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Directora: Beatriz Isaac | Directores-adjuntos: Emanuel Monteiro | Joana Portugal © Jean-Philippe Ksiazek/AFP/Getty Images Edição Especial: 40 anos da Revolução dos Cravos A inquietação em busca de mudança: Uma cuidada análise da actualidade venezuelana Págs. 7-11 Reportagem Fotográfica: Portugueses pelo Mundo | Memórias de um 25 de Abril Relatos de vivências da Revolução nas Colónias Págs. 19-25 Grande Entrevista: Jorge Fazenda Loureço e Jorge Vaz de Carvalho contam-nos como foi o seu 25 de Abril Págs. 12-18 O 25 de Abril e o Cinema Português: Que mudanças trouxe a liberdade à produção cine- matográfica Págs. 29-30 A Revolução tam- bém de faz a rir: Um desabafo que relem- bra a importância do hu- mor na revolução social Pág. 36

14ª edição

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Page 1: 14ª edição

Directora: Beatriz Isaac | Directores-adjuntos: Emanuel Monteiro | Joana Portugal

© Jean-Philippe Ksiazek/AFP/Getty Images

Edição Especial: 40 anos da Revolução dos Cravos

A inquietação em busca de mudança: Uma cuidada análise da actualidade venezuelana

Págs. 7-11

Reportagem Fotográfica: Portugueses pelo Mundo | Memórias de um 25 de Abril Relatos de vivências da Revolução nas Colónias

Págs. 19-25

Grande Entrevista: Jorge Fazenda Loureço e

Jorge Vaz de Carvalho

contam-nos como foi o

seu 25 de Abril

Págs. 12-18

O 25 de Abril e o Cinema Português: Que mudanças trouxe a

liberdade à produção cine-

matográfica

Págs. 29-30

A Revolução tam-bém de faz a rir: Um desabafo que relem-

bra a importância do hu-

mor na revolução social

Pág. 36

Page 2: 14ª edição

EDITORIAL

As Revoluções e a Mudança

Naquela que e a sua 14ª

ediça o, o jornal O Acadé mico,

talvez por influe ncia do ambi-

ente revoluciona rio das come-

moraço es de Abril, deu uma

volta de 360 graus. Ressurge

hoje com imagem e nome re-

novados, que esperemos que

passem pelo crivo dos nossos

leitores.

Assim, Pontiví gula sera , da-

qui em diante, o nome deste

nosso jornal. Perguntar-se-a o,

certamente, de onde surgiu

esta invulgar designaça o, ao

que respondo, dos valores a

que associamos este meio de

comunicaça o.

Pontivírgula é, então, além

de um trocadilho que se pre-

tende que seja sonante, um

sí mbolo de ponderaça o e re-

flexa o, porquanto se encontra

a meio caminho entre o ponto

final e a ví rgula. Ale m do mais,

procura-se tambe m que re-

presente a vontade de trans-

mitir informaça o precisa e cla-

ra que na o impeça, contudo, a

livre interpretaça o do leitor,

assumindo-se como um espa-

ço pu blico. Por u ltimo, Ponti-

vírgula simboliza a atenção

particular a imparcialidade, e

a aproximaça o, tanto quanto

possí vel, a objectividade, sen-

do que procuraremos sempre

apresentar todos os lados da

questa o.

O Pontiví rgula dinamizou

tambe m a sua pa gina de Facé-

book onde partilha diariamen-

te com os seus leitores notí -

cias de va rios meios de comu-

nicaça o. Para estar sempre

informado basta aceder a este

link e colocar gosto, no canto

superior direito.

Deixando a nossa mudança

de parte, e agora tempo de fa-

lar sobre a Revoluça o de 25 de

Abril de 1974 que celebra hoje

40 anos. Como na o podia dei-

xar de ser, e este o grande te-

ma da presente ediça o onde

esta o presentes relatos pesso-

ais de quem a viveu, reflexo es

sobre as mudanças que trouxe

e as promessas faltam cum-

prir.

De facto, a Revoluça o de 25

de Abril e um dos mais impor-

tantes marcos da Histo ria de

Portugal que trouxe, indubita-

velmente, o nascer de uma no-

va aurora. Com algumas pe-

dras pelo caminho, e certo,

mas as suas conquistas sa o

bem maiores que as suas der-

rotas. Creio que, para no s, re-

dactores do Pontiví rgula, bem

como para todos os outros jor-

nalistas, esta revoluça o se

mostra especialmente admira -

vel contanto sem Liberdade

na o existe Democracia, e sem

Democracia na o existe Jorna-

lismo, mas apenas publicida-

de.

Termino, enfim, saudando

todos aqueles que lutaram, e

lutam, aqui ou por esse mundo

fora, pela justiça e liberdade, e

esperando que este projecto

venha tambe m a ser um con-

tributo nesta luta sem fim

pois, como disse um dia N.H.

Kleinbaum “No matter what

people tell you, words and

ideas can change the world”.

Beatriz Isaac

Pág

. 2

Directora:

Beatriz Isaac

Directores-Adjuntos:

Emanuel Monteiro

Joana Portugal

Redacção:

Ana Cla udia Rodrigues

Ana Machado

Da rio Moreira

Ine s Correia

Joa o Gonçalo Simo es

Jose Paiva

Mariana Rodrigues

Patrí cia Fernandes

Sara Pla cido Po

ntiví

gula

| N

º14 F

icha T

écn

ica

Edição de Março

Page 3: 14ª edição

MUNDO UNIVERSITÁRIO Pág

. 3

Décima Quarta Edição

Todos no s sabemos que a

FCH anda a par e passo do

“Valor para Sempre”. Mas ja

paraste para pensar em quem

esta por tra s desta nossa mar-

ca? De todos os eventos, acti-

vidades, Facebook, site… tanta

coisa que na o da para enume-

rar.

Elas sa o homo nimas e e

com um sorriso que as vemos

todos os dias. A Dr.ª Ine s Rom-

ba e a Dr.ª Ine s Carra o sa o as

responsa veis pelo Gabinete de

Marketing e Comunicaça o da

Faculdade de Cie ncias Huma-

nas. Raramente esta o para-

das, e quando esta o os seus

dedos esta o ocupados ou no

computador, ou ao telefone,

sempre com simpatia e boa

disposiça o, tratando de assun-

tos da faculdade.

Para que serve este gabine-

te? – perguntas. E fa cil de per-

ceber e difí cil de executar: o

Gabinete de Marketing e Co-

municaça o e o serviço que tem

a responsabilidade sobre a co-

municaça o e imagem da insti-

tuiça o – quer interna quer ex-

ternamente. O principal objec-

tivo da actuaça o do Gabinete e

o reforço da visibilidade e do

prestí gio da Faculdade atrave s

da definiça o de uma estrate gia

concertada de comunicaça o.

A utilizaça o de uma linha

gra fica coerente e a sua cor-

recta aplicaça o em todos os

suportes nos quais se preten-

da veicular a imagem, interna

e externamente, e decisiva pa-

ra o reconhecimento da Facul-

dade, cuja actividade denuncia

responsabilidade e moderni-

dade. Assim, entre outras com-

pete ncias, o Gabinete de Mar-

keting e Comunicaça o apoia a

organizaça o e da a conhecer a

sociedade as atividades e os

assuntos de cara cter pu blico,

valorizando o seu papel no

meio em que se insere e a pos-

tura da sua intervença o social.

As “Ineses”, como muitas

vezes ouvimos, sa o um exce-

lente exemplo de um trabalho

a rduo que muitas vezes na o

recebe o seu cre dito no meio

estudantil. Tambe m a elas de-

vemos agradecer o valor para

sempre que transportamos e

que a Faculdade transmite.

Se ficaste interessado no

seu trabalho, acompanha al-

guns dos projectos que desen-

volvem acede a sua pa gina de

Facébook, clicando aqui.

Inês em dose dupla Quem está por trás do Gabinete de Comunicação da FCH

Miriam Andrade

Para que serve es-

te gabinete? – per-

guntas. É fácil de

perceber e difícil

de executar: o Ga-

binete de Marke-

ting e Comunica-

ção é o serviço

que tem a respon-

sabilidade sobre a

comunicação e

imagem da insti-

tuição

As “Ineses”, como

muitas vezes ou-

vimos, são um ex-

celente exemplo de

um trabalho árduo

que muitas vezes

não recebe o seu

crédito no meio

estudantil. Tam-

bém a elas deve-

mos agradecer o

valor para sempre

que transportamos

e que a Faculdade

transmite.

Page 4: 14ª edição

E de conhecimento geral

que no presente ano se cele-

bram os 40 anos daquilo que

foi a Revoluça o dos Cravos e e ,

ainda hoje, sí mbolo de uma

independe ncia (tardiamente)

conquistada.

O que talvez na o seja do co-

nhecimento dos alunos, funci-

ona rios e docentes da Faculda-

de de Cie ncias Humanas, e a

pano plia de festejos ao nosso

dispor.

O Jornal Pontiví rgula pro-

po e assim 25 maneiras de ce-

lebrar este marco histo rico.

1. Museu Nacional da Im-

prensa

A decorrer entre 28 de

Abril e 31 de Maio, no Porto, o

Museu contara com a presença

do corpo gerente da Associa-

ça o 25 de Abril, Vasco Louren-

ço, na sessa o de abertura e

com a exposiça o tempora ria

de peças jornalí sticas censura-

das por Oliveira Salazar.

2. Abril Esperanças Mil

Dia 30 de Abril a s 21 horas

na Sala do Senado da Assem-

bleia da Repu blica, em Lisboa,

sera apresentada a peça de

teatro Abril Esperanças Mil

pela companhia A Barraca.

3. Ciclo de Confere ncias

“Revoluça o e Democracia”

A Faculdade de Cie ncias So-

ciais e Humanas da Universi-

dade Nova de Lisboa esta a

promover, durante todo o ano

2014, um ciclo de confere ncias

com tema ticas variadas com

base na “Revoluça o e Demo-

cracia: 40 anos do 25 de

Abril”.

Para saber datas, oradores

e tema ticas de cada me s, pode

clique aqui.

4. Congresso “A Revolu-

ção de Abril”

Entre 21 e 24 de Abril, pode

inscrever-se gratuitamente no

congresso internacional a de-

correr no Teatro Nacional D.

Maria II em Lisboa. Tambe m

aqui ira o decorrer va rias con-

fere ncias, as quais ira o abor-

dar tema ticas sob a perspecti-

va histo ria e polí tica de Portu-

gal.

5. Manifestação em Coim-

bra

Coimbra celebra os 40 anos

atrave s de uma manifestaça o

popular a decorrer na Praça

da Repu blica com o tema “E

com Abril, por Abril, sempre!

40 anos”. Contara com a parti-

cipaça o de Pedro Mendonça,

concertos, peças de teatro e o

lançamento do livro “25 de

Abril em Coimbra” no Audito -

rio da Reitoria da Universida-

de de Coimbra.

6. Livros proibidos no re-

gime fascista

De 14 de Abril a 15 de Maio,

a Biblioteca Municipal de Es-

tremoz contara com uma mos-

tra de livros censurados por

Oliveira Salazar. Ale m disso,

sera o feitas comemoraço es

populares ao Regime de Cava-

laria 3 (RC3) atrave s duma

sessa o de poesia, um desfile e

outras actividades, as quais

pode consultar aqui.

7. Concerto

Ja a Ca mara Municipal de

Santiago do Cace m vai festejar

a Revoluça o dos Cravos com

um concerto da famosa banda

portuguesa Amor Electro, a

decorrer durante a noite de 24

de Abril no Parque Verde da

Quinta do Chafariz.

8. Comemorações no Ter-

reiro do Paço

Na noite de 24 de Abril po-

dera assistir a concertos de

duas dezenas de artistas por-

Ana Machado

ACTUALIDADE Pág

. 4

Edição de Março

Um só dia, 40 anos de História

Page 5: 14ª edição

tugueses, entre eles, Linda

Martini, Camane e JP Simo es,

os quais ira o terminar com

fogo-de-artifí cio e acordes da

mu sica Gra ndola, Vila Morena

de Zeca Afonso. Tambe m nes-

te espaço decorrera durante

toda a noite a projecça o de ví -

deos alusivos ao 25 de Abril,

em toda a fachada do Terreiro.

