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HERMENUTICA
FILOSFICA
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Edna Selma David Silva
Maria dos Milagres da Cruz Lopes
Maria dos Santos Silva Lopes
HERMENUTICAFILOSFICA
So Lus
2013
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SUMRIO
APRESENTAO
INTRODUO
UNIDADE 1
ELUCIDAES HISTRICO-CONCEITUAIS SOBRE O TERMOHERMENUTICA
1.1 Apresentando a hermenutica...........................................................1.2 Evoluo da hermenutica na Filosofia Moderna..............................1.3Hermenutica e linguagem................................................................
1.4 Hermenutica: Uma aproximao com a Histria.............................
UNIDADE 2
HERMENUTICA CLSSICA
2.1 A hermenutica universal de Schleiermarcher............................2.2 Romantismo e historicismo na hermenutica de Dilthey.............
2.2.1 A frmula hermenutica de Dilthey........................2.2.1.1 Experincia.................................................................2.2.1.2 Expresso..................................................................2.2.1.3 Compreenso.............................................................
2.2.2 Hermenutica e historicismo no pensamento de Dilthey...
UNIDADE 3
DA INTERPRETAO DOS TEXTOS PARA UMA HERMENUTICA DAFACTICIDADE
3.1 A compreenso existencial...............................................................
3.2 A estrutura da interpretao..............................................................
3.3 O crculo hermenutico.....................................................................
UNIDADE 4
A LINGUAGEM COMO COMPREENSO EM GADAMER
4.1 Da estrutura prvia da compreenso de Heidegger para o conceitode pr-compreenso em Gadamer....................................................................
4.2 Coisas ou coisas-elas-mesmas.........................................................
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4.3 A positivao do pr-conceito pela distncia temporal......................
4.4 O tempo como filtragem dos pr-conceitos.......................................
4.5 A influncia dos efeitos histricos para a compreenso....................
4.6 A fuso de horizontes como realidade da compreenso...................
UNIDADE 5
HERMENUTICA FILOSFICA EM PAUL RICOEUR
5.1 Paul Ricoeur: sua vida e suas obras..................................................
5.2 O ponto de partida da reflexo hermenutica de Ricoeur.................5.2.1 Paul Ricoeur e cogito cartesiano..........................................
5.2.2 Paul Ricoeur e a fenomenologia de Husserl........................
5.3 O sentimento filosfico da hermenutica em Ricoeur: do mundo dotexto conscincia histrica narrativa....................................................
5.3.1 Ricoeur: o percurso da hermenutica e suas interlocues
5.3.2 Ricoeur: da hermenutica dos smbolos hermenutica doMundo ao Texto.......................................................................................
RESUMO
REFERNCIAS
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PLANO DE ENSINO
DISCIPLINA: Hermenutica Filosfica
Carga Horria: 60 horas
1. EMENTA: Hermenutica e Filosofia. O Carter Metodolgico e Filosficoda Hermenutica. O Crculo Hermenutico. Problemas HermenuticosContemporneos.
2. OBJETIVOS
2.1 Geral
Caracterizar a hermenutica em seus pressupostos, identificando no contextocontemporneo seus principais tericos.
2.2 Especfico
- Caracterizar a hermenutica em sua definio, mbito e significado;- Definir o significado moderno da hermenutica;
- Apresentar os principais tericos da hermenutica contempornea.
3. CONTEDO PROGRAMTICO:
UNIDADE 1ELUCIDAES HISTRICO-CONCEITUAIS SOBRE O TERMOHERMENUTICA
1.1 Apresentando a hermenutica
1.2 Evoluo da hermenutica na Filosofia Moderna.
1.3 Hermenutica e linguagem.
1.4 Hermenutica: uma aproximao com a Histria
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UNIDADE 2
HERMENUTICA CLSSICA
2.1 A hermenutica universal de Schleiermarcher2.2 Romantismo e historicismo na hermenutica de Dilthey1.2.1.1 A frmula hermenutica de Dilthey
2.2.1.1 Experincia
2.2.1.2 Expresso
2.2.1.3 Compreenso
2.2.2 Hermenutica e historicismo no pensamento de Dilthey
UNIDADE 3
DA INTERPRETAO DOS TEXTOS PARA UMA HERMENUTICA DAFACTICIDADE
3.1 A compreenso existencial
3.2 A estrutura da interpretao
3.3 O crculo hermenutico
UNIDADE 4
A LINGUAGEM COMO COMPREENSO EM GADAMER
4.1 Da estrutura prvia da compreenso de Heidegger para o conceitode pr-compreenso em Gadamer
4.2 Coisas ou coisas-elas-mesmas
4.3 A positivao do pr-conceito pela distncia temporal4.4 O tempo como filtragem dos pr-conceitos
4.5 A influncia dos efeitos histricos para a compreenso
4.6 A fuso de horizontes como realidade da compreenso
UNIDADE 5
HERMENUTICA FILOSFICA EM PAUL RICOEUR
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5.1 Paul Ricoeur: sua vida e suas obras
5.2 O ponto de partida da reflexo hermenutica de Ricoeur
5.2.1 Paul Ricoeur e cogito cartesiano
5.2.2 Paul Ricoeur e a fenomenologia de Husserl
5.3 O sentimento filosfico da hermenutica em Ricoeur: do mundo dotexto conscincia histrica narrativa
5.3.1 Ricoeur: o percurso da hermenutica e suas interlocues
5.3.2 Ricoeur: da hermenutica dos smbolos hermenutica do Mundoao Texto
4. METODOLOGIA
O desenvolvimento e a avaliao da disciplina sero realizados de acordo comas diretrizes e orientaes para a Educao a Distncia.
5. AVALIAO
A avaliao em perspectiva dos objetivos considerar a leitura dos textos eatividades propostos e a participao em todas as atividades concernente ao
desenvolvimento da disciplina.
6. REFERNCIAS
ABBAGNANO. Dicionrio de Filosofia. 3. ed. So Paulo: Martins Fontes,1999, p.946-947.
BLEICHER, J. Hermenutica Contempornea. Lisboa: Edies 70, 1992.
CAMARGO, Maria de Nazar, AMARAL Pacheco. Perodo clssico da
hermenutica filosfica na Alemanha. So Paulo: Editora da Universidade
de So Paulo, 1994.
CORETH, E. Questes Fundamentais de Hermenutica. So Paulo:EPUIEDUSP, 1973.
. O problema da Conscincia Histrica; Organizador: Pierre
Fruchon. Traduo Paulo Csar Duque Estrada. Rio de Janeiro: Fundao
Getlio Vargas, 1998.
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. Esttica y Hermenutica. Introduccin de ngel Gabilondo.
Traduccin de Antonio Gmez Ramos. 3. ed. Espana:Tecnos, 2006.
. Introduo Hermenutica Filosfica.Traduo de Benno
Dischinger. So Leopoldo: UNISINOS, 1999, Coleo Focus.
DE MORI Geraldo. Hermenutica filosfica e hermenutica bblica em Paul
Ricoeur.http:/www.teoliteraria.com capa v. 2, n. 4, 2012.
DESCARTES, Ren. Meditaes Metafisicas. Traduo de Maria Ermantina
Galvo. So Paulo: Martins Fontes, 2000.
DILTHEY, Wilhelm. A construo do mundo histrico nas cincias
humanas. So Paulo: UNESP, 2010.
FRUCHON, Pierre. Lhermeneutique de GadamerPlatonisme et modernit.
Paris: Les ditions du Cerf, 1994GADAMER, Hans-Georg. Hermenutica em
retrospectiva. Petrpolis, RJ: Vozes, 2007.
GADAMER, Hans-Georg. Verdade e mtodo. Traos Fundamentais de uma
Hermenutica Filosfica. Traduo de Flvio Paulo Meurer. 3. ed. Petrpolis:Vozes, 1999.. Verdade e mtodo II. Complementos e ndices. Traduo de nioPaulo Giachini. Petrpolis: Vozes, 2002.
. O problema da conscincia histrica. Organizador: PierreFruchon. Traduo Paulo Csar Duque Estrada. Rio de Janeiro: FundaoGetlio Vargas, 1998.
. Esttica y hermenutica. Introduccin de ngel Gabilondo.Traduccin de Antonio Gmez Ramos. 3. ed. Espana: Tecnos, 2006.
. A atualidade do belo: a arte como jogo smbolo e festa. Traduode Celeste Ainda Galeo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1985.
GRONDIN. Jean. Introduction Hans-Georg Gadamer; La nuit surveille.Paris: Les Editions du Cerf,1999.
. Introduo hermenutica filosfica. Traduo de BennoDischinger. So Leopoldo: UNISINOS, 1999, Coleo Focus.
http://www.teoliteraria.com/tlj/index.php/tlt/indexhttp://www.teoliteraria.com/tlj/index.php/tlt/indexhttp://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=geraldo+de+mori+hermenutica+&source=web&cd=1&cad=rja&ved=0CDIQ6QUoATAA&url=http%3A%2F%2Fwww.teoliteraria.com%2Ftlj%2Findex.php%2Ftlt%2Fissue%2Fview%2F5&ei=3HLPUcxD4crTAdHNgYAE&usg=AFQjCNEv-ShZGFihWLZZ8uVV2UKowzIXTQhttp://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=geraldo+de+mori+hermenutica+&source=web&cd=1&cad=rja&ved=0CDIQ6QUoATAA&url=http%3A%2F%2Fwww.teoliteraria.com%2Ftlj%2Findex.php%2Ftlt%2Fissue%2Fview%2F5&ei=3HLPUcxD4crTAdHNgYAE&usg=AFQjCNEv-ShZGFihWLZZ8uVV2UKowzIXTQhttp://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=geraldo+de+mori+hermenutica+&source=web&cd=1&cad=rja&ved=0CDIQ6QUoATAA&url=http%3A%2F%2Fwww.teoliteraria.com%2Ftlj%2Findex.php%2Ftlt%2Fissue%2Fview%2F5&ei=3HLPUcxD4crTAdHNgYAE&usg=AFQjCNEv-ShZGFihWLZZ8uVV2UKowzIXTQhttp://www.teoliteraria.com/tlj/index.php/tlt/index7/24/2019 Fasciculo de Hermeneutica
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GRONDIN, Jean. Introduo hermenutica filosfica. Traduo de Breno
Dischinguer. So Leopoldo: Ed. Unisinos, 1999, 336p. (coleo Focus).
________ O pensamento de Gadamer. So Paulo: Paulus, 2012.
________ Jean. Hermenutica. Traduo de marcos Marciolino. So Paulo,
2012.
