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A INTERAÇÃO ESTRUTURAL ENTRE A DESIGUALDADE DE RAÇA E DE GÊNERO NO BRASIL * José Alcides Figueiredo Santos Os princípios de ordenamento social geram conseqüências que vão além dos seus poderes cau- sais específicos. As divisões sociais que organizam desigualdades duráveis exercem efeitos conjuntos derivados da sua interação estrutural. Investiga-se aqui a hipótese de que a desigualdade de gênero de renda no Brasil seria afetada pela hierarquia racial. Tendo em vista este fim, assim como as suas moti- vações teóricas, estima-se a distância (gap) de gêne- ro de renda entre os grupos raciais, usando novas soluções metodológicas, e analisam-se os compo- nentes desta desigualdade no âmbito de cada gru- po racial. Este trabalho focaliza as divisões de gê- nero no interior das divisões de raça, as combinações dessas categorias, considerando a especificidade dos mecanismos de cada divisão social e seus processos de interação social. A análise empreendida situa e explora, de modo complementar, o papel do con- texto subjacente da estrutura da desigualdade eco- nômica de classe no entendimento dos padrões de desigualdade emergentes. Esta iniciativa inscreve-se, ainda, em um programa de investigação de maior amplitude a respeito da produção e da reprodução da desigualdade social na sociedade brasileira. 1 Os estudos já realizados sobre as desigualdades de raça RBCS Vol. 24 n o 70 junho/2009 Este estudo contou com um auxílio de pesquisa principal da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – Fapemig e um complementar do Conselho Na- cional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq. O autor agradece ao professor Trond Petersen, do Departamento de Sociologia da Universidade da Califór- nia-Berkeley, pela oportunidade de conhecer seu inova- dor trabalho metodológico que fundamenta a escolha do modelo estatístico usado nesta investigação. O estudo contou também com a participação de três bolsistas de iniciação cientifica: Lara Cruz Correa, Juliana de Souza Barbosa e Eder Lima Moreira, que colaboraram no ma- nuseio dos dados. Artigo recebido em junho/2007 Aprovado em fevereiro/2009 * 03 rbcs 70 José alcides figueiredo santos.p65 8/18/2009, 2:24 PM 37

A INTERAÇÃO ESTRUTURAL ENTRE A DESIGUALDADE DE … · Barbosa e Eder Lima Moreira, que colaboraram no ma-nuseio dos dados. Artigo recebido em junho/2007 Aprovado em fevereiro/2009

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A INTERAÇÃO ESTRUTURAL ENTRE ADESIGUALDADE DE RAÇA E DE GÊNERONO BRASIL*

José Alcides Figueiredo Santos

Os princípios de ordenamento social geramconseqüências que vão além dos seus poderes cau-sais específicos. As divisões sociais que organizamdesigualdades duráveis exercem efeitos conjuntosderivados da sua interação estrutural. Investiga-seaqui a hipótese de que a desigualdade de gênero de

renda no Brasil seria afetada pela hierarquia racial.Tendo em vista este fim, assim como as suas moti-vações teóricas, estima-se a distância (gap) de gêne-ro de renda entre os grupos raciais, usando novassoluções metodológicas, e analisam-se os compo-nentes desta desigualdade no âmbito de cada gru-po racial. Este trabalho focaliza as divisões de gê-nero no interior das divisões de raça, as combinaçõesdessas categorias, considerando a especificidade dosmecanismos de cada divisão social e seus processosde interação social. A análise empreendida situa eexplora, de modo complementar, o papel do con-texto subjacente da estrutura da desigualdade eco-nômica de classe no entendimento dos padrões dedesigualdade emergentes. Esta iniciativa inscreve-se,ainda, em um programa de investigação de maioramplitude a respeito da produção e da reproduçãoda desigualdade social na sociedade brasileira.1 Osestudos já realizados sobre as desigualdades de raça

RBCS Vol. 24 no 70 junho/2009

Este estudo contou com um auxílio de pesquisa principalda Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de MinasGerais – Fapemig e um complementar do Conselho Na-cional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico –CNPq. O autor agradece ao professor Trond Petersen, doDepartamento de Sociologia da Universidade da Califór-nia-Berkeley, pela oportunidade de conhecer seu inova-dor trabalho metodológico que fundamenta a escolha domodelo estatístico usado nesta investigação. O estudocontou também com a participação de três bolsistas deiniciação cientifica: Lara Cruz Correa, Juliana de SouzaBarbosa e Eder Lima Moreira, que colaboraram no ma-nuseio dos dados.

Artigo recebido em junho/2007Aprovado em fevereiro/2009

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e de gênero no Brasil servem de esteio para o trata-mento atual das interações entre essas categoriassociais (Figueiredo Santos, 2005a e 2008).2

Gênero e raça evoluíram como campos sepa-rados de investigação nas ciências sociais. Os estu-dos raciais privilegiaram o homem não branco e osestudos de gênero, a mulher branca. Esta modalida-de de estudo de cada hierarquia separada, em iso-lamento uma da outra, tanto marginalizou em am-bas as áreas o estudo da mulher não branca comoincentivou o tratamento meramente aditivo dos atri-butos de gênero e de raça (Glenn, 2000, pp. 3-4).Não são poucas as pesquisas que, ao considerargênero e raça como fatores independentes, focali-zam um fator em detrimento do outro. Do pontode vista teórico, omitir gênero ou raça implica assu-mir que a atribuição de recompensas é neutra emrelação ao fator omitido. Em um modelo estatísti-co, isso representa um erro de especificação, pois seestá suprimindo uma variável relevante, correlacio-nada com variáveis independentes no modelo, oque enviesa as estimativas dos efeitos das variáveisindependentes correlacionadas. Já outras pesquisas,quando controlam o outro fator, o que representaavanço, muitas vezes não testam a possibilidade deinterações entre ambas as variáveis (Reskin e Char-les, 1999, p. 385).

As construções sociais de gênero e raça, embo-ra distintas, estariam entrelaçadas na sua constitui-ção história e na experiência individual. A naturezae a dinâmica do poder, do privilégio e da opressãopoderiam ser mais bem entendidas se gênero fosseconsiderado em combinação com raça, assim comoclasse. Os papéis de gênero e as experiências de dis-criminação no local de trabalho podem variar comouma função tanto de gênero como de raça (Ferd-man, 1999). Em certo sentido, raça e gênero seriamsistemas de relações sociais mutuamente constituí-das, organizadas em torno de diferenças percebi-das, e não características de categorias fixas (Glenn,2000, p. 9).3

No estudo das relações entre gênero e raça naprodução de desigualdade ganhou curso a tese da“dupla desvantagem”, em que a pessoa que ocupauma posição subordinada em mais de uma hierar-quia sofreria da soma das desvantagens de ambasas dimensões. Essa idéia, embora freqüentemente

invocada, não tem sido devidamente examinada(Leffler e Xu, 1997, p. 71). A tese da “dupla des-vantagem” supõe que os efeitos de gênero e raçasão aditivos, de modo que a mulher não brancasofreria a soma da desvantagem plena associada aosdois tipos de status subordinado. Uma revisão daliteratura sociológica sobre a interseção de gênero eraça no mercado de trabalho, com foco particularnos Estados Unidos, sugere que a evidência coleta-da ainda seria mista, sem favorecer claramente umamodalidade de interpretação, e dependeria da ques-tão colocada, do método empregado e do tipo deprocesso investigado. Apesar da ambigüidade dosresultados empíricos apurados, este artigo argumen-ta que a focalização da interseção entre ambas asdivisões sociais pode enriquecer o entendimento dadesigualdade econômica e oferecer conceituaçõesmais acuradas dos processos do mercado de tra-balho (Browne e Misra, 2003). A suposição de efei-tos aditivos, adotada como orientação ou por mo-tivo de simplicidade, representa, na verdade, umatese bastante forte, pois supõe que o grupo subor-dinado enfrenta o ônus integral do pior dos doismundos. Estudo empírico mais recente apresentaevidências amplas e robustas que colocam em ques-tão a caracterização da “dupla desvantagem” nosEstados Unidos, ao demonstrar que as mulheresde todos os dezoito grupos minoritários estudadossofrem de uma menor penalidade de gênero doque as mulheres brancas, dentro dos respectivosgrupos raciais ou étnicos (Greenmam e Xie, 2008).

As investigações da distância (gap) de gênero(ou raça) de renda devem estimar médias ajustadas,não se limitando apenas a comparar médias obser-vadas, pois esse procedimento adicional revela-seimportante para demonstrar relações intrínsecas eespecificar a natureza dos nexos subjacentes entreas variáveis. Nas análises da distância de gênero derenda no Brasil, que estimam médias ajustadas, pre-dominam trabalhos escritos por economistas naperspectiva da abordagem de “capital humano”(Kassouf, 1998; Matos e Machado, 2006). Este pa-radigma hegemônico na área e com influências naprópria sociologia subestima as bases posicionais erelacionais da desigualdade social, o que não invali-da as contribuições parciais oferecidas e as evidên-cias encontradas, embora algumas delas precisem

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ser qualificadas e mesmo reinterpretadas, em parti-cular quando variáveis posicionais endógenas às di-visões sociais são tratadas como se fossem variá-veis exógenas, a exemplo da aquisição de credenciaiseducacionais (Reskin e Charles, 1999, pp. 389-390;Figueiredo Santos, 2002, pp. 199-216 e 253-262).A contribuição sociológica destaca-se particularmen-te nas investigações sobre a desigualdade racial derecompensas (Valle Silva e Hasenbalg, 1992; Ha-senbalg et al., 1999; Telles, 2003). Entretanto, regrageral esses trabalhos não conceituam nem mode-lam diretamente a possibilidade de efeitos interati-vos entre ambas as variáveis. Um efeito interativoocorre quando a associação entre a variável inde-pendente de interesse (gênero) e a dependente (ren-da) difere em força ou forma nos diferentes níveis,ou categorias, da outra variável (raça) com a qualinterage. Na medida em que raça e gênero intera-gem, excluir um termo de interação do modeloexplicativo produz estimativas inexatas dos efeitosde gênero e raça (Reskin e Charles, 1999, p. 386). Opresente estudo pretende dar uma contribuição dife-renciada em cinco aspectos: a introdução da dimen-são da estrutura subjacente da desigualdade econô-mica de classe na análise das diferenças estimadas; aexploração do entendimento de que raça e gênerorepresentam mecanismos causais distintos, cujasconseqüências para a renda variam em termos danatureza dos nexos causais (diretos ou mediados;tipos de fatores mediadores) e das respectivas in-tensidades, o que tem importantes implicações parao estudo dos efeitos conjuntos; a modelagem ex-plicativa estrita dos efeitos interativos entre raça egênero, com o uso de termos multiplicativos entreambas as variáveis; o uso de uma especificação log-linear de um Modelo Linear Generalizado para es-timar as discrepâncias de médias condicionais; e aformulação de uma interpretação teórica da intera-ção estrutural, ou efeitos interativos, entre as divi-sões de raça e gênero no Brasil.

