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DA EXPERIÊNCIA HUMANATESTEMUNHO
DA EXPERIÊNCIA HUMANATESTEMUNHO
HUMANAMas as coisas findas,muito mais que lindas,essas ficarão.
Homenagear Carlos Drummond de Andrade (1902–1987), no Projeto Memória, uma parceria entre a Fundação Banco do Brasil, a Petrobras e a Associação de Amigos da Casa de Rui Barbosa, é um pretexto para lançar um novo olhar sobre a fundamentação do problema da memória, que atravessa a obra do poeta. Memória de uma história da vida privada e pública, nacional e mundial, que está na origem da discussão sobre a preservação da memória histórica brasileira. Os exemplos mais evidentes são os poemas ou crônicas que tematizam acontecimentos históricos brasileiros ou mundiais, muitas vezes escritos no calor da hora e colados à notícia de jornal, cartas de protesto contra a morte ou desaparecimento, notícias que lembram a necessidade de lembrar. Ou aquelas que “fotografam” cidades históricas, artistas, monumentos do período colonial mineiro, em comunicação direta com aquele que trabalhou durante 17 anos no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN). Em sua poesia, delineia-se, antes de tudo, um diagnóstico sobre o grande perigo que corre o humano em nossos dias, junto com seu emblema maior, a poesia, que a própria poesia tenta preservar, fixando-a precariamente como a flor que nasce no asfalto. É assim que o poeta anuncia o nascimento de sua feia e precária flor: “Uma flor nasceu na rua!/Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego./Uma flor ainda desbotada/ilude a polícia, rompe o asfalto./Façam completo silêncio, paralisem os negócios,/garanto que uma flor nasceu.” A manifestação maior dessa morte na vida humana é a desumanização que chamamos “modernidade”, trazida pela presença maciça das máquinas, ou da “Grande Máquina”, no nosso cotidiano. Cantor do acontecimento, do presente, o poema absolutamente moderno se desfaz de sua feição tradicional passadista para nomear o agora: “O tempo presente é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes/a vida presente.” Nas crônicas, Drummond tratará, com sua elegância e fineza habituais, de problemas comezinhos e grandes, com frequência nos fazendo rir e chorar ao mesmo tempo. Pequenas intervenções na vida brasileira e mundial, numa tarefa sutil de salvamento do humano onde quer que ele se refugie, sinalizando o perigo iminente de sua destruição terminal. Cronista do presente e do passado, Drummond fixa a memória, patrimonializa a vida, testemunha sobre os fatos e coisas do presente no momento em que viram passado, atravessadas pela luminosidade opaca do tempo. Ou, como diz ele próprio no poema “Memória”:
João Cândido 2008
Rondon 2009Carlos Drummond de Andrade 2010
Brasil 500 anos 2000
Nísia Floresta 2006
Monteiro Lobato 1998
Paulo Freire 2005
Josué de Castro 2004
Oswaldo Cruz 2003
Juscelino Kubitschek 2002
Castro Alves 1997
Rui Barbosa 1999
Como se vê, criado em 1997, o Projeto Memória tem a missão de resgatar, difundir e preservar a memória cultural do País por meio de homenagens a personalidades que contribuíram para a transformação social e a construção da cultura brasileira. Sendo uma iniciativa da Fundação Banco do Brasil, desde 2004, o projeto conta com a parceria da Petrobras e, nesta edição, tem também como parceira a Associação de Amigos da Casa de Rui Barbosa.
O projeto oferece suporte a professores, pesquisadores e estudantes de todo o Brasil, por meio de peças desenvolvidas para contar a história de Carlos Drummond de Andrade. São elas: a exposição, que percorre cerca de 800 municípios; o material pedagógico, que será distribuído junto com o videodocumentário para aproximadamente 18 mil escolas públicas de ensino fundamental; o livro fotobiográfico, que é entregue com o vídeo para mais de 5 mil bibliotecas públicas; e o sítio na internet, que, além de contar a história de Drummond, disponibiliza, para serem baixadas, todas as peças citadas. Visite-o no endereço: www.fundacaobancodobrasil.org.br.
Projeto MeMória
DA EXPERIÊNCIA HUMANATESTEMUNHO
FUNDAÇÃO BANCO DO BRASIL
PresidenteJorge Alfredo Streit
Diretor Executivo de Desenvolvimento SocialÉder Marcelo de Melo
Diretor Executivo de Gestão de Pessoas, Controladoria e LogísticaDênis Corrêa
Gerente de Educação e CulturaMarcos Fadanelli Ramos
Assessoria técnicaJuliana Mary M. Ganimi Fontes
ASSOCIAÇÃO DE AMIGOS DA CASA DE RUI BARBOSA
PresidenteJoão Maurício de Araújo
Vice-PresidenteIrapoan Cavalcanti
Diretor-tesoureiroJoão Aguiar Sobrinho
Diretora-secretáriaMaria Augusta Brandão
FUNDAÇÃO CASA DE RUI BARBOSA
PresidenteJosé Almino de Alencar e Silva Neto
Diretora ExecutivaRosalina Maria Fernandes Gouveia
Diretora do Centro de PesquisaRachel Teixeira Valença
Diretora do Centro de Memória e InformaçãoAna Maria Pessoa dos Santos
Coordenador-Geral de Planejamento e AdministraçãoCarlos Renato Costa Marinho
Chefe do Arquivo-Museu de Literatura BrasileiraEduardo Coelho
PETROBRAS
PresidenteJosé Sergio Gabrielli de Azevedo
Diretor de ComunicaçãoWilson Santarosa
Gerente de PatrocínioEliane Costa
Gerente de Patrocínio CulturalTais Wohlmulth Reis
PRODUTORA CULTURAL
Abravideo
Texto e PesquisaJoão Camillo Penna
Coordenação GeralElizabete Braga
Assistente de PesquisaMariana Quadros
Pesquisa Histórica e IconográficaSilvana Jeha
Imagens de ArquivoArquivo-Museu de Literatura Brasileira - FCRB
Arquivo NacionalArquivo Público Mineiro
Biblioteca José e Guita MindlinFundação Biblioteca Nacional
Fundação Casa de Rui BarbosaFundação Getulio Vargas
Instituto de Estudos Brasileiro - USPInstituto Moreira Salles
Jornal do BrasilMuseu de Arte Moderna - RJ
Museu Histórico Abílio BarretoSecretaria de Turismo de Itabira
Revisão de TextosCely Curado
Ana Paula Belchor
Análise PedagógicaRosa Gens
Martha AlkiminAna Crelia DiasManoel Santana
Digitalização e tratamento de imagensTrio Studio
Projeto GráficoRuth Freihof – Passaredo Design
Chistiane Krämer
Supervisão Geral Ruy Godinho
Painel 1 e banner externo:Dolores e Carlos Drummond - Arquivo Carlos Drummond de Andrade -
AMLB/FCRB
Drummond - Luiz Alphonsus/Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
Casario de Itabira com pico do Cauê ao fundo. Início do século XX| Secretaria de Turismo de Itabira/Museu de Itabira
1 | CANÇADO, José Maria. Os sapatos de Orfeu: Biografia de Carlos Drummond de Andrade. Rio de Janeiro: Globo, 2006. p.35.
