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  • Seis Anos: A desmaterializao do objeto de arte, de 1966 a 1972: um livro de consulta que informa acerca de algumas fronteiras estticas: consistindo em uma bibliografia na qual se inserem fragmentos de textos, obras de arte, documentos, entrevistas e simpsios, ordenados cronologicamente e centrando na assim chamada arte conceitual ou arte de informao ou arte de ideia, com referncias reas de denominaes to vagas como arte minimal, antiforma, arte sistema, arte da terra ou arte processo, que esto ocorrendo nas Amricas, Europa, Inglaterra, Austrlia e sia (ocasionalmente com conotaes polticas), editado por Lucy R. Lippard.

  • 1971Robert Barry apresenta trs exposies e uma crtica por Lucy R. Lippard. Yvon Lambert, Paris, abril de 1971. A crtica a seguinte:O convite enviado por correio da exposio atual de Robert Barry, na galeria Yvon Lambert de Paris diz: ROBERT BARRY apresenta trs exposies e uma crtica de LUCY R. LIPPARD. A Sra. Lippard uma crtica de arte americana. A exposio consiste em sua crtica e de uma caixa contendo cerca de 150 fichas que constituem os catlogos de trs exposies que a Sra. Lippard organizou nos anos de 1969 a 1971, cujos ttulos correspondiam ao nmero de habitantes de cada uma das cidades onde as exposies aconteceram: 557.087, em Seattle (EUA), 955.000, em Vancouver (Canad) e 2.972.453 em Buenos Aires (Argentina) (algumas fichas desta ltima exposio foram expressamente retiradas porque no seguiram as instrues de impresso).Desde 1968, Barry trabalha com fio de nylon, quase invisvel, radiao invisvel, mas existente, campos magnticos, ondas radiofnicas, telepatia, pensamentos esquecidos, qualidades no especficas que definem condies indefinidas. Esta exposio a terceira de uma srie de trabalhos apresentados por Barry. As duas anteriores foram relativas obra dos artistas James Umland e de Ian Wilson. Ela faz parte tambm de outro grupo, de 1969, que consiste em comentar o uso do espao da galeria e do sistema internacional de galerias para uma arte to desmaterializada que no necessita nada disso. A primeira obra deste grupo foi um anncio que dizia: Durante a exposio, a galeria permanecer fechada. Em janeiro de 1971, a galeria Yvon Lambert mostrou uma obra de Barry na qual se lia: Alguns lugares que podemos vir e, por um momento, ficarmos livres de pensar no que vamos fazer (Marcuse). Ler no o melhor termo; Barry no trabalha com palavras; comunica condies. Sua obra mais recente indica que entre arte e vida h uma juno mais que uma separao, no sentido de tentar definir (novamente dando voltas ao redor de algo) o papel do artista no mundo, no de um ponto de vista social (ainda que isto insinue um impacto social), mas sim do artista como um propositor de arte mais do que como uma pessoa. Talvez a pergunta mais importante das muitas propostas pela obra de Barry seja: O artista tem uma funo no mundo, e por isso deve mud-lo? Ou s um questionador que impe regras sobre a capacidade esttica dos outros, e sem ele o mundo seria um lugar diferente?

    *De minha parte, tenho tambm algumas perguntas. Uma crtica que no foi publicada em revista, mas que faz parte de uma exposio, pode ser considerada uma falsa crtica? Pode-se consider-la objetivamente? Ou vlida de qualquer forma, porque as pessoas leram, porque comentam a exposio da qual faz parte? Quem escreve uma critica um artista, ainda que no faa arte? Se um crtico denomina crtica o que faz, pode outra pessoa denomin-la de arte? O artista que expe a obra de um crtico somente como uma parte de seu trabalho (a maior parte sendo a apresentao em si) ele pode ser considerado um crtico? Um artista tem necessariamente que fazer arte? E, finalmente no importa sobre do que trata esta crtica. Seu potencial confirma-se pela sua existncia, mais do que pelo seu contedo.

    1 Fragmento traduzido para o portugus do original em ingls retirado do livro Six Years: The dematerialization of the art object from 1966 to 1972, organizado e comentado por Lucy Lippard, Berkeley e Los Angeles, University of Califrnia Press, edio de 1997, pp. 231-233.

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  • A amnsia cultural- promovida menos por perda de memria do que por uma deliberada estratgia poltica- atraiu uma cortina sobre importantes trabalhos curatoriais realizados nas quatro dcadas passadas. Como essa amnsia tem sido particularmente prevalecente nos campos do feminismo e da arte de oposio, encorajador ver jovens pesquisadores abordando a histria de exposies e esperanosamente ressuscitando alguns dos eventos mais marginalizados.Eu nunca me tornei exatamente uma curadora. A maior parte das cinquenta ou mais exposies das quais eu fiz a curadoria desde 1966 foram pequenas, pouco profissionais, e frequentemente realizadas em espaos no convencionais, variando entre vitrines de lojas, ruas, sindicatos, manifestaes, uma cadeia antiga, bibliotecas, centros comunitrios e escolas... alm de alguns museus. No possuo metodologia curatorial nem qualquer treinamento museolgico, exceto por ter trabalhando dois anos na biblioteca do Museu de Arte Moderna de Nova York, quando recm sada da faculdade. Mas essa experincia- o nico emprego de verdade que j tive- provavelmente me preparou bem para o aspecto arquivista e informacional da arte conceitual.Devo me concentrar aqui nas primeiras exposies que organizei nos 1960 e comeo dos 1970, especialmente aquelas com nmeros nos seus ttulos. Para comear, meu modus operandi contradizia, ou simplesmente ignorava o connoisseurismo que convencionalmente entendido como o corao da curadoria. Eu sempre preferi o inclusivo ao exclusivo, e tanto a arte conceitual como o feminismo satisfaziam o contnuo desejo pelo open-ended. Julgamentos ilgicos levam a novas experincias escreveu Sol LeWitt em 1969 . Rejeitar o connoisseurismo fazia parte da rebelio geracional contra a ditadura da esttica greenbergiana que estava se tornando obsoleta em Nova York em meados dos 1960. Assim como os artistas pop e minimalistas com os quais aprendi sobre arte, irreversivelmente virei minhas costas para os excessos diludos da segunda gerao do Expressionismo Abstrato. Nos 1960 os crticos raramente realizavam curadorias, e artistas muito menos, mas todos os tipos de limites comeavam a ser borrados, como na fuso ou confuso da pintura com a escultura que marcou o incio do Minimalismo. Eu o chamei de Third Stream (como no jazz) ou Rejective Art e depois Primary Structures (Estruturas Primrias). Minha primeira exposio foi Eccentric Abstraction (Abstrao Excntrica), em 1969 na Galeria Marilyn Fischbach, em Nova York. Ela foi uma tentativa de borrar limites - neste caso entre o minimalismo e algo mais sensorial e sensual alm de, vendo em retrospecto, ter tido algo de feminista. No havia nada de inovador sobre as exposies exceto a arte. Donald Droll, diretor da galeria e grande amigo, estava l para me ajudar, e tnhamos que lidar com os oito artistas: Louise Bourgeois, Eva Hesse, Alice Adams, Bruce Nauman, Keith Sonnier, Gary Kuehn, Don Potts e Frank Lincon Viner. Depois de Eccentric Abstraction, organizei algumas exposies no departamento de exposies itinerantes do Museu de Arte Moderna, s quais no contabilizo porque no tive a oportunidade de mont-las. Ao montar, finalmente pode-se ver o todo, antes fragmentos. como segurar um livro terminado nas mos, isso faz todo processo rduo valer a pena. Suspeito que todo curador sinta o mesmo. Em novembro de 1968, quando Paula Cooper abriu a sua primeira galeria na Prince Street, em Nova York, eu concebi uma mostra na qual havia principalmente trabalhos minimalistas, com os artistas Robert Huot e o Socialist Workers Party organizado por Ron Wolin, em benefcio da mobilizao estudantil contra a guerra do Vietn. Eu havia recm voltado de uma radical viagem Argentina (com o crtico francs Jean Clay) durante a ditadura militar . L, conhecemos os membros do grupo Rosario, durante a campanha Tucumn Arde (a qual apenas na ltima dcada foi finalmente reconhecida pelo trabalho groundbreaking que era). Foi a primeira vez que ouvi artistas dizerem que no fariam arte at que o mundo fosse mudado para melhor. Isso me marcou profundamente.Na Amrica Latina eu estava tentando promover uma srie de suitcases-show que podiam ser transportadas de pas em pas pelos artistas, ignorando as instituies e permitindo uma rede internacional e uma interao mais cara-a-cara entre os artistas. Quando voltei a Nova York conheci Seth Siegelaub, que tinha ideias parecidas com as minhas e estava comeando a implement-las. Logo depois a Art Workers Coalition (AWC) foi fundada em torno dos direitos dos artistas e logo concentrou aes anti-guerra do Vietn. Ambos, Siegelaub e eu, e a gangue dos quatro- Robert Barry, Douglas Huebler, Joseph Kosuth e Lawrence Weiner- nos associamos a AWC, como fez Carl Andre, e perifericamente meu querido amigo e modesto mentor, Sol LeWitt.Havia uma espcie de energia internacional inconsciente: ideias formadas no ar, como a doena de Alzheimer, de um incompreensvel enredo de nervos e interaes entre artistas de diversos meios. Isso tudo surgiu da amizade como matria prima, da histria da arte,

