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26 Resumo A qualidade da água que deixa o reservató- rio de distribuição não é necessariamente a mesma qualidade da água que chega ao consumidor. Componentes não-conser- vativos presentes na água - como no caso do desinfetante cloro - variam sua concen- tração ao longo do percurso. Garantir a qua- lidade da água é uma atribuição das em- presas de saneamento. A prática atual de verificação em campo por meio de amos- tras para análise de cloro pelas empresas brasileiras pode ser associada à modelagem matemática para análise e gerenciamento da qualidade da água. Este trabalho apre- senta a teoria da desinfecção e os desinfe- tantes mais utilizados e analisa o processo da modelagem matemática nos módulos hi- dráulico e de qualidade, aplicando um estu- do de caso na cidade de Curitiba, no qual é utilizado o software WaterCad. O modelo apresentou bons resultados na calibração e validação, desta forma pôde-se estabelecer cenários de operação de cloro, verificando- se melhorias na qualidade da água distribuí- da com economia de desinfetante. Palavras-chave: modelagem matemática de cloro, rede de distribuição, qualidade de água, estratégias de cloração. Abstract The quality of the water that leaves the supply reservoirs does not necessarily match the one that reaches consumers. The concentration of non-preserving elements that are present Modelagem matemática do cloro em redes de distribuição de água Katia Regina Garcia da Silva Regina Tiemy Kishi in water, like chlorine (used as a disinfectant), varies along the way. Ensuring the quality of water is incumbent upon water utilities. The current in-field checking practice through sampling for chlorine analysis carried out by Brazilian companies may be associated to mathematical modeling for water quality analysis and management. In this paper we introduce the theory of disinfection and the most widely utilized disinfectants, as well as analyze the mathematical modeling process relating to the hydraulic and quality aspects, applying a case study using the WaterCad software, for Curitiba. The model has shown good calibration and validation results, therefore we were able to establish scenarios for chlorine operations leading to improved quality of the supplied water, and savings with disinfectants. Key words: chlorine mathematical modeling, supply network, quality of water, chlorination strategies. Introdução No Brasil e no mundo, na maioria dos sistemas de tratamento e distribuição de água à população, utiliza-se do agente químico cloro para proteção contra elementos bio- lógicos ou não, capazes de causar danos à saúde pública. O cloro é introduzido na água em uma das últimas etapas do tratamento em Estações de Tratamento de Água (ETA), chamada desinfecção. O cloro é um elemento não-conservativo e sua concentração na água vai se reduzindo conforme ele reage com outros elementos Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.19, n.19, p. 26-40, jan./jun. 2003

Modelagem matemática do cloro em redes de distribuição de água · 2004-05-11 · A qualidade da água que deixa o reservató-rio de distribuição não é necessariamente a mesma

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Resumo

A qualidade da água que deixa o reservató-rio de distribuição não é necessariamente amesma qualidade da água que chega aoconsumidor. Componentes não-conser-vativos presentes na água - como no casodo desinfetante cloro - variam sua concen-tração ao longo do percurso. Garantir a qua-lidade da água é uma atribuição das em-presas de saneamento. A prática atual deverificação em campo por meio de amos-tras para análise de cloro pelas empresasbrasileiras pode ser associada à modelagemmatemática para análise e gerenciamentoda qualidade da água. Este trabalho apre-senta a teoria da desinfecção e os desinfe-tantes mais utilizados e analisa o processoda modelagem matemática nos módulos hi-dráulico e de qualidade, aplicando um estu-do de caso na cidade de Curitiba, no qual éutilizado o software WaterCad. O modeloapresentou bons resultados na calibração evalidação, desta forma pôde-se estabelecercenários de operação de cloro, verificando-se melhorias na qualidade da água distribuí-da com economia de desinfetante.

Palavras-chave: modelagem matemática decloro, rede de distribuição, qualidade deágua, estratégias de cloração.

