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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA … · 2016. 6. 10. · CONTEXTO ESCOLAR À LUZ DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL Ramira Francisca Botelho 1 ... da SEED/PR. Como implementação

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

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REPENSANDO O PROCESSO DE AVALIAÇÃO PSICOEDUCACIONAL NO

CONTEXTO ESCOLAR À LUZ DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

Ramira Francisca Botelho1 Lucia Terezinha Zanato Tureck 2

Resumo: O tema abordado proporcionou reflexão e discussão coletiva sobre o processo de Avaliação Psicoeducacional no Contexto Escolar, com a contribuição da Psicologia Histórico Cultural aos professores e equipe pedagógica da Escola Estadual Padre Anchieta, de Assis Chateaubriand, Paraná. Teve como finalidade a identificação e avaliação das necessidades educacionais especiais, como recurso complementar para ampliar a intervenção no processo ensino aprendizagem. Como objeto de investigação analisou manifestações que suscitam questionamentos dos professores e equipe pedagógica, quanto à avaliação pedagógica, encaminhamento e atendimento dos alunos com Transtornos Funcionais Específicos - TDA/H para a Sala de Recursos Multifuncional - tipo I, somente com laudo clínico e/ou psicológico, sem a avaliação pedagógica / psicoeducacional no contexto escolar. Neste contexto, propôs analisar criticamente a Sala de Recursos Multifuncional – Tipo I e a sua relação no cotidiano do trabalho pedagógico da Sala Comum, quanto aos critérios e usos de instrumentos avaliativos, como recursos alternativos para a inserção do aluno na SRM, assim como compreender o suporte legal do Plano de Atendimento Educacional Especializado - AEE, previsto na Instrução n° 016/2011, da SEED/PR. Como implementação e intervenção do projeto na escola foram envolvidos professores que participaram do curso presencial de formação continuada de 40h e do Grupo de Trabalho em Rede–GTR abordando as temáticas sobre avaliação pedagógica e psicoeducacional; estudo de caso; medicalização e atendimento educacional especializado; tendo como estratégias diversificadas de ação. Os sujeitos desses grupos debateram e forneceram subsídios significativos para discussões e aprofundamentos desse o objeto de estudo, sendo avaliado de forma positiva, obtendo os resultados desejados.

Palavras-chave: Avaliação Psicoeducacional; Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I; Psicologia Histórico-Cultural.

Introdução

O presente artigo foi estruturado a partir da Produção Didático-Pedagógica,

que é resultado dos estudos realizados e implementados no Plano Integrado de

Formação Continuada do Programa de Desenvolvimento Educacional–PDE, Turma

VI-2013 a 2014, da Secretaria de Estado da Educação do Paraná –SEED/PR3, tendo

1 Professora da rede estadual de ensino da rede pública do Estado do Paraná e integrante do PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE 2013; graduada em Letras Português e Inglês, Especialista em Educação Especial e Inclusão e Supervisão, Administração e Orientação Educacional; atuando na educação especial. E-mail: [email protected] 2 Professora orientadora da UNIOESTE, campus de Cascavel. Pedagoga, Mestre em Educação e Doutora em Letras; docente do Colegiado do Curso de Pedagogia e membro do Programa de Educação Especial e dos Grupos de Pesquisa: Educação Especial GEPEE e HISTEDOPR. E-mail: [email protected] 3 O Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, da Secretaria de Estado da Educação do

Paraná, proporciona aos professores da rede pública de ensino, por meio de seleção periódica, participar do processo de formação continuada com foco na prática docente, tendo como objetivo a

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por finalidade possibilitar subsídio científico que contribua com as ações dos

professores, pedagogos e comunidade escolar, enfatizando a importância da Sala

de Recursos Multifuncional e as Salas de Ensino Regular, como parte da

Implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica no Colégio Estadual Padre

Anchieta – Ensino Fundamental e Médio, localizado no município de Assis

Chateaubriand, Paraná.

As atividades que compuseram a unidade didática foram selecionadas para

subsidiar teoricamente os trabalhos desenvolvidos com os professores no processo

de adaptação e flexibilização curricular, atendendo às necessidades educacionais

especiais, bem como, com os pedagogos na intervenção pedagógica para os alunos

que apresentam dificuldades de aprendizagem, transtorno de déficit de atenção e

hiperatividade no atendimento educacional especializado em sala de recursos

multifuncional-Tipo-I4 e na sala do ensino regular.

O Colégio Estadual Padre Anchieta - Ensino Fundamental e Médio está

localizado no centro da cidade de Assis Chateaubriand, Paraná. Conta atualmente

com 988 alunos, divididos em 37 turmas, distribuídas em três turnos de

funcionamento, com a maior quantidade de alunos atendidos no período matutino.

Possui duas Salas de Recursos Multifuncionais-Tipo I em funcionamento. Uma das

salas funciona no período matutino, atendendo 11 alunos, e a outra, no período

vespertino atendendo 19 alunos, num total de 30 alunos matriculados e

frequentando em contra turno da classe comum, dentre eles, 26 alunos possuíam

diagnóstico de TDA/H no ano letivo de 2013.

