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Educação e cultura midiática Volume I

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Educação e Cultura Midiática

Volume I

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Universidade do Estado da Bahia - UNEB

Lourisvaldo Valentim da SilvaReitor

Maria Nadja Nunes BittencourtDiretora da Editora

Conselho Editorial

Delcele Mascarenhas QueirozJosé Cláudio Rocha

Josemar Rodrigues de SouzaMárcia Rios da SilvaMaria Edesina Aguiar

Mônica Moreira de Oliveira TorresWilson Roberto de Mattos

Yara Dulce Bandeira Ataíde

Suplentes

Kiyoko Abe SandesLiana Gonçalves Pontes Sodré

Lynn Rosalina Gama AlvesRonalda Barreto Silva

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Maria Olívia de Matos Oliveira

Lucila Pesce

(Organizadoras)

Educação e Cultura Midiática

Volume I

EDUNEB

Salvador

2012

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© 2010 Editora da UNEBProibida a reprodução total ou parcial por qualquer meio de impressão, em forma idêntica,

resumida ou modificada, em Língua Portuguesa ou qualquer outro idioma.Depósito Legal na Biblioteca Nacional

Impresso no Brasil em 2012.

Ficha Técnica

Coordenação EditorialRicardo Baroud

Coordenação de Design e CapaSidney Silva

Projeto Gráfico, Editoração, Normalização e RevisãoGrajaú Gráfica e Encadernadora

Ficha Catalográfica - Sistema de Bibliotecas da UNEB

Editora da Universidade do Estado da Bahia - EDUNEBRua Silveira Martins, 2555 - Cabula

41150-000 - Salvador - BahiaFone: + 55 71 3117-5342

[email protected]

Educação e cultura midiática / Organizado por Maria Olivia de Matos Oliveira; Lucila Pesce. – Salvador: EDUNEB, 2012. 218p. v. 1.

ISBN: 978-85-7887-122-2.

Inclui referências. 1. Educação - Inovações tecnológicas. 2. Inovações educacionais. 3. Tecnologia educacional. I. Oliveira, Olívia de Matos. II. Pesce, Lucila.

CDD: 371.334

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Prefácio

A cultura midiática e os desafios para a educação

Até perto do final do século XIX, o território da cultura nas sociedades ocidentais fazia-se compreender na oposição entre cultura erudita e superior, de um lado, e cultura popular, de outro. Trata-se de uma oposição decorrente do desenvolvimento da sociedade capitalista e da formação da burguesia, expressando a dominação desta classe, identificada com a cultura de elite, sobre a cultura popular de origem camponesa e proletária. Isso significa que a cultura erudita, própria das classes dominantes não impedia a existência de sistemas culturais populares, tais como o folclore rural, enfim, a existência de produtos culturais específicos capazes de dar expressão a experiências coletivas dotadas de um imaginário social próprio.

De meados do século XIX em diante, como fruto da industrialização, da explosão demográfica, do êxodo rural e do surgimento do telégrafo, da fotografia e da presença do jornal, a oposição precedente entre cultura de elite e popular passou a sofrer fundas alterações. A esse binômio veio se somar um novo tipo de cultura, a emergente cultura de massas e os mecanismos de um fenômeno inteiramente distinto, a industrialização da cultura. Com isso, deixaram de persistir as situações de produção daquilo que tão redondamente era chamado de cultura erudita versus cultura popular. Embora os padrões culturais tradicionais tenham continuado a existir, eles foram se tornando cada vez menos dominantes diante dos modos de produção cultural que operam de acordo com a lógica da industrialização da cultura.

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O que eram apenas prenúncios da cultura de massas no jornal, no cinema e na publicidade veio alcançar o seu clímax, em meados do século XX, nos processos de comunicação radiofônicos e televisivos. Foi nessa época que se deu a explosão da cultura pop, quando o papel desempenhado pela dimensão da cultura nas formações sociais foi se tornando cada vez mais proeminente. Essa proeminência intensificou-se nos anos 1980 com o advento da cultura das mídias, ou seja, uma cultura na qual emergiram a máquina xérox, o controle remoto, a TV a cabo, o vídeo cassete e outros equipamentos que começaram a permitir ao receptor alguma escolha no tipo de entretenimento ou informação que deseja receber.

Impacto similar, na antiga oposição entre cultura erudita e popular, que fora provocado pela cultura de massas, esta passou a sofrer frente ao advento da cultura das mídias, visto que os pequenos dispositivos, aparentemente inofensivos, introduzidos por esta última, foram minando a hegemonia da cultura de massas. A segmentação do público, a possibilidade aberta para que o indivíduo possa escolher informação e entretenimento ao seu gosto e repertório – que são próprias da cultura das mídias, uma cultura do disponível – começaram a preparar a sensibilidade do receptor para o surgimento da revolução digital, das redes planetárias de comunicação e da cibercultura nos anos 1990. Além de provocar uma inflação ainda maior no papel desempenhado pela dimensão cultural no todo social, a cibercultura inaugurou a intensa dinâmica das conexões que torna o acesso à informação e ao conhecimento um bem ao alcance de uns poucos cliques no computador.

Ora, o que importa reter nessa sequência acelerada e ininterrupta de transformações socioculturais é que os diferentes tipos de formações culturais – popular, erudita, massiva, das mídias e digital – criam ambientes cognitivos, perceptivos e sensórios que lhes são próprios. Esses ambientes vão se misturando e coexistindo, pois um novo ambiente não leva os

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precedentes ao desaparecimento. É em função disso que a cultura em que hoje vivemos é complexa, densa, intrincada, híbrida e multifacetada. Não apresenta mais nada que possa lembrar a mera e simples oposição entre cultura popular e cultura erudita que era própria da sociedade pré-massa, do início do século XIX.

As consequências que essas condições culturais cada vez mais hipercomplexas trazem para a educação não são poucas. O que fica evidente, na passagem de uma formação cultural para a outra, é o crescimento e diversificação da produção de informações e o acesso a elas que se amplifica cada vez mais. Que os processos de aprendizagem não são mais privilégio da formação escolar parece ser evidência que a cultura digital tornou incontestável. Os meios de massa – jornal, rádio, televisão – já trazem notícias, entretenimento e informações para dentro de nossas casas com a mesma facilidade com que chegam a luz e a água. Os equipamentos típicos da cultura das mídias – vídeo, TV por assinatura, xerox etc. – permitem que escolhas individuais se efetuem diante de uma pletora de opções.

Agora, com as mídias digitais, notícias, informações, entretenimento, jogos, comunicação multilateral, veiculadas em redes fixas e móveis, podem ser acessadas, em qualquer momento, de qualquer lugar para qualquer outro lugar. Isso provoca transformações radicais nos modos de se informar, aprender, conhecer, nas práticas de lazer e de socialização. Não são poucos os autores que têm defendido a ideia de que a inteligência humana hoje se encontra expandida em uma inteligência coletiva, de caráter planetário que palpita e estala em ritmo exponencial.

Embora desde o final do século XIX, tenha havido uma escalada crescente da penetração das mídias na existência individual e social, no mundo pré-digital, ainda era possível se perceber uma diferenciação nítida entre os espaços de vida e das funções que neles são desempenhadas,

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tais como o espaço da escola, do trabalho, do lazer, o espaço do lar, dos encontros sociais. Agora, na cultura digital, espaços e funções tendem a se misturar. Eles se interpenetram e se complementam inelutavelmente de modo que tem se tornado cada vez mais difícil separar e discernir as funções que cabem a cada espaço.

Levando em consideração apenas o que diz respeito à educação, é preciso levar em conta que os dispositivos digitais, especialmente aqueles de caráter móvel, estão propiciando novas formas de aprendizagem, ou seja, aprendizagem ubíqua, a qualquer tempo, de qualquer lugar, que ocorre ao sabor das circunstâncias no movimento vertente da vida. Diante disso, como estabelecer distinções precisas entre aprendizagem formal, planejada, sistematizada, organizada, de um lado, e aprendizagem informal, contingente, descontínua, caótica e ubíqua, de outro? Como conceber novas formas de ensino que possibilitem o intercâmbio dessas duas formas? Como incorporar a informação descontínua e fragmentária que é própria das redes, no contínuo e cumulativo que é próprio do saber protegido pela memória? Essas questões são apenas pequenas pontas do imenso iceberg dos desafios que hoje se apresentam aos educadores. Vem daí o grande valor dos dois volumes da coletânea que aqui se apresenta, voltada para uma miríade de reflexões sobre a educação frente à cultura midiática. Por isso mesmo, aqui o leitor só terá a ganhar, pois a leitura desses livros já é um passo significativo na direção de um debate que não pode ser adiado.

Lucia Santaella

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Apresentação 13

PArTE I: CUlTUrA MIdIáTICA

Mídia, Educação e Cidadania 19

Osvaldo Biz

Comunicação, Multimeios e Educação: programas educacionais em pauta 47

Adriana Rocha Bruno e Ana Maria Di Grado Hessel

Mundos Virtuais, Games e Simulações em Educação: alternativas ao design instrucional 69

João Mattar

Processo Educativo e Inclusão Sócio–digital na EJA: uma proposição 97

Adriana dos Santos Marmori Lima

PArTE II: ForMAção On-line

Formação Online de Educadores: uma proposta dialógica 121

Lucila Pesce

Sumário

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Formação docente e Aprendizagens Online: reflexões sobre curriculo 145

Maria Olivia Matos Oliveira

Sala de Aula Virtual: novos lugares e novas durações para o ensinar e o aprender na contemporaneidade 169

Daniel Mill, Nara Dias Brito e Aparecida Ribeiro Silva

A Comunicação na “Era do Príncipe Eletrônico”: a EAd como desafio político e pedagógico 193

Eliana Romão e César Nunes

Sobre os Autores 213

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Apresentação

Caro leitor, o primeiro volume da coletânea que ora apresentamos reúne pesquisadores de distintas universidades brasileiras e trata de dois temas instigantes da sociedade contemporânea: cultura midiática e processos de formação desenvolvidos nos ambientes digitais.

Os artigos que compõem a primeira parte deste livro – Cultura Midiática – revelam, na polissemia das vozes dos autores, uma unicidade nas reflexões sobre como a mídia se torna presente em todos os aspectos da vida cotidiana e como o discurso midiático participa do processo histórico de construção da identidade dos sujeitos, nas interações sociais, afirmando ou negando a nossa condição de cidadãos.

No primeiro parte do volume, de acordo com Osvaldo Biz, no seu texto Mídia, Educação e Cidadania, diante da exposição dos sujeitos aos meios de comunicação de massa, há necessidade de uma educação crítica para as mídias, pois “a construção da cidadania envolve a descoberta de que devemos nos tornar sujeitos da história e não meros objetos de manipulação”.

Adriana Bruno e Ana Hessel chamam a atenção para a necessidade de trabalhar temas que integrem a Educação e a Comunicação. E o fazem com o relato analítico de propostas de programas educacionais, em diferentes mídias, que vêm sendo desenvolvidas por ambas as pesquisadoras desde 2005.

No contexto da cultura midiática, “Mundos virtuais, games e simulações são elementos essenciais da cultura midiática”, conforme adverte

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João Mattar. A partir dessa premissa, o autor explora os usos pedagógicos de mundos virtuais (em especial, o Second Life), games e simulações, apresentando o estado da arte do debate teórico e analisando algumas experiências práticas.

A seu turno, Adriana Marmori Lima reflete sobre o processo educativo e a inclusão sociodigital na educação de jovens e adultos, procedendo a uma imersão na trajetória de vida pessoal e profissional dos educadores. Ao fazê-lo abre “possibilidades de articulação entre o aprender o mundo das letras e o aprender o mundo digital e a cultura midiática nos processos de EJA”.

O conjunto das reflexões inerentes aos capítulos que compõem a primeira parte do livro busca, portanto, discutir a importância de se conhecer o poder da mídia no cotidiano das pessoas, para a partilha conjunta de significados e compreensão crítica da contemporaneidade.

Para apresentar a segunda parte do livro – Formação Online – julgamos pertinente iniciar com a questão formulada por Eliana Romão e César Nunes: Como é possível a comunicação num contexto em que o contato presencial não é condição para a relação educativa? Os referidos autores partem da premissa de que educação é comunicação e buscam, através do desenvolvimento do texto, saídas alternativas para a superação do impasse de uma educação a distância para uma educação sem distância. Consideram a importância do desenvolvimento da autonomia intelectual dos sujeitos aprendentes, a partir de intervenções pedagógicas que possibilitem espaços de expressão, participação e criatividade.

Na segunda parte do volume os textos voltam-se para os distintos aspectos inerentes à formação veiculada nos dispositivos e interfaces digitais. As reflexões sobre as novas linguagens audiovisuais demandam dos docentes uma nova visão paradigmática capaz de ressignificar as atuais

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práticas educacionais, em sintonia com as emergências dos sujeitos que participam das atuais organizações societárias.

Também são abordadas questões relacionadas à docência, no contexto da cultura midiática.

Lucila Pesce relata uma pesquisa em desenvolvimento sobre formação de educadores no e para o contexto digital, cujos princípios e pressupostos teórico-metodológicos coadunam-se com a perspectiva dialógica.

Ao discorrer sobre os limites e as possibilidades da formação de professores em cursos a distância, Maria Olívia Matos Oliveira pontua, no capítulo de sua autoria, questões relativas ao currículo dos cursos online, aprofundando reflexões sobre temporalidade e sua relação com as aprendizagens significativas.

Questões relativas à educação veiculada nos dispositivos e interfaces digitais, como a fragilidade das interações entre a equipe conceptora e os tutores, o pouco investimento institucional no processo de formação continuada de professores para o exercício da mediação a distância e problemas quanto à adequação dos tempos nas aprendizagens online são discutidos ao longo das nossas páginas, sobretudo nas linhas assinadas por Maria Olívia Matos Oliveira e Lucila Pesce. A guisa de inconclusão – em um campo de trabalho e pesquisa em ebulição, no atual momento histórico – apontamos ao leitor os questionamentos expressos nas interrogações dos autores de um dos textos Daniel Mill, Nara Brito e Aparecida Silva: Como uma sala de aula se configura? Quais os tempos e espaços de uma (sala de) aula? Que mudanças conceituais as tecnologias digitais trouxeram para a aula e para a sala de aula?

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Para compreender as concepções de aula e sala de aula na contemporaneidade é preciso, antes de tudo, entender aspectos relacionados à sala de aula presencial, bem como entender algumas atitudes docentes e da escola, que revelam resistência em reconhecer a inevitável inserção dos estudantes na cultura digital.

Nessa miríade de reflexões finalizamos a apresentação do primeiro volume da coletânea por nós organizada. Ao fazê-lo, apontamos mais dúvidas que certezas, mais interrogativas que afirmativas, porque as questões pendentes poderão ser esclarecidas ou aprofundadas, na interlocução de você, leitor, junto a cada um dos autores da presente obra.

Maria Olívia Matos Oliveira

Lucila Pesce

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PARTE I

CULTURA MIDIáTICA

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Mídia, Educação e Cidadania

Osvaldo Biz(PUC-RGS)

A - MÍdIA

o que se entende por Comunicação

O processo da comunicação inicia com o emissor, que pré-

determina o processo, a mensagem. Mas o elemento que dá sentido concreto à mensagem é o receptor. Havendo a percepção do sentido entre o emissor e o receptor, acontece a interpretação correta da mensagem e aí, sim, é possível falar em comunicação, ou seja, compartilhar, tornar comum a todos, interagir com as pessoas e com o mundo. As ferramentas utilizadas para tal fim são as mais variadas.

Como afirma Bowditch e Buono (1992, p. 81), a comunicação existe quando há troca de informações entre o transmissor e o receptor e há percepção do significado entre os indivíduos envolvidos. Sem essa ação recíproca não existe comunicação, apenas difusão do noticiário a partir do emissor. Trata-se de informação, mas não comunicação. Uma comunicação excelente é aquela conhecida como simétrica, ou seja, de duas mãos. Temos, então, os elementos básicos: um emissor, uma mensagem, um receptor e uma interpretação da mensagem.

A compreensão da importância dos meios de comunicação e sua influência no cotidiano das pessoas parte da discussão de quatro

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proposições (GUARESCHI; BIZ, 2009). A primeira afirmativa é a seguinte: a comunicação, hoje, constrói a realidade. Aqui a palavra realidade significa o que existe, o que tem valor, o que tem respostas, o que legitima e dá densidade significativa ao nosso cotidiano. Ou seja, algo passa a existir, ou não, se as mídias, no caso em foco, rádio, televisão e jornal, comentam ou mostram imagens.

A segunda afirmativa é complemento da primeira: a mídia não só afirma o que existe, como decide o que não existe, em vista do seu silêncio.

A terceira afirmativa é que os donos dos veículos de comunicação controlam a pauta da discussão. Se um fato que aconteceu não for comunicado ou comentado é sinal de que não existiu. Por consequência, os ouvintes de rádio, os telespectadores, os leitores de jornal deixaram de tomar conhecimento de sua existência.

Para Marcondes Filho (2004, p. 7)

[...] apesar do volume imenso de aparelhos postos à nossa disposição, – televisão, internet, telefone celular, aparelhos de transmissão de fax, telões etc. – a vida de cada um ainda é uma caixinha fechada, um universo oculto, um mundo trancado.

E, por fim, nesses tempos da era da informática, da internet, mas de modo especial do meio midiático mais popular que é a televisão, ela ocupa muito do tempo de uma parcela imensa de crianças e jovens, calculada entre quatro e cinco horas diárias. Normalmente são retratadas como parte de um nicho do mercado consumidor e não como seres humanos com direitos específicos.

No Brasil, as crianças recebem mensagens para adquirir brinquedos e cobram de seus pais a aquisição dos mesmos. No Canadá, por exemplo,

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antes e durante a apresentação de programas infantis é proibido fazer publicidade. Tudo isso é bastante complexo. Daí a necessidade de uma visão abrangente das mensagens que nos chegam através dos veículos eletrônicos, ou seja, rádio e televisão.

Nosso texto, além de explicar o surgimento do jornal, rádio e televisão no Brasil, quer oferecer elementos que possam colaborar para uma análise mais crítica da realidade apresentada, ou seja, como algo acabado, pronto, invariável, desenraizado do passado. Ora, informações descontextualizadas privam o leitor de uma compreensão maior dos acontecimentos.

Sabedores de quão poderosa é a mídia em nossa vida cotidiana, estudá-la significa entender o mundo, utilizando nossa capacidade de crítica e decifração para compreender sempre mais do que aquilo que lemos, vemos e ouvimos e compartilhar seus significados (SILVERSTONE, 2002).

Agora, é preciso ter cuidado. O senso de análise não nasce automaticamente. É uma tarefa diária de aprendizagem. Vai crescendo à medida que descobrimos a importância do ‘como’ os noticiários dizem as coisas, em detrimento do que eles afirmam.

Ter uma visão de conjunto, contextualizar as informações, ligar as partes ao todo poderia ser um meio eficaz para a formação de um espírito crítico. Uma reflexão sobre mídia é inerente a todas as pessoas que afirmam e reafirmam sua cidadania, já que mídia está presente em todos os aspectos de nossa vida cotidiana.

Frente às mídias (jornal, rádio e televisão), podemos ter uma postura de ingenuidade ou de supervalorização, encarando-as como simples entretenimento, ocupação das horas de ociosidade, ou uma crença total nas

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informações. É fundamental, porém, não ignorá-las, bem como é premente aprofundar um olhar crítico sobre as mesmas.

A falta de contextualização, o realce a acontecimentos menores em detrimento dos principais que são esvaziados, constitui-se em esquemas de manipulação pelos proprietários das mídias. Com esse procedimento, certos noticiosos não geram polêmica, mas pura conformidade ao que é mostrado. Ora, a moeda mais forte desse milênio é a informação. Quem a detém possui o poder.

Entender o funcionamento da mídia eletrônica

Para realizar a função de análise crítica é preciso ter algumas informações. A primeiríssima é saber que a mídia eletrônica – rádio e televisão – resulta de concessões feitas pelo Governo, por um período limite, necessitando de renovação quando esgotados os prazos, de 10 anos para estações de rádio e 15 para os canais de televisão.

O que significa obter uma concessão? Em outras palavras, significa ter uma licença para usar o que não é seu. Na verdade, o povo é o verdadeiro dono das frequências dos canais. Mas a exploração é destinada a um pequeno grupo de empresários. Em vista de uma legislação que não muda, que já dura 47 anos, sempre as mesmas pessoas são beneficiadas por novas concessões. De acordo com Comparato (2000, p. 193),

[...] deve-se partir do princípio fundamental de que a comunicação social, numa sociedade democrática, é matéria de interesse público, isto é, pertinente ao povo, não podendo, portanto, admitir nenhuma forma direta ou indireta de controle particular sobre os meios de comunicação de massa.

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O que se está exigindo é o cumprimento da Constituição Brasileira de 1988, que em seu artigo 220, parágrafo 5º, prescreve: “Os meios de comunicação social não podem direta ou indiretamente ser objeto de monopólio ou oligopólio”.

Enquanto não chegam as mudanças na legislação, urge criticar e denunciar os monopólios existentes na comunicação. A mídia eletrônica contorce-se dentro de um círculo vicioso férreo, que precisa ser rompido, se quisermos pensar em democracia e cidadania.

Esta intrincada situação da mídia nacional fica bem esclarecida com a afirmativa de Thompson (1995, p. 327): “A liberdade está ameaçada não apenas pelo exercício do poder do Estado, mas também pelo crescimento desenfreado das organizações da mídia no campo privado”.

A pergunta que a descrição deste quadro suscita é a seguinte: onde fica a pluralidade de informações, o contraditório, a diversidade de opiniões, o direito de dizer sua palavra, principalmente na linha do telejornalismo, que constitui a principal fonte de informação?

As notícias repassadas para a maioria dos brasileiros de uma forma sintética podem ser comparadas como um “fast food”, um “drops”, uma “cesta básica”. E pior: esta postura pode ser observada na maioria dos canais abertos.

Daí a necessidade de uma educação para a mídia, para desconstruir suas mensagens veiculadas pelos meios de comunicação. O mundo é pior do que a mídia diz naquilo que ela não diz: na desigualdade, na injustiça, na indiferença do serviço público.

Jornalista não é apenas transmissor, mas verdadeiro construtor de conteúdos. De uma mesma informação é possível apresentar resultados

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totalmente diferentes. Depende de quem dá “forma” a essa informação. Ele deve localizar as contradições, os interesses que os proprietários defendem, uma vez que sempre há algo para ser descoberto.

E o receptor deve deixar de lado a ideia de ser um mero leitor ou espectador. É fácil concluir, então, que não existe uma mídia impressa ou eletrônica independente, neutra, apartidária, em que o leitor é sua razão de ser, como gostam de lembrar, continuamente, os seus proprietários. De acordo com Hohenberg (1981, p. 29),

[...] o mero processo de decidir publicar uma matéria ou suprimi-la é um exercício de opinião do editor. Se a matéria vai levar uma manchete grande ou pequena, se será colocada na primeira página, no meio de anúncios de ‘precisa-se’, é, igualmente, não o resultado de qualquer processo objetivo, porém de uma escolha editorial, opinativa.

Editar uma notícia é escolher e, essa escolha já é uma tomada de posição. O destinatário precisa ter uma visão abrangente das mensagens que a ele chegam. Só assim há de crescer seu discernimento, o que lhe possibilitará uma interpretação crítica. A postura crítica do receptor oferece condições de localizar as contradições, os interesses que os proprietários da mídia defendem.

Morin (2001) é o autor da Teoria da Complexidade, entendida como aquilo que é tecido junto, ou seja, existe um elo interdependente entre as partes e o todo, o todo e as partes. Para este sociólogo francês, compreender significa ligar os conhecimentos.

Caso contrário, viveremos rodeados por um cipoal de informações onde não haverá tempo para meditar sobre a primeira notícia, simplesmente porque já foi substituída por outra. Morin (1986) diz que estamos rodeados

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de sub e super informações. O excesso abafa a informação, dificultando o discernimento sobre o que está acontecendo.

A caminhada do monopólio da mídia brasileira

Os serviços da radiodifusão são regulamentados através do Código Nacional de Comunicações, criado em 1962. No mesmo ano é fundada a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT), para defender os interesses dos donos desses veículos.

Este Código sofre alterações a partir do regime militar (1964-1985), quando, em 1967, a legislação estabelece que nenhuma entidade ou pessoa pode ter participação em mais de dez emissoras de televisão em todo o país, das quais cinco, no máximo, devem ser em VHF. Esta legislação abriu brecha para burlar tal determinação. O registro começou a ser feito em nome de empresas diferentes e em nome de vários membros da família.

Isso explica por que no Brasil alguns grupos familiares concentram toda a comunicação do setor de rádio e televisão, que abrange o território nacional. Família Roberto Marinho: Rede Globo Rio, com início em 26 de abril de 1965. Possui também: televisão paga, jornal O Globo, estações de rádio, revistas, agência de notícias, gravadora, televisão a cabo, telefonia celular, provedores de internet, gráfica.

Família João Saad: Rede Bandeirante de Televisão inicia em 13 de maio de 1967 e dispõe de estações de rádio. O espólio da Rede Tupi, após

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sua falência foi distribuída entre a Família Abravanel (Sílvio Santos), que criou o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), e Adolf Bloch, que inaugurou a Televisão Manchete, que também entrou em falência. Em 1999, 15 de novembro, Amilcare Dallevo Júnior fica com a falida Televisão Manchete, sob novo nome: Rede TV. Edir Macedo, compra a Rede Record, que se transforma em Rede Nacional, dispondo de estações de rádio e televisão e mais jornais, revistas, com filiais no exterior.

Nelson Tanure comprou e edita o centenário Jornal do Brasil, a Gazeta Mercantil (que fechou em 2009), e é dono do canal Jornal do Brasil de Televisão (JBTV), antiga Central Nacional de Televisão (CNT), do Paraná, pertencente à família Martinez.

Existem também grupos regionais, repetidores dos grandes canais: Família Sirotsky, que comanda a Rede Brasil Sul de Comunicações (RBS), mantendo o controle midiático do Rio Grande do Sul através de repetidoras de televisão e estações de rádio. Além disso, é proprietária de quatro jornais diários: Zero Hora (Porto Alegre), O Pioneiro (Caxias do Sul), Diário Gaúcho (Porto Alegre) e Diário de Santa Maria (Santa Maria). Em Santa Catarina dispõe de repetidoras da RBS e mais quatro jornais: Diário Catarinense (Florianópolis), o Estado de Santa Catarina (Blumenau), A Notícia (Joinvile) e Hora de Santa Catarina (Municípios da Grande Florianópolis)1.

A Família Daou, com influência no Acre, Amapá, Rondônia, e Roraima. A Família Jereissati, presente no Ceará, Alagoas, Pernambuco. A Família Zahran, no Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A Família Jaime

1 O Ministério Público Federal de Santa Catarina, através de uma ação pública, pede que o Grupo RBS abra mão de um dos seus quatro jornais diários que circulam no Estado de Santa Catarina e escolha apenas duas, entre as seis emissoras da RBS TV regional. “Ainda esse ano podemos ter uma sentença. Porque essa ação tem instrução, ela se prova,” acredita o Procurador da República Federal de Santa Catarina, Celso Três (REVISTA ADVERSO, Porto Alegre, n. 162, p. 9, jun. 2009).

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Câmara: Goiás, Distrito Federal e Tocantins. Família Mesquita: Jornal o Estado de São Paulo e Rádio Eldorado. José Sarney dispõe de canal de Televisão, estações de rádio AM e FM, além de jornal no Estado do Maranhão.

Mais algumas Famílias: Rômulo Mairana (Estado do Pará); Albano Franco (Sergipe); Fernando Collor (Alagoas); Alves (Rio Grande do Norte); Calisto Lobo (Piauí); Antonio Carlos Magalhães, na Bahia (canal de televisão, rádio, jornal).

Muitas dessas famílias ocupam posições políticas nos seus Estados e em Brasília. Em resumo, noventa por cento da mídia brasileira é controlada por grupos familiares. Esta realidade está em perfeita contradição com o Artigo 220 da Constituição, parágrafo quinto: “Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio”.

Há riscos na formação destas corporações?

A formação de redes vai beneficiar o sistema capitalista, uma vez que será possível vender os bens produzidos em nível nacional. Servirá, e muito, para alavancar o período do denominado “milagre brasileiro” (1968-1972), quando há um forte crescimento do Produto Interno Bruto, sem, em contrapartida, uma distribuição de renda. A elite é a beneficiada. Além disto, um país todo interligado permite que o regime militar esteja informado sobre todos os acontecimentos internos. A transmissão da

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Copa do Mundo, em 1970, diretamente do México, serviria como símbolo máximo da integração nacional.

Haveria algum inconveniente com a presença destas corporações? A formação deste monopólio e suas redes facilitam a transmissão de uma mesma imagem, um mesmo e único som e, principalmente, impossibilitam a multiplicidade de informações. Uma única voz percorre todo o país. Não há pluralidade e, como consequência, uma limitação no sentido da democracia, uma vez que é parte inerente dela o direito à informação correta.

Observa muito bem o sociólogo português Boaventura de Souza Santos2 quando escreve:

Quem tem poder para difundir notícias, tem poder para manter segredos e difundir silêncios. Tem poder para decidir se o seu interesse é mais bem servido por notícias ou por silêncio. Podemos concluir, pois, que uma parte do que de importante ocorre no mundo, ocorre em segredo e em silêncio, fora do alcance dos cidadãos.

A influência destas corporações é enorme. O ex-ministro das Comunicações, Sérgio Motta, na Presidência de Fernando Henrique Cardoso, percebeu esta realidade, em entrevista à revista Veja3: “Não acho que a estrutura das comunicações que temos no Brasil seja justa, a mais adequada”.

2 Folha de S. Paulo, São Paulo, 15 mar. 1998. Caderno A, p. 2.

3 Revista Veja, 23 jul. 1997. Páginas Amarelas.

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A questão da democratização

No Brasil, a entrega de canais de rádio e televisão funciona na base de concessões. O governo é quem os distribui. No caso do rádio, o período de concessão é de 10 anos e para um canal de televisão 15 anos. Normalmente, a permissão é renovada. Para evitar qualquer surpresa, é inevitável que exista um comprometimento destas famílias com o poder concedente.

O que deve ser constatado é que se trata de serviço público. O povo é dono destes serviços, que são repassados para algumas famílias. A mídia eletrônica precisa ser democratizada. E isto significa dizer que deveria existir o “direito de antena”, ou seja, o direito de reclamar, de contra-atacar, de produzir programas a serem veiculados pelas redes. Aqui deveria estar presente o poder do Estado, para garantir espaço de transmissão e o acesso aos meios técnicos de produção.

A moeda mais forte deste milênio é a informação. Segue-se, então: quem a detém, é possuidor de poder. Por isso mesmo é preciso ampliar o universo de discussão, ainda mais que a maioria da população permanece sem o direito de se fazer ouvir. A constatação é de Ramonet (1998, p. 72):

Grupos mais poderosos que os Estados estão açambarcando o bem mais precioso das democracias: A informação. Será que vão impor sua lei no mundo inteiro ou, pelo contrário, abrir uma nova área de liberdade para os cidadãos?

No artigo 224 do Capítulo V da Constituição, que trata da Comunicação Social, está escrito: “Para os efeitos do disposto neste capítulo,

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o Congresso Nacional instituirá como seu órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Social, na forma da lei”. Passaram-se anos da aprovação da chamada Constituição Cidadã para que acontecesse a regulamentação deste Conselho. Em dezembro de 1991 foi aprovada a lei Nº 8.398 que constituiu o Conselho de Comunicação Social, com 13 integrantes: quatro representantes dos empresários, quatro dos trabalhadores e cinco da sociedade civil. Passaram-se mais alguns anos até que os membros do Conselho fossem empossados. As restrições partiam do próprio governo, dos políticos e dos proprietários das redes de rádio e televisão. Sem uma mídia democrática, como podemos falar em soberania popular?

Para o jornalista Daniel Herz (1994, p. 9)4:

O Conselho surge como primeiro espaço institucional para o debate da comunicação no Brasil, superando a relação direta e exclusiva entre o Executivo e o empresariado e criando uma instituição que pode se voltar para o equacionamento dos conflitos, busca do consenso e superação do atraso da sociedade civil sobre as questões da comunicação.

Nos últimos dois anos (2008 e 2009), não aconteceu nenhuma reunião desta Comissão. Por que esta focalização nas mídias? Pergunta Gonnet (2004, p. 51):

Porque elas não refletem a realidade. Elas a codificam. As mensagens midiáticas não são neutras. Além de informar sobre o mundo, as mídias apresentam maneiras de percebê-lo e de o compreender. Este papel das mídias nos força a

4 Jornal Mundo Jovem, Porto Alegre, ab. 1994, p. 9.

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revisar a opinião corrente segundo a qual a única função das mídias é informar ou divertir.

Novas tecnologias e a Comunicação

A Internet comercial completa 15 anos no Brasil com um grande desafio pela frente. Segundo o Massachusetts Institute of Technology (MIT) “em 2015 haverá 1 trilhão de aparelhos conectados o tempo todo.” São fatos marcantes: 1969, nasce a Arpanet, embrião da Internet. Em 1991, o cientista Tim Berners-Lee cria a World Wide Web (WWW) sistema de documentos interligados pela Internet que são acessados por meio de navegadores. No ano de 1995, temos o início da Internet comercial no Brasil. Já em 2010, a Internet entra na fase das redes sociais, com ferramentas como Twitter, Facebook, Orkut, blogs, ganhando notoriedade. É a chamada internet social, de comunidades5. Temos, então, uma nova realidade em termos de comunicação.

De acordo com Volton6, as técnicas aproximam os homens e a sociedade, tornando mais visível as diferenças culturais, sociais e religiosas e, aumentam as dificuldades de inter-compreensão. Afirma: “As máquinas podem ser on line, os indivíduos e as sociedades não o serão jamais. Estreitam-se as distâncias geográficas e crescem as distâncias culturais”.

De um lado, as informações estão em toda a parte, de outro, constata-se que falta muito para acontecer uma intercompreensão. A existência de milhões de aparelhos de comunicação significa mais comunicação? Fica sempre a mesma pergunta: O que é comunicação? Qual a visão de sociedade daqueles que possuem os veículos de comunicação? É preciso, na visão de

5 MONTE, Fabiana. Internet faz 15 anos e enfrenta novos desafios. Jornal Brasil Econômico, 25 maio 2010.

6 Revista Famecos, p. 7-18, dez. 2002. [EXCERTOS]

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Volton7, “[...] utilizar o espírito crítico no dia-a-dia em relação aos ideais de comunicação e a realidade das indústrias de comunicação. Não vivemos com a internet na era das solidões interativas?”.

A comunicação é só técnica? Volton (2003, p. 31) observa que:

[...] qualquer reflexão torna-se suspeita, toda crítica descabida. Nesse contexto desprovido de debate e de controvérsia, a menor manifestação de ceticismo é identificada com o medo de mudanças e de progresso. Isso explica a defasagem considerável que se estabeleceu há meio século entre a extraordinária rapidez das mudanças relativas à comunicação e o inexpressivo número de reflexões e análises, outras que não apologias.

Vive-se uma era de graus de persuasão e manipulação, alguns mais visíveis, outros mascarados. De acordo com Roiz (1992, p. 6) “[...] é possível afirmar que o elemento persuasivo está colado ao discurso como a pele ao corpo. É muito difícil rastrearmos as organizações discursivas que escapem à persuasão”. De fato, as campanhas de persuasão são mais aceitas entre indivíduos que já comungam com as ideias apresentadas ou que estão predispostos para os temas apresentados.

Na manipulação, alerta Berrio (1983, p. 78)

[...] que existe a vontade expressa de mover-se no terreno da ambiguidade ou da mentira porque se perseguem determinados objetivos, eticamente condenáveis, aos que se subordinam e também, naturalmente, o auditório, o qual se converte em objeto em lugar de sujeito.

7 Ibidem

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Muitas das crianças são submetidas ao mundo adulto, metralhadas por questões que não fazem parte do universo infantil. De acordo com a psicóloga Rosely Sayão8

[...] crianças não são pequenos adultos. Várias consequências de tantos estímulos levam a perda precoce da infância: depressão, medo da violência e consequente dificuldade para conseguir autonomia compatível com a idade, dificuldade de aprender, acúmulo de informações que não se transformam em conhecimento, e, claro, a erotização precoce que provoca super excitação à abeira do incontrolável.

A Internet é uma resposta às novas formas de acumulação de capital. É uma evolução em vista das necessidades econômicas do sistema capitalista. Mas o que a maioria da população sem dinheiro, sem cultura, sem propriedade vai fazer com a Internet? Estamos, de novo, frente à economia política com características burguesas, ou seja, a uma nova exclusão, agora, digital. Para Schwarts (2000, p. 2)

[...] o maior risco, com a disseminação de redes de informação e comunicação, é o de se observar apenas a reprodução dos padrões de embotamento político e de passividade intelectual que predominaram na era do rádio e da televisão. A exclusão digital não é de ficar sem computador ou telefone celular. É continuarmos incapazes de pensar, de criar e de organizar novas formas, mais justas e dinâmicas de produção e distribuição de riqueza simbólica e material.

