Filme Close Sarte

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    ROSA, M. I. P. D. org.) 1º Simpósio de Psicologia, v.1, n.1, 2015. Curitiba : Editora Champagnat.  Página 1

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    A CONDIÇÃO DA EXISTÊNCIA HUMANA: UMA ANÁLISE FENOMENOLÓGICA-EXISTENCIAL DO

    FILME CLOSER

     Ana Carolina Becker Nisiide 1  

     Adriana Dias Basseto 2  

    Estre trabalho faz uma análise do filme “Closer”, o qual retrata as relações amorosas estabelecidas

    entre o jornalista de obituários Dan, a stripper Alice, a fotógrafa Anna e o médico Larry. O filme perpassa os

    encontros e desencontros destes personagens, sua paixão, emoções, traições e instabilidade emocional em uma

     perspectiva que reflete os vínculos relacionais da sociedade moderna. Pode ser considerado um quadrado

    amoroso e as escolhas que os quatro personagens vão fazendo ao longo do filme vai dando o tom das suas

    histórias, explicitando a sua condição de existência. Neste caso, a ficção reflete o vivido no real e expressa a

    célebre frase de Sartr e (1997) que a “existência precede a essência”, ou seja, a partir das relações e das escolhas

    que o homem derrelito estabelece ela vai se constituindo num eterno vir a ser.

     A ficção muitas vezes é um reflexo da realidade vivida, portanto, este trabalho objetiva estabelecer uma

    relação entre teoria e ficção sob um enfoque acadêmico, analisando o filme “Closer” e propondo-lhe uma

    interpretação a partir da teoria fenomenológica-existencial.

    Esta pesquisa é de cunho qualitativo e “abarca não somente o sistema  de relações que constrói o modo

    de conhecimento exterior ao sujeito, mas também as representações sociais que constituem a vivência das

    relações objetivas pelos atores sociais, que lhe atribuem significados” (MINAYO, 1998, p.11). 

     A análise faz-se através de um comparativo entre as relações analisadas no longa metragem e a teoria

     fenomenológica-existencial, tendo por base o material bibliográfico publicado por Jean-Paul Sartre. Para Gil

    (1991), a pesquisa bibliográfica é elaborada a partir de material já publicado, constituindo-se principalmente de

    livros, artigos de periódicos e atualmente com material disponibilizado na Internet. A condição da existênciahumana é a liberdade, é através de escolhas livres que o homem vai constituindo sua essência a partir da sua

    existência. Este processo é evidenciado no filme “Closer”, onde os personagens estão em uma constante busca

     por felicidade e tentam aplacar sua angústia de existir buscando no outro uma completude que só pode ser

    encontrada em si mesmo, a partir do momento que o ser humano aceita sua solidão e assume seu projeto.

     1 Assistente Social. Acadêmica do 8o período do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Contato:

    Rua XV de novembro, n. 928, Toledo/PR. [email protected]  

    2 Psicóloga. Mestre em Saúde Coletiva – UERJ. Docente da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Contato: Av. União, n.

     500, Toledo/PR. [email protected]  

    mailto:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected]

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    Portanto, esta análise demonstra a fragilidade dos vínculos afetivos quando o homem não tem claro seu projeto

    e não se responsabiliza por suas escolhas, agindo na má-fé.O longa metragem “Closer” problematiza as relações afetivas modernas, desvelando a instabilidade dos

     vínculos e a solidão3 humana. A história relata os encontros e desencontros amorosos de quatro personagens. Dan

     mora com Alice, sua inspiração para escrever o livro que esta tentando lançar; ele conhece e se envolve com Anna em

     um ensaio fotográfico. Anna casa-se com Larry e mantém um caso amoroso com Dan. Ao longo da história as

    relações de traição se revelam, os casais se separam e envolvem-se novamente formando um ciclo onde eles se amam

    e se odeiam, mentem uns para os outros, traem, revelando como a essência humana vai se constituindo a partir das

    escolhas que o existir livre impõe.

     Ao longo do enredo é perceptível a vivência da famosa frase em que Sarte (1997, p. 238) afirma: "eu quero

    dizer que se as relações com outrem são torcidas, vividas, então o outro só pode ser o Inferno. Por quê? Porque os

    outros são, no fundo o que há de mais importante em nós mesmos para o nosso conhecimento de nós- mesmos”.

