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Movimento & Percepção, Espírito Santo do Pinhal, SP, v. 10, n. 14, Jan./jun. 2009– ISSN 1679-8678
ARTIGO
________________________________________________________________________________
Dança na escola: um estudo a partir do discurso dos envolvidos
Marília Del Ponte de Assis Graduada em Educação Física pela PUC de Campinas/SP, especialista em Ginástica Rítmica pela UNOPAR/Londrina/PR e especialista em Dança pela PUC de Porto Alegre/RS Regina Simões Doutora em Educação Física pela UNICAMP/Campinas/SP e professora da Universidade Federal do Pará/PA Roberta Gaio Doutora em Educação pela UNIEP/Piracicaba/SP e professora do Mestrado em Educação do Centro Universitário Moura Lacerda/Ribeirão Preto/SP
Resumo
O estudo tem como objetivo analisar a realidade da dança nas aulas de Educação Física de 5ª a 8ª séries, sua relação com a formação profissional e as questões de gênero. Partindo de uma pesquisa bibliográfica, buscamos identificar as possibilidades do ensino deste conteúdo nas escolas. Em seguida, fizemos uma pesquisa de campo do tipo descritiva de opinião, na qual foi aplicado um questionário proposto por Ferreira, Góis e Gaio (2006). O universo da pesquisa foi composto por quatro professores de Educação Física de 5ª a 8ª séries de escolas particulares e estaduais da cidade de Andradas. Os resultados apontaram que a dança como um conteúdo da Educação Física escolar, mostrou-se presente no componente curricular de todos os professores que participaram desta pesquisa. Verificamos pontos relevantes na análise das contribuições da dança sendo oferecida nas escolas, tanto para o desenvolvimento motor e cognitivo, quanto social e afetivo dos alunos. Os dados obtidos reforçam a existência da dança como bloco de conteúdo obrigatório no currículo escolar, e concluímos que, tanto entre os professores quanto entre os alunos, já está havendo uma valorização dessa atividade para o desenvolvimento do ser humano, da sua cultura, promoção de saúde e qualidade de vida.
Palavras Chave: Dança, Educação Física Escolar, Gênero, Formação Profissional.
Abstract
The study analyzed the present status of dance offered in the Physical Education (PE) classes of secondary school, their relationship to the professional formation and gender. Following a literature search, a field interview was performed utilizing the questionnaire proposed by Ferreira, Góis and Gaio (2006). The research universe was composed of four teachers of Physical Educatio from 5th to 8th grades, of public and private schools located in the city of Andradas, MG. The results showed that dancing was present in the curricular grades of all teachers interviewed. Several relevant points were found, based in the analysis of the contributions of dancing offered in the schools, either for motor and cognitive development as well as social and emotional aspects of the students. The data obtained reinforce the importance of dance as a component in the mandatory school curriculum; moreover, it was also observed among teachers and students an increasing
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valorization of this activity for the development of human beings, their culture, health improvement and quality of life.
Key words: Dance, Physical Education School, Gender, Professional Formation.
Introdução
Além dos esportes, dos jogos, das lutas e das ginásticas, a Educação Física
também permite a abordagem da dança. Pensando nisso e considerando uma longa
vivência com este meio de expressão corporal e artística, nos sentimos desafiados a
investigar se esse conteúdo é explorado em aulas de Educação Física na escola, tendo
como referencial o discurso dos professores da área.
A dança, além da importância exercida em relação às capacidades de
movimentação, contribui principalmente para a formação pessoal das crianças,
jovens, adultos e idosos, sendo eles com ou sem deficiência, de ambos os sexos.
Porém, na nossa vida participamos de atividades de dança, muito mais fora do que
dentro da escola, ficando essa atividade somente restrita para eventos
comemorativos.
Entre essas possíveis datas comemorativas, podemos citar o dia do folclore, as
festas dos dias do pai e da mãe, as festas juninas e o encerramento do ano letivo,
mas a dança era apenas trabalhada como elaboração de coreografias, somente como
reprodução e não produção de conhecimento, pois na maioria das vezes essas
composições de movimentos já estavam prontas e nem sempre podíamos contribuir
com movimentos, ritmos ou expressões corporais.
Porém, tendo a escola como um local de construção e socialização de
conhecimento, de valorização das relações sócias e ampliação da cultura, é nesse
âmbito que a dança, como um conteúdo da disciplina de Educação Física, deve ser
abordada.
Publicados pelo Ministério da Educação e do Desporto (MEC) em 1997, os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PN’s) tem como objetivo nortear a educação do
país, indicando eixos temáticos fundamentais para as disciplinas escolares. De acordo
com esse documento, a dança faz parte do volume Arte (Brasil, 1997), no qual se
encontra os subsídios para um trabalho na perspectiva escolar. Já no volume
Educação Física (Brasil, 2000), a dança aparece como um complemento presente no
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bloco “Atividades rítmicas e expressivas”, que trata das danças e brincadeiras
cantadas, incluindo manifestações da cultura corporal ligadas à comunicação e
expressão através de gestos e estímulos sonoros como referencia para o movimento
corporal.
A dança está, pelos PCN’s, na escola, seja pela disciplina de arte ou pela
Educação Física. Mas é nesse momento que surge o problema desse artigo: a dança é
abordada na Educação Física Escolar? Como a dança acontece e se manifesta nas
aulas de Educação Física nas escolas? A dança é ministrada tendo como referencial os
PCN’s?
Os objetivos desse estudo são: analisar a realidade da dança nas aulas de
Educação Física de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental nas escolas da cidade de
Andradas; discutir se os PCN’s servem de referencial para elaboração do
planejamento pedagógico em dança e se os/as docentes aplicam o conteúdo dança
sem preconceitos de gênero.
Dança no contexto escolar
É através do corpo, especificamente do corpo em movimento, que agimos no
mundo, nos comunicando, trabalhando, aprendendo e sentindo o que nos rodeia. O
movimento corporal então, possibilita ao indivíduo que ele sinta o mundo, e com isso
que ele também seja sentido. Observa-se, porém, um preconceito em relação a isso,
um preconceito em relação ao movimento, no qual adultos são reprimidos e
conseqüentemente as crianças também. (STRAZZACAPPA, 2001).