9. 40 anos, 40 Murais

Projecto desenvolvido pela

Associaça o Portuguesa de Arte

Urbana, o qual celebra os 40

anos pintando murais polí ti-

cos sobre a Revoluça o por to-

do o paí s. O primeiro encontra

-se ja em Lisboa, na zona de

Alca ntara.

10. Jantar Comemorativo

do 25 de Abril

A Associaça o 25 de Abril

esta a organizar um jantar co-

memorativo da Revoluça o na

Estuda Fria, no Parque Eduar-

do VII em Lisboa, a 24 de

Abril. Para quem se queira ins-

crever, pode faze -lo no evento

de Facebook criado pela Asso-

ciaça o, atrave s deste link.

11. Capitãs de Abril

Para aqueles que prefiram

ficar por casa, mas querem,

contudo, celebrar ou usufruir

desta data para conhecer mais

sobre a histo ria e cultura por-

tuguesas, aconselhamos a lei-

tura da nova obra de Ana Sofia

Fonseca. Jornalista e escritora

portuguesa, recolheu o teste-

munho de dez mulheres de

capita es de Abril, contando o

que foi a Revoluça o aos olhos

do feminino.

Para mais informaço es so-

bre o livro clique aqui.

12. 37ª Corrida da Liber-

dade

Pela 37ª vez consecutiva, a

Ca mara Municipal de Lisboa

esta a organizar uma corrida

dia 25 de abril, a começar as

10:30 na Praça dos Restaura-

dores.

13. Militares de Abril

Dia 24 de Abril tera lugar

na Capela do Rato, em Lisboa,

uma missa pelo sufra gio dos

militares, celebrada por D. Ja-

nua rio Torgal Ferreira, Bispo

Eme rito das Forças Armadas e

Segurança.

14. À Descoberta da Revo-

lução

A Antena2, juntamente com

o Teatro A Barraca, va o dina-

mizar um “Teatro de Rua” de-

dicado ao tema da Revoluça o.

15. Comemorações Popu-

lares

Dia 25 de Abril seremos to-

dos testemunhas (e alguns,

participantes) da manifesta-

ça o que ira do Marque s de

Pombal ate ao Rossio, como

gesto comemorativo da Revo-

luça o dos Cravos. Terminara

com a intervença o de um

“militar de abril”, no Rossio.

16. Inauguração da insta-

lação de 8 Girândolas de Luz

No Largo do Carmo, em Lis-

boa, sera o instaladas 8 gira n-

ACTUALIDADE Pág

. 5

© 40 anos 40 Murais

Décima Quarta Edição

Page 6: 14ª edição

dolas em honra das 8 reunio es

do “Movimento dos Capita es”.

17. O 25 de Abril 40 anos

depois

A Fundaça o Calouste Gul-

benkian esta a organizar uma

confere ncia para o pro ximo

dia 14, com a apresentaça o de

va rias sesso es sobre o 25 de

abril, abordando diferentes

tema ticas. A entrada e livre e o

programa pode ser encontra-

do aqui.

18. Cinemateca Portugue-

sa

Usufruindo de filmes docu-

mentais e ficcionais sobre o

Fascismo em Portugal, a Cine-

mateca Portuguesa procurou

reunir as melhores peças a

exibir a alunos de 3º ciclo e

ensino secunda rio. A progra-

maça o pode ser consultada

aqui.

19. 40 anos, 40 Histórias

do 25 de Abril

Peça de teatro sobre a His-

to ria de Portugal, promovida

pela Embaixada do Conheci-

mento, em Lisboa, a estrear ja

em Abril.

Ale m desta iniciativa, a Em-

baixada do Conhecimento esta

a fazer uma selecça o de poetas

contempora neos de forma a

realizar um A udio-Livro com

40 poemas. A interpretaça o

desses textos sera realizada

por Nuno Miguel Henriques,

famoso declamador da lí ngua

portuguesa.

20. Democracy and Revo-

lutions, 84 Anos de 69 de

Abril

Exposiça o inserida no pro-

jecto internacional Démocracy

and Révolutions. Terá início em

Abril e sera uma actividade

permanente da Junta de Fre-

guesia de Carnide, no Centro

Cultural.

21. 40 anos a construir

Abril - Seixal, terra de futuro

Para funciona rios, alunos e

docentes que habitem no Sei-

xal, ou que considerem perti-

nente o Programa organizado

pela Ca mara Municipal, tera o

oportunidade de assistir ao

concerto de Xutos&Pontape s,

famosa banda portuguesa,

bem como presenciar espeta -

culos em va rios Media, de ce-

lebraça o aos 40 anos.

22. 40 anos. 25 de Abril

uma aventura para a demo-

cracia

Tambe m na a rea do cinema

vemos explorado este tema,

atrave s de 7 filmes e 3 curtas-

metragens a serem exibidos

no Audito rio Carlos Paredes

em Lisboa. Segue a programa-

ça o neste link.

23. 40 Anos do 25 de Abril

na Fundação José Saramago

Entre os meses de Abril e

Maio, a Fundaça o Jose Sarama-

go preparou uma agenda re-

cheada de actividades cultu-

rais a serem realizadas no teor

da revoluça o. Para poder con-

sultar quais as actividades e

respectivas datas consulte o

seguinte link.

24. IndieLisboa

Durante a 11ª ediça o do In-

dieLisboa, a iniciar a 24 de

Abril, a Revoluça o sera cele-

brada com tre s filmes, sendo

eles «Les grandes ondes a

l'Ouest», de Lionel Baier, os

documenta rios «Outra forma

de luta», de Joa o Pinto Noguei-

ra, e «Mudar de vida», de Pe-

dro Fidalgo e Nelson Guerrei-

ro, com a participaça o do mu -

sico Jose Ma rio Branco.

25. Conferências na UCP

Como na o poderia deixar de

ser, a Universidade Cato lica

Portuguesa esta a organizar

confere ncias de teor cultural e

histo rico dentro do Campus

Palma de Cima. Estas ira o de-

correr durante o me s de Maio,

ainda com data a definir.

ACTUALIDADE Pág

. 6

Edição de Março

Page 7: 14ª edição

Com a crise da Ucra nia do

outro lado do globo, os Vene-

zuelanos queixam-se da falta

de apoio dos media internaci-

onais, naquilo que tem sido o

maior desassossego do paí s

nos u ltimos 12 anos. O que afi-

nal se passa na ta o longí nqua

Venezuela?

Uma tentativa de violaça o

de uma estudante universita -

ria na cidade venezuelana de

San Cristo bal foi a gota de

a gua para o iní cio dos protes-

tos estudantis. No dia 4 de Fe-

vereiro do presente ano, os

estudantes reuniram-se para

exigir ao governo um maior

controlo da segurança no paí s.

Como conseque ncia dos pro-

testos em San Cristo bal, va rios

estudantes foram presos, o

que provocou uma onda de

revolta em Caracas, a 12 de

Fevereiro. Terminado o pri-

meiro dia de manifestaça o na

capital Venezuelana, podiam

contar-se ja 3 mortes.

As exige ncias de Caracas

começaram por dirigir-se a

libertaça o dos jovens encarce-

rados, mas rapidamente se

disseminaram para outros

descontentamentos da popu-

laça o, sobretudo da classe me -

dia, segundo va rios ob-

servadores. Para ale m do au-

mento de segurança, os pro-

testos focaram a escassez de

bens de primeira necessidade,

desemprego elevado, aumento

descontrolado da inflaça o, bai-

xos ordenados, falta de liber-

dade de expressa o, corrupça o,

e um sentimento por parte da

classe me dia da existe ncia de

um regime ditatorial.

A Venezuela regista uma

das taxas mais altas de homicí -

dios anuais. Em 1999, ano em

que Hugo Cha vez chegou ao

poder, registavam-se 5 mil

mortes por ano, relacionadas

com viole ncia e falta de segu-

rança. No u ltimo ano de vida

de Cha vez, os valores subiram

para os 16 mil homicí dios, o

que equivale a 43 indiví duos

mortos por dia. Apo s um ano

de governo de Nico las Madu-

ro, em 2013 registou-se um

aumento para 67 homicí dios

por dia, num total de 24 700

homicí dios anuais, de acordo

com dados da organizaça o na o

-governamental Observato rio

Venezuelano de Viole ncia.

Nos u ltimos 12 meses o pa-

í s registou 57% de inflaça o,

segundo o Banco Central da

Venezuela (BCV). Produtos

como leite, farinha, açu car,

frango, azeite e papel higie ni-

co sa o de difí cil obtença o em

va rios pontos do paí s. Com a

u ltima desvalorizaça o do bolí -

var (moeda venezuelana), um

cidada o recebe em me dia um

ordenado de 63 do lares ame-

ricanos, ou 45.70 euros men-

sais, tornando a Venezuela o

paí s com o sala rio mais baixo

da Ame rica-Latina.

Os meios de comunicaça o

sa o controlados quase exclusi-

vamente pelo governo. Tendo

sido criados de raiz 25 canais

televisivos, 146 estaço es de

ra dio regionais e 17 jornais,

todos financiados pelo gover-

no outrora de Cha vez, hoje de

Maduro. O acesso a canais por

Irina Shev

ACTUALIDADE

Venezuela A inquietação em busca de mudança

As exigências de

Caracas começa-

ram por dirigir-se

à libertação dos

jovens encarcera-

dos, mas rapida-

mente se dissemi-

naram para outros

descontentamen-

tos da população

Pág

. 7

Décima Quarta Edição

Page 8: 14ª edição

cabo e muito limitado, e a in-

ternet carece de qualidade de

recepça o. Oscar Apablaza, jo-

vem Venezuelano de 29 anos

licenciado em Gesta o Industri-

al e Telecomunicaço es, em en-

trevista ao Pontiví rgula, afir-

mou que “para ale m de na o

haver meios de comunicaça o

privados, o serviço de internet

e pe ssimo, os hospitais na o

te m material necessa rio para

tratar dos doentes, os super-

mercados esta o vazios. Estes

protestos realizam-se porque

o povo esta cansado de tantas

mentiras. Somos um paí s rico

em petro leo, minerais e turis-

mo, na o temos razo es para vi-

ver assim ta o mal. Desde que

entrou Hugo Cha vez ha uma

ma administraça o na Venezue-

la”. Contudo, e de realçar que

Cha vez diminuiu a mal-

nutriça o da populaça o venezu-

elana de 15% para 5%, com as

suas polí ticas sociais, segundo

a Organizaça o das Naço es Uni-

das para Alimentaça o e Agri-

cultura (FAO).

Um cí rculo fechado desde a

morte de Cha vez tem traba-

lhado para consolidar a sua

posiça o no governo – Presi-

dente da Repu blica Nico las

Maduro, Presidente da Assem-

bleia Nacional Diosdado Cabe-

llo e o Presidente da compa-

nhia de petro leo estatal, Rafael

Ramí rez. No entanto, numa

luta pelo poder, este cí rculo

aparentemente so lido e unido

tem demonstrado fraquezas e

inseguranças. O mesmo se

passa na oposiça o. Desde o

iní cio dos protestos de Feve-

reiro que os lí deres da oposi-

ça o te m saí do a rua para apoi-

ar os manifestantes, mas na o

de uma forma unida. De um

lado encontra-se Enrique Ca-

priles, que perdeu as eleiço es

de Abril de 2013 para Maduro,

por 1% eleitoral. Capriles de-

fende uma negociaça o pací fi-

ca, apostando em tentativas de

chegar a um acordo entre am-

bas as partes sem recorrer a

viole ncia. Este polí tico, toda-

via, foi ridicularizado por ou-

tros lí deres da oposiça o por

ter apertado a ma o do presi-

dente Venezuelano, numa reu-

nia o relativa ao incremento de

segurança no paí s.

