18
179 Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. INOVAÇÃO, MUDANÇAS INSTITUCIONAIS E DESENVOLVIMENTO DO SETOR PESQUEIRO DO MUNICÍPIO DE VIGIA DE NAZARÉ, ESTADO DO PARÁ José Nazareno Araújo dos Santos * Ana Paula Vidal Bastos ** RESUMO A inovação é considerada por Celso Furtado e pela teoria neoschumpeteriana como importante instrumento de promoção do desenvolvimento, por provocar um dinamismo econômico capaz de transformar cenários sem qualquer perspectiva de mudança. Principalmente em regiões pouco desenvolvidas ou quase sem nenhum grau de desenvolvimento, como no município paraense de Vigia de Nazaré, e no setor industrial da pesca. Este município se destaca em relação aos demais municípios do Estado pela presença de empreendedores que vem liderando o processo de introdução de tecnologias na industrialização de pescado favorecendo não só o desenvolvimento sustentável da atividade como a inserção de trabalhadores no mercado formal de emprego. A adoção de inovações causa mudanças nos agentes públicos enrobustecendo as instituições ligadas à atividade. Observou-se um ambiente favorável à endogeneização do desenvolvimento local, e a possibilidade de se estender o modelo para as esferas estadual e regional. Palavras-chave: Inovação. Desenvolvimento local. Pesca-Vigia de Nazaré-Pará * Economista; Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA/UFPA). Professor Assistente de Economia do Instituto de Estudos Costeiros da Faculdade de Engenharia de Pesca da UFPA. Bragança-Pa. E-mail: [email protected] ** Doutora em Economia pela Universidade de Tsukuba, Japão. Professora Adjunta do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA/UFPA). Belém-PA. E-mail: [email protected]

C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

  • Upload
    ngodung

  • View
    213

  • Download
    1

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

179Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

INOVAÇÃO, MUDANÇAS INSTITUCIONAIS E DESENVOLVIMENTO DO SETOR PESQUEIRODO MUNICÍPIO DE VIGIA DE NAZARÉ, ESTADO DO PARÁ

José Nazareno Araújo dos Santos*

Ana Paula Vidal Bastos**

RESUMO

A inovação é considerada por Celso Furtado e pela teoria neoschumpeteriana como importanteinstrumento de promoção do desenvolvimento, por provocar um dinamismo econômico capaz detransformar cenários sem qualquer perspectiva de mudança. Principalmente em regiões poucodesenvolvidas ou quase sem nenhum grau de desenvolvimento, como no município paraense de Vigiade Nazaré, e no setor industrial da pesca. Este município se destaca em relação aos demais municípiosdo Estado pela presença de empreendedores que vem liderando o processo de introdução de tecnologiasna industrialização de pescado favorecendo não só o desenvolvimento sustentável da atividade comoa inserção de trabalhadores no mercado formal de emprego. A adoção de inovações causa mudançasnos agentes públicos enrobustecendo as instituições ligadas à atividade. Observou-se um ambientefavorável à endogeneização do desenvolvimento local, e a possibilidade de se estender o modelopara as esferas estadual e regional.

Palavras-chave: Inovação. Desenvolvimento local. Pesca-Vigia de Nazaré-Pará

* Economista; Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA/UFPA).Professor Assistente de Economia do Instituto de Estudos Costeiros da Faculdade de Engenharia de Pesca da UFPA.Bragança-Pa. E-mail: [email protected]

** Doutora em Economia pela Universidade de Tsukuba, Japão. Professora Adjunta do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos(NAEA/UFPA). Belém-PA. E-mail: [email protected]

Page 2: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 180

INNOVATION, CHANGE INSTITUCIONAL AND DEVELOPMENT OF THE FISHING SECTOROF THE CITY OF VIGIA OF NAZARÉ, STATE OF PARÁ

ABSTRACT

The innovation is considered by Celso Furtado and for the neoschumpeterian theory as importantinstrument of promotion of the development, have seen to provoke an economical dynamism beforecapable to change sceneries without any change perspectives, mainly in areas little developed oralmost without any development degree, as in the municipal district paraense of Vigia de Nazaré,especially in the industrial section of the fishing. This municipal district stands out in relation to theother municipal districts of the State for the entrepreneurs’ presence that is leading the process ofintroduction of new technologies in the fish industrialization favoring not only the maintainabledevelopment of the activity as the workers’ insert in the formal market of job. The adoption of innovationsis causing changes in the agent’s public nourishing the linked institutions to the activity. A favorableatmosphere was observed to the endogenous form of the local development, and the possibility ofcould extend the model for the state and regional spheres.

Key words: Innovation. Local development. Fishery - Vigia de Nazaré-Pará.

Page 3: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

181Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

1 INTRODUÇÃO

O processo de adoção de inovação comoinstrumento referencial de promoção dodesenvolvimento tornou-se importante naliteratura econômica por volta dos fins dos anos1970 e início dos anos 1980.

Esta questão ganhou dimensão no cenárioacadêmico não somente por sua capacidade demodificar os ambientes onde é introduzida, masprincipalmente pela disposição de dinamizar eimpulsionar o desenvolvimento econômico,aspecto que toma uma dimensão especial nateoria neoschumpeteriana.

É verdadeiro, também, que para odesenvolvimento econômico seja atingido, apartir do desenvolvimento e adoção de inovações,faz-se necessário uma pré-disposição local e istodecorre da formação de um ambiente favorável,onde haja instituições capazes de provocar oumesmo sustentar ações empreendedorasvoltadas para esse fim.

A atividade pesqueira do município deVigia de Nazaré tem na inovação um ponto de

atratividade de políticas institucionaisdirecionadas para a criação de um ambientefavorável ao processo de desenvolvimento dosetor o que coloca o município em lugar dedestaque no estado do Pará.