Os estudos contemporâneos da estratificaçãosocial de cor no Brasil demonstraram que em ter-mos de desigualdades de recompensas materiais ocontraste marcante se faz entre brancos e não bran-cos (pardos e pretos). Foram geradas evidências queapontam a existência de um “ciclo cumulativo dedesvantagens” que afeta a trajetória e os resultados

atingidos pelos não brancos. Esses trabalhos desta-cam o papel das assimetrias nas trajetórias educacio-nais e na distribuição da escolaridade entre os gru-pos raciais nos processos de mobilidade social e deconstituição das discrepâncias de rendimento. Adesigualdade racial no Brasil, quando comparadaaos Estados Unidos, possui como uma de suas ca-racterísticas específicas a pequena presença dos nãobrancos no topo da pirâmide social (Valle Silva eHasenbalg, 1992; Hasenbalg et al., 1999; Telles,2003). Estudo das interseções e interações entre clas-se social e raça no Brasil contribuiu para demons-trar que grande parte da desigualdade racial de ren-da é uma desigualdade de acesso a contextos erecursos valiosos, notadamente alocação à estrutu-ra de classes, posse de credenciais educacionais edistribuição socioespacial (Figueiredo Santos, 2005a).A distinção analítica entre desigualdade de acesso edesigualdade de tratamento, assim como a corretainterpretação do significado de ambas, é uma ques-tão chave para entender a desigualdade racial noBrasil. O elo entre classe social e raça, particular-mente forte no Brasil, decorre da importância dosprocessos de exclusão do controle de recursos queas duas divisões sociais envolvem. Divisões sociaisque se cruzam tão fortemente realçam o papel dosefeitos indiretos e dos processos mediadores. Asconseqüências das divisões de raça, quando ope-ram mediante a colocação dos não brancos emposições inferiores na hierarquia social, testemunhama importância da raça como uma categoria socialque condiciona o acesso desigual aos “bens posicio-nais” valiosos e em relação aos quais se constituemprocessos de discriminação de acesso ou alocação.

A desigualdade de gênero no Brasil, como pro-curei demonstrar em outro artigo conectado aomesmo programa de investigação, estrutura-se comcaracterísticas bem diferenciadas de raça. Gênerocria uma discrepância de renda observada bemmenor do que raça (32% contra 75%), entretantoproduz uma divergência de renda ajustada ou con-trolada muito maior (35% contra 13%), o que indicaque estamos diante de processos geradores de discre-pâncias de renda muito divergentes. Embora existauma desigualdade de gênero de acesso à estruturade classes e à ordem ocupacional, as mulheres têmimportantes vantagens posicionais particularmente

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nos controles de credenciais educacionais, e o efei-to direto de gênero (desigualdade de tratamento)prepondera sobre o efeito indireto (desigualdadede acesso) na explicação das discrepâncias de rendaentre homens e mulheres (Figueiredo Santos, 2008).Os processos de seletividade social, cujos efeitosexcludentes podem ser cumulativos, e que têm im-pactos decisivos no controle de “bens posicionais”,operam de modo muito mais forte entre as divi-sões raciais. Embora a maior parte do efeito deraça seja indireta e a maior parte do efeito de gêne-ro seja direta, isso não quer dizer que raça seja me-nos importante do que gênero. As divisões raciaisgeram conseqüências mais pronunciadas e excluden-tes, assim como têm se relevado mais difíceis deserem erodidas no Brasil.

Trabalhos realizados por economistas interes-sados na temática da discriminação focalizam a com-paração entre grupos combinados de raça e gêne-ro: mulheres brancas, mulheres negras, homensbrancos e homens negros. Mattos e Machado utili-zam cross sections empilhadas para analisar a presençade discriminação por sexo e cor no Brasil. O estu-do usa uma técnica de decomposição e define adiscriminação na ótica tradicional da teoria de capi-tal humano, como o diferencial de rendimento quenão pode ser atribuído às discrepâncias de habili-dades (resumidas pelo diferencial de escolaridade).Ao comparar a desigualdade de renda de cor, noâmbito do mesmo sexo, o estudo constata que, alémdo diferencial associado à discriminação, uma partesignificativa, em especial para os homens, deve-se àdeficiência na dotação do atributo de qualificação.Já na comparação da desigualdade entre homens emulheres da mesma cor, o trabalho constata umaredução do diferencial de sexo de rendimentos en-tre 1987 e 2001, sendo que o que ainda se mantémda desigualdade se deve somente a fatores associa-dos à discriminação. A investigação conclui que “adesigualdade de rendimento do trabalho no Brasilé ainda uma questão de sexo e, sobretudo, de cor”(Matos e Machado, 2006, p. 23). Outro estudo sobreo perfil de discriminação no mercado de trabalhocompara os grupos com atributos desvantajososcom os homens brancos, tomados como o grupopadrão, que estabelece a norma no mercado de tra-balho. Diversas técnicas são usadas para analisar o

diferencial de rendimento devido à discriminaçãosofrida pelos indivíduos por não serem homensbrancos. Constata-se que os homens negros sofremmais discriminação na formação e na inserção ocu-pacional, enquanto as mulheres brancas sofrem maisdiscriminação na definição salarial, quando ambosos grupos são comparados aos homens brancos.O perfil de discriminação das mulheres negras seria“intermediário” entre os homens negros (baseadana formação e inserção) e as mulheres brancas (ba-seada na definição salarial) (Soares, 2000). Caccia-mali e Hirata analisam a discriminação no mercadode trabalho para homens e mulheres, segundo ogrupo racial, em dois estados brasileiros com com-posição racial distinta: Bahia e São Paulo. A investi-gação compara a probabilidade de obtenção derenda, usado um modelo probit, com o controle deidade e escolaridade, em três categorias que estru-turam o mercado de trabalho: dirigentes e gerentes,empregados com carteira de trabalho e emprega-dos sem carteira. Além disso, o trabalho focaliza ogrupo diferenciado de trabalhadores pobres, en-tendidos como aqueles que estão no primeiro quin-til da distribuição da renda média familiar per capita.Contata-se que a discriminação de gênero predo-mina na categoria de dirigentes e gerentes; no en-tanto, as probabilidades de obtenção de renda dehomens e mulheres não brancos, independentemen-te do nível de escolaridade, são inferiores àquelasdos brancos. No grupo de empregado com regis-tro prevalece a discriminação de gênero, enquantono de empregado sem registro destaca-se a discri-minação racial. Entre os pobres, existe discrimina-ção de gênero, porém a discriminação racial nãoapresenta significância estatística (Cacciamali e Hi-rata, 2005).

Examinar gênero e raça simultaneamente podeoferecer um quadro relevante das situações especí-ficas dos vários subgrupos formados das combi-nações dessas categorias (Leffler e Xu, 1997, p. 73).Entretanto, ao se fazer isso, perdem-se as demarca-ções entre as divisões de raça e de gênero, que re-presentam mecanismos causais distintos e cujas con-seqüências para a renda se fazem sentir através decaracterísticas e elos explicativos diferenciados. Amulher negra no Brasil, por ser mulher e negra, ten-de a estar em maior desvantagem, mesmo que não

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exista uma “soma simples” das duas desvantagens.Entretanto, ao se realizar a superposição de raça egênero, como conseqüência torna-se difícil precisara contribuição independente de cada “componen-te” responsável por esta grande desvantagem, dasco-variáveis associadas a cada um, assim como dosfatores que permitem entender os efeitos conjun-tos, o que pode ser especialmente problemáticodiante da existência de processos claramente diver-gentes entre as duas divisões sociais. Em face dasdivergências constatadas entre gênero e raça na des-vantagem de renda bruta e de renda ajustada, quetêm relação com a predominância dos efeitos indi-retos na desigualdade racial e dos efeitos diretos nadesigualdade de gênero, seria melhor trilhar umpercurso analítico que distingue e especifica os efei-tos aditivos, diretos e indiretos, e os interativos, quesão efeitos sobre efeitos, em vez de tomar comoponto de partida a fusão das duas categorias.

Estudos sociológicos mais recentes que abor-dam os efeitos conjuntos de gênero e de raça naprodução de desigualdade de recompensas reali-zam comparações relevantes e reveladoras, porémnão chegam a modelar diretamente, com o uso determos multiplicativos, os efeitos interativos queespecificam as condições segundo as quais os efei-tos de uma variável de interesse se altera em forçaou forma a depender do nível ou categoria da ou-tra variável com a qual interage. Uma investigaçãosobre a relação entre o desenvolvimento regionaldesigual, confrontando os estados de São Paulo eBahia, e a desigualdade salarial de raça e gênerono Brasil, mostrou que em 1991 a maior distânciade gênero se encontrava entre os brancos. Ao usarum modelo tradicional de decomposição da dis-tância de renda, em que a discriminação representao “resíduo” não explicado pelas dotações de capi-tal humano, o estudo chega à conclusão já precon-figurada pelo modelo adotado de que a mulherbranca seria o “grupo que sofre a maior discrimi-nação salarial” (Lovell, 2000, p. 291). Estudo maisrecente focaliza explicitamente a articulação e a tema-tização cruzada dos determinantes de gênero e denatureza étnico-racial. A decomposição do diferen-cial de salários revela que as mulheres brancas so-frem mais da discriminação gerada no interior domercado de trabalho. Os homens negros são mais

penalizados pela desigualdade de acesso às creden-ciais educacionais. Entre as posições mais elevadasno mercado de trabalho, no entanto, prevalece tam-bém para os homens negros o componente de dis-criminação. Já entre as mulheres negras um calei-doscópio de fatores de acesso e de discriminaçãodireta explicam a distância salarial em relação aoshomens brancos. O grau de discriminação é cres-cente conforme se caminha para o topo da hierar-quia de renda e isso prevalece para todos os grupossubordinados (Bidernam e Guimarães, 2004).