O lí der do partido social-

democrata Vontade Popular,

Leopoldo Lo pez, foi conhecido

internacionalmente por dar a

cara nas maiores manifesta-

ço es do paí s. Apoiou os jovens

e espalhou a sua ideologia en-

ACTUALIDADE

© Reuters

Pág

. 8

Edição de Março

Page 9: 14ª edição

tre eles, reivindicando uma

mudança radical na Venezue-

la, a renu ncia do presidente e

a revisa o constitucional. Se-

gundo as palavras de Lo pez,

numa entrevista ao canal in-

ternacional de notí cias com

sede na Colo mbia, NTN24:

“(…) no s na o temos armas,

mas sim gente nas ruas. O nos-

so terreno de luta e a rua. No s

so conseguiremos mudar algo

no nosso paí s com um movi-

mento de força popular em

todo o territo rio nacional”. No

passado dia 18 de Fevereiro

Leopoldo Lo pez entregou-se a

polí cia, tendo sido considera-

do responsa vel pela perturba-

ça o da paz na Venezuela, isto

e , pela viole ncia das manifes-

taço es contra o regime.

Apo s a prisa o de Lo pez,

uma outra personalidade polí -

tica ganhou terreno – Marí a

Corina, deputada independen-

te da oposiça o que tambe m

tem apoiado os manifestantes

na sua jornada pela mudança.

Com a sua recente viagem ao

estrangeiro, Diosdado Cabello

destituiu Corina das suas fun-

ço es de deputada na Assem-

bleia Nacional, por motivos

relacionados com traiça o a pa -

tria. Tudo se deveu ao facto da

deputada ter aceitado o cargo

de representante alternativa

pelo Panama na Organizaça o

dos Estados Americanos. Os

Estados Unidos da Ame rica

ponderam sanço es contra este

acontecimento, mas Cabello

avisa que a deputada Marí a

Corina pode ser presa a qual-

quer momento.

Durante os meses passados

de Fevereiro e Março tambe m

houve demonstraço es de

apoio ao actual presidente da

Repu blica Venezuelana, Nico -

las Maduro. Muitos jovens di-

zem-se indignados pelas quei-

xas dos opositores ao governo,

alegando que na o concordam

nem com a falta de segurança

no paí s, nem com a falta de

liberdade de expressa o. Se-

gundo um estudo realizado

pelo Serviço Internacional de

Consultadoria (ICS), onde fo-

ram inquiridas 1400 famí lias,

52,3% dos indiví duos dizem

que a liberdade de expressa o

se encontra garantida. Uma

percentagem de 54,8% dos

inquiridos defende que a de-

mocracia venezuelana e in-

questiona vel juntamente com

65,2 % segundo os quais a for-

ça usada pela polí cia e justifi-

cada pela lei. O ICS possui uma

margem de erro de 2,7%, e um

ní vel de confiança que se en-

contra nos 95%. O que o Servi-

ço Internacional de Consulta-

doria na o informa e a classe

social dos indiví duos inquiri-

dos que, como se tem vindo a

saber, influencia muito a opi-

nia o dos venezuelanos. Do la-

do governo esta ainda a coléc-

tivo militia – mecanismo de

segurança sem uma fonte de

controlo certa, a maioria da

classe baixa venezuelana e cu-

bana.

ACTUALIDADE

Durante os meses

passados de Feve-

reiro e Março tam-

bém houve de-

monstrações de

apoio ao actual

presidente da Re-

pública Venezuela-

na, Nicólas Madu-

ro. Muitos jovens

dizem-se indigna-

dos pelas queixas

dos opositores

52,3% dos indiví-

duos dizem que a

liberdade de ex-

pressão se encon-

tra garantida. Uma

percentagem de

54,8% dos inquiri-

dos defende que a

democracia vene-

zuelana é inquesti-

onável juntamente

com 65,2 % se-

gundo os quais a

força usada pela

polícia é justifica-

da pela lei.

Pág

. 9

Décima Quarta Edição

Page 10: 14ª edição

As relaço es entre Cuba e

Venezuela ganharam força du-

rante a preside ncia de Cha vez,

que assentou uma se rie de

acordos entre estes dois paí -

ses. Em 1999 Hugo Cha vez

chamou irma o a Fidel Castro e

proferiu: “Aqui estamos no s,

ta o alertas como nunca Fidel e

Hugo, a lutar com dignidade e

coragem para defender os in-

teresses dos nossos povos”.

Um dos acordos, em original o

Convenio Integral de Coopera-

cio n, estipulou que ate 2020, a

Venezuela exportara para Cu-

ba entre 20.000 e 26.000 bar-

ris de petro leo por dia. Cada

barril compreende cerca de

160 litros de volume, o que da

um total entre 3.200.000 litros

e 4.160.000 litros por dia. Em

retorno, Cuba fornecera entre

30 000 a 50 000 te cnicos em

va rias a reas, como por exem-

plo fí sicos, desportistas, artis-

tas, me dicos, entre outros, as-

sim como disponibiliza o tra-

tamento de doentes graves,

sendo a u nica despesa venezu-

elana o seu transporte para

Cuba.

Jovem venezuelana de 33

anos, désignér gra fica e psico-

pedagoga, Lydia Solyma r de-

clarou ao Pontiví rgula, a pro-

po sito da relaça o entre os dois

paí ses latino-americanos, que

“Cuba vive da Venezuela e

sempre quis transmitir a sua

ideologia polí tica a Venezuela.

Isto seria o pior que poderia

acontecer ao meu paí s, pois

isto significaria um total fecho

da economia e, por conse-

que ncia, um extremo ní vel de

pobreza e ignora ncia”. Oscar

Apablaza a propo sito da mes-

ma questa o defende que a Ve-

nezuela na o necessita de Cuba

pois tem os melhores te cnicos

em todas as a reas enumera-

das.

Em 2002, o regime de Hugo

Cha vez sofreu um breve golpe

de estado e Nico las Maduro

traça um paralelismo entre o

que sucedeu a Cha vez e o que

esta a acontecer, neste mo-

mento, ao seu governo. Madu-

ro culpa a oposiça o pela tenta-

tiva de golpe de estado com o

apoio dos Estados Unidos da

Ame rica, alegando que os EUA

esta o a tentar criar conflitos

num paí s rico em petro leo.

Elí as Jaua, o Ministro de Nego -

cios Estrangeiros, afirmou que

va rios diplomatas norte-

americanos se reuniram com

ACTUALIDADE

“Cuba vive da Ve-

nezuela e sempre

quis transmitir a

sua ideologia polí-

tica à Venezuela.

Isto seria o pior

que poderia acon-

tecer ao meu país,

pois isto significa-

ria um total fecho

da economia e,

por consequência,

um extremo nível

de pobreza e igno-

rância”.

Lydia Solymár

Pág

. 10

Edição de Março

Page 11: 14ª edição

os jovens universita rios para

treino, financiamento e orga-

nizaça o de manifestaço es vio-

lentas. O governo dos EUA ne-

ga esta acusaça o. Maduro ape-

lidou recentemente os mani-

festantes de “fascistas”, contu-

do, “Chukies” e o nome comu-

mente usado pelos lí deres po-

lí ticos para se referirem aos

protestantes violentos, aludin-

do ao boneco de uma se rie de

filmes de terror.

Apo s va rias tentativas de

dia logo com a oposiça o, por

parte do governo venezuela-

no, a resposta foi constante-

mente negativa. Na o obstante,

vai iniciar-se um conjunto de

reunio es entre os dois lados

do conflito, apo s dois meses

de protestos sangrentos. O se-

creta rio de estado do Vatica-

no, Cardinal Pietro Parolin,

estara presente, na seque ncia

de ter sido escolhido como

embaixador do Papa Francis-

co, cuja nacionalidade e argen-

tina. Muitos observadores di-

zem-se incre dulos de uma

conciliaça o pací fica e breve,

visto que os opositores extre-

mistas continuam a negar a

possibilidade de dia logo.

O sentimento geral apo s a

morte de Hugo Cha vez e de

que sera muito difí cil, se na o

impossí vel, arranjar um candi-

dato a altura do ex-presidente.

Com dados oficiais de 39 mor-

tos e centenas de feridos, mui-

tos na o ve m o fim dos desa-

cordos para breve. Num paí s

como a Venezuela, que e o nu -

mero um em reservas de pe-

tro leo do mundo, e o legado

histo rico do seu hero i inde-

pendentista Simo n Bolí var que

acende a alma a qualquer lati-

no-americano. Tal como o por-

tugue s Dom Sebastia o, Bolí var

e esperado para vir e guiar o

povo venezuelano com fe , es-

perança e dedicaça o, em direc-

ça o a um futuro pro spero e

justo.

ACTUALIDADE

Maduro apelidou

recentemente os

manifestantes de

“fascistas”, contu-

do, “Chukies” é o

nome comumente

usado pelos líde-

res políticos para

se referirem aos

protestantes vio-

lentos , aludindo

ao boneco de uma

série de filmes de

terror.

© Reuters

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. 11

Décima Quarta Edição

Page 12: 14ª edição

O 25 de Abril de 1974 teve

um impacto inega vel em todos

os que o viveram. O Professor

Doutor Jorge Fazenda Louren-

ço fala-nos da sua experie ncia

pessoal, numa altura em que o

pro prio, com 18 anos de ida-

de, se viu confrontado como

uma realidade muito diferen-

te.

Pontivírgula (1): Lembra-

se do que estava a fazer nesse

dia?

Jorge Fazenda Lourenço

(JFL): Estava em Lisboa, a

estudar na Faculdade de Me-

dicina e a viver na Rua das La-

ranjeiras. Acordei de manha

com o ra dio a dar a notí cia de

que as pessoas na o deviam

sair de casa, pois algo estava

acontecer.

Pontivírgula (2): Como

viveu o dia? Teve algum im-

pacto no seu dia-a-dia?

Jorge Fazenda Lourenço

(JFL): O dia foi vivido com

alguma perplexidade. Durante

as primeiras horas na o se sa-

bia se o golpe de estado iria

ser bem-sucedido ou ate se

este era por parte da direita

ou da esquerda, ja a direita do

pro prio regime de Marcello

Caetano estava descontente

com este. Quando começaram

a aparecer na ra dio canço es

proibidas e mensagens, as

pessoas começaram a aperce-

ber-se do que estava realmen-

te a acontecer. Este aconteci-

mento transformou completa-

mente o meu dia-a-dia, como

o de todas pessoas, imagino.

E ramos um paí s muito si-

lencioso – dentro dos cafe s e

das pro prias casas havia um

medo interiorizado, sempre o

receio de que algue m estives-

se a escutar. De um dia para o

outro, passa mos a ser um paí s

alegremente ruidoso.

Pontivírgula (3):

Quais foram, na sua opinia o,

as mudanças sociais e polí ti-

cas mais importantes, nos dias

que se seguiram?

Jorge Fazenda Lourenço

(JFL): A ideia que tínhamos

na e poca e que havia mudan-

ças todos os dias e, nos pri-

meiros dias, deixou de haver

censura nos jornais e outros

meios de comunicaça o. Ate

censuras simples como pisar a

relva ou namorar na rua. A

associaça o das pessoas de for-

ma livre, o que tambe m foi

sensí vel. Por exemplo, nas

GRANDE ENTREVISTA

Patrícia Fernandes

Professor Jorge Fazenda Lourenço

Éramos um país mui-

to silencioso – dentro

dos cafés e das pró-

prias casas havia um

medo interiorizado,

sempre o receio de

que alguém estivesse

a escutar. De um dia

para o outro, passá-

mos a ser um país

alegremente ruidoso

Houve uma grande

vontade de participa-

ção das pessoas em

todo o tipo de deci-

sões, até para aque-

las que não estavam

preparadas. Toda a

gente passou a que-

rer decidir tudo so-

bre tudo, tanto nas

Universidades como

nos empregos

Pág

. 12

Edição de Março

Page 13: 14ª edição

Universidades, as associaço es

de estudantes puderam orga-

nizar-se de uma forma que

na o era clandestina. Houve

uma grande vontade de parti-

cipaça o das pessoas em todo o

tipo de deciso es, ate para

aquelas que na o estavam pre-

paradas. Toda a gente passou

a querer decidir tudo sobre

tudo, tanto nas Universidades

como nos empregos. Os alu-

nos passaram a decidir as ma-

te rias que queriam estudar e

os professores que os ensina-

vam.

