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Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed por Mariana Sandroni em set. 2014 1 Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º Encontro Nacional de Inovação em Fármacos e Medicamentos 8º ENIFarMed Coordenação, compilação, e revisão ortográfica: Mariana Sandroni Em setembro de 2014

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º Encontro ... enifarmed/Relatorio... · Para obtenção de um adensamento da cadeia de biológicos será necessário capacitar recursos

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Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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Relatório de Resultados e Desdobramentos do

8º Encontro Nacional de Inovação em Fármacos e Medicamentos

8º ENIFarMed

Coordenação, compilação, e revisão ortográfica: Mariana Sandroni

Em setembro de 2014

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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SUMÁRIO

Item N. Pág.

Agradecimentos 3

1) Resumo 4

2) Introdução 5

3) Resultados 6

3.1) 1ª Plenária “Trajetória da inovação no Complexo Industrial da Saúde” 6

3.2) 2a Plenária “Regulação de fito e toxinoterápicos e o uso da biodiversidade brasileira” 10

3.3) 3ª Plenária Internacional “Como usar a regulação em favor da inovação” 16

3.4) 4ª Plenária “Capacitação de recursos humanos para biotecnologia” 17

3.5) Sessão Temática 1 “Pesquisa Clínica: o que queremos para o Brasil?” 18

3.6) Sessão Temática 2 “Do petróleo ao medicamento: como equacionar a dependência da importação de farmoquímicos”

19

3.7) Sessão Temática 3 “Adensamento da cadeia de suprimentos farmacêutica e o nicho dos biológicos”

20

3.8) Sessão Temática 4 “Incorporação de novas tecnologias no SUS” 24

3.9) Sessão Temática 5 “Barreiras ao acesso a novos produtos para saúde: proteção de dados apresentados para o registro de medicamentos, e propriedade industrial”

27

3.10) Sessão Temática 6 “Inovação Farmacêutica Veterinária” 28

3.11) Sessão Temática 7 “CROs e os estudos pré-clínicos” 29

3.12) Sessão Temática 8 “Instrumentos de fomento” 30

4) Conclusões 31

5) Desdobramentos 41

6) Programa realizado do 8º ENIFarMed 43

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos os participantes do 8º Encontro Nacional de Inovação em Fármacos e

Medicamentos (8º ENIFarMed) pelo amplo debate sobre temas de suma importância para o setor saúde e

para o país como um todo pois, sem o público presente, não poderíamos validar propostas e discutir os

pontos mais relevantes. Também agradeço à equipe da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica

(Protec) e do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento em Fármacos e Produtos Farmacêuticos (IPD-Farma)

pelo apoio na divulgação e realização do evento. Aos parceiros, agradeço e peço manutenção do

relacionamento institucional.

Cabe um agradecimento especial aos patrocinadores e apoiadores do 8º ENIFarMed, além dos

associados do IPD-Farma, pois sem eles nada seria possível.

Para finalizar, tenho a honra de destacar e agradecer profundamente a excelente qualidade das

relatorias técnicas entregues pelos profissionais listados abaixo, por ordem alfabética, material esse que deu

base e viabilizou a elaboração do presente relatório.

Alessandra Dossi Gabas, SCTIE / Ministério da Saúde

Beatriz Bulhões, SBPC

Carla Beatriz de Paulo, Pro Reg Casa Civil

Eduardo Motti, SBMF

Fabiana Palma, Abrifar

Fernando Varella, Protec

Heloisio Rodrigues, Phase Pharma

Jorge Costa, VPPIS / Fiocruz

Maria da Conceição Monteiro, Farmanguinhos / Fiocruz

Mauro Pacanowski, FGV Projetos

Rose Katharine Couto, SESAB

Rubens Alves Pereira, Nupeec / UFPel

Tatiane Baptista, UERJ e GECIV

Teresa Lowen, Gestec / Fiocruz

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1) RESUMO

O 8º Encontro Nacional de Inovação em Fármacos e Medicamentos (8º ENIFarMed) foi realizado em São

Paulo nos dias 8 e 9 de setembro de 2014, quando se debateu vários temas prioritários para a inovação em

saúde. Segue um breve relato das plenárias e sessões temáticas. A trajetória da inovação no Brasil é recente

e tem na saúde um grande potencial de desenvolvimento. Assim, a saúde deve ser tratada como um sistema

produtivo e, neste ponto, é preciso pensar em reconstruí-lo trazendo a indústria, serviços e produtos para

debater de forma conjunta como podemos capitalizar a cadeia de valor e amenizar gargalos como (1)

Regulação; (2) Preço; (3) Pesquisa clínica; e (4) Carga tributária. As empresas nacionais precisam utilizar

estratégias de diferenciação sustentáveis, catch-up em biotecnologia bem sucedida, e inserções

internacionais, junto a uma consolidação de estruturas de governança e a uma articulação virtuosa entre a

necessidade de saúde e a política industrial, que têm sido potencializadas no ENIFarMed, pois a

oportunidade está no tripé: inovação incremental, biotecnologia, e inserção internacional.

Com a intenção de resolver os entraves do uso da biodiversidade brasileira em função do marco legal

vigente, o Projeto de Lei 7735 foi encaminhado ao Congresso Nacional em 24 de junho de 2014, sob regime

de urgência. Porém, o PL 7735 carece de mais debate no Congresso, que enseja: ter uma norma única que

revogue totalmente a MP 2.186/2001, resolver a pendência dos outros 6 projetos encaminhados ao

Congresso sobre mesmo tema, e incluir na análise o acesso a recursos genéticos para alimentação e

agricultura, com o apoio de seus respectivos ministérios, ainda neste ano.

Para fortalecer mecanismos regulatórios que podem promover a inovação, o setor regulado deve

melhorar a qualidade dos dossiês enviados à agência e a Anvisa deve agilizar a avaliação dos processos de

análise e implementar normas que padronizem os procedimentos, além de melhorar a capacitação dos

servidores para lidar com esses temas de alta complexidade.

A capacitação de recursos humanos para biotecnologia e para nanotecnologia ainda é insuficiente em

termos quantitativos e qualitativos, pois 80% dos alunos que saem das escolas não estão preparados para o

mercado de trabalho.

Quanto à Pesquisa Clínica no Brasil, ainda sofremos com os prazos lentos de autorização para início da

pesquisa, com entraves inter-organizacionais, e com uma participação de patrocinadores e voluntários,

dentre outros, em desigualdade de condições com os demais atores do processo. A indústria de capital

nacional faz todo o desenvolvimento no Brasil, precisando de apoio e de excelência e, portanto, fica cada vez

mais avessa ao risco.

Como incentivo para a produção de farmoquímicos e insumos no Brasil destaca-se a necessidade de

buscar mecanismos tais como: diminuição da carga tributária; diminuição de encargos; aumento de

financiamento para P&D e produção; suporte para a criação de parques tecnológicos para produção de

intermediários; regulação sanitária buscando uma isonomia regulatória; incentivo ao estabelecimento de

parcerias das Universidades com as empresas; diminuição da burocracia para exportação. A ANVISA deveria

implementar, rapidamente, mecanismos internos para diminuir o tempo para concessão de registro e pós-

registro.

Para obtenção de um adensamento da cadeia de biológicos será necessário capacitar recursos

humanos e certificar e manter os certificados nas instituições prestadoras de serviços, além de mostrar que

não existe diferença entre o biossimilar e o referência. Adicionalmente, o país precisa ter um plano de

medicação de risco para imunogenicidade encontrada nos produtos aqui desenvolvidos. Mas, como definir a

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produção de anticorpos neutralizantes? Como será detectado o problema da reação infusional? Esses e

outros pontos devem ser analisados, em conjunto com a sugestão de maior interação dentre a cadeia de

valor, para desenvolver uma plataforma tecnológica de risco que atenda aos players de todos os tamanhos,

e que tenha em mente as possibilidades de exportação para a América Latina.

Para que se possa melhorar a efetividade da incorporação de novas tecnologias pelo SUS várias ações

precisam ser coordenadas. É preciso que os órgãos compradores e fornecedores conheçam a lei; é

necessário investimento em capacitação e profissionalização de recursos humanos e maior interlocução

entre fornecedor e cliente; é necessária uma mudança de comportamento de ambos os lados, vislumbrando

um ambiente melhor gerenciado e otimizado - a tecnologia pode ajudar neste processo na organização das

informações e na geração de conhecimento para promover as mudanças requeridas e a gestão necessária; é

preciso ter acesso a ferramentas mais amigáveis e à formação e capacitação de recursos humanos. O

processo de compras públicas deve ser melhor gerenciado e as demandas judiciais podem ser um indicador

da necessidade de incorporação de determinadas tecnologias pois enquanto não funcionar a justiça

processual, a judicialização vai ser a solução paliativa.

No tocante à inovação tecnológica, é necessária a proteção do data-package, e também há necessidade

urgente de uma regulamentação do prazo no qual a ANVISA estará impedida de utilizar os dados clínicos em

seu poder para a aprovação do registro de medicamentos genéricos. Há que se estipular um prazo para a

proteção do data-package, pois ele aumenta a proteção intelectual já que a patente não revela totalmente o

invento, necessitando do uso dos dados. A não utilização dos dados pode acarretar a realização

desnecessária de testes em animais e em humanos. Há que se ponderar bastante quando falamos de saúde,

sistema de saúde, acesso à vida, diferentemente de acesso a outras tecnologias. Mas qual o limiar entre o

direito privado e o direito humano? Quem vai decidir é o juiz, pois assim consta na Constituição Brasileira de

1988.

Como entraves para a inovação farmacêutica veterinária temos: o ambiente regulatório para inovar no

Brasil; a certificação e o credenciamento de laboratórios; os meios de captação de recursos. Por outro lado,

as empresas podem se organizar para criar um ambiente ainda mais favorável à inovação, utilizando

produtos de uso compartilhado entre humanos e a área veterinária, pois há similaridade entre a cadeia

produtiva farmacêutica veterinária e a humana e a complementaridade dos setores facilita a diluição dos

custos com pesquisa, desenvolvimento e inovação, aumentando a competitividade das operações.

Quanto à evolução dos Estudos Pré-Clínicos, acredita-se que teremos de conviver com métodos com

e sem o uso de animais por ao menos cerca de 20 a 30 anos até ser factível incorporar o uso de testes em

células humanas e outros métodos alternativos de forma mais barata e acessível.

E quanto aos instrumentos de fomento para empresas inovadoras e que crescem rapidamente

conclui-se o que já se falou anteriormente: o país precisa urgentemente do aumento no número de

empresas inovadoras, que utilizem profissionais graduados e pós graduados, além de técnicos em diversas

áreas, pois precisamos diversificar a economia do país.

2) INTRODUÇÃO

O 8º Encontro Nacional de Fármacos e Medicamentos (ENIFarMed) foi realizado nos dias 8 e 9 de

setembro de 2014 no Centro de Convenções Rebouças, São Paulo, e reuniu 281 representantes de toda a

cadeia produtiva, universidades e governo para debater temas políticos, estruturais e regulatórios que têm

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impacto direto no investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novos produtos. A Sessão de

Abertura do encontro contou com a presença do diretor do BNDES, Julio César Ramundo, do secretário de

Inovação do MDIC, Nelson Fujimoto, e do secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do

Ministério da Saúde, Carlos Gadelha, que analisaram o histórico evolutivo da inovação tecnológica no

Brasil e apontaram as principais dificuldades e avanços do setor.

E, para dar continuidade às discussões desses últimos sete anos e traçar os novos rumos,

o programa desta oitava edição apresentou quatro Plenárias para debater a Trajetória da inovação no Complexo

Industrial da Saúde, a Regulação de fito e toxinoterápicos e o uso da biodiversidade brasileira, Como usar a

regulação a favor da inovação no Brasil, e a Capacitação de Recursos Humanos para Biotecnologia.

Dentre as Sessões Temáticas, foram discutidos: Estudos pré-clínicos, Pesquisa Clínica,

Farmoquímicos, Cadeia de suprimentos de biológicos, Incorporação de novas tecnologias, Proteção do data-

package, Inovação farmacêutica veterinária, e Instrumentos de fomento. E, para criar um ambiente de troca

técnica e interação empresa-universidade, foi mantida a Premiação Reconhecimento Técnico, momento em

que são apresentados os trabalhos submetidos ao ENIFarMed que provarem ser inovadores, com foco no

mercado e/ou relevância social.

Ao final deste relatório, encontra-se o programa realizado do 8º ENIFarMed.

3) RESULTADOS

3.1) 1ª Plenária “Trajetória da inovação no Complexo Industrial da Saúde”

A plenária visava analisar a situação atual da indústria farmacêutica no Brasil, sua inserção no

universo da inovação, sua implicação na questão do acesso à saúde e sua interação no tripé das políticas de

saúde, instituições governamentais e setor privado. No âmbito do ENIFarMed, os problemas que atrapalham

a competitividade nacional vêm sendo exaustivamente discutidos mas nunca é demais lembrar que a lista é

extensa e inclui a carência da infraestrutura, falta de produtividade, elevada carga de impostos, mão de obra

deficiente, base tecnológica defasada, alta taxa de juros e uma moeda valorizada, o que forma o chamado

“Custo Brasil”, que sufoca as empresas que atuam neste país. O reflexo desses obstáculos fica evidente na

escalada do déficit comercial da indústria de transformação, que fechou o ano passado em US$ 59,7 bilhões.

Até 2007, o saldo estava positivo em US$ 18,7 bilhões. Nos últimos 25 anos, o Brasil foi perdendo

intensidade na sua indústria, foi se voltando cada vez mais para dentro, para o seu mercado interno, sem

aquela oxigenação que uma projeção externa é capaz de dar. O Brasil já perde na largada: ainda na fase da

construção, o investidor que decide levantar uma planta em território nacional gasta até 8,75% a mais

comparado a outra nação. Para produzir, os problemas se avolumam, pois a burocracia é elevada e os custos

na operação se multiplicam, e quem quiser exportar terá de superar até 17 processos alfandegários

diferentes e uma infraestrutura precária para conseguir inserir seu produto no mercado internacional. No

final, o resultado dessa equação perversa é um produto 33,7% mais caro do que o fabricado pelos principais

parceiros do país.

O custo regulatório da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que detêm uma imagem de

qualidade no exterior pelo que produz e escreve, mas não tem a mesma sintonia para fiscalizar e organizar o

mercado nacional, é outro problema pro empresariado. A agência sofre o dilema entre ser rígida no registro

e afrouxar no cumprimento, por exemplo, das prescrições e fiscalizações. Enquanto existe uma enorme

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defasagem que pode chegar a 12 anos para resolver processos, a mesma agência emite várias Resoluções de

Diretoria Colegiada (RDCs) para normatizar o mercado, além de possuir em seus quadros uma equipe

inexperiente, insuficiente, e de poucos recursos técnicos, além de utilizar uma tecnologia da informação

ultrapassada. Mas não somente a ANVISA tem este tipo de problema. O Instituto Nacional de Propriedade

Industrial (INPI) é conhecido pela morosidade de sua atuação, análise e concessão de patentes, o que

ocasiona prejuízos e litigância judicial.

Quanto às novas abordagens adotadas pela ANVISA, verifica-se que: em 2010 foi adotada nova regra

para produto biológico diferente das agências internacionais; norma brasileira tem impacto nos

investimentos e tem sido debatida no cenário internacional; ANVISA não adota biossimilares ou biogenéricos

como conceitos; regra está no compasso do desenvolvimento e avançará na mesma sintonia; há

reconhecimento de que a parte operacional é mais lenta e, assim, a demanda será sempre maior; e há busca

contínua de aperfeiçoamento e modos de fazer diferentes como, por exemplo, a criação dos Comitês

Regulatórios, com redução de mais de 50% do tempo regulatório, e a publicação da Resolução Normativa RN

02/2010. No que se refere à Pesquisa Clínica, há necessidade de uma nova estrutura, acompanhamento

prévio, e aprovação do protocolo. Quanto à fase Pré-clínica, a situação ainda não está definida e a agenda

continua inconclusa, tanto da parte da ANVISA, quanto do segmento produtivo. Quanto à agilidade no

registro sanitário, verifica-se falha de documentação em cerca de 60% dos processos, portanto essa é uma

questão que tem que ser enfrentada dentro das próprias empresas. Pelo lado da indústria, verifica-se a

necessidade de qualificar a inovação em seus dossiês: ela abaixa o custo? Aumenta o acesso? Oferece ganho

terapêutico?

Dentro da proposta da agência de desburocratização e simplificação de seus processos, existe um

sistema de corresponsabilidade entre o sistema de vigilância sanitário estadual, municipal e a ANVISA para

que as decisões não causem impacto nos processos operacionais. Neste cenário, a vigilância sanitária tem

autonomia regional mas muitas vezes não existe sincronia, ou seja, as diferenças de autonomia regionais

influenciam como um todo o sistema, afetando a definição de estratégias e o compartilhamento de

responsabilidade para os devidos controles. Como todo modelo, é fundamental um entendimento maior

entre as instituições para que as estratégias possam ser internalizadas com maior eficiência, reduzindo os

ruídos de comunicação. Por outro lado, o arcabouço regulatório brasileiro é reconhecido mundialmente, o

que nos leva a entender que nossos controles e processos são bem avaliados sendo reconhecidos pela

confiança e credibilidade, o que por vezes incide numa observância de prazo maior. A ANVISA está

trabalhando para tornar seu sistema mais ágil e minimizar o uso tempo de seus funcionários na formulação

de regulamentos: atualmente são emanadas cerca de 60 resoluções anuais o que já é um avanço perto das

250 anteriormente apresentadas.

A deficiência em logística em um país extenso e tropical é outro gargalo fundamental. Os custos de

transporte e armazenagem mais a segurança e ambiente específico para se manter os insumos e

medicamentos causam elevação nos custos, refletindo-se para o consumidor final. Outro ponto importante é

o fato de o Brasil produzir uma grande quantidade de doutores e artigos científicos que não se traduzem em

riqueza nem em inovação. Com referência ao número de patentes farmacêuticas, o país tem atualmente 262

patentes, valor muito abaixo dos principais países do mundo além de outros de menor poder de mercado.

Por outro lado, mesmo com um cenário não muito favorável à inovação, o Laboratório Cristália é a

única empresa farmacêutica brasileira que realiza a cadeia completa de P&D&I - concepção do projeto,

desenvolvimento do princípio ativo farmoquímico ou biotecnológico, prospecção da propriedade intelectual

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e industrial, tecnologia farmacêutica, estudos de estabilidade, testes clínicos para comprovação da eficácia e

segurança, fabricação do produto até a disponibilização do medicamento no mercado, estando fortemente

direcionada a estratégia de patenteamento de seus novos produtos. Investe de 7% a 10% do seu

faturamento anual nas atividades de P&D&I, preferindo se concentrar em substâncias com alto valor

agregado. O Cristália recebeu a concessão de 74 Patentes de Invenção, resultado de anos de investimentos

em P&D&I, sendo uma referência nacional e internacional na pesquisa e desenvolvimento, o que possibilita

a produção de qualquer tipo de molécula, em qualquer forma farmacêutica. O Cristália é a prova de que é

possível desenvolver inovações que possibilitem patenteamento e conquistar maior mercado através de um

plano de capacitação e qualificação constante da equipe e internalizando o conceito de inovação em todos

os departamentos, desenvolvendo o pensamento estratégico para mudança de característica seja de um

produto ou de sua embalagem, da melhor prática de armazenagem, reduzindo por exemplo tamanho do

comprimido, seja utilizando novos materiais ou design através da diferenciação de uma molécula. É

imprescindível o compromisso com a qualidade, oferecer um ganho terapêutico na inovação e, no caso de

um medicamento hospitalar, possibilitar a redução do índice de contaminação.

