237

Comunicação midiática

Embed Size (px)

Citation preview

  • COMUNICAO MIDITICAMATIZES, REPRESENTAES E RECONFIGURAES

  • Organizadores

    Dafne PedrosoLcia Coutinho

    Vilso Junior Santi

    COMUNICAO MIDITICAMATIZES, REPRESENTAES E RECONFIGURAES

    GEISC\PUCRS

    Porto Alegre2011

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Ficha Catalogrfica elaborada pelo Setor de Tratamento da Informao da BC-PUCRS.

    EDIPUCRS Editora Universitria da PUCRSAv. Ipiranga, 6681 Prdio 33Caixa Postal 1429 CEP 90619-900 Porto Alegre RS BrasilFone/fax: (51) 3320 3711e-mail: [email protected] - www.pucrs.br/edipucrs

    TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reproduo total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas grficos, microflmicos, fotogrficos, reprogrficos, fonogrficos, videogrficos. Vedada a memorizao e/ou a recuperao total ou parcial, bem como a incluso de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibies aplicam-se tambm s caractersticas grficas da obra e sua editorao. A violao dos direitos autorais punvel como crime (art. 184 e pargrafos, do Cdigo Penal), com pena de priso e multa, conjuntamente com busca e apreenso e indenizaes diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos direitos Autorais)

    C741 Comunicao miditica : matizes, representaes e reconfiguraes [recurso eletrnico] / org. Dafne Pedroso, Lcia Coutinho, Vilso Junior Santi. Dados eletrnicos. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2011.

    Modo de acesso: World Wide Web ISBN 978-85-397-0074-5

    1. Comunicao. 2. Imaginrio. 3. Cultura. 4. Sociedade. I. Pedroso, Dafne. II. Coutinho, Lcia. III. Santi, Vilso Junior.

    CDD 301.161

    EDIPUCRS, 2011

    Capa: Rodrigo Oliveira

    Diagramao: Rodrigo Valls

    Reviso Lingustica: Julia Roca dos Santos

  • COLABORADORES

    Ana Carolina EscosteguyProfessora do Programa de Ps-Graduao em Comunicao Social da PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Bruna do Amaral PaulinJornalista. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Camila Garcia KielingJornalista. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Camila Pereira MoralesPublicitria. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Caren Adriana Machado de MelloJornalista. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Carolina Conceio e SouzaPublicitria. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Caroline Delevati ColpoRelaes Pblicas. Doutoranda em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Cristiane Freitas GutfreindProfessora do Programa de Ps-Graduao em Comunicao Social da PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Dafne Reis Pedroso da SilvaJornalista. Doutoranda em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

  • Eduardo Campos PellandaProfessor do Programa de Ps-Graduao em Comunicao Social da PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Isabel Almeida Marinho do RgoPublicitria. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Karine dos Santos RuyJornalista. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Lcia Loner CoutinhoJornalista. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Samara KalilJornalista. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    Sandro Adalberto ColferaiGraduado em Letras. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR Email: [email protected]

    Vilso Junior SantiJornalista. Doutorando em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

  • AGRADECIMENTOS

    Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul e ao Programa de Ps-Graduao em Comunicao Social pela estrutura e apoio oferecidos.

    Aos professores do PPGCOM/PUCRS Ana Carolina Escosteguy, Cristiane Freitas Gutfreind, Eduardo Campos Pellanda, Antnio Hohlfeldt e Juremir Machado da Silva pelas contribuies, incentivo e inspirao.

    EDIPUCRS pelo acolhimento da proposta.

  • SUMRIO

    Prefcio ................................................................................................10

    Parte IMatizes do cinema brasileiro e sociedade

    1. A multiplicidade da pesquisa em cinema ..........................................13 Cristiane Freitas Gutfreind

    2. Circuito de exibio perifrico: cineclubismo e itinerncias ..............16 Dafne Reis Pedroso da Silva

    3. Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo .................31 Karine dos Santos Ruy

    4. O jogo cinematogrfico de Cama de Gato ........................................45 Isabel Almeida Marinho do Rgo

    Parte IICultura e representaes miditicas

    5. Em defesa de uma perspectiva analtica scio-cultural .....................63 Ana Carolina Escosteguy

    6. Favela-Movies e Favela-Series: novas representaes na produo audiovisual brasileira ............................................................................66 Lcia Loner Coutinho

    7. Esteretipos do Britpop atravs dos enquadramentos da revista New Musical Express ...................................................................................82 Bruna do Amaral Paulin

    8. Amaznia margem da sociedade em rede: imigrantes em busca de comunidades imaginadas ...................................................................103 Sandro Adalberto Colferai

  • 9. A fotografia de moda e a produo de sentidos ..............................118 Samara Kalil

    10. Revoluo Farroupilha: uma leitura do manifesto de 1838 atravs da Poltica de Aristteles ..........................................................................134 Camila Garcia Kieling

    11. O pensamento complexo e os estudos culturais na pesquisa em Jor-nalismo: por uma interseco terico-metodolgica ...........................148 Vilso Junior Santi

    Parte IIIImaginrio e reconfiguraes da publicidade

    12. Consumo e experincia de uso em um contexto de ubiqidade de informao ..........................................................................................172 Eduardo Campos Pellanda

    13. Pistas hipermodernas para alteraes da mensagem publicitria contempornea ...................................................................................182 Camila Pereira Morales

    14. A teoria culturolgica na campanha da Arezzo .............................198 Carolina Conceio e Souza

    15. A convergncia de funes: publicidade e entretenimento. Duas indstrias, um fim: o game ..................................................................213 Caroline Delevati Colpo

    16. A hiptese de agenda-setting no comercial da Brahma Caren Adriana Machado de Mello ...........................................226

  • PREFCIO

    A proposta deste livro surge a partir da ideia de estimular a divul-gao e a circulao de pesquisas realizadas por estudantes de ps-graduao. A publicao inclui-se no mbito das atividades do Grupo de Estudos sobre Imaginrio, Sociedade e Cultura (GEISC/PPGCOM/PUCRS), o qual procura estimular a autonomia e a cooperao direta entre os acadmicos.

    O grupo, que organizado e coordenado pelos prprios alunos, surgiu em 2008 com o propsito de compreender os efeitos dos proces-sos miditicos e suas implicaes culturais sobre o imaginrio nas reas de jornalismo, publicidade, relaes pblicas e produes audiovisuais. Nele, tem destaque a socializao contnua e sistemtica dos projetos de investigao do corpo discente, promovida atravs de encontros quinzenais, onde so realizadas discusses de textos, apresentaes e debates relacionados s pesquisas desenvolvidas.

    Os participantes do grupo tm conscincia da necessidade de divulgao e circulao de textos acadmicos e por isso deram incio organizao coletiva desta obra. Durante o processo de organizao da publicao, os artigos circularam entre os membros do grupo, os quais revisaram as produes dos seus pares e deram sugestes aos seus colegas-autores.

    A multiplicidade de olhares marca esta obra, j que os interesses de pesquisa dos integrantes do grupo so bastante diversos. De todo modo, h elementos em comum que permeiam esses escritos, sejam temticas, objetos e/ou perspectivas de anlise. Ao todo so 13 artigos, os quais foram agrupados em trs eixos, cada um apresentado por um professor do PPGCOM/PUCRS.

    A primeira parte, Matizes do cinema brasileiro e sociedade, apresentada pela Profa. Dra. Cristiane Freitas Gutfreind, conta com trs textos: Circuito de exibio perifrico: cineclubismo e itinerncias, de Dafne Reis Pedroso da Silva; Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo, de Karine dos Santos Ruy; e O jogo cinematogrfico de Cama de Gato, de Isabel Almeida Marinho do Rgo.

    O segundo eixo, Cultura e representaes miditicas, apresen-tado pela Profa. Dra. Ana Carolina Escosteguy, conta com seis textos: Favela-Movies e Favela-Series: novas representaes na produo

  • 11

    Prefcio

    audiovisual brasileira, de Lcia Loner Coutinho; Esteretipos do Brit-pop atravs dos enquadramentos da revista New Musical Express, de Bruna do Amaral Paulin; Amaznia margem da sociedade em rede: imigrantes em busca de comunidades imaginadas, de Sandro Adalberto Colferai; A fotografia de moda e a produo de sentidos, de Samara Kalil; Revoluo Farroupilha: uma leitura do manifesto de 1838 atravs da Poltica de Aristteles, de Camila Garcia Kieling; e O pensamento complexo e os estudos culturais na pesquisa em jornalismo: por uma interseco terico-metodolgica de Vilso Junior Santi.

    A terceira e ltima parte do livro, Imaginrio e reconfiguraes da publicidade, apresentada pelo Prof. Dr. Eduardo Campos Pellanda e conta com quatro textos: Pistas hipermodernas para alteraes da men-sagem publicitria contempornea, de Camila Pereira Morales; A teoria culturolgica na campanha da Arezzo, de Carolina Conceio e Souza; A convergncia de funes: publicidade e entretenimento. Duas indstrias, um fim: o game, de Caroline Delevati Colpo; e A hiptese de agenda setting no comercial da Brahma, de Caren Adriana Machado de Mello.

    para o exerccio deste olhar mltiplo sobre a comunicao que convidamos os leitores a passear pelas contribuies aqui apresenta-das. Boa leitura a todos!

    Os organizadores.

  • Parte I

    Matizes do cinema brasileiro e sociedade

  • A MULTIPLICIDADE DA PESQUISA EM CINEMA

    Cristiane Freitas Gutfreind

    Professora do PPGCOM/ PUCRS e pesquisadora do CNPq.

    O Grupo de Estudos sobre Imaginrio, Sociedade e Cultura GEISC - um dos grupos de pesquisa do Programa de Ps-Graduao em Comunicao da PUCRS, gerenciado pelo corpo discente. Fundado em 2008, o GEISC se consolidou ao longo desses anos com estudos e pesquisas relevantes acerca de trs eixos temticos: imaginrio, so-ciedade e comunicao, que se relacionam com a linha de pesquisa do PPGCOM intitulada Prticas culturais nas mdias, comportamentos e imaginrios da sociedade da comunicao.

    Por esses eixos temticos perpassam os estudos de cinema que no PPGCOM acolhem um importante nmero de dissertaes e teses, que tem os seus projetos, mtodos e textos discutidos junto ao grupo do GEISC. Entre alguns desses trabalhos merece destaque as pesquisas aqui apresentadas: Circuito de exibio perifrico: cineclubismo e iti-nerncias de Dafne Pedroso (doutoranda), O jogo cinematogrfico de Cama de Gato de Isabel Marinho (mestre) e Traos da indstria do ci-nema brasileiro contemporneo de Karine Ruy (mestre). Trs pesquisas que representam a diversidade do campo do cinema em seus diferentes interesses e formas de compreenso e apreenso metodolgica.

    Em Circuito de exibio perifrico: cineclubismo e itinerncias, Dafne Pedroso nos apresenta uma discusso sobre a exibio perif-rica dentro do contexto cinematogrfico brasileiro atravs das sesses itinerantes e suas relaes com o cineclubismo. Para percorrer esse ca-minho, a autora serve-se do aporte terico empreendido por Joo Gui-lherme Barone no texto Exibio, crise de pblico e outras questes do cinema brasileiro, onde discutida a clssica questo do cinema brasileiro: a receptividade do pblico em relao ao filme nacional.