Isto leva a configurar um aglomeradoprodutivo local inovador (APLi), o qual poderáformar um ambiente institucional capaz de torná-lo sustentável ao longo do tempo e com elevadapossibilidade de desenvolvimento local.

Assim sendo, este artigo procura mostrartal processo, ressaltando questões que levam auma reflexão sobre os efeitos causados nadinâmica econômica local, bem como suaimportância como referência para políticaspúblicas que procure dinamizar a atividade noEstado como um todo. Além desta introduçãoapresenta duas seções sobre as discussõesteóricas no âmbito da inovação e dodesenvolvimento local, uma delas destaca o setorpesqueiro industrial vigiense, e as consideraçõesfinais, onde se apontam as principais questõesdiscutidas.

O desenvolvimento e a adoção de inovaçãomostra-se como um processo que requer umesforço dos diversos agentes envolvidos naatividade econômico, objeto da mudança. Emalguns casos, principalmente em locais onde odesempenho macro das forças produtivas ésubdesenvolvido, as dificuldades de implantaçãode novas formas de organização da produção ea criação de produtos podem tornar-se o estágiomais importante a ser superado.

Esta questão é tratada com elevado teor deimportância pela teoria neoschumpeteriana, a qual

tem como ponto central de análise o papel exercidopela inovação (tecnológica) e como o seu processode mudança acaba influenciando na dinâmica daatividade econômica capitalista (POSSAS, 1989;ROSENBERG, 2006). De acordo com Nelson e Winter(2005, p.39) “a preocupação central da teoriaevolucionária diz respeito aos processos dinâmicosque determinam conjuntamente os padrões decomportamento da firma e os resultados demercado ao longo do tempo”. O processo dedesenvolvimento sustentado pelo avançotecnológico, portanto, deve ocorrer endogenamenteàs estruturas produtivas.

2 O PAPEL DA INOVAÇÃO NA CONSTRUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO: BREVES REFLEXÕES

Page 4: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 182

A abordagem neoschumpeteriana, tendoas inovações tecnológicas como o cerne de suasdiscussões sobre desenvolvimento, buscainspiração nos fundamentos de Schumpeter àdinâmica capitalista ao mesmo tempo em quetenta mostrar os processos periódicos detransformação econômicos e institucionaiscondicionados pela evolução capitalista, sobdistintos níveis de intensidade e abrangência(POSSAS, 1989) e fazendo da firma capitalista aunidade de análise principal de sua elaboraçãoteórica (PAULA et al., 2001).

Entretanto, embora a firma seja de fato oagente desencadeador das mudançasparadigmáticas, decorrentes do processo deadoção e/ou desenvolvimento de inovações, éimportante se evidenciar que os aspectossocioinstitucionais e ambientais assumem umpapel relevante na conjuntura e da própriaconcepção do progresso técnico. Neste sentido,Pavitt (1984) chega à conclusão de que as origensdo progresso técnico estão vinculadas à presençade distintos setores industriais, bem como dasrelações existentes internamente entre os setorese destes com outras instituições.

Furtado (2000) no âmbito de discussão dainovação e o seu papel em relação aodesenvolvimento tem importantes pontoscomuns com os neoschumpeterianos,principalmente com a linha que discute ossistemas de inovação, que para promover odesenvolvimento precisa de suportes que atornem um poderoso instrumento detransformação social e local, os quais vão desdeaspectos econômicos aos sociais. É precisoenquadrar os agentes econômicos nas estruturasque permitem a realização do desenvolvimento.

Desta forma, a inovação é importante parapromover o desenvolvimento, pois parte de umaracionalidade humana que permite estabelecer umnovo estágio de sua evolução aflorando aspectos

da sua criatividade e resultando no que se chamaprogresso técnico, o qual é fruto da faculdadehumana para inovar, (FURTADO, 2000, p. 43).

É importante destacar que o processocriativo é fruto de uma capacidade humanamovida pela necessidade de acumular capitalprimeiramente, antes mesmo de se tornar umaforma de desenvolver recursos humanos, o que épeculiar à própria lógica do modo capitalista deprodução (FURTADO, 2000).

Os ganhos oriundos do progresso técnicopor parte dos agentes produtores podem se tornarextraordinários em virtude da dificuldade deimitação e ingresso ao mercado, dasustentabilidade do segredo industrial, nopatenteamento, no saber fazer e na ocorrênciada mudança técnica em economias dinâmicas deaprendizado (TAPIA; CAPDEVIELLE, 2002), o quereforça a condição dinâmica do progresso técnico(POSSAS, 1989) ao mesmo tempo em que revelaa complexidade do acesso e difusão da tecnologiaapresentada por Rosenberg (1976).

Nelson e Winter (2005) desenvolvem suaanálise evolucionista sobre o progressotecnológico enfocando uma contraposição aopensamento dominante no que tange aocomportamento da firma e dos mercados. Nestesentido, apontam dois pontos de ruptura com ateoria ortodoxa, onde destacam a essencialidadedo desequilíbrio e das assimetrias no processo demudança estrutural e de movimento, bem comoa presença da incerteza no ambiente de tomadade decisões capitalistas e no esforço inovador dasempresas, em virtude principalmente da adesãodos agentes à rotina (CAPDEVIELLE, 2002;POSSAS, 1989; TAPIA, 2002).

Isto reforça um dos pontos de reflexão deFurtado (2000) quando destaca que a rotina temum forte elo entre a acumulação de capital e ainovação, haja vista que esta inovação é fruto de

Page 5: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

183Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

uma racionalidade humana voltada principalmentepara atender necessidades que lhe são exógenas,mas ao mesmo tempo endógenas ao sistema. Aacumulação de capital é o seu objetivo finalísticoe as ações adotadas para sua promoção inovaçãotêm a intenção de torná-la rotineira.

