UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE ENGENHARIA DE LORENA
SOLANGE INÊS MUSSATTO DRAGONE
Aproveitamento integral de subproduto da indústria cervejeira em processos químicos e
biotecnológicos
Lorena – SP
2007
SOLANGE INÊS MUSSATTO DRAGONE
Aproveitamento integral de subproduto da indústria cervejeira em processos químicos e
biotecnológicos
Tese apresentada à Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de Doutor em Biotecnologia Industrial.
Área de Concentração: Conversão de biomassa Orientador: Dra. Inês Conceição Roberto
Lorena – SP
2007
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
Catalogação na Publicação Biblioteca Universitária
Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo
Dragone, Solange Inês Mussatto
Aproveitamento integral de subproduto da indústria cervejeira em processos químicos e biotecnológicos / Solange Inês Mussatto Dragone; orientador Inês Conceição Roberto. -- 2007
173 f. : fig.
Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia Industrial. Área de Concentração: Conversão de Biomassa) – Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo, 2007
1. Bagaço de malte 2. Hidrólise 3. Xilitol 4. Ácido láctico 5. Carvão ativado 6. Ácidos fenólicos 7. Branqueamento I. Título.
663.48 - CDU
Este trabalho eu dedico a:
Meu marido, Giuliano, por estar ao meu lado em todos os momentos, pelo seu amor, respeito,
carinho e confiança.
Minha mãe, Idalina, por tudo! Por ter me criado com tanto amor e carinho, por ter me
educado e sempre me apoiado em todos os momentos.
Meu pai, Ercy, que infelizmente não está mais presente fisicamente entre nós, mas que estará
sempre dentro de mim como um grande exemplo de dignidade, força, amor e humildade.
AGRADECIMENTOS
À Dra. Inês Conceição Roberto, pela amizade, confiança e orientação, não apenas durante o
doutorado, mas desde 1998, quando iniciei meus trabalhos de pesquisa sob sua orientação.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela bolsa de
doutorado concedida.
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e ao Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelos apoios financeiros.
À Novozymes, pela doação das enzimas.
Aos professores, George Jackson de Moraes Rocha, Adriane Maria Ferreira Milagres e Ismael
Maciel de Mancilha, pelas valiosas explicações e sugestões dadas para que este trabalho
pudesse ser realizado da melhor forma possível.
Aos professores João Batista de Almeida e Silva, Silvio Silvério da Silva, Maria das Graças
de Almeida Felipe e Arnaldo Márcio Ramalho Prata, pela amizade constante.
A todos os colegas e funcionários da EEL-USP que de alguma forma contribuíram para a
realização deste trabalho, em especial à Marcela, por quem tenho grande carinho e amizade,
ao meu grande amigo Júlio César dos Santos e ao Paulinho (meu padrinho).
À Escola de Engenharia de Lorena (EEL-USP) e aos professores do Programa de Pós-
graduação em Biotecnologia Industrial de uma forma geral, pelos conhecimentos transmitidos
e pela abertura de novas fronteiras em minha vida.
RESUMO
MUSSATTO, S.I. Aproveitamento integral de subproduto da indústria cervejeira em processos químicos e biotecnológicos. 2007. 173 f. Tese (Doutorado em Biotecnologia Industrial) – Escola de Engenharia de Lorena, Universidade de São Paulo, Lorena, 2007. O objetivo deste trabalho foi avaliar a possibilidade de aproveitamento integral do bagaço de malte em processos químicos e biotecnológicos. O material foi fracionado através de três diferentes procedimentos: hidrólise com ácido diluído, para separação da hemicelulose; hidrólise alcalina, para solubilização da lignina e hidrólise enzimática, para conversão da celulose em glicose. Para cada um destes procedimentos foi realizado um estudo de otimização das condições de fracionamento, empregando variáveis previamente selecionadas. Os hidrolisados obtidos nas condições otimizadas foram utilizados em processos químicos ou biotecnológicos para obtenção de compostos de interesse comercial, tais como: 1. xilitol, produzido por fermentação da xilose a partir do hidrolisado hemicelulósico, pela levedura Candida guilliermondii; 2. ácido láctico, produzido por fermentação da glicose a partir do hidrolisado celulósico, pela bactéria Lactobacillus delbrueckii; 3. carvão ativado, produzido por ativação química da lignina presente no licor alcalino. Foi também avaliada e otimizada a liberação de ácidos fenólicos durante a hidrólise alcalina da lignina e foi ainda realizado um estudo sobre as características da polpa de celulose obtida nas condições otimizadas, antes e após seu branqueamento com peróxido de hidrogênio, para avaliar sua possibilidade de emprego na produção de papel ou de derivados de celulose. Os resultados de hidrólise ácida da hemicelulose revelaram que a eficiência deste processo em reator foi >85% para todas as condições avaliadas, porém, a produção de xilitol foi favorecida a partir do hidrolisado obtido nas condições de relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 100 mg H2SO4/g de matéria seca, 120ºC por 17 min, atingindo um fator de rendimento de 0,70 g/g e produtividade de 0,45 g/l.h. Na etapa de hidrólise alcalina, os melhores resultados foram obtidos quando o processo foi realizado a 120ºC por 90 min, empregando NaOH 2% p/v e uma relação sólido:líquido de 1:20 g:g. Nestas condições, a polpa obtida apresentou (% p/p): 90,4 de celulose, 8,2 de lignina e 1,1 de hemicelulose. Nas condições otimizadas de hidrólise enzimática para esta polpa (45 FPU/g de matéria seca, substrato 2% p/v, 100 rpm, 45ºC, 96 h), a eficiência de conversão da celulose em glicose foi de 93,1%. A produção de ácido láctico a partir deste hidrolisado apresentou elevado rendimento (0,98 g/g), porém, a produtividade aumentou 2,8 vezes quando o meio foi suplementado com nutrientes. Os carvões obtidos por ativação química da lignina apresentaram uma elevada eficiência para remoção de metais, principalmente níquel, ferro, cromo e silício, a qual foi superior à obtida a partir de um carvão comercial. Através da hidrólise alcalina do bagaço de malte tratado com ácido sulfúrico diluído, foi possível recuperar vários ácidos fenólicos, principalmente os ácidos ferúlico e p-cumárico, que são os dois ácidos fenólicos presentes em maior quantidade neste material. Além disso, a polpa celulósica obtida nestas condições, quando branqueada por uma seqüência utilizando hidróxido de sódio e peróxido de hidrogênio, apresentou características adequadas para utilização na produção de derivados de celulose. Em função destes resultados, foi concluído que o bagaço de malte é um subproduto industrial com grande potencial para aproveitamento como matéria-prima em processos químicos e biotecnológicos. Palavras-chave: Bagaço de malte. Hidrólise. Xilitol. Ácido láctico. Carvão ativado. Ácidos fenólicos. Branqueamento.
ABSTRACT
MUSSATTO, S.I. Integral use of brewery by-product in chemical and biotechnological processes. 2007. 173 f. Thesis (Doctoral in Industrial Biotechnology) – Escola de Engenharia de Lorena, Universidade de São Paulo, Lorena, 2007. The possibility of brewer’s spent grain integral use, in chemical and biotechnological processes, was evaluated. The material was fractionated by means of three different procedures: dilute acid hydrolysis, for the hemicellulose recovery; alkaline hydrolysis, for the lignin solubilization, and enzymatic hydrolysis, for the cellulose conversion into glucose. A study on the optimization of the fractionation conditions using previously selected variables was performed for each one of these procedures. The hydrolysates produced under the optimum conditions were used in chemical or biotechnological processes for obtainment of commercial interest compounds, such as: 1. xylitol, produced by fermentation of xylose from hemicellulosic hydrolysate, by Candida guilliermondii yeast; 2. Lactic acid, produced by fermentation of glucose from cellulosic hydrolysate, by Lactobacillus delbrueckii bacterium; 3. activated charcoal, produced by chemical activation of the lignin present in the alkaline liquor. The phenolic acids release during the lignin alkaline hydrolysis was also evaluated and optimized. In addition, a study about the characteristics of the cellulose pulp produced under the optimum conditions, before and after bleaching with hydrogen peroxide, was also performed to evaluate the possibility of using this pulp on the production of paper or cellulose derivatives. The hemicellulose acid hydrolysis results revealed that the efficiency of this process in reactor was >85% for all the evaluated conditions, but the xylitol production was favored from the hydrolysate obtained in the conditions of 1:8 g:g solid:liquid ratio, 100 mg H2SO4/g dry matter, 120ºC for 17 min, attaining a yield factor of 0.70 g/g and productivity of 0.45 g/l.h. In the alkaline hydrolysis stage, the best results were obtained when the process was performed at 120ºC for 90 min, using 2% w/v NaOH and a solid:liquid ratio of 1:20 g:g. Under these conditions, the obtained pulp presented (% w/w): 90.4 cellulose, 8.2 lignin and 1.1 hemicellulose. In the optimized conditions of enzymatic hydrolysis for this pulp (45 FPU /g dry matter, 2% w/v substrate, 100 rpm, 45ºC, 96 h), the efficiency of cellulose conversion into glucose was 93.1%. The lactic acid production from this hydrolysate presented a high yield (0.98 g/g), but the productivity increased 2.8-times when the medium was supplemented with nutrients. The charcoals produced by chemical activation of the lignin presented high efficiency for the removal of metals, mainly nickel, iron, chromium and silicon, which was higher than that obtained from commercial charcoal. By alkaline hydrolysis of brewer’s spent grain pretreated with dilute sulfuric acid, it was possible to recover several phenolic acids, mainly ferulic and p-coumaric acids that are the two phenolic acids present in larger amount in this material. Furthermore, the cellulose pulp obtained under these conditions presented characteristics suitable for use on the production of cellulose derivatives when bleached by a sequence using sodium hydroxide and hydrogen peroxide. Due to these results it was concluded that brewer’s spent grain is an industrial by-product with great potential for use as raw material in chemical and biotechnological processes. Keywords: Brewer’s spent grain. Hydrolysis. Xylitol. Lactic acid. Activated charcoal. Phenolic acids. Bleaching.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 2.1 - Grãos de cevada. ................................................................................................... 21
Figura 2.2 - Representação esquemática do processo de obtenção do bagaço de malte a partir da cevada natural........................................................................................ 23
Figura 2.3 - Bagaço de malte.................................................................................................... 24
Figura 2.4 - Microscopia eletrônica de varredura de partículas do bagaço de malte. (A) Ampliação de 100 vezes; (B) Ampliação de 300 vezes....................................... 24
Figura 2.5 - Representação esquemática da ação das enzimas celulolíticas na estrutura da celulose. ............................................................................................................... 31
Figura 2.6 - Estrutura da lignina proposta por ADLER (1977)................................................ 37
Figura 3.1 - Representação esquemática do trabalho proposto para aproveitamento integral do bagaço de malte. ................................................................................ 40
Figura 3.2 - Reator utilizado nos experimentos de hidrólise ácida. ......................................... 45
Figura 3.3 - Representação esquemática dos procedimentos utilizados para preparo dos meios de fermentação a partir do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte. ................................................................................................................... 50
Figura 3.4 - Banho termostatizado com óleo de silicone, utilizado para a hidrólise alcalina do bagaço de malte. ............................................................................................. 53
Figura 4.1 - Gráficos de Pareto para estimativa dos efeitos das variáveis: (1) relação sólido:líquido, (2) concentração de ácido sulfúrico e (12) a interação entre elas, nas respostas: eficiência de hidrólise da arabinana (A), eficiência de hidrólise da xilana (B), eficiência de hidrólise da hemicelulose (xilana + arabinana) (C) e concentração de lignina solúvel (D), obtidas nos processos de hidrólise ácida do bagaço de malte em autoclave. Efeitos acima da linha de p=0,05 são significativos ao nível de 95% de confiança. ............................... 73
Figura 4.2 - Cromatograma do hidrolisado obtido em autoclave, nas condições de relação sólido líquido de 1:10 g:g e 120 mg de ácido/g de matéria seca. ........................ 75
Figura 4.3 - Crescimento da levedura Candida guilliermondii em hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte e em meio semidefinido (MSD), contendo 20 g/l de xilose (diluído) ou 85 g/l de xilose (concentrado). ............... 86
Figura 4.4 - Consumo de xilose pela levedura Candida guilliermondii em hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte e em meio semidefinido (MSD), contendo 20 g/l de xilose (diluído) ou 85 g/l de xilose (concentrado). ............... 87
Figura 4.5 - Produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii em hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte e em meio semidefinido (MSD),
contendo 20 g/l de xilose (diluído) ou 85 g/l de xilose (concentrado). ............... 89
Figura 4.6 - Desempenho da levedura Candida guilliermondii em meio semidefinido preparado com (símbolos abertos) ou sem (símbolos fechados) arabinose. Crescimento celular (, ), consumo de xilose (, ) e produção de xilitol (, ∇). ................................................................................................................. 90
Figura 4.7 - Consumo de xilose (A) e produção de xilitol (B) pela levedura Candida guilliermondii em hidrolisado de bagaço de malte: HDS (), HC (), HCT ( ) e HCDS ()................................................................................................. 94
Figura 4.8 - Superfícies de resposta para os teores de lignina residual e de celulose (% p/p) nas polpas de bagaço de malte, em função das variáveis operacionais empregadas no processo de hidrólise alcalina. .................................................. 102
Figura 4.9 - Micrografia eletrônica de varredura (ampliação: 45 vezes) e aspecto visual das partículas do bagaço de malte nas formas: original (A), pré-tratado com ácido diluído (B) e após a hidrólise alcalina (C). .............................................. 103
Figura 4.10 - Gráficos de Pareto para o efeito das variáveis: concentração de NaOH, temperatura e tempo de reação, nas respostas: concentração de ácido ferúlico (A) e concentração de ácido p-cumárico (B) nos licores obtidos por hidrólise alcalina do bagaço de malte. Efeitos acima da linha de p=0,05 são significativos ao nível de 95% de confiança...................................................... 107
Figura 4.11 - Valores previstos pelo modelo linear em função dos valores observados para as respostas de concentração de ácido ferúlico (A) e concentração de ácido p-cumárico (B) nos licores obtidos por hidrólise alcalina do bagaço de malte. 109
Figura 4.12 - Superfícies de resposta descrita pelos modelos para o rendimento em glicose ( ) e o rendimento total (glicose + celobiose) ( ) da hidrólise enzimática do bagaço de malte. ........................................................................................... 115
1y y 2
Figura 4.13 - Perfil da liberação de glicose durante a hidrólise enzimática do bagaço de malte a 45ºC, 100 rpm e 8% p/v de concentração de substrato, utilizando diferentes relações de enzima/substrato (15 a 85 FPU/g).................................. 119
Figura 4.14 - Efeito da relação enzima/substrato nos rendimentos de hidrólise da celulose do bagaço de malte a 45ºC, 100 rpm e 8% p/v de concentração de substrato. .. 119
Figura 4.15 - Hidrólise enzimática das amostras de bagaço de malte original, celulignina e polpa celulósica. (A) Concentração de glicose e celobiose nos hidrolisados obtidos; (B) Rendimento em glicose e rendimento total de hidrólise para cada amostra utilizada........................................................................................ 122
Figura 4.16 - Fotomicrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura das amostras de bagaço de malte. Material original antes (A) e após (B) a hidrólise enzimática; Celulignina antes (C) e após (D) a hidrólise enzimática; Polpa celulósica antes (E) e após (F) a hidrólise enzimática. Ampliação: 300 vezes. ................................................................................................................. 125
Figura 4.17 - Efeito da concentração inicial de inóculo nos parâmetros fermentativos da produção de ácido láctico por Lactobacillus delbrueckii a partir do hidrolisado celulósico de bagaço de malte. ....................................................... 130
Figura 4.18 - Efeito da suplementação nutricional do hidrolisado celulósico de bagaço de malte no consumo de glicose (A), produção de ácido láctico (B), crescimento celular (C) e pH da fermentação (D) por Lactobacillus delbrueckii. Meio 1 (): hidrolisado não suplementado; Meio 2 (): hidrolisado suplementado com extrato de levedura; Meio 3 (): hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS; Meio 4 ( ): MRS com a mesma concentração inicial de glicose do hidrolisado. ....................................................................... 133
Figura 4.19 - Efeito da suplementação nutricional do hidrolisado celulósico de bagaço de malte nos parâmetros fermentativos (YP/S e QP) da produção de ácido láctico por Lactobacillus delbrueckii. Meio 1: hidrolisado não suplementado; Meio 2: hidrolisado suplementado com extrato de levedura; Meio 3: hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS; Meio 4: MRS com a mesma concentração inicial de glicose do hidrolisado. ................................................. 136
Figura 4.20 - Efeito do controle de pH no consumo de glicose (A) e produção de ácido láctico (B) por Lactobacillus delbrueckii em meios: Hidrolisado não suplementado () sem controle de pH e () com controle de pH; Hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS () sem controle de pH e ( ) com controle de pH; Meio MRS com a mesma concentração inicial de glicose do hidrolisado ( ) sem controle de pH e ( ) com controle de pH. .... 138
Figura 4.21 - Fotomicrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura das amostras de bagaço de malte original (A), polpa do bagaço original não branqueada (B), polpa do bagaço original branqueada (C); bagaço de malte pré-tratado (D), polpa do bagaço pré-tratado não branqueada (E), polpa do bagaço pré-tratado branqueada (F). Ampliação: 300 vezes............................... 143
Figura 4.22 - Aparência das amostras de bagaço de malte original (A), polpa do bagaço original não branqueada (B), polpa do bagaço original branqueada (C); bagaço de malte pré-tratado (D), polpa do bagaço pré-tratado não branqueada (E), polpa do bagaço pré-tratado branqueada (F)........................... 144
Figura 4.23 - Massa precipitada e remoção de lignina em função da redução do pH do licor alcalino de bagaço de malte....................................................................... 146
Figura 4.24 - Efeito da redução do pH (de 12,56 - amostra 1, para 2,15 - amostra 10) na cor do licor alcalino de bagaço de malte............................................................ 148
LISTA DE TABELAS
Tabela 3.1 - Planejamento fatorial completo 22 para avaliação do processo de hidrólise ácida do bagaço de malte, em autoclave, sob diferentes condições operacionais. ........................................................................................................ 44
Tabela 3.2 - Planejamento fatorial completo 23 para avaliação do processo de hidrólise ácida do bagaço de malte, em reator, sob diferentes condições operacionais. .... 46
Tabela 3.3 - Composição do meio semidefinido utilizado para crescimento do inóculo da levedura Candida guilliermondii. ........................................................................ 47
Tabela 3.4 - Planejamento fatorial completo 23 para avaliação do processo de hidrólise alcalina do resíduo do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais. ........................................................................................................ 52
Tabela 3.5 - Planejamento fatorial completo 23 para avaliação do processo de hidrólise enzimática da celulose da polpa do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais. ....................................................................................... 54
Tabela 3.6 - Planejamento fatorial completo 22 para avaliação do processo de produção de carvão ativado a partir da lignina do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais. ....................................................................................... 61
Tabela 4.1 - Composição química do bagaço de malte. ........................................................... 69
Tabela 4.2 - Concentração de açúcares (glicose, xilose e arabinose), produtos de degradação (furfural, hidroximetilfurfural e lignina solúvel) e ácido acético nos hidrolisados hemicelulósicos de bagaço de malte obtidos em autoclave sob diferentes condições operacionais................................................................. 71
Tabela 4.3 - Eficiência de hidrólise da xilana, da arabinana e da hemicelulose (xilana + arabinana) durante a hidrólise ácida do bagaço de malte em autoclave, sob diferentes condições operacionais. ...................................................................... 72
Tabela 4.4 - Concentração de açúcares (glicose, xilose e arabinose), produtos de degradação (furfural, hidroximetilfurfural e lignina solúvel) e ácido acético nos hidrolisados hemicelulósicos de bagaço de malte obtidos em reator sob diferentes condições operacionais. ...................................................................... 77
Tabela 4.5 - Eficiência de hidrólise da xilana, da arabinana e da hemicelulose (xilana + arabinana) durante a hidrólise ácida do bagaço de malte em reator, sob diferentes condições operacionais. ...................................................................... 77
Tabela 4.6 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student para a concentração de lignina solubilizada durante a hidrólise ácida do bagaço de malte. ................................................................................................................... 80
Tabela 4.7 - Consumo de xilose, crescimento celular e produção de xilitol nos hidrolisados de bagaço de malte produzidos em reator, sob diferentes
condições operacionais. ....................................................................................... 81
Tabela 4.8 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student para o fator de rendimento (YP/S) e produtividade volumétrica em xilitol (QP) obtidos durante a fermentação do hidrolisado de bagaço de malte. ................................. 83
Tabela 4.9 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student para o fator de rendimento em células (YX/S) obtido durante a fermentação do hidrolisado de bagaço de malte............................................................................................... 83
Tabela 4.10 - Composição química do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte nas formas diluída (original) e concentrada. .............................................................. 85
Tabela 4.11 - Parâmetros fermentativos obtidos durante o cultivo da levedura Candida guilliermondii em hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte e em meio semidefinido. ....................................................................................................... 87
Tabela 4.12 - Composição dos hidrolisados de bagaço de malte empregados como meio de fermentação para produção de xilitol.............................................................. 91
Tabela 4.13 - Parâmetros fermentativos e concentração final de células obtidas durante a produção de xilitol a partir dos hidrolisados de bagaço de malte........................ 93
Tabela 4.14 - Concentração de alguns compostos fenólicos identificados nos hidrolisados de bagaço de malte............................................................................................... 95
Tabela 4.15 - Composição química do bagaço de malte nas formas original (BO) e pré-tratado com ácido sulfúrico diluído (BPT), massa recuperada e perda de cada fração após o pré-tratamento ácido...................................................................... 97
Tabela 4.16 - Composição química das polpas de bagaço de malte e perdas de celulose e lignina após o tratamento de hidrólise alcalina sob diferentes condições operacionais. ........................................................................................................ 99
Tabela 4.17 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e resultados do teste t de Student, para os teores de celulose e lignina residual nas polpas obtidas a partir do bagaço de malte................................................................................... 100
Tabela 4.18 - Equações do modelo para a hidrólise alcalina do bagaço de malte e seus respectivos R2, ajustados aos dados experimentais para as respostas de lignina residual e teor de celulose nas polpas obtidas. ...................................... 101
Tabela 4.19 - Porcentagem de lignina solubilizada e concentração de ácidos fenólicos no licor obtido a partir da hidrólise alcalina do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais. ..................................................................................... 106
Tabela 4.20 - Equações do modelo para a hidrólise alcalina do bagaço de malte e seus respectivos R2, ajustados aos dados experimentais para as respostas de concentração de ácido ferúlico e concentração de ácido p-cumárico no licor alcalino obtido. .................................................................................................. 108
Tabela 4.21 - Rendimento em glicose e rendimento total (glicose + celobiose) da hidrólise
enzimática do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais............ 111
Tabela 4.22 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student, para o rendimento em glicose e rendimento total (glicose + celobiose) da hidrólise enzimática do bagaço malte............................................................................... 112
Tabela 4.23 - Análise de variância com erro total e teste da curvatura, para o rendimento em glicose e rendimento total da hidrólise enzimática do bagaço malte........... 113
Tabela 4.24 - Equações do modelo para a hidrólise enzimática do bagaço de malte e seus respectivos R2, ajustados aos dados experimentais para as respostas de rendimento em glicose e rendimento total (glicose + celobiose) de hidrólise... 114
Tabela 4.25 - Composição química das amostras de bagaço de malte empregadas no processo de hidrólise enzimática. ...................................................................... 121
Tabela 4.26 - Composição de carboidratos nos hidrolisados enzimáticos produzidos a partir do bagaço de malte nas formas original, celulignina e polpa celulósica. 127
Tabela 4.27 - Parâmetros fermentativos e concentração de glicose nos meios de fermentação para a produção de ácido láctico por Lactobacillus delbrueckii. .. 138
Tabela 4.28 - Rendimento e características das polpas de celulose obtidas por hidrólise alcalina do bagaço de malte nas formas original e pré-tratado com ácido sulfúrico diluído................................................................................................. 140
Tabela 4.29 - Volume de ácido sulfúrico adicionado nas amostras do licor alcalino de bagaço de malte, caracterização do licor obtido e quantificação da massa de lignina precipitada. ............................................................................................ 146
Tabela 4.30 - Remoção de metais, cor e compostos fenólicos a partir do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte, por adsorção nos carvões ativados preparados a partir da lignina............................................................................. 149
Tabela 4.31 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student para a remoção de níquel, ferro, cromo e silício a partir do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte, por adsorção nos carvões ativados preparados a partir da lignina............................................................................. 150
LISTA DE SIGLAS
ATP Adenosina Trifosfato
CLAE Cromatografia Líquida de Alta Eficiência
MRS Man, Rogosa and Sharpe
UV Ultravioleta
VPSE Variable Pressure Secondary Electron
LISTA DE SÍMBOLOS
ºC graus Celsius
β beta
p pára
α alfa
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 19
2 REVISÃO DA LITERATURA 21
2.1 BAGAÇO DE MALTE 21
2.1.1 Da cevada ao bagaço de malte 21 2.1.2 Características e aplicações do bagaço de malte 23
2.2 FRACIONAMENTO DA MATÉRIA-PRIMA LIGNOCELULÓSICA 26
2.2.1 Hidrólise com ácido diluído 27 2.2.2 Hidrólise alcalina 29 2.2.3 Hidrólise enzimática 30
2.3 PRODUTOS DE INTERESSE COMERCIAL QUE PODEM SER OBTIDOS POR PROCESSOS BIOTECNOLÓGICOS A PARTIR DE MATÉRIAS-PRIMAS LIGNOCELULÓSICAS 32
2.3.1 Xilitol 32 2.3.2 Ácido láctico 34 2.3.3 Carvão ativado 35 2.3.4 Ácidos fenólicos 36 2.3.5 Polpa de celulose branqueada 38
3 MATERIAIS E MÉTODOS 40
3.1 CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA DO BAGAÇO DE MALTE E ENSAIOS PRELIMINARES DE HIDRÓLISE ÁCIDA EM AUTOCLAVE 41
3.1.1 Determinação do teor de umidade 41 3.1.2 Determinação dos teores de celulose, hemicelulose e lignina 41 3.1.3 Determinação do teor de cinzas 43 3.1.4 Determinação do teor de proteínas 43 3.1.5 Determinação do teor de minerais 43 3.1.6 Hidrólise ácida em autoclave 43
3.2 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ÁCIDA EM REATOR VISANDO A MÁXIMA LIBERAÇÃO DE XILOSE E PRODUÇÃO DE XILITOL A PARTIR DO HIDROLISADO 45
3.2.1 Hidrólise ácida em reator 45 3.2.2 Fermentação dos hidrolisados obtidos para produção de xilitol 46
3.2.2.1 Microrganismo e preparo do inóculo 46 3.2.2.2 Meio e condições de fermentação 48
3.3 AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO CINÉTICO DA LEVEDURA Candida guilliermondii DURANTE A PRODUÇÃO DE XILITOL A PARTIR DO HIDROLISADO HEMICELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE DILUÍDO E CONCENTRADO 48
3.3.1 Hidrolisado hemicelulósico 48 3.3.2 Microrganismo e preparo do inóculo 48 3.3.3 Meios e condições de fermentação 49
3.4 INFLUÊNCIA DOS COMPOSTOS TÓXICOS PRESENTES NO HIDROLISADO HEMICELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE NA BIOCONVERSÃO DE XILOSE A XILITOL PELA LEVEDURA Candida guilliermondii 49
3.4.1 Hidrolisado hemicelulósico 49 3.4.2 Microrganismo e preparo do inóculo 50 3.4.3 Meios e condições de fermentação 50
3.5 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ALCALINA DO BAGAÇO DE MALTE PARA A PRODUÇÃO DE POLPA CELULÓSICA E LIBERAÇÃO DE ÁCIDOS FENÓLICOS 51
3.6 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ENZIMÁTICA DO BAGAÇO DE MALTE PARA MÁXIMA CONVERSÃO DA CELULOSE EM GLICOSE 52
3.6.1 Enzima 53 3.6.2 Hidrólise enzimática 53 3.6.3 Efeito da hemicelulose e da lignina na hidrólise enzimática da celulose do
bagaço de malte 55
3.7 PRODUÇÃO DE ÁCIDO LÁCTICO POR Lactobacillus delbrueckii A PARTIR DO HIDROLISADO CELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE 55
3.7.1 Hidrolisado celulósico 55 3.7.2 Fermentação do hidrolisado celulósico para produção de ácido láctico 56
3.7.2.1 Microrganismo e preparo do inóculo 56 3.7.2.2 Meios e condições de fermentação 57
3.8 BRANQUEAMENTO DAS POLPAS DE CELULOSE OBTIDAS A PARTIR DO BAGAÇO DE MALTE 58
3.8.1 Obtenção das polpas de celulose 58 3.8.2 Branqueamento das polpas de celulose 59
3.9 RECUPERAÇAO DA LIGNINA A PARTIR DO LICOR ALCALINO E SUA UTILIZAÇÃO NA PRODUÇÃO DE CARVÃO ATIVADO 59
3.9.1 Obtenção do licor alcalino contendo lignina solúvel 59 3.9.2 Precipitação da lignina a partir do licor alcalino 60 3.9.3 Preparo dos carvões ativados a partir da lignina 60
3.10 MÉTODOS ANALÍTICOS 61
3.10.1 Determinação da concentração de glicose, xilose, arabinose, celobiose, xilitol, ácido acético e ácido láctico 61
3.10.2 Determinação da concentração de furfural, hidroximetilfurfural e compostos fenólicos 62
3.10.3 Determinação da concentração de metais 62 3.10.4 Determinação do pH 62 3.10.5 Determinação da densidade 63 3.10.6 Determinação da cor dos hidrolisados 63 3.10.7 Determinação da concentração celular da levedura Candida guilliermondii 63 3.10.8 Determinação da concentração celular da bactéria Lactobacillus delbrueckii 63
3.10.9 Determinação dos parâmetros do processo fermentativo para a produção de xilitol 64
3.10.10 Determinação dos parâmetros do processo fermentativo para a produção de ácido láctico 64
3.10.11 Determinação do teor de proteínas totais presentes no extrato celulolítico 64 3.10.12 Determinação da atividade enzimática do extrato celulolítico 65 3.10.13 Determinação do número kappa das polpas de celulose 65 3.10.14 Determinação da viscosidade das polpas de celulose 66 3.10.15 Determinação da alvura das polpas de celulose 67 3.10.16 Fotomicrografias 67
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 68
4.1 CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA DO BAGAÇO DE MALTE E ENSAIOS PRELIMINARES DE HIDRÓLISE ÁCIDA EM AUTOCLAVE 68
4.1.1 Composição química do bagaço de malte 68 4.1.2 Ensaios preliminares de hidrólise ácida do bagaço de malte em autoclave 70 4.1.3 Análise estatística da hidrólise ácida do bagaço de malte em autoclave 72
4.2 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ÁCIDA EM REATOR VISANDO A MÁXIMA LIBERAÇÃO DE XILOSE E PRODUÇÃO DE XILITOL A PARTIR DO HIDROLISADO 75
4.2.1 Composição química dos hidrolisados obtidos 76 4.2.2 Fermentabilidade dos hidrolisados de bagaço de malte para produção de
xilitol 80
4.3 AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO CINÉTICO DA LEVEDURA Candida guilliermondii DURANTE A PRODUÇÃO DE XILITOL A PARTIR DO HIDROLISADO HEMICELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE DILUÍDO E CONCENTRADO 84
4.3.1 Composição química dos hidrolisados utilizados como meio de fermentação 85 4.3.2 Avaliação do crescimento celular da levedura Candida guilliermondii durante
a fermentação dos hidrolisados de bagaço de malte 85 4.3.3 Avaliação da produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii
durante a fermentação dos hidrolisados de bagaço de malte 88 4.3.4 Efeito da arabinose na produção de xilitol pela levedura Candida
guilliermondii 89
4.4 INFLUÊNCIA DOS COMPOSTOS TÓXICOS PRESENTES NO HIDROLISADO HEMICELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE NA BIOCONVERSÃO DE XILOSE A XILITOL PELA LEVEDURA Candida guilliermondii 91
4.4.1 Composição química dos hidrolisados de bagaço de malte 91 4.4.2 Fermentação dos hidrolisados de bagaço de malte contendo diferentes
concentrações de compostos tóxicos 92
4.5 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ALCALINA DO BAGAÇO DE MALTE PRÉ-TRATADO PARA PRODUÇÃO DE POLPA CELULÓSICA 96
4.5.1 Características do bagaço de malte utilizado nos experimentos 96 4.5.2 Hidrólise alcalina do bagaço de malte pré-tratado 97 4.5.3 Análise estatística da hidrólise alcalina do bagaço de malte 100
4.5.4 Micrografias das polpas de bagaço de malte 102 4.5.5 Balanço de massa da hidrólise alcalina 104
4.6 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ALCALINA DO BAGAÇO DE MALTE PRÉ-TRATADO PARA LIBERAÇÃO DE ÁCIDOS FENÓLICOS 104
4.6.1 Liberação de ácidos fenólicos durante o pré-tratamento do bagaço de malte com ácido sulfúrico diluído 105
4.6.2 Liberação de ácidos fenólicos durante a hidrólise alcalina do bagaço de malte 105 4.6.3 Análise estatística para a remoção de ácido ferúlico e p-cumárico durante a
hidrólise alcalina do bagaço de malte 106
4.7 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ENZIMÁTICA DO BAGAÇO DE MALTE PARA MÁXIMA CONVERSÃO DA CELULOSE EM GLICOSE 110
4.7.1 Composição química do substrato 110 4.7.2 Análise estatística da hidrólise enzimática do bagaço de malte 111 4.7.3 Análise comparativa da hidrólise enzimática do bagaço de malte com a
hidrólise enzimática de outros materiais lignocelulósicos 115 4.7.4 Efeito da carga de enzimas na hidrólise enzimática da celulose do bagaço de
malte 118
4.8 EFEITO DA HEMICELULOSE E DA LIGNINA NA HIDRÓLISE ENZIMÁTICA DA CELULOSE DO BAGAÇO DE MALTE 120
4.8.1 Hidrólise enzimática do bagaço de malte com diferentes composições químicas 121
4.8.2 Estrutura morfológica do bagaço de malte após a hidrólise enzimática 124 4.8.3 Composição dos hidrolisados celulósicos produzidos 126
4.9 EMPREGO DO HIDROLISADO CELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE COMO MEIO DE FERMENTAÇÃO PARA PRODUÇÃO DE ÁCIDO LÁCTICO 128
4.9.1 Aspectos gerais do processo fermentativo 128 4.9.2 Efeito do nível de inóculo na produção de ácido láctico 129
4.10 EFEITO DO PH E DA SUPLEMENTAÇÃO NUTRICIONAL DO HIDROLISADO CELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE NA PRODUÇÃO DE ÁCIDO LÁCTICO POR Lactobacillus delbrueckii 132
4.10.1 Efeito da suplementação nutricional do hidrolisado celulósico 132 4.10.2 Efeito do pH 136
4.11 BRANQUEAMENTO DAS POLPAS DE CELULOSE OBTIDAS A PARTIR DO BAGAÇO DE MALTE 139
4.11.1 Características das polpas obtidas 139 4.11.2 Branqueamento das polpas de celulose do bagaço de malte 141
4.12 RECUPERAÇÃO DA LIGNINA A PARTIR DO LICAR ALCALINO E SUA UTILIZAÇÃO NA PRODUÇÃO DE CARVÃO ATIVADO 145
4.12.1 Influência do pH na precipitação da lignina a partir do licor alcalino 145 4.12.2 Produção de carvão ativado a partir da lignina e sua utilização na adsorção de
metais e compostos fenólicos 149
5 CONCLUSÕES 152
REFERÊNCIAS 155
ANEXOS 172
ANEXO A – Trabalhos que já foram publicados em periódicos científicos a partir dos
resultados obtidos nesta tese. 172
ANEXO B – Recomendações para trabalhos futuros. 173
19
1 INTRODUÇÃO
Atualmente existe uma grande pressão política e social no que diz respeito à redução da
carga poluente proveniente de atividades industriais. Esta é uma preocupação dos órgãos
ambientalistas não somente do Brasil, mas de países do mundo todo. Praticamente todos os
países, desenvolvidos ou em desenvolvimento, estão procurando se adaptar a esta realidade
modificando os seus processos de forma a reciclar ao máximo todo e qualquer resíduo ou
subproduto produzido em suas estações de processamento. Neste sentido, a maioria das
grandes empresas tem hoje uma visão onde os resíduos e os subprodutos não devem mais ser
considerados inutilizáveis, mas sim matérias-primas para outras indústrias. Seguindo este
raciocínio, além de deixarem de ser problema, os resíduos e os subprodutos passam a fazer
parte de novas tecnologias para desenvolvimento de produtos de interesse.
No processo de fabricação da cerveja, a geração de subprodutos é inevitável, sendo o
bagaço de malte, o lúpulo gasto e a levedura, os mais produzidos. No entanto, como a maioria
destes subprodutos é proveniente de matérias-primas agrícolas, eles podem ser reciclados e
reaproveitados. O presente trabalho teve como objetivo o aproveitamento integral do bagaço
de malte em processos químicos e biotecnológicos. Inicialmente, a matéria-prima foi
caracterizada quimicamente e em seguida foram avaliadas diversas condições de
fracionamento visando promover uma separação seletiva de todas as suas frações poliméricas
(celulose, hemicelulose e lignina). Nesta fase foram utilizados os procedimentos de hidrólise
ácida (para separação da hemicelulose), hidrólise alcalina (para solubilização da lignina) e
hidrólise enzimática (para conversão da celulose em glicose). Para cada um destes
procedimentos foi realizado um estudo de otimização das condições de fracionamento,
empregando variáveis previamente selecionadas. Os hidrolisados obtidos nas condições
otimizadas foram utilizados em processos químicos e biotecnológicos para produção de
compostos de interesse comercial, tais como: 1. xilitol, produzido por fermentação da xilose a
partir do hidrolisado hemicelulósico, pela levedura Candida guilliermondii; 2. ácido láctico,
produzido por fermentação da glicose a partir do hidrolisado celulósico, pela bactéria
Lactobacillus delbrueckii; 3. carvão ativado, produzido por ativação química da lignina
presente no licor alcalino. Foi também avaliada e otimizada a liberação de ácidos fenólicos
durante a hidrólise alcalina da lignina, uma vez que estes compostos também apresentam
20
interesse comercial. Além disso, foi ainda realizado um estudo sobre as características da
polpa de celulose obtida nas condições otimizadas, antes e após o seu branqueamento com
peróxido de hidrogênio (tecnologia livre de cloro), para avaliar sua possibilidade de emprego
na produção de papel ou de derivados de celulose.
Este trabalho está inserido no programa de pesquisas do Grupo de Microbiologia
Aplicada e Bioprocessos do Departamento de Biotecnologia da Escola de Engenharia de
Lorena, que tem como objetivo o desenvolvimento de tecnologias para o aproveitamento de
resíduos e subprodutos agrícolas e agro-industriais, visando a produção de insumos por via
biotecnológica.
21
2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 BAGAÇO DE MALTE
2.1.1 Da cevada ao bagaço de malte
A cevada, cereal empregado principalmente como matéria-prima para a elaboração de
cervejas, é um dos cereais mais importantes mundialmente, ficando atrás apenas do trigo,
milho e arroz (KENDAL, 1994). O Brasil é o segundo maior produtor de cevada cervejeira da
América Latina seguido da Argentina, com uma produção anual de 275 mil toneladas
(LIZARAZO; de FRANCISCO, 2003). O grão de cevada (Figura 2.1) é rico em amido e
proteínas e é composto basicamente por três partes: uma casca externa, um endosperma
amiláceo e o germe (embrião). A casca atua como uma proteção externa para o grão e é
constituída principalmente de material celulósico, apresentando proteínas, resinas e tanino em
menores quantidades (VENTURINI FILHO; CEREDA, 2001).
Figura 2.1 - Grãos de cevada.
Antes de ser utilizada no processo cervejeiro, a cevada obtida nos campos é submetida a
um processo de maltagem, o qual serve para elevar o conteúdo enzimático dos grãos. No
entanto, a cevada recém colhida não pode ser diretamente malteada, pois ainda não apresenta
características adequadas de poder germinativo. Por este motivo, após a colheita ela é mantida
armazenada durante 4 a 6 semanas até atingir a plenitude de seu poder germinativo, o que é
comprovado através de testes laboratoriais. Após este tempo, a cevada já pode ser malteada
(TSCHOPE, 2001).
22
O processo de malteação consiste em três etapas: maceração, germinação e secagem.
Durante a maceração, os grãos limpos de cevada são colocados em tanques com água
(temperatura entre 5 e 18ºC) onde são mantidos por um período de aproximadamente dois
dias, sendo realizadas sucessivas trocas de água a cada 6 a 8 horas. Após 2 dias a cevada
atinge um teor de umidade de 42 a 48%. Nesta etapa, o metabolismo da semente é ativado
através da hidratação, induzindo a germinação. Em seguida, a cevada macerada é colocada
para germinar em compartimentos apropriados que permitem a passagem de um fluxo de ar
úmido através do leito de cevada, mantendo a temperatura dos grãos na faixa de 15 a 21ºC.
Nesta segunda etapa ocorrem mudanças físico-químicas e estruturais do grão, sendo formadas
e ativadas as principais enzimas do malte (amilases, proteases, glucanases, entre outras). Ao
término da germinação (processo que dura de 6 a 7 dias), o malte de cevada obtido é secado
em uma temperatura de 40 a 60ºC até obter um teor de umidade de 4 a 5%, para evitar a
contaminação microbiana e desenvolver o sabor característico do malte. Em seguida o malte
desidratado é armazenado em silos durante 3 a 4 semanas para homogeneizar seu teor de
umidade (LIZARAZO; de FRANCISCO, 2003; TSCHOPE, 2001; VENTURINI FILHO;
CEREDA, 2001).
Nas cervejarias, o malte de cevada é moído e em seguida submetido a um processo de
mosturação, onde os grãos moídos da cevada malteada são misturados com água e a mistura
obtida é aquecida em vários níveis de temperatura (aumentados lentamente de 37 a 78ºC).
