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    Mihaly Csikszentmihalyi. 2002. Mihaly Csikszentmihalyi. 2002. Mihaly Csikszentmihalyi. 2002. Mihaly Csikszentmihalyi. 2002. Mihaly Csikszentmihalyi. 2002. Fluir: AFluir: AFluir: AFluir: AFluir: APsicologia da Experincia ptimaPsicologia da Experincia ptimaPsicologia da Experincia ptimaPsicologia da Experincia ptimaPsicologia da Experincia ptima. Ttulo. Ttulo. Ttulo. Ttulo. Ttulooriginal: original: original: original: original: Flow: The Psychology of OptimalFlow: The Psychology of OptimalFlow: The Psychology of OptimalFlow: The Psychology of OptimalFlow: The Psychology of OptimalExperienceExperienceExperienceExperienceExperience (1990). Nova Iorque: Harper (1990). Nova Iorque: Harper (1990). Nova Iorque: Harper (1990). Nova Iorque: Harper (1990). Nova Iorque: HarperPerennial . Traduo de Marta Amado.Perennial . Traduo de Marta Amado.Perennial . Traduo de Marta Amado.Perennial . Traduo de Marta Amado.Perennial . Traduo de Marta Amado.Lisboa: Relgio dgua Editores. 309 pp.Lisboa: Relgio dgua Editores. 309 pp.Lisboa: Relgio dgua Editores. 309 pp.Lisboa: Relgio dgua Editores. 309 pp.Lisboa: Relgio dgua Editores. 309 pp.ISBN: 0-06-016253-8.ISBN: 0-06-016253-8.ISBN: 0-06-016253-8.ISBN: 0-06-016253-8.ISBN: 0-06-016253-8.

    A obra de Csikszentmihalyi sintetiza duasdcadas de investigao sobre os aspectospositivos da experincia humana, como a ale-gria, a criatividade e o processo de imersototal na vida, que o autor designa por flow, evisa apresentar os princpios gerais que per-mitem transformar vidas dominadas peloaborrecimento e a ausncia de sentido emvidas plenas de satisfao. O contributo deCsikszentmihalyi insere-se no que tem vindoa ser designado por uma psicologia da felici-dade, ou seja, pretende usar alguns dos ins-trumentos da psicologia moderna para ex-plorar um problema to velho como a huma-nidade, o de saber o que torna as pessoasfelizes. A tese defendida pelo autor pode re-sumir-se da seguinte forma: a felicidade no algo que acontece, relacionada com a sor-te ou o acaso; no depende de acontecimen-tos externos aos indivduos mas sim da for-ma como estes os interpretam. A felicidade, assim, uma condio que deve ser prepa-rada, cultivada e defendida por cada pessoa.No entanto, acrescenta, a felicidade no podeser alcanada pela procura consciente, maspelo domnio sobre os contedos da consci-ncia. Mais de meio sculo de estudos sobrea percepo demonstraram amplamente deque modo as percepes que temos sobre asnossas vidas so o resultado de mltiplasforas que moldam a experincia, muitas de-las colocadas fora do nosso controlo; aspec-to fsico, traos da personalidade, heranagentica, antecedentes familiares, perodohistrico em que nos dado nascer, nacio-nalidade, so apenas algumas da inmerascondies que determinam o que fazemos,vemos e sentimos. , pois, compreensvelque se pense que destino individual , emprimeiro lugar, imposto por foras externas.

    Csikszentmihalyi identifica, porm, mo-mentos em que todo o indivduo se sentiu nocompleto controlo das suas aces e senhorabsoluto da sua vida. Esses momentos, ge-ralmente raros e caracterizados por um pro-fundo sentimento de euforia e de satisfaoplena, permanecem na memria individualcomo situaes ideais ou experincias pti-

    mas (optimal experiences), na terminologiado autor. A experincia ptima qualquercoisa que o indivduo faz acontecer, que lheproporciona uma sensao de controlo eintegrao e que acrescenta sentido vidapelo sentimento de participao no prpriodevir.

