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18 jan 2008 Nº 44 Entendendo a crise do subprime Ernani Teixeira Torres Filho 1 Economista e superintendente da área de Pesquisas Econômicas EUA devem ter desaceleração, mas impacto no Brasil tende a ser limitado e crescimento pode atingir 5,5% Visão do Desenvolvimento é uma publicação da área de Pesquisas Econômicas (APE), do Banco Nacional de Desenvolvimento Econô- mico e Social. As opiniões deste informe são de responsabilidade dos autores e não refletem ne- cessariamente o pensamento da administração do BNDES. 1 Agradeço o apoio de Marcelo Nascimento e Gilberto Borça do BNDES e de Marcos Cintra e Maryse Farhi da Unicamp. A crise do subprime foi um dos temas que mais se desta- cou no cenário econômico in- ternacional de 2007. Ao longo do segundo semes- tre, os mercados financeiros foram, por duas vezes, surpreendidos por notícias de que as perdas relacio- nadas com o financiamento de imóveis nos Estados Unidos eram muito elevadas, o que ameaçava a saúde financeira de importantes bancos e fundos de investimento. Em reação, os investidores se apressaram em desfazer suas po- sições em créditos hipotecários, chegando a afetar o funcionamen- to de vários mercados. Alguns fun- dos de investimento tiveram que suspender os resgates de cotas. Houve uma redução na liquidez dos títulos de curto prazo nos EUA – os chamados commercial papers. Na Inglaterra, registrou-se, pela primeira vez em mais de 140 anos, uma corrida contra um dos maio- res bancos locais - o Northern Rock. Nos mercados interban- cários, as taxas de juros começa- ram a subir, mostrando que os grandes bancos estavam receosos de realizar empréstimos de curto prazo entre si. Nesse estágio, os bancos centrais decidiram intervir, injetando liquidez, para evitar que a crise tomasse proporções sistêmicas. No início de dezembro de 2007, as perdas dos mais importantes

TORRES FILHO, E. T. 2008. Entendendo a Crise Do Subprime. BNDES Visão Do Desenvolvimento, Número 44

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TORRES FILHO, E. T. 2008. Entendendo a Crise Do Subprime. BNDES Visão Do Desenvolvimento, Número 44

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18 jan 2008

Nº 44

Entendendo a crise do subprimeErnani Teixeira Torres Filho1

Economista e superintendente da áreade Pesquisas Econômicas

EUA devem terdesaceleração,mas impacto noBrasil tende aser limitado ecrescimento podeatingir 5,5%

Visão do Desenvolvimento é uma publicaçãoda área de Pesquisas Econômicas (APE), doBanco Nacional de Desenvolvimento Econô-mico e Social. As opiniões deste informe são deresponsabilidade dos autores e não refletem ne-cessariamente o pensamento da administraçãodo BNDES.

1 Agradeço o apoio de Marcelo Nascimento e GilbertoBorça do BNDES e de Marcos Cintra e Maryse Farhi da Unicamp.

A crise dosubprime foi umdos temas quemais se desta-cou no cenárioeconômico in-ternacional de

2007. Ao longo do segundo semes-tre, os mercados financeiros foram,por duas vezes, surpreendidos pornotícias de que as perdas relacio-nadas com o financiamento deimóveis nos Estados Unidos erammuito elevadas, o que ameaçavaa saúde financeira de importantesbancos e fundos de investimento.

Em reação, os investidores seapressaram em desfazer suas po-sições em créditos hipotecários,chegando a afetar o funcionamen-to de vários mercados. Alguns fun-

dos de investimento tiveram quesuspender os resgates de cotas.Houve uma redução na liquidezdos títulos de curto prazo nos EUA– os chamados commercial papers.Na Inglaterra, registrou-se, pelaprimeira vez em mais de 140 anos,uma corrida contra um dos maio-res bancos locais - o NorthernRock. Nos mercados interban-cários, as taxas de juros começa-ram a subir, mostrando que osgrandes bancos estavam receososde realizar empréstimos de curtoprazo entre si. Nesse estágio, osbancos centrais decidiram intervir,injetando liquidez, para evitar quea crise tomasse proporçõessistêmicas.

No início de dezembro de 2007,as perdas dos mais importantes

Se você quer receber os próximos números destapublicação envie e-mail para

[email protected].

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Fonte: S&P, Índice Nacional de Preço de Imóveis Case-Schiller

bancos, corretoras e companhiasimobiliárias internacionais – como oCitibank, a Merrill Lynch e a FreddieMac americanos e o UBS suíço - so-mavam, segundo a Bloomberg, maisde US$ 70 bilhões. Nesse valor nãoestavam computados os prejuízosdecorrentes da desvalorização dasações dessas empresas, o que, emalguns casos, chegou a 40%.

Uma conseqüência menos dramá-tica da crise foi, como afirmou TheEconomist (29/12/2007), o “enrique-cimento do vocabulário dos investi-dores internacionais”. Até então,poucas pessoas estavam familiari-zadas com a existência de créditossubprime ou com a “sopa de letras”formada pelas siglas dos novos de-rivativos de crédito, como os CDO -Collateralised Debt Obligations (“Títu-los Garantidos por Dívidas”) - ou as

SIV - Structured Investment Vehicles(“Empresas de InvestimentosEstruturados”).

