Curso Gestão por Competências

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    CURSO

    GESTO POR COMPETNCIAS

    BRASLIA (DF)MAIO DE 2009

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    Curso Gesto por Competncias

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    SUMRIO

    PROGRAMA DO CURSO .................................................................................. 02O QUE GESTO POR COMPETNCIAS?(BRANDO,2005)............................. 06

    CAUSAS E EFEITOS DA EXPRESSO DE COMPETNCIAS NO TRABALHO(BRANDO &BORGES-ANDRADE,2007)........................................................ 14

    MTODOS E TCNICAS PARA MAPEAMENTO DE COMPETNCIAS(BRANDO &BAHRY,2005)........................................................................... 28

    TRILHAS DE APRENDIZAGEM COMO ESTRATGIA PARADESENVOLVIMENTO DE COMPETNCIAS (FREITAS &BRANDO,2005).......... 41

    DECRETO N 5.707, DE 23 DE FEVEREIRO DE 2006........................................... 60

    PORTARIA N 208, DE 25 DE JULHO DE 2006.................................................... 65

    GESTO DE PESSOAS POR COMPETNCIAS:OCASO SABESP ........................... 68

    APRESENTAO IMPRESSA.............................................................................. 78

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    CURSO GESTO POR COMPETNCIAS

    1. Objetivos de Aprendizagem:

    Ao final do curso, espera-se que os participantes sejam capazes de:

    Discutir conceitos, dimenses e tipos de competncias;

    Descrever conceitos, pressupostos, propsitos e processos inerentes gestopor competncias;

    Identificar relaes de interdependncia entre estratgia organizacional,aprendizagem, competncia e desempenho;

    Descrever as implicaes do Decreto 5.707, de 23/02/2006, sobre o processo dedesenvolvimento de competncias individuais na Administrao Pblica;

    Descrever a importncia e o propsito do mapeamento de competncias;

    Formular descries de competncias institucionais e de competncias individuais;Descrever mtodos e tcnicas de pesquisa aplicadas ao mapeamento decompetncias relevantes para a organizao;

    Identificar competncias relevantes a diferentes contextos, propsitos, papisocupacionais e organizaes; e

    Planejar o mapeamento de competncias.

    2. Contedo

    A noo de competncia;Dimenses da competncia individual: conhecimentos, habilidades e atitudes;

    Da competncia individual competncia coletiva;

    A competncia nos diferentes nveis organizacionais;

    Tipos de competncia;

    Pressupostos, objetivos e etapas da gesto por competncias;

    Relaes entre estratgia organizacional, aprendizagem, competncia e desempenho;

    Aprendizagem formal como estratgia para desenvolvimento de competncias;

    O Decreto 5.707, de 23/02/2006, e suas implicaes;Experincias de gesto por competncias no setor pblico;

    O mapeamento como etapa fundamental da gesto por competncias;

    Etapas e aplicaes do mapeamento de competncias;

    Descrio de competncias institucionais e de competncias individuais;

    Cuidados metodolgicos, condies e critrios associados descrio de competncias;

    Mtodos e tcnicas de pesquisa aplicadas ao mapeamento de competncias:anlise documental, observao, entrevista, grupo foco e questionrio;

    Exemplos de mapeamento de competncias no setor pblico;Instrumentos para identificao de competncias existentes na organizao; e

    Aspectos relevantes para planejar o mapeamento de competncias.

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    3. Carga horria

    24 horas/aula.

    4. Metodologia

    Exposies dialogadas e participativas, com utilizao de exemplos ilustrativos, debates,discusses em grupo, filme e exerccios. Utilizar-se- como recursos audiovisuais de apoio aprojeo de slides (em powerpoint) e de filme em DVD. As sesses sero programadas parafuncionar como um espao de aprendizagem coletiva, buscando-se a integrao entre a teoriae a prtica. Em algumas sesses, os participantes sero divididos em grupos de 4 ou 5integrantes cada, para estudo, discusso e soluo de exerccios. Os alunos seroincentivados reflexo, visando correlacionar os conceitos abordados na oficina ao dia-a-diadas organizaes.

    5. Bibliografia Recomendada

    Os conceitos e proposies abordados esto baseados nas seguintes obras:

    BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; ABBAD, Gardnia; MOURO, Luciana (Org.).Treinamento, desenvolvimento e educao em organizaes e trabalho:

    fundamentos para a gesto de pessoas. Porto Alegre: Ed. Artmed/Bookman, 2006.

    BRANDO, Hugo Pena. Aprendizagem, contexto, competncia e desempenho: um

    estudo multinvel. Tese de Doutorado (Psicologia do Trabalho e das Organizaes) Universidade de Braslia, Depto. Psicologia Social e do Trabalho, Braslia, 2009.

    BRANDO, Hugo Pena; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo. Causas e efeitos daexpresso de competncias no trabalho: para entender melhor a noo decompetncia.Revista de Administrao MackenzieRAM, v.8, n.3, p.32-49, 2007.

    BRANDO, Hugo Pena; BAHRY, Carla Patricia. Gesto por competncias: mtodos etcnicas para mapeamento de competncias. Revista do Servio Pblico RSP,Braslia, v. 56, n. 2, p. 179-194, 2005.

    BRANDO, Hugo Pena; GUIMARES, Toms de Aquino. Gesto de competncias egesto de desempenho: tecnologias distintas ou instrumentos de um mesmoconstructo? Revista de Administrao de Empresas RAE, So Paulo, v.41, n.1,p. 08-15, 2001.

    CARBONE, Pedro Paulo; BRANDO, Hugo Pena; LEITE, Joo Batista Diniz;VILHENA, Rosa Maria. Gesto por competncias e gesto do conhecimento.Rio de Janeiro: Ed. Fundao Getlio VargasFGV, Srie Gesto de Pessoas, 2005.

    CASTRO, Pedro M. R.; BORGES-ANDRADE, Jairo E. Identificao das necessidades decapacitao profissional: o caso dos assistentes administrativos da Universidade de

    Braslia.Revista de Administrao - RAUSP, v. 39, n. 1, p. 96-108, 2004.

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    DURAND, Thomas. Forms of incompetence. Proceedings of the Fourth InternationalConference on Competence-Based Management. Oslo: Norwegian School ofManagement, 1998.

    DUTRA, Joel Souza. Competncias:conceitos e instrumentos para a gesto de pessoasna empresa moderna. So Paulo: Atlas, 2004.

    FLEURY, Maria Tereza L.; FLEURY, Afonso C. Correia. Alinhando estratgia ecompetncias.Revista de Administrao de EmpresasRAE, So Paulo, v. 44, n. 1,p. 44-57, 2004.

    FREITAS, Isa Aparecida; BRANDO, Hugo Pena. Trilhas de aprendizagem comoestratgia para desenvolvimento de competncias.Anais do 29 Encontro Anual da

    Associao Nacional dos Programas de Ps-graduao em Administrao ENANPAD. Braslia: ANPAD, 2005.

    GONCZI, Andrew. Competency-based learning: a dubious past an assured future? In:BOUD, D. & GARRICK, J. (Org.). Understanding learning at work. London:Routledge, 1999. Cap. 12, p. 180-194.

    GUIMARES, Toms de Aquino; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; MACHADO,Magali S; VARGAS, Miramar R. Forecasting core competencies in an R&DEnvironment.R&D Management Review, v. 31, n. 3, p. 249-255, 2001.

    GUIMARES, Toms de Aquino; BRUNO-FARIA, Maria de Ftima; BRANDO, HugoPena. Aspectos metodolgicos do diagnstico de competncias em organizaes. In:

    BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; ABBAD, Gardnia; MOURO, Luciana(Org.). Treinamento, desenvolvimento e educao em organizaes e trabalho: fundamentos para a gesto de pessoas. Porto Alegre: Artmed/Bookman, 2006.Cap. 11, p. 216-230.

    LE BOTERF, Guy. Desenvolvendo a competncia dos profissionais. Porto Alegre:ArtMed/Bookman, 2002.

    MAGER, Robert F.Preparing instructional objectives: a critical tool in the developmentof effective instruction. Belmont (EUA): Fearon-Pitman Publishers, 1990.

    NISEMBAUM, Hugo.A competncia essencial. So Paulo: Ed. Infinito, 2000.PIRES, Alexandre Kalil et al. Gesto por competncias em organizaes de governo.

    Braslia: Ed. Escola Nacional de Administrao PblicaENAP, 2005.

    SANTOS, Armando Cuesta. O uso do mtodo Delphi na criao de um modelo decompetncias.Revista de Administrao - RAUSP, v. 36, n. 2, p. 25-32, 2001.

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    O QUE GESTO POR COMPETNCIAS?1

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    BRANDO, Hugo Pena. O que gesto por competncias? (captulo). In: PIRES, AlexandreKalil (org.). Gesto por competncias em organizaes de governo. Braslia: Ed. Escola Nacionalde Administrao PblicaENAP, p.13-22, 2005.

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    O QUE GESTO POR COMPETNCIAS?2

    SOBRE A

    NOO DE

    COMPETNCIA

    No fim da Idade Mdia, a expresso competncia era associada essencialmente

    linguagem jurdica. Dizia respeito faculdade atribuda a algum ou a uma instituio paraapreciar e julgar certas questes. Por extenso, o conceito de competncia veio a designar oreconhecimento social sobre a capacidade de algum pronunciar-se a respeito de determinadoassunto e, mais tarde, com o advento daAdministrao Cientfica3, passou a ser utilizado paraqualificar o indivduo capaz de realizar determinado trabalho (Isambert-Jamati, 1997).