HEIDEGGER, Martin. (GA 63; SS 1923). Ontology: The Hermeneutics of
Facticity.Trad. Jon van Buren. Indiana: Indiana University Press, 1999.
________, Ser e Tempo. Traduo de Mrcio de S Cavalcanti, Petrpolis:
Vozes, 1988, v. 1.
HEKMAN, Susan J. Hermenutica e sociologia do conhecimento. Traduode Lus Manoel Bernardo. Lisboa: Edies 70, 1986.
JAPIASS, Hilton & Marcondes Danilo. Dic ionrio bsico de fi lo so fia. 3. ed.
ver. e ampliada. Rio de Janeiro: Zahar, 1996.
JERVOLINO. Domenico. Introduo a Ricoeur, So Paulo: Paulus, 2011.
MONGIN, Olivier. Paul Ricoeur. As f ronte i ras da f i losof ia. Lisboa: Instituto
Piaget, 1994.
OLIVEIRA, Manfredo Arajo de. Reviravolta lingustico-pragmtica nafilosofia contempornea: So Paulo: Loyola, 1996.
OSS, A.O. Diccionario de hermenutica. Bilbao: Universidad de Deusto,
1997.
PALMER, Richard E. Hermenutica. Edies 70: Portugal, 2011.
REALE, Giovani e ANTISERE, Drio. Histria da filosofia: do romantismo atnossos dias. So Paulo: Paulinas, v. 3, 1991.
REIS, Rbson Ramos dos, ROCHA, Ronai Pires da. Filosofia hermenutica.
Santa Maria: Ed. Da UFSM, 1990.
RICOEUR, Paul. Temps et rcit I. Lintriguei et le rcit historique. Paris:Seuil,1983.
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______. Do tex to aco ensaio s de h ermenut ica II. Portugal: Rs
Editora, 1990.
_____. O conf lito das i nt erp retaes: ensaios de hermenutica. Rio deJaneiro: Imago, 1978.
_____. O si-mesmo como um outro. So Paulo: Papirus, 1991.
ROHDEN, Luiz. Hermenutica Filosfica. So Leopoldo: Unisinos, 2002.
Col.Idias.
SCHMIDT, K. Lawrence. Hermenutica. Petrpolis, RJ: Vozes. 2012.
SCHLEIERMACHER, Friedrich D.E. Hermenutica: arte e tcnica da
interpretao. 2.ed. Vozes: Petroplis.
SILVA, Maria Lusa P. F. da, O Preconceito em H.-G. Gadamer: sentido deuma Reabilitao. Coimbra: FCG, JNICT, 1995.
SPEERBER-CANTO, Monique (Org). Dicionrio de tica e filosofia moral.
So Leopoldo: UNISINOS, I e II, 2003.
STEIN, Ernildo. Aproximaes sobre hermenutica. 2. ed. Porto Alegre:
Edipucrs, 2010, 115p.
________. A caminho de uma fundamentao ps-metafsica.Porto Alegre:EDIPUCRS, 1997.
________. Para alm da interpretao. Trad. de R. Paiva. Rio de Janeiro:Tempo Brasileiro, 1999.
VATTIMO, Gianni. Para alm da interpretao: o significado da hermenutica
para a filosofia. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1999.
________ Gianni. Introduo a Heidegger. Lisboa: Edies 70, 1971.
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APRESENTAO
Caro estudante,
com grande contentamento que apresentamos a voc a disciplina
Hermenutica Filosfica. A hermenutica, de modo geral, caracterizada como
a arte de interpretar, o que a situa dentre os diversos campos do saber, diante
da necessidade de compreenso das variadas abordagens que se pode ter de
temas expressos em textos. Tal necessidade pressupe, diante do avano
cientfico ocorrido no contexto moderno, a utilizao de um mtodo no intuito
de dar objetividade s variadas interpretaes para que se perceba o sentido
daquilo que proposto nos textos.
A questo do sentido tornou-se ao longo desse processo a grande tarefa
da hermenutica. Portanto, podemos considerar que as expresses, de modo
geral, carregam uma mensagem, querem transmitir algo e esse algo nem
sempre expresso ou compreendido. necessrio, ento que a mensagem
comunique e faa sentido. Para tanto, recorre ao uso da linguagem como um
dos recursos fundamentais no processo de comunicao, pois atravs dela
que os discursos so construdos, por meio da linguagem que significamos e
passamos a dar sentido s coisas e ao mundo. Nas palavras de Alexandre
Costa (s/d, p. 6) ahermenutica justamente um discurso acerca do modo
humano de lidar com essas significaes que atribumos s coisas.
Ento, carssimos, convidamos voc a imergir nessa profunda discusso
sobre o sentido que a hermenutica possibilita sobre os discursos j que estes,
ao contrrio da mera descrio, significam a realidade, permitindo que esta
faa sentido para ns.
Bom estudo!
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INTRODUO
O presente estudo tem por finalidade apresentar a hermenutica a partirdas elucidaes histrico-conceituais que o prprio termo remete para depois
perfazer um caminho que vai do perodo denominado clssico at os nossos
dias. Inicialmente, faremos uma apresentao do termo e da sua significao
enquanto arte da interpretao. Nesse sentido, temos a partir da primeira
unidade a origem etimolgica que se assenta, na sua denominao mais
originria, no mito do semideus Hermes Trimegisto considerado o mensageiro-
alado. Nesse contexto, preciso considerar o mito diante da funo que eleexerce, ou seja, como cenrio onde se inicia a mensagem, com aparecimento da
palavra e da escrita, elementos essncias da interpretao. O mito no
resgatado aqui no sentido de sustentao da realidade atravs de suas
narrativas, mas pela introduo do discurso, pela importncia que este assumir
ao longo da histria humana. Seguidamente, observamos que o termo
interpretao vai sendo, ampliando na tentativa de responder s diversas
interpretaes da realidade. Nesse sentido, constroem-se uma variedade de
teorias que podem atender s variadas interpretaes do real. Assim, a
hermenutica vai adquirindo contornos tcnicos em detrimento da difuso do
pensamento cientfico moderno, o que permitiu um avano nos estudos de textos
medida que promove a reinterpretao dos mesmos. Com esse avano a
hermenutica adequa-se cada vez mais s exigncias de um novo cenrio, o
moderno, ampliando o universo da interpretao, passando pelo chamado
crculo hermenutico, cuja especificidade d-se na relao do todo de um texto
em relao s partes que o compem, na tentativa de compreender o significado
resultante dessa relao.
Schleiermacher tem uma participao fundamental nesse processo de
construo da hermenutica, pois, ele quem a transfere do mbito tcnico
cientfico para o filosfico, por isso considerado o pai da doutrina da arte, a
arte da interpretao.
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A interpretao da realidade, das coisas, por seu turno, exige a
linguagem, pois esta quem possibilita a compreenso daquilo que se quer
comunicar. A linguagem , portanto, doadora de sentido, na medida em que
permite a interao entre o leitor e o texto.
Outro fator considerado a histria, pois nesta se descortinam uma
variedade de culturas e nela estas se alternam, exigindo uma interpretao
sempre atualizada. Nesse sentido, a histria sintetiza a relao todo e partes,
objetos da hermenutica, considerando que essa sntese est sempre em
processo, que a caracterstica intrnseca da primeira. A compreenso o elo
que une historiador e hermeneuta nesse processo de significao das coisas, do
homem, da prpria histria, da histria humana que se desdobra que cria erecria e no, meramente, descreve fatos.
A questo do sentido o que diferencia a abordagem cientfica das
coisas, de um modo geral, da abordagem hermenutica que o possibilita quando
compreende, interpreta e no apenas descreve. Essa maneira de compreender
distancia-se do rigor de uma interpretao tcnica, sem perder a legitimidade,
proporcionando um enriquecimento para hermenutica, cuja expresso se faz
notar nos filsofos, Schleiermacher, Dilthey, Heidegger e Gadamer.
Schleiermacher se destaca por unificar as variadas hermenuticas
propostas por variadas disciplinas em uma hermenutica universal na tentativa
de superar os limites que estas, isoladamente, apresentam, propondo uma
organizao sistemtica das mesmas. Prope assim uma hermenutica
unificada do processo de unificao.
A seguir, apresentaremos a hermenutica a partir do romantismo ehistoricismo em Dilthey, na qual repousa a proposta de objetividade que se
estrutura na mesma proporo em que o autor pretende resguardar a
humanidade, geralmente descaracterizada nas abordagens puramente tcnico-
objetivas. Com isso o autor se contrape ao Positivismo e ao Realismo e em
propores menores supera ainda o psicologismo e o historicismo quando estas
abordagens reduzem a compreenso do texto pura objetividade sem
considerar elementos da totalidade que sustentam as cincias do esprito. Paratanto prope um mtodo, pautado na experincia, na expresso e na
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compreenso, elementos que enredaro toda a vivncia, a partir das individuais
at a totalidade, para resguardar o sentido que se desdobra no curso da histria,
na medida em que nela que o homem se faz compreender e se
autocompreende.
Na unidade 3 abordaremos o filsofo hermeneuta Heidegger que constri
sua proposta na esteira da historicidade proposta por Dilthey. O filsofo realiza
ainda a virada que promove a hermeneutica ao mbito da filosofia, dando
mesma um carter fenomenolgico, j que considera necessria essa
abordagem para resgatar a questo do ser, fundamento essencial da existncia.
Trata-se, pois, de uma hermenutica da existncia. Heidegger constri assim
uma hermenutica prpria ancorada na concepo de Daseinser a, a partirda qual se compreende o modo prprio do ser que caracteriza a existncia.
Outro ponto marcante da Filosofia Hermenutica de Heidegger a
questo do entendimento como projeto que ele situa no horizonte da
antecipao de significados, que por sua vez possui um pr-saber, uma previso
e uma pr-apropriao, elementos fundamentais da interpretao.
Heidegger retoma a questo do crculo hermenutico, j enfatizado por
Schleiermacher e Dilthey, embora pretenda resolver o problema enfrentado
anteriormente, qual seja, interpretar independentemente dos preconceitos. Ento
parte de uma adequada abordagem destes a partir de uma elaborao de uma
estrutura de antecipao do entender das prprias coisas que por sua vez se
do a conhecer atravs da linguagem. Nesse sentido, Heidegger insere a
questo da linguagem como um caminho para a hermenutica.