Conclusão

8 Folha de S.Paulo, São Paulo, 31 mar. 2005. Folha Equilíbrio, p. 21.

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Frente à mídia, podemos ter uma postura de ingenuidade, de supervalorização, encarando-a como simples entretenimento e ocupação na ociosidade. No entanto, a posição mais inteligente e, na verdade, um imperativo, é desenvolver um senso crítico, conscientes de que a mídia e a Internet servem como matérias de discussão, uma vez que elas refletem o poder dominante, a realidade social, econômica e política do país e, por isso mesmo, é preciso modificar o modo como as encaramos. Ainda mais que no caso da televisão, ela representa para uma imensa maioria da população a única fonte de informação.

B - EdUCAção

o Papel do Professor

Ao longo da história da educação, assim como também nas revoluções industriais (FRANCHI, 1995), mudou a função do professor. Na história clássica e medieval, a classe dominante estudava nas escolas paroquiais e monacais. Os pobres se educavam trabalhando. O professor era o produtor de conhecimentos, e como tal falava a seus discípulos.

Quando surgem as Universidades, o professor torna-se mediador entre os produtores de conhecimento, locados nas Universidades, e a grande massa de aprendizes. Conteúdos e instrumentos são selecionados pelas Universidades e repassados. Só que esses ensinamentos não podem ser absorvidos cegamente.

Hoje, em vista das velozes mudanças no campo do saber, o professor deve buscar incessantemente a atualização, o aprender a aprender. O que hoje é a última palavra das pesquisas pode estar superado logo mais adiante.

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No que diz respeito à Educação, entendida como um processo permanente, ela não pode parar no ensino, ou seja, na pura instrução. Nesta função, os meios de comunicação estão muitos anos luz à nossa frente. A informação está disponível em toda a parte.

A aprendizagem, sintetizada em receber a informação e memorizá-la, também nada representa em termos de mudança. Infelizmente, em muitos lugares é a escola que temos. Trata-se de um processo alienante. A contribuição mais importante que podemos oferecer aos nossos alunos é ensinar a pensar.

Um processo educativo envolve a produção do conhecimento, que não é uma necessidade só dos cursos de pós-graduação. É um meio essencial, para avançar, intervir, e melhor agir. De acordo com Barthes (1996, p. 47), “[...] há uma idade em que se ensina o que se sabe; mas vem em seguida outra, em que se ensina o que não se sabe: isso se chama pesquisa”.

Em contraposição a uma educação alienante, devemos trabalhar pela libertação (PADIM et al., 1987), que deve ser criadora, antecipando o novo tipo de sociedade que queremos, aprofundando a consciência da dignidade do ser humano, aberta ao diálogo, e respeitando as peculiaridades locais e nacionais. Diz Guareschi et al. (2000, p. 79):

[...] nossa concepção de ser humano é que ele é uma pessoa = relação, isto é, ele não é nem um indivíduo, alguém que é um e não tem nada a ver com os outros, como o compreende a filosofia liberal; nem é uma peça de uma máquina, alguém que não passa de um número, de uma parte de um todo, onde o que realmente ‘vale’ é o todo, a instituição, a organização do Estado, o partido. O ser humano, como o compreendemos, é o resultado dos milhões de relações que o vão construindo, e através das quais ele vai continuamente se transformando.

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O conteúdo deve ser considerado um meio e não um fim. Professor e aluno devem se exercitar em descobrir o que está oculto nos livros, jornais, revistas, ou seja, as marcas, as pegadas, os traços deixados, e ler também as entrelinhas, o texto pelo contexto. Os alunos precisam saber como aquilo que estudam tem a ver com o que vivem. Brand (2001, p. 5)9 afirma que

[...] a escola precisa organizar-se em torno de poucos, mas significativos eixos temáticos, em torno dos quais giram as atenções na busca de conteúdos necessários. Eixos que não podem estar alheios num projeto político pedagógico da escola hoje: o cotidiano, educação para uma cidadania efetiva, a construção de uma prática dialógica e a afirmação incondicional da dignidade humana. [...] A escola necessária é a escola da e para a vida.

A questão está em priorizar a educação em vez da instrução, a vida em relação ao mercado, embora, muitas vezes, pais e alunos pressionem pelo mercado, mais do que pela vida. É importante a educação para conseguir emprego hoje; questiona-se se é condição suficiente. No dizer de Demo (1997, p. 90),

[...] o problema está em encontrar um termo médio entre a expectativa de mercado, inevitável para as pessoas ganharem a vida, e a competência humana, que deve poder se opor ao mercado, privilegiando o objetivo e a ética da cidadania sobre a produtividade econômica.

9 BRAND, Táurio. Boletim da Associação Católica. Rio Grande do Sul: AECRS, 2001.

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A escola deve fugir daquela qualidade apregoada pelo neoliberalismo que visa à preparação da mão-de-obra para o mercado e a proclamação de sua excelência, visando sempre à satisfação do cliente.

o Pedagógico e o Político

A competência de um professor na sala de aula não se mede somente pelo domínio que tem sobre sua matéria. Há o lado da formação política, do seu engajamento e de seus alunos na luta pela superação das injustiças, que são intrínsecas ao capitalismo.

Trata-se, então, de tornar o pedagógico mais político, sem medo do outro discurso que defende a neutralidade da escola, para que tudo permaneça como está. Ao problematizar o conhecimento, o professor torna-se junto com seus alunos mais crítico, tornando o político mais pedagógico.

Paulo Freire insistia que o primeiro livro a ser lido é o da realidade. Para este educador, “ler mundo” e “ler palavra”, implicava em “reescrever o mundo”. Em outras palavras transformá-lo. No plano social, Gadotti (1991, p. 70) afirma que:

[...] é ato pedagógico desvelar as contradições existentes, evidenciá-las com vistas à sua superação. O educador, nesse sentido, não é o que cria as contradições e os conflitos. Ele apenas os revela, isto é, tira os homens da inconsciência. Educar passa a ser essencialmente conscientizar. Conscientizar sobre o nada? Não. Sobre a realidade social e individual do educando. Formar a consciência crítica de si mesmo e da sociedade.

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A educação deve girar ao redor de alguns eixos. Um deles, de acordo com Candau et al. (1995), é o cotidiano, significando o desenvolvimento da pedagogia do espanto e da indignação e não da resignação.

O sociólogo português, Boaventura de Souza Santos reforça este aspecto, ao afirmar em palestra, promovida pela Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre: “Assistimos ao sofrimento humano e sequer perdemos o sono. É necessário recuperar a capacidade de espanto e indignação dos indivíduos, levando para as salas de aula imagens que despertem paixão e emoção”10.

O professor e geógrafo Milton Santos, de renome internacional, em conferência na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), segue na mesma linha ao insistir que não é a inteligência que empurra os homens, mas a emoção.

É obrigação de o professor possibilitar ao menos uma reflexão sobre o que está acontecendo no processo social global. Ainda no cotidiano poderia ser incluída a pedagogia da admiração e da mística pela vida, justiça e liberdade. De acordo com Assmann (1998, p. 23), “[...] somente educadores entusiasmados com seu papel na sociedade conseguem uma opinião pública favorável aos seus reclamos”.

Vamos restaurar, então, a nossa autoestima. Enquanto nos considerarmos heróis ou sacerdotes, a sociedade nunca se interessará por nós. Somos profissionais. Cobramos reconhecimento, respeito e salário.

Um segundo eixo diz respeito a promover a educação para a cidadania, voltada para organização e radicalização dos movimentos populares contra qualquer tipo de subordinação e exploração. A maior parte do nosso povo vive nas trevas, não conhece seus direitos e nem sabe

10 Jornal Zero Hora, Porto Alegre, 2 jul. 1996. p. 51.

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onde buscá-los. A população não sabe o que está acontecendo e nem ao menos sabe que não sabe, de acordo com o linguista norte-americano Noam Chomsky.

Ao proferir sua aula inaugural da cadeira de Semiologia Literária, no Colégio de França, a 7 de janeiro de 1977, Barthes (1996, p. 46) afirmou, entre outras tantas pérolas: “[...] se quero viver, devo esquecer que meu corpo é histórico, devo lançar-me na ilusão de que sou contemporâneo dos jovens corpos presentes e não de meu próprio corpo passado. Em síntese: periodicamente devo renascer, fazer-me mais jovem do que sou”.

A questão não é tanto saber o que estamos fazendo. A pergunta mais importante diz respeito àquilo que não fizemos. Deste modo, construiremos uma proposta, sem a qual não existe um processo educativo.

Segundo Gonnet (2004, p. 41), “[...] desde o dia em que os professores, jornalistas e pais se perguntaram por que não se utiliza o noticiário e suas imagens para interessar às crianças, a problemática das mídias na educação estava colocada. Ora, esta questão é tão velha quanto às próprias mídias”.

Althusser (1985, p. 80) elogia os professores, “que, em condições assustadoras de trabalho, se voltam contra a ideologia, contra o sistema, com as poucas armas que podem encontrar na história e no saber que ‘ensinam’. São uma espécie de heróis”. É que estes heróis não separam educação da sociedade, da economia, das mudanças tecnológicas, no interior das quais ela se desenvolve.

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C - A CoNSTrUção dA CIdAdANIA

No Novo Dicionário do Aurélio: CIDADÃO é entendido como o “indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado ou no seu desempenho para com este”. CIDADANIA: qualidade ou estado de cidadão.

A construção da cidadania passa pela discussão do papel exercido pelos Meios de Comunicação Social. Daí sua importância em conhecê-los e discuti-los.

Quem pode tirar o Brasil das dificuldades de todo gênero em que se encontra não é o governo, é a cidadania. E cidadania é, antes de tudo, o exercício de crítica permanente, de exigência crescente. Só esse cerco é que submete os governos às aspirações de um país11.

A cidadania é um processo de luta e conquista. Precisamos então aprender a falar, a reclamar, exigir nossos direitos. Duas palavras do historiador Capistrano de Abreu resumem bem nossa postura de brasileiro: “Povo Capado, Sangrado”, e Ribeiro (1994) no seu livro ‘A Identidade do Brasileiro’ acrescenta: e “Festeiro”. Ainda vivenciamos a cultura do silêncio.

A construção da cidadania passa pela discussão do papel exercido pelos meios de comunicação social. Agora, se o professor nem cidadão é (também em vista dos salários) como fica a construção da cidadania?

O exercício da cidadania depende da informação, por isso, ela precisa ser correta, honesta; momento importante para que a mídia, em vez de “vender” um candidato, trabalhe em favor da cidadania, auxiliando na educação política da sociedade.

A participação política decorre fundamentalmente de três elementos (BIZ; PEDROSO, 1978, p. 13): 1) Primeiro a percepção da importância dos

11 Folha de S.Paulo, 31 dez. 1998. Caderno 1, p. 8.

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fenômenos políticos pelos cidadãos; 2) O interesse em conhecê-los e discuti-los, e 3) A vontade de interferir na sociedade, isto é, para que as decisões políticas reflitam os interesses da maioria da população. Esta participação pode ser de intensidade, frequência e abrangências variáveis. Qualquer que seja sua natureza ou forma contribui para a democracia.

Formas de Participação Política: Associação de Moradores, Escola (alunos, pais, professores, funcionários), Sindicatos, Partidos Políticos, Defesa dos Direitos Humanos, Defesa do Consumidor, Defesa do Meio Ambiente, Defesa de Minorias Étnicas e Religiosas.

Afora estas formas de participação, a Constituição12 atual fornece aos cidadãos e às entidades da sociedade civil um conjunto de instrumentos jurídicos para que eles possam, diretamente, fazer cumprir os preceitos constitucionais: Mandado de Segurança Coletivo; Mandado de Injunção, “Habeas Data”, Ação Popular, Iniciativa Popular.

Independentemente do nível de participação de cada indivíduo, o fato de estar engajado numa agremiação, lutando por uma causa que ultrapasse o seu interesse individual (embora o inclua), reduz a passividade, elimina a apatia geral da sociedade.

Indivíduos lutando por seus direitos são indivíduos que os conhecem seus direitos e também seus deveres. Portanto, não são passíveis de manipulação, ou dominação. Indivíduos conscientes e participantes sentem-se como parte da sociedade – verdadeiros cidadãos que ajudam a definir as regras da sociedade e lutam para que elas sejam cumpridas e aperfeiçoadas.

Enfim, tornam-se capazes de controlar os governantes e não serem controlados pelos mesmos. Alertamos, entretanto, que a construção de uma

12 Constituição de 1988, Título II, Capítulo I, Item LXX ao LXXIII e Artigo 61, § 2.

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sociedade verdadeiramente democrática inclui dupla dimensão: a política – que diz respeito à participação nas decisões – e as socioeconômicas – que dizem respeito à participação na riqueza gerada pelo trabalho de todos. Se a síntese entre estas duas dimensões não se completar, usufruir do processo democrático será apenas privilégio de poucos.

Para Pedro Demo (1992, p. 17), “[...] cidadania é um processo histórico de conquista popular, através do qual a sociedade adquire progressivamente condições de tornar-se sujeito histórico, consciente e organizado, com capacidade de conceber e efetivar projeto próprio”.

A construção da cidadania propiciará a todos a descoberta da importância de se tornar sujeito da história e não objeto de manipulação. Isso significa dizer que o conceito de cidadania extrapola, e muito, aquela ideia de votar no dia das eleições, pagar os impostos devidos. Essa visão é de uma pobreza extrema.

Ao longo da história, a população conseguiu uma série de direitos: eles resultaram das lutas de séculos, de muitas pessoas que nos antecederam. Não dependeram de concessões por parte do Estado.

1689 - Carta dos Direitos, promulgada pelo Parlamento Inglês. Direito à vida. liberdade, propriedade e justiça.

1776 - Independência dos Estados Unidos da América. Acrescenta à Carta Inglesa, o direito à felicidade.

1789 - Revolução Francesa. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Resistência à opressão, liberdade de imprensa, liberdade religiosa.

1948 - O.N.U. Declaração Universal dos Direitos do Homem. Direito à vida, liberdade (pensamento, opinião, expressão, reunião, associação, participação política), à segurança, ao trabalho, repouso, lazer.

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1976 - Declaração Universal dos Povos (Argel). Direito de:

• governar independentemente,

• ser respeitado em sua identidade nacional e cultural,

• participar do progresso científico e tecnológico,

• não imposição de uma cultura estrangeira.

Para Silverstone (2003, p. 58),

A cidadania no século XXI requer um grau de conhecimento que até agora poucos de nós têm. Requer do indivíduo que saiba ler os produtos da mídia e que seja capaz de questionar suas estratégias. Isso envolveria capacidades que vão além do que foi considerado alfabetização em massa na época da mídia impressa.

Para ser cidadão não basta ter certidão de nascimento, pagar impostos, obedecer leis, votar. Faz parte da cidadania exigir direitos e assumir deveres. Descobrir a relevância da cidadania, não aguardando a concessão de políticos e governantes.

Trata-se de uma exigência crescente. Deste modo não há mais espaço para salvadores da pátria, ou seja, a crença de que a libertação depende somente dos detentores do poder.

Ser cidadão significa preparar-se para revelar as contradições existentes na sociedade; acostumar-se ao exercício da crítica permanente. Ser cidadão é ter a história em suas mãos.

Comunicação, Educação, Cidadania não são realidades excludentes para aqueles que, em especial, se dedicam ao magistério. Elas devem ser

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cotidianamente construídas, uma vez que são dinâmicas e necessitam de contínuos aperfeiçoamentos. Faz parte dessa construção o permanente questionamento, de forma a atingir milhões de brasileiros que ainda vivem nas trevas em relação a essas três realidades.

Esse nosso Brasil, como o vemos hoje, em que poucos tomam parte da riqueza, foi feito por um grupo de homens. Não é, portanto, uma ordem que não pode ser mudada. Ao contrário, professores e alunos deverão investigar, indagar, procurar as causas dessas injustiças, que os impedem de serem cidadãos.

Nesse momento estarão, alunos e professores, desenvolvendo a consciência crítica que os levará a alterar o projeto que beneficia poucos brasileiros. Essa é a função primordial da educação. A missão primeira do professor não é tanto repassar informações. Outros meios podem fazer esta tarefa com mais desenvoltura e rapidez.

Sua missão como professor-educador é trabalhar no sentido de ajudar o alunado a compreender o mundo que nos rodeia; em suma: a desenvolver o espírito crítico. E, nessa missão, continuamos insubstituíveis. Esse é o nosso grande valor. E não há projeto, vindo de cima, que nos inibirá.

Conclusão

O exercício da cidadania é feito em conjunto com outras pessoas. Não adianta só denunciar, reclamar. O exercício da cidadania é amplo. É preciso associar-se aos grupos que lutam em defesa da conservação do Planeta para mudar os rumos de uma sociedade predadora, consumista. A cidadania Global ou Planetária está ligada à ecologia, à sobrevivência do nosso Planeta Terra e, por uma dedução muito simples, à continuação da existência de bilhões de seres humanos, da própria flora e fauna.

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Comunicação, Multimeios e Educação: programas educacionais em pauta

Adriana Rocha Bruno (UFJF)

Ana Maria Di Grado Hessel(PUC-SP)

Introdução

A ação docente do educador, em tempos de cibercultura e cultura das mídias, tem contribuído de forma singular para uma articulação entre as áreas do conhecimento. Nesse sentido, professores da área de educação são integrados a cursos diversos como corresponsáveis pelas discussões e ampliação dos campos de atuação para as profissões emergentes.

Neste cenário, o presente texto apresenta as experiências de duas educadoras e pesquisadoras da pedagogia que têm em seu percurso a atuação em áreas multidisciplinares, tais como a Educação online e, no caso específico, o curso de Comunicação e Multimeios da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Estas ações materializam a integração de áreas do conhecimento para a formação do homem contemporâneo. Para além da integração de mídias,

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tão presente no contexto social atual, há se que articular ações de docência e pesquisa que oxigenem e de fato promovam o imbricamento de profissionais e de campos de conhecimento, respeitando suas especificidades.

Para Marques de Melo (2003) o campo da comunicação compreende cinco áreas: Artes, Humanidades (incluindo a interface com a Pedagogia), Tecnologias, Ciências Sociais e Conhecimento Midialógico. A associação de áreas e o hibridismo marcante do século XXI exigem a dinamicidade que as mídias possibilitam. Coexistem a cultura de massa e a cultura de mídias e, neste cenário, há que se formarem profissionais plurais. Singulares em espaços de multiplicidades, no sentido deleuziano (BRUNO, 2010).

No primeiro semestre de 2005, iniciamos um trabalho como docentes junto aos alunos do curso de Comunicação e Multimeios da PUCSP, na disciplina Novas Tecnologias e Educação (NTE). Desenvolvida em quatro semestres, buscava estudar o contexto imbricado das áreas da comunicação e educação e todos os seus desdobramentos, tais como as abordagens cognitivas, os processos de conhecimento que justificam o uso de tecnologias, a análise das mídias na ação de difusora do conhecimento, o debate sobre os limites e possibilidades para a atuação do profissional nas áreas de comunicação social e da educação etc. Em síntese, a disciplina oferecia elementos para a compreensão das múltiplas possibilidades da transmissão do saber e da cultura que são veiculadas através de instâncias de comunicação e não se reduzem às instituições educacionais.

A partir de 2006, o curso passou por uma significativa reforma curricular. A consolidação da identidade do profissional da área de comunicação e multimeios foi amplamente debatida por todo corpo docente e discente do curso, culminando com uma proposta de reorientação curricular. Essa reformulação resultou na proposição de duas disciplinas assumidas pelos departamentos da Faculdade de Educação da

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PUCSP, ofertadas em dois semestres da nova matriz curricular, a qual foi introduzida em 2009: Metodologia de pesquisa para TCC e Tecnologias para a Aprendizagem.

A proposta do curso voltou-se para a formação de um profissional cujo diferencial está na competência de integração de mídias. Não há intenção de formar o especialista, mas o profissional que possua visão sistêmica e integrada de áreas e que desenvolva olhar crítico e criativos para a sociedade contemporânea. Não se trata de incorporar uma disciplina a um público específico, tendo em vista a ampla área de atuação que esses temas envolvem, mas promover aos futuros profissionais de Comunicação e Multimeios as possibilidades para uma formação contextualizada e coerente com os avanços tecnológicos, com a formação humanística e com os campos emergentes no mercado.

Tem-se em vista a formação de um profissional pronto para atuar (criar, produzir, dirigir) em novos meios comunicacionais e culturais e, por conseguinte, vinculado à expansão da tecnologia e dos meios de comunicação. (LEOTTE et al., 2006, p. 33).

Este texto tem por objetivo relatar e discutir as experiências docentes e discentes por ocasião do desenvolvimento dos programas das disciplinas “Novas Tecnologias e Educação” (NTE) e “Tecnologias para a aprendizagem”, no curso de Comunicação e Multimeios da PUCSP.

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Flexibilização Curricular

O mote que reza que “é preciso articular teoria e prática” se apresenta cotidianamente nos discursos, textos e documentos educacionais. Mas o que vem a ser isso?

De origem grega, a palavra teoria (theórein) significa observar, assistir ou especular. É compreendida também como um olhar privilegiado próximo a Deus, ou seja, um olhar superior.

A palavra prática (praktiké), também origina-se do grego práxis e significa agir, negociar, fazer algo em favor de si mesmo. Designa, desde Platão, além da  ação imanente pela qual o sujeito o indivíduo vivencia o padrão rotineiro do ethos, também a possibilidade de  transformá-lo, em virtude da finalidade de um bem-agir ou um bem-fazer (SODRÉ, 2000).

Integrar estes dois aspectos no ethos educativo tem sido o grande desafio de todos os educadores e projetos pedagógicos.

Na realidade, associamos a teoria com o saber (conhecer) e a prática com o fazer. Valorizamos em demasia o conhecimento, em forma de conteúdo e de informações e intencionamos que ele se evidencie na prática do aluno. Percebemos a prática como uma demonstração de que o aluno sabe o conteúdo, pois conseguiu colocá-lo em ação. Neste sentido, grande parte das aulas oferecidas nos cursos de graduação ainda está baseada em dois dos quatro pilares propostos por Delors (1999): aprender a conhecer (com ênfase no saber) e aprender a fazer. Os demais pilares (aprender a viver junto e aprender a ser) são colocados em segundo plano, como algo menor, sem importância.

Revela-se, assim, um modelo curricular engessado e pautado na rigidez do conteudismo e da racionalidade técnico-científica instrumental.

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Este modelo estimula o acúmulo de informações, a fragmentação dos conhecimentos e das práticas educativas e a cisão do espaço e tempo pedagógicos e do próprio indivíduo, criando o império do individualismo e da centralização do saber no professor.

O modelo curricular educacional subjacente às práticas docentes dessa natureza torna-se inconsistente, visto que as práticas educacionais e a articulação teórico-prática, tão desejada por todos, prescindem da integração desses quatro pilares.

Historicamente o currículo não tem sido concebido em sua dimensão complexa. Em verdade, o currículo não é neutro e possui papel social: 1) na produção de sujeitos dotados de classe, raça e gênero; 2) na expressão, representação ou reflexo de interesses sociais determinados, e 3) na produção de identidades e subjetividades sociais (GOODSON, 1995).

A construção de um currículo voltado para uma classificação social discriminatória pode incorrer no erro de favorecer uma classe em detrimento da outra e, ainda criar a ilusão de solucionar problemas, ser democrático etc. Portanto, a concepção de currículo adotada no universo educacional vai promover a inclusão ou a exclusão social, perpetuando, neste segundo caso, o ‘guarda-chuva hegemônico’ (APPLE, 2000) que finge nos abrigar, mas nos sufoca, legitimando a política das desigualdades.

Um dos modelos mais usuais adotados pelas instituições educacionais ainda tem suas bases no que Goodson (1995) definiu como ‘pré-ativo’. Tal modelo compreende o conhecimento como algo externo ao indivíduo, dado pela sociedade, e que deve ser por todos incorporado.

Hoje, sabemos que o currículo deve ser concebido numa linha emancipatória, a qual significa participação, autonomia, responsabilidade coletiva, criatividade, organização, planejamento e dialogicidade.

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O conhecimento emancipatório é, portanto, aquele capaz de reconhecer a igualdade na diferença do outro, integrando, desse modo, os pilares ‘aprender a viver junto e aprender a ser’ aos outros dois, ‘aprender a conhecer e aprender a fazer’, privilegiados pelos sistemas educacionais.

Diante deste cenário impõe-se a necessidade prática de um currículo flexível, que evidencie as transformações pelas quais todos estão vivendo.

Compreendendo a importância da articulação e da integração destes conhecimentos para a qualidade do Curso de Comunicação de Multimeios, a disciplina NTE assumiu o compromisso de integrar os pressupostos da emancipação, com o propósito de colaborar para a construção de um currículo flexível.

Por sua proposta flexível, é uma disciplina em constante construção. Sabemos que é pelo processo recursivo de construção-desconstrução-reconstrução, no sentido espiralado, que o currículo flexível e emancipatório se mantém sólido em seus propósitos de coerência, não-engessamento e interdisciplinaridade.

Neste contexto, cabe-nos a clareza do significado da palavra interdisciplinar e o que este conceito envolve.

Interdisciplinaridade vem de Inter (entre) e disciplinas (regras), ou seja, o que está entre as regras. Devemos compreender que a “Inter” contém a disciplina e, portanto, tem origem na disciplinaridade, uma vez que propõe outra forma de trabalhar com as disciplinas, respeitando as especificidades de cada área do conhecimento, integrando-as, desfragmentando-as e buscando uma dimensão complementar a isto, no sentido de descobrir elementos que estejam além destas regras.

A concepção de interdisciplinaridade remete-nos ao fio tênue que permeia o nosso conhecimento e consequentemente o nosso ser. Por isso,

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ser interdisciplinar é diferente de estar ou fazer um trabalho e nomeá-lo de interdisciplinar. Tornar-se interdisciplinar é mudar posturas, quebrar paradigmas, é permitir-se e perceber-se complexo, “inacabado” como diria Paulo Freire, em construção contínua, pela articulação entre o tempo cronológico (Chrónos) e o tempo cairológico (Kairós – tempo vivido).

Tecnologias para a aprendizagem: construção de uma área de estudo e pesquisa

As disciplinas organizam os saberes no campo do conhecimento humano e viabilizam o funcionamento estrutural de um curso de forma vertical e horizontal. Entretanto compreendemos que esse conhecimento não é fragmentado nem estático.

O currículo pode ser organizado não só em torno de disciplinas, como costuma ser feito, mas de núcleos que ultrapassam os limites das disciplinas, centrados em temas, problemas, tópicos, instituições, períodos históricos, espaços geográficos, grupos humanos, idéias etc. (SANTOMÉ, 1998, p. 25).

O excerto de Santomé (1998) explicita claramente o que queremos dizer, elencando as possibilidades de um projeto curricular flexível, numa abordagem interdisciplinar. Acrescentaríamos aos itens destacados o trabalho por projeto, foco central da nossa proposta de disciplina.

Embora o conhecimento tenha como característica a hipertextualidade, as disciplinas são tratadas de forma linear em grande parte dos cursos de graduação. O Curso de Comunicação e Multimeios se propõe a transcender essa estrutura e romper com a concepção funcionalista, por

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meio de um currículo interdisciplinar, pautado não apenas no diálogo entre as disciplinas, mas na possibilidade do avanço de nossas práticas no sentido de uma transversalidade, interpenetração e transformação dos saberes.

A dimensão sistêmica é garantida pela dinâmica não-linear oferecida no curso, que concebe dois eixos integrados e complementares (vertical e horizontalmente), que viabilizam o imbricamento das demais dimensões previstas no curso e também nas disciplinas da área de educação.

Tal estrutura tem em vista uma educação de qualidade, que apresente uma aproximação da realidade socioeducacional da comunidade e ofereça, ao futuro profissional, as oportunidades de vivenciar situações motivadoras através de projetos interdisciplinares. O uso de cases ou de cenários que reproduzam e viabilizem experiências teórico-práticas, na resolução coletiva de problemas, são estratégias utilizadas para desenvolver o pensamento crítico e potencializar o interesse pela pesquisa, para despertar um novo olhar sobre a avaliação do processo ensino-aprendizagem, bem como para orientar a escolha e a uso de diferentes mídias.

Uma estrutura curricular espiralada compreende a tessitura entre a teoria e a prática, o contexto, a diversidade e a plasticidade. Estamos numa área em constante mutação, uma vez que emergem com muita rapidez novas mídias. O novo que se apresenta deve ser incorporado ao curso, de modo a garantir fluidez e atualização constantes na formação do profissional da Comunicação.

As transformações decorrentes desse processo de reestruturação do curso e das áreas que o compõem caracterizam a identidade do curso e o sentido educacional dos saberes do profissional que se deseja formar:

• abertura ao novo;

• produção de conhecimento e de serviços;

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• captação, criação e inovação de produtos;

• visão e práticas interdisciplinares;

• gestão de projetos e processos;

• desenvolvimento de pesquisa;

• formação de profissionais multidisciplinares.

O nome da disciplina “Tecnologias para a aprendizagem” espelha tais mudanças, e os trabalhos agora se voltam para o uso e a produção de mídias destinadas a segmentos educativos, bem como estudos sobre os fundamentos epistemológicos e abordagens do processo educacional em ambientes de aprendizagem contemporâneos.

O profissional da área de Comunicação e Multimeios deve ter, como explicitado no Projeto Pedagógico para o Curso de Comunicação e Multimeios proposto pela reorganização curricular em 2006, uma formação sistêmica e baseada num contexto sócio-tecnológico em que as mudanças são rápidas e profundas.

A flexibilidade foi o diferencial proposto para o Curso, de modo a atender às demandas sociais emergentes. Desse modo, a disciplina da área educacional, Tecnologias para a aprendizagem, propõe-se a trabalhar temas que integrem a Educação e a Comunicação para uma sociedade multimidiática. Os temas desenvolvidos nessa disciplina apresentam-se como fundamentais para a formação do profissional da área de Comunicação e Multimeios, por promover a reflexão sobre áreas nobres de atuação para esses profissionais, como a Educação a Distância e o desenvolvimento de Programas Educacionais, áreas de estudo e pesquisa, bem como de atuação da educação.

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Composta por múltiplas áreas do conhecimento, a disciplina em questão desenvolve estudos teórico-práticos sobre design instrucional, objetos de aprendizagem, análise, desenvolvimento e produção de programas educacionais e de ambientes de aprendizagem online (Educação a Distância), cujo escopo de estudo e atuação são abarcados pelo campo da educação e podem ser trabalhados por profissionais dessa área.

Não se trata de incorporar uma disciplina a um público específico, tendo em vista a ampla área de atuação que esses temas envolvem, mas promover aos futuros profissionais de Comunicação e Multimeios possibilidades para uma formação contextualizada e coerente com os avanços tecnológicos, com a formação humanística e com os campos emergentes no mercado.

o projeto “programas educacionais”: docência e pesquisa como campos de estudo e produção

As mudanças socioeconômicas e culturais decorrentes do mundo atual, associadas à plasticidade social e à aprendizagem (BRUNO, 2010) na área de multimeios, suscita uma ampliação do universo cultural e profissional para todos os envolvidos neste processo.

Diante desse cenário, a disciplina Tecnologias para a aprendizagem tem realizado, desde o ano de 2005 (ainda NTE) propostas que articulam teoria e prática, como é o caso do “Projeto: Programas educacionais”, foco principal do presente texto.

A resistência dos alunos do curso em relação às disciplinas da área da Educação anunciavam que aquele ano de 2005 não seria fácil. A coordenação do curso já havia “preparado” a professora que acabara de

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assumir a disciplina de NTE sobre tal situação, na esperança de que algo pudesse ser feito de modo a atenuar os possíveis conflitos. De fato, estudos e abordagens educacionais pouco ou nada significavam para aqueles alunos que se viam imersos num cenário multimidiático, fértil em ações voltadas para o cinema, produção de vídeos, trabalho com web, arte e tecnologia, leituras e produções imagéticas, dentre outros atrativos que o curso apresentava.

Os primeiros contatos, entre a docente da área educacional e os alunos do curso, se pautaram na busca de uma nova identidade para a disciplina e identificação do contexto dos alunos, seus desejos, suas possibilidades e habilidades. Como inserir os estudos da área da educação neste cenário, de modo a envolver os alunos e ressignificar os conhecimentos das áreas envolvidas?

Deste estudo, surgiu o projeto de trabalharmos com o desenvolvimento de Programas educacionais, por meio das mídias disponíveis, com vistas ao processo de convergência. A convergência de mídias no contexto educacional e nos processos de formação deve ser compreendida como possibilidade de relação e de aprendizagem. Quando pensamos nas relações estabelecidas no âmbito educacional, devemos também refletir que são relações intersubjetivas, que imbricam pontos da interpessoalidade e da interprofissionalidade e isso significa que o investimento na formação de todos os envolvidos neste processo deve se dar de forma contínua, ao longo do processo.

A busca pela comunicação indica tentativas de construir comunidades, estabelecer relações, socializar informações e, nesse sentido, as tecnologias e as mídias contribuem para a criação de redes interdependentes (PALLOF; PRATT, 2002). Isto quer dizer que a necessidade de conexão com o outro motiva a criação de vínculos, de

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contato, e influencia no desenvolvimento de ações interativas que, por sua vez, alimentam a necessidade de comunicação. À luz destas premissas, o projeto de Programas educacionais foi colaborativamente se constituindo.

Alem disso, cabe elucidar que este projeto assumiu o desafio de desenvolver um olhar crítico sobre a produção de simulacros potencializados pelas mídias, como a TV e mais recentemente a Internet, tais como apontados por Chauí (2006).

Na prática, em sala de aula, os alunos se dividiram em grupos para o planejamento e desenvolvimento de um projeto piloto. O público alvo poderia contemplar qualquer faixa etária, qualquer mídia (web, vídeo, rádio, material impresso etc) e qualquer tema, desde que o foco, educativo ou educacional, fosse atendido. Os alunos acolheram prontamente a proposta e passamos a trabalhar, durante as aulas, conteúdos que subsidiassem o desenvolvimento do projeto. Mais do que uma atividade para uma disciplina, os alunos compreenderam que estavam construindo portfólios para sua vida profissional e, quanto mais se dedicassem, melhores seriam os resultados e a veiculação deste trabalho para o seu futuro. Estudos sobre a aprendizagem de crianças, jovens e adultos foram trabalhados com o objetivo de colher minimamente elementos que ajudassem na proposta de atividades, linguagens e as mídias, estudo de cores, interesse, brincadeiras, abordagem temática etc. Os estudos de Belloni (2001), Chauí (2006), Demo (2001), Napolitano (2003), Pfromm Netto (1999), dentre outros, fomentaram estas discussões. Também foram realizadas análises de alguns programas educacionais realizados para TV, vídeos educacionais, games, jogos etc.

Após este período de estudos, cada grupo foi orientado a apresentar um Projeto escrito sobre o Programa a ser desenvolvido. A elaboração do projeto foi realizada no decorrer de duas aulas, nas quais cada grupo

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discutia as ideias com os membros e com a professora. A palavra de ordem foi “transgredir”. Isso porque as análises de programas educativos evidenciaram a carência existente em grande parte destes, especialmente no que diz respeito à utilização de abordagens e linguagens mais dinâmicas, hipertextuais e interativas.

Questões emergiram neste processo coletivo de estudo e produção, tais como: Será que criança gosta de ouvir rádio? Por que não temos programas de rádio infantil? Hoje em dia, crianças e jovens escutam histórias sem que a imagem esteja associada? Como pensar num programa de rádio, interativo para crianças? Como desenvolver esquetes educativos sem “dar lição de moral”? Programa de culinária é educativo? Como dar feedbacks em jogos educativos na web? Podemos fazer um vídeo sobre como fazer vídeo? Jogo de tabuleiro educativo só pode ter “matéria” de escola?

Estas perguntas ilustram parte do processo de construção do projeto e resultaram em discussões que foram essenciais para o desenvolvimento dos protótipos dos Programas Educativos.

Os projetos escritos foram apreciados pelos colegas e pela professora com o objetivo de contribuir para a melhoria de cada proposta. Os alunos, mais experientes em relação na área da comunicação e das mídias trabalhadas na disciplina, teciam considerações e apresentavam sugestões do ponto de vista da comunicação, e a professora fazia a análise do ponto de vista educacional.

Por fim, cada grupo se organizou para o desenvolvimento do produto, ou seja, um projeto piloto. Foi agendada uma data para apresentação dos protótipos e o resultado foi muito satisfatório.

