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MEGAFONE MEGAFONE Nepomuceno(MG), 24 de março de 2003 - Edição 1 - Copyleft(reprodução autorizada) NOJENTO ESPETÁCULO TELEVISIVO Otávio de Barros* Otávio de Barros* Todos, lamentavelmente, fazemos parte desta platéia global, que acompanha, passiva, esse vergo- nhoso e nojento ataque contra vi- das humanas. É como retornar ao tempo dos gladiadores, que fazi- am espetáculo de sangue na Roma antiga. A diferença, hoje, é que o poder da tecnologia tornou- se tão grandioso que o sangue der- ramado fica oculto entre os des- troços provocados pelos mísseis “inteligentes”. Isso a TV não mos- tra. E a platéia, antes limitada ao “reduzido” espaço do Coliseu, hoje ocupa lugares confortáveis, no aconchego do lar, nos quatros can- tos do planeta. Assistimos a cada detalhe, a cada movimento, a cada bomba lançada, tudo ao vivo, em cores, sentindo-nos privilegiados por assistir a esse nojento espetá- culo televisivo. Em outras épocas, os conflitos ar- mados aconteciam inesperadamen- te. Hoje, existe contagem regres- siva. Expectativa. Apostas de se- tores nobres da economia capita- lista, que na Nasdaq, a bolsa ele- trônica americana, comemoram às gargalhadas, excelentes desempe- nhos dos investimentos depois do início da “guerra”. De forma equivocada, a mídia cha- ma o ataque covarde dos Estados Unidos ao Iraque de guerra. Ata- que esse comandado por um lou- co que fraudulentamente chegou ao poder. Como podemos chamar de guerra uma invasão com for- ças tão desproporcionais? Onde estão as armas químicas e biológi- cas de Saddam, que justificaram o ataque americano? Poderíamos estar vivendo a melhor época da história da humanidade, mas o uso, de forma estúpida, das maravilhas tecnológicas para vene- ração ao poder do capital, banali- za a grandeza da vida humana. E nos deixa incertos quanto ao nos- so futuro, de nossos filhos, netos... Otávio de Barros é formando em jornalismo ([email protected]) Não há Não há por que se por que se preocupar preocupar Não há por que se preocupar (apesar da invasão do Iraque) o mercado está reagindo bem e o dólar continua estável. Não há por que se preocupar (apesar do Estados Unidos terem ignorado a ONU) as bolsas estiveram em alta hoje e um grande volume de ações foi negociado. Não há por que se preocupar (apesar da democracia estar afundada na lama) o preço do barril de petróleo não sofreu grande oscilação e os investidores estão confiantes. Não há por que se preocupar (apesar das mortes de crianças inocentes) a indústria armamentista vai ter um bom reaquecimento e a economia mundial não será prejudicada. (texto de Marcos Menezes, em www.rbc.org.br) Pensem nas crianças mudas, tele- páticas...” . E há crianças aguardan- do uma guerra, com suas luzes de morte e rastros de sangue. Sim, foi anunciada uma guerra, e nós precisamos melhor desempenhar o nosso papel. Não dissemos ainda que é uma insanidade o que os Estados Unidos e a Inglaterra anunciam: um ato que servirá apenas para demons- trar o quanto essas nações (mais ri- cas) desprezam os mínimos valores humanos. Nós, jornalistas conscientes, não po- demos – como têm feito outros – sim- plesmente reproduzir as versões que interessam aos senhores da guerra. A verdade que está sendo contada é somente meia-verdade, e, como toda meia-verdade, não passa de uma mentira. É preciso que os jornalistas se com- prometam com algo mais que a ver- são contada pelo ricos e poderosos deste planeta; é preciso que os cole- gas, também, reproduzam as vozes dos insatisfeitos, dos que não acei- tam essa guerra, e