Este processo tem como objetivo promover a hidrólise enzimática dos constituintes do malte,
principalmente do amido, que é convertido em açúcares fermentáveis (maltose e maltotriose)
e não-fermentáveis (dextrinas). Posteriormente, é realizada uma filtração para separar a fração
líquida, denominada mosto, a qual é empregada como meio de fermentação para a produção
da cerveja (DRAGONE, 2007; LINKO et al. 1998). A fração sólida obtida é composta pelo
bagaço do malte de cevada. A Figura 2.2, é uma representação esquemática do processo de
obtenção do bagaço de malte a partir da cevada natural obtida nos campos.
Segundo Townsley (1979), o processo cervejeiro é seletivo e remove a partir da cevada
malteada somente os nutrientes que são necessários para a fabricação do mosto. O bagaço
obtido do malte de cevada pode ser proveniente somente da matéria-prima empregada (malte
de cevada), ou da matéria-prima e de adjuntos (arroz ou milho) que podem ser incorporados
ao processo durante a mosturação. A adição de adjuntos é feita dependendo do tipo de
processo cervejeiro utilizado e do tipo de cerveja que se deseja produzir (REINOLD, 1997).
23
MALTE DE CEVADA
Moagem
Mosturação
Filtração
BAGAÇO DE MALTE
Água / aquecimento
Mosto Fração líquida
Fração sólida
PROCESSO CERVEJEIRO
CEVADA
Maceração
Germinação
Secagem
Armazenamento
Água (5 a 18°C) / 48 h
PROCESSO DE MALTAGEM
Ar úmido (15 a 21ºC) / 6 a 7 dias
Figura 2.2 - Representação esquemática do processo de obtenção do bagaço de malte a partir da cevada natural.
2.1.2 Características e aplicações do bagaço de malte
O bagaço de malte consiste basicamente da casca do grão de cevada obtida após a
elaboração do mosto cervejeiro (Figura 2.3). Por esta razão, sua composição química pode
variar de acordo com o tipo de cevada utilizada e o seu tempo de colheita, as condições de
malteação e mosturação a que esta foi submetida e também com a qualidade e o tipo de
adjuntos adicionados ao processo cervejeiro (HUIGE, 1994; SANTOS et al., 2003).
24
Figura 2.3 - Bagaço de malte.
Embora sua composição química possa sofrer pequenas variações, o bagaço de malte é
um material lignocelulósico rico em proteínas e fibras, frações que correspondem a
aproximadamente 20-30% e 70-80% de sua composição, respectivamente (HERNÁNDEZ et
al., 1999). A estrutura fibrosa deste material pode ser facilmente visualizada na Figura 2.4.
Hemicelulose, celulose e lignina são os principais componentes destas fibras (REINOLD,
1997). Além de fibras e proteínas, o bagaço de malte também apresenta em sua composição,
lipídeos e cinzas (SANTOS et al., 2003), minerais, vitaminas e aminoácidos (HUIGE, 1994).
De acordo com Kunze (1996), 25% dos minerais presentes no bagaço de malte encontram-se
na forma de silicatos. Na Figura 2.4, os pontos brilhantes presentes na parte externa do
material correspondem a estes compostos. Nota-se, portanto a presença de grandes
quantidades de silicatos na estrutura do bagaço de malte.
A B
Figura 2.4 - Microscopia eletrônica de varredura de partículas do bagaço de malte. (A) Ampliação de 100 vezes; (B) Ampliação de 300 vezes.
25
O bagaço de malte é o mais importante subproduto proveniente da indústria cervejeira,
representando aproximadamente 85% do total de subprodutos gerados (REINOLD, 1997).
Segundo Townsley (1979), o bagaço de malte corresponde em média por 31% do peso do
malte original e sua geração é da ordem de 20 kg/ hl de cerveja produzida (REINOLD, 1997).
Considerando essa relação e sabendo que a produção de cervejas no Brasil no ano de 2006 foi
de 9,5 bilhões de litros (DRAGONE, 2007), é possível estimar que somente no ano passado, a
produção de bagaço de malte no Brasil foi de cerca de 1,9 milhões de toneladas.
Apesar de ser obtido em grandes quantidades durante o ano todo e apresentar uma
composição química rica em carboidratos e proteínas, entre outros compostos, o bagaço de
malte é muito pouco reaproveitado sendo seu principal emprego (úmido ou seco) como ração
para animais, devido ao elevado teor de proteínas e fibras (REINOLD, 1997). Alguns estudos
avaliaram a adição deste material na alimentação humana, na manufatura de pães, biscoitos e
petiscos (BARTOLOMÉ et al., 2002; ÖZTÜRK et al., 2002; SANTOS et al., 2003), tendo
chegado às seguintes conclusões: 1. o bagaço de malte na forma em que é produzido nas
cervejarias, apresenta uma granulometria grosseira para adição direta em alimentos, devendo
ser primeiramente processado para fornecer farinhas; 2. como as proteínas do bagaço de malte
úmido liberam uma coloração marrom clara, o bagaço só pode ser usado na formulação de
produtos que não são brancos, como bolos, pães e alguns cookies; 3. sua adição em alimentos
deve ser feita em pequenas quantidades (5 a 15%), pois grandes quantidades provocam
alteração no sabor, no aroma e nas propriedades físicas do produto final, como por exemplo,
na cor e na textura (MIRANDA; GROSSMANN; NABESHIMA, 1994; TOWNSLEY, 1979).
Alguns trabalhos têm avaliado também a possibilidade de emprego do bagaço de malte
em processos biotecnológicos como substrato para cultivo de microrganismos ou para a
produção de enzimas. Wang, Sakoda e Suzuki (2001), encontraram uma boa eficiência
biológica e valor nutricional do fungo Pleurotus ostreatus quando cultivado em bagaço de
malte e consideraram este material como um dos melhores substratos para cultivo desta
espécie de fungo. De acordo com Townsley (1979), o bagaço de malte favorece o crescimento
de fungos devido ao seu elevado teor de proteínas. No entanto, Wang, Sakoda e Suzuki
(2001) consideram que o crescimento destes microrganismos em bagaço de malte é
favorecido não somente pelo elevado teor de proteínas e umidade deste material, mas também
devido a algumas propriedades físicas, como o tamanho de partícula, densidade, porosidade e
capacidade de retenção de água. Quando utilizado como substrato para produção de enzimas,
o bagaço de malte mostrou-se como uma excelente fonte de nitrogênio e energia para
26
produção de alpha-amylase por Bacillus subtilis (DUVNJAK; BUDIMIR; SUSKOVIC, 1983)
ou Aspergillus oryzae (FRANCIS et al., 2003), xilanase por Aspergillus awamori
(BHUMIBHAMON, 1978) ou Streptomyces isoladas do cerrado brasileiro (NASCIMENTO
et al., 2002) e ferulosil esterase por Streptomyces avermitilis (BARTOLOMÉ et al., 2003).
Dragone (2007) e Brányik et al. (2004) utilizaram o bagaço de malte como suporte para
a imobilização das leveduras no processo de produção de cerveja e concluíram que este
material é uma alternativa promissora para a imobilização destes microrganismos quando
comparado com outros suportes encontrados comercialmente, pois além da capacidade de
imobilização de células, apresenta vantagens do ponto de vista econômico e simplicidade de
preparação.
A extração de compostos de interesse comercial por processamento hidrolítico ou
enzimático do bagaço de malte também tem sido avaliada. Kabel et al. (2002) e Carvalheiro et
al. (2004b) obtiveram várias misturas de oligossacarídeos com diferentes pesos moleculares,
quando submeteram o bagaço de malte a um tratamento hidrotérmico. A hidrólise deste
material com ácido sulfúrico diluído proporcionou a liberação de açúcares, principalmente
xilose e arabinose (CARVALHEIRO et al., 2004a), enquanto que por tratamento enzimático
já foram obtidos açúcares (glicose, xilose) e ácidos hidroxicinâmicos (ferúlico e p-cumárico)
(BARTOLOMÉ et al., 2002; BELDMAN; HENNEKAM; VORAGEN, 1987; KHAN;
LAMB; SCHNEIDER, 1988).
A possibilidade de emprego do bagaço de malte em processos de bioconversão tem sido
muito pouco explorada. Carvalheiro et al. (2004a) hidrolisaram o bagaço de malte com ácido
diluído e verificaram que o hidrolisado produzido, rico em açúcares, proporcionou elevados
rendimentos em biomassa quando fermentado pela levedura Debaryomyces hansenii. A
produção de xilitol e arabitol a partir deste hidrolisado também foi avaliada por Carvalheiro et
al. (2005), que concluíram que este hidrolisado apresenta características favoráveis para uso
na produção de xilitol.
2.2 FRACIONAMENTO DA MATÉRIA-PRIMA LIGNOCELULÓSICA
A utilização biotecnológica dos diferentes componentes passíveis de serem obtidos a
partir dos materiais lignocelulósicos, requer uma separação seletiva dos mesmos, uma vez que
a estrutura complexa da lignocelulose em plantas atua como uma barreira que as protege do
27
ataque de bactérias e fungos. Por isso, para que se possa aproveitar integralmente o bagaço de
malte, é necessário primeiramente submetê-lo a tratamentos de fracionamento, capazes de
promover uma separação seletiva de seus componentes poliméricos (celulose, hemicelulose e
lignina).
A separação dos principais componentes dos materiais lignocelulósicos pode ser
realizada através de diferentes técnicas de fracionamento, as quais incluem tratamentos
térmicos, químicos, físicos, biológicos, ou uma combinação entre estes. A escolha do
tratamento deve ser feita em função do grau de separação requerido e da finalidade do
processo. No entanto, para que o processo seja economicamente vantajoso, o tratamento
empregado deve ser eficiente do ponto de vista energético e químico, e deve promover ou
proporcionar a conversão efetiva do carboidrato de interesse, para que se obtenha um produto
final com alto rendimento. Logo, a degradação ou a perda de carboidratos deve ser evitada,
bem como a formação de compostos inibidores do metabolismo celular ou da ação de enzimas
usadas nos processos de conversão da biomassa (McMILLAN, 1994).
Apesar de existirem vários métodos de tratamento, os processos de hidrólise com ácido
diluído, hidrólise alcalina e hidrólise enzimática são as técnicas mais empregadas para
fracionamento dos materiais lignocelulósicos em geral.
2.2.1 Hidrólise com ácido diluído
A hidrólise com ácido diluído é um dos processos mais utilizados para separação da
hemicelulose (heteropolímero composto por pentoses e hexoses, cujo açúcar principal é a
xilose) da biomassa lignocelulósica. Baseia-se em uma técnica realizada normalmente em
temperaturas entre 120 e 200ºC, com a adição de pequenas quantidades de ácidos minerais
como H2SO4 ou HCl (PALMQVIST; HAHN-HÄGERDAL, 2000).
Neste processo de hidrólise, o ácido empregado libera prótons que rompem as ligações
éter entre os açúcares existentes na cadeia polimérica formada pela hemicelulose e a celulose.
O rompimento destas ligações promove a liberação de vários compostos, principalmente
xilose, arabinose e glicose (AGUILAR et al., 2002). Segundo McMillan (1994) a hidrólise
completa da hemicelulose ocorre entre 5 a 10 minutos para uma temperatura de 160ºC, ou
entre 30 a 60 minutos para uma temperatura de 140ºC. Temperaturas mais elevadas (acima de
200ºC) favorecem a hidrólise da celulose. Devido à estrutura ramificada das xilanas e ao seu
grau de cristalinidade ser inferior ao da celulose, as ligações glicosídicas entre os monômeros
28
de D-xilose na hemicelulose são menos estáveis que as ligações glicosídicas entre os
monômeros de D-glicose na celulose. Como conseqüência, as pentoses são facilmente
extraídas do material lignocelulósico através desta técnica de hidrólise.
No entanto, além de açúcares, a hidrólise ácida também promove a liberação de outros
compostos no meio reacional, tais como o ácido acético e compostos provenientes da
degradação dos açúcares (furfural e hidroximetilfurfural) e da lignina (fenólicos e aromáticos)
(AGUILAR et al., 2002; NEUREITER et al., 2002; TÉLLEZ-LUIS; RAMÍREZ; VÁZQUEZ,
2002). De acordo com Curreli et al. (2002) a formação de produtos de degradação é o
principal problema encontrado quando os materiais lignocelulósicos são tratados com ácidos
minerais. Um hidrolisado com elevado rendimento em produtos de degradação apresentará
um baixo rendimento na recuperação de açúcares. Além disso, como o ácido acético e os
produtos de degradação atuam como inibidores do microrganismo em processos
fermentativos, é necessário obter hidrolisados com baixas concentrações destes compostos, o
que requer então um estudo para otimização das condições operacionais a serem empregadas
(MUSSATTO; ROBERTO, 2004a).
Matos (2001) otimizou as condições de hidrólise ácida do bagaço de cana-de-açúcar e
obteve a máxima recuperação de xilose (22,71 g/l) empregando uma concentração de ácido
sulfúrico de 130 mg/g de matéria seca, durante 30 minutos de reação. Canilha (2002) avaliou
o efeito da temperatura, concentração de ácido sulfúrico, tempo de reação e relação
sólido:líquido no processo de hidrólise ácida da palha de trigo e observou que a temperatura e
a concentração de ácido exerceram grande influência na recuperação de xilose. Nas condições
otimizadas por este autor (140ºC, H2SO4 1%, 20 minutos e relação sólido:líquido de 1:15 g:g),
foram obtidas 15,33 g/l de xilose. Roberto, Mussatto e Rodrigues (2003) otimizaram as
condições de hidrólise ácida da palha de arroz e atingiram um rendimento em xilose de 77%
quando a reação foi realizada com uma solução de ácido sulfúrico 1%, durante 27 minutos.
De uma forma geral, a hidrólise com ácido diluído é considerada uma técnica vantajosa,
pois promove elevados rendimentos em açúcares com baixa formação de produtos de
degradação (PALMQVIST; HAHN-HÄGERDAL, 2000). Além disso, o uso de reagentes
diluídos e temperatura de reação relativamente baixa fazem desta técnica de hidrólise uma
tecnologia barata e pouco agressiva ao meio ambiente (CURRELI et al., 2002).
29
2.2.2 Hidrólise alcalina
A lignina é uma macromolécula polifenólica que pode ser facilmente solubilizada
através da técnica de hidrólise alcalina empregando hidróxido de sódio como agente químico.
De acordo com Gonçalves, Schuchardt e Corrêa (1997), o uso de reagentes alcalinos e
temperaturas elevadas causa uma série de reações de clivagem das ligações tipo éter entre as
unidades de fenilpropano, as quais promovem a dissolução da lignina. Sun e Cheng (2002)
reportaram que o tratamento de materiais lignocelulósicos com NaOH diluído promove um
inchamento do material, aumentando sua área superficial interna e diminuindo seu grau de
polimerização e cristalinidade. Este tratamento promove ainda a separação das estruturas da
lignina e dos carboidratos, sendo que a estrutura da lignina, além de separada é também
rompida e solubilizada, restando uma polpa rica em celulose como material sólido residual.
A hidrólise alcalina é considerada muito útil para a deslignificação de matérias-primas
vegetais e plantas fibrosas em geral, sendo um dos processos mais antigos utilizados para
obtenção de polpa celulósica (FOELKEL; BARRICHELO, 1975), porém ainda hoje muito
empregado em inúmeras indústrias de celulose e papel, de pequeno e médio porte. Quando
comparado com outros métodos de polpação comumente utilizados (métodos Kraft e sulfito),
a hidrólise alcalina, também denominada como polpação soda, apresenta a vantagem de
causar um menor impacto ambiental, pois não requer o uso de agentes sulfurados (IGLESIAS
et al., 1996; XIAO; SUN; SUN, 2001).
Segundo Fengel e Wegener (1989) a solubilização da lignina e a qualidade da polpa
celulósica obtida por hidrólise alcalina de materiais lignocelulósicos, varia de acordo com a
matéria-prima utilizada e com as condições de processo empregadas, tais como a relação
sólido:líquido, o tempo de reação, a temperatura e a concentração de NaOH, sendo este último
considerado como o fator de maior influência na dissolução da lignina. Por esta razão, as
condições ótimas de hidrólise alcalina devem ser estabelecidas para cada matéria-prima
utilizada. Silva, Rocha e Moura (1990) avaliaram a hidrólise alcalina do bagaço de cana-de-
açúcar com concentrações de NaOH variando de 0,25 a 1% e tempos de reação de 5 a
120 minutos e observaram que, para as máximas condições empregadas (1% NaOH, 120
minutos) o conteúdo de lignina solubilizada foi de 97,16%. Balczó e Rocha (2002)
conseguiram solubilizar 95% da lignina existente no bagaço de cana-de-açúcar pré-tratado em
meio ácido, empregando um processo de hidrólise com solução de NaOH 1,5%, a 100ºC,
durante 1 h. Segundo estes autores, quando a concentração de NaOH empregada foi reduzida
30
para 1%, a porcentagem de lignina solubilizada foi diminuiu para 89%.
2.2.3 Hidrólise enzimática
Enzimas produzidas por uma variedade de microrganismos (bactérias e fungos) são
capazes de romper a estrutura dos materiais lignocelulósicos, liberando os açúcares no meio
reacional. Este processo de hidrólise enzimática, também denominado sacarificação, tem sido
normalmente empregado para liberação dos açúcares da fração celulósica (polímero linear de
unidades de glicose unidas por ligações do tipo β-(1→4)) dos materiais, apresentando bons
resultados. Contudo, antes de ser hidrolisada enzimaticamente, a matéria-prima normalmente
necessita ser submetida a uma etapa prévia de tratamento, a qual tem por objetivo promover a
abertura da estrutura lignocelulósica (através da remoção da hemicelulose e da lignina),
aumentando sua porosidade e facilitando o acesso das enzimas celulolíticas à celulose (CAO;
TAN, 2002; SUN; CHENG, 2002). O pré-tratamento pode ser físico (ex. moagem), físico-
químico (ex. explosão a vapor, com amônia ou com CO2), químico (ex. hidrólise com ácido
diluído, hidrólise alcalina, ozonólise) ou biológico (empregando microrganismos para
degradar o material) (SUN; CHENG, 2002).
As enzimas celulolíticas incluem a β-1-4-endoglucanase (endoglucanase, EC 3.2.1.4),
β-1-4-exoglucanase (celobiohidrolase, EC 3.2.1.91), e β-glucosidase (celobiase, EC 3.2.1.21),
que atuam sinergisticamente rompendo a estrutura da celulose em glicose (BELDMAN;
HENNEKAM; VORAGEN, 1987; CAO; TAN, 2002). Uma representação esquemática da
ação destas três classes de enzimas na estrutura da celulose, é mostrada na Figura 2.5.
As endoglucanases são enzimas que atuam randomicamente ao longo da molécula de
celulose, degradando as regiões amorfas e clivando as ligações β-1→4-glicosídicas,
promovendo, desta forma, um decréscimo significativo em seu grau de polimerização com
pouca liberação de açúcares redutores. As exoglucanases atuam nas regiões terminais da
molécula de celulose, hidrolisando ambas as regiões amorfas e cristalinas e promovendo sua
despolimerização gradativa através da remoção de unidades de celobiose terminais. As
enzimas endoglucanases e exoglucanases geram glicose e principalmente celobiose como
produtos de reação. Finalmente, as glucosidases hidrolisam a celobiose em monômeros de
glicose. Estas três classes de enzimas, individualmente, acarretam alterações bastante
diferenciadas na estrutura da celulose e por apresentarem propriedades complementares,
31
descrevem um alto grau de sinergismo durante a hidrólise da celulose (CAO; TAN, 2002; van
WYK, 1998).
lig a çõ es B (1 -4 )
endog lucanase
P olissa ca r ídeos m enores
Figura 2.5 - Representação esquemática da ação das enzimas celulolíticas na estrutura da celulose.
Para que ocorra a hidrólise enzimática da celulose é necessário primeiramente que haja
a difusão das enzimas no líquido e posterior transferência destas para a superfície do material,
formando então o complexo enzima-celulose (CAO; TAN, 2002). A adsorção das enzimas na
superfície da celulose caracteriza o primeiro estágio do processo de hidrólise, ocorrendo em
seguida a biodegradação da celulose em açúcares fermentáveis e finalmente a dessorção da
celulase (SUN; CHENG, 2002). Durante o processo, as enzimas podem sofrer uma perda
progressiva de sua atividade catalítica, devido a fatores como: (a) inibição devido ao acúmulo
do produto final de hidrólise no meio reacional (glicose e celobiose); (b) inativação ou
desnaturação devido ao efeito prolongado da temperatura e da agitação; (c) ocorrência de uma
adsorção não específica e/ou não produtiva de um ou mais componentes enzimáticos sobre o
material (RAMOS; SADDLER, 1994). Além disso, as variáveis operacionais (pH, agitação,
temperatura, tempo de reação, concentração de enzimas, concentração de substrato) utilizadas
também podem interferir na eficiência do processo de hidrólise, inibindo ou acelerando a
velocidade da reação (KAYA; HEITMANN; JOYE, 2000). Segundo Aguiar e Menezes
(2002), a relação celulase/bagaço apresentou grande influência na hidrólise enzimática do
CELULOSEexog luca na se
lig a çõ es B (1 -4 )
lig a çõ es B (1 -4 ) g lucosida se
C E L O B IO S E
G L IC O S E
32
bagaço de cana-de-açúcar e a presença da enzima β-glucosidase potencializou a hidrólise da
celulose. Kaur, Arneja e Singh (1998) avaliaram a hidrólise enzimática da palha de arroz e
otimizaram as condições de reação (para uma máxima liberação de açúcares redutores) como
sendo baseadas no uso de uma concentração de substrato de 4% p/v, pH 5,0, temperatura de
50ºC, concentração de enzima de 25 FPU/g de substrato e tempo de reação de 48 h. De uma
forma geral, o processo de hidrólise enzimática é considerado interessante, pois proporciona
elevado rendimento e gera produtos mais puros e com baixo poder inibitório (SUN; CHENG,
2002).
2.3 PRODUTOS DE INTERESSE COMERCIAL QUE PODEM SER OBTIDOS POR
PROCESSOS BIOTECNOLÓGICOS A PARTIR DE MATÉRIAS-PRIMAS
LIGNOCELULÓSICAS
2.3.1 Xilitol
O xilitol é um poliálcool de fórmula estrutural C5H12O5, com aparência de um pó branco
cristalino, inodoro e de valor calórico igual a 2,4 kcal/g. Por apresentar um poder adoçante
similar ao da sacarose e possuir importantes propriedades físico-químicas e fisiológicas, o
xilitol é considerado como um produto com potencial para aplicações em diversos setores
industriais, como por exemplo, na manufatura de alimentos, produtos farmacêuticos e
cosméticos (BAR, 1991). O xilitol é considerado ainda como um adoçante perfeitamente
capaz de substituir com vantagens a sacarose, pois além de poder adoçante apresenta
propriedade anticariogênica e possui várias aplicações clínicas que o indicam no tratamento
de pessoas com diabetes, desordem no metabolismo de lipídeos, lesões renais e parenterais, na
prevenção de otite, infecções pulmonares e osteoporose (MUSSATTO; ROBERTO, 2002).
Na natureza, o xilitol pode ser encontrado em frutas, vegetais e cogumelos. Entretanto,
sua extração diretamente de fontes naturais é um processo antieconômico e impraticável, uma
vez que o xilitol é encontrado apenas em pequenas quantidades (menos que 900 mg/ 100 g)
(PARAJÓ; DOMINGUEZ; DOMINGUEZ, 1998a). Uma alternativa à extração do xilitol
diretamente de suas fontes naturais, é a sua obtenção pela hidrogenação da D-xilose presente
na fração hemicelulósica da matéria vegetal, o que pode ser realizado por via química
33
(empregando agentes químicos como catalisadores) ou por via biotecnológica (utilizando
microrganismos como catalisadores do processo de redução).
O processo químico é atualmente utilizado para a produção de xilitol em escala
industrial. Esse processo inclui cinco etapas: 1. hidrólise ácida do material natural rico em
xilana; 2. purificação do hidrolisado até obter uma solução de xilose pura; 3. hidrogenação
catalítica da xilose pura a xilitol, com uso de um catalisador (liga Ni-Al2O3); 4. purificação da
solução de xilitol obtida; 5. cristalização do xilitol (MELAJA; HÄMÄLÄINEN, 1977). De
acordo com alguns autores, o custo envolvido na produção de xilitol pela via química é
relativamente alto, pois este processo requer um grande aporte energético devido ao uso de
elevada pressão (até 50 atm) e temperatura (80-140ºC), utiliza um catalisador de alto custo e
necessita de várias etapas para purificação da solução de xilose. Além disso, o xilitol é obtido
com um rendimento da ordem de 50-60% (PARAJÓ; DOMINGUEZ; DOMINGUEZ, 1998a;
SAHA, 2003).
Uma alternativa interessante ao processo químico de produção de xilitol é a obtenção
por processo biotecnológico, a qual apresenta um menor impacto ambiental e requer um
menor consumo de energia (KIM et al., 2004). Dentre os microrganismos estudados para esta
bioconversão, as leveduras, especialmente as do gênero Candida, são consideradas as
melhores produtoras e por isso tem sido amplamente empregadas neste processo (BARBOSA
et al., 1988).
A produção de xilitol por via biotecnológica é influenciada por vários fatores, os quais
incluem o tipo e a concentração inicial de substrato, o nível e a idade do inóculo, o pH, a
temperatura e a demanda de oxigênio (PARAJÓ; DOMINGUEZ; DOMINGUEZ, 1998b;
WINKELHAUSEN; KUZMANOVA, 1998). Porém, quando hidrolisados hemicelulósicos
são utilizados como meio de fermentação, existe ainda um outro fator capaz de interferir no
desempenho do processo de bioconversão: a presença de compostos provenientes da
degradação dos açúcares ou da lignina, os quais podem ser tóxicos ao microrganismo
dependendo da concentração em que se encontram no meio de fermentação (MUSSATTO;
ROBERTO, 2004a). A concentração máxima de cada um destes compostos que pode estar
presente no meio de fermentação varia de acordo com a espécie de microrganismo utilizada e
o seu grau de adaptação ao meio, o tipo de processo fermentativo empregado e a presença
simultânea de vários inibidores, que pode proporcionar um efeito sinergístico (PARAJÓ;
DOMINGUEZ; DOMINGUEZ, 1998b). Hidrolisados hemicelulósicos obtidos a partir de
diferentes matérias-primas podem ser utilizados como meio de fermentação para a produção
34
biotecnológica de xilitol, porém, por apresentarem composições químicas diferentes, cada um
deles requer um estudo que defina as condições mais adequadas para realização deste
bioprocesso (MUSSATTO; ROBERTO, 2004a).
2.3.2 Ácido láctico
Ácido láctico é o nome comercial do ácido 2-hidróxi-propanóico, cuja fórmula
estrutural é C3H6O3. Com a aparência de um líquido incolor, inodoro e viscoso, o ácido
láctico é considerado o mais importante ácido orgânico existente, apresentando numerosas
aplicações como regulador de pH, conservante, agente tamponante ou solvente, nas indústrias
de alimentos, químicos, fármacos, couros e tecidos (HOFVENDAHL; HAHN-HÄGERDAL,
2000; PARAJÓ; ALONSO; SANTOS, 1996). Recentemente, este composto também tem
recebido grande atenção como matéria-prima para a manufatura de plásticos biodegradáveis,
os quais são alternativas menos agressivas ao meio ambiente do que os plásticos obtidos a
partir de materiais petroquímicos (JIN; HUANG; LANT, 2003). Devido a todas estas
aplicações, a produção de ácido láctico que corresponde atualmente a um mercado superior a
100.000 toneladas/ano está prevista em aumentar ainda cerca de 15% com a possibilidade de
produção de plásticos biodegradáveis (IDRIS; SUZANA, 2006). Todo este aumento na
demanda de produção gera um grande interesse em encontrar métodos alternativos para
produzir ácido láctico com o menor custo possível.
Industrialmente, a produção de ácido láctico pode ser feita por processo químico ou
biotecnológico. A síntese química baseia-se principalmente na hidrólise da lactonitrila por
ácidos fortes. No entanto, outras rotas também podem ser utilizadas para obtenção deste
ácido, tais como a degradação de açúcares catalisada por bases, oxidação de propilenoglicol,
hidrólise do ácido cloropropiônico, reação de acetaldeído, monóxido de carbono e água sob
elevada temperatura e pressão (DATTA et al., 1995; JOHN; NAMPOOTHIRI; PANDEY,
2007). Por outro lado, o processo biotecnológico utilizado para a produção de ácido láctico
baseia-se na bioconversão de uma solução de açúcares (a qual pode conter como fonte de
carbono, glicose, frutose, sacarose ou lactose) por bactérias (HOFVENDAHL; HAHN-
HÄGERDAL, 2000). Segundo John, Nampoothiri e Pandey (2007) a produção biotecnológica
de ácido láctico apresenta várias vantagens quando comparada à síntese química, tais como
baixo custo do substrato, uso de temperaturas mais brandas e menor consumo de energia.
Além disso, a produção de ácido láctico por processo fermentativo tem também aumentado o
35
seu mercado, principalmente na indústria de alimentos, devido à preferência dos
consumidores por produtos de origem natural (MOLDES; ALONSO; PARAJÓ, 1999).
De acordo com John, Nampoothiri e Pandey (2006) um dos principais problemas
relacionados com a produção biotecnológica de ácido láctico em larga escala, é o custo da
matéria-prima utilizada. Vários substratos podem ser utilizados como fonte de carbono neste
processo, os quais incluem glicose, sacarose, lactose, maltose, manose, xilose e galactose. O
uso de resíduos agro-industriais em substituição a estas fontes de carbono pode ser uma
alternativa interessante, devido a grande disponibilidade e aos baixos custos com que eles
podem ser obtidos (JOHN; NAMPOOTHIRI; PANDEY, 2006; TANAKA et al., 2006).
Parajó, Alonso e Santos (1996) produziram ácido láctico a partir dos hidrolisados de madeira
de eucalipto e madeira de pinus, empregando a espécie Lactobacillus delbrueckii como
microrganismo e encontraram uma produtividade volumétrica de 2,74 g/l.h em 14 h de
processo, a partir de uma concentração inicial de substrato de aproximadamente 37 g/l.
Richter e Berthold (1998) produziram ácido láctico com um rendimento de 94%, empregando
como matéria-prima o talo de sorgo e o grão de centeio e a espécie Lactobacillus paracasei
como microrganismo.
Assim como a produção de xilitol, a produção de ácido láctico por microrganismos
também é influenciada pelas condições experimentais utilizadas, tais como pH, agitação,
temperatura, fonte de carbono, composição do meio de fermentação, carga e idade do inóculo,
aeração, concentração inicial de açúcar e forma de condução do processo (contínuo,
semicontínuo ou descontínuo) (BAI et al., 2003; HOFVENDAHL; HAHN-HÄGERDAL,
2000; SILVA; MANCILHA, 1991). Conhecer o efeito destas variáveis e estabelecer as
melhores condições de processo é de grande importância para se obter elevados rendimentos e
produtividades.
2.3.3 Carvão ativado
Durante a hidrólise alcalina dos materiais lignocelulósicos, a lignina é dissolvida
podendo ser separada na forma de um licor negro que representa o efluente do processo
(FENGEL; WEGENER, 1989). Este licor contém uma série de compostos que são tóxicos e
precisam ser removidos antes da descarga deste efluente ao meio ambiente (KARAM;
NICELL, 1997). Com o objetivo de diminuir o impacto ambiental, as indústrias de polpa e
papel normalmente queimam a lignina dissolvida no licor negro para geração de energia.
36
Entretanto, a lignina pode ser utilizada como matéria-prima para a obtenção de vários
produtos de interesse comercial, tais como carvão ativado, vanilina, fenóis, benzeno,
fertilizantes, polímeros, agentes dispersantes, emulsificantes e quelantes, antioxidantes,
adesivos, entre outros (GARGULAK; LEBO, 2000). Normalmente a lignina é isolada do licor
negro por precipitação com ácido sulfúrico ou clorídrico, seguido por uma etapa de filtração e
lavagem com água para eliminação do álcali residual (SANTOS; CURVELO, 2001).
A lignina, por si só, já apresenta poder adsorvente com capacidade de remover corantes,
surfactantes, pesticidas, fenóis e metais, tais como chumbo, cobre, zinco, cádmio, mercúrio e
cromo. Porém, quando transformada em carvão ativado, sua capacidade de adsorção de
compostos é aumentada. A transformação da lignina em carvão pode ser feita por ativação
física ou química. A ativação física é um processo realizado em duas etapas onde o material é
inicialmente carbonizado a 600-900ºC e em seguida ativado em presença de um gás oxidante
(por ex. CO2) a 600-1200ºC. Na ativação química, a lignina é impregnada com um agente
químico (H3PO4, KOH ou NaOH) e aquecida em atmosfera inerte a 450-900ºC, quando os
processos de carbonização e ativação ocorrem simultaneamente (SUHAS; CARROTT;
RIBEIRO CARROTT, 2007). Segundo Guo e Rockstraw (2006), a ativação química é mais
amplamente utilizada do que a ativação física, pois requer uma menor temperatura e
proporciona um maior rendimento do produto. Dentre os agentes químicos que podem ser
empregados nesta técnica, o ácido fosfórico destaca-se como sendo o mais utilizado, devido a
questões econômicas e ambientais, uma vez que ele requer baixas temperaturas de ativação
(aprox. 400-500ºC) e pode ser recuperado ao final do processo (HSISIHENG; TIEN-SHENG;
LI-YEH, 1998; DIAO; WALAWENDER; FAN, 2002).
As características dos carvões obtidos por ativação química da lignina, tais como área
superficial e distribuição do tamanho dos poros (micro, meso e macroporos) interferem na sua
capacidade de adsorção e podem variar de acordo com as condições de temperatura, tempo de
carbonização, tipo de agente químico, relação agente/lignina e tempo de impregnação,
utilizadas no processo de ativação (SUHAS; CARROTT; RIBEIRO CARROTT, 2007).
2.3.4 Ácidos fenólicos
Além da produção de polpa de celulose, a hidrólise alcalina de materiais
lignocelulósicos também fornece uma série de compostos fenólicos de interesse comercial
provenientes da solubilização da lignina, uma vez que esta é uma macromolécula polifenólica
37
(Figura 2.6). Tais compostos incluem a vanilina e uma série de ácidos fenólicos, dentre estes
os ácidos ferúlico, p-cumárico, p-hidroxibenzóico, vanílico, siríngico, entre outros, os quais
apresentam uma série de possíveis aplicações, podendo ser convertidos quimicamente a éteres
de arila (usados como aditivo para gasolina), solventes e ácidos orgânicos (FENGEL;
WEGENER, 1989) e por bioconversão, a vanilina (LESAGE-MEESEN et al., 1996).
Figura 2.6 - Estrutura da lignina proposta por ADLER (1977).
O ácido ferúlico, por exemplo, é considerado como um dos mais importantes ácidos
fenólicos existentes, pois apresenta ação anti-oxidante, anti-inflamatória, anti-microbiana,
anti-trombose e anti-câncer (OU; KWOK, 2004). Devido a todas estas propriedades, ele tem
recebido grande atenção para aplicação nas indústrias farmacêutica, cosmética e alimentícia
(KROON; WILLIAMSON, 1999). O ácido p-cumárico é também outro ácido fenólico de
grande interesse devido a suas propriedades anti-oxidantes (TORRES y TORRES;
ROSAZZA, 2001). Além disso, ambos ácidos podem ser utilizados como precursores para a
produção de compostos naturais aromáticos de valor agregado.
38
A possibilidade de se obter compostos fenólicos (principalmente ácidos fenólicos e
vanilina) a partir de matérias-primas de baixo custo, como os materiais lignocelulósicos, tem
estimulado as pesquisas nesta área. Diversas matérias-primas já foram avaliadas para esta
finalidade, incluindo a madeira de eucalipto, farelo de cevada, fibras de aveia, sabugo e
folhagem de milho (CRUZ et al., 1999, 2001; GONZÁLES et al., 2004; LEHTINEN;
LAAKSO, 1998).
2.3.5 Polpa de celulose branqueada
No mundo todo, aproximadamente 95% das matérias-primas utilizadas pela indústria
papeleira para obtenção de polpa celulósica são madeiras (JIMÉNEZ et al., 2005). No entanto,
várias vantagens têm sido mencionadas sobre a produção de polpas a partir de resíduos
agrícolas, as quais incluem uma fácil capacidade de polpação, obtenção de fibras de excelente
qualidade para tipos especiais de papel e obtenção de uma polpa branqueada de alta qualidade
(LÓPEZ et al., 2000; NAVAEE-ARDEH; MOHAMMADI-ROVSHANDEH; POURJOOZI,
2004). Além disso, o aumento do consumo e da produção de papel durante a última década
(50% de aumento) tem despertado um grande interesse em se utilizar resíduos agrícolas para
esta finalidade. Atualmente, estes resíduos estão gradualmente substituindo a madeira na
produção de polpa e papel, por razões econômicas e ambientais (LOPEZ et al., 2001, 2003).
Segundo Jiménez et al. (1999) e López et al. (2000), as polpas obtidas a partir destas matérias-
primas podem ser utilizadas em mistura ou não com polpas obtidas a partir de madeiras ou
com papel reciclado, para obtenção de vários produtos, tais como papel, papelão e outros
derivados lignocelulósicos.
O branqueamento das polpas de celulose nada mais é que um tratamento físico-químico
que tem por objetivo remover os compostos que geram cor, melhorando também as
propriedades da polpa celulósica. Neste processo, são utilizados reagentes que modificam
quimicamente as substâncias coloridas, descorando-as (DANILAS, 1988), o que leva a um
aumento da alvura da polpa. A alvura é o fator de refletância utilizado para avaliar a eficiência
do branqueamento na remoção da cor amarela da polpa celulósica (BIERMANN, 1996).
Nas indústrias de polpa e papel, a etapa de branqueamento é uma das mais críticas, pois
gera um grande volume de efluentes tóxicos formados por compostos organoclorados de
baixa massa molar provenientes do uso de agentes químicos clorados. A maior parte destes
compostos apresenta efeito cumulativo nos organismos, além de possuir caráter tóxico,
39
mutagênico e/ou carcinogênico (RAHMAWATI et al., 2005; WANG; FERGUSON;
McCARTHY, 1992). Embora o cloro e seus derivados sejam considerados agentes de
branqueamento eficientes e de baixo custo (BIANCHI; CRISOL; SCHUCHARDT, 1999),
preocupações ambientais relacionadas com a descarga destes efluentes têm criado uma grande
necessidade em se desenvolver novas tecnologias que utilizem seqüências de branqueamento
menos poluentes (RAHMAWATI et al., 2005; TANAKA et al., 2004; TUTUS, 2004).
Recentemente, o branqueamento de polpas com tecnologias totalmente livres de cloro,
baseadas no uso de agentes químicos oxidativos tais como oxigênio molecular, ozônio ou
peróxido de hidrogênio, tem se mostrado como alternativas com grande potencial para
substituir os procedimentos convencionais que utilizam compostos clorados (SHATALOV;
PEREIRA, 2007). Dentre estes agentes oxidativos o peróxido de hidrogênio é reconhecido
como um agente oxidante forte, porém pouco agressivo ao meio ambiente, sendo considerado
um dos mais importantes agentes químicos de branqueamento (RAWMAWATI et al., 2005).
As polpas de celulose branqueadas podem ser utilizadas para diferentes fins,
dependendo do nível de alvura que apresentam. Khristova et al. (2006) produziram polpas
branqueadas com 76,9% de alvura, as quais foram consideradas adequadas para uso em papéis
para escrita e impressão. De acordo com Caraschi, Filho e Curvelo (1996), polpas
branqueadas de baixo rendimento (30 a 35%), com um alto conteúdo de celulose pura (>85%)
e baixos conteúdos de poliose (1 a 10%) e lignina (<0,05%) são adequadas para uso na
obtenção de derivados de celulose, tais como viscose, acetato de celulose e celofane.
40
3 MATERIAIS E MÉTODOS
A Figura 3.1 é uma representação esquemática do trabalho proposto para
aproveitamento integral do bagaço de malte. Os experimentos foram realizados nos
laboratórios do Grupo de Microbiologia Aplicada e Bioprocessos do Departamento de
Biotecnologia da Escola de Engenharia de Lorena (EEL-USP).
Bagaço de malte Obtenção / Caracterização
Hidrolisado
hemicelulósico Resíduo sólido contendo
celulose + lignina
Otimização das condições de hidrólise ácida
Resíduo sólido
contendo celulose
Licor contendo
lignina solúvel
Otimização das condições de hidrólise alcalina
Hidrolisado
celulósico
Otimização das condições de hidrólise enzimática
Produção de
XILITOL
Processo Fermentativo
Figura 3.1 - Representação esquemática do trabalho proposto para aproveitamento integral do bagaço de malte.
Produção de
CARVÃO ATIVADO
Produção de
ÁCIDO LÁCTICO
Produção de
POLPA BRANQUEADA
Processo Químico
Processo Químico
ÁCIDOS
FENÓLICOS
Processo Fermentativo
41
O bagaço de malte utilizado nos experimentos foi fornecido pela Microcervejaria do
Departamento de Biotecnologia da EEL-USP. Primeiramente o bagaço foi lavado com água
para remoção dos resíduos do processo cervejeiro, sendo em seguida secado em estufa elétrica
a 50 ± 5ºC até apresentar um teor de umidade de aproximadamente 10% e armazenado para
uso nas etapas seguintes.
3.1 CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA DO BAGAÇO DE MALTE E ENSAIOS
PRELIMINARES DE HIDRÓLISE ÁCIDA EM AUTOCLAVE
3.1.1 Determinação do teor de umidade
Amostras de aproximadamente 1 grama do bagaço de malte foram colocadas em uma
balança com secagem por ação de raios infravermelhos (Denver Instrument IR30). As
amostras foram mantidas a 100ºC até obter peso constante e a umidade do bagaço de malte foi
então determinada pela diferença de peso obtida antes e após o aquecimento.