Diante desse cenário, esse informeanalisa os motivos que levaram osgrandes bancos internacionais a se-rem diretamente afetados pelas per-das imobiliárias norte-americanasem 2007 e as perspectivas de conti-nuidade desta crise ao longo de 2008.

O boom dos imóveisnos Estados UnidosComo se pode ver no Gráfico 1,

houve de 1997 a 2006 uma forte va-lorização dos imóveis residenciaisamericanos. Os aumentos reais atin-giram 85%, sendo que, no ano de2005, no auge do processo, essepercentual chegou a 15%. Foi o mai-or boom imobiliário nos EUA em maisde 50 anos.

bro de 2007) “os principais gruposde bancos comerciais e de investi-mento (envolvidos com a crise dosubprime) estão suficientemente ca-pitalizados, diversificados e lucrati-vos para absorver perdas diretas”.

Entre os fatores indiretos que po-dem ampliar os efeitos da crise es-tão: a possibilidade de contaminaçãode outros segmentos do mercado decrédito ao consumidor americano; aperspectiva de os bancos adotaremposturas mais conservadoras emseus novos empréstimos e os impac-tos negativos sobre o emprego e arenda, decor-rentes da desa-celeração daconstrução civil.Em compensa-ção, não sedeve desprezar a capacidade de res-posta dos governos e dos bancoscentrais - particularmente o ameri-cano - em tomar medidas para com-pensar os efeitos da crise, tanto so-bre os mercados financeiros quantosobre a demanda global.

Uma das conseqüências mais cla-ras da crise do subprime é o aumentoda incerteza, o que se espelha emuma maior dispersão nas projeçõessobre o desempenho da economiaamericana em 2008. A GoldmanSachs, por exemplo, já admite um ce-nário de dois trimestres de cresci-mento negativo, de -1% aa, e umataxa de 0,8% para o ano como umtodo. Já OECD, em seu Economic

Outlook de dezembro de 2007, pre-vê um crescimento da economiaamericana para 2008 em torno a 2%.Assim, a despeito do susto inicial, asestimativas sobre impacto da crisesobre o nível de atividade da econo-mia americana apontam para umadesaceleração de curta duração.

No Brasil, a crise do subprime tam-bém provocou uma ampliação no di-ferencial entre as projeções de cresci-mento para 2008 que, nas últimas se-manas passaram a variar de menos de3% a mais de 6%.3 Entretanto, o últi-mo boletim Focus do Banco Central

aponta que mer-cado financeiroespera, em mé-dia, que a econo-mia cresça 4,5%ao ano em 2008,

um percentual que, tendo em vista odesempenho nos últimos trimestres,representaria uma certa desa-celeração no crescimento do nível deatividade ao longo do ano. Mesmo as-sim, o impacto direto do subprime nãoparece ser muito relevante.

No caso do BNDES, nossas proje-ções apontam para um quadro demaior estabilidade do processo decrescimento em curso, sustentadopor uma trajetória robusta de inves-timentos. Nossa taxa de crescimen-to esperada para o PIB em 2008 éde 5,5%.

3 Ver Fraga, A., em Valor Econômico 18/12/2007 eLengruber, A., em Folha de São Paulo, 15/12/2007

No Brasil, investimentos devemsustentar o crescimento do PIB,que pode chegar a 5,5%

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Tabela 4- Geração Líq. de Empregos por Região e Participação de cada Região no no Saldo Líquido Total

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Perdas financeiras estimadas jásão de mais de US$ 70 bilhões edevem crescer ainda mais

2 Pela junção das iniciais da expressão em inglês, “noincome, no job or asset”.

Essa valorização foi, em grandemedida, sustentada pela expansãodo crédito imobiliário, que, nos EUA,engloba mais de dois terços das re-sidências próprias. O mercado dehipotecas - o mecanismo de financi-amento imobiliário mais importante- movimentou entre 2001 e 2006uma média anual de US$ 3 trilhõesem novas operações, chegando aoum máximo de quase US$ 4 trilhõesem 2003.

Esse crescimento foi, nos últimos5 anos, determinado, em boa medi-da, pela incorporação ao mercado deum contingente expressivo de deve-dores subprime, ou seja, de pessoasfísicas de elevadorisco de crédito.Eram indivíduosque apresenta-vam, entre outrascaracterísticas,renda incompatível com as presta-ções, passado recente deinadimplemento ou falta de docu-mentação adequada. As operaçõesmais arriscadas eram aquelas queenvolviam os chamados ninjas2, de-vedores que não tinham renda, tra-balho ou patrimônio.

Como se pode ver na Tabela, a par-ticipação dos subprime no total dasnovas hipotecas passou de 8,6% em2001 para 20,1% em 2006. Por cau-sa do elevado risco de crédito, amaior parte dessas operações foi fei-ta sem contar com as garantias tra-dicionalmente oferecidas pelo gover-

no federal americano a empréstimosresidenciais para tomadores de bai-xa renda.