Persiste ainda um conhecimento empírico limi-tado das discrepâncias de recompensas que emer-gem das interações entre gênero e raça. Como senão bastasse esta limitação, o tratamento das intera-ções entre raça e gênero tem se realizado muitasvezes de modo passivo, como se as evidências deefeitos interativos representassem basicamente nuan-ças empíricas. Não tem sido feita uma tentativa dederivar significado teórico para os padrões interati-vos encontrados. Entretanto, os efeitos interativosentre raça e gênero possuem informação de interesseteórico que deve ser abordada de modo direto eativo (Greenmam e Xie, 2008, p. 1219). O presenteestudo insere-se em um programa de investigaçãoabrangente das principais divisões sociais no país,notadamente classe, raça e gênero, com uma unida-de ou convergência de orientações teóricas, instru-mentos de mensuração, base de dados e estratégiasde análise. Os resultados obtidos pela investigaçãoprévia das características específicas das divisõescategóricas de raça e gênero contribuem para clari-ficar os termos de comparação entre as categorias,esclarecem as divergências de processos e conse-qüências, assim como oferecem uma oportunidadeespecial para abordar os efeitos interativos entreambas as divisões sociais.

Pretende-se colocar à prova a proposição deque a desigualdade de gênero no Brasil não seriahomogênea entre os grupos raciais. Uma especifi-cação adequada dos processos causais nos estudosda desigualdade de gênero envolve a incorporaçãodas interações entre raça e gênero, de modo que odesenho da investigação permita que o efeito degênero possa diferir entre os grupos raciais, evitan-do-se a suposição de que a desigualdade de gêneroseria equivalente entre brancos e não brancos (Reskin

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e Charles, 1999, pp. 385-386). As explicações dadesigualdade entre homens e mulheres não podemser generalizadas automaticamente para brancos enão brancos. Foi escolhido o recorte racial dicotô-mico entre brancos e não brancos (pardos e pre-tos), pois se encontra aí o divisor preponderante dadesigualdade racial de renda no Brasil (Valle Silva,2000, pp. 18-19; Telles, 2003, p. 192).

Este estudo adota uma abordagem sociológi-ca que privilegia os determinantes relacionais, cate-góricos e estruturais na geração de desigualdadesde recompensas. Não se adota aqui a solução tradi-cional de estimar resíduos da análise de regressão,após o controle dos fatores de capital humano,como medidas do conceito de discriminação. Essaprática revela limitações em particular quando sepretende comparar duas dimensões distintas dadesigualdade, como são raça e gênero, cada qualcom os seus próprios determinantes estruturais. Essetipo de abordagem tradicional, ao constatar que asdiferenças de gênero de rendimentos, ajustadas porcapital humano, são maiores que aquelas de raça,estimula a conclusão artificial de que a discrimina-ção de gênero suplantaria a discriminação racial. Talconclusão representa basicamente um resultadoconstruído pelos próprios termos em que a ques-tão é posta. A lógica subjacente a essa abordagemalimenta a prática teórica e empiricamente poucoconsistente de tratar variáveis endógenas como sefossem exógenas. As variáveis estipuladas suposta-mente como exógenas às divisões sociais podemresponder estatisticamente por uma parte substan-cial das diferenças de rendimentos do trabalho, emparticular no caso de raça. Os indicadores de capi-tal humano e social, no entanto, devem ser tratadostanto como resultados como causas da desigualda-de racial e de gênero. Eles estão inextricavelmenteassociados ao papel que raça e gênero tem tido econtinuam a ter como princípios fundamentais deorganização da vida social (Marini, 1989, pp. 361-362; Reskin e Charles, 1999, pp. 389-393).

No tratamento das interações entre gênero eraça, com a construção de termos multiplicativos,manteremos o foco na desigualdade de gênero, ten-do em vista o argumento teórico que será desen-volvido. Sem desconhecer a natureza simétrica dosefeitos interativos, pretende-se estimar a variação

racial do “efeito de gênero”. Essa abordagem pos-sui a virtude de mensurar a magnitude e a significân-cia estatística do efeito condicional, ou seja, o mon-tante da distância de gênero de renda em cada gruporacial. Entretanto, possui a limitação de não realizaruma comparação direta entre, por exemplo, o ho-mem branco e a mulher não branca, ou entre quais-quer dois grupos que difiram um do outro tantoem raça como em gênero (Greenmam e Xie, 2008,p. 1218). Por outro lado, ao se considerar os gru-pos que contrastam em ambas as dimensões, con-fundem-se os mecanismos e os resultados caracte-rísticos de cada divisão social e perde-se a distinçãoda desigualdade de gênero, que foi o “ângulo” es-colhido para olhar as interações entre gênero e raça.

Este estudo pretende abordar igualmente, comoum passo preliminar, a desigualdade de alocação ouacesso à estrutura de classes dos grupos combinadosde gênero e raça. A estrutura social marca um pa-drão de desigualdade entre as posições de classe.Parte importante das discrepâncias entre estes gruposcombinados pode ser mediada pelo acesso aos con-textos de classe que são desigualmente recompensa-dos. O contexto subjacente da estrutura da desigual-dade econômica de classe ajuda a situar e entenderos componentes de alocação subjacentes às discre-pâncias de gênero de renda entre os grupos raciais.

Distribuição dos grupos e acesso à estruturade classes

A Tabela 1 retrata os padrões de distribuição eacesso desproporcional de homens e mulheres, di-ferenciados por grupo racial, à estrutura de posi-ções de classe no Brasil. A distribuição percentualde gênero entre as categorias de classe permite desdejá identificar uma relação, ou associação, entre asduas variáveis e mostrar o quanto gênero condicionao acesso à ordem de classe. Entretanto, a compara-ção entre os grupos será realizada recorrendo ànoção de chances (odds) e ao cálculo das razões entrechances (odds ratio) ou chances relativas. Uma chancerepresenta a razão entre a freqüência de estar emuma categoria e a freqüência de não estar nesta cate-goria. Isto equivale a comparar duas probabilidadesformando a razão entre as probabilidades. O resul-

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tado pode ser interpretado como a chance de umindivíduo selecionado ao acaso na população serencontrado na categoria de interesse em vez de emoutra categoria. Na análise de dados categóricos, o“efeito” de uma variável na outra é mais bem ex-presso em termos de chances relativas, que corres-ponde à razão entre duas chances. A chance de umacategoria pode ser comparada com qualquer outra.Comparam-se nesta tabela apenas as discrepânciasde gênero de chances em cada universo racial dis-tinto. Esta medida que permite comparar as chan-ces, ou mensurar as chances relativas, possui umainterpretação simples. Quando as chances das duascategorias comparadas são iguais, o razão resultaráno valor 1 (um), o que equivale à inexistência deassociação estatística. Valores menores que 1 (um)implicam em uma associação negativa, e maioresque 1 (um), em uma associação positiva. Quantomais o valor se distanciar de 1 (um) maior será aassociação (Reynolds, 1982; Rudas, 1998). Na Ta-bela 1 o homem (branco ou não branco) forma onumerador das razões entre chances.

No universo do grupo branco, os homens pos-suem uma vantagem de gênero de acesso a todasas posições que implicam em controle de ativos decapital e de terra. Esta vantagem cresce conformeaumenta a dimensão do capital controlado. Na áreaagrícola, onde predominam relações de gênero maistradicionais, a chance masculina de ser o titular deuma pequena atividade agrícola é multiplicada por4,45 em comparação à feminina.

Entre as localizações privilegiadas de classemédia existe no grupo branco uma forte desvanta-gem masculina no acesso à condição de empregadoespecialista, um quase equilíbrio à posição de espe-cialista autônomo e uma pequena vantagem à posi-ção de autoridade exercida pelo gerente. Ao olharo conjunto da configuração de classe média no uni-verso branco, os homens ostentam uma desvanta-gem de acesso, devido ao peso relativo ou densida-de maior do emprego de especialista – o que podeser visto comparando as percentagens nas colunas– e ao fato de as chances relativas da mulher serempronunciadamente maiores nesta categoria.

Tabela 1Distribuição Percentual dos Grupos Combinados de Gênero e de Raça entre as Categorias de Classe e Discre-

pâncias de Gênero nas Chances Relativas de Acesso à Categoria, conforme o Grupo Racial – Brasil, 2005

Categorias de classe

CapitalistaPequeno empregadorAutônomo com ativosAutônomo agrícolaEspecialista autônomoGerenteEmpregado especialistaEmpregado qualificadoSupervisorTrabalhador típicoTrabalhador elementarAutônomo precárioEmpregado domésticoTotal

Homembranco

1,246,409,426,901,663,954,266,762,54

37,2610,328,470,78

100,00

Mulherbranca

0,593,365,471,111,643,596,80

11,591,09

35,274,23

10,1615,1

100,00

Chancesrelativas de

gênero

2,111,971,794,451,021,100,620,552,371,092,610,820,04

Homemnão branco

0,203,147,569,590,401,701,394,212,26

35,4721,2611,631,18

100,00

Chancesrelativas de

gênero

2,502,141,874,391,111,140,550,473,541,313,120,820,03

Mulhernão branca

0,081,494,192,360,361,502,518,620,65

29,637,97

13,8926,74

100,00

Fonte: IBGE, 2006 (tabulações especiais, ver Quadro 1 do Anexo). Dados para os casos com renda positiva.

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Entre as posições ambíguas de classe de em-pregados qualificados e supervisores, as associaçõesse fazem em direções opostas. As chances de acessoaumentam significativamente entre os supervisorese regridem fortemente entre os empregados quali-ficados. O quadro registrado na última categoriareflete o avanço educacional das mulheres e o fortecontingente de professoras de primeiro grau pre-sentes nesta posição.

Ao voltar o olhar para a base da estrutura declasses, constata-se que os homens brancos têmchances relativas maiores, embora não muito maio-res, de estarem no grande agregado de trabalhado-res típicos. Entre as posições de classe destituídas,logo abaixo na Tabela 1, a chances masculinas su-plantam bastante as chances femininas de seremencontradas entre as ocupações mais braçais tantoagrícolas como não agrícolas que compõem os tra-balhadores elementares. Por outro lado, os homenspossuem uma vantagem de gênero de estarem ne-gativamente associados às posições de autônomosprecários e empregados domésticos, que obtêmmenores recompensas.

Não serão comentadas aqui as discrepâncias dealocação entre os grupos raciais, que podem serfacilmente constatadas comparando as colunas depercentagens, pois isso foi objeto de outro estudo(Figueiredo Santos, 2005a). Tendo em vista o focodo presente estudo nas variações raciais da desi-gualdade de gênero, a Tabela 1 serve para mensu-rar o componente de desigualdade de gênero deacesso às posições de classe desigualmente recom-pensadas que podem estar subjacentes às discrepân-cias de gênero de renda e às possíveis divergênciasneste hiato de renda quando são confrontados osgrupos raciais.

Quando são comparados o universo branco eo universo não branco percebem-se semelhanças edivergências nos padrões de interseções ou cruza-mentos entre classe e gênero. Os homens não bran-cos possuem maiores vantagens relativas no acessoa ativos de capital, e estas vantagens crescem igual-mente conforme aumenta a dimensão do capitalcontrolado.

