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GRAVEL ISSN 1678-5975 Dezembro - 2006 Nº 4 89-98 Porto Alegre Construção de um Modelo de Elevação Digital de Terreno para a Ilha dos Marinheiros, Rio Grande, RS, com uso de DGPS e Rotinas de Geoprocessamento Tagliani C.R.A. 1 ; Conterato M.R. 2 Antiqueira J.A.F. 1 ; Calliari L.J. 1 ; Tagliani P.R. 3 ; Soares M.N. 1 1 Departamento de Geociências - FURG 2 Departamento de Materiais e Construção - FURG 3 Departamento de Oceanografia - FURG RESUMO Este artigo apresenta as técnicas utilizadas para a geração de um modelo de elevação digital do terreno para a Ilha dos Marinheiros, Rio Grande, RS, Brasil. O modelo foi elaborado em um Sistema de Informações Geográficas a partir de pontos de controle geodésicos de alta precisão, coletados por um receptor GPS marca Ashtech, modelo ProMark 2. Tendo como ponto de partida o marco geodésico da Estação Naval do Rio Grande, foram materializados duas bases em pontos extremos da ilha, a partir das quais foram adquiridos os demais pontos. No pós-processamento os arquivos gerados no GPS foram descarregados em computador, separados por data de coleta e processados posteriormente. A determinação dos parâmetros de precisão do projeto para os pontos pós- processados na horizontal foi de 0,02 m + 1 ppm, e na vertical de 0,04 m + 2 ppm. Problemas ocasionados por comunicação com a rede de satélites e condições atmosféricas adversas inutilizaram parte dos dados coletados em campo. A falta de dados em alguns locais da ilha foi compensada pela digitalização manual no programa Surfer 8.0, utilizando com referência três camadas de informações: uma imagem de satélite de alta resolução (Ikonos), um mapa geomorfológico e um mapa de vegetação e uso atual do solo, todos precisamente georreferenciados a partir de 12 pontos de controle coletados com o DGPS. Em que pese os problemas ocorridos no levantamento de campo, considera-se que o levantamento altimétrico realizado com auxílio de DGPS é bastante vantajoso em relação aos métodos mais tradicionais. ABSTRACT This paper presents the methodology to generate a digital terrain model of Ilha dos Marinheiros, an island located in the estuary of Patos Lagoon in southern Brazil. The model was created in a Geographic Information System using precision control points collected by a Differential Global Position System (DGPS). The horizontal and vertical data of the official geodetic point existing at Rio Grande Naval Station were transferred to the island in order to set two new geodetic points located at extreme positions in the island (east and west), which were the base for the altimetric mapping of the whole study area. The precision parameters used in this project were 0.02 m + 1 ppm (pixel per meter) for horizontal data and 0.04 m + 2 ppm in the vertical data. Problems of connection between GPS system and satellites constellation due adverse meteorological conditions have disabled part of the acquired data. The lack of data in some portion of the island was solved by using digitized data in Surfer® software. These additional points were digitized taking as base the detailed knowledge of the area and three layers of information represented by a high resolution image, a geologic map and a land use map, all of them precisely georrefered with twelve control points collected with DGPS System. Although these problems have disabled part of the acquired data, the methods used have been quite advantageous in relation to the most traditional methods of altimetric mapping. Palavras chave: Sistema de Posicionamento Global, Modelo de Elevação Digital de Terreno, Gerenciamento Costeiro.

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GRAVEL ISSN 1678-5975 Dezembro - 2006 Nº 4 89-98 Porto Alegre

Construção de um Modelo de Elevação Digital de Terreno para a Ilha dos Marinheiros, Rio Grande, RS, com uso de DGPS e Rotinas de Geoprocessamento Tagliani C.R.A.1; Conterato M.R.2 Antiqueira J.A.F.1; Calliari L.J.1; Tagliani P.R.3; Soares M.N.1 1Departamento de Geociências - FURG 2Departamento de Materiais e Construção - FURG 3Departamento de Oceanografia - FURG