As rotinas na visão de Nelson e Winter(2005) são consideradas como processosimportantes na compreensão da conduta dasempresas em um modelo evolutivo, haja vista que,aliadas a fatores estocásticos, acabam pordeterminar a própria mudança destas práticasreferentes ao comportamento das empresas. Esteesforço que as firmas fazem no sentido dainovação, alteração de suas rotinas denominadapelos autores de processo de busca deoportunidades presentes ou futuras,expectacionalmente, dado o contexto tecnológico,pois “(...) o resultado das buscas de hoje constituitanto uma nova tecnologia bem-sucedida comoum novo ponto de partida natural para as buscasde amanhã” (NELSON; WINTER, 2005, p.373).

Esse processo de busca das inovaçõesquando em interatividade com o de seleção irácompor, em um ambiente competitivo e demercado, o fundamento do quadro teóricoalternativo proposto pela abordagemevolucionista (KUPFER, 1996; POSSAS, 1989) sobo qual se dá o progresso tecnológico (PAULA etal., 2001).

A busca por inovações é parte de todo oprocesso do progresso tecnológico, uma vez quese complementa pelo processo de seleção, o qualtem o propósito de validar ou não uma inovaçãorealizada, através de uma implementação práticae de eventual difusão no mercado e/ou entreempresas concorrentes.

De acordo com Nelson e Winter (2005) parase entender mais profundamente as questões queenvolvem os efeitos causados pela introdução de

inovações em um dado segmento da economiafaz-se necessário distinguir os dois tiposexistentes onde algumas podem ser resultantesdas atividades de P&D das firmas com o setorem que atuam enquanto “outras podem assumir,em grande parte, a forma de materiais, decomponentes ou de equipamentos ofertadospelas firmas fornecedoras” (NELSON; WINTER,2005, p. 383).

Dosi (1984) apresenta sua contribuiçãoteórica a respeito do progresso da indústriacentrado nos fundamentos da chamada“concorrência schumpeteriana”, onde por meiodos padrões da mudança tecnológica analisa oprocesso de transformação e de dinâmica noambiente industrial.

Assim como Nelson e Winter (2005), oautor em destaque tem a concepção de que oprocesso de geração e difusão de inovaçõestecnológicas tem papel de reforçar e mesmo degestar mecanismos de dinâmica industrial, osquais são oriundos das assimetrias tecnológicase produtivas.

As assimetrias assumem importante papelno processo de dinâmica industrial em Dosi(1984), uma vez que conduz a uma transformaçãonos padrões industriais então existentes. É apartir, portanto, da existência de assimetrias quea dinâmica inovadora e industrial tem“sustentabilidade” e continuidade no âmbitoindustrial.

Isto é de certo modo representado no setorindustrial pesqueiro vigiense, o qual, apesar denão haver tendências generalizadas de inovaçãoe, portanto, de concorrência mais intensa, temna inovação tecnológica elementos de basemodificadores da estrutura produtiva do setor nolocal e por efeito refletido aos demais locais deatuação das empresas de pesca (a nível estaduale regional).

Page 6: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 184

A inovação, mais precisamente a inovaçãotecnológica1, tem papel precípuo na promoçãodo desenvolvimento econômico e a geração edifusão destas inovações é a forma depromoção, a qual exige acumulação deconhecimento e um ambiente propício para tal(TEECE, 2005).

O conhecimento e o aprendizado,portanto, passam a ter um papel central naconstrução deste espaço onde a interação entreos agentes econômicos acaba criandocondições para a promoção da dinâmicatecnológica em termos do local. Entretanto, aefetivação de uma ação inovadora, seja sob aforma de processo ou de produto e/ouconjugadamente, preestabelece um estágiomínimo de capacidade de recursos humanospara que se obtenham os resultadosprogramados. A própria ação inovadora nodecorrer de sua trajetória, da concepção aconcretização, contempla o aprendizado e oconhecimento dele resultante.

Nesta direção, estabelecendo que o ato deinovar resulte da dotação de técnicas, haja vistao objetivo fim seja a acumulação de capital,Furtado (2000, p.44-45) reforça a importância dacodificação do conhecimento, pois o homem aoagir com maior eficácia:

Dota-se de técnicas que, via de regra, ampliam

sua capacidade operativa mediante o uso de

instrumentos. Seja incorporando-se diretamente

ao saber do homem, seja sob a forma de

instrumentos, as técnicas somente se

transmitem mediante um processo de

acumulação. Portanto, o desenvolvimento da

capacidade do homem para agir (e para

produzir) funda-se num misto de inventividade

e acumulação.

Fica cristalino a partir desta orientaçãoteórica que o processo inovador apresenta umarelação recíproca com o ambiente de interação eprincipalmente com os seus atores, embora essamutação seja em grandes proporções limitadaàs necessidades impostas pelo capital dominante.Existem, portanto, fortes evidências na literaturaeconômica sob a projeção dos efeitos dinâmicosdo processo de adoção de inovação em umambiente geográfico delimitado.

A questão que envolve o espaço geográficoe suas características como foco importante nasdiscussões sobre desenvolvimento vem ganhandonovamente força no cenário acadêmico atual.Furtado (2000, p. 44), porém, vai além dosaspectos territoriais destacando a importância dese considerar as particularidades que envolvema sociedade local. “Para entender o processo de

Porém não deixa de ser algo muitopróximo à assimetria apresentada por Dosi(1984), pois torna a indústria pesqueira vigiense(por meio de sua empresa líder) umaassimiladora exclusiva, até que o mercadoselecione e passe a imitar, dos ganhos oriundosda inovação. Neste sentido, diz-se então que aadoção de práticas inovadoras revolucionáriasdos padrões vigentes coloca o inovador emsituação de vantagem competitiva no ambiente

de mercado, ampliando e reforçando suacondição de líder, impulsionando a dinâmicaeconômica.