A pouco e pouco a Demo-

cracia foi-se organizando e

acalmando, mas houve clara-

mente um perí odo de desre-

gramento, que se sucede a to-

dos os perí odos onde predo-

mina a falta de liberdade.

Pontivírgula (4): O dia 25

de Abril teve algum impacto

relevante no resto da sua vi-

da?

Jorge Fazenda Lourenço

(JFL): Sim. Eu era uma pes-

soa que ja tinha alguns inte-

resses em intervença o social e

isso acentuou-se mais no perí -

odo imediatamente anterior,

com a sensaça o de que todos

podí amos participar no desti-

no Portugal. A longo prazo,

esse perí odo de grande tumul-

to fez com que eu deixasse a

Faculdade de Medicina, entre

outras razo es. Deixei de me

preocupar em ter de ir

para a tropa, tive a oportuni-

dade de me integrar nas cam-

panhas de alfabetizaça o. Era o

tempo de intervir e na o de me

preocupar com os estudos.

Tive a oportunidade, por-

tanto, de ter experie ncias no-

vas, de conhecer melhor o

meu paí s e de alagar os meus

horizontes – descobri novas

a reas, tirei uma licenciatura

em Jornalismo, mas logo des-

cobri que na o era exatamente

o jornalismo que me interes-

sava. Depois fiz enta o o Mes-

trado e o Doutoramento em

Literatura, nos Estados Uni-

dos. Descobri enta o a profis-

sa o de professor, quando me

inscrevi para dar aulas em Sa o

Tome e Prí ncipe, em 1977.

Senti-me bem ali.

Pontivírgula (5): Acha que,

hoje em dia, e necessa rio um

movimento como o que acon-

teceu em 1974?

Jorge Fazenda Lourenço

(JFL): Acho que hoje em dia

e necessa rio outro movimen-

to, mas que na o seja igual ao

de 1974. O que e necessa rio e

que haja um movimento contí -

nuo de renovaça o de ideias,

mentalidades e atitudes, e es-

se movimento na o tem que

ser so feito pelas geraço es

mais novas, mas impulsionado

por estas, ja que as mais ve-

lhas va o ficando mais instala-

das e conforta veis.

O que e preocupante e ver

geraço es mais novas mais aco-

modadas do que geraço es

mais velhas.

g. 7 GRANDE ENTREVISTA

Eu era uma pessoa

que já tinha al-

guns interesses

em intervenção so-

cial e isso acen-

tuou-se mais no

período imediata-

mente anterior

[ao 25 de Abril],

com a sensação de

que todos podía-

mos participar no

destino Portugal

O que é necessário

é que haja um movi-

mento contínuo de

renovação de ideias,

mentalidades e ati-

tudes, e esse movi-

mento não tem que

ser só feito pelas ge-

rações mais novas,

mas impulsionado

por estas

Pág

. 13

Décima Quarta Edição

Page 14: 14ª edição

GRANDE ENTREVISTA

Professor Jorge Vaz de Carvalho

Professor, investigador, en-

saí sta, tradutor, escritor, can-

tor de o pera, encenador e ate

director de uma orquestra.

Muitas sa o as vive ncias de Jor-

ge Vaz de Carvalho nas mais

diferentes a reas. E em relaça o

ao 25 de Abril, o tema que

preenche esta ediça o especial

do Pontiví rgula, na o poderia

ser diferente. Enquanto aluno

universita rio, o professor da

Faculdade de Cie ncias Huma-

nas viveu a revoluça o, com

apenas 19 anos, e coleccionou

histo rias e aprendizagens que

partilha, hoje, connosco, numa

grande entrevista onde, para

ale m de falar do dia 25 de

Abril de 1974, avalia as conse-

que ncias da revoluça o para si,

para os estudantes e para o

paí s em geral. Espaço tambe m

para fazer um balanço das ex-

pectativas cumpridas e das

na o cumpridas e dos passos a

percorrer para concretizar

aquilo que ainda esta por fa-

zer, uma missa o que cabe, so-

bretudo, a jovens e estudantes

universita rios.

Pontivírgula (1): Profes-

sor, pertenceu a algum movi-

mento estudantil?

Jorge Vaz de Carvalho

(JVC): Nunca fui filiado em

nenhum grupo, partido ou

movimento estudantil. No en-

tanto, participava em manifes-

taço es de estudantes que con-

testavam as condiço es em que

estuda vamos, o pro prio regi-

me, com o qual na o concorda -

vamos e, sobretudo, a questa o

premente que era a guerra

colonial. Especialmente, por-

que eu e outros jovens com

dezoito ou dezanove anos es-

tarí amos a pouco tempo de ir

parar a alguma das frentes de

combate.

Pontivírgula (2): Como foi

o seu dia 25 de Abril de 1974?

Jorge Vaz de Carvalho

(JVC): Foi um dia muito curi-

oso, ate porque a minha expe-

rie ncia pessoal reflecte, em

parte, o que aconteceu naque-

la revoluça o. Eu morava no

Montijo, o que significa que fiz

a travessia de barco ate Lisboa

para vir a Faculdade. Logo de

manha , cedo, ja no barco, fui-

me apercebendo daquilo que

se estava a passar: estava toda

a gente em volta de ra dios e a

comentar que havia um golpe

de Estado em Lisboa. Quan-

do o barco atracou, no Terrei-

ro do Paço, precisamente o

centro revoluciona rio, Sal-

gueiro Maia havia ja ocupado

aquele espaço. Presumi logo

que alguma coisa importante

ali se passaria.

Mesmo assim, eu tinha

combinado encontrar-me na

faculdade com umas amigas.

Por isso, fui ate ao Rossio, apa-

nhei o metro, vim ate ao Cam-

po Grande, dirigi-me, a pe , ate

a faculdade e encontrei-me

com as minhas colegas. O nos-

Emanuel Monteiro e

Joana Portugal

estava toda a gente

em volta de rádios e

a comentar que ha-

via um golpe de Es-

tado em Lisboa.

Quando o barco

atracou, no Terrei-

ro do Paço, precisa-

mente o centro re-

volucionário, Sal-

gueiro Maia havia

já ocupado aquele

espaço

Pág

. 14

Edição de Março

Page 15: 14ª edição

so dilema, por mais curioso

que possa parecer, foi mesmo

procurar um sí tio para almo-

çar, uma vez que estava quase

tudo fechado, a começar pela

cantina. Resolvido este aspec-

to muito pra tico, vim de novo

para a baixa. Quando cheguei,

deparei-me com todos os

acontecimentos do Carmo e

arredores e, evidentemente,

misturei-me com a multida o

que assistia a prisa o de Marce-

llo Caetano e dos outros ele-

mentos do regime. Depois dis-

so, voltei para o Montijo, tam-

be m de barco, e segui os acon-

tecimentos pela ra dio e pela

televisa o.

Este cena rio que retratei

mostra dois aspectos extraor-

dina rios da revoluça o portu-

guesa. O facto de estar a de-

correr uma revoluça o e os

transportes pu blicos funciona-

rem normalmente, com o povo

nas ruas a apoiar os militares,

da -lhe, por um lado, uma di-

mensa o um tanto folclo rica;

por outro lado, reflecte, a rea-

lidade de um regime que ja

estava ta o corrompido, ta o po-

dre, ta o decre pito que na o te-

ve grande resiste ncia. As coi-

sas funcionavam normalmente

enquanto o regime caí a, um

caso raro, sena o ine dito na

histo ria mundial. Continuo

sempre a dizer que o 25 de

Abril foi o dia mais feliz da mi-

nha vida.

Pontivírgula (3): Quais fo-

ram as conseque ncias imedia-

tas que o 25 de Abril teve na

sua e na vida do paí s?

Jorge Vaz de Carvalho

(JVC): Na minha vida, para

ale m da questa o polí tica de

passar a sentir e a viver uma

liberdade ate enta o desconhe-

cida, as conseque ncias foram a

universidade transformar-se

numa coisa completamente

diferente daquilo que era: pa-

ra ale m das sucessivas restru-

turaço es nos cursos, os estu-

dantes passaram a ter mais

reunio es gerais de alunos do

que aulas, a participar activa-

mente na vida acade mica. An-

dava tudo numa grande con-

vulsa o, o que e normal depois

de uma revoluça o. Esta vamos

todos certos de que e ramos

contra o regime derrubado,

que na o querí amos nem cen-

sura, nem tortura, nem presos

polí ticos e muito menos uma

guerra colonial. Todavia, a

partir do momento em que se

deu a revoluça o, começaram

as diverge ncias, uma vez que

cada um queria uma sociedade

diferente. Todos tinham um

conceito distinto de democra-

cia, de liberdade e do tipo de

sociedade que queriam. Mas

estas sa o ideias suficiente-

mente largas e que permitem

uma quantidade de opinio es

divergentes. As pessoas na o

g. 7 GRANDE ENTREVISTA

© Emanuel Monteiro

Pág

. 15

Décima Quarta Edição

Page 16: 14ª edição

estavam preparadas para dis-

cutir, de uma forma serena e

tranquila, as opinio es diver-

gentes, ate porque a liberdade

e um processo que se aprende.

Na realidade, a grande ques-

ta o que se colocava a todos

no s era: como e que depois de

uma revoluça o se desmantela-

va todo um sistema de poder –

polí tico, social e econo mico,

baseado em monopo lios e nu-

ma exploraça o desenfreada

das pessoas – e como se viria a

colocar fim a quilo que mais

nos preocupava, a guerra colo-

nial.

Portanto, conseguir fazer tudo

isso foi uma coisa extraordina -

ria para um paí s ta o pequeno.

Fomos capazes de batalhar em

duas frentes: a do desmantela-

mento de um poder e, ao mes-

mo tempo, a de colocar fim a

guerra colonial. E consegui-

mos fizer tudo isso sem per-

das de vidas humanas, sem

desmantelamentos sociais

significativos e fomos ha beis

ao ponto de transitar para a

democracia de uma forma

muito serena e tranquila, e de

algum modo, ta o adulta.

Pontivírgula (4): Hoje, qua-

renta anos depois, considera

que as aspiraço es e as pro-

messas do 25 de Abril se cum-

priram?

Jorge Vaz de Carvalho (JVC):

Eu creio que as principais as-

piraço es do 25 de Abril esta o

cumpridas: temos um regime

democra tico, possuí mos liber-

dade de expressa o e somos

livres na escolha das opço es

polí ticas e ideolo gicas que

pretendemos. No entanto, o

que na o se cumpriu com o 25

de Abril tem mais que ver com

uma mudança de mentalida-

des. Se olharmos para a socie-

dade portuguesa de hoje, ve-

mos que na o foi possí vel de-

sentranhar uma determinada

imagem de inferioridade e de

atraso em relaça o a Europa.

Da mesma forma, na o foi pos-

sí vel acabar com uma mentali-

dade baseada em ha bitos de

mesquinhez, de inveja, de ma-

ledice ncia e de intrigas. Mas,

sobretudo, na o foi possí vel,

depois do 25 Abril, fazer acre-

ditar aos portugueses que e

pelo desenvolvimento intelec-

tual, moral e espiritual, pelo

estudo e pela cultura, dando

lugar ao saber e ao me rito, que

e possí vel desenvolver o paí s.