E, para impulsionar as empresas inovadoras e articular projetos junto a pesquisadores, o Brasil

dispõe de algumas agências e bancos de extrema relevância. A Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP)

tem apresentado uma variedade de instrumentos para apoiar a inovação como, por exemplo, subvenções,

financiamento não reembolsável com encomenda dos Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs), com

chamadas públicas, cooperativadas via empresas e ICTs e ou somente ICTs, mais financiamento de inovação

em pesquisa e o FINEP 30 dias sem edital. Passa a contar com um setor exclusivo para área de saúde, dada a

projeção e importância do setor. Serão apoiados projetos de P&D&I em farmoquímicos obtidos por

processos de síntese química, biotecnológicos e extrativos, para desenvolvimento de medicamentos, novos

ou genéricos, tanto para atendimento às demandas do Sistema Único de Saúde (SUS), quanto para o

atendimento ao mercado nacional e internacional. Será apoiado, também, o desenvolvimento de

intermediários químicos para a indústria farmacêutica. Nesta linha temática, devem também ser

fomentados projetos que envolvam a busca de competências tecnológicas para ampliar e consolidar a

produção doméstica de biofármacos - como anticorpos monoclonais e proteínas terapêuticas – no sentido

de incorporar a rota biotecnológica na base produtiva de saúde no país. O apoio a esta linha deve incluir os

processos de aprendizagem tecnológica e exploração de inovações, bem como a infraestrutura necessária ao

desenvolvimento pretendido, notadamente quanto à capacitação para escalonamento, estudos e pesquisas

pré-clínica e clínica e para o atendimento às exigências de certificação nacional. Serão apoiados

prioritariamente projetos para o desenvolvimento de produtos estratégicos ao SUS, em atendimento às

Portarias MS nº 978/2006 e nº 1284/2010, bem como para a adequação de produtos e serviços a

regulamentos técnicos, no Brasil e no exterior. Serão apoiados, ainda, projetos que visem à aquisição e

internalização de tecnologias estratégicas desenvolvidas no exterior, prioritariamente visando dar apoio às

políticas do Ministério da Saúde. Serão destinados recursos também voltados à qualificação técnica para o

fornecimento de produtos e serviços a empresas-âncora, com a finalidade de contribuir para a formação de

fornecedores locais, bem como startups, através das grandes empresas do setor como forma de estímulo à

renovação de seu portfólio tecnológico.

No exercício de 2014, a disponibilidade de recursos foi ampliada em duas vezes mais que a previsão

inicial, que era de 3.9 bi, sendo 2.7 bi em recursos reembolsáveis e 70 milhões em subvenção econômica. Em

equipamentos médicos, os recursos reembolsáveis somam 240 milhões e existem 30 milhões em

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subvenções econômicas. O investimento para 2014, somente para atender o plano de inovação, será de 900

milhões. Estão em contratação 500 milhões e em elaboração 350 milhões, perfazendo um potencial de 1.75

bilhões. E, aguardando manifestação, estão qualificados 1.30 bilhões. Para o FINEP 30 dias o valor estimado

é de 750 milhões, sendo contratados 250 milhões, em contratação 450 milhões, e em elaboração 50

milhões, perfazendo um total para 2014 de 2.5 bilhões. Em 2013 foram contratados 6.4 bi e, em 2014, 10 bi,

ou seja, 56% de incremento. Especificamente para área de saúde, em 2013 foi contratado 850 milhões e em

2014 o desempenho subiu para 1.7 bi, ou seja, houve 100% de aumento.

Com relação ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), pode-se afirmar

que o banco é indutor das políticas públicas e contribuiu para o crescimento da posição do setor Saúde no

desenvolvimento do país. O apoio à inovação é prioridade estratégica para o BNDES. O objetivo é fomentar e

apoiar operações associadas à formação de capacitações e ao desenvolvimento de ambientes inovadores,

gerando valor econômico e social e melhorando o posicionamento competitivo das empresas, o aumento da

eficiência produtiva e o crescimento sustentado do país. O entendimento do BNDES é que a inovação pode

ser tanto radical quanto incremental, desde que seja relevante para criar valor, aumentar a competitividade

ou a sustentabilidade do crescimento das empresas e que envolva esforço adicional para aumento de

capacidade produtiva, expansão ou modernização. Os dois principais desafios à atuação do BNDES –

inovação e fortalecimento de grupos nacionais – justificam-se pelo esperado aumento da concorrência

interna no mercado de genéricos, que deve reduzir, no médio e longo prazo, as margens desse segmento.

Para garantir a sustentabilidade das empresas no futuro, torna-se imprescindível o movimento em direção à

inovação. Contudo, para sustentar o custo das atividades associadas ao desenvolvimento de novos

medicamentos, é necessário um volume significativo de recursos. Empresas com estrutura de capital mais

forte serão mais capazes de destinar os recursos necessários para essas atividades.

Houve uma enorme evolução no crescimento dos investimentos o que pode ser constatado pelas

mudanças significativas no país desde a 1ª edição do Programa PROFARMA em 2004 até 2013, chegando à

cifra de R$ 57 bi. Este aporte está sendo fundamental para os interesses do país, haja vista a relevância do

mercado nacional em relação ao cenário internacional em crise, pois o mercado brasileiro vem crescendo a

taxas de 13 a 16% ao longo de 5 anos. Os fatores que influíram neste crescimento foram a maior mobilidade

social com ascensão da classe C, a transição demográfica e epidemiológica e a política industrial mais ativa.

Ficou caracterizada a enorme disposição do setor Saúde para a inovação e tecnologia, com o maior índice de

crescimento entre todos os setores da indústria de transformação. Como uma perspectiva e visão de futuro

para o setor, a continuidade da produção alicerçada na síntese química manterá sua trajetória pois há massa

crítica de competências acumuladas e ainda produtos integrantes da listagem RENAME importantes para o

SUS e a introdução da biotecnologia com esforço de investimentos, agregando uma nova trajetória e

competência. O BNDES tem interesse em intensificar apoio na expansão para novos mercados e inserir o

Brasil no sistema internacional de inovação e tecnologia, já que o percentual de crescimento das empresas

nacionais é visível, o que pode ser demonstrado com o aporte de 57% de capital nacional dentro deste

cenário. O BNDES, nos últimos 10 anos, aplicou R$ 4.8 bilhões em 105 operações: Reestruturação (31%);

Produção (26%); Biotec (29%); e Inovação (14%). Agora, na 3ª fase do Profarma, que prioriza a Biotecnologia,

a Inovação e a Produção, espera-se que nos próximos anos as empresas nacionais desenvolvam estratégias

de diferenciação sustentável com: Avanço (catch-up) em biotecnologia bem sucedido; maior inserção

internacional; consolidação de estruturas de governança; articulação virtuosa entre necessidades da área da

saúde e política industria,l como mostrado abaixo.

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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E, para promover as inovações, reduzir os custos dos medicamentos comprados pelo SUS, e oferecer

acesso à saúde, atualmente a Secretaria de Ciência e Tecnologia em Insumos Estratégicos (SCTIE / MS) tem

como uma de suas prioridades a revisão das atividades das Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo

(PDPs). A inclusão do tema Ciência, Inovação e Tecnologia (C,T&I)como um dos pilares básicos da agenda

política do século XXI e a construção de uma política de Estado acima de partidos e ideologias de longo

prazo, integrada com os diferentes players públicos e privados, deve ser um exemplo a ser seguido, trazendo

como experiência a reforma do sistema de saúde americano, onde ocorreu uma integração com a iniciativa

privada, principalmente da área farmacêutica. A interação entre a base industrial e a prestação de serviços

(hospitais, clínicas, e centros de diagnóstico) no atendimento à saúde impõe a necessidade de uma análise

integrada e sistêmica, entendida no conceito de Complexo econômico-Industrial da Saúde (CIS). Essa

abordagem se propõe a analisar a saúde de uma perspectiva mais ampla, que leva em conta a articulação

entre a geração e difusão tecnológica e a dinâmica social. As políticas de promoção do desenvolvimento

industrial e tecnológico passam, assim, a considerar sua articulação com as demandas sociais.

Dentro deste cenário é importante registrar a incapacidade de absorção de novos conhecimentos e

novas tecnologias se não houver maior investimento nas competências científicas e tecnológicas em nosso

país. Esta exigência de um olhar adequado às especificidades nacionais diz respeito também à identidade

histórico-cultural que deve definir as estratégias, ao contrário dos que propõem “modelos” construídos em

outros países, outras culturas. Os estudos desenvolvidos sobre as políticas de C,T&I e sobre as relações

entre universidade e sociedade nos levam a concluir que o conceito de tecnologia social compreende

produtos, técnicas e metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com uma coletividade e que

representem efetivas soluções de transformação social remete para uma proposta inovadora de

desenvolvimento, considerando a participação coletiva no processo de organização, desenvolvimento e

implementação. Está baseado na disseminação de soluções para problemas voltados a demandas e

carências concretas e resolução de problemas de saúde. E o Brasil é um dos únicos países dos BRICS a unir

tecnologia com social.

O diálogo entre setor produtivo-industrial e demais componentes complexo da saúde é uma

construção tipicamente brasileira em se comparando com os BRICS e mesmo em âmbito mais amplo. Essa

política é rara e tem como objetivo maior reduzir a vulnerabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS). O setor

saúde deve ser visto como um sistema produtivo que deve se orientar para a perenização e fluidez do

fornecimento ao SUS assim como para se antecipar à falta de Insumo Farmacêutico Ativo (IFA) no mercado

internacional que possa vir a comprometer esse fornecimento. A consolidação do CIS como política de

Estado passa por argumentos irrefutáveis como os gastos governamentais em saúde, da ordem de 20% do

PIB agregado, um novo marco regulatório acordado com a ANVISA, além de deixar explícito o processo de

poder de compra do Estado. O decreto nº 7.713, de 3 de abril de 2012, sobre a mudança da lei de compras

públicas no uso do poder de compra para alavancar iniciativas de desenvolvimento de tecnologia e inovação

vendo sendo amplamente discutido nas edições do ENIFarMed. O poder de compra do setor público passou

de 18% para 50% do mercado total nos últimos 5 anos, sendo que 90% da demanda pública é atendida pelo

governo.

3.2) 2a Plenária “Regulação de fito e toxinoterápicos e o uso da biodiversidade brasileira”

Há cerca de 13 anos, o Brasil convive com a Medida Provisória 2.186-16/2001 com bastante

dificuldade de operacionalização prática devido a entraves e subjetividades que não permitem sucesso em

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sua implementação. Desde então, várias propostas foram apresentadas à Câmara de Deputados. O último

esforço foi iniciado há 3 anos por entidades associativas, como Abifina e Grupo FarmaBrasil, em colaboração

com os ministérios MMA, MDIC e MCTI, feito para substituir a MP 2186-16/2001 com os seguintes objetivos:

conhecer melhor a biodiversidade e os conhecimentos tradicionais associados para possibilitar

desenvolvimento econômico e para proteger a nossa biodiversidade e a sociodiversidade.

As prioridades do governo no desenho deste projeto foram: tirar os entraves existentes para a

pesquisa, desenvolvimento e inovação; valorizar o conhecimento tradicional dos extrativistas, povos

indígenas, e inúmeras outras comunidades tradicionais que habitam o Brasil. Além disto, pretendeu

promover a bioindústria e a próxima fronteira de inovação tecnológica, fortalecer a competitividade do setor

produtivo, agregar valor ao nosso rico capital natural. Para fazer isto é importante superar o estágio atual de

criminalização de pesquisa científica, reconhecer a excelência das instituições científicas estabelecidas no

Brasil e sua capacidade de cooperação com outras instituições internacionais, efetivar de forma concreta a

repartição de benefícios em escala maior do que a atual e combater a biopirataria com inteligência, por meio

da rastreabilidade para, então, efetivar a repartição de benefícios. A situação atual tem alguns elementos

perversos, pois cria barreiras para a pesquisa e desenvolvimento sobre a sociobiodiversidade. Isso resulta

em obstáculos muito grandes para a inovação tecnológica e para obter patentes, disseminando desconfiança

entre os diferentes atores do sistema de acesso ao patrimônio genético e conhecimentos tradicionais

associados tais como pesquisadores, inovadores, indústrias, comunidades e agentes governamentais. A

insegurança jurídica gerada elevou fortemente a judicialização do processo, aumentando o custo de

transação para todos esses atores que interagem no sistema. E o resultado disso é um baixo êxito na

repartição de benefícios no Brasil - até 2011, apenas 30 contratos haviam sido celebrados. Desde então, o

Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN) passou por um processo de reestruturação bastante

grande, conseguindo dar mais dinamismo aos seus procedimentos - anuiu 80 contratos desde 2012. Apesar

do aumento do número de contratos celebrados, houve também, neste ínterim, 420 multas no sistema,

totalizando mais de 200 milhões de reais. Isto gera cautela por parte de quem está operando no sistema. E,

por conta disto, os potenciais beneficiários, como as comunidades tradicionais e aqueles que atuam na

manutenção dos conhecimentos tradicionais associados e na biodiversidade brasileira estão naturalmente

frustrados, pois existe uma legislação para proteger e efetivar os direitos destes agentes, e reconhecer as

ações que estes agentes têm realizado para a manutenção da sociobiodiversidade, mas sem efetividade.

Em suma, estamos operando muito aquém do potencial do Brasil, que é o país G1 em biodiversidade

e G5 em relação a conhecimento tradicional associado. A proposta do projeto de lei (PL), portanto, foi

primeiramente estimular a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação. Para isto, é preciso eliminar muitos

dos entraves iniciais para concepção de um projeto, substituindo o atual mecanismo de autorização prévia

por um mecanismo de cadastro, e com isto espera-se reduzir o tempo para emissão de autorização de 6

meses para alguns minutos. O projeto visa assegurar a repartição de benefícios com regras claras e

consistentes para minimizar o custo de transação e criar uma política que institui um Fundo Nacional de

Repartição de Benefícios, que irá aplicar seus recursos na conservação e uso sustentável da biodiversidade

brasileira e dos conhecimentos tradicionais. Desta forma, tira-se os entraves enfrentados pela bioindústria

brasileira.

O processo de construção do PL foi distinto de várias experiências antecessoras do MMA, que tem

um histórico limitado de atuação conjunta com outros ministérios. A construção do PL proporcionou um

processo de aprendizagem muito importante para o MMA, que teve uma interlocução sadia, transparente e

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produtiva com o MDIC e com o MCTI. Outros órgãos de governo também foram consultados, tais como

Ministério da Fazenda, Ministério da Cultura, Planejamento, Secretaria da Promoção da Igualdade Racial

(SEPIR), Ministério da Justiça, Funai, e outros. Mas o que realmente diferenciou a construção deste PL foi a

interação com a sociedade civil, notadamente, o diálogo com a indústria, com cerca de 8 a 10 setores

industriais. Também houve interação com comunidades tradicionais e agentes que participam do complexo

da pesquisa brasileira.

Um ponto fundamental no sistema de acesso é ter uma regra clara para repartição de benefícios.

Hoje, o dispositivo diz que a repartição de benefícios deve ser feita de forma justa e equitativa, dando

margem a um amplo espectro de interpretação, o que implica em insegurança jurídica. O intuito do governo

foi delimitar um parâmetro que atenda a estes anseios de forma justa e equitativa. Esse parâmetro serve

como base para realizar a repartição de benefícios monetária e não monetária: efetivação de projetos com

biodiversidade, manutenção de conhecimentos tradicionais associados, inclusão produtiva, inclusão

socioeconômica, e investimento em infraestrutura para pesquisa.

O escopo para a repartição de benefícios está alinhado com as melhores práticas internacionais já

delimitadas. Mas, naturalmente, diversos segmentos da indústria estão repletos de idiossincrasias e, para

acomodar tais diferenças, se propôs o estabelecimento de acordos setoriais, experiência que tem dado

resultados bastante positivos no âmbito do Plano Nacional de Resíduos Sólidos. A ideia desses acordos é não

comprometer a competitividade do setor, adequando a repartição de benefícios às possibilidades do setor,

podendo diminuir o percentual da repartição de benefícios exigida a até 0,1% da receita líquida. A repartição

de benefícios pode assumir duas modalidades: monetária, por meio da União ou diretamente com as

comunidades e a não monetária, que pode ser feita com a comunidade ou outros agentes, como institutos

de pesquisa, instituições de manutenção de coleções, algum tipo de reserva para proteção do patrimônio

natural, entre outros. O percentual determinado para a repartição de benefícios foi criado em cima de

negociação internacional. A Costa Rica, em sua legislação, cobra 5%. A Austrália estabelece o valor caso a

caso baseado em um mecanismo existente para fundamentar a negociação do governo. Infelizmente, o

Estado brasileiro não goza de uma reputação suficientemente ilibada para poder fundamentar uma

negociação caso a caso e, por isto, foi estabelecido um patamar único. E por que 1%? O Tratado

Internacional sobre Recursos Fitogenéticos para Alimentação e Agricultura (TIRFAA), ao regulamentar a

repartição de benefícios com a finalidade de alimentação e agricultura, estabeleceu 0,77% da receita bruta,

o que equivale a 1,1% da receita líquida. Esse foi o ponto inicial de partida. Após 2 anos de discussão,

concluiu-se que este era um percentual adequado. No entanto, alguns setores da indústria apresentaram

estudos que mostravam que não conseguiriam suportar este percentual de repartição de benefícios. E, como

o regulador não intenciona inibir qualquer atividade, propôs-se o mecanismo do acordo setorial para poder

tratar diferenças e particularidades entre os setores.

Outro aspecto importante do PL é dar incentivos para que os agentes que hoje estão enfrentando

problemas com o atual sistema possam se regularizar e focar em suas atividades principais que são a

inovação, pesquisa, desenho e comercialização de novos produtos. A regularização é baseada em Termo de

Ajustamento de Conduta (TAC) e prevê que as multas aplicadas, por conta do acesso ao patrimônio genético

e da pesquisa sobre conhecimento tradicional associado, sejam inteiramente perdoadas. Nos casos de quem

efetuou a exploração econômica, a contrapartida será a repartição de benefícios de até 5 anos para trás. No

caso de conhecimento tradicional associado, quem realizou exploração econômica vai poder ser beneficiado

em até 90% de desconto da multa que hoje está aplicada. Desta forma, espera-se que os agentes voltem

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para o sistema e para suas atividades principais, e possam aproveitar o rico potencial da biodiversidade

brasileira. Quanto à fiscalização, os agentes fiscalizadores continuam a ser o Ibama e a Marinha, que irão

fiscalizar a regularidade do acesso, se há ou não exploração econômica e, em havendo a repartição de

benefícios, se ela está sendo feita de acordo com as regras delimitadas.

A nova lei ainda vai estar sujeita a uma ampla regulamentação que terá de ser promovida pelo

governo federal em conjunto com todos os agentes que participam e são afetados pelo sistema. Não se pode

perder de vista que, para tornar esta lei efetiva, é preciso garantir inteligência na fiscalização por meio da

rastreabilidade e, assim, assegurar a repartição de benefícios. O PL não regula autorizações de outros

órgãos: o usuário ainda irá precisar da autorização para ingressar em uma unidade de conservação, em terra

indígena, ou uma área de fronteira, por exemplo.

A proposta do novo marco legal é repartição de benefícios com a União, muito mais simples, semter

que fazer negociação avulsa, caso a caso. Chama a atenção o fato de que muitas empresas que não foram

multadas têm protocolado solicitação de acesso no CGEN. A nova lei vai agilizar os trâmites em relação à

pesquisa porque vai substituir o procedimento atual de autorização prévia para se iniciar uma pesquisa por

um cadastro eletrônico. Atualmente, se a pesquisa tiver alguma perspectiva de retorno econômico é

necessário ainda que seja celebrado um contrato de repartição de benefícios, sem critério nenhum que

embase a definição do valor de tal repartição. Na nova lei, para efetuar qualquer tipo de pesquisa, seja

acadêmica, básica ou aplicada, não é mais necessário pedir autorização. O usuário vai precisar fazer um

cadastro que levará alguns poucos minutos. Assim, o pesquisador precisará apenas informar aos órgãos

reguladores para poder realizar sua pesquisa, não precisará esperar meses para receber uma autorização

para então começar a pesquisa. O tempo será reduzido de 5 meses para 5 minutos. Outra inovação que o

projeto traz é que a repartição de benefícios será cobrada apenas quando houver ganho econômico

concreto. A intenção é não antecipar custos transacionais sem que possam ser valorados.