Além de se direcionarem atomadores que não comprovavamcapacidade de pagamento adequa-da, os créditos imobiliários subprimeapresentavam duas outras caracte-rísticas que agravavam seu risco.Eram operações de prazo total lon-go, normalmente de 30 anos, queenvolviam dois regimes de pagamen-to. Havia um período inicial curto,de 2 ou 3 anos, em que as presta-ções e as taxas de juros eram fixase relativamente baixas. Seguia-seoutro, de 27 ou 28 anos, em que as

prestações e osjuros eram maiselevados e reajus-tados periodica-mente com baseem taxas de mer-

cado, como a Libor. Eram os chama-dos empréstimos do tipo 2/28 ou 3/27.

Os tomadores subprime normal-mente enfrentavam dificuldadespara continuar honrando essas dí-vidas, quando o período em que asprestações eram baixas chegava aofinal. Até 2006, a saída mais comumera trocar a dívida existente por umanova hipoteca do tipo 2/28 ou 3/27, só que de valor mais elevado.Isto era possível porque o preço dosimóveis estava subindo. Assim, ini-ciava-se um novo período de 2 ou 3anos em que as prestações voltavama ser fixas e baixas, o que atendia ànecessidade dos devedores. Estes,além disso, conseguiam embolsar

O acúmulo de prestações em atra-so comprometeu não só as receitasesperadas das cotas Equity que per-tenciam às SIV, mas também dastranches de menor risco que forma-vam os CDO. Diante da falta de in-formações claras sobre o tamanho ea responsabilidade sobre as perdasem curso, os investidores correrampara resgatar suas aplicações emfundos imobiliários e pararam derenovar suas aplicações emcommercial papers das SIV. Isto dei-xou os grandes bancos americanose europeus expostos ao risco imo-biliário, uma vez que as SIV passa-ram a fazer uso das linhas de crédi-to que manti-nham com es-sas instituições,o que, na práti-ca, representa-va a transferência para essas insti-tuições de parte dos prejuízos. Al-guns fundos de hedge, administra-dos por grandes bancos, suspende-ram os resgates de seus cotistas.

Nesse momento, os bancos viramseus custos de captação subir, in-clusive nos mercados interban-cários. Isso foi o sinal para que osbancos centrais interviessem, ofere-cendo liquidez a taxas mais baixas,inclusive a instituições com cartei-ras de crédito problemáticas.

No início de dezembro, as agênci-as classificadoras internacionais re-duziram o rating das SIV. A Standardand Poor´s admitiu publicamenteque não via mais futuro nesse tipode veículo financeiro e que, pela pri-meira vez em 20 anos, estava assis-

tindo ao inadimplemento decommercial papers que haviam obti-do boa classificação de risco.

Para evitar maiores perdas e man-ter clientes, os grandes bancos ecorretoras americanas passaram ase responsabilizar pelas dívidas deseus veículos, explicitando prejuí-zos. Em meados de dezembro, oCitigroup, o maior banco america-no, informou que estava assumindoas obrigações das SIV que havia cri-ado, em um total de US$ 49 bilhõesem ativos de péssima qualidade.

ConclusõesA crise do subprime ainda está lon-

ge de seu fim.Existe um esto-que elevadodesse tipo dee m p r é s t i m o

imobiliário que ainda irá enfrentaraumentos de prestações ao longodos próximos dois anos. Isto signifi-ca dizer que as perdas dos bancos,corretoras e companhias imobiliári-as, particularmente nos EUA, devemsubir ainda mais.

Até o início de dezembro de 2007,as cifras oficiais de perdas reunidaspela Bloomberg somavam mais deUS$ 70 bilhões. As estimativas, deinstituições como o Deutsche Bank,é de que este total venha a superaros US$ 300 bilhões. Trata-se de umasoma elevada, mas que, por si só,não parece ser suficiente para pro-vocar uma crise financeira de pro-porções sistêmicas. De acordo como Fundo Monetário Internacional(Global Financial Stability de setem-

Operações de alto riscoalimentaram maior boomimobiliário em 50 anos

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alguma diferença em dinheiro, mes-mo tendo de pagar as elevadas co-missões, que os agentes financeiroscobravam pela renegociação.

O papel dos bancos nosempréstimos subprimeO crescimento dos subprimes foi fi-

nanciado, basicamente, através daobtenção de recursos com a vendade títulos no mercado de capitais.Como se pode ver na Tabela, opercentual dessas hipotecas que fo-ram securitizadas passou de 50,4%em 2001 e para 80,5% em 2006. Foinessa atividade que os grandes ban-cos e corretoras americanas tiveramum papel decisivo.

O Gráfico 2 mostra, de formaestilizada, os esquemas financeirosque foram montados por essas ins-tituições para repassar esses crédi-tos a terceiros. As figuras em azulresumem a operação original de ven-

das de títulos, enquanto as em ama-relo e vermelho mostram os passosseguintes, em que são utilizados de-rivativos de crédito, ou seja, em quese emitiam novos títulos de dívidacujos valores derivavam de outrostítulos de crédito baseados emsubprimes.