Entre os não brancos o exercício de autorida-de representa uma prerrogativa de acesso masculi-na mais forte, em particular na posição de primeira

linha de supervisão. Já na dimensão de controle deativos de qualificação, exceto entre os especialistasautônomos, ser homem no universo não brancoimplica em associação fortemente negativa com asposições que incorporam qualificação e perícia en-tre os empregados.

Entre a classe trabalhadora assalariada vincula-da às formas coletivas de trabalho, que exerce umtrabalho típico ou elementar, os homens não bran-cos possuem fortes vantagens de gênero de acessoquando confrontados às mulheres do mesmo gru-po racial. Já entre as posições de classe destituídasque são autônomas ou estão inseridas no âmbitodomiciliar, as chances relativas de gênero mostram-se bastantes semelhantes em ambos os universosraciais. A distribuição racial entre estas posições, cabeobservar, é extremamente divergente: os não bran-cos estão muito mais concentrados entre os traba-lhadores elementares e os empregados domésticos.Entretanto, a análise realizada aqui focaliza as dis-crepâncias de gênero dentro de cada grupo racial.As razões entre chances cumprem bem este objeti-vo, pois representam medidas de associação quebuscam captar relações inerentes entre as variáveis,ou seja, as relações intrínsecas que independem dasdivergências entre as distribuições marginais dasvariáveis contrastadas.

Distâncias de gênero de renda entreos grupos raciais

A Tabela 2 apresenta dados sobre as diferençasde renda média em reais entre as interseções ou cru-zamentos das categorias sociais de interesse, tendoem vista a necessidade de situar o papel mediadorda estrutura de classes no entendimento da varia-ção racial das discrepâncias de gênero de renda. Aúltima linha dessa tabela, onde está o total, revelaque a vantagem masculina de renda, não ajustadapor outras variáveis, é maior entre os brancos(46,14%) do que entre os não brancos (38,55%).Além disso, observa-se que na verdade existem di-ferentes patamares de vantagem masculina, a de-pender do contexto de classe, o que testemunha opapel não apenas mediador, mas também modera-dor da estrutura de classes. O papel mediador decor-

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A INTERAÇÃO ESTRUTURAL... 45

re do acesso diferenciado às posições que são de-sigualmente recompensadas. O papel moderadorde classe mostra-se através do fato de que a distân-cia de gênero de renda se acentua ou se atenua adepender do contexto de classe, conforme demons-trado em outro artigo (Figueiredo Santos, 2008).Caberia então observar se o distanciamento damédia geral, ou seja, a sua variação entre os contex-tos de classe, seria semelhante ou não entre os gru-pos raciais, particularmente entre as categorias declasse que possuem uma densidade maior na estru-

tura de classes e por isso possuem um peso maiorna formação da média do grupo racial. O resulta-do não mostra um contraste marcante. Entre osbrancos e não brancos iguais números de contex-tos de classe (seis) e quase os mesmos contextos,exceto um, puxam a média da discrepância de gê-nero de renda para cima. Os dados sinalizam, en-tão, uma importância maior da desigualdade degênero de acesso à ordem de classe como um fa-tor a ser considerado no entendimento das varia-ções raciais da discrepância de gênero de renda.

Vantagemmasculina

54,6823,6166,3188,3443,8748,8647,2343,3710,1827,806,62

73,0938,3246,14

Homemnão branco

4.349,611.400,37

703,93271,90

2.327,661.588,152.101,80

966,77931,20572,78314,34427,80334,52582,94

Método de análise e modelo estatístico

Passa-se agora à especificação do método deanálise dos dados e das características do modeloestatístico usado para estimar a distância (gap) derenda ajustada. O confronto simples de rendasmédias, ainda que relevante, pois mostra a distânciabruta de renda entre as categorias, não permite de-monstrar sem ambigüidades o “efeito de gênero”,uma vez que a renda está associada também a ou-

tras variáveis, que cabe controlar, para ver a varia-bilidade da renda que decorre do fator de interes-se. Além disso, a aplicação de um modelo estatísti-co incorpora à análise as múltiplas variáveis queatuam no interior do nexo original constatado. Esseprocesso de elaboração da relação original permi-te abordar e trazer à superfície a estrutura subja-cente dos dados. A análise da variação da desigual-dade de gênero de renda no Brasil, entre os gruposraciais, será realizada estimando-se a distância de

Tabela 2Renda Média Mensal em Real do Trabalho Principal e Vantagem do Homem, conforme os Cruzamentos entre

Categorias de Classe, Gênero e Grupo Racial – Brasil, 2005

Categorias de classe

CapitalistaPequeno empregadorAutônomo com ativosAutônomo agrícolaEspecialista autônomoGerenteEmpregado especialistaEmpregado qualificadoSupervisorTrabalhador típicoTrabalhador elementarAutônomo precárioEmpregado domésticoTotal

Homembranco

5.684,482.241,811.198,54

520,473.667,542.646,622.948,971.300,271.169,46

707,48374,27602,28393,67

1.128,13

Mulherbranca

3.675,031.813,54

720,67276,35

2.549,221.777,942.002,98

906,941.061,37

553,57351,03347,95284,60771,95

Vantagemmasculina

60,836,08

39,68108,0026,7232,4941,0643,6619,0632,822,24

84,5332,4638,55

Mulhernão branca

2.704,481.320,12

503,94130,72

1.836,911.198,651.391,38

672,98782,11431,24307,46231,83252,54420,73

Fonte: IBGE, 2006 (tabulações especiais, ver Quadro 1 do Anexo). Dados para os casos com renda positiva.

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gênero em sucessivos Modelos Lineares Generali-zados, que incluem outros fatores com impacto im-portante na renda e que podem estar associados àsdivisões de gênero e de raça. O uso destes “experi-mentos estatísticos” permite conhecer os principaisfatores que conformam, especificam e medeiam adesigualdade de gênero, assim como estabelecer osefeitos diretos, não mediados, das divisões de gê-nero entre os grupos raciais.

A presente investigação beneficia-se de umanova proposição metodológica formulada peloprofessor Trond Petersen, da Universidade da Ca-lifórnia-Berkeley, para a estimativa da média condi-cional de uma variável dependente intervalar, comoa renda. Essa solução retém a vantagem interpreta-tiva de estimar diferenças relativas de rendimentosmédios, porém sem os problemas associados à es-pecificação semilogarítmica de um modelo de re-gressão padrão. Uma especificação loglinear de umModelo Linear Generalizado produz interpretaçõesde diferenças relativas, em termos de médias arit-méticas, em vez de médias geométricas, ao contrá-rio do que ocorre com a especificação semilogarít-mica do modelo de regressão OLS, após o cálculodo exponencial do coeficiente estimado, visando àsua reconversão para a métrica original da variáveldependente intervalar (Petersen, 2006; Goodman2006). O Modelo Linear Generalizado têm trêscomponentes: um aleatório, um sistemático e umde ligação. O primeiro refere-se à variável depen-dente e à distribuição de probabilidade que está asso-ciada a ela. O componente sistemático diz respeitoàs variáveis independentes e como elas se combi-nam com a finalidade de construir um modelo ex-plicativo. O de ligação especifica como a média davariável dependente está relacionada com o cha-mado preditor linear (o modelo explicativo). A mé-dia pode ser modelada diretamente ou alguma fun-ção monotônica da média pode ser então modelada(Agresti, 2007, pp. 66-67; Jaccard, 2001, pp. 3-4).4O presente estudo utilizará o Modelo Linear Gene-ralizado com uma função de ligação logarítmica euma distribuição Gamma. Na especificação logli-near deste Modelo a transformação logarítmica éinternalizada dentro do próprio modelo. A funçãode ligação exponencializa o preditor linear em vezde fazer a transformação logarítmica da variável

dependente. Já a distribuição Gamma é apropriadapara lidar com variáveis dependentes positivas comcoeficiente de variação constante – propriedade quecompartilha com a distribuição log-normal –, maso modelo é robusto mesmo na presença de gran-des desvios deste critério. Modelar observaçõescom uma distribuição Gamma e uma função deligação logarítmica é uma alternativa melhor do queusar a regressão padrão com a transformação lo-garítmica da variável dependente, pois o modelonão requer nenhuma transformação externa, retémas observações originais e é mais fácil de interpre-tar. “De fato”, explicam Hardin e Hilbe, “porque oformato dos dois parâmetros da distribuição gam-ma é flexível e pode ser parametrizado para ajustarmuitos formatos de resposta, ele seria preferível aomodelo Gaussiano para muitas situações de dadoscom respostas estritamente positivas” (Hardin eHilbe, 2007, p. 90; Halekoh, 2007). Todos os Mo-delos formam estimados, usando o programa es-tatístico Stata, versão 9.2 (Stata, 2005).

A medida apropriada da distância de rendaentre categorias contrastadas depende do propósi-to da análise. A distância de renda estimada aquireflete diversas formas de discriminação, não ape-nas aquelas que ocorrem no âmbito da inserção nomundo do trabalho, mas também as conseqüênciasdecorrentes de escolhas e trajetórias empreendidassob a influência de constrangimentos vividos ouantecipados (Gunderson, 1989, pp. 48-49). Os coe-ficientes da especificação loglinear, ao forneceremdiferenças relativas entre as categorias, ajustam-sebem à lógica teórica do estudo da desigualdade.Esta especificação, além disso, ajuda a corrigir a forteassimetria positiva da distribuição e contribui parareduzir a influência na estimativa dos valores extre-mos dissonantes do conjunto.

Na especificação da equação de rendimentospara estimar a distância de gênero, o tratamento dashoras trabalhadas joga um papel bastante impor-tante. Segue-se aqui a especificação proposta peloinovador trabalho metodológico de Morgan e Ar-thur, que evita a subestimação do gap de gênero derenda. Recomenda-se o uso do log do rendimentocomo variável dependente e do log do tempo tra-balhado como variável independente de controle,com o retorno para o equivalente em log das horas

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A INTERAÇÃO ESTRUTURAL... 47

trabalhadas variando de modo seccional (piecewise),em uma função spline, através do espectro de horastrabalhadas (Morgan e Arthur, 2005, pp. 398-401).O equivalente da primeira recomendação em umModelo Linear Generalizado seria a escolha da fun-ção de ligação logarítmica.

