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ORIENTAES DIDTICAS PARA EJA

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PREFEITURA DO MUNICPIO DE SO PAULO SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAO DIRETORIA DE ORIENTAO TCNICA

CADERNO DE ORIENTAES DIDTICAS PARA EJA ALFABETIZAO Etapas Alfabetizao e Bsica

SO PAULO 2010

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DIVISO DE ORIENTAO TCNICA DA EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS Leny Angela Zolli Juliani (Diretora) EQUIPE TCNICA DE EJA Gislaine dos Santos Koenig Leda Maria Silva Nunes Rosa Maria Laquimia de Souza EQUIPE DE APOIO Hebe Moreira de Britto ASSESSORIA ESPECIALIZADA Maria Alice Coelho COLABORADORES Celi Espasandin Lopes Luiz Percival Leme Britto Tereza Cristina Bertoncini Gonalez Joo Luiz Maximo da Silva Paulo Takeo Sano Eduardo Campos Walkyria Monte Mor LEITURA CRTICA Zilma de Moraes Ramos de Oliveira PROJETO GRFICO Ana Rita da Costa Joseane A. Ferreira CAPA Ana Rita da Costa Katia Marinho Hembik EDITORAO Katia Marinho Hembik REVISO Sidoni Chamoun AGRADECIMENTO Aos professores que participaram dos Encontros de Reflexo e Aprofundamento das Orientaes Curriculares para a EJA.Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) So Paulo (SP). Secretaria Municipal de Educao. Diretoria de Orientao Tcnica. Caderno de orientaes didticas para EJA - Alfabetizao: etapas alfabetizao e bsica So Paulo : SME / DOT, 2010. 142p. : il. Bibliografia 1.Educao de Jovens e Adultos 2.Alfabetizao CDD 374

Cdigo da Memria Tcnica: SME-DOT/Sa.019/10

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Caro ProfessorApresentamos a voc o Caderno de Orientaes Didticas para a Educao de Jovens e Adultos, que parte do Programa de Orientao Curricular do Ensino Fundamental, da Secretaria Municipal de Educao. Trata-se de mais um recurso didtico que tem o objetivo de subsidiar o seu trabalho docente e contribuir para o seu desenvolvimento profissional. Considerando esse princpio, as expectativas de aprendizagem definidas nas Orientaes Curriculares foram analisadas, revisadas e ajustadas para oferecer a voc um conjunto de indicaes para o aprimoramento da prtica docente. Elaborado por Professor especialista e coordenado pela Diretoria de Orientao Tcnica, o presente documento tambm fruto de trabalho realizado com um grupo de professores da EJA que, ao longo do processo, participaram de encontros na Secretaria Municipal de Educao, onde puderam discutir, comentar e sugerir formas de apresentao dos tpicos abordados que pudessem contemplar seus anseios. O resultado deste trabalho chega agora s mos de todos os professores da EJA, com a finalidade de fortalecer nosso compromisso de oferecer formao de qualidade para os jovens e os adultos da cidade de So Paulo.

Alexandre Alves SchneiderSecretrio Municipal de Educao

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SUMRIO1.Introduo ............................................................................................... 10 2.EJA Modalidade especfica da educao escolar ............................. 142.1 As funes da EJA .......................................................................................................... 17 2.2 Organizando a EJA como modalidade especfica da educao escolar ........................... 20 2.3 Contedos escolares e aprendizagem na EJA ................................................................. 21

3.Fundamentos da Alfabetizao para EJA ............................................ 263.1 Aprendendo a escrita e a escrever ................................................................................... 26 3.2 A especificidade da alfabetizao de jovens e adultos ..................................................... 35 3.3 Orientaes didticas ..................................................................................................... 39 3.3.1 Atividade de ensino e aprendizagem 1 ........................................................................ 40 3.3.2 Atividade de ensino e aprendizagem 2 ........................................................................ 47 3.4 Estudos Lingusticos ....................................................................................................... 49 3.4.1 Atividade de ensino e aprendizagem 3 ........................................................................ 50 3.5 A leitura ........................................................................................................................... 52 3.5.1 Atividade de ensino e aprendizagem 4 ........................................................................ 53

4.O conhecimento matemtico e a alfabetizao ................................... 604.1 Introduo ....................................................................................................................... 60 4.2 Eixos matemticos ......................................................................................................... 61 4.3 Orientaes didticas ..................................................................................................... 67 4.4 Consideraes finais ....................................................................................................... 69

5.Arte - que bicho esse? ........................................................................ 725.1 O que Arte? .................................................................................................................. 73 5.2 A compreenso do produto artstico ................................................................................ 73 5.3 Arte e sociedade ............................................................................................................ 75 5.4 Um olhar sobre o hoje ..................................................................................................... 76

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6. Histria e Identidade ............................................................................. 806.1 Identidade ....................................................................................................................... 82 6.2 Trabalho .......................................................................................................................... 83 6.3 Orientaes didticas ..................................................................................................... 84

7.O que Cincias? .................................................................................. 88 8.O que espao quando se pensa a relao homem e natureza? ... 968.1 Os fatores econmicos ................................................................................................... 98 8.2 Os fatores polticos ......................................................................................................... 98 8.3 Os fatores culturais ......................................................................................................... 99 8.4 Os fatores naturais ........................................................................................................ 100 8.5 A interao dos fatores .................................................................................................. 100 8.6 A produo do espao ................................................................................................... 100

9.Lngua Estrangeira ............................................................................... 1069.1 Identidade e alteridade: uma compreenso sobre a vivncia social ................................ 106 9.2 Diversidade e pluralidade: uma expanso da vivncia e convivncia social ..................... 108

10.Expectativas de aprendizagem .......................................................... 11210.1 Etapa Alfabetizao ..................................................................................................... 113 10.1.1 Expectativa geral ..................................................................................................... 113 10.1.2 Lngua Portuguesa .................................................................................................. 114 10.1.3 Matemtica ............................................................................................................. 115 10.1.4 Natureza, sociedade e os cuidados de si e do outro ................................................ 116 10.1.5 Artes ....................................................................................................................... 117 10.2 Etapa bsica ............................................................................................................... 118 10.2.1 Expectativa geral ..................................................................................................... 118 10.2.2 Lngua Portuguesa .................................................................................................. 118 10.2.3 Matemtica ............................................................................................................. 120 10.2.4 Natureza, sociedade e os cuidados de si e do outro ................................................ 122 10.2.5 Artes ....................................................................................................................... 123

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11.Fundamentos e princpios da avaliao na EJA .............................. 12611.1 Definio e limites da avaliao ................................................................................... 127 11.2 Finalidades e objetivos da avaliao ............................................................................ 128 11.3 Critrios de avaliao ................................................................................................... 129 11.4 Fundamentos do processo avaliativo ............................................................................ 131 11.5 Imparcialidade e independncia ................................................................................... 133

12.Referncias para o trabalho didtico e formao ............................ 13612.1 Bibliografia bsica ....................................................................................................... 136 12.2 Bibliografia complementar ........................................................................................... 137 12.3 Sites ........................................................................................................................... 140

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1. INTRODUOCeli Espasandin Lopes

A resoluo CNE/CEB N 1, DE 5 DE JULHO DE 2000, estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao de Jovens e Adultos, destacando a importncia de considerar as situaes, os perfis e as faixas etrias dos estudantes. Salienta que a EJA precisa reparar a dvida histrica e social relacionada a uma parte da populao brasileira, que teve negado o direito educao; possibilitar seu reingresso no sistema educacional, oferecendolhe melhoria nos aspectos sociais, econmicos e educacionais; e buscar uma educao permanente, diversificada e universal. De acordo com essas diretrizes, a EJA deve pautar-se pelos princpios de equidade, diferena e proporo, propondo um modelo pedaggico prprio, de modo a assegurar: a distribuio especfica dos componentes curriculares, a fim de propiciar um patamar igualitrio de formao e restabelecer a igualdade de direitos e de oportunidades diante do direito educao; a identificao e o reconhecimento da alteridade, prpria e inseparvel, dos jovens e dos adultos em seu processo formativo, da valorizao do mrito de cada qual e do desenvolvimento de seus conhecimentos e valores; a proporcionalidade, com disposio e alocao adequadas dos componentes curriculares s necessidades prprias da Educao de Jovens e Adultos, com espaos e tempos nos quais as prticas pedaggicas assegurem aos seus estudantes identidade formativa comum aos demais participantes da escolarizao bsica. Considerando essas proposies, a Secretaria Municipal de Educao de So Paulo, no mbito da Diretoria de Orientao Tcnica Diviso de Orientao Tcnica da Educao de Jovens e Adultos (SME/DOT/EJA), est implementando os Cadernos de Orientaes Didticas. O objetivo que subsidiem o processo de discusses e reflexes sobre

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a prtica pedaggica na EJA, considerando o que os estudantes tm o direito de aprender em cada rea do conhecimento e orientando sobre quais prticas docentes podem efetivar essa aprendizagem. Almeja-se construir coletivamente uma proposta curricular que atenda s finalidades e s necessidades da EJA. A finalidade deste documento orientar a organizao curricular da Educao de Jovens e Adultos na Rede Municipal de Ensino, tendo como ponto de partida as Expectativas de Aprendizagem, as quais vm sendo discutidas com os educadores. Desses debates, emerge a necessidade de organizar e aprimorar os projetos pedaggicos da EJA, considerando as particularidades e as contribuies de cada rea do conhecimento para a formao dos estudantes e para o atendimento s potencialidades e dificuldades destes no processo de ensino e aprendizagem. Busca-se oferecer aos educadores da Educao de Jovens e Adultos subsdios tericos e metodolgicos que os auxiliem nos desafios de seu cotidiano, considerando que essa modalidade de ensino visa superar os processos de excluso e marginalizao social daqueles que estiveram distantes de um processo educacional. Ademais, h que considerar, na implantao da proposta e no desenvolvimento dos contedos, os saberes, os valores e a forma de relacionar-se com o conhecimento e com a cultura de cada estudante e do grupo como um todo. Toda aprendizagem se faz necessariamente em funo da leitura de mundo (isto , da forma como se experimenta e se pensa a vida objetiva). A desconsiderao disso, algo que infelizmente frequente, um fator essencial de insucesso. Assim, estes cadernos marcam o incio de uma transformao no processo educacional da EJA na cidade de So Paulo, o que requer o comprometimento dos educadores para que se efetive. Espera-se que este documento seja uma contribuio para o desenvolvimento de uma educao envolvida com os alunos e sua comunidade.

