CADA QUAL COM SUA DANÇA Impressões sobre dança contemporânea a partir de leituras de alunos do Ensino Fundamental

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O presente estudo busca conhecer impressões e relações de alunos do Ensino Fundamental sobre dança contemporânea, a partir da apreciação de alguns trabalhos dessa vertente de dança, exibidos em vídeo. O trabalho começa a se configurar a partir da pergunta "o que é dança contemporânea?" e da inserção do pesquisador no meio artístico, como bailarino e no ambiente escolar, como professor de Educação Física. A pesquisa é de caráter qualitativo, e visa levantar alguns aspectos sobre a prática pessoal de dança desses sujeitos, e refletir sobre as leituras que os mesmo fazem sobre dança contemporânea. Para tanto se utilizou dez vídeos contendo obras da alemã Pina Bausch, dos belgas Wim Vandekeybus e Anne Teresa de Keersmaeker e do inglês Lloyd Newson, que buscaram contemplar um pouco da estranheza e familiaridade contida na dança contemporânea, no que diz respeito a corpos, trilha sonora, espaços e figurino. This study seeks to understand relationships and impressions of elementary school students about contemporary dance, from the appreciation of some aspects of this dance work, shown on video.

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  • 1. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE EDUCAO PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO CURSO DE ESPECIALIZAO EM PEDAGOGIA DA ARTE Robson Lima Duarte CADA QUAL COM SUA DANA Impresses sobre dana contempornea a partir de leituras de alunos do Ensino Fundamental Porto Alegre 2012

2. 2 Robson Lima Duarte CADA QUAL COM SUA DANA Impresses sobre dana contempornea a partir de leituras de alunos do Ensino Fundamental Monografia apresentada ao Curso de Especializao em Pedagogia da Arte do Programa de Ps-Graduao em Educao da Faculdade de Educao da Universidade Federal do Rio Grande do Sul como requisito para concluso do curso. Orientadora: Prof. Dra. Flavia Pilla do Valle Porto Alegre 2012 3. 3 Para os meus filhos, Joo Brandimiller Duarte e Pedro Goulart Lima Duarte, que eles tambm possam desfrutar da delcia que esse jogo, da busca pelo conhecimento, absorvidos pela curiosidade, inquietao, e todas as possveis coceiras que nos levam a fazer um trabalho como esse. Dedico tambm duas pessoas que foram estmulos insuperveis para que eu descobrisse, fosse absorvido e desfrutasse de todas essas coisas que me tornaram um professor/artista. Minha me Rita Severina de Lima Duarte e meu primeiro mestre, e amigo, o bailarino e coregrafo Zdenek Hampl. 4. 4 Ao concluir esse trabalho quero agradecer em primeiro lugar, aos meus alunos, sujeitos nessa pesquisa, que se mostraram disponveis, atentos e excelentes colaboradores, durante todo processo. s duas escolas, nas quais atuo no corpo docente, que se colocaram totalmente disposio e cederam gentilmente, espaos e equipamentos. professora Flavia Pilla do Valle, minha orientadora, que desde o incio fez uma escuta atenta e uma fala precisa, contribuindo de forma decisiva para a realizao desse trabalho. Aos demais professores do Curso de Especializao em Pedagogia da Arte, edio 2012 da UFRGS, pelos estmulos, contribuies e aulas memorveis. Aos colegas de turma, pelas discusses calorosas e produtivas, pelo companheirismo e pelo afeto que tornaram essa jornada muito mais agradvel. amiga Marilu Silveira Goulart, que acreditou desde o incio nesse trabalho, em alguns momentos, at mais do que eu, pela sua apreciao, crtica, e sugestes preciosas. 5. 5 A dana contempornea estranha. Parece um teatro sem fala, numa mistura de passos coreografados e livres, um pouco de cada. Algumas coreografias so sincronizadas com a msica e entre os bailarinos, mas outras no e a maioria so crticas. Pode ser de muitos tipos e ritmos, uma dana para todo mundo at pra quem no tem pernas. Pode ser apenas com partes do corpo, pode ser sem msica, tentando transmitir alguma coisa. (Robson Lima Duarte, a partir das leituras de alunos do Ensino Fundamental). 6. 6 RESUMO O presente estudo busca conhecer impresses e relaes de alunos do Ensino Fundamental sobre dana contempornea, a partir da apreciao de alguns trabalhos dessa vertente de dana, exibidos em vdeo. O trabalho comea a se configurar a partir da pergunta "o que dana contempornea?" e da insero do pesquisador no meio artstico, como bailarino e no ambiente escolar, como professor de Educao Fsica. A coleta das informaes acontece em duas escolas pblicas da cidade de Porto Alegre, durante quatro encontros, sendo dois encontros em cada escola. A pesquisa de carter qualitativo, e visa levantar alguns aspectos sobre a prtica pessoal de dana desses sujeitos, e refletir sobre as leituras que os mesmo fazem sobre dana contempornea. Para tanto se utilizou dez vdeos contendo obras da alem Pina Bausch, dos belgas Wim Vandekeybus e Anne Teresa de Keersmaeker e do ingls Lloyd Newson, que buscaram contemplar um pouco da estranheza e familiaridade contida na dana contempornea, no que diz respeito a corpos, trilha sonora, espaos e figurino. Alm disso, realizaram-se dois questionrios, o primeiro investigando as prticas de dana dos sujeitos e o segundo problematizando a dana contempornea. Realizar essa pesquisa me possibilitou enxergar a importncia e a dimenso do espao que a dana tem dentro da escola. Primeiramente, percebe-se com relao s prticas de dana dos alunos, que com exceo de um pequeno grupo que s danava coreografias embaladas por msicas do estilo Teen Pop, gnero musical caracterstico de algumas bandas como Rebeldes e Restart, a grande maioria tinha como preferncia o funk carioca, o pagode e o free step, estilos de dana da atualidade, comum entre grande parte dos jovens com esse perfil. Com relao ao conhecimento que os mesmo possuam sobre a dana contempornea, no havia qualquer referncia sobre o assunto, e nenhum dos alunos fazia a menor idia do que se tratava, mostrando que essa prtica ainda algo muito distante desse publico. Com base na anlise dos questionrios constatou-se, alm do estranhamento para com o desconhecido, que aparece no incio dessa investigao, que a msica e os movimentos reconhecidos por esses sujeitos, aparecem como critrios de aproximao, e que boa parte desse estranhamento deve-se a falta de conhecimento sobre o tema. Sugere-se, contudo, que sejam feitos outros estudos sobre os gostos e estranhezas desses alunos em relao dana, principalmente, com alunos no praticantes e em outros contextos sociais, para que a dana realmente possa fazer parte efetivamente, dos currculos escolares. Concluindo, respondo a uma interrogao de Analice Dutra Pillar - Pode- se educar o olhar dentro da escola? - pode-se sim educar o olhar dentro da escola, permitindo a entrada de outras imagens, outras msicas e outras danas para que a arte possa cumprir o seu papel, ampliando as possibilidades de expresso, de comunicao, e as mltiplas formas de se ver e pensar o mundo. Palavras-chave: Dana contempornea Apreciao Educao 7. 7 LISTA DE FIGURAS Figura 1 Vdeo 01, Abertura do filme Pina ......................................15 Figura 2 Vdeo 02 - Solo para msica leozinho...................................16 Figura 3 Vdeo 03 - Cafe Muller.............................................................17 Figura 4 Veideo 04 - Solo do vestido com flores...................................18 Figura 5 Vdeo 05 - Vollmond (Lua cheia).............................................18 Figura 6 Vdeo 06 Blusch................................................................ 