A língua portuguesa e
as literacias do século XXI
Coimbra, 2-4 de Dezembro de 2015 Congresso Internacional – 725 Anos da UC A Língua Portuguesa: uma Língua de Futuro
li·te·ra·ci·a (inglês literacy) substantivo feminino
1. No século XX. Capacidade de usar as competências de leitura e escrita.
1. No século XX.
2. No século XXI. Capacidade de construir sentido a partir das linguagens que caracterizam uma cultura e de intervir ativa e autonomamente nessa cultura através dessas linguagens.
2. No século XXI.
As literacias estendem-se hoje para além da palavra escrita, incluindo os discursos escrito, falado, visual, multimodal e multimédia, presenciais e a distância.
alternativas às �literacias tradicionais
degeneração dos usos da língua
No século XXI:
novas formas �de discurso
novos instrumentos e práticas de mediação
novas retóricas
No século XXI:
novas barreiras �e inibições
No século XXI:
Dois cenários extremos:
fim da literacia tradicional 1.
literacia crítica e emancipatória 2.
1. fim da literacia tradicional
Fim tranquilo da literacia tradicional e surgimento de novas iliteracias
Novas formas de vivência linguística e fruição cultural A literacia tradicional como
território de cultivo só por alguns
2. literacia crítica e emancipatória
Literacia engloba competências, �mas também ideias e valores
Linguagem é preocupação connosco próprios, como indivíduos e como espécie
É urgente construir uma �literacia crítica e emancipatória
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
5. CONCLUSÕES
2. A REBELIÃO DAS MASSAS 3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
5. CONCLUSÕES
2. A REBELIÃO DAS MASSAS 3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
CENÁRIO 1 O FIM DA LITERACIA
TRADICIONALMihai Nadin (1997)
The Civilization of Illiteracy
Nem todos necessitam de dominar a literacia tradicional
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
Bastam as competências básicas para o dia-a-dia
e para aprender em contexto,
quando for necessário Assistimos a um culto do
instantâneo e da mudança
Deficiências de literacia ↔ dinâmicas transformadoras
Decadência da literacia ↔ aumento das interações
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
A literacia tradicional não desaparecerá, mas passará a
ser cultivada apenas por profissionais e peritos:
1. Os que a ela se dedicam
por profissão (autores, editores, educadores, humanistas, técnicos)
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
2. Os que exploram os limites e métodos da comunicação
(como os profissionais da comunicação e do marketing)
3. Os que se deleitam com a riqueza da ficção, da poesia,
do ensaio, da história e da filosofia e cultivam os
respetivos valores)
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
Na civilização das iliteracias as competências literárias
deixam de ser a estrutura base da construção da experiência.
Não haverá uma literacia dominante, como não existiu
durante milénios, até há cerca de dois séculos
CENÁRIO 2 POR UMA LITERACIA CRÍTICA
Paulo Freire (1970) Pedagogia do Oprimido
Literacia como fenómeno ideológico e político
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
A leitura do mundo precede a leitura da palavra, pelo que a
leitura desta não pode prescindir da leitura daquele
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
Numa civilização de múltiplas literacias a compreensão do mundo liga-se à conquista da
capacidade para ler e (re-)escrever esse mundo
Adquirir literacia não é apenas aprender a codificar e
descodificar as linguagens dos novos media –
é também interiorizar, pela ação e pela interação, as culturas nas quais esses
novos media se inscrevem
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
A literacia é um processo crescente de criação de
consciência, de libertação e auto-capacitação
que permite aos cidadãos transformarem as condições
sociais que os submetem à desigualdade e à opressão
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
5. CONCLUSÕES
2. A REBELIÃO DAS MASSAS 3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
2. A REBELIÃO DAS MASSAS
O cenário 1 poderia augurar o cultivo de formas
enriquecidas de literacia mas tal não está
a acontecer Em larga medida, assiste-se a uma degradação das literacias
que Ortega y Gasset já denunciava em 1929
2. A REBELIÃO DAS MASSAS
Assistimos à proliferação do “homem massa” de Ortega
O “homem massa” é o homem-multidão
o homem inculto, que perdeu a vergonha dessa sua condição e proclama
com orgulho o seu direito à vulgaridade
2. A REBELIÃO DAS MASSAS
O livro “A Rebelião das Massas” reflete sobre essa assumida e orgulhosa adesão à incultura
que se observa nos nossos dias
Agora estimulada pelas tecnologias, a incultura assumida
propaga-se como o fogo nas sociedades e nas redes sociais
2. A REBELIÃO DAS MASSAS
A escrita improvisada, a ortografia torturada, os
clichés estafados, a argumentação acéfala, o
discurso desleixado
tudo isso é hoje ostentado com
orgulho pelo “homem massa”
2. A REBELIÃO DAS MASSAS
Ortega incluía na sua crítica ao “homem massa” o cientista que
em nome da ciência se demite da sua dimensão humanista:
“É preciso que o homem de ciência deixe de ser o que
hoje é com deplorável frequência: um bárbaro que
sabe muito de uma coisa”
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
5. CONCLUSÕES
2. A REBELIÃO DAS MASSAS 3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
O cenário 2 acentua a nossa responsabilidade
no cultivo da língua uma língua que, hoje,
se prolonga muito para além da escrita e da leitura
e se dilui no universo das novas literacias
A leitura de Freire é hoje cada vez mais metafórica
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
A opressão a que se referia Freire relacionava-se com o
analfabetismo e dependência associados à colonização
mas a leitura que hoje se faz da sua obra alarga o conceito
a todas as formas de opressão resultantes de desigualdades
no acesso ao saber
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
A leitura de hoje aplica-se, não apenas às literacias
da leitura e da escrita
mas também às outras literacias, presentes e futuras, incluindo as
dos media e das redes sociais
E aplica-se à partilha e convivência cultural a distância com outros
povos que partilham a mesma língua
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
Assiste-se, entretanto, ao declínio da procura das humanidades
à redução dos financiamentos
ao fecho de várias escolas de línguas,
humanidades e ciências sociais
Que fazer?
