeitando as experiências vividas e não menosprezando outras formas de pensar e agir. Ele não torna professores e alunos iguais, simplesmente marca uma posição democrática entre eles (FREIRE, 2005). Essa nos parece ser a maior dificuldade para a construção de um sistema de ensino ou de uma metodologia baseada no diálogo: como considerar as experiências vividas por professores e estudantes? Como levar isso para a sala de aula com um fim definido, sem que apenas a vontade do professor prevaleça?

Palomar (2004) mostra que caminhar nessa direção é basicamente uma imposição ao sistema educa-cional vigente, uma vez que a própria sociedade está mais dialógica, mais reflexiva, mais crítica, na qual a utilização da tecnologia não é mais que um simples indicador do dinamismo de nossas sociedades. O importante é que a reflexão implica que cada vez mais é necessário o diálogo, o confrontar de opini-ões e pontos de vista diferentes, para se chegar a consensos em todos os espaços da vida cotidiana, passando pela escola.

Para melhor compreender alguns movimentos dessa sociedade dialógica, Palomar (2004) discute um pouco do que seria a “sociedade da informação”. Segundo ele, as tecnologias da informação e da comunicação têm sido incorporadas rapidamente às nossas vidas. Isso tem implicado mudanças de posturas e de ações, levando a uma nova forma de organizar o pensamento e a cultura, fazendo com que a sociedade necessite de pessoas críticas, capazes de processar rapidamente as informações e estímulos que nos chegam de todas as partes. O saber enciclopédico é algo do passado, porque as fontes de informações são cada vez mais acessíveis a todas as pessoas. Isso significa que é necessário um novo enfoque da educação, de acordo com as necessidades formativas da sociedade atual, ou seja, um enfoque no diálogo, o que aproximaria a escola dos movimentos dessa sociedade.

Para que isso ocorra, é necessário que haja um replanejamento da educação, refletindo a respeito do que estamos ensinando e como estamos ensinando. Desse ponto de vista e pensando especificamente

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na Matemática, não é mais suficiente saber fazer contas e desenvolver algoritmos, porque isso pode ser feito com calculadoras e computadores. As ações estão voltadas agora para outras questões: por um lado, desenvolver capacidades tais como a compreensão, o raciocínio lógico-dedutivo, a resolução de problemas, a capacidade de modelar situações, entre outras e, por outro, encontrar formas de superar o medo e as dificuldades que a Matemática gera em muitas pessoas, porque esse medo dificulta a aprendizagem e exclui o estudante do sistema educacional. Em uma sociedade baseada no diálogo e na argumentação, é preciso destinar mais tempo de nossas vidas ao desenvolvimento de capacidades como o raciocínio, a compreensão etc. Isso que dizer que é necessário mudar o conceito do que é “saber Matemática”. Palomar (2004) adota o conceito utilizado pela Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD) que diz:

[...] a aprendizagem da matemática é a capacidade que um indivíduo possui de identificar e entender o papel que a matemática desempenha no mundo, para fazer juízos matemáticos fundamentados e para lidar com a matemática, com a finalidade de fazer destes indivíduos, no futuro, cidadãos construtivos, preocupados e reflexivos.

Ou seja, é importante ter bem clara nossa visão de ensino e aprendizagem para que possamos utilizar o diálogo como algo que possa incluir os estudantes na construção do seu conhecimento e em sua formação. Se não soubermos fazer isso de forma democrática, podemos excluir, mais uma vez, esse estudante, mas, ao mesmo tempo, devemos ter consciência de que agir de uma forma mais reflexiva não é apenas tomar uma decisão entre as possíveis ações que há, mas também estabelecer quais serão as consequências de tomar outro caminho. O que nos parece difícil e, ao mesmo tempo, necessário, é saber nos colocar no lugar do outro. Habermas (1992) diz que antes disso seria importante que se estabelecesse um diálogo consigo mesmo, ver a si mesmo com os olhos do outro, adquirir uma relação reflexiva consigo mesmo.