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  • dos livros e de um fervor em mudar o mundo e tambm as formas como os artistas atuavam nele. O movimento trans-disciplinar Do It Yourself (Faa Voc Mesmo) ou DIY, que esta sendo redescoberto hoje em diversos contextos por uma gerao muito mais jovem, era um elemento integrante dessa rede internacional. Voc no se candidatava a subvenes: voc trabalhava apenas com o que estava mo. Para mim, o ponto principal da Arte Conceitual estava nessa noo de faz-la ns mesmos- ignorando as instituies oficiais e a noo opressiva de ascenso no mundo da arte ao ter qualquer ideia e, direta e independentemente, atuar nela. Mesmo tendo claramente emergido do minimalismo, os princpios bsicos da Arte Conceitual eram muito diferentes, salientando o aceitvel e em aberto, em contraste com o rejeitvel e o auto suficiente. Por um breve perodo, a Process Art (Arte-Processo, Arte Povera na Europa) se interps, com sua perversa recusa sobre a materialidade do objeto de arte em favor da obsesso pelos materiais. Dispersando, salpicando, empoando e pulverizando, ela abriu novos caminhos para os artistas se identificarem com o que estavam fazendo, incluindo performance, trabalhos na rua, vdeo e outras rebelies efmeras contra o que ento era chamado de sndrome do objeto precioso.Eu gostava da idia de fragmentar o meu trabalho tambm. Nunca considerei a crtica como uma arte em si mesma, separada dos outros assuntos, como alguns consideravam, mas sim como tecer um texto (a raiz etimolgica a mesma), tecido com arte e tambm com os sistemas que a rodeiam, includo exposies. Nos anos 1960, eu estava tentando- s vezes sem muito sucesso- realizar uma aproximao camalenica (ou parasitria) para escrever sobre arte, escolhendo um estilo de escrita que fosse congruente com o estilo do artista em fazer arte. O Dada era o meu campo histrico, se eu posso falar que tive um, e Ad Reinhardt era um heri e influncia maior pela sua iconoclastia fundamental. De formas diferentes, Dada e Reinhardt estavam tentando a tabula rasa, um quadro em branco para nele desenhar planos para um mundo novo e um novo tipo de arte. Somente o Minimalismo e a Arte Conceitual aparentemente ofereceram esse quadro em branco para os artistas, assim como o fizeram para os curadores. ( claro, o palimpsesto nesses quadros se tornou bvio em retrospecto, a histria sempre alcana os rebeldes.)Parecia perfeitamente lgico que se a arte iria mudar to drasticamente em relao a seus antecessores, ento a crtica e as estratgias expositivas tambm deveriam mudar. Artistas faziam filmes em branco, trancavam galerias, e praticavam o fazer nada. Eles estavam negando a arte convencional enfatizando o vazio, o cancelamento, o vcuo, a anulao, a desmaterializao, o invisvel. Julgamentos de valor estavam fora de questo outra reao contra a definio estreita de qualidade disseminada pelos greenberguianos, bem como uma forma de desafiar e questionar a autoridade no resto do mundo. Minhas exposies, cuja curadoria baseava-se em nmeros, ilustravam todos esses aspectos. Assim como Hanne Darboven escreveu em 1968: A contemplao deu lugar ao, como uma maneira de se aceitar outras formas . Huebler disse que j havia muitos objetos no mundo e que ele no queria acrescentar mais nenhum. Ao invs, ele queria fazer uma arte que abraasse tudo em relao a tudo. Quanto mais expansiva, mais inclusiva uma exposio pudesse ser, mais coerente ela seria com todas as outras chamadas revolues que aconteciam naquela poca. Eu comecei a enxergar curadoria como sendo simplesmente uma extenso fsica da crtica. Em maio de 1969 organizei a primeira das minhas exposies numeradas- Number 7 na galeria Paula Cooper. No consigo lembrar de onde veio o nmero, mas tinha base em algum fato. Essa foi a progenitora das outras exposies numeradas, e ela se reverteu como uma mostra beneficente para a AWC. Havia apenas um carto com o nome dos artistas: eu chamei a mim mesma de compiladora da exposio, mais do que curadora. A galeria de Cooper tinha trs salas relativamente pequenas e haviam trinta e nove artistas, dos quais todos ou a maioria estariam nas prximas exposies numeradas. A sala maior parecia virtualmente vazia, embora contivesse nove trabalhos, inclusive um dos primeiros desenhos de parede de LeWitt, o Air Current de Haacke (um discreto ventilador num canto), Existing Shadows de Bob Huot, um pisca-pisca de Richard Artschwager, uma pequena marca na parede de Lawrence Weiner deixada por um tiro de espingarda de presso, um campo magntico de Robert Barry, um secret de Steve Kaltenbach, Oral Communication de Ian Wilson (estes trs ltimos eram invisveis), e um pequeno arame encontrado no cho, por Andre. A sala do meio apresentava duas paredes vazias pintadas de azul (por Huot), enquanto a sala pequena estava cheia de trabalhos conceituais, na maioria livros, fotos, fotocpias e textos em uma mesa comprida. Eu acho que essa exposio foi visualmente muito mais interessante em termos de instalao do que seriam as prximas exposies numeradas. Mas j que nenhuma documentao dessa exposio sobrou, pode ser apenas um otimismo exagerado.Tenho vergonha de dizer que haviam apenas quatro mulheres e meia na Number 7: Christine Kozlov, Rosemarie Castoro, Hanne Darboven,

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  • Adrian Piper, e Ingrid Baxter (que era metade do NE Thing Co.). 557.087 no foi muito melhor, apesar de que tinha quase o dobro do tamanho. Em termos de representao global, 557.087 foi at pior. Eu s posso murmurar, em minha defesa, de que eu ainda no havia visto a luz. Me tornei feminista um ano depois. Quando assumi 557.087 no vasto pavilho do Seatles World Fair em 1969 e a sua irm 955.000, em Vancouver em 1970, eu estava mal preparada para executar uma coisa naquela escala. As duas exposies consistiam no alastramento de uma variedade de objetos, no-objetos e trabalhos em site-specific. Minha falta de treinamento e minha falta de respeito pela ubiquidade das luvas brancas deve ter chocado os profissionais na hora. Mas por outro lado, a ignorncia era uma vantagem: eu tinha to pouca bagagem quanto os artistas. As exposies numeradas de 1969-1973 foram dispersas e expansivas (pode-se dizer desfocadas) como a prpria arte. Embora 557.087 tenha sido patrocinada pelo Contemporary Art Council do Museu de Arte de Seattle, no aconteceu no museu propriamente dito, mas no antigo pavilho da Worlds Fair, cuja posio marginal era altamente adequada.Levei a srio a afirmao de Barry em 1968: Durante anos as pessoas estiveram preocupadas com o que acontecia dentro da moldura. Talvez tenha alguma coisa acontecendo fora da moldura . Pensando os museus como a moldura, 557.087 e a subsequente verso de Vancouver 955.000, foram as primeiras mostras que fiz e quem sabe as primeiras mostras em qualquer lugar- que aconteceram metade fora do museu, pela cidade, num raio de 15 milhas. Embora os mapas fossem fornecidos pelo museu, acho seguro afirmar que poucas pessoas de fato viram a exposio inteira- a fragmentao, mais uma vez, apropriada para a prpria arte, como nos pisca-piscas de Artschwager ou nas etiquetas de John Baldessari marcando os limites do gueto. Enquanto a arte pblica no vista com a intensidade privada que a arte nos museus geralmente recebe, ela vista por pessoas que no entrariam nem mortas em um museu. Trabalhar fora de um museu ou de uma galeria a minha parte preferida do exerccio de curadoria, e o mais arriscado, j que expe tanto o artista quando a audincia a experincias inesperadas e desconhecidas, que podem levar a vilification e vandalismos.As exposies de Seattle e Vancouver foram as primeiras das exposies numeradas a terem um catlogo- fichas avulsas no tamanho de 10x15cm para serem lidas e arranjadas randomicamente, incluindo meu texto introdutrio, ou interfoliado. (Quarenta e duas fichas e trs artistas foram acrescentados quando a mostra foi para a Art Gallery of Vancouver e a Student Union at the University of British Columbia, onde o ttulo se tornou 955.000). Gostava da ideia de que o leitor podia jogar fora as fichas que ela ou ele no gostasse, fazendo um paralelo com o vis anti-gosto de toda a exposio. A mostra era to grande que o pblico seria sobrecarregado e teria que depender das suas prprias percepes. O formato de fichas foi levado adiante nas exposies subseqentes: 2.972.453 no Centro de Arte y Comunicacion, em Buenos Aires, em 1971 (incluindo apenas artistas que no estavam nas primeiras exposies, dentre eles Siah Armajani, Stanley Brouwn, Gilbert & George, e Victor Burgin) e c. 7.500 na CalArts, em Valencia, Califrnia, em 1973-4. No montei nenhuma dessas exposies, e c. 7.500 viajou para muitos outros lugares. Os ttulos dessas mostras numeradas eram aproximadamente os nmeros da populao das respectivas cidades onde as mostras aconteciam. Estava, claro, procurando por alguma coisa neutra- no associativa, no relacional, de acordo com a cartilha da poca. Eu tambm estava determinada a no fornecer uma nova categoria na qual disparate artistas poderiam ser amalgamados. Os nmeros eram, como sabemos, um fator importante na Arte Conceitual. Havia uma certa competio silenciosa pra ver quo longe o artista podia ir: On Kawara teve os livros One Million Years, Barry produziu One Billion Dots (recentemente reconstitudo em cores) e o March 31, 1966, de Dan Graham, cobrindo uma extenso entre a beira da extremidade do universo e o micro espao entre a crnea e a retina do olho. Nenhuma rea estava a salvo, pois os artistas iam longe procura de matria-prima. Tenho em mente as discusses que Robert Smithson e eu tnhamos sobre a finitude versus infinitude (como se fosse possvel discutir uma coisa dessas); ele era pela finitude, eu era, de forma idealista, pela infinitude.Embora a vertente terica da Arte Conceitual, representada pelos gostos de Kosuth, Mel Bochner e antes o Art&Language, tivesse sido encontrada em anlises filosficas e boundaries, a vertente de livre forma com o qual eu me identificava era essencialmente utpica na sua abertura a tudo que existisse. Nessa vertente ramos obcecados com o tempo e o espao, corpo e mapeamento, percepo, medidas, definies, o literal e o cotidiano e com o enigmtico, atividades entediantes que apareciam simplesmente para preencher o espao e tempo, um tipo de experincia de vivncia corriqueira que poderia no estar disponvel queles que no a vivessem. Um dos meus vrios focos- como escrevi em uma das fichas do catlogo de 557.087, uma observao que ressurgiu anos depois no meu livro Overlay que ressoava na minha continua fascinao com a arqueologia- era numa arte deliberadamente comedida que/e