    A preocupao das organizaes em contar com indivduos capacitados para odesempenho eficiente de determinada funo no recente. Taylor (1970) j alertava,no incio do sculo passado, para a necessidade de as empresas contarem com homenseficientes, ressaltando que a procura pelos competentes excedia oferta. poca, baseadasno princpio taylorista de seleo e treinamento do trabalhador, as empresas procuravamaperfeioar em seus empregados as habilidades necessrias para o exerccio de certas funes,restringindo-se a questes tcnicas relacionadas ao trabalho e especificao do cargo.Sob esta perspectiva, referia-se competncia como um conjunto de conhecimentos ehabilidades que credenciavam um profissional a exercer determinada funo.

    Em decorrncia de presses sociais e do aumento da complexidade das relaes detrabalho, as organizaes passaram a considerar, no processo de desenvolvimento de seusempregados, no s conhecimentos e habilidades, mas tambm aspectos sociais e atitudinais.Algumas concepes, ento, comearam a valorizar a atitude como maior determinante da

    competncia. Zarifian (1996), por exemplo, ao definir competncia, baseia-se na premissa deque, em um ambiente dinmico e competitivo, no possvel considerar o trabalho como umconjunto de tarefas ou atividades estticas. Para esse autor, competncia significa "assumirresponsabilidades frente a situaes de trabalho complexas [aliado] ...ao exerccio

    sistemtico de uma reflexividade no trabalho" (id.ib), que permita ao profissional lidar comeventos inditos, surpreendentes e de natureza singular.

    A freqente utilizao do termo competncia no campo da gesto organizacional fezcom que este adquirisse variadas conotaes, sendo, no raras vezes, utilizado de diferentesmaneiras, conforme relatam Brando & Guimares (2001) e McLagan (1997). Abordagensmais modernas, contudo, buscam no s considerar os diversos aspectos do trabalho,

    mas tambm associar a competncia ao desempenho. Para Rop & Tanguy (1997), porexemplo, um dos aspectos essenciais da competncia que esta no pode ser compreendidade forma separada da ao. Dutra, Hiplito & Silva (1998), por sua vez, definem competnciacomo a capacidade de uma pessoa gerar resultados dentro dos objetivos organizacionais.

    2 BRANDO, Hugo Pena. O que gesto por competncias? (captulo). In: PIRES, Alexandre Kalil (org.).Gesto por competncias em organizaes de governo. Braslia: Ed. Escola Nacional de AdministraoPblicaENAP, p.13-22, 2005.

    3 Movimento que se consolidou no incio do sculo passado. Tinha como principal preocupao a organizaoracional do trabalho, dando nfase a tarefas, mtodos e processos de trabalho na busca por maior eficincia.Teve como principal expoente o engenheiro americano Frederick W. Taylor (1856-1915). Ver Taylor (1970).

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    Sob esta perspectiva, que parece ter aceitao mais ampla tanto no meio acadmicocomo no ambiente empresarial, competncias representam combinaes sinrgicas deconhecimentos, habilidades e atitudes, expressas pelo desempenho profissional, dentro dedeterminado contexto ou estratgia organizacional (Durand, 2000; Nisembaum, 2000;

    Santos, 2001). As competncias so reveladas, ento, quando as pessoas agem frente ssituaes profissionais com as quais se defrontam (Zarifian, 1999). Servem como ligaoentre atributos individuais e a estratgia da organizao (Prahalad & Hamel, 1990).

    Dessa forma, as competncias agregam valor econmico e valor social a indivduos e aorganizaes, na medida em que contribuem para a consecuo de objetivos organizacionais eexpressam o reconhecimento social sobre a capacidade de determinada pessoa (Brando &Guimares, 2001; Zarifian, 1999), conforme ilustra a Figura 1 a seguir.

    Figura 1: Elementos constitutivos da competncia profissional.

    Fonte: Carbone et al. (2005) e Fleury & Fleury (2001), com adaptaes.

    As competncias so descritas por alguns autores utilizando-se pautas ou referenciaisde desempenho (Nisembaum, 2000; Santos, 2001), de forma que o profissional demonstrariadeter uma dada competncia por meio da adoo de certos comportamentos passveis deobservao no ambiente de trabalho, conforme mostra o Quadro 1 a seguir.

    Quadro 1: Exemplos de descrio de competncias sob a forma de referenciais de desempenho.

    TTULO DA COMPETNCIA DESCRIO (REFERENCIAIS DE DESEMPENHO)

    Orientao para Resultados Implementa aes para incrementar o volume de negcios.Avalia com preciso os custos e benefcios dasoportunidades negociais.Utiliza indicadores de desempenho para avaliar os resultadosalcanados.Elabora planos para atingir as metas definidas.

    Trabalho em Equipe Compartilha com seu grupo os desafios a enfrentar.Mantm relacionamento interpessoal amigvel e cordial comos membros de sua equipe.Estimula a busca conjunta de solues para os problemasenfrentados pela equipe.

    Compartilha seus conhecimentos com os membros daequipe.

    Fonte: Santos (2001), com adaptaes.

    ELEMENTOS DESEMPENHO

    Conhecimentos

    Habilidades

    Atitudes

    Comportamentos

    Realizaes

    Resultados

    Valor Econmico

    Valor Social

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    Outros autores (Brando, Guimares & Borges-Andrade, 2001; Bruno-Faria &Brando, 2003), por opo metodolgica, procuram descrever tambm os recursos oudimenses da competncia, ou seja, os conhecimentos, habilidades e atitudes que sepressupem sejam necessrios para que a pessoa possa apresentar determinado

    comportamento ou desempenho, conforme mostra o Quadro 2 a seguir.

    Quadro 2: Exemplos de recursos ou dimenses da competncia prestar um atendimento bancriobaseado em padres de excelncia.

    DIMENSO DA COMPETNCIA DESCRIO

    Conhecimentos Princpios de contabilidade e finanas.Produtos e servios bancrios.Princpios de relaes humanos.

    Habilidades Aptido para operar computadores, perifricos e outrosrecursos tecnolgicos.Habilidade para argumentar de maneira convincente.

    Atitudes Predisposio para a tomada de iniciativa (proatividade).Respeito privacidade do cliente.Predisposio para aprimorar-se continuamente.

    Fonte: Brando, Guimares & Borges-Andrade (2001), com adaptaes.

    Em geral, a adoo de um ou outro critrio para descrio de competncias ocorre emrazo do uso que se pretende dar descrio. Quando utilizadas em instrumentos de avaliaodo desempenho no trabalho, por exemplo, as competncias so descritas sob a forma decomportamentos passveis de observao (referenciais de desempenho), para que o avaliador

    possa mensurar o desempenho do avaliado a partir dos comportamentos que este adota notrabalho. Quando utilizadas na formulao pedaggica de aes educacionais (planejamentoinstrucional), por sua vez, ento faz-se necessrio descrever no apenas os comportamentosdesejados (referenciais de desempenho), os quais constituiro os objetivos instrucionais dotreinamento, mas tambm os conhecimentos, habilidades e atitudes correspondentes, os quaisconstituiro os contedos educacionais a serem ministrados.

    A seguir discute-se sobre essas dimenses ou recursos da competncia profissional.

    SOBRE ASDIMENSES DA COMPETNCIA

    Uma competncia profissional resulta da mobilizao, por parte do indivduo, de umacombinao recursos. Le Boterf (1999) explica que a competncia da pessoa decorrente daaplicao conjunta, no trabalho, de conhecimentos, habilidades e atitudes, que representam ostrs recursos ou dimenses da competncia.

    De acordo com Durand(2000),conhecimentocorresponde a uma srie de informaesassimiladas e estruturadas pelo indivduo, que lhe permitem entender o mundo. Refere-seao saber que a pessoa acumulou ao longo da vida. Davenport & Prusak (1998) e Davis &Botkin (1994) explicam que o conhecimento deriva da informao, que, por sua vez, deriva deconjuntos de dados. Segundo esses autores, dados so sries de fatos ou eventos isolados;informaes so dados que, percebidos pelo indivduo, tm significado e relevncia; econhecimentos so conjuntos de informaes reconhecidas e integradas pelo indivduo dentro

    de um esquema pr-existente, causando impacto sobre seu julgamento ou comportamento.Essa dimenso, para Bloom et al. (1979) e Gagn et al. (1988), representa algo relacionado lembrana de idias ou fenmenos, alguma coisa armazenada na memria da pessoa.

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    A habilidade, por sua vez, est relacionada ao saber como fazeralgo (Gagn et al.,1988) ou capacidade de fazer uso produtivo do conhecimento, ou seja, de instaurarconhecimentos e utiliz-los em uma ao (Durand, 2000). Segundo Bloom et al. (1979),uma definio operacional comum sobre habilidade a de que o indivduo pode buscar emsuas experincias anteriores conhecimentos, sejam eles de fatos ou princpios, e tcnicasapropriadas, para examinar e solucionar um problema qualquer. As habilidades podem serclassificadas como intelectuais, quando abrangerem essencialmente processos mentais deorganizao e reorganizao de informaes por exemplo, em uma conversao ou narealizao de uma operao matemticae como motoras ou manipulativas, quando exigiremfundamentalmente uma coordenao neuromuscular, como na realizao de um desenho ouna escrita a lpis, por exemplo (Bloom et al., 1979; Gagn et al., 1988).

    Ao abordar as duas primeiras dimenses da competncia (conhecimentos ehabilidades), Durand (2000) utiliza a estrutura de anlise do conhecimento sugerida por

    Sanchez (1997), explicando que habilidade refere-se ao saber como fazer algo dentro dedeterminado processo (know-how), enquanto conhecimento diz respeito ao saber o que e porque fazer(know-whate know-why), ou seja, compreenso do princpio terico que rege esseprocesso e seu propsito.