    Pedroso recorre aos primrdios do cinema para contextualizar as apresentaes itinerantes atuais no Brasil, objeto de sua pesquisa de dou-toramento, o que permite a construo de um imaginrio que reflete na ma-neira diversificada de se assistir filmes na atualidade, como afirma a autora:

  • Cristiane Freitas Gutfreind

    14

    Contemporaneamente, a experincia de recepo ci-nematogrfica pode se dar nas salas comerciais de cinema, em casa, em cineclubes, mostras itinerantes, festivais, entre outros. E a reconfigurao do mercado cinematogrfico passa a refletir-se na construo do espectador, nas suas maneiras de consumo, nos seus gostos e na recepo dos filmes.

    Em seguida, Pedroso desenvolve uma reflexo sobre cineclu-bismo e itinerncia, ilustrados com exemplos de experincias concre-tizadas na rea para finalizar com provocaes e tensionamentos sobre a formao do pblico. Percebemos, ento, a complexidade da formao de um pblico que tem encontros espordicos com o filme e a necessidade da construo do mesmo de forma pragmtica com o que possvel.

    Passa-se do espectador para anlise flmica, o que evidencia O jogo cinematogrfico de Cama de Gato. O texto de Isabel Marinho reflete sobre o jovem contemporneo tendo como caso emblemtico o filme Cama de Gato (Alexandre Stockler, 2002), apropriando-se da anli-se flmica para compreender, atravs da hibridizao da linguagem cine-matogrfica, a ideia de tribalizao (Michel Maffesoli). A escolha do filme justificada pela sua linguagem, comprovada na seguinte afirmao: no mesmo filme h a sensao de ter assistido a vrios tipos de obras e ex-perimentado uma diversidade de linguagens. A relao com a tribaliza-o aparece nessa nova forma comunitria contempornea que reflete a efemeridade e a diversificao dos laos sociais alterando conceitos como indivduo e identidade, promovendo uma hibridizao cultural pela tecnologia. O texto mostra a sua atualidade, principalmente, em uma poca em que o cinema brasileiro volta-se para a temtica jovem, algo esquecido no nosso cinema desde os anos 80, iniciado por Deu Pra Ti Anos 70 (Nelson Nadotti e Giba Assis Brasil, 1980).

    Finalmente, essa sesso intitulada Matizes do cinema brasileiro e sociedade fechada com Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo. Karine Ruy reflete sobre os filmes brasileiros de maior bilheteria nas salas entre 2003 e 2008, tentando compreender o porqu, sob o ponto de vista do mercado, alguns filmes brasileiros possuem visi-bilidade em detrimento de outros. A autora sugere uma pista importante para esse panorama, que pode ser resumida na seguinte ideia:

  • 15

    A multiplicidade da pesquisa em cinema

    A formulao de polticas pblicas especficas deu suporte ao setor e vem viabilizando sua produo atravs de mecanismos como mecenato e renncia fiscal. A distribuio e exibio, contudo, no foram abarcadas pelo Estado, deixando a grande maioria dos filmes nacionais desprovidos de qualquer espcie de auxlio estratgico para se inserir no disputado cir-cuito de exibio tradicional.

    Assim, os filmes que apresentam um diferencial justamente em termos de produo e exibio so, segundo Ruy, aqueles que contam com uma presena representativa do pblico nas salas. Essa ideia sustentada por uma amostra de seis filmes que se associaram a majors, ou a Globo Filmes, para efetivar a ponta da cadeia cinematogrfica, a exceo de um deles, que tambm tem a sua singularidade analisada. A bilheteria dos filmes nacionais estaria, ento, vinculada ao apelo miditi-co que passa pelo espetacular e pelo consumo. Porm, a autora afirma a importncia de se manter uma indstria com diversidade em termos de produo e esttica.

    A leitura desses textos oriundos de pesquisas sobre o cinema tor-na-se necessria medida que nos deparamos com objetos diversos que se complementam: a experincia apaixonada da itinerncia de filmes, o interesse pela linguagem e as escolhas do mercado refletem questes que compem toda a cadeia cinematogrfica - produo-distribuio-exi-bio - e suas questes tcnicas e estticas. Percebamos, assim, a mul-tiplicidade da pesquisa em cinema, que a primeira vista parece tratar de temas especficos, mas que so imbricados entre si e que, finalmente, nos coloca sempre diante de uma questo maior, que segundo Kracauer, a relao do cinema com o mundo, portanto com o social e o imaginrio, te-mas que fazem do GEISC um interessante grupo de pesquisa com textos como esses que em muito contribuem para o avano da rea.

    tima leitura!

  • CIRCUITO DE EXIBIO PERIFRICO: CINECLUBISMO E ITINERNCIAS

    Dafne Reis Pedroso da Silva

    Jornalista. Doutoranda em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    RESUMOO trabalho problematiza e discute alguns elementos do contexto cinema-togrfico brasileiro, considerado como base constituinte e geradora de certas condies que configuram o fenmeno pesquisado: a prtica dos cineclubes e das sesses itinerantes de cinema. A contextualizao aqui traada procura abarcar e definir essas duas atividades (cineclubista e itinerante) estabelecendo relaes com a discusso proposta por Baro-ne (2008) a respeito do circuito de exibio perifrico. Dentre os resul-tados, evidencia-se que essas duas prticas surgiram em decorrncia e em reao ao cenrio comercial cinematogrfico que se instituiu no pas.

    PALAVRAS CHAVEItinernciasCineclubismoContexto cinematogrfico brasileiro

    ABSTRACTThis paper discusses and reviews some aspects of the Brazilian cinema context, considered as a constituent base and generating certain condi-tions that shape the studied phenomena: the practice of film clubs and itinerant film sessions. The context here looks to draw cover and set these two activities (film clubs and itinerant exhibitions) establishing a relationship with the discussion proposed by Barone (2008) about the exhibition circuit device. Among the results, it is evident that these two practices arose as a result and reaction to the film business scenario instituted in the country.

    KEYWORDSFilm itinerant exhibitions Film ClubsBrazilians context cinema

  • 17

    Circuito de exibio perifrico

    A proposta deste artigo a de discutir elementos do contex-to cinematogrfico brasileiro, problematizando acerca do chama-do circuito de exibio perifrico (BARONE, 2008)1, estabelecendo relaes com as sesses itinerantes de cinema e o cineclubismo. A escolha destas duas prticas se deu pelo meu interesse de pes-quisa, pois desde o mestrado2 venho abordando tais questes e sigo nesta perspectiva em minha tese de doutorado. Para alm de um interesse pessoal/acadmico, penso que so prticas de exibio e de consumo relevantes, com uma trajetria histrica de experincias no Brasil, e que so importantes para reflexo sobre as transforma-es da indstria audiovisual nacional. A inteno discutir e levantar questes a respeito de outros possveis desenhos da clssica trade produo-distribuio-exibio de cinema no cenrio brasileiro.

    Barone (2008) nos lembra que a trade produo-distribuio-exibio necessita ser compreendida a partir das atividades correspon-dentes aos campos fundadores do espao audiovisual. Esses campos estabelecem relaes que no so lineares, mas sim processos onde se do tensionamentos, antagonismos, assim como interdependncias. A exibio, por sua vez, funciona em torno do ato essencial que seria a projeo na tela para o consumo/desfrute do espectador. Para isso, ela

    opera os meios fsicos e os sistemas necessrios ao consumo final do produto audiovisual. Neste esquema simblico, o se-tor de exibio corresponde ao campo responsvel pela ltima mediao entre o produto e o pblico (BARONE, 2008, p. 4-5).

    A exibio de cinema, como a entendemos hoje, possui dois mar-cos fundadores. Um, que data do incio da dcada de 1900, nos Estados Unidos, onde havia os nickelodeons (se pagava um nquel como ingresso) e os filmes eram exibidos em grandes galpes e depsitos. O segundo

    1 Aproprio-me da expresso circuito de exibio perifrico, utilizada por Barone (2008), em texto que serviu como base para esse artigo, intitulado Exibio, crise de pblico e outras questes do cinema brasileiro. O autor, entretanto, utiliza ainda o termo digital (circuito de exibio digital perif-rico) e se refere s experincias baseadas na tecnologia do vdeo domstico, tais como os Pontos de Cultura, a Programadora Brasil, as pequenas salas, os cineclubes, entre outros. Optei por reti-rar o digital, j que algumas propostas de itinerncias, tais como Cine Tela Brasil e Rodacine RGE ainda projetam filmes em 35mm. De todo o modo, a expresso parece manter sua proposta inicial.2 Mestrado em Cincias da Comunicao pela UNISINOS, com dissertao intitulada Hoje tem ci-nema: a recepo das mostras itinerantes organizadas pelo Cineclube Lanterninha Aurlio (2009), sob a orientao da Prof. Dr. Jiani Bonin.

  • 18

    Dafne Reis Pedroso da Silva

    marco, a partir de 1925, refere-se s exibies nos chamados cines-tea-tro, j ento elitizadas. Entretanto, antes que as sesses de cinema e o mercado exibidor se institussem, havia as itinerncias.

    As primeiras exibies caracterizavam-se pelo nomadismo, e nas projees em cafs, parques de diverses e feiras o cinema foi sendo co-nhecido. Nos fins do sculo XIX, os filmes eram exibidos de forma impro-visada pelos ambulantes, sendo que no havia a separao e a autonomi-zao dos campos de produo, distribuio e exibio. O empreendedor detinha todos os mbitos do processo, dominava as tcnicas, filmava, re-velava, copiava e exibia os filmes.

    nos primrdios do cinema que as atuais sesses itinerantes se inspiram, porm com objetivos reformulados. Atualmente, grupos ambu-lantes passam de cidades em cidades, ou de bairros em bairros, proje-tando nos mais diversos espaos. O pblico destinado so pessoas que, em tese, no tm acesso ao cinema nacional. So projetos que surgem por iniciativa de coletivos, compostos por cineclubistas, cineastas, produ-tores culturais, entre outros, e muitas vezes so financiados por projetos pblicos ou leis de incentivo cultura. Alm das itinerncias, o cineclubis-mo brasileiro, que completar 83 anos em 2011, reafirma sua proposta ancorada na cinefilia, ou seja, no gosto pelo cinema, e tambm busca a formao de demanda para o cinema nacional.

    Para abordar essas duas prticas de exibio de cinema, me parece importante compreender as condies ambientais em que elas surgem e funcionam. Barone (2008) elenca uma srie de constataes sobre o cen-rio de circulao e de exibio no Brasil, que tm como consequncia o res-trito espao para os filmes nacionais. Algumas das constataes seriam as mudanas no aparato tcnico da exibio, a pouca regulao e a ocupao do circuito nacional pela produo hegemnica distribuda pelos grandes conglomerados de mdia norte-americanos (BARONE, 2008, p. 6).

    Por conta disso, ele nos lembra que (...) a pouca frequncia dos filmes nos circuito comercial compromete aspectos simblicos da for-mao do imaginrio social (BARONE, 2008, p.6). Este diagnstico do autor elemento de preocupao para cineclubistas e exibidores itine-rantes, sendo que essas prticas tm em comum a busca pela exibio de filmes nacionais em seus circuitos.

    O espao limitado para as produes nacionais nas salas de cine-ma se revela tambm pelos nmeros. Se, em 2003, os filmes nacionais

  • 19

    Circuito de exibio perifrico

    ocuparam 22% das salas de exibio, em 2008 passaram a ocupar 6,9% (BARONE, 2008. p. 6). E, se a permanncia depende dos ingressos ven-didos, o autor nos lembra que h tambm uma falta de interesse do p-blico pelos filmes nacionais.