O processo se iniciava com a trans-ferência de diferentes contratos dehipotecas para um único fundo deinvestimentos – o mortgage pool.Esse fundo, por sua vez, emitia co-tas (tranches) de classes diferentes.Cada uma tinha uma taxa de retor-no que era tanto maior quanto mai-or fosse o risco que seu cotista esti-vesse correndo. O tamanho de cadatranche e seu risco-retorno eram cal-culados com base em modelos es-tatísticos aprovados pelas principaisempresas de classificação de risco,como a Standard and Poor’s,Moody’s etc.

estruturação era combinar a renta-bilidade elevada das cotas do tipoCapital com as taxas baixas de ju-ros dos commercial papers. Para ga-rantir aos investidores que as SIVeram robustas, os bancos fundado-res dessas empresas estendiam li-nhas de crédito que permitiam àsSIV enfrentar dificuldades circuns-tanciais de liquidez.

A crise do subprimeAs raízes da crise do subprime po-

dem ser encontradas nadesaceleração do mercado imobili-ário americano. Como se pode verno Gráfico 3, depois de alcançarvendas de mais de 8,2 milhões deimóveis residenciais em 2005, o

mercado iniciou uma trajetória dequeda. As vendas nos 12 mesesque antecederam setembro de2007 atingiram 5,7 milhões, ou seja,houve uma queda global de 30%,mas que, no caso dos imóveis no-vos, foi de quase 50%.

Acompanhando essa queda na de-manda, os preços das residênciascomeçaram a ceder ao final de2006. Com isso, ficou mais difícilrenegociar as hipotecas subprime, oque levou a uma onda deinadimplência. De acordo com o LeMonde Diplomatique de setembrode 2007, 14% dos tomadores deempréstimo subprime se tornaraminadimplentes no primeiro trimes-tre de 2007.

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O caso das tranches de risco mé-dio está retratado no Gráfico 2 pe-los retângulos de cor amarela. Es-sas cotas eram transferidas a umFundo CDO, junto com outros títu-los de dívida, derivativos e até mes-mo outros investimentos imobiliá-rios. Um CDO de hipotecasresidenciais podia assim ser com-posto por direitos sobre milhares decontratos, agrupados de diferentesformas, por meio dos mais diversosinstrumentos. Com isso, esperava-se produzir a máxima diluição dorisco de cada hipoteca individual-mente e, assim, obter uma carteiraque, por sua distribuição estatísti-ca, alcançasse ní-veis de risco su-periores às classi-ficações dos títu-los que lhe deramorigem.

O CDO, com base nesses ativos,emitia novas séries de títulos com ca-racterísticas de risco e retornoescalonadas, a exemplo do fundo dehipotecas. Através desse expedien-te, os bancos conseguiam que 75%das dívidas colocadas no CDO des-sem lugar a novos títulos classifica-dos pelas empresas especializadasem níveis superiores aos ratings dosativos que constituíram o fundo. As-sim, por exemplo, cada US$ 100 emcotas já existentes de risco BBB, queeram incluídas na carteira de umCDO, davam lugar a US$ 75 em títu-los novos de classificação superior,ou seja, AAA, AA e A. Dessa forma,os bancos podiam obter recursosmais baratos para financiar essa par-

te menos nobre dos subprime. Deacordo com o Wall Street Journal (28/12/07), no primeiro semestre de2007, houve o lançamento de US$68 bilhões em novos CDO, lastreadosem hipotecas de qualidade igual ouinferior a BBB. Esse valor foi o dobrodo alcançado em igual período doano anterior.

Resolvido o custo de captação doscréditos classificáveis pelas agênci-as, restava ainda o que fazer com atranche de pior risco – o Capital. Es-sas cotas eram um resíduo necessa-riamente produzido em cada uma dasetapas do processo de transforma-ção financeira. Da mesma forma que

nas demaistranches, erapreciso obteruma forma ba-rata de financi-

amento dessas dívidas, que não com-prometesse o balanço dos bancos edas corretoras originadoras dos fun-dos imobiliários.

A saída encontrada foi montar em-presas específicas – as SIV – cujo úni-co propósito era emitir títulos de curtoprazo – commercial papers – usados,nos EUA, para remunerar aplicaçõesde caixa de empresas. A maior difi-culdade nesse tipo de estruturaçãoera que os commercial papers têmuma duração curta, 3 ou 6 meses,enquanto os créditos que as SIVmantinham em carteira eram de até30 anos. Esse descompasso tornavanecessário que as SIV mantivessemprogramas permanentes de coloca-ção e resgate de seus títulos. Aatratividade principal dessa

Crescimento dos subprimes foiimpulsionado pela venda detítulos no mercado de capitais Gráfico 2: Esquema Estilizado de Securitização de Créditos Subprime

Elaboração do autor5

A parcela que assumia as primeirasperdas com atrasos ou inadimplênciaera chamada de Capital (Equity), mastambém era conhecida como “Lixo Tó-xico” (Toxic Waste), pela dificuldade deser descartada. Os detentores dessascotas recebiam, em troca, a taxa deremuneração mais elevada e serviam,assim, como amortecedores de riscopara os demais investidores. Caso osprejuízos viessem a ser superiores aomontante aportado como Equity, o ex-cedente passava a ser automatica-mente de responsabilidade dos inves-tidores da classe de risco seguinte, nocaso a “B”, e assim sucessivamente.