    Finalmente, a atitude, terceira dimenso da competncia, refere-se a aspectos sociais eafetivos relacionados ao trabalho (Durand, 2000). Gagn et al. (1988) comentam que atitudesso estados complexos do ser humano que afetam o seu comportamento em relao a pessoas,coisas e eventos, determinando a escolha de um curso de ao pessoal. Segundo esses autores,as pessoas tm preferncias por alguns tipos de atividades e mostram interesse por certoseventos mais que por outros. O efeito da atitude justamente ampliar a reao positiva ou

    negativa de uma pessoa, ou seja, sua predisposio, em relao adoo de uma aoespecfica. Essa ltima dimenso est relacionada a um sentimento, uma emoo ou um graude aceitao ou rejeio da pessoa em relao aos outros, a objetos ou a situaes. Portanto,por analogia, atitude refere-se ao querer fazer.

    Vale ressaltar que a competncia pressupe interdependncia e complementaridadeentre conhecimentos, habilidades e atitudes, ou seja, requer a aplicao conjunta dessas trsdimenses em torno de um objetivo no trabalho.

    SOBRE A COMPETNCIA NOSDIFERENTESNVEIS ORGANIZACIONAIS

    At aqui, referiu-se competncia no plano individual, como um atributo relacionadoa uma pessoa. Alguns autores, no entanto, elevam o conceito a equipes de trabalho ou mesmo organizao como um todo. Zarifian (1999), por exemplo, sustenta que no se devedesconsiderar a perspectiva da equipe no processo produtivo e sugere que uma competnciapode ser inerente a um grupo de trabalho. Para esse autor, em cada equipe se manifesta umacompetncia coletiva, que representa mais do que a simples soma das competncias de seusmembros. Isso porque h uma sinergia entre essas competncias individuais e as interaessociais existentes no grupo. Da mesma forma, Le Boterf (1999) comenta que a competnciacoletiva de uma equipe de trabalho uma propriedade que emerge da articulao e da sinergiaentre as competncias individuais de seus componentes.

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    Prahalad & Hamel (1990), por sua vez, tratam do conceito no nvel organizacional,referindo-se competncia como um conjunto de conhecimentos, habilidades, tecnologias,sistemas fsicos, gerenciais e valores que geram um diferencial competitivo para aorganizao. Para esses autores, competncias essenciais nas organizaes so aquelas queconferem vantagem competitiva, geram valor distintivo percebido pelos clientes e so difceisde ser imitadas pela concorrncia. Nessa mesma linha, Green (1999) refere-se a competnciasorganizacionais como os atributos de uma organizao que a fazem eficaz. A mecnica de altapreciso da Canon, o design de motores leves e eficientes da Honda e a capacidade deconceber e produzir produtos miniatuarizados da Sony so alguns dos exemplos decompetncia citados por Prahalad e Hamel (1990). No Brasil, a capacidade degeoprocessamento4 da Embrapa (Guimares, Borges-Andrade, Machado & Vargas, 2001),a inovao na concepo e produo de avies comerciais da Embraer (Fleury & Fleury,2001), a celeridade e confiabilidade na apurao de resultados eleitorais do Tribunal Superior

    Eleitoral, e a capacidade de prospeco e explorao de petrleo em guas profundas daPetrobrs (Carbone et al., 2005) so exemplos comumente mencionados de competncias nonvel organizacional.

    possvel, ento, classificar as competncias como profissionais ou individuais(aquelas relacionadas a indivduos) e organizacionais (aquelas inerentes organizao comoum todo ou a uma de suas unidades produtivas), ressaltando-se que as competnciasprofissionais, aliadas a outros recursos e processos, do origem e sustentao s competnciasorganizacionais. A gesto por competncias, como ser visto a seguir, prope-se a alinharesforos para que competncias profissionais possam gerar e sustentar competnciasorganizacionais necessrias consecuo de objetivos estratgicos.

    Dependendo da abordagem terica adotada ou da finalidade prtica que se desejaatribuir ao conceito, existem diversas outras tipologias e possibilidades de classificao dascompetncias. Em razo da natureza do papel ocupacional desempenhado pelas pessoas, porexemplo, as competncias individuais podem ser classificadas como tcnicas e gerenciais,como sugere Cockerill (1994). Em razo de sua singularidade, as competnciasorganizacionais podem ser classificadas como bsicas (aquelas que representam atributosnecessrios ao funcionamento da organizao, mas no distintivos em relao concorrncia)e essenciais (aquelas que representam atributos de carter distintivo, que diferenciam aorganizao das demais), conforme sugere Nisembaum (2000). E quanto sua relevncia aolongo do tempo, conforme proposto por Sparrow & Bognanno (1994), as competnciaspodem ser classificadas como emergentes (aquelas cujo grau de importncia tende a crescer

    no futuro), declinantes (aquelas cujo grau de importncia tende a diminuir no futuro), estveis(as que permanecem relevantes ao longo do tempo) e transitrias (aquelas que se fazemimportantes apenas em momentos crticos, crises e transies).

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    A competncia de geoprocessamento da EMBRAPA refere-se a um conjunto de conhecimentos, tecnologias,processos e metodologias que permitem empresa analisar e inter-relacionar informaes espaciais e espao-temporais georreferenciais, de origem bitica, abitica e socioeconmica, para realizao de pesquisasagropecurias de qualidade. Ver Guimares et al. (2001).

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    SOBRE A GESTO POR COMPETNCIAS5

    Muitas empresas tm adotado a Gesto por Competncias como modelo de gesto,visando orientar seus esforos para planejar, captar, desenvolver e avaliar, nos diferentes

    nveis da organizao (individual, grupal e organizacional), as competncias necessrias consecuo de seus objetivos. Brando e Guimares (2001), ao analisarem os pressupostos eaplicaes da Gesto por Competncias, apresentam o diagrama disposto na Figura 2 parailustrar as principais etapas ou fases desse modelo. bom lembrar que todo modelo, poressncia, simplificador, de modo que o diagrama exposto a seguir no tem a pretenso deesgotar as atividades e interaes afetas Gesto por Competncias, mas sim expor, de formaresumida, a lgica de funcionamento desse modelo.

    5 Embora neste texto se utilize a expresso gesto por competncias para denominar esse modelo de gesto,muitos autores adotam denominaes diferentes para expressar concepes semelhantes. comum naliteratura sobre o assunto, por exemplo, a utilizao de termos como gesto de competncias, gestobaseada em competncias e gesto de desempenho por competncias, que, apesar das diferenas de ordemsemntica, representam essencialmente a mesma idia. Para efeito deste livro, optou-se por utilizar a

    denominao gesto por competncias porque a partcula por, quando utilizada na formao de adjuntos,indica fim, propsito, destino, desejo. Assim, a expresso gesto por competncias inspira a idia de que oesforo gerencial tem como propsito alavancar, desenvolver, mobilizar competncias, conforme sugerido porLe Boterf (1999) e Carbone et al. (2005).

    Diagnsticodas

    CompetnciasProfissionais

    Acompanhamento e Avaliao

    Captao eIntegrao

    de CompetnciasExternas

    Desenvolvimentode Competncias

    Internas

    Formulao da

    Estratgia Organizacional

    Definio da Misso, da Visode Futuro e dos Objetivos

    Estratgicos

    Definio de Indicadores deDesem enho Or anizacional

    Diagnstico das Competncias

    Essenciais Organizao

    Formulao dosPlanos

    Operacionaisde Trabalho e

    de Gesto

    Definio deIndicadores deDesempenho e

    Remunerao deEquipes eIndivduos

    Figura 2: Modelo de Gesto por Competncias.Fonte: Guimares et al. (2001), com adaptaes.

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    REFERNCIASBIBLIOGRFICAS

    BORGES-ANDRADE, JairoE. & LIMA, Suzana M. Valle. Avaliao de necessidades de treinamento:um mtodo de anlise de papel ocupacional. Tecnologia Educacional, v.12, n.54, p.5-14, 1983.

    BLOOM, Benjamim S.; KRATHWOHL, David R. & MASIA, Bertram B. Taxonomia de objetivoseducacionais: domnio afetivo. Porto Alegre: Globo, 1973.

    BLOOM, Benjamim S.; ENGELHART, Max D.; FURST, Edward J.; HILL, Walker H. &KRATHWOHL, David R. Taxonomia de objetivos educacionais: domnio cognitivo. Porto Alegre:Globo, 1979.

    BRANDO, Hugo Pena & GUIMARES, Toms de Aquino. Gesto de competncias e gesto dedesempenho: tecnologias distintas ou instrumentos de um mesmo constructo? Revista deAdministrao de Empresas, So Paulo, v.41, n.1, p.08-15, 2001.

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    CAUSAS E EFEITOS DA EXPRESSO DE COMPETNCIAS NO TRABALHO:PARA ENTENDER MELHOR A NOO DE COMPETNCIA*

    * BRANDO, Hugo Pena; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo. Causas e efeitos da expresso decompetncias no trabalho: para entender melhor a noo de competncia.Revista de AdministraoMackenzieRAM, So Paulo, v. 8, n. 3, p. 32-49, 2007.

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    CAUSAS E EFEITOS DA EXPRESSO DE COMPETNCIAS NO TRABALHO:PARA ENTENDER MELHOR A NOO DE COMPETNCIA*

    IntroduoNo contexto de transformaes sociais, econmicas e culturais por que passa asociedade contempornea, as organizaes tm procurado desenvolver e incorporarinovaes, sejam elas em produtos, processos produtivos ou modelos de gesto, que lhespermitam melhorar continuamente seu desempenho.