RESUMO Este artigo apresenta as técnicas utilizadas para a geração de um modelo de

elevação digital do terreno para a Ilha dos Marinheiros, Rio Grande, RS, Brasil. O modelo foi elaborado em um Sistema de Informações Geográficas a partir de pontos de controle geodésicos de alta precisão, coletados por um receptor GPS marca Ashtech, modelo ProMark 2. Tendo como ponto de partida o marco geodésico da Estação Naval do Rio Grande, foram materializados duas bases em pontos extremos da ilha, a partir das quais foram adquiridos os demais pontos. No pós-processamento os arquivos gerados no GPS foram descarregados em computador, separados por data de coleta e processados posteriormente. A determinação dos parâmetros de precisão do projeto para os pontos pós-processados na horizontal foi de 0,02 m + 1 ppm, e na vertical de 0,04 m + 2 ppm. Problemas ocasionados por comunicação com a rede de satélites e condições atmosféricas adversas inutilizaram parte dos dados coletados em campo. A falta de dados em alguns locais da ilha foi compensada pela digitalização manual no programa Surfer 8.0, utilizando com referência três camadas de informações: uma imagem de satélite de alta resolução (Ikonos), um mapa geomorfológico e um mapa de vegetação e uso atual do solo, todos precisamente georreferenciados a partir de 12 pontos de controle coletados com o DGPS. Em que pese os problemas ocorridos no levantamento de campo, considera-se que o levantamento altimétrico realizado com auxílio de DGPS é bastante vantajoso em relação aos métodos mais tradicionais.

ABSTRACT This paper presents the methodology to generate a digital terrain model of Ilha

dos Marinheiros, an island located in the estuary of Patos Lagoon in southern Brazil. The model was created in a Geographic Information System using precision control points collected by a Differential Global Position System (DGPS). The horizontal and vertical data of the official geodetic point existing at Rio Grande Naval Station were transferred to the island in order to set two new geodetic points located at extreme positions in the island (east and west), which were the base for the altimetric mapping of the whole study area. The precision parameters used in this project were 0.02 m + 1 ppm (pixel per meter) for horizontal data and 0.04 m + 2 ppm in the vertical data. Problems of connection between GPS system and satellites constellation due adverse meteorological conditions have disabled part of the acquired data. The lack of data in some portion of the island was solved by using digitized data in Surfer® software. These additional points were digitized taking as base the detailed knowledge of the area and three layers of information represented by a high resolution image, a geologic map and a land use map, all of them precisely georrefered with twelve control points collected with DGPS System. Although these problems have disabled part of the acquired data, the methods used have been quite advantageous in relation to the most traditional methods of altimetric mapping.

Palavras chave: Sistema de Posicionamento Global, Modelo de Elevação Digital de Terreno,

Gerenciamento Costeiro.

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INTRODUÇÃO

Atualmente, o fato de que a temperatura superficial média da Terra aumentou neste último século é amplamente aceito (IPCC, 2001), mas sua relação direta com a elevação do nível dos oceanos ainda é uma questão controversa e que suscita calorosos debates.

A linha de costa é uma das feições mais dinâmicas do planeta e sua flutuação em posição ocorre em várias escalas de tempo (diariamente, sazonalmente, em décadas, séculos e milênios). Na costa do Rio Grande do Sul, fenômenos erosivos em praias oceânicas e margens estuarinas são amplamente reportados na literatura (TOMAZELLI et al., 1996; TOMAZELLI & VILLWOCK, 1989; CALLIARI et al., 1996, 1998; SPERANSKI & CALLIARI, 2002), e suas taxas crescentes, com os respectivos efeitos nas atividades humanas, são motivos de preocupação no mundo todo. Independente das causas, as implicações econômicas, ambientais e institucionais dos efeitos do recuo da linha de costa tornam urgente a incorporação desta nova perspectiva no planejamento das atividades humanas em zonas costeiras, sendo necessário estabelecerem estratégias de respostas adaptativas ao fenômeno.

Um encontro do Inter-Governmental Panel on Climate Change (IPCC) realizado em 1990 em Perth, Austrália, considerou irrealista as opções “duras” (de engenharia) dentro do atual contexto econômico e social dos países em desenvolvimento, e conclui que há necessidade de aperfeiçoar o conhecimento básico dos processos nas zonas costeiras, desenvolver sistemas globais regionais e nacionais mais acurados para monitoramento e avaliação de impactos, identificar áreas costeiras críticas e ilhas em risco e considerar as vulnerabilidades em desenvolvimento e implementar respostas estratégicas (PERNETTA & ELDER, 1992).

