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Ficheiro modelo 2ª sessão

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Este artigo contém comentários às obras dos Prémios Nobel

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Rede Concelhia de Clubes de Leitura http://silvesalermais.blogspot.com

AUTORES PREMIADOS COM O NOBEL – Junho’14

Obras lidas pelo Clube de Leitura da BMS

- As belas adormecidas de Yasunari Kawabata (lida pela Vilma) - Memória das minhas putas tristes de Gabriel García Márquez (lida pela Ana Paula) - O último Verão de Klingsor de Hermann Hesse (lida por Paula Torres) - A saga de Gösta Berling de Selma Lagerlöff e Cadernos de Lanzarote (Diários I e II) (lida por Esmeralda Lopes) - O amor de Mítia de Ivan Búnin e Tudo o que tenho trago comigo de Herta Müller (lida por Lúcia Mendonça) - Outras cores: ensaios sobre a vida, a arte, os livros e as cidades de Orhan Pamuk (lida pela

Sónia Pereira)

Obras lidas pelo Clube de Leitura de Alcantarilha, Pêra e Armação de Pêra

- A terra das ameixas verdes de Herta Müller (lida pela Luísa)

- O velho e o mar de Hernest Hemingway (lida pela Ana Maia)

- A fábula de William Faulkner (lida por Afonso)

- Cem anos de solidão de Gabriel García Márquez (lida por Luís Ricardo)

- O adeus às armas de (lida por Octávio Paz)

- A bagagem do viajante de José Saramago (lida por Ana Santorio)

- Outras cores: ensaios sobre a vida, a arte, os livros e as cidades de Orhan Pamuk (lida pela

Sónia Pereira)

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Tudo o que tenho trago comigo de Herta Muller

“É muda a bagagem que carrego. Tão fundas e longas são estas malas

de silêncio, nunca por palavras conseguirei desfazê-las. Limito-me a

disfarçar a bagagem enquanto falo.”

Lúcia Mendonça

Outras cores: ensaios sobre a vida, a arte, os livros e as cidades de

Orhan Pamuk

Chega o Verão e acho que se activa o meu lado solar! Por outro lado, as

esplanadas ficam, de repente, aos meus olhos, mais sedutoras e a

disposição e convites para petiscos e concertos com amigos aumenta

interiormente, ao mesmo tempo que me apetecem textos mais curtos,

tematicamente mais variados e ligados à frescura da singularidade e

encanto de cada cidade. Também nunca tinha lido nada da literatura

turca e, portanto, a opção por esta obra foi verdadeiramente instintiva.

Mas foi, sem dúvida, a riqueza temática da obra que abarca capítulos como “Vida e preocupações”, “Livros e leituras”, “A Política, a Europa, e outros problemas por sermos nós mesmos”, “Os meus livros são a minha vida”, “Imagens e textos” e “Outras cidades, outras civilizações” (além de entrevistas e da conferência que Pamuk proferiu aquando da atribuição do Nobel), que me fez aderir afectiva e imediatamente a este título. Questões quotidianas, que constituem preocupações de todos (como deixar de fumar, ser-se feliz, questões sobre os nossos pais, o fantasma dos cataclismos naturais) encontram-se no primeiro capítulo, a explicação de por que alguns escritores (como Camus, Bernhard, Llosa, Nabokov, Dostoiévski, Hugo ou Rushdie) o fascinam e influenciaram de forma decisiva ou considerações sempre íntimas sobre o valor e prazer da literatura para si estão arrumadas no segundo, as ilusões e sonhos europeus, saber o que é ser mediterrânico, a política e as refeições familiares nos feriados religiosos são abordados no terceiro, questões relacionadas quer com os processos, hábitos, dificuldades e inseguranças que assolam o artista da palavra antes do término do seu trabalho são descritas no quarto capítulo, sendo o quinto dedicado à relação cúmplice de como as imagens e textos se combinam, complementam ou dialogam no espírito do ficcionista e o último aos seus primeiros encontros com os americanos e às suas impressões da capital do mundo. Descobri e percebi depois a beleza e força das palavras do Nobel com as suas considerações honestas, nada polidas e sempre muito pessoais, quer na análise da vida em geral, da sua própria e do seu percurso literário, quer na apreciação de outras figuras e culturas, alicerçadas numa visão e sentimentalidade humanistas e ecuménicas. Interessantíssimo também é este livro porque, como o próprio escritor afirma no prefácio “Este é um livro feito de ideias, imagens e fragmentos de vida que ainda não encontraram lugar num dos [seus] romances”, pelo que este livro de ensaios é muito ecléctico, tem um tom

