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SUMÁRIO APRESENTAÇÃO.........................7 CAPÍTULO 2 A EDUCAÇÃO ARISTOCRÁTICA NO BRASIL COLONIAL . 19 CAPÍTULO 3 A EDUCAÇÃO NO BRASIL (1808-1822)..........41 CAPÍTULO 4 A EDUCAÇÃO DE ELITE NO PERÍODO IMPERIAL (1822-1889).................. 53 CAPÍTULO 5 A REPÚBLICA VELHA E A EDUCAÇÃO (18 89-1930).. . 71 CAPÍTULO 6 A ERA VARGAS E AS TRANSFORMAÇÕES NA EDUCAÇÃO (1930-1945)...............83 CAPÍTULO 7 EDUCAÇÃO E DEMOCRATIZAÇÃO (1946-1964).....99 CAPÍTULO 8 A EDUCAÇÃO NOS GOVERNOS MILITARES (1964-1985) 113 CAPÍTULO 9 A EDUCAÇÃO E A TRANSIÇÃO DEMOCRÁTICA (1985-2001)...............131 CAPÍTULO 10 TEORIAS QUE INFLUENCIARAM A EDUCAÇÃO BRASILEIRA........................157 CAPÍTULO 11 A EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES...........183 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................195

A Educação Brasileira no Contexto Historico

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Page 1: A Educação Brasileira no Contexto Historico

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO.........................7

CAPÍTULO 2

A EDUCAÇÃO ARISTOCRÁTICA NO BRASIL COLONIAL . 19

CAPÍTULO 3

A EDUCAÇÃO NO BRASIL (1808-1822)..........41

CAPÍTULO 4

A EDUCAÇÃO DE ELITE NO PERÍODO

IMPERIAL (1822-1889).................. 53

CAPÍTULO 5

A REPÚBLICA VELHA E A EDUCAÇÃO (18 89-1930).. . 71

CAPÍTULO 6

A ERA VARGAS E AS TRANSFORMAÇÕES

NA EDUCAÇÃO (1930-1945)...............83

CAPÍTULO 7

EDUCAÇÃO E DEMOCRATIZAÇÃO (1946-1964).....99

CAPÍTULO 8

A EDUCAÇÃO NOS GOVERNOS MILITARES (1964-1985) 113

CAPÍTULO 9

A EDUCAÇÃO E A TRANSIÇÃO

DEMOCRÁTICA (1985-2001)...............131

CAPÍTULO 10

TEORIAS QUE INFLUENCIARAM A EDUCAÇÃO BRASILEIRA........................157

CAPÍTULO 11

A EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES...........183

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................195

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............. 199

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APRESENTAÇÃO

A necessidade de utilizar um livro em sala de aula, que versasse sobre o processo histórico,

trabalhando a história da educação inserida, que fosse prático e de fácil manuseio, que

englobasse diversas idéias e correntes, sem perder o senso crítico, determinou a elaboração

deste trabalho.

O trabalho "A Educação Brasileira no Contexto Histórico", além de procurar atender os

pontos acima citados, é também fruto da experiência de várias décadas em sala de aula e de

muitos anos de trabalho preparando professores para diversos concursos públicos.

Se fosse possível sintetizar os referidos capítulos em poucas palavras, no mínimo poderia

ser dito que: Enfoca a história da educação brasileira fazendo parte dos acontecimentos e

contribuindo com o processo histórico. Cada capítulo além de estar relacionado com todo e

os demais, numa interação dialética, pode ser analisado separadamente sem que haja

solução de continuidade e prejuízo do entendimento. Acompanhando cada capítulo há

sempre textos de várias autoridades no assunto ao longo da história, dentro das diversas

ideologias ainda discutidas nos trabalhos acadêmicos. Existe um capítulo específico sobre as

teorias que mais influenciaram nossa educação e outro sobre a educação em todas as

Constituições Brasileiras.

No entanto, o objetivo maior é levar à reflexão sobre os assuntos tratados e contribuir para a

popularização do conhecimento, como imaginava o filósofo Antônio Gramsci, na primeira

metade do século XX.

Agradeço as críticas dos colegas, alunos e demais interessados pelo assunto e desejo estar

sempre preparado para dar continuidade ao trabalho dialético de ação-reflexão-ação,

entendido como a única maneira de participar e colaborar para a transformação da sociedade

brasileira.

O autor

Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende.

(Guimarães Rosa)

Page 3: A Educação Brasileira no Contexto Historico

CAPÍTULO 1

A EXPANSÃO COMERCIAI, E TERRITORIAL DA EUROPA

OCIDENTAL

O primeiro passo estava dado, e a Europa deixará de viver recolhida sobre si mesma para

enfrentar o Oceano. O papel de pioneiro nesta etapa caberá aos portugueses, os melhores

situados geograficamente.

(Caio Prado Júnior)

A Europa Ocidental do século XI ao XV, época chamada pelos historiadores de Baixa Idade

Média, passou por grandes transformações. A nobreza estava em decadência, enquanto a

burguesia (classe social que controla os meios de produção) estava em plena ascensão.

A partir da Revolução Comercial no século XI, do desempenho das Cruzadas (movimento

cristão armado para retomar Jerusalém que estava nas mãos dos árabes) c dos avanços do

Humanismo (movimento intelectual favorável às novas idéias), que forneceram as bases

epislemológicas (teoria do conhecimento) à vanguarda daquele momento, estão abertas as

portas para as grandes Navegações, a Reforma Religiosa e as mudanças educacionais.

Portugal é privilegiado pela situação geográfica favorável, voltada para o Oceano Atlântico,

e com o embargo comercial feito pelos árabes barrando as possibilidades de

comercialização com o Oriente, a sorte foi lançada no Mar Tenebroso (Oceano Atlântico).

Com a vitória da Dinastia de Avis (1385-1580) sobre a Dinastia de Borgonha (1139-1383),

numa revolução apoiada pela burguesia em ascensão, D. João I de Avis encontrou o

momento certo para promover as grandes conquistas portuguesas. A expansão começa pelas

costas da África, vai contornando aquele continente, passa pelo Cabo da Boa Esperança e

atinge Calicute na índia em 1498; estava concluída a rota de comércio das especiarias. A

chegada ao Brasil em 22 de abril de 1500 era simplesmente mais uma posse portuguesa

conquistada no referido contexto, isto é, da expansão portuguesa que se iniciara mais de

cem anos antes e assinalava o apogeu de suas conquistas.

Analisando de maneira ampla os acontecimentos, notamos que a Idade Moderna (1453-

1789) já estava caminhando a passos firmes e o Mercantilismo (Ia fase do capitalismo)

fornecia as bases do pensamento econômico, amparado por um Estado poderoso, que

Page 4: A Educação Brasileira no Contexto Historico

possuía exército, polícia, justiça, cunhava moeda, tinha contornos territoriais definidos, com

balança comercial favorável, estoques de metais, apoiando as exportações, promovendo a

exaltação do nacionalismo, adotando colônias para atender as necessidades da metrópole,

principalmente para fornecer matérias-primas e obedecer o estatuto dos monopólios

estabelecido pela Coroa.

No que toca à educação, a hegemonia das Sete Artes Liberais, Trivium (Gramática,

Dialética e Retórica) e Qua-drivium (Aritmética, Geometria, Música e Astronomia)

estruturadas durante a Idade Média da Europa Ocidental (Século V ao XV), já não atendia

as necessidades do novo momento histórico. As idéias de Santo Tomás de Aquino (1224-

1274), procurando superar a dicotomia fé-razão, não encontrava tantos seguidores, isto é, a

Escolástica estava em decadência, depois de muitos séculos de soberania no campo

educacional.

Outro acontecimento importante para a época e que também ajudou a disseminar as novas

idéias, o novo tempo, foi a Revolução de Gutenberg (1391-1468) dando dinamismo

necessário à produção literária em escala comercial e possibilitando que mais pessoas

tivessem acesso ao conhecimento documentado, antes quase que monopolizado pelos

membros da Igreja, atendendo as perspectivas da burguesia em ascensão. Os textos clássicos

proibidos são estudados novamente e os textos religiosos também são impressos e

divulgados com mais facilidade e estudados pelos leigos com maior profundidade.

No contexto que se inicia, há necessidade da alfabe-tização da nova e emergente classe

social (burguesia), tanto para ler os textos clássicos e religiosos como para trabalhar

comercializando os produtos da época. O momento histórico exigia mudanças, ler e escrever

já não se constituíam apenas tarefa de religiosos, como antes ocorria.

Outro acontecimento importante que também influenciou seriamente em toda a

transformação no que tange à religião foi a crise que se alastrava no seio da Igreja, em terras

européias. Perdia adeptos com o avanço do Humanismo e precisava de novas áreas onde

pudesse evangelizar outros povos. Daí surge o apoio da Igreja, inclusive seu engajamento, à

política das Grandes Navegações. Seriam novos fiéis, mesmo que para isso tivesse que

assumir o ônus da educação e da catequese nas novas terras "descobertas".

Em uma análise mais cuidadosa percebemos que o Brasil, a partir de 1500, se "encaixava"

no contexto, fornecendo matérias-primas para a Metrópole, iniciando com o pau-brasil,

depois com o açúcar não refinado e o ouro das minas brasileiras. O monopólio

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(exclusividade comercial) pertencia a Portugal e o Brasil passou a existir em função da

política econômica e financeira, na condição de colônia. Enquanto os burgueses cuidavam

da exploração comercial nos primeiros ciclos da colonização, os religiosos faziam a

catequese dos gentios e preparavam os brancos para estudos ulteriores; mas este já é assunto

para outro capítulo.

RESUMO

Séculos XI ao XIV a Europa Ocidental sofre grandes transformações, inciando com o

Renascimento Comercial e as Cruzadas. A nobreza está em franca decadência diante da

ascensão da burguesia.

O Humanismo serve de alicerce para o proselitismo das novas idéias.

O Renascimento fornece bases epistemológicas para as Grandes Navegações, a Reforma

Religiosa e as mudanças educacionais.

Portugal: posição geográfica privilegiada, voltada para o Oceano Atlântico.

A Vitória da Dinastia de Avis em 1385 sobre a Dinastia de Borgonha, quando D. João I de

Avis juntou força com os burgueses e começou a conquista pelas costas da África, chegando

ao Brasil em 1500.

Idade Moderna: começa no século XV tendo as bases do pensamento econômico assentadas

no Mercantilismo, que defendia: balança comercial favorável, estoque de metais, Estado

poderoso, mais exportações menos importações, exaltação ao nacionalismo, governo

direcionado aos assuntos econômicos e colônias para atender as necessidades da metrópole.

Educação: A hegemonia das sete Artes Liberais: Trivium (Gramática, Dialética e Retórica),

Quadrivium (Aritmética, Geometria, Música e Astronomia) já não atende o novo momento

histórico. As idéias de Santo Tomás de Aquino (1224-1274), procurando trabalhar conjun-

tamente fé e razão, não encontravam tantos seguidores.

A Revolução de Gutenberg (1391-1468) difunde o novo saber com maior velocidade, para

que a burguesia pudesse ser mais bem informada, era, também, a volta dos estudos dos

clássicos e o saber anterior que se concentrava, em grande parte, nos membros da Igreja,

agora sofre mudanças.

Alfabetização: passou a ser necessária para a nova classe em ascensão (burguesia).

Migração de sábios: por toda a Europa, devido às facilidades, de trabalhar as novas idéias.

Brasil em 1500: estava inserido no contexto, fornecendo matérias-primas para Portugal,

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começando com o pau-brasil, depois açúcar e ouro.

Monopólio: Brasil passa a existir em função da política econômica, na condição de colônia.

A Religião: Havia crise no seio da Igreja, que perdia adeptos na Europa Ocidental e

necessitava de novas áreas de atuação. Apoia as Grandes Navegações e assume o trabalho

educacional e de catequese nas novas terras.

PROPOSTAS PARA REFLEXÃO

Por que a história da educação está inserida no contexto geral?

Qual a importância do conhecimento histórico?

Quais fatores contribuíram para as Grandes Navegações?

Reflita sobre a ascensão do capitalismo e as mudanças educacionais.

Qual a importância para a educação da relação Estado e Igreja?

Faça uma análise sobre o Renascimento para a realidade histórica.

Por que Portugal foi o pioneiro nas Grandes Navegações?

Quais as mudanças contidas no seio da Idade Moderna?

Por que as Sete Artes Liberais não se ajustavam ao novo modelo?

Faça uma análise sobre a educação da nobreza e da burguesia.

Por que a educação acompanha o desenvolvimento e o processo histórico?

LEITURA COMPLEMENTAR

TEXTO I -AS GRANDES NAVEGAÇÕES

As grandes viagens marítimas dos séculos XV e XVI foram uma continuação natural do

renascimento do comércio na Europa, iniciado ainda na Idade Média. Esse renascimento

deu origem ao capitalismo, cujo elemento impulsionador é o lucro. Era natural então que,

esgotadas as possibilidades de desenvolvimento comercial na Europa, novas regiões

passassem a ser exploradas, mesmo à custa de muito esforço e sacrifício.

Assim, entre os fatores que motivaram as grandes navegações marítimas, o principal foi sem

dúvida a busca de lucros pela burguesia comercial e financeira da Europa. Por isso a

burguesia européia investia vultosos recursos para armar esquadras, remunerar tripulações,

para financiar, enfim, as expedições oceânicas.

Neste mesmo sentido, foi importante também o apoio de alguns monarcas, como os de

Portugal e Espanha, que partilhavam os lucros dos empreendimentos comerciais.

Page 7: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Por outro lado, foram valiosos os grandes progressos alcançados na arte de navegar, sobre-

tudo em Portugal. Nesse período surgiu a caravela, com leme e velame mais aperfeiçoados

que os dos navios existentes até então; desenvolveram-se instrumentos científicos, como a

bússola, o quadrante, o astrolábio, que facilitaram a navegação em alto-mar. Além disso, foi

considerável a evolução da cartografia. Nos portulanos da época, começaram a ser inscritas

as primeiras rotas seguras estabelecidas nos oceanos. Portulanos eram relatórios detalhados

de uma região por um piloto que estiver a lá antes.

O incentivo da Igreja Católica, que via nos empreendimentos a oportunidade de levar a fé

cristã a outros povos, também contribuiu para o sucesso das grandes navegações.

Por meio de seus navegadores, as nações européias estabeleceram contato com as

civilizações dispersas pelos demais continentes. Como resultado das grandes navegações, os

europeus atingiram regiões, que nem suspeitavam existir e assim conheceram populações e

culturas bem diferentes da sua.

Em conseqüência das grandes viagens marítimas, o mundo inteiro, praticamente, passou por

modificações profundas. A partir das grandes navegações, as instituições sociais, políticas,

econômicas e culturais européias foram impostas a grande parte da humanidade.

(FERREIRA, 1996, pp. 12-14)

TEXTO II -A MONTAGEM DA COLONIZAÇÃO

(...) O sistema de colonização que a política econômica mercantilista visa desenvolver tem

em mira os mesmos fins mais gerais do mercantilismo e a eles se subordina. Por isso, a

primeira preocupação dos estados colonizadores será de resguardar a área de seu império

colonial face às demais potências; a administração se fará a partir da metrópole, e a

preocupação fiscal dominará todo o mecanismo administrativo. Mas a medula do sistema,

seu elemento definidor, reside no monopólio do comércio colonial. Em torno da preservação

desse privilégio, assumido inteiramente pelo Estado, ou reservado à classe mercantil da

metrópole ou parte dela, é que gira toda a política do sistema colonial. E aqui reaparece o

caráter de exploração mercantil que a colonização incorporou da expansão comercial, da

qual foi um desdobramento.

O monopólio do comércio das colônias pela metrópole define o sistema colonial porque é

através dele que as colônias preenchem a sua função histórica, isto é, respondem aos

estímulos que lhe deram origem, que formam a sua razão de ser, enfim que lhes dão sentido.

E realmente, reservando a si com exclusividade a aquisição de produtos coloniais, a

Page 8: A Educação Brasileira no Contexto Historico

burguesia mercantil metropolitana pode forçar a baixa de seus preços até ao mínimo além

do qual se tornaria antieconômica a produção; a revenda, na metrópole ou alhures, a preço

de mercado, cria uma margem de lucros de monopólio apropriada pelos mercadores inter-

mediários: se vendidos no próprio mercado consumidor metropolitano os produtos

coloniais, transferem-se rendas da massa da população metropolitana (bem como dos

produtos coloniais) para a burguesia mercantil; se vendidos em outros países trata-se de um

ingresso externo, apropriado pelos mercadores metropolitanos. Igualmente, adquirido a

preço de mercado, na própria metrópole ou no mercado europeu, os produtos de consumo

colonial (produtos manufaturados sobretudo), e revendendo-os na colônia a preços

monopolistas, o grupo privilegiado se apropria mais uma vez de lucros extraordinários.

Num e outro sentido uma parte significativa da massa de renda real gerada pela produção da

colônia é transferida pelo sistema de colonização para a metrópole e apropriada pela

burguesia mercantil; essa transferência corresponde às necessidades históricas da expansão

da economia capitalista de mercado na etapa de sua formação. Ao mesmo tempo, garantindo

o funcionamento do sistema, face às demais potências e diante dos produtores coloniais e

mesmo das demais camadas da população metropolitana, o Estado realiza a política

burguesa e simultaneamente se fortalece, abrindo novas fontes de tributação. Estado

centralizado e sistema colonial conjugam-se, pois, para acelerar a acumulação de capital

comercial pela burguesia mercantil européia.

(NOVAIS, 1968, pp. 59-60

CAPÍTULO 2

A EDUCAÇÃO ARISTOCRÁTICA NO BRASII, COLONIAL

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na

escola, de um modo ou de muitos todos nós envolveremos pedaços da

vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender e ensinar.

Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias

misturamos a vida com educação.

(Carlos Rodrigues Brandão)

O PROCESSO DE COLONIZAÇÃO

Quando Pedro Álvares Cabral tomou posse destas terras em 22 de abril de 1500,

Page 9: A Educação Brasileira no Contexto Historico

representando o governo português e em seu nome, não havia o menor interesse em começar

a colonização. O Oriente ocupava o primeiro lugar nas prioridades lusas e assim

permaneceu por trinta anos. Era o comércio lucrativo de especiarias, que se encontrava no

apogeu. Durante três décadas, Portugal, apenas, encaminhou, para fazer reconhecimento e

defender as terras, algumas expedições. Logo de início ficou patente que devido à

abundância de pau-brasil e à grande extensão, com mais de sete mil quilômetros de litoral,

seria impossível defendê-los.

A necessidade de colonizar as terras portuguesas na América surgiu devido às crises

econômicas, à impossibilidade de derrotar a pirataria do pau-brasil e ao medo de perder a

posse das terras para outras potências européias. Em 1530, chegou Martim Afonso de Souza

para dar início à colonização e promover o povoamento ao longo do litoral, fundando

núcleos. A primeira vila fundada foi São Vicente em 1532. Se por um lado Martim Afonso

queria promover o povoamento, por outro, estava inserindo o Brasil nos ditames da política

mercantilista, criando condições para que a colônia cumprisse o seu papel histórico,

atendendo as necessidades da metrópole. Existia, ainda, o descontentamento dos demais

estados europeus que não aceitavam a partilha das terras entre Portugal e Espanha, feito pelo

Tratado de Tordesilhas em 1494.

Antes de mandar a Expedição Colonizadora, Portugal iniciou a exploração do pau-brasil,

usando para tanto o estatuto do monopólio. A cessão de arrendamento foi feita a favor de

Fernão de Loronha, poderoso burguês da época, que implantou feitorias ao longo do litoral e

utilizou o trabalho indígena, numa atividade extrativa predatória, ou seja, cortavam as

árvores para fazer corantes na Europa e não plantavam outras no lugar, além de não fixar o

homem à terra para defendê-la.

Pelos motivos expostos, surge a iniciativa de se montar a expedição colonizadora em 1530,

de base agrícola, alta rentabilidade e segura, produtora de um fluxo de bens para o comércio

europeu. No dizer da professora Alice Canabrava, a solução encontrada para a organização

de tal empresa é a solução açucareira, ou seja, a produção do açúcar em larga escala,

aproveitando-se ao máximo a disponibilidade da terra e as suas condições ecológicas

favoráveis, bem como a demanda firme do produto nos mercados da Europa. A experiência

com a cana-de-açúcar já existia; os portugueses tinham cultivado esse tipo de plantação nas

ilhas do Atlântico.

Os holandeses participaram do empreendimento ao lado dos portugueses, ficando

inicialmente com o refino e a distribuição do açúcar no mercado. Amsterdã, com o passar

Page 10: A Educação Brasileira no Contexto Historico

dos anos, tornou-se grande centro financeiro, dando suporte para os gastos dos senhores de

engenho, principalmente, financiando a compra de escravos africanos. Foi a solução

encontrada para resolver o problema da mão-de-obra dos grandes latifúndios açucareiros.

A grande propriedade rural, hoje ainda uma marca registrada destas terras, nasceu com a

implantação das capitanias hereditárias, regime de donatárias que também permitia a doação

de sesmarias. Era a criação do latifúndio e as terras eram cedidas aos burgueses que

promoviam a colonização. D. João III, rei de Portugal, dizia que estava recompensando os

fidalgos pelos serviços prestados. Foi um grande passo rumo à colonização, mas poucas

capitanias prosperaram e também se criava uma grande descentralização, o que não interes-

sava naquele momento histórico. Como resposta à situação criou-se o governo geral em

1548 e no ano seguinte Tome de Souza chegou acompanhado de assessores e jesuítas, e

fundou Salvador para ser a capital. Era constituído o governo geral e os jesuítas passariam a

trabalhar na catequização dos indígenas e na promoção da educação dos filhos da elite rural.

Naquela época a população era formada de brancos europeus, negros africanos e indígenas

nativos. A colonização sufoca esses dois últimos, dizimando os nativos e alienando cultu-

ralmente os negros, que foram escravizados.

A sociedade colonial, ora formada, tinha caráter aristocrático e patriarcal. Os grandes

proprietários rurais produtores e exportadores detinham todos os direitos, enquanto os

escravos considerados peças existiam como força de trabalho para atender as necessidades

da produção. Havia, também, grupos flutuantes como os forros, mestiços, mamelucos,

mascates, rendeiros e agregados, todos mais ou menos considerados desocupados, sem

posição definida nos quadros sociais da colônia. No que tange à participação política vivia-

se o absolutismo; foram fundadas as câmaras municipais para os "homens bons", isto é,

ricos fazendeiros brancos.

Cabe verificar, ainda, que a sociedade patriarcal estava embuída de idéias medievais e os

jesuítas trabalhavam no espírito da Contra-Reforma. Eram soldados da Companhia de Jesus

fundada pelo militar Inácio de Loyola em 1534 e reconhecida pelo papa Paulo III em 1540.