No Brasil, o Ministério do Meio Ambiente pretende determinar os impactos das mudanças climáticas globais sobre os ecossistemas brasileiros, que possam resultar, entre outros, na identificação das tendências de alterações internas nos ecossistemas terrestres e dos efeitos da elevação do nível do mar sobre os ecossistemas naturais costeiros. Os dados obtidos irão compor um banco de dados inicial e

serão empregados em simulações na mensuração dos efeitos das mudanças climáticas globais sobre a biodiversidade brasileira, frente aos cenários climáticos futuros regionalizados. Esse esforço insere-se no conjunto de ações previstas no subprojeto financiado pelo Global Environmental Facility (GEF), dentro do Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira (PROBIO).

A enorme complexidade da rede de inter-relações do potencial de impactos exige dados e modelos que descrevam não somente os sistemas climáticos locais, mas também que descrevam previsões locais de climas futuros. Como as previsões regionais de clima podem não estar disponíveis nas próximas uma ou duas décadas, a prioridade será aperfeiçoar o conhecimento atual das zonas costeiras a nível local regional e global e assegurar a aquisição de dados compatíveis e mudar sistemas de coletas de dados atuais incompatíveis, para alimentar os modelos regionais que estão sendo desenvolvidos.

Dentro desse contexto, foi concebido um projeto de avaliação de impactos frente a cenários de elevação do nível do mar sobre a Ilha dos Marinheiros, estuário da Laguna dos Patos, RS, Brasil. Embora exista uma variedade de ecossistemas muito importantes nos entornos da região estuarina, a Ilha dos Marinheiros possui características que, no conjunto, a tornam especial no contexto da região. Entre estas, destacam-se a sua representatividade em área (40 km2), o significado cultural e científico, a população tradicional (pescadores, agricultores), a diversidade de ambientes (dunas, matas, terraços, marismas, lagoas) e o grande potencial turístico. Essas características possibilitam um estudo de caso representativo do problema em análise e que poderá servir de modelo para uma avaliação em toda a região estuarina.

Uma avaliação de vulnerabilidade procura atingir 3 objetivos principais: identificar o grau de risco futuro induzido por mudança climática e elevação do nível do mar, identificar setores-chave e área vulneráveis e fornecer parâmetros para elaborar estratégias adaptativas e sua implementação.

Para uma avaliação de vulnerabilidade frente a cenários de elevação do nível do mar são necessários, basicamente, dois tipos de informação: um diagnóstico ambiental detalhado e um modelo de elevação digital do terreno

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(MEDT). Um Sistema de Informações Geográficas (SIG) é uma ferramenta valiosa para tal tarefa, possibilitando modelar cenários, identificar áreas vulneráveis e auxiliar na formulação de políticas para lidar com os problemas antecipados.

Para estudos em zonas costeiras, os MEDT são focalizados em áreas que estão normalmente abaixo de 10 m de altitude e por isso precisam ser construídos com dados adquiridos a intervalos verticais pequenos, iguais ou menores que 1 m. Existem muito poucas áreas onde a zona costeira apresenta dados com esse grau de acuracidade vertical, o que torna imprescindível a sua geração através de técnicas de mapeamento topográfico de detalhe.

LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

O município de Rio Grande está

localizado na Planície Costeira do Rio Grande do Sul, entre as paralelos 31°47’02” e 32°39’45” de latitude Sul e entre os meridianos de 52°03’10” e 52°44’10” de longitude oeste. As principais vias de acesso terrestre ao município estão representadas pelas rodovias federais BR-392 (Pelotas - Rio Grande) e a BR-471 (Chuí - Rio Grande) e pela ferrovia da RFFSA. Por água, há vias navegáveis que dão acesso pela Laguna dos Patos e por via marítima até o Porto de Rio Grande.

A Ilha dos Marinheiros tem uma área de 40 km2, pertence ao segundo distrito de Rio Grande, e situa-se na posição central de uma grande enseada no estuário da Laguna dos Patos, uma região compreendida entre a barra do Rio Grande e uma linha imaginária ligando a ponta da Feitoria à ponta dos Lençóis (Fig. 1). A construção de uma ponte em 2001 proporcionou acesso via terrestre à Ilha dos Marinheiros através da estrada municipal RG250, a partir da Vila da Quinta.

OBJETIVOS

O objetivo desse trabalho é apresentar e

discutir a metodologia utilizada para geração do modelo de elevação digital de terreno da Ilha dos Marinheiros bem como os modelos gerados.