    Outro elemento do cenrio cinematogrfico nacional a reduo no nmero de salas nos ltimos trinta anos. Em 1970 e 1980 havia cerca de 4 mil salas, mas hoje so aproximadamente 2.100, sendo que 92% dos municpios no possuem salas de exibio, as quais esto concen-tradas nas grandes cidades (BARONE, 2008). Ou seja, no interior do pas quase no h a possibilidade da experincia da recepo coletiva nas salas de cinema.

    Entretanto, o consumo se d de outras maneiras, seja pelo que exibido na televiso, ou pelos filmes comprados/locados/baixados da internet. Ainda que a referncia de projeo sejam as salas de cinema, nas ltimas dcadas viu-se a transformao do campo com novas tec-nologias, ocasionando o desmonte destes espaos de exibio. Nesse sentido, h a crescente desnaturalizao da sala de cinema como o ni-co local de recepo de filmes.

    Contemporaneamente, a experincia de recepo cinematogrfica pode se dar nas salas comerciais de cinema, em casa, em cineclubes, mostras itinerantes, festivais, entre outros. E a reconfigurao do merca-do cinematogrfico passa a refletir-se na construo do espectador, nas suas maneiras de consumo, nos seus gostos e na recepo dos filmes. Novamente, neste sentido, se v a atuao das prticas aqui abordadas, ou seja, da promoo de diferentes experincias de recepo de cinema.

    Conforme Barone (2008), com o aumento do valor do ingresso, o pblico C e D, que ia com frequncia ao cinema em outros perodos, acabou afastando-se das salas. A ida ao cinema tornou-se uma ativi-dade elitista. Por conta disso, percebe-se que o pblico das sesses itinerantes atuais , principalmente, de sujeitos de classes populares. As projees itinerantes parecem se organizar em reposta ao cenrio cinematogrfico que se instituiu ao longo dos anos.

    Esses so alguns dos elementos do mercado nacional que se constituiu e onde operam as prticas cineclubista e itinerante. No texto que segue, a proposta a de resgatar origens sobre essas experincias, assim como trazer exemplos atuais concretos de como as projees iti-nerantes tm atuado no cenrio brasileiro.

  • 20

    Dafne Reis Pedroso da Silva

    SOBRE O CINECLUBISMO E AS ITINERNCIAS

    O consumo de filmes em clubes de cinema surge na Frana, no incio do sculo XX, com Riccioto Canudo, que fundou o Club des Amis du Septine Art, o primeiro cineclube de que se tem registro, conforme nos lem-bra Lunardelli (2000)3. No momento em que foram criados esses primeiros cineclubes, o cinema ainda estava afirmando-se como arte. Como os filmes costumavam ser exibidos nas feiras de variedades, o cinema era despreza-do por ser uma diverso das classes populares. O cineclubismo, inserido nesse contexto, contribua para uma nova possibilidade de recepo de ci-nema, que privilegiava um pensamento crtico em relao ao que se assistia, para alm do entretenimento. As elites intelectuais foram as responsveis pelo desenvolvimento dos cineclubes e Revestiam-se de um dissimulado papel educativo, que est na gnese do cineclubismo, evidenciado na linha doutrinria adotada pelos cineclubes catlicos (LUNARDELLI, 2000, p.18).

    De l para c, o cineclubismo foi praticado de diversas formas, de acordo com o perodo histrico, com o contexto de cada pas e re-gio e com os propsitos dos grupos que organizam seus cineclubes. No h um cineclubismo nico, j que este reformulado ao longo dos anos. Sem dvida existe um rgo maior, no caso brasileiro, o Conselho Nacional de Cineclubes, que cria diretrizes de ao, mas os cineclu-bes, por sua vez, recriam essas propostas de acordo com seus prprios objetivos. possvel perceber alguns eixos de propostas cineclubistas desde o seu incio no pas, tais como: uma defesa esttica em relao ao cinema arte, que deveria ser apreciado; uma ideia de cineclube en-quanto espao de formao de sujeitos crticos e competentes nas l-gicas cinematogrficas; uma proposta de educao do olhar, difundida pelos cineclubes catlicos durante as dcadas de 1950 e 1960; uma proposta de utilizar o cinema como possibilidade de mobilizao social em torno de uma causa, como foi durante o perodo militar; um eixo de ao do cineclube enquanto um espao de discusso acerca do cenrio cinematogrfico institudo, como um local de difuso de filmes que no so exibidos nas salas comerciais de cinema e/ou disponibilizados em vdeolocadoras e veiculados em canais de televiso.

    3 Entretanto, foi Louis Delluc, um seguidor de Canudo quem inventou o termo cin-club. Ele fundou, em 1920, o Cine-Club e, aps sua morte, o Cine-Club uniu-se ao CASA (Club des Amis du Septine Art) de Canudo e criou-se Le Club Franais du Cinema, entidade que deu base para a constituio do que viria a ser o movimento cineclubista.

  • 21

    Circuito de exibio perifrico

    Atualmente, a bandeira levantada pelo cineclubismo nacional atua no sentido de criar circuitos alternativos de filmes, em especial os brasileiros, e formar platias para tal. Por conta disso, frequentemente encontram-se cineclubes que desenvolvem tambm sesses itineran-tes, unindo a proposta cineclubista ao cinema itinerante.

    Quanto s origens e trajetria das sesses itinerantes de cine-ma, percebe-se que, se no incio das exibies de cinema no Brasil o carter ambulante se dava pela falta de pblico e de um mercado cons-titudo, as sesses itinerantes contemporneas se do tambm pelas consequncias do mercado que se construiu. A falta de espao para exibio e de demanda para o consumo dos filmes brasileiros faz com que surjam atividades como as projees ambulantes. Com o quase total desaparecimento dos cinemas de calada e a transferncia das salas de cinema para os shopping centers dentro dos grandes com-plexos, ou multiplex, a possibilidade de recepo coletiva de cinema torna-se cada vez mais difcil.

    Os projetos atuais tm a proposta de democratizao do aces-so aos filmes nacionais, assim com a formao de platias para estas produes. Entretanto, cada atividade itinerante tem caractersticas particulares: algumas so organizadas por cineclubes; outras por em-presas ou rgos pblicos; existem as que s exibem filmes brasileiros, enquanto h as que tambm projetam produes norte-americanas de grande distribuio; algumas atividades possuem grande estrutura, j em outras, as sesses acontecem de forma improvisada; ainda h as projees que renem filmes e variadas apresentaes artsticas. As sesses itinerantes de cinema se caracterizam tambm pela gratuida-de e por serem feitas, principalmente, em cidades em que no haja sa-las comerciais de cinema ou em regies perifricas de cidades que tm salas de cinema, mas que os moradores dessas regies no teriam possibilidades financeiras de frequent-las. As itinerncias possibilitam a experincia coletiva de recepo de cinema, mas uma experincia diferenciada, em que o contexto de recepo tem papel fundamental.

    Parece-me que esses projetos se propem divulgao do ci-nema, abertura de possibilidade da recepo coletiva, em especial para um pblico popular que tem pouco acesso s salas de cinema e s produes feitas no pas. Das atividades mapeadas a partir da dca-da de 90, destaco alguns projetos. H os que possuem grande financia-

  • 22

    Dafne Reis Pedroso da Silva

    mento, principalmente a partir de Leis de Incentivo Cultura e outras formas de financiamento pblico tendo, consequentemente, uma maior estrutura, com equipe fixa, grandes telas, projetores, cadeiras confor-tveis, transporte prprio e uma maior circulao, percorrendo diversas cidades. Assim como existem os de menor estrutura, que funcionam de uma maneira mais improvisada, mas que compartilham do propsito de formao de platias, exibio de filmes nacionais e de proporcionar a experincia da recepo coletiva.

    O Cine Tela Brasil4, por exemplo, possui uma grande estru-tura e possvel ver uma preocupao com o espao de recepo de modo que este simule uma sala comercial de cinema. O projeto tem o objetivo de exibir filmes, brasileiros e estrangeiros, em diversos municpios do pas. O cinema permanece por trs dias na periferia das cidades e oferece quatro sesses dirias, duas para crianas e duas para adultos, sendo que j exibiu filmes para mais de 600 mil espectadores desde 1996.

    Em 2007, foi includa ao projeto a Oficina Itinerante de Vdeo Tela Brasil. Cineastas-educadores ensinam noes sobre produo de cine-ma para os moradores das comunidades por onde passam os caminhes do projeto. Percebe-se aqui mais um movimento desse cenrio cinema-togrfico, que o de formao de sujeitos nas lgicas de produo, com o propsito de incluso audiovisual. Algo que se v tambm em projetos como o Revelando os Brasis5, que alia a formao de sujeitos compe-tentes na lgicas audiovisuais problemtica da exibio de cinema no pas, com o propsito de realizar sesses itinerantes.

    4 Em 1996, por exemplo, os cineastas Las Bodanzky e Luiz Bolognese criaram o Cine Mambembe, com um projetor 16mm, uma tela montvel e uma Saveiro. Eles exibiam filmes brasileiros em praas e em escolas de So Paulo. O projeto seguiu at 2004, ano em que, com apoio da Lei de Incentivo Cultura (LIC), da CCR Controladora da AutoBan e Nova Dutra, entre outras concessionrias, ele passou a se chamar Cine Tela Brasil. Em 2005 foram somadas 504 sesses e um total de 100.000 espectadores. Em 2006 somavam-se 200 mil espectadores.5 O Revelando os Brasis, projeto do Ministrio da Cultura em parceria com a Petrobrase o Institu-to Marlin Azul, promove a produo de curtas-metragens por moradores de cidades com at 20 mil sobre os locais onde vivem. Nesse sentido, alm de uma proposta de consumo coletivo de filmes brasileiros, o projeto parece promover a incluso desses sujeitos no cenrio cinematogrfico de modo que possam expressar elementos de suas culturas audiovisualmente. H a capacitao de sujeitos para que possam contar suas histrias audiovisualmente. Pontos de Cultura, produes da CUFA (central nica das favelas), Ns do Morro, so tambm organizaes que possuem atividades nesse sentido.

  • 23

    Circuito de exibio perifrico

    Figura 1: Estrutura externa do Cine Tela Brasil.

    Figura 2: Parte interna do Cine Tela Brasil.

  • 24

    Dafne Reis Pedroso da Silva

    Figura 3: Exibio na cidade de Vinhedo6.

    No Rio Grande do Sul, desde 2001, existe outro projeto de gran-de estrutura chamado RodaCineRGE, que percorre vrias cidades do estado. O projeto uma iniciativa do Governo do Estado do RS, atra-vs da Secretaria Estadual da Cultura e do Instituto Estadual de Cine-ma (IECINE) e realizado pela Fundao de Cinema RS (FUNDACI-NE). Desde 2001, o pblico acumulado supera 372 mil pessoas, em 360 municpios. O RodaCineRGE, diferentemente do Cine Tela Brasil, faz as sesses ao ar livre ou em espaos cobertos, utilizando a estru-tura do local, o que possibilita um outro tipo de recepo de acordo com o espao adaptado. Alm disso, o projetor 35 mm utilizado (raro nas itinerncias que utilizam, em sua maioria, projetores digitais) fica exposto ao fundo, possibilitando que os sujeitos tenham contato com um equipamento que possivelmente no conheciam.

    6 Disponvel em: . Acesso em: 10 de abr. 2008.

    http://www.cinetelabrasil.com.br

  • 25

    Circuito de exibio perifrico

    Figura 3: Exibio na cidade de Vinhedo6.