ainda daqueles que vão morrer! O jornalista, como cidadão, deve in- dignar-se com o que está acontecen- do. Não podemos aceitar que os Es- tados Unidos – a nação a mais beli- cosa do mundo; a que mais investe em armamentos; a que mais promo- veu invasões a outros países; a que mais pagou mercenários para ações terroristas; a única condenada pela ONU por terrorismo, continue com seu projeto de dominação mundial. Não podemos aceitar que uma na- ção – seja a Alemanha de Hitler ou, nos dias de hoje, os Estados Unidos – elabore e ponha em prática um programa de domínio do mundo sem que esbocemos uma reação de de- núncia dessa intenção. Não podemos aceitar que, sob o hipócrita argumen- to de que o Iraque está desenvolven- do armas de destruição em massa, o país que mais fabrica armas de des- truição no mundo queira impedir isso. A anunciada guerra contra o Iraque – um ex-aliado norte-americano que se tornou inimigo por querer ser in- dependente – é apenas um motivo para que os EUA ataquem e impo- nham à região o seu domínio. Não é outro o motivo. E, então, nós vamos ser parceiros dessa pretensão nazis- ta? A presença militar norte-americana no mundo aumentou em 20% depois do 11 de setembro. São 300 mil sol- dados em 140 países, velando pelo império dos Estados Unidos, que, hoje, já têm 20 guarnições militares na América Latina, divididas entre bases aéreas e de radar. A um custo estimado de US$ 337 milhões, elas abrigam ao todo 1.500 soldados. Deve-se incluir a base na Argentina, camuflada como centro de pesquisas para uso pacífico da ener- gia nuclear, e a que pretendem insta- lar no Brasil, em Alcântara (Maranhão), com a devida cumplici- dade do governo Fernando Henrique e do seu ministro da Ciência e Tecnologia, Ronald Sardenberg. Colegas: nós, jornalistas, temos um papel fundamental neste momento. Temos de mostrar a verdade por in- teiro, em suas muitas versões, e não apenas a cômoda e covarde versão do Departamento de Estado do go- verno norte-americano, que é unica- mente a quem a guerra interessa. Não podemos tratar essa chacina se- gundo uma falsa imparcialidade, que significa, isto sim, omissão e cumpli- cidade com os seus autores. Ao con- trário do que faz ver a cinematogra- fia oficial, não existe heroísmo numa guerra. Por isso, conclamamos aos colegas jornalistas a assumirem o dever de cidadãos, brasileiros, habitantes deste planeta, e renegar a guerra e seus propagadores. Devemos comentar sobre a guerra? Sim, devemos, mas no seu devido lugar: como um ato bárbaro, medieval, pelo qual uma nação poderosa, rica, quer impor seu mando sobre outra. Sim. Sejamos humanos e critiquemos a guerra. Se não o fizermos agora, em pouco tempo a História mostrará o papel desempenhado por quem ti- nha a obrigação de informar, mas, co- vardemente, posicionou-se do lado que iria vencer. E os mortos e inváli- dos dessa guerra, crianças e adul- tos, serão sempre uma lembrança no tempo: a certeza de que esses cole- gas também contribuíram com ela. Brasília, 12 de novembro de 2002. * Dioclécio Luz é jornalista e escritor “Devemos comentar sobre a guerra? Sim, devemos, mas no seu devido lugar: como um ato “Devemos comentar sobre a guerra? Sim, devemos, mas no seu devido lugar: como um ato bárbaro, medieval, pelo qual uma nação poderosa, rica, quer impor seu mando sobre outra.” bárbaro, medieval, pelo qual uma nação poderosa, rica, quer impor seu mando sobre outra.” Deoclécio Luz* Deoclécio Luz* Onde obter informações sobre o “outro lado” da in- vasão americana no Iraque: www.midiaindependente.org www.novae.inf.br www.rbc.org.br C