O projeto foi enviado ao Congresso em 24 de junho, em regime de urgência, e já está trancando a

pauta de votação do Plenário da Câmara dos Deputados desde o do dia 11 de agosto. Foi criada uma

Comissão Especial para analisar a matéria, que ainda não havia sido instalada quando da realização do 8º

ENIFarMed. Essa Comissão recebeu várias indicações da bancada ruralista, apesar do projeto não tratar de

alimentação e agricultura. Em relação a esses temas, a interlocução com o Ministério da Agricultura,

Pecuária e Abastecimento (MAPA) foi difícil mas, desde que o projeto foi enviado ao Congresso, a

interlocução com a Frente Parlamentar da Agricultura (FPA) tem se mostrado bastante produtiva. Em

outubro, pretende-se realizar audiências públicas no Congresso, de forma a aumentar a transparência do

projeto. Para garantir a aprovação do projeto, é importante que o governo e indústria atuem em conjunto.

Porém, para que possamos entender o que esperar do legislativo frente à apresentação do PL

7735/2014 e dos demais anteprojetos de lei, é necessário saber como funciona o Congresso Nacional em

Brasília. O Poder Legislativo é bicameral, com duas Casas: o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, que

trabalham bastante próximas na aprovação de um projeto de lei. O projeto pode ser de iniciativa de uma das

Casas, da Câmara ou do Senado, e a outra então atuará como Casa Revisora. Se o projeto for aprovado na

íntegra pelas duas Casas ele vai à sanção presidencial, que poderá vetá-lo ou não. Se o Presidente não vetar,

o projeto está aprovado e vira lei mas, se vetar, o projeto volta ao Congresso Nacional que, em sessão

conjunta, irá analisar o veto presidencial, podendo manter ou derrubar o mesmo. Se o projeto for alterado

pela Casa Revisora, o mesmo volta para a Casa de origem, que pode manter as alterações ou não da Casa

Revisora e, depois de aprovado, segue para sanção presidencial. No caso da proposição ser de origem da

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Câmara dos Deputados, a Casa Revisora é o Senado Federal, e se a proposição se iniciou no Senado, a Casa

Revisora neste caso é a Câmara dos Deputados.

O projeto também pode ser de iniciativa do Poder Executivo e, desta forma, sua tramitação se inicia

na Câmara dos Deputados. O governo pode gestar um projeto, encaminhar para a Câmara dos Deputados e

pedir urgência. Neste ponto, cabe destacar o projeto que se originou no Senado, da então senadora Marina

Silva, o PLS 306/1995, há quase 20 anos atrás, que foi aprovado pelo Senado e hoje tramita na Câmara dos

Deputados com o número PL 4842/1998 com mais 6 projetos apensados sobre o mesmo tema. Em 2007, a

ideia de Marina Silva e do CGEN já era mudar o arcabouço de lei e, para isto, foi realizada uma consulta

pública durante um ano. Após a proposta praticamente pronta, faltando apenas alguns ajustes com as

comunidades tradicionais, houve a mudança de ministro e este assunto “caiu”. Com a nova gestão, o MMA

enviou à Casa Civil dois projetos distintos, devido à dificuldade de interação com a área da agricultura. No

entanto, esses projetos nunca saíram do lugar na Casa Civil, pois não havia e não há espaço para separar a

agricultura de um projeto sobre a biodiversidade.

Então: o que vai acontecer? Já que mais 6 projetos foram apensados ao PL 4842/1998 (PLS

306/1995), então todo o processo terá que voltar ao Senado. Em contrapartida, está em questão hoje no

Executivo o PL 7735, que foi gestado dentro do MMA, MCTI e MDIC e que é um projeto que foi discutido

com a sociedade brasileira. Este PL foi apresentado pelo Poder Legislativo em fins de junho. No início de

julho, a presidência da Câmara criou uma Comissão Especial para proferir o parecer. Até uma semana antes

do 8º ENIFarMed (final de agosto) ainda faltavam as indicações do PT e do PV, o que impossibilitava a

instalação de tal Comissão. Mas este é um ano eleitoral, também o ano da Copa do Mundo, o que dificulta o

processo interno na Câmara que tem seu ritmo próprio. O projeto tramita em regime de urgência

constitucional e tranca a pauta do Plenário desde o dia 11 de agosto. Para análise do projeto, o Deputado

Alexandre Roso contou com o apoio da assessoria técnica da Câmara, que concluiu que o PL não revoga a

MP 2186-16/2001, que ora disciplina a matéria. Além disto, o PL não traz regras para pesquisas ligadas à

agricultura e para a produção de alimentos, que continuarão a ser reguladas pela MP de 2001. O PL

tampouco regula a pesquisa sobre patrimônio genético humano que estão sujeitas à legislação específica.

Até o dia 25 de agosto de 2014, este PL já tinha 137 emendas. Será muito difícil apreciar um projeto em

regime de urgência, já com 137 emendas, numa Comissão Especial. E será necessário juntar toda a matéria

para discutir, além do PL 7735, suas emendas, pois essa imensa sobreposição de conteúdo, se transformada

em lei, trará grande insegurança e permitirá questionamentos jurídicos. Ou seja, o tema tem implicações

científicas, econômicas, sociais, ambientais e éticas, e cada uma destas proposições é inerentemente

complexa. Mesmo com um forte debate na Câmara, é imprescindível que seja aprovada uma norma única,

para que o Congresso Nacional se preocupe com a segurança jurídica e evite a judicialização. Porém, ao

receber regime de urgência constitucional (pela Presidente da República), os prazos de aprovação do PL

7735 são bastantes restritivos, em torno de 90 dias, tanto assim que a expectativa é que o PL seja aprovado

ainda neste ano.

Pode-se dizer que a dificuldade em se estabelecer uma legislação adequada no Brasil esteja

relacionada com o debate internacional que culminou com a adoção da Convenção sobre Diversidade

Biológica (CDB) durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em

1992, no Rio de Janeiro. Neste debate, percebeu-se que a indústria, ao utilizar a biodiversidade de vários

locais do planeta, e do Brasil em particular, poderia com este uso colaborar com repartição de benefícios

para que a biodiversidade pudesse ser mantida para pesquisas presentes e futuras. Como o Brasil é

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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signatário da CDB, este tema virou regra para o país. Esta é a razão de termos uma legislação de acesso e

repartição de benefícios.

O Brasil tem 1/5 da biodiversidade de todo o planeta, a qual tem sido aplicada em diversos setores

da indústria, tais como farmacêutica, agroindústria, novos materiais, biocombustíveis e outras, sendo uma

tendência para se buscar a inovação. O Brasil, oitava economia do mundo, tem um parque industrial

relevante e uma comunidade científica ativa, com grande produção científica. O Brasil possui, também, uma

rica sociodiversidade, com diversos povos indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais, que

fazem o elo entre a biodiversidade e o conhecimento popular. Esse conhecimento popular pode ser usado

pela indústria como uma dica para a inovação e é por isso que o país tem assumido o protagonismo na

discussão deste tema no cenário internacional. Apesar disto, pelas suas complexidades internas, o Brasil

ainda não conseguiu ratificar o Protocolo de Nagoia, acordo vinculado à CDB que trata das regras

internacionais sobre acesso e repartição de benefícios. Cabe destacar que não haverá repartição de

benefícios se o Brasil continuar autorizando 29 acessos ou 100, por ano. Precisamos e podemos muito mais

que isto, pois o potencial brasileiro é gigantesco.

O Ibama tem algumas características decorrentes de suas atribuições institucionais. Tem natureza

normativa infralegal, quando participa do CGEN ou quando estabelece portarias internas. Tem uma função

de gestão, pois hoje o Ibama autoriza o acesso ao patrimônio genético com a finalidade de pesquisa básica,

porque foi credenciado pelo CGEN, tal como o CNPq e o Iphan. E o Ibama é também um órgão que tem a

função fiscalizatória, em articulação com a Marinha, pois não há norma sem sanção, sem penalidade

prevista, senão seria apenas uma carta de intenção. Em relação à atribuição normativa, o Ibama atua como

formulador colegiado dentro do CGEN. Tem grande experiência como órgão autorizativo e como órgão

fiscalizador, contribuindo com o Conselho na tomada de decisão com maior segurança jurídica e com maior

capacidade de crítica sob a realidade. O Ibama é também um formulador específico na sua estrutura interna,

regulando suas atividades. No que se refere à atribuição de gestão, como Conselheiro do CGEN, o IBAMA

autoriza ou não projetos submetidos ao Conselho, bem como autoriza o acesso ao patrimônio genético com

finalidade de pesquisa científica, conforme o credenciamento pelo CGEN, o que ajuda a desafogar a pauta do

mesmo. A ação fiscalizatória, atribuição exclusiva do Ibama, é regida por conjunto de normas, sendo elas: Lei

complementar 140/2011, que delegou à União a responsabilidade pela gestão do patrimônio genético; Lei

9.605/1988, a conhecida Lei de Crimes Ambientais; Decreto 6514/2008, que regulamenta a Lei de Crimes

Ambientais; MP 2186-16/2001; Decreto 5459/2005; Resoluções CGEN que objetivam tornar o sistema mais

factível e possibilitam que a MP seja aplicada. Porém, o Ibama sofre ao estar submetido à MP 2186/2001,

pois tem que aplicar penas em nome do Estado e da sociedade brasileira para fazer valer uma legislação

cheia de contradições e antagonismos. Como ações mais relevantes e recentes desenvolvidas pelo Ibama,

destacam-se: a Operação Novos Rumos I e II; a presença estratégica do Ibama no CGEN; a contribuição para

o novo projeto de lei; e a difusão de conhecimento. Em relação à Operação Novos Rumos I e II, desde 2007,

o CGEN começou a sobrestar processos na intenção de criar um novo marco legal porque, em 2005, por

meio do Decreto 5459, foi regulamentado o Art. 30, que é o artigo que aplica as penas. A partir desta data, o

Estado brasileiro passou a ter um instrumento de repressão aos ilegais. O foco era os estrangeiros fazendo

biopirataria, mas a Medida Provisória colocou também o estudante de mestrado, que publicou seu currículo

na Plataforma Lattes, como infrator. Ou seja, até então, todo estudante de mestrado que envolvia

biotecnologia automaticamente era réu confesso, quando publicava seu projeto. E aí fica a questão: não

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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adianta o governo colocar 5 bilhões em inovação se todos que pesquisarem com tais recursos forem

criminalizados.

Com o Art. 3º regulamentado, o CGEN enviou para o Ibama mais de 100 processos de empresas e

universidades que não tinham cumprido com as regras da MP. Muitas instituições entraram com pedido de

anistia. Este processo estourou quando a Casa Civil concluiu que não era possível conceder anistia. Nessa

época foi realizado o 5º ENIFarMed e, durante a plenária sobre Impacto do Protocolo de Nagoya no mercado

farmacêutico, em 31 de agosto de 2011, Braulio Dias, então representante do MMA e atual Secretário Geral

da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), informou da não anistia, o que revoltou várias pessoas da

plateia. Assim, o Ibama teve que obedecer a lei em vigor e agir contra uma série de “réus confessos”. E, para

isto, construiu critérios que norteassem sua atuação. Esta foi a Operação Novos Rumos I. O critério seguido

foi o seguinte: para as empresas que procuraram o CGEN para se regularizarem, aplicou-se a multa mínima;

para a comunidade científica aplicou-se apenas advertência, pois o pesquisador não gerou atividade

econômica e por consequência não gerou repartição de benefícios; para os casos que envolviam remessa ao

exterior a sanção aplicada foi a mais grave, pois não envolvia apenas um problema ambiental, mas também

a soberania nacional. Houve flutuação na dinâmica dos processos dentro do CGEN. Depois de 2005, quando

saiu o Decreto 5459, o número de processos aumentou. Mas, com uma expectativa de anistia, a busca pelo

sistema caiu, e o número de processos diminuiu. Após a Operação Novos Rumos I, em 2010, novamente a

busca pelo sistema aumentou, principalmente pela indústria. Esta situação desconfortável provocou a

demanda por um novo marco legal pelo usuário e pelo governo pois, se o Ibama continuasse a não multar o

estudante de mestrado, poderia ser considerado omisso.

Como consequências da Operação Novos Rumos I e II, destacam-se alguns pontos: 1) utilização da

estratégia da dissuasão e efeitos pedagógicos; 2) criação e desenvolvimento de cursos de fiscalização de

acesso a PG e CTA; 3) estabelecimento de frente fiscalizatória específica nos Planos Nacionais Anuais de

Proteção Ambiental; 4) Nivelamento da AGU para suporte ao judiciário; 5) difusão em larga escala do

sistema de acesso; 6) empoderamento do CGEN.

O Ibama atua ativamente no CGEN, dando segurança jurídica aos conselheiros devido à sua

experiência prática acumulada, e também tem proposto normas e linhas políticas para o melhoramento da

gestão. Em relação ao novo projeto de lei, o Ibama atuou ativamente e propôs ao MMA que o projeto se

pautasse pela simplificação do sistema, pela centralidade da repartição de benefícios, pela exclusão de

pesquisa básica do sistema de controle, pelo estabelecimento de tipos penais, pelo foco nas competências

da União e no grande infrator. No texto final da nova proposta do marco legal, as propostas do Ibama foram

incorporadas e por isto o órgão se sente contemplado com o PL que tramita no Congresso. Neste sentido, o

Ibama colaborará com o Congresso e continuará atuando com base na estratégia de dissuasão,

concentrando-se na repartição de benefícios. Os próximos alvos do Ibama serão as indústrias que não têm

autorização e estão produzindo, além daquelas que foram regularizadas ou que foram autorizadas pelo

CGEN, para verificar se estão cumprindo com as obrigações legais.

3.3) 3ª Plenária Internacional “Como usar a regulação em favor da inovação”

A palestra do consultor internacional Jurij Petrin buscou mostrar o estado atual do mercado global

de medicamentos, a posição do Brasil nesse contexto, e como a situação do país poderia ser melhorada caso

decidisse adentrar nessa comunidade global de desenvolvimento de novas drogas. Atualmente, poucos

países desenvolvem novas drogas e medicamentos somente em seu país e esse desenvolvimento é feito em

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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parceria ou cooperação entre vários países, podendo chegar a 15 países envolvidos nas diferentes etapas do

processo. Para um país decidir entrar na comunidade global de medicamentos, deve considerar os fatores

que envolvem o processo de desenvolvimento, como o tempo e o investimento, dentre outros desafios que

o Brasil enfrentaria para chegar no mercado internacional, mas também há benefícios, como o da inovação

para o país.

A visão que o mercado internacional tem do ambiente regulatório brasileiro pontua principalmente

a morosidade na análise do processo de avaliação do dossiê técnico pela Agência Nacional de Vigilância

Sanitária - ANVISA e a necessidade de revisão e atualização nas boas práticas de fabricação e de laboratório

de modo a ampliar e assegurar a qualidade, a eficiência, a clareza, a transparência e a consistência das

avaliações feitas pela ANVISA. Há uma harmonização da regulação pelos demais países que utilizam normas

internacionais como orientação, principalmente as diretrizes do ICH, em contraste à uma postura de

independência regulatória local. Assim, a decisão política de o Brasil adentrar no mercado global de

medicamentos envolve a necessidade de harmonização da regulação local às diretrizes ICH, além de

melhoria no desenvolvimento pré-clínico e o papel da agência reguladora nesse processo.

O modelo de regulação no Brasil é muito novo (a ANVISA tem apenas 15 anos) e encontra-se ainda

em maturação, tanto no que se refere às agências reguladoras, como também à sociedade civil. Cada país

tem suas peculiaridades que precisam ser levadas em conta quando se trata de um modelo regulatório. O

Brasil é extenso e é preciso considerar suas características, entre elas, o caráter multirracial e as diversas

zonas climáticas do país, o que o difere dos principais países que são harmonizados entre si. Por isso, o Brasil

precisa estabelecer diretrizes específicas, o que impõe desafios ao setor de medicamentos. Outro ponto é a

configuração do sistema jurídico brasileiro, cujas punições ao setor regulado em caso de acidentes com

fármacos são brandas e morosas, fazendo com que a ANVISA tenha que ser rígida em suas normas. A

ANVISA é contra a harmonização e a favor da convergência regulatória e da independência do país.

3.4) 4ª Plenária “Capacitação de recursos humanos para biotecnologia”

Os produtos biotecnológicos significam atualmente 60% dos gastos do sistema público com

medicamentos, daí a relevância e necessidade de se produzir biológicos no Brasil. Mas, para tal, é necessário

ter recursos humanos capacitados. Vejamos as necessidades das empresas nacionais, a seguir.

A Orygen tem origem na fusão entre a Biolab e a Eurofarma e, para avançar na produção de biotec

no Brasil, será preciso capacitar recursos humanos desde o treinamento de operários até a adaptação dos

programas da graduação e da pós-graduação. Atualmente, a demanda a Orygen envolve aproximadamente

110 profissionais, dos quais 60 estariam diretamente envolvidos em processos técnicos, destes

aproximadamente 28 na área de manufatura, 20 em controle e garantia da qualidade, 12 na engenharia de

produção, entre outros profissionais envolvidos em TI, EHS e manutenção. Se considerássemos as demais

empresas de biotecnologia em fase de estabelecimento, poderíamos estimar uma demanda imediata de

aproximadamente 600 profissionais. Atualmente a empresa tem adotado como estratégia identificar

talentos no exterior, incluindo avaliação em outros setores como Biocombustível. Identificaram a carência

do técnico como um perfil profissional que merece ser considerado. Sobre as atividades de capacitação da

empresa, um de seus funcionários concluiu um curso internacional oferecido pela UMBC e, através de

contatos, a Orygen juntamente com o Grupo FarmaBrasil elaborou uma proposta de curso de três meses a

ser oferecido por profissionais da UMBC. Estão acompanhando as iniciativas de criação de um Mestrado

Profissional em Biotecnologia (uma iniciativa entre a UFF, a UECE, a UCB, dentre outros), já aprovado pela

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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CAPES, e estão apoiando um curso que está sendo montado pela UFRJ/COPPE, com o apoio do Grupo

Executivo das Ciências da Vida (GECIV/RJ), além de iniciativas do SENAI na montagem de um centro de

capacitação em biotecnologia, fóruns e simpósios de capacitação. A empresa tem interesse em participar

dos programas de RH no Brasil.

A demanda da Bionovis vai do desenvolvimento de processos até o envase, além de P&D, por isso a

estratégia da empresa é internalizar expertise atualmente disponível na academia. Há necessidade de

recursos humanos aptos para atuar na transferência de tecnologia, na produção e em pesquisa para

desenvolvimento e inovação. Para resolver esses gargalos, a empresa adotou a seguinte estratégia:

treinamento com parceiros internacionais; contratação de experts do exterior; repatriamento de talentos;

terceirização do P&D; participação em programas de treinamentos como a Plataforma em Biotecnologia

(montagem do “ITA” da biotecnologia); além de vários programas de treinamentos e outros que estão sendo

propostos em conteúdos complementares, como o que está sendo desenvolvido pelo GECIV/RJ em gestão

de projetos, gestão de pessoas, assuntos regulatórios, empreendedorismo em biotecnologia e cadeia de

fornecedores. A Bionovis investirá 1,3 bilhões de reais em 8 anos e gerará 150 empregos diretos, sendo que

destes 122 são técnicos. A empresa iniciará suas atividades produzindo biossimilares, mas com capacidade

de realizar inovação no setor em curto prazo.

A planta para produção de biotecnológicos da LIBBS está pronta para produzir o primeiro lote de

medicamentos em 2016. As Parcerias para Desenvolvimento Produtivo (PDPs) foram o grande salto para

viabilizar o setor de biotecnologia no Brasil, pois para as empresas aceitarem fazer a transferência de

tecnologia para o Brasil foi importante a certeza de que teriam o governo brasileiro como cliente. A LIBBS

realiza o treinamento com equipes próprias e a demanda da empresa se dá desde o técnico até nível

superior, em diferentes áreas específicas. Na empresa, buscam o alinhamento de valores, como produzir e

aprimorar ética, trabalho em equipe, maturidade e impactos potenciais e reais, e reconhecem que

atualmente há um alinhamento das políticas públicas no setor de biotecnologia com fundos, SUS,

investidores, empreendedores, marco regulatório e isso gera um círculo virtuoso, possibilitando a redução

de déficit comercial na área, a incorporação de tecnologias e o fortalecimento do parque industrial.