    No Rio Grande do Sul, desde 2001, existe outro projeto de gran-de estrutura chamado RodaCineRGE, que percorre vrias cidades do estado. O projeto uma iniciativa do Governo do Estado do RS, atra-vs da Secretaria Estadual da Cultura e do Instituto Estadual de Cine-ma (IECINE) e realizado pela Fundao de Cinema RS (FUNDACI-NE). Desde 2001, o pblico acumulado supera 372 mil pessoas, em 360 municpios. O RodaCineRGE, diferentemente do Cine Tela Brasil, faz as sesses ao ar livre ou em espaos cobertos, utilizando a estru-tura do local, o que possibilita um outro tipo de recepo de acordo com o espao adaptado. Alm disso, o projetor 35 mm utilizado (raro nas itinerncias que utilizam, em sua maioria, projetores digitais) fica exposto ao fundo, possibilitando que os sujeitos tenham contato com um equipamento que possivelmente no conheciam.

    6 Disponvel em: . Acesso em: 10 de abr. 2008.

    Figura 4: Sesso do RodaCineRGE na Praa Saldanha Marinho, em Santa Maria, durante o 4 Santa Maria Vdeo e Cinema.

    Figura 5: Sesso do RodaCineRGE, na cidade de Arvorezinha, em 13 de setembro de 20057.

    Outro projeto, este de menor estrutura, desenvolvido por um coleti-vo e que suscita a discusso sobre espaos de projeo, o projeto Acen-da uma Vela. Criado em 2005 pela Iderio (organizao cultural sem fins lucrativos, de Alagoas), mostra que os filmes podem ser exibidos em telas pouco usuais. Realizando exibies em localidades litorneas, Hermano 7 Disponvel em: . Acesso em: 10 de abr. 2008.

    http://www.cinetelabrasil.com.brhttp://www.rge-rs.com.br/rodacine_rge

  • 26

    Dafne Reis Pedroso da Silva

    Figueiredo projeta os filmes nas velas das embarcaes. A programao do Acenda uma Vela composta de filmes brasileiros de curta-metragem com nfase em temas da cultura popular. O projeto financiado pelo Mi-nistrio da Cultura, atravs do Fundo Nacional de Cultura (FNC) e da Se-cretaria do Audiovisual, e conta, tambm, com apoios em cada localidade na mobilizao do pblico, alm da parceria dos realizadores que enviam seus filmes. Essa proposta um exemplo emblemtico do desmonte que a sala de cinema vem sofrendo enquanto espao legitimado de exibio de cinema. As itinerncias trazem em sua gnese a problematizao so-bre o espao, sobre a materialidade do consumo.

    Figuras 6 e 7: exibies do projeto Acenda uma Vela. Fotos de Nataska Conrado8.

    8 Disponvel em: . Acesso em: abr. 2010.

    http://www.acendaumavela.blogspot.com

  • 27

    Circuito de exibio perifrico

    Fotos 8: Exibio do Cineclube Lanterninha Aurlio itinerante em uma escola rural na cidade de Formigueiro, RS.

    Foto 9: Exibio do Cineclube Lanterninha Aurlio itinerante. Fotos: Dafne Pedroso

  • 28

    Dafne Reis Pedroso da Silva

    O cineclube Lanterninha Aurlio, de Santa Maria, Rio Grande do Sul, um exemplo de proposta cineclubista que se mescla s ex-perincias itinerantes. Financiado pela Lei de Incentivo Cultura, ele possui uma pequena estrutura. As sesses no tm uma agenda feita com antecedncia e acontecem de acordo com as possibilidades dos locais de exibio e dos cineclubistas. O projeto se inclui nas sesses que privilegiam o cinema nacional para receptores de classes popula-res, e se assemelha a propostas de pequena estrutura que tm uma preferncia pela exibio de curtas-metragens brasileiros.

    TENDNCIAS E QUESTES

    Aps essa contextualizao e relato com exemplos de sesses itinerantes e de elementos sobre o cineclubismo, uma srie de questes surgem, tais como:

    - Em que medida essas prticas contribuem para transformar a estrutura clssica produodistribuioexibio?

    - At que ponto cineclubes e projetos itinerantes so perifricos, j que no interior do pas sequer existem salas de cinema?

    - Que implicaes esse circuito pode ter no sentido de configurar as competncias cinematogrficas do pblico?

    - Como formar platias com sesses itinerantes espordicas? A ideia, nestas consideraes finais, no a de responder, mas

    justamente provocar. Pois, se em uma primeira passada de olhos pode nos parecer que essas propostas promovam a recepo coletiva, a cria-o de platias, preciso observar, problematizar, tensionar. Digo isso, porque muitas das atividades itinerantes, por exemplo, no retornam mensalmente aos mesmos locais para exibio. Sendo assim, como for-mar pblico para o cinema brasileiro com espectadores que parecem consumir, majoritariamente, filmes estrangeiros? Ou seja, no basta pro-mover o acesso espordico, mas sim o consumo sistemtico, algo que visto, por exemplo, no trabalho de muitos cineclubes que possuem ses-ses semanais de exibio de filmes. Mas como aumentar o nmero de pessoas que frequentam essas sesses? preciso investir em projetos de exibio de cinema nacional que pensem no espectador de cinema, que o conheam. E que conheam o contexto em que ele est inserido.

  • 29

    Circuito de exibio perifrico

    necessrio considerar, por exemplo, que um sistema de exibi-o importado dos Estados Unidos, o qual estabelece a noo de su-cesso de bilheteria em dezenas de milhes de espectadores, passa a sedimentar no imaginrio do pblico a ideia de que o blockbuster o verdadeiro cinema (BARONE, 2008). Conforme Barone

    impossvel construir uma indstria ou mesmo dimensionar a atividade cinematogrfica em busca da sua sustentabilidade, com base apenas nos filmes de grande pblico. necessrio e importante assegu-rar a diversidade dos lanamentos para os diferentes pblicos (BARO-NE, 2008, p. 3).

    Ou seja, em tempos de audincias fragmentadas, no seria hora de pensar em pequenos lanamentos? Em cineclubes, itinerncias, pon-tos de cultura, pequenas salas?

    Para isso esto os circuitos perifricos de exibio, ttulo deste artigo. Tendncia, como trata Barone (2008), que confronta as propos-tas das majors, pois muitas vezes utilizam cpias de uso domstico, no permitidas para sesses pblicas, mas que poderiam estar apon-tando outro caminho, uma nova possibilidade para o cinema nacional. Ou seja, considerar no somente as grandes salas, mas a projeo na vela do barco, a igreja que vira cinema (e no o contrrio), a praa cheia de pessoas e iluminada com a projeo em um muro. Pequenas sesses, que multiplicam platias e retomam a experincia do coletivo e do encontro. No seria o desmonte do cinema a favor do cinema?

    REFERNCIAS

    BARONE, Joo Guilherme. Sesses do Imaginrio. Exibio, crise de pblico e outras questes do cinema brasileiro. Porto Alegre, n 20, Dez. 2008.

    LUNARDELLI, Fatimarlei. Quando ramos jovens: histria do Clube de Cine-ma de Porto Alegre. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS/EU da Secretaria Municipal de Cultura, 2000.

    Sites consultados

    Cine Tela BrasilDisponvel em: . Acesso em 10 de abr. 2010.

    http://www.cinetelabrasil.com.br

  • 30

    Dafne Reis Pedroso da Silva

    Cineclube Lanterninha AurlioDisponvel em: . Acesso em 10 de abr. 2010.

    Conselho Nacional de CineclubesDisponvel em: . Acesso em 10 de abr. 2010.

    Programadora BrasilDisponvel em: . Acesso em 10 de abr. 2010.

    RodaCine RGEDisponvel em: . Acesso em 10 de abr. 2010.

    www.cineclubelanterninhaaurelio.blogspot.comhttp:// www.cnc.utopia.com.brhttp://www.programadorabrasil.org.brhttp://www.rge-rs.com.br/rodacine_rge

  • TRAOS DA INDSTRIA DO CINEMA BRASILEIRO CONTEMPORNEO

    Karine dos Santos Ruy

    Jornalista. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    RESUMOO objetivo deste trabalho traar um breve perfil dos filmes brasilei-ros que alcanaram as maiores bilheterias no circuito interno de salas entre 2003 e 2008, levando em considerao, para isso, elementos relativos ao esquema de produo e distribuio, prprio da indstria cinematogrfica. Para interpretar tais indicadores, utilizamos nesse ar-tigo as contribuies tericas de autores da linha da Economia Poltica da Comunicao, sobretudo no que se refere ao estatuto das indstrias culturais na sociedade contempornea.

    PALAVRAS CHAVECinema brasileiroIndstrias culturaisGlobo Filmes

    ABSTRACTThe intent of this paper is to project a compact profile of Brazilians cinema biggest box office successes in the intern circuit of theaters between the years of 2003 and 2008, by observing elements of produc-tion and distribution scheme. To interpret such information, well use in this paper the theoretical contributions of the Political Economy of Communication, especially about the statute of cultural industries in contemporary society.

    KEYWORDSBrazilian cinemaCultural industriesGlobo Filmes

  • 32

    Karine dos Santos Ruy

    Em 1960, em uma de suas crticas publicadas no Suplemento Literrio do jornal O Estado de So Paulo, Paulo Emlio Salles Gomes mostrou seu descontentamento com o modo de se fazer cinema no Brasil. Num dos trechos do texto anunciado com o sugestivo ttulo Uma situao colonial?, afirmava o autor que:

    O denominador comum de todas as atividades relacio-nadas com o cinema em nosso pas a mediocridade. A indstria, as cinematecas, o comrcio, os clubes de cinema, os laboratrios, a crtica, a legislao, os qua-dros tcnicos e artsticos, o pblico e tudo mais que eventualmente no esteja includo nesta enumerao mas que se relacione com o cinema no Brasil, apre-senta a marca cruel do subdesenvolvimento (SALLES GOMES, 1979, p. 11).

    Trazendo as palavras do crtico para o cenrio cultural brasileiro da virada do sculo XX para o XXI, percebemos que a opinio dese-nhada h 40 anos no empresta sentido para interpretar a realidade do cinema nacional contemporneo. Atualmente, o eixo da problemtica enfrentada pelo cinema nacional deslocou-se de questes referentes qualidade e s suas especificidades narrativas e de gnero para ques-tes prprias ao ciclo da cadeia produtiva do cinema. Assim, o conceito de subdesenvolvimento no parece ser mais uma categoria coeren-te para se pensar o cinema brasileiro contemporneo. Uma anlise que mude o foco para os aspectos industriais do cinema nacional e sua performance no circuito interno de salas nos ltimos anos capaz de apontar elementos sintomticos para se compreender a insero e consumo dessa espcie de bem cultural no mercado interno.

    Desde que o fenmeno Cidade de Deus (Fernando Meirelles, 2002) ganhou destaque fora do pas com sua indicao disputa do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2004, chamando consequente-mente a ateno da audincia brasileira para as produes nacionais, diversos filmes made in Brasil conseguiram lugar ao sol leia-se um espao no disputado circuito de exibio. So ttulos como Carandiru (Hector Babenco, 2002), Os dois Filhos de Francisco (Breno Silveira, 2005) e Tropa de Elite (Jos Padilha, 2008), exemplares que superaram a marca dos dois milhes de espectadores no mercado interno. Em contrapartida, muitas obras cinematogrficas produzidas aqui so com-

  • 33

    Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo

    pletamente desconhecidas do pblico por no terem a fora comercial e apoio necessrio para entrar nesse circuito.