No entanto, Skovsmose (2007) prefere pensar em um grupo de pessoas, ao invés de uma pessoa indivi-dual, como o sujeito que aprende. Enxergar dessa forma implica que essa reflexão interna aconteça no mesmo momento em que as relações são estabelecidas, ou seja, não há um momento para se enxergar como indivíduo e outro como grupo. As ações são simultâneas a tal ponto de confundirmos o indivíduo com o grupo, e é dessa forma que nós acreditamos que podemos ter o diálogo como algo que realmente agrega. O sujeito da aprendizagem, incluindo aí professor e aluno, torna-se uma unidade relacional, “[...] comunicação e interação, em geral, são constituídas por aqueles que estão interagindo, assim a interação é diferente de ‘soma’ das ações individuais” (SKOVSMOSE, 2007, p. 229).

Nesse processo, as pessoas aprendem a pensar juntas, preenchem uma sensibilidade coletiva, na qual pensamentos, emoções e ações oriundas dessa ação de dialogar não pertencem a um único indiví-duo, mas a todos ao mesmo tempo (SKOVSMOSE, 2006). Essa relação, quando aberta, exige que se assumam riscos, pois requer uma entrega por inteiro, tanto cognitiva quanto sentimentalmente e, ao fazermos isso, devemos estar preparados para novas possibilidades não pensadas ao nos inserirmos em um grupo que se predispõe a participar de um processo de aprendizagem dialogada. Dessa maneira, ficamos “[...] abertos à investigação e à aprendizagem, mas essa abertura os deixa, ao mesmo tempo, vulneráveis” (SKOVSMOSE, 2006, p. 128).

Evidentemente, atuar nessa perspectiva exige um desarme por parte do professor, sobretudo que tenha ciência de que não se pode pensar pelos outros e nem para os outros, muito menos sem os outros (FREI-RE, 2005). Exige-se, assim, que o professor compreenda que, ao agir dessa forma, ele também está aprendendo, não está se colocando em posição inferior e, acima de tudo, que saiba que se trata de uma relação estabelecida democraticamente, não por imposição e, ao mesmo tempo, de forma intencional, que tem como referência o ato de ensinar e aprender. Ter esse referencial permite que não assumamos o diálogo como algo “irresponsável” ou, como Freire diz, um simples “bate-papo”. Obriga-nos a encarar

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o diálogo pedagógico (FREIRE) ou a aprendizagem dialógica (SKOVSMOSE) como processos ativos permeados por um conteúdo ou “[...] objeto cognoscível em torno de que gira quando a exposição sobre ele feita pelo educador ou educadora para os educandos” (FREIRE, 1992, p.118).

CONsiDeRAÇÕes fiNAis

Debruçamo-nos, neste texto, para mostrar um pouco dos aportes teóricos acerca de aprendizagem matemática de adultos que temos considerado em nossa prática e pesquisas. Temos caminhado em busca de relacionar as bases teóricas e epistemológicas que podem nos dar suporte nesses momentos de crescimento coletivo, a fim de compreendermos o que para nós começa a se consolidar como uma nova modalidade de ensino, o Proeja. Uma modalidade que faz uso de bases teóricas já consolidadas e com anos de pesquisas que a subsidiam e ajudam no processo norteador das ações educacionais a que se refere: Educação Profissional e Educação de Jovens e Adultos. Temos buscado encontrar pontos comuns e direções a seguir nessa empreitada e ainda pensar em uma Educação Matemática que pudesse ter como perspectiva valorizar ações caras a essas duas modalidades que agora caminham, não lado a lado, mas como se estivessem em um só corpo. A opção tem sido a aprendizagem dialógica como orientadora das ações pedagógicas, o que reforça o trabalho na perspectiva da Educação Matemática crítica e aponta caminhos não somente para as pesquisas, mas também para a prática dos professores de Matemática que atuam no Proeja.