A unidade 4 aborda a hermenutica de Gadamer o qual se destaca entreos anteriores por ampliar alguns dos conceitos propostos pelos mesmos. O
hermeneuta, autor de Verdade e Mtodoreconstri a problemtica das cincias
do esprito, na qual insere uma nova interpretao do crculo hermenutico para
a defesa de uma hermenutica universal da linguagem.
A pretenso da verdade em Gadamer prescinde do resgate da ideia de
pr-conceito em Heidegger, assim como o resgate da hermenutica como obra
de arte, na medida em que atravs desta se alcana a verdade.
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Gadamer apresenta a hermenutica a partir do conceito de pr-
compreenso enquanto fundamentao de uma hermenutica das Cincias do
Esprito fundamentada no horizonte da compreenso e da linguagem. Para
tanto, recorre questo do crculo hermenutico de Heidegger enquanto crculo
da interpretao e da compreenso para o seu prprio crculo, o crculo do todo
e das partes. O autor prope uma ampliao na noo de crculo hermenutico
anteriormente definido para uma concepo prvia da perfeio para uma
unidade completa de sentido, o que pressupe uma anlise histrica para
afirmao da coisa.
Gadamer chama a ateno aos falsos preconceitos, na medida em que
estes inviabilizam uma interpretao coerente e adequada da coisa, favorecendoa alienao, a recusa da tradio. Para superar esta dificuldade o hermeneuta
de Verdade e Mtodo prope a pr-compreenso como ponto de partida,
seguida da indagao. A relao do preconceito positivo com a verdade
desenrola-se a partir da distncia temporal, na medida em que esta favorece a
compreenso e o sentido da coisa. Por seu turno essa compreenso contnua,
d-se no tempo e este por sua vez favorece uma filtragem que permite superar
os falsos pr-conceitos e favorecendo a construo da conscincia histrica,fator essencial na hermenutica de Gadamer. A compreenso histrica tem que
ser compreendida a partir de dois horizontes: o de quem compreende e o de
quem compreendido, formando assim a fuso de horizontes na qual a
compreenso se realiza.
A unidade 5 trata da hermenutica de Paul Ricoeur. O filsofo apresenta
uma hermenutica interpretativa, expressando, em ltima instncia, o interesse
pela existncia. O interesse de sua investigao tem como marco afenomenologia que conheceu atravs de Edmund Husserl e seguidamente com
mestre Jean Nabert dedica-se ao estudo da liberdade e ao problema do mal,
temas que sustentam todo seu projeto filosfico.
A proposta de Paul Ricoeur perpassa pela filosofia da reflexo, ancorada
no cogito cartesiano; a filosofia fenomenolgica que tem em Edmund Husserl
seu alicerce, apesar da crtica referente interpretao idealista realizada por
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ele; e a filosofia hermenutica a partir da referncia do mundo do texto
conscincia histrica reflexiva, cuja relao intitula uma de suas obras.
Ao ampliar o universo da compreenso Ricoeur encontra o suporte na
fenomenologia, cuja abordagem ele se apropria para fundamentar suahermenutica, mas depois vai alm dela, na medida em que fundamenta o
mundo dos textos, do sujeito capaz de interpretar a si mesmo com um outro.
Trata-se do pensamento maduro de Ricoeur. Nessa passagem do pensamento
fenomenolgico para o hermenutico ele constri a hermenutica do outro como
si mesmo, a chamada ipseidade da temporalidade narrativa e historicidade. O
sujeito compreendido nessa dialtica o ponto alto de sua hermenutica.
Essas so, portanto, as linhas gerais do pensamento desses filsofos que
tanto contriburam para uma interpretao do mundo e do homem a partir da
experincia histrico-lingustico que sustenta a relao destes.
Ento, mais uma vez lhe convidamos a enveredar por essa riqueza que a
filosofia apresenta agora sob a modalidade da Hermenutica.
Aproveitem bem o material e bom estudo!
Professoras:
Edna Selma David Silva
Maria dos Milagres da Cruz Lopes
Maria dos Santos Lopes Silva
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1 ELUCIDAES HISTRICO-CONCEITURAIS SOBRE O TERMO
HERMENENUTICA
Objetivos desta unidade
Apresentar a hermenutica e mostrar sua relao com a
linguagem;
Mostrar o crculo hermenutico como proposta de compreenso
do texto em relao s suas partes;
Mostrar a hermenutica como processo de redescobrimento do
sentido original de textos; Especificar o objeto da hermenutica que se desdobra no
horizonte do sentido;
Mostrar a relao sentido, significado e linguagem no processo de
interpretao;
Mostrar a distino entre o mtodo usado pelas cincias naturais
e o mtodo hermenutico.
1.1 Apresentando a hermenutica
A necessidade de compreender o mundo repousa na abordagem e
interpretao que se faz do mesmo. nesse horizonte que se situa a
hermenutica. Mas o que a hermenutica?
A palavra vem do grego hermeneutik e significa a arte de interpretar. A
afirmao, embora precisa, carece de aprofundamento, pois uma definio da
Hermenutica pressupe que se remonte sua origem com suas significaes,
no grego, do verbo hermeneuein, que significa interpretar e do substantivo
hermenia, interpretao. A interpretao est presente em textos da
Antiguidade, como no Organonde Aristteles, em Plato, bem como em textos
de Xenofonte, Plutarco, Eurpedes, Epicuro, Lucrcio e Longino. Contudo, sua
origem mais remota est na mitologia grega, associada ao semideus Hermes, o
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deus-mensageiro-alado. Tanto o verbo hermeneuein, quanto o substantivo
hermenia, dizem respeito a ele, pois hermeios refere-se ao sacerdote do
orculo de Delfos. Logo, Hermes o interprete dos deuses; era fazia a
mediao entre a vontade dos deuses e a correspondncia humana.
Compreender Hermes como mensageiro da palavra, identific-lo
como o descobridor da linguagem e da escrita,
ferramentas essenciais da compreenso, pois
ao interpretar a mensagem dos deuses, ele
atualiza a mensagem do destino, que quer
dizer hermeneuein, isto , mediador e portador.
A hermenutica, portanto, tem sua origem noprocesso de compreenso, pela linguagem.
Entretanto, considerando a origem mitolgica
que encerra a explicao, h de se duvidar
dessa conexo etimolgica, embora, Lawrence
Schimidt (2012, p. 18) encontre nela um bom
recurso heurstico.
A transliterao do verbo grego hermeneuein para hermenutica,
palavra latina, foi cunhada pelo alemo Johann Dannhauer no sculo XVII e
significa expressar em voz alta, explicar ou interpretar e traduzir. Mas a
compreenso maior da palavra vem atravs da traduo latina da palavra
grega que interpretatio, o que justifica a afirmativa de que a Hermenutica a
arte de interpretar, ou simplesmente, interpretao.
Assimilando a interpretao no uso mais corrente e mais abrangente,
considera-se que a hermenutica tenha surgido com a fala, ou seja, no
momento em que o homem comea a falar. J no que diz respeito escrita, a
frequncia com que se utiliza a hermenutica d-se quando os textos se
tornam mais significativos, quando conseguem exprimir uma linguagem
coerente. Surge a partir de ento a necessidade de desenvolver vrias teorias
da interpretao correspondente s vrias abordagens do real, especificamente
a interpretao correta da lei, da Bblia, e j no contexto moderno a
interpretao dos clssicos a partir da filologia. Nesse contexto, a
SAIBA MAIS
Hermes Trimegisto, deus grego
mensageiro-alado-hermes, filho de
Zeus e de Maia. Seus atributos
principais: astcia e
inventividade, domnio sobre as
trevas, interesse pela atividadedos homens, psicopompia. oque sabe e por isso transmite
toda cincia secreta. Foi
confundido com Paulo, em Listra,
quando este realizou um milagre,
pois Hermes " aquele que lhe
dirigia a palavra"(At 14, 11-12).
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Hermenutica assume um sentido mais tcnico: a tcnica de interpretao da
lei, a tcnica de interpretao da Bblia, a tcnica de interpretao dos
clssicos, ou estudo filolgico.
A tcnica de interpretao da Bblia vale ressaltar, foi valorizada em umcontexto, no qual a palavra expressa nos escritos bblico-teolgicos, assumiu
uma importncia capital, cuja formao literria desenvolveu-se atravs das
reinterpretaes tendo o seu incio no Antigo Testamento, numa prtica
contnua dos Hebreus que alm de tais reinterpretaes, adaptadas sua
contemporaneidade, reliam as profecias luz dos ltimos acontecimentos, que
se constituam para eles fatos inerentes a sua histria salvfica, como tambm
a interpretao semantolgica de sonhos e vises.
A hermenutica, para os judeus, h que ser considerada pelo seu
carter de interpretao atualizante, pois tanto a torh quanto os profetas,
falam sempre s geraes os que leem. Contam histria, sim, mas no por
mero interesse historicstico, mas, antes, uma histria atualizante com uma
mensagem para os contemporneos, fazendo com que o sentido histrico do
autor s tenha valor na medida em que fale ainda para o presente.
A histria da hermenutica esta assentada no cho de problemas
filosficos, exegticos e teolgicos, tais como: a arte da compreenso, o valor e
a interpretao da tradio humanstica, o conhecimento como hermenutica
do ser, a historicidade da verdade, o papel do sujeito na interpretao, as
vrias funes da linguagem e a relao entre as filosofias e ideologias.
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1.2 Evoluo da Hermenutica na Filosofia Moderna
O destaque dado ao contexto moderno em relao hermenutica
acontece em funo do avano proposto pela Reforma Protestante, quando
fora reclamada uma interpretao literal da Sagrada Escritura, numa tentativa
de evitar os variados sentidos dados aos textos. A reclamao se situava na
ordem da normatividade, tanto na hermenutica teolgica como na
hermenutica humanista da Idade Moderna. Martinho Lutero (1483-1546)
protagonista de uma verdadeira revoluo na hermenutica bblica, pois com
seus princpios de Sola Scritura e Scritura sui ipsius interpres; a Reforma
Protestanterompe com a interpretao bblica
da tradio, da Igreja e do Magistrio e torna a
Bblia um livro de interpretao individual.
Com a Reforma protestante, a
hermenutica deixa de ser um mtodo para
interpretar a sagrada Escritura, para tornar-se uma
disciplina autnoma, tendo como objeto obras
literrias ou artsticas.
Um nome importante, considerado um
dos pais dessa nova disciplina Matias Flcito
Ilrico (1520-1575), telogo luterano que
sublinhando a autossuficincia da Escritura,
prope o crculo hermenutico, com que se
aplica o todo atravs das partes.