Segundo a mesma autora citada, antigamente, as crianças que tinham bom
comportamento eram aquelas que não se moviam. A boa educação dos alunos e o
conceito de disciplina na escola implicavam a um não movimento. Apesar disso ainda
prevalecer em nossa sociedade, mesmo que com menos rigor, outras maneiras de se
anular o corpo foram criadas. Embora as pessoas tenham consciência de que é
através do movimento que elas se expressam, este, fica restrito apenas ao horário do
recreio e às aulas de Educação Física, e mesmo assim, de maneira precisa, tendo a
criança pouca liberdade de movimentação.
De acordo com Marques (2007, p. 15), quando a dança foi incluída nos PCN’s,
ela ganhou “reconhecimento nacional como forma de conhecimento a ser trabalhado
na escola”. Atualmente, tanto na área da Educação Física quanto de Artes, são
diversos os encontros, congressos e simpósios que incluem a dança como parte de
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seus programas, além das diversas universidades e instituições de ensino do nosso
país que promovem cursos de especialização e/ou mestrado em dança.
Muitas mudanças ocorreram no ensino ao longo dos anos. No entanto, continua-se não considerando relevante a educação rítmica nas aulas de Educação Física. A atividade musical, o contato com o som, o ritmo, o movimento, o incentivo às artes, unidas aos jogos recreativos estão enquadradas no que tange ao desenvolvimento da formação do homem. (VERDERI, 1998, p. 18)
Durante sua pesquisa, Freire (2001) fez o inquietante questionamento sobre o
porquê as crianças não aprendem dança em suas escolas, já que é tão clara a
influência desta na formação cultural da sociedade. Aproveitar a dança para estimular
o potencial dos alunos e das alunas, além dos/das docentes é apenas uma das
vantagens do ensino da dança, algo tão cultural em nosso país, quando se trata de
espaços não escolares.
Ehrenberg; Gallardo (2005) também se sentiram motivados a escrever sobre a
dança na escola, já que esta abordagem ainda é discutida de maneira equivocada.
Ao contrário do que poderíamos esperar para um país dito “dançante”, a dança é um dos conhecimentos da Educação Física pouco trabalhado nas escolas. Na verdade, referimo-nos a pouco trabalhado, pois entendemos que um conhecimento escolar deva ter sentido, significado, contextualização, além de objetivos específicos associados ao componente curricular a que se destina. E, geralmente, o trabalho de dança que encontramos nas escolas se remete a simples composições coreográficas com fins em si mesmo. (EHRENBERG; GALLARDO, 2005, p.111)
Embora a presença da dança, enquanto linguagem artística esteja referenciada
na LDB 9394/96, percebe-se que, assim como outras manifestações, ela nem sempre
é abordada nas escolas, já que há uma ausência de especialistas nessas áreas, bem
como os que lá estão, são despreparados. Algumas experiências, porém, caminham
no sentido oposto mostrando que a dança pode contribuir em diversos âmbitos.
(STRAZZACAPPA, 2001).
Discutindo a dança como uma disciplina escolar sob determinados aspectos,
Marques (1997), comenta que está havendo nos últimos anos uma maior conotação
da dança nos trabalhos e programas dos professores/as e educadores/as que se
preocupam com esta questão. A autora considera que existe uma grande diversidade
entre as atividades de dança e o seu ensino no país: ela se apresenta de variadas
formas, propostas de realização, locais, produções, que tornam o mundo da dança tão
multifacetado quanto “o mundo da educação dedicado a ela”.
Mesmo assim, como em várias partes do mundo, persistem no Brasil alguns “desentendimentos” sobre o campo de conhecimento da dança
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que já foram, vamos dizer, “resolvidos”, em outras áreas do conhecimento como a matemática, a geografia, a física: na escola, em que disciplina a dança seria ensinada? Artes? Educação Física? Será que estaria na hora de pensarmos uma disciplina exclusivamente dedicada à dança? (...) Mas o que é afinal a dança na escola? Área de conhecimento? Recurso educacional? Exercício físico? Terapia? Catarse? E...quem estaria habilitado para ensinar dança? O bacharel em dança? Ou este bacharel deveria, necessariamente, ter cursado a licenciatura? O licenciado em Educação Artística? O licenciado em Educação Física? As pedagogas e professoras formadas em magistério de 2° Grau estariam aptas a trabalhar esta disciplina nas quatro primeiras séries da escola fundamental? Enfim, que nome daríamos à “dança da escola”? Expressão Corporal? Dança Educativa? Educação pelo/do/no (etc) movimento?, entre tantos outros que escutamos por aí? (MARQUES, 1997, p. 20)
Freire (2001), referindo-se a manifestação cultural do carnaval potencialmente presente
na sociedade brasileira, questiona a realidade da dança na escola, mencionado se esse
conteúdo é considerado complexo ou simples demais para ser explorado, haja visto que, nosso
povo tem o swing como algo tão espontâneo e o molejo como característica rítmica cultural.
De acordo com Ferreira (2005), a dança na Educação Física deve estar voltada, não só
para a recreação, ou só para o treino de habilidades motoras, mas também para o equilíbrio
psíquico, para a expressão criativa e espontânea, assegurando aos alunos/as a possibilidade
de reconhecimento e compreensão do universo simbólico, possibilitando também o resgate da
cultura brasileira por meio da tematização das origens culturais, seja do índio, do branco ou do
negro, como forma de despertar a identidade social do/a aluno/a do projeto de construção da
cidadania.
Sobre isso, Marques (1997, p.20) diz: “É nesta perspectiva da diversidade e da
multiplicidade de propostas e ações que caracterizam o mundo contemporâneo que seria
interessante lançarmos um olhar mais crítico sobre a dança na escola”.
