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Memorando 87 (2445838) SEI 08850001453201620 / pg. 1 2445838 08850001453201620 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA Memorando nº 87/2016/SIC SENASP/SENASP À Senhora Coordenadora do Serviço de Informação ao Cidadão - SIC Central Assunto: Estatuto do Desarmamento Ao cumprimentar Vossa Senhoria e em atendimento ao pedido de informação nº 08850.001453/2016-20, encaminho o Despacho nº 371/2016/DEPRO/SENASP 2439003, Informação 38/2016/CGPE/DEPRO/SENASP 2422808, anexos 2438580 e 2438601, com informações referentes ao Estatuto do Desarmamento. Atenciosamente, MARCELLO BARROS DE OLIVEIRA Chefe de Gabinete da SENASP Documento assinado eletronicamente por MARCELLO BARROS DE OLIVEIRA, Chefe de Gabinete da Secretaria Nacional de Segurança Pública, em 13/06/2016, às 11:59, conforme o § 2º do art. 10 da Medida Provisória nº 2.200/01. A autenticidade do documento pode ser conferida no site http://sei.autentica.mj.gov.br informando o código verificador 2445838 e o código CRC A3BA3FA9 O trâmite deste documento pode ser acompanhado pelo site http://www.justica.gov.br/acesso-a- sistemas/protocolo e tem validade de prova de registro de protocolo no Ministério da Justiça. Referência: Processo nº 08850001453201620 SEI nº 2445838 Criado por jocely.santos, versão 3 por jocely.santos em 10/06/2016 19:58:13.

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Memorando 87 (2445838) SEI 08850001453201620 / pg. 1

2445838 08850001453201620

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

Memorando nº 87/2016/SIC SENASP/SENASP À Senhora Coordenadora do Serviço de Informação ao Cidadão - SIC Central

Assunto: Estatuto do Desarmamento

Ao cumprimentar Vossa Senhoria e em atendimento ao pedido de informação nº

08850.001453/2016-20, encaminho o Despacho nº 371/2016/DEPRO/SENASP 2439003, Informaçãonº 38/2016/CGPE/DEPRO/SENASP 2422808, anexos 2438580 e 2438601, cominformações referentes ao Estatuto do Desarmamento.

Atenciosamente,

MARCELLO BARROS DE OLIVEIRA Chefe de Gabinete da SENASP

Documento assinado eletronicamente por MARCELLO BARROS DE OLIVEIRA, Chefede Gabinete da Secretaria Nacional de Segurança Pública, em 13/06/2016, às 11:59,conforme o § 2º do art. 10 da Medida Provisória nº 2.200/01.

A autenticidade do documento pode ser conferida no site http://sei.autentica.mj.gov.brinformando o código verificador 2445838 e o código CRC A3BA3FA9 O trâmite deste documento pode ser acompanhado pelo site http://www.justica.gov.br/acesso-a-sistemas/protocolo e tem validade de prova de registro de protocolo no Ministério da Justiça.

Referência: Proces s o nº 08850001453201620 SEI nº 2445838

Criado por jocely.santos, versão 3 por jocely.santos em 10/06/2016 19:58:13.

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Despacho 371 (2439003) SEI 08850001453201620 / pg. 2

2439003 08850001453201620

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E CIDADANIA

Despacho nº 371/2016/DEPRO/SENASP Assunto: Resposta ao Serviço de Informação ao Cidadão (SIC)Processo: 08850001453201620Interessado: Vasconcelos Reis Wakim

1. De acordo com a Informação nº 38/2016/CGPE/DEPRO/SENASP(2422808).2. Encaminhe-se ao GAB SENASP para conhecimento e demais providências.

Atenciosamente,

RICARDO GUANAES COSSODiretor do Departamento de Políticas, Programas e Projetos - Substituto

Documento assinado eletronicamente por Ricardo Guanaes Cosso, Diretor(a) doDepartamento de Políticas, Programas e Projetos da SENASP - Subtituto(a), em09/06/2016, às 10:02, conforme o § 2º do art. 10 da Medida Provisória nº 2.200/01.

A autenticidade do documento pode ser conferida no site http://sei.autentica.mj.gov.brinformando o código verificador 2439003 e o código CRC 1480248C O trâmite deste documento pode ser acompanhado pelo site http://www.justica.gov.br/acesso-a-sistemas/protocolo e tem validade de prova de registro de protocolo no Ministério da Justiça.

Referência: Proces s o nº 08850001453201620 SEI nº 2439003

Criado por f lavia.marcelino, versão 3 por f lavia.marcelino em 09/06/2016 08:23:50.

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Informação 38 (2422808) SEI 08850001453201620 / pg. 3

2422808 08850001453201620

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E CIDADANIA

INFORMAÇÃO Nº 38/2016/CGPE/DEPRO/SENASP

Processo nº 08850001453201620Interessado: Vasconcelos Reis Wakim

Resposta ao Serviço de Informação ao Cidadão (SIC): Vasconcelos Reis Wakim

1. Em resposta ao Despacho 64 (2335506), o qual encaminha pedido de informações

do cidadão Vasconcelos Reis Wakim acerca de dados, informações e textos referentes àimplementação do Estatuto do Desarmamento, Lei nº 10.826/2003, nas Unidades Federativas (UF) doBrasil; temos a informar o que segue:

2. O Estatuto do Desarmamento, Lei nº 10.826 de 2003, é uma lei federal que "dispõesobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional deArmas – SINARM, define crimes e dá outras providências" para os casos de posse, porte, comércio etráfico ilegal de armas de fogo. O Artigo 32 da referida lei embasa a Campanha Nacional doDesarmamento ao afirmar que "os possuidores e proprietários de arma de fogo poderão entregá-la,espontaneamente, mediante recibo, e, presumindo-se de boa-fé, serão indenizados, na forma doregulamento, ficando extinta a punibilidade de eventual posse irregular da referida arma".

3. Ressaltamos que esta Coordenação, no que tange ao Estatuto do Desarmamento,responde apenas pela campanha voluntária de entrega de armas de fogo; ficando as outras atribuiçõesda lei concentradas, principalmente, com o Departamento de Polícia Federal (DPF). Deste modo,todas as informações e dados aqui presentes serão referentes exclusivamente à Campanha Nacional doDesarmamento, devendo o cidadão contatar os demais órgãos competentes para ter acesso a dados einformações referentes aos demais aspectos da lei.

4. Outrossim, informamos que a Campanha Nacional do Desarmamento esteve sobgestão da Polícia Federal desde a publicação do Estatuto do Desarmamento até a publicação doDecreto nº 7.473 de 2011, o qual tornou o Ministério da Justiça (MJ) o órgão responsável pelacampanha. Assim, todos os dados e informações apresentados serão referentes ao período em que acampanha esteve sob gestão deste Ministério, ou seja, de 06 de maio de 2011 à presente data.

5. Por se tratar de Lei Federal, o Estatuto do Desarmamento entrou em vigor em todoo território nacional. No entanto, enquanto esteve sob gestão da Polícia Federal, a entrega voluntáriade armas de fogo e munições ocorria exclusivamente em postos do órgão. A partir da publicaçãodo Decreto nº 7.473 de 2011, que passou a gestão da campanha para o Ministério da Justiça, foiprevisto através do artigo 70 que "a entrega da arma de fogo, acessório ou munição, de que tratam os

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Informação 38 (2422808) SEI 08850001453201620 / pg. 4

arts. 31 e 32 da Lei no 10.826, de 2003, deverá ser feita na Polícia Federal ou nos órgãos e entidadescredenciados pelo Ministério da Justiça". Logo, as UFs puderam aderir à Campanha e cadastrar postosestaduais de recolhimento de armas de fogo e munição como postos nas Polícias Militares, PolíciasCivis, Corpos de Bombeiros Militares e outros. O credenciamento de órgãos de segurança pública dosentes federativos interessados em participar na Campanha do Desarmamento é regulado pela Portarianº 936, de 17 de maio de 2011. O artigo segundo de tal portaria determina que "o credenciamento deórgãos de segurança pública será formalizado mediante acordo de cooperação firmado entre oMinistério da Justiça e o ente federativo interessado". Segue abaixo a lista de UFs com suasrespectivas datas de assinatura de acordo de cooperação com este Ministério no âmbito da CampanhaNacional do Desarmamento:

ESTADO ASSINATURAAC 03/08/2011AL 12/09/2011AM 31/01/2012AP 20/12/2011BA 06/06/2011CE 16/06/2011DF 14/06/2011ES 16/06/2011GO 26/06/2011MA 05/07/2011MG 30/09/2011MS 26/07/2011MT 13/07/2011PA 27/10/2011PB 01/07/2011PE 05/07/2011PI 01/09/2011PR 15/08/2011RJ 06/05/2011RN 22/07/2011RO 06/10/2011RR 15/07/2011RS 23/05/2011SC 14/10/2011SE 13/07/2011SP 23/05/2011TO 31/01/2012

6. Segue abaixo o número de armas de fogo recolhidas por cada Unidade Federativa

durante o período em que a gestão da Campanha Nacional do Desarmamento esteve sobresponsabilidade deste ministério (06/05/2011 a 07/06/2016):

ESTADO QUANTIDADEAC 682AL 1.529AM 608AP 120BA 11.610

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Informação 38 (2422808) SEI 08850001453201620 / pg. 5

CE 1.820DF 2.119ES 1.893GO 1.472MA 1.095MG 12.510MS 1.478MT 1.186PA 1.252PB 1.413PE 9.529PI 547PR 5.877RJ 11.168RN 863RO 431RR 104RS 15.087SC 3.641SE 759SP 41.408TO 226

TOTAL 130.427

7. Por fim, comunicamos que foram inseridos no processo dois produtos

(2438580 e 2438601) de consultoria realizada em parceria com o Programa das Nações Unidas para oDesenvolvimento (PNUD), nos quais são destacados os trabalhos e realizações de algumas UF noâmbito da política pública do desarmamento.

Respeitosamente,

Kauê Darzi AlvesAnalista Técnico Administrativo

CGPE/DEPRO/SENASP

Documento assinado eletronicamente por KAUÊ DARZI ALVES, Analista Técnico-Administrativo - ATA, em 08/06/2016, às 18:25, conforme o § 2º do art. 10 da MedidaProvisória nº 2.200/01.

A autenticidade do documento pode ser conferida no site http://sei.autentica.mj.gov.brinformando o código verificador 2422808 e o código CRC 75F25C59 O trâmite deste documento pode ser acompanhado pelo site http://www.justica.gov.br/acesso-a-sistemas/protocolo e tem validade de prova de registro de protocolo no Ministério da Justiça.

Referência: Proces s o nº 08850001453201620 SEI nº 2422808

Criado por kaue.alves, versão 16 por kaue.alves em 08/06/2016 18:21:51.

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FICHA TÉCNICA

GOVERNO FEDERAL

DILMA ROUSSEFFPresidenta da República

JOSÉ EDUARDO CARDOZOMinistro da Justiça

REGINA MARIA FILOMENA DE LUCA MIKISecretária Nacional de Segurança Pública

CRISTINA GROSS VILLANOVADiretora do Departamento de Políticas, Programas e Projetos/SENASP

RAFAEL PEREIRACoordenador Geral de Planejamento Estratégico, Programas e Projetos Especiais – DEPRO/SENASP

LÍVIA REJANE DE MELLO ÁVILACoordenadora de Programas e Projetos Especiais – DEPRO/SENASP PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDASPARA O DESENVOLVIMENTO - PNUD

JORGE CHEDIEK Representante Residente

- Este documento foi produzido com base no Termo de Cooperação Técnica:Projeto de Cooperação Técnica Internacional Segurança Cidadã (BRA/04/029)Termo de Referência: 139527Parceria: Ministério da Justiça, Senasp, PNUD

Consultor responsável (pesquisa, texto e organização)ROBSON SÁVIO REIS SOUZA

Capa, diagramação, ilustrações e arte final: RÔMULO GARCIAS

A importância dodesarmamento

Por que as armas de fogosão um perigo e não

uma solução?

O processo de entregadas armas e munições

Conheça os principais pontosdo Estatuto do Desarmamento

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43

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A importância do desarmamentoEste guia tem como objetivo apresentar bre-

ves informações sobre a violência armada, respon-sável pela dizimação de milhares de vidas no Brasil. Além disso, traz subsídios sobre o Estatuto do De-sarmamento e os impactos das campanhas de de-sarmamento já realizadas no Brasil, além de dicas de como o cidadão deve proceder para entregar armas e munições.

Segundo o Relatório Global sobre Homicídios 2013 (lançado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime), somente em 2012, o Brasil, onde vive quase 3% da população mundial, regis-trou 50.108 homicídios, aproximadamente 10% de um total de 437 mil ocorridos em todo o mundo. O documento informa que “as vítimas brasileiras são em sua maioria homens (90%). No entanto, destaca-se no relatório o número de mulheres as-sassinadas em situações de violência doméstica. O homicídio praticado pela família ou por parceiros da vítima afeta dois terços destas vítimas de ho-micídio globalmente, ou seja, 43,6 mil, enquanto os homens representam um terço, 20 mil. Quase metade de todas as mulheres vítimas de homicí-dio em 2012 foi morta por parceiros ou membros da família. Desta forma, a pesquisa deixa evidente o grande número de mulheres vítimas de assassi-natos cometidos por pessoas de quem se esperava zelar por elas”1.

Uma pesquisa organizada pela ONG Viva Rio, intitulada “Estoques e Distribuição de Armas de Fogo no Brasil”, publicada em 2010, aponta que a maior parte dos homicídios no Brasil era ocasio-nada por armas de pequeno porte. Além disso, a pesquisa estimou que em 2010, cerca de 90% das armas no país (aproximadamente 15 milhões) es-tariam em poder da sociedade civil e não do Es-tado, sendo que, em torno de 50% seriam ilegais (NASCIMENTO e PURCENA, 2010, p. 34).

1 Informações obtidas em “Determinantes Sociais da Saúde – Portal e Observatório sobre Iniquidades em Saúde”. Fonte: http://dssbr.org/site/2014/05/relatorio-da-onu-lancado-mundialmente-em-abril-mostra-que-brasil-registrou-cerca-de-11-dos-homicidios-ocorridos-no-mundo-em-2012/. Acesso em 10.out.2014.

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Até 2005, apenas no Estado do Rio de Janeiro, a polícia registrava por mês, em média, mais homi-cídios do que ocorre em um ano inteiro em alguns países. Significativa parte desses crimes foi come-tida por cidadãos que se envolveram em alguma discussão de família, de vizinho ou em uma discus-são de bar e, naquele momento, infelizmente por-tavam uma arma. (MISSE, 2005, pg. 28).

Além disso, muitas pessoas que não domi-nam o manuseio de uma arma acabam perdendo-a para os seus agressores, tornando-se vítimas de sua própria arma, supostamente sua maior aliada.

O Instituto de Estudos da Religião (ISER) cons-tatou que a chance de morrer após tentar de se defender com uma arma de fogo em um assalto a mão armada é 180 vezes maior. (CANO apud BOURGOIS).

É um equívoco afirmar que os crimes estão circunscritos a utilização de armas de fogo exclusi-vamente por infratores contumazes:

Podemos concluir que os crimes violentos não são co-

metidos apenas por bandidos, mas também por “pes-

soas do bem” que, não tendo antecedentes criminais,

simplesmente por falta de capacidade para controlar

a raiva e os rancores, tornam-se assassinas por moti-

vos banais. As armas de fogo transformam os conflitos

mais corriqueiros em tragédias. (GOMÉZ, pg.79.).

Estima-se que 500 mil pessoas em todo mun-do morrem por ano, vítimas de armas de fogo. Des-

te total, 200 mil óbitos são oriundos de homicídios, suicídios e acidentes (BINGEMER, 2005), ratifican-do, mais uma vez, que as mortes provocadas por armas de fogo nem sempre são praticadas por me-liantes ou por pessoas com o porte ilegal.

Em 1997, o Governo Federal manifestou pela primeira vez a preocupação com o controle dos re-gistros de armas de fogo em posse da população, com a criação do Sistema Nacional de Registro de Armas, que abrangia dados cadastrais, de produ-ção, de venda e importação de armamentos, regu-lado pelo Ministério da Justiça, tendo como agên-cia de referência a Polícia Federal.

Porém, o aumento dos homicídios na virada do século XXI motivou ainda mais o debate pú-blico em torno da violência armada. E, através da ação direta da Secretaria Nacional de Segurança Pública e com o apoio de organizações da socie-dade civil (ONGs, entidades religiosas, universida-des, personalidades públicas relacionadas às artes e entretenimento, associações e movimentos po-pulares), em 2003 o tema ganhou nova configu-ração na agenda política. Como resultado, houve um pequeno recuo por parte dos setores tradi-cionais. E, finalmente, tivemos a aprovação da Lei 10.826/2003, conhecida como Estatuto do Desar-mamento.

A partir do Estatuto, institucionalizou-se uma campanha pelo desarmamento da população, com dois grandes objetivos: um país menos violento e a tentativa da construção de uma cultura de paz.

A violência letal é um fenômeno que não pode ser dissociado do uso das armas de fogo, con-forme atestam os dados do Sistema de Informação de Mortalidade do Ministério da Saúde – SIM/MS2, mostrados nos gráfico abaixo:

A curva do total de mortes decorrentes de agressão ao longo da última década no país possui clara simetria com a curva das mortes ocasionadas por armas de fogo.

Embora haja uma indissociável relação entre

violência e negação da cidadania, os debates sobre o desarmamento nem sempre são acompanhados de uma discussão mais profunda sobre a questão dos direitos civis, políticos e sociais dos brasilei-ros. Apesar disso, não deixam de ter importância sobre a possibilidade de frear os alarmantes índi-ces de violência homicida que atinge, sobretudo, a população jovem, pobre e negra, com histórico de carência de direitos fundamentais (WAISELFISZ, 2003, 2004, 2013 e 2014).

2 Categorias da 10ª Classificação Internacional de Doenças - CID-10: W32 a W34 (óbitos por traumatismos acidentais); X72 a X74 (Lesões Autoprovocadas Intencionalmente); X93 a X95 (Agressões); e Y22 a Y24 (Capítulo de Intenção In-determinada).

GRÁFICO 1 - Evolução dos homicídios e dos casosresultantes do uso de armas de fogo – Brasil – 1996 a 2012.

Fonte: DataSus/Ministério da Saúde, 2014. Nota: produzido pelo autor.

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Alguns resultados das campanhas de desarmamento

Em 2005, a UNESCO realizou uma pesquisa in-titulada “Vidas Poupadas” 3. O intuito era mensurar quantas mortes foram evitadas em decorrência do Estatuto e da primeira campanha de desarmamen-

to. Com base nos números dos anos anteriores, estimaram-se quantas mortes ocorreriam em 2004 por armas de fogo.

A pesquisa chegou aos seguintes resultados:

As evidências até aqui demonstradas permitem sustentar que:

a) No País· Em 2004, ocorreram no Brasil 36.119 mortes por armas de fogo. Se nada tivesse sido feito a respeito, o cresci-mento contínuo dos óbitos por armas de fogo nos últimos anos indicava que deveriam ter acontecido 41.682 óbitos nesse ano, dado que em 2003 as mortes chegaram a 39.325.· A estratégia de desarmamento (Estatuto e Campanha), em 2004, não só anulou a tendência de crescimento anual de 7,2% pré-existente, mas também originou uma forte queda de 8,2% no número de óbitos registradas em 2003, e devido a isso, é possível sustentar que o impacto do desarmamento foi uma queda de 15,4% no número de mortes por armas de fogo no país.· Essa queda significa possibilitou evitar 5.563 mortes só em 2004.· No primeiro semestre de 2004, o Estatuto do Desarmamento determinou uma queda de 12,5% nos óbitos, o que representou evitar 2.292 mortes por arma de fogo.· No segundo semestre, com a Campanha, o impacto foi bem maior: uma queda de 18,4%, o que significou evitar 3.271 mortes por armas de fogo. b) Nas Capitais· As capitais, que concentram 23,8% da população do país, foram responsáveis, por 38,3% dos óbitos por armas de fogo acontecidos, ainda em 2004. Isto evidencia a necessidade de concentrar esforços de desarmamento nas capitais com maiores índices de concentração de mortes.· O impacto da implantação do Estatuto, primeiro semestre de 2004, foi levemente menor nas capitais (queda de 10,3%) do que no país como um todo (queda de 12,5%).

· Mas, pelo contrário, o impacto da Campanha, no segundo semestre, foi bem superior nas capitais (22,2%) do que no resto do país (18,4%). Desta forma, a contribuição da Campanha na produção das quedas dos índices de mortalidade foi bem significativa: 11,9% das quedas nas capitais podem ser atribuídas à Campanha.· Desta forma, 39,8% das vidas poupadas pelo desarmamento aconteceram nas capitais, onde 2.214 pessoas tiveram suas vidas poupadas pela vigência do Estatuto e pela Campanha.· No segundo semestre, 45% das vidas poupadas ocorreram nas capitais, mostrando dessa forma a eficiência das campanhas nesse âmbito, que, como veremos, se reproduz também nas regiões metropolitanas. c) Nas Regiões Metropolitanas· As 10 Regiões Metropolitanas tradicionais (Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Vitória, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo) focalizadas no estudo, concentrando 30,8% da população, foram responsáveis por mais da metade: 55,4% dos óbitos ainda em 2004, quando as taxas já começaram a cair em função do desarmamento. Isto reforça o indicado anteriormente, sobre a necessidade de focalização das cam-panhas nas regiões metropolitanas.· Com um panorama semelhante ao das capitais, foi bem mais eficiente a Campanha realizada no segundo semestre do que no país como um todo. d) Substituição das Armas de Fogo· Diante da possibilidade de que as armas de fogo fossem aos poucos substituídas por outros instrumentos letais, verificou-se que a significativa queda de 3.200 homicídios por armas de fogo entre 2003 e 2004 não foi acompanhada por um concomitante incremento dos homicídios por instrumentos cortantes, perfurantes, contundentes ou, inclusive, pelo uso da força corporal. Os dados até aqui demonstrados permitem sustentar, sem sombra de dúvida, a enorme contribuição das es-tratégias de desarmamento implementadas no Brasil, em 2004, no resguardo de vidas humanas, direito fun-damental das pessoas sem o qual nenhum outro direito tem razão de ser. Isso guarda estreita relação com experiências de outros países ou cidades do mundo, como Bogotá, Canadá, África do Sul, Austrália, etc. que implementaram estratégias de desarmamento e consequentemente tiveram níveis de violência reduzidos ou controlados.

QUADRO 1: Conclusões da Pesquisa “Vidas Poupadas” (2005)

3 A análise foi realizada pela equipe técnica da UNESCO no Brasil, com a colaboração das equipes da Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde e do Ministério da Justiça. O objetivo foi aprofundar o entendimento dos resultados e do impacto do Estatuto do Desarmamento e da posterior campanha de entrega voluntária de armas de fogo acontecida no Brasil em 2004. Para acessar a pesquisa completa: http://www.mapadaviolencia.org.br/publi-cacoes/VidasPoupadas.pdf. Acesso em 20.09.2014.

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A redução no número de armas ilegais em cir-culação e o alto índice de homicídios provocados por armas de fogo mostram que o desafio ainda é grande, mas que Brasil tem trilhado um caminho importante no sentido de desarmar a população e, com essa ação, diminuir o número de homicídios que tem vitimado milhares de brasileiros todos os anos. A facilidade de acesso e a grande circulação de armas de fogo no país destacam o Brasil nessa tendência que se tornou marca da violência homi-cida.4

A cooperação diária entre União, Estados, Mu-nicípios e sociedade civil é imprescindível para que os números continuem a reduzir e os brasileiros construam, gradualmente, uma sociedade mais segura e pacífica.

A seguir, utilizando dados divulgados pelo Ministério da Justiça, um balanço geral da entrega de armas no Brasil (TABELA 1), considerando o pe-ríodo de 2004 até o dia 30 de junho de 2014.

De 2004 a 2010, cerca de 550 mil armas de fogo foram entregues voluntariamente em função

4 Duas em cada três pessoas mortas nos países das Américas são assassinadas com armas de fogo. No Brasil, o índice é maior, com 70% das mortes. Segundo o “Estudo Global sobre o Homicídio 2013”, as armas de fogo foram utilizadas em 41% dos 437 mil homicídios no mundo em 2012. O estudo divulgado pelo Escritório sobre Drogas e Crime das Nações Unidas (UNODC) pode ser acessado em: http://www.unodc.org/gsh/. Acesso em 20.09.2014.

Período Armas entregues (N) Armas entregues (%)

2004 a 2010 550.000 84,0%

2011 (antes do Sistema Desarma) 2.860 0,4%

2011 (06/05/2011 a 31/12/2011) 34.749 5,3%

2012 27.316 4,2%

2013 31.265 4,8%

2014 (até 30/06) 8.493 1,3%

Total 654.682 100,0%

Fonte: Ministério da Justiça, 2014. Nota: adaptado pelo autor.

da política nacional de desarmamento. Após a implantação do Sistema Desarma e as

campanhas publicitárias realizadas desde 2011 te-mos os seguintes valores: em 2011, considerando o período anual, foram registradas 37.609 armas entregues; em 2012, um total de 27.316 armas; em 2013, o número foi de 31.265 e em 2014 (até 30/06), um total de 8.493.

É importante considerar que o elevado vo-lume de armas entregues entre 2004 a 2010 con-templa o recolhimento das armas artesanais (dado não computado oficialmente e que não integra o registro, a partir de 2011).

Segundo números disponibilizados pelo Por-tal Desarma, em relação às armas entregues, no período entre 06 de maio de 2011 até a data de 30 de junho de 2014, registrou-se um total de 101.822 armas entregues, conforme Tabela 2 (página se-guinte).

Registrem-se, ainda, as iniciativas conjuntas envolvendo setores específicos, como as igrejas, na Campanha “Religiões unidas pela Paz”, realizada em São Paulo em 2011, bem como a “Campanha Itinerante” adotada inicialmente por Alagoas e, posteriormente, em outras Unidades da Federação como Pernambuco e Espírito Santo.

TABELA 1: Balanço geral da entrega de armasBrasil / 2004 até 06/2014

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Fonte: Portal DESARMA (06/05/2011 até 30/06/2014). Elaborado pelo autor.

Boas práticas de desarmamento no Brasil

Com o objetivo de relatar alguns cases exito-sos relativos à Campanha do Desarmamento que ocorre no Brasil desde 2004, apresentamos alguns exemplos aleatórios, que ilustram algumas ações de desarmamento realizadas em estados e muni-cípios, e seus efetivos impactos na diminuição dos homicídios.5

Espírito Santo

Em outubro de 2013 foi relançada, pela Secre-taria de Estado da Segurança Pública do Espírito Santo uma nova etapa da Campanha do Desarma-mento que trouxe uma inovação extremamente produtiva: a Ação Itinerante de Recolhimento de Armas (AIRA).

A AIRA foi criada com o objetivo de incre-mentar o recolhimento de armas de fogo, volunta-riamente entregues pela população capixaba, em especial nas localidades onde não haviam postos de recolhimento estabelecidos.

O objetivo dessa ação era estimular a entre-ga voluntária de armas, munições e acessórios, por meio de visitas itinerantes nos municípios capixa-bas. Ademais, procurava-se difundir o Estatuto do Desarmamento e promover uma cultura de paz, por meio da conscientização do cidadão capixaba acerca dos riscos de se ter uma arma em casa, bem como acerca dos aspectos jurídico e penais que cercam a matéria.

Para a realização da campanha, utilizou-se da seguinte metodologia: orientados pelos informes estatísticos sobre o recolhimento voluntário de ar-mas nos municípios capixabas, elaborados e publi-cizados semanalmente pelo Ministério da Justiça,

5 Certamente, existem outras experiências exitosas de desarmamento realizadas por estados e municípios brasileiros. Uma pesquisa rápida feita na Internet, utilizando sites e outras ferramentas de busca, indexou várias ações realizadas no Brasil.

Espécie de arma entregue Número Percentual

Morteiro 2 0,002%

Sub metralhadora 16 0,02%

Metralhadora 18 0,02%

Mosquetão 96 0,1%

Outras espécies 126 0,1%

Pistolão 146 0,1%

Garruchão 267 0,3%

Escopeta 291 0,3%

Pistolete 315 0,3%

Fuzil 397 0,4%

Rifle 1.917 1,9%

Arma não identificada 3.864 3,8%

Carabina 4.057 4,0%

Garrucha 7.392 7,3%

Pistola 8.886 8,7%

Espingarda 23.905 23,5%

Revolver 50.127 49,2%

Total 101.822 100,00%

TABELA 1: Balanço geral da entrega de armasBrasil / 2004 até 06/2014

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a Gerência de Integração Comunitária, subordina-da à Subsecretaria de Integração Institucional da SESP/ES, buscou construir em conjunto com as instituições e órgãos parceiros, já enunciados no Estatuto do Desarmamento e no Acordo de Coo-peração Técnica, uma estratégia que pudesse au-mentar o volume de armas recolhidas em território capixaba, renovando o desempenho da Campanha do Desarmamento desenvolvida 2011.

Criou-se de início um Grupo de Trabalho que teve a finalidade de buscar soluções para o problema: a campanha do desarmamento estava caindo no esquecimento. E se por um lado, o esta-do, por meio de suas polícias, vinha apreendendo milhares de armas, pela Campanha e pelo volunta-riado que ela propunha recolhia-se não mais que algumas dezenas de armas.

Realizaram-se diagnósticos acerca dos muni-cípios a serem visitados pela equipe durante a iti-nerância. Em meados de outubro de 2013, criou-se em conjunto com os parceiros (SENASP, Polícia Fe-deral, Polícia Rodoviária Federal, Exército Brasileiro, Polícia Militar e Polícia Civil) um modelo de ação que se assentava num calendário de recolhimen-tos regulares de armas já realizados pela Polícia Federal nos Fóruns das cidades do interior do Es-tado.

Elaborou-se, então, um projeto piloto deno-minado “Ações Itinerantes de Recolhimento de Armas – AIRA”: ações de recolhimento a serem re-alizadas durante os meses de novembro e dezem-

bro de 2013, em seis incursões semanais, em seis municípios diferentes, observando um calendário de visitas previamente elaborado pela SESP/ES em conjunto as prefeituras locais.

Em cada visita, durante as AIRAs realizadas em 2014, dois policiais civis, identificados e loca-lizados anteriormente, foram designados direta-mente pelo Delegado Chefe de Polícia Civil, para serem treinados no recebimento e no uso do sis-tema Desarma/Infoseg. E nas localidades onde não havia posto de recolhimento foram criados os postos novos, ficando estes policiais responsáveis, após o recolhimento, pelo posto, pela divulgação da campanha junto à população local.

Outra parceria foi realizada com as prefeitu-ras de cada município visitado. Identificaram-se os prefeitos e atores indicados por seus gabine-tes, que envolvidos na campanha, davam suporte necessário à realização das AIRA, seja o acesso à rede Infoseg por meio da rede de Internet da Pre-feitura, a energia elétrica para funcionamento de computadores e impressoras utilizadas na ação, a mobilização de atores internos e da população de modo geral num chamamento à participação e ao voluntariado na entrega de armas, munições e acessórios.

Em 2014, a equipe da Gerência de Integração Comunitária responsável pela operacionalização da Campanha do Desarmamento e pelas AIRAs propôs, como desdobramento espontâneo da AIRA, uma intervenção a ser realizada nas escolas

locais, nos municípios visitados. A intervenção, ain-da incipiente e como um projeto piloto, foi aplica-da ao modo de palestras realizadas para crianças e adolescentes da rede municipal de ensino. O obje-tivo desta intervenção agregada à AIRA era cons-cientizar esses jovens acerca dos riscos que envol-vem a posse de uma arma, seja em espaço privado, seja em espaço público. Tratava-se de uma ação de disseminação de cultura de paz junto às crianças e adolescentes que tem reflexo em seus familiares adultos.

Ademais, outra importante atividade realiza-da com as crianças e adolescentes foi a troca de ar-mas de brinquedo por brindes. Houve ocasião em que o recolhimento de armas de brinquedo entre as crianças e adolescentes obteve maior êxito que entre adultos, superando o número de objetos re-colhidos.

Segundo informações da SENASP, em outubro de 2013 o estado do Espírito Santo ocupava o 12º lugar no ranking nacional de entrega voluntária de

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armas. Após a implantação da Campanha Itineran-te de Recolhimento de armas, chegou-se, em julho de 2014, na oitava posição.

Alagoas

Em Alagoas, o Ônibus do Desarmamento fez parte da estratégia da política de desarmamento utilizada no estado. Trata-se de uma unidade itine-rante de coleta de armas, numa iniciativa conjun-ta da Secretaria de Estado de Promoção da Paz de Alagoas (SEPAZ), executada com apoio logístico da Secretaria de Estado de Defesa Social (SEDS) e da Polícia Militar de Alagoas (PMAL).

A ideia surgiu a partir da necessidade de uma estratégia de aproximação com a Campanha Na-cional do Desarmamento. A SEPAZ percebeu que as pessoas tinham receio de entregar armas em delegacias e batalhões (postos fixos da campanha) porque, motivadas pelo medo, preconceito ou desinformação temiam ser presas, já que ter uma arma sem registro é crime.

O objetivo da estratégia foi criar um equipa-mento que desmistificasse esse estigma e levasse informação à população; que pudesse percorrer os bairros e municípios, aproximando-se das pessoas e diminuindo as desculpas e dificuldades de para a entrega voluntária das armas de fogo.

Lançado em 26 de outubro de 2012, benefi-ciado com as ações do plano “Brasil Mais Seguro”, a primeira atividade de mobilização das ações liga-

das ao Ônibus do Desarmamento foi no sentido de aproximar a equipe da Secretaria de Estado de Pro-moção da Paz (SEPAZ) com líderes comunitários e religiosos. Além de intensa atividade de conscien-tização e sensibilização nas escolas públicas e par-ticulares do Jacintinho. Esse momento de sensibili-zação foi necessário para apresentar o novo posto móvel de coleta de armas à população alagoana.

A novidade encontrou certa resistência da população, embora na segunda semana de ativi-dades, tenha sido registrada a entrega de três ar-mas de fogo em um único dia. A presença constan-te na mídia de gestores públicos debatendo com jornalistas e com o público sobre a importância do desarmamento auxiliou na divulgação e mobiliza-ção social, aproximando a necessidade do debate sobre armas de fogo, segurança pública e ação di-reta dos alagoanos para alterar o cenário de vio-lência no Estado.

A segunda parada do Ônibus do Desarma-mento foi no Mirante de São Gonçalo, ponto turís-tico de Maceió, ao lado do presépio em tamanho real da paróquia de São Gonçalo. Esta etapa teve um caráter especial, pois tomou a forma da campa-nha “Natal de Paz, Natal sem Armas”, realizada em parceria com a Arquidiocese de Maceió. Essa mini-campanha de Natal buscou aproveitar o momento de reflexão que as festas de fim de ano trazem às pessoas, fazendo com que elas “desarmassem seu espírito e suas casas”. Aproveitou-se também da credibilidade da Igreja Católica junto à população.

As terceira e quinta paradas do ônibus encer-ram o ciclo de apresentação do novo equipamento e definiram a boa adesão da população alagoana ao posto móvel de coleta de armas. Aconteceram, respectivamente, na orla da Praia de Ponta Verde (outro ponto turístico de Maceió) e na Praça da Igreja Matriz, em Arapiraca (segunda maior e mais importante cidade de Alagoas, também beneficia-da pelo plano Brasil Mais Seguro).

Foram pontos de forte presença de pessoas, turistas (locais e interestaduais) e da mídia, am-pliando ainda mais a divulgação da campanha e da facilidade da entrega. Na praia de Ponta Verde foram entregues sessenta e nove armas de fogo e em Arapiraca, cento e quatro armas.

A estratégia de mobilização e divulgação é sempre feita em contato permanente com a im-prensa, incentivando e atraindo mídia espontânea

(gratuita) sobre a atuação do posto móvel de co-leta de armas, o perigo de uma arma de fogo em casa e a importância da Campanha do Desarma-mento como uma contribuição objetiva e direta da população na construção de uma cultura de paz e efetivando a participação da sociedade no plano Brasil Mais Seguro.

Observou-se que a partir das mobilizações feitas em torno das ações promovidas pelo Ônibus do Desarmamento houve um aumento da procu-ra pelos postos fixos de entrega de armas de fogo, em delegacias, batalhões da Polícia Militar, sede da Polícia Federal e postos da Polícia Rodoviária Fede-ral.

Cinco meses após seu lançamento, em abril de 2012, o estado de Alagoas passou da 19ª posi-ção no ranking nacional da Campanha do Desar-mamento para o 9º lugar em arrecadação absoluta

O objetivo da estratégia foi criar um equipamento que desmistificasse esse estigma e levasse informação

à população; que pudesse percorrer os bairros e municípios, aproximando-se das pessoas e diminuindo

as desculpas e dificuldades para a entregavoluntária das armas de fogo.

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e um inédito 2º lugar em números proporcionais à população – posição atingida no mês de abril de 2013 e mantida até maio (dados oficiais do Boletim Semanal da Campanha do Desarmamento nº 90, de 28/04/2013, Ministério da Justiça).