    (...) o cinema brasileiro nestes anos recentes teve mo-mentos fortssimos em certas obras, em meio s pou-cas chances dadas aos muitos estreantes e aos es-quemas predominantes entre is veteranos do mercado. Dentro das limitaes trazidas por esta pretensa diver-sidade, possvel encontrar jias tanto em alguns dos formatos que a dcada viabilizou como em outros que ela praticamente esgoelou (CAETANO, 2005, p. 239).

    Posto isso, interessa-nos aqui procurar traos de semelhana e continuidade nas maiores bilheterias do cinema brasileiro contempor-neo, ao qual este trabalho delimita como o perodo que vai de 2003 (ps Cidade de Deus) a 2008. O objetivo analisar caractersticas pontuais do ttulo que conquistou a maior bilheteria em cada ano dentro do pe-rodo sugerido, com a inteno de evidenciar suas especificidades na trade produo distribuio exibio (BARONE, 2005)1.

    Essa breve pesquisa parte do pressuposto da existncia de uma indstria cinematogrfica no Brasil centrada, sobretudo, na etapa de produo e calcada em mecanismos institucionais de apoio mas cuja estrutura ainda carece de investimentos estratgicos para que consiga se transformar em um agente capaz de proporcionar uma diversidade cultural ao setor audiovisual brasileiro. As contribuies tericas que me-lhor se integram proposta de estudar o cinema, a partir dos agentes da trade referida por Barone, so tomadas, sobretudo, da Economia Poltica da Comunicao, linha que se caracteriza por focalizar fatores estruturais e processo de trabalho na produo, distribuio e consumo da comunicao (SERRA, 2007, p. 68).

    Primeiramente, para compreender as especificidades do cinema em sua trade produo distribuio exibio, devemos lanar um olhar para alm do territrio da chamada stima arte, indo em direo aos condicionamentos prprios das indstrias culturais. Como avalia Sadoul1 Embora no faa parte do recorte temporal escolhido para este artigo, necessrio chamar a aten-o para alguns fatos relevantes do mercado cinematogrfico brasileiro em 2010. Nesse ano, Tropa de Elite 2, dirigido por Jos Padilha, se tornou o filme brasileiro mais visto da histria, registrando 11.023.475 espectadores entre outubro e dezembro. At ento, o ranking era liderado por Dona flor e seus dois maridos (Bruno Barreto, 1976), que foi visto no circuito de salas por 10.735.524 pessoas. Em 2010, houve um crescimento de 56,77% no pblico do cinema brasileiro em relao a 2009.

  • 34

    Karine dos Santos Ruy

    No se pode imaginar um cineasta realizando gran-des filmes desconhecidos de todos. A necessidade de empregar capitais considerveis impe aos criadores condies precisas para a elaborao de suas obras. , portanto, impossvel estudar a histria do cinema como arte (...) sem evocar os seus aspectos indus-triais. E a indstria inseparvel da sociedade, de sua economia e sua tcnica (1964, p. 8).

    Tendo conscincia que nos referimos a uma sociedade em rede e globalizada, imprescindvel levar em considerao o contexto em que esse cinema produzido, abrangendo a atuao e interao en-tre diversas espcies de agentes econmicos, culturais e polticos, por exemplo na configurao desse cenrio. Como alerta Moraes, tornou-se importante perceber que a cultura

    (...) est imersa na lgica do lucro que preside a expanso da forma- mercadoria a todos os campos da vida social. Integrada, como as demais reas produtivas, ao consumismo, a esfera cultural torna-se componente essencial na lubrificao do siste-ma econmico, a ponto de o setor do entretenimen-to, juntamente como o se software, liderar a pauta de exportaes dos Estados Unidos (MORAES, 2003, p. 37).

    Foi, afinal, a concentrao de capital e o acesso s tecnolo-gias os fatores preponderantes para que os Estados Unidos e sua Hollywood se consagrassem como maior produtor/exportador/distribui-dor de produtos audiovisuais do mundo, detendo hoje 85% do mercado cinematogrfico global. Levantamento realizado pela Screen Digest, em outubro de 2000, mostrou que a produo dos Estados Unidos ocu-pou aproximadamente metade do mercado exibidor em 90% do mundo (BARONE, 2005, p.125). Tal competncia influencia diretamente nas cinematografias realizadas fora do eixo norte-americano. O relatrio da Agncia Nacional do Cinema (Ancine)2 oferece um exemplo: em 2008, dos 89.960,164 espectadores que compareceram s salas de cinema no pas, somente 9.143,052 assistiram filmes brasileiros.

    2 Criada em 2001 e vinculada ao Ministrio da Cultura, a Ancine tem como atribuies o fomento, a regulao e a fiscalizao do mercado do cinema e do audiovisual no Brasil.

  • 35

    Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo

    A disparidade se deve prpria estrutura da indstria cinemato-grfica, sobretudo ao poder estratgico conferido ao setor de distribui-o, indispensvel para que o produto filme encontre uma audincia. Barone define a distribuio como o sistema que

    Opera os canais e os meios necessrios a circu-lao o produto audiovisual, visando ao seu con-sumo pelo maior nmero possvel de pessoas. o setor que responde pela efetiva comercializao do produto igualmente caracterizado pela grande con-centrao de capital e alto grau de especializao (Ibidem, p. 35).

    Bustamante tambm destaca o papel da distribuio no siste-ma cinematogrfico, afirmando que somente com seu domnio avan-ado se pode garantir tais operaes, facilitadas pela concentrao tambm travada nas cadeias de salas multiplex, megaplex, prefe-rencialmente (BUSTAMANTE, 2003, p. 32).

    Chegamos ao ponto-chave da proposta deste trabalho: a ca-pacidade do cinema nacional fazer-se visto. A formulao de polti-cas pblicas especficas deu suporte ao setor e vem viabilizando sua produo atravs de mecanismos como mecenato e renncia fiscal. A distribuio e exibio, contudo, no foram abarcadas pelo Esta-do, deixando a grande maioria dos filmes nacionais desprovidos de qualquer espcie de auxlio estratgico para se inserir no disputado circuito de exibio tradicional. Ao no atrair o interesse de majors3 do setor, e consequentemente condenados a um espao limitado na ca-deia de exibio ou a espao algum , uma leva de filmes brasileiros desconhecida de seus espectadores em potencial.

    Mas h uma contrapartida. Analisando dados da Ancine sobre a atuao do cinema brasileiro desde 2003, vemos em cada ano a exis-tncia de filmes que conseguem se inserir com sucesso nas cadeias de distribuio e alcanar um pblico considerado alto para os padres nacionais (mais de 1 milho de espectadores). As perguntas a [tentar] responder so: o que difere esses filmes da grande maioria dos ttulos lanados no pas e quais foram suas prticas de produo-distribuio?3 O termo utilizado para se referir aos grandes estdios e distribuidoras de cinema, com atu-ao global no mercado audiovisual. Empresas como Fox Filmes, Warner e Sony Pictures so exemplos de majors.

  • 36

    Karine dos Santos Ruy

    OS SUCESSOS DO CINEMA BRASILEIRO RECENTE

    O primeiro passo para traar um breve perfil sobre os sucessos de bilheteria do cinema brasileiro contemporneo observar alguns dados relativos produo e distribuio, reunidos na tabela 1. Nela, vemos a presena de grandes produtores e distribuidores associados aos filmes brasileiros de maior rendimento do perodo.

    O destaque so as majors internacionais: Columbia Tristar, Fox Film, Universal Pictures e Sony Pictures. A Columbia Tristar, por exem-plo, participou como co-produtora e distribuidora exclusiva de Carandi-ru, Cazuza O Tempo no para (Sandra Werneck e Walter Carvalho, 2004) e Os dois filhos de Francisco. Ou seja, ela esteve presente em trs das seis maiores bilheterias do cinema nacional entre 2003 e 2008. Apenas Tropa de Elite no se associou a uma empresa estrangeira durante sua produo, mas deixou a etapa da distribuio sob os cui-dados da Universal Pictures e da The Weinstein Company. Vemos a

    (...) uma espcie de transnacionalizao cultural na qual os canais fluem todos para uma nica direo, dos centros para periferia, concentrando sempre seu domnio em elites ou grupos que monopolizam ou compartilham, em feroz concorrncia, seus meios de capital e sua capacidade tecnolgica para fortalecer sua influncia sobre o pensamento e os valores da populao (LPEZ e ORTEGA, 1997, p.177).

    Mais interessante ainda constatar a presena macia da Globo

    Filmes. Nessa listagem, o brao da Rede Globo no cinema aparece em cinco dos seis filmes relacionados, sempre associada a outros co-produ-tores. Novamente, somente Tropa de Elite no foi includo na regra.

    Essas informaes, mesmo superficiais, so vlidas e eficazes para qualquer proposta de se compreender o mercado cinematogrfico do Brasil da ltima dcada. Tal relato nos mostra que os filmes nacionais com uma trajetria satisfatria no mercado interno seguiram um padro de produo/comercializao prprio indstria audiovisual norte-ame-ricana: associao a monoplios com o aporte financeiro e miditico ca-paz de fazer o produto circular de forma eficiente (distribuio) e atrair a ateno da audincia consumidora desse meio (marketing/divulgao).

  • 37

    Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo

    Filme Ano Produo Direo Distribuio Pblico

    Carandiru 2003 HB Filmes/GloboFilmes/ Columbia

    TriStar

    Hector Babenco

    Columbia TriStar 4.693.853

    Cazuza O Tempo no para

    2004

    Globo Filmes/ Lereby Produes/ Cineluz Produes/

    Columbia Tristar

    Sandra Wernech / Walter

    Carvalho

    Columbia TriStar 3.082.522

    Os dois filhos de

    Francisco2005

    Globo Filmes/ Conspirao Filmes/

    ZCL Produes Artsticas/ Columbia

    Tristar

    Breno Silveira

    COLUMBIA TRISTAR 5.319.677

    Se eu fosse voc

    2006

    Globo Filmes/ Total Filmes/ Lereby

    Produes/ Fox Film do Brasil

    Daniel Filho Fox Film do Brasil 3.644.956

    Tropa de Elite 2007 Zazen Produes Jos Padilha

    Universal Pictures do Brasil

    / The Weinstein Company

    2.417.193

    Meu nome no Johnny

    2008

    Globo Filmes/ Atitude Produes/

    Sony Pictures Home Entertainment/

    Teleimage/ Apema

    Mauro LimaDowntown

    Filmes/ Sony Pictures

    2.000.000

    Tabela 1: Maiores bilheterias do cinema brasileiro entre 2003 e 2008, segundo a Ancine4

    Resumindo, a relevncia da participao de grandes produtoras e distribuidores nos longas brasileiros assim como em qualquer cine-matografia sua capacidade de operar em duas frentes cruciais para a carreira de um filme: torn-lo disponvel aos espectadores e trabalhar para despertar o interesse desse pblico consumidor.

    E justamente pelo quesito despertar o interesse do pblico que faz necessrio olhar com ateno ao papel da Globo Filmes no cinema brasileiro contemporneo. Trata-se, afinal, de uma produto-ra ligada ao maior grupo miditico do pas. Na prtica, isso significa poderosas campanhas de marketing e propaganda dos lanamentos em questo. Mesmo atuando como produtora associada, e sendo as aes de marketing etapa abrangida pela distribuio, a Globo Filmes usa seu aporte miditico para divulgar os filmes do qual participa,

    4 As estatsticas sobre o mercado cinematogrfico nacional so disponibilizadas pelo Observatrio Brasileiro do Cinema e do Audiovisual (O.C.A.) no portal da Ancine: http://www.ancine.gov.br/oca/.

    http://www.ancine.gov.br/oca/

  • 38

    Karine dos Santos Ruy

    incluindo merchandising no roteiro de novelas e outros programas de boa audincia do grupo. Segundo Butcher, o capital que a Glo-bo Filmes oferece aos produtores no dinheiro, mas uma moeda ainda mais valorizada no mercado do audiovisual: espao na mdia (2005, p. 90).