Abstract

The quality of the water that leaves the supplyreservoirs does not necessarily match the onethat reaches consumers. The concentrationof non-preserving elements that are present

Modelagem matemática do cloro em redesde distribuição de água

Katia Regina Garcia da SilvaRegina Tiemy Kishi

in water, like chlorine (used as a disinfectant),varies along the way. Ensuring the quality ofwater is incumbent upon water utilities. Thecurrent in-field checking practice throughsampling for chlorine analysis carried out byBrazilian companies may be associated tomathematical modeling for water qualityanalysis and management. In this paper weintroduce the theory of disinfection and themost widely utilized disinfectants, as well asanalyze the mathematical modeling processrelating to the hydraulic and quality aspects,applying a case study using the WaterCadsoftware, for Curitiba. The model has showngood calibration and validation results,therefore we were able to establish scenariosfor chlorine operations leading to improvedquality of the supplied water, and savings withdisinfectants.

Key words: chlorine mathematical modeling,supply network, quality of water, chlorinationstrategies.

Introdução

No Brasil e no mundo, na maioria dossistemas de tratamento e distribuição de águaà população, utiliza-se do agente químicocloro para proteção contra elementos bio-lógicos ou não, capazes de causar danos àsaúde pública. O cloro é introduzido na águaem uma das últimas etapas do tratamentoem Estações de Tratamento de Água (ETA),chamada desinfecção.

O cloro é um elemento não-conservativoe sua concentração na água vai se reduzindoconforme ele reage com outros elementos

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presentes nos sistemas de distribuição (tubu-lações e reservatórios), por isso precisa sermonitorado ao longo do sistema.

Devido à complexidade e ao tamanho damaioria dos sistemas de distribuição, é difícilconhecer totalmente a variação da qualidadeda água que ocorre no percurso entre a ETA eo consumidor. Nesse sentido o uso de mode-los matemáticos de qualidade da água torna-se uma ferramenta útil para traçar a variaçãoda mesma no espaço e no tempo. A aplica-ção desta ferramenta pode propiciar às com-panhias de saneamento muitos benefícios, umavez que os modelos podem predizer o com-portamento da qualidade da água em redesde distribuição e tanques, levando a estraté-gias de controle para manter e melhorar a qua-lidade da água em sistemas de distribuição pormeio da avaliação de alternativas operacionaise na otimização do processo de desinfecção.O uso do modelo pode auxiliar na determina-ção de locais para estações de recloração,reduzindo o consumo total de desinfetante econseqüentemente, custos, além de garantir aconcentração adequada aos consumidores.

Revisão bibliográfica

Modelos de qualidade de água emredes de distribuição

O desenvolvimento e a implementaçãode modelos de qualidade de água em siste-mas de distribuição têm tido crescente inte-resse a partir da década de 1980. Inúmerosmodelos têm sido desenvolvidos e aplicados(MALES et al, 1988; GRAYMAN e CLARK,1988; GRAYMAN et al, 1993; CLARK et al,1988; CLARK et al, 1993; ROSSMAN et al,1993; ROSSMAN e BOULOS, 1994;ROSSMAN et al, 1996; CASAGRANDE eSARMENTO, 1999; ISLAM et al,1997; WUet al, 1998; GAGNON et al, 1998; SMITHet al, 1998; FERNANDES, 2002), tanto parasimulação em condição permanente quan-to dinâmica.

