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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA REGISTRADO(A) SOB N° ACÓRDÃO '01560848* Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 7134148-9, da Comarca de Mogi das Cruzes, em que é Apelante Comercial Auto Posto Logus Ltda e outros, sendo Apelado Chevron Brasil Ltda (atual Denominação de Texaco Brasil Ltda): ACORDAM, em 20 a Câmara de Direito Privado "D" do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao(s) recurso(s), v.u. ", de conformidade com o relatório e voto do Relator, que integram este acórdão. Presidiu o julgamento, o Desembargador, Antônio Carlos da Cunha Garcia, e dele participaram, os Desembargadores Paulo Jorge Scartezzini Guimarães e Rodrigo de Castro Carvalho. São Paulo, 17 •o de 2007. -Ramon Mateo Júnior Relator

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA

REGISTRADO(A) SOB N°

A C Ó R D Ã O '01560848*

Vistos, relatados e discutidos estes autos de

Apelação n° 7134148-9, da Comarca de Mogi das Cruzes, em que é

Apelante Comercial Auto Posto Logus Ltda e outros, sendo

Apelado Chevron Brasil Ltda (atual Denominação de Texaco

Brasil Ltda):

ACORDAM, em 20a Câmara de Direito Privado

"D" do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a

seguinte decisão: "Negaram provimento ao(s) recurso(s), v.u. ", de

conformidade com o relatório e voto do Relator, que integram este

acórdão.

Presidiu o julgamento, o Desembargador,

Antônio Carlos da Cunha Garcia, e dele participaram, os

Desembargadores Paulo Jorge Scartezzini Guimarães e Rodrigo

de Castro Carvalho.

São Paulo, 17 •o de 2007.

-Ramon Mateo Júnior Relator

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

20a Câmara 'D' - Seção de Direito Privado

Apelação c/ Revisão n° 7.134.148-9 Comarca: Mogi das Cruzes Açáo: Embargos à Execução - Processo n° 1282/02-A Apelante(s).: Comercial Auto Posto Logus Ltda e Outros Apelado (a)(s).: Chevron Brasil Ltda.

Voto n° 235

EMBARGOS À EXECUÇÃO - Escritura Pública de Confissão de Dívida - Inexistência de nulidade em seu teor, ou mesmo de excesso de execução -Celebração de contrato de fornecimento de revenda de combustíveis que deve observar o princípio pacta sunt servanda, justamente para conferir aos negócios jurídicos a estabilidade e segurança às relações jurídicas - Nâo verificação, ademais, da incidência de erro ou de dolo no caso em tela - Apelo desprovido, rejeitadas as preliminares.

Comercial Atuo Posto Logus Ltda., Wilson Grilo,

Márcia Regina de Almeida Grilo, Newton Hilário Grilo, Lúcia de Fátima

Grilo, Sílvio Grilo Júnior e Janete Said Grilo opuseram Embargos à

Execução promovida contra eles por Texaco Brasil S/A - Produtos de

Petróleo, atualmente denominada de Chevron Brasil Ltda., havendo sido

julgados improcedentes, pela respeitável sentença defls. 591/596.

Inconformados, apelaram os embargantes. Em

preliminar, requerem seja declarada a nulidade da sentença, não só pelo

julgamento antecipado da lide, mas também em razão da incapacidade técnica

do perito nomeado pelo Juízo ao quo\ certo que, segundo seu entendimento, a

perícia não foi concluída de modo satisfatório porque o réu não apresentou

documentos necessários para tanto. No mérito, insistem no reconhecimento de

nulidade da confissão de dívida, com a respectiva declaração de nulidade da

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cláusula contratual e desconstituiçáo do título executivo extrajudicial, ao

fundamento de que foram induzidos a erro. Eis que, por meio dela,

comprometeram-se a adquirir volume excessivo de combustível, praticado por

preço superior ao mercado, ficando ao contrato vinculados, em razão da

cláusula de exclusividade. Acenam, ainda, que, ao contratar com a apelada,

assumiram obrigação que se mostrou impossível de ser cumprida, justamente

em razão das condições de mercado impostas pela ré.

Recurso tempestivo, preparado (fls. 609/610) e

respondido (fls. 628/634).

É o relatório.

Voto.

O apelo, sempre debaixo da mais acatada vênia,

não comporta provimento, devendo ser mantida a respeitável sentença,

inclusive por seus bem deduzidos fundamentos.

Inicialmente, rejeitam-se as preliminares de

cerceamento defensório e de nulidade da perícia, suscitadas pelos apelantes.

Sustentam, com efeito, que seria necessária a

produção de prova oral, com oitiva de testemunhas e depoimento pessoal do

representante legal da ré, para demonstrar os fatos constitutivos de seu direito.