A Biocad Brazil é uma empresa russa que desenvolve o produto do estudo clínico à prateleira, sem

terceirização de nenhuma etapa. Possui atualmente 750 funcionários (mais de 20% em P&D) e uma

metodologia própria para recrutamento e capacitação de recursos humanos. A Biocad Brazil planeja a

instalação de duas fábricas no Brasil, com um pipeline de 17 moléculas.

O CNPq tem tido forte atuação através do programa Ciências Sem Fronteiras, e outros programas

que visam facilitar e desenvolver a inovação tecnológica como a bolsa Rhae (Estudante na Empresa) e o novo

programa do CNPQ que prevê a criação de uma Rede Nacional de Plataformas do Conhecimento.

A UEZO é instituição voltada para a formação de tecnólogos para a indústria e, no último período, a

instituição se viu obrigada a diversificar sua oferta com cursos clássicos como Ciências Farmacêuticas em

função da baixa demanda de mercado na área de biotecnologia. As portas da instituição estão abertas para

as novas necessidades do setor e, assim, já vêm trabalhando nesse sentido, com representante junto ao

Grupo de Trabalho de Recursos Humanos (RH) do GECIV/RJ.

3.5) Sessão Temática 1 “Pesquisa Clínica: o que queremos para o Brasil?”

O Departamento de Ciência e Tecnologia (DECIT) do Ministério da Saúde atua no fomento à

pesquisa. Entretanto, devido à limitação dos recursos do orçamento, é importante priorizar a destinação

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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destes. O processo de priorização não é totalmente transparente e os critérios não são bem conhecidos, até

mesmo dentro do Ministério, que participa da seleção de propostas e das decisões de financiamento, mas

não há um acompanhamento dos projetos que permita avaliar se os recursos aplicados reverteram-se em

benefícios para a saúde pública no país. A medida do sucesso do processo está mais em conseguir alocar a

verba do que no resultado dos projetos em si. A alocação de recursos, a nível nacional e estadual, é feita

através de "chamadas” pelas agências de fomento (CNPq e FINEP) e fundações de apoio à pesquisa. Por

outro lado, muito maior que o orçamento do DECIT (cerca de 100 milhões de reais anuais) são os programas

de isenção fiscal: PROADI (cerca de 75 milhões só para pesquisas para o triênio 2012-2014), PRONON e

PRONAS (cerca de 600 milhões cada para 2015, para assistência, capacitação e pesquisa). É preciso criar uma

estrutura capaz de otimizar o aproveitamento desses recursos. Quanto às REDES, a Rede Nacional de

Pesquisa Clínica (RNPC) foi criada em 2005 e hoje conta com 32 hospitais públicos participantes. A RNPC

ainda é subutilizada, pois não tem havido demanda por parte do Ministério da Saúde. As inovações vindas

das PDPs ainda não chegaram e a capacitação dos diversos participantes ainda é muito variável. Haverá uma

reunião do DECIT para reavaliar o trabalho das redes em novembro de 2014.

A ética na pesquisa começou com o Código de Nurembergue e tem base hoje na Resolução

196/1996. Atualmente, os principais desafios enfrentados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa

(CONEP) são: (1) a morosidade dos processos, que vem sendo atacada com a contratação de mais relatores

ad-hoc, melhor estrutura física e pessoal de apoio administrativo e melhora no fluxo dos relatórios através

da Plataforma Brasil, pois o prazo médio para conclusão da avaliação em 2013 era de 118 dias e hoje gira em

torno de 90 dias; (2) acesso social à informação – o número de atendimentos aos pesquisadores e Comitês

de Ética em Pesquisa (CEPs) foi de 34.400 em 2013 e, em 2014, devem chegar a 40.000 – as inspeções aos

CEPs foram 39 em 2013 e as atividades de capacitação atingiram 98 CEPs em 2013 e devem atingir 400 CEPs

em 2014, fora o Encontro Nacional de Comitês de Ética em Pesquisa (ENCEP) que será realizado em

novembro; (3) há bastante atividade nos Grupos de Trabalho, especialmente aqueles ligados aos estudos das

ciências sociais e à criação de um processo para acreditação de CEPs e risco dos projetos; (4) a Plataforma

Brasil terá uma nova versão, 3.0, em 2015.

O Fórum Permanente dos Comitês de Ética em Pesquisa (FOCEP) surgiu dentro da Câmara Municipal

de São Paulo como um espaço independente para os CEPs poderem discutir seus assuntos livremente e com

bastante transparência, pois as sessões são públicas e transmitidas ao vivo pela Internet. A interação com a

CONEP foi boa no início mas hoje poderia ser mais próxima e o funcionamento da Plataforma Brasil e da

CONEP deveria acolher mais a participação de entidades externas.

3.6) Sessão Temática 2 “Do petróleo ao medicamento: como equacionar a dependência da importação de

farmoquímicos”

Os EUA já sinalizavam preocupação com a internalização da produção de fármacos desde 1903. Na

ocasião, o governo americano obrigou a Bayer a internalizar a produção do AAS (Ácido Acetilsalicílico), o

qual até aquele momento estava sendo produzido na Alemanha. Desde a Declaração de Independência,

Alexander Hamilton, considerado um dos “pais da pátria”, preconizava a produção industrial interna na base

de dois requisitos: boa qualidade e preço razoável. Esses são exemplos da importância do tema para a

sociedade e de como a política econômica e política de saúde são elos importantes para o desenvolvimento

do país.

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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As matérias primas utilizadas nos processos para obtenção de fármacos são obtidas de duas fontes

principais: petróleo (nafta) e produtos naturais, com destaque para os produtos de origem vegetal. Neste

particular, destaca-se a vantagem competitiva do Brasil com sua biodiversidade e recursos naturais.

É importante haver uma política regulatória apropriada e forte como condição para a garantia de saúde

pública da população, abastecimento do SUS com produtos estratégicos, e garantia de sustentabilidade do

SUS. Enquanto o mercado farmacêutico movimenta cerca de US$ 1 trilhão/ano, o mercado de fármacos

movimenta US$ 120 bilhões, ou seja, 10% do mercado farmacêutico. Este dado denota a diferença de

margens e resultados dos dois segmentos e explica o fato do déficit atribuído às importações de

medicamentos ser maior que o relacionado à importação de fármacos. Enquanto o setor farmacêutico é

caracterizado por processos fabris compostos de operações físicas, no setor farmoquímico destacam-se as

operações químicas fundamentalmente. Assim, ressalta-se a maior complexidade industrial e tecnológica

para o setor farmoquímico.

O Brasil é frágil nas etapas 1 e 2 da cadeia de desenvolvimento, ou seja, P&D e produção de Insumo

Farmacêutico Ativo (IFA), e é dependente da importação de intermediários para a produção de fármacos, o

que representa um reflexo da fragilidade atual da química fina praticada pela indústria petroquímica. Como

principais fatores que dificultam o desenvolvimento do setor farmoquímico, destacam-se: alta carga

tributária; dificuldade de acesso a intermediários; custos diretos e indiretos elevados; tempo excessivo para

análise de pedido de patente no INPI; e tempo excessivo para concessão de licenças pela ANVISA.

É claro o processo de desindustrialização do setor farmoquímico, observado a partir dos anos 90.

Atualmente, o Brasil não possui produção de antibióticos para uso humano, fato que impõe uma grande

vulnerabilidade sanitária. Além disso, há um movimento de transferência de plantas fabris para a Ásia na

busca de menores custos de fabricação, devido ao menor custo de mão de obra, política ambiental menos

exigente e menores custos fixos em geral.

Ficou evidenciada a importância da pioneira política de compras praticada por Farmanguinhos/Fiocruz, a

partir de 2006, que passou a licitar o serviço tecnológico para a produção de IFA em vez de licitar a compra

do IFA propriamente dita, cujas diretrizes foram regularizadas pela Portaria Interministerial No 128/2008.

Embora tenhamos experimentado um intenso processo de desindustrialização no setor farmoquímico, ainda

há espaço para o crescimento deste segmento industrial, desde que haja vontade política para tal. O Brasil

possui capacitação técnica em síntese orgânica e engenharia química capazes de responder às necessidades

do setor. Portanto, não há carência de mão de obra especializada. A retomada do setor farmoquímico

nacional representará para o país independência tecnológica, geração de emprego e renda, diminuição do

déficit comercial, além de total rastreabilidade dos produtos aqui produzidos. A licença compulsória do

Efavirenz deve ser utilizada como exemplo da capacidade científica e tecnológica do país em responder às

demandas institucionais. Em pouco tempo foi desenvolvida internamente a formulação do Efavirenz e o

processo de fabricação do IFA.

3.7) Sessão Temática 3 “Adensamento da cadeia de suprimentos farmacêutica e o nicho dos biológicos”

Nas últimas décadas, a indústria farmacêutica brasileira cresceu muito, principalmente pela

produção de medicamentos genéricos e similares de síntese química. Porém, a partir de 2010, com a

publicação dos Guias de Biológicos pela ANVISA, ocorreu uma alteração no cenário farmacêutico voltado

para os produtos de alta tecnologia desenvolvidos por células vivas, ou seja, os biotecnológicos ou biológicos

de 3º geração. As discussões atuais estão voltadas para definir o que queremos para o Brasil nesse novo

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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mercado. Estamos em tempo de pensar como será o planejamento, a execução, quais as perspectivas

futuras e qual aprendizado pode-se tirar em relação ao tema.

Pensando nesse cenário, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)

acompanha projetos com estudos setoriais para a construção de conhecimentos na tomada de decisões

estratégicas quanto à biotecnologia. A intenção do BNDES com esses projetos é que eles sejam capazes de

liderar uma cadeia que, no Brasil, ainda é nascente. O banco realizou um estudo exploratório intitulado de

“A Cadeia de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de Biotecnológicos” através de conversas junto aos

principais atores do setor, ou seja, das instituições farmacêuticas, bases tecnológicas, incubadoras e ICTs. O

que o BNDES percebeu quando deparou-se com os números é que a produção científica no Brasil nos

últimos 15 anos cresceu muito mas, ao avaliar a produção científica medida pela publicação em

biotecnologia, percebe-se que ela cresce, porém cresce menos. Considerando, então, a participação das

publicações em biotecnologia no total das publicações brasileiras, ela cai de 14% para 9%. Outra visão foi em

relação aos números de patentes. Segundo a OECD (em inglês, Organization for Economic Co-operation and

Development), o Brasil parece mal no ranking das patentes. No período de 2010/2011 eram 311, sendo que

esse número é pequeno e reflete o desestímulo ao crescimento da cadeia produtiva do setor. Partindo de

um cenário em que as estatísticas não são boas, o BNDES procurou montar um diagrama que organizasse a

cadeia de P&D do Brasil. E, com base nas entrevistas realizadas a campo, buscou-se identificar os principais

gargalos. Ao longo das entrevistas, conseguiu-se identificar algumas competências que estavam no Brasil,

mas ainda latentes. Um exemplo foi um projeto criado após o estudo, com o laboratório Nacional de

Biociências em parceria com a empresa Recepta, para o desenvolvimento do banco de células, seleção de

linhagens, construção gênica e a seleção dos clones, ocupando um nicho pouco explorado no Brasil.

O que orienta a atuação do banco nessa cadeia é um conjunto de projetos, como o citado, e outros

também na mesma linha que são bastante interessantes. O BNDES financia para que se tenha um aumento

no número de pesquisas nessa linha e para se desfazer um ciclo vicioso de que a oferta não existe porque

não tem demanda, e também não tem demanda pro Brasil porque a oferta não consegue ser atendida.

Então, de alguma forma, esse ciclo tem que ser rompido e o BNDES acredita que um dos meios é a fixação

desses projetos maiores junto às empresas farmacêuticas brasileiras. O tipo de instrumento que o BNDES

tem utilizado para apoiar as pequenas empresas são o PROFARMA que, desde 2007, tem um valor reduzido,

muito menor do que é a regra geral do banco de limites mínimos de valor de financiamento. Mas, mesmo

assim, o banco não consegue ainda atuar em todas as empresas. Também existem outros instrumentos

como o Cartão BNDES e o MPNE inovador que foi lançado em 2014 com esse objetivo, ou seja, atingir as

pequenas empresas.

Pela visão da indústria farmacêutica nacional, os desafios enfrentados para planejamento e

execução dos ensaios clínicos, o ambiente regulatório, a cadeia de suprimentos e os riscos que a indústria

farmacêutica nacional enfrenta são os principais entraves. O Brasil já desenvolveu competência para

produzir moléculas simples, empresas com plantas farmoquímicas instaladas no país já desenvolvem rota de

síntese e são capazes de verticalizar toda sua produção. Ou seja, isso não é mais um tema que aflige o país.

O grande passo que o Brasil quer dar é a produção dos medicamentos com moléculas mais complexas. Para

o desenvolvimento de biossimilar, é realizado um estudo prévio do medicamento de referência por meio de

uma metodologia conhecida como o Quality By Design (QBD) que é um estudo realizado entre alguns lotes

do medicamento referência e seu medicamento em desenvolvimento. São estabelecidos todos os pontos de

corte entre esses medicamentos, como seu biossimilar deve se comportar dentro desses pontos de corte até

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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chegar à fase clínica, que é a caracterização físico-química. Para esse produto, é uma etapa muito extensa e

no país ainda não se tem competência para realizar esse tipo de estudo e por isso todos esses testes físico-

químicos estão sendo externalizados. Assim como a competência para o desenvolvimento da linhagem e do

banco de células, o que não temos no Brasil está sendo feito no exterior.

No ambiente regulatório, o Brasil tem uma vantagem: o país não se retardou muito para cuidar da

legislação que cercava o desenvolvimento dos produtos biossimilares e conseguiu sair na frente dos Estados

Unidos da América (EUA) com a publicação da Resolução nº 55 de 2010, oferecendo uma vantagem

competitiva através de um arcabouço regulatório para guiar a indústria. Porém, esse marco legal é

discutível, não agrada a todos, mas há que se entender além do que é a resolução, entender o ambiente

regulatório do mundo inteiro e tentar desenvolver o medicamento brasileiro dentro desse ambiente

regulatório para que, depois, o produto possa ser exportado. O Brasil tem a particularidade regulatória de

desenvolvimento pela via individual mas acredita-se que seja o caminho que não vai ser seguido por

ninguém que queira desenvolver um biossimilar com qualidade dentro do país.

Os grandes desafios para quem está realizando um planejamento clínico é entender esse arcabouço

regulatório no Brasil e compará-lo com o mundo, tanto com mercados regulados quanto os não regulados.

Na hora de planejar, deve-se conhecer muito bem a legislação mundial. Um ponto que dificulta a pesquisa

clínica é que não existem guidelines específicos por produto. Encontra-se guidelines para produtos biológicos

de baixa complexidade e moléculas pequenas. Porém, para moléculas maiores, não existem guidelines

específicos de como fazer e o que fazer a respeito. Outro desafio enfrentado pela indústria farmacêutica é

que os medicamentos biológicos de baixa complexidade, geralmente obtidos por fermentação, são tratados

da mesma forma que os biológicos de alta complexidade, proteínas recombinantes como os anticorpos

monoclonais que são administrados por via endovenosa, podendo incorrer em uma série de riscos, ou seja, a

mesma legislação sendo utilizada para tudo é um complicador muito grande pra quem está trabalhando na

fase clínica dos projetos.

Desenvolver medicamentos biológicos é de uma complexidade muito grande, sendo uma atividade

pouco trabalhada no país. Há uma deficiência muito grande de centros de pesquisas para a execução dos

estudos de Fase I, portanto os estudos Fase I estão sendo executados todos no exterior em virtude dessa

deficiência e da falta de centros especializados na execução de estudos de biossimilares aqui no país.

Na cadeia de suprimentos, é necessário montar toda uma estratégia multicêntrica. Falta no país

empresas que realizem revisão central de imagens e cegamento de medicação. O CRF eletrônico acabou de

virar um problema já que a empresa que ajudava as indústrias nacionais fechou. Obter Biomarcadores é um

grande problema principalmente na validação dos testes analíticos dos estudos clínicos pois no país só

existem marcadores ainda em desenvolvimento, mas a necessidade está presente. Então, é necessário

correr contra o tempo para atendimento dessa demanda. Em relação aos riscos, o desenvolvimento de

biossimilares é um projeto bastante ambicioso, não é para amadores, não é para uma empresa que queira se

aventurar. É preciso muita seriedade e é necessário ter recursos adequados, profissionalismo, processos

adequados e regulamentação adequada.

Na Fiesp, existe o Comitê da Bioindústria que busca reunir os comitês da saúde e da biotecnologia,

além dos departamentos do meio ambiente, agricultura, energia, infraestrutura e outros departamentos que

trabalhem de maneira transversal. A Fiesp analisa os diferentes setores e verifica como esses setores irão se

beneficiar da biotecnologia. A área de saúde vem nessa discussão há muito tempo, assim como o setor de

energia e agricultura, o que leva a Fiesp a perceber a necessidade de começar a falar um pouco de

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convergência. Sinergia é uma palavra chave. No Brasil tem-se um discurso depressivo em relação à

biotecnologia porém algo vem mudando. Existe uma escassez de sinergia principalmente das lideranças

empresariais e dos diferentes setores, o que dificulta o próprio governo a tomar atitudes e fazer escolhas.

No último governo, o Conselho Nacional de Biotecnologia se enfraqueceu (o próprio Fórum Nacional de

Biotecnologia) e isso dificulta a comunicação porque os fóruns foram criados justamente para criação de

convergência e sinergismo entre os setores.

As iniciativas em biotecnologia industrial deixam claro onde o Brasil quer chegar. No momento, a

falta de diálogo entre a academia, o governo, a indústria e o meio empresarial prejudicam o crescimento da

biotecnologia, apresentando um gargalo maior para os próximos 10 anos. O processo de desindustrialização

no Brasil preocupa, e a biotecnologia ainda não nos permite enxergar que existem meios de se reverter esse

processo porque produzir fora do Brasil é muito mais barato do que produzir no próprio país. Tornam-se

prioritárias as políticas que revertam esse quadro.

Em relação aos avanços da capacitação da formação de recursos humanos, recentemente foi revisto

o Plano Nacional de Educação, que mostrou-se crítico em algumas questões como o nível de alfabetização

vinculado ao Ensino Fundamental e a desvalorização do Ensino Médio. Não é possível falar em educação

profissional para o trabalho de forma desvinculada à formação e à educação tanto no ensino fundamental

quanto no ensino médio, ensinos esses que irão dar base a esses jovens e melhorar a empregabilidade

juvenil dentro de plantas produtivas funcionando com os investimentos que o BNDES, FINEP estão fazendo.

É necessário um olhar sistêmico para que todo esse esforço do governo nas empresas, principalmente em

relação aos investimentos, seja efetivo. É importante lembrar que a biotecnologia é um setor altamente

globalizado e somente 10 % da população fala inglês, além do analfabetismo funcional girar em torno de

70%. O papel desempenhado pela educação superior visa compensar os problemas apresentados no ensino

médio mas o custo desse profissional passa a ficar muito caro e são necessários profissionais de nível

superior fazendo atividades que poderiam ser desempenhados por alunos de nível médio. As empresas

entendem que a escola no Brasil é um lugar que se dá notas para se obter um diploma. No Brasil, a formação

atual não oferece uma carreira tecnológica, voltada para o desenvolvimento de novas habilidades e para um

novo mundo de trabalho, que engloba o mundo da biotecnologia e da inovação.

Se de um lado para o adensamento da cadeia produtiva falta sinergia, do lado da educação e do

trabalho falta a sintonia da indústria com as escolas e esse é um desafio que vem sendo enfrentado no

último ano. O SENAI São Paulo vem atuando nessas áreas e recentemente o SENAI nacional buscou resolver

esse problema para formação de pessoas capacitadas a desenvolver essas habilidades com ajuda

internacional. O SENAI começou a desenhar os cursos de técnicos e de tecnólogos para a biotecnologia com

a estimativa inicial de construção de 15 mil metros quadrados e 15 laboratórios com previsão de

investimento de R$ 100 milhões.