Sendo aplicada na escola, a dança pode contribuir na adoção de atitudes de valorização
e apreciação das manifestações expressivas e culturais brasileiras; na melhoria da
aprendizagem do/a educando/a, já que trabalha a percepção do próprio corpo, elemento
indispensável à aquisição das habilidades leitura e escrita; possibilita uma ampliação na
capacidade de interação social fazendo o educando conhecer e respeitar a diversidade; auxilia
no desenvolvimento cognitivo, motor e afetivo social das crianças e jovens, apontando o
movimento expressivo-corpóreo como forma de aprimoramento e domínio do esquema
corporal, da estruturação espacial e da orientação temporal, elementos estes responsáveis por
grande parte da aprendizagem da criança. (FERREIRA, 2005).
Isoladamente, assim como qualquer outro estímulo, fica difícil a dança auxiliar em tudo
aquilo que o/a aluno/a necessita, mas irá contribuir com boa parte de sua formação. Verderi
(1998, p.32) ratifica nossas idéias quando diz:
Considerando a educação como evolução e transformação do indivíduo, considerando a dança como um conteúdo da Educação Física, expressão da corporeidade, e considerando o movimento um meio para se visualizar a corporeidade de nossos alunos, a dança na escola deve
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proporcionar oportunidades para que o aluno possa desenvolver todos os seus domínios do comportamento humano e através de diversificações e complexidades, o professor possa contribuir para a formação de estruturas corporais mais complexas.
Para que se torne bem sucedido, é necessário que o trabalho da educação,
através da dança, atinja metas, tais como: desenvolvimento de um indivíduo integral,
ampliação do repertório motor; promoção da formação estética; desenvolvimento da
noção corporal; produção e divulgação de conhecimento a partir da experiência de
cada um. (FREIRE, 2001)
Por sua forma lúdica e não competitiva, ela passa a ser agente formador e
transformador, possibilitando oportunidades de humanização, diversificação e
democratização, conforme os PCN’s, pois valoriza as diferenças, limitações e
capacidades de cada um, integrando estes itens num contexto só, aproveitando sem
discriminação qualquer movimento ou expressão do/a aluno/a, pondo em prática
então o verdadeiro sentido do "pertencimento e compartilhamento", conceitos sempre
citados para uma educação inclusiva. (FERREIRA, 2005).
Strazzacappa (2001) destaca que, infelizmente, ainda existe dentro da própria
escola, o preconceito que é com aqueles que se dirigem a ela para lecionar dança. A
começar por alguns professores/as, que consideram a dança algo de pouca
importância em relação ás outras disciplinas, menosprezando essa atividade motora,
sendo indiferente a sua existência enquanto conteúdo. Outra questão vem relacionada
ao preconceito de gênero: para não afastar os meninos das aulas, os/as discentes
intitulam as aulas de dança de expressão corporal, educação pelo movimento entre
outras terminologias.
Não podemos deixar de considerar que, atualmente, já existem muitos
docentes preocupados com este conhecimento e com os processos metodológicos que
serão utilizados no trato com esse conteúdo. São vários os significados que a dança
tem para os/as alunos/as, e o que os diferencia, normalmente, é a prática
metodológica utilizada pelos/pelas professores/as. Ehrenberg; Gallardo (2005, p. 114)
completam esta questão dizendo:
Sem dúvidas existem várias formas culturais de se compreender a dança, formas estas construídas ao longo dos tempos e específica de cada local, mas não existe sentido em estudar tais manifestações desvinculadas de seu contexto social, político, histórico. É necessário ir além do movimento por si só e com fins em si mesmo. A dança, como outras manifestações da cultura corporal, é capaz de inserir o seu aluno ao mundo em que vive de forma crítica e reconhecendo-se como agente de possível transformação, mas, para tal é necessário não apenas contemplar estes conteúdos e sim identificá-los, vivenciá-los e interpretá-los corporalmente.
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Há de se concordar com Marques (1997), que os/as docentes, mesmo os que
têm procurado obter informações, experiências, práticas e discutido a relação ao
ensino da dança, ainda, na maioria dos casos, não sabem exatamente o que, como ou
porque ensinar dança na escola.
O profissional de Educação Física, dentre outros, pode explorar o conteúdo de
dança naqueles que vivenciam este modo de expressão, seja onde for,
proporcionando com isso uma emancipação intelectual, afinal: “(...) a dança é isto:
educação, arte e múltiplos outros papéis que ela vem assumindo em diferentes
momentos históricos, sociais, políticos e culturais.” (GAIO; GÓIS, 2006, p.20).
A proposta central de Marques (1997) se dá em função da escolha do contexto
a ser trabalhado com os/as alunos/as. A autora propõe que deve haver um “tema a
ser desenvolvido” e não um “objetivo a ser desenvolvido”, no qual o interlocutor
dessas práticas artístico-educativas deve possibilitar uma relação entre corpo, mente,
movimento, indivíduo, história de vida e conteúdos da dança, num contexto que será
trabalhado, compreendido, problematizado e transformado por esse processo
artístico-educativo que é o mundo da dança.
Antes de qualquer coisa, numa proposta de ensino da dança para crianças e
jovens, o/a docente deve conhecê-los, saber o que necessitam, entendendo e
verificando suas vontades e seus medos, para, aí sim, elaborar um programa de
dança educacional adequada. O/A professor/a também deve aproveitar os
conhecimentos advindos dos alunos e das alunas, mas que muitas vezes não foram
despertados, trabalhando a partir deles, no desafio de promover novos
conhecimentos, mais complexos. (VERDERI, 1998).
Torna-se muito importante também, de acordo com Gaio; Góis (2006), que
este profissional investigue, discuta e entenda a dança, pensando nesta em relação ao
corpo e o movimento, para posteriormente, explorá-la. Todos devem participar do
processo de composição das coreografias, e até de questões relacionadas às
apresentações, discutindo os movimentos, os temas, os acessórios, dentre outras
ações, lembrando que todos, sem exceção, devem participar desse processo.