Durante os três primeiros anos foram realizados programas nas seguintes mídias: 13 em vídeos/DVD; 12 via rádio/podcast; oito para web;

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três como material impresso e seis tipos jogos de tabuleiro. Para efeito de ilustração, elencamos alguns destes projetos:

a. Videos-documentários, como por exemplo, reciclagem de lixo urbano – documentado em 8 min e 34’, a partir de visitas a aterros sanitários; entrevistas com catadores de lixo recicláveis que encontram nesta atividade o sustento de suas famílias; visitas a espaços como a Oficina Escola Cooparte (São Paulo) que conta com vinte moradores de rua que desenvolvem obras de arte a partir de material reciclável; cooperativas em condomínios; além de dados sobre os processos de reciclagem no Brasil e na cidade de São Paulo e com proposições para a melhoria das condições de vida nas cidades com a reciclagem.

b. Esquetes de áudio como sobre Campanha de consciência ambiental, que trouxe quatro quadros, nonsense, com situações inusitadas que transgridem os formatos “tradicionais” de desenvolver campanhas publicitárias, com temas como chuva ácida.

c. Programa de rádio para o público infantil, como o “viajando na maionese”, que trazia em sua programação a ‘contação’ de histórias infantis com a participação (via e-mail ou telefone) dos ouvintes mirins para a sua finalização; além de brincadeiras, dicas, música e curiosidades.

d. Jogos na Web, como a viagem planetária de um extraterrestre que, perdido em nosso planeta precisa da ajuda das crianças para consertar sua nave construída com materiais recicláveis.

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Alguns dos protótipos foram concebidos por meio de links com os trabalhos de conclusão de curso dos alunos e, nestes casos, as aulas de NTE auxiliaram tanto no desenvolvimento dos produtos para tais trabalhos, quanto na análise destes.

Ao longo dos anos, os projetos foram incorporando melhorias estéticas e funcionais. Houve a demanda de grupos de alunos para o desenvolvimento de jogos de tabuleiro. A cada nova turma, eram apresentados os trabalhos desenvolvidos pelos colegas de turmas anteriores. O desejo de superação surgiu como fator decisivo para a criação de bons programas.

Em 2009, a disciplina NTE incorporou algumas inovações, com a introdução dos estudos das midias emergentes na web 2.0. O uso de materiais pedagógicos destinados a segmentos educativos, em especial aos ambientes virtuais de aprendizagem, surgiu como uma nova demanda de produção no mercado de design educacional. A dinâmica interativa das redes sociais na web 2.0, no tocante à distribuição, produção e consumo de conhecimento propicia a disseminação dos materiais hipermediáticos. Ao tratar sobre a cibercultura, Lévy (1999), anuncia uma mutação contemporânea da relação com o saber e ressalta que, devido à velocidade de aparição e de renovação dos saberes e do saber-fazer, trabalhar significa cada vez mais aprender, transmitir saberes e produzir conhecimento. A construção de novos modelos do espaço dos conhecimentos surge naturalmente na web 2,0. Ao invés de uma representação em escalas lineares e paralelas, em pirâmides estruturadas por níveis, organizadas pela noção de pré-requisitos e convergindo para saberes superiores, estamos privilegiando a imagem de espaços de conhecimento emergentes, abertos, contínuos, em fluxos não lineares, reorganizando-se em função dos objetivos ou dos contextos, nos quais cada indivíduo ocupa uma posição singular e evolutiva.

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Na implementação do novo currículo no curso de Comunicação e Multimeios, a disciplina denominada Tecnologias para a aprendizagem passou a focar a produção de vídeos educativos para a web, que pudessem ser divulgados no site distributivo de serviços Youtube1.

Habitar a “rede” (Web) nos faz retomar Lévy (1999). Se para este autor o ciberespaço é o “espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores” (Ibid., p. 92) e o virtual multiplica as oportunidades de atualização do real, os espaços de navegação na web se apresentam como possibilidades de caçada ou pilhagem. A primeira (caçada) nos coloca nos trilhos rápidos, rumo ao procurado. A segunda (pilhagem), assim como Alice (do país das maravilhas), nos indica que quando não sabemos qual rumo tomar, a procura (ou o caminho), a busca pode se apresentar por meio de descaminhos.

Em todos os casos, a navegação pode se dar por meios (mídias) diversas, como nos apresenta o autor, e que já são conhecidas por muitos de nós. As redes, neste ciberespaço e na cibercultura se enlaçam em configurações não mais lineares, mas plurais – todos/todos. É essa a dinâmica desejada para o desenvolvimento do Projeto e do curso.

Os objetivos do curso adequaram-se à reorientação curricular e passaram a destacar: a utilização e desenvolvimento das mídias como instrumentos de acesso, transformação e produção do conhecimento; o reconhecimento do potencial das mídias e dos materiais educativos no processo de aprendizagem; a análise e produção de materiais educativos fundamentados no conhecimento sobre educação e comunicação.

Uma dinâmica teórico/prática imprimiu uma tônica estratégica para a disciplina, desenvolvida por meio de estudos de referenciais teóricos e de atividades de criação dos vídeos educativos.

1 <www.youtube.com>.

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Os temas abordados em aula priorizaram o conhecimento sobre as modalidades de vídeo, diferenciando-se segundo os objetivos de uso. Os textos de Ferrés (1996), Moran (2002) e Hessel (2004), nos auxiliaram na definição e planejamento de alguns tipos de vídeo, os quais foram sintetizados nas seguintes categorias: Vídeo sensibilização - utilizado para introduzir ou finalizar um tema, para provocar a reflexão sobre uma questão etc, assumindo um motivador ou conclusivo; Vídeo simulação - empregado para auxiliar na compreensão de  temas densos ou abstratos, bem como para apresentar situações que não podem ser vivenciadas ou visualizadas; Vídeo documentário - apropriado para abordar um tema em detalhes, transmitir informações e fatos contextualizados, pois amplia a visão da realidade e permite a reflexão; Vídeo entrevista - adequado para apresentar pensamentos, trajetórias e trabalhos de pessoas, bem como para apresentar as diferentes posições sobre um assunto em evidência; Vídeo ilustração - empregado para exemplificar um fato, uma situação, um conceito, uma rotina, uma habilidade ou até mesmo uma sequência de procedimentos; Vídeo interativo - utilizado em circunstâncias nas quais o espectador pode opinar sobre a sequência do vídeo, pode participar na construção do enredo ao escolher um roteiro alternativo; Vídeo avaliação, também denominado de vídeo-espelho - apropriado para captar a ação de pessoas ou grupos de pessoas, a qual será analisada e avaliada pelos próprios figurantes.

A produção dos vídeos teve início com uma fase de planejamento. Os alunos se reuniram em grupos e definiram os temas. Um briefing2 foi desenvolvido para cada vídeo, o que permitiu aos alunos experimentarem

2 O briefing é um conjunto de informações, uma coleta de dados passadas em uma reunião para o desenvolvimento de um trabalho, documento, sendo muito utilizadas em Administração, Relações Públicas e na Publicidade. O briefing deve criar um roteiro de ação para criar a solução que o cliente procura, é como mapear o problema, e com estas pistas, ter idéias para criar soluções. (Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Briefing>. Acesso em: 8 maio 2010).

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a dinâmica do processo de especificação do produto e validação do mesmo, junto a um cliente fictício.

A primeira providência exigiu uma pesquisa cuidadosa, ou seja, um levantamento das informações relevantes, tais como a escolha do conteúdo, as demandas de aprendizagem, a profundidade do tema, a abordagem, a linguagem. O público alvo foi considerado no tocante à faixa etária, à escolaridade, ao interesse cultural e à procedência cultural. Esses elementos foram considerados na definição dos objetivos de cada produto, os quais atenderam à determinada necessidade cognitiva, à valoração de alguma atitude ou ao desenvolvimento de certas habilidades. Outras especificações complementaram o plano, tais como a duração do vídeo, a definição das técnicas e dos processos de trabalho, escolha de software de produção e edição etc. Foram estabelecidos um cronograma e a distribuição de tarefas. Por fim, o roteiro foi preparado, com a descrição da sequência das ações do vídeo, as imagens, a trilha sonora etc.

Os planos foram divulgados entre os alunos da classe através de um fórum criado para tal função, na plataforma Moodle da PUCSP. Tal estratégia motivou a turma para uma ação colaborativa e integrada de troca de ideias e materiais. Todo o processo de planejamento ficou registrado cumulativamente, refletindo o caráter reconstrutivo da produção de um material midiático.

Um canal3 do Youtube foi criado para reunir os vídeos produzidos pelos alunos. Além de divulgar os trabalhos na web, o site de serviço de publicação e distribuição de vídeos proporciona a possibilidade de compartilhamento com usuários em diferentes espaços e distintos

3 A URL do canal criado no ano de 2009: <http://www.youtube.com/ntepuc2009>; A URL do canal criado no ano de 2010: <http://www.youtube.com/ntepuc2010>.

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tempos, pois nessa rede interativa todos assumem papeis de produtores e consumidores de conhecimento.

À etapa de produção seguiu-se uma etapa de avaliação. Cada grupo preparou um registro dos percursos de produção, dando ênfase aos aspectos mais significativos do processo. Tais observações foram postadas em fórum com o fim de facilitar a divulgação e promover um debate avaliativo.

Os depoimentos dos alunos revelaram situações e desafios que surgiram durante a produção dos vídeos. Em sua maioria, esses relatos tratam do processo criativo, das providências para alcançar um resultado harmônico, no que dia respeito à congruência e à complementaridade da imagem, som e texto. Em algumas circunstâncias, os alunos tiveram que lidar com aspectos técnicos tais como: a reorganização do tempo em função dos contratempos; autorizações e direitos autorais; com a escolha e uso de novos softwares de edição de imagens. Alguns grupos reconheceram que fizeram novas aprendizagens ao pesquisarem os conteúdos e materiais. A escolha de assuntos de natureza social e educacional contribuiu para uma ampliação de consciência sobre a vida em sociedade, bem como para uma reflexão sobre as responsabilidades cidadãs.

Ao final do semestre, o melhor vídeo foi eleito. Reservamos uma aula para a avaliação final das produções. Todos os vídeos foram executados e pontuados segundo o critério de criatividade nos aspectos tema, roteiro, trilha sonora e imagens. Ao longo dos meses posteriores, pudemos acompanhar os acessos do público em geral, através dos registros quantificados, no site Youtube. Tal resposta nos estimulou a dar continuidade a este trabalho, nos anos seguintes.

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Considerações

Em virtude do crescente fluxo hipermediático na web, ativado pela expansão das redes sociais, o mercado de produção de materiais educativos tende a absorver profissionais oriundos das áreas de tecnologia e comunicação.

Nesse sentido, a disciplina NTE reorganizou-se na dimensão curricular com vistas a proporcionar aos formandos da graduação em Comunicação e Multimeios, o conhecimento do potencial das diversas mídias como instrumentos de acesso, transformação e produção de conhecimento.

A produção de materiais pedagógicos e programas educacionais, vivenciados pelos alunos da área de comunicação, revelou aos mesmos, um campo de trabalho no qual os conhecimentos sobre o fazer, são interdisciplinares. Ao lado de aspectos técnicos estão os aspectos pedagógicos. Os materiais da mídia estão, prioritariamente, a serviço da sociedade de consumo, mas também têm um importante papel na formação ética e conscientização dos seres humanos. Estes aspectos foram trabalhados pelas professoras das disciplinas da área da educação, denominadas Novas Tecnologias e Educação/ Tecnologias para Aprendizagem.

O processo criativo dos produtos midiáticos foi pontuado por muitos momentos reflexivos, nos quais professores e alunos experimentaram um acréscimo de conhecimentos e saberes, ao mesmo tempo, específicos e contextualizados. O movimento interdisciplinar redundou em significativos avanços da prática docente e discente.

Se somos parte de uma rede cibercultural é preciso que compreendamos que é este movimento é que nos faz universal e não

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totalizante (LÉVY, 1999). Podemos entender que as redes, que são rizomáticas, são universais por sua plasticidade, sua dinamicidade, sua fluidez (BRUNO, 2010). Não são totalizantes pois não são fixas, lineares e determinadas. Suas conexões se fazem, desfazem, refazem. Se recriam, se transformam e contornam, reformam, deformam. Assim somos nós. Assim são os nós. Assim são as redes constituídas neste curso: vivas.

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Mundos Virtuais, Games e Simulações em Educação: alternativas ao design instrucional

João Mattar(U. Anhembi-Morumbi)

INTrodUção

Mundos virtuais, games e simulações são hoje marcas registradas da cultura das mídias e da cibercultura. Nos últimos anos, seu uso em educação tem crescido intensamente, nas mais diversas áreas. Para muitos autores, os três conceitos se confundem. Aldrich (2010), entretanto, em diversos posts em seu blog, diferencia-os em relação ao seu uso educacional.

Enquanto os mundos virtuais seriam ambientes sociais mais amplos e livres para exploração e interação, os games seriam mais estruturados. As simulações educacionais, por sua vez, seriam processos rigorosos, ainda mais estruturados, que visam desenvolver habilidades específicas a serem transferidas ao mundo real. Ou seja, estariam voltadas para objetivos educacionais mais definidos, visando à aplicação do aprendizado. A

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gradação entre mundos virtuais, games e simulações educacionais passaria, portanto, pelo seu nível de estruturação e pela precisão dos objetivos de aprendizagem.

Apesar de ser possível apontar essas e outras diferenças conceituais, Aldrich acrescenta que mundos virtuais, games e simulações são conceitos aninhados, melhor compreendidos como partes discretas de um contínuo, do que como sinônimos ou conceitos totalmente distintos. Todos os games ocorrem em algum tipo de mundo virtual, muitas vezes em um ambiente online multiusuário, e todas as simulações educacionais podem ser compreendidas como games bastante rigorosos.

Acessar um mundo virtual não significa necessariamente jogar, assim como jogar um game não garante a transferência do aprendizado, que seria para Aldrich o objetivo principal das simulações educacionais. Se você parte de um mundo virtual para chegar a uma simulação educacional, terá que desenhá-la rigorosamente. Da mesma maneira, um serious game como SimCity não é por si só uma simulação educacional: não se espera que você seja um prefeito melhor apenas por jogá-lo.

Aldrich explora ainda, especificamente, as relações entre serious games e simulações educacionais. Embora ambos estejam muito próximos em qualquer taxonomia, ainda assim seria possível apontar diferenças. Serious games são experiências leves, fáceis e divertidas que constroem algum nível de compreensão, enquanto simulações educacionais desenvolvem habilidades e capacidades de uma maneira rigorosa. De um lado, os serious games são geralmente mais independentes e inclusive se disseminam de maneira viral, enquanto as simulações educacionais, de outro lado, em geral exigem um instrutor e fazem parte de um currículo pré-definido.

A diferença entre simulações educacionais e serious games poderia ser bem resumida por cada um de seus ‘exemplos originais’. O melhor

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exemplo de uma simulação educacional seriam os simuladores de voo, que conseguem lidar ao mesmo tempo com atividades simples, como pequenos ajustes, e incrivelmente complicadas, como pousos de emergência.

Um serious game típico seria o altamente divertido SimCity. Mesmo tendo sido concebido como um game, encontrou espaço em muitos currículos acadêmicos. É simples de usar, embora apresente elementos incrivelmente complicados e interessantes. Seus jogadores têm insights sobre planejamento urbano e se tornam orgulhosos de suas cidades.

Para completar, um exemplo paradigmático de mundo virtual seria o Second Life, que será abordado na próxima seção.

Analisando a questão por outra perspectiva, o mesmo Aldrich (2005) explora as semelhanças e diferenças básicas entre elementos de games, simulação e pedagogia. Avaliar a combinação entre esses elementos em mundos virtuais, games e simulações seria mais útil do que tentar responder às questões: “Qual é a diferença entre games e mundos virtuais?”, “Qual é a diferença entre um game e uma simulação?” e “Qual é a diferença entre simulações e mundos virtuais?”.

‘Elementos de games’ oferecem interações familiares e divertidas, aumentando o prazer da experiência educacional. É possível conceber diversos usos de elementos de games em ambientes e conteúdos educacionais, como: misturar escalas; colocar o conteúdo em músicas; oferecer respostas exageradas para tornar a experiência mais divertida; utilizar gêneros de jogos estabelecidos; forçar o usuário a passar de fases; provocar a imersão em uma atmosfera interessante; possibilitar que o aprendiz molde seu personagem; criar papéis de heróis ou modelos; estimular a competição entre alunos; produzir conflito; apresentar um mistério ou um quebra-cabeça para ser resolvido etc.

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Já os “elementos de simulação” representam objetos ou situações, envolvem interações entre os usuários, estimulam a prática e possibilitam transferência do aprendizado e de habilidades para o mundo real. É importante que o contexto da simulação esteja alinhado com o contexto da situação real que pretende simular, e tecnologias mais atuais permitem inclusive misturar elementos da realidade nas próprias simulações. O PEO STRI - Program Executive Office for Simulation, Training & Instrumentation, por exemplo, é um centro de aquisição de excelência do Departamento de Defesa norte-americano que fornece soluções em simulações, treinamento e testes.

Seu novo Game After Ambush deve integrar dados do mundo real disponíveis nos sistemas de comando de batalha, permitindo dessa maneira que os treinadores modifiquem o jogo dinamicamente ao editarem terrenos, modificarem cenários e mexerem em estradas, muros, clima e personagens coadjuvantes. Essa evolução possibilitará, por exemplo, simular guerras irregulares, preparando assim melhor os soldados para o combate.

Elementos pedagógicos, por fim, estão baseados na teoria do design instrucional, que exploraremos especificamente na terceira seção deste capítulo. Incluem objetivos de aprendizagem, os motivos para construir conteúdos instrucionais e a decisão sobre o que ensinar. Devem acompanhar os elementos de games e simulação para garantir que o tempo do aluno seja utilizado produtivamente.

Assim, a combinação adequada entre elementos de games, simulação e pedagógicos deve servir não apenas para orientar a produção de mundos virtuais, games e simulações educacionais, mas também de currículos, cursos e disciplinas, objetos e ambientes de aprendizagem.

Partindo desses conceitos, o restante deste capítulo explora, num primeiro momento, o uso de mundos virtuais (em especial o Second Life)

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em educação, abordando em seguida o uso de games em educação e suas relações com o design instrucional. Em ambos os casos, são apresentados exemplos de simulações educacionais.

MUNdoS VIrTUAIS: o USo do SeCOnD liFe EM EdUCAção

Apesar do desconhecimento e da descrença de muitos educadores, mundos virtuais continuam sendo integrados ao currículo por diversas instituições de ensino. Isso pode ser percebido por pelo menos três perspectivas distintas: (a) a crescente produção de pesquisas e trabalhos acadêmicos; (b) a utilização cada vez mais comum de mundos virtuais como plataformas em eventos acadêmicos; (c) cursos que adotaram mundos virtuais como ambientes virtuais de aprendizagem. Exploramos a seguir essas perspectivas com exemplos da utilização do Second Life em educação.

Em primeiro lugar, uma breve revisão de alguns trabalhos acadêmicos defendidos recentemente no Brasil, relacionando especificamente Second Life e aprendizagem.

A pesquisa de Gomes (2008), que utiliza como referencial teórico a análise do discurso, compara o ambiente virtual da Unisul Virtual com o Second Life em dois cursos, analisando as atuações dos autores, tutores e alunos. A autora conclui que o Second Life é um ambiente mais adequado para a oferta de cursos abertos e a realização de atividades síncronas, cooperação e autoria, possibilitando novas formas de fazer pedagógico, produção e compartilhamento do conhecimento.

O trabalho de Gecelka (2009), cuja defesa foi realizada no próprio Second Life e aberta ao público, analisou o planejamento, o desenvolvimento, a execução e os resultados de um curso oferecido na ilha do Sebrae. O autor

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conclui que, no Second Life, o professor pode visualizar o aprendizado dos alunos em um ambiente virtual lúdico, rompendo assim com uma característica marcante da educação a distância: o fato de o professor não poder acompanhar visualmente a aprendizagem. A avaliação de um dos alunos, ao final do curso, reforça algumas características do Second Life como ambiente virtual de aprendizagem:

Gostei muito das aulas, foram 100% interativas, pude aprender muito sobre o SL [...] percebi que o método de ensino via SL é tão eficaz quanto um presencial, pois disponibiliza para o aluno imagens em slide ao vivo, áudio do professor, interatividade síncrona e assíncrona com os colegas e o professor. (GECELKA, 2009, p. 50).

Corrêa (2009) analisa como interações sociais cada vez mais complexas são permeadas pelo físico e pelo virtual. A pesquisa mostra como os processos de interação e comunicação, mediados por tecnologias hipermidiáticas como o Second Life, possibilitam novas formas de construção do conhecimento.

A pesquisa de Fernandes (2010) explora o uso do Second Life no ensino de ciências e biologia. A interação com os recursos nativos do próprio mundo virtual permite estruturar uma nova forma de pensar, um pensar hipertextual. Segundo o autor, a interface tridimensional do Second Life proporciona novos modos interação e comunicação. A navegação torna-se imersão: navegar não é mais preciso quando se pode caminhar, correr, voar e até mesmo teletransportar-se por caminhos construídos pelos próprios usuários. O Second Life possibilitaria assim novos modos de contato com a informação, que se encontra agora na forma de objetos multimeios e nas relações entre os usuários.

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A investigação de Pires (2010) conclui que, ao contrário da telepresença, um mero deslocamento da voz e/ou da imagem, a criação de identidades digitais virtuais no Second Life faz com que o usuário se sinta envolvido em uma experiência imersiva e interativa mais rica, propiciada pela sensação de ser o avatar e pertencer ao ambiente. No Second Life, o estar junto virtual síncrono, e a possibilidade de expressar a corporalidade e criar identidades digitais virtuais por meio de avatares, aumentam o sentimento de presença e de pertencimento, contribuindo para a superação do paradigma da distância e da falta de presença física na educação online. A defesa da dissertação foi realizada no Second Life e aberta ao público.

Por fim, a pesquisa em andamento de Silva (2010) analisa como o design de interação pode ser aplicado para tornar eficiente a integração entre LMSs baseados na Web e mundos virtuais 3D, nos quais as interfaces são desenvolvidas de forma emergente pelos usuários, e não necessariamente por designers. Para realizar a análise, são examinados projetos como o TIDIA-Ae, que utiliza o Sakai, e o Sloodle, que integra o Moodle ao Second Life.

Esta lista, provavelmente incompleta, mostra como o Second Life tem sido objeto, em nosso país, de pesquisas acadêmicas que exploram seu uso como ambiente de aprendizagem. Suas conclusões apontam diversas vantagens no uso de mundos virtuais em relação aos ambientes virtuais de aprendizagem tradicionais.

Vários eventos têm também utilizado o Second Life como plataforma virtual. Dentre eles, podem ser mencionados: Second Life Best Practices in Education (2007, 1.200 participantes, realizado integralmente no Second Life); Rock the Academy: Radical Teaching, Unbounded Learning (2008, realizado integralmente no Second Life); 7º SENAED – Seminário Nacional ABED de Educação a Distância (2009, mais de 2.000 participantes); Virtual Worlds

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Best Practices in Education (2009 e 2010, ao redor de 6.000 participantes na última versão, realizado integralmente no Second Life); Slactions (realizado integralmente no Second Life); III Simpósio Virtual de EaD (realizado pelo Portal Educação em 2009, com o número impressionante de mais de 8.000 participantes); e Seminário Webcurrículo, promovido pela PUC-SP.

Além disso, o Second Life tem sido utilizado em diversas disciplinas e integrado ao currículo em inúmeros cursos, que não seria possível aqui elencar. O Grupo de Pesquisa Educação Digital - GP e-du Unisinos/CNPq, por exemplo, liderado por Schlemmer (2010), desenvolveu um projeto de formação docente para 13 instituições da RICESU – Rede de Instituições Católicas de Ensino Superior, utilizando o Second Life. Os resultados do projeto indicam que os participantes, representados por seus avatares, puderam experimentar a telepresença e a presença digital virtual, o que lhes permitiu realizar ações e utilizar diferentes formas de comunicação (linguagem oral, textual, gestual e gráfica) na interação com os demais avatares, ampliando e tornando mais intensos os sentimentos de presença, proximidade, imersão e realidade. Schlemmer conclui que os processos de formação, capacitação e ação pedagógica em rede tornam-se mais significativos do ponto de vista da aprendizagem, pois os participantes configuram juntos um ECODI - Espaço de Convivência Digital Virtual.

Gostaríamos de ressaltar ainda duas experiências internacionais de integração do Second Life ao currículo de maneira continuada.

O Departamento de Tecnologia Educacional (Edtech) da Boise State University possui uma ilha no Second Life com inúmeros espaços voltados para educadores, como o Center for Virtual Educators (que distribui gratuitamente objetos para uso educacional), Amphitheater and Hollodeck Classroom (sala que pode mudar de ambiente com um simples clique), Sandbox (onde os usuários podem praticar a construção de objetos), espaços

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para aulas, workshops e atividades etc. Várias das disciplinas a distância oferecidas regularmente por seus cursos de mestrado em tecnologia educacional utilizam o espaço para atividades síncronas semanais: Teaching and Learning in Virtual Worlds (que capacita o aluno ao uso educacional de mundos virtuais), Educational Games & Simulations (que explora o uso de games e simulações em educação), Teaching Mathematics in Virtual Worlds (que explora o uso de mundos virtuais no ensino de matemática) e Educational Design and Building in Virtual Worlds (voltada à construção de objetos e ambientes em mundos virtuais). Ou seja, o programa de mestrado da Boise State University incorporou decisivamente o Second Life ao currículo, o que deve se intensificar nos próximos semestres.

Num projeto ainda mais radical, o Texas State Technical College oferece quatro Certificados em Mídia Digital e Narrowcasting, além de um programa mais geral que envolve história, política, filosofia e matemática, todos inteiramente ministrados no Second Life. Os programas do vTSTC duram de 2 a 4 semestres e incluem diversas disciplinas. Em maio de 2009, Julie Shann foi a primeira aluna a se formar em um programa inteiramente ministrado em um mundo virtual.

Essas e muitas outras pesquisas e experiências servem para comprovar que o Second Life pode ser utilizado com sucesso em substituição a ambientes de aprendizagem como Blackboard, Moodle e Sakai. Mundos virtuais como o Second Life são autossuficientes como ambientes de aprendizagem, ou seja, podem ser utilizados como apoio à educação presencial, ou mesmo como plataformas para educação a distância, sem a necessidade do suporte dos ambientes virtuais de aprendizagem tradicionais. Eles possuem ferramentas que permitem a combinação entre elementos de games, simulação e pedagogia de maneira que os professores sejam capazes de projetar, elaborar e adequar esses elementos durante o próprio andamento dos cursos, além da participação dos próprios alunos no co-design do processo de ensino

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e aprendizagem. Permitem, portanto, que os professores, assim como os próprios alunos, tornem-se autores, questionando assim a necessidade de divisão de trabalho entre conteudistas, designers instrucionais e tutores, comum em diversos projetos de educação a distância.

As experiências pedagógicas que têm sido realizadas em mundos virtuais, mais especificamente no Second Life, chamam ainda a atenção para a importância do “espaço” de aprendizagem, que a literatura sobre interação em educação a distância em geral não aborda (MATTAR, 2009). O grau de envolvimento e imersão dos alunos com o conteúdo dos cursos, os colegas e o próprio professor, em um ambiente de realidade virtual 3D como o Second Life, não parece ser facilmente reproduzível nos ambientes de aprendizagem tradicionais. Isso facilita a introdução de elementos de games e simulação nas atividades educacionais.

Além da importância do ambiente em três dimensões, o exercício de criação de uma identidade virtual no Second Life, por meio da construção de um avatar, desempenha também papel essencial no processo de aprendizagem. Segundo Pires (2010, p. 210):

As evidências resultantes desta investigação mostram que a possibilidade de criação de identidades digitais virtuais por meio de avatares, aumenta o sentimento de “presença” e de “pertencimento” dos sujeitos envolvidos em processos de ensinar e de aprender em Metaversos, por meio da telepresença e da presença digital virtual, o que contribui com a superação do paradigma vinculado à “falta de presença física” na Educação Online.

A integração de mundos virtuais ao currículo de forma sustentada, entretanto, pressupõe a continuidade de pesquisas sobre seu uso em educação, além de processos de formação docente como o desenvolvido

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pela Unisinos, já que há uma longa cura de aprendizado para que o professor seja capaz de utilizar e integrar essas novas ferramentas ao processo de ensino e aprendizagem.

GAMES E EdUCAção

O aprendizado através de games (game-based learning) tem diversas características que o distingue do aprendizado tradicional, mesmo em educação a distância (MATTAR, 2010).

Portnow e Floyd (2008), por exemplo, desenvolvem o conceito de aprendizado tangencial, que não é o que você aprende ao ser ensinado, mas ao ser exposto a objetos, conteúdos e ambientes em um contexto no qual esteja envolvido. Há uma separação ainda muito marcante entre games para educação e games para diversão, principalmente porque vários games educacionais produzidos até agora são muito monótonos e enfadonhos, quando comparados aos games comerciais. Para superar essa dicotomia, os autores propõem a ideia de permitir e facilitar o aprendizado com games, em vez de ensinar. Sem sermos forçados, e estando envolvidos com o game, teríamos mais probabilidade de aprender. Portanto, a ideia de aprendizado tangencial considera que uma parte da sua audiência se autoeducará, caso você facilite sua introdução a assuntos que possam lhe interessar, em um contexto excitante e envolvente. E esse aprendizado poderá ainda contar com a atuação do professor, como um guia que auxilie o jogador a refletir sobre sua experiência e acrescente elementos de apoio à aprendizagem, após o jogo.

Outra questão que separa os games do aprendizado tradicional é a forma de lidar com o erro. Nos games, o custo do fracasso é normalmente diminuído – quando os jogadores fracassam, podem, por exemplo,

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recomeçar de seu último jogo salvo. Além disso, o fracasso é em geral encarado como uma maneira de aprender e, numa próxima oportunidade, tentar obter sucesso. Essas características do fracasso nos games permitem que os jogadores arrisquem-se e experimentem hipóteses que seriam muito difíceis de testar em situações em que o custo do fracasso é maior, como na vida real, ou onde nenhum aprendizado deriva do fracasso, como ocorre muitas vezes na educação formal. Esse design do fracasso seria um importante elemento de game a ser inserido nas experiências educacionais.

Além disso, nos games os próprios jogadores podem determinar como aprendem, estando livres para descobrir e criar arranjos de aprendizado. Assim, além de compreender como as características dos próprios games suportam o aprendizado, podemos também avaliar a maneira pela qual os jogadores assumem papéis ativos de aprendizagem nos games.

Muitos games são desenhados com objetivos determinados, embora deixem os jogadores livres para atingir esses objetivos da maneira que preferirem. Entretanto, games podem também permitir que os jogadores tracem seus próprios objetivos. Além disso, a reflexão e a interpretação são também encorajadas nos games: é possível, por exemplo, estudar um jogo com o recurso do replay e, por consequência, refletir sobre a experiência. Isso tudo desempenha, obviamente, um papel primordial no processo de aprendizagem.

Para Lehto (2009), o que define um game é a necessidade de participação – se a interatividade é removida, ele deixa de ser um game. Games são de alguma maneira ‘escritos’ pelo jogador, não simplesmente lidos. Um game é um sistema dinâmico explorável, mas que, simultaneamente, é também construído pelas escolhas livres do jogador. O usuário está, portanto, ao mesmo tempo percebendo o que ocorre ao seu redor e participando da construção do ambiente que percebe.

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Enquanto o cinema está baseado na estética da narração audiovisual (e podemos aqui pensar na educação tradicional, baseada em aulas e leituras de livros-texto), os games estão baseados na estética do espaço de experiências. Um game pressupõe interação (com os colegas) e/ou interatividade (com os próprios elementos do game), ou seja, a sua exploração não pode se constituir numa visita guiada, pré-planejada ou pré-enlatada, mas deve incluir a possibilidade de construção do caminho pelo próprio usuário, liberdade, inclusive certo grau de incerteza, que garantam a sua imersão. Essa interação e interatividade colocariam os games um passo além do cinema e de outras formas estáticas de experiência estética. Jogar um game é diferente de testemunhar uma história ou um filme contemplativamente.

Para Lehto (2009), se é possível falar de uma narrativa textual e de uma imersão cinemática, com os games é necessário falar de uma interação lúdica. A estrutura dos games (desafios, fronteiras, regras) seria uma mera desculpa, uma ilusão necessária para penetrarmos no reino da interatividade. É possível então falar de uma imersão interativa, de uma estrutura que é preenchida pelos próprios atos do jogador, que é estruturada, portanto, não apenas por elementos de games, mas também de simulação, como apresentados por Aldrich.

Para Juul (2001), enquanto as narrativas estão baseadas numa sequência de eventos no passado, games são construídos pela influência que o jogador tem sobre os eventos no presente. Daí a ideia de uma ficção interativa, que você ‘lê’, da qual participa e que ao mesmo tempo cria. Num game, o ‘leitor’ é parte integrante do significado do jogo. Um game delega ao seu leitor um tipo de liberdade que o leitor de um texto tradicional não possui. O leitor de um game assume a posição de um autor, já que suas ações determinam a construção do texto. Mais do que simplesmente interpretar, o leitor de um game tem de fazer um esforço para progredir na história.

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Murray (1998) explora a atuação do interator (interactor) em histórias digitais, alertando, entretanto, que seria um equívoco considerá-lo o autor da história. Seria necessário distinguir entre desempenhar um papel criativo em um ambiente autorado e ser autor do próprio ambiente. Os interatores só podem agir dentro das possibilidades que foram estabelecidas pela escrita e pela programação. Podem construir cidades simuladas, experimentar estratégias de combate, traçar um caminho único através de uma teia labiríntica ou mesmo impedir um assassinato, mas, ao menos que o mundo imaginário não seja mais do que uma fantasia de avatares vazios, todo o desempenho possível do interator teria sido criado com antecedência pelo autor original.

O autor de mídias eletrônicas escreve tanto o texto quando as regras pelas quais o texto deve aparecer. Escreve as regras para o envolvimento do interator, ou seja, as condições pelas quais as coisas acontecerão, em resposta às ações do participante. Estabelece as propriedades dos objetos e objetos potenciais no mundo virtual, e as fórmulas pelas quais eles se relacionarão uns com os outros. O autor cria não apenas um conjunto de cenas, mas um mundo de possibilidades narrativas. Por analogia, poderíamos conceber uma nova função para o designer educacional, que criaria um universo de possibilidades a serem exploradas pelo aluno, ao invés de um percurso linear a ser obrigatoriamente seguido.

Na narrativa eletrônica, o autor é o coreógrafo que fornece o ritmo, o contexto e o conjunto de passos que serão dados. O interator, por sua vez, seja um navegador, protagonista, explorador ou construtor, faria uso desse repertório de passos e ritmos possíveis para improvisar uma dança particular entre muitas danças que o autor tornou possíveis. Poderíamos dizer que o interator é o autor de uma performance particular no sistema de história eletrônico, ou o arquiteto de uma parte particular do mundo

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virtual, mas é importante distinguir essa autoria derivativa da autoria originária do próprio sistema.

O livro de Murray foi publicado originalmente em 1997, sendo então possível argumentar que nos games de hoje, o jogador estaria bem mais próximo da posição de autor descrita por Juul e Lehto, cujos textos são posteriores, inclusive pelas possibilidades de modificar a própria estrutura do sistema, com o recurso dos mods, que proporcionam a criação de games inteiramente novos e distintos dos originais. Além disso, é interessante apontar que um mundo virtual como o Second Life se aproxima bastante da ideia de ‘fantasia de avatares vazios’ de que fala Murray, já que tudo é construído pelos participantes, e o próprio avatar pode ser totalmente construído pelo usuário. O que, por analogia, nos transportaria para uma visão da educação em que os objetos e objetivos de aprendizagem, o ambiente e o próprio design fossem desenvolvidos colaborativamente durante o processo de ensino e aprendizagem, e não impostos com antecedência por um designer instrucional, que teria empacotado o conteúdo elaborado por um especialista. As regras para a aprendizagem não estariam, portanto, claramente traçadas antes do início do aprendizado, ou seja, o design continuaria durante a experiência educacional.

Segundo Johnson (2006), a maioria dos videogames difere de jogos tradicionais, como xadrez ou Monopoly, pela maneira como restringem a informação sobre as regras subjacentes do sistema. Quando você joga xadrez sem ser um iniciante, as regras do jogo não possuem ambiguidades; você sabe exatamente os movimentos permitidos por cada peça e os procedimentos que permitem a captura de uma peça por outra. A pergunta que o provoca, quando você está frente ao tabuleiro, não é: ‘Quais são as regras aqui?’ mas ‘Que tipo de estratégia eu devo utilizar para tirar melhor proveito dessas regras?’

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No mundo dos videogames, ao contrário, as regras raramente estão estabelecidas em sua totalidade antes que você comece a jogar. Você recebe poucas instruções básicas sobre como manipular objetos ou personagens na tela, além de um senso de algum tipo de objetivo imediato. Mas muitas das regras – a identidade do seu objetivo final e as técnicas disponíveis para atingi-lo, por exemplo – tornam-se aparentes apenas pela exploração do mundo. Ou seja, você literalmente aprende jogando; precisa descobrir sozinho o que deve fazer; deve explorar as profundezas da lógica do jogo para compreendê-lo, e, como em muitas expedições exploratórias, como nas visitas às ilhas do Second Life, obtém os resultados por tentativa e erro, tropeçando nas coisas e seguindo intuições. Em todos os outros empreendimentos que utilizam a linguagem dos jogos – poker, basquete e gamão, por exemplo – qualquer ambiguidade nas regras e nos objetivos seria uma falha fatal. Em videogames, ao contrário, a ambiguidade nas regras é uma parte essencial da experiência. Muitos jogos carregam histórias misteriosas embutidas, com perguntas como ‘quem o matou’, ‘quem roubou aquilo’ etc., mas o verdadeiro mistério que move o jogador no mundo do jogo é um mistério mais autorreferencial: ‘como este jogo é jogado?’. Na maioria dos games, portanto, a chave para o sucesso não está em aprender a manipular joysticks, mas em decifrar suas regras.