Sergipe

No Sergipe, a Campanha do Desarmamento abrange, principalmente, os seis municípios priori-tários, focados no Projeto “Brasil Mais Seguro”: Ara-caju (capital), Lagarto, Estância, Nossa Senhora do Socorro, Itabaiana e São Cristóvão.

Na primeira fase da campanha no estado, en-tre 2004 e 2005, Sergipe ficou, em termos propor-cionais, em primeiro lugar no ranking dos estados que mais recolheram armas da população.

Na segunda fase, a partir de 2011, várias par-cerias com órgãos e instituições ampliaram as ações da Campanha. Destacam-se as articulações envolvendo: Secretaria de Estado da Educação, Secretaria de Estado da Segurança Pública, Secre-taria de Estado de Direitos Humanos e Cidadania,

Casa Civil do Governo, Conselho de Execuções e Causas Penais, SESI/SE, OAB/SE, Tribunal de Jus-tiça, polícias Civil e Militar, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Rede Desarma Brasil, Ong Viva Rio, entre outras.

A forma de mobilização da Campanha se dá através de contatos com as prefeituras e com enti-dades religiosas ou associativas, utilizando-se para a divulgação carros de som, material gráfico espe-cífico, bem como palestras de conscientização em escolas. Na mídia, o impacto da Campanha é posi-tivo, tendo apoio das principais redes televisivas e de rádios.

A articulação das ações da Campanha do De-sarmamento é feita pela Coordenação do Comitê pelo Desarmamento e em Favor da Vida, institu-ída através do Decreto Estadual 28.065, de 03 de outubro de 2011, aglutinando várias entidades governamentais, bem como entidades não-gover-namentais.

O objetivo é diminuir os números de homi-cídios ocasionados por armas de fogo e principal-mente promover a conscientização dos adolescen-

tes, jovens e adultos, através de palestras que são realizadas pelos membros do Comitê.

Em Aracaju, projetos como “Escola Promoto-res de Cultura de Paz”, idealizado pelo Comitê do Desarmamento6, conseguiram ao longo de dois anos e meio ministrar palestras para mais de qua-tro mil alunos das redes estadual e municipal de ensino. Foram visitadas várias escolas, com uma média de público de 250 alunos. Nesses encontros, além do tema do desarmamento são discutidas outras questões, como a violência no ambiente es-colar. Também é feita a entrega de material gráfico alusivo à campanha.

Desde 2012, além das visitas nas escolas fo-ram feitas palestras para operadores de Segurança Pública, articuladas parcerias com o SESI (na Ação Global) com stand para apresentação de material gráfico da Campanha, discussão na Câmara de Ve-readores da Capital sobre o Desarmamento infan-til, culto ecumênico para homenagear as mulheres em seu dia (tratando também sobre violência do-méstica), seminários (como o que foi realizado na sede da OAB, instruindo operadores de segurança

6 É formado pela Assembleia Legislativa, Câmara de Vereadores, Corpo de Bombeiros, Polícias Civil, Militar e Rodoviária Federal, Guarda Municipal, Defensoria Pública, Ministérios Públicos Estadual e Federal, OAB, Secretaria de Direitos Hu-manos e Cidadania, Secretaria da Justiça, SSP, Secretaria da Educação, Secretaria de Estado da Inclusão e Assistência Social, Universidade Federal de Sergipe, Tribunal de Justiça, Arquidiocese de Aracaju, Conselho da Comunidade da Execução Penal, Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, Federação dos Conselhos de Segurança Comunitária do Estado de Sergipe, Movimento Evangélico Progressista de Sergipe, SESI, Sindicato dos Agentes Penitenciários do Estado de Sergipe, Sindicato dos Policiais Civis do Estado de Sergipe, Sociedade Semear, União dos Ministros Evangé-licos do Estado de Sergipe, Associação Integrada de Mulheres de Segurança Pública e Confederação das Associações de Moradores de Bairros. (Fonte: Assessoria de Comunicação da Secretaria de Educação de Sergipe).

pública) e afixação de faixas e placas da campanha nas delegacias de polícia (locais de recebimento das armas).

Foram realizadas duas Caminhadas pela Paz, com participação de aproximadamente mil pesso-as em ambos os eventos.

O número de apreensões de armas de fogo deu um salto exponencial a partir de 2009 em todo o estado de Sergipe. O acompanhamento das ar-mas retiradas das ruas é feito mensalmente pelo Centro de Estatística e Análise Criminal (Ceacrim) da Secretaria de Segurança Pública, que compro-vou um crescimento histórico de armas apreendi-das no estado. Os dados mostram que entre 2009 a junho de 2013 foram retiradas das mãos de cri-minosos da Capital e do interior de Sergipe 6.744 armas de fogo de diversos calibres.

Os números apontam que no ano de 2008 foram apreendidas 115 armas, subindo para 1.338 em 2009; 1.686 em 2010, chegando a 1.686 em 2011; em 2012, 1.551 e finalmente até junho de 2013, 896 armas de fogo saíram de circulação.

O objetivo é diminuir os números de homicídios ocasionados por armas de fogo e principalmente

promover a conscientização dos adolescentes, jovens e adultos, através de palestras que são realizadas pelos

membros do Comitê.

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O estado de São Paulo se tornou um exemplo internacional na redução dos homicídios. Segundo o Mapa da Violência 2010, no período entre 2000 e 2010 enquanto a maioria dos estados brasileiros experimentava substancial incremento no número de homicídios, houve naquele estado uma redu-ção de 63,8% nos assassinados.

Existem variadas análises sobre a diminuição na taxa de crimes violentos em São Paulo. Alguns estudos têm apontado como uma das causas da diminuição do número de homicídios em São Pau-lo a adesão do estado e de vários de seus municí-pios nas campanhas de desarmamento, a partir do ano de 2004.

De 2001 a 2007, o número de homicídios diminuiu

60,1% em todo o Estado, colocando São Paulo como

um dos casos internacionais mais emblemáticos, ao

lado de Nova Iorque e Bogotá. Os dados sobre as vá-

rias dinâmicas criminais indicaram, entretanto, que

não houve uma queda generalizada da criminalidade

em São Paulo. Ao contrário, os crimes contra a pessoa

e contra o patrimônio aumentaram cerca de 20%.

Com efeito, os crimes que tiveram maior queda foram

aqueles geralmente praticados com o uso da arma de

fogo. Mais interessante ainda, essa diminuição ocorreu

de forma mais acentuada exatamente após a entrada

em vigor do Estatuto do Desarmamento. (CERQUEIRA,

2014, p. 147, ).

Enquanto nos anos de 2000, 2001, 2002 e 2003, São Paulo teve, respectivamente, 10.631, 11.409, 10.229 e 10.094 homicídios, a partir de 2004 houve queda abrupta nos assassinatos, dimi-nuindo o número para 8.146, chegando em 2010 a 3.845 homicídios; portanto quase 64% de redução no período de 11 anos.

Em sua tese de doutorado intitulada “Causas e consequências do crime no Brasil”, Daniel Ricar-do de Castro Cerqueira (2014) dedica um capítulo para analisar a relação entre armas e crimes, nota-damente os homicídios. No referido capítulo, há um estudo detalhado acerca do que ocorreu em São Paulo. O autor analisou dados criminais dos 645 municípios paulistas.

Para testar a relação causal entre armas e cri-mes, Cerqueira (2014) usou dados compreendidos entre 2001 e 2007. Utilizando-se de variadas meto-dologias de pesquisa (um modelo teórico de de-mandas por armas e crimes, no qual o dilema entre prevalência de armas na cidade, o custo de obten-ção da arma no mercado ilegal e o efeito dissuasão da vítima armada foram analisados), o autor con-cluiu que:

a) O efeito do desarmamento foi maior nas cidades onde havia maior prevalência de armas anteriormente;

b) As análises comprovaram a relação segundo a qual o maior número de armas gera maior quantidade de homicídios;

c) Em relação aos incidentes interpessoais violentos, a redução do acesso à arma de fogo faz com que os indivíduos envolvidos em práticas criminais utilizem outros instrumentos menos letais para resolver variadas disputas;

d) Não se observou relação significante entre armas de fogo e crimes como latrocínio e roubo de veículos, corroborando a hipótese segundo a qual armas de fogo têm relação com homi-cídios;

e) O efeito da diminuição na prevalência de armas foi no sentido de aumentar as lesões cor-porais dolosas. O estudo aponta que houve uma substituição quantos aos meios para reso-lução de conflitos interpessoais violentos, fazendo com que as pessoas sem acesso a armas utilizassem instrumentos menos letais;

f ) Corroborando estudo de Lott e Mustard (1997) e Kleck (1979), “pelo menos em São Paulo, o criminoso profissional não se abstém de cometer crimes pelo fato de a população se armar para a autodefesa. A difusão das armas de fogo nas cidades, entretanto, é um importante elemento criminógeno para fazer aumentar os crimes letais contra a pessoa”. (CERQUEIRA, 2014, p. 149).

São Paulo

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Assim, a análise exaustiva feita por Cerquei-ra (2014) reforça o argumento segundo o qual as ações de desarmamento realizadas no estado de São Paulo corroboram na exponencial diminuição dos homicídios por arma de fogo naquela unidade da federação.

Cidade de São Paulo

Além de estudos envolvendo todo o estado de São Paulo, existem informações específicas so-bre as ações da Campanha do Desarmamento na Capital.

As informações a seguir foram extraídas de um relatório das ações de desarmamento na cida-de de São Paulo, publicado pela Secretaria Munici-pal de Segurança Urbana na cartilha “A campanha de desarmamento e controle de armas: a experiên-cia da cidade de São Paulo”.

O documento informa que em meados de 2009 foi realizada na capital uma campanha pon-

tual envolvendo o Instituto Sou da Paz, a Igreja Ca-tólica e a Guarda Civil Metropolitana, produzindo materiais de comunicação próprios e autonomia para divulgação. Ao todo, vinte e seis paróquias da Igreja Católica aderiram a esta Campanha e abri-ram pela primeira vez suas portas para o recolhi-mento, com o apoio de Bases Móveis e agentes da Guarda Civil Metropolitana, com uma Base Comu-nitária Móvel.

Os postos de recolhimento da Guarda Civil Metropolitana foram estruturados a partir da esco-lha das Bases e Inspetorias que fossem localizadas em pontos estratégicos para o recebimento de ar-mas de fogo, acessórios e munições pela CEVAM – Campanha de Entrega Voluntária de Armas e Munições – e dentro destas procurou-se espaços adequados para o recebimento efetivo, ou seja, que fosse o mais protegido possível e que possi-bilitasse certo conforto e privacidade ao cidadão na entrega.

As estratégias em relação à divulgação se de-ram inicialmente através da identificação do posto de recolhimento para dar visibilidade e informar à população do entorno e também nos parques da cidade e em igrejas de diferentes denominações religiosas.

Não menos importantes foram as ações de divulgação nas reuniões dos Conseg’s (Conselhos Comunitários de Segurança) e até mesmo por meio de jornais de bairros.

No ano de 2010, durante o Carnaval, no Polo Cultural e Esportivo Grande Otelo (Anhembi), uma faixa sobre a campanha foi passada entre a apre-sentação de uma escola e outra, para orientar os participantes e divulgar a ação.

Em dezembro de 2010, as 536 armas de fogo que foram arrecadadas em pouco mais de dois meses da Campanha de Desarmamento na capi-tal, foram inutilizadas em ato simbólico no Vale do Anhangabaú.

A Secretaria Municipal de Segurança Urbana, através da Guarda Civil Metropolitana e integran-tes da Campanha de Desarmamento realizaram em 2011, no dia de Finados, o “Ato pela Vida”’, uma ação que visou simbolizar as 177 vidas poupa-das/salvas até aquele momento, graças ao reco-lhimento das armas. No ato, 177 pessoas vestidas de branco deitaram sobre as “lápides” no gramado do Cemitério Parque dos Girassóis (zona Sul de São Paulo), formando a palavra vida, simbolizando as pessoas que estariam mortas não fosse a Campa-

nha de Desarmamento.Segundo informações da cartilha da Secre-

taria de Segurança Urbana de São Paulo, é impor-tante destacar o esforço da Guarda Civil Metropo-litana na arrecadação de armas junto à população, o que a coloca como uma das protagonistas da “Campanha do Desarmamento”. Embora seja sem-pre delicado pensar em relações causais, é possível olhar para a quantidade de armas recolhidas pela GCM nos últimos anos e constatar um significativo aumento nos anos que compreenderam a criação do Comitê: em 2009 e 2010, a quantidade total de armas arrecadadas foi 1.695, já a partir de 2011 (até setembro de 2012), esse valor sobe para 3.026 no período. A média de armas arrecadadas por ins-petoria duplica: de 44 em 2009 e 2010 para 89 em 2011 e 2012.

“Ao analisar os dados de um ano da campanha nacio-

nal do desarmamento voluntário, merece destaque

especial a participação da GCM que recolheu neste

período (maio/11 a maio/12) mais de 2.500 armas. Este

número colocaria a cidade de São Paulo – consideran-

do apenas o recolhimento da GCM – a frente de outros

Estados como o Paraná que é o 7º Estado que mais re-

colhe armas. São números realmente impressionantes

que precisamos divulgar e festejar”. (Bruno Langeani,

Coordenador da área de Sistema de Segurança e Justi-

ça do Instituto Sou da Paz). (PREFEITURA DE SÃO PAU-

LO, s/d., página 23)

DESARMAMENTO

VIOLÊNCIA

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Registre-se, ainda, a Campanha “Unidos pelo Desarmamento”, que se efetivou com postos pro-visórios de recolhimento de armas de fogo nos Centros de Integração da Cidadania (CICs), entre os dias 13 e 18 de agosto de 2012. Cinco CICs da cidade de São Paulo se tornaram postos com a aju-da da Polícia Militar do Estado de São Paulo, e tira-ram de circulação 63 armas e dois simulacros, além de 644 munições de diversos calibres. Essa ação foi provocada pela Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania, por meio dos Centros de Integração da Cidadania (CICs), em parceria com a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Polícia Militar e o Instituto Sou da Paz.

Estudo feito pela Coordenadoria de Análise e Planejamento (CAP/SSP), órgão ligado ao Gabine-te do Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo7, concluiu que, analisando as apreen-sões de armas ocorridas na Região Metropolitana de São Paulo (Capital e Grande São Paulo) no pe-ríodo de janeiro de 2009 a agosto de 2012, o re-sultado da análise de regressão indicou que existe relação entre a quantidade de armas apreendidas

e os eventos de homicídio doloso. A correlação é negativa (-0,36) e indica que o aumento no núme-ro de armas apreendidas tem como contrapartida a redução dos homicídios dolosos. Significa dizer: a cada 10 armas tiradas de circulação através da apreensão, estima-se que mais de duas vidas te-nham sido poupadas (2.3 vidas).

Para a média mensal de 787 armas apreendi-das na RMSP no período (44 meses), pode-se esti-mar que, em média, 185 vidas tenham sido poupa-das mensalmente.

Hipoteticamente, o modelo demonstra: se nenhuma arma fosse apreendida na RMSP, ocorre-riam 549 Homicídios dolosos ao mês.

Todos os resultados dos estudos e análises realizados pela CAP/SSP confirmam a forte relação entre armas e mortes. Por conseguinte, corrobo-ram a importância do desarmamento na preser-vação da vida, quer seja na queda dos homicídios, quer seja na possibilidade de essa arma cair em mãos de criminosos que a utilizarão, inclusive, em confronto com a polícia.

7 O estudo foi divulgado na cartilha da Secretaria Municipal de Segurança Urbana de São Paulo. Disponível em: [http://www.soudapaz.org/upload/pdf/campanha_de_desarmamento_1.pdf]. Acesso em 17.set.2014.

Por que as armas de fogosão um perigo e nãouma solução?

Entre os anos de 1980 e 2010, as mortes cau-sadas por armas de fogo aumentaram 346%, se-gundo o ‘Mapa da Violência 2013: Mortes Matadas por Armas de Fogo’. Nesse período, as vítimas pas-saram de 8.710, no ano de 1980, para 38.892, em 2010. No mesmo intervalo, a população do país cresceu 60,3%. A pesquisa analisou as mortes por armas de fogo decorrentes de agressão intencio-nal de terceiros (homicídios), autoprovocadas in-tencionalmente (suicídios) ou de intencionalidade desconhecida cuja característica comum foi a mor-te causada por uma arma de fogo. De acordo com esse estudo, o crescimento da mortalidade por ar-mas de fogo foi maior entre as pessoas com idade entre 15 e 29 anos (414%), se comparado com o

conjunto da população (346,5%). Os homicídios de jovens cresceram de forma mais acelerada: na população como um todo foi 502,8%, mas entre os jovens o aumento foi 591,5%. O trabalho mos-tra, ainda, que, entre 1982 e 2003, o percentual de mortes de jovens por armas de fogo teve cresci-mento médio de 6,5% ao ano, contra 5,5% do con-junto da população. De cada três mortos por arma de fogo, dois estavam na faixa dos 15 a 29 anos. Os jovens representavam 67,1% dos mortos por arma de fogo no Brasil.

Em 30 anos, um total de 799.226 pessoas mor-reram vítimas de armas de fogo. Desses, 450.255 mil eram jovens entre 15 e 29 anos de idade. (MAPA DA VIOLÊNCIA, 2013).

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Neste contexto, a população norte-americana iniciou um debate. O que vale mais: a falsa sensa-ção de segurança ou expor suas crianças ao perigo, diariamente? Muitos americanos têm defendido uma reestruturação na legislação sobre a posse de arma.

Em 2011, o Brasil lamentou o massacre ocor-rido na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Re-alengo, no Rio de Janeiro. Um ex-aluno entrou na

Ao contrário do que é propagado pela mídia e povoa o imaginário, no senso comum, uma pes-quisa do Conselho Nacional do Ministério Público, divulgada em 2012, e elaborada a partir de inqué-ritos policiais referentes a homicídios acontecidos em 2011 e 2012, em 16 Unidades da Federação, apontou que as maiores causas de homicídios de-correram de motivos fúteis, como “brigas, ciúmes, conflitos entre vizinhos, desavenças, discussões, violências domésticas, desentendimentos no trân-sito.”

Uma célebre pesquisa desenvolvida por Ar-thur Kellermann, publicada no New England Jour-nal of Medincie revela:

A família que tem arma de fogo em casa corre qua-

tro vezes mais risco de que seja disparado um tiro de

forma não intencional, onze vezes mais riscos de que

seja instrumento de suicídio de que sirva de autodefe-

sa da própria família, dezoito vezes mais riscos de que

a arma seja usada contra um membro da casa do que

contra um invasor” (KELLERMANN, apud BOURGOIS,

2005. p. 33)

8 Segundo reportagem publicada pelo Portal G1 Brasil, em 08/11/2012, o estudo patrocinado pelo Conselho Nacio-nal do Ministério Público (CNMP), com dados de 16 unidades da federação, mostrou que, de 2011 a 2012, 83,03% dos homicídios no estado de São Paulo, por exemplo, foram cometidos por motivos “fúteis ou por impulso”. No Rio de Ja-neiro, entre janeiro de 2011 e setembro de 2012, 26,85% dos homicídios tiveram a mesma motivação, sendo a maioria classificada como “outras causas”, entre elas “execução”. Segundo a reportagem, “os órgãos de segurança consideram de razão fútil e por impulso as mortes por vingança, desavenças, passionais, rixa, embriaguez, entre outros”. Tendo em vista essa realidade, o Conselho Nacional do Ministério Público lançou a campanha “Conte até 10”, direcionada à pre-venção de homicídios que acontecem no Brasil por motivos fúteis ou por ações impulsivas. (Fonte: http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/11/em-sp-83-dos-homicidios-sao-por-motivos-futeis-ou-por-impulso-diz-mp.html. Acesso em 20.09.2014).

Os Estados Unidos são conhecidos interna-cionalmente pelas tragédias envolvendo armas de fogo, dado que a aquisição de tais equipamentos é facilitada naquele país. Conforme apontam al-gumas pesquisas do Instituto Small Arms Survey, em 2007, noventa em cada cem norte-americanos possuíam uma arma em casa, o que equivalia a 270 milhões em números absolutos. Resultado: o número de crianças e adolescentes que perdem a vida em assassinatos em massa, suicídios ou víti-mas de bala perdida é alarmantes (SMALL ARMS SURVEY, 2007). De acordo com estudo do jornal The New York Times, o governo americano tem tentado maquiar estes números.

O quadro a seguir mostra os valores apresen-tados pelo governo e os constatados pelo jornal:

QUADRO 2: Mortes por tiros acidentais em menores de 15 anos

Fonte: LUO e McINTIRE, 2012.

escola com dois revólveres calibre 38, atirando contra os estudantes e suicidou-se em seguida. Ao todo, onze crianças morreram e treze ficaram feri-das. O episódio trouxe novamente à tona a discus-são sobre os riscos que todos correm quando se tem cidadãos armados.

A comunidade internacional está mobilizada no intuito de reduzir os impactos negativos das ar-mas nas mãos de civis. No dia 3 de junho de 2013,

O número de crianças e adolescentes que perdem a vida em

assassinatos em massa, suicídios ou vítimas

de bala perdida é alarmantes

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o Brasil juntamente com 60 países assinou nas Na-ções Unidas, o ATT – Arms Trade Treaty (em portu-guês, Tratado de Comércio de Armas). O objetivo é regular o comércio internacional de armas, a fim de diminuir o número de armas de fogo desviadas para o tráfico ilegal.

A adesão a este tratado faz jus ao que precei-tua a Constituição Federal de 1988, no artigo 4º, VI - de que o Brasil se rege em suas relações inter-nacionais pela defesa da paz.9 Assim, este tratado renova as esperanças dos membros da comunida-

de internacional que lutam incessantemente pela redução do número de armas em seus territórios. Fica evidente que não basta apenas um esforço nacional, embora ele seja imprescindível. É preci-so um empenho mútuo, já que muitas armas são oriundas do tráfico internacional. Se os países se comprometerem a fiscalizar de modo mais severo o comércio, certamente reduzir-se-ão ainda mais o número de homicídios por arma de fogo no Brasil, e nos demais países signatários do Tratado.

O perigo das “balas perdidas”

Reportagem do jornal O Globo10, de 23 de se-tembro de 2014, informa que um relatório divulga-do pelo Centro Regional das Nações Unidas para a Paz, Desarmamento e Desenvolvimento na Amé-rica Latina e Caribe (UN-LiREC), revela que o Bra-sil é o segundo país onde há mais ocorrências de balas perdidas da América Latina e o terceiro com o maior número de mortes por elas provocadas. O levantamento foi feito a partir de reportagens pu-blicadas em 27 países. No Brasil, 35% das ocorrên-cias analisadas resultaram em morte.

O ranqueamento internacional do UN-LiREC contabilizou 22 brasileiros mortos e 53 feridos, entre 2009 e 2013. Porém, uma amostragem fei-ta pelo jornal fluminense aponta que somente no Rio de Janeiro pelo menos 22 pessoas morreram vítimas de balas perdidas entre janeiro e setembro

9 A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: [...] VI – defesa da paz. (CF/1988, art. 4º, VI).

de 2014, sendo que nove eram crianças de até 12 anos de idade.

O UN-LiREC mapeou 550 ocorrências envol-vendo balas perdidas em 27 países do continente, totalizando, entre mortos e feridos, 617 pessoas. A Venezuela é o país que guarda o maior número de casos de balas perdidas e de mortes, 74 e 67, res-pectivamente. Segundo lugar no número de casos, com 71, o Brasil fica atrás da Colômbia em mortes, com 29 óbitos, enquanto foram registradas 36 mortes de colombianos. Já em relação aos feridos, o Brasil tem o maior número de ocorrências do continente, com 53 feridos.

Ainda segundo a reportagem, tendo como ful-cro os dados divulgados pelo UN-LiREC, no Brasil, o maior número de casos tem como origem algum tipo de intervenção policial, como perseguição a

10 A reportagem completa está disponível no link: http://oglobo.globo.com/brasil/brasil-o-segundo-pais-sofrer-com-balas-perdidas-na-america-latina-14016759. Acesso em 25.09.2014.

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supostos criminosos (27% das ocorrências). Em se-gundo lugar, estão os tiroteios entre gangues ou quadrilhas, com 24%, acompanhados por disparos efetuados durante assaltos 20%. Outro dado cha-ma a atenção: 10% dos casos são devidos a confli-tos interpessoais em que as testemunhas acabam alvejadas. No entanto, em 40% dos casos não foi possível determinar a causa dos disparos.

A reportagem de O Globo faz referência, ain-da, a um estudo da ONG Sou da Paz, que lançou um levantamento próprio sobre as armas apreendidas em São Paulo, mostrando como armas antigas e de baixo calibre são as mais utilizadas em homicídios e causam os maiores danos nos casos de testemu-nhas atingidas: “de 14.488 armas analisadas, 1,2 mil estavam ligadas a homicídios. A maioria, 97%, eram armas curtas e 34% eram de calibre 38. Esse armamento é majoritariamente nacional, sendo que 77,8% eram da marca Taurus. E o que mais se destacou no levantamento foi a idade das armas: 88% dos revólveres usados nesses crimes foram fabricados antes de 2003, ano em que foi promul-gada a lei 10.826/2003”.

Segundo informações do “Relatório Temático Bala Perdida”,11 referente ao primeiro semestre de 2012, publicado pelo Instituto de Segurança Públi-ca do Rio de Janeiro:

Após analisar os dados de Registros de Ocorrência

cujo campo “Dinâmica dos Fatos” continha a expres-

são “bala perdida”, identificamos que, no período ana-

lisado (2009-2011), a capital fluminense foi a área que

concentrou o maior número de vítimas relacionadas a

esse tipo de evento. No período de janeiro a junho de

2012 não foi diferente: foram 35 (trinta e cinco) vítimas

(ou seja, 57,4%) de “bala perdida”, fatais e não fatais,

de um total de 61 (sessenta e uma) vítimas. Segundo

dados analisados por AISP, quatro delas reuniram mais

de 50% das vítimas de “bala perdida” do estado no pe-

ríodo de janeiro a junho de 2012. [...] Verificou-se ainda

que, no período analisado, a maior parte dos registros

apontava vítimas do sexo masculino, atingidas em “via

pública”, sem menção a qualquer tipo de evento que

pudesse ter relação com o fato em si, o que podería-

mos entender como incidências típicas de “bala perdi-

da”. (RELATÓRIO TEMÁTICO BALA PERDIDA, 1º SEMES-

TRE DE 2012, p. 10).

A indústria brasileira de armas

O Brasil possui uma pujante indústria bélica, sendo o quarto maior exportador de armas leves do mundo, de acordo com o Small Arms Survey, o principal estudo a respeito desta indústria, rea-lizado pelo Instituto de Estudos Internacionais e de Desenvolvimento em Genebra. Está atrás dos Estados Unidos, Itália e Alemanha - mas à frente de países como Israel, Áustria e Rússia. De acordo com o Exército Brasileiro, responsável por fiscalizar e controlar as exportações, de 2005 a 2010 o Brasil exportou 4.482.874 armas de fogo.

Além dos mercados tradicionais no continen-te americano e na Europa, o Brasil vem buscando vender armas leves para a África e a Ásia. Levanta-mentos feitos pela Iniciativa Norueguesa em Trans-ferência de Armas Leves (Nisat, do inglês Norwe-gian Initiative on Small Arms Transfers) apontam que, de 1999 a 2009, o Brasil vendeu armas para África do Sul, Argélia, Angola, Botswana, Burkina Faso, Costa do Marfim, Egito, Gana, Guiné, Quênia, Madagascar, Malawi, Mauritânia, Marrocos, Namí-bia, Níger, Nigéria, Paquistão, República do Congo,

11 Acessado no link: http://arquivos.proderj.rj.gov.br/isp_imagens/Uploads/BalaPerdida_1sem2012.pdf. Acesso em 25.09.2014. O documento é divulgado, trimestralmente, pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) e tem como ob-jetivo apresentar o número de vítimas no Estado do Rio de Janeiro. Fica entendido como “vítima de bala perdida”, a pessoa que não tinha nenhuma participação ou influência sobre o evento no qual houve o disparo de arma de fogo, sendo, no entanto, atingida por projétil e podendo vir a falecer ou não. O documento é divulgado com base nas ocor-rências criminais registradas pelos Delegados.

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Senegal, Tanzânia, Uganda, Zâmbia e Zimbábue. De acordo com o Small Arms Survey, a indús-

tria de arma brasileira movimenta por ano, cerca de cem milhões de dólares. Um país com uma es-cala de produção bélica com destaque internacio-nal, não pode, de modo algum, ignorar o potencial que possui para protagonizar o tráfico ilícito de ar-mas. (SMALL ARMS SURVEY, 2014).

Pesquisas revelam que grande parte das ar-mas produzidas no Brasil são exportadas e, pos-teriormente, retornam ao território brasileiro de forma clandestina, alimentando o tráfico ilegal de armas e outros crimes desencadeados por este.

Como aponta o quadro abaixo, 71% das ar-mas que produzem crimes no Brasil entram ilegal-mente no país através de contrabando vindo de países vizinhos:

Como aponta o quadro abaixo, 71% das ar-mas que produzem crimes no Brasil entram ilegal-mente no país através de contrabando vindo de países vizinhos.

É importante registrar, nesse contexto, que o Estatuto do Desarmamento impõe à indústria bé-lica maior responsabilização sobre o seu produto. Neste sentido, não há espaço para se ignorar todos os reflexos oriundos da venda de arma de fogo.

QUADRO 3– Procedência da armas dos crimes, no Brasil

Fonte: ABBUD e MARICATE, 2011.

Segundo o “Mapa do Tráfico Ilícito de Armas no Brasil e o Ranking dos Estados no Controle de Armas Brasil”13 , o país tinha, em 2010, 16 milhões de armas de fogo. Desse total, 14 milhões de armas (87%) estavam nas mãos de civis e dois milhões com agentes do Estado, ou seja, 13% do total apu-rado.

O mesmo estudo informa que o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking de crimes por arma de fogo no mundo, com 34,3 mil homicídios anuais.

Para combater o tráfico de armas dos paí-ses vizinhos, destaca-se a elaboração da Estraté-gia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras (ENAFRON)14: plano estratégico que visa à criação de mecanismos para coordenar de maneira mais efetiva as ações dos órgãos públicos nessas regi-ões, com o intuito de diminuir a criminalidade e o tráfico de ilícitos.

Segundo informações da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp/MJ)15, 843 policiais civis e militares já foram capacitados pelo governo federal em 2013 e 2014 para patrulhar a faixa de

12 Empresas de armas migram para África e Ásia para ampliar exportações. (MOTA, 2012).

fronteira de 11 estados com 10 países da América do Sul. Além de capacitar operadores, o Curso de Unidades Especializadas de Fronteira também for-ma multiplicadores – profissionais que são capaci-tados para serem instrutores – que são qualifica-dos durante edições com o dobro da carga horária de aulas oferecidas a operadores.

Somando inovação tecnológica e maior in-tegração entre os organismos locais ligados a po-líticas públicas de segurança, o governo federal tem destinado maiores investimentos para estas regiões, pautados em critérios objetivos, tais como tamanho da população residente na área de fron-teira, taxa de homicídio, extensão da fronteira por unidade federativa e número de apreensões de ar-mas e drogas.

Registre-se, ainda que, para a consecução do plano de combate ao tráfico de pessoas, coordena-do pelo Ministério da Justiça, encontram-se ações também voltadas para o combate e tráfico de ar-mas, dadas as associações entre essas duas moda-lidades de crimes16.

13 O “Mapa do Tráfico Ilícito de Armas no Brasil e o Ranking dos Estados no Controle de Armas Brasil” foi divulgado em dezembro de 2010 pelo Ministério da Justiça em parceria com oViva Rio. Detalhes em: http://www.vivario.org.br/publique/media/TEXTO%20LAN%C3%87AMENTO%20LIVROS%20III.pdf. Acesso em 27.set.2014.

14 A apresentação da Estratégia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras está disponível em: http://www.se-plan.am.gov.br/arquivos/download/arqeditor/plano_estrategico_fronteiras.pdf

15 Fonte: http://www.justica.gov.br/noticias/ministerio-da-justica-qualifica-mais-de-800-policiais-que-atuam-na-fronteira

16 Para mais informações sobre as ações de combate ao tráfico de pessoas, acessar o portal do Ministério da Justiça, no link: http://www.justica.gov.br/sua-protecao/trafico-de-pessoas . Acesso em 20.09.2014.

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Conheça os principais pontos do Estatuto do Desarmamento

Em função do aumento das mortes e da vio-lência envolvendo armas de fogo no país, segmen-tos da sociedade civil e dos governos, notamente o governo federal, através do Ministério da Justiça, manifestaram-se em busca de ações efetivas para o controle do armamento em poder da população civil. Dentre os diversos esforços realizados desta-caremos aqui, como ponto de partida e de análise, o Estatuto do Desarmamento.

A Lei nº 10.826/2003, conhecida como Esta-tuto do Desarmamento, significou um novo marco regulatório para o acesso às armas de fogo, impli-cando em alterações sobre os seguintes requisitos:

registro, posse, porte e a comercialização de armas de fogo e munição no interior do território nacio-nal.

O Estatuto de Desarmamento veio, em certa medida, responder ao clamor da população brasi-leira, cansada da insegurança e do altíssimo núme-ro de homicídios provocados por armas de fogo. Esta lei surgiu como mecanismo de combate à vio-lência e ao tráfico ilegal de armas.

A legislação que vigorava até então, a Lei 9.437/199717, em diversos pontos era rasa, facilitan-do assim, que pessoas despreparadas e sem qual-quer motivo justo portassem uma arma de fogo.

As autoridades competentes encontravam fortes barreiras para combater o porte e o tráfico ilegais de armas. De acordo com a pesquisa elaborada pelo Ministério da Justiça/Instituto Sangari, até 2003 o Brasil experimentava um aumento anual de 4% no número de homicídios. Após o advento do Estatuto do Desarmamento, houve uma queda desse número, principalmente em 2004 (WAISEL-FISZ, 2011).

A antiga lei não estabelecia qualquer requisi-to para que o indivíduo portasse uma arma. Deste modo, qualquer cidadão interessado poderia re-querer o registro de sua arma.

Hoje, o procedimento é mais complexo. O artigo 4º do Estatuto e o artigo 12 do Decreto 5.123/200418, que regulamenta o Estatuto, preve-em que para ser proprietário de uma arma é ne-cessário ter no mínimo 25 anos, declarar efetiva necessidade de possuí-la, comprovar idoneidade, apresentar certidões de antecedentes criminais emitidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e

Eleitoral, bem como, não estar respondendo a in-quérito ou a processo criminal. É necessário tam-bém provar residência certa e ocupação lícita. Ademais, o requerente deve passar por um exame psicológico para o manuseio da arma de fogo. O artigo quinto19, parágrafo 2º, determina que todos estes requisitos devem ser periodicamente com-provados, por um prazo não inferior a 3 anos. É necessário que o proprietário prove ao Estado que está apto a ter a posse da arma e da munição, e que tal fato não oferece risco à sociedade.

Desde 2003, as empresas que comercializam arma de fogo são obrigadas a informar suas ven-das às autoridades competentes, bem como, obri-gadas a manter um banco de dados com todas as características da arma e a cópia dos documentos acima elencados.

Conforme prevê o parágrafo 4º, do artigo 4º do Estatuto, as armas de fogo, os acessórios e as munições estão sob a responsabilidade da empre-sa até o momento da venda. De modo que, ela é a

17 BRASIL. Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9437.htm>. Acesso em 27 Ago. 2014.

18 BRASIL. Lei nº 5.123, de 1º de julho de 2004. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5123.htm>. Acesso em 27 Ago. 2014.

19 O certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência desses, ou, ai-nda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal pelo estabelecimento ou empresa. (Redação dada pela Lei nº 10.884, de 2004). § 1º - O certificado de registro de arma de fogo será expedido pela Polícia Federal e será precedido de autorização do Sinarm. § 2º - Os requisitos de que tratam os incisos I, II e III do art. 4º de-verão ser comprovados periodicamente, em período não inferior a 3 (três) anos, na conformidade do estabelecido no regulamento desta Lei, para a renovação do Certificado de Registro de Arma de Fogo. (Lei 10.826, art. 5 e parágrafos 1º e 2º).

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proprietária e responde legalmente pelos equipa-mentos estocados.20

Outro avanço, tanto no que se refere à verifica-ção das origens (da arma) e na investigação de cri-mes, foi a introdução do inciso X, no artigo 2º, que determina o cadastro e a identificação do cano da arma, das características e impressões de raiamen-to e do microestreitamento do projétil disparado21. Anteriormente, sem estas informações, era tarefa árdua para os investigadores descobrirem todo o caminho percorrido pela arma e, consequente-mente, encontrar o responsável pelos crimes.

A Lei 10.826/2003 também trouxe uma mu-dança significativa no que diz respeito ao porte de arma. O Estatuto já inicia o Capítulo III, destinado a regulamentação do porte com os seguintes di-zeres: “Art. 6o - É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria [...].”

