Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
ENTRE MITOS E PRECONCEITOS: O ESTUDO DO ESTATUTO DA CRIANÇA E
DO ADOLESCENTE.
Autora: Rosângela Ber1
RESUMO
Com as mudanças e necessidades do mundo moderno foi elaborada uma doutrina
jurídica de proteção integral a infância e ao adolescente, o Estatuto da Criança e do
Adolescente – ECA – Lei 8069/90, cujo objetivo principal é assegurar como
prioridade absoluta, os direitos fundamentais das crianças e adolescentes, entre os
quais o direito à educação. Pode-se dizer que a escola e a família são as duas
principais instituições sociais responsáveis por garantir o pleno desenvolvimento
dos mesmos. Por isso, o estudo do ECA possibilitou à comunidade do Colégio
Estadual do Jardim San Rafael de Ibiporã conhecer e compreender esse
documento. Tal estudo teve como objetivo direcionar para uma visão destituída de
mitos e preconceitos que auxilie em suas situações cotidianas. A promulgação do
ECA foi uma grande conquista da sociedade brasileira, contemplando o que há de
mais avançado na normativa internacional quanto aos direitos da população
infanto-juvenil. O ECA prevê a legitimação dos direitos e deveres das crianças e
dos adolescentes que são prioridade, pois seu desenvolvimento deve ser
assegurado perante a sociedade.
Neste trabalho analisamos o ECA. As atividades envolveram estudos e
discussões com um Grupo de Trabalho em Rede e aplicação de curso para a
Comunidade Escolar do Colégio Estadual do Jardim San Rafael de Ibiporã – PR. O
incentivo ao estudo do ECA e da Lei nº 8.069/1990 ajuda na aplicação dos
conhecimentos dos cursistas visando contribuir para os esclarecimentos e a
aplicação dos direitos e deveres das crianças e adolescentes.
Palavras Chave: Criança - Adolescente - Direito – ECA
1 Professora PDE - Professora da Rede Pública Estadual do Paraná, Graduada em História/ Universidade
Estadual de Londrina com Especialização em: História Social/UEL e Gestão Escolar/UNOPAR. Pesquisa PDE orientada pela prof. Edméia Ribeiro, docente do departamento de História da UEL.
INTRODUÇÃO
Mais do que apenas uma retrospectiva histórica, o que se apresenta são reflexões sobre a situação da criança e do adolescente estruturado em um movimento pela sociedade brasileira. Em 1990, foi aprovado o Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo um marco histórico fundamental na consolidação de um conceito de infância e adolescência que, superando a antiga visão baseada naquilo que ela não é (não é capaz, não é maior e não responsável), funda-se naquilo que é: crianças, adolescente, sujeito de direitos, pessoa humana em condição peculiar de desenvolvimento que deve ser tratada com prioridade absoluta. (MULLER; MORELLI, 2002, p.6)
A promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – Lei
8069/90 – foi uma grande conquista da sociedade brasileira. Este documento
contempla o que há de mais avançado na normativa internacional no atinente aos
direitos da população infanto-juvenil. Sendo assim, torna-se fundamentalmente
importante o trabalho de estudo, análise e compreensão deste estatuto, de forma a
buscar a reflexão sobre os mitos, gerados por má interpretação ou má
compreensão do aparado legal.
Esta pesquisa teve como norteadora a seguinte questão: quais são os mitos
e os preconceitos da comunidade escolar que prejudicam o entendimento e a
finalidade do ECA em relação ao direito à educação e as medidas pertinentes aos
pais ou responsável?
Verificou-se nestes últimos anos que, com a necessidade da mulher/mãe
ingressar no mercado de trabalho juntamente com o marido, seus filhos (nossos
alunos) perderam a referência familiar do acompanhamento intelectual e escolar.
Através de depoimentos dos participantes notamos que no Colégio Estadual
do Jardim San Rafael – Ensino Fundamental e Médio, tanto os alunos do Ensino
Fundamental como do Médio desconhecem seus direitos adquiridos perante o
estatuto. Por exemplo: muitos sem convênios médicos e condições de pagar
médicos especialistas (neurologista, psiquiatras, psicólogos, etc.) recorrem ao
SUS, onde aguardam meses nas filas sem serem atendidos. Desconhecem que,
tendo sido comprovada a necessidade de acompanhamento com especialista,
poderiam recorrer a promotoria pública para efetivarem um atendimento mais
rápido.