A escolha por alunos com diagnóstico de Transtornos Funcionais Específicos

- TFE e Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade - TDA/H, neste estudo,

decorreu da incidência majoritária desse transtorno nos alunos que integram as duas

Salas de Recursos Multifuncional, considerando os dados fornecidos pelo Sistema

Estadual de Registro Escolar-SERE e Núcleo Regional de Educação de Assis

Chateaubriand, referente ao ano de 2013.

implementação de um projeto de intervenção pedagógica na escola, como a primeira etapa do programa. O afastamento dos professores de suas atividades profissionais por um período destinado à pesquisa, seguida de estratégias de ação na escola, é necessário para a caminhada de transformação da realidade quando a preocupação coletiva é a formação e transformação humana. 4 Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I, na Educação Básica, é um atendimento educacional especializado, de natureza pedagógica que complementa a escolarização de alunos que apresentam deficiência Intelectual, eficiência física neuromotora, transtornos globais do desenvolvimento e transtornos funcionais específicos, matriculados na Rede Pública de Ensino.

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Apesar da recomendação de acompanhamento psicológico e

psicopedagógico, poucos alunos o obtêm, pois depende das condições econômicas

das famílias o acesso às terapias particulares, não disponíveis na rede pública de

saúde e educação.

Para refletir sobre o processo de escolarização desses alunos torna–se

necessário compreender como são utilizados os instrumentos de avaliação para

ingresso na Sala de Recursos Multifuncional.

Assim, este Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola justificou-se pela

necessidade de repensar sobre a ótica coletiva, multidisciplinar, teórico - prática do

processo de ensino e aprendizagem com ênfase na Avaliação Pedagógica e

Psicoeducacional no contexto escolar, tendo em vista o aumento da demanda de

alunos com e sem diagnóstico clínico, uso de medicalização, baixo rendimento

escolar, reprovação, evasão, apresentando necessidades de mediação e

intervenções imediatas, tem provocado inquietações nos profissionais da educação

básica e do ensino superior.

Sendo assim, o presente estudo propôs-se a enfrentar a seguinte

problemática: O quê e como fazer para que os dispositivos contidos na Instrução n°

016/2011-SEED/SUED sejam cumpridos na sua integralidade, dando as respostas

necessárias às necessidades educacionais especiais dos alunos? Quais são as

práticas destinadas à educação especial e inclusiva adotadas na escola? E, quais as

reflexões teóricas que vem sendo pensadas acerca das dificuldades encontradas e

de como superá-las?

Neste contexto é necessário, ainda, compreender a dinâmica de toda a

comunidade escolar, o sistema de avaliação e o contexto que envolve o cotidiano

desses alunos e familiares. Não há como pensar a inclusão escolar, ou seja,

educação de qualidade para todos, sem considerar a composição da sociedade e

suas respectivas relações psico-socio-culturais. Portanto, há que considerar a não

possibilidade de avaliar um indivíduo isolado do contexto em que ele vive, mas, deve

sê-lo no conjunto de suas relações internas e externas.

O objetivo principal do presente trabalho foi refletir, com base nos

pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural, o processo de Avaliação

Psicoeducacional no Contexto Escolar, como requisito para o ingresso de alunos

com necessidades educacionais especiais na Sala de Recurso Multifuncional – Tipo

I. Considera-se, para além do ingresso, a construção significativa de práticas

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pedagógicas inclusivas, tanto no ensino regular, como na sala de recursos

multifuncional, visando analisar a sua relação com a sala comum, identificando

criticamente o uso de instrumentos avaliativos como recursos alternativos utilizados

como indicação que permitem o acesso do aluno na SRM -TIPO I, compreendendo

os critérios de seleção, adaptação e avaliação de conteúdos e metodologias

contemplados na proposta pedagógica e utilizados para a elaboração do Plano de

Atendimento Educacional Especializado para cada aluno.

Constituíram-se como objetivos específicos: - refletir sobre as implicações do

uso de medicamentos controlados por alunos que apresentam Transtorno de Déficit

de Atenção e ou Hiperatividade; - reconhecer o diagnóstico pedagógico como

instrumento indispensável no processo ensino-aprendizagem; - analisar o

diagnóstico clínico e possíveis encaminhamentos, como um processo de mediação

e intervenção, ressaltando o mesmo como um meio e não como um fim no

processo ensino aprendizagem.

Referencial Teórico

No cotidiano escolar observa-se uma multiplicidade de alunos com

problemas de aprendizagem que, na maioria das vezes, não são atendidos nas suas

reais necessidades educacionais. Muitos dos problemas identificados se distanciam

da formação docente e da prática pedagógica e o que se verifica são medidas de

intervenções incompatíveis com as necessidades educacionais especiais dos

alunos, e, por conseguinte, esses não alcançam os resultados esperados na

aprendizagem.

Inicialmente, faz-se necessário considerar as medidas tomadas para o

processo diagnóstico, que na maioria das vezes desconsidera a participação efetiva

da avaliação pedagógica.