O ensino jesuítico, como veremos, era feito fora da realidade política e econômica, e

permaneceu até 1759, quando Marquês de Pombal expulsa os padres inacianos das terras

portuguesas, deixando a colônia sem um sistema que o substituísse à altura.

A ESTRUTURA DE ENSINO DA COMPANHIA DE JESUS NA ÉPOCA DA

COLONIZAÇÃO

Page 11: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Para Leonel Franca, o objetivo primeiro da Companhia de Jesus, cuja fundação foi

autorizada pelo papa Paulo III em 1540, era formar bons soldados da Igreja de Roma,

capazes de combater heresias e rebeldes na Europa e no resto do mundo e promover a

conversão dos pagãos.

Usando o teatro escolar para difundir os novos valores, idéias e sentimentos, isto é, pregar a

fé cristã que abarcava a moral e a formação da personalidade, cada colégio da Cia. de Jesus

tinha como figura central um reitor, que distribuía os ofícios, convocava e dirigia reuniões

dos professores, presidia as grandes solenidades escolares. Era a autoridade mais alta,

subordinada na província à do provincial e fora dela à autoridade do geral, por quem era

nomeado. O braço direito do reitor, na orientação, era o prefeito de estudos. Conhecedor da

doutrina e com grande experiência no ensino, acompanhava de perto toda a vida escolar,

visitando as salas de aula, fiscalizando a execução dos programas, aconselhando e

articulando as atividades. Não deixava perder a tradição e a continuidade. Tinha como

auxiliares outros prefeitos de estudos para os graus e tarefas inferiores. Existiam, também,

os auxiliares de disciplina, encarregados de fazer cumprir as ordens. Os estudos eram

organizados com precisão e o Ratio Studiorum (ordem de estudos) determinava como teria

que ser o currículo, que ficava assim estipulado:

I. Currículo Teológico: com duração de quatro anos, era principalmente para alunos cujo

objetivo seria fazer carreira religiosa na Ordem;

II. Currículo Filosófico: com duração de 3 anos, sendo obrigatórios os seguintes estudos: Io

ano -Lógica e Introdução às Ciências; 2o ano - Cosmo-logia, Psicologia, Física e

Matemática e no 3o ano -Psicologia, Metafísica e Filosofia Moral e

III. Currículo Humanista: correspondendo ao nosso atual ensino médio, englobava para

estudos: Retórica, Humanidades, Gramática Inferior, Média e Superior. A duração do curso

era de cinco anos, mas na prática durava 6 a 7 anos, porque enquanto o aluno não dominasse

um estágio não passaria para o próximo. Quem terminasse era licenciado com a conclusão

do grau."

A Companhia de Jesus foi administrativamente dividida em províncias ou circunscrições

territoriais. A frente de cada província achava-se um provincial.

O Ratio Studiorum determinava cinco horas de estudos por dia, divididos pela manhã e a

tarde. O estudo de gramática versava sobre Latim, Grego, prosa e poesias. As lições eram

decoradas, existindo castigos físicos, e a língua pátria ou a local somente foi aceita muitos

Page 12: A Educação Brasileira no Contexto Historico

anos depois, com as respectivas literaturas, havendo modificações no Ratio.

A metodologia de ensino começava com uma preleção, explicando o que o aluno teria que

estudar. Nas classes elementares de gramática, após a leitura e resumo do texto, o professor

explicava resolvendo as dificuldades relativas ao vocabulário, à propriedade dos termos, ao

sentido das metáforas e à conexão das palavras. Mais tarde chega-se à retórica, à arte da

composição, à sintaxe e ao estilo. Não se perdiam de vista as idéias e sua expressão. O

professor aceitava o diálogo dando dinamismo às aulas.

A EDUCAÇÃO JESUÍTICA NO CONTEXTO COLONIAL

A cosmovisão católica serviu de ideologia adequada para a promoção e a defesa

dos interesses da classe dominante, ao mesmo tempo que fundamentava a

legitimação, junto às camadas dominadas, dessa situação econômico-social.

(Antônio Joaquim Severino)

Uma ordem religiosa se encarregava pela Coroa e pelo Papado de fazer o trabalho de

catequese nas novas terras "descobertas", era a ponte entre os cristãos do mundo civilizado e

a "salvação dos nativos". Na verdade a Companhia de Jesus estava a serviço da fé e do

Império. Na Europa os padres inacianos não encontravam muito espaço, a Reforma

Religiosa de Lutero expandiu-se pela Alemanha, Inglaterra, França, Holanda e Suíça em

poucas décadas. Restava enfrentar o desconhecido e hostil além-mar, numa guerra que

incluiria para esses soldados, além da catequese dos indígenas, a educação da elite branca.

Normalmente surgem perguntas, por que a Igreja não procurou evangelizar os negros

africanos? Não havia ainda uma posição definida, pela Igreja, se o negro tinha ou não alma;

só esse entendimento por si só aumentava a discriminação racial e social na época da

colonização do Brasil.

Com Tome de Souza, fundador de Salvador em 1549, para ser capital, chegaram os jesuítas

sob o comando de Manuel da Nóbrega para iniciar oficialmente os trabalhos que se

desenvolveriam por mais de dois séculos; somente terminando quando o Marquês de

Pombal, em 1759, expulsou os jesuítas de todo o território português. Além de catequizar os

indígenas, preparar os filhos dos colonos brancos que completariam os estudos no Velho

Continente, os jesuítas tinham a incumbência de aumentar o contingente de sacerdotes da

ordem. O "trabalho heróico" servia de pretexto para a colonização portuguesa, era na

realidade uma maneira de implantar o efetivo povoamento e manter subjugadas outras

Page 13: A Educação Brasileira no Contexto Historico

pessoas não pertencentes à elite branca. Homens tementes a Deus não provocariam revoltas

e "aceitavam os destinos" para um dia gozar a eternidade cristã.

Na catequese, os jesuítas começaram pelas crianças visitando as aldeias, depois procuraram

aglomerar indígenas em missões espalhadas por vários pontos e com isso alteravam a vida

pacata e organizada existente antes da chegada daqueles religiosos Para ajudar na catequese

utilizavam conhecimentos de pintura, música, danças, inclusive nativas, rituais, teatro e

festas católicas. Os indígenas aprendiam uma nova língua, compreendiam de maneira cristã

a vida e a morte. Pelo batismo, um dos sacramentos, operava-se o renascer da população

nativa; assumiam as culpas, separavam o bem e o mal, evitavam a nudez, o canibalismo e

cumpriam longas penitências. Era a aculturação completa dos nativos. A divisão social do

trabalho estava presente no trabalho de catequese e os rumos do sistema capitalista, ainda no

mercantilismo, iam sendo introduzidos no horizonte indígena.

A leitura, a escrita e o cálculo estavam nos programas de catequese. Era uma maneira de

"racionalizar" o gentio como força de trabalho e ao mesmo tempo poder compreender os

catecismos, cantos e demais textos sagrados. Esses indígenas seriam súditos dos dois

maiores poderes da época, Rei e Papado. Ou seja, seriam filhos de Deus e súditos da Coroa.

No que se refere à escravidão africana, é sabido que os negros trabalhavam em Portugal, na

condição de escravos, antes da Colonização do Brasil, porém o número não era muito alto e

na empresa açucareira foi a base de toda a mão-de-obra.

Os jesuítas não se preocuparam com a conversão dos negros ao catolicismo e aos poucos a

catequese dos gentios ficou em segundo plano; a preocupação, depois de algumas décadas,

passou a ser com a formação dos novos quadros da ordem. Foram criados seminários que,

também, assumiram a educação da elite branca latifundiária e dos funcionários do govaerno.

Os estudos programados, agora, passaram a ser propedêuticos, isto é, visavam á preaparação

dos filhos dos colonos brancos para futuros estudos complementares na Europa.

Com o aumento da população colonial e o inicio do desenvolvimento urbano, o trabalho

dos padres da Cia de Jesus ganhou mais importância e os grandes colégios foram criados;

era quase o monopólio na área educacional. Formavam as elites e lideranças da sociedade

colonial, dentro da cultura européia, estudando Latim e Grego e os caminhos do

catolicismo, cercando por todos os lados os avanços da Reforma Religiosa.

O trabalho do escravo negro africano tinha como alicerce a Filosofia de Aristóteles,

redimensionada por Santo Tomás de Aquino no século XIII. Considerava-se que alguns

homens nascem para comandar, são esclarecidos e têm espírito de liderança, outros são

Page 14: A Educação Brasileira no Contexto Historico

desorganizados, vivem de maneira tribal e sempre serão subalternos. Deus é o princípio de

tudo e o destino de cada um é determinação divina. Também existia a dúvida se o negro

tinha ou não alma, como o homem branco.

O Ratio Studiorum (plano ou programa de estudos) imperou no ensino colonial por vários

séculos e a redí-zima (10% dos impostos arrecadados pela Coroa) era recolhida aos cofres

da Companhia de Jesus, cobrada durante o período colonial.

Paralelamente ao ensino organizado pelos jesuítas, outros trabalhavam como preceptores

ensinando línguas aos filhos dos colonos brancos, praticando, assim, um reforço escolar

naquele ensino elitista e também propedêutico aos estudos acadêmicos no Velho

Continente.

Durante a colonização os padres da Companhia de Jesus tiveram inúmeros atritos com

funcionários da Coroa na época das entradas e bandeiras, que procuravam escravizar os

indígenas, invadindo, inclusive, as missões e pelo fato de a Ordem ter acumulado uma gran-

de riqueza material, além do monopólio quase que total do conhecimento organizado e do

ensino. Eram acusados de subversão da ordem, trabalhar contra o Império e res-

ponsabilizados pelo baixo nível de conhecimento da elite portuguesa, em relação às elites

européias. Em 1759 Marquês de Pombal, primeiro ministro de D. José I, influenciado pelas

idéias Iluministas, expulsou os jesuítas de todo o Império Lusitano, desmontando o sistema

de ensino implantado durante a colonização do Brasil.

Houve o desmantelamento do sistema jesuítico, mas não se criou outro sistema à altura para

substitui-lo, ou seja, não foi criado outro sistema organizado para ocupar o espaço

específico na área educacional da elite.

Portugal estava em crise e a hegemonia inglesa já se fazia sentir, os soldados inacianos já

haviam cumprido a missão e não houve grande defesa da Ordem por parte dos colonos

brancos brasileiros. O conhecimento passa a ser influenciado pelo Iluminismo e o ensino

também; o enciclopedismo francês é a palavra da moda. O ensino jesuítico colonial com

grandes resquícios do período medieval está fora de cogitação para o novo momento

histórico e chega a ser acusado como responsável pelo atraso de Portugal em relação às

demais nações européias.

Para substituir o sistema de ensino anterior foi encontrada uma solução: a criação de aulas

regias. Eram aulas avulsas financiadas através de um imposto colonial chamado subsídio

literário; o que não funcionou. Os impostos foram cobrados e poucas aulas foram dadas; não

foi feita a cobertura necessária de todas as áreas ocupadas pelo antigo sistema. O objetivo

Page 15: A Educação Brasileira no Contexto Historico

continuou o mesmo, preparar as elites para completar estudos no velho continente. Criou-se

o cargo de Diretor Geral dos Estudos, responsável, inclusive, pela seleção de professores

régios para diferentes cadeiras ou disciplinas e pela concessão de licenciatura para o

magistério público e privado na Colônia. O novo sistema teve dificuldade desde a

implantação, não substituiu o antigo, tanto quantitativamente como qualitativamente, ou

seja, não teve abrangência suficiente e nem a qualidade desejada Foi o "desmanche" do

ensino da elite, criando descontentamentos e descrença no novo, contribuindo para várias

revoltas coloniais no futuro próximo. O Marquês de Pombal, também, não foi muito longe

politicamente e caiu em desgraça algum tempo depois. Outras ordens religiosas tiveram

grande ascensão, mas não tinham grandes estruturas e só ocuparam parte do espaço.

Portugal não rompeu com a fé católica e a própria Universidade de Coimbra continuou nas

mãos dos padres, só que agora, dirigida pela Ordem do Oratório. Os jesuítas são perdoados

décadas mais tarde, mas o sistema de ensino para a elite colonial não foi recuperado, e só se

modificou em 1808 com a chegada da Família Real Portuguesa nestas belas terras, fugindo

das invasões napoleônicas. Naquele momento o Brasil tornava-se sede do governo

português e não estava mais submetido ao estatuto colonial. Veremos as mudanças nas

próximas páginas.

A CULTURA COLONIAL

No Período Colonial aconteceu o transplante da cultura européia para o Brasil, feita pelos

portugueses colonizadores de diversas maneiras. O processo envolveu língua, religião,

valores, política e educação. Como vimos neste capítulo, em outra parte, os jesuítas se

encarregaram do ensino e da catequização na Colônia, quase que "monopolizaram" ambas;

outras ordens religiosas apenas complementaram e não tinham .situações muito

diferenciadas. Tanto as elites brancas como indígenas passaram pelos ensinamentos dos

soldados da Companhia de Jesus. A dominação cultural I portuguesa aniquilou a cultura

nativa e alienou os negros escravos africanos. Era proibido desde criar jornal, isto é,

a impressão da palavra escrita, até promover manifestações culturais, não aceitas pelas

autoridades portuguesas. Com estes quadros, as manifestações artísticas tiveram origem nos

assuntos ligados à Igreja, que gozava de alguma autonomia e realizava uma parceria com o

poder constituído. As manifestações foram proibidas durante todo o Período Colonial até a

chegada da Família Real Portuguesa, quando as coisas mudam de direção.

Durante os primeiros séculos de colonização praticamente não tivemos uma literatura

Page 16: A Educação Brasileira no Contexto Historico

tipicamente brasileira. As obras literárias eram escritas segundo moldes portugueses, mesmo

que o assunto fosse brasileiro. O que existe sobre o referido período são relatos de viagens

de estrangeiros que visitaram estas terras. Era quase uma literatura informativa, não tinha as

características típicas deste trópicos. O primeiro documento considerado como certidão de

batismo da nossa literatura foi a Carta de Pero Vaz de Caminha ao rei D. Manuel, de

Portugal, comunicando o descobrimento. No século XVII encontramos escritos do baiano

Gregório de Matos Guerra, o Boca do Inferno e do Padre Vieira, com vários sermões.

Ambos pertenceram ao Barroco e sofreram censura. Gregório de Matos Guerra teve suas

obras proibidas para publicação, somente chegando ao público depois de 1850. O Padre

Vieira teve que prestar contas à Inquisição. As obras de arte de Antônio Francisco Lisboa, o

Aleijadinho, principalmente ligadas à Igreja, passaram pelo crivo das autoridades e mesmo

com outros significados, chegaram até nós.

No século XVIII em Minas Gerais, no apogeu da Mineração, surgiu o Arcadismo Mineiro,

embora sob influências da estruturação literária da Metrópole. Poetas como Cláudio Manuel

da Costa, Basílio da Gama, Tomás Antônio Gonzaga e outros se destacaram. Eram oriundos

da elite colonial, despertaram alguns sentimentos pela Terra, participaram da Inconfidência

Mineira de 1789 e foram varridos do cenário; presos e degredados.

Pode-se observar que o desenvolvimento artístico acompanhou os ciclos econômicos.

Quando o açúcar era o principal produto colonial, o maior desenvolvimento aconteceu no

Nordeste, região ocupada economicamente. Quando o eixo econômico se deslocou para

Minas Gerais com a Mineração, o Sudeste passou a ocupar lugar de destaque e até a Capital

foi mudada para o Rio de Janeiro em 1763, no auge da extração do ouro na Colônia.

RESUMO

Em 1500 Portugal vivia sob as idéias do Mercantilismo (primeira fase do capitalismo), que

priorizava o comércio.

A colonização do Brasil foi feita no sentido de atender as necessidades da Metrópole.

O ensino difundido pela Companhia de Jesus estava fora do contexto, estudava-se Grego e

Latim com os ditames da Filosofia de Santo Tomás de Aquino, século XIII.

O ensino na Colônia atendia a uma elite latifundiária, que completaria os estudos na Europa,

aos funcionários da Coroa e à formação de padres para a própria ordem.

Cada colégio da Cia. de Jesus tinha um reitor, subordinado ao provincial, auxiliado por um

Page 17: A Educação Brasileira no Contexto Historico

prefeito de estudos, que, também, tinha auxiliares para tarefas menores. Havia encarregados

da disciplina e todos seguiam os estudos determinados pelo Ratio Studiorum (ordem de

estudos). Havia um Currículo de Teologia com quatro anos de estudos, um Currículo de

Filosofia.com 3 anos de duração e um Currículo Humanista com 5 anos, que na prática

durava 6 ou 7 anos, porque não começava um assunto antes de dominar o anterior.

Estudava-se Latim e Grego e existiam castigos, inclusive, físicos.

A metodologia de ensino começava com uma preleção. Nas classes elementares após a

leitura era feito o resumo do texto, o professor tirava as dúvidas. Mais tarde chegava-se à

retórica, à arte da composição, à sintaxe e ao estilo; o professor aceitava o diálogo.

O trabalho de catequese tinha como objetivo converter os indígenas em cristãos e em

súditos do Governo Português.

Na época da colonização do Brasil a burguesia estava em ascensão e o Renascimento

colocava em evidência novos valores.

Portugal foi o pioneiro nos "descobrimentos", tinha posição geográfica privilegiada, uma

burguesia que apoiou e foi apoiada pelo Rei desde 1385 com a Revolução de Avis.

O Mercantilismo defendia balança comercial favorável, estoque de metais, mais exportações

que importações, governo forte direcionando os assuntos econômicos e a criação de colônias

para atender às necessidades da metrópole dentro do estatuto do monopólio.

De 1500 a 1530 Portugal não se interessou pela colonização destas terras, mandou

expedições de reconhecimento e para defender o litoral dos invasores. Estava preocupado

com as especiarias do Oriente.

O primeiro ciclo econômico foi do Pau-brasil. A madeira era extraída de forma predatória,

para fazer corante na Europa. A cessão para exploração foi feita a favor do burguês Fernão

de Loronha, que obteve monopólio.

O segundo ciclo econômico da Colônia e mais forte começa ainda no século XVI, foi o

açucareiro. A cana-de-açúcar havia sido "testada" nas ilhas do Atlântico, encontrou aqui

condições favoráveis.

Os holandeses participaram, inicialmente, com o refino e distribuição do açúcar nos

mercados europeus, depois financiando os senhores de engenho.

A colonização do Brasil teve início com a grande propriedade rural, baseada no sistema de

capitanias hereditárias e sesmarias.

O problema da mão-de-obra foi resolvido com a i mportação de negros africanos, na

condição de escravos. Discutia-se na época se o negro tinha ou não alma e não recebia

Page 18: A Educação Brasileira no Contexto Historico

nenhum tipo de educação formal, aprendia no trabalho diário. Sofreu forte alienação

cultural.

Na sociedade colonial, com caráter aristocrático e patriarcal, o senhor de engenho tinha

todos os direitos, aos negros, mulheres, mestiços, indígenas etc, só restava obedecer para um

dia gozar a eternidade do paraíso cristão.

O desenvolvimento artístico sempre acompanhou os ciclos econômicos e foram proibidos.

Marquês de Pombal, primeiro ministro de D. José I de Portugal, expulsou os jesuítas de todo

o território português em 1759, acusando-os de promover a subversão, trabalhar contra o

Império e ter responsabilidades sobre a formação da elite portuguesa, que se encontrava em

situação inferior diante das elites das outras nações européias.

O novo sistema educacional implantado pelo Marquês não substituiu à altura o anterior.

Cobraram o "subsídio literário," imposto para pagar as aulas regias, que foram poucas e de

má qualidade.

Em 1808 com a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil estava quebrado o estatuto

colonial, começando uma nova fase.

PROPOSTAS PARA REFLEXÃO

Quais foram os objetivos da educação jesuítica na colonização do Brasil?

Na época da colonização imperavam as idéias mercantilistas. Reflita sobre os princípios.

Quais grupos sociais existiam no período colonial? Analise a posição social de cada um.

Explique o que eram as Sete Artes Liberais.

Quais foram os fatores que contribuíram para que Portugal colonizasse o Brasil?

A cana-de-açúcar foi escolhida para ser plantada nos primeiros séculos da colonização.

Analise os motivos e as vantagens.

Faça uma reflexão sobre a participação holandesa na economia açucareira.

Como foi resolvido o problema da mão-de-obra no Brasil Colonial?

Quais foram as razões alegadas pelo Marquês de Pombal para expulsar os jesuítas?

Qual sistema substituiu o ensino jesuítico na Colônia? Por que não funcionou?

Descreva e analise a estrutura de um colégio da Companhia de Jesus.

Por que a educação no Brasil Colonial era voltada para as elites? Quais os interesses?

Quais currículos eram desenvolvidos pelos jesuítas nas escolas coloniais?

O que significa a Ratio Studiorum? Como era aplicado?

Por que ocorreram mudanças na política colonial em 1808?

Page 19: A Educação Brasileira no Contexto Historico

LEITURA COMPLEMENTAR

TEXTO I O PREDOMÍNIO DA

IDEOLOGIA CATÓLICA (1500-1889)

A história da educação brasileira nesse período está intimamente ligada à presença e à

atuação da Igreja Católica que para aqui veio logo após o descobrimento, com o propósito

de desenvolver trabalho de evangelização missionária. Dadas as condições econômicas,

políticas e sociais do processo de colonização portuguesa no Brasil, o catolicismo acabou se

implantando como a religião tradicional dos colonizadores, impregnando também

fortemente o ethos religioso dos indígenas locais e dos escravos africanos, grupos alvo do

trabalho de evangelização pelos padres católicos. O catolicismo com os seus valores impregnou

profundamente a vida social e cultural da colônia, chegando até mesmo a ser a religião oficial do

país à época do Império. Era tão íntima a vinculação da Igreja ao Estado Imperial, que ela se

transformara em autêntica instituição estatal, mais ligada ao Estado que à própria Santa Sé. A

existência do padroado garantia ao Imperador poderes muito amplos de censura e de fiscalização

sobre as decisões e atividades eclesiásticas. E a proclamação da República em 1889, que rompe

com o regime de padroado, fato que trouxe mais autonomia para a Igreja Local frente ao poder

imperial. Além disso, a Igreja Católica no Brasil reforçava suas vinculações com a Sé Romana.

(...) Contudo, no primeiro período, o conflito ideológico entre Igreja Católica e Estado não se

opunha, ao contrário, a ideologia católica serviu adequadamente aos objetivos do Estado Colonial e

Imperial. Com efeito, já no Regimento de Dom João III, de 1548, constava diretriz política para a

colônia, que se referia à conversão dos indígenas à fé católica pela catequese e pela instrução

(Ibidem, p.l).