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  • associada runa, mais com o Neoltico do que com os monumentos clssicos, amlgamas do passado e futuro, reminiscncias de alguma coisa a mais, vestgios de um empreendimento desconhecido. E passei a falar sobre o fantasma do contedo pairando sobre a mais obstinada e impenetrvel arte e sugeria que quanto mais aberta, ou ambgua a experincia oferecida, mais o observador forado a confiar em suas prprias percepes .Peter Plagens, revisando 557.087 na ArtForum, me acusou de ser artista. Ele escreveu: Existe um estilo total para a mostra, um estilo penetrante o suficiente para sugerir que Lucy Lippard de fato uma artista e que o seu meio consiste me outros artistas . Fiquei irritada com isso naquela poca, mas por outro lado, no uma m avaliao de todo exerccio curatorial, pois aponta um dos assuntos principais do perodo no qual essas mostras foram feitas a deliberada diluio dos papis, assim como dos limites entre os meios e as funes. Ao passar dos anos fiz o meu melhor pra exacerbar essa confuso, colaborando com vrios artistas conceituais, LeWitt, Barry, Huebler, David Lamelas, dentre outros. Em um texto labirntico, no qual fundia minhas contribuies para um livro e um projeto de exposio de Lamelas em colaborao com Huebler, escrevi: tudo apenas uma questo de como chamar. Isso interessa? ... o curador um artista por que usa um grupo de pinturas e esculturas em uma mostra temtica para provar o seu ponto de vista? Seth Siegelaub um artista quando formula novas frameworks dentro das quais os artistas podem mostrar seu trabalho sem referncia a um tema, galeria, instituio, at mesmo espao e tempo? ele um autor por que suas frameworks so livros? Sou eu artista quando peo aos artistas para trabalhar ou responder a uma dada situao? . Esta dada situao era uma referncia minha exposio-reao em cadeia que aconteceu em um volume de 1970 da Studio Internacional co-editada por Siegelaub, que era inspirada por uma frase de LeWitt: As palavras de um artista para outro podem gerar uma cadeia de ideias . Na mesma poca, eu tambm fiz uma exposio chamada Groups, na School of Visual Arts, na qual pedi aos artistas que fotografassem grupos de pessoas. Eu tinha uma segunda inteno aqui, pois estava escrevendo um romance I See/ You Mean- que comeou unicamente com descries escritas de fotos de grupos e um ndice; que eventualmente se abriu para outra coisa, mas a Arte Conceitual era sua influncia principal .Ento perguntei, Robert Barry um artista quando ele apresenta um trabalho de Iam Wilson dentro do prprio trabalho, sendo que o processo de apresentar seu trabalho, e o trabalho de Iam continua sendo o trabalho de Iam? Se a crtica um veculo para a arte, um artista que torna a si mesmo o veculo da arte de outro artista se torna um crtico? . Este jogo de incluses pode seguir adiante de forma que lembre o jogo significativo do Dada. Imagine do John Lennon nos atiou, e o poder da imaginao era a raiz at das tentativas mais convencionais de escapar da torre de marfim onde a arte parecia estar aprisionada.Em outra verso desta diluio de papis, eu fui chamada para escrever uma crtica in absentia (j que estava morando na Espanha) para a influente exposio Information no MoMA no importante ano de 1970, ano da Primavera do Camboja e dos massacres em Kent State e Jackson State. Quando produzi uma coisa incompreensvel e randmica, o curador Kynaston McShine no teve outra opo seno me listar como uma artista, j que o texto crtico que ele havia me pedido estava definitivamente in absentia. (Ele me deixou fazer outro texto randmico-readymade para o catlogo de uma exposio do Duchamp no MoMA. A gente tinha vrias brechas naqueles tempos.) No me tornei artista por colaborar com artistas, mas a fixao que tinham pelo ordinrio permitiu minha participao em seus trabalhos. A introduo do texto como arte e a noo de artista trabalhando num estudo ao invs de em um estdio como John Chandler e eu colocamos no nosso artigo de 1967 A Desmaterializao da Arte deu-me, como escritora, a entrada no jogo . Os prprios artistas estavam tentando mudar toda a definio de artista, eu acompanhava isso, em parte porque eu nunca quis ser uma crtica, e porque a palavra soava antagnica aos artistas com os quais me associei. J que eles, certamente, no estavam de acordo com o que era esperado das artes visuais, no vi motivos para que eu tivesse que atender s expectativas da crtica.Em Seattle e Vancouver, no entanto, no tive a oportunidade de encenar a artista: fui realmente forada a fazer vrios dos trabalhos destas exposies, pois no havia dinheiro para levar os artistas. Involuntariamente, curadoria tornou-se criao. E mais, as fichas dos catlogos que descreviam os projetos dos artistas, no pareciam muito com nada do que realmente estava na exposio. Isso acontecia por dois motivos: o/a artista mudou de ideia, ou o trabalho era fora de escala ou proporo com o tempo e dinheiro disponveis. No tenho nem certeza se todos os artistas listados de fato produziram alguma coisa. Ns tentamos construir cada trabalho de acordo com as instrues do artista. s vezes conseguamos. Por exemplo, Smithson no estava em Seattle, ento me

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  • deu instrues de tirar 400 fotos dos horizontes de Seattle- deveria ser vazio, plano, silencioso, comum, ordinrio, esvaziado, simples, nivelado. Realmente, lembro de sair um fim de tarde na montanhosa Seattle em busca de lugares que atendessem seus critrios. Andre no teve tanta sorte. Suas instrues eram simples: Timber Piece , 28 unidades, 1x1x3 e um pequeno desenho. Eu supus timber (lenha) como toras longas, enquanto ele queria dizer tbuas serradas. Ficou timo, mas ele insistia em dizer que era um trabalho meu, e no dele. Os trabalhos com corda de Barry Flanagan e Robert Roehm tampouco deram certos. O arco branco de Randy Sims, pintada com spray nas rvores, parecia lindo na maquete e terrvel no real. O trabalho de Sol LeWitt no foi executado em Seattle por conta de uma m carpintaria, nem o de Jan Dibbets, por causa das condies climticas. Richard Serra no produziu sua contribuio para a exposio de Seattle, mas havia um trabalho de compensados dele nos registros fotogrficos, portanto, algum o deve ter feito. Em Vancouver o trabalho de LeWitt foi habilmente executado pelo artista Glenn Lewis. Smithson arrumou um jeito de viajar at l e fez seu trabalho principal Glue Pour.Essas duas exposies me ensinaram muito mais do que tudo que se havia dito a respeito da natureza da arte. Elas tambm deixaram muito claro, assim como outras exposies contemporneas, como When Atitudes Become Form, Op Losse Schroeven e Information que este trabalho era impossvel de categorizar. Mesmo com a ateno que minhas exposies numeradas tem atrado hoje em dia, elas no chegam nem perto em inovao que as exposies desmaterializadas que Seth Siegelaub fazia na mesma poca especialmente a sua exposio March, que quebrou todas as convenes, acontecendo simultaneamente ao redor do mundo, e o Xerox Book, que introduzia a noo de que uma exposio de trabalhos reais, ao invs de reprodues, podiam ser apresentadas nos livros, que por sua vez desencadeava a significativa, e sempre marginal, indstria artesanal de livros de artista. Certamente, minha compilao Six Years: The Dematerialization of the Art Object etc (o ttulo tinha 87 palavras que cobriam a capa inteira do livro) podia ser visto como uma exposio. Tambm foi chamado, ele mesmo, de um objeto de arte conceitual e autocrtica especifico-temporal da crtica como um ato. Por fim, Six Years foi provavelmente o meu mais bem sucedido esforo curatorial, justamente por eu ser uma escritora e no uma artista.A estratgia em ambas exposies numeradas e no livro, era um acmulo, o resultado de uma esttica politicamente intencional e anti-exclusiva, que era o valor essencial da arte feminista, que me atingiu em Nova York no outono de 1970 e que me levou a um ativismo poltico. Desde 1969 o Guerrilla Art Action Group usou texto e performances para protestar contra a hierarquia dos museus e para, metaforicamente, depor contra o governo americano. Em 1970, o Ad Hoc Women Artists Comittee usou meios da arte conceitual em protestos feministas contra as exposies anuais predominantemente masculinas do Whitney. Ns distribumos um release falso, supostamente produzido pelo Whitney, anunciando orgulhosamente que, j que o museu tinha sido fundado por uma mulher, era apropriado que a exposio de escultura do museu consistisse em 50% mulheres artistas e outros 50% para artistas no brancos (como ardilosamente colocamos). No modelo da carteirinha falsa de filiao do MoMA, de Kosuth, em 1969, ns tambm forjamos convites para a abertura no Whitney, onde faramos um sit-in dentro do museu, enquanto mostrvamos slides de trabalhos de artistas mulheres do lado de fora do museu uma torcida bacana no site-specificity. (Graas aos nossos esforos e da Womens Art Slide Registry, o Whitney incluiu quatro vezes mais mulheres do que tinham antes). Por sorte, tudo isso foi feito de forma meio annima, j que o FBI tinha sido chamado para prender os criminosos (eles no prenderam nenhum). Como Lee Lozano disse, Busque os extremos. l que est a ao .A ultima exposio numerada com fichas como catlogo c. 7. 500, em 1973 foi uma resposta exasperada, como escrevi no catlogo, para aqueles que dizem no existem mulheres fazendo arte conceitual. A exposio terminou em Londres, depois de viajar por sete localidades, e por isso a populao, que d o ttulo exposio, tornou-se irrelevante. No havia pensado naquilo. Dentre os vinte e seis artistas que participaram da c. 7.500 tinham poetas, escritores, performers, assim como artistas visuais. Os trabalhos eram pequenos e estreitos com mais fichas informativas (texto dos dois lados) do que nos catlogos de fichas anteriores. Comparando c. 7.500 com as exposies anteriores, formadas majoritariamente por artistas conceituais homens, h um destaque s contribuies da arte feminina ao movimento, principalmente atravs da nfase no corpo, biografia, transformao, assim como percepes de gnero.Havia uma linha poltica que incorporava um populismo rarefeito, a esperana de que pela desmaterializao do objeto de arte ns pudssemos torn-lo acessvel a uma audincia mais ampla. Mas, ao fazer isso, esquecemos que o pblico precisa desejar o que foi disponibilizado. Blake Stimson sugeriu que a Arte Conceitual tinha um pouco da utopia social que levou aos primeiros movimentos