A avaliação clínica deve subsidiar a avaliação pedagógica no que diz respeito

às necessidades educacionais especiais, porém não deve ser considerada como

determinante, mas, sim, como mediadora do processo, compreendendo de que as

funções mentais superiores são desenvolvidas a partir da aquisição e apropriação

da cultura humana. Neste sentido, a avaliação pedagógica será a base necessária

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para o direcionamento do processo de mediação e intervenção em momentos

posteriores:

A intervenção pedagógica precisará transcender técnicas e estratégias e criar oportunidades para valorização da condição humana para formação de vínculos. O tratamento médico pode estar baseado no diagnóstico das anomalias, mas a educação deve expor potencialidades (CUNHA, 2005, p.1).

Na realidade, é na ação pedagógica que irão se constituir e revelar os

desafios do processo de ensino-aprendizagem, uma vez que os alunos que não

alcançam resultados inicialmente esperados na aprendizagem implicam aumento

nos índices dos alunos considerados com problemas de aprendizagem.

Levando-se em conta esta realidade, pode-se afirmar que todos os alunos

devem ser respeitados em sua individualidade, capacidades, potencialidades,

dificuldades, motivações, comprometimentos, ritmos, desenvolvimento, maneiras de

aprender e contextos sociais. Entende-se que todos os problemas de aprendizagem

são em si mesmos, contextuais e relativos, sendo necessário, portanto,

compreender primeiramente o próprio processo de ensino e aprendizagem. Negar

essa pluralidade significa negar a própria natureza da escola, que é no seu todo rica

em características e especificidades, que se traduzem em desafios constantes aos

educadores e à comunidade escolar em geral.

Cabe ressaltar que qualquer aluno durante sua vida escolar pode apresentar

dificuldades de aprendizagem, com defasagem em uma ou mais disciplinas, o que

não significa, necessariamente, que as causas dessa dificuldade de aprendizagem

estejam vinculadas a uma deficiência. Um ponto de relevância da avaliação

psicoeducacional é o de contribuir para a inclusão de alunos da educação

especial no ensino regular, possibilitando pesquisar suas possibilidades e

potencialidades. Nesta linha de reflexão, o professor Paulo Ricardo Ross (2004)

assim contribui:

[...] as necessidades especiais são decorrentes das oportunidades, existentes ou não, bem como dos instrumentos e mediações que possam ser apropriados por estas pessoas em suas relações sociais e não resultam unicamente das deficiências biológicas que possam apresentar. Se favoráveis forem as condições sociais, a situação de deficiência será atenuada, uma vez que não serão impostas restrições à participação dessas pessoas (ROSS, 2004, p. 204).

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As dificuldades específicas de aprendizagem podem ser classificadas de

diferentes formas, conforme sua origem, manifestação, idade cronológica do aluno e

situações apresentadas na aprendizagem. No caso de alunos com Transtornos

Funcionais Específicos – TFE, conforme a Secretaria de Estado da Educação

(PARANÁ, 2013), devem ser atendidos e tem-se os seguintes entendimentos:

[...] abrangem um grupo de alunos que apresentam problemas específicos de aprendizagem escolar manifestadas por dificuldades significativas na aquisição e uso da audição, fala, leitura, escrita ou habilidades matemáticas, não existindo para os mesmos, uma explicação evidente. Estas desordens são intrínsecas ao sujeito, presumivelmente devem-se a disfunções neurológicas em determinada área cerebral, que comprometem a aquisição e o desenvolvimento das habilidades escolares (PARANÁ, 2013, p. 44).

[...] pode ser apenas uma criança/adolescente que aprende de uma forma diferente. Esse aluno possui uma dificuldade específica em determinada aprendizagem, como por exemplo: não aprende as quatro operações; não compreende o que lê; compreende o que lê, mas não sabe escrever (PARANÁ, 2012, p. 20)

Todavia, de acordo com a Política Nacional de Educação Especial na

Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), os casos que implicam em

transtornos funcionais específicos não caracterizam público-alvo da Educação

Especial, devendo esta atuar de forma articulada com o ensino comum, orientando

para o atendimento às suas necessidades educacionais especiais.

Porém, no Estado do Paraná, por entender que esse grupo de alunos

necessita de um complemento à escolarização da classe comum para obter sucesso

na sua vida escolar, o sistema estadual de ensino oferta este apoio especializado

em Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I, nas escolas públicas da Educação

Básica, o qual é definido pela Instrução nº 16/2011-SEED/SUED como,

[...] atendimento educacional especializado, de natureza pedagógica que complementa a escolarização de alunos que apresentam deficiência intelectual, deficiência física neuromotora, transtornos globais do desenvolvimento e transtornos funcionais específicos, matriculados na Rede Pública de Ensino (PARANÁ, 2011, p. 1).

Neste sentido, o atendimento educacional especializado ao aluno não pode

ser confundido como mero reforço escolar, mas como ferramenta fundamental que

visa complementar o conjunto de procedimentos peculiares mediadores do processo

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de apropriação e produção de conhecimentos. Reafirma-se, assim, a necessidade

da avaliação psicoeducacional como mais um recurso alternativo no contexto

escolar, para apoiar alunos e professores.

Diante da realidade exposta, pretende-se promover a reflexão, análise e

compreensão do objeto em estudo o qual implica em conhecer inicialmente alguns

marcos históricos da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva.