O exemplo mais evidente rela-

tivamente a essa questa o foi o

facto de grandes personalida-

g. 7 GRANDE ENTREVISTA

Fomos capazes de

batalhar em duas

frentes: a do des-

mantelamento de um

poder e, ao mesmo

tempo, a de colocar

fim à guerra coloni-

al. E conseguimos fi-

zer tudo isso sem

perdas de vidas hu-

manas, sem desman-

telamentos sociais

significativos

© Emanuel Monteiro

Pág

. 16

Edição de Março

Page 17: 14ª edição

des portuguesas, logo a seguir

a revoluça o, na o terem sido

chamadas para as universida-

des. Sa o os casos de Jorge de

Sena e de Ruy Belo. As univer-

sidades, as instituiço es do sa-

ber, na o foram sensí veis a isto

e preferiram dar lugar a pes-

soas intelectualmente inferio-

res apenas por questo es de

amizade ou opço es partida -

rias. Creio que nos falta, ainda,

acreditar no valor do me rito

como motor de desenvolvi-

mento de um paí s. Mas isso,

na o podemos pedir que uma

revoluça o conduzida pelas for-

ças armadas resolva. Tem de

partir de cada um de no s o de-

sejo e a vontade de reverter a

situaça o de pessimismo e pas-

sividade da sociedade em ge-

ral, e dos jovens em particular.

E , de facto, um trabalho de to-

dos no s e de cada um no seu

lugar. E os lugares, a começar

pelos lí deres e dirigentes, te m

de ser para os que provam

merece -los pelas suas qualida-

des e o valor do serviço que

prestam a s instituiço es e ao

paí s.

Pontivírgula (5): No 25 de

Abril, os estudantes foram

fundamentais na mudança de

regime. Considera que hoje

esta classe se demite do seu

papel activo e da sua respon-

sabilidade social?

Jorge Vaz de Carvalho

(JVC): Antes do 25 de Abril

os estudantes tinham agendas

e preocupaço es muito defini-

das: um sistema de ensino em

certa medida anacro nico, que

na o fomentava a inves-

tigaça o e o desenvolvimento,

mas que facilitava o acesso ao

emprego. Havia tambe m um

medo evidente – a guerra co-

lonial –, um problema que

afectava na o so os rapazes,

como as raparigas, pois elas

tinham irma os, primos, namo-

rados e famí lia. Logo, os estu-

dantes em geral tinham causas

muito definidas por que lutar.

Hoje, e ainda bem, na o ha

causas ta o evidentes, ta o mar-

cadas e definidas pelas quais

os estudantes tenham que ba-

talhar. Por isso, a s vezes, a

passividade prevalece em vez

da solidariedade e da defini-

ça o lu cida de objectivos. Ape-

sar disto, e mais do que evi-

dente o problema do desem-

prego que afecta os jovens, ao

ponto absurdo de o paí s gastar

fortunas na educaça o e na pre-

paraça o dos jovens, nomeada-

mente nas universidades, para

depois na o lhes criar oportu-

nidades, fazendo com que es-

tes tenham de emigrar e enri-

quecer a massa intelectual de

outro paí s que apenas benefi-

cia e nada investiu nessa for-

maça o.

Os jovens de hoje sa o uma

geraça o extraordina ria, a gera-

ça o com mais ferramentas de

investigaça o, com melhores e

mais ra pidos acessos a infor-

maça o: hoje em dia esta tudo

ao alcance de um clique. Esta e

uma geraça o na o menos inteli-

gente, talvez bem preparada

do ponto de vista te cnico, mas,

do meu ponto de vista, com

graves deficie ncias na instru-

ça o, fruto de modelos e pro-

gramas de ensino tolos, que

dinamitaram o aprofunda-

mento do conhecimento hu-

manista, fomentaram o lu dico

em prejuí zo da disciplina e o

facilitismo em prejuí zo do ri-

gor. Talvez por isso seja tam-

be m uma geraça o mais passi-

va e pactuante, que ainda na o

percebeu com toda a profun-

didade a terrí vel ameaça do

desemprego e da estagnaça o, e

que, para alcançar os seus in-

teresses e os do paí s tem de

g. 7 GRANDE ENTREVISTA

Creio que nos falta,

ainda, acreditar no

valor do mérito como

motor de desenvolvi-

mento de um país.

Mas (…) Tem de par-

tir de cada um de

nós o desejo e a von-

tade de reverter a si-

tuação de pessimis-

mo e passividade da

sociedade em geral,

e dos jovens em par-

ticular.

Pág

. 17

Décima Quarta Edição

Page 18: 14ª edição

agir.

Pontivírgula (6): Muitas

pessoas dizem que Portugal

precisa de um novo 25 de

Abril. Precisara mesmo?

Jorge Vaz de Carvalho

(JVC): Um novo 25 de Abril,

conduzido pelas forças arma-

das, com tanques nas ruas, se-

ra um anacronismo impensa -

vel. E necessa rio, sim, que as

pessoas voltem a ter esperan-

ça, uma esperança na o conti-

nuamente apregoada e adiada

para o futuro, mas ja no pre-

sente. E crucial quebrar uma

certa mentalidade rural de

construir e guardar para o fu-

turo. Temos de começar ja , e

na o adiar a felicidade quotidi-

ana e o pro prio paí s para um

tempo incerto. Nesse sentido,

penso que na o se colocam as

questo es do 25 de Abril origi-

nal, isto e , a erosa o do prestí -

gio das Forças Armadas, a con-

quista das liberdades indivi-

duais e a implementaça o de

uma democracia. No entanto,

tenho voltado a sentir algo

que na o esperava, francamen-

te, sentir 40 anos depois: o de-

sespero, o medo e a incapaci-

dade de as pessoas viverem as

suas vidas, de terem para co-

mer e pagar os estudos dos

seus filhos, sobretudo, a im-

possibilidade de uma vida dig-

na. Isso, a mim, perturba-me

em dimenso es colossais, mui-

to mais do que a questa o da

liberdade, ate porque a temos

garantida, seja a liberdade de

expressa o, de publicaça o ou

de reunia o. O que me preocu-

pa verdadeiramente e o medo,

o medo que as pessoas te m em

relaça o a s suas existe ncias, ao

futuro e o desespero que isso

lhes provoca. E esta questa o e

uma das grandes perdas em

relaça o a s expectativas de

uma revoluça o que prometia,

exactamente, uma melhoria

das vidas das pessoas a va rios

ní veis, nomeadamente a pro-

messa de uma existe ncia de-

cente e serena. E esta esta a

ser posta em causa, como

comprova o crescente nu mero

de famí lias que subsiste nos

dias de hoje graças a caridade

de va rias instituiço es de soli-

dariedade social. Deste modo,

devemos ficar humanamente

muito preocupados, porque ha

muitas promessas trazidas

com a revoluça o que na o se

cumpriram, ha conquistas sob

ameaça e que sa o fundamen-

tais para a dignidade e ate a

sobrevive ncia das pessoas (o

Serviço Nacional de Sau de, por

exemplo). Mas, acima de tudo,

ha um ideal de esperança que

o 25 de Abril trouxe a Portugal

e a certeza que, tal como acon-

teceu ao longo da Histo ria, no s

somos capazes, “por obras va-

lorosas”, de superar o que pa-

rece impossí vel.

g. 7 GRANDE ENTREVISTA

Um novo 25 de

Abril, conduzido

pelas forças arma-

das, com tanques

nas ruas, será um

anacronismo im-

pensável. É neces-

sário, sim, que as

pessoas voltem a

ter esperança,

uma esperança

não continuamen-

te apregoada e

adiada para o futu-

ro

muito mais do que

a questão da liber-

dade, até porque a

temos garantida,

(…) o que me pre-

ocupa verdadeira-

mente é o medo, o

medo que as pes-

soas têm em rela-

ção às suas exis-

tências, ao futuro

e o desespero que

isso lhes provoca.

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. 18

Edição de Março

Page 19: 14ª edição

REPORTÁGEM FOTOGRÁFICA

Passaram-se 40 anos e onde ficam as memórias daqueles que, ainda com nacionalidade

portuguesa, viveram a Revolução em países transatlânticos chamados em 74 de Colónias Por-

tuguesas?

Maria do Rosário Amorim de Sousa, 72 anos

Rosarito, como prefere ser chamada, tinha 32 anos quando ouviu na ra dio que Lisboa tinha sido

alvo de uma Revoluça o. Sozinha em casa naquele momento, dirigiu-se a cozinha onde se encontrava

o seu cozinheiro, o Salvador, e disse-lhe “Depois disto Moçambique vai ser independente”. E assim

foi. Rosarito vivia desde os 8 anos em Moçambique e na altura na o lhe passou pela cabeça que tivesse

que abandonar o paí s que viu os seus filhos nascer. 1977 foi o ano em que teve que regressar a Portu-

gal, deixando a sua casa nas ma os do escultor Chissano (hoje um museu).

Portugueses pelo Mundo Memórias de um 25 de Abril

Mariana Rodrigues

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. 19

Décima Quarta Edição

Page 20: 14ª edição

REPORTÁGEM FOTOGRÁFICA

Entre uma mala pequena com livros e roupa, trouxe este desenho feito por Malangatana (pintor

moçambicano) onde este pintou Rosarito com o seu filho Joa o a s costas na Ilha da Inhaca em Moçam-

bique. Esta e das poucas coisas que, passados 40 anos, guarda de Moçambique. Rosarito nunca mais

voltou a visitar a quente cidade de “Lourenço Marques” e hoje diz ja na o querer voltar. Portugal e ho-

je o seu paí s. “Acho que o 25 de Abril foi indispensa vel mas os resultados na o foram os esperados”,

afirma Rosarito.

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. 20

Edição de Março

Page 21: 14ª edição

REPORTÁGEM FOTOGRÁFICA

Ricardo Rocha, 51 anos

Ricardo tinha apenas 11 anos quando se deu a Revoluça o mas lembra-se que estava a jogar bas-

quetebol com os primos, no jardim de sua casa, em “Lourenço Marques”, quando de repente ouve o

pai a chama -los para dentro com alguma rapidez. Percebeu que algo estava prestes a mudar. Os dias

seguintes foram marcados por discursos de 5 horas de Samora Machel (Presidente de Moçambique

na altura) em que afirmava que os “brancos” ja na o tinham os mesmos privile gios. Para Ricardo, o 25

de Abril tinha que acontecer mas lamenta que a situaça o com as colo nias tenha tido tal desfecho, em

especial, dado que em 1962 Eduardo Mondlane (Frelimo) quis estabelecer um acordo com o Estado

Portugue s que tendo sido realizado, quiça , poderia ter evitado a Guerra Colonial.

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Décima Quarta Edição

Page 22: 14ª edição

REPORTÁGEM FOTOGRÁFICA

Estes elefantes foram o u nico brinquedo que Ricardo trouxera de Moçambique quando, em 1976,

fugiu da Guerra Colonial e foi viver para o Porto. Em 1992 regressou a Moçambique, ainda em guerra,

e “Senti-me a chegar a casa. Se na o fosse o facto de ter um filho com 2 anos em Portugal, teria ficado

la ” assegura Ricardo.

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. 22

Edição de Março

Page 23: 14ª edição

REPORTÁGEM FOTOGRÁFICA

Maria da Graça, 69 anos

Graça trabalhava na TAP em Sa o Tome e Prí ncipe na altura do 25 de Abril. Apesar de Sa o Tome ter

escapdo a guerra, lembra-se que, ao ouvir a ra dio, disse ao seu marido, “Ja vou conseguir, finalmente,

ter o meu passaporte portugue s”. Como Graça tinha casado com um cidada o Ingle s, e ha muitos anos

que na o visitava Portugal, o regime de Salazar na o lhe permitia a obtença o de um passaporte do seu

paí s de origem e, por isso, andava com um passaporte diploma tico, que era proibido. Maria da Graça

viu a Revoluça o como uma “necessidade”, no entanto, o destino, apo s o 25 de Abril, nunca a fez voltar

para Portugal, tendo vivido em Inglaterra e, desde 1997 em Joanesburgo, na A frica do Sul. Portugal,

desde os seus 10 anos, e apenas um destino de fe rias e para visitar a famí lia.

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. 23

Décima Quarta Edição

Page 24: 14ª edição

REPORTÁGEM FOTOGRÁFICA

Maria José Correia da Fonseca, 54 anos

Maria Jose viu o destino do 25 de Abril de uma forma diferente. Aqueles que trabalhavam para a

funça o pu blica em Angola e eram portugueses tinham direito a uma licença graciosa. Esta licença

consistia numas fe rias de 6 meses em Portugal, de 4 em 4 anos. Assim, Maria Jose encontrava-se de

fe rias com os pais e os irma os na sua casa de Portugal, em S. Bento, quando se deu a Revoluça o. Nun-

ca esperou que naquele dia, com apenas 14 anos, percebesse que nunca mais voltaria a Nova Lisboa,

sem nunca sequer um adeus.