Mesmo assim, ainda há fragilidade da cadeia de valor em biotecnologia. Esse tema já tinha sido

debatido com o SENAI em 2011 e teve evoluções. A discussão agora fica sempre em torno de que não existe

demanda no Brasil por isso a cadeia é muito frágil, mas a cadeia de biofármacos no Brasil é frágil desde o

começo e atinge as grandes empresas farmacêuticas e as empresas de biotecnologia. Principalmente quando

se tenta desenvolver um novo produto no Brasil, se passa por problemas desde o início da cadeia, porque as

vidrarias que se compram no mercado nacional não são calibradas, as linhagens celulares e os testes de

validação também têm problemas, ou seja, já no início do desenvolvimento surgem dificuldades.

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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Na cadeia de suprimentos das indústrias de biotecnologia começa-se a encontrar gargalos de

fornecedores, como problemas com os insumos para processos pilotos, equipamentos para processos

pilotos e normas regulatórias para isso. Existem normas regulatórias para biossimilares mas não temos

normas regulatórias quando se está validando e criando um medicamento novo, levantando um debate e

gerando consultas públicas. As pessoas vinculadas aos órgãos públicos mudam muito, portanto, uma decisão

não pode ser baseada na opinião de um técnico que ocupa a posição no órgão naquele momento, ela tem

que ser uma definição sistematizada, para amenizar esses riscos no começo do processo.

A Fundação Ezequiel Dias (FUNED), em meados de 2004, optou por construir uma unidade de

biotecnologia que está sendo finalizada agora e ao final de 2014 buscará suas certificações. É um longo

processo porque o setor público, além das dificuldades já encontradas pelo setor privado, ainda necessita

vivenciar as rotinas e dificuldades burocráticas. O laboratório, em alguns momentos, ousou demais e isso

acabou gerando alguns contratempos. Apesar disto, a visão é de que foi uma boa escolha apostar na

biotecnologia. Exemplo é que, dentro das Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDP) firmadas pela

FUNED, duas delas são de produtos biológicos, uma da vacina meningocócica em parceria com a Novartis e a

outra em que o laboratório está avançando é para a produção da Somatropina junto com a Pfizer. Só com

essa parceria que o laboratório obteve, somadas às parcerias em andamento de farmoquímicos, a FUNED

saiu de uma receita de R$ 30 milhões para R$ 350 milhões em um período de quatro anos, o que evidencia

que foi uma boa oportunidade.

3.8) Sessão Temática 4 “Incorporação de novas tecnologias no SUS”

Quanto às principais dificuldades enfrentadas na elaboração de dossiês para registro de

medicamentos e incorporação de tecnologias em saúde, verifica-se algumas incoerências da saúde brasileira,

onde o Congresso Nacional é capaz de desfazer um ato da Agência Regulatória, através da politização dos

discursos técnicos. O processo de incorporação de tecnologias deveria se iniciar no questionamento sobre a

existência ou não de evidências. Uma vez constatada a evidência, deve-se avaliar se o custo vale o benefício

e se a sociedade pode pagar por esta tecnologia. Além disso, devem ser avaliadas as condições logísticas e

técnicas desta incorporação, o que é esquecido no Brasil. Em última instância, a decisão final pela

incorporação é sempre política, mas não se pode subverter a técnica às questões políticas.

A ANVISA tem, como uma de suas atribuições, avaliar se um determinado medicamento é efetivo ou

não e se ele tem o perfil de segurança adequado para ser colocado no mercado brasileiro. Quando a ANVISA

aprova um medicamento, a aprovação vale para determinada situação. Na etapa seguinte, a Câmara de

Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) determina o preço que ele pode ser comercializado. Para

este produto ficar disponível no SUS, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC)

realiza nova análise, levando em conta o custo e a efetividade do produto. O incômodo atual diz respeito à

divergência entre o parecer dos dois órgãos, pois não é possível discutir questões financeiras junto com

questões técnicas, e o relatório da CONITEC deve tratar estes elementos de forma distinta.

A CONITEC considera como frágeis as análises feitas por outros órgãos do mundo inteiro. Por outro

lado, medicamentos foram incorporados pelo Ministério da Saúde (MS), mesmo com parecer desfavorável

da CONITEC, a exemplo do Rituximabe, reprovado inicialmente e, após pressão da mídia, incorporado sem

nenhum estudo novo. O problema é que não dá pra incorporar sem ajustar o preço, pois o fornecedor não

vai querer entregar. Assim, o processo de incorporação pode estar mascarando o subfinanciamento do SUS.

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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A dificuldade de incorporação na cardiologia intervencionista vem diminuindo e tem base nos

princípios da ética biomédica: beneficência, autonomia e justiça. O prazo entre a aprovação na ANVISA e a

incorporação ao SUS e convênios das tecnologias empregadas na área da cardiologia intervencionista gira

em torno de 10 anos. E a judicialização da saúde é outro agravante. Em 2012, mais de R$ 356 milhões do

orçamento do Ministério da Saúde tiveram que ser destinados ao custeio de tratamentos e equipamentos

em virtude de decisões judiciais, representando um aumento de 1400 vezes em relação a 2003.

O processo de incorporação de novas tecnologias no Brasil tem diferentes atores: o Conselho

Federal de Medicina (CFM), que aprova as novas terapias; a ANVISA, que autoriza a comercialização de

fármacos e produtos para saúde; a Agência Nacional de Saúde (ANS), que determina o rol de procedimentos

e eventos em saúde; e a CONITEC, que recomenda a incorporação de novas tecnologias em SUS. Porém,

percebe-se um certo conflito de competências entre estes órgãos. As regras da CONITEC para incorporação

de tecnologias são claras: evidências de eficácia, segurança e efetividade; necessidades do sistema; impacto

no sistema, impacto orçamentário; protocolos para uso seguro e racional; e indicadores de monitoramento

de resultados. As sociedades de medicina podem contribuir com o MS na identificação das evidências, na

definição dos protocolos e indicadores de monitoramento. Sugere-se a utilização de critérios técnicos para

avaliação de novas tecnologias, tais como: redução do risco relativo, redução do risco absoluto, número

necessário para tratar e número necessário para causar dano. São considerados desfechos clínicos

relevantes para os pacientes: redução da mortalidade, redução do risco de acidente vascular cerebral (AVC),

redução do risco do infarto agudo do miocárdio (IAM), redução da necessidade de realização de novos

procedimentos e melhora dos sintomas.

Em uma perspectiva diferente, fazendo a relação com o sistema de produção e inovação em

fármacos e medicamentos, verifica-se uma relação entre o sistema de utilização de tecnologias em saúde e o

sistema de produção destes fármacos e medicamentos. Quando a regulação da incorporação opta por

alguns critérios, ela está indicando uma direção que deveria orientar os esforços de P&D da indústria

farmacêutica. O sistema de incorporação é afetado de acordo com o que é produzido e a produção e a

P&D&I realizada pela indústria deveria considerar aquilo que o sistema tem interesse e necessidade de

incorporar. Destaca-se a importância da clareza dos critérios para que o sistema produtivo e de inovação

possa compreender o que deve produzir e em que tipo de inovações deve investir, considerando que a

intenção é que a produção e as inovações sejam incorporadas no sistema de saúde. Isso possibilitaria o

desenho de uma agenda de pesquisa e desenvolvimento do setor produtivo a partir do que o SUS precisa

incorporar. Existem peculiaridades locais e do SUS que podem ser aproveitadas como um caminho a ser

seguido pela indústria nacional. Além das evidências científicas, é preciso considerar a necessidade de

avaliações econômicas e de impacto orçamentário na tomada de decisão para a incorporação de

tecnologias, como ocorre hoje. Há necessidade de se estreitar relações entre o setor produtivo e o sistema

de saúde no que diz respeito à melhor compreensão pelo primeiro daquilo que é considerado apropriado à

incorporação pelo segundo e que a clareza de critérios é fundamental nesse sentido.

Outras perspectivas que devem ser consideradas são a judicialização da saúde e a incorporação de

tratamentos de alto custo para doenças raras. O custo dos medicamentos vai afetar o acesso dos pacientes

ao tratamento fornecido pelo SUS. No caso de doenças raras, as avaliações de efetividade são mais

complexas, uma vez que os estudos clínicos são mais difíceis de serem feitos pela própria raridade das

doenças e pelo pequeno número de pacientes. Em relação à judicialização, há um recorte entre tecnologias

já incorporadas e novas tecnologias ainda não incorporadas. No rol das tecnologias já incorporadas, a

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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judicialização se dá pela ineficácia do SUS em fornecer o tratamento. Este fornecimento, que deve ser feito

pelos Estados e Municípios, está sujeito a uma série de questões e, por ser muitas vezes ineficaz, os

pacientes apelam para a justiça (exemplo dado: obtenção de fórmulas especiais para fenilcetonuria). No que

diz respeito a medicamentos e/ou tecnologias não incorporadas, sendo a judicialização a única alternativa

para obtenção dos mesmos, a questão é ainda mais complexa. Através dos mandatos, as aquisições são

feitas sem planejamento, sem licitação, de forma fragmentada, e com preços que oscilam. O julgamento da

pertinência da demanda é feito sem embasamento técnico, como no exemplo do grupo das

Mucopolissacaridoses.

Outra questão é que a judicialização fornece só a medicação, não garante o tratamento como todo,

e o paciente precisa de tratamento clínico, acesso a exames, internamentos, etc. Atrelado a isso, não

existem critérios técnicos de entrada e saída no programa. Para a incorporação de tecnologias de alto custo

para doenças raras estão sendo elaborados pela CONITEC os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas

(PCDT). Estes protocolos vão além do fornecimento de medicamentos, estabelecem diretrizes para os

tratamentos, controles a serem realizados, exames, e condutas. Já existem alguns implantados no Brasil,

como os protocolos de Doença de Gaucher e Osteogênese Imperfeita, mas também existem incongruências

do processo. Existem grupos de especialistas e centros de pesquisa que poderiam ser consultados antes da

incorporação e da elaboração e revisão dos PCDTs. Existem mecanismos de avaliação e temos histórias de

sucesso no SUS. O Brasil tem o maior sistema público de saúde de mundo e é preciso avaliar com que base

estas decisões de incorporação são tomadas e qual o mecanismo de controle sobre o processo.

E, dando atenção a outro ponto que tange a incorporação, deve-se ter um olhar voltado para as

compras públicas sob três aspectos: o Brasil (país de proporções continentais, com mais de 5,5 mil

municípios); a lei de licitações (que não é tão simples como a maioria das pessoas acredita, gerando erros de

interpretação); e como colocar a “mão na massa” para resolver estes problemas. No Brasil temos 26 Estados

e o Distrito Federal, mais de 5,5 mil municípios, com inexistência de um órgão centralizador que gere

indicadores nacionais; as compras têm base em informações descentralizadas; são usadas diferentes

ferramentas, métodos e modalidades de licitação e há inexistência de um padrão. Ou seja, o ambiente é

bastante complexo e de difícil gestão pela falta de utilização de um ferramental adequado e, por

ferramental, entende-se uma equação que envolve pessoas, ambiente, cultura e tecnologia. Com relação à

lei de licitações, é preciso que compradores e vendedores a interpretem adequadamente, considerando a

avaliação de preço, porém voltado a uma especificação correta de produto ou serviço. Atualmente, o que se

percebe no mercado público é uma “briga” insana por preços mais baixos, sem levar em consideração a

qualidade do produto ou serviço. Além disso, não existe capacitação dos envolvidos tanto no que tange a

processos de gestão quanto ao produto a ser adquirido que é, na maior parte das vezes, desconhecido

tecnicamente pela gestão pública. A falta de especificação adequada nos editais pode gerar a compra de

produtos de qualidade inferior, imputando um custo elevado na gestão do mesmo e podendo provocar

aumento da judicialização, devido à falta de disponibilidade de produtos adequados. Na hora de realizar

uma compra, é necessário levar em consideração os custos diretos e indiretos. O pregão eletrônico não é

uma ferramenta ruim pois trouxe muitos benefícios em termos de facilitação na participação dos processos,

acesso e transparência de informação. A questão é que a tecnologia não atua de forma milagrosa. Não

adianta colocar uma tecnologia intermediando um ambiente onde as definições não estão claras e as

pessoas não foram adequadamente capacitadas.

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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3.9) Sessão Temática 5 “Barreiras ao acesso a novos produtos para saúde: proteção de dados

apresentados para o registro de medicamentos, e propriedade industrial”

No âmbito da SUMED (Superintendência de Medicamentos e Produtos Biológicos) todos os

documentos são considerados públicos, exceto aqueles sigilosos por força de legislação específica. Porém, os

processos de registro de medicamentos possuem documentos que contém informações provenientes da

atividade intelectual desenvolvida pelas empresas e assim são protegidas pelas regras de sigilo comercial.

Neste caso, a SUMED atua como depositária fiel destes documentos, ou seja, tem responsabilidade de

guarda mas assegura o direito às indústrias detentoras destes documentos de que eles sejam sigilosos. A

SUMED elaborou uma tabela classificando todos os documentos de um processo de registro quanto ao sigilo

e submeteu ao Comitê de acesso à informação com a sugestão de que seja criada uma Portaria, precedida

de uma consulta pública, que contenha em anexo a tabela que define quais documentos constantes do

processo de registro são considerados sigilosos e quais não. Esta sugestão precisa ser aprovada pela

Diretoria Colegiada (DICOL) da ANVISA. Destaca-se que a questão a ser considerada neste debate é se a

simples solicitação do registro de um medicamento genérico pode ser considerada uso dos documentos

sigilosos que estão na ANVISA. Na visão regulatória, a legislação do FDA (em inglês, Food and Drud

Administration) não pode ser aplicada no Brasil pois, por exemplo, nos EUA o medicamento pode realizar

testes clínicos e ser registrado como genérico. No Brasil, não existe a possibilidade de um medicamento

fazer estudos clínicos e ser registrado como genérico. Aqui, o medicamento só pode ser genérico se

comparado com um medicamento de referência.

A PróGenéricos considera que o sigilo dos dados é uma barreira a entrada de medicamentos, sejam

eles similares ou genéricos e já empreendeu disputas judiciais nas quais saiu vitoriosa. A tese defendida

pelas indústrias detentoras do dossiê de registro do medicamento de referência é de que a ANVISA, como

ente do poder público, não tem o direito de examinar o dossiê de registro do medicamento de referência

para verificar se o dossiê das empresas de genéricos é adequado. A PróGenéricos, vendo que algumas

empresas têm usado o poder judiciário de uma forma abusiva, representou empresas produtoras de

genéricos na SDE (Secretaria de Direito Econômico) contra o que os americanos chamam de

“Shamlitigation”, que é o abuso do direito de petição, e obteve da superintendência da SDE um parecer

conclusivo de abuso do direito de petição que opina pela condenação da empresa com uma multa de um

percentual do faturamento. Não basta discutir a tese em juízo. É necessário ir a diante e discutir também o

abuso na área concorrencial para evitar que estas teses sejam uma espécie de barreira forense à produção e

comercialização dos medicamentos genéricos e similares. A grande celeuma é a interpretação de dois

artigos: o 39.3 do TRIPS (acordo sobre aspectos dos direitos de propriedade industrial) e o inciso no artigo

195 da nossa Lei de Propriedade Industrial (LPI), para tentar entender se a proteção que é dada aos dados de

registro é de caráter exclusivo e, sendo assim, qual prazo que ela merece, ou se a proteção é única e

exclusivamente limitada contra a concorrência desleal. Por outro lado, não há oposição entre acesso a

medicamentos e proteção ao data-package (conjunto ou pacote de dados). Existem duas normas legais que

estabelecem a proteção ao data-package: o art. 39.3 do TRIPS que diz que nos países membros da OMC o

data-package deve ser protegido contra uso comercial ilegal e o artigo 195, inciso XIV, da LPI que criminaliza

a concorrência desleal e indica como condutas tipificadas, entre outras, a exploração e utilização do data-

package sem a devida autorização, ou seja, é um crime no Brasil usar os dados que foram entregues a um

órgão público sem a devida autorização. Porém, nenhum dos dois dispositivos legais resolve integralmente a

questão. O TRIPS pretende que haja uma proteção preventiva, a priori, e a LPI assegura uma proteção

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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punitiva, a posteriori, quando já ocorreu a violação ao data-package. Um terceiro aspecto é que a falta de

definição de um prazo para a proteção gera incerteza jurídica mas de forma alguma vai gerar a falta de

proteção. Custa entender o motivo de, por não haver um prazo fixado, o data-package não ter proteção. O

TRIPS fala sobre o uso comercial desleal, que é uma figura muito mais ampla do que a mera concorrência

desleal estabelecida na LPI.

A proteção por patentes e a proteção por data-package são questões distintas. O objeto da patente

é a exclusividade sobre o medicamento e o objeto do data-package é uma exclusividade sobre as

informações relativas aos testes de segurança e eficácia gerados pelo titular. A patente interdita, de uma

maneira geral, a pirataria; o dossiê de testes interdita a aprovação de comercialização de um produto

competidor com base em dados regulatórios angariados pelo titular do direito. A finalidade das patentes é

proteger e incentivar invenções e revelar o conhecimento para a sociedade; já o dossiê de testes pretende

proteger os dados científicos relativos à segurança e eficácia de medicamentos. Nas patentes os requisitos

são novidade, atividade inventiva e aplicação industrial e, no data-package, novidade e esforço considerável.

O prazo da patente é de 20 anos contados do depósito ou 10 a partir da concessão. Para o dossiê de testes,

só temos fixado prazo para a área de medicamentos de uso veterinário e agroquímicos, que varia de 5 a 10

anos de acordo com o fato de a molécula ser nova ou não. Já os medicamentos de uso humano não têm

prazo especificamente regulado na legislação vigente. Portanto, não se pode afirmar que a proteção

temporária ao data-package representaria uma mera extensão indevida do prazo de proteção por patentes.

Um segundo aspecto é que os prazos, na maior parte das vezes, vão correr paralelamente. O Instituto

Nacional de Propriedade Industrial (INPI) está levando 12 anos para começar a examinar um pedido de

patentes, mais ou menos o tempo de realização dos testes em medicamentos. Portanto, os prazos vão

correr paralelamente e vão cair em domínio público em momentos distintos, visto que têm duração distinta.

O terceiro argumento é que nem sempre haverá esta dupla proteção, pois nem sempre o medicamento será

patenteado, mas ele sempre terá depositado o seu dossiê de testes na ANVISA. O aparente conflito entre a

política de acesso a medicamentos e a política de incentivo à inovação não pode ser resolvido pela

eliminação de uma delas, em favor da outra, mas sim com o respeito a ambas. Países que protegem data-

package também apresentam forte mercado de genéricos mas não se pode dizer que a proteção do data-

package acaba por inviabilizar o mercado de genéricos. O Brasil já tem uma norma legal que determina o

prazo de proteção de 5 a 10 anos, dependendo do grau de inovação incorporado ao produto, para o data-

package na área veterinária e agroquímica (Lei n. 10.603/2002). Além disso, a legislação prevê o uso da

licença compulsória em caso de interesse público. A mesma lógica poderia ser utilizada para os

medicamentos de uso humano, ou seja, definir um prazo para o sigilo do data-package, com a prerrogativa

de utilização da licença compulsória em caso de interesse público. A proteção do data-package serve como

incentivo à inovação na indústria brasileira, sendo que a proteção do data-package na maioria dos países da

América Latina decorreu de acordos de livre comércio firmados, normalmente com os EUA. Muitos

entendem que esta proteção só foi dada como uma forma de coerção dos EUA em forçar o TRIPSplus.