  • de vanguarda, mas eu iria argumentar que esta unio idealista de tudo sobre tudo era utpica, um termo que eu no rejeito: porque no querer um ideal? . De qualquer modo, esta unio estava limitada ao mundo da arte, que onde ns vivamos, a parte boa e ruim. Ao mesmo tempo fazia sentido estar debruados principalmente sobre as instituies de arte, o seu sistema de distribuio, etc, precisamente porque onde ns vivemos, que nos afeta tanto, onde ns temos o conhecimento e um pouco de poder (se no muito) em outras palavras, onde ns podemos de fato mudar. A ideia era de que a revoluo iria acontecer por mudanas radicais em todos os setores. A soma dessas partes chegaria a uma mudana poltica permanente. Ento, se tudo poderia ser arte, e digno de ser assunto para arte, pareceu em 1969 que a curadoria poderia se tornar obsoleta. O fato de que ela no apresenta sinais de falncia. Apesar da sua grande influncia no mundo da arte at os dias de hoje, a curadoria conceitual continua sendo o que Luis Camnitzer chamou arte de barriga cheia .Ao se pensar isso, exposies sedentrias tornam-se veculos estranhos para a comunicao e informao de assuntos globais, mas podem permitir curadores e grupos de artistas fazerem o que chamo de exposies-colagem, ou trabalhos coletivos em formato de exposio. Como exemplo, posso falar das duas vitrines da Printed Matter, de frente Lispenard Street, em Nova York, onde fiz uma curadoria de uma exposio que durou vrios anos. Group Material, Anti-World War 3, CoLab e PAD/D (Political Art Documentation/Distribution) estavam dentre os primeiros que estrearam esse trabalho conceitual em Nova York por volta dos anos 1980. Jerry Kearns e eu organizamos juntos vrias exposies parecidas, e mais tarde eu trabalhei com grupos no Colorado para produzir exposies nas quais os temas- homofobia, as guerras na Amrica Central e a conscincia do lugar- tomaram o lugar da produo individual dos artistas. No vemos exposies deste tipo hoje em dia, enquanto a sociedade esta cada vez mais baseada na individualidade acumulada ao invs de uma estrutura comunitria como colocado por Camnitzer. A ltima exposio que fiz a curadoria Weather Report: Art and Climate Change, em 2007, no Boulder Museum of Contemporary Art foi convencionalmente instalada dentro da galeria, mas tambm inclua dezessete trabalhos espalhados na cidade, indo da escultura displays fotogrficos, performances, desenhos de criana na biblioteca pblica e uma interveno no jornal. Muitos destes trabalhos foram feitos para lugares onde o aquecimento global mudaria drasticamente o ambiente.Em meu comentrio favorito segunda edio do Six Years, o artista Liam Gillick criticou-me por entender, em retrospecto, o poder das ideias que surgiram entre 1966 e 1972.Ele argumentou que os artistas, crticos e organizadores, ao mesmo tempo articularam um conjunto de pensamentos e uma quantidade de mudanas sociais que no estavam limitadas ao campo da arte e por isso abriu um novo territrio disponvel pra ns todos . Ele est certo, porque a riqueza imaginativa e liberdade daquela poca ainda esto comigo.

    1 Traduo para o portugus do original em ingls publicado em TATE PAPERS - Tates Online Research Journal, n. 12, outono de 2009. Esse texto a verso da palestra de Lucy Lippard realizada na conferncia Landmark Exhibitions: Contemporary Art Shows Since 1968, em Londres, em outubro de 2008.2 Lucy Lippard, Six Years: The dematerialization of the Art Object from 1966 to 1972..., Berkeley/Los Angeles, 1973, ltima edio 1997, p. vii.3 Em 1968 Lucy Lippard e Jean Clay foram jurados de um salo. Em entrevista com Hans Ulrich Obrist (Breve Histria da Curadoria, SP: Bei Comunicao, 2012, p. 266) ela conta que durante todo o perodo que ficaram em Buenos Aires o hotel era vigiado por militares que apontavam rifles sempre que algum chegava. N.T.4 Hanne Darboven, Statement to Lucy Lippard, em Alexander Alberro and Blake Stimson (eds.), Conceptual Art: A Critical Anthology, Cambridge/Londres, 1999, p. 62.5 Lippard, Six Years, p. 40.6 Ibid., p. 111.7 Ibid., p. 188.8 Ibid., p. xiii.9 Lucy Lippard, I See/You Mean, Los Angeles, 1979.10 Lippard, Six Years, p. 188.11 Lucy Lippard e John Chandler, The Dematerialization of Art, Art International, fevereiro 1968, pp. 31-36.12 Lippard, Six Years, p.xii.13 Alberro e Stimson, Conceptual Art, p. xlvii.14 Lippard, Six Years, p.xiii.15 Liam Gillick, Twenty-five Years: The Rematerialization of the Art World, Art Monthly. Fevreiro 1999, p. 44.

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  • Caro (artista)

    Gostaria que seu trabalho participasse de uma grande exposio que abrir em 4 de setembro de 1969, no Pavilho da Feira Mundial de Seattle, e que viajar para trs outros museus na Costa Oeste. Haver algumas pinturas e esculturas em meios no convencionais, uma grande seo de documentos, fotografias, livros e projetos conceituais, e peas ao ar livre (ou no interior), que podero estar na cidade e na paisagem circundante, ou onde voc queira escolher. No haver um tema especfico; o ttulo ser diferente em cada cidade; e no haver limitao quanto concepo, com exceo questo financeira. No tenho oramento para transportar coisas pesadas ou executar projetos caros.Eu gostaria de ter vrias proposies, para escolher a mais vivel. No sei exatamente quanto terei para despesas at que todos os projetos estejam aqui, mas sei que no terei como levar o artista para Seattle. Desse modo, tem que ser algo que eu possa executar com a ajuda de amigos e voluntrios. Se voc precisar de informaes especficas - plantas do pavilho (que enorme, com muito espao de parede), mapas da cidade, etc. me avise.O catlogo (e o texto tambm) ser datilografado em cartes de 10 x 15 cm e os projetos podem ser alterados a cada cidade (outros cartes provavelmente sero adicionados, a cada lugar). Voc pode me dizer qual informao e reproduo gostaria que estivesse em seu carto.Quanto mais rpido eu tiver seu retorno, melhor, e terei mais esperana quanto a capacidade de realizar projetos mais ambiciosos. O endereo est acima.

    Obrigada, Lucy R. Lippard

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    1 Carta de Lucy R. Lippard datada de 14 de maro de 1969, do arquivo Lippard, 557.089/ 955.000: Correspondncias, Arquivo da Arte Americana, traduzida do original em ingls

    publicado no texto de Cornelia Butler, Women Concept Art: Lucy R. Lippards Numbers Shows publicado no livro From Conceptualism to Feminism: Lucy Lippards Numbers Shows 1960-74 organizado por Cornelia Butler, Afterall Books Exhibition Histories, Londres, 2012, p. 31.