Percebe-se uma preocupação muito grande por parte do legislador em controlar o número de armas que circulam nas ruas. Hoje, a regra é a proi-bição. O cidadão não pode mais transportar con-sigo uma arma de fogo, salvo exceções. Os incisos do artigo 6º indicam quem são as autoridades que

não se enquadram nesta regra, bem como, em quais situações um cidadão com a posse pode, também, ter o porte de arma. Sem a necessidade de se adentrar nestas exceções, citam-se apenas a título de exemplo, os integrantes das forças arma-das e os residentes em áreas rurais, maiores de 25 anos que dependam da arma para prover a subsis-tência sua e de sua família.

Essa medida visa proteger os cidadãos bem intencionados que, ao pensarem que podem ga-rantir a sua defesa e a defesa de sua família, aca-bam majorando o risco de um desastre.

Merece igual destaque as mudanças referen-tes aos crimes e às penas. O artigo 10, da antiga lei, tipificava todas as condutas criminosas relaciona-das às armas, com uma aplicação da pena irrisória: um a dois anos de detenção e multa. O Estatuto trata o assunto com a profundidade que lhe é de-vida. Ao todo, são 10 artigos com diferenciação de pena, conforme o crime.

No Brasil, o porte ilegal de armas já foi consi-derado uma contravenção penal ao invés de crime. E a pena para o tráfico ilegal era a mesma aplicada para o tráfico de CDs.

Quanto ao tráfico ilegal de armas, o Estatuto

20 § 4o - A empresa que comercializa armas de fogo, acessórios e munições responde legalmente por essas mer-cadorias, ficando registradas como de sua propriedade enquanto não forem vendidas. (Lei 10.826, art. 4 e parágrafo 4°).

21 X – cadastrar a identificação do cano da arma, as características das impressões de raiamento e de microestria-mento de projétil disparado, conforme marcação e testes obrigatoriamente realizados pelo fabricante. (Lei 10.826, art. 1º, X).

criminalizou o ato de importar, exportar e favorecer a entrada ou a saída de arma de fogo, acessório ou munição do território nacional sem autorização da autoridade competente22. Tais medidas deveriam inibir o traficante de armas e munições a alimentar o comércio ilegal no Brasil.

Mais da metade das armas que circulavam no país até 2003 foram adquiridas por meio ilegal. Este percentual possui ligação direta com o número de homicídios. De acordo com o Ministério da Saúde, 38.088 pessoas foram vítimas fatais por arma de fogo no ano de 2002. O mesmo estudo informa que 64% do total de homicídios no país são provo-cados por armas. Assim, o aperfeiçoamento no ca-pítulo IV que trata dos crimes e das penas, mostra-se imprescindível para uma redução no número de homicídios e no comércio ilegal de armas.

É evidente que para combater a criminalida-de, são necessárias modificações em vários setores da administração: aperfeiçoamento do sistema judiciário, melhoria na qualidade da educação, diminuição da desigualdade social, valorização e controle da atividade policial, investimento em infraestrutura e equipamentos utilizados no com-bate a violência.

Somente um conjunto de ações seria capaz de reestruturar o cenário da segurança pública no país. Contudo, os resultados destas reformas serão

22 Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente. Pena – reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (Lei 10.826, art. 18).

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vistos em longo prazo. A reestruturação legislativa, que veio através do Estatuto do Desarmamento e as campanhas maciças do governo em desarmar a população revelam-se como resposta imediata e eficaz para a redução de homicídios por armas de fogo no Brasil.

A partir do Estatuto, o país finalmente passou a ter critérios mais rigorosos para o controle do acesso às armas lícitas por parte da população civil e também por parte das agências privadas de se-gurança. Somente as armas devidamente registra-das podem, desde então, ser portadas em residên-cias ou no local de trabalho pelo responsável legal pelo estabelecimento. O trânsito dos cidadãos com a arma pelas vias públicas passou a ser regulado, exigindo-se a autorização para o porte de arma de fogo (concedida pela Polícia Federal). Além disso, o porte de arma está previsto para maiores de 25 anos e que possuam ocupação lícita e comprova-ção de residência.

Contudo, o acesso ao porte só é concedido aos cidadãos que, por motivos de insegurança pública, comprovem viver sob ameaça de risco de

morte. A partir de nova redação do Capítulo II, Ar-tigo 4º, Inciso I, do ED, em 200823 o direito ao porte de armas também ficou condicionado à apresenta-ção de comprovação de idoneidade (certificações negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral) e restrito para os indivíduos que respondem a in-quérito policial ou a processo criminal.

Além disso, a nova redação alterou o § 2º, Ar-tigo 4º, do ED24, no sentido de vincular o acesso à munição ao calibre da arma, aumentando o con-trole de forma mais racional e previsível.

O ED também prevê a proibição do porte de arma quando o portador for identificado utilizan-do sua arma em estados de embriaguez alcoólica ou sob efeito de outras substâncias psicotrópicas que expressem alteração clara de seu desempe-nho intelectual ou motor.25

A seguir elaboramos uma síntese de tais ini-ciativas tendo como ponto de partida as modifica-ções normativas que incidem no Estatuto do De-sarmamento (Quadro 4).

23 “I- comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos.” (Lei 10.826/2003; redação dada pela Lei 11.706/2008).

24 “§ 2o A aquisição de munição somente poderá ser feita no calibre correspondente à arma registrada e na quan-tidade estabelecida no regulamento desta Lei”. (Lei 10.826/2003; redação dada pela Lei 11.706/2008).

Iniciativa Ano Objetivo Desdobramentos Condicionantes

Lei nº 10.826/2003 2003

Estabelecer novas formas de controle sobre o comércio inter-no/nacional de armas de fogo.

Regulamentação do SINARM – Sistema Na-cional de Armas e do registro, posse e porte de arma; Instituiu a realiza-ção de campanhas de de-sarmamento e punições mais efetivas ao comércio ilegal e tráfico internacio-nal de armas de fogo.

De 2004 até 2010 o recebimento de armas e munições pela Campanha do Desarmamento era realizado apenas pela Polícia Federal.A entrega de armas não era anônima.Decreto nº

5.123/2004 2004

Regulamentar a Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003.

Portaria nº 797 de 05/05/11

2011 Regular o pro-cedimento de entrega da arma

Campanha atingiu maior cobertura geográfica efetiva a partir de Acordo de Cooperação assinado por 26 estados; Distrito Federal;9 municípios e1 consórcio intermunici-pal (7 municípios). Postos de entrega: Corpo de Bombeiro Militar; Guarda Municipal; Polícia Civil; Polícia Militar; Polícia Fe-deral; Polícia; Rodoviária Federal; Sociedade Civil.

Anonimato garanti-do; Indenização mais rápida; Inutilização da arma; Não há risco de ser preso ou processado, mesmo que o armamento já tenha sido utilizado em algum crime. Mais postos de coleta.

Portaria nº 936 de 17/05/11

Regular o pro-cedimento de credenciamento dos órgãos interessados em participar da campanha.

Portaria nº 2.969 de 22/12/12

2012 Alterar o Anexo I da Portaria nº 797,de 5 de maio de 2011(reajustar valor indeniza-ções).

Estabelece critérios para o porte de ar-mas para integrantes efetivos e guardas prisonais.

Lei nº 12.993/2014

2014 Alterar § 1º A do Capítulo III do ED.

QUADRO 4: Quadro geral sobre principais marcos normativos doEstatuto do Desarmamento no Brasil – 2003-2012

Fonte: Ministério da Justiça, 2014. Nota: adaptado pelo autor.25 Artigo 10, § 2º: “A autorização de porte de arma de fogo, prevista neste artigo, perderá automaticamente sua eficá-cia caso o portador dela seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de substâncias químicas ou alucinógenas”. (Lei 10.826/2003).

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Em relação ao desarmamento é importante mencionar o referendo público (Referendo Sobre a Proibição do Comércio de Armas e Munição no Brasil) realizado em 23 de outubro de 2005. Atra-vés dessa consulta popular, o governo brasileiro verificou o posicionamento da nação em relação à proibição da comercialização de armas de fogo e munição: 63,94% dos votantes se pronunciaram favoráveis à comercialização das armas.

De um modo geral, o porte de armas ficou, en-tão, concedido aos agentes de segurança pública (policiais e guardas municipais em municipalida-des com população superior a 500 mil habitantes

e que possuam Guarda Municipal Armada), bem como aos membros das Forças Armadas, agen-tes de inteligência governamental e também aos agentes de segurança privada.

No caso de integrantes do quadro efetivo de agentes e guardas prisionais, o porte de armas de fogo de propriedade particular ou fornecida pela respectiva corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, tem como critérios básicos: submetidos a regime de dedicação exclusiva; sujeitos à forma-ção funcional, nos termos do regulamento; subor-dinados a mecanismos de fiscalização e de contro-le interno (Lei nº 12.993/2014).

O processo de entregadas armas e munições

De 2004 até 2011 o recebimento de armas e munições pela Campanha do Desarmamento era realizado apenas pela Polícia Federal. Após 2011, outros órgãos da segurança pública passaram a in-tegrar a rede de postos de recolhimento: Corpo de Bombeiro Militar; Guarda Municipal; Polícia Civil; Polícia Militar; Polícia Rodoviária Federal; entida-des da sociedade civil.

Atualmente, os valores das indenizações das armas entregues pela população variam entre R$ 150,00 a R$450,00, e os postos encontram-se geo-graficamente distribuídos nas 26 Unidades da Fe-deração, entre seus mais populosos municípios, e no Distrito Federal. A seguir, um fluxograma que ilustra o percurso institucional desde a entrega da arma feita pelo cidadão até seu destino final.

FLUXOGRAMA 1: Fluxo institucional da entrega de armasna Campanha do Desarmamento/ Brasil - 2014

Fonte: Ministério da Justiça, 2014. Nota: adaptado pelo autor.

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A entrega das armas (FLUXOGRAMA 1) é ge-renciada por um sistema informatizado, o “Siste-ma Desarma”, que foi especialmente desenvolvido para a Campanha Nacional do Desarmamento.

O sistema, integrado à Rede Infoseg26, é orga-nizado de modo a garantir a confidencialidade no

momento da entrega das armas de fogo e muni-ções, a agilidade no pagamento das indenizações27 e possibilita, também, o levantamento de dados que podem ser utilizados para a confecção de rela-tórios gerenciais periódicos.

Além das indenizações em dinheiro, a Cam-

26 A Rede INFOSEG é um sistema que reúne informações de segurança pública, justiça e fiscalização, normatizada a partir do Decreto 6.138/2007. Seu objetivo principal é a integração das informações de processos judiciais, inquéritos, termos circunstanciados, mandados de prisão, veículos, condutores e armas de fogo. O acesso à rede está disponível aos usuários através do portal www.infoseg.gov.br.

panha Nacional do Desarmamento promove ma-rketing publicitário enfatizando sobre os riscos inerentes que a presença de armas de fogo impõe à convivência familiar e comunitária.

A campanha publicitária em torno do desar-mamento fundamentou-se no slogan “Proteja sua família, desarme-se” e já passou por três fases dis-tintas, desde seu início em 06 de maio de 2011.

A campanha é responsável pela circulação de mensagens em favor do desarmamento em emis-soras de televisão, rádio, revistas e jornais impres-sos de grande circulação, além de cartazes afixados em espaços públicos e outras estratégias comuni-cacionais, como camisetas, folders, panfletos infor-

mativos, etc. O objetivo da campanha é incentivar a entrega voluntária de armas pela população, pro-movendo a circulação e a difusão de informações, principalmente em relação à garantia do anonima-to e de recebimento de indenização por parte dos cidadãos que voluntariamente entregarem armas ou munições nos postos credenciados.

De acordo com o projeto “Mapeamento do Comércio e tráfico ilegal de armas no Brasil” reali-zada pelo “Viva Rio”, em parceria com a subcomis-são Especial de Armas e Munições, da Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados (CSPCCO), com apoio da Secretaria Nacional de Se-gurança Pública (Senasp), do Ministério da Justiça,

Imagem 1: Portal Desarma

Fonte: www.desarma.mj.gov.br

27 O sistema também torna mais ágil o pagamento das indenizações que podem ser sacadas em agências do Banco do Brasil em um prazo de 24 horas. Após a entrega, as armas são encaminhadas para serem destruídas pelo Co-mando do Exército, através de fundição em fornos industriais.

FIGURA 1: Campanha do DesarmamentoSlogans e Imagens das três fases - Brasil - 2014

Fonte: http://www.entreguesuaarma.gov.br. 2014.Nota: adaptado pelo autor.

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constatou-se que esta segunda campanha, organi-zada pelo Ministério da Justiça e pela Polícia Fede-ral, recolheu 30.721 armas de fogo (RANKING DOS ESTADOS NO CONTROLE DE ARMAS, 2010).

Em 2011, o Ministério da Justiça lançou a campanha “Tire uma arma do Futuro do Brasil”.28 O desafio era superar o recolhimento de armas das campanhas anteriores. Para atrair mais cidadãos dispostos a entregarem voluntariamente as armas de fogo, o governo acrescentou alguns benefícios, tais como: anonimato do possuidor e pagamen-to da indenização em até 30 dias após a entrega. (BLOG DO PLANALTO, 2011).

Em 2012, o programa de entrega de armas passou a fazer parte do Programa Brasil Mais Segu-ro29, uma cooperação entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, que visa reduzir a criminali-dade e o crime organizado.

Além disso, o Ministério da Justiça editou a portaria 2.969, que aumentou o valor da indeniza-ção por cada arma entregue. Antes, as indenizações variavam de R$ 100 a R$300,00. Com a portaria os valores foram majorados de R$150 a R$450,00, conforme o tipo e calibre do armamento.

Nos anos de 2011 e 2012, mais de 60 mil armas foram entregues, com destaque para o Estado de São Paulo, que possuía 670 postos de recolhimen-to (CAMPANHA NACIONAL DO DESARMAMENTO, 2013). De acordo com o Ministério da Justiça, em 2014 a campanha “Proteja a sua família. Desarma-se” recolheu apenas nos 3 primeiros meses do ano, 4.147 armas de fogo.

Desde 2004 as companhas de desarmamento recolheram 650.336 armas em todo o Brasil. (MI-NISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2014).

28 O governo previa um investimento R$ 10 milhões em indenizações e recolhimento. (BLOG DO PLANALTO, 2011).

29 “Programa de redução da criminalidade violenta, a ser implantado por meio do acordo de cooperação da União, Estados, Distrito Federal e Municípios com o objetivo de reduzir a impunidade, aumentar a sensação de segurança da população e promover maior controle de armas”. (Fonte: http://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-pu-blica/programas-1/brasil-mais-seguro. Acesso em 14.10.2014).

Breves informações sobre o SINARM e o SIGMA

O SINARM (Sistema Nacional de Armas), criado pelo Mistério da Justiça, no âmbito da Polícia Fede-ral, foi estabelecido pela Lei 9.437/199730 e possui circunscrição em todo o território nacional. Esse sistema foi implantado com o intuito de centralizar os registros e autorizações de porte de armas que, até então, eram feitas pelas polícias estaduais. Viu-se a necessidade de adoção deste sistema, já que

era inviável o controle em nível nacional, pois não havia comunicação dos dados estaduais. A inexis-tência deste controle inviabilizava o conhecimento exato do número de armas circulantes no país, o que era extremante danoso para o combate do trá-fico ilegal de armas.

O Estatuto do Desarmamento acrescentou ao SINRAM outras competências, a fim de viabilizar e

30 BRASIL. Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9437.htm>. Acesso em 27 Ago. 2014.

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sofisticar o banco de informações acerca das ar-mas, desde o seu surgimento até sua possível des-truição. Dentre as competências trazidas pelo Esta-tuto, destacam-se: cadastrar mediante registro os produtores, atacadistas, varejistas, exportadores e importadores autorizados de armas de fogo, aces-sórios e munições e informar às Secretarias de Se-gurança Pública dos Estados e do Distrito Federal os registros e autorizações de porte de armas de fogo nos respectivos territórios, bem como manter o cadastro atualizado para consulta.

Desde 2003, passou a ser obrigatória a autori-zação do SINARM para a comercialização de armas e munições entre pessoas físicas31. Ademais, todo o procedimento necessário para se obter a autoriza-ção para a posse de arma passa pelo SINARM.

Vale destacar que o SINARM é responsável pelo cadastro dos registros das armas de fogo ins-titucionais da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal, das Polícias Civis, das Guardas Municipais e demais órgãos, instituições, corporações e seus integrantes, elencadas no artigo 1º, § 1º, do Decre-to 5.123/2004;

Já o SIGMA (Sistema e Gerenciamento Militar de Armas) foi instituído pelo Decreto 5.123/200432, no âmbito do Comando do Exército, com cir-

cunscrição em todo território nacional, conforme preceitua o artigo 2º. O objetivo deste sistema é manter de modo permanente e integralizado o cadastro geral de armas de fogo importadas, pro-duzidas e comercializadas em território nacional, além das armas de testes e avaliação técnica, armas de fogo de colecionadores, atiradores, caçadores e as armas obsoletas. Compete ainda ao SIGMA ca-dastrar as armas de fogo institucionais das Forças Armadas, das Polícias Militares, da Agência Brasi-leira de Inteligência (ABIN) e demais instituições e seus integrantes, previstas no §1º, do artigo 2º, do decreto que o criou.

São importantes e eficientes os benefícios tra-zidos por estes sistemas de gerenciamento e con-trole de armas de fogo. Hoje, o monitoramento do fluxo de armas no Brasil é demasiadamente mais avançado em relação à legislação anterior ao Esta-tuto do Desarmamento. Isto contribui diretamente para o combate ao tráfico ilegal de armas e justa penalização para os que utilizam as armas ilegais para cometerem diversas modalidades de crimes.

Para que estas operações continuem avançan-do é desejável a integração dos dois sistemas, a fim de que os desvios de armas sejam reduzidos e que haja maior sucesso na descoberta do(s) autor(es)

31 Artigo 4º, parágrafo 5º da Lei 10.826 e artigo 14 do Decreto 5.123/2004.

32 BRASIL. Lei nº 5.123, de 1º de julho de 2004. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5123.htm>. Acesso em 27 Ago. 2014

do(s) crime(s). Em 2006, a Câmara dos Deputados através da Comissão Parlamentar de Inquérito do Tráfico de Armas, solicitou ao Poder Executivo a in-tegração dos cadastros do SINARM e do SIGMA.

Assim, tanto a Polícia Federal quanto o Exér-cito Brasileiro têm trabalhado em estratégias que possibilitem o compartilhamento de dados e infor-mações acerca das armas de fogo no Brasil.

O controle das armas no exterior

O debate internacional sobre o controle das armas de fogo está longe de alcançar consenso. As nações exercem a soberania sobre tal questão a partir de diferentes referências culturais e histó-ricas. Contudo, notamos uma intenção política fa-vorável ao desarmamento defendida por relevan-tes organizações internacionais multilaterais que exercem forte influência sobre os países, como é o

caso da Organização das Nações Unidas (ONU). Na 66ª Sessão do Comitê sobre o Desarma-

mento, da Assembleia Geral da ONU, em 11 de ou-tubro de 2011, relativo ao desarmamento civil, o tema do desarmamento foi novamente debatido. A retórica difundida pela ONU (2014) em torno de uma cultura global de paz reconhece que o desen-volvimento de regimes democráticos depende,

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cada vez mais, de políticas e práticas legais capa-zes de produzir um mundo mais seguro, justo e previsível. De modo que, o controle da produção e disseminação de armas de destruição em massa, bem como a regulação e a limitação do acesso às armas convencionais foram tratadas como requi-sitos fundamentais sobre o desenvolvimento dos países.

Por outro lado, a adesão dos países a tal pers-pectiva depende de variáveis como a origem his-tórica, política e cultural das nações modernas. O direito de portar armas não implicou necessaria-mente em uma relação causal determinística com a expansão da violência entre todas as nações. Em contextos distintos as armas possuem significado social e cultural também distinto. Não há um uni-versalismo sobre tal questão. Observam-se, não obstante, tendências que apontam caminhos e possibilidades de construção de novos significa-dos sobre o lugar das armas nas sociedades.

Na Suíça, por exemplo, país que apresenta ta-xas de violência situadas entre os níveis mais baixos do planeta, as armas de fogo estão presentes nos domicílios de praticamente todos os cidadãos. Elas são entregues gratuitamente pelo governo após o cumprimento do serviço militar obrigatório.

Já o Japão, país com níveis baixos de violên-cia armada, as armas foram proibidas desde o tér-mino da 2ª Guerra Mundial, em 1945 (OMS, 2009). Ambos os países, Suíça e Japão são nações desen-volvidas e com níveis baixos de violência interna.

Porém, seguem caminhos opostos em relação ao controle estatal das armas de fogo sobre a vida so-cial em seus territórios nacionais. Portanto, fatores culturais, sociais e políticos são relevantes na com-preensão acerca da produção da violência associa-da à posse e uso de arma de fogo e no controle, pelo Estado, da violência, em geral.

Há casos de países com níveis baixos de vio-lência armada que nas últimas décadas tornaram mais rígida a legislação de controle desses equipa-mentos dos seus cidadãos. No Canadá, por exem-plo, desde 1995 foi adotada lei para exercer maior controle sobre a disseminação de armas de fogo em seu território. O objetivo da lei estava direta-mente relacionado com a intenção de diminuir a ocorrência de violência armada, de modo que tornou obrigatória a autorização de porte e a ve-rificação de antecedentes criminais, embora a lei canadense permita o porte de armas de fogo para os indivíduos de 12 a 18 anos, autorizados por seus responsáveis. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisa do Canadá, com a nova legislação, o número de armas roubadas diminuiu (30% entre 1998 e 2001). A taxa de homicídios com arma de fogo caiu 35% desde o início da década de 1990 (0,55 por 100 mil habitantes).

Há casos de alterações na legislação em fun-ção de acontecimentos pontuais, mas de grande repercussão pública e midiática como foi o caso de um assassinato em massa, na Nova Zelândia. Na década de 1990 um cidadão, após uma discussão

com o vizinho, usou sua arma e começou a atirar contra as pessoas que estavam à sua volta, matan-do 13 indivíduos, com um rifle semiautomático, no município de Aramoana33. Após esse episódio, o governo do país adotou um sistema de licencia-mento mais rigoroso, exigindo fotos dos proprie-tários de armas de fogo e renovações periódicas, pagamento de seguro, além de exames para averi-guar o conhecimento das leis vigentes.

No contexto sul-americano e caribenho, que

se aproxima mais ao contexto sociocultural e polí-tico do Brasil, resguardada as inúmeras diferenças que há entre os países que o integram, destaca-se o caso da política de prevenção à violência na Co-lômbia, através da qual a legislação local restringiu o porte de armas de fogo nas municipalidades de Bogotá (de 1995 a 1997) e Cali (de 1993 a 1994) em dias de feriados e fins de semana. Nos demais dias o porte estava submetido ao pagamento de

33 Segundo relatos variados encontrados na Internet sobre o caso de Aramoana, David Gray, 33 anos, desempregado, começou a matar pessoas indiscriminadamente com um rifle semiautomático, depois de uma briga verbal com o seu vizinho. Ele atirou em vizinhos e em uma família que estava visitando o município, matando treze pessoas, incluindo o sargento da polícia local, Stewart Guthrie. Após uma cuidadosa procura casa-a-casa no dia seguinte, policiais lo-calizaram Gray, numa gruta, e atiraram nele, matando-o. Dentro da gruta a polícia encontrou um rifle 22 Winchester equipado com um silenciador, uma espingarda de ar, centenas de cartuchos de munição. Gray estava carregando um rifle Remington e um rifle Norinco , quando foi baleado. A polícia disparou entre 50 e 60 tiros, e pelo menos 150 poli-ciais estavam envolvidos na operação. Este foi considerado o pior tiroteio criminoso da história de Nova Zelândia.

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tributo. O controle foi exercido através de opera-ções policiais (VILLAVECES ET AL, 2000). Como re-sultado das ações, segundo Villaveces et al. (2000), houve queda do volume médio de homicídios re-gistrados para tais localidades naquele período.

De 1995 a 1997, em Cali, encontramos taxas homicí-

dios 14% menor (IC 95%, 3% -24%) do que o esperado

durante períodos em que a proibição de transportar

armas de fogo estava em vigor. Em Bogotá, a inci-

dência foi 13% menor (IC 95%, 1% - 24%) durante os

períodos de intervenção (VILLAVECES ET AL, 2000, p.

1.209).

Em El Salvador, uma campanha de prevenção da violência ocorrida a partir de agosto de 2005 tornou ilegal portar armas de fogo em espaços pú-blicos como parques, escolas, praças, centros de re-creação e outros locais dessa natureza. Nesta ação a veiculação midiática publicitária em torno dos objetivos da campanha foi considerada relevante para a difusão das ideias em torno do desarma-mento e também para gerar maior cooperação dos cidadãos junto ao trabalho policial, favorecendo a capacidade da polícia em fazer cumprir a proibição de armas de fogo (CANO, 2006). Segundo o autor, a ação provocou inicialmente uma queda de cer-ca de 47% no número de homicídios registrados mensalmente nos municípios participantes (mais

populosos). Aliado a isso, foi introduzido, via mu-dança na legislação, um controle nacional sobre o registro das armas de fogo, possibilitando assim o rastreio dos equipamentos, fator que também pode ser relacionado à diminuição dos crimes ar-mados no país (CANO, 2006). Outra ação relevante, em 2005, foi a criação de um tributo sobre a co-mercialização de armas de fogo cuja finalidade era de gerar fundos para o sistema de saúde.

Uma ampla análise da literatura sobre armas e crimes foi feita por Daniel Ricardo de Castro Cer-queira34 que mapeou vários trabalhos acadêmicos que vem sendo produzidos nos últimos anos mo-tivados pelo incremento da criminalidade violenta que ocorreu principalmente na segunda metade dos anos de 1980, nos Estados Unidos.

Segundo esse autor, vários estudiosos procu-ram evidenciar a relação entre “mais armas e mais crimes” utilizando os seguintes argumentos:

(i) O indivíduo que possui uma arma de fogo fica

encorajado a dar respostas violentas para solução de

conflitos interpessoais; (ii) o possuidor de armas fica

com poder para coagir; (iii) do ponto de vista do cri-

minoso, a posse de arma de fogo faz aumentar a pro-

dutividade e diminuir o risco do perpetrador cometer

crimes, além de (iv) aumentar a facilidade e o acesso e,

consequentemente, diminuir o custo da arma pelo cri-

minoso no mercado ilegal. (CERQUEIRA, 2014, p. 91).

A conclusão geral da revisão da literatura feita por Daniel Cerqueira envolvendo armas e crimes indica uma relação positiva entre essas duas va-riáveis, conforme podemos observa na Tabela 3 (abaixo), principalmente quando se trata da rela-ção entre armas de fogo e homicídios e suicídios.

Assim sendo, ao que tudo indica, existe uma relação causal entre armas de fogo e crimes como homicídios e suicídios e, certamente, políticas de desarmamento podem incidir favoravelmente na redução de tais crimes:

34 CERQUEIRA (2014).

Menos armas, menos crimes? Nas últimas duas déca-

das, vários estudiosos de diversas áreas do conheci-

mento se debruçaram sobre essa questão. Não obstan-

te a escassez de dados sobre a prevalência de armas e

as dificuldades metodológicas subjacentes, a resposta

parece ser positiva. (CERQUEIRA, 2014, p. 147).

TABELA 3 – Armas e crimes segundo vários autores

Artigo Localidade Período Método Resultados em relação às armas

Lester (1991) 16 naçõeseuropeias

1989 Correlação Alta correlação com homicí-dios por PAF

Killias (1993) 14 países desen-volvidos

1989 Correlação Alta correlação com homicí-dios e com suicídios com e sem o uso de arma

Sloan et al. (1988) Seattle e Vancou-ver

1980 a 1986

Comparação de diferença de médias

Correlação com lesões do-losas por PAF e com homicí-dios por PAF

Kellermann et al. (1993)

EUA (Tennessee, Washigton e Ohio)

1987 a 1992

Regressãologística

A posse da arma é um fator de risco para algum familiar sofrer um homicídio

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Kleck (1979) EUA (dados agregados)

1947 a 1973

2SLS Elasticidade em relação aos homicídios = 0,4

Cummings et al. (1997)

EUA (dados por setor censitário)

1940 a 1993

Regressãologística

A arma em casa dobra a probabilidade de alguém sofrer suicídio ou homicídio no domicílio

McDowall (1991) EUA (Detroit) 1951 a 1986

GLS com variáveis instrumentais

Elasticidade em relação aos homicídios = 1,3

Lester (1991) 16 nações euro-peias

1989 Correlação Alta correlação com homicí-dios por PAF

Stolzenberg e D’Alessio (2000)

EUA (Carolina do Sul)

1991 a 1994

OLS com efeito fixo

Crimes violentos, crimes praticados com armas e crimes perpetrados por jo-vens respondem à disponibi-lidade de armas ilegais, mas não de armas legais

Cook e Ludwig (2002)

EUA (dados por cidade)

1987 a 1998

IV2SLS Elasticidade da arma em rela-ção às invasões a domicílios entre 0,3 e 0,7

Moody e Marvell (2002)

EUA (dados por estado)

1977 a 1998

Pooled OLS Não há relação de causali-dade entre armas e crimes

McDowall, Loftin e Wiersema (1995)

EUA (grandes cidades da Flórida, Mississipi e Or-egon)

1973 a 1982

Modelos de inter-venção baseado em ARIMA

A SI não teve efeito sobre os homicídios, mas fez crescer os homicídios por PAF

Lott Jr e Mustard (1997)

EUA (dados por cidades e estados)

1977 a 1992

Pooled OLS e IV2SLS

A SI fez diminuir os crimes violentos

Duggan (2001) EUA (dados por cidades e estados)

1980 a 1998

Regressão em diferenças

Elasticidade em relação aos homicídios = 0,2 e não houve efeito da SI sobre crimes

Bartley e Cohen (1998)

EUA (por cidades) 1977 a 1992

Regressão (ex-treme bound analysis)

A SI levou a uma diminuição dos crimes violentos

Ludwig (1998) EUA (dados por estados)

1977 a 1994

Diferenças em diferenças em diferenças

O efeito da SI ou foi nulo ou foi no sentido de aumentar o homicídio de adultos

Bronars e Lott Jr (1998)

EUA (dados por cidades)

1977 a 1992

Pooled OLS e IV2SLS

A SI fez diminuir os crimes violentos

Dezhbakhsh e Ru-bin (1998, 1999)

EUA (dados por cidades e estados)

1977 a 1992

2SLS Pequena queda no número de homicídios, aumento dos roubos, e ambiguidade nos demais crimes

Stolzenberg e D’Alessio (2000)

EUA (Carolina do Sul)

1991 a 1994

OLS com efeito fixo

Crimes violentos, crimes praticados com armas e crimes perpetrados por jo-vens respondem à disponibi-lidade de armas ilegais, mas não de armas legais

Cook e Ludwig (2002)

EUA (dados por cidade)

1987 a 1998

IV2SLS Elasticidade da arma em rela-ção às invasões a domicílios entre 0,3 e 0,7

Moody e Marvell (2002)

EUA (dados por estado)

1977 a 1998

Pooled OLS Não há relação de causali-dade entre armas e crimes

McDowall, Loftin e Wiersema (1995)

EUA (grandes cidades da Flórida, Mississipi e Or-egon)

1973 a 1982

Modelos de inter-venção baseado em ARIMA

A SI não teve efeito sobre os homicídios, mas fez crescer os homicídios por PAF

Lott Jr e Mustard (1997)

EUA (dados por cidades e estados)

1977 a 1992

Pooled OLS e IV2SLS

A SI fez diminuir os crimes violentos

Duggan (2001) EUA (dados por cidades e estados)

1980 a 1998

Regressão em diferenças

Elasticidade em relação aos homicídios = 0,2 e não houve efeito da SI sobre crimes

Bartley e Cohen (1998)

EUA (por cidades) 1977 a 1992

Regressão (ex-treme bound analysis)

A SI levou a uma diminuição dos crimes violentos

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Segundo dados recentes do Mapa da Violên-cia, mais de 50 mil pessoas morrem todos os anos no Brasil, número superior a mortes que ocorrem anualmente em diversos conflitos armados no mundo.

No Brasil, país sem disputas territoriais, mo-vimentos emancipatórios, guerras civis, enfrenta-mentos religiosos, raciais ou étnicos, conflitos de fronteira ou atos terroristas foram contabilizados, nos últimos quatro anos disponíveis – 2008 a 2011 – um total de 206.005 vítimas de homicídios, nú-mero bem superior aos 12 maiores conflitos arma-dos acontecidos no mundo entre 2004 e 2007. Mais ainda, esse número de homicídios resulta quase idêntico ao total de mortes diretas nos 62 conflitos armados desse período, que foi de 208.349. (MAPA DA VIOLÊNCIA, 2013, p. 28).

O fenômeno das mortes no Brasil tem como principal

vetor a utilização de armas de fogo. Mais de 70% dos

homicídios são cometidos utilizando-se esse tipo de

armamento. (MAPA DA VIOLÊNCIA, 2013).

Fruto da mobilização popular de diversos se-tores da sociedade civil brasileira, o Estatuto do Desarmamento completou dez anos em dezem-bro de 2013. Primeira lei a efetivar uma política de controle de armas no Brasil, definindo padrões de

produção, registro, comercialização e circulação das armas, o Estatuto teve como principal, no pri-meiro ano de sua implementação, a redução no número de homicídios.

Para a efetividade do Estatuto, o poder público em parceria com a sociedade civil realiza, desde 2004, campanhas objetivando a entrega vo-luntária de armas de fogo.

Este guia constatou que a Campanha do Desarmamento teve, nestes dez anos, importantes ações que redundaram na entrega de significativa quantidade de armas de fogo, incidindo certamen-te na diminuição do número de homicídios no Bra-sil. Não obstante, dado ainda o elevando número

Breves notas conclusivasde assassinatos com armas de fogo – que coloca o Brasil em vergonhosa situação se comparado com outros países - a campanha de entrega voluntária de armas precisa ser incrementada e reforçada. Neste sentido, constata-se com clareza que o su-cesso da Campanha depende, fundamentalmente, da articulação entre os vários níveis de governo e a sociedade civil em prol de ações que promovam o recolhimento das armas, facilitando o acesso dos cidadãos a postos de entrega e utilizando-se de va-riadas técnicas de comunicação para informar dos riscos associados à posse de armas.

Algumas ações adotadas por estados e muni-cípios, mostradas neste guia, corroboram a certeza de que somente com a soma de esforços envolven-do agências públicas das esfera federal, dos gover-nos locais (estaduais e municipais) e a sociedade civil, as entidades religiosas e de classe, dentre ou-tras, é possível estimular a entrega das armas pelos cidadãos.

Numa sociedade do medo, os incentivos para a posse de arma e para as soluções privadas para o enfrentamento da violência são poderosos. Por-tanto, confrontar-se com o lobby da indústria ar-mamentista, a sensação de insegurança e medo (em boa medida superdimensionada pela mídia) e a cultura individualista que estimula as soluções privadas para os problemas públicos demanda uma articulação permanente e potente dos gover-nos comprometidos com a efetivação dos direitos, numa sociedade justa e pacífica.

As armas utilizadas em crimes no Brasil são majoritariamente brasileiras (78%) e de calibres acessíveis, conforme estudo do Instituto Sou da Paz. O mesmo instituto comprovou que 64% das armas apreendidas em São Paulo, entre 2011 e 2012, foram fabricadas antes do Estatuto. E que 82%, nos casos de roubo, as armas apreendidas de fabricação nacional.

Um alto percentual de homicídios é cometi-do por motivação fútil, conforme apresentamos ao longo deste estudo. Portanto, é falacioso o ar-gumento segundo o qual somente os criminosos com alto poder ofensivo provocam as mortes por arma de fogo no Brasil.

Todos os esforços para garantir o controle rígido das armas em poder dos civis são fundamen-tais na diminuição da violência homicida em nosso país. Fundamental, portanto, que os três poderes, nos três níveis de governo, e em parceria com a so-ciedade, somem esforços nessa empreitada.

Para um país mais seguro, a política de segu-rança pública (compreendida como garantia dos direitos) deve ser abordada de forma sistêmica e integral. Assim, além do controle das armas, inves-timentos em políticas de prevenção à criminalida-de e maior articulação entre as agências e órgãos da segurança pública são fundamentais.

E, em relação à quantidade de armas disponí-veis, além do controle do armamento, outras ações são da mesma importância: vigilância das frontei-ras; treinamento rigoroso e controle das armas em

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Referências bibliográficas

poder dos agentes públicos; enfrentamento ao lo-bby da indústria armamentista; ações focalizadas de apreensão de armamento em poder de grupos e organizações criminosas, entre outras.

Apesar dos grandes desafios no controle das armas, a população brasileira continua favo-rável às campanhas e às ações de desarmamento. Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha sobre o posicionamento ideológico da população mos-trou que 69% dos brasileiros creem que a posse de

armas deve ser proibida, pois ameaça a vida das pessoas. Esse percentual deve motivar os agentes públicos a empreenderem todos os esforços no desarmamento da população.

Assim sendo, é de se esperar um incre-mento nas ações de desarmamento da população. Campanhas de recolhimento de arma são iniciati-vas que devem se somar a outros esforços visan-do à diminuição dos homicídios e a construção de uma cultura de paz.