Por crculo hermenutico entende-se o
processo de compreenso do todo de um
texto, a partir das preconcepes dos
significados das partes e do modo como estas
se relacionam. As preconcepes que o leitor
possa ter de um texto acrescenta-lhe algo, d-
lhe sentido, porque ultrapassa o que est
http://www.grupoescolar.com
SAIBA MAISNascido em Eisleben, naSaxnia (1483), entrou para aordem dos agostinianos, ondecompletou seus estudosteolgicos e foi ordenadosacerdote. Publica em 1517 asfamosas Noventa e cinco teses,
cuja investida principal era deposicionamento contra apregao das Indulgncias.Excomungado pela IgrejaCatlica, na Dieta de Worms(1521) rompe definitivamente
com a Igreja de Roma,acompanhado e apoiado pormuitos prncipes, bispos,padres e leigos alemes. Nasua imensa produo teolgicao destaque para oscomentrios bblicos, sendoclebres trs breves ensaios: nobreza crist da nao alem;O cativeiro babilnico da Igrejae a Liberdade Crist.
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escrito, sem descaracteriz-lo, ao mesmo tempo em que o enriquece. Autor e
texto formam assim um todo recheado de significado e sentido. O crculo
caracteriza-se por ser um processo contnuo, entre o todo e as partes, cuja
importncia ocorre quando este sistematiza o processo de compreenso e
interpretao proposto pela hermenutica.
As figuras 1 e 2 configuram essa inter-relao das partes a partir de suas
preconcepes, oferecendo uma compreenso do todo.
Figura 1: Inter-relao das partes
Fonte:http://www.dgz.org.br/abr09/Art_04.htm
Figura 2
Fonte:http://www.mayane.com.br/2010/09/circulo-hermeneutico.html
http://www.dgz.org.br/abr09/Art_04.htmhttp://www.dgz.org.br/abr09/Art_04.htmhttp://www.mayane.com.br/2010/09/circulo-hermeneutico.htmlhttp://www.mayane.com.br/2010/09/circulo-hermeneutico.htmlhttp://www.mayane.com.br/2010/09/circulo-hermeneutico.htmlhttp://www.dgz.org.br/abr09/Art_04.htm7/24/2019 Fasciculo de Hermeneutica
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Gadamer (1999, p. 274), filsofo alemo, ao aludir sobre este mtodo,
tece sua crtica:
[...] esta relao circular do todo e das partesno , em si, nenhuma novidade. A retricaantiga j sabia disso, ela que compara odiscurso perfeito com o corpo orgnico com arelao entre a cabea e os membros, por isso contundente ao dizer que o que dahermenutica bblica interessa enquanto pr-histria da hermenutica moderna das cinciasdo esprito o princpio escriturstico daReforma, radicado no princpio da retricaclssica, trazida por Lutero e seus seguidorespara o campo da compreenso.
A obra Verdade e Mtodo continua, sendo utilizada para situar oprincpio de interpretao da Escritura Sagrada da teologia da Reforma:
Lutero e seus seguidores transferiram essaimagem conhecida da retrica clssica aoprocedimento da compreenso, edesenvolveram como princpio fundamental egeral de uma interpretao de texto o fato deque todos os aspectos individuais de um textodevem ser compreendidos a partir de um
contextus, do conjunto, e a partir do sentidounitrio para o qual o todo est orientado, oscopus (1999, p.276).
Por conseguinte, Gadamer (1999, p. 276)vai concluir sua crtica:
[...] tambm a teologia da Reforma dogmticae confunde o caminho a uma s interpretaoindividual da Escritura Sagrada, que tivesse emmente o conjunto relativo de uma escritura, suafinalidade e sua composio, cada vez emseparado.
Quanto ao que da Reforma nos interessa para a historicidade da
hermenutica, que com o iluminismo, a interpretao fortemente
influenciada pelo racionalismo; e quando surge o mtodo histrico-crtico na
teologia que visa explanar o sentido tcnico e direto do texto bblico, e
particularmente . A obra de Spinoza Tratactus Theolgico, osdois caminhos
de desenvolvimento da doutrina da arte da compreenso e da interpretao
eram o filolgico e teolgico, at que no sculo dezoito com J.H. Ernesti, a
hermenutica sagrada torna-se um departamento da hermenutica filosfica.
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Gadamer considera que somente com Semler e Ernesti se desvencilhou
de enquadramentos dogmticos, liberou-se a si mesma e elevou-se a um
significado universal de um organon histrico:
[...] homens como Semler e Ernestireconheceram que, para compreenderadequadamente a Escritura, pressupe-sereconhecer a diversidade de seus autores, eabandonar, por consequncia, a unidadedogmtica do cnon. Com essa liberao dainterpretao do dogma (Dilthey), a reuniodas Escrituras Sagradas da Cristandadeassume o papel de reunir fontes histricas que,na qualidade de obras escritas, tm desubmeter a uma interpretao no somentegramatical, mas tambm histrica (1999, p.
276-278).
A hermenutica contempornea reconhece Schleiermacher como pai da
hermenutica. Celso R. Braida (1999, p. 15) ao lhe conferir o mrito de
precursor da hermenutica filosfica o faz pelo fato de ter sido ele,
Schleiermacher, aquele que transferiu a hermenutica do mbito tcnico e
cientfico para o filosfico. Citando Schleiermacher (1999, p. 15):
Visto que a arte de falar e compreender(correspondente) esto contrapostas uma outra, e falar , porm, apenas o lado doexterior do pensamento, assim a hermenuticaest conectada com a arte de pensar e,portanto, filosfica.
Na inferncia de Schleiermacher, as obras de Wolf, Ast, sobretudo de
Ernesti no correspondem as suas expectativas: Eu mesmo fui levado a
procurar uma tal introduo, tanto para mim mesmo como para os meus
ouvintes, quando pela primeira vez eu tive que fazer cursos de interpretao.Mas foi em vo (1999, p. 26).
Referindo-se sobre o limite da hermenutica de Wolf e Ars,
Schleiermacher pontua:
Todavia, meus dois guias me limitam de vriosmodos: um na medida em que ele fala apenasde escritores os quais devem sercompreendidos, como se o mesmo noocorresse tambm na conversao e no
discurso imediatamente ouvido; o outro namedida em que ele logo limita o estranho
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aquilo que est redigido em lngua estrangeira,e, deste modo, s obras do esprito assimredigidas, o que constitui um domnio aindamais restrito do que aqueles dos escritores emgeral (1999. p. 31-32).
Estas preliminares sobre Schleiermacher so para respaldar aimportncia desse autor na trajetria da hermenutica. O movimento realizado
por este autor ao elaborar o mtodo de uma hermenutica universal faz com
que ela seja a arte da compreenso e no da explicao limitada s obras
escritas. Tal compreenso inclui tambm o discurso oral, e tanto o ato da fala
como o da escrita so fatos lingusticos, considerados no contexto da lngua
como no modo de quem fala.
Schleiermacher aborda o conceito de crculo hermenutico, mas talconceito s ser tratado mais adiante quando o prprio Gadamer o pressupe
a partir de uma conceituao prpria.
Gadamer, na segunda parte de sua principal obra Verdade e Mtodo,
tratando da questo da compreenso, traa o fio condutor da histria da
hermenutica, apresenta-a como advinda de duas vertentes: da teologia e a da
filologia. A primeira, ainda que num processo reformista, com a preocupao
de assegurar a tradio; esta ltima, vista como um instrumento para assegurar
a literatura clssica, portanto, uma hermenutica em processo de
redescobrimento, cuja tarefa, tanto no cho da tradio bblica, como da
tradio literria, buscar, des-velar, descobrir o sentido original dos textos.
Sobre esses autores, Schleiermacher e Gadamer se discorrer mais
adiante, no momento recorreu-se aos mesmos para sustentar a questo do
crculo hermenutico.
Como se verificou nesse processo de construo histrica, esta arte no
to recente, porm, s ganhou autonomia no final do sculo XIX, quando da
necessidade de tratar de forma mais objetiva as cincias relacionadas s
questes humanas propriamente, ou as ditas cincias humanas. Pelo prprio
contexto no qual elas se inseriam, havia uma necessidade de encontrar o
fundamento epistemolgico que as sustentava, ou seja, era necessrio
especificar o objeto de estudo. Para tanto, se fez necessrio tambm encontrar
um mtodo que garantisse alcan-lo com objetividade, j que a interpretao
precisa ser correta, coerente.
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Surge a tendncia hermenutica com a proposta de compreender o que
est alm da escrita, dos textos, da realidade de um modo geral. Trata-se de
uma releitura daquilo que se j supe conhecer, para que se tenha uma
percepo mais criteriosa, mais especfica dos objetos de estudo que cada
situao envolve, pois diferentemente da abordagem das cincias naturais que
tem como objetivo uma descrio exata da realidade, dos fatos, tal como eles
acontecem e tal como a realidade se constitui a partir de sua estrutura prpria,
as cincias humanas, em cujo mbito se situa a hermenutica, busca uma
compreenso do real para alm do que est posto, analisa outras
possibilidades de compreenso e conhecimento da realidade. Podemos ento
compreender a hermenutica como uma tendncia ou corrente, j que ela no
se limita a objetos especficos e determinados, como fazem as cincias
naturais principalmente, mas por tratar das mais diversas questes referentes
existncia. Nesse sentido, a hermenutica pode ser entendida como um
mtodo que se prope a analisar corretamente um texto, cujo esforo
possibilita-a relacionar-se com outros mtodos, sempre no intuito de permitir
maior compreenso do mesmo.
necessrio ento, compreender a hermenutica no horizonte dosentido que se quer atribuir s coisas, ao mundo, dentro do qual o homem se
movimenta e almeja entender-se. Ento, podemos afirmar que a ideia do
sentido a questo de fundo da hermenutica. Aliada ideia do sentido, est a
do significado, na medida em que ambas se complementam para preencher a
necessidade que o homem tem de conhecer a si mesmo e o mundo no qual
est inserido. Sentido e significado constituem assim dois polos desse mesmo
processo de compreenso que permite ao homem situar-se no mundo de
maneira significativa.
No obstante, a correlao entre esses dois polos exige a linguagem, na
medida em que esta se torna necessria nesse processo de interpretao.