3.1.2 Determinação dos teores de celulose, hemicelulose e lignina
O bagaço de malte (10% de umidade) foi caracterizado quanto aos teores de celulose,
hemicelulose e lignina, baseando-se nas metodologias descritas por Browning (1967) e Rocha
(2000). Aproximadamente 2 gramas de amostra do material foram transferidas para um
béquer de 50 ml e adicionou-se 10 ml de H2SO4 72% p/p. A reação foi mantida em banho
termostatizado a 45 ± 1ºC, por 7 minutos, sob agitação constante. Após esse tempo, a reação
foi interrompida pela adição de 50 ml de água destilada e todo o conteúdo do béquer foi
transferido quantitativamente para um Erlenmeyer de 500 ml, onde o volume total de água foi
elevado para 275 ml. Em seguida, o Erlenmeyer foi fechado com papel alumínio e
autoclavado a 1 atm, 120ºC, durante 45 minutos, para promover a hidrólise completa dos
oligômeros restantes. Após autoclavagem, o frasco foi resfriado até temperatura ambiente e o
material sólido foi separado da fração líquida por filtração utilizando papel de filtro
previamente tarado. O hidrolisado foi recolhido em um balão volumétrico de 500 ml e o
sólido contido no papel de filtro foi lavado com água destilada até atingir o volume do balão.
A lignina retida no papel de filtro foi lavada ainda com cerca de 800 ml de água destilada e
42
secada em estufa à 105ºC até atingir peso constante. A relação entre o peso do resíduo e o
peso inicial da amostra foi utilizada para determinar a porcentagem de lignina insolúvel
presente no bagaço de malte (equação 1). Uma alíquota de aproximadamente 1 ml da fração
líquida obtida foi filtrada em filtro Sep Pak C18 e analisada por Cromatografia Líquida de Alta
Eficiência (CLAE) para determinação das concentrações de glicose, xilose e arabinose, as
quais foram utilizadas para o cálculo da porcentagem de celulose e hemicelulose presente na
amostra (IRICK et al., 1988) de acordo com as equações 2 e 3:
% lignina insolúvel = PR*10000/(PA*PSA) equação 1
% celulose = Gli*5000*Fc*Fph/(PA*PSA) equação 2
% hemicelulose = (Xil*5000*Fc*Fph)/(PA*PSA)+(Arab*5000*Fc*Fph)/(PA*PSA)
equação 3
onde: Fc = fator de conversão (0,9 para a celulose e 0,88 para a hemicelulose); Fph = fator de
perda de hidrólise (1,055 para celulose e 1,155 para hemicelulose); Gli, Xil, Ara =
concentração de glicose, xilose e arabinose, respectivamente (g/l); PA = peso inicial da
amostra (g); PR = peso do resíduo de lignina (g); PSA = peso seco da amostra (%).
Para determinação da lignina solúvel, uma alíquota de 5 ml do hidrolisado foi
alcalinizada com 1 ml de NaOH 6M até atingir pH 12, diluída em balão volumétrico de 50 ml
e analisada por espectroscopia de UV (espectrofotômetro Beckman DU 640B) a um
comprimento de onda de 280 nm. Amostras do hidrolisado foram também analisadas por
CLAE para determinação das concentrações de furfural e hidroximetilfurfural, as quais
juntamente com a leitura de absorbância, foram empregadas para calcular a porcentagem de
lignina solúvel na amostra, de acordo com as equações 4 e 5 a seguir:
% lignina solúvel = (4,187x10-2*(Ahid280-Apd280)-3,279x10-4)*200 equação 4
Apd280 = (Cfurf*Efurf)/200+(CHMF*EHMF)/200 equação 5
43
onde: Ahid280 = absorbância do hidrolisado a 280 nm; Cfurf e CHMF = concentração de furfural e
hidroximetilfurfural, respectivamente, no hidrolisado (g/l); Efurf = absortividade do furfural
(146,85 l/g.cm); EHMF = absortividade do hidroximetilfurfural (114 l/g.cm).
3.1.3 Determinação do teor de cinzas
Para determinação de teor de cinzas do bagaço, cerca de 1 grama da amostra (pesada em
balança analítica) foi colocada em um cadinho de porcelana previamente tarado e aquecida
em mufla elétrica a 800ºC por 2 h. As cinzas foram determinadas pela diferença de peso das
amostras, antes e após a incineração (equação 6). Antes de serem pesadas, as amostras foram
colocadas em um dessecador por 50 minutos.
% cinzas = PC*100/PA equação 6
Onde: PC = peso de cinzas (g); PSA = peso seco da amostra (%).
3.1.4 Determinação do teor de proteínas
O teor de proteínas foi determinado como o conteúdo total de nitrogênio pelo método
Kjeldahl, utilizando o fator de correção N × 6,25.
3.1.5 Determinação do teor de minerais
Os teores de diversos minerais presentes no bagaço de malte foram determinados por
espectrometria de emissão atômica por ionização acoplada a plasma, em um aparelho AR
Labs modelo 3410, após oxidação com ácido nítrico, conforme metodologia desenvolvida nos
laboratórios do Departamento de Engenharia de Materiais, DEMAR, EEL-USP.
3.1.6 Hidrólise ácida em autoclave
Estes experimentos foram realizados sob diferentes condições operacionais (Tabela
3.1), para avaliar a influência das variáveis concentração de ácido sulfúrico (98% p/p) e
44
relação sólido:líquido, na eficiência de hidrólise da hemicelulose (xilana + arabinana). Para os
experimentos, uma massa de 30 g do bagaço de malte e a quantidade necessária de solução
ácida foram acondicionados em frascos Erlenmeyer de 500 ml, os quais foram devidamente
fechados e autoclavados a 120ºC durante 27 minutos. Os hidrolisados obtidos foram
separados do resíduo sólido por filtração e caracterizados quanto à concentração de açúcares
(xilose, arabinose e glicose), ácido acético, furfural, hidroximetilfurfural e lignina solúvel. A
evaporação de água ocorrida durante o processo de hidrólise foi estimada e utilizada para
corrigir os valores de concentração dos compostos identificados nos hidrolisados.
Tabela 3.1 - Planejamento fatorial completo 22 para avaliação do processo de hidrólise ácida do bagaço de malte, em autoclave, sob diferentes condições operacionais.
Níveis originais das variáveis Níveis codificados das variáveis Ensaio
Concentração de H2SO4 (mg/g)
Relação sólido:líquido (g:g)
Concentração de H2SO4
Relação sólido:líquido
1 100 1:10 -1 -1 2 120 1:10 +1 -1 3 100 1:20 -1 +1 4 120 1:20 +1 +1 5 110 1:15 0 0 6 110 1:15 0 0 7 110 1:15 0 0
O rendimento em açúcares recuperados (YS, em gramas de substância que pode ser
obtida a partir de 100 g do bagaço de malte em peso seco) e a eficiência de hidrólise (η, %)
foram calculados através das equações 7 e 8:
YS = (C*V/M)*100 equação 7
η = (YS/Ymáx)*100 equação 8
onde: C é a concentração da substância na fase líquida (g/l), M é a quantidade de bagaço de
malte (em peso seco) utilizada no experimento (g), V é o volume de solução líquida utilizada
(l) e Ymáx é o rendimento máximo em açúcares recuperados que pode ser obtido (g/100 g em
peso seco).
45
3.2 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ÁCIDA EM REATOR VISANDO
A MÁXIMA LIBERAÇÃO DE XILOSE E PRODUÇÃO DE XILITOL A PARTIR DO
HIDROLISADO
3.2.1 Hidrólise ácida em reator
Nesta etapa, os experimentos de hidrólise ácida foram realizados em reatores de
capacidade 1,5 L, com forma de tubos cilíndricos de 42,5 cm de altura e 6,7 cm de diâmetro,
confeccionados em aço-inox e munidos de aquecimento por resistência elétrica, controle de
temperatura e manômetro. Um conjunto de quatro reatores com estas características foi
montado e, uma vez ligado, o sistema girava em torno de um eixo (localizado próximo à
metade da altura total do sistema), completando uma volta em um tempo de 40 segundos
(Figura 3.2).
Figura 3.2 - Reator utilizado nos experimentos de hidrólise ácida.
Estes experimentos foram realizados empregando diferentes condições de relação
sólido:líquido, concentração de ácido sulfúrico (98% p/p) e tempo de reação (Tabela 3.2),
para avaliar a influência destas variáveis na eficiência de hidrólise da hemicelulose (xilana +
arabinana). Nos ensaios, cada reator foi preenchido com 90 g de bagaço de malte e a
quantidade necessária de solução ácida, sendo em seguida fechado e submetido a um
aquecimento até 120ºC, temperatura onde a reação foi mantida por diferentes tempos, de
46
acordo com o planejamento experimental apresentado na Tabela 3.2. O tempo necessário para
aquecimento dos reatores até 120ºC foi de aproximadamente 1,5 h, sendo que um tempo
similar a este também foi necessário para o posterior resfriamento dos reatores até
temperatura ambiente.
Ao término das hidrólises, os materiais sólidos residuais foram separados por filtração e
os hidrolisados obtidos foram caracterizados quanto à concentração de açúcares (xilose,
arabinose e glicose), ácido acético, furfural, hidroximetilfurfural e lignina solúvel. O
rendimento em açúcares recuperados e a eficiência de hidrólise para cada condição avaliada
foram calculados conforme descrito no item 3.1.6. A análise dos resultados obtidos e
otimização da melhor condição de hidrólise foram realizadas através do emprego da
metodologia estatística de superfície de resposta, utilizando o programa Statistica versão 5.0.
Tabela 3.2 - Planejamento fatorial completo 23 para avaliação do processo de hidrólise ácida do bagaço de malte, em reator, sob diferentes condições operacionais.
Níveis originais das variáveis Níveis codificados das variáveis Ensaio
Concentração de H2SO4 (mg/g)
Relação sólido:líquido (g:g)
Tempo
(min)
Concentração de H2SO4
Relação sólido:líquido
Tempo
1 100 1:8 17 -1 -1 -1 2 140 1:8 17 +1 -1 -1 3 100 1:12 17 -1 +1 -1 4 140 1:12 17 +1 +1 -1 5 100 1:8 37 -1 -1 +1 6 140 1:8 37 +1 -1 +1 7 100 1:12 37 -1 +1 +1 8 140 1:12 37 +1 +1 +1 9 120 1:10 27 0 0 0 10 120 1:10 27 0 0 0 11 120 1:10 27 0 0 0 12 120 1:10 27 0 0 0
3.2.2 Fermentação dos hidrolisados obtidos para produção de xilitol
3.2.2.1 Microrganismo e preparo do inóculo
O microrganismo utilizado nestes experimentos foi a levedura Candida guilliermondii
FTI 20037, da coleção de culturas do Grupo de Microbiologia Aplicada e Bioprocessos do
47
Departamento de Biotecnologia da EEL-USP. A cultura foi mantida repicada em tubos de
ensaio contendo ágar extrato de malte inclinado e conservada em geladeira a 4ºC. Um repique
com cerca de 24 h foi utilizado para o preparo do inóculo.
O meio utilizado para crescimento do inóculo foi formulado utilizando soluções
concentradas de cada componente (Tabela 3.3), as quais foram preparadas separadamente e
esterilizadas a 121ºC por 20 minutos, exceto a solução de xilose que foi autoclavada a 112ºC
por 15 minutos. As soluções foram então misturas assepticamente de forma a se obter a
concentração desejada de cada nutriente no meio de cultura.
Para a utilização do farelo de arroz como nutriente, preparou-se uma suspensão de
farelo em água destilada, em uma concentração de 10% p/v. Esta suspensão foi esterilizada a
121ºC por 20 minutos, resfriada até temperatura ambiente e posteriormente centrifugada em
condições assépticas a 1100 × g por 20 minutos. A fração líquida então obtida (extrato de
farelo de arroz) foi transferida para um frasco previamente esterilizado e conservada em
geladeira até a sua utilização, por um período de no máximo 24 h.
Tabela 3.3 - Composição do meio semidefinido utilizado para crescimento do inóculo da levedura Candida guilliermondii.
Componente Concentração (g/l)
Xilose 20,0 Sulfato de amônio 3,0 Cloreto de cálcio 0,1 Extrato de farelo de arroz 20,0*
* valor em % p/v
O inóculo foi preparado transferindo-se uma alçada de células, proveniente do repique
em meio de manutenção, para tubos de ensaio contendo cerca de 5 ml de água destilada
esterilizada. Alíquotas de 2 ml desta suspensão foram transferidas para frascos Erlenmeyer de
250 ml contendo 100 ml do meio descrito na Tabela 3.3. Os frascos foram incubados à 30°C
em agitador rotatório (Tecnal TE-420) a 200 rpm por 24 h. Após este tempo as células foram
separadas por centrifugação a 1100 × g por 20 minutos e ressuspendidas diretamente no meio
de fermentação.
48
3.2.2.2 Meio e condições de fermentação
As fermentações foram realizadas em frascos Erlenmeyer de 250 ml contendo 100 ml
de meio de fermentação (hidrolisado com o pH ajustado para 6,5 pela adição de NaOH em
pastilhas) inoculado com uma concentração celular inicial de 1 g/l. Os frascos inoculados
foram incubados à 30°C em agitador rotatório (Tecnal TE-420) a 200 rpm por 24 h. Durante
as fermentações foram retiradas amostras para determinação do crescimento celular, consumo
de glicose e xilose e produção de xilitol.
3.3 AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO CINÉTICO DA LEVEDURA Candida
guilliermondii DURANTE A PRODUÇÃO DE XILITOL A PARTIR DO HIDROLISADO
HEMICELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE DILUÍDO E CONCENTRADO
3.3.1 Hidrolisado hemicelulósico
O hidrolisado hemicelulósico utilizado nestes experimentos foi produzido em reatores
de 1,5 L de capacidade (item 3.2.1), empregando as seguintes condições de reação: 100 mg
H2SO4/g de matéria seca, relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC por 17 minutos. Ao término
da reação, o material sólido residual foi separado por filtração e parte do hidrolisado obtido
foi submetida a um processo de concentração sob vácuo, em evaporador com capacidade de 4
litros, a uma temperatura de 70 ± 5ºC, visando aumentar a concentração de xilose para
aproximadamente 85 g/l. Os hidrolisados diluído (original) e concentrado foram analisados
para determinação das concentrações de açúcares, ácido acético, furfural, hidroximetilfurfural
e compostos fenólicos.
3.3.2 Microrganismo e preparo do inóculo
As condições de cultivo do microrganismo e preparo do inóculo utilizadas nestes
experimentos foram as mesmas descritas anteriormente no item 3.2.2.1.
49
3.3.3 Meios e condições de fermentação
Para serem utilizados com meio de fermentação, os hidrolisados (diluído e concentrado)
tiveram o pH ajustado para 6,5 pela adição de NaOH (pastilhas), sendo que o precipitado
formado foi removido por centrifugação (1100 × g, 20 minutos). Além das fermentações em
meio hidrolisado, foram também realizados alguns ensaios em meio semidefinido contendo as
mesmas concentrações de açúcares (glicose, xilose e arabinose) presentes nos hidrolisados.
Além de açúcares, os meios semidefinidos foram suplementados com 3,0 g/l de sulfato de
amônio, 0,1 g/l de cloreto de cálcio e 10% v/v de extrato de farelo de arroz, o qual foi
preparado conforme descrito no item 3.2.2.1. As fermentações foram realizadas em frascos
Erlenmeyer de 250 ml contendo 100 ml de meio de fermentação (pH 6,5) inoculado com uma
concentração celular inicial de 1 g/l. Os frascos foram incubados em agitador rotatório
(Tecnal TE-420) a 200 rpm, 30°C durante 30 h (meios diluídos) ou 96 h (meios
concentrados). Durante as fermentações foram retiradas amostras para determinação do
crescimento celular, consumo de glicose, xilose e arabinose e produção de xilitol.
3.4 INFLUÊNCIA DOS COMPOSTOS TÓXICOS PRESENTES NO HIDROLISADO
HEMICELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE NA BIOCONVERSÃO DE XILOSE A
XILITOL PELA LEVEDURA Candida guilliermondii
3.4.1 Hidrolisado hemicelulósico
O hidrolisado hemicelulósico utilizado nestes experimentos foi produzido em reatores
de 1,5 L de capacidade (item 3.2.1), empregando as seguintes condições de reação: 100 mg
H2SO4/g de matéria seca, relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC por 17 minutos. Ao término
da reação, o material sólido residual foi separado por filtração e parte do hidrolisado obtido
foi submetida a um processo de concentração sob vácuo, em evaporador com capacidade de 4
litros, a uma temperatura de 70 ± 5ºC, visando aumentar a concentração de xilose para
aproximadamente 85 g/l. Os hidrolisados diluído (original) e concentrado foram analisados
para determinação das concentrações de açúcares, furfural, hidroximetilfurfural ácido acético
e compostos fenólicos (vanilina, seringaldeído, ácido ferúlico e ácido siríngico).
50
3.4.2 Microrganismo e preparo do inóculo
As condições de cultivo do microrganismo e preparo do inóculo utilizadas nestes
experimentos foram as mesmas descritas anteriormente no item 3.2.2.1.
3.4.3 Meios e condições de fermentação
Os procedimentos utilizados para preparo dos meios de fermentação a partir do
hidrolisado de bagaço de malte original, estão apresentados na Figura 3.3.
Hidrolisado original
Ajuste do pH para 6,5
Hidrolisado
diluído (HD)
Suplementação com açúcares (xilose, glicose e arabinose) até uma concentração 4 vezes maior do que no hidrolisado diluído e posterior ajuste do pH para 6,5
Hidrolisado diluído
suplementado (HDS)
Hidrolisado concentrado
Concentração (4 vezes)
Ajuste do pH para 6,5
Hidrolisado
concentrado (HC)
Tratamento com carvão ativado e posterior ajuste do pH para 6,5
Hidrolisado concen-
trado tratado (HCT)
Diluição até uma concentração de açúcares igual à do hidrolisado diluído, suplementação com açúcares (xilose, glicose e arabinose) até concentrações 4 vezes maiores e posterior ajuste do pH para 6,5
Hidrolisado
concentrado, diluído e
suplementado (HCDS)
Figura 3.3 - Representação esquemática dos procedimentos utilizados para preparo dos meios de fermentação a partir do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte.
51
O pH dos hidrolisados foi ajustado para 6,5 pela adição de NaOH (pastilhas) e o
precipitado formado foi removido por centrifugação (1100 × g, 20 minutos). O tratamento do
hidrolisado com carvão ativado consistiu na adição de 2,5 g de carvão/100 g de hidrolisado
em pH 2,0, a 150 rpm, 45ºC durante 60 minutos. Os cinco meios de fermentação obtidos
foram analisados por CLAE para determinação da concentração de açúcares, ácido acético,
furfural, hidroximetilfurfural e compostos fenólicos.
As fermentações foram realizadas em frascos Erlenmeyer de 250 ml contendo 100 ml
de meio de fermentação inoculado com uma concentração celular inicial de 1 g/l. Os frascos
foram incubados em agitador rotatório (Tecnal TE-420) a 200 rpm, 30°C durante 30 h (HD)
ou 96 h (HDS, HC, HCT e HCDS). Durante as fermentações foram retiradas amostras para
determinação do crescimento celular, consumo de glicose, xilose e arabinose e produção de
xilitol.
3.5 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ALCALINA DO BAGAÇO DE
MALTE PARA A PRODUÇÃO DE POLPA CELULÓSICA E LIBERAÇÃO DE ÁCIDOS
FENÓLICOS
O resíduo do bagaço de malte obtido após a etapa de hidrólise ácida nas condições de
100 mg H2SO4/g de matéria seca, relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC por 17 minutos, foi
submetido a um processo de hidrólise alcalina empregando hidróxido de sódio como agente
químico. As reações foram realizadas em ampolas de aço inoxidável de 200 ml de capacidade
total, mantendo uma relação sólido:líquido de 1:20 g:g, porém, empregando várias
combinações entre as variáveis temperatura, tempo de reação e concentração de NaOH, de
acordo com o planejamento fatorial completo 23 apresentado na Tabela 3.4. Após serem
preenchidas com o bagaço de malte e a solução de NaOH, as ampolas foram devidamente
fechadas e introduzidas em um banho com óleo de silicone, onde foram mantidas durante o
tempo desejado. Ao término de cada reação, as ampolas foram retiradas do banho de silicone
e imediatamente resfriadas em um banho de gelo. Os licores obtidos, contendo a lignina
solúvel, foram separados do resíduo sólido por filtração em tecido 100% poliéster e
caracterizados quanto à concentração de ácidos fenólicos (ferúlico, p-cumárico, siríngico,
vanílico e p-hidroxibenzóico). Os resíduos sólidos obtidos (polpa celulósica) foram lavados
52
com água até pH neutro, secados em estufa a 50 ± 5ºC até atingir um teor de umidade de
aproximadamente 10% e caracterizados quimicamente quanto aos teores de celulose,
hemicelulose, lignina e cinzas, conforme metodologia descrita nos itens 3.1.2 e 3.1.3.
Tabela 3.4 - Planejamento fatorial completo 23 para avaliação do processo de hidrólise alcalina do resíduo do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais.
Níveis originais das variáveis Níveis codificados das variáveis Ensaio
Temperatura
(°C)
Tempo
(min)
NaOH
(% p/v)
Temperatura
Tempo NaOH
1 80 30 1,0 -1 -1 -1 2 120 30 1,0 +1 -1 -1 3 80 90 1,0 -1 +1 -1 4 120 90 1,0 +1 +1 -1 5 80 30 2,0 -1 -1 +1 6 120 30 2,0 +1 -1 +1 7 80 90 2,0 -1 +1 +1 8 120 90 2,0 +1 +1 +1 9 100 60 1,5 0 0 0 10 100 60 1,5 0 0 0 11 100 60 1,5 0 0 0 12 100 60 1,5 0 0 0
A análise dos resultados obtidos e otimização da melhor condição de hidrólise foram
realizadas através do emprego da metodologia estatística de superfície de resposta, utilizando
o programa Statistica versão 5.0.
3.6 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ENZIMÁTICA DO BAGAÇO DE
MALTE PARA MÁXIMA CONVERSÃO DA CELULOSE EM GLICOSE
Nestes experimentos foi utilizada a polpa celulósica do bagaço de malte obtida após
pré-tratamento do material por uma seqüência de hidrólises ácida (empregando 100 mg
H2SO4/g de matéria seca, relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC por 17 minutos) e alcalina
(empregando uma solução de NaOH 2% p/v, relação sólido:líquido de 1:20 g:g, 120ºC por
90 minutos). Os processos de hidrólise foram realizados conforme descrito nos itens 3.2.1 e
3.5. Para a hidrólise alcalina, foram empregadas ampolas de aço inoxidável de 500 ml de
53
capacidade e um banho de óleo de silicone (Lauda) especialmente confeccionado para esta
finalidade (Figura 3.4). Após esta seqüência de tratamentos, o material sólido residual obtido
(polpa celulósica) foi peneirado e apenas as partículas que passaram em peneira da Série
Tyler nº 10 (<1,68 mm) foram utilizadas nas reações de hidrólise enzimática.
Figura 3.4 - Banho termostatizado com óleo de silicone, utilizado para a hidrólise alcalina do bagaço de malte.
3.6.1 Enzima
O extrato enzimático comercial, Celluclast 1.5L (Novozymes) produzido por
Trichoderma reesei, foi a única fonte de enzimas utilizada nos experimentos. Este extrato era
um líquido de cor castanha com densidade de aproximadamente 1,20 g/ml, teor de proteínas
de 27 mg/ml e atividade celulolítica total de 74 FPU/ml.
3.6.2 Hidrólise enzimática
Os experimentos de hidrólise enzimática foram realizados empregando diferentes
condições de agitação, relação enzima/substrato e concentração de substrato, de acordo com o
planejamento fatorial completo 23 apresentado na Tabela 3.5. Para os experimentos, a enzima
foi adicionada em tampão citrato de sódio 50 mM (pH 4,8) suplementado com 0,02% p/v de
54
azida de sódio, para prevenir a contaminação microbiana. Os ensaios foram realizados em
frascos Erlenmeyer de 125 ml contendo 25 ml de volume de reação (mistura enzima-tampão).
Após a adição do substrato, os frascos foram fechados com papel filme e incubados em
agitador rotatório (Tecnal TE-420) a 45°C durante 96 h.
Tabela 3.5 - Planejamento fatorial completo 23 para avaliação do processo de hidrólise enzimática da celulose da polpa do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais.
Níveis originais das variáveis Níveis codificados das variáveis Ensaio
Agitação
(rpm)
Enzima/Substrato
(FPU/g)
Substrato
(% p/v)
Agitação
Enzima/Substrato
Substrato
1 100 5 2 -1 -1 -1 2 200 5 2 +1 -1 -1 3 100 45 2 -1 +1 -1 4 200 45 2 +1 +1 -1 5 100 5 8 -1 -1 +1 6 200 5 8 +1 -1 +1 7 100 45 8 -1 +1 +1 8 200 45 8 +1 +1 +1 9 150 25 5 0 0 0 10 150 25 5 0 0 0 11 150 25 5 0 0 0 12 150 25 5 0 0 0
Amostras do meio reacional foram retiradas a cada 24 h até o tempo final de hidrólise
(96 h), para determinar a concentração de glicose e celobiose liberada. Assim que retirada, a
amostra foi aquecida em banho maria a 100ºC durante 5 minutos, para precipitar as proteínas
e desta forma cessar a atividade enzimática. Após resfriada, a mistura reacional foi
centrifugada a 4000 rpm durante 10 minutos e os hidrolisados obtidos foram analisados para
determinar a concentração de glicose e celobiose presente. Através destes valores, o
rendimento total de hidrólise da celulose (YT = rendimento em glicose + rendimento em
celobiose) foi calculado (equação 9). A análise dos resultados obtidos e otimização da melhor
condição de hidrólise enzimática foram feitas através da metodologia estatística de superfície
de resposta, empregando o programa Statistica versão 5.0.
YT (%) = (glicose/celobiose) × 0,9 × 100 + (celobiose/celulose) × 0,95 × 100 equação 9
55
3.6.3 Efeito da hemicelulose e da lignina na hidrólise enzimática da celulose do
bagaço de malte
Nestes experimentos, amostras do bagaço de malte com diferentes composições
químicas foram utilizadas como substrato no processo de hidrólise enzimática: 1. bagaço de
malte na forma original; 2. bagaço de malte pré-tratado com ácido sulfúrico diluído (100 mg
H2SO4/g de matéria seca, relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC por 17 minutos); 3. bagaço
de malte pré-tratado por com ácido sulfúrico diluído (100 mg H2SO4/g de matéria seca,
relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC por 17 minutos) e posteriormente com hidróxido de
sódio (solução de NaOH 2% p/v, relação sólido:líquido de 1:20 g:g, 120ºC por 90 minutos).
Os processos de hidrólise foram realizados conforme descrito nos itens 3.2.1 e 3.5. A
composição química destes materiais foi determinada de acordo com as metodologias
descritas nos itens 3.1.2 e 3.1.3.
Os experimentos de hidrólise enzimática foram realizados conforme descrito no item
3.6.2, porém, em frascos Erlenmeyer de 250 ml contendo 50 ml de volume de reação e
utilizando condições de agitação, relação enzima/substrato e concentração de substrato, de
100 rpm, 45 FPU/g e 2% p/v, respectivamente. As reações foram mantidas a 45°C durante
96 h. Os hidrolisados obtidos foram analisados por CLAE para determinação das
concentrações de glicose, celobiose, xilose e arabinose. O rendimento total de hidrólise da
celulose (rendimento em glicose + rendimento em celobiose), para cada substrato utilizado,
foi calculado através da equação 9 (item 3.6.2).
3.7 PRODUÇÃO DE ÁCIDO LÁCTICO POR Lactobacillus delbrueckii A PARTIR DO
HIDROLISADO CELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE
3.7.1 Hidrolisado celulósico
O hidrolisado celulósico utilizado como meio de fermentação para a produção de ácido
láctico, foi obtido através da hidrólise enzimática da polpa de celulose a partir do bagaço de
malte pré-tratado com ácido sulfúrico diluído e posteriormente com solução de NaOH. As
condições de hidrólise utilizadas em cada uma destas etapas foram: 1. hidrólise ácida: 100 mg
H2SO4/g de matéria seca, relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC por 17 minutos; 2. hidrólise
56
alcalina: solução de NaOH 2% p/v, relação sólido:líquido de 1:20 g:g, 120ºC por 90 minutos;
3. hidrólise enzimática: concentração de substrato de 8% p/v, 45 FPU/g, 100 rpm, 45ºC por 96
h. Estes processos foram realizados conforme descrito nos itens 3.2.1, 3.5 e 3.6.2,
respectivamente. A atividade celulolítica total do extrato enzimático comercial, Celluclast
1.5L (Novozymes), utilizado nestes experimentos de hidrólise enzimática foi de 98 FPU/ml.
3.7.2 Fermentação do hidrolisado celulósico para produção de ácido láctico
3.7.2.1 Microrganismo e preparo do inóculo
O microrganismo utilizado nos experimentos foi a bactéria Lactobacillus delbrueckii
UFV H2B20, proveniente da coleção de culturas da Universidade Federal de Viçosa (Viçosa,
Brasil). A espécie foi mantida repicada em tubos de ensaio contendo meio MRS ágar com a
seguinte composição (g/l): glicose (20), peptona (10), extrato de carne (8), extrato de levedura
(4), acetato de sódio.3H2O (5), citrato triamoniacal (2), fosfato dipotássico (2), sulfato de
magnésio.7H2O (0,2), sulfato de manganês.4H2O (0,05), ágar (14) e 1 ml de Tween 80. A
cultura foi conservada em geladeira a 4ºC.
O meio utilizado para preparo do inóculo foi o MRS caldo, cuja composição é a mesma
do MRS ágar ausente apenas em ágar. Para a formulação deste meio, todos os componentes
foram pesados individualmente e misturados um a um em um fraco Erlenmeyer contendo
água destilada, sob agitação. Após completa homogeneização, o meio foi autoclavado a 1 atm
durante 15 minutos, sendo então resfriado e guardado em geladeira até o momento de uso.
Para o preparo do inóculo, duas alçadas de células mantidas em meio MRS ágar foram
transferidas para um tubo de ensaio contendo 10 ml do meio MRS caldo. O tubo foi fechado
com rolha e papel filme e foi mantido em estufa a 37ºC, sem agitação, durante 24h.
Nos experimentos realizados para avaliar o efeito da concentração inicial de inóculo,
após 24 h na estufa, 1 ml do inóculo foi transferido para um novo tubo de ensaio contendo
10 ml do meio MRS caldo, sendo mantido novamente em estufa a 37ºC, sem agitação, por
mais 24 h. Após este tempo, as células foram separadas por centrifugação (1100 × g, 15 min)
e ressuspendidas em água destilada esterilizada de forma a se obter uma suspensão com
concentração celular de aproximadamente 5 g/l. A partir desta suspensão, diferentes volumes
foram adicionados aos meios de fermentação para se obter concentrações iniciais de células
57
de 0,5, 0,75 e 1,0 g/l no início da fermentação.
Nos experimentos realizados para avaliar o efeito do pH e da suplementação nutricional
do hidrolisado, após 24 h na estufa, 2 ml do inóculo foram transferidos para um Erlenmeyer
de 250 ml contendo 110 ml de meio MRS caldo, sendo mantido novamente em estufa a 37ºC,
sem agitação, por mais 24 h. Após este tempo, as células foram separadas por centrifugação
(1100 × g, 15 min) e transferidas diretamente para o meio de fermentação de forma a se obter
uma concentração celular de 1 g/l no início da fermentação.
3.7.2.2 Meios e condições de fermentação
Inicialmente os experimentos foram realizados em tubos de ensaio para avaliar o efeito
da concentração inicial de inóculo na produção de ácido láctico. O meio de fermentação
utilizado nestes experimentos foi constituído pelo hidrolisado celulósico de bagaço de malte
com o pH original (4,72) ajustado para 6,0 pela adição de NaOH 5N. Após o ajuste de pH,
10 ml do hidrolisado foi adicionado em cada tubo de ensaio de 25 ml, os quais foram então
fechados e autoclavados a 0,5 atm durante 15 minutos. As fermentações foram conduzidas a
37ºC, sem agitação, durante 48 h. A cada 24 h foi retirado um tubo de ensaio para
determinação da concentração celular, pH, consumo de glicose e produção de ácido láctico.
Posteriormente, foram realizados experimentos em tubos de ensaio para avaliar o efeito
da suplementação nutricional do hidrolisado celulósico de bagaço de malte na produção de
ácido láctico. Os meios usados nestes experimentos foram preparados das seguintes formas:
Meio 1: Hidrolisado com o pH ajustado para 6,0 pela adição de NaOH 5N.
Meio 2: Hidrolisado com o pH ajustado para 6,0, suplementado com 5 g/l de extrato de
levedura.
Meio 3: Hidrolisado com o pH ajustado para 6,0, suplementado com os mesmo nutrientes do
meio MRS caldo.
Meio 4: Meio MRS caldo com uma concentração de glicose igual à do hidrolisado (57 g/l).
Depois de formulados, os meios foram autoclavados a 0,5 atm por 15 minutos. As
fermentações foram conduzidas em tubos de ensaio de 25 ml contendo 10 ml de meio de
fermentação, a 37ºC, sem agitação, durante 72 h. A cada 12 h foi retirado um tubo de ensaio
para determinação da concentração celular, pH, consumo de glicose e produção de ácido
láctico.
58
Os experimentos para avaliar o efeito do controle do pH na produção de ácido láctico
por fermentação do hidrolisado celulósico de bagaço de malte, suplementado ou não com
nutrientes, foram realizados em frascos Erlenmeyer de 250 ml. Estes ensaios foram realizados
com os meios 1, 2 e 4 descritos anteriormente. Após a formulação, 100 ml de cada meio
foram adicionados aos frascos Erlenmeyer e autoclavados a 0,5 atm durante 15 min. Para
avaliar o efeito do controle de pH, foram realizadas fermentações com e sem a adição de
NaOH 5N durante a fermentação. Estas fermentações foram realizadas a 37ºC, sem agitação,
durante 60 h. O desempenho das fermentações foi avaliado através de retiradas periódicas de
amostras (2 ml) a cada 12 h, para determinação da concentração celular, pH, consumo de
glicose e produção de ácido láctico.
Em todas as fermentações, assim que retiradas do meio de fermentação as amostras
foram centrifugadas a 4330 × g por 10 min. O sobrenadante foi separado e utilizado para
determinação do pH e das concentrações de glicose, celobiose e ácido láctico por CLAE. O
precipitado foi lavado com água destilada e utilizado para determinação da concentração
celular.
3.8 BRANQUEAMENTO DAS POLPAS DE CELULOSE OBTIDAS A PARTIR DO
BAGAÇO DE MALTE
3.8.1 Obtenção das polpas de celulose
Nesta etapa do trabalho foram obtidas duas polpas de celulose, uma a partir do bagaço
de malte original e outra a partir do bagaço de malte pré-tratado com ácido sulfúrico diluído
nas condições de 100 mg H2SO4/g de matéria seca, relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC
por 17 minutos, conforme descrito no item 3.2.1. As condições utilizadas para obtenção da
polpa de celulose a partir destes materiais basearam-se no uso de uma solução de NaOH
2% p/v, relação sólido:líquido de 1:20 g:g, 120ºC por 90 minutos, conforme metodologia
descrita no item 3.5.
59
3.8.2 Branqueamento das polpas de celulose
As polpas de bagaço de malte obtidas conforme item 3.8.1 foram submetidas a um
processo de branqueamento químico realizado em três etapas. Inicialmente, uma amostra de
30 g de cada polpa foi colocada em um béquer de 600 ml juntamente com uma solução de
hidróxido de sódio 0,07N de forma a se obter uma consistência de 10%. Em seguida foi
adicionado peróxido de hidrogênio (5% em base seca) e o meio reacional foi mantido a 70ºC,
durante 40 min, sob agitação. Após este tempo a polpa obtida foi filtrada em um funil de
Büchner, lavada com água destilada até pH neutro e secada à temperatura ambiente. Este
procedimento foi realizado por duas vezes seguidas. Na terceira etapa do branqueamento, a
polpa foi submetida à reação com hidróxido de sódio 0,25 N de forma a se obter uma
consistência de 10% e a reação foi mantida a 70ºC durante 60 minutos, sob agitação. Após
este tempo, a polpa obtida foi filtrada em um funil de Büchner, lavada com água destilada até
pH neutro e secada em temperatura ambiente até obter um teor de umidade de
aproximadamente 10%.
As polpas obtidas antes e após o branqueamento foram caracterizadas quanto aos teores
de celulose, hemicelulose, lignina e cinzas (itens 3.1.2 e 3.1.3), número kappa, viscosidade e
alvura. O rendimento das polpas foi determinado pela diferença entre as massas antes e após o
branqueamento.
3.9 RECUPERAÇAO DA LIGNINA A PARTIR DO LICOR ALCALINO E SUA
UTILIZAÇÃO NA PRODUÇÃO DE CARVÃO ATIVADO
3.9.1 Obtenção do licor alcalino contendo lignina solúvel
O licor utilizado nestes experimentos foi obtido a partir da hidrólise alcalina do bagaço
de malte pré-tratado com ácido sulfúrico diluído (100 mg H2SO4/g de matéria seca, relação
sólido:líquido de 1:8 g:g, 120ºC por 17 minutos, conforme metodologia descrita no item
3.2.1). As condições utilizadas para hidrólise alcalina basearam-se no uso de uma solução de
NaOH 2% p/v, relação sólido:líquido de 1:20 g:g, 120ºC por 90 minutos, conforme
metodologia descrita no item 3.5.
60
3.9.2 Precipitação da lignina a partir do licor alcalino
Nestes ensaios, foi avaliada a influência do pH na precipitação da lignina a partir do
licor alcalino. Um volume de 20 ml do licor foi colocado em 10 tubos de centrífuga de 50 ml
de capacidade total. A cada tubo foi adicionado um diferente volume de ácido sulfúrico
concentrado (98% p/p) visando obter diferentes valores de pH, variando de 12,56 a 2,15.
Após a adição do ácido, os tubos foram fechados, homogeneizados e centrifugados a 4000
rpm durante 10 min. A lignina precipitada foi separada do licor, lavada com cerca de 40 ml de
água destilada, homogeneizada e centrifugada novamente a 4000 rpm por 10 min. Este
procedimento de lavagem foi realizado duas vezes para cada amostra. Ao término da lavagem,
a lignina obtida foi secada em estufa a 60ºC até apresentar massa constante. Os licores obtidos
foram mantidos a 4ºC durante 24 h e posteriormente centrifugados a 4000 rpm por 10 min. A
lignina então precipitada foi lavada com água conforme descrito anteriormente e secada em
estufa a 60ºC até massa constante. A massa total de lignina precipitada foi considerada como
a soma da massa precipitada após a adição do ácido e a massa precipitada após o
resfriamento. Os licores obtidos foram caracterizados quanto ao pH, concentração total de
lignina solúvel e concentração dos ácidos fenólicos: ferúlico, p-cumárico, p-hidroxibenzóico,
siríngico e vanílico. A remoção de lignina a partir do licor foi calculada pela diferença entre a
concentração de lignina solúvel antes e após o tratamento de precipitação.
3.9.3 Preparo dos carvões ativados a partir da lignina
A lignina seca, recuperada a partir do licor alcalino por precipitação pela adição de
ácido sulfúrico até pH 2,15, foi macerada e passada por uma peneira de 170 mesh. Apenas as
partículas que passaram por esta peneira (<88 µm) foram utilizadas para a produção de
carvão. O processo de ativação da lignina foi realizado empregando diferentes temperaturas
de carbonização e relações entre H3PO4/lignina, de acordo com o planejamento fatorial
completo 22 apresentado na Tabela 3.6. A lignina foi inicialmente impregnada com ácido
fosfórico (85% p/p) na proporção de 1 a 3 g H3PO4/g lignina e mantida em temperatura
ambiente durante 1 h. Após este tempo a mistura foi acondicionada em uma mufla onde foi
mantida a 100ºC durante 1 h. Em seguida a temperatura da mufla foi aumentada até a
temperatura de carbonização desejada, sendo mantida durante 2 h. Os carvões ativados
obtidos foram lavados com água milli Q a 60ºC, durante 48 h, até apresentarem pH neutro.
61
Em seguida, estes foram secados em estufa a 105ºC durante 2,5 h, para perder a umidade.
Os carvões obtidos nas diferentes condições de ativação foram utilizados para
destoxificação do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte. A concentração de metais
(níquel, cálcio, magnésio, zinco, ferro, cromo, alumínio e silício) e compostos fenólicos no
hidrolisado antes e após o tratamento, foi determinada para poder calcular a eficiência de cada
carvão na remoção destes compostos. A cor dos hidrolisados antes e após os tratamentos
também foi determinada. Uma análise estatística dos resultados foi realizada empregando o
programa Statistica versão 5.0.
Tabela 3.6 - Planejamento fatorial completo 22 para avaliação do processo de produção de carvão ativado a partir da lignina do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais.
Níveis originais das variáveis Níveis codificados das variáveis Ensaio
Relação ácido/lignina (g/g)
Temperatura de carbonização (ºC)
Relação ácido/lignina
Temperatura de carbonização
1 1 300 -1 -1 2 3 300 +1 -1 3 1 600 -1 +1 4 3 600 +1 +1 5 2 450 0 0 6 2 450 0 0
3.10 MÉTODOS ANALÍTICOS
3.10.1 Determinação da concentração de glicose, xilose, arabinose, celobiose, xilitol,
ácido acético e ácido láctico
As concentrações de glicose, xilose, arabinose, celobiose, xilitol, ácido acético e ácido
láctico foram determinadas por CLAE, em um equipamento Waters nas seguintes condições:
detector de índice de refração, coluna Bio-Rad Aminex HPX-87H (300 x 7,8 mm),
temperatura de 45ºC, ácido sulfúrico 0,01N como eluente em um fluxo de 0,6 ml/min e
volume de amostra de 20µl. Antes de serem injetadas no cromatógrafo, as amostras foram
diluídas com água deionizada e filtradas em filtros Sep Pak C18 (Millipore). As concentrações
dos compostos foram calculadas a partir de curvas de calibração obtidas com soluções padrão.
62
3.10.2 Determinação da concentração de furfural, hidroximetilfurfural e compostos
fenólicos
As concentrações de furfural, hidroximetilfurfural, vanilina, seringaldeído e dos ácidos
ferúlico, p-cumárico, siríngico, vanílico e p-hidroxibenzóico foram determinadas por CLAE,
em um equipamento Waters nas seguintes condições: detector UV a 276 nm, coluna Waters
Resolve C18 5 µm (300 x 3,9 mm), temperatura ambiente, acetonitrila/água (1/8 com 1% de
ácido acético) como eluente em um fluxo de 0,9 ml/min e volume de amostra de 20 µl. Antes
de serem injetadas no cromatógrafo, as amostras foram diluídas com água deionizada e
filtradas em membranas do tipo HSWP com poros de 0,45 µm (Millipore). As concentrações
destes compostos foram calculadas a partir de curvas de calibração obtidas de soluções
padrão.