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2014

Robson Sávio Reis Souza – consultor

Projeto de Cooperação Técnica BRA

04/029

Ministério da Justiça/SENASP/PNUD

TERMO DE REFERÊNCIA: 139527

POLÍTICA NACIONAL DO DESARMAMENTO

- Documento técnico -

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1

SUMÁRIO

1. MARCO TEÓRICO-CONCEITUAL ......................................................... 3

1.1. Histórico da política de desarmamento no Brasil ................................ 9

1.2. Alguns aspectos da Campanha do Desarmamento ............................ 14

1.3. Dados da implantação do Estatuto do Desarmamento no Brasil ...... 18

1.4. A indústria bélica no Brasil e no mundo ............................................ 28

1.5. Balas perdidas e armas de fogo ........................................................... 35

2. ASPECTOS RELEVANTES DA LEI 10.826/03 .................................... 37

2.1. SINARM e SIGMA .............................................................................. 44

2.2. Direito Comparado ............................................................................. 46

3. ESTUDOS E EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS ............................. 49

3.1. Panorama sobre o desarmamento no contexto internacional ........... 49

4. BOAS PRÁTICAS DE DESARMAMENTO .......................................... 60

4.1. ESPÍRITO SANTO .............................................................................. 62

4.1.1. Diagnóstico ...................................................................................... 63

4.1.2. A Ação Itinerante de Recolhimento de Armas (AIRA) ................... 64

4.1.3. Resultados ........................................................................................ 67

4.2. ALAGOAS ........................................................................................... 70

4.2.1. Metodologia ..................................................................................... 71

4.2.2. Reconhecimento .............................................................................. 73

4.2.3. Créditos ........................................................................................... 74

4.4.4. Descrição do equipamento .............................................................. 74

4.3. SERGIPE ............................................................................................ 76

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2

4.3.1. Detalhamento das ações .................................................................. 78

4.3.2. Atividades ........................................................................................ 78

4.3.3. Metodologia ..................................................................................... 78

4.3.4. Equipe de Trabalho ......................................................................... 78

4.3.5. Parceiros Institucionais ................................................................... 79

4.4. SÃO PAULO ....................................................................................... 80

4.4.1. Desarmamento na cidade de São Paulo .......................................... 83

5. BREVES NOTAS CONCLUSIVAS ......................................................... 87

6. REFERÊNCIAS..................................................................................... 90

FICHA TÉCNICA ....................................................................................... 96

ANEXO 1 .................................................................................................... 97

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3

1. MARCO TEÓRICO-CONCEITUAL: A IMPORTÂNCIA DO

DESARMAMENTO COMO POLÍTICA PACIFICADORA

O controle estatal sobre a produção, comercialização e disseminação

demográfica de armas fogo é ainda muito recente na história do Brasil. Ao longo

do século XX não havia nas legislações nacionais qualquer tipo de preocupação

em regular o mercado consumidor dessa natureza.

Em sua história mais recente, o Brasil favoreceu a produção de armas de

fogo. A justificativa para o incremento da indústria armamentista brasileira foi

sustentada por uma retórica construída em torno da “segurança nacional”

[governos de Getúlio Vargas (1937-45) e Ditadura, orquestrada por militares

com apoio de grupos civis (1964-1985)]. Nos governos democráticos, o discurso

é o da garantia do emprego (gerado pela indústria de armamentos já instalada)

e do crescimento econômico.

O período que se segue posterior à promulgação da Constituição Federal

de 1988 (CF/1988) deixou evidente (através, por exemplo, das estatísticas

oriundas de registros da saúde), um crescimento abrupto e exponencial da

violência armada dirigida contra civis no interior do território brasileiro,

trazendo novas problematizações a respeito do conceito de “segurança” e do

papel das armas de fogo num contexto de violência e criminalidade ascendentes.

No campo normativo, a noção de segurança foi superando a concepção

balizada exclusivamente em torno de premissas militares e econômico-

industriais. Segurança Pública, gradualmente, passa a ser compreendida,

também, como um direito universal dos cidadãos, conforme consolidado no

artigo 144, da CF/19881.

1 “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a

preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes

órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias

civis; V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. § 1º A polícia federal, instituída por lei

como órgão permanente, estruturado em carreira, destina-se a: I - apurar infrações penais contra a ordem

política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades

autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual

ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei; II - prevenir e reprimir o tráfico

ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e

de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência; III - exercer as funções de polícia

marítima, aérea e de fronteiras; IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da

União. § 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente, estruturado em carreira, destina-se, na forma

da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais. § 3º A polícia ferroviária federal, órgão

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É fato que as concepções anteriores à Constituição Federal de 1988 não

deixaram de existir. Passaram a concorrer diretamente com a nova perspectiva

trazida na “Constituição Cidadã”. Se tradicionalmente os governos estiveram

comprometidos com a expansão da indústria e do mercado bélico interno e

externo, coube então a sociedade civil, setores da Academia e agências

internacionais se preocuparem com a efetivação do direito à segurança cidadã2

e, portanto, a exigirem dos governos respostas em relação ao crescimento da

violência armada no país.

O conceito de “segurança cidadã”, que objetiva sintetizar um amplo

processo de mudanças discursiva e conceitual na política de segurança pública

brasileira, refere-se a uma ordem cidadã democrática que permite a convivência

segura e pacífica. Nesta perspectiva, a política pública de segurança é

democrática e deve ser orientada pelos princípios da integração

interinstitucional, interagencial e intersetorial e da participação popular,

conjugando investimentos em projetos de inclusão e coesão social (numa

perspectiva territorial); articulação das agências encarregadas da política de

segurança cidadã, com foco no policiamento comunitário; a atuação de outras

agências do Estado e do município, como as guardas municipais; políticas de

desarmamento e construção de uma cultura de paz; a atuação e participação de

permanente, estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias

federais. § 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a

competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as

militares. § 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos

corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades

de defesa civil. § 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do

Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito

Federal e dos Territórios. § 7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis

pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades. § 8º Os Municípios poderão

constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme

dispuser a lei. (CF/1988, art. 144).

2 Segundo Velásquez (2002), ―em 1994, a Organização das Nações Unidas (ONU) defendeu pela

primeira vez o conceito de segurança humana, o qual se encontra inserido no paradigma do

"desenvolvimento humano sustentável" esboçado pela mesma organização no princípio da década de

1990. [...] Dar novo conceito à segurança pressupõe considerar que o centro da mesma é o cidadão, a

pessoa considerada como indivíduo e ser social. Entendida como um bem público, a segurança cidadã

refere-se a uma ordem cidadã democrática que elimina as ameaças de violência na população e permite a

convivência segura e pacífica. Esse enfoque possui uma série de implicações substanciais. Ao centrar-se

na noção de ameaça e, de maneira implícita, nas noções de vulnerabilidade e desproteção, a definição

distancia-se de determinadas concepções que definem a segurança cidadã puramente em função da

criminalidade e do delito e apresenta explicitamente a dualidade objetiva/subjetiva do conceito de

segurança cidadã, que, como foi dito, converte-se em um direito exigível perante o Estado‖.

(VELÁSQUEZ, 2002).

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conselhos comunitários na política; a utilização de ferramentas de inteligência e

novas tecnologias aplicadas à segurança pública.

Há que se destacar nesse processo de democratização da segurança

pública a contribuição da sociedade civil em várias ações e frentes de atuação e,

notadamente, nos processos de desarmamento da população. Dentre as diversas

contribuições civis destacamos a demanda junto aos poderes públicos no

sentido de controlar o mercado bélico, em função do aumento da violência

armada no país.

A partir de meados da década de 1990 emergem várias entidades e

instituições dedicadas ao tema, vinculadas a trabalhos comunitários e ao meio

acadêmico. Tais iniciativas, fundamentais para consolidação da democracia,

contrapunham à retórica dominante balizada na tradição armamentista,

expondo publicamente a situação do Brasil em relação ao contexto internacional

no que diz respeito às mortes ocasionadas por arma de fogo e situando-o entre

os países mais violentos do mundo, mesmo quando se comparado a contextos

declarados de guerra civil e/ou externa.

Dentre os diversos esforços dessa natureza destacamos, entre outros, os

produzidos pelo Instituto Sangari, em parceria com o Ministério da Justiça,

através da série intitulada “Mapa da Violência” e os realizados através da ONG

Viva Rio, responsável por organizar pesquisas diretamente relacionadas à

questão das armas de fogo no país.

Segundo pesquisa organizada pela ONG Viva Rio, intitulada “Estoques e

Distribuição de Armas de Fogo no Brasil”, publicada em 2010, a maior parte dos

homicídios no país era ocasionada por armas de pequeno porte. Além disso, a

pesquisa estimou que em 2010, cerca de 90% das armas no país

(aproximadamente 15 milhões) estariam em poder da sociedade civil e não do

Estado, sendo que, em torno de 50% seriam ilegais (NASCIMENTO e PURCENA,

2010, p. 34).

Ainda na década de 1990, como resposta às demandas de entidades da

sociedade civil, o Governo Federal manifestou sua preocupação com o controle

dos registros de armas de fogo em posse da população através da criação do

Sistema Nacional de Registro de Armas, em 1997, que abrangia dados

cadastrais, de produção, de venda e importação de armamentos, regulado pelo

Ministério da Justiça, tendo como agência de referência a Polícia Federal.

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Em 1999, o Senado Federal se pronunciou através de projetos de lei com

intuito de efetivar mecanismos de controle sobre o mercado de armas.

Destacamos o Projeto de Lei 2923, que serviu de alicerce para a elaboração do

Estatuto do Desarmamento, de 2003. O projeto sofreu diversos embargos,

prevalecendo naquela década os interesses tradicionais da indústria das armas.

Por outro lado, a ascendência dos homicídios na virada do século XXI

inflou ainda mais o debate público em torno da violência armada. E, através da

ação direta da Secretaria Nacional de Segurança Pública4 e com o apoio de

organizações da sociedade civil (ONGs, entidades religiosas, universidades,

personalidades públicas relacionadas às artes e entretenimento, associações e

movimentos populares), em 2003 o tema ganhou nova configuração na agenda

política. Como resultado, fez recuar em parte a força dos vetores tradicionais até

então prevalecentes no país em relação ao tema, recebendo, finalmente, o apoio

institucional de parte suficiente de representes do Senado e do Executivo

Federal, cujo principal desdobramento foi a Lei nº 10.826/2003, denominada

como Estatuto do Desarmamento (ED).

A partir do Estatuto, institucionalizou-se uma campanha pelo

desarmamento da população, ensejando um país menos violento e a tentativa da

construção de uma cultura de paz. Essa perspectiva é corroborada pelas

premissas de relevantes pensadores das ciências sociais e políticas. Ao Estado

cabe desempenhar o papel de regulador das tensões sociais a partir da

exclusividade sobre o uso força (WEBER, 1973).

Inserido num contexto de construção do processo civilizatório5, Estado e

sociedade civil corroboram na construção de um estado democrático. O

processo civilizatório, como discorre Elias (1997), não ocorre somente com um

controle sobre os meios mais destrutivos de violentar ou de destruir o outro,

mas perpassa por outros canais de construção dos valores partilhados

socialmente entre os indivíduos. Tais valores dependem de ações de efetivação

dos direitos previstos nas constituições dos diversos países.

3 De autoria do então senador Gerson Camata, o projeto de lei dispunha sobre o fabrico, depósito, trânsito

e porte de arma de fogo, dando também outras providências. 4 Registre-se, aqui, a liderança do então Secretário Nacional de Segurança Pública, Luís Eduardo Soares.

5 ―O Processo Civilizatório‖, de Norbert Elias (1897 - 1990), obra publicada pela primeira vez em 1939,

analisa a história dos costumes a partir da formação do Estado Moderno e suas influências sobre a

civilização.

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7

O desarmamento da população face ao crescimento da violência no Brasil

pode ser também compreendido como uma fase importante do processo

civilizatório de nossa sociedade. A violência letal é um fenômeno que não pode

ser dissociado do uso das armas de fogo, conforme atestam os dados do Sistema

de Informação de Mortalidade do Ministério da Saúde – SIM/MS6 (GRAF.1).

No Brasil, observamos, historicamente, um enorme hiato entre as

garantias formais e a efetivação dos direitos. Em “Armas de fogo: proteção ou

risco? Guia prático. Respostas a 100 perguntas”, Bandeira e Bourgois (2005)

evidenciam essa questão, não somente no contexto brasileiro, mas também dos

países latino-americanos:

O Brasil e a América em geral não têm uma tradição pacífica de convívio social e de resolução de conflito. A exceção é Costa Rica, que em 1948 aboliu suas Forças Armadas, investiu maciçamente em educação pública e cultura de paz, e conta por isso mesmo com baixo índice de homicídios por arma de fogo: 3,3 homicídios por 100 mil habitantes, em 1998. (BANDEIRA e BOURGOIS, 2005, p. 60).

A curva do total de mortes decorrentes de agressão ao longo da última

década no país (GRAF.1, seguinte) possui clara simetria com a curva das mortes

ocasionadas por armas de fogo. De um modo geral observamos uma tendência

de crescimento dos homicídios no país, mesmo que um pequeno recuo pode ser

observado em 2004 (ano diretamente posterior a entrada em vigor do Estatuto

do Desarmamento).

De fato, o crescimento dos homicídios associados ao uso de armas de

fogo na transição das décadas de 1990 e de 2000 representa um fator presente

nas análises da bibliografia especializada produzidas no país: Waiselfisz (1998,

2004, 2005, 2006, 2008, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014), Beato Filho e Marinho

(2007), Cano (1997), Cano e Santos (2001), Sapori (2007), Santos (2007), entre

outros autores.

6 Categorias da 10ª Classificação Internacional de Doenças - CID-10: W32 a W34 (óbitos por

traumatismos acidentais); X72 a X74 (Lesões Autoprovocadas Intencionalmente); X93 a X95

(Agressões); e Y22 a Y24 (Capítulo de Intenção Indeterminada).

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8

GRÁFICO 1 - Evolução dos homicídios e dos casos resultantes do uso de armas de fogo – Brasil – 1996 a 2012.

0

10000

20000

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40000

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60000

70000

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Total Geral

Armas

Fonte: DataSus/Ministério da Saúde, 2014. Nota: produzido pelo autor.

Embora haja uma indissociável relação entre violência e negação da

cidadania, os debates sobre o desarmamento nem sempre são acompanhados de

uma discussão mais profunda sobre a questão dos direitos civis, políticos e

sociais dos brasileiros. Apesar disso, não deixam de ter importância sobre a

possibilidade de frear os alarmantes índices de violência homicida que atinge,

sobretudo, a população jovem, pobre e negra, com histórico de carência de

direitos fundamentais (WAISELFISZ, 2003, 2004, 2013 e 2014).

Entre os anos de 1980 e 2010, as mortes causadas por armas de fogo

aumentaram 346%, segundo o 'Mapa da Violência 2013: Mortes Matadas por

Armas de Fogo'. Nesse período, as vítimas passaram de 8.710, no ano de 1980,

para 38.892, em 2010. No mesmo intervalo, a população do país cresceu 60,3%.

O levantamento, feito pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos e

pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, traça um amplo

panorama da evolução da violência letal no período. A pesquisa analisou as

mortes por armas de fogo decorrentes de agressão intencional de terceiros

(homicídios), autoprovocadas intencionalmente (suicídios) ou de

intencionalidade desconhecida cuja característica comum foi a morte causada

por uma arma de fogo.

De acordo com esse estudo, o crescimento da mortalidade por armas de fogo

foi maior entre as pessoas com idade entre 15 e 29 anos (414%), se comparado

com o conjunto da população (346,5%). Os homicídios de jovens cresceram de

forma mais acelerada: na população como um todo foi 502,8%, mas entre os

jovens o aumento foi 591,5%. O trabalho mostra, ainda, que, entre 1982 e 2003,

o percentual de mortes de jovens por armas de fogo teve crescimento médio de

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6,5% ao ano, contra 5,5% do conjunto da população. De cada três mortos por

arma de fogo, dois estavam na faixa dos 15 a 29 anos. Os jovens representavam

67,1% dos mortos por arma de fogo no Brasil.

Em 30 anos, um total de 799.226 pessoas morreram vítimas de armas de

fogo. Desses, 450.255 mil eram jovens entre 15 e 29 anos de idade. (MAPA DA

VIOLÊNCIA, 2013).

Uma pesquisa do Conselho Nacional do Ministério Público, divulgada em

2012, e elaborada a partir de inquéritos policiais referentes a homicídios

acontecidos em 2011 e 2012, em 16 Unidades da Federação, apontou que as

maiores causas de homicídios decorreram de motivos fúteis, como “brigas,

ciúmes, conflitos entre vizinhos, desavenças, discussões, violências domésticas,

desentendimentos no trânsito.”7

1.1. Histórico da política de desarmamento no Brasil

Em função do aumento das mortes e da violência envolvendo armas de

fogo no país, segmentos da sociedade civil e dos governos, notamente o governo

federal, através do Ministério da Justiça, manifestaram-se em busca de ações

efetivas para o controle do armamento em poder da população civil. Dentre os

diversos esforços realizados destacaremos aqui, como ponto de partida e de

análise, o Estatuto do Desarmamento.

A Lei nº 10.826/2003 significou um novo marco regulatório para o

acesso às armas de fogo, implicando em alterações sobre os seguintes requisitos:

registro, posse, porte e a comercialização de armas de fogo e munição no

interior do território nacional.

A partir do Estatuto, o país finalmente passou a ter critérios mais

rigorosos para o controle do acesso às armas lícitas por parte da população civil

e também por parte das agências privadas de segurança. Somente as armas

7 Segundo reportagem publicada pelo Portal G1 Brasil, em 08/11/2012, o estudo patrocinado pelo

Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), com dados de 16 unidades da federação, mostrou que,

de 2011 a 2012, 83,03% dos homicídios no estado de São Paulo, por exemplo, foram cometidos por

motivos "fúteis ou por impulso". No Rio de Janeiro, entre janeiro de 2011 e setembro de 2012, 26,85%

dos homicídios tiveram a mesma motivação, sendo a maioria classificada como "outras causas", entre elas

"execução". Segundo a reportagem, ―os órgãos de segurança consideram de razão fútil e por impulso as

mortes por vingança, desavenças, passionais, rixa, embriaguez, entre outros‖. Tendo em vista essa

realidade, o Conselho Nacional do Ministério Público lançou a campanha "Conte até 10", direcionada à

prevenção de homicídios que acontecem no Brasil por motivos fúteis ou por ações impulsivas. (Fonte:

http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/11/em-sp-83-dos-homicidios-sao-por-motivos-futeis-ou-por-

impulso-diz-mp.html. Acesso em 20.09.2014).

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devidamente registradas podem, desde então, ser portadas em residências ou no

local de trabalho pelo responsável legal pelo estabelecimento. O trânsito dos

cidadãos com a arma pelas vias públicas passou a ser regulado, exigindo-se a

autorização para o porte de arma de fogo (concedida pela Polícia Federal). Além

disso, o porte de arma está previsto para maiores de 25 anos e que possuam

ocupação lícita e comprovação de residência.

Contudo, o acesso ao porte só é concedido aos cidadãos que, por motivos

de insegurança pública, comprovem viver sob ameaça de risco de morte. A

partir de nova redação do Capítulo II, Artigo 4º, Inciso I, do ED, em 20088, o

direito ao porte de armas também ficou condicionado à apresentação de

comprovação de idoneidade (certificações negativas de antecedentes criminais

fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral) e restrito para os

indivíduos que respondem a inquérito policial ou a processo criminal.

Além disso, a nova redação alterou o § 2º, Artigo 4º, do ED9, no sentido

de vincular o acesso à munição ao calibre da arma, aumentando o controle de

forma mais racional e previsível.

O ED também prevê a proibição do porte de arma quando o portador for

identificado utilizando sua arma em estados de embriaguez alcoólica ou sob

efeito de outras substâncias psicotrópicas que expressem alteração clara de seu

desempenho intelectual ou motor.10

A seguir elaboramos uma síntese de tais iniciativas tendo como ponto de

partida as modificações normativas que incidem no Estatuto do Desarmamento

(Quadro 1).

8 “I- comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais

fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito

policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos.‖ (Lei 10.826/2003;

redação dada pela Lei 11.706/2008). 9 “§ 2o A aquisição de munição somente poderá ser feita no calibre correspondente à arma registrada e

na quantidade estabelecida no regulamento desta Lei‖. (Lei 10.826/2003; redação dada pela Lei

11.706/2008). 10

Artigo 10, § 2º: ―A autorização de porte de arma de fogo, prevista neste artigo, perderá

automaticamente sua eficácia caso o portador dela seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou

sob efeito de substâncias químicas ou alucinógenas‖. (Lei 10.826/2003).

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QUADRO 1: Quadro geral sobre principais marcos normativos do Estatuto do Desarmamento no Brasil – 2003-2012

Iniciativa Ano Objetivo Desdobramentos Condicionantes

Lei nº 10.826/2003

2003

Estabelecer novas formas de

controle sobre o comércio

interno/nacional de armas de fogo.

Regulamentação do SINARM – Sistema Nacional de Armas e do registro, posse

e porte de arma; Instituiu a

realização de campanhas de

desarmamento e punições mais

efetivas ao comércio ilegal e

tráfico internacional de armas de fogo.

De 2004 até 2010 o recebimento de armas e munições

pela Campanha do

Desarmamento era realizado apenas pela

Polícia Federal. A entrega de

armas não era anônima.

Decreto nº 5.123/2004

2004

Regulamentar a Lei no 10.826, de 22 de dezembro

de 2003.

Portaria nº 797 de 05/05/11

2011

Regular o procedimento de entrega da arma.

Campanha atingiu maior cobertura

geográfica efetiva a partir de Acordo de

Cooperação assinado por 26 estados; Distrito

Federal;9 municípios e 1 consórcio

intermunicipal (7 municípios). Postos de entrega: Corpo

de Bombeiro Militar; Guarda

Municipal; Polícia Civil; Polícia

Militar; Polícia Federal; Polícia;

Rodoviária Federal; Sociedade Civil.

Anonimato garantido;

Indenização mais rápida;

Inutilização da arma; Não há

risco de ser preso ou processado, mesmo que o armamento já

tenha sido utilizado em algum crime.

Mais postos de coleta.

Portaria nº 936 de 17/05/11

Regular o procedimento de credenciamento

dos órgãos interessados em

participar da campanha.

Portaria nº 2.969 de 22/12/12

2012

Alterar o Anexo I da Portaria nº

797,de 5 de maio de 2011(reajustar

valor indenizações).

Lei nº 12.993/2014

2014 Alterar § 1º A do Capítulo III do

ED.

Estabelece critérios para o porte de armas

para integrantes efetivos e guardas

prisonais. Fonte: Ministério da Justiça, 2014. Nota: adaptado pelo autor.

Em relação ao desarmamento é importante mencionar o referendo

público (Referendo Sobre a Proibição do Comércio de Armas e Munição no

Brasil) realizado em 23 de outubro de 2005. Através dessa consulta popular, o

governo brasileiro verificou o posicionamento da nação em relação à proibição

da comercialização de armas de fogo e munição: 63,94% dos votantes se

pronunciaram favoráveis à comercialização das armas.

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12

De um modo geral, o porte de armas ficou, então, concedido aos agentes

de segurança pública (policiais e guardas municipais em municipalidades com

popoulação superior a 500 mil habitantes e que possuam Guarda Municipal

Armada), bem como aos membros das Forças Armadas, agentes de inteligência

governamental e também aos agentes de segurança privada.

No caso de integrantes do quadro efetivo de agentes e guardas prisionais,

o porte de armas de fogo de propriedade particular ou fornecida pela respectiva

corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, tem como critérios básicos: i)

submetidos a regime de dedicação exclusiva; sujeitos à formação funcional, nos

termos do regulamento; subordinados a mecanismos de fiscalização e de

controle interno (Lei nº 12.993/2014).

O Estatuto do Desarmamento tornou mais seletivo o acesso ao porte de

arma e, ao mesmo tempo, trouxe estímulos à população para se desarmar,

mediante o pagamento de indenização para os indivíduos que,

espontaneamente, entregarem suas armas nos postos credenciados.

De 2004 até 2011 o recebimento de armas e munições pela Campanha do

Desarmamento era realizado apenas pela Polícia Federal. Após 2011, outros

órgãos da segurança pública passaram a integrar a rede de postos de

recolhimento: Corpo de Bombeiro Militar; Guarda Municipal; Polícia Civil;

Polícia Militar; Polícia Rodoviária Federal; entidades da sociedade civil.

Atualmente, os valores das indenizações das aramas entregues pela

população variam entre R$ 150,00 a R$450,0011, e os postos encontram-se

geograficamente distribuídos nas 26 Unidades da Federação, entre seus mais

populosos municípios, e no Distrito Federal.

A seguir, um fluxograma que ilustra o percurso institucional desde a

entrega da arma feita pelo cidadão até seu destino final.

11

Mais detalhes sobre os valores das indenizações segundo a espécie de armamento ver: Anexo 1.

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13

FLUXOGRAMA 1: Fluxo institucional da entrega de armas na Campanha do Desarmamento/ Brasil - 2014

Fonte: Ministério da Justiça, 2014. Nota: adaptado pelo autor.

A entrega das armas (FLUXOGRAMA 1) é gerenciada por um sistema

informatizado, o “Sistema Desarma”, que foi especialmente desenvolvido para a

Campanha Nacional do Desarmamento. O sistema, integrado à Rede Infoseg12, é

organizado de modo a garantir a confidencialidade no momento da entrega das

armas de fogo e munições, a agilidade no pagamento das indenizações13 e

possibilita, também, o levantamento de dados que podem ser utilizados para a

confecção de relatórios gerenciais periódicos.

Além dos valores monetários, a Campanha Nacional do Desarmamento,

instituída pelo ED, regulamentada pelo Decreto nº 5.123/2004 e inserida na

política de Estado de Segurança Pública, promove marketing publicitário

enfatizando sobre os riscos inerentes que a presença de armas de fogo impõe à

convivência familiar e comunitária, corroborando a perspectiva defendida por

Bandeira e Bourgois (2005). Segundo esses autores, os indivíduos e suas

famílias não teriam garantida sua segurança através da aquisição de armas de

fogo, pois, além dos riscos de acidente e acontecimentos não previstos pelo

12

A Rede INFOSEG é um sistema que reúne informações de segurança pública, justiça e fiscalização,

normatizada a partir do Decreto 6.138/2007. Seu objetivo principal é a integração das informações de

processos judiciais, inquéritos, termos circunstanciados, mandados de prisão, veículos, condutores e

armas de fogo. O acesso à rede está disponível aos usuários através do portal www.infoseg.gov.br. 13

O sistema também torna mais ágil o pagamento das indenizações que podem ser sacadas em agências

do Banco do Brasil em um prazo de 24 horas. Após a entrega, as armas são encaminhadas para serem

destruídas pelo Comando do Exército, através de fundição em fornos industriais.

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14

“fator surpresa”, uma parte significativa das armas utilizadas pelos criminosos

teria na sua origem o furto de armas legalizadas.

A campanha publicitária em torno do desarmamento fundamentou-se no

slogan “Proteja sua família, desarme-se” e já passou por três fases distintas,

desde seu início em 06 de maio de 2011. A segunda fase foi lançada em 12 de

setembro de 2011 e a terceira fase em 9 de dezembro de 2012. A campanha é

responsável pela circulação de mensagens pró-desarmamento, veiculadas em

diversos campos informacionais relevantes, como emissoras de televisão, de

rádio, revistas e jornais impressos de grande circulação, além de cartazes

afixados em espaços públicos e outras estratégias comunicacionais, como

camisetas, folders, panfletos informativos, etc.

Segundo informações do Ministério da Justiça (2014), a campanha surte

efeito na entrega voluntária de armas pela população à medida que promove a

circulação e a difusão da informação, principalmente em relação à garantia do

anonimato e de recebimento de indenização por parte dos cidadãos que

voluntariamente entregarem armas ou munições nos postos credenciados.

A seguir, expomos algumas das imagens que circularam pelo país ao

longo da campanha publicitária pró-desarmamento (FIGURA 1).

FIGURA 1: Campanha do Desarmamento

Slogans e Imagens das três fases - Brasil - 2014

1ª FASE 2ª FASE 3ª FASE

Fonte: http://www.entreguesuaarma.gov.br. 2014.Nota: adaptado pelo autor.

1.2. Alguns aspectos da Campanha do Desarmamento

Mesmo com a entrada em vigor do Estatuto do Desarmamento, os índices

de morte ainda eram altos, o que demandava com urgência a adoção de novas

medidas. Desta maneira, o governo federal iniciou uma série de campanhas de

desarmamento. A primeira delas ocorreu de julho de 2004 a outubro de 2005.

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Ao todo, foram recolhidas 450 mil armas. Esta foi a segunda maior campanha

de entrega de armas do mundo, até então (BOURGOIS, 2005. p.37.). Os

cidadãos que entregaram voluntariamente suas armas receberam uma

indenização do governo e, aqueles que tinham a posse ilegal foram anistiados.

Em 2005, a UNESCO realizou uma pesquisa intitulada “Vidas

Poupadas”.14 O intuito era mensurar quantas mortes foram evitadas em

decorrência do Estatuto e da primeira campanha de desarmamento. Com base

nos números dos anos anteriores, estimaram-se quantas mortes ocorreriam em

2004 por armas de fogo.

A pesquisa chegou aos seguintes resultados:

QUADRO 2: Conclusões da Pesquisa “Vidas Poupadas” (2005)

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As evidências até aqui demonstradas permitem sustentar que:

a) No País

Em 1994, aconteceram no Brasil 36.119 mortes por armas de fogo. Se nada tivesse sido feito a respeito, o crescimento contínuo dos óbitos por armas de fogo nos últimos anos indicava que deveriam ter acontecido 41.682 óbitos nesse ano, dado que em 2003 as mortes que as armas de fogo chegaram a 39.325.

A estratégia de desarmamento (Estatuto e Campanha) em 2004 não só anulou a tendência de crescimento anual de 7,2% pré-existente, mas também originou uma forte queda de 8,2% no número de óbitos registradas em 2003, e devido a isso, é possível sustentar que o impacto do desarmamento foi uma queda de 15,4% no número de mortes por armas de fogo no país.

Essa queda significa que o desarmamento possibilitou evitar 5.563 mortes só em 2004.

No primeiro semestre de 2004, o Estatuto do Desarmamento determinou uma queda de 12,5% nos óbitos, o que representou evitar 2.292 mortes por arma de fogo.

No segundo semestre, com a Campanha, o impacto foi bem maior: uma queda de 18,4%, o que significou evitar 3.271 mortes por armas de fogo.

b) Nas Capitais

As capitais, que concentram 23,8% da população do país, foram responsáveis, por 38,3% dos óbitos por armas de fogo acontecidos, ainda em 2004. Isto evidencia a necessidade de concentrar esforços de desarmamento nas capitais com maiores índices de concentração de mortes.

14

A análise foi realizada pela equipe técnica da UNESCO no Brasil, com a colaboração das equipes da

Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde e do Ministério da Justiça. O objetivo foi

aprofundar o entendimento dos resultados e do impacto do Estatuto do Desarmamento e da posterior

campanha de entrega voluntária de armas de fogo acontecida no Brasil em 2004. Para acessar a pesquisa

completa: http://www.mapadaviolencia.org.br/publicacoes/VidasPoupadas.pdf. Acesso em 20.09.2014.

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16

O impacto da implantação do Estatuto, primeiro semestre de 2004, foi levemente mente menor nas capitais (queda de 10,3%) do que no país como um todo (queda de 12,5%).

Mas, pelo contrário, o impacto da Campanha, no segundo semestre, foi bem superior nas capitais (22,2%) do que no resto do país (18,4%). Desta forma, a contribuição da Campanha na produção das quedas dos índices de mortalidade foi bem significativa: 11,9% das quedas nas capitais podem ser atribuídas à Campanha.

Desta forma 39,8% das vidas poupadas pelo desarmamento aconteceram nas capitais, onde 2.214 pessoas tiveram suas vidas poupadas pela vigência do Estatuto e pela Campanha.

No segundo semestre, 45% das vidas poupadas aconteceram nas capitais, mostrando dessa forma a eficiência das campanhas nesse âmbito, que, como veremos, se reproduz também nas regiões metropolitanas.

c) Nas Regiões Metropolitanas

As 10 Regiões Metropolitanas Tradicionais focalizadas no estudo, concentran do 30,8% da população, foram responsáveis por mais da metade: 55,4% dos óbitos ainda em 2004, quando as taxas já começaram a cair em função do desarmamento. Isto reforça o indicado anteriormente, sobre a necessidade de focalização das campanhas nas regiões metropolitanas.

Com um panorama semelhante ao das capitais, foi bem mais eficiente a Campanha realizada no segundo semestre do que no país como um todo.

d) Substituição das Armas de Fogo

Diante da possibilidade de que as armas de fogo fossem sendo substituídas por outros instrumentos letais, verificou-se que a significativa queda de 3.200 homicídios por armas de fogo entre 2003 e 2004 não foi acompanhada por um concomitante incremento dos homicídios por instrumentos cortantes, perfurantes, contundentes ou, inclusive, pelo uso da força corporal.

Os dados até aqui demonstrados permitem sustentar, sem sombra de dúvida, a

enorme contribuição das estratégias de desarmamento implementadas no Brasil, em

1994, no resguardo de vidas humanas, direito fundamental das pessoas sem o qual

nenhum outro direito tem razão de ser. Isso guarda estreita relação com experiências

de outros países ou cidades do mundo, como Bogotá, Canadá, África do Sul, Austrália,

etc. que implementaram estratégias de desarmamento e consequentemente tiveram

níveis de violência reduzidos ou controlados.

Fonte: UNESCO, 2005, p.14-16.

Os esforços para reduzir as mortes por amas de fogo continuaram após as

primeiras iniciativas implementadas a partir da vigência do Estatuto do

Desarmamento. Em 2008, através da lei 11.706/200815, foi acrescido ao

15

BRASIL. Lei nº 11.706, de 19 de junho de 2008. Altera e acresce dispositivos à Lei no 10.826, de 22

de dezembro de 2003, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição e

sobre o Sistema Nacional de Armas - Sinarm e define crimes. Diário Oficial [da República Federativa do

Brasil], Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11706.htm>.

Acesso em 27 Ago. 2014.

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17

Estatuto o artigo 32, que declarava ser de boa-fé os possuidores que

espontaneamente entregassem suas armas. Todos seriam indenizados e aqueles

que porventura as tivessem de modo irregular, teriam a punibilidade do crime

extinta. Em 2008 e 2009 o governo se empenhou na segunda campanha de

desarmamento.

De acordo com o projeto “Mapeamento do Comércio e tráfico ilegal de

armas no Brasil” realizada pelo “Viva Rio”, em parceria com a subcomissão

Especial de Armas e Munições, da Comissão de Segurança Pública da Câmara

dos Deputados (CSPCCO), com apoio da Secretaria Nacional de Segurança

Pública (Senasp), do Ministério da Justiça, constatou-se que esta segunda

campanha, organizada pelo Ministério da Justiça e pela Polícia Federal,

recolheu 30.721 armas de fogo (RANKING DOS ESTADOS NO CONTROLE DE

ARMAS, 2010).

Em 2011, o Ministério da Justiça lançou a campanha “Tire uma arma do

Futuro do Brasil”.16 O desafio era superar o recolhimento de armas das

campanhas anteriores. Para atrair mais cidadãos dispostos a entregarem

voluntariamente as armas de fogo, o governo acrescentou alguns benefícios, tais

como: anonimato do possuidor e pagamento da indenização em até 30 dias após

a entrega. (BLOG DO PLANALTO, 2011).

Em 2012, o programa de entrega de armas passou a fazer parte do

Programa Brasil Mais Seguro17, uma cooperação entre União, Estados, Distrito

Federal e Municípios, que visa reduzir a criminalidade e o crime organizado.

Além disso, o Ministério da Justiça editou a portaria 2.969, que

aumentou o valor da indenização por cada arma entregue. Antes, as

indenizações variavam de R$ 100 a R$300,00. Com a portaria os valores foram

majorados de R$150 a R$450,00, conforme o tipo e calibre do armamento (ver

Anexo 1).

16

O governo previa um investimento R$ 10 milhões em indenizações e recolhimento. (BLOG DO

PLANALTO, 2011).

17 Segundo informações do Portal Atlas, o Brasil mais Seguro é um ―Programa de redução da

criminalidade violenta, a ser implantado por meio do acordo de cooperação da União, Estados, Distrito

Federal e Municípios com o objetivo de reduzir a impunidade, aumentar a sensação de segurança da

população e promover maior controle de armas. Visa induzir e promover a atuação qualificada e eficiente

dos órgãos de Segurança Pública para redução dos índices de violência e criminalidade, por meio da

qualificação dos procedimentos investigativos, do fortalecimento do policiamento ostensivo e de

proximidade com a população e maior cooperação e articulação entre as instituições de segurança pública,

sistema prisional e o sistema de justiça criminal (Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria

Pública)‖. (Fonte: http://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/programas-1/brasil-mais-

seguro. Acesso em 14.10.2014).