Na posição final, estava a tranche dotipo AAA. Seus detentores só teriam

perdas caso todos os demais cotistastivessem sofrido perdas integrais. Tra-ta-se, portanto, de uma classe de in-vestimento extremamente segura, masque, por isso mesmo, proporcionavaum ganho pequeno frente ao que erapago aos demais investidores.

Os bancos, para fins de colocação jun-to ao mercado, dividiam essas cotas emtrês grupos. As de menor risco - ou seja,as classificadas como AAA, AA e A -eram vendidas diretamente aos inves-tidores. As cotas de risco médio - B, BBe BBB - e as de risco extremo - o Capi-tal - eram submetidas a uma novatransformação financeira, através douso de derivativos, que melhoravam aclassificação de risco desses créditos.

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O caso das tranches de risco mé-dio está retratado no Gráfico 2 pe-los retângulos de cor amarela. Es-sas cotas eram transferidas a umFundo CDO, junto com outros títu-los de dívida, derivativos e até mes-mo outros investimentos imobiliá-rios. Um CDO de hipotecasresidenciais podia assim ser com-posto por direitos sobre milhares decontratos, agrupados de diferentesformas, por meio dos mais diversosinstrumentos. Com isso, esperava-se produzir a máxima diluição dorisco de cada hipoteca individual-mente e, assim, obter uma carteiraque, por sua distribuição estatísti-ca, alcançasse ní-veis de risco su-periores às classi-ficações dos títu-los que lhe deramorigem.

O CDO, com base nesses ativos,emitia novas séries de títulos com ca-racterísticas de risco e retornoescalonadas, a exemplo do fundo dehipotecas. Através desse expedien-te, os bancos conseguiam que 75%das dívidas colocadas no CDO des-sem lugar a novos títulos classifica-dos pelas empresas especializadasem níveis superiores aos ratings dosativos que constituíram o fundo. As-sim, por exemplo, cada US$ 100 emcotas já existentes de risco BBB, queeram incluídas na carteira de umCDO, davam lugar a US$ 75 em títu-los novos de classificação superior,ou seja, AAA, AA e A. Dessa forma,os bancos podiam obter recursosmais baratos para financiar essa par-

te menos nobre dos subprime. Deacordo com o Wall Street Journal (28/12/07), no primeiro semestre de2007, houve o lançamento de US$68 bilhões em novos CDO, lastreadosem hipotecas de qualidade igual ouinferior a BBB. Esse valor foi o dobrodo alcançado em igual período doano anterior.

Resolvido o custo de captação doscréditos classificáveis pelas agênci-as, restava ainda o que fazer com atranche de pior risco – o Capital. Es-sas cotas eram um resíduo necessa-riamente produzido em cada uma dasetapas do processo de transforma-ção financeira. Da mesma forma que

nas demaistranches, erapreciso obteruma forma ba-rata de financi-

amento dessas dívidas, que não com-prometesse o balanço dos bancos edas corretoras originadoras dos fun-dos imobiliários.

A saída encontrada foi montar em-presas específicas – as SIV – cujo úni-co propósito era emitir títulos de curtoprazo – commercial papers – usados,nos EUA, para remunerar aplicaçõesde caixa de empresas. A maior difi-culdade nesse tipo de estruturaçãoera que os commercial papers têmuma duração curta, 3 ou 6 meses,enquanto os créditos que as SIVmantinham em carteira eram de até30 anos. Esse descompasso tornavanecessário que as SIV mantivessemprogramas permanentes de coloca-ção e resgate de seus títulos. Aatratividade principal dessa

Crescimento dos subprimes foiimpulsionado pela venda detítulos no mercado de capitais Gráfico 2: Esquema Estilizado de Securitização de Créditos Subprime

Elaboração do autor5

A parcela que assumia as primeirasperdas com atrasos ou inadimplênciaera chamada de Capital (Equity), mastambém era conhecida como “Lixo Tó-xico” (Toxic Waste), pela dificuldade deser descartada. Os detentores dessascotas recebiam, em troca, a taxa deremuneração mais elevada e serviam,assim, como amortecedores de riscopara os demais investidores. Caso osprejuízos viessem a ser superiores aomontante aportado como Equity, o ex-cedente passava a ser automatica-mente de responsabilidade dos inves-tidores da classe de risco seguinte, nocaso a “B”, e assim sucessivamente.

Na posição final, estava a tranche dotipo AAA. Seus detentores só teriam

perdas caso todos os demais cotistastivessem sofrido perdas integrais. Tra-ta-se, portanto, de uma classe de in-vestimento extremamente segura, masque, por isso mesmo, proporcionavaum ganho pequeno frente ao que erapago aos demais investidores.