Algumas dessas regras você descobre lendo manuais, mas outras só descobre jogando. No entanto, o computador faz mais do que mostrar ao jogador regras: ele constrói todo um mundo, o que Johnson (2006) chama de física do mundo virtual. E a exploração da física desse mundo envolve os mesmos passos da metodologia científica: exploração, hipóteses, teste, reformulação das hipóteses e assim por diante. Ou seja, quando os gamers interagem com os games, estão aprendendo os procedimentos básicos do método científico.

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Essa ambiguidade das regras, portanto, seria outro importante elemento de games a ser injetado nos materiais e nas experiências educacionais, ao contrário do que propõem as matrizes exatas do design instrucional, em que os objetivos de aprendizagem encontram-se milimetricamente definidos e fatiados.

‘Elementos de simulação’ e pedagogia nos games

Shaffer (2008) desenvolve o conceito de games epistêmicos (epistemic games): mundos virtuais criados a partir de práticas profissionais e que estimulam o pensamento inovador. Eles ajudariam os jogadores a aprender a pensar, por exemplo, como engenheiros, planejadores urbanos, jornalistas, arquitetos e outros profissionais inovadores. Com os games epistêmicos, os jovens não precisariam esperar o ensino superior ou o mundo do trabalho para começar sua educação para a inovação.

Estruturas epistêmicas (epistemic frames), por sua vez, são definidas como conjuntos de habilidades, conhecimentos, identidades, valores e epistemologia pelas quais profissionais enxergam o mundo de determinada perspectiva e pensam de maneira inovadora. A epistemografia envolveria o olhar para os tipos de ações e de reflexões-em-ação que desenvolvem a estrutura epistêmica de uma profissão.

A principal mudança gerada com o uso de games epistêmicos seria pararmos de pensar que o objetivo da escola é simplesmente ensinar matemática, ciências ou estudos sociais. Games permitem criar mundos virtuais em que podemos pensar de maneiras diferentes. Para Shaffer (2008), eles representam uma mudança no mesmo nível das mudanças geradas com a linguagem, a escrita e a imprensa. Desenvolvem uma maneira profissional e prática de ver, pensar e atuar sobre problemas importantes, suportada pela reflexão com a ajuda dos colegas. Tornam possível nos movermos para

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além de disciplinas derivadas do conhecimento medieval e ensinadas em escolas programadas para a revolução industrial. Ou seja, os ‘elementos de simulação’ nos games permitem ensinar no futuro, preparar o aluno para uma atividade na prática, ao invés da pura teoria.

Bogost (2007), por sua vez, analisa os videogames como mídias expressivas e persuasivas, que representam como os mundos real e imaginário trabalham, convidando os jogadores a interagir com esses sistemas e elaborar juízos de valor. Além de suportar posições sociais e culturais existentes, games podem também ser disruptivos e modificar posições, gerando mudanças sociais de longa duração.

Bogost (2007) utiliza como referencial a retórica, desde a Grécia Antiga, analisando sua função nos games. Ele define a retórica procedimental como a arte da persuasão através de representações e interações baseadas em regras, em vez de palavras faladas e escritas, imagens fixas ou em movimento. Para o autor, os videogames teriam poderes retóricos e persuasivos únicos, distintos de outros softwares.

A procedimentalidade refere-se a uma maneira de criar, explicar e compreender processos que definem como as coisas funcionam – os métodos, técnicas e lógica que guiam a operação de sistemas, sejam eles mecânicos (como motores) ou organizacionais (como escolas). Já a retórica refere-se à expressão efetiva e persuasiva. A retórica procedimental, combinando os dois conceitos, seria a prática de utilizar processos persuasivamente. Mais especificamente, a prática de persuadir através de processos em geral, e processos computacionais em particular.

Além da retórica verbal, que abrange os campos da fala e da escrita, Bogost explora o emergente campo de estudos da retórica visual, que envolve a análise de como fotos, desenhos, gráficos, tabelas e imagens em movimento são utilizados para influenciar as atitudes, as opiniões e os

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desejos das pessoas. A retórica visual costuma ser estudada de diversas maneiras: do ponto de vista social, da criação de comunidades de prática ao redor de novas mídias; da interatividade no sentido de comunicação mediada por computadores; ou ainda da maneira como computadores modificam práticas sociais (cartas, por exemplo, viraram e-mails).

A retórica digital, por sua vez, abordaria o papel da procedimentalidade, a propriedade de representação específica dos computadores. Enquanto a retórica verbal é a prática de utilizar a oratória persuasivamente, e a retórica visual é a prática de utilizar imagens persuasivamente, a retórica procedimental seria a prática de utilizar processos persuasivamente. Games persuasivos seriam, por consequência, aqueles que constroem argumentos sobre como os sistemas funcionam no mundo real, levando o jogador a modificar sua opinião fora do jogo.

Bogost está interessado na retórica procedimental como uma prática crítica, não como reprodução de práticas estabelecidas:

[...] jogadores de videogames desenvolvem uma alfabetização procedimental pela interação com modelos abstratos de processos específicos, reais ou imaginários, apresentados nos games que eles jogam. Os videogames ensinam perspectivas tendenciosas sobre como as coisas funcionam. E a maneira como eles ensinam essas perspectivas é através da retórica procedimental, que os jogadores ‘leem’ pelo envolvimento direto e crítico. (BOGOST, 2007, p. 260).

[...] os videogames para treinamento tornam-se educacionais quando deixam de reforçar um processo como um conjunto de regras arbitrárias a serviço da organização, e começam a apresentar uma retórica procedimental do modelo de negócios no qual o empregado foi solicitado a trabalhar.

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Quando o empregado tem uma perspectiva desse modelo de negócio, pode interrogá-lo como um sistema de valor, em vez de uma condição arbitrária de emprego. (BOGOST, 2007, p. 282).

Bogost, portanto, propõe o uso dos videogames em nome de uma educação revolucionária, algo que talvez tenhamos dificuldade em enxergar, guiados que somos pela visão dos jogos comerciais triviais e violentos, submetidos ao regime cultural dominante. Propõe, assim, que elementos pedagógicos sejam inseridos em games de uma maneira específica, distinta da maneira como são sugeridos pelo design instrucional clássico.

Um exemplo interessante do uso de �elementos de simulação� como recursos persuasivos é a recriação da prisão de Guantánamo no Second Life por Nonny de la Peña, aluna de mestrado da USC (University of Southern California). Assim que você aceita o desafio, seu avatar se torna um prisioneiro, começa a ser espancado e é jogado em um helicóptero com o rosto vendado. Na prisão, você pede a assistência de um advogado – mas logo descobre que não tem esse direito. Aliás, rapidamente aprende que não tem direito a nada. Ou seja, a simulação é utilizada para sensibilizar politicamente o usuário, de uma maneira provavelmente mais poderosa do que um texto seria capaz. Seria esse o futuro do discurso político? (SANCTON, 2008).

Outro exemplo é o Virtual Worlds Story Project (<http://www.tvwsp.com/>), desenvolvido por Marty Snowpaw e Jenaia Morane, que oferece viagens interativas, imersivas e educacionais no Second Life. Vivendo histórias como a de Uncle D, um personagem que morreu de AIDs, o usuário acaba criando sua própria narrativa e ao mesmo tempo sendo influenciado por ela. Apropriando-se dos objetos e interagindo com os

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ambientes projetados pelos designers, o usuário assume o papel de autor de uma história que, magicamente, exercerá poder persuasivo sobre si próprio.

Outro exemplo interessante é o Virtual Hallucinations, projeto desenvolvido no Second Life pela Universidade da California em Davis, em que seu avatar entra em um ambiente e passa a se sentir como um esquizofrênico: tem visões, ouve vozes e assim por diante. Neste caso, trata-se da simulação de uma experiência puramente interna, que torna possível visualizar alucinações.

Em todos esses casos, independente de sua classificação como games, mundos virtuais ou simulações, elementos pedagógicos são combinados criativamente com “elementos de simulação” e de games. Essas experiências têm o objetivo de alterar a perspectiva do usuário sobre determinados temas, atuando diretamente no nível emocional e produzindo novas atitudes. Pode-se, assim, dizer que elas são utilizadas para persuadir, educando eticamente.

design instrucional e design de games

O excesso de sobriedade dos modelos tradicionais de design instrucional não combina com as características das novas gerações para as quais eles, supostamente, deveriam estar facilitando a aprendizagem. Um comentário feito por um game designer, em um debate conduzido por Marc Prensky durante uma edição da Game Developers Conference, reforça essa ideia: “Assim que você acrescenta um designer instrucional em uma equipe [de game design], a primeira coisa que ele faz é arrancar a diversão” (PRENSKY, 2006, p. 83).

Como já procuramos mostrar em diversos momentos, esses modelos de design instrucional precisam ser superados porque são inadequados para

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redesenhar a educação na cultura midiática. Akilli (2007), por exemplo, defende que esses modelos surgiram antes dos games e das ferramentas de simulação, e, portanto, não precisam simplesmente ser atualizados, mas totalmente refeitos. Emendas ou remendas não resolvem o problema.

Para Prensky (2007), o ISD - Instructional System Design, base para as várias versões de design instrucional, não é criativo; ao contrário, está cheio de ‘estes são os objetivos de aprendizagem’, ‘neste módulo você vai aprender a…’ etc., ou seja, recheado somente de elementos pedagógicos de que fala Aldrich. Isso pode ser lógico para o designer instrucional, mas essa racionalidade não garante o aprendizado do aluno, principalmente quando o estilo da nova geração é menos lógico que o das anteriores. Faltam ao ISD tanto elementos de games quanto de simulação.

Para Gordon e Zemke (2000), o ISD é lento, sem graça e orientado a processos, mais do que a pessoas ou a aprendizado. Encoraja uma preocupação cega com os meios em detrimento dos fins, e sua ambição por um programa perfeito de instrução pode levar à perda de foco no problema real e no resultado. É um sistema de administração de projeto ultracuidadoso e burocrático, excessivamente preocupado em obedecer às regras e que precisa ser superado. O processo tende a criar programas enfadonhos e cookie-cutter (sem originalidade, uma referência à uniformidade que resulta da utilização de ferramentas para cortar massas de biscoito em um formato específico).

Esse excesso de rigidez bloqueia a criatividade. Koster (2004), por exemplo, sugere um importante insight para designers de games: quanto mais formalmente construído um game, mais limitado ele será – e, por consequência, mais enfadonho e incapaz de prender a atenção do jogador. Podemos estar criando aprendizes incapazes quando lhes oferecemos instrução mastigada, num esforço para atingir resultados homogêneos. Se

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há uma frase que não descreve o estilo-ISD de programas de treinamento, é ‘flexível e fácil de modificar’, ao contrário dos exemplos de games, simulações e mundos virtuais que exploramos neste capítulo. Falta ao ISD conceber o aluno como autor de seu caminho, projetar mods na instrução, elaborar ambientes de aprendizagem que possam ser modificados durante o processo de aprendizagem, e assim por diante.

Zemke e Allsion (2002), continuando as críticas, afirmam que o ISD pode fazer sentido no papel, mas na prática é um processo pesado e lento que pode levar à ‘paralisia da análise’. Em vez de uma abordagem flexível para suportar resultados de aprendizagem desejados, o ISD sistemático tornou-se simplesmente um checklist para administração de projetos, restrito a elementos pedagógicos.

Para outros críticos, o ISD é uma abordagem rígida e ultrapassada que não contempla as novas teorias de ensino e aprendizagem, nem os novos desenvolvimentos tecnológicos, nem as características da cultura midiática. A abordagem de design linear não está centrada no aprendiz, fazendo sentido para os burocratas preparam os cursos, não para os alunos.

CoNClUSão

Como alternativa ao design instrucional clássico, temos disponíveis hoje ferramentas como mundos virtuais, games e simulações que permitem exercitar uma educação criativa e inovadora, mais em sintonia com a cultura midiática. Procuramos neste capítulo indicar algumas delas, além de fundamentar teoricamente o seu uso. Essas ferramentas são o habitat dos nossos novos alunos, permitindo assim que possamos travar com eles uma comunicação mais adequada, além de exercitar uma interação que, nas

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ferramentas tradicionais de ensino, inclusive nos LMSs ou AVAs, não temos mais conseguido estimular.

Entretanto, como sabemos, a questão não se resume apenas a novas ferramentas, mas principalmente ao uso pedagógico que fazemos delas. Utilizar games, mundos virtuais ou simulações em educação é uma tendência que parece inevitável, mas tão ou mais importante seria injetar nessas ferramentas uma combinação adequada de elementos de games, simulação e pedagogia.

Tanto para o domínio técnico dessas ferramentas quanto para o uso adequado desses elementos, é imprescindível desenvolver programas de formação continuada para que os professores sejam capazes de integrá-los ao processo de ensino e aprendizagem. Programas que não se resumam a simples treinamentos, mas que envolvam experimentação e pesquisa, e tenham continuidade. Treinamento é uma palavra que nos remete a linhas de montagem e a um modelo industrial de educação, com o qual o design instrucional clássico está identificado. Da mesma maneira que observamos a necessidade de utilizar games, simulações e mundos virtuais na educação de nossos novos alunos, envolvidos pela cultura midiática, observamos a necessidade de inserir elementos de games, simulações e mundos virtuais nos programas de formação profissional para professores.

De qualquer maneira, além dos modelos e das ferramentas utilizadas, é necessário garantir tempo e oferecer suporte para os educadores aprenderem. Caso contrário, programas de formação continuada para a utilização de games, mundos virtuais e simulações em educação não terão sucesso.

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Processo Educativo e Inclusão Sócio-digital na EJA: uma proposição

Adriana dos Santos Marmori Lima

(UNEB)

Introdução

Durante séculos a humanidade tem delegado à escola a responsabilidade de ensinar. Desde os códigos escritos da língua, números e regras matemáticas, biografias de pessoas ilustres perpassando pelos estudos sobre os fenômenos da natureza e sobre as próprias relações do homem com a técnica, ou as técnicas.

Atualmente, é comum ouvir de alguns pais de estudantes “a escola não é mais como antigamente”, ou comentários aflitos de professores: “não sei mais o que fazer com meus alunos, pois não querem nada”. Esse descontentamento nos mostra que a mudança da sociedade é visível e ao não se ter clareza para onde iremos o melhor mesmo tem sido recorrer ao saudosismo do passado como na fala dos pais ou depositar as nossas angústias nos estudantes como na fala dos professores.

Mas, e os estudantes, o que pensam e dizem? Estes, mesmo que não expressem oralmente a ação do “querer nada”, não aprenderem ou não

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corresponderem às expectativas da escola e da família, vêm demonstrando claramente suas críticas à educação atual.

A tríade escola-vida-conhecimento, em plena era contemporânea, continua caminhando em sentidos opostos: “a vida na escola e a escola da vida” (CECCON et al., 1982, p. 2). No primeiro mundo, as informações ou blocos de conhecimentos são interiorizados por meio da leitura ou ensino pelo professor para serem devolvidos através das provas de conhecimentos ao final de semestres ou unidades letivas. No segundo mundo, o conhecimento é aprendido na convivência com/no meio, através da própria utilização das diversas linguagens (verbais, não verbais, sinestésica...) que possibilitam a realização de diferentes leituras e que servem aparentemente apenas para as relações diárias com outras pessoas e objetos.

Corroborando essa discussão Alves (1991), reitera que a escola toma como base as respostas prontas, construídas em um tempo e espaço que não mais se encaixa neste momento, ao invés de possibilitar aos estudantes de hoje viverem e pensarem dentro da escola sobre um currículo vivo que não ignora as regras, os códigos, mas percebe-os como parte integrante de um contexto cultural maior.

Nesse caso, educar o homem é diferente de dar doses de conhecimentos conforme a idade e a série e ir aumentando as doses com o sonho de prepará-lo para o vestibular, para ingresso na universidade, mas é possibilitar a construção de um saber cultural, coletivo e socializável.

Os meios tecnológicos de comunicação influenciam estudantes a partir de um apelo multissensorial que os atraem e os levam a “querer tudo”, enquanto a escola continua insistindo que os mesmos estudantes “não querem nada”. Se, são sujeitos ávidos por conhecerem o mundo, por que mais precisamente as instituições de ensino não aproveitam o desejo de conhecer, mesmo que seja apenas uma alucinação temporal e desafia-

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os constantemente a pensarem, construírem perguntas que os levem as respostas?

É nesse movimento continuo de busca, imersos no mundo contemporâneo que não nos cabe insistir em educar o homem fazendo-o “decorar” letras, sílabas, palavras, fragmentos de livros para aprender a ler. Pois na “sociedade informática” (SCHAFF, 2007, p. 16), textos lineares inflexíveis para leitura apenas sequenciais estão com os dias contados.

O momento exige: primeiro, nos percebermos diante de redes de informações que ultrapassam sobremaneira os muros da escola; segundo, que os “hipertextos” com sua capilaridade plástica de manuseio e de viagem a outros e outros textos no mundo virtual, nos possibilitam enxergar a dinamicidade das coisas, a percebermos uma infinidade de autores, visões e posições sobre uma pluralidade de temas e de contextos. E, portanto descobrirmos que é hora de fazer leituras dinâmicas e críticas da realidade.

A grande rede de informações não se esgota no computador conectado à internet, está presente em todos os lugares, em casas, ruas, na escola, em outros estados e países. Disponível via rádio, TV, jornais, livros, celulares e internet. Enfim, um mundo composto por leitores ou produtores de hipertextos. Leitores pela capacidade de interpretarem as realidades e produtores por serem responsáveis por transformar essa realidade em novos textos e contextos.

É possível inverter o curso da história da educação brasileira e, ao invés de andar seguindo os passos deixados na areia, nos manuais dos alfabetizadores, nos ditados de palavras, nas cópias, na decoreba de regras, das leituras em coro, difundir o saber cultural e construir novos saberes considerando o desejo de conhecer dos estudantes?

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Construir saberes fomentados pelos meios tecnológicos de comunicação e informação, coerentes com o processo de desterritorialização, transformando esses “saberes” em currículo vivo, nos remete a outra questão: não estaríamos preparando melhor os homens e mulheres para viverem nessa e para essa sociedade?

O que vem a ser mais importante numa sociedade capitalista cheia de desigualdades sociais: os acúmulos de conteúdos desconectados da vida ou a capacidade de pensar criticamente sobre esses conteúdos e de reconstruí-los coletivamente?

O cidadão que é preparado para pensar reconhece o momento de acumular conhecimentos para fazer um vestibular e concorrer igualmente a uma vaga na universidade ou em concursos. Um dos objetivos precípuos da escola, não deveria ser o de apenas formar cidadãos vazios, que acumulam informações como robôs, pois homens são dotados de pensamento. Desse modo, Lévy (1995, p. 130) afirma: “[...] nossa memória não parece em nada com um equipamento de armazenamento e recuperação fiel das informações”. Daí a importância do aprender a pensar e não a acumular dados desconexos da realidade.

O uso dos instrumentos tecnológicos de comunicação e informação, principalmente do computador, por ser considerado atualmente um dos equipamentos mais eficientes que marcou a história da civilização, também pode marcar consideravelmente a discussão sobre as políticas públicas de inclusão a partir do contexto educacional.

repensando a EJA no Contexto Socio-digital

Nessa perspectiva das mídias na educação, ao processo de Educação de Jovens e Adultos, não basta apenas garantir a execução de políticas

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públicas que forneçam aulas de “ler e escrever” os códigos escritos. É preciso rever a formulação de tais políticas para que os Jovens e Adultos, já excluídos socialmente do processo educativo por idade e condição financeira, não sejam excluídos também da nova ‘condição humana’1, de apreender e de ter acesso a todas as produções de saberes e a todas as formas de comunicação do/no mundo.

A construção do alfabeto, a descoberta da escrita, e a criação da imprensa trouxeram mudanças significativas de paradigmas sobre a aprendizagem humana e sobre os processos de alfabetização nos contextos educativos, modificando sobremaneira as relações entre as pessoas. Portanto, as novas formas de comunicação, com o advento das tecnologias também transformam as formas de ensinar e aprender.

Mesmo após significativas contribuições de Piaget advindos dos estudos sobre a gênese do conhecimento humano; de Emilia Ferreiro, com seus estudos linguísticos e de Vygotsky (1984), em seu livro intitulado A Formação Social da Mente no qual descreve os processos de aprendizagem por instrumentos de mediação, muitos alfabetizadores ainda não conseguiram perceber que a aprendizagem é autoconstruída pelos aprendizes nas suas interações e no curso das suas necessidades de serem entendidos e de entenderem o mundo.

Diante de uma diversidade textual contemporânea, presente nos programas de TV, jornais, revistas, outdoors, filmes, receituários e músicas, enfim, da mídia, os sujeitos são capazes de construir suas hipóteses sobre a escrita, de realizar suas leituras e, motivados, de aprofundar o pensamento, constituindo-se leitores e escritores, capazes de utilizar a base alfabética e todos os demais códigos que produzem sentido.

1 Schaff (2007, p. 18) no livro A Sociedade Informática esclarece que diante das velozes e profundas mudanças de ordem econômica, social, cultural e política, o indivíduo vê transfigurar-se a sua  “condição” como “homo autocreator”.

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Dessa forma, os Programas voltados para Alfabetização de Jovens e Adultos, poderão dispor de outras formas de intervenção que desafiem as elaborações mentais dos sujeitos e os façam avançar no processo de construção da lecto-escrita. Para tanto vale lançar mão dos diversos ambientes de aprendizagem, da pluralidade textual e dos equipamentos disponíveis como o computador, para que estes aprendizes ao mesmo tempo em que se constituem cidadãos incluídos no mundo letrado, sejam também incluídos no mundo digital.

A hipertextualidade oferecida pelas mídias é infinita e não só pode substituir as cartilhas e os métodos tradicionais utilizados para alfabetizar como poderá oportunizar aos usuários a fazerem relações durante o processo de aprendizagem até então não realizadas como, por exemplo, perceber a escrita enquanto forma de comunicação, para além do simples registro dos livros a fim de ser absorvida e tomada como verdade absoluta; perceber a leitura como uma elaboração humana, alterável, móvel visto que nenhuma ideia é totalmente definitiva assim como a evolução natural do homem e do mundo e ainda o mais importante, perceber-se capaz e autônomo para pensar e criar.

Nesse universo de criação, de liberdade de expressão, de interatividade com os diferentes textos, a cibercultura2 conforme afirma Silva (2003, p. 53) “[...] põe em questão o esquema clássico da informação”, uma vez que tanto o emissor quanto o receptor manipulam nesse novo espaço os sentidos e conteúdos da mensagem, é preciso uma reorganização das relações nessa grande rede.

Ainda sobre hipertextualidade, Castells (2004, p. 174) defende a ideia de uma convergência entre internet e multimídia por considerar as

2 Cibercultura é a atualidade sociotécnica informacional e comunicacional definida pela codificação digital (bits), isto é, pela digitalização, que garante o caráter plástico, hipertextual, interativo e tratável em tempo real da mensagem (SILVA, 2003, p. 53).

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transformações da Internet que se converteu em “[...] uma ferramenta organizativa da empresa e um meio de comunicação [...], constituindo-se, além disso, numa alavanca de transformação social”. Pensamento que se complementa com a afirmação de Pretto e Silveira (2008, p. 36) sobre a internet ao ressaltar que “[...] essa possibilidade fantástica ocorre devido à inexistência de um órgão central que decida o que pode e o que não pode ser criado”.

Ramal (2003, p. 251) diz que, aplicada ao contexto escolar, a hipertextualidade funciona como “[...] ambiente de construção de novas identidades docentes”, e que a “[...] materialidade digital gera uma velocidade nunca imaginada na produção e na circulação de informações, materialidade essa construída para a interatividade”.

Sendo, pois, a internet uma “alavanca de transformação social” encontra eco na educação, mais precisamente na escola, onde seus atores, professores e estudantes, diante das mudanças advindas dos usos das TICs, buscam uma posição e outras posturas, onde relações diferenciadas poderão ser assumidas, conforme afirma Silva (2003, p. 56):

O professor para além do apresentador de conhecimentos pode tornar-se o provocador do conhecimento [...] formulador de problemas, proponente de situações, arquiteto de percursos, mobilizador de inteligências múltiplas e coletivas na construção de conhecimentos. O aprendiz experimenta a criação do conhecimento quando participa interferindo, agregando e modificando. [...] deixa o lugar de recepção passiva de onde ouve e olha, copia e presta contas para se envolver com a proposição do professor e/ou de outro aprendiz.

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Uma educação pautada na liberdade para construir conhecimentos, na autonomia dos sujeitos, na utilização das múltiplas possibilidades de atuação para solucionar problemas, na interatividade, pode ser um dos caminhos para a garantia da inclusão sociodigital dos indivíduos no mundo.

A educação que inclui sociodigitalmente requer uma mudança de paradigma, uma organização que garanta de fato a operacionalização dessas ideias. Nesse sentido, Silva (2003, p. 56) ao aprofundar o conceito de interatividade, propõe que um curso, para ser de fato interativo, deve buscar a garantia de três aspectos essenciais: “[...] a participação colaborativa, a bidirecionalidade e dialógica e, conexões em teias abertas”.

Pensando esse formato para o curso de formação de alfabetizadores, os três aspectos poderiam ser tomados como base para o planejamento do curso, para sua execução e avaliação, transformados em princípios, teríamos as seguintes orientações.

Primeira, quanto à participação colaborativa: “[...] participar não é apenas responder sim ou não, prestar contas ou escolher uma opção dada, mas significa intervenção na mensagem como co-criação da emissão e da recepção” (SILVA, 2003, p. 56.). Os alfabetizadores como co-criadores poderiam intervir na definição dos conteúdos do curso, apontando suas dificuldades pedagógicas para alfabetizar, seus conceitos de alfabetização, relatando suas formas de ensinar.

Segunda orientação, ou seja, quanto à bidirecionalidade dialógica: “[...] a comunicação é produção conjunta da emissão e da recepção, os dois pólos codificam e decodificam” (SILVA, 2003, p. 56). De forma articulada, os coordenadores, professores formadores, professores alfabetizadores e alfabetizandos, numa comunicação multidirecional realizariam as trocas de saberes em rede, a fim de fortalecer suas ações no desenvolvimento dos

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seus papéis, na perspectiva de que suas funções possam convergir para um objetivo a inclusão social dos sujeitos através do processo de letramento.

A terceira orientação ou princípio poderia ser assim enunciado: “[...] a comunicação supõe múltiplas redes articulatórias de conexões e liberdades de trocas, associações e significações” (SILVA, 2003, p. 56). A Alfabetização de Jovens e Adultos neste sentido, deve ser compreendida como um processo de letramento, onde, os mais importantes nesse contexto não são: o método, o conteúdo ou o material a ser utilizado para alfabetizar, mas sim, a conquista da autonomia do cidadão que empoderado, percebe-se capaz de construir saberes e de utilizar esses saberes na sua vida cotidiana e na busca da transformação sua realidade.

Portanto, um curso de formação de alfabetizadores, pautado nos princípios acima descritos vem reiterar que a educação se dá em todos os lugares e, sob a influência das mais variadas tecnologias de informação e comunicação sejam elas: sociais, culturais e digitais, na qual a leitura é compreendida como ato individual e coletivo de interpretação e a escrita como forma de expressão livre do pensamento para ser socializada ou simplesmente guardada. Nesse contexto, o papel do alfabetizador alterna-se, hora como desafiador e mediador, hora como observador das construções dos alfabetizandos, mas, sempre como leitor e escritor que tem o compromisso de incluí-los sociodigitalmente no mundo contemporâneo.

A sociedade atual está marcada por um processo civilizatório de mudanças e, como escreve Freire (1996, p. 99):

Nem somos, mulheres e homens, seres simplesmen-te determinados nem tampouco livres de condicio-namentos genéticos, culturais, sociais, históricos, de classe, de gênero, que nos marcam e a que nos achamos referidos.

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Para compreender melhor como alfabetizadores e alfabetizandos percebem-se os principais atores do processo formativo em EJA, e enquanto membros efetivos de uma sociedade desigual e excludente, é que trilhamos metodologicamente um estudo de caso, para verificarmos no interior de uma política pública de alfabetização de Jovens e Adultos na Bahia, como se efetiva tal política e quais as relações desta com as TICs e a inclusão digital.

Percorrendo a Trilha Metodológica da Pesquisa

A origem da pesquisa deu-se a partir da análise crítica do Programa TOPA — Todos pela Alfabetização — quanto às questões relacionadas às estratégias ou ações implementadas; às políticas de formação do professor alfabetizador e a própria gestão do Programa no âmbito da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).

Essa investigação teve como principal objetivo identificar possibilidades e limites do Programa Topa enquanto política pública do Estado da Bahia, verificando como acontece a formação de professores alfabetizadores e de que forma estes têm conduzido o processo educativo dos sujeitos jovens e adultos no contexto das tecnologias de informação e comunicação.

Buscou-se como opção metodológica a abordagem qualitativa na perspectiva de compreender as possibilidades de articulação entre os atos de ler e escrever e a inclusão sociodigital dos alfabetizandos. Tal abordagem não tem a pretensão de alcançar a verdade, apenas tenta compreender a lógica que permeia, na realidade, as práticas desses alfabetizadores (MINAYO, 2004).

A análise qualitativa ancorou-se na escolha do universo amostral com critérios distintos da metodologia quantitativa (representatividade

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estatística). Por esse motivo, procurou-se privilegiar a escolha de sujeitos que pudessem elucidar a problemática levantada, ajudando-a a compreender melhor o objeto em estudo.

Os sujeitos desta investigação, foram escolhidos pela facilidade de acesso aos alfabetizadores, pela necessidade de verificar através da opinião dos mesmos qual a efetiva contribuição do programa TOPA em sua formação docente e, principalmente porque boa parte do processo de alfabetização e inclusão dos alfabetizandos traduz-se pelo trabalho pedagógico desenvolvido.

Os sujeitos da pesquisa foram os 116 alfabetizadores de 20 turmas do Programa Topa, entrevistados através do preenchimento de questionário contendo questões objetivas e subjetivas, ou seja, abertas e fechadas aplicadas nos municípios de: Capim Grosso, Contendas do Sincorá, Juazeiro, Santo Sé, Rio Real,Valença,Juazeiro, Casanova, Santa Maria da Vitória, Sta Rita de Cássia, Barreiras, Riachão das Neves, São Desidério, Brejolândia, Cotegipe, Baianópolis e Formosa do Rio Preto.

Tratamento e Análise dos dados

Para responder as indagações sobre os limites e as possibilidades do Programa TOPA, sobre quem são os alfabetizadores do programa e como estes compreendem sua relevância para a inclusão sociodigital dos alfabetizandos, e sobre quais as estratégias ou ações que estão sendo implementadas para melhorá-lo, foi aplicado um questionário com questões fechadas organizadas em dois grandes blocos: um para traçar o perfil dos alfabetizadores e outro para coletar as opiniões dos mesmos acerca do Programa TOPA.

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No grupo 01, foram organizadas questões para caracterizar o perfil dos sujeitos a saber: idade, sexo, nível de escolaridade, tempo de experiência na alfabetização e na docência, os cursos que participou e os equipamentos de tecnologias de comunicaçao que utilizam diariamente.

No grupo 02, foram organizadas questões referentes à opinião dos entrevistados acerca do Programa TOPA. Essas questões foram reagrupadas em cinco subgrupos:

• Subgrupo 1 - As perguntas3 foram elaboradas para verificar como os sujeitos percebem o programa no que tange à formação de alfabetizadores para inclusão sociodigital dos alfabetizadores;

• Subgrupo 2 - As perguntas induzem à verificação do papel da Universidade na formação docente, na articulação institucional e na interação com a comunidade externa;

• Subgrupo 3 - As perguntas foram pensadas para esclarecimentos acerca do processo de formação de professores quanto aos conteúdos trabalhados no curso para a inserção do método Paulo Freire, contemplando a articulação entre teoria e prática, metodologia dinâmica e criativa do trabalho do alfabetizador, objetivo esse relacionado com a leitura e escrita;

• Subgrupo 4 - As questões desse subgrupo referem-se à visão sistêmica do programa no que concerne à sua gestão e avaliação;

• Subgrupo 5 - uma questão apenas foi inserida para repensar o lugar das tecnologias de comunicação e informação na formação

3 As perguntas relacionadas com o Subgrupo 1 são as de nos 01, 02, 04, 05, 11, 12 e 13; as relacionadas com o Subgrupo 02 são as de nos 03, 06, 07 e 10. As referentes aos Subgrupos 03 e 04 são, respectivamente, 08, 09, 15, 17 e 18 e 14 e 16. O Subgrupo 05 ficou com a questão 08.

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do alfabetizador enquanto docente que pode contribuir também para a inclusão sociocultural e digital dos sujeitos.

Vale destacar que os instrumentos foram aplicados com o auxílio dos professores formadores do programa que ministraram o curso de 60 horas presenciais, para os docentes alfabetizadores.

A escolha pela aplicação de questionário4 enquanto instrumento de coleta de dados deu-se pela necessidade de organização de questões objetivas que pudessem traduzir a realidade do TOPA e obter respostas que pudessem melhor expressar o perfil dos pesquisados e as opiniões acerca do referido programa.

Para tabulação dos dados dos grupos 1 e 2, foi utilizado o Sistema SPSS , um software estatístico com interface de fácil manuseio, muito utilizado atualmente para organização de dados de pesquisa em ciências humanas por oferecer a possibilidade de gerenciamento, cruzamento e avaliação dos dados, otimizando a visualização geral e detalhada das respostas.

Posteriormente, foram utilizados os relatórios de atividades, documentos do arquivo do Núcleo de Educação de Jovens e Adultos, como instrumentos para análise com o objetivo de contextualizar a fala dos sujeitos: docentes coordenadores de núcleos/formadores e alfabetizadores.

O material coletado foi organizado em dois grupos: o primeiro com as falas dos professores formadores sobre suas trajetórias de vida e profissional na área de EJA e alfabetização, avaliação do curso de formação de alfabetizadores, avaliação do programa TOPA e o segundo

4 O referido questionário utilizou a escala Likert de 1 a 7, num continum de respostas variáveis de ‘discordo totalmente’ iniciando do numero 1 com intervalo de 2 a 6, a ‘concordo totalmente’ finalizando com o numero 7.

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grupo, voltado para as falas dos professores alfabetizadores, sobre as dificuldades encontradas para alfabetizar, avaliação do curso de formação de alfabetizadores e avaliação do programa TOPA.

A contextualização da fala dos sujeitos tanto nos questionários do grupo II que trata das opiniões dos mesmos sobre o Programa TOPA, como nos relatórios acima mencionados, implicou na necessidade de se utilizar a análise de conteúdo de Bardin (2009, p.11), tendo em vista que essa técnica representa um esforço de interpretação que:

Oscila entre o rigor da objetividade e a fecundidade da subjetividade. Absolve e cauciona o investigador por esta atração pelo escondido, o latente, o não aparente, o potencial do inédito (do não – dito) retido por qualquer mensagem.

A leitura dessa técnica não se restringe apenas à uma leitura “ao pé da letra” mas, levar em consideração as mensagens de forma mais ampla: o emissor, seu conteúdo e os efeitos/sentidos da mensagem.

Foram definidas três etapas fundamentais: 1. Análise prévia do material (pré-análise com base nos questionários aplicados e nos relatos dos professores formadores (PF) e professores alfabetizadores (PA); 2. Análise do material realizando uma exploração flutuante sobre os depoimentos e 3. inferências para interpretação das falas a partir das categorias de análise. Nesse sentido, no grupo II definiram-se as seguintes categorias :1. formação de alfabetizadores; 2. articulação universidade X comunidade 3. gestão e avaliação do programa; 4. Alfabetização e letramento e 5 inclusão sócio-digital/contribuições das TIC.

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resultados

O caminho trilhado para chegar aos resultados do estudo sobre o Programa TOPA/UNEB e a formação de professores alfabetizadores quanto às possibilidades de inserção das TIC na alfabetização de jovens e adultos na Bahia, representou um caminho ao mesmo tempo prazeroso e árduo, desafiador e instigante, comprometido e técnico.

O prazer foi encontrado no resgate histórico da vida profissional de professores alfabetizadores e formadores, em sua maioria mulheres que, com garra e coragem, educam outros homens e mulheres na certeza de que através da educação se constrói um mundo melhor.