2 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Vila de Utopia. (Confissões de Minas, 1944). Prosa seleta. Rio de Janeiro: Aguilar, 2003. p. 212-213.
3 | ANDRADE, Carlos Drummond. Liquidação. (Boitempo, 1968). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 943.
4 | ANDRADE, Carlos Drummond. Itabira. (Alguma poesia, 1930). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 12.
5 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Autobiografia para uma Revista. (Confissões de Minas, 1944) Prosa seleta. Rio de Janeiro: Aguilar, 2003. p. 197.
Nos anos 1920 o sobrado foi vendido.
Fazenda do Pontal ou dos Doze Vinténs, propriedade da família de Drummond onde ele passava as férias na infância | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
ItabIra (Alguma poesia, 1930)
Cada um de nós tem seu pedaço no pico do Cauê.Na cidade toda de ferro as ferraduras batem como sinos. Os meninos seguem para a escola. Os homens olham para o chão. Os ingleses compram a mina.
Só, na porta da venda, Tutu Caramujo cisma na derrota incomparável.4
LiquidaçãoLiquidação (Boitempo, 1968)
A casa foi vendida com todas as lembrançastodos os móveis todos os pesadelostodos os pecados cometidos ou em via de cometera casa foi vendida com seu bater de portascom seu vento encanado sua vista do mundo seus imponderáveis por vinte, vinte contos.3
Carlos Drummond de Andrade nasce em Itabira do Mato Dentro, no interior de Minas Gerais, em 31 de outubro de 1902, em uma família de proprietários de terras.
O sobrado de Carlos Paula de Andrade, pai de Drummond, era “todo um sistema de poder”: a frente dava para a Câmara Municipal (onde Carlos de Paula Andrade era vereador valetudinário), para a visão de uma parte da Fazenda do Pontal, de propriedade da família, e para a cadeia.1
[...] Os passos ecoavam ainda nos mesmos imensos corredores, nas mesmas salas
infinitas. E nela existiam desvãos que nós nunca havíamos explorado. Por baixo da
escada, por cima da copa, aqui, ali, o mistério abria-nos os seus lares. Mas nós crescíamos
depressa e não púnhamos reparos na casa grande.2
[...] Declaro que nasci em
Itabira, Minas Gerais, no ano de
1902, filho de pais burgueses, que
me criaram no temor de Deus.5
3
a casa,
o Pico,
a cidade
Drummond aos 3 anos | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
Primeiro capítulo da adaptação de Robinson Crusoé de Daniel Defoe, publicada na revista O Tico-Tico em 1911| Lucia Loeb/Biblioteca José e Guita Mindlin
Colégio Anchieta, Friburgo, RJ | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
Colégio Arnaldo, Belo Horizonte, MG, década de 1920 | Arquivo Público Mineiro
Estuda com os padres alemães do Verbo Divino, no Colégio Arnaldo, em Belo Horizonte, e no Colégio Anchieta, em Friburgo, no estado do Rio de Janeiro, de onde é expulso por “insubordinação mental”. Anos depois, avalia a importância que a expulsão teve em sua vida: “[...] perdi a confiança na justiça dos que me julgavam. Mas ganhei vida e fiz alguns amigos inesquecíveis.”1
1 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Autobiografia para uma Revista. (Confissões de Minas, 1944). Prosa seleta. Rio de Janeiro: Aguilar, 2003. p. 197.
2 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Mal obrigado. (Tempo, vida, poesia: Confissões no rádio, 1986). Prosa seleta. Rio de Janeiro: Aguilar, 2003. p. 1.214.
3 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Infância. (Alguma poesia, 1930). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 6.
4
PriMeiras leituras e escola
A primeira reminiscência de sentido literário, que me acode,
não é propriamente de um texto de literatura, em verso ou prosa,
mas de um personagem de romance. Não do romance em si, mas
da figura projetada por ele. Porque o texto não era bem texto,
era uma coleção de legendas a uma coleção de figuras, na versão
infantil do Robinson Crusoé, de Defoe, na revista O Tico-
Tico, publicação da maior importância na formação intelectual
das crianças do começo deste século.2
InfâncIa (Alguma poesia, 1930) A Abgar
Renault
Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.Minha mãe ficava sentada cosendo.Meu irmão pequeno dormia.Eu sozinho menino entre mangueiraslia a história de Robinson Crusoé,comprida história que não acaba mais.
No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeua ninar nos longes da senzala — e nunca se esqueceuchamava para o café.Café preto que nem a preta velhacafé gostosocafé bom.
Minha mãe ficava sentada cosendoolhando para mim:— Psiu... Não acorde o menino.Para o berço onde pousou um mosquito.E dava um suspiro... que fundo!
Lá longe meu pai campeavano mato sem fim da fazenda.
E eu não sabia que minha históriaera mais bonita que a de Robinson Crusoé.3
Drummond aos 11 anos de idade | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
“Aula de francês de Mestre Emílio. Itabira, 191...” Legenda de Drummond | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
No período, Drummond desenvolve intensa atividade jornalística, fazendo crítica de cinema; escreve sobre música popular, sobre Greta Garbo e Charlie Chaplin, sobre o sambista João da Bahiana.
Sobre Greta Garbo, de maneira iconoclasta, começa manifestando a sua opinião sobre a beldade de Hollywood, de maneira polêmica:
[...] Meditemos um pouco à beira dessa senhora e concluamos que ela é, em
primeiro lugar, feia. (Minas Gerais, 18-V-1930)
ruas (Boitempo, 1968)
Por que ruas tão largas?Por que ruas tão retas?Meu passo tortofoi regulado pelos becos tortosde onde venho.Não sei andar na vastidão simétricaimplacável.Cidade grande é isso?Cidades são passagens sinuosasde esconde-escondeem que as casas aparecem-desaparecemquando bem entendem
e todo mundo acha normal.Aqui tudo é expostoevidentecintilante. Aquiobrigam-me a nascer de novo, desarmado.2
Sobre Carlito, de Charlie Chaplin:
Afinal, Carlito é um homem que deu a volta ao cômico. E que verificou a
precariedade e a contingência do cômico, máscara tênue demais para disfarçar a
seriedade profunda da vida. (Minas Gerais, 8-IV-1930)
Anos depois, em A rosa do povo (1945), ele escreverá “Canto ao homem do povo Charlie Chaplin”:
[...]Falam por mim os que estavam sujos de tristeza e feroz desgosto de tudo,que entraram no cinema com a aflição de ratos fugindo da vida,são duras horas de anestesia, ouçamos um pouco de música,visitemos no escuro as imagens — e te descobriram e salvaram-se.