    A gesto por competncias1 (CARBONE et al., 2005; HEENE; SANCHEZ, 1997;LE BORTERF, 1999; ZARIFIAN, 1999) se insere entre os modelos gerenciais propostos paraaprimorar os desempenhos profissional e organizacional. Baseando-se no pressuposto de queo domnio de certos recursos determinante do desempenho de uma organizao, essemodelo se prope a integrar e orientar esforos, sobretudo os relacionados gesto de

    pessoas, visando desenvolver e sustentar competncias consideradas fundamentais consecuo dos objetivos organizacionais (BRANDO; GUIMARES, 2002;BITENCOURT, 2004).

    Com a emergncia da gesto por competncias (GONCZI, 1999), grande discusso temsido feita em torno do conceito de competncia, suas dimenses e implicaes.Por isso, esse termo adquiriu variadas conotaes no campo da gesto organizacional, sendoanalisado e utilizado de diferentes maneiras, conforme relatam McLagan (1997) eBrando e Guimares (2002), o que parece contribuir para a fragmentao terica nessecampo de estudo.

    No entanto, algumas teorias e pesquisas no campo da Psicologia Social e

    Organizacional, sobretudo aquelas relacionadas cognio social e a abordagensinstrucionais, ao serem cotejadas com proposies oriundas da rea de Administrao, podemauxiliar a esclarecer a natureza da competncia e de seus elementos constitutivos. o que sugere Bastos (2004), para quem as abordagens cognitivistas podem ser largamenteutilizadas para analisar e explicar fenmenos e processos organizacionais.

    Dessa forma, constitui objetivo deste ensaio discutir pressupostos e componentes danoo de competncia, assim como os principais fatores que explicam a sua expresso notrabalho, luz de abordagens cognitivistas, como aquelas relacionadas atribuio de causa(HEIDER, 1958), ao estudo das relaes entre atitude e comportamento (MARTIN-BAR,1985) e aprendizagem nas organizaes (GONCZI, 1999). Pretende-se, tambm, apresentarsemelhanas e relaes entre conceitos e proposies das reas de Psicologia Social eOrganizacional e de Administrao, buscando compreender as causas e efeitos dacompetncia. Ao final, discute-se a influncia da aprendizagem e do suporte organizacionalsobre o desenvolvimento e a expresso de competncias no trabalho.

    A Noo de Competncia

    No final da Idade Mdia, o termo competncia pertencia essencialmente linguagemjurdica. Dizia respeito faculdade atribuda a uma pessoa ou a uma instituio para apreciare julgar certas questes. Por extenso, a expresso veio a designar o reconhecimento socialsobre a capacidade de algum pronunciar-se a respeito de determinado assunto e, mais tarde,

    *BRANDO, Hugo Pena; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo. Causas e efeitos da expresso decompetncias no trabalho: para entender melhor a noo de competncia.Revista de AdministraoMackenzieRAM, So Paulo, v. 8, n. 3, p. 32-49, 2007.

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    passou a ser utilizada tambm para qualificar o indivduo capaz de realizar certo trabalho(ISAMBERT-JAMATI, 1997; BRANDO; GUIMARES, 2002).

    Com a Revoluo Industrial e o advento do taylor-fordismo, o termo competncia foiincorporado linguagem organizacional, sendo utilizado para qualificar a pessoa capaz dedesempenhar eficientemente determinado papel. A partir da dcada de 1970, o interesse peloassunto estimulou o debate terico e a realizao de pesquisas. Muitos autores procuraramcriar definies prprias para o termo, chamando a ateno para variados aspectos dacompetncia. Gilbert (1978), autor da rea de Psicologia Organizacional, por exemplo,destaca que a competncia expressa em funo do desempenho ou comportamento dapessoa no trabalho, enquanto Durand (2000), da rea de Administrao, d nfase aoselementos que constituem a competncia, ou seja, aos conhecimentos, habilidades e atitudesda pessoa.

    Por trs da proposta de Gilbert (1978) est expressa a base terica influenciada pelomovimento S-R, que na psicologia advoga que a compreenso do comportamento deve

    estar vinculada investigao das relaes estabelecidas entre estmulos (S) erespostas (R). A proposta de Durand (2000), por outro lado, parece influenciada pelomovimento S-O-R, pois parte da premissa de que essas relaes, para serem plenamentecompreendidas, precisam levar em conta o que ocorre no indivduo ou organismo (O), quemediaria as relaes entre estmulos (S) e respostas (R). Esse segundo movimento, empsicologia, constitui a base sobre a qual esto sustentadas as abordagens cognitivistas epressupe que a interao do indivduo com o ambiente resulta em processos cognitivos ou naaquisio de conhecimentos, habilidade e atitudes.

    No obstante a possibilidade de interpretar a competncia de mltiplas maneiras, possvel perceber a existncia de duas grandes correntes tericas, conforme sugere

    Dutra (2004). A primeira, representada principalmente por autores norte-americanos(BOYATZIS, 1982; McCLELLAND, 1973, por exemplo), entende a competncia como umconjunto de qualificaes ou caractersticas subjacentes pessoa, que permitem a ela realizardeterminado trabalho ou lidar com uma dada situao. A segunda, representada sobretudo porautores franceses (LE BOTERF, 1999; ZARIFIAN, 1999, por exemplo), associa acompetncia no a um conjunto de atributos da pessoa, mas sim s suas realizaes emdeterminado contexto, ou seja, quilo que o indivduo produz ou realiza no trabalho(DUTRA, 2004).

    Na ltima dcada, uma terceira vertente tem obtido destaque, medida que busca adotaruma perspectiva integradora, procurando definir a competncia a partir da juno deconcepes das referidas correntes. Esse posicionamento defendido por Gonczi (1999), paraquem a competncia associa atributos pessoais ao contexto de trabalho em que so utilizados,isto , ao ambiente e s atividades que a pessoa realiza no trabalho. A competncia entendida, ento, no apenas como um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudesnecessrios para exercer certa atividade, mas tambm como o desempenho expresso pelapessoa em determinado contexto produtivo, em termos de comportamentos adotados notrabalho e realizaes decorrentes.

    Sob essa perspectiva, evidentemente mais prxima do denominado movimentoS-O-R e, portanto, de abordagens cognitivistas, competncias podem ser entendidas comocombinaes sinrgicas de conhecimentos, habilidades e atitudes, expressas pelo desempenhoprofissional dentro de determinado contexto organizacional, que agregam valor a pessoas e

    organizaes (CARBONE et al., 2005; FREITAS; BRANDO, 2005). Essas combinaesrepresentariam a letra O, que sugere ser o indivduo capaz de desenvolver competncias quemediam as relaes que seu comportamento (R) estabelece com o ambiente (S). Segundo

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    Heider (1958) desenvolveu diversos estudos a respeito do comportamento interpessoal,procurando analisar o processo de determinar ou inferir a razo pela qual um comportamentoocorre. Seus estudos influenciaram numerosos pesquisadores e pensadores, dando origem denominada Teoria da Atribuio de Causa. Essa teoria sugere que as pessoas atribuem, ao

    comportamento dos outros, dois tipos de causas: internas ou disposicionais (quando acausalidade atribuda a fatores internos da pessoa); e externas ou situacionais (quando acausalidade atribuda a fatores externos), conforme explicam Davis e Newstrom (1992).Assim, quando algum est atrasado para uma reunio de trabalho, pode-se atribuir o atrasoda pessoa a fatores internos, como a indiferena dela, por exemplo, ou a fatores externos que aimpossibilitaram de chegar a tempo (VONK, 1998), como o trnsito ou um defeito em seuveculo, por exemplo. A noo de causa, portanto, em termos gerais, est associada idia deagente ou fora, ou seja, ao pressuposto de que existem fatores que causam oudeterminam certos eventos (efeitos). Sob essa perspectiva, a causalidade revela-se, ento,quando o evento conseqente sucede, no tempo, de forma consistente, o fator antecedente.

    Segundo Heider (1958), o resultado de uma ao depende de aspectos disposicionais esituacionais. Os primeiros referem-se a propriedades (como a capacidade, por exemplo) quedispem as pessoas, sob certas condies, a se comportarem de determinada maneira.Os ltimos, por sua vez, dizem respeito a propriedades mais variveis, presentes no ambiente,que influenciam a coordenao entre o resultado e as propriedades disposicionais doindivduo, visto que podem aumentar ou reduzir a possibilidade de a pessoa manifestarsuas capacidades.

    Esse autor explica, ainda, que a disposio da pessoa para a ao pode ser determinadapor dois elementos: um fator de poder (capacidade) e um fator de intencionalidade (HEIDER,1958). A capacidade condicionada por conhecimentos e habilidades, que tornam a pessoacapaz de realizar algo. O fator intencional, por sua vez, refere-se quilo que a pessoa tentafazer e intensidade com que tenta faz-lo. Manifesta-se na tentativa, impulsionando eorientando a ao, alm de lhe dar carter intencional (HEIDER, 1958). Para Atkinson (apudMcCLELLAND, 1985), o fator de intencionalidade constitui aquilo que influencia a tendnciade uma pessoa adotar certo comportamento. Equivale determinao do indivduo na buscapor um objetivo.

    Esses dois fatores (capacidade e inteno) so necessrios para determinar a ao, masnenhum deles, isoladamente, suficiente. Heider (1958) explica que se uma pessoa temcapacidade, mas no tem inteno (ou motivao), ou vice-versa, no far progresso nadireo do objetivo. Ser capaz e desejar so vistos por esse autor como condies para oxito de uma ao.