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Onde obter informações sobre o “outro lado” da in- vasão americana no Iraque: Nepomuceno(MG), 24 de março de 2003 - Edição 1 - Copyleft(reprodução autorizada) www.novae.inf.br www.rbc.org.br www.midiaindependente.org Otávio de Barros*OtáviodeBarros*

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MEGAFONEMEGAFONENepomuceno(MG), 24 de março de 2003 - Edição 1 - Copyleft(reprodução autorizada)

NOJENTO ESPETÁCULO TELEVISIVOOtávio de Barros*Otávio de Barros*

Todos, lamentavelmente, fazemosparte desta platéia global, queacompanha, passiva, esse vergo-nhoso e nojento ataque contra vi-das humanas. É como retornar aotempo dos gladiadores, que fazi-am espetáculo de sangue naRoma antiga. A diferença, hoje, éque o poder da tecnologia tornou-se tão grandioso que o sangue der-ramado fica oculto entre os des-troços provocados pelos mísseis“inteligentes”. Isso a TV não mos-tra. E a platéia, antes limitada ao“reduzido” espaço do Coliseu, hojeocupa lugares confortáveis, noaconchego do lar, nos quatros can-tos do planeta. Assistimos a cadadetalhe, a cada movimento, a cadabomba lançada, tudo ao vivo, emcores, sentindo-nos privilegiadospor assistir a esse nojento espetá-culo televisivo.Em outras épocas, os conflitos ar-mados aconteciam inesperadamen-te. Hoje, existe contagem regres-siva. Expectativa. Apostas de se-tores nobres da economia capita-lista, que na Nasdaq, a bolsa ele-trônica americana, comemoram àsgargalhadas, excelentes desempe-nhos dos investimentos depois doinício da “guerra”.De forma equivocada, a mídia cha-ma o ataque covarde dos EstadosUnidos ao Iraque de guerra. Ata-que esse comandado por um lou-co que fraudulentamente chegouao poder. Como podemos chamarde guerra uma invasão com for-ças tão desproporcionais? Ondeestão as armas químicas e biológi-cas de Saddam, que justificaram oataque americano?Poderíamos estar vivendo a melhorépoca da história da humanidade,mas o uso, de forma estúpida, dasmaravilhas tecnológicas para vene-ração ao poder do capital, banali-za a grandeza da vida humana. Enos deixa incertos quanto ao nos-so futuro, de nossos filhos, netos...

Otávio de Barros é formando emjornalismo([email protected])

Não háNão hápor que sepor que sepreocuparpreocupar

Não há por quese preocupar(apesar dainvasão doIraque)o mercado estáreagindo beme o dólarcontinua estável.Não há por quese preocupar(apesar doEstados Unidosterem ignorado aONU)as bolsasestiveram emalta hojee um grandevolume de açõesfoi negociado.Não há por quese preocupar(apesar dademocracia estarafundada nalama)o preço do barrilde petróleo nãosofreu grandeoscilaçãoe os investidoresestão confiantes.Não há por quese preocupar(apesar dasmortes decriançasinocentes)a indústriaarmamentista vaiter um bomreaquecimentoe a economiamundial não seráprejudicada.(texto de MarcosMenezes, emwww.rbc.org.br)

“Pensem nas crianças mudas, tele-páticas...”. E há crianças aguardan-do uma guerra, com suas luzes demorte e rastros de sangue.Sim, foi anunciada uma guerra, e nósprecisamos melhor desempenhar onosso papel. Não dissemos ainda queé uma insanidade o que os EstadosUnidos e a Inglaterra anunciam: umato que servirá apenas para demons-trar o quanto essas nações (mais ri-cas) desprezam os mínimos valoreshumanos.Nós, jornalistas conscientes, não po-demos – como têm feito outros – sim-plesmente reproduzir as versões queinteressam aos senhores da guerra.A verdade que está sendo contada ésomente meia-verdade, e, como todameia-verdade, não passa de umamentira.É preciso que os jornalistas se com-prometam com algo mais que a ver-são contada pelo ricos e poderososdeste planeta; é preciso que os cole-gas, também, reproduzam as vozesdos insatisfeitos, dos que não acei-tam essa guerra, e ainda daquelesque vão morrer!O jornalista, como cidadão, deve in-dignar-se com o que está acontecen-do. Não podemos aceitar que os Es-tados Unidos – a nação a mais beli-cosa do mundo; a que mais investeem armamentos; a que mais promo-veu invasões a outros países; a quemais pagou mercenários para açõesterroristas; a única condenada pelaONU por terrorismo, continue com