Falam por mim os abandonados da justiça, os simples de coração,os párias, os falidos, os mutilados, os deficientes, os recalcados,os oprimidos, os solitários, os indecisos, os líricos, os cismarentos,os irresponsáveis, os pueris, os cariciosos, os loucos e os patéticos.
E falam as flores que tanto amas quando pisadas,falam os tocos de vela, que comes na extrema penúria, falam a mesa,
[os botões,os instrumentos do ofício e as mil coisas aparentemente fechadas,cada troço, cada objeto do sótão, quanto mais obscuros mais falam.3
[...]
Sua mudança para Belo Horizonte deu-se em
1920, tendo morado em diversas pensões, no Hotel
Avenida, no Internacional e na rua Silva Jardim,
nos números 117 e 127.1
5
Belo Horizonte
1 | NAVA, Pedro. Beira-Mar. São Paulo: Ateliê Editorial; Ed. Giordano, 2003. p. 192.
2 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Ruas. (Boitempo, 1968). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p.1.093-1.049.
3 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Canto ao homem do povo Charle Chaplin. (A rosa do povo, 1945). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 220-227.
Grande Hotel na rua da Bahia, Belo Horizonte, MG, década de 1930 | Acervo do Museu Histórico Abílio Barreto
O personagem Carlito, de Charles Chaplin, no filme Em busca do ouro, de 1925 | Bettmann/Corbis/Latinstock
Cine Teatro Glória. Drummond escreveu em diversos jornais, fazendo assiduamente crítica de cinema. Belo Horizonte, 1929 | Acervo do Museu Histórico Abílio Barreto
Em 1924, uma caravana modernista de São Paulo, que incluía Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e o poeta franco-suiço Blaise Cendrars, aporta em Belo Horizonte. Drummond e seus amigos Pedro Nava, Martins de Almeida, João Alphonsus, Emílio Moura, todos jovens mineiros escritores que se iniciavam nas atividades literárias, acorrem ao Grande Hotel, onde estava hospedada a trupe paulistana.
O encontro é de grande importância para os jovens, que iniciam assíduas correspondências com Mário de Andrade, as quais se estendem pelos próximos anos. Para os paulistas, a “viagem de descoberta do Brasil” significava injetar uma profundidade histórica à reflexão sobre a modernidade, que o movimento modernista de 1922 encarnava. Para os mineiros, os paulistas vieram lhes fazer descobrir Minas, uma vez que eles só tinham olhos para a Europa.1 Para os paulistas, Minas lhes mostra o Brasil.
Antes da publicação de seu primeiro livro, Alguma poesia, em 1930, Drummond publica vários dos poemas que depois integrariam seu primeiro volume de poesias, em revistas que desdobram a lição do Modernismo de 1922.
Em 1929, publica-se um número de O Jornal sobre Minas Gerais, por iniciativa do editor, Rodrigo M. F. de Andrade. A ênfase é o barroco mineiro. Ao mesmo tempo, reúne-se aqui, pela primeira vez, um núcleo de pessoas congregadas em torno de Rodrigo M. F. de Andrade, que formará adiante, em 1937, o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o SPHAN, onde Drummond trabalhará muitos anos (1945-1962). Ali estão Mário de Andrade, Manuel Bandeira, o próprio Drummond, entre outros. Nessa publicação, podemos entrever o plano-piloto do SPHAN, oito anos antes de sua fundação.
1 | SANTIAGO, Silviano. Suas cartas, nossas cartas. In: SANTIAGO, Silviano (org.) Carlos & Mário: Correspondência de Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade. Rio de Janeiro: Bem-te-vi, 2003. p.16.
2 | SANTIAGO, Silviano (org.) Carlos & Mário: Correspondência de Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade. Rio de Janeiro: Bem-te-vi, 2003. p. 232.
6
o ModernisMo
“Grupo dos cinco”: Mário de Andrade e Tarsila do Amaral tocando piano; Oswald de Andrade e Menotti Del Picchia deitados no tapete; e Anita Malfatti deitada no sofá. Anita Malfatti, 1922 | Lucia Loeb/Coleção Mário de Andrade/Instituto de Estudos Brasileiros-USP
Publicado na Revista de antropofagia (São Paulo, julho de 1928), editada por Oswald de Andrade, “No meio do caminho” é um manifesto do nosso Modernismo. Mário de Andrade inicialmente não gosta, mas depois se curva à estranheza do poema: Acho isto formidável. Me irrita e me ilumina. É símbolo.2
Capa do número três da Revista de Antropofagia, primeira publicação de “No meio do caminho”. São Paulo, julho de 1928| Lucia Loeb/Biblioteca José e Guita Mindlin
Revista Verde, onde publicou pela primeira vez o poema “Quadrilha”. Cataguazes, novembro de 1927| Lucia Loeb/Biblioteca José e Guita Mindlin
Retrato de Mário de Andrade. Lasar Segall, 1927 | Coleção Mário de Andrade/Instituto de Estudos Brasileiros-USP
“Viagem de Sabará”, texto de Drummond publicado em O Jornal. Rio de Janeiro, 1929 | Coleção Mário de Andrade/Instituto de Estudos Brasileiros-USP
Poema de sete faces (Alguma poesia, 1930)
Quando nasci, um anjo tortodesses que vivem na sombradisse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homensque correm atrás de mulheres.A tarde talvez fosse azul,não houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:pernas brancas pretas amarelas.Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.Porém meus olhosnão perguntam nada.
O homem atrás do bigodeé serio, simples e forte.Quase não conversa.Tem poucos, raros amigoso homem atrás dos óculos e do bigode.
Meu Deus, por que me abandonastese sabias que eu não era Deusse sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo,se eu me chamasse Raimundoseria uma rima, não seria uma solução.Mundo mundo vasto mundo,mais vasto é meu coração.
Eu não devia te dizermas essa luamas esse conhaquebotam a gente comovido como o diabo.2
Alguma poesia, publicado em 1930, que completou 80 anos em 2010, é considerado até hoje o mais impressionante livro de estreia de um poeta brasileiro. Drummond pensava chamá-lo “Minha terra tem palmeiras”. Num dado momento, pensa em destruir o volume. O amigo Mário de Andrade, a quem o volume é dedicado, o impede: “Isso você não tem direito de fazer e seria covardia. Você pode ficar pratiquíssimo na vida se quiser porém não tem direito de rasgar o que já não é mais só seu, que você mostrou pros amigos e eles gostaram. [...] Eu quero uma cópia de todos os seus versos para mim. Quero e exijo, é claro.”1 O poema de abertura é “Poema de sete faces”. Apresentação inicial e definitiva da persona frágil e desajeitada do poeta gauche, o poema se constrói a partir de elementos heterogêneos e desencontrados, justapostos. A quarta estrofe contém uma descrição do autor, na época.