3.10) Sessão Temática 6 “Inovação Farmacêutica Veterinária”

Pela primeira vez, o ENIFarMed incluiu em sua programação o debate acerca das oportunidades,

gargalos e orientações para melhorar o cenário da Inovação Farmacêutica Veterinária no Brasil, o qual foi

muito produtivo. No tocante a mercado de produtos veterinários, há que se verificar os termos qualitativos e

os quantitativos. A indústria veterinária tem como característica ser segmentada de acordo com o destino

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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dos produtos: animais de companhia ou animais de produção. As perspectivas de expansão do mercado de

saúde animal em virtude da continuidade da ameaça de doenças nos animais, bem estar animal, aumento

do interesse da população pela segurança alimentar, o conseqüente aumento do rigor regulatório e o

crescimento da população de animais de companhia, são fatores que precisam ser considerados. A indústria

veterinária brasileira é caracterizada por dois tipos de empresas: as multinacionais de grande porte com

atuação global, e as nacionais de pequeno porte e atuação, normalmente, local. As multinacionais lideram o

processo de inovação, trazendo para o mercado brasileiro produtos modernos, embora, devido à sua

atuação global, não sejam especializadas. A especialização fica a cargo de raras empresas nacionais que

conseguem desenvolver opções específicas, voltadas para necessidades locais. Assim, sendo o Brasil um dos

maiores mercados veterinários do mundo (o segmento pet com uma das maiores populações de animais de

estimação e o segmento de animais de produção destacado como um dos maiores exportadores de carnes

do mundo), o país é um dos mercados mais desejados pelas multinacionais devido às oportunidades de

exploração.

Quanto às etapas de P&D de produtos farmacêuticos veterinários, o tempo e o valor estimados

desde o desenvolvimento até o lançamento de um novo produto farmacêutico veterinário constituem parte

relevante do processo. A disponibilidade brasileira de pesquisadores e estruturas laboratoriais para P&D de

novos produtos veterinários podem auxiliar na inovação e lançamento de produtos adequados e acessíveis.

Neste ponto, a interação entre empresas e universidades é fundamental. Apesar dos ICTs estarem buscando

melhorar a inovação no setor farmacêutico veterinário, ainda há uma certa dificuldade de interação com a

indústria. Pesquisadores não sabem vender sua pesquisa e as indústrias exigem demais das universidades. O

papel das CROs (em inglês, Contract Reserach Organization) na aproximação das empresas com

universidades consolida-se através da apresentação de projetos inovadores da academia para a indústria.

Um ponto importante é conhecer as políticas que as empresas possuem para captação de recursos

humanos para inovação (programa de talentos e de valorização de ideias) e saber quais modelos utilizam

para o lançamento de produtos: inovação aberta ou inovação fechada.

3.11) Sessão Temática 7 “CROs e os estudos pré-clínicos”

Existe uma enorme dificuldade das empresas e laboratórios privados em implementar os métodos

alternativos, que não utilizam animais para análise de segurança e toxicidade. A indústria farmacêutica tem

compromissos com a segurança com eficácia e em termos regulatórios é exigida com métodos em animais. É

fato que este uso tem sido reduzido ao longo dos tempos mas ainda existe insegurança regulatória quanto

aos métodos alternativos. A Sociedade Brasileira de Métodos Alternativos (SBMAlt) tem iniciativas nos

setores cosméticos e farmacêutico e foi criada há dois anos para treinar pessoas e levar o conhecimento

tanto à comunidade científica quanto regulatória, laboratórios privados e empresas, através da união de

profissionais da área biológica, médica, e química que trabalham com métodos de ensaios pré-clínicos

alternativos, ou seja, sem o uso de animais, para aplicar em segurança e eficácia. A SBMAlt atua em eventos

como o ENIFarMed, participa de eventos sobre nanotecnologia e pretende ter atuação junto ao governo

para implementação dos métodos alternativos em áreas como agrotóxicos e brinquedos. Para a certificação

dos brinquedos são utilizados mais de 80 mil animais só pra testes de segurança. Como exemplo do absurdo,

é obrigatória a realização de testes de segurança a cada lote produzido de uma caneta e é para a

substituição dos métodos utilizados e redução do uso de animais que a SBMAlt tem trabalhado.

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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3.12) Sessão Temática 8 “Instrumentos de fomento para empresas inovadoras e que crescem

rapidamente”

O financiamento da inovação tem sido equacionado, em boa parte, através das Fundações Amparo à

Pesquisa, as FAPs como a Fapesp e Fapemig, que estiveram presentes no ENIFarMed, assim como a Fipase

(Fundação Instituto Pólo Avançado da Saúde), para debater com empresas como a Natura. As FAPs têm uma

capilaridade especial no sentido de trabalhar com pequenas empresas, grandes empresas, universidades, já

que nem sempre as grandes agências de fomento conseguem ter o dinamismo das FAPs. As ações de

fomento das empresas perpassam bastante pelas FAPs, numa construção conjunta de todo o processo de

inovação, já que com essa proximidade tem sido possível propor editais para financiamento de centros de

excelência em pesquisa, que formam um elo fundamental do sistema de inovação entre a cadeia produtiva e

a cadeia de inovação.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) é uma das principais agências de

fomento à pesquisa científica e tecnológica do país. Com autonomia garantida por lei, a Fapesp está

vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Inovação e Tecnologia do Governo de São

Paulo, tendo sido criada em 1960, mas só começou a funcionar, efetivamente, em 1962. A principal fonte de

recursos da agência são os repasses do Estado: 1% das receitas tributárias do Estado vão para a agência, e o

orçamento de 2014 deve alcançar R$ 1,2 bilhão. A agência apoia a pesquisa científica e tecnológica através

de bolsas e auxílios à pesquisa que contemplam todas as áreas do conhecimento. Ente os principais

programas em parceria com o setor privado, destacam-se:

a) PIPE – Pesquisa Inovativa na Pequena Empresa, lançado em 1997, cujo principal objetivo é apoiar

o desenvolvimento de pesquisas inovadoras, a serem executadas em pequenas empresas sediadas no Estado

de São Paulo, sobre importantes problemas em C&T que tenham alto potencial de retorno comercial ou

social. No âmbito desse programa, 164 projetos foram apoiados em 2013;

b) PAPPE-Subvenção que tem por objetivo apoiar, por meio de concessão de recursos de subvenção

econômica do FNDCT/MCT/Finep e de recursos orçamentários da Fapesp, o desenvolvimento por empresas

paulistas de produtos, processos e serviços inovadores, visando ao desenvolvimento das áreas consideradas

estratégicas nas políticas públicas federais e ao estímulo à ampliação e ao adensamento das atividades de

pesquisa para inovação no universo empresarial paulista;

c) PITE, Pesquisa em Parceria para inovação tecnológica, lançado em 1995 em parceria com

institutos de pesquisa e empresas, tem se caracterizado por um grande sucesso;

d) CEPIDs – Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão. Casos de destaque: as parcerias com a GSK e a

Natura.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) é a única agência de

fomento do Governo de Minas Gerais com vistas ao desenvolvimento científico e tecnológico de Minas

Gerais, sendo uma fundação do Governo do Estado vinculada à Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e

Ensino Superior, com autonomia administrativa e financeira. Os recursos financeiros são assegurados pela

Constituição do Estado. Em 2007, um dos fatos mais importantes da trajetória da agência foi o

reconhecimento do vínculo institucional da receita de 1% do ICMS, em favor da Fapemig, garantindo a

continuidade de recursos para o seu trabalho. Em 2014, essa receita está sendo responsável por R$ 340

milhões, no orçamento da Fapemig, com um crescimento de 100% nos últimos cinco anos. Também cabe

destacar que a Fapemig tem investido fortemente, mediante editais e instrumentos de cooperação,

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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especialmente elaborados com foco na pesquisa tecnológica e na inovação junto às empresas e instituições

com sede em Minas Gerais, através dos seguintes principais programas:

a) Tecnova, R$ 15 milhões, via Finep;

b) Promete, R$ 70 milhões, parceria com o BDMG;

c) Proptec, R$ 30 milhões,

d) Open Inovation, R$ 44 milhões, em parceria com a Vale.

Para auxiliar as instituições do setor de biotecnologia localizadas na região de Ribeirão Preto, a

agência de fomento Fipase foi criada em 2001, com foco nos segmentos de biotecnologia: fármacos,

cosméticos e produtos animais. A Fipase participa de dois APLs – arranjos produtivos na região, o primeiro

do setor de software e o outro de fármacos. A Fipase é, ainda, responsável pela gestão do Parque

Tecnológico de Ribeirão Preto, em final de instalação, localizado dentro do campus regional da Universidade

de São Paulo (USP). Todas as 35 empresas da incubadora da Fipase saíram do ambiente da universidade,

uma experiência única no nosso país, e o apoio que a Fipase e as empresas regionais sempre receberam da

Fapesp foi fundamental para a consolidação do parque tecnológico regional.

A Natura nasceu em 1969 e atualmente é a mais importante empresa brasileira do setor de higiene

pessoal, perfumaria e cosméticos e, também, no segmento de venda direta. A empresa vem crescendo a um

ritmo médio de 13% ao ano, com a permanente ampliação da sua rede de vendas que capta,

aproximadamente, 7.000 colaboradores, alcançando 58,5% dos lares brasileiros, pelo menos uma vez ao

ano, sendo um excelente exemplo de empresa inovadora e que cresce rapidamente. A empresa vem se

beneficiando de editais e do fomento disponível, mas percebe que nem todas as demais conseguem, por

motivos que constam a seguir, em “Conclusões”.

4) CONCLUSÕES

Quanto à trajetória da inovação no Brasil, percebe-se uma mudança significativa nos últimos 10

anos. Em 2004 existia uma incerteza regulatória, várias indústrias operavam suas plantas sem Boas Práticas

de Fabricação (BPF), havia uma baixa capacitação local em P&D e as empresas eram focadas muito mais em

aspectos concorrenciais. A Lei de Propriedade Industrial (LPI) era recente e havia dúvidas conceituais em sua

aplicabilidade. Agora, em 2014, temos um padrão regulatório consolidado, mais plantas atuando com BPF,

considerável aumento da capacitação em P&D, forte utilização do poder de compra do Estado e uma LPI

consolidada. Portanto, hoje podemos apresentar como cenário para acirramento da concorrência a inovação

incremental e a inserção internacional. Para tanto, a indústria farmacêutica precisa internalizar e entender a

competição de forma cada vez mais agressiva, a pressão sobre os preços, o fortalecimento do varejo e dos

pagadores institucionais, as alterações regulatórias nos similares, a pressão por portfolio e a escassez de

moléculas com patentes a expirar. Na área de biotecnologia, as oportunidades estão relacionadas ao poder

de compra do Ministério da Saúde (MS), financiamento do BNDES/FINEP, a regulação da ANVISA, a

competitividade pela produção de produtos de alto valor agregado cujo mercado apresenta a expiração de

patentes valendo U$ 45 bi além do impacto nas compras centralizadas do SUS que alcançaram, em 2012, R$

4.8 bi.

Verifica-se, atualmente, maior proximidade e integração entre a política industrial e a política da

saúde e absorção da produção local para produtos estratégicos através de uma indústria mais competitiva e

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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diversificada que utiliza a estratégia de catch-up para a área de biotecnologia, o que promoveu a ampliação

do acesso da população a bens e serviços de saúde. A inserção tecnológica possibilitou um aumento da

qualidade de vida e da aderência a tratamentos portanto o próximo passo deve ser a internalização da

pesquisa clínica, já que ela representa um novo patamar no desenvolvimento de processos e produtos. Em

suma, as empresas nacionais precisam utilizar estratégias de diferenciação sustentáveis, catch-up em

biotecnologia bem sucedida, e inserções internacionais, junto a uma consolidação de estruturas de

governança e a uma articulação virtuosa entre a necessidade de saúde e a política industrial que têm sido

potencializadas no ENIFarMed.

Quanto ao estado atual do desenvolvimento tecnológico da nossa indústria, verifica-se que: o BNDES

vem fazendo enorme esforço ao longo dos anos; o Governo vem procurando valer-se do poder de compra; o

Brasil só está à frente da África do Sul em número de patentes farmacêuticas considerando apenas os BRICS;

o Brasil só tem 262 patentes; os laboratórios nacionais reproduzem o mesmo perfil de déficit na balança

comercial do conjunto de empresas; o “custo Brasil” precisa ser diminuído pois as companhias brasileiras

importam 86% dos insumos em função do custo.

Quanto aos desafios para 2015, a Finep pretende consolidar o apoio às inovações tecnológicas na

saúde aderindo ao conceito de política de Estado e de longo prazo dentro das premissas da Secretaria de

Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do MS, fortalecendo a cadeia de valor do conhecimento

em biotecnologia, telemedicina, órtese e prótese e medicina regenerativa, e intermediando o

relacionamento entre empresas e ICTs. A plataforma de conhecimento tem no decreto 8269/14 uma série

de artigos que têm como objetivos um arranjo institucional importante, além do art. 20 da Lei de Inovação.

Há prioridade em biofármacos e busca-se atender aos tratamentos para câncer, diabetes e artrite

reumatóide de forma mais econômica e eficaz em função da economia financeira e do atendimento à

população. O ponto de equilíbrio será o desenvolvimento de exames pré-clínicos e clínicos, a criação de

novas moléculas e a gestão de bancos de células mestras. No caso das vacinas, há um forte apoio e

investimento na produção local principalmente para doenças negligenciadas e epidêmicas. Assim, a Finep

atua em beneficio da política de PDPs em parceria com o MS para consolidação de invenções tecnológicas e

a melhoria contínua na avaliação de projetos e ampliação na cobertura e fomento, identificando a

intermediação entre empresas de diferentes portes com os ICTs instalados.

O custo regulatório é outro gargalo, pois a ANVISA tem que ser rigorosa, com a visão de regulador,

mas do papel à realidade há um longo caminho pois é mais fácil redigir regulamentos do que cumpri-los.

Outro entrave é a performance do INPI: são 174.000 processos aguardando análise. Somado às dificuldades

em obter patentes em prazo razoável, outro custo a entravar nosso desenvolvimento é o “Desperdício

Brasil” pois o País tem 12.000 PhDs, triplicou a produção de artigos científicos e portanto tem um avanço

acadêmico descolado do processo produtivo já que boa parte da universidade brasileira é avessa e não

interage com a sociedade para transformar conhecimento em inovação. Em função das dificuldades

apontadas, o empresariado brasileiro é avesso ao risco pois, regra geral, não tem com quem compartilhá-lo.

Portanto, há que se produzir um arcabouço regulatório que atenda aos anseios da indústria seja

nacional e internacional oferecendo agilidade e simplificação dos registros, trabalhando melhor a agenda de

visitação e fiscalização na indústria e também no varejo. A proposta da ANVISA é que exista um acordo

setorial para inovação específico com tratamento diferenciado para determinados tipos de medicamentos e,

neste caso, será necessário uma revisão deste sistema de registros. É preciso avançar numa agenda que

privilegie a estrutura regulatória e os processos visando atender o setor produtivo, ou seja, fazer uma

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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revisão das estruturas regulatórias e ativar a capacitação do corpo técnico. Para tal, foram efetivados 340

novos funcionários, sendo que a maior parte será destinada a áreas fundamentais como a de análise de

medicamentos e a de fiscalização. O ponto alto na capacitação dos profissionais será a visitação das plantas

produtivas das empresas, visando conhecer todo o processo e criando uma maior integração entre a

indústria e a agência. Hoje, a análise de medicamentos leva até um ano e quatro meses e o objetivo é

reduzir os períodos, até o fim de 2014, para quatro a seis meses o registro de produtos novos, para até oito

meses o de medicamentos genéricos e similares e para oito meses a um ano, no caso de alterações na

composição. A agência está se reestruturando para sair de uma postura mais defensiva, em que a maior

parte do seu pessoal está absorvida pelo trabalho de análise de pedidos de registro de produtos, para a

posição de “ataque”. A ANVISA vai agir mais fortemente contra as indústrias que não cumprirem as normas

de vigilância sanitária, pois os servidores têm mais autonomia para analisar os processos. Com isso, o foco

deixará de ser o produto para ser o risco sanitário. Outro passo dado na direção de uma linha de fiscalização

mais pró-ativa foi o aperfeiçoamento dos canais de comunicação com consumidores, médicos e serviços de

saúde. Como um exemplo, está sendo estudada uma regra diferenciada para produto biológico desde a

edição de norma diferenciada, a definição de nomenclatura, a adoção da compatibilidade, o benchmarking

para processos. A operação ainda é lenta, um verdadeiro gargalo, porém a ANVISA não pode de forma

isolada ter uma atividade pró-ativa sem cooperação dos demais entes envolvidos. Dentre este processo de

agilizar os procedimentos administrativos, foi emitida a resolução que instituiu comitês técnicos regulatórios

para analisar e facilitar o registro de medicamentos oriundos das PDPs. Constantemente serão analisados os

processos objetivando, se necessário, deliberar sobre alguma mudança que se faça importante para agilizar

a forma de atendimento.

No campo de pesquisa clínica, haverá um acompanhamento prévio de protocolos através de um

plano piloto juntamente com o desenvolvimento clínico. Por outro lado, é fundamental que as empresas

possam chegar totalmente preparadas apresentando o desenho clínico necessário que desejam desenvolver.

Verifica-se uma falta de sintonia entre o que a ANVISA deseja receber com o que é apresentado pelas

empresas, com recusas de quase 50% dos dossiês para pesquisa clínica por falta de adequação e

inconsistências, incluindo dossiês de empresas de grande porte, o que acarreta demora nas aprovações.

Alguns desafios que os brasileiros devem perseguir são dar continuidade ao processo de ampliação e

aperfeiçoamento das ações em C,T&I, tornando-as políticas de Estado. Precisamos expandir e melhorar a

qualidade da ciência brasileira e contribuir, de fato, para o avanço da fronteira do conhecimento, para que a

Ciência, Tecnologia e Inovação se tornem efetivos componentes do desenvolvimento sustentável, com

atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação nas empresas e incorporação de avanços nas políticas

públicas intensificando as ações, divulgações e iniciativas de C,T&I. Como exemplo de avanço, temos a

evolução da indústria farmacêutica no Brasil, com um crescimento de mais de 17% ao ano, o que é

altamente representativo frente ao caminho que estamos seguindo. Os resultados desta política de unir

público e privado pode ser analisado pelos números: enquanto em 2009/10 tínhamos 24 parceiros

produtivos, em 2011/12 agregamos mais 21 parcerias e, em 2013, mais 49 parcerias e 57 empresas privadas

nacionais e estrangeiras e, portanto, esta não pode ser considerada uma política xenófoba. O Brasil alcançou

uma média de 26 parcerias por ano. Temos 31 produtos com registro sanitário e 19 produtos consumidos

pelo SUS, entre produtos de base química, vacinas e equipamentos. Isto demonstra que as PDPs estão

atendendo às demandas exigidas. O uso total do poder de compra da Saúde correspondeu a R$ 8,9

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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bilhões/ano em compras públicas; R$ 4,1 bilhões/ano a economia média estimada e a economia de divisas

ao final dos projetos de US$ 3,9 bilhões.

Um ponto a destacar é o perfil epidemiológico e neste caso a produção de produtos específicos para

36 doenças imunes e 4 para doenças de fonte infecciosa e negligenciadas, o que demonstra a assertiva na

condução do target produtivo. Outro desafio é a aversão ao risco do empresariado. Inovação tem risco e

precisamos erradicar a ideia de não risco. Temos risco para gestor público, assim como para gestor privado,

além de existir em todas as fases de uma pesquisa clínica, por exemplo. Não existe um mercado cativo,

comprador e recebedor de inovação sem considerar o risco. A saúde deve ser tratada como um sistema

produtivo e, neste ponto, é preciso pensar em reconstruí-lo trazendo a indústria, serviços e produtos para

debater de forma conjunta como podemos capitalizar a cadeia de valor, e o ENIFarMed tem sido o fórum

que se propõe a fazer esta difícil tarefa.

O Ministério da Saúde (MS) pretende fortalecer o conjunto de processos que objetivam o poder de

compra do Estado, com foco em tecnologia e inovação. E, para sair da fase de projeto para a produção de

produtos, é preciso uma visão de longo prazo, com horizonte de pelo menos 10 anos. Para tanto, o MS está

trabalhando com a ANVISA, numa parceria de longo prazo, objetivando uma economia de mercado onde

decisões sobre preços dos produtos estão relacionadas com a trajetória da inovação e a acessibilidade.