A Educação Especial historicamente se organizou com o atendimento

educacional especializado substitutivo ao ensino regular, corroborando diferentes

concepções, nomenclaturas e modalidades que levaram à criação de instituições

especializadas, escolas especiais e classes especiais.

Essas instituições, baseadas no conceito de normalidade/anormalidade,

determinaram formas e critérios de atendimento clínico-terapêuticos fortemente

determinados por testes psicométricos que, por meio de diagnósticos, definiam as

práticas escolares para os alunos com deficiência. Ao descrever aspectos históricos

das dificuldades de aprendizagem, Scoz (1994) observa, referindo-se ao século XVIII

e XIX:

[…] por volta dos séculos XVIII e XIX, com o grande desenvolvimento das ciências médicas e biológicas, especialmente da psiquiatria. Datam dessa época os estudos de neurologia, neurofisiologia e neuropsiquiatria, conduzidos em laboratórios anexos a hospícios, e a rígida classificação dos pacientes dessas instituições como “anormais”. Posteriormente o conceito de anormalidades começou a ser transferido dos hospitais para as escolas: as crianças que não acompanhavam seus colegas na aprendizagem passaram a ser designadas como “anormais escolares”, já que seu fracasso era atribuído a alguma anormalidade orgânica (SCOZ, 1994, p. 19).

O atendimento às pessoas com deficiência no Brasil remonta à época do

Império, com a criação de duas instituições: o Imperial Instituto dos Meninos Cegos,

em 1854, atual Instituto Benjamin Constant – IBC, e o Instituto dos Surdos Mudos,

em 1857, hoje denominado Instituto Nacional da Educação dos Surdos – INES,

ambos no Rio de Janeiro, conforme apresenta Silveira Bueno (1993).

Já no início do século XX é fundada a instituição especializada no

atendimento às pessoas com deficiência mental: Instituto Pestalozzi (1926); em

1954, é fundada a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE;

e, em 1945, é criado o primeiro atendimento educacional especializado às pessoas

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com superdotação na Sociedade Pestalozzi, por Helena Antipoff (SILVEIRA BUENO,

1993).

A partir dessas instituições e serviços, inúmeros instrumentos legais foram

criados até à promulgação da Constituição Brasileira (BRASIL, 1988), que em seu

artigo 205, assegurou a educação como um direito de todos e dever do Estado e da

família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,

visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da

cidadania e sua qualificação para o trabalho.

O mesmo texto legal assegurou, em seu artigo 208, aos alunos com

necessidades educacionais especiais o direito à educação (escolarização)

preferencialmente realizada em classes comuns e ao atendimento educacional

especializado complementar ou suplementar à escolarização.

A Declaração de Salamanca (1994) afirma que todas as crianças têm

necessidades e aprendizagens únicas, tem direito a ir à escola de sua comunidade,

com acesso ao ensino regular, e os sistemas educacionais devem implementar

programas, considerando a diversidade humana e desenvolvendo uma pedagogia

voltada para a criança.

Escolas regulares com orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994)

Essas mesmas garantias são asseguradas posteriormente em outros

instrumentos legais, dentre eles, a LDBEN - Lei n°. 9.394/96, na Resolução

CNE/CEB n°. 2 e Parecer nº 17, de 11 de setembro de 2001, na Lei n°. 10.436/02

e no Decreto n°. 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Contudo, a letra da lei não é

plena garantia de concretização de tais direitos, pois,

A sociedade brasileira, fundada nos princípios democráticos de igualdade, preconiza um amplo campo de direitos sociais. Todavia, em seu próprio âmago, por sustentar-se no modo de produção capitalista, produz também a desigualdade e a exclusão (TURECK, 2003, p. 20)

Neste sentido, a inclusão escolar e até mesmo social, pode encontrar sérias

dificuldades, desafios e enfrentamentos, visto que, de um lado os princípios

democráticos pregam a igualdade de direitos e do outro, no mesmo contexto social,

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o regime capitalista depende da exclusão e desigualdade entre classes sociais para

garantir sua própria existência.

Em cumprimento ao disposto na LDBEN de 1996, o Ministério da Educação

lançou a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação

Inclusiva (BRASIL, 2008), para implementar a reestruturação do sistema

educacional, visando constituir políticas públicas promotoras de uma educação

inclusiva.

Assim, a educação especial na perspectiva da educação inclusiva passa a

integrar a proposta pedagógica da escola regular, promovendo o atendimento às

necessidades educacionais especiais de alunos com deficiência, transtornos globais

de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Nestes casos e outros, que

implicam em transtornos funcionais específicos, a Educação Especial atua de forma

articulada com o ensino comum, orientando para o atendimento às necessidades

educacionais especiais desses alunos. Nesse sentido,

A educação inclusiva é um processo em que se amplia a participação de todos os estudantes nos estabelecimentos de ensino regular. Trata-se de uma reestruturação da cultura, da prática e das políticas vivenciadas nas escolas de modo que estas respondam à diversidade de alunos. É uma abordagem humanística, democrática, que percebe o sujeito e suas singularidades, tendo como objetivos o crescimento, a satisfação pessoal e a inserção social de todos (RODRIGUES, 2008, p. 21).