A comparação entre grupos envolvendo ocontrole de múltiplas variáveis, visando a estudarefeitos interativos ou condicionais, às vezes é feitapor meio do cálculo de equações de regressão paracada grupo em separado. Entretanto, essa práticaanalítica usualmente não resulta num teste estatísticode diferenças nos coeficientes estimados entre osdois grupos, quando este teste é necessário caso sequeira falar de diferenças entre os grupos. A análi-se conduzida com a construção de termos intera-tivos, aplicada aqui, realiza esta avaliação estatísticadas diferenças entre grupos (Jaccard e Turrisi, 2003,p. 36). No modelo interativo, a variável indepen-dente X possui um efeito condicional, que dependedo valor da variável Z, com a qual interage. Esti-ma-se o efeito de X em Y, dado Z=0 (zero).Quando são construídos termos interativos entrevariáveis binárias, como gênero e raça, o efeito con-dicional ao valor 0 (zero) refere-se naturalmente àcategoria de referência (omitida) da outra variávelque compõe o termo interativo (Brambor, Clark eGolder, 2006, pp. 73-74). A análise das variaçõesda distância de gênero entre os grupos raciais utili-zará a estratégia de “recodificação das variáveis bi-nárias”, em que são realizados sucessivos recálculosda equação de regressão e produzidas as estatísticasrelevantes após a especificação de cada categoriade referência de interesse (Jaccard e Turrisi, 2003,pp. 55-60).

A pesquisa empírica utiliza a base de microda-dos da PNAD de 2005 (IBGE, 2006). A amostrautilizada neste estudo é composta de 165.147 ca-sos, que possuem informações válidas para todasas variáveis. Devido à escolha da especificação lo-glinear de um Modelo Linear Generalizado, a aná-lise foi restrita aos casos com renda positiva. Utili-za-se apenas a renda do trabalho principal, pormotivo de ajuste, já que a classificação socioeconô-mica usada para mensurar o conceito de classe so-cial foi construída com base no trabalho principalda pessoa.

Variações da distância de gênero entre osgrupos raciais

A Tabela 3 apresenta os resultados dos modelosestimados já convertidos em diferenças percentuaisa favor do homem5 . O modelo 1, composto apenasdas variáveis do termo interativo, mostra que avantagem de gênero dos homens não é homogê-nea entre os grupos raciais. A distância de gêneroentre os brancos suplanta a registrada entre os nãobrancos. Este padrão revelador de uma maior pe-nalidade de gênero para as mulheres brancas serámantido em todos os modelos, com variações deintensidade.

O modelo 2 controla as diferenças de horastrabalhadas entre homens e mulheres recorrendo auma solução que evita a subestimação da distânciade gênero, conforme foi demonstrado em outroartigo (Figueiredo Santos, 2008). A desigualdadeexistente de horas trabalhadas entre homens e mu-lheres, ainda assim, faz com que a distância de gê-nero seja reduzida em ambos os grupos raciais.Entretanto, a distância se reduz mais entre os nãobrancos, mostrando que neste grupo existe umamaior divergência de gênero no efeito das horastrabalhadas, conforme captado pela spline linear, oque gera um aumento da discrepância de gêneroentre os dois universos raciais.

O modelo 3 introduz o controle das credenciaiseducacionais. Controlam-se neste modelo os efei-tos da desigualdade de educação entre os grupos edos diferenciais de renda por nível educacional. Naespecificação do modelo de regressão sem termosinterativos entre a credencial educacional e o fatoratribuído raça ou gênero, os diferenciais de rendapor nível educacional seriam equivalentes entre osgrupos. Isso significa que o efeito produzido na dis-tância de renda decorre, dados os diferenciais exis-tentes de renda por nível educacional, da desigual-dade de educação encontrada entre as categorias.Esse procedimento produz e revela um incremen-to muito significativo da desigualdade de tratamen-to de gênero nos grupos raciais. O aumento abso-luto ainda mais forte da distância entre os brancosfaz com que a discrepância racial na desigualdadede gênero atinja aí o seu ponto mais alto. Como adistância de renda já está em um patamar muito

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elevado entre os brancos, o controle estatístico dascredenciais educacionais – o controle de um fatorque faz emergir o efeito direto da desigualdade detratamento de gênero – incrementa a variação absolu-ta da distância de gênero entre os grupos raciais,embora o seu aumento relativo, em comparação aopercentual registrado no modelo anterior, mostreuma divergência muito pequena entre os gruposraciais.6

O controle das discrepâncias de tempo de tra-balho e tempo no trabalho atual, realizado no mo-delo 4, em que as mulheres brancas e não brancaspossuem desvantagens, reduz a diferença entre asduas distâncias, mas essa defasagem ainda se man-tém em um patamar alto. De uma maneira muitosimplificada pode-se dizer que o controle da varia-bilidade devido a uma desvantagem diminui a dis-tância de renda entre o grupo em desvantagem(mulher) e o privilegiado (homem), revelando-se,desse modo, o peso da contribuição deste compo-nente da distância de gênero de renda. Nesse senti-do as discrepâncias de gênero em relação a estes

fatores parecem ser maiores entre os brancos, poisocorre aí a maior retração tanto absoluta como re-lativa da distância de gênero.

Os controles das circunstâncias de localizaçãogeográfica, moradia urbana e de condição de migra-ção, realizados no modelo 5, aumentam as distânciasde gênero em ambos os grupos raciais, porém esseprocesso ocorre com mais força no grupo não branco,o que precipita uma redução da sua variação racial.Esse resultado mostra que a distribuição regional eurbana dá uma pequena vantagem relativa à mulherno grupo não branco, quando confrontada ao ho-mem não branco, pois o seu controle estatístico fazcom que aumente mais a distância de gênero nestegrupo racial.

A partir do modelo 6 são introduzidas variáveissocioeconômicas relacionadas com a divisão socialdo trabalho e que são de natureza tipicamente es-truturais. O modelo 6 faz com que volte a crescer adivergência na distância de gênero. A desigualdadede gênero de acesso aos setores econômicos, nosquais existem diferentes padrões de renda média,

Notas: Modelo Linear Generalizado, usando a distribuição Gamma e a função de ligação log.*Spline linear do equivalente em log dos intervalos de horas de trabalho (ver Quadro 2 do Anexo).O impacto percentual dos coeficientes foi calculado conforme: 100 [exp (Coef.) – 1].Todos os coeficientes originais são estatisticamente significativos no nível de 0,001 ou mais.Fonte: Tabelas 1-A e 2-A do Anexo Estatístico.

Tabela 3Distância (gap) de Renda do Trabalho Principal a favor do Homem, em relação à Mulher,

no Grupo Branco e Não Branco e Diferença entre Ambos, Estimada por meio de Modelo LinearGeneralizado – Brasil, 2005

Modelo

1 (gênero, raça e termo interativo)2 (+ horas de trabalho: spline linear)*3 (+ educação)4 (+ tempo de trabalho e tempo no trabalho atual)5 (+ região, residência urbana e migrante)6 (+ setor público e seis grandes setores econômicos)7 (+ categorias de classe)8 (+ composição de gênero das ocupações)

Distânciaentre brancos

(%)

45,9937,7358,5847,8350,4548,9838,5030,63

Distânciaentre não

brancos (%)

38,4428,6644,3637,5842,2439,7231,9423,82

Diferença(B – NB)

(%)

7,559,07

14,2210,258,219,266,566,80

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A INTERAÇÃO ESTRUTURAL... 49

revela-se maior entre os não brancos, pois o con-trole deste componente mediador da desigualdadegera uma redução maior da distância de gênero derenda neste grupo racial, o que produz o incremen-to da sua discrepância entre os grupos raciais.

A introdução das categorias de classe, no mo-delo 7, reduz a discrepância entre as distâncias degênero ao seu nível mais baixo. Isso significa que oacesso assimétrico às posições de classe, que sãodesigualmente recompensadas, joga um papel cha-ve na explicação da divergência existente. Cabe pri-meiro descortinar o tipo de distância de renda quepassou a ser estimada neste modelo. Controla-seagora a distribuição diferenciada de homens e mu-lheres entre as posições de classe, dentro de cadauniverso racial, e as discrepâncias de remuneraçãoentre as posições de classe. A desigualdade de aces-so à ordem de classe entre homens e mulheres pa-rece ser maior no universo branco, pois o controledas interseções entre classe e gênero em cada gruporacial aproxima mais as distâncias de gênero de rendaentre brancos e não brancos, devido ao fato de adistância de gênero cair mais no grupo branco, tan-to no nível absoluto como relativo. O forte com-ponente de acesso desigual a recursos valiosos, queestá associado à opressão racial, responde possivel-mente por uma menor diferenciação de classe en-tre mulheres e homens não brancos.

Por fim, o modelo 8 incorpora um indicadorde segregação ocupacional de gênero, que é a pro-porção de mulheres em cada um dos 519 gruposocupacionais da PNAD. O controle da segrega-ção ocupacional de gênero existente no interior dascategorias de classe social – a alocação entre as po-sições de classe já foi controlada estatisticamente nomodelo anterior – tem um grande impacto na dis-tância de gênero, porém aumenta apenas ligeiramentea sua divergência entre os grupos raciais. Note-seentão que a divergência entre os grupos raciais estámais associada aos grandes agregados da estruturade classes, já que o componente interno de segrega-ção ocupacional, apesar da sua importância comofator mediador da desigualdade de gênero nos doisgrupos raciais, responde apenas por uma tênue des-vantagem relativa da mulher não branca, indicadapelo fato da vantagem masculina diminuir mais nogrupo não branco.