Neste ponto, existe uma linha tênue entre entender e equacionar a relação entre os preços estáticos e

dinâmicos de mercado. Assim, torna-se importante definir a atuação regulatória sobre o preço e reduzir a

carga tributária em curto prazo, pois é prioritário alcançar 10% do PIB para Saúde. Verifica-se que, a partir de

um pequeno departamento em 2009/2010, com 24 parcerias PDPs firmadas em início de desenvolvimento, a

SCTIE chegou a cerca de 70 PDPs em 2013, sendo que 31 dos produtos já têm registro aprovado na ANVISA e

19 já estão sendo efetivamente fornecidos e consumidos pela população, desde vacinas até equipamentos

médicos.

Quanto aos principais pontos que merecem melhorias, destaca-se (1) Regulação; (2) Preço; (3)

Pesquisa clínica; e (4) Carga tributária. Porém, o mercado nacional é crescente, sendo perceptível o forte

crescimento da demanda doméstica no mercado farmacêutico que, a partir de 2004, cresceu 9% em volume

e 14% em valor, atingindo R$57 bilhões. Os principais fatores que alavancaram esse crescimento foram a

mobilidade social (ascensão da “classe C”) e a transição demográfica/epidemiológica para padrões

compatíveis com o existente em países desenvolvidos, com um perfil de doenças crônico-degenerativas em

uma população cada vez mais idosa. No mesmo período, verificou-se também uma política industrial ativa a

partir de 2004 e um aumento da atividade interna de P&D&I nas empresas, que saltou de 0.5% do

faturamento em 2003 para 2.4% em 2011, muito acima de 0.6% verificado no conjunto das empresas

industriais. Outro fator de suma importância é o aumento da participação das empresas nacionais no

faturamento do mercado farmacêutico, que atingiu 57% de participação nacional em valor contra 35%, há

10 anos.

Por outro lado, houve também aumento da participação das importações no déficit da balança

comercial, de 10% para 26% nos últimos 10 anos. Assim, focando a visão de futuro da indústria, o cenário

favorece o surgimento de novas plantas produtivas para biotecnologia, biossimilares e novos produtos

biológicos enquanto a síntese química deve manter a continuidade, com as competências já adquiridas e

acumuladas. Esse ambiente fará a indústria farmacêutica passar por longo período de pressão por preço,

não só pela própria competitividade do mercado mas pela necessidade de promover o acesso da população

aos medicamentos; e pressão por portfolio, devido a alterações regulatórias mais exigentes e restritivas,

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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além da escassez de moléculas com patente a expirar. Assim, a biotecnologia representa: competitividade e

produtos de alto valor agregado; mercado e negociação de patentes em vias de expiração, envolvendo

faturamento potencial de US$ 45 bilhões entre 2014 e 2018; impacto no SUS e aumento do acesso; e

faturamento de R$ 4.8 bilhões para o governo em 2012. Em vista disso, a oportunidade está no tripé:

inovação incremental (química de polímeros, nanotecnologia, complexação, e aprimoramento dos

processos de pesquisa clínica), biotecnologia, e inserção internacional (expansão para novos mercados e

inserção no sistema de inovação de países desenvolvidos).

Quanto ao uso da biodiversidade brasileira, conclui-se que o Brasil precisa que o novo marco legal,

ou seja, o Projeto de Lei 7735, seja aprovado o mais rápido possível. Porém, este tema é de grande

complexidade e o Congresso Nacional dispõe de pouco tempo para analisá-lo e aprová-lo na qualidade

necessária, sob regime de urgência. O governo está analisando as emendas apresentadas com o intuito de

aprimorar o projeto, entretanto não se pode perder a noção de que o regime de urgência não é da

Presidente da República e sim da sociedade brasileira, em função do atraso que a atual legislação está

trazendo para o país. O PL 7735 carece de mais debate no Congresso e isto já está sendo feito com a parte

que representa o agronegócio, mas é importante que o Poder Executivo mantenha a coesão que tinha até

enviar o projeto para o Congresso, e que contribua para achar uma solução boa para todos. Do lado da

indústria, pensando na inovação, a ideia é buscar o consenso, mas não sendo possível, pretende-se batalhar

pelo menos para que o projeto estimule um maior número de autorizações para P&D em biodiversidade, e

facilite o registro de patentes. O PL ideal deveria ter medidas adicionais de estímulo à inovação, tal como

desconto às empresas que contratarem pesquisadores, e alguns conceitos deveriam ser ajustados como, por

exemplo, o conceito de produto acabado e produto intermediário, conceitos de difícil implementação. Neste

caso, parece que cabe o provérbio que determina que “o ótimo é inimigo do bom”, mas há pleitos para a

retirada de urgência para que haja mais debate no Congresso. Destaca-se, por outro lado, que a partir do

momento em que o PL 7735 saiu do âmbito governamental e foi para o Legislativo, a interlocução com o

setor agrícola mudou de patamar. Mesmo com a separação da alimentação e da agricultura, o que é uma

imperfeição do PL que dá margem para algumas distorções regulatórias, ainda assim é uma situação muito

melhor do que a atual, pois não podemos ficar reféns do medo, da completa aversão ao risco, da

desinformação disseminada de que o Brasil terá que pagar milhões e milhões para a China por causa da

repartição de benefícios em relação à soja. Um medo completamente sem fundamento. E, por isto a MP

2.186/2001 continuará em vigor, para tratar da regulamentação da agricultura e alimentação, enquanto o

MAPA não apresentar um PL para regular o tema. O MMA gostaria que este mesmo PL regulamentasse o

acesso a recursos genéticos para alimentação e agricultura e esse parece ser o desejo de vários

representantes do setor agrícola no Congresso, mas ainda não houve consenso, já que este é um tema difícil

de se chegar a um consenso. Cabe aqui destacar que não foi editada uma medida provisória pois ela passa a

vigorar imediatamente e, por conta das regras de regularização, seria temerário que ela entrasse

imediatamente em vigor, já que o Parlamento poderia modificá-la, gerando anomalias jurídicas. Por esta

razão, o PL foi encaminhado sob regime de urgência. Segundo a assessoria técnica da Câmara, o projeto

ainda tem problemas que podem criar insegurança jurídica aos usuários, já que não revoga totalmente a

medida provisória em vigor. Porém, quanto à sobreposição que pode criar insegurança jurídica por conta da

não revogação da MP, o PL é claro: há um artigo que diz que ela continuaria valendo exclusivamente para

atividades relacionadas à alimentação e agropecuária, tendo que satisfazer as duas condições

concomitantemente. Mesmo assim, já que o projeto estava pronto desde o ano passado, o momento em

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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que chegou na Câmara atrapalhou o processo de tramitação pois antes da eleição este tema não será

tratado. Até 11 de outubro de 2014 existe um prazo de discussão para aprovação mas, independente do

resultado da eleição, a Câmara deve aprovar o projeto ainda neste ano. Cabe mencionar que este projeto

incide fortemente na saúde humana e que os profissionais desta área devem ficar mais atentos ao limite

deste projeto, que exclui de seu escopo o material genético humano, o que é extremamente pertinente. No

entanto, ao aprofundar o tema, nota-se algumas medidas perversas, tal como a questão dos patógenos que

podem ser isolados de um sangue humano, por exemplo, e que o provedor do material genético neste caso

seria a pessoa dona daquele sangue. Neste caso incide também legislação sobre ética na pesquisa. Esta é

uma situação bastante sensível para a área da saúde e, como proposta, sugeriu-se a exclusão do material

genético humano e seus respectivos patógenos, mesmo sabendo que vai contra o Protocolo de Nagoia, que

apoia fortemente o acesso e a repartição de benefícios aos patógenos. Se isto for aceito, a área da saúde

ficará mais confortável, já que daqui a alguns anos deverá chegar ao mercado algumas vacinas. Caso

contrário, haverá problemas para regularização de alguns casos de acesso a patógenos, o que poderá

comprometer boa parte da pesquisa em saúde humana, que tem potencial de gerar produtos importantes

para o país.

No tocante aos mecanismos regulatórios que podem promover a inovação, debatido durante a

plenária internacional, os aspectos que precisam ser melhorados pela ANVISA e pelo setor regulado são: o

setor regulado deve melhorar a qualidade dos dossiês enviados à agência e a agência deve agilizar a

avaliação dos processos de análise e implementar normas que padronizem os procedimentos que devem ser

seguidos na avaliação de documentos técnicos e processos como de inspeção e certificação. O aumento de

pessoal da agência, além da atualização dos normativos relacionados às pesquisas clínicas, que estão sob

consulta pública para elaborar uma nova Resolução da Diretoria Colegiada – RDC, devem auxiliar na

performance da agência. Percebe-se uma fragilidade na capacitação dos técnicos da ANVISA e o

desconhecimento da realidade das fábricas, principalmente os da área de fiscalização. Tal situação revela a

necessidade de melhorar a capacitação dos servidores da ANVISA para lidar com esses temas de alta

complexidade. Há necessidade de se entender melhor a fase pré-clínica e de regular essa etapa, sobretudo

em relação aos testes produzidos pelas multinacionais, assim como desenvolver a área da ANVISA que lida

com o setor regulado e de oferecer capacitações a esse setor produtivo de modo a melhorar os dossiês

enviados à agência. A excessiva burocracia no país ainda dificulta e atrasa os procedimentos de registros de

novos medicamentos sobretudo no que se refere às pesquisas para a descoberta de novas moléculas, as

quais demandam um tratamento diferenciado por parte da ANVISA. E, em resposta à essa demanda por

eficiência, a ANVISA tem concentrado esforços no treinamento e na capacitação de seus servidores. Os

novos servidores que ingressaram recentemente na agência realizaram curso de formação que contemplou

além das aulas acadêmicas, palestras proferidas pelo setor regulado e visitas técnicas para conhecer o

cotidiano das fábricas.

O debate acerca da capacitação de recursos humanos, incluindo a biotecnologia e a nanotecnologia,

é bastante antigo dentro do próprio ENIFarMed. Essa discussão veio para dentro da indústria por meio de

uma demanda do Grupo FarmaBrasil e de empresas da área cosmética, empresas na área de etanol, que

buscaram junto ao SENAI uma resposta para essas questões. Há um ano, a Fiesp vem trabalhando tentando

mapear quais são as principais dificuldades educacionais do setor. Já se sabe que, para o setor de

biofármacos, existe uma demanda de aproximadamente 2.300 profissionais para os próximos 5 anos, o que

significa dizer que seriam necessárias 500 matrículas por ano e que todas essas pessoas saíssem de lá

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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prontas para o trabalho. Existe uma percepção no Brasil de que as escolas e universidades acham que

preparam 50% de seus alunos para o mercado de trabalho, enquanto a indústria acha que 80% dos alunos

que saem dos centros técnicos não estão preparados para o mercado de trabalho, ou seja, existe uma falta

de sintonia na formação e na capacitação dos recursos humanos.

Discutiu-se muito sobre Pesquisa Clínica em ENIFarMeds anteriores. Este ano ficou evidente que o

gargalo da Pesquisa Clínica não está na Plataforma Brasil e sim na regulação que não traz segurança jurídica

nem ao participante nem aos pesquisadores, nem aos patrocinadores. Não haveria pesquisa clínica sem os

patrocinadores. A tentativa de dar toda a proteção ao participante acaba por desprotegê-lo pois mitiga o

elemento volitivo do participante na medida em que a oferta de benefícios pode ser superior à sua

contribuição individual, e isto não seria ético. Ao fim e ao cabo, acaba por afastar a pesquisa clínica do Brasil.

É preciso haver mais equilíbrio e bom senso para evitar que a liberdade do participante seja comprometida

pela super-proteção. Se continuarmos assim, o país terá a inovação vinda de fora, mas não terá a pesquisa.

O debate deveria ser técnico, desapaixonado, equilibrado e não ideológico. E os patrocinadores devem

participar em igualdade de condições com os demais atores do processo. A indústria de capital global faz

apenas parte do desenvolvimento global de seus produtos no Brasil e depois volta para fazer o registro, mas

a indústria de capital nacional faz TODO o desenvolvimento aqui e precisa de apoio e de excelência. A

incerteza para elas é maior, pois há incerteza quanto aos tempos regulatórios e incerteza quanto à obtenção

dos registros, o que pode inviabilizar o processo produtivo. Com isso, o empresariado nacional fica cada vez

mais avesso ao risco, assim como investidores. A aprovação de um plano de desenvolvimento será um

desafio para as indústrias locais e para a ANVISA e o nível das exigências não poderá ser maior do que as

competências instaladas. As atuais consultas públicas penalizam as indústrias nacionais na medida em que

impõe prazos que antes não existiam. E será que os revisores da ANVISA terão competência técnica para o

novo desafio que irão enfrentar e para o crescimento da atividade de pesquisa, caso ele ocorra?

No que diz respeito à produção de farmoquímicos e insumos no Brasil, destaca-se a necessidade de

incentivar a relação empresa-universidade e de incrementar as articulações entre os diversos entes da

cadeia produtiva farmacêutica com o apoio do governo, particularmente entre as ICTs e empresas, e avaliar

a prevalência de novos agravos, em função da mudança demográfica da população e, a partir destas

informações, traçar novas estratégias de desenvolvimento de produtos inovadores. Quanto ao governo, o

mesmo deverá buscar mecanismos para incentivos, tais como, diminuição da carga tributária; diminuição de

encargos; aumento de financiamento para P&D e produção; suporte para a criação de parques tecnológicos

para produção de intermediários; regulação sanitária buscando uma isonomia regulatória; incentivo ao

estabelecimento de parcerias entre empresas e universidades; diminuição da burocracia para exportação.

No campo regulatório, sugere-se um mecanismo mais efetivo para a ANVISA analisar mais rapidamente os

processos Pós-Registro de incorporação de produtor nacional de insumos farmacêuticos ativos (IFA). Para o

fortalecimento do setor farmoquímico com isonomia regulatória, deveria ser aumentada a lista de IFA

prevista na RDC 57/2009, que dispõe sobre o registro de IFA. Adicionalmente, o governo deveria aplicar o

disposto na Lei 6360/1976, que dispõe sobre a Vigilância Sanitária a que ficam sujeitos os Medicamentos, as

Drogas, os Insumos Farmacêuticos e Correlatos, Cosméticos, Saneantes e Outros Produtos, e dá outras

Providências – particularmente no tocante ao registro de IFA. E, para finalizar, a ANVISA deveria

implementar, rapidamente, mecanismos internos para diminuir o tempo para concessão de registro e pós-

registro.

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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Conclui-se que a demanda deve liderar a formação e o adensamento da cadeia de biológicos,

trabalhando junto aos dois outros grandes gargalos no Brasil: a capacitação de recursos humanos e a

certificação e manutenção dos certificados nas instituições prestadoras de serviços. Com relação à fase

clínica dos projetos, o grande desafio está em partir de um estudo que mostre que não existe diferença

entre seu biossimilar e o referência. O pesquisador não parte de um estudo pivotal que já foi utilizado para o

registro do medicamento de referência. Isso já começa na primeira etapa que são os estudos de Fase I e o

desafio maior é em relação à infraestrutura para execução desses estudos no Brasil, pois não existe no país

centros de pesquisas, principalmente os especializados em população especial para fazer a parte clínica. A

etapa analítica, que é bastante deficitária do ponto de vista da farmacocinética e principalmente da

farmacodinâmica, é analisada paralelamente. Quanto à imunogenicidade, não encontra-se no Brasil centros

que trabalhem com este estudo e nem especialistas capazes de discutir sobre o assunto no estudo de Fase I.

O especialista no desenvolvimento clínico tem que ter um conhecimento profundo do produto referência e

também das etapas que foram realizadas no seu desenvolvimento porque um produto biológico, mesmo

tendo a mesma sequência genética, é produzido por uma tecnologia diferente e pode ter ao final algum

resultado que se diferencie do produto referência que pode ser impactante na imunogenicidade. O país tem

de pensar em como ter uma precaução especial contando com um plano de medicação de risco para

imunogenicidade encontrada nos produtos aqui desenvolvidos. Como definir a produção de anticorpos

neutralizantes? Como será detectado o problema da reação infusional? Esses e outros são pontos que

devem ser analisados.

Os desafios relacionados ao estudo de Fase III são diversos. Primeiro, é um modelo que permite a

extrapolação da indicação, não existe um consenso mundial de quais seriam os melhores modelos e,

portanto, deve ser pensado qual o melhor modelo para se atingir todas as indicações e como estará o

ambiente regulatório daqui a 4-5 anos. O desfecho, desenhar um protocolo clínico que preveja o resultado

final, também é uma parte difícil pois não é utilizado em um estudo o desfecho que foi utilizado no estudo

pivotal. Sabe-se que várias multinacionais já estão conduzindo vários estudos clínicos fora do país mas nem

sempre se é utilizada essa lógica no Brasil. Outra dificuldade é o cálculo amostral. Qual o desenho que será

escolhido para o projeto? Esse desenho será seguido de forma cartesiana, um único desenho? Existe uma

série de técnicas que podem ser utilizadas, como medidas repetidas para se definir o cálculo amostral.

A indústria de biotecnologia no Brasil não se conversa. Nos EUA, a cadeia de valor é muito integrada,

os parceiros interagem, existem centros de estudos capacitados. Essa cadeia de valor no Brasil é fragilizada

não só pela demanda, mas a sociedade não se une para mapear os pontos fracos e não há união para

resolver esses problemas. É muito comum as empresas nos EUA se unirem para desenvolver uma plataforma

tecnológica de risco. Então, já que o Brasil está sempre copiando, porque não existe esse conceito de se

juntar para construir uma plataforma tecnológica de risco conjunta? Mesmo não existindo demanda em

biológicos para todos no Brasil, a indústria de biotecnologia não deve pensar apenas no mercado interno,

pois a demanda mundial também é muito boa. Existe um mercado consumidor da América Latina que é

muito interessante, mas o Brasil olha apenas para o mercado americano, onde existem 4.160 empresas de

biotecnologia para fazer concorrência. Enquanto isso, há um mercado da Ibero América, aqui ao lado, ávido

por parcerias e ávido para desenvolver. Para que o Brasil comece a diversificar o mercado e ampliar o

horizonte de mercado, as grandes empresas nacionais que estão inovando, ainda poucas, têm que delinear o

que é essa demanda de mercado porque os recursos são escassos e pode-se desenvolver os centros de

pesquisas nacionais que auxiliem de fato a dar base e desenvolver a indústria nacional de biológicos. Como

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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serão criadas linhas de financiamento para realmente iniciar a internalização das nossas empresas de

biotecnologia? Como criar maneiras para sermos competitivos em produtos e serviços fora do país de forma

a conseguir atender o mercado interno e, ainda, se sustentar? A demanda hoje é pequena porém existe a

possibilidade de realizar o desenvolvimento dessa cadeia se pensarmos que o mercado não tem fronteiras.

É comum que cada setor explore seu espaço de atuação sem interação com os parceiros mas, no

contexto atual, é importante os trabalhos em parcerias e o desenvolvimento de uma rede de fomento para a

biotecnologia, pois o Brasil não irá internalizar tudo da noite para o dia. Desde 2004, existe uma perspectiva

legal a partir da Lei da Inovação que permite uma instituição como a FUNED, que é uma instituição pública

de ciência e tecnologia, fazer esse link com a área privada. Os setores público e privado subestimaram as

dificuldades em relação aos biológicos de terceira geração, pois não se trata de uma nova onda de genéricos

como se imaginava no começo. Não faltam recursos, o que falta é muito mais uma articulação adequada da

cadeia, sinergia entre empresas e universidades, cultura ainda fraca no Brasil. E, quando formos falar sobre

exportação, é preciso olhar para as oportunidades na América Latina.