3.10.3 Determinação da concentração de metais
As concentrações dos metais, níquel, cálcio, magnésio, zinco, ferro, cromo, alumínio e
silício foram determinados por espectrometria de absorção atômica por chama, em um
equipamento PerkinElmer modelo Analyst 800. Para as determinações, 1 ml da amostra foi
transferido para um béquer de vidro contendo 5 ml de água (Millipore 18,2 mΩ.cm), o qual
foi colocado em uma chapa com aquecimento. Durante o aquecimento da amostra, foi
adicionado 2 a 3 ml de uma mistura ácida de HNO3:HCl, para digerir os açúcares formando
CO2 e H2O. O tempo de digestão foi de 3 a 4 h ou até que fosse notada mudança da cor
inicial. Após a digestão, a amostra foi resfriada e transferida quantitativamente para um balão
volumétrico, onde o volume foi completado com água (Millipore 18,2 mΩ.cm). A diluição foi
feita em função da concentração da amostra e da sensibilidade do aparelho.
3.10.4 Determinação do pH
Os valores de pH das amostras foram determinados por potenciometria, em um aparelho
Micronal modelo B474, com correção de temperatura.
63
3.10.5 Determinação da densidade
Os valores de densidade dos hidrolisados foram determinados em temperatura
ambiente, através do uso de um picnômetro de 50 ml.
3.10.6 Determinação da cor dos hidrolisados
Para determinação da cor, o pH das amostras do hidrolisado foi ajustado para 5,5, pela
adição de NaOH 6N. Em seguida as amostras foram centrifugadas (4330 × g, 10 minutos),
filtradas em membrana HSWP com poros de 0,45 µm (Millipore) e diluídas em água destilada
também com o pH ajustado para 5,5. As soluções obtidas foram analisadas em
espectrofotômetro (Beckman DU 640B) em um comprimento de onda de 440 nm. Nesta
análise, o valor zero foi atribuído à água destilada, e a diferença entre as leituras foi calculada
como porcentagem de remoção de cor.
3.10.7 Determinação da concentração celular da levedura Candida guilliermondii
O crescimento celular da levedura Candida guilliermondii foi acompanhado por medida
da densidade ótica a 600 nm em espectrofotômetro (Beckman DU 640B). Amostras de
volume conhecido foram centrifugadas a 4330 × g por 10 minutos, para recuperação da massa
celular que posteriormente foi lavada 2 vezes com água destilada e diluída para uma faixa de
leitura entre 0,05 a 0,5 unidades de DO. A concentração celular foi determinada utilizando
uma equação obtida por regressão linear dos dados entre peso seco e absorbância a 600 nm.
3.10.8 Determinação da concentração celular da bactéria Lactobacillus delbrueckii
O crescimento celular da bactéria Lactobacillus delbrueckii foi acompanhado por
medida da densidade ótica a 620 nm em espectrofotômetro (Hitachi U-1800). A massa de
células, proveniente de amostras de volume conhecido, foi lavada com água destilada e
devidamente diluída para uma faixa de leitura entre 0,05 a 0,5 unidades de DO. A
concentração celular foi determinada utilizando uma equação obtida por regressão linear dos
dados entre peso seco e absorbância a 620 nm.
64
3.10.9 Determinação dos parâmetros do processo fermentativo para a produção de
xilitol
O fator de conversão de xilose em xilitol (YP/S, g/g) foi calculado pela relação entre a
concentração de xilitol formado (g/l) e a concentração de xilose consumida (g/l). O fator de
conversão de substrato em células (YX/S, g/g) foi calculado pela relação entre a concentração
de células formadas (g/l) e a concentração de substrato (glicose + xilose) consumido (g/l). O
fator de rendimento de xilitol por célula (YP/X, g/g) foi determinado pela relação entre a
concentração de xilitol formado (g/l) e a concentração de células presentes no meio de
fermentação (g/l). A produtividade volumétrica em xilitol (QP, g/l.h) foi calculada pela
relação entre a concentração de xilitol formado (g/l) e o tempo de fermentação (h). O
coeficiente volumétrico de consumo de xilose (QS, g/l.h) foi calculado pela relação entre a
concentração de xilose consumida (g/l) e o tempo de fermentação (h). A eficiência de
produção de xilitol (η, %) foi calculada pela relação entre os valores de YP/S obtido (g/g) e o
valor máximo teórico para este parâmetro (0,917 g/g) de acordo com Barbosa et al. (1988).
3.10.10 Determinação dos parâmetros do processo fermentativo para a produção de
ácido láctico
O fator de conversão de glicose em ácido láctico (YP/S, g/g) foi calculado pela relação
entre a concentração de ácido láctico formado (g/l) e a concentração de glicose consumida
(g/l). A produtividade volumétrica em ácido láctico (QP, g/l.h) foi calculada pela relação entre
a concentração de ácido láctico formado (g/l) e o tempo de fermentação (h). O fator de
rendimento de ácido láctico por célula (YP/X, g/g) foi determinado pela relação entre a
concentração de ácido láctico formado (g/l) e a concentração de células presentes no meio de
fermentação (g/l). O rendimento máximo teórico para a produção de ácido láctico é de 1 g/g
(para microrganismos homofermentativos).
3.10.11 Determinação do teor de proteínas totais presentes no extrato celulolítico
O teor de proteínas totais do extrato enzimático comercial foi determinado de acordo
com o método de Bradford (1976), utilizando como padrão a albumina de soro bovino.
65
3.10.12 Determinação da atividade enzimática do extrato celulolítico
A atividade celulolítica total do extrato enzimático comercial foi determinada de acordo
com o procedimento descrito por Mandels, Andreotti e Roche (1976), sendo expressa como
unidades de papel de filtro (FPU). Nesta análise, 1,5 ml da solução de enzima diluída em
tampão citrato de sódio 0,05M (pH 4,8) foi adicionado em um tubo de ensaio contendo uma
tira de 50 mg de papel de filtro Whatman no1. Esta mistura foi incubada a 50ºC durante 1 h.
Os açúcares redutores liberados do papel de filtro pela ação do extrato celulolítico foram
estimados pelo método do ácido 3,5-dinitrosalicílico (DNS) segundo Miller (1959). À solução
incubada foram adicionados 3 ml de DNS e esta foi mantida durante 5 minutos em banho
maria a 100ºC. Após resfriamento foi feita a leitura da absorbância a 540 nm em
espectrofotômetro (Hitachi U-1800). Os açúcares redutores foram expressos em µmoles de
glicose liberados, com base em uma curva de calibração feita entre absorbância e
concentração de glicose. Uma unidade de papel de filtro é definida como a quantidade de
enzima necessária para liberar 1 µmol de glicose a partir de papel de filtro Whatman no 1, em
1 minuto, a 50ºC.
3.10.13 Determinação do número kappa das polpas de celulose
O número kappa (medida indireta de determinação da lignina residual na polpa) foi
determinado pela oxidação por permanganato de potássio e titulação iodométrica com
tiossulfato de sódio, seguindo-se metodologia padrão (TAPPI, 1985). Amostras de polpas,
com massas entre 0,30 e 0,35 g foram pesadas com precisão de 0,1 mg em béqueres e
suspensas em 10 ml de água destilada. Cada suspensão de polpa foi transferida com 140 ml de
água para um erlenmeyer de 500 ml que foi mantido a 25oC sob agitação magnética.
Uma solução foi preparada misturando 25 ml de uma solução padrão de KMnO4 0,1 N
(recém preparada) com 25 ml de H2SO4 4 N, em um erlenmeyer de 125 ml que foi mantido a
25oC sob agitação magnética (solução A). Essa solução foi adicionada quantitativamente a
cada erlenmeyer contendo a suspensão de polpa, utilizando-se 50 ml de água destilada para
lavar as paredes do frasco. Após exatos 10 min (medidos com um cronômetro) foram
adicionados 5,0 ml de uma solução de KI 0,1 N. Essa mistura foi titulada com uma solução
padronizada de Na2S2O3 0,1 N até próximo ao ponto de viragem (desaparecimento da cor
castanha). Em seguida, foram adicionados 2,5 ml de uma solução de amido 2% e a titulação
66
prosseguiu até a viragem de azul a incolor.
Em um experimento paralelo foi quantificado o consumo de KMnO4 sem a adição de
polpa (branco), substituindo-se a suspensão de polpa por 150 ml de água destilada e seguindo-
se o mesmo procedimento descrito acima.
O número kappa foi determinado pelas equações 10, 11 e 12 a seguir (TAPPI, 1985),
baseados no volume de KMnO4 e nos ajustes para o volume consumido e para a temperatura.
P = (b-a)*N/0,1 equação 10
f = 0,0084*P + 0,895 equação 11
k = P*f *[1 + 0,013*(25 – T)]/W equação 12
onde: P = volume de KMnO4 que reagiu (ml); a = volume de Na2S2O3 consumido pela
amostra (ml); b = volume de Na2S2O3 consumido pelo branco (ml); f = fator de correção
determinado para cada P (TAPPI, 1985); N = normalidade da solução de Na2S2O3; T =
temperatura da análise (oC); W = massa da polpa seca (g); k = número kappa.
3.10.14 Determinação da viscosidade das polpas de celulose
Para a determinação da viscosidade das polpas foi utilizado um viscosímetro em U
(Ostwald – Fensk) imerso em banho termostatizado a 25 ± 0,1ºC. A determinação da
constante do viscosímetro (kv) foi feita com H2SO4 98% p/p. O líquido foi aspirado até
ultrapassar as duas marcas de calibração e deixado escoar, sendo então determinado o tempo
necessário para que o menisco do líquido ultrapassasse as 2 marcas. Através dos valores de
densidade e viscosidade do H2SO4 98% p/p, na temperatura de trabalho, foi calculada a
constante do viscosímetro pela equação 13:
kv = V/t*d equação 13
onde: kv = constante do viscosímetro (cP*cm3/s*g), V = viscosidade do H2SO4 a 25ºC =
19,25 cP (TAPPI, 1982); d = densidade do H2SO4 a 25ºC = 1,84 g/cm3 (WEAST, 1984); t =
tempo de escoamento (s).
A viscosidade das polpas foi determinada pelo método padrão Tappi (1982). Uma
massa de 0,125 g de cada polpa seca foi pesada (com precisão de 0,1 mg) e em seguida foram
adicionados 25 ml de etilenodiamina cúprica (solução 0,5 M em Cu+2). A mistura obtida foi
mantida sob agitação magnética por 20 min, sendo, após esse tempo, filtrada em cadinho de
vidro sinterizado (no 3) e transferida para o viscosímetro previamente aferido. Depois de
67
atingido o equilíbrio térmico, a solução foi aspirada e o tempo de escoamento foi medido
conforme descrito anteriormente. A viscosidade da polpa foi determinada pela equação 14:
V = kv*t*d Equação 14
onde: V = viscosidade da solução (cP); kv = constante do viscosímetro (cP*cm3/s*g); t =
tempo de escoamento (s); d = densidade da solução de celulose (1,052 g/cm3 – TAPPI, 1982).
3.10.15 Determinação da alvura das polpas de celulose
A alvura das polpas foi determinada de acordo com a norma Tappi (1991). Para
determinação da alvura, foram preparados corpos de prova seguindo a norma Tappi T-218 sp-
97. Cerca de 4 g de polpa (base seca) foram suspensas em 1300 ml de água destilada e a
suspensão obtida foi agitada durante 5 min, sendo posteriormente vertida em um funil de
Büchner de 70 mm de diâmetro e filtrada a vácuo. Após filtração, o funil foi invertido e a
polpa foi liberada através da passagem de um fluxo de ar. A folha de prova assim formada foi
então prensada e colocada para secar em ambiente protegido da luz. Após um dia, as folhas,
com gramatura de 0,09 g/cm2, tiveram a porcentagem de reflexão em 457 nm determinada em
um aparelho Photovolt modelo 577. A porcentagem de reflexão foi determinada em três
pontos diferentes das polpas e os resultados foram apresentados como média destas medidas.
A gramatura, ou seja, a massa por unidade de área do papel, foi calculada através da equação
15, onde g = gramatura (g/cm2), m = massa do corpo de prova (g) e A = área do corpo de
prova (cm2).
g = (m/A)*104 Equação 15
3.10.16 Fotomicrografias
Amostras secas do bagaço de malte foram colocadas na base de um suporte metálico,
onde foram aderidas através de uma fita adesiva. Em seguidas, estas foram recobertas com
ouro e analisadas em um microscópio eletrônico de varredura da marca Leo 1450VP, sendo
então obtidas as fotomicrografias. Estas análises foram realizadas no Departamento de
Engenharia de Materiais (DEMAR) da EEL-USP.
68
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA DO BAGAÇO DE MALTE E ENSAIOS
PRELIMINARES DE HIDRÓLISE ÁCIDA EM AUTOCLAVE
4.1.1 Composição química do bagaço de malte
Após obtenção, o bagaço de malte foi lavado com água para remover os açúcares
residuais provenientes do mosto, e secado até atingir 10% de umidade. Este procedimento foi
realizado para poder manter as características do material durante a estocagem, uma vez que,
o bagaço de malte procedente do mosto cervejeiro contém açúcares fermentáveis e apresenta
um teor de umidade de aproximadamente 80%, o que favorece sua deterioração. A secagem
da matéria-prima é também interessante em termos de redução de volume e diminuição dos
custos de armazenamento.
A composição química do bagaço de malte utilizado neste trabalho está apresentada na
Tabela 4.1, onde os valores estão expressos como porcentagem em peso seco de celulose
(glucana), hemicelulose (xilana + arabinana), lignina total (Klason + solúvel em ácido), cinzas
grupos acetil, proteínas, e extrativos. Observa-se que o bagaço de malte produzido a partir de
100% malte de cevada é um material lignocelulósico composto principalmente por (% p/p):
hemicelulose (28,42), lignina (27,78), celulose (16,78) e proteínas (15,25). A estrutura
hemicelulósica é formada pelos polissacarídeos xilana e arabinana em uma proporção de
2,3:1. Embora o teor de arabinana no bagaço de malte seja elevado, xilana e glucana são os
principais polissacarídeos presentes neste material, assim como em outros resíduos agrícolas.
Por outro lado, o bagaço de malte apresenta um alto teor de lignina (27,78 % p/p) que o
diferencia da maioria dos resíduos agrícolas. Bagaço de cana-de-açúcar, palha de arroz e
palha da cevada, por exemplo, apresentam teores de lignina de 18,10, 17,20 e 15,80 % p/p,
respectivamente (ROBERTO; MUSSATTO; RODRIGUES, 2003; SUN et al., 2004, 2005).
O teor de proteínas no bagaço de malte (15,25 % p/p) também é maior do que os teores
encontrados em outros materiais lignocelulósicos, tais como as palhas de cevada, aveia, arroz
e trigo, as quais contêm entre 3,0 a 5,0 % p/p de proteínas (THEANDER; AMAN, 1984). Os
aminoácidos ligados às proteínas não foram determinados no presente trabalho, mas alguns
69
autores relataram que o bagaço contém os aminoácidos: leucina, valina, alanina, serina,
glicina, ácido glutâmico, ácido aspártico, tirosina, prolina, treonina, arginina, lisina, cistina,
histidina, isoleucina, metionina, fenilalanina, e triptofano (HUIGE, 1994; MARIANI, 1953).
Tabela 4.1 - Composição química do bagaço de malte.
Componente (% p/p)
Celulose (glucana) 16,78 Hemicelulose 28,42
Xilana 19,94 Arabinana 8,48
Lignina total 27,78 Lignina Klason 22,96 Lignina solúvel em ácido 4,82
Cinzas 4,60 Grupos acetil 1,35 Proteínas 15,25 Extrativos (por diferença) 5,82
Minerais (mg/kg)
Cálcio 3515,0 Sódio 309,3 Potássio 258,1 Magnésio 1958,0 Alumínio 36,0 Ferro 193,4 Bário 13,6 Estrôncio 12,7 Manganês 51,4 Cobre 18,0 Zinco 178,0 Fósforo 5186,0 Enxofre 1980,0 Cromo 5,9 Silício 10740,0
Além de celulose, hemicelulose, lignina e proteínas, o bagaço de malte também
apresenta 4,6% p/p de cinzas. Uma análise de espectrometria de emissão atômica revelou que
diversos minerais estão presentes na composição deste material, os quais incluem: cálcio,
sódio, potássio, magnésio, alumínio, ferro, bário, estrôncio, manganês, cobre, zinco, fósforo,
enxofre, cromo e silício, em níveis que variam de 5,9 a 10740,0 mg/kg em peso seco (Tabela
4.1). Assim como nas palhas de cereais (aveia, cevada, arroz e trigo) (THEANDER; AMAN,
70
1984), as cinzas do bagaço de malte também são ricas em silício; entretanto, o bagaço
apresenta teores mais elevados de fósforo e cálcio, minerais existentes em menores
proporções nestas outras matérias-primas.
O teor de extrativos (ceras, gorduras, gomas, amidos, resinas, taninos, óleos essenciais,
e vários outros constituintes citoplasmáticos (KUHAD; SINGH, 1993)) no bagaço de malte
foi calculado por diferença. As vitaminas presentes neste material não foram determinadas,
mas alguns autores relataram a presença de (ppm): biotina (0,1), colina (1800), ácido fólico
(0,2), niacina (44), ácido pantotênico (8,5), riboflavina (1,5), tiamina (0,7) e vitamina B6 (0,7)
(HUIGE, 1994; MARIANI, 1953).
Após sua caracterização, o bagaço de malte foi submetido a um processo de hidrólise
ácida visando recuperar os açúcares provenientes da hemicelulose (xilose e arabinose). A
partir da composição química do material, o rendimento máximo destes açúcares que poderia
ser obtido no hidrolisado foi calculado e correspondeu a 19,6 g de xilose e 8,3 g de arabinose
(g/100 g em peso seco).
4.1.2 Ensaios preliminares de hidrólise ácida do bagaço de malte em autoclave
Estes ensaios foram propostos para se ter uma avaliação preliminar do comportamento
da reação do bagaço de malte em meio ácido sulfúrico, visando recuperar os açúcares da
fração hemicelulósica. Nesta etapa, foi utilizado um planejamento fatorial completo 22 para
avaliar a influência das variáveis relação sólido:líquido e concentração de ácido sulfúrico, na
hidrólise do bagaço de malte. As faixas de valores das variáveis utilizadas foram selecionadas
de acordo com trabalhos da literatura que utilizaram valores similares para hidrólise ácida de
outros materiais lignocelulósicos (AGUILAR et al., 2002; ROBERTO; MUSSATTO;
RODRIGUES, 2003; TÉLLEZ-LUIS; RAMÍREZ; VÁZQUEZ, 2002).
Os hidrolisados obtidos nas diferentes condições de hidrólise foram analisados para
determinação da concentração de açúcares (glicose, xilose e arabinose), produtos de
degradação (furfural, hidroximetilfurfural e lignina solúvel) e ácido acético. Os resultados
obtidos estão apresentados na Tabela 4.2. Nota-se que a concentração destes compostos nos
hidrolisados variou para cada condição de hidrólise empregada. Todos os hidrolisados
continham xilose e arabinose em concentrações muito mais elevadas que a de glicose, sendo
que as máximas concentrações destes açúcares (obtidas no ensaio 3) corresponderam a 13,21
e 8,21 g/l, respectivamente, enquanto que a mais alta concentração de glicose (também obtida
71
no ensaio 3) correspondeu a apenas 0,32 g/l. Estes resultados sugerem que as condições de
hidrólise utilizadas foram capazes de hidrolisar apenas a fração hemicelulósica do material,
sem interferir praticamente na estrutura da celulose, que teria permanecido inalterada.
Tabela 4.2 - Concentração de açúcares (glicose, xilose e arabinose), produtos de degradação (furfural, hidroximetilfurfural e lignina solúvel) e ácido acético nos hidrolisados hemicelulósicos de bagaço de malte obtidos em autoclave sob diferentes condições operacionais.
Variáveisa Respostas (g/l) Ensaio
S:L (g:g)
A (mg/g)
Glicose Xilose Arabinose Furfural HMFb Lignina solúvel
Ácido acético
1 1:10 100 0,17 9,65 8,08 0,04 0,10 3,79 0,49 2 1:20 100 0,01 2,15 3,91 0,04 0,13 3,29 0,08 3 1:10 120 0,32 13,21 8,21 0,02 0,03 2,05 0,60 4 1:20 120 0,05 3,68 4,00 0,01 0,04 2,40 0,19 5 1:15 110 0,12 6,27 5,62 0,03 0,06 2,78 0,34 6 1:15 110 0,11 5,88 5,52 0,03 0,07 2,56 0,30 7 1:15 110 0,11 5,35 5,36 0,03 0,06 2,61 0,27
a S:L = relação sólido:líquido; A = concentração de ácido sulfúrico; b hidroximetilfurfural.
De acordo com Lee et al. (1978), durante o processo de hidrólise ácida a hemicelulose é
hidrolisada mais rapidamente do que a celulose; e quando a reação é conduzida em condições
que favorecem a hidrólise da celulose, a maior parte da xilose é degradada a furfural, sendo
então muito pouco recuperada. No presente trabalho, as condições de hidrólise utilizadas
praticamente não hidrolisaram a celulose e também não favoreceram a formação de furfural e
hidroximetilfurfural (subprodutos provenientes da degradação de pentoses e hexoses,
respectivamente), uma vez que estes compostos estavam presentes nos hidrolisados em
concentrações muito baixas (<0,13 g/l, Tabela 4.2). Estes resultados mostram, portanto, que
para todas as condições de hidrólise estudadas, apenas pequenas quantidades de açúcares
foram degradadas. As concentrações de furfural e hidroximetilfurfural obtidas foram inclusive
menores do que os valores encontrados em hidrolisados ácido diluídos produzidos a partir de
outras matérias-primas lignocelulósicas, tais como silagem, gramíneas, bagaço de cana-de-
açúcar, palhas de arroz e de sorgo e madeiras (AGUILAR et al., 2002; KIM; YUM; PARK,
2000; NEUREITER et al., 2004; ROBERTO; MUSSATTO; RODRIGUES, 2003; TÉLLEZ-
LUIS; RAMÍREZ; VÁZQUEZ, 2002).
Durante a hidrólise ácida do bagaço de malte, os grupos acetil ligados à estrutura da
xilana também foram liberados no meio reacional, uma vez que foi verificada a presença de
72
ácido acético em todos os hidrolisados obtidos (Tabela 4.2). Porém, este composto também
estava presente em baixas concentrações nos hidrolisados, variando de 0,08 a 0,6 g/l. A
hidrólise ácida foi ainda capaz de solubilizar parte da estrutura da lignina do bagaço de malte,
sendo que a lignina solúvel foi o subproduto obtido em maior concentração nos hidrolisados
(variando de 2,05 a 3,79 g/l, Tabela 4.2). A escolha de uma condição de hidrólise que
minimize a formação destes compostos é de grande interesse, pois favoreceria o emprego do
hidrolisado em processos de bioconversão uma vez que a lignina solúvel é composta
principalmente por compostos fenólicos, os quais são extremamente tóxicos para os
microrganismos (MUSSATTO; ROBERTO, 2004a).
4.1.3 Análise estatística da hidrólise ácida do bagaço de malte em autoclave
A partir das concentrações de xilose e arabinose presente nos hidrolisados, foram
calculadas as eficiências de hidrólise da xilana, da arabinana, e da hemicelulose (xilana +
arabinana) (Tabela 4.3). As estimativas dos efeitos das variáveis utilizadas na hidrólise e a
significância estatística delas foram determinadas pelo teste t de Student e podem ser
visualizados nos gráficos de Pareto apresentados na Figura 4.1.
Tabela 4.3 - Eficiência de hidrólise da xilana, da arabinana e da hemicelulose (xilana + arabinana) durante a hidrólise ácida do bagaço de malte em autoclave, sob diferentes condições operacionais.
Eficiência de hidrólise (%) Ensaio
Xilana Arabinana Hemicelulose
1 48,93 96,35 63,08 2 21,89 93,59 43,28 3 66,97 97,84 76,18 4 37,44 95,68 54,81 5 47,71 100,00 63,48 6 44,75 98,80 60,87 7 40,67 95,80 57,12
Observa-se que ambas as variáveis, relação sólido:líquido e concentração de ácido, não
apresentaram influência significativa ao nível de 95% de confiança sobre a hidrólise da
arabinana (Figura 4.1A). Este fato é justificável uma vez que a eficiência de hidrólise da
arabinana foi maior que 93,6 % para todas as condições de hidrólise avaliadas (Tabela 4.3).
73
Por outro lado, a eficiência de hidrólise da xilana variou significativamente, de 21,89 a
66,97%, demonstrando que houve influência das condições de hidrólise, sobre esta resposta. É
interessante notar que a condição que proporcionou o menor valor de eficiência de hidrólise
da arabinana (93,59%, ensaio 2) também proporcionou o menor valor de eficiência de
hidrólise da xilana (21,89%). No entanto, se compararmos estes dois valores fica evidente que
a arabinana do bagaço de malte é hidrolisada muito mais facilmente do que a xilana. Kabel et
al. (2002) também observaram que durante o tratamento hidrotérmico do bagaço de malte, a
arabinose foi removida mais facilmente da estrutura da hemicelulose do que a xilose. De
acordo com Carvalheiro et al. (2004b), a arabinose possui uma maior sensibilidade térmica do
que a xilose e por esta razão ela é liberada primeiro da estrutura da hemicelulose.
Estimativa dos efeitos
0,12
0,72
-0,98
p=,05
(12)
(2)
(1)
0 1 2 3 4
(A)
p=0,05
Estimativa dos efeitos
-0,43
5,75
-9,69
(12)
(2)
(1)
0 2 4 6 8 10 1
2
(B)
p=0,05
Estimativa dos efeitos
-0,28
4,47
-7,48
(12)
(2)
(1)
0 2 4 6 8 10
(C)
p=0,05
Estimativa dos efeitos
-0,40
2,18
-6,42
(1)
(12)
(2)
0 2 4 6 8
(D)
p=0,05
Figura 4.1 - Gráficos de Pareto para estimativa dos efeitos das variáveis: (1) relação sólido:líquido, (2) concentração de ácido sulfúrico e (12) a interação entre elas, nas respostas: eficiência de hidrólise da arabinana (A), eficiência de hidrólise da xilana (B), eficiência de hidrólise da hemicelulose (xilana + arabinana) (C) e concentração de lignina solúvel (D), obtidas nos processos de hidrólise ácida do bagaço de malte em autoclave. Efeitos acima da linha de p=0,05 são significativos ao nível de 95% de confiança.
74
O efeito da relação sólido:líquido e da concentração de ácido na eficiência de hidrólise
da xilana está apresentado na Figura 4.1B. Como se pode observar, ambas as variáveis
apresentaram efeito principal significativo ao nível de 95% de confiança nesta resposta. O
efeito negativo da relação sólido:líquido indica que a eficiência de hidrólise da xilana foi
favorecida quando a relação sólido:líquido foi diminuída; enquanto que o efeito positivo da
concentração de ácido demonstra que a eficiência de hidrólise foi maior quanto maior a
concentração de ácido utilizada. O aumento no rendimento de xilose devido ao aumento da
concentração de ácido sulfúrico também foi observado durante a hidrólise de outros materiais
lignocelulósicos, tais como bagaço de cana-de-açúcar, silagem e gramíneas (NEUREITER et
al., 2002, 2004). Quando comparamos as Figuras 4.1B e 4.1C, observa-se que as variáveis
operacionais apresentaram efeitos similares para ambas as eficiências de hidrólise da xilana e
da hemicelulose. Isto provavelmente se deve ao fato de que a eficiência de hidrólise da
arabinana foi praticamente a mesma para todas as condições avaliadas. Logo, a eficiência de
hidrólise da hemicelulose foi dependente principalmente da hidrólise da xilana. A interação
entre as variáveis não foi significativa para nenhuma das respostas analisadas, sugerindo que
o efeito de cada variável deve ser interpretado individualmente.
A análise estatística para a resposta de lignina solúvel (Figura 4.1D) revelou que apenas
a concentração de ácido apresentou efeito significativo ao nível de 95% de confiança para esta
resposta e com um efeito negativo, indicando que a solubilização da lignina foi favorecida
quanto menor a concentração de ácido utilizada no processo. Entretanto, o valor máximo de
lignina solúvel não pode ser obtido em ausência de ácido, mas uma concentração mínima
deste é requerida. Por outro lado, para se obter uma baixa concentração de lignina solúvel, a
concentração de ácido deve ser aumentada. Isto ocorre porque o ácido promove a reticulação
da lignina, impedindo sua solubilização. Logo, com o aumento na concentração de ácido uma
maior parte da lignina se torna reticulada e deixa de ser solubilizada no meio reacional
(FENGEL; WEGENER, 1989).
Uma análise de variância com estimativa de curvatura foi realizada para todas as
respostas estudadas e revelou que este parâmetro não apresentou significância estatística
mesmo a 90% de confiança. Isto significa que na região em estudo, os valores das respostas
variaram de forma linear. Como as condições que promoveram os mais altos valores de
eficiência de hidrólise da xilana e da hemicelulose foram as mesmas que proporcionaram os
mais baixos valores de lignina solúvel, as melhores condições para hidrólise ácida do bagaço
de malte em autoclave, na região em estudo, foram baseadas no uso de uma relação
75
sólido:líquido de 1:10 g:g e uma concentração de ácido sulfúrico de 120 mg/g de matéria
seca. Entretanto, os valores de eficiência obtidos com o uso destas condições de hidrólise
(67% para a xilana e 76,2% para a hemicelulose, ensaio 3) revelam que as condições de
hidrólise ácida do bagaço de malte ainda precisam ser otimizadas de forma a aumentar a
recuperação dos açúcares da fração hemicelulósica, principalmente xilose. Observando o
cromatograma obtido para esta condição de hidrólise (Figura 4.2), nota-se a existência de
picos entre os tempos de retenção de 6,5 a 8 minutos, sugerindo a presença de oligômeros no
hidrolisado. De acordo com alguns autores, a hemicelulose apresenta duas frações de xilana
com diferentes suscetibilidades à hidrólise, sendo que uma reage mais rapidamente do que a
outra. A fração que é mais facilmente hidrolisada com ácidos diluídos corresponde a 60-80%
do total enquanto que os restantes 20-40% correspondem a uma fração mais difícil de ser
hidrolisada (GARROTE; DOMÍNGUEZ; PARAJÓ, 2002; KIM; YUM; PARK, 2002;
LAVARACK; GRIFFIN; RODMAN, 2002).
MV
0.00
200.00
400.00
600.00
800.00
1000.00
1200.00
1400.00
Minutes1.00 2.00 3.00 4.00 5.00 6.00 7.00 8.00 9.00 10.00 11.00 12.00 13.00 14.00
glic
ose
- 8.8
63
xilo
se -
9.51
7
arab
inos
e - 1
0.48
6
12.0
46
Figura 4.2 - Cromatograma do hidrolisado obtido em autoclave, nas condições de relação sólido líquido de 1:10 g:g e 120 mg de ácido/g de matéria seca.
4.2 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ÁCIDA EM REATOR VISANDO
A MÁXIMA LIBERAÇÃO DE XILOSE E PRODUÇÃO DE XILITOL A PARTIR DO
HIDROLISADO
Nesta etapa do trabalho, os experimentos de hidrólise ácida foram realizados em reator
visando aumentar a eficiência de hidrólise da hemicelulose do bagaço de malte, conforme
76
discutido na seção anterior. Estes ensaios foram realizados de acordo com um planejamento
fatorial completo 23 para avaliar o efeito das variáveis relação sólido:líquido, concentração de
ácido sulfúrico e também do tempo de reação, nas respostas de eficiência de hidrólise da
xilana, da arabinana e da hemicelulose (xilana + arabinana) e na fermentabilidade dos
hidrolisados obtidos para a produção de xilitol.
4.2.1 Composição química dos hidrolisados obtidos
Assim como nos experimentos de hidrólise em autoclave, xilose e arabinose também
foram os principais açúcares presentes nos hidrolisados produzidos em reator (Tabela 4.4). A
partir das concentrações destes compostos foram calculadas as eficiências de hidrólise, cujos
valores obtidos estão apresentados na Tabela 4.5. Analisando esta tabela, observa-se que os
resultados de hidrólise ácida do bagaço de malte em reator foram superiores aos obtidos em
autoclave, principalmente em relação à eficiência de hidrólise da xilana e da hemicelulose.
Em autoclave, a máxima eficiência de hidrólise da xilana e da hemicelulose foi 67% e 76,2%,
respectivamente, enquanto que em reator estes valores atingiram 94,2% e 96,5%, (ensaio 8 –
Tabela 4.5). Mesmo para a condição que proporcionou os mais baixos resultados de eficiência
em reator, os valores de hidrólise da xilana e da hemicelulose foram 28% e 16% superiores à
melhor condição obtida em autoclave. Isto demonstra que os ensaios preliminares em
autoclave foram importantes, pois mostraram a direção para a qual os valores das variáveis
exerciam maior influência no processo de hidrólise. Além disso, os melhores resultados
obtidos nesta etapa podem ser atribuídos também ao sistema de agitação, presente em reator e
ausente em autoclave, o que permitiu uma maior interação entre as partículas do material e a
solução ácida.
Os elevados valores de eficiência de hidrólise (>85,8%) obtidos para ambos, xilana e
arabinana, proporcionaram elevados valores de eficiência de hidrólise da hemicelulose,
variando de 88,7 a 96,5% para todas as condições avaliadas. A análise estatística destes
resultados revelou que não houve diferença entre os tratamentos a um nível de confiança de
95%, o que permite concluir que a faixa de valores estudada em reator já se encontra dentro
de uma região ótima, onde a extração de xilose e arabinose foi máxima independente das
variações aplicadas.
77
Tabela 4.4 - Concentração de açúcares (glicose, xilose e arabinose), produtos de degradação (furfural, hidroximetilfurfural e lignina solúvel) e ácido acético nos hidrolisados hemicelulósicos de bagaço de malte obtidos em reator sob diferentes condições operacionais.
Variáveisa Concentração (g/l)bEnsaio
S:L (g:g)
A (mg/g)
T (min)
Gli Xil Arab Furfural HMF Lignina solúvel
Ac. acético
1 1:8 100 17 1,19 21,88 10,71 0,63 0,09 4,22 1,20 2 1:12 100 17 0,57 14,28 7,17 0,31 0,05 2,66 0,77 3 1:8 140 17 1,72 21,44 10,10 0,99 0,08 2,70 1,19 4 1:12 140 17 1,08 15,11 7,21 0,48 0,04 2,73 0,76 5 1:8 100 37 1,25 20,96 10,12 0,87 0,07 3,22 1,34 6 1:12 100 37 0,57 14,36 6,81 0,28 0,03 2,26 1,12 7 1:8 140 37 1,89 22,62 10,51 1,02 0,07 2,56 1,39 8 1:12 140 37 0,96 15,48 7,12 0,46 0,03 2,20 0,81 9 1:10 120 27 1,33 18,16 8,65 0,58 0,04 3,40 1,12 10 1:10 120 27 1,30 17,69 8,40 0,65 0,05 3,50 1,03 11 1:10 120 27 1,36 17,60 8,23 0,50 0,04 3,16 1,08 12 1:10 120 27 1,12 16,94 8,03 0,60 0,05 3,13 0,99
a S:L = relação sólido:líquido; A = concentração de ácido sulfúrico; T = tempo de reação. b Gli = glicose; Xil = xilose; Arab = arabinose; HMF = hidroximetilfurfural
Tabela 4.5 - Eficiência de hidrólise da xilana, da arabinana e da hemicelulose (xilana + arabinana) durante a hidrólise ácida do bagaço de malte em reator, sob diferentes condições operacionais.
Variáveisa Eficiência de hidrólise Ensaio
S:L (g:g)
A (mg/g)
T (min)
Xilana Arabinana Hemiceluloseb
1 1:8 100 17 88,7 100,0 92,7 2 1:12 100 17 87,1 99,0 91,8 3 1:8 140 17 86,7 96,1 89,5 4 1:12 140 17 91,7 100,0 95,1 5 1:8 100 37 87,2 96,6 90,0 6 1:12 100 37 87,5 97,6 90,5 7 1:8 140 37 91,5 100,0 94,1 8 1:12 140 37 94,2 100,0 96,5 9 1:10 120 27 92,0 100,0 95,3 10 1:10 120 27 89,6 100,0 92,7 11 1:10 120 27 89,1 98,1 91,8 12 1:10 120 27 85,8 95,7 88,7
a S:L = relação sólido:líquido; A = concentração de ácido sulfúrico; T = tempo de reação. b Hemicelulose = xilana + arabinana.
78
Glicose também estava presente nos hidrolisados obtidos em reator, em concentrações
bem menores do que as de xilose e arabinose (Tabela 4.4). Segundo Téllez-Luis, Ramírez e
Vázquez (2002), a glicose liberada nos hidrolisados pode ser proveniente da hemicelulose ou
da celulose. No entanto, normalmente a celulose não é hidrolisada nas condições operacionais
empregadas para hidrólise com ácido diluído. Como no presente trabalho as concentrações de
glicose e hidroximetilfurfural (produto da degradação da glicose) nos hidrolisados foram
muito baixas (<1,9 e <0,1 g/l, respectivamente), é provável, portanto, que praticamente toda a
glicose tenha sido liberada a partir da hemicelulose do bagaço de malte.
Além de açúcares, os hidrolisados obtidos em reator também continham ácido acético,
furfural, hidroximetilfurfural e lignina solúvel (Tabela 4.4), assim como observado nos
hidrolisados obtidos em autoclave. O ácido acético é um composto que, quando presente nos
hidrolisados em concentrações maiores que 3 g/l, atua como um potente inibidor do
metabolismo microbiano se o hidrolisado for utilizado como meio de fermentação (FELIPE et
al., 1995). Segundo Lawford e Rousseau (1998), este ácido atravessa a membrana celular e
diminui o pH intracelular, afetando então o metabolismo do microrganismo. Como os
hidrolisados de bagaço de malte continham ácido acético em concentrações variando de 0,76
a 1,39 g/l (Tabela 4.4), provavelmente este ácido não será capaz de afetar o metabolismo
microbiano quando o hidrolisado for utilizado como meio de fermentação. Porém, não se deve
desconsiderar seu efeito interativo com outros compostos tóxicos.
Furfural e hidroximetilfurfural foram encontrados em pequenas quantidades (<1,02 g/l)
nos hidrolisados, demonstrando que novamente houve pouca degradação dos açúcares durante
o processo de hidrólise ácida, independente das condições operacionais utilizadas. Apesar de
pequenas, as concentrações de furfural nos hidrolisados foram superiores às concentrações de
hidroximetilfurfural (Tabela 4.4), sugerindo que os açúcares do tipo pentoses foram mais
suscetíveis à degradação do que os açúcares do tipo hexoses. De acordo com Pessoa Jr,
Mancilha e Sato (1997), a degradação dos açúcares durante o processo de hidrólise ácida
ocorre quando se utiliza uma elevada concentração de ácido, ou quando a homogeneização do
reator é feita de forma inadequada, criando regiões com alta acidez. Téllez-Luis, Ramírez e
Vázquez (2002) observaram um aumento na concentração de furfural quando aumentaram a
concentração de ácido e o tempo de reação utilizados na hidrólise ácida da palha de sorgo.
Lavarack, Griffin e Rodman (2002) também verificaram que o aumento da concentração de
ácido durante a hidrólise ácida do bagaço de cana-de-açúcar favoreceu a degradação de xilose
a furfural. No presente trabalho, as baixas concentrações de furfural e hidroximetilfurfural
79
obtidas nos hidrolisados provavelmente foram resultados da baixa concentração de ácido
(<1,5%) e temperatura de reação (<120ºC) utilizadas.
Além de ácido acético, furfural e hidroximetilfurfural, todos os hidrolisados obtidos
também continham lignina solúvel, em concentrações que variaram de 2,2 a 4,22 g/l (Tabela
4.4). Quando comparado com os outros subprodutos presentes nos hidrolisados de bagaço de
malte, estes foram os compostos produzidos em maior concentração. Segundo Parajó,
Dominguez e Dominguez (1998b) os compostos provenientes da degradação da lignina são
mais tóxicos aos microrganismos do que o ácido acético, hidroximetilfurfural e furfural,
mesmo quando presentes em baixas concentrações.
Ao contrário dos outros subprodutos, a concentração de lignina solúvel nos hidrolisados
foi fortemente influenciada pelas condições de hidrólise empregadas. A análise estatística
para esta resposta (Tabela 4.6) revelou que todas as variáveis estudadas (relação
sólido:líquido, concentração de ácido e tempo de reação) apresentaram efeito significativo a
95% de confiança e com sinal negativo, o que significa que a concentração de lignina solúvel
no hidrolisado foi aumentada quando a relação sólido:líquido, a concentração de ácido e o
tempo de reação empregados na hidrólise foram diminuídos.
De acordo com Fengel e Wegener (1989), uma pequena fração da molécula de lignina
sempre é solubilizada durante o tratamento dos materiais lignocelulósicos com ácidos
minerais. No entanto, quando a concentração de ácido é aumentada, a lignina se torna menos
solúvel (conforme mencionado no item 4.1.3), pois as reações de condensação passam a
ocorrer em maior proporção, modificando suas propriedades e também a estrutura, que se
torna mais rígida e difícil de solubilizar. O efeito do tempo de reação na solubilização da
lignina também está relacionado com a condensação desta molécula. Segundo Allen, Cousin e
Pierce (1980) duas reações consecutivas ocorrem quando a lignina é hidrolisada com ácidos
diluídos: 1. despolimerização da lignina pelo ácido; 2. condensação/repolimerização da
lignina parcialmente hidrolisada. Inicialmente, a reação de hidrólise é predominante,
proporcionando um aumento na quantidade de lignina solúvel. Entretanto, com o passar do
tempo as reações de condensação tornam-se predominantes, causando um aumento na
quantidade de lignina insolúvel residual. Recentemente, estudando a autohidrólise do bagaço
de malte, Carvalheiro et al. (2004b) observaram que a recuperação de lignina no resíduo
sólido foi maior quando o tempo de reação foi aumentado.