1 | SANTIAGO, Silviano (org.). Carlos & Mário: Correspondência de Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade. Rio de Janeiro: Bem-te-vi, 2003. p. 215.
2 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Poema de sete faces. (Alguma poesia, 1930). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 5.
7
alGuMa Poesia
Andando em Belo Horizonte, 1932 | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
Capa da primeira edição de Alguma poesia. Belo Horizonte, Edições Pindorama, 1930| Marcella Azal/Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
Datiloscrito do poema “Nota social” de 1923, com intervenções manuscritas de Mário de Andrade. A versão definitiva será incluída em Alguma poesia| Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
O atual Palácio Gustavo Capanema, concluído em 1945, foi construído para sediar o Ministério da Educação e Saúde Pública. O prédio, projetado por Lúcio Costa, Affonso Eduardo Reidy, Carlos Leão, Oscar Niemeyer e outros, é o emblema do advento da arquitetura moderna no Brasil.3 Drummond tem influência nos rumos do concurso que escolhe o projeto vencedor.
A Revolução de 1930, que depõe Washington Luís e empossa Getúlio Vargas na presidência do Brasil, encontra Drummond no cargo de auxiliar de gabinete do Secretário do Interior de Minas Gerais, Cristiano Machado, do lado vitorioso. Ele chega à burocracia pelo jornalismo, como redator do jornal Diário de Minas, órgão do Partido Republicano Mineiro (PRM).1 Drummond participa lateralmente da revolução, em Barbacena, redigindo telegramas e fazendo caricaturas irônicas de revolucionários.2
Na Revolução Constitucionalista de 1932, Drummond é chefe de gabinete de Capanema, que substituíra Cristiano Machado na Secretaria do Interior. Mais uma vez, o poeta encontra-se do lado vitorioso.
Após a visita com Capanema ao local da Batalha de Passa Quatro, escreve o texto “O soldado do túnel”, que lê na rádio:
[...] Foi então que vi o soldado desenhando-se vagamente na estreita fita de luz, onde havia
a paisagem e havia o cano da arma. A presença humana denunciava-se naquelas alturas pelo
som capcioso das balas, de uma parábola instantânea. Mas na serra enorme vi apenas um
homem feito de pau, de ferro, de substâncias diferentes, um ser sem necessidades e sem desvios,
agindo certo, visando o certo, atirando firme. Vi o soldado lutando.
No fim de 1934, Gustavo Capanema, o novo ministro da Educação e Saúde, convidou Drummond para ser seu chefe de gabinete na capital federal, Rio de Janeiro.
Visitando com Gustavo Capanema o front da Revolução de 1932. Estação do Túnel em Passa Quatro, MG, fronteira com São Paulo | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
Drummond em seu gabinete. Belo Horizonte, década de 1930
| Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
1 | SANTIAGO, Silviano. Suas cartas, nossas cartas. In: SANTIAGO, Silviano (org.) Carlos & Mário: Correspondência de Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade. Rio de Janeiro: Bem-te-vi, 2003. p. 30-33.
2 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Tempo, vida, poesia: Confissões no rádio. In: ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa seleta. Rio de Janeiro: Aguilar, 2003. p. 1.250.
3 | WISNIK, Guilherme. Lúcio Costa. São Paulo: Cosac & Naify, 2001. p. 52-125.
8
o HoMeM PÚBlico
Revolução de 1930. Manifestação na praça da Liberdade em Belo Horizonte. Ao fundo o Palácio da Liberdade | Acervo do Museu Histórico Abílio Barreto
Um novo, claro BrasilSurge, indeciso, da pólvora.Meu Deus, tomai conta de nós.
Trecho do poema “Outubro 1930”
9
Poesia e PolÍtica
Sentimento do mundo sai em 1940, em tiragem de 150 exemplares, numa edição clandestina, que circula por fora das livrarias e dos controles da censura do Estado Novo de Getúlio Vargas. A poesia participante encontra ali uma tonalidade nunca antes vista no Brasil.2 Há uma contradição explícita entre a obra e a posição de Drummond como secretário de gabinete do ministro da Educação e da Saúde Pública, do Estado Novo. Tal fato pode ser considerado revelador de nuances no interior do próprio programa de Gustavo Capanema, aberto para o modernismo revolucionário, representado por Drummond, na cultura, e bem menos aberto, no que toca, por exemplo, à educação. Exemplo disso é o fechamento da Universidade do Distrito Federal (UDF), projeto de Anísio Teixeira, do movimento da Escola Nova, suspeito de ser comunista.3 Por outro lado, as simpatias de Drummond com posições de esquerda eram conhecidas na época e não o impediram de exercer a sua função burocrática.4
sentImento do mundo (Sentimento do mundo, 1940)
Tenho apenas duas mãose o sentimento do mundo,mas estou cheio de escravos,minhas lembranças escorreme o corpo transigena confluência do amor.
Quando me levantar, o céuestará morto e saqueado,eu mesmo estarei morto,morto meu desejo, mortoo pântano sem acordes.
Os camaradas não disseramque havia uma guerrae era necessáriotrazer fogo e alimento.Sinto-me disperso,anterior a fronteiras,humildemente vos peçoque me perdoeis.
Quando os corpos passarem,eu ficarei sozinhodesfiando a recordaçãodo sineiro, da viúva e do microscopistaque habitavam a barracae não foram encontradosao amanhecer
esse amanhecermais noite que a noite1
Com Getúlio Vargas e Gustavo Capanema na inauguração de novas seções da Colônia Juliano Moreira, atual Hospital Psiquiátrico Juliano Moreira. Rio de Janeiro, 1938 | Fundação Getulio Vargas - CPDOC
VII Congresso Nacional de Educação no estádio do Vasco. Drummond é o primeiro de pé, à esquerda. Em primeiro plano, Getúlio Vargas ladeado por Gustavo Capanema e Pedro Ernesto, prefeito do Distrito Federal. Agachado, atrás de Vargas, Anísio Teixeira. Rio de Janeiro, 1935| Fundação Getulio Vargas - CPDOC
Pilotis do Edifício do Ministério da Educação e Saúde| Fundação Getulio Vargas - CPDOC
Avenida Central. Centro do Rio de Janeiro, década de 1940 | Arquivo G. Ermakoff
mãos dadas (Sentimento do mundo, 1940)
Não serei o poeta de um mundo caduco.Também não cantarei o mundo futuro.Estou preso à vida e olho meus companheiros.Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.Entre eles, considero a enorme realidade.O presente é tão grande, não nos afastemos.Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,a vida presente.5
1 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento do mundo. (Sentimento do mundo, 1940). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 67.
2 | CANDIDO, Antonio. Fazia frio em São Paulo. Recortes. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2004. p. 24.
3 | SCHWARTZMAN, Simon. Tempos de Capanema. São Paulo: Paz e Terra; Ed. FGV, 2000. p. 226-230.
4 | CANDIDO, Antonio. Fazia frio em São Paulo. Recortes. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2004. p. 23.