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18

Nos anos de 2011 e 2012, mais de 60 mil armas foram entregues, com

destaque para o Estado de São Paulo, que possuía 670 postos de recolhimento

(CAMPANHA NACIONAL DO DESARMAMENTO, 2013). De acordo com o

Ministério da Justiça, em 2014 a campanha “Proteja a sua família. Desarma-se”

recolheu apenas nos 3 primeiros meses do ano, 4.147 armas de fogo.

Desde 2004 as companhas de desarmamento recolheram 650.336 armas

em todo o Brasil. (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2014).

As ações do governo ganharam reconhecimento internacional. A

UNESCO, em 2004, premiou o Brasil pelas estratégias de desarmamentos

adotadas em prol da paz.

A redução no número de armas ilegais em circulação e o alto índice de

homicídios provocados por armas de fogo mostram que o desafio ainda é

grande, mas que Brasil tem trilhado um caminho importante no sentido de

desarmar a população e, com essa ação, diminuir o número de homicídios que

tem vitimado milhares de brasileiros todos os anos. A facilidade de acesso e a

grande circulação de armas de fogo no país destacam o Brasil nessa tendência

que se tornou marca da violência homicida.18

A cooperação diária entre União, Estados, Municípios e sociedade civil é

imprescindível para que os números continuem a reduzir e os brasileiros

construam, gradualmente, uma sociedade mais segura e pacífica.

1.3. Dados relativos a implantação do Estatuto do Desarmamento no Brasil

Apresentamos, a seguir, utilizando dados divulgados pelo Ministério da

Justiça, um balanço geral da entrega de armas no Brasil (TABELA 1),

considerando o período de 2004 até o dia 30 de junho de 2014.

18

Duas em cada três pessoas mortas nos países das Américas são assassinadas com armas de fogo. No

Brasil, o índice é maior, com 70% das mortes. Segundo o ―Estudo Global sobre o Homicídio 2013‖, as

armas de fogo foram utilizadas em 41% dos 437 mil homicídios no mundo em 2012. O estudo divulgado

pelo Escritório sobre Drogas e Crime das Nações Unidas (UNODC) pode ser acessado em:

http://www.unodc.org/gsh/. Acesso em 20.09.2014.

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19

TABELA 1: Balanço geral da entrega de armas Brasil / 2004 até 06/2014

Período Armas entregues (N) Armas entregues (%)

2004 a 2010 550.000 84,0%

2011 (antes do Sistema Desarma) 2.860 0,4%

2011 (06/05/2011 a 31/12/2011) 34.749 5,3%

2012 27.316 4,2%

2013 31.265 4,8%

2014 (até 30/06) 8.493 1,3%

Total 654.682 100,0%

Fonte: Ministério da Justiça, 2014. Nota: adaptado pelo autor.

De 2004 a 2010, cerca de 550 mil armas de fogo foram entregues

voluntariamente em função da política nacional de desarmamento.

Após a implantação do Sistema Desarma e as campanhas publicitárias

realizadas desde 2011 temos os seguintes valores: em 2011, considerando o

período anual, foram registradas 37.609 armas entregues; em 2012, um total de

27.316 armas; em 2013, o número foi de 31.265 e em 2014 (até 30/06), um total

de 8.493.

É importante considerar que o elevado volume de armas entregues entre

2004 a 2010 contempla o recolhimento das armas artesanais (dado não

computado oficialmente e que não integra o registro, a partir de 2011).

Considerando o período atual, de 2014 (até 30/06), identificamos a

seguinte situação da entrega de armas segundo as Unidades da Federação

(TABELA 2).

TABELA 2: Balanço da entrega de armas entre as Unidades da Federação segundo a população residente, número de armas entregues e taxa de armas entregues por 100 mil habitantes –

Brasil / 2014 (até 30/06)

Unidade da Federação

População residente (Censo 2010 IBGE)

Armas entregues (N)

Taxa de armas entregues por 100 mil habitantes

Acre 733.559 7 0,95

Alagoas 3.120.494 7 0,22

Amapá 669.526 12 1,79

Amazonas 3.483.985 11 0,32

Bahia 14.016.906 71 0,51

Ceará 8.452.381 35 0,41

Distrito Federal 2.570.160 60 2,33

Espírito Santo 3.514.952 74 2,11

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Goiás 6.003.788 15 0,25

Maranhão 6.574.789 29 0,44

Mato Grosso 3.035.122 10 0,33

Mato Grosso do Sul 2.449.024 27 1,10

Minas Gerais 19.597.330 205 1,05

Pará 7.581.051 23 0,30

Paraíba 3.766.528 30 0,80

Paraná 10.444.526 158 1,51

Pernambuco 8.796.448 489 5,56

Piauí 3.118.360 9 0,29

Rio de Janeiro 15.989.929 184 1,15

Rio Grande do Norte 3.168.027 14 0,44

Rio Grande do Sul 10.693.929 267 2,50

Rondônia 1.562.409 8 0,51

Roraima 450.479 3 0,67

Santa Catarina 6.248.436 98 1,57

São Paulo 41.262.199 1.067 2,59

Sergipe 2.068.017 11 0,53

Tocantins 1.383.445 7 0,51

Total no país 190.755.799 2.931 1,54

Fontes: IBGE, 2014; Ministério da Justiça, 2014. Nota: elaborado pelo autor.

Ao considerarmos as taxas por 100 mil habitantes durante o primeiro

semestre de 2014 (TABELA 2), observamos que 20 Unidades da Federação

(76,9%) apresentaram taxas inferiores à média nacional de 1,54. São elas, em

ordem decrescente de taxa: Alagoas (0,22); Goiás (0,25); Piauí (0,29); Pará

(0,3); Amazonas (0,32); Mato Grosso (0,33); Ceará (0,41); Maranhão (0,44);

Rio Grande do Norte (0,44); Bahia (0,51); Rondônia (0,51); Tocantins (0,51);

Sergipe (0,53); Roraima (0,67); Paraíba (0,8); Acre (0,95); Minas Gerais (1,05);

Mato Grosso do Sul (1,1); Rio de Janeiro (1,15) e Paraná (1,51). Somente seis

UF’s (23,1%) tiveram taxas superiores à média nacional. São elas: Santa

Catarina (1,57); Amapá (1,79); Espírito Santo (2,11); Distrito Federal (2,33); Rio

Grande do Sul (2,5); São Paulo (2,59) e Pernambuco (5,56).

Esses dados podem indicar uma distância relativa significativa entre as

UF’s no que se refere ao desenvolvimento da Campanha do Desarmamento, a

partir das taxas de armas entregues por 100 mil habitantes.

A seguir, ilustramos essa discrepância do ranking entre taxas das

Unidades da Federação (GRÁFICO 2, abaixo):

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GRÁFICO 2 – Ranking das taxas de entrega de armas por 100 mil habitantes entre as Unidades da Federação

Brasil –2014 (até 30/06)

Fontes: IBGE, 2014; Ministério da Justiça, 2014. Nota: elaborado pelo autor.

Os dados acima expostos (GRÁFICO 2) indicam a necessidade de

fortalecimento da Campanha do Desarmamento em todo o território nacional.

Percebe-se, ainda, um desequilíbrio entre as taxas, demonstrando que os

resultados são possivelmente consequência do modo como cada estado federado

tem respondido à política nacional de segurança pública, ratificada pelo

Estatuto do Desarmamento, de 2003.

Segundo números disponibilizados pelo Portal Desarma, em relação às

armas entregues, no período entre 06 de maio de 2011 até a data de 30 de junho

de 2014, registrou-se um total de 101.822 armas entregues, conforme Tabela 3,

abaixo:

TABELA 3: Número e percentual de armas entregues segundo a espécie - Brasil (06/05/2011 até 30/06/2014)

Espécie de arma entregue

Número

Percentual

Morteiro 2 0,002%

Sub metralhadora 16 0,02%

Metralhadora 18 0,02%

Mosquetão 96 0,1%

Outras espécies 126 0,1%

Pistolão 146 0,1%

Garruchão 267 0,3%

Escopeta 291 0,3%

Pistolete 315 0,3%

Fuzil 397 0,4%

Rifle 1.917 1,9%

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22

Arma não identificada 3.864 3,8%

Carabina 4.057 4,0%

Garrucha 7.392 7,3%

Pistola 8.886 8,7%

Espingarda 23.905 23,5%

Revolver 50.127 49,2%

Total 101.822 100,00%

Fonte: Portal DESARMA (06/05/2011 até 30/06/2014). Elaborado pelo autor.

As armas de menor calibre, lideradas pela espécie “revolver”, ocuparam o

maior volume de armas entregues no período considerado, com número de

50.127 unidades (correpondente a 49,2% do total registrado)19. A “espingarda”

teve 23.905 espécies entregues (23,5% do total); seguida de: “pistola”, com

8.886 (8,7%); “Garucha”, com 7.392 (7,3%); “Carabina”, com 4.057 (4,0%);

“Arma não identificada”, com 3.864 (3,8%); “Rifle”, com 1.917 (1,9%); “Fuzil”,

com 397 (0,4%); “Pistolete”; com 315 (0,3%); “Escopeta”, com 291 (0,3%);

“Garruchão”, com 267 (0,3%); “Pistolão”, com 146 (0,1%); “outras espécieis”,

com 126 (0,1%); sendo que as espécies “Mosquetão, Metralhadora,

Submetralhadora e Morteiro”, agregadas, somaram 132 unidades (0,14%).

Os resultados (TABELA 3) corroboram a tendência idenficiada pelos

estudos da ONG Viva Rio de que o maior volume de armas entregue constitue-

se de armas de pequeno porte.

Através da exposição gráfica seguinte (GRÁFICO 3) ilustramos a

diferença de espécies de armas entregues, considerando o período de 06 de

maio de 2011 até 30 de junho de 2014.

19

Segundo o Relatório Global sobre Homicídios 2013, lançado pela ONU no escritório das Nações

Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), em Londres, em abril de 2014, ―armas de fogo apresentaram

predominância como instrumentos usados em homicídios na América, onde dois terços destes crimes são

cometidos com revólver‖ (Fonte: http://dssbr.org/site/2014/05/relatorio-da-onu-lancado-mundialmente-

em-abril-mostra-que-brasil-registrou-cerca-de-11-dos-homicidios-ocorridos-no-mundo-em-2012/.

Acessado em 10.10.2014, grifo nosso).

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23

GRÁFICO 3: Número de armas entregues segundo a espécie – Brasil (06/05/2011 até 30/06/2014)

Fonte: Portal DESARMA (06/05/2011 até 30/06/2014). Elaborado pelo autor.

Muito provavelmente, o resultado das entregas voluntárias (TABELAS 2 e

3) possui relação com as campanhas de publicidade e marketing em torno do

desarmamento, fundamentais para informar e promover a sensibilização da

população em relação aos riscos trazidos pelo porte de arma de fogo.

Registrem-se as iniciativas conjuntas envolvendo setores específicos,

como as igrejas, na Campanha “Religiões unidas pela Paz”, realizada em São

Paulo em 2011, bem como a “Campanha Itinerante” adotada inicialmente por

Alagoas e, posteriormente, em outras Unidades da Federação como

Pernambuco e Espírito Santo.

Atualmente, o país possui um total de 2.127 postos de recolhimento de

armas. A seguir, (TABELA 4), identificamos por Unidade da Federação a

quantidade de postos de entrega de armas, bem como realizamos uma análise

do número de postos em função da população residente em cada UF, através da

construção de taxa de postos por 100 mil habitantes, cujo objetivo é oferecer um

parâmetro de análise global da oferta de postos em relação à população

residente em cada estado.

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24

TABELA 4: Número de postos de entrega de armas entre as Unidades da Federação segundo a população residente e taxa de cobertura

demográfica dos postos por 100 mil habitantes Brasil (06/05/2011 até 30/06/2014)

Unidade da Federação População residente (Censo 2010 IBGE)

Postos de recolhimento de

armas (N)

Taxa relativa ao número de postos

por 100 mil habitantes

Acre 733.559 25 3,4

Alagoas 3.120.494 45 1,4

Amapá 669.526 3 0,4

Amazonas 3.483.985 3 0,1

Bahia 14.016.906 76 0,5

Ceará 8.452.381 14 0,2

Distrito Federal 2.570.160 39 1,5

Espírito Santo 3.514.952 61 1,7

Goiás 6.003.788 116 1,9

Maranhão 6.574.789 4 0,1

Mato Grosso 3.035.122 37 1,2

Mato Grosso do Sul 2.449.024 9 0,4

Minas Gerais 19.597.330 165 0,8

Pará 7.581.051 44 0,6

Paraíba 3.766.528 24 0,6

Paraná 10.444.526 48 0,5

Pernambuco 8.796.448 29 0,3

Piauí 3.118.360 18 0,6

Rio de Janeiro 15.989.929 204 1,3

Rio Grande do Norte 3.168.027 28 0,9

Rio Grande do Sul 10.693.929 231 2,2

Rondônia 1.562.409 33 2,1

Roraima 450.479 3 0,7

Santa Catarina 6.248.436 74 1,2

São Paulo 41.262.199 681 1,7

Sergipe 2.068.017 97 4,7

Tocantins 1.383.445 18 1,3

Total do país 190.755.799 2.129 1,1

Fontes: IBGE, 2014; Portal DESARMA (06/05/2011 até 30/06/2014). Elaborado pelo autor.

Ao analisarmos a relação entre a população residente e a cobertura

demográfica dos postos de entegra disponíveis no país20, a partir das unidades

da Federação, identificamos que quatorze estados (53,8% delas) encontravam-

se com um volume relativo de postos inferior à média nacional de 1,1 por 100

20

Obviamente a distribuição geográfica dos postos no interior dos estados brasileiros é fundamental para

atender à demanda de entrega de armas de fogo de forma estratégica, em função da localização e

concentração/dispersão dos habitantes residentes (no território). Porém, as enormes diferenças de

infraestrutura urbana, econômica e de manifestações culturais e políticas entre as UF’s do país é por si um

dificultador para a realização de qualquer tipo de análise comparada entre elas. Contudo, a análise

proposta pode proporcionar um parâmetro a mais para a compreensão dos efeitos da Campanha do

Desarmamento no Brasil.

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25

mil habitantes, observados até 30 de junho de 2014. São eles, em ordem

decrescente de taxa: Maranhão (4 postos) e Amazonas (3 postos), com taxas de

0,1; Ceará, com taxa de 0,2 (14 postos); Pernambuco (29 postos), com taxa de

0,3; Mato Grosso do Sul (9 postos) e Amapá (3 postos), com taxas de 0,4;

Paraná (48 postos) e Bahia (76 postos), com taxas de 0,5; Piauí (18 postos), Pará

(44 postos) e Paraíba (24 postos), com taxas de 0,6; Roraima (3 postos), com

taxa de 0,7; Minas Gerais (165 postos), com taxa de 0,8 e Rio Grande do Norte

(28 postos), com taxa de 0,9 postos por 100 mil habitantes.

Treze estados (46,2%) tinham um volume de postos superior à média

nacional no período considerado. Em ordem decrescente são: Santa Catarina

(74 postos) e Mato Grosso (37 postos), com taxas de 1,2; Rio de Janeiro (204

postos) e Tocantins (18 postos), com taxas de 1,3; Alagoas (45 postos), com taxa

de 1,4; Distrito Federal (39 postos), com taxa e 1,5; São Paulo (681 postos) e

Espírito Santo (61 postos), com taxas de 1,7; Rondônia (33 postos), com taxa de

2,1; Rio Grande do Sul (231 postos), com taxa de 2,2; Acre (25 postos) e taxa de

3,4; e, Sergipe (97 postos) com taxa de 4,7.

A seguir (GRÁFICO 4) ilustramos as diferenças da taxa de cobertura

demográfica entre as UF’s.

GRÁFICO 4: Taxa de cobertura demográfica dos postos de entrega de armas, por 100 mil habitantes, por Unidades da Federação

Brasil (06/05/2011 até 30/06/2014)

Fontes: IBGE, 2014; Portal DESARMA (06/05/2011 até 30/06/2014). Elaborado pelo autor.

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26

Consideramos que as discrepâncias entre as taxas observadas nas

TABELAS 2 e 4 indicam que a Campanha ainda pode ser melhor estruturada e

incrementada na maior parte das UF’s. A presença dos postos, segundo sua

cobertura demográfica (TABELA 4), demonstra que outras ações ainda podem

ser realizadas para que haja maior efetividade de entrega de armas entre as

diversas Unidades da Federação, de modo que possa avançar na forma como

atinge seu público alvo: todos os cidadãos brasileiros.

Além disso, reconhecemos que o relativo sucesso da Campanha do

Desarmamento dependerá do aumento da confiança dos brasileiros nas

instituições que representam o eixo da segurança pública, principalmente nos

segmentos policiais militares e civis. Neste sentido, é importante registrar que

em 2013, o Índice de Confiança na Justiça Brasileira (ICJB) - construído pela

Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas e constante do sétimo Anuário

Brasileiro de Segurança Pública, publicação do Fórum Brasileiro de Segurança

Pública21 -, que mensura sobre a confiança nas instituições, revela que as

polícias brasileiras estão entre as organizações menos confiáveis do país. A

pesquisa revela que do ano de 2012 para 2013 ocorreu um decréscimo geral da

confiança nas instituições no Brasil, porém, as instituições policiais tiveram

uma diminuição da confiança de expressivos nove pontos percentuais: 70% dos

entrevistados disseram não confiar nas polícias brasileiras. O documento faz um

comparativo com a situação em outros países: tendo como fonte a BBC22, 82%

dos ingleses confiavam em sua polícia em outubro de 2013.

A seguir apresentamos a distribuição dos 2.129 postos entre os diversos

atores institucionais da segurança pública e sociedade civil envolvidos

diretamente na Capanha do Desarmamento, considerando dados do Sistema

Desarma, relativos ao período de 06 de maio de 2011 a 30 de junho de 2014.

21 O documento completo está publicado no site do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Nele

verificamos também que é alta a desconfiança em relação aos meios de comunicação: TVs não têm a

confiança de 71% dos brasileiros — percentual [de desconfiança] maior que a polícia (70,1%) e a

imprensa escrita (62%). No primeiro semestre de 2013, a instituição da qual a população mais

desconfiava era os partidos políticos (95,1%), seguida do Congresso Nacional (81,5%). Com índice [de

desconfiança] melhor que a polícia, aparecem a Igreja Católica (50,3%) e as Forças Armadas (34,6%).

(ANUÁRIO BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2013, p. 106).

22 A British Broadcasting Corporation (BBC) é uma emissora pública de rádio e televisão do Reino

Unido, fundada em 1922. É considerada uma das emissoras de maior credibilidade mundial.

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27

TABELA 5: Número e percentual postos de entrega de armas segundo a natureza instucional da gestão dos postos/ Segurança

Pública e Sociedade Civil Brasil (06/05/2011 até 30/06/2014)

Natureza da Instituição Postos de entrega de armas (N) Postos de entrega de armas (%)

Seg

ura

nça

bli

ca Polícia Civil 1.117 52,5%

Polícia Militar 744 34,9%

Polícia Federal 127 6,0%

Polícia Rodoviária Federal

64 3,0%

Guarda Municipal 48 2,3%

Corpo de Bombeiro 5 0,2%

Sub-total 2.105 98,9%

Sociedade Civil 24 1,1%

Total do país 2.129 100,0%

Fonte: Portal DESARMA (06/05/2011 até 30/06/2014). Elaborado pelo autor.

Em relação à gestão dos postos de entrega de armas pelos órgãos de

Segurança Pública, 1.117 postos (52,5%) eram geridos pelas polícias civis

estaduais, 744 postos (34,9%) pelas polícias militares estaduais, 127 postos

(6,0%) pela Polícia Federal, 64 postos (3,0%) pela Polícia Rodoviária Federal,

48 postos (2,3%) por guardas municipais armadas de municípios com

população superior a 500 mil habitantes e 5 postos (0,2%) são geridos pelo

Corpo de Bombeiro.

GRÁFICO 5: Distribuição dos postos de entrega de armas segundo a natureza da gestão dos postos/ Segurança Pública e Sociedade Civil –

Brasil (06/05/2011 até 30/06/2014)

Fonte: Portal DESARMA (06/05/2011 até 30/06/2014). Elaborado pelo autor.

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28

Dos 2.129 postos existentes no país até a data de referência, 2.105

(98,9%) eram geridos por órgãos do sistema de Segurança Pública e 24 (1,1%)

por entidades da Sociedade Civil (GRÁFICO 5).

Os dados indicam que a Campanha atinge poucas entidades da sociedade

civil (1%).

1.4. A indústria bélica no Brasil e no mundo23

A célebre pesquisa desenvolvida por Arthur Kellermann24, publicada no New

England Journal of Medincie revela:

A família que tem arma de fogo em casa corre quatro vezes mais risco de que seja disparado um tiro de forma não intencional, onze vezes mais riscos de que seja instrumento de suicídio de que sirva de autodefesa da própria família, dezoito vezes mais riscos de que a arma seja usada contra um membro da casa do que contra um invasor” (KELLERMANN, apud BOURGOIS, 2005. p. 33)

A Austrália é, ainda hoje, um dos países que mais exporta armas de fogo

no mundo. De acordo com o Instituto Small Arms Survey, os australianos estão

em quinto lugar no ranking mundial de exportadores e lucram por ano, no

mínimo, 100 milhões de dólares neste ramo (SMALL ARMS SURVEY PT, 2014).

Assim, os australianos enfrentaram grande dificuldade para modificar a

legislação concernente às armas. O lobby das indústrias bélicas era fortíssimo.

Os empresários do ramo eram responsáveis pelo financiamento da campanha de

vários parlamentares australianos. Por isso, pressionavam os principais partidos

a se manterem inertes quanto as mudanças legislativas.

Diante deste conflito de interesses, os australianos não conseguiam

reformar a legislação, até que, em abril de 1996, experimentaram o pesadelo

mundialmente conhecido como o massacre de Port Arthur. Um homem

assassinou 35 pessoas em um ponto turístico da Tasmânia. Após o desastre, as

autoridades competentes tiveram que ceder aos clamores populares e

reformular as normas sobre porte e posse de arma.

Outro caso emblemático é o dos Estados Unidos da América. Os Estados

Federados possuem autonomia para decidir sobre a proibição ou não das armas

23

No capítulo 3 deste estudo, discorreremos mais detidamente sobre pesquisas e experiências

internacionais acerca do desarmamento. 24

KELLERMANN, A.; REAY, D. Protection or Peril? An Analysis of Firearm Related Deaths in the

Home. New England Journal of Medicine, vol 314, nº 24, June 1986, pp. 1557-60.

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29

de fogo, gerando com isso uma divisão entre áreas controladas e áreas de livre

ao acesso a tais equipamentos por parte da população civil.

Em parte, a adesão às armas de fogo naquele o país [que possui uma das

maiores taxas de armamento por habitante, atingindo uma média de 101 armas

de fogo para cada grupo de 100 habitantes (GUN POLICY, 2014)], relaciona-se à

histórica conquista da independência frente à Inglaterra, através de levante de

armas pela nação norte-americana.

No ano de 1976, o estado de Washington (D.C) proibiu a aquisição de

armas de fogo possibilitando, na década posterior, de 1980, uma redução dos

homicídios em torno de 25% (LOFTIN et al, 1991). Apesar disso, o controle

sobre as armas e possível desarmamento dos norte-americanos ainda parece

distante de tornar-se política nacional, mesmo com os trágicos assassinatos em

massa ocorridos em escolas do país, lançando questões sobre o problema da

posse de arma de fogo por civis e repercutindo na agenda política nacional

(BANDEIRA e BOURGOIS, 2005).

Conforme apontam as pesquisas do Instituto Small Arms Survey, em

2007, 90 em cada 100 americanos possuíam uma arma em casa; o que equivalia

a 270 milhões em números absolutos. O número de garotos e garotas que

perdem a vida em assassinados em massa, suicídios ou vítimas de bala perdida

são alarmantes (SMALL ARMS SURVEY, 2007). De acordo com estudo do

jornal The New York Times, o governo tem tentado maquiar estes números.

O gráfico a seguir mostra os valores apresentados pelo governo e os

constatados pelo jornal:

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30

QUADRO 3: Mortes por tiros acidentais em menores de 15 anos

Fonte: LUO e McINTIRE, 2012.

Diante deste quadro, a população norte-americana iniciou o debate: o

que vale mais? A pseudo-sensação de segurança ou expor suas crianças ao

perigo, diariamente? Muitos americanos têm defendido uma reestruturação na

legislação sobre a posse de arma.

Lancemos, novamente, nosso olhar sobre o Brasil: em 2011, o país inteiro

lamentou o massacre ocorrido na Escola Municipal Tasso da Silveira, em

Realengo, no Rio de Janeiro. Um ex-aluno entrou na escola com dois revólveres

calibre 38, atirando contra os estudantes e suicidou-se em seguida. Ao todo,

onze crianças morreram e treze ficaram feridas. O episódio trouxe novamente à

tona a discussão sobre os riscos que todos correm quando se tem cidadãos

armados.

Ainda no que tange a indústria armamentista, há de se destacar os

prejuízos sociais e ambientais. Uma fábrica estatal localizada na Cidade do

Cabo, na África do Sul, produzia granada e gás lacrimogêneo em meio a uma

população de aproximadamente um milhão de habitantes. No período do

Apartheid, ninguém ousava questionar a existência dessa indústria. Hoje, um

grande número de moradores da região e ex-funcionários está com câncer e

problemas cardíacos. Algumas pesquisas indagam se houve contaminação da

água pela indústria de armamentos. (BROWNE, 2005. p.61.).

Sobre resíduos da indústria armamentista, 250 mil soldados norte-

americanos que atuaram na Guerra do Golfo ainda sofrem os efeitos do contato

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31

com munição a base de urânio. O Iraque registrou um aumento considerável de

bebês que nasceram deformados. (BROWNE, 2005. p.61.). Especula-se que

várias doenças tenham relação com resquícios à exposição de subprodutos da

indústria bélica.

Os recursos que poderiam ser utilizados para a prevenção e tratamento

de doenças, muitas vezes são utilizados para reparar atrocidades causadas pela

má utilização das armas de fogo. A preocupação com os efeitos nefastos

causados pelo uso desordenado de armas de fogo tem gerado mudanças não

apenas nas legislações domésticas.

A comunidade internacional está mobilizada no intuito de reduzir os

impactos negativos das armas nas mãos de civis. No dia 3 de junho de 2013, o

Brasil juntamente com 60 países assinou nas Nações Unidas, o ATT – Arms

Trade Treaty (em português, Tratado de Comércio de Armas). O objetivo é

regular o comércio internacional de armas, a fim de diminuir o número de

armas de fogo desviadas para o tráfico ilegal.

A adesão a este tratado faz jus ao que preceitua a Constituição Federal de

1988, no artigo 4º, VI - de que o Brasil se rege em suas relações internacionais

pela defesa da paz.25 Assim, este tratado renova as esperanças dos membros da

comunidade internacional que lutam incessantemente pela redução do número

de armas em seus territórios. Fica evidente que não basta apenas um esforço

nacional, embora ele seja imprescindível. É preciso um empenho mútuo, já que

muitas armas são oriundas do tráfico internacional. Se os países se

comprometerem a fiscalizar de modo mais severo o comércio, certamente

reduzir-se-ão ainda mais o número de homicídios por arma de fogo no Brasil, e

nos demais países signatários do Tratado.

Há que se registrar, ainda, mesmo que suscintamente, as conexões da

indústria da segurança privada com a indústria de armas de fogo. A “bancada da

bala”, por exemplo, é responsável por defender em certa medida os interesses

desse segmento. Tal bancada é financiada, em parte, por empresas que fabricam

e vendem armas no Brasil e também por associações patronais. Segundo o site

“A Pública”26, a indústria de armas, incluindo aí a Associação Nacional da

25

A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

[...] VI – defesa da paz. (CF/1988, art. 4º, VI). 26

Agência independente de jornalismo investigativo sem fins lucrativos e de livre reprodução de

conteúdo, inspirada em organizações similares de outros países, com a missão de produzir reportagens

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32

Indústria de Armas e Munições (ANIAM), a CBC (Companhia Brasileira de

Cartuchos) e a empresa Taurus doaram quase R$ 2,5 milhões a campanhas de

parlamentares. O site apresenta, ainda, os perfis de 14 parlamentares - onze

deputados federais, dois senadores e um deputado estadual - que receberam

doações a partir de R$ 40 mil e que foram eleitos na campanha de 2010,

segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)27. A mesma fonte informa que em

janeiro de 2012 tramitavam no Congresso 27 projetos que buscam ampliar as

categorias profissionais que têm direito a porte de armas, até para

pesquisadores de entidades científicas.

Como se pode observar, o Brasil possui uma pujante indústria bélica,

sendo o quarto maior exportador de armas leves do mundo, de acordo com o

Small Arms Survey, o principal estudo a respeito desta indústria, realizado pelo

Instituto de Estudos Internacionais e de Desenvolvimento em Genebra. Está

atrás dos Estados Unidos, Itália e Alemanha - mas à frente de países como

Israel, Áustria e Rússia. De acordo com o Exército, responsável por fiscalizar e

controlar as exportações, de 2005 a 2010 o Brasil exportou 4.482.874 armas de

fogo.

Além dos mercados tradicionais no continente americano e na Europa, o

Brasil vem buscando vender armas leves para a África e a Ásia. Levantamentos

feitos pela Iniciativa Norueguesa em Transferência de Armas Leves (Nisat, do

inglês Norwegian Initiative on Small Arms Transfers) apontam que, de 1999 a

2009, o Brasil vendeu armas para África do Sul, Argélia, Angola, Botswana,

Burkina Faso, Costa do Marfim, Egito, Gana, Guiné, Quênia, Madagascar,

Malawi, Mauritânia, Marrocos, Namíbia, Níger, Nigéria, Paquistão, República

do Congo, Senegal, Tanzânia, Uganda, Zâmbia e Zimbábue.28

De acordo com o Small Arms Survey, a indústria de arma brasileira

movimenta por ano, cerca de cem milhões de dólares. Um país com uma escala

de produção bélica com destaque internacional, não pode, de modo algum,

ignorar o potencial que possui para protagonizar o tráfico ilícito de armas.

(SMALL ARMS SURVEY, 2014).

pautadas pelo interesse público, visando ao fortalecimento do direito à informação, à qualificação do

debate democrático e à promoção dos direitos humanos. 27

Para outros detalhes sobre o perfil dos congressistas da ―Bancada da Bala‖ que receberam doações de

empresas de armamento, consultar: Mota (2012). 28

Empresas de armas migram para África e Ásia para ampliar exportações. (MOTA, 2012).

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33

Pesquisas revelam que grande parte das armas produzidas no Brasil são

exportadas e, posteriormente, retornam ao território brasileiro de forma

clandestina, alimentando o tráfico ilegal de armas e outros crimes

desencadeados por este.

Como aponta o quadro abaixo, 71% das armas que produzem crimes no

Brasil entram ilegalmente no país através de contrabando vindo de países

vizinhos:

QUADRO 4 – Procedência da armas dos crimes, no Brasil

Fonte: ABBUD e MARICATE, 2011.

É importante registrar, nesse contexto, que o Estatuto do Desarmamento

impõe à indústria bélica maior responsabilização sobre o seu produto. Neste

sentido, não há espaço para se ignorar todos os reflexos oriundos da venda de

arma de fogo.

Segundo o “Mapa do Tráfico Ilícito de Armas no Brasil e o Ranking dos

Estados no Controle de Armas Brasil”29, o país tinha, em 2010, 16 milhões de

armas de fogo. Desse total, 14 milhões de armas (87%) estavam nas mãos de

civis e 2 milhões com agentes do Estado, ou seja, 13% do total apurado.

O mesmo estudo informa que o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking

de crimes por arma de fogo no mundo, com 34,3 mil homicídios anuais.

29

O ―Mapa do Tráfico Ilícito de Armas no Brasil e o Ranking dos Estados no Controle de Armas Brasil‖

foi divulgado em dezembro de 2010 pelo Ministério da Justiça em parceria com oViva Rio. Detalhes em:

http://www.vivario.org.br/publique/media/TEXTO%20LAN%C3%87AMENTO%20LIVROS%20III.pdf.

Veja também: http://www.comunidadesegura.org/pt-br/MATERIA-a-rota-das-armas-ate-o-crime. Acesso

em 27.set.2014.

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34

Para combater o tráfico de armas dos países vizinho, destaca-se a

elaboração da Estratégia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras

(ENAFRON)30: plano estratégico que visa à criação de mecanismos para

coordenar de maneira mais efetiva as ações dos órgãos públicos nessas regiões,

com o intuito de diminuir a criminalidade e o tráfico de ilícitos.

Segundo informações obtidas no site da Secretaria Nacional de

Segurança Pública (Senasp/MJ)31, 843 policiais civis e militares já foram

capacitados pelo governo federal em 2013 e 2014 para patrulhar a faixa de

fronteira de 11 estados com 10 países da América do Sul. Até agosto de 2014, já

receberam uma edição do curso para operadores as cidades de Guajará-mirim

(RO), Dourados (MS), Vilhena (RO), São Miguel do Guaporé (RO), Santana do

Livramento (RS), Jaguarão (RS), Laranjal do Jari (AP), Santa Rosa (RS), Rolim

de Moura (RO), São Luiz Gonzaga (RS), Costa Marques (RO), Chuí (RS),

Brasiléia (AC), Pacaraima (RR) e Buritis (RO). Porto Esperidião (MT) recebeu

duas edições, e Marechal Cândido Rondon (PR) teve três cursos.

Além de capacitar operadores, o Curso de Unidades Especializadas de

Fronteira também forma multiplicadores – profissionais que são capacitados

para serem instrutores – que são qualificados durante edições com o dobro da

carga horária de aulas oferecidas a operadores. Foram cinco edições, em

Marechal Cândido Rondon (PR), Dourados (MS), Porto Velho (RO), Oiapoque

(AP) e Santarém (PA).

Somando inovação tecnológica e maior integração entre os organismos

locais ligados a políticas públicas de segurança, o governo federal tem destinado

maiores investimentos para estas regiões, pautados em critérios objetivos, tais

como tamanho da população residente na área de fronteira, taxa de homicídio,

extensão da fronteira por unidade federativa e número de apreensões de armas

e drogas.

Registre-se, ainda que, para a consecução do plano de combate ao tráfico

de pessoas, coordenado pelo Ministério da Justiça, encontram-se ações também

30 A apresentação da Estratégia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras está disponível em:

http://www.seplan.am.gov.br/arquivos/download/arqeditor/plano_estrategico_fronteiras.pdf

31 Fonte: http://www.justica.gov.br/noticias/ministerio-da-justica-qualifica-mais-de-800-policiais-que-

atuam-na-fronteira

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35

voltadas para o combate e tráfico de armas, dadas as associações entre essas

duas modalidades de crimes.32

1.5. Balas perdidas e armas de fogo

Uma reportagem do jornal O Globo33, de 23 de setembro de 2014, informa

que um relatório divulgado pelo Centro Regional das Nações Unidas para a Paz,

Desarmamento e Desenvolvimento na América Latina e Caribe (UN-LiREC),

revela que o Brasil é o segundo país onde há mais ocorrências de balas perdidas

da América Latina e o terceiro com o maior número de mortes por elas

provocadas. O levantamento foi feito a partir de reportagens publicadas em 27

países. No Brasil, 35% das ocorrências analisadas resultaram em morte.

O ranqueamento internacional do UN-LiREC contabilizou 22 brasileiros

mortos e 53 feridos, entre 2009 e 2013. Porém, uma amostragem feita pelo

jornal fluminense aponta que somente no Rio de Janeiro pelo menos 22 pessoas

morreram vítimas de balas perdidas entre janeiro e setembro de 2014, sendo

que nove eram crianças de até 12 anos de idade.

O UN-LiREC mapeou 550 ocorrências envolvendo balas perdidas em 27

países do continente, totalizando, entre mortos e feridos, 617 pessoas. A

Venezuela é o país que guarda o maior número de casos de balas perdidas e de

mortes, 74 e 67, respectivamente. Segundo lugar no número de casos, com 71, o

Brasil fica atrás da Colômbia em mortes, com 29 óbitos, enquanto foram

registradas 36 mortes de colombianos. Já em relação aos feridos, o Brasil tem o

maior número de ocorrências do continente, com 53 feridos.

Ainda segundo a reportagem do jornal, tendo como fulcro os dados

divulgados pelo UN-LiREC, no Brasil, o maior número de casos tem como

origem algum tipo de intervenção policial, como perseguição a supostos

criminosos (27% das ocorrências). Em segundo lugar, estão os tiroteios entre

gangues ou quadrilhas, com 24%, acompanhados por disparos efetuados

durante assaltos 20%. Outro dado chama a atenção: 10% dos casos são devidos

a conflitos interpessoais em que as testemunhas acabam alvejadas. No entanto,

em 40% dos casos não foi possível determinar a causa dos disparos.

32

Para mais informações sobre as ações de combate ao tráfico de pessoas, acessar o portal do Ministério

da Justiça, no link: http://www.justica.gov.br/sua-protecao/trafico-de-pessoas . Acesso em 20.09.2014. 33

A reportagem completa está disponível no link: http://oglobo.globo.com/brasil/brasil-o-segundo-pais-

sofrer-com-balas-perdidas-na-america-latina-14016759. Acesso em 25.09.2014.