Situações como pais que diante do mau comportamento dos filhos ameaçam
entrega-los ao Conselho Tutelar, ocorrem muitas vezes quando os responsáveis
são convocados a comparecer na escola. Isso demonstra que já não têm soluções
para os problemas enfrentados, que não possuem conhecimentos básicos sobre a
legislação para menores de 18 anos e que apresentam uma visão distorcida da
proteção integral da criança e do adolescente.
Portanto, o estudo do ECA mostrou-se importante para nossa comunidade
escolar, pois possibilitará o esclarecimento e o garantir dos direitos e deveres de
nossos educandos e de seus pais em relação a eles. Sendo assim, visou-se:
esclarecer a importância dos pais em acompanhar seus filhos nas atividades
intelectuais e sociais; demonstrar que o estatuto não é composto apenas de
direitos para os jovens, mas de deveres perante a família, a escola e a sociedade
em que vivem; que há órgãos e instâncias a serem consultados e obedecidos
quando do surgimento de divergências envolvendo jovens; que há
responsabilidades específicas da família, da escola e da comunidade perante estes
indivíduos - não esquecendo a necessidade de proteger nossos educandos de
situações de violência física ou psicológica.
O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, SOB A LEI Nº 8.069/ 1990
Por muito tempo na história brasileira as crianças e os jovens não eram
sujeitos reconhecidos como portadores de direitos e, com frequência, eram vítimas
de abusos e de exploração.
De acordo com Rossato e Rossato (2011) até o século XIX crianças e
adolescentes não eram reconhecidos como cidadãos sendo desconsiderados,
desvalorizados e, muitas vezes, maltratados por adultos, incluindo seus próprios
pais, que não eram julgados moralmente por isso.
Segundo Marcos Cezar de Freitas (2003) a partir do século XIX, a infância
começa a ocupar um lugar de fundamental importância para a família e para a
sociedade. Iniciam-se reflexões e discussões acerca deste ser de pouca idade
como alguém que necessita de lugar, tempo, espaço e cuidados diferenciados,
passando-se a delinear o que mais tarde evoluiu para o que hoje reconhecemos
como infância. No século XX a situação da criança e do adolescente passou a ser
uma questão preocupante para o Estado e para as políticas não governamentais
devido as mudanças na dinâmica familiar e na sociedade. Até então, a legislação
brasileira não continha normas que obrigavam o Estado a cumprir com suas
responsabilidades para com as crianças e adolescentes no âmbito das políticas
sociais.
Foi a partir da promulgação da Constituição de 1988 e do Estatuto da
Criança e do Adolescente em 1990 (lei 8.069/90) que esse público passou a ser
efetivamente reconhecido tanto na lei como nas políticas públicas. O ECA
aprovado em 1990 foi um marco significativo na luta pelos direitos humanos, sendo
que o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, teve como seu objetivo
principal assegurar os direitos fundamentais da criança e do adolescente,
conscientizá-los de sua importância a serem tratados em sua plenitude,
principalmente em relação à educação.
Por essa razão o ECA, com a concepção nela definida, passou a interferir diretamente na organização de nossa sociedade, de nossas leis, de nossas famílias, e de nossos sistemas de ensino, bem como a interferir diretamente no cotidiano escolar. De forma progressiva, nossas leis buscam estabelecer para a infância a garantia de uma saudável e “pleno” desenvolvimento, responsabilizando civil, penal, política e administrativamente, instituições, políticos, pais responsáveis, professores, etc. que deixam de prestar às crianças e adolescentes cuidados elementares do ponto de vista material, moral, psicológico, e intelectual, ou que se excedam, sob o pretexto de os estarem educando (PILLETI; ROSSATO, 201,1 p. 28).
O campo de estudo em torno da criança e do adolescente tem apresentado
um desenvolvimento notável, sobretudo quanto ao desenvolvimento de
determinadas ações consideradas como políticas públicas nos âmbitos municipais,
estaduais e federais. Segundo Silvestre e Gomes “todo movimento ocorrido pelo
ECA afirmou-se no sentido de avançar sobre o senso comum, rompendo com a
velha tradição de gabinete e levando as discussões a entidades da sociedade civil,
e principalmente, aos movimentos sociais” (2002, p.120).