5 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Mãos dadas. (Sentimento do mundo, 1940). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 80.
Soldados russos no campo de batalha em fevereiro de 1943 | Pictorial Parade/Getty Images
Datiloscrito da crônica “Educação em face da guerra”, proferida por Drummond no rádio em 1942 | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
10
Poesia e
MilitÂncia
carta a stalIngrado (A rosa do povo, 1945)
Stalingrado...Depois de Madri e de Londres, ainda há grandes cidades!O mundo não acabou, pois que entre as ruínas outros homens surgem, a face negra de pó e de pólvora, e o hálito selvagem da liberdade dilata os seus peitos, Stalingrado,seus peitos que estalam e caem, enquanto outros, vingadores, se elevam.[...]A poesia fugiu dos livros, agora está nos jornais.Os telegramas de Moscou repetem Homero.Mas Homero é velho. Os telegramas cantam um mundo novoque nós, na escuridão, ignorávamos.Fomos encontrá-lo em ti, cidade destruída, na paz de tuas ruas mortas mas não conformadas,no teu arquejo de vida mais forte que o estouro das bombas, na tua fria vontade de resistir.4
[...]todos morreram, estropiaram-se, os últimos defendem pedaçosnegros de parede, mas a vida em ti é prodigiosa e pulula como insetos ao sol, ó minha louca Stalingrado![...]
Em 13 de março de 1945, Drummond deixa o seu posto no gabinete de Gustavo Capanema.3 Desde 1944, Drummond participa da agitação política, fazendo parte das discussões para a formação de uma entidade de classe, a Associação Brasileira de Escritores (ABDE), e da União de Trabalhadores Intelectuais (UTI). Participa ativamente da organização do 1.° e do 2.° Congressos de Escritores (respectivamente ocorridos em 1945 e 1947). Dois meses depois de pedir sua demissão do Ministério da Educação e Saúde, ele aceita participar do Conselho Diretor da Tribuna Popular, órgão do Partido Comunista, e integra a redação do jornal. Logo se desencanta. Já no dia 22 de junho, comunica a sua resolução de deixar a direção do jornal. Em 5 de novembro, ele oficializa a sua saída.
A rosa do povo (1945) retoma e adensa o filão da poesia participante. Em torno do livro, forma-se toda uma frente literária antifascista.1 Drummond escreve “Carta a Stalingrado” no calor da hora da Batalha de Stalingrado, considerada uma das mais cruentas da história bélica do mundo. Ponto da virada da Segunda Guerra Mundial, a batalha, em que as forças alemãs foram sitiadas e destruídas pelo exército vermelho, marca o início da derrota nazista. Drummond constrói um hino à resistência política, que tem como pano de fundo a chacina dos quase dois milhões de pessoas em ambos os lados, segundo algumas estatísticas.2
a flor e a náusea (A rosa do povo, 1945)
Preso à minha classe e a algumas roupas, vou de branco pela rua cinzenta.Melancolias, mercadorias espreitam-me.Devo seguir até o enjôo?Posso, sem armas, revoltar-me?
Ao menino de 1918 chamavam anarquista. Porém meu ódio é o melhor de mim.Com ele me salvoE dou a poucos uma esperança mínima.[...]Uma flor nasceu na rua!Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.Uma flor ainda desbotadaIlude a polícia, rompe o asfalto.Façam completo silêncio, paralisem os negócios,garanto que uma flor nasceu.5
[...]
Fundação da Associação Brasileira de Escritores (ABDE), novembro de 1942. Sentados: Carlos Drummond de Andrade, Norberto Frontini, Peregrino Junior, Manuel Bandeira, Edgar Cavalheiro, Astrojildo Pereira, Francisco Assis Barbosa, Tito Batini. Em pé: Simões dos Reis, Pinheiro de Lemos, Aurélio Buarque de Holanda, Aydano do Couto Ferraz, Josué Montello, José H. Rodrigues, Genolino Amado, Graciliano Ramos, Marques Rebelo, Roberto Alvim Correia, Wilson Lousada, Wilson W.Rodrigues, Alves, Melo Lima, Rubem Braga, Vinicius de Moraes| Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
1 | CANÇADO, José Maria. Os sapatos de Orfeu. Biografia de Carlos Drummond de Andrade. São Paulo: Globo, 2006. p. 161-162.
2 | SANTIAGO, Silviano. Introdução à leitura dos poemas de CDA. Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p.xxxv.
3 | ANDRADE, Carlos Drummond de. O observador no escritório. Prosa Seleta. Rio de Janeiro: Aguilar, 2003. p. 977.4 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Carta a Stalingrado. (A rosa do povo, 1945). Poesia completa. Rio de Janeiro:
Aguilar, 2006. p. 200-202. 5 | ANDRADE, Carlos Drummond de. A Flor e a náusea. (A rosa do povo, 1945). Poesia completa. Rio de Janeiro:
Aguilar, 2006. p. 118-119.
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literatura e PatriMÔnio
ou “a Poesia das ruÍnas”
No final de 1945, Drummond é convidado por Rodrigo M. F. de Andrade para trabalhar na diretoria do Serviço Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN). Drummond trabalhará no SPHAN até a sua aposentadoria, em 1962.
Em 1951, Drummond faz uma viagem pelas cidades históricas de Minas Gerais. Dessa viagem temos um relato em prosa, “Contemplação de Ouro Preto”, e a série de poemas “Selo de Minas”, de Claro enigma (1951).
Ponto de recuo com relação à poesia participante de A rosa do povo, Claro enigma é uma espécie de “retirada estratégica”, um repúdio ao dogmatismo da “política stalinista do PCB”, experimentado por Drummond durante a sua curta participação no jornal Tribuna Popular.1
selo de mInas evocação mariana
A igreja era grande e pobre. Os altares, humildes.Havia poucas flores. Eram flores de horta.Sob a luz fraca, na sombra esculpida(quais as imagens e quais os fiéis?)ficávamos.
Do padre cansado o murmúrio de rezasubia às tábuas do forro,batia no púlpito seco,entranhava-se na onda, minúscula e forte, de incenso,perdia-se.
Mas, não se perdia...Desatava-se do coro a música deliciosa(que esperas ouvir à hora da morte, ou depois da morte, nas campinas do ar)e dessa música surgiam meninas — a alvura mesma — cantando.
De seu peso terrestre a nave libertada,como do tempo atroz imunes nossas almas,flutuávamosno canto matinal, sobre a treva do vale.2
V/ museu da Inconfidência
São palavras no chãoe memórias nos autos.As casas inda restam,os amores, mais não.
E restam poucas roupas,sobrepeliz de pároco,a vara de um juiz,anjos, púrpuras, ecos.
Macia flor de olvido,sem aroma governaso tempo ingovernável. Muros pranteiam. Só.