Existem no mercado de informática di-versos modelos e softwares de modelagem

matemática para auxílio da análise hidráuli-ca e de qualidade. Dentre eles: H2Onet -Montgomery Watson Inc.; SynerGEE - StonerWorkstation Service; Epanet - EnvironmentalProtection Agency (EPA); WaterCad - HaestadMethods Inc.; Pipe2000 - KYPipe (Universityof Kentucky); MikeNet - Boss International.Cada um desses softwares provê uma ro-busta interface gráfica para o desenvolvimen-to dos modelos, anotações, códigos de co-res e dados de contorno ou resultados, e têminterface com dados de Sistemas de Infor-mações Geo-referenciadas (GIS) e dados deAutoCad. O aspecto comercial que os mo-delos têm (com exceção do Epanet) faz comque seus proprietários estejam constante-mente atualizando-os, para manter seus cli-entes. Atualmente, os softwares oferecemconexão com base de dados GIS, “esquele-tonização” (redução da malha de abasteci-mento às redes de maior porte), opção decálculo de bomba com velocidade variável,análises de custo de energia, regrasoperacionais complexas, calibração otimi-zada (ajuste de parâmetros como coeficien-te de Hazen-Williams e demandas), e sofisti-cadas formas de apresentação de resulta-dos.

No aspecto de maior interesse para estaaplicação - a Análise de Qualidade da Água- os softwares têm como base o Epanet, oqual, por ser de propriedade de EPA, foidesenvolvido com interesse em relação àproteção ao meio ambiente.

Na aplicação deste trabalho foi utiliza-do o software WaterCad, o qual é atualmenteaplicado na Unidade de Distribuição deCuritiba da Companhia de Saneamento doParaná (Sanepar), para análise hidráulica dosistema de distribuição.

O Processo da Modelagem Matemática

Construção, calibração e aplicação demodelos para sistemas de distribuição deágua são tarefas que envolvem muitos da-dos e mapas do sistema real. Como em qual-

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quer grande tarefa, o caminho é dividi-laem diversas etapas e trabalhar em cadauma delas. Algumas podem ser feitas emparalelo, enquanto que outras precisam serfeitas em série. A figura 1 ilustra as etapasda modelagem da rede de distribuição sub-divididas no módulo hidráulico e no módulode qualidade.

Um arquivo de dados básicos descre-vendo a rede, parâmetros operacionais e de-mandas, usados em conjunto com um pro-grama de computador para solução de re-des, produz o modelo de um sistema.

A análise de sistemas de distribuição deágua para modelagem pode ser generica-mente completada com os seguintes passos:

a) coleta de dados;b) preparação do modelo básico;c) calibração do modelo;d) uso do modelo calibrado para análise do sistema de distribuição.

O Módulo de Qualidade somentepode ser aplicado a uma rede já modeladahidraulicamente em período estendido, equanto melhores forem os resultados dassimulações hidráulicas, mais confiáveis tam-bém serão os resultados de cálculo da qua-lidade da água distribuída (CASAGRANDEe SARMENTO, 1999; GAGNON et al.,1998).

As equações básicas para solução demodelos de qualidade são fundamentadasno princípio da conservação de massa enas reações cinéticas. O processo de qua-lidade da água dentro de um tubo geral-mente inclui advecção, difusão e dispersão,reações químicas e biológicas, interaçõescom superfície interna dos tubos e fontesexternas. Esses processos também podemincluir o transporte simultâneo de múltiplassubstâncias e suas interações (FERNANDES,2002).

FIGURA 1 - FLUXOGRAMA DO PROCESSO DE MODELAGEM

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A expressão da taxa de reação de pri-meira ordem é a mais comumente utilizadanos processos de decaimento ou aumento daconcentração do componente em reações degrupo. A função de primeira ordem tem aforma:

onde:R = taxa de reação do componente (mg/l.s),k = coeficiente da taxa de reação dedecaimento (negativo) ou aumento de con-centração (positivo) (1/s),Ci = concentração da substância no fluido(mg/l).Assumindo esta taxa de reação de primeiraordem, tem-se a equação geral de transportede componente:

onde:t = intervalo de tempo para cálculo de qua-lidade da água (s)ui = velocidade média do fluxo (m/s)x = distância no tubo, positiva na direçãodo fluxo (m)