19 Figura 7 Vdeo 07 NieuwZwart...........................................................20 Figura 8 Vdeo 08 - Ma mere Ioye Extract I.......................................21 Figura 9 Vdeo 09 - Trecho 1 The cost of living DV8..........................21 Figura 10 Vdeo 10 - Trecho 2 The cost of living DV8........................22 8. 8 SUMRIO 1 PRLOGO.............................................................................................................08 1.1 Cada qual com sua dana..................................................................................08 1.2 Qual o problema?............................................................................................09 1.3 A dana e a escola.............................................................................................09 1.4 Investigar e problematizar..................................................................................10 . 2 PRIMEIRO ATO.....................................................................................................12 2.1 Cenrio...............................................................................................................12 2.2 Personagens......................................................................................................13 2.3 Adereo..............................................................................................................13 2.3.1 Vdeos.............................................................................................................13 2.3.2 Questionrios..................................................................................................22 3 SEGUNDO ATO....................................................................................................24 3.1 Das danas contemporneas............................................................................24 3.2 Das prticas de dana dos sujeitos pesquisados..............................................27 . 4 EPLOGO: dos gostos e estranhezas...................................................................29 4.1 Dos gostos.........................................................................................................29 4.2 Das estranhezas................................................................................................32 5 APLAUSOS...........................................................................................................35 CRDITOS 9. 9 1 PRLOGO 1.1 CADA QUAL COM SUA DANA O Homo sapiens1 originou-se na frica, isso fato comprovado por estudos de DNA e achados paleoantropolgicos. Sendo assim, a dana originou-se nesse continente como parte essencial da vida nas aldeias acentuando a unidade entre seus membros, pois os principais acontecimentos da vida africana, como nascimento, morte, trabalho, e at mesmo a guerra so comemorados com dana. Antes de falar e de escrever o homem se mexe, atravs do movimento se comunica e ainda no tero, ensaia suas primeiras investidas nessa forma de comunicao. Segundo Laban (1978 p.19), o movimento do homem tem a finalidade de satisfazer uma necessidade e atingir algo valioso para ele, sendo fcil perceber o objetivo desse movimento, quando ele dirigido para algo palpvel ou sensvel, apesar de outros valores tambm inspirarem movimentos. O movimento como forma de expresso sempre foi a via predileta desse que vos fala. Fosse atravs das danas da moda, praticadas na infncia e na adolescncia, fosse por meio do esporte, atividade presente em toda minha escolaridade. Essa relao com a cultura corporal influenciou diretamente na maneira como me comunico e na minha formao profissional, o que me remete a uma fala de Pina Bausch, no filme Pina de Wim Wenders: Tem coisas que nos deixam sem palavras. E tem coisas que as palavras no do conta de dizer. a que entra a dana Trazer esse tema para uma pesquisa acadmica abriu novas perspectivas, ampliando o meu entendimento como professor/artista. Tambm me fez percorrer essa trajetria com olhares de dentro e de fora, proporcionando um reencontro com os estmulos pelos os quais comecei a danar. Resignificando as escolhas que fiz tanto como bailarino de dana contempornea, quanto como professor de Educao Fsica. 1 Do latim homem sbio designa a condio plena da humanidade no processo evolutivo das espcies. Originaram-se na frica h cerca de 200 mil anos. 10. 10 Assim como o bal clssico, o sapateado americano, o frevo de Pernambuco, e a chula do Rio Grande do Sul, a maioria das danas que conhecemos possui vocabulrios, vestimentas e cdigos bem definidos, o que auxilia na hora de descrev-las ou conceitu-las, mas no caso da dana contempornea essas referncias no so to fceis de serem identificadas. 1.2 QUAL O PROBLEMA? Nessa pesquisa, a questo comea a se configurar, a partir da pergunta O que dana contempornea? Que a princpio parece uma simples pergunta, fcil de responder, mas ao faz-la percebesse que no bem assim. Eu, por exemplo, apesar de pratic-la h mais de vinte anos, nunca soube responder a essa questo de uma forma tranqila. O momento de responder essa pergunta geralmente, precedido de certa hesitao mesmo entre os praticantes. No transcorrer desse estudo abordaremos algumas das questes que contribuem para tal hesitao. Na ausncia de uma resposta clara e definitiva para esta questo, reside inquietao e a motivao para realizao desse estudo. Outro dado que contribui para essa realizao a insero do pesquisador no meio artstico como bailarino de dana contempornea, e no ambiente escolar como professor de Educao Fsica no Ensino fundamental. Desse modo o presente estudo prope-se analisar, que leituras alunos do ensino fundamental, de duas escolas estaduais da cidade de Porto Alegre, fazem a partir da apreciao de alguns trabalhos de dana contempornea?. 1.3 A DANA E A ESCOLA Conhecer os gostos e as estranhezas de alunos do Ensino Fundamental, revelados atravs das respostas de dois questionrios, aps apreciao de alguns trabalhos de dana contempornea, nos possibilita entender de que forma se d a 11. 11 compreenso, dos significados do movimento corporal humano, por meio dessas leituras. Contrariando um dos objetivos dos Parmetros Curriculares Nacionais PCN, no qual se indica a utilizao das diferentes linguagens verbal, musical, matemtica, grfica, plstica e corporal como meio para produzir, expressar e comunicar ideias, ainda raro encontrarmos aulas regulares de dana, nas grades curriculares das disciplinas de Artes e de Educao Fsica na maioria das escolas, principalmente, nas da rede estadual da cidade de Porto Alegre. Fora isso, afirmaes do tipo, no Brasil todo mundo j nasce danando, ou o brasileiro tem samba no p, acabam ofuscando a importncia da dana no currculo escolar. Essa viso de dana, e consequentemente de corpo, um tanto ingnua, no leva em considerao estudos sociolgicos e antropolgicos em relao construo do corpo em sociedade e, muito menos, o fato de que muitos, por razes diversas, no possuem o movimento nato ou a dana no sangue, tal qual alegam essas correntes. Na sociedade contempornea, no se pode tampouco ignorar a presena da dana virtual, que se relaciona com os corpos fsicos de maneira totalmente distinta da dos antepassados. Assim, no se tem, necessariamente, um corpo que se movimenta no tempo e no espao sempre que se dana. Em suma, sempre se aprende formal e/ou informalmente, com, por que e quando se movimentar e transformar esse movimento em dana. (BRASIL, 1998, p. 69) Fora do ambiente escolar, a dana praticada de vrias formas e com os mais variados propsitos, mas cabe escola organizar uma grade curricular na qual a dana seja contemplada. Diante da escassa presena dessa matria nos currculos escolares, acredito que as impresses e relaes traadas por esses sujeitos atravs desse estudo, podem ajudar o ensino da dana na escola, tanto da perspectiva da dana contempornea quanto das danas que esses prprios sujeitos trazem. 