Os bancos, para fins de colocação jun-to ao mercado, dividiam essas cotas emtrês grupos. As de menor risco - ou seja,as classificadas como AAA, AA e A -eram vendidas diretamente aos inves-tidores. As cotas de risco médio - B, BBe BBB - e as de risco extremo - o Capi-tal - eram submetidas a uma novatransformação financeira, através douso de derivativos, que melhoravam aclassificação de risco desses créditos.

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alguma diferença em dinheiro, mes-mo tendo de pagar as elevadas co-missões, que os agentes financeiroscobravam pela renegociação.

O papel dos bancos nosempréstimos subprimeO crescimento dos subprimes foi fi-

nanciado, basicamente, através daobtenção de recursos com a vendade títulos no mercado de capitais.Como se pode ver na Tabela, opercentual dessas hipotecas que fo-ram securitizadas passou de 50,4%em 2001 e para 80,5% em 2006. Foinessa atividade que os grandes ban-cos e corretoras americanas tiveramum papel decisivo.

O Gráfico 2 mostra, de formaestilizada, os esquemas financeirosque foram montados por essas ins-tituições para repassar esses crédi-tos a terceiros. As figuras em azulresumem a operação original de ven-

das de títulos, enquanto as em ama-relo e vermelho mostram os passosseguintes, em que são utilizados de-rivativos de crédito, ou seja, em quese emitiam novos títulos de dívidacujos valores derivavam de outrostítulos de crédito baseados emsubprimes.

O processo se iniciava com a trans-ferência de diferentes contratos dehipotecas para um único fundo deinvestimentos – o mortgage pool.Esse fundo, por sua vez, emitia co-tas (tranches) de classes diferentes.Cada uma tinha uma taxa de retor-no que era tanto maior quanto mai-or fosse o risco que seu cotista esti-vesse correndo. O tamanho de cadatranche e seu risco-retorno eram cal-culados com base em modelos es-tatísticos aprovados pelas principaisempresas de classificação de risco,como a Standard and Poor’s,Moody’s etc.

estruturação era combinar a renta-bilidade elevada das cotas do tipoCapital com as taxas baixas de ju-ros dos commercial papers. Para ga-rantir aos investidores que as SIVeram robustas, os bancos fundado-res dessas empresas estendiam li-nhas de crédito que permitiam àsSIV enfrentar dificuldades circuns-tanciais de liquidez.

A crise do subprimeAs raízes da crise do subprime po-

dem ser encontradas nadesaceleração do mercado imobili-ário americano. Como se pode verno Gráfico 3, depois de alcançarvendas de mais de 8,2 milhões deimóveis residenciais em 2005, o

mercado iniciou uma trajetória dequeda. As vendas nos 12 mesesque antecederam setembro de2007 atingiram 5,7 milhões, ou seja,houve uma queda global de 30%,mas que, no caso dos imóveis no-vos, foi de quase 50%.

Acompanhando essa queda na de-manda, os preços das residênciascomeçaram a ceder ao final de2006. Com isso, ficou mais difícilrenegociar as hipotecas subprime, oque levou a uma onda deinadimplência. De acordo com o LeMonde Diplomatique de setembrode 2007, 14% dos tomadores deempréstimo subprime se tornaraminadimplentes no primeiro trimes-tre de 2007.

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Tabela 4- Geração Líq. de Empregos por Região e Participação de cada Região no no Saldo Líquido Total

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Perdas financeiras estimadas jásão de mais de US$ 70 bilhões edevem crescer ainda mais

2 Pela junção das iniciais da expressão em inglês, “noincome, no job or asset”.

Essa valorização foi, em grandemedida, sustentada pela expansãodo crédito imobiliário, que, nos EUA,engloba mais de dois terços das re-sidências próprias. O mercado dehipotecas - o mecanismo de financi-amento imobiliário mais importante- movimentou entre 2001 e 2006uma média anual de US$ 3 trilhõesem novas operações, chegando aoum máximo de quase US$ 4 trilhõesem 2003.

Esse crescimento foi, nos últimos5 anos, determinado, em boa medi-da, pela incorporação ao mercado deum contingente expressivo de deve-dores subprime, ou seja, de pessoasfísicas de elevadorisco de crédito.Eram indivíduosque apresenta-vam, entre outrascaracterísticas,renda incompatível com as presta-ções, passado recente deinadimplemento ou falta de docu-mentação adequada. As operaçõesmais arriscadas eram aquelas queenvolviam os chamados ninjas2, de-vedores que não tinham renda, tra-balho ou patrimônio.

Como se pode ver na Tabela, a par-ticipação dos subprime no total dasnovas hipotecas passou de 8,6% em2001 para 20,1% em 2006. Por cau-sa do elevado risco de crédito, amaior parte dessas operações foi fei-ta sem contar com as garantias tra-dicionalmente oferecidas pelo gover-

no federal americano a empréstimosresidenciais para tomadores de bai-xa renda.