O software utilizado implementa um modelode taxa de reação de primeira ordem que usaum coeficiente de taxa de reação composto.Este efetivamente simula reações que ocor-rem no próprio fluido e na interface do fluidoe parede do tubo. O modelo de reação con-sidera que o aumento ou decaimento de umasubstância é dirigido por reações que acon-tecem tanto na água quanto com o materialao longo da parede de tubo.A expressão geral para taxa de decaimentode substância para cada tubo, i, é determi-nada abaixo:

onde:kb = coeficiente da taxa de reação no flui-do, de primeira ordem, (1/s)Ci = concentração de substância no fluido,(mg/l)kf = coeficiente de transferência de massaentre o fluido e a parede do tubo (m/s), quedepende de kw (coeficiente de taxa de rea-ção na parede do tubo)RHI = raio hidráulico do tubo (Diâmetro / 4),(m)CWI

= concentração da substância na pare-de, (mg/l).

Conforme ROSSMAN et al. (1994) eWALSKI (2001), o coeficiente da taxa de rea-ção na água - kb pode ser determinado utili-zando-se procedimento experimental chama-do ‘teste de garrafa’. Este teste permite de-terminar as reações do fluido separada-mente, sem a influência de outros processosque afetam a qualidade da água. A varia-ção da concentração do componente naágua será apenas função do tempo.

O coeficiente da taxa de reação naparede - kw é adaptado para a calibraçãodo modelo, ou seja, seu valor é ajustado paramelhor aproximação das concentrações ob-servadas em campo com os resultados si-mulados.

A calibração dos residuais de cloro éanáloga à calibração do modelo hidráuli-co. Os parâmetros com maior grau de in-certeza são alterados apropriadamente parase obter as melhores correlações entre da-dos observados e preditos. Para residuais decloro, o fator mais incerto é a taxa de rea-ção, a qual pode ser assumida como umaconstante de decaimento de primeira ordemk para cada tubo do sistema. Diferente dosfatores de fricção do modelo hidráulico,equações gerais para estimativa de taxas dedecaimento de cloro não estão disponíveis.As taxas de decaimento em cada sistemapodem ser estimadas pela combinação deanálises prévias de laboratório e coleta dedados de campo. Estudos experimentais so-bre taxas de decaimento de cloro em tubos

Equação 1

Equação 3

Equação 2

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simples têm revelado que as taxas dedecaimento em tubos são muitas vezes maio-res do que a taxa de decaimento da mesmaágua em um frasco.

Metodologia

Área de EstudoO estudo de caso foi desenvolvido na

Unidade de Distribuição Campo Compri-do (zona de pressão Recalque CampoComprido), que faz parte do Sistema deAbastecimento Passaúna, dentro do Siste-ma de Abastecimento de Água Integradode Curitiba. Esta zona de pressão abran-ge uma área de aproximadamente

34.405.780 m2 e atende, atualmente,84.600 habitantes da Região Leste da ci-dade (ref. Mar/2002), ou seja, 26.192economias, considerando cerca de 3 ha-bitantes por economia. Esta zona de pres-são entrega uma vazão média anual de17.625.600 litros de água por dia. A re-gião é basicamente residencial, contendotambém comércio e indústrias. A figura 2mostra a localização da área de estudono município de Curitiba.

A distribuição de água se dá a partir doCentro de Reservação Apoiado Campo Com-prido, que tem volume nominal de 5.000 m3

e conta com 283.200 metros de rede, comdiâmetros variando de 32 a 600 mm.

FIGURA 2 - LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO DENTRO DE CURITIBA

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Aplicação e Calibração do ModeloHidráulico

O modelo hidráulico é a base para omodelo de qualidade e foi aplicado seguin-do as etapas:

• “Esqueletonização”;• Detalhamento da Unidade Operativa;• Avaliação das regras operacionais;

• Cálculo de demanda média;• Definição do perfil de demanda;• Para a calibração do modelo hidráu-

lico foram medidas pressões no período de13 a 21 de maio de 2002. Do gráfico 1 aográfico 4 estão apresentadas as pressõesmedidas de alguns pontos, em conjunto comas pressões calculadas (com o modelo ajus-tado para uma operação usual).