  • 1969

    557.087. Seattle Art Museum (Worlds Fair Pavillon, Seattle Center), patrocinada por The Contemporary Arts Council, 5 de setembro-5 de outubro de 1969. Organizada por Lucy R. Lippard. O catlogo consiste em 95 fichas de 10 x 15 cm ordenadas aleatoriamente; cada uma desenhada pelo prprio artista, 20 fichas de texto de Lippard, trs fichas de bibliografia, lista dos filmes projetados (Barry, Frampton, Gehr, Huot, Jacobs, Landow, Schum, Serra, Sharits, Snow, Wieland e Land Art).Artistas: Acconci, Andr, Arnatt, Artschwager, Asher, Atkinson, Baldessari, Baldwin, Barry, Barthelme, Baxter, Beery, Bochner, Bollinger, Borofsky, Burgy, Buren, Castoro, Darboven, de Maria, Dibbets, Ferrer, Flanagan, Graham, Haacke, Heizer, Hesse, Huebler, Huot, Kaltenbach, Kawara, Keinholz, Kinmont, Kosuth, Kozlov, Latham, Le Va, LeWitt, Louw, Lunden, McLean, Morris, Nauman, N.Y. Graphic Workshop, Nikolaides, Oppenheim, Perreault, Piper, Rohm, Ruppersberg, Ryman, Ruscha, Sandback, Saret, Sawchuk, Serra, Sims, Smithson, Sonnier, Wall, Weiner, Wilson. Crticas de John Voorhees, Seattle Times, 5 de setembro; Thomas Albright, San Francisco Examiner & Chronicle, 21 de setembro; William Wilson, Los Angeles Times, 21 de setembro e Peter Plagens, Artforum, novembro de 1969. O pargrafo seguinte pertence ao artigo de Plagens.

    555.087... ser lembrada, em geral, como a primeira exposio relevante de arte conceito organizada por uma instituio pblica, mas o que ela na realidade um amlgama de trabalhos acromticos mostrando um espectro at seus mais recentes, funky Minimal at o ponto em que a arte literalmente substituda pela literatura. A mostra um termmetro, suficientemente consolidado para separar a enorme chatice da arte pensante da Canal Street, do material genuinamente perigoso e substancial... A exposio tem um estilo prprio, um estilo que impregna-se a mostra at o ponto de sugerir que Lucy Lippard na realidade a artista, e os outros artistas so o seu meio, uma consequncia previsvel da prtica atual dos museus de contratar um crtico para fazer uma exposio e o crtico, por sua vez, pedir aos artistas que faam trabalhos para a exposio... Em cada parte de 557.087 surgem mltiplas fontes de distintos graus de relevncia (relevncia depende da crena nas questes na arte atual, em oposio a um refinamento sem fim, 557.087 sobre questes)... A nica e mais pertinente fonte, acredito, uma preocupao moralista,

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  • quase puritana, com a ameaadora, irritante, e perversa presena da arte e, como uma sub-fonte, a anti-tecnologia.

    Na realidade esta exposio foi concebida como um exerccio de anti-gosto, como um compndio de trabalhos to diversos que o pblico teria que preparar sua mente para ideias a que anteriormente nunca havia sido exposto. No foi uma mostra de arte conceito; se fosse certamente eu no teria includo trabalhos de artistas como Andr, Bollinger, Hesse, Ryman, Serra, etc. Quando a

    exposio foi concebida, no outono de 1968, a arte conceitual ainda no estava cristalizada e na poca em que a lista de artistas estava completa, no incio da primavera de 1969, eu estava particularmente preocupada em no fornecer uma nova categoria onde artistas to diferentes fossem aglomerados. Eu no via como podia ser possvel agrupar minimal art, outdoor art, idea art, etc. em um nico conjunto. O ttulo derivou-se do nmero de habitantes da cidade onde a mostra estava sendo apresentada. De qualquer maneira, era a primeira exposio, que eu saiba, na qual as obras se espalhavam no s pelo interior e exterior, mas em um raio de 50 milhas ao redor da cidade. Ainda que mapas estivessem disponveis no museu, parece certo dizer que, alm de mim e Anne Focke, a ajudante do museu, ningum viu a exposio completa. O tronco gigante de Bollinger (pesando vrias toneladas) estava justamente em frente ao museu, porm o crtico da Artforum sequer notou. Imaginem, ento, o destino do trabalho de Louw, postes brancos que seguiam os contornos de uma colina prxima ao museu, os espelhos de Baxter que refletiam uma paisagem isolada, o arco pintado de spray branco de Sims nos limites de uma floresta ao longo de uma rodovia, os tubos de George Sawchuk colocados no meio de um amontoado de arbustos, etc. Muitas propostas no foram executadas em Seattle por causa de falta de dinheiro, falta de ajuda, minha prpria inaptido ou qualquer outra coisa. Tudo foi tentado; trs propostas (a de Andr, de Flanagan e de Rohm) no deram certo; Serra nunca foi l fazer seu trabalho; os projetos de LeWitt e Dibbets nunca foram terminados devido m carpintaria e s condies do tempo. O trabalho de Heizer, tanto o de Seattle como o de Vancouver, tomou um tempo muito grande e jamais chegou a ser executado. Eu fico espantada, ao rever, que tenhamos feito muitos dos trabalhos, dado minha tremenda ingenuidade em relao ao esforo necessrio para realizar cada um dos projetos. Contudo, foi uma experincia que eu s repetiria se estivesse louca, mas que me ensinou mais sobre a natureza da arte

  • envolvida que todos os trabalhos que tinham sido realizados ao longo dos ltimos dois anos.O catlogo randmico das fichas de leitura tendia a uma simplificao romntica, em cada uma eu redescubro meu desagrado. Porque algumas das ideias oferecidas foram, para melhor ou para pior, no momento atual, como os trechos a seguir:

    Arte deliberadamente comedida frequentemente associada runa, mais com o Neoltico do que com os monumentos clssicos, amlgamas do passado e futuro, reminiscncias de alguma coisa a mais, vestgios de um empreendimento desconhecido. O fantasma do contedo continua a pairar obstinadamente sobre a arte abstrata. Quanto mais aberta, ou ambgua a experincia oferecida, mais o observador forado a confiar em suas prprias percepes. O artista visual usa palavras para transmitir informaes sobre fenmenos sensoriais ou potencialmente perceptveis. Sua constante preocupao com a linguagem, semntica e estruturas sociais, como expostas pela antropologia, no surpreendente. O fato que so exatamente os padres estruturais que so a base desses campos que determinam o alcance visual. Se a insistente presena fsica da estrutura primria um dispositivo de parada no tempo que resiste ao fluxo do mundo moderno ao criar monumentos novos, frontais e estticos para o presente, a maioria dos trabalhos aqui tratados funcionam base de energia, animao, e linhas de tempo e matria relativamente irracionais e no sequenciais. Eles podem, no entanto, ser especulativamente concretos, mesmo quando invisveis. Apesar da apresentao enganosamente cientfica ou aparentemente pragmtica, os artistas geralmente aceitam e se envolvem com o desconhecido num nvel diferente dos cientistas. Artistas no analisam as circunstncias em mente com progresso, mas como coloc-las em evidncia, fazendo a si mesmos, e a seu pblico, conscientes, de coisas anteriormente desconsideradas, informaes que j esto no ar e que podem ser aproveitadas como experincia esttica. E o que no pode ser? Um artista pode fazer ser sentida sua prpria presena ou a de seu entorno apontando para um ponto, uma linha, um acento, uma palavra, no mundo, abrangendo todas as partes de qualquer rea, ou perodo em qualquer lugar ou tempo. Simultaneamente a importncia do lugar ou tempo pode ser neutralizada at que a arte se torne mais abstrata do que nunca at quando virtualmente inseparvel da vida. A implicao que aquilo que agora ns consideramos arte ser eventualmente irreconhecvel. Por outro lado, os limites de ver, como os aspectos perceptveis da natureza ou outro espao, parecem se estender infinitamente at onde a experincia do homem e seus experimentos podem lev-lo. Experincia e conscincia so, afinal, compartilhadas por todos. Arte entendida como experincia pura no existe at que algum a experimente, desafiando propriedade, reproduo, identidade. A arte imaterial poderia romper com a imposio artificial da cultura e ao mesmo tempo fornecer um pblico mais amplo para o tangvel objeto de arte.

    1 Fragmento traduzido para o portugus do original em ingls retirado do livro Six Years: The dematerialization of the Art Object from 1966 to 1972 ..., organizado e comentado por Lucy Lippard, Berkeley/Los Angeles, University of Califrnia Press, edio de 1997, pp. 100-112.

  • Resposta de Lucy Lippard proposio de Douglas Hueblerposteriormente publicada em Publication, de David Lamelas

    David Lamelas me pediu (provavelmente como parte de sua prpria obra de arte) que, junto a outros crticos e artistas, comentasse trs afirmaes: 1) O uso da linguagem oral e escrita como uma Forma de Arte. 2) A linguagem pode ser considerada uma Forma de Arte. 3) A linguagem no pode ser considerada uma Forma de Arte.