Entretanto, é importante se frisar que oprocesso de adoção e desenvolvimento deinovações em regiões periféricas aos grandescentros é limitado e em alguns aspectos precárias,tornando mais complexa a internalização desseprocesso (CROCCO et al., 2006).

3 O LOCAL INFLUENCIADO PELO PROCESSO DE INOVAÇÃO

Page 7: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

185Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

inovação em uma cultura necessitamos inserir osagentes da criatividade nas estruturas sociais”.

Para tanto, torna-se inevitável oabarcamento das considerações acerca dadinâmica territorial (GALVÃO, 2002), o qual éfundamental para o entendimento de questõesespecíficas quanto a forma que toma certosdesdobramentos emergentes da adoção deinovações, uma vez que as diferençassocioespaciais são importantes nodesenvolvimento técnico-econômico daatualidade (ALBAGLI; MACIEL, 2004).

Neste sentido, o espaço local deve serobservado e considerado como “(...) um sistemade interações capaz de potencializar oaprendizado tecno-inovativo e de regular asdireções empreendidas pelos agentes” (GALVÃO,2002, p.42), onde a dinâmica interna do localtorna-se importante neste processo.

Isto é reforçado por Lall (2005) quandodestaca a importância do local no processo dedifusão de tecnologias e por extensão do própriodesenvolvimento. Nas palavras do autor “aimportação de tecnologia não é, porém, umsubstituto para o desenvolvimento de aptidõeslocais; a eficácia com a qual as tecnologias sãoutilizadas depende de esforços locais” (LALL,2005, p.35). A condução e o comportamento doambiente local condicionam o desempenho demecanismos implementadores de inovação, sejavia geração ou difusão.

O local acaba sendo impulsionado peloprogresso tecnológico a “reagir” àsnecessidades impostas pela mudança econômicaintroduzida a partir do âmbito produtivo daeconomia. Estas observações são apresentadasem literaturas mais recente que têm procuradoencontrar a importância da dimensão territorialna relação com os processos inovativos(GALVÃO, 2002).

Neste sentido destaca Lastres et al. (1999,p.53):

O foco de contribuições mais recentes neste

sentido, em particular na economia da inovação,

reside fundamentalmente na noção de que os

processos de geração de conhecimento e

inovação são interativos e localizados. Isto é,

argumenta-se que a interação criada entre

agentes localizados em um mesmo espaço

favorece o processo de geração e difusão de

inovações.

Lastres et al. (1999) e Crocco et al. (2006)corroboram o fato de que o desenvolvimento nãoé decorrente tão somente da implementação denovos processos de produção, mas sim da formacomo serão organizados em um ambiente local.

Desta forma se mostra um caminhoalternativo de análise das transformaçõesrecentes na produção e no território (MARTINS,2001). O território passa a ser incorporado comoelemento importante no desenvolvimento porquede acordo com o autor (2001, p. 49) “possui umaimportância fundamental, uma dimensão ativana constituição e evolução dos processosprodutivos”. Isto é possível em virtude dapotencialidade de integração e do dinamismosocial que o território pode representar, inclusivereforçando o processo muito destacado noâmbito da literatura econômica que é o dedesenvolvimento local.

Por isso, é necessário destacar que oprocesso de desenvolvimento deve ser feito dentrode limites territoriais os quais forcemendogenamente a criação de inovações quepermitam um ganho para seus criadores e aomesmo tempo inviabilizem o acesso imediato eem um mesmo grau dos demais agentes que seposicionam externamente, reforçando evalorizando os conhecimentos locais. OConhecimento é fruto do aprendizado e este

Page 8: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 186

aprendizado quando realizado de forma interativaacaba criando o processo de inovação, onde seenvolvem intensas junturas entre agentes distintos,o que necessita de novos formatos organizacionaisem rede (LEMOS, 1999), inclusive com oaparelhamento de instituições que o consolide.

Neste sentido Martins (2001) destaca quea abordagem neoschumpeteriana tem partido danoção do learning by interacting, consideradafundamental nesta abordagem, onde o territórioé abordado basicamente a partir de trêscategorias: as redes de empresas, os sistemas deinovação e a eficiência coletiva.

A este respeito destaca Martins (2001,p.79) que:

(...) a análise neoschumpeteriana das redes deempresa enfatiza os aspectos dinâmicos desses

arranjos, em termos de aglutinação de

competências para realizar a inovação. Já a

noção de sistemas de inovação [...] coloca a

ênfase na interação entre os diversos agentes

presentes em um território, o que evidencia um

grau de territorialização maior. A terceira noção

analisada, a de Eficiência Coletiva, enfatiza as

economias externas geradas pela clusterização,

e a ação coletiva deliberadamente realizada

pelas empresas do cluster.

O papel que o território representa naabordagem neoschumpeteriana vem ganhandoespaço importante nas discussões mais recentessobre desenvolvimento, pois o território, e porextensão, a dimensão local permite que se tenhauma compreensão melhor dos processosinovadores potencialmente geradores dedesenvolvimento local, em especial quando talespaço tem a capacidade de criação de umambiente inovador.

Em um aspecto mais geral pode-se dizerque os efeitos gerados localmente a partir dos

resultados obtidos com a inovação, em virtudeprincipalmente da forma como está organizadoeste território e como se dá a relação entre osagentes econômicos, portanto aspectossocioinstitucionais podem ser estendidos acoletividade e criando bases para que o processode geração e incorporação de inovações seja defato o promotor do progresso econômico.

Entretanto, é importante se destacar que nocaso de regiões localizadas marginalmente aoscentros mais evoluídos em termos de processostécnico-econômicos, em virtude do grau dedificuldade existente e face ao hiato técnicopresente as ações dos agentes econômicosestabelecidos no local tem precípua participaçãono intuito de se formar um ambiente propício aodesenvolvimento de mecanismos que o possainserir no mundo globalizado de forma a competirem condições de igualdade ou muito próxima dela.