A utilização de materiais alternativos promove a participação de todos, num
processo coletivo, no qual alunos e alunas têm a oportunidade de construir e utilizá-
los durante o desenvolvimento da criação da dança. Isso, incorporado a diversidade
rítmica do nosso país, com músicas, festas, costumes e crenças, torna-se um
conteúdo muito rico a ser explorado pelos profissionais de Educação física que atuam
com a dança. (GAIO; GÓIS, 2006).
Os alunos e as alunas são emoções, sentimentos e histórias de vida e, os/as
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profissionais na escola devem estar preparados/as para trabalhar a dança
considerando esse ambiente que permeia a subjetividade do ser enquanto
corporeidade viva.
Rangel (2002) fala que a dança, assim como a Educação, apresenta seus
“descaminhos”. Isso acontece quando o indivíduo que dança se vê obrigado a utilizar
técnicas precisas e limitadas no seu processo educativo, ao invés de explorar suas
infinitas possibilidades de se mover. Não que o trabalho técnico não seja importante,
mas existem professores que, de tão preocupados com as apresentações de festinhas
na escola, criam coreografias que na maioria das vezes o aluno ainda não incorporou
no seu vocabulário motor.
Ainda com base nas colocações da autora, esta forma de conduzir a dança
coloca o corpo em segundo plano, alienando o indivíduo, fazendo com que a dança
perca suas características de liberdade e espontaneidade. Ou seja, assim, o ensino da
dança interfere no desenvolvimento desses alunos, não permitindo liberdade de
expressão e descoberta do próprio corpo com suas diversas possibilidades de
manifestação.
Este profissional também precisa sentir-se criador, intérprete e espectador,
recriando-se e expressando com clareza seu próprio discurso, mostrar-se aberto a
ouvir discussões entre os alunos e alunas. Desta relação surgem surpreendentes
experiências, formando laços de confiança, sinceridade e companheirismo que
conduzem ao processo educacional às conquistas e sucessos de ambos, tornando essa
socialização de conhecimentos gratificante para quem ensina e para quem aprende.
(BARRETO, 2004).
Gaspari (2005) acredita que a dança pode ser adaptada à escola de acordo com
as características, necessidades e pressupostos educacionais de cada instituição e seu
contexto. Apesar da distância entre o que é proposto e o que efetivamente acontece
na prática, as propostas oficiais da dança na educação não devem ser pensadas como
uma utopia, e sim, como passos importantes na direção de uma nova mentalidade.
Metodologia
Foi feita uma pesquisa descritiva, baseada em Rudio (2003, p.69), que tem
como finalidade “(...) conhecer e interpretar a realidade sem nela interferir para
modificá-la”. Dentre as formas que uma pesquisa descritiva pode aparecer, optou-se
pela descritiva de opinião, a qual “(...) procura saber que atitudes, pontos de vista e
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preferência tem as pessoas a respeito de algum assunto, com intuito geralmente de
se tomar decisões sobre o mesmo”. (RUDIO, 2003, p.71)
Para analisar a visão da dança no ambiente escolar, a pesquisa foi realizada
com professores de Educação Física, de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental, de
escolas particulares e estaduais da cidade de Andradas, Minas Gerais.
Os critérios de seleção para a escolha das escolas que participaram da pesquisa
foram: escolas que tinham de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental; que tinham a
Educação Física inserida na grade curricular; que se localizassem na área urbana da
cidade; que os/as diretores assinassem uma Carta de Autorização; que os/as
docentes assinassem um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, concordando
em participar da investigação.
A cidade de Andradas possui um total de cinqüenta e uma escolas, sendo cinco
particulares, sete estaduais e vinte e sete municipais. Deste total, três particulares,
três estaduais e cinco municipais têm Ensino Fundamental. Do total de onze escolas,
somente cinco atendiam crianças de 5ª a 8ª séries, sendo elas somente escolas
estaduais e particulares. O universo da pesquisa foi definido como 100% a partir
desses critérios de inclusão e exclusão, porém, uma escola particular foi eliminada,
pois o participante não respondeu o questionário no prazo estipulado, o que
prejudicaria o andamento da pesquisa.
Dessas escolas, os sujeitos analisados foram os professores de Educação Física,
totalizando quatro docentes, sendo dois de escolas particulares e dois de escolas
estaduais.
Para a realização da pesquisa, foi aplicado um questionário proposto por
Ferreira, Góis; Gaio (2006). Esse questionário foi instrumento de uma pesquisa
realizada na cidade de Piracicaba, aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade
Metodista de Piracicaba/SP.
Resultados e discussões
Apresentamos neste momento os dados obtidos tendo como referencial,
primeiramente, os dados pessoais dos participantes e, posteriormente, a
sistematização das perguntas abertas e fechadas de acordo com o questionário
proposto por Ferreira, Góis; Gaio (2006).
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Em relação à idade, temos:
Quadro 1. Idade dos participantes Idade % de participantes
Entre 20 a 29 anos 25%
Entre 30 a 39 anos 25%
Entre 40 a 49 anos 50%
Quanto ao sexo, temos:
Quadro 2. Sexo dos participantes Sexo % de participantes
Feminino 75%
Masculino 25%
Sobre o ano de formação dos professores, temos:
Quadro 3. Ano de formação dos participantes Ano de Formação % dos participantes
entre 1980 e 1989 50%
entre 1990 e 1999 25%
entre 2000 e 2006 25%
Em relação à área de formação dos participantes, temos que todos, ou seja,
100% deles são formados em Educação Física.