12. 12 1.4 INVESTIGAR E PROBLEMATIZAR O presente estudo pretende investigar, que leituras alunos do Ensino Fundamental, que no tm a dana como atividade escolar, fazem sobre dana contempornea. Para tanto, se formulou dois objetivos centrais: Investigar alguns aspectos das danas trazidas pelos sujeitos pesquisados. Problematizar a dana contempornea a partir de questionrios, afim de conhecer as impresses e possveis relaes desses sujeitos, acerca do tema. A partir de agora tomei a liberdade de dar aos ttulos dos captulos nomes mais artsticos, como se fossem itens da ficha tcnica de um espetculo. No segundo captulo, onde a metodologia recebeu o nome de Primeiro ato, os locais onde realizou-se a pesquisa so identificados como cenrios, os participantes como personagens, e os instrumentos utilizados foram chamados de adereos. No terceiro captulo, os referenciais tericos recebem o nome de segundo ato, no quarto captulo, a anlise dos dados chama-se eplogo, no quinto captulo, as consideraes finais e a concluso recebem o nome de aplauso e as referencias bibliogrficas so chamadas de crditos. 13. 13 2 PRIMEIRO ATO 2.1 CENRIOS A presente pesquisa de carter qualitativo e realizou-se em duas Escolas Estaduais da cidade de Porto Alegre RS, sendo uma na rea urbana e a outra na rea rural. Desenvolveu-se em trs etapas que podemos cham-las de: Preparao, Desenvolvimento ou pesquisa propriamente dita, Anlise e concluso. Etapa de preparao A partir da convivncia do pesquisador como professor de Educao Fsica nessas duas escolas, estruturou-se trs tarefas que deram incio a realizao desse estudo. As tarefas consistiam em observar, escolher e convidar os sujeitos que pudessem e quisessem participar dessa pesquisa. Na primeira tarefa, observou-se no ambiente escolar, os grupos que espontaneamente praticavam algum tipo de dana em seus tempos livres. Essa tarefa realizou-se no ptio dessas escolas durante quatro semanas. Na segunda tarefa, escolheu-se um grupo em cada uma das escolas, observando-se, a frequncia com que esses grupos realizavam esses encontros, para uns chamados de treinos e para outros chamados de ensaios. Isso demonstrava o interesse pela prtica da dana, o que os aproximavam do critrio estabelecido para constituir a populao priorizada nesta investigao. Na terceira e ultima tarefa desta primeira etapa formalizou-se o convite aos grupos escolhidos, para que os mesmo viessem a se tornar sujeitos nesta pesquisa. Para tanto foram redigidos termos de consentimentos e autorizaes, j que todos os sujeitos eram menores de idade. Etapa de desenvolvimento A pesquisa propriamente dita realizou-se em salas de audiovisual dessas escolas, onde foram aplicados questionrios antes e aps a exibio de vdeos de dana contempornea. A durao dessa etapa foi de quatro encontros de noventa minutos cada, sendo dois encontros para cada escola. 14. 14 Etapa de anlise e concluso A partir das respostas desses questionrios foram coletadas as leituras que esses sujeitos fizeram sobre dana contempornea. Sob a coordenao da orientadora apresentou-se a anlise e discusso dos resultados desse estudo, trazendo reflexes, questionamentos e concluses. 2.2 PERSONAGENS A populao priorizada nesta pesquisa constitui-se de 13 adolescentes e pr-adolescentes, todos eles alunos do ensino fundamental, de duas escolas estaduais da cidade de Porto Alegre. Foram oito meninas com a idade entre 11 e 13 anos, da Escola Estadual de Ensino fundamental Dona Luiza de Freitas Vale Aranha, e cinco meninos, entre 12 e 15 anos de idade, da Escola Estadual de Ensino fundamental Leopolda Barnewitz. Durante a anlise dos dados os sujeitos receberam nomes fictcios, e foram identificados por iniciais. 2.3 ADEREOS Os instrumentos utilizados nesta pesquisa foram dez vdeos numerados de um a dez, cada vdeo contendo uma coreografia de dana contempornea, e mais dois questionrios de entrevistas semiestruturadas. Para coleta e registro das respostas desses questionrios foram utilizadas anotaes e um gravador. 2.3.1 Vdeos Os dez vdeos selecionados para essa investigao foram organizados em 15. 15 dois mdulos com cinco vdeos cada. O primeiro mdulo contou com cinco obras da coregrafa alem Pina Bausch, extradas do filme Pina de Wim Wenders. As coreografias da Pina Bausch foram exibidas no primeiro encontro de cada grupo. Desse modo, os sujeitos foram apresentados primeiramente, a uma forma especfica de se pensar a dana, a maneira Pina Bausch de coreografar. Philippine Bausch, mais conhecida como Pina Bausch foi uma coregrafa, bailarina e pedagoga de dana. Estreou como coregrafa em 1968 e em 1974 funda a sua nica companhia, o Wuppertal Tanztheater, que se tornaria um marco na dana da segunda metade do sculo vinte. Desde ento produziu, em mdia, um espetculo por temporada. No decorrer desse estudo as coreografias utilizadas sero citadas pelo nmero do vdeo correspondente, que a partir de agora sero apresentados por uma pequena descrio. Primeiro mdulo Vdeo 01 - A primeira obra trazida para essa investigao foi a coreografia de abertura do filme Pina, na qual participam praticamente todos os bailarinos da Wuppertal Tanztheater. Figura 01 - Foto referente ao vdeo 01 Fonte: extrada do filme em DVD Pina de Wim Wenders No palco, segurando um acordeom, uma das bailarinas inicia a coreografia, 16. 16 dizendo um verso que fala das quatro estaes do ano. Enquanto fala, ela faz um gesto especfico para cada estao, em seguida os outros bailarinos cruzam o palco, enfileirados e caminhando. A coreografia tem um clima solene, etreo, e com uma expresso suave, os bailarinos repetem vrias vezes a sequencia de gestos que a primeira bailarina mostrou. Com a mesma estrutura e dinmica, a coreografia reaparece no final do filme, num cenrio ao ar livre, com lindas paisagens desrticas. Vdeo 02 - A segunda coreografia a ser mostrada foi um solo, feito para a msica Leozinho de Caetano Veloso. A coreografia parte da obra Para as crianas de ontem, hoje e amanh de 2002. Figura 02 - Foto referente ao vdeo 02 Fonte: extrada do filme em DVD Pina de Wim Wenders. Nessa coreografia um bailarino de meia idade vestindo cala, terno e gravata, executa uma coreografia na qual, a maior parte dos gestos contida, executados apenas por braos e mos que esto prximos ao corpo. Quase no h deslocamentos, ele permanece no mesmo lugar do comeo ao fim da coreografia, utilizando as pernas apenas para se agachar num determinado momento. Como comum nas obras de Pina Bausch a seqncia se repete vrias vezes. Vdeo 03 - Terceira coreografia, um trecho de Caf Muller, obra criada em 1978. Uma metfora sobre a solido, questionamentos sobre as relaes, encontros 17. 