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. 24

Edição de Março

Page 25: 14ª edição

REPORTÁGEM FOTOGRÁFICA

Estas foram as u nicas recordaço es que Maria Jose trouxe de sua casa em Nova Lisboa (hoje Huam-

bo). A sua fotografia, em casa, e a fotografia com a sua avo . Em Portugal, nos dias depois do 25 de

Abril, receberam caixotes e mais caixotes com bens que, quem ocupou a sua casa em A frica, enviou

para a sua casa em S. Bento. Aquelas fe rias por Portugal tornaram-se numa nova vida e, sobretudo,

numa deslocaça o “forçada” para um novo paí s. Apesar de nunca mais ter voltado a Nova Lisboa e

nunca se ter despedido, sente que ha -de voltar, e para ficar. Por isso, “apesar do 25 de Abril ter sido

importante, na altura fiquei baralhada e na o compreendi porque na o podia mais voltar para o meu

paí s e porque que tinha que viver num paí s onde na o tinha liberdade ate ao dia” confessa Maria Jose .

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. 25

Décima Quarta Edição

Page 26: 14ª edição

Vencedor do Pre mio Leya

2011, Joa o Pedro Ricardo

mostra uma histo ria marcada

pelos tempos da Ditadura Sa-

lazarista e que tem iní cio, pre-

cisamente, na Revoluça o dos

Cravos. Sa o tre s geraço es da

mesma famí lia, apresentadas

em pequenos episo dios apa-

rentemente desconexos e alia-

das por uma linha temporal

quase imperceptí vel.

Embora a histo ria arranque

em 1974, acaba por se distan-

ciar da tema tica a que se pro-

mete. O doutor Augusto Men-

des, o seu filho Anto nio e o seu

neto Duarte podiam estar in-

seridos noutro qualquer perí -

odo – a falta de uma justifica-

ça o histo rica, existem algumas

refere ncias a personalidades

contempora neas. Ainda assim,

sa o por demais te nues para

enriquecer o enredo.

Os pontos fortes sa o enta o

difí ceis de detectar, ja que a

decisa o de partir uma linha

temporal em pequenos peda-

ços acaba por apenas dificul-

tar uma leitura que poderia

ter sido mais interessante. A

histo ria de tre s geraço es na o

apresenta uma ordem clara e

os episo dios, que parecem car-

regadas de significado, aca-

bam por na o revelar o poten-

cial prometido.

Os menos familiarizados

com o acontecimento de 25 de

Abril te m, no entanto, alguns

momentos de aproximaça o ao

feno meno que merecem ex-

ploraça o. Em alguns momen-

tos, o autor mostra uma opini-

a o que parece quase sua e o

enredo, embora abalado pelas

ditas razo es, traz uma urge n-

cia de leitura singularizada

pela sensaça o particular de

imine ncia de algo mais.

Infelizmente, a obra acaba

por cair num limbo entre a

ameaça do passado e um pos-

sí vel futuro feliz. Definitiva-

mente um estilo que consegue

agarrar mas cuja escrita preci-

sa de amadurecer, porventura

em histo rias diferentes.

CULTURA

O Teu Rosto Será o Último, de João Ricardo Pedro

João Gonçalo Simões

LITERATURA

© Wook

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. 26

Edição de Março

Page 27: 14ª edição

Esta e uma obra fotogra fica

documental que nos apresenta

relatos e imagens emotivas da

quinta-feira que marcou para

sempre a histo ria de Portugal.

E um relato de aconteci-

mentos desse mesmo dia que

nos traz um sentimento ine-

quí voco de proximidade aos

rapazes jovens que estiveram

presentes na Revoluça o – al-

guns para lhe por fim, outros

para a defenderem. Num para-

lelismo com a actualidade, es-

te relato e feito por Jose Alves

Costa, um dos soldados que no

dia 25 de Abril de 1974 se re-

cusou a abrir fogo contra os

protestantes.

Uma assumida

“homenagem aos homens da

Cavalaria que acabaram com

48 anos de ditadura”, a obra

conta com a opinia o de va rias

figuras conceituadas e igual-

mente com testemunhos indi-

viduais dos va rios soldados

que deram forma aos aconte-

cimentos retratados. Apesar

disso, a obra dedica-se essen-

cialmente a informaça o visual,

mostrando imagens reais or-

denadas cronologicamente no

dia.

Imagens raras e extrema-

mente ricas do Terreiro do

Paço, Cais do Sodre , Largo do

Carmo e das va rias ruas do

centro de Lisboa pintam um

quadro riquí ssimo que merece

ser apreciado (ou ate relem-

brado) por todos os Portugue-

ses.

CULTURA

Os Rapazes do Tanques, de Alfredo Cunha e Adelino Gomes

João Gonçalo Simões

LITERATURA

© Alfredo Cunha

[a obra] traz um

sentimento ine-

quívoco de proxi-

midade aos ra-

pazes jovens que

estiveram pre-

sentes na Revo-

lução – alguns

para lhe por fim,

outros para a

defenderem

© Alfredo Cunha

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Décima Quarta Edição

Page 28: 14ª edição

Jorge de Sena

Cantiga de Abril

A s Forças Armadas e ao

povo de Portugal

«Na o hei-de morrer sem

saber qual a cor da liber-

dade»

J. de S.

Qual a cor da liberdade?

E verde, verde e vermelha.

Quase, quase cinquenta

anos

reinaram neste pais,

e conta de tantos danos,

de tantos crimes e enga-

nos,

chegava ate a raiz.

Qual a cor da liberdade?

E verde, verde e vermelha.

Tantos morreram sem ver

o dia do despertar!

Tantos sem poder saber

com que letras escrever,

com que palavras gritar!

Qual a cor da liberdade?

E verde, verde e vermelha.

Essa paz de cemite rio

toda prisa o ou censura,

e o poder feito galde rio.

sem limite e sem caute rio,

todo embo fia e sinecura.

Qual a cor da liberdade?

E verde, verde e vermelha.

Esses ricos sem vergonha,

esses pobres sem futuro,

essa emigraça o medonha,

e a tristeza uma peçonha

envenenando o ar puro.

Qual a cor da liberdade?

E verde. verde e vermelha.

Essas guerras de ale m-

mar

gastando as armas e a

gente,

esse morrer e matar

sem sinal de se acabar

por politica demente.

Qual a cor da liberdade?

E verde, verde e vermelha.

Esse perder-se no mundo

o nome de Portugal,

essa amargura sem fundo,

so mise ria sem segundo,

so desespero fatal.

Qual a cor da liberdade?

E verde, verde e vermelha.

Quase, quase cinquenta

anos

durou esta eternidade,

numa sombra de gusanos

e em nego cios de ciganos,

entre mentira e maldade.

Qual a cor da liberdade?

E verde, verde e vermelha.

Saem tanques para a rua,

sai o povo logo atra s:

estala enfim altiva e nua,

com força que na o recua,

a verdade mais veraz.

Qual a cor da liberdade?

E verde, verde e vermelha.

CULTURA

P equeno espaço de leitura onde são escritos poemas que carecem de interpretações individuais, porque os poemas precisam disso, necessitam que cada leitor os sinta e os aplique para que eles pos-sam viver.

INDIRECTO

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. 28

Edição de Março

Page 29: 14ª edição

Quando em 2014 celebra-

mos os 40 anos da Revoluça o

dos Cravos, importa refletir

sobre o impacto do 25 de Abril

no cinema portugue s.

E oportuno recordar que,

apesar de a Revoluça o de

1974 ter trazido a liberdade

depois de mais de quarenta

anos de um regime autorita rio

marcado pelas restriço es im-

postas pela censura, o cinema

portugue s ja tinha experimen-

tado a sua “revoluça o” no iní -

cio da de cada de sessenta do

se culo passado com a emer-

ge ncia do Novo Cinema e com

a busca de uma linguagem que

rompesse com os modelos que

vinham informando o cinema

do Estado Novo. Por outras

palavras, a renovaça o da cine-

matografia portuguesa esta

ligada a filmes como Os Ver-

des Anos (1963) de Paulo Ro-

cha e Belarmino (1964) de

Fernando Lopes, bem como ao

empreendedorismo de ho-

mens como Cunha Telles, que

aceitou o desafio de apoiar jo-

vens cineastas que retorna-

vam do estrangeiro com ideias

novas e a ousadia de homens

como Anto nio Macedo

(Domingo a Tarde, 1965) que,

sem nunca ter saí do de Portu-

gal, trazia a experie ncia e a

vive ncia do movimento cine-

clubista.

O 25 de Abril traz a ta o de-

sejada liberdade e enceta a

produça o de filmes de cara ter

preferencialmente documen-

tal, que refletem a necessidade

de registar um momento his-

to rico de extrema releva ncia

na histo ria nacional. Nos fil-

mes produzidos em 1974 pre-

domina um tom de interven-

ça o polí tica militante, o que se

compreende, tendo em conta a

viragem polí tica observada.

Acreditava-se que era impor-

tante dar a voz ao povo que,

durante anos, teve este direito

negado. Os cineastas ve m para

a rua e, mais do que registar

os eventos, desejam intervir

na sociedade. Surgem produ-

ço es coletivas que resultam do

trabalho em regime de coope-

rativa e muitos documenta rios

sa o claramente ideologica-

mente informados, colocando

em relevo a importa ncia do

trabalho, revelando o quotidi-

ano dos camponeses e dos

CULTURA

O 25 de Abril e o Cinema Português

Adriana Martins

CINEMA

apesar de a Revo-

lução de 1974 ter

trazido a liberdade

depois de mais de

quarenta anos de

um regime autori-

tário marcado pe-

las restrições im-

postas pela censu-

ra, o cinema por-

tuguês já tinha ex-

perimentado a sua

“revolução” no iní-

cio da década de

sessenta do século

passado

O 25 de Abril traz

a tão desejada li-

berdade e enceta a

produção de fil-

mes de caráter

preferencialmente

documental, que

refletem a necessi-

dade de registar

um momento his-

tórico de extrema

relevância na his-

tória nacional.

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. 29

Décima Quarta Edição

Page 30: 14ª edição

CULTURA

opera rios das fa bricas, o que e

reforçado pela crí tica acutilan-

te aos proprieta rios. Um

exemplo dessa tende ncia e o

documenta rio As Armas e o

Povo (1975). Importava tam-

be m rever o passado e conta -

lo a partir de uma perspetiva

diferente, o que levou a filmes

que visavam desconstruir os

princí pios ideolo gicos do Esta-

do Novo, como e o caso de

Deus, Pa tria e Autoridade

(1975) de Rui Simo es. Para a

produça o fí lmica, muito con-

tou a importa ncia crescente da

RTP, sendo alguns dos filmes

produzidos pela ou para a te-

levisa o nacional.

Ainda no a mbito dos docu-

menta rios, e oportuno chamar

a atença o para os filmes de

teor mais etnogra fico, que

buscavam dar a conhecer e

valorizar a vida em determina-

das comunidades do paí s. Um

caso emblema tico e o premia-

do documenta rio Tra s-os-

Montes (1976) de Anto nio

Reis e Margarida Cordeiro que

revela o a mago de uma comu-

nidade no nordeste transmon-

tano. Um outro exemplo que

merece destaque e o de Torre

Bela (1975), de Thomas Har-

lan, que retrata a ocupaça o de

uma herdade alentejana por

um coletivo de camponeses

em pleno PREC e o seu contac-

to com a realidade, passada a

euforia da Revoluça o. Ainda a

tí tulo de exemplo, vale a pena

mencionar Continuar a Vivér

ou os Índios da Méia Praia

(1976) de Anto nio da Cunha

Teles que aborda a nova expe-

rie ncia de habitaça o no seio da

comunidade piscato ria na

Meia-Praia, no Algarve, com o

apoio do SAAL (Serviço de

Apoio Ambulato rio).