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2. EJA MODALIDADE ESPECFICA DA EDUCAO ESCOLARLuiz Percival Leme Britto

A educao de adultos vem se realizando no Brasil h pelo menos um sculo, com nfase na alfabetizao. Nos anos 90 do sculo passado, introduziu-se o conceito de educao de jovens e adultos, incorporando a reflexo que vinha se fazendo no mbito da educao popular. No mais das vezes, contudo, o debate sobre a EJA (principalmente quando se considera a questo da alfabetizao) no se prende educao escolar propriamente dita. Ainda que a aprendizagem da leitura e da escrita se faa principalmente por meio da escola, a alfabetizao de adultos guarda uma relao relativamente vaga com os procedimentos escolares, e se fez e se faz, mais frequentemente, independentemente, por meio de campanhas pblicas de iniciativa estatal ou de aes educativas de organizaes sociais. Conforme indicam diversos autores, o ncleo intelectual e poltico da Educao de Adultos sustentou-se revelia da escola regular, quando muito constituindo programas paralelos, os quais deviam alcanar o estatuto de correspondncia aos nveis escolares formalmente estabelecidos. Do ponto de vista do contedo e da metodologia de ensino, em funo da crtica aos valores hegemnicos que se afirmavam pela educao escolar, firmou-se a noo de que os conhecimentos adquiridos na vida prtica, independentemente, portanto, da eventual experincia escolar, deviam ser considerados e avaliados como to importantes quanto o saber transmitido pela escola. Estabeleceu-se, ademais, um consenso (se no na prtica, certamente no ncleo terico da EJA) de que os tempos e os ritmos de aprendizagem do adulto so daqueles que se propem para crianas e pberes e que, portanto, tanto os contedos a serem trabalhados, como os tempos e os mtodos de ensino deveriam ter perfis prprios. A educao escolar de jovens e adultos propriamente (EJA) s viria a consolidar-se recentemente, inicialmente nos anos de 1960 com os exames

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de madureza, depois com os supletivos e, finalmente, j nos anos de 1990, em funo da Nova LDB, com a institucionalizao da EJA no mbito das secretarias municipais e estaduais de educao, com a oferta regular dessa modalidade pelas escolas de Ensino Fundamental e Mdio. Alm disso, surgiram vrias iniciativas de grupos que tradicionalmente atuavam com a EJA, de realizar programas especiais que respondessem s demandas e necessidades especficas da populao adulta e jovem de pouca escolaridade. A realidade de uma EJA especificamente escolar fez com que o Conselho Nacional de Educao, considerando as determinaes legais, se visse na obrigao de estabelecer um referencial mais preciso sobre as possibilidades de oferta. Contudo, apesar de muitos avanos polticos e pedaggicos na forma de compreender e oferecer educao escolar de adultos, verifica-se ainda a forte tendncia de reproduzir no mbito da EJA os modelos de educao caractersticos da escola de crianas e pberes, ignorando as especificidades do alunado da EJA e as instrues normativas de organizao dessa modalidade. A expanso e o sucesso da EJA como modalidade escolar, no entanto, impe que, seguindo o que orienta o Conselho Nacional de Educao atravs do parecer 11/ 2000, de autoria do Conselheiro Jamil Cury, considere-se a EJA no como a simples reproduo resumida e aligeirada, mas como modalidade especfica da educao escolar. Tal deciso no faz mais que seguir as instrues maiores. Determina o CEB/CNE, pelo parecer n: 11/2000, que a EJA, de acordo com a Lei 9.394/ 96, passando a ser uma modalidade da educao bsica nas etapas do ensino fundamental e mdio, usufrui de especificidade prpria que, como tal, deveria receber um tratamento consequente. (grifos acrescidos) Isto implica estabelecer processos e tempos de ensino, bem como contedos e mtodos que considerem o perfil do aluno, suas formas de relacionar-se com o conhecimento e de atuar e viver na sociedade. No se trata de negar a referncia fundamental da educao escolar. O parecer desde logo adverte que, sendo a EJA uma modalidade da educao bsica no interior das etapas fundamental e mdia, lgico que deve se

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pautar pelos mesmos princpios postos na LDB. Ademais disso, no que se refere aos componentes curriculares dos seus cursos, ela toma para si as diretrizes curriculares nacionais destas mesmas etapas exaradas pela CEB/ CNE. (grifos acrescidos). O que se deve reconhecer que o carter lgico no significa uma igualdade direta quando pensada luz da dinmica sciocultural das fases da vida e que a faixa etria, respondendo a uma alteridade especfica, se torna uma mediao significativa para a ressignificao das diretrizes comuns assinaladas. (grifos acrescidos). H que destacar que os fundamentos acima assinalados recorrem evidentemente do reconhecimento de que, independentemente de haver diversas formas de aprender e de ascender ao conhecimento na sociedade moderna, caracterizada pela multiplicidade de instncias formativas e informativas, a educao escolar a forma de educao mais organizada e elevada de acesso ao conhecimento e cultura, sendo sua funo precpua a formao geral do cidado; com nfase, por um lado, nas letras, na matemtica, nas cincias e nas artes e, por outro, na formao poltica e profissional. De fato, a educao escolar representa, em relao educao extraescolar, a forma mais desenvolvida e mais avanada de educao, de maneira que, reconhecendo que a partir do mais desenvolvido que se compreende o menos desenvolvido, deve-se assumir que pela escola e por aquilo que nela se pode aprender que se compreende a educao em geral. Por isso, h que reafirmar que a aprendizagem, no mbito da Educao Escolar, implica explicitaes do estgio atual de conhecimento e o esforo sistemtico de sua superao, pelo reconhecimento de valores, dos modos de ser e das vises de mundo predominantes; e que o que se vive e se aprende na escola no pode ser a simples reproduo do que se vive e se aprende fora dela. Nessa perspectiva, a finalidade fundante da Educao Escolar oferecer condies de a pessoa dar conta da complexidade do mundo e de nele intervir, por um lado conhecendo e compreendendo as formas de produo da cultura e do conhecimento (saber terico) e, por outro, relacionando-se com propriedade com as formas de ser contemporneas (saber pragmtico).

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Enfim, como determina o parecer, a EJA deve ser considerada um momento de reflexo sobre o conceito de educao bsica que preside a organizao da educao nacional em suas etapas. As necessidades contemporneas se alargaram, exigindo mais e mais educao, por isso, mais do que o ensino fundamental, as pessoas buscam a educao bsica como um todo.

2.1 As funes da EJAO pa r e c e r C E B / C N E n 11 / 2 0 0 0 n o s e l i m i t a a r e c o n h e c e r a especificidade da EJA como modalidade de educao escolar de nvel fundamental e mdio. O Conselho tambm, reconhecendo que a EJA representa uma dvida social no reparada para com os que no tiveram acesso a e nem domnio da escrita e leitura como bens sociais, na escola ou fora dela, e tenham sido a fora de trabalho empregada na constituio de riquezas e na elevao de obras pblicas, indica suas funes, a saber: reparadora, equalizadora, qualificadora. A funo reparadora parte do reconhecimento no s o direito a uma escola de qualidade, mas tambm da igualdade ontolgica de todo e qualquer ser humano. Nesse sentido, a educao escolar devidamente estruturada a oportunidade objetiva de os jovens e adultos participarem da escola desde uma alternativa vivel em funo das especificidades scioculturais destes segmentos para os quais se espera efetiva atuao das polticas sociais. Por isso, para que a funo reparadora que a EJA necessita ser pensada como um fim de criar situaes pedaggicas e aprendizagem de jovens e adultos. (grifo no se efetive, o parecer considera modelo pedaggico prprio a satisfazer necessidades de original)

A funo equalizadora considera que o indivduo que teve sustada sua formao, qualquer tenha sido a razo, busca restabelecer sua trajetria escolar de modo a readquirir a oportunidade de um ponto igualitrio no jogo conflitual da sociedade. Assumindo a possibilidade de um padro social em que todos disponham das mesmas condies de acesso ao conhecimento, a EJA manifesta-se como uma promessa de efetivar um caminho de desenvolvimento de todas as

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pessoas, de todas as idades, de modo que adolescentes, jovens, adultos e idosos atualizem conhecimentos, mostrem habilidades, troquem experincias e tenham acesso a novas regies do trabalho e da cultura. A funo qualificadora considerada pelo parecer como o prprio sentido da EJA. (grifo no original). Seu fundamento est na assuno definitiva do carter incompleto do ser humano cujo potencial de desenvolvimento e de adequao pode se atualizar em quadros escolares ou no escolares. Nessa perspectiva, a EJA assume, como postulam as reflexes mais atuais sobre ela realizadas em nvel mundial, um carter de educao permanente e criao de uma sociedade educada para o universalismo, a solidariedade, a igualdade e a diversidade. Da o imperativo de reconhecer que os termos jovens e adultos indicam que, em todas as idades e em todas as pocas da vida, possvel se formar, se desenvolver e constituir conhecimentos, habilidades, competncias e valores que transcendam os espaos formais da escolaridade e conduzam realizao de si e ao reconhecimento do outro como sujeito. Ademais, o parecer observa que esta funo deve ser percebida como um apelo para as instituies de ensino e pesquisa no sentido da produo adequada de material didtico que seja permanente enquanto processo, mutvel na variabilidade de contedos e contempornea no uso de e no acesso a meios eletrnicos da comunicao. No h dvida de que, em certa medida, as funes identificadas para a EJA tambm se aplicam educao escolar de crianas e pberes, principalmente as duas ltimas. Afinal, carter incompleto do ser humano e a decorrente necessidade do ampliar as potncias individuais e sociais fundamento essencial da escola e coincide com a assuno feita acima de que cabe a esta instituio a formao geral do cidado, desde a mais tenra idade e que a educao para a vida inteira inicia na infncia. Isso apenas vem reforar a forte aliana entre as diferentes modalidades de ensino. No entanto, as formas como se d o processo de ensino-aprendizagem e como se define a relao que se estabelece entre sujeito e escola so completamente distintas. Se a criana cresce com e na escola, encontrando nela um lugar fundamental de identidade, manifestando-se uma relao direta entre idade e srie escolar.