Assim, a Politica Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação

Inclusiva define o atendimento especializado - AEE, especificando que,

o atendimento educacional especializado tem como função identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para plena participação dos alunos, considerando suas necessidades especificas (BRASIL, 2008, p. 15).

A sala de recursos multifuncional passa a ser um espaço organizado com

materiais didáticos, pedagógicos, equipamentos e profissionais com formação para o

atendimento às necessidades educacionais especiais.

Diante das necessidades administrativas decorrentes, o Decreto Federal nº

7.611, de 17 de novembro de 2011, dispõe legalmente sobre a Educação

Especial e o atendimento educacional especializado, devendo este último, integrar a

proposta pedagógica da escola envolvendo a participação da família, a fim de

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assegurar o pleno acesso do educando, atendendo às suas necessidades

especificas em parcerias com as demais politicas públicas.

Por conseguinte, o atendimento educacional especializado na sala de

recursos multifuncional busca acolher a diversidade ao longo do processo

educativo, constituindo-se num serviço disponibilizado pela escola para oferecer o

suporte necessário às necessidades educacionais especiais dos alunos,

favorecendo seu acesso ao conhecimento curricular, estando organizado para

apoiar, complementar e suplementar os serviços educacionais comuns.

Diante disso,

o atendimento educacional especializado não pode ser confundido com atividades de mera repetição de conteúdos programáticos desenvolvidos na sala de aula, mas deve constituir um conjunto de procedimentos específicos mediadores do processo de apropriação e produção de conhecimentos (BRASIL, 2008, p. 10).

Ocorre que, ao refletir sobre o atendimento educacional especializado no

contexto escolar, faz-se necessário repensar coletivamente o processo de avaliação

pedagógica enquanto “(...) um procedimento útil e necessário para redirecionar

qualquer prática, seja ela individual ou coletiva” (FERREIRA, 2002, p. 23).

Verifica-se que a avaliação pedagógica não vem sendo praticada no âmbito

escolar no seu verdadeiro sentido, tendo como principal objetivo a transformação

social, com resgate de sua função diagnóstica, como afirma Luckesi (1999).

Para o mesmo autor, a avaliação pedagógica utilizada na modernidade, do

ponto de vista politico pedagógico é antidemocrática, porque ainda está focada na

coleta de dados, aplicação de provas e atribuição de notas, tornando a avaliação um

processo excludente por selecionar os educandos como aptos, ou seja, ainda é

realizada sem nenhuma reflexão sobre o que o aluno é capaz de aprender.

Diferente disso, a avaliação pedagógica no contexto escolar deve

corresponder à instrumentalização de todo trabalho realizado pelos profissionais da

educação envolvidos no processo avaliativo do educando a partir de discussões e

análise de dados qualitativos das informações coletadas.

Na realidade, é na avaliação pedagógica que serão identificados os desafios

do processo ensino aprendizagem. Nesse contexto, os alunos que não

alcançarem rendimentos inicialmente esperados em seus conhecimentos e que

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apresentarem dificuldades de aprendizagem serão encaminhados para avaliação

psicoeducacional.

Para a apresentação dessa temática, num primeiro momento deter-se-á em

discorrer brevemente sobre a avaliação psicoeducacional na escola, em seguida

tratar-se-á do processo de avaliação na perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural.

A Avaliação Psicoeducacional, de natureza complementar, tem como objetivo

investigar o processo de ensino aprendizagem e compreender a origem dos

problemas/dificuldades de aprendizagem considerando também o seu contexto

familiar e social, para então propor intervenções pedagógicas subsidiando mudanças

na ação do professor, da gestão escolar e oferta de serviços e apoio especializados.

De acordo com Giné (2004, p. 279) avaliação é:

Um processo compartilhado de coleta e análise de informação relevante acerca dos vários elementos que intervém no processo de ensino e aprendizagem, visando a identificar as necessidades educativas de determinados alunos ou alunas que apresentem dificuldades em seu desenvolvimento pessoal ou desajustes com respeito ao currículo escolar por causas diversas, e a fundamentar as decisões a respeito da proposta curricular e do tipo de suporte necessário para avançar no desenvolvimento das várias capacidades e para desenvolvimento da instituição.

Essa avaliação configura-se na coletividade da escola, efetivando-se tanto

como uma prática de investigação do processo educacional, quanto um meio de

transformação da realidade escolar, tendo como recursos da avaliação

psicoeducacional todos os profissionais da escola (professores das disciplinas,

pedagogos, professor especialista, entre outros) e também a participação

imprescindível de uma equipe multiprofissional externa à escola, composta por

psicólogos, especialistas em psicopedagogia, fonoaudiólogos e/ou equipe médica

(clínico geral, neurologistas e psiquiatras, entre outros), os quais deverão realizar

estudo de caso, definindo a partir daí, a proposta e intervenção pedagógica mais

adequada no ensino comum e, sendo necessário, os seus respectivos

encaminhamento para Sala de Recursos Multifuncional – Tipo I.