Nos últimos anos, o debate sobre o ECA permitiu uma reflexão sobre as
concepções e relações estabelecidas com a infância e juventude ao longo da
história de sua constituição.
É necessário reconhecer que o Brasil possui, em relação a outros países,
uma das mais avançadas leis sobre a infância. O art. 227 da Constituição e a Lei nº
8069/90, que o regulamenta (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA), trazem
em si concepção da criança cidadã, o que significa entender que todas são sujeitos
de direitos, merecem proteção integral, por se encontrarem em condições especiais
de desenvolvimento. O Eca define criança como:
a pessoa até doze anos de idades incompletos, e adolescentes aquela entre doze e dezoito anos de idade”, (excepcionalmente até vinte e um). Determina também que tanto crianças como adolescentes têm direito à vida, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização e à proteção ao trabalho, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (art. 1º ao 69). (MULLER; MORELLI, 2002, p. 6)
Digiácomo e Digiácomo (2010) colocam como de importância fundamental a
aplicação cotidiana da Lei nº 8.069/1990, denominando-a “Sistema de Garantia dos
Direitos da Criança e do Adolescente”, pois contribui os encaminhamentos às
questões pertinentes ao ECA indispensáveis aos que militam no campo da infância
e juventude. Afirmam que o Brasil tornou-se um “campeão mundial” das
desigualdades sociais, das quais as crianças padecem como vítimas frágeis e
vulneráveis pela omissão da família, da sociedade e principalmente do Estado, no
que tange à segurança dos seus direitos fundamentais – calcula-se a existência de
40 milhões de crianças carentes e abandonadas.
Há necessidade de que essas leis não fiquem somente em artigos e
discursos políticos, mas sim, de que sejam colocadas em prática, criando
condições e meios para que nos transformemos em uma sociedade mais justa e
igualitária. O ECA, sob a Lei nº 8.069/1990, é reconhecido internacionalmente
como um dos mais importantes documentos a garantir os direitos da população
infanto-juvenil. Apesar disso, podemos dizer que, ainda hoje, é desconhecido da
maioria e descumprido por boa parte dos administradores públicos, não atendendo
a Constituição Federal, no que concerne a assegurar o efetivo exercício dos
direitos e o acesso à cidadania plena pelas crianças e adolescentes.
Torná-lo presente no cotidiano escolar consistirá em capacitar os envolvidos
(pais, funcionários, professores e alunos) a formar crianças e adolescentes
esclarecidos e ao mesmo tempo cidadãos conhecedores de seus direitos e deveres
já legitimados legalmente por este estatuto.
Segundo professor Luigi (GTR 2014), o referido estatuto foi uma conquista
da sociedade brasileira. A questão é que sua interpretação negativa protagonizada
pela mídia faz com que as pessoas, e principalmente os professores de forma
geral, mantenham um posicionamento negativo em relação ao mesmo.
Os direitos garantidos pelo estatuto são fundamentais para o
desenvolvimento da criança e do adolescente. Mas é necessário focar nos deveres
da sociedade para com as crianças e adolescentes. Estão sendo cumpridos? Na
realidade das escolas públicas de periferia é comum um índice de criminalidade
juvenil bem maior. Constantemente tais instituições recebem alunos que passaram
por alguma medida sócio- educativa e muitos dos alunos iniciam a vida no tráfico
muito cedo e também perdem a vida muito cedo. Todas essas escolas registram
alunos que são assassinados por participarem da famosa “VIDA LOKA” . É
necessário realizar intervenções com propostas fundamentais, mas o trabalho com
os profissionais da educação poderá minimizar o preconceito para com essa
legislação, o que será um ponto inicial e fundamental na mudança da realidade.
Um dos fatores que tem contribuído para a degeneração de nossas crianças
e adolescentes vem da ausência da família como educadora. O requisito familiar
está esquecido, transferindo à escola a exclusiva responsabilidade da formação o
indivíduo. Muitos pais e responsáveis, quando chamados à responsabilidade pela
instituição escolar, expressão não saber como lidar com suas crianças e
adolescentes, logicamente a escola pode orientar, mas não conseguirá substituir a
educação familiar.