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J para o jovem e o adulto, no h tal progresso, de modo que o aluno entra em qualquer tempo e no nvel que lhe for mais apropriado (o que tem importantes implicaes para os programas, metodologias e avaliaes). Tampouco h a obrigatoriedade legal de o aluno frequentar a escola, resultando sua adeso do entendimento da importncia da escola. Ademais, tanto os conhecimentos de que dispe como os que lhe so pertinentes so distintos dos das crianas e pberes. Vejam-se dois exemplos bastante esclarecedores. A percepo do lugar e de sua presena nele completamente distinta para uma criana e para um adulto, mesmo que este no tenha escolaridade nenhuma. As perguntas onde estou? Que lugar esse? Como ele se articula com outros lugares? so percebidas e respondidas diferentemente por uma pessoa que est a descobrir-se no mundo e na sociedade e por outra que viveu a experincia de localizar-se. Assim, apresentar a uma criana as dimenses da espacialidade e do territrio no mundo e na histria pressupe um movimento de descoberta de si e da vida e, de alguma forma, j foi realizado pelo adulto. Da porque os contedos e o tratamento dados a ele no que concerne a este objeto devem necessariamente ser distintos. A mesma e radical diferena se percebe quando se consideram conhecimentos do corpo e da sade. O adulto e o jovem adulto vivem sua corporeidade, sua sade e sua sexualidade de forma completamente distinta da criana e tm valores e saberes igualmente diferenciados. Mesmo que muitas vezes recortados por percepes equivocadas ou parciais da sade e da sexualidade, o fato que os adultos dispem de um conhecimento objetivo, de uma experincia e de uma percepo sobre isso, e qualquer programa educativo deve partir dessa realidade. Alis, a intensidade mesma com que se trata do tema deve ser distinta. O adulto deve saber inclusive da sade da criana para poder cuidar dela. Enfim, os alunos de EJA dispem, em nveis variados, de um amplo universo de conhecimentos prticos e concepes relativamente cristalizadas dos diversos aspectos da realidade social e natural. Alm disso, tm compromissos e responsabilidades definidos que os ocupam e os movem, bem como modelos de mundo, estratgias de compreenso de fatos e de avaliao de valores densamente constitudos, de forma que novas incorporaes devem promover compreenses mais amplas.

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2.2 Organizando a EJA como modalidade especfica da educao escolarDo que se apresentou at aqui, pode-se assumir com segurana que, mesmo considerando-a como parte do sistema, deve ter contedos e metodologias prprias. (Parecer CEB n. 11/2000). Nesse sentido, a EJA, enquanto modalidade da Educao Bsica e reconhecendo os sujeitos que participam dela, a concretude de suas vidas e as formas como interagem com o conhecimento, deve criar as condies de superao do lugar em que se encontram, contribuir para que os estudantes da EJA, na problematizao da vida concreta, adquiram conhecimento e procedimentos que contribuam para a superao das formas de saber cotidiano. Isso implica: Considerar as diretrizes nacionais, inclusive no que concerne aos componentes curriculares e seus contedos. Organizar-se segundo suas caractersticas e necessidades. Buscar as mediaes apropriadas. Considerar o conhecimento prvio e a experincia adquiridos dos alunos. Contudo, mesmo reconhecendo que a educao no ocorre no abstrato, independentemente dos modos objetivos e concretos de vida social e coletiva, h que cuidar, contudo, para no banalizar o processo educativo, limitando-o a um pragmatismo que submeteria a EJA apenas s demandas de conhecimento imediato em funo das necessidades da vida cotidiana. necessrio ter sempre presente que a leitura do mundo como cunhou Paulo Freire a expresso do saber adquirido na vida vivida se amplia com a leitura da palavra, medida que a pessoa ou o grupo reconsidera seus olhares, suas e x p e r i n c i a s e s e u s v a l o r e s , e m f u n o d e s u a i n t e r a o c o m novos conhecimentos. Paulo Freire explicitava, sempre, que a educao no ocorre no abstrato, de forma independente dos modos objetivos e concretos de vida social e coletiva. A leitura do mundo e a leitura da palavra, essencial para a expanso

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daquela na sociedade letrada, se ampliam medida que a pessoa ou o grupo reconsidera seus olhares, suas experincias e seus valores em funo de sua interao com novos conhecimentos. A incorporao desta perspectiva de educao contribuiu para a redefinio da atribuio de responsabilidades e significou importantes rearranjos nas propostas pedaggicas, em funo da compreenso dos valores, objetivos e contedos constitutivos da educao escolar. Contudo, a interpretao ingnua da lio de Freire tem contribudo para a supervalorizao de saberes e valores caractersticos do senso comum (entendido como aquilo que prprio dos indivduos e de suas experincias, fruto da experincia imediata com o mundo material), implicando a desvalorizao em alguns casos, a negao do conhecimento formal como elemento essencial de compreenso da realidade. A educao formadora impe o dilogo constante com as referncias culturais dos alunos, que se realizam por sua interao com saberes e valores constitudos historicamente de modo que o reconhecimento da necessidade do dilogo no significa, em absoluto, que a questo pedaggica se concentre na elaborao de um novo mtodo para ensinar contedos tradicionais nem na submisso s formas de divulgao e reproduo do fato miditico.

2.3 Contedos escolares e aprendizagem na EJA j sobejamente reconhecido que os alunos de EJA dispem, em nveis variados, de um amplo universo de conhecimentos prticos e concepes relativamente cristalizadas dos diversos aspectos da realidade social e natural. Ademais, tm compromissos e responsabilidades bem definidos que os ocupam e os movem. Tal assuno, extremamente necessria na concepo e realizao da EJA, no permite supor que a pessoa jovem ou adulta aprenda mais rapidamente que as crianas; aprende, sim, diferentemente, em funo de seu quadro de referncias e formas de se pr e perceber o mundo.

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absolutamente fundamental o reconhecimento de que os tempos e formas de aprendizagem do jovem e adulto so diferentes dos das crianas e pberes, tanto pela conformao psquica e cognitiva como pelo tipo de insero e responsabilidade social. Isto significa reconhecer que os adultos, em funo do j-vivido, tm modelos de mundo, estratgias de compreenso de fatos e de avaliao de valores densamente constitudos, de forma que toda nova incorporao conduz a compreenses mais amplas e, eventualmente, difceis de realizarem. Disso decorre que os contedos escolares da EJA, considerando aquilo que estabelecem as diretrizes curriculares nacionais, devem ser reorganizados em funo do lugar social, poltico e histrico em que as pessoas se encontram. Mais ainda, advirta-se que assumir as limitaes e equvocos da educao convencional e dos processos de ensinar e aprender deste modelo no implica postular que a soluo esteja em algum modelo que, negando o conhecimento, valorize os processos de simples ajustamento ao sistema produtivo. Uma educao que corresponda s necessidades e interesses dos trabalhadores deve tomar por referncia a realidade objetiva em que vivem os alunos, no apenas em sua imediaticidade, mas tambm naquilo que implica a superao da condio em que vivem. O desafio que se pe o de, reconhecendo os sujeitos que dela participam, bem como a concretude de suas vidas e as formas como interagem com o conhecimento, criar as condies de superao do lugar em que se encontram. Trata-se de, pela ao educativa, contribuir para que estes alunos sujeitos plenos de direito possam, na problematizao da vida concreta, adquirir conhecimentos e procedimentos que contribuam para a superao das formas de saber cotidiano. Isto se faz pelo deslocamento do lugar em que se costuma estar, pa r a , t o m a n d o c o m o e s t r a n h o o q u e f a m i l i a r, r e s s i g n i f i c a r o r e a l , entendido no como o absoluto em si, mas sim como o resultado da produo histrica do conhecimento. Nes s a d i r e o , a e d u c a o d e a d u l t o s n o p o d e s e r p e n s a d a como recuperao de algo no aprendido no momento adequado e,

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tampouco, deve seguir os critrios e referenciais da educao r e g u l a r d e c r i a n a s e a d o l e s c entes. O adulto no volta para a escola para aprender o que deveria ter aprendido quando criana. Para alm do legtimo desejo de reconhecimento social, ele busca a escola para aprender conhecimentos importantes no momento atual de sua vida, conhecimentos que lhe permitam desenvolver e constituir conhecimentos, habilidades, competncias e valores que transcendam os espaos formais da escolaridade e conduzam realizao de si e ao reconhecimento do outro como sujeito (Parecer CNE 11/2000).