MATERIAIS E MÉTODOS Para a geração do MEDT é necessário a

obtenção de isolinhas de 1 em 1 m ou menos. Como essas informações não estão disponíveis nas cartas topográficas de maior detalhe existentes (DSG), é necessário obtê-las por algum meio.

Existem várias metodologias para isto, como por exemplo aquela baseada na superposição de imagens de satélite e estereoscopia, a partir dos quais, softwares específicos podem obter as informações de altimetria necessárias. Entretanto, tal técnica torna-se muito cara para análise de grandes áreas. Como pretende-se testar uma metodologia que possa ser aplicada futuramente para toda a região estuarina, optamos por realizar o estudo com auxílio de dados coletados diretamente em campo, através de um sistema de posicionamento global diferencial (DGPS).

Para materializar os pontos de controle geodésicos de alta precisão para a geração do MEDT, foi utilizado um receptor GPS marca Ashtech, modelo ProMark 2, de 10 canais e receptor L1, com precisão 0,005 m + 1 ppm (pixel por m) na horizontal -

maior ou menor

precisão dependendo do tempo de observação - e 0,010 m + 2 ppm na vertical - dependendo da distância da base ao ponto- tempo de coleta modo estático de 20 a 60 min, 2 canais de satélite WASS e EGNOS, horizonte mínimo de rastreamento = 10° - especificações fornecidas pelo fabricante. O receptor utilizou a superfície de referência geoidal do Woldwide Geoid Model (WGM96), o datum horizontal SAD-69 (South American Datum, 1969) e o sistema de coordenadas plano retangular UTM (Universal Transversa de Mercator), Zona 22, Meridiano Central 51. O pós-processamento foi realizado com a utilização do software Ashtec Solutions 2.6 dotado de algoritmos de combinação de observáveis (fase da portadora).

Os trabalhos de coleta de dados em campo foram realizados entre janeiro e junho de 2005. A aquisição dos pontos geodésicos teve sua origem no marco geodésico da Estação Naval do Rio Grande (ENRG), Quarta Secção da Barra, homologada pelo IBGE sob código 91715. A solução foi baseada em fase portadora L1 com o princípio do posicionamento relativo e posicionamento diferencial, com correção

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Figura 1. Localização da área de estudo.

diferencial obtida em pós-processamento com utilização de técnicas baseadas em suavização através da portadora, onde a correlação espacial entre o ponto de referência e os pontos a determinar, permitem a eliminação ou redução

substancial da maior parte dos erros de posicionamento.

Através do modo estático com inicialização na origem e taxa de gravação interna de 10 s, foram materializados os pontos Base1 e Base2 localizados respectivamente a

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nordeste e sudeste da ilha, com o tempo de rastreio de 60 min. De início, foi realizada a transferência do ponto geodésico da Base da Marinha para a Base1, com distância menor que 20 km e seqüencialmente, da Base1 para a Base2, com uma distância entre as bases menor que 10 km, seguindo os preceitos estabelecidos na Norma Técnica de Georreferenciamento e Transferência de Pontos (IBGE, 1983, 1989; INCRA, 2002).

O planejamento dos caminhamentos para a aquisição dos pontos de referência em campo foi realizado com o auxílio de uma imagem do satélite IKONOS, com resolução espacial de 4 m, de 29/11/2004. A estratégia utilizada foi a de realizar caminhamentos a pé, perpendiculares às margens, até ultrapassar a linha de dunas que circula quase que ininterruptamente toda a ilha. Posteriormente, foram realizados caminhamentos à cavalo segundo os eixos maiores e menores da ilha, pelo centro.

Para a aquisição da maioria dos pontos de referência principais foi utilizado o modo

Stop and Go com inicialização na base conhecida, taxa de gravação interna de 5 s e tempo de coleta de 60 s. Também foi utilizado o modo Cinemático com taxa de gravação interna de 5 s, para os mesmos pontos gerados no caminhamento percorrido pelo modo Stop and Go (como pontos de apoio), inicializados na base de referência e materializados com antena em movimento.

No pós-processamento os arquivos gerados no GPS foram descarregados em computador, separados por data de coleta e processados posteriormente. A determinação dos parâmetros de precisão do projeto para os pontos pós-processados na horizontal foi de 0,02 m + 1 ppm, e na vertical de 0,04 m + 2 ppm.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os pontos principais obtidos pela

transferência do marco geodésico da ENRG para as bases instaladas na Ilha dos Marinheiros foram (Tab. 1).