A trajetória tem passado, e não pode ser de outra forma, pelo mergulho em pesquisas feitas atualmente nos campos da EJA e Proeja, tentando reconhecer os caminhos trilhados e, ao mesmo tempo, encontrar interseções tão necessárias no início de qualquer percurso. No campo da EJA, temos notado uma ten-dência praticamente irrefutável de utilização da Resolução de Problemas como caminho metodológico, reforçada pela introdução da aprendizagem dialógica como fundamental no reconhecimento de um estudante jovem ou adulto que traz sua experiência de vida para o contexto escolar. Temos trilhado ca-minhos que têm orientado uma questão que para nós é fundamental: como o estudante adulto aprende? A resposta a essa questão passa pela compreensão dos processos de aprendizagem dos estudantes. Afinal, entendemos que qualquer trabalho ou produção pedagógica somente pode contribuir com a formação dos estudantes se ajudar esses estudantes em seus percursos de aprendizagem.

Até então, temos discutido algumas direções para essa questão, todas elas focando esse como aprende em estratégias didático-metodológicas, tanto pela dificuldade em explorar aspectos cognitivos, quanto por compreender a importância de tal discussão para a concepção do próprio Proeja, apesar de enten-dermos que, na apropriação de estudos feitos para a Educação de Jovens e Adultos e para a Educação Profissional, estamos nos deparando com questões próprias de uma nova realidade que nos envolve. Temos discutido o tema a partir de teorias que têm nos ajudado a compreender a aprendizagem de adultos a partir das próprias experiências e da reflexão sobre essas experiências, pela interação em grupo, mediada pelas construções pedagógicas, a partir da integração curricular, com a busca pela liberdade e com o diálogo. A maioria desses aspectos já é objeto de pesquisa no campo da EJA. O que acrescentamos, o que trazemos de novo é o diálogo teórico que buscamos entre a Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional e Educação Matemática com foco na formação de estudantes inseridos em um curso profissionalizante integrado ao ensino médio. Neste texto focamos dois desses aspectos: a experiência e o diálogo, entendendo que são os principais aportes e têm nos mostrado aproximações importantes entre os três campos teóricos que embasam nosso fazer como pesquisador e como professor.

Agência Financiadora: Capes

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Recebido em março de 2011Aceito em maio de 2011

Correspondência para/ Reprint request to:Prof. Dr. Rony C. O. FreitasR. dos Laranjais, 300 - Nova Itaparica - Vila Velha – ESCEP 29104-222E-mail: [email protected]

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NORMAs PARA APReseNtAÇãO De

ARtiGOs PARA A ReVistA

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A Revista Científica FAESA, uma publicação interdisciplinar com distribuição nacional e periodicidade anual, está aberta a contribuições da comunidade científica local, nacional e internacional, com o pro-pósito de contribuir para a divulgação de trabalhos científicos e tecnológicos.

1 NORMAs eDitORiAis

1 Esta publicação tem por finalidade divulgar trabalhos produzidos pela comunidade acadêmica da Instituição e também por pesquisadores e profissionais externos à FAESA.

2 Os trabalhos são de estrita responsabilidade dos autores não refletindo a opinião do Conselho Editorial e da Instituição.

2 AVALiAÇãO DOs ARtiGOs

1 Os artigos submetidos à Revista serão encaminhados ao Conselho Editorial, que considerará o mérito científico da contribuição. Após aprovação nessa etapa, serão enviados aos revisores previamente selecionados pelo Conselho.

2 O Conselho Editorial se reserva o direito de introduzir alterações nos originais, com vistas a manter a homogeneidade e a qualidade das publicações, respeitando o estilo e as opiniões dos autores.

3 A decisão sobre a publicação do artigo é dos editores, aos quais se reserva o direito de sugerir ajustes necessários. Nesse caso, o artigo será devolvido aos autores para as devidas alterações e o trabalho reformulado deverá retornar dentro do prazo determinado pelo Conselho.

4 Ao editor reserva-se o direito de indicação dos pareceristas, que serão contactados pelo Conselho Editorial para avaliação dos artigos e sugestões de modificações.

5 Cada volume terá um número máximo de dez artigos que serão publicados respeitando a ordem de aprovação. Os artigos aprovados que excederem o número máximo estabelecido por volume serão publicados no volume subsequente.