Quanto aos conteúdos que são explorados pelos participantes nas aulas de
Educação Física, o quadro 4 nos mostra a seguinte realidade:
Quadro 4. Conteúdos explorados pelos participantes Conteúdos explorados % de participantes
Esportes 75%
Ginástica 100%
Dança 100%
Jogos 75%
Lutas 0%
Outros 50%
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Analisando a resposta de 25% dos professores que citaram abordar também o
teatro, nos baseamos em Barreto (2004), que em sua leitura, valeu-se do volume
Arte, dos PCN’s, citando objetivos que se pretende com o ensino da arte aos seus
alunos. Dentre esses objetivos, segundo a autora a dança, o teatro, as artes visuais e
a música devem interagir com instrumentos, materiais e procedimentos diversos,
conhecendo-os e experimentando-os em seus trabalhos. Foram citadas ainda algumas
estratégias, enquanto técnicas, para se chegar aos objetivos da dança na escola,
como atividades lúdicas que envolvam mímicas e interpretações de cenas e músicas,
ressaltando que a dança e o teatro não devem caminhar juntos apenas para serem
reconhecidos em determinadas ocasiões.
Ehrenberg; Gallardo (2005) citam que o aluno deve se sentir como parte que
integra a formação e recriação de qualquer que seja a manifestação cultural
trabalhada nas aulas, de modo que os conteúdos tenham significado e façam sentido
para eles.
De acordo com os PCN’s (Brasil, 2000, p. 27), deve-se contemplar “(...)
múltiplos conhecimentos produzidos e usufruídos pela sociedade a respeito do corpo e
do movimento”, assim a Educação Física pode ser fundamental em atividades
culturais que tenham como finalidades o lazer, a saúde, a socialização e a expressão
de sentimentos. Deve-se então, formular propostas para a Educação Física nas quais
sejam trabalhados os benefícios psicológicos e fisiológicos a partir dessas
manifestações, ou seja, do jogo, do esporte, da ginástica, da dança e da luta.
Esses conteúdos, como parte da cultura corporal, são explicitados por Castellani
Filho (2002, p. 54), quando o autor cita que:
(...) integrante da cultura do homem e da mulher brasileiros, a cultura corporal constitui-se como uma totalidade formada pela interação de distintas práticas sociais, tais como a dança, o jogo, a ginástica, o esporte que, por sua vez, materializam-se, ganham forma, através das práticas corporais. Enquanto práticas sociais, refletem à atividade produtiva humana de buscar respostas às suas necessidades. Compete, assim, à Educação Física, dar tratamento pedagógico aos temas da cultura corporal, reconhecendo-os como dotados de significado e sentido porquanto construídos historicamente.
Quando questionados sobre os conteúdos explorados, as justificativas foram as
seguintes: 75% dos professores citaram que estes conteúdos fazem parte dos
Conteúdos Básicos Comuns (CBC’s); 25% dos participantes justificaram trabalhar
apenas a dança e a ginástica, pois no colégio, esse tipo de aula é voltado apenas para
discentes do sexo feminino, e procura-se então explorar nas alunas a expressão
corporal, flexibilidade e a postura.
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Pesquisando o que seriam os Conteúdos Básicos Comuns (CBC’s) citados pelos
professores, e qual a finalidade deste documento, obtivemos informações que esses
conteúdos são citados como essenciais de todas as disciplinas dos ensinos
Fundamental e Médio, visando a construção do aprendizado do aluno, indicando eixos
temáticos importantes dentro da Educação Física escolar. Como uma proposta oficial
do estado de Minas Gerais, desde 2006 os CBC’s são obrigatórios em todas as escolas
estaduais deste estado, e foram elaborados por professores das escolas do Projeto
Escola Referência (Projer), da Secretaria de Estado de Educação (SEE). Os técnicos do
Projer dão suporte às escolas e suas equipes na implantação dos CBC.1
Sobre a questão que envolve 25% dos professores que ministram os conteúdos
de ginástica e dança em suas aulas, apenas para meninas, como proposta
metodológica da escola para a disciplina Educação Física, há que se levantar as
seguintes questões: Como fica o papel do/da professor/a de Educação Física como
agente transformador da sociedade? O/A docente não promove na escola uma
discussão sobre co-educação como fato relevante para educação atual, que prevê a
comunhão entre meninos e meninas em atividades diversas? Como o/a docente
participa do processo de resignificação da sociedade frente à quebra da hierarquização
do poder do homem sobre a mulher e as conseqüências disso para ambos os sexos?
A prática de todo professor, mesmo que de forma pouco consciente, apóia-se em determinada concepção de aluno, ensino e aprendizagem, que é responsável pelo tipo de representação que o professor constrói sobre o seu papel, o papel do aluno, a metodologia, a função social da escola e os conteúdos a serem trabalhados. (DARIDO; SANCHEZ NETO, 2005, p. 2)
Os conteúdos não explorados foram justificados da seguinte maneira: 50% dos
professores citaram não ministrar aulas de lutas por falta de capacitação profissional e
por não possuírem um conhecimento pedagógico concreto em relação a este
conteúdo; 75% dos participantes citaram que a falta de espaço físico e recursos
materiais também impedem a abordagem das lutas nas aulas de Educação Física;
quanto às lutas, 25% citaram que, assim como a natação e os esportes radicais, são
dados como conteúdo informativo teórico, já que a escola não dispõe de materiais e
espaço necessários para a prática dos mesmos; foi justificado por 25% não abordar os
esportes, jogos e lutas, pois as aulas têm um tempo curto e acontecem apenas uma
vez por semana, com isso, trabalha-se mais com coreografias propriamente ditas.
A partir desses levantamentos, os estudos de Ehrenberg; Gallardo (2005)
colocam que, mesmo sabendo que as aulas de Educação Física devem abordar os
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conhecimentos relacionados à dança, aos esportes, aos jogos, às ginásticas e às lutas,
dentre outras propostas, a fim de que estas manifestações culturais sejam realmente
explicitadas através do corpo, dependendo do espaço físico, dos recursos materiais,
do tempo e diversos outros fatores, estes conteúdos manifestam-se de diferentes
formas.
Igualmente, há de se concordar com os PCN’s (Brasil, 2000) quando citam que
na realidade das escolas brasileiras, os espaços disponíveis para as práticas que
envolvem a Educação Física geralmente não têm qualidade e adequação necessárias.
A união de esforços da comunidade e do poder público é determinante na busca de
alterações deste panorama.