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
Em ambientes de inovação intensiva e elevada concorrência, como os que caracterizam o nosso século,
não podem ser descuradas as dimensões institucionais e disciplinares da estratégia,
liderança e imagem de marca
Onde estão a estratégia, liderança e imagem de marca para a língua portuguesa e suas instituições?
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
1. Promoção da imagem de marca
Num mundo onde o bem mais escasso é a atenção, a percepção
social da relevância dos seus estudos é quase nula
Os especialistas e estudiosos dirigem-se hoje quase exclusivamente para os
círculos fechados dos seus pares
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
2. Abertura ao mundo
Ex.: Books@Work parceria desloca académicos para ambientes
empresariais, onde demonstram a relevância das suas áreas e reforçam a
ligação entre literatura e vida real
Abertura estratégica das línguas e das literaturas à sociedade
comunicação, debate, ética, competências relacionais e comportamentais, tomada de
decisão, pensamento crítico
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
3. Confluência com as tecnologias
• humanidades digitais
Ligações muito promissoras na confluência das humanidades
com as tecnologias
Dizia Edgar Morin que “o grande desafio do século XXI é o de interligar os conhecimentos”
• jornalismo de dados
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
análogo aos que marcaram outras grandes mudanças
histórico-culturais
“Vivemos um raro momento de oportunidade para as humanidades”
“como os da transição do rolo para o codex, da invenção da imprensa,
da descoberta do Novo Mundo ou da Revolução Industrial”
HUMANIDADES DIGITAIS
Anne Burdick et al (2012) Digital Humanities, MIT Press
3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
As humanidades digitais são uma extensão de conhecimento,
competências e métodos, não uma substituição”
“As humanidades nunca foram tão necessárias”
“uma reinterpretação das humanidades”
HUMANIDADES DIGITAIS
Anne Burdick et al (2012) Digital Humanities, MIT Press
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
5. CONCLUSÕES
2. A REBELIÃO DAS MASSAS 3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
que reconheça todas as dimensões da língua, mesmo
para além da escrita e da leitura
que encare a língua na complexidade do ecossistema em
que se desenvolve
Para que haja uma língua de futuro é necessária uma
política da língua
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
que não separe a língua das culturas humanísticas, científicas e
tecnológicas que lhe dão sentido
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
Uma política aberta a espaços de entendimento
entre falantes de todo o mundo
mas que também estimule pequenas coisas, como a
geração, agregação e curadoria de conteúdos,
em que o país é tão pobre.
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
Uma política que se oponha a absurdos como o da imposição da publicação científica em
inglês nas nossas universidades
1. A LITERACIA JÁ NÃO É O QUE ERA
5. CONCLUSÕES
2. A REBELIÃO DAS MASSAS 3. NOVAS LITERACIAS, NOVOS DESAFIOS
4. PARA UMA LÍNGUA DE FUTURO
5. CONCLUSÕES
Para além das múltiplas dicotomias que caracterizam os nossos tempos
existe, para a língua, uma dicotomia profunda entre duas culturas: uma que que proclama com
orgulho o direito à vulgaridade i. outra que milita por uma
literacia crítica e emancipatória ii.
1.
Por qual delas nos batemos? Como?
5. CONCLUSÕES
O estudo e o cultivo da língua, da literatura e das humanidades enfrentam, no século
XXI, um pesado conjunto de desafios:
• afirmação da sua imagem de marca • clarificação da sua relevância e valor social
2.
• garantia da abertura ao mundo • confluência com as ciências e tecnologias
Conseguirão superar esses desafios? Como?
5. CONCLUSÕES
É urgente uma política da língua
para as novas literacias e para os novos territórios ontológicos e epistemológicos
que as configuram e lhes dão expressão
que vá muito para além da escrita e da leitura
que expanda a língua para os espaços geográficos, culturais, científicos e
tecnológicos que hoje lhe são próprios,
3.
5. CONCLUSÕES
O futuro da língua portuguesa dependerá da
forma como, coletivamente, conseguirmos responder
a estes desafios
A língua portuguesa e
as literacias do século XXI
Coimbra, 2-4 de Dezembro de 2015 Congresso Internacional – 725 Anos da UC A Língua Portuguesa: uma Língua de Futuro
Slides em: www.slideshare.net/adfigueiredoPT
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