    O importante que a Globo d a certeza de uma es-trutura nacional de divulgao que pode se dar nos formatos tradicionais (anncios e spots de TV) ou na chamada cross media citao e promoo nos progra-mas da casa). Dessa maneira, a Globo demonstrou imenso poder para alavancar o filme nacional naqui-lo que ele tem maior fraqueza e relao ao produto norte-americano: os altos investimentos em marketing (BUTCHER, 2005, p. 75).

    O pesquisador conclui, ainda que, ao projetar-se na rea do cine-ma, o objetivo da Rede Globo era

    (...) manter o controle sobre a produo e sustentar a hegemonia no campo da produo de narrativas au-diovisuais do pas, posio que a TV globo assumiu a partir de meados da dcada de 70, mas que comeou a se desestabilizar, principalmente, com o surgimento de novas tecnologias de difuso e consumo da ima-gem (Ibidem, p. 88).

    O primeiro longa-metragem a levar o selo da Globo Filmes foi O Auto da Compadecida (1999), de Guel Arraes. Mas o filme que definiria de vez a participao do grupo no setor foi Cidade de Deus (2002). A parceria foi acertada somente no perodo de lanamento do filme, a cargo da distribuidora Lumire. Na poca, at as previses mais oti-mistas, que previam 1 milho de espectadores, foram desbancadas. Cidade de Deus tornou-se um fenmeno no mercado cinematogrfico brasileiro, ultrapassando a marca de 3,3 milhes de ingressos vendi-dos. Trata-se de um marco qualitativo, responsvel por despertar nova-mente o interesse do pblico brasileiro pelos filmes nacionais.

    O filme foi capaz de atrair espectadores que esta-vam longe dos cinemas, lotando os multiplex mais

  • 39

    Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo

    elitizados e os cinemas de rua mais populares. Cidade de Deus instaurou-se no centro do deba-te nacional ultrapassando o nicho dos cadernos culturais e configurando-se como um filme even-to brasileiro. A violncia urbana deixou de ser um tema tabu para o cinema de retomada (BUTCHER, 2005, p. 90).

    O efeito Cidade de Deus estende-se a Carandiru, primeiro fil-me apresentado pela tabela 1 deste trabalho. Alm de ser a segunda maior bilheteria do perodo, o longa dirigido por Hector Babenco se destacou em um cenrio peculiar dentro do mercado cinematogrfico brasileiro: o nmero de espectadores voltou aos 100 milhes (marca no ultrapassada desde 1989), sendo que os filmes brasileiros repre-sentaram 21,4% deste total. O filme, que seguiu a trilha de Cidade de Deus e mergulhou na temtica social da criminalidade e da violncia, ganhou altos investimentos em distribuio da Columbia, um reflexo do sucesso do antecessor.

    As particularidades do ano de 2003 na esfera do cinema nacio-nal no se resumem s cifras de Carandiru; a participao da Globo Filmes tambm no. No mesmo ano, outros seis filmes brasileiros ultra-passaram a marca de 1 milho de espectadores. Em um nico final de semana, trs ttulos nacionais - Os Normais (Jos Alvarenga Jr, 2003), Maria Me do Filho de Deus (Moacyr Ges, 2003) e Lisbela e o Pri-sioneiro (Guel Arraes, 2003) - ocuparam as posies inicias no ranking das maiores bilheterias, atingindo 70% do mercado (BUTCHER). A Glo-bo Filmes estava associada s seis produes.

    Essas informaes indicam que o cinema brasileiro comercial-mente sustentvel vem seguindo o padro hollywoodiano no que diz respeito participao de conglomerados da comunicao e investi-mentos generosos em marketing para atrair o consumidor-espectador. Mas seguindo essa lgica, o que justificaria o sucesso de Tropa de Eli-te? Primeiramente, um filme deve ser apreendido como um espetculo, e uma vez assim o considerando necessrio levar em considerao a imprevisibilidade de fenmenos dessa ordem. Como argumenta Dou-glas Kellner em sua crtica a Guy Debord, as polticas do espetculo so imprevisveis e os espetculos nem sempre conseguem manipular o pblico e podem falhar (KELLNER, 2003, p. 138).

  • 40

    Karine dos Santos Ruy

    No caso de Tropa de Elite o espetculo no falhou; pelo con-trrio, foi superdimensionado. O filme sobre as intervenes do BOPE nas favelas cariocas no foi divulgado por vias tradicionais, com es-paos pagos por propaganda nos veculos de comunicao. A frmula foi muito mais eficaz. A pirataria do filme entrou na pauta da mdia jornalstica, e logo foi a vez do contedo do longa ser polemizado. Ao invs de ocupar espao somente nas editorias de Cultura dos jor-nais e revistas, Tropa de Elite ganhou capas e reportagens especiais. Quando o filme venceu o Festival de Berlim, em 2008, novamente agendou a mdia.

    Percebe-se, assim, que para conquistar um pblico acima da mdia e concorrer com o arsenal hegemnico norte-americano as produes nacionais precisam se destacar aos olhos do especta-dor. E em tempos que as decises de consumo so mais prticas que ideolgicas, a frmula destacar-se midiaticamente, seja pelas aes articuladas das majors envolvidas ou por particularidades que despertem o interesse do campo jornalstico, como a pirataria de Tropa de Elite.

    CONSIDERAES FINAIS

    O quadro recente do mercado cinematogrfico brasileiro indica a formao de uma hegemonia dentro do prprio cinema brasileiro. Trata-se de uma hegemonia das bilheterias, portanto comercial, mas nem por isso menos importante de ser analisada. Afinal, estamos dian-te de um modelo de autossustentao de projetos cinematogrficos al-tamente exclusivos, disposio de muito poucos. A maioria dos filmes realizados no Brasil financiada por mecanismos pblicos de incentivo cultura, por intermdio da Ancine. Essa mesma maioria tambm no conta com distribuidores, restringindo sua exibio a um circuito limita-do de espectadores. Outros ttulos sequer conseguem pleitear espao em uma sala de exibio.

    Diante de cenrios to opostos, a questo a ser observada da-qui pra frente como esses mecanismos de produo sustentvel via majors e Globo Filmes podero interferir nos gneros tpicos de uma cinematografia nacional. Na lista de filmes que foi apresentada no de-correr deste trabalho, as temticas enraizadas na sociedade brasileira contempornea foram praticamente constantes. Aparecem ali a crimina-

  • 41

    Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo

    lidade (Carandiru, Tropa de Elite e Meu nome no Johnny) e biografias de personagens conhecidos do grande pblico (Cazuza O Tempo no para e Dois Filhos de Francisco, sobre a histria dos cantores sertanejos Zez Di Camargo e Luciano). Foge regra a comdia romntica Se eu fosse voc (Daniel Filho, 2006), cujo roteiro trabalha em um tema j co-mum no cinema: pessoas que passam por uma experincia sobrenatural de troca de corpos. A autenticidade do filme, no que diz respeito a esse carter regional, fica por conta dos protagonistas Glria Pires e Tony Ramos, atores de sucesso em telenovelas da prpria Globo. A temtica e o gnero, por sua vez, so recorrentes no cinema hollywoodiano norte-americano consumido pelos espectadores brasileiros, sobretudo na gra-de da televiso aberta Sexta-feira muito louca (Mark S. Waters, 2003), De repente 30 (Gary Winick, 2004), Tal pai, tal filho (Rod Daniel, 1987) e Vice versa (Brian Gilbert, 1988), por exemplo.

    Levando em considerao que na sociedade de massa a cultura em escala industrial produzida para tentar conquistar a maior audin-cia possvel, o potencial de consumo em busca de um retorno financeiro satisfatrio sempre ser explorado ao mximo. No campo do cinema, esse esquema no se atm ps-produo, com seus sofisticados me-canismos de promoo e venda; ele pode determinar a escolha do rotei-ro, no por critrios de qualidade narrativa, mas de potencial econmi-co. Como bem coloca Achille, a ordem no vender o que se produz, mas produzir o que se pode vender (ACHILLE apud BUSTAMANTE, 2003, p. 32). Diante disso, relevante tentar proteger das especifici-dades mercadolgicas da linha de produo cultural a originalidade da cinematografia nacional.

    Isso no significa a condenao da indstria cinematogrfica que d sinais de fortalecimento no pas. Em um mercado to competitivo como o cinematogrfico, todas as iniciativas de dar espao e atrair aten-o para o cinema nacional so vlidas e devem ter continuidade. Mas o cinema tem que continuar sendo nacional, e no apenas nos crdi-tos apresentados ao final da exibio, mas em seu carter cultural de representao e construo de imaginrios que nos so prximos, co-nhecidos. essa sua especificidade, esse seu diferencial, esse seu argumento mais eficiente para conquistar o pblico.

    Em um mercado que ainda tenta se estruturar, produzir filmes seguindo apenas um padro de consumo capaz de garantir seu suces-

  • 42

    Karine dos Santos Ruy

    so em termos de bilheteria pode ser entendido como uma prtica cons-trangedora diversidade das narrativas audiovisuais que historicamen-te diferencia as cinematografias nacionais. Contudo, pelos movimentos que se observam nos ltimos anos, essa reproduo interna de um modelo de indstria cinematogrfica assimtrica, no qual os grandes investimentos em distribuio e marketing transformam-se em compo-nentes quase imprescindveis para mobilizao de espectadores, est conseguindo se consolidar como um novo padro para o mercado de cinema brasileiro.

    REFERNCIAS

    ANCINE. Filmes Brasileiros com mais de 500 mil espectadores 1970-2007 Disponvel em . Acesso em 20 de maio de 2009.

    BARONE, Joo Guilherme. Comunicao e Indstria Audiovisual: Cen-rios Tecnolgicos & Institucionais do cinema brasileiro na dcada de 1990. Dissertao apresentada a Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, 2005.

    BUSTAMANTE, Enrique (org.). Hacia um nuevo sistema mundial de comuni-cacin. Barcelona: Editorial Gedisa, 2003.

    BUTCHER, Pedro. Cinema brasileiro hoje. So Paulo: Publifolha, 2005.

    CAETANO, Daniel. Cinema brasileiro 1995 2005 Ensaios sobre uma dca-da. Rio de Janeiro: Contracampo, 2005.

    KELLNER, Douglas. Cultura da mdia e triunfo do espetculo. In: MORAES, Dnis de. (org.). Por uma outra comunicao Mdia, mundializao cultural e poder. Rio de Janeiro: Record, 2003.

    LPEZ, Silvana Levi de., ORTEGA, Graciela Uribe. Globalizao e frag-mentao. O papel da cultura e da informao. In: SANTOS, M. et al. (org.). O novo mapa do mundo Fim de sculo e globalizao. So Paulo: Hucitec, 1997.

    MORAES, Dnis de. A tirania do fugaz: Mercantilizao cultural e saturao miditica. In: MORAES, Dnis de. (org.). Por uma outra comunicao Mdia, mundializao cultural e poder. Rio de Janeiro: Record, 2003.

    www.ancine.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=804

  • 43

    Traos da indstria do cinema brasileiro contemporneo

    SADOUL, Georges. A Histria Mundial do Cinema. So Paulo: Martins, 1964.