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Aplicação e Calibração do Modelode Qualidade

Uma vez calibrado o módulo hidráuli-co, pode-se aplicar o módulo de qualidadeà rede de distribuição. Para isto é necessáriaa determinação do coeficiente de taxa dereação na água e a análise e ajuste do coe-ficiente da taxa de reação na parede da tu-bulação.

O modelo de qualidade foi calibradoutilizando-se uma série de dados de concen-tração de cloro em campo e, com uma ou-

tra série de dados, foi validado.Para determinação do coeficiente de

decaimento de cloro na água - kb, a equipeda Unidade de Produção de Curitiba daSanepar efetuou testes na Estação de Trata-mento de Água Passaúna, onde existe o la-boratório de análises.

A medição da concentração de clororesidual livre na rede de distribuição se deuem dois períodos de 24 horas, na data de08.06.02 (série de dados utilizada para acalibração do modelo) e 15.06.02 (sérieutilizada para validação do modelo), pela

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equipe de Qualidade da Água da Unida-de de Serviço de Distribuição de Curitiba(Usdi-CT) da Sanepar. Nos dois períodos,a equipe iniciou a medição à 0:00 h, de-terminando o cloro residual livre na saídado reservatório e seguindo o percurso mos-trado na figura 3, determinando cloro resi-

dual livre nos pontos indicados.O coeficiente kw foi utilizado para o ajus-

te do módulo de qualidade da água. Por mé-todo de tentativas, chegou-se a kw = 0,15m/dia, valor que resultou em melhores apro-ximações entre dados de campo e do mo-delo.

Resultados

Calibração do Modelo de QualidadePara a data de 08.06.02, em que fo-

ram coletadas as informações sobre clororesidual livre na rede de distribuição, execu-tou-se simulação em período de 24 horas,reproduzindo-se as condições operacionais

e de demanda (obtidas do SCADA).Os resultados do modelo e os dados

de campo estão apresentados do gráfico5 ao gráfico 8 e representam alguns dospontos que foram monitorados. Nos gráfi-cos são apresentados os limites superior einferior, conforme faixa de imprecisão deleitura do equipamento medidor de cloro.

FIGURA 3 - CAMINHO PERCORRIDO PARA ANÁLISE DE CLORO NA REDE DE DISTRIBUIÇÃO

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A validação do modelo ocorre apóssua calibração quando, ajustado para umasérie de dados, o modelo é aplicado parauma segunda série, alterando-se apenas osparâmetros de entrada do cálculo.

Este processo foi executado para a datade 15.06.02, utilizando-se dados de con-dições operacionais e de demanda doSCADA, além de análises de cloro residualnos pontos da rede (conforme figura 3).Alguns dos resultados de modelo e os da-dos de campo estão apresentados do grá-fico 9 ao gráfico 12.

A análise da validação pode ser encon-trada na tabela 1 através do RMS Erro e do

valor de λ. O valor de λ foi de 0,048,valores entre 0,014 e 0,116 considerandoseparadamente os nós monitorados. No-vamente os valores, abaixo de 0,50, de-monstram que o modelo teve um bom re-sultado. Quanto ao RMS Erro, o valor en-contra-se abaixo de 0,053 mg/L em cadanó, sendo 0,01mg/L para todos os pontos.Considerando a precisão de medição decloro residual, o valor pode ser considera-do insignificante, e o modelo, validado.

Verificou-se que a aplicação do mode-lo para os dois dias resultou em valores deconcentração em acordo com as mediçõesde campo.