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3. FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAO PARA EJAMaria Alice Coelho

3.1 Aprendendo a escrita e a escreverSaber ler e escrever condio essencial para que o indivduo enfrente as situaes do mundo contemporneo. A posse da leitura e da escrita amplia o acesso s informaes de fatos diversos da esfera cotidiana e das esferas pblicas, possibilitando decises conscientes, participao ativa na sociedade e insero na sociedade da cultura. O domnio da escrita compreende, por um lado, a apropriao do sistema de escrita, a reconhecimento dos princpios alfabtico e ortogrfico, e, por outro, a posse do conhecimento elaborado. A maneira como se considera a escrita tem implicaes pedaggicas. Se concebida como cdigo de transcrio da oralidade, sua aprendizagem consistiria da aquisio de uma tcnica. Se concebida como sistema de representao da lngua falada, sua aprendizagem se converte na apropriao de um objeto de conhecimento, o que significa a aprendizagem conceitual. a partir de mltiplas experincias de leitura e de escrita que o sujeito incorpora a lngua escrita s prticas sociais. O alfabetizando desenvolve o conhecimento num processo ativo e no na repetio de modelos, em que memorizaria sem compreender. A simples memorizao no se constitui em conhecimento do objeto nem favorece o desenvolvimento cognitivo, ao mesmo tempo em que deixa dvida sobre o uso do cdigo escrito de forma efetiva. Cada sujeito aprende de maneira diferente, interpretando os dados de acordo com seus esquemas assimiladores e tambm no linear. Em termos diretos: ele no se aproxima do conhecimento passo a passo, juntando peas umas sobre as outras, mas por reestruturaes globais. As caractersticas especficas da escrita (por exemplo, o uso de letras, ainda que indiferenciadas) vo aos poucos se convertendo em observveis, ao mesmo tempo

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em que se incorporam como variveis dentro do sistema. A cada nvel, o aluno faz a reestruturao do sistema de escrita, comportando novas assimilaes e acomodaes que permitem a adaptao a este objeto. isso que tem que fazer o tempo todo: acomodar, reformulando seus esquemas de ao. Ao assimilar as informaes que o meio oferece e formular hipteses, procura descobrir e organizar as propriedades da escrita. Trata-se de um processo de conceituao da linguagem. Nessa perspectiva, as situaes de aprendizagem oferecidas pela escola devem reconhecer o saber do educando, sua experincia e seu envolvimento social, oferecendo possibilidades de ele, pela convivncia contnua com a produo e a circulao do conhecimento, pensar sua vida, seus modos de viver e estar no mundo. Ao avanar a compreenso das regras que orientam a leitura e a escrita, os alunos desenvolvem conhecimentos e capacidades diversas, relativos natureza e ao funcionamento do sistema alfabtico e da ortografia, alm de explorar uma multiplicidade de textos. Assim, desde o incio, percebem o que a escrita, para que e como se usa, com quais caractersticas, formatos, estruturas, recursos, contedos e apresentaes grficas. A aprendizagem da escrita e dos contedos que se veiculam por ela central na formao dos sujeitos e no se realiza seno por meio do exerccio sistemtico e reflexivo. Uma capacidade a ser desenvolvida conhecer e compreender o alfabeto. Identificar os nomes das letras, entender que o nome de cada letra tem relao com pelo menos um dos fonemas que ela representa e compreenda que as letras desempenham uma funo no sistema implica reconhecer que determinadas letras devem ser usadas para escrever determinadas palavras, em determinada ordem. A apropriao da escrita passa pela aquisio da base alfabtica, o que, por sua vez, significa compreender que o princpio que regula a escrita a correspondncia entre som e letra, ou os grafemas representam fonemas. A partir da, progride a reflexo relacionada s regras da ortografia. Como as regras de correspondncia so variadas, preciso avanar a observao e a anlise, para entender as correspondncias, que, apesar de dependerem de posio ou de contexto, so regulares e obedecem a padres. Outras regularidades da ortografia podem ser analisadas quando se observa a morfologia da lngua.

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H, contudo, casos em que as regras no se aplicam - as chamadas irregularidades ortogrficas -, situao em que se tornam necessrios mecanismos de memorizao. Para esse fim, a visualizao frequente de tais palavras nos textos a serem lidos ou escritos pode ser facilitadora. Para que seja possvel a compreenso e o uso da leitura e da escrita, preciso que elas sejam didaticamente trabalhadas. Deve prevalecer no trabalho com a lngua escrita uma mensagem escrita com inteno comunicativa e no a construo de fragmentos de escrita baseadas em sons e slabas que se unem casualmente e sem sentido. Outros aspectos da organizao da escrita, como o alinhamento e a direo da escrita e a segmentao dos espaos em branco, so igualmente importantes. Os aprendizes precisam observar e identificar como convenes a serem seguidas precisam ser abordadas sistematicamente. O uso constante de textos pode gerar essas e outras anlises, como o emprego de pontuaes especficas para cada inteno comunicativa, assim como da distribuio do texto em pargrafos. Quais so as atividades que podem favorecer que a aprendizagem da escrita seja uma aprendizagem conceitual? Partimos do pressuposto de que, desde o incio do processo de aprendizagem, possvel usar a escrita em exerccios sistemticos, seja de reconhecimento de letras e palavras num texto lido, seja de reescrita de texto dado a conhecer, seja de escrita de textos, mesmo que curtos e desprovidos ainda do uso convencional. A reflexo da escrita em todos os nveis de elaborao por parte do sujeito deve ser mediada pelo professor que, ao propor questes, conflite as hipteses do aluno, desequilibrando o sistema, levando a um novo equilbrio. E para que essas intervenes aconteam preciso que o professor saiba o que conflito em cada nvel. Por exemplo, no incio da aprendizagem, a pessoa procura combinar de vrias maneiras as formas de letras que capaz de reproduzir; nesse momento, o conflito a ser superado a quantidade de letras (nunca inferior a trs) e a variedade entre elas, (no podem ser repetidas), como preconizam os estudos desenvolvidos por Emlia Ferreiro. Ao propor o trabalho com a escrita, o professor pode dar a quantidade de letras para que o aluno pense em quais letras usar ou ainda dar a quantidade e a

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variedade, possibilitando ao aluno refletir sobre a ordem das letras na formao da palavra em questo. Na transio para outra fase da escrita, o conflito que se estabelece por uma exigncia interna da pessoa (o nmero mnimo de grafias) e a realidade das formas que o meio lhe oferece, faz com que o aprendiz procure solues para representar as partes sonoras das palavras. O equilbrio que marca esse perodo vem da compreenso de que a cada um dos caracteres da escrita correspondem valores menores que a slaba, e que uma palavra, se tiver duas ou mais slabas, necessita mais do que duas letras para ser escrita. Para alcanar o outro nvel, o sujeito ter que considerar novos pontos de vista e novas possibilidades de escrita proporcionadas pela reflexo oriunda de conflitos cognitivos e pela aprendizagem. Para escrever ortograficamente, ter que percorrer um longo caminho, que inclui refletir sobre a regularidade do sistema e as irregularidades que tero que ser memorizadas. No entanto, ele s avanar se tiver conhecimentos sobre alfabeto e se souber diferenciar letras vogais e letras consoantes. Por isso preciso experimentar vrias possibilidades de combinaes entre vogais e consoantes e perceber o valor posicional das letras. No exerccio de escrita, jogos, cruzadinhas, caa-palavra, dentre outros, podem contribuir para que o aluno, aos poucos, perceba que a vogal parte imprescindvel da slaba. Ao fazer e desfazer e observar os resultados reconhecer slabas formadas por apenas uma letra vogal e que no existem slabas formadas somente por consoante. Na progresso, descobrir que h slabas formadas por uma, duas, trs, quatro e cinco letras. Conhecendo o alfabeto, o aluno pode pensar sobre a ordem alfabtica e como essa ordenao facilita e agiliza a localizao de palavras numa lista (lista telefnica, agenda, catlogo, dicionrio, arquivo, etc.). Apesar das contribuies dessas descobertas, o aluno precisar reconhecer a palavra como identidade de significado entre dois espaos. Na leitura e cpia de textos de diferentes gneros, o espao deve ser trabalhado como observvel, possibilitando essa elaborao e a amplia, bilhete, etc.). Alm de ser um conhecimento necessrio para a escrita, entender o modo como o texto est organizado no espao da folha, contribui para a leitura, pois, ao entender

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o significado do espao, encontram-se orientaes sobre o gnero a que pertence o texto, o que permite que se faam antecipaes significativas. A discusso dos tipos de espao encontrados nos textos pode gerar as primeiras descobertas sobre pargrafo. Toda descoberta impe novas reflexes no sentido de reconstruo e reorganizao do conhecimento assimilado. As novidades prprias desse processo contribuiro para que o aluno supere as limitaes iniciais de compreenso e uso do pargrafo, ampliando para que perceba que h mudanas de pargrafos quando se muda de assunto, por mudana de tempo, de espao, de personagem, de foco, etc. Nessa etapa, torna-se necessrio colocar como observveis os sinais de pontuao. O professor precisa ajudar os alunos para que identifiquem nos textos impressos os sinais que no so letras. A funo de cada sinal encontrado deve ser motivo de reflexo, assim como o local onde podem aparecer na escrita. A leitura de textos variados feita com nfase nas falas das personagens, acompanhadas de gestos e expresses faciais sugerem que esses recursos traduzem o sentimento das personagens e que, na escrita, essa funo ocupada pelos sinais de pontuao. Dramatizaes de histrias do cotidiano ou da literatura podem preceder o exerccio de escrita que tem por objetivo a escrita de texto e o emprego dos sinais de pontuao. A coordenao dos significados do espao e da pontuao facilitadora da aprendizagem do discurso direto, mas ainda assim preciso que o leitor consiga diferenciar entre os trechos narrados e as falas das personagens. O ldico deve ser considerado como uma possibilidade de trabalho tambm na educao de jovens e adultos. A linguagem oral e escrita pode ser considerada como forma de interao para externar pensamentos ou para apropriao de conhecimentos. Desse modo, atravs de jogos, brincadeiras, dramatizaes e produes dos alunos, pode-se criar um ambiente alfabetizador concreto para jovens e adultos que, diferentemente da criana, que se interessa pela atividade em si, busca o objetivo ou finalidade do jogo. O desenvolvimento do aspecto ldico contribui para o desenvolvimento pessoal, social e cultural, alm de facilitar os processos de socializao, comunicao, expresso e construo do conhecimento. Freire, em sua dinmica de alfabetizao, props o trabalho com gravuras, desenhos, imagens que, de alguma maneira, esto sempre em contato com as formas ldicas. Ao longo do trabalho de leitura e produo de textos, os conhecimentos vo se reorganizando em um todo coordenado pela progressiva tomada de conscincia,