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36

A reportagem de O Globo faz referência, ainda, a um estudo da ONG Sou da

Paz, que lançou um levantamento próprio sobre as armas apreendidas em São

Paulo, mostrando como armas antigas e de baixo calibre são as mais utilizadas

em homicídios e causam os maiores danos nos casos de testemunhas atingidas:

“de 14.488 armas analisadas, 1,2 mil estavam ligadas a homicídios. A maioria,

97%, eram armas curtas e 34% eram de calibre 38. Esse armamento é

majoritariamente nacional, sendo que 77,8% eram da marca Taurus. E o que

mais se destacou no levantamento foi a idade das armas: 88% dos revólveres

usados nesses crimes foram fabricados antes de 2003, ano em que foi

promulgada a lei 10.826/2003”.

Segundo informações do “Relatório Temático Bala Perdida”,34 referente ao

primeiro semestre de 2012, publicado pelo Instituto de Segurança Pública do

Rio de Janeiro:

Após analisar os dados de Registros de Ocorrência cujo campo “Dinâmica dos Fatos” continha a expressão “bala perdida”, identificamos que, no período analisado (2009-2011), a capital fluminense foi a área que concentrou o maior número de vítimas relacionadas a esse tipo de evento. No período de janeiro a junho de 2012 não foi diferente: foram 35 (trinta e cinco) vítimas (ou seja, 57,4%) de “bala perdida”, fatais e não fatais, de um total de 61 (sessenta e uma) vítimas. Segundo dados analisados por AISP, quatro delas reuniram mais de 50% das vítimas de “bala perdida” do estado no período de janeiro a junho de 2012. [...] Verificou-se ainda que, no período analisado, a maior parte dos registros apontava vítimas do sexo masculino, atingidas em “via pública”, sem menção a qualquer tipo de evento que pudesse ter relação com o fato em si, o que poderíamos entender como incidências típicas de “bala perdida”. (RELATÓRIO TEMÁTICO BALA PERDIDA, 1º SEMESTRE DE 2012, p. 10).

34 Acessado no link: http://arquivos.proderj.rj.gov.br/isp_imagens/Uploads/BalaPerdida_1sem2012.pdf.

Acesso em 25.09.2014. O documento é divulgado, trimestralmente, pelo Instituto de Segurança Pública

(ISP) e tem como objetivo apresentar o número de vítimas no Estado do Rio de Janeiro. Fica entendido

como ―vítima de bala perdida‖, a pessoa que não tinha nenhuma participação ou influência sobre o evento

no qual houve o disparo de arma de fogo, sendo, no entanto, atingida por projétil e podendo vir a falecer

ou não. O documento é divulgado com base nas ocorrências criminais registradas pelos Delegados.

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37

2. ASPECTOS RELEVANTES DA LEI 10.826/03

A Lei 10.826/2003 – Estatuto de Desarmamento35 - veio, em certa

medida, responder ao clamor da população brasileira, cansada da insegurança e

do altíssimo número de homicídios provocados por armas de fogo. Esta lei

surgiu como mecanismo de combate à violência e ao tráfico ilegal de armas.

Na década de 1990, em alguns estados brasileiros o número de óbitos por

arma de fogo superava o número de mortes por acidentes de trânsito. Na região

norte, por exemplo, os homicídios cometidos com arma de fogo, representavam

35,2% do total de mortes externas, conforme aponta o estudo do Núcleo de

Estudos da Violência (NEV/USP). (PERES, 2004 p. 37).

A legislação que vigorava até então, a Lei 9.437/199736, em diversos

pontos era rasa, facilitando assim, que pessoas despreparadas e sem qualquer

motivo justo portassem uma arma de fogo. As autoridades competentes

encontravam fortes barreiras para combater o porte e o tráfico ilegais de armas.

De acordo com a pesquisa elaborada pelo Ministério da Justiça/Instituto

Sangari, até 2003 o Brasil experimentava um aumento anual de 4% no número

de homicídios. Após o advento do Estatuto do Desarmamento, houve uma

queda desse número, principalmente em 2004 (WAISELFISZ, 2011).

A antiga lei não estabelecia qualquer requisito para que o indivíduo

portasse uma arma. Deste modo, qualquer cidadão interessado poderia requerer

o registro de sua arma.

Hoje, o procedimento é mais complexo. O artigo 4º do Estatuto e o artigo

12 do Decreto 5.123/200437, que regulamenta o Estatuto, preveem que para ser

proprietário de uma arma é necessário ter no mínimo 25 anos, declarar efetiva

35

BRASIL. Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003. Dispõe sobre registro, posse e comercialização

de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – Sinarm, define crimes e dá outras

providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.826compilado.htm>. Acesso em 27 Ago. 2014. 36

BRASIL. Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997. Institui o Sistema Nacional de Armas – SINARM -

estabelece condições para o registro e para o porte de arma de fogo, define crimes e dá outras

providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9437.htm>. Acesso em 27

Ago. 2014. 37

BRASIL. Lei nº 5.123, de 1º de julho de 2004. Regulamenta a Lei no 10.826, de 22 de dezembro de

2003, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema

Nacional de Armas - SINARM e define crimes. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil],

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5123.htm>. Acesso

em 27 Ago. 2014.

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38

necessidade de possuí-la, comprovar idoneidade, apresentar certidões de

antecedentes criminais emitidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e

Eleitoral, bem como, não estar respondendo a inquérito ou a processo criminal.

É necessário também provar residência certa e ocupação lícita. Ademais, o

requerente deve passar por um exame psicológico para o manuseio da arma de

fogo. O artigo quinto38, parágrafo 2º, determina que todos estes requisitos

devem ser periodicamente comprovados, por um prazo não inferior a 3 anos. É

necessário que o proprietário prove ao Estado que está apto a ter a posse da

arma e da munição, e que tal fato não oferece risco à sociedade.

Desde 2003, as empresas que comercializam arma de fogo são obrigadas

a informar suas vendas às autoridades competentes, bem como, obrigadas a

manter um banco de dados com todas as características da arma e a cópia dos

documentos acima elencados.

Conforme prevê o parágrafo 4º, do artigo 4º do Estatuto, as armas de

fogo, os acessórios e as munições estão sob a responsabilidade da empresa até o

momento da venda. De modo que, ela é a proprietária e responde legalmente

pelos equipamentos estocados.39

Outro avanço, tanto no que se refere à verificação das origens (da arma) e

na investigação de crimes, foi a introdução do inciso X, no artigo 2º, que

determina o cadastro e a identificação do cano da arma, das características e

impressões de raiamento e do microestreitamento do projétil disparado40.

Anteriormente, sem estas informações, era tarefa árdua para os investigadores

descobrirem todo o caminho percorrido pela arma e, consequentemente,

encontrar o responsável pelos crimes.

38 O certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu

proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou

dependência desses, ou, ainda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal

pelo estabelecimento ou empresa. (Redação dada pela Lei nº 10.884, de 2004). § 1º - O certificado de

registro de arma de fogo será expedido pela Polícia Federal e será precedido de autorização do Sinarm. §

2º - Os requisitos de que tratam os incisos I, II e III do art. 4º deverão ser comprovados periodicamente,

em período não inferior a 3 (três) anos, na conformidade do estabelecido no regulamento desta Lei, para a

renovação do Certificado de Registro de Arma de Fogo. (Lei 10.826, art. 5 e parágrafos 1º e 2º).

39 § 4

o - A empresa que comercializa armas de fogo, acessórios e munições responde legalmente por

essas mercadorias, ficando registradas como de sua propriedade enquanto não forem vendidas. (Lei

10.826, art. 4 e parágrafo 4°). 40

X – cadastrar a identificação do cano da arma, as características das impressões de raiamento e de

microestriamento de projétil disparado, conforme marcação e testes obrigatoriamente realizados pelo

fabricante. (Lei 10.826, art. 1º, X).

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39

A Lei 10.826/2003 também trouxe uma mudança significativa no que diz

respeito ao porte de arma. O Estatuto já inicia o Capítulo III, destinado a

regulamentação do porte com os seguintes dizeres: “Art. 6o - É proibido o porte

de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em

legislação própria [...].”

Percebe-se uma preocupação muito grande por parte do legislador em

controlar o número de armas que circulam nas ruas. Hoje, a regra é a proibição.

O cidadão não pode mais transportar consigo uma arma de fogo, salvo exceções.

Os incisos do artigo 6º indicam quem são as autoridades que não se enquadram

nesta regra, bem como, em quais situações um cidadão com a posse pode,

também, ter o porte de arma. Sem a necessidade de se adentrar nestas exceções,

citam-se apenas a título de exemplo, os integrantes das forças armadas e os

residentes em áreas rurais, maiores de 25 anos que dependam da arma para

prover a subsistência sua e de sua família.

Essa medida visa proteger os cidadãos bem intencionados que, ao

pensarem que podem garantir a sua defesa e a defesa de sua família, acabam

majorando o risco de um desastre.

Até 2005, apenas no Estado do Rio de Janeiro, a polícia registrava por

mês, em média, mais homicídios do que ocorre em um ano inteiro em alguns

países. Significativa parte desses crimes foi cometida por cidadãos que se

envolveram em alguma discussão de família, de vizinho ou em uma discussão de

bar e, naquele momento, infelizmente portavam uma arma. (MISSE, 2005, pg.

28).

Além disso, muitas pessoas que não dominam o manuseio de uma arma

acabam perdendo-a para os seus agressores, tornando-se vítimas de sua própria

arma, supostamente sua maior aliada.

O Instituto de Estudos da Religião (ISER) constatou que a chance de

morrer após tentar de se defender com uma arma de fogo em um assalto a mão

armada é 180 vezes maior. (CANO apud BOURGOIS).

Neste sentido, é um equívoco afirmar que os crimes estão circunscritos a

utilização de armas de fogo exclusivamente por infratores contumazes:

Podemos concluir que os crimes violentos não são cometidos apenas por bandidos, mas também por “pessoas do bem” que, não tendo antecedentes criminais, simplesmente por falta de capacidade para controlar a raiva e os rancores, tornam-se assassinas por motivos

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banais. As armas de fogo transformam os conflitos mais corriqueiros em tragédias. (GOMÉZ, pg.79.).

Estima-se que 500 mil pessoas em todo mundo morrem por ano, vítimas

de armas de fogo. Deste total, 200 mil óbitos são oriundos de homicídios,

suicídios e acidentes (BINGMER, 2005), ratificando, mais uma vez, que as

mortes provocadas por armas de fogo nem sempre são praticadas por meliantes

ou por pessoas com o porte ilegal.

Merece igual destaque as mudanças referentes aos crimes e às penas. O

artigo 10, da antiga lei, tipificava todas as condutas criminosas relacionadas às

armas, com uma aplicação da pena irrisória: um a dois anos de detenção e

multa. O Estatuto trata o assunto com a profundidade que lhe é devida. Ao todo,

são 10 artigos com diferenciação de pena, conforme o crime.

No Brasil, o porte ilegal de armas já foi considerado uma contravenção

penal ao invés de crime. E a pena para o tráfico ilegal era a mesma aplicada para

o tráfico de CDs.

Quanto ao tráfico ilegal de armas, o Estatuto criminalizou o ato de

importar, exportar e favorecer a entrada ou a saída de arma de fogo, acessório

ou munição do território nacional sem autorização da autoridade competente41.

Tais medidas deveriam inibir o traficante de armas e munições a alimentar o

comércio ilegal no Brasil.

Segundo pesquisa feita junto à Divisão de Fiscalização de Armas e Explosivos do Rio de Janeiro (DFAE-PCRJ), do total de armas apreendidas pela polícia de 1993 a 2003, 80% são armas de calibre permitido (revólveres e pistolas), 76% são brasileiras, 30% delas têm registro legal. (BOURGOIS, Josephine, 2005, p. 39)

Pode-se aferir a partir das informações acima que mais da metade das

armas que circulavam no país até 2003 foram adquiridas por meio ilegal. Este

percentual possui ligação direta com o número de homicídios. De acordo com o

Ministério da Saúde, 38.088 pessoas foram vítimas fatais por arma de fogo no

ano de 2002. O mesmo estudo informa que 64% do total de homicídios no país

41

Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de

fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente. Pena – reclusão de 4 (quatro) a 8

(oito) anos, e multa. (Lei 10.826, art. 18).

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41

são provocados por armas. Assim, o aperfeiçoamento no capítulo IV que trata

dos crimes e das penas, mostra-se imprescindível para uma redução no número

de homicídios e no comércio ilegal de armas.

Os Tribunais brasileiros têm enxergado a importância da aplicação das

normas do Estatuto do Desarmamento para a redução da criminalidade no país.

A decisão abaixo é um exemplo:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ARTIGO 14 DA LEI N. 10.826/2003. PERÍCIA DA ARMA. - COMPROVAÇÃO DE SUA POTENCIALIDADE LESIVA. DESNECESSIDADE. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. 1. A Terceira Seção deste Sodalício consolidou o entendimento de que o crime previsto no art. 14 da Lei 10.826/03 é de perigo abstrato, cujo objeto jurídico imediato é a segurança coletiva. 2. É irrelevante, portanto, a realização de exame pericial para a comprovação da potencialidade lesiva do artefato, pois basta o simples porte de arma de fogo, ainda que desmuniciada (como no caso em apreço), em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para a incidência do tipo penal. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. 42

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que, para se

configurar o crime de porte ilegal de armas, não é necessário expor alguém a um

risco real. Apenas a conduta de portar ilegalmente uma arma já é delituosa.

Assim, mesmo que não haja risco iminente de disparo, a posse da arma sem a

devida autorização é crime.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus que se

segue, reafirma a ideia de que o crime tipificado no artigo 14 do Estatuto é crime

de perigo abstrato.

2. CRIMES DE PERIGO ABSTRATO. PORTE DE ARMA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALDIADE. A Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) tipifica o porte de arma como crime de perigo abstrato. De acordo com a lei, constituem crimes as meras condutas de

42 BRASIL, SUPERIOR TRIBUNAL JUSTIÇA - Agravo Regimental no Recurso Especial: AgRg no

REsp 1294551 GO 2011/0285871-0 • Inteiro Teor. Min JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em

01/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-62 DIVULG 19-08-2014 PUBLIC 20-08-2014.

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42

possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo. Nessa espécie de delito, o legislador penal não toma como pressuposto da criminalização a lesão ou o perigo de lesão concreta a determinado bem jurídico. Baseado em dados empíricos, o legislador seleciona grupos ou classes de ações que geralmente levam consigo o indesejado perigo ao bem jurídico.43

Para tal interpretação, basta se atentar para os dizeres do artigo 144 da

Constituição Federal:44 “A segurança pública, dever do Estado, direito e

responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da

incolumidade das pessoas e do patrimônio [...]” O uso de uma arma, mesmo que

sem munição, já é o suficiente para colocar em risco a segurança dos cidadãos

sendo, portanto, dever do Estado coibir estas condutas.

Um dado interessante: pesquisas indicam que no Reino Unido, 70% dos

crimes supostamente cometidos por armas de fogo eram praticados com

réplicas de armamento (BANDEIRA; BOURGOIS, 2005). Isso significa que a

presença da arma, mesmo sendo uma réplica, já é suficiente para causar pânico

e desordem. Deste modo, parecem acertadas as decisões que vem sendo

proferidas pelos Tribunais brasileiros, no sentido de aplicar a sanção prevista no

artigo 14 do Estatuto para aqueles que ilegalmente portarem uma arma.

Neste contexto, há de se destacar o trabalho do Conselho Nacional de

Justiça (CNJ). Em 2011, entrou em vigor a resolução 13445 que trata da

destinação das armas apreendidas pelo Poder Judiciário. Dentre as previsões já

contidas no artigo 25 do Estatuto, como o encaminhamento da arma apreendida

ao Comando do Exército após a persecução penal, o CNJ ainda veda a carga, a

cessão ou depósito de arma durante o inquérito ou durante o processo judicial,

43

BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC 104410, Relator: Min. GILMAR MENDES,

Segunda Turma, julgado em 06/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-062 DIVULG 26-03-2012

PUBLIC 27-03-2012 44 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:

Senado Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>.

Acesso em 27 Ago. 2014.

45 BRASIL. Resolução nº134 de 21 de junho de 2011. Conselho Nacional de Justiça. Dispõe sobre o

depósito judicial de armas de fogo e munições e a sua destinação. Disponível em:

http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/resolucoespresidencia/14846-resolucao-n-

134-de-21-de-junho-de-2011. Acesso em 15 set.2014.

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43

bem como o recebimento de armas de fogo ou munição sem vinculação a um

boletim de ocorrência ou a um processo.

O CNJ preocupou-se, ainda, em incluir nos mutirões de remessa de

armas de fogo ao Comando do Exército, os Ministérios Públicos, Ordem dos

Advogados do Brasil, Defensorias Públicas e Sociedade Civil, se assim

desejarem. O trabalho conjunto entre o Estado, sociedade civil e outros

institutos já provou o quão eficaz é a parceria no combate ao desarmamento.

Em 2001, fruto de cooperação entre o Governo do Estado do Rio de Janeiro,

Exército e a ONG Viva Rio, cem mil armas foram destruídas em público, no Rio

de Janeiro. (BOURGOIS, 2005. p.37.).

A medida visa a reduzir o risco de furto, roubo ou desvio de finalidade

das armas apreendidas pelo Poder Judiciário. De acordo com o levantamento

feito pelo Sistema Nacional de Bens Apreendidos (SNBA), existem 755,2 mil

armas (brancas e de fogo) apreendidas por decisão judicial. Um número

considerável destas armas já foi submetido ao laudo pericial e não mais

necessita estar de posse do Poder Judiciário para o esclarecimento do crime em

questão. Neste sentido, o artigo 5º da resolução do CNJ determina que em 180

dias as armas depositadas no âmbito do Poder Judiciário devem ser

encaminhadas ao Comando do Exército, salvo se ainda for necessário a sua

permanência nas dependências do Judiciário. O despacho que decidir pela

retenção da arma deverá ser fundamentado. Caso contrário, as armas serão

encaminhadas para doação ou destruição.

É evidente que para combater a criminalidade, são necessárias

modificações em vários setores da administração: aperfeiçoamento do sistema

judiciário, melhoria na qualidade da educação, diminuição da desigualdade

social, valorização e controle da atividade policial, investimento em

infraestrutura e equipamentos utilizados no combate a violência.

Somente um conjunto de ações seria capaz de reestruturar o cenário da

segurança pública no país. Contudo, os resultados destas reformas serão vistos

em longo prazo. A reestruturação legislativa, que veio através do Estatuto do

Desarmamento e as campanhas maciças do governo em desarmar a população

revelam-se como resposta imediata e eficaz para a redução de homicídios por

armas de fogo no Brasil.

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44

2.1. SINARM e SIGMA

O SINARM (Sistema Nacional de Armas), criado pelo Mistério da Justiça,

no âmbito da Polícia Federal, foi estabelecido pela Lei 9.437/199746 e possui

circunscrição em todo o território nacional. Esse sistema foi implantado com o

intuito de centralizar os registros e autorizações de porte de armas que, até

então, eram feitas pelas polícias estaduais. Viu-se a necessidade de adoção deste

sistema, já que era inviável o controle em nível nacional, pois não havia

comunicação dos dados estaduais. A inexistência deste controle inviabilizava o

conhecimento exato do número de armas circulantes no país, o que era

extremante danoso para o combate do tráfico ilegal de armas.

O Estatuto do Desarmamento acrescentou ao SINRAM outras

competências, a fim de viabilizar e sofisticar o banco de informações acerca das

armas, desde o seu surgimento até sua possível destruição. Dentre as

competências trazidas pelo Estatuto, destacam-se:

Art. 2º - Ao Sinarm compete: [...] IX – cadastrar mediante registro os produtores, atacadistas, varejistas, exportadores e importadores autorizados de armas de fogo, acessórios e munições; [...] XI – informar às Secretarias de Segurança Pública dos Estados e do Distrito Federal os registros e autorizações de porte de armas de fogo nos respectivos territórios, bem como manter o cadastro atualizado para consulta.

Desde 2003 passou a ser obrigatória a autorização do SINARM para a

comercialização de armas e munições entre pessoas físicas47. Ademais, todo o

procedimento necessário para se obter a autorização para a posse de arma passa

pelo SINARM.

Vale destacar que o SINARM é responsável pelo cadastro dos registros

das armas de fogo institucionais da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária

Federal, das Polícias Civis, das Guardas Municipais e demais órgãos,

instituições, corporações e seus integrantes, elencadas no artigo 1º, § 1º, do

Decreto 5.123/2004:

46

BRASIL. Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997. Institui o Sistema Nacional de Armas – SINARM:

estabelece condições para o registro e para o porte de arma de fogo, define crimes e dá outras

providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9437.htm>. Acesso em 27

Ago. 2014. 47

Artigo 4º, parágrafo 5º da Lei 10.826 e artigo 14 do Decreto 5.123/2004.

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45

§ 1º - Serão cadastradas no SINARM: I - as armas de fogo institucionais, constantes de registros próprios: a) da Polícia Federal; b) da Polícia Rodoviária Federal; c) das Polícias Civis; d) dos órgãos policiais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, referidos nos arts. 51, inciso IV, e 52, inciso XIII da Constituição; e) dos integrantes do quadro efetivo dos agentes e guardas prisionais, dos integrantes das escoltas de presos e das Guardas Portuárias; f) das Guardas Municipais; e g) dos órgãos públicos não mencionados nas alíneas anteriores, cujos servidores tenham autorização legal para portar arma de fogo em serviço, em razão das atividades que desempenhem, nos termos do caput do art. 6o da Lei no 10.826, de 2003.

Já o SIGMA (Sistema e Gerenciamento Militar de Armas) foi instituído

pelo Decreto 5.123/200448, no âmbito do Comando do Exército, com

circunscrição em todo território nacional, conforme preceitua o artigo 2º. O

objetivo deste sistema é manter de modo permanente e integralizado o cadastro

geral de armas de fogo importadas, produzidas e comercializadas em território

nacional, além das armas de testes e avaliação técnica, armas de fogo de

colecionadores, atiradores, caçadores e as armas obsoletas. Compete ainda ao

SIGMA cadastrar as armas de fogo institucionais das Forças Armadas, das

Polícias Militares, da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) e demais

instituições e seus integrantes, previstas no §1º, do artigo 2º, do decreto que o

criou.

São importantes e eficientes os benefícios trazidos por estes sistemas de

gerenciamento e controle de armas de fogo. Hoje, o monitoramento do fluxo de

armas no Brasil é demasiadamente mais avançado em relação à legislação

anterior ao Estatuto do Desarmamento. Isto contribui diretamente para o

combate ao tráfico ilegal de armas e justa penalização para os que utilizam as

armas ilegais para cometerem diversas modalidades de crimes.

48

BRASIL. Lei nº 5.123, de 1º de julho de 2004. Regulamenta a Lei no 10.826, de 22 de dezembro de

2003, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema

Nacional de Armas - SINARM e define crimes. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil],

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5123.htm>. Acesso

em 27 Ago. 2014

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46

Para que estas operações continuem avançando é desejável a integração

dos dois sistemas, a fim de que os desvios de armas sejam reduzidos e que haja

maior sucesso na descoberta do(s) autor(es) do(s) crime(s). Em 2006, a Câmara

dos Deputados através da Comissão Parlamentar de Inquérito do Tráfico de

Armas, solicitou ao Poder Executivo a integração dos cadastros do SINARM e do

SIGMA.

Assim, tanto a Polícia Federal quanto o Exército Brasileiro têm

trabalhado em estratégias que possibilitem o compartilhamento de dados e

informações acerca das armas de fogo no Brasil.

2.2. Direito Comparado

O Direito Comparado apresenta-se na atualidade como uma ferramenta

jurídica eficaz no que tange ao desenvolvimento e a inovação legislativa.

A população mundial tem se voltado nas últimas décadas à questão do

aumento da violência e dos índices de homicídio, sobretudo daqueles causados

por armas de fogo. Experiências internacionais revelam que as campanhas de

desarmamento e a implementação de legislações mais rígidas têm reduzido

substantivamente o número de mortes por arma de fogo. As reduções vão muito

além do número de assassinatos planejados. Houve um decréscimo no número

de suicídios e acidentes provocados por discussões irrelevantes, conforme já

demostrado ao longo deste estudo.

A Austrália nos apresenta um bom exemplo. Em 1997, o maior país da

Oceania iniciou uma profunda reforma em sua legislação referente a posse de

arma e deu início à campanha de entrega voluntária do armamento mediante

indenização. O resultado foi a devolução e a destruição de mais de 640 mil

armas, o que equivalia a quase um sexto do arsenal bélico nas mãos de civis.

Cinco anos mais tarde, observou-se uma diminuição de 28% no número de

mortes por homicídios, acidentes e suicídios (PETERS, 2005).

Neste contexto, é importante esclarecer, mais uma vez, que um número

considerável de mortes por armas de fogo se dá por suicídio, balas perdidas,

brigas no trânsito, na vizinhança e na família. De acordo com a Polícia Civil do

Rio de Janeiro, a cada seis dias uma pessoa morre vítima de bala perdida,

naquele estado. (BOURGOIS, 2005)49. Segundo a pesquisa desenvolvida pelo

49

Outros detalhes sobre a discussão acerca de mortes por balas perdidas ver o item 1.5 deste estudo.

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47

Professor David Hemenway da Universidade de Harvard, “onde tem mais armas

tem mais suicídios50” (HEPBURN e HEMENWAY, 2004).

Como em muitos outros países desenvolvidos, cerca de três quartos das mortes causadas por armas de fogo são suicídios. Essas armas estão envolvidas em cerca de 16% dos homicídios, mas em torno de 20% de assassinatos familiares. Elas constituem as armas preferidas em incidentes homicidas com múltiplas vítimas.” (PETERS, 2005. p. 65.).

Na Austrália, o número de homicídios em 1996 era de 523. Após a

mudança da lei, este número caiu para 299, em 2002. Os australianos

desenvolveram a nova legislação sob o argumento de que a população armada

majorava os gastos com a saúde pública, visto que, quanto mais pessoas feridas,

maior o gasto com medicamentos e políticas de recuperação (PETERS, 2005).

A noção do “direito” em ter uma arma passou a ser vista como um

privilégio. Se o cidadão quisesse possuir uma arma, deveria obedecer

rigorosamente a uma série de pré-requisitos. A autodefesa já é não argumento

plausível para se ter uma arma.

Outro aspecto interessante, acrescido à legislação australiana, foi proibir

a posse de arma a pessoas envolvidas em casos de violência doméstica. Lá, a

maior parte dos homicídios é fruto da violência doméstica. Se praticasse esse

tipo de restrição, o Brasil só teria a avançar. De acordo com a pesquisa realizada

pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), estima-se que entre

2009 e 2011, 16,9 mil mulheres morreram por conflito de gênero (IPEA, 2010).

Segundo o estudo, 50% dos feminicídios envolveram o uso de armas de fogo.51

Ainda segundo o Relatório Global sobre Homicídios 2013, lançado pelo

Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), em abril de

2014, somente em 2012, o Brasil, onde vive quase 3% da população mundial,

registrou 50.108 homicídios, aproximadamente 10% de um total de 437 mil

ocorridos em todo o mundo. O documento informa que “as vítimas brasileiras

são em sua maioria homens (90%). No entanto, destaca-se no relatório o 50

Tradução de ―Where there are more guns there is more homicide‖ (HEPBURN e HEMENWAY,

20049:417). 51

Ainda segundo a pesquisa, 34% dos feminicídios foram com o uso de instrumento perfurante, cortante

ou contundente. Enforcamento ou sufocação foi registrado em 6% dos óbitos. Maus tratos – incluindo

agressão por meio de força corporal, força física, violência sexual, negligência, abandono e outras

síndromes de maus tratos (abuso sexual, crueldade mental e tortura) – foram registrados em 3% dos

óbitos. Um resumo executivo da pesquisa e com mais detalhes pode ser acessado em:

http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/130925_sum_estudo_feminicidio_leilagarcia.pdf.

Acesso em 20.set.2014.

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48

número de mulheres assassinadas em situações de violência doméstica. O

homicídio praticado pela família ou por parceiros da vítima afeta dois terços

destas vítimas de homicídio globalmente, ou seja, 43,6 mil, enquanto os homens

representam um terço, 20 mil. Quase metade de todas as mulheres vítimas de

homicídio em 2012 foi morta por parceiros ou membros da família. Desta

forma, a pesquisa deixa evidente o grande número de mulheres vítimas de

assassinatos cometidos por pessoas de quem se esperava zelar por elas”.52

52

Informações obtidas em ―Determinantes Sociais da Saúde – Portal e Observatório sobre Iniquidades em

Saúde‖. Fonte: http://dssbr.org/site/2014/05/relatorio-da-onu-lancado-mundialmente-em-abril-mostra-

que-brasil-registrou-cerca-de-11-dos-homicidios-ocorridos-no-mundo-em-2012/. Acesso em 10.out.2014.

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49

3. ESTUDOS E EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS NO

CONTROLE DE ARMAS

Inicialmente é necessário expor que o debate internacional sobre o

controle das armas de fogo está longe de alcançar consenso. As nações exercem

a soberania sobre tal questão a partir de diferentes referências culturais e

históricas. Contudo, notamos uma intenção política favorável ao desarmamento

defendida por relevantes organizações internacionais multilaterais que exercem

forte influência sobre os países, como é o caso da Organização das Nações

Unidas (ONU).

No recente debate internacional promovido na 66ª Sessão do Comitê

sobre o Desarmamento, da Assembleia Geral da ONU, em 11 de outubro de

2011, relativo ao desarmamento civil, o tema foi novamente debatido. A retórica

difundida pela ONU (2014) em torno de uma cultura global de paz reconhece

que o desenvolvimento de regimes democráticos depende, cada vez mais, de

políticas e práticas legais capazes de produzir um mundo mais seguro, justo e

previsível. De modo que, o controle da produção e disseminação de armas de

destruição em massa, bem como a regulação e a limitação do acesso às armas

convencionais foram tratadas como requisitos fundamentais sobre o

desenvolvimento dos países.

Por outro lado, a adesão dos países a tal perspectiva depende de variáveis

como a origem histórica, política e cultural das nações modernas. O direito de

portar armas não implicou necessariamente em uma relação causal

determinística com a expansão da violência entre todas as nações. Em

contextos distintos as armas possuem significado social e cultural também

distinto. Não há um universalismo sobre tal questão. Observam-se, não

obstante, tendências que apontam caminhos e possibilidades de construção de

novos significados sobre o lugar das armas nas sociedades.

3.1. Panorama sobre a questão do desarmamento no contexto internacional

Além das experiências já citadas, nos referimos a Suíça, por exemplo, país

que apresenta taxas de violência situadas entre os níveis mais baixos do planeta.

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50

Lá, as armas de fogo estão presentes nos domicílios de praticamente todos os

cidadãos. Elas são entregues gratuitamente pelo governo após o cumprimento

do serviço militar obrigatório.

Já o Japão, país com níveis baixos de violência armada, as armas foram

proibidas desde o término da 2ª Guerra Mundial, em 1945 (OMS, 2009). Ambos

os países, Suíça e Japão são nações desenvolvidas e com níveis baixos de

violência interna. Porém, seguem caminhos opostos em relação ao controle

estatal das armas de fogo sobre a vida social em seus territórios nacionais.

Portanto, fatores culturais, sociais e políticos são relevantes na compreensão

acerca da produção da violência associada à posse e uso de arma de fogo e no

controle, pelo Estado, da violência, em geral.

Há casos de países com níveis baixos de violência armada que nas

últimas décadas tornaram mais rígida a legislação de controle desses

equipamentos dos seus cidadãos. No Canadá, por exemplo, desde 1995 foi

adotada lei para exercer maior controle sobre a disseminação de armas de fogo

em seu território. O objetivo da lei estava diretamente relacionado com a

intenção de diminuir a ocorrência de violência armada, de modo que tornou

obrigatória a autorização de porte e a verificação de antecedentes criminais,

embora a lei canadense permita o porte de armas de fogo para os indivíduos de

12 a 18 anos, autorizados por seus responsáveis (POSSESSION AND

ACQUISITION LICENCE - PAL, 2014). Segundo o Instituto Nacional de

Pesquisa do Canadá, com a nova legislação, o número de armas roubadas

diminuiu (30% entre 1998 e 2001). A taxa de homicídios com arma de fogo caiu

35% desde o início da década de 1990 (0,55 por 100 mil habitantes).

Kopel (1991) analisa o sistema canadense de controle de armas para

considerar se ele pode servir como um modelo para a reestruturação das leis de

controle de armas nos Estados Unidos. O texto abrange desde as liberdades

civis, o modelo de polícia até variáveis sociológicas quanto ao uso de armas.53

No Canadá, escopetas, rifles de cano curto serrado e silenciadores são

completamente ilegais. Armas automáticas são legais apenas se elas foram

53

O título do artigo de Kopel (1991) é: ―Canadian Gun Control: Should the United States Look North for

a Solution to its Firearms Problem‖, que pode ser assim traduzido: controle de armas do Canadá:

deveriam os Estados Unidos olharem para o norte por uma solução para o seu problema de armas de

fogo?

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51

registradas pelo seu proprietário antes de Janeiro de 1978, a data de vigência da

nova lei.

Os canadenses que desejam comprar qualquer tipo de arma devem

adquirir um Certificado de Aquisição de Armas de Fogo (sigla em inglês, FAC)

da polícia. Para compradores de quase todas as armas longas (rifles e

espingardas), o FAC é o único passo legal necessário. O FAC dá direito a

comprar a maioria das armas longas em qualquer lugar no Canadá. A polícia

pode rejeitar um candidato se acreditar que "é do interesse da segurança do

requerente ou de qualquer outra pessoa que o candidato não deva adquirir uma

arma de fogo". Já as "armas de mão" (pistolas/revólveres) são todas restritas.

Para receber um Certificado de Registro de Arma Restrita, o requerente precisa

provar que a arma será usada para um dos quatro objetivos: (1) para proteger a

vida, onde outro tipo de proteção é inadequada; (2) em conexão com uma

profissão legal ou ocupação; (3) para uso na prática de alvo sob os auspícios de

um clube de tiro; e (4) como parte de uma coleção de armas por um autêntico

colecionador.

São apontados alguns autores que acreditam que, em alguns casos, como

nos Estados Unidos, o controle de armas já não é mais possível porque a posse

de armas é muito difundida. O sistema de controle promulgado em 1977 rendeu

poucas evidências palpáveis de sucesso; e os estudos que se propõem a mostrar

resultados positivos a partir da lei de 1977 são, geralmente, de competência

duvidosa. O autor afirma que o maior benefício da lei parece ser simbólico, uma

vez que existe pouca evidência empírica para demonstrar que as leis de controle

de armas canadense realmente reduzem a criminalidade.

Há casos de alterações na legislação em função de acontecimentos

pontuais, mas de grande repercussão pública e midiática como foi o caso de um

assassinato em massa, na Nova Zelândia. Na década de 1990 um cidadão, após

uma discussão com o vizinho, usou sua arma e começou a atirar contra as

pessoas que estavam à sua volta, matando 13 indivíduos, com um rifle

semiautomático, no município de Aramoana54. Após esse episódio, o governo do

54

Segundo relatos variados encontrados na Internet sobre o caso de Aramoana, David Gray, 33 anos,

desempregado, começou a matar pessoas indiscriminadamente com um rifle semiautomático, depois de

uma briga verbal com o seu vizinho. Ele atirou em vizinhos e em uma família que estava visitando o

município, matando treze pessoas, incluindo o sargento da polícia local, Stewart Guthrie. Após uma

cuidadosa procura casa-a-casa no dia seguinte, policiais localizaram Gray, numa gruta, e atiraram nele,

matando-o. Dentro da gruta a polícia encontrou um rifle 22 Winchester equipado com um silenciador,

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país adotou um sistema de licenciamento mais rigoroso, exigindo fotos dos

proprietários de armas de fogo e renovações periódicas, pagamento de seguro,

além de exames para averiguar o conhecimento das leis vigentes.

No contexto sul-americano e caribenho, que se aproxima mais ao

contexto sociocultural e político do Brasil, resguardada as inúmeras diferenças

que há entre os países que o integram, destaca-se o caso da política de

prevenção à violência na Colômbia, através da qual a legislação local restringiu o

porte de armas de fogo nas municipalidades de Bogotá (de 1995 a 1997) e Cali

(de 1993 a 1994) em dias de feriados e fins de semana. Nos demais dias o porte

estava submetido ao pagamento de tributo. O controle foi exercido através de

operações policiais (VILLAVECES ET AL, 2000). Como resultado das ações,

segundo Villaveces et al. (2000), houve queda do volume médio de homicídios

registrados para tais localidades naquele período.

De 1995 a 1997, em Cali, encontramos taxas homicídios 14% menor (IC 95%, 3% -24%) do que o esperado durante períodos em que a proibição de transportar armas de fogo estava em vigor. Em Bogotá, a incidência foi 13% menor (IC 95%, 1% - 24%) durante os períodos de intervenção (VILLAVECES ET AL, 2000, p. 1.209).