    Douglas Huebler enviou-me uma obra sua (de arte) e me pediu que lhe enviasse algo (artstico, se entende), em troca.No fao arte. Mas, s vezes, escrevo sobre os artistas e utilizo seus trabalhos de tal modo que me acusaram de fazer arte. Digo acusaram porque isso no se trata necessariamente de um elogio. Eu sou uma escritora e me agrada quando me consideram como tal, pois uso as palavras como uma Forma de Arte convencional, que se chama literatura ou crtica artstica. Uso o termo Arte, neste caso, como um termo amplo que se refere a qualquer tipo de enquadramento, no necessariamente visual, colocado ao redor de uma experincia real ou imaginada. No pinto. No utilizo quadros. No fao esquemas sobre a pgina, com as palavras (se fao, so esquemas convencionais, ao acaso, no hierrquicos; apenas secundrios em relao inteno de escrever algo). O nico objeto que fao uma pilha de papel coberto de palavras, ou um livro de bolso (os de capa dura so pretensiosos e normalmente so livros muito grandes para carregar no bolso; por isso devem ser lidos pretensiosamente, colocando-se na situao de sentar-se em uma cadeira de balano fumando um cachimbo Agora Vou Ler Um Livro , e no na do transcorrer fragmentado, do ir e vir da vida e do livro).Depois de um tempo, falei com Doug e ele (por engano) disse-me que ia publicar as obras que recebesse em resposta, como parte de seu trabalho com trocas. Eu havia pensado em fazer uma srie artificial de palavras a partir do livro que estou escrevendo, ou simplesmente escolher uma pgina ao acaso, de seu primeiro rascunho manuscrito (ilegvel). Mas, agora, creio que irei lhe dar algum tipo de declarao neste sentido:A literatura convencional (definio do dicionrio: a profisso e a produo de um autor), ao contrrio da arte visual convencional (primeira definio do dicionrio: habilidade humana de fazer coisas), no vale nada em si mesma at se tornar um livro; e, quando se torna um, talvez valha dois dlares, e ento est disponvel para quem possui dois dlares ou pega-o emprestado em uma biblioteca ou de um amigo. A arte tambm pode ser comercializada, como os livros; mas, se eu troco uma cpia de meu livro por uma pintura ou uma escultura, ou ainda por uma gravura impressa, quem o receber provavelmente se sentir fraudado. Meu livro s poder ser trocado quando estiver publicado e somente se o estiver e por uma reproduo de obra de arte. Se a obra de Doug existisse em uma edio de 50, seria uma reproduo? Se assim fosse, do que seria essa reproduo? Talvez a obra de Doug possa ser trocada por um livro impresso em uma edio de 50 cpias e que valha, portanto, 200 dlares ao invs de dois. Por um acaso, meu livro publicado ou no, e a obra de Doug como exemplar nico ou mltiplo, valem o que se pode ganhar com eles? Ou, ainda, a obra de Doug vale o que se paga por ela, de forma que este tipo de situao tem a ver com o tipo de obra que ele est fazendo, e uma vez que ela se incorpore em nossa troca, sua obra valer mais como a soma das partes do que valecada parte separada, ou ainda valer 200 dlares ou 1.000 dlares ou o quanto essas coisas valem no mercado? algo desagradvel. Evidentemente, a Doug no importa se se trata de uma troca equivalente, somente lhe interessa que ela acontea. A questo no est nem no valor monetrio, nem no prestgio da obra de Doug, nem no que eu lhe d em troca (gostaria de dar-lhe uma resposta especfica a esta obra, mais do que algo que j existisse antes dele me propr a troca). A questo est nas diferenas entre os meios e nos objetos que so. quase o problema da gua e do leo. Pode-se trocar arte por literatura? Ou por couves-flores? As linguagens como Forma de Arte (visual) e a linguagem como Forma de Arte (escrita), como por exemplo a literatura, so intercambiveis? Se a arte (visual) escrita uma Forma de Arte (visual) vivel, como distingui-la da literatura? Se diferenciam unicamente no fato de que uma realizada por um artista e a outra por um escritor? Se um artista inventa uma histria e a relata em forma de livro, isso arte? Se um escritor realiza um lindo quadro, isso literatura? Se pego emprestado (plagio, que significa roubo) uma obra de Joseph Kosuth (Special Investigation, 1969/1970), que foi apresentada como Arte (visual) depois de ser tomada de um livro de charadas de outro autor, e a uso em meu livro de fico, ela volta a ser literatura? (E era literatura no livro de charadas?) No h, portanto, mais plgio no primeiro emprstimo, de Kosuth? Qual o preo do resgate? Se ponho meu livro de fico em uma exposio de arte, se trata ento de um plgio de uma obra de Kosuth? Uma questo semelhante surgiu h muitos anos quando Erle Loram quis pedir a Roy Lichtenstein que fizesse pinturas baseadas nos diagramas pedaggicos de Loran sobre Czanne. No se chegou a qualquer concluso. Seria diferente se eu pusesse uma nota de rodap que dissesse agradeo a Joseph Kosuth que me fez achar este material? Mudaria a obra de Kosuth se eu agradecesse sua informao?Se tudo isso confuso, considere o seguinte: um curador um artista pelo fato de que usa um grupo de pinturas e esculturas em uma exposio temtica para demonstrar algo? Seth Siegelaub um artista quando formula um novo lugar onde os artistas podem mostrar sua obra sem nenhuma referncia a qualquer tema, galeria, instituio ou, ainda, ao tempo e ao espao? Ele um autor por que seu territrio de trabalho so os livros? Sou uma artista quando peo a vrios artistas que trabalhem em uma situao dada e depois publico os resultados considerando-os como os de um grupo relacionado? Bob Barry (Robert Barry) um artista quando apresenta a obra de Ian Wilson dentro de uma obra sua, na qual o processo de apresentao constitui sua obra e a obra de Ian segue sendo a obra de Ian? Se o crtico um veculo para a arte, um artista que se converte ele mesmo em um veculo para arte de outro artista, se converte em um crtico?Tudo isso uma questo de nomenclatura? E isso importa? Deve importar quando, por exemplo, Joseph Kosuth faz arte como ideia como ideia e no somente ideia como ideia, e quando o grupo Art & Language est fazendo linguagem sobre arte e chama isso de arte. claro que o modo como chamamos importante; possvel que seja ainda mais do que , na verdade? Ainda que haja Exposies de Arte e Livros como Exposies de Arte, como algo distinto de Livros como Literatura, e, ainda que se possa escolher um livro-como-objeto, sem saber nem se importar se ele se chama arte ou literatura, ou fico ou ensaio, claro que tudo isso importa. Os artistas querem ser chamados de artistas. Os escritores querem ser chamados de escritores. Embora isso no importe.No o meio que conta, nem a mensagem, mas como cada um se apresenta, separado ou junto, e em que contexto. E os artistas que afirmam estarem fazendo no-arte ou antiarte deveriam ter a bondade de permanecerem fora das galerias, dos museus e das revistas de arte at que esses nomes estejam apagados. Nenhuma arte, independente de sua semelhana com a vida ou com a literatura, pode chamar-se a si mesma de outra coisa que no arte, se ela foi, ou ser mostrada dentro de um contexto artstico.

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  • Os escritores que se declaram como tal deveriam permanecer nos livros, nas revistas e nos catlogos? Considerando a o que o catlogo se refere, no entanto, pode haver confuso, agora que existe arte que aparece somente no catlogo da exposio. O texto crtico (no totalmente reconhecido como tal) que escrevi para o catlogo da exposio Information do Museu de Arte Moderna se colocou no corpo do livro junto das obras dos artistas e eu aparecia entre eles, no ndice. Isto desconcertante, e eu s percebi quando j era tarde. Gosto que se crie desconcerto, mas no gosto que me incluam no ndice como artista. A auto-identidade pblica importante. No plano privado, no importa. Uma das poucas coisas das quais estou segura, a de que uso as palavras como escritora. Gosto de pargrafos sucessivos, relativamente grandes, e gosto das palavras que se referem a outras palavras. No posso pensar em nenhum artista (visual) que faa isso sem chamar de arte (o que j converte em arte), ou que o faa sem referir-se ao seu lugar estrutural. No, isto no completamente exato. As investigaes de Kosuth, quando sobre pginas (no em letreiros de parede), a comunicao oral de Ian Wilson, a entrevista de Lamelas com Duras e o grupo Art&Language e seus amigos, tudo isso prova que a linguagem um meio artstico, mas tem que estar dentro dos limites do territrio da Arte para ser uma Forma de Arte. o costume que faz com que um artista mantenha sua linguagem dentro dos limites da Arte? Ou a disciplina? possvel que, uma vez que a linguagem no chamada de arte (ou literatura, que seja), isso j no seja significativo? significativo como arte, principalmente por que, ao isol-la como arte, ao separ-la da vida, isso faz as pessoas serem conscientes em relao linguagem em um contexto inesperado e, portanto, mais poderoso? semelhante pintura e escultura que se distanciam da arte comercial, da decorao e do desenho industrial, para se autossituarem um grau acima? Esto os artistas fazendo sua obra significativa como arte devido sua relutncia em participar (e competir) num mbito acadmico-literrio mais amplo, e que faz uso da linguagem? Qual a diferena entre esta frase tem cinco palavras e este todo tem cinco partes?Talvez tudo isso se trate de um dualismo artificial, um dilema artificial que simplesmente nos leva de volta ao problema de se as prprias intenes afetam o mundo ou no, e como. Se sou totalmente a favor de um futuro onde as distines se confundam e se apaguem, por qu, ento, me preocupa tanto manter minha identidade pblica como escritora? Quero isso porque mesclar a crtica com a arte dilui ainda mais a arte. Ao mesmo tempo, farei o que posso para apagar a distino entre a escrita e a escrita de arte e, quem sabe finalmente, entre a arte e os escritos de arte; e para gerar circunstncias onde estas distines se borrem. Provavelmente, se trate de um dilema artificial, mas o que h na arte que no seja artificial quando se chega a ela ou se escreve sobre ela?