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(quase) diarístico, familiar e leve mesmo quando explana sobre motivos mais sérios ou melancólicos. E, claro, este não poderia deixar de ser um livro amado por quem ama livros, já que grande parte das suas páginas é, de facto, uma homenagem ao poder da literatura e isto, na verdade, não é passível de ser explicado, mas apenas lido e sentido.

Memória das Minhas Putas Tristes de Gabriel García Márquez

“Há já alguns meses previra que a minha crónica de aniversário não

fosse o habitual lamento pelos anos passados, mas na realidade o

contrário: uma glorificação da velhice. Comecei por interrogar-me

quando tomei a consciência de ser velho e creio que foi muito pouco

tempo antes daquele dia. Aos quarenta e dois anos tinha ido a um

médico com uma dor nas costas que me incomodava para respirar. Ele

não lhe deu importância: é uma dor natural na sua idade, disse-me.

- Nesse caso- disse-lhe eu- o que não é natural é a minha idade.

O médico fez-me um sorriso de comiseração. Vejo que o senhor é um filósofo, disse-me. Foi a

primeira vez que pensei na minha idade em termos de velhice, mas não tardei a esquecer.

Habituei-me a acordar cada dia com uma dor diferente que ia mudando de lugar e forma à

medida que os anos passavam. Às vezes parecia ser um golpe de garra e no dia seguinte

esfumava-se. Por essa época ouvi dizer que o primeiro sintoma de velhice é que começamos a

parecer-nos com o nosso pai. Devo estar condenado à juventude eterna, pensei então, porque

o meu perfil equino não se parecerá nunca com o caribe puro que foi o meu pai nem com o

romano imperial da minha mãe. A verdade é que as primeiras mudanças são tão lentas que

não se notam, e continuamos a ver-nos de dentro como sempre tínhamos sido, mas os outros

vêem-nas por fora.

(…)

A minha idade sexual não me preocupou nunca, (…). Hoje rio-me dos rapazes de oitenta que

consultam o médico assustados por estes sobressaltos, sem saber que aos noventa são piores,

mas já não interessam: são os riscos de estar vivo. Em contrapartida, é um triunfo da vida que

a memória dos velhos se perca para as coisas que não são essenciais, mas que raras vezes

falhe para as que na verdade nos interessam. Cícero ilustrou-o de uma penada: Não há velho

que esqueça onde escondeu o seu tesouro.

Com estas reflexões, e outras várias, tinha acabado um primeiro rascunho da crónica quando o

sol de Agosto estoirou entre as amendoeiras do parque e o navio fluvial do correio, atrasado

uma semana pela seca, entrou bramindo no canal do porto. Pensei: Aí vêm os meus noventa

anos. Nunca saberei porquê, nem o pretendo, mas foi pelo conjunto daquela evocação

arrasadora que decidi telefonar a Rosa Cabarcas para que me ajudasse a honrar o meu

aniversário com uma noite libertina. Estava há anos em santa paz com o meu corpo, dedicado

à releitura errática dos meus clássicos e aos meus programas privados de música erudita, mas

o desejo daquele dia foi tão premente que me pareceu um recado de Deus. Depois do

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telefonema não pude continuar a escrever. Pendurei a rede num canto da biblioteca onde não

dá o sol pela manhã e deitei-me com o peito oprimido pela ansiedade da espera.”

Ana Paula

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