No caso dos alunos com transtornos de déficit de atenção e hiperatividade –

TDA/H, parte do objeto do presente estudo e consoante disposição na Instrução nº

016/2011-SEED/SUED deverão:

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[...] enfocar aspectos relativos à aquisição da língua oral e escrita, interpretação, produção de textos, sistemas de numeração, cálculos, medidas, entre outros, bem como as áreas do desenvolvimento das funções psíquicas acrescido de parecer neurológico e/ou psiquiátrico e complementada quando necessário, por psicólogo (PARANÁ, 2011, p. 7).

Considerando o exposto, a avaliação psicoeducacional à luz da Psicologia

Histórico-Cultural é destacada por Facci, Eidt e Tuleski (2006) como um processo

onde é necessário contemplar uma análise do desenvolvimento da criança de um

modo prospectivo, apresentando indicadores e conceitos que estão no nível de

desenvolvimento próximo, contribuindo para uma prática pedagógica que possibilite

o aluno apropriar-se do conhecimento.

Os pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural, elaborados a partir dos

estudos de Lev Semenovitch Vigotski (1896-1934), Alexander Romanovich Luria

(1902-1977) e Alexei Nikolaievich Leontiev (1904-1979) trouxeram novos elementos

para pensar a relação entre aprendizagem e desenvolvimento, o que acabou por

interferir na forma de entender a avaliação psicológica e psicoeducacional onde,

[...] toda função no desenvolvimento cultural da criança aparece em cena duas vezes, em dois planos; primeiro no plano social e depois no psicológico, a princípio entre os homens como categoria interpsíquica e logo no interior da criança, como categoria intrapsíquica. Isto se refere de igual forma para a atenção voluntária, à memória lógica, à formação de conceitos e ao desenvolvimento da vontade. Temos pleno direito de considerar a tese exposta como uma lei, mas a passagem, naturalmente, do externo ao interno, modifica o próprio processo, transforma sua estrutura e funções. Atrás de todas as funções superiores e suas relações se encontram geneticamente a relações sociais, as autênticas relações humanas (VYGOTSKI, 1931/1995, p. 150).

Enfatizadas nos estudos de Vigotski (1996), as relações entre

desenvolvimento e aprendizagem ocupam lugar de destaque, principalmente na

educação e propõem uma reflexão histórica do psiquismo humano, propondo a

construção de uma psicologia fundamentada no marxismo e partindo de uma

concepção filosófica que concebe o homem como ser histórico, ressaltando a

importância de compreender os processos psicológicos do ser humano e sua história

de vida, levando em consideração a forma e o momento de sua intervenção no

processo de desenvolvimento, devendo o investigador atentar-se para a busca da

essência do fenômeno dentro de um contexto histórico determinante.

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Vigotski (1995) afirma ainda que, ao investigar um fenômeno psicológico,

deve-se partir da análise do processo, e não do objeto; deve-se priorizar a análise

explicativa e não descritiva; e deve-se utilizar a análise genética, que volta ao ponto

de partida e restabelece todos os processos de desenvolvimento.

Com respeito às práticas avaliativas na educação especial existem muitas

discussões e sugestões, porém pouca ação concreta. As práticas avaliativas

deveriam assumir características diferentes:

O habitual processo de avaliação diagnóstica não tem sido suficiente para estabelecer qual a forma de ensino mais adequada para atender essa clientela e como avaliar seu potencial de aprendizagem. Os erros no procedimento diagnóstico, a inexistência de avaliação e acompanhamentos adequados vem perpetuando uma série de equívocos quanto aos processos de ensino e aprendizagem desses alunos, essencialmente naqueles com deficiência mental (OLIVEIRA, 2005, p. 55).

Sob a análise dessa discussão, destaca-se uma redução do processo

avaliativo às técnicas estatísticas para verificação do aprendizado escolar e

desempenho dos alunos.

[...] ao pretender estudar um fator ativo pretensamente estável e fornece as indicações prognósticas decisivas, defendem a ideia de uma fatalidade da deficiência mental e refreiam assim o desenvolvimento de métodos pedagógicos ativos, científicos e diferenciados destinados à crianças diminuídas (LEONTIEV, 2004, p. 339).

Os desafios encontrados para o atendimento desses alunos são muitos, por

isso faz-se necessário um maior preparo teórico, leituras e estudo sobre temas

pertinentes, buscando melhor embasamento cientifico para que se possam pensar

as práticas educativas visando possibilitar que as crianças de fato se apropriem dos

conteúdos elaborados historicamente pela humanidade e sejam também sujeitos

ativos no processo de transformação social, desempenhando um trabalho

satisfatório em sala de aula.

Neste sentido, a avaliação psicoeducacional precisa ir além da avaliação do

aluno, de seus conhecimentos, potencialidades e fatores orgânicos de

desenvolvimento, sendo necessária também uma avaliação institucional e de suas

metodologias, dos conteúdos que esta oferece aos alunos, bem como da

qualidade das mediações para um projeto de vida humanizada.

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Nagel (1985, p. 29) afirma que “a avaliação só tem função social quando está

intimamente vinculada a um projeto de vida para os homens. Educa-se, ensina-se,

para a sociedade que se deseja ser transformada”.

Em síntese, a avaliação constitui-se um instrumento que extrapola o âmbito

educacional para o âmbito sócio-educacional, ao considerar a função social da

escola e da sociedade onde a criança está inserida, sendo menos excludente e

seletiva e mais dinâmica, desenvolvimentista e revolucionária, como proposta por

Vigotski e seus continuadores.