    Nesse sentido, parece que conhecimentos, habilidades e atitudes, os trs elementosconstitutivos da competncia, podem ser considerados propriedades disposicionais da pessoa,isto , causas do desempenho ou da expresso de competncias no trabalho. importante,ento, analisar cada um desses elementos e as relaes entre eles.

    De acordo com Durand (2000), o conhecimento corresponde a uma srie deinformaes assimiladas e estruturadas pelo indivduo, que lhe permitem entender o mundo.Refere-se ao saber que a pessoa acumulou ao longo da vida. Davis e Botkin (1994) eDavenport e Prusak (1998) explicam que o conhecimento deriva da informao, que, por suavez, deriva de conjuntos de dados. Segundo esses autores, dados so sries de fatos oueventos isolados; informaes so dados que, uma vez agregados a outros dados, adquirem

    significado e relevncia; e conhecimentos so conjuntos de informaes, reconhecidas eintegradas pela pessoa em um esquema cognitivo pr-existente, que causam impacto sobre seu

    julgamento ou comportamento. Para Bloom et al. (1979) e Gagn, Briggs e Wager (1988),

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    autores de teorias instrucionais, o conhecimento representa algo relacionado lembrana deidias ou fenmenos, isto , algo armazenado na memria da pessoa por meio de processospsicolgicos de aquisio e interpretao de informaes.

    A habilidade, por sua vez, refere-se ao saber como fazeralgo (GAGN et al., 1988) ou capacidade da pessoa de fazer uso produtivo do conhecimento, ou seja, de instaurarconhecimentos armazenados em sua memria e utiliz-los em uma ao (DURAND, 2000).Esta dimenso est relacionada capacidade de processamento cognitivo, ou seja, capacidade de processar informaes (como, por exemplo, relacionar idias, reorganizaresquemas e derivar implicaes lgicas a partir de regras gerais) para resolver problemas oupara lidar com determinada situao (PRIMI et al., 2001).

    Segundo Bloom et al. (1979), uma definio comum sobre habilidade a de que oindivduo pode buscar, em suas experincias anteriores, conhecimentos (sejam eles de fatosou princpios) e tcnicas apropriadas para examinar e solucionar um problema qualquer.As habilidades podem ser classificadas como intelectuais, quando abrangerem essencialmente

    processos mentais de organizao e reorganizao de informaes como na realizao deuma operao matemtica, por exemplo e como motoras ou manipulativas, quandoexigirem fundamentalmente uma coordenao neuromuscular (BLOOM et al., 1979;GAGN et al., 1988), como na colocao de peas em uma linha de produo, por exemplo.Investigao realizada por McClelland (1985) aponta a habilidade como um importantepreditor do desempenho. Segundo esse estudo, a combinao da habilidade com os motivosda pessoa e com fatores situacionais favorveis explica grande parte do comportamentono trabalho.

    Ao abordar esses dois primeiros elementos ou dimenses da competncia(conhecimentos e habilidades), Durand (2000) utiliza a estrutura de anlise do conhecimento

    sugerida por Sanchez (1997), explicando que habilidade refere-se ao saber como fazeralgoem determinado processo (know-how), enquanto conhecimento diz respeito ao saber o que epor que fazer(know-whate know-why), ou seja, compreenso do princpio terico que regeesse processo e seu propsito. A associao de conhecimentos e habilidades, ento, parececonstituir o que Heider (1958) e outros tericos da Atribuio de Causa denominamcapacidade, conforme j descrito. Esses elementos, portanto, so propriedades disposicionais,visto que dispem as pessoas a se comportarem de determinada maneira.

    A atitude, como terceiro elemento ou dimenso da competncia, refere-se a aspectossociais e afetivos relacionados ao trabalho (DURAND, 2000). Embora algumas investigaesno tenham conseguido verificar empiricamente as relaes entre a atitude e ocomportamento, sobretudo por dificuldades metodolgicas (MARTIN-BAR, 1985), aatitude tida conceitualmente como uma propriedade que influencia, em certa medida, ocomportamento da pessoa. Sob essa perspectiva, Gagn et al. (1988) comentam que atitudesso estados complexos do ser humano, que afetam o seu comportamento em relao apessoas, objetos e eventos, determinando a escolha de um curso de ao pessoal. Segundoesses autores, as pessoas tm preferncias por alguns tipos de atividades e mostram interessepor certos eventos mais que por outros. O efeito da atitude justamente ampliar a reaopositiva ou negativa de uma pessoa, ou seja, sua predisposio ou inteno, em relao adoo de uma ao especfica.

    Esse componente da competncia est relacionado a um sentimento ou a um grau deaceitao ou rejeio da pessoa em relao aos outros, a objetos ou a situaes. A atitude,

    ento, por analogia, refere-se ao que Heider (1958) denominou desejar e ao queDurand (2000) referiu-se como querer fazer, ou seja, constitui uma propriedade relacionadaao desejo, disposio, inteno, que influencia a tendncia de a pessoa adotar determinado

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    comportamento. Para Sansone (1986), a atitude representa um componente da motivaointrnseca aquela relacionada ao desejo ou satisfao pessoal do indivduo pelo trabalhoque realiza. Caracteriza-se, portanto, como uma outra propriedade disposicional da pessoa.

    Algumas pesquisas indicam que esses trs elementos determinantes da competncia(conhecimentos, habilidades e atitudes) possuem carter complementar e interdependente, deforma que existe uma influncia mtua entre eles. Estudo realizado por Sansone (1986), porexemplo, indicou que o conhecimento da pessoa a respeito dos padres de competnciarequeridos em seu trabalho afetava no apenas a percepo dela sobre sua competncia (auto-eficcia), mas tambm a sua disposio (ou seja, suas atitudes) para demonstrar ascompetncias requeridas. Um experimento realizado por Harackiewitz, Sansone e Manderlink(1985) tambm indicou que conhecimentos adquiridos pelos sujeitos antes de uma atividadeafetaram positivamente a sua auto-eficcia e o seu interesse pelo trabalho. Da mesma forma,uma habilidade pressupe o domnio de conceitos, tcnicas ou princpios especficos(BRANDO; GUIMARES; BORGES-ANDRADE, 2001) e o interesse da pessoa pelo

    trabalho influencia a aprendizagem de novos conhecimentos e habilidades (POZO, 2002).Diante do exposto, possvel afirmar que conhecimentos, habilidades e atitudes seriam

    propriedades disposicionais do indivduo, constituindo causas de seus desempenhos ou daexpresso de competncias. Sabe-se tambm que as pessoas manifestam suas capacidades emotivos por meio da realizao (HEIDER, 1958), ao transformar a capacidade potencial emao real, de tal forma que a competncia profissional expressa pelos comportamentos que apessoa adota no trabalho e pelos resultados decorrentes (CARBONE et al., 2005). Estes, porsua vez, tm como conseqncia a gerao de valor, seja ele econmico ou social, tanto para apessoa quanto para a organizao em que ela atua, conforme j explicado.

    Embora os modelos de Atribuio de Causa sejam por definio relacionados ao estudo

    das causas do comportamento (VONK, 1998), e no s suas conseqncias, estas no sefazem menos importantes para compreender a noo e a natureza da competncia. Em estudorealizado por Harackiewitz et al. (1985), por exemplo, verificou-se que o valor percebido ouatribudo pelas pessoas expresso de suas competncias pode fazer com que se dediquemmais e se tornem mais envolvidas com o trabalho que realizam. Assim, o valor que umcomportamento agrega pessoa que o adota torna-se conseqncia e tambm causa dacompetncia, na medida em que influencia as propriedades disposicionais do indivduo.

    Reeder et al. (2004), por sua vez, verificaram que comportamentos atribudos apropriedades disposicionais da pessoa so mais valorizados (considerados mais importantes)que aqueles atribudos a fatores situacionais. Em outros estudos, Vonk (1998) e Vonk e Konst(2003), ao investigarem as relaes entre o comportamento e a percepo social, verificaramque as conseqncias do comportamento de uma pessoa podem influenciar o julgamento dosoutros a respeito dela. Segundo Vonk (1998), quando o comportamento de uma pessoa temuma conseqncia negativa para aquele que o julga ou avalia, ento as infernciascorrespondentes so mais extremadas e negativas, especialmente se o comportamento causado por fatores disposicionais do sujeito. Tais resultados trazem implicaes importantespara os modelos de avaliao do desempenho humano no trabalho em que a avaliao baseada na percepo das pessoas sobre as competncias expressas pelo indivduo avaliado.

    Considerando a necessidade de aperfeioar continuamente seu desempenho, asorganizaes esto impelidas adoo de iniciativas que possam favorecer a expresso decompetncias desejadas no trabalho. Para tanto, pode-se promover processos de aprendizagem

    para desenvolvimento de competncias, e, ainda, atuar sobre componentes situacionais,criando oportunidades favorveis manifestao de competncias e afastando barreirasambientais, questes que sero discutidas a seguir.

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    O Papel da Aprendizagem e do Suporte Organizacional

    A aprendizagem constitui o processo ou meio pelo qual se adquire a competncia,enquanto o desempenho no trabalho representa uma manifestao do que o indivduoaprendeu, da competncia por ele adquirida em processos de aprendizagem (FREITAS;BRANDO, 2005). Desenvolver novas formas para prover oportunidades e experincias deaprendizagem constitui, portanto, um grande desafio para as organizaes (CASEY, 1999),sobretudo porque a complexidade do ambiente organizacional faz surgir diversificadasdemandas de aprendizagem, aumentando a distncia entre o que as pessoas sabem e o que elasprecisam aprender (POZO, 2002).