6 Caso não aprovado, o artigo não será devolvido.

7 Após a aprovação final, encaminhar o artigo em CD, empregando o editor de texto MSWord versão 6.0 ou superior.

3 suBMissãO DOs tRABALHOs

1 Só serão avaliados artigos originais em português acompanhados de:

a) carta de apresentação do tema indicando nome, endereço, número de telefone, e-mail e fax do autor para o qual as correspondências deverão ser enviadas até a publicação do artigo;

b) declaração concordando com a cessão dos direitos autorais do artigo, declarando que o tra-balho está sendo submetido apenas à Revista Científica FAESA e autorizando a publicação do e-mail e endereço de um dos autores na Revista. A declaração deverá ser assinada por todos os autores.

2 Para experimentos com seres humanos, os autores deverão informar sobre o consentimento de todos os sujeitos envolvidos.

3 Em caso de utilização de figuras ou tabelas de outras fontes, deve-se anexar documento que ateste a permissão para o uso.

4 Quando o artigo incluir fotos de seres humanos, deverá ser encaminhado consentimento para publicação, assinado pelo sujeito retratado ou pelo responsável maior de 21 anos.

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4 APReseNtAÇãO DO ARtiGO

1 Os trabalhos serão enviados para a Coordenação de Pesquisa e Extensão, Rodovia Serafim Derenzi, 3.115, São Pedro, Vitória, ES, CEP 29032-060, em três vias impressas em papel e uma cópia em CD, preparadas em espaço duplo, com fonte Times New Roman tamanho 12, margens superior e esquerda de 3cm e inferior e direita de 2cm, com limite máximo de dez páginas por artigo, incluindo as referências.

2 Os artigos não deverão conter notas de rodapé.

3 A primeira parte deverá conter: a) título completo em português e em inglês; b) nome completo de todos os autores, seguido da titulação e filiação institucional de cada autor; c) endereço para contato. Esta deverá ser a única parte do texto com identificação dos autores.

4 A segunda parte deverá conter as seções: a) Resumo, parágrafo único, em português, com um número máximo de 200 palavras; b) Palavras-chave, no máximo três palavras em português; c) Abstract, parágrafo único, com um número máximo de 200 palavras; e d) Keywords, três palavras--chave em inglês. O resumo e o abstract não deverão incluir citações bibliográficas.

5 A terceira parte inclui o texto escrito em português. Palavras e expressões escritas em outro idioma (incluindo latim) deverão ser destacadas em itálico.

6 Poderão ser submetidos artigos, cartas ao editor, relatos de caso e notas científicas, estruturados conforme as características específicas da contribuição, com as páginas numeradas no canto inferior direito.

7 A citação bibliográfica, no texto, deverá mencionar o último sobrenome do autor e a data da pu-blicação. Quando se tratar de mais de três autores, a citação deverá conter o último sobrenome do primeiro autor seguido de et al. e a data da publicação. Citação de vários autores deverá obedecer à ordem alfabética. Todos os trabalhos citados no texto deverão ser relacionados nas Referências.

exemplos:

Citação direta

De acordo com as conclusões de Sinhorini (1983, p. 20), “O BCG induz à formação de lesão granulomatosa, quer na ausência, quer na presença da hipersensibilidade específica detectada pelo PPD”.

Citação indireta

A hipertermia em bovinos Jersey foi constatada quando a temperatura ambiente alcançava 29.5° C (RIECK; LEE, 1948).

Citação de citação

Mueller (1858, apud REIS; NOBREGA, 1956) chegou às mesmas conclusões... ou (MUELLER, 1858, apud REIS; NOBREGA, 1956)

Citação com mais de três autores

Jardim et al. (1965) ou (JARDIM et al., 1965)

Casos omissos deverão seguir as normas da NBR 6023/2002

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8 Os agradecimentos devem ser registrados ao final do texto, antes das referências, e dirigidos apenas às pessoas ou instituições que prestaram efetiva colaboração ao trabalho. Caso o trabalho seja resultado de pesquisa financiada, o órgão financiador deverá ser mencionado ao final dos agradecimentos.