Há, além dos preconceitos gerados pela mídia e por discursos anti- ECA,
muita falta de conhecimento do próprio documento. A maioria dos profissionais da
educação desconhecem os conceitos de medidas socioeducativas e atos
infracionais. Não podemos furtar-nos da responsabilidade social como educadores,
ao contrário, podemos assumir uma postura diferente, a de protagonista da
responsabilidade social com nossos adolescentes.
Devemos reconhecer como fato a situação de vulnerabilidade dos
adolescentes, por isso faz-se necessário às escolas montarem uma rede de
proteção a estes adolescentes, visto que muitos dos seus problemas escolares
estão vinculados à situação de vulnerabilidade familiar como: pais presos,
adolescentes obrigados a se prostituir, adolescentes que são espancados, situação
de vícios dos mais diversos, situação de medida socioeducativa.
A situação de risco se faz presente quando uma criança ou adolescente está com seus direitos fundamentais violados ou ameaçados de lesão. Pode ocorrer por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável e em razão da própria conduta da criança e do adolescente (Disponível em: http://www.tjdft.jus.br/cidadaos/infancia ejuventude/informacoes/situacao-de-risco).
Reconhecer o que está acontecendo com o aluno é o passo inicial para a
descoberta dos motivos que levam o aluno a não conseguir ter o rendimento
esperado na escola.
O conhecimento do ECA por parte do corpo docente da escola é
fundamental, pois quando os professores criam vínculo com a escola, o docente
começa a conhecer afetivamente seu aluno, descobre razões, motivos e este é o
primeiro passo para o desenvolvimento de uma proximidade em relação ao aluno e
à sua realidade. Isto não significa uma ação sentimentalista, mas uma ação
pedagógica de interação com a realidade do aluno, mesmo sendo necessário
discordar das condições desta realidade. Contudo há um problema, normalmente
em escolas consideradas difíceis a rotatividade de professores é alta e também
grande parte dos profissionais não estão preparados e falta formação dos docentes
para trabalhar com esta realidade.
Há necessidade de profissionais capacitados para o trabalho com realidades
consideradas de fronteira, como o risco pessoal e social. Para isso, é necessário
interagir com as redes de proteção existentes, como a ação social, a patrulha
escolar, o conselho tutelar e as instituições de apoio assistencial. Esta integração
conduz-nos como professores a perceber e participar da realidade do estudante,
possibilitando assim ações diferenciadas em nossas aulas, criando assim objetivo a
partir dessa realidade e não somente do que é esperado que o aluno produza.
Neste sentido a estrutura escolar pode servir de base a favor da superação
dos problemas dos discentes e também dos mitos relativos à aplicação do Estatuto
da Criança e do Adolescente, com profissionais preparados e diálogo com as redes
de proteção, a escola transforma-se em uma estrutura benéfica na formação,
atendendo às reais necessidades dos educandos em situação de risco.
Realmente, informar constitui-se o primeiro passo para que possamos iniciar
um trabalho de qualidade. Sabemos que a realidade não é simples, e acredito que
este passo deve ser dado gradativamente, para não acontecer um choque abrupto
com a realidade. Poderemos realizar a inserção da análise e estudo do ECA aos
nossos educandos em nossas aulas, vinculando às disciplinas de ética e política
com objetividade de nosso trabalho em diferentes realidades. Nossas crianças e
adolescentes, além dos pais, não têm muito acesso à lei. A lei para eles configura-
se como algo meramente punitivo, isto transmite um sentimento de que o estado
faz-se presente de forma meramente punitiva e pouca ou nenhuma vez, faz-se
presente de forma realmente educativa. O acesso à lei como procedimento
educativo é fundamental.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, considerado por muitos que
desconhecem o Estatuto como conjunto de leis existentes apenas para “proteger
bandidos menores”, com certeza sofre do maior dos males vinculados à realidade
de nossa sociedade- a ignorância. Sabemos que não são menores que fabricam ou
distribuem armas.
Sabemos que os grandes criminosos estão dentro de gabinetes ou
condomínios fechados, bem guardados e protegidos. Por isso vemos no estatuto
uma chave para que se abra a porta da justiça para nossas crianças e
adolescentes. Toda realidade começa pelo conhecimento. Neste sentido, as
iniciativas da prática pedagógica vão ao encontro desta necessidade fundamental,
a de conhecer o estatuto e a de fazer com que este atue na prática. A lei não pode
ser apenas punitiva, mas fundamentalmente deve ser mostrada como educativa.