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comportando diferena qualitativa na forma de pensar e de aplicar os novos conhecimentos adquiridos. O aluno, aps sucessivas intervenes dos professores, deve ser capaz de escrever autonomamente pequenos textos, redigindo alfabeticamente as palavras, conservando espao entre elas, questionando e elaborando hipteses sobre questes ortogrficas, fazendo uso de pargrafos e sinais de pontuao, mesmo que nem sempre corretos e nos lugares adequados. Mais que isso, ele pode produzir textos de sua autoria, sendo capaz de revis-los com ajuda do professor ou de outra pessoa. H uma infinidade de possibilidades de escrita que se tornam mais fceis e disponveis medida que o aluno avana na apropriao do cdigo, desde as mais simples e de aplicao imediata, como a produo de listas de compras, agenda de telefone, recados, receitas, bilhetes, cartas, at a reescrita de textos de histrias conhecidas, considerando as idias principais do texto-fonte e algumas caractersticas da linguagem escrita. Concomitante ao trabalho direcionado para a aquisio do cdigo escrito, h que fazer um trabalho intencional para que o aluno aprenda diferentes formas de ler em funo da finalidade e do contexto. Assim, ele ir ler para estudar, ler para se informar, ler para apreciar, ler para fazer, etc. Para isso, necessrio que o aluno estabelea estratgias de leitura, adquira procedimentos de leitura e desenvolva um comportamento leitor. So procedimentos que se aprendem na escola e que, portanto, pressupem um fazer por parte do professor, dialogando, instigando, desafiando, sugerindo, lendo com o aluno. Ao ler para e com o aluno, o professor mostra como os escritos que circulam no cotidiano so usados. Assim, uma proposta metodolgica de leitura deve se constituir numa atividade constante, de fato e sistemtica; uma atividade que estimule processos cognitivos, tais como: acionar conhecimentos prvios leitura, reconstruir relaes temporais, lgicas e sociais, identificar fatos e elementos, formular hipteses, aceitar ou discordar dos valores sociais socialmente produzidos. Para que o texto seja lido e compreendido pelo sujeito, este lanar mo de diferentes procedimentos, pois para cada tipo de texto h estratgias diferentes de compreenso. O ensino da leitura deve privilegiar a incorporao de estratgias que se apliquem a outras situaes, servindo de recurso para outras aprendizagens.

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Assim, h que se trabalhar para que o aluno, por si s, perceba os espaos em branco, o tipo de letra, as ilustraes e grficos que fazem parte do texto, como tambm os aspectos lingusticos. Quanto mais elementos reconhecer, mais fcil sero a leitura e a compreenso. Desse modo, a tomada de conscincia proporcionar resultados superiores ao conhecimento em ao. Em situaes contextualizadas e significativas, os textos oferecidos para leitura devem ser aqueles que, como props Paulo Freire, tenham significncia na vida do aluno, com diferentes estilos e funes; textos que faam parte de sua realidade, e que acolham suas necessidades. Para Freire, a compreenso crtica na leitura no se esgota na decodificao das palavras, mas se antecipa e se alonga na inteligncia do mundo. Ao reconhecer a leitura como atividade social facilitadora de suas aes no cotidiano, o aluno se motivar ao faz-la, tornando-a frequente no decorrer de sua vida. Dessa maneira, conseguir sua emancipao cultural. As exigncias quanto ao uso das habilidades de processamento de informao para o enfrentamento de atividades cotidianas e no trabalho so cada vez maiores numa sociedade como a nossa. Assim, preciso contemplar uma gradao entre as etapas alfabetizao e bsica, sem, contudo, definir um limite para cada uma delas. So os novos conhecimentos e procedimentos que permitiro ao aluno superar as formas dos saberes cotidianos. Esses novos saberes construdos implicam uma possibilidade intelectual que extrapola, em muito, as primeiras aquisies do sujeito. De carter extensional, so fundadas unicamente nos observveis, havendo assimilao de novos contedos observveis em um esquema pr-existente, que no se v modificado, seno quanto riqueza maior que a assimilao proporciona. J os conhecimentos fundados nas operaes do sujeito ou em seus produtos tm sua natureza simultaneamente compreensiva e extensiva, conduzindo produo de novas formas de percepo e, s vezes, de novos contedos. Para formar o leitor crtico e participativo, a leitura de diferentes tipos de textos deve impregnar o trabalho pedaggico na EJA, contribuindo para que o aluno, tornando-se capaz de ler com autonomia, compreenda e se aproprie de conhecimentos relevantes para ele enquanto pessoa e para o desenvolvimento de outras atividades educativas. No que concerne leitura, tanto o conhecimento lingustico como o textual devem ser usados como estratgias facilitadoras da compreenso do texto lido. A ativao do

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conhecimento prvio (o conhecimento que o sujeito tem sobre o assunto) permite fazer inferncias necessrias para relacionar partes do texto num todo coerente. No que a habilidade do aluno de responder questes literais no seja importante, mas h que trabalhar para que o aprendiz consiga atingir a leitura autnoma, sendo capaz de solucionar questes inferenciais feitas ao texto. A formao de leitor ativo, que formula hipteses e as testa medida que vai lendo o texto, que identifica e analisa a estrutura e o contedo do texto, que reconhece o que informao e o que opinio do autor, um objetivo central na educao de jovens e adultos. Certamente no se espera que os alunos percebam os elementos formais do texto, consigam analis-los e formulem hipteses sem a participao ativa do agente formador. O professor, selecionando diferentes possibilidades de leitura (livro, poemas, mapas, grficos, notcias, anncios, documentos, etc.), lendo com e para o aluno, pondo o texto sistematicamente em discusso, fazendo predies, perguntas e comentrios, contribuir para que o aluno desenvolva a capacidade de interpretar e estabelecer significados dos diferentes textos e se torne, verdadeiramente, leitor. So nessas situaes de interao entre aluno e professor que o leitor menos experiente compreende o texto. Durante a conversa que se estabelece entre eles, professor e aluno, sobre os aspectos relevantes do texto. tambm o professor quem planeja e promove situaes de leitura e escrita de textos que sugerem um leitor especfico (carta, email, dirio) ou de textos outros que fazem parte da prtica escolar (esquema, resumo), que em muito contribuem para estudo, e outros, como a narrao e dissertao este nas etapas finais do processo de escolarizao. So critrios para a escolha dos textos: (a legibilidade, ou grau de dificuldade; a relevncia; e o interesse, tanto do ponto de vista de apelo ao aluno quanto do ponto de vista dos objetivos acadmicos da escola). Quanto narrativa, que constitui uma ao que o sujeito realiza a todo o momento e que serve de apoio para que se organize a experincia humana, tem nessas razes, propsitos para a produo de escrita. As narrativas orais e escritas podem ser trabalhadas extrapolando os recursos de memria para alcanar interao entre personagens, entre autor e leitor. No desenvolvimento do texto narrativo h a possibilidade de ampliar o uso do pargrafo e da pontuao, inclusive daquela necessria no uso do discurso direto e de outros recursos coesivos.

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No exerccio de escrita de textos, a leitura e anlise de textos do mesmo tipo que o aluno est escrevendo deve ser prtica do professor, possibilitando ao aluno confrontar textos escritos e lidos com textos de sua autoria, retirando deles caractersticas e especificidades. Esses momentos de reflexo permitem a tomada de conscincia pelo aluno a respeito das exigncias que caracterizam cada tipo de produo. Os exerccios de anlise orientados permitem a descoberta de aspectos gramaticais, estruturais e discursivos de produo de sentido presentes nos textos publicados. Com isso, o aluno passa a perceber estratgias usadas pelos autores e pode, em algum momento, se apropriar delas. Nesse processo, o professor deve interagir com o aluno, no s no momento de produo do texto, no planejar a escrita do texto considerando o assunto, a finalidade e o interlocutor, mas tambm na reescrita, orientando-o para que perceba e solucione limitaes do texto (no no domnio da escrita formal, no preenchimento de lacunas, nas incoerncias, na necessidade de reestruturao de frases, na falta de recursos coesivos), para fazer no texto as alteraes que forem necessrias e, finalmente, chegar escrita definitiva do texto. Como tambm se l e escreve para aprender, uma possibilidade de trabalho ensinar o aluno a fazer resumo de textos informativos lidos, de contedos variados. A tcnica do resumo permite converter grande quantidade de informaes em unidades menores, possibilitando maior armazenamento de dados na memria. Mais do que isso, quando bem orientado, o sujeito conseguir transformar a palavra do outro na prpria palavra, facilitando o domnio de informaes e contedos relevantes, que podero ser acionados quando necessrios. Para esse fim, o aluno seleciona e sintetiza informaes que devem ser escritas de forma organizada e articulada para facilitar a compreenso e a reteno das ideias do texto. Ele conseguir elaborar bom resumo e poder us-lo, inclusive como material de estudo quando o professor apresentar procedimentos para esse fim, procedimentos que comeam com o levantamento do que j sabe sobre o assunto, passando pela leitura dialogada do texto, a anlise de todas as informaes que o texto contm (fonte, autor, ttulo, subttulo, imagens, grfico, etc.), propondo questes, elaborando um esquema e, finalmente, escrita do resumo com informaes e explicaes principais presentes no texto. O traba l h o d e c o m p r e e n s o d o t e x t o l i d o p a s s a a s e r d e responsabilidade de todos os professores e no somente dos professores alfabetizadores ou de Lngua Portuguesa. O mesmo vlido para a escrita

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que perpassa todas as reas de conhecimento. No podemos deixar de considerar a importncia e a necessidade de desenvolver com os jovens e adultos da EJA um trabalho intencional com a literatura. A leitura de obras literrias pode parecer, para muitos, diverso e entretenimento, mas preciso ressaltar que o mais importante seu papel na formao de cidados, pois amplia e diversifica nossas vises e interpretaes sobre o mundo e da vida como um todo e nos transporta ao mundo da imaginao. Ler boa literatura aprender o que e como somos, poder dividir sentimentos, emoes, conhecer aspectos importantes da cultura. Para isso, o educador deve ter critrios para selecionar os livros para seus alunos e explor-los sem usar de recursos que faam do texto um pretexto para outras coisas. Ao final da Etapa Bsica, o aluno deve ter se apropriado da leitura de maneira a us-la com razovel desenvoltura nas situaes cotidianas em que ela se faz necessria, e, como abertura para novas aprendizagens e estudos, e como instrumento para sua emancipao e desenvolvimento. Quanto escrita, a expectativa de que os alunos participem das prticas de uso da escrita nas diversas situaes, escrevendo com domnio suficiente das regras mais comuns de ortografia, comunicando de forma organizada dados e informaes, planejando-a, considerando o assunto, a finalidade e o interlocutor. dessa vivncia proporcionada pela escola aos alunos da EJA que poder resultar em usurios da leitura e da escrita de forma crtica e participativa, capazes de fazer uma nova histria.