9 Apenas os trabalhos citados no texto deverão ser apresentados sob o título Referências. Os tra-balhos deverão ser relacionados em ordem alfabética, segundo o último sobrenome dos autores. Os títulos das revistas não deverão ser abreviados.

exemplos:

Citação de livros:

um autor

PASTRO, C. Arte sacra. São Paulo: Loyola, 1993. 343 p.

Dois autores

DAMIÃO, R. T.; HENRIQUES, A. Curso de direito jurídico. São Paulo: Atlas, 1995.

Três autores

PASSOS, L. M. M.; FONSECA, A.; CHAVES, M. Alegria de saber: matemática, segunda série, primeiro grau. São Paulo: Scipione, 1995. 136 p.

A partir de quatro autores

URANI, A. et al. Constituição de uma matriz de contabilidade social para o Brasil. Brasília, DF: IPEA, 1994.

Citação de capítulos de livros:

MAYER, R. J. Neoplasias do esôfago e do estômago. In: ISSELBACHER, K. J. et al. (Ed.). Harrison: medicina interna. 13. ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill, 1995. cap. 253, p. 1450-1454.

Citação de artigo:

SIMON, J. E.; PERES, J.; RUSCHI, P. A. A importância da Serra das Torres para a conservaçõ de aves no estado do Espírito Santo, Sudeste do Brasil. Revista Científica da Faesa, Espírito Santo, v. 4, n. 1, p. 47-62, jan./dez. 2008.

Citação de tese:

ASSINE, M. L. Aspectos da estratigrafia das seqüências pré-carboníferas da Bacia do Paraná no Brasil. 1996. 207 f. Tese (Doutorado em Geologia Sedimentar) – Faculdade de Geociências, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1996.

Citação de dissertação:

DEMARCHI, C. Medida liminar em mandado de segurança no Direito educacional. 1998. 166 f. Dissertação (Mestrado em Ciência Jurídica) – Faculdade de Direito, Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, 1998.

Citação de monografia:

JARRETTA, C. N. Perícia contábil: um estudo contributivo ao aperfeiçoamento do conteúdo programático aplicável ao curso de Ciências Contábeis. 1996. 59 f. Monografia (Especialização em Ciências Contábeis) – Faculdade de Ciências Humanas, Universidade de Marília, Marília, 1996.

Artigo publicado em evento:

CARVALHO, M. M. Utilização de sistemas silvipastoris. In: SIMPÓSIO SOBRE ECOSSISTEMA DE PASTAGENS, 3., 1997, Jaboticabal. Anais ... Jaboticabal: UNESP, 1997. p. 164-207.

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Informação retirada da Internet:

TEMPORAO, J. G. O mercado privado de vacinas no Brasil: a mercantilização no espaço da prevenção. Caderno de saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 19, n. 5, p. 15-36, set./out. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2003000500011&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt>. Acesso em: 9 fev. 2003.

CD-ROM:

KOOGAN, A.; HOUAISS, A. (Ed.). Enciclopédia e dicionário digital 98. São Paulo: Delta, 1998. 5 CD-ROMs.

fita de vídeo ou DVD:

AGROTURISMO: um novo conceito de negócio. Produção de Marcos Orlando de Oliveira. Vitória: SEBRAE, 1999. 1 videocassete. (61min).

Casos omissos deverão seguir as normas da NBR 6023/2002

10 As tabelas e as ilustrações (quadros, gráficos, figuras, fotografias, mapas etc.) deverão ser enviadas em páginas separadas com numeração independente, em números arábicos na ordem em que são citadas no texto. Os autores deverão indicar, ao longo do texto (entre os parágrafos) os locais onde deverão ser inseridas as tabelas e as ilustrações. Nas legendas deverão constar o título e fonte (caso necessário). No caso de ilustrações, deverão ser enviados os originais (ou a imagem em CD, com qualidade necessária para reprodução e identificação do programa utilizado).

Vitória, 11 de outubro de 2011.

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