Método alternativo: o efeito contidono termo interativo

Uma metodologia alternativa para analisar eapresentar os efeitos interativos entre gênero e raçanos rendimentos foi proposta e utilizada por EmilyGreenmam e Yu Xie (2008). Após fazer uma revi-são crítica da tese da “dupla desvantagem” na lite-ratura norte-americana, assim como das estratégiasdesenvolvidas para estudar os efeitos conjuntos deraça e gênero, o trabalho oferece um modelo de in-vestigação empírica, usando o que seria, na formu-lação das autoras, uma conceituação nova e menosrestritiva dos seus efeitos. Nesta abordagem, o co-eficiente de interesse principal na equação deregressão é aquele formado pelo termo de intera-ção entre as variáveis raça e gênero. Para entenderadequadamente o significado do valor captado pelotermo interativo, cabe atentar para o fato de estenão representar estritamente a magnitude de umefeito, como são os coeficientes das variáveis que ocompõem, mas expressar essencialmente como umefeito muda, ou seja, ele corresponde a um efeito sobreum efeito (Kam e Franzese, 2007). O estudo desen-volvido aqui tem relação estreita com esta metodo-logia, diferindo mais na forma de apresentação dosdados, pois a variação racial do coeficiente de gê-nero entre os grupos raciais decorre justamente damagnitude e do sinal (positivo ou negativo) do ter-mo interativo, que estima como o efeito de raçamuda o efeito de gênero ou, simetricamente, comoo efeito de gênero muda o efeito de raça.7

No modelo interativo construído aqui para apli-car este método alternativo, raça é incluída como va-riável binária que assume o valor 1 para o branco.Gênero é incluído como uma variável binária querecebe o valor 1 para o homem. Gerou-se, então,um termo interativo ou multiplicativo entre a variá-vel raça e gênero. O coeficiente do termo interativorepresenta a extensão em que ser membro do gruporacial branco tem um efeito diferente para o homemem comparação à mulher ou, alternativamente, a ex-tensão em que ser homem tem um efeito diferentepara membros do grupo branco em relação aosmembros do grupo não branco. O exponencial ouantilog do coeficiente do termo interativo, na codifi-cação adotada aqui, pode ser pensado como a taxa

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de rendimento observado/predito ou esperado dohomem branco, em que o rendimento predito é ba-seado na suposição de efeitos apenas aditivos (ausênciade interação) entre as variáveis raça e gênero. O Mode-lo Linear Generalizado usado neste estudo expo-nencializa o preditor linear. As pesquisadoras norte-americanas usam um modelo de regressão padrãocom a transformação logarítmica dos rendimentos.Um valor positivo do coeficiente corresponde aoexponencial maior que 1, enquanto o valor negativocorresponde a um valor menor que 1 (Greenam eXie, 2008). O exponencial do coeficiente no valorde 1 equivale à ausência de interação entre as variáveis,ou seja, o coeficiente de raça não afeta o de gênero evice-versa. Esta forma de apresentação tem o méritode realçar o significado do termo de interação, de

um modo matemático simples e claro, como umadiscrepância positiva ou negativa em relação ao va-lor 1 (um) neutro, que traduz ausência de interação.

A Tabela 4 apresenta o exponencial do coefi-ciente estimado do termo interativo, que dá a taxade rendimento observado em relação ao preditopara o homem branco. Os valores do exponencialdo coeficiente, nos diversos modelos estatísticos,indicam que os rendimentos médios do homembranco variam de 5,0% (modelo 7) a 9,9% (mo-delo 3) a mais do que seria predito sob a suposiçãode relações apenas aditivas entre as variáveis raça egênero. A discrepância entre o rendimento obser-vado e predito do homem branco mostra que estese beneficia de um ganho adicional de gênero emcomparação ao homem não branco.

Greenmam e Xie (2008) constataram a existên-cia na sociedade norte-americana de uma maior pe-nalidade de gênero para a mulher branca, quandocomparada a todos os outros grupos raciais e étni-cos. Na interpretação deste resultado, recorreramao enfoque de especialização de papéis, baseado na

economia neoclássica, cujo modelo teórico vinculaa desigualdade no trabalho à desigualdade de gêne-ro na família. As autoras encontraram alguma evi-dência que sugere que nas famílias brancas existiriauma maior especialização de papel do que nas fa-mílias de outros grupos raciais. Isso significa que a

Tabela 4Taxa de Rendimento Observado/Predito do Homem Branco, em relação à Suposição de Efeitos apenas

Aditivos entre Raça e Gênero (=1,00) – Brasil, 2005.

Modelo

1 (gênero, raça e termo interativo)2 (+ horas de trabalho: spline linear)**3 (+ educação)4 (+ tempo de trabalho e tempo no trabalho atual)5 (+ região, residência urbana e migrante)6 (+ setor público e seis grandes setores econômicos)7 (+ categorias de classe)8 (+ composição de gênero das ocupações)

Taxa de rendimento observado/predito(homem branco)*

1,05451,07051,09861,07451,05771,06631,04971,0550

Notas: Modelo Linear Generalizado, usando a distribuição Gamma e a função de ligação log. Todos os coeficientes originaissão estatisticamente significativos ao nível de 0,001 ou mais.*Exponencial do coeficiente do termo interativo entre raça e gênero.**Spline linear do equivalente em log dos intervalos de horas de trabalhoFonte: Tabela 2-A do Anexo Estatístico.

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A INTERAÇÃO ESTRUTURAL... 51

mulher branca nos Estados Unidos, na ótica destaabordagem de especialização de papéis, possuiriauma maior penalidade de gênero na sua renda indi-vidual, pois o contexto familiar particularmente doscasais brancos com filhos, diferente daquele da mu-lher não branca, indicaria uma “racionalidade eco-nômica” derivada desta vantagem de grupo, asso-ciada à especialização de papéis entre homens emulheres, dentro da divisão de trabalho e do com-partilhamento de renda familiar, ainda que a mu-lher tenha nesta especialização uma função indivi-dual subalternizada no mercado de trabalho. Aconvergência metodológica entre os dois estudos,no entanto, não impede a existência de uma impor-tante divergência teórica na interpretação dos resul-tados obtidos, apesar de as evidências apresentadaspor ambos os artigos contradizerem os pressupos-tos aditivos inerentes à proposição da dupla des-vantagem. O presente artigo, ao se debruçar sobreos dados brasileiros, inscreve-se em uma orienta-ção sociológica situada dentro da tradição marxistaem ciências sociais e adota uma linha de interpreta-ção distinta.

Significado teórico da interaçãoentre gênero e raça

A noção de limitação estrutural ajuda a clarifi-car o aparente paradoxo subjacente à menor pena-lidade de gênero sofrida por um grupo racialmenteprivilegiado, que ocorre como conseqüência dosprocessos de interação entre os determinantes so-ciais. Erik Olin Wright introduziu a noção de “modode determinação” com a finalidade de enfatizar apluralidade de causas dentro da teoria marxista. Alimitação estrutural seria, então, um modo de de-terminação em que uma estrutura ou processo es-tabelece limites de variação em outra estrutura ouprocesso (Wright, 1980 e 1981). A interpretação dosresultados encontrados destaca a forma assumidapelo processo de interação estrutural entre as hie-rarquias sociais e as características da desigualdaderacial no Brasil. Em primeiro lugar, deve-se enten-der que a hipótese da “dupla desvantagem” refleteuma visão “estanque” da estruturação da desigual-dade, pois pressupõe que a desigualdade em uma

hierarquia não gera conseqüências para a desigual-dade na outra hierarquia. A pessoa em posição su-bordinada nas duas hierarquias sofreria, então, oefeito integral somado de ambas as desigualdades.A relação não aditiva ou interativa supõe a possibi-lidade de uma hierarquia social condicionar o efeitoda outra hierarquia: interação equivale justamente aum efeito sobre outro efeito. A forma deste condi-cionamento pode ser pensada como um constran-gimento da assimetria passível de ser produzida pelaoutra hierarquia. Em segundo lugar, no Brasil existeuma disparidade racial de renda muito elevada,como pode ser constatado na distância racial bruta.Da mesma forma, homens e mulheres não bran-cos sofrem de um elevadíssimo componente dedesigualdade de acesso a contextos e recursos valio-sos, que caracteriza a desigualdade de raça no Bra-sil. Esta opressão racial tão acentuada seria capazde tolher, em certa medida, a variação que pode serproduzida por outros atributos, como gênero, nointerior do grupo não branco, subordinado na di-mensão racial. Processo semelhante foi constatadono estudo das interações entre classe e raça no Bra-sil, que demonstrou a existência de uma menor de-sigualdade de classe entre os não brancos, em rela-ção aos brancos. A interação estrutural entre classee raça assume um sentido especialmente restritivoquando a exploração de classe comum limita a de-sigualdade racial dentro da classe trabalhadora e, demodo especial, no seu segmento mais destituído(Figueiredo Santos, 2005a). Quando são controla-das as diferenças de recursos e contextos valiosos,que estão no cerne da desigualdade racial brasileira,a variação racial entre as distâncias de gênero derenda recua para um patamar menor. A explicação,no Brasil, da maior vantagem de gênero do ho-mem branco, equivalente à menor vantagem dohomem não branco, se radicaria nas característicasda desigualdade racial. O peso da opressão racialcomum de mulheres e homens não brancos deixa-ria um espaço menor para a realização da assime-tria causal associada ao atributo de gênero. A hie-rarquia racial estabeleceria certo limite de variação àhierarquia de gênero. Parte principal do efeito deraça na discrepância de gênero é mediada pela aloca-ção desigual dos grupos raciais na estrutura de classes.A variação racial da distância de gênero de renda,

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como foi demonstrada, atinge o seu menor mon-tante (6,56%) quando ocorre o controle estatísticodas categorias de classe social. A estrutura subjacen-te da desigualdade econômica de classe revela-seum importante fator mediador na constituição dospadrões que emergem das interações entre raça egênero.

Em um quadro geral de alta vantagem de gê-nero a favor dos homens, a menor penalidade degênero sofrida pelas mulheres não brancas, porconta de uma certa compressão social introduzidapela opressão racial, não deve obscurecer o fato deestas mulheres experimentarem uma forte desigual-dade de acesso aos contextos de classe desigual-mente recompensados. A dimensão de perícia equalificação permitiu avanços de classe para a mu-lher no seu mundo racial de não brancos. Entretan-to, a vantagem obtida pelas mulheres não brancas,em relação aos homens da mesma cor, no acessoàs posições privilegiadas de classe média, mostra-secontraditada por uma forte distribuição relativa entreas posições mais destituídas, que possuem uma den-sidade social muito maior. Entre as mulheres nãobrancas, deve-se lembrar, a divisão racial permaneceainda como uma barreira bem mais difícil de sertransposta do que a desigualdade de gênero. Naverdade, todos os não brancos (homens e mulheres)estão em clara desvantagem na ordem de classe.

Notas

Tal programa explora os efeitos das divisões de classe,raça e gênero, assim como de suas interseções e intera-ções, na produção da desigualdade. Utiliza-se comoinstrumento analítico uma classificação socioeconô-mica para o Brasil que aperfeiçoa a tipologia utilizadano livro Estrutura de posições de classe no Brasil (Figueire-do Santos, 2002). Os fundamentos teóricos das suascategorias empíricas foram formulados em outro arti-go (Figueiredo Santos, 2005b).Considerando o percurso já trilhado e o interesse atualpelas relações condicionais entre essas categorias, nãoserá repetido aqui o posicionamento teórico dessasnoções sociológicas. A recapitulação de manifestaçõesempíricas de desigualdade organizadas no Brasil emtorno dessas categorias ocorrerá apenas quando hou-ver necessidade.