Isto leva a reforçar a discussão de queembora as mudanças técnicas hodiernas tenhamavançado no sentido de tornar os diversosambientes mais próximos via incorporação deespaços econômicos marginais, nãonecessariamente os tornaram menos desiguaissociais e territorialmente. Desta forma, o localtem extrema importância na trajetória destainserção no mundo globalizado (ALBAGLI;MACIEL, 2004).

Estes efeitos identificados no município deVigia de Nazaré (PA) são causados localmente apartir do progresso industrial do setor pesqueiroaliado à geração e incorporação de inovações,os quais agregam elementos da participação dasinstituições como agentes colaboradores nesteprocesso, onde as instituições locais, bem comoaquelas externas, mas que atuam localmente,vêm sendo influenciadas pela conduta deste setormoldando assim suas políticas e utilizandomecanismos que tornem possível abarcar osdemais agentes da atividade municipal e ao

Page 9: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

187Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

Localizada a 96 km de Belém, o principalacesso ao município é feito via terrestre por meioda rodovia PA 140. Vigia de Nazaré é estratégicae privilegiadamente localizado às proximidadesdo Oceano Atlântico. Está situado na MesorregiãoNordeste Paraense e na Microrregião do Salgadolimitando-se com os municípios de São Caetanode Odivelas, Castanhal, Santo Antônio do Tauá eColares.

As principais atividades econômicas domunicípio de Vigia são: a pesca, a agricultura e ocomércio, responsáveis por grande parte dospostos de trabalho gerados no âmbito privadomunicipal ao mesmo tempo em que agregam umcontingente de trabalhadores com baixaqualificação e, portanto, com baixa remuneração.

A pesca assume um importante papel noconjunto das atividades que compõem aeconomia da Região Norte do Brasil, em especialporque é exercida em larga escala regional,estadual e local. O estado do Pará destaca-se naRegião apresentando os melhores resultadossocioeconômicos. O município paraense de Vigiade Nazaré tem na pesca sua mais importanteatividade econômica, a qual é responsável pelofuncionamento da economia do município,principalmente em seu aspecto formal2.

O gráfico a seguir permite visualizar o ritmodo crescimento da produção de pescado vigiensecomparado com o do estado do Pará, que em2004 recuou enquanto que a local permaneceuem crescente evolução crescente.

mesmo tempo promover a criação de umambiente mais favorável ao desenvolvimentosustentado da pesca.

As instituições ganham um importantepapel no processo de consolidação de um novoestágio produtivo possibilitando uma melhorestruturação da interação humana, seja noâmbito político, social ou econômico (NORTH,1998), haja vista que são moldadas pelainteração que existe entre os indivíduos e aomesmo tempo como resultado deste processo.Assim sendo, as instituições precisam

acompanhar o processo evolutivo das economiasnacionais, regionais e locais para estabelecer umambiente favorável as interações, pois asperformances alcançadas por estas economiasdevem-se à natureza de suas instituições acapacidade de inovar (AREND; CÁRIO, 2005) e éa partir do processo inovador que as elas semoldam tentando estabelecer um ambientecapaz de promover o desenvolvimentoeconômico, pois “as mudanças institucionais,assim como as tecnológicas, devem sercompreendidas como um processoevolucionário” (NELSON, 2006, p. 12).

4 INOVAÇÃO, MUDANÇAS INSTITUCIONAIS E IMPORTÂNCIA ECONÔMICA E SOCIAL NAPESCA DO MUNICÍPIO DE VIGIA DE NAZARÉ (PA)

Page 10: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 188

A produção pesqueira de Vigia de Nazaréapresentou uma trajetória de crescimento daprodução para o período de 1995 a 2004ininterruptamente atingindo, em 2004, aquantidade de 22.223,50t de pescado o quecorrespondeu a 24,98% da produção estadual.

As características da pesca em Vigia deNazaré têm um caráter bem peculiar e pode-se atribuir a elas boa parte das mudançasocorridas no setor. Apresentando-se em umaestrutura bipolar (industrial e artesanal) compredominância, em termos quantitativos, nosetor artesanal, responsável pelo maior volumede produção e de ocupações. Entretanto, éimportante destacar que neste segmentoexiste um predomínio da informalidade, ondeaproximadamente 80% do total dasocupações e dos estabelecimentos ligados àpesca estão enquadrados neste tipo de relaçãoeconômica.

Apesar de sua importância para aeconomia local, o setor artesanal é poucodinâmico e contribui infimamente para odesenvolvimento da atividade, sendo conduzidopelo desempenho do setor industrial, aliestabelecido, sendo o mais dinâmico3 em seusegmento, tanto em nível local quanto estadual,e quando conduzido por práticas inovadoras dáum outro ritmo de desenvolvimento para o local.

O setor industrial pesqueiro é tambémresponsável praticamente pela totalidade daindústria no município, assim como responde porelevada parcela dos empregos formais locais (em2006 foram registrados 545 empregos naindústria de pesca correspondendo a 30,1% dototal de empregos formais do município) o quetorna Vigia de Nazaré como o município paraensemais especializado na atividade pesqueira nosúltimos anos, conforme mostra a tabelasubseqüente.

Gráfico 1 - Evolução da produção física da pesca de Vigia de Nazaré – 1998 a 2004.Fonte: Santos (2007).

Page 11: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

189Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

Fonte: MTB/RAIS, 2008.

Esta posição tem justificação em virtudedo grau de formalidade que existe no setor tantolocal quanto em relação ao restante do Estado,pois é bastante considerável a participação dosempregos formalmente gerados na indústria depesca. Analisando especificamente o estoque deempregos da indústria local, percebe-se que aolongo da série analisada obteve-se umcrescimento continuado. Isto corrobora a situaçãoapresentada pelo setor pesqueiro industrialvigiense, o qual vem apresentando desempenhoprogressivo no mercado de seu segmento(SANTOS; CRUZ, 2006) ao mesmo tempo em quepromove mudanças na ossatura institucional emum patamar não observado até então.