Essa imersão nas falas dos sujeitos levou-me a concluir que nossas vidas são entrelaçadas por saberes do cotidiano agregados aos saberes das ciências e aos saberes tecnológicos, que imprimem nossas marcas em tudo que pensamos ou produzimos. Aos poucos, vamos tecendo redes de relacionamentos e de conhecimentos e, nesse emaranhado, nos constituímos como sujeitos históricos, políticos, comunicativos e, portanto críticos – reflexivos e capazes de ensinar e aprender. A pesquisa constituiu-se em um trabalho árduo, no debruçar-me sobre os livros, no resgatar saberes dos inúmeros teóricos há tempos já lidos e nos atuais, para ressignificar conceitos e teorizar práticas. Nesse garimpo, o olhar construído sobre políticas públicas, formação de professores, alfabetização e letramento e também sobre as TICs como instrumentos para a inclusão sociodigital dos sujeitos, foi alterado significativamente.

Ressalto que é preciso compreender as políticas públicas como decisões que não resultam apenas da vontade ou das demandas sociais do povo, mas, que tais políticas dependem das relações de poder estabelecidas pela economia, por grupos políticos ou por classes sociais, e, ainda,

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que estas encontrarem-se fortemente ancoradas no contexto histórico, conforme defende Boneti (2006). Para efetivamente intervir nas políticas públicas, os principais sujeitos poderiam participar efetivamente se fossem considerados “protagônicos”, conforme a abordagem de Brandão (2008). E se tal protagonismo fosse sustentado por uma participação dos sujeitos como co-criadores conforme afirma Silva (2003).

Nessa lógica, pesquisar o Programa TOPA foi desafiador, uma vez que ao adentrar os meandros das políticas públicas desenvolvidas pela SEC-BA em parceria com as Universidades públicas, tive que manter uma postura impessoal de pesquisadora, para realizar um olhar como membro externo do objeto pesquisado, devido a minha condição de Pró-Reitora de Extensão que, cotidianamente, encontra-se às voltas com os documentos, relatórios e negociações junto à SEC para implementação do Programa. Daí a responsabilidade de encontrar subsídios nos documentos oficiais e nos registros das falas dos sujeitos para ter o respaldo necessário no percurso metodológico.

O Programa se caracteriza pela busca do “desenvolvimento da leitura e escrita daqueles que estiveram excluídos do mundo letrado” com o objetivo de “diminuir os índices quantitativos de analfabetismo e de despertar a necessidade de escolarização dos sujeitos” (BAHIA, 2007, p. 2). Com tal objetivo amplo e complexo, foi instigante poder situar o Programa TOPA no contexto histórico em que foi elaborado, implementado e, principalmente, verificar quais as forças sociais e políticas que o conduzem.

Dessa forma, inicialmente pautando-me nas técnicas de pesquisa quantitativa, busquei a utilização dos instrumentos de coleta de informações como aplicação de questionários. Em seguida busquei aprimorar o aprofundamento da questão através da pesquisa qualitativa realizando um estudo de caso a partir da utilização dos relatos dos sujeitos da pesquisa

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(professores alfabetizadores e professores formadores) e análise dos documentos disponibilizados pelo Núcleo de Educação de Jovens e Adultos – NEJA da Pró-Reitoria de Extensão - PROEX da Universidade do Estado da Bahia (UNEB, 2008); registros e documentos por meio dos quais pude tecer algumas conclusões comprometidas com os resultados alcançados quanto ao perfil dos alfabetizadores, à gestão do programa e ao processo de formação dos professores alfabetizadores.

Quanto ao perfil dos alfabetizadores, entrevistados, na amostra de 116 docentes, observou-se que são em sua maioria mulheres, concluintes do ensino médio (65%), com menos de três anos em classe, embora com experiência em alfabetização (61,21%) e com pouca vivência em cursos de formação na área das novas tecnologias (30,17%). Dados que nos leva a afirmar que é necessário um maior investimento nesses profissionais para que estes possam cumprir adequadamente com o seu papel de preparar outros sujeitos para o mundo letrado.

Quanto à gestão do programa, podemos concluir que a forma de organização encontrada pela UNEB para atender a demanda do Programa TOPA em todo o Estado da Bahia pressupõe a definição de papéis e a articulação entre os diversos atores (coordenadores, supervisores, formadores, monitores), a fim de cumprir com os objetivos de formar alfabetizadores, acompanhar e avaliar as ações do programa e que o sucesso dessa gestão está intimamente vinculado ao engajamento das pessoas que compõem a equipe e o desenvolvimento coerente de suas funções.

Quanto ao processo de formação de alfabetizadores, concluímos diante do perfil dos sujeitos (professores alfabetizadores) que a carga horária estabelecida pelo MEC por meio do Programa Brasil Alfabetizado com uma carga horária de 60 horas para formação inicial e continuada, é insuficiente, pois, o aprofundamento dos conteúdos propostos pelo Programa TOPA,

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que toma como base os conceitos de Freire (1996), Ferreiro e Teberosky (1985) e Soares (1998) de Alfabetização e Letramento, requerem uma postura de estudo contínuo e uma imersão teórica profunda e detalhada com vistas à construção de uma metodologia para alfabetizar mais próxima das demandas educacionais do contexto em que os alfabetizandos estão inseridos.

Mesmo diante dos relatos dos alfabetizadores a respeito das deficiências de infraestrutura do Programa, como a falta de material didático, de óculos para jovens e adultos, dentre outras demandas, há que se considerar também as dificuldades de transpor para a prática diária dos conhecimentos difundidos nos cursos de formação.

Os resultados apontaram, ainda, para uma inclusão sociodigital dos alfabetizandos e para a necessidade de implementar ações que voltem-se também para o uso das Tecnologias de Informação e Comunicação no contexto da alfabetização. Os alfabetizadores consideram importante a evolução da sociedade contemporânea e a necessidade de incluir os alfabetizandos também na era digital.

Acredito que é na crise paradigmática provocada pela produção de novos instrumentos tecnológicos que se buscam caminhos para a educação enquanto um processo eminentemente de comunicação. E que tal comunicação deve respeitar a nova estrutura de rede onde os diversos pontos de convergência são inicio e fim das trocas de saberes. Nesse contexto da cibercultura, professores, estudantes, outros atores sociais, são mediados pelas informações disponíveis e, ao tratá-las, transformam seus saberes, transformam seus textos, transformam, enfim, o próprio mundo.

Face ao exposto, acredito na potencialidade do docente como sujeito que articula o conhecimento da experiência e o conhecimento teórico e que encoraja também os estudantes em seu processo educativo a articularem

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seus conhecimentos de vida com os conhecimentos científicos produzidos pela humanidade.

Defendo a ideia de que a inclusão sócio-digital dos cidadãos, aqui entendida como a democratização do acesso dos homens e mulheres aos bens materiais e imateriais produzidos ao longo da história da sociedade, incluindo-se neste campo os bens das tecnologias digitais, não necessariamente se dá pela implementação de políticas públicas elaboradas em gabinetes ou por grupos isolados, mas sim pelo processo educativo escolar e extramuros.

Para incluir sociodigitalmente os homens, a universidade e a escola desempenham papéis fundamentais por representarem um dos lócus de produção e socialização dos saberes e por disporem de espaço e tempo organizados para tal inclusão, mas, principalmente, por estarem inseridos nas discussões como propositoras e executoras dessa nova “política”.

A universidade, mais especificamente, possui, ainda, outra responsabilidade, a de integrar as pesquisas realizadas ao ensino de graduação e a extensão, tripé acadêmico que deve garantir a excelência acadêmica e, consequentemente, dar retorno à sociedade quanto ao atendimento de suas demandas.

Penso que os índices de analfabetismos na Bahia, retratados nessa pesquisa, encontram no percurso da história da educação brasileira as respostas para sua justificativa, embora seja necessário considerar que as alternativas até então encontradas para minimizar esse quadro de desigualdade e exclusão social não atendem a proporção esperada, ou seja, a de um dia podermos conviver com uma sociedade eminentemente letrada, na perspectiva do letramento defendida por Souza (2001), ou seja, com pessoas que possam utilizar sua condição humana para interagir com diferentes portadores e gêneros textuais em suas práticas sociais, enfim,

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que possam, parafraseando Freire (1987), articular a leitura dos diferentes mundos com a leitura e escrita das palavras.

E o diálogo continua, porque é necessário a realização de novas pesquisas que apontem para aprimoramento do conceito de inclusão sociodigital e para a verificação dos resultados do processo de alfabetização na vida e no trabalho dos sujeitos jovens e adultos.

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PARTE II

FORMAçãO Online

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Formação Online de Educadores: uma proposta dialógica1

 

Lucila Pesce (UNIFESP)

 Introdução

 Para pensarmos na formação online de educadores é necessário

pensarmos nos desenhos didáticos de cursos online. Em concordância com Marco Silva (2008), sinalizamos que, grosso modo, os desenhos didáticos de cursos online tendem a abarcar três dimensões: conteúdos de aprendizagem, propostas de atividades e atuação nas interfaces. Este entendimento do pesquisador invita-nos a considerar que pensar nos desenhos didáticos de cursos online implica, necessariamente, pensar na relação dialética entre três elementos: fundamentos, organização e docência.

Em relação aos fundamentos do desenho didático de cursos online, é basilar que voltemos nosso olhar para as vertentes curriculares tradicionais (TYLER, 1974) e críticas – estas últimas sob enfoque culturalista (MOREIRA, 1999; SILVA, 2000) – reconhecendo-se as distintas vertentes críticas, tais como a reprodutivista (ALTHUSSER, 1983; BOURDIEU;

1 O presente texto foi escrito para a mesa redonda “Docência online: pressupostos, interfaces e mediações”, do II Simpósio Mídia-Educação (UNEB, 2009). Seu conteúdo pauta-se na discussão de dois outros artigos publicados em Pesce (2008a,b).

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PASSERON, 1975) e a neomarxista (APPLE, 2002; GIROUX, 1997). O estudo das concepções curriculares adquire sentido, em relação ao nosso objeto de investigação, na reflexão de como elas se materializam nos desenhos didáticos de cursos online.

No tocante à organização, uma questão que se impõe aos desenhos didáticos dos cursos online são os limites e as possibilidades do meio digital. Ao considerarmos que tais circunstâncias situam-se como instâncias primordiais aos meios de objetivação do desenho didático de um curso online, é capital que levemos em consideração recursos interativos como wikipedia, blog, webconference, fórum, chat, portfólios, dentre outros.

No contexto da organização, em concordância com Corazza (1997) – para quem o planejamento de ensino situa-se como estratégia de política cultural – entendemos (assim como LIBÂNEO, 1994; TURRA, 2005) que o planejamento enraíza-se em uma dada concepção curricular. Com Arnold (2003) e Palloff e Pratt (2002), anunciamos que o planejamento de cursos online, além de se ancorar em uma dada concepção curricular, abarca um trabalho coletivo que se erige no imbricar de distintas áreas, tais como educação, comunicação, tecnologia da informação (TI) e áreas específicas ao conteúdo veiculado no curso.

Na docência online, as principais implicações dos desenhos didáticos costumam centrar-se nas ações de tutoria e avaliação. Pensar na natureza singular da docência online e na sua relação com o desenho didático implica abordar temas como as especificidades do meio, notadamente as formas de comunicação, a partir de três determinantes circunstanciais: as interações nos ambientes de rede, a temporalidade inerente à aprendizagem em tais ambientes e os processos de acompanhamento e avaliação da aprendizagem.

Como podemos observar, pensar nos princípios que balizam os desenhos didáticos de cursos online é pensar na orquestração harmoniosa

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dos aludidos elementos. Contudo, não pretendemos nos debruçar sobre o conjunto dos elementos que perpassam a complexidade dos desenhos didáticos de cursos online. Faremos um recorte específico nos desdobramentos dos desenhos didáticos dos cursos online sobre os processos de formação online de educadores. Para tanto, é imperiosos desvelar os três conceitos que balizam a nossa proposta dialógica: agir comunicativo habermasiano, interação dialógica freireana e dialogia bakhtiniana.

 Agir comunicativo habermasiano

 Herdeiro da Escola de Frankfurt, Habermas (2002, 2003) busca

uma alternativa aos impasses das sociedades contemporâneas, mediante a elaboração da Teoria da Ação Comunicativa, a qual se baseia no conceito de razão comunicativa e se ergue em meio a distintas fontes teóricas. Propõe-se a contribuir para a reconstrução do projeto social fundamentado no cultivo da razão comunicativa, tendo em vista a fecundidade da linguagem para a autorreflexão e para o entendimento mútuo.

O filósofo situa a razão comunicativa como opositora da razão instrumental (calcada no sujeito egologicamente constituído), na medida em que se efetiva na materialidade histórica do contexto social e se manifesta nas relações cotidianas, mediante o agir comunicativo. Diferencia os tipos de ação social em dois níveis paradoxais. De um lado, o agir estratégico, orientado pela lógica instrumental e voltado ao sucesso e aos fins de controle e dominação. De outro, o agir comunicativo fundamentado na intersubjetividade do entendimento linguístico e voltado à emancipação humana.

Para o estudioso, a razão instrumental faz com que a linguagem habite a periferia do mundo do sistema, cedendo espaço para a ação instrumental.

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Em meio a tal expansão, a razão comunicativa acaba por se restringir ao mundo da vida: o pano de fundo das manifestações culturais. Habermas consolida a ideia de que as sociedades modernas se encontram em estado de mal-estar, pela distorcida relação entre sistema e mundo da vida. A partir de tal constatação, aponta que as sociedades modernas necessitam descolonizar o mundo da vida (Lebenswelt) da razão instrumental, a qual se ergue em meio à penetração controladora de mecanismos de integração sistêmica (como o dinheiro e o poder) nas instituições culturais.

Em contraposição à instrumentalização das ações sociais, no agir comunicativo, a comunicação intersubjetiva contribui com a produção de uma vida social solidária, dialógica, ética e emancipada. Nesse contexto, a linguagem situa-se como medium regulador do entendimento mútuo e se consubstancia como forma de ação social, para além da mera representação de mundo. Enquanto ação social, o agir comunicativo busca sua criticidade em meio a procedimentos argumentativos. Nesse movimento, reveste-se da capacidade de problematizar as sociedades contemporâneas, situando-se como elemento fundante no processo de emancipação humana.

O filósofo destaca que o processo comunicativo é coordenado pela linguagem, em especial pelos atos de fala. Na perspectiva do agir comunicativo, a busca de consenso parte de uma base argumentativa da comunidade comunicacional. Somente nesse contexto intersubjetivo e provisório é que o consenso pode ser concebido.

Outro aspecto que se revela ao estudioso é o papel das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) nos atuais processos de organização societária. No texto O Caos da Esfera Pública, Habermas (2006), ao discutir o papel do intelectual nas sociedades contemporâneas, sinaliza a forma como este sujeito social tem se relacionado com as TIC. Ao fazê-lo, percebe as contradições inerentes a tal instrumental. Por um lado, a ampliação da esfera

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pública midiática, a condensação das redes de comunicação e o aumento do igualitarismo. Por outro, a descentralização dos acessos à informação e a fragmentação dos nexos de comunicação. Como consequência, outra tensão: em um turno, a subversão positiva em regimes totalitários; em outro, o enfraquecimento das conquistas das esferas públicas tradicionais, em meio ao anonimato e à dispersão de informações.

Ancorado na perspectiva praxiológica e nas relações intersubjetivas mediatizadas pela linguagem, o agir comunicativo oferece amplas oportunidades para avaliar o modus operandi das sociedades contemporâneas, podendo vir a lhe auferir maior emancipação.

A incursão de Habermas aos estudos linguísticos para a elaboração da Teoria da Ação Comunicativa evidencia sua positividade, ao buscar brechas para uma nova forma de organização social, mais solidária e emancipadora, embasada no entendimento mútuo. Habermas entende que a razão comunicativa ainda sobrevive nas práticas cotidianas. Ergue-se em meio à lógica pragmática argumentativa, expressa pela compreensão descentralizada do mundo. Em tal movimento, a contribuição fecunda para que o mundo da vida seja descolonizado pelo sistema. Ao considerar essa perspectiva evolutiva, Habermas concebe a possibilidade de o agir estratégico ceder espaço para o agir comunicativo, no evolutivo processo de descentração das sociedades contemporâneas.

O projeto crítico e emancipado de Habermas para a superação das patologias das atuais sociedades capitalistas prevê a descolonização do mundo da vida, privilegiando-o sobre o mundo do sistema. A crítica habermasiana à racionalidade instrumental fundamentada no agir comunicativo situa-se como rico manancial às discussões educacionais. A positividade da teoria habermasiana supõe a reconstelação de novos modelos socioculturais, embasados em um conceito amplo de racionalidade, que

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parte do paradigma da consciência e prossegue em direção ao paradigma da comunicação.

 dialogia bakhtiniana

 Bakhtin adentra o terreno das investigações de caráter pragmático,

notadamente no tocante à filosofia da linguagem compromissada com suas angústias políticas e éticas. Ao fazê-lo, expande suas preocupações linguísticas e volta-se à linguagem como prática social. Desse modo aufere valor à enunciação, à interação verbal dos sujeitos sociais, ao contexto de produção dos discursos, enfim, às questões linguísticas atinentes ao cotidiano, pano de fundo da constituição da consciência humana.

No livro Marxismo e Filosofia da Linguagem (BAKHTIN, 1997a) sobressaem-se dois temas: o papel dos signos no pensamento humano e o papel da elocução na linguagem, de modo a anunciar o papel da linguagem enquanto instância constituinte dos sujeitos sociais. Bakhtin sinaliza a linguagem como campo eminentemente ideológico; daí sua relevância à formação da consciência humana. A constatação de que os seres humanos são historicamente datados embasa o entendimento bakhtiniano de que eles se constituem mutuamente, por meio da linguagem e dos históricos processos de interação social, nos quais se engendram negociações de sentido.

Para Bakhtin, a consciência dos sujeitos sociais e a construção dos significados que a ensejam erguem-se em meio à alternância do diálogo. A palavra consubstancia-se como produto da interação entre locutor e ouvinte, os quais alteram seus papéis, no inconcluso diálogo da vida. Para o linguista, a palavra é o locus no qual a força social encontra sua maior expressão.

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Preocupado com a relevância do contexto histórico-cultural à formação dos processos mentais, Bakhtin debruça-se sobre o conceito de dialogia (1997b). Ao fazê-lo, preconiza o diálogo entre os homens como objetivo a ser atingido, em face do contexto de incomunicabilidade presente em nossa época. Postula que a competência linguística dos sujeitos ergue-se em meio às ações recíprocas de uns sobre outros, diretamente ou mediado por objetos ou signos. O linguista concebe dialogia como um profícuo cenário de contradições entre distintas vozes, no qual se explicita o contexto ideológico dos falantes. Ao fazê-lo, releva o valor da linguagem à elaboração e explicitação do contexto ideológico.

Ao esclarecer que o conhecimento é construído na interação do sujeito com o objeto e do sujeito com outros sujeitos, Bakhtin avança para a concepção de sujeito interativo. Denuncia a característica sócio-ideológica da língua existente na dialética relação entre os sistemas da língua e seus enunciadores e conjuga as funções linguísticas de reprodução e reconstrução de mundo. Tal condição situa as preocupações de Bakhtin no contexto das relações sociais, em que os falantes assumem-se como sujeitos sociais.

Ancorado em uma concepção materialista-histórica, Bakhtin esclarece que o sujeito é individual e socialmente constituído. O sujeito bakhtiniano é um ser corporificado no cotidiano, na enunciação, na dialogia. Sujeito social e culturalmente situado em sua concretude histórica.

O conceito bakhtiniano de dialogia (BAKHTIN, 1997b) percebe o quanto o individual e o social engendram-se mutuamente, a ponto de a cultura tornar-se parte de natureza intrínseca do ser humano. Na visão dialógica, a diversidade ocorrente na complexidade da existência humana também é outro ponto de atenção da abordagem bakhtiniana, a qual percebe a unidade do mundo nas múltiplas vozes e nos múltiplos significados que participam do diálogo da vida. A palavra é concebida como

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elemento fundante na convivência com o outro, manifestada e edificada pela linguagem. Na acepção bakhtiniana, a interação verbal está sempre eivada do locus social no qual se realiza, sendo constitutiva dos sujeitos e da linguagem por eles veiculada. A consciência dos sujeitos ergue-se em meio aos signos internalizados, os quais são cunhados pelo trabalho social, histórico e ideológico. Nessa dialética relação, a dialogia ergue-se como elemento fundante da constituição mútua dos sujeitos sociais.

Cada fala insere-se na infinita cadeia de enunciados, respondendo, pelas contra-palavras, questões anteriores e prevendo interpretações. Tal dinâmica aponta o inacabamento da linguagem, justamente por ser utilizada pelos sujeitos, os quais se constituem nos processos linguísticos históricos e interativos. A dialogia bakhtiniana foca sua atenção na dimensão reconstrutora da linguagem; dimensão esta que vive nas interações de seus enunciadores.

O estudioso releva o valor da elocução ao desenvolvimento do sujeito social, nela incluindo a veiculação ideológica. Para Bakhtin, o enunciado não é determinado pela língua, como sistema puramente linguístico, mas pelas interações dos enunciadores. Nessa perspectiva, o fluxo da interação verbal é de fundamental importância à dimensão sócio-ideológica da linguagem. Para o estudioso, só há sentido no estudo da língua, se concebida no fluxo de comunicação verbal.

A constituição social do sujeito o compreende na sua relação com o outro, diretamente ou mediada pelos signos. Dialogia, polifonia e polissemia são elementos fundantes na teoria bakhtiniana, a qual situa a interação verbal como locus primeiro da produção de linguagem e ideologia. Bakhtin defende uma interação horizontal, em oposição à interação diretiva de um sujeito sobre o outro.

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Uma breve incursão junto ao conceito bakhtiniano de dialogia permite que desvelemos a positividade de suas proposições, em face das esferas constituintes dos sujeitos sociais. A dimensão dialógica bakhtiniana exprime o caráter inovador da sua racionalidade. A fecundidade da sua teoria linguística releva-se socialmente, na medida em que fornece elementos para situarmos a linguagem no bojo das ações compromissadas com a constituição de seres humanos. Em tais ações, a solidariedade, a conscientização, a emancipação, enfim, a humanização. Em linha semelhante, apresenta-se o conceito de interação dialógica freireana.

 Interação dialógica freireana

 A visão dialética de Freire, tendo como premissa a utopia inerente a

todo e qualquer projeto social emancipador, parte da concretude histórica dos excluídos, dos desumanizados pela dinâmica societária do capitalismo tardio, para problematizar o mundo em que estão inseridos. De que modo? Mediante o estabelecimento de uma relação dialógica, crítica, transformadora, aberta à alteridade e ao novo.

Freire elabora seu discurso calcado na transcendente natureza humana, a qual se expressa, em devir, em sua inconclusão, à busca de constante superação. A ciência de que a constituição humana ergue-se em meio à sua historicidade, na qual são engendradas circunstâncias socioculturais, é elemento fundante na cosmovisão freireana. Em tais circunstâncias, a relevância auferida ao diálogo. A atitude praxiológica de proporcionar aos sujeitos sociais, sobretudo aos oprimidos, uma tomada de consciência mediante interações dialógicas mobilizadoras de constante reflexão sobre a realidade concreta que os entorna consubstancia-se como o

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bojo da proposta educacional freireana. O diálogo freireano situa-se como instrumento capital à conscientização e emancipação.

Freire contrapõe-se a todo e qualquer projeto societário que se oponha à humanização e que, ao contrário, trabalhe em favor da coisificação do homem. Nessa denúncia é que o autor cunha, no livro Pedagogia do Oprimido, o termo “educação bancária”, como metáfora de uma vertente educacional alienante (FREIRE, 2002). Ao refutar a educação bancária, Freire propõe a educação libertadora como contribuinte aos projetos educacional e social emancipadores, nos quais os aprendizes compreendem o mundo como realidade em transformação, em processo. Ao fazê-lo, salienta a importância de a intervenção pedagógica ocorrer em contexto dialógico, a partir do tema gerador emergente do mundo vivido do educando.

Freire destaca a dialética relação da educação, como toda e qualquer instância social desenvolvida no seio do sistema capitalista: reproduz o modus vivendi ou o reconstrói, a depender do enfoque que se dê. Ao distinguir a dialética relação de emancipação e subordinação que os seres humanos podem estabelecer com as TIC (FREIRE, 1997), de modo a humanizá-los ou a coisificá-los, o estudioso vai à contramão do fetiche a elas auferido. Nesse movimento, ressalta a tensão e o valor relativo deste instrumental à humanização. No movimento de denúncia e superação, Freire situa a linguagem e as relações dialógicas por meio dela estabelecidas, como instrumento capital à constituição dos sujeitos sociais realizadores das circunstâncias históricas que os entornam.

A relevância auferida à linguagem como instrumento primordial à constituição dos sujeitos sociais e ao movimento dialógico à edificação legítima de relações sociais evidencia-se no conjunto de sua obra. Todavia, é no livro ‘Extensão ou Comunicação?’ que o conceito de interação

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dialógica é cunhado, com o firme intento de pensar a dialogia no contexto educacional (FREIRE, 1983). Ao fazê-lo, anuncia que o processo de constituição mútua dos sujeitos sociais em formação ocorre em meio à interação dialógica, em três instâncias: investigação temática, tematização do conhecimento articulada à realidade vivida e problematização do conhecimento. Na investigação temática, Freire esclarece que o conhecimento da visão de mundo do sujeito social em formação implica o levantamento de temas geradores de estudo. Tais temas advêm de uma metodologia dialógico-problematizadora, na qual, o formador, mediante interação dialógica, forma-se juntamente com o formando. Sobre a tematização do conhecimento articulada à realidade vivida, Freire alerta que a problematização deve ocorrer no campo da comunicação, em torno de situações reais vividas pelos sujeitos em formação. Com isso, evidencia o quanto a intervenção pedagógica deve ocorrer em meio à concretude histórica do mundo vivido dos sujeitos sociais em formação. Problematizar, no entendimento freireano, é trabalhar no pólo educacional reconstrutor; é refutar a hegemonia educacional reprodutora do modus vivendi.

A positividade de Habermas, Bakhtin e Freire frente à fecundidade da linguagem para se repensar os atuais processos societários consubstancia-se como elemento fundante, na proposição de desenhos didáticos dialógicos de cursos online, em virtude dos seus desdobramentos sobre os processos de formação online dos educadores.

 desenhos didáticos dialógicos de cursos online

 De modo geral os cursos online costumam habitar dois universos:

acadêmico e corporativo. Os cursos corporativos voltam-se ao aprimoramento profissional imediato e se dividem em dois grandes grupos,

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com primazia do primeiro sobre o segundo. Os ancorados na concepção de treinamento costumam trabalhar com a vertente educacional instrucional, embasada na transmissão de informação e se voltam ao aprimoramento profissional dos trabalhadores que lidam no plano operacional. Em geral, costumam ser cursos auto-instrucionais, que não prevêem interação e o sistema de avaliação tende a assumir a concepção somativa. A seu turno, os cursos ancorados na concepção de formação costumam trabalhar com a vertente educacional interacionista, embasada na construção sócio-histórica do conhecimento. Em geral, tais cursos apostam no uso de estratégias metodológicas que mobilizem as interações do grupo, tais como cenários, situações-problema e desenvolvimento de projetos. Seu desenho didático tende a incorporar instrumentais que propiciem ações colaborativas, como chats, fóruns de discussão e webconference, dentre outros. Tais cursos prevêem ações de tutoria e se voltam para os princípios da avaliação formativa, a qual, por assumir um caráter processual e autorregulador, costuma fazer uso de instrumentos como portfólio, diário de bordo e memorial reflexivo. Geralmente, os cursos balizados na concepção de formação encontram um campo fértil no universo acadêmico. Quando fazem parte do setor corporativo, costumam voltar-se à formação dos trabalhadores que operam no plano simbólico e, como tal, necessitam lidar com situações complexas que lhes demandam muita iniciativa, criatividade, criticidade e rapidez na tomada de decisão, dentre outras habilidades.

Tomando como base os cursos online voltados à esfera da formação e tendo como ponto de partida o intertexto teórico acima elaborado, propomos que os desenhos didáticos de tais cursos sejam pensados sob enfoque dialógico (PESCE, 2008a).

Desenhos didáticos elaborados sob enfoque dialógico recusam a perspectiva monológica, de caráter pragmático e impositivo, afeita à dimensão funcionalista, ancorada no pólo gnosiológico, que gera

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conformismo, bem como relacionamentos e processos de formação aligeirados e planificados. Ao contrário, defendem a formação em meio ao caráter relacional, afeito à dimensão culturalista, ancorado no pólo ontológico, em diálogo com o gnosiológico. Desenhos didáticos de cursos online voltados à emancipação buscam uma estrutura que propicie a leitura crítica das circunstâncias micro e macro-estruturais dos sujeitos sociais em formação; voltam-se à aproximação destes sujeitos, na mobilização de ações conjuntas de enfrentamento aos desafios que se lhes apresentam.

Desenhos didáticos dialógicos concebem a linguagem como prática social. Elaborar desenhos didáticos dialógicos é equacionar ações de formação que partam do senso comum e levem o sujeito social à consciência emancipada, sem, contudo, solapar seu tempo vivencial.

No entendimento habermasiano, os desenhos didáticos dialógicos refutam ações de formação pautadas no agir estratégico, em meio à lógica instrumental, voltada aos fins de controle e dominação. Ao contrário, buscam no agir comunicativo as bases de uma formação emancipadora: compromissada com a descolonização do mundo da vida, pelo sistema, através da relação dialógica que se erige em meio ao argumento livre de coação.

Amparados na acepção freireana, desenhos didáticos dialógicos pautam suas ações no seguinte movimento metodológico: investigação temática, tematização e problematização. Na investigação temática, a abertura à alteridade, na superação do senso comum, no diálogo profícuo com formadores teoricamente consistentes e atentos à inscrição histórica dos sujeitos sociais em formação. Desenhos didáticos que refutam a operacionalidade técnica travestida no acento ao pólo gnosiológico. Que resistem à implementação de princípios como eficiência, eficácia e produtividade, travestidos no desenvolvimento de competências e

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habilidades. Que dizem não ao atendimento massivo, que torna os cursos online economicamente viáveis. Como desdobramentos positivos, a constituição mútua dos sujeitos sociais envolvidos e a saudável orquestração das temporalidades cronológica e vivencial que constituem a formação. A investigação temática descarta a possibilidade de réplica dos materiais didáticos, sem minucioso estudo prévio. Na tematização do conhecimento, o firme intuito em uma intervenção pedagógica consistente, que amplie o repertório conceitual dos sujeitos sociais, sem, contudo, deixar de responder a concretude histórica do seu mundo da vida, mediante um diálogo profícuo do gnosiológico com o ontológico.

Na problematização do conhecimento, desenhos didáticos de formação erguidos em meio à estratégia metodológica que não se restrinja à perspectiva internalista, que desconsidera os determinantes contextuais mais amplos em que se insere o trabalho dos sujeitos sociais em formação. Na problematização, o trabalho com os fundamentos da educação percebe os conteúdos de formação como instrumentos de conscientização e emancipação. Por isso a importância de se superar o neopragmatismo imperante, com acento quase que exclusivo nas questões metodológicas e avançar para indicadores basilares, como a íntima relação entre leitura da palavra e leitura de mundo. A problematização compromissada com a formação como prática social tem como meta a formação emancipadora do sujeito social em formação, pelo compromisso com a constituição da sua identidade, no seio da sua concretude histórica. Daí a problematização consubstanciar-se como estratégia primordial à elaboração dos desenhos didáticos dialógicos dos cursos online.

Desenhos didáticos dialógicos preocupam-se com a adequada equação das temporalidades inerentes aos processos de formação, para que o tempo vivencial dos sujeitos sociais em formação não seja solapado. Para que as ações de formação contribuam com a superação do senso comum,

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é necessária a contratação de formadores cujo repertório conceitual e cuja vivência profissional os situem como educadores aptos a problematizar a realidade dos sujeitos sociais em formação, a partir da tematização teoricamente consistente e relacionada à sua concretude histórica, porque advinda da investigação temática. Para tanto, as equipes de formação devem ter um currículo diferenciado, o que implica outro patamar de remuneração e rigorosa política de seleção, que leve em conta a qualificação profissional do candidato, sua trajetória profissional e seu repertório teórico. Os formadores, por também serem chamados a pensar o desenho didático dos programas de formação desde a sua concepção, não mais procedem a intervenções pedagógicas artificiais, porque desenvolvidas a partir de um script de autoria alheia e têm autonomia sobre a temporalidade inerente à relação pedagógica constituinte dos processos de formação.

Desenhos didáticos dialógicos buscam engendrar nova sensibilidade às relações, em recusa a vínculos pedagógicos aligeirados e planificados e em favor da aproximação dos sujeitos sociais envolvidos nos processos de formação. Nesse movimento, tentam privilegiar: a) a tematização do conhecimento intimamente imbricada à concretude histórica dos sujeitos sociais; b) ações de formação com autonomia sobre o tempo de formação e, por isso, atentas ao momento mais adequado para intervir; c) a ampliação da alteridade, mediante imersão nas circunstâncias históricas dos sujeitos sociais, em diálogo com o sólido repertório conceitual dos formadores; d) a condução dos formadores para o centro do processo educativo e não somente para as periféricas ações de tutoria e avaliação.

Para verificar em que medida tais indicadores têm se materializado nos desenhos didáticos de cursos online de formação de educadores, coordenamos uma pesquisa, que se encontra em desenvolvimento no Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (TIDD - PUC/SP).

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o enfoque dialógico da pesquisa em desenvolvimento no TIdd

 Conforme apontado em estudos anteriores (PESCE, 2008b), a

pesquisa em desenvolvimento – Formação Docente e Cidadania: Utilização Dos Ambientes Virtuais de Aprendizagem sob Enfoque Dialógico – parte da ideia anunciada no Projeto Internacional Red Internacional de Ecologia de los Saberes (TORRE; MORAES, 2008), de que a formação docente precisa de uma renovação conceitual, estratégica e atitudinal. O supracitado Projeto Internacional é sediado na Universidade de Barcelona e, até agora, abarca pesquisadores vinculados a programas de pós-graduação de quatorze países.

A pesquisa vincula-se ao oitavo item do decálogo do referido projeto internacional: Proyección en las Reformas Educativas: Formar Ciudadanos en la Sociedad del Conocimiento, o qual considera que a sociedade da informação e do conhecimento está regida pelo predomínio das comunicações e que a aquisição de conhecimentos deve ocorrer intimamente articulada ao desenvolvimento de valores e atitudes  pertinentes à formação de cidadãos éticos e felizes.

Com base nos anunciados princípios da Red Internacional de Ecologia de los Saberes, a pesquisa tem como objetivo geral contribuir com o desenvolvimento e implantação de ações online de formação docente voltadas ao humanismo e à emancipação do profissional da educação básica.

Do objetivo geral decorrem os seguintes objetivos específicos:

• Aprofundar os estudos sobre a perspectiva dialógica de formação de educadores;

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• Investigar sobre o sentido e o significado da experiência de formação de educadores em ambientes digitais de aprendizagem, em distintos segmentos: educação básica, ensino superior, pós-graduação e gestão escolar;

• Discutir os resultados, à luz da abordagem dialógica de formação de educadores:

• Levantar propostas de ação, relativas aos novos rumos dos programas de formação docente, nos ambientes virtuais de aprendizagem.

A pesquisa levanta a seguinte problemática: qual a contribuição da perspectiva dialógica para o desenvolvimento e implantação de ações de formação docente desenvolvidas nos ambientes virtuais de aprendizagem, sob enfoque humanista e emancipatório?

No tocante à justificativa, do ponto de vista social, o grande contingente de educadores brasileiros, aliado às recomendações legais relativas ao aprimoramento docente, tem demandado políticas públicas voltadas à implantação de programas de educação continuada desses profissionais da educação.

Com o advento das atuais tecnologias de informação e comunicação, muitos desses programas têm percebido a contribuição dos ambientes virtuais de aprendizagem, o que justifica o aumento significativo do número de programas de formação de educadores que têm se valido do instrumental telemático. Entretanto, é preciso destacar: se a intenção é que a formação de educadores situe-se em contexto emancipador, urge uma investigação sobre as abordagens educacionais e os procedimentos metodológicos que sustentam as propostas de tais programas de formação.

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No Brasil, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores de Educação Básica, em Nível Superior, Curso de Licenciatura, de Graduação Plena (BRASIL, 2001a,b, 2002) e as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia (BRASIL, 2005) enfocam a relevância de uma formação docente que abarque a utilização crítica das tecnologias da informação e comunicação. Nesse sentido, vale ressaltar que o êxito de qualquer programa de formação de educadores desenvolvido nos ambientes virtuais de aprendizagem e que se pretenda inovador depende de distintos aspectos, em especial do desenho didático, do trabalho integrado de uma equipe multidisciplinar e da figura do mediador.

Sabe-se que as atuais políticas educacionais brasileiras anunciam a necessidade premente de investir em programas de formação docente e percebem os ambientes virtuais de aprendizagem como estratégia contribuinte a tal intento. Por outro lado, uma análise crítica de tal proposição ancora-se na percepção da necessidade de formar o trabalhador em consonância com as demandas do ideário neoliberal, de modo a inserir o Brasil de modo dependente no cenário mundial competitivo. Isso requer uma profunda modificação no modus operandi da educação brasileira. Daí a razão pela qual tem havido, por parte do Estado brasileiro, a preocupação em promover ações de formação de educadores por vezes pautadas em uma racionalidade instrumental, como quer Habermas (2003). Este cenário perverso vai de encontro à concepção educacional emancipatória e humanista defendida pela Red Internacional de Ecologia de los Saberes e pela presente pesquisa.