    O autor fez os seus primeiros estudosneste domnio tentando compreender a natu-reza destas experincias subjectivas por par-te de algumas centenas de artistas, atletas,cirurgies, campees de xadrez, entre outros.Os relatos sobre o que os entrevistados sen-tiam ao realizar as tarefas que lhes davammais prazer esto na origem do desenvolvi-mento da teoria da experincia ptima, combase no conceito de flow um estado noqual os indivduos esto to envolvidos numaactividade que nada mais parece importar;uma experincia em si to satisfatria que osindivduos esto prontos a pagar qualquerpreo para poderem realiz-la. A partir dodesenvolvimento de um mtodo destinado amedir a qualidade da experincia subjectiva(Experience Sampling Method),Csikszentmihalyi e os seus colaboradores daUniversidade de Chicago estudaram, nas l-timas dcadas, o contedo das experinciasptimas relatadas por milhares de homens emulheres de todo o mundo. Independente-mente do contexto cultural, dos antecedentespessoais e da actividade em causa, os relatossobre as experincias ptimas demonstraramobedecer de forma consistente s mesmasregularidades. O conceito de flow alastroupor todo o mundo acadmico e constitui,actualmente, objecto de estudo de inmerasequipas de investigao. No domnio da psi-cologia, o conceito aplicado ao estudo dafelicidade, da satisfao e da motivao in-trnseca; na sociologia, usado comocontraponto da anomia e da alienao; naantropologia, pelo interesse que tem demons-trado para a compreenso dos rituais. Almde constituir um objecto de estudoacadmico, o conceito de flow tem inspiradoa concepo de curricula escolares experi-mentais, influenciou contedos para progra-mas de formao, usado na prtica dapsicoterapia, na reabilitao de delinquentesjuvenis, na organizao de actividades emlares de idosos, na concepo de exposiesem museus e em terapia ocupacional paradeficientes.

    No primeiro captulo, Csikszentmihalyifaz uma reflexo sobre as origens da insatis-

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    fao existencial e os seus pontos de vistarecuperam, em grande parte, os contributosde Erich Fromm, nomeadamente em Escapefrom Freedom e de Rollo May, em Freedomand Destiny e em The Courage to Create. Aideia principal aqui exposta e apresentada pelorecurso a uma citao de Epicteto, os ho-mens no temem as coisas mas a maneiracomo vem as coisas, a de que a realidadepode ser transformada, na medida em que oindivduo influencia o que acontece na suaconscincia. No entanto, o controle sobre aconscincia no constitui apenas uma com-petncia cognitiva e exige o envolvimento dasemoes e da vontade. Este controle, por suavez, reformulado de acordo com as mu-danas histricas e culturais.

    No segundo captulo o autor analisa oque designa por anatomia da conscincia apartir de um modelo fenomenolgico daconscincia baseado na teoria da informa-o e em que trata os acontecimentos talcomo so vividos e interpretados pelos indi-vduos. Nesta abordagem os acontecimentosconstituem informao que pode ser mani-pulada e usada e a conscincia consideradacomo informao intencionalmente ordena-da. A experincia ptima apresentada comoo oposto da entropia psquica e o autor con-sidera-a intimamente ligada ao crescimentodo self. A organizao do self torna-se maiscomplexa depois de uma experincia destanatureza, como resultado de dois processospsicolgicos, a diferenciao e a integrao.

    O terceiro captulo aborda a satisfao eas estratgias para melhorar a qualidade devida, assim como os elementos que as deter-minam. Csikszentmihalyi introduz aqui o seuconceito de experincia autotlica, equivalenteao estado de flow. Este estado, consideradofrequentemente como bom ou determinantepara a felicidade e qualidade de vida por aque-les que o experimentam, no o num sentidoabsoluto, mas apenas na medida em que au-menta o poder e a complexidade do self.

    O captulo seguinte analisa as condiesde existncia das experincias de flow, emestreita relao com o contexto cultural emque ocorrem. Partindo da ideia de que asdiferentes culturas se distinguem, neste as-pecto, em termos do grau de procura da fe-licidade que tornam possvel, o autor avan-a a hiptese de que todos os indivduos pos-suam o mesmo potencial para controlar assuas conscincias. Se esta afirmao no sedemonstrar verdadeira, pretende, ento, ave-

    riguar o que distingue aqueles que conse-guem alcanar esse controle (dotados doque designa por personalidade autotlica)dos que dele so incapazes. A partir de con-ceitos sociolgicos como anomia e aliena-o e dos contributos de E. Durkheim, B.Bettelheim e V. Frankl, Csikszentmihalyi des-taca aqui a importncia do contexto familiar(autotlico) para o desenvolvimento da capa-cidade para sentir prazer, apreciar a vida eser feliz.