Embora o cinema dito mili-

tante predomine como resul-

tado do 25 de Abril e do fim da

censura, quando Portugal pro-

curava se reconstruir como

naça o, num novo ciclo da sua

histo ria, o panorama cinema-

togra fico portugue s e marcado

por outras experie ncias que,

sem assumirem um tom mili-

tante, interrogam na o so a

claustrofobia dos anos de dita-

dura, como o fervor revolucio-

na rio. Bénildé ou a Virgém

Mãé (5978) de Manoel de Oli-

veira e um filme, a este propo -

sito, a ser revisto, tambe m

porque antecipa muito do que

viria a ser a cinematografia de

Oliveira nos anos seguintes.

Em suma, as celebraço es

dos 40 anos do 25 de abril, pa-

ra ale m de um exercí cio cí vico

fundamental de memo ria, sa o

um excelente pretexto para

que os espectadores que vi-

venciaram os acontecimentos

daquela e poca, e, especialmen-

te, aqueles que ja nasceram

depois da Revoluça o, possam

interrogar o Portugal atual e o

percurso seguido desde enta o.

Neste processo de interroga-

ça o e revisa o da memo ria na-

cional, o cinema portugue s de-

sempenha um papel funda-

mental. A este propo sito, a ini-

ciativa da Cinemateca Portu-

guesa, denominada “25 de

Abril, Sempre”, e definitiva-

mente uma oportunidade a

na o perder. Para tal, basta

consultar a programaça o da

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. 30

Edição de Março

Page 31: 14ª edição

CULTURA

Quando se fala de uma data

ta o importante para Portugal,

como e o caso do 25 de Abril de

1974, e impossí vel na o se faze-

rem associaço es directas a mu si-

ca!

Quem na o se lembra do

“Gra ndola Vila Morena” de Zeca

Afonso ou de “E Depois do

Adeus” de Paulo de Carvalho?

Estas foram duas das va rias mu -

sicas que assinalaram simbolica-

mente este dia ta o marcante na

nossa histo ria (que nos trouxe a

ta o preciosa liberdade de expres-

sa o)!

Numa e poca em que a liberda-

de e uma realidade mas em que o

Paí s se encontra numa fase me-

nos positiva, sa o va rias as formas

de expressar os males e dissabo-

res que va o na alma dos portu-

gueses. Uma das formas e , clara-

mente, a mu sica – nomeadamen-

te na forma de mu sicas de inter-

vença o.

Formalmente, a mu sica de in-

tervença o, vulgarmente conheci-

da como mu sica de protesto, e

uma categoria na a rea da mu sica

popular cujo principal objectivo e

chamar a atença o aos problemas

polí ticos, sociais e/ou econo mi-

cos de uma sociedade.

Ricardo Se rgio, jornalista de

mu sica, produtor e locutor da

Antena 3, assim como antigo alu-

no da Universidade Cato lica Por-

tuguesa, em conversa com o Pon-

tivírgula, reconhece a suma im-

porta ncia da mu sica de interven-

ça o, no entanto, revela que “No s

em Portugal temos uma definiça o

de mu sica de intervença o associ-

ada a um ge nero musical muito

pro prio, como o de Zeca Afonso

ou Jose Ma rio Branco, o que nos

leva para a balada. Contudo, a

mu sica de intervença o na o e um

ge nero, pode ser o punk, o hip-

hop ou o rock. Por isso, gosto

mais de falar de canço es de inter-

vença o ou canço es de protesto.”

Quando desafiado a nomear

algumas bandas e artistas con-

tempora neos que, hoje em dia, se

dedicam a intervença o social

atrave s da mu sica de protesto,

Ricardo sublinha que:

“Actualmente, por exemplo, na o

se pode dizer que o Pedro Abru-

nhosa ou os Diabo na Cruz fazem

mu sica de intervença o, contudo,

Música

Música de Intervenção: Uma realidade Actual?

Patrícia Fernandes

a música de inter-

venção (…) é uma

categoria na área

da música popular

cujo principal ob-

jectivo é chamar à

atenção aos pro-

blemas (…) de

uma sociedade

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. 31

Décima Quarta Edição

Page 32: 14ª edição

CULTURA

te m canço es de intervença o, co-

mo e o caso dos singlés ‘Para os

braços da minha ma e’ e ‘Vida de

Estrada’, respectivamente. Por-

tanto, hoje em dia, na o ha bandas

ou cantores que se dediquem ex-

clusivamente a mu sica de inter-

vença o.”

Ricardo Se rgio indica, todavia,

nomes como Deolinda, Diabo na

Cruz e ate Se rgio Godinho. Afir-

ma ainda, que, de forma um pou-

co discreta, a nova mu sica dos

Diabo na Cruz pode ser vista co-

mo uma cança o de protesto, pela

sua releva ncia actual “O singlé

desta banda fala sobre a vida na

estrada, a vida de uma banda em

tourne e, mas nas entre-linhas

esta patente a ideia de ‘ir para

fora’ porque la fora e que se esta

bem. ”

Ricardo Se rgio sublinha-nos

tambe m a importa ncia que o hip-

hop dete m na sociedade contem-

pora nea, bem como a sua credibi-

lidade moral e social, relativa-

mente aos problemas da actuali-

dade.

Sobre a mu sica Portuguesa, o

locutor diz-nos, com noto rio or-

gulho, que “O perí odo que a mu -

sica portuguesa vive hoje e í mpar

e absolutamente extraordina rio.

Para isto contribui, a maior acei-

taça o da parte do pu blico (toda a

gente gosta de ouvir mu sica por-

tuguesa) e tambe m a maior facili-

dade em fazer mu sica, devido a

democratizaça o das tecnologias.”

Em 25 de Abril de 1974, a mu -

sica foi um elemento-chave para

a Revoluça o dos Cravos e definiu

o caminho de Portugal. Assim, e

inevita vel ponderar a possí vel

necessidade de uma nova Revo-

luça o e reflectir sobre o papel da

mu sica caso tal viesse a concreti-

zar-se. Nas palavras de Ricardo,

“Eu na o sei se faz falta haver

mais mu sica para chamar a aten-

ça o para o que esta mal, o que se

calhar faz falta e ouvintes que

reajam a ela, porque estamos

num perí odo em que o que e con-

siderado lutar contra o que esta

mal e apenas colocar um post no

Facébook. Somos muito passivos.”

Para quando, enta o, sera a uti-

lizaça o da mu sica, tal como na

Revoluça o dos Cravos, como

kéyword para uma reacção à soci-

edade?

O período que a

música portugue-

sa vive hoje é ím-

par e absoluta-

mente extraordiná-

rio. Para isto con-

tribui, a maior

aceitação da parte

do público (…) e

também a maior

facilidade em fazer

música não sei se faz falta

haver mais música

para chamar a

atenção para o

que está mal, o

que se calhar faz

falta é ouvintes

que reajam a ela

(…) Somos muito

passivos

Pág

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Edição de Março

Page 33: 14ª edição

O caro Capita o Salgueiro

Maia na o deve fazer ideia da-

quilo que se passa em Portu-

gal. Desiludir-se-ia se soubes-

se. Vejo em si a alternativa

u nica para mais uma necessa -

ria mudança. Dito isto, tomo a

decisa o de lhe escrever e fazer

um pequeno retrato daquele

paí s que salvou ha 40 anos. Sei

que sera um aborrecimento

prescindir desse eterno des-

canso para vir a esta pequena

e apa tica miniatura peninsu-

lar. Se realmente tenciona ini-

ciar algum tipo de revoluça o,

aviso-lhe ja que na o pode co-

meçar na Escola pra tica de ca-

valaria de Santare m – foi van-

dalizada, esta completamente

destruí da e deserta. A ca mara

na o demonstra intença o de a

reconstruir, pelo menos por

enquanto – esta demasiado

endividada e pretende conti-

nuar a endividar-se com a

construça o de novas rotundas.

Tudo para o bem da segurança

rodovia ria e para a este tica

citadina – na o me pergunte a

lo gica disto: manias!

Provavelmente na o sabe, e

com o devido reconhecimento,

todos celebramos o 25 de

Abril como aquela data que foi

princí pio de mudança para um

paí s que vivera durante tantos

anos sob um regime fascizan-

te. Hoje considero, e repare

que e so a minha opinia o (vale

o que vale), que estamos apa -

ticos e encostados a parede

com medidas de austeridade

que tiram a dignidade a mui-

tas famí lias. Fazemos manifes-

taço es, sim. Repare bem que

ate ja arranca mos as pedras

da calçada para atirarmos a

uma barreira de seguranças

em frente a Assembleia da Re-

publica. Veja la o senhor que

facilita mos o trabalho e pou-

pa mos alguma ma o-de-obra

porque ha pouco tempo, deci-

diu-se acabar com a calçada

portuguesa – ironia do desti-

no.

Um jovem da minha idade

ja na o tem muita esperança no

futuro profissional. A emigra-

ça o, inevitavelmente, torna-se

a u nica alternativa. E repare

que, muitas das vezes, na o e

por falta de vontade. Gosta-

mos do nosso paí s. Penso que

a identidade nacional ficou-se

pelos feitos que ja foram. O

que sera ja foi.

Admiramo-lo muito, sabe?

A escola onde aprendeu as pri-

meiras letras e hoje uma

“escola museu” – a escola pri-

ma ria de Sa o Torcato de Coru-

che. Se na o tivesse la estudado

possivelmente estaria no role

de escolas que deveriam ser

reconstruí das por causa do

problema do amianto.

Poderia continuar a desaba-

far, mas preferia faze -lo pesso-

almente. Precisamos de si. Ve-

nha que tenho todo o gosto em

oferecer-lhe um cafe . Na o sei

se o nosso Presidente da Re-

publica estara presente – ca

para no s, ele na o e homem de

muitas conversas. O Primeiro-

ministro provavelmente esta-

ria, se o convida ssemos…mas

penso que o senhor quer estar

na companhia de gente se ria.

Responda, por favor, com a

ma xima urge ncia.

OPINIÃO

Carta a Salgueiro Maia

Michelle Tomás

A emigração, inevi-

tavelmente, torna-

se a única alterna-

tiva. E repare que,

muitas das vezes,

não é por falta de

vontade. Gostamos

do nosso país.

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Décima Quarta Edição

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O fim do Estado Novo con-

sumado a 25 de Abril de 1974

atrave s do golpe militar de-

sencadeado pelo MFA

(Movimento das Forças Arma-

das) foi o consumar da

“cro nica de uma morte anunci-

ada”.

Olhando em retrospectiva

os u ltimos 15 anos de regime,

facilmente entendemos que a

sua queda na o foi inesperada,

tendo va rios episo dios acendi-

do o rastilho de descontenta-

mento entre a populaça o ape-

sar da modernizaça o da eco-

nomia atrave s dos Planos de

Fomento do Governo de Mar-

cello Caetano e a tentativa de

aproximaça o ao projecto euro-

peu.

A passagem para o conflito

armado, vulgo Guerra Coloni-

al, em 1961, que levou milha-

res de soldados para o Ultra-

mar, despedaçou famí lias e os

alicerces do Estado. Cerca de

40% do Orçamento Geral do

Estado estava reservado a de-

fesa das colo nias, sendo por

isso um dos factores da queda

do regime. Para ale m disso,

tambe m contribuí ram para o

desmoronar do regime, a saí da

de Salazar da chefia do paí s, a

crescente crí tica internacional

e nacional a s possesso es ultra-

marinas, a par da diminuiça o

da qualidade de vida das famí -

lias que continuava significati-

vamente abaixo do standard

europeu da altura e por u lti-

mo, o grande descontenta-

mento de capita es e milicianos

que combatiam no Ultramar.