Em consonância com as atuais recomendações legais, o estudo situa a dimensão tecnológica como um dos aspectos da formação humanista e emancipatória de educadores. Entretanto, adverte que essa vertente de formação pode ocorrer, a depender do enfoque que se dê à utilização deste novo instrumental.

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Atento às circunstâncias históricas do profissional da educação, a pesquisa Formação Docente e Cidadania: Utilização dos Ambientes Virtuais de Aprendizagem sob Enfoque Dialógico, no que se refere ao marco teórico, busca no intertexto dos três anunciados conceitos – dialogismo bakhtiniano, agir comunicativo habermasiano e interação dialógica freireana – a construção coletiva de novas formas de sentir, pensar e atuar do docente em formação, nos ambientes virtuais de aprendizagem. Em meio às especificidades cosmovisivas de cada um dos três teóricos em discussão neste intertexto, podemos encontrar diversas ideias que se coadunam, frente à visão de homem, de sociedade e do papel da linguagem na constituição da consciência humana e na emancipação social.

Quanto ao método urge observar que a pesquisa não é neutra, objetiva, tampouco isenta de valores subjetivos. Daí a consciência de que as concepções epistemológicas, interpretativas e subjetivas do pesquisador engendram-se à sua análise (CHIZZOTTI, 1998). Em outros termos, as concepções metodológicas e ontológicas relativistas moldam a cosmovisão do pesquisador.

Partindo dessa premissa, o presente projeto de pesquisa prevê como procedimentos investigativos o desenvolvimento de:

• pesquisa bibliográfica sobre formação online de educadores,  pautada no intertexto dos três conceitos dialógicos anunciados;

• pesquisas de campo sobre o sentido e o significado da aprendizagem em ambientes virtuais, nos programas de formação de educadores. Cada uma das pesquisas de campo deverá ser desenvolvida por alunos da PUC/SP, em nível de dissertação de mestrado do Programa de Pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital;

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• pesquisa documental erguida em meio à análise comparativa dos resultados de análise das pesquisas de campo presentes nas dissertações em tela.

No tocante aos métodos e técnicas de investigação, a opção por entrevistas semiestruturadas e pela gravação objetiva deixar os sujeitos de pesquisa o mais à vontade possível, para que as representações sociais possam emergir (GUARESCHI; JOVCHELOVITCH, 1998).

Nas pesquisas de campo, as entrevistas semi-estruturadas são aplicadas aos sujeitos de pesquisa deste projeto (educadores em formação), os quais deverão comentar a experiência de aprendizagem no ambiente virtual, apontando avanços alcançados e desafios a serem vencidos.

Em relação à seleção dos sujeitos de pesquisa, ressalta-se que, de acordo com Jodelet (apud GUARESCHI; JOVCHELOVITCH, 1998, p. 120), as respostas individuais dos sujeitos de pesquisa devem ser percebidas como “manifestações de tendências do grupo de pertença ou de filiação na qual os indivíduos participam”.

No momento presente, a primeira parte, referente à pesquisa bibliográfica, encontra-se em curso. A segunda etapa da pesquisa, que abarca as pesquisas de campo, já conta com investigações de duas alunas do Programa de Tecnologia da Inteligência e Design Digital da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. A primeira pesquisa, já defendida, volta-se à formação de professores do Ensino Superior e a segunda, com defesa prevista para março de 2010, volta-se à formação de gestores escolares.

 

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Considerações finais

 O intertexto de três conceitos – agir comunicativo habermasiano,

dialogia bakhtiniana, interação dialógica freireana – respalda-nos na defesa de desenhos didáticos dialógicos de cursos online, que se pautem: a) na seleção de formadores altamente qualificados e atuantes nas capilaridades, o que significa a superação do conceito tecnicista de formação em cadeia, que cinde conceptores e tutores; b) em interações genuínas entre formando e formador, em recusa a interações artificiais, erguidas em meio a um script de autoria alheia; c) na condução autônoma da temporalidade constituinte dos processos de formação; d) na proporção adequada do número de formandos por formador, de modo a não comprometer a relação pedagógica inerente a esse processo.

As proposições iniciais aqui alinhavadas situam-se como esboço primeiro, para pensarmos os desenhos didáticos de cursos online erguidos em meio à vertente dialógica e se revelam nos princípios e pressupostos da pesquisa em desenvolvimento no Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital da Pontifícia Universidade Católica de são Paulo – Formação docente e cidadania: utilização dos ambientes virtuais de aprendizagem sob enfoque dialógico.

Acreditando que o desenho didático de cursos online tem desdobramentos diretos sobre a qualidade dos processos de formação online de educadores, convidamos você, leitor, a aprofundar conosco o diálogo na área, com vistas à elaboração de propostas coletivas de ação, no atual momento histórico.

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Formação Docente e Aprendizagens Online: reflexões sobre currículo

Maria Olivia de Matos Oliveira(UNEB)

Pedagogia Crítica e Currículo

O avanço da tecnologia, a velocidade e o fluxo de informações têm gerado mudanças significativas na dinâmica das sociedades atuais. O novo contexto socioeconômico e cultural emergente traz profundas transformações nas funções tradicionais do Estado e  (re)configura um novo modelo de sociedade e de educação que, se por um lado, apresenta avanços científicos e tecnológicos, por outro, gera desigualdades cada vez mais profundas. Santos (2001, p. 31) explica que “[...] a globalização1 traz a cognoscibilidade do planeta, possibilitando que os sujeitos conheçam de forma extensiva o mundo e aproveitem todas as possibilidades de se recolocarem como sujeitos no universo”. No entanto, também relaciona um

1 Santos (2001, p. 28) no seu livro “Por uma outra globalização. Do pensamento único à consciência universal” relata quatro fatores que contribuem para explicar a globalização atual: unicidade da técnica; convergência dos momentos; cognoscibilidade do planeta e existência de um motor único na história.

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fator perverso que explica a globalização: a existência de um motor único na história, representado pela mais valia globalizada (SANTOS, 2001, p. 24). Essa “mais valia” atua como alavanca do capitalismo, onde a produção acontece entre os grandes conglomerados econômicos, que sobrevivem graças a uma concorrência extremamente agressiva. Nessa forma de capitalismo, o Estado fortalece suas conexões com grupos econômicos, não assumindo a defesa dos cidadãos e, por isso, assiste-se à emergência de mobilizações frequentes da sociedade civil. Os movimentos populares, comunitários ou acadêmicos representam rachas nas estruturas de poder e provocam práticas alternativas de resistência.

Apesar da Constituição de 1988 consagrar o ideal da universalização das políticas públicas sociais, o Brasil ainda não conseguiu implantar um estado justo e igualitário, pois as políticas, sobretudo as voltadas para a educação, se mostram ineficientes para dar conta das necessidades e expectativas da população, em termos de qualidade de ensino.

Entre as décadas de 1970 e 1980, no Brasil, a ideologia neoliberal, incorporada pelo Estado nas diretrizes curriculares norteadoras dos programas oficiais, adota uma posição universalista de currículo hegemônico, que desrespeita a diversidade e autonomia dos professores e das escolas. Nos anos 1990, período emblemático no campo político e do currículo com o término da ditadura militar, a circulação da literatura internacional e a reestruturação produtiva do país, a introdução das Tecnologias da Informação e Comunicação - TIC geram, de um lado, reformas ligadas ao desenvolvimento econômico, e, de outro, reformas oriundas de esquerda, comprometidas com a defesa de um currículo mais acolhedor e diversificado e com qualidade para a educação pública. As políticas públicas do atual governo já começam a chamar a atenção para a questão da diversidade cultural e para o questionamento do currículo e das suas lógicas até então vigentes.

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Os estudos teóricos da pedagogia crítica assinalam como as escolas devem ser convertidas em espaços de maior igualdade social e de maior oposição às estruturas de poder, defendendo uma forma de currículo que enfatize o histórico, o cultural e as vozes de todos os sujeitos envolvidos. Um dos mais legítimos representantes dessa concepção, Giroux (2005), ao se posicionar sobre a questão, diz que é necessário que as experiências e os saberes não escolares sejam compreendidos e valorizados, abandonando marcos de referência da cultura dominante.

Nessa perspectiva, a concepção de currículo aqui exposta é a de que o currículo vai além de um conjunto de conhecimentos organizados e sistematizados, envolve também uma reflexão coletiva nas instituições escolares sobre as experiências do mundo da vida, da cultura popular ainda não devidamente incorporadas às práticas pedagógicas. “O currículo oficial ao lado do real mesclam-se no espaço escolar, num processo social de conflitos e lutas, que envolve controle, poder, interesses, conhecimentos científicos, crenças, visões sociais e resistências” (MATOS OLIVEIRA, 2007, p. 29).

Nesse sentido, poderíamos dizer que o currículo escolar representa todo um conjunto de experiências propostas pela escola, aceitas ou negadas pelos alunos. De acordo com MacLaren (1991), as salas de aula são espaços para se compreender como se problematizam as experiências e as necessidades dos estudantes socialmente construídas e às vezes contraditórias.

Santomé (2005) também reconhece a necessidade de inserir, no currículo das escolas, as culturas negadas1, sob pena de se cair em falsas

1 Dentre as culturas negadas, Santomé cita: às vozes silenciadas do terceiro mundo, as culturas infantis juvenis e da terceira idade; as etnias minoritárias e dos sem poder; ao mundo feminino, rural e litorâneo; às sexualidades lésbica e homossexual; à classe trabalhadora e ao mundo das pessoas pobres e de pessoas com deficiências físicas.

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propostas de currículo turístico, desconectado de situações da vida cotidiana, nas quais os problemas raciais e sociais são psicologizados. O citado autor ainda afirma que o professor é fruto de modelos de socialização profissional em que não lhe exigem a seleção de conteúdos culturais nos currículos, porque esses são definidos pelas editoras de livros didáticos, aparecendo como os únicos possíveis e pensáveis (SANTOMÉ, 2005, p. 160-161).

Hoje, o campo curricular não vem dando respostas satisfatórias quer pela complexidade do espaço escolar, quer pelas contradições entre o anunciado nas orientações curriculares emanadas da legislação educacional e o realizado nas salas de aula. A cultura centralizadora, burocrática e pouco flexível dos sistemas de educação não observa que os professores precisam antes, discutir os projetos nas escolas, para depois, incorporá-los às suas práticas, a partir das singularidades de cada situação.

Por outro lado, a sociedade tecnológica que substituiu a sociedade industrial expõe a convivência cada vez mais presente da comunicação oral e escrita com a comunicação eletrônica, modificando relações entre instituições e pessoas e introduzindo novas formas no ensinar e no aprender, assim como práticas sociais mais compartilhadas.

A passagem da cultura impressa para uma cultura baseada no meio áudio visual, nas mídias e na cultura digital gera subjetividades inteiramente diferentes com as quais a escola e os professores não estão conseguindo lidar. De maneira geral, o temor de muitos professores, com relação às tecnologias, é a de que possam ser superadas, no plano cognitivo, pelos recursos instrumentais da informática (ASSMANN, 2000, p. 8).

Pimenta e Anastasiou (2005) e Cunha (2006) levantam a necessidade de uma mudança de postura de alunos e professores diante da ciência e do conhecimento, para reconhecer as possibilidades educacionais e políticas

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a serem construídas pelos estudantes oriundos das camadas populares. Mostra a importância do conhecimento do aluno, enquanto sujeito de aprendizagem e a importância da escola reconstruir a imagem dos jovens da era digital de forma inteiramente diferente e negociada com essa nova geração.

Pelo exposto concluímos que, as novas tecnologias não podem substituir o professor, mas criam necessidades de definir novas estruturas e novas práticas de escolarização. Segundo Green e Bigun (2005, p. 228), “[...] estamos diante de subjetividades construídas a partir de relações sociais e práticas tecnologicamente mediadas” e, por isso, os educadores devem delinear espaços dialógicos de interação e de construção coletiva do conhecimento, utilizando as TIC de forma crítica.

Saberes docentes e Formação Universitária: impasses e possibilidades

As profundas mudanças que caracterizam a sociedade atual revelam que nenhuma reforma educacional resolve a crise em que estamos imersos, sem a adequada formação dos professores. O cenário atual está mudando rapidamente e essas mudanças exercem impacto sobre o professor que, despreparado para enfrentar tantas exigências e pressões, encontra-se desestabilizado e vivendo inúmeras contradições postas pela sociedade contemporânea. Charlot (2008) descreve o professor como o profissional das contradições que tenta superar a distância entre o excesso de discursos sobre a educação e a pobreza das práticas pedagógicas. O autor argumenta que as contradições relativas à escola são contradições sociais que, mesmo não estando necessariamente dentro da escola, desestabilizam a função docente. Tais contradições estão refletidas na valorização do professor no texto da lei e no discurso político, porém são desmentidas, a todo momento,

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pela realidade dos baixos salários docentes, desconfiança e desprestígio social do professor (CHARLOT, 2008, p. 31). Nesse sentido, o horizonte social no qual a subjetividade dos docentes é constituída, está marcada por uma visão ideológica que o desprofissionaliza e enfraquece o exercício da docência.

Nas últimas décadas, para fazer frente aos recorrentes problemas enfrentados pelos professores, surgem abordagens enfatizando a formação reflexiva do professor, sugerindo que o mesmo seja um profundo questionador do seu fazer pedagógico. O exercício da reflexão exige um repensar contínuo das ações pedagógicas e atribuição de significados às ações docentes, num processo de revisão contínua da prática pedagógica.

A reflexão envolve responsabilidades partilhadas, discussões e atividades em grupo, sendo um ato solidário, jamais solitário. SHÖN (1992) questiona o processo de formação universitária, pois esse distancia a teoria da prática, uma vez que fornece ao aluno inicialmente a teoria e, só no final do curso, a vivência da prática através do estágio. Segundo o citado autor, a reflexão da ação exige que o professor fale sobre suas experiências, no coletivo da escola para repensá-la e reconstruí-la de forma criativa, no cotidiano.

Partilhando a mesma opinião de Shön (1992), Tardif (2002) faz críticas ao modelo universitário de formação docente, propondo uma epistemologia da prática profissional do professor que seria o estudo do conjunto de saberes mobilizados pelos profissionais em seu espaço de trabalho cotidiano, para desempenhar suas tarefas. Na visão de Tardif (2002), mudanças deveriam acontecer no rumo das pesquisas na universidade, pois existem problemas epistemológicos no modelo universitário de formação. O autor aponta dois problemas: a) modelo centrado na lógica disciplinar e b) prática equivocada de tratar os professores como espíritos

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virgens destituídos de crenças ou expectativas. A solução para os problemas mencionados, segundo Tardif, está numa nova postura da universidade, no sentido de incorporar mudanças curriculares que tenham a efetiva participação do professor. Essas mudanças não visam necessariamente esvaziar a lógica disciplinar dos programas de formação, mas executar “um trabalho profundo sobre os filtros cognitivos sociais e afetivos através dos quais os professores recebem e processam essas informações” (TARDIF, 2002, p. 273).

De maneira geral, Tardif (2002) tem enfatizado nos seus trabalhos a necessidade de tratar os professores como atores que possuem um saber e um saber fazer e devem ser considerados como sujeitos do conhecimento. Nesse sentido, enquanto sujeitos de sua prática, os professores da escola básica devem partilhar com os pesquisadores universitários todas as experiências e, portanto, estar no centro das pesquisas realizadas na escola.

Por conseguinte, o hábito da prática reflexiva, quando incorporado às ações do profissional docente, torna-se o motor de articulação entre a teoria e a prática. A prática não pode ser individualista ou solitária, mas coletiva, para o enfrentamento responsável da crise em que a escola está mergulhada.

o Ensinar e o Aprender na Sociedade Tecnológica

A educação online2 tem enfrentado interpretações divergentes por parte de muitos educadores desde pequenas resistências até a mais profunda rejeição.

2 O termo educação online é, neste artigo, utilizado para identificar a 5ª geração da EaD, assim denominada por Moore (2007), para caracterizar a educação que utiliza o computador, a internet e outras ferramentas online, características deste momento histórico.

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As críticas à Educação a Distância crescem na medida em que aumentam significativamente os cursos nessa modalidade de ensino. Inúmeras análises realizadas no nosso país mostram o caráter instrumental de que a EAD se reveste, baseando-se em critérios técnicos de adequação e organização dos meios aos fins, próprios da racionalidade científica. Esta modalidade de educação tem sido, no Brasil, cada vez mais assumida pelas universidades particulares, recebendo críticas dos acadêmicos que a classificam como produto típico das políticas públicas nesse contexto neoliberal em que estamos mergulhados.

Por outro lado, a Educação a Distância, rompendo com as limitações do ambiente físico e (des)construindo a idéia da presença física do professor, não tem conseguido retirar o aluno do isolacionismo, gerando índices de evasão crescentes.3

As reflexões de Habermas (1987) são pertinentes para se entender o isolacionismo gerado pela falta de diálogo nas sociedades industriais em que os problemas não residem no desenvolvimento científico ou tecnológico, mas no abandono da razão comunicativa que contém em si as possibilidades de diálogo sobre questões vitais para os indivíduos. O referido teórico posiciona-se radicalmente contra a penetração da racionalidade instrumental na esfera pública4 na qual deve predominar a racionalidade comunicativa. (GONÇALVES, 1999).

Neste cenário, dialogar é uma condição fundamental para interagir e fazer valer a comunicação e, quando a aprendizagem acontece numa

3 Dados do INEP (2006) mostram uma evasão média de alunos de cursos a distância no Ensino Superior de 30,9% de vários tipos de universidades (INEP, 2006 apud TOCZEC et al., 2008).

4 Thompson (2009, p. 155) argumenta que há limitações na tese de Habermas porque a esfera pública, tal qual o autor a apresenta não pode ser reativada nas novas bases por ele propostas, porque a natureza da comunicação de massa e as condições em que ela se dá, na contemporaneidade, não é a mesma.

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parceria co-instituinte e co-estruturante, na qual a máquina representa um novo patamar, alguma coisa muda no processo de aprender. Muda porque os meios de comunicação e as novas tecnologias não criam apenas máquinas, mas são estruturadores de nossos modos de organizar e configurar as linguagens, ampliando “o potencial cognitivo do ser humano (cérebro/mente) e possibilitando mixagens cognitivas complexas e cooperativas” (ASSMANN, 2000, p. 9). Muda porque exige novas formas de investigação e trilhas metodológicas diferentes a serem seguidas pelos pesquisadores online. Finalmente, muda porque exige um professor com a cabeça mais aberta e flexível, disposto a construir novas relações de aprendizagem através da internet.

Bakthin (1988) também mostra o papel da linguagem e do diálogo como um objetivo a ser atingido face a incomunicabilidade da nossa era. Enfatiza o fenômeno social da interação verbal que se realiza através da enunciação, mas que não é uma enunciação monológica isolada (BAKTHIN, 1988, p. 117). No diálogo, o sujeito bakthiniano perde o papel de centro e é substituído por vozes sociais que fazem dele um sujeito histórico e contextualizado. A concepção e os conceitos apresentados por Bakhtin (1988) permitem entender que, na produção dos discursos, os lugares que as pessoas ocupam interferem no significado produzido.

Freire (1988) também vê o diálogo, a abertura respeitosa aos outros, como objetivo da reflexão crítica e da aventura docente. “Seria impossível saber-se inacabado e não se abrir ao mundo e aos outros à procura de explicação, de respostas a múltiplas perguntas” (FREIRE, 1988, p. 86).

No intertexto das concepções de Habermas, Bakthin e Freire e dos teóricos da pedagogia crítica, buscamos respaldo para refletir sobre a necessidade de uma formação adequada nos cursos em EAD, chamando

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a atenção para a necessidade de interações mais autênticas entre a equipe docente formadora (autor, formador e tutor) e os discentes.

Acreditamos que as instituições formadoras têm o papel de viabilizar a interlocução e comunicação dos sujeitos da ação educativa e a autonomia do estudante no processo de construção de sua aprendizagem. Para tal, é necessária uma reflexão coletiva para possibilitar a adoção de posturas que superem as tradicionais e considerem a educação online como um sistema aberto, interconectado a outras práticas sociais.

Pelo exposto, há necessidade de se pensar uma nova proposta nos programas de formação de professores em ambientes virtuais, assegurada por um desenho didático que favoreça a dialogia e que proporcione um tempo adequado para aprendizagens significativas. Tudo isso demanda espaços mais abertos, onde adultos formandos tenham não apenas acesso às informações, mas uma participação autônoma na produção e apropriação dos valores que as tecnologias agregam.

Formação Online e Tempos de Aprendizagem

“Todos estão matriculados na escola da vida, onde o mestre é o tempo”. Cora Coralina (1989)5

5 Cora Coralina, pseudônimo de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas Brandão, mulher simples de Goiás, nasceu em 1898 e faleceu em 1985, produziu uma obra poética, muito admirada por Carlos Drummond de Andrade. Foi a primeira mulher a ganhar o Prêmio Juca Pato, em 1983, com o livro Vintém de Cobre – Meias Confissões de Aninha. Sua filha, Vicência Brêtas Tahan é autora do livro biográfico Cora Coragem Cora Poesia, lançado em 1986. Para falar do tempo, iniciamos com a significativa frase da famosa poetiza: “Todos estão matriculados na escola da vida, onde o mestre é o tempo”. Disponível em: <http://www.pensador.info/cora_coralina_frases/>. Acesso em: 16 dez. 2009

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Autores como Tardif e Raymond (2000) colocam que os saberes ligados ao trabalho são temporais, pois são construídos e dominados progressivamente durante um período de aprendizagem variável, de acordo com cada ocupação. Essas são competências e aptidões constitutivas da dimensão laboral, adquiridas no próprio ambiente de trabalho e não no ambiente formal da escola.

Pesquisas realizadas ao longo dos anos com os professores mostram que

[...] os saberes profissionais dos professores parecem ser, portanto, plurais, compósitos, heterogêneos, pois trazem à tona, no próprio exercício do trabalho, conhecimentos e manifestações do saber-fazer e do saber-ser bastante diversificados, provenientes de fontes variadas, as quais podem supor que sejam também de natureza diferente (TARDIF; RAYMOND, 2000, p. 213).

Nessa tipologia multidimensional de saberes, os autores procuram “associar a questão da natureza e da diversidade dos saberes do professor à de suas fontes, enfatizando sua proveniência social” (TARDIF; RAYMOND, 2000, p. 214). Os referidos autores apresentam um quadro no qual encontram “[...] fontes de saberes provenientes da história de vida individual, da sociedade, da instituição escolar, dos programas e livros didáticos, dos outros atores educativos, dos lugares de formação etc.” (TARDIF; RAYMOND, 2000, p. 214). Esses diferentes saberes se inscrevem numa dimensão temporal ao longo da carreira docente. Os autores mostram ainda que a inscrição no tempo é significativa para a compreensão da genealogia dos saberes docentes e revelam que a memorização de experiências educativas é marcante para a construção do eu profissional docente. Um outro aspecto

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importante citado pelos autores são os saberes docentes que são sociais e adquiridos em tempos distintos: tempo da infância, da escola, da formação profissional, do ingresso na profissão, da carreira (TARDIF; RAYMOND, 2000, p. 236).

O tempo não é um dado objetivo representado por horas de trabalho, nem apenas um meio no qual estão imersos os trabalhadores da educação, mas, como dizem com muita propriedade os citados autores, uma referência na aquisição de conhecimentos e domínio laboral:

A própria noção de experiência, que está no cerne do eu profissional dos professores e de sua representação do saber ensinar remete ao tempo, concebido como um processo de aquisição de um certo domínio do trabalho e de um certo conhecimento de si mesmo. (TARDIF; RAYMOND, 2000, p. 239).

Outra referência quanto à questão do tempo escolar é a de Moura (2009) que reflexiona criticamente sobre a cultura escolar, colocando que esta prima pela homogeneidade do tempo, do espaço, das normas, tornando-se pouco acessível a mudanças. A repetição, a ênfase na individualidade, o caráter pouco interativo das atividades escolares cria resistências escolares que se traduzem no abandono, na evasão e, evidentemente, no insucesso escolar. O aluno resiste de forma implícita ou explícita aos objetivos, ao tradicionalismo da organização escolar e aos modos de socialização da cultura escolar (MOURA, 2009, p. 7).

Pelo exposto, o tempo da escola é curto, centralizado na ação do professor que não oportuniza momentos de reflexão crítica, desconsiderando os sujeitos aprendentes, e nesse sentido pode funcionar como opressor, que gera resistências.

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A perspectiva marxista de Piazze (2007) mostra que a vida do indivíduo gira em torno do binômio: trabalho e tempo livre, ou seja, um tempo destinado à produção e outro tempo destinado a si mesmo ou às suas preocupações mais íntimas, porém frisa que os seus momentos de lazer ou de diversão são também programados pela indústria da cultura, sendo o sujeito uma mera engrenagem do sistema capitalista e o tempo um aliado desse sistema (PIAZZE, 2007, p. 1). Essa redução do indivíduo a uma simples peça de engrenagem do sistema capitalista foi muito bem problematizada por Chaplin na película Tempos Modernos.

Pereira (2004) também enfatiza a condição de trabalho produzida pelo avanço capitalista na primeira década do século XX, relativizando a percepção individual do tempo que reorganiza o espaço e fragmenta a organização espacial de produção. Apresenta duas categorias distintas de temporalidade: o tempo cósmico, mensurável pela ciência e o tempo fenomenológico, tempo do interior da consciência, inseparável da vivência (PEREIRA, 2004, p. 6).

As concepções filosóficas sobre o tempo também divergem. Os gregos concebem o tempo como a ordem mensurável do movimento e essa concepção cíclica do mundo forneceram as bases para a mecânica de Newton. Santo Agostinho reduz a concepção do tempo à consciência e desconhece, pelo menos filosoficamente, a existência de um tempo objetivo. O tempo em sua teoria não é um “ente” independente do homem e objetivo, mas, pelo contrário, existe tão somente dentro de nossa consciência.

A noção mais antiga de tempo na filosofia remonta aos gregos. Chrónos refere-se ao tempo cronológico ou sequencial. É medido pelo relógio e calendário; é ordenado, rítmico e previsível. O kairos é o tempo da sensibilidade e das verdadeiras aprendizagens, que na literatura corresponde

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ao tempo psicológico. Numa comparação entre as duas palavras enquanto chronos é de natureza quantitativa, o kairos é qualitativo.

Já na pós-modernidade, o tempo é efêmero e desordenando numa sequência de eventos simultâneos (CASTELLS, 1999, p. 490). Com o advento das tecnologias digitais uma nova visão paradigmática emerge na educação e surgem novos formas de gerenciar o tempo bem como novas temporalidades. Castells (1996 apud SANTAELLA, 2010, p. 111) diz que, nas sociedades em rede, o espaço organiza o tempo e passa a representar uma figura central nos estudos de mobilidade, fazendo emergir certos constrangimentos impostos a mobilidade dos cidadãos, fato indissoluvelmente ligado a natureza expansiva do mundo capitalista. Por outro lado, o tempo linear, segundo Nowotny (apud SANTAELLA, 2010, p. 111) vem sendo substituído pela “ilusão de simultaneidade” e por “series temporais superpostas”.

O grande desafio para a educação e os educadores, portanto, é o de administrar todas as questões referentes a uma nova concepção de temporalidades, na qual o que importa não é o sentido cronológico do tempo, mas fundamentalmente o relacional e o comunicativo.

Além das inúmeras atribuições para administrar os processos formativos online existe ainda o problema provocado pela presença de uma cultura resultante da incorporação das novas tecnologias na qual o tempo tem uma dimensão contraditória: flexível, com excesso de informações e, muitas vezes, difícil de ser administrado. Para enfrentar esse desafio são necessárias estratégias pedagógicas diferentes e relações mais compartilhadas e solidárias, para dar voz aos sujeitos aprendentes como explicita Nóvoa (1988, p. 26), “[...] a troca de experiências e a partilha de saberes consolidam espaços de formação mútua, nos quais cada professor

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é chamado a desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e de formando”.

Pesce (2008) apresenta uma cronologia histórica do tempo, a saber: tempo dos deuses; tempo dos corpos; tempo das máquinas e, na contemporaneidade, o tempo dos códigos. Adverte que se perdeu a dimensão kairológica do tempo, para se ficar à mercê do tempo cronológico e isso tem implicações na constituição das identidades dos sujeitos, pois solapa a noção histórica do tempo e ameaça o tempo como possibilidade pessoal e social. A referida autora mostra ainda a necessidade dos cursos de formação online de professores levarem em conta o equilíbrio entre o tempo cronológico e o kairós:

[...] para que as distâncias sejam geográficas e não simbólicas, os programas de formação docente online devem buscar um tempo de aprendizagem mais equilibrado na conjugação harmoniosa entre chrónos e kairós. (PESCE, 2008, p. 33).

Corroborando com a autora supracitada, transcrevemos alguns depoimentos dos sujeitos do nosso estudo, que serão delineados nas próximas páginas e que revelam a necessidade de reflexão sobre a temporalidade e a importância de se estabelecer diferenças entre o tempo do relógio (chrónos) e o da sensibilidade ou psicológico (kairós), porque as verdadeiras aprendizagens não são apenas produzidas pela mera passagem do tempo.

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o Percurso Metodológico da Pesquisa: a Escuta das Vozes docentes

Os sujeitos do presente estudo foram 66 professores selecionados

que atuam nos diversos campi da Universidade do Estado da Bahia, integrantes de dez grupos do Curso de Especialização em EaD do Projeto UNEB, em parceria com a Universidade Aberta do Brasil (UAB) em uma das disciplinas do curso intitulada: Metodologia do Ensino Superior. Nessa disciplina, oportunizamos momentos de reflexão sobre o cenário atual em que se insere a prática profissional docente, discutimos os saberes que os professores mobilizam nas situações específicas de ensino, questões relativas ao desenho didático dos cursos – interações e tempo de aprendizagem, este último aspecto, objeto do presente artigo.

A nossa vivência como professora, autora e formadora em cursos a distância e, sobretudo, a experiência interinstitucional intitulada: “Formação de professores para a Docência online” vivida no espaço virtual do ambiente Moodle6 e os enriquecedores debates sobre essa problemática encabeçados pela impecável equipe da PUC/SP7, me instigaram a aprofundar, com os alunos do Curso de especialização em EAD, os seguintes questionamentos: Os cursos de formação docente online estão equacionando bem os tempos de aprendizagem? Há tempo suficiente para os participantes construírem aprendizagens significativas? Quais as interferências no processo de constituição das identidades docentes advindas do meio digital?

6 Nesse espaço, desenvolvemos o projeto interinstitucional intitulado: Formação de Professores para a Docência Online, coordenado pelo professor Marco Silva, no qual utilizamos o ambiente Moodle. Foram vários pesquisadores representando vários programas de pós-graduação do Brasil e exterior, discutindo temáticas importantes relacionadas à docência na cibercultura. Disponível em: <www.saladeaulainterativa.pro.br/moodle/>.

7 Destaco os professores que compõem a equipe do PPGE/PUC/SP, em especial, as professoras doutoras Lucia Santaella e Lucila Pesce de Oliveira.

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Os depoimentos dos sujeitos oriundos de grupos de vários campus da Universidade do Estado da Bahia que participaram do curso foram longos, bem fundamentados, com a incorporação de imagens e vídeos aos textos discutidos na interface: Fórum e levantaram discussões sobre tempo de aprendizagens nos cursos online.

Seguem-se as vozes de dois sujeitos da pesquisa que assim definiram o tempo como referência para aprendizagens significativas:

[...]Portanto, as aprendizagens significativas acontecem no Kairós, tempo que não pode ser medido pelo tempo (Chrónos) permanência nos ambientes virtuais mas pela qualidade das interações  e pelas possibilidades ilimitadas de construção de

conhecimento [...] (PE-G10.)

O excesso de textos e tarefas no ambiente virtual que impedem o aluno, dentro do tempo previsto, de obter uma aprendizagem significativa foi outro aspecto abordado pelos sujeitos da pesquisa. Os sujeitos mostram ainda o tempo como fator de referência e defendem a flexibilidade de horários nos cursos online para viabilizar maiores possibilidades de administrar o tempo e as atividades propostas.

[...] nós, professores, podemos controlar o tempo disponível com nossos alunos e acrescento que cabe ao professor apresentar as tarefas em etapas acessíveis, para evitar o excesso de informações. [...] Então, cabe ao professor ajudar os alunos a gerenciar seu próprio tempo online e desenvolver disciplina suficiente para realizar

as tarefas [...] (LMN-ESPG4).

[...] o tempo é um elemento organizador de nossas ações; não podemos perdê-lo como referência. É natural que, no processo de transição e estabelecimento de

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um novo paradigma (como a relatividade do tempo), os equívocos e incertezas ocorram na ação educativa. O amadurecimento de aprendizagens é consequencia de discussões, de reflexões e de trocas que podem ou não ser contempladas, com

base nos tempos disponíveis e bem aproveitados. (PBRESP-G5).

Os depoimentos também mostram a dificuldade de se administrar o tempo nos cursos online, enfatizando a falta de tempo dos docentes para acompanhar as atividades propostas como se pode observar a seguir.

[...] É verdade também que enfrentamos a falta de tempo daqueles que se propõem

a nos orientar [...]. (HLCD-ESP-G4).

[...] Dessa maneira, o tempo do relógio sendo escasso, como administrá-lo de modo a ser investido para a formação? Chega a ser utópico acreditar que um professor que trabalhe 60h, conforme o nosso colega relatou, tenha a mesma motivação, vigor físico e disponibilidade para estar em cursos de formação. Junte-se a isso o fator sociocultural: o da mulher, que além de ser profissional, necessita assumir o papel de dona de casa, esposa e mãe. [...] (ASCO-ESP-G5).

Um dos sujeitos da pesquisa assinalou a necessidade de uma reflexão coletiva para o enfrentamento das questões nos cursos a distância e a necessidade de evitar a superficialidade dos cursos, atentando para os ganhos formativos produzidos.

[...] a pretensa eficiência quantitativa de muitos cursos, respaldada em critérios de eficácia, geralmente mostra uma falsa impressão de aprendizagem e sucesso formativo, escondendo uma perda significativa de qualidade, justamente pelo atropelamento do kairós (tempo vivencial, da sensibilidade e das verdadeiras

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aprendizagens) ante a “ditadura” do chrónos (tempo opressor, objetivo, linear e hegemônico por essência), que obriga os sujeitos a cumprir programas e prazos em busca de resultados não condizentes com o real intuito da educação, a qual vai além do abarrotamento de conteúdos curriculares rumo à formação crítico-reflexiva, comprometida com a ética e a cidadania, acima de tudo. (PL-G2).

Como nos encontramos no espaço virtual, com novas configurações, optamos por adotar uma postura etnográfica que possibilitasse a interação necessária entre os sujeitos da pesquisa, viabilizando a construção conjunta de sentidos e de resultados (HINE, 2000). Adotamos a etnografia como opção metodológica para analisar os depoimentos extraídos da interface: Fórum Virtual.

Esclarecemos que, como estamos analisando escritas produzidas em ambientes mediados pelo computador e pela internet, um aspecto importante a ser considerado é a refletividade, em que pesquisador e pesquisados devem crescer por meio da pesquisa e se auto‐analisarem. Além disso, a adoção da uma postura etnográfica permite a confluência da subjetividade com a objetividade, articulando as distintas vozes docentes e discentes. Justificamos tal esforço metodológico para compensar a falta do contato mais direto entre pesquisador e sujeitos da investigação, fato comum, quando estamos em ambientes virtuais, mediados pelo computador.

Ao discutir a questão do tempo, a percepção construída dessa pesquisadora também foi modificando, a partir da interação comunicativa com os sujeitos do estudo. Esclarecemos que os Fóruns deixaram outros questionamentos referentes à docência online, que serão discutidos posteriormente, não se constituindo em objeto do presente artigo.

O percurso metodológico do presente estudo ainda não concluído, já atingiu uma primeira etapa caracterizada pela leitura crítica das escritas digitais colhidas no Fórum bem como, por uma leitura flutuante dessas, para

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uma primeira análise de conteúdo. Pelo exposto, espera-se que a presente pesquisa possa contribuir para revelar outros espaços de investigação e possibilidades de formação que desloquem o eixo da docência tradicional para um espaço-tempo de escuta dos formadores da universidade com os professores da educação básica, levando-os a exercerem uma reflexão crítica sobre a sua própria formação, nos espaços online de aprendizagem.

Conclusões, ainda que Parciais

Discutimos, neste artigo que as tecnologias apontam para um novo tipo de sociedade, predisposta à interações mais democráticas, mas também sinalizam outras formas de desigualdades e divisão social.

Enfatizamos o posicionamento dos críticos dos estudos culturais da Pedagogia que defendem uma concepção de currículo que leve em consideração as vozes dos sujeitos excluídos.

Analisamos como a Educação online pode dar suporte à inovação pedagógica e desafiar a educação tradicional, se estiver disposta a repensar seus modelos de formação docente e de gestão educacional.