Não se assume neste trabalho a tese de que gêneroseria inerentemente constituído por raça. Exploram-seaqui os efeitos da interação entre essas categorias.A transformação logarítmica, de amplo uso, faz parteda família de transformações monotônicas que pre-serva a ordem subjacente da variável transformada.Embora o interesse principal deste estudo esteja naestimativa dos coeficientes parciais que captam os efei-tos interativos, a Tabela 1-A do Anexo Estatísticofornece a estatística BIC, usada para comparação demodelos. O modelo com melhor ajuste é aquele queregistra o menor valor. Como esta estatística freqüen-temente possui um valor negativo, o modelo com omaior valor negativo seria preferível (Hardin e Hilbe,2007, pp. 56-58).Na mudança do modelo 2 para o modelo 3, ocorreentre os brancos um maior aumento absoluto da dis-crepância percentual, de 20,85%, contra 15,70% entreos não brancos, o que explica a ampliação da divergên-cia racial. Entretanto, o aumento relativo da distânciade renda, em relação ao patamar anterior, difere muitopouco entre os grupos raciais. Entre os não brancos adistância é multiplicada por 1,548, ao passar de 28,66%para 44,36%; já a distância entre os brancos é multipli-cada por 1,553, ao passar de 37,73% para 54,58%. Avantagem feminina no controle de credenciais educa-cionais, dentro do respectivo grupo racial, é maior entre osnão brancos quando computada em termos de mé-dias de anos completos de estudo. A mulher não bran-ca possui em média 7,565 contra 5,999 anos de escola-ridade do homem, o que dá uma vantagem de 1,566anos; já a mulher branca têm em média 9,538, contra8,154 anos do homem, o que gera uma vantagem de1,414 (dados para as pessoas com posição de classe erenda positiva).O trabalho de Greenmam e Xie apresenta uma ins-trutiva representação e demonstração matemática dadivergência entre os efeitos aditivos e interativos. Asautoras modelam os efeitos interativos pela introdu-ção de termos interativos na equação de regressão. Aconvergência entre as abordagens fica clara, por exem-plo, quando elas sintetizam a metodologia para exa-minar a relação entre a determinação dos rendimen-tos de raça e de gênero: “Para cada grupo racial ouétnico k, nós computamos a quantidade d, que repre-senta a diferença entre a distância de renda de gêneroda minoria e dos brancos” (Greenam e Xie, 2008, p.1225).

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Anexos

Quadro 1Classificação Socioeconômica para o Brasil: Categorias Empíricas e Critérios Operacionais

Categorias

Capitalista e fazendeiro

Pequeno empregador

Autônomo com ativos

Critérios operacionais

Posição na ocupação de empregador; empregador não agrícola com 11 ou mais empregados;empregador agrícola com 11 ou mais empregados permanentes; empregador agrícola queemprega simultaneamente 6 ou mais empregados permanentes e 11 ou mais empregadostemporários; empregador agrícola com 1.000 hectares ou mais de terra, independentementedo número de empregados.

Posição na ocupação de empregador; empregador não agrícola que ocupa de 1 a 10 emprega-dos; empregador agrícola que ocupa de 1 a 10 empregados permanentes, desde que nãoempregue simultaneamente de 6 a 10 empregados permanentes e 11 ou mais empregadostemporários.

Posição na ocupação de conta-própria com atividade de natureza não agrícola, cujo em-preendimento ou titular possui uma ou mais das seguintes condições: estabelecimento(loja, oficina, fábrica, escritório, banca de jornal ou quiosque), veículo automotor (taxi, ca-minhão, van etc.) usado para trabalhar ou ocupação qualificada no emprego principal.

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Categorias

Autônomo agrícola

Especialista autônomo

Gerente

Empregado especialista

Empregado qualificado

Supervisor

Trabalhador típico

Trabalhador elementar

Autônomo precário

Empregado doméstico

Critérios operacionais

Posição na ocupação de conta-própria com atividade em empreendimento do ramo quecompreende a agricultura, silvicultura, pecuária, extração vegetal, pesca e piscicultura.

Posição na ocupação de conta-própria ou empregador; especialista de acordo com o grupoocupacional, com até 5 empregados ou sem empregados, com ou sem estabelecimento (loja,oficina, fábrica, escritório).

Posição na ocupação de empregado, gerente de acordo com o grupo ocupacional, abarcandoos diretores de empresas, dirigentes da administração pública, administradores em organiza-ções de interesse público (sem fins lucrativos etc.) e gerentes de produção, operações e deáreas de apoio.

Posição na ocupação de empregado, especialista de acordo com o grupo ocupacional, incluin-do as profissões credenciadas, as profissões de menor poder profissional e os professores doensino médio e profissional com formação superior.

Posição na ocupação de empregado, empregado qualificado de acordo com o grupo ocupa-cional, abarcando os técnicos de nível médio nas diversas áreas, professores no ensino infan-til e fundamental, professores de nível médio no ensino profissional, professores em edu-cação física e educação especial.

Posição na ocupação de empregado, supervisor, chefe, mestre ou contramestrede acordo com o grupo ocupacional.

Posição na ocupação de empregado, trabalhador em reparação e manutençãomecânica, ferramenteiro e operador de centro de usinagem; trabalhador de semi-rotina na operação de instalações químicas, petroquímicas e de geração e distri-buição de energia; trabalhador de semi-rotina em serviços administrativos, co-mércio e vendas; trabalhador de rotina na operação de máquinas e montagem naindústria; trabalhador de rotina em serviços administrativos, comércio e vendas.

Posição na ocupação de empregado, trabalhador com tarefas de trabalho bas-tante elementares na indústria e nos serviços, como ajudantes de obras, trabalha-dores elementares na manutenção de vias públicas, faxineiros, lixeiros e carrega-dores de carga; trabalhadores manuais agrícolas, garimpeiros e salineiros, exclusiveos trabalhadores na mecanização agrícola, florestal e drenagem.

Posição na ocupação de conta-própria e empreendimento ou titular sem a possede nenhuma das seguintes condições: estabelecimento (loja, oficina, fábrica, escri-tório, banca de jornal ou quiosque), veiculo automotor (taxi, caminhão, van, etc)usado para o trabalho ou ocupação qualificada no emprego principal.

Posição na ocupação de trabalhador doméstico, com ou sem carteira de trabalhoassinada.

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REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 24 No 7056

Quadro 2Relação e Descrição das Variáveis Utilizadas no Estudo

Variáveis

Renda

Raça

Raça* gênero

Gênero

Horas de trabalho

Educação

Anos de trabalho

Anos de trabalho2

Anos no trabalho atua

Anos no trabalho atual3

Região

Residência

Migração

Descrição

Variável dependente intervalar. Rendimento mensal do trabalho principal; considera-se ren-dimento mensal do trabalho a remuneração bruta mensal para empregados e trabalhadoresdomésticos e a retirada mensal para conta própria e empregadores; no caso de renda variável,valor médio mensal (média condicional estimativa com o uso de uma função de ligaçãologarítmica).

Variáveis binárias. Não-branco (pardo e preto) como categoria designada, código 1;branco como categoria de referência, código 0 (recodificação da variável para efeito de estima-ção).

Variáveis binárias. Termos multiplicativos (interativos) entre as variáveis binárias de raça e degênero.

Variável binária. Masculino como categoria designada, código 1; feminino como categoria dereferência, código 0.

Spline linear do equivalente em log das faixas de horas de trabalho semanal estipuladas: 1 a 29horas, 30 a 39 horas, 40 a 49 horas e 50 horas ou mais de trabalho.

Variáveis Binárias. De 8 a 10 anos escolaridade completa, 11 a 14 anos, 15 anos ou mais,como categorias designadas, código 1; menos de oito anos, como categoria de referência,código 0.

Variável intervalar, idade menos a idade em que começou a trabalhar.

Variável intervalar, quadrado dos anos de trabalho.

Variável intervalar, número de anos no trabalho principal atual, com valores a partir de 0(menos de 1 ano).

Variável contínua, quadrado dos anos no trabalho principal atual.

Variáveis binárias. Regiões Sudeste, Sul, Centro-Oeste como categorias designadas, código 1;Nordeste como categoria de referência, código 0.

Variável binária. Residência urbana como categoria designada, código 1; residência rural comocategoria de referência, código 0.

Variável binária. Pessoa nascida em outro município que não o município de residência,como categoria designada, código 1; pessoa nascida no município de residência, como cate-goria de referência, código 0.

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A INTERAÇÃO ESTRUTURAL... 57

Variáveis

Setor público/privado

Setores econômicos

Classe

Composição de gênero dasocupações

Descrição

Variável binária. Setor público federal, estadual ou municipal, abrangendo, além daadministração direta, as suas fundações, autarquias e empresas públicas e de economiamista, como categoria designada, código 1; setor privado como categoria de referência,código 0.

Variáveis binárias. Indústria de transformação, indústria extrativa, serviços produtivos, ser-viços de distribuição e serviços sociais como categorias designadas, código 1; serviços pesso-ais como categoria de referência, código 0.

Variáveis binárias. Capitalista, pequeno empregador, auto-empregado especialista, au-tônomo com ativos, autônomo agrícola, empregado especialista, gerente, empregadoqualificado, supervisor, trabalhador, autônomo precário, empregado doméstico, comocategorias designadas, código 1; trabalhador elementar como categoria de referência, có-digo 0.

Variável intervalar. Proporção de mulheres nos grupos ocupacionais, estimada ao nível docódigo ocupacional de quatro dígitos da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) – Do-miciliar.