    Tudo que foi escrito aqui por mim e seus direitos pertencem a Douglas Huebler em troca por sua obra Duration Piece n. 8, Global; somente perante a permisso de Douglas Huebler por escrito, pode-se publicar no livro de David Lamelas, que tambm constitui sua exposio.

    Lucy R. Lippard, Nova York, 25 de setembro de 1970

    1 Traduo para o portugus da verso em espanhol, Seis Aos: La desmaterializacin del objeto artstico de 1966-1972, organizado e comentado por Lucy Lippard, Editora Akal, Madrid, 2004, pp. 269-273, realizada por Tradutores Annimos S.A. cuja inteno de fazer circular informaes em portugus. Ela nasceu de um botar as mos nas cadeiras e bradar: que diabo de antropofagia essa nossa, que no traduz o que interessa? Traduzidos de forma amadora, os textos aqui vertidos para o portugus seguem o lema de que prefervel t-los assim, do que no t-los antes mal acompanhado que sozinho. A Tradutores Annimos S.A. se desculpa publicamente com tradutores profissionais que fariam de modo espetacular o servio aqui prestado, caso fossem contratados e pagos para tal. O texto original, em ingls, foi publicado pela primeira vez em Publication, livro-exposio de David Lamelas, Editora Nigel Greenwwod, Londres, 1970.

  • Conversa entre Seth Siegelaub e Jo Melvin

    Curador, marchand e editor, Seth Siegelaub trabalhou com Lucy Lippard na elaborao da exposio 557.087, em Seattle, em 1969. Sob o nome comercial de International General, Siegelaub foi pioneiro em novas estratgias de apresentao e circulao da arte contempornea na dcada de 1960. Sua ao mais radical foi enfatizar o catlogo como um espao expositivo onde a pgina expunha a prpria obra, ausente de qualquer comentrio crtico . Na verdade, dispensava-se, temporariamente, a necessidade do espao da galeria, deixando o pensamento livre para reavaliar possibilidades de acesso aos trabalhos de arte distribudos de forma diferente e barata atravs das publicaes como catlogos, livros de artista ou revistas - e da arte correio.

    Jo Melvin Voc conheceu os trabalhos curatoriais de Lucy Lippard na dcada de 1960? Voc viu, por exemplo, Eccentric Abstraction (Abstrao Excntrica) ou Primary Structures (Estruturas Primrias)?

    Seth Siegelaub Estamos falando de 45 anos atrs. Em relao ao trabalho de Lucy, minha ateno era mais voltada escritora e crtica, no tanto organizadora de exposio... o surgimento da prtica da curadoria independente estava no pice. E, em parte, foi com o meu trabalho e com o desenvolvimento do projeto dela que a ideia de curador independente passou a existir como possibilidade. Ns, obviamente, tnhamos muito em comum: uma atrao homem e mulher que era, tambm, intelectual. O projeto esttico e intelectual que hoje se tornou a arte conceitual tomou forma durante esses contatos, o que naturalmente inclui Lucy.

    JM De qualquer maneira, voc a conheceu antes...

    SS Eu sabia dela tambm no somente a conhecia. Conversvamos nas aberturas de exposies e depois no bar. Voc se refere a uma pequena comunidade de vanguarda, de provavelmente cem pessoas e cinco, talvez dez, galerias. Todos se viam diariamente. Pode-se dizer que, como premissa, tinha-se que estar doente ou fora da cidade para no ver as coisas.

    JM Lippard diz que foi durante sua viagem Argentina, em 1968, onde participou do jri de uma exposio, que ela teve o que chamou de despertar para a poltica atravs de seu contato com artistas locais, sobretudo com o Grupo Rosario. Enquanto viajava pela Argentina e Peru, Lippard promovia o que descreveu como uma suitcase show (exposio dentro de uma mala), na qual todos os trabalhos eram facilmente transportveis de um pas para outro pelos prprios artistas, sem custo, utilizando apenas suas passagens areas. Ainda segundo Lippard, ao voltar a Nova York ela descobriu que voc j estava empregando as mesmas estratgias. Neste retorno da Argentina, ela foi convidada por Robert Huot para organizar uma exposio na Galeria Paula Cooper, uma mostra beneficente para o Student Mobilization Committee (SMC) para o fim da Guerra do Vietn.

    SS Foi a exposio de abertura da galeria, e foi feita tambm com Ron Wolin.

    JM Wolin foi responsvel pelo contato com a poltica partidria?

    SS Sim, ele era membro de uma organizao trotskista, o Partido Socialista dos Trabalhadores, e super envolvido com o movimento anti-guerra no Vietn.

    JM Ento, esse tema poltico foi quase uma declarao para a mostra de abertura.

    SS Cooper ganhou muitos pontos por isso. Talvez por outras coisas tambm, mas certamente por essa exposio.

    JM Outra exposio que Lucy Lippard fez na Galeria Paula Cooper foi uma mostra beneficente para a Art Workers Coalition (AWC), chamada Number 7 . Para-visual, foi assim que John Perreault descreveu como parecia a grande sala vazia na galeria, embora contivesse um campo magntico de Bob Barry, a corrente de ar de um ventilador de Hans Haacke, os blps de Richard Artschwager, uma reentrncia na parede de Lawrence Wiener e um trabalho com fio de arame de Andre. Perreault observou que a AWC estava preparando um contrato padro, de modo a permitir um percentual de lucro das revendas.

  • Creio que esta foi a primeira meno de contrato de direito dos artistas que o advogado Bob Projansky elaborou. O projeto surgiu diretamente das demandas da AWC? Ou j estava no ar?

    SS Ele nunca foi amplamente utilizado por causa da concorrncia entre os artistas, embora tenha sido proposto em muitas ocasies nas quais uma obra de arte era comprada. Eu no acho que algum iria perder uma venda porque se recusava a assinar. O contrato foi impresso como um encarte que poderia ser anexado ao trabalho. Andre utilizou-o e insistia que o contrato no fosse removido da obra.

    JM Eu gostaria de falar sobre a 557.087, a curadoria da exposio de Lucy Lippard em Seattle, em 1969, questionada por ter o carter de trabalho de artista no caso, ela mesma. Peter Plagens escreveu na Artforum que ela usou as obras como meio de produzir outro trabalho de arte, o seu prprio, ou seja, a exposio. Existe um paralelo com o modo como Jack Burnham considerou voc como um artista, e sua prtica como uma prtica artstica .

    SS Sim, eu fui acusado disso e voc certamente poderia considerar Lucy e eu como vanguarda dessa tradio. Provavelmente existem paralelos, mas eu teria que pensar cuidadosamente sobre quem mais estava fazendo isso. Um exemplo, no to perfeito, foi Germano Celant, na Itlia, talvez Charles Harrison, na Inglaterra, embora eu no acho que ele tenha curado muitas exposies, e tambm Michel Claura, na Frana. Todos eram crticos e curadores, mas independentes de instituies. Gene Goossen foi uma personalidade importante no mundo da arte, para mim; ele me influenciou em termos de atividades curatoriais e tambm estava trabalhando com a ideia de ser crtico e curador. Joseph Kosuth tambm um outro exemplo - um artista-curador.

    JM Era o mesmo que voc estava fazendo na poca?

    SS No, acho que no. Eu estava mais interessado em fazer coisas. No me vejo como um intelectual. Detecto um problema, uma questo ou situao e tento fazer algo desenvolvendo-o da forma mais interessante, com um olhar crtico para o que est acontecendo ao meu redor. Minha tese estar perto do cho, para ser o mais diverso possvel e enfrentar muitas reas. Em contrapartida, creio que hoje os chamados curadores independentes tm a inteno de teorizar. Todas as pessoas que acabei de mencionar no contexto dos anos 1960 e, certamente, outros que escapam de minha memria ou que eu nunca soube que exerciam essas atividades na poca, estavam cumprindo novas funes prticas.Muito disso teve a ver com questes como a do mais etreo, do mais barato e do envolvimento de materiais mais acessveis. Isso tornou possvel viabilizar tipos de exposies que voc no poderia fazer facilmente com esculturas e pinturas tradicionais exposies sem o problema do transporte ou de ter que mover coisas.

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  • JM Isso caracterizou a exposio de Seattle. Vocs foram l? Lippard escreveu que voc colaborou desde o incio no desenvolvimento dessa mostra.

    SS Sim. Lucy era uma crtica conhecida nos EUA, provavelmente tambm na Europa. Ela estava em uma posio na qual podia fazer este tipo de coisas e tinha contato com pessoas que a conheciam atravs de seus escritos. Na verdade, eu no tinha muito a fazer nesta mostra, o que fiz foi acompanh-la, e o meu trabalho foi produzir o catlogo. Eu estava l, ento eu sabia o que havia na exposio, mas as escolhas curatoriais e a ideia de fazer o catlogo em formato de fichas foram inteiramente dela. Eu s oferecia apoio para os aspectos da produo - acompanhar a impresso do catlogo em Nova York, por exemplo. Fomos juntos a Seattle para trabalhar na montagem; todo o trabalho havia sido feito por Lucy um ou dois anos antes. Ns alugamos um carro na Califrnia e em seguida fomos para Seattle. Ficamos l algumas semanas e eu a ajudei a definir a exposio .