Tabela 1. Identificação pontos: Base1, Base2. ID

Ponto Posição UTM

(E) Posição UTM

(N) Altitude Ort.(m) Localização (Descrição)

Base1 395938,501 6459753,503 5,328 Primeira base gerada próximo à igreja da Marambaia.

Base2 387455,581 6456217,778 4,607 Segunda base gerada próximo à ponte de entrada da ilha.

A quantidade de pontos captados nos

modos Stop and Go e Cinemático para a constituição do modelo de elevação digital do terreno atingiram um total de 2.564, com a

média nas posições menores que 0,05 m, atendendo, portanto a 1ª edição da Norma Técnica Para Georreferenciamento (Tab 2).

Tabela 2. Precisão dos pontos coletados.

Posições

Erro Mínimo Observado (Com

95% de Confiabilidade)

Erro Máximo Observado (Com

95% de Confiabilidade)

Erro Médio Observado (Com

95% de Confiabilidade)

Desvio Padrão dos Erros Observados

(Com 95% de Confiabilidade)

Latitude UTM (E) 0,012 m 0,092 m 0,030 m 0,009 m

Longitude UTM (N) 0,012 m 0,098 m 0,042 m 0,015 m

Altitude Ortométrica

(m) 0,027 m 0,098 m 0,066 m 0,015 m

Apesar da quantidade de pontos obtidos

pelo levantamento de campo ser relativamente grande para fins de geração do MEDT (média de 65 pontos por km2) a distribuição dos pontos não

foi uniforme, estando concentrada nos terraços lagunares entre a estrada (tracejada) e as margens (Fig. 2).

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Figura 2. Distribuição dos pontos cotados obtidos pelo DGPS.

Essa concentração foi proposital uma

vez que essa faixa caracteriza-se por ser uma área plana, com uma suave pendente até o nível d’água, e é onde os efeitos de uma possível subida do nível do mar teriam os maiores impactos já que concentra toda a atividade agrícola do local, além de abrigar mais de 900 residências e toda a infra-estrutura existente. O centro da ilha é desabitado e abriga um extenso campo de dunas.

Entretanto, após o processamento dos dados em escritório, uma grande quantidade de pontos não pode ser utilizada em função dos erros de posicionamento gerados por problemas de perda de sinal e presença de nuvens. Assim, algumas áreas nos terraços lagunares ao norte e noroeste da ilha ficaram carentes de dados. Para contornar essa situação, a partir de um mapa georreferenciado tendo a imagem Ikonos como base, foram superpostas alternadamente duas layers (unidades geomorfológicas e vegetação e uso atual) sobre as quais foi realizada a digitalização de pontos de apoio, através do software Surfer 8.0.

O procedimento levou em consideração os 2.564 pontos coletados com erro médio abaixo dos limites da norma correspondente, os limites entre os três terraços existentes (Fig. 3), o conhecimento do local e a interpretação auxiliada pelo mapeamento do uso atual da terra (Tagliani et al., 2006) (Fig. 4). No total foram digitalizados cerca de 2.500 pontos adicionais, sendo que a grande maioria foi digitalizada nas áreas centrais da ilha, no campo de dunas, uma área virtualmente fora da influência dos cenários de elevação do nível do mar a serem modelados, com o objetivo apenas de tornar o modelo mais próximo da situação real nessa área (Fig. 5).

Os pontos adicionais digitalizados nas áreas dos terraços lagunares tiveram como base os pontos coletados com o DGPS nas imediações e, considerando a regularidade e monotonia do relevo essencialmente plano, foram considerados como válidos para a construção final do modelo de elevação digital.

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Figura 3. Arquivo vetorial das unidades geomorfológicas sobre imagem Ikonos.

Figura 4. Mapa de Vegetação e Uso Atual.

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Figura 5. Distribuição dos pontos cotados obtidos pelo DGPS (vermelho) e pela digitalização no programa

Surfer 8.0 (azul).

O arquivo de pontos final foi gravado no formato ASCII Data (*.txt) para que pudesse ser usado diretamente pelos softwares que geraram o MEDT.