Afinal, atravs desta que tudo se d. ela que possibilita o acesso ao mundo
quando este se revela em forma de conceitos. A realidade conceitual, por sua
vez, fornece elementos de algo j dado, j dito, j circunscrito. Tais elementos
podem contrastar com o universo daquele que quer compreender, medidaque este j se encontra diante desta, carregado de significados previamente
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concebidos, isto , j compreende o mundo e este se apresenta dotado de
sentido. O que significa que a compreenso exige pressupostos conceituais,
uma linguagem anteriormente estabelecida, situada, contextual, que, em
contraste com o universo daquele que quer compreender, estabelece um novo
significado, um novo horizonte. Este basicamente o terreno no qual acontece
a experincia hermenutica.
Aqui se estabelece uma distino clara entre cincias naturais e a
hermenutica. A primeira preocupa-se em explicar o mundo; a segunda em
interpret-lo, atribuir-lhe sentido, no simplesmente dizer do mundo o que est
correto e o que est errado, mas volta-se para as aes humanas no intuito de
compreend-las a partir do fundamento que as sustenta, ou seja, daquilo quefaz com que se os homens ajam em detrimento de certas regras ou quando
eles as negam.
Essas duas abordagens do mundo, a explicao e a interpretao,
constituem os dois temas fundamentais da filosofia na medida em que esta se
d como reflexo racional. Em outras palavras, a explicao e a compreenso
do mundo fazem parte do mesmo ncleo que sustenta a filosofia. A diferena
est no discurso: um filosfico e o outro cientfico. Isso significa que,
enquanto seres racionais os homens tm dupla racionalidade, a que quer
chegar verdade ou falsidade dos fatos e a que quer compreender o
fundamento das aes em relao a estes. Enquanto racionalidade, a
hermenutica tem contribudo com vrias cincias humanas na medida em que
estas buscam a interpretao como instrumento de justificao. Nesse sentido,
a hermenutica mostra-se como um suporte sobre o qual a filosofia se sustenta
para compreender fatos e comportamentos humanos que escapam abordagem cientfica, j que esta se fundamenta sobre princpios empricos,
observveis.
Todavia, a hermenutica, embora faa uma abordagem diferente da que
a cincia faz em relao ao mundo, no deixa de integrar-se a esta para
oferecer uma compreenso mais totalizada do mundo, o que a coloca na
esteira da filosofia, j que ela, a filosofia, que se prope a oferecer esse
discurso. Para tanto, esta envolve todos os discursos cientficos, inviabilizando
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a cincia, enquanto discurso especfico sobre a realidade, de assumir essa
pretenso. Ento, verifica-se que h duas racionalidades, uma que percebe o
mundo e, portanto, caracteriza-se como uma abordagem sobre o mesmo, a
filosofia, e outra que se percebe dentro do mundo, a cincia. Nesse contexto,
insere-se a hermenutica como um recurso fundamental na abordagem que se
pode fazer do mundo e fora dele, uma vez que essa tarefa se revela complexa.
A hermenutica se coloca tanto do lado da filosofia, quanto da cincia,
principalmente porque necessrio fazer uma interpretao de todos os
discursos (cientficos) e, posteriormente, integr-los para constituir aquela
razo capaz de agregar todos os tipos de racionalidade, tal como exige a
filosofia.
O termo racionalidade aqui tratado com bastante peculiaridade, j que
existem vrios usos para o mesmo, adotado por uma variedade de cincias
humanas, especificamente, que as buscam compreender a racionalidade do
ser humano a partir dos seus variados aspectos, tal como se prope a
psicologia, a sociologia, a teologia, a poltica, a economia, a antropologia. Mas
a racionalidade da qual se discorrer nesse estudo aquela correspondente
especificidade do ser humano, a partir da sua essncia. Trata-se, portanto, de
uma abordagem estritamente filosfica. Entretanto, a abordagem feita pela
filosofia d-se de outras formas. No tocante interpretao, podemos aludir
filosofia analtica que discute a questo da linguagem, do significado e da
compreenso de textos, mas a hermenutica filosfica no se restringe a uma
interpretao textual de forma objetiva, ela insere nessa abordagem certa
intencionalidade.
A busca pela racionalidade prope de modo indispensvel o uso da
linguagem, no da variedade de linguagens dentro do mundo, mas da
linguagem enquanto ela o mundo sobre o qual falamos (2010, p. 15). Essa
a importncia que a linguagem assume no seio da filosofia e que dar
suporte para a hermenutica. Aqui se delimita a especificidade da linguagem,
pois se trata de dar a esta um tratamento filosfico, o que se pode classificar
como uma hermenutica filosfica.
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1.3 Hermenutica e linguagem
A abordagem que a filosofia faz do mundo e sua consequente
explanao dar-se- a partir de um discurso. Isso significa que ela se utiliza da
linguagem para dizer o mundo. No entanto, esse dizer no implica esgotar todaa questo do mundo, o que nos remete ao pressuposto da inesgotabilidade
daquilo que ela diz, embora o faa de maneira compreensiva, porque situada,
isto , o discurso sobre o mundo no sem sentido por conta da
inesgotabilidade, porm, este no pode ser dito na sua totalidade. Eis a
verdade da filosofia: a infinitude. Nesse sentido, a filosofia diz sempre uma
parte da realidade, nunca o todo desta, porque quem fala sobre o mundo, trata
de algo que no se limita e sempre que algum fala de algo dentro do mundofala de algo que se limita (2010, p. 16).
Essa distino entre o que est dentro do mundo e o falar sobre ele o
que separa a filosofia das cincias, pois estas se referem sempre a um objeto
determinado, finito, contrariamente filosofia, que fala de si mesma atravs do
discurso proposto pelas cincias humanas. Isso significa que a linguagem
quem favorece a compreenso e esse poder dizer de si mesma; ela quem
assegura o saber, posto que este s ocorra atravs dela. A linguagem , pois o
modo pelo qual a filosofia expressa o mundo,
pois ela considera o prprio mundo como
linguagem, pois atravs dela que o mesmo
ganha sentido. Aqui se estabelece
claramente a relao hermenutica e
linguagem, pois esta que possibilita o
acesso do homem ao mundo a partir dosentido que este lhe quer atribuir. Ento, o
princpio de racionalidade, capaz de pensar o
todo, no qual a filosofia se sustenta repousa
na capacidade de fazer uso correto de
enunciados assertricos predicativos, ou
seja, na capacidade de falar, de comunicar.
Enunciados assertricos
predicativos.
Na abordagem feita por Ernerst
Tugendhat trata-se da forma
correta de analisar sentenas,
uma vez que em tais enunciados
articulado tanto o aspecto
elementar, aquele que sustenta a
questo ontolgica fundamental
que reside na pergunta o que o
ente enquanto ente? ou o que a
coisa enquanto coisa? quanto o
veritativo. A partir desses
enunciados redefine-se o conceito
de objeto como totalidadesignificativa da sentena.
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A linguagem ento esse pressuposto fundamental e inesgotvel da
filosofia. Entretanto, h que se observar que no existe uma racionalidade no
estado puro, que se revele atravs de um enunciado assertrico predicativo,pois o ser humano sempre aparece em uma cultura determinada, o que o
impossibilita de construir um enunciado correto do ponto de vista lingustico,
gramatical (2010, p. 18), posto a influncia das determinaes culturais,
histricas e contextuais se interpe entre a linguagem que comunica o mundo,
e o prprio mundo. Por isso a impossibilidade de se ter uma definio lgico-
formal totalizada acerca do conhecimento. Ela s possvel em parte, devido
s determinaes histrico-contextuais e culturais, acima citadas. Ento,aquela exigncia de uma racionalidade que pudesse dar conta da totalidade
fica comprometida, o que sustenta a exigncia de um elemento fundamental, a
interpretao. E, como j fora dito acima, interpretao hermenutica,
compreenso (2010, p.19). Isso significa que a hermenutica constitui o
elemento essencial no processo de compreenso do mundo, j que ela se
traduz no mundo em processo, definido por condies histricas, culturais que
so mutveis, o que justifica a impossibilidade de um processo totalizado doconhecimento proposto pela lgica.
Lgica e hermenutica constituem elementos necessrios e
complementares do processo de conhecer, embora os primeiros, os lgicos,
no reconheam a fundamental importncia da hermenutica. Mas esta ltima
atua exatamente no momento que a lgica no d conta de sustentar
argumentaes para dizer o mundo, quando estas argumentaes fracassam.
O que os lgicos parecem ou no querem se dar conta de que [...]
todo discurso que se pretende basear na lgica, pressupes o universo da
compreenso e da interpretao (2010, p. 20). Nisso consiste, pois a
racionalidade da hermenutica, posto que esta se defina a partir da linguagem.
Esta, por sua vez, o que aproxima o homem dos objetos, na medida em que
ela o significa, o situa, o faz compreensvel a partir do contexto no qual ele est
inserido.
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Dizer que atravs da linguagem compreendemos algo a partir do
contexto, significa que este algo no dado a conhecer em sua plenitude, em
si mesmo, mas pela situao que o circunscreve. Significa conhecer algo como
algo, pelo uso que se faz dele. Essa estrutura do algo como algo est presente
tanto no mundo como no modo que o homem tem de compreender, ento,
podemos afirmar que a filosofia sempre hermenutica, j que a interpretao
o que possibilita o acesso aos objetos com os quais ela se ocupa. Vale
lembrar que a filosofia no trata diretamente dos objetos, mas do modo como
esses objetos acontecem, das condies que os possibilitam. E o modo destes
acontecerem a linguagem, sem ela no possvel mediar qualquer
experincia. Aqui retomada a ideia da racionalidade, tanto cientfica quanto
filosfica, pois que esta marcada pela necessidade de estruturao dos
discursos estruturados para se ao chegar aos objetos atravs do significado.
Nesse momento chama-se a ateno para a questo do sentido, que
ocupa a posio central na hermenutica. Nesta questo, o significado est
implcita a ideia da linguagem, pois ela quem possibilita o conhecimento tanto
de um (sentido), como do outro (significado). Sentido, significado e linguagem
constituem, assim, uma trade que sustentam as condies de possibilidade detodo discurso humano. A nica preocupao que se deve ter, segundo Ernildo
Stein (2010, p. 24), de que essa linguagem, medida que valoriza mais a
questo tanto do sentido, quanto do significado, no dilua fortemente o
pensamento humano. E continua com a interrogao: ser que a no existe
uma espcie de compromisso que deveria ser propriedade da linguagem?
Aqui se insere a questo do mtodo, no como esse procedimento usado
pelas cincias emprico-matemticas, principalmente, mas porque ao pensar
em mtodo em referncia hermenutica temos que levar em considerao
que no h separao entre sujeito e objeto, mas que, compreendemos essa
relao como circularidade, Ernildo Stein (2010, p.26) acrescenta que [...]
existe um compromisso entre sujeito e objeto no universo hermenutico.