    Portanto, a relação com o outro é conflituosa, já que, como os homens são livres escolher livremente implica em

    responsabilidade, e por vezes a liberdade de um colide com a liberdade de outro homem. Além disto, o olhar do

    outro muitas vezes impede o homem de viver na má-fé, pois evidenciava sua escolha e portanto sua condição de

    liberdade. Afinal, “a má -fé tem na aparência, portanto, a estrutura da mentira. Só que – e isso muda tudo – na má-

     fé eu mesmo escondo a verdade de mim mesmo” (SARTRE, 1997, p. 94), por conseguinte, é na relação com o outro

    que muitas vezes o homem tem que desvelar-se e não consegue mais viver na mentira. Ao longo do filme, quando

    Larry e Ana brigam e ele a questiona sobre seu caso amoroso ela se sente culpada e angustiada, isso demonstra que

    o outro ao explicitar a situação esta impedindo-a de negar sua escolha e viver na má-fé, evidenciando sua liberdade

    e escolha na situação que estava colocada.

     A liberdade está condicionada ao fato de que quando escolho por mim, escolho por toda humanidade

    (SARTRE, 1978), portanto, não se pode escolher de forma irresponsável, deve-se refletir sobre as opções postas para

    que as escolhas não sejam levianas, imediatas, baseadas em uma consciência de primeiro grau. Contudo, o que se percebeu ao longo do filme foram escolhas nem sempre responsáveis e que não mostravam autenticidade, como por

    exemplo, quando Anna e Dan conversam sobre um beijo enquanto Alice estava em outro cômodo próximo, ela

    escuta a conversa e sente-se traída e em sofrimento. Escolher enganar o outro, tentar esconder suas ações demonstra

    inautenticidade, da mesma forma que Alice escolhe não falar sobre o assunto e maquiar a situação, negando sua

     possibilidade de existir, de enfrentar a situação posta colocando-se na má-fé. Ao negar a situação posta, Alice

     3  A solidão humana na perspectiva fenomenológica-existencial corresponde ao natural estado humano, refere-se ao homem

    livre que é o único capaz de escolher e responsabilizar-se por suas escolhas (SARTRE, 1997). 

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     permite que Dan continue alimentando sua paixão por Ana e que ela se engane sobre seu casamento. Portanto,

     Alice não é uma vítima da traição, pois ela também escolheu não enfrentar e lançar-se frente a situação mas, fugir e viver na má-fé. Assim, a condição humana é a ação, "ter, fazer e ser são as categorias cardinais da realidade

    humana" (SARTRE, 1997, p. 485)

    Em vários trechos do filme a liberdade está posta. Quando Dan decide mandar Alice para casa e voltar

    a vernissage ele se lançou ao nada e fez uma escolha que impactou todas as relações dos personagens. A partir

    disto Anna também decidiu se lançar ao Nada e iniciar um relacionamento amoroso com Dan. As

    consequências dessas duas escolhas foi um processo de traição e sofrimento e Anna, Dan e seus parceiros

    tiveram que lidar com as consequências das opções que fizeram. Portanto, a escolha de um homem não impacta

    apenas a sua existência, mas a do outro também, por isso o homem é um ser-no-mundo, um ser em relação, que

     precisa usar sua liberdade de forma responsável.

    Os personagens estão em uma constante busca por felicidade. Alice foge dos EUA buscando uma nova

    existência na Inglaterra, nega seu passado e busca construir uma outra vida, negando inclusive o seu nome

     verdadeiro, portanto, a personagem vive uma mentira. Anna busca viver um romance que lhe traga felicidade

     plena e, cada vez que percebe que a plenitude da felicidade é impossível nega este fato e troca Larry por Dan,

    retornando para Larry no final. Dan fracassa profissionalmente, não encontra coragem para persistir no seu

    sonho de ser escritor e busca felicidade em um romance com Anna, uma mulher que não dependa dele mas,

    assim que ela o abandona retorna para Alice demonstrando que não encontra persistência para seguir seu

     projeto4. Larry quer manter seu relacionamento com Anna e não se importa com a moral e o impacto de suas

    escolhas no outro desde que alcance seus objetivos e mantenha seu casamento, que para ele representa sua

     felicidade.