3.2 A especificidade da alfabetizao de jovens e adultosPara alcanar os objetivos da EJA no que concerne s etapas de alfabetizao e bsica torna-se necessrio considerar a especificidade do processo de ensinoaprendizagem para jovens e adultos.

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H uma distino entre alfabetizar crianas, que vivenciam a aprendizagem da leitura e escrita num processo de escolarizao que acontece concomitante com seu desenvolvimento fsico, emocional e social, e a alfabetizao de jovens e adultos, que, j socializados e includos na cultura geral, no tiveram a oportunidade e/ou a possibilidade de concluir a escolaridade e so analfabetos ou analfabetos funcionais, ou seja, tm domnio limitado das habilidades de processamento de informao necessrias para o enfrentamento de atividades cotidianas e no trabalho, e de forma espontnea procuram a escola para suprir essas limitaes. O desafio de alfabetizar jovens e adultos est em criar condies para que esses educandos superem o lugar comum em que se encontram e consigam usar a escrita e a leitura para a vida prtica e, que, fundamentalmente, avancem em seus horizontes culturais. O ensino a ser oferecido a jovens e adultos deve refletir a posio dialgica entre teoria e prtica, na compreenso do aluno enquanto sujeito do conhecimento, e movimentar-se no sentido de uma ao pedaggica que garanta a condio de letrado a esses sujeitos, independentemente de idade, condies sociais e profissionais, interesses e necessidades. Para esse fim, torna-se necessrio conhecer os alunos da EJA e considerar que, sendo pessoas com vivncias particulares diferem em necessidades e interesses e, muito possivelmente, tm conhecimentos diferentes sobre a lngua escrita. Alguns alunos, principalmente os mais velhos e sem nenhuma escolaridade, podem ter objetivos pontuais, como aprender a ler e escrever, mesmo que minimamente, para dizer que, apesar da idade e das experincias e condies de vida, conseguiram, ainda que tardiamente, aprender algo na escola, o que pode representar prestgio na comunidade, valor pessoal, reconhecimento e orgulho no grupo familiar. Para essas pessoas, a aprendizagem da leitura e escrita, a alfabetizao, alm de dar status, contribui par a m o d i f i c a r s u a c o n d i o e m t e r m o s p e s s o ais e, qui, profissional. Outros podem apontar a necessidade de usar a leitura e escrita na vida e no trabalho, por reconhecerem que essas habilidades facilitam a lida com situaes cotidianas. O letramento e a alfabetizao dariam os diferenciais nessa etapa da vida. O domnio das habilidades de ler e escrever para muitos jovens da EJA representa o salto qualitativo necessrio para a vida adulta, inclusive, o de acessar nveis mais elevados de escolaridade. Ao pensar na educao oferecida a jovens e adultos, partimos do pressuposto

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que ela no pode reproduzir o modelo escolar tradicional, pois o ensino escolar de tradio prescritiva no reconhece nem valoriza o sujeito da aprendizagem, tampouco a construo do conhecimento. Ao fazer essa opo, fica claro que preciso valorizar as experincias dos educandos, reconhecer que possuem um universo de conhecimentos prticos, tm formas de pensar e responder aos diversos aspectos da realidade social e natural. Isto obriga reconhecer que aprendem de maneiras prprias e que as condies de aprendizagens precisam ser diversificadas e facilitadoras, pois a assimilao de novos contedos exigir novas construes, reorganizando e ampliando por combinao com os elementos prprios das novas aprendizagens. O que inicialmente se utiliza como instrumento do pensamento, torna-se um objeto do pensamento, modificando sua posio enquanto elemento do conhecimento. Quanto ao funcionamento intelectual do adulto, Palcios (1995) afirma que as pessoas mantm bom nvel de competncia cognitiva at uma idade avanada. Por sua vez, os psiclogos evolutivos consideram que o que determina o nvel de competncia cognitiva das pessoas mais velhas no tanto a idade em si mesma, quanto uma srie de fatores de natureza diversa. Entre esses fatores podem-se destacar, como muito importantes, o nvel de sade, o nvel educativo e cultural, a experincia profissional e o tnus vital da pessoa (sua motivao, seu bem-estar psicolgico, etc.). esse conjunto de fatores e no a idade cronolgica puramente o que determina boa parte das probabilidades de xito que as pessoas apresentam, ao enfrentar as diversas demandas de natureza cognitiva. Tanto crianas como jovens e adultos no alfabetizados dispem de conhecimentos sobre a lngua e todos passam por etapas at chegarem ao domnio da leitura e escrita. Para isso, preciso que sejam sujeitos ativos, construam hipteses, comparem, classifiquem, observem, modifiquem, avanando aos poucos nessa construo. preciso tambm que percebam um sentido naquilo que esto fazendo para valorizarem e vivenciarem, com um mnimo de resistncia e desistncia possvel, essa apropriao. Jovens e adultos que tiveram alguma experincia com a educao regular podem ser menos suscetveis a novos procedimentos e prticas de aprendizagens por estarem ligados, mesmo que de memria, s situaes conflituosas de ensino pelas quais passaram. O ensino voltado repetio de modelos em que se prioriza a memorizao e aplicao do cdigo em situaes descontextualizadas, sem objetividade, no constitui experincia efetiva com a comunicao escrita.

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O desafio tambm se impe quando os alunos precisam superar o medo de errar, de produzir textos. preciso que se sintam autores de seus textos, para que tenham voz. Vencer o constrangimento de no saber escrever e ler, admitindo que no se trata de processos fceis e nem imediatos, pelo contrrio, exigem esforo e persistncia do aluno, tambm se faz necessrio, pois pode evitar a frustrao e favorecer a autoestima. Assim, preciso quebrar barreiras e avanar na perspectiva de prticas efetivas, significativas e contextualizadas, voltadas para a formao de leitores-escritores, o que em muito supera a simples conquista da base alfabtica. Conforme esclarece Paulo Freire: a opo realmente libertadora nem se realiza atravs de uma prtica manipuladora nem tampouco por meio de uma prtica espontanesta (FREIRE, 1989, p.15) Para isso, o objetivo da educao escolar o de desenvolver no aluno a habilidade de expresso e de compreenso de mensagens, alm de capacit-lo para uma atitude de autonomia, sujeito de sua aprendizagem. No se pode infantilizar o processo. As propostas de leituras e escritas devem ser adequadas e os assuntos relevantes para faz-los avanar e deslocar-se do senso comum. em Paulo Freire que encontramos orientao para o uso de textos para a alfabetizao de jovens e adultos. Diz ele: O comando da leitura e escrita se d a partir de palavras e de temas significativos experincia comum dos alfabetizandos e no de palavras e temas apenas ligados experincia do educador. (FREIRE, 1989, p. 18) Assim, prope-se uma prtica de educao de jovens e adultos que toma o texto como a unidade bsica do processo de ensino-aprendizagem da Lngua Portuguesa. Na busca de atividades adequadas para cada sujeito da aprendizagem, no o nvel de conceituao sobre o sistema de escrita que define a escolha, mas o fato de o aluno reconhecer o texto solicitado como algo que se escreve (FERREIRO, 1986). Cabe advertir que, embora o aluno que faz a apropriao do cdigo escrito assimila de maneira diferente algo que a humanidade produziu, essa apropriao no solitria. Pelo contrrio, a interao entre aluno-aluno e professor-aluno constitui-se, como afirma Weisz (1992), em ferramenta pedaggica, cuja funo se define no prprio planejamento da situao de aprendizagem. , pois, o trabalho com o texto, de leitura e escrita, desde o incio do processo, que promover o desenvolvimento da competncia textual pelo educando, ao mesmo tempo em que proporcionar uma nova postura dele frente lngua escrita.

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A EJA necessita ser pensada, ento, como um modelo pedaggico prprio a fim de criar situaes pedaggicas e satisfazer necessidades de aprendizagem de jovens e adultos.

3.3 Orientaes DidticasNo processo de aprendizagem da leitura e da escrita, preciso considerar que ler um ato de comunicao no qual algum tem algo a comunicar para outro e quem l deve construir o significado que aparece representado por letras e outros sinais. Assim, preciso considerar a decifrao e a compreenso. A compreenso leitora inclui o conhecimento e uso de uma srie de procedimentos para construir o significado que cada texto prope. As estratgias incluem o levantamento prvio do aluno, as expectativas em funo do suporte, em funo do gnero, do autor, a antecipao do tema ou ideia principal, a observao de imagens, a definio de objetivos da leitura. As exploraes iniciais, feitas atravs de questionamentos, permitiro ao alunoleitor organizar seus conhecimentos. Quando ele for para a leitura ou acompanhamento dela, o texto j no ser totalmente novo para ele. Quanto maior o nmero de elementos que dispuser sobre o assunto, mais fcil e significativa ser a leitura. Considerando a especificidade da alfabetizao e a importncia de que ela se desenvolva num contexto de letramento, h que reconhecer a necessidade de metodologias diferentes para atingir os objetivos de cada uma delas. Tendo o texto como unidade bsica do ensino da lngua escrita, as atividades voltadas para apropriao do cdigo escrito devem desencadear reflexes acerca da lngua e estimular o desempenho lingustico. Alm de motivadoras e significativas, devem permitir ao aluno avanar do patamar de conhecimento que j conquistou para outro mais evoludo. Como, contudo, cada pessoa processa as informaes a partir de seus esquemas assimiladores, a compreenso de como se d esse processo de construo da escrita e da leitura no acontece num mesmo tempo para todos e nem numa nica interveno.

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Os exerccios da leitura e da escrita devem ser constantes e planejados para atender os diferentes nveis de elaborao dos alunos, seus interesses e tendo em vista a ampliao dos conhecimentos. O ensino assim concebido constitui-se de um conjunto de atividades sistemticas, cuidadosamente planejadas, planejamento esse que tem como objetivo assegurar a unidade e a coerncia do trabalho docente, relacionando entre si objetivos (para que ensinar), contedos (o que ensinar), os alunos, os mtodos e tcnicas (como ensinar) e a avaliao. Flexvel, permite ajustes que se fazem em funo da forma como os alunos reagem e o trabalho se desenvolve. A seguir, sero apresentadas algumas atividades comentadas como exemplos possveis do trabalho a ser realizado.