17 e desencontros humanos. Figura 03 - Foto referente ao vdeo 03 - coreografia Cafe Muller. Fonte: extrada do filme em DVD Pina de Wim Wenders. Interpretada por seis bailarinos e na sua formao original inclua a prpria Pina Bausch, uma coreografia de certo modo, simples, mas impressionante pela a intensidade da expresso. Uma bailarina de olhos fechados e braos estendidos a frente, circula s cegas por um mar de cadeiras vazias, enquanto outro bailarino vai, desesperadamente, tirando os obstculos de sua frente traando um percurso. Vdeo 04 - Na quarta obra desse mdulo, outro solo masculino. O cenrio um tablado de madeira, uma espcie de per, montado na beira de um rio e ao fundo na margem oposta, uma floresta. Um bailarino vestindo um vestido branco com flores rosa, executa uma sequencia de movimentos, que em alguns momentos so suaves, contnuos, mas precisos, como o tai chi chuan. J em outros momentos, esses movimentos ficam mais bruscos e cortantes, como na arte marcial milenar Kung fu, depois voltam suavidade, mesclando essas duas qualidades de movimentos. 18. 18 Figura 04 - Foto referente ao vdeo 04 Fonte: extrada do filme em DVD Pina de Wim Wenders. A expresso do bailarino serena e sua movimentao parece dar voz a toda exuberncia que o cenrio representa e impe. Vdeo 05 - A quinta e ultima coreografia desse primeiro mdulo Vollmond (Lua cheia), que estreou em 2006. Figura 05 - Foto referente ao vdeo 05 - coreografia Vollmond (Lua cheia). Fonte: extrada do filme em DVD Pina de Wim Wenders. 19. 19 No palco, uma cena inusitada, o nico objeto uma grande rocha no lado direito, chove constantemente, mesmo assim, doze bailarinos exibem toda sua tcnica num cho encharcado de gua. Como crianas, os bailarinos aproveitam toda aquela chuva com uma coreografia marcada pelo ldico e pela alegria. E como numa festa, se jogam na gua acumulada no cho, chutam essa gua uns nos outros, e jogam-na pro alto com baldes, formando arcos que desenham variadas formas no espao. Segundo mdulo O segundo mdulo de vdeos, exibido no segundo encontro de cada grupo, mostrou obras de trs criadores distintos, os belgas Wim Vanderkeybus e Anne Teresa de Keersmaeker, e o ingls Lloyd Newson. Nesse mdulo, os sujeitos puderam conhecer distintas formas de criao com coreografias que traziam uma variedade de movimentos, corpos, cenrios e figurinos nada convencionais. Numa perfeita mistura de ao, dana e tecnologia iniciou-se o segundo mdulo de vdeos com trechos de duas coreografias bem caractersticas do belga Wim Vandekeybus, que se chamam Blush e Nieuwzwart. Vdeo 06 - Em Blush, o foco, a explorao dos instintos e do subconsciente selvagem do ser humano, trazendo seqncias de dana de confrontos, atrao e repulsa. Figura 06 - Foto referente ao vdeo 06 - Blusch de Wim Vandekeybus, Fonte: http://www.myspace.com/vandekeybus/photos/1366135 20. 20 Numa cenografia deslumbrante com cenrios entre praias paradisacas, florestas e paisagens da Crsega e de Bruxelas. Vdeo 07 - J em NieuwZwart, que em holands quer dizer Novo preto, os bailarinos dividem o palco com a banda do tambm belga Mauro Pawlowski, que com seu punk rock executado ao vivo, deixa clara a intensidade e o clima da cena, tanto para os bailarinos, quanto para quem assiste. Figura 07 - Foto referente ao vdeo 07 - NieuwZwart de Wim Vandekeybus. Fonte: http://www.flickr.com/photos/desingel/6243738454/ Sobre o palco os bailarinos se jogam violentamente ao cho, no ar e uns contra os outros, construindo cenas fortes, impactantes e ao mesmo tempo delicadas. Vdeo 08 - A terceira obra desse conjunto Ma mere l'oye Extract 1, de Anne Teresa De Keersmaeker, um videodana, no qual um casal executa uma coreografia leve e romntica com muitos passos caractersticos do bal clssico, mas num cenrio surpreendentemente buclico, em plena floresta. Anne Teresa De Keersmaeker uma das mais importantes coregrafas de dana contempornea do mundo. Fundadora da famosa companhia Rosas de Bruxelas. 21. 21 Figura 08 - Foto referente ao vdeo 08 - Ma mere l'oye Extract 1. Fonte, foto e vdeo: http://www.youtube.com/watch?v=hkVk4XPnFxQ Ela conhecida por focar suas coreografias na relao entre a dana e a msica, aliando suas composies a sensualidade e a teatralidade, fazendo com que vrios de seus trabalhos se transformassem em filmes de dana. Vdeo 09 Nesse vdeo, mostrou-se um trecho do videodana The Cost of Living do grupo DV8. Criado em Londres e dirigido pelo britnico Lloyd Newson. Figura 09 - Foto referente ao vdeo 09 - trecho 1 de The Cost of Living. Fonte: Dv8 Physical Theatre The cost of living em DVD 22. 22 A coreografia inicia-se, com um bailarino caminhando com um radiogravador na mo, para em frente porta de uma garagem e coloca o rdio no cho. Com uma expresso sria, Inicia uma sequencia de movimentos simtricos e comedidos com as mos, primeiro em volta do rosto, que evolui para movimentos mais amplos e segue repetindo vrias vezes. A msica Believe, cantada pela deusa do pop, a cantora americana Cher. medida que a msica evolui, a sequencia de movimentos da coreografia vai aumentando de tamanho at perderem a forma inicial e ficarem praticamente livres, enquanto que a expresso do bailarino vai transformando-se de sria para alegre e at muito alegre, o bailarino vai se deslocando pelo espao, at sair de cena. Vdeo 10 - Encerrando a mostra de vdeos, mais um trecho de The Cost of Living, apresentando como cenrio, um gramado extenso em dois nveis, ao fundo um prdio de tijolos vista com vrias janelas. Figura 10 - Foto referente ao vdeo 10 - trecho 2 de The Cost of Living. Fonte: Dv8 Physical Theatre The cost of living em DVD A cena inicia-se com um dilogo entre um videomaker e um dos atores/bailarinos, que tem as pernas amputadas. No dilogo, o videomaker busca informaes sobre a relao entre a amputao e o amputado. Em seguida, o videomaker sai de cena e do nvel inferior do gramado 23. 23 surgem seis bailarinos que se locomovem usando apenas o apoio de mos e dos braos, numa movimentao onde as pernas so arrastadas pelo tronco e membros superiores, juntam-se ao bailarino amputado e realizam uma dana alegre, divertida e rasteira, na qual a utilizao das pernas, quase passa desapercebida, puxando o foco da coreografia para a fluidez e a fruio. Nas coreografias selecionadas para essa investigao observaram-se os critrios de familiaridade e estranheza, sob os seguintes aspectos: espao, movimento, corpo e msica. Tentou-se de certo modo, contemplar um pouco da diversidade que est contida na dana contempornea, trazendo diferentes tcnicas, variadas maneiras de composio, coreografias executadas com trilhas sonoras compostas por msicas clssicas, populares, alternativas e algumas sem msica, e com intrpretes masculinos, femininos, jovens, maduros, clssicos e contemporneos. 2.3.2 Questionrios O primeiro questionrio foi aplicado antes da exibio dos vdeos e tinha o intuito de investigar sobre as prticas de dana dos sujeitos pesquisados, traz-los para o ambiente da pesquisa, preparando-os para a entrevista propriamente dita. Para tanto continha as seguintes questes: Qual a sua dana preferida? Como se aprende essa dana? Porque voc escolheu essa dana? Voc conhece dana contempornea? J o segundo questionrio aplicado aps a exibio de cada vdeo (ou de grupos de vdeos) tinha o objetivo especfico de problematizar a dana contempornea. Nesse sentido trazia questes como: Ao ver essa coreografia o que lhe vem mente? 24. 