seu projeto de dominação mundial.Não podemos aceitar que uma na-ção – seja a Alemanha de Hitler ou,nos dias de hoje, os Estados Unidos– elabore e ponha em prática umprograma de domínio do mundo semque esbocemos uma reação de de-núncia dessa intenção. Não podemosaceitar que, sob o hipócrita argumen-to de que o Iraque está desenvolven-do armas de destruição em massa, opaís que mais fabrica armas de des-truição no mundo queira impedir isso.A anunciada guerra contra o Iraque– um ex-aliado norte-americano quese tornou inimigo por querer ser in-dependente – é apenas um motivopara que os EUA ataquem e impo-nham à região o seu domínio. Não éoutro o motivo. E, então, nós vamosser parceiros dessa pretensão nazis-ta?A presença militar norte-americanano mundo aumentou em 20% depoisdo 11 de setembro. São 300 mil sol-dados em 140 países, velando peloimpério dos Estados Unidos, que,hoje, já têm 20 guarnições militaresna América Latina, divididas entrebases aéreas e de radar.A um custo estimado de US$ 337milhões, elas abrigam ao todo 1.500soldados. Deve-se incluir a base naArgentina, camuflada como centro depesquisas para uso pacífico da ener-gia nuclear, e a que pretendem insta-lar no Brasil, em Alcântara(Maranhão), com a devida cumplici-dade do governo Fernando Henrique

e do seu ministro da Ciência eTecnologia, Ronald Sardenberg.Colegas: nós, jornalistas, temos umpapel fundamental neste momento.Temos de mostrar a verdade por in-teiro, em suas muitas versões, e nãoapenas a cômoda e covarde versãodo Departamento de Estado do go-verno norte-americano, que é unica-mente a quem a guerra interessa.Não podemos tratar essa chacina se-gundo uma falsa imparcialidade, quesignifica, isto sim, omissão e cumpli-cidade com os seus autores. Ao con-trário do que faz ver a cinematogra-fia oficial, não existe heroísmo numaguerra.Por isso, conclamamos aos colegasjornalistas a assumirem o dever decidadãos, brasileiros, habitantes desteplaneta, e renegar a guerra e seuspropagadores. Devemos comentarsobre a guerra? Sim, devemos, masno seu devido lugar: como um atobárbaro, medieval, pelo qual umanação poderosa, rica, quer impor seumando sobre outra.Sim. Sejamos humanos e critiquemosa guerra. Se não o fizermos agora,em pouco tempo a História mostraráo papel desempenhado por quem ti-nha a obrigação de informar, mas, co-vardemente, posicionou-se do ladoque iria vencer. E os mortos e inváli-dos dessa guerra, crianças e adul-tos, serão sempre uma lembrança notempo: a certeza de que esses cole-gas também contribuíram com ela.Brasília, 12 de novembro de 2002.* Dioclécio Luz é jornalista e escritor

“Devemos comentar sobre a guerra? Sim, devemos, mas no seu devido lugar: como um ato“Devemos comentar sobre a guerra? Sim, devemos, mas no seu devido lugar: como um atobárbaro, medieval, pelo qual uma nação poderosa, rica, quer impor seu mando sobre outra.”bárbaro, medieval, pelo qual uma nação poderosa, rica, quer impor seu mando sobre outra.”

Deoclécio Luz*Deoclécio Luz*

Onde obter informaçõessobre o “outro lado” da in-vasão americana no Iraque:

www.midiaindependente.org

www.novae.inf.br

www.rbc.org.br

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