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Simulações

Após a calibração do modelo de quali-dade, de maneira a demonstrar o uso domesmo como ferramenta de gerenciamentoe definição de estratégias para manutençãoda qualidade da água, foram estudados trêscenários de operação com relação àcloração, sendo eles:

a) concentração constante na saída doreservatório, de 1,0 mg/l;b) concentração constante na saída doreservatório, de 2,0 mg/l;c) concentração constante na saída doreservatório, de 1,0 mg/l, com pontosde recloração na rede.No primeiro cenário estudado, cuja con-

centração na saída do reservatório foi mantidaconstante em 1,0 mg/l de cloro residual livre,ficou evidenciado um nó (rcco-139) com resi-dual de 0,19 mg/l (no horário crítico - 7 ho-ras), além de vários nós com concentraçõesabaixo de 0,5 mg/l. O valor de 0,19 mg/l está5% abaixo do limite determinado pela Portaria36/90 MS, que fixa o valor mínimo de 0,2mg/l de cloro residual livre em qualquer pontoda rede de distribuição. Além disso, a Saneparadota o limite mínimo de 0,5 mg/l para omesmo caso, o que faz com que o ponto críti-co fique situado 62% abaixo do mínimo.

Para o segundo cenário de operação,considerou-se a concentração de saída cons-tante e igual a 2,0 mg/l (valor máximo reco-mendado pela Portaria 1469/2000 do Mi-nistério da Saúde).

Nesta simulação, observou-se que o nócrítico quanto ao residual de cloro ficou com0,39 mg/l, no horário das 7 horas da ma-nhã. Conforme o exposto, a concentraçãode cloro no nó crítico fica abaixo do padrãoda empresa, apesar de a concentração nasaída do reservatório ser a máxima.

Para este caso, considerando a vazãomédia de 204 l/s e concentração constantede cloro, de 2,0 mg/l, o consumo diário dodesinfetante foi calculado em 35,25 kg.

No terceiro cenário de operação estu-dado, optou-se por 1,0 mg/l para a concen-tração de saída do reservatório, como na pri-meira simulação, acrescentando-se quatropontos de recloração nos nós rcco-012, rcco-021, rcco-034 e rcco-094, destacados na fi-gura 4. Considerou-se a concentração desaída de 1,5 mg/l para os recloradores dosnós rcco-012, rcco-034 e rcco-094; e 2,0mg/l para o reclorador rcco-021.

O nó rcco-139 manteve-se crítico emconcentração de cloro, com o valor mínimo(às 7 horas) de 0,42 mg/l. Pelo gráfico 13 (ce-nário “cloradores”) pode-se observar que a

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Calculated Concentration Varying TimePressure Junction: rcco-139

Time(hr)

(mg/l)

Ca

lcu

late

d C

once

ntr

ation

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1,0

1,1

96,0 100,0 104,0 108,0 112,0 116,0 120,0

cloro 1ppmcloradorescloro 2ppm

concentração fica abaixo de 0,5 ppm das 5às 8 horas (hora 101 a 104). Calculou-se oconsumo diário do desinfetante em 25,12 kg.

Analisando os três resultados, o cenáriode recloração apresenta, além de uma redu-

ção no consumo de cloro para a zona depressão, aumento de concentração no nó crí-tico rcco-139. Apesar deste ter apresentadoresidual menor que 0,5 ppm (o que ocorredurante 12,5% do dia), os valores calculados

FIGURA 4 - LOCALIZAÇÃO DE PONTOS DE RECLORAÇÃO

GRÁFICO 13 - CONCENTRAÇÃO DE CLORO NO NÓ RCCO-139, PARA TRÊS CENÁRIOS DE OPERAÇÃO

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Conclusões e recomendações

Através da calibração e validação domodelo de qualidade e sua aplicação paracenários de operação e demanda, os obje-tivos da pesquisa foram atingidos. Foi possí-vel a análise da representatividade do mo-delo e do comportamento da concentraçãode cloro na área piloto, determinando-seestratégias de recloração e indicando-sepossibilidades de economia.

O modelo correspondeu bem às expec-tativas, demonstrando claramente que podedar suporte ao gerenciamento do sistema,indicando os efeitos da operação do mes-mo na variação espacial e temporal da qua-lidade da água distribuída.