80
Tabela 4.6 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student para a concentração de lignina solubilizada durante a hidrólise ácida do bagaço de malte.
Variáveis independentes e interações
EE E t
Média 2,819 ±0,083 33,92* Curvatura 0,957 ±0,288 3,33* X1 -0,712 ±0,166 4,29* X2 -0,542 ±0,166 3,26* X3 -0,517 ±0,166 3,11* X1X2 0,547 ±0,166 3,29* X1X3 0,052 ±0,166 0,32 X2X3 0,182 ±0,166 1,10
* valores significativos ao nível de 95% de confiança. X1 = relação sólido:líquido; X2 = concentração de ácido sulfúrico; X3 = tempo de reação.
4.2.2 Fermentabilidade dos hidrolisados de bagaço de malte para produção de xilitol
A eficiência de hidrólise e a concentração de compostos tóxicos no hidrolisado não são
as duas únicas respostas que devem ser avaliadas em estudos para otimização das condições
de hidrólise. Em termos de aplicação prática, a fermentabilidade do hidrolisado obtido é
também muito importante e deve ser considerada. No presente trabalho, todos os hidrolisados
de bagaço de malte produzidos foram empregados como meio de fermentação para a
produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii. De uma forma geral, é esperado que
os hidrolisados apresentem uma boa fermentabilidade devido à presença de baixos níveis de
compostos tóxicos e também porque o bagaço de malte é um material que apresenta um
elevado teor de proteínas (15,25% p/p) que podem ser solubilizadas durante o procedimento
de hidrólise atuando como fonte de nitrogênio para os microrganismos. Confirmando esta
idéia, os resultados apresentados na Tabela 4.7 revelam que a levedura foi capaz de crescer e
produzir xilitol em todos os hidrolisados de bagaço de malte, mas os resultados de
fermentação variaram para cada um deles, mostrando que cada condição de hidrólise produziu
um hidrolisado com diferentes características.
O consumo de glicose pela levedura foi total em todos os meios utilizados, enquanto
que o consumo de xilose variou de 67 a 96,9%, dependendo do hidrolisado empregado
(Tabela 4.7). Por outro lado, não houve consumo de arabinose pelo microrganismo durante o
tempo de fermentação considerado (24 h).
81
Tabela 4.7 - Consumo de xilose, crescimento celular e produção de xilitol nos hidrolisados de bagaço de malte produzidos em reator, sob diferentes condições operacionais.
Níveis das variáveis utilizadas na hidrólisea
Resultados dos processos fermentativosbEnsaio
S:L
(g:g)
A
(mg/g)
T
(min)
So
(g/l)
Scons
(%)
X
(g/l)
P
(g/l)
YP/S
(g/g)
QP
(g/l.h)
YX/S
(g/g)
1 1:8 100 17 21,88 78,7 3,86 10,76 0,70 0,45 0,23 2 1:12 100 17 14,28 89,3 3,97 6,30 0,46 0,26 0,28 3 1:8 140 17 21,44 75,2 3,65 9,28 0,53 0,39 0,19 4 1:12 140 17 15,11 86,1 3,61 6,98 0,50 0,29 0,24 5 1:8 100 37 20,96 82,5 4,15 9,07 0,50 0,38 0,21 6 1:12 100 37 14,36 94,5 4,51 5,32 0,38 0,22 0,31 7 1:8 140 37 22,62 67,0 3,18 9,08 0,55 0,38 0,17 8 1:12 140 37 15,48 87,2 3,98 6,43 0,43 0,27 0,24 9 1:10 120 27 18,16 79,1 3,27 7,87 0,55 0,33 0,21 10 1:10 120 27 17,69 88,1 4,46 8,05 0,51 0,33 0,26 11 1:10 120 27 17,60 88,1 4,28 7,76 0,48 0,32 0,24 12 1:10 120 27 16,94 96,9 4,57 7,45 0,41 0,31 0,24
a S:L = relação sólido:líquido; A = concentração de ácido sulfúrico; T = tempo de reação. b So = concentração inicial de xilose; Scons = porcentagem de xilose consumida; X = concentração celular; P = concentração de xilitol; YP/S (g/g) = fator de rendimento em xilitol (gramas de xilitol produzido/ gramas de xilose consumida); Qp (g/l.h) = produtividade volumétrica em xilitol (concentração de xilitol formado/ tempo de fermentação); YX/S (g/g) = fator de rendimento em células (gramas de células formadas/ gramas de substrato (xilose + glicose) consumido).
O crescimento celular variou de 3,18 a 4,57 g/l, enquanto que a produção de xilitol
variou significativamente, de 5,32 a 10,76 g/l, dependendo do hidrolisado utilizado (Tabela
4.7). Como a produção de xilitol tende a aumentar com o aumento da concentração inicial de
xilose (MUSSATTO; ROBERTO, 2003; PARAJÓ; DOMINGUEZ; DOMINGUEZ, 1995)
estes resultados devem ser comparados em termos dos parâmetros fermentativos YP/S, QP e
YX/S. De uma forma geral, quando comparado com a fermentação de hidrolisados produzidos
a partir de outras matérias-primas lignocelulósicas, todos os hidrolisados obtidos a partir do
bagaço de malte apresentaram boa fermentabilidade. Parajó, Dominguez e Dominguez (1995)
obtiveram um YP/S de 0,38 g/g e QP de 0,055 g/l.h durante a fermentação do hidrolisado de
madeira contendo 17 g/l de xilose, suplementado com nutrientes. Cruz et al. (2000)
conseguiram atingir um YP/S de 0,66 g/g e QP de 0,41 g/l.h durante a fermentação do
hidrolisado de farelo de cevada suplementado ou não com nutrientes. No presente trabalho,
valores de YP/S e QP de até 0,70 g/g e 0,45 g/l.h, respectivamente, foram obtidos a partir do
hidrolisado de bagaço de malte contendo 21,9 g/l de xilose, não suplementado com nutrientes.
82
Devido às diferenças observadas nos resultados de fermentação dos hidrolisados de
bagaço de malte, uma análise estatística foi realizada para avaliar os efeitos das variáveis
operacionais empregadas no processo de hidrólise, nos valores de YP/S e QP obtidos. De
acordo com esta análise, a relação sólido:líquido foi a variável de maior influência em ambas
as respostas, YP/S e QP, apresentando um efeito negativo (Tabela 4.8). O tempo de reação
também apresentou significância estatística ao nível de 90% de confiança para QP, com um
efeito negativo. Estes resultados indicam que a produção de xilitol pela levedura Candida
guilliermondii foi favorecida em hidrolisados produzidos com a menor relação sólido:líquido
(1:8 g:g) e menor tempo de reação (17 minutos). A concentração de ácido não apresentou
efeito principal significativo para estas respostas, mas sua interação com o tempo de reação
(BC = +2,59) e com a relação sólido:líquido (AB = +4,54) foi significativa ao nível de 90%
de confiança para QP. O sinal positivo destas interações sugere que os valores de QP foram
maiores em hidrolisados produzidos com a menor concentração de ácido (100 mg/g de
matéria seca). A curvatura não foi significativa para ambas as respostas, YP/S e QP (Tabela
4.8), revelando que os valores destes parâmetros aumentaram linearmente quando os valores
das variáveis operacionais utilizadas nas hidrólises foram diminuídos.
É interessante notar que o hidrolisado produzido nas condições que favoreceram YP/S e
QP (condições do ensaio 1) foi o que apresentou a mais alta concentração de lignina solúvel
(Tabela 4.4). Em um trabalho realizado por Mussatto e Roberto (2004b) sobre a produção de
xilitol a partir de hidrolisado de palha de arroz, os mais altos valores dos parâmetros
fermentativos também não foram obtidos a partir do hidrolisado que continha a menor
concentração de lignina solúvel. Isto sugere que os hidrolisados que são mais tóxicos aos
microrganismos não são aqueles que apresentam as maiores concentrações de lignina solúvel.
Provavelmente a lignina contém compostos que não interferem no metabolismo microbiano,
ou ainda que possam favorecer o processo fermentativo, apresentando algum efeito
estimulante. Tais compostos poderiam ter sido solubilizados em maior quantidade no
hidrolisado produzido nas condições do ensaio 1. Como a lignina é formada por uma série de
componentes aromáticos e fenólicos, tais como hidroquinona, álcool vanílico, ácidos ferúlico,
p-cumárico, siríngico, vanílico, entre outros (ZALDIVAR; MARTINEZ; INGRAM, 2000),
um estudo sobre o efeito de cada um destes na bioconversão de xilose a xilitol poderia ser útil
para explicar os resultados aqui observados.
83
Tabela 4.8 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student para o fator de rendimento (YP/S) e produtividade volumétrica em xilitol (QP) obtidos durante a fermentação do hidrolisado de bagaço de malte.
YP/S (g/g) QP (g/l.h) Variáveis independentes e interações EE E t EE E t
Média 0,506 ±0,022 22,65* 0,330 ±0,004 85,65* Curvatura -0,037 ±0,077 0,48 -0,015 ±0,013 1,12 X1 -0,127 ±0,045 2,85* -0,140 ±0,008 18,17* X2 -0,007 ±0,045 0,17 0,005 ±0,008 0,65 X3 -0,082 ±0,045 1,84 -0,035 ±0,008 4,54* X1X2 0,052 ±0,045 1,17 0,035 ±0,008 4,54* X1X3 0,007 ±0,045 0,17 0,005 ±0,008 0,65 X2X3 0,057 ±0,045 1,29 0,020 ±0,008 2,59*
* valores significativos ao nível de 90% de confiança. X1 = relação sólido:líquido; X2 = concentração de ácido sulfúrico; X3 = tempo de reação.
O fator de rendimento em células, YX/S, também foi avaliado durante a fermentação dos
hidrolisados de bagaço de malte e apresentou diferenças significativas em função do meio
utilizado (Tabela 4.7). A análise estatística para esta resposta revelou que os valores de YX/S
foram afetados principalmente pela relação sólido:líquido e pela concentração de ácido,
variáveis que apresentaram efeitos positivo e negativo, respectivamente (Tabela 4.9). Isto
significa que os valores de YX/S foram favorecidos em hidrolisados produzidos com a mais
alta relação sólido:líquido e a mais baixa concentração de ácido.
Tabela 4.9 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student para o fator de rendimento em células (YX/S) obtido durante a fermentação do hidrolisado de bagaço de malte.
YX/S (g/g) Variáveis independentes e interações EE E t
Média 0,234 ±0,006 35,50* Curvatura 0,007 ±0,023 0,33 X1 0,067 ±0,013 5,12* X2 -0,047 ±0,013 3,61* X3 -0,002 ±0,013 0,19 X1X2 -0,007 ±0,013 0,57 X1X3 0,017 ±0,013 1,33 X2X3 -0,007 ±0,013 0,57
* valores significativos ao nível de 90% de confiança. X1 = relação sólido:líquido; X2 = concentração de ácido sulfúrico; X3 = tempo de reação.
84
De uma forma geral, a análise estatística dos parâmetros fermentativos revelou que os
hidrolisados de bagaço de malte produzidos a partir de uma baixa relação sólido:líquido,
favoreceram a formação de produto (os valores de YP/S foram aumentados); enquanto que
aqueles obtidos a partir de uma alta relação sólido:líquido favoreceram o crescimento celular
(os valores de YX/S foram aumentados). Em outras palavras, com o aumento na relação
sólido:líquido foram produzidos hidrolisados que proporcionaram um desvio no metabolismo
microbiano, da formação de produto para o crescimento celular.
Com base nos resultados da análise estatística, a melhor condição para hidrólise do
bagaço de malte com ácido sulfúrico diluído foi estabelecida como sendo baseada no uso de
uma relação sólido:líquido de 1:8 g:g, 100 mg de ácido sulfúrico/g de matéria seca e um
tempo de reação de 17 minutos. Vale a pena ressaltar que, além de proporcionar os melhores
resultados, esta condição foi também a mais economicamente viável dentre todas as que
foram avaliadas, uma vez que necessitou de uma menor quantidade de ácido e um tempo de
reação mais curto, requerendo, portanto, um menor consumo de energia.
4.3 AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO CINÉTICO DA LEVEDURA Candida
guilliermondii DURANTE A PRODUÇÃO DE XILITOL A PARTIR DO HIDROLISADO
HEMICELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE DILUÍDO E CONCENTRADO
Normalmente os hidrolisados hemicelulósicos não são utilizados como meio de
fermentação para produção de xilitol na forma em que são obtidos, pois o baixo teor de xilose
presente (≅ 15-20 g/l), não é considerado favorável para que o processo de bioconversão
ocorra com elevada eficiência (FELIPE et al., 1993; PARAJÓ; DOMINGUEZ;
DOMINGUEZ, 1995). Por este motivo, primeiramente os hidrolisados são submetidos a um
processo de concentração para aumentar o teor de xilose a valores acima de 50 g/l. Porém,
durante esta etapa, a composição química do hidrolisado sofre algumas modificações que
podem influenciar no desempenho do microrganismo durante a fermentação. Nesta fase do
trabalho, foi então avaliado o comportamento cinético da levedura Candida guilliermondii
durante a produção de xilitol a partir do hidrolisado de bagaço de malte diluído e concentrado.
85
4.3.1 Composição química dos hidrolisados utilizados como meio de fermentação
O hidrolisado de bagaço de malte utilizado nesta etapa foi produzido nas condições de
hidrólise previamente otimizadas. A composição química deste hidrolisado na forma original
(diluído) e concentrado, está apresentada na Tabela 4.10. Nota-se que durante a etapa de
concentração do hidrolisado, o teor dos açúcares foi aumentado proporcionalmente ao fator de
concentração utilizado (aproximadamente 4 vezes), mostrando que não houve degradação de
açúcares durante a realização deste processo. As concentrações de ácido acético e compostos
fenólicos também foram aumentadas, mas não proporcionalmente ao fator de concentração
empregado, sugerindo que estes compostos podem ter sido parcialmente volatilizados ou
degradados durante a etapa de concentração do hidrolisado. O mesmo pode ter ocorrido para o
hidroximetilfurfural, cujo teor no hidrolisado não foi alterado após o processo de
concentração. Por outro lado, o teor de furfural foi diminuído significativamente, o que é
justificável uma vez que este composto é volátil a 70ºC sob vácuo (PERRY; GREEN, 1997).
Tabela 4.10 - Composição química do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte nas formas diluída (original) e concentrada.
Concentração no hidrolisado de bagaço de malte (g/l) Componentes
Diluído Concentrado
Glicose 1,51 6,08 Xilose 22,97 88,62 Arabinose 10,24 40,70 Ácido acético 1,25 3,83 Furfural 0,66 0,01 Hidroximetilfurfural 0,10 0,10 Compostos fenólicos 4,01 10,38
4.3.2 Avaliação do crescimento celular da levedura Candida guilliermondii durante a
fermentação dos hidrolisados de bagaço de malte
O perfil do crescimento celular da levedura Candida guilliermondii nos hidrolisados de
bagaço de malte diluído e concentrado, está apresentado na Figura 4.3. Visando comparar o
desempenho da levedura em um meio ausente em compostos tóxicos, alguns ensaios foram
também realizados em meio semidefinido contendo as mesmas concentrações de açúcares
86
presentes nos hidrolisados (diluído e concentrado). Observa-se que o crescimento da levedura
foi similar em ambos os meios contendo 20 g/l de xilose, porém, em meios concentrados
(85 g/l de xilose) o crescimento foi maior em meio semidefinido do que em hidrolisado. Estes
resultados sugerem que, além de monossacarídeos, o hidrolisado hemicelulósico de bagaço de
malte apresenta em sua composição alguns compostos que podem estar atuando como fonte
de nitrogênio para o microrganismo, favorecendo seu crescimento. No entanto, quando o
hidrolisado foi concentrado, o aumento na concentração de alguns compostos, provavelmente
os que são tóxicos para o microrganismo, afetou o crescimento celular.
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 1000
1
2
3
4
5
6
MSD diluído hidrolisado diluído MSD concentrado hidrolisado concentrado
Cél
ulas
(g/l)
Tempo de fermentação (h)
Figura 4.3 - Crescimento da levedura Candida guilliermondii em hidrolisado hemicelulósico de
bagaço de malte e em meio semidefinido (MSD), contendo 20 g/l de xilose (diluído) ou 85 g/l de xilose (concentrado).
Embora o crescimento celular tenha sido menor em hidrolisado concentrado do que em
meio semidefinido, o fator de conversão de substrato em células (YX/S) foi maior a partir do
hidrolisado concentrado (Tabela 4.11). Este resultado revela que o crescimento celular foi
menor em hidrolisado concentrado por que a capacidade da levedura em consumir xilose foi
afetada neste meio, o que pode ser verificado através dos valores de velocidade específica de
consumo de xilose (QS) apresentados na Tabela 4.11. A Figura 4.4 mostra claramente que em
meios concentrados, o consumo de xilose após 96 h de fermentação foi total em meio
semidefinido, enquanto que em hidrolisado, 61% da xilose presente no início da fermentação
ainda não havia sido consumida. Nos meios de fermentação diluídos, o consumo de xilose e o
87
crescimento celular ocorreram de forma similar, sugerindo que o metabolismo da levedura
não foi afetado nestes meios.
Tabela 4.11 - Parâmetros fermentativos obtidos durante o cultivo da levedura Candida guilliermondii em hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte e em meio semidefinido.
Parâmetros fermentativosbMeio de fermentaçãoa
YX/S(g/g)
YP/X(g/g)
YP/S(g/g)
QP(g/l.h)
QS(g/l.h)
η (%)
Semidefinido diluído 0,14 2,59 0,54 0,37 0,68 58,9 Hidrolisado diluído 0,20 2,34 0,65 0,38 0,62 70,9 Semidefinido concentrado 0,05 10,21 0,76 0,66 1,08 82,9 Hidrolisado concentrado 0,10 2,28 0,37 0,13 0,38 40,3
a Meios diluídos: 20 g/l de xilose; Meios concentrados: 85 g/l de xilose. b YX/S = fator de conversão de substrato (xilose + glicose) em células; YP/X = fator de rendimento de xilitol por massa celular; YP/S = fator de rendimento de xilitol por xilose consumida; QP = produtividade volumétrica em xilitol; QS = velocidade específica de consumo de xilose; η = eficiência de produção de xilitol (% do valor máximo teórico = 0,917 g/g).
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
MSD diluído hidrolisado diluído MSD concentrado hidrolisado concentrado
Xilo
se (g
/l)
Tempo de fermentação (h)
Figura 4.4 - Consumo de xilose pela levedura Candida guilliermondii em hidrolisado hemicelulósico
de bagaço de malte e em meio semidefinido (MSD), contendo 20 g/l de xilose (diluído) ou 85 g/l de xilose (concentrado).
88
4.3.3 Avaliação da produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii durante a
fermentação dos hidrolisados de bagaço de malte
A produção de xilitol em meios diluídos e concentrados foi inicialmente avaliada em
meios semidefinidos simulando a concentração de xilose presente nos hidrolisados de bagaço
de malte. Nestes meios, o aumento da concentração inicial de xilose, de 20 para 85 g/l
favoreceu o fator de rendimento e a produtividade volumétrica em xilitol em 40% e 78%,
respectivamente (Tabela 4.11). De fato, baixas concentrações de substrato proporcionam
menores rendimentos, pois parte da fonte de carbono é utilizada para crescimento celular,
enquanto que em altas concentrações de xilose a produção de xilitol passa a ser favorecida.
O efeito positivo do aumento da concentração de xilose na produção de xilitol não pôde
ser observado em meios hidrolisado, provavelmente devido a alta concentração de compostos
tóxicos presentes (Figura 4.5). Os valores de fator de rendimento de xilitol por massa celular
(YP/X) mostram que a capacidade da levedura em converter xilose a xilitol foi fortemente
afetada em hidrolisado concentrado, uma vez que o valor deste parâmetro foi 4,5 vezes menor
em hidrolisado do que em meio semidefinido (Tabela 4.11). Logo se pode concluir que, assim
como foi observado para o crescimento celular, o aumento da concentração de compostos
tóxicos no hidrolisado também afetou a produção de xilitol e conseqüentemente interferiu nos
valores dos parâmetros fermentativos YP/S, QP e η. Os valores destes parâmetros foram
inclusive menores do que os obtidos em hidrolisado diluído (Tabela 4.11). Uma forte inibição
no desempenho da levedura Candida guilliermondii também foi observada durante a
produção de xilitol a partir de hidrolisado de palha de arroz concentrado (90 g/l de xilose),
proporcionando baixos valores de fator de rendimento (0,49 g/g) e produtividade volumétrica
(0,32 g/l.h) (MUSSATTO; SANTOS; ROBERTO, 2004).
É importante ressaltar que no presente trabalho, os hidrolisados de bagaço de malte
(diluído e concentrado) foram utilizados como meio de fermentação sem ser submetidos a
nenhum tratamento prévio para reduzir a concentração dos compostos tóxicos presentes.
Provavelmente os baixos valores de fator de rendimento e produtividade volumétrica obtidos
a partir do hidrolisado concentrado podem ser melhorados se o hidrolisado for tratado antes
de ser utilizado como meio de fermentação. Tratamentos de destoxificação de hidrolisados
por ajuste de pH (ROBERTO et al., 1991a), uso de carvão ativado (DOMINGUEZ; GONG;
TSAO, 1996; MUSSATTO; SANTOS; ROBERTO, 2004) ou resinas de troca iônica
89
(DOMINGUEZ et al., 1997; MANCILHA; KARIM, 2003) têm sido considerados eficientes
para reduzir a concentração de compostos tóxicos, melhorando o desempenho da levedura e
favorecendo a produção de xilitol, como conseqüência.
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
0
10
20
30
40
50
60
MSD diluído hidrolisado diluído MSD concentrado hidrolisado concentrado
Xili
tol (
g/l)
Tempo de fermentação (h)
Figura 4.5 - Produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii em hidrolisado hemicelulósico
de bagaço de malte e em meio semidefinido (MSD), contendo 20 g/l de xilose (diluído) ou 85 g/l de xilose (concentrado).
4.3.4 Efeito da arabinose na produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii
A bioconversão de xilose a xilitol a partir de hidrolisados hemicelulósicos pode ser
afetada pela presença e concentração de outros açúcares no meio de fermentação. De acordo
com Walther, Hensirisak e Agblevor (2001), elevadas concentrações de açúcares podem
causar estresse osmótico, inibição da indução da enzima xilose redutase ou ainda um desvio
da produção de xilitol para a produção de etanol.
O hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte apresenta uma elevada concentração
de arabinose, quando comparado aos hidrolisados obtidos a partir de outras matérias-primas
lignocelulósicas. Para avaliar a influência deste açúcar na conversão de xilose a xilitol pela
levedura Candida guilliermondii, foram realizados alguns ensaios em meios semidefinidos
preparados com a mesma concentração de glicose e xilose presente no hidrolisado de bagaço
de malte concentrado, porém, com e sem a adição de arabinose. Os resultados obtidos
revelaram um consumo seqüencial dos açúcares xilose e arabinose durante a fermentação,
sendo que a arabinose apenas foi consumida quando toda a xilose presente no meio já havia
90
sido esgotada. No meio que não continha arabinose, a levedura consumiu xilitol ao término da
xilose. Este fato explica a diferença observada na concentração de xilitol obtida ao final das
fermentações (Figura 4.6). Apesar de não ter sido consumida pela levedura durante a
fermentação de xilose, a presença de arabinose no meio de fermentação não interferiu no
crescimento celular, consumo de xilose e na produção de xilitol, conforme pode ser observado
na Figura 4.6.
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
0
15
30
45
60
75
90
Tempo de fermentação (h)
Xilo
se e
Xili
tol (
g/l)
1
2
3
4
5
6
7
Células (g/l)
Figura 4.6 - Desempenho da levedura Candida guilliermondii em meio semidefinido preparado com
(símbolos abertos) ou sem (símbolos fechados) arabinose. Crescimento celular (, ), consumo de xilose (, ) e produção de xilitol (, ∇).
Ao final da fermentação o xilitol foi o composto presente em maior concentração no
meio (cerca de 60 g/l), seguido pela arabinose, também presente em elevada concentração
(40 g/l). Como a presença de arabinose na concentração existente no hidrolisado
hemicelulósico de bagaço de malte não interferiu na produção de xilitol pela levedura
Candida guilliermondii, uma alternativa interessante que poderia ser avaliada seria a
realização de um processo fermentativo em dois estágios a partir deste hidrolisado, visando a
produção de xilitol a partir da xilose e arabitol a partir da arabinose. Desta forma poderiam ser
obtidos dois compostos de elevado valor comercial. A produção de arabitol tem sido pouco
estudada, mas as leveduras Candida entomaea e Pichia guilliermondii são consideradas boas
produtoras deste composto (SAHA; BOTHAST, 1996).
91
4.4 INFLUÊNCIA DOS COMPOSTOS TÓXICOS PRESENTES NO HIDROLISADO
HEMICELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE NA BIOCONVERSÃO DE XILOSE A
XILITOL PELA LEVEDURA Candida guilliermondii
4.4.1 Composição química dos hidrolisados de bagaço de malte
Como o aumento na concentração inicial de xilose é importante para se obter uma
elevada produção de xilitol e, considerando que em hidrolisado hemicelulósico de bagaço de
malte concentrado o desempenho da fermentação pela levedura Candida guilliermondii foi
afetado, realizou-se então nesta etapa um estudo para avaliar o efeito dos compostos tóxicos
presentes neste hidrolisado na bioconversão de xilose a xilitol. Vários meios de fermentação
foram preparados a partir do hidrolisado de bagaço de malte diluído de forma que
apresentassem diferentes concentrações de compostos tóxicos, sendo em seguida utilizados
para a produção de xilitol. A composição destes meios está apresentada na Tabela 4.12.
Tabela 4.12 - Composição dos hidrolisados de bagaço de malte empregados como meio de fermentação para produção de xilitol.
Concentração no hidrolisado (g/l) Composto
HDa HDSb HCc HCTd HCDSe
Glicose 1,51 6,00 6,08 6,02 5,93 Xilose 22,97 84,21 88,62 86,94 86,52 Arabinose 10,24 38,75 40,70 39,96 39,77 Furfural 0,66 0,61 0,01 0,00 0,00 Hidroximetilfurfural 0,10 0,08 0,10 0,01 nd Ácido acético 1,25 1,22 3,83 1,53 1,05 Fenólicos totais 4,01 3,93 10,38 5,38 3,34
a HD = hidrolisado diluído; b HDS = hidrolisado diluído suplementado com açúcares; c HC = hidrolisado concentrado; d HCT = hidrolisado concentrado tratado com carvão ativado; e HCDS = hidrolisado concentrado, diluído com água e suplementado com açúcares. nd = não detectado.
Conforme mencionado anteriormente, durante a etapa de concentração do hidrolisado
alguns compostos tiveram seus teores aumentados enquanto que outros, por apresentarem
certa volatilidade nas condições operacionais utilizadas, foram parcialmente removidos ou
degradados. O tratamento do hidrolisado concentrado com carvão ativado (HCT) reduziu a
concentração dos compostos tóxicos presentes e praticamente não interferiu na concentração
dos açúcares. Furfural e hidroximetilfurfural foram praticamente eliminados do hidrolisado
92
através deste tratamento, enquanto que a concentração de compostos fenólicos e ácido acético
foi reduzida em 48% e 60%, respectivamente (Tabela 4.12). Uma concentração ainda mais
baixa destes compostos foi obtida quando o hidrolisado concentrado foi diluído e
posteriormente suplementado com açúcares (HCDS). Em HCDS, a concentração de
compostos fenólicos e ácido acético foi 68% e 72% menor do que em hidrolisado
concentrado, sendo similar à concentração encontrada nos hidrolisados diluídos (original, HD,
e suplementado com açúcares, HDS). No entanto, a presença de furfural e hidroximetilfurfural
nos hidrolisados diluídos constitui a principal diferença entre estes e o HCDS.
4.4.2 Fermentação dos hidrolisados de bagaço de malte contendo diferentes
concentrações de compostos tóxicos
A fermentação para produção de xilitol a partir do hidrolisado diluído (HD)
proporcionou um valor de YX/S (fator de rendimento de células por substrato consumido) mais
elevado do que os obtidos nas fermentações dos outros hidrolisados (Tabela 4.13). De fato,
Felipe et al. (1993) e Parajó, Dominguez e Dominguez (1995) reportaram que em meios de
fermentação contendo concentrações de xilose inferiores a 50 g/l o comportamento cinético
da levedura é desviado da produção de xilitol para o aumento da massa celular. No entanto,
quando o hidrolisado concentrado (HC) foi utilizado como meio de fermentação, a produção
de xilitol não foi favorecida, mas ao contrário, observa-se na Tabela 4.13 que os valores dos
parâmetros fermentativos YP/S e QP foram os mais baixos dentre todos os meios avaliados.
Porém, a capacidade produtiva da levedura (YP/X) em HC foi a mesma que em HD. Isto
demonstra que o aumento da concentração de compostos tóxicos no meio interferiu
principalmente no consumo de xilose pela levedura, uma vez que a xilose consumida foi
convertida em xilitol com a mesma eficiência que em hidrolisado diluído.
O consumo de glicose não foi afetado pelo aumento da concentração de compostos
tóxicos no hidrolisado, uma vez que este açúcar foi totalmente consumido pela levedura logo
no início de todas as fermentações. Por outro lado, a arabinose não foi consumida em nenhum
dos meios avaliados, durante o tempo de fermentação considerado.
93
Tabela 4.13 - Parâmetros fermentativos e concentração final de células obtidas durante a produção de xilitol a partir dos hidrolisados de bagaço de malte.
Parâmetros fermentativosbHidrolisadoa
YP/S QP YX/S YP/X η X
HD 0,65 0,38 0,20 2,34 70,88 4,91 HDS 0,79 0,86 0,06 10,00 86,15 6,23 HC 0,37 0,13 0,10 2,28 40,35 5,28 HCT 0,55 0,18 0,13 2,83 59,98 6,02 HCDS 0,67 0,78 0,07 7,60 73,06 7,37
a HD = hidrolisado diluído; HDS = hidrolisado diluído suplementado com açúcares; HC = hidrolisado concentrado; HCT = hidrolisado concentrado tratado com carvão ativado; HCDS = hidrolisado concentrado, diluído com água e suplementado com açúcares. b YP/S = fator de rendimento de xilitol por xilose consumida (g/g); QP = produtividade volumétrica em xilitol (g/l.h); YX/S = fator de rendimento de células por substrato (xilose + glicose) consumido (g/g); YP/X = fator de rendimento de xilitol por massa celular (g/g); η = eficiência de produção de xilitol (% do valor máximo teórico = 0,917 g/g); X = concentração total de células ao final da fermentação.
Analisando os hidrolisados com elevada concentração de açúcares, observa-se na Figura
4.7 que a diferença na concentração de compostos tóxicos influenciou tanto no consumo de
xilose como na produção de xilitol. Os hidrolisados HC e HCT apresentaram perfis muito
similares em relação ao consumo de xilose (Figura 4.7A), sugerindo que apesar da elevada
remoção de compostos tóxicos (cerca de 50%), o tratamento do hidrolisado com carvão
ativado não favoreceu o consumo desta pentose. Entretanto, a produção de xilitol (Figura
4.7B) foi levemente melhorada a partir de hidrolisado tratado, refletindo também em um
aumento no valor dos parâmetros fermentativos (Tabela 4.13). Estes resultados sugerem que a
produção de xilitol a partir do hidrolisado de bagaço de malte é favorecida quando a
concentração dos compostos tóxicos presentes é diminuída. Porém, é importante destacar que
as condições empregadas neste trabalho para tratamento do hidrolisado com carvão ativado,
foram otimizadas para o hidrolisado hemicelulósico de palha de arroz (MUSSATTO;
ROBERTO, 2004b). O hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte tratado nestas
condições não proporcionou uma melhora significativa na produção de xilitol, como foi
observada em hidrolisado de palha de arroz, o que permite concluir que as condições de
tratamento do hidrolisado devem ser otimizadas para cada matéria-prima utilizada.
O consumo de xilose pela levedura Candida guilliermondii foi mais rápido em HDS e
HCDS, do que em HC ou HCT (Figura 4.7A). Além disso, HDS e HCDS também
proporcionaram uma maior concentração de xilitol ao final do processo (Figura 4.7B). Dentre
estes, a máxima produção de xilitol ocorreu em HDS (62,3 g/l em 72 h de fermentação),
94
correspondendo a um fator de rendimento de 0,79 g/g e uma produtividade volumétrica de
0,86 g/l.h. Apesar de ambos hidrolisados terem apresentado similares rendimentos de célula
por substrato consumido (YX/S), os valores de rendimento de xilitol por massa celular (YP/X)
confirmam que a capacidade produtiva da levedura foi maior em HDS do que em HCDS
(Tabela 4.13). Analisando a composição destes dois hidrolisados (Tabela 4.12) nota-se que a
principal diferença entre eles está no teor de furfural, composto que estava presente em HDS e
ausente em HCDS. Tal fato sugere que a presença deste composto no hidrolisado (0,61 g/l),
além de não ter inibido o processo fermentativo, favoreceu a produção de xilitol. Ojamo,
Ylinen e Linko (1988) relataram um efeito benéfico de baixas concentrações de furfural
(<0,6 g/l) na produção de xilitol. Além disso, vários autores têm reportado que o furfural
somente é tóxico para os microrganismos quando em concentrações maiores que 1 g/l
(MARTINEZ et al., 2000; PARAJÓ; DOMINGUEZ; DOMINGUEZ, 1997; ROBERTO et
al., 1991b).
0 15 30 45 60 75 90 105
0
15
30
45
60
75
90
Xilos
e (g/l
)
Tempo de fermentação (h)
0 2 4 6 8 10
0
2
4
6
8
10
A
0 15 30 45 60 75 90 105
0
10
20
30
40
50
60
70
Xilito
l (g/
l)
Tempo de fermentação (h)
0 2 4 6 8 10
0
2
4
6
8
10
B
Figura 4.7 - Consumo de xilose (A) e produção de xilitol (B) pela levedura Candida guilliermondii em hidrolisado de bagaço de malte: HDS (), HC (), HCT ( ) e HCDS ().
Uma outra possível explicação para a diferença observada durante a fermentação de
HDS e HCDS (Tabela 4.13), seria em função da concentração individual de alguns compostos
fenólicos. Os compostos fenólicos totais compreendem uma série de compostos provenientes
da degradação parcial da lignina durante o processo de hidrólise ácida, os quais incluem
vanilina, seringaldeído, ácidos ferúlico, p-cumárico, siríngico, entre outros. Individualmente,
95
estes compostos apresentam diferentes graus de toxicidade para os microrganismos. Por
exemplo, Cortez (2005) observou que concentrações de vanilina de até 2 g/l favoreceram a
produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii, enquanto que o seringaldeído na
mesma concentração foi fortemente tóxico a este microrganismo. No presente trabalho foi
constatado a presença de vanilina, seringaldeído, ácido ferúlico e ácido siríngico na
composição dos hidrolisados de bagaço de malte (Tabela 4.14). Quando o hidrolisado foi
concentrado, a concentração de seringaldeído foi aumentada em 3,4 vezes, enquanto que a
concentração de vanilina, que não é considerada tóxica ao microrganismo, foi aumentada em
2,4 vezes. É possível então que durante o processo de concentração do hidrolisado, compostos
fenólicos de maior toxicidade ao microrganismo (não identificados neste trabalho) tenham
tido suas concentrações aumentadas em maior proporção do que os compostos fenólicos de
menor toxicidade. Isto explicaria a maior toxicidade do HCDS quando comparado ao HDS,
apesar de ambos apresentarem um teor similar de compostos fenólicos.
Tabela 4.14 - Concentração de alguns compostos fenólicos identificados nos hidrolisados de bagaço de malte.
Concentração no hidrolisado (g/l) Composto
HDa HDSb HCc HCTd HCDSe
Vanilina 0,0302 0,0291 0,0719 0,0359 0,0218 Seringaldeído 0,1776 0,1753 0,6127 0,3163 0,1932 Ácido ferúlico 0,0598 0,0595 0,2246 0,0898 0,0709 Ácido siríngico nd nd 0,0435 0,0165 0,0122
a HD = hidrolisado diluído; b HDS = hidrolisado diluído suplementado com açúcares; c HC = hidrolisado concentrado; d HCT = hidrolisado concentrado tratado com carvão ativado; e HCDS = hidrolisado concentrado, diluído com água e suplementado com açúcares. nd = não detectado.
Comparando a fermentação do HCT com a do HDS observa-se que houve uma grande
diferença nos resultados do processo fermentativo, as quais refletiram principalmente em um
aumento de 4,8 vezes em QP (de 0,18 para 0,86 g/l.h, respectivamente), e de 3,5 vezes em
YP/X (de 2,83 para 10,0 g/g, respectivamente). Analisando a composição destes hidrolisados
(Tabela 4.12), a diferença observada em suas fermentabilidades pode ser atribuída a maior
concentração de compostos fenólicos totais em HCT. De fato, dentre os compostos tóxicos
identificados no hidrolisado de bagaço de malte, os compostos fenólicos parecem ser os mais
tóxicos ao microrganismo devido a elevada concentração em que se encontram presentes. Por
outro lado, como o ácido acético em concentrações maiores que 3 g/l é tóxico para a levedura
96
Candida guilliermondii (FELIPE et al., 1995), é provável que este ácido também tenha
influenciado na elevada toxicidade observada para o hidrolisado concentrado. Porém, deve-se
considerar também que, apesar de que o ácido acético estava presente nos meios HCT, HDS e
HCDS em concentrações consideradas não tóxicas para o metabolismo do microrganismo, a
presença de compostos fenólicos nestes meios pode potencializar a toxicidade do ácido
acético como conseqüência de um efeito sinergístico entre estes compostos.
4.5 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ALCALINA DO BAGAÇO DE
MALTE PRÉ-TRATADO PARA PRODUÇÃO DE POLPA CELULÓSICA
4.5.1 Características do bagaço de malte utilizado nos experimentos
Esta etapa do trabalho teve como objetivo otimizar as condições de hidrólise alcalina do
bagaço de malte visando a obtenção de uma polpa rica em celulose. Nestes ensaios, foi
utilizado como matéria-prima o material sólido resultante após a remoção da hemicelulose
(celulignina) nas condições otimizadas de hidrólise ácida. Segundo vários autores, a remoção
desta fração prévia a hidrólise alcalina é de grande interesse, por várias razões: 1. a
hemicelulose é também atacada durante o processo de hidrólise alcalina, contribuindo,
portanto, para um maior consumo do reagente químico (FENGEL; WEGENER, 1989;
GRACE; LEOPOLD; MALCOLM, 1996; ZHAO et al., 2002); 2. a remoção da hemicelulose
aumenta a porosidade do material, facilitando a difusão e impregnação do hidróxido de sódio
na etapa posterior, melhorando desta forma a deslignificação (remoção da lignina) e a
uniformidade da polpa obtida (ZHAO et al., 2002); 3. a hemicelulose é uma valiosa fonte de
xilose, açúcar que pode ser utilizado para obtenção de produtos de valor agregado, tais como
xilitol (MUSSATTO; ROBERTO, 2004b) ou etanol (FERRARI et al., 2004). Logo, com a
dissolução desta fração no licor alcalino, potenciais aplicações para o material lignocelulósico
seriam perdidas.
Análises da composição química do bagaço de malte antes e após o processo de
hidrólise ácida foram realizadas com o objetivo de monitorar o rendimento de biomassa
recuperada, bem como as perdas de celulose, hemicelulose e lignina ocorridas (Tabela 4.15).
De acordo com esta análise, o rendimento de biomassa recuperada após o pré-tratamento
ácido do material foi da ordem de 48,55% (p/p). A hemicelulose foi a principal fração
97
removida, restando 3,83 g a partir de cada 28,4 g presente no material original. Por outro lado,
a estrutura da celulose permaneceu praticamente inalterada, uma vez que foi observada uma
redução de apenas 0,3 g (de 16,8 g para 16,5 g) nesta fração após o pré-tratamento. A
porcentagem de lignina solubilizada neste estágio (14% p/p) foi maior do que a porcentagem
de celulose solubilizada, porém muito menor do que o valor observado para a hemicelulose.
Isto já era esperado, pois segundo McMillan (1994), a celulose e a lignina são mais resistentes
ao ataque com ácidos diluídos do que a hemicelulose, embora uma pequena parte da lignina
(aproximadamente 10% p/p) possa ser solubilizada em meio ácido. Uma elevada remoção,
similar àquela obtida para a hemicelulose (cerca de 85% p/p), foi observada também para a
fração restante do material (denominada por “outros”, correspondente a proteínas, extrativos e
cinzas) restando apenas 4,32 g a partir de cada 27 g tratadas. Devido à elevada remoção destas
duas frações a partir do bagaço de malte original, o resíduo sólido obtido tornou-se
enriquecido em celulose e lignina, conforme pode ser observado em sua composição química,
apresentada na Tabela 4.15.
Tabela 4.15 - Composição química do bagaço de malte nas formas original (BO) e pré-tratado com ácido sulfúrico diluído (BPT), massa recuperada e perda de cada fração após o pré-tratamento ácido.
Composição (g/100 g) Fração
BO BPT
Massa recuperadaa
(g)
Perdas
(% p/p)
Celulose 16,8 34,0 16,50 1,80 Hemicelulose 28,4 7,9 3,83 86,50 Lignina 27,8 49,2 23,90 14,00 Outrosb 27,0 8,9 4,32 84,00 Total 100 100 48,55 51,45
a Massa recuperada a partir de 100 g do bagaço original, calculada pela porcentagem de cada fração em 48,55 g do material pré-tratado (massa total recuperada após o pré-tratamento). b Outros compostos incluem cinzas, proteínas e extrativos.