    SALLES GOMES, Paulo Emlio. Uma situao colonial. Arte em Revista: anos 60. Ano 1. n.1, So Paulo: Centro de Estudos de Arte Contempornea/Kayrs. jan./mar. 1979, p.11-14.

    SERRA, Snia. Vertentes da economia poltica da comunicao e jornalis-mo. In: Metodologias de Pesquisa em Jornalismo. Petrpolis, RJ: EditoraVozes, 2007.

    FILMES CITADOS

    2 FILHOS de Francisco A Histria de Zez di Camargo & Luciano. Breno Sil-veira, 2005, 132, Colorido. Produtora: Conspirao Filmes. Roteiro: Carolina Kotscho e Patrcia Andrade. Origem: Brasil. Elenco: ngelo Antnio, Dira Paes, Mrcio Kieling, Thiago Mendona, Paloma Duarte.

    CARANDIRU. Hector Babenco, 2003, 145, Colorido. Produtora: HB Filmes. Ro-teiro: Hector Babenco, Fernando Bonassi, Victor Navas. Origem: Brasil. Elenco: Luiz Carlos Vasconcelos, Milton Gonalves, Maria Luisa Mendona, Lzaro Ra-mos, Wagner Moura, Rodrigo Santoro.

    CAZUZA O Tempo no para. Sandra Werneck e Walter Carvalho, 2004, 98, Colorido. Produtora: Lereby Produes. Roteiro: Fernando Bonassi e Victor Na-vas. Origem: Brasil. Elenco: Daniel de Oliveira, Dudu Azevedo, Andra Beltro, Dbora Falabella, Maria Flor.

    CIDADE de Deus. Fernando Meirelles, 2002, 132, Colorido. Produtora: O2 Fil-mes. Roteiro: Brulio Montovani. Origem: Brasil. Elenco: Alexandre Rodrigues, Matheus Nachtergaele, Leandro Firmino.

    DONA flor e seus dois maridos. Bruno Barreto, 1976, 120, Colorido. Produtora: Carnaval Unifilm, Cia Sr e Coline. Roteiro: Bruno Barreto, Eduardo Coutinho e Leopoldo Serran. Origem: Brasil. Elenco: Snia Braga, Jos Wilker, Mauro Men-dona, Dbora Brillanti.

    DE repente 30= 13 Going on 30. Gary Winick, 2004, 98, Colorido. Produtora: Re-volution Studios e Thirteen Productions. Roteiro: Josh Goldsmith, Cathy Yuspa. Origem: Estados Unidos. Elenco: Jennifer Garner. Mark Ruffalo, Judy Greer.

    LISBELA e o Prisioneiro. Guel Arraes, 2003, 106, Colorido. Produtora: Natasha Enterprises. Roteiro: Guel Arraes, Pedro Cardoso, Jorge Furtado. Origem: Bra-sil. Elenco: Selton Mello, Selton Mello, Virginia Cavendish, Bruno Garcia.

  • 44

    Karine dos Santos Ruy

    MARIA Me do Filho de Deus. Moacyr Ges, 2003, 107, Colorido. Produtora: Diler & Associados. Roteiro: Thiego Balteiro, Marta Borges, Moacyr Ges, Mar-co Ribas de Farias, Maria de Souza. Origem: Brasil. Elenco: Giovanna Antonelli, Luigi Barricelli, Padre Marcelo Rossi, Jos Wilker, Jos Dumond.

    MEU nome no Johnny. Mauro Lima, 2008, 107, Colorido. Produtora: Ati-tude Produes e Empreendimentos Ltda. Roteiro: Mauro Lima (roteiro), Ma-riza Leo. Origem: Brasil. Elenco: Selton Mello, Clo Pires, Jlia Lemmertz, Cssia Kiss.

    O Auto da Compadecida. Guel Arraes, 1999, 104, Colorido. Produtora: Glo-bo Filmes. Roteiro: Guel Arraes, Adriana Falco e Joo Falco. Origem: Bra-sil. Elenco: Matheus Natchergaele, Selton Mello, Diogo Vilela, Denise Fraga.

    OS Normais. Jos Alvarenga Jr, 2003, 88, Colorido. Produtora: Misso Imposs-vel Cinco Produes Artsticas. Roteiro: Alexandre Machado e Fernanda Young. Origem: Brasil. Elenco: Fernanda Torres, Luiz Fernando Guimares, Fernanda Torres, Marisa Orth, Evandro Mesquita.

    SE eu fosse Voc. Daniel Filho, 2006, 108, Colorido. Produtora: Total En-tertainment. Roteiro: Adriana Falco, Daniel Filho, Ren Belmonte e Carlos Gregrio. Origem: Brasil. Elenco: Glria Pires, Tony Ramos, Thiago Lacerda, Danielle Winits.

    SEXTA-feira muito louca= Freaky Friday. Mark S. Waters, 2003, 93, Colorido. Produtora: Walt Disney Pictures / Gunn Films / Casual Friday Productions. Roteiro: Heather Hach e Leslie Dixon. Origem: Estados Unidos. Elenco: Jamie Lee Curtis, Lindsay Lohan, Mark Harmon.

    TAL pai, tal filho= Like Father Like Son. Rod Daniel, 1987, 96, Colorido. Pro-dutora: Imagine Films Entertainment. Roteiro: Steve Bloom, Lorne Cameron. Origem: Estados Unidos. Elenco: Dudley Moore, Kirk Cameron, Margaret Collin, Catherine Hicks, Sean Astin, Patrick O Neal.

    TROPA de Elite. Jos Padilha, 2007, 115, Colorido. Produtora: Zazen Filmes. Roteiro: Jos Padilha, Rodrigo Pimentel e Brulio Montovani.

    Origem: Brasil. Elenco: Wagner Moura, Caio Junqueira, Andr Ramiro, Maria Ribeiro.

    VICE-Versa. Brian Gilbert, 1988, 98, Colorido. Produtora: Columbia Pictures. Roteiro: Dick Clement e Ian La Frenais. Origem: Brasil. Elenco: Judge Reinhold, Fred Savage , Swoosie Kurtz, William Prince.

  • O JOGO CINEMATOGRFICO DE CAMA DE GATO

    Isabel Almeida Marinho do Rgo

    Publicitria. Mestre em Comunicao Social pela PUCRS/RS/BR. E-mail: [email protected]

    RESUMOO filme brasileiro Cama de Gato o objeto deste artigo e, a partir da anlise flmica, pode ser observado como a sinergia entre a lingua-gem cinematogrfica e os jogos representam a cultura dos jovens contemporneos. Jovens imersos em uma profuso de mensagens e meios com diferentes tipos de linguagens que demonstram a carac-terstica cultural e social da atualidade denominada neotribalizao, por Michel Maffesoli.

    PALAVRAS CHAVECultura juvenilCinema brasileiroJogos

    ABSTRACTThe Brazilian movie Cama de Gato is the object of this article and, through film analysis, we can observe how the synergy between cine-matographic languages and games represent the contemporary youth culture. Young people immersed in a profusion of messages and me-dia with different kinds of languages which demonstrate cultural and social characteristics of the present time named neotribalization by Michel Maffesoli.

    KEYWORDSYouth cultureBrazilian cinemaGames

    O cinema um tipo de arte mdia que revela traos culturais da sociedade em que est imerso, por isso o filme Cama de Gato foi esco-lhido como objeto de estudo deste artigo. Ele representa em sua sinergia

  • 46

    Isabel Almeida Marinho do Rgo

    com a linguagem dos jogos a cultura jovem contempornea, caracteriza-da por Michel Maffesoli como neotribalizao.

    A presena de elementos caractersticos dos jogos no filme Cama de Gato remete a traos da tribalizao, entre outras razes, por ser um tipo de atividade em que o estar-junto importante; grupos se formam em torno de jogos na busca da diverso em grupo, o hedonismo compar-tilhado; pela descrena nos valores e tradies e busca por outros ideais mesmo que temporrios, pela evaso desta realidade que o jogo com suas regras prprias proporciona; pela liberdade, to valorizada atual-mente, mas ainda buscada em seu sentido pleno, de liberdade radical, fuga das regras, o livre arbtrio abordado pelos jovens no filme traz a noo de liberdade para a realidade.

    Os jovens apresentam uma cultura prpria bastante influenciada pelas ferramentas tecnolgicas de que fazem uso, as obras de arte e mdia que retratam esse pblico refletem diretamente essa influncia e revelam como a cultura jovem se mostra atualmente.

    O cinema atual conta com vrios recursos para representar e atrair a ateno dos jovens, buscando muitas caractersticas tpicas dos quadrinhos, jogos, animaes, videoclipes e programas de tele-viso, linguagens habituais para os jovens, por isso o filme escolhido consegue manter um dilogo bem prximo com a cultura juvenil. No uma novidade o cinema dialogar e trazer caractersticas de outras formas de arte e comunicao, mas as inovaes nas tecnologias de informao e comunicao trouxeram novos elementos para o cinema, e a comunicao com os jovens atualmente requer uma diversidade de formatos e tcnicas.

    A convivncia diria com a televiso e os meios eletrnicos em geral tem mudado substancialmente a maneira como o espectador se relaciona com as imagens tcnicas e isso tem consequncias diretas na abordagem do cinema.

    A JUVENTUDE E A SINERGIA ENTRE AS LINGUAGENS

    Por meio da caracterizao da juventude como a fase intermedi-ria entre a infncia e a vida adulta, sem a delimitao baseada apenas em idades, simples perceber seu incio. A transio entre infncia, ado-lescncia e juventude identificada pelas perceptveis mudanas fsicas

  • 47

    O jogo cinematogrfico de Cama de Gato

    e comportamentais, mas no h uma delimitao evidente entre juven-tude e vida adulta, entretanto h comportamentos sociais e culturais que sinalizam uma cultura dos jovens.

    O jovem procura formar nos aspectos biolgicos, psquicos e so-ciais uma identidade socialmente reconhecida mais ampla que a vivida na famlia. Os jovens esto num perodo de escolhas, de experimenta-o, possuem vitalidade e disposio para viver os mais diversos tipos de situaes e correr riscos. Os adolescentes ainda esto numa fase de descoberta do prprio corpo, de sua identidade, de suas afinidades e no ingresso inicial em distintas esferas da vida.

    Erikson (1987) caracteriza a juventude como uma moratria psicossocial que antecede a entrada no mundo adulto, um perodo de procura de alternativas e experimentao de papis que permitem um trabalho de elaborao interna, tambm caracterizada pelas necessi-dades e exigncias socioculturais.

    Assim como a gerao dos nascidos nas dcadas de 60 e 70 contaram com o rtulo de gerao X, os jovens nascidos entre 80 e 90 contam com a denominao de gerao Y, e com o ttulo vm as carac-terizaes, que em sua maioria so esteretipos e generalizaes, mas h algumas ideias que ajudam a refletir sobre a contemporaneidade.

    A primeira associao feita com a gerao Y remete s tecnolo-gias de informao, comunicao e entretenimento desenvolvidas nos ltimos anos. Os jovens esto acostumados a absorver as informaes com a lgica dos links da internet, alternando a navegao entre diversos sites, comunicando-se pelos programas de conversa on-line enquanto navegam na rede, ou ainda enquanto falam ao celular; no gostam ou no tm pacincia para processos muito longos, demorados. A capa-cidade de dividir a ateno entre vrias atividades uma necessidade decorrente do nmero de ferramentas de comunicao e informao, e suas demandas de ateno.