Esse fundamento metdico, embora diferenciado na hermenutica, de
uma importncia capital, exatamente porque assegura a relao sujeito e
objeto nas diversas abordagens que se pode fazer de um contexto histricoe/ou cultural, ou seja, atravs dele possvel entender que o conhecimento dos
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fatos histricos ou de um fato cultural no exige a separao destes, mas, ao
contrrio, a compreenso de um e de outro se d de uma forma recproca.
preciso entender aqui que a filosofia trata da linguagem de maneira
especial, pois a compreende como forma atravs da qual tudo se d, ou seja, ela que possibilita o alcance das coisas, na medida em que as significa.
nesse universo que se insere a compreenso (2010, p.27).
A experincia hermenutica exige por um lado um texto, na medida em
que este se apresenta como uma realidade dada, situada, cujo contedo
sustenta um horizonte carregado de sentido,
com valores e convices; e por outro, o
intrprete tambm com seu horizonte de
significados com seus valores e convices
preconcebidos. O contato com o texto permite-
lhe questionar suas convices, suas verdades.
Ento, ele tenta encontrar naquele uma maneira
de legitim-la, tenta justific-la, o que no
significa que isso ir acontecer
necessariamente.
No obstante, o movimento do intrprete
em relao ao texto, ou seja, a insero do
intrprete no texto, na tentativa de sustentar
suas verdades, permite-lhe ampliar seu universo
de compreenso, possibilitando-lhe
compreender outra realidade que no a sua.
Ento, se tem, a partir dessa relao intrprete-
texto, um novo horizonte de interpretao. A
tarefa do intrprete diante do texto fazer uma
leitura a partir da verdade contida no mesmo,
fundindo-a a sua, aos seus preconceitos e, ao
faz-la, ele expande a compreenso destes, legitimando-os. Ento tem-se o
que se chama fuso de horizontes, temtica que ser discutida posteriormente
por Gadamer.
A fuso de horizontes a
compreenso resultante da fusode dois ou mais horizontes,
quando, da tentativa de
compreender um texto ou um
documento, parte-se da situao
histrico-conceitual na qual estes
esto inseridos, considerando
suas verdades e contrastando-as
com as do intrprete. Isso
significa que no h uma
interpretao nica acerca da
realidade e que tudo que dado a
interpretar tem que ser
considerado luz das condies
que os sustentam, posto que no
exista uma interpretao pura
acerca dos mesmos. A expresso
fuso de horizontes foi cunhada
por H. G Gadamer, filsofo
alemo, considerado um dosmaiores expoentes da
hermenutica filosfica. Sua obra
de maior destaque foi Verdade e
mtodo, na qual ele discute uma
metodologia das cincias
humanas, luz da hermenutica.
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1.4 Hermenutica: uma aproximao com a histria
O desafio da interpretao uma situao comum entre hermeneutas e
historiadores. Ambos sofrem com as mutaes ocorridas ao longo do processohistrico, pela variedade de culturas e pela linguagem. O tempo que transcorre
entre duas culturas diversas no pode ocultar fatos ocorridos que sustentam e
explicam valores presentes. A compreenso de uma cultura no traduz apenas
na anlise e interpretao atual dos acontecimentos que explicam a vida do
homem em determinado momento histrico, mas resulta de uma compreenso
global da mesma e isso s acontece se for realizado o estudo dos fatos
particulares para que se alcance tal compreenso, ou seja, uma compreensomesma da cultura na sua totalidade. Aqui se evidencia a relao todo e partes,
objetos da hermenutica e tambm da historia.
O que parece distanciar o trabalho realizado pelo hermeneuta e pelo
historiador que o primeiro trabalha com eventos imaginrios e o segundo com
eventos reais. Mas essa provvel diferena e a distncia que separa o real e a
fico parece no distanci-los tanto, visto que o trabalho de reconstruo do
sentido de um texto literrio e de um texto histrico repousa na textualidade, no
exerccio de compreenso muito semelhante. Por ser tal, ambos enfrentam
uma dificuldade comum: a diferena de smbolos de uma cultura, cujos
princpios e valores so muito diferentes daqueles que sustentam os tempos
presentes. O estudo dos fatos histricos, assim como dos fatos literrios,
exigem assim uma dedicao cuidadosa, criteriosa para que estas dificuldades
sejam, pelo menos, amenizadas. Afinal, compreender a diversidade cultural e
tentar reconstruir o sentido destas elas sem perder o fundamento que assustenta, no fcil.
A sada para a superao dessas dificuldades reside na compreenso.
esse procedimento que aproxima historiador e hermeneuta, na medida em que
o trabalho realizado pelo primeiro parte de uma situao que exige a busca do
sentido tanto do homem como da histria e no uma abordagem meramente
descritiva e metodolgica recorrente da verificao tal como realizado pelas
cincias naturais. A estas interessa, apenas, compreender a sucesso dos
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acontecimentos causais, a regularidade de ocorrncia dos fatos particulares,
para que se chegue a uma verdade.
Quando a histria segue apenas essa abordagem descritiva, ela perde
de vista o elemento fundamental que o sentido. Mas, como no se trataapenas de uma sucesso de fatos e sim da histria humana, os historiadores
perseguem esse elemento fundamental, afinal, o sentido da histria como um
todo o sentido da histria humana. s a partir do homem que se pode falar
de sentido. As coisas em si mesmas s passam a ter sentido a partir do
movimento que o homem faz em relao a elas. A explicao destas do ponto
de vista causal, explicativo, dado pelas cincias naturais.
Partir de uma explicao causal, explicativa e descritiva da realidade,
como fazem as cincias naturais, abandonar o sentido. Mas isso no
interessa para a cincia moderna, especificamente, o que ela pretende mesmo
dar uma explicao objetiva do mundo.
A histria humana, por sua vez, no se reduz a teorias matematizantes,
tal como aponta Alexandre Arajo Costa (s/d, p.69-70) na citao que segue:
O saber histrico trata das recorrncias assimcomo do irredutvel, do irrepetvel, do nico.Assim, a histria um objeto que no se deixaestudar nos laboratrios cientficos, no sedeixa apreender adequadamente por leis dainduo, revela-se em fenmenos particularese complexos que no podem ser vistos apenascomo a repetio de fatos segundo leisconstantes e predeterminadas. E a captaodessas individualidades dotadas designificao no um papel que possa seradequadamente desempenhado pelo discursocientfico positivista porque, em sua
reconstruo abstrata do universal, a cinciamoderna precisa deixar de lado tudo o que particular, acessrio, contingente, ou seja, tudoque propriamente histrico.
Nesse sentido, a histria no se constitui um saber cientfico, pelo
menos para alguns pensadores do sculo XX, para quem o critrio de verdade
no se constri na esteira das significaes que a histria, cujo saber
narrativo, desdobra a partir de relatos significativossobre o mundo e no em
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sistemas abstratos de explicao (s/d, p. 70). E assim compreendido como um
saber encantado, prprio das narrativas. No obstante, contrariamente ao que
pensava a cincia, esse tipo de saber encerra critrios de legitimidade, padres
de avaliao, assim como constitui sentido para o agir, alm de modelos de
identidades, apesar de no se tratar de uma abordagem rigorosamente
objetivista, racionalmente demonstrvel, o que no o descaracteriza, pois a
histria humana quer ser compreendida, no simplesmente explicada.
Segundo Alexandre Arajo Costa (s/d, p. 70):
[...] quando o homem fala de si, ele no sedescreve, mas se interpreta. E o que possibilitaessa interpretao no uma explicao
causal, mas uma compreenso dos sentidosdos atos individuais e coletivos, que ocorre pormeio da construo de uma narrativa. claroque o homem tambm constri discursosexplicativos sobre si mesmo, mas o limitedesses discursos justamente o fato que elesno oferecem uma abertura para a suaautocompreenso. E o homem seautocompreende como sentido.
A abordagem cientfica no d conta da questo do sentido, pois este
no mensurvel e, por isso, s se revela a partir do desdobramento da
atuao do homem na histria, na medida em que ele mesmo a constri e a
significa. Por isso tal abordagem insuficiente, incompleta. Para dizer a histria
humana necessria uma narrativa tambm histrica, porque esta dotada de
sentido, de significaes. Mas, para tanto, h de se ultrapassar os limites e
exigncias propostos pela racionalidade cientfica. Tarefa por deveras difcil,
principalmente se o paradigma para fundamentar tal empresa for o sculo XIX,
no qual o processo de cientificizaofoi coroado como o nico discurso vlido
para o alcance da verdade. Tal critrio instigou toda forma de saber a buscar
esta fundamentao metodolgica, mensurvel, inclusive a hermenutica e a
histria. Entretanto, no mbito destas ltimas, a cincia falhava medida que
realizava uma descrio pura dos fenmenos empricos, pois pensar a histria,
principalmente, como amontoado de fatos isolados, mesmo que
metologicamente correto, no faz sentidoalgum.
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A expresso sentido usada aqui na compreenso mesma de uma
histria universal, enquanto uma totalidade dotada de significado (s/d, p. 70).
Havia uma incongruncia entre a exigncia do sentido e a impossibilidade de
capt-lo atravs dos modelos matematizantes das cincias. Diante dessa
situao que se impe, pensadores se esforaram por encontrar modelos
alternativos de cientificidade, capazes que responder a essa exigncia.
nesse contexto que o filsofo alemo Friederich Schleiermacher se
insere, pois este adota um mtodo de compreenso dos sentidos que se
estende para alm da matematizao do real. Com isso, ele prope outro vis,
outro modelo, o de uma metodologia diferente da que era usada pelas cincias
naturais, mas que pudesse resguardar o carter de cientificidade exigido pelasmesmas.
Com essa proposta, a hermenutica assume, a partir dos sculos XIX e
XX, o status de um tipo filosfico de questionamento, enquanto constitui-se
uma disciplina auxiliar subordinada, deixando para trs, o status de um mtodo
atravs do qual se realizava a correta interpretao de textos da tradio
histrica. Correspondente a esse novo papel que a hermenutica assume,
esto os filsofos: Schleiermacher, Dilthey, Heidegger e Gadamer. Os dois
primeiros se situam no perodo denominado clssico, sobre os quais se
discorrer nas linhas a seguir.
Atividade de Aprendizagem
1. Que distines h entre a abordagem da realidade feita pelas
cincias naturais e as cincias humanas, cujo mbito se situa a
hermenutica?