3.3.1

Atividade de ensino e aprendizagem 1

Objetivos: Acionar estratgias que permitam descobrir o que est escrito e onde Considerar o uso social, levando em conta o processo e as condies de escrita na produo de textos Perceber as funes sociais dos diferentes gneros Analisar as perspectivas de como autor e leitor interagem na situao Comunicativa Propomos, a ttulo de sugesto, a leitura do poema Retrato, de Ceclia Meireles. Em Retrato, a autora busca enxergar e aprender mais profundamente uma realidade existencial que se concretiza numa imagem espelhada. Usando a linguagem potica, externa sentimentos sobre a passagem do tempo. Retrato Ceclia Meireles http://www.filologia.org.br/revista/artigo/6(16)14-25.html http://www.youtube.com/watch?v=hYEMQ0Gbe38

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A escolha do texto foi pensada como forma de desencadear reflexes sobre o funcionamento da lngua escrita e da leitura, e, ao mesmo tempo, trabalhar com a questo da identidade. A identidade firma-se em capacidades e em valores, no que somos capazes de compreender do mundo e no significado que damos s nossas vidas. O saber deve partir da conscientizao do indivduo em relao ao contexto social e cultural em que vive, da conscientizao do ser e do pertencer a um grupo, de compartilhar a existncia com outros.

Antes da leitura Conhea mais sobre a autora e sua obra. Na internet h sites que analisam poesias e obras de autores nacionais e estrangeiros. O conhecimento prvio possibilita ao professor direcionar as questes feitas aos alunos para aspectos importantes do texto (http://www.filologia.org.br/revista/artigo/6(16)14-25.html); essas perguntas podem ajudar os alunos a melhor compreender o texto. Questes feitas pelo professor ajudam o aluno a reconhecer o texto enquanto gnero (estrutura de poesia, ocupao do espao), expectativa em funo do gnero (rima), antecipao do tema ou ideia principal a partir do ttulo, relao com a imagem da autora includa junto ao texto (http:// www.releituras.com/cmeireles_bio.asp), dentre outras. O texto oferecido para a leitura em dois tipos de letras - script e basto, acrescido da imagem da autora. A partir do ttulo, pode-se perguntar como seria o retrato do aluno transformado em palavras e em desenho. O professor faz a lista de palavras na lousa. Depois da leitura, cabe ao professor, com a participao dos alunos, destacar palavras usadas pela autora e comparar com aquelas que propuseram inicialmente. O aluno faz seu retrato e desenha sua imagem. Essa primeira parte descrita, leitura e registro pelo professor, desenho e retrato pelo aluno, no impe grandes dificuldades. Todos os alunos, independente da condio leitora, podem participar, trocando informaes e experincias.

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Durante a leitura Durante a leitura feita pelo professor, o aluno acompanha o texto. Como possvel ter alunos em diferentes condies leitoras, importante que o professor apresente o texto na lousa ou com ajuda de recurso de informtica para indicar cada palavra lida, a mudana das estrofes. A heterogeneidade dos alunos tambm se d no mbito da leitura. possvel que haja, numa mesma turma, alunos no nvel da decodificao - reconhecem letras e slabas, mas nem sempre conseguem ou fazem com dificuldade a sntese para formar palavras , outros capazes de ler palavras, mas ainda demasiadamente preocupados com a parte mecnica da leitura, no prestam a ateno devida ao significado, e outros que leem com alguma desenvoltura e percebem a inteno comunicativa do texto e que, com a leitura do professor, percebem melhor as marcas da pontuao e da entonao. A repetio da leitura auxilia nos mecanismos de memria, facilitando a leitura pelos alunos menos experientes que podem antecipar o que vem a seguir, buscando indcios grficos por meio do conhecimento de letras iniciais ou finais. A leitura pode ser feita por outros alunos. O professor pode utilizar recursos diferentes, como a audio do poema disponvel na internet (http://www.youtube.com/watch?v=hYEMQ0Gbe38). Questes como quem fala no texto (eu, a autora), o que ela descreve (seu prprio rosto), por que no o reconhece (mudanas, quais), que experincias pode ter vivido e que contriburam para marcar sua face, qual o sentido de corao usado pela autora dentre outras, possibilitam a compreenso mesmo para alunos no leitores. Aps vrias leituras, pode-se pedir para um ou mais alunos recontarem com suas palavras o texto lido. Sugerimos o reconto (ou parfrase) oral por entender que se trata de uma forma de se apropriar do texto. O reconto preserva do original lido o mximo de fidelidade. Os recontos orais so muito mais extensos que os correspondentes recontos escritos. Muitos detalhes apresentados no reconto oral se perdem no escrito. Os recontos escritos resumem, enquanto os orais aproximam-se mais do modelo, isto , do texto que lhes serviu de desencadeador . No oral, os sujeitos tentam reproduzir o modelo, no escrito h a reconstruo do

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mesmo recorrendo a inferncias e generalizaes feitas a partir do texto origem. O fato de os alunos se encontrarem numa fase de aquisio do conhecimento da escrita faz com que tenham que operar uma reformulao do texto-origem condicionada pelo seu nvel de domnio da palavra escrita, que implica a reconstruo do texto-origem no registro escrito. No reconto oral, encontramos muitas sequncias conversacionais-dialogais enquanto que no escrito elas so restritas.

Depois da leitura Torna-se necessrio planejar situaes didticas desafiadoras para diferentes nveis de escrita dos alunos, tendo o texto lido como uma das possibilidades. O trabalho com a escrita para alunos no alfabetizados pode ser iniciado a partir de algumas palavras do texto, em situaes de reflexo e estudo. Propomos: retrato, rosto, face, olhos, lbio, mos e corao. Essas palavras podem ser grifadas no texto lido. A cpia dessas palavras pode gerar comparao (quantidade e variedade de letras), da observao da letra inicial, a classificao em comeadas com vogal ou consoante, a organizao delas pela ordem alfabtica, dentre outras possibilidades. O professor deve questionar os alunos a respeito de seus conhecimentos sobre coisas organizadas em ordem alfabtica e registrar as respostas, que podem ser copiadas. Quando tiverem avanado na construo do cdigo, os alunos podero usar esses conhecimentos para compor agenda pessoal, procurar palavras no dicionrio, em listas telefnicas, etc. Os alunos podem ser orientados a voltar ao texto lido e retirar outras palavras tambm comeadas por vogal ou consoante. Ainda com o uso de letras, cabe propor uma situao de escrita pensada em forma de jogo, trocando-se apenas uma letra de cada palavra do jogo (exemplo: boca, bola, mola, sola, sopa, etc.). O professor pode orientar a procura da palavra retrato no dicionrio. Os alunos podem examinar as acepes da palavra oferecidas, analisando quando cada uma usada. Os questionamentos quanto aos sentidos da palavra retrato podem gerar novas escritas, inclusive de outras acepes reais e imaginrias que poderiam ser acrescentadas s que o dicionrio oferece.

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Outras atividades de escrita para alunos que precisam deslocar em seus conhecimentos sobre a construo de palavras podem ter como ponto de partida os nomes deles e os locais de nascimento, contribuies que sero teis nas prximas atividades de leitura e escrita a serem propostas. Alguns procedimentos citados podem ser usados, mas h inmeras possibilidades. O objetivo aqui apresentar apenas algumas propostas que ajudem os alunos a descobrir que possvel, a partir de uma palavra, reescrever outras, usando as letras reordenadas (ex: Renata: nata, rena, ata, reta, neta, etc.). As intervenes feitas pelo professor ajudam o aluno na observao e compreenso de que as palavras so formadas por slabas, que no h slaba sem vogal, que h slaba formada por apenas uma letra vogal e que no existem slabas formadas somente por consoante. O exerccio de escrita deve gerar conhecimento sobre slabas formadas por uma, duas, trs, quatro e cinco letras. Os nomes dos alunos, as cidades e estados de origem, palavras retiradas do texto e outras podem ser classificadas quanto ao nmero de slabas. A separao deve ser estudada dentro do universo dos possveis (re- tra -to, retra- to, re- trato). Como as atividades de escrita no podem ficar restritas letra, slaba ou palavra, mas ao texto, deve-se voltar ao texto lido ou tomar outro texto para que os alunos exercitem seus conhecimentos num todo com significado. No texto, eles devem ser solicitados a observar os espaos em branco para compreender o conceito de palavra. Assim, com a ajuda do professor, faro novas descobertas como palavras de uma letra. Outros textos podem ser apresentados com lacunas de palavras de uma letra para serem lidos e completados. O uso de letras mveis e computadores com editores de textos podem ser usados para ajudar o aluno a arriscar a escrever, com possibilidade de reescritas. As propostas feitas e outras planejadas pelo professor para atender as necessidades dos alunos, distribudas em vrias aulas, geram conhecimentos sobre o funcionamento da lngua escrita e promover deslocamentos nos nveis de escrita dos alunos. Enquanto alguns alunos exercitam a construo de palavras e frases, outros podem reescrever com suas palavras o texto lido.