Com a necessidade de se estabilizar no novo país o empreendimento colonizador, a política

educacional logo amplia suas perspectivas, indo além da simples catequese dos indígenas, de modo

a atender com a instrução os filhos dos colonos brancos. Na realidade é a educação dos filhos dos

colonizadores que acaba prevalecendo e para ela se voltam os reais objetivos dos colégios dos

jesuítas. (...) O teor e a metodologia da instrução desenvolvida na colônia pelos jesuítas era da Ratio

Studiorum, com o objetivo essencialmente religioso, de conteúdo literário e de método escolástico.

Os seus fundamentos filosóficos e teológicos eram baseados na tradição cristã, revitalizada pela

Contra-Reforma. Adotando orientação universa-lista do curso de humanidades, os jesuítas vincu-

laram a continuidade dos estudos dos jovens dos cursos de filosofia ou teologia na metrópole com o

objetivo de preparar endogenicamente suas novas lideranças.

Page 20: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Esta concepção da educação assumia, assim, plenamente, o conteúdo doutrinário do Cristianismo

pós-reforma; dirigia os objetivos da educação escolar à formação da elite intelectual destinada à

liderança da sociedade colonial; privilegiava o trabalho intelectual e desvalorizava o

trabalho manual; seu universalismo, ou melhor, seu europeísmo, levava os estudantes a não

se confrontar com a problemática da realidade concreta que viviam, além de separá-los cada

vez mais da população. Ao invés da busca de um eventual modelo de civilização a ser

construído na colônia, o que era introjetado nas novas gerações é que o verdadeiro modelo

de civilização estava fora, na Europa. Além disso, essa formação universalizante buscava

canalizar para a Ordem os melhores alunos, que eram encaminhados para cursar teologia,

tornando-se sacerdotes jesuítas.

Levado pelo Iluminismo político-filosófico, o Marquês de Pombal, em 1759, pôs fim ao

monopólio educacional dos jesuítas, que foram expulsos da colônia. Mas isso não provocou

ruptura com a tradição, no campo educacional. O que se contestava era o excesso de poder

econômico assumido pela Ordem e o fato de ela colocar seus interesses, na formação dos

estudantes, na frente dos interesses do país. Por outro lado, alterações são feitas na

organização do ensino e no seu conteúdo, que passa a incluir informações científicas. (...)

Mas as reformas pombalinas não transformaram a essência da educação no Brasil, apesar de

representarem ura esforço de modernização na formação da elite nacional.

(SEVERINO, 1986, pp. 65-69)

TEXTO II - IEUMINISMO E

POMBAUSMO

As reformas pombalinas da instrução pública constituem expressão altamente significativa

do Iluminismo português. Nelas se encontra consubstanciado um programa pedagógico que,

se por um lado representa o reflexo das idéias que agitavam a mentalidade européia, por

outro, traduz, nas condições da vida peninsular, motivos, preocupações e problemas

tipicamente lusitanos. No complexo quadro das manifestações espirituais do período

pombalino, as reformas do ensino são como o denominador comum de uma aspiração

generalizada. Um de seus objetivos, a remodelação dos métodos educacionais vigentes, pela

introdução da filosofia moderna e das ciências da natureza em Portugal, era a preocupação

constante de algumas das mais expressivas figuras intelectuais da época. Nestas condições,

a indagação do significado e da orientação deste esforço no sentido de renovar a mentali-

Page 21: A Educação Brasileira no Contexto Historico

dade imperante se impõe como tarefa preliminar para quem pretende compreender a

fisionomia espiritual do pombalismo.

Ora, se o nosso problema é uma questão de ordem pedagógica, e por isso mesmo cultural, e

se devemos partir antes de tudo das manifestações contemporâneas, o primeiro fato que

chama a nossa atenção é a consciência que tiveram os próprios letrados do século XVIII da

oposição entre o pensamento "tradicional" e o pensamento "moderno". Os historiadores

registram e encarecem, de alguns anos a esta parte, as raras opiniões filosóficas de alguns

letrados que, contra a rotina dos métodos de pensamento vigentes, se insurgiram, abrindo

aos olhos portugueses as novas perspectivas do pensamento moderno. Se compreendermos

não apenas o valor destas críticas - o que elas encerram de verdadeiro ou de falso - mas a

intenção que as animou, resulta claramente que um dos traços inconfundíveis da cultura

lusitana do século XVIII é a sua manifestação literária, expressa como um programa de

modernismo filosófico contra a tradição. Reconheçamos, todavia, que esta renovação

pedagógica, inspirada nos ideais e problemas da filosofia moderna, não é uma manifestação

exclusiva do período pombalino; ela se inicia no reinado de Dom João V e prolonga-se sem

solução de continuidade, e através de vicissitudes diversas, no governo de Dona Maria I, da

Academia Real de História, fundada em 1720, à Reforma da Universidade, em 1772, e desta

à Academia Real de Ciências, criada em 1779, se efetuou um esforço de renovação de

métodos e de atitudes de pensamento e de integração de novos ideais, esforços estes que não

disfarçam os propósitos "iluministas" que animaram estas iniciativas e reformas.

(CARVALHO, 1978, pp. 25-26)

CAPÍTULO 3

A EDUCAÇÃO NO BRASIL (1808-1822)O sistema colonial montado pelo capitalismo comercial entrou em crise quando o

capital industrial se tornou preponderante e o Estado absolutista foi posto em

xeque pelas novas aspirações da burguesia, ansiosa por controlar o poder através

de formas representativas de governo.

(Emília da Costa Viotti)

VISÃO HOUSTICA DO INÍCIO DO SÉCULO XIX

Quando a Família Real Portuguesa desembarcou nestas terras em 1808, o Mercantilismo já

não era a teoria econômica em moda na Europa. Estava em evidência, como algo novo, o

Page 22: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Liberalismo, amparado pelas idéias da Escola Clássica. Já não interessavam o monopólio, o

trabalho escravo e o tipo de administração praticada por Portugal durante a colonização. As

obras citadas naquele momento pelas elites intelectuais eram de Adam Smith, de Ricardo,

de Malthus e de John Stuart Mill. As idéias básicas deste novo tipo de pensamento

econômico podem ser mais ou menos assim resumidas: O crescimento econômico se dá

graças à acumulação de capital; trabalhadores produtivos são os que criam riquezas

materiais; é essencial o excedente econômico; a economia é regida por leis naturais que

auto-regulam o sistema buscando o equilíbrio, é a política do "Laissez Faire"; existe a

tendência inata à troca de mercadoria; defende a destreza pessoal; aceita a teoria da "mão

invisível"; todos os seres humanos agem por desejo de recompensa: o Estado deve proteger

a sociedade contra os ataques externos, praticando a justiça, mantendo obras e instituições

necessárias à sociedade, cunhando a moeda e promovendo a riqueza para todos. A Escola

Clássica trabalha as categorias: trabalho, preço, mercado, utilidade, produtos, valor, riqueza,

salário natural e salário de mercado, troca... Para Adam Smith deveria existir o livre

comércio entre as nações e cada uma estaria especializada naquilo que produz mais e

melhor, e fazer troca do excedente por produtos oferecidos por outras nações. Todos seriam

beneficiados pelas trocas de mercadorias.

Verificando com mais atenção, o que se constata é que o capitalismo estava passando para a

sua segunda fase, o Liberalismo, baseado na industrialização, cuja ênfase foi dada pela

Revolução Industrial ocorrida na Inglaterra no século XVIII. Foi essa mesma Inglaterra que

mandou conduzir a Família Real Portuguesa em 1808 ao Brasil. Os interesses eram dos

ingleses e o velho Mercantilismo já não ditava mais as regras na Europa e naquele momento

no Brasil. Tanto tudo isso é verdade que Dom João ao chegar ao Brasil em 1808, como

regente, tomou a primeira medida abrindo os portos brasileiros às nações amigas. Não é

simples coincidência e depois em 1810 assinou um tratado com os "aliados" ingleses,

quando estes pagavam, aqui, menos impostos que os portugueses.

O lado bom de tudo isso é que em 1808 com a chegada da Família Real ao Brasil, estava

quebrado o vínculo colonial. Naquele momento, o Brasil não era mais uma simples colônia

de Portugal e sim sede da Monarquia. Era ali aqui que partiam as ordens e logicamente as

proibições de se fabricar algo, aqui, foram canceladas. No entanto os produtos ingleses

inundaram nosso espaço. Era um momento de euforia para as elites, que tinham oportuni-

dades de circular na corte e de comprar produtos estrangeiros, em grande parte supérfluos.

As modificações aconteceram para as elites, mas a estrutura básica não mudou e ainda

Page 23: A Educação Brasileira no Contexto Historico

perdurou por quase todo o século XIX. A escravidão negra sobreviveu à chegada da Família

Real e também à Independência em 1822. É fácil entender isso, as nossas elites eram donas

dos grandes latifúndios e o trabalho escravo era a "força motriz", como dizem alguns

historiadores: "eram as mãos e os pés dos senhores aristocratas". Mesmo com a nova teoria

e as forças inglesas pressionando para extinção do trabalho escravo, ele permaneceu.

A vida da Corte Portuguesa continuava aqui, enquanto em Portugal, os ingleses ajudavam a

expulsar os franceses, que haviam invadido a Península Ibérica em represália, porque

Portugal e Espanha violaram a proibição napoleônica de fazer comércio com a Inglaterra.

Portugal estava no caminho dos dois grandes gigantes da época, França e Inglaterra e

desobedecendo a um deles teria que sofrer conseqüências. Portugal pagou um preço alto por

ficar ao lado do "aliado" inglês. Era uma briga pela hegemonia e o Imperialismo Britânico

se estendeu por todo século XIX e início do XX, colonizando grandes territórios, inclusive

na Ásia e na África; movimento chamado de neocolonialismo.

A elite branca não podia mandar seus filhos para completar os estudos na Europa; a Família

Real estava no Brasil

42

44 45

defendesse mesmo os seus interesses pessoais, tanto é que a escravidão permaneceu, ainda,

por oitenta anos. São os efeitos produzidos por uma educação de elite e não por pessoas

pertencentes aos grupos dominados que procurasse transformar a realidade. As

transformações aconteceram sob controle e, a Independência do Brasil em 1822 foi

proclamada pelo filho mais velho do Rei de Portugal, logicamente, o próprio herdeiro da

Coroa. Parece ironia da história, mas analisando outros movimentos posteriores, quase

sempre, nos deparamos com uma parte da elite descontente, traída ou por não ter recebido a

sua parte nas barganhas políticas cotidianas, que acaba se rebelando.

Dando continuidade às melhorias citadas com a vinda da Família Real, em 1812 foi criado

um laboratório de química, em 1814 o Curso de Agricultura, em 1816 a Escola Real de

Ciências, Artes e Ofícios. Outros cursos de outras modalidades, também, foram criados,

Page 24: A Educação Brasileira no Contexto Historico

inclusive de Desenho Técnico em 1817. A Gazeta do Rio de Janeiro colocou o primeiro

jornal brasileiro em circulação. Foram criadas bibliotecas públicas e em 1814 o próprio

Príncipe cedeu 60.000 volumes do seu acervo particular.

O ensino elementar não sofreu modificação, os cuidados continuaram a ser com o

conhecimento superior, ou seja, das elites palaciana e latifundiária. Não houve alteração na

linha adotada durante a colonização, o povo não foi lembrado nos momentos em que se

planejaram as mudanças e a política educacional continuou a privilegiar os mais

aquinhoados pelos bens materiais. Foi uma mudança para se adequar às novas condições e

continuar a carruagem pelo mesmo caminho, separando o ensino das elites do ensino dos

outros segmentos sociais.

RESUMO

Em 1808 a Família Real Portuguesa chega ao Rio de janeiro fugindo da invasão de

Napoleão Bonaparte, em Portugal.

O Mercantilismo tinha perdido espaço para o Libera lismo inglês e o estatuto colonial com a

escravidão já ii.io interessava à nova teoria.

O comércio livre entre as nações era uma das idéias de Adam Smith. A Revolução Industrial

tinha acontecido na Inglaterra no século XVIII, daí todos os interesses nas mudanças.

A abertura dos portos às nações amigas em 1808 quebrou o estatuto colonial, mas

beneficiou, principalmente, a Inglaterra.

Em 1808 o Brasil passou a sediar a Monarquia Portuguesa, deixando de ser colônia. Em

1815 passa a Reino Unido de Portugal e Algarve.

Com a nova situação do Brasil em 1808, as proibições comerciais e industriais são

suspensas.

Com a abertura dos portos, as elites passaram a comprar produtos ingleses, mesmo os não

adequados para os trópicos.

A Corte Portuguesa no Rio de Janeiro favoreceu as elites brasileiras, mas não alterou a

estrutura no atendimento ao povo.

O trabalho escravo sobreviveu às teorias liberais, à vinda da Corte Portuguesa, à

Independência, chegando próximo da república.

O século XIX foi marcado pelo neocolonialismo e já em 1808, os ingleses e franceses

estavam lutando pela hegemonia, Portugal ficou no caminho dos dois grandes gigantes e

sofreu invasão do seu território.

Page 25: A Educação Brasileira no Contexto Historico

No campo educacional, a preocupação continuou com o ensino superior para as elites,

deixando as camadas menos privilegiadas praticamente abandonadas. Não houve mudança

na estrutura, o ensino elementar não recebeu cuidados.

A população brasileira em 1808 era mais ou menos de quatro milhões de pessoas, sendo

mais de um milhão de escravos negros. O Rio de Janeiro tinha pouco mais de cem mil

habitantes.

Logo em 1808, Dom João assinou decreto abrindo os portos às nações amigas, determinou a

criação de escolas superiores, museus, Jardim Botânico, bibliotecas etc. Eram melhorias

principalmente para atender a burocracia palaciana e seus agregados.

As melhorias foram rápidas para as elites e as idéias de independência foram reforçadas. A

Independência política aconteceu dentro da visão de mundo fornecida pelas novas teorias e,

foi proclamada pelo Príncipe herdeiro da própria Coroa, como se fosse uma ironia da

história.

PROPOSTAS PARA REFLEXÃO

Quais foram os principais motivos da vinda da Família Real ao Brasil em 1808?

A invasão de Napoleão em Portugal foi ou não um fato isolado? Explique.

Faça uma análise crítica da passagem do Mercantilismo para o Liberalismo.

Quais foram os grupos mais favorecidos com a chegada de Dom João no Rio de Janeiro em

1808?

Por que os ingleses apoiaram a Independência do Brasil?

Analise as condições educacionais no Brasil de 1808 a 1822.

Relacione as mudanças provocadas com a transferência da Família Real ao Brasil.

Por que o período de 1808 a 1822 é considerado Como pré-independência?

Reflita sobre as novas idéias do século XIX vindas 11,\ Buropa Ocidental.

Por que a escravidão negra continuou após 1808?

LEITURA COMPLEMENTAR TEXTO I - O BRASIL NO INÍCIO DO

SÉCULO XIX: ASPECTOS POLÍTICOS

No começo do século XIX, a situação do Brasil, do ponto de vista político, não era muito

diferente do século anterior. As autoridades das capitanias continuavam subordinadas à

autoridade central do vice-rei, que governava em nome do rei de Portugal.

Page 26: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Os vice-reis cuidavam da ordem e da segurança da colônia. Entre outras obrigações tinham

o dever de zelar pelos interesses econômicos do governo português, encaminhando para a

metrópole grande parte das riquezas produzidas na colônia.

Depois da chegada de Dom João, em 1808, várias mudanças políticas e administrativas

começaram a ocorrer no Brasil. Estas culminaram na elevação do Brasil à condição de

Reino Unido a Portugal e Algarve, em 1815. Em 1821, Dom João VI e a Corte retornaram a

Portugal. Os treze anos de permanência da administração real deixaram marcas profundas

no reino do Brasil, que ficara sob a regência do jovem Príncipe Dom Pedro.

Quando as Cortes de Lisboa quiseram promover a recolonização do Brasil, os brasileiros

logo reagiram. No ano seguinte ao da partida de Dom João e da Corte para a metrópole, foi

proclamada a Independência.

(...) Dentre as providências tomadas pela administração portuguesa no Brasil, teve consi-

derável importância para o futuro cultural do país a vinda, em 1816, de uma comissão de

artistas franceses e, mais tarde, de uma comissão científica austríaca. Entre os artistas

franceses, veio o famoso pintor João Batista Debret, que retratou cenas da vida brasileira.

Entre os austríacos vieram os naturalistas Carlos Filipe Von Martius e João Batista Spix,

que estudaram a vegetação e os animais brasileiros.

Em 1815, após a derrota definitiva de Napoleão, as potências européias reuniram-se no

Congresso de Viena, com o objetivo principal de restaurar o regime absolutista anterior à

Revolução Francesa. A situação política de Portugal era frágil -o país estava sob a tutela

inglesa e os seus governantes encontravam-se no Brasil. Para obter o reconhecimento da

dinastia de Bragança e o direito de participar do Congresso, Dom João transformou o Brasil

em Reino Unido a Portugal e Algarve (1815). Com essa medida o Brasil deixa de ter o

estatuto legal de colônia. Era um passo importante para a emancipação política.

(FERREIRA, 1996, pp. 168 e 176)

TEXTO II - A VINDA DE DOM JOÃO: UM IMPULSO POLÍTICO E CULTURAL

(...) O Príncipe Regente português, envolvido na disputa entre ingleses e franceses pela he-

gemonia dos mercados mundiais, fora obrigado a fugir de uma ocupação francesa ao

território português. Esse era, conforme assinalamos, um dos ônus que a Metrópole pagava

pela dependência econômica em relação à Inglaterra; fugia das represálias do inimigo e aqui

cairia na armadilha do suposto aliado.

Para todas as potências em fase de industrialização, ansiosas por ampliar os seus mercados

Page 27: A Educação Brasileira no Contexto Historico

consumidores, os monopólios comerciais constituíam um ranço intolerável da fase primitiva

do capitalismo. Isso as levara mesmo a desprezar a posse jurídica das colônias, que

acabavam sugando recursos metropolitanos com os seus aparelhos administrativos,

substituindo-a pelo controle indireto dos seus mercados internos. Essa nova fórmula de

controle, a neocolonial, se operava através de acordos mutuamente vantajosos, ao menos

para as suas elites. (...)

Assim, escoltado por guarda inglesa e trazendo consigo a Corte, Dom João instalou a sede

do governo no Brasil transformando em Reino Unido a Portugal. E, ato contínuo, antes de

qualquer outra medida, cedeu aos interesses conjugados dos grupos coloniais exportadores e

importadores e da burguesia industrial inglesa, decretando a Abertura dos Portos (1808).

Esse gesto simbolizava o fim do monopólio português sobre o comércio brasileiro, apesar

da intenção metropolitana de que fosse solução transitória. Em outras palavras, era a

independência econômica que o Brasil conquistava em relação a Portugal, com a ajuda de

uma potência protetora e supostamente aliada. A Proclamação da Independência (1822)

apenas formaliza a emancipação no plano político.

(XAVIER, 1994, pp. 53-54)

CAPÍTULO 4

A EDUCAÇÃO DE ELITE NO PERÍODO IMPERIAE (1822-1889)Era um florescimento social e cultural como nunca se vira antes, deixando para trás,

definitivamente, a vida opressa, triste e estreita da Colônia e mesmo do Primeiro

Império.

(Heitor Ferreira Lima)

AS GRANDES TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XIX

O século XIX quase coincidiu com o Período Imperial do Brasil. Foi uma época repleta de

grandes transformações econômicas, políticas e sociais, provocadas, em parte, pelas

Revoluções Industrial e Francesa do final do século anterior. A Revolução Industrial teve

início na Inglaterra por volta de 1760 e acelerou os passos do capitalismo na sua segunda

fase, estruturado sob as grandes fábricas, mecanização, modificação da força de trabalho. A

liberdade de iniciativa empresarial alicerçada pelo Liberalismo e depois pelo Iluminismo

abala as estruturas do antigo Estado Moderno. O Iluminismo surgiu na França durante o

Page 28: A Educação Brasileira no Contexto Historico

século XVIII e estabeleceu as bases do pensamento para a democracia burguesa; portanto as

bases epistemológicas (conhecimento) estavam prontas. Agora a burguesia não quer só fazer

o livre comércio, mas exercer também poder político, como classe social dominante, tanto

no plano econômico-financeiro, como no exercício político, pela representação.

O período de idéias liberais coincide com as lutas pela hegemonia entre a França e a

Inglaterra. Passado esse momento e com a derrota de Napoleão Bonaparte, as potências

européias se reorganizaram e partiram para o neocolonialismo, principalmente na Ásia e na

África. No entanto, é no século XIX que surge o Marxismo. Aparece em 1848 com o

Manifesto Comunista e explode com a publicação dos primeiros livros d'O Capital. Era uma

reação contra as péssimas condições de vida dos trabalhadores, que chegavam a cumprir

jornada de até 18 horas de trabalho diário. Crianças eram amarradas às máquinas para não

fugir. Começa uma luta pelos direitos dos trabalhadores, surgem as internacionais socialistas

e a primeira surgiu em 1864 tendo a participação de Marx e Bakunin, entre outros teóricos e

líderes. A Segunda Internacional surgiu em 1889 e deu origem à Social Democracia.

Essas novas idéias chegaram ao Brasil durante o século XIX com os imigrantes

estrangeiros, porém, os efeitos foram pequenos tendo em vista que o conhecimento não se

espalhava por toda a sociedade; a educação acompanhava a elite que não se interessava em

alterar as estruturas sociais. No entanto são as novas idéias chegadas da Europa que vão

fornecer os alicerces teóricos para as novas mudanças até o fim do século. E com base no

Liberalismo que surgem os movimentos para libertação dos escravos e é com essa mesma

base que a Inglaterra faz pressão para a extinção da escravidão, a essa altura do processo

histórico, já não interessava aos Ingleses o trabalho compulsório, pois, trabalhadores livres

seriam potenciais compradores. Os valores eram outros e o Brasil passou, vagarosamente, a

investir na imigração estrangeira para compor a força de trabalho necessária,

principalmente, para atender à ascensão do ciclo do café.

As idéias continuavam a chegar da Europa, agora era o Positivismo de Comte e de

Durkheim fazendo a cabeça dos filhos das nossas elites. Tudo passou a ser baseado na

razão, na ciência, não deixando espaço para o ,afetivo e o subjetivo. Até a religião que já

havia sido combatida pelo Marxismo, considerada como ópio da pobreza, uma maneira de

não de se pensar nos problemas materiais. Com o Positivismo o culto seria à ciência, o

conhecimento estaria fundamentado no império da razão, o restante seria subterfúgio da

realidade. O pensamento era rigorosamente científico, o homem sofre a história e o

pesquisador é absolutamente objetivo, nada interfere no conhecimento, que por si só explica

Page 29: A Educação Brasileira no Contexto Historico

a realidade.