    Destarte, essas relações demonstram que o homem está sozinho, ele é lançado no mundo e constrói

    sua existência. Na vivência humana ele depende apenas de si mesmo, o outro faz parte e influencia sua vida mas

    o homem é o único responsável por sua história. Neste sentido, não adianta Alice depender de Dan para ser felizou Anna tentar buscar no outro sua plenitude, o que os personagens buscam no outro só pode ser encontrado

     neles mesmos, ou seja, a aceitação da sua condição de liberdade e, portanto, a escolha de uma vida em que eles

    compreendam a derrelição do humano. Aceitar sua condição de liberdade significa que o homem deve viver o

    seu projeto, ou seja, buscar a essência, o projeto originário, para que suas ações sejam autênticas. Não é

    4 O projeto para Sartre (1997) refere-se ao projeto de ser, a escolha original da qual derivam as demais escolhas orientadas por

     um projeto.

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    ROSA, M. I. P. D. org.) 1º Simpósio de Psicologia, v.1, n.1, 2015. Curitiba : Editora Champagnat.  Página 4

     perceptível nos personagens sua conexão com seu projeto, eles passam por idas e vindas, encontros e

    desencontros amorosos na tentativa de se completar no outro o que se mostra impossível.Outra questão importante é que a liberdade não é um estado momentâneo na existência e que não se

     pode fugir da angústia de existir e de escolher. Viver é viver angustiado, não se tira a angústia do homem pois é

    ela que o move em direção ao seu projeto, que o inquieta. Assim, para Sarte (1997), sua filosofia é uma filosofia

    da angústia pois ela é o próprio humano que por sua condição de liberdade vive angustiado pois está sempre

    tendo que escolher. Contudo, a sociedade contemporânea nega constantemente a angústia, tentando aplaca-la

    se vale de medicação e impõe uma “ditadura” da felicidade. Neste processo, os personagens buscam

    incessantemente uma felicidade ilusória e ao negar a angústia de existir vivem na má-fé. Negam sua condição

    de liberdade acreditando que se tiverem um amante a vida será mais feliz, se voltarem com o companheiro

    sairão da angústia, fatos que os levam a viver apenas a náusea buscando as mesmas coisas e negando a

    autenticidade. Neste sentido, “todo homem se refugia na desculpa de su as paixões, todo homem que inventa um

    determinismo é um homem de má fé” (SARTRE, 1978, p. 81). Não existem determinismos, a condição humana é

     viver em liberdade e através de ações que possam evidenciar escolhas responsáveis, o homem que se esconde

    atrás da má-fé nega sua liberdade.

    O filme mostra a própria condição da existência humana, sem herói e vilão, bom e mau; ele desnuda o

    humano na sua condição de liberdade. Os personagens vivem uma rede de mentiras e traições e em uma

    tentativa de busca por felicidade vivem em um constante em-si e para-si. Em alguns momentos se lançam,

    tentam construir novas relações (para-si), mas como não tem claro seu projeto e não assumem sua liberdade

    acabam escolhendo em um nível imediato, sem responsabilizar-se, e quando tem que lidar com a consequência

    das suas escolhas paralisam, ficam estagnados, vivem um em-si retornando ao seu estado original.

    No final, os personagens retornam a condição em que se encontravam, Ana volta com o marido, Dan

     fica sozinho, Alice volta aos EUA, mas sua essência já não é mais a mesma, pois eles tiveram experiências que a

     modificaram. Portanto, a condição da existência humana é a liberdade, mas nem sempre o homem a assume e vive seu projeto.

    Referências Bibliográficas

    GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 1991.

    MINAYO, M. C. de S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 5. ed. São Paulo-Rio de Janeiro: Hucitec-

     Abrasco, 1998.

    SARTRE, J. P. O Existencialismo é um humanismo. 4.ed. Lisboa: Presença, 1978.

    SARTRE, J. P. O ser e o nada: ensaio de ontologia fenomenologia. 3. ed. Petropolis: Vozes, 1997.