Para o modelo de qualidade da água,o coeficiente da taxa de reação na parededo tubo foi ajustado e considerado como umúnico valor para toda a malha de distribui-ção. Esta conduta é uma simplificação darealidade, pois cada tubo da rede pode terum valor de coeficiente próprio, diferente deoutros. Esta variação do valor do coeficien-te kw em cada tubo é devida ao material,ano de instalação ou tempo de uso e condi-ções das paredes internas do tubo.

O valor de kw utilizado no modelo dequalidade é baixo, o que condiz com (1) omodelo hidráulico que, na fase de calibraçãoteve o coeficiente de Hazen-Williams de vá-rios trechos das redes de ferro aumentadoem relação ao usual, (2) 88,11% da exten-

são da rede, que é de material plástico,tem menor rugosidade que o ferro e é maisinerte (não se altera com os elementos con-tidos na água tratada). Outras áreas doSistema de Abastecimento Integrado deCuritiba, com redes mais antigas em ferrofundido, terão condições menos favoráveis.Como citado por CLARK et al. (1993), odecaimento de cloro na água é, em muitoscasos, menor que o decaimento devido àtaxa de reação na parede, portanto, é muitoimportante considerar as condições damalha de distribuição no ajuste de kw.

As análises de cloro residual efetuadasnos pontos da malha de distribuição fo-ram feitas de forma convencional, a partirde um plano de trabalho de 24 horas paraas equipes que monitoram a qualidadeda água da Usdi-CT. Este mesmo tipo deanálise pode ser executado de formaautomatizada, pois existem atualmente nomercado, equipamentos eletrônicos demonitoramento. Esses equipamentos ana-lisam o componente cloro na rede e ar-mazenam em data logger a informaçãode concentração, podendo ainda transmi-ti-la, se interligado a linha telefônica ouantena de rádio. O uso desses equipa-mentos facilita a coleta de dados na fasede calibração do modelo de qualidade,visto que a tomada dos valores de con-centração no campo deve ser feita porperíodos estendidos.

Estudos futuros podem derivar-se des-ta pesquisa, que se limitou à análise, atra-vés de modelagem matemática, de clorona rede de distribuição. Um aspecto quenão foi aprofundado, mas que tem grandeimportância, é a avaliação de decaimento

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estão próximos a 0,5 ppm e bem acima domínimo estabelecido pela Portaria 36/90 MS.

A tabela 2, acima, traz um resumo dosresultados das simulações.

x

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de concentração de cloro em tanques. Con-forme constatado em estudos anteriores(GRAYMAN e CLARK, 1993; LIOU eKROON, 1987; ISLAM e CLARK, 1997), osreservatórios são grandes consumidores dedesinfetante.

Também se faz necessária uma avalia-ção mais aprofundada sobre coeficientes detaxa de reação em tubos, estabelecendo-serelação entre o coeficiente, material de tuboe idade, e determinando-se valores.

Referências

CASAGRANDE, J.; SARMENTO, R. O usode modelagem matemática de qualidadede água no controle de cloro residual emsistemas de distribuição. In: CONGRES-SO BRASILEIRO DE ENGENHARIA SANI-TÁRIA E AMBIENTAL,19., Foz do Iguaçu.Anais... Foz do Iguaçu, Pr.: ABES, 1999,v. 2.

FERNANDES, C. Water quality modeling inpipelines including the impact of hydraulictransients. Toronto, 2002. 204 f. Tese (Dou-torado em Engenharia Civil) - Departamen-to de Engenharia Civil, Universidade de To-ronto.

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Autoras

Katia Regina Garcia da Silva,tecnóloga da construção civil, pós-

graduada em Planejamento e Gestão deNegócios, mestre em engenharia

ambiental pela UFPR, responsável peloModelo Matemático da Unidade de Produ-

ção- USPD-CT da Sanepar.

Regina Tiemy Kishi,doutora em engenharia ambiental

pela Karlsruhe, Alemanha, pesquisadorado Lactec.

Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.19, n.19, p. 26-40, jan./jun. 2003