24 Algo soa estranho ou familiar nessa coreografia? Como voc descreveria esta obra? J viram algo parecido? Como voc avaliaria o grau de dificuldade dessa coreografia? Como voc v a msica, os corpos, os movimentos, as roupas, e o cenrio? Essa coreografia lhe passa alguma emoo? 25. 25 3 SEGUNDO ATO 3.1 DAS DANAS CONTEMPORNEAS As referncias tericas presentes nesse estudo buscam primeiramente, conceituar o termo dana contempornea, com o intuito de acalmar a inquietao que motivou a realizao desse trabalho. Em seguida, procura contextualizar as danas trazidas por esses sujeitos para o ambiente escolar, e por ltimo nos ajuda a entender como se d a compreenso de significados do movimento corporal humano, atravs das leituras feitas por esses sujeitos, quando da apreciao de obras dessa vertente de dana. A leitura aqui citada tenta uma aproximao com o conceito de leitura e apreciao presente nos Referenciais Curriculares do Estado do Rio Grande do Sul, que diz: Ler dana est relacionado leitura dos cdigos especficos da dana. atribuir sentido e no tentar decifr-los, pois envolve a interpretao de significados no rgidos. Relaciona-se com a questo da fruio e apreciao artstica, que por sua vez envolve uma gama de outro saberes. A apreciao comunicar e dividir experincias com os outros atravs da dana. A leitura tambm se desenvolve na pesquisa sobre dana, artistas, conceitos e problemticas relacionadas rea. (SE/DP, 2009. p. 72 v.2.) Podemos pensar que a dana contempornea surge nos Estados Unidos, na dcada de 1960, e s na dcada de 1980 comea a desenvolver uma identidade prpria, mas resiste a ser formatada em um cdigo ou em uma proposta fechada e definida. Em relao a movimentos anteriores, ela sofre influncia de vrios deles, como o caso da dana moderna e ps-moderna, modificando posies, vestimentas e at o prprio espao de apresentao. Ela est mais interessada geralmente, em falar dos sentimentos, ideias e conceitos, do que apenas o virtuosismo, e abre definitivamente para uma multiplicidade de formas de dana. Dessa forma, no so impostos ao bailarino os pr-requisitos de um corpo ideal, ou de uma idade especfica para pratic-la. Segundo Tomazzoni, (2006, p.1) 26. 26 A dana contempornea no uma escola, tipo de aula ou dana especfica, mas sim um jeito de pensar a dana. Forjada por mltiplos artistas no mundo, teve nas propostas da Judson Church, em Nova York, na dcada de 60, sua mais clara formulao de princpios. Dentre eles, o de que cada projeto coreogrfico ter de forjar seu suporte tcnico. E que ter um projeto percorrer escolhas coerentes, como o fez Trisha Brown e tambm, longe dali, na Alemanha, Pina Bausch, com sua dana-teatro, nos anos 70. Tal princpio implicou tanto a preservao de aulas de bal nutridas por outras tcnicas e linguagens quanto o abandono do bal e a incorporao, por exemplo, de tcnicas orientais. [...] No h modelo/padro de corpo ou movimento. Portanto, a dana no precisa assombrar por peripcias virtuosas e nem partir da premissa de que h corpos eleitos. Na dana contempornea, a mxima repetida por pedagogos ortodoxos de que no tu que escolhes a dana, mas a dana que te escolhe no tem sustentao. E, dessa forma, pode-se reconhecer a diversidade e estabelecer o dilogo com mltiplos estilos, linguagens e tcnicas de treinamento. Hoje em dia a dana contempornea praticada em quase todas as partes do mundo, observando-se similaridades e distines em cada lugar e influenciada por modelos e traos culturais, elegendo a diversidade como uma de suas principais caractersticas. A diversidade tanta, que alguns coregrafos, por exemplo, buscaram simplificar tanto a coreografia a ponto de reduzir a tcnica ao uso de movimentos naturais. Porm, segundo Banes2 (1987, p.17) Para os coregrafos ps-modernos dos anos de 1960 e 1970, natural significava algo diferente, significava uma ao sem distores, para uma eficcia teatral, drenada de sobreposio emocional, referncia literal ou manipulao temporal. Um salto, uma queda, uma corrida ou uma caminhada, devem ser executadas sem considerar o apelo visual ou a habilidade tcnica. (Traduo do autor) 2 For the post-modern choreographers of the 1960s and '70s, natural means something quite dfferent. It means action undistorted for theatrical effectiveness, drained of emotional overlay, literary reference, or manipulated timing. A jump, fall, run, or walk is executed without regard to grace, visual appeal, or technical skill. 27. 27 No Brasil no diferente, no se sabe precisamente quando e nem como surge a dana contempornea, mas a partir da segunda Guerra Mundial que muitos artistas estrangeiros como: Maria Duschenes, Marika Gidali, Renn Gumiel, muitos deles oriundos de pases que se encontravam em conflitos, chegam ao Brasil trazendo novas formas de se pensar a dana e vo dar incio ao surgimento dessa vertente no Brasil, formando profissionais e grupos, alguns desses atuando at hoje. Iniciei a minha carreira como bailarino na dcada de 1980, em Recife, e como tal, nunca detive uma tcnica especfica de dana, fiz dana contempornea de vrias maneiras e com criadores distintos, na maioria das vezes como intrprete/criador e em outras, apenas como intrprete. Com o bailarino e coregrafo tcheco Zdenek Hampl3 , por exemplo, ficava claro que o importante era ter um corpo apto para lidar com uma variedade de movimentos, sem a preocupao com uma tcnica especfica, e do ponto de vista filosfico, para ele a dana era um instrumento sociopoltico transformador, onde POR QUE e PARA QUE eram mais importantes do que COMO danar. Para outros criadores que trabalhei, a consistncia do trabalho era apoiada por prticas oriundas do sistema Laban e Aiquid e buscavam simultaneamente, uma esttica e um aperfeioamento tcnico dos bailarinos. E havia os que acreditavam cegamente na tcnica do bal clssico e para criar, inspiravam-se nas obras da coregrafa alem, Pina Bausch. Nessa poca, eu estava interessado apenas em me apropriar daqueles conhecimentos e me sentir pertencente ao meio. No havia a preocupao de classificar, descrever, muito menos buscar um consenso entre aquelas formas de pensar a dana, que para mim se apresentavam. At porque, como diz Dantas (2005, P. 31-57), No existe um consenso para uma definio de dana contempornea, e o termo pode revestir inmeras formas de dana. Em geral, o termo dana contempornea utilizado para abarcar 3 Nascido na antiga Tchecoslovquia, em 1946, estudou na Universidade de Dana de Praga durante o regime comunista. Foi solista do Teatro Nacional de Praga e da Lanterna Mgica de Praga. A partir de sua chegada ao Rio de Janeiro, em 1972, Zdenek participou de trabalhos historicamente significativos, a exemplo da montagem proibida da pea Calabar, de Chico Buarque de Holanda e Ruy Guerra. No mbito da dana, Zdenek integrou o Corpo de Bal da Rede Globo e coreografou para programas como Stio do Pica-Pau Amarelo e Fantstico. No Recife, Zdenek coreografou e dirigiu trabalhos, como Piazzolada (1983), sobre Astor Piazzola; Peles da Lua (1986); Festa de Pedra (1988); e Lua Cambar (1991); entre outros. 28. 