Implementação da Produção Didático-Pedagógica

A intervenção pedagógica na escola foi realizada no período de março a junho

do ano de 2014, através da Produção Didática Pedagógica, que consistiu na

realização de curso para pedagogos, professores do ensino regular e professores da

Sala de Recursos Multifuncional–Tipo I, funcionários e agentes educacionais do

Colégio Estadual Padre Anchieta, como já mencionado.

A realização dessa formação ocorreu em parceria com o Programa

Institucional de Ações Relativas às Pessoas com Necessidades Especiais-PEE da

Universidade Estadual do Oeste do Paraná-UNIOESTE.

O estudo teve como principal objetivo propiciar a reflexão coletiva sobre a

justificativa e problematização do tema proposto, tendo como fundamentação teórica

os pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural já apresentada. Utilizou-se de

metodologias diversificadas que contemplou estudos, pesquisas, debates, palestras,

dinâmicas de grupos e oficinas tecnológicas, utilizando-se o software JClic, além de

depoimentos, troca de ideias e experiências que fizeram parte do processo de

avaliação. Contou com a participação de profissionais mestres e doutores do PEE,

que contribuíram na busca da compreensão e aprofundamento teórico-metodológico

sobre a função social da escola no processo de escolarização, mediação e

intervenção pedagógica do professor, entre o conhecimento e o aluno em sua

dimensão individual e social.

O curso de formação continuada foi realizado em 10 encontros de 04 horas,

sendo 07 presenciais e 03 na modalidade EAD, com carga horária total de 40 horas.

Nos encaminhamentos teóricos metodológicos à distância, as atividades e tarefas

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foram realizadas individualmente e em pequenos grupos, conforme a diversidade

dos participantes e mediadas pela tutoria do professor PDE.

Por se tratar de temas relevantes para atender aos desafios da realidade

escolar, os encontros aconteceram às quintas-feiras, no período noturno, levando em

consideração a disponibilidade e horário de trabalho da maioria dos envolvidos, num

total de 35 participantes, com diferentes formações, atuação e vínculos: Educação

Infantil, Ensino Fundamental e Médio, Educação Especial e Fonoaudiologia.

O curso realizado teve como embasamento teórico as contribuições da

Psicologia Histórico-Cultural, na busca de intervenções e mediações para repensar

coletivamente sobre o processo da avaliação psicoeducacional no contexto escolar

para com os alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem e ou transtornos

funcionais específicos, e o software como recurso tecnológico, articulador necessário

nas ações pedagógicas.

No curso foram abordados e discutidos os referenciais teóricos: 1- Pessoas

com deficiência na política da assistência social: refletindo sobre concepções

(TURECK, 2003); 2- Os sujeitos da educação especial a partir da perspectiva

Histórico-Cultural (ROSSETTO, 2012); 3- Dificuldades de aprendizagem (DA):

doença neurológica ou percalço pedagógico? (SZYMANSKI, 2012); 4- O

desenvolvimento do psiquismo (LEONTIEV, 2004); 5- Pedagogia histórico-critica e

psicologia histórico-cultural (MARTINS, 2010); 6- Softwares Livres Educacionais -

JClic (PARANÁ, 2012).

Em depoimentos, os professores do ensino regular relataram que o curso foi

de grande importância por ter proporcionado momentos de reflexão, construção e

reconstrução de conhecimentos em diferentes áreas, contribuindo para a melhoria da

prática pedagógica. Destacaram a oportunidade de trocas de ideias e experiências

entre os pedagogos, professores da educação especial, funcionários, agentes

educacionais, família e, principalmente, os momentos de discussão e articulação

com os professores do ensino regular.

Também a possibilidade de manifestar suas preocupações, angústias,

inseguranças e dúvidas sobre o processo pedagógico na perspectiva da educação

inclusiva, bem como, a relevância da fundamentação teórica à luz da Psicologia

Histórico-Cultural que o curso proporcionou através de orientações, esclarecimentos

e encorajamento em busca de caminhos para a superação dos obstáculos frente às

dificuldades de aprendizagem encontradas.

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Os participantes demonstraram ter reconhecido a necessidade do trabalho

colaborativo entre os professores do ensino regular, das salas de recursos

multifuncional e equipe pedagógica, conhecendo e contribuindo com a dinâmica da

escola e as interações necessárias com a comunidade escolar, conforme Instrução

nº 016/2011, que prevê “quanto ao cronograma de atendimento que deve constar um

horário para realização do trabalho colaborativo com professores do ensino regular e

família” (PARANÁ, 2011).

Avalia-se a realização do curso como um evento dinâmico, produtivo e

participativo, no qual os participantes manifestaram sua satisfação em conhecer e

debater as temáticas e produzir novos conhecimentos para ampliar, aprofundar e

enriquecer seus conceitos e práticas pedagógicas.