Como já foi dito as novas filosofias não chegavam até os trabalhadores, exceto o

Anarquismo que trouxe OS embriões do sindicalismo, da educação libertária, porém,

logicamente o domínio das informações pertencia à elite. Com base no Positivismo surge

grande parte tios grupos positivistas e não havia nenhuma "razão positiva" para se manter a

monarquia. São militares, intelectuais, altos funcionários etc, émbuídos das novas idéias,

pregam a mudança para república. Porém, como se fosse por ironia da história, a República

é proclamada pelo soldado número um do Império. Foi durante o século XIX, também, que

as ferrovias tiveram o grande crescimento, ligando as áreas produtoras de café aos locais de

exportação, os portos. Segundo Virgílio Noya Pinto, em 1889, o Brasil tinha quase dez mil

quilômetros de ferrovias.

A EDUCAÇÃO NO IMPÉRIO BRASILEIRO

O sistema de ensino de elite ultrapassou todo o Período Imperial e chegou até o século XX.

Durante o Império, implantaram-se cursos superiores e ao lado cursos preparatórios, oficiais

e particulares, muitos desses, confessionais. Por grande parte do tempo, as aulas avulsas

tomaram conta, salvo em alguns colégios religiosos, que tinham como objetivo formar

padres para a ordem. Com a fundação do Colégio D. Pedro II -1837, no Rio de Janeiro,

tentou-se dar início ao ensino seriado. O Colégio tinha um currículo que deveria ser seguido

pelos demais.

Pela nossa Primeira Constituição - 25 de março de 1824 -, a instrução primária passou a ser

gratuita, fez previsões para que fossem criados no país colégios e universidades; centralizou

a administração do ensino sob responsabilidade do governo central e instituiu o ensino da

religião católica como parte obrigatória dos currículos e programas.

Com o Ato Adicional de 1834 - emenda à Constituição de 1824 -, foram ratificadas as

proibições de as assembléias provinciais legislativas legislarem sobre assuntos de interesse

do Império. Mas, abria oportunidades para legislar e promover os ensinos elementar e

secundário. Estava claro, às províncias cabia a iniciativa com o ensino menor, portanto a

criação das escolas de primeiras letras não era responsabilidade do poder central. Poucas

escolas primárias foram fundadas e a instrução elementar, com o passar do tempo, tornou-se

um encargo da família para os mais pobres. Para a elite, os colégios confessionais

realizavam muito bem essa tarefa, principalmente no Município do Rio de Janeiro e em

outros grandes centros. A instrução pública gratuita para ensinar a ler e escrever ficou quase

Page 30: A Educação Brasileira no Contexto Historico

esquecida nas linhas mortas da Constituição de 1824. Na prática, essa instrução pública

f.raluita abrangendo do ensino fundamental ao superior fazia parte dos discursos políticos,

sempre com uma oratória "inflamada", para defender ideais civilizados, principalmente

com a chegada das novas teorias que se multiplicaram durante o século XIX.

Durante o Império, houve expansão do ensino superior, cresceu também o número de

instituições religiosas trabalhando com o ensino secundário, preparando os filhos da elite

para o ensino superior. 1'oucas escolas públicas foram construídas e os liceus públicos,

também, eram freqüentados pela elite. Os liceus, imitação francesa, eram montados nas

capitais ou grandes centros economicamente importantes, visavam ,i tender a uma clientela

específica com vista aos cursos superiores. A idéia e a lei existente sobre a obrigação da

província com o ensino popular elementar sofriam continuada refutação; ou era por falta de

verba ou por outro entendimento qualquer.

Quanto à educação das meninas, apesar de constar nas leis, quase nada existia. A população

feminina ficava marginalizada do sistema escolar. A elite promovia uma educação às suas

filhas, relacionada com os afazeres domésticos e nas camadas populares somente existia a

educação informal familiar; orientações passavam de mãe para filha.

No que se refere ao ensino superior, os cuidados aconteceram desde a chegada da Família

Real Portuguesa em 1808. Todas as providências foram tomadas, surtindo efeito imediato.

Com a Proclamação da Independência em 1822 foi dada ênfase rapidamente ao ensino

superior. Criaram-se cursos jurídicos em São Paulo e Olinda em 1827, continuando a

tradição anterior.

Com o passar dos anos, já no Segundo Império (1840-1889), o acesso ao curso superior

passava pelos exames preparatórios, chamados de exames parcelados. Os mais afortunados

preparavam-se com professores particulares ou em escolas religiosas etc, e, prestavam

exames às bancas das faculdades. Esses exames às vezes eram realizados durante diversos

anos consecutivos e após concluí-lo o aluno tinha o direito de cursar o superior, sem a

obrigação de fazer um curso seriado nos graus inferiores. Até por volta de 1850, os exames

preparatórios eram realizados nas bancas das faculdades. Depois, até 1875, o Colégio Dom

Pedro II e a Inspetoria do Ensino Público passaram a avaliar os estudos feitos fora,

credenciando os candidatos ao ensino superior. Era um controle de qualidade para a elite,

eliminando os intrusos em ascensão e combatendo a corrupção que já havia se instalado.

Esses exames feitos no Colégio da Corte e na Inspetora foram estendidos às províncias por

delegação e passaram a ser realizados nas diversas faculdades oficiais do país, com validade

Page 31: A Educação Brasileira no Contexto Historico

jurídica em todo o território nacional, mas por um prazo estabelecido que normalmente era

de quatro anos. Segundo as informações da época, esse sistema generalizou os cursos

parcelados e aumentou a corrupção no segmento.

Em 1879 os liceus provinciais que seguiam os programas do Colégio D. Pedro II passaram a

estabelecer bancas de exames no nível secundário para aferição daquele grau. Esses exames

tinham validade nacional e "ninguém queria" mais estudar vários anos para ter o direito de

ingressar no ensino superior; isso fez com que até o Colégio da Corte fizesse sua adesão à

nova sistemática de parcelamento do ensino secundário e propedêutico; estava com as suas

salas vazias e era hora de mudar e acompanhar "o bonde da história". A corrupção foi

muito grande, mas a elite, como sempre, se acertou e tudo .acabou sem grandes

turbulências, embora se reconhecesse que a qualidade havia caído bastante.

Sobre a formação de professores, o que se sabe é que os letrados da elite formavam as

bancas e estavam credenciados para fazer a aferição das novas gerações e, também, faziam

parte dos quadros docentes das faculdades. De professores para o ensino elementar, temos

poucas informações. Algumas escolas surgiram e é sabido que em 1836 a Província da

Bahia colocou em funcionamento uma escola normal para alunos de ambos os sexos,

envolvendo métodos, gramática, aritmética desenho linear e caligrafia. O curso fora

estruturado para dois anos, os homens assistiam à aula num dia e as mulheres no outro. Era

um dia só de aula por semana para cada turma e poucos se interessaram, não favorecia a

ascensão social.

Como foi exposto, no Período Imperial, o ensino elementar para as camadas menos

favorecidas economicamente quase não saiu do papel e os cursos superiores receberam

todos os cuidados dos poderes públicos. Em 1834 o Ato Adicional à Constituição passou a

incumbência para as províncias de tudo que se referia aos estudos menores.

O Colégio D. Pedro II, fundado em 1837, atendia a elite agrária, escravocrata e patriarcal,

tinha, inicialmente, currículo enciclopédico e se referia mais à cultura européia que a nossa

realidade. Outros colégios e liceus se instalaram e seguiram as orientações do Colégio da

Corte. Eram instituições leigas e religiosas que trabalhavam com conteúdo erudito

verbalista, chamado cultura geral.

Inúmeros projetos foram apresentados ao Parlamento Nacional sobre questões que se

iniciavam com o ensino elementar popular, até a reforma do ensino secundário, passando

pela formação de pessoal para o magistério. Alguns projetos foram corajosos em pedir

Page 32: A Educação Brasileira no Contexto Historico

ensino gratuito e obrigatório para todos; porém não se conseguia aprovação. Não havia

interesse e a falta de verba e outros motivos, alegados, empurravam tais projetos para o

arquivo.

Em 1854 foi aprovada a Lei Couto Ferraz, criando a obrigatoriedade do ensino elementar,

ratificava a gratuidade, já existente, mas vetava o acesso de escravos ao ensino público e

criava classes especiais para adultos, que não tinham concluído os cursos. As informações

que temos é que a lei foi considerada absurda e não foi cumprida nem mesmo no Rio de

Janeiro. Funcionou como uma referência filosófica e como parâmetros no sentido de

orientar as províncias. Na prática, pouco resultado se obteve.

As Escolas Normais para formação de professores se iniciaram no Período Regencial (1831-

1840) e sabemos que em 1860 eram seis, localizadas nos maiores centros. Em São Paulo foi

inaugurada em 1894 a Escola Normal Caetano de Campos, freqüentada, principalmente,

pelas filhas da elite, meninas que não tinham acesso ao conhecimento organizado, nos anos

anteriores. Era um certo controle ideológico feito pela elite e as escolas normais

corroboraram no sentido de manter os privilégios dos "machos". Surge a idéia da

professorinha, da tia, e até as músicas da época passaram a enfatizar esse acontecimento. No

entanto, foi o primeiro passo dado pelas meninas, procurando ocupar espaços na sociedade.

Foi o possível para aquele momento e chegava a ser encarado pelos homens de maneira

pejorativa.

Houve certa expansão das escolas normais, e em 1881, o Império criou a Escola Normal

Oficial, na Capital, servindo de modelo às províncias. No entanto os salários das

"professorinhas" eram baixos, as condições de trabalho, precárias, não existia qualidade e

era restrito cm termos de quantidade. Algumas acabaram fechando. As que permaneceram

funcionando tinham nível baixo, não trabalhavam com a nossa realidade, tinham duração de

dois ou três anos e eram considerados cursos de "humanidades".

Com a imigração estrangeira durante quase todo o século XIX, surgiram escolas

diferenciadas nos moldes da educação européia, atendiam os filhos dos imigrantes e

procuravam conservar as tradições da terra natal. Foi durante essa época que os italianos

fundaram algumas escolas anarquistas e também semearam os primeiros embriões do

sindicalismo. Por esse tempo, o café avançou pela Região Sudeste e São Paulo passou a ter

grande importância como eixo do referido ciclo econômico.

Page 33: A Educação Brasileira no Contexto Historico

O ensino técnico surgiu durante o Império com as chamadas escolas para os desvalidos.

Eram influências recebidas das sociedades mais industrializadas, procurando preparar os

"pobres coitados" para o trabalho. Surgiram, com o tempo, liceus de arte e ofícios em São

Paulo e no Rio de Janeiro. Eram escolas profissionais masculinas, uma imitação dos liceus

franceses.

Em 1879 Leôncio de Carvalho promoveu a última reforma educacional do Império,

estabelecendo normas para os ensinos primário e secundário da Corte e o superior em todo o

país. Dava certa autonomia aos cursos superiores no que tange ao ensino e pesquisa,

autorizava ,i fundação de escolas particulares, ensino obrigatório dos 7 aos 14 anos e podia

ser freqüentado pelos filhos de escravos. Foi um grande avanço, mas na realidade o Império

legou à República um ensino de elite, parcelado e sem nenhuma atenção ao conhecimento

para as classes populares.

RESUMO

Século XIX surge com grandes transformações, recebeu influências do Liberalismo,

completado com os avanços do Iluminismo, formando a base da democracia burguesa. É a

época do neocolonialismo, principalmente na Ásia e África.

Surge o Marxismo com o Manifesto Comunista de 1848 e depois segue com a publicação do

primeiro livro d'O Capital. Foi uma reação contra as péssimas condições de vida dos

trabalhadores. São formadas as internacionais socialistas a partir de 1864.

As novas idéias chegaram da Europa e o Positivismo de Comte e Durkheim influenciou a

proclamação da República.

O café ocupa espaço como ciclo econômico importante e as ferrovias crescem

acompanhando a expansão da lavoura cafeeira.

A educação continuou de elite no Período Imperial. As aulas avulsas tomaram conta e a

escolas confessionais ajudaram a cumprir os objetivos.

Em 1837 foi fundado o Colégio D. Pedro II para servir de modelo.

Em 1834 o Ato Adicional à Constituição de 1824 centralizou o ensino superior no governo

Imperial e deu às províncias o direito de legislar e promover o ensino primário e secundário.

As escolas de primeiras letras tiveram pouca ascensão, quase foram abandonadas e não

havia interesse político.

Os projetos de lei para a educação não vingavam e sempre alegavam a falta de verba ou

outro motivo para refutar.

Page 34: A Educação Brasileira no Contexto Historico

As meninas da elite recebiam educação sobre afazeres domésticos e as meninas das camadas

mais pobres só recebiam a educação informal de mãe para filha.

O ensino superior tem prioridade durante todo o seculo XIX. Logo em 1827 foram fundados

os cursos jurídicos de São Paulo e Olinda.

Foi instituído o ensino parcelado. Nas bancas das faculdades eram feitas as avaliações para

ingresso no ensino superior. A preparação, anterior, ficava por conta i Io aluno, que não

precisava freqüentar o ensino seriado. Somente a elite tinha condições de pagar professores

ou um colégio religioso. Com o tempo, o Colégio D. Pedro II, modelo para os demais,

aderiu ao sistema parcelado, listava com as salas vazias e necessitava acompanhar o bonde

da história.

Em 1854 a Lei Couto Ferraz criou a obrigatoriedade do ensino primário e reforçou a

gratuidade, mas negava o .acesso aos filhos de escravos.

As Escolas Normais começaram no Período Regencial (1831-1840). Em São Paulo a Escola

Normal Caetano de Campos foi fundada em 1894. Existia um dia de aula por semana para

os homens e um dia de aula por semana para as mulheres.

Em 1881 foi criada a Escola Normal Oficial na Capital do Império para servir de modelo às

demais. O conhecimento trabalhado nada tinha com a nossa realidade.

As escolas profissionalizantes, inicialmente, foram íundadas para atender os desvalidos,

depois aparecem os liceus de arte e ofício.

Leôncio de Carvalho em 1879 promoveu a última reforma educacional do Império.

Estabeleceu normas para os ensinos primário e secundário da Corte e para o ensino superior

em todo o país; dava autonomia ao ensino e pesquisa, autorizava a abertura de escolas

particulares; aceitava o aluno filho de escravo e estabelecia a obrigatoriedade de estudos dos

7 aos 14 anos. Na prática não funcionou.

O Império legou à República um ensino superior de elite, sistema parcelado, baixo nível e

nenhuma estrutura para atender os filhos dos trabalhadores.

PROPOSTAS PARA REFLEXÃO

Analise criticamente as transformações ocorridas no século XIX.

Verifique em que profundidade as idéias européias "fizeram a cabeça" das nossas elites.

Por que o ensino primário foi renegado pela elite imperial?

Page 35: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Faça uma reflexão sobre as mudanças introduzidas no Brasil pela imigração estrangeira.

Verifique as influências do Positivismo na Procla-mação da República em 1889.

Qual foi a importância do Marxismo no cenário político?

O Anarquismo chegou da Europa com a imigração italiana. Por que foi importante?

Faça uma análise minuciosa da estrutura de ensino no Período Imperial.

Quais traços da educação brasileira do século XIX ainda persistem no século XXI?

Verifique a importância dos ciclos econômicos no século XIX.

Por que foi fundado o Colégio D. Pedro II na Capital do Império?

Analise o contexto onde o ensino superior ficava com o poder central e os graus menores

com as províncias. Compare com hoje.

Faça uma análise das reformas educacionais feitas no Brasil do século XIX. Verifique os

efeitos práticos.

Explique como funcionava o ensino parcelado.

Trace a trajetória de desenvolvimento das idéias de gratuidade e obrigatoriedade em nosso

ensino.

Como foi a evolução histórica das Escolas Normais e Técnicas?

Analise como se desenrolou a educação para meninas no século XIX.

Qual foi o legado do Império à República em 1889, referente à educação?

Como era a formação de professores no Brasil do século XIX?

LEITURA COMPLEMENTAR

TEXTO I - O culto AO DOUTOURDO

Cavalcanti ainda não tinha tempo de atender a este e já era obrigado a ouvir a observação de

outro.

• É muito bonito ser formado. Se eu tivesse ouvido meu pai não estava agora a quebrar a

cabeça no Dever e Haver. Hoje, torço a orelha e não sai sangue.

• Atualmente, não vale nada, meu caro senhor, dizia modestamente Cavalcanti. Com essas

academias livres... Imaginem que já se fala numa academia livre de Odontologia! É o

cúmulo! Um curso difícil e caro, que exige cadáveres, aparelhos, bons professores, como é

que particulares poderão mantê-los? Se o governo mantém mal...

• Pois doutor, acudia um outro, dou-lhe meus parabéns. Digo-lhe o que disse ao meu sobri-

nho, quando se formou: vá furando!

Page 36: A Educação Brasileira no Contexto Historico

• Ah! seu sobrinho é formado? inquiria delicadamente Cavalcanti.

• Em engenharia. Está no Maranhão, na estrada de Caxias.

• Boa carreira.

Nos intervalos da conversa, todos eles olhavam o novel dentista como se fosse um ente

sobrenatural.

Para aquela gente toda, Cavalcanti não era mais um simples homem, era homem e mais

alguma coisa sagrada e de essência superior; e não juntavam à imagem que tinham dele

atualmente as cou-sas que porventura ele pudesse saber ou tivesse aprendido. Isto não

estava nela de modo algum, e aquele tipo, para alguns, continuava a ser vulgar, comum na

aparência, mas a sua substância tinha mudado, era outra diferente da deles e fora ungido de

não sei que cousa vagamente fora da natureza terrestre, quase divina.

(BARRETO, 1992, p. 46)

TEXTO II - AULAS PÚBLICAS DE

INSTRUÇÃO SECUNDÁRIA

(...) não se achavam nem se acham estas aulas estabelecidas em edifícios públicos

apropriados para tal fim: continuam os professores a dar lições em suas casas e às horas que

mais cômodo lhes oferece; e sendo quase sempre distante uma da outra a residência dos

professores e encontradas as horas que marcam para suas aulas, muito limitado deve

necessariamente ser o número de alunos que a elas podem concorrer, sendo que até acontece

ignorar o aluno a que lugar há de dirigir-se para matricular-se em qualquer dessas aulas

públicas de instrução secundária.

A estas diversas circunstâncias cumpre acrescentar que mui difícil, se não impossível, se

torna a inspeção e vigilância dessas cadeiras que, isoladas, funcionam sem direção alguma e

sem nexo e relação entre si, unicamente entregues ao zelo individual dos professores.

Estes, por sua parte, como poderão ter grande exatidão, no cumprimento dos seus deveres,

se, além de mesquinhamente retribuídos, tem de dar aulas em suas próprias casas, ou alugar

a sua custa aulas onde recebem os alunos, sendo ainda obrigados a ministrar tudo quanto

exige o material e o asseio indispensáveis a estabelecimentos deste gênero?

(Eusébio de Queirós, Rio de Janeiro, 1855. Citado In: PILETTI, 1990, p. 48)

TEXTO III - REFORMA DO ENSINO PRIMÁRIO

Page 37: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Uma reforma radical do ensino público é a primeira de todas as necessidades da pátria,

amesquinhada pelo desprezo da cultura científica e pela insígne deseducação do povo. Sob

esta invocação conservadores e liberais, no Brasil, podem reunir-se em um terreno neutro: o

de uma reforma que não transija com a rotina. Num país onde o ensino não existe, quem

disser que é "conservador em matéria de ensino" volteia as costas ao futuro, e desposa os

interesses da ignorância. E preciso criar tudo; porquanto o que aí está, salvo raríssimas exce-

ções, e quase todas no ensino superior, constitui uma perfeita humilhação nacional.

Mas essa reorganização vem-nos custar duros sacrifícios, sacrifícios muito penosos a um

orçamento onde o déficit se alinhou, e prolífica.

Esta objeção está respondida. Ela encerraria o país numa eterna petição de princípios, num

círculo vicioso insuperável. A extinção do déficit não pode resultar senão de um abalo

profundamente renovador nas fontes espontâneas da produção. Ora, a produção, como já

demonstramos, é um efeito da inteligência: está por toda a superfície do globo, na razão

direta da educação popular. Todas as leis protetoras são ineficazes, para gerar a grandeza

econômica do país; todos os melhoramentos materiais são incapazes de determinar a

riqueza, se não partirem da educação popular, a mais criadora de todas as forças

econômicas, A MAIS FECUNDA DE TODAS AS MEDIDAS FINANCEIRAS.(...)

Reforma dos métodos e reforma do mestre: eis, uma expressão completa, a reforma escolar

inteira; eis o progresso todo e, ao mesmo tempo, toda a dificuldade contra a mais endurecida

de todas as rotinas - a rotina pedagógica.

Cumpre renovar o método, orgânico, substancial, absolutamente, nas nossas escolas. Ou

antes, cumpre criar o método; porquanto o que existe entre nós usurpou um nome, que só

por antífrase lhe assentaria: não é o método de ensinar; é, pelo contrário, o método de

inabilitar para aprender. A criança, esse belo organismo, animado, inquieto, asssimilativo,

feliz, com os seus sentidos dilatados pela viveza das impressões como amplas janelas

abertas para a natureza, com a sua insaciável curiosidade interior a atraí-la para a

observação dos fenômenos que a rodeiam, com o seu instinto investigativo, com a sua

irreprimível simpatia pela realidade, com a sua espontaneidade poderosa, fecunda, criadora,

com a sua capacidade incomparável de sentir e amar "o divino prazer de conhecer" - a

criança, nascida assim, sustentada assim pela independência dos primeiros anos, entra para o

regímen da escola, como flor, que se retirasse do ambiente energético e luminoso do céu

tropical, para experimentar na vida vegetativa da planta os efeitos da privação do sol, do ar

livre, de todas as condições essenciais à natureza da pobre criaturinha condenada.

Page 38: A Educação Brasileira no Contexto Historico

O primeiro atentado que contra ela, contra a sua existência normal, contra os seus direitos

indefesos cometem o mestre e o método é esquecerem no aluno a existência de um corpo

com as mais imperiosas de todas as necessidades. A escola olvida ignora que a educação

não atua sobre elementos impalpáveis, que a sua influência se exerce contínua e diretamente

sobre a saúde do organismo.

(BARBOSA, 1947, pp. 33-4)

Capitulo 5

A REPÚBLICA VEEHA E A EDUCAÇÃO (1889-1930)Mas os positivistas foram os exemplares mais característicos de uma raça humana

que prosperou consideravelmente em nosso país, logo que este começou a ter

consciência de si. (...) Trouxemos de terras estranhas um sistema complexo e

acabado de preceitos, sem saber até que ponto se ajustavam à vida brasileira.