    Nos captulo 5, 6 e 7 so estudadas vri-as dimenses das experincias de flow, rela-cionadas com o uso do corpo, o uso do pen-samento e o trabalho como actividade gera-dora de prazer. Csikszentmihalyi destaca aimportncia das experincias fsicas que de-safiam o indivduo a superar os seus limites,orientados por objectivos realistas. No pla-no da sexualidade, o autor chama a atenopara as condies em que o sexo se podetornar uma via privilegiada para o prazer eque dependem da conjuno de dimensesfsicas e psicolgicas, com particular desta-que para a componente relacional e do cres-cimento a dois. Crtico do recurso excessivoa fontes externas de estmulo, o autor salien-ta a importncia do desenvolvimento da aten-o, da imaginao, da memria e da capaci-dade de concentrao como factores indis-pensveis para se ser capaz de experimentaro flow mediante a actividade mental. No pla-no do trabalho produtivo, Csikszentmihalyiidentifica os empregos autotlicos ou activi-dades profissionais produtoras de flow comoaqueles em que o indivduo incapaz dedissociar o trabalho do lazer. Trata-se de ex-perincias em que o indivduo se encontraintrinsecamente motivado para a actividade ena qual se envolveria ainda que nada tivessea ganhar, para alm da satisfao da retira-da.

    A partir da constatao emprica de que aqualidade de vida associada s experinci-as de trabalho e s relaes interpessoais, oautor dedica o captulo 8 anlise do aparen-te conflito entre estar s e estar com outros.Csikszentmihalyi passa em revista os dife-rentes tipos de defesas contra a ansiedadeontolgica e salienta a importncia de umaaprendizagem precoce da solido e das es-tratgias de coping. O autor volta aqui a su-blinhar o carcter determinante da famliaautotlica nas suas funes de encorajamentoda individualidade e de integrao das expe-rincias vividas pelos seus elementos.

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    No captulo 9, Csikszentmihalyi retoma atese que perpassa por todo livro: a experin-cia subjectiva no constitui apenas uma di-menso da vida, mas a prpria vida; ascondies materiais apenas nos afectam in-directamente, pela via da experincia. A me-nos que o indivduo seja capaz de controlar asua energia psquica, as vantagens proporci-onadas pelo dinheiro, a sade ou a belezarevelam-se completamente inteis. Aqui soanalisadas as regras a que obedece o selfautotlico e que lhe permite transformar ex-perincias potencialmente entrpicas em ex-perincias ptimas: o estabelecimento deobjectivos, a capacidade de imerso na acti-vidade, a ateno centrada sobre o aqui eagora e a disponibilidade para disfrutar aexperincia imediata.

    A obra termina com uma reflexo sobre acriao de sentido na vida. Passando em re-vista as diferentes acepes que pode tomaro termo sentido, Csikszentmihalyi apontapara uma sada s aparentemente simples o sentido da vida o sentido ou, nas pala-vras do autor: seja o que for e venha de onde

    vier, um propsito unificado o que atribuisentido vida. Uma experincia de flow aquela que unifica e atribui sentido vidaindividual, a partir de objectivos, determina-o e harmonia interior.

    Mihaly Csikszentmihalyi, autor poucoconhecido em Portugal, professor e ex-pre-sidente do Departamento de Psicologia daUniversidade de Chicago. membro daNational Academy of Education e da NationalAcademy of Leisure Sciences nos EstadosUnidos. Dedicou os ltimos trinta anos investigao sobre temas relacionados coma teoria do flow e com a criatividade. Na suaobra so notrias as influncias de algunsdos autores mais destacados da psicologiahumanista, como Erich Fromm, BrunoBettelheim, Rollo May, Fritz Perls e ViktorFrankl, mas tambm da filosofiaexistencialista, com Jean-Paul Sartre e da so-ciologia, com Erving Goffman.

    Maria Joo da Costa PereiraMaria Joo da Costa PereiraMaria Joo da Costa PereiraMaria Joo da Costa PereiraMaria Joo da Costa PereiraInstituto Superior de Comunicao Empresarial

    Instituto Superior Miguel Torga


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