Entrando numa narrativa

de ana lise da revoluça o sob o

ponto de vista da identidade

OPINIÃO

O longo [e tortuoso] caminho da Democracia

Bernardo Lourenço

Olhando em re-

trospectiva os últi-

mos 15 anos de

regime, facilmente

entendemos que a

sua queda não foi

inesperada, tendo

vários episódios

acendido o rasti-

lho de desconten-

tamento entre a

população

© João Abel Manta

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Edição de Março

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OPINIÃO

nacional, podemos dizer que

foi uma revoluça o com toques

roma nticos tí picos dos portu-

gueses… Fica mos com

“Saudade” dos laços que cria -

mos com os povos que coloni-

za mos, querendo manter uma

relaça o com eles e vice‐versa,

ao mesmo tempo que, ao inve s

de disparar balas, opta mos

por colocar cravos nas Chaimi-

tes e nas armas de fogo… fo-

ram tiros de paz, rumo a um

futuro cheio de esperanças em

que todas as organizaço es po-

lí ticas e militares quiseram

impulsivamente governar os

destinos do paí s.

Com o consumar da revolu-

ça o a Junta de Salvaça o Nacio-

nal po s em pra tica o programa

do MFA, tendo como lema De-

mocratizar, Descolonizar, De-

senvolver… Basicamente eli-

minaram‐se as principais fer-

ramentas do regime: a extin-

ça o da PIDE/DGS, a libertaça o

dos presos polí ticos e o iní cio

do processo descolonizador,

cortando assim todos os laços

com o Estado Novo.

Nos dois anos posteriores a

revoluça o, Portugal deu os pri-

meiros passos rumo a Demo-

cracia e a integraça o na Euro-

pa. Foram momentos bastante

conturbados, principalmente

pela tentativa de instauraça o

de um regime comunista em

Portugal atrave s do PREC, que

so terminou com o mí tico epi-

so dio de 25 de Novembro,

pondo fim ao “Vera o Quente

de 1975”.

Estabilizadas as condiço es

para a realizaça o das primei-

ras eleiço es verdadeiramente

livres, Portugal teve o seu pri-

meiro Governo democra tico

em Julho de 1976, abrindo ca-

minho para o concretizar do

projecto do 25 de Abril.

Criadas as fundaço es para a

democracia começou‐se a pla-

near a forma de integraça o da

economia portuguesa na Euro-

pa, tentando apanhar este

comboio que na o mostrava

sinais de abrandamento.

Olhando em retrospectiva a

adesa o de Portugal a CEE em

1986, podemos dizer que a

Europa na o foi o “El-dorado”

que se pensava. Basta, fazer as

contas…recebemos cerca de

80 mil milho es de euros em

fundos, equivalente ao resgate

e de 2011. Este facto elucida‐

nos do desastre que foi a inte-

graça o de um tecido econo mi-

co com potencialidades inte-

ressantes (porta de entrada da

Ame rica do Sul e A frica), que

contava com um dos maiores

portos de a gua profundas do

mundo (Sines), num projecto

em que so os paí ses com maio-

res posses conseguiram ver-

dadeiramente vingar.

Num espectro global, o 25

de Abril foi talvez a maior

obra de coragem e de esperan-

ça que temos memo ria desde a

e poca dos descobrimentos.

Em suma, fomos fazendo

“zapping” de Governos, rece-

bendo fundos, sem nunca pa-

rar para construir um projecto

so lido… talvez, olhando para

tra s e recortando da histo ria

os episo dios em que soube-

mos ir “ale m da Taprobana” e

demos “novos mundos ao

mundo” fosse um bom exerci-

cí o, mas nunca nos demos a

esse esforço… Caí mos num

vazio de futuro ao mesmo

tempo com uma mirí ade de

sonhos.

a Europa não foi

o “El-dorado” que

se pensava. Basta,

fazer as contas…

recebemos cerca

de 80 mil milhões

de euros em fun-

dos, equivalente

ao resgate e de

2011

ao invés de dispa-

rar balas, optámos

por colocar cravos

nas Chaimites e

nas armas de fo-

go… foram tiros de

paz, rumo a um fu-

turo cheio de espe-

ranças

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Décima Quarta Edição

Page 36: 14ª edição

Herman Jose tambe m foi

Capita o de Abril, so que alguns

anos depois. Pena que nos te-

nhamos esquecido disso.

Em 1987, lança-se “ Humor

de Perdiça o”, um programa

humorí stico televisivo, criado

por Herman Jose , com um

elenco de fazer inveja a qual-

quer dos “novos” conteu dos

co micos do se culo XXI, incluin-

do a actriz Ana Bola, Miguel

Guilherme, Virgí lio Castelo ou

Victor de Sousa. Para ale m

destas verdadeiras estrelas

televisivas, este programa

contou ainda com Miguel Este-

ves Cardoso ou Carlos Paia o.

Ja chega para vos convencer,

ou na o?

A voce s certamente, mas a

RTP 1 na o. Em 1988, a emis-

sa o de tre s “Entrevistas Histo -

ricas ” foram subitamente in-

terrompidas tornando-se este

o primeiro episo dio pole mico

na vida de Herman Jose . De

sublinhar o facto de se passa-

rem ja 14 anos desde o 25 de

Abril. 14 anos.

Este ano celebramos 40

anos de uma revoluça o que faz

parte dos anais da nossa histo -

ria mas que ainda assim na o

surtiu todos os efeitos que es-

pera vamos. No humor, Her-

man nunca baixou os braços e

deixou-nos um legado ignora-

do por alguns, como parte dos

novos humoristas tanto gos-

tam de fazer, mas que perdu-

ra. Assim, consegue deixar

bem assente que a nossa co-

me dia foi silenciada durante a

tempestade salazarista, contu-

do, viveu tempos a ureos logo

apo s a famosa cadeira pregar

uma partida ao nosso lí der de

voz fininha.

Se Herman Jose foi um dos,

por mim apelidado claro,

“Capita o de Abril”, porque e

que hoje, quando ligamos a

televisa o, ou iniciamos uma

pesquisa de ví deos no Youtu-

be sa o poucos os conteu dos

inspirados nas suas pro prias

obras? Porque e que larga mos

verdadeiros tesouros como os

livros e publicaço es de Rafael

Bordalo Pinheiro, as pinturas

de Ze Penincheiro ou os carto-

ons, de tantos e tantos, como

Joa o Abel Manta ou Vasco de

Castro? Para onde foram tan-

tos anos de luta humorí stica

que denunciaram os malfeito-

res e os corruptos, os ladro es

e os abastados, ou que nos

trouxeram figuras como o Ze

Povinho?

Esta revoluça o na o se fez so

de espingarda na ma o e cravo

no cano. Na o se fez so de gran-

des discursos e palavras que

ditaram um caminho feliz. Fez

-se de homens que quiseram

que nos continua ssemos a rir

e que na o perde ssemos uma

das coisas em que somos me-

lhores (exceptuando os ingle-

ses com os Monty Python) : a

Come dia.

Este ano celebram-se 40

anos de liberdade e esta na

altura de repensar se na o de-

vemos recuar um pouco, cor-

tar nos excessos vazios daqui-

lo que se subentende por Hu-

mor e trazer de volta os Jose

Esteves e as Maximianas desta

vida.

OPINIÃO

A Revolução também se faz a rir

José Paiva

Esta revolução não

se fez só de espin-

garda na mão e

cravo no cano.

Não se fez só de

grandes discursos

e palavras que di-

taram um caminho

feliz. Fez-se de ho-

mens que quise-

ram que nos conti-

nuássemos a rir

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Edição de Março

Page 37: 14ª edição

HUMOR

Quem comia morangos com

açu car deve lembrar-se de To

Pe , um dos integrantes dos

D´zrt. A personagem era inter-

pretada por Paulo Vinte m. Ate

aqui, nada de anormal. Fez um

papel representativo daquilo

que e o adolescente portugue s.

Apenas falhou numa parte. Os

adolescentes portugueses do

Se culo XXI na o celebraram a

vito ria republicana porque

esta aconteceu a 5 de Outubro

de 1910. Na o e por serem mo-

narcas, e por na o estarem vi-

vos naquela e poca. Aquilo que

mais me custa e ter sido inge -

nuo. Na altura na o reparei,

com os meus 12 anos, que

Paulo Vinte m e imortal.

Este feno meno merece ser

estudado. Alia s, Paulo pode ter

informaço es ine ditas sobre a

histo ria de Portugal. Bem me

lembro agora que, numa tarde

de Sexta, cheguei a casa e mu-

dei para a TVI. Estava o To Pe

a falar bem do Teo filo Braga

ao ouvido do Ze Milho,

numa das aulas de dança. En-

tretanto, entra o To Jo em cena

e diz que aposta uma perna de

presunto em como o Teo filo

acabou o mandato em 1911.

Estavam todos os bréakdan-

cérs a insistir na data de 5956.

To Pe na o aceitou a aposta e

agora percebo porque . Ele sa-

bia, ele esteve la . Tambe m me

pareceu ve -lo nas pinturas do

antigo Egipto, mas ainda na o

posso confirmar.

Dário Moreira

Tó Pê e a Revolução Republicana

Na altura não reparei, com os meus 12 anos, que Paulo Vintém

é imortal. Este fenómeno merece ser estudado.

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Décima Quarta Edição

Page 38: 14ª edição

HUMOR

Doença das vacas loucas,

Pneumonia atí pica, Gripe das

aves e Selfies, sa o as doenças

do Se culo XXI. Abordo aqui a

u ltima pelo seu ní vel de agres-

sividade. O Ministe rio da Sau -

de recomendou cuidado ao

cidada o quanto ao surto selfa -

tico. Este ví rus aparece de sur-

presa. Ha relatos de pessoas

que estavam a viver a sua vida

tranquilamente quando, de

forma inesperada, as suas

ma os agarram num telemo vel

e tiram uma fotografia com a

ca mara frontal. Reparem na

intelige ncia do SN1H78EH

(nome cientí fico da doença).

Ha cuidados a ter, pois ja se

contabilizam 7 bilio es de pes-

soas que gostam demasiado

delas pro prias. Ate que a situ-

aça o normalize, os governos

estipularam duas alternativas:

1) Os humanos destroem

todos os aparelhos electro ni-

cos que possuem;

2) Os humanos bebem tre s

shots de absinto. Assim, a Sel-

fie fica desfocada e ningue m se

chateia. Isto, obviamente, na o

elimina o ví rus mas ajuda a

espantar.

Um outro problema que

surge, inclusive em Portugal,

centra-se no bolso dos que

aqui vivem. Va rios economis-

tas alegam que o nosso paí s

pode vir a ser pobre. Pode ate

perder, num curto-prazo, a

auto-suficie ncia econo mica

invejada por tantos outros. Se

pensarmos bem, encontramos

a lo gica. O dinheiro sai-nos do

bolso porque o telemo vel pre-

cisa do seu espaço. Um sa bio

disse-me uma vez que as notas

do futuro sera o ana s e que os

telemo veis sera o jogadores de

basquetebol. Nessa altura, se-

ra cada um por si ou Mé, Your

Sélfié and I.

Dário Moreira

Me, Your Selfie and I

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Edição de Março

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“Canções de Intervenção”:

1. Bob Dylan, “The Times They Are a-Changin’! (1964)

2. Caetano Veloso, “Alegria, Alegria” (1967)

3. Gil Scott-Heron, “The Revolution Will Not Be Televised” (1970)

4. Sérgio Godinho, “Que Força É Essa?” (1971)

5. Zeca Afonso, “Grândola Vila Morena” (1971)

6. Paulo de Carvalho, “E Depois do Adeus” (1974)

7. The Clash, “White Riot” (1977)

8. Bob Marley, “Redemption Song” (1980)

9. José Maria Branco, “FMI” (1982)

10. Patti Smith, “People Have the Power” (1988)

11. Public Enemy, “Fight The Power” (1988)

12. Rage Against The Machine, “Killing In The Name” (1992)

13. The White Stripes, “The Big Three Killed My Baby” (1999)

14. Valete, “Fim da Ditadura” (2005)

15. Da Weasel, “Negócios Estrangeiros” (2008)

16. Deolinda, “Parva que Eu Sou” (2011)

17. B Fachada, “Deus, Pátria e Família” (2011)

18. Boss AC, “Sexta-Feira (Emprego Bom Já)” (2012)

19. Virgem Suta, “Exporto Tristeza” (2012)

20. Diabo na Cruz, “Vida de Estrada” (2014)