(Sérgio Buarque de Holanda)

A EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Com a Proclamação da República em 1889 não houve grandes mudanças na estrutura do

ensino primário e secundário, na prática. O ensino superior continuou recebendo os

principais cuidados, formando a elite e as demais lideranças do país.

No contexto político-econômico, os cafeicultores paulistas passaram a dar as cartas, através

da chamada I 'Política dos Governadores e formando com os fazendeiros de Minas Gerais a

dobradinha do poder, apelidada historicamente de Política do café-com-leite. Era um

sistema bem estudado e organizado; o Presidente da República era escolhido de Sao Paulo

ou de Minas Gerais, de maneira alternada e os presidentes do Senado e da Câmara dos

deputados vinham do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul. Os coronéis locais recebiam

carta branca, inclusive nomeando autoridades e altos funcionários e em troca canalizavam

os votos para os candidatos apoiados pelo governo. O voto não era mais censitário, como no

Império. Os parlamentares, também, eram eleitos no mesmo esquema e a degola da

oposição acontecia sempre. O deputado rnais idoso fazia a conferência da lisura da eleição e

sempre constatava fraude na oposição, nunca nos candidatos do governo. Era o voto de

cabresto, como base de sustentação e outros mecanismos, também, atuavam conforme a

necessidade do momento. Existia desde troca de urnas até o acompanhamento dos pleitos

por "pequenos exércitos particulares armados", que faziam a segurança. Todos sabiam

Page 39: A Educação Brasileira no Contexto Historico

antecipadamente os resultados e se alguém fosse oposição não havia o menor espaço. Os

partidos não tinham nenhuma seriedade, era normal encontrar pessoas que haviam iniciado

em um partido, e por diversas vezes foram e voltaram de outros partidos. Dependia do

momento, quando um partido estava no poder, havia migração em massa dos outros, e vice-

versa. A grande maioria era chamada de partido republicano, cada Estado tinha o seu e

outros menores giravam como partidos de aluguéis.

As camadas populares não participavam ativamente, existiam como massa de manobra,

serviam para ratificar os escolhidos pelo sistema. Era um jogo controlado sem perigo de

perdê-lo.

Com a instalação do regime republicano a Igreja e o Estado ficaram separados; foi decretada

a liberdade de culto e o catolicismo já não era mais a religião oficial do Estado.

No século XX, com o desenrolar dos acontecimentos ■■urgem os descontentamentos e

alguns movimentos são marcantes; demonstrando que a insatisfação era maior do que se

supunha. Tivemos o movimento militar chamado de Tenentismo em 1922, se prolongando

com altos e baixos, até 1930, passando pela Coluna Prestes. No ano,também, de 1922, surge

em São Paulo, no Teatro Municipal, no mês de fevereiro, a Semana de Arte Moderna.

Agora, eram os intelectuais que não aceitavam a situação v i gente, e continuaram por

muitas décadas contestando a ordem das coisas. Na área da educação chegavam dos Estados

Unidos as idéias da Escola Nova; mas, no geral as principais mudanças só aconteceram em

1930 com a Revolução vencida por Getúlio Vargas, que nada mais era que um dissidente da

política adotada até 1930. Vargas havia participado do Governo Washington Luís e SÓ

partiu para a oposição quando foi prejudicado na eleição disputada com Júlio Prestes. A

mesma oligarquia que Vargas apoiou e da qual se beneficiou teve que ser combatida, porque

seus interesses foram contrariados. O Movimento de 1930, que colocou Vargas no poder,

foi leito pela oligarquia dissidente, principalmente do Rio grande do Sul, de Minas Gerais e

da Paraíba, reforçadas com os descontentes de vários Estados e da classe média urbana em

ascensão. Era um novo momento histórico, a urbanização era uma realidade, e o sistema

vigente não acompanhou as transformações.

REFORMAS REPUBLICANAS DO ENSINO

Com a Proclamação da República em 1889, surgem as primeiras mudanças na área da

educação. Benjamim Constant em 1890 rompeu com a tradição humanista, adotando em sua

reforma princípios positivistas; começou a implantar um ensino enciclopédico, seriado, com

Page 40: A Educação Brasileira no Contexto Historico

obrigatoriedade e gratuidade. Era uma imitação da educação francesa que ocupava espaço

em nossa sociedade no final do século XIX. O Colégio D. Pedro II passou a se chamar

Ginásio Nacional. Ao lado das disciplinas tradicionais, foram introduzidos estudos de

Ciências, Noções de Sociologia, Direito e Economia Política. Dividiu-se o primário em dois

graus e ao todo tinha duração de sete anos. A grande maioria dos capítulos da Lei não

chegou a ser colocada em prática, não houve interesse político.

Em 1901 foi feita a Reforma Epitácio Pessoa, mudando o ensino secundário para seis anos,

mas não mudou o objetivo estabelecido em 1890 que era o de I preparar para o ensino

superior; no entanto, dava liberdade para ensinar, bandeira existente desde a época do

Império.

Em 1911 foi aprovada a Lei Orgânica Rivadávia Corrêa, provocando um verdadeiro

retrocesso; deu liberdade e autonomia aos estabelecimentos de ensino, que acabaram

preferindo o retorno ao ensino parcelado. Tirou o caráter oficial do ensino, que já não

controlava a concessão de títulos e diplomas. As faculdades voltaram a fazer exame de

admissão ao curso superior.

Como reação, surge a Reforma de Carlos Maximiliano em 1915, determinando o

cancelamento das alterações feitas em 1911. Criou exame de vestibular aos cursos

superiores, a obrigação da conclusão do curso secundário para ingresso nas faculdades. E o

ensino superior de elite não foi alterado.

Em 1925 surgiu a última reforma antes da Era Vargas. A Lei chamada de Rocha Vaz foi

reacionária e conservadora, completou o ciclo de educação elitista; não

aceitou as idéias da Escola Nova, manteve o controle ideológico sob o Estado, através da

inspeção escolar e autorizações, cerceando e policiando os afazeres de professores e alunos,

criando, inclusive, Moral e Cívica como disciplina obrigatória nas escolas primárias e

secundárias, Era um momento conturbado do governo do mineiro Artur Bernardes; os

descontentamentos eram uma constante em "todas as áreas". A função da escola ria fornecer

pessoal para a política e administração, formando a inteligência do sistema, mas sem

vínculo com ,a nossa realidade. Novamente não se levou em consideração as novas idéias e

as transformações provocadas no seio da escola com a ascensão do novo modelo urbano-

iudustrial. A necessidade de ler e escrever para executar ,as novas funções urbanas não foi

percebida por Rocha Vaz, e anos depois, aquele Brasil dos coronéis, em 1930, sofreu

mudanças, mas não além dos interesses e compromissos.

O período chamado de República Velha, ou Primeira República (1889-1930), ficou

Page 41: A Educação Brasileira no Contexto Historico

marcado, inicialmente, pelas inovações positivistas. O Poder Moderador, Senado Vitalício,

Igreja sob as ordens do Estado são extintos, porque todo aquele entulho Imperial não

interessava aos novos grupos em ascensão. Com o passar dos anos são criados mecanismos

para garantir os privilégios da oligarquia café-com-leite, mas nenhuma reestruturação foi

feita no sentido de atender as populações menos favorecidas. Em 1930, houve ruptura no

seio dos compromissos da oligarquia, causando algumas mudanças que no geral somente

acertaram os rumos diante da urbanização crescente, mas este já é um assunto para a Era

Vargas.

RESUMO

Em 15 de novembro de 1889 foi Proclamada a República. As novas lideranças passaram a

governar pela Política dos Governadores e a Política do café-com-leite. Os fazendeiros de

São Paulo e Minas Gerais estavam em evidência.

Distribuíram o poder político da seguinte maneira: São Paulo e Minas forneciam o

Presidente da República, alternadamente; Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul "tinham

direito" às presidências do Senado e Câmara dos Deputados. Tudo tinha como alicerce o

coronelismo, que nomeava autoridades e altos funcionários e em troca apoiava os

candidatos aceitos pelas bases do governo.

Terminada cada eleição existia a degola dos candidatos da oposição. O deputado mais idoso

verificava as fraudes e todos já sabiam o resultado.

O voto era de "cabresto" e os coronéis tinham "pequenos exércitos particulares armados"

para manter a segurança.

Os partidos políticos não tinham nenhuma ideologia; as pessoas trocavam de partido como

se troca de roupa, dependendo da conveniência e compromisso. Cada Estado tinha o seu

próprio partido republicano.

Nesse período surgiram alguns movimentos de peso, o Tenentismo em 1922 e depois a

Coluna Prestes, no campo militar. No plano intelectual surge a Semana de Arte Moderna,

também, em 1922, alterando os rumos da cultura.

Com a República surgem as reformas de ensino. Em 1890, Benjamim Constant faz a

primeira, rompendo com o humanismo tradicional e inserindo princípios positivistas.

Implanta o ensino enciclopédico, acrescenta Ciências, Noções de Sociologia, Moral, Direito

e Economia Política no ensino secundário.

Page 42: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Em 1901 Epitácio Pessoa introduz mudanças no ensino secundário, mas o objetivo não

muda o de preparar para os cursos superiores. A maior inovação foi a liberdade de ensinar.

Em 1911 foi aprovada a Lei Orgânica Rivadávia Corrêa. Há retrocesso, volta ao ensino

parcelado e o listado já não controla a emissão de títulos e diplomas.

Em 1915 com a aprovação da Lei Carlos Maximiliano, cancela-se o ensino parcelado,

criam-se vestibular e obrigatoriedade do curso secundário para ingresso no ensino superior.

Em 1925 Rocha Vaz faz a última reforma antes da I ira Vargas, foi conservadora e

reacionária, não aceitou as idéias da Escola Nova, manteve o controle ideológico sob 0

Estado, através de inspeções e autorizações, criou Moral e Cívica para o ensino primário e

secundário. A escola existia para fornecer pessoal à política e à administração.

Nenhuma reforma mexeu com os privilégios do ensino superior e nem criou uma sólida

estrutura para o ensino primário às camadas populares.

A ruptura em 1930 aconteceu no seio da própria oligarquia dominante. Getúlio que apoiava

e foi apoiado pelo Governo integrava o governo de Washington Luís, mas virou dissidente

porque teve seus interesses contrariados e encontrou o momento histórico certo.

PROPOSTAS PARA REFLEXÃO

Analise criticamente a ação dos novos grupos políticos a partir de 1889.

Relacione os motivos que contribuíram para a permanência dos privilégios do ensino

superior.

Na prática, quais foram as mudanças no ensino primário e secundário?

Como estava dividido o poder político na República Velha?

Qual era a importância dos partidos políticos da época?

Explique os movimentos sociais chamados de Tenentismo e Semana de Arte Moderna.

Quais fatores contribuíram para a Revolução de 1930?

Por que Vargas rompeu com a oligarquia que estava no poder?

Analise as reformas de ensino, no período, e constate as mudanças que cada uma queria

provocar.

O que significa ensino secundário propedêutico?

LEITURA COMPLEMENTAR

TEXTO I - SENHOR CORONEE,

Page 43: A Educação Brasileira no Contexto Historico

MEUS "RESPEITOS" A VOSSA MERCÊ

As outras oligarquias atingem o poder. Acabou o Império. Oligarcas republicanos substi-

tuem oligarcas monárquicos. O leitor atento vai reclamar: então pouca coisa mudou? Não é

bem assim. A República, como já vimos, nasceu de algumas mudanças da sociedade

brasileira; para o autor Fernando Henrique Cardoso, a fase republicana nasce da união de

"setores socialmente novos" que rompem com a velha ordem do Império. Esta expressão

significa, por um lado, os oficiais de Exército que combateram no Paraguai e voltaram para

casa "contaminados" pelo sistema de governo que viram na região do rio da Prata: todos,

essencialmente (ou, disfarçados de), republicanos. Por outro lado, a expressão do autor,

"setores socialmente novos", também abrange aquelas pessoas que, embora vivendo no

tempo do Império, defendiam as idéias novas, diferentes, para os problemas do tempo; por

exemplo, os fazendeiros, logo, que adotaram a mão-de-obra livre, assalariada ou aquelas

pessoas que cursaram alguma faculdade, moravam na cidade, eram bem remuneradas.

Falamos de médicos, advogados, altos funcionários públicos (que em seu tempo eram

chamados de "letrados civis").

Este grupo, oficiais do Exército, fazendeiros com outras idéias e os letrados civis, para F.H.

Cardoso, são os que fazem a República. É evidente que isto não quer dizer que estas pessoas

tenham passado a "mandar" com a República. Estas pessoas simplesmente "fizeram" a

República. Ajudaram a proclamá-la e nada mais.

O Império cai, quando as tropas do Senhor Deodoro da Fonseca vão às ruas e o derrubam.

Quem era Deodoro? Figura respeitadíssima no Exército, velho combatente na Guerra do

Paraguai, valoroso soldado, fiel monarquista convicto e confesso. Amigo do Imperador,

como também era amigo dos demais monarquistas. E, no entanto, ele proclama a nova

ordem. Bastante curioso; vamos tentar descobrir os motivos.

A ordem republicana já despontava, bem antes de 1889, como única solução para o

problema do país. O governo excessivamente centralizado atrapalhava "negócios locais".

Bons negócios para os donos de terras do Nordeste eram perdidos, porque leis, que na

maioria das vezes eram feitas no centro-sul do país, impunham obstáculos. Se as

"Províncias" tivessem mais autonomia, estas perdas poderiam ser suavizadas. A necessidade

da

Federação era um fato. Mas era preciso "derrubar" o Império. Os donos da terra, os grandes

comerciantes, mesmo os fazendeiros de café com novas idéias tinham muito medo dessa

mudança. Toda vez que uma velha ordem precisa ser substituída e esta substituição não for

Page 44: A Educação Brasileira no Contexto Historico

feita com muita calma, podem ocorrer grandes instabilidades. O que evidentemente era

prejudicial aos bons negócios.

As mudanças deviam acontecer com muita calma. Sem grandes alterações da ordem

pública. Aí entra a figura de Deodoro, velho soldado, respeitado, que asseguraria as

mudanças sem grandes desordens.

(TREVISAN, 1982, pp. 21-22)

TEXTO II - UMA CULTURA PARA A

CLASSE DIRIGIDA E OUTRA PARA A DIRIGENTE

A escravatura que desonrou o trabalho nas suas formas rudes, enobreceu o ócio e estimulou

o parasitismo contribuiu para acentuar, entre nós, a repulsa pelas atividades manuais e

mecânicas, e fazer-nos considerar como profissões vis as artes e os ofícios. Segundo a

opinião corrente, "trabalhar, submeter-se a uma regra qualquer era coisa de escravos". Nessa

sociedade, de economia baseada no latifúndio e na escravidão, e à qual, por isso, não

interessava a educação popular, era para os ginásios e as escolas superiores que afluíam os

rapazes do tempo com possibilidades de fazer os estudos. As atividades públicas,

administrativas e políticas, postas em grande realce pela vida da Corte e pelo regime

parlamentar, e os títulos concedidos pelo Imperador contribuíam ainda mais para valorizar o

letrado, o bacharel e o doutor, constituindo, com as profissões liberais, o principal

consumidor das elites intelectuais forjadas nas escolas superiores do país. Esse contraste

entre a quase ausência de educação popular e o desenvolvimento de formação de elites tinha

forçosamente de estabelecer, como estabeleceu, uma enorme desigualdade entre a cultura da

classe dirigida, de nível extremamente baixo, e a da classe dirigente, elevando sobre a

grande massa de analfabetos "a nebulosa humana desprendida do colunata, uma pequena

elite em que figuravam homens de cultura requintada e que, segundo ainda, em 1890,

observa Max Leclerc, não destoaria entre as elites das mais cultas sociedades européias."

(AZEVEDO, 1963, p. 574)

CAPÍTULO 6

A ERA VARGAS E AS TRANSFORMAÇÕES NA EDUCAÇÃO

(1930-1945)

Page 45: A Educação Brasileira no Contexto Historico

No período de 1928 existiam em São Paulo pelo menos três propostas de revo-

lução vindas de agrupamentos políticos diferentes: O Partido Democrático, Os

"Tenentes" e O Bloco Operário e Camponês.

(Edgar de Decca)

VISÃO HOUÍSTICA DA ÉPOCA

Para muitos estudiosos do assunto, o estado moderno brasileiro começa a ser construído em

1930. Aristocracia rural sofre derrota diante dos avanços da industrialização. Parte da

aristocracia rural passou a direcionar os investimentos na industrialização emergente, e se

mudou para os centros urbanos, procurando se ajustar ao novo momento.

A industrialização ainda estava se estruturando e .í burguesia representava a tendência

progressista. "Caíram por terra" a Política dos Governadores, O Coronelismo Rural e a

Política do café-com-leite; já não atendiam aos novos grupos em ascensão. As idéias

marxistas e anarquistas estavam inseridas no contexto tinham acontecido o Tenentismo, a

Semana de Arte Moderna e a fundação do Partido Comunista. Na área educacional, o

Escolanovismo nascido em Summerhill, propagado nos EUA no início do século XX,

chegava até nós. Os tempos eram outros.

Em outubro de 1930 Washington Luís foi deposto por um movimento armado iniciado no

sul do país. Juntaram-se às forças do Rio Grande do Sul os descontentes de Minas Gerais,

companheiros de Antônio Carlos de Andrada, prejudicados pelo processo eleitoral viciado e

pela ruptura dos compromisso entre São Paulo e Minas; quando foi escolhido Júlio Prestes

para presidência e não Antônio Carlos, conforme regras do jogo. Juntaram-se aos revoltosos

representantes do Estado da Paraíba, terra de João Pessoa e berço vivo do Tenentismo,

parcelas dos plantadores de café de São Paulo, descontentes com a política econômica e

componentes do Partido Democráticos, além dos "puros" que desejavam eleições livres, não

viciadas, voto direto, secreto e feminino e uma completa regeneração nacional.

Numa análise mais cuidadosa, percebemos que os revolucionários de 1930, a grande

maioria, pertenciam à \ elite, estavam inseridos no contexto anterior, mas tiveram seus

interesses e privilégios contrariados. O próprio Vargas foi ministro do governo Washington

Luís e concorreu pela oposição à presidência, sendo derrotado pelo jogo de "cartas

marcadas"; soube compreender e capitalizar o momento histórico, rompendo no momento

certo, conseguindo com muita facilidade derrubar aquele sistema desgastado.

Em 1930, com o apoio das Forças Armadas, Vargas iniciou o Governo Provisório e em

Page 46: A Educação Brasileira no Contexto Historico

1934 passa a Constitucional; deu o golpe do Estado Novo em 1937 e continuou no poder até

1945, quando foi deposto pelos Militares que o apoiaram.

Em 1932 houve reação dos fazendeiros paulistas provocando a Revolução

Constitucionalista de 9 de julho; São Paulo foi derrotado pelas forças de Vargas, porém, em

1934 a Constituição que havia sido pretexto fora aprovada. Vargas foi, talvez, o maior

político brasileiro com capacidade de aglutinar forças tão diferentes. Durante o seu período

de governo, recebeu apoio dos integralistas, dos comunistas, dos tenentes, das Forças

Armadas, de parte da população urbana e das elites regionais. Era chamado de "pai dos

pobres e mãe dos ricos". Iniciou e teve força dentro do populismo. As forças que apoiaram

Vargas, quando discordavam, eram derrotadas por ele.

Vargas mudou as regras do jogo sempre que foi necessário para continuar presidente. Em

1937 outorga a Carta Magna com o apoio dos militares, recebendo .amplos poderes de

ditador, podendo alterar os rumos I los acontecimentos. Combateu a ferro e fogo os

inimigos de cada momento, derrotando desde os comunistas, de ,Luís Carlos Prestes até os

integralistas de Plínio Salgado. Demonstrou simpatia pelos governos autoritários de Hitler e

de Mussolini até fazer acordo com os EUA e passar para o lado dos aliados. O Presidente

Roosevelt veio ao Brasil, depois de superar a crise da Quebra da Bolsa de Nova Iorque em

1929, com a política New Deal (novo acordo), inspirado nas idéias do economista John

Keynes, rompendo com princípios do liberalismo econômico, achando saída para a crise.

Vargas se inspirou nas medidas tomadas por Roosevelt e recebeu empréstimos para

construir a nossa primeira siderúrgica, a Companhia Siderúrgica Nacional, CSN.

Com o ingresso do Brasil no grupo dos aliados, fomos para a Segunda Guerra Mundial

(1939-1945), ao lado dos EUA, URSS, Inglaterra, França etc. Vargas passa a apoiar os

governos democráticos, criticando os autoritários, mas continuava a governar como ditador.

Era uma incoerência.

Para a educação, o momento histórico tornava imperiosa a necessidade de mudar. Eliminar

o analfabetismo passou a ser a palavra de ordem; era preciso preparar o trabalhador urbano

para o concorrido mercado de trabalho. O sistema de ensino existente era para atender a

elite e não respondia às aspirações do momento. As mudanças feitas nos rumos da educação

em 1930, ainda, refletiam as contradições entre o antigo e o moderno. No entanto, passou a

ter uma relação direta entre o crescimento urbano e as taxas de alfabetização e de

escolarização. Ambas tornaram-se ascendentes à proporção da urbanização. Foi criado o

Page 47: A Educação Brasileira no Contexto Historico

ensino supletivo para atender os trabalhadores que não tiveram a oportunidade de estudar na

juventude. Algumas coisas não mudaram, persistiu no seio da escola um sistema dual. De

um lado, escolas preparando para carreiras universitárias, do outro, escolas preparando a

força de trabalho. Eram escolas para as classes médias e ricas e outra diferenciada para os

mais pobres, os trabalhadores. Esse sistema ainda perdura neste início do século XXI.

Foram criados, também, cursos rápidos e rapidíssimos para treinamento dos trabalhadores

das diversas profissões emergentes Em geral, era uma população urbana procedente da área

rural, empurrada para as cidades pelas sucessivas ondas do êxodo rural, que se avolumava.

Voltando à educação, em 1924 foi fundada a Associação Brasileira de Educação - ABE,

como uma organização que reivindicava junto aos poderes públicos medidas concretas que

pudessem solucionar os problemas cruciais da educação nacional. A ABE realizou muitas

conferências e em 1932 promoveu o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nacional. Pedia

gratuidade, obrigatoriedade, co-educação, plano nacional de educação, escola dinâmica,

alegre e viva, atendendo às aspirações do crescimento urbano.

AS REFORMAS EDUCACIONAIS DE FRANCISCO CAMPOS

Em 1930 foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública e foi nomeado o Sr.

Francisco Campos, como seu titular. A reforma criou o Conselho Nacional de educação e

procurou estruturar a educação no território nacional, em todos os níveis.