4.5.2 Hidrólise alcalina do bagaço de malte pré-tratado
O principal objetivo da polpação química é liberar as fibras de celulose do material
através da deslignificação, sem degradar ou remover os principais polissacarídeos da parede
celular. No entanto, o processo de hidrólise alcalina não é totalmente seletivo para a lignina, e
os carboidratos, incluindo a celulose, também podem ser degradados (FENGEL; WEGENER,
98
1989; GRACE; LEOPOLD; MALCOLM, 1996). No presente trabalho, o meio reacional foi
imediatamente resfriado em banho de gelo ao término da reação, com o objetivo de impedir a
hidrólise alcalina e a reação de “peeling” da celulose, as quais devem ser evitadas por dois
motivos: 1. a hidrólise alcalina pode romper a cadeia polimérica da celulose, diminuindo
drasticamente seu tamanho (BERGGREN et al., 2003; KNILL; KENNEDY, 2003); 2. a
reação de “peeling” promove a remoção das unidades de açúcares redutores finais da cadeia
polissacarídica, o que também é indesejável (BERGGREN et al., 2003; GRACE; LEOPOLD;
MALCOLM, 1996; KNILL; KENNEDY, 2003). Mesmo tomando este cuidado, a celulose
pode ser parcialmente degradada sob condições severas de reação. Logo, a realização de
estudos que estabeleçam as melhores condições de polpação é necessária para minimizar a
degradação da celulose, maximizando a solubilização da lignina durante a hidrólise alcalina.
No presente trabalho, um planejamento experimental foi proposto para avaliar o efeito
das variáveis utilizadas na hidrólise alcalina do bagaço de malte e estabelecer as melhores
condições para realização deste processo. A composição química das polpas obtidas para cada
condição de hidrólise avaliada está apresentada na Tabela 4.16. Observa-se nesta tabela que o
teor de celulose nas polpas variou fortemente dependendo da condição de hidrólise utilizada
(de 43,6% p/p no ensaio 5, a 72,1% p/p no ensaio 8) e, embora a maior parte dos tratamentos
tenha promovido perdas insignificantes desta fração (< 1,8% p/p), perdas de até 23,3% p/p no
teor de celulose foram observadas durante o tratamento alcalino. A Tabela 4.16 mostra
também que todas as polpas obtidas apresentavam um resíduo de hemicelulose, que variou de
5,6 a 10,7% p/p. Durante o tratamento alcalino do talo de milho, palha de centeio e palha de
arroz, Xiao, Sun e Sun (2001) também obtiveram polpas com resíduos de hemicelulose
correspondentes a 7,7, 9,9 e 5,0% p/p, respectivamente.
Além de um resíduo de hemicelulose, todas as polpas produzidas a partir do bagaço de
malte também continham um resíduo de lignina, que variou de 10,4% p/p (ensaio 8) a
28,5% p/p (ensaio 1) (Tabela 4.16). De fato, resíduos de hemicelulose e lignina podem ser
encontrados em polpas obtidas por tratamento alcalino porque parte destas frações encontra-se
fortemente ligada à celulose, sendo, portanto, muito resistentes ao processo de hidrólise. De
acordo com McKinney (citado por GRACE; LEOPOLD; MALCOLM, 1996) algumas
pentosanas são resistentes ao tratamento alcalino porque durante este processo ocorre uma
reação de transglicosilação, onde parte da hemicelulose que é quimicamente ligada à lignina
por ligações glicosídicas passa a formar ligações glicosídicas com a celulose. Por outro lado, a
dificuldade em remover os últimos traços de lignina durante a reação com NaOH pode ser
99
explicada de duas formas: 1. uma pequena fração da lignina é fortemente ligada aos
carboidratos por ligação química; 2. os últimos traços de lignina reagem entre si ou com os
carboidratos, formando produtos que são difíceis de serem dissolvidos no licor alcalino
(GRACE; LEOPOLD; MALCOLM, 1996).
Tabela 4.16 - Composição química das polpas de bagaço de malte e perdas de celulose e lignina após o tratamento de hidrólise alcalina sob diferentes condições operacionais.
Variáveis independentesa
Composição da polpa (% p/p) Perda durante a polpação (% p/p)
Ensaio
X1 X2 X3 Celulose Hemicelulose Lignina Outrosb Celulose Lignina
1 1,0 80 30 51,2 10,7 28,5 9,6 0,0 60,5 2 2,0 80 30 54,1 10,0 26,3 9,6 0,0 65,0 3 1,0 120 30 57,9 7,1 23,8 11,2 10,9 74,7 4 2,0 120 30 55,3 6,1 21,5 17,1 12,5 76,5 5 1,0 80 90 43,6 7,1 22,5 26,8 23,3 72,6 6 2,0 80 90 56,0 8,6 23,5 11,9 1,7 71,5 7 1,0 120 90 61,3 5,6 21,1 12,0 15,0 79,8 8 2,0 120 90 72,1 7,8 10,4 9,7 1,8 90,2 9 1,5 100 60 56,4 6,1 20,1 17,4 0,0 74,8 10 1,5 100 60 54,9 7,0 21,7 16,4 0,0 72,3 11 1,5 100 60 55,4 7,2 22,8 14,6 0,0 71,3
a X1 = concentração de NaOH (% p/p); X2 = temperatura (ºC); X3 = tempo de reação (min). b Outros incluem proteínas, cinzas e extrativos.
Vale a pena observar que, mesmo nas condições mais brandas de reação utilizadas
(NaOH 1% p/v, 80ºC, 30 min - ensaio 1) obteve-se uma significativa dissolução da lignina
(60,5% p/p), a qual correspondeu a uma redução no teor de lignina do material de 49,2% p/p
(no bagaço de malte pré-tratado) para 28,5% p/p (na polpa obtida após a deslignificação).
Valor similar de dissolução da lignina (68,8% p/p) foi obtido durante o tratamento da palha de
centeio com uma solução de NaOH 4% p/v, a 30º C por 18 h (XIAO; SUN; SUN, 2001).
Porém, apesar de no presente trabalho terem sido utilizadas temperaturas mais elevadas de
reação (80-120ºC), as condições aqui empregadas podem ser mais econômicas e menos
agressivas ao meio ambiente, pois requerem um menor tempo de reação e uma solução de
NaOH menos concentrada.
100
4.5.3 Análise estatística da hidrólise alcalina do bagaço de malte
Para otimizar as condições de hidrólise alcalina, o primeiro passo é identificar as
variáveis que exerceram maior influência nas respostas, o que pode ser feito através de uma
análise dos efeitos estimados das variáveis. Esta análise revelou um efeito principal negativo e
significativo da temperatura (p<0,05), tempo de reação (p<0,05) e concentração de NaOH
(p<0,10), no conteúdo de lignina residual na polpa de bagaço de malte (Tabela 4.17). Os
sinais negativos indicam que a polpa obtida nas condições mais brandas de reação apresenta
uma maior quantidade de lignina residual. Em outras palavras, a quantidade de lignina
residual na polpa é menor quanto maior a concentração da solução de NaOH, a temperatura e
o tempo de reação empregado no processo. O aumento na concentração de NaOH até 2% p/v
e o aumento na temperatura até 100ºC também foram as variáveis de maior influência na
solubilização da lignina durante a polpação de Miscanthus sinensis (IGLESIAS et al., 1996).
Tabela 4.17 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e resultados do teste t de Student, para os teores de celulose e lignina residual nas polpas obtidas a partir do bagaço de malte.
Lignina residual (% p/p) Teor de celulose (% p/p) Variáveis independentes e interações EE E t EE SE t
X1 -3,550 ±1,638 2,167c 5,875 ±0,768 7,647a
X2 -6,000 ±1,638 3,662b 10,425 ±0,768 13,569a
X3 -5,650 ±1,638 3,448b 3,625 ±0,768 4,718a
X1X2 -2,950 ±1,638 1,800 -1,775 ±0,768 2,310c
X1X3 -1,300 ±1,638 0,793 5,725 ±0,768 7,451a
X2X3 -1,250 ±1,638 0,763 6,475 ±0,768 8,427a
a p<0,01; b p<0,05; c p<0,10. X1 = concentração de NaOH; X2 = temperatura; X3 = tempo de reação.
Para a resposta de teor de celulose, a análise estatística revelou um efeito principal
positivo altamente significativo (p<0,01) de todas as variáveis estudadas (Tabela 4.17), ou
seja, quanto maior a concentração de NaOH, a temperatura e o tempo de reação, maior o teor
de celulose na polpa obtida. Dentre as variáveis, a temperatura foi a que apresentou maior
efeito nesta resposta, uma vez que seu aumento de 80 para 120º C resultou em um aumento
médio no teor de celulose na polpa de 10,42% p/p. O aumento da concentração de NaOH (de
1 para 2% p/v) e do tempo de reação (de 30 para 90 min), causaram efeitos menos marcantes,
com variações no conteúdo de celulose, de 5,87 e 3,62% p/p, respectivamente. As interações
101
entre tempo de reação e temperatura, tempo de reação e concentração de NaOH, e
concentração de NaOH e temperatura também foram significativas para esta resposta, com
p<0,01, p<0,01 e p<0,10, respectivamente.
A significância estatística dos efeitos principais e interações entre as variáveis foi
determinada por análise de variância e uma análise de regressão múltipla foi realizada para
ajustar os dados experimentais a equações polinomiais (Tabela 4.18). As respostas foram
descritas como funções de primeira ordem e os elevados valores de R2 (>0,90) obtidos
indicam que os modelos selecionados são adequados para o processo, mostrando uma forte
concordância entre os resultados experimentais e os valores teóricos previstos pelos modelos.
Tabela 4.18 - Equações do modelo para a hidrólise alcalina do bagaço de malte e seus respectivos R2, ajustados aos dados experimentais para as respostas de lignina residual e teor de celulose nas polpas obtidas.
Resposta Equações do modeloa R2
Lignina residual ( em %) 1y 1y = 22,018 – 1,775X1 – 3,0X2 – 2,825X3 –1,475X1X2 – 0,650X1X3 – 0,625X2X3
0,90
Teor de celulose ( em %) 2y 2y = 56,200 + 2,937X1 + 5,212X2 + 1,812X3 – 0,887X1X2 + 2,862X1X3 + 3,237X2X3
0,99
a X1 = concentração de NaOH; X2 = temperatura; X3 = tempo de reação.
As superfícies de resposta descritas pelas equações do modelo para a lignina residual e o
teor de celulose (Figura 4.8) mostram claramente que o aumento no valor das variáveis
operacionais favoreceu linearmente o aumento no teor de celulose e a diminuição no teor de
lignina residual na polpa obtida. Os melhores valores foram atingidos quando o processo de
hidrólise alcalina foi realizado a 120°C, durante 90 minutos, empregando uma solução de
NaOH 2% p/v. Nestas condições obteve-se uma polpa com elevado teor de celulose (72,1%
p/p) e baixo teor de lignina residual (10,4% p/p). Considerando que uma pequena fração da
hemicelulose e da lignina é muito difícil de ser removida da estrutura lignocelulósica durante
o processo de deslignificação, maiores esforços não foram dados visando reduzir ainda mais
os conteúdos destas frações nas polpas de bagaço de malte. Isto porque o aumento no
consumo de energia devido ao uso de uma temperatura e tempo de reação maior,
provavelmente não justificaria o pequeno aumento no teor de celulose ou a pequena
diminuição no teor de lignina residual na polpa.
102
80
100
120
90
Figura 4.8 - Superfícies de resposta para os teores de lignina residual e de celulose (% p/p) nas polpas de bagaço de malte, em função das variáveis operacionais empregadas no processo de hidrólise alcalina.
4.5.4 Micrografias das polpas de bagaço de malte
A influência dos processos de hidrólise ácida e alcalina (nas condições otimizadas) na
estrutura da partícula do bagaço de malte pode ser observada na Figura 4.9. As Figuras 4.9A
(partícula do bagaço de malte na forma original) e 4.9B (partícula de bagaço de malte pré-
tratada com ácido diluído) mostram que o pré-tratamento ácido promoveu algumas rupturas
na estrutura do material devido à remoção da hemicelulose. Durante a hidrólise alcalina, a
lignina foi atacada e solubilizada no licor produzido. Como conseqüência, a estrutura do
bagaço foi fortemente rompida e um resíduo rico em celulose foi gerado. A remoção da
lignina permitiu a separação das fibras da celulose, como pode ser visualizado na Figura 4.9C.
Em termos de cor, a polpa celulósica obtida apresentou uma coloração bege clara, a qual foi
muito diferente da cor original do bagaço de malte (amarelo escuro). Na verdade, o bagaço de
malte pré-tratado com ácido diluído apresentou uma cor marrom escura, causada pelo
aumento no teor de lignina após a hidrólise ácida. Posteriormente, a elevada remoção desta
fração (90,2% p/p) durante a hidrólise alcalina promoveu a descoloração do material (Figura
4.9).
11030
4560
7590
12
16
20
24
28
32
TEMPERATURA ( oC)
TEMPO DE REAÇÃO (min)
76
70LIGN
INA
RE
SID
UA
L (%)
CE
LULO
SE
(%)
64
58
52
46
2,0
1,75
1,5
1,0
1,25
CONCENTRAÇÃO NaOH (%)
8090
100110
TEMPERATURA (o C)
120
103
A
C
B
Figura 4.9 - Micrografia eletrônica de varredura (ampliação: 45 vezes) e aspecto visual das partículas do bagaço de malte nas formas: original (A), pré-tratado com ácido diluído (B) e após a hidrólise alcalina (C).
104
4.5.5 Balanço de massa da hidrólise alcalina
Como já foi mencionado anteriormente, o rendimento em biomassa recuperada após o
processo de hidrólise ácida foi de 48,55 g/100 g de bagaço de malte original. Um valor similar
de rendimento em biomassa recuperada foi obtido para o processo de hidrólise alcalina, sendo
recuperadas 46,3 g a partir de 100 g do material pré-tratado. Isto significa que para cada 100 g
de bagaço de malte original, foram recuperadas 22,5 g de polpa contendo 72,1% p/p de
celulose. Durante a hidrólise alcalina, apenas 1,8% da fração celulósica presente no material
pré-tratado foi removida. Ao final deste processo, 16,2 g de celulose foram recuperadas a
partir de 16,8 g de celulose presentes em 100 g do bagaço de malte original, o que
correspondeu a uma recuperação de 96,4% do total desta fração existente inicialmente.
A fração hemicelulósica ainda presente no material pré-tratado foi removida em
54,3% p/p durante a hidrólise alcalina, sendo recuperadas 1,75 g a partir das 28,4 g presentes
em 100 g do material original. Isto significa que 6,16% da hemicelulose presente inicialmente
no bagaço de malte foi resistente a ambos os processos de tratamento, ácido e alcalino. A
remoção da fração correspondente a outros materiais (cinzas, proteínas e extrativos), foi
similar à remoção obtida para a hemicelulose, correspondendo a 49,5% p/p. Isto significa que
para 27 g desta fração presentes em 100 g do bagaço de malte original, 2,18 g permaneceram
no material após as reações ácida e alcalina (8,07% do total existente inicialmente). A lignina
foi a principal fração removida durante a hidrólise alcalina (90,2% p/p), sendo recuperadas
somente 2,34 g a partir das 23,9 g presentes no material pré-tratado. A porcentagem de lignina
que permaneceu na polpa após os dois processos de hidrólise, correspondeu a 8,42% do total
desta fração presente no material original.
4.6 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ALCALINA DO BAGAÇO DE
MALTE PRÉ-TRATADO PARA LIBERAÇÃO DE ÁCIDOS FENÓLICOS
Além da produção de polpa celulósica, a deslignificação dos materiais lignocelulósicos
gera um efluente líquido, denominado licor alcalino, o qual é rico em compostos fenólicos
provenientes da degradação da lignina. Como estes compostos (principalmente os ácidos
fenólicos) apresentam grande interesse comercial, e, considerando que os ácidos ferúlico e p-
cumárico são os dois ácidos fenólicos presentes em maior quantidade no bagaço de malte
105
(BARTOLOMÉ; FAULDS; WILLIAMSON, 1997; BARTOLOMÉ et al., 2003), fez-se então
nesta etapa um estudo sobre a influência das variáveis operacionais empregadas na hidrólise
alcalina do bagaço de malte, na liberação destes compostos.
4.6.1 Liberação de ácidos fenólicos durante o pré-tratamento do bagaço de malte com
ácido sulfúrico diluído
Inicialmente, o hidrolisado hemicelulósico obtido por hidrólise ácida do bagaço de
malte foi analisado quimicamente para verificar se houve liberação de ácidos fenólicos
durante esta etapa de tratamento do material. Os resultados obtidos revelaram a presença de
apenas um ácido fenólico: o ácido ferúlico, em concentração de 51,0 mg/l. A presença deste
ácido já foi também observada em hidrolisados hemicelulósicos obtidos a partir da hidrólise
ácida de outras matérias-primas lignocelulósicas, tais como palha de arroz (CORTEZ, 2005),
bagaço de cana-de-açúcar (VAN ZYL; PRIOR; DU PREEZ, 1988) e alguns tipos de madeira
(JÖNSSON et al., 1998; TRAN; CHAMBERS, 1985). A pequena liberação de ácido ferúlico
durante esta etapa de hidrólise provavelmente ocorreu devido à localização deste ácido na
parede celular do material. De acordo com alguns autores, o ácido ferúlico encontra-se ligado
tanto com a arabinose nas hemiceluloses, quanto com a lignina, enquanto que os outros ácidos
fenólicos encontram-se predominantemente ligados com a lignina (MAILLARD; BERSET,
1995; SUN et al., 2000). Isto explica porque apenas parte do ácido ferúlico foi solubilizada
junto com a arabinoxilana durante o pré-tratamento ácido do bagaço de malte, enquanto que
os outros ácidos fenólicos não foram solubilizados neste estágio.
4.6.2 Liberação de ácidos fenólicos durante a hidrólise alcalina do bagaço de malte
Durante a hidrólise alcalina do bagaço de malte pré-tratado, 60 a 90% p/p da lignina
presente no material foi solubilizada dependendo das condições de reação utilizadas. Os
licores então produzidos continham vários ácidos fenólicos, dentre os quais, ferúlico e p-
cumárico foram os mais abundantes (Tabela 4.19). De acordo com White e Xing (1997), os
ácidos ferúlico, p-cumárico, siríngico, p-hidroxibenzóico, vanílico, caféico e protocatecuico
são os ácidos fenólicos mais encontrados em cereais. Isto justifica a presença de grande parte
deles nos licores alcalinos produzidos a partir do bagaço de malte, uma vez que este material é
proveniente do grão de cevada. Além disso, as maiores concentrações dos ácidos ferúlico e p-
106
cumárico também podem ser explicadas, uma vez que estes são os ácidos fenólicos presentes
em maior quantidade no grão de cevada, estando concentrados principalmente na casca do
grão (MAILLARD; BERSET, 1995; WHITE; XING, 1997) e o bagaço de malte é composto
basicamente por esta fração do grão de cevada original. O ácido ferúlico é também o ácido
fenólico encontrado em maior quantidade em outros grãos de cereais, tais como centeio
(ANDREASEN et al., 2000), trigo (LEMPEREUR; ROUAU; ABECASSIS, 1997), arroz e
milho (ADOM; LIU, 2002).
Tabela 4.19 - Porcentagem de lignina solubilizada e concentração de ácidos fenólicos no licor obtido a partir da hidrólise alcalina do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais.
Variáveisa Concentração de ácidos fenólicos no licor (mg/l) Ensaio
X1 X2 X3
LSb
(% p/p) Ferúlico p-Cumárico Siríngico Vanílico p-HBc
1 1,0 80 30 60,6 74,20 67,10 4,90 3,10 1,30 2 2,0 80 30 65,0 85,00 100,70 4,70 2,70 1,50 3 1,0 120 30 74,7 85,70 95,80 5,20 3,00 4,50 4 2,0 120 30 76,5 111,90 114,70 5,40 2,90 7,80 5 1,0 80 90 72,6 91,50 91,60 5,00 2,90 1,60 6 2,0 80 90 71,5 100,30 105,90 5,40 2,40 1,40 7 1,0 120 90 79,8 112,40 106,70 7,10 2,60 13,70 8 2,0 120 90 90,2 145,30 138,80 8,10 3,10 26,90 9 1,5 100 60 74,8 99,50 114,40 5,80 3,60 5,50 10 1,5 100 60 72,3 92,90 104,10 5,50 3,40 3,60 11 1,5 100 60 71,3 96,80 100,80 5,70 3,40 3,10
a X1, concentração de NaOH (% p/p); X2, temperatura (ºC); X3, tempo de reação (min). b lignina solubilizada; c Ácido p-hidroxibenzóico.
4.6.3 Análise estatística para a remoção de ácido ferúlico e p-cumárico durante a
hidrólise alcalina do bagaço de malte
A Tabela 4.19 mostra que houve uma grande variação nas concentrações dos ácidos
ferúlico (74,20 a 145,3 mg/l) e p-cumárico (67,10 a 138,8 mg/l) nos licores obtidos, em
função das condições de reação utilizadas. Por esta razão, uma análise estatística foi realizada
para avaliar a influência das variáveis operacionais empregadas na hidrólise alcalina do
bagaço de malte, na liberação destes ácidos. Os gráficos de Pareto apresentados na Figura
4.10 representam os efeitos estimados de cada variável estudada, bem como da interação entre
elas, nas concentrações dos ácidos ferúlico e p-cumárico obtidas no licor alcalino. Observa-se
107
através destes gráficos que todas as variáveis estudadas influenciaram na liberação destes dois
ácidos a partir do bagaço de malte, sendo que todas apresentaram efeito positivo. Tal efeito
significa que quanto maior a concentração de NaOH, a temperatura e o tempo de reação
empregados na hidrólise alcalina, maior foi a liberação de ácido ferúlico e p-cumárico a partir
do material. Quando todas as variáveis foram utilizadas em seu nível superior (concentração
de NaOH de 2,0% p/v), temperatura de 120°C e tempo de reação de 90 min – ensaio 8),
90,2% p/p da lignina presente no bagaço de malte foi solubilizada.
Ácido ferúlico
Efeito estimado (Valor absoluto)
0,39
2,27
3,26
6,49
7,65
8,60
p=0,05
X1X3
X2X3
X1X2
NaOH (X1)
Tempo (X3)
Temperatura (X2)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
A
Ácido p-cumárico
Efeito estimado (Valor absoluto)
0,13
0,23
-0,26
2,82
3,95
4,31
p=0,05
X1X2
X2X3
X1X3
Tempo (X3)
Temperatura (X2)
NaOH (X1)
0 1 2 3 4 5
6
B
Figura 4.10 - Gráficos de Pareto para o efeito das variáveis: concentração de NaOH, temperatura e
tempo de reação, nas respostas: concentração de ácido ferúlico (A) e concentração de ácido p-cumárico (B) nos licores obtidos por hidrólise alcalina do bagaço de malte. Efeitos acima da linha de p=0,05 são significativos ao nível de 95% de confiança.
108
A temperatura foi a variável de maior influência (+8,60) na liberação de ácido ferúlico,
seguida pelo tempo de reação (+7,65) e pela concentração de NaOH (+6,49) (Figura 4.10A).
A interação entre concentração de NaOH e temperatura (X1X2) também foi estatisticamente
significativa para esta resposta, com um efeito de sinal positivo (+3,26), indicando que a
liberação deste ácido é ainda mais favorecida quando elevadas concentrações de NaOH e
temperatura são empregadas simultaneamente. Para a liberação de ácido p-cumárico, apenas
os efeitos principais das variáveis foram estatisticamente significativos sendo que dentre
estes, o maior efeito foi o da concentração de NaOH (+4,31), seguido pela temperatura
(+3,95) e pelo tempo de reação (+2,82) (Figura 4.10B).
Uma vez que 90,2% p/p da lignina presente no material foi solubilizada quando a
hidrólise alcalina foi realizada nos níveis mais altos das variáveis, maiores esforços não foram
feitos para solubilizar o restante da lignina que permaneceu no bagaço de malte. Isto porque o
gasto energético envolvido no uso de uma temperatura ainda mais elevada ou de um tempo de
reação mais prolongado, provavelmente não justificaria o pequeno aumento na concentração
dos ácidos fenólicos no licor alcalino. Por este motivo, optou-se por estabelecer as melhores
condições operacionais de hidrólise alcalina dentro da faixa de valores avaliada.
Uma análise de regressão múltipla foi então realizada para obter modelos matemáticos
que descrevam a relação entre as variáveis operacionais e as respostas estudadas. De acordo
com esta análise, modelos lineares podem ser bem ajustados para explicar a variação de
ambas as respostas (concentração de ácido ferúlico e de ácido p-cumárico) como função das
variáveis operacionais empregadas na hidrólise alcalina do bagaço de malte, uma vez que a
curvatura não foi significativa para nenhuma das respostas. Os modelos matemáticos que
descrevem a concentração de ácido ferúlico e ácido p-cumárico no licor alcalino foram
representados pelas equações dadas na Tabela 4.20.
Tabela 4.20 - Equações do modelo para a hidrólise alcalina do bagaço de malte e seus respectivos R2, ajustados aos dados experimentais para as respostas de concentração de ácido ferúlico e concentração de ácido p-cumárico no licor alcalino obtido.
Resposta Equações do modeloa R2
Ácido ferúlico ( em mg/l) 1y 1y = 99,59 + 9,84X1 + 13,04X2 + 11,59X3 + 4,94X1X2 + 3,44X2X3
0,99
Ácido p-cumárico ( em mg/l) 2y 2y = 103,69 + 12,36X1 + 11,342X2 + 8,09X3 0,92 a X1 = concentração de NaOH; X2 = temperatura; X3 = tempo de reação.
109
A interação entre as variáveis temperatura e tempo de reação (X2X3) foi mantida na
equação do modelo para a resposta de ácido ferúlico, para minimizar o erro de determinação.
De uma forma geral, os elevados valores de R2 (≥0,92) obtidos indicam que os modelos
selecionados são adequados para o processo, mostrando uma forte concordância entre os
resultados experimentais e os valores teóricos previstos pelas equações. A Figura 4.11 mostra
os valores de concentração de ácido ferúlico e ácido p-cumárico previstos pelos modelos e os
valores reais obtidos nos ensaios. Observa-se nestas figuras uma distribuição dos pontos ao
redor da linha, para ambas as respostas, o que confirma que os modelos lineares foram bem
ajustados.
Ácido p-cumárico
Valores observados (mg/l)
Val
ores
pre
vist
os (m
g/l)
50
60
70
80
90
100
110
120
130
140
150
50 60 70 80 90 100 110 120 130 140 150
B
Ácido ferúlico
Valores observados (mg/l)
Val
ores
pre
vist
os (m
g/l)
60
70
80
90
100
110
120
130
140
150
160
60 70 80 90 100 110 120 130 140 150 160
A
Figura 4.11 - Valores previstos pelo modelo linear em função dos valores observados para as respostas
de concentração de ácido ferúlico (A) e concentração de ácido p-cumárico (B) nos licores obtidos por hidrólise alcalina do bagaço de malte.
110
Para finalizar, realizou-se um balanço de massa para quantificar a extração de ácido
ferúlico obtida a partir do bagaço de malte. Considerando que este ácido está presente no
material em uma concentração de 0,32% p/p (BARTOLOMÉ; FAULDS; WILLIAMSON,
1997), a quantidade liberada durante o pré-tratamento com ácido sulfúrico foi estimada em
11%. Logo, a porcentagem de ácido ferúlico no material submetido à hidrólise alcalina era de
aproximadamente 0,285% p/p, quantidade que foi totalmente solubilizada no licor durante a
realização da hidrólise nas condições operacionais otimizadas.
A extração enzimática de ácido ferúlico a partir do bagaço de malte tem sido estudada
por alguns autores, porém, os resultados obtidos são menores do que os encontrados no
presente trabalho. Por exemplo, o emprego de uma esterase de Aspergillus niger proporcionou
a liberação de apenas 3,3% do ácido ferúlico presente neste material. Quando esta enzima foi
utilizada juntamente com uma xilanase de Trichoderma viride, a liberação deste ácido foi
aumentada para 30% (BARTOLOMÉ; FAULDS; WILLIAMSON, 1997). Um resultado um
pouco maior (43% de liberação) foi obtido através do cultivo de Streptomyces avermitilis
CECT3339 em bagaço de malte (BARTOLOMÉ et al., 2003). Além de proporcionar menores
rendimentos de extração, o uso de enzimas requer um tempo de reação mais prolongado (até
48 h, aproximadamente). No presente trabalho, o uso de uma solução diluída de NaOH
(2% p/v) em um curto tempo de reação (90 min) foi suficiente para extrair todo o ácido
ferúlico presente no bagaço de malte.
4.7 OTIMIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE ENZIMÁTICA DO BAGAÇO DE
MALTE PARA MÁXIMA CONVERSÃO DA CELULOSE EM GLICOSE
4.7.1 Composição química do substrato
A polpa de celulose obtida nas condições otimizadas de hidrólise alcalina foi utilizada
nesta etapa do trabalho como substrato para obtenção de glicose. No entanto, como a reação
de hidrólise alcalina foi conduzida em um banho termostatizado diferente daquele onde foram
realizados os experimentos do planejamento experimental, a polpa de celulose aqui obtida
apresentou uma composição química diferente daquela obtida anteriormente. A composição
desta polpa foi de (% p/p): 90,5% celulose, 1,1% hemicelulose e 8,2% de lignina; enquanto
que a composição da polpa obtida anteriormente na melhor condição de hidrólise foi de
111
(% p/p): 72,1% celulose, 7,8% hemicelulose e 10,4% lignina. Provavelmente, a maior
solubilização da hemicelulose e da lignina ocorreu devido ao melhor controle de temperatura
e agitação do banho utilizado, que pode ter proporcionado uma transferência de calor mais
adequada para o meio reacional. Como conseqüência, houve um aumento no teor de celulose
do material, o que é bastante interessante, pois permite obter uma maior quantidade de glicose
após a reação enzimática.
4.7.2 Análise estatística da hidrólise enzimática do bagaço de malte
A hidrólise enzimática da polpa de celulose foi realizada empregando diferentes
condições de agitação, relação enzima/substrato e concentração de substrato, de acordo com
um planejamento fatorial completo 23, visando maximizar o rendimento em glicose liberada.
Os resultados obtidos, analisados em termos de rendimento em glicose e rendimento total
(glicose + celobiose) de hidrólise, estão apresentados na Tabela 4.21.
Tabela 4.21 - Rendimento em glicose e rendimento total (glicose + celobiose) da hidrólise enzimática do bagaço de malte, sob diferentes condições operacionais.
Variáveis Respostas Ensaio
Agitação (rpm)
Enz/Subst (FPU/g)a
Substrato (% p/v)
Rendimento em glicose (%)
Rendimento total (%)
1 100 5 2 42,6 65,9 2 200 5 2 23,7 51,6 3 100 45 2 93,1 99,4 4 200 45 2 84,5 89,1 5 100 5 8 25,9 40,7 6 200 5 8 17,9 36,9 7 100 45 8 73,8 83,7 8 200 45 8 71,2 80,5 9 150 25 5 70,3 79,6 10 150 25 5 67,0 80,5 11 150 25 5 71,7 81,7 12 150 25 5 71,2 81,0
a Relação enzima/substrato.
Nota-se na Tabela 4.21 que ambas as respostas variaram de acordo com as condições de
processo utilizadas. Uma análise de estimativa dos efeitos foi então realizada para identificar
as variáveis de maior influência no processo de hidrólise. De acordo com esta análise (Tabela
112
4.22), apenas a variável relação enzima/substrato apresentou efeito significativo (p<0,01) para
ambas as respostas. Tal efeito, de sinal positivo, indica que o aumento no valor desta variável
favoreceu o rendimento em glicose e o rendimento total de hidrólise da celulose em glicose +
celobiose. As outras duas variáveis estudadas (agitação e concentração de substrato) não
apresentaram efeito significativo, mesmo a um nível de 90% de confiança, para o rendimento
em glicose; mas para o rendimento total de hidrólise, a variável concentração de substrato
apresentou um efeito significativo a 90% de confiança e de sinal negativo, indicando que
quanto menor a concentração de substrato utilizada, maior foi o rendimento total de hidrólise
obtido.
Tabela 4.22 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student, para o rendimento em glicose e rendimento total (glicose + celobiose) da hidrólise enzimática do bagaço malte.
Rendimento em glicose (%) Rendimento total de hidrólise (%) Variáveis independentes e interações EE E t EE SE t
X1 -9,525 ± 8,641 -1,102 -7,905 ± 6,335 -1,248 X2 53,110 ± 8,641 6,146*** 39,400 ± 6,335 6,220*** X3 -13,765 ± 8,641 -1,593 -16,050 ± 6,335 -2,534* X1X2 3,900 ± 8,641 0,451 1,145 ± 6,335 0,181 X1X3 4,225 ± 8,641 0,489 4,405 ± 6,335 0,695 X2X3 -2,530 ± 8,641 -0,293 3,900 ± 6,335 0,616
*** Valor significativo a 99% de confiança; *Valor significativo a 90% de confiança. X1 = agitação; X2 = relação enzima/substrato; X3 = concentração de substrato.
A significância estatística dos efeitos principais e interações entre as variáveis foi
determinada por análise de variância. Para a resposta de rendimento em glicose, a análise de
variância realizada para um modelo linear revelou que apenas a relação enzima/substrato foi
significativa a um nível de 99% de confiança, com um coeficiente de determinação (R2) de
0,89. No entanto, quando se fez a estimativa da curvatura (Tabela 4.23), todas as variáveis
estudadas, bem como todas as interações entre elas passaram a ser significativas a pelo menos
95% de confiança e o coeficiente de determinação (R2) aumentou para 0,99, sugerindo que
um modelo matemático de segunda ordem é mais adequado para explicar as variações do
rendimento em glicose, em função das variáveis avaliadas na região de estudo. Resultados
similares foram obtidos para a análise de variância dos resultados de rendimento total da
hidrólise enzimática. A análise de variância para esta resposta mostrou que para um modelo
113
linear, apenas as variáveis relação enzima/substrato e concentração de substrato foram
significativas (a um nível de 99% e 90% de confiança, respectivamente) com um coeficiente
de determinação (R2) de 0,90. Entretanto, quando se fez a estimativa da curvatura (Tabela
4.23), todas as variáveis estudadas, bem como as interações entre elas (exceto a interação
entre agitação e relação enzima/substrato) passaram a ser significativas a pelo menos 95% de
confiança e o coeficiente de determinação (R2) aumentou para 0,99, sugerindo que um modelo
matemático de segunda ordem também é mais adequado para representar as variações do
rendimento total de hidrólise, em função das variáveis estudadas, na região analisada.
Tabela 4.23 - Análise de variância com erro total e teste da curvatura, para o rendimento em glicose e rendimento total da hidrólise enzimática do bagaço malte.
Rendimento em glicose Variável
SQ GL MQ F p
Curvatura 741,926 1 741,926 621,551 0,000*** X1 181,451 1 181,451 152,011 0,000*** X2 5641,344 1 5641,344 4726,055 0,000*** X3 378,950 1 378,950 317,467 0,000*** X1X2 30,420 1 30,420 25,484 0,007*** X1X3 35,701 1 35,701 29,909 0,005*** X2X3 12,802 1 12,802 10,725 0,031** Erro 4,775 4 1,194 Total 7027,370 11
Rendimento total de hidrólise Variável
SQ GL MQ F p
Curvatura 397,232 1 397,232 389,649 0,000*** X1 124,978 1 124,978 122,592 0,000*** X2 3104,720 1 3104,720 3045,448 0,000*** X3 515,205 1 515,205 505,369 0,000*** X1X2 2,622 1 2,622 2,572 0,184 X1X3 38,808 1 38,808 38,067 0,004** X2X3 30,420 1 30,420 29,839 0,005*** Erro 4,078 4 1,019 Total 4218,063 11
X1 = agitação; X2 = relação enzima/substrato; X3 = concentração de substrato. GL = graus de liberdade; SQ = soma quadrática; MQ = média quadrática. *** Valor significativo a 99% de confiança; **Valor significativo a 95% de confiança. R2 = 0,99 para ambos, rendimento em glicose e rendimento total de hidrólise.
114
Para estabelecer as equações matemáticas de segunda ordem que descrevam o
comportamento destas respostas em função das variáveis estudadas, seria necessária a
realização de alguns ensaios adicionais modificando a faixa de valores das variáveis. No
entanto, estes ensaios não foram realizados por duas razões: 1. no planejamento experimental
estudado foi possível atingir elevados valores de rendimento (93,1% em glicose e 99,4% total
- ensaio 3). Logo, estes ensaios adicionais não proporcionariam um aumento significativo nos
valores destas respostas; 2. quando a análise de variância foi realizada sem estimativa da
curvatura, foram obtidos altos valores de R2 (>0,89), os quais indicam uma boa concordância
entre os resultados experimentais e os valores previstos pelas equações de primeira ordem.
Por este motivo, o modelo linear foi então aplicado para as duas respostas, obtendo-se as
equações apresentadas na Tabela 4.24.
Tabela 4.24 - Equações do modelo para a hidrólise enzimática do bagaço de malte e seus respectivos R2, ajustados aos dados experimentais para as respostas de rendimento em glicose e rendimento total (glicose + celobiose) de hidrólise.
Resposta Equações do modeloa R2
Rendimento em glicose ( em %) 1y
1y = 59,65 – 4,76X1 + 26,55X2 – 6,88X3 + 1,95X1X2 + 2,11X1X3 – 1,26 X2X3
0,89
Rendimento total de hidrólise ( em %) 2y
2y = 72,57 – 3,95X1 + 19,70X2 – 8,02X3 + 0,57X1X2 + 2,20X1X3 – 1,95 X2X3
0,90
a X1 = agitação; X2 = relação enzima/substrato; X3 = concentração de substrato.
Através das equações obtidas do modelo (Tabela 4.24) foi possível construir uma
representação tridimensional da superfície de resposta para o rendimento em glicose e para o
rendimento total de hidrólise, na região estudada (Figura 4.12). Estas figuras mostram
claramente que ambas as respostas foram bem ajustadas a uma superfície plana e que os
maiores valores de rendimento em glicose e rendimento total de hidrólise podem ser obtidos
utilizando o nível superior de relação enzima/substrato (45 FPU/g) e inferior de concentração
de substrato (2% p/v) e agitação (100 rpm).
115
33,560 39,639 45,719 51,798 57,878 63,957 70,037 76,116 82,196 88,275 above
2,0
3,5
5,0
6,5
8,0
515
2535
45
1009080706050403020
REN
DIM
EN
TO EM
GLIC
OSE
(%)
ENZIMA/SUBSTRATO (FPU/g)SUBSTRATO (% p/v)
acima
47,939 52,980 58,021 63,062 68,103 73,144 78,185 83,226 88,267 93,307 above
515
2535
45
2
3,5
5
6,5
8
110
100
9080
70
60
5040
RE
ND
IMEN
TO TO
TAL (%
)
SUBSTRATO (% p/v)ENZIMA/SUBSTRATO (FPU/g)
acima Figura 4.12 - Superfícies de resposta descrita pelos modelos para o rendimento em glicose ( ) e o
rendimento total (glicose + celobiose) ( ) da hidrólise enzimática do bagaço de malte. 1y
2y
4.7.3 Análise comparativa da hidrólise enzimática do bagaço de malte com a hidrólise
enzimática de outros materiais lignocelulósicos
A análise estatística da hidrólise enzimática do bagaço de malte revelou que o
rendimento em glicose e o rendimento total de hidrólise foram aumentados quando agitação
utilizada no processo foi diminuída (Tabelas 4.22 e 4.23). Uma influência similar da agitação
116
foi também observada durante a hidrólise enzimática de outras matérias-primas
lignocelulósicas. Durante a hidrólise enzimática de Avicel, por exemplo, Mukataka, Tada e
Takahashi (1983) verificaram que o uso de elevadas agitações (> 200 rpm) diminuiu o
rendimento de conversão da celulose, enquanto que o uso de uma agitação mais moderada
(100 a 200 rpm) proporcionou melhores resultados de rendimento de hidrólise. Por outro lado,
Gan, Allen e Taylor (2002) constataram que o aumento da velocidade de agitação de 50 para
90 rpm não influenciou significativamente na hidrólise enzimática de um material celulósico
obtido a partir de madeira dura.
De acordo com Ingesson et al. (2001) a hidrólise enzimática da celulose requer uma
adequada mistura do meio reacional para garantir o contato entre as enzimas e o substrato e
promover a transferência de massa e calor dentro do reator. O uso de alguma agitação é
necessário, pois aumenta a velocidade e o rendimento da hidrólise, mas o uso de uma agitação
muito elevada pode causar a perda da atividade das enzimas devido à força de cisalhamento
gerada pelo misturador, reduzindo o rendimento de conversão (INGESSON et al., 2001;
WRIGHT, 1988).
A concentração de substrato foi outra variável que influenciou no rendimento em
glicose e no rendimento total de hidrólise da celulose do bagaço de malte (Tabela 4.22), sendo
que o valor de ambas as respostas foi aumentado quando a concentração de substrato foi
diminuída. Em termos numéricos, o aumento da concentração de substrato de 2 para 8% p/v
proporcionou uma redução de 13,8% no rendimento em glicose. Resultados bastante similares
foram observados durante a hidrólise enzimática de α-celulose, onde o aumento da
concentração de substrato de 2,5 para 7,5% p/v reduziu o rendimento em glicose em 14%
(INGESSON et al., 2001).
O efeito da concentração de substrato na hidrólise enzimática da celulose também já foi
avaliado para outros materiais lignocelulósicos, tais como bagaço de cana-de-açúcar
(MANONMANI; SREEKANTIAH, 1987), sabugo de milho (CHEN; XIA; XUE, 2007) e
madeira mole (TENGBORG; GALBE; ZACCHI, 2001). Em todos estes casos, assim como
no presente trabalho, foi observado que a concentração de glicose no hidrolisado e o
rendimento da hidrólise enzimática apresentam perfis opostos, com a concentração de glicose
aumentando e o rendimento de hidrólise diminuindo com o aumento da concentração de
substrato. Este efeito pode ser atribuído a uma possível inibição pelo produto, causada pela
alta concentração de glicose obtida meio, e às limitações de transferência de massa dentro da
117
mistura reacional devido à alta viscosidade da suspensão (INGESSON et al., 2004; WEN;
LIAO; CHEN, 2004). Outros fatores que podem contribuir para um baixo grau de conversão
da celulose quando se utiliza altas concentrações de substrato, principalmente quando são
empregadas baixas quantidades de enzima, incluem diferentes tipos de inativação da enzima e
uma adsorção não específica das enzimas na molécula de lignina (VLASENKO et al., 1997).