O ESTUDO DO ESTATUO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
O colégio situa-se no bairro Jardim San Rafael, município de Ibiporã, que
tem características peculiares embora sua população tenha nível sócio-econômico
de baixo poder aquisitivo. A origem da maioria das famílias é rural e reflete o
êxodo ocorrido em toda a região Norte do Paraná em decorrência da grande
geada de 1975 e da consequente substituição da cultura do café pela lavoura da
soja e do milho, que utiliza pouca mão de obra. Sem preparo para novos trabalhos,
a maioria dos pais e alunos jovens ocupa-se com trabalhos braçais na construção,
na indústria ou nos serviços domésticos. É dentro desse universo de referência que
se encontra nossa clientela, nossa Escola.
Como em todo cenário nacional, também aqui tem ocorrido o aumento da
violência, do tráfico de drogas, e isto tem se refletido também na escola.
Diariamente nos deparamos com alunos irreverentes, indisciplinares e
desinteressados pelos estudos. Os pais, em sua maioria, preocupados com a
sobrevivência, deixam para a Escola o que seria a sua tarefa: educar. São poucos
os pais que se responsabilizam diante da Escola de acompanhar verdadeiramente
o desempenho escolar de seus filhos.
O ECA foi analisado e estudado junto a alguns representantes dos diversos
grupos da comunidade escolar (docentes, discentes, funcionários e pais) tendo
como foco algumas de suas diretrizes, pois através desses estudos buscou-se
propor uma perspectiva livre de mitos e pré-conceitos.
Em nosso cotidiano escolar enfrentamos diversas situações relacionadas à
compreensão do ECA, muitas vezes não interpretado corretamente. Não
pretendemos com esse trabalho nos debruçar sobre todos os artigos desta
normativa e os mitos relacionados aos mesmos, sendo assim, aplicaremos nossos
esforços sobre os artigos 53 e 129, quais sejam:
Art. 53. A criança e o adolescente têm direito a educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II – direito de ser respeitado por seus educadores;
III – direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer as instâncias escolares superiores; IV- direito de organização e participação em entidades estudantis; V – acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência. Art. 129, inciso V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua frequência e aproveitamento escolar. (BRASIL, 2006, p.19; 41)
Foram realizados cinco encontros com a comunidade escolar (professores,
funcionários, alunos e pais de alunos) no primeiro semestre de 2014.
No primeiro encontro após a apresentação do projeto e repassado aos
cursistas os conteúdos a serem analisados, bem como o seu objetivo e suas
justificativas foi elaborado juntamente com o grupo o cronograma e as dinâmicas
dos encontros.
Dando sequência às atividades programadas, realizamos um levantamento
de como o grupo via e entendia como ECA e suas relações com a família, a escola
e a educação das crianças e adolescentes. A maioria dos cursistas desconheciam
o teor dos artigos do ECA, e alguns opinaram que o seria favorável às crianças e
jovens de forma injusta e protecionista, sendo uma coletânea de artigos que vinha
favorecendo de forma irrestrita e os protegendo seus beneficiados das
consequências de seus atos e deixando pais e responsáveis sem opções para
educá-los.
Foram distribuídas aos participantes cópias do prefácio do ECA, cuja autoria
é do Promotor Olímpio de Sá Sotto Maior Neto e realizada a leitura coletiva com
ênfase na compreensão da importância e finalidade deste conjunto de leis e
oferecer subsídios para que todos os componentes pudessem cumprir e fazer
cumprir as normas e princípios instituídos em benefício da população infanto-
juvenil, assegurando-lhes o efetivo exercício de seus direitos e, por via de
consequência, o acesso à cidadania plena que há tanto lhes foi prometida.
Com vistas a contextualizar melhor os trabalhos a serem iniciados, alguns
relatos dos professores participantes do GTR – Entre Mitos e Preconceitos: Estudo
do Estatuto da Criança e do Adolescente - foram apresentados. Tais relatos
transmitiam as análises, discussões e conclusões de diversos professores sobre as
relações entre os membros e grupos da comunidade escolar.