Quanto questionados se possuem conhecimento dos conteúdos propostos pelos
PCN’s e se acham que são significativos para o processo pedagógico em Educação
Física, os participantes deram as seguintes respostas: 100% afirmaram ter
conhecimento sobre os PCN’s, sendo que deste total, 25% completaram dizendo ter
algum conhecimento, cabendo ao professor estar se atualizando, modificando e
aprendendo sempre, pois acham os conteúdos importantes; 25% completaram sua
resposta citando que os PCN’s trabalham com todos os eixos dos conteúdos
curriculares básicos, não só em Educação Física, mas em todas as outras disciplinas,
abrangendo a proposta pedagógica da escola, os temas transversais e assuntos
contemporâneos, havendo uma interdisciplinaridade na organização dos projetos e
das demais áreas e 25% apenas citaram que alguns, e não todos os conteúdos são
significativos para o processo pedagógico.
De acordo com Darido; Sanchez Neto (2005) podemos compreender que a
abordagem dos PCN’s se propõe a uma construção da cidadania de forma crítica,
elaborando questões sociais a partir dos temas transversais. Deste modo, a Educação
Física deve promover os princípios da inclusão, inserção e integração dos/das
alunos/as à cultura corporal de movimento, através de vivências críticas relacionadas
a cada conteúdo.
A tarefa do/a docente de Educação Física é considerar as características dos/das
alunos/as em suas dimensões corporal, social, cognitiva, ética, afetiva e estética, para
garantir através do conteúdo e do processo de ensino escolhido que o aluno tenha
acesso às práticas da cultura corporal. Dessa perspectiva, os PCN’s (Brasil, 2000, p.
28) ressaltam que:
1http://www.agenciaminas.mg.gov.br/detalhe_noticia.php?cod_noticia=6234 - Site acessado em 26/09/07
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A Educação Física permite que se vivenciem diferentes práticas corporais advindas das mais diversas manifestações culturais e se enxergue como essa variada combinação de influências está presente na vida cotidiana. As danças, esportes, lutas, jogos e ginásticas compõem um vasto patrimônio cultural que deve ser valorizado, conhecido e desfrutado. Além disso, esse conhecimento contribui para a adoção de uma postura não-preconceituosa e discriminatória diante das manifestações e expressões dos diferentes grupos étnicos e sociais e às pessoas que dele fazem parte.
Em relação à dança:
Os PCNs são, portanto, uma alternativa para que professores que por ventura desconheçam as especificidades da dança como área de conhecimento possam atuar de modo a ter alguns indicativos para não comprometer em demasia a qualidade do trabalho artístico-educativo em sala de aula. Não se trata, obviamente, de querer instrumentalizar, capacitar e até mesmo formar professores de dança a partir desses documentos, mas como o próprio nome diz, indicar parâmetros. (...) (MARQUES, 2007, p. 36)
Se já trabalharam os temas transversais nas aulas de Educação Física, qual
(quais) e de que forma, temos:
Quadro 5. Temas transversais já trabalhados nas aulas Tema Transversal % de participantes
Saúde 50%
Sexualidade 50%
Cidadania 50%
Pluralidade Cultural 25%
Ética 25%
Meio Ambiente 25%
Consumo 25%
Sobre os temas transversais e de acordo com Marques (2007, p. 36 e 37) é
necessário analisar que:
O trabalho com os temas transversais na área de dança tem interface com outras disciplinas do currículo em que o corpo também é um dos principais eixos de articulação e trabalho (...) Acima de tudo, é de vital importância ressaltar que o trabalho com os Temas Transversais não deve se sobrepor aos conteúdos específicos dessa área de conhecimento, mas sim ampliar sua prática e reflexões de modo a abranger os aspectos sociais, afetivos, culturais e políticos da dança em sociedade.
Sobre a forma como trabalham os temas, 75% dos participantes afirmaram ser
através de projetos; 25% através de práticas esportivas em grupos e individuais,
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além dos projetos e 25% mostrando a importância de se manter o corpo saudável e
livre de lesões.
Deve ser proporcionada aos alunos uma associação entre a dança e uma vida
saudável, além de outras relações, de modo que eles possam colaborar identificando
problemas e dados sobre situações da educação para a saúde, pois como completa
Marques (2007, p. 55) “Centrada no corpo, as aulas de dança podem traçar relações
diretas com situações de dor e prazer, alimentação, uso de drogas e prevenção e cura
de lesões, sem que se afaste de seus conteúdos específicos”.
A partir dessa reflexão, podemos dizer que a Educação Física precisa refletir
amplamente sobre a saúde e seus conceitos, e de acordo com Rodrigues; Galvão
(2005), privilegiando também as dimensões social, afetiva, psicológica e cultural.
Sobre a utilização de bibliografias da área e quais seriam, temos:
Quadro 6. Bibliografias consultadas pelos participantes Bibliografias % de participantes
CBC’s 75%
PCN’s e CBC’s 50%
Revistas Especializadas 25%
João Batista Freire 25%
Nenhuma 25%
Tendo em vista que o único autor citado pelos participantes foi João Batista
Freire, tomamos como fonte de pesquisa uma das obras do autor para a análise desta
questão. Freire (1992) diz que podemos promover a educação pelos movimentos,
tendo em vista que estes são produzidos num certo nível, servindo de base para
outras aquisições mais elaboradas. Enxergar e privilegiar o movimento humano com
suas intenções e sentimentos é o que está faltando na Educação Física. E somente
com indivíduos conscientes, dinâmicos e realizadores, a escola será transformada num
lugar que realmente tenha significado para as crianças.
Sobre a “cultura” em Freire, Daolio (2004, p. 24) diz que este autor “(...)
enfatiza como tarefa da educação física o desenvolvimento das habilidades motoras,
porém num contexto de jogo e de brinquedo, desenvolvidas a partir do universo da
cultura infantil que a criança possui.”