    JM Havia tambm outras pessoas envolvidas?

    SS Certamente havia pessoas de Seattle e, mais tarde, quando a exposio foi para Vancouver, a populao local tambm ajudou. Era uma tarefa particularmente importante para uma pessoa independente e nova no lugar ter que descobrir onde obter isto ou conseguir aquilo. Depois de cerca de duas semanas, voei de volta para produzir o catlogo com base no trabalho fornecido e no material reunido em Nova York. Tenho quase certeza de que eu estava fazendo isso enquanto ela ainda estava l.

    JM Como os catlogos foram distribudos?

    SS Atravs de minha escassa rede de vendas, ou da de Wittenborn George e sua livraria em Nova York, alm de outros contatos. Mas um dos problemas do catlogo, e isso vale para as publicaes no encadernadas, que os livreiros no queriam se

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  • SS No sei. Isto deixa claro quais so as intenes do curador e, provavelmente, resulta em algo mais imparcial. Pode-se dar a todos os artistas um peso semelhante - ao menos poderia, no contexto desse projeto. Obviamente, se algum muito conhecido ou algum est presente, a realidade pode ser outra. Mas voc pode apresentar condies de igualdade para que todos tenham as mesmas possibilidades.

    JM Ele d espao e representao iguais a todos, tal como voc fez em seus prprios catlogos.

    SS Sim. Acho que isso sempre importante. No sei se pode-se chamar isso de vontade democrtica, mas acho profundamente chocante quando no catlogo de uma exposio coletiva h um artista na capa. Tomei conscincia de outras disparidades quando eu trabalhava em exposies. Por exemplo, que algum cujo trabalho muito desmaterializado est efetivamente pagando a escultura de Richard Serra. Temos um oramento de, digamos, $100.000; a obra de Lawrence Weiner custa US $ 1 para produzir e a de Serra US $ 50.000. Voc pode argumentar que a forma como o trabalho , mas eu no vou por a. Ocasionalmente, como um protesto simblico, Lawrence e eu, ainda que eu fosse o dono da obra, pedamos uma taxa para o emprstimo.

    JM Os catlogos de Lippard para suas exposies numeradas, normalmente com uma ficha para cada artista, poderiam ter tido uma ordem se assim voc preferisse, mesmo que fosse alfabtica. SS Acho que pode ter sido o esprito da poca, para tentar fugir da figura do artista que privilegiado. Eu no acho necessariamente que isso aconteceu, mas foi uma tentativa de lidar diretamente com essas questes de uma forma muito antecipada. Entender o que existe por trs de certos tipos de escolhas algo que desmistifica - outra palavra da dcada de 1960 - os processos em jogo. Isto lhe torna mais responsvel e faz com que as pessoas envolvidas - o artista e quem est produzindo o catlogo - compreendam um pouco mais claramente estes tipos de mecanismos e entendam como funcionam essas coisas. Uma das perguntas que me acompanham a questo da qualidade na arte. Como, quem, onde, por que e quando que um artista se torna mais importante do que o outro? E quem determina isso? Obviamente a resposta rpida o dinheiro, mas na verdade uma srie de coisas. muito estranho que no exista um estudo realizado sobre isso. um territrio totalmente desconhecido, como se diz. As pessoas simplesmente tomam por certo o acordo de que x timo e y no .

    JM Eu gostaria de voltar questo da propriedade de uma ideia e como isso se desenvolve, a fim de relacionar o que Lippard fez com o seu catlogo de fichas ao apresent-las como parte do trabalho total e tambm como contribuies distintas de cada artista. E apesar de eu no concordar com Plagens, de que todas as obras em 557.087 tornaram-se componentes do projeto de uma artista - Lippard - eu acho que a apresentao das fichas assemelha-se nitidamente com um projeto de arte.

    SS Eu concordo, e isso um problema se voc quer que seja um problema. Assume-se uma responsabilidade por isso, suponho eu, como qualquer um assume responsabilidade por qualquer outra coisa. um problema para se pensar. Eu no sei como ser superado, a no ser atravs de um certo tipo de anonimato.

    JM claro que uma pilha de fichas d infinitas possibilidades para embaralhar e, por isso, h a chance de reorganizao e participao do espectador.SS Sim, isso verdade. Mas voc tambm pode pintar a sua casa da cor que voc quiser, mas foi o arquiteto que projetou a edificao. Por isso, esta pode ser uma ideia falsa. Provavelmente, o mais interessante sobre as fichas sua ordem arbitrria. No haver linearidade faz com que voc possa l-las como quiser e compar-las entre si, porm esta falta de ordem tambm pode ser um p no saco. Lucy assume a responsabilidade de tudo isso ao colocar seu nome. Contudo, eu no iria to longe em dizer que fichas so a liberdade e os livros so a morte. (...) voc pode ler um livro a partir desta pgina, ou daquela outra pgina. Tenho certeza de que Lippard tambm pensou sobre isso em relao aos livros.

  • 1 Traduo para o portugus do original em ingls publicado no livro organizado por Cornelia Butler, From Conceptualismo to Feminism Lucy Lippards Numbers Shows 1969-1974. Exhibitions Histories, London, Afterall, 2012, pp. 250-262. Reproduzimos aqui apenas um trecho desta conversa que ocorreu em 28 de outubro de 2008.2 Seth Siegelaub expe suas estratgias curatoriais em On Exhibition and the World at Large (Studio International, dezembro de 1969, vol. 178, no. 917, pp. 202-203), entrevista a Charles Harrison publicada aps a exposio 557.087, em Seattle, e antes de 955.000, em Vancouver. Ver a traduo para o portugus, Sobre exposies e o mundo como um todo, em Hay en portugus?, nmero zero- edio experimental, maio/junho de 2012. N.T.3 Number 7, Galeria Paula Cooper, Nova York, 18 de maio a 15 de junho de 1969. Uma grande sala da galeria, aparentemente vazia, continha trabalhos, por exemplo, de Robert Barry (um campo magntico), Lawrence Weiner (um reentrncia na parede deixada por um tiro de espingarda), Ian Wilson (comunicao oral), Stephen Kaltenbach (segredo), Hans Haacke (corrente de ar produzida por um ventilador na porta), Robert Huot (sombras existentes), Richard Artschwager (pequenos losangos pretos, na janela e outros espalhados pela na rua), e de artistas que participaram com publicaes impressas, cadernos e livros sobre uma mesa.4 Blps (pronuncia-se blips) uma denominao criada pelo artista, no final dos anos 1960, para pequenas estruturas pretas ou brancas que so inseridas na paisagem urbana (fachadas de edifcios, metr, galerias, etc) chamando a ateno para superfcies ou elementos que normalmente passam desapercebidos. N.T. 5 O projeto Os Direitos dos Artistas e Transferncia de Contrato de Vendas foi elaborado por Siegelaub e o advogado Robert Projansky respondendo s demandas da AWC para a realizao de um contrato de trabalho para os artistas. O contrato especificava lucro de revenda que seria compartilhado entre artista e galerista, e que a cada transao seria declarado que o colecionador teria acesso direto informao. Isso foi publicado na Studio International, vol. 181, no.932, abril de 1971, pp. 186-188.6 Peter Plagens. Artforum. Vol. 8, no. 3, novembro de 1969, p. 67.7 Refere-se ao texto que Jack Burnham publicou na Artforum, vol. 8, no. 6, fevereiro de 1970: Alices Head: Reflexionon Conceptual Art, pp. 37-43.8 Lucy Lippard lembra tambm de Anne Focke como colaboradora chave. 9 O envelope contendo as fichas tinha o Seattle Museum como o seu endereo de retorno.10 Em um documento intitulado Despesas propostas para a Exposio Seattle, Lippard orou US$ 750 para as despesas de viagens dela e de Siegelaub, uma taxa de US$ 1.500 para ela com despesas do catlogo e seleo de artistas e US$ 1.000 Siegelaub para impresso do catlogo, embalagem e negcios em geral.

    JM Ela fez isso em sua contribuio para o catlogo da exposio de Marcel Duchamp, no MoMA em 1973, ao usar um sistema randmico que selecionou o material de um dicionrio e, atravs disso, construiu uma srie de textos readymade. Antes, havia seu ensaio para a mesma instituio, para o catlogo da exposio Information, em 1970. Ela escreveu sobre ausncia, sistemas e casualidade, abordando como organizar um determinado processo de catalogao, apropriando-se do aumento contnuo de cruzamento de referncias.

    JM Voc falou sobre os momentos do passado que foram se tornando importantes.

    SS Por outro lado, existe a crena de que quando voc est fazendo algo, voc est fazendo histria. Eu certamente nunca tinha pensado dessa forma. Se voc acha que voc est mudando o mundo, significa que voc j tem uma ideia da histria antes que ela tenha acontecido. E se voc pensa assim voc est tentando encaixar-se em uma linha histrica. Eu acredito que essas coisas sejam talvez lentas ou demorem muito. Ento, olhando para trs, talvez algo parea se constituir como o ponto inicial, ou parea ter desencadeado muitas das ideias adjacentes daquilo que voc vinha matutando na sua cabea durante muito tempo.