Chamamos a atenção para a questão da temporalidade nos processos formativos à distância e aprofundamos a questão dos cursos online atentarem para a singularidade nos ambientes virtuais e para a necessidade de se formar professores competentes e comprometidos, capazes de mediar a aprendizagem dos alunos nesses espaços.

Como discutimos ao longo do texto e dos depoimentos aqui registrados, ainda persistem dúvidas e incertezas no que diz respeito ao tempo utilizado pelas instituições de ensino a distância e alguns sujeitos questionam a forma como o tempo tem sido utilizado nos desenhos

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didáticos dos cursos online. Nesse particular, destacamos o tempo construtor de aprendizagens significativas, que não pode ser medido pelo relógio, o Kairós, que envolve dialogia e interrelações mais afetivas entre formadores e formandos em ambientes virtuais. São aprendizagens que “[...] tocam o coração das pessoas”8, como nos ensina Cora Coralina com sua sensibilidade e sabedoria exemplares, aprendidas ao longo da sua vida e das suas ricas experiências.

As intervenções dos sujeitos também revelam descontentamento e a necessidade de uma atitude crítica para o enfrentamento dessas questões.

Pelo exposto, fica evidente que precisamos estar preparados para enfrentar esses desafios, abertos e flexíveis para as mudanças paradigmáticas na educação. Concordamos com Hine (2004) quando diz que, quando se trata de pesquisa, em que se utiliza o ambiente virtual, o agente de mudanças não é a tecnologia, mas os sentidos que se constroem em torno dela. Não estamos lidando apenas com novas tecnologias, mas com novos conceitos, o que está no centro da questão, a essência substantiva do nosso problema, é a qualidade da educação, seja ela presencial ou à distância.

O desafio que está sendo posto vai muito além, exigindo mudanças paradigmáticas que se constroem no coletivo das instituições, superando as visões lineares que ainda perduram, procurando formar uma equipe interdisciplinar que tenha como ponto de partida a consideração pelo perfil e expectativas da clientela envolvida, uma gestão de sistema eficaz, um projeto pedagógico e um desenho didático que acolham verdadeiramente uma educação sem distância.

8 Disponível em: <http://www.congonhas.mg.gov.br/arquivos/cora_coralina_1014204010.pdf>.

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Referências

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HINE, Cristine. Etnografía virtual. Barcelona: Editorial UOC, 2000. (Colección Tecnologías e Sociedad).

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Sala de Aula Virtual: novos lugares e novas durações para o ensinar e aprender na contemporaneidade

Daniel Mill(UFSCar)

Aparecida Ribeiro da Silva (UFSCar)

Nara Brito(UFSCar)

Introdução

O que é uma aula? Como uma sala de aula se configura? O que a caracteriza? Quais os tempos e espaços de uma (sala de) aula? Que mudanças conceituais as tecnologias digitais trouxeram para a aula e para a sala de aula? Para compreender as concepções de aula e sala de aula na contemporaneidade é preciso antes entender aspectos relacionados à sala de aula presencial.

Assim, o objetivo deste texto é discutir e buscar compreender a aula e a sala de aula virtual como espaços e tempos diferenciados, tendo como referência a compreensão vigente de sala de aula presencial e o atual estágio

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de desenvolvimento das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC). A influência dessas TDIC na educação (especialmente na educação a distância) trouxe diferentes entendimentos sobre espaços e tempos educacionais.

Entendemos que essas análises e discussões são fundamentais para compreender a educação na contemporaneidade. A sala de aula virtual está no bojo das transformações mais profundas pelas quais passou a educação ultimamente e, por isso, merecem ser estudadas.

A sala de aula presencial: definições e considerações preliminares

A sala de aula tem papel central no espaço escolar, pois é nele que as relações educacionais e a formação dos alunos acontecem de modo privilegiado. O espaço da sala de aula é composto de inúmeros elementos e sua identificação ou compreensão está na base de análise da educação na atualidade, especialmente na educação a distância (EaD). Discutiremos a seguir noções sobre aula e seus espaços e tempos, caracterizando-as em seus entendidos como lugar e duração de ensinar e aprender.

Entendendo uma aula

Para compreender adequadamente uma concepção de sala de aula, é preciso antes entender o que é uma aula. Em seu livro, Veiga (2008) nos apresenta uma concepção de gênese, dimensões, princípios e práticas da aula. De forma simplificada e numa concepção tradicional, podemos dizer que uma aula é um fato social que ocorre na relação ensino-aprendizagem num espaço e tempo determinado, envolvendo docente e educando. Com as

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mudanças tecnológicas mais recentes, essa noção de aula sofreu mudanças também. Assim, questiona-se: o que é uma aula? O que a caracteriza e qual sua relação efetiva com os tempos e espaços da sala de aula?

Como princípio, uma aula se instala num espaço e tempo determinado para o ensino-aprendizagem, em que as intencionalidades docente e discente devem vigorar. Tradicionalmente, a sala de aula é o lócus privilegiado para a realização da aula, pois foi planejada e construída para essa finalidade. Além disso, a organização de tempos e espaços destaca-se como elemento fundamental na constituição da aula. “[...] A aula se realiza em um espaço e em um tempo demarcados, mas apresenta uma composição de unidades, que pressupõe uma estruturação entre objetivo, finalidade, conteúdo, método e técnica de ensino, tecnologia e avaliação” (ARAÚJO, 2008, p. 59).

Tendo como referência noções de espaço/lugar e tempo/duração de uma aula, o docente planeja a aula e as atividades que desenvolverá com os alunos de acordo com a sua concepção dos processos de ensino e aprendizagem. O desenvolvimento do pensamento, da cognição e da racionalidade humana é explicado diferentemente por diversos autores e teorias, que embasam as relações de ensino e aprendizagem entre alunos e professores e vão configurar o desenvolvimento do trabalho pedagógico. A intencionalidade docente é influenciada, portanto, por essas teorias e estudiosos da educação.

[...] o que orienta a organização dos espaços-tempos de aula é a intencionalidade do trabalho pedagógico: a forma como são selecionados os objetivos educativos, os conteúdos, os métodos, o processo de avaliação, como a relação professor-aluno é conduzida e a compreensão de que essas opções teórico-

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metodológicas não se caracterizam pela neutralidade, ao contrário, expressam concepções de sociedade, educação e homem (SILVA, 2008, p. 38).

A forma como os professores organizam as relações de ensino-aprendizagem e os conhecimentos no tempo e espaço disponíveis é norteada pelos seus referenciais epistemológicos. Em cada linha teórica, a aula se configura de determinada maneira e, também por isso, uma aula nunca é neutra, pois carrega uma concepção e uma maneira de compreender os processos envolvidos no ensinar e aprender. Assim, uma aula é a organização didático-pedagógica de uma determinada fatia de conhecimento, prevista para se desenvolver num lugar e durante um intervalo de tempo predeterminados, numa discussão entre sujeitos (educador e educandos) socialmente e historicamente estabelecidos, objetivando o desenvolvimento cognitivo especialmente dos estudantes do grupo. Como dissemos, por ser planejada pedagogicamente para um determinado fim (intenção de ensinar) e por atender a um determinado grupo de interessados (desejo de aprender), uma aula pressupõe intencionalidade docente e interesse discente na construção do conhecimento.

Sobre sala de aula como lugar privilegiado para a formação

O espaço planejado e privilegiado para que a aula aconteça é a sala de aula, que geralmente compõe parte de uma instituição educacional igualmente planejada e construída. O espaço escolar é arquitetado para fins educacionais. A arquitetura escolar prevê a construção de espaços como bibliotecas, secretarias, sala de aula, sala de professores, banheiros, espaço para recreio etc.. Entretanto, por princípio, é no espaço da sala de

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aula que acontece o processo da ação educativa. É nesse espaço da sala de aula que alunos e professores se reúnem para compartilhar o ensino e a aprendizagem. Dessa forma, o espaço da sala de aula é um importante e privilegiado espaço para a formação do estudante (e do professor, indiretamente). Apesar dessa importância, ainda há aspectos da sala de aula por compreender, especialmente no contexto multimidiático e cibercultural atual. Como ocorre o processo de ensino e aprendizagem nos espaços de uma sala de aula na contemporaneidade? Qual o lugar da aula atualmente?

O tempo de uma aula é cronometrado em minutos, mais especificamente, em hora/aula. É nessa duração da hora/aula que o docente desenvolve o processo de formação dos alunos, no espaço da sala de aula. Frago e Escolano (2001, p. 27) explica que “[...] a espacialidade precisa ser parte integrante da arquitetura escolar, de forma que se observa tanto na separação das salas de aula como na disposição regular das carteiras”. Essas coisas, segundo Frago e Escolano, facilitam também a rotina das tarefas e economia do tempo. Sendo assim, é importante que ao projetarem o espaço de uma sala de aula, seja pensado no tempo compartilhado entre o professor e os alunos na relação de ensino e aprendizagem. Bernard (apud BUFFA; PINTO, 2002, p. 19) afirma que, “[...] geralmente, as escolas são muito pequenas, sem espaço suficiente para a circulação dos alunos; são mal iluminadas, mal ventiladas e mal aquecidas. Os móveis não são ajustados aos alunos, nem dispostos de forma a lhes proporcionar conforto e a fácil supervisão do mestre”.

Portanto, para possibilitar formação adequada aos alunos, a arquitetura escolar deve levar em consideração o espaço da sala de aula, com destaque para as dimensões de conforto: espaço disponível, a claridade e iluminação, ventilação, temperatura ambiente, organização dos alunos/mobiliário e o manejo da turma pelo docente. É essencial que o ambiente de estudos da sala de aula configure-se como um espaço agradável, confortável

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e que proporcione boas condições de discussão entre os participantes e desenvolva cognitivamente os educandos. Além disso o docente leva em consideração que “[...] a aula possui alguns componentes, e entre eles está o tempo, que é o processo de duração de uma aula, cronometrada pelo relógio, em 40’ a 50’, que se configura em uma hora-aula” (ARAUJO, 2008, p. 61). É nessa hora/aula, espaço/lugar que o professor/docente discute com os alunos/discentes, sobre os conteúdos no processo de ensino e aprendizagem. Num plano geral e como fundamento da construção do conhecimento em sala de aula, pode-se concluir que o momento de convivência em sala de aula precisa ser uma duração relacional rica e fértil, o que exige boas condições para a sala ambiente da aula.

Além disso, mesmo em condições adequadas a configuração de uma sala de aula pode ser fator limitante para o desenvolvimento do educando. Segundo Kenski (2007), a arquitetura da sala de aula tradicional limita o potencial de discussão de uma aula, levando-nos à conclusão de que são espaço-tempo finitos e de difícil gerenciamento. Embora longa, a citação abaixo traduz a afirmação da autora.

Se as arquiteturas das escolas e os espaços das salas de aula nos falam de uma educação em que se privilegia o ensino, os tempos das escolas vão reforçar essa minha tese, porque o tempo nas salas de 50 ou mais alunos é determinado, curto e finito. Um tempo curto demais para que todos possam falar, dizer o que pensam. Um tempo em que não há como debruçar-se sobre a informação, refletir e posiciona-se criticamente, apresentar suas reflexões para os que freqüentam a mesma sala de aula. Um tempo que precisa ser gerenciado pelo professor para poder transmitir a informação, encaminhar exercícios, corrigir, tirar dúvidas, avaliar. Um tempo pequeno demais para o professor e todo o ‘programa’ da disciplina que precisa cumprir. Um

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tempo que, assim como o espaço, aposta na função de ensinar e na ação do professor e desconsidera o aluno e suas formas de aprender (KENSKI, 2007, p. 108).

Por outro lado, podem haver modelos alternativos, pois nem sempre os tempos e espaço da (sala de) aula foram definidos e organizados em função da arquitetura escolar. Essa relação altera-se tanto em função da época histórica quanto com relação à sociedade considerada. Segundo Silva (2008, p. 17), “[...] na Europa medieval não existia um espaço construído e destinado a ser uma sala de aula. Na verdade, os filhos de aristocratas que viviam no campo se organizavam em grupos e remuneravam os professores”. Para essa autora, a duração de uma aula não estava circunscrita no espaço de uma sala de aula. Após a Idade Média, “[...] as relações de aprendizagem dos nobres passaram a ser nas aulas particulares, interagindo com um professor, conhecido como interceptor” (XAVIER; FERNANDES, 2008, p. 228). Somente após a Revolução Industrial que o espaço de ensino-aprendizagem começa a tomar a configuração do que conhecemos hoje como uma sala de aula.

Caracterizando aula como duração e a sala de aula como lugar de aprendizagem

Sabemos que o surgimento da sala de aula (como a conhecemos hoje) é relativamente recente, mas ganhou importância central na análise do ensino-aprendizagem. Embora sala de aula pareça um termo simples e claro, trata-se de uma expressão bastante complexa até mesmo para educadores. Nem todos sabem o que é uma sala de aula e quais suas principais características. Quais as particularidades de uma sala de aula em

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relação a outros espaços arquitetônicos? Quais as principais características físicas/arquitetônicas e/ou pedagógicas que determinam uma sala de aula?

Segundo Mill e Fidalgo (2006, p. 25), os espaços são percebidos de maneira simbólica. Afirmam que cada espaço e lugar são compreendidos a partir de sua função e, dessa maneira, a sala de aula é percebida como esse espaço de ensino-aprendizagem por ter determinadas características e por ser planejada e desenvolvida com o objetivo pedagógico. É essa característica que diferenciará o espaço da sala de aula de outros espaços.

A sala de aula é composta por vários elementos e não apenas por docentes e alunos. Conforme Dussel e Caruso (2003, p. 36), há também “[...] mobiliário, instrumentos didáticos, as questões da arquitetura escolar, tudo faz parte da sala de aula”. Assim, o espaço da sala de aula é percebido pelas suas características, em relação à sua arquitetura e à disposição dos objetos em seu interior. Por questões contextuais, é necessário um olhar histórico para a sala de aula buscando entendimento das transformações e decisões que a configuraram como ela é hoje. Por ser um espaço construído socialmente, Dussel e Caruso (2003, p. 36) sugerem que a sala de aula seja analisada como construção histórica dos seres humanos.

Os aspectos arquitetônicos, de configuração e organização dos objetos e pessoas fazem parte do que constitui a sala de aula como espaço destinado à relação pedagógica entre discentes e docentes. Segundo Frago e Escolano (2001, p. 74), o espaço escolar educa e, por esse motivo, ele deve ser pensado e construído com essa intenção educacional, pois o espaço nada tem de neutro. Dessa forma, educação e arquitetura estão ou estiveram intimamente inter-relacionadas.

O papel do professor na configuração de um espaço educativo (ou espaço que educa) é fundamental. Ainda segundo Frago e Escolano (2001, p. 139), o espaço da sala de aula vai se configurar conforme a

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visão de organização e, portanto, de educação que o professor carrega. Nesse sentido, o docente é também arquiteto, pois ele pode transformar o espaço da sala de aula em um espaço mecânico e frio ou dinâmico e vivo. Sua capacidade de criar um ambiente agradável e adequado para si e seus alunos está relacionada à forma como o professor organizará os objetos e pessoas na sala de aula e também na concepção de formação que a sua prática pedagógica é baseada. Acreditamos que essa caracterização do espaço da sala de aula é identificada a partir da compreensão de Therrien e Therrien (2001, p. 78), que compreendem a racionalidade do fazer pedagógico cotidiano dos professores a partir da exploração do “[...] universo epistemológico que fundamenta o agir pedagógico; isto é, a partir da identificação e caracterização dos elementos fundantes de uma razão eminentemente prática que estrutura o fazer”.

Assim, com base nos estudos de Mill e Fidalgo (2006, p. 21), pode-se afirmar que o aspecto organizacional da sala de aula é importante e inerente a prática pedagógica; embora ele não deva se desprender do aspecto arquitetônico da escola. Ambos os aspectos são partes importantes na compreensão das relações de ensino e aprendizagem. Os espaços físicos da escola (inclusive aqueles extraclasse), sua arquitetura é parte importante na organização do espaço escolar para possibilitar melhor ensino e aprendizagem, esse é um aspecto que não deve ser ignorado por ser parte importante no contexto escolar. Como disse Silva (2008), há aspectos organizacionais e arquitetônicos extraclasse que compõem o processo educacional e isso também deve ser considerado na análise da sala de aula.

A sala de aula se vincula à dimensão física – local apropriado para a realização de ações, ao passo que a aula assume a dimensão de organização do processo educativo, tempo e

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espaço de aprendizagem, de desconstrução e não se vincula a um lugar específico, uma vez que a aula pode realizar-se em espaços não convencionais, para além de uma sala retangular com cadeiras e mesas dispostas linearmente, com um quadro de giz na parede e um espaço central para o professor (SILVA, 2008, p. 36).

A partir dessa compreensão, podemos entender que uma aula acontece em qualquer espaço, sendo a sala de aula o lócus privilegiado e intencionalmente construído para o exercício do ensino e aprendizagem. Atualmente, com o desenvolvimento intenso da EaD, a aula e a sala de aula passaram por transformações em decorrência do redimensionamento espaço-temporal promovido pelas tecnologias de informação e comunicação (TDIC). A maneira como as relações de ensino-aprendizagem socialmente construídas nos tempos atuais (na EaD, em especial) retira a centralidade da sala de aula como espaço privilegiado para a construção de conhecimentos e expande o lugar da formação e a duração de uma aula para outros limites. Consideramos ser importante compreender esses aspectos e é por isso que aprofundaremos o assunto no próximo tópico.

A aula e a sala de aula na contemporaneidade: virtualidades e redimensionamentos

Como afirma Harvey (2001), o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação, principalmente da internet, possibilitou outras maneiras de experimentar os tempos e espaços. Possibilitou, por conseguinte, outras formas de pensar e configurar a aula como duração e a sala de aula como lugar. Essa nova configuração emerge num contexto

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de mudanças de paradigma no campo educacional. A maior contribuição que a internet pode proporcionar ao processo educacional diz respeito à mudança de paradigma, impulsionada pelo grande poder de interação que ela propicia (SCHLEMMER, 2005, p. 30).

As mudanças de paradigmas promovidas pela intensificação do uso das tecnologias digitais na educação estão diretamente relacionadas aos tempos e aos espaços do ensinar e aprender. Assim, compreender esta relação entre tecnologias digitais e educação parece necessário.

A evolução das Tecnologias de Informação e Comunicação: contextualizando

Autores como Castells (2003) e Harvey (2001), dentre outros tantos, analisam as mudanças das últimas décadas sob o ponto de vista das tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC). A tese central é que as experiências sociais com os tempos e espaços passaram por mudanças abissais desde a virada do século. As tecnologias de base telemática e informacionais têm gerado transformações culturais em todas as instâncias sociais do mundo, inclusive na educação. Algumas dessas mudanças educacionais podem ser consideradas positivas e importantes, embora outras consequências menos benéficas possam ser identificadas. Do ponto de vista da sociedade cibercultural, as TICs fizeram emergir novas formas de relacionamento sociais e novas maneiras de experimentar o tempo e o espaço. No centro destas análises, estão as questões espaçotemporais da educação, com destaque para a aula e a sala de aula.

Conforme Kenski (2003, p. 23), o uso das tecnologias de informação e comunicação, caracterizadas como midiáticas, criaram uma nova cultura e um novo modelo de sociedade — o que, direta ou indiretamente, influenciou

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a educação em praticamente todos os sentidos. Em sentido semelhante, Mill e Fidalgo (2006, p. 20) afirmam que, “[...] sendo a educação uma atividade perpassada pelos processos comunicacionais, ela é diretamente influenciada pelas novas possibilidades comunicacionais criadas pela digitalização ou virtualização”. Enfim, é nessa direção que várias discussões contemporâneas são abertas sobre as transformações ocorridas na educação em função do avanço tecnológico. Tais transformações ocorrem em diversos aspectos, principalmente nos espaços/tempos educacionais (especialmente o ensinar e aprender na sala de aula).

Com o uso das tecnologias digitais na educação, a noção de espaços e tempos mudou drasticamente, inclusive no âmbito da educação. As TDIC possibilitaram “[...] a criação de situações pedagógicas diversificadas, ricas e complexas, incentivando a autonomia do aluno e de todos os envolvidos” (PERRENOUD, 2000, p. 139). Seguindo a mesma linha de raciocínio e referindo-se aos espaços da sala de aula, Kenski (2003) acrescenta outras alterações provocadas pela inserção das tecnologias digitais na educação, destacando aí dois aspectos.

As tecnologias redimensionam o espaço da sala de aula em dois aspectos: primeiro aos procedimentos realizados pelo grupo de alunos e professores no espaço físico da sala de aula. No segundo aspecto, é o próprio espaço da sala de aula que também se altera (KENSKI, 2003, p. 50).

Mudanças, portanto, nas concepções de sala de aula (organização espacial e conforto) e aula (relação social com o tempo e o conteúdo). Como argumenta Araujo (2008, p. 59), uma “[...] aula se realiza em um espaço e em um tempo demarcados, mas apresenta uma composição de unidades, que pressupõe uma estruturação entre objetivo, finalidade, conteúdo, método e técnica de ensino, tecnologia e avaliação”. Dussel e Caruso (2003, p. 237) acrescentam que “[...] o espaço da sala de aula não é definido unicamente

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pelas tecnologias, mas em grande parte do que homens e mulheres se dispunham a fazer destas tecnologias”. A despeito do atual estágio de desenvolvimento das tecnologias digitais, a relação ensino-aprendizagem ainda possui como princípio primeiro a relação entre educador e educando.

No âmbito da educação a distância (EaD), a relação entre educação e telemática é mais explícita e também intensamente explorada. Os ambientes virtuais de aprendizagem, as videoconferências, as discussões virtuais em fóruns e outras ferramentas da modalidade de EaD representam possibilidades até então desconhecidas de experimentar o tempo e o espaço na educação. Vejamos mais detalhadamente no próximo tópico essa questão.

Mudanças espaços-temporais na educação contemporânea

Nos últimos anos, muito se ouve falar em mudanças paradigmáticas. Também na educação, essas discussões são evidentes e é nesse contexto que a modalidade de EaD emerge como uma possibilidade adicional de formação inicial ou continuada. Intensamente permeada por TDIC, o contexto educacional contemporâneo caracteriza pela mudança nas formas de aprender e de ensinar. A EaD ganha impulsos como uma modalidade educacional com intenso uso de mídias informacionais e com proposta pedagógica descentralizada, em que docentes e estudantes compartilham informações e aprendem colaborativamente. Especialmente na EaD, o professor perde a centralidade do processo e ganha status de orientador da aprendizagem dos seus alunos. Pelas possibilidades de comunicação síncronas e assíncronas das TDIC, o aluno da EaD pode não ter contato direto com o docente. Esta relação diferenciada entre professor-aluno é mediada por múltiplas mídias e por materiais didáticos diversos. Isso está

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diretamente relacionado às formas como as pessoas se organizam na “sala de aula”: os alunos para aprenderem (colaborativamente) e o professor para manejar sua turma e oferecer uma aula didaticamente organizada.

Para atender a uma nova distribuição espaço-temporal dos sujeitos do ensino-aprendizagem na EaD, aos poucos foram sendo criadas outras estruturas de “sala de aula” e novos tempos educacionais. Segundo Frago e Escolano (2001, p. 134), a imagem do espaço de sala de aula é como um espaço aberto, não mais a imagem de sala de aula como espaço fechado. As TDIC possibilitaram a reformulação do processo educativo, da relação professor-aluno, da aula e do manejo da turma, da sala de aula e de todos os espaços escolares. Essa mudança de paradigma educacional não é exclusiva da EaD e também vale para a educação presencial. Como afirma Behar (2009, p. 20).

A mudança paradigmática na educação aconteceu de fora para dentro, resultante da introdução das tecnologias da informação e da comunicação, levando a um novo perfil de instituição e à reformulação das funções do ‘atores’ envolvidos, entre eles gestores da educação, professores, alunos e monitores (BEHAR, 2009, p. 20).

Da sala de aula presencial entre quatro paredes para uma sala de aula virtual, muita coisa muda, mas não em essência. Continua a idéia de um docente com intenção de ensinar e alunos com desejo ou interesse em aprender. As mudanças nos espaços e tempos da educação permitem o ensino-aprendizagem sem que alunos e professores estejam, face-a-face, num mesmo lugar e num determinado momento ou duração. A aula acontece em espaços e tempos diferentes. Segundo Xavier e Fernandes (2008, p. 238), existem outros espaços e tempos que precedem e sucedem no momento da aula, que não se resume ao que ocorre entre quatros paredes. Para possibilitar o gerenciamento destas relações sociais e de aprendizagem na

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EaD, foram desenvolvidos sistemas informáticos, denominados ambientes virtuais de aprendizagem (AVA). Esses sistemas permitem o gerenciamento das atividades organizadas de modo espaço-temporalmente diversificado e, grosso modo, funcionam como uma simulação do ambiente escolar ou universitário.

Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA) como simulação do ambiente escolar ou universitário

A compreensão do que são os ambientes virtuais de aprendizagem passa pela noção de redimensionamento da temporalidade e espacialidade da educação escolar e universitária. Trata-se de um lugar e uma duração diferenciada daqueles experimentados na educação presencial e isso exige uma reorganização dos processos de ensino e aprendizagem. A noção dos tempos de aula e dos espaços de sala de aula influencia na forma de ensinar e aprender. Portanto, alunos e professores da educação a distância (e mesmo da educação presencial, quando utiliza tecnologias digitais) precisam reformular sua forma de pensar e construir o conhecimento. A configuração de um ambiente virtual de aprendizagem (AVA) representa um primeiro passo para essa mudança de mentalidade psicopedagógica necessária aos sujeitos da educação, pois se instala no ciberespaço como um novo espaço que se desenvolve do nada. Como explicam Mill e Fidalgo (2006, p. 5), as redes globais de computadores não estão expandindo em nenhum domínio previamente existente, esse novo espaço tem certa dependência em relação ao espaço físico e ele só existe se as pessoas fizerem uso dele. Ao contrário do espaço físico, que existe com ou sem a nossa interferência. Esta é a primeira noção que um docente e um aluno precisam reformular: os espaços e tempos da educação virtual são sociais e fluidos, o que exige participação efetiva e colaboração. Do contrário, não

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existe os lugares e durações de aprendizagem e, portanto, nem as relações de aprendizagem em si.

Além disso, esses autores ressaltam que o ciberespaço surge em complemento ao espaço existente, não substituindo o espaço físico conhecido.

O surgimento do ciberespaço não suprime, obviamente, a existência do espaço físico; e, por outro lado, salienta-se que ambos, espaço físico e ciberespaço, estão entrelaçados – a começar pelo simples fato do ‘ciberEU’ ter como referencial o Eu físico; trata-se de um espaço que se abre somente quando o usuário conecta-se com a rede (MILL; FIDALGO, 2006, p. 7). Portanto, os AVAs são criados como referência virtual de espaços e tempos para sujeitos habitantes em contextos multiformes tradicionais. Professores e alunos coabitam dois mundos e as relações de ensino-aprendizagem se estabelecem em ambos os espaços e tempos. Esta complexidade inerente da aula virtual é simplificada pela noção de ambientes virtuais de aprendizagem, conhecidos como referência da comunidade de determinado grupo. Nesta perspectiva, existem diversos sistemas informáticos que se propõem como ambientes virtuais de aprendizagem, sendo todos portadores de positividades e limitações.

O desenvolvimento dos ambientes virtuais de aprendizagem só foi possível com o avanço das novas tecnologias digitais e principalmente da internet, que possibilita a interatividade síncrona e assíncrona, o redimensionamento espaço-temporal na educação entre outros aspectos.

Utilizando a web, tornam-se possíveis ações como a utilização, o armazenamento e a recuperação, a distribuição e compartilhamento instantâneo da informação; a superação dos limites de tempo e espaço; a construção do conhecimento pelo sujeito, da aprendizagem colaborativa e cooperativa, da maior autonomia dos sujeitos no processo de aprendizagem,

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do relacionamento hierárquico, do processo de avaliação continuada e formativa, por meio do uso de portfólio; um maior grau de interatividade pela utilização de comunicação síncrona e assíncrona (SCHLEMMER, 2005, p. 31).

Percebe-se, portanto, que o ciberespaço cria possibilidades educacionais antes não experimentadas, sendo o AVA uma sistematização objetiva dessas possibilidades num lugar e numa duração habitáveis pelos interessados. No AVA há interações síncronas (exemplos: bate-papo, webconferências etc.) e assíncronas (exemplo: fóruns, email etc.). Em qualquer dessas formas comunicacionais, o objetivo do AVA é viabilizar encontros e promover discussões e debates entre docentes e discentes.

Segundo Oliveira (2008, p. 205), nos fóruns, o orientador acadêmico lança inicialmente um tema ou uma situação-problema inter-relacionada ao conteúdo em questão e os educandos registram suas argumentações e opiniões, interagindo com os demais participantes, sob a supervisão do moderador e coordenador. Tecnicamente, esta dinâmica é gerenciada pelo AVA, que são configurados de maneira específica de acordo com a concepção pedagógica do grupo de educadores envolvido. Do ponto de vista pedagógico, o AVA dá suporte ao professor e sua equipe de profissionais no auxílio aos seus alunos.

Esta nova configuração das relações de ensino-aprendizagem na EaD virtual acaba reformulando as formas de ensinar e aprender. O fato de não existir (ou reduzir) os contatos face-a-face entre professor-alunos exige outras formas de pensar a interação e o uso da linguagem. Isso não é necessariamente um problema ou dificultador, pois como afirma Kenski (2007, p. 88), “[...] o uso adequado das tecnologias em atividades de EaD pode criar laços e aproximações bem mais firmes do que as interações que ocorrem no breve tempo da aula presencial”.

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A educação a distância se configura de maneira diferenciada quando comparada com a modalidade presencial porque a construção do conhecimento e a relação professor e aluno acontece em tempos e espaços distintos, com isso a configuração do modelo pedagógico deve ser pensado com base nessas e outras peculiaridades presentes na educação a distância (BEHAR, 2009, p. 17).

Dependendo da concepção pedagógica, o AVA pode potencializar o desenvolvimento dos estudantes, especialmente aquelas propostas de formação baseadas nas relações sociais. Por esse motivo, a maioria das experiências de EaD atuais se propõem como interacionista. Schlemmer (2005, p. 34) faz essa associação entre a “concepção interacionista” e os “ambientes virtuais de aprendizagem” e as “comunidades virtuais de aprendizagem”, tratando-os como “espaços nos quais os sujeitos podem interagir e construir conhecimento”. Daí a importância da escolha de um AVA adequado.

Na utilização de um ambiente virtual de aprendizagem (AVA), o primeiro e mais importante item a ser analisado é o critério didático-pedagógico do software, pois todo e qualquer desenvolvimento de um produto para educação é permeado por uma concepção epistemológica, ou seja, por uma crença de como se dá a aquisição do conhecimento, de como o sujeito aprende (SCHLEMMER, 2005, p. 34).

Enfim, a escolha e configuração dos ambientes virtuais de aprendizagem é aspecto muito importante dos cursos a distância, pois a forma como é planejada e as ferramentas utilizadas carregam concepções de educação. Se do ponto de vista técnico um AVA se pretende neutro (embora não o seja, visto que nenhuma tecnologia o é), do ponto de vista pedagógico ele não pode se omitir desta não-neutralidade. É nesse espaço que os processos educacionais da EaD acontecerão mais intensamente,

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pois é nele que alunos e professores irão desenvolver atividades de ensino e aprendizagem através das interações proporcionadas pelas tecnologias de informação e comunicação.

Também os tempos do ensinar e aprender são influenciados pela proposta de ambiente virtual de aprendizagem. Afinal de contas, é no tempo que está o movimento do espaço. O tempo entendido como quarta dimensão do espaço. No espaço tridimensional não há movimento, até que a duração se instale.

Sala de aula virtual: considerações finais

Neste texto, propusemos uma reflexão sobre a sala de aula virtual como novo ambiente de ensino-aprendizagem, em que se estabelecem as relações entre docente e alunos. Como afirmaram Mill e Fidalgo (2006, p. 24), “[...] uma sala de aula virtual continua sendo uma sala de aula”. O que muda na instalação da sala de aula virtual é o redimensionamento dos espaços e tempos do ambiente. Decorre daí uma série de mudanças nos processos, mas todos partem desse mesmo aspecto: novos tempos e espaços de ensinar e aprender. Como vimos, o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), entendido como o ambiente de sala de aula virtual, comporta a ação educativa da maioria das experiências da EaD na contemporaneidade. É na sala de aula virtual que os envolvidos com o processo de ensino-aprendizagem na modalidade de educação a distância compartilham seus conhecimentos.

Neste contexto, Behar (2009, p. 23) orienta que “[...] o papel das TDIC é contribuir para ‘diminuir’ essa ‘distância pedagógica’, assegurando formas de comunicação e interação entre os ‘atores’ envolvidos no processo de construção do conhecimento pela EaD”. As tecnologias digitais são

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fundamentais, portanto, para que a aula virtual aconteça. Entretanto, o movimento educativo para a estruturação de uma proposta pedagógica rica e contextualizada é essencial para que o ambiente virtual exerça adequadamente sua função... uma escola sem bons professores e o desejo de executar um bom projeto pedagógico não é muito mais do que uma construção tridimensional. O fazer educativo instalado no movimento dos sujeitos envolvidos é que vai nos demonstrar o potencial da escola ou do AVA como espaços privilegiados de formação e da educação.

Na sala de aula virtual, várias ferramentas podem ser utilizadas para simular as condições de uma sala de aula presencial. Palloff e Pratt (2002, p. 73) observam que “[...] as aulas, os encontros e as reuniões, as oficinas e os seminários eletrônicos podem ser ministrados tanto de maneira sincrônica (em tempo real ou chat) quanto assincrônica (quando as mensagens são enviadas em intervalos mais espaçados)”. Mensagens instantâneas ou não são trocadas no ambiente virtual de acordo com os interesses dos sujeitos, configurando-se, assim, as condições desejáveis para o ensino e a aprendizagem.

A comunicação sincrônica pode ser uma ferramenta muito útil na sala de aula eletrônica, mas não deve deixar de levar em consideração os seguintes fatores: trabalho preferencial com grupo pequenos, cuidado com o fuso horário e determinação prévia das diretrizes do curso para que os participantes tenham espaço igual para se manifestarem. Nas reuniões assincrônicas, pode-se dispor do tempo. As mensagens são enviadas de acordo com a vontade dos participantes, que têm tempo de ler, processar a informação e, finalmente, responder (PALLOFF; PRATT, 2002, p. 73).

Percebe-se que as atividades pedagógicas que tradicionalmente ficavam circunscritas no espaço da sala de aula ou, de modo mais amplo, nos limites da escola, ganham uma nova configuração. Essa reconfiguração

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afeta diretamente os espaços construídos para fins educacionais como conhecemos até hoje; isto é, afeta os ambientes das salas de aulas e das escolas. Como sintetiza Kenski (2001, p. 126), as TDIC tornam os espaços permanentemente mutantes, em que as escolas virtuais refletem e apresentam uma nova forma de linguagem e de cultura, características do momento tecnológico que vivemos na atualidade. Daí as concepções de ciberespaço e cibercultura.

Como Dussel e Caruso (2003, p. 208), entendemos a sala de aula como o lugar em que se aprende, onde o ensino e a comunicação se ajustam num espaço de aprendizagem. Do mesmo modo, compreendemos que a aula é o momento, por excelência, quando se aprende. Por isso, entendemos as salas de aula virtual ou tradicional como ambientes ou lugares de aprendizagem. Nesse sentido, os ambientes virtuais de aprendizagem constituem-se como salas de aulas virtuais, planejadas e organizadas como ambientes privilegiadamente educativos – embora a sua organização seja distribuída e descentralizada no espaço e com temporalidades diversas. Decorre daí a compreensão de ambientes virtuais de aprendizagem como “[...] um espaço na internet formado pelos sujeitos e suas interações e formas de comunicação que se estabelecem por meio de uma plataforma, tendo como foco principal a aprendizagem” (BEHAR, 2009, p. 29).

Conforme Mill e Fidalgo (2006, p. 26), um AVA caracteriza-se primordialmente pela flexibilidade espaçotemporal; e, dessa maneira, as relações aí estabelecidas não obedecem à mesma lógica do espaço material ou geográfico, nem das experiências tradicionais que estabelecemos com o tempo. A sala de aula virtual está, por isso, em todo lugar e a qualquer momento. Em decorrência, “[...] quando a aula sai do espaço físico da sala de aula para ocupar ambiente virtual, praticamente todas as fases do processo didático alteram-se, desde a estruturação da aula até a relação com o aprendiz na condição da aula virtual” (OLIVEIRA, 2008, p. 210). Por isso,

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a aula na EaD e a sala de aula virtual – como espaço de trabalho do docente e dos alunos da EaD virtual – apenas possuem uma configuração distinta daquela tradicional, mas continuam sendo um lugar e um momento de ensinar e aprender (MILL; FIDALGO, 2006, p. 25). Reconfigurados dessa forma, os novos espaços e tempos adéquam-se às novas necessidades e, ou, ao estágio de desenvolvimento tecnológico; descartando a necessidade de professores e alunos estarem presentes num mesmo espaço e tempo num lugar determinado para discutir um tema e promover a construção do conhecimento – o que é inevitável e essencial na aula presencial.