O debate acerca da incorporação de novas tecnologias pelo SUS foi muito rico. Verificou-se que é

preciso que os órgãos (compradores) e fornecedores leiam de uma forma mais assertiva a lei, entendendo

que esta permite que se especifique o que está sendo comprado. Também é necessário investimento em

capacitação e profissionalização de recursos humanos e maior interlocução entre fornecedor e cliente. O

cliente público precisa e quer entender melhor os produtos e serviços disponíveis para otimizar suas

compras e minimizar problemas futuros. Se o custo do produto é alto, o custo da ignorância pode ser mais

alto. É necessária uma mudança de comportamento de ambos os lados, vislumbrando um ambiente melhor

gerenciado e otimizado. A tecnologia pode ajudar neste processo, na organização das informações e na

geração de conhecimento para promover as mudanças requeridas e a gestão necessária. Verifica-se a

necessidade de melhor comunicação entre fornecedores e órgãos, ferramentas mais amigáveis e

capacitação de recursos humanos como alternativas para solucionar a situação. O processo de incorporação

de tecnologias de saúde envolve uma série de interessados, sejam eles fabricantes, academia, associações

médicas e pacientes. A definição dos critérios de incorporação deve ser transparente, podendo direcionar o

investimento em novas pesquisas e o interesse da indústria internacional. O processo de compras públicas

deve ser melhor gerenciado e as demandas judiciais podem ser um indicador da necessidade de

incorporação de determinadas tecnologias. A CONITEC não vem se mostrando capaz de criar um ciclo

virtuoso, onde todos saem ganhando no processo de incorporação de tecnologias de saúde. Faz-se

necessária uma mudança de comportamento no pensar o SUS. Existe uma Rede Brasileira de Avaliação de

Tecnologia, formada por Núcleos de Avaliação de Tecnologia – NATs, que são os responsáveis por realizar as

avaliações de novas tecnologias para a CONITEC. Entretanto, a CONITEC tem utilizado sempre avaliações do

mesmo NAT, com o agravante de que o nome do parecerista e qual o teor do parecer não têm sido

divulgados. As publicações científicas devem ter seus autores identificados. As consultas públicas,

atualmente, servem apenas para validar o que já foi decidido, não se leva em conta as opiniões da

sociedade. Do ponto de vista regulatório, a CONITEC foi um grande avanço mas, enquanto não funcionar a

justiça processual, a judicialização vai ser a solução paliativa.

A discussão da proteção do data-package deve levar em consideração as políticas públicas e

motivações de cada país. Destaque para o fato de, nas várias reuniões de discussão sobre o acordo TRIPS, à

época, em nenhum momento a alínea 14 do artigo 195 foi objeto de discussões, assim como o parágrafo

único do artigo 40. Assim, não se sabe como as mesmas foram aprovadas. No tocante à inovação

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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tecnológica, é necessária a proteção do data-package e também há necessidade urgente de uma

regulamentação do prazo no qual a ANVISA estará impedida de utilizar os dados clínicos em seu poder para

a aprovação do registro de medicamentos genéricos. Há que se estipular um prazo para a proteção do data-

package, mas sem esquecer que os outros países não têm o “backlog” que temos no INPI e na ANVISA. Cinco

anos após concessão do registro, será mais um “backlog”. A proteção do data-package aumenta a proteção

intelectual pois a patente não revela totalmente o invento, daí a necessidade do uso dos dados. A não

utilização dos dados pode acarretar a realização desnecessária de testes em animais e em humanos.

Não é possível aplicar no Brasil, de forma indiscriminada, o que se faz no exterior, pois lá existem regras

a serem seguidas. Nos países desenvolvidos a concorrência é muito forte e a regulação é mais fraca, já nos

países em desenvolvimento a concorrência é mais fraca e a regulação é mais forte. Portanto, os

pesquisadores devem fazer o que deve ser feito: discutam tudo, questionem tudo, pois as regras são feitas

no momento do interesse em discussão. Basta que outro país tenha um problema concreto para mudar

tudo. Se os interesses individuais e os coletivos estão cruzados, não há mágica: nenhum juiz vai negar a

utilização dos dados em função de uma discussão teórica, que só interessa naquele momento e que a

qualquer instante pode ser revogada. Quanto à tendência dos países desenvolvidos terem legislações

indutivas e os países em desenvolvimento terem legislações restritivas, este fato também é observado de

forma nítida no campo da transferência de tecnologia. Os países em desenvolvimento precisam ter

capacidade de entender seu projeto de desenvolvimento e discutir suas legislações em prol deste

desenvolvimento. O desafio do Brasil é fazer legislações convergentes. Precisamos da sinergia de todos os

atores sociais, de todas as tendências, do público e do privado, para não perder mais tempo, para reduzir o

custo Brasil, agregar valor à P&D e, assim, observarmos mais inovações na área da saúde. O projeto de lei

5.400 de 2013, que sugere inserir um parágrafo terceiro no artigo 195 da LPI, onde deixa claro que a

proteção dos dados se limita à concorrência desleal, está em tramitação, e não podemos esquecer o

interesse público do cidadão, pois os dados referem-se à segurança e eficácia de medicamentos. A lei de

patente é ruim para o critério saúde da população e a prerrogativa do artigo 68, que diz que todo produtor

inovador após três anos de comercialização tem que produzir este produto localmente na sua integralidade,

nunca foi cumprido. Se produtos inovadores, após três anos, fossem produzidos localmente, teríamos acesso

a monografias, metodologias, padrões primários, etc., que são informações que não estão nas patentes.

Tentamos harmonizar legislações de países com realidades econômicas muito diferentes. Há que se

ponderar bastante quando falamos de saúde, sistema de saúde, acesso à vida, diferentemente de acesso a

outras tecnologias. E qual o limiar entre o direito privado e o direito humano? Quem vai decidir é o juiz, pois

assim consta na Constituição Brasileira de 1988.

O debate acerca da inovação farmacêutica veterinária evidenciou que os entraves regulatórios da

inovação envolvem o ambiente regulatório para inovar no Brasil em comparação a outros países; a

certificação e o credenciamento de laboratórios que prestam serviços de pesquisa e desenvolvimento no

Brasil ainda precisam de melhorias; os meios de captação de recursos através de projetos de inovação

submetidos para apreciação dos órgãos de fomento nacionais precisam de ajustes; e a forma como as

empresas podem se organizar para criar um ambiente ainda mais favorável à inovação é parte da solução

dos gargalos. Verifica-se um alto número de produtos de uso compartilhado entre humanos e a área

veterinária. Assim, o uso de plantas produtivas de laboratórios humanos para produzir medicamentos

veterinários e vice-versa é uma atividade bastante promissora. Adicionalmente, há similaridade entre a

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

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cadeia produtiva farmacêutica veterinária e a humana e a complementaridade dos setores facilita a diluição

dos custos com pesquisa, desenvolvimento e inovação, aumentando a competitividade das operações.

Apesar de, no presente momento, não haver Estudos Pré-Clínicos com a qualidade necessária no

Brasil, o futuro dos Estudos Pré-Clínicos no cenário mundial é muito promissor, pois percebe-se claramente

que será mantido, porém reduzido, o uso dos métodos tradicionais (com uso de animais) mas já existem

vários outros métodos in vitro sendo aplicados e aprimorados. Desde já, temos de aprender a conviver com

as duas situações, que se manterá por um bom tempo, estimado de 20 a 30 anos, até ser possível não

apenas a contínua redução do uso de animais mas sobretudo será factível incorporar o fator humano através

do uso de testes em células humanas na predição de efeitos tóxicos e na eficácia de medicamentos. Quando

esta tecnologia for mais barata e acessível, será possível incorporar os métodos alternativos na pesquisa

regulatória.

E quanto aos instrumentos de fomento para empresas inovadoras e que crescem rapidamente a

conclusão é simples: o país precisa urgentemente do aumento no número de empresas inovadoras,

sobretudo na área de fármacos para a saúde, pois são as empresas que geram empregos e que arrecadam

impostos. Porém, se as grandes empresas não se tornarem inovadoras, e continuarem a comprar todos os

insumos da China, as menores vão usar o mesmo modelo. Neste sentido, é importante que as grandes

empresas, assim como as menores, em seus processos de pesquisa e desenvolvimento e em seus processos

produtivos, utilizem engenheiros, químicos, biólogos, médicos, gestores, além de técnicos em diversas áreas,

pois precisamos diversificar a economia do país. Por outro lado, em função da Fapesp e demais agências

ainda não terem dados definitivos sobre os resultados práticos do apoio a projetos e a empresas, urge criar

um sistema de avaliação de resultados em termos de geração de produtos, processos e serviços inovadores,

inseridos no mercado. Para finalizar, verifica-se que, apesar do amadurecimento das agências de fomento

brasileiras, entre elas a Fapesp, há uma demanda reprimida da indústria na busca de recursos para inovação.

Embora exista um grande esforço de disponibilização de mais recursos para inovação por parte das agências

federais e estaduais, ainda temos um imenso contingente de empresas que ainda não se beneficiam das

políticas de apoio à inovação.

5) Desdobramentos

Como principais desdobramentos do 8º ENIFarMed, foram geradas cartas a serem encaminhadas para

os órgãos diretamente afeitos aos respectivos temas discutidos durante o evento. Abaixo consta a relação de

temas das cartas e os órgãos para as quais foram direcionadas. As cartas, em sua íntegra, encontram-se

disponíveis para consulta no site do IPD-Farma e as respectivas respostas ali também serão incluídas, assim

que forem recebidas.

� 2ª Plenária “Uso da Biodiversidade Brasileira”: a carta será encaminhada para o Senado

Federal, para a Câmara de Deputados, e para o Deputado Alexandre Roso, que esteve

presente no ENIFarMed

� 4ª Plenária “Capacitação de Recursos Humanos para Biotecnologia”: a carta será

encaminhada para CNPq, Capes, Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições

Federais de Ensino Superior – Andifes (http://www.andifes.org.br/), ABRUEM - Associação

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais e Municipais

(http://www.abruem.org.br/), e Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras – CRUB

(http://www.crub.org.br/o-crub)

� Sessão Temática "Incorporação de novas tecnologias no SUS": a carta será encaminhada

para a CONITEC (cuja representante não esteve no 8º ENIFarMed apesar de ter confirmado

presença, pois houve um imprevisto de última hora)

� Sessão Temática "Instrumentos de fomento para empresas inovadoras e que crescem

rapidamente": a carta será encaminhada para o SEBRAE Nacional (que, apesar de ter sido

convidado, não enviou representante)

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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6) PROGRAMA REALIZADO do 8º ENIFarMed

Dia 08 de setembro de 2014

2ª feira 08h00 08h30 Credenciamento e Welcome Coffee

08h30 10h00

Sessão de Abertura – Auditório Amarelo

Palestra de Abertura: Julio César Ramundo, Diretor do BNDES Presidente de mesa: Dante Alario Jr, Presidente do Conselho Deliberativo do IPD-Farma e da Biolab

Convidados especiais:

Carlos Gadelha, Secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde - MS Luiz Henrique Canto, Coordenador Geral de Biotecnologia e Saúde do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação – MCTI

Jorge Guimarães, Presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes

10h00 10h30 Intervalo

10h30 12h30

1ª Plenária – Trajetória da inovação no Complexo Industrial da Saúde - Auditório Amarelo

Moderador: Reginaldo Arcuri, Grupo FarmaBrasil Palestrantes: Debatedores: Plateia convidada: Carlos Gadelha, SCTIE/MS Rafael Paganotti Figueiredo, Finep Antônio Werneck, IVB Pedro Palmeira, BNDES Norberto Rech, ANVISA Antonio Britto, Interfarma Ogari Pacheco, Abifina e Cristália

Relatores: Mauro Pacanowski, FGV Projetos e Heloisio Rodrigues, PHASE Pharma

12h30 14h30

ALMOÇO na ExpoFarMed e das 12h30 às 13h: Talk Show com Fábio Mury, da ThermoFisher, “Farmacogenômica: o caminho para a medicina personalizada” no Auditório Amarelo

14h30 16h00

Sessão Temática 1 – Auditório Amarelo Pesquisa Clínica: o que queremos

para o Brasil? Moderador: Charles Schmidt, SBMF

Palestrantes: Sérgio Nishioka, DECIT/MS João Fernando M. Ferreira, CONEP Paulo Frange, FOCEP e Câmara de Vereadores

Debatedores: Beatriz Kestener, Mattos Muriel Kestener Advogados - MMK Luciana Ferrara, LAL Marisa Lisboa, Anvisa Relator: Eduardo Motti, SBMF

Sessão Temática 2 – Auditório Vermelho

Do petróleo ao medicamento: como equacionar a dependência da importação de farmoquímicos

Moderador: Fernando Sandroni, Firjan

Palestrantes:

Marcus Soalheiro, Nortec Química Verginia Schiavo, Blanver Jean Daniel Peter, Globe

Debatedores:

Nelson Brasil, Abifina José Correia da Silva, Abiquifi Lélio Maçaira, Laborvida Relator: Jorge Costa, VPPIS / Fiocruz

Sessão Temática 3 – Sala Coral Adensamento da cadeia de

suprimentos farmacêutica e o nicho dos biológicos

Moderadora: Camille Silva, Lab Farm Zodiac

Palestrantes: Vitor Paiva Pimentel, BNDES Débora Rodrigues, Cristália Eduardo Giacomazzi, BioBrasil FIESP

Debatedores:

Francisco Tavares Jr, Funed Taíla Lemos, Gentros Relatora: Alessandra Gabas, SCTIE / MS

16h00 16h30

CAFÉ na ExpoFarMed e das 16h às 16h15: Talk Show com Patrícia Fernandes, do IEL, “Como fomentar projetos de inovação usando o Inova Talentos” no Auditório Amarelo

16h30 18h30

2ª Plenária - Regulação de fito e toxinoterápicos e o uso da biodiversidade brasileira - Auditório Amarelo

Moderadora: Adriana Diaféria, Grupo FarmaBrasil Palestrantes: Debatedores: Henrique Dolabella, MMA Rafael Marques, MDIC Alexandre Roso, Câmara de Deputados (PSB-RS) Maria Celeste Emerick, Gestec / Fiocruz Bruno Barbosa, IBAMA e CGEN Relatoras: Beatriz Bulhões, SBPC e Maria da Conceição Monteiro, Farmanguinhos

18h30 19h00

Coquetel de Confraternização na ExpoFarMed

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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Dia 09 de setembro de 2014

3ª feira 08h00 08h30 Credenciamento

08h30 10h00

3ª Plenária Internacional – Como usar a regulação a favor da inovação no Brasil - Auditório Amarelo Moderador: Jadir Dias Proença, PRO-REG Casa Civil

Palestrante internacional: Jurij Petrin, Pharmaceutical Regulatory Services – USA

Debatedor: Ivo Bucaresky, Anvisa Relatoras: Carla Beatriz de Paulo, PRO-REG Casa Civil e Fabiana Palma, Abrifar

10h00 10h30 Intervalo com Café na ExpoFarMed

10h30 12h00

Sessão Temática 4 – Auditório Amarelo Incorporação de novas tecnologias

no SUS Moderadora: Vanessa Teich, Medinsight

Palestrantes: Marcelo Queiroga, SBHCI Otávio Clark, Evidências Credibilidade Científica

Debatedoras: Helena Klein, Univ. Passo Fundo – UPF Dafne Horovitz, IFF/Fiocruz Daniela Triñanes, Ibiz Relatora: Rose Katharine Couto, SESAB

Sessão Temática 5 – Auditório Vermelho Barreiras ao acesso a novos produtos

para saúde: proteção de dados apresentados para o registro de

medicamentos, e propriedade industrial Moderadora: Bruna Rego Lins, Montaury Pimenta,

Machado & Vieira de Mello Palestrantes:

Danielle Filadelpho, GGMED/Anvisa José Carlos Vaz e Dias, Vaz e Dias Advogados Liliane Roriz, Licks Attorneys

Debatedores: Arystóbulo Freitas, Pró-Genéricos Ana Claudia Dias de Oliveira, Abifina André Fontes, Desembargador do TRF Relatoras: Luciene Amaral, INPI e Teresa Lowen, Gestec / Fiocruz

Sessão Temática 6 – Sala Coral Inovação farmacêutica

veterinária

Moderador: Rubens Alves Pereira, NUPEEC/UFPel

Palestrantes: Marcelo Oliveira, Elanco /Eli Lilly Eder Branderburgo, FlowKern

Debatedoras: Poliana Silva, Laboratório Simões Sandra Barioni Toma, Ouro Fino Janaína Carlstron, Bayer HealthCare Relator: Aberlardo Silva Júnior, UFV

12h00 14h00

ALMOÇO na ExpoFarMed e das 13h30 às 14h: Talk Show com Ricardo Dalla Costa, da ThermoFisher, “O seqüenciamento de DNA em larga escala e seu impacto na medicina personalizada” no Auditório Amarelo

14h00 15h30

Sessão Temática 7 – Auditório Amarelo CROs e os Estudos Pré-Clínicos no

Brasil Moderador e relator:

Luiz Carlos Sá-Rocha, CIALLYX e USP e UNIMONTE

Palestrantes: Simone Fanan, SBMAlt Marcelo Morales, UFRJ, CONCEA e CNPq

Debatedores:

João Batista Calixto, UFSC Octávio Presgrave, INCQS/Fiocruz

Sessão Temática 8 – Auditório Vermelho Instrumentos de fomento para empresas inovadoras e que crescem rapidamente

Moderador: Roberto Nicolsky, Protec, UEZO e IPD-Farma

Palestrantes: Sergio Queiroz, Fapesp Evaldo Ferreira Vilela, Fapemig

Debatedores:

Ícaro Santos, Natura Willy de Goes, Fipase Relator: Fernando Varella, Protec

Sessão Temática 9 – Sala Coral

Premiação Reconhecimento Técnico

Apresentador: Luis Eduardo Caroli, Biozeus

Premiados:

1º - Ana Luiza Millas, FEQ/UNICAMP 2º - Thayssa Cunha, INCT-INOFAR 3º - Ruth Lucinda-Silva, U. Vale do Itajaí 4º - Caio Victor do Nascimento, UFRJ 5º - Rafael Prietsch, Nupeec / U.F. Pelotas 6º - Fernando Guimarães, U.F. Pelotas Comitê de Seleção (ver na próxima página)

15h30 16h00 CAFÉ na ExpoFarMed

16h00 18h00

4ª Plenária – Capacitação de Recursos Humanos para Biotecnologia - Auditório Amarelo Moderador: Marcelo Lima, Amgen

Palestrantes: Debatedores: Plateia convidada: Priscila Scheinberg, Orygen Alex da Silva Sirqueira, UEZO Maria Sueli Felipe, ABDI Thiago Mares Guia, Bionovis Marcelo Morales, CNPq Paula Lenz, UECE Marcia Martini Bueno, Libbs Ruy Caldas, Capes David Zylbergeld Neto, Biocad Brazil Relatora: Tatiane Baptista, UERJ e GECIV

18h00 18h30 Encerramento

Relatório de Resultados e Desdobramentos do 8º ENIFarMed

por Mariana Sandroni em set. 2014

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Dias 08 e 09 de setembro de 2014 – 2ª e 3ª feira

Sessão de Pôsteres na ExpoFarMed

Dia 08/09: das 12h às 18h

Dia 09/09: das 8h30 às 18h

Comitê de Seleção para a Premiação Reconhecimento Técnico:

Presidente do Comitê: Alaide Barreto, UEZO

Alessandra Micherla Nascimento, UEZO Ana Claudia Dias de Oliveira, Abifina

André Faraco, UFMG André Helal Gonçalves, BIOTEC AHG

Antonia Maria Cavalcanti de Oliveira, IVB Carlos Tagliati, UFMG e In Vitro Cells

Gláucio Diré Feliciano, UEZO Julia Paranhos, IE/UFRJ Luciene Amaral, INPI

Luis Lopez Martinez, BIOTEC AHG Luíz Eduardo Cunha, IVB

Marco Antonio Mota da Silva, UEZO Maria Behrens, Farmanguinhos

Marize Valadares, UFG Paulo Roberto F. de Carvalho, UNESP

Roberto Santos, IFES Ronaldo Pedro da Silva, UFRJ e Nanobusiness

Sergio Mecena, IVB e UFF Thomas Gerlach, Bbfinancial