    Aprender implica em mudar conhecimentos, habilidades ou atitudes anteriores.Constitui uma mudana relativamente duradoura no comportamento da pessoa, transfervelpara novas situaes com as quais ela se depara (POZO, 2002; SONNENTAG et al., 2004).A aprendizagem, portanto, est associada noo de mudana e pode ser observada notrabalho quando se compara o desempenho da pessoa antes e depois de um processo de

    aprendizagem. O desempenho resultante da aplicao de novas competncias revela que oindivduo aprendeu algo novo: mudou sua forma de atuar (FREITAS; BRANDO, 2005).

    Comparando-se os elementos ou dimenses da competncia (conhecimentos,habilidades e atitudes) com proposies de autores de teorias instrucionais e de aprendizagem, possvel identificar relaes conceituais entre a aprendizagem e a competncia. Pestalozzi(apudLARROYO, 1974), por exemplo, idealizou a aprendizagem como o desenvolvimentonatural, espontneo e harmnico das capacidades humanas, que se revelam na trpliceatividade da cabea, das mos e do corao (head, hande heart), isto , na vida intelectual,psicomotora e moral do indivduo. Bloom et al. (1973, 1979), por sua vez, desenvolveramuma classificao de objetivos educacionais baseada em trs domnios: cognitivo (objetivos

    relacionados memria e ao desenvolvimento de capacidades intelectuais); psicomotor(objetivos vinculados ao desenvolvimento de habilidades motoras); e afetivo (objetivos quedescrevem mudanas de interesses e de valores). A Figura 2 ilustra a analogia existente entreas chaves da aprendizagem individual (PESTALOZZI apudLARROYO, 1974), os domniosdos objetivos educacionais (BLOOM et al., 1973, 1979) e as dimenses da competncia(DURAND, 2000), explicitando as relaes de interdependncia entre a aprendizagem e acompetncia.

    Segundo Illeris (2004), o processo de aprendizagem envolve dois tipos de interao:uma entre o contedo (conhecimentos, habilidades e atitudes) e a dinmica da aprendizagem

    (motivao, conscincia e ateno do aprendiz, entre outros processos); e outra entre oaprendiz e o ambiente em que ele est inserido, que ao mesmo tempo influencia e influenciado pelo que o indivduo aprende. Le Boterf (1999) refora esse entendimento,

    Chaves daAprendizagem Individual

    (Pestalozzi)

    Domnios deObjetivos Educacionais

    Bloom

    Cabea (Head)

    Mo (Hand)

    Corao (Heart)

    Cognitivo

    Psicomotor

    Afetivo

    Conhecimentos

    Habilidades

    Atitudes

    Dimenses da

    Competncia(Durand)

    Figura 2: As relaes entre a aprendizagem e a competncia.

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    ser necessariamente monetrios, pois h estudos que mostram que as pessoas atribuem grandevalor a benefcios no monetrios, como tempo livre de trabalho e orientao de carreira,entre outros (McCLELLAND, 1985).

    Como descrito, para favorecer o desenvolvimento e a expresso de competncias notrabalho, as organizaes podem atuar tanto sobre componentes disposicionais promovendoa aprendizagem de conhecimentos, habilidades e atitudes , como sobre fatores situacionaiscriando um ambiente que seja estimulador da transferncia da aprendizagem para o trabalho.No obstante os esforos que tm sido realizados, sobretudo no campo terico, para explicar anatureza da competncia e de seus componentes, suas causas e efeitos, muitas questes aindapermanecem sem resposta, sugerindo a necessidade de se realizar mais investigaesempricas para compreender melhor a competncia e seus antecedentes. Isso remete necessidade de estabelecer uma agenda de pesquisas sobre o tema, o que ser sugerido aseguir.

    Consideraes FinaisA noo de competncia caracteriza-se como complexa e multifacetada, podendo ser

    interpretada de diferentes maneiras. Embora esse conceito tenha emergido na rea deAdministrao, algumas teorias, pesquisas e proposies de outras reas de conhecimento,como a Psicologia Social e Organizacional, ajudam a compreender a natureza da competnciae de seus componentes.

    Como visto neste ensaio, estudos relacionados atribuio de causa e aprendizagem,entre outros, podem ser utilizados para interpretar a noo de competncia, a partir da anlisede suas causas e conseqncias.

    Embora as investigaes e modelos de atribuio de causa sejam por definio

    relacionados s causas dos comportamentos, e no s suas conseqncias, os tericos daatribuio de causa poderiam considerar tambm os efeitos do comportamento em seusmodelos, expandindo a perspectiva da atribuio, conforme sugerido por Vonk (1998).Isso poderia contribuir para a melhor compreenso dos efeitos da competncia, isto , dovalor econmico e social gerado em decorrncia da expresso de competncias no trabalho.

    Alm disso, considerando o contexto de fragmentao terica no qual est inserida anoo de competncia, parece fundamental estudar empiricamente esse construto. Sobre isso,Brando (2006) comenta que, embora nos ltimos anos tenha ocorrido um aumento nonmero de pesquisas publicadas sobre competncias no trabalho, esse tema ainda carecemuito de investigaes empricas, em especial no Brasil.

    Esse autor analisou criticamente os relatos de pesquisas empricas sobre o assunto,publicados em importantes peridicos nacionais das reas de Administrao e Psicologia(Brando, 2006). Alm de identificar e discutir problemas e limitaes das pesquisasrevisadas, revelou carncias, lacunas e questes relevantes para estudo do tema. Seu trabalhodemonstrou que faltam pesquisas destinadas a examinar relaes entre varveis que so tidascomo causas e conseqncias da expresso de competncias no trabalho, de tal forma queimportantes pressupostos tericos, bastante mencionados pela literatura sobre o tema, aindacarecem de investigaes empricas.

    Este o caso de suposies como, por exemplo: a) o domnio de conhecimentos,habilidades e atitudes explica, em alguma medida, o desempenho no trabalho; b) a expresso

    de competncias profissionais agrega valor, seja ele econmico ou social, ao indivduo e organizao; c) conhecimentos, habilidades e atitudes como componentes da competnciahumanapossuem carter complementar e interdependente; d) a expresso de competncias

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    humanas no trabalho explica, em alguma medida, o desempenho organizacional; e e) a adoode estratgias de aprendizagem informal no trabalho est associada ao desenvolvimento decompetncias e melhoria do desempenho. Tais hipteses, embora representem pressupostostericos assumidos por diversos autores, conforme exposto neste ensaio, ainda necessitam de

    maior suporte emprico.Como essas e outras suposies precisam ser melhor investigadas, organizaes e

    pesquisadores poderiam se dedicar a, por exemplo:

    a) examinar as efetivas relaes entre conhecimentos, habilidades e atitudes, elementostidos como componentes ou dimenses da competncia profissional;

    b) investigar que fatores (disposicionais e situacionais) exercem maior influncia sobreo desempenho ou a expresso de competncias no trabalho;

    c) analisar como as competncias humanas (ou seus elementos constitutivos) mediamas relaes entre os estmulos presentes no ambiente organizacional e o

    comportamento adotado no trabalho;d) identificar que estratgias de aprendizagem no trabalho esto mais associadas ao

    desenvolvimento de competncias e melhoria do desempenho;

    e) examinar em que medida as competncias expressas por pessoas e equipes detrabalho influenciam o desempenho organizacional;

    f) identificar estmulos e barreiras ao desenvolvimento e ao compartilhamento decompetncias no trabalho;

    g) investigar como a expresso de competncias no trabalho agrega valor (econmicoe/ou social) a pessoas, equipes de trabalho e organizaes; e

    h) verificar em que medida o domnio de conhecimentos, habilidades e atitudes explicao desempenho humano no trabalho.

    Tratando-se de estudo sobre um conceito em evidncia e cujos pressupostos aindacarecem de investigaes empricas, espera-se que este ensaio tenha oferecido contribuiesao debate terico e prtico em torno do tema, bem como indicado caminhos para estudosfuturos e ensejado a realizao de novas pesquisas.

    Notas

    1Embora neste ensaio se utilize a expresso gesto por competncias para denominar esse modelo de gesto,

    muitos autores adotam denominaes diferentes para expressar concepes semelhantes. comum naliteratura sobre o assunto a utilizao de termos como, por exemplo, gesto de competncias, gesto baseada em competncias e gesto de desempenho por competncias, entre outros, que, apesar dasdiferenas semnticas, representam essencialmente a mesma idia. Neste ensaio, optou-se por utilizar adenominao gesto por competncias porque a partcula por, quando utilizada na formao de adjuntos,indica fim, propsito, destino, desejo. Assim, a expresso gesto por competncias inspira a idia de que oesforo gerencial tem como propsito alavancar, desenvolver, mobilizar competncias, conforme sugerido porLe Boterf (1999) e Carbone et al. (2005).

    2 Alguns autores (HEENE; SANCHEZ, 1997; BRANDO; GUIMARES, 2002, por exemplo) classificam ascompetncias como humanas ou profissionais (aquelas relativas a indivduos) e como organizacionais (aquelasque constituem atributos da organizao, e no de indivduos isoladamente). Este ensaio trata apenas dacompetncia no nvel individual, como um atributo da pessoa.

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    GESTO POR COMPETNCIAS:MTODOS E TCNICAS PARA MAPEAMENTO DE COMPETNCIAS*

    * BRANDO, Hugo Pena; BAHRY, Carla Patricia. Gesto por competncias: mtodos e tcnicas paramapeamento de competncias. Revista do Servio Pblico RSP, Braslia, v. 56, n. 2,p. 179-194, 2005.