[...] Hoje vivemos tempos difíceis em lidar com situações as quais estamos de mão atadas para com o educando, como educadores somos xingados e muitas vezes ameaçados por educando que nada querem com o conhecimento, por isso escolhi este curso, ele trata de uma arma tanto para criança e adolescentes, mas também é uma grande
ferramenta para o professor determinar até onde o educando pode ir, ao passar a legislação aos educandos também estaremos informando que eles não estão impunes, que eles também tem um limite que a lei os impõe ( participante do GTR 2014). [...] Infelizmente vivemos em uma sociedade que devemos ter um estatuto para respeitar o direito das crianças e adolescente, como também respeito ao idoso, dizendo que armas são proibidas, ou seja, a nossa cultura é que se não tiver uma lei proibindo então é permitido, isso se faz em uma cultura pobre de ensinamentos desde a infância na pré - escola até o fim do ensino médio, são leis que sobrepõe leis, lacunas e interpretações difusas sobre determinado artigo ou parágrafo, um determinado fato hoje é permitido e já amanhã é proibido, enfim, m país onde cidadãos de papel devem ter mais papéis de coadjuvantes do que atores em relações aos empregos legalistas( participante do GTR 2014)
Entrando no tema do ECA...
[...] Na escola que leciono sempre temos problemas com alunos que xingam os professores achando que ficaram impunes, e ficavam, mas este ano a realidade é outra, todo educando que xinga o professor está sendo levado a delegacia de policia, lá se faz um B.O. sobre o ocorrido e depois em sala junto com o promotor o educando e mandado cumprir horas de serviço comunitário ou se negar-se a tal ato irá para um lugar onde ficam os menores infratores e lá passará um determinado tempo(participante do GTR 2014).
Enfim, o ECA dá muitos "poderes" a tais delinquentes, acho que passado tal legislação e usando a meio que este ano esta sendo empregado, com certeza será mudado o jeito deles pensarem e de refletir antes de tomarem atitudes deselegante para com seus educandos (participante do GTR 2014).
No segundo encontro, dividimos os artigos do ECA entre os grupos
formados por integrantes dos diversos coletivos que formam a comunidade escolar:
professores, alunos, funcionários e pais. Cada grupo ficou responsável por ler,
interpretar, discutir os seguintes temas:
Parte Geral;
Título I das Disposições Preliminares;
Título II dos Direitos Fundamentais;
Título III da Prevenção;
Título I da Política de Atendimento.
Após o trabalho realizado nos grupos menores, cada grupo compartilhou
compreenções e conclusões para toda a turma, possibilitando, assim, a troca de
conhecimentos adquiridos e a abertura para discussões mais amplas acerca do
referido documento, os mitos e preconceitos que o envolvem. Munidos disso, foram
conduzidos a elaborar propostas de desconstrução dos mesmos.
No terceiro encontro, também foram analisados os artigos do ECA, com
apresentações dos grupos, referentes aos seguintes trechos:
Título II das Medidas de Proteção;
Título III da Prática de Ato Infracional
Título IV das Medidas Pertinentes aos Pais o Responsáveis;
Título V do Conselho Tutelar;
Título VI do Conselho Tutelar;
Título IVII dos Crimes e das Infrações Administrativas.
Realizados os procedimentos semelhantes ao segundo encontro, os
cursistas apresentaram os aspectos de maior relevância dos artigos e foi realizado
um levantamento de casos ocorridos no colégio que necessitaram de intervenção
do Conselho Tutelar.
Os casos apresentados com maiores frequências foram: alunos agredidos
pelos responsáveis, alunos com história de abuso sexual, alunos abandonados
intelectualmente pelos responsáveis, pequenos furtos no ambiente escolar,
conflitos e agressões de alunos dentro e no entorno da escola, falta de atendimento
médico especializado.
No quarto encontro contamos com a presença dos Conselheiros Tutelares
do Município de Ibiporã que apresentaram uma palestra e abriram espaço para as
dúvidas e questionamentos referêntes ao ECA. Com isso, os participantes do curso
tiveram uma visão global da importância do ECA junto a subsídios para
esclarecimento com vias a cumprir e exigir o cumprimento das normas e princípios
instituídos em benefício da população infanto-juvenil, assegurando-lhes o efetivo
exercício de seus direitos e, por via de consequências, o acesso à cidadania plena.
Foram problematizados os principais artigos do ECA juntamente com os
Conselheiros Tutelares, numa perspectiva crítica, buscando entender a razão da
não efetivação dos mesmos: falta de vagas na creches, encaminhamentos das
crianças e adolescentes para especialidades, o papel do Conselheiro Tutelar,
negligências contra a criança e o adolescente.