Em El Salvador, uma campanha de prevenção da violência ocorrida a

partir de agosto de 2005 tornou ilegal portar armas de fogo em espaços públicos

como parques, escolas, praças, centros de recreação e outros locais dessa

natureza. Nesta ação a veiculação midiática publicitária em torno dos objetivos

da campanha foi considerada relevante para a difusão das ideias em torno do

desarmamento e também para gerar maior cooperação dos cidadãos junto ao

trabalho policial, favorecendo a capacidade da polícia em fazer cumprir a

proibição de armas de fogo (CANO, 2006). Segundo o autor, a ação provocou

inicialmente uma queda de cerca de 47% no número de homicídios registrados

mensalmente nos municípios participantes (mais populosos). Aliado a isso, foi

introduzido, via mudança na legislação, um controle nacional sobre o registro

das armas de fogo, possibilitando assim o rastreio dos equipamentos, fator que

também pode ser relacionado à diminuição dos crimes armados no país (CANO,

uma espingarda de ar, centenas de cartuchos de munição. Gray estava carregando um rifle Remington e

um rifle Norinco , quando foi baleado. A polícia disparou entre 50 e 60 tiros, e pelo menos 150 policiais

estavam envolvidos na operação. Este foi considerado o pior tiroteio criminoso da história de Nova

Zelândia.

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53

2006). Outra ação relevante, em 2005, foi a criação de um tributo sobre a

comercialização de armas de fogo cuja finalidade era de gerar fundos para o

sistema de saúde.

Registram-se casos de proibição geral, como na Jamaica, que desde 1974

atestou legislação proibindo a compra e a posse de qualquer espécie de arma de

fogo ou de munição pela população civil, ou seja, armas de fogo são legalmente

permitidas somente para os agentes estatais representantes dos setores de

segurança.

O Reino Unido igualmente viveu uma experiência digna de nota. Em

1997, através do Firearmact, o Reino Unido proibiu a posse da arma de fogo. O

número de homicídios caiu de 74 em 1993 para 59 em 1997. Entre 1999 e 2000

foram 62 homicídios.

As campanhas de entrega voluntária de armas anistiando os que tinham a

posse ilegal também foram exitosas. Em 1996, foram entregues 22.939 armas e

em 2003, 43.908.

Finalmente, o Japão se destaca por ser um dos país com o menor índice

de homicídios por armas de fogo do mundo: 0,03 a cada 100 mil habitantes.

Desde 1945 é proibido o porte de arma de fogo e fuzil. No país inteiro, menos de

50 pessoas são autorizadas a portarem uma arma, isto porque, são atletas

olímpicos que disputam alguma modalidade tiro. (BANDEIRA; BORGOIS

2005). A dificuldade do Japão, atualmente, é controlar o contrabando de armas.

Em “Japanese Gun Control”, David B. Kopel (1993) trata da experiência

do Japão com armas. O relato informa que os japoneses podem adquirir apenas

espingardas e/ou pistolas de ar comprimido. O processo de licenciamento no

Japão é bastante rigoroso. Um proprietário potencial de arma deve, primeiro,

assistir aulas presenciais e passar por um teste escrito. Feito isto, ele deverá

frequentar aulas de tiro e passar por uma prova de tiro. O processo inclui um

"teste mental" simples em um hospital local para garantir que o requerente não

sofra de uma doença mental facilmente detectável, um atestado médico que

comprove que ele é mentalmente saudável e não é viciado em drogas, além de

uma investigação dos antecedentes criminais do candidato e dos seus parentes

mais próximos.

A posse ilegal de armas, como a posse de drogas ilegais, é uma ofensa

consensual no Japão. Assim, a fim de encontrar armas ilegais, a polícia japonesa

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tem amplo poder de busca e apreensão. A lei básica de armas de fogo permite a

um policial revistar os pertences de um cidadão se julgar que há suspeita

suficiente de que a pessoa esteja carregando uma arma. Na prática, a lei especial

para busca de armas não é necessária, já que a polícia rotineiramente as

procura.

No Japão, o sistema jurídico funciona como uma autoridade onipotente e

unitária do Estado. Todos os administradores responsáveis pela aplicação da lei

são nomeados pela Agência Nacional de Polícia e recebem o financiamento

dessa agência. O Governo japonês promove um clima social para o controle de

armas pelo bom exemplo de desarmar a si mesmo. A polícia tem apenas

revólveres de calibre 38 especiais, não os revólveres de 9 milímetros de alta

capacidade, muitas vezes usados pela polícia americana. E nenhum policial

pode portar sua arma após o expediente, devendo sempre deixá-la na delegacia.

Conclui-se, pelo texto de Kopel (1993), que o controle de armas do Japão

tem um papel importante no baixo índice de criminalidade japonesa, mas não

por causa de alguma relação simples entre a quantidade de armas e crime, mas

pelo fato de o controle de armas estar inserido na cultura social japonesa.

Estudo produzido por Antônio Rangel Bandeira e Josephine Bourgois

para a ONG Viva Rio, por ocasião do debate acerca do Referendo sobre o

Desarmamento comprova que nos Estados Unidos, país conhecido pela

facilidade no acesso a armas de fogo, há décadas são feitos estudos exaustivos

sobre os benefícios e riscos do uso de armas na prevenção de assaltos e

homicídios. Por exemplo, uma pesquisa feita entre 1987 e 1992, naquele país,

constatou que não é frequente o uso de armas de fogo como autodefesa porque

os criminosos geralmente agem de forma furtiva e de surpresa. Poucas vítimas

têm tempo suficiente e habilidade para usarem sua arma.

Outro estudo, referente ao período 1987-1990, e analisando os dados

oficiais da Pesquisa Nacional sobre Vítimas de Crimes, concluiu que, em média,

menos de dois homicídios em mil foram cometidos devido à resistência com

arma. A mais provável explicação é o fato de que as armas de fogo são

raramente usadas para inibir o assalto de uma residência, porque poucos

proprietários de arma têm tempo suficiente para localizar e pegar sua arma e se

defender preventivamente. (BANDEIRA; BOURGOIS, 2013, pp. 13- 16).

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55

O trabalho de Bandeira e Bourgois apresenta uma série de outros dados e

pesquisas: segundo o governo norte-americano, “para cada sucesso no uso

defensivo de arma de fogo em homicídio justificável, houve 185 mortes com

arma de fogo em homicídios, suicídios ou acidentes”. Dados da Revista de

Criminologia dos Estados Unidos apontam que muitos proprietários de arma de

fogo acreditam que elas sejam úteis para autodefesa. Mas uma arma em casa

tem muito mais chance de ser usada em homicídio, suicídio e acidente dentro de

casa do que contra um assaltante. Pesquisa da Universidade da Califórnia,

coordenada pelo médico epidemiologista Douglas Wiebe, concluiu que, no

Estado, “pessoas com armas em casa têm duas vezes mais possibilidades de

serem mortas por armas de fogo do que aquelas que não as possuem, e 16 vezes

mais chances de cometer suicídio. Mais de 56% das vítimas de arma de fogo

conheciam seus assaltantes; destas, 15% durante brigas familiares e 6% por

disputas por drogas”. (BANDEIRA; BOURGOIS, 2013, pp. 13- 16).

Em “The Effectiveness of Gun Control Laws: Multivariate Statistical

Analysis” (A Eficácia das Leis de Controle de Armas: Análise Estatística

Multivariada) de Ik-Whan G. Kwon, Bradley Scott, Scott R. Safranski & Muen

Bae (1997) utiliza modelos de regressão linear para avaliar a relação entre o

número de mortes por arma em 1990 e os conjuntos de determinantes que

incluem leis e regulamentos estaduais que regem o uso de armas de fogo nos

Estados Unidos. Os resultados do estudo indicam que as leis de controle de

armas têm um efeito leve sobre o número de mortes por arma, enquanto as

variáveis socioeconômicas, tais como nível de pobreza, a taxa de desemprego e

consumo de álcool, tem um impacto significativo sobre as mortes por armas de

fogo.

Este estudo examinou a eficácia das leis e regulamentos de controle de

armas utilizando dados estaduais. Se, no entanto, os Estados Unidos tivessem

tido uma lei de controle de armas uniforme semelhante à lei canadense de 1977,

o impacto poderia ter sido mais forte do que o que foi constatado, que se baseia

em sistemas de leis que variam significativamente entre os estados. Este estudo

ainda cogita que, se bem aplicada, a "lei Brady"55 poderia obter um impacto

55

A partir de 1980, como consequência do crescimento da criminalidade violenta nos Estados Unidos,

houve mudanças na legislação. Tais mudanças possibilitaram a oportunidade de se identificar o efeito

causal entre armas e crimes. Em 1993, o Congresso americano adotou o Brady Handgun Violence

Prevention Act, lei que aumentou o controle sobre aquisição de armas de fogo pelos cidadãos. Por outro

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56

significativo sobre a diminuição do número de mortes associadas ao uso de

armas de fogo.

No entanto, este estudo mostra que a maior associação de mortes por

armas de fogo é com os fatores socioeconômicos, tais como os níveis de pobreza

e consumo de álcool. Ou seja, a menos os Estados Unidos direcionem seus

esforços para os males socioeconômicos que parecem ter uma relação mais forte

com mortes violentas por armas de fogo, as mortes provavelmente continuarão,

havendo leis de controle de armas ou não.

Uma ampla análise da literatura sobre armas e crimes foi feita por Daniel

Ricardo de Castro Cerqueira56 que mapeou vários trabalhos acadêmicos que

vem sendo produzidos nos últimos anos motivados pelo incremento da

criminalidade violenta que ocorreu principalmente na segunda metade dos anos

de 1980, nos Estados Unidos.

Segundo esse autor, vários estudiosos57 procuram evidenciar a relação

entre “mais armas e mais crimes” utilizando os seguintes argumentos:

(i) O indivíduo que possui uma arma de fogo fica encorajado a dar respostas violentas para solução de conflitos interpessoais; (ii) o possuidor de armas fica com poder para coagir; (iii) do ponto de vista do criminoso, a posse de arma de fogo faz aumentar a produtividade e diminuir o risco do perpetrador cometer crimes, além de (iv) aumentar a facilidade e o acesso e, consequentemente, diminuir o custo da arma pelo criminoso no mercado ilegal. (CERQUEIRA, 2014, p. 91).

Há alguns estudos que procuram evidenciar a relação “mais armas,

menos crimes”58. Para esses autores, segundo Cerqueira (2014, p. 91 – 92), a

difusão de armas na população repercutiria na diminuição da taxa de crimes,

notadamente, os crimes contra o patrimônio, “uma vez que o uso defensivo da

arma de fogo (defensive gun use) pelas potenciais vítimas faria aumentar o

custo esperado, para o perpetrador, de cometer crimes”. (CERQUEIRA, 2014, p.

91 – 92).

lado, a partir de 1987, trinta e um estados americanos aprovaram legislações que permitiam que os

cidadãos tivessem licença para circular portando armas de fogo. (CERQUEIRA, 2014, pp. 103 – 104). 56

CERQUEIRA, Daniel (2014). 57

DUGGAN (2001); SHERMAN, SHAW e ROGAN(1995); STOLZENBERG e D’ALESSIO (2000);

MCDOWALL (1991); MACDOWALL, LOFTIN e WIERSEMA (1995); COOK e LUDWIG (1998,

2002); SLOAN et al. (1990); LUDWIG (1998) E NEWTON e ZIMRING ((1996). 58

BRONARS e LOTT (1998); LOTT e MUSTARD (1997); KLECK (1997) e BARTLEY E COHEN

(1998).

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57

Os estudos citados não alcançaram um consenso acerca do efeito causal

das armas de fogo sobre os crimes: “possivelmente isso decorra de dificuldades

relativas às metodologias envolvidas, que passam pela busca de uma medida

confiável de prevalência de armas de fogo nas cidades, além dos clássicos

problemas de simultaneidade e de variáveis omitidas.” (CERQUEIRA, 2014, p.

92).

Porém, a conclusão geral da revisão da literatura feita por Daniel

Cerqueira envolvendo armas e crimes indica uma relação positiva entre essas

duas variáveis, conforme podemos observa na Tabela 6 (abaixo), principalmente

quando se trata da relação entre armas de fogo e homicídios e suicídios.

TABELA 6– Armas e crimes segundo vários autores

Artigo Localidade Período Método Resultados em relação às armas

Lester (1991) 16 nações europeias

1989 Correlação Alta correlação com homicídios por PAF

Killias (1993) 14 países desenvolvidos

1989 Correlação Alta correlação com homicídios e com suicídios com e sem o uso de arma

Sloan et al. (1988)

Seattle e Vancouver

1980 a 1986

Comparação de diferença de médias

Correlação com lesões dolosas por PAF e com homicídios por PAF

Kellermann et al. (1993)

EUA (Tennessee, Washigton e Ohio)

1987 a 1992

Regressão logística

A posse da arma é um fator de risco para algum familiar sofrer um homicídio

Kleck (1979) EUA (dados agregados)

1947 a 1973

2SLS Elasticidade em relação aos homicídios = 0,4

Cummings et al. (1997)

EUA (dados por setor censitário)

1940 a 1993

Regressão logística

A arma em casa dobra a probabilidade de alguém sofrer suicídio ou homicídio no domicílio

McDowall (1991) EUA (Detroit) 1951 a 1986

GLS com variáveis instrumentais

Elasticidade em relação aos homicídios = 1,3

Lester (1991) 16 nações europeias

1989 Correlação Alta correlação com homicídios por PAF

Stolzenberg e D’Alessio (2000)

EUA (Carolina do Sul)

1991 a 1994

OLS com efeito fixo

Crimes violentos, crimes praticados com armas e crimes perpetrados por jovens respondem à disponibilidade de armas ilegais, mas não de armas legais

Cook e Ludwig (2002)

EUA (dados por cidade)

1987 a 1998

IV2SLS Elasticidade da arma em relação às invasões a domicílios entre 0,3 e 0,7

Moody e Marvell (2002)

EUA (dados por estado)

1977 a 1998

Pooled OLS Não há relação de causalidade entre armas e crimes

McDowall, EUA (grandes 1973 a Modelos de A SI não teve efeito sobre os

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58

Loftin e Wiersema (1995)

cidades da Flórida, Mississipi e Oregon)

1982 intervenção baseado em ARIMA

homicídios, mas fez crescer os homicídios por PAF

Lott Jr e Mustard (1997)

EUA (dados por cidades e estados)

1977 a 1992

Pooled OLS e IV2SLS

A SI fez diminuir os crimes violentos

Duggan (2001) EUA (dados por cidades e estados)

1980 a 1998

Regressão em diferenças

Elasticidade em relação aos homicídios = 0,2 e não houve efeito da SI sobre crimes

Bartley e Cohen (1998)

EUA (por cidades)

1977 a 1992

Regressão (extreme bound analysis)

A SI levou a uma diminuição dos crimes violentos

Ludwig (1998) EUA (dados por estados)

1977 a 1994

Diferenças em diferenças em diferenças

O efeito da SI ou foi nulo ou foi no sentido de aumentar o homicídio de adultos

Bronars e Lott Jr (1998)

EUA (dados por cidades)

1977 a 1992

Pooled OLS e IV2SLS

A SI fez diminuir os crimes violentos

Dezhbakhsh e Rubin (1998, 1999)

EUA (dados por cidades e estados)

1977 a 1992

2SLS Pequena queda no número de homicídios, aumento dos roubos, e ambiguidade nos demais crimes

Stolzenberg e D’Alessio (2000)

EUA (Carolina do Sul)

1991 a 1994

OLS com efeito fixo

Crimes violentos, crimes praticados com armas e crimes perpetrados por jovens respondem à disponibilidade de armas ilegais, mas não de armas legais

Cook e Ludwig (2002)

EUA (dados por cidade)

1987 a 1998

IV2SLS Elasticidade da arma em relação às invasões a domicílios entre 0,3 e 0,7

Moody e Marvell (2002)

EUA (dados por estado)

1977 a 1998

Pooled OLS Não há relação de causalidade entre armas e crimes

McDowall, Loftin e Wiersema (1995)

EUA (grandes cidades da Flórida, Mississipi e Oregon)

1973 a 1982

Modelos de intervenção baseado em ARIMA

A SI não teve efeito sobre os homicídios, mas fez crescer os homicídios por PAF

Lott Jr e Mustard (1997)

EUA (dados por cidades e estados)

1977 a 1992

Pooled OLS e IV2SLS

A SI fez diminuir os crimes violentos

Duggan (2001) EUA (dados por cidades e estados)

1980 a 1998

Regressão em diferenças

Elasticidade em relação aos homicídios = 0,2 e não houve efeito da SI sobre crimes

Bartley e Cohen

(1998)

EUA (por

cidades)

1977 a

1992

Regressão

(extreme bound

analysis)

A SI levou a uma diminuição

dos crimes violentos

Fonte: CERQUEIRA, 2014, pp. 111 e 112. Legenda: SI (“Shall Issue”): mudança de lei que flexibilizou o porte de armas nos EUA.

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59

Assim sendo, ao que tudo indica, existe uma relação causal entre armas

de fogo e crimes como homicídios e suicídios e, certamente, políticas de

desarmamento podem incidir favoravelmente na redução de tais crimes:

Menos armas, menos crimes? Nas últimas duas décadas, vários estudiosos de diversas áreas do conhecimento se debruçaram sobre essa questão. Não obstante a escassez de dados sobre a prevalência de armas e as dificuldades metodológicas subjacentes, a resposta parece ser positiva. (CERQUEIRA, 2014, p. 147).

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60

4. BOAS PRÁTICAS DE DESARMAMENTO REALIZADAS POR

ESTADOS E MUNICÍPIOS

Com o objetivo de relatar alguns cases exitosos relativos à Campanha do

Desarmamento que ocorre no Brasil desde 2004, entramos em contato com os

responsáveis nas unidades da federação pela coordenação local da campanha,

solicitando o envio de informações para a apresentação neste guia59.

Informamos, na ocasião, que para preparar o case de sucesso os

interlocutores da Campanha nos estados deveriam separar o material bruto, ou

seja, dados, datas, informações quantitativas e qualitativas, gráficos e tudo

aquilo que é importante para o relato da experiência da campanha local.

Recomendamos que os interessados em relatar as experiências devessem

verificar sobre como apresentar os dados, utilizando preferencialmente uma

narrativa envolvendo os responsáveis, as instituições e como se deu a

campanha. Destacamos que o importante seria contar uma história com os

protagonistas, objetivos, resultados e eventuais obstáculos. O case deveria ser

escrito de maneira impessoal, em linguagem simples e objetiva.

Recebemos o retorno de três estados (Espírito Santo, Alagoas e Sergipe) e

acrescentamos a experiência de São Paulo (estado e município)60, utilizando

como referência o estudo de Daniel Cerqueira sobre o tema e uma cartilha

produzida pela Secretaria Municipal de Segurança Urbana da cidade de São

Paulo.

59

Em 14/08/2014, foi enviado o seguinte e-mail para os coordenadores estaduais da Campanha do

Desarmamento: ―Prezados interlocutores da Campanha Nacional do Desarmamento: há duas semanas, os

senhores e as senhoras receberam um e-mail informando-lhes que a SENASP está elaborando um Guia

Nacional da Campanha do Desarmamento e para isso conta com nossa colaboração nessa empreitada. Na

ocasião, também foi comunicado que eu entraria em contato com os senhores e senhoras para solicitar

informações sobre as experiências locais, com vistas à inclusão, no Guia, de Boas Práticas

de Desarmamento realizadas por Estados e Municípios. Neste sentido, solicito a colaboração de todos(as)

no sentido de nos enviar relatos, fotos, material publicitário e resultados da campanha sob sua

responsabilidade e/ou coordenação. As melhores práticas serão selecionadas e poderão constar no Guia

em fase de elaboração. Para facilitar seu trabalho enviamos, abaixo, um roteiro mínimo que deve ser

respondido por todos aqueles(as) que desejam divulgar suas experiências na campanha. Além das

questões aqui apresentadas, outros acréscimos poderão ser feitos livremente pelos senhores e senhoras. E

é muito importante que além da descrição das ações da campanha, sejam anexados arquivos com fotos,

materiais publicitários, artigos publicados em veículos de comunicação ou acadêmicos que relatem sobre

a experiência. E, sem dúvida, dados que possam demostram a efetividade da campanha seja num bairro,

cidade, região ou estado sob sua responsabilidade e/ou coordenação. Contamos com sua colaboração‖.

60 Vários estudos têm apontado que a exponencial queda dos homicídios em São Paulo deve-se, em boa

medida, as várias ações de desarmamento ocorridas naquele estado. Por isso, a importância do relato,

mesmo que panoramicamente, dessa experiência.

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61

Certamente, existem outras experiências exitosas de desarmamento

realizadas por estados e municípios brasileiros. Uma pesquisa rápida feita na

Internet, utilizando sites e outras ferramentas de busca, indexou várias ações

realizadas no Brasil. Como não é objetivo deste trabalho mapear tais

experiências (haja vista a diversidade de narrativas, fontes, formas de

abordagem, etc. e a dificuldade metodológica de sistematizar material

informativo tão diversificado), limitamo-nos na exposição dos casos que

seguem, reconhecendo que tais experiências fazem parte de um universo

provavelmente muito mais amplo.

Tendo em vista os relatos enviados, iniciamos apresentando a seguir

essas experiências, considerando a forma como foram redigidos, ressalvando

que foi feita uma edição com vista a sintetizar tais experiências.

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62

4.1. ESPÍRITO SANTO

No Espírito Santo, 80% dos homicídios registrados ocorrem por arma de

fogo e, deles, 40% são por motivação fútil ou banal, segundo informa a

Secretaria de Estado de Segurança Pública (SESP/ES).

Em outubro de 2013 foi relançada, pela SESP/ES, a Campanha do

Desarmamento que trouxe uma inovação extremamente produtiva: a Ação

Itinerante de Recolhimento de Armas (AIRA).

A AIRA foi criada com o objetivo de incrementar o recolhimento de

armas de fogo, voluntariamente entregues pela população capixaba, em especial

nas localidades onde não haviam postos de recolhimento estabelecidos.

Em 2011, o estado do Espírito Santo, por meio da SESP, e o Ministério da

Justiça, por meio da SENASP, tornaram-se signatários de um Acordo de

Cooperação Técnica derivado do Estatuto do Desarmamento, pelo qual o Estado

comprometeu-se com a implantação da Campanha do Desarmamento em

território capixaba. Na ocasião, 52 unidades das polícias civil e militar foram

alçadas à condição de Posto de Recolhimento de armas, munições e acessórios.

No mesmo ano, foi criado o Fórum Capixaba pelo Desarmamento, que reunia

executivos estaduais e municipais com a finalidade de estimular a entrega de

armas.

Importante frisar que os índices referentes ao número de acidentes e

mortes por arma de fogo ganhou os noticiários locais e, a cada evento, a

população foi-se tornando mais consciente do real perigo da posse de armas.

Em 2013, no entanto, o que se viu foi um arrefecimento da campanha, a

desarticulação do Fórum e uma clara redução nas entregas em voluntariado.

Acompanhando estes números, os gestores da SESP/ES chegaram à

compreensão de que a população carecia de maior estímulo para o voluntariado.

Se por um lado a população carecia de estímulo, por outro, o Estado

carecia de uma renovação em sua prática: deixar de aguardar a população nos

postos já estabelecidos e oportunizar à população o acesso facilitado para a

entrega de armas; levar às comunidades mais interiorizadas do Estado a

campanha e o posto de recolhimento.

Em julho de 2013 iniciou-se um processo de revitalização da Campanha

do Desarmamento. Em fins de agosto daquele ano, após um diagnóstico

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63

operacional da rede de postos de recolhimento, chegou-se à confirmação de que

34 dos 53 postos de recebimento voluntário de armas, criados em 2011, estavam

inativos. Isso correspondia a 64,15% dos postos.

4.1.1. Diagnóstico

Em 2013, dos 34 postos inativos, 29 alegavam “falta de profissional

qualificado para receber e registrar as armas no sistema”; um alegava que “os

dois funcionários credenciados saíram da Delegacia” [o que poderia também ser

caracterizado como “falta de profissional qualificado”]; três alegavam que a

inatividade se amparava devia-se ao fato de que “as demandas que surgem são

encaminhadas para a Polícia Federal” [o que, em princípio, não permitia

medição de resultados]; e por fim, um que afirmava estar inativo “por falta de

informações relacionadas à forma de pagamento, para onde as armas serão

encaminhadas”.

Dos 19 postos de recolhimento ativos, correspondentes a 35,85% do

número total de postos implantados, 13 deles estavam “funcionando

normalmente”; dois afirmaram que, embora estivessem funcionando, haviam

problemas no sistema [INFOSEG]; um que informava que “nos últimos dias o

INFOSEG não está funcionando para novos registros” [observando que a

pesquisa ocorreu entre os dias 19 e 23 de agosto]; outro afirmou que “está

funcionando, mas pediram um retorno, pois estão com pequenos problemas no

sistema”; três postos afirmaram que, apesar de o posto estar funcionando,

faltava-lhes “material de divulgação” da campanha; um afirmava estar

funcionando e que, no momento da pesquisa feita pela SESP/ES [entre os dias

19 e 23 de agosto], “não tem feito por falta de profissional qualificado para

receber e registrar as armas no sistema”, o que poderia também ter sido

classificado como “falta de profissional qualificado”.

Detectou-se, portanto, as frentes de trabalho a serem enfrentadas:

identificação e localização de pessoal já treinado para o recolhimento e

cadastramento das armas, munições e acessórios; treinamento de pessoal novo

na utilização do sistema Infoseg; adequação das senhas de acesso dos

profissionais no Infoseg; restruturação dos postos de recolhimento e ações de

comunicação da campanha à população.

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4.1.2. A Ação Itinerante de Recolhimento de Armas (AIRA)

O objetivo dessa ação era estimular a entrega voluntária de armas,

munições e acessórios, por meio de visitas itinerantes nos municípios capixabas.

Ademais, procurava-se difundir o Estatuto do Desarmamento e promover uma

cultura de paz, por meio da conscientização do cidadão capixaba acerca dos

riscos de se ter uma arma em casa, bem como acerca dos aspectos jurídico e

penais que cercam a matéria.

Para a realização da campanha, utilizou-se da seguinte metodologia:

orientados pelos informes estatísticos sobre o recolhimento voluntário de armas

nos municípios capixabas, elaborados e publicizados semanalmente pelo

Ministério da Justiça, a Gerência de Integração Comunitária, subordinada a

Subsecretaria de Integração Institucional da SESP/ES, buscou construir em

conjunto com as instituições e órgãos parceiros, já enunciados no Estatuto do

Desarmamento e no Acordo de Cooperação Técnica, uma estratégia que pudesse

aumentar o volume de armas recolhidas em território capixaba, renovando o

desempenho da Campanha do Desarmamento desenvolvida 2011.

Criou-se de início um Grupo de Trabalho que teve a finalidade de buscar

soluções para o problema: a campanha do desarmamento estava caindo no

esquecimento. E se por um lado, o estado, por meio de suas polícias, vinha

apreendendo milhares de armas, pela Campanha e pelo voluntariado que ela

propunha recolhia-se não mais que algumas dezenas de armas.

O primeiro passo foi o relançamento da Campanha do Desarmamento

junto com os parceiros, numa ação de destruição de cerca de duas mil armas,

em oito de outubro de 2013. A ação, simbólica, contou com a presença de

representantes de todas as instituições e entidades parceiras na Campanha, bem

como com a presença do Governador do Estado. A ação contou com ampla

divulgação pela mídia local, estadual e nacional.

O passo seguinte foi a realização de diagnósticos sobre a situação do

Estado, tanto em relação ao número de armas apreendidas, quanto ao número

de homicídios e acidentes com uso de armas de fogo, bem como da situação da

rede de recolhimento montada em 2011. Esse diagnóstico da rede revelou uma

desarticulação, o que demandou iniciar uma política de reestruturação dos

postos fixos de recolhimento de armas voluntariamente entregues pela

população. A coordenação da campanha promoveu treinamentos e capacitações

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necessárias à consecução dos seus objetivos de modo contínuo e com a

participação dos municípios capixabas por meio de pactuação em Termo de

Cooperação.

Realizaram-se diagnósticos acerca dos municípios a serem visitados pela

equipe durante a itinerância. Em meados de outubro de 2013, criou-se em

conjunto com os parceiros (SENASP, Polícia Federal, Polícia Rodoviária

Federal, Exército Brasileiro, Polícia Militar e Polícia Civil) um modelo de ação

que se assentava num calendário de recolhimentos regulares de armas já

realizados pela Polícia Federal nos Fóruns das cidades do interior do Estado.

Elaborou-se, então, um projeto piloto denominado “Ações Itinerantes de

Recolhimento de Armas – AIRA”: ações de recolhimento a serem realizadas

durante os meses de novembro e dezembro de 2013, em seis incursões

semanais, em seis municípios diferentes, observando um calendário de visitas

previamente elaborado pela SESP/ES em conjunto as prefeituras locais.

Com a Superintendência da Polícia Federal organizou-se um itinerário e

um calendário para as Ações Itinerantes de Recolhimento de Armas – AIRA e

com o comando do 38º BI do Exército Brasileiro articulou-se o recebimento e a

destruição destas armas, criando um cronograma e um fluxo a que os parceiros

deveriam se adequar.

Às polícias Militar e Civil estaduais couberam a localização dos

profissionais treinados em 2011 e identificação de seus acessos ao Sistema

Infoseg e nele ao subsistema de recolhimento, o Desarma. Num primeiro

momento observou-se que a maioria dos profissionais havia mudado de unidade

(uma migração que deixou postos de recolhimento desguarnecidos e com suas

atividades suspensas). Alguns destes profissionais, inclusive, tiveram suas

senhas canceladas ou bloqueadas, o que demandou uma atualização nas senhas

de acesso e a inclusão e exclusão de operadores do sistema Desarma/Infoseg.

Esse trabalho de identificação e localização de operadores pelas polícias

Militar e Civil foi de suma importância, vez que as unidades policiais tornaram-

se bases de apoio nos municípios a serem visitados pela ação em itinerância.

A identidade visual da AIRA foi inicialmente (em 2013) pensada de modo

muito simples, mas com grande impacto na proposta de aproximação com as

comunidades visitadas. Foi criado um briefing de comunicação audiovisual para

o relançamento da Campanha, composto de cartazes, folders, camisas, spots

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testemunhais em emissoras de rádio, banners, brindes e plotagem em veículo

para dar ênfase e visibilidade às práticas exitosas implantadas. As ações de

comunicação e marketing tinham com o objetivo aumentar o volume de armas

recolhidas voluntariamente nos postos de coleta.

Quanto à forma, compunha-se inicialmente de uma tenda, mesas e

cadeiras plásticas e uma lona de fundo de palco emoldurada. Estes

equipamentos foram montados nas praças principais das cidades, geralmente

nas proximidades das sedes das Prefeituras Municipais. Guarnecia a AIRA,

neste momento, duas viaturas descaracterizadas: uma da SESP/ES e outra da

PF, a segunda com cofre para a guarda das armas.

Em 2014 essa estrutura foi simplificada, não obstante o acréscimo de

uma Van plotada com a identidade visual da Campanha Estadual de

Desarmamento, que apoia a equipe no seu traslado e transporte de materiais e

equipamentos necessários.

Com o advento da Copa do Mundo, a Polícia Federal anunciou sua

ausência durante aquele período, vez que seu pouco efetivo deveria ser aplicado

no evento nacional e o Estado viria a abrigar em 2014 duas delegações

estrangeiras. Este óbice inicial promoveu uma mudança singular na Ação

Itinerante. A cumprir o papel da PF, foi convidada a Polícia Civil que acolheu a

demanda e se empenhou na aplicação de seu efetivo local durante as visitas

programadas da AIRA.

Em cada visita, durante as AIRA realizadas em 2014, dois policiais civis,

identificados e localizados anteriormente, foram designados diretamente pelo

Delegado Chefe de Polícia Civil, para serem treinados no recebimento e no uso

do sistema Desarma/Infoseg. E nas localidades onde não havia posto de

recolhimento foram criados os postos novos, ficando estes policiais

responsáveis, após o recolhimento, pelo posto, pela divulgação da campanha

junto à população local.

Outra parceria foi realizada com as prefeituras de cada município

visitado. Identificaram-se os prefeitos e atores indicados por seus gabinetes, que

envolvidos na campanha, davam suporte necessário à realização das AIRA, seja

o acesso à rede Infoseg por meio da rede de Internet da Prefeitura, a energia

elétrica para funcionamento de computadores e impressoras utilizadas na ação,

a mobilização de atores internos e da população de modo geral num

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chamamento à participação e ao voluntariado na entrega de armas, munições e

acessórios.

Em 2014, a equipe da Gerência de Integração Comunitária responsável

pela operacionalização da Campanha do Desarmamento e pelas AIRAs propôs,

como desdobramento espontâneo da AIRA, uma intervenção a ser realizada nas

escolas locais, nos municípios visitados. A intervenção, ainda incipiente e como

um projeto piloto, foi aplicada ao modo de palestras realizadas para crianças e

adolescentes da rede municipal de ensino. O objetivo desta intervenção

agregada à AIRA era conscientizar esses jovens acerca dos riscos que envolvem

a posse de uma arma, seja em espaço privado, seja em espaço público. Tratava-

se de uma ação de disseminação de cultura de paz junto às crianças e

adolescentes que tem reflexo em seus familiares adultos.

As palestras potencializavam, por meio de apresentações em slides com

fotos e notícias de acidentes fatais ocorridos dentro de residências, justamente

em função da presença de armas de fogo, a discussão sobre posse de armas de

fogo e riscos letais que advém dessa posse. O tema, assim abordado, promovia

grande impacto e na interação com os alunos, tornava-se possível a propagação

da cultura de paz pela realidade negativa das notícias.

Ademais, outra importante atividade realizada com as crianças e

adolescentes foi a troca de armas de brinquedo por brindes. Houve ocasião em

que o recolhimento de armas de brinquedo entre as crianças e adolescentes

obteve maior êxito que entre adultos, superando o número de objetos

recolhidos.

O investimento em cada ação itinerante girava em torno de dez mil reais,

além da aquisição de um veículo, tipo van.

4.1.3. Resultados

Segundo informações da SENASP, em outubro de 2013 o estado do

Espírito Santo ocupava o 12º lugar no ranking nacional de entrega voluntária de

armas. Após a implantação da Campanha Itinerante de Recolhimento de armas,

chegou-se, em julho de 2014, na oitava posição.

O Gráfico 6, abaixo, ilustra o montante de armas de fogo recolhidas nos

anos de 2011 a 2014, até agosto.

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GRÁFICO 6 - Entrega voluntária de armas - Espírito Santo (2011 – 2014, até agosto)

050

100150

2011

2012

2013

2014

2011 2012 2013 2014

TOTAL DE ARMAS ENTREGUES 39 17 126 143

Fonte: SESP/ES

Como se pode observar no Gráfico 6, a partir de 2013, com a implantação

da AIRA houve um incremento na quantidade de armas recolhidas. Enquanto

no ano de 2011 foram recolhidas apenas 39 armas de fogo, em 2013 esse

número passou para 126 e em 2014, até agora, já ultrapassava a marca das 143

armas entregues pela população.

- Equipe

Guilherme Pacífico – Subsecretário de Integração Institucional

Alessandro Vieira Darós – Gerente de Integração Comunitária

Atila Vieira Mendes – Coordenador da AIRA

Leonardo Nascimento – Jornalista

Paulo Henrique Moraes – Pedagogo

Edson Ribeiro dos Santos – Suporte Administrativo

Fabiane Salvador – Suporte Administrativo

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MONTAGEM 1: Posto Itinerante, inutilização das armas e van de apoio

MONTAGEM 2: Palestras nas escolas e entrega de armas de brinquedo

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4.2. ALAGOAS

O Ônibus do Desarmamento, parte da estratégia da política de

desarmamento utilizada no estado de Alagoas, é uma unidade itinerante de

coleta de armas. Trata-se de uma iniciativa da Secretaria de Estado de

Promoção da Paz de Alagoas (SEPAZ), executada com apoio logístico da

Secretaria de Estado de Defesa Social (SEDS) e da Polícia Militar de Alagoas

(PMAL).

A ideia surgiu a partir da necessidade de uma estratégia de aproximação

com a Campanha Nacional do Desarmamento. A SEPAZ percebeu que as

pessoas tinham receio de entregar armas em delegacias e batalhões (postos fixos

da campanha) porque, motivadas pelo medo, preconceito ou desinformação

temiam ser presas, já que ter uma arma sem registro é crime.

O objetivo da estratégia foi criar um equipamento que desmistificasse

esse estigma e levasse informação à população; que pudesse percorrer os bairros

e municípios, aproximando-se das pessoas e diminuindo as desculpas e

dificuldades de para a entrega voluntária das armas de fogo.

O Ônibus do Desarmamento vai ao encontro da proposta do Governo de

Alagoas ao criar a Secretaria de Promoção da Paz, em 2009: enfrentamento da

violência e criminalidade não apenas como questão de polícia e da justiça, mas

envolvendo uma mudança de cultura e de hábitos por parte da população.