Anexo estatístico

Tabela 1-AModelos Lineares Generalizados Sucessivamente Abrangentes e os Coeficientes Estimados (Variável “Mascu-

lino” Estima a Vantagem de Renda do Homem Branco)

Modelo 2

5,248531(0,0399687)

0,3201629(0,0108237)

-0,5840133(0,0120818)

-0,681164(0,0155498)

0,3584113(0,0130076)

1,226938(0,0434348)

Modelo 7

3,448256(0,02512)

0,3256627(0,0059236)

-0,0949376(0,0065364)

-0,0484684(0,0080944)

0,2789534(0,0070954)

0,9235307(0,0236776)

Variáveis

(Constante)

Masculino

Não branco

Masculino*não branco

Lghs1a 29

Lghs30a 39

Modelo 1

6,651979(0,081851)

0,3783923(0,010714)

-06089287(0,0121463)

-0,053115(0,01564)

Modelo 3

4,586146(0,0316376)

0,4611216(0,0083757)

-0,2666641(0,0094006)

-0,940038(0,0119492)

0,3029849(0,0102611)

1,115506(0,033873)

Modelo 4

4,019993(0,0287026)

0,3908807(0,0073801)

-0,2347689(0,008242)

-0,0718759(0,0104712)

0,2800173(0,0091029)

1,13522(0,0298655)

Modelo 5

3,447754(0,0294978)

0,4084319(0,007305)

-0,1657172(0,0083664

-0,0560688(0,0103553

0,2885807(0,0090535)

0,9506609(0,0296674

Modelo 6

3,475021(0,0305)

0,3986873(0,0075898)

-0,1559473(0,0084693)

-0,0642068(0,010486)

0,2756825(0,0092011)

0,9373989(0,0302363)

Modelo 8

3,589045(0,0258834)

0,2671944(0,0064765)

-0,0939382(0,0065187)

-0,0535507(0,0080793)

0,2805371(0,007077)

0,9051451(0,0236352)

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REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 24 No 7058

Variáveis

Lghs 40 a 49

Lghs 50 mais

Edu 8 a 10

Edu 11a 14

Edu 15

Anos detrabalho

Anos detrabalho²

Anos no atualemprego

Anos no atualemprego²

Norte

Centro-Oeste

Sul

Sudeste

Residênciaurbana

Migrante

Setor público

Indústriaextrativa

Indústria detransformação

Modelo 1 Modelo 3

0,1314242(0,041585)

0,8660062(0,038326)

0,2662266(0,0083669)

0,7189483(0,0070888)

1,734368(0,0111648)

Modelo 4

0,2166261(0,0366624)

0,6400849(0,0334895)

0,3845195(0,0075241)

0,8165396(0,0064956)

1,724387(0,0099635)

0,031848(0,0006105)

-0,0004042(0,0000109)

0,0307715(0,0007269)

-0,0005226(0,0000191)

Modelo 5

0,2464361(0,0362038)

0,6470467(0,0332366)

0,3243878(0,0075215)

0,7620926(0,0065701)

1,65557(0,0099874)

0,0288534(0,0006065)

-0,0003811(0,0000107)

0,0317581(0,0007163)

-0,0004688(0,0000188)

0,3179177(0,0107651)

0,4333422(0,0106651)

0,3627153(0,0086766)

0,3805723(0,0066823)

0,2861654(0,0077118

0,1084317(0,0052626)

Modelo 6

0,3606677(0,037092)

0,6480801(0,0336854)

0,2908467(0,0076503)

0,6940263(0,0069373)

1,564196(0,010759)

0,0282887(0,000612)

-0,0003684(0,0000108)

0,0305262(0,0007295)

-0,0004247(0,000019)

0,3135879(0,010853)

0,4362985(0,0107517)

0,3670941(0,0087759)

0,3846862(0,0067876)

0,1948708(0,0089023)

0,1098252(0,0053107)

0,0723894(0,0117723)

-0,0605635(0,0114744)

0,1224891(0,0089692)

Modelo 8

0,2319894(0,0285377)

0,3246168(0,0258847)

0,2038998(0,0059552)

0,4789453(0,0057123)

1,016037(0,0098897)

0,0258964(0,0004723)

-0,0003761(0,0000083)

0,0243713(0,0005713)

-0,000346(0,0000149)

0,3068224(0,0083386)

0,4217045(0,0082565)

0,3834234(0,0067565)

0,4024554(0,0052319)

0,1454956(0,0069676)

0,0940008(0,0040811)

0,1367151(0,0092758)

0,2319894(0,0124537)

0,0183383(0,008868)

Modelo 2

-0,9358351(0,052835)

0,9331086(0,0502138)

Modelo 7

0,2412049(0,0285867)

0,3287646(0,0259205)

0,2000492(0,005965)

0,467339(0,0056982)

0,9987002(0,0098912)

0,0263513(0,0004728)

-0,0003843(0,0000083)

0,0245379(0,000572)

-0,0003486(0,0000149)

0,3075794(0,0083577)

0,4223956(0,0082755)

0,3852664(0,0067716)

0,4034758(0,0052436)

0,1469646(0,0069862)

0,0942554(0,00409)

0,1439959(0,0093008)

0,0239481(0,0122029)

0,065991(0,0086318)

03 rbcs 70 José alcides figueiredo santos.p65 8/18/2009, 2:24 PM58

A INTERAÇÃO ESTRUTURAL... 59

Variáveis

Serviçosprodutivos

Serviços dedistribuição

ServiçosSociais

Capitalista

Pequenoempregador

Autônomocom ativos

Autônomoagrícola

Especialistaautônomo

Gerente

Especialista

Qualificado

Supervisor

Trabalhador

Autônomoprecário

Empregodoméstico

Composiçãode gêneroocupações

Estatística BIC

Modelo 1

-1818192

Modelo 3

-1871691

Modelo 4

-1883522

Modelo 5

-1889802

Modelo 6

0,2676099(0,0117264)

0,193485(0,0087717)

0,1732808(0,0123076)

-1891103

Modelo 8

0,1246819(0,01051)

0,0506135(0,0085418)

0,0436482(0,0110085)

1,789099(0,027032)

1,136625(0,0124673)

0,5408964(0,0109648)

-0,0144826(0,0117033)

1,119436(0,0223123)

0,9519983(0,0143842)

0,9419349(0,0143927)

0,5232658(0,0108696)

0,5242498(0,0163258)

0,2742707(0,0080215)

0,0806644(0,0099046)

0,1035388(0,0128106)

-0,2155389(0,00978)

-1904856

Modelo 2

-1871691

Modelo 7

0,1584681(0,0104164)

0,0887609(0,008383)

0,04623(0,011031)

1,789378(0,0270939)

1,136073(0,0124932)

0,5334673(0,010979)

-0,0140359(0,0117339)

1,115491(0,0223685)

0,9464578(0,0144185)

0,9418829(0,0144317)

0,5058554(0,0108486)

0,5342563(0,0163557)

0,262271(0,0080076)

0,0646534(0,0098813)

0,0364307(0,012463)

-1904567

Nota: Coeficientes estimados com erros padrões (entre parênteses). Estatística Z.Fonte (dados originais): IBGE, Microdados da PNAD de 2005.

03 rbcs 70 José alcides figueiredo santos.p65 8/18/2009, 2:24 PM59

REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 24 No 7060

Tabela 2-ACoeficientes Estimados da Vantagem de Renda do Homem entre os Não Brancos, de acordo com Diferentes

Modelos Lineares Generalizados

Modelos

Modelo 1

Modelo 2

Modelo 3

Modelo 4

Modelo 5

Modelo 6

Modelo 7

Modelo 8

Distância entre não brancos

0,3252773(0,0113938)

0,2520464(0,0115437)

0,3671178(0,0089071)

0,3190047(0,0078142)

0,3523632(0,0077518)

0,3344804(0,0082679)

0,3344804(0,0082679)

0,2136437(0,0071171)

Termo interativo

0,053115(0,01564)

0,0681164(0,0155498)

0,0940038(0,0119492)

0,0718759(0,0104712)

0,0560688(0,0103553)

0,0642068(0,0104866)

0,0484684(0,0080944)

0,0535507(0,0080793)

Notas: Coeficientes estimados com erros padrões (entre parênteses). Estatística Z. Como foi feita apenas a recodificação davariável binária raça, para efeito de estimativa da distância (gap) de rendimentos entre os não brancos, não são apresentadosos demais coeficientes.Fonte (dados originais): IBGE, Microdados da PNAD de 2005.

03 rbcs 70 José alcides figueiredo santos.p65 8/18/2009, 2:24 PM60

RESUMOS / ABSTRACTS / RESUMÉS 181

A INTERAÇÃO ESTRUTURALENTRE A DESIGUALDADE DERAÇA E DE GÊNERO NOBRASIL

José Alcides Figueiredo Santos

Palavras-chave: Divisões sociais; Desi-gualdade de gênero e raça; Interseçõesentre classe, raça e gênero; Rendimentos.

Este trabalho é orientado pela noção te-órica de que as divisões sociais geramefeitos derivados da sua interação estru-tural. Tendo em mente esta motivaçãoteórica, o autor estima a distância de gê-nero de renda entre os grupos branco enão branco (pretos e pardos) no Brasil.Todos os oito Modelos Lineares Genera-lizados estimados, cujas variáveis são su-cessivamente incluídas, mostram que adistância de gênero é grande em ambosos grupos raciais, porém é ainda maiorentre os brancos. A investigação explorao papel do contexto subjacente da desi-gualdade de classe, assim como de outrosfatores, no entendimento da variaçãoracial da desigualdade de gênero. Consi-dera-se que as características da desigual-dade racial no Brasil, assim como asinterseções entre classe e raça, explicamesta maior vantagem de gênero do ho-mem branco. A hierarquia racial estabe-lece certo limite de variação sobre a hie-rarquia de gênero no grupo não branco.

STRUCTURAL INTERACTIONBETWEEN GENDER AND RACEINEQUALITY IN BRAZIL

José Alcides Figueiredo Santos

Keywords: Social divisions; Genderinequality; Racial inequality; Intersectionsbetween class, race and gender; Ernings.

This paper is guided by the theoreticalnotion that social divisions generate ef-fects derived from its structural interac-tion. Having in mind this theoreticalmotivation, it estimates the gender earn-ings gap among white e non white (blackand mixed color) groups in Brazil. Allthe eight Generalized Linear Models es-timated, whose variables are successivelyincluded, show that the gender gap is bigacross both racial groups but it is biggeramong whites. The investigation exploresthe role of the underlying context ofclass inequality, as well as others factors,on understanding the racial variation ofthe gender inequality. The study consid-ers that the characteristics of the racialinequality in Brazil, as well as the inter-section between class and race, explainthe bigger gender advantage for the whiteman. The racial hierarchy establishes limitsof variation on the gender hierarchy forthe non white.

L’INTERACTIONSTRUCTURELLE ENTREL’INÉGALITÉ DE RACE ET DEGENRE AU BRÉSIL

José Alcides Figueiredo Santos

Mots-clés: Divisions sociales; Inégalitéde genre et de race; Intersections entreclasse, race et genre; Revenus.

Ce travail est guidé par la notion théori-que suivant laquelle les divisions socialesgèrent des effets dérivés de leur interac-tion structurelle. Ayant cette motivationthéorique en vue, l’auteur estime la dis-tance de genre de revenu entre les grou-pes blanc et non-blanc (noirs et métis)au Brésil. Tous les huit Modèles Linéai-res Généralisés estimés, dont les varia-bles sont succéssivement inclues, démon-trent que la distance de genre est grandedans les deux groupes raciaux, mais l’estdavantage entre les blancs. La rechercheexplore le rôle du contexte sous-jacentde l’inégalité de classe, ainsi que les autresfacteurs, suivant la compréhension de lavariation raciale de l’inégalité de genre.Nous considérons que les caractéristiquesde l’inégalité raciale au Brésil, ainsi queles intersections entre classe et race, ex-pliquent cet avantage accru de genre del’homme blanc. La hierarchie raciale éta-blit une certaine limite de variation surla hiérarchie de genre dans le groupe non-blanc.

012 rbcs 70 resumos abstracts résumés.p65 8/18/2009, 2:28 PM181