Em 11 de abril de 1931 criou-se o Estatuto da Universidade Brasileira, com um total de 7

cursos. Mesmo tendo no papel a Universidade do Rio de Janeiro, a primeira a funcionar em

território brasileiro foi a Universidade de São Paulo - USP, em 1934. Importaram-se

professores estrangeiros para começar os respectivos trabalhos acadêmicos. O Decreto n°

19851/31 fixou os fins para o ensino universitário: elevar o nível da cultura geral; estimular

as investigações científicas, habilitar ao exercício de atividade técnico-científicas; trabalhar

pela educação do indivíduo e da coletividade, levando ao aperfeiçoamento da humanidade e

à grandeza da nação. No mesmo decreto previa-se a existência de reitoria, conselho

universitário, corpos docente e discente, obrigação de cada universidade ter no mínimo três

dos seguintes cursos: Medicina, Direito, Engenharia, Educação, Filosofia, Ciências e Letras.

Cada escola tinha autonomia, o que impediu que tivéssemos um verdadeiro regime

universitário.

A Reforma do Ensino Secundário aconteceu em 18 de abril de 1931, com o objetivo de

preparar o homem para o ensino superior, propiciar a formação do homem para todos os

Page 48: A Educação Brasileira no Contexto Historico

grandes setores da sociedade. Ficou estabelecido o regime seriado, com freqüência

obrigatória. O grupo Escolar continuou com 4 anos de estudos; foi criado o Io ciclo do

Ensino Secundário com duração de 5 anos, e o 2o ciclo, chamado de pré-universitário, tinha

dois anos de estudos e habilitava para o ingresso no ensino superior. O sistema foi apelidado

de 452.

Todas as escolas secundárias passaram a ser inspecionadas pelos órgãos federais, inclusive o

Colégio D. Pedro II.

Em 30 de junho de 1931 surge a Reforma do Ensine Comercial, que abrangia o nível médio

e superior. Curso Médio possuía dois ciclos, um com duração de anos de natureza

propedêutica e com mais dois anos formava auxiliar es no nível de 1 ° ciclo. O 2 o ciclo

formava técnicos: Secretariado em um ano; Guarda livros Administrador vendedor em 2

anos; Atuário e Perito Contador em 3 anos. Esses dois últimos permitiam acesse ao curso

superior de finanças em 3 anos.

Algumas falhas são constatadas pela crítica e pelos demais estudiosos. Dentre elas: Houve a

super-representação do ensino superior nos conselhos e colegiados, faltando representação

do magistério nos níveis primário e profissional. Isso levou à marginalização desses graus i

de todo o ensino profissional. Deram ênfase ao ensine superior. Neste sentido conservaram-

se resquícios de ensino aristocrático. Discriminou-se o ensino técnico que não recebeu os

devidos cuidados e reforçou-se a estrutura seletiva do ensino primário e secundário. As de-

cisões foram excessivamente centralizadas, dificultando a articulação e continuidade entre

os níveis de ensino.

AS REFORMAS DE GUSTAVO CAPANEMA

Em 1942 o Ministro da Educação, Gustavo Capanema, promoveu algumas mudanças nos

diversos níveis de ensino, as chamadas Leis Orgânicas de Capanema.

Os Decretos-lei4073,6141 e 9613/1942 organizarar o ensino técnico profissional na área de

economia, estruturando nos dois ciclos existentes o ensino secundário. O Ensino Industrial

Básico passou a ter duração de 4 anos, podendo ser completado com o curso de maestria

com mais dois anos. Os cursos técnicos passaram a ter duração de 3 ou 4 anos e o curso

pedagógico para formação de professores passou a ser de um ano de estudos; todos em

nível de 2o ciclo.

Os referidos decretos, também, criaram estruturas para os cursos artesanais de curta e

média duração; cursos de aprendizagem rápida e de rapidíssima duração.

Page 49: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Organizaram cursos de 4 anos no nível de Io ciclo; o ensino comercial e vários cursos

técnicos no nível de 2o ciclo: comércio, propaganda, administração, contabilidade, estatística

e secretariado. O Ensino Agrícola se assentava nos dois ciclos. Existia o básico agrícola

com 4 anos de estudos e o de maestria com dois anos de duração e vários cursos técnicos;

no nível de 2o ciclo: Agricultura, Zootécnica Prática Veterinária, Horticultura e Laticínio.

O Decreto-lei 4244/42 determinou que o primeiro ciclo do Ensino Secundário passasse a se

chamar Ginasial. E o 2o ciclo a ser chamado de Colegial, sendo reestruturado como Clássico

e Científico.

O Ensino Primário foi regulamentado pelo Decreto-lei 8529/ 46, sendo dividido em

primário elementar com 4 . i nos de estudos e o complementar com mais um ano, destinados

às crianças dos 7 aos 12 anos. Determinou as bases para o Ensino Primário Supletivo com

dois anos de estudos, para adolescentes e adultos que não haviam recebido esse nível de

ensino na idade adequada. A Reforma de Capanema ficou conhecida como 443. Grupo

Escolar de 4 anos, Ginasial, também, com 4 anos de estudos e Colegial com no mínimo três.

O Ensino Superior continuou com praticamente a mesma estrutura e recebendo todos os

cuidados.

RESUMO

Em 1930 começa a formação do estado moderno brasileiro. A aristocracia rural foi

derrotada pela burguesia urbana. Muitos fazendeiros passam a aplicar recursos na

industrialização.

O sistema político da República Velha é substituído na Era Vargas, já não atendia as

aspirações da emergente urbanização.

Washington Luís, Presidente, foi derrubado pela Revolução de 1930, por forças

descontentes, traídas pelo sistema, revolucionários como os Tenentes e demais oligarquias

regionais.

O Governo Vargas teve vários períodos, ficando de 1930 a 1945 no Poder, vencendo os

inimigos do momento e inventando pretextos para continuar. Em 1945 foi deposto pelos

mesmos militares que o apoiaram.

Em 1932, explode em São Paulo a Revolução Consti-tucionalista de 9 de julho. São Paulo

foi derrotado por Vargas, mas foi promulgada dois anos depois uma constituição.

Vargas era simpático à política de Hitler e Mussoli-ni, mas com ao chegada ao Brasil do

Page 50: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Presidente Roosevelt dos EUA, inclusive, emprestando dinheiro para construção da nossa

primeira Siderúrgica, a CSN, o Brasil ingressou ao lado dos Aliados e foi combater na Itália

durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Na área educacional as mudanças são uma necessidade. O analfabetismo teria que ser

eliminado, era necessidade de trabalhadores urbanos com os mínimoE conhecimentos para o

desempenho das novas funções.

A educação continuou a ser dual, uma escola que encaminharia à universidade e outra para

formar a force de trabalho com média, curta e rapidíssima duração.

Em 1924 foi fundada a Associação Brasileira de Educação - ABE para pressionar o poder

público no sentido de reformar a educação. Em 1932 tivemos o Mani festo dos Pioneiros da

Educação Nacional, embuídos das idéias da Escola Nova.

Em 1930 Francisco Campos assume, como ministro, 0 Ministério da Educação e Saúde

Pública e promove, grandes mudanças, principalmente no ensino secundário. Cria o Estatuto

da Universidade Brasileira e a primeira a funcionar em nosso território é a Universidade de

São Paulo, USP, em 1934.

O Ensino Primário e Secundário ficaram assim divididos: Primário com 4 anos de duração;

o Secundário de Io ciclo, em 5 anos de estudos e o 2o ciclo, ou pré-universitário, com 2. Era

necessário cursar os menores níveis para ingressar no ensino superior. O Primário era

obrigatório e gratuito. A inspeção federal cobria todo território nacional. O ensino Agrícola

e Comercial foi encaixado no línsino Secundário, Io ou 2o ciclo, de acordo com a duração e a

profundidade.

Em 1942 Gustavo Capanema reforma os diversos níveis de ensino. Reestruturou o Ensino

Técnico, ampliando o número de cursos; muda os nomes do Io e 2o ciclos |\ira Ginasial e

Colegial, respectivamente. Dá ênfase no línsino Industrial Básico; o Colegial pode ser

Clássico ou Científico e ambos são propedêuticos para a universidade.

O Ensino Superior recebe os maiores privilégios, inclusive tendo mais participação nos

conselhos e colegiados.

PROPOSTAS PARA REFLEXÃO

Faça uma análise crítica do Período anterior à Revolução de 1930.

Quais eram as transformações da sociedade Brasileira nos anos 30?

O que aconteceu com o poder das oligarquias rurais?

Verifique os fatores que contribuíram para o êxitc da Revolução de 1930.

Page 51: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Por que a educação aristocrática já não atendia as novas aspirações?

Explique as idéias da Escola Nova.

Quais eram as perspectivas dos Pioneiros de 1932?

Faça uma verificação na Reforma de Francisco Campos. Constate o sentido da mudança.

Como foi reestruturada a educação com a Reforr Capanema?

Você tem alguma idéia sobre o ensino superior, nc que tange aos privilégios desde o

Período Colonial?

Na sua opinião quais foram as mudanças signif cativas?

Por que a eliminação do analfabetismo é sempre palavra de ordem desde 1930?

LEITURA COMPLEMENTAR

TEXTO I - CONCEPÇÃO DO ENSINO SECUNDÁRIO

A reforma atribui ao ensino secundário a sua finalidade fundamental, que é a formação da

personalidade adolescente.

E de notar, porém, que formar a personalidade, adaptar o ser humano às exigências da

sociedade, socializá-lo constituem finalidade de toda espécie de educação.

E sendo esta a finalidade geral da educação, é por isso mesmo a finalidade única do ensino

primário, que é o ensino para todos.

Entretanto, a partir do 2o grau do ensino, cada ramo da educação se caracteriza por uma

finalidade específica, que se acrescenta àquela finalidade geral.

O que constitui o caráter específico do ensino secundário é a sua função de formar nos ado-

lescentes uma sólida cultura geral, marcada pelo cultivo a um tempo das humanidades

antigas e das humanidades modernas, e bem assim de neles acentuar e elevar a consciência

humanística.

Este último traço definidor do ensino secundário é de uma decisiva importância nacional e

humana.

O ensino primário deve dar os elementos essenciais da educação patriótica. Nele o patrio-

tismo, esclarecido pelo conhecimento elementar do passado e do presente do País, deverá

ser formado como um sentimento vigoroso, como um alto fervor, como amor e devoção,

como sentimento de indissolúvel apego e indefectível fidelidade para com a Pátria.

Já o ensino secundário tem mais precisamente por finalidade a formação da consciência

patriótica.

É que o ensino secundário se destina à preparação das individualidades condutoras, isto é,

Page 52: A Educação Brasileira no Contexto Historico

dos homens que deverão assumir as responsabilidades maiores dentro da sociedade e da

Nação, dos homens portadores das concepções e atitudes espirituais que é preciso infundir

nas massas, que é preciso tornar habituais entre o povo. Ele deve ser, por isto, um ensino

patriótico por excelência, e patriótico no sentido mais alto da palavra, isto é, um sentido

capaz de dar aos adolescentes a compreensão da continuidade histórica da Pátria, a

compreensão dos problemas e das necessidades, da missão e dos ideais da Nação, e bem

assim dos perigos que a acompanhem, cerquem ou ameacem, um ensino capaz, além disso,

de criar, no espírito

das gerações novas, a consciência da responsabilidade diante dos valores maiores da Pátria,

a sua independência, a sua ordem, o seu destino.

Por outro lado, seria de todo impraticável introduzir na educação primária e insinuar no

espírito das crianças o difícil problema da significação do homem, este problema crítico, de

que depende o rumo de uma cultura e de uma civilização, o rumo das organizações políticas,

o rumo da ordem em todos os terrenos da vida social. Tal problema só poderá ser

considerado quando a adolescência estiver adiantada, e é por isto que a formação da

consciência humanística, isto é, a formação da compreensão do valor e do destino do

homem é finalidade de natureza específica do ensino secundário.

Um ensino secundário que se limitasse ao simples desenvolvimento dos atributos naturais

do ser humano e não tivesse a força de ir além dos estudos de mera informação literária,

científica ou filosófica, que fosse incapaz de dar aos adolescentes uma concepção do que é o

homem, uma concepção do ideal da vida humana, que não pudesse formar, em cada um

deles, a consciência da significação histórica da Pátria e da importância do seu destino no

mundo, assim como o sentimento da responsabilidade nacional, falharia à sua finalidade

própria, seria ensino secundário apenas na aparência e na terminologia, porque de seus

currículos proviriam as individualidades responsáveis e dirigentes, as individualidades

esclarecidas de sua missão social e patriótica, e capazes de cumpri-las.

(CAPANEMA, Gustavo. Exposição de motivos da lei orgânica do ensino secundário, em 1942)

TEXTO II - A CARTA TESTAMENTO DE GETÚLIO VARGAS

Trabalhadores do Brasil - mais uma vez as forças que os interesses contra o povo

coordenaram se desencadearam sobre mim. Não me acusam, insultam-me; não me

combatem, caluniam-me; não me dão o direito de defesa; precisam sufocar a minha voz e

Page 53: A Educação Brasileira no Contexto Historico

impedir a minha ação, para que não continue a defender, como sempre defendi, o povo e

principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto.

Depois de decênios de domínios e espoliação dos grupos econômicos internacionais, fiz-me

chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de

liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha

subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais, revoltados contra o

regime de garantia ao trabalho.

A lei dos lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do

salário mínimo desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na potencialização

das nossas riquezas, através da Petrobrás. E mal começa esta a funcionar, a onda de agitação

se avoluma. E a Petrobrás foi obstaculizada até o desespero.

Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente.

Assumi o governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os

lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores

do que importávamos,

existiam fraudes constatadas de mais de cem milhões de dólares ao ano. Veio a crise do

café. Valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço, e a resposta foi

uma violenta pressão sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder.

Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante,

incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo para

defender o povo, que agora se queda desamparado.

Nada mais vos posso dar, a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de

alguém, querem continuar sugando o sangue do povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a

minha vida.

Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem sentirei minha alma

sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentirei em vosso peito a

energia para a luta, por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu

pensamento a força para a reação.

Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota do

meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para

a resistência. Ao ódio, respondo com o perdão. E aos que pensaram que me derrotaram,

respondo com a minha vitória.

Page 54: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui

escravo nunca mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício fícará para sempre em sua

alma e meu sangue será o preço do seu resgate.

Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de

peito ■ iberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo.

Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente, dou

o primeiro passo a caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História.

(Carta de Getúlio Vargas - 24 de agosto de 1954)

TEXTO III - SÃO BERNARDO

Tive por esse tempo a visita do Governador do Estado. Fazia três anos que o açude estava

concluído.

- Burrice, na opinião do Fidelis.

- Para que açude onde corre um riacho que não seca?

Realmente parecia não servir. Mas saiu dali, uma levada, a água que foi movimentar as

máquinas do descaroçador e da serraria.

O Governador gostou do pomar, das galinhas Orpington, do algodão e da mamona, achou

conveniente o gado limosino, pediu-me fotografias e perguntou onde ficava a escola.

Respondi que não ficava em parte alguma. No almoço, que teve champanhe, o Dr.

Magalhães gemeu um discurso. S. Ex.a tornou a falar na escola. Tive vontade de dar uns

apartes, mas contive-rne.

Escola! Que me importava que os outros soubessem ler ou fossem analfabetos?

Esse homens do governo têm um parafuso frouxo. Metam pessoal letrado na apanha da

mamona. Hão de ver a colheita.

Levantando-se da mesa, Padilha, de olho vidrado, pediu-me em voz baixa cinqüenta mil

réis.

- Nem um tostão.

Fui mostrar ao ilustre hóspede a serraria, o descaroçador e o estábulo. Expliquei em resumo

a prensa, o dínamo, as serras e os banheiros carra-paticida. De repente supus que a escola

poderia trazer benevolência do Governador para certos favores que eu tencionava solicitar.

- Pois sim senhor. Quando V. Ex.a vier aqui outra vez, encontrará essa gente aprendendo

cartilha

Page 55: A Educação Brasileira no Contexto Historico

(RAMOS, 1979, pp. 40-41)

CAPÍTULO 7

EDUCAÇÃO E DEMOCRATIZAÇÃO

(1946-1964)Na civilização moderna, a instrução constitui um bem que deve ser partilhado por

todos. Ninguém pode se tornar útil à coletividade ou a si próprio sem um mínimo de

instrução.

(Florestan Fernandes)

O MOMENTO POLÍTICO

A pressão pela democratização do Brasil vinha aumentando desde os inícios dos anos 1940.

Em 1943, um grupo de jovens políticos e profissionais liberais publicou um documento que

ficou conhecido como Manifesto dos Mineiros. O documento foi assinado, entre outros, por

Odilon Braga, Virgílio de Melo Franco, Afonso Arinos de Melo Franco, Milton Campos,

Pedro Aleixo e Magalhães Pinto. Durante o ano de 1944, políticos da oposição procuraram

articular um partido que mais tarde recebeu o nome de União Democrática Nacional - UDN.

Em 1944 o Brasil mandou a Força Expedicionária Brasileira - FEB combater na Itália os

nazistas e os fascistas; enquanto isso o governo brasileiro não em diferente,

ideologicamente. A pressão política aumentava de todos os lados.

Em 28 de fevereiro de 1945, Vargas assinou um ato adicional convocando eleições diretas e

anunciava a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte. Vários partidos se

organizaram: o Partido Trabalhista Brasileiro - PTB reuniu setores populistas e getulistas; a]

União Democrática Brasileira - UDN acomodou, principalmente, a burguesia liberal; o

Partido Social Democrático - PSD formou com getulistas parte da burguesia e de velhas

oligarquias; o Partido Comunista Brasileiro - PCB foi reorganizado por Luís Carlos Prestes.

O continuísmo estava desenhado, "todos conheciam Vargas". Os comunistas e o PTB

lançaram o "Queremismo", isto é, queriam que Vargas continuasse no poder. Houve

articulação dos grupos que não concordavam com os rumos da política e, em 29 de outubro

de 1945, Vargas foi deposto pelos militares.

O General Eurico Gaspar Dutra disputou as eleições pelo PTB e PSD, contra o Brigadeiro

Eduardo Gomes, da UDN7 ambos participaram do governo Vagas e ajudaram a derrubá-lo.

Page 56: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Em 16 de setembro de 1946 foi promulgada a nova Constituição. Em 1947, Dutra rompe

relações diplomáticas com a URSS e fecha o PCB por decreto. No campo econômico, Dutra

não fez uso do dirigismo estatal, governou dentro das idéias econômicas do liberalismo,

assistindo à especulação financeira desenfreada.

Nas eleições de 1950, Vargas se elegeu pelo PTB e PSD somando o apoio dos sindicalistas

"pelegos". Os sindicalistas recebiam dinheiro direto do Imposto Sindical, criado por Vargas,

para poder intervir nos sindicatos. Os sindicalistas não se esforçavam para aumentar o

número de sócios e o governo atrasava a "mesada" caso restasse alguma dúvida. Esse

entulho autoritário deixou 'vestígios no sindicalismo do século XXI; ainda é uma praga.

Vargas voltou à pratica populista, a oposição desconfiava do continuísmo e do

intervencionismo. Dia 5 de agosto de 1954, houve a tentativa de assassinato do jornalista

Carlos Lacerda, da UDN; no episódio da rua do Toneleiros, morreu o Major Rubens Vaz da

Aeronáutica Brasileira. Os suspeitos foram presos pela Força Aérea e confessaram estar

ligados à Guarda Presidencial c terem agido por ordens do "Anjo Negro", como era

conhecido, Gregório Fortunato, chefe da Segurança de Vargas. Sem achar saída, Vargas

suicidou-se em 24 de agosto de 1954.

Nos dezesseis meses que se seguiram até a posse de Juscelino Kubitschek de Oliveira, o

Brasil teve três presidentes: Café Filho era Vice e logo foi afastado, Carlos Luz era

Presidente da Câmara e também não continuou, Nereu Ramos, Presidente do Senado,

passou o governo para Juscelino que, para assumir, teve apoio do Exército.

Juscelino com seu "jogo de cintura" conseguiu governar de 1956 a 1961 com relativa paz.

Construiu e mudou a Capital Federal para Brasília, "trouxe" a indústria automobilística para

o Brasil e passou o governo para Jânio da Silva Quadros.

Jânio foi eleito pela UDN com apoio de vários setores da oposição, não possuía a maioria

parlamentar no Congresso e tomou algumas decisões que desagradaram vários setores.

Condecorou Che Guevara, um dos líderes da Revolução Cubana de 1959, entrou em atrito

com as mulheres pelo uso do biquíni, proibiu brigas de galo, quis cobrar impostos sobre

corridas de cavalo e tinha como vice-presidente João Belchior Marques Goulart, ou

simplesmente Jango, suspeito pelos setores tradicionais de ser simpático ao socialismo.

Jânio renunciou em 25 de agosto de 1961, depois de sete meses, de governo e sem

condições de aprovar o seu programa de governo. Estaria pensando em voltar nos braços dol

povo; não aconteceu.

Jango assumiu sob protestos, foi dado um jeitinho, criou-se o parlamentarismo que somente

Page 57: A Educação Brasileira no Contexto Historico

foi extinto em 1963 por um plebiscito. Era o auge da Guerra Fria, Jango era considerado

socialista, embora fosse latifundiário; coisas normais no Brasil. A crise continuou se avolu-

mando, protestos, descontentamentos e em 31 de março de 1964 os militares depuseram

Jango em nome da democracia. Naquele momento existia uma luta ideológica e "o mundo"

estava dividido em dois grandes blocos. De um lado o Capitalismo, direcionado pelos EUA,

com países periféricos o apoiando, e do outro, o Socialismo real comandado pela URSS.

Nós estávamos atrelados aos americanos e funcionávamos como consumidores de bens de

civilização, como dizia Florestan Fernandes.

MODISMO EM EDUCAÇÃO

Enquanto no Brasil, nos anos de 1940-1950, o Escola-novismo ocupava grande parte das

mentes dos educadores, nos EUA e na URSS, o Behaviorismo fornecia as bases

epistemológicas (teorias) da educação. Skinner foi o principal behaviorista dos EUA.

Começou trabalhando com ratos, pombos em laboratórios de psicologia, e "emprestou" sua

teoria para treinamento de soldados na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Depois de

anos as teorias behavioristas encontraram espaço no ensino escolar. Era a arte de

condicionar pessoas, através de estímulos. O comportamento que seria fixado era reforçado

ou estimulado, aquilo que não se queria perpetuar era refutado. Esse tipo de pensamento

pedagógico chegou ao Brasil, anos mais tarde e influenciou as nossas leis 5.540/68 e

5.692/71. Por outro lado, a outra potencia a URSS, não fazia muita coisa diferente. Pavlov

trabalhou condicionando comportamento de animais também. "Emprestou" sua teoria para

treinar soldados e depois assistiu à implantação da sua teoria na educação escolar A teoria

de Pavlov é conhecida como condicionamento clássico e a teoria de Skinner, como

condicionamento operante.