O total de empregos formais domunicípio também vem apresentando

crescimento. Nos últimos três biênios registrou-se elevação, embora o biênio 2004-2005 tenharegistrado o maior índice 29,85%, período emque o setor industrial local sofreu maiordinamização. Para o período 2005-2006 ocrescimento foi da ordem de 7%, praticamentegerado pelo setor industrial. Houve um maiordinamismo e a nova postura da indústriapesqueira se traduziu em resultados positivospara a economia vigiense.

Em termos de estado, considerando-seisoladamente o setor industrial da pesca, Vigiade Nazaré responde por elevada parcela dosempregos formais. Em 2004, por exemplo,respondeu por nada menos que 45,59% dototal do Pará, conforme apresenta a tabelaseguinte:

Tabela 1 - Participação do emprego formal da indústria pesqueira vigiense sob os demais setores da economiamunicipal, 2000 a 2006.

Tabela 2 - Participação da indústria de pesca vigiense no emprego formal do setor no estado do Pará -2000 - 2006.

Fonte: MTB/RAIS, 2008.

Page 12: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 190

Em 2006, houve uma queda relativa naparticipação do emprego formal da pescaindustrial de Vigia de Nazaré em relação ao totaldo Estado, fato que pode ser atribuído às açõesgovernamentais, principalmente de caráterfederal, que induziram uma elevação do nível deempregos da pesca industrial no Pará, atingindoum índice de crescimento na ordem de 20%.

Percebe-se, entretanto, que no estado comoum todo, o setor mostra um baixo nível deempregos formais quando comparado a outrossetores da economia, fato decorrenteprincipalmente do baixo dinamismo apresentado,por grande parte das empresas que o compõem.Entretanto, destaca-se que no Brasil, considerandoo emprego formal do setor industrial da pesca noano de 2006, o estado do Pará respondeu por11% do total de empregos (Vigia de Nazaré com4,4%) sendo o terceiro mais importante, ficandoatrás de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Além de sua capacidade de agregargrande parte dos postos de trabalho, a pesca

industrial de Vigia de Nazaré assume um papelde destaque no cenário regional e estadual faceà postura adotada a partir de 1998 quandoapostou na inovação para alcançar um novoestágio e status em seu segmento. O grau dedesenvolvimento alcançado desde então épromissor e idiossincrático fato que torna omunicípio o centro de atenção de políticasvoltadas para o desenvolvimento sustentadoda pesca ao mesmo tempo em que surge noespaço local a formação de uma estruturainstitucional que busca criar um ambientefavorável à extensão de externalidadespositivas geradas com este momento da pescaindustrial vigiense.

O desempenho apresentado pelo setortem induzido a formação de um arranjoinstitucional robusto em sua composição e,pelo menos em termos de propostas, noprocesso de condução de políticas de que dêimpulso e sustentação à atividade nomunicípio, proporcionando-lhe uma novaconfiguração. (Figura 1)

Figura 1 - Configuração do APL(i) Pesca do Município de Vigia de Nazaré-PA.Fonte: Santos (2007).

Page 13: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

191Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

A postura apresentada pelo setor industrialpesqueiro vigiense e os efeitos causadosretrospectivamente e prospectivamente(HIRSCHMAN, 1985), embora este último aindaseja modesto localmente, provocaram a formaçãode um novo arranjo institucional capaz de atenderas necessidades surgidas com as mudançastécnicas implementadas. Neste sentido, a partirde 2004, o município vive um momento muitoparticular quando o poder público local criou umasecretaria específica (Secretaria de Pesca eAgricultura - SEPESCA) no sentido de dar suporteao setor como um todo e nos anos seguintes(2005 e 2006) o Governo Federal (SEBRAE eSEAP) e o Estadual (SAGRI, SEDUC e Banco doCidadão) promoveram a instalação de unidadesinstitucionais locais ao mesmo tempo em queimplementaram políticas públicas específicas afim de expandir as externalidades positivasgeradas localmente aos demais agenteseconômicos ligados à atividade.

Torna-se importante destacar que esteestágio alcançado pela pesca industrial é frutotambém da capacidade empresarial presenteno município de Vigia de Nazaré, onde os

moldes do empresário inovador deSchumpeter se fazem presente na conduçãodo processo de desenvolvimento do setor.Existe localmente uma empresa que sempreinova e assume a liderança na condução dapesca que a faz diferenciar de todas as outrasestabelecidas no arranjo e fora dele, estaduale regional.

Conforme apresentado no Quadro 1 odesenvolvimento de inovações é realizado comfreqüência, tanto em nível de produto quanto deprocesso, bem como nas ações comercial eorganizacional. Isto reforça a posição assumidapelo município de Vigia de Nazaré como foco deatenção das instituições condutoras de políticaspúblicas para a pesca. Particularmente, asinovações referentes a produtos, os quais, emborapossam existir em algum outro local (externo àregião norte), são cruciais e projetam o setor paraum novo estágio de desenvolvimento ao mesmotempo em que proporcionam uma redução dosesforços sobre o meio ambiente viabilizandomecanismos para a promoção de umdesenvolvimento sustentável e sustentado daatividade.

Page 14: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 192

Quadro 1 - Inovações adotadas pelas empresas no período de 2000 - 2005.Fonte: Santos (2007).Nota: adaptado a partir do questionário da REDESIST.

Em comparação com o setor no estado doPará tem-se que embora as empresas estejamconcentradas mais próximas aos centros dedesenvolvimento de pesquisas as inovações serestringem à melhoria de produtos já existentespara fins de adequação às exigências do mercado.Portanto, limitam-se as chamadas inovações deprocessos e pouco contribuem para o crescimentodo setor.