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    GESTO POR COMPETNCIAS:MTODOS E TCNICAS PARA MAPEAMENTO DE COMPETNCIAS*

    Introduo

    A Gesto por Competncias tem sido apontada como um modelo gerencial alternativoaos instrumentos tradicionalmente utilizados pelas organizaes. Baseando-se no pressupostode que o domnio de certos recursos determinante do desempenho superior de pessoas eorganizaes, esse modelo prope-se fundamentalmente a gerenciar o gap ou lacuna decompetncias, ou seja, a reduzir ao mximo a discrepncia entre as competncias necessrias consecuo dos objetivos organizacionais e aquelas j disponveis na organizao.

    A reduo ou eliminao de eventuais lacunas de competncias est condicionada aomapeamento das competncias necessrias consecuo da estratgia organizacional. Pararealizar esse mapeamento, a organizao pode fazer uso de diversos mtodos e tcnicas de

    pesquisa social, que auxiliam na realizao de um diagnstico, permitindo no apenas aidentificao da lacuna de competncias, mas tambm o planejamento de aes derecrutamento, seleo e desenvolvimento profissional, entre outras.

    Sob essa perspectiva, este artigo tem como objetivo apresentar alguns mtodos,tcnicas e instrumentos que podem ser utilizados para mapeamento de competncias emorganizaes pblicas e privadas. Para isso, apresenta-se a seguir uma reviso da literaturasobre o conceito de competncia, o mapeamento e a gesto por competncias, discutindo-seseus pressupostos e aplicaes. Ao final, so levantadas implicaes para o setor pblico eapresentadas recomendaes prticas.

    A noo de competncia

    O surgimento de modelos de gesto baseados na noo de competncia e, porconseguinte, sua incorporao ao ambiente organizacional, fizeram com que o termocompetncia adquirisse diferentes conotaes, conforme relata McLagan (1997). No sepretende aqui discutir as diversas correntes tericas e abordagens conceituais existentes, poiso assunto j foi suficientemente tratado por muitos autores (BRANDO e GUIMARES,2001; DUTRA, 2004; e FLEURY e FLEURY, 2001, entre outros).

    Assim, para efeito deste artigo, entende-se competncias individuais ou profissionaiscomo combinaes sinrgicas de conhecimentos, habilidades e atitudes, expressas pelodesempenho profissional dentro de determinado contexto ou estratgia organizacional

    (CARBONE et al., 2005; FREITAS e BRANDO, 2005). So reveladas quando as pessoasagem frente s situaes profissionais com as quais se deparam (ZARIFIAN, 1999) e servemcomo ligao entre atributos individuais e a estratgia da organizao (PRAHALAD eHAMEL, 1990).

    Sob essa perspectiva, a aplicao de conhecimentos, habilidades e atitudes no trabalhogera um desempenho profissional. Esse desempenho, por sua vez, expresso peloscomportamentos que a pessoa manifesta no trabalho e pelas suas conseqncias, em termos derealizaes e resultados (GILBERT, 1978). O desempenho da pessoa, ento, representa umaexpresso de suas competncias (BRANDO e GUIMARES, 2001). Por essa razo, algunsautores (SANTOS, 2001; e WHIDDETT e HOLLYFORDE, 1999) descrevem ascompetncias individuais sob a forma de comportamentos observveis no trabalho.

    * BRANDO, Hugo Pena & BAHRY, Carla Patricia. Gesto por competncias: mtodos e tcnicas paramapeamento de competncias. Revista do Servio Pblico RSP, Braslia, v. 56, n. 2, p. 179-194, 2005.

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    importante ressaltar, ainda, que alguns autores associam o conceito de competnciano apenas a pessoas, mas tambm a equipes de trabalho ou mesmo a organizaes. o casode Le Boterf (1999), para quem em cada equipe de trabalho se manifesta uma competnciacoletiva, que emerge das relaes sociais que se estabelecem no grupo e da sinergia entre as

    competncias individuais de seus membros. Prahalad e Hamel (1990), por sua vez, elevam oconceito ao nvel organizacional, referindo-se competncia como um atributo daorganizao. possvel, ento, classificar as competncias como individuais ouprofissionais(aquelas relacionadas a indivduos) e organizacionais (aquelas inerentes a toda a organizaoou a uma de suas unidades produtivas).

    A gesto por competncias

    A gesto por competncias prope-se a orientar esforos para planejar, captar,desenvolver e avaliar, nos diferentes nveis da organizao (individual, grupal eorganizacional), as competncias necessrias consecuo de seus objetivos, conforme

    explicam Brando e Guimares (2001). O diagrama disposto na Figura 1 apresenta asprincipais etapas ou fases desse processo.

    Trata-se de um processo contnuo, que tem como etapa inicial a formulao daestratgia da organizao, oportunidade em que so definidos sua misso, sua viso de futuroe seus objetivos estratgicos. Em seguida, so definidos indicadores de desempenho e metas,

    com base nos objetivos estratgicos estabelecidos.Segundo Carbone et al. (2005), uma vez formulada a estratgia organizacional, torna-

    se possvel realizar o mapeamento de competncias, o que constitui a segunda etapa doprocesso. O mapeamento objetiva identificar o gap ou lacuna de competncias, isto ,

    a diferena entre as competncias necessrias para concretizar a estratgia formulada e ascompetncias internas j disponveis na organizao, conforme ser discutido adiante.

    importante ressaltar que, na ausncia de aes de captao ou desenvolvimento decompetncias, por parte da organizao, essa lacuna tende a crescer. Isso porque acomplexidade do ambiente no qual as organizaes esto inseridas faz com que sejamexigidas cada vez mais novas competncias. As prprias competncias internas, j disponveisna organizao, podem tornar-se obsoletas com o passar do tempo. Por isso, fundamentalrealizar periodicamente o mapeamento e planejar a captao e o desenvolvimento decompetncias.

    Definir Misso,Viso de Futuroe ObjetivosEstrat icos

    FORMULAODA ESTRATGIAORGANIZACIONAL

    Estabelecer

    indicadores dedesempenho emetas

    ACOMPANHAMENTOE AVALIAO

    Acompanhare apurar osresultados

    alcanados

    Compararresultados

    alcanadoscom resultadosesperados

    RETRIBUIO

    Reconhecer epremiar o bomdesempenho

    Remunerar porcompetncias

    MAPEAMENTO DECOMPETNCIAS

    Identificar ascompetnciasnecessrias

    Inventariar as

    competnciasexistentes

    Mapearo gap decompetncias eplanejar acaptao e/ou odesenvolvimento

    CAPTAO DECOMPETNCIAS

    Selecionarcompetnciasexternas

    Admitir,alocar eintegrar

    DESENVOLVIMENTODE COMPETNCIAS

    Definirmecanismo dedesenvolvimento

    Disponibilizare orientar oaproveitamento

    Fi ura 1: Modelo de esto or com etncias.

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    A descrio de uma competncia, portanto, deve representar um desempenho oucomportamento esperado, indicando o que o profissional deve ser capaz de fazer. Essecomportamento deve ser descrito utilizando-se um verbo e um objetivo de ao1. A ele podeser acrescido, sempre que possvel e conveniente, uma condio na qual se espera que o

    desempenho ocorra. Pode incluir, ainda, um critrio que indique um padro de qualidadeconsiderado satisfatrio, conforme exemplos dispostos no Quadro 1 a seguir:

    Quadro 1: Exemplos de condies e critrios associados a competncias.

    COMPORTAMENTO(VERBO + OBJETO DA AO)

    CRITRIO CONDIO

    Realiza anlises financeiras com precisoutilizando diferentes modelos para estimaro retorno de investimentos

    Atende aos cidados (usurios

    do servio pblico)

    com presteza e

    cordialidade

    levando em considerao as suas

    expectativas e necessidades

    Na descrio de competncias, deve-se evitar:

    a)a construo de descries muito longas e a utilizao de termos tcnicos, quedificultem a compreenso das pessoas;

    b)ambigidades, como, por exemplo, implementa modelos de gesto bem sucedidosem outras organizaes. No se sabe, nesse caso, se a pessoa deve ser capaz deimplementar, na organizao em que trabalha, modelos de gesto que foram bemsucedidos em outras organizaes, ou, ento, implementar, em outrasorganizaes, modelos de gesto bem sucedidos. Essa redao ambgua, dandomargem dupla interpretao;

    c)irrelevncias e obviedades, como, por exemplo, coordena reunies que somarcadas. Neste caso, bastaria dizer: coordena reunies;

    d)duplicidades, como, por exemplo, soluciona problemas de forma criativa eoriginal;

    e)abstraes, como, por exemplo, pensa o indito, sugerindo idias que resolvamdivergncias. Neste exemplo, seria melhor dizer simplesmente: sugere idias

    para solucionar problemas; e

    f)a utilizao de verbos que no expressem uma ao concreta, ou seja, que norepresentem comportamentos passveis de observao no trabalho, como, porexemplo, saber, apreciar, internalizar, acreditar e pensar, entre outros.

    Para obter boas descries de competncias, Bruno-Faria e Brando (2003) sugerem:

    a)utilizar verbos que expressem uma ao concreta, ou seja, que representemcomportamentos observveis no trabalho, como, por exemplo, analisar, organizar,selecionar, operar, comunicar, avaliar e formular, entre outros;

    b)submeter as descries crtica de pessoas-chave da organizao, visandoidentificar possveis inconsistncias e inadequaes; e

    c)realizar validao semntica2 das competncias descritas, visando garantir quetodos os funcionrios compreendam o comportamento descrito.