A forma como trabalham a Educação Física para meninos e meninas nos
forneceu as seguintes respostas: 75% dos professores responderam trabalhar em
suas aulas da mesma maneira com meninos e meninas, integrando ambos os sexos, e
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desta porcentagem total, 25% completaram que trabalham assim principalmente na
Educação Infantil e nos primeiros anos da Educação Básica, e, no período da
adolescência, por surgirem mais diferenças e contrastes físicos, cabe ao professor
usar estas possíveis “diferenças” a favor dos alunos, discutindo, debatendo e
encontrando soluções democráticas e satisfatórias para todos; 25% completaram
dizendo em suas respostas que, além das informações sobre regras esportivas,
também orientam seus alunos com relação à nutrição e aos benefícios da atividade
física para uma melhor qualidade de vida e 25% dos participantes trabalham mais
especificamente com coreografias, alongamento e força, em aulas de dança e
ginástica ministradas somente para meninas.
Cabe aqui ressaltar que os PCN’s (Brasil, 2000) sinalizam que a cultura corporal
entre meninos e meninas pode ser diferente, considerando as experiências oriundas
do viver fora da escola, pois algumas habilidades com bola são socialmente mais
próximas dos meninos, e as meninas acabam por aperfeiçoar mais as habilidades
relacionadas com esportes artísticos, em função de determinadas experiências. O fato
é que, por existir um estilo diferente entre meninos e meninas, os modos de atuação
desses dois grupos devem, mutuamente, se completar e se enriquecer, deixando de
lado conflitos baseados em preconceitos e estereótipos.
O/A docente tem o compromisso de promover um diálogo entre meninos e
meninas e assim ampliar a cultura corporal de ambos, considerando os
acontecimentos que por ventura sinalizem vivencias diferenciadas, porém devem se
utilizar desse fato para trabalhar de forma igualitária os movimentos, fazendo que
ambos os sexos experimentem movimentos antes nunca vivenciados.
O que normalmente acontece é que os meninos não querem participar das
aulas de dança por acharem que isto os rotularia de afeminados e que a graciosidade
é uma característica exclusivamente feminina. Essa cultura que distancia os garotos
das aulas de dança deve ser combatida com propostas na perspectiva da co-
educação, isto é, o/a docente deve criar espaços para levar meninos e meninas a se
relacionarem em harmonia, sem preconceitos, quebrando assim o paradigma da
hierarquia do poder masculino.
Ao serem questionados se, na concepção deles, a dança traz contribuições para
o processo educativo dos alunos, e o porquê, 100% dos participantes da pesquisa
afirmaram que sim, sendo que deste total, 50% citaram a dança como mais uma
opção corporal para o aluno expressar seus sentimentos, com base em suas
limitações; 25% citaram que como uma importante manifestação cultural, a dança
além de proporcionar muitos benefícios físicos e motores, também é utilizada no
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trabalho e performances teatrais e 25% afirmaram que a dança extravasa a timidez,
pois trabalha a auto-estima e valorização do ser humano.
Sem o objetivo do rigor técnico e da perfeição de movimento, os alunos podem
adquirir noções de posições, posturas e movimentações das danças, experimentando
e vivenciando o espírito de cada uma.
Haas; Garcia (2006) destacam que a dança pode promover: a melhoria e o
aperfeiçoamento das capacidades físicas, como coordenação, equilíbrio, resistência,
força e velocidade; o desenvolvimento e a melhoria da natureza cognitiva do ser
humano, despertando potencialidades reflexivas como raciocínio, concentração,
atenção, criatividade e senso crítico; o desenvolvimento e a melhoria da consciência
corporal e espaço-temporal; e também o desenvolvimento da educação e consciência
rítmica e dos sentidos.
A dança não só dá a oportunidade de aquisição de habilidades, como contribui
para o aprimoramento das habilidades básicas, dos padrões fundamentais e de outras
potencialidades que poderão surgir, cabendo ao professor explorar o potencial de cada
aluno, possibilitando então seu desenvolvimento natural e estimulando sua
criatividade. (VERDERI, 1998).
Sobre se vêem a possibilidade de abordar os temas transversais em aulas de
dança, qual (quais) e como, temos que 100% dos participantes afirmaram sim, sendo
que deste total, 25% citaram trabalhar o tema preconceito através de filmes como
“Billy Eliot” e “Ela dança eu danço”; 25% disseram trabalhar os temas saúde,
pluralidade cultural e meio ambiente, bastando expressar estas propostas dentro do
contexto de uma dança ou música e 25% completou esta questão citando apenas que
a dança é um teatro rítmico e uma manifestação da vida.
Tais afirmações vêm ao encontro do que queremos, pois conforme Marques
(2007) cita, em uma sociedade machista como a nossa, a manifestação de
preconceitos ainda é muito grande, principalmente no que diz respeito ao gênero e à
dança. Geralmente, esse preconceito está no imaginário da sociedade, ou seja,
mesmo sem ter assistido a um espetáculo de balé clássico, por exemplo, as pessoas
erroneamente já associam que este estilo apresenta características avessas à
virilidade.
A proposta de transversalidade contida nos PCNs (...) aponta para possibilidades de relações críticas entre a dança e a sociedade, pois propõe tessituras de interfaces entre temas de relevância social e conteúdos curriculares específicos. Contudo, o trabalho com os Temas Transversais continua em larga escala sem articulação prática por parte de grande parcela dos professores. A proposta da transversalidade ainda se apresenta distante e complexa, principalmente para o professorado
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que pouco domina os conteúdos específicos da própria dança. (MARQUES, 2007, p. 102)
Quando relacionou a dança às questões de gênero e, principalmente ao tema
transversal Pluralidade Cultural, Marques (2007, p. 37-38), fala que pela linguagem
da dança, podemos trabalhar e discutir isto em nossa sociedade, já que:
(...) Em primeiro lugar, o corpo em si já é expressão da pluralidade. Tanto os diferentes biótipos encontrados hoje no Brasil quanto a maneira com que esses corpos se movimentam, tornam evidentes aspectos sócio-político-culturais nos processos de criação em dança. Em segundo lugar, as relações espaço-temporais contidas nas danças tradicionais (rituais, populares) e nas produções artísticas teatrais (moderno, clássico, contemporâneo) estão diretamente relacionadas à pluralidade cultural, pois expressam e comunicam conceitos e vivências de diferentes épocas e espaços geográficos. Portanto, na dança também estão contidas as possibilidades de compreendermos, desvelarmos, problematizarmos e transformarmos as relações que se estabelecem em nossa sociedade entre etnias, gêneros, idades, classes sociais e religiões.