O Grupo de Trabalho em Rede - GTR5 contou com 17 professoras

participantes de forma interativa, colaborativa e propositiva, demonstrando interesse

e diferentes expectativas pelo tema, o qual instigou, segundo vários relatos, a

necessidade urgente de rever, repensar as práticas pedagógicas no contexto da

educação de um modo geral, mas principalmente a educação especial e inclusiva,

enfatizando nesse momento a necessidade e importância do estudo e pesquisa

sobre a concepção teórico-metodológica numa abordagem histórico cultural.

Recomendações e contribuições foram trazidas pelos professores

participantes do GTR, dentre elas, a relevância do projeto e a qualidade do trabalho

desenvolvido, para que seja apresentado e socializado com Chefias e Equipes da

Educação Especial dos Núcleos Regionais de Educação, promovendo formação

continuada nas escolas.

Considerou-se necessária uma revisão de alguns dos conceitos da psicologia

educacional na perspectiva histórico cultural, para assim, poder relacioná-los às

ações pedagógicas no processo educativo e discutir suas implicações no fazer

pedagógico e na prática docente.

5 O Grupo de Trabalho em Rede - GTR realizado durante implementação do Projeto de Intervenção

Pedagógica na escola constitui-se em uma política educacional de formação continuada, que proporciona um espaço próprio e cria uma sequência de exposição de estudo e discussão das atividades de implementação do projeto de intervenção pedagógica na escola através de trocas de ideias e experiências sobre o objeto de pesquisa e o aprofundamento teórico-metodológico nas áreas do conhecimento, tem como principal característica a interação virtual entre o professor PDE e demais professores da Rede Pública Estadual do Paraná.

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A partir das contribuições acima citadas foi possível refletir também sobre as

práticas pedagógicas atuais que merecem uma atenção especial no momento da

elaboração do plano de trabalho docente, do planejamento participativo, conselho de

classe, hora/atividade, a maneira como é abordado o tema: dinâmica do processo e

resultado sobre avaliação, considerado um dos aspectos fundamentais no processo

educativo em todas as modalidades de ensino. Para Vygotsky "o processo de

ensino-aprendizagem inclui sempre aquele que aprende, aquele que ensina e a

relação entre essas pessoas" (OLIVEIRA, 1993, p. 57).

Percebeu-se que os professores precisam de formação continuada quanto ao

uso das tecnologias. Saber operar programas e equipamentos - que mudam cada

vez mais rapidamente - não é a principal demanda de gestores e professores. O

verdadeiro desafio está em associá-los aos temas de estudo para realizar melhor a

tarefa de aprender e ensinar, destacando a importância do uso de instrumentos

tecnológicos, como o software JClic, recurso com múltiplas formas de atividades

implementado na escola, obtendo ótimo resultado.

No caso das atividades realizadas com o software JClic, foi possível constatar

a necessidade de mais aulas presenciais para o domínio tecnológico, ressaltando

que este recurso pode e deve ser utilizado, realimentado e reformulado com a

demanda de cada escola e de acordo com as necessidades específicas de cada

aluno.

Também foi destacado pelos participantes que o presente projeto veio dar

ânimo e esperança para os profissionais que almejam mudança no processo de

Avaliação Psicopedagógica, pois acredita-se que a partir do momento em que

houver humanização e qualidade nas avaliações, a prática pedagógica desenvolver-

se-á com mais eficiência.

Os participantes contribuíram efetivamente com suas ideias, sugestões,

relatando suas experiências, seus anseios por mudanças, necessidades urgentes de

aprimorar em suas atuações.

Observou-se que não houve contradição pelos participantes sobre as

concepções de avaliação da aprendizagem apresentadas, trazendo grandes

acréscimos para a implementação e intervenção do projeto na escola.

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Considerações Finais

Pelas discussões realizadas e as atividades escritas, bem como as atividades

desenvolvidas a partir do GTR, pode-se evidenciar que os pedagogos, professores,

funcionários e agentes educacionais participantes, modificaram sua concepção de

educação especial e inclusiva, ampliaram seus conhecimentos e refletiram suas

práticas pedagógicas na forma de pensar, sentir e agir em relação ao processo

educativo e o desenvolvimento social e cultural dos alunos com dificuldades de

aprendizagem e transtornos funcionais específicos em relação aos demais alunos na

sala de aula comum, atingindo os objetivos propostos e resultados esperados.

A direção e equipe pedagógica do colégio acompanharam e avaliaram as

atividades realizadas de forma positiva, ressaltando a importância da contribuição

dessa formação continuada para a educação inclusiva. Quanto ao PDE, a professora

orientadora deu parecer aprobatório às atividades desenvolvidas pela ministrante do

curso.

Considerou-se que os resultados alcançados estão de acordo com a

abordagem da Psicologia Histórico-Cultural, que propõe uma nova concepção de

sujeito e reconhecimento da educação como processo de humanização.

Em consonância, Nagel (1985) enfatiza que é preciso clareza, para qual tipo

de sociedade e de homem trabalha-se, e que a avaliação só tem função social,

quando está intimamente vinculada a um projeto de vida para os homens. Partindo

deste contexto, a escola que está a serviço da sociedade e de uma sociedade que

precisa ser transformada, necessita repensar as suas práticas pedagógicas, o que foi

realizado e que contribuiu para a efetivação com êxito da proposta desse trabalho.

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