Além de se direcionarem atomadores que não comprovavamcapacidade de pagamento adequa-da, os créditos imobiliários subprimeapresentavam duas outras caracte-rísticas que agravavam seu risco.Eram operações de prazo total lon-go, normalmente de 30 anos, queenvolviam dois regimes de pagamen-to. Havia um período inicial curto,de 2 ou 3 anos, em que as presta-ções e as taxas de juros eram fixase relativamente baixas. Seguia-seoutro, de 27 ou 28 anos, em que as

prestações e osjuros eram maiselevados e reajus-tados periodica-mente com baseem taxas de mer-

cado, como a Libor. Eram os chama-dos empréstimos do tipo 2/28 ou 3/27.

Os tomadores subprime normal-mente enfrentavam dificuldadespara continuar honrando essas dí-vidas, quando o período em que asprestações eram baixas chegava aofinal. Até 2006, a saída mais comumera trocar a dívida existente por umanova hipoteca do tipo 2/28 ou 3/27, só que de valor mais elevado.Isto era possível porque o preço dosimóveis estava subindo. Assim, ini-ciava-se um novo período de 2 ou 3anos em que as prestações voltavama ser fixas e baixas, o que atendia ànecessidade dos devedores. Estes,além disso, conseguiam embolsar

O acúmulo de prestações em atra-so comprometeu não só as receitasesperadas das cotas Equity que per-tenciam às SIV, mas também dastranches de menor risco que forma-vam os CDO. Diante da falta de in-formações claras sobre o tamanho ea responsabilidade sobre as perdasem curso, os investidores correrampara resgatar suas aplicações emfundos imobiliários e pararam derenovar suas aplicações emcommercial papers das SIV. Isto dei-xou os grandes bancos americanose europeus expostos ao risco imo-biliário, uma vez que as SIV passa-ram a fazer uso das linhas de crédi-to que manti-nham com es-sas instituições,o que, na práti-ca, representa-va a transferência para essas insti-tuições de parte dos prejuízos. Al-guns fundos de hedge, administra-dos por grandes bancos, suspende-ram os resgates de seus cotistas.

Nesse momento, os bancos viramseus custos de captação subir, in-clusive nos mercados interban-cários. Isso foi o sinal para que osbancos centrais interviessem, ofere-cendo liquidez a taxas mais baixas,inclusive a instituições com cartei-ras de crédito problemáticas.

No início de dezembro, as agênci-as classificadoras internacionais re-duziram o rating das SIV. A Standardand Poor´s admitiu publicamenteque não via mais futuro nesse tipode veículo financeiro e que, pela pri-meira vez em 20 anos, estava assis-

tindo ao inadimplemento decommercial papers que haviam obti-do boa classificação de risco.

Para evitar maiores perdas e man-ter clientes, os grandes bancos ecorretoras americanas passaram ase responsabilizar pelas dívidas deseus veículos, explicitando prejuí-zos. Em meados de dezembro, oCitigroup, o maior banco america-no, informou que estava assumindoas obrigações das SIV que havia cri-ado, em um total de US$ 49 bilhõesem ativos de péssima qualidade.

ConclusõesA crise do subprime ainda está lon-

ge de seu fim.Existe um esto-que elevadodesse tipo dee m p r é s t i m o

imobiliário que ainda irá enfrentaraumentos de prestações ao longodos próximos dois anos. Isto signifi-ca dizer que as perdas dos bancos,corretoras e companhias imobiliári-as, particularmente nos EUA, devemsubir ainda mais.

Até o início de dezembro de 2007,as cifras oficiais de perdas reunidaspela Bloomberg somavam mais deUS$ 70 bilhões. As estimativas, deinstituições como o Deutsche Bank,é de que este total venha a superaros US$ 300 bilhões. Trata-se de umasoma elevada, mas que, por si só,não parece ser suficiente para pro-vocar uma crise financeira de pro-porções sistêmicas. De acordo como Fundo Monetário Internacional(Global Financial Stability de setem-

Operações de alto riscoalimentaram maior boomimobiliário em 50 anos

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Fonte: S&P, Índice Nacional de Preço de Imóveis Case-Schiller

bancos, corretoras e companhiasimobiliárias internacionais – como oCitibank, a Merrill Lynch e a FreddieMac americanos e o UBS suíço - so-mavam, segundo a Bloomberg, maisde US$ 70 bilhões. Nesse valor nãoestavam computados os prejuízosdecorrentes da desvalorização dasações dessas empresas, o que, emalguns casos, chegou a 40%.

Uma conseqüência menos dramá-tica da crise foi, como afirmou TheEconomist (29/12/2007), o “enrique-cimento do vocabulário dos investi-dores internacionais”. Até então,poucas pessoas estavam familiari-zadas com a existência de créditossubprime ou com a “sopa de letras”formada pelas siglas dos novos de-rivativos de crédito, como os CDO -Collateralised Debt Obligations (“Títu-los Garantidos por Dívidas”) - ou as

SIV - Structured Investment Vehicles(“Empresas de InvestimentosEstruturados”).

Diante desse cenário, esse informeanalisa os motivos que levaram osgrandes bancos internacionais a se-rem diretamente afetados pelas per-das imobiliárias norte-americanasem 2007 e as perspectivas de conti-nuidade desta crise ao longo de 2008.