28 diferentes poticas da dana nos dias de hoje as quais no se enquadram nas classificaes tradicionais, como bal e dana moderna. Historicamente, identificam-se, em coregrafos como o norte-americano Merce Cunningham na dana ps-moderna e na dana-teatro de Pina Bausch, algumas das matrizes conceituais e tcnicas da dana contempornea. Desse modo, os trabalhos mais recentes da gerao da dana ps-moderna norte-americana; a nouvelle danse europia; a dana-teatro, o but japons e seus seguidores no Ocidente; e as criaes brasileiras, latino-americanas e africanas que buscam uma identificao com a cultura local podem ser designadas como dana contempornea. Ainda, segundo Valle (2010, p.56), Outra tendncia da dana de abordagem contempornea acreditar no artista como investigador, isto , todo o bailarino- criador deve ser um pesquisador de movimentos, gestos, ritmos e significados.. Mais que uma tcnica especfica a dana contempornea soma sistemas e mtodos desenvolvidos da dana moderna e ps-moderna, alm de contracenar com outras reas artsticas. 3.2 DAS PRTICAS DE DANA DOS SUJEITOS PESQUISADOS Menino com menino e menina com menina a priori, parece uma frase do sculo passado, mas assim que a msica toca em pleno sculo XXI, quando o assunto danas da atualidade, pelo menos nos ptios de escolas pblicas do Ensino Fundamental na cidade de Porto Alegre. O curioso que o mesmo no acontece de uma maneira em geral, no contexto das brincadeiras, nem das aulas de Educao Fsica, nesses eventos surpreendentemente, meninos e meninas j participam simultaneamente das mesmas atividades, em alguns casos, at nas partidas de futebol. Atualmente, nos ptios de algumas dessas escolas comum encontrarmos alguns grupos de alunos praticando algum tipo de dana, as chamadas danas atuais. As danas atuais, danas da atualidade ou danas da moda fazem parte praticamente, de todas as geraes, cada qual com a sua dana, e algumas dessas danas, seguem sendo praticadas por vrias geraes como o caso do samba no 29. 29 Brasil. A escola como local de troca de conhecimento por excelncia, assiste hoje nos seus ptios e em suas reas de lazer, a um verdadeiro desfile desses tipos de danas. Elas apresentam uma gama de qualidades de movimento, e trazem um gestual, que vai do ingnuo, presente em algumas coreografias de programas infantis, mostradas na televiso, passam pelo virtuoso, das danas de rua, at o sensual com forte conotao sexual, presente no polmico Funk carioca4 . Segundo Bregolato (2000, p. 168), [...] as danas atuais, aquelas que crianas e adolescentes mais gostam de danar, podem ser muito teis numa iniciao dana na escola. Elas possibilitam uma aproximao para, posteriormente, facilitar o contato com outros tipos de danas.. Quando observo esses garotos e garotas danantes, lembro que quando tinha essa idade, na dcada de 1970, o quanto me sentia atrado pelas danas atuais daquela poca. Nesse perodo em Recife/PE, as danas atuais que eu tinha acesso eram as apresentadas pelo ator, cantor e compositor Toni Tornado, que tinham como trilha sonora, a msica negra norte americana, a chamada Black music. Na dcada seguinte, foram as coreografias do filme Os embalos de sbado noite, estrelado pelo ator John Travolta, e simultaneamente, as danas de pares, embaladas tanto por sucessos internacionais, quanto por sucessos nacionais, incluindo as de cunho folclrico, como o forr. Apesar de no ter tido nenhum contato mais formal com a dana na infncia e na adolescncia, era nesse territrio, onde eu me expressava melhor, me sentia vontade e identificado. 4 Descendente direto do soul, do rhythm'n blues e do jazz, O funk nasceu oficialmente nos anos 1960 por meio de uma inveno genial de James Brown. No Brasil, o funk chegou na dcada 1970 e seu primeiro palco foi o Caneco ironicamente o templo da MPB. Este fenmeno nasceu nas favelas do Rio de Janeiro, e s na capital carioca, rene cerca de dois milhes de jovens em bailes nos finais de semana. Infelizmente a nica diverso de milhares de jovens margem da sociedade passou a ser vista como caso de polcia. Pior que isso, ao longo dos ltimos quinze anos, o termo funkeiro comeou a ser adotado pela mdia como sinnimo de pivete. Ironicamente, no momento o funk tem embalado trilhas de novelas e de toda natureza de programas dessa mesma mdia. 30. 30 4 EPLOGO (DOS GOSTOS E ESTRANHEZAS) 4.1 DOS GOSTOS Como esperado, o fato dos sujeitos pesquisados j praticarem algum tipo de dana deixou-os vontade para referirem-se com mais propriedade, a elementos como; movimento, cenrio, trilha sonora e figurino. A anlise e discusso que apresento agora um recorte dos resultados dessa pesquisa, que se apoiou nas leituras feitas por esses sujeitos, atravs das respostas obtidas em dois questionrios j citados anteriormente. O primeiro questionrio, que sondava tanto sobre as prticas de dana trazidas por esses sujeitos, quanto sobre o conhecimento que os mesmo possuam sobre dana contempornea, e o segundo questionrio que problematizava a dana contempornea atravs de perguntas que se referiam s obras dessa vertente de dana que foram exibidas em vdeos. A partir das respostas obtidas com o primeiro questionrio constatou-se, que com relao as dana praticadas pelos sujeitos pesquisados, o primeiro grupo composto por oito meninas gostava de danar principalmente, dance pop, tipo de dana da atualidade, embalada por msicas do estilo Teen Pop5 , gnero musical caracterstico de algumas bandas como Rebeldes, Rouge e Restart, que so mostradas com frequncia em programas de televiso e na internet. Porm, algumas integrantes desse grupo tambm danavam os gneros funk carioca e pagode com o mesmo entusiasmo. J o segundo grupo composto por cinco meninos gostava de danar principalmente, o free step6 , um tipo de dana de rua embalada por msica 5 Estilo de msica que comercializada, mas no exclusivamente, para pr-adolescentes e adolescentes. Ela chamada teen pop, porque a maioria dos artistas dentro deste gnero iniciou a sua carreira na sua adolescncia. No Brasil, a dupla Sandy & Junior eram as principais estrelas do teen pop, em seguida a banda Rouge e Bro'z tambm fizeram sucesso com crianas e adolescentes, Kelly Key, Wanessa Camargo, Felipe Dylon tambm representaram o gnero. 6 Traduzindo do ingls: Passos Livres, origina-se do Rebolation, que por sua vez uma evoluo do Charleston Dance, que originalmente era danada pelos negros do sul dos Estados Unidos e recebeu o nome da cidade de Charleston. O Free Step consiste em deslizar sobre o cho fazendo movimentos com as pernas e geralmente com as mos sob as batidas da msica eletrnica, baseia- se em movimentos elaborados, e at a incluso de outros passos de danas. 31. 31 eletrnica, mas, como no primeiro grupo, nesse tambm tinham os sujeitos que alm do free step, danavam tanto o funk carioca quanto o pagode com a mesma empolgao. Com base na anlise desse material nota-se que, com exceo de um pequeno grupo que s danava apenas o dance pop, a grande maioria dos sujeitos pesquisados tinha como prtica de dana preferida, o funk carioca, o pagode e o free step, estilos de dana comum entre boa parte dos adolescentes e pr- adolescentes brasileiros de classes populares. Essas danas, geralmente, esto entre as atividades de lazer preferidas desses jovens, apesar desses estilos de dana tambm serem praticados em contextos sociais bem diferentes. Nota-se tambm, dois motivos pelos os quais esses sujeitos escolhem suas danas: O primeiro motivo pelo simples prazer e bem estar que a dana proporciona, como relata, por exemplo, W. D. B. de 15 anos Gosto de dana funk porque fera, maneiro! ou como relata L. S. S. de 14 anos a respeito do free step uma coisa que te energiza, te passa uma coisa boa, uma coisa rpida que funciona como exerccio, e o segundo motivo que aparece, passa pela auto-estima como nota-se no depoimento de I. F.C de 13 anos, praticante de pagode, legal para quando a gente chegar festa fazer bonito ou como diz ainda B. F. A. de 13 anos, que gosta de danar funk, Ningum quer fica de fora, e nem fazer feio no baile!. preciso, no entanto, ter claro que esta leitura, esta percepo, esta compreenso, esta atribuio de significados vai ser feita por um sujeito que tem uma determinada histria de vida, em que objetividade e subjetividade organizam, de modo singular, sua forma de apreenso e de apropriao do mundo (PILLAR, 2002, p.74). Uma das coisas que chamou a ateno na maioria das danas praticadas por esses sujeitos foi que, etnicamente, tanto o funk carioca, quanto o pagode e o free step so danas que possuem suas origens nas matrizes africanas. Outro dado que tambm remete a influencia da tradio africana a forma como esses sujeitos aprendem essas danas. Na maioria das vezes em que responderam a pergunta, de que forma se aprendem essas danas?, citaram a oralidade e a imitao como 32. 