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A Comunicação na “Era do Príncipe Eletrônico”: a EAD como desafio político e pedagógico

Eliana Romão(UFS)

Cesar Nunes(UNICAMP)

IntroduçãoNa história da formação política e no registro das constituições

econômicas e culturais hegemônicas, muitos príncipes foram criados. Em diversos cenários de diferentes épocas, lideranças constituídas em forma de figuras e metáforas se sucederam e ocuparam espaços por muito tempo, sobretudo no universo da política. Muitos príncipes marcaram épocas, em diferentes regimes – na monarquia e na república, na democracia e na tirania, na guerra e na paz. Em ordenamentos hierárquicos de natureza política, com adensamentos de linhagens sucessórias sobrepõe-se o príncipe como a consubstanciação do poder. Para Ianni (2000), o príncipe eletrônico tem sido figura importante na teoria e na prática da política, e esse símbolo por diferentes denominações aparece em toda história dos tempos modernos. A começar pelo “Príncipe de Maquiavel” tido como uma pessoa, figura

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política capaz de articular suas qualidades, de atuar de exercer sua liderança de modo notável. O Príncipe de Maquiavel, cuja invenção inaugura no século XVI o pensamento político moderno, é considerado uma expressão influente, embora controvertida, na sociedade moderna. O autor lembra que muitos textos de política, tomados como referências de diversos governos, destacados presidentes e inúmeros pensadores dialogam, seja de forma aberta ou velada, tomando como referência de liderança política o primeiro príncipe: o Príncipe de Maquiavel. Muitos os têm como modelo.

Na medida em que se realiza como príncipe, este se mostra preparado para pensar, decidir, negociar, dirigir, administrar e agir, conciliar e dividir, premiar e punir, constituindo-se como símbolo ou emblema para uns e para outros indivíduos em coletividades [...] (IANNI, 2000, p. 142).

Muito tempo depois, no século XX, Gramsci formula o “Moderno Príncipe” tido, na esteira do autor, como um partido político, intérprete e condutor dos indivíduos, coletividades, grupos e classes sociais. O moderno príncipe apresenta-se, primando pelo ideário coletivo, dotado de capacidades tanto de interpretar os seguidores do partido como outros setores da sociedade e até adversários.

No final do século XX, de acordo com o autor, parece que os conceitos e representações dos príncipes de Maquiavel e de Gramsci foram superados e apelam para outras configurações. Na era da globalização, era em que o conhecimento ultrapassa a barreira do tempo e espaço, são afetadas as estruturas e relações de poder, as formas de convivência, as forças sociais nos universos do trabalho, do lazer, da cultura, da comunicação, da formação de diferentes profissionais, da educação de novas e velhas gerações, da educ(ação) do professor. Ianni (2000), descreve também que em lugar do Príncipe de Maquiavel e do moderno príncipe de Gramsci,

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assim como outros príncipes que sucederam nos tempos modernos, cria-se o “Príncipe Eletrônico” que simultaneamente subordina, recria e absorve ou simplesmente supera as outras personagens simbólicas e históricas.

Nesse contexto, de alguma maneira, todas as esferas da sociedade são influenciadas e desafiadas pela expansão das tecnologias eletrônicas, informáticas e cibernéticas. Para o autor posto em destaque, esse pode ser o clima em que se impõe o “príncipe eletrônico” sem o qual seria difícil avançar e entender no universo da ciência, da penetrabilidade das tecnologias de comunicação e informação nas plurívocas formas de relações humanas.

Na atualidade, o príncipe já não é mais um líder ou partido político, mas uma proposição que transcende os descortinos, tinos e desatinos dos príncipes anteriores, ainda que de forma enigmática. O Príncipe Eletrônico é uma entidade nebulosa e ativa, presente e invisível, predominante abstrata e ubíqua, permeando continuamente todos os níveis da sociedade em âmbito local, nacional, regional e mundial [...] (IANNI, 2000, p. 148).

O “Príncipe Eletrônico”, enfim, apresenta-se com uma nova e diferente índole política, diversa dos príncipes do passado e convive com o espólio dessas figuras de diferentes maneiras, mas ganha projeção e importância na virtualidade. O autor, ainda, adverte, se queremos compreender a crescente importância das tecnologias, sejam eletrônicas, informáticas, midiáticas educativas, importa começar pelo reconhecimento de que este século, a exemplo do século passado, está impregnado, organizado, dinamizado e influenciado por invenções tecnológicas e técnicas sociais. As tecnologias de informação e comunicação não estão “protegidas pela neutralidade”. Assim, o que parece neutro logo se revela influente e até decisivo no mundo pelo qual se constitui as relações sociais.

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Duas atitudes se destacam no cenário dessa contradição: a adoção idolatrada das tecnologias na educação, concebidas como demiúrgicas e soteriológicas, por um lado, e de outro a negação de sua potencialidade, um sentimento de rejeição, misturado a uma panacéia supostamente pré-industrial e ingenuamente naturalista, bucólica, que se ressente de toda tecnologia como maléfica e desumanizadora. Há urgente necessidade de superar tais conceitos maniqueístas e distantes do acurado senso histórico e político.

Muito se debate sobre a utilidade das TIC, colocando em evidência se são boas ou ruins, divinas ou diabólicas, mas ninguém duvida de sua interferência no solo e (sub)solo da vida humana. Castells (1999) lembra que as redes interativas de computadores estão crescendo e criando formas de comunicação e relações “moldando a vida” e, ao mesmo tempo, sendo moldadas por ela.

Nessa realidade, projetos de educação em ambientes não convencionais, potencializados pelas tecnologias de informação e comunicação, tomam vulto. O censo da Educação Superior de 2006, publicado dois anos depois em Brasília, mostra que a Educação a Distância é a modalidade de educação que mais cresce no Brasil. O censo mostra um crescimento de 571%. Com tal crescimento o número de estudantes, incluindo professores em formação, também aumentou – de 49 mil estudantes em 2003 passou, três anos depois, para 207 mil, um aumento correspondente a 315%. A aceitação desses cursos deve-se, conforme a mesma fonte, a três fatores principais: à credibilidade do caminho adotado pela EAD, à criação da Universidade Aberta do Brasil (UAB), e, ao lado disso, a penetrabilidade e contribuição das novas tecnologias nos últimos anos. Importa lembrar, porém, que aumentam também problemas e desafios que se misturam entre as velhas e novas formas de se valer dos meios, das técnicas e das tecnologias de ensinar e aprender, seja de perto, seja de longe.

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É sabido que a EAD tem sido caminho de formação, seja amparada pela tecnologia da escassez ou pela tecnologia da fartura, há mais de 170 anos, pois EAD faz história desde 1840 ou “até antes”. A EAD ganha projeção no Brasil, todavia, como modalidade de educação e, com efeito, objeto de estudo e debate após a promulgação da LDBEN no. 9394, promulgada em 1996. A EAD, em muito, apesar de sua especificidade, aproxima-se da educação presencial, até naquilo que é apontado como sua marca principal: “o aluno se envolve na aprendizagem em local onde o professor não está fisicamente presente.” Ocorre que todo bom professor é capaz de transformar o afastamento entre ele e o aluno em proximidade e fazer a passagem de sua intensa ausência em intensa presença. Importa, porém, reconhecer na modalidade aqui em destaque os encontros são mais escassos que os encontros previstos em cursos convencionais de formação. Assim, não há como projetar e desenvolver experiências de educação a distância sem contar com meios e tecnologias para estabelecer a comunicação que toda relação educativa requer.

Constatações e desafios

A mesma base conceitual que ampara a educação presencial é, igualmente, comum a ambientes virtuais de educação, embora cada qual preserve suas especificidades, pois estamos falando de educação, uma dimensão estrutural da práxis social. Os desafios que emergem de formas diferentes de educação são similares, quais sejam: identificar que educação se pretende realizar, para quem se dirige, com quem será desenvolvida e com quais meios e tecnologias. Almeida (2003) assinala que a compreensão da complexidade de projetos educativos, particularmente a distância quer seja na sua forma mista ou inteiramente online, apela para construir inter-relações entre as abordagens que fundamentam tanto a educação

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convencional como não-convencional e, sobretudo, implica em admitir, acrescenta a autora, que mudar o meio pelo qual se utiliza e constrói a relação educativa significa mudar a própria educação.

Os desafios, porém, não terminam por aí. Importa não descurar da concepção de educação subjacente. Uma educação de qualidade que, de fato, atenda a que veio, não é exclusividade desta ou daquela forma de educação. Note que, mesmo mediante os impactos que as TIC têm causado no campo educativo, nada vai substituir os encantamentos que emergem do encontro ao vivo e a cores. Sabe-se que as novas tecnologias educativas poderão facilitar os canais de informação e comunicação até com maior “rapidez e eficiência” que as pessoas, sobretudo no âmbito da educação – o professor, mas, conforme aproximam-se Arroyo (2000), Kenski (2003), Romão (2008),

[...] um vídeo, uma parabólica, um computador... não darão conta do papel socializador da escola, do encontro de gerações, da intersubjetividade, do aprendizado humano que se deu sempre no convívio direto de pessoas, nas linguagens e nas ferramentas da cultura, nos gestos, nos símbolos e comemorações [...] (ARROYO, 2000, p. 168).

De qualquer maneira, nesse campo tudo é muito incerto, pleno de tensões e provocações. Indagações variadas são levantadas. Uma delas, todavia, continua a desafiar o professor, esteja ele de perto, esteja ele de longe, a saber: como minimizar a dificuldade de contato e interagir com o aluno distante? Se de perto é correto entender que o universo da educação já é, por si, complexo, a complexidade aumenta quando se conceitua essa relação de longe. O aluno, por vezes, se vê enovelado com diversas distâncias. Alguns, de acordo com Romão (2007), chegam a afirmar que tudo é tão distante que nem sabem por onde começar para tirarem suas dúvidas.

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Professores tutores do Distrito Federal, sujeitos da pesquisa em destaque, também apresentam suas queixas as quais se alongam em experiências tidas como inovadoras de educação.

O aluno fica em casa, quieto, a distância, bem distante, sem interação alguma. Ele só lê ou não o material impresso que recebeu e o faz, por vezes, na superficialidade. Outras vezes se esconde no trabalho em grupo que é muito cômodo. A maior dificuldade é criar uma consciência de grupo. E isso “não é defeito da distância” por no presencial também é assim. (ROMÃO, 2008, p. 86).

Diante dessa realidade há de pensar-se no como fazer para diminuir ou encurtar os caminhos e rever as formas de convivências pedagógicas. Como lidar com a dificuldade de contato e constituir a relação educativa? Maraschin (2000) afirma que aprender não é apenas mudança de comportamento, mas mudança de convivência. Educação, portanto, evoca mudança de convivência, evoca o encontro, evoca, mais que isso, relação. Relação dialogal que provoca, acrescenta Romão (2008), não necessariamente a negação ou “suspensão da distância”, mas o enfrentamento da distância para que ela, de par com a intensa presença se constitua como possibilidade de educação.

É aceitando a distância que será possível fazer nascer dela a presença e, portanto, instaurar-se a relação educativa. É preciso, pois querer a todo custo negar ou suspender a distância, mas aprender a lidar com ela, de modo que seja possível fazer nascer dela a presença e, assim, fazer a passagem do encontro para a relação. Importa aprender a lidar, a aceitar e a compreender o sentido da distância para que nela se constitua uma forma de presença dialogada e a relação educativa nela germine. Quando Paulo Freire ficou viúvo, Romão (2002, p. 88) relata seu desespero ao lembrar de

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uma placa encontrada no túmulo de Elza a qual dizia: “Quem me dera que eu pudesse passar de um tempo para o outro com a pressa e a maciez com que as nuvens andam no lindo azul do céu.” Cinco anos mais tarde, após três anos de viver uma nova experiência no casamento, o ex-viúvo retorna ao cemitério com outra placa, dizendo:

ElzaCorte fundoDor intensaNoites sem manhãDias sem sentidoTempo coisificado, imobilizadoDesespero, angústia, solidãoFoi preciso aceitar a tua ausência Para que ela virasse presençaNa saudade amena que tenho de ti.Por isso, voltei à vida sem te negar.(FREIRE, 1991 apud ROMÃO, 2002, p. 89)

À distância e a presença, como especificidades de processos educativos se embolam. Na dinâmica dessa relação, a distância e a proximidade, a presença e a ausência, o velho e o novo se fundem. Na distância alimenta-se o interesse do encontro, ao passo que é no encontro com presença, com relação, se define e motiva o que fazer e produzir na distância. Distância e presença caminham sem que necessariamente esta venha em detrimento daquela.

A questão, afirma Romão (2008), não é suspender a distância, mas admiti-la e transformá-la em momentos de reflexão. A partir do momento

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em que se reflete sobre o que se faz passamos a ressignificar, a construir, a mudar. À distância, para dezenas de professores entrevistados, é fato quando “o aluno está fazendo sua reflexão em cima do módulo, a articulação lá com seu cotidiano” (ROMÃO, 2008, p. 142). Assim, a distância vista como necessária para “poder respirar”, permite a oxigenação da prática e a passagem da intensa ausência para intensa presença. O que antes se via distante se vê próximo. Quando a distância é tida como momento de reflexão, reflexão que abarca a ação e ação que parte da reflexão, emerge a dimensão transformadora do trabalho educativo.

É preciso saber didaticamente que fazer com a natureza da educação em que a presença não é obrigatória, que fazer quando o aluno está separado do professor. Importa trazê-lo para alguma forma de presença, pois em experiências de educação, prevê que é necessário o ajuntamento de pessoas. No momento em que encontros presenciais são escassos, os professores em formação que inspiraram o presente texto, estão desenvolvendo algum tipo de atividade que qualifica o momento presencial de modo que este momento se alongue na distância. Não há uma presença integral, até porque a proposta é de formação a distância, mas há uma presença tida como qualificada.

O que determina, assim, experiências de educação em ambientes não convencionais de educação, de acordo com o balanço de entrevistas, assinala Romão (2004, 2008), não é comparecer todos os dias na universidade – não é isso que faz a diferença, mas, entre outros, a forma de organizar e se utilizar dos meios, das tecnologias, desenvolver as técnicas no desenvolvimento da relação educativa e, enfim, lidar com os desafios inerentes ao trabalho pedagógico que se instaura, seja em experiências de educação na presença, seja na distância. Se contando com as vantagens do encontro presencial é complexo, a complexidade parece aumentar a distância. Não pela distância em si, mas porque estamos habituados a pensar e a depender da presença,

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das formas de contatos tradicionais e convencionais de ensinagem e aprendizagem. Japiassu (1975, p. 163) lembra que as facilidades do contato presencial dificilmente a educação a distância irá superar, “[...] pois os estudantes têm necessidade fundamental de um contato vivo com o educador capaz de fazer coisas que máquina algumas terá condições de fazer [...]”. Importa, todavia, sem ignorar o valor do encontro face a face, discutir novas formas de educação. Ademais, a distância, porém, “não é um defeito” dos vários modelos de EAD, seja na sua forma combinada, seja na sua forma pura, seja online, pois é necessária “para respirar.” É necessária, então, para oxigenar a prática e, enfim, transformá-la.

Numa época em que se alteram as dimensões produtivas da própria realidade, os conceitos de espaço e tempo tradicionais sofrem profundas superações. Importa analisar esses elementos e buscar decodificar sua gênese e alcance político. Não é a potencialidade dos meios ou a manutenção da tradicionalidade das coisas que determinará o caráter mais democrático ou conservador de algum processo ou mediação, mas sim a determinação política que a envolve e direciona.

A educação a distância, por essa perspectiva, mantém vivo o processo educativo. Para manter um projeto de educação substanciosamente atrativo, não basta, contudo, respirar. Assim, como ocorre com o ser humano. Para viver, não basta apenas respirar. Note o que adverte Rousseau (1999, p. 150), “viver não é respirar, mas agir; é fazer uso de nós mesmos que nos dão o sentimento de nossa existência”. Para manter ambientes virtuais vivos e atraentes, não basta apenas cuidar dos seus pulmões, mas, cuidar e preparar os profissionais de modo que saibam fazer uso de suas faculdades em face da complexidade da educação. Cuidar dos meios, das técnicas e das tecnologias de educação e comunicação sem, no entanto, deixar na penumbra aqueles que se valem desses recursos na mediação do saber. Quando Lévy (2000) pensou sobre as tecnologias denominadas por ele “da inteligência” ou

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“intelectuais” e dizia que tais tecnologias estruturam em profundidade o uso das faculdades de percepção, manipulação e de imaginação, fez uma homenagem a “aventura intelectual humana”. Tecnologias intelectuais participam de modo fundamental nos processos cognitivos, no interior da capacidade humana. O reconhecimento de sua importância não está em si mesma, mas na sua relação com o mundo cognoscitivo e, assim, na sua relação com o mundo humano nas suas relações sociais. As tecnologias no campo da educação só têm sentido se utilizadas para elevação da condição humana e, portanto, possibilitarem o diálogo entre os sujeitos envolvidos no processo. Assim, as tecnologias dialogais pedem passagem.

Tecnologias dialogais

Ambientes não convencionais de educação, marcados, sobretudo, pela separação entre professores e alunos, apela para o estudo e uso dos meios e das tecnologias – as quais se divergem entre si, merece atenção cuidadosa. O número de cursos de formação, incluindo de professores, tem crescido potencializado pelos avanços das tecnologias educativas, sobretudo em ambientes não convencionais de educação. Os processos de comunicação e interlocução educativos, no interior desses cursos, tais como: a leitura, a escrita, a ensinagem e a aprendizagem, não ocorrem sem que venha se valer, entre outros, do emprego das técnicas e das tecnologias. Isso, porém, não se reduz a uma visão meramente tecnicista, nem tampouco do vazio teórico. Denomina-se tecnologia, conforme lembra Kenski (2007), um conjunto de conhecimentos e princípios científicos que se aplicam ao planejamento, à construção e à utilização de um equipamento em um determinado tipo de atividade. Ao passo que técnicas, acrescenta, se referem aos modos ou

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aos jeitos ou, ainda, as habilidades de se valer dos mais variados tipos de tecnologias.

Ambas terminologias, porém, resultam da mesma raiz – do grego, techné –, que, conforme Lion (1997), lembra estado de criação, implica uma verdadeira linha de raciocínio. O termo tecnologia, portanto, vai além de uma mera ferramenta, de um mero instrumento ou recurso, se incorpora ao contexto social, ao sujeito cognoscente que indaga, que estranha, sujeito de criação e de luz. Tecnologias fazem parte do tecido social que atravessam as práticas educativas. Rumble (2000) vai mais adiante ao lembrar os meios como uma forma genérica de comunicação e, ao mesmo tempo, formas particulares de viabilizar o conhecimento. Cada qual tem sua maneira de difundir o conhecimento, mas, igualmente, de organizá-lo em certos “formatos e estilos de apresentação”. Para o autor, a tecnologia é o veículo que transportam os meios. Os meios são vários – texto, áudio, TV, computação, contato humano presencial – e sempre andam de par com as tecnologias. Sejam elas mais tradicionais ou não – a exemplo do texto de par com a tecnologia da impressão, a computação, de par com as tecnologias de computadores, telefone, satélites, entre outros, que giram no entorno do príncipe eletrônico. Assim, elucida o autor,

[...] o texto está ligado a tecnologias de impressão e computadores; o áudio a fitas cassetes, rádio, telefone e discos; a televisão à transmissão, videocassetes, videodiscos, satélites, fibras óticas, ITFS, microondas, e videoconferências; e a computação a computadores, telefone, satélites, fibras óticas, ISDN, CD-ROM, CD-I. Essas tecnologias dão suporte a vários aplicativos de meios em educação a distância. (RUMBLE, 2000, p. 46).

A questão aqui não é nem pender para as mais tradicionais, nem pender para as mais recentes tecnologias, pois, de acordo com o autor,

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as tecnologias mais atuais não são tão necessariamente melhores do que as mais antigas. O que importa é que, sem ignorar em que medida tais realidades se distinguem, as TIC sejam operacionalizadas para atender os fins educativos a que se propõem. Como se utilizar desses quesitos de modo que os professores ensinem e os alunos aprendam e não se limitem apenas o contato, mas a interação dialogal com projeção revolucionária que todo projeto a altura de seu tempo requer.

O que quero enfatizar aproxima-se de Arroyo (2000), Valente (2000), Litwin (2001), Apareci (2006), Freire (2006b), Cobacho e Miravalles (2007), Kenski (2003, 2007), Romão (2008) ao lembrarem que não são as tecnologias que vão revolucionar o ensino e, com efeito, a educação, mas a maneira como as tecnologias são utilizadas na mediação do saber. Essa maneira é posta sob suspeita – “pode ou não ser inovadora”. A interação e a comunicação nos ambientes educativos, sejam eles em ambientes convencionais ou não de educação, quase sempre dependeram, de acordo com Kenski (2007), entre outros, muito mais das pessoas envolvidas no processo do que das tecnologias utilizadas, sejam as mais tradicionais, sejam as mais modernas.

Sancho (2006, p. 23), na mesma linha, vai mais longe, chamando a atenção da força das crenças e mentalidades subjacentes na utilização das tecnologias, no desenvolvimento dos meios e das técnicas de ensinagem e aprendizagem.

Professores costumam introduzir meios e técnicas adaptando-os à sua própria forma de entender o ensino, em vez de questionar suas crenças [...] As TIC são usadas muitas vezes para reforçar as crenças existentes sobre os ambientes de ensino em que ensinar é explicar, aprender é escutar e o conhecimento é o que contêm os livros-textos.

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Isso posto, ressalta-se a importância de relacionar os meios, as técnicas e as tecnologias a prática do diálogo entre os intérpretes dessa prática. Se é certo dizer que as tecnologias só têm sentido quando empregadas para humanizar, é certo também afirmar que só ganham força na educação quando provocam o diálogo que toda relação requer. Tecnologias dialogais favorecem a comunicação, a relação que toda proposta de educação libertadora reclama e revoluciona desde os tempos socráticos.

A interlocução dialogal desafia o trabalho educativo, particularmente, desenvolvido em ambientes em que o Príncipe Eletrônico reina quase absoluto, embora não seja exclusividade desta ou daquela forma de educação. O diálogo e a comunicação são tidos como condição determinante para a educação, para o processo de hominização, seja em que modalidade, seja em qualquer época. Não é no silêncio que os homens se fazem, diz Freire (1987, p. 78), mas na palavra, no trabalho [...], no encontro. O diálogo, acrescenta, “[...] é este encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo” (FREIRE,1987, p. 78), mas, para transformar-se a si e ao mundo. Se é certo afirmar que dizendo a palavra o mundo se pronuncia, se expressa e se eleva, é certo, igualmente, dizer que o diálogo se impõe como caminho pelo qual os homens elevam sua existência e a sua condição de ser. Toda criatura humana é necessariamente dialógica a medida que constrói sua plena realização apelando para o outro, com o outro, em comunhão com o mundo. Todos temos exemplos de que sempre necessitamos de alguém que necessita de nós. Freire (1987), Sacristán (2002), Peters (2001), Aretio e Corbella (2007), aproximam-se ao lembrarem que graças a relação com os outros vai desenrolando o próprio modo de ser, uma vez que descobrindo nesse processo como interpretar e enfrentar a realidade que nos rodeia.

É sabido que a responsabilidade para comigo mesmo não pode separar-se da responsabilidade com o resto dos homens. É na prática do diálogo que se experimenta um modo de vida tido como fundamental para

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a elevação da existência humana. O diálogo é o “traço da humanidade” que faz o homem se projetar como gente e não como coisa, como objeto. Sabe-se que é, porém, ser comum constatar o domínio da relação sujeito/objeto no lugar de sujeito/sujeito em práticas não só convencionais de educação, mas até naquelas tidas como inovadoras e revolucionárias. Vale insistir na relação sujeito/sujeito na direção de fazer emergir a relação educativa com base na reciprocidade.

Essa possibilidade histórica e institucional se apresenta vigorosa nas práticas de educação a distância. A tarefa, política e pedagógica, de constituir um conjunto de significações conceituais, mediações operacionais, liturgias e disposições de dialogo, de trocas de vivências e conhecimentos amplia-se nas atuais potencialidades de educação a distância. Os qualificantes políticos e as dimensões pedagógicas dessa modalidade educacional deverão ser construídos no chão da história, não negados ou celebrados a priori.

Relação educativa é reciprocidade, referência definitiva da educação. Os alunos, no processo de interlocução instaurada, diz Romão (2008), atuam sobre nós e num movimento de idas e vindas atuamos sobre eles. Trata-se de processos que se entrelaçam e se fortalecem em nó(s) que jamais serão desfeitos. São processos educativos no plural, não mais do eu aqui e o tu acolá, mas do eu e tu em comunhão, em ebulição, em comunicação, em processo efetivo de educação.

Cuando se plantea que la educación es comunicación, no se está refiriendo de forma exclusiva a la necesidad del lenguaje para transmitir una serie de conhocimientos, aunque, sin duda, estos son impotantes. Se está mostrando que esta acción exige contacto, relación, revelación entre personas. Si no se logra esse encuentro, esa revelación, entre os indivíduos, realmente no podríamos hablar de educación. (ARETIO; CORBELLA, 2007, p. 79).

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Considerações Finais

A prática educativa exige mais que contato, exige relação, exige laços entre as pessoas envolvidas. Sem querer cair na armadilha das comparações falazes, o uso adequado das TIC, tecnologias empregadas para humanizar, e, portanto, parece possibilitar laços, aproximações e encontros “bem mais firmes” que os encontros habituais em projetos em que sua natureza favorece a interação e o diálogo. Sem que se constitua a passagem do encontro para a relação não é possível falar em educação. Assim, todo ensino será educativo na medida em que seja capaz de promover a relação dialogal e, com efeito, a ação formativa, enquanto, acrescentam os autores, provoca o encontro entre os iguais na diversidade, “en la medida en que és capaz de revelar al otro modos de ser valiosos para su desarrollo” (ARETIO; CORBELLA, 2007, p. 79).

Isso posto, só tem sentido falar da educação em novos ambientes educativos quando não se perde de vista que o substantivo aqui é o príncipe, potencializado pela eletrônica, pelas invenções tecnológicas. Se origina da sociedade medieval, moderna ou contemporânea, não importa, pois que cada era viveu seus espantos e encantamentos. Importa perceber que seus braços, suas pernas, suas inteligências e, até suas emoções emergem de nossos corpos e, assim, estão ligadas essencialmente a natureza humana, a elevação da humanidade. Estamos, portanto, falando de educação.

A Tecnologia Eletrônica é somente, de acordo com Cobacho e Miravelles (2007), Litwin (2000), Apareci (2006), um recurso a mais que pode facilitar os processos de ensinagem e aprendizagem. Para este modelo, uma câmara de vídeo, um lápis, um pen-drive, um data-show, “un ordenador”, entre outros, são instrumentos que permitem a comunicação, a reflexão, a compreensão da realidade, mas por si só pouco ou menos que nada podem

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fazer a favor do movimento de idas e vindas do pensamento. O movimento do pensamento em sua dupla função: “cognoscitiva e comunicativa.” É fácil entender que em estado de reciprocidade e diálogo o sujeito pensa em relação ao(s) outro(s). Para Freire (2006a, p. 66), “não se pode pensar sem a co-participação de outros sujeitos no ato de pensar sobre o objeto”. Não há um penso no singular, “mas um pensamos”. “É no pensamos, acrescenta o autor, que estabelece o penso e não o contrário. Esta co-participação dos sujeitos no ato de pensar que se dá a comunicação [...] A comunicação é diálogo, assim como o diálogo é comunicativo” (FREIRE, 2006a, p. 69). É reciprocidade, coisa essencialmente humana, pois à frente, não por trás, das TIC, das tecnologias ditas inteligentes, ditas humanas e, por isso, dialogais, encontramos profissionais diversos, professores vários que planejam suas atividades, selecionam livros, textos, idéias, saberes, definem os meios, as técnicas, as tecnologias educativas. Tecnologias, que transformam intensas ausências em intensas presenças; tecnologias como caminho que me leve ao outro e o outro a mim; um canal que me permita “el reconhecimiento de mi mismo en el outro”; tecnologias, enfim, que sirvam, elevar a condição humana.

Digo, ao fim, que se é certo que o bom ou o mau ou, até, razoável uso das tecnologias determinam a imagem da educação a distância é certo, igualmente, que são os docentes que promovem, junto, entre outros, com estudantes determinados a aprender, a educação. É a educação em sua essência que permite, seja de perto, seja de longe, aos estudantes compreenderem formas de participação nos procedimentos virtuais e, com efeito, entrarem em comunicação. Apareci (2006, p. 40), lembra que comunicação implica em diálogo “uma forma de relación que pone a dos o más personas en un proceso de interacción y de transformación continua”. Implica, assim, na participação efetiva das pessoas envolvidas, sobretudo, educandos e educador. Resta saber se este está disposto a sair

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do enclausuramento que o sufoca e descobrir-se a altura de seu tempo sem ficar a sombra dos príncipes que sucederam em sua época, sem ficar intimidado pelo príncipe eletrônico. É preciso desvendá-lo e desvendar as potencialidades do príncipe eletrônico significa tecer novas relações de saberes e poderes.

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Sobre os Autores

Adriana dos Santos Marmori Lima (UNEB)

Doutoranda em Educação (Universidade Udelmar/Chile). Mestre em Educação e Contemporaneidade (UNEB). Especialista em Alfabetização (FAEBA/IAT) e em Informática Educativa (UEFS). Pedagoga (UNEB). Professora, Pró-Reitora de Extensão e Vice-Reitora da Universidade do Estado da Bahia. Ex-Diretora do Campus IX - Barreiras e ex-Gerente de Extensão Universitária (UNEB). Possui experiência na área de Educação, com ênfase em Formação de Professores Alfabetizadores, Tecnologias de Informação e Comunicação Aplicada à Educação, Extensão Universitária e Gestão Acadêmica. Atuou como Multiplicadora do Núcleo de Tecnologia Educacional. E-mail: [email protected]

Adriana Rocha Bruno (UFJF)

Doutora e Mestre em Educação (Currículo pela Pontifícia Universidade Católica - São Paulo - PUCSP). Professora Adjunta do Departamento de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação Educação e em Gestão e Avaliação da Educação Pública da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Coordenadora de Inovação Acadêmica e Pedagógica no Ensino Superior (CIAPES) junto à PROGRAD-UFJF e coordena os tutores a distância do Curso de Pedagogia - FACED-UFJF-UAB. Líder do Grupo de Pesquisa Aprendizagem em Rede - GRUPAR. Pesquisadora da rede internacional de pesquisa COLEARN (Collaborative Open Learning - Comunidade de Pesquisa sobre Aprendizagem Colaborativa e Tecnologias, Open University). Atua na área de Educação, Pesquisa,

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principalmente a partir dos temas Docência no Ensino Superior, Formação de professores, Educação online e cibercultura, Didática, Aprendizagem de adultos, Neurociências e Educação, Mídias e Tecnologias. E-mail: [email protected]

Ana Maria Di Grado Hessel (PUC-SP)

Doutora e mestre em Educação (Currículo pela Pontifícia Universidade Católica - São Paulo-PUCSP) e graduada em Pedagogia (PUCSP), com especialização em Informática (Universidade Federal do Pará - UFPA). Professora do Departamento de Fundamentos da Educação da PUCSP e docente nos cursos de Tecnologia e Midias Digitais e no curso de Comunicação e Multimeios. Pesquisadora do Programa de Pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital, vinculada à linha de pesquisa Aprendizagem e Semiótica Cognitiva. E-mail: [email protected]

As duas são especialistas (Pós-Grad. Lato sensu), sendo que a Nara Brito está também vinculada ao Mestrado em Educação. A Especialização da Cida é na área de Planejamento e Organização da Educação a Distância.

Aparecida Ribeiro da Silva (UFSCar)

Especialista lato sensu em Planejamento e Organização da Educação a Distância. Graduada em Geografia (FUNORTE). Supervisora de Pólos (Universidade Aberta do Brasil da Universidade Federal de São Carlos - UAB-UFSCar) e membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação a Distância (GEPED-UFSCar). Atua na área de temáticas relacionadas ao redimensionamento dos espaços e tempos contemporâneo (sala de aula

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da EaD virtual) e ao ensino-aprendizagem pela modalidade de educação a distância (EaD). E-mail: [email protected]

César Aparecido Nunes (UNICAMP)

Doutor em Educação (Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP). Professor associado (UNICAMP). Livre-docente na área de Filosofia da Educação. Coordenador executivo do grupo de estudos e pesquisas em Filosofia e Educação Paidéia e presidente nacional da ABRADES. Coordenador do Centro Cultural de Integração e Inclusão Social (Cisguanabara-UNICAMP). Assessor da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários da Unicamp. Exerce atualmente a chefia do Departamento de Filosofia e História da Educação (FE-UNICAMP). Atua na área de educação, com ênfase em Filosofia da Educação e na linha de pesquisa Ética, Filosofia e Educação. E-mail: [email protected]

Daniel Mill (UFSCar)

Doutor em Educação. Professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Gestor de EaD e Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação a Distância. Membro do Grupo de Pesquisa Trabalho, Tecnologia e Educação (UFMG). Atuou na UEMG como professor e pesquisador. Atua na área de temáticas relacionadas à Educação a distância (gestão, tecnologia, trabalho docente, tempo, espaço, gênero, logística, mobilidade e sistemas de tutoria), relação mentes e máquinas, letramento e inclusão digital. E-mail:[email protected]

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Eliana Romão (UFS)

Doutora em Educação (Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP), Mestre em Educação (UNICAMP). Graduação em Pedagogia (Universidade Federal de Alagoas). Professora da Graduação (DEDI) e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Coordenadora de Pesquisa/Capes na área formação de professor e a criança nos anos iniciais do ensino fundamental. Pesquisadora na área de formação de professor no âmbito da Educação a Distância, bem como Docência, Formação de Professor e Narrativas. E-mail: [email protected]

João Mattar (Anhembi-Morumbi)

Pós-Doutor (Visiting Scholar, Stanford University - USA), Doutor em Letras (Universidade de São Paulo), Pós-Graduado em Administração (Escola de Administração de Empresas - Fundação Getúlio Vargas - SP). Bacharel em Filosofia (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP) (1986), Bacharel em Letras (Português, Inglês e Francês) (Universidade de São Paulo - USP). Cursos de Extensão (University of California - Berkeley e Departamento de Tecnologia Educacional da Boise State Univeristy - USA). Professor da Universidade Anhembi Morumbi. Professor autor e tutor da Faculdade Online UVB. Ex-professor e Coordenador de Pós-Graduação e Pesquisa (Unibero - Centro Universitário Ibero-Americano). E-mail: [email protected]

Lucila Pesce (UNIFESP)

Pós-doutora em Filosofia e História da Educação (Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP). Doutora e Mestre em Educação

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(Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). Bacharel e licenciada em Letras (Universidade Presbiteriana Mackenzie). Professora Adjunta Nível I da Universidade Federal de São Paulo. Ex-professora do Departamento de Fundamentos da Educação (PUC-SP), onde atuou no Programa de Pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital, no bacharelado em Tecnologia e Mídias Digitais, nas licenciaturas e na pós-graduação Lato Sensu. Membro dos Grupos de Pesquisa Informática em Saúde (UNIFESP), linha de pesquisa Educação em Saúde Mediada por Computador e Ecologia dos Saberes e Transdisciplinaridade (UCB), linha de pesquisa Docência Transdisciplinar e formação de professores. E-mail: [email protected]

Maria Olivia de Matos Oliveira (UNEB)

Pós-doutora em Educação (UERJ). Doutora em Calidad y Procesos de Innovación Educativa (Universidad Autonoma de Barcelona), Mestre em Calidad Educativa (Universidade Autónoma de Barcelona) e Mestre em Educação (Universidade Federal da Bahia - UFBA). Graduada em Pedagogia (UFBA). Especialista em EAD (Católica Virtual de Brasília).Professor Titular da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Professor titular da Universidade do Estado da Bahia. Trabalha com os processos formativos a Distância e as tecnologias aplicadas a Educação, atuando principalmente nas áreas de Formação de Professores para a Educação Infantil e EJA, Mídia e Mediação Pedagógica. E-mail: [email protected]

Nara Dias Brito (UFSCar)

Mestranda em Educação. Especialista lato sensu. Graduanda em Pedagogia (Universidade Federal de São Carlos - UFScar). Membro participante do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação a Distância

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da UFSCar. Secretária da Coordenação de Relações Institucionais da Secretaria de Educação a Distância da UFScar. Desenvolve estudos de iniciação cientifica com foco na educação a distância. E-mail: [email protected]

Osvaldo Biz (PUC-RGS)

Doutor em Comunicação Social e Mestre em História (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC-RGS). Bacharel em Comunicação Social, Jornalismo (PUC-RGS). Graduado em Licenciatura em Filosofia (Faculdade de Filosofia Nossa Senhora Imaculada Conceição). Bacharel e Licenciado em Geografia e História (Faculdade Salesiana). Professor da PUC-RGS. E-mail: [email protected]

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