O boom dos imóveisnos Estados UnidosComo se pode ver no Gráfico 1,

houve de 1997 a 2006 uma forte va-lorização dos imóveis residenciaisamericanos. Os aumentos reais atin-giram 85%, sendo que, no ano de2005, no auge do processo, essepercentual chegou a 15%. Foi o mai-or boom imobiliário nos EUA em maisde 50 anos.

bro de 2007) “os principais gruposde bancos comerciais e de investi-mento (envolvidos com a crise dosubprime) estão suficientemente ca-pitalizados, diversificados e lucrati-vos para absorver perdas diretas”.

Entre os fatores indiretos que po-dem ampliar os efeitos da crise es-tão: a possibilidade de contaminaçãode outros segmentos do mercado decrédito ao consumidor americano; aperspectiva de os bancos adotaremposturas mais conservadoras emseus novos empréstimos e os impac-tos negativos sobre o emprego e arenda, decor-rentes da desa-celeração daconstrução civil.Em compensa-ção, não sedeve desprezar a capacidade de res-posta dos governos e dos bancoscentrais - particularmente o ameri-cano - em tomar medidas para com-pensar os efeitos da crise, tanto so-bre os mercados financeiros quantosobre a demanda global.

Uma das conseqüências mais cla-ras da crise do subprime é o aumentoda incerteza, o que se espelha emuma maior dispersão nas projeçõessobre o desempenho da economiaamericana em 2008. A GoldmanSachs, por exemplo, já admite um ce-nário de dois trimestres de cresci-mento negativo, de -1% aa, e umataxa de 0,8% para o ano como umtodo. Já OECD, em seu Economic

Outlook de dezembro de 2007, pre-vê um crescimento da economiaamericana para 2008 em torno a 2%.Assim, a despeito do susto inicial, asestimativas sobre impacto da crisesobre o nível de atividade da econo-mia americana apontam para umadesaceleração de curta duração.

No Brasil, a crise do subprime tam-bém provocou uma ampliação no di-ferencial entre as projeções de cresci-mento para 2008 que, nas últimas se-manas passaram a variar de menos de3% a mais de 6%.3 Entretanto, o últi-mo boletim Focus do Banco Central

aponta que mer-cado financeiroespera, em mé-dia, que a econo-mia cresça 4,5%ao ano em 2008,

um percentual que, tendo em vista odesempenho nos últimos trimestres,representaria uma certa desa-celeração no crescimento do nível deatividade ao longo do ano. Mesmo as-sim, o impacto direto do subprime nãoparece ser muito relevante.

No caso do BNDES, nossas proje-ções apontam para um quadro demaior estabilidade do processo decrescimento em curso, sustentadopor uma trajetória robusta de inves-timentos. Nossa taxa de crescimen-to esperada para o PIB em 2008 éde 5,5%.

3 Ver Fraga, A., em Valor Econômico 18/12/2007 eLengruber, A., em Folha de São Paulo, 15/12/2007

No Brasil, investimentos devemsustentar o crescimento do PIB,que pode chegar a 5,5%

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18 jan 2008

Nº 44

Entendendo a crise do subprimeErnani Teixeira Torres Filho1

Economista e superintendente da áreade Pesquisas Econômicas

EUA devem terdesaceleração,mas impacto noBrasil tende aser limitado ecrescimento podeatingir 5,5%

Visão do Desenvolvimento é uma publicaçãoda área de Pesquisas Econômicas (APE), doBanco Nacional de Desenvolvimento Econô-mico e Social. As opiniões deste informe são deresponsabilidade dos autores e não refletem ne-cessariamente o pensamento da administraçãodo BNDES.

1 Agradeço o apoio de Marcelo Nascimento e GilbertoBorça do BNDES e de Marcos Cintra e Maryse Farhi da Unicamp.

A crise dosubprime foi umdos temas quemais se desta-cou no cenárioeconômico in-ternacional de

2007. Ao longo do segundo semes-tre, os mercados financeiros foram,por duas vezes, surpreendidos pornotícias de que as perdas relacio-nadas com o financiamento deimóveis nos Estados Unidos erammuito elevadas, o que ameaçavaa saúde financeira de importantesbancos e fundos de investimento.

Em reação, os investidores seapressaram em desfazer suas po-sições em créditos hipotecários,chegando a afetar o funcionamen-to de vários mercados. Alguns fun-

dos de investimento tiveram quesuspender os resgates de cotas.Houve uma redução na liquidezdos títulos de curto prazo nos EUA– os chamados commercial papers.Na Inglaterra, registrou-se, pelaprimeira vez em mais de 140 anos,uma corrida contra um dos maio-res bancos locais - o NorthernRock. Nos mercados interban-cários, as taxas de juros começa-ram a subir, mostrando que osgrandes bancos estavam receososde realizar empréstimos de curtoprazo entre si. Nesse estágio, osbancos centrais decidiram intervir,injetando liquidez, para evitar quea crise tomasse proporçõessistêmicas.

No início de dezembro de 2007,as perdas dos mais importantes

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