32 prticas recorrentes nesse processo de ensino e aprendizagem. Quando falamos de tradio em relao histria africana, referimo- nos tradio oral, e nenhuma tentativa de penetrar a histria e o esprito dos povos africanos ter validade a menos que se apoie nessa herana de conhecimentos de toda espcie, pacientemente transmitidos de boca a ouvido, de mestre a discpulo, ao longo dos sculos. Essa herana ainda no se perdeu e reside na memria da ltima gerao de grandes depositrios, de quem se pode dizer so a memria viva da frica. Entre as naes modernas, onde a escrita tem precedncia sobre a oralidade, onde o livro constitui o principal veculo da herana cultural, durante muito tempo julgou-se que povos sem escrita eram povos sem cultura. (KI-ZERBO, 2010, p.167) Segundo os sujeitos pesquisados, geralmente, o amigo ou o irmo que ensina essas danas mostrando, ou se aprende olhando outros danarem. Realmente, durante toda essa pesquisa, raramente ouviu-se falar de aulas regulares desses estilos de dana, com professores, sala de aula, etc., da forma como acontece normalmente, na tradio ocidental. A influncia da cultura africana nas danas atuais notria em muitas partes do mundo e no Brasil, como podemos perceber no Charme, no Hip hop, no Free step, no funk, no Ax da Bahia, etc. Refletindo sobre todos esses dados, percebe-se aqui uma excelente oportunidade, para que, atravs dessas danas, sejam inseridos no currculo escolar, os contedos referentes Histria e Cultura afro-brasileira, como manda a lei 11.645/087 , que torna obrigatrio o ensino dessa matria especialmente nas reas de Artes, de Literatura e Histria Brasileiras. Finalizando a anlise do primeiro questionrio, com relao ao conhecimento que os sujeitos pesquisados possuam sobre a dana contempornea, no havia qualquer referncia sobre o assunto, e nenhum dos sujeitos fazia a menor ideia do que se tratava. Percebe-se com isso, que pelo menos no contexto das escolas pblicas da cidade de Porto Alegre, embora a arte contempornea j aparea na forma de msica, e nas artes visuais, a dana contempornea tanto na teoria, quanto na prtica, infelizmente, ainda algo muito 7 Lei n 11. 645/08 altera a Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei n 10.639 de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educao nacional, para incluir no currculo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temtica Histria e Cultura Afro-brasileira e Indgena. 33. 33 distante desse pblico. Acompanhando o retrospecto de editais de ocupao de teatros, de fomento cultura e de programaes culturais, onde geralmente, em primeiro lugar est msica, o cinema ou as artes visuais, aqui no ambiente escolar tambm se encontrou a dana numa posio menos prestigiada em relao a outras artes. 4.2 DAS ESTRANHEZAS Chegamos ao que se pode chamar de cerne dessa pesquisa. Depois de apreciarem alguns trabalhos de dana contempornea, atravs das dez coreografias exibidas em vdeo, esses alunos danantes fizeram suas leituras e deixaram as impresses que conseguiram captar, por meio de suas respostas ao questionrio que problematizava este tema. Analisando as respostas do segundo questionrio, alguns aspectos chamaram a ateno. Primeiramente, mesmo j estando vontade, aps terem falado sobre suas danas, expressarem a opinio sobre algo novo e diferente no foi to fcil no incio. As primeiras respostas eram tmidas e vinham acompanhadas, geralmente, de certo estranhamento, em palavras isoladas como; estranho, louco, divertido, legal, diferente, interessante, incrvel, no gostei. E isso s comea a mudar quando surgem as primeiras coreografias com temas cmicos, ou as que trazem msicas conhecidas e parecidas, com as que esses sujeitos esto habituados a ouvir e a danar. A partir desse momento as respostas passam a ser mais expressivas. Podemos citar como exemplo a coreografia do vdeo 02, cuja trilha sonora msica Leozinho de Caetano Veloso. Sobre essa coreografia B. F. A. de 13 anos, diz: Ah! eu adoro essa msica, essa dana eu gostei! achei interessante, o jeito como ele faz, parece ser fcil de danar, mas no . E completa, Sabe as mos dele, cada movimento que ele faz conta um pedao da msica, tipo como se fosse uma histria, e a mo dele vai seguindo como se fosse o ritmo da msica. Ainda sobre a mesma coreografia, estimulado pela colega, W. D. B. de 15 34. 34 anos afirma, [...] Essa dana lembrou hip hop, s que mais lento [...] ele usa a mo, como se a mo fosse um controle, pra ele poder usar os braos e pernas e poder se mexer. Da mesma forma, as coreografias nas quais, os sujeitos identificaram ou reconheceram alguns movimentos, mesmo que descontextualizados, tambm provocaram respostas mais participativas. Um exemplo a coreografia do vdeo 04, o solo masculino do vestido com flores, sobre a qual L. S. S. de 14 anos, diz, me lembra muito cultura oriental, parece uma luta. Ainda sobre essa obra, um dado chamou a ateno, apesar de o bailarino interpretar um personagem, que a princpio no tinha um gnero definido, ele usava uma saia, mas esse detalhe no chamou a ateno da maioria dos sujeitos, que se detiveram muito mais, s associaes que puderam fazer com os movimentos que reconheceram, e ao fato dessa coreografia ser executada em um tablado, na beira de um rio. Quando o detalhe da saia foi percebido por M. E. V. de 12 anos com a expresso, estranho, ele ta de saia!, I. F.C de 13 anos argumentou, ah, estranho porque no daqui, de outro pas, apesar de que Samurais tambm usam saias. Com base nas observaes dos sujeitos fica claro que, as coreografias que mais agradaram foram as que tinham msicas ou movimentos que se assemelhavam aos que eles estavam acostumados a ouvirem ou fazerem. Como j observado em algumas falas anteriormente. Quando a msica era estranha aos seus repertrios, ou a coreografia era sem msica, ou o espao diferente, ou os movimentos eram concebidos a partir de gestos simples do cotidiano, geralmente, no agradavam. Observou-se ainda que, nas coreografias cuja tnica so as sequencias mais acrobticas em duplas, chama a ateno dos sujeitos, a teatralidade, a coragem e a semelhana que esse tipo coreografia tem com as lutas, alm da segurana que os bailarinos tm uns para com os outros, revelada para eles, na confiana de quem se jogava para ser aparado pelo colega. Outra coisa que chama a ateno dos mesmos o grau de dificuldade dessas coreografias, levando-os a concluir, que para tanto necessrio muito ensaio e uma boa preparao fsica. Entretanto, nota-se que de certo modo, os sujeitos dessa pesquisa no percebem a dana enquanto forma de linguagem, e sim, como mais uma forma de lazer, pois em suas concepes no cabem danar, por exemplo, o feio, o triste, e 35. 