Sem embargo, não havia mesmo necessidade de

dilação probatória na hipótese dos autos, sendo adequada a aplicação do

artigo 330, I, do Código de Processo Civil, verbis: o juiz conhecerá diretamente

do pedido, proferindo sentença, quando a questão de mérito for unicamente de

direito, ou, sendo de direito ou de fato, não houver necessidade de produzir

prova em audiência.

Assim, embora seja a matéria de direito e de fato, os

documentos acostados aos autos, aliados à prova pericial produzida em juízo,

foram suficientes para o julgamento da lide, na profundidade exigida,

inocorrendo violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Antes,

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sim, atendendo ao princípio da célere prestação jurisdicional, acrescentado ao

artigo 5°, da Constituição Federal, pela emenda constitucional n° 45.

Por outro lado, de incapacidade técnica do perito

judicial não há falar. Acenam os embargantes que a perícia contábil foi

realizada por um economista, o qual não estaria habilitado para desenvolver os

trabalhos necessários.

Pese tal alegação, verifica-se dos autos que, além

de economista, o perito nomeado também possui qualificação como contador;

o que, por si só, o tornaria mais qualificado tecnicamente para analisar os fatos

consignados nos autos.

Não bastasse isso, conquanto tenham os

embargantes questionado a habilitação do profissional respectivo,

conformaram-se com a mesma, na medida em que deixaram de impugnar a

nomeação pela via procedimental adequada; tanto que apresentaram quesitos,

indicaram assistente técnico e efetuaram pagamento parcelado dos honorários

periciais. Destarte, tal questão, a bem de ver-se, encontra-se salvaguardada

pelo manto da preclusão temporal, pondo-se como descabido seu

questionamento no presente âmbito recursal.

No mérito, propriamente, e como acima ressalvado,

o recurso não comporta provimento.

Pelo constante dos autos, originalmente foram

celebrados Contrato de Concessão Comercial, Mútuo e Outras Avenças, com

Garantia Fidejussória (fls. 50/60), Contrato de Fornecimento e Comodato com

Garantia Fidejussória (fls. 38/47) e Contrato Particular de Mútuo com Garantia

Fidejussória e Outras Avenças (fls. 61/67), pelos quais, em síntese, a

embargada comprometeu-se a fornecer, com exclusividade, quantidade de

combustível e derivado de petróleo.

No entanto, os embargantes, acenando haverem

sido induzidos em erro, discorrem que houve hiperdimensionamento do

combustível objeto da contratação, além de que o preço de custo praticado

pela embargada não lhes proporcionou margem de lucro, por ser superior -'"7 àqueles ofertados pelos concorrentes.

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Ulteriormente, em razão de dívidas pendentes,

firmaram Escritura Pública de Confissão de Dívida com Prestação de Garantia

Hipotecária e Fidejussória e Outras Avenças, documento que embasa a

execução, E, sustentam que, ao contratar com a apelada, assumiram

obrigação que se mostrou impossível de ser cumprida, justamente em razão

das condições de mercado impostas pela ré.

Numa primeira ordem de consideração, importa

referir que escritura pública de confissão de dívida goza dos requisitos da

liquidez, exigibilidade e certeza. É, pois, documento apto a instruir o pleito

executório, por possuir natureza de título executivo extrajudicial.

De outro aspecto, não obstante insistam que

recaíram em erro ao firmar o contrato respectivo, inexiste qualquer prova a

esse respeito nos autos.

Por erro entende-se a noção falsa sobre

determinado objeto. O erro consiste, pois, em vício de consentimento

espontâneo; vale dizer, a parte erra sozinha. É certo que o erro, sendo

substancial, torna o negócio jurídico anulável. Para tanto, não se leva em conta

o grau de discernimento e a razoabilidade do homem médio, mas as condições

pessoais da vítima (o desenvolvimento mental, o cultural, o profissional, etc).

E, ao que consta dos autos, os embargantes não

podem ser considerados hipossuficientes. Pois, pela qualificação de cada um

deles, não há negar possuírem discernimento e instrução para celebrar um

contrato, especialmente em se tratando de negócio jurídico de elevada monta.

O fato de não terem logrado êxito em seu

desiderato; vale dizer, obtido os lucros pretendidos, não induz à anulação do

contrato respectivo.

Demais disso, conquanto, ao menos de forma

tangencial, tenham os apelantes ferido a ocorrência de dolo, também deste

vicio de vontade não há falar, porquanto não há indício de captação da vontade

errônea dos autores, por meio de artifícios fraudulentos ou ardis.

Pelo contrário. Como bem acenado pela respeitável

sentença monocrática, inegável que os contratantes, pessoas instruídas e

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esclarecidas, antes de firmar o pacto, analisaram as condições

mercadológicas, e somente após o exame da conjuntura é que formalizaram o

contrato, de forma livre e consciente, para a comercialização dos produtos

fornecidos pela embargada. Basta, com efeito, analisar as cláusulas insertas na

escritura de confissão de dívida para se concluir que inexiste qualquer abuso

ou fraude. Nela consta a origem do débito e a forma de pagamento, com a

inclusão dos encargos respectivos, derivados da mora. E, como bem apontado

pelo digno Juiz a quo tivesse sido o débito quitado, a dívida não seria acrescida

de encargos.