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A reescrita particularmente mais fcil do que a produo de um texto, pois o contedo conhecido do aluno que j leu e releu o texto. Ao escrever, ele ter que se preocupar mais com a grafia das palavras, do que com o enredo. O professor, nesse momento, respondendo dvidas, dando modelo, apoiando o aluno no registro, principalmente para os recm-alfabticos que enfrentam dificuldades bsicas em questes de ortografia, contribui para que a atividade de escrita seja apropriada para o aluno que, muitas vezes, reluta em escrever por receio de errar. Alunos no alfabticos podem escrever como sabem e podem ditar para o professor o texto para no perder a mensagem passada pelo aluno. Durante o trabalho de leitura e escrita as intervenes do professor so fundamentais para que o aluno avance em seus conhecimentos. Ele precisa compreender o caminho de aprendizagem que o aluno est fazendo para planejar novas atividades que permitam ao aluno avanar. So necessrias muitas situaes de escrita e de leitura para que o aluno avance em seus conhecimentos e consiga, pela tomada de conscincia, se apropriar da escrita. Antes de apresentar outro gnero textual para leitura e escrita, possvel trabalhar com outros poemas (da mesma autora e de outros poetas). O procedimento ajuda o aluno a conhecer melhor o gnero, a apreci-lo e a compreend-lo. Sugerimos, agora, a leitura do poema Ou isto ou aquilo, tambm de Ceclia Meireles. um poema infantil, mas interessante na forma e na temtica. Ele aborda a questo de fazer escolhas, coisa nem sempre fcil. No poema, a autora apresenta, com leveza, aspectos de um processo de escolha to bvios quanto difceis de serem assumidos, por adultos, jovens e crianas. Em se tratando de situaes de aprendizagem em que fazer opes est de alguma forma presente no tema de estudo, pode ser interessante estimular uma dinmica atravs deste poema para lembrar que, seja o que for, preciso optar por isto, ou aquilo e, simultaneamente, excluir ou isto, ou aquilo. A escolha foi pensada tambm por entender que alunos podem elaborar bons textos quando desafiados a produzir poemas como o sugerido, pois o mote de repetio assegura a coerncia interna dos elementos. Essa uma estratgia possvel quando se objetiva que os alunos consigam fluncia no uso do cdigo escrito, deixando para ocupar ateno em aspectos mais relevantes, posteriormente.

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O levantamento do conhecimento prvio do aluno, questionamentos direcionados para ttulo, gnero e outros que podem facilitar a leitura e a compreenso do texto devem permear o trabalho docente no momento de leitura de um novo texto. A leitura deve ser repetida tendo o professor como leitor, alunos leitores e outras leituras podem ser feitas, inclusive com a ajuda da internet (verificar, por exemplo, o link http://www.youtube.com/watch?v=A4p4aa5Nu6o).

Ou isto ou aquilo Ceclia Meireles http://www.revista.agulha.nom.br/ceciliameireles05.html

Depois de vrias leituras, o professor pode perguntar o que mais chamou a ateno dos alunos e que situaes esto sendo colocadas que sugerem dvida. Os alunos podem optar por uma ou outra, justificando a escolha. Situaes inicialmente colocadas como trocas orais, podem gerar escritas significativas. Podem propor outras situaes nas quais se veem em conflito para decidir. A lista dessas situaes pode ser grafada na lousa e servir de apoio para escrita de poema. A anlise da estrutura do texto onde aparecem rimas? Como cada estrofe introduzida? so observaes que os alunos antecedem a situao de escrita, Cabe ao professor selecionar, da lista elaborada pelos alunos relativa s situaes de conflito e dvida, as mais adequadas para escrita, sugerindo a no repetio ou as contraditrias. Em duplas ou individualmente, os alunos podem ser solicitados a escrever o poema, mas no se excluem outras possibilidades, tais como o estudo de palavras do texto. A leitura das produes escritas dos alunos pode ser compartilhada com os colegas, numa forma de valorizao do trabalho feito. Como um assunto leva ao outro, na continuidade do trabalho propomos a leitura de outro gnero textual. Sugerimos a leitura de texto biogrfico de Ceclia Meireles (verificar, por exemplo, o link http://www.releituras.com/cmeireles_bio.asp)

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3.3.2 Atividade de ensino e aprendizagem 2Objetivos: Criar um espao de reflexo sobre as caractersticas da linguagem escrita Promover situaes de leitura e escrita de biografias e autobiografias

Antes da leitura Na conversa com os alunos, o professor destaca o significado da palavra biografia. Ele precisa saber que na biografia importante a ordem cronolgica e o uso do pretrito perfeito para orientar a produo de texto. Com esses conhecimentos, o aluno comea a ser preparado para a leitura e para a escrita. Pode-se desafiar o aluno para que pense sobre os possveis contedos, modos de organizao dos fatos ou episdios. possvel que, ao saber sobre o tipo de texto e sobre quem o texto conta, ele elabore uma imagem mental, no caso da vida da autora.

Durante a leitura A partir da leitura e da explorao feita da biografia (nome, onde nasceu, situaes vividas, ordenao temporal dos fatos, etc.), orientada pelo professor, o aluno comea a se apropriar das caractersticas do gnero e a perceber diferena entre a maneira de contar pela autora (tipo de letra, escrita em 1 pessoa, forma como conta e revela sentimentos) do autor da biografia. As hipteses feitas anteriormente, comparadas com as informaes fornecidas pelo texto, ajudaro a confirmar ou reconstruir a primeira imagem. comum biografias de autores apresentarem a lista de suas obras; neste caso, possvel consider-la dando destaque para aquelas mais conhecidas, sugerindo sua leitura. Durante a leitura, importante que o professor ajude o aluno a perceber a estrutura desse texto, anotando na lousa suas caractersticas, que sero usadas na situao de escrita.

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Depois da leitura Alm de destacar as caractersticas do texto lido, as informaes nele contidas geram estudos relacionados a outras reas do conhecimento. As datas das publicaes das obras proporcionam anlises histricas. Assim, os alunos podem agrupar informaes relativas a tempo: antes, depois, dcada, sculo. Como o aluno precisa ter contato com outros textos de mesma tipologia para se apropriar da forma e do contedo deles, sugere-se a leitura de outras biografias (verificar, por exemplo, o texto Leonardo e seu auto-retrato, disponvel em http:// pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Leonardo_self.jpg) Para ampliar o conhecimento do aluno, o professor faz a leitura com apresentao de imagens das obras de Leonardo encontradas em vrios livros e sites (sugesto Mestres das Artes Leonardo Da Vinci, Editora Moderna; A arte de Leonardo, Companhia das Letrinhas) Ao comparar a biografia de Ceclia Meireles e de Leonardo da Vinci, o aluno vai se apropriando da estrutura da biografia (o que os textos tm em comum, como se apresentam, sobre o que contam, a ordem dos fatos, etc.) Muitas biografias esto disponveis em livros e sites, assim como retratos e autoretratos (sugesto: http://pintoresfamosos.juegofanatico.cl/autorretrato-pintores.htm.) Pode-se propor, em seguida, a escrita da biografia pelo aluno. Para esse fim, ele precisar planej-la, selecionando lembranas queridas, fatos relevantes, organizando seus dados pessoais a serem registrados. No caso do aluno que no est de posse do instrumental da escrita, seu registro tem o apoio do professor (atuando como escriba) e de outros colegas mais desenvoltos no domnio da escrita. A escrita pelo professor de sua biografia, gesto simptico, pode estreitar o vnculo afetivo com os alunos, alm de dar um modelo de escrita. Como produzir textos um processo que envolve vrias etapas (planejar, escrever, revisar e reescrever), aps a produo do texto a interveno do professor ser direcionada para a reviso. A reviso no consiste apenas da correo de erros de ortografia e gramtica, incluindo aspectos que aprimorem o texto. com ajuda do professor que o aluno aprende a analisar as ideias e recursos usados que foram eficazes e como o texto pode ser melhorado.

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A reescrita coletiva pode ser objeto de reflexo e aprendizagem de um ou mais aspectos do texto (pontuao, paragrafao, recursos coesivos, escolha de linguagem, etc.), principalmente se so conhecimentos necessrios a vrios alunos. Alm disso, deve-se propor a reviso individual ou em dupla, feitas aps certo distanciamento em relao ao trabalho. O exerccio de reescrita em dupla possibilita ao aluno se colocar como leitor de outro texto, trocar opinies, crticas, o que lhe permite, depois, revisar seu prprio texto, enxergando possibilidades e fragilidades a serem superadas. Os textos, depois de revisados e reescritos, podem compor um mural (retrato, desenho, biografia) a ser compartilhado por todos os alunos e professores. Da socializao das escritas dos alunos outras exploraes se tornam possveis, como localizao no mapa do local de nascimento, das caractersticas da cidade, populao, etc. So inmeras possibilidades de leitura a partir dos dados obtidos com as informaes colocadas na escrita da biografia do aluno. Cabe ao professor selecionar outros textos para leitura, adequados aos alunos, suas vivncias e interesses.

3.4 Estudos LingusticosAs situa e s d e r e f l e x o d a l n g u a e s c r i t a c o m p o r t a m , p a r a o s alunos alfabticos, situaes que os levem a observar a grafia das palavras em busca de regularidades. Como a forma de escrever corretamente as palavras uma conveno, o conhecimento ortogrfico algo que o aluno no descobre sozinho, precisando das orientaes do professor e de situaes didticas que favoream a observao, a classificao, a construo de regras. A norma ortogrfica de nossa lngua possui correspondncias letrasom regulares e passveis de reflexo e outras que, por serem irregulares, exigem memorizao.

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Morais (1999) descreve trs tipos de regularidades: diretas, morfolgicogramaticais e contextuais. Nas regulares diretas encontramos o uso de grafias do P, B, T, D, F e V em palavras nas quais no existe nenhuma letra competindo para grafar esses sons. Nas morfolgico-gramaticais a categoria gramatical da palavra que estabelece a regra e, nas contextuais, o contexto, dentro da palavra, que vai definir qual letra ou dgrafo dever ser usada. O estudo da letra R, por exemplo, seria uma regularidade contextual, sendo possvel grafar palavras com a letra R sem precisar memorizar. Por ser um estudo complexo obriga o aluno a pensar modos distintos de raciocinar sobre as palavras, exigindo, portanto, estratgias de ensino que levem o aluno a compreender essas regras de nossa ortografia. Ao internalizar as regras do uso da letra R ele ter segurana para escrever corretamente as palavras nas quais a letra aparece e ter ampliado significativamente o repertrio de escrita.

3.4.1 Atividade de ensino e aprendizagem 3Objetivos Refletir e explicitar conhecimentos sobre as regularidades de nossa norma ortogrfica. Antes do estudo Para chegar s regras do uso da letra R, parte-se do estudo de diferentes palavras que contenham a letra em questo em diferentes posies na palavra. A lista pode ser apresentada pelo professor ou coletada pelo aluno. Para facilitar a observao, pede-se para o aluno colorir a letra em estudo, a que vem antes e a que vem depois dela, diferenciando com cores em se tratando de vogal ou consoante.

Durante o estudo Os alunos, trabalhando em pequenos grupos, classificam as palavras segundo um critrio observado (por