Nesse aspecto, é uma maneira de envolver a sociedade diretamente no

plano de segurança “Brasil Mais Seguro”, iniciativa do governo federal, por meio

do Ministério da Justiça/Senasp, instalado em Alagoas em junho de 2012.

De acordo com levantamento do Conselho Nacional do Ministério

Público (CNMP), citado no Mapa da Violência 2013, uma em cada quatro

mortes em espaços públicos no Brasil acontece por motivo fútil ou banal,

praticada por pessoas sem antecedente criminais e com acesso facilitado a

armas de fogo. O mesmo documento aponta a influência da cultura da violência

no alto índice de homicídios no país, especialmente em Alagoas, há anos

apontada como primeiro lugar na taxa (nacional) dos homicídios com armas de

fogo.

É neste cenário que a SEPAZ criou estratégias para facilitar ao máximo o

acesso da população ao posto móvel da Campanha do Desarmamento. A entrega

da arma de fogo é um passo objetivo, pois o cidadão supera uma visão

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deturpada de segurança, percebendo que a arma é um instrumento de ataque e

de grande propensão a gerar tragédias tanto em casa (nos casos de disparos

acidentais e “brincadeiras” envolvendo crianças e adolescentes), como nos

ambientes públicos.

Tal iniciativa corrobora também para tirar de circulação armas que,

certamente, parariam nas mãos de criminosos: através do comércio ilegal

(muitas vezes, em situações de dificuldade financeira, é comum que a arma de

fogo torna-se o primeiro objeto a ser utilizado em busca de dinheiro), ou através

do roubo ou furto da arma em uma invasão de domicílio. Um exemplo desse

fato foi documentado em Maceió, em novembro de 2012, quando um

comerciante assassinou um vigilante de automóvel (“flanelinha”) e feriu outro,

com um revólver que havia comprado em uma feira, para “proteção” do seu

estabelecimento. Ao ser apreendida pela polícia, verificou-se que a arma estava

registrada em nome de um juiz de Direito e havia sido furtada de sua casa meses

antes.

4.2.1. Metodologia

Lançado em 26 de outubro de 2012, beneficiado com as ações do plano

“Brasil Mais Seguro”, a primeira atividade de mobilização das ações ligadas ao

Ônibus do Desarmamento foi no sentido de aproximar a equipe da Secretaria de

Estado de Promoção da Paz (SEPAZ) com líderes comunitários e religiosos.

Além de intensa atividade de conscientização e sensibilização nas escolas

públicas e particulares do Jacintinho. Esse momento de sensibilização foi

necessário para apresentar o novo posto móvel de coleta de armas à população

alagoana.

A novidade encontrou certa resistência da população, embora na segunda

semana de atividades, tenha sido registrada a entrega de três armas de fogo em

um único dia. A presença constante na mídia de gestores públicos debatendo

com jornalistas e com o público sobre a importância do desarmamento auxiliou

na divulgação e mobilização social, aproximando a necessidade do debate sobre

armas de fogo, segurança pública e ação direta dos alagoanos para alterar o

cenário de violência no Estado.

A segunda parada do Ônibus do Desarmamento foi no Mirante de São

Gonçalo, ponto turístico de Maceió, ao lado do presépio em tamanho real da

paróquia de São Gonçalo. Esta etapa teve um caráter especial, pois tomou a

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forma da campanha “Natal de Paz, Natal sem Armas”, realizada em parceria

com a Arquidiocese de Maceió. Sacerdotes e o próprio arcebispo de Maceió

envolveram-se na divulgação da campanha durante as missas, fazendo com que

pessoas de vários bairros se dirigissem ao presépio para entregar sua arma de

fogo.

Essa mini-campanha de Natal buscou aproveitar o momento de reflexão

que as festas de fim de ano trazem às pessoas, fazendo com que elas

“desarmassem seu espírito e suas casas”. Aproveitou-se também da

credibilidade da Igreja Católica junto à população.

As terceira e quinta paradas do ônibus encerram o ciclo de apresentação

do novo equipamento e definiram a boa adesão da população alagoana ao posto

móvel de coleta de armas. Aconteceram, respectivamente, na orla da Praia de

Ponta Verde (outro ponto turístico de Maceió) e na Praça da Igreja Matriz, em

Arapiraca (segunda maior e mais importante cidade de Alagoas, também

beneficiada pelo plano Brasil Mais Seguro).

Foram pontos de forte presença de pessoas, turistas (locais e

interestaduais) e da mídia, ampliando ainda mais a divulgação da campanha e

da facilidade da entrega. Na praia de Ponta Verde foram entregues sessenta e

nove armas de fogo e em Arapiraca, cento e quatro armas.

O relatório final da campanha, envolvendo datas, paradas do ônibus e

armas recebidas, segue abaixo:

QUADRO 5 – Recolhimento de armas (Ônibus do Desarmamento)

Fonte: Sepaz/AL

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4.2.2. Reconhecimento

O Ônibus do Desarmamento pode ser considerado um case de sucesso

enquanto estratégia de aproximar a população da Campanha do Desarmamento

e facilitar a entrega de armas.

A estratégia de mobilização e divulgação é sempre feita em contato

permanente com a imprensa, incentivando e atraindo mídia espontânea

(gratuita) sobre a atuação do posto móvel de coleta de armas, o perigo de uma

arma de fogo em casa e a importância da Campanha do Desarmamento como

uma contribuição objetiva e direta da população na construção de uma cultura

de paz e efetivando a participação da sociedade no plano Brasil Mais Seguro.

Observou-se que a partir das mobilizações feitas em torno das ações

promovidas pelo Ônibus do Desarmamento houve um aumento da procura

pelos postos fixos de entrega de armas de fogo, em delegacias, batalhões da

Polícia Militar, sede da Polícia Federal e postos da Polícia Rodoviária Federal.

Cinco meses após seu lançamento, em abril de 2012, o estado de Alagoas

passou da 19ª posição no ranking nacional da Campanha do Desarmamento

para o 9º lugar em arrecadação absoluta e um inédito 2º lugar em números

proporcionais à população – posição atingida no mês de abril de 2013 e mantida

até maio (dados oficiais do Boletim Semanal da Campanha do Desarmamento

nº 90, de 28/04/2013, Ministério da Justiça).

O Gráfico 7, abaixo, ilustra o incremento na entrega de armas, a partir

das ações do ônibus em novembro de 2012, com repercussões no ano de 2013.

GRÁFICO 7 – Recolhimento de armas Alagoas (2011 – 2013)

Fonte: Sepaz/AL

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Entre novembro de 2011 e abril de 2012, quando não havia o posto móvel

de coleta, foram recebidas 104 armas de fogo nos cerca de 40 postos fixos da

Campanha do Desarmamento em Alagoas. Com o funcionamento do Ônibus em

novembro de 2012, foram recebidas, até abril de 2013, 520 armas de fogo (316

pelo Ônibus), um aumento de 500% na arrecadação. (SEPAZ/AL).

4.2.3. Créditos

- Órgão responsável: Secretaria de Estado de Promoção da Paz.

- Parceiros logísticos: Secretaria de Estado de Defesa Social e Polícia Militar de

Alagoas.

- Conscientização: ONGs MovPaz, Rede Desarma Brasil em Alagoas e Igreja

Católica.

- Duração da atividade: 26 de outubro de 2012 a 31 de outubro de 2013,

percorrendo várias cidades do Estado de Alagoas.

- Armas recebidas: 424 armas de fogo recebidas em 21 ações do ônibus – das

quais 13 em bairros da capital, Maceió, e 08 em municípios do interior.

- Resultados secundários:

Renovação da Campanha Nacional do Desarmamento em Alagoas;

Divulgação dos postos fixos de entrega de armas em Alagoas;

Aumento da entrega de armas de fogo nos postos fixos;

Retomada do debate com a sociedade sobre as consequências da posse de

armas e sua presença em casa;

Interiorização da campanha e do debate sobre desarmamento;

Criação de uma nova modalidade de recolhimento de armas de fogo na

Campanha do Desarmamento, com provas de sua viabilidade e adesão de

outros estados brasileiros.

4.4.4. Descrição do equipamento

O Ônibus do Desarmamento é um micro-ônibus totalmente dedicado ao

desarmamento e personalizado para a campanha, identificado como unidade

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itinerante de coleta de armas através de plotagem com a identidade visual da

Campanha Nacional do Desarmamento em Alagoas.

Funciona como um mini-escritório para executar todas as etapas da

entrega voluntária da arma de fogo: imprimir a guia de trânsito (documento

necessário para o transporte seguro de casa até o posto de entrega), receber a

arma, danificá-la e realizar a emissão da ordem de pagamento da bonificação.

Possui uma TV e cadeiras, pois é também um posto de difusão de informação,

onde os interessados podem assistir vídeos institucionais da Campanha do

Desarmamento. Também são distribuídos vários panfletos sobre a campanha e

a equipe é preparada para responder dúvidas da população e imprensa.

A equipe no ônibus é composta por quatro pessoas:

- um motorista, ligado à SEPAZ;

- dois divulgadores, ligados à SEPAZ; e

- um policial militar à paisana.

MONTAGEM 3: Ônibus do Desarmamento (Alagoas)

Fonte: Sepaz/AL

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4.3. SERGIPE

A Campanha do Desarmamento em Sergipe abrange, principalmente, os

seis municípios prioritários, focados no Projeto “Brasil Mais Seguro”: Aracaju

(capital), Lagarto, Estância, Nossa Senhora do Socorro, Itabaiana e São

Cristóvão.

Na primeira fase da campanha no estado, entre 2004 e 2005, Sergipe

ficou, em termos proporcionais, em primeiro lugar no ranking dos estados que

mais recolheram armas da população.

Na segunda fase, a partir de 2011, várias parcerias com órgãos e

instituições ampliaram as ações da Campanha. Destacam-se as articulações

envolvendo: Secretaria de Estado da Educação, Secretaria de Estado da

Segurança Pública, Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Cidadania, Casa

Civil do Governo, Conselho de Execuções e Causas Penais, SESI/SE, OAB/SE,

Tribunal de Justiça, polícias Civil e Militar, Polícia Federal, Polícia Rodoviária

Federal, Rede Desarma Brasil, Ong Viva Rio, entre outras.

A forma de mobilização da Campanha se dá através de contatos com as

prefeituras e com entidades religiosas ou associativas, utilizando-se para a

divulgação carros de som, material gráfico específico, bem como palestras de

conscientização nas escolas da rede pública estadual, municipal ou particular.

Na mídia, o impacto da Campanha é positivo, tendo apoio das principais

redes televisivas e de rádios.

A articulação das ações da Campanha do Desarmamento é feita pela

Coordenação do Comitê pelo Desarmamento e em Favor da Vida, instituída

através do Decreto Estadual 28.065, de 03 de outubro de 2011, aglutinando

várias entidades governamentais, bem como entidades não-governamentais.

O objetivo é diminuir os números de homicídios ocasionados por armas

de fogo e principalmente promover a conscientização dos adolescentes, jovens e

adultos, através de palestras que são realizadas pelos membros do Comitê.

Em Aracaju, projetos como “Escola Promotores de Cultura de Paz”,

idealizado pelo Comitê do Desarmamento61, conseguiram ao longo de dois anos

61 É formado pela Assembleia Legislativa, Câmara de Vereadores, Corpo de Bombeiros, Polícias Civil,

Militar e Rodoviária Federal, Guarda Municipal, Defensoria Pública, Ministérios Públicos Estadual e

Federal, OAB, Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania, Secretaria da Justiça, SSP, Secretaria da

Educação, Secretaria de Estado da Inclusão e Assistência Social, Universidade Federal de Sergipe,

Tribunal de Justiça, Arquidiocese de Aracaju, Conselho da Comunidade da Execução Penal, Conselho

Municipal dos Direitos da Mulher, Federação dos Conselhos de Segurança Comunitária do Estado de

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e meio ministrar palestras para mais de quatro mil alunos das redes estadual e

municipal de ensino. Foram visitadas várias escolas, com uma média de público

de 250 alunos. Nesses encontros, além do tema do desarmamento são

discutidas outras questões, como a violência no ambiente escolar. Também é

feita a entrega de material gráfico alusivo à campanha.

Desde 2012, além das visitas nas escolas foram feitas palestras para

operadores de Segurança Pública, articuladas parcerias com o SESI (na Ação

Global) com stand para apresentação de material gráfico da Campanha,

discussão na Câmara de Vereadores da Capital sobre o Desarmamento infantil,

culto ecumênico para homenagear as mulheres em seu dia (tratando também

sobre violência doméstica), seminários (como o que foi realizado na sede da

OAB, instruindo operadores de segurança pública) e afixação de faixas e placas

da campanha nas delegacias de polícia (locais de recebimento das armas).

Foram realizadas duas caminhadas pela Paz, com participação de

aproximadamente de mil pessoas em ambos os eventos.

Em Sergipe todas as noventa e cinco delegacias da Polícia Civil estão

aptas para receberem as armas.

O número de apreensões de armas de fogo deu um salto exponencial a

partir de 2009 em todo o estado de Sergipe. O acompanhamento das armas

retiradas das ruas é feito mensalmente pelo Centro de Estatística e Análise

Criminal (Ceacrim) da Secretaria de Segurança Pública, que comprovou um

crescimento histórico de armas apreendidas no estado. Os dados mostram que

entre 2009 a junho de 2013 foram retiradas das mãos de criminosos da Capital

e do interior de Sergipe 6.744 armas de fogo de diversos calibres.

Os números apontam que no ano de 2008 foram apreendidas 115 armas,

subindo para 1.338 em 2009; 1.686 em 2010, chegando a 1.686 em 2011; em

2012, 1.551 e finalmente até junho de 2013, 896 armas de fogo saíram de

circulação.

Sergipe, Movimento Evangélico Progressista de Sergipe, SESI, Sindicato dos Agentes Penitenciários do

Estado de Sergipe, Sindicato dos Policiais Civis do Estado de Sergipe, Sociedade Semear, União dos

Ministros Evangélicos do Estado de Sergipe, Associação Integrada de Mulheres de Segurança Pública e

Confederação das Associações de Moradores de Bairros. (Fonte: Assessoria de Comunicação da

Secretaria de Educação de Sergipe).

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78

4.3.1. Detalhamento das ações

Visita às unidades policiais;

Visitas às escolas;

Visita aos municípios;

Caminhadas para conscientização;

Delegacia de polícia itinerante;

Reunião mensal dos membros do Comitê do Desarmamento.

4.3.2. Atividades

Entrega de material didático;

Recebimento de armas de fogo;

Capacitação de policiais;

Capacitação de professores das redes públicas de ensino;

Plenárias de discussão com os membros do Comitê do

Desarmamento para decisão de ações a serem implementadas.

4.3.3. Metodologia

Sensibilização dos executivos em segurança pública;

Palestras para o corpo docente e discente das escolas públicas;

Conscientização das comunidades para a entrega voluntária de

arma de fogo;

Discussão e formatação de agendas positivas.

4.3.4. Equipe de Trabalho

Meire Mansuet Alcântara Campos – Secretaria de Estado da Segurança Pública

Fábio Costa – Representante da Comunidade (Coordenador do Comitê do

Desarmamento)

Severino Cesário da Silva – Secretaria da Casa Civil do Estado (Coordenador

adjunto do Comitê do Desarmamento)

Jussiene Melo Pache – Secretaria de Estado da Segurança Pública

Nailson Pimenta – Secretaria de Estado da Segurança Pública

Angela Maria de Carvalho Machado – Secretaria de Estado da Educação

Acrízio Campos – Superintendente Regional do SESI/SE

Clênia Vanuza A. Barbosa – Representante da comunidade

Anselmo Ramos Santos – Movimento Evangélico Progressista – MEPS

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Roberto Moraes – Vereador (Câmara Municipal de Vereadores – Aracaju/SE)

4.3.5. Parceiros Institucionais

OAB/SE

Tribunal de Justiça

Ministério Público Estadual

Secretaria de Estado de Direitos Humanos/SE

Câmara Municipal de Vereadores de Aracaju

Conselho de Execuções Penais

Secretaria Municipal de Defesa Social de Aracaju

Guarda Municipal

Assembleia Legislativa do Estado

Polícias Militar e Civil

MONTAGEM 4: Campanha Desarmamento Sergipe

Fonte: SESP/SE

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80

4.4. SÃO PAULO

São Paulo se tornou um exemplo internacional na redução dos

homicídios. Segundo o Mapa da Violência 2010, no período entre 2000 e 2010

enquanto a maioria dos estados brasileiros experimentava substancial

incremento no número de homicídios, houve naquele estado uma redução de

63,8% nos assassinados.

Existem variadas análises sobre a diminuição na taxa de crimes violentos

em São Paulo. Ferreira, Lima e Bessa (2009), por exemplo, utilizam o

argumento segundo o qual o aperfeiçoamento nos mecanismos de gestão da

segurança pública foram fundamentais para tal redução.

Outros estudos têm apontado como uma das causas da diminuição do

número de homicídios em São Paulo a adesão do estado e de vários de seus

municípios nas campanhas de desarmamento, a partir do ano de 2004.

De 2001 a 2007, o número de homicídios diminuiu 60,1% em todo o Estado, colocando São Paulo como um dos casos internacionais mais emblemáticos, ao lado de Nova Iorque e Bogotá. Os dados sobre as várias dinâmicas criminais indicaram, entretanto, que não houve uma queda generalizada da criminalidade em São Paulo. Ao contrário, os crimes contra a pessoa e contra o patrimônio aumentaram cerca de 20%. Com efeito, os crimes que tiveram maior queda foram aqueles geralmente praticados com o uso da arma de fogo. Mais interessante ainda, essa diminuição ocorreu de forma mais acentuada exatamente após a entrada em vigor do Estatuto do Desarmamento. (CERQUEIRA, 2014, p. 147, grifo nosso).

Como se pode observar na Tabela 7 (abaixo), nos anos de 2000 a 2003 a

média de homicídios naquele estado estava em torno dos 10 mil/ano.

Justamente a partir de 2004, após a entrada em vigor do Estatuto do

Desarmamento, observa-se a exponencial queda, gradual e contínua.

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TABELA 7 – Homicídios por estado (2000 – 2010) Destaque para São Paulo

Fonte: Mapa da Violência, 2010.

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82

Os dados apresentados na Tabela 7 são significativos: enquanto nos anos

de 2000, 2001, 2002 e 2003, São Paulo teve, respectivamente, 10.631, 11.409,

10.229 e 10.094 homicídios, a partir de 2004 houve queda abrupta nos

assassinatos, diminuindo o número para 8.146, chegando em 2010 a 3.845

homicídios; portanto quase 64% de redução no período de 11 anos.

Em sua tese de doutorado intitulada “Causas e consequências do crime

no Brasil”, Daniel Ricardo de Castro Cerqueira (2014) dedica um capítulo para

analisar a relação entre armas e crimes, notadamente os homicídios. No referido

capítulo, há um estudo detalhado acerca do que ocorreu em São Paulo. O autor

analisou dados criminais dos 645 municípios paulistas.

Para testar a relação causal entre armas e crimes, Cerqueira (2014) usou

dados compreendidos entre 2001 e 2007. Utilizando-se de variadas

metodologias de pesquisa (um modelo teórico de demandas por armas e crimes,

no qual o dilema entre prevalência de armas na cidade, o custo de obtenção da

arma no mercado ilegal e o efeito dissuasão da vítima armada foram

analisados), o autor concluiu que:

a) O efeito do desarmamento foi maior nas cidades onde havia maior

prevalência de armas anteriormente;

b) As análises comprovaram a relação segundo a qual o maior número

de armas gera maior quantidade de homicídios;

c) Em relação aos incidentes interpessoais violentos, a redução do

acesso à arma de fogo faz com que os indivíduos envolvidos em

práticas criminais utilizem outros instrumentos menos letais para

resolver variadas disputas;

d) Não se observou relação significante entre armas de fogo e crimes

como latrocínio e roubo de veículos, corroborando a hipótese segundo

a qual armas de fogo têm relação com homicídios;

e) O efeito da diminuição na prevalência de armas foi no sentido de

aumentar as lesões corporais dolosas. O estudo aponta que houve

uma substituição quantos aos meios para resolução de conflitos

interpessoais violentos, fazendo com que as pessoas sem acesso a

armas utilizassem instrumentos menos letais;

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83

f) Corroborando estudo de Lott e Mustard (1997) e Kleck (1979), “pelo

menos em São Paulo, o criminoso profissional não se abstém de

cometer crimes pelo fato de a população se armar para a autodefesa. A

difusão das armas de fogo nas cidades, entretanto, é um importante

elemento criminógeno para fazer aumentar os crimes letais contra a

pessoa”. (CERQUEIRA, 2014, p. 149).

Assim, a análise exaustiva feita por Cerqueira (2014) reforça o argumento

segundo o qual as ações de desarmamento realizadas no estado de São Paulo

corroboram na exponencial diminuição dos homicídios por arma de fogo

naquela unidade da federação.

4.4.1. Desarmamento na cidade de São Paulo

Além de estudos envolvendo todo o estado de São Paulo, existem

informações específicas sobre as ações da Campanha do Desarmamento na

Capital.

As informações a seguir foram extraídas de um relatório das ações de

desarmamento na cidade de São Paulo, publicado pela Secretaria Municipal de

Segurança Urbana na cartilha “A campanha de desarmamento e controle de

armas: a experiência da cidade de São Paulo”.

O documento informa que em meados de 2009 foi realizada na capital

uma campanha pontual envolvendo o Instituto Sou da Paz, a Igreja Católica e a

Guarda Civil Metropolitana, produzindo materiais de comunicação próprios e

autonomia para divulgação. Ao todo, vinte e seis paróquias da Igreja Católica

aderiram a esta Campanha e abriram pela primeira vez suas portas para o

recolhimento, com o apoio de Bases Móveis e agentes da Guarda Civil

Metropolitana, com uma Base Comunitária Móvel.

Os postos de recolhimento da Guarda Civil Metropolitana foram

estruturados a partir da escolha das Bases e Inspetorias que fossem localizadas

em pontos estratégicos para o recebimento de armas de fogo, acessórios e

munições pela CEVAM – Campanha de Entrega Voluntária de Armas e

Munições – e dentro destas procurou-se espaços adequados para o recebimento

efetivo, ou seja, que fosse o mais protegido possível e que possibilitasse certo

conforto e privacidade ao cidadão na entrega.

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84

As estratégias em relação à divulgação se deram inicialmente através da

identificação do posto de recolhimento para dar visibilidade e informar à

população do entorno e também nos parques da cidade e em igrejas de

diferentes denominações religiosas.

Não menos importantes foram as ações de divulgação nas reuniões dos

Conseg’s (Conselhos Comunitários de Segurança) e até mesmo por meio de

jornais de bairros.

No ano de 2010, durante o Carnaval, no Polo Cultural e Esportivo Grande

Otelo (Anhembi), uma faixa sobre a campanha foi passada entre a apresentação

de uma escola e outra, para orientar os participantes e divulgar a ação.

Em dezembro de 2010, as 536 armas de fogo que foram arrecadadas em

pouco mais de dois meses da Campanha de Desarmamento na capital, foram

inutilizadas em ato simbólico no Vale do Anhangabaú.

A Secretaria Municipal de Segurança Urbana, através da Guarda Civil

Metropolitana e integrantes da Campanha de Desarmamento realizaram em

2011, no dia de Finados, o “Ato pela Vida”’, uma ação que visou simbolizar as

177 vidas poupadas/salvas até aquele momento, graças ao recolhimento das

armas. No ato, 177 pessoas vestidas de branco deitaram sobre as “lápides” no

gramado do Cemitério Parque dos Girassóis (zona Sul de São Paulo), formando

a palavra vida, simbolizando as pessoas que estariam mortas não fosse a

Campanha de Desarmamento.

Segundo informações da cartilha da Secretaria de Segurança Urbana de

São Paulo, é importante destacar o esforço da Guarda Civil Metropolitana na

arrecadação de armas junto à população, o que a coloca como uma das

protagonistas da “Campanha do Desarmamento”. Embora seja sempre delicado

pensar em relações causais, é possível olhar para a quantidade de armas

recolhidas pela GCM nos últimos anos e constatar um significativo aumento nos

anos que compreenderam a criação do Comitê: em 2009 e 2010, a quantidade

total de armas arrecadadas foi 1.695, já a partir de 2011 (até setembro de 2012),

esse valor sobe para 3.026 no período. A média de armas arrecadadas por

inspetoria duplica: de 44 em 2009 e 2010 para 89 em 2011 e 2012.

“Ao analisar os dados de um ano da campanha nacional do desarmamento voluntário, merece destaque especial a participação da GCM que recolheu neste período (maio/11 a maio/12) mais de 2.500 armas. Este número colocaria a cidade de São Paulo – considerando

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apenas o recolhimento da GCM – a frente de outros Estados como o Paraná que é o 7º Estado que mais recolhe armas. São números realmente impressionantes que precisamos divulgar e festejar”. (Bruno Langeani, Coordenador da área de Sistema de Segurança e Justiça do Instituto Sou da Paz). (PREFEITURA DE SÃO PAULO, s/d., página 23)

Registre-se, ainda, a Campanha “Unidos pelo Desarmamento”, que se

efetivou com postos provisórios de recolhimento de armas de fogo nos Centros

de Integração da Cidadania (CICs), entre os dias 13 e 18 de agosto de 2012.

Cinco CICs da cidade de São Paulo se tornaram postos com a ajuda da Polícia

Militar do Estado de São Paulo, e tiraram de circulação 63 armas e dois

simulacros, além de 644 munições de diversos calibres. Essa ação foi provocada

pela Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania, por meio dos Centros de

Integração da Cidadania (CICs), em parceria com a Defensoria Pública do

Estado de São Paulo, Polícia Militar e o Instituto Sou da Paz.

Estudo feito pela Coordenadoria de Análise e Planejamento (CAP/SSP),

órgão ligado ao Gabinete do Secretário de Segurança Pública do Estado de São

Paulo62, concluiu que, analisando as apreensões de armas ocorridas na Região

Metropolitana de São Paulo (Capital e Grande São Paulo) no período de janeiro

de 2009 a agosto de 2012, o resultado da análise de regressão indicou que existe

relação entre a quantidade de armas apreendidas e os eventos de homicídio

doloso. A correlação é negativa (-0,36) e indica que o aumento no número de

armas apreendidas tem como contrapartida a redução dos homicídios dolosos.

Significa dizer: a cada 10 armas tiradas de circulação através da apreensão,

estima-se que mais de duas vidas tenham sido poupadas (2.3 vidas).

Para a média mensal de 787 armas apreendidas na RMSP no período (44

meses), pode-se estimar que, em média, 185 vidas tenham sido poupadas

mensalmente.

Hipoteticamente, o modelo demonstra: se nenhuma arma fosse

apreendida na RMSP, ocorreriam 549 Homicídios dolosos ao mês.

Todos os resultados dos estudos e análises realizados pela CAP/SSP

confirmam a forte relação entre armas e mortes. Por conseguinte, corroboram a

importância do desarmamento na preservação da vida, quer seja na queda dos

62

O estudo foi divulgado na cartilha da Secretaria Municipal de Segurança Urbana de São Paulo.

Disponível em: [http://www.soudapaz.org/upload/pdf/campanha_de_desarmamento_1.pdf]. Acesso em

17.set.2014.

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homicídios, quer seja na possibilidade de essa arma cair em mãos de criminosos

que a utilizarão, inclusive, em confronto com a polícia.

MONTAGEM 6: Campanha na cidade de São Paulo

Fonte: Imagens da Cartilha “A Campanha do Desarmamento e controle de armas: a experiência

da cidade de São Paulo”

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5. BREVES NOTAS CONCLUSIVAS

Segundo dados recentes do Mapa da Violência, mais de 50 mil pessoas

morrem todos os anos no Brasil, número superior a mortes que ocorrem

anualmente em diversos conflitos armados no mundo.

No Brasil, país sem disputas territoriais, movimentos emancipatórios, guerras civis, enfrentamentos religiosos, raciais ou étnicos, conflitos de fronteira ou atos terroristas foram contabilizados, nos últimos quatro anos disponíveis – 2008 a 2011 – um total de 206.005 vítimas de homicídios, número bem superior aos 12 maiores conflitos armados acontecidos no mundo entre 2004 e 2007. Mais ainda, esse número de homicídios resulta quase idêntico ao total de mortes diretas nos 62 conflitos armados desse período, que foi de 208.349. (MAPA DA VIOLÊNCIA, 2013, p. 28).

O fenômeno das mortes no Brasil tem como principal vetor a utilização

de armas de fogo. Mais de 70% dos homicídios são cometidos utilizando-se esse

tipo de armamento. (MAPA DA VIOLÊNCIA, 2013).

Fruto da mobilização popular de diversos setores da sociedade civil

brasileira, o Estatuto do Desarmamento completou dez anos em dezembro de

2013. Primeira lei a efetivar uma política de controle de armas no Brasil,

definindo padrões de produção, registro, comercialização e circulação das

armas, o Estatuto teve como principal, no primeiro ano de sua implementação,

a redução no número de homicídios.

Para a efetividade do Estatuto, o poder público em parceria com a

sociedade civil realiza, desde 2004, campanhas objetivando a entrega voluntária

de armas de fogo.

Este estudo técnico constatou que a Campanha do Desarmamento teve,

nestes dez anos, importantes ações que redundaram na entrega de significativa

quantidade de armas de fogo, incidindo certamente na diminuição do número

de homicídios no Brasil. Não obstante, dado ainda o elevando número de

assassinatos com armas de fogo – que coloca o Brasil em vergonhosa situação se

comparado com outros países - a campanha de entrega voluntária de armas

precisa ser incrementada e reforçada. Neste sentido, constata-se com clareza

que o sucesso da Campanha depende, fundamentalmente, da articulação entre

os vários níveis de governo e a sociedade civil em prol de ações que promovam o

recolhimento das armas, facilitando o acesso dos cidadãos a postos de entrega e

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88

utilizando-se de variadas técnicas de comunicação para informar dos riscos

associados à posse de armas.

Os cases de sucesso apresentados neste estudo corroboram a certeza de

que somente com a soma de esforços envolvendo agências públicas das esfera

federal, dos governos locais (estaduais e municipais) e a sociedade civil, as

entidades religiosas e de classe, dentre outras, é possível estimular a entrega das

armas pelos cidadãos.

Numa sociedade do medo, os incentivos para a posse de arma e para as

soluções privadas para o enfrentamento da violência são poderosos. Portanto,

confrontar-se com o lobby da indústria armamentista, a sensação de

insegurança e medo (em boa medida superdimensionada pela mídia) e a cultura

individualista que estimula as soluções privadas para os problemas públicos

demanda uma articulação permanente e potente dos governos comprometidos

com a efetivação dos direitos, numa sociedade justa e pacífica.

As armas utilizadas em crimes no Brasil são majoritariamente brasileiras

(78%) e de calibres acessíveis, conforme estudo do Instituto Sou da Paz. O

mesmo instituto comprovou que 64% das armas apreendidas em São Paulo,

entre 2011 e 2012, foram fabricadas antes do Estatuto. E que 82%, nos casos de

roubo, as armas apreendidas de fabricação nacional.63

Um alto percentual de homicídios é cometido por motivação fútil,

conforme apresentamos ao longo deste estudo. Portanto, é falacioso o

argumento segundo o qual somente os criminosos com alto poder ofensivo

provocam as mortes por arma de fogo no Brasil.

Todos os esforços para garantir o controle rígido das armas em poder dos

civis são fundamentais na diminuição da violência homicida em nosso país.

Fundamental, portanto, que os três poderes, nos três níveis de governo, e em

parceria com a sociedade, somem esforços nessa empreitada.

Para um país mais seguro, a política de segurança pública (compreendida

como garantia dos direitos) deve ser abordada de forma sistêmica e integral.

Assim, além do controle das armas, investimentos em políticas de prevenção à

criminalidade e maior articulação entre as agências e órgãos da segurança

pública são fundamentais.

63

Fonte: [http://www.soudapaz.org/upload/pdf/relatorio_20_01_2014_alterado_isbn.pdf].

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89

E, em relação à quantidade de armas disponíveis, além do controle do

armamento, outras ações são da mesma importância: vigilância das fronteiras;

treinamento rigoroso e controle das armas em poder dos agentes públicos;

enfrentamento ao lobby da indústria armamentista; ações focalizadas de

apreensão de armamento em poder de grupos e organizações criminosas, entre

outras.

Apesar dos grandes desafios no controle das armas, a população

brasileira continua favorável às campanhas e ações de desarmamento. Pesquisa

realizada pelo Instituto Datafolha sobre o posicionamento ideológico da

população mostrou que 69% dos brasileiros creem que a posse de armas deve

ser proibida, pois ameaça a vida das pessoas.64 Esse percentual deve motivar os

agentes públicos a empreenderem todos os esforços no desarmamento da

população.

Assim sendo, é de se esperar um incremento nas ações de desarmamento

da população. Campanhas de recolhimento de arma são iniciativas que devem

se somar a outros esforços visando à diminuição dos homicídios e a construção

de uma cultura de paz.

64 Fonte: [http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2013/05/02/posicao_brasileiros_temas_25122012.pdf].

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90

6. REFERÊNCIAS

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FICHA TÉCNICA

GOVERNO FEDERAL

Dilma Rousseff Presidenta da República José Eduardo Cardozo Ministro da Justiça Regina Maria Filomena de Luca Miki Secretária Nacional de Segurança Pública

Cristina Gross Villanova Departamento de Políticas, Programas e Projetos Lívia Rejane de Mello Ávila Coordenadora Geral Substituta de Programas e Projetos Especiais - DEPRO

PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO - PNUD

Jorge Chediek Representante Residente

- Este documento foi produzido com base no Termo de Cooperação Técnica:

Projeto de Cooperação Técnica internacional Segurança Cidadã (BRA/04/029) Termo de Referência: 139527 Parceria: Ministério da Justiça, Senasp, PNUD

Consultor Responsável: Robson Sávio Reis Souza Equipe:

Robson Sávio Reis Souza (responsável técnico/autor) Marco Antônio Couto Marinho Flávia Raíssa Said Calill Pires Samantha Rodrigues (estagiária)

Setembro/2014

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ANEXO 1

TABELA 1A: Valores de indenização por espécie de armamento –

Brasil - 2014

ESPÉCIE

VALOR

Revolver

Cal. 22 (.22) R$ 150,00

Cal. 32 (.32) R$ 150,00

Cal. 38 (.38) R$ 150,00

Cal. 357 Magnum (.357) R$ 300,00

Cal. 44 (.44 Remington Magnum; .44 Magnum) R$ 300,00

Cal. 45 R$ 300,00

Outros calibres R$ 150,00

Pistola

Cal. 22 R$ 150,00

Cal. 6,35 R$ 150,00

Cal. 32 R$ 300,00

Cal. 7,65 R$ 300,00

Cal. 380 R$ 300,00

Cal. 9mm (9) R$ 450,00

Cal. 10mm (10) R$ 450,00

Cal. 40 R$ 450,00

Cal. 357 R$ 450,00

Cal. 44 Magnum R$ 450,00

Cal. 45 R$ 450,00

Outros calibres R$ 150,00

Espingarda / Escopeta

Cal. 40 R$ 150,00

Cal. 36 R$ 150,00

Cal. 32 R$ 150,00

Cal. 28 R$ 150,00

Cal. 24 R$ 150,00

Cal. 20 R$ 150,00

Cal. 16 R$ 150,00

Cal. 12 R$ 150,00

Outros calibres R$ 150,00

Rifle

Cal. 243 / 270 / 300 / 308 / 338 / 30.06 R$ 450,00

Cal. 7,62 mm R$ 450,00

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Cal. 5,56 mm (223, .223) R$ 450,00

Cal. 7mm R$ 450,00

Cal. 38 / 357 R$ 300,00

Cal. 44 / 45 / 450 R$ 300,00

Cal. 17 / 22 / 32 / 32.20 R$ 300,00

Outros calibres R$ 300,00

Carabinas

Cal. 17 R$ 300,00

Cal. 22 R$ 300,00

Cal. 22 Magnum R$ 300,00

Cal. 32.20 (32/20) R$ 300,00

Cal. 38 R$ 300,00

Cal. 38.40 (38/40) R$ 300,00

Cal. 44.40 (44/40) R$ 300,00

Cal. 44 R$ 300,00

Outros calibres R$ 300,00

Fuzis

Cal. 7mm R$ 450,00

Cal. 7,62 mm (308, .308) R$ 450,00

Cal. 5,56 mm (223, .223) R$ 450,00

Cal. 243 R$ 450,00

Cal. 375 R$ 450,00

Cal. 338 R$ 450,00

Cal. 30 (30 carbine) R$ 450,00

Outros Calibres R$ 450,00

Metralhadora / Submetralhadora

Todos os calibres R$ 450,00

Garrucha / Pistolão / Pistolete / Espécie não

identificada

Todos os calibres R$ 150,00

Fonte: Ministério da Justiça/Acordo de Cooperação, 2014. Adaptado pelo autor.

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Este documento foi produzido com base no Termo de

Cooperação Técnica: Projeto de Cooperação Técnica

internacional Segurança Cidadã (BRA/04/029)

Termo de Referência: 139527

Parceria: Ministério da Justiça, Senasp, PNUD

OUTUBRO/2014