A hidrólise enzimática do bagaço de malte também foi influenciada pela relação
enzima/substrato empregada de forma que, quanto maior a carga de enzimas utilizada, maior
foi o rendimento de hidrólise obtido (Tabela 4.22). Na verdade, esta foi a variável de maior
influência na hidrólise enzimática do bagaço de malte, sendo que seu aumento de 5 para 45
FPU/g de substrato proporcionou um aumento de 53,1% e 39,4% no rendimento em glicose e
no rendimento total de hidrólise, respectivamente. Durante a hidrólise enzimática da madeira
de álamo, Sattler et al. (1989) também observaram um aumento (31%) no rendimento de
conversão da celulose quando a relação enzima/substrato foi aumentada de 5 para 50 FPU/g
de substrato. De fato, o favorecimento da hidrólise enzimática devido ao aumento da relação
enzima/substrato já foi observado para diferentes substratos celulósicos, obtidos a partir de
madeira dura (GAN; ALLEN; TAYLOR, 2002), madeira mole (PAN et al., 2005), bagaço de
cana-de-açúcar (MANONMANI; SREEKANTIAH, 1987), cascas de arroz (YÁÑEZ;
ALONSO; PARAJÓ, 2006) e palha de arroz (KAUR; ARNEJA; SINGH, 1998; VLASENKO
et al., 1997). No entanto, a quantidade de enzimas requerida para se atingir uma completa
conversão da celulose em glicose varia para cada matéria-prima utilizada. Por exemplo,
durante a hidrólise enzimática de madeira, a máxima conversão de celulose em glicose foi
obtida utilizando uma relação enzima/substrato de 11,4 FPU/g. O aumento na quantidade de
enzimas não favoreceu o processo de hidrólise e não afetou o rendimento final em glicose
(EKLUND; GALBE; ZACCHI, 1990). Por outro lado, durante a hidrólise enzimática da palha
de arroz pré-tratada por explosão a vapor, foi necessário o uso de 100 FPU/g de substrato para
hidrolisar completamente a celulose (VLASENKO et al., 1997). No presente trabalho, uma
relação enzima/substrato de 45 FPU/g foi suficiente para promover uma hidrólise completa da
celulose a partir do bagaço de malte.
118
4.7.4 Efeito da carga de enzimas na hidrólise enzimática da celulose do bagaço de
malte
Conforme apresentado no item 4.7.2, a concentração de substrato otimizada para a
hidrólise enzimática da celulose do bagaço de malte foi de 2% p/v. A concentração máxima
de glicose no hidrolisado que pode ser obtida a partir desta concentração de substrato, é de
20,1 g/l. Este valor é baixo se for desejada a utilização do hidrolisado como meio de
fermentação, para produção de etanol ou ácido láctico, por exemplo, o que necessitaria a
realização de uma etapa de concentração para aumentar o teor de glicose. Porém, a inclusão
desta etapa pode aumentar o custo global do processo. Desta forma, poderia ser mais
vantajoso produzir diretamente um hidrolisado com uma concentração mais elevada de
glicose, de forma que a etapa de concentração não se torne necessária. Isto é possível
aumentando a concentração de substrato utilizada no processo de hidrólise. No presente
trabalho, a concentração máxima de substrato avaliada foi de 8% p/v, pois para concentrações
maiores não foi possível obter uma mistura adequada do meio reacional, devido à alta
viscosidade da suspensão. Porém, com o uso de uma concentração de substrato de 8% p/v e
uma relação enzima/substrato de 45 FPU/g, não foi atingida a máxima conversão de celulose
em glicose (rendimento em glicose = 73,8%). Para tentar melhor os resultados de rendimento
do processo de hidrólise, alguns ensaios foram realizados empregando uma concentração de
substrato de 8% p/v, mas aumentado a quantidade de enzima utilizada para até 85 FPU/g de
substrato. Os resultados obtidos nestes experimentos estão apresentados na Figura 4.13.
A Figura 4.13 mostra claramente o aumento na liberação de glicose a partir da celulose
do bagaço de malte, quando a relação enzima/substrato utilizada no processo de hidrólise foi
aumentada de 15 para 45 FPU/g de substrato. Porém, o uso de uma quantidade maior de
enzimas não favoreceu a hidrólise da celulose em glicose, de forma que o rendimento em
glicose foi mantido constante para relações enzima/substrato de 45 a 85 FPU/g (Figura 4.14).
Estes resultados sugerem que o aumento na quantidade de enzimas favorece a hidrólise
enzimática da celulose do bagaço de malte, mas até certo limite, acima do qual a velocidade
da reação não é mais alterada. Por esta razão, os ensaios onde se utilizou 45 FPU/g a
85 FPU/g de substrato proporcionaram resultados similares de rendimento em glicose e
rendimento total de hidrólise de cerca de 74% e 84%, respectivamente. Em nenhum destes
casos foi obtida, portanto, uma completa conversão da celulose em glicose, provavelmente
devido a uma possível inibição das enzimas pelo produto da reação. De acordo com alguns
119
autores, as enzimas celulolíticas de Trichoderma reesei são altamente sensíveis à inibição
causada por ambos os produtos de hidrólise, glicose e celobiose (VLASENKO et al., 1997;
WEN; LIAO; CHEN, 2004), sendo que quanto maior a concentração destes compostos no
meio reacional, maior a inibição que eles causam a estas enzimas.
0 20 40 60 80 100
0
10
20
30
40
50
60
70C
once
ntra
ção
de g
licos
e (g
/l)
Tempo de hidrólise (h)
15 FPU/g 25 FPU/g 35 FPU/g 45 FPU/g 55 FPU/g 65 FPU/g 75 FPU/g 85 FPU/g
Figura 4.13 - Perfil da liberação de glicose durante a hidrólise enzimática do bagaço de malte a 45ºC,
100 rpm e 8% p/v de concentração de substrato, utilizando diferentes relações de enzima/substrato (15 a 85 FPU/g).
10 20 30 40 50 60 70 80 9040
45
50
55
60
65
70
75
80
85
90
Ren
dim
ento
de
hidr
ólis
e (%
)
Relação enzima/substrato (FPU/g)
Rendimento em glicose Rendimento total de hidrólise
Figura 4.14 - Efeito da relação enzima/substrato nos rendimentos de hidrólise da celulose do bagaço
de malte a 45ºC, 100 rpm e 8% p/v de concentração de substrato.
120
Apesar da conversão da celulose ter sido incompleta, alguns dos hidrolisados obtidos
nestes experimentos apresentaram uma concentração de glicose de aproximadamente 59 g/l,
valor mais adequado para uso em processos fermentativos. Porém, além de glicose estes
hidrolisados também continham celobiose em concentrações variando de 6,7 a 7,9 g/l. Uma
alternativa para reduzir a concentração deste composto no hidrolisado seria a suplementação
do extrato enzimático com a enzima β-glicosidase, a qual atua na conversão da celobiose em
glicose (CAO; TAN, 2002). Porém, o alto custo envolvido com a adição de uma outra enzima
no processo, pode não justificar a adição de β-glicosidase para converter esta baixa
concentração de celobiose. De acordo com Chen, Xia e Xue (2007) o custo da enzima
contribui significativamente no custo total do processo de conversão de biomassas e, portanto,
a quantidade de enzima utilizada no processo deve ser minimizada o máximo possível. Além
disso, dependendo do processo fermentativo a ser realizado, a presença de celobiose no meio
de fermentação pode não interferir no desempenho do microrganismo. Alguns autores
verificaram inclusive consumo de celobiose quando o hidrolisado de madeira foi utilizado
como meio de fermentação para a produção de ácido láctico por Lactobacillus delbrueckii
NRRL B-445 (MOLDES; ALONSO; PARAJÓ, 1999).
4.8 EFEITO DA HEMICELULOSE E DA LIGNINA NA HIDRÓLISE ENZIMÁTICA DA
CELULOSE DO BAGAÇO DE MALTE
Estes ensaios foram realizados com o objetivo de avaliar a influência das frações de
hemicelulose e lignina na hidrólise enzimática do bagaço de malte e assim verificar a
necessidade de se submeter o material a duas etapas prévias de tratamento para poder atingir
elevados rendimentos de hidrólise. Três amostras com diferentes composições químicas foram
preparadas a partir deste material e utilizadas como substrato nos experimentos de hidrólise:
1. bagaço de malte na forma original; 2. bagaço de malte obtido após o processo de hidrólise
ácida (celulignina); 3. bagaço de malte obtido após as seqüências de hidrólise ácida e alcalina
(polpa celulósica). Conforme se observa na Tabela 4.25, o bagaço de malte original é
composto principalmente por hemicelulose e lignina. Na amostra tratada com ácido
(celulignina) a lignina é a fração presente em maior quantidade, enquanto que a polpa é
basicamente constituída por celulose.
121
Tabela 4.25 - Composição química das amostras de bagaço de malte empregadas no processo de hidrólise enzimática.
Composição química (g/100 g) Componente
Bagaço de malte original
Celulignina Polpa celulósica
Celulose 16,8 34,0 90,4 Hemicelulose 28,4 7,9 1,1 Lignina 27,8 49,2 8,2 Outrosa 27,0 8,9 0,3
a outros componentes incluem cinzas, proteínas e extrativos
4.8.1 Hidrólise enzimática do bagaço de malte com diferentes composições químicas
Os resultados da hidrólise enzimática do bagaço de malte com diferentes composições
químicas estão apresentados na Figura 4.15. Observa-se nesta figura que os resultados obtidos
variaram com a composição do material. A formação de glicose (Figura 4.15A) foi favorecida
na amostra com baixo teor de hemicelulose e lignina (polpa celulósica), a qual também
proporcionou o mais alto rendimento total de hidrólise da celulose (Figura 4.15B). Por outro
lado, o material original rendeu os mais baixos valores de glicose liberada e rendimento total
de hidrólise. Esses resultados sugerem que a composição química do substrato, isto é, a
presença de hemicelulose e/ou de lignina na amostra afetou negativamente a hidrólise
enzimática da celulose.
Os resultados obtidos a partir do resíduo de celulignina revelam a influência da
hemicelulose na hidrólise enzimática da celulose, uma vez que, apesar do teor de lignina na
amostra ter sido aumentado após o pré-tratamento ácido, a hidrólise enzimática desta amostra
proporcionou maiores valores de liberação de glicose e rendimento total de hidrólise do que
os obtidos a partir do material original. Esta melhora nos resultados pode ser atribuída,
portanto, à baixa presença de hemicelulose no material. A remoção de lignina, além da
hemicelulose, aumentou ainda mais esses resultados. A partir da polpa celulósica, foram
atingidos os mais altos valores de rendimento em glicose (85,6%) e rendimento total de
hidrólise (91,7%). Tais valores foram 14,5% e 17,4% superiores àqueles obtidos a partir da
celulignina, e 280% e 310% superiores àqueles obtidos a partir do material original. Conclui-
se, portanto, que quanto menor os teores de hemicelulose e lignina na amostra, melhor o
desempenho da hidrólise enzimática da celulose.
122
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100-2
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
20
Glic
ose
(Gli)
e C
elob
iose
(Cel
) (g/
l)
Tempo de hidrólise (h)
Gli - Original G li - Celulignina Gli - Polpa celulósica Cel - Original Cel - Celulignina Cel - Polpa celulósica
(A)
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100(B)
Ren
dim
ento
em
glic
ose,
YG
(%)
Ren
dim
ento
tota
l de
hidr
ólis
e, Y
T (%
)
Tempo de hidrólise (h)
YT - Original YT - Celulignina YT - Polpa celulósica YG - Original YG - Celulignina YG - Polpa celulósica
Figura 4.15 - Hidrólise enzimática das amostras de bagaço de malte original, celulignina e polpa celulósica. (A) Concentração de glicose e celobiose nos hidrolisados obtidos; (B) Rendimento em glicose e rendimento total de hidrólise para cada amostra utilizada.
De acordo com Mansfield, Mooney e Saddler (1999), os materiais lignocelulósicos na
sua forma original são relativamente resistentes à ação enzimática. Porém, a remoção da
hemicelulose e da lignina modifica a estrutura do material, tornando a celulose mais aberta e
acessível ao contato com as enzimas. Por essa razão, a hidrólise enzimática dos materiais
lignocelulósicos em sua forma original ocorre com baixa eficiência.
123
Assim como foi observado no presente trabalho, a remoção parcial da hemicelulose e da
lignina também proporcionou uma melhora no rendimento em glicose durante a hidrólise
enzimática da celulose a partir de outros materiais lignocelulósicos, tais como cascas de arroz
(YÁÑEZ; ALONSO; PARAJÓ, 2006), sabugo de milho (ÖHGREN et al., 2007), bagaço de
cana-de-açúcar (MARTÍN; KLINKE; THOMSEN, 2007) e madeira de álamo (CHANG;
HOLTZAPPLE, 2000). De acordo com Liao et al. (2005), tanto a hemicelulose como a
lignina, inibem física e/ou quimicamente a ação das enzimas, impedindo a celulose de ser
atacada. Com a remoção dessas duas frações, a cristalinidade da celulose é reduzida, enquanto
que a porosidade do material e a área superficial acessível às enzimas são aumentadas,
favorecendo a ação enzimática (MANSFIELD; MOONEY; SADDLER, 1999; SUN;
CHENG, 2002). Estudando a hidrólise enzimática de Pinus radiata, Wong et al. (1988)
concluíram que durante o pré-tratamento do material, a remoção da hemicelulose e
redistribuição da lignina aumentaram a área superficial presente na forma de poros,
melhorando desta forma a acessibilidade às enzimas.
Pan et al. (2005) sugeriram que a lignina reduz a hidrólise da celulose através de dois
distintos mecanismos: 1. formando uma barreira física que impede ou previne o acesso da
enzima à celulose; 2. adsorvendo irreversivelmente as enzimas celulase, impedindo, portanto,
a ação delas sobre a celulose. Por essa razão, em amostras com elevado teor de lignina grande
parte das enzimas são adsorvidas ou bloqueadas por esta molécula e apenas uma pequena
parte consegue se adsorver efetivamente na superfície do substrato. Por outro lado, para
amostras com baixo teor de lignina, muitas enzimas podem ser adsorvidas na celulose, sendo
efetivas e digerindo rapidamente a biomassa (CHANG; HOLTZAPPLE, 2000).
Embora a lignina seja considerada um dos fatores mais limitantes da hidrólise
enzimática da celulose (BERLIN et al., 2005), no presente trabalho foi verificado uma grande
influência negativa da hemicelulose na ação das enzimas à celulose. Isto porque, quando esta
fração foi removida quase que totalmente (86,5% de remoção, junto com apenas 14% de
remoção da lignina, obtendo a celulignina), o rendimento total de hidrólise aumentou em 3,5
vezes comparado com o rendimento obtido a partir do material original, atingindo um valor de
78,1% (Figura 4.15B). O pré-tratamento do bagaço de malte pelas seqüências de hidrólise
ácida e alcalina promoveu uma remoção quase total de ambas as frações, hemicelulose e
lignina (99,3% e 94,7% de remoção, respectivamente), porém, o rendimento total de hidrólise
foi aumentado em 4 vezes quando comparado com o rendimento obtido a partir do material
original, atingindo um valor de 91,8%. Estes resultados sugerem, portanto, que não é
124
necessário promover uma remoção total das frações de hemicelulose e lignina da amostra,
para se atingir elevados rendimentos durante a hidrólise enzimática da celulose. Alguns
autores também relataram que não é necessário remover completamente a lignina do material
para que a hidrólise enzimática da celulose seja completa (GREGG; SADDLER, 1996). Neste
caso, uma análise econômica poderia ser útil para avaliar se os melhores resultados obtidos no
rendimento da hidrólise enzimática a partir da polpa celulósica justificariam o custo envolvido
com a realização da etapa de tratamento alcalino da celulignina, antes da hidrólise enzimática.
De um ponto de vista ambiental a não realização desta etapa seria benéfica, pois a degradação
da lignina durante a hidrólise alcalina gera um licor rico em compostos fenólicos, dentre os
quais, muitos são tóxicos e precisam ser removidos antes da descarga deste efluente no meio
ambiente (KARAM; NICELL, 1997).
É também interessante notar que a partir da celulignina do bagaço de malte, mas
principalmente a partir da polpa celulósica, a hidrólise enzimática da celulose apresentou uma
fase inicial logarítmica associada com uma rápida liberação de glicose, seguida por uma
diminuição na velocidade de produção deste açúcar à medida que a reação avançou (Figura
4.15A). Para explicar este comportamento, alguns autores sugeriram que durante a hidrólise
enzimática da celulose, as enzimas celulolíticas degradam rapidamente a fração amorfa mais
acessível do substrato. Com o progresso da hidrólise, a celulose torna-se mais resistente à
hidrólise como resultado do aumento da cristalinidade (GHARPURAY; LEE; FAN, 1983;
GREGG; SADDLER, 1996; PURI, 1984). Outros fatores associados com a natureza do
sistema enzimático utilizado também têm sido sugeridos para explicar a diminuição da
velocidade da hidrólise da celulose. Estes incluem a inativação térmica das enzimas, a
adsorção irreversível ou ligação não específica das celulases e a inibição das enzimas pelo
produto da reação (GREGG; SADDLER, 1996; MORIYAMA; SAIDA, 1986; RAMOS;
NAZHAD; SADDLER, 1993).
4.8.2 Estrutura morfológica do bagaço de malte após a hidrólise enzimática
Vários autores consideram que o melhor desempenho da hidrólise enzimática quando se
utiliza substratos pré-tratados, está relacionado às modificações morfológicas causadas pelo
pré-tratamento na estrutura do material (GHARPURAY; LEE; FAN, 1983; RAMOS;
NAZHAD; SADDLER, 1993). Por este motivo, algumas fotomicrografias em microscópio
eletrônico de varredura foram realizadas, para as diferentes amostras de bagaço de malte, com
125
o objetivo de se verificar as mudanças estruturais ocorridas no material durante os processos
de hidrólise ácida, alcalina e enzimática (Figura 4.16).
(A)
(C)
(E)
(B)
(D)
(F)
Figura 4.16 - Fotomicrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura das amostras de bagaço de malte. Material original antes (A) e após (B) a hidrólise enzimática; Celulignina antes (C) e após (D) a hidrólise enzimática; Polpa celulósica antes (E) e após (F) a hidrólise enzimática. Ampliação: 300 vezes.
126
A Figura 4.16A mostra que o bagaço de malte na sua forma original apresenta uma
estrutura de fibras rígidas e altamente ordenadas. Com a remoção da hemicelulose, a estrutura
deste material foi modificada, mas a estrutura principal não foi rompida (Figura 4.16C).
Quando a lignina também foi removida (Figura 4.16E), a estrutura do material foi fortemente
modificada resultando em uma estrutura muito diferente das outras duas, original e
celulignina. Neste caso, as fibras de celulose tornaram-se totalmente expostas, o que
aumentou a área superficial e a porosidade do material. Conseqüentemente, essas fibras
encontram-se mais susceptíveis à ação das enzimas do que as outras duas amostras de bagaço
de malte. Ooshima, Burns e Converse (1990) também observaram que quanto mais severo o
pré-tratamento utilizado, maior a área superficial da celulose disponível para as enzimas.
Após a hidrólise enzimática, observa-se que a estrutura do material original
praticamente não foi modificada (Figura 4.16B), confirmando a baixa eficiência de hidrólise
obtida. A imagem da celulignina hidrolisada (Figura 4.16D) mostra uma maior destruição das
fibras neste caso quando comparada com as fibras hidrolisadas a partir do material original, o
que justifica o melhor desempenho da hidrólise a partir da celulignina do que a partir da
amostra original. As fibras hidrolisadas a partir da polpa celulósica do bagaço de malte foram
completamente destruídas (Figura 4.16F), o que explica os altos valores de rendimento em
glicose e rendimento total de hidrólise, atingidos a partir deste substrato. Nota-se ainda neste
caso que as fibras de celulose tornaram-se mais estreitas e curtas, sugerindo um ataque
longitudinal e lateral das fibras.
4.8.3 Composição dos hidrolisados celulósicos produzidos
A composição em termos de carboidratos (glicose, celobiose, xilose e arabinose) dos
hidrolisados produzidos a partir do bagaço de malte encontra-se na Tabela 4.26. Observa-se
nesta tabela que a glicose foi o principal açúcar presente nos hidrolisados produzidos a partir
da celulignina e da polpa celulósica. Embora a concentração tenha sido diferente para cada
caso, estes valores estão relacionados com a composição química do material, de forma que
quanto maior o teor de celulose presente, maior a concentração de glicose que poderia ser
obtida no hidrolisado. Para o bagaço de malte nas formas original, celulignina e polpa
celulósica, a máxima concentração de glicose que poderia ser obtida no hidrolisado seria de
3,7 g/l, 7,6 g/l e 20,1 g/l, respectivamente. Estes resultados demonstram, portanto, que a
liberação de glicose a partir do material foi favorecida com a realização dos pré-tratamentos
127
de hidrólise ácida e alcalina, uma vez que a concentração de glicose nos hidrolisados
enzimáticos correspondeu a 23%, 74% e 86% do máximo que poderia ser obtido para o
material na forma original, celulignina e polpa celulósica, respectivamente.
Tabela 4.26 - Composição de carboidratos nos hidrolisados enzimáticos produzidos a partir do bagaço de malte nas formas original, celulignina e polpa celulósica.
Concentração de carboidratos no hidrolisado (g/l) Componente
Original Celulignina Polpa celulósica
Glicose 0,84 5,65 17,21 Celobiose - 0,24 1,17 Xilose 0,86 0,60 - Arabinose 1,90 - -
A arabinose foi o principal açúcar encontrado no hidrolisado produzido a partir da
amostra original. Existem duas explicações possíveis para este fato: 1. a arabinose presente no
bagaço de malte apresenta uma alta sensibilidade térmica, a qual é maior do que aquela
apresentada pela xilose (CARVALHEIRO et al., 2004b), e por esta razão ela teria sido
facilmente liberada da estrutura da hemicelulose durante o processo de hidrólise; 2. as
celulases são geralmente misturas de várias enzimas e, além daquelas envolvidas no processo
de hidrólise da celulose (endoglucanase, exoglucanase, e β-glucosidase) existem também
várias enzimas auxiliares que atacam a hemicelulose, tais como glucuronidase, acetilesterase,
xilanase, β-xilosidase, galactomananase e glucomananase (DUFF; MURRAY, 1996; SUN;
CHENG, 2002) que poderiam ter atacado a estrutura da hemicelulose liberando xilose e
arabinose no meio reacional.
Um aspecto importante que deve ser considerado quando se avalia a composição de
hidrolisados é com respeito à presença de subprodutos. De acordo com Martín et al. (2002), a
baixa formação de subprodutos é uma importante vantagem da hidrólise enzimática quando
comparada à hidrólise ácida, por exemplo. No presente trabalho, todos os hidrolisados
produzidos continham outros carboidratos (xilose, arabinose ou celobiose) em sua
composição, além de glicose. O hidrolisado obtido a partir do bagaço de malte original
continha xilose e arabinose em concentrações mais elevadas que a de glicose, enquanto que o
hidrolisado produzido a partir da celulignina continha celobiose e xilose em mistura com a
glicose, porém, em concentrações menores que a deste açúcar (Tabela 4.26). No hidrolisado
128
obtido a partir da polpa celulósica, somente celobiose foi detectada em mistura com a glicose.
Em termos de proporção, nota-se que a xilose estava presente no hidrolisado original, em uma
relação de 1/1 com a glicose. Porém, no hidrolisado da celulignina, esta proporção foi
reduzida para 1/9,4 e no hidrolisado da polpa celulósica não foi detectada a presença de
xilose. Esta diminuição na relação xilose/glicose se deve à liberação da xilose durante as
etapas de pré-tratamento do bagaço de malte. A mesma explicação pode ser dada para
justificar a presença de arabinose apenas no hidrolisado do bagaço de malte original (Tabela
4.26). Por outro lado, a presença de celobiose foi verificada nos hidrolisados obtidos a partir
da celulignina e da polpa de celulose, mas não a partir do material original. Além disso,
quanto mais pré-tratado o material, maior a concentração de celobiose obtida no hidrolisado
(Tabela 4.26) o que sugere um efeito maior de inibição das enzimas neste hidrolisado,
afetando a capacidade de conversão da celobiose em glicose. Tal efeito pode estar relacionado
com a alta concentração de glicose obtida neste meio.
A presença de compostos tóxicos ao metabolismo microbiano (hidroximetilfurfural,
furfural, ácido acético e compostos fenólicos) não foi detectada nos hidrolisados produzidos.
Este fato pode ser atribuído à alta especificidade das enzimas celulase (BEGUIN; AUBERT,
1994), e também às condições brandas de reação empregadas. A ausência de compostos
tóxicos é de fundamental importância para o emprego do hidrolisado em processos de
bioconversão, pois a maior limitação do uso de hidrolisados para esta finalidade se deve à
inibição causada pelos compostos tóxicos nele presentes (MUSSATTO; ROBERTO, 2004a).
4.9 EMPREGO DO HIDROLISADO CELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE COMO
MEIO DE FERMENTAÇÃO PARA PRODUÇÃO DE ÁCIDO LÁCTICO
4.9.1 Aspectos gerais do processo fermentativo
O hidrolisado obtido por hidrólise enzimática da polpa celulósica do bagaço de malte
foi empregado como meio de fermentação para a produção de ácido láctico pela bactéria
Lactobacillus delbrueckii. No entanto, como era de interesse utilizar um hidrolisado contendo
cerca de 50 g/l de glicose, este foi produzido nas condições otimizadas de hidrólise, porém,
utilizando uma concentração de substrato de 8% p/v. Análises da composição química do
hidrolisado assim obtido revelou a presença de glicose e celobiose nas concentrações de
129
57,8 g/l e 7,5 g/l, respectivamente.
Quando cultivada neste hidrolisado, a bactéria Lactobacillus delbrueckii foi capaz de
consumir a glicose presente e produzir ácido láctico, o qual foi detectado apenas na forma
isomérica L. Embora o ácido láctico se apresente sob duas formas isoméricas, D e L, de
acordo com Hofvendahl e Hahn-Hägerdal (2000) normalmente a maioria das bactérias ácido
lácticas produzem apenas a forma isomérica L deste ácido.
A celobiose presente no hidrolisado não foi consumida pelo microrganismo durante o
tempo de fermentação considerado (48 h) e a presença de subprodutos da reação, incluindo
etanol, ácido acético e ácido fórmico, também não foi verificada no hidrolisado fermentado.
Este resultado é interessante, pois para que a produção de ácido láctico em escala industrial
ocorra de forma eficiente, a formação de subprodutos deve ser evitada ou mantida em um
mínimo (HOFVENDAHL; HAHN-HÄGERDAL, 2000).
4.9.2 Efeito do nível de inóculo na produção de ácido láctico
A produção de ácido láctico por microrganismos é influenciada por vários fatores, os
quais incluem pH, agitação, fonte de carbono, temperatura, suplementação nutricional e nível
do inóculo (HOFVENDAHL; HAHN-HÄGERDAL, 2000; SILVA; MANCILHA, 1991).
Para avaliar o efeito da concentração inicial do inóculo na produção de ácido láctico por
Lactobacillus delbrueckii a partir do hidrolisado celulósico de bagaço de malte, foram
realizados alguns ensaios empregando valores de concentração celular inicial de 0,5, 0,75 e
1,0 g/l. Os resultados obtidos revelaram que após 48 h de fermentação, o pH inicial de todos
os ensaios havia sido reduzido de 5,95 (pH inicial) para aproximadamente 4,5, devido a
formação e liberação de ácido láctico no meio reacional. Porém, o consumo de glicose e a
produção de ácido láctico variaram para cada nível de inóculo utilizado. A eficiência destas
fermentações foi avaliada através dos valores dos parâmetros: produtividade volumétrica
(QP), fator de conversão de glicose em ácido láctico (YP/S) e fator de rendimento de ácido
láctico por célula (YP/X). Os resultados obtidos estão apresentados na Figura 4.17.
Nota-se na Figura 4.17 que os valores de YP/S aumentaram com o aumento do nível de
inóculo de 0,5 para 1,0 g/l, atingindo o valor máximo de 0,73 g/g (73% de eficiência) quando
se utilizou 1,0 g/l de células no início da fermentação. Por outro lado, quando o nível de
inóculo foi dobrado, os valores de YP/X foram reduzidos pela metade, sugerindo que o
aumento da quantidade de células no início da fermentação exerceu um efeito negativo sobre
130
a capacidade do microrganismo em converter glicose a ácido láctico. Tal efeito pode estar
relacionado com a presença de nutrientes no meio de fermentação. O hidrolisado celulósico
de bagaço de malte foi utilizado como meio de fermentação na forma em que foi produzido,
isto é, sem suplementação adicional de nutrientes. Como a polpa de celulose que foi
hidrolisada enzimaticamente continha uma pequena fração (0,3% p/p) composta por proteínas
e minerais, é possível que parte destas substâncias tenham sido solubilizadas durante o
processo de hidrólise enzimática, proporcionando desta forma alguma fonte nutricional para o
desenvolvimento do microrganismo. No entanto, esta quantidade de nutrientes solubilizada
pode não ter sido suficiente para os microrganismos quando o nível de inóculo foi aumentado.
Isto teria afetado o desempenho das células em converter glicose a ácido láctico, justificando
a queda observada nos valores de YP/X.
0
2
4
6
8
10
0 1 2 3 4 5 6 7 80,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
1,00,75
YP/
S (g
/g);
Q
P (g/
l.h)
Concentração inicial de inóculo (g/l)
0,5
YP/
X (g
/g)
Figura 4.17 - Efeito da concentração inicial de inóculo nos parâmetros fermentativos da produção de
ácido láctico por Lactobacillus delbrueckii a partir do hidrolisado celulósico de bagaço de malte.
Por outro lado, quanto maior o nível de inóculo utilizado, maior a quantidade de células
disponíveis para realizar este processo de bioconversão. Por esta razão, o aumento da carga do
inóculo de 0,5 para 1,0 g/l foi capaz de mascarar esta menor capacidade da célula em
converter glicose a ácido láctico, uma vez que o fator de rendimento do processo (YP/S) foi
aumentado em 20%. Conclui-se então com estes resultados que, quando se utilizou um
131
inóculo com 1 g/l de células, o fator de rendimento em ácido láctico por substrato consumido
foi maior do que nos outros experimentos devido ao maior número de células presentes no
meio de fermentação. Durante a produção de ácido láctico por Lactobacillus delbrueckii a
partir de resíduo de abacaxi, Idris e Suzana (2006) também verificaram uma relação entre a
concentração de células e a produção de ácido láctico, de forma que a produção deste ácido
foi favorecida quando a concentração celular utilizada foi aumentada. O aumento do nível de
inóculo de 104 para 106 esporos/ml também favoreceu a produção de ácido láctico por uma
espécie mutante do fungo Rhizopus (MIURA et al., 2003).
Em relação à produtividade volumétrica em ácido láctico (QP) observa-se na Figura
4.17 que o valor deste parâmetro foi idêntico em todos os experimentos. Isto significa que em
um tempo de fermentação de 48 h as células produziram a mesma quantidade de ácido láctico
em todos os meios avaliados. Um comportamento similar foi observado por Gomez e Goma
(1986) durante a fermentação para produção de ácido láctico a partir de glicose empregando
diferentes níveis de inóculo (0,4, 2,5 e 3,6 g/l). De acordo com estes autores, um tempo de
fermentação de 50 h foi suficiente para que todos os meios de fermentação atingissem a
mesma concentração final de ácido láctico, devido à queda do pH do meio de fermentação.
Durante a fermentação para produção de ácido láctico, na medida em que o ácido láctico é
formado e excretado para fora da célula, o pH do meio de fermentação diminui causando uma
inibição no crescimento do microrganismo, reduzindo então o rendimento de formação de
produto (SILVA; MANCILHA, 1991). Logo, no presente trabalho, um tempo de 48 h foi
longo o suficiente para permitir que as células produzissem, em todos os meios de
fermentação, a mesma quantidade de ácido láctico capaz de proporcionar a queda do pH até
este valor limite onde o metabolismo do microrganismo foi afetado. Por este motivo, todas as
fermentações apresentaram valores similares de pH final e de produtividade volumétrica. De
acordo com Hofvendahl e Hahn-Hägerdal (2000), o pH ótimo para produção de ácido láctico
varia entre 5,0 e 7,0. Valores abaixo deste limite afetam negativamente o desempenho do
microrganismo, determinando o final da fermentação.
132
4.10 EFEITO DO pH E DA SUPLEMENTAÇÃO NUTRICIONAL DO HIDROLISADO
CELULÓSICO DE BAGAÇO DE MALTE NA PRODUÇÃO DE ÁCIDO LÁCTICO POR
Lactobacillus delbrueckii
Nos experimentos anteriores foi verificado que o hidrolisado celulósico de bagaço de
malte apresenta características favoráveis para ser utilizado como meio de fermentação para a
produção de ácido láctico. Porém, o desempenho da fermentação foi afetado pela queda do
pH ocorrida em decorrência da formação deste ácido. Por este motivo, os experimentos
realizados nesta etapa foram conduzidos com e sem o controle do pH de fermentação, para
avaliar a influência desta variável no processo de bioconversão. Além disso, alguns ensaios
foram também realizados empregando o hidrolisado suplementado com nutrientes, para
verificar a possibilidade de melhorar os valores dos parâmetros fermentativos obtidos
anteriormente.
4.10.1 Efeito da suplementação nutricional do hidrolisado celulósico
A adição de nutrientes ao meio de fermentação empregado para a produção de ácido
láctico tem sido investigada em um grande número de trabalhos envolvendo como substrato
sacarose, glicose, lactose, soro de queijo, hidrolisados hemicelulósicos, entre outros. Nestes
estudos, os principais nutrientes adicionados aos meios de fermentação incluem o extrato de
levedura e os componentes presentes na formulação do meio MRS caldo (meio empregado
para crescimento de bactérias) (HOFVENDAHL; HAHN-HÄGERDAL, 2000). A Figura 4.18
mostra que a adição de extrato de levedura ao hidrolisado celulósico de bagaço de malte
favoreceu o consumo de glicose e a produção de ácido láctico pelo microrganismo; no
entanto, o desempenho da fermentação foi ainda melhor quando o hidrolisado foi enriquecido
com os nutrientes do meio MRS.
De fato, as bactérias ácido lácticas são considerados microrganismos de grande
exigência nutricional, pois apresentam uma capacidade limitada em biosintetizar vitaminas do
complexo B e aminoácidos (FITZPATRICK; O’KEEFFE, 2001; OH et al., 2005). Logo, para
garantir boas condições de crescimento e atividade biológica destas bactérias, o meio de
cultivo deve conter minerais, vitaminas do complexo B, aminoácidos, bases purinas e
pirimidinas (HOFVENDAHL; HAHN-HÄGERDAL, 2000; KWON et al., 2000; PAULI;
FITZPATRICK, 2002).
133
0 10 20 30 40 50 60 70 8015
20
25
30
35
40
45
50
550 10 20 30 40 50 60 70 80
15
20
25
30
35
40
45
50
55G
licos
e (g
/l)
Tempo de fermentação (h)
(A)
0 10 20 30 40 50 60 70 80-3
0
3
6
9
12
150 10 20 30 40 50 60 70 80
-3
0
3
6
9
12
15
Áci
do lá
ctic
o (g
/l)
Tempo de fermentação (h)
(B)
0 10 20 30 40 50 60 70 803,0
3,5
4,0
4,5
5,0
5,5
6,00 10 20 30 40 50 60 70 80
3,0
3,5
4,0
4,5
5,0
5,5
6,0
pH
Tempo de fermentação (h)
(D)
0 10 20 30 40 50 60 70 800,5
1,0
1,5
2,0
2,50 10 20 30 40 50 60 70 80
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
Cél
ulas
(g/l)
Tempo de fermentação (h)
(C)
Figura 4.18 - Efeito da suplementação nutricional do hidrolisado celulósico de bagaço de malte no consumo de glicose (A), produção de ácido láctico (B), crescimento celular (C) e pH da fermentação (D) por Lactobacillus delbrueckii. Meio 1 (): hidrolisado não suplementado; Meio 2 (): hidrolisado suplementado com extrato de levedura; Meio 3 (): hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS; Meio 4 ( ): MRS com a mesma concentração inicial de glicose do hidrolisado.
A necessidade de suplementação nutricional do hidrolisado celulósico de bagaço de
malte é justificável uma vez que o material submetido à hidrólise enzimática (polpa
celulósica) já havia sido pré-tratado duas vezes, com ácido diluído e com solução de
hidróxido de sódio. Por esta razão, importantes componentes nutricionais, tais como minerais
(presentes nas cinzas) e proteínas existentes no material original, já haviam sido quase
totalmente solubilizados durante estas etapas. Mesmo assim, observa-se na Figura 4.18B que
houve produção de ácido láctico a partir do hidrolisado sem suplementação nutricional, o que
sugere a presença de alguma fonte de nutrientes neste meio. A necessidade de suplementação
nutricional do hidrolisado para a produção de ácido láctico já foi verificada também em
hidrolisados obtidos a partir de outros materiais lignocelulósicos, tais como palha de trigo
134
(GARDE et al., 2002), madeira (PARAJÓ; ALONSO; SANTOS, 1996; WEE et al., 2006),
bagaço de mandioca e bagaço de cana-de-açúcar (JOHN; NAMPOOTHIRI; PANDEY, 2006).
A adição de extrato de levedura ao hidrolisado de bagaço de malte proporcionou um
aumento de 27% na produção de ácido láctico. Por outro lado, quando o hidrolisado foi
suplementado com os nutrientes do meio MRS, o aumento na produção de ácido láctico foi de
67%. Resultados similares a estes foram também observados em outros trabalhos sobre
produção de ácido láctico, conforme relatado por Hofvendahl e Hahn-Hägerdal (2000). Estes
autores compararam diversos estudos sobre a produção de ácido láctico onde os meios de
fermentação foram suplementados com diferentes tipos de nutrientes. Além de observar um
efeito positivo da suplementação nutricional na produção deste ácido, eles também
verificaram que a adição dos nutrientes do meio MRS tem proporcionado melhores resultados
de fermentação do que a adição de extrato de levedura apenas. Isto poderia ser explicado pelo
fato de que o meio MRS é uma mistura mais completa de nutrientes, pois também contém
extrato de levedura e ainda é acrescido de extrato de carne, peptona entre outros nutrientes.
De acordo com Kwon et al. (2000), quanto mais completa a mistura de nutrientes adicionada
ao meio de fermentação, maior será a produtividade volumétrica em ácido láctico.
Um fato interessante observado foi que os resultados de consumo de glicose e produção
de ácido láctico a partir do hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS foram
superiores àqueles obtidos no próprio meio MRS (Figuras 4.18A e B). Isto sugere que o
hidrolisado celulósico de bagaço de malte apresenta algum componente em sua composição
que não foi identificado, mas que atuou sinergisticamente com os nutrientes do meio MRS
favorecendo a produção de ácido láctico.
O crescimento celular também foi favorecido em meios suplementados com nutrientes,
porém, neste caso, os resultados foram similares em ambos os hidrolisados suplementados,
com extrato de levedura ou com os nutrientes do meio MRS (Figura 4.18C). A partir dos
meios suplementados, o crescimento do microrganismo foi inicialmente rápido, mas
praticamente cessou após 12 h de fermentação. Por outro lado, no meio não suplementado, o
crescimento do microrganismo foi muito pequeno, não havendo uma fase inicial exponencial,
como aquela observada nos outros meios.
É importante ressaltar que todos estes ensaios foram realizados sem controle do pH do
meio de fermentação, o que claramente afetou o desempenho do processo. A Figura 4.18D
mostra que durante as primeiras 12 h de fermentação houve uma forte queda do pH (de 6,0
para 4,4) em todos os meios, devido à produção de ácido láctico. Conseqüentemente, o
135
metabolismo do microrganismo foi afetado e nas 12 h seguintes de fermentação, o consumo
de glicose foi pequeno em todos os meios, prejudicando a produção de ácido láctico e o
crescimento celular. Mesmo assim, ainda houve uma pequena formação de ácido láctico
durante este período, causando uma queda do pH para 4,2, o que praticamente determinou o
final de todas as fermentações. Observa-se na Figura 4.18 que após 24 h de fermentação, o pH
de todos os meios permaneceu praticamente estável em 4,2 e não foi mais verificado consumo
de glicose, produção de ácido láctico e crescimento celular. Comportamento similar foi
observado durante a fermentação para a produção de ácido láctico por Lactococcus lactis, a
partir do hidrolisado de farinha de trigo, onde a queda do pH inicial (5,85) para 3,2, durante as
primeiras 24 h do processo, determinou o final da fermentação (HOFVENDAHL; HAHN-
HÄGERDAL, 1997).
Com base nestes resultados, os parâmetros fermentativos da produção de ácido láctico
foram calculados apenas para os tempos de fermentação de 12 e 24 h (Figura 4.19). Observa-
se que com 12 h de fermentação, todos os meios formulados a partir do hidrolisado de bagaço
de malte apresentaram valores similares de fator de rendimento em ácido láctico (YP/S), os
quais foram superiores ao valor obtido no meio MRS. Porém, a produtividade volumétrica foi
maior nos meios suplementados com nutrientes, atingindo um valor máximo de 0,79 g/l.h no
hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS (meio 3). Considerando 24 h como
tempo final de fermentação (tempo a partir do qual não foi mais observado consumo de
glicose e produção de ácido láctico) observa-se que os valores de fator de rendimento
permaneceram na faixa de 0,7 g/g para os meios MRS e hidrolisado não suplementado. No
entanto, estes valores aumentaram cerca de 10% nos meios onde o hidrolisado foi
suplementado com nutrientes, mostrando que a adição de nutrientes ao hidrolisado favoreceu
a produção de ácido láctico pelo microrganismo.
Ao contrário do fator de rendimento, a produtividade volumétrica em ácido láctico foi
bastante diferente considerando os tempos de 12 ou 24 h como final da fermentação (Figura
4.19). Com 12 h de processo, quando o microrganismo ainda estava em condições de pH
favoráveis ao seu desenvolvimento, as produtividades obtidas em todos os meios foram 40%
maiores do que os valores observados após 24 h de fermentação. Esta queda nos valores de
produtividade volumétrica indica que a produção de ácido láctico entre 12 e 24 h de
fermentação foi menor do que a produção obtida entre 0 e 12 h, ou seja, entre 12 e 24 h de
processo o microrganismo não conseguiu produzir ácido láctico com a mesma eficiência que
produziu durante as 12 h iniciais.