A EDUCAÇÃO BRASILEIRA (1946-1964)

Durante muitos anos do Período Republicano, o ensino técnico permaneceu marginalizado,

quem tivesse passado por esse ensino tinha que cursar o ensino secundário para ter direito

de freqüentar um curso superior. Em 1950, a Lei 1076 derrubou essa barreira, dando a equi-

valência entre os ensinos técnico e secundário para fins de estudos no grau superior. Deu

igual direito a quem concluísse o ensino comercial, industrial ou agrícola no nível de Io

ciclo, para prosseguir estudos no clássico ou no científico. No entanto, o estudante ficava

obrigado a fazer as adaptações das disciplinas não cursadas; o que na realidade atrapalhava.

Page 58: A Educação Brasileira no Contexto Historico

No mesmo sentido a Lei 1821/53 facultava aos concluintes do 2o ciclo o ingresso no curso

superior, desde que prestassem exame das disciplinas não cursadas durante o ensino

secundário: ginasial e colegial; da mesma maneira ainda mantinha uma quase invisível

barreira. Mas a equivalência somente aconteceu com a Lei 4024/61, quando o ensino médio

passou a incluir o industrial, o comercial e o agrícola. Não havia mais separação entre esses

cursos e o ensino secundário.

A luta pela escola pública passou a ganhar força partir de 1930, com as influências da

Escola Nova, quando a industrialização e a urbanização eram reali dades e não figura de

retórica. Em 1932, o Manifesto dos Pioneiros exigia as mudanças que julgavam necessárias.

Naquele ano, 1932, havia no Brasil somente 394 unidades de ensino secundário, sendo 58

mantidas pelos poderes públicos. No Estado de São Paulo, segundo o professor Nelson

Piletti, havia em 1940,41 ginásios públicos, sendo 38 no interior e 3 na Capital. Em 1962, o

Estado de São Paulo contava com uma rede de 561 estabelecimentos de ensino secundário,

sendo menos de 100 na capital.

Em 1948, Clemente Mariani envia ao Congresso Nacional um projeto de lei que 13 anos

depois se tornaria a Ia lei de diretrizes e bases. A Lei 4024/61, depois de "uma viagem" de

13 anos pelos labirintos do Poder Legislativo, a chamada "guerra dos 13 anos", com suces-

sos e retrocessos, brigas entre católicos e escolanovistas, entre adeptos do centralismo e

contrários, entre grupos regionais, acabou sendo aprovada e na prática trouxe poucas

mudanças em relação à Lei Orgânica de Capa-nema.

A Lei 4024/61 estabeleceu os fins da educação com base nos princípios de liberdade,

solidariedade, compreensão dos direitos e deveres, respeito a dignidade e liberdades

humanas, fortalecimento da unidade nacional, solidariedade internacional, com

desenvolvimento integral da personalidade humana e sua participação no bem comum; tudo

sem preconceito. Estruturava a educação em:

1. Pré-primário: escolas maternais e jardins da infância para crianças de até 6 anos de idade;

2. Ensino Primário: com no mínimo 4 anos de duração, para crianças com 7 anos ou mais;

3. Ensino Secundário: formado por dois ciclos: ginasial com 4 anos e colegial com o

mínimo de 3 anos de duração, abrangendo os cursos técnicos, normal e toda estrutura antiga

da educação média, e

4. Ensino Superior: em faculdades ou universidades, englobando aulas, pesquisa e extensão.

Abrangendo a graduação e a pós-graduação.

O currículo do colegial passou a ser diversificado a partir da 3a série, preparando para o

Page 59: A Educação Brasileira no Contexto Historico

curso superior. O Currículo pleno era composto de 3 partes: uma nacional: Português,

História, Geografia, Matemática, Ciências e Educação Física; uma regional fixada pelos

conselhos de educação estaduais e outro do próprio estabelecimento, cuja relação era

elaborada pelos conselhos e escolhida pelas escolas. Em 1962, criou-se o Conselho Federal

de Educação e foi elaborado o Io Plano Nacional de Educação (1962-1970).

Paralelamente à aprovação da Lei de Diretrizes e bases 4024/61, grandes movimentos

"ganharam as ruas" em todo o Brasil. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB

-, apoiou o Movimento de Educação de base - MEB -, do governo federal. Desde a década

de 1950, Paulo Freire vinha acumulando experiências e em 1961, em Recife, começou a

alfabetização, dando ênfase à transformação política social. O movimento se alastrou por

outros Estados do Nordeste. Era nada mais do que trabalhar no contexto; considerava as

condições sociais e desenvolvia uma pedagogia política, utilizando as palavras usadas no

dia-a-dia dos alfabetizados. Os Vocábulos eram todos conhecidos do grupo, eliminando a

cartilha artificial existente na época. A União Nacional dos Estudantes - UNE, criou o

Centro Popular de Cultura - CPC. Outros movimentos tiveram como palco o Nordeste,

dentre eles se destacaram: "De pé no chão também se aprende a ler" e Movimento de

Cultura Popular. Com os governos militares a partir de 1964, esses movimentos são extintos

ou colocados fora da lei ai seus líderes são presos ou acabaram foragidos.

RESUMO

Durante os anos 40 aumentou a pressão pela democratização. Em 1943 houve o Manifesto

dos Mineiros: jovens políticos e profissionais liberais exigiam a democratização. Em 1944,

políticos da oposição fundaram a União Democrática Nacional - UDN. Em 1944 o Brasil

Mandou a Força Expedicionária Brasileira lutar na Itália contra Hitler e Mussolini, enquanto

no Brasil o regime autoritário não era muito diferente.

Em 28 de fevereiro de 1945 Vargas assinou um ato adicional convocando eleições diretas e

anunciando a. formação da Assembléia Nacional Constituinte. Porém, o PTB e os

comunistas lutavam pelo "Queremismo", isto é, queriam continuidade com Vargas. Os

partidos se organizaram e a pressão aumentou pela democratização.

Em 29 de outubro, Vargas foi deposto pelos militares e o General Dutra disputou e ganhou

as eleições com o Brigadeiro Eduardo Gomes.

Em 1946 foi promulgada a nova Constituição e, em 1947, Dutra rompe relações

diplomáticas com a URSS e por decreto fecha o PCB.

Page 60: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Com o grupo de getulistas espalhados pelo PTB, PSD e sindicalistas "pelegos", Vargas foi

eleito diretamente, usando o populismo. A Segurança de Vargas se envolve no episódio da

rua dos Toneleiros, quando se tentou assassinar o jornalista Carlos Lacerda e morreu o

Major da Aeronáutica, Rubens Vaz. Getúlio Vargas não encontrou uma saída e suicidou-se

em 24 de agosto de 1954.

Com a morte de Vargas, o Brasil teve três presidentes em 16 meses. Café Filho era vice e

foi afastado, Carlos Luz presidia a Câmara dos deputados e também não ficou por muito

tempo, Nereu Ramos presidia o ' Senado e passou a faixa ao Sr. Juscelino Kubitschek de

Oliveira

Juscelino governou de 1956 a 1961, construiu e mudou a capital para Brasília, facilitou a

vinda das montadoras de automóveis no Brasil, teve "jogo de cin-lura" para terminar o

governo, que desde a posse teve que ser garantida pelo Exército Brasileiro.

Depois de Juscelino em 1961, O Sr Jânio da Silva Quadros foi eleito e empossado como

Presidente. Pertencia à UDN, não tinha a maioria parlamentar no Congresso, condecorou

Che Guevara, um dos líderes da Revolução Cubana de 1959, proibiu o uso de biquíni e

brigas de galo, quis cobrar impostos sobre corridas de cavalo e procurou relações comerciais

com países socialistas. Renunciou em 25 de agosto de 1961, depois de 7 meses de governo,

sem conseguir aprovar seus projetos.

Jango assumiu, mas no parlamentarismo, e somente em 1963, por um plebiscito, aprovou-se

o presidencialismo. Jango era suspeito de ser socialista ou simpatizante e teve bastante

oposição, sendo derrubado por um movimento militar em 31 de março de 1964.

Nos EUA e na URSS o Behaviorismo era um modismo na educação. Era a prática de

condicionar comportamentos. Clássico por Pavlov na URSS e Operante por Skinner, nos

EUA. Ambos começaram adestrando animais, viram suas teorias sendo usadas para treinar

soldados para a Segunda Guerra Mundial e depois sendo utilizadas nas escolas. No Brasil o

chamado por nós de Tecnicismo chegou mais tarde, no período militar (1964-1985)

influenciando as nossas Leis 5540/68 e 5692/71.

Na educação brasileira, até 1964, imperavam ai idéias da Escola Nova. Desde o Manifesto

dos Pioneiros em 1932 o Escolanovismo estava em ascensão e acabou influenciando a Lei

4024/61.

As idéias da Escola Nova tinham como fundamento as teorias de Rousseau e de outros

Page 61: A Educação Brasileira no Contexto Historico

filósofos liberais. A primeira escola de que se tem notícia surgiu na Inglaterra, Summerhill;

as idéias influenciaram o educador americano Dewey e chegaram ao Brasil trazidas por

Anísio Teixeira.

Nelson Piletti fala que em 1932 havia 394 unidades de ensino secundário no Brasil, sendo

58 públicas. Em 1940, o Estado de São Paulo tinha 41 ginásios públicos, sendo 3 na capital.

Em 1948 Clemente Mariani enviou ao Congresso Nacional um projeto de lei que depois de

13 anos de tramitação foi aprovado como a Lei 4024/61; era a nossa primeira lei de

diretrizes e bases da educação nacional. 1

A Lei 4024/61 era liberal em suas concepções, com forte influência da Escola Nova. Dividia

o ensino em: Pré-prirnário: para crianças de até 6 anos de idade; Ensino Primário: com

duração de 4 anos, para crianças de 7 anos ou mais: Ensino Secundário: formado por dois

ciclos, o Ginasial com 4 anos e o Colegial com no mínimo 3 anos de estudos. Abrangia

todos os cursos técnicos da estrutura antiga. Tinha um currículo diversificado em 3 partes.

Uma parte era de âmbito nacional, outra parte de livre escolha dos conselhos estaduais de

educação e uma outra parte de escolha local, pela própria escola.

Em 1962 foi criado o Conselho Federal de Educação e feito o primeiro Plano Nacional de

Educação para o período de 1962 a 1970.

Muitos movimentos populares envolvendo a educação apareceram nos anos 60. Desde

Paulo Freire com a alfabetização no contexto; O Movimento de Educação de base apoiado

pela CNBB; o Centro Popular de Cultura criado pela União Nacional dos Estudantes e

outros movimentos de cultura popular. Em 31 de março de 1964, esses movimentos foram

colocados na clandestinidade e seus líderes ou foram presos ou se tornaram foragidos.

PROPOSTAS PARA REFLEXÃO

Faça uma análise crítica sobre as condições brasileiras em 1945.

Relacione os movimentos sociais que contribuíram para a democratização do Brasil em

1946.

Quais eram os partidos políticos e como foram formados, nos anos 40?

O que se entende por continuísmo e "Queremismo"?

Analise a formação dos sindicatos brasileiros.

Explique os acontecimentos que culminaram com o suicídio de Vargas.

Faça uma análise sobre o governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira.

Page 62: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Como foram a ascensão e a queda de Jânio?

Qual era a conjuntura envolvente na época de Jango?

Faça uma análise crítica do Movimento Militar de 1964.

Na época da Segunda Guerra Mundial, qual era o modismo em educação nas duas maiores

potências?

Verifique as influências das diversas teorias educacionais nas Leis 4024/61, 5540/68 e

5692/71.

Qual era a estrutura de ensino estabelecida pela Lei 4024/61?

Analise os efeitos das idéias da Escola Nova na educação brasileira.

Verifique a importância dos movimentos de cultura popular nos anos 1960.

O que você acha que faltou neste capítulo para entender melhor o período?

LEITURA COMPLEMENTAR

TEXTO I - O BRASIL, NAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS (1945-1964)

(...) No Brasil, a ditadura de Vargas não vingou, porque não tinha a importância estratégica

da de seus colegas da península ibérica. A entrada do Brasil na guerra foi o começo do fim;

a luta contra o nazi-fascismo foi o elemento catalisador da luta interna contra a o fascismo

brasileiro. A redemocratização do país era um imperativo da situação: à medida que a

ditadura afrouxava suas tenazes, permitindo os movimentos estudantis e do povo em prol do

engajamento do país na conflagração mundial, cavava sua própria sepultura, pois em tais

movimentos a propaganda pela derrubada da ditadura lhes era subjacente. A posição de

Vargas ainda mais se agravava pelos seus titubeios e suas simpatias em relação aos países

do Eixo, que não lhe permitiam uma opção definitiva, senão quando o quadro geral da

guerra estava já plenamente delineado. A assinatura do armistício punha um prazo na

vigência da ditadura getulista; contudo, sua habilidade política conseguiu a dilataçao de

mais alguns meses, para a derrocada final. Nada parecia conter a avalancha democrática,

que se estendia por todo o país, e ela acabou por ser representada por dois antigos

companheiros e sustentáculos do regime Vargas: os generais Dutra e Gois Monteiro.

Se a cessação das hostilidades, por um lado, dera como conseqüência a explosão do

sentimento de liberdade, por outro, reyelara ao mundo uma nova superpotência, cujo poder

não mais se fundamentava no terror do desconhecido, mas, especialmente, no que realizara,

em campo aberto, durante os anos de guerra. A URSS terminava a guerra não mais como

uma grande incógnita, e sim como a Segunda potência mundial, apenas superada pelos

Page 63: A Educação Brasileira no Contexto Historico

EUA. (...) As duas nações haviam ganho no campo da luta o direito de serem elevadas à

posição de primeiras potências mundiais, substituindo as nações européias na hegemonia

mundial.

(ODÁLIA, 1974, pp. 356-357)

TEXTO II - A PEDAGOGIA RENOVADA

A pedagogia renovada, também conhecida como pedagogia da Escola Nova, desenvolveu-se

no Brasil a partir da década de 30, apresentando uma série de críticas à educação tradicional

e buscando construir um modelo alternativo.

Um dos mais importantes princípios pedagógicos defendidos pelo movimento Escola Nova

é o respeito à personalidade do educando, às suas características individuais. Como dizia

Lourenço Filho, "Isso leva a combater o aspecto impositivo da educação tradicional,

caracterizado pelo apelo ao automatismo, com eliminação do valor dos impulsos naturais,

desejos e propósitos, fontes do sistema vital que é a personalidade. Em conseqüência, as re-

lações entre mestres e alunos hão de modificar-se".

A pedagogia da Escola Nova passou a repelir a tradicional postura de que o saber é algo que

se transmite corno uma dádiva, onde encontramos de um lado o mestre oferecendo o

"presente da sabedoria" e, de outro, os alunos recebendo~o passivamente. Concluiu-se que o

conhecimento capaz de influenciar significativamente o educando deve ter o caráter de uma

conquista pessoal. Algo que requeira atividade, participação e energia do aluno.

Assim, o professor que despeja conhecimento deixa de ocupar o centro da atividade

pedagógica. Ao invés, sua função é ser um facilitador da aprendizagem, alguém capaz de

colaborar com o livre desenvolvimento da personalidade do aluno. O relacionamento na sala

de aula deve assumir um clima de harmonia, espontaneidade e cooperação entre professor e

alunos.

O esforço na aprendizagem deveria ser substituído pelo interesse na aprendizagem,

resultando daí a grande importância atribuída aos fatores motivacionais capazes de despertar

no estudante o indispensável estímulo para aprender.

Tendo em vista motivar seus alunos, o professor teria que recorrer a múltiplas técnicas de

aprendizagem, adequadas à idade e ao grau de desenvolvimento do educando. Como

exemplo dessas atividades podemos citar: a pesquisa experimental, o estudo do meio natural

e social, atividades lúdicas, as dinâmicas de grupo etc.

Em vez de valorizar a mera retenção dos conteúdos do ensino, a pedagogia renovada passou

Page 64: A Educação Brasileira no Contexto Historico

a enfatizar a importância do desenvolvimento das habilidades mentais, como a observação,

a análise, a reflexão e a criatividade. A participação do aluno foi considerada fundamental

no processo pedagógico. O educando devia aprender a fazer, fazendo; e a pensar, pensando.

(COTRIM, 1988, pp. 39-40

CAPÍTULO 8

A EDUCAÇÃO NOS GOVERNOS MILITARES (1964-1985)No Brasil só duas influências políticas se fizeram sentir ininterruptamente, em

âmbito nacional: o Poder Militar e a Igreja. Os partidos políticos no Império, na

República Velha ou na República Nova foram vistosas fachadas anunciando

programas que não cumpriam, sem disciplina e arregimentação partidárias,

atuando, periodicamente por ocasião das eleições.

(Hélio Silva)

SÍNTESE DOS ACONTECIMENTOS HISTORICOS

Com a ascensão dos militares ao poder em 1964, as instituições democráticas não estavam

preparadas para atender às novas perspectivas do governo. Desde o Congresso Nacional até

o ensino, "todos" sofreram alterações substanciais com o rumo da nova política.

A partir de 1960, o país entrou numa nova fase, consolidando o modelo urbano industrial.

Fazendo um retrospecto: no final do século XIX, com a imigração estrangeira surge o

primeiro e acanhado surto industrial.

Em 1930, com o governo Vargas, a industrialização e a urbanização tiveram grandes

avanços, encontrando o espaço político necessário para a expansão. O Censo de 1970 é o

divisor de águas; a população urbana naquele momento superou a população rural; tínhamos

em 1970 56% das pessoas morando nas cidades. Foi uma época dos grandes êxodos rurais,

inchando as cidades com um crescimento desordenado, sem planejamento e estrutura para

atender os novos moradores, aumentando os problemas sociais.

Por volta de 1960, no final do governo de JK, o capitalismo começa a entrar na fase

monopolista e financeira. Os grande conglomerados estenderam os seus negócios por quase

"todo o Planeta"; é o momento de abertura ao capital estrangeiro, não há mais fronteiras

para segurar o capital; estávamos dando passos largos para a globalização. Internamente, era

Page 65: A Educação Brasileira no Contexto Historico

um momento de grande euforia. Na passagem dos anos 1950 para 1960, surgiram grandes

acontecimentos no Brasil: O Cinema Novo estava em pleno vapor, a Bossa Nova "fazia a

cabeça" da nova juventude e a Copa do Mundo de Futebol disputada e vencida em 1958 na

Suécia e em 1962 no Chile fazia a alegria do "povão" A televisão, ainda em preto e branco,

era a aspiração dos diversos segmentos sociais da sociedade urbana industrializada. O

populismo começado por Vargas estava agonizando e passou a ser motivo de análise e

reflexão pela intelectualidade.

Os anos 60 marcaram o apogeu da crise entre os blocos capitalista e socialista. Estrutura

mundial formada no término da Segunda Guerra Mundial -1945, quando as duas grandes

potências: URSS e EUA praticavam a chamada "guerra fria". Bastava uma fofoca, uma

informação errada ou até mesmo vingança para uma pessoa ser presa ou até condenada à

morte, por fornecer informações confidenciais. Era a "política do terror", cada potência

queria dominar outros espaços, inclusive os já ocupados pela concorrente. Ambas prati-

cavam um imperialismo semelhante e qualquer hesitação era encarada como traição. Esse

estado de almas armadas atingiu os países periféricos e o Brasil não foi exceção.

Com a tomada do poder pelos militares, muitas modificações foram introduzidas, dentre

elas, houve a cassação dos partidos políticos existentes e a formação de apenas dois: a

Aliança Renovadora Nacional - ARENA -, para dar sustentação parlamentar ao governo e o

Movimento Democrático Brasileiro - MDB -, com a incumbência de fazer oposição; porém

até certo ponto. Existia um limite que não devia ser ultrapassado, quem desobedecesse seria

punido; era a aplicação do velho e cansado provérbio chinês: "manda quem pode e obedece

quem tem juízo".

Já em abril de 1964, a Constituição Federal de 1946 não tinha nenhuma utilidade. O

governo usava os atos institucionais, decretos e decretos-leis, que depois foram

incorporados à Constituição outorgada em 1967.

Em 1968, houve uma avalanche de grandes protestos e movimentos sociais diversos, no

Brasil e em "todos os lugares" do mundo. Movimentos jovens abalaram os EUA e grande

parte da Europa. Era o auge da luta ideológica e dos protestos, estendidos a ambos os blocos

políticos. No Brasil foi editado o Ato Institucional n° 5 AI-5, e o Decreto 477, procurando

segurar as rédeas do movimento estudantil. O Serviço Nacional de Informações - SNI -,

tinha acesso a todas as instituições e informações, espécie de carta branca para investigar e

processar quem quer que fosse. O clima foi atenuado pelo "milagre brasileiro" (1968-1973),

quando o país cresceu quase 10% ao ano, em

Page 66: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Média. Porém, a crise do petróleo no início dos anos 70 "acalmou" toda aquela euforia:

"Este é um país que vai pra frente", "Avante Brasil", "O futuro chegou", "Ame-o ou deixe-

o", "Integrar para não entregar".

Em 1960, o país tinha 39,4% da população analfabeta e em 1970 não havia mudado muito;

constatavam-se 33,6%. A educação por essa época passou a ter o caráter compensatório,

teria que contribuir decisivamente para romper com o atraso da nossa sociedade. Foram

assinados acordos internacionais para orientação do esquema a ser seguido. O Banco

Nacional de Habitação - BNH -, foi criado em 1964, para financiar casas quase a fundo per-

dido às pessoas que não tinham condições de comprá-las no mercado. No entanto, anos

após, o BNH passou a integrar o sistema de poupança e o Fundo de Garantia por Tempo de

Serviço - FGTS -> buscando, agora, o lucro e financiando casas de alto padrão, sendo

extinto na década de 1980, sem cumprir o objetivo para o qual foi criado.

Em 1978, o já esgotado governo militar dava sinais de cansaço, a pressão aumentava por

todos os lados. Pediam desde eleições diretas, assembléia constituinte, até anistia aos

brasileiros que viviam no exterior devido ao ostracismo. Foi constituído o Comitê Brasileiro

pela Anistia, integrado, entre outros, pela Ordem dos Advogados do Brasil - OAB -,

Associação Brasileira de Imprensa - ABI - e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil

- CNBB. A pressão aumentava pela chamada liberação e em 1979, com um "golpe de

mestre" o governo aprovou o pluripartidarismo. A oposição se dividiu, brigou entre si,

negou antigas alianças, guerreou por siglas partidárias, feudalizou as instituições, criaram-se

donos de partidos políticos, sem nenhuma vinculação ideológica. Como diria o velho

Maquiavel: "o terreno estava limpo" para permanecer por mais alguns anos; isto é, a

oposição estava dividida e com isso o governo militar teve mais 6 anos de fôlego, para

governar até 1985. A educação será tratada em seguida, dentro do espírito político enfocado.