Os PCN’s (Brasil, 2000), colocam que, dentro das aulas de Educação Física, os
alunos podem aprender muito sobre as diferentes manifestações da cultura corporal,
principalmente a dança, através de filmes, vídeos e da televisão. Quando os alunos e
alunas passam a ter acesso, independente de que maneira, a apresentações de
dança, ginástica, jogos de futebol e ainda Jogos Olímpicos e Pan-americanos, dentre
outros, ele não só aprende mais sobre corpo e movimento de determinada cultura
como também passa a valorizar mais essas manifestações. O poder da mídia é muito
grande atualmente, cabendo ao professor resgatar e contextualizar à dança o que
existe de positivo e proporcionar também debates com críticas e questionamentos
sobre os meios de comunicação e as formas como estes apresentam aspectos éticos,
padrões de estética, beleza e saúde.
Por fim, ao questionamento se o conteúdo dança pode ser trabalhado com
meninos, meninas ou ambos os sexos, 100% dos professores afirmaram que a dança
pode ser trabalhada, sim, com ambos os sexos.
É uma questão positiva saber que todos os participantes concordam que a
dança deve ser abordada com os dois sexos, apesar disso não acontecer na prática
por 100% deles, por razões impostas pela escola e não por vontade própria de 25%
dos professores, que só dão aulas de dança para meninas.
Os estudos de Marques (2007, p. 40), vêm ao encontro de nossos anseios, no
sentido de mostrar que:
Dançar, compreender, apreciar e contextualizar danças de diversas origens culturais pode ser uma maneira de trabalharmos e discutirmos
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preconceitos e de incentivarmos nossos alunos a criarem danças que não ignorem ou reforcem negativamente diferenças de gênero.
Os PCN’s (Brasil, 2000, p. 83) sugerem um cuidado especial em relação às
competências de meninos e meninas, pois “Muitas dessas diferenças são
determinadas social e culturalmente e decorrem, para além das vivências anteriores
de cada aluno, de preconceitos e comportamentos estereotipados”.
Conclusão
Ao analisarmos o questionamento deste trabalho sobre a realidade da dança no
ambiente escolar, verificamos que o objetivo principal foi respondido. A dança como
um conteúdo da Educação Física escolar, mostrou-se presente no componente
curricular de todos os professores que participaram desta pesquisa. Isto mostra que,
no contexto desta pesquisa, tanto entre os/as professores/as quanto entre os/as
alunos/as já está havendo um maior reconhecimento da importância desta atividade
motora, cultural e artística.
Através das revistas especializadas, dos artigos e dos livros utilizados como
fonte durante o período da pesquisa, podemos verificar pontos relevantes na análise
das contribuições da dança sendo oferecida nas escolas para o desenvolvimento
motor, cognitivo, social e afetivo dos alunos. Entendemos, então, porque a dança é
parte obrigatória no currículo escolar.
Julgamos relevante refletir sobre a contribuição dos conteúdos da Educação
Física para a construção do ser humano como cidadãos e cidadãs e assim, pensar a
dança e sua influência na sociedade, é trazer a baila o valor que esse conteúdo pode
ter nas escolas, para os/as professores/as e para comunidade envolvida no processo
de aprendizagem dos alunos e das alunas, para além do simples movimentos
automatizados, estereotipados e das danças apresentadas nas festas tradicionais do
folclore e nas datas comemorativas em geral.
O ambiente sócio-cultural que faz parte deste processo torna-se rico e muito
útil na medida em que aproxima os fatos da vida dos/das alunos/as aos conceitos que
devem ser trabalhados em aula incluindo, principalmente, a Educação Física, pelo
contato próximo que permite com os/as alunos/as.
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Consideramos o papel do/a professor/a durante as aulas como essencial neste
processo educativo. O conhecimento dos conteúdos que serão abordados na Educação
Física, incluindo a dança, devem ser estudados e aplicados respeitando as
individualidades de cada aluno e quebrando preconceitos.
Este estudo, juntamente com outros, pode estimular os profissionais que atuam
nas escolas, em especial os professores e as professoras de Educação Física, a
pensarem na dança como conteúdo da Educação Física a ser abordado em sua
amplitude de movimentos, estilos, alcance cultural, propiciando discussões sobre
diversas temáticas atuais, inclusive os temas transversais, com meta a quebrar
paradigmas de gênero e contribuir para a construção de uma sociedade que entenda e
atenda as diferenças, diminuindo dessa forma o preconceito que possa surgir de
conceitos antes explorados, tais como: a dança é atividade somente das meninas,
somente as crianças leves e elegantes podem participar de coreografias em dança, o
gordinho jamais pode se apresentar em composições de danças, entre outros.
Nas palavras de Gaio; Góis (2006, p.17) finalizamos esse trabalho, assumindo,
como profissional de Educação Física, o compromisso de continuar estudando e
refletindo sobre essa temática, para que cada vez mais possamos viver numa
sociedade onde caibam todos, ao mesmo tempo diferentes, em suas constituições
biológicas e culturais, e iguais nos seus direitos sociais e políticos:
A dança como possibilidade de movimentos livres, que nascem pela vontade de se comunicar por meio dos gestos, das expressões que emanam dos sentimentos, dos valores gerados pelo cotidiano, pelas dificuldades e pelos prazeres de viver, remete-nos a o encontro com o outro e com os outros, e, mais do que uma simples coreografia, ela constrói realidade social, cultural, política, enfim, aborda uma temática que pode ser uma linguagem voltada a transformações em benefício da própria existência dos seres humanos.
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Data de recebimento: 27/ 02//09 Data de aceite: 29/03/09 Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.
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