Toda história é remorso.3
estampas de Vila rica I/carmo
Não calques o jardimnem assustes o pássaro.Um e outro pertencem aos mortos do Carmo.
Não bebas a esta fontenem toques nos altaresTodas estas são prendasdos mortos do Carmo.
Quer nos azulejosou no ouro da talha,olha: o que está vivosão mortos do Carmo.
1 | CAMILO, Vagner. Drummond: da Rosa do Povo à Rosa das Trevas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. p.19, 174, 305.
2 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Selo de Minas. (Claro Enigma, 1951). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p.275.
3 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Estampas de Vila Rica. (Claro Enigma, 1951). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 275-277.
Drummond com Antonio Joaquim de Almeida, diretor do Museu do Ouro de Sabará. Ouro Preto, março de 1951 | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
Em visita a Ouro Preto, 1951 | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
Vista de Ouro Preto, MG. Em destaque o Museu da Inconfidência e Igreja de Nossa Senhora do Carmo | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
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a MÁQuina do Mundo (claro enigma, 1951)“A máquina do mundo” é um dos poemas mais comentados de Drummond. A referência a Dante na forma, a retomada
de um episódio de Os Lusíadas, de Camões, e o retorno ao impasse transcrito no seu “No meio do caminho” são alguns pontos que chamam a atenção no poema.
O poema tem uma narrativa simples: o poeta caminha por uma estrada de Minas Gerais e vê diante de si a máquina do mundo se abrir. Ela fala ao poeta, oferecendo-lhe “a total explicação da vida”. Por um breve momento, o poeta vislumbra a epifania do Universo, mas, ao final, surpreendentemente, recusa a oferta grandiosa. Há, no poema, tudo indica, traços da viagem que Drummond realizara às cidades históricas no início de 1951.1
O poema relata uma cena divida em seis partes: 2
1 | o encontro no meio do caminho
E como eu palmilhasse vagamenteuma estrada de Minas, pedregosa, e no fecho da tarde um sino rouco
se misturasse ao som de meus sapatos que era pausado e seco; e aves pairassem no céu de chumbo, e suas formas pretas
lentamente se fossem diluindona escuridão maior, vinda dos montese de meu próprio ser desenganado,
a máquina do mundo se entreabriupara quem de a romper já se esquivavae só de o ter pensado se carpia.
2 | a abertura da máquina do mundo e o anúncio de sua fala
Abriu-se majestosa e circunspecta,sem emitir um som que fosse impuronem um clarão maior que o tolerável
pelas pupilas gastas na inspeçãocontínua e dolorosa do deserto,e pela mente exausta de mentar
toda uma realidade que transcendea própria imagem sua debuxadano rosto do mistério, nos abismos.
Abriu-se em calma pura, e convidandoquantos sentidos e intuições restavama quem de os ter usado os já perdera
e nem desejaria recobrá-los,se em vão e para sempre repetimosos mesmos sem roteiro tristes périplos,
convidando-os a todos, em coorte,a se aplicarem sobre o pasto inéditoda natureza mítica das coisas,
assim me disse, embora voz algumaou sopro ou eco ou simples percussãoatestasse que alguém, sobre a montanha,
a outro alguém, noturno e miserável,em colóquio se estava dirigindo:
3 | o discurso do mundo
“O que procuraste em ti ou fora deteu ser restrito e nunca se mostrou,mesmo afetando dar-se ou se rendendo,e a cada instante mais se retraindo,
olha, repara, ausculta: essa riquezasobrante a toda pérola, essa ciênciasublime e formidável, mas hermética,
essa total explicação da vida,esse nexo primeiro e singular,que nem concebes mais, pois tão esquivo
se revelou ante a pesquisa ardenteem que te consumiste... vê, contempla,abre teu peito para agasalhá-lo.”
4 | a epifania do universo
As mais soberbas pontes e edifícios,o que nas oficinas se elabora,o que pensado foi e logo atinge
distância superior ao pensamento,os recursos da terra dominados,e as paixões e os impulsos e os tormentos
e tudo que define o ser terrestreou se prolonga até nos animaise chega às plantas para se embeber
no sono rancoroso dos minérios,dá volta ao mundo e torna a se engolfar,na estranha ordem geométrica de tudo,
e o absurdo original e seus enigmas,suas verdades altas mais que todosmonumentos erguidos à verdade:
e a memória dos deuses, e o solenesentimento de morte, que floresceno caule da existência mais gloriosa,
tudo se apresentou nesse relancee me chamou para seu reino augusto,afinal submetido à vista humana.
5 | a recusa do eu
Mas, como eu relutasse em respondera tal apelo assim maravilhoso,pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,
a esperança mais mínima — esse anelode ver desvanecida a treva espessaque entre os raios do sol inda se filtra;
como defuntas crenças convocadaspresto e fremente não se produzissema de novo tingir a neutra face
que vou pelos caminhos demonstrando,e como se outro ser, não mais aquelehabitante de mim há tantos anos,
passasse a comandar minha vontadeque, já de si volúvel, se cerravasemelhante a essas flores reticentes
em si mesmas abertas e fechadas;como se um dom tardio já não foraapetecível, antes despiciendo,
baixei os olhos, incurioso, lasso,desdenhando colher a coisa ofertaque se abria gratuita a meu engenho.
6 | o fechamento do mundo e a volta do eu à condição de caminhante
A treva mais estrita já pousarasobre a estrada de Minas, pedregosa,e a máquina do mundo, repelida,
se foi miudamente recompondo,enquanto eu, avaliando o que perdera,seguia vagaroso, de mãos pensas.
1 | BISCHOF, Betina. Razão da recusa. São Paulo: Nakin Editorial, 2005. p. 112.2 | BOSI, Alfredo. “A máquina do mundo” entre o símbolo e a alegoria. In: BOSI, Alfredo.Céu,
inferno. 2. ed. São Paulo: Duas Cidades: Ed. 34, 2003. p. 99-121. A divisão é de Alfredo Bosi.
1 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Nova bossa: a qualqueridade. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 2 fev. 1968.
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a crÔnica coMo coMentÁrio da Vida
urBana e PolÍtica
Em 1954, Drummond começa a publicar três crônicas por semana no Correio da Manhã, em uma coluna intitulada “Imagens”. Ele permanecerá no Correio da Manhã até 1969, quando passará ao Jornal do Brasil. “A pipa”, sua primeira crônica, de 9 de janeiro de 1954, gira em torno do problema sistêmico da falta de água na cidade do Rio de Janeiro em 1954, auge da crise de distribuição de água na capital.
Em janeiro de 1968, no auge da ditadura militar brasileira, durante o mandato de Costa e Silva, pouco menos de um ano antes da declaração do AI-5, Drummond publica uma série de cinco crônicas, que satirizam o estado de exceção do governo brasileiro. João Brandão, personagem criado por Drummond para suas crônicas, é convidado por um general para ser o presidente do Brasil.