Em síntese. Na oportunidade em que celebraram o

contrato, os embargantes tinham conhecimento de todos os termos e

condições, assim como de seus efeitos e conseqüências.

Vigorando entre as partes a autonomia da vontade,

correspondente à livre iniciativa de contratar, o negócio jurídico possui força

vinculante, a qual se presta para dar segurança e estabilidade às relações

jurídicas. No caso, pois, aplica-se o princípio da intangibilidade ou imutabilidade

do contrato, decorrente da fórmula de que o acordo faz lei entre as partes

{pacta sunt servanda), equiparado a disposições legais.

Bem por isso, deixaram os embargantes de

demonstrar, de forma concludente e concreta, os fatos constitutivos de seu

pretenso direito - de que o débito confessado teria sido derivado de ato

abusivo da embargada - ; certo que tal prova era de sua incumbência.

Sobre esse aspecto, impende esclarecer que,

cuidando-se de execução fundada em título executivo extrajudicial, incide, em

prol dos credores, presunção de legitimidade do mesmo título, cuja

desconstituição somente poderia ser levada a efeito por força de prova

suficiente a respeito de sua ineficácia, do que não cuidaram os embargantes.

Demasia não será ressaltar que as alegações no

sentido de que o fato de não possuírem giro comercial, porque o preço do

combustível praticado pela embargada era superior ao oferecido pelas

concorrentes, bem como de que havia abusividade nas metas de compra de

combustível estabelecida nos contratos, soam despropositadas7.

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Eis que, como já referido, celebraram o contrato de

seu intento, inexistindo provas de que foram compelidos a tanto. E, apenas a

título de argumentação, fosse o preço praticado pela embargada superior

àqueles empregados pelos concorrentes, tal circunstância não pode ser

determinante para declarar a nulidade do contrato ou das cláusulas contratuais.

Pois, como já referido, possuindo os embargantes plena liberdade de contratar,

poderiam ter discutido o valor do contrato, assim como o preço do combustível

usualmente consumido pelo mercado respectivo, previamente, ou mesmo

contratado com empresa diversa, pois tiveram oportunidade de avaliar as

condições mercadológicas antes de contratar.

Daí porque, não há como acolher a assertiva de que

o cumprimento da obrigação assumida revelou-se impossível em razão das

condições de mercado impostas pela ré.

A sentença monocrática lançou uma pá de cal, ao

afirmar que a análise da viabilidade econômico-financeira competia aos

embargantes e deveria ter sido feita antes da assinatura dos contratos, de

modo que eventual fracasso comercial não pode ser imputado à embargada,

nem utilizado como argumento para a desconstituição de confissão de dívida

livremente assinada em cartório (fls. 594).

Pois, nos contratos bilaterais, quem suporta o risco

do negócio é o próprio devedor, especialmente quando cumprida a obrigação

pelo credor (no caso, a embargada).

Demais disso, impende sublinhar não ser aplicável

ao caso o disposto no artigo 256 do Código Civil vigente (artigo 888 do CC/16),

no sentido de que se todas as prestações se tornarem impossíveis sem culpa

do devedor, extinguir-se-á a obrigação.

Tal dispositivo legal, com efeito, aplica-se às

obrigações alternativas. Todavia, a relação jurídica obrigacional vislumbrada

nos autos não possui esta natureza. Por outra colocação, a obrigação

assumida pelos embargantes é simples, havendo unidade de prestação. Os

embargantes adquiriram produtos da embargada para revenda, satisfazendo a

obrigação pelo pagamento respectivo.

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Assim, deixaram os embargantes de demonstrar que

a impossibilidade do cumprimento da obrigação derivou da imposição de

condições por parte da ré, fato que lhes incumbia.

Ao fim e ao cabo, mister ressaltar que, embora os

embargantes acenem haver atendido todas as orientações estabelecidas no

contrato, não foi esta a conclusão levada a efeito pela perícia, que

expressamente consignou haver verificado aquisições de produtos de outras

distribuidoras além da embargada (fls. 177); não se vislumbrando, de resto,

abusividade na cláusula de exclusividade.

Pontofinalizando, não restou bem caracterizado o

excesso de execução, cujas alegações, sobre genéricas, mostraram-se

infundadas e despropositadas para a hipótese.

Destarte, não merece reforma a respeitável

sentença, inclusive por seus bem deduzidos fundamentos, motivo pelo qual a

execução deve prosseguir nos regulares efeitos.

Por tais motivos, meu voto, rejeitadas as

preliminares, nega provimento ao recurso.

São Paulo, 17 de dezembro de 2.007.

RAMON MATEO JÚNIOR Relator