Com o intuito de reforçar a posição dedestaque e para melhor entender o que diferencia osetor pesqueiro industrial de Vigia de Nazaré com orestante do Estado, optou-se por pesquisar e analisarquatro das empresas do setor, isto é, àquelas commaior representatividade dentro do Pará4.

Procurou-se indagar a respeito dasinovações adotadas nos últimos anos e qual a

Page 15: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

193Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

finalidade dos processos de inovação. Comoresposta, várias foram às ações adotadas,variando de processos a produtos, na relação coma produção do pescado, entretanto, nenhuma emcaráter radical. Basicamente todas as açõesinovadoras foram de caráter incremental.

Todas as empresas pesquisadasresponderam ter realizado inovações quanto aprodutos, embora com limitadas melhorias, comopor exemplo, adequação de tamanho eembalagem. Não há por parte das empresasentrevistadas quem apresentasse lançamento deprodutos no mercado, ao mesmo tempo em quenão se constatou nas empresas a presença dosetor de P&D ou de desenvolvimento de outrasatividades. Todas as inovações adotadas emtermos de produto foram importadas tendo comoprincipal estratégia o atendimento do mercadocom qualidade e eficiência5.

Neste sentido, quando indagadas arespeito de inovações de processos também todaselas mostraram-se preocupadas com a questãodo enquadramento nas normas de qualidadeexigidas pelo mercado. 100% das empresasresponderam que detém um centro de controleda qualidade e que constantemente inovam nestedepartamento. Destarte, pode-se afirmar que ainovação ao mesmo tempo em que promovemudanças no cenário da principal atividadeeconômica local cria efeitos sobre toda a

economia em especial aumentando aparticipação do setor na geração de emprego erenda formal, além de referenciá-lo comoprincipal centro dinamizador da pesca no Estado.

Portanto, no caso específico de Vigia deNazaré, a evolução técnica está promovendomelhorias econômicas e sociais locais o queresulta em transformações no arcabouçoinstitucional existente no sentido de promovercom maior amplitude o desenvolvimento local.

Assim sendo a inovação reforça suacondição de força motriz do desenvolvimentoproporcionando para Vigia de Nazaré uma novadinâmica econômica e social. Este ponto leva auma reflexão sobre o desenvolvimento diantecondições endógenas tal como discutido porBarquero (2001) e Boisier (2005) ondetransformações de caráter econômico,organizacional, tecnológico, político einstitucional são decorrentes do comportamentodos atores locais e da utilização eficiente dosrecursos disponíveis, inclusive este destacando acontribuição face o processo de globalização.Portanto, a capacidade de organização social doambiente projeta o desenvolvimento em umsentido mais amplo assim o caracterizando comoendógeno. Entretanto, é válido lembrar que emVigia de Nazaré este processo está decorrendodo desempenho basicamente de um agente líder:uma empresa de pesca industrial.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento e a adoção deinovações fazem parte do cotidiano da principalempresa do setor da pesca no município de Vigiade Nazaré o que vem provocando mudançasimportantes na atividade, na economia e no local.

Portanto, um novo cenário se formou nosegmento da pesca como um todo, de modo

particular e mais dinâmico no setor industrial.Produtos e processos foram desenvolvidos eadotados afetando positivamente o mercado detrabalho local e minimizando os impactoscausados sobre o meio ambiente.

A adoção de inovações trouxe maiorcapacidade de competição do setor no mercado

Page 16: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 194

proporcionando elevação do volume de absorçãode mão de obra e da renda do trabalho direta eindiretamente. Sobre o meio ambiente, o impactodeu-se em virtude da redução do chamadoesforço de pesca, ao mesmo tempo em que sereduziu o descarte de resíduos antes devolvidosao rio. Espécies de baixo valor comercialpassaram também a ser aproveitadas gerandoum equilíbrio (ou reduzindo o déficit) na capturadaquelas de maior valor.

Face este desempenho e a emergência domunicípio como pólo inovador o setor público,tanto local quanto estadual e nacional, voltou-se para a possibilidade de consolidar ali umaespécie de modelo promotor de desenvolvimento.Neste sentido, um novo arranjo institucional foiformado, enrobustecendo e fortalecendo aspoucas instituições que estavam estabelecidaslocalmente.

Criou-se um ambiente favorável, porémcom ressalvas a promoção do desenvolvimento.

É preciso adotar políticas as quais visem atingirtodo o setor e sua respectiva cadeia produtivasem que haja isolamento de quaisquer etapas,no intuito de se evitar que ocorramfavorecimento e fortalecimento de fragmentoscapazes de por em risco o processo aliestabelecido.

As instituições precisam interferirpositivamente criando mecanismos paraviabilizar e fortalecer o setor pesqueiro vigiensepara torná-lo mais dinâmico e competitivo.Entretanto, torna-se necessário que o arranjoinstitucional ali estabelecido ultrapasse os limitesde sua condição física, presencial e estatutária eatue efetivamente.

É importante tornar o processoendogeneizado onde o desenvolvimento decompetências seja sempre estimulado nosentido de tornar o município de Vigia de Nazaréum local com uma atividade de pescasustentada.

NOTAS

1 Embora as chamadas inovações de processos, que não

necessariamente requer uma inovação de tecnologias,

tenham relevância não desprezível.

2 Embora haja uma evolução na formalização da atividade

e de seus desdobramentos o índice de informalidade é

elevado e a maior parte dos agentes envolvidos encontra-

se nesta condição

3 Em virtude de se buscar analisar os efeitos causados

formalmente na economia vigiense optou-se por

pesquisar as empresas que se encontram formalmente

estabelecidas e que também processam o peixe o

transformando em produto final. No caso específico do

município de Vigia de Nazaré duas foram as empresas

incluídas nestas condições e, portanto, as que foram

consideradas para análise deste estudo.