No quinto e último encontro, baseados nos conteúdos trabalhados nos
encontros anteriores, foi promovido debate entre os participantes com o objetivo de
analisar a temática e as discussões feitas no decorrer do curso.
[...] Como participante do curso, com o tema central sendo o Estatuto da Criança e do Adolescente, esperava a leitura e discussão dos artigos presentes neste. Foi o que ocorreu, professores, funcionários, pais e alunos envolvidos na leitura e discussão de cada tema do Estatuto com posterior palestra dos alunos envolvidos e Conselheiros Tutelares de nossa cidade. Atendo-se apenas ao que tange o Direito, vimos: como o Estatuto da Criança e Adolescentes, sem distinção de raça, cor ou classe social, passaram a ser reconhecidos como sujeitos de direitos e deveres, considerados como pessoas em desenvolvimento a quem se deve prioridade absoluta do Estado. Seu objetivo, a proteção dos menores de 18 anos, proporcionando a eles um desenvolvimento físico, mental, moral e social, condizentes com os princípios constitucionais da liberdade e da dignidade, preparando para a vida adulta em sociedade. Mas quão grata surpresa surge com o rompimento dos diques da expectativa. Posso afirmar que o entendimento, para todos, foi ampliado e a capacidade crítica e argumentativa se elevaram devido á participação dos alunos, sim, deles, dos quais me acostumei a não esperar muito, vieram, participaram e ampliaram as discussões nos levando de carona com sua energia, curiosidade e perspicácia, ligando o texto com a realidade. Em suma, o curso atingiu e superou as expectativas. (Funcionário do Col. Est. do Jardim San Rafael - 2014)
Foram relatados pelos cursistas vários fatos em relação às punições,
negligências e abusos presenciados na família e no bairro, que os mesmos
desconheciam seus direitos e os deveres em relação ao ECA.
Foi desenvolvida uma oficina com a comunidade escolar sobre os temas
analisados referente ao ECA de painéis que foram expostos no colégio em
diferentes formatos: expositor de fotos, artigos e desenhos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nas considerações finais, foi possível verificar a validade das reflexões
coletivas sobre o tema, pois estas contribuíram e facilitaram a atuação do público
envolvido no estudo, conseguindo desenvolver no grupo o entendimento de que o
Estatuto da Criança e Adolescente é um grande aliado no cotidiano de nossos
alunos.
Observou-se durante o projeto de intervenção na escola, que, mesmo entre
os professores não há um conhecimento amplo sobre o Estatuto da Criança e
Adolescente e com isso tornou-se o estudo e análise do ECA, um objeto de estudo
com peculiaridades importantes para ser divulgado e ampliado para toda a
comunidade escolar.
Uma das críticas diariamente ouvidas em nosso ambiente escolar, e que foi
trazida a tona e discutida, é que ele estabelece somente direitos. Tal crítica foi
desconstruida pelas Conselheiras Tutelares, quando deixaram claro que os
deveres estão implícitos nos direitos da população infanto-juvenil.
Com relação à participação dos alunos, esta foi surpreendente. Tanto alunos
do período matutino quanto do noturno mostraram-se fundamental ao trazerem,
sob seu ponto de vista, fatos reais correlacionados com as situações analisadas.
Junto a isso, demonstraram grande interesse sobre o tema abordado, pois o
conhecimento sobre o ECA muitos já tinham uma bagagem sobre os assuntos
abordados, pois a maioria sendo de uma camada social mais vulnerável tinham
sempre uma história vivenciada sobre os artigos analisados e curiosos à aprender
sempre mais, despertando o interesse pelo assunto à conhecer seus deveres e
exigir seus direitos.
Foi considerado pelos participantes a necessidade de inserir o estudo e
análise do Estatuto da Criança e Adolescente no Projeto Político Pedagógico e
também na formação dos professores para que conheçam a Lei 8069/90 tendo
assim clareza em divulgar e esclarecer nossas crianças e adolescentes a serem
conhecedores de seus direitos e deveres.
REFERÊNCIAS
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São Paulo, Atlas, 2005.
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Malheiros Editores, 2006.
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http://www.tjdft.jus.br/cidadaos/infanciaejuventude/informacoes/situacao-de-risco).
Acesso em 29 out. 2014.