136
Yp/s Qp0,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
Parâmetros fermentativos para 12 h de processo
Meio 1 Meio 2 Meio 3 Meio 4
Yp/
s (g
/g);
Qp
(g/l.
h)
Yp/s Qp0,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
Yp/s
(g/g
); Q
p (g
/l.h)
Parâmetros fermentativos para 24 h de processo
Meio 1 Meio 2 Meio 3 Meio 4
Figura 4.19 - Efeito da suplementação nutricional do hidrolisado celulósico de bagaço de malte nos
parâmetros fermentativos (YP/S e QP) da produção de ácido láctico por Lactobacillus delbrueckii. Meio 1: hidrolisado não suplementado; Meio 2: hidrolisado suplementado com extrato de levedura; Meio 3: hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS; Meio 4: MRS com a mesma concentração inicial de glicose do hidrolisado.
Estes resultados permitem concluir que a produção de ácido láctico por Lactobacillus
delbrueckii em hidrolisado celulósico de bagaço de malte pode ser realizada com elevados
valores de rendimento (0,70 g/g) e produtividade volumétrica (0,79 g/l.h) quando o
hidrolisado é suplementado com nutrientes. Porém, como o pH de fermentação não foi
controlado, uma grande quantidade de glicose (33 a 43 g/l) permaneceu nos meios,
comprometendo a produtividade do processo e a posterior purificação do caldo fermentado.
4.10.2 Efeito do pH
O pH é considerado um dos principais fatores que interferem na produção de ácido
láctico por fermentação, pois a atividade metabólica dos microrganismos depende do pH
extracelular (SILVA; MANCILHA, 1991). De acordo com Hofvendahl e Hahn-Hägerdal
(2000), o pH ótimo para a produção de ácido láctico varia entre 5 e 7, dependendo da espécie
utilizada. Para a bactéria Lactobacillus delbrueckii, valores de pH na faixa de 5,5 a 7,5 foram
considerados adequados para proporcionar um bom crescimento e produção de ácido láctico
(IDRIS; SUZANA, 2006), por isso, no presente trabalho, todas as fermentações iniciaram
com um valor de pH igual a 6,0.
137
A Figura 4.20 apresenta os perfis de consumo de glicose e produção de ácido láctico nas
fermentações realizadas com e sem o controle do pH. Observa-se que durante as primeiras
12 h de processo, ambas as fermentações, com e sem controle de pH, apresentaram resultados
bastante similares. Isto ocorreu tanto em hidrolisado como no meio MRS. Porém, a partir
deste tempo o consumo de glicose e a produção de ácido láctico foram influenciados pelo pH
do meio de fermentação. Quando o pH foi mantido em 6,0, as fermentações prosseguiram até
o tempo final considerado (60 h); enquanto que quando o pH não foi controlado, as
fermentações praticamente terminaram após 12 h de processo, devido à queda do pH para um
valor de aproximadamente 4,6. De acordo com alguns autores, os ácidos fracos, como por
exemplo, o ácido láctico, são realmente capazes de inibir o crescimento bacteriano
dependendo do pH do meio de fermentação. Na medida em que o ácido láctico é excretado
para fora da célula, ele diminui o pH externo. Com a queda do pH, este ácido, que está
presente na forma não dissociada, tem a sua passagem facilitada através da membrana
plasmática. Desta forma, o ácido entra novamente na célula e ao encontrar um pH interno
igual a 7,4, ele se dissocia liberando prótons H+ . A célula passa então a gastar energia na
forma de ATP para expulsar estes prótons do seu interior. Quanto maior a quantidade de ácido
formado, mais o pH externo diminui e uma quantidade maior de ácido entra novamente na
célula e se dissocia. Logo, maior será o gasto de energia da célula para manter sua integridade
física. Isto ocorre até certo limite onde a célula não apresenta mais energia suficiente para
bombear os prótons para fora. Então o crescimento pára e a célula pode chegar à morte
(HOFVENDAHL; HAHN-HÄGERDAL, 1997; KASHKET, 1987).
Na fermentação do hidrolisado não suplementado, com controle de pH, a produção de
ácido láctico foi de 12,76 g/l, valor 62% superior ao obtido no final da fermentação sem
controle de pH (7,87 g/l) (Figura 4.20B). Por outro lado, em hidrolisado suplementado e com
controle de pH, a produção de ácido láctico atingiu 35,54 g/l, enquanto que a máxima
concentração obtida neste meio sem controle de pH, foi de 13,02 g/l. Estes valores
representam um aumento de 170% na produção de ácido láctico quando o pH do hidrolisado
suplementado foi controlado. Comparando as fermentações em hidrolisado, fica claro
novamente que a suplementação nutricional promoveu um aumento na eficiência de
conversão da glicose a ácido láctico.
Os parâmetros fermentativos obtidos nestas fermentações estão apresentados na Tabela
4.27. Observa-se nesta tabela que houve uma grande quantidade de glicose residual em todos
os meios sem controle de pH, o que demonstra que o consumo de glicose pelo microrganismo
138
foi afetado nestes meios. O controle do pH de fermentação favoreceu o consumo desta
hexose, principalmente a partir do hidrolisado suplementado, proporcionando, como
conseqüência, uma maior formação de ácido láctico. Devido à maior formação deste ácido, a
produtividade volumétrica (QP) neste meio foi a mais elevada dentre todos os meios
avaliados, atingindo 0,59 g/l.h ao final da fermentação, mas com um pico de 0,82 g/l.h com
12 h de processo.
0 10 20 30 40 50 6010
15
20
25
30
35
40
45
50
550 10 20 30 40 50 60
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
Glic
ose
(g/l)
Tempo de fermentação (h)
(A)
0 10 20 30 40 50 60-5
0
5
10
15
20
25
30
35
400 10 20 30 40 50 60
-5
0
5
10
15
20
25
30
35
40
(B)
Áci
do lá
ctic
o (g
/l)
Tempo de fermentação (h)
Figura 4.20 - Efeito do controle de pH no consumo de glicose (A) e produção de ácido láctico (B) por Lactobacillus delbrueckii em meios: Hidrolisado não suplementado () sem controle de pH e () com controle de pH; Hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS () sem controle de pH e ( ) com controle de pH; Meio MRS com a mesma concentração inicial de glicose do hidrolisado ( ) sem controle de pH e ( ) com controle de pH.
Tabela 4.27 - Parâmetros fermentativos e concentração de glicose nos meios de fermentação para a
produção de ácido láctico por Lactobacillus delbrueckii. Hidrolisado não suplementado
Hidrolisado suplementado
MRS
Sem controle de pH
Com controle de pH
Sem controle de pH
Com controle de pH
Sem controle de pH
Com controle de pH
Glicose inicial (g/l) 50,86 51,05 50,97 51,14 50,13 52,09 Glicose final (g/l) 41,23 38,00 37,84 15,58 40,02 28,58 Ácido láctico (g/l) 7,87 12,76 13,02 35,54 8,33 23,46 YP/S (g/g) 0,82 0,98 0,99 0,99 0,82 0,99 QP (g/l.h) 0,13 0,21 0,22 0,59 0,14 0,39 YP/X (g/g)
8,94 16,57
8,57 17,95
6,31 18,62 YP/S = fator de rendimento de ácido láctico por glicose consumida (g/g); QP = produtividade volumétrica em ácido láctico (g/l.h); YP/X = fator de rendimento de ácido láctico por célula (g/g).
139
Os valores de fator de rendimento em ácido láctico (YP/S) foram elevados (≥0,82 g/g)
em todos os experimentos (Tabela 4.27), sugerindo que o microrganismo foi capaz de
converter quase toda a glicose consumida em ácido láctico, independente do meio de
fermentação utilizado. Os valores mais baixos foram observados nos meios sem controle de
pH. Em hidrolisado suplementado, os valores de YP/S obtidos foram similares em ambos os
meios, com e sem o controle do pH de fermentação, embora a produção de ácido láctico tenha
sido quase três vezes maior no meio onde o pH foi controlado. Isto significa que a produção
de ácido láctico foi afetada no meio sem controle de pH porque o consumo de glicose pelo
microrganismo foi prejudicado. Com relação à produção de ácido láctico por grama de célula,
os valores de YP/X mostram claramente que o controle de pH foi fundamental para que
houvesse uma maior formação de produto por célula.
4.11 BRANQUEAMENTO DAS POLPAS DE CELULOSE OBTIDAS A PARTIR DO
BAGAÇO DE MALTE
Além de ser utilizada como matéria-prima para obtenção de glicose por hidrólise
enzimática, a polpa de celulose obtida na condição otimizada de hidrólise alcalina foi também
submetida a um processo de branqueamento para verificar sua possibilidade de emprego na
produção de papel ou de derivados de celulose. Para comparação, uma polpa de celulose foi
também produzida a partir do bagaço de malte original e submetida ao mesmo procedimento
de branqueamento, visando avaliar o efeito do pré-tratamento ácido na qualidade da polpa
branqueada.
4.11.1 Características das polpas obtidas
A composição química das duas polpas de celulose utilizadas nestes experimentos está
apresentada na Tabela 4.28. Nota-se nesta tabela que as polpas apresentaram composições
químicas diferentes em função dos tratamentos a que foram submetidas.
De acordo com alguns autores, para se produzir papéis de alta qualidade é necessário
promover uma elevada remoção da hemicelulose e da lignina do material (sem interferir na
estrutura da celulose), pois a presença destas frações diminui a qualidade dos papéis, sendo
que a lignina interfere ainda na etapa de fabricação (CHEN et al., 2001; GRACE; LEOPOLD;
140
MALCOLM, 1996). O processo de hidrólise alcalina utilizado no presente trabalho, foi capaz
de remover seletivamente as frações de hemicelulose e lignina, a partir dos dois materiais
utilizados. Quando aplicado ao material original, a remoção destas frações foi superior a 78%
p/p enquanto que a celulose praticamente não foi atacada (remoção de 3,0% p/p). Como
conseqüência, o teor de celulose neste material foi aumentado em 3,2 vezes após a polpação,
atingindo 54,3% p/p. Quando o processo de hidrólise alcalina foi aplicado ao material pré-
tratado, obteve-se um aumento similar no teor de celulose (2,7 vezes) devido também à
elevada remoção de hemicelulose e de lignina (>94% p/p) e à baixa remoção de celulose
(≈ 10% p/p). No entanto, como o material pré-tratado apresentava um teor de celulose
(34% p/p) quase duas vezes maior do que o do bagaço de malte original (16,8% p/p), sua
polpa também atingiu um teor de celulose aproximadamente duas vezes maior do que o da
polpa do bagaço de malte original (Tabela 4.28).
Tabela 4.28 - Rendimento e características das polpas de celulose obtidas por hidrólise alcalina do bagaço de malte nas formas original e pré-tratado com ácido sulfúrico diluído.
Polpa do bagaço de malte original
Polpa do bagaço de malte pré-tratado
Características
Não branqueada
Branqueada Não branqueada
Branqueada
Celulose (% p/p) 54,3 60,8 90,5 95,7 Hemicelulose (% p/p) 20,4 13,7 1,0 0 Lignina (% p/p) 14,4 12,6 8,1 3,4 Cinzas (% p/p) 3,1 1,4 0,4 0,3 Rendimentoa (%) 30,1 78,8 33,5 88,9 Número kappa 48,4 40,2 27,9 11,2 Viscosidade (cp) 13,7 10,9 12,5 3,1 Alvura (%) 27,2 39,1 33,8 71,3 a calculado para cada processo individualmente.
Além da composição química, a Tabela 4.28 também apresenta outras características
das polpas obtidas a partir do bagaço de malte original (BMO) e pré-tratado (BMP), incluindo
o rendimento, número kappa, viscosidade e alvura. Nota-se que o rendimento da hidrólise
alcalina foi similar para ambas as polpas (30,1% p/p e 33,5% p/p, para BMO e BMP,
respectivamente). Porém, como o material pré-tratado havia sido recuperado com um
rendimento de 48,6% p/p, a massa total de polpa obtida para cada 100 g de bagaço de malte
original foi de apenas 16,3 g, ou seja, aproximadamente metade do rendimento da polpa
141
obtida por hidrólise alcalina do bagaço de malte original (30,1 g/100 g). Apesar do maior
rendimento, a polpa de BMO apresentou uma qualidade inferior à da polpa de BMP, uma vez
que seu número kappa foi mais elevado e sua alvura foi menor (Tabela 4.28). Um rendimento
similar de polpa (27,9%) foi encontrado por Khristova, Kordsachia e Khider (2005) após a
hidrólise alcalina das folhas de tamareira. Nesse caso, os autores atribuíram o baixo
rendimento de polpação ao baixo teor de celulose (30,3% p/p) e aos elevados teores de lignina
(31,2% p/p) e extrativos (21,2% p/p) presentes na matéria-prima. Considerando este fato, os
baixos rendimentos obtidos para as polpas de bagaço de malte também são justificáveis, uma
vez que os materiais submetidos à hidrólise alcalina também apresentavam baixo teor de
celulose (16,8% p/p e 34% p/p para BMO e BMP, respectivamente), e elevado teor de lignina
(27,8% p/p e 49,2% p/p para BMO e BMP, respectivamente).
4.11.2 Branqueamento das polpas de celulose do bagaço de malte
A etapa de branqueamento modificou as características de ambas as polpas, porém a
diferença entre elas foi notável (Tabela 4.28), demonstrando que o tratamento do material
com ácido diluído prévio ao processo de polpação interferiu nas características das polpas
produzidas. O teor de lignina e a viscosidade da polpa de BMP branqueada foram menores do
que os da polpa de BMO branqueada, enquanto que o teor de celulose e a alvura foram
maiores.
O número kappa (um indicador do conteúdo de lignina na amostra) da polpa de BMP
branqueada foi baixo (≈11,0), indicando que a maior parte da lignina presente nesta polpa foi
removida utilizando esta seqüência de branqueamento livre de cloro. Por outro lado, a polpa
de BMO branqueada apresentou um número kappa elevado, aproximadamente 4 vezes maior
do que o da polpa de BMP (Tabela 4.28). Provavelmente a presença de extrativos nesta polpa
afetou negativamente o processo de branqueamento. Essa fração é composta por resinas,
ceras, gorduras gomas, amidos, taninos, óleos essenciais entre outros constituintes (KUHAD;
SINGH, 1993) e de acordo com Fengel e Wegener (1989) ela deve ser removida antes da
separação da lignina para evitar a formação de produtos de condensação com a lignina,
durante o processo de polpação. Tais produtos de condensação diminuem a solubilidade da
lignina residual interferindo na posterior remoção dessa fração (ARGYROPOULOS et al.,
2001). De fato, foi observada a formação de uma espécie de “cola” durante a hidrólise
alcalina do BMO, a qual proporcionou uma forte união entre as fibras de celulose (Figura
142
4.21B). O branqueamento dessa polpa não foi eficiente, pois as fibras permaneceram
fortemente unidas entre si (Figura 4.21C) e a polpa branqueada apresentou uma cor amarela
(Figura 4.22C) devido ao elevado teor de lignina presente (12,6% p/p), correspondendo a uma
alvura de apenas 39,1%.
Os resultados obtidos no branqueamento da polpa de BMP foram melhores do que os
da polpa de BMO, provavelmente devido à ausência de extrativos nesta polpa e à elevada
remoção de hemicelulose ocorrida durante o pré-tratamento ácido. Como conseqüência, o
material tornou-se mais susceptível ao ataque alcalino e a degradação de lignina ocorreu de
forma mais eficiente, liberando as fibras de celulose, conforme pode ser observado na Figura
4.21E. Além disso, a polpa de celulose foi branqueada mais facilmente atingindo uma alvura
de 71,3% (Figura 4.22F).
Uma alvura de 71,3% é um bom valor considerando a simplicidade do processo de
branqueamento empregado e o uso de uma seqüência livre de cloro. Tanaka et al. (2004)
produziram uma polpa a partir de resíduos de dendezeiro, com alvura de 73-74% após o
branqueamento com uma seqüência realizada em quatro etapas, utilizando O2, ácido, O3 e
H2O2. Tutus (2004) obteve uma alvura de 68,34% em uma polpa de palha de arroz utilizando
um procedimento de branqueamento de apenas uma etapa, empregando H2O2 em mistura com
uma solução de NaOH 2,25% p/v, concentração quase 10 vezes maior do que a utilizada no
presente trabalho (0,28% p/v).
A viscosidade da polpa de BMP foi fortemente reduzida após o branqueamento (de 12,5
para 3,1 cp, Tabela 4.28), indicando que o grau de polimerização da celulose foi diminuído,
uma vez que a perda de viscosidade ocorre devido à clivagem aleatória das ligações
glicosídicas dessa cadeia polissacarídica (VU; PAKKANEN; ALÉN, 2004). De fato, Abrantes
et al. (2007) relataram que, embora o peróxido de hidrogênio seja um eficiente agente de
branqueamento, ele realmente apresenta pouca seletividade, o que reflete em grandes perdas
de viscosidade. Como a degradação da celulose pelo uso de peróxido ocorre devido à
decomposição deste agente químico, uma possibilidade para minimizar esse problema seria
utilizar sulfato de magnésio juntamente com o H2O2, pois este sal reduz a velocidade de
decomposição do peróxido e desta forma, poderia impedir as reações de degradação dos
carboidratos (LAPIERRE; BERRY; BOUCHARD, 2003).
143
A
B
C
E
D
F
Figura 4.21 - Fotomicrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura das amostras de
bagaço de malte original (A), polpa do bagaço original não branqueada (B), polpa do bagaço original branqueada (C); bagaço de malte pré-tratado (D), polpa do bagaço pré-tratado não branqueada (E), polpa do bagaço pré-tratado branqueada (F). Ampliação: 300 vezes.
144
E
F
D A
B
C
Figura 4.22 - Aparência das amostras de bagaço de malte original (A), polpa do bagaço original não branqueada (B), polpa do bagaço original branqueada (C); bagaço de malte pré-tratado (D), polpa do bagaço pré-tratado não branqueada (E), polpa do bagaço pré-tratado branqueada (F).
Durante o branqueamento da polpa de BMO também foi observada uma perda da
viscosidade, mas em menor extensão, diminuindo de 13,7 para 10,9 cp (Tabela 4.28). Isso
provavelmente ocorreu devido à resistência proporcionada pela “cola” formada pelos
produtos de condensação com a lignina, a qual teria impedido o ataque do agente de
branqueamento. Por este motivo, o grau de polimerização da celulose foi preservado, mas os
teores de lignina e hemicelulose também foram pouco reduzidos, o que levou à geração de
uma polpa com menor qualidade do que aquela obtida a partir de BMP.
145
Estes resultados sugerem, portanto, que apenas a polpa de celulose obtida a partir do
bagaço de malte pré-tratado apresenta potencial para aplicação em processos industriais,
podendo ser utilizada, por exemplo, para a produção de derivados de celulose, tais como
viscose, acetato de celulose e celofane. Isto porque, de acordo com Caraschi, Filho e Curvelo
(1996), polpas branqueadas de baixo rendimento (30 a 35%), com um alto conteúdo de
celulose pura (>85%) e baixo conteúdo de poliose (1 a 10%) e lignina (<0,05%) são
adequadas para esta finalidade. Por outro lado, a realização de alguns testes adicionais de
resistência à tração, resistência ao rasgo, entre outros, seria útil para verificar a possibilidade
de emprego desta polpa na produção de papéis.
4.12 RECUPERAÇÃO DA LIGNINA A PARTIR DO LICAR ALCALINO E SUA
UTILIZAÇÃO NA PRODUÇÃO DE CARVÃO ATIVADO
4.12.1 Influência do pH na precipitação da lignina a partir do licor alcalino
No processo de hidrólise alcalina, realizado nas condições otimizadas para produção de
polpa de celulose a partir do bagaço de malte pré-tratado, 95,3% p/p da lignina presente no
material foi removida e solubilizada no licor, correspondendo a uma concentração de
12,44 g/l. De acordo com Fengel e Wegener (1989) a lignina é altamente solúvel em meio
alcalino, mas sua solubilidade diminui na medida em que o pH é reduzido. No entanto, como
a natureza da lignina varia para cada espécie de planta (HON, 1996), o perfil da sua
precipitação com a redução do pH também pode variar de acordo com a matéria-prima
utilizada. No presente trabalho, a adição de ácido sulfúrico para redução do pH do licor,
causou a precipitação da lignina solubilizada, de forma que, quanto menor o pH, maior a
massa de lignina recuperada (Tabela 4.29).
É interessante observar que a queda de pH até o valor de 7,71 (amostra 4) praticamente
não influenciou na precipitação da lignina, que foi removida a partir do licor em apenas
0,32% (Tabela 4.29). No entanto, a redução do pH para um valor próximo de 6 já passou a
influenciar na precipitação desta fração, aumentando a remoção para 15,67%. Este valor foi
aumentado em 4,4 vezes quando o pH foi reduzido de 5,98 para 4,3. A Figura 4.23 mostra
claramente que o maior aumento na massa de lignina precipitada ocorreu na faixa de pH entre
7,71 e 4,3, atingindo um valor de remoção de 68,49%. Para valores de pH menores que 4,3,
146
foi observado um acréscimo de 13% na massa de lignina removida, porém, este incremento na
remoção foi cerca de 5 vezes menor quando comparado ao aumento observado na faixa de
pH entre 7,71 e 4,3.
Tabela 4.29 - Volume de ácido sulfúrico adicionado nas amostras do licor alcalino de bagaço de malte, caracterização do licor obtido e quantificação da massa de lignina precipitada.
Amostra VH2SO4 98% (ml)
pH Lignina solúvel (g/l)
Remoção de lignina (%)
Massa precipitada (g)
1 original - 12,56 12,44 - 0,0301 2 0,14 10,61 12,42 0,16 0,0361 3 0,16 9,90 12,40 0,32 0,0373 4 0,18 7,71 12,40 0,32 0,0383 5 0,20 5,98 10,49 15,67 0,0909 6 0,22 4,30 3,92 68,49 0,2939 7 0,24 3,23 2,63 78,86 0,3100 8 0,26 2,62 2,45 80,30 0,3202 9 0,28 2,48 2,33 81,27 0,3209 10 0,30 2,15 2,31 81,43 0,3208
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 130,00
0,05
0,10
0,15
0,20
0,25
0,30
0,35
massa precipitada remoção de lignina
pH
Mas
sa p
reci
pita
da (g
)
0
15
30
45
60
75
90
Rem
oção de lignina (%)
Figura 4.23 - Massa precipitada e remoção de lignina em função da redução do pH do licor alcalino de
bagaço de malte.
147
No mais baixo valor de pH avaliado (2,15), 81,43% da lignina solubilizada no licor foi
recuperada (Tabela 4.29). Um rendimento similar de recuperação de lignina (87,8%) foi
obtido por Santos e Curvelo (2001) quando reduziram de 13,6 para 3,0, o pH do licor alcalino
de madeira de eucalipto. No entanto, este valor de remoção é 10% superior ao obtido no
presente trabalho para o valor de pH de 3,23 (78,86% de recuperação). De acordo com
Rohella et al. (1996), a composição da lignina solubilizada varia de uma biomassa para outra
e também com o processo de polpação utilizado. Isto explicaria as diferenças observadas entre
os resultados do presente trabalho e aqueles obtidos por Santos e Curvelo (2001), uma vez
que além de terem sido utilizadas matérias-primas diferentes, o licor alcalino de bagaço de
malte foi obtido por polpação soda (hidrólise alcalina) enquanto que o licor obtido por estes
autores foi obtido pelo processo de polpação Kraft.
Segundo Villar, Caperos e García-Ochoa (2001), o emprego de ácidos para precipitação
da lignina é o método mais utilizado para recuperar a lignina Kraft a partir do licor de
polpação, sendo capaz de proporcionar 100% de recuperação quando o pH é reduzido para
uma faixa de valores entre 2,0 e 3,0. No presente trabalho, a lignina solubilizada no licor
obtido por polpação soda do bagaço de malte não foi totalmente recuperada quando o pH foi
acidificado até 2,15, confirmando que realmente o processo de polpação utilizado pode
influenciar na posterior recuperação da lignina a partir do licor.
Embora a lignina não tenha sido totalmente recuperada, o valor de remoção obtido em
pH 2,15 (81,43%) foi elevado e pode ser comparado com outros já descritos na literatura. Por
exemplo, Sun, Tomkinson e Bolton (1999) utilizaram H3PO4 (9,68 N) para reduzir o pH do
licor alcalino obtido a partir do bagaço de dendê. Neste processo eles observaram que com a
redução do pH de 13,8 para 2,0 foi possível recuperar 1 g de lignina para cada 100 ml de licor
acidificado. Entretanto, além de lignina o precipitado continha produtos provenientes da
degradação de polissacarídeos uma vez que o material submetido à polpação não havia sido
pré-tratado. No presente trabalho, o rendimento de massa recuperada em pH 2,15 foi de 1,6
g/100 ml de licor acidificado, e esta massa foi composta basicamente pela lignina, pois a
fração hemicelulósica do material já havia sido quase totalmente solubilizada durante o pré-
tratamento ácido e a celulose praticamente não foi atacada durante o processo de hidrólise
alcalina. Considerando estes fatos, a massa de lignina recuperada no presente trabalho foi
quase duas vezes maior do que a obtida por Sun, Tomkinson e Bolton (1999), o que é
justificável dado que o bagaço de malte contém 27,8% p/p de lignina enquanto que o bagaço
de dendê contém apenas 14,2% p/p. Portanto, estes resultados sugerem que a eficiência de
148
recuperação da lignina solubilizada no licor alcalino foi similar quando se utilizou ácido
sulfúrico concentrado (presente trabalho) ou ácido fosfórico 9,68 N (SUN; TOMKINSON;
BOLTON, 1999).
Como conseqüência da remoção da lignina, observou-se uma forte alteração na cor do
licor. Nota-se na Figura 4.24 que o licor na sua forma original (1) apresentava uma cor
marrom escura e à medida que o pH foi reduzido, sua cor passou a se tornar mais clara, de
forma que no mais baixo valor de pH avaliado (2,15 – amostra 10), o licor apresentou uma cor
amarela clara. Segundo Fengel e Wegener (1989), a cor escura do licor alcalino é proveniente
dos grupos funcionais cromóforos (quinonas, fenólicos, entre outros) gerados a partir da
degradação da lignina, os quais são solúveis em meio alcalino, mas não em meio ácido.
Figura 4.24 - Efeito da redução do pH (de 12,56 - amostra 1, para 2,15 - amostra 10) na cor do licor
alcalino de bagaço de malte.
Nota-se também na Figura 4.24 que apesar de na amostra 5 (pH 5,98) já ter ocorrido
uma remoção de 15,67% da lignina, a cor do licor ainda não tinha sido alterada, sendo tão
escura quanto na amostra original (amostra 1). Provavelmente, os compostos que conferem
cor ao licor ainda não tinham sido precipitados nesta faixa pH (entre 12,56 e 5,98). Na
amostra 6 (pH 4,30), 68,49% da lignina foi precipitada, causando alteração na cor do licor. A
queda do pH de 4,3 para 3,23 (amostra 7) também influenciou na cor do licor, que se tornou
amarela e pouco se alterou com a posterior redução do pH para 2,15 (amostra 10). Estes
resultados sugerem, portanto, que os grupos cromóforos que conferem cor ao licor alcalino,
foram removidos principalmente na faixa de pH entre 5,98 (amostra 5) e 3,23 (amostra 7).
149
4.12.2 Produção de carvão ativado a partir da lignina e sua utilização na adsorção de
metais e compostos fenólicos
Depois de recuperada do licor alcalino, a lignina foi utilizada como matéria-prima para
a produção de carvão ativado. O processo de ativação foi realizado empregando diferentes
relações entre H3PO4/lignina e temperaturas de carbonização, de acordo com um
planejamento fatorial completo 22. Os carvões obtidos nestas condições foram utilizados para
destoxificação do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte, uma vez que este contém
uma série de metais e compostos fenólicos e permitiria, portanto, avaliar o desempenho dos
carvões na remoção de diversos componentes. Os resultados obtidos nestes experimentos de
destoxificação estão apresentados na Tabela 4.30. Observa-se nesta tabela que todos os
carvões produzidos foram capazes de remover metais e compostos fenólicos a partir do
hidrolisado, sendo que dentre os metais, níquel, ferro, cromo e silício foram os mais
removidos. No entanto, a capacidade de adsorção variou para cada carvão. A remoção de
níquel, por exemplo, foi total quando se utilizou o carvão produzido na mais alta temperatura,
empregando a maior relação ácido/lignina (amostra 4). Por outro lado, este mesmo carvão foi
pouco eficiente para a remoção de magnésio e silício.
Tabela 4.30 - Remoção de metais, cor e compostos fenólicos a partir do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte, por adsorção nos carvões ativados preparados a partir da lignina.
Variáveisa Remoção (%)
Metais
Amostra
A/L T
Ni Ca Mg Zn Fe Cr Al Si
Cor Fenólicos
1 1 300 65,1 0,2 1,3 4,5 53,9 54,7 10,6 31,6 60,4 22,6 2 3 300 65,9 21,1 7,8 1,1 39,5 35,6 7,6 38,1 61,4 15,7 3 1 600 3,2 27,9 4,6 0,1 61,5 17,3 16,3 33,5 61,5 12,0 4 3 600 100,0 29,3 1,9 14,9 70,7 39,7 30,5 16,3 64,4 33,3 5 2 450 61,2 15,9 4,3 7,5 66,9 21,2 12,1 38,8 62,9 25,5 6 2 450 65,1 23,3 3,0 9,3 67,7 20,5 21,2 38,0 61,1 25,5 Comercial 0,0 26,5 0,3 3,6 77,6 10,8 19,5 1,1 70,3 50,8 a A/L = relação ácido/lignina (g/g); T = temperatura de carbonização (ºC)
Uma análise estatística foi realizada para os compostos removidos em maior quantidade
a partir do hidrolisado (níquel, ferro, cromo e silício). De acordo com esta análise, a remoção
de níquel foi influenciada principalmente pela relação ácido/lignina empregada no processo
150
de ativação, sendo que o efeito desta variável foi positivo e significativo a 99% de confiança.
Isto significa que a remoção deste composto foi maior nos carvões produzidos com a mais alta
relação ácido/lignina. No entanto, esta variável não apresentou efeito principal significativo
para nenhuma das outras respostas avaliadas (Tabela 4.31).
Tabela 4.31 - Estimativa dos efeitos (EE), erros-padrão (E) e teste t de Student para a remoção de níquel, ferro, cromo e silício a partir do hidrolisado hemicelulósico de bagaço de malte, por adsorção nos carvões ativados preparados a partir da lignina.
Remoção de Níquel (%) Remoção de Ferro (%) Variáveis independentes e interações EE E t EE SE t
Curvatura 9,200 ± 4,776 1,926 21,800 ± 0,980 22,249** X1 48,800 ± 2,758 17,696*** -2,600 ± 0,566 -4,596 X2 -13,900 ± 2,758 -5,040 19,400 ± 0,566 34,295** X1X2 48,000 ± 2,758 17,406*** 11,800 ± 0,566 20,860**
Remoção de Cromo (%) Remoção de Silício (%) Variáveis independentes e interações EE E t EE SE t
Curvatura -31,950 ± 0,857 -37,267** 17,050 ± 0,980 17,402** X1 1,650 ± 0,495 3,333 -5,350 ± 0,566 -9,458 X2 -16,650 ± 0,495 -33,638** -9,950 ± 0,566 -17,589** X1X2 20,750 ± 0,495 41,921** -11,850 ± 0,566 -20,948**
*** Valor significativo a 99% de confiança; **Valor significativo a 95% de confiança. X1 = relação ácido/lignina; X2 = temperatura de carbonização. R2 = 0,999 para todas as respostas.
A temperatura de carbonização apresentou um efeito principal significativo a 95% de
confiança para as respostas de remoção de ferro, cromo e silício. Porém, para cromo e silício
o efeito desta variável foi negativo, indicando que a remoção destes metais foi maior quando
se utilizou carvões produzidos na menor temperatura (300ºC). Por outro lado, o efeito da
temperatura na remoção de ferro foi positivo, indicando que a remoção deste metal foi maior
quando se utilizou carvões produzidos na maior temperatura (600ºC) (Tabela 4.31).
Embora a capacidade do carvão em adsorver compostos tenha variado de acordo com as
condições em que este foi produzido, é interessante observar na Tabela 4.30 que, em vários
casos, o carvão produzido apresentou uma capacidade de remoção superior à do carvão
comercial. A remoção de níquel, magnésio, cromo e silício, por exemplo, foi maior em todos
os carvões produzidos do que no carvão comercial. Por outro lado, o carvão comercial foi
151
mais eficiente para a remoção de ferro, cor e fenólicos. No entanto, de uma forma geral, os
carvões produzidos apresentaram um poder de adsorção comparável ou até mesmo superior
ao do carvão comercial, demonstrando que eles apresentam potencial para serem utilizados
em substituição aos carvões encontrados no mercado.
152
5 CONCLUSÕES
Os resultados experimentais obtidos neste trabalho permitiram concluir que:
O bagaço de malte é um material rico em carboidratos e compostos fenólicos, sendo a
fração hemicelulósica o seu principal constituinte polimérico (28,4 g/100 g de bagaço).
A arabinana do bagaço de malte é hidrolisada mais facilmente com ácido diluído do que a
xilana. Para todas as condições avaliadas, tanto no processo em autoclave como em reator,
as eficiências de hidrólise desta molécula foram superiores a 93%.
A eficiência de hidrólise da xilana e da hemicelulose em autoclave, a 120ºC, foi
influenciada pela relação sólido:líquido e pela concentração de ácido sulfúrico empregada,
sendo que os maiores valores, 67% e 76,2%, respectivamente, foram obtidos utilizando
uma relação sólido:líquido de 1:10 g:g, concentração de ácido sulfúrico de 120 mg/g de
matéria seca e um tempo de reação de 27 minutos.
Para todos os hidrolisados obtidos em autoclave, as concentrações de ácido acético,
furfural e hidroximetilfurfural observadas foram abaixo dos níveis normalmente
reportados por causar inibição dos microrganismos, sugerindo que o hidrolisado
hemicelulósico de bagaço de malte constitui um meio de cultivo adequado para uso em
processos fermentativos.
Em reator, a eficiência de hidrólise da hemicelulose foi elevada (>88%) para todas as
condições avaliadas e todos os hidrolisados produzidos apresentaram características
favoráveis para o crescimento e produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii.
A fermentabilidade dos hidrolisados hemicelulósicos obtidos em reator variou devido a
diferenças em suas composições. O hidrolisado que mais favoreceu a produção de xilitol
(YP/S = 0,70 g/g e QP = 0,45 g/l.h) foi produzido empregando uma relação sólido:líquido
de 1:8 g:g, 100 mg de ácido sulfúrico/g de matéria seca, 17 minutos de reação, a 120ºC.
153
A produção de xilitol pela levedura Candida guilliermondii a partir do hidrolisado
hemicelulósico de bagaço de malte contendo 85 g/l de xilose foi fortemente influenciada
pela concentração dos compostos tóxicos presentes (YP/S = 0,37 g/g e QP = 0,13 g/l.h), o
que sugere a necessidade de tratamentos de destoxificação visando a redução dos níveis
dos compostos inibidores do metabolismo microbiano presentes neste hidrolisado.
A hidrólise alcalina do bagaço de malte pré-tratado com ácido sulfúrico diluído foi um
procedimento altamente eficiente para solubilizar a lignina do material, sendo útil tanto
para a produção de polpa de celulose, como para a liberação de ácidos fenólicos.
Os melhores resultados de hidrólise alcalina foram obtidos quando o processo foi
conduzido a uma temperatura de 120ºC durante 90 minutos, com uma concentração de
NaOH 2% p/v. Nestas condições, a polpa do bagaço de malte obtida apresentou um
elevado teor de celulose (72,1% p/p) e um baixo teor de lignina residual (10,4% p/p);
enquanto que o licor alcalino gerado era rico em ácidos fenólicos, principalmente em
ácido ferúlico e p-cumárico.
A hidrólise enzimática da polpa celulósica do bagaço de malte, empregando o extrato
celulolítico comercial Celluclast 1.5L (Novozymes), pode ser realizada com elevada
eficiência de conversão, uma vez que nas condições otimizadas de hidrólise (relação
enzima/substrato de 45 FPU/g, concentração de substrato de 2% p/v, 100 rpm, 45ºC) foi
possível obter um rendimento de conversão da celulose em glicose de 93,12%, e um
rendimento total de hidrólise (conversão da celulose em glicose + celobiose) de 99,42%.
A hidrólise enzimática utilizando uma concentração de substrato de 8% p/v, relação
enzima/substrato de 45 FPU/g, a 45ºC e 100 rpm, é a condição mais adequada para
liberação de glicose do bagaço de malte pré-tratado visando a posterior utilização do
hidrolisado como meio de fermentação.
A produção de ácido láctico pela bactéria Lactobacillus delbrueckii a partir do hidrolisado
celulósico de bagaço de malte foi influenciada pela concentração de inóculo,
suplementação nutricional do hidrolisado e pelo controle do pH do meio de fermentação.
154
Os melhores resultados do processo de bioconversão de glicose em ácido láctico foram
obtidos utilizando o hidrolisado suplementado com os nutrientes do meio MRS caldo,
inoculado com 1 g/l de células e mantendo o pH de fermentação controlado em 6,0.
Nestas condições foi possível obter valores de YP/S e QP de 0,99 g/g e 0,59 g/l.h,
respectivamente, com um pico máximo de produtividade de 0,82 g/l.h nas 12 h iniciais do
processo (onde YP/S = 0,96 g/g).
A polpa de celulose branqueada por uma seqüência empregando hidróxido de sódio e
peróxido de hidrogênio apresentou características adequadas para uso na produção de
derivados de celulose (alto teor de celulose = 95,7% p/p; baixo teor de lignina = 3,4% p/p;
e baixo rendimento de recuperação = 33,5% p/p), permitindo mais uma possível aplicação
para este material além do uso como substrato em processos enzimáticos.
Os carvões obtidos por ativação química da lignina do bagaço de malte apresentaram
elevada eficiência para remoção de metais, principalmente níquel, ferro, cromo e silício, a
qual foi superior à obtida para um carvão comercial, sugerindo que estes carvões
poderiam ser utilizados com sucesso em processos de destoxificação, em substituição aos
carvões encontrados no mercado.
De uma forma geral, conclui-se que o bagaço de malte é um subproduto industrial com
grande potencial para aproveitamento como matéria-prima em processos químicos e
biotecnológicos.
155
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172
ANEXOS
ANEXO A – Trabalhos que já foram publicados em periódicos científicos a partir dos
resultados obtidos nesta tese.
MUSSATTO, S.I., DRAGONE, G., ROBERTO, I.C. Brewer's Spent Grain: Generation, Characteristics and Potential Applications. Journal of Cereal Science, v.43, p.1-14, 2006.
MUSSATTO, S.I., ROBERTO, I.C. Chemical Characterization and Liberation of Pentose Sugars from Brewer's Spent Grain. Journal of Chemical Technology and Biotechnology, v.81, p.268-274, 2006.
MUSSATTO, S.I., ROBERTO, I.C. Acid Hydrolysis and Fermentation of Brewer's Spent Grain to Produce Xylitol. Journal of the Science of Food and Agriculture, v.85, p.2453-2460, 2005.
MUSSATTO, S. I., DRAGONE, G., ROBERTO, I. C. Kinetic Behavior of Candida guilliermondii Yeast during Xylitol Production from Brewer's Spent Grain Hemicellulosic Hydrolysate. Biotechnology Progress, v.21, p.1352-1356, 2005.
MUSSATTO, S.I., DRAGONE, G., ROBERTO, I.C. Influence of the Toxic Compounds Present in Brewer's Spent Grain Hemicellulosic Hydrolysate on Xylose-to-Xylitol Bioconversion by Candida guilliermondii. Process Biochemistry, v.40, p.3801-3806, 2005.
MUSSATTO, S.I., DRAGONE, G., ROCHA, G.J.M., ROBERTO, I.C. Optimum Operating Conditions for Brewer's Spent Grain Soda Pulping. Carbohydrate Polymers, v.64, p.22-28, 2006.
MUSSATTO, S.I., DRAGONE, G., ROBERTO, I.C. Ferulic and p-Coumaric Acids Extraction by Alkaline Hydrolysis of Brewer's Spent Grain. Industrial Crops and Products, v.25, p.231-237, 2007.
MUSSATTO, S.I., FERNANDES, M., ROBERTO, I.C. Lignin Recovery from Brewer's Spent Grain Black Liquor. Carbohydrate Polymers, in press.
MUSSATTO, S.I., FERNANDES, M., DRAGONE, G., MANCILHA, I.M., ROBERTO, I.C. Brewer’s Spent Grain as Raw Material for Lactic Acid Production by Lactobacillus delbrueckii UFV H2B20. Biotechnology Letters, (aceito).
173
ANEXO B – Recomendações para trabalhos futuros.
Para complementar este estudo, dando continuidade aos processos químicos e biotecnológicos
avaliados para aproveitamento integral do bagaço de malte, são dadas as seguintes sugestões:
Realizar uma análise dos custos envolvidos envolvidos na fermentação para produção de
xilitol a partir do hidrolisado hemicelulósico nas formas diluída e concentrada, para avaliar o
que seria mais vantajoso: utilizar o hidrolisado diluído como meio de fermentação e obter
uma concentração menor de xilitol, ou, utilizar o hidrolisado concentrado como meio de
fermentação, porém, devendo realizar uma etapa de destoxificação prévia à fermentação para
poder obter uma concentração mais elevada de xilitol.
Avaliar a fermentabilidade do hidrolisado hemicelulósico para a produção de etanol.
Avaliar o emprego de fontes nutricionais mais econômicas para suplementação do hidrolisado
celulósico de bagaço de malte visando a produção de ácido láctico.
Realizar testes mecânicos na polpa de celulose branqueada para verificar sua possibilidade de
emprego na produção de papéis.
Avaliar outras seqüências para branqueamento da polpa celulósica de forma a se obter um
maior grau de alvura, sem reduzir a viscosidade.
Avaliar outras variáveis do processo para produção de carvão ativado visando melhorar a
capacidade de remoção de compostos fenólicos e de alguns metais que foram removidos em
pequena proporção, tais como cálcio, magnésio, zinco e alumínio.