35 nem a utilizao de gestos do cotidiano, pois apesar desses gestos serem reconhecidos e identificados por eles, no so considerados como parte da coreografia, mas sim como dana livre. 36. 36 5 APLAUSOS Partindo dessas observaes, identifica-se claramente, a msica e os movimentos reconhecidos pelos sujeitos, como um critrio de aproximao com o tema, o que vai ao encontro com o que Pillar (2002, p. 73,74) diz, O significado est relacionado ao sentido que se d situao, ou seja, s relaes que estabelecemos entre as nossas experincias e o que estamos vendo. [...] Ao ver precisamos decodificar os signos de uma cultura e compreender o sentido que criam a partir do modo como esto organizados. [...] O sentido vai ser dado pelo contexto e pelas informaes que o leitor possui. Ao ver, estamos entrelaando informaes do contexto sociocultural, onde a situao ocorreu, e informaes do leitor, seus conhecimentos, suas inferncias, sua imaginao. Assim, o que e descrito no a situao, o fato, mas a interpretao que o leitor lhe conferiu num determinado momento e lugar. Num pas multicultural como o Brasil, que se constitui pela influncia de tantas etnias, e embalado por tantos ritmos e sotaques, est a o carnaval para confirmar essa evidncia, lamentavelmente uma arte como a dana, ainda no faz parte efetivamente, do currculo escolar da maioria das escolas pblicas. Se a escola existe para trabalhar as relaes entre as pessoas e o conhecimento, como afirma Marques (2012, p.59), se existem os PCNs e uma lei que indica e regulamenta a matria, se esse conhecimento j faz parte do cotidiano de muitos dos sujeitos que frequentam essa escola, como se percebe nos ptios e corredores e tambm fora dela, e ainda, se o mercado j oferece profissionais habilitados para tal funo, o que falta para que se faa livre o acesso a mais esta forma de linguagem? Ao ensinarmos e aprendermos a dana como linguagem, estamos tambm nos apropriando de mais uma forma de ler o mundo: Ler o mundo do ponto vista de nossa corporeidade, das relaes corpo/espao/tempo. No aprendemos dana para ler o mundo, mas efetivamente danando produzindo, apreciando, 37. 37 contextualizando dana temos a oportunidade de vivenciar tempos e espaos que nos permitem outras leituras de mundo. (MARQUES, 2012, p.60) Neste processo de pesquisa que chega ao final, surge uma definio de dana contempornea construda pelo autor, a partir das leituras dos sujeitos dessa pesquisa: A dana contempornea estranha. Parece um teatro sem fala, numa mistura de passos coreografados e livres, um pouco de cada. Algumas coreografias so sincronizadas com a msica e entre os bailarinos, mas outras no e a maioria so crticas. Pode ser de muitos tipos e ritmos, uma dana para todo mundo at pra quem no tem pernas. Pode ser apenas com partes do corpo, pode ser sem msica, tentando transmitir alguma coisa. Concluindo, realizar essa pesquisa me possibilitou enxergar a importncia e a dimenso do espao que a dana tem dentro da escola. E que as danas que os sujeitos dessa pesquisa j traziam com eles eram to importantes quanto dana contempornea que eu trazia para ser apresentada. At porque, de certo modo, as danas que eles trouxeram tambm so contemporneas. A maioria delas utiliza como referencial a vida cotidiana, os traos culturais do meio em que esto inseridas e como podemos constatar anteriormente, trazem razes profundas de suas tradies. Essas danas desempenham um papel importantssimo enquanto trao cultural na vida desses sujeitos. Como forma de lazer, como linguagem e como identidade, muitos desses jovens so reconhecidos em suas comunidades como sujeitos danantes, inclusive na prpria escola. Acredito que a partir de agora, por estar inserido no meio artstico e no ambiente escolar, posso promover de forma mais efetiva, o encontro desses sujeitos com a dana contempornea. No inicio dessa pesquisa foram tantas e to interessantes as contribuies trazidas por eles, atravs dos relatos sobre suas prticas, que por um instante pensei em transferir o foco dessa pesquisa para as danas. Porm preferi seguir a proposta inicial, porque tambm importante revelar e refletir sobre os estranhamentos que a dana contempornea provocava nesses sujeitos danantes. Acredito tambm, que a presena da dana contempornea to importante na escola como em outros espaos, durante essa pesquisa estava sendo vinculado 38. 38 na TV aberta um comercial da Natura8 , empresa de cosmticos, no qual estava sendo lanada uma nova fragrncia de perfume, era um vdeo de 15 segundos, onde o objeto central era uma coreografia de dana contempornea, na verdade um videodana. O vdeo inicia-se com pingos em close, que caem num lquido escuro, em seguida mostra o rosto da bailarina, por trs de um vidro de perfume, ela executa movimentos com braos e mos, espirais e delicados, de uma de suas mos sai um p brilhoso que preenche todo o quadro, os movimentos se aceleram junto com a msica, e o vdeo se encerra em um quadro aberto e a bailarina executando um movimento espiral brusco, que finaliza com ela agachada num palco escuro, apenas um pino de luz sobre seu corpo. Em meio s perguntas que fiz no segundo questionrio descrevi e perguntei se algum tinha visto aquele comercial, vrios sujeitos disseram que sim, em seguida perguntei o que tinham achado, e os comentrios foram todos elogios. Quando falei que se tratava de uma coreografia de dana contempornea ficaram todos surpresos, e os comentrios foram empolgados, provavelmente por aquele vdeo estar num veculo habitual desses sujeitos, que a televiso e tambm por aquelas informaes estarem nos padres de linguagem com os quais a maioria das pessoas est habituada a ler e a absorver. Muitas informaes ao mesmo tempo, muitos cortes interessantes, uma msica instigante, uma boa luz e cores vivas. Tudo como eles gostam. Que pena que no temos mais arte, mais msicas e mais dana contempornea nas coisas rotineiras do nosso dia a dia. Sugere-se, contudo, que sejam feitos outros estudos sobre os gostos e estranhezas desses alunos em relao dana, principalmente, com aqueles que no a praticam e em outros contextos sociais, para que a dana realmente possa fazer parte efetivamente, dos currculos escolares. Concluo esse estudo respondendo a pergunta de Pillar (2002 p. 71) - Pode- se educar o olhar dentro da escola? - No s se pode como se faz necessrio, educar o olhar dentro da escola, permitindo a entrada de outras imagens, outras msicas e outras danas para que a arte possa cumprir o seu papel, ampliando as possibilidades de expresso, de comunicao, e as mltiplas formas de se ver e pensar o mundo. 8 - http://www.youtube.com/watch?v=jpWiVzhG5Io. Acesso em 22/01/2013. 39. 39 CRDITOS LABAN, Rodolf. Domnio Pelo Movimento. So Paulo: Summus, 1978, p. 19. BRASIL. Secretaria de educao fundamental. Parmetros Curriculares Nacionais: Educao Fsica Braslia: MEC/SEF, p. 69 1997. Disponvel em: < http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf>. Acesso em: 28/11/2012 TOMAZZONI, A. Esta Tal de Dana Contempornea. Disponvel em: Porto Alegre: Idana, 2006. Acessado em 27 de outubro de 2012. RIO GRANDE DO SUL. 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