2. Qual a importncia da linguagem no processo de compreenso do
mundo e do mundo?
3. Em que momento a Histria e a Hermenutica se aproximam para
responder a questo do sentido?
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2 A HERMENUTICA CLSSICA: SCHLEIERMACHER E DILTHEY
Objetivos dessa unidade:
Apresentar a proposta de uma
hermenutica universal em
Schleiermacher;
Destacar a importncia da
linguagem no processo de
compreenso do texto;
Destacar a experincia, a expresso
e a compreenso enquanto
elementos constituintes da frmula
hermenutica de Dilthey para o
estudo das cincias humanas;
Mostrar a relao do crculo
hermenutico com a histria, cujo
desdobramento permite a
compreenso do sentido da
existncia.
2.1 A hermenutica universal de
Schleiermacher
O destaque dado a Schleiermacher deu-seexatamente por ter sido ele o primeiro a unificar
as vrias teorias hermenuticas proposta por
cada disciplina especfica, como a hermenutica
legal, a bblica e a filolgica em uma
hermenutica universal, embora no tenha sido o
primeiro em elaborar uma teoria universal. Com
esses contornos a hermenutica, a partir dele,
ganhou certa autonomia o que se faz sentir
SAIBA MAIS
Friedrich Daniel Ernst
Schleiermacher, telogo, fillogo
e filsofo alemo, nasceu em
Breslau no dia 21 de novembro de
1768 e morreu em Berlim em 12
de fevereiro de 1834. Em 1787,
estabeleceu-se em Halle,
continuando a sua formao
teolgica e os estudos filosficos
e filolgicos. Mantm contato
com os romnticos
principalmente F. Schlegel e E.
Hertz. Publica sobre pseudnimo
a sua primeira grande obra: sobre
a religio e, logo a seguir, a obra
Monlogos. Em 1801, publica a
primeira srie de seus Sermes.
Por esta poca, inicia a traduo
dos dilogos de Plato,
juntamente com F. Schlegel. Em
1807, volta a Berlim, convidado
por Humboldt, contribuindo
ativamente na fundao da
Universidade de Berlim, em
1809, ingressando como titular de
teologia em 1810. Ali lecionou
por vinte e quatro anos,
concorrendo com Fichte e Hegelat sua morte (1834).
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posteriormente, pelo prprio desenvolvimento da mesma, a partir de outros
autores.
A proposta de unificao se sustenta na considerao que
Schleiermacher faz de que a abordagem feita pelas variadas disciplinasencerra certa limitao e para super-la ele prope a substituio dessas
abordagens particulares por uma descrio mais organizada e sistemtica do
processo interpretativo, que resultar [...] tanto uma descrio correta do modo
como a compreenso ocorre quanto uma orientao adequada sobre como os
interpretes se devem conduzir (s/d, p.49).
Nesse sentido, Schleiermacher combate as fragmentaes da
hermenutica, alegando que estas constituam vrias abordagens de um
mesmo processo de compreenso, o que as tornavam injustificveis. Da ele
desenvolve o projeto de uma hermenutica que pudesse a um s tempo
abranger a interpretao de todos os textos, escritos e/ou oral, antigos e/ou
modernos, sacros e/ou profanos. Delineia-se o projeto de uma hermenutica
que se caracterizava por ser uma descrio unificada dos processos de
compreenso.
preciso notar que Schleiermacher rejeita uma hermenutica jurdica,
por isso nesse estudo no se far referncia a esta. Essa rejeio, segundo
Gadamer se deu por oposio da hermenutica tradicional vigente que tratava
dos textos de forma dogmtica, na tentativa de extrair destes apenas uma
soluo correta dos fatos, e no buscar neles um significado. Esta
interpretao dogmtica dos textos no campo jurdico no constitui a
autonomia, que a partir de Schleiermacher, far da interpretao um recurso
autntico e enriquecedor, na medida em que garante esta autonomia do texto.
Quando se fala em autonomia do texto refere-se compreenso do prprio
sentido que o mesmo encerra e no o simples revelar, tal como dizer o que
est escrito de forma literal.
Quando se fala da rejeio da hermenutica jurdica, no se quer dizer
que no seja possvel fazer uma interpretao a partir dessa proposta ensejada
por Schleiermacher, que seja a de aplicar as regras hermenuticas gerais aoestudo do direito, mas que o resultado dessa proposta no suficiente para o
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campo jurdico j que este no aceitaria limitar sua atividade a mera
compreenso do sentido do texto (s/d, p.50).
Segundo Palmer (2011, p. 91) apesar de Schleiermacher considerar a
hermenutica como a arte da interpretao, ele afirma que enquanto tal [...]ainda no existe de um modo geral, h apenas vrias formas de hermenuticas
especficas. Estas por sua vez precisam de justificao, o que sustenta a
necessidade de uma teoria universal de interpretao.
Dizer que a hermenutica a arte da compreenso no significa que ela
meramente um processo criativo e subjetivo, mas a arte aqui assume a
responsabilidade de saber como fazer alguma coisa (2011, p. 26). Entenda-se
o sentido de arte como a utilizao de regras metodolgicas. Porm, como j
fora aludido acima, o uso dessas regras no caracteriza uma apreenso do
texto de forma mecnica, matematizada somente, mas serve para dar rigor
interpretao, ou seja, para que se possa interpretar corretamente. Nesse
sentido, reitera Schleiermacher (1999, p. 33):
A hermenutica no deve estar limitadameramente s produes literrias; pois eu mesurpreendo seguidamente no curso de umaconversao [familiar] realizando operaeshermenuticas, quando eu no me satisfaocom o nvel ordinrio da compreenso, masprocuro discernir como, em um amigo, pode sedar a passagem de uma ideia outra, ouquando questiono acerca das opinies, juzos etendncias que fazem com ele se expresse,sobre um assunto de discusso, de um modo eno de outro.
Enquanto arte da compreenso a hermenutica se prope a
compreender corretamente o que est manifesto na escrita e/ou oralmente por
outras pessoas. preciso considerar ento, uma totalidade da linguagem que
unifique o enunciado daquele que quer comunicar, que sempre uma
linguagem particular com o ouvinte e/ou leitor. Quando isso acontece podemos
dizer que houve um pensamento claro, no dizer de Schleiermacher isso ocorre
quando as palavras apropriadas foram descobertas. Significa que houve
harmonia em compreender, exatamente, aquilo que se quis dizer.
No discurso, cada palavra tem seu significado em relao s outraspalavras do discurso, o que implica dizer que no h um nico significado para
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as coisas as quais os objetos se referem. Em outras palavras, possvel
atribuir a um mesmo objeto vrios significados, em diferentes contextos. Ento,
podemos pensar na linguagem como infinita. Schleiermacher diz que A
linguagem infinita porque cada elemento determinvel, de modo particular,
atravs do resto dos elementos (s/d, p. 11). Essa determinao particular dos
objetos em relao aos outros elementos evidencia o carter relacional do
significado que se quer dar s coisas com a totalidade da linguagem expressa
naquele momento. Isso significa que, mesmo que o interprete signifique de
outra maneira o que o orador quis dizer, no h uma total discrepncia entre o
que foi comunicado e o que foi compreendido, ou seja, mesmo diante das
variadas interpretaes que se pode dar aos objetos, h uma linguagem
comum entre aquele que quer comunicar e o que assimila o comunicado.
A linguagem comum pela qual o orador se comunica define-se dentro de
um contexto determinado cultural e socialmente. Essa determinao interfere
diretamente no pensamento do orador. Entretanto, preciso considerar que
mesmo determinado por essa linguagem comum, o orador tenta comunicar um
pensamento particular, articulado com seus outros pensamentos, o que
significa que cada orador deve ser compreendido a partir do contexto no qualest inserido, de sua cultura, de seu tempo.
Se a hermenutica for considerada pela compreenso do discurso,
podemos dizer que ela abrange qualquer disciplina. Schleiermacher discorda.
Afinal, a hermenutica no se limita simplesmente em compreender a
semntica do texto, mas quer [...] descobrir os pensamentos por trs de uma
expresso (2012, p. 27).
Schleiermacher discute, ainda, a questo da legitimidade dos textos, e
salienta que para se possa fazer uma interpretao correta destes necessrio
que estejam eles tambm corretos, pois s assim possvel compreend-los.
O autor atenta para a prioridade da atividade hermenutica no sentido que para
se possa fazer qualquer juzo de autenticidade, tem-se que ter feito alguma
compreenso antes.
O processo de compreenso dos enunciados, apresentado em seusaspectos duplos, compreende duas partes: a gramatical e a parte tcnica ou
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psicolgica. Pela primeira possvel interpretar o enunciado a partir da
linguagem, ou melhor, como um derivado dela, j a segunda reala as
condies internas que motivam o pensador, o modo como ele interpreta o
enunciado. Embora esta ltima parte compreenda os termos tcnica e
psicolgica, Schleiermacher reala mais o segundo termo - psicolgica. Ento,
podemos compreender a hermenutica na concepo do autor a partir das
partes gramatical e do termo psicolgica, posto que a abordagem hermenutica
prescinda de uma interpretao tanto de uma parte quanto da outra. O uso
dessas duas partes, que so necessrias, no se d pela prioridade de uma
sobre a outra, depende do objetivo do intrprete, ora uma, ora outra. a
situao que vai determinar essa prioridade. E o autor salienta: [...] preciso
mover de um para o outro, e no h nenhuma regra sobre como isso deve ser
feito (2012, p. 28 HC: 11).
As duas perspectivas propostas, a gramatical e a psicolgica constituem
o objetivo bsico proposto por Schleiermacher, que compreender o sentido
do texto, atravs da compreenso gramatical que, ao mesmo tempo revela a
individualidade de seu autor, pela compreenso psicolgica.
A grande sacada de Schleiermacher, que o colocou frente do seu
tempo, foi perceber que essa duas perspectivas, apesar de distintas,
constituam o mesmo processo interpretativo. Todavia, a compreenso de um
texto no algo que acontece de forma imediata, como uma intuio, mas
deriva de um constante esforo que se perpetua continuamente atravs de um
processo de compreenso, cuja denominao a de crculo hermenutico,
sobre o qual j se aludiu acima e ser retomado mais adiante tanto por
Heidegger e Gadamer.
atravs desse processo contnuo que se alcana um conhecimento
completo, na medida em que se rene nele a totalidade da linguagem que
determina uma dada cultura o pensamento do autor que se insere dentro dela.