4 A opção por apenas quatro das empresas que atuam

no setor industrial da pesca do Pará deve-se

principalmente as similitudes na postura e no porte

da empresa líder do setor no município de Vigia de

Nazaré.

5 Aqui o termo tem sentido de adequação dos produtos as

exigências de seus consumidores/clientes.

Page 17: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

195Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

REFERÊNCIAS

ALBAGLI, S.; MACIEL, M. L. Informação e conhecimento na inovação e no desenvolvimento local. Ciência daInformação, Brasília,DF, v. 33, n. 3, p. 9-16, set./dez. 2004.

AREND, M.; CÁRIO, S. A. F. Instituições, inovações e desenvolvimento econômico. Florianópolis: UFSC,2005.

BARQUERO, A. V. Desenvolvimento endógeno em tempos de globalização. Porto Alegre: Fundaçãode Economia e Estatística, 2001.

BOISIER, S. Hay espacio para el desarrollo local en la globalización? Revista de la CEPAL, Santiago, n. 86,ago. 2005.

BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Relatório Anual de Informações Sociais (RAIS). Disponívelem: <http://www.mte.gov.br/rais>.Acesso em: 16 jan. 2008.

CROCCO, M.A. et al. Metodologia de identificação de arranjos produtivos locais potenciais. Nova Economia,Belo Horizonte, v. 16, n. 2, p. 211-241, maio/ago. 2006.

DOSI, G. Technical change and industrial transformation: the theory and an application to thesemiconductor industry. London: Macmillan, 1984.

FURTADO, C. Introdução ao desenvolvimento: enfoque histórico-estrutural. Rio de Janeiro: Paz e Terra,2000.

GALVÃO. A. P. O desenvolvimento local e a dimensão social da inovação. Rio de Janeiro: LABTeC/EPPG/UFRJ, 2002.

HIRSCHMAN, O. Desenvolvimento por efeitos em cadeia: uma abordagem generalizada. In: CARDOSO, F. H.;SORJ, B.; FONT, M. (Org.). Economia e movimentos sociais na América Latina. Rio de Janeiro: Brasiliense,1985.

KUPFER, D. Uma abordagem neo-schumpeteriana da competitividade industrial. Ensaios FEE, Rio de Janeiro,v.17, n. 1, p 355-372, 1996.

LALL, S. A mudança tecnológica e a industrialização nas economias de industrialização recente da Ásia:conquistas e desafios. In: KIM, L.; NELSON, R. Tecnologia, aprendizado e inovação: as experiências daseconomias de industrialização recente. Campinas: Unicamp, 2005.

LASTRES, H. M. M. et al. Globalização e inovação localizada. In: LASTRES, Helena M. M.; ALBAGLI, Sarita (Org.).Informação e globalização na era do conhecimento. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

LEMOS, C. Inovação na era do conhecimento. In: Informação e globalização na era do conhecimento.LATRES, Helena M.M.; ALBAGLI, Sarita (Org.). Rio de Janeiro: Campus, 1999.

MARTINS, H. E. P. Transformações recentes na produção e no território: uma abordagemneoschumpeteriana. Rio de Janeiro: UFRJ/IPPUR, 2001.

Page 18: C&D Vol VI Inovacao Mudancas Institucionais · PDF filePOSSAS, 1989; TAPIA, 2002). Isto reforça um dos pontos de reflexão de Furtado (2000) quando destaca que a rotina tem ... “concorrência

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 196

NELSON, Richard R. As fontes do crescimento econômico. Campinas: Editora da Unicamp, 2006.

NELSON, R. R.; WINTER, S. Uma teoria evolucionária da mudança econômica. Campinas: Unicamp,2005.

NORTH, D. C. Custos de transação, instituições e desempenho econômico. Rio de Janeiro: InstitutoLiberal, 1998.

PAULA, J. A. et al. Ciência e tecnologia na dinâmica capitalista: a elaboração neo-schumpeteriana e ateoria do capital. Belo Horizonte: UFMG/CEDEPLAR, 2001.

PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change. Research policy, Amsterdam, n. 13, p.343-373, 1984.

POSSAS, M. Em direção a um paradigma microdinâmico: a abordagem neoschumpeteriana. In: AMADEO, E.(Org.). Ensaios sobre economia política moderna. São Paulo: Marco Zero, 1989.

ROLL, E. História das doutrinas econômicas. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1972.

ROSENBERG, N. Perspectives on technology. Cambridge: Cambridge University, 1976.

______. Por dentro da caixa preta: tecnologia e economia. Campinas: Editora da Unicamp, 2006.

SANTOS, J. N. A.; CRUZ, A. G. Arranjo produtivo local da pesca: contribuições e possibilidades de uma novaetapa no ambiente econômico e institucional de Vigia de Nazaré – Pará. In: ENCONTRO NACIONAL DAASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESTUDOS REGIONAIS, 4., 2006, Foz de Iguaçu. Anais... Foz de Iguaçu, 2006.

______. Industrialização e inovação no setor pesqueiro vigiense: análise sobre as possíveiscontribuições para o desenvolvimento local. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento) -NAEA, UFPA. Belém, 2007.

SCHUMPETER, J. A teoria do desenvolvimento econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1985.

TAPIA, N.; CAPDEVIELLE, A. Corrientes y conceptos de la teoría evolucionista. In: TREVIÑO, Leonel Corona.Teorías económicas de la innovación tecnológica. México: Escola Superior de Economia, 2002.

TEECE, D. J. As aptidões das empresas e o desenvolvimento econômico: implicações para as economias deindustrialização recente. In: KIM, L.; NELSON, R. Tecnologia, aprendizado e inovação: as experiênciasdas economias de industrialização recente. Campinas: Unicamp, 2005.

TREVIÑO, L. C. Teorías económicas de la innovación tecnológica. México: Escola Superior de Economia,2002.