AS MUDANÇAS EDUCACIONAIS NO PERÍODO

A marginalização educacional foi uma constante em nossa história; os grupos menos

favorecidos economicamente, em todas as épocas, receberam uma educarão diferenciada,

oscilando do abandono à própria sorte, á preparação para o trabalho, sem perspectivas para

continuar os estudos no ensino superior. Em 1950, tínhamos no Estado de São Paulo 42%

das crianças em idade escolar - 7 a 14 anos - fora da escola. A repetência e a evasão

persistiam em todo ensino primário e secundário. Havia estrangulamentos nas passagens

Page 67: A Educação Brasileira no Contexto Historico

para várias séries: da 1a para 2a série do ensino primário; da 4a série do ensino primário para

a Ia série do ensino ginasial e da última série do ensino ginasial para a 1a série do ensino

colegial. A educação, ainda, era livresca e acadêmica, a avaliação e os métodos de ensino

eram tradicionais, imperavam na prática os castigos físicos e a memorização de textos

clássicos. O homem educado "recitava" sem muito esforço versos de Camões, discursos de

Cícero, A Odisséia de Homero e assim por diante. Ter conhecimento era ter na memória os

grandes clássicos e raramente se sabia contextualizar aquelas leituras.

A partir de 1930, com o início da urbanização, crianças das classes populares começaram a

ingressar em nossas escolas e por volta de 1960 a 1970 já eram a maioria nas escolas

publicas. O universo de conhecimento dos mais pobres era muito diferente da "cultura" das

classes média e rica, e conforme a escola pública foi recebendo as crianças das camadas

pobres, as taxas de repetência e evasão aumentaram. Hoje, comprovado por diversas teses,

temos a certeza de que a escola não estava preparada para "trabalhar pedagogicamente" esse

tipo de clientela. Esse alunado falando diferente e apresentando outras soluções para os seus

problemas não entendia e não eram entendido pela "escola".

Após a tomada do poder político em 1964, os militares procuraram fazer novas adequações,

dividindo o ensino em Io e 2o graus e superior. A Lei 5692/71 estruturou o ensino de Io e 2o

graus. As quatro séries do antigo ensino primário foram juntadas às quatro séries do ensino

ginasial, formando o Io grau com 8 anos de duração, sem o estrangulamento do exame de

admissão ao ginásio, e procurando integrar em um único bloco aquele que era tido como Io

ciclo do ensino secundário, sendo justaposto ao antigo primário. Teoricamente teríamos um

ensino obrigatório com 8 anos de duração, mas, na prática não funcionou. A integração

entre o antigo ensino primário e ginasial não aconteceu, os professores permaneciam

separados dividindo até mesmo a sala dos professores. Ficava um grupinho de um lado,

eram os antigos professores primários e outro grupinho do outro lado, eram os ainda

chamados de professores secundários; os assuntos conversados eram diferentes e as

conversas aconteciam de maneira paralela. Não havia integração. Quanto à terminalidade

que seria de 8 anos, também foi um engodo. Passou-se a discutir a terminalidade ideal, que

era de 8 anos e a terminalidade real, diferente para cada região ou lugar,

Quanto ao 2o grau, a Lei 5692/71 estabelecia a obrigatoriedade da formação profissional. As

escolas públicas não tinham as condições mínimas para promovera tal profissionalização,

faltava pessoal especializado, condições materiais e físicas. As escolas particulares,

acostumadas na preparação da elite para as grandes universidades, criaram um sistema para

Page 68: A Educação Brasileira no Contexto Historico

burlar a lei; constava nos seus currículos e programas a base profissional exigida, mas na

prática trabalhavam os conteúdos de maneira antiga, atendendo às exigências dos grandes

vestibulares. Os mais pobres continuavam à margem do conhecimento elaborado e

organizado, que dava acesso, ao ensino superior público. Os vestibulares continuaram

cobrar os conhecimentos memorizados como nos séculos anteriores, não fizeram as

adequações no sentido de acompanhar as mudanças. As universidades públicas apenas

produziram lindas teses a respeito e se esqueceram da própria prática.

Por outro lado, os novos professores formados em cursos, na grande maioria, de curta

duração, pelas inúmeras escolas particulares que proliferaram em todo o país, não

apresentavam o mesmo nível de conhecimento; eram procedentes da nova escola pública e a

defasagem se acumulava desde o ensino de Io grau. Era ensino universitário gratuito para

quem teve condições de pagar escola particular de Io e 2o graus, e escola superior, paga e

nem sempre de qualidade, para os alunos oriundos da escola pública. A discriminação, que

teoricamente estaria resolvida, agravou-se ainda mais. As profissões tradicionais como

medicina, engenharia etc, que davam prestígio, tornaram-se quase utopia para os alunos

mais pobres. O novo corpo docente da escola pública de Io e 2o graus, em grande parte,

interpretava de maneira errada as novas teorias educacionais, muitos chegavam à conclusão

de que o conteúdo não tinha nenhuma importância, confundiam formar e informar, ensino

com pesquisa; o valor do professor era comparado ao nível do livro didático e de outros

materiais utilizados em aula.

A escola pública "cresceu" bastante no período, o Estado de São Paulo construiu quase uma

escola por dia, do final dos anos 60 até os 90. O número de funcionários foi sempre menor

que o necessário para atender à escola com 4, 5 e até 6 turnos diários. As classes passaram a

ter um número grande de alunos, aumentando a repetência e evasão, e acabaram caindo no

descrédito. Certa vez perguntei se alguns dos meus colegas tinham a coragem do colocar os

seus próprios filhos em escola pública; não houve nenhum sim. Os salários dos professores

ficaram menores com o passar dos anos, e a qualidade de ensino foi caindo ainda mais.

Chegamos a ponto de verificar que a escola pública, que teria que promover a transformação

pelo conhecimento, como pensava Vygotsky, passou a atender os mais pobres com um

ensino ainda mais pobre. Não é um mero jogo de palavras.

A Lei 5540/68 forneceu as bases para a criação de cursos de licenciatura curta, cursos de

fins de semana e de outras aberrações. Os professores, também, foram enganados. Recebiam

uma formação rápida, com direito lecionar vários componentes curriculares, mas passaran a

Page 69: A Educação Brasileira no Contexto Historico

trabalhar 40, 50, ou 60 horas semanais com alunos em sala de aula. Era normal um professor

ter durante um ano letivo 700, 800 e até 1000 alunos. Esse professor não recebia nenhuma

qualificação ou requalificação docente. Se quisesse se preparar era obrigado a fazê-la nas

horas de folga. Era impossível, sobrava da meia noite às 6 horas.

Os livros didáticos acompanharam a decadência, vinham com as respostas prontas e eram

descartáveis; daí surgiu uma brincadeira "o professor é aquele que leu o livro didático

primeiro, após recebê-lo da editora, respondido" . O professor não teve mais tempo de

pensar.

A escola pública passou a ser posto de vacinação, distribuidora de merenda e laboratório

para estudos pedagógicos das grandes universidades. Professores do ensino superior fizeram

teses maravilhosas sobre os graus inferiores, tendo em suas salas de aula, muitas vezes, não

mais que meia dúzia de alunos. Se você não concorda com a minha afirmação, procure saber

quantos alunos ingressam por ano em cada carreira nas universidades estaduais e federais e

verifique quantos são formados. A evasão é maior que nos graus inferiores e não há

desculpa no sentido de dizer que esses ingressantes não possuem base para aprender: são os

melhores QUe conseguem passar pela seleção e os de maior poder aquisitivo, como foi

comprovado em diversas teses. como o curso é gratuito, não há desculpa no sentido de

justificar a evasão relacionada aos problemas sociais; até porque os alunos selecionados têm

o melhor poder aquisitivo, conforme já foi dito.

O TECNICISMO

A partir de 1960, o país passa para uma nova fase histórica, integra-se com mais ênfase,

como membro da internacionalização do capital, desenvolvendo um capitalismo periférico e

dependente. Passou a buscar a modernização e a educação passou a ser vista como fator de

desenvolvimento. O governo em 1964 começou uma política, reforçando os poderes do

Executivo, aumentou o controle feito pelo Conselho de Segurança Nacional e procurou

centralizar a administração pública, centrando forças na recuperação econômica e contendo

os protestos pela repressão, quando "necessário." A educação também tinha que se ajustar à

política do governo militar.

Nesse sentido foi assinado acordo com a Agência Internacional de Desenvolvimento dos

Estados Unidos, os famosos acordos MEC/US AID, para implantação do tecnicismo na

educação brasileira. A Lei 4024/61 » atendia as novas pretensões governamentais e a

reforma universitária se deu com a aprovação da Lei 5540/68. A nova lei fornecia as bases

Page 70: A Educação Brasileira no Contexto Historico

estruturais para graduação, pós-graduação, extensão universitária, aperfeiçoamento e

especialização. Os cursos de graduação passaram a ter um núcleo comum básico para áreas

afins e um ciclo profissional de curta ou longa duração. Procurou-se integrai1 cursos, áreas e

disciplinas com um currículo que atendesse aos interesses individuais, didáticos e de

pesquisa. Houve a extinção da cátedra e maior representação nos órgãos colegiados.

Unificou-se o vestibular, adotaram-se matrículas por disciplina e por crédito, criaram-se

departamentos, entre outros.

Na prática, as vantagens esperadas não aconteceram. Faltou verba às pesquisas, aumentou a

nossa dependência cultural, continuamos a seguir os modismos e naquele momento a

palavra de ordem era o tecnicismo.

Na verdade a modernização não rompeu com as antigas tradições conservadoras. Com a

ajuda internacional: empréstimos, convênios culturais, a situação pouco mudou; abrimos as

portas para o crescimento das faculdades particulares e a educação somente melhorou em

termos de estatística.

A Lei 5692/71 seguiu os moldes da Lei 5540; estabeleceu uma estrutura de princípios

baseada no tecnicismo, determinou que se desse uma formação profissional no nível de 2o

grau, eliminou barreiras como admissão ao ginásio e criou um grande bloco com 8 anos de

estudos, chamado de Io grau. Em 1982 a Lei 7044 derrubou a obrigatoriedade de se formar

profissionalmente no nível de 2o grau. A legislação elaborada na época dos militares esteve

em vigência até 20 de dezembro de 1996 com a aprovação da Lei 9394

RESUMO

Em 1964 houve a tomada do poder político pelos militares. As instituições foram alteradas

para atender às novas perspectivas.

A partir de 1960, o país começa a consolidar o mo-tlclo urbano industrial e em 1970 a

população urbana passa a ser maior que a população rural.

A internacionalização do capital ocupa nossos espaços e vai aumentando o grau de

dependência dos anos 60 até hoje. A dívida externa cresce.

Nos anos 1950-1960 surgem grandes movimentos 110 Brasil: Bossa Nova, Cinema Novo,

Copa do Mundo de l;utebol vencida em 1958 na Suécia e em 1962 no Chile. Surge e atinge

o auge o Movimento Estudantil de 1968, acompanhando outros movimentos do resto do

mundo.

Por volta de 1960 a "Guerra Fria" estava no auge. Os dois blocos: EUA e URSS lutavam

Page 71: A Educação Brasileira no Contexto Historico

pelo espaço como potências imperialistas, praticando mais ou menos os mesmos absurdos.

No Brasil, após 1964, os partidos políticos existentes foram cassados e somente foi

permitida a formação da Aliança Renovadora Nacional - ARENA, para dar base

parlamentar ao governo e o Movimento Democrático Brasileiro - MDB, de oposição,

porém, não muita.

Os poderes do Executivo foram aumentados, as letras da Constituição de 1946 se esfriaram,

governava-se por atos institucionais, decretos e decretos-lei.

De 1968 a 1973 tivemos o chamado "milagre brasileiro", mas a crise do petróleo logo no

início dos anos 70 derrubou aquele mundo de sonhos.

Em 1964 foi criado o Banco Nacional da Habilitação - BNH, com o objetivo de construir

casas às pessoas mais pobres. Dois anos depois o BNH entrou no sistema de poupança e de

correção monetária, passando a visar lucro, até ser extinto na década de 1980.

No final da década de 1970, o governo militar dava sinais de cansaço, os movimentos

pedindo liberação política cresceram, e a abertura lenta e gradual começava a acontecer. Os

brasileiros que se encontravam no ostracismo retornam, aprovam-se eleições diretas. Mas,

antes o governo com um "golpe de mestre" cria o pluripartidarismo e a oposição se divide,

briga entre si, dando mais 6 anos de fôlego para o governo.

Com os governos militares a educação também sofreu mudanças, a Lei 4024/61 não atendia

a nova situação e as idéias tecnicistas estavam "nas nossas cabeças". Foi feito acordo com

os EUA e a idéia de condicionai comportamentos passou a ser uma realidade. Skinner e |

Pavlov passaram a ser leitura obrigatória. O tecnicismo influenciou as Leis 5540/68 que

regia o ensino superior I a 5692/71, que reorganizou o ensino de Io e 2o graus.

Pela Lei 5692/71, foi estruturado o Io grau com 8 anos de duração, sendo justapostos os 4

anos do antigo I grupo escolar e mais 4 anos do antigo ginásio, eliminando a barreira da

admissão ao ginásio. No 2o grau foi criada a profissionalização obrigatória. Os problemas

não foram resolvidos, a formação profissional foi um engodo, as escolas particulares

continuaram preparando para ai grandes universidades e a escola pública, com salas cada

vez mais superlotadas e com poucas verbas, também não cumpriu a finalidade.

Quanto a evasão e repetência, não houve diminuição através dos anos.

Com a construção de mais escolas, as pessoas mais pobres passaram a ingressar na escola

pública, que passou a trabalhar com um conteúdo pobre. As novas idéias foram

interpretadas de maneira errada pelos professores e especialistas, os conteúdos passaram a

não ter importância. Paralelamente as classes ficaram super lotadas, a escola tinha 4, 5 e até

Page 72: A Educação Brasileira no Contexto Historico

6 turnos e os professores, devido aos baixos salários, passaram a trabalhar 40,50,611 e até

70 horas por semana com alunos em sala de aula. li ido concorreu para ficar pior, apesar de

ter dado opor-111 n idade para estudo a uma faixa da população que antes n.u) freqüentava

a escola.

Com a aprovação da Lei 5540/68 houve a proliferação das faculdades particulares, dando

formação de curta 1111 ração em um ano e meio, cursos de fim de semana etc. I )s alunos

oriundos das camadas mais pobres que estudavam na escola pública passaram a pagar

escolas particulares e os alunos formados em escolas particulares e conteudistas garantiram

vagas na universidade pública.

As universidades públicas, com um corpo docente mais bem titulado, escolhendo os

melhores alunos da ndedade, passara a formar poucas pessoas por ano em Cada carreira. A

discriminação não foi corrigida. Classes Com poucos alunos e uma produção de teses

criticando os )',raus inferiores sem verificar a sua própria prática.

Quanto ao ensino de Io e 2o graus, os livros didáticos |.i vinham com respostas prontas para o

professor não cansar o que facilitava bastante, tendo em vista a jornada enorme de trabalho

com aluno, que inclusive dificultava .a qualificação e a atualização.

Com o passar dos anos, a escola que recebeu o pobre cm seu seio ficou mais pobre e se

transformou, sem jogo de palavras, em uma escola exclusiva para o pobre, com professores

mais pobres, inclusive em conhecimento.

PROPOSTAS PARA REFLEXÃO

Analise criticamente as mudanças ocorridas na sociedade brasileira nos anos 1950-1960.

Na área educacional quais foram as grandes mudanças ocorridas nos anos 1960-1970?

Faça uma reflexão sobre as mudanças feitas no ensino superior.

O que mudou no ensino com a Lei 5692/71?

Analise as propostas do tecnicismo e verifique os fundamentos epistemológicos.

Você concorda que a escola que acolheu o pobre ficou mais pobre, inclusive em

conhecimento? Explique ou argumente discordando.

Verifique quais transformações ocorreram em 1968, em diversos países, e quais fatores

colaboraram para tais acontecimentos.

Faça uma profunda reflexão sobre o ensino superior. Analise as faculdades públicas e

particulares.

Page 73: A Educação Brasileira no Contexto Historico

Procure verificar o que significa: exclusão, evasão, repetência e discriminação no contexto

educacional escolar.

A nossa escola atende com imparcialidade as diferentes camadas sociais?

Por que os problemas não são resolvidos? Até quando vamos ter uma escola para a elite e

outra para os "outros"?

Por que a universidade pública não abre mais cursos noturnos e não completa suas classes

com tanta gente procurando conhecimento? Por que não abrir para ouvintes vestibulares no

meio do ano? Verifique quantos alunos são formados por ano em uma faculdade pública que

você conhece. Ou faça uma pesquisa.

FEITURA COMPLEMENTAR

TEXTO I - NA JAUIA DO LEAO

Havíamos decidido voltar ao Brasil para reativar a Ação Popular como um instrumento de

luta contra os militares. A idéia da guerrilha se impunha progressivamente. Existia uma

ditadura militar, e as massas se opunham a ela. O único meio de mostrar a verdadeira face

da dita "revolução" era obrigar os militares a pegarem em armas. As massas se juntariam em

peso àqueles que lutassem de armas nas mãos. Uma rebelião nacional se generalizaria e

permitiria o triunfo sobre a ditadura. Com esse modelo na cabeça, retornamos ao Brasil.

Pouco importavam os governadores, os deputados, os dirigentes sindicais de antes: nada

disso subsistia. Nós nos encontrávamos diante de uma ocupação militar do país. A política

tradicional e institucional havia desaparecido. A única política viável eram as armas e o uso

da força. Esse esquema guiava a Ação Popular. Optamos pela guerrilha. Mas foi mais fácil

encontrar a opção do que tocá-la para frente. (...) O que tínhamos para enfrentá-los? Nem

armas, nem chicote; talvez um pedaço de pau. Como poderíamos declarar a guerra popular

às Forças Armadas Brasileiras se não dispúnhamos de armas? A declaração de guerra foi

suicida, pois nossos adversários acreditaram em nós. Se não tivessem levado tão ao pé da

letra nossa declaração, poderíamos ter prosseguido nossa louca aventura sem nenhum risco.

Mas eles nos levaram a sério, convencidos de que começaríamos uma guerra. De tempos em

tempos, aparecia uma máuser, um revólver, ou um de nós louco entre os dementes, se metia

a fabricar coquetéis molotov. Lastimável armamento. Enfim, nosso principal erro foi nos

concentrarmos exclusivamente nas cidades. Vivíamos uma completa loucura... A Ação

Popular decidiu enviar um grupo de militantes à China. Voltaram transformados. Um deles,

Jair Ferreira da Sá, travestiu-se de "camarada Dorival", futuro líder da revolução no Brasil e

Page 74: A Educação Brasileira no Contexto Historico

na América Latina. O " grupo chinês" tomou o controle da Ação Popular e, de um dia para o

outro, nos tornamos uma organização maoísta. Aquele período, eu estava em Cuba,

participando da Olas (Organização Latino-Americana de Solidariedade), organizada por

"Che" Guevara, que procurava reagrupar os núcleos guerrilheiros de toda a América Latina

para realizar a revolução continental. Fiquei lá durante um ano. Ao morrer em outubro na

cidade de Nancahuazú "Che" levou consigo a Olas para o túmulo, pois pareceu-me que

aquela organização servia de cobertura para sua guerrilha na Bolívia. Mas, ainda que os

cubamos pensassem a mesma coisa, não anunciaram oficialmente o enterro da

organização...

Certos questionamentos começaram a aparecer em meu espírito. Eu me incomodava ao ver

o quanto a política cubana havia sido milítarizada. As Forças Armadas estavam presentes

em tudo: da colheita da cana-de-açúcar ao aparelho de Estado, passando pelo Partido. Que

dificuldade manter e desenvolver um processo político com aquela disciplina militar!

(SOUZA, 1996, pp. 38-41)

TEXTO II - UM MODELO DE EXCLUSÃO CULTURAL

No Brasil, em especial, o processo histórico que é dado observar, e que vem do reformismo

desenvolvimentista e populista dos anos 50, pouco apto a enfrentar politicamente o

militarismo dos anos 60, desembocou nos anos 70 num sofisticado modelo de exclusão

cultural montado "lenta e gradualmente". Nessa fase, iniciativas educacionais tipo MEC/

USAID, por exemplo, entraram portas adentro, destruindo as incipientes linhas de liabalho

que vinham se estruturando: a universidade de Brasília, a experiência de alfabetização de I

'aulo Freire e os ensaios de ação cultural, as faculdades de filosofia como núcleo de

organização cultural etc.

(MOTA, 1978)

TEXTO III- DECRETO-LEI N°477/69

Art. Io - Comete infração disciplinar o professor, aluno, funcionário ou empregado de

estabelecimento de ensino público ou particular que:

I. alicie ou incite à deflagração de movimento que tenha por finalidade a paralisação de

atividade escolar ou participe nesse movimento;

II. atente contra pessoas ou bens tanto em prédio ou instalações, de qualquer natureza,

dentro de estabelecimento de ensino, como fora deles;

Page 75: A Educação Brasileira no Contexto Historico

III. pratique atos destinados à organização de movimentos subversivos, passeatas, desfile ou

comícios não autorizados, ou deles participe;

IV. conduza ou realize, confeccione, imprima, tenha em depósito, distribua material sub-

versivo de qualquer natureza;

V. seqüestre ou mantenha em caráter privado diretor, membro de corpo docente, funcionário

ou empregado de estabelecimento de ensino, agente de autoridade ou aluno;

VI. use dependência ou recinto escolar para fins de subversão ou para praticar ato contrário

à moral ou à ordem pública;

§ Io As infrações definidas nestes artigos serão punidas:

I. se se tratar de membro do corpo docente, funcionário ou empregado de estabelecimento

de ensino com pena de demissão ou dispensa, a proibição de ser nomeado, admitido ou

contratado por qualquer outro da mesma natureza, pelo prazo de cinco anos;

II. se se tratar de aluno, com pena de desligamento, e a proibição de se matricular em

qualquer outro estabelecimento de ensino pelo prazo de três anos.

§ 2o Se o infrator for beneficiário de bolsa de estudo ou perceber qualquer ajuda do Poder

Público, perdê-la-á, e não poderá gozar de nenhum desses benefícios pelo prazo de cinco

anos.

§ 3o Se se tratar de bolsista estrangeiro será solicitada a sua imediata retirada do território

nacional.

(DECRETO-LEI FEDERAL N° 477 de 26 de fevereiro de 1969

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