Para surpresa do marechal-presidente, JB não lhe apresentou nenhum projeto de ato
institucional estabelecendo preceitos revolucionários de terceiro grau, nem outros de nenhuma
espécie. Ficou entendido tacitamente que não era necessário baixar novas leis, por ser suficiente,
e até excessivo, o número de leis em vigor. [...] O Diário Oficial entrou a circular em branco,
prestando maiores serviços aos leitores, que passaram a ter papel para seus rascunhos e para
exercícios escolares de seus filhos. [...] Começou então a funcionar no território pátrio um novo
modo de ser, a qualqueridade. Termo [que] [...] significa o modo de ser de um qualquer, não-
herói, não-iluminado, não-portador de missão. No pensamento de JB, interpretado pela Agência
Nacional da maneira mais simples (a ‘Voz do Brasil ’ passou a irradiar sambas de Chico Buarque
e Caetano Veloso, em lugar do blablablá tradicional), qualquer um é bom para presidir o povo
[...]1
Moradores de Copacabana em fila para obtenção de água de uma bica. Rio de Janeiro, década de 1950
Caminhão pipa abastecendo uma residência de Copacabana. Rio de Janeiro, 1957
Passeata na rua Pompéia em protesto pela falta de água. Rio de Janeiro, dezembro, 1957
Mãe e filha apanham água com canecos numa via pública. Rio de Janeiro, década de 1950
| Fundo Correio da Manhã/Arquivo Nacional
“A Pipa”, primeira crônica no Correio da Manhã, sobre a falta de água no Rio. Coluna “Imagens do Rio”. 9 de Janeiro de 1954 | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
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a crÔnica e a Poesia da MeMória
Entre 1969 e 1984, Drummond escreve no Caderno B do Jornal do Brasil sobre temas diversos: crônica esportiva, samba, homenagens a personagens relevantes da cultura brasileira. Tudo o que corre perigo de desaparecer, de ser esquecido, ou que precisa ser lembrado é fixado em suas colunas. Sua posição: preservar, ao invés de destruir, ou “imolar”. É sempre o ponto de vista da intervenção patrimonial, antídoto contra a destruição, interferindo no ponto de junção em que a cultura confina com a política, e a política é um programa de sobrevivência e salvamento.
Os poemas de Boitempo são frequentemente construídos a partir de ma-terial resultante de pesquisa histórica. Bom exemplo é o poema “Homem li-vre”, baseado em anúncio de recompensa colocado por um parente de Drum-mond, para quem achasse o escravo fugido Atanásio, publicado na edição de O Jequitinhonha de 03/01/1869.
E m 1968, Drummond inicia a publicação de sua trilogia memorialística, Boitempo, a que se seguirá Menino antigo (Boitempo II, 1973) e Esquecer para lembrar (Boitempo III, 1979). O título consiste em um jogo de palavras em que se combinam “bom tempo”, o tempo filtrado pela memória, e “boi tempo”, o tempo do boi, com a retomada do motivo da infância na fazenda paterna em
Homem lIVre (Boitempo, 1968)
Atanásio nasceu com seis dedos em cada mão.Cortaram-lhe os excedentes.Cortassem mais dois, seria o mesmoadmirável oficial de sapateiro, exímio seleiro.Lombilho que ele faz, quem mais faria?Tem prática de animais, grande ferreiro.
Sendo tanta coisa, nasce escravo,o que não é bom para Atanásio e para ninguém.Então foge do Rio Doce.Vai parar, homem livre, no Seminário de Diamantina,onde é cozinheiro, ótimo sempre, esse Atanásio.
Meu parente Manuel Chassim não se conforma.Bota anúncio no Jequitinhonha, explicadinho:Duzentos mil-réis a quem prender crioulo Atanásio.Mas quem vai prender homem de tantas qualidades? 2
coleção de cacos (Boitempo, 1968)
Já não coleciono selos. O mundo me inquizila. Tem países demais, geografias demais. Desisto. Nunca chegaria a ter álbum igual ao do Dr. Grisolia,orgulho da cidade.E toda gente colecionaos mesmos pedacinhos de papel.Agora coleciono cacos de louçaquebrada há muito tempo. Cacos novos não servem.Brancos também não.Têm de ser coloridos e vetustos,desenterrados — faço questão — da horta.Guardo uma fortuna em rosinhas estilhaçadas,restos de flores não conhecidas.Tão pouco: só o roxo não delineado,o carmezim absoluto,o verde não sabendo a que xícara serviu.Mas eu refaço a flor por sua cor,e é só minha tal flor, se a cor é minhano caco de tigela.
O caco vem da terra como frutoa me aguardar, segredoque morta cozinheira ali depôspara que um dia eu o desvendasse.Lavrar, lavrar com mãos impacientesum ouro desprezadopor todos da família. Bichos pequeninosfogem de revolvido lar subterrâneo.Vidros agressivosferem os dedos, preçode descobrimento:a coleção e seu sinal de sangue;a coleção e seu risco de tétano;a coleção que nenhum outro imita.Escondo-a de José, por que não rianem jogue fora esse museu de sonho.1
Comentário sobre a situação ameríndia no Brasil. E esclarecimento sobre a sua participação no Estado Novo. A revista Veja havia publicado um resumo tendencioso da tese de Sérgio Miceli, Intelectuais e classe dirigente no Brasil (1920-1945l), sobre a cooptação de intelectuais durante o Estado Novo | JB/Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
1 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Coleção de cacos. (Boitempo, 1968). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 973-974.
2 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Homem livre. (Boitempo, 1968). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 887.
Anúncio da fuga do escravo Atanásio no jornal O Jequitinhonha. Diamantina, 3 de janeiro de 1869 | Arquivo Público Mineiro
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Poesia erótica
edições da oBra de druMMond
Para o sexo a exPIrar
Para o sexo a expirar, eu me volto, expirante.Raiz de minha vida, em ti me enredo e afundo.Amor, amor, amor — o braseiro radianteque me dá, pelo orgasmo, a explicação do mundo.
Pobre carne senil, vibrando insatisfeita,a minha se rebela ante a morte anunciada.Quero sempre invadir essa vereda estreitaonde o gozo maior me propicia a amada.
Amanhã, nunca mais. Hoje mesmo, quem sabe?enregela-se o nervo, esvai-se-me o prazerantes que, deliciosa, a exploração acabe.
Pois que o espasmo coroe o instante do meu termo,e assim possa eu partir, em plenitude do ser,de sêmen aljofrando o irreparável ermo.1
Nos últimos anos de vida, Drummond concentra o seu esforço maior na poesia amorosa e erótica. Publica em vida dois livros sobre o tema: Corpo (1984) e Amar se aprende amando (1985), deixando um terceiro pronto, para publicação póstuma, O amor natural (1992).
O último poema de Amor natural, um soneto:
Ilustração de Carlos Leão para a coletânea de poemas eróticos Amor, amores. Edições Alumbramento, 1975
| Carlos Leão/ AMLB/FCRB
1 | ANDRADE, Carlos Drummond de. Para o sexo a expirar. (Amor natural, 1992). Poesia completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2006. p. 1.389.