Essa relao entre o todo e as partes, promovida por uma interao recproca,
caracteriza o crculo hermenutico. Schleiermacher acrescenta: O
conhecimento completo est sempre neste crculo aparente, onde cada
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particular s pode ser compreendido atravs do geral do qual faz parte, e vice-
versa (2012, p. 31).
A interdependncia entre o todo e as partes indica que para se
compreender o todo - o sentido completo de um texto - necessriocompreender as partes - as palavras que constituem - e que a compreenso
destas exige a compreenso do todo. Essa compreenso por sua vez acontece
num contexto situado cultural e historicamente, com uma linguagem especfica.
Todavia, essa interdependncia, salienta Schleiermacher, pode ser
quebrada. Isso acontece quando, uma vez de posse da linguagem comum,
podemos fazer uma leitura superficial para que se possa ter uma compreenso
geral do todo. Essa quebra elimina de antemo a circularidade na qual a
compreenso se envolve. Nisso consiste a provisoriedade da efetivao da
compreenso objetiva e subjetiva, por que:
[...] um discurso dado o produto doentrecruzamento da totalidade da linguagem`(Gesantheit der Sprache) e da totalidade davida do autor` (Ganzen seines Lebens), asquais nunca se do inteira e simultaneamente(SCHLEIERMACHER,1999, p. 19).
De acordo com a citao, podemos compreender o discurso como algo
construdo em detrimento da rea lingustica comum que une autor e texto,
para que estes possam encontrar-se e chegar a essa linguagem comum. Para
tanto, chama-se a ateno para o destaque ao carter provisrio da
compreenso que constitui o discurso, uma vez que as palavras mudam,
ganham e perdem significados diferentes ao longo dos tempos.
A compreenso do discurso, que sempre encerra a vida do autor,
sustenta-se a partir da compreenso da linguagem atravs da qual ele
expressa o seu pensamento. Ento, a linguagem esse mediador entre o que
o autor quis dizer e o modo como se faz compreensvel sob a interpretao do
leitor. Ento, podemos afirmar que a linguagem como discurso constitui-se, na
proposta de Schleiermacher o objeto, o instrumento e o resultado da
hermenutica. Portanto, necessria a compreenso de que toda produo deexpresso humana situa-se em um horizonte lingustico, por isso o autor
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prope que se busque o sentido na interpretao textual sem que se perca de
vista a leitura que inter-relaciona o sujeito (autor) e o objeto (geralmente o
texto).
A proposta da hermenutica de Schleiermacher situa-se nacompreenso do autor e no simplesmente na compreenso do texto enquanto
texto e exatamente esta abordagem que d sustentao terica ao aspecto
psicologizante da sua hermenutica romntica.
Na medida em que Schleiermacher estende a compreenso e
interpretao para todas as formas de comunicao ele reala a dimenso,
genuinamente, filosfica da hermenutica. Seus passos so seguidos por
Dilthey, embora este se preocupe mais em construir uma metodologia para
explicar as cincias humanas a partir da
compreenso, diante da recusa explicao
causal. sobre este filsofo que se
discorrer a seguir.
2.2 Romantismo e historicismo na
hermenutica de Dilthey
Nascido na Alemanha, na cidade de
Biebrich, Wilhelm Dilthey (1833-1911) era
filsofo, psiclogo e historiador literrio. Interessado nas cincias do esprito,
aquelas cincias relacionadas vida interior do homem em todos os seus
mbitos, tem como meta encontrar um fundamento que d objetividade s
mesmas. Por ocasio desse propsito, busca encontrar na hermenutica tal
suporte. Na verdade, a proposta de Dilthey era encontrar um fundamento que
ao mesmo tempo assegurasse a validade das cincias do esprito e
preservasse o seu carter especfico: a humanidade.
Dilthey recusou veementemente a proposta dos estudos humansticos
que pretendiam aplicar s cincias humanas o mesmo tratamento das cincias
naturais, pois no encontrou nesta consistncia epistemolgica. Emcontrapartida prope a experincia concreta, histrica e viva como ponto de
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partida e de chegada para realizar um estudo que valorizasse os atos
histricos, gestos, leis codificadas, obras de arte e a literatura. O autor acredita
que na vida concreta dos homens que o pensamento se orienta e se
desenvolve e para esta que as questes devem ser orientadas. Para Dilthey
a experincia viva que conta. Esse pensamento se contrapunha orientao
positivista e realista dominante na poca para as quais a imediatez, a plenitude
e a variedade da prpria experincia viva no atendiam exigncia
metodolgica de objetividade.
Dilthey revela sua tendncia romntica ao se contrapor ao pensamento
dessas duas correntes que marcaram fortemente o sculo XIX, o Positivismo e
o Realismo. O autor procura resgatar a imediatez e a totalidade, mesmo semdispensar a busca pela objetividade e validade que poderia sustentar as
cincias do esprito. Mais ainda, ultrapassa embora que parcialmente, o
historicismo e o psicologismo da poca, em detrimento de uma compreenso
histrica mais fecunda.
Com o intuito de encontrar uma base metodolgica para as cincias do
esprito, Dilthey promove o ponto de encontro de duas perspectivas
conflituosas de uma abordagem correta do homem: realismo emprico, e
positivismo anglo-francs, a filosofia de vida e o idealismo alemo.
O projeto de encontrar uma base metodolgica para as cincias do
esprito/humano faz, ainda, com que Dilthey comece por abandonar a
perspectiva reducionista e mecanicista das cincias naturais, no intuito de
encontrar uma abordagem adequada plenitude dos fenmenos. Essa tarefa
foi vista segundo Richard Palmer (2011, p.107), como:
[...] 1) um problema epistemolgico, 2) umaquesto de aprofundamento da nossaconcepo da conscincia histrica, e 3) umanecessidade de compreender expresses apartir da prpria vida.
Uma vez que os fatores citados por Palmer forem assimilados, as
dificuldades em distinguir a abordagem feita pelas cincias naturais e cincias
humanas ser desfeita.
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O que Dilthey almeja uma compreenso epistemolgica do homem,
no meramente uma interpretao pautada numa explicao metafsica. Para
tanto, seria necessrio recuperar a conscincia da historicidade da existncia
humana que, pelo tratamento mecanicista, adotado pela cincia, ficou oculto.
O homem no pode ser compreendido na sua totalidade por essas
regras de rigor metodolgico, apenas, pois elas no alcanam o horizonte do
sentido que s a vivncia histrica permite alcanar. Tal horizonte se desdobra
em momentos complexos e individuais, na experincia direta da vida como
totalidade e na captao amorosa do particular (2011, p. 108).
Dilthey com sua filosofia da vida objetivada quer resgatar a totalidade do
ser vivente, individual, concreto, que sente a realidade, que quer realizar-se em
plenitude, mostrar-se em sua autenticidade de ser e no simplesmente deixar-
se descrever pelas regras metodolgicas das cincias naturais, a partir de seu
rigor objetivo. Em uma palavra, o homem quer viver, e viver em um contexto
no qual a cincia era modelo de apreenso do real, da verdade, da objetividade
das coisas, era negar a prpria razo, visto que esta era definida a partir desse
parmetro de objetividade. Eis a necessidade de encontrar uma base
metodolgica para as cincias humanas Elas no poderiam se restringir
sistemtica quantitativa e objetiva proposta pela cincia, pelo fato de que a tal
formalidade nega a prpria vida, mas era necessrio, alm de um estudo
sistemtico, encontrar uma dinmica que valorizasse as categorias intrnsecas
da vida, como a vontade e os sentimentos humanos, que, ao lado dos fatores
biolgicos, naturais, compreende a totalidade do ser.
O homem no apenas um ser quantificvel, mas um ser que pensa
que sente, que ama, e esse modo de ser se constri ao longo da histria,
portanto, para compreend-lo temos que atentar para as significaes de sua
vida passada, presente, assim como suas projees futuras.
A compreenso dessas significaes revela uma necessidade de
regressar vida, na medida em que esta se d a conhecer a partir das
condies internas, pois o pensamento se desdobra na prpria vida, no
momento em que ela acontece. A vida , pois, construo histrica. O sentidode histria aqui no entendido como manifestao do esprito absoluto, tal
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como proposto por Hegel, mas uma expresso da prpria vida que se
constri na relatividade das situaes cotidianas.
A compreenso da vida permite ao homem penetrar no mundo e
compreend-lo a partir dos seus agentes ntimos, como os imperativos morais,os sentimentos e reaes dos outros que se constroem historicamente e que
so compartilhados. Chamamos a ateno aqui para o contexto histrico, pois
atravs deste que essa abordagem revela o modo prprio e diferenciado que
as cincias humanas percebem o objeto e o compreendem. Ento, podemos
concluir que os objetos ou fatos so os mesmos tanto para as cincias naturais
como para as cincias humanas, o que muda o tipo de relao que uma
abordagem e outra dispensa sobre os mesmos.
O fundamento essencial para o estudo das cincias humanas destaca
Dilthey, a compreenso, pois a vida, compreendida aqui como horizonte de
sentido, tem que ser compreendida e no mensurada. Esta por no considerar
a vivncia do homem em toda a sua extenso, reduz a compreenso da
mesma.
2.2.1 A frmula hermenutica de Dilthey
Os objetos, nos estudos humansticos, s se tornaro acessveis se
estiverem pautados na relao sistemtica entre experincia, expresso e
compreenso. Esses trs elementos constituem a frmula hermenutica de
Dilthey. Entretanto, cada um dos termos tem um significado distinto, o que
exige uma anlise detalhada sobre os mesmos.
2.2.1.1 Experincia
Segundo Richard Palmer (2011, p. 113) [...] a palavra experincia tem
dois significados Erfahrung e a mais tcnica e recente Erlebnis. A primeira
refere-se experincia em geral, como quando nos referimos nossa
experincia de vida. Dilthey utiliza o segundo que mais especfico e limitadoque derivado do verbo experimentar, que no alemo aproxima-se do verbo
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viver, o que resulta na acepo de uma experincia de vida, compreendida por
Dilthey como [...] os princpios que se formam em algum crculo de pessoas
ligadas umas s outras e que so comuns a elas(2010, p. 91).
Podemos considerar como experincia de vida tudo que derivado davivncia de cada pessoa e do modo como essas vivncias singulares se
identificam a outras vivncias no seio de uma comunidade, o que faz dessa
experincia uma experincia geral de vida.
Cada evento vivido pelas pessoas, seja ele na arte, no amor, constitui
parte de uma experincia significativa que