Primeiramente foi gerado um MEDT pelo método Kriging do software Surfer 8.0., um método geoestatístico muito útil para determinação de grades regulares. O método leva em conta as tendências sugeridas pelos dados de campo, de maneira que pontos elevados podem ser conectados em uma crista ao invés de linhas de contorno tipo “olho-de-boi” isoladas. O método fornece uma excelente representação em 3 dimensões do terreno, além de permitir cálculos rápidos e precisos de volumes e áreas. Entretanto, o Surfer 8.0 não é um SIG e portanto, não é um sistema muito adequado para realizar análises uma vez que as relações espaciais não são definidas na estrutura de dados.

Assim, um segundo modelo de elevação foi gerado no SIG Idrisi Kilimanjaro (Fig. 6), visando a futura avaliação de impacto da subida do nível do mar sobre os recursos

naturais e atividades socioeconômicas da Ilha dos Marinheiros. O modelo foi gerado através da interpolação de uma superfície completa a partir de dados de pontos (rotina INTERPOL), um método que utiliza a média ponderada das distâncias e que preserva os valores dos dados amostrais, sendo por isso uma técnica de interpolação exata.

A análise do modelo mostra que os terraços lagunares que margeiam a Ilha dos Marinheiros são áreas muito planas com um declive muito suave desde o cordão de dunas que circunda a ilha até as margens. A linha d’água está a 2,3 m em relação ao nível médio do mar e a estrada foi construída em uma cota aproximadamente a 1 m desse nível. As áreas agrícolas ocupam predominantemente o terraço lagunar 4 (LONG, 1989) com cotas variando entre 2,5 a 3,5 m acima do nível médio. A maioria das dunas do centro da ilha tem alturas em torno de 12 m, enquanto os campos arenosos de suas imediações situam-se em cotas próximas de 6 m.

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Figura 6. Modelo de Elevação Digital de Terreno da Ilha dos Marinheiros gerado pelo SIG Idrisi kilimanjaro,

vista ortogonal. CONCLUSÕES

O método utilizado para levantamento

dos dados de campo mostrou-se bastante vantajoso em relação aos métodos mais tradicionais de levantamento altimétrico. Entre as vantagens de utilização do equipamento pode-se apontar:

1. Rapidez de coleta dos dados (60 s por ponto); 2. Necessidade de apenas uma pessoa para coleta dos pontos; 3. Facilidade de deslocamento pelo terreno, que pode ser realizada a pé, motorizado, a cavalo, ou qualquer outro meio de transporte; 4. Possibilidade de determinação da precisão desejada na horizontal e vertical; 5. Possibilidade de eliminação de pontos com erro fora da precisão determinada; 6. Possibilidade de programação antecipada (via internet) dos trabalhos de campo, em função da quantidade de nuvens que podem interferir na recepção do sinal.

A principal desvantagem do uso do DGPS para o trabalho de campo realizado na Ilha dos Marinheiros foi o fato de que, em dias nublados, a coleta de dados fica bastante prejudicada, seja pela perda do sinal do aparelho DGPS com a constelação de satélites orbitais,

seja pelos erros inseridos nos dados coletados nessas condições atmosféricas. Devido a isso, uma quantidade muito grande de dados de campo não pôde ser utilizada para a geração do MEDT. Assim, em locais como a Planície Costeira do Rio Grande do Sul, os trabalhos de campo devem ser realizados preferencialmente nos meses de verão, época de pouca nebulosidade geralmente.

A solução utilizada para compensar a perda de dados, com a digitalização de pontos adicionais no software Surfer 8.0, foi muito útil e fácil de ser implementada. Entretanto, isso só foi possível devido a grande familiaridade com a área de estudo, o tamanho relativamente reduzido da área e a regularidade topográfica do terreno ao longo das margens, resultado da sua origem a partir de terraços lagunares holocênicos.

A combinação de técnicas avançadas de Sistema de Informação Geográfica com entrevistas de campo e dados censitários permitiu inferir para a Ilha dos Marinheiros, de forma bastante simplificada, diferentes custos econômicos e sociais associados a efeitos de simples elevação de nível da Lagoa dos Patos, sem considerar a complexa cadeia de efeitos associados a esse processo. Adicionalmente, permitiu modelar facilmente as áreas impactadas em diferentes cenários, quantificar perdas de

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habitat e definir áreas de maior risco. Um estudo como esse pode ser reproduzido em qualquer localidade costeira com relativa facilidade.

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