    O Blog Gerao Y escrito por vrios jovens e aborda temas relacionados a cinema, teatro, jogos, ecologia e tecnologia, a definio sobre eles mesmos faz referncia s tecnologias:

    Falar no celular, dominar a internet e ouvir msica... tudo ao mesmo tempo! Jovens antenados, de mente aberta e ambiciosos: essa a Gerao Y. Vivendo na velocidade da cena pop e da tecnologia, somos a ge-

  • 48

    Isabel Almeida Marinho do Rgo

    rao capaz de se relacionar e at impactar o mundo sem sair de casa. (BLOG GERAO Y, 2008).

    A familiaridade dos jovens com as ferramentas tecnolgicas de comunicao, informao e entretenimento uma das qualidades da gerao que acompanhou a ascenso meterica da tecnologia em uma sociedade cada vez mais dependente das mquinas.

    O surgimento de diferentes tecnologias originou produtos arts-ticos e culturais com vrias linguagens e hibridizao entre elas. A for-ma que o filme Cama de Gato dialoga com as diversas linguagens e tecnologias revela muitos traos da cultura jovem e do perodo atual: a linguagem hbrida que traz caractersticas de jogos, programas de televiso, internet e videoclipes; o ritmo da montagem acompanhan-do a tendncia atual de muitas informaes transmitidas em pouco tempo; a relao instintiva com o tempo, que no segue sempre uma linearidade; os vrios focos narrativos; as sequncias sendo intensifi-cadas pela trilha sonora.

    Os recursos tecnolgicos auxiliam na produo dos filmes e, as-sim como a vida cotidiana est intimamente ligada s tecnologias de informao e comunicao, essas ferramentas esto dentro do enredo do filme Cama de Gato, sendo utilizados pelos personagens, e esto por trs das telas auxiliando o realizador em vrias etapas do processo cinematogrfico, influenciando duplamente a narrativa. Filmadoras e cmeras de vdeo digitais, de circuito de segurana e webcams fazem parte da narrativa do filme, e oferecem diferentes ngulos e texturas para que o espectador acompanhe a histria contada.

    H uma longa tradio de dilogo e colaborao entre os diver-sos meios e suas linguagens caractersticas; nos anos 60 e 70 foram realizados filmes voltados para a exibio na televiso e alguns cineas-tas dirigiam sries de televiso, como Godard.

    Historicamente anteriores ao aparecimento da televiso, do v-deo e da Internet, a linguagem e a narrativa cinematogrficas, de acor-do com Gerbase (2003), podem ser consideradas as bases sobre as quais todas as outras linguagens e narrativas audiovisuais se estabele-ceram. Mas no caminho inverso, os realizadores contemporneos, que conviveram com vrios tipos de linguagens j diferenciadas do cinema, trazem caractersticas especficas dos outros meios, atingindo o dina-mismo necessrio para atrair o pblico contemporneo.

  • 49

    O jogo cinematogrfico de Cama de Gato

    O cinema comea a absorver, com a velocidade bai-xa que lhe prpria, alguns componentes estticos do ps-modernismo. (...) resultado de um ambiente, ou de uma condio (Lyotard) que faz alguns ro-teiristas, diretores e montadores criarem filmes que, alm de retratarem seu tempo, acabam, em sua lgi-ca narrativa interna, absorvendo os mecanismos de uma poca (GERBASE, 2003, p.172).

    O filme escolhido est permeado pelo imaginrio da socie-dade contempornea feito por uma equipe de pessoas, em grande parte, vindas da televiso e publicidade, contando com os recursos tecnolgicos disponveis nesse incio de sculo XXI para retratar a atual sociedade, que no Brasil , em sua maioria, formada por uma populao jovem.

    Maffesoli afirma que No a imagem que produz o imaginrio, mas o contrrio. A existncia de um imaginrio determina a existncia de conjuntos de imagens. A imagem no o suporte, mas o resultado (MAFFESOLI, 2001, p.74).

    A arte um meio de fruio, mas tambm nos oferece um ima-ginrio no qual podemos ver refletidas as concepes acerca de nossa sociedade e dilemas de nossa poca.

    Serge Toubiana, crtico, ex-redator chefe da revista Cahiers du Cinma, afirmou em entrevista: o que me assusta que para a nova gerao, o cinema virou uma linguagem lenta, incapaz de prend-los (CARTA CAPITAL, 2007).

    (...) o cinema adere, em parte, esttica dos games?Serge Toubiana: para tentar capturar a ateno dessa gerao que no tem mais pacincia de olhar uma cena, uma seqncia. A garotada to formada pela imagem, que no se deixa mais levar por ela (CARTA CAPITAL, 2007).

    Para atrair a ateno atravs de imagens, em meio a tantos apelos visuais, preciso recorrer a vrios recursos tcnicos e estrat-gicos. A hibridizao de linguagens um processo que se aprofunda medida que o tempo avana, e no vai deixar de se desenvolver enquanto a imagem contar com tanta importncia.

  • 50

    Isabel Almeida Marinho do Rgo

    No mesmo filme h a sensao de ter assistido a vrios tipos de obras e experimentado uma diversidade de linguagens. Depois de 92 mi-nutos do longa-metragem Cama de Gato, foram vistos depoimentos reais e espontneos de jovens em lugares frequentados pela classe mdia alta paulistana, fotos captadas por cmeras digitais, imagens de webcams, c-meras de segurana e momentos de convivncia entre amigos numa mistu-ra de jogo eletrnico e realidade com referncia a Second Life e The Sims1.

    A sinergia entre o cinema e os efeitos especiais desenvolvidos pela animao, a tcnica de transmisso de mensagens em poucos segundos da televiso, as informaes organizadas por meio de as-sociaes dos links de internet em vez de uma lgica temporal, a volta ao mundo real e seu sistema formal de leis proporcionada pelos noticirios de televiso e a profuso de imagens coloridas com luzes intermitentes acompanhadas de msicas, como em um videoclipe, representa os jovens tanto em seus comportamentos e vivncias, quanto em seus meios habituais de comunicao e entretenimento. Demonstrando a tamanha importncia que os meios de comunicao exercem na vida social dos jovens contemporneos, nas formas de lazer e tambm nas outras esferas de suas vidas, que esto direta-mente ligadas s linguagens desenvolvidas pelos diferentes objetos culturais e ferramentas tecnolgicas.

    CAMA DE GATO: FILME E JOGO

    Cama de Gato foi roteirizado e dirigido por Alexandre Stockler. A obra foi apoiada por uma agncia de publicidade e fez toda a sua divulgao por meio da internet, meio que tambm serviu para escolha da trilha sonora, com msicas de bandas desconhecidas inscritas na seleo promovida na rede.

    Antes do incio da fico e logo aps a ltima cena so mostrados depoimentos de jovens entrevistados em lugares badalados da noite paulis-tana, os jovens falam sobre diversos temas e revelam valores pouco ticos.

    Os protagonistas da trama so trs jovens: Cristiano, Gabriel e Chico. Cristiano se junta com seus dois amigos na casa de sua me,

    1 The Sims um jogo eletrnico de estratgia no qual o jogador observa a vida de uma vizinhana de pessoas simuladas, que so os Sims, o jogo vendido em CDs. Second Life o misto de jogo eletrnico, realidade virtual e rede de relacionamentos, jogado on-line em rede com outras pesso-as reais mediante o pagamento de determinada quantia empresa responsvel pelo jogo.

  • 51

    O jogo cinematogrfico de Cama de Gato

    chama uma colega fingindo estar sozinho e a brincadeira acaba viran-do um estupro, Joana morre nas mos dos jovens. Quando a me de Cristiano chega, cai das escadas com o susto e morre. Os garotos se livram dos corpos no lixo, onde matam mais um homem. No fim, os jovens conversam com Deus e escutam dele que tudo ficar bem.

    O nome do filme faz referncia direta a um jogo, e d indcios de como ser o desenrolar da narrativa em que os jovens jogam, se divertem, cada vez mais se fecham em uma armadilha e, finalmente, nada de concreto que interfira nas suas vidas acontece. O tradicional jogo da cama de gato envolve a habilidade de seus participantes, o bom desempenho resulta em belas figuras, e a falta de destreza leva ao fim do jogo, num emaranhado sem volta.

    A marca registrada dos jogos a interatividade, o desafio de articular tticas e estratgias estimula os jogadores a raciocinarem ra-pidamente e reagirem frente aos obstculos. Toda a trama do filme Cama de Gato assemelha-se a um grande jogo: requer estratgias dos personagens e reaes aos desafios impostos. Alm da necessidade de contornar os problemas que se colocam no caminho que eles deci-dem percorrer, os jovens ainda se esforam para se divertir. Eles esta-belecem suas prprias regras, construindo um jogo especfico, mas a realidade acaba se impondo sobre o mundo ilusrio dos personagens, e as regras da vida real no so claras nem previsveis.

    A interatividade indica a gradao de influncia que os usurios possuem dentro da forma ou contedo de um ambiente mediado. As vivncias dos personagens alternam o domnio deles sobre os aconte-cimentos e estratgias para programar os prximos eventos, com situ-aes no esperadas, que fogem ao controle.

    Os jogos tambm envolvem desafios, como os quebra-cabeas (puzzles), e tm como objetivo resolver um problema, a soluo de peas caindo, algo embaralhado, a construo de pequenos mecanis-mos, o vdeo-game se desenvolveu com a constante atualizao dos desafios tendo como norte a sensao de realidade.

    A primeira sequncia com elementos de jogos mostrada nos mi-nutos iniciais do filme. Os trs jovens, Cristiano, Chico e Gabriel discutem sobre poltica, sociedade, liberdade e segurana na casa de um deles, quando a disputa de argumentos fica mais acirrada, Cristiano comea a anotar os pontos de cada um numa folha de papel, cada personagem de-

  • 52

    Isabel Almeida Marinho do Rgo

    fende sua ideia e coloca uma nota de Dlar em cima da mesa. As aes demonstram uma disputa de argumentos, um jogo que envolve raciocnio.

    Outros elementos da sequncia tambm reforam a ideia de jogo: a folha com as anotaes dos pontos alcanados mostrada em detalhe, assim como a pilha onde os Dlares so apostados, o quadro por trs do personagem remete ao mundo simulado do Second Life e The Sims. medida que a disputa fica mais acirrada, com os nimos exaltados, os argumentos e ataques mais agressivos, os cortes so mais rpidos, a cmera treme e as tomadas subjetivas levam o espec-tador para dentro da disputa.

    Antes das tomadas subjetivas, h uma aproximao da cmera em direo cabea do personagem, como se a cmera levasse o espectador para ocupar o lugar daquele jogador. A disputa dada como encerrada quando Cristiano pergunta se Gabriel acredita em Deus, h um corte, o ttulo do filme mostrado. Chico faz a contagem regressiva, mas Gabriel no reage com nenhum argumento, Cristia-no declarado vencedor, merecedor do prmio: os Dlares sobre a mesa. Cortes rpidos acompanham a velocidade dos argumentos nos dois minutos finais da sequncia, h variao entre planos prximos e mdios, cmera fixa e movimentos da cmera subjetiva, ao fim da ao h um efeito sonoro de luta, como a campainha que determina o fim de um round na luta de boxe.

    Os jogos eletrnicos apresentam interatividade, variao no de-senvolvimento dos acontecimentos e de consequncias decorrentes das escolhas, diferente das formas da narrativa clssica, as histrias se desenrolam de uma forma cheia surpresas e aes inusitadas quan-do parte de um jog