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    Com base nessas consideraes sobre a descrio de competncias, pode-se, ento,discutir as principais tcnicas de pesquisa e procedimentos utilizados para identificarcompetncias relevantes consecuo dos objetivos organizacionais. Conforme descrito,geralmente primeiro realizada uma anlise dos documentos que compem o planejamento

    estratgico da organizao. Essa anlise de contedo da estratgia organizacional objetivaidentificar categorias, descrever objetivamente o contedo de mensagens e identificarindicadores que permitam fazer inferncias a respeito de competncias relevantes paraconcretizao dos objetivos da organizao, conforme sugerem Guimares et al. (2001).

    Ao assessorar o mapeamento de competncias em um rgo pblico, Bruno-Faria eBrando (2003) fizeram uma anlise detalhada do contedo de documentos que compunhamsua estratgia, publicados em portarias e decretos governamentais. Referido rgo eraresponsvel pela gesto de funes administrativas em uma unidade da federao, tendostatus de Secretaria de Estado. Entre suas atribuies, figuravam o planejamento, acapacitao e a gesto de servidores pblicos para diversos rgos do governo. Na viso de

    futuro dessa Secretaria, que expressava a situao futura desejada por ela para um perodoaproximado de 3 anos (amplitude temporal da viso), havia, entre outras, as seguintesmenes (GDF, 2001, p. 14):

    Recursos fsicos, materiais, tecnolgicos e financeiros adequados para odesempenho das atividades da Secretaria;

    Agentes pblicos capacitados, motivados e comprometidos com a

    excelncia dos servios prestados sociedade.

    Ou seja, ao final desse perodo, a Secretaria esperava possuir todos os recursos

    necessrios ao desempenho de suas funes, assim como prover o Estado de servidorespblicos qualificados e comprometidos com a qualidade dos servios prestados populao.Foram realizadas, ento, a anlise e a interpretao dessa viso de futuro e de outrosdocumentos disponveis na Secretaria. Verificou-se que, se o processo de desenvolvimentodos servidores ficasse limitado a aes formais de capacitao, as quais estavam sujeitas alimitaes oramentrias, dificilmente a Secretaria conseguiria concretizar a sua viso defuturo. Para conseguir os recursos de que necessitava e promover a capacitao dosservidores, seria preciso no s estabelecer parcerias com a sociedade civil organizada e osegmento empresarial, mas tambm estimular o autodesenvolvimento e a profissionalizaodos servidores. Pde-se inferir, ento, que para concretizar a viso de futuro, algunsservidores dessa Secretaria deveriam possuir, entre outras, as seguintes competncias

    individuais:Realiza parcerias com a sociedade civil e o segmento empresarial, visando

    obter recursos necessrios consecuo dos objetivos da Secretaria; e

    Planeja e implementa aes de comunicao interna (endomarketing) para

    estimular o autodesenvolvimento e a profissionalizao dos servidores

    pblicos.

    A entrevista constitui outra tcnica de pesquisa bastante aplicada ao mapeamento decompetncias. Geralmente utilizada para cotejar a percepo dos entrevistados com os dadosapurados na anlise documental, visando identificar as competncias relevantes

    organizao, a exemplo do que foi realizado por Brando et al.(2002) em um banco pblico.

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    Neste caso, o entrevistador seleciona as pessoas a serem entrevistadas entre aquelasque possuem maior conhecimento da organizao. Depois, formula um roteiro de perguntas eagenda as entrevistas. Ao iniciar a coleta de dados, o entrevistador deve expor ao respondenteos objetivos do trabalho e a importncia de sua colaborao, bem como garantir o anonimato

    para quaisquer declaraes. Deve-se, ainda, valorizar a participao do respondente, buscandouma relao de empatia, conforme descrito por Lodi (1991).

    Para compor o roteiro da entrevista, Carbone et al. (2005) sugerem a utilizao dequestes, como, por exemplo: Que competncias profissionais voc julga relevantes para aconsecuo dos objetivos organizacionais? Para que a organizao consiga concretizar suaestratgia, os funcionrios devem ser capazes de qu? Como voc reconhece um desempenhocompetente?

    recomendvel gravar os depoimentos e registrar notas que facilitem a compreensodas respostas. Findas as entrevistas, as respostas devem ser transcritas e analisadas, conformesugerem Richardson et al. (1999), visando identificar e descrever de forma objetiva as

    competncias mencionadas pelos entrevistados como relevantes. Na anlise do contedo dasentrevistas, deve-se interpretar o discurso do entrevistado, procurando identificar aspectossubjacentes s respostas (CARBONE et al., 2005).

    No mapeamento de competncias relevantes a atendentes da rea de seguridade (emum banco comercial), por exemplo, Brando et al. (2001) formularam a seguinte pergunta:Que competncias voc julga importantes para que atendentes possam prestar umatendimento de excelncia ao cliente?. O respondente, um executivo da empresa, deu odepoimento a seguir:

    Acho muito importante o atendente interpretar o comportamento doconsumidor. Voc sabia que l em Belo Horizonte um funcionrio

    percebeu que homens recentemente divorciados so mais predispostos aadquirir planos de previdncia privada para seus filhos? Isto porque se

    sentem culpados por estarem pouco presentes na educao das crianas.

    Dessa forma, buscam alguma compensao para os filhos, algo que possa

    contribuir para o seu bem-estar futuro.

    Realizada a anlise do contedo dessa e de outras respostas, os autores chegaram descrio das competncias profissionais consideradas relevantes para atendentes de empresaestudada, sendo uma delas assim descrita: Identifica oportunidades negociais a partir doconhecimento do comportamento do consumidor. importante, ainda, verificar a freqnciacom que cada competncia mencionada nas entrevistas, visto que o nmero de menes

    realizadas a respeito de determinado item um indicativo da sua relevncia, conformesugerem Brando et al. (2002).

    Muitas vezes, nem o pesquisador nem os profissionais objeto do estudo dispem detempo para entrevistas individuais. Nesse caso, uma alternativa realizar uma entrevistacoletiva, tambm denominada grupo focal ou focus group. Em um grupo focal,o entrevistador atua como um moderador, estimulando e coordenando a discusso dosparticipantes a respeito de determinado tema, a fim de obter os dados desejados(MATTAR, 1996).

    Os grupos geralmente possuem entre 5 e 10 participantes, pois nmero superior a essepode dificultar a expresso de todos os componentes, enquanto nmero inferior pode no

    gerar idias ou manifestaes suficientes. recomendvel, ainda, que os participantes tenhamcaractersticas demogrficas e socioeconmicas semelhantes, para que haja identificao eintegrao entre eles, facilitando a discusso, conforme recomendado por Mattar (1996).

  • 8/6/2019 Curso Gesto por Competncias

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    Curso Gesto por Competncias

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    Segundo Carbone et al. (2005), a exemplo do que ocorre na entrevista individual,o entrevistador necessita elaborar um roteiro de questes e estabelecer os procedimentos pararegistro dos dados, o tamanho e a composio do grupo. A discusso realizada pelo grupofocal deve ser transcrita e analisada, visando identificar quais competncias os entrevistados

    mencionaram como relevantes organizao.Para identificar o comportamento competente, o pesquisador pode optar, ainda, pela

    observao. Esta constitui-se em uma anlise detalhada do objeto estudado, ou seja, dascompetncias relevantes ao trabalho das pessoas.

    Segundo Viegas (1999) e Mattar (1996), a observao pode ser do tipo participante,quando o investigador atua como se fosse um integrante da equipe de trabalho. Pode, ainda,ser do tipo no participante, quando o observador no compe a equipe, atuando apenascomo um espectador.

    Independentemente do tipo de observao realizada, fundamental, para o bom

    desenvolvimento do processo de coleta de dados, que seja mantido um relacionamentoamistoso e um clima de confiana entre o investigador e os componentes da equipe detrabalho. Por meio da observao, torna-se possvel identificar as competncias queindivduos e grupos expressam no trabalho e o grau de importncia delas para o exerccio deuma atividade.

    Carbone et al. (2005) ressaltam que uma das vantagens da observao, nomapeamento de competncias, refere-se possibilidade de verificar detalhes do desempenhode pessoas e grupos, identificando dados que poderiam ser omitidos pelos pesquisados, caso acoleta fosse realizada por meio de entrevistas ou questionrios.

    O questionrio, por sua vez, talvez a tcnica mais utilizada para mapear

    competncias relevantes a um contexto organizacional. A formatao desse instrumento depesquisa geralmente requer a aplicao prvia de uma ou mais das tcnicas j relatadas(anlise documental, observao e entrevista), com o objetivo de identificar elementos paracompor os itens do questionrio, a exemplo do trabalho realizado por Brando et al.(2001),em um banco pblico, e por Bruno- Faria e Brando (2003), em uma secretaria de Estado.

    Neste caso, o pesquisador identifica, por meio de anlise documental e/ou entrevistas,competncias consideradas relevantes organizao. Depois, ordena e descreve essascompetncias que devero compor os itens do questionrio , eliminando ambigidades,duplicidades e irrelevncias, conforme descrito por Brando et al. (2001). Para elaborao dosenunciados e itens do instrumento, deve-se evitar frases longas e expresses tcnicas,extremadas ou negativas, conforme sugerem Rocha e Christensen (1997), Viegas (1999) eRichardson et al. (1999).

    A prxima etapa consiste em definir a escala mais adequada para os respondentes doquestionrio avaliarem o grau de importncia das competncias. Segundo Brando et al.(2001), pode-se utilizar, por exemplo, uma escala do tipo diferencial semntico, tambmconhecida como escala de Osgood, que utiliza adjetivos de significados opostos em seusextremos. Neste caso, o enunciado do questionrio poderia ter o seguinte formato:

    Por favor, considerando os atuais objetivos da organizao em que voc

    trabalha, assinale um nmero de UM a SEIS, na escala direita de cada

    item, a fim de indicar o quo i