O prazer das imagens - 1987
Poesia errante - 1988
O amor natural - 1992
Farewell - 1996
Auto-retrato e outras crônicas - 4a ed. 1998
O elefante - 4a ed.2004
Aurora Collegial - 1918-1919
Alguma poesia - 1930
Brejo das almas - 1934
Sentimento do mundo - 1940
Poesias - 1942
Confissões de Minas - 1944
A rosa do povo - 1945
O gerente - 1945
Poesia até agora - 1948
Máquina do Mundo - 1949
Claro enigma - 1951
Contos de aprendiz - 1951
A mesa - 1951
Viola de bolso - 1952
Passeios na ilha - 1952
Fazendeiro do ar e poesia até agora - 1954
Sonêto da buquinagem - 1955
Ciclo - 1957
Fala, amendoeira - 1957
Poemas - 1959
A bôlsa e a vida - 1962
Lição de coisas - 1962
Cadeira de balanço - 1966
Versiprosa - 1967
Minas Gerais - 1967
José e outros - 1967
Boitempo - 1968
Reunião : 10 livros de poesia - 1969
Caminhos de João Brandão - 1970
O poder ultrajovem : e mais 79 textos em prosa e verso - 1972
As impurezas do branco - 1973
Menino antigo : Boitempo II - 1973
Atas Poemas - 1974
De notícias e não notícias faz-se a crônica - 1974
Amor, amores - 1975
A visita - 1977
Discurso de primavera e algumas sombras - 1977
O marginal Clorindo Gato - 1978
70 historinhas - 1978
Esquecer para lembrar : Boitempo III - 1979
Nudez - 1980
A paixão medida - 1980
Contos plausíveis - 1981
O pipoqueiro da esquina - 1981
A lição do amigo : car tas de Mário de Andrade a Carlos Drummond de Andrade - 1982
Nova reunião : 19 livros de poesia - 1983
Caso do vestido - 1983
Corpo: novos poemas - 1984
Boca de luar - 1984
O observador no escritório - 1985
Amar se aprende amando - 1985
História de dois amores - 1985
Pantanal - 1985
Mata Atlântica - 1985
Tempo, vida, poesia : confissões no rádio - 1986
Moça deitada na grama - 1987
O avesso das coisas - 1987
Edições da obra de Drummond | Marcella Azal/Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB
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cronoloGia1902 Nasce, a 31 de outubro, em Itabira do Mato Dentro, Minas
Gerais. É o nono filho do fazendeiro Carlos de Paula Andrade e de Julieta Augusta Drummond de Andrade.
1916 Torna-se aluno interno no Colégio Arnaldo, da Congregação do Verbo Divino, Belo Horizonte.
1919 É expulso do Colégio Anchieta mesmo depois de ter sido obrigado a retratar-se. Justificativa da expulsão: “insubordinação mental”.
1920 Muda-se com a família para Belo Horizonte.
1923 Ingressa na Escola de Odontologia e Farmácia de Belo Horizonte.
1924 Conhece Blaise Cendrars, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e Mário de Andrade no Grande Hotel de Belo Horizonte. Pouco tempo depois, inicia a correspondência com Mário de Andrade, que durará até poucos dias antes da morte de Mário, em 1945.
1925 Casa-se com Dolores Dutra de Moraes. Conclui o curso de Farmácia, mas não exerce a profissão, alegando querer “preservar a saúde dos outros”.
1928 Nasce, no dia 4 de março, sua filha Maria Julieta, que se tornará sua grande companheira ao longo da vida.
1930 Publica seu primeiro livro, Alguma poesia, em edição de 500 exemplares paga pelo autor, sob o selo imaginário “Edições Pindorama”, criado por Eduardo Frieiro.
Trabalha como auxiliar de gabinete do Secretário de Interior Cristiano Machado. Passa a oficial de gabinete quando seu amigo Gustavo Capanema substitui Cristiano Machado.
1933 Trabalha como redator de A Tribuna. Acompanha Gustavo Capanema quando este é nomeado Interventor Federal em Minas Gerais.
1934 Muda-se, com Dolores e Maria Julieta, para o Rio de Janeiro, onde passa a trabalhar como chefe de gabinete de Gustavo Capanema, novo Ministro de Educação e Saúde Pública.
1945 Publica A rosa do povo, pela José Olympio, e a novela O gerente. Colabora no suplemento literário do Correio da Manhã e na Folha Carioca.
Deixa a chefia de gabinete de Capanema, sem nenhum atrito com este, e, a convite de Luís Carlos Prestes, figura como editor do diário comunista, então fundado, Tribuna Popular, junto com Pedro Mota Lima, Álvaro Moreyra, Aydano do Couto Ferraz e Dalcídio Jurandir. Meses depois, se afasta do jornal por discordar da orientação do diário.
É chamado por Rodrigo Melo Franco de Andrade para trabalhar na Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, onde, mais tarde, se tornará chefe da Seção de História, na Divisão de Estudos e Tombamento.
1951 Publica Claro enigma, Contos de aprendiz e A mesa.
1954 Inicia, no Correio da Manhã, a série de crônicas “Imagens”, mantida até 1969.
1962 Aposenta-se como chefe de seção da DPHAN, após 35 anos de serviço público, recebendo carta de louvor do ministro da Educação, Oliveira Brito.
1968 Publica Boitempo & A falta que ama.
1969 Deixa o Correio da Manhã e começa a escrever para o Jornal do Brasil.
1975 Publica Amor, amores. Recebe o Prêmio Nacional Walmap de Literatura e recusa, por motivo de consciência, o Prêmio Brasília de Literatura, da Fundação Cultural do Distrito Federal.
1984 Despede-se também do Jornal do Brasil, com a crônica “Ciao”, depois de 64 anos de trabalho jornalístico.
1986 Sofre um infarto e é internado durante 12 dias.
1987 No dia 31 de janeiro, escreve seu último poema, “Elegia a um tucano morto”, que passa a integrar Farewell, último livro organizado pelo poeta.
É homenageado pela escola de samba Estação Primeira de Mangueira, com o samba-enredo “No reino das palavras”, que vence o Carnaval de 1987.
No dia 5 de agosto, depois de 2 meses de internação, falece sua filha Maria Julieta, vítima de câncer. O estado de saúde do escritor piora. 12 dias depois, falece o poeta, de problemas cardíacos, e é enterrado no mesmo túmulo que a filha, no Cemitério São João Batista do Rio de Janeiro.
Drummond no banco da praia de Copacabana em 1982, aos 80 anos, onde hoje em dia existe a sua estátua nesta mesma posição | Rogério Reis/Agência Tyba
Montagem de retratos feita